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Sexta-feira, 16 de Abril de 2004 I Série - Número 75

IX LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2003-2004)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 15 DE ABRIL DE 2004

Presidente: Ex.mo Sr. João Bosco Soares Mota Amaral

Secretários: Ex. mos Srs. Manuel Alves de Oliveira
Ascenso Luís Seixas Simões
Henrique Jorge Campos Cunha

S U M Á R I O


O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta da entrada na Mesa do projecto de resolução n.º 243/IX, de requerimentos e da resposta a alguns outros.
Em declaração política, o Sr. Deputado Luís Marques Guedes (PSD) anunciou que vai requerer a vinda do Tribunal de Contas à comissão parlamentar competente para esclarecer as conclusões de uma auditoria desta entidade sobre as obras do Metropolitano de Lisboa no Terreiro do Paço e respondeu ao pedido de esclarecimento do Sr. Deputado Rui Cunha (PS).
Também em declaração política, o Sr. Deputado António Filipe (PCP) chamou a atenção para uma notícia do Diário de Notícias onde se refere que, em face da escalada de violência no Iraque, o Governo português pondera a substituição do contingente da GNR por uma força do Exército, tendo respondido aos pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados João Rebelo (CDS-PP) e Vieira de Castro (PSD).
Ainda em declaração política, o Sr. Deputado João Pinho de Almeida (CDS-PP) congratulou-se pela medida tomada pelo Governo sobre o programa de combate ao abandono escolar e respondeu ao pedido de esclarecimento do Sr. Deputado António Braga (PS).
Igualmente em declaração política, o Sr. Deputado António José Seguro (PS), a propósito da sua eleição para Presidente da bancada socialista, reafirmou as prioridades políticas já definidas pelo seu partido e criticou a política económica e social do Governo. No final, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Guilherme Silva (PSD), Telmo Correia (CDS-PP) e Bernardino Soares (PCP).
Finalmente, também em declaração política, o Sr. Deputado Francisco Louçã (BE) referiu-se à situação no Iraque e condenou a actuação do Governo nesta questão.

Ordem do dia. - Procedeu-se ao debate da proposta de resolução n.º 63/IX - Aprova o Acordo entre a República Portuguesa e o Reino de Espanha para a Constituição de um Mercado Ibérico da Energia Eléctrica, assinado em Lisboa, em 20 de Janeiro de 2004, que foi aprovada em votação global. Usaram da palavra, a diverso título, além do Sr. Ministro da Economia (Carlos Tavares), os Srs. Deputados Honório Novo (PCP), Luís Fazenda (BE), Isabel Castro (Os Verdes), Graça Proença de Carvalho (PSD), Maximiano Martins (PS), Herculano Gonçalves (CDS-PP).
Deu-se conta da entrada na Mesa da proposta de lei n.º 122/IX, da proposta de resolução n.º 67/IX, dos projectos de resolução n.os 241 e 242/IX e da apreciação parlamentar n.º 76/IX.
A Câmara apreciou, na generalidade e em conjunto, a proposta de lei n.º 119/IX - Aprova o Estatuto do Mecenato Científico e altera o Estatuto do Mecenato, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 74/99, de 16 de Março, que foi aprovada, e o projecto de lei n.º 426/IX - Altera o Estatuto do Mecenato, promove o mecenato científico e alarga o regime de incentivos fiscais à I&D empresarial (PS), tendo merecido

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aprovação um requerimento, apresentado pelo PS, de baixa à Comissão de Economia e Finanças, sem votação. Intervieram, a diverso título, além da Sr.ª Ministra da Ciência e do Ensino Superior (Maria da Graça Carvalho), os Srs. Deputados Augusto Santos Silva (PS), Pinho Cardão e Massano Cardoso (PSD), Isabel Castro (Os Verdes), João Pinho de Almeida (CDS-PP), Francisco Louçã (BE), Luísa Mesquita (PCP) e Eduardo Cabrita (PS).
Foram aprovados os votos n.os 147/IX (PSD e CDS-PP) e 148/IX (PS) - De pesar pelo falecimento de Francisco Lyon de Castro, fundador das publicações Europa-América, sobre os quais intervieram os Srs. Deputados Isilda Pegado (PSD), Luiz Fagundes Duarte (PS), Narana Coissoró (CDS-PP), Lino de Carvalho (PCP), Isabel Castro (Os Verdes) e Luís Fazenda (BE), tendo, no fim, a Câmara guardado 1 minuto de silêncio.
A Câmara aprovou o projecto de resolução n.º 243/IX - Viagem do Presidente da República a Varsóvia e a Paris (Presidente da AR).
Após aprovação de um requerimento de avocação, apresentado pelo PSD, para votação em Plenário da proposta de resolução n.º 44/IX - Aprova, para ratificação, a Decisão do Conselho, reunido ao nível dos Chefes de Estado ou de Governo, de 21 de Março de 2003, relativa a uma alteração do n.º 2 do artigo 10.º dos Estatutos do Sistema Europeu de Bancos Centrais e do Banco Central Europeu, foi a mesma aprovada em votação global. Produziram declaração de voto os Srs. Deputados Alberto Costa (PS), Pinho Cardão (PSD), Francisco Louçã (BE) e Bernardino Soares (PCP).
Finalmente, foram aprovados três pareceres da Comissão de Ética, autorizando Deputados do PSD a prestarem depoimento em tribunal.
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 30 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas.

Srs. Deputados presentes à sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
Abílio Jorge Leite Almeida Costa
Adriana Maria Bento de Aguiar Branco
Alberto Pedro Caetano
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
Ana Paula Rodrigues Malojo
António Carlos de Sousa Pinto
António da Silva Pinto de Nazaré Pereira
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Fernando de Pina Marques
António Henriques de Pinho Cardão
António Joaquim Almeida Henriques
António Manuel da Cruz Silva
António Maria Almeida Braga Pinheiro Torres
António Pedro Roque da Visitação Oliveira
António Ribeiro Cristóvão
Bernardino da Costa Pereira
Bruno Jorge Viegas Vitorino
Carlos Alberto da Silva Gonçalves
Carlos Alberto Rodrigues
Carlos Jorge Martins Pereira
Carlos Manuel de Andrade Miranda
Carlos Parente Antunes
Daniel Miguel Rebelo
Diogo de Sousa Almeida da Luz
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Eduardo Artur Neves Moreira
Eduardo Casimiro de Deus Pereira da Silva
Elvira da Costa Bernardino de Matos Figueiredo
Fernando António Esteves Charrua
Fernando Jorge Pinto Lopes
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho
Fernando Santos Pereira
Francisco José Fernandes Martins
Gonçalo Miguel Lopes Breda Marques
Hugo José Teixeira Velosa
Isménia Aurora Salgado dos Anjos Vieira Franco
João Bosco Soares Mota Amaral
João Carlos Barreiras Duarte
João Eduardo Guimarães Moura de Sá
João José Gago Horta
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Joaquim Miguel Parelho Pimenta Raimundo
Joaquim Virgílio Leite Almeida da Costa
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado
José Alberto Vasconcelos Tavares Moreira
José António Bessa Guerra
José António de Sousa e Silva
José Luís Campos Vieira de Castro
José Manuel Álvares da Costa e Oliveira
José Manuel Carvalho Cordeiro

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José Manuel de Lemos Pavão
José Manuel de Matos Correia
José Manuel dos Santos Alves
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro
José Manuel Pereira da Costa
José Miguel Gonçalves Miranda
Judite Maria Jorge da Silva
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Luís Cirilo Amorim de Campos Carvalho
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Filipe Soromenho Gomes
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Manuel Alves de Oliveira
Manuel Filipe Correia de Jesus
Maria Assunção Andrade Esteves
Maria Aurora Moura Vieira
Maria da Graça Ferreira Proença de Carvalho
Maria Eduarda de Almeida Azevedo
Maria Goreti Sá Maia da Costa Machado
Maria Isilda Viscata Lourenço de Oliveira Pegado
Maria Natália Guterres V. Carrascalão da Conceição Antunes
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria Teresa da Silva Morais
Mário Patinha Antão
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Fernando Alves Ramos Coleta
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Paulo Jorge Frazão Batista dos Santos
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Rodrigo Alexandre Cristóvão Ribeiro
Rui Miguel Lopes Martins de Mendes Ribeiro
Salvador Manuel Correia Massano Cardoso
Vasco Manuel Henriques Cunha

Partido Socialista (PS):
Alberto Arons Braga de Carvalho
Alberto Bernardes Costa
Alberto de Sousa Martins
Alberto Marques Antunes
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Ana Maria Benavente da Silva Nuno
Antero Gaspar de Paiva Vieira
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António de Almeida Santos
António Fernandes da Silva Braga
António José Martins Seguro
António Luís Santos da Costa
António Ramos Preto
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Ascenso Luís Seixas Simões
Augusto Ernesto Santos Silva
Carlos Manuel Luís
Edite Fátima Santos Marreiros Estrela
Eduardo Arménio do Nascimento Cabrita
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues
Fausto de Sousa Correia

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Fernando dos Santos Cabral
Fernando Manuel dos Santos Gomes
Fernando Pereira Cabodeira
Fernando Pereira Serrasqueiro
Fernando Ribeiro Moniz
Francisco José Pereira de Assis Miranda
Guilherme Valdemar Pereira D'Oliveira Martins
Jaime José Matos da Gama
Jamila Bárbara Madeira e Madeira
João Cardona Gomes Cravinho
João Rui Gaspar de Almeida
Joaquim Augusto Nunes Pina Moura
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira
Jorge Lacão Costa
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho
José António Fonseca Vieira da Silva
José Augusto Clemente de Carvalho
José Carlos Correia Mota de Andrade
José da Conceição Saraiva
José Eduardo Vera Cruz Jardim
José Manuel de Medeiros Ferreira
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
José Manuel Santos de Magalhães
José Maximiano de Albuquerque Almeida Leitão
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa
Laurentino José Monteiro Castro Dias
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís Alberto da Silva Miranda
Luís Manuel Capoulas Santos
Luís Manuel Carvalho Carito
Luísa Pinheiro Portugal
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Manuel Pedro Cunha da Silva Pereira
Maria Amélia do Carmo Mota Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Cristina Vicente Pires Granada
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria do Carmo Romão Sacadura dos Santos
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Maximiano Alberto Rodrigues Martins
Nelson da Cunha Correia
Nelson Madeira Baltazar
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui António Ferreira da Cunha
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Teresa Maria Neto Venda
Victor Manuel Bento Baptista

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Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Zelinda Margarida Carmo Marouço Oliveira Semedo

Partido Popular (CDS-PP):
Álvaro António Magalhães Ferrão de Castello-Branco
António Herculano Gonçalves
Diogo Nuno de Gouveia Torres Feio
Henrique Jorge Campos Cunha
Isabel Maria de Sousa Gonçalves dos Santos
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
João Rodrigo Pinho de Almeida
José Miguel Nunes Anacoreta Correia
Manuel de Almeida Cambra
Manuel Miguel Pinheiro Paiva
Narana Sinai Coissoró
Paulo Daniel Fugas Veiga
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia

Partido Comunista Português (PCP):
António Filipe Gaião Rodrigues
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas
Jerónimo Carvalho de Sousa
José Honório Faria Gonçalves Novo
Maria Luísa Raimundo Mesquita

Bloco de Esquerda (BE):
Alda Maria Botelho Correia Sousa
Francisco Anacleto Louçã
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda

Partido Ecologista "Os Verdes" (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
Isabel Maria de Almeida e Castro

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai proceder à leitura do expediente.

O Sr. Secretário (Manuel Oliveira): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deu entrada na Mesa, e foi admitido, o projecto de resolução n.º 243/IX - Viagem do Sr. Presidente da República a Varsóvia e Paris (Presidente da AR).
Foram ainda apresentados diversos requerimentos.
Nos dias 22 e 23 e nas reuniões plenárias de 24 e 25 de Março: ao Sr. Primeiro-Ministro e aos Ministérios da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, das Obras Públicas, Transportes e Habitação e da Economia, formulados pelos Srs. Deputados José Apolinário, Maria Santos e Renato Sampaio; aos Ministérios da Economia, das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, da Ciência e do Ensino Superior, das Obras Públicas, Transportes e Habitação, da Educação, da Segurança Social e do Trabalho e à Câmara Municipal de Coimbra, formulados pelos Srs. Deputados Luísa Mesquita, Bruno Dias e Honório Novo; aos Ministérios da Defesa Nacional, da Economia, das Obras Públicas, Transportes e Habitação, da Cultura, da Justiça e das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, formulados pelas Sr.as Deputadas Zelinda Marouço Semedo e Isabel Castro; ao Governo e ao Ministério da Saúde, formulados pelos Srs. Deputados Bernardino Soares e Jerónimo de Sousa; ao Ministério das Finanças, formulados pelos Srs. Deputados Lino de Carvalho e Francisco Louçã; ao Ministério da Administração Interna, formulado pelo Sr. Deputado José Miguel Medeiros.
Na reunião plenária de 26 e no dia 29 de Março: ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e

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Habitação, formulado pelo Sr. Deputado Jorge Tadeu Morgado; aos Ministérios da Economia e da Justiça e à Administração da EDP, formulados pelos Srs. Deputados Marques Júnior, Ricardo Gonçalves e Luís Fazenda; à Ordem dos Arquitectos Portugueses, formulado pela Sr.ª Deputada Isabel Gonçalves; aos Ministérios da Administração Interna e da Saúde, formulados pelo Sr. Deputado Bernardino Soares; aos Ministérios das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, da Justiça, da Defesa Nacional, das Obras Públicas, Transportes e Habitação, da Educação e da Ciência e Ensino Superior, formulados pelas Sr.as Deputadas Isabel Castro e Luísa Mesquita; à Câmara Municipal de Tomar, formulado pelo Sr. Deputado Herculano Gonçalves; à Secretaria de Estado da Juventude e Desportos, formulado pelo Sr. Deputado Bruno Dias.
No dia 30 e na reunião plenária de 31 de Março: ao Sr. Primeiro-Ministro, aos Ministérios das Obras Públicas, Transportes e Habitação, da Educação e da Economia e à Administração dos CTT - Correios de Portugal, formulados pelo Sr. Deputado António Galamba; ao Ministro Adjunto do Primeiro-Ministro e aos Ministérios da Economia, dos Negócios Estrangeiros e das Comunidades Portuguesas e da Administração Interna, formulados pelo Sr. Deputado José Apolinário; aos Ministérios da Saúde e da Administração Interna, à Administração do Hospital Garcia de Orta e à Câmara Municipal de Lisboa, formulados pelos Srs. Deputados Narana Coissoró e Bruno Dias; aos Ministérios dos Negócios Estrangeiros e das Comunidades Portuguesas, da Administração Interna, da Justiça e da Defesa Nacional, formulados pelos Srs. Deputados Alberto Martins, Vitalino Canas e António Filipe; aos Ministérios da Segurança Social e do Trabalho, da Economia, da Saúde, das Obras Públicas, Transportes e Habitação e das Finanças, formulados pelo Sr. Deputado Honório Novo.
Nas reuniões plenárias de 1 e 2 e nos dias 5 e 6 de Abril: aos Ministérios da Saúde, das Obras Públicas, Transportes e Habitação, das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, da Justiça e da Saúde e à Secretaria de Estado da Juventude e Desportos, formulados pelos Srs. Deputados Fernando Moniz, Álvaro Castello-Branco, Honório Novo e Alberto Antunes; ao Tribunal de Contas, formulado pelo Sr. Deputado Maximiano Martins; aos Ministérios da Justiça e da Educação, formulados pelos Srs. Deputados Duarte Pacheco e José Apolinário; ao Sr. Primeiro-Ministro, à Ministra de Estado e das Finanças e ao Ministério da Segurança Social e do Trabalho, formulados pelos Srs. Deputados Teresa Venda e António Galamba; ao Ministério da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, formulado pelo Sr. Deputado Carlos Carvalhas; ao Ministério das Finanças, formulado pelo Sr. Deputado José Augusto de Carvalho.
Por sua vez, o Governo respondeu a requerimentos apresentados por vários Srs. Deputados.
No dia 29 de Março: Luísa Mesquita, José Junqueiro e Carlos Luís.
Nos dias 30 e 31 de Março: Isabel Castro, Lino de Carvalho, Manuela Melo, Leonor Coutinho, Honório Novo, Bernardino Soares, José Saraiva, António Filipe, Marques Júnior, José Lello, Carlos Carvalhas, Álvaro Castello-Branco, António Galamba, Helder Amaral, Nelson Correia, Luísa Mesquita, Bruno Dias, Diogo Feio e Miguel Paiva.
Nos dias 31 de Março e 2 de Abril: José Apolinário, Honório Novo e Bruno Dias.
No dia 6 de Abril: António Filipe, Honório Novo, Bernardino Soares, Rodeia Machado, Jerónimo de Sousa, Luiz Fagundes Duarte, Leonor Coutinho, Alberto Antunes, Rui Miguel Ribeiro, João Teixeira Lopes, Eduardo Moreira e Miguel Paiva.
Foram ainda respondidos requerimentos apresentados por vários Srs. Deputados.
No dia 29 de Março: Manuel Oliveira, Diogo Feio, Paulo Veiga, Miguel Paiva e Herculano Gonçalves.
No dia 30 de Março: Diogo Feio, Paulo Veiga e Miguel Paiva.
Nos dias 1, 2 e 6 de Abril: Diogo Feio, Manuel Oliveira e Herculano Gonçalves.
Em termos de expediente, é tudo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a primeira parte do período de antes da ordem do dia de hoje destina-se a declarações políticas.
Assim, para uma declaração política, em nome do Grupo Parlamentar do PSD, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O assunto que vou abordar prendeu, durante largos meses, a agenda política e a atenção da opinião pública. Encheu páginas de jornais, abriu noticiários, foi objecto de análises e de discussões, dentro e fora deste Parlamento. Refiro-me às obras do Metropolitano de Lisboa, no Terreiro do Paço, um assunto que alguns quiseram que rapidamente se esgotasse, só que foi esta semana publicamente conhecido o resultado da auditoria efectuada pelo Tribunal de Contas.
Não se trata, agora, de afirmações proferidas por dirigentes do Partido Social Democrata, tão-pouco

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de apreciações feitas por Deputados ou de trabalho produzido no âmbito de uma comissão parlamentar. Não! Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O que agora é confirmado e denunciado consta de uma auditoria feita pelo Tribunal de Contas e das conclusões que, nesse âmbito, são sentenciadas. E estas são claras, manifestas e inequívocas: apontam erros grosseiros, faltas graves, falhas inqualificáveis, ao longo de todo o processo que conduziu aos incidentes ocorridos no Terreiro do Paço. Erros, faltas e falhas que - importa referir - se reportam à responsabilidade da anterior administração do Metropolitano de Lisboa e do anterior Governo, do Governo do Partido Socialista.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Alguma da adjectivação que até agora usei é minha. Mas que dizer, quando o Tribunal de Contas aponta, e cito, a "falta de maturidade e rigor posta na elaboração dos projectos"?
Para que não restem dúvidas, vou ler uma passagem do referido relatório da auditoria, onde, depois de referir surpresa crítica por a elaboração de projectos e a fiscalização das empreitadas estarem cometidas à mesma empresa, participada na totalidade pelo próprio Metropolitano de Lisboa, o Tribunal de Contas remata da forma que passo a citar: "Considerando, por um lado, que um mau projecto tem como consequência directa o aumento dos custos de fiscalização, em resultado do deslizamento do prazo da obra, e que, por outro lado, o Metropolitano não implementou quaisquer mecanismos de responsabilização dos projectistas, nomeadamente quanto a erros e omissões do projecto, quer na vertente conceptual, quer em termos de medições, esta acumulação de funções não contribuiu para salvaguardar os interesses do Metropolitano de Lisboa." Esta conclusão é lapidar, inequívoca e mais do que suficiente para que muitos, hoje, se envergonhem do que fizeram e disseram num passado bem recente.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Não há teoria da cabala ou da vitimização que resista a afirmações tão contundentes.
O Tribunal de Contas aponta erros indesculpáveis: falta de rigor quanto aos estudos e aos projectos, critérios de avaliação das propostas que não privilegiaram a mais valia das soluções técnicas, isto é, a reunião das condições necessárias para as sucessivas e significativas alterações do preço e do prazo da empreitada.
Tudo isto é muito grave e muito sério. Tudo isto custou muitos milhões de euros aos bolsos dos portugueses.
Mas mais: o Tribunal de Contas aponta ainda erros muito graves quanto ao empreiteiro da obra, quanto à fiscalização, quanto ao projectista e quanto ao dono da obra - entenda-se a administração -, que o Tribunal de Contas brinda com a seguinte e elucidativa conclusão, que passo a citar: "A decisão que fundamentou a opção pela solução tecnológica inerente ao actual sistema não foi precedida, nem de uma avaliação, nem de um estudo técnico, económico e financeiro que revelasse as respectivas vantagens e benefícios."
O Tribunal de Contas condena, pois, sem rebuço, a administração à data, pela acção ou inacção na fase de planeamento, na fase concursal, na fase das negociações, mas também pelos problemas de prazo de fornecimento e montagem dos equipamentos.
Ou seja: o Tribunal de Contas critica, e condena, de forma inequívoca, as opções da administração quanto aos aspectos técnicos e de segurança, imputando-lhe claras responsabilidades. A este respeito, o mínimo que se pode dizer, e parafraseando o próprio Tribunal, é que os responsáveis agiram com "falta de maturidade e com falta de rigor".

O Sr. Miguel Frasquilho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Mas o Tribunal de Contas critica e condena também a forma pouco transparente como foi conduzido todo o processo. A este propósito, vale a pena citar, mais uma vez, o Tribunal: "o redimensionamento dos equipamentos, bem como a reavaliação das respectivas funcionalidades, foi objecto de negociações privilegiadas com um único concorrente, o que, objectivamente, se pode traduzir numa derrogação aos princípios da estabilidade das regras concursais, da concorrência, da igualdade e da transparência."

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Em suma, falta de maturidade, falta de rigor, falta de transparência, incompetência, eis como o Tribunal de Contas classifica a actuação de quem foi responsável, directa ou politicamente, num passado

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ainda recente, pelo lamentável dossier das obras do metro no Terreiro do Paço.

O Sr. Fernando Santos Pereira (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Maior censura seria difícil! E não se trata da censura de um qualquer agente político, trata-se da censura de um órgão soberano, como é o Tribunal de Contas.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: No fundo, aquilo que o Tribunal veio agora dizer, preto no branco, foi que tudo quanto os Deputados do Partido Social Democrata tinham afirmado, quando criticaram a empresa e o Governo socialista por todo este inominável processo, só pecou por defeito. E, quando criticámos o que criticámos, fizemo-lo pensando nos dinheiros públicos, na segurança das pessoas e dos bens, no conforto e na comodidade dos cidadãos, isto é, no interesse público. Mas fizemo-lo também porque entendemos que, havendo erros grosseiros e manifesta incompetência, agora publicamente demonstrada, tinha de haver responsáveis.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Fomos, então, acusados de tudo: de estarmos a fazer politiquice, de que era tudo mentira, porque a lisura e a transparência tinham sido irrepreensíveis, de que as vítimas não éramos nós, os portugueses, que estávamos, e estamos, a pagar isto tudo, mas, sim, os apontados como pretensamente falsos responsáveis.
E agora? O que vamos ouvir? Vamos ouvir as mesmas acusações, proferidas pelas mesmas pessoas, só que dirigidas, agora, ao Tribunal? Talvez isso venha a acontecer mas, então, o que ficará bem demonstrado é a falta de vergonha, que não tem limites, de quem profere tais afirmações.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

De uma coisa podem estar certos: nós, Partido Social Democrata, não deixaremos que mais uma cortina de fumo seja erguida em torno de todo este processo, evitando que se apure a verdade e se perceba quem foi e é responsável directo ou político e pelo quê.
Nesse sentido, vamos requerer a vinda urgente do Tribunal de Contas à comissão parlamentar competente para o cabal esclarecimento das responsabilidades, da sua hierarquia e dos factos apurados.

A Sr.ª Isménia Franco (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, esgotou-se o tempo de que dispunha.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: É em nome da publicitação da verdade, que alguns habilidosamente tentaram escamotear, que o vamos fazer.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: É em defesa da transparência, da seriedade de propósitos e do interesse público, que alguns teimaram em sacrificar, para que sirva de lição e para que seja mais difícil que isto volte a acontecer.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Cunha.

O Sr. Rui Cunha (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Marques Guedes, o Tribunal de Contas fez um trabalho sério e profundo nesta auditoria ao Metropolitano de Lisboa.
A intervenção que acaba de ser proferida pelo Sr. Deputado Marques Guedes, aliás, em dissonância com declarações públicas do actual Presidente do Conselho de Administração do Metropolitano de Lisboa, só pode ter um significado: o alijar de responsabilidades por parte da bancada do PSD…

Aplausos do PS.

… em relação ao tempo em que também exerceu a tutela do Metropolitano de Lisboa. E se há críticas fundadas do Tribunal de Contas sobre a forma como o concurso foi lançado e adjudicado não nos

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esqueçamos de que, durante o consulado Ferreira do Amaral, nenhuma das empreitadas do Metropolitano de Lisboa foi alvo de concurso…

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - … e, ao longo de 10 anos, foram entregues sempre à mesma empresa, por ajustes directos sucessivos.

Aplausos do PS.

Portanto, se é grave um concurso ser mal lançado e mal adjudicado, mais grave é não haver concurso e as obras serem entregues sempre à mesma empresa, através de ajustes directos sucessivos, que foi o que sucedeu com as empreitadas do Metropolitano de Lisboa.

Aplausos do PS.

E eu pergunto ao Sr. Deputado Marques Guedes: sabe quem foi o projectista e o fiscal da obra? O projectista e o fiscal da obra foi a Ferconsult. E sabe quem foi o responsável pela fiscalização da obra? Foi um membro do Conselho de Administração da Ferconsult, depois nomeado assessor e conselheiro do Ministro Valente de Oliveira.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Portanto, nós não estamos aqui para alijar as nossas responsabilidades mas para dizer que as assumimos e que desejamos que também os outros as saibam assumir.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Rui Cunha, em primeiro lugar, agradeço a questão que me quis colocar, embora, na prática, tenha acabado por não colocar questão alguma. Mas eu percebo a sua dificuldade,…

Aplausos do PSD.

… porque, de facto, em face da dureza e da crueza do relatório do Tribunal de Contas, pouco haverá a acrescentar por parte do Partido Socialista.
Em qualquer circunstância, daquilo que o Sr. Deputado disse - e não do que perguntou, porque não perguntou nada -, relevo que, afinal, desta vez, o Partido Socialista não vai atirar as culpas para cima do Tribunal, não vai voltar a dizer que há uma cabala, não vai assumir a posição da "vitimazinha", como se houvesse uma cabala, contra aquilo que verdadeiramente se passou.

O Sr. Afonso Candal (PS): - Forças de bloqueio é convosco!

O Orador: - O Sr. Deputado Rui Cunha sabe bem que neste relatório, independentemente das pessoas envolvidas, o que está em causa são os factos e as políticas e - que se entenda bem! - nunca serão as pessoas. O que está em causa neste relatório é o que se passou no Metropolitano de Lisboa e nas respectivas obras entre o ano de 2000 e o ano de 2002 e, portanto, é sobre o que aconteceu nesse período e sobre os responsáveis da empresa e os responsáveis políticos da altura que tem de recair qualquer apreciação, qualquer juízo de valor, por parte desta Câmara.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Que isto fique claro! Não vale a pena tentar desviar as atenções!
Concluo, Sr. Deputado, acrescentando apenas, e uma vez que não tenho qualquer resposta a dar a perguntas que não existiram, que, pelo menos por este acto de contrição da vossa parte, valeu a pena subir à tribuna e publicitar aquela que é a verdade dos factos e que, ao longo do último ano ou ano e meio, alguns responsáveis do Partido Socialista tentaram ocultar de uma forma, às vezes, no mínimo,

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pouco ética.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Também para uma declaração política, tem, agora, a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Diário de Notícias informa hoje, em primeira página, que, em face da escalada de violência no Iraque, o Governo português pondera a substituição do contingente da GNR, que em má hora foi enviado para esse país, por uma força do Exército.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Se, se!…

O Orador: - Esta notícia, que ainda não foi desmentida, constitui uma prova cabal da completa desorientação em que o Governo português se encontra, depois de ter embarcado na aventura da ocupação militar do Iraque, desorientação, essa, que já havia sido ontem demonstrada pela falta de resposta do Ministro da Administração Interna às perplexidades que os portugueses, obviamente, manifestam quanto ao futuro da presença de um contingente português num teatro de guerra onde a situação se agrava de dia para dia.
O Ministro da Administração Interna compareceu ontem nesta Assembleia para nos falar da situação no Iraque e a única coisa que nos disse, para além dos slogans do costume, foi que não sabe quando será o regresso da GNR. O mandato é de seis meses prorrogável. Será prorrogado. Até quando? O Governo não sabe.
Em 21 de Maio de 2003, dois Ministros deste Governo vieram a esta Assembleia justificar o envio de um contingente da GNR para o Iraque, concretamente o então ministro dos Negócios Estrangeiros e o Ministro da Administração Interna, que permanece em funções.
Da intervenção feita pelo primeiro destes membros do Governo merece hoje a pena reter o seguinte: "Terminado o conflito iraquiano, que para embaraço de alguns pessimistas durou menos de quatro semanas e não teve as consequências catastróficas que outros (ou os mesmos) pessimistas vaticinavam e anunciavam, a comunidade internacional tem agora pela frente um desafio onde podemos identificar quatro processos: a estabilização do Iraque; a assistência humanitária às suas populações; a reabilitação e a reconstrução; o desenho e a criação de um futuro democrático."
Ou seja, segundo o Governo, Portugal não ia participar na guerra mas na reconstrução do pós-guerra; a GNR não teria missões tipicamente militares mas, antes, policiais; o cenário que a GNR iria encontrar não seria de hostilização mas de aceitação, quando não de acolhimento triunfal, por parte das populações.
Ora, é hoje mais do que evidente que este cenário idílico está rotundamente desmentido e que, em vez da pacificação, da estabilização, da reconstrução e da democratização, aquilo a que todo o mundo assiste é ao agravamento da insegurança e à rápida evolução para uma situação de guerra aberta contra as tropas ocupantes, entre as quais o contingente português, como é óbvio, se integra.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Exactamente!

O Orador: - É hoje uma evidência que os pressupostos em que o Governo português baseou o envio da GNR para o Iraque falharam completamente: a situação é de guerra, como todos sabemos; a ocupação não é bem vinda pelos iraquianos, como já todos percebemos; os riscos da missão da GNR cresceram enormemente; vive-se uma crise gravíssima de novos contornos, com o sequestro e mesmo a horrível liquidação de civis; a coligação militar de ocupação fragiliza-se de dia para dia, com sucessivos governos a anunciarem a reconsideração da sua posição, incluindo países da NATO, como a Espanha ou a Polónia.
E, no meio de tudo isto, como reage o Governo português? O Ministro da Administração Interna limita-se a considerar prorrogada a missão da GNR sem termo certo. O Primeiro-Ministro limita-se a mandar regressar os civis, não podendo dar garantias quanto à sua segurança. Entretanto, equaciona-se o envio de um contingente militar em face do agravamento da situação.
Perante a degradação da situação no Iraque e a completa derrocada das suas irrealistas previsões, o Governo exibe a mais completa desorientação. Os poucos defensores da guerra que ainda não se remeteram a um prudente silêncio recorrem agora ao mais incrível dos argumentos: "não podemos retirar do Iraque porque se o fizéssemos a situação poderia ser ainda pior". Aliás, ainda há poucos dias ouvimos o Eurodeputado do PSD José Pacheco Pereira, nas suas vestes de analista, afirmar que a guerra no Iraque terá valido a pena porque não sabemos se, não tendo havido guerra, a situação não estaria pior.

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Risos do PCP.

Com estes argumentos, os defensores da guerra e da permanência da ocupação militar do Iraque, as tais pessoas sensatas de que fala o Ministro Figueiredo Lopes, continuam a fazer assentar as suas opções na base das meras suposições, mesmo depois de todas as suposições anteriores se terem revelado completamente infundadas.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Os Estados Unidos e os seus parceiros de coligação invadiram o Iraque porque diziam supor que houvesse lá armas de destruição em massa. Suposição falsa.
Supunham que, atacando e ocupando o Iraque, iriam reduzir a ameaça terrorista. Como tragicamente se vê, suposição falsa.
Supunham que os invasores iriam ser recebidos como libertadores. Suposição falsa.
Supunham que iriam pacificar e estabilizar o Iraque. Suposição falsa.
Supunham, ou diziam supor, que iriam implantar a democracia no Iraque. Suposição falsa, porque, como muito bem se sabe, a democracia não se impõe à bomba nem à custa do massacre das populações.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Supunham que a guerra do Iraque iria ter repercussões positivas na resolução do conflito israelo-palestiniano.

O Sr. José Magalhães (PS): - Como se vê!

O Orador: - Suposição falsa, como se viu ainda ontem, quando Bush e Sharon rasgaram publicamente o roteiro para a paz.
Apesar de falhadas todas as suposições, o Governo quer que Portugal mantenha a sua presença militar no Iraque, supondo que se assim não fosse as coisas poderiam ficar ainda pior. E em que se baseia essa suposição? Obviamente, em nada!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente e Srs. Deputados , basta ler a imprensa norte-americana e as insistentes comparações que vão sendo feitas entre a guerra do Iraque e a do Vietname, basta dar um pouco de atenção ao que pensam os cidadãos comuns, a opinião pública, dos países beligerantes, basta olhar para a realidade sem ideias pré-fabricadas para ter de reconhecer que a guerra do Iraque foi, e é, um gigantesco atoleiro para todos os que quiseram deixar-se atolar.
Ninguém sabe como tudo isto vai acabar. E o Governo português, que, ao contrário de alguns dos seus parceiros europeus que não embarcaram nesta aventura e que só têm de congratular-se com isso, se deixou envolver no atoleiro do Iraque, em vez de fazer uma reflexão serena sobre todo o processo, de reconhecer os seus erros e de arrepiar caminho, continua a seguir, de forma acéfala, as posições irresponsáveis das autoridades norte-americanas e a ensaiar novas fugas para a frente na base de slogans mais que desacreditados.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - É fabuloso!…

O Orador: - Sr. Presidente e Srs. Deputados, no mesmo dia - o dia de hoje - em que é reafirmada em Espanha, pelo futuro primeiro-ministro, a retirada das suas tropas em 30 de Junho, anuncia-se em Portugal o possível envio de tropas precisamente a partir dessa data se a situação se agravar.

Vozes do CDS-PP: - Se!

O Orador: - Ou seja, o Governo português insiste em manter uma atitude de seguidismo em relação aos Estados Unidos, recusa-se a encarar a realidade e a assumir a única posição realista e responsável: reequacionar a presença de Portugal no Iraque e decidir, como o povo português maioritariamente deseja, o regresso quanto antes das forças da GNR que neste momento participam na ocupação desse país.

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Aplausos do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Rebelo.

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, considero extraordinário o Partido Comunista Português, que tem um serviço de informações tão competente, não saber que o Sr. Ministro da Administração Interna já veio negar a notícia do Diário de Notícias.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Não foi bem isso!

O Orador: - Isto, aliás, não é desculpa para o PCP, que tem acesso a tantas informações mas que se esqueceu de referir este aspecto. Interessava para a demagogia do PCP, nomeadamente do Sr. Deputado António Filipe, com esse discurso, não querer saber o que disse o Governo em relação a essa matéria.
O Governo mantém exactamente a posição que sempre teve, aliás, em consonância com o Sr. Presidente da República, sendo que, à partida, tinham posições divergentes sobre o conflito. Neste momento, a comunidade internacional tem a este respeito a mesma visão, ou seja, que os países devem contribuir para a paz e a estabilidade no Iraque. Ora, é isso o que Portugal está a fazer com a presença da GNR no Iraque.
Ninguém nega as dificuldades que neste momento subsistem…

O Sr. José Magalhães (PS): - Mas têm civis agora!

O Orador: - … e ninguém devia estar feliz e contente com as dificuldades que estão a passar-se no Iraque, cuja responsabilidade, como o Sr. Deputado sabe, não é das forças que estão no terreno mas de movimentos terroristas, de algum banditismo e de dirigentes radicais islâmicos. Portanto, a responsabilidade não é das forças internacionais presentes, que defendem e estão a tentar contribuir para a paz na região.
Ainda se viu recentemente que, passados três dias de as forças italianas terem sido atacadas, estavam a ser destruídos medicamentos nas zonas dos ataques. Portanto, as forças internacionais presentes têm uma contribuição e tentam colaborar para a paz no Iraque.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Essa é a única verdade!
Quem não quer a paz no Iraque não são as forças que estão presentes!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Aliás, aconselho o PCP a, neste momento em que existem forças portuguesas no terreno, pelo menos respeitar os esforços que estão a ser feitos pelos guardas republicanos no Iraque.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Exactamente!

O Orador: - O PCP deveria respeitar e apreciar o esforço que os guardas republicanos estão a fazer.
Portanto, sistematicamente, quando há dificuldades, o PCP vem bater-se quanto a este assunto - já conhecemos o discurso, não é novo.
O Governo mantém exactamente a mesma posição de há um mês, não mudou nada. Portanto, não vamos enviar para o Iraque o Exército, trata-se de uma notícia do Diário de Notícias já desmentida, que não alterou a nossa posição de dar o nosso contributo para a paz e para a estabilidade no Iraque com vista ao estabelecimento de uma democracia e de instituições laicas nesse país. Esse é o nosso contributo, obviamente na medida das nossas possibilidades.
Portanto, o Governo não mudou de posição, o PCP é que continua a manter a mesma posição, com a salvaguarda de não ter legitimidade. Ainda me recordo de, no passado, o PCP, que nunca o negou, ter aplaudido a invasão do Afeganistão por parte da União Soviética.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Isto aconteceu no passado, sistematicamente! Basta ver a história do PCP e dos apoios públicos dados no seu passado, que nunca negou e do qual está muito orgulhoso!

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Portanto, Sr. Deputado António Filipe, os senhores não têm autoridade nenhuma para virem criticar o Governo desta maneira.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Uma vez que o Sr. Deputado António Filipe pretende responder conjuntamente, tem a palavra o Sr. Deputado Vieira de Castro também para pedir esclarecimentos.

O Sr. Vieira de Castro (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, sobre aquilo que parece ser o pacifismo que o PCP professa agora não falaremos hoje, vamos falar noutra altura.

O Sr. António Filipe (PCP): - Quando quiser!

O Orador: - Vou repetir ao Sr. Deputado António Filipe e a todos os Srs. Deputados da oposição qual é a posição do Governo sobre a questão do Iraque. Começo por referir-me à permanência de uma força da GNR no Iraque.
Essa unidade da Guarda Nacional Republicana está no Iraque ao abrigo de uma resolução da Organização das Nações Unidas, com o objectivo de contribuir para a segurança e a ordem públicas. Vai estar no Iraque por um período de seis meses, prorrogável por outro período de seis meses.
O que há de certo é o que acabei de dizer!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Esta questão merecia ser tratada com outra responsabilidade e sensatez. Parece-me que já basta o facto de, não todos mas ainda alguns partidos da oposição, usarem esta questão como uma arma de arremesso. Estão a proceder mal e procedem muito mal quando, por exemplo, exigem que a unidade da Guarda Nacional Republicana regresse ao País. Não podemos desertar, somos um país que tem de honrar os seus compromissos. E os senhores fazem parte desse País!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Honrar a mentira?! Honrar a vigarice?!

O Orador: - Os senhores, que tantas vezes, nas mais diversas matérias, fazem apelo às posições do Sr. Presidente da República, reflictam um pouco sobre o que este tem dito justamente acerca da permanência desta unidade da Guarda Nacional Republicana no Iraque.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Há dias, aquando do último embarque de oficiais, sargentos e praças da GNR para o Iraque, uma jornalista perguntou a um jovem tenente qual era o seu estado de espírito e das tropas que comandava e ele respondeu que estavam cheios de vontade para trabalhar e orgulhosos de representarem a Guarda Nacional Republicana e o País.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Defender a mentira é muito difícil!

O Sr. Presidente: - Para responder aos dois pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados João Rebelo e Vieira de Castro, não me levem a mal, mas tenho de dizer-lhes que a vossa desorientação espelha bem a desorientação do Governo.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Ah!

O Orador: - Aliás, essa desorientação foi pública e notória.
Sr. Deputado João Rebelo, nós não estamos felizes nem contentes com a situação que está a passar-se.

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A intervenção que fiz em nome da minha bancada não é de felicidade nem de contentamento; muito pelo contrário, é uma posição de pesar, de protesto e de repúdio relativamente à decisão política que o Governo português tomou de enviar um contingente da GNR para o Iraque.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Os senhores sabem muito bem que, obviamente, respeitamos a integridade destes cidadãos portugueses e que desejamos que nada de mal lhes aconteça, mas isso não significa que possamos alguma vez concordar com a decisão política que os fez arriscar as suas vidas no teatro de guerra do Iraque.

Aplausos do PCP.

O Sr. Deputado João Rebelo falou no desmentido do Governo relativamente à notícia de que estaria a equacionar o envio do Exército português para o Iraque. Na notícia a que tive acesso, com declarações feitas hoje mesmo pelo Sr. Ministro Figueiredo Lopes, não vejo um desmentido,…

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Não leu?!

O Orador: - … mas se os Srs. Deputados da maioria entendem que há um desmentido, então, assumam-no e digam aqui claramente que, caso essa questão seja equacionada, irão opor-se.

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Exactamente!

O Orador: - O que queríamos que ficasse aqui registado é que há uma oposição da maioria parlamentar ao envio de militares portugueses para o Iraque se essa hipótese alguma vez for equacionada.

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Ficamos na mesma!

O Orador: - Era importante que esse registo aqui fosse feito. Os Srs. Deputados ainda estão a tempo de o fazer, mas até agora não o fizeram. Esperemos, no entanto, que esse cenário se não concretize.
Sr. Deputado Vieira de Castro, o que aqui disse sobre a presença da GNR no Iraque não foi bem o que disse ontem o Sr. Ministro. O Sr. Ministro disse, ontem, que essa presença era por seis meses prorrogáveis enquanto fosse necessário prorrogar.

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Exactamente!

O Orador: - E ele não sabe até quando essa necessidade existe!
Portanto, o Sr. Ministro não falou em seis meses prorrogáveis apenas por mais seis. Ou melhor, são seis meses de cada vez, mas o Governo não sabe até quando essa prorrogação será necessária.
Isto chama-nos a atenção para a última mentira, até ver, deste processo: os pressupostos da missão da GNR. Isto porque o que o Governo claramente afirmou foi que a GNR não iria participar na guerra, iria ter missões policiais, e por isso era enviada a GNR, uma força de segurança. Não iria participar em cenários de guerra, iria ajudar à estabilização num cenário de pós-guerra e de amistosidade das populações.
Ora bem, não é nada disso que se verifica. Há, de facto, um cenário de guerra e o Governo recusa-se não só a encarar esta realidade como a tomar posições realistas, como acontece noutros países, não só em Espanha. L'Osservatore Romano refere que as tropas italianas que se encontram no Iraque estão constrangidas a não serem agentes de paz mas, antes, de morte. Quem o refere é L'Osservatore Romano.
Era bom que os Srs. Deputados vissem esta realidade e que também o Governo português tomasse a posição realista e responsável de reequacionar profundamente este processo e decidir a retirada, quanto antes, das forças portuguesas que estão no Iraque a arriscar a sua vida.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado João Pinho de Almeida.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O abandono

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escolar é, desde há muitos anos, um problema que preocupa não só os que intervêm no meio escolar mas também toda a sociedade portuguesa. Sabemos que o facto de os mais jovens não concluírem os seus estudos e abandonarem precocemente o meio escolar faz com que, por um lado, não se atinjam os objectivos nessa área, o que não é sequer o mais importante, e, por outro, não só não se consiga qualificar os portugueses como era exigível numa altura como esta de extrema competitividade no meio europeu mas também que os nossos jovens não se realizem. É um mal de sempre, que nunca encontrou resolução.
Pois este Governo resolveu avançar com um programa, claro, de combate ao abandono escolar numa lógica positiva, a da não desistência.
Assim, lançou uma campanha intitulada "Eu não desisto". Ora, é exactamente isso que está em causa: a criação de condições para que os jovens portugueses não desistam, para que as famílias dos jovens portugueses não desistam, para que os professores não desistam, ou seja, criar um conjunto de condições que permitam que todo o meio escolar dê resposta à grande necessidade de qualificarmos os portugueses.
Se dúvidas houvesse, basta atentarmos aos dados da OCDE para sabermos do atraso que Portugal tem nesta matéria.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Em relação aos dados da OCDE de 2003, a percentagem da população portuguesa que concluiu, pelo menos, o equivalente ao ensino secundário é a mais baixa de todos os países que integram esta estatística. Em Portugal, cifra-se em 20% a percentagem dos que atingiram o ensino secundário, enquanto a média da OCDE é de 64%. Ou seja, os que em Portugal concluem, pelo menos, o ensino secundário são metade dos que concluem o ensino secundário na média dos restantes países da OCDE.
Mas não devemos olhar, única e exclusivamente, para este dado final. Temos de reconhecer que, nos últimos anos, Portugal tem feito um esforço para conseguir responder a este grande desafio. E se atendermos, nomeadamente, ao período que vai de 1991 a 2001, verificamos que a taxa de abandono escolar em Portugal passou de 12,5% para 2,7%. Ou seja, no que diz respeito ao abandono escolar temos conseguido fazer alguma coisa, temos conseguido evoluir bastante. No entanto, isso não é ainda o suficiente para, pelos menos em relação aos dados da OCDE, apresentarmos resultados satisfatórios.
Portanto, é preciso responder às várias perguntas que se fazem no sentido de obter uma justificação para esta taxa de abandono escolar, para esta taxa de insucesso, para esta falta de população portuguesa com, pelo menos, o nível secundário.
A primeira tem a ver com o acompanhamento que os jovens encontram na escola. Que acompanhamento? A ida dos jovens à escola não é simplesmente assistir às aulas e estar no recreio, têm de ter um nível de integração que lhes permita sentirem-se verdadeiramente parte do meio escolar. É por isso que a criação, até 2005, do cargo de tutor escolar é uma medida fundamental. Na verdade, é preciso haver um professor que, para além de acompanhar os alunos nas actividades curriculares, esteja também disponível para todas as outras questões do âmbito escolar.
A segunda tem a ver com as crianças fora da escola, porque muitas vezes o problema é exactamente o de não encontrarem, fora da escola, nem um espaço, nem pessoas, nem família que lhes permita harmonizar a sua vida extra-escolar com a actividade escolar. É também por isso que a medida, a ser tomada até 2006, da criação de um plano de apoio e financiamento a actividades extra-curriculares é importante para manter estes jovens integrados no meio escolar e para que eles sintam que a presença no meio escolar é mais relevante do que as outras coisas que fazem no resto do tempo.
Todavia, para isso é preciso criar motivação e para consegui-la é preciso, para além destas actividades curriculares, investir também, por exemplo, no desporto escolar, que sabemos ser uma forma de integrar e de motivar os jovens, de fazê-los sentir orgulho em pertencerem a uma determinada comunidade escolar.
Mas a escola não é só composta por professores e alunos, a escola deve ter também a capacidade de integrar os pais. Ora, esse é um desafio de há muito tempo, a que acresce o de procurar fazer com que os pais sejam os primeiros interessados em que os seus filhos continuem a frequentar a escola, que não a abandonem. Também até 2005 este plano apresenta medidas de formalização e motivação do envolvimento dos pais e das famílias na actividade escolar.
Por outro lado, é preciso criar alternativa. Sabemos que, em Portugal, há uma taxa muito grande de jovens - representam 71,7% da população escolar - que prosseguem estudos na área geral; nos restantes países da OCDE apenas 48,5% dos jovens segue essa área. Ou seja, a média da OCDE diz-nos que a maioria dos jovens dos países que a constituem escolhe áreas alternativas à da formação geral e que, em Portugal, mais de dois terços dos jovens escolhe a área geral.
Ora, isso contribui não só para este problema do abandono escolar mas também para um outro problema estrutural da sociedade portuguesa: o de não termos quadros médios. E não os temos exactamente porque no meio escolar não somos capazes de criar as alternativas que possibilitariam aos

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jovens escolher outro tipo de formação.
Mas é importante também formar os professores, é necessário que eles não sejam o "parente pobre" de uma aposta como esta, porque eles são essenciais para que essa aposta seja de sucesso. Por isso, o plano de formação de professores até 2005 é uma medida essencial para o cumprimento dos objectivos em causa.
Outro problema que surgiu em Portugal nos últimos anos foi o de os jovens e crianças que vieram de comunidades não terem como língua materna o Português. Sabemos que, hoje, muitas crianças e jovens que frequentam as nossas escolas não têm como língua materna o Português mas, sim, outra. Por isso, o plano de formação da leitura e da escrita e o plano específico para o apoio, ensino e aprendizagem de outras áreas com dificuldades, como, por exemplo, a Matemática, permitem responder a questões pontuais: por um lado, a questão da língua para aqueles que não têm o Português como língua materna; por outro, responder a uma das principais dificuldades de formação dos portugueses, ou seja, à área da Matemática, onde apresentemos piores resultados.
Assim, o Governo lança agora a meta de - é um desafio abrangente -, conseguir, até 2010, a duplicação dos actuais níveis de crianças e jovens que optam por vias tecnológicas e profissionalizantes, mas também o desafio de, até 2010, reduzir para metade o nível de abandono escolar. São desafios ambiciosos, mas são, acima de tudo, são desafios essenciais para que Portugal apresente não só melhores resultados nas estatísticas da educação mas também para que, acima de tudo, consigamos formar jovens com maior qualidade e torná-los essenciais àquilo que muitas vezes é dito mas poucas vezes é cumprido, ou seja,…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se.

O Orador: - … que os recursos humanos são o principal alicerce de um projecto nacional de sucesso.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Braga.

O Sr. António Braga (PS): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, a intervenção do Sr. Deputado João Pinho de Almeida veio confirmar aquilo de que há muito já desconfiávamos: o PP lidera também a matéria educativa no Governo.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): - Essa já é velha!

O Orador: - Agora apenas o confirmámos. O juízo de valor que fazemos é a tradução do programa do PP no Programa do Governo, nomeadamente no que respeita à educação.
Mas deixe-me que lhe diga, Sr. Deputado, que um programa que lute contra o abandono escolar é, em princípio, uma boa ideia. E não contem com a nossa oposição a um programa desses.
De qualquer modo, a ideia de lutar contra o abandono escolar não é nova. Estranho, por isso, que só ao fim de dois anos e meio o Governo se lembre que há abandono escolar. O Governo tem os números desse abandono desde que tomou posse. Aliás, o governo anterior tinha também esses números e tinha outras medidas, de que não vamos agora falar porque do que aqui se trata não é disso mas, sim, do que veio aqui anunciar, isto é, do programa de luta contra o abandono escolar.
Sr. Deputado, este programa, que chegou recentemente ao nosso conhecimento, tem três ou quatro questões iniciais que podem prejudicar o seu andamento, e queremos avisá-lo disso.
Em primeiro lugar, os senhores não são credíveis nem fiáveis na negociação com os parceiros. Veja-se o que aconteceu recentemente com a questão dos agrupamentos escolares, em que o Governo não cumpriu aquilo a que se tinha comprometido, nomeadamente no que concerne ao envolvimento das autarquias na definição do recorte final e da aprovação dos agrupamentos escolares. Donde, fundamentalmente neste caso da criação de um modelo que tem de envolver todos os agentes, nomeadamente aqueles que estão mais próximos e que são, como bem sabe, os eleitos, aqueles que têm também legitimidade de eleição ao nível local, o Governo não tem esse crédito. Aliás, o próprio programa não nos diz como vai envolver esses agentes.
Sr. Deputado, uma outra lacuna que tem de ter em atenção e que nós acompanharemos com este tom de fiscalização activa - e contará, certamente, com contributos para denunciar esses comportamentos -

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é o facto de os senhores estarem a transformar esse programa num programa standard, que querem aplicar igualmente em todas as escolas.
Ora, como o senhor bem sabe, o problema do abandono escolar tem muitas componentes. E vou citar uma, aquela que é essencial e relativamente à qual o Governo já perdeu dois anos e meio. O Governo suspendeu a revisão curricular e, como o Sr. Deputado sabe, uma das questões que mais contribui para o abandono escolar é o desinteresse e a desmotivação que, muitas vezes, é provocada pelo curriculum escolar. E os senhores sabem que, ao atrasarem dois anos a implementação de um novo modelo de revisão curricular, estão também a contribuir para esse abandono que agora dizem querer combater.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se. Tenha a bondade de concluir.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
Sr. Deputado, se os senhores suspendessem a revisão curricular para fazer uma ruptura com a anterior, eu ainda teria de pensar: bom, mudaram de programa, têm legitimidade. Mas não! Os senhores vão reconduzir o programa que o PS lançou com pequenas alterações.
Por isso, a questão que fica é esta, Sr. Deputado: que agentes vai envolver este programa de luta contra o abandono escolar, que negociação vai abrir…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, como já tinha alertado, o seu tempo terminou.
Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Pinho de Almeida.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Braga, a primeira razão que explica a importância deste plano e a falta de argumentos que a oposição tem para o contrariar é exactamente o facto de grande parte do pedido de esclarecimento do Sr. Deputado António Braga ter incidido sobre a questão curricular e não sobre o plano que agora estamos a analisar, o que tem explicação no facto de este ser um plano abrangente.
Respondendo agora às questões que o Sr. Deputado António Braga colocou no sentido de saber que agentes envolve, respondo-lhe que envolve todos.
Na minha intervenção, tive oportunidade de falar do plano de formação de professores, do plano de incentivo e motivação à participação dos pais e, em matéria de motivação dos alunos, também tive oportunidade de referir as medidas nesta área.
Mas há mais: o Sr. Deputado disse que se trata de um projecto standard e que não se adapta às diferentes realidades. Respondo-lhe que se adapta, por exemplo, à diferente realidade de muitos dos jovens que hoje em dia frequentam as escolas em Portugal não terem a língua portuguesa como língua materna. É uma especificidade, não se verifica no País inteiro e estes jovens têm diferentes línguas maternas. Ora, este Governo teve isso em atenção e dá resposta a essa problemática.
O Governo tem, ainda, em atenção a especificidade da disciplina de Matemática, aquela cujos resultados as estatísticas apresentam como mais problemáticos. É uma realidade específica, é uma realidade que encontra resposta neste programa.
O Sr. Deputado questiona um outro aspecto que tem a ver com a metodologia, perguntando por que é que só ao fim de dois anos o Governo apresenta um projecto deste tipo. Respondo-lhe que há duas maneiras de abordar este tipo de desafios.
Uma dessas maneiras, a que este Governo adoptou e esta maioria apoia, é a de dar uma resposta concreta, clara, objectiva, mas também que dê garantias de sucesso. Para dar uma resposta com todas estas garantias é preciso preparação, é preciso elaborar um programa, saber o que está em causa, partindo das estatísticas e das diferentes realidades.
Um outro tipo de abordagem a estas matérias é o de, logo à partida, criar um grupo de trabalho, uma comissão, e dizer "temos aqui pessoas que são os melhores especialistas e que estão a estudar a resposta que havemos de dar a esta matéria". Sabe o que normalmente acontece neste caso? Estes grupos de trabalho, estas comissões, nunca dão qualquer resposta.
Este Governo prefere preparar, prefere apresentar respostas concretas, ainda que demore mais tempo, pois tal demora é sinal que a solução encontrada prevalecerá durante mais tempo, é sinal que terá condições para ser aplicada durante mais tempo e que vai conseguir responder a um dos grandes problemas da educação em Portugal que é o das reformas consecutivas.
Esta é, pois, uma resposta objectiva, uma resposta duradoura.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado António José

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Seguro.

O Sr. António José Seguro (PS): - Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr.as e Srs. Deputados: Ao intervir pela primeira vez na qualidade de Presidente do Grupo Parlamentar do PS, quero renovar os cumprimentos a todas as Sr.as Deputadas e a todos os Srs. Deputados e, em particular, ao Sr. Presidente da Assembleia da República.
Aproveito a oportunidade para reafirmar, em nome do Grupo Parlamentar do PS, uma atitude e uma agenda política.
Uma atitude de respeito e de lealdade - respeito por cada um dos Deputados, em natural convivência com a divergência de opinião, e lealdade pelas práticas e pelas regras parlamentares.
Uma agenda política que seja a tradução do compromisso eleitoral que assumimos com quase 2 milhões de portugueses que aqui representamos.
Fiéis a essas ideias e a essas propostas concentramo-nos numa agenda política que não admira nem espanta ninguém, que, no topo das suas prioridades, coloque as questões sociais, particularmente a promoção de políticas activas que dinamizem o emprego, promovam o acesso aos cuidados de saúde por parte de todos os portugueses, independentemente da sua situação económica, e promovam, também, a educação para todos. Ao que parece, o Governo, ao fim de dois anos, junta-se ao Partido Socialista.

Aplausos do PS.

Temos um caminho, uma estratégia e uma direcção.
Um caminho que queremos seguir na fidelidade aos valores que constituem o património do Partido Socialista.
Por isso, devo dizer-vos que não encaramos com nenhum dramatismo se nesse caminho, em respeito por essa orientação, se nos juntarem, pontualmente, quer os partidos da direita quer os partidos que connosco fazem oposição ao Governo.
Essa desdramatização da vida pública e da vida parlamentar é que faz com que a fidelidade, que há pouco anunciei, às nossas propostas, às promessas e ao nosso contrato com o eleitorado contribua para a dignidade e para a nobreza da actividade parlamentar, ocupando este Parlamento o lugar central na nossa democracia representativa.

Aplausos do PS.

Este caminho tem um objectivo: darmos o nosso contributo para um Portugal mais desenvolvido e mais solidário - repito, Srs. Deputados da maioria: um País mais desenvolvido e mais solidário . É aqui que se acentuam as divergências entre nós e as propostas de alternância política que apresentamos.
Há dois anos, era difícil imaginar que a situação do País pudesse ser tão má como a que se verifica neste momento consequência das políticas erradas do Governo da maioria que os senhores sustentam nesta Casa.

Aplausos do PS.

Em dois anos, os senhores conseguiram que Portugal voltasse à cauda dos países da União Europeia. Até mesmo as previsões de Primavera da Comissão Europeia apontam para que, este ano e em 2005, o crescimento da Grécia seja superior ao de Portugal.
Ao fim destes dois anos, os senhores conseguiram que Portugal tenha aumentado o número dos seus desempregados. Há mais 132 826 desempregados em Portugal, isto é, mais de 6000 desempregados/mês, mais de 200 desempregados/dia, mais de 8 desempregados/hora.
O desemprego feminino cresceu 49%; o desemprego dos jovens cresceu 50%; o desemprego mais qualificado aumentou para o dobro; o desemprego de longa duração cresceu 78%. Portugal conhece o maior aumento de desemprego da Europa - cinco vezes mais. São estes os resultados sociais da vossa política e da vossa insensibilidade para com os portugueses mais carenciados.

Aplausos do PS.

Entre 2002 e 2003, faliram mais de 1000 empresas. Mais preocupante do que isso, Sr.as e Srs. Deputados, é que, entre 2002 e 2003, comparativamente com os anos anteriores, foram constituídas menos 17 000 empresas. Isto é grave em termos de dinamização do tecido industrial produtivo e, particularmente grave, quanto à criação de emprego.

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A economia portuguesa entrou em recessão. Seis trimestres consecutivos de queda do PIB - seis, Srs. Deputados! Trata-se da mais longa recessão na União Europeia. Isto deve envergonhar-vos.

Aplausos do PS.

Ao contrário do que os senhores prometeram, com o vosso Governo, estamos a divergir em relação à União Europeia.

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): - Já divergíamos no vosso tempo!

O Orador: - E não é na conjuntura internacional que deve procurar-se explicação para tal, mas nas políticas económicas erradas cujas consequências denunciámos em devida altura: congelamento de salários, o que reduz a procura interna e, sobretudo, um corte cego no investimento público quando se exigia uma seriação, o estabelecimento de prioridades e uma definição da qualidade desse mesmo investimento público. Era difícil fazer pior!
Mais grave do que todos estes dados, Sr.as e Srs. Deputados, é que as previsões de Primavera da Comissão Europeia apontam para uma revisão em alta do défice para o ano 2004. As previsões de Outubro já apontavam para um défice superior a 3% - 3,3% - e as da Primavera apontam para um défice de 3,4%. Ou seja, está claro que mesmo esse objectivo de redução do défice, que os senhores elevaram a grande desígnio nacional, trata-se de "gato escondido com rabo de fora". Significa isso, Srs. Deputados, que os senhores conseguem mascarar o défice apenas à custa de receitas extraordinárias. Só assim se compreende duas coisas, e com isto lanço dois desafios à maioria: primeiro, a recusa obstinada quanto à criação, proposta pelo Secretário-Geral do PS, de uma comissão para avaliar o rigor das contas públicas e, designadamente, o valor do défice,…

Aplausos do PS.

… nas mesmas condições que os senhores exigiram em 2001.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Nessa altura, não queriam!

O Orador: - Pergunto, com total clareza e em tom de desafio: se era bom para as contas de 2001, por que é que os senhores têm medo que o mesmo se aplique à vossa gestão quanto às contas de 2003?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se. Por favor, conclua.

O Orador: - Sr. Presidente, o meu tempo esgotou-se mas, infelizmente, os problemas dos portugueses continuam. É que os erros deste Governo saem grátis à maioria mas saem muito caro aos portugueses.
Lanço-vos, pois, o segundo desafio, com total clareza: os senhores e o Governo fizeram gáudio do anúncio da Comissão quanto ao levantamento do processo por défice excessivo, o que é uma notícia positiva. No entanto, o Comissário Pedro Solbes anunciou que essa decisão foi tomada na base de um documento escrito entregue em Bruxelas pela Sr.ª Ministra das Finanças.

O Sr. José Magalhães (PS): - Onde é que está esse documento?

O Orador: - Que documento é esse? Qual é o seu conteúdo? E quais as consequências sociais do conteúdo desse documento que os senhores vão obrigar os portugueses a suportar?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se. Tem mesmo de concluir.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Que papel é destinado a esta Assembleia da República? Nós temos o dever de controlar o poder executivo, este tem o dever de responder perante esta Assembleia.
Fica claro - e com isto termino - que os portugueses podem contar com o Grupo Parlamentar do PS, coeso e unido no essencial. O essencial é retomar o caminho da esperança, é renovar a confiança dos portugueses, é apostar na sua inteligência, na sua confiança, na sua capacidade de trabalho e de inovação.

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Força portugueses!

Aplausos do PS, de pé.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António José Seguro, renovo-lhe os meus cumprimentos e o meu desejo de que o Sr. Deputado e a restante direcção da sua bancada desempenhem o melhor possível o papel que vos cabe como maior partido da oposição.
Sr. Deputado, apenas quero lembrar-lhe que a sua intervenção, acompanhada por gráficos, foi muito incompleta. Devia ter trazido os gráficos referentes aos anos de governação do Partido Socialista…

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

… para assim vermos as causas da situação a que chegámos.
Recordo-lhe que VV. Ex.as negociaram o Pacto de Estabilidade, ao qual se vincularam, prometeram que, em 2001, o défice seria 1,1% e foi 4,4%, e por aí adiante, até terem colocado o País na vergonha de ter sido o primeiro da União Europeia ao qual foi posto um processo por incumprimento do Pacto de Estabilidade.
A diferença entre nós é muito simples, Sr. Deputado: o vosso desregramento conduziu àquele processo; o nosso esforço, o nosso rigor, a nossa contenção conduziram ao levantamento do referido processo,…

O Sr. José Magalhães (PS): - E à recessão!

O Orador: - … como tudo indicia. A diferença é essa!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. José Magalhães (PS): - A diferença é brutal!

O Orador: - Sr. Deputado, parece-me que é absolutamente inequívoco, toda a gente perceberá, que as afirmações da Comissão Europeia, da OCDE, do Banco de Portugal e do respectivo Governador quanto ao acerto da nossa política valem muito mais do que as suas proposições político-partidárias na qualidade de líder parlamentar do maior partido da oposição.
Procure agora dar uma novidade, sacudindo um pouco dessa carga político-partidária, colocando o País à frente, e associe-se a nós num esforço de cooperação. É este o desafio que lhe faço: mude um pouco a forma de estar da sua bancada e tenha uma maior abertura na convergência quanto ao que não é do PSD nem da maioria, é de Portugal. É por Portugal que queremos o vosso contributo.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. José Magalhães (PS): - Precisa de uma bengala!

O Orador: - E, Sr. Deputado, porque as coisas não acontecem por acaso e porque V. Ex.ª apresentou gráficos incompletos, pergunto-lhe se não é altura de aqui reconhecer que é na vossa política de esbanjamento e de desperdício - aliás, ainda hoje patente no relatório do Tribunal de Contas em relação à sucessão de erros e de acumulação de gastos inúteis, verificados nas obras do Metro no Terreiro do Paço -, política essa que, aliás, abarca questões que ultrapassam o próprio Tribunal de Contas e que eventualmente terão de ser tratadas pela Procuradoria-Geral da República, pergunto-lhe, repito, se não é aí, nessa vossa política de esbanjamento, que está a razão de toda esta situação a que chegámos e que, felizmente, estamos a inverter.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António José Seguro.

O Sr. António José Seguro (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Guilherme Silva, quero agradecer as palavras simpáticas que me dirigiu e expressar-lhe a minha desilusão.

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Dirigi-lhe dois desafios, muito simples, e o senhor propositadamente não quis responder a nenhum deles. Recordo-lhe quais são esses dois desafios.
O primeiro tem a ver com o conteúdo do documento que vincula o Governo português e que foi apresentado em Bruxelas.

O Sr. José Magalhães (PS): - Qual é?!

O Orador: - Qual é esse documento? Esta Casa tem o direito constitucional de o saber. É que nós somos pagos para controlar a acção do Governo. É por isso que os contribuintes pagam a estes representantes!
Já os senhores são pagos, porventura (como se viu pela sua intervenção), para fazer oposição ao Grupo Parlamentar do Partido Socialista.

O Sr. José Magalhães (PS): - É pouco!

O Orador: - A segunda nota tem a ver com a questão das governações. Nós já fomos avaliados, Sr. Deputado Guilherme Silva. E, se a campanha eleitoral tivesse durado mais uma ou duas semanas, pode ter a certeza que os portugueses tinham feito uma avaliação ainda mais justa. Agora, o que é interessante é que, na única sondagem realizada, ao fim de dois anos, sobre a acção governativa, 50% dos portugueses consideram que a actuação do vosso Governo é pior do que foi a actuação do nosso governo e só 5% dos portugueses consideram que é melhor.
Mas voltemos à questão do défice, Sr. Deputado Guilherme Silva. Se os senhores conseguiram uma proeza, por que é que têm receio de que se crie uma comissão independente para, com os mesmos critérios, avaliarmos do resultado da vossa governação? É que isso ajudava inclusivamente a credibilizar as contas públicas.

O Sr. José Magalhães (PS): - Claro!

O Orador: - Sr. Deputado, até lhe cedo algum tempo do meu grupo parlamentar para me poder responder!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Ninguém sabia quais eram as vossas contas!

O Orador: - Aceita ou não? É que, verdadeiramente, os senhores nem esse objectivo conseguem realizar.
E quanto à herança, Sr. Deputado, convém que, como nas boas famílias, aqueles que herdam sejam merecedores de herdar tudo. Há bem pouco tempo, na semana passada, o Governo anunciou o lançamento de um investimento público (ao fim de dois anos!) vocacionado para a dinamização regional e local - uma boa iniciativa, aliás - e foi buscar dinheiro à reserva de eficiência. Essa reserva de eficiência estava na Agenda 2000. Sabe quem é que negociou a Agenda 2000, que vos permite ter dinheiro para os senhores implementarem esses programas? O governo do Partido Socialista, que os senhores deviam ter tido oportunidade de elogiar.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputado, o seu tempo esgotou-se.

O Orador: - Por último, Sr. Deputado Guilherme Silva, continuamos à espera da resposta aos nossos dois desafios: querem, ou não, uma comissão para avaliar o défice e estão, ou não, disponíveis para connosco exigir do Governo que, por uma questão de transparência e respeito para com este Parlamento, nos entregue uma cópia do documento que entregou à Comissão, em Bruxelas?

Aplausos do PS.

O Sr. António Filipe (PCP): - Eles já a têm!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.

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O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António José Seguro, meu caro amigo, permita-me também que o cumprimente e saúde no exercício destas novas funções, dizendo-lhe, no entanto, que se há alguém que pode começar a ficar desiludido somos nós, não é V. Ex.ª.

Vozes do PS: - Oh!

O Orador: - Efectivamente, nós esperamos sempre, até porque temos uma enorme confiança nas capacidades e na natureza humana, que as coisas evoluam e melhorem e que os discursos se renovem e consigam dizer-se coisas novas. No entanto, ouvido o discurso de V. Ex.ª, vem-me à memória, neste caso, uma frase batida, a de que V. Ex.ª apresentou algumas ideias boas e outras originais, sendo certo que as boas não seriam de todo originais e aquilo que V. Ex.ª quis dizer de original não era de todo bom.
O que lhe quero dizer com isto,…

O Sr. José Magalhães (PS): - Uma citação marcelista vem mesmo a propósito nesta data!

O Orador: - … independentemente do entusiasmo que a citação causa ao Deputado José Magalhães,…

O Sr. José Magalhães (PS): - É uma citação do Marcelo! O 25 de Abril está próximo!

O Orador: - … é que V. Ex.ª propõe agora - e essa é a novidade - a criação de uma comissão ou uma auditoria, ou seja o que for, às contas públicas.
Ora, quero dizer-lhe que, quando o PSD, em 2001, propôs essa auditoria, fê-lo com razão, porque, nessa altura, com o final do governo do PS, de que V. Ex.ª fazia parte, os senhores estavam a dizer ao País que o défice era de 1,1% e estavam a faltar à verdade. A verdade é que o défice era superior a 4% e os senhores estavam a enganar o País. E por isso é que era preciso uma auditoria.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Protestos do PS.

Hoje em dia, essa proposta não faz sentido, porque o actual Governo fez aquilo que tinha de fazer, fez o saneamento das contas públicas.

O Sr. José Magalhães (PS): - Oh, se fez!

O Orador: - E fez um saneamento das contas públicas indiscutível, necessário e urgente para Portugal.
Fala V. Ex.ª no Sr. Pedro Solves, Comissário europeu e novo Ministro das Finanças do governo de Zapatero, que tanto o entusiasma e aos seus companheiros de bancada.

O Sr. Afonso Candal (PS): - E aos espanhóis também!

O Orador: - Chamo só a atenção para esta enorme contradição, Sr. Deputado António José Seguro: o Comissário Solves pertenceu à Comissão Europeia, que precisamente levantou o processo por défice excessivo a Portugal. O Comissário Solves, na União Europeia, foi sempre, ele sim, um defensor obsessivo do défice zero. E, mais, o Comissário Solves, ao assumir responsabilidades no governo de Zapatero, que tanto entusiasma os meus caros amigos,…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente, dizendo ao Sr. Deputado António José Seguro que o Comissário Solves, ao assumir responsabilidades, a primeira coisa que disse foi "vamos continuar com uma política de défice zero, porque esse é o caminho correcto". Ou seja, os senhores não ouvem sequer o Sr. Comissário Solves. Ouçam-no e vão perceber que os senhores, que escolheram como cabeça de lista o "pai do défice", podem agora não falar da nossa vergonha mas falar, sim, da vossa vergonha, porque nós temos orgulho no trabalho que fizemos.

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Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António José Seguro.

O Sr. António José Seguro (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Telmo Correia, retribuo-lhe em dobro a gentileza das suas palavras e quero dizer-lhe que é verdade que o PS já tem um cabeça de lista às eleições europeias.

Aplausos do PS.

E a escolha não nos envergonha, orgulha-nos.

Aplausos do PS.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Não a todos!

O Orador: - E devo dizer-lhe, Sr. Deputado Telmo Correia,…

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Sei que estão nervosos, e compreende-se, porque isso é o tilintar das vossas consciências perante aquilo a que a vossa bancada e o vosso líder vos obriga.

Aplausos do PS.

Sr. Deputado Telmo Correia, quero dizer-lhe, com total generosidade, que o nosso critério para a designação dos cabeças de lista é um critério que se baseia num trabalho de escolha dos melhores e daqueles que, em cada momento, estão em condições de protagonizar o projecto.
Devo dizer-lhe que não utilizamos o critério das sondagens, divulgando ou colocando nessas sondagens meia dúzia de nomes para ver, em cada sondagem e em cada momento, de onde "sopra o vento", para ver aquele que pode ter mais votos.
Só assim se compreende que os senhores, a menos de dois meses de eleições, a única coisa que tenham é um slogan! Inacreditável! Só um slogan! Com um objectivo: tentarem apropriar-se e partidarizar uma iniciativa nacional, que deve juntar todos os portugueses, que foi uma conquista dos governos do PS e que é o EURO 2004.

Aplausos do PS.

A segunda nota que gostava de lhe deixar, Sr. Deputado Telmo Correia, é esta: o senhor desiludiu-me. É que todos nós sabemos que o CDS-PP tem um peso no Governo muito superior ao vosso peso aritmético nesta Casa.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Essa também não é nova!

O Orador: - Por isso, perante a recusa do Sr. Deputado Guilherme Silva em aceitar os nossos dois desafios, esperávamos que ao menos o CDS-PP pudesse responder a esses dois desafios. Mas não respondeu,…

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Eu respondi!

O Orador: - … porque os senhores não se sentem confortáveis com essa situação, estão muito incomodados. Se os senhores se sentissem confortáveis com essa situação, não tenho dúvida de que seriam os primeiros a propor a certificação dessas contas públicas.
Quanto à questão de que o Sr. Deputado Telmo Correia falou, mais uma vez, sobre o passado, devo dizer-lhe que nós, sobre o passado, já tivemos oportunidade de ser julgados.
Estamos disponíveis para os debates que quiser, mas nesta Casa quem tem de ser julgado…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se.

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O Orador: - … é a maioria e o Governo e é esse o nosso propósito. Por isso, não nos afastaremos um milímetro que seja de confrontar-vos com as propostas que os senhores fizeram em campanha eleitoral, já que foi pelas propostas que fizeram, mas não cumpriram, que os senhores, hoje, são Governo, tendo contribuído dessa maneira para, mais uma vez, afastar os eleitos dos eleitores.
Cumpram as promessas e, sobretudo, governem! Chegou a altura de se deixarem de desculpas, de se desresponsabilizarem e de assumirem os compromissos que fizeram com os portugueses.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Srs. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António José Seguro, em primeiro lugar, quero saudá-lo pela recente eleição para Presidente do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, bem como toda a direcção que consigo foi eleita nesse mesmo momento, e dizer-lhe que pode contar, por parte desta bancada, com a lealdade e a frontalidade que têm sido hábito nas relações entre as nossas bancadas, com a colaboração institucional que julgamos que é devida nesta matéria e também com a procura e o esforço para as convergências necessárias nos pontos em que estivermos de acordo, no combate à grave política que este Governo tem imposto ao nosso país.
Pois a verdade é que estes dois anos de governo da maioria de direita têm sido um desastre para o País e, mais do que um desastre até agora, comprometem seriamente o futuro dos portugueses, do quase meio milhão de portugueses que está no desemprego, de todos os outros que estão com salários reduzidos, de todos os que estão com emprego precário, de todos os que vêem as suas vidas mais difíceis e sem perspectivas, também por via da política deste Governo e do que ela tem significado para este país.
Com este Governo, aumentou a desigualdade no nosso país: os ricos estão mais ricos e os pobres estão mais pobres. Bem pode a maioria - e, ainda há pouco, o Sr. Deputado Guilherme Silva - falar do rigor, que é uma palavra fundamental no discurso deste Governo. O rigor?! Mas, então, o rigor é só para os que mais precisam do apoio de todos nós, do nosso colectivo, e do Estado português? O rigor não chega a cortar nos benefícios daqueles que mais têm?! O rigor não chega a cortar nos benefícios fiscais, nas operações offshore na Madeira e em todas as benesses que continuam a existir para os mais afortunados?!
Efectivamente, o rigor só chega para penalizar aqueles que estão de baixa por doença, para penalizar o salário mínimo com aumentos abaixo da inflação, para penalizar os trabalhadores da Administração Pública que continuam a ser o bode expiatório da falta de coragem de sucessivos governos para empreender uma verdadeira reforma democrática da Administração Pública.
Esta política e este Governo têm produzido um verdadeiro retrocesso social, que é preciso inverter e combater. É preciso recuperar os direitos sociais, como direitos fundamentais de um país que se quer avançado, moderno e democrático. É preciso promover o aumento do mercado interno, designadamente através do crescimento dos salários, tendo em conta a produtividade e a inflação, e não promover o congelamento dos salários, como este Governo tem feito. É preciso aumentar o investimento reprodutivo para o desenvolvimento do País e para uma maior dinâmica económica. É preciso combater a fuga para o estrangeiro dos centros de decisão fundamentais da nossa economia e, por isso, parar imediatamente uma política de privatizações que se tem traduzido em sucessivas alienações desses centros de decisão para os estrangeiros.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se, queira terminar.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente!
Portanto, é preciso uma radical inversão da política que está a ser seguida para uma política diferente, e que seja muito mais diferente do que a diferença que existe entre o "Força Portugal", da maioria, e o "Força portugueses", que o Sr. Deputado António José Seguro ainda agora utilizou.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António José Seguro.

O Sr. António José Seguro (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Bernardino Soares, agradeço as suas palavras e retribuo-as. De facto, é verdade que um país que não cria riqueza não a pode distribuir.
E já nem vou ao ponto de discutir se a maioria está interessada em redistribuir equitativamente essa riqueza através de políticas sociais, mas este gráfico que aqui tenho comigo, e que é do conhecimento do Sr. Deputado, é um gráfico que a maioria deveria ter presente cada vez que se senta nestas bancadas.

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Vozes do PS: - Todas as manhãs!

O Orador: - Ou seja, este gráfico demonstra bem o esforço de convergência que os portugueses estavam a fazer em relação à União Europeia e mostra, a partir do momento em que o Governo desta maioria tomou posse, o decréscimo da convergência.

Vozes do CDS-PP: - Já divergia no vosso tempo!

O Orador: - O Sr. Deputado Bernardino Soares recorda-se disto, mas eu até vou facultar cópias a cores aos Srs. Deputados.
A este propósito, gostava também de recordar que este resultado não pode ser desligado da promessa que o então candidato a Primeiro-Ministro, Durão Barroso, fez aos portugueses, pois prometeu um crescimento de 2% acima da média da União Europeia.
Está escrito no Programa do Governo para a área económica que o défice que a maioria calculava era de 5%, ou seja, muito superior àquele que ela veio apurar. Pergunto: então, se este Governo e esta maioria se prepararam para governar na base de um défice de 5%, que se verificou ser inferior, prometendo aos portugueses um crescimento de 2% acima da média, e afinal verificamos que somos aquele país que cresce negativamente, que nos atrasamos e que a Grécia, durante o consulado deste Governo, já nos ultrapassou, que razões é que os portugueses têm para acreditar neste Governo?

Vozes do PS: - Nenhumas!

O Orador: - Mais: o Sr. Deputado Bernardino Soares falou nas questões sociais e numa em particular que sei que lhe é cara, a da saúde. O Dr. Durão Barroso prometeu, há dois anos, que, com ele, em dois anos, acabava a lista de espera.

Vozes do PSD: - É verdade! Não é preciso explicar outra vez!

O Orador: - Porém, verificamos que não só não acabou a lista de espera como agora há duas! Infelizmente, então, havia 90 000 portugueses à espera de uma intervenção médica; neste momento, há cerca de 140 000!

O Sr. Afonso Candal (PS): - Mais, muito mais!

O Orador: - A maioria tem uma obsessão, mas, de facto, a vossa sensibilidade social não existe.
Sr. Deputado Bernardino Soares, podemos dar outro exemplo: dos medicamentos. O facto de este Governo ter definido um preço de referência para a comparticipação faz com que hoje haja um esforço das famílias muito maior na comparticipação dos medicamentos do que aquele que era feito durante os governos do Partido Socialista, e esse esforço penaliza, sobretudo, aqueles portugueses que mais precisam de recorrer aos medicamentos.

O Sr. José Magalhães (PS): - Exactamente!

O Orador: - É por isso, aliás, que este Governo, anualmente, através de decreto-lei, tem de fixar taxas de majoração para os cidadãos reformados. É por isso, Sr. Deputado Bernardino Soares, que, em matéria social, em matéria de preocupações sociais, há um caminho que queremos fazer e temos muito gosto que, nestas preocupações, também o PCP se junte a nós para combatermos este Governo.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Quiseram as circunstâncias da agenda parlamentar que o debate em ponto antes da ordem do dia, o debate político geral que temos hoje, seja o único que ocorre durante o mês de Abril.
É, portanto, uma boa ocasião, quando passam dois anos sobre a tomada de posse deste Governo e quando ele entra na sua segunda metade de mandato, para se fazer um balanço das questões decisivas, das questões que dividem, separam e clarificam.
Ao longo destes últimos meses, o Bloco de Esquerda convocou duas interpelações, uma com o

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Ministro Bagão Félix, para que fosse discutido o desemprego, a miséria, a pobreza e o atraso social, e outra, mais recente, com a Ministra dos Negócios Estrangeiros, Teresa Patrício Gouveia, acerca da política externa do Governo português.
No momento em que é possível fazer esta apreciação sobre dois anos de balanço do Governo constatamos aquilo que todos os portugueses sabem: nunca nenhum Governo fez tão depressa tanto mal a tantas pessoas no nosso país.
Por isso, vale a pena colocarmos agora uma pergunta: o que é que tem mudado? Quais são as ideias, a ideologia, os princípios, a orientação, o que é que há de novo na direita e na extrema direita que se coligam no Governo?
Começarei precisamente por procurar responder a esta questão. O que há de novo nas ideias e na ideologia da direita é um alinhamento político novo, que não era o que definia, até então, estas forças sociais e políticas.
Falta-lhes credibilidade, falta-lhes lucidez, porque hoje a direita é uma direita obediente mas sem orientação, tem uma estratégia mas não sabe qual é.
O exemplo mais claro talvez esteja no debate internacional que temos tido.
No dia 1 de Abril, a Ministra dos Negócios Estrangeiros veio à Assembleia da República dizer que não havia nenhum problema que não se estivesse a resolver no Iraque; 15 dias depois três cidades iraquianas, e não das mais pequenas, registaram a fuga das forças de ocupação e uma insurreição popular contra a ocupação.
Sadr City é uma cidade de 2 milhões de habitantes, que constitui uma grande parte de Bagdad onde as forças ocupantes não entram. Falujah é uma cidade onde se têm desenvolvidos conflitos sucessivos e que agora é vítima de uma punição colectiva por um atentado recente. E Najaf é a cidade santa dos xiitas, onde está o túmulo de Ali, o genro de Maomé, que corresponde, para a religião xiita, ao mesmo que o Vaticano para a religião Católica.
Foram estas três cidades que se levantaram contra a ocupação das forças norte-americanas e britânicas. E o que há de novo, agora, é que o Primeiro-Ministro fez um apelo à retirada das forças civis, de todos os civis portugueses, pelos quais não se responsabiliza. Suponho, no entanto, que não incluía nisso o Dr. José Lamego, correspondente do jornal Expresso em Bagdad.
Ontem, o Ministro da Administração Interna veio esclarecer que o quadro legal para a presença da GNR deverá manter essas forças militares no terreno, mesmo depois do dia 30 de Junho, o dia que está fixado para a passagem do poder para uma autoridade iraquiana.
Dizia-nos o Deputado João Rebelo, do CDS-PP, que, pelo menos, a oposição tinha de respeitar - e apoiar, portanto, em consequência - a presença da GNR no terreno. É precisamente porque respeitamos a vida e os direitos desses soldados portugueses que dizemos que o Primeiro-Ministro é o único e inteiro responsável pela sua vida e acusamos este Governo de não os respeitar.
Os senhores da direita quiseram uma guerra colonial, de que já tinham 30 anos de saudades, e lá estão envolvidos na sua guerra colonial, o que, evidentemente, é o contrário absoluto do respeito.
Ora, a situação do Iraque prova um descontrolo total, contrariando o que nos disse aqui a Ministra dos Negócios Estrangeiros. Estava previsto que as forças americanas se reduziriam a 40 000 soldados; George Bush anunciou ontem que passarão para 140 000. Estava previsto não haver dotação orçamental plurianual no Orçamento norte-americano, a partir do final de 2004; afinal, serão mais de 150 biliões de dólares; e, sobretudo, estava previsto que em 30 de Junho haveria uma passagem do poder.
Sr.as e Srs. Deputados, quero chamar-vos a atenção para o detalhe desta passagem do poder que condiciona e organiza as condições da presença portuguesa entre as forças da ocupação: o cônsul do Iraque, Paul Bramer, anunciou, em 4 de Dezembro de 2003, que a 31 de Maio, ou seja, daqui a pouco mais de um mês, deveria haver eleição para uma assembleia nacional provisória. Mas não vai haver. E que a 30 de Junho, dissolvida a autoridade da coligação, haveria uma transmissão de soberania para esta assembleia nacional provisória. Continua a dizer o Presidente Bush - disse-o ontem - que a 30 de Junho haverá transmissão de soberania. Mas para quem? Não há autoridade iraquiana eleita, o que existe é uma autoridade iraquiana nomeada pelas forças que lhe vão entregar o poder, sendo que ela, evidentemente, não tem nenhuma outra legitimidade que não o mandato dado pelos ocupantes.
Por isso, mantém-se a situação de falta de legitimidade, de guerra civil absoluta. E, hoje, vale a pena lembrar, quando muitas vezes os autores e os ideólogos da direita apontam para paralelos históricos, que há um que nunca foi referido, o paralelo da ocupação pelas forças aliadas da Alemanha. A Alemanha vinha de uma ditadura, a ditadura nazi, com um enorme apoio popular (Hitler tinha ganho as eleições e tinha tido um apoio maioritário do povo alemão). Derrotada a ditadura nazi, foi ocupada pelas forças aliadas.
Quantos soldados americanos foram mortos por resistência popular provocada, por exemplo, pelos antigos nazis, que eram tantos durante o período de ocupação militar no pós-guerra? Zero! Nenhum

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soldado americano foi morto!
Em contrapartida, num ano de ocupação do Iraque morreram mais soldados americanos do que durante os primeiros quatros anos de guerra no Vietname. Talvez aí se perceba a diferença!
E há aqui um problema ideológico fundamental: na verdade, o grande problema ideológico da direita é que hoje já não há ideias na direita. Os senhores já não têm ideias, já não têm propostas, aliás, nem sequer são, na política europeia, um governo, são talvez uma embaixada, talvez um consulado, talvez uma instalação das autoridades norte-americanas.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado o seu tempo terminou, queira concluir.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
E por isso mesmo é que se pode compreender que, hoje, um Eurodeputado do PSD como Pacheco Pereira reconhece o seu papel de "idiota útil", e os que argumentam que a razão para a guerra é criar a democracia têm de se manter na firmeza das posições de que só volte o último civil morto e que ninguém abandone nunca o Iraque. Desertaram a Europa! Desertaram a verdade! Desertaram a paz! Desertaram os portugueses! Resta-vos o vosso último slogan "A força da mentira"!

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.

Eram 16 horas e 30 minutos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos iniciar o primeiro ponto da ordem do dia com a discussão da proposta de resolução n.º 63/IX - Aprova o Acordo entre a República Portuguesa e o Reino de Espanha para a constituição de um mercado ibérico da energia eléctrica, assinado em Lisboa, em 20 de Janeiro de 2004.
Peço ao Sr. Vice-Presidente Narana Coissoró o favor de me substituir na Presidência da Mesa e conduzir os trabalhos.

Neste momento, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Narana Coissoró.

O Sr. Presidente: - Para apresentar a proposta de resolução n.º 63/IX, tem a palavra o Sr. Ministro da Economia.

O Sr. Ministro da Economia (Carlos Tavares): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Acordo Internacional para a criação do Mercado Ibérico de Electricidade, assinado no dia 20 de Janeiro pelos Governos de Portugal e Espanha, foi um passo decisivo para o futuro do sector da energia dos dois países. Mas a sua importância não se cinge apenas a estes dois países, ele é também um marco histórico do futuro Mercado Interno de Electricidade da União Europeia.
Este Acordo representa o culminar de um caminho. Um caminho iniciado, em 1998, com a assinatura de um Memorando de Acordo entre as Administrações de Portugal e Espanha, onde já eram reconhecidos os benefícios mútuos resultantes da criação de um mercado de dimensão ibérica. Um caminho que foi possível graças ao empenho dos governantes dos dois países, em que os interesses particulares foram postos de lado em benefício do interesse que importa prosseguir: o da economia, das empresas e dos consumidores.
Mas este Acordo é também o início de um novo caminho, ainda mais estimulante e por isso também mais exigente. A concretização prática do MIBEL é o grande desafio, não apenas para os governos mas também para os operadores do sector eléctrico dos dois países.
O espírito construtivo e de cooperação bem como a vontade política que norteou este Acordo serão, a partir de agora, mais necessários do que nunca entre os dois Estados.
Mas não duvido, nem por um instante, que assim será e que o MIBEL será um exemplo para os restantes países. Teremos um mercado que favorece o intercâmbio e a concorrência entre as empresas do sector, em que haverá igualdade, transparência e objectividade no acesso ao pleno respeito pelo direito comunitário, em que existe um quadro jurídico estável e coordenado que permita aos agentes do sector desenvolver a sua actividade em toda a Península Ibérica.
Este é, aliás, um dos aspectos mais relevantes do Acordo que hoje é trazido para ratificação desta

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Assembleia: o do reconhecimento recíproco e automático de agentes por parte dos dois países, conferindo-lhes igualdade de direitos e obrigações, independentemente da sua nacionalidade. Podemos assim falar de verdadeiros agentes ibéricos, sejam eles produtores, comercializadores ou consumidores, a operar num mesmo mercado.
Sr. Presidente Srs. Deputados: Este Acordo vem estabelecer um elemento fundamental para a criação de um mercado concorrencial, mas saudável. As competências do Conselho Ibérico de Reguladores são a forma mais transparente de garantirmos a aplicação uniforme das regras de mercado em nome da defesa dos direitos dos consumidores e dos agentes do mercado.
Em 2006, existirá um operador de mercado ibérico único, criado a partir dos dois pólos: o OMIP, pólo português que gere os mercados a prazo e que vai ser inaugurado no próximo dia 20 de Abril, e o OMEL, pólo espanhol que gere o mercado à vista.
Os dois países têm desenvolvido de forma coordenada a legislação necessária ao funcionamento de um mercado integrado. Também esta legislação está pronta, fruto de um trabalho de colaboração intensa entre as administrações de Portugal e Espanha, faltando apenas o acordo final da parte espanhola, pelas razões de ordem administrativa e política que são conhecidas.
O Mercado Ibérico de Electricidade é o mais significativo caso de cooperação ibérica, com integral respeito pela identidade e pelos interesses dos dois países. É mesmo, posso dizer-vos, um caso exemplar!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este Acordo é uma peça da mudança profunda do mercado de electricidade no nosso País. Em apenas um ano pusemos fim ao regime de quase monopólio na produção e na comercialização de electricidade.
As empresas já têm liberdade de escolha do seu fornecedor de electricidade e o mesmo será oferecido aos consumidores domésticos dentro de apenas dois meses. É uma alteração tão profunda e duradoura quanto tranquila.
Juntamente com a reorganização empresarial do sector energético, que estamos a finalizar, esta é maior e mais importante transformação de sempre do sector da energia em Portugal.
Tudo isto é feito em benefício dos consumidores e da competitividade das empresas, através de uma maior previsibilidade de preços decorrente da existência de mercados a prazo e do aumento da concorrência no sector, que, legitimamente, esperamos tenha efeitos na descida dos preços da energia e na qualidade do serviço prestado.
Mas esta mudança é também realizada em nome da eficiência das empresas portuguesas do sector, que terão acesso a um mercado concorrencial de 53 milhões de consumidores.
Estou certo de que com o MIBEL poderemos ter, na Península Ibérica, as melhores empresas do sector eléctrico europeu.
Acredito sinceramente que seremos um exemplo para a Europa e que o MIBEL será um forte incentivo à concretização do futuro mercado interno da energia na União Europeia.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, a criação do MIBEL está indissociável e incontornavelmente ligada ao anúncio, feito pelo Governo, da eventualidade da descida dos preços da energia eléctrica. O Sr. Ministro bem se recordará que no dia 8 de Outubro de 2003 disse isso claramente na Comissão de Economia e Finanças e o Sr. Primeiro-Ministro, no dia 20 de Janeiro, quando subscreveu o acordo internacional com o então Primeiro-Ministro espanhol, afirmou isso de uma forma reiterada, dizendo que o objectivo deste Mercado tinha em vista a baixa dos preços da energia eléctrica.
Mas a verdade, Sr. Ministro, é que agora quase ninguém defende e admite esse cenário. Pelo contrário, quase todos admitem o cenário contrário. É que a tendência é no sentido de aumentarem os preços da energia eléctrica. Isso mesmo disse, aliás, nesta Casa o Sr. Presidente da entidade reguladora, que, em Fevereiro, enunciou seis factores (não foram nem um, nem dois, nem três, Sr. Ministro!) para que os preços não venham a descer. Aliás, o que todos os peritos dizem é que, provavelmente, sucederá o contrário, ou seja que os preços actualmente praticados em Espanha tenderão a aumentar e a aproximarem-se dos preços praticados em Portugal.
Então o Governo enganou-se, Sr. Ministro da Economia? É o único a não saber fazer uma previsão? É o único a não saber ver bem a realidade do que se vai passar com o MIBEL? Ou, tal como sucedeu na liberalização dos combustíveis, tenta vender ilusões de preços mais baixos, mais baratos, para fazer passar um projecto que poderá, de facto, lesar os interesses do País?
Sr. Ministro, uma outra questão tem a ver com o futuro da produção nacional de energia eléctrica.

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Cada vez mais gente (gente, até, do seu partido e apoiante deste Governo) afirma claramente que o MIBEL vai provocar a absorção do mercado espanhol. Diz mesmo que vai provocar a apropriação da produção eléctrica nacional por grupos e por empresas espanholas. Então, Sr. Ministro, para que serve o MIBEL? A quem serve o MIBEL? Se não vai diminuir preços, se pode significar, como muitos afirmam, o desaparecimento do sector eléctrico nacional, serve a quem? Serve a Portugal ou a Espanha? Serve as empresas, os grupos e os interesses nacionais ou os grandes grupos espanhóis? Serve a tão propalada - e, diga-se, tão desprezada - conservação dos centros de decisão nacionais ou é mais um "selo postal", mais um meio caminho andado para que todo e qualquer sector económico estratégico, produtivo nacional passe para mãos estrangeiras?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Era bom que nos entendêssemos sobre isso para verificarmos o que quer e o que serve o MIBEL.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, não hesitamos em considerar que possa haver uma integração de mercados e sabemos que esse é um curso mais ou menos irreversível e que mais cedo do que tarde ou mais tarde do que cedo é objectivo e inevitável.
Porque temos outra concepção de modelo económico, teríamos preferido que esta questão se tivesse processado de outra forma, que o sector público fosse fundamental, quer num quer noutro País. Todavia, não é o quadro que encontramos.
A nossa oposição não se coloca em relação à integração e ao alargamento de mercados, mas sim em relação ao modelo de liberalização e ao que se esconde por trás da palavra "liberalização".
Chegados aqui, e com base na posição crítica que temos em relação à proposta de acordo que nos é trazida, a nossa pergunta tem a ver com garantias. Em primeiro lugar, quais as garantias que nos traz o Sr. Ministro acerca de uma regulação independente, num quadro pluriestatal e nos termos em que está previsto o funcionamento do MIBEL? Quais as garantias de melhoria de serviço? Quais as garantias de descida de preço, aliás já aqui evocada, que foi anunciada como uma descida recorrente, frequente e deslizante, nada parecendo indicar nesse sentido? Que garantias nos traz acerca do investimento num serviço de interesse geral, de modo a que a capacidade de transporte da energia tenha planificação de investimento e que não sucedam casos de congestionamento que são frequentes em Espanha, mas também de forma a que não haja uma selecção adversa de consumidores e de zonas geográficas? Que garantias temos quanto a esses factos? Que garantias temos de que, em relação a um tarifário diferenciado, não haja uma discriminação da generalidade dos consumidores, ou seja, dos consumidores domésticos? Que garantias temos neste momento de que Espanha cumpra tudo o que foi acordado entre os dois países?
Sr. Ministro, uma última pergunta: atendendo a que neste momento ocorre uma transição do governo espanhol, por que não esperámos alguns dias? Por que temos de aprovar este acordo antes de os espanhóis o aprovarem? Não teria sido mais prudente aguardar algum tempo antes de trazer esta proposta de resolução para votação na Assembleia da República de Portugal?

Vozes do BE: - Bem perguntado!

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Economia.

O Sr. Ministro da Economia: - Sr. Presidente, Srs. Deputados, o Sr. Deputado Honório Novo não é, reconhecidamente, um especialista na área da energia, pelo que tenho todo o gosto em explicar-lhe algumas questões relativamente às perguntas que colocou.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Não é preciso ser especialista para saber que os preços aumentam!

O Orador: - Basta ter-se o 1.º ano do curso de Economia para se saber que no mercado mais alargado, com mais concorrência, só há uma possibilidade para os preços: serem mais baixos do que seriam com menor concorrência.

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O Sr. Honório Novo (PCP): - Não é isso que diz o Eng.º Mira Amaral.

O Orador: - Sr. Deputado, vai permitir que lhe responda e que lhe explique com todo o gosto. Aliás, se o Sr. Deputado tivesse estado com atenção à exposição do regulador quando esteve na Comissão de Economia e Finanças veria, pela apresentação que fez, que o primeiro benefício potencial do mercado ibérico que ele apresentou foi a existência de preços mais competitivos.

O Sr. Honório Novo (PCP): - O que é que isso quer dizer?

O Orador: - Preços mais competitivos são preços mais baixos do que seriam noutro caso.
Os Srs. Deputados, provavelmente por não terem estudado o assunto, confundem uma coisa: é que ao dizer-se que os preços são mais baixos do que seriam noutras circunstâncias não quer dizer que os preços baixem se tiverem outros factores de subida.

Vozes do PCP: - Ah!

O Orador: - Se, por força das energias renováveis, por força das questões relacionadas com o Protocolo de Quioto, por força da subida dos preços dos combustíveis, os preços tiverem de subir, o que lhe garanto é que sobem menos do que subiriam noutro caso. Com o mercado ibérico da electricidade, com mais concorrência, seguramente os preços serão mais baixos do que seriam noutro caso.
Sr. Deputado, não é sério o argumento que usa em relação aos preços dos combustíveis. De uma vez por todas lhe digo: o Sr. Deputado sabe muito bem que, em Portugal, os preços dos combustíveis subiram menos do que no resto dos países da Europa desde Janeiro até agora. O Sr. Deputado sabe muito bem que o preço do petróleo subiu e que o dólar não desvalorizou, ao contrário do que os senhores têm dito. Desde Janeiro que o dólar valorizou relativamente ao euro. Sr. Deputado, tenho todo o gosto em dar-lhe as estatísticas, mas consulte os câmbios do Banco de Portugal, que são publicados todos os dias.
Por isso, não é um argumento sério - tenho de lho dizer - associar-se a subida do preço da gasolina e do gasóleo à liberalização do mercado. De facto, esses preços subiram mais em Espanha e na União Europeia do que em Portugal, mas garanto-lhe que nenhum combustível em Portugal subiu mais do que teria subido se se tivesse mantido o anterior regime.
Portanto, aquilo que disse em relação aos preços repito-o. E não há nenhum especialista que lhe possa dizer o contrário: os preços com o MIBEL, com um mercado mais concorrencial, serão mais baixos do que seriam noutros casos.
Por um lado, a simples extinção de contratos de aquisição de energia eléctrica vai ter, ao contrário do que alguns têm dito, um efeito de redução da pressão sobre os preços. Sabe porquê, Sr. Deputado? Porque os custos dos contratos longos de aquisição de energia eléctrica já estão no sistema e vão ser diluídos nas tarifas por um período mais longo do que o prazo médio desse contratos, o que resulta numa pressão descendente sobre os preços.
Por outro lado, os contratos de aquisição de energia tinham uma taxa real de remuneração do capital - uma coisa de que os senhores não gostam é de remunerar o capital) de 8,5%, que, neste caso, com a extinção dos contratos, vai poder ser reduzida, traduzindo-se também numa redução da pressão sobre os preços.
Sr. Deputado, estou, pois, disposto a explicar-lhe, pelo tempo que quiser, por que razões é que o mercado ibérico de energia eléctrica só pode ter um efeito sobre os preços, que é o de redução da pressão sobre os mesmos.
O Sr. Deputado colocou também uma questão que tem a ver com uma outra colocada pelo Sr. Deputado Luís Fazenda. Compreendo que os senhores defendam um modelo diferente daquele que nós defendemos, apreciando, até, a honestidade intelectual com que o afirmam, mas as empresas em Espanha, que são privadas, são mais eficientes, pelo que, neste momento, os consumidores espanhóis estão beneficiados. Em Portugal, não há razão para que o Estado tenha o peso que ainda tem, indo o mercado ibérico permitir que a EDP, a nossa empresa de electricidade, possa ser mais concorrencial com a reestruturação que temos feito.
Lembrem-se do seguinte, Srs. Deputados: a EDP é a única empresa ibérica que está significativamente presente dos dois lados da fronteira, através das operações da Hidrocantábrica e da Naturcorp, e vai ser - ou já é, se quiserem - a única empresa ibérica que tem uma operação de gás e de electricidade combinados, o que lhe dá uma vantagem competitiva muito grande e que vai seguramente fazer com que seja forte no mercado ibérico e possa explorar o facto de ter à sua disposição um mercado de 53 milhões de consumidores.

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Em relação às garantias que o Sr. Deputado Luís Fazenda pediu que lhe desse, e que eu compreendo, há uma, essencial, que lhe dou: o modelo de regulação que está definido.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Sr. Ministro, tem de abreviar a sua resposta, se faz favor.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Nós temos uma regulação independente. Entendo, aliás, que o nosso modelo de regulação é mais positivo do que o espanhol, mas o conselho de reguladores vai ter uma acção uniforme sobre os dois mercados, por isso acreditamos que as virtualidades do nosso modelo vão estender-se também ao mercado vizinho, porque a regulação tem de ser assente em regras comuns - isso também faz parte do acordo.
Finalmente, direi que não havia nenhuma razão para não ratificarmos este acordo antes do dia 20, conforme nos comprometemos, tal como foi acordado entre Estados (não entre partidos). É-nos, pois, indiferente, para este efeito, que o governo de Espanha seja um ou outro, dado que celebrámos um acordo entre Estados, que respeitamos, e estamos a reunir todas as condições para que entre em vigor no dia 20 de Abril. E já recebemos do governo espanhol, pela via diplomática, a informação de que o acordo também entrará em vigor no próximo dia 20 em Espanha.
Já é tempo de não andarmos a reboque dos outros e de cumprirmos as nossas obrigações sem estarmos a olhar para o que os espanhóis estão a fazer.
Esta era, pois, a nossa obrigação e estamos a cumpri-la hoje.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O Sr. Ministro, em resposta às questões que lhe foram formuladas, e a propósito de a discussão ocorrer no Parlamento português antes de ter lugar nas Cortes espanholas, disse que Portugal estava na vanguarda, razão pela qual não tem nenhuma preocupação em esperar que a ratificação desde acordo, que foi celebrado entre Estados, não entre governos ou entre partidos, ocorra aqui por antecipação.
Se o Sr. Ministro reserva esse vanguardismo para a forma, do ponto de vista de Os Verdes o vanguardismo de Portugal não existe de modo algum em relação ao conteúdo deste acordo.
Não se trata de articulação nem tão-só de integração, mas de absorção, de assimilação pura e simples do mercado de Portugal, e não foi seguramente por acaso - os símbolos também têm um significado - que na cerimónia em que este acordo foi assinado, na Figueira da Foz, não estavam presentes os símbolos da União Europeia, o que julgo ser esclarecedor.
Sobre as reservas, o Sr. Ministro e o Governo manifestam um grande optimismo, mas as incertezas e as incógnitas são seguramente mais do que as certezas e as respostas sobre o que esta integração pode vir a significar.
Chamo a atenção para um aspecto que gostaria que o Sr. Ministro esclarecesse, porque até agora ainda o não fez. Como sabe, não é indiferente a energia nas economias. Ora, estes dois países têm dois sistemas tarifários totalmente diversos: em Portugal, há uma entidade reguladora independente que estabelece preços e em Espanha é o governo que define os preços e que, aliás, subvenciona o preço da energia. O Governo não tem clarificado a matéria nem tem dado garantias sobre o modo como quer ou como pensa - se é que o fez - prevenir as consequências desta realidade, tendo já a Associação Portuguesa dos Industriais Grandes Consumidores de Energia Eléctrica levantado esta questão.
Sr. Ministro, outra questão que claramente fica em aberto quando pensamos neste acordo é o facto de Portugal não falar de uma forma forte, mas totalmente diluída, não falar com voz própria, por exemplo no plano da União Europeia, em termos de mercado energético, mas de uma forma fictícia, em conjunto, através da voz do seu parceiro mais poderoso.
Sobre a questão das alterações climáticas, sabemos que o Governo tem tido uma enorme desatenção, tem procurado adiá-la, e com os adiamentos tem tentado ganhar tempo e fazer amanhã aquilo que devia ter feito ontem. Mas esta matéria constituiria um factor de competitividade importante para as nossas empresas, não só do ponto de vista ambiental, mas também do ponto de vista económico e social.
Gostaria, pois, de saber em que medida é que foi tido em conta um cenário para além de 2006. É que, no âmbito do plano nacional de alocações, o único sector que conta para efeitos do mercado das emissões vai ser autorizado a aumentá-las durante dois anos. É evidente que isto vai ter consequências depois desse

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prazo, não só nos outros sectores como provavelmente nos próprios contribuintes, porque alguém vai ter que pagar aquilo que Portugal vai gastar fora em termos de compra de emissões.
Não sei se o Orçamento para 2005, que provavelmente já começou a ser elaborado, já tem em conta a questão, mas ela terá de ser equacionada não muito fora deste limite temporal.
Gostaríamos, pois, de saber em que medida é que o Governo pensou, não numa perspectiva imediatista, mas de longo prazo, nas consequências para Portugal desta pretensa parceria, ou seja, desta assimilação, que nos coloca lado a lado com um país que desperdiça energia, que a utiliza mal, pelo menos até agora, que tem estado não tão desatento como o Governo português, mas, no mínimo, suficientemente longe daquilo que os países mais desenvolvidos da União Europeia têm procurado fazer.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Graça Proença de Carvalho.

A Sr.ª Graça Proença de Carvalho (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A decisão de criar um mercado único de energia eléctrica na Península Ibérica não é de agora e vem de encontro à necessidade de garantir a eficiência e a competitividade das empresas nacionais do sector no processo em curso de liberalização do mercado eléctrico europeu, sempre salvaguardando os interesses dos consumidores.
A situação geográfica de Portugal e a excessiva concentração empresarial do sector eléctrico exigiriam, à partida, um empenho do Estado enquanto definidor de uma estratégia para um sector de extrema importância para o desenvolvimento económico do País.
Nesse sentido, o Estado português iniciou, em 1998, contactos com Espanha com vista à celebração de um acordo de cooperação para a integração das redes eléctricas dos dois países e consequente criação de um mercado ibérico único.
Embora pouco relevante agora, porque muitos dos obstáculos existentes inicialmente já foram eliminados, o processo arrastou-se sem grandes desenvolvimentos até finais de 2001.
Nessa altura, as entidades reguladoras dos dois países, a Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE) e a Comisión Nacional de Energía (CNE), foram mandatadas para proceder à elaboração de um modelo de funcionamento para ser apresentado em Março de 2002, modelo esse que assegurasse a livre concorrência, a eficiência, a transparência e a objectividade, sendo enquadrado pela legislação comunitária aplicável e pelas boas práticas da regulação.
A mudança de governo, em Março de 2002, não parou o processo, pelo contrário, dinamizou-o e desenvolveu as condições necessárias para a sua concretização, superando as lacunas encontradas na proposta de modelo de funcionamento então apresentado pelas entidades reguladoras e reivindicando um papel mais relevante para Portugal, defendendo assim os direitos nacionais.
Desde então as cimeiras luso-espanholas de Valência, em Outubro 2002, e da Figueira da Foz, em Novembro de 2003, foram determinantes pelos compromissos assumidos por cada uma das partes, Portugal e Espanha, no sentido de criar condições de igualdade aos agentes portugueses e espanhóis, quer a nível interno, quer a nível externo, com destaque para a França e Marrocos, países geograficamente mais próximos, sem descurar aspectos como a legislação e a regulamentação do futuro mercado ibérico de electricidade.
A formalização do acordo internacional entre Portugal e Espanha, no dia 20 de Janeiro de 2004, foi um passo de importância política fundamental para a implementação do mercado ibérico de electricidade, porque estabelece as condições essenciais para a competitividade das empresas nacionais e, sobretudo, a salvaguarda dos interesses dos consumidores com previsíveis benefícios no preço e na qualidade dos serviços prestados.
Aliás, na audição parlamentar ao presidente da entidade reguladora nacional promovida pela Comissão de Economia, em Fevereiro deste ano, foi demonstrado, ao contrário do que o Sr. Deputado Honório Novo aqui referiu, que a implementação do mercado eléctrico ibérico traz benefícios aos consumidores e salvaguarda os produtores, dando-lhes, por exemplo, acesso a outros mercados em melhores condições, em condições igualitárias, como também tem riscos e incógnitas, especialmente na definição de alguns instrumentos relevantes para a sua operacionalidade, mas que não condicionam o processo nem nunca o inviabilizarão.
A proposta de resolução n.º 63/IX, apresentada aqui hoje pelo Governo português, consubstancia mais um passo importante na implementação do mercado ibérico de electricidade, demonstrando o continuado esforço e interesse na sua prossecução.
Também é de realçar que a mudança de governo recente em Espanha em nada alterou os compromissos antes assumidos, existindo inclusivamente uma cláusula no referido acordo que prevê a aplicação provisória do mercado ibérico de electricidade até que o processo seja também ratificado pelo

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parlamento espanhol.

O Sr. Hugo Velosa (PSD): - Bem lembrado!

A Oradora: - Com assumido interesse político nacional, o Grupo Parlamentar do PSD congratula-se com a iniciativa do Governo e acredita que mais um passo relevante foi dado num processo que, acima de tudo, será benéfico para Portugal e para portugueses.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Maximiano Martins.

O Sr. Maximiano Martins (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O objecto do acordo agora em apreciação é, como sabemos, a criação e o desenvolvimento de um mercado de electricidade comum aos dois países como um marco de um processo de integração dos dois sistemas eléctricos.
A igualdade de direitos e obrigações de todos os agentes e o desenvolvimento, de forma coordenada, da legislação interna que permita o funcionamento do MIBEL são elementos centrais desta "construção" cooperativa - se me é permitida a expressão -, que, em nenhuma circunstância, deverão esquecidos por parte do Governo.
Outro elemento central é o mandato atribuído às respectivas entidades reguladoras. A estas é pedida a apresentação de "um modelo de organização do mercado ibérico de electricidade que tenha em conta os objectivos acima mencionados, a legislação comunitária aplicável, a experiência recente de funcionamento dos mercados eléctricos de ambos os países e as boas práticas de regulação".
Este modelo "deverá permitir o desenvolvimento de um mercado concorrencial, fluido e eficaz, dotado dos necessários mecanismos de acompanhamento e controlo que garantam a satisfação das necessidades dos consumidores, a segurança de abastecimento no curto e no longo prazo e a plena compatibilidade com os objectivos de eficiência energética e fomento das energias renováveis em ambos os países".
Citei trechos do acordo celebrado entre Portugal e Espanha, que estabelece claramente uma compatibilização de objectivos que deve ser parte da doutrina e do discurso de todos os intervenientes, a começar pelo Sr. Ministro da Economia. Refiro-me não apenas à eficiência do sistema mas à segurança de abastecimento, aos interesses dos consumidores e ao fomento das energias renováveis em ambos os países.
Esta matéria tem, como se sabe, antecedentes. É matéria iniciada em governos do PS, sendo então Ministro da Economia o Eng.º Luís Braga da Cruz. O elemento mais relevante foi o Protocolo de 14 de Novembro de 2001, que expressamente refere que "as Administrações de ambos os países, conscientes de que a cooperação tem sido benéfica e frutuosa, reconhecem a conveniência em acelerar a realização de um mercado ibérico de electricidade, que constituirá um passo para a construção do mercado interno da energia, em linha com as conclusões do Conselho Europeu de Lisboa de 23 e 24 de Março de 2000". Lembram-se, Srs. Deputados, da estratégia de Lisboa, durante a presidência portuguesa da União Europeia! É bom que, a todo o momento, esses factos sejam aqui lembrados.
Mas além do Congresso Luso-Espanhol sobre Energia, que teve lugar em Novembro de 2001, refiro um documento de discussão preparado ainda em 2001 pelas entidades reguladoras e os passos que foram dados, até finais de Março de 2002, antes da entrada em funções deste Governo, e que culminaram com a apresentação de um modelo de organização do MIBEL.
Como é sabido, este processo teve a sua consagração com a assinatura do acordo internacional agora em ratificação, que teve lugar em 20 de Janeiro de 2004.
Depois da previsão de entrada em funcionamento do MIBEL em 1 de Janeiro de 2003, já com este Governo fixou-se inicialmente para o primeiro semestre de 2003 e depois para 20 de Abril de 2004. Como se sabe, esta data não será integralmente cumprida, como também não há garantia de que outras datas previstas para outros aspectos do acordo venham a ser respeitadas, como, por exemplo, as relativas ao mercado a prazo financeiro, à oferta de venda do capital do operador do mercado ibérico do pólo português para o mercado a prazo, entre outros aspectos, em relação ao que expressamos a nossa preocupação.
Manifestamos também sérias preocupações relativamente a fases decisivas futuras que dependem da acção do Governo, designadamente à transposição da directiva comunitária que estabelece regras comuns para o mercado interno da electricidade com a liberalização do mercado eléctrico a 100% em 1 de Julho

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de 2004 e de mais de 50% do mercado do gás.
De resto, algumas disposições do acordo poderão ser não consentâneas com a directiva que acabo de referir, pelo que se trata de uma matéria que é urgente clarificar, se não aqui, em sede própria.
Expressamos também a nossa preocupação relativamente à necessidade da aprovação indispensável da lei de bases do sistema eléctrico, bem como da lei de bases do gás natural.
O Grupo Parlamentar do Partido Socialista é favorável à concretização do MIBEL, que contém benefícios potenciais sensíveis.

O Sr. Hugo Velosa (PSD): - Nem outra coisa seria de esperar!

O Orador: - De resto, Portugal não tem dimensão para poder organizar isoladamente um mercado grossista eficiente. Mas colocam-se-nos sérias dúvidas, algumas das quais já referi, nomeadamente as que dizem respeito à competência do Governo e da Administração na concretização atempada das necessárias adaptações e actos legislativos que o MIBEL pressupõe.
Temos dúvidas quanto à própria política energética defendida por este Governo, dado que a Espanha diversificou mais do que Portugal (nuclear e carvão) a sua oferta energética, sendo a vulnerabilidade portuguesa mais forte, além de Portugal estar geograficamente mais distante de outros países da Europa central.
Temos sérias dúvidas em relação aos contratos de aquisição de energia e à opção de Portugal por um sistema de solução semelhante ao que existe em Espanha. Queremos ter oportunidade de discutir esta matéria, dado que esta opção que o Governo está a tomar "amarra" o preço da electricidade com grandes inconvenientes.
Temos também sérias dúvidas quanto à continuação da existência de subsídios cruzados em Espanha, que têm como consequência sérios benefícios competitivos aos grandes produtores industriais espanhóis, bem como o dito sistema de interruptibilidade praticado em Espanha, que permite descontos na ordem dos 20% e que envolve diversos sectores industriais.
Temos ainda dúvidas sobre a natureza não independente da "REN" espanhola, que é uma entidade dominada pelos produtores. E é bom lembrar que as empresas que fazem a grande distribuição são a chave do mercado.
Temos igualmente sérias dúvidas quanto às diferenças de regulação entre Portugal e Espanha, e mantemos como indispensável que, em Espanha, seja o regulador a fixar os preços.
Queremos ver clarificados os critérios que levaram à opção por instalar em Lisboa o mercado de longo prazo e em Madrid o mercado, mais relevante, do spot e do curto prazo.
Queremos também saber como pensa o Governo actuar para continuar a promover as energias renováveis.
São tantas e tantas as dúvidas que não poderei prosseguir por falta de tempo.
A terminar, relembro ao Sr. Ministro as dúvidas que consumidores industriais, consumidores particulares e o regulador colocaram relativamente ao facto de o Governo ter ou não acautelado os interesses nacionais em termos do MIBEL e relativamente à questão dos preços.
São tantas e tantas as questões e preocupações que poderiam e deveriam estar esclarecidas para que fosse possível um amplo consenso entre a maioria e o Partido Socialista em matéria tão relevante.
Infelizmente, apesar do pedido de audição do Ministro da Economia em sede de Comissão de Economia e Finanças, solicitado desde Janeiro deste ano, e após audição do presidente da ERSE em 11 de Fevereiro deste ano, ainda não foi possível conseguir disponibilidade do Sr. Ministro para vir à Comissão discutir connosco as questões agora sublinhadas e outras.

O Sr. Hugo Velosa (PSD): - Isso é uma obsessão!

O Orador: - Trata-se de uma forma inaceitável de condução de assuntos de Estado.
Era nossa intenção pedir a baixa à Comissão de Economia e Finanças deste acordo. Mas não o faremos e votá-lo-emos favoravelmente, tendo em atenção a existência (que nos garante o Governo português) da nota diplomática do governo espanhol que permite a entrada em funcionamento do MIBEL mesmo antes da sua ratificação por Espanha e a garantia de que a sua discussão prosseguirá em sede da Comissão de Economia e Finanças, não se furtando o Sr. Ministro da Economia ao debate que solicitámos em Janeiro passado.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado

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Herculano Gonçalves.

O Sr. Herculano Gonçalves (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A energia é um sector em rápida transformação quer na Península Ibérica quer na Europa, é um sector que reveste de importância vital para as economias actuais.
Importa, por isso, responder com eficácia aos desafios que neste domínio se colocam, desde a garantia e segurança do abastecimento nacional aos requisitos de natureza ambiental e à sua influência na competitividade das empresas enquanto factor de produção, à liberalização do sector na União Europeia.
Desde 1988 foram abertas à iniciativa privada as actividades de produção e distribuição de energia eléctrica através do Decreto-Lei n.º 449/88, no seguimento, aliás, da Directiva 96/92/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, que desencadeou alterações no panorama jurídico e organizativo do sector eléctrico.
A partir destes instrumentos legais, foi produzida regulamentação específica para o sector.
Nos termos de uma nova directiva europeia, a Directiva 2003/54/CE, altera-se a Directiva 96/92/CE, no sentido da construção de um mercado europeu de energia aberto e integrado.
O Governo tem vindo implementar um conjunto de instrumentos legislativos que consubstanciam a criação de um verdadeiro mercado de electricidade, criando condições para uma efectiva concorrência neste sector.
Este novo enquadramento permitirá aos consumidores a liberdade de escolha sobre o fornecedor de energia eléctrica, com claros benefícios na qualidade dos serviços e nos preços desta mesma energia eléctrica.
Estas medidas são particularmente importantes para a competitividade do País como destino de investimento, na medida em que permitirão às empresas instaladas em Portugal o acesso a um mercado eléctrico eficiente e competitivo.
A resolução destas questões é um factor essencial do processo de liberalização da actividade de produção de energia e da criação de um horizonte de estabilidade aos produtores.
A liberalização do mercado português de electricidade terá consequências positivas para os consumidores nos vários níveis de tensão - empresas e particulares.
A concorrência efectiva no mercado de electricidade cria condições para uma melhoria na qualidade de serviço, diversificação de produtos e possibilidade de oferta de produtos combinados (gás e electricidade, por exemplo).
Simultaneamente, o mercado livre tenderá para uma maior aproximação aos preços praticados no país vizinho, tornando-se previsível uma redução das tarifas.
Relativamente às empresas eléctricas, a maior liberdade de actuação no mercado cria condições de acrescida competitividade, concorrência e de incentivo a maior eficiência de actuação. As empresas passam a dispor de uma maior flexibilidade de gestão das suas posições e/ou necessidades de compra ou venda de energia no mercado grossista, facto que lhes pode permitir actuar no sentido de captar oportunidades de arbitragem de mercado.
Além disso, com a criação do Mercado Ibérico de Electricidade, os produtores que exercem actividade em Portugal passam a ter acesso a um mercado mais vasto e a novas oportunidades de venda de energia.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A integração dos sistemas eléctricos de Portugal e Espanha, sem distinção operacional de fronteiras, cria um mercado integrado à escala de aproximadamente 50 milhões de consumidores e que representará o quarto maior produtor eléctrico da União Europeia.
Este mercado representará 260 milhões de megawatts e 10.500 milhões de euros de facturação anual. Ou seja, a partir de 20 de Abril próximo haverá uma única bolsa de energia para a compra e venda de energia eléctrica por parte das empresas de ambos os países.
Com o funcionamento integrado do mercado, estará ao alcance das empresas portuguesas e espanholas um mercado a prazo de energia eléctrica.
Para além das vantagens decorrentes da previsibilidade de preço, inerente aos mercados a prazo, e de maior certeza no planeamento de custos para as empresas, é legítimo prever que a liberalização do mercado de electricidade em Portugal e o aumento da concorrência pela criação do mercado ibérico tenham efeitos na descida dos preços, à semelhança do que já aconteceu em Espanha.
Com as medidas legislativas aprovadas pelo Governo no ano anterior, estão já criadas as condições para a liberalização do mercado eléctrico nacional, permitindo a entrada de novos produtores, comercializadores e distribuidores de electricidade.
O acordo internacional em questão formaliza o reconhecimento de um mercado único de electricidade a nível ibérico e permite o avanço do processo de integração dos sistemas eléctricos de Portugal e Espanha e da construção do mercado interno de energia na União Europeia.

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Um dos aspectos mais relevantes do acordo é o reconhecimento recíproco de agentes, ou seja, sendo concedido o estatuto de produtor, comercializador ou outro por parte de um país, o reconhecimento pelo outro país é automático, conferindo igualdade de direitos e obrigações a esse agente.
Já este ano, a Península Ibérica passa a constituir um mercado integrado de electricidade, interagindo de forma homogénea com o restante espaço da União Europeia no que é a primeira experiência de concretização do mercado interno de energia.
Trata-se de avançar no sentido do desenvolvimento de um mercado concorrencial fluido e eficaz. Um mercado dotado de mecanismos de acompanhamento e controlo, que garantam a satisfação das necessidades dos consumidores, a segurança de abastecimento e a compatibilidade com os objectivos de eficiência energética e fomento das energias renováveis de ambos os países.
O acordo celebrado entre Portugal e Espanha constituirá, como bem disse o Sr. Ministro da Economia, "um marco histórico do futuro mercado interno de electricidade".
Como foi já referido, o MIBEL "é o mais significativo caso de cooperação ibérica, com integral respeito pela identidade dos dois países".
As empresas sediadas em ambos os países já podem escolher o fornecedor de electricidade que mais lhes convém, seja ele espanhol ou português e, a partir de 1 de Julho, também os particulares terão oportunidade de escolha.
As vantagens parecem evidentes, já que os consumidores portugueses pagam, de um modo geral, mais pela electricidade que os espanhóis e, no caso português, é possível prever que os clientes particulares vão pagar menos 4% a 7% e as empresas até menos 10%.
É um passo no sentido da integração de um mercado onde as empresas continuam a ser independentes e onde Portugal tem alguns argumentos.
Parece-nos que, apesar da dimensão, a EDP e a Hidrocantábrica têm um papel a desempenhar. Portugal tem excesso de produção de electricidade e Espanha tem problemas nos picos de consumo.
Temos de encarar o mercado espanhol como uma oportunidade e não como uma ameaça. Nesse contexto, o MIBEL é um projecto pioneiro.
O incremento da abertura e da concorrência nos mercados energéticos é não só importante mas também uma necessidade. Isso trará benefícios claros para as empresas e para a sua competitividade. Aqui, as entidades reguladoras desempenham um papel essencial de defesa dos interesses dos consumidores, no quadro dos objectivos de política económica e energética.
As orientações estratégicas, alicerçadas também em objectivos ambientais, que o Governo tem imprimido à política energética são as adequadas para assegurar o reforço da competitividade das empresas que exercem a sua actividade em Portugal, em termos de eficiência, valorização da produção endógena de energia e cumprimento das obrigações de carácter ambiental.
Na nossa perspectiva, deve procurar-se igualmente criar as condições para o desenvolvimento de uma fileira dinâmica, competitiva e moderna de actividades económicas e de I&D, no sector da energia, com capacidade para se posicionarem no mercado ibérico e no mercado interno europeu.
A prazo, a abertura do MIBEL seguida da abertura de um mercado semelhante para a Europa é vantajosa para todos; é a forma de construir um sistema eficiente sob o ponto de vista energético, com factura ambiental valorizada com o devido valor económico. É também o caminho para a inovação e para a geração descentralizada de energia a partir das eólicas, biomassa, ondas, fotovoltaica e outras.
Será vantajosa a multiplicação dos agentes num mercado largo, aberto, grande e não controlado verticalmente, como até agora.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Se há um país que não tem soberania energética é o nosso. Tem de passar a ter muito mais soberania no futuro, aproveitando as condições que tem para as energias renováveis e apostando num programa ambicioso de gestão da procura.
Daí a lógica e pertinência deste acordo, que merece o apoio inequívoco da bancada do CDS-PP.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro da Economia: Uma questão preliminar a este debate é tentarmos perceber o que é que faz o Governo "andar a correr" atrás da ratificação do Acordo para a Constituição do MIBEL.
Quero lançar-lhe um repto, Sr. Ministro da Economia: o Sr. Ministro disse que havia uma nota diplomática entregue pelo governo espanhol ao Governo português, pelo que gostaria de lhe pedir que a distribuísse hoje à Assembleia da República, se possível. Se ela existe, será certamente muito fácil

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confrontar esse documento com as palavras que aqui proferiu há pouco.
Não obstante as explicações formais, não se entende muito bem tanta pressa, sobretudo quando se sabe que a Espanha ainda não ratificou o acordo e que há bastante regulamentação por aprovar. Portanto, o MIBEL não tem condições para entrar em funcionamento a 20 de Abril. A menos, Sr. Ministro da Economia, que o Governo, de "bom aluno" europeu, se queira agora transformar numa espécie de "bom aluno" ibérico.
A verdade é que estamos perante a ratificação de um acordo que pode ter consequências muito graves para o País, para os consumidores domésticos, para as pequenas e médias empresas e, no futuro, para o provável agravamento das assimetrias internas entre litoral e interior, entre zonas urbanas e zonas rurais.
A questão central que se coloca tem a ver com o futuro do sector eléctrico nacional. É que a liberalização introduzida pelo MIBEL vai muito provavelmente provocar a absorção por Espanha do mercado português de energia, vai muito provavelmente provocar a apropriação pelas grandes empresas espanholas da produção nacional de energia eléctrica. Ó Sr. Ministro da Economia, até técnicos e políticos ligados ao PSD e ao Governo reconhecem e admitem isto. E, em vez de o Sr. Ministro vir aqui dar explicações mais ou menos professorais aos Deputados, queria que o Sr. Ministro fosse dar uma explicação ao Sr. Eng.º Mira Amaral, que admitiu, no jornal Público de 5 de Março, o risco de absorção por Espanha do mercado português de energia.
Sr. Ministro, posso oferecer-lhe cópia dessa notícia, se quiser, mas, de facto, gostaria que fosse dar uma aula ao Sr. Eng.º Mira Amaral, para lhe explicar por que é que isso pode ou não acontecer.
O MIBEL vai criar as condições óptimas para que mais um sector económico estratégico português passe para o estrangeiro, para que mais um centro fundamental de decisão nacional seja entregue de mão beijada, neste caso em mãos espanholas.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, ao contrário do que é sugerido nas entrelinhas, mas evidentemente nunca explicitado, o MIBEL não vai contribuir em nada para inverter o processo de degradação da qualidade do serviço actualmente prestado - com o encerramento de serviços, a ausência de apostas de investimento no alargamento, conservação da rede, garantia de fornecimento contínuo e sem quebra de energia eléctrica, entre outros - e que atinge especialmente as populações mais afastadas dos grandes centros urbanos, onde não se justifica (segundo os critérios neoliberais do MIBEL) a realização deste tipo de investimentos.
Se é verdade (argumentarão alguns, com justificação) que estas não são responsabilidades directas do MIBEL (e é verdade que não são), não é menos verdade que as orientações políticas de gestão do sector eléctrico nacional têm unicamente servido a liberalização a introduzir pelo MIBEL e, por isso mesmo, têm estado na base da constante degradação da qualidade do serviço eléctrico, que atinge cada vez mais portugueses, sobretudo fora dos centros urbanos, cavando cada vez mais as assimetrias regionais internas.
Uma palavra ainda, Sr. Ministro da Economia, para os preços de energia eléctrica com que o Governo tenta adoçar a criação do MIBEL e as suas consequências, começando por lhe dar conta de uma notícia do Diário de Notícias do dia 12 de Fevereiro - já agora, vou oferecer uma fotocópia ao Sr. Ministro e outra à Sr.ª Deputada Graça Proença de Carvalho -,…

A Sr.ª Graça Proença de Carvalho (PSD): - Não preciso!

O Orador: - … onde se diz que "a ERSE contradiz o Ministro e prevê a alta dos preços".
Ora vejam lá! Afinal não é o PCP, é o Eng.º Jorge Vasconcelos que o prevê! E previu-o duas vezes! Diz, pois, a notícia que Jorge Vasconcelos quis esfriar a opinião pública quanto a uma generalizada quebra dos preços da energia eléctrica, acrescentando depois que em Portugal a pressão sobre os preços da electricidade vai no sentido da subida.
Ó Sr. Ministro, vá lá explicar ao Presidente da ERSE que não é assim, mas explique também a todos os outros que têm defendido esta tese.
Antes de mais, uma constatação: se os preços são mais baixos em Espanha, isso acontece porque o governo espanhol, ao contrário do que sucede em Portugal, tem intervenção directa na sua definição e subsidia, directa ou indirectamente, o seu valor, designadamente no que respeita aos preços da energia que é fornecida às empresas espanholas. Isto é: se os preços em Espanha são mais baixos, não é apenas consequência da existência de um mercado maior e mais forte, que toda a gente reconhece, e muito menos é consequência de qualquer processo de liberalização. Pelo contrário, no fundamental, os preços em Espanha são inferiores, porque são preços políticos pré-definidos e garantidos pelo governo, criando-se, assim, condições para uma maior competitividade da economia espanhola.
Mas a isto, como se sabe, faz o Governo português "orelhas moucas", limita-se a invocar o mercado e o "santo nome da liberalização", com as consequências conhecidas, por exemplo, no caso dos combustíveis.

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Ao contrário do que afirma o Governo, os preços da energia eléctrica em Portugal não irão descer em consequência da introdução do MIBEL. Esta é, como eu disse, também a opinião de muitos técnicos e políticos que aqui citei e que me dispenso de voltar a referir.
O que, aliás, muitos dizem é o contrário, Sr. Ministro, como, certamente, saberá, que o que se passará é que a convergência das tarifas se fará pela aproximação dos preços espanhóis aos portugueses e nunca pela descida dos preços da energia eléctrica em Portugal.
Esta foi, de facto, uma "cenourinha" que o Governo usou para aprovar esta decisão, com consequências negativas graves, alguns delas ainda mal determinadas, para Portugal e para os portugueses. Mas, Sr. Ministro da Economia, a "cenoura", a "cenourinha" da diminuição dos preços como consequência da liberalização já não convence ninguém, não convence os seus companheiros de partido e, certamente, muito menos convence os portugueses.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro da Economia.

O Sr. Ministro da Economia: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero, nesta intervenção final, por um lado, esclarecer algumas dúvidas e, por outro, dar também alguns esclarecimentos.
No que se refere às dúvidas, começo pela Sr.ª Deputada Isabel Castro, que não está presente, recordando que o acordo não foi assinado na Figueira da Foz mas, sim, em Lisboa, no Centro Cultural de Belém, com os símbolos da União Europeia presentes. Fica o esclarecimento feito.
O Sr. Deputado Maximiano Martins usou a figura da dúvida metódica, porque tem dúvidas sobre tudo.

O Sr. Hugo Velosa (PSD): - Só não sabe é quais são!

O Orador: - Em primeiro lugar, começa por ter dúvidas por estar enganado sobre quem assinou o primeiro memorando de entendimento com Espanha sobre o acordo. Justiça seja feita a um colega seu de bancada, não foi o Eng.º Braga da Cruz mas o Dr. Joaquim Pina Moura quem, em 1998, assinou o primeiro memorando de entendimento com Espanha.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem lembrado!

O Orador: - Em segundo lugar, é verdade que, quando tomámos posse, estava fixada a data de 1 de Janeiro de 2003. Mas a única coisa que existia era uma data. Mas, como sabem, a coisa mais fácil é fixar uma data.

O Sr. José Magalhães (PS): - Às vezes!

O Orador: - Havia a extinção dos contratos de aquisição de energia, que são incompatíveis com o mercado? Não! Havia liberalização e elegibilidade dos consumidores - pequenas e médias empresas e consumidores domésticos? Não! Havia regulamentação dos mercados à vista e a prazo em Portugal e Espanha? Não! Havia operador do mercado de electricidade em Portugal? Não! Havia harmonização das regras de formação das tarifas, que são indispensáveis para o mercado funcionar? Não! Nada disto estava feito. Tudo isto foi feito por nós até hoje, Sr. Deputado.
Por isso, de facto, não nos limitámos a fixar uma data, fixámos também esta data de 20 de Abril, que só não é plenamente eficaz por razões conhecidas do lado de Espanha e das suas eleições, de que, certamente, não nos querem culpar.
O que posso garantir-lhe é que terça-feira, dia 20, é um marco histórico para a Península Ibérica e também para Portugal, e, desde logo, para o nosso produtor de electricidade, a EDP, com o qual o Partido Comunista Português está tão preocupado - e ainda bem que está! -, porque, a partir de terça-feira, a EDP passa a ser uma empresa com iguais direitos num mercado muito maior, que é o mercado espanhol, passa a ter acesso, em condições de exacta igualdade, a um mercado de 43 milhões de consumidores, que hoje não tem.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - E os Srs. Deputados também deveriam ter estudado o acordo, como fez a Sr.ª Deputada

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Graça Proença de Carvalho, para ver que a sua entrada em vigor em Espanha não depende de qualquer nota diplomática, nem do que quer que seja, ele entra em vigor provisoriamente, independentemente da ratificação pelas Cortes espanholas. Isto está escrito no acordo.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Não, não! Leu mal!

O Orador: - Eu não tenho culpa de que os senhores não tenham lido o acordo e, por isso, tenham cometido alguns lapsos relacionados com isso.

O Sr. Hugo Velosa (PSD): - Têm dúvidas que ninguém percebe!

O Orador: - O Sr. Deputado Honório Novo recolocou, mais uma vez de forma distorcida e inaceitável, a questão dos preços.
Primeiro, os senhores têm uma grande dificuldade em lidar com mercados; têm uma grande dificuldade porque não entendem, de facto, o que é o mercado, porque continuam a falar em tarifas quando temos de passar a falar em preços de mercado.
Segundo, o senhor ganhará, seguramente, um Prémio Nobel da Economia se conseguir demonstrar que, quando dois mercados se juntam, o preço alinha pelo mercado mais alto.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Não sou eu que o digo, é o seu colega de partido Mira Amaral!

O Orador: - Garanto-lhe que ganha o Prémio Nobel da Economia se for capaz de comprovar isso.

Protestos do PCP.

Por isso, o que posso garantir-lhe é que, a partir da entrada em vigor do mercado ibérico e do funcionamento do operador, haverá um preço único de mercado, um preço de mercado para os dois países.
Terceiro, não é verdade, ao contrário do que disse o Sr. Deputado Maximiano Martins, que o mercado à vista vá ser o mais importante. Isto também seria ilógico! Também é desconhecer o funcionamento dos mercados! As empresas não preferem comprar no dia-a-dia, preferem cobrir os seus riscos e comprar a prazo. De facto, com o tempo, o mercado a prazo vai ser o mais importante.
Mas isto também não é particularmente relevante, porque, se também tivessem lido o acordo, veriam que o mercado vai ser único e que, desde o primeiro dia, vai estar interligado. Vai ser indiferente dar uma ordem no mercado em Lisboa ou no mercado em Madrid, porque ela aparece simultaneamente nos dois locais. É isto que deveriam ter entendido.
O Sr. Deputado também não está informado de que já houve troca de posições entre o OMIP e o OMEL. Neste momento já há participações accionistas cruzadas.
Portanto, do nosso lado, está tudo pronto a funcionar. Fizemos ponto de honra nisto. Ou seja, assinámos um acordo entre Estados e fizemos ponto de honra de que tudo estivesse perfeito no momento em que nos comprometemos a iniciar. E o OMIP, na próxima terça-feira, entrará em funcionamento em regime de teste, porque não pode ser de outra maneira, porque não há regulamentação do lado espanhol.
Por isso, o que quero dizer, para terminar, Sr. Presidente e Srs. Deputados, é que, de facto, este é um grande passo para o mercado da energia em Portugal. Congratulo-me com a ratificação, que espero que seja feita por este Parlamento, deste importantíssimo passo da construção de um mercado interno da energia a nível europeu, porque esta não é uma vitória do Governo ou do Parlamento, é uma vitória do País, é uma vitória dos consumidores, que vão ter acesso, de facto, a energia em melhores condições de preço e a uma maior qualidade do serviço, e das empresas portuguesas do sector, porque vão poder dispor de um mercado mais vasto e mais concorrencial, que será, como eu disse, um exemplo para toda a Europa.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Srs. Deputados, terminámos a discussão da proposta de resolução n.º 63/IX.
Antes de entrarmos no ponto seguinte da nossa ordem de trabalhos, o Sr. Secretário vai dar conta da entrada de iniciativas legislativas.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e

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foram admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: proposta de lei n.º 122/IX - Autoriza o Governo a legislar sobre a possibilidade de utilização nas salas de jogos dos casinos de equipamento electrónico de vigilância e controlo, como medida de protecção de pessoas e bens, que baixou à 1.ª Comissão para o efeito de promover a audição à Comissão Nacional de Protecção de Dados; proposta de resolução n.º 67/IX - Aprova o acordo de cooperação jurídica e judiciária entre a República Portuguesa e a República de Cabo Verde, assinado na Praia, em 2 de Dezembro de 2003, que baixou à 2.ª Comissão; projectos de resolução n.os 241/IX - Referente à criação da Área Protegida de Monsanto (Os Verdes) e 242/IX - Cria uma Comissão Eventual de Acompanhamento e Avaliação das Medidas de Prevenção e Combate aos Fogos Florestais (PS); e a apreciação parlamentar n.º 76/IX (PS) - Decreto-Lei n.º 74/2004, de 26 de Março, que estabelece os princípios orientadores da organização e da gestão curricular, bem como da avaliação das aprendizagens, no nível secundário de educação.
É tudo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Srs. Deputados, vamos passar à discussão conjunta, na generalidade, da proposta de lei n.º 119/IX - Aprova o Estatuto do Mecenato Científico e altera o Estatuto do Mecenato, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 74/99, de 16 de Março, e do projecto de lei n.º 426/IX - Altera o Estatuto do Mecenato, promove o mecenato científico e alarga o regime de incentivos fiscais I&D empresarial (PS).
Para apresentar a proposta de lei, em nome do Governo, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Ciência e do Ensino Superior.

A Sr.ª Ministra da Ciência e do Ensino Superior (Maria da Graça Carvalho): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como é do conhecimento de VV. Ex.as, o mecenato científico enquadra-se num plano de acção que o Ministério da Ciência e do Ensino Superior tem vindo a preparar sobre o investimento em investigação e desenvolvimento para o objectivo europeu de 3% do PIB, intitulado "Investir em I&D - Um Plano de Acção para Portugal até 2010", que tem quatro eixos prioritários: Eixo 1 - Aumentar o investimento público em investigação e desenvolvimento; Eixo 2 - Promover o ambiente facilitador para o investimento privado em I&D; Eixo 3 - Aumentar os recursos humanos qualificados nas ciências e tecnologias; e Eixo 4 - Promover o emprego científico.
Quanto ao Eixo 1 - Aumentar o investimento público em I&D -, já apresentámos a iniciativa estratégica Ciência e Inovação 2010 e Futuro 2010. Este é um investimento que promove a ligação entre a ciência e as empresas e entre o ensino superior e o mundo empresarial, tudo na perspectiva do desenvolvimento sustentado de um maior progresso económico e social.
Em relação ao Eixo 2 - Promover o ambiente facilitador para o investimento privado em I&D -, já foi anunciado um conjunto de medidas fiscais e não fiscais para aumentar o envolvimento do sector privado em todas as vertentes de investigação, desenvolvimento, demonstração e inovação.
Através do mecenato, queremos incentivar uma maior ligação entre as empresas e as unidades de investigação; através da reserva fiscal, queremos incentivar a investigação, o desenvolvimento e a inovação dentro das empresas. Estas são duas medidas complementares.
Simultaneamente, com o financiamento público, vamos catalisar o investimento privado através de projectos em consórcio, projectos de demonstração em empresas e projectos mobilizadores.
No que diz respeito ao Eixo 3 - Aumentar os recursos humanos qualificados nas ciências e tecnologias -, vamos aumentar em 5000 o número de investigadores até 2006.
Por último, a par da formação de novos investigadores, temos de criar as condições para o aumento do emprego científico. Neste âmbito, já apresentámos várias medidas: 7000 bolsas para licenciados, mestres e doutores para a Administração Pública; incentivos para a inserção de mestres e doutores em empresas; incentivos para a criação de empresas de base tecnológica por jovens doutorados; planos de contratação de doutores por unidades de investigação, às quais seja concedido o estatuto de laboratório associado (e gostaria aqui de referir que será aberto concurso para novos laboratórios associados já em Setembro); e bolsas para jovens cientistas portugueses a trabalhar no estrangeiro que se queiram radicar em Portugal.

O Sr. Hugo Velosa (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este conjunto de medidas é imprescindível para prosseguirmos os objectivos da Estratégia de Lisboa. Estas são medidas complementares a outras, nomeadamente a profunda reforma que a implementação do processo de Bolonha irá operar no ensino superior em Portugal e que será divulgada e discutida logo a seguir à aprovação da lei de bases.
Também a revisão dos estatutos das carreiras, nomeadamente da carreira docente universitária e politécnica, da carreira de investigador e de bolseiro de investigação, se enquadram neste plano de

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reestruturação da ciência e do ensino superior.

O Sr. Gonçalo Capitão (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Com o objectivo de capacitar o nosso sistema científico, tecnológico e de inovação, apresentámos já esta semana um novo modelo de financiamento e organização do sistema.
Num país de recursos limitados, como é Portugal, saber optimizar meios humanos e materiais tem de ser um desígnio nacional.
Com este projecto de reforma de financiamento de todo o sistema científico, tecnológico e de inovação, o Governo clarifica e sistematiza as regras de atribuição de financiamento de todas as unidades de I&D e, por via disto, redefine o mapa científico existente, que é hoje composto por 431 centros de investigação, dos quais 15 são laboratórios associados.
Também pela primeira vez se determina que a atribuição do estatuto de laboratório associado será feita através de concurso público, em áreas previamente determinadas pelo Governo que prossigam o interesse público e estratégico do País.
O Governo faz uma aposta clara na cultura do mérito e da excelência no incremento do emprego científico e na melhoria de condições, por forma atrair para Portugal os investigadores nacionais radicados no estrangeiro e investigadores de outras nacionalidades.
Não quis perder a oportunidade de aqui estar para vos falar deste conjunto de medidas, pese embora o facto de saber que é o estatuto do mecenato científico que hoje está em discussão.

O Sr. Augusto Santos Silva (PS): - Ah!

O Sr. Hugo Velosa (PSD): - Uma coisa tem a ver com a outra!

A Oradora: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A proposta de lei relativa ao estatuto do mecenato científico representa um marco decisivo para a ciência no nosso país.
Trata-se de um importante instrumento legal para incentivar o apoio à ciência e à investigação. O Estado tem a obrigação de estimular a iniciativa privada a investir mais no conhecimento e na investigação científica.
O novo regime do mecenato científico é claro quanto aos beneficiários, quanto aos projectos a apoiar, quanto aos incentivos fiscais a conceder pelo Estado, nomeadamente em sede de IRS, IRC e IVA.
Mas o novo regime de mecenato científico vai ainda mais longe: acaba com qualquer limite à dedutibilidade dos donativos, se as entidades forem públicas, e alarga os limites de deduções, se as entidades forem privadas.
Cria-se também um instrumento totalmente inovador, através do qual se comprova a afectação do donativo a uma actividade de natureza científica.
Com este certificado, institui-se um regime simples e fiável na linha das recomendações europeias para o sector da investigação e desenvolvimento.
Criam-se, também, incentivos não fiscais. A rede nacional do mecenato científico, que permitirá a divulgação das acções desenvolvidas e apoiadas, servirá como pólo agregador de mecenas e beneficiários e representará uma ponte para a internacionalização da ciência feita em Portugal.
A isto acresce a atribuição anual dos prémios mecenas.
Trata-se, em suma, de incentivar a iniciativa privada a investir mais em investigação. Mas trata-se também de mais investimento do Estado. Ao conceder benefícios fiscais para investigação, o Estado perde receita, mas o País ganha um novo surto de desenvolvimento. Desta forma, ganharão as empresas, ganhará comunidade científica e o futuro de Portugal.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Numa palavra, é preciso aproveitar ao máximo o potencial científico e tecnológico do nosso país. Mais e melhor investigação, mais e melhor tecnologia e melhor saber são indispensáveis para um crescimento económico estrutural. Investir em projectos de investigação, em equipamento científico, em recursos humanos, em acções de demonstração é investir no aumento da competitividade da nossa economia.
Estas novas medidas são uma prova de confiança nos nossos investigadores, são uma nova aposta e um novo estímulo para as nossas universidades e institutos politécnicos, para as nossas instituições de investigação, para os nossos laboratórios e centros de investigação e para as nossas empresas.
Este, Sr. Presidente e Srs. Deputados, é o caminho que queremos para Portugal.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para apresentar o projecto de lei, tem a palavra o Sr. Deputado Augusto Santos Silva.

O Sr. Augusto Santos Silva (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Discute-se hoje uma questão muito importante da política de ciência e tecnologia, na sua relação com o desenvolvimento económico e social. Queremos, ou não, incentivar as empresas a participarem no esforço nacional em investigação científica e criação tecnológica? Esta é a pergunta. E estou certo de que todos responderemos positivamente à pergunta. Trata-se, aliás, de uma obrigação da União Europeia e de um objectivo principal da Estratégia de Lisboa. É, pois, necessário avançar, discutindo os meios e os métodos a usar para incentivar as empresas. É sobre isto que nos encontramos profundamente divididos, e é sobre isto que incide este debate.
O Governo adoptou uma opção clara, claríssima, no seu erro. Ao mesmo tempo que estrangulava, financeira e organizativamente, o sistema público de investigação, designadamente os Laboratórios do Estado, e reduzia substancialmente as formas de apoio público à actividade das unidades de investigação e dos investigadores, o Governo acabou com o regime de incentivos fiscais à I&D empresarial. Foi isto que eu disse e repito: o regime criado em 1997, que configurou um benefício fiscal específico para as despesas das empresas com investigação, que foi sucessivamente melhorado até 2001, e até considerado como uma prática de excelência pela OCDE, e que permitiu multiplicar o investimento privado em inovação, este regime, foi deixado cair pelo actual Governo. Este regime deixou de existir.
Hoje, não há em Portugal qualquer sistema de incentivos específicos para a investigação e desenvolvimento empresarial. Repito: não há hoje em Portugal qualquer regime de incentivos fiscais específico para apoio à I&D empresarial. E não há, porque este Governo liquidou o que existia.

O Sr. José Magalhães (PS): - É verdade!

O Orador: - É certo que foi criado, em 2004, o regime da reserva fiscal para investimento, que abrange também as despesas de I&D. Mas - atenção! - abrange-as ao mesmo título que qualquer outro investimento e só para as indústria extractivas, as indústrias transformadoras e o turismo.
É isto um sistema de incentivos próprio e adequado à promoção de investigação e desenvolvimento? Não é, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados! Não é porque posso beneficiar da totalidade da reserva fiscal de investimento gastando tudo em imobilizado corpóreo, sem afectar um cêntimo que seja à investigação e inovação, e porque posso investir milhões de euros em I&D e não beneficiar de um cêntimo de incentivos, se a minha empresa for, por exemplo, do terciário superior.
Portanto, o Governo que agora diz querer reforçar o mecenato científico para estimular a despesa privada em I&D é o mesmíssimo Governo que liquidou o regime de incentivos a essa mesma despesa que existia, e com excelentes resultados, à altura da sua posse.

O Sr. José Magalhães (PS): - É verdade!

O Orador: - Este é o primeiro e gravíssimo erro!
O segundo erro, não menos grave, é, aliás, associado ao primeiro. O Governo acha que é pela via do mecenato, a cuja tramitação confere, aliás, maior burocracia, que aproxima mais as empresas da ciência e da inovação.
Ora, isto é não perceber nem a economia de mercado nem o sistema científico. As empresas não devem investir em investigação e desenvolvimento como investem no patrocínio de uma companhia de teatro, ou de uma instituição social, porque isso lhes dá prestígio, afirmação pública ou acrescida responsabilidade cívica. As empresas devem investir em I&D porque é um factor decisivo de qualificação da sua cadeia de valor. As empresas não devem encarar a investigação como algo que está fora delas e a que devem atribuir uns subsídios, recebendo em troca, do Ministério das Finanças, parte do que gastaram. As empresas devem encarar a investigação como elemento central da sua actividade económica e devem ser fiscalmente premiadas as que melhor interiorizarem esta questão essencial do seu desenvolvimento.
A proposta do Governo não compreende este ponto e, por isso, pouco adianta. O projecto de lei do PS recentra as questões no seu verdadeiro domínio e, sem descartar qualquer possibilidade de melhoria do actual instituto do mecenato, situa-o no quadro correcto, que é o sistema mais amplo de incentivos públicos ao investimento empresarial na ciência. Deve, por isso, do nosso ponto de vista, merecer toda a atenção desta Assembleia.

Aplausos do PS.

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Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente, Mota Amaral.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Pinho Cardão.

O Sr. Pinho Cardão (PSD): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Augusto Santos Silva afirmou que queria incentivar as empresas na inovação e investigação e que o projecto de lei enquadra as questões no seu verdadeiro domínio. Ora, como, pela leitura que fiz, o projecto de lei do PS me parece ter sido redigido de uma forma ligeira e, sobretudo, pouco pensada, irei fazer-lhe três perguntas para aferir desta minha afirmação e dependerá das respostas que me der o continuar ou não com este julgamento.
A proposta do Governo cria um corpo regulador de mecenato científico e gasta várias páginas com a regulação do âmbito de aplicação, das modalidades, da acreditação, dos mecenas, das entidades beneficiárias, etc.
O projecto de lei do PS é um vazio nesta matéria, apenas prevê um único artigo, que é o artigo 2.º, que vem na pág. 5 do vosso diploma. E o que é que prevê para o mecenato científico? Uma organização em rede das diversas entidades e prémios. É assim a estrutura do mecenato científico.
Pergunto: o projecto de lei do PS é mesmo um vazio, ou estou enganado e não li eventuais linhas ou páginas ocultas?
A proposta do Governo prevê que os donativos para o mecenato a considerar como custo passarão de 6‰ para 8‰, em relação ao volume das vendas, passando o seu montante de 130% para 140% do seu custo real. O projecto do PS, apresentado depois de conhecer a proposta de lei, esqueceu a base e prevê esta última alteração. Assim, é pior do que a proposta do Governo, e o pior é que as consequências são importantes: pode perder qualquer significado a generosidade do PS ao aumentar o montante de 130% para 140% dos custos reais, se a base, medida pela permilagem, não aumentar. Pergunto-lhe, Sr. Deputado Augusto Santos Silva: foi propositado? Foi lapso? Foi erro? Já que não vou imaginar que seja ignorância matemática por parte do Sr. Professor Augusto Santos Silva.
O projecto do PS amplia o conteúdo do diploma com um regime de incentivos fiscais à I&D por parte das empresas. Uma das disposições consta da pág. 9, e passo a ler: "É cumulativamente concedida uma redução…"…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se. Peço-lhe que conclua.

O Orador: - Vou terminar Sr. Presidente.
Como eu estava a dizer, numa das disposições, que consta da pág. 9, diz-se que é, cumulativamente, concedida uma redução, a qual tem a ver com a média da intensidade de I&D do respectivo sector. Pergunto: como pensa o PS tornar operacional esta sofisticada regra para além da portaria que refere e da menção ao INE. Será através de um qualquer "intensitómetro", ou através de qualquer "intensómetro" que tem em estudo, ou cuja patente já detém?

Aplausos do PSD e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Augusto Santos Silva.

O Sr. Augusto Santos Silva (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Pinho Cardão, agradeço as questões que me colocou e responder-lhe-ei disciplinadamente.
Quanto ao conteúdo do projecto de lei, devo dizer que ele é o mesmo da proposta do Governo. Trata-se de proceder a alterações no estatuto de mecenato científico, para estimular o aumento da despesa privada em I&D. Só que nós achamos, e é a grande diferença que temos em relação ao Governo, que não faz sentido estimular o mecenato das empresas às instituições científicas sem, ao mesmo tempo, incentivarmos as empresas a interiorizarem, na sua cadeia de valor, a utilização de investigação científica e da inovação.
Esta é a grande diferença, e, aliás, a grande diferença política, neste debate. Para o Governo, a investigação científica é algo que está fora das empresas e que estas devem apoiar, como apoiam o bailado, os clubes desportivos, as instituições de solidariedade social. Para o PS, a investigação científica é algo que deve estar no coração da actividade das empresas; portanto, só faz sentido melhorar e reforçar o estatuto do mecenato científico se, ao mesmo tempo, o acompanharmos de incentivos fiscais, para que as empresas interiorizem, na sua actividade económica, a utilização de I&D. Esta é a questão essencial.
Assim, e porque, ao contrário do Governo, não entendemos que valha a pena inventar a roda, quando a roda está inventada, o que fazemos é reforçar no Estatuto do Mecenato, que está aprovado desde 1999,

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a componente de apoio, no que diz respeito ao mecenato científico, mudando o respectivo artigo. E autorizamos o Governo, porque também não é nossa vocação copiar as propostas interessantes que o Governo apresenta, a criar incentivos não fiscais à promoção do mecenato, isto é, a criar os prémios que o Governo pretende e as formas de organização em rede que propõe no seu diploma. É que não vale a pena repetir o que há de bom na proposta do Governo.
O que é que nós não repetimos? Não repetimos aquilo que levaria a mais burocracia na atribuição do mecenato científico.
Quanto à sua segunda questão, Sr. Deputado Pinho Cardão - bom! -, remeto-o para o nosso projecto e verá que ele é muito claro, muito directo e muito concreto. Trata-se de alterar o valor da dedução, nos termos já previstos pelo actual Estatuto do Mecenato.

O Sr. Pinho Cardão (PSD): - Não, não!

O Orador: - Trata-se sim, senhor!
Relativamente à fórmula de cálculo dos incentivos, a questão também é muito simples: para além dos incentivos fiscais já previstos em 1997, e que queremos recuperar,…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, esgotou-se o tempo de que dispunha. Peço-lhe que conclua.

O Orador: - Estou mesmo a terminar, Sr. Presidente.
Como eu estava a dizer, para além dos incentivos fiscais já previstos em 1997, e que queremos recuperar, trata-se de criar dois incentivos adicionais, ou seja, uma premiação às empresas que invistam mais do que a média do seu sector em I&D.
Espero ter esclarecido o Sr. Deputado Pinho Cardão.

O Sr. Presidente: - Sr.as Deputadas e Srs. Deputados, antes de prosseguirmos, importa dar aqui nota de uma pequena questão: há acordo dos grupos parlamentares para que as votações se façam no final deste debate. Assim sendo, vou dar a palavra ao Sr. Deputado Massano Cardoso, para uma intervenção, após o que se seguirá a ordem das inscrições e, no final, realizaremos todas as votações, incluindo já a dos diplomas que estamos a apreciar.
Tem, pois, a palavra o Sr. Deputado Massano Cardoso.

O Sr. Massano Cardoso (PSD): - Ex.mo Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Estamos, hoje, a discutir a proposta de lei n.º 119/IX, que cria o estatuto do mecenato científico e altera o Estatuto do Mecenato, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 74/99, de 16 de Março. Este diploma consagra, entre outros aspectos, um objectivo muito claro: a necessidade de uma aposta forte no investimento do conhecimento.
Reiteradamente, somos confrontados com discursos sobre a necessidade de tornar a União Europeia na economia mais dinâmica e competitiva do mundo em 2010, tal como foi definido na Estratégia de Lisboa.
É do conhecimento geral que a União Europeia pretende, até esta data, gerar cerca de 700 000 novos investigadores e investir 3% do PIB em investigação e desenvolvimento.
Portugal, no contexto da criatividade, da inovação científica e tecnológica, apresenta indicadores insuficientes.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço desculpa, mas tenho de interromper a sua intervenção.
Srs. Deputados, agradeço a atenção da Câmara para o facto de haver um ruído manifestamente excessivo na Sala que impede o bom funcionamento deste debate.
Faça o favor de prosseguir, Sr. Deputado Massano Cardoso.

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Presidente.
No tocante à convergência tecnológica e com base na taxa de crescimento de patentes por milhão de habitantes, Portugal necessita de um século para atingir a União Europeia, dois para atingir os Estados Unidos e três para alcançar o Japão. O número de patentes por milhão de habitantes não chega a 10, contra 150, em média, da Europa. A Suécia lidera, com 350 patentes, e a Irlanda está francamente à nossa frente, com 90 patentes.
No tocante à convergência científica e tendo em linha de conta a taxa de crescimento médio anual de pessoal em investigação e desenvolvimento, Portugal está mais próximo da União Europeia, calculando-se em nove anos o tempo necessário para a alcançar; relativamente aos Estados Unidos e ao Japão, são

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necessários, respectivamente, 13 e 20 anos.
Estes indicadores traduzem uma insuficiente política de inovação em Portugal. Mas não podemos deixar de relevar que temos vindo a aumentar o número de doutorados, na ordem de 10%/ano, além do incremento substancial de publicações científicas em revistas referenciadas e do número de citações, as quais duplicaram nos últimos cinco anos.
O nosso sistema tecnológico e científico sofreu, na última década, um crescimento, mesmo assim, notável - imperativo que não podemos deixar de citar. Em 1999, o peso da investigação e desenvolvimento, em termos de percentagem do PIB, alcançou os 0,8% versus 0,43% em 1988. E, neste mesmo período de tempo, a proporção de investigadores mais do que duplicou.
Numa perspectiva de taxinomia funcional dos aspectos relacionados com o financiamento e concretização prática, em termos de investigação e desenvolvimento, é lícito agrupar os países em quatro categorias: países cujos sistemas são dominados pela indústria, como é o caso dos povos mais desenvolvidos do mundo (Japão, Estados Unidos, Finlândia, Alemanha, Suécia); países cujos sistemas resultam de um equilíbrio entre a indústria e o Governo mas com as universidades como protagonistas (caso de Áustria, Dinamarca, Holanda, Noruega e Espanha); países cujos sistemas resultam de um equilíbrio entre a indústria e o governo mas com as instituições públicas como protagonistas (caso de França, Hungria, Islândia, Itália e Polónia); por fim, países cujos sistemas são dominados pelo governo e nos quais as universidades são os principais locais de pesquisa (caso de Grécia, México, Portugal, Turquia e Nova Zelândia).
Esta estratificação permite-nos, rapidamente, associar os tipos de sistemas com o grau de desenvolvimento dos países.
Portugal necessita de investir, até 2010, 3% do PIB no coração do conhecimento mas dois terços terão de vir do sector privado. Para que tal aconteça, importa modificar o sistema em que estamos inseridos, de modo a que avultadas fontes de financiamento possam ser geradas através do denominado mecenato científico.
A promoção e o estímulo dos sectores privado e público são cruciais para todos.
As entidades beneficiárias não devem encarar estas iniciativas apenas como meio de obterem meros benefícios fiscais mas como uma necessidade de desenvolver novas áreas de produção e inovação, cujas mais-valias permitirão um enriquecimento, a todos os níveis, da economia.
A interacção entre os centros de investigação e os diferentes sectores da actividade económica constitui uma parceria, que pode revestir inúmeros figurinos, entre os criadores do conhecimento e os produtores de bens.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Sobrinho Simões afirmou que a ciência portuguesa é um recém-nascido de baixo peso, ainda frágil, com uma síndrome de dificuldade respiratória, a ver se se aguenta no mundo conturbado em que vivemos. É certo que é frágil, mas, hoje, dispomos de meios e tecnologias susceptíveis de fazer com que sobreviva.
As avultadas verbas, anunciadas pelo Governo, para o sector da ciência, assim como a medida que estamos a debater, aliadas à necessidade e consciencialização dos diferentes sectores de actividade económica, são um garante para que, daqui a alguns anos - esperemos que em 2010 -, possamos dar início a uma nova odisseia.
Para termos uma ideia do estado actual da ciência em Portugal é indispensável fazer algumas incursões nas mentes dos nossos mais notáveis cientistas.
Recentemente, em diferentes entrevistas, foram feitas algumas perguntas comuns, triviais, tais como: "Vale a pena ser cientista?" e "Os portugueses têm razões para estarem orgulhosos dos seus cientistas?". Invariavelmente, as respostas foram positivas, assim como a perspectiva do futuro.
De entre as várias entrevistas, destaco, a título de mero exemplo, alguns aspectos focados por duas mulheres cientistas, uma das quais, a matemática Irene Fonseca, afirma que os alunos portugueses de pós-graduação que aparecem na sua universidade norte-americana estão entre os melhores. Quando há alunos portugueses que querem fazer admissão à sua universidade, essa admissão é praticamente trivial; desde que digam que são portugueses, toda a gente os quer, porque são óptimos, têm óptima preparação, imenso saber e valor.
Por outro lado, a médica bióloga Maria do Carmo Fonseca afirma que muito poucos portugueses sabem que existe ciência, muito poucos percebem a vantagem de se fazer ciência; é preciso fazer passar a mensagem de quão importante é um país investir em ciência e ter cientistas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Estas duas brevíssimas observações permitem realçar que estamos a tratar de um dos sectores mais importantes, o qual vai marcar definitivamente o nosso futuro.

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Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O tempo escasseia e é absolutamente indispensável investir e promover o emprego científico e a cooperação com o sector produtivo, aliciar os nossos cientistas a regressarem ao País, impedir a fuga de cérebros e, consequentemente, produzir riqueza,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - … riqueza cultural, riqueza científica e riqueza material, base do bem-estar e da realização de um povo, que há muito anseia recuperar o lugar que outrora fez invejar ao mundo.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - A nossa ciência pode ser um recém-nascido frágil, mas com cuidado, atenção, investimento e carinho irá transformar-se num ser forte e invejável. Queremos que constitua, no futuro, motivo de orgulho.
Compete ao Governo e, sobretudo, a V. Ex.ª, Sr.ª Ministra, uma atenção e uma atitude de verdadeira pediatra da ciência portuguesa.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Narana Coissoró.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Que a ciência e o investimento na ciência são uma necessidade absoluta do desenvolvimento de qualquer país é, naturalmente, uma questão incontroversa. Que o investimento, a investigação e desenvolvimento são, particularmente num país como o nosso, condições indispensáveis para a modernização, para a transformação da nossa economia, para vencer os atrasos estruturais do nosso país e, ainda, para um desenvolvimento ecologicamente equilibrado, também é para Os Verdes uma questão inquestionável. Mas não deixa de ser bizarro que o Governo, que hoje debate uma proposta de lei que visa alterar o estatuto do mecenato científico, o faça e o anuncie com propósitos que escamoteiam a realidade daquela que tem sido, neste domínio, a sua acção concreta. São este Governo e esta maioria os responsáveis directos pelo desmantelamento da investigação científica em Portugal e pela sua asfixia financeira, com todas as consequências, extraordinariamente negativas, que daí advêm; são este país e esta maioria que têm, numa ofensiva sem paralelo, designadamente com fusões não sustentadas e sem qualquer razoabilidade, deitado por terra, inviabilizando e ponto em causa, projectos de investigação que prosseguiam e nos quais algumas instituições prestigiadas do nosso país estavam a participar, quer no plano europeu quer no internacional.
Aquilo que, de modo verdadeiramente mistificador, se visa com esta proposta de lei não é, ao contrário do que hoje é afirmado pela Sr.ª Ministra, como, aliás, o foi no dia em que veio ao Plenário fazer a síntese do que iria ser esta proposta, alterar a situação existente em Portugal, pondo as empresas a investir mais em investigação e desenvolvimento, não é criar condições para aumentar o investimento público em ciência, mas - e o Governo tem vindo a fazê-lo de modo habilidoso - deixar de apoiar a ciência, transferindo-o para as empresas. E neste propósito o Governo abdica da sua função de estratega, porque aquilo que se dá às empresas é a possibilidade de escolher os seus próprios projectos. Os seja, o Governo não estabelece os programas e as áreas onde a investigação é importante, dá às empresas, "de mão beijada", a possibilidade de escolherem os projectos. Por outras palavras, o Governo dá às empresas, que eventualmente recorram a este estatuto de mecenato, a possibilidade de definirem os projectos em que têm interesse directo, sem que, porventura, essas sejam as áreas essenciais e determinantes para o nosso país, beneficiando-as com o custo fiscal deste próprio mecanismo, sem que isto se possa converter em qualquer vantagem para o nosso país e para a necessidade de inverter a actual situação.
No fundo, o Estado, enquanto tal, investirá menos e as empresas, dentro das suas próprias estruturas, não irão ser incentivadas a apoiar a investigação e a envolverem-se nela, são, antes, convidadas a comprar recursos humanos e a beneficiar fiscalmente com este facto.
Por isso, Sr. Presidente e Srs. Deputados, esta proposta do Governo é, em nosso entendimento, uma

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operação mistificadora, que não vem, seguramente, fazer aquilo que é fundamental para o nosso país: criar condições para a investigação científica, dar prioridade a um domínio que, como diz Alexandre Quintanilha, não pode continuar a ser um luxo, pois é algo que tem de ser visto não numa perspectiva economicista mas como essencial para a modernização, para a sustentabilidade do desenvolvimento, no fundo para o nosso futuro.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Pinho de Almeida.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Ministros, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Para um país de tamanho médio e de localização periférica, como Portugal, que não apresenta sequer, neste momento, a melhor posição nos índices europeus, é fundamental que a investigação e o desenvolvimento sejam prioridades. Só um país com as características que disse poderá afirmar-se numa União Europeia cada vez maior e cada vez mais competitiva. É por isso que o objectivo da Estratégia de Lisboa não pode ser visto por Portugal como mais uma declaração vazia, bem intencionada, que, podendo, iremos cumprir; tem antes de ser visto como um desafio estratégico fundamental e prioritário.
Os objectivos da Estratégia de Lisboa, nomeadamente em relação a esta área, são claros: a criação de uma economia mais sustentável, mais produtiva e mais competitiva.
Ora os objectivos de um país como Portugal são, exactamente, conseguir ter essa sustentabilidade, essa produtividade e essa competitividade. É por isso importante atendermos também, claramente, à Estratégia de Lisboa e ao que nela é dito: 3% de investimento em investigação, 3% do PIB para investimento em inovação e desenvolvimento. De assinalar que destes 3% 2/3 serão suportados pelos sector privado e 1/3 pelo sector público.
Portanto, não colhem, de forma alguma, as declarações que aqui foram proferidas no sentido de que o Estado está a demitir-se das suas responsabilidades. Pelo contrário, o Estado está a incentivar o cumprimento exacto do que vem na Estratégia de Lisboa.
É por isso que o Estado não investe só num dos lados. Em primeiro lugar - e mais importante -, o Governo apresentou já aqui, claramente, a sua posição - porque havia várias posições possíveis - perante a Estratégia de Lisboa: uma, que nós conhecemos durante tantos anos, era a de nada fazer, deixar que os factos fossem respondendo a este grande desafio; outra era esperar que o sector privado conseguisse cumprir a sua parte "por obra e graça do Espírito Santo"; a terceira hipótese era o Governo assumir o papel fundamental, ser ele a fazer não só a sua parte de investimento público mas, mais importante, a fazer ainda com que os privados investissem, também eles, e cumprissem a sua parte.
Então, o que é que o Governo fez no que diz respeito ao investimento público?
Antes disso convém relembrar o que é dito em relação a este Governo. E o que é dito é que, supostamente, ele é insensível à cultura (amanhã discutiremos aqui a nova lei do cinema), que não se importa com os problemas da educação (ainda agora foi apresentado um programa, claro e objectivo, de combate ao abandono escolar), que é insensível à ciência (hoje discutimos aqui o mecenato científico)…
Mas, como dizia, este Governo não se limita a actuar na parte relativa ao fomento do investimento privado em investigação e desenvolvimento, pois aprovou também um investimento público de um bilião de euros na iniciativa estratégica "Conhecimento e Inovação", com dois programas claros, duas medidas com sustentabilidade para apoiar o conhecimento e a inovação em Portugal.
Este Governo é ainda criticado por não fazer investimento público, mas isso não é verdade! Sempre o dissemos: fazemos investimento público mas não nos limitamos a fazer gasto público e despesa pública; fazemos investimento público só no que é fundamental! Fazemos investimento público nesta área porque há apoios da União Europeia para que possamos fazê-lo.
Convém relembrar que, se não tivesse sido a acção, no fim do prazo, deste Governo para conseguir garantir que Portugal continuasse a receber os apoios comunitários na área da ciência, se não tivesse sido corrigido o que vinha sendo a linha de orientação dos programas seguida pelo governo anterior, Portugal não teria agora condições de recolher, da parte da União Europeia, os apoios necessários para fazer este investimento. Ou seja, este Governo tem a sua própria estratégia, mas também teve de corrigir a estratégia anterior para garantir os apoios da União Europeia.
Esta proposta de lei sobre o mecenato científico é uma iniciativa legislativa que clarifica todos os tipos de apoios necessários, quer para as instituições certificadas pelo Ministério da Ciência e do Ensino Superior, quer para os investigadores quer no que diz respeito a questões logísticas, de divulgação ou de investigação.

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No entanto, esta proposta de lei não se fica apenas pelos apoios a conceder às realidades que hoje em dia já existem. Pretende ir-se mais longe. Por isso, nesta proposta de lei, há duas medidas que devem ser realçadas, uma das quais a da certificação.
No que diz respeito aos apoios na área da investigação, do desenvolvimento e da inovação, esta proposta de lei introduz o certificado Ciência 2010 - e sabemos como, hoje em dia, a certificação é importante para a transparência e para a credibilidade deste tipo de apoios no que toca à participação de todos os agentes que intervêm numa área tão importante.
Há, ainda, outra realidade introduzida por esta proposta de lei que também é inovadora e que permitirá que o próprio diploma seja implementado com maior sucesso. Refiro-me à criação da rede nacional de mecenato científico.
A existência de uma rede nacional de mecenato científico permite uma maior divulgação, uma maior participação de todos no investimento e na realização dos objectivos já traçados.
Sr.as e Srs. Deputados: A fama e o proveito são duas realidades que, muitas vezes, não aparecem identificadas uma com a outra, tantas vezes aparecem invertidas.
Este Governo tem, de facto, a fama, criada pela oposição, de não se importar com a ciência, tem a fama de não saber fazer investimento público, mas foi este Governo que apresentou os programas que permitem não só o investimento de 2 biliões de euros como a manutenção dos apoios da União Europeia para a área da ciência.
Este Governo é o que apresenta novas medidas na área do mecenato científico.
Portanto, para um Governo, e uma maioria, que realiza este tipo de iniciativas e que promove o desenvolvimento destas áreas, o que menos importa será a fama, porque o proveito estará garantido. Muito mais importante ainda é que este não é um proveito para uma maioria ou para um governo mas, sim, para Portugal e para os portugueses.
Portanto, fique a oposição com a fama que criou porque os portugueses ficarão com o proveito que este Governo tem produzido.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não sei se há um único Deputado da maioria que tenha ouvido a intervenção do Deputado Massano Cardoso em nome da bancada do PSD. Sei que foram muito poucos os Deputados da maioria que ouviram a Ministra ou o ex-ministro da Ciência apresentar o contra-projecto do Partido Socialista. Talvez esta descontracção com que se trata um assunto tão importante diga tudo a respeito "famas e a proveitos"… É que, de facto, este é um problema importante.
Temos aqui um ponto de partida para uma discussão que trata das raízes essenciais do atraso português no acesso ao conhecimento e à competência e é tratado com a descontracção do turista que se passeia na feira de Carcavelos - foi esse o sururu que houve até agora!
Vale a pena sublinhar que há uma falta de resposta nesta questão essencial que desmente em absoluto as declarações do Governo ou da maioria que o apoia sobre a importância que dão a esta matéria.
Aliás, o Deputado Massano Cardoso, com razão, sublinhou o atraso em número de teses em comparação com outros países, em número de publicações científicas, em número de citações. Registou, também com razão, que, nessas matérias, houve ligeiro progresso nos últimos anos.
Se assim é, como explicar, então, que, com este Governo, sejam encerrados laboratórios e centros de investigação e que os estudantes mais qualificados das Universidades não tenham qualquer possibilidade de fazer carreira académica ou científica em Portugal?
Como explicar que, em campos tão importantes como o da biotecnologia ou o da farmacogenómica, este Governo assista impávido e sereno à declaração de um dos mais importantes cientistas europeus, que é português, que declara que, para fazer investigação, terá de ir para Madrid porque, em Portugal, não terá condições para continuar a investigação que lhe permitiu não só registar patentes como desenvolver competências e publicar artigos científicos?
Como explicar, então, que a resposta para esta situação seja esta lamentável e pífia tentativa de dizer que, concedendo benefícios fiscais à iniciativa privada, obteremos uma compensação por aquela falta?
O que é que a iniciativa privada fez até agora, Sr.ª Ministra? As Universidades privadas…, compare-as com as públicas e veja onde está a competência, onde está a qualidade, onde está o germe do progresso possível de que o País precisa. Veja onde está a diferença!!
Há uma única Universidade privada que pode equiparar-se à grande maioria das Universidades

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públicas. Foi isso que o ensino superior privado trouxe do ponto de vista da investigação.
Mas a Sr.ª Ministra quer mais: quer entregar ao critério e ao discernimento de empresas privadas a potencialidade de investigação por via do financiamento e da selecção em financiamento.
É certo que o privado tem de ter uma participação muito maior no esforço de investigação em Portugal, mas também é certo, Sr.ª Ministra, que o privado só pode e só vai escolher aquilo que é do seu próprio interesse, ou seja, o que está no horizonte temporal de um investimento rentabilizado. O privado procurará protótipos e não investigação, procurará resultados a curto prazo e não projectos de ciência de base. Isso só o País, com o seu esforço organizado, é que pode fazer.
Por via do privado, não haverá nem mais um cêntimo de investigação em ciência de base. Por via do privado, não haverá qualquer acréscimo significativo de competência no que é essencial na ciência em Portugal. Com o privado, teremos algumas operações de curtíssimo prazo, nunca teremos um projecto com o desenvolvimento de longo prazo de que precisa a ciência portuguesa. É aí que reside o erro deste tão limitado enfoque do Governo.
Sr.ª Ministra, todos os países que estão à nossa frente, todos, criaram um sistema nacional de inovação. Um sistema nacional de inovação significa potenciar tudo o que existe de melhor, desenvolver tudo o que existe de melhor, criar competências novas, não esperar por um "maná dos céus" de uma ou outra empresa privada.
Dois terços das empresas privadas não pagam impostos. Está a Sr.ª Ministra à espera de quê em relação à I&D?
Prosseguindo neste caminho, teremos avanços marginais, insignificantes, desprezíveis do ponto de vista da ciência.
Se, em contrapartida, se combinarem essas potencialidades do desenvolvimento privado com as capacidades que existem nas Universidades, nos laboratórios, nos corpos científicos nacionais, se se desenvolver essa potencialidade, então, sim, teremos um sistema nacional de inovação e de iniciativa científica.
Foi o que aconteceu no Japão, com o Ministério da Ciência, foi o que aconteceu na Finlândia, em relação às telecomunicações, é o que acontece em Espanha, em França, é o que se passa com a investigação da ciência de base nos Estados Unidos, é o que acontece rigorosamente em todo o lado.
Nesta matéria, o Governo quer contentar-se com alguma promessa de dinheiro que não sabemos se existe para projectos que não sabemos se vão ser aceites, que não sabemos se são os melhores. Pelo contrário, sabemos que este é um caminho que não resultou em país algum. Esta é a fama e a falta de proveito que este Governo tem, com esta proposta de lei.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Sr.as e Srs. Deputados: Pela terceira vez, no espaço de três meses, e agora finalmente com um texto, vem a Sr.ª Ministra falar do mecenato científico.
E o que é isto do mecenato da ciência? Que implicações terá no cada vez mais fragilizado sistema científico nacional?
As novidades previstas na proposta de lei, os chamados "incentivos não fiscais", são, sobretudo, incentivos morais.
O texto consagra, por exemplo, a atribuição de uma medalha ou, melhor, de uma certificação ao mecenas, assegura ao mecenas a presença nominal numa rede on line do mecenato, exceptuando desta visibilidade pública os mecenas que optarem pelo anonimato, e atribui ao mecenas, "anualmente, em cerimónia pública, promovida pelo Ministério da Ciência e do Ensino Superior, os Prémios 'Mecenas'".
Estas são as novidades dos incentivos morais.
Quanto aos incentivos fiscais, nada de significativo se acresce relativamente ao Decreto-Lei n.º 74/99, de 16 de Março.
Retocam-se alguns números, retira-se o mecenato científico e tecnológico de um diploma e produz-se um texto próprio para esta área.
Sr.ª Ministra, se de textos próprios, de medalhas e de cerimónias mediáticas vivessem a ciência e a tecnologia no nosso país, talvez esta decisão pudesse ser entendida como uma medida.
Mas não é de declarações de intenções - escritas ou orais -, em Óbidos ou na Assembleia da República, que o sistema nacional necessita. Antes pelo contrário, anseia, sim, e com urgência, por um conjunto de medidas que resolvam os graves problemas que definham e estrangulam, nesta área, como

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em muitas outras, o nosso país.
No entanto, o Governo e, naturalmente, a Sr.ª Ministra consideram que esta proposta de lei é um antídoto determinante para a maioria das maleitas do sistema científico.
E a Sr.ª Ministra acrescenta que "A razão é simples: a União Europeia definiu como objectivo aumentar o esforço europeu de investigação e desenvolvimento para 3% do PIB da União até 2010" e o mecenato científico é uma das respostas.
De facto, a situação, em Portugal, é de penúria nesta área, porque não andaremos longe de um total de 0,8% do PIB relativamente às despesas de I&D e de 0,2% a 0,25% para o sector das empresas.
Ora, neste sentido e com o objectivo de melhorar estes dados, a Comissão Europeia propõe que seja aumentada a percentagem da despesa com actividades de investigação e desenvolvimento executadas nas empresas e financiadas pelas empresas.
Como é fácil de verificar, isto não é uma questão de mecenato, nem se resolve com o fomento dos mecenas.
Neste caso, dos mecenas, estamos a falar de contribuições financeiras para custear actividades de I&D executadas por outrem, que não aquele que disponibiliza o bem em espécie.
Não se entende, por isso, Sr.ª Ministra, como é que este instrumento pretende ajudar a alcançar a meta definida pela Comissão Europeia.
Convém ainda referir que, na maioria dos países, os governos têm vindo a financiar alguma investigação nas empresas, exactamente com o objectivo de fomentarem essas actividades de investigação e desenvolvimento no seio das empresas.
Por exemplo, na União Europeia, o valor médio da despesa com a I&D executada pelo sector privado era, em 2001 (o último número que se conhece), de 65,3% da despesa total e o esforço das empresas ficava-se apenas pelos 56,3%.
De facto, o que está em causa na proposta da Comissão Europeia é o aumento do respectivo investimento em actividades de investigação e desenvolvimento executadas nas próprias empresas e não o financiamento pelas empresas destas actividades em qualquer outro sector, nomeadamente no sector público.
A não ser, Sr.ª Ministra, que o que o Governo pretenda seja, exclusivamente, poupar dinheiro, levando o sector privado a pagar projectos que o sector público executaria, subordinando os interesses nacionais às necessidades do mundo empresarial.
Pensamos que o caminho é outro.
Deve ser mantido um forte sector público de I&D, propiciando uma permanente e sustentada inovação nas actividades de investigação e, simultaneamente, disponibilizando-as para as empresas.
Os problemas do sistema científico e tecnológico são reais e a ausência de medidas adequadas às necessidades continuará a determinar e a agravar o nosso atraso face aos parceiros europeus.
Mais importante do que a exibição mediática das intenções e o irrealismo de algumas afirmações seria a solução dos problemas e esses, Sr.ª Ministra, são muitos.
Os laboratórios de Estado estão financeiramente estrangulados porque o Governo decidiu sentenciar-lhes o fim da autonomia e o decréscimo dos orçamentos.
Os bolseiros de investigação são, hoje, trabalhadores precários, sem direitos, que dão respostas permanentes ao sistema, mas com uma bolsa que já não é actualizada há cerca de dois anos.
As parcas condições de trabalho são denunciadas por diversos responsáveis quer de laboratórios quer de centros de investigação universitária.
Sr.ª Ministra, a comunidade científica está atenta. Se olhar para os jornais de ontem e de hoje, pode naturalmente concluir que o Governo não pode continuar a distribuir adornos em vez de medidas, porque, senão, sujeita-se a ouvir o que afirmou o astrónomo holandês do Observatório Astronómico de Lisboa, a propósito da fuga para o estrangeiro dos investigadores portugueses e do complemento financeiro para os investigadores com 100 artigos científicos publicados em revistas internacionais.
Diz este investigador holandês: "Quem tem 100 artigos ou não faz mais nada na vida ou já está no fim da carreira e tem emprego fixo. A aposta…" - e oiça este recado, Sr.ª Ministra, porque é fundamental - "… passa por fixar, em Portugal, os jovens formados lá fora, que têm 30 a 40 anos e não têm 100 artigos publicados. Não podemos viver de bolsas que são temporárias. O problema é colocar as pessoas em estruturas institucionais a sério e com contrato."
É por isso que a maioria deve aprovar o projecto de lei do PCP, relativo aos bolseiros de investigação.
E quanto à medida, Sr.ª Ministra, diz este investigador que é "uma piada de mau gosto". De facto, o mecenato também não passa disso, de uma piada, e a ciência precisa de mais.

Aplausos do PCP.

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O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Eduardo Cabrita.

O Sr. Eduardo Cabrita (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Sr.as e Srs. Deputados: Ao ouvir o discurso da Sr.ª Ministra, em que, em vez de apresentar um projecto sobre mecenato científico, falou, em geral, sobre política de ciência, seria tentado a ficar seduzido pela sua intervenção, se este fosse um governo recém-chegado, em estado de graça. Mas não é essa a situação. Este Governo tem dois anos de história, de destruição da política científica, de redução do investimento público em ciência, de corte completo nos incentivos fiscais à investigação desenvolvida pelas próprias empresas.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr.ª Ministra, leia os estudos da Associação Industrial Portuguesa, assim como os da Associação Empresarial de Portugal, e verificará que o que eles dizem é que o fundamental para o cumprimento da Estratégia de Lisboa, para os 3% de investimento em I&D, é o reforço do investimento empresarial. E, sobre isso, a Sr.ª Ministra nada disse.

Vozes do PS: - Nada!

O Orador: - Em 2002, quase 300 empresas portuguesas usaram esse mecanismo de apoio fiscal à investigação e desenvolvimento. No entanto, o Governo de que faz parte, quando a senhora ainda não era Ministra, entendeu acabar com esses incentivos fiscais.
A medida hoje apresentada é positiva, é tímida, não retoma, antes toca ao lado, esse mecanismo, e tudo coloca no mecenato. Ora, Portugal não precisa de mecenas; precisa é de empresários que apostem também na inovação, na investigação, feita na própria empresa.
Entre 1995 e 2001, Portugal foi o país da União Europeia onde o investimento empresarial em investigação e desenvolvimento (I&D) mais cresceu. Como dizem as associações empresariais, entre 1999 e 2001, cresceu 28%/ano o investimento empresarial em I&D.
Esta proposta de lei nada diz sobre o incentivo às empresas inovadoras, nada diz sobre o incentivo ao registo de novas patentes.
É por isso, Sr.ª Ministra, que não podemos deixar de receber com simpatia a iniciativa do Governo. É por isso que iremos viabilizá-la, porque significa um "emendar de mão" relativamente a dois anos de desastrosa política científica.
Mas é preciso mais e, para isso, o Governo tem é de, com a maioria, em sede de comissão, trabalhar as propostas do Partido Socialista, para que não baste o mecenato, não baste a despesa pública que o Governo não faz, e sejam as empresas, o sector produtivo, os motores do desenvolvimento, da criatividade e da inovação.
É este o desafio do PS ao Governo.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Ciência e do Ensino Superior, em tempo cedido pelo PSD e pelo CDS-PP.

A Sr.ª Ministra da Ciência e do Ensino Superior: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Foram aqui colocadas algumas questões a que não queria deixar de responder.
Em primeiro lugar, o mecenato. Para o Governo, esta é uma das muitas medidas que temos vindo a propor para o desenvolvimento científico em Portugal, em conjunto com a reserva fiscal, com os projectos em consórcio, com as bolsas em ambiente empresarial, com os projectos demonstradores em empresas. Para o Governo, a ciência está nas empresas, nas Universidades, nos institutos politécnicos, nos laboratórios e nas unidades de I&D; está, e deverá estar, em toda a sociedade.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Em segundo lugar, o investimento na ciência. O Governo tomou uma opção política na reprogramação dos fundos do Quadro Comunitário de Apoio, investindo e pondo a maioria da sua reprogramação nas áreas da ciência, da inovação, da sociedade de informação e da sociedade do conhecimento. É uma aposta clara no desenvolvimento científico, em Portugal.
Em terceiro lugar, o sistema científico de desenvolvimento e de inovação. Tenho pena de que os Srs.

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Deputados não tenham tido a atenção ou o tempo de ler a nova reforma que, na terça-feira, foi proposta ao País e que está em consulta a todos os que queiram mandar os seus contributos. É uma profunda reforma do nosso financiamento, com regras claras para o investimento de todas as nossas unidades de I&D que tem como estímulo a excelência, a formação dos recursos humanos qualificados, o emprego científico, a consolidação institucional, a sustentabilidade das unidades, a produção científica, a transferência de tecnologia e a internacionalização. Qualquer unidade de I&D é capaz hoje de, olhando para a fórmula, saber em quanto é que vai ser financiada e de, se tiver comentários ou contributos a fazer, mandá-los.
Pela primeira vez, temos uma fórmula completamente transparente para o financiamento das unidades de I&D que depende do número de doutores e da avaliação externa internacional. Mas o complemento disso é feito através de um índice de produção científica em função do número de doutores formados, doutores formados em ambiente empresarial, do número de artigos publicados e do impacto desses artigos, do número de patentes, do número de spin off e start up que essa unidade produziu.
Portanto, há uma fórmula que está na nossa página da internet e que permite a qualquer unidade de I&D calcular o seu investimento.
É uma profunda reforma no sistema de financiamento, é um reorganizar do nosso mapa científico como tínhamos prometido.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Com autonomia, Sr.ª Ministra…!

A Oradora: - Quanto à questão do êxodo dos nossos cientistas, quero dizer-vos que, no âmbito do Programa Ciência 2010, temos um pacote de bolsas, parte das quais com um complemento para a inserção destinado a jovens cientistas nacionais radicados no estrangeiro que queiram regressar a Portugal.
Também no pacote da nova tipologia de projectos do Programa Ciência 2010 teremos projectos para os jovens cientistas que queiram regressar a Portugal. O estímulo que apresentámos na terça-feira é um estímulo à qualidade para cientistas com currículo excepcional tanto em Portugal como no estrangeiro.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Pela primeira vez, a um cientista de qualidade damos um financiamento mediante a lista de publicações e de citações e a única coisa que exigimos, passados dois anos, é a lista dos novos artigos e citações publicados durante esse período, portanto, sem sequer ter um plano de actividades prévio.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Fazemo-lo sem burocracia, pela excelência; é um sistema de estímulo aos investigadores de grande currículo. Se esses investigadores forem estrangeiros ou nacionais no estrangeiro que queiram voltar para Portugal é-lhes dado um estímulo dobrado, portanto, terão um acréscimo de 100%.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Temos assim um modelo completo. O nosso sistema científico de tecnologia e inovação em conjunto com o mecenato, em conjunto com a reserva fiscal, em conjunto com as novas tipologias de projectos do Programa Ciência 2010 e do Futuro 2010, em conjunto com as 5000 bolsas para novos investigadores e as 7000 para colocar os investigadores já formados na Administração Pública e nas empresas, fazem um novo sistema de ciência e de inovação que vai tornar Portugal um país cada vez mais próximo da Europa, um país mais rico e com uma distribuição mais justa desta riqueza.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Entretanto, reassumiu a Presidência o Sr. Presidente Mota Amaral.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, chegámos ao fim do debate da proposta de lei n.º 119/IX e também do projecto de lei n.º 426/IX, que votaremos de seguida aquando do período de votações.
Srs. Deputados, antes de verificarmos o quórum peço a atenção da Câmara para o seguinte: na próxima semana teremos vários actos evocativos do 30.º aniversário da Revolução do 25 de Abril. O programa em pormenor será divulgado e peço, desde já, a colaboração de todos para que esses actos

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atinjam o brilho devido - o mais solene de todos será a sessão que vamos ter no domingo de manhã, não é um domingo qualquer mas, sim, a comemoração do 30.º aniversário do 25 de Abril numa sessão em que estará presente o Sr. Presidente da República como é sabido.
Nessa ocasião, tenho o gosto de confirmar à Câmara, estarão presentes os Presidentes dos Parlamentos dos países de expressão portuguesa que se tornaram independentes depois do 25 de Abril. Assinalo que todos aceitaram o convite que lhes dirigi e virão, desde os mais próximos geograficamente aos mais longínquos como Timor Leste, para estarem aqui connosco partilhando esta comemoração que é uma data de liberdade para Portugal e uma data também de liberdade para esses jovens países com os quais temos ligações tão estreitas.
Neste mesmo ano, vai celebrar-se o 750.º aniversário das Cortes de Leiria e julgo que o Parlamento se deve associar a esta comemoração, aliás, estamos a tomar providências nesse sentido. As concelharias terão sido as primeiras em que participaram os representantes do povo, representantes dos concelhos e, portanto, de alguma forma, as concelharias são o nosso "antepassado" mais remoto, pelo que o Parlamento não deve de forma alguma dissociar-se desta comemoração.
Quero, ainda, pedir ao grupo de trabalho para os assuntos culturais que organize a participação da Assembleia da República em algumas datas especialmente significativas que ocorrerão nos próximos anos como em 2007 o centenário da morte de Hintze Ribeiro, líder do Partido Regenerador, Primeiro-Ministro, e uma das figuras marcantes dos últimos tempos da monarquia liberal. Aliás, é uma das poucas figuras parlamentares que tem, como todos sabemos, um busto dentro do Palácio de São Bento, ora isto significa alguma coisa e é preciso que participemos nessas comemorações. No nosso programa editorial há uma referência a Hintze Ribeiro, mas deveria, até, fazer-se, estimular, animar, uma biografia deste famoso político.
Depois, no horizonte já temos o Centenário da República que ocorrerá em 2010. Nas comemorações deste centenário, o Parlamento tem uma especial responsabilidade, nomeadamente neste período passará o centenário da participação dos Deputados republicanos que lutaram, na altura, por uma democracia mais avançada e que deixaram um rasto que será preciso assinalar.
Srs. Deputados, quero ainda dar notícia do seguinte: no dia 5 deste mês passaram 20 anos da morte de Nuno Rodrigues dos Santos que foi uma figura marcante da Assembleia Constituinte, aliás, desde a resistência à ditadura, e que aqui marcou uma presença muito significativa, não só nessa altura mas também na I Legislatura da Assembleia da República. Sugeri que se preparasse a publicação em livro das suas intervenções. Como é sabido, ele veio a ser Presidente do Partido Social-Democrata, tendo tido um percurso anterior pela linha da oposição democrática.
Srs. Deputados, é chegada a hora regimental de votações, pelo que vamos, antes de mais, proceder à verificação do quórum, utilizando o quadro electrónico.

Pausa.

Srs. Deputados, o quadro electrónico regista 146 presenças, pelo que temos quórum para proceder às votações.
Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, gostaria de lembrar que ainda antes dos aniversários que V. Ex.ª referiu temos hoje um outro aniversário o de V. Ex.ª, pelo que queríamos felicitá-lo.

Aplausos gerais, tendo os Deputados do PSD, do CDS-PP e alguns Deputados do PS aplaudido de pé.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Sr. Deputado, mas isso não é regimental…
Sr. Deputado, o meu aniversário é pouco significativo face a este centenário de que estamos aqui a falar.

O Orador: - Sr. Presidente, a pretexto deste seu aniversário, tive aqui uma pequena ilusão de que, pela primeira vez, tinha um aplauso total da Câmara e realmente só o aniversário de V. Ex.ª poderia ter proporcionado esta prenda.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado a todos os Srs. Deputados.
Srs. Deputados, antes de mais passaremos à apreciação dos votos n.os 147/IX (PSD e CDS-PP) e 148/IX (PS), ambos de pesar pelo falecimento de Francisco Lyon de Castro, fundador das publicações Europa-América.

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Francisco Lyon de Castro foi uma grande figura de resistência à ditadura e da construção da democracia e da liberdade de expressão de pensamento.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isilda Pegado.

A Sr.ª Isilda Pegado (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O homem parte, a obra fica.
É neste mote que encontramos a forma de, nesta Assembleia da República, expressar o pesar e, simultaneamente, o orgulho, que a morte não apaga antes reforça, por um homem que marcou o nosso tempo.
Faleceu Francisco Lyon de Castro, no passado dia 11 de Abril.
Nasceu em Lisboa, em 1914, numa família de 10 irmãos, de que era o benjamim.
Em 1945, com apenas 29 anos, lançou aquele que viria a ser, e ainda hoje é, um dos maiores empreendimentos editoriais portugueses: as Publicações Europa-América.
Fundador das Publicações Europa-América, tornou-se à frente daquela empresa/instituição uma referência de cultura, de independência, de empresário dinâmico e sabedor, enfim, uma referência enquanto homem de liberdade.
Francisco Lyon de Castro foi o primeiro presidente eleito da Associação Portuguesa de Editores, constituída após o 25 de Abril de 1974, como também foi o primeiro presidente eleito da Associação Portuguesa das Indústrias Gráficas, o que mostra bem a estima e o mérito que granjeou entre os seus pares.
Apenas com 14 anos, começou a trabalhar como aprendiz de artes gráficas na Imprensa Nacional, onde tomou contacto com os ideais operários anarco-sindicalistas e comunistas.
Durante todo o Estado Novo foi uma voz de oposição ao regime, congregando à sua volta muitos dos que consigo partilhavam ideais de um marxismo-leninismo que em certa intelectualidade encontrou eco e amizade.
Lyon de Castro inscreve-se nessa página da história que o século XX português tem necessariamente escrita por imposição dos factos, a qual poderá seguramente ter por epígrafe "Liberdade essência do Homem".
Quem sobe nunca se detêm, vai de início em início, segundo inícios que nunca acabam.
Na vida de Lyon de Castro encontramos inscrito o grande drama do homem: a liberdade.
Faleceu no estado de viúvo de Eunice, mulher de uma vida. Deixa um filho, Tito Lyon de Castro, dois netos e quatro bisnetos, a quem a Assembleia da República apresenta sentidos pêsames nesta hora de luto e de dor.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luiz Fagundes Duarte.

O Sr. Luiz Fagundes Duarte (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Francisco Lyon de Castro, editor e livreiro - nobre condição a que chegou depois de ter sido jornalista e tipógrafo - e também sindicalista, temporariamente marxista-leninista, lutador permanente pelas liberdades contra o Estado Novo, exilado político no estrangeiro ou preso político nos Açores, falecido, no passado dia 11 de Abril, aos 89 anos de idade, ficará na história da cultura portuguesa como o homem que democratizou o livro e a leitura. Tão-só ou tão muito!!…
De facto, em 1945, aos 31 anos, quando apenas terminava a II Guerra Mundial, Lyon de Castro fundou aquele que seria, até hoje, o maior e mais afortunado empreendimento editorial em Portugal - as Publicações Europa-América - que, seis décadas depois, apresentam um catálogo editorial com 135 colecções, onde se reúnem 5000 títulos de 1900 autores, num total de 51 milhões de exemplares vendidos em todo o mundo lusófono. Entre estas colecções, ficará na História, pelas suas características materiais, pela sua diversidade de conteúdos e de autores, e também pela sua longevidade, a colecção "Livros de bolso Europa-América", que andará hoje pelo meio milhar de títulos publicados e que, pelo seu baixo preço, deu um contributo inestimável, e ainda não devidamente avaliado, para a promoção e a divulgação da leitura em Portugal.
Entre os autores editados contam-se, desde sempre, escritores clássicos e famosos, mas também, e sobretudo, escritores proibidos ou malditos pelo obscurantismo salazarista e ainda jovens autores que pela mão de Lyon de Castro conheceram pela primeira vez "a luz da publicidade". Eles foram, entre os primeiros, Thomas More ou Maquiavel, Bocaccio ou John Steinbeck, Almeida Garrett ou Virgílio, García Márquez ou António Damásio. Entre os segundos, estão Soeiro Pereira Gomes ou Jorge Amado, Fernando Namora ou Oscar Wilde, Alves Redol ou Nabókóv. Entre os mais novos, convém lembrar escritores como Eduardo Brum, ou Rui Zink, ou Lídia Jorge.
Entre Abril de 1952 e Outubro de 1953, Francisco Lyon de Castro fundou, dirigiu e financiou aquela que foi talvez a primeira revista que em Portugal foi exclusivamente dedicada ao livro e à leitura e

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destinada a um público vasto, muito mais vasto do que aquele que tradicionalmente consumia as efémeras publicações literárias. Era a revista Ler, onde escreveram homens e mulheres de pensamento livre como João José Cochofel, José Cardoso Pires, Maria Lamas, Mário Dionísio, José Régio, Delfim Santos ou Orlando Ribeiro.
Como homem de causas e de princípios, como espírito livre, que sempre conseguiu construir e sustentar projectos editoriais à margem das influências políticas ou das pressões económicas, como empresário editorial, que ousou transformar o livro num objecto de consumo generalizado, como trabalhador incansável que quase sem ter deixado o seu posto nos faleceu, levando consigo o título de "Mais Velho Editor do Mundo", e sobretudo como exemplo de homem vertical, de espírito iluminado, de antifascista convicto e activo, de empresário sem medo, e de trabalhador infatigável. Francisco Lyon de Castro foi um daqueles filhos de que qualquer pátria se deverá orgulhar.
Por isso, por ocasião da sua morte, a Assembleia da República, sob proposta dos Deputados do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, curva-se respeitosamente em homenagem a Francisco Lyon de Castro.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Já foi feito pelos oradores que me precederam o elogio da figura e o inventário da obra deixada por Francisco Lyon de Castro.
Poderá dizer-se que a minha geração durante a adolescência não conheceria qualquer livro publicado no estrangeiro se não fosse Lyon de Castro, porque as primeiras traduções portuguesas de Literatura Universal foram produzidas sob as edições Europa-América, aventura de que Lyon de Castro foi fundador e depois o grande promotor.
Nos tempos da nossa juventude universitária procurávamos avidamente, todos os meses, os livros que saiam e as edições da Europa-América, porque só através dessa casa os universitários de Lisboa e de Coimbra e todos aqueles que gostavam de ler ficavam a par do que se passava na literatura mundial. Foi também o inaugurador dos "livros de bolso".
Teve sempre o cuidado de não pôr preços altos. Lembro-me de que fazia descontos especiais aos associados e que aqueles que lhe escrevessem directamente sobre determinado livro que gostariam de ler mas que não tinham posses para o comprar (conheço alguns casos), Francisco Lyon de Castro nunca se esquecia desses pedidos e mandava-os como oferta pessoal.
Muitos daqueles que hoje têm conhecimento das grandes obras literárias do século XX devem-no ao trabalho e à ambição de Francisco Lyon de Castro, que foi o fundador da célebre revista Ler.
Não vamos aqui fazer a história da sua vida política, não é isso que está hoje em causa, mas deve dizer-se que Francisco Lyon de Castro foi uma personalidade importante do Partido Comunista Português nos anos 30.
Teve, como sucede em todos os partidos, as suas desavenças com a hierarquia oficial do partido. Os historiadores do Partido Comunista Português descrevem, como, aliás, o fez hoje num matutino o Dr. Pacheco Pereira, em prosa de homenagem, algumas das peripécias da sua vida de resistente à ditadura, o modo como ele, apesar de ter sido expulso do PCP, nunca deixou de proteger aqueles que estavam dentro do partido e também os que foram expulsos.
Mas, apesar das suas profundas convicções, apesar de todas as vicissitudes políticas que sofreu, Lyon de Castro é um homem que marca uma época, a formação intelectual de gerações inteiras, que, só por causa dele, são hoje homens cultos.
Por isso mesmo devemos-lhe esta homenagem neste Parlamento.
O CDS-PP não pode esquecer estes aspectos do grande divulgador da cultura e um cidadão ilustre que serviu Portugal.

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Lyon de Castro foi mais do que editor e livreiro, como genericamente é mais conhecido. Lyon de Castro foi, antes de mais, uma figura de democrata, de anti-fascista, de lutador pela liberdade, que, através do livro e da editora que criou, deu um importante contributo para a divulgação da cultura.
Mas também deu um importante contributo, sobretudo antes do 25 de Abril, para fazer da cultura um espaço de resistência e de liberdade contra o obscurantismo da ditadura.

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Foi nas publicações Europa-América, designadamente na sua colecção de livros de bolso, que muitos de nós tomámos contacto com os grandes livros da literatura e da cultura universais que a censura autorizava e que a PIDE não apreendia.
Mas foi também nas publicações Europa-América, nos livros entregues por baixo do balcão, que tomámos conhecimento e lemos os livros proibidos pela ditadura de autores como Jorge Amado, Soeiro Pereira Gomes ou Alves Redol, entre tantos outros.
Com o falecimento de Lyon de Castro, Portugal perde uma figura marcante de democrata e de homem de cultura.
O Grupo Parlamentar do PCP manifesta a sua homenagem à figura de Lyon de Castro e presta à família os seus sentimentos de solidariedade.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Francisco Lyon de Castro é e será seguramente sempre lembrado como um antifascista, como um resistente, como um homem de princípios.
Mas Lyon de Castro, como editor e livreiro, foi, sobretudo, alguém que, tendo-se ou não consciência disso, marcou gerações e gerações, influenciando, através do livro, milhares e milhares de portugueses ao longo de anos.
Porventura de modo subversivo, através do livro, através do contacto com os grandes nomes da literatura, através do desvendar, pela escrita, de horizontes que um país obscurantista, fechado e triste não permitia ver, Lyon de Castro fez do livro e da cultura uma constante e a sua trajectória e escolhas foram em prol da liberdade. Cultura é liberdade, cultura é a luta pela liberdade.
É por essa via, e não porventura por outra, e tendo também em conta a aposta, depois do 25 de Abril, nos jovens escritores, que a sua marca ficará para sempre, de forma incontornável, nos milhões e milhões de portugueses que, nas edições Europa-América e, através delas, em Lyon de Castro, descobriram muitos horizontes, que rasgaram muitos dos seus pequenos espaços fechados em que durante muito tempo foram obrigados a viver e que descobriram, através da escrita e do seu prazer, valores da maior importância para o desenvolvimento dos seres humanos.
Por isso, gostaria, em nome de Os Verdes, de me associar a este voto e de dizer que Lyon de Castro será sempre fundamentalmente um homem de liberdade e de cultura.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Exprimimos o nosso pesar pelo falecimento de Francisco Lyon de Castro, cidadão insubmisso, longamente insubmisso, à ditadura e também a qualquer unicidade de pensamento ou de arte. Foi um homem de espírito aberto, com visão, com um espírito empreendedor, promotor da leitura, da literatura, de um encontro, na sua editora, de literaturas muito desencontradas, o que constituiu uma marca de universalismo, que impregnou gerações e gerações de portugueses.
Francisco Lyon de Castro, ao falecer, deixa-nos o exemplo da sua convicção democrática e antifascista, a forma sempre corajosa como enfrentou as adversidades políticas e todas as outras contrariedades ao longo da sua vida.
Podemos apenas, neste momento, curvar-nos em sua memória, deixar um manifesto de respeito e de dor e endossar as nossas condolências à família enlutada, aos amigos e à própria democracia.

O Sr. Presidente: - Sr.as e Srs. Deputados, a Mesa associa-se convictamente às palavras que aqui foram dirigidas em memória de Francisco Lyon de Castro, que merece, sem dúvida alguma, o nosso maior respeito.
Proponho que se proceda à votação conjunta dos dois votos apresentados, já que manifestamente convergem nos seus objectivos.

Pausa.

Srs. Deputados, vamos, então, votar em conjunto os votos n.os 147/IX (PSD e CDS-PP) e 148/IX (PS) - De pesar pelo falecimento de Francisco Lyon de Castro, fundador das publicações Europa-América.

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Submetidos à votação, foram aprovados por unanimidade.

Srs. Deputados, vamos guardar 1 minuto de silêncio.

A Câmara guardou, de pé, 1 minuto de silêncio.

Srs. Deputados, os votos vão ser enviados à família enlutada, mormente ao filho de Francisco Lyon de Castro.
Passamos, agora, à votação do projecto de resolução n.º 243/IX - Viagem do Presidente da República a Varsóvia e a Paris (Presidente da AR).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, vamos votar um requerimento de avocação, apresentado pelo PSD, para votação em Plenário da proposta de resolução n.º 44/IX - Aprova, para ratificação, a Decisão do Conselho, reunido ao nível dos Chefes de Estado ou de Governo, de 21 de Março de 2003, relativa a uma alteração do n.º 2 do artigo 10.º dos Estatutos do Sistema Europeu de Bancos Centrais e do Banco Central Europeu.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Vamos passar à votação global da proposta de resolução n.º 44/IX - Aprova, para ratificação, a Decisão do Conselho, reunido ao nível dos Chefes de Estado ou de Governo, de 21 de Março de 2003, relativa a uma alteração do n.º 2 do artigo 10.º dos Estatutos do Sistema Europeu de Bancos Centrais e do Banco Central Europeu.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD e do CDS-PP, votos contra do PCP, do BE e de Os Verdes e a abstenção do PS.

O Sr. Alberto Costa (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Alberto Costa (PS): - Sr. Presidente, é apenas para informar que, no final das votações, farei uma declaração de voto.

O Sr. Presidente: - Fica registado, Sr. Deputado.
Vamos proceder à votação global da proposta de resolução n.º 63/IX - Aprova o Acordo entre a República Portuguesa e o Reino de Espanha para a Constituição de um Mercado Ibérico da Energia Eléctrica, assinado em Lisboa, em 20 de Janeiro de 2004.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, do PS e do CDS-PP e votos contra do PCP, do BE e de Os Verdes.

Seguidamente, vamos passar à votação, na generalidade, da proposta de lei n.º 119/IX - Aprova o Estatuto do Mecenato Científico e altera o Estatuto do Mecenato, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 74/99, de 16 de Março.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD e do CDS-PP e abstenções do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

Srs. Deputados, vamos agora votar um requerimento, apresentado pelo PS, de baixa à Comissão de Economia e Finanças, sem votação, do projecto de lei n.º 426/IX - Altera o Estatuto do Mecenato, promove o mecenato científico e alarga o regime de incentivos fiscais à I&D empresarial (PS).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Assim sendo, Srs. Deputados, fica prejudicada a votação deste projecto de lei, que vai baixar à 5.ª Comissão.
Por último, vamos passar à votação de três pareceres da Comissão de Ética.

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Para proceder à respectiva leitura, tem a palavra o Sr. Secretário.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelos Juízos de Pequena Instância Criminal de Lisboa - 1.º Juízo, 2.ª Secção, Processo n.º 1533/03, 2TFLSB, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Sérgio Vieira (PSD) a prestar depoimento por escrito, na qualidade de testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo Tribunal Judicial da Comarca da Mealhada, Secretaria do Ministério Público - Inquérito n.º 27/04.3TAMLD, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Gonçalo Breda Marques (PSD) a prestar depoimento, na qualidade de assistente, no âmbito do processo em referência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo Tribunal Judicial da Comarca de Guimarães - 3.º Juízo Criminal, Processo n.º 1203/99.4TAGMR, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Jorge Neto (PSD) a prestar depoimento por escrito, na qualidade de testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Vou dar agora a palavra, para uma declaração de voto sobre a votação da proposta de resolução n.º 44/IX, ao Sr. Deputado Alberto Costa.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Alberto Costa (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Com a aprovação por esta Assembleia da República, para ratificação, da Decisão do Conselho, que altera o sistema de governo do Banco Central Europeu, podemos dizer que fica chancelada e antecipada a revisão num ponto não menor do sistema decisório europeu, em termos que consideramos insatisfatórios do ponto de vista do procedimento institucional. Quando tanto se exalta a participação dos parlamentos na reforma institucional europeia, esta matéria apareceu aqui, na Assembleia, para ser aprovada, para ratificação, sem que alguma vez alguma instância da Assembleia fosse associada ao complexo processo negocial que lhe deu origem.
O procedimento não esteve conforme às declarações e princípios que todos enunciamos sobre a revisão do sistema institucional europeu.
Em segundo lugar, a oportunidade é francamente infeliz. Já não foi feliz o Conselho Europeu quando se apressou a aprovar esta reforma mal o Tratado de Nice entrou em vigor, sem que mesmo na vigência dele fizesse a ponderação que, evidentemente, uma reforma deste calibre exigia. Mas o caso agravou-se quando, no momento em que se prepara uma nova SIG e se fazem já contactos preparatórios em vista das negociações que lhe correspondem, no momento em que se avança no debate de um projecto constitucional europeu, nos apressamos a aprovar já uma verdadeira reforma neste domínio. Uma verdadeira reforma institucional e num ponto, não pequeno, do sistema de decisão europeu.
Mas consideramos também insatisfatória a substância, porque não basta declamar o princípio da igualdade dos Estados, é preciso saber promovê-lo e é preciso saber praticá-lo.
Ora, é preciso dizer que esta reforma vai diferenciar os Estados em duas divisões, e depois em três divisões, sendo que os Estados pertencentes a cada uma das divisões vão ficar com diferentes

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oportunidades de acesso ao exercício do poder de voto. E nós não aceitamos nem consideramos feliz que, num momento em que temos problemas análogos para decidir e soluções a encontrar para problemas paralelos, como acontece no caso da Comissão Europeia, o Parlamento português venha antecipar e chancelar esta reforma.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O princípio da igualdade dos Estados, para ser defendido com coerência e firmeza, não precisa nada da precipitação deste tipo de soluções que emitem uma mensagem errada num momento errado.
Na política europeia, e não só, não devemos fingir que temos…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
Como estava a dizer, na política europeia, e não só, não podemos fingir que temos soluções diferentes quando temos soluções iguais, mas também não podemos fingir que temos posições iguais quando temos posições diferentes.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Também para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Pinho Cardão.

O Sr. Pinho Cardão (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A propósito da aprovação, para ratificação, da Decisão do Conselho relativa a uma alteração do n.º 2 do artigo 10.º dos Estatutos do Sistema Europeu de Bancos Centrais e do Banco Central Europeu, o PSD gostaria de referir que a postura portuguesa se insere no conjunto das decisões tomadas pelos diversos Estados-membros.
Até este momento, esta decisão já foi ratificada pela maioria dos parlamentos e espera-se, pelas informações que temos, que até ao fim do mês de Abril - já não faltará muito tempo - todos os países a ratifiquem, pelo que não há qualquer decisão precipitada do nosso Parlamento. Se não estivéssemos nesta fase, o que aconteceria é que estaríamos completamente deslocados em relação àquele que é o sentir dos diversos Estados.
Gostaria também de dizer que se trata de uma solução equilibrada, que foi aquela que resultou de negociações e que foi aprovada por unanimidade por todos os Estados-membros.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Numa negociação, parte-se de posições divergentes, mas conseguiu-se chegar a uma posição de equilíbrio, que foi aprovada.
O Banco de Portugal deu o seu aval a esta alteração, tendo seguido muito estreitamente as negociações, e o próprio Governador do Banco de Portugal, em reunião na Assembleia da República com duas comissões, o que significa, portanto, que a Assembleia da República não esteve alheada deste problema, considerou que o resultado a que se tinha chegado era, de facto, de grande equilíbrio.
Como tal, julga o PSD que se tratou de uma decisão equilibrada e que foi aqui ratificada no momento oportuno.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Ainda para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Muito brevemente, quero só declarar, em nome da bancada do Bloco de Esquerda, que subscrevemos palavra por palavra a declaração de voto feita pelo Deputado Alberto Costa, que verifica que, num momento infeliz, foi tomada uma decisão errada e por se tratar de uma decisão errada, consequentemente, votámos contra.

O Sr. Presidente: - Igualmente para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

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O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A resolução que aprovámos consubstancia a introdução do princípio da desigualdade entre Estados, ainda por cima numa matéria e num campo decisivos para a vida e para as economias dos países, em que escapam já às soberanias nacionais partes fundamentais do controle democrático de decisões importantes e agora vêem acentuada essa ausência de controle democrático por um escalonamento em razão da dimensão e da importância dos diversos Estados-membros, o que prejudica, designadamente, Portugal.
Não se trata de um problema de oportunidade ou de processo, trata-se de um problema de fundo, e por isso só podia merecer o voto claramente contra da bancada do PCP.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, chegámos ao fim dos trabalhos de hoje.
A próxima sessão plenária realiza-se amanhã, sexta-feira, com início às 10 horas, tendo como ordem de trabalhos a discussão conjunta, na generalidade, da proposta de lei n.º 113/IX e do projecto de lei n.º 420/IX e a discussão, em separado, das petições n.os 13/VII (1.ª), 127/VII (3.ª) e 158/VII (4.ª).
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 30 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
António Alfredo Delgado da Silva Preto
Arménio dos Santos
Eugénio Fernando de Sá Cerqueira Marinho
Gonçalo Dinis Quaresma Sousa Capitão
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Henrique José Monteiro Chaves
João Manuel Moura Rodrigues
Jorge Nuno Fernandes Traila Monteiro de Sá
Manuel Ricardo Dias dos Santos Fonseca de Almeida
Maria Clara de Sá Morais Rodrigues Carneiro Veríssimo
Pedro Filipe dos Santos Alves
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva
Sérgio André da Costa Vieira

Partido Socialista (PS):
João Barroso Soares
José Apolinário Nunes Portada
José Manuel Pires Epifânio
Júlio Francisco Miranda Calha
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta
Vitalino José Ferreira Prova Canas

Partido Comunista Português (PCP):
Bernardino José Torrão Soares
Bruno Ramos Dias
Lino António Marques de Carvalho

Srs. Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:

Partido Social Democrata (PSD):
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

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Partido Social Democrata (PSD):
Fernando Manuel Lopes Penha Pereira
Marco António Ribeiro dos Santos Costa
Maria João Vaz Osório Rodrigues da Fonseca
Maria Leonor Couceiro Pizarro Beleza de Mendonça Tavares
Vítor Manuel Roque Martins dos Reis

Partido Socialista (PS):
Elisa Maria da Costa Guimarães Ferreira
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
Manuel Alegre de Melo Duarte
Maria Isabel da Silva Pires de Lima
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Vicente Jorge Lopes Gomes da Silva

Partido Comunista Português (PCP):
António João Rodeia Machado
Maria Odete dos Santos

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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