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Sexta-feira, 9 de Julho de 2004 I Série - Número 105

IX LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2003-2004)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 8 DE JULHO DE 2004

Presidente: Ex.mo Sr. João Bosco Soares Mota Amaral

Secretários: Ex. mos Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Henrique Jorge Campos Cunha

S U M Á R I O


O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta à Assembleia de uma carta do Sr. Presidente da República comunicando a não realização da viagem de carácter particular que tinha prevista à Península da Indochina.
Deu-se ainda conta da apresentação de requerimentos, dos projectos de resolução n.os 268 a 271/IX e dos projectos de lei n.os 471 a 474/IX.
Foi aprovado um parecer da Comissão de Ética relativo à retoma de um Deputado do PSD.
Sobre o voto n.º 192/IX - De saudação pelo êxito que significou a realização, em Portugal, do Euro 2004 (Presidente da AR, PSD, PS, CDS-PP, PCP, BE e Os Verdes), usaram da palavra, além do Sr. Presidente, os Srs. Deputados Laurentino Dias (PS), Jorge Pereira (PSD), Isabel Castro (Os Verdes), Telmo Correia (CDS-PP), Luís Fazenda (BE) e Bruno Dias (PCP) e o Sr. Ministro Adjunto do Primeiro-Ministro (José Luís Arnaut). No final, o voto foi aprovado por unanimidade e aclamação.
Seguiu-se o voto n.º 190/IX - De pesar pelo falecimento de Sophia de Mello Breyner Andresen (Presidente da AR, PS, PSD, CDS-PP, PCP, BE e Os Verdes), que foi aprovado, tendo-se pronunciado, além do Sr. Presidente e do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Luís Marques Mendes), os Srs. Deputados Manuel Alegre (PS), Luísa Mesquita (PCP), Teresa Morais (PSD), Francisco Louçã (BE), Isabel Castro (Os Verdes) e Narana Coissoró (CDS-PP). No fim, a Câmara aplaudiu, durante 1 minuto, em memória da homenageada.
Após os Srs. Deputados Judite Jorge (PSD), Luiz Fagundes Duarte (PS), Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP) e António Filipe (PCP) terem intervindo, ao que o Sr. Presidente da AR se associou, sobre o voto n.º 191/IX - De congratulação pela elevação da paisagem da cultura da vinha do Pico ao estatuto de Património Mundial (PCP, PSD, PS, CDS-PP, BE e Os Verdes), foi o mesmo aprovado.
Foi anunciada a entrada na Mesa dos projectos de lei n.os 475 a 478/IX e do projecto de resolução n.º 272/IX.
Em declaração política, o Sr. Deputado Medeiros Ferreira (PS) deu conta da alteração dos objectivos das jornadas parlamentares do PS, realizadas em Ponta Delgada, devido à demissão do Primeiro-Ministro, a qual levou a uma mudança na agenda parlamentar e ao actual momento político do País. No fim, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Isabel Castro (Os Verdes), António Filipe (PCP), Guilherme Silva (PSD), Telmo Correia (CDS-PP) e Luís Fazenda (BE).
Sobre o actual momento político do País, pronunciaram-se, em declaração política, os Srs. Deputados Bernardino Soares (PCP), Luís Fazenda (BE) e Isabel Castro (Os Verdes), que deu resposta a um pedido de esclarecimento do Sr. Deputado António José Seguro (PS).

Ordem do dia. - Foi discutido, na generalidade, o projecto de lei n.º 28/IX - Informação genética pessoal e informação de saúde (BE), que foi aprovado, tendo feito intervenções os Srs. Deputados Alda Sousa (BE), Massano Cardoso (PSD), Maria de Belém Roseira (PS), Odete Santos (PCP), Miguel Paiva (CDS-PP) e Isabel Castro (Os Verdes).
Foi apreciado o Decreto-Lei n.º 108/2004, de 11 de Maio, que altera o Decreto-Lei n.º 83/2000, de 11 de Maio, que aprova o regime legal da concessão e emissão de passaportes [apreciações parlamentares n.os 78/IX (PS) e 79/IX (PCP)], tendo usado da palavra, a diverso título, os Srs. Deputados Carlos Luís (PS), Luísa Mesquita (PCP), António Nazaré Pereira (PSD) e Miguel Anacoreta Correia (CDS-PP).
Foi apreciada a petição n.º 80/VIII (3.ª) - Apresentada pela Associação Nacional dos Doentes com Artrite Reumatóide (ANDAR),

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solicitando que a Assembleia da República legisle no sentido de poderem beneficiar da comparticipação de 100% nos medicamentos prescritos, nomeadamente imunosupressores, imunomoduladores e corticoesteroides. Intervieram os Srs. Deputados José Manuel Pavão (PSD), Luísa Portugal (PS), Alda Sousa (BE), Isabel Gonçalves (CDS-PP) e Bernardino Soares (PCP).
Sobre a petição n.º 70/IX (2.ª) - Apresentada pelo Movimento de Cidadãos pró-Cuidados Paliativos, reclamando que o acesso aos cuidados paliativos seja considerado como um direito inquestionável de todos os cidadãos e incluído na Constituição da República Portuguesa, intervieram os Srs. Deputados Clara Carneiro (PSD), Maria de Belém Roseira (PS), Luís Fazenda (BE), Isabel Gonçalves (CDS-PP), Bernardino Soares (PCP) e Isabel Castro (Os Verdes).
Deu-se conta da entrada na Mesa do projecto de resolução n.º 273/IX.
A Câmara procedeu à apreciação do relatório da Comissão Eventual para a Análise e a Fiscalização dos Recursos Públicos Envolvidos na Organização do EURO 2004, tendo intervindo, além do Sr. Presidente, os Srs. Deputados Laurentino Dias (PS), na qualidade de Presidente da Comissão, Hugo Velosa (PSD), Bruno Dias (PCP), João Pinho de Almeida (CDS-PP) e António Galamba (PS).
O projecto de resolução n.º 67/IX - Medidas para combate à violência doméstica (PCP) não mereceu aprovação.
Foram rejeitados os projectos de resolução n.os 200/IX - Cria uma comissão eventual de acompanhamento das medidas de combate às listas de espera (PS) e 201/IX - Realização de um estudo de âmbito nacional sobre as listas de espera (PS).
O projecto de lei n.º 378/IX - Alteração da imagem feminina nos manuais escolares (Os Verdes) foi aprovado na generalidade.
Mereceu aprovação, na especialidade e em votação final global, o texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo à proposta de lei n.º 124/IX - Estabelece e regula os princípios e bases gerais do exercício do direito de associação profissional dos militares da Guarda Nacional Republicana e ao projecto de lei n.º 445/IX - Direito de associação profissional do pessoal da GNR (PS).
Em votação final global, mereceram aprovação os seguintes textos finais:
apresentado pela Comissão de Educação, Ciência e Cultura, relativo ao projecto de lei n.º 415/IX - Altera o Decreto-Lei n.º 123/99, de 20 de Abril, que aprova o Estatuto do Bolseiro de Investigação (PCP);
apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo à proposta de lei n.º 123/IX - Define o sentido e o alcance dos actos próprios dos advogados e dos solicitadores e tipifica o crime de procuradoria ilícita;
apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo à proposta de lei n.º 127/IX - Estabelece o regime jurídico das perícias médico-legais e forenses;
apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo ao projecto de lei n.º 425/IX - Lei de organização e funcionamento da Comissão Nacional de Protecção de Dados (PSD e CDS-PP);
apresentado pela Comissão de Educação, Ciência e Cultura, relativo à proposta de lei n.º 120/IX - Aprova a Lei-Quadro dos Museus Portugueses.
Foram aprovados os projectos de resolução n.os 268/IX - Participação da Assembleia da República na Assembleia Parlamentar Euro-Mediterrânica (Presidente da AR), 269/IX - Grupos de parlamentares conexos com organismos internacionais e grupos de parlamentares membros ou apoiantes de associações internacionais (Presidente da AR), 270/IX - Participação da Assembleia da República na UIP (Presidente da AR), 271/IX - Deslocações de Deputados (Presidente da AR e Presidente e Deputados membros do Conselho de Administração) e 272/IX - Quadro e conteúdos funcionais do pessoal da Comissão Nacional de Protecção de Dados (PSD, PS, CDS-PP e PCP).
Em votação final global, mereceu aprovação o texto final, apresentado pela Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais, relativo à proposta de lei n.º 116/IX - Aprova o regime jurídico aplicável à realização de ensaios clínicos com medicamentos de uso humano.
Na generalidade, o projecto de lei n.º 381/IX - Regula o acesso aos documentos da Administração (Os Verdes), foi aprovado.
O projecto de resolução n.º 29/IX - Sobre a imagem da mulher na publicidade (Os Verdes), foi rejeitado.
Foram rejeitados os requerimentos de avocação a Plenário, subscritos pelo PS, da votação, na especialidade, dos artigos 10.º, 11.º, 15.º, 18.º a 31.º e 57.º do texto final, apresentado pela Comissão de Economia e Finanças, relativo aos projectos de lei n.os 416/IX - Terceira alteração à Lei n.º 91/2001, de 20 de Agosto (Lei de enquadramento orçamental) (PS), e 440/IX - Terceira alteração à Lei de enquadramento orçamental (PSD e CDS-PP), tendo sido apresentados pelos Srs. Deputados Eduardo Cabrita, Joel Hasse Ferreira, Teresa Venda, Maximiano Martins e Fernando Serrasqueiro (PS). De seguida, a Câmara aprovou, em votação final global, o referido texto final.
Por último, foram aprovados três pareceres da Comissão de Ética, um de retoma de mandado de um Deputado do BE, outro autorizando um Deputado do PSD e ainda outro denegando autorização a um Deputado do PS a deporem em tribunal.
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 20 horas e 45 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas.

Srs. Deputados presentes à sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
Adriana Maria Bento de Aguiar Branco
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
Ana Paula Rodrigues Malojo
António Carlos de Sousa Pinto
António da Silva Pinto de Nazaré Pereira
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Fernando de Pina Marques
António Henriques de Pinho Cardão
António Joaquim Almeida Henriques
António Manuel da Cruz Silva
António Pedro Roque da Visitação Oliveira
António Ribeiro Cristóvão
Arménio dos Santos
Bernardino da Costa Pereira
Bruno Jorge Viegas Vitorino
Carlos Alberto da Silva Gonçalves
Carlos Alberto Rodrigues
Carlos Jorge Martins Pereira
Carlos Manuel de Andrade Miranda
Carlos Parente Antunes
Daniel Miguel Rebelo
Diogo de Sousa Almeida da Luz
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Eduardo Artur Neves Moreira
Elvira da Costa Bernardino de Matos Figueiredo
Fernando António Esteves Charrua
Fernando Jorge Pinto Lopes
Fernando Manuel Lopes Penha Pereira
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho
Fernando Santos Pereira
Francisco José Fernandes Martins
Gonçalo Dinis Quaresma Sousa Capitão
Gonçalo Miguel Lopes Breda Marques
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Henrique José Monteiro Chaves
Hugo José Teixeira Velosa
Isménia Aurora Salgado dos Anjos Vieira Franco
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Joaquim Miguel Parelho Pimenta Raimundo
Joaquim Virgílio Leite Almeida da Costa
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado
José Alberto Vasconcelos Tavares Moreira
José António Bessa Guerra
José António de Sousa e Silva
José Eduardo Rego Mendes Martins
José Luís Campos Vieira de Castro
José Manuel Carvalho Cordeiro
José Manuel de Lemos Pavão
José Manuel de Matos Correia
José Manuel dos Santos Alves
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro

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José Manuel Pereira da Costa
José Manuel Álvares da Costa e Oliveira
José Miguel Gonçalves Miranda
João Bosco Soares Mota Amaral
João Carlos Barreiras Duarte
João Eduardo Guimarães Moura de Sá
João José Gago Horta
João Manuel Moura Rodrigues
Judite Maria Jorge da Silva
Luís Cirilo Amorim de Campos Carvalho
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Filipe Soromenho Gomes
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Manuel Alves de Oliveira
Manuel Ricardo Dias dos Santos Fonseca de Almeida
Maria Assunção Andrade Esteves
Maria Aurora Moura Vieira
Maria Clara de Sá Morais Rodrigues Carneiro Veríssimo
Maria da Graça Ferreira Proença de Carvalho
Maria Goreti Sá Maia da Costa Machado
Maria João Vaz Osório Rodrigues da Fonseca
Maria Leonor Couceiro Pizarro Beleza de Mendonça Tavares
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira
Maria Natália Guterres V. Carrascalão da Conceição Antunes
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria Teresa da Silva Morais
Miguel Fernando Alves Ramos Coleta
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Mário Patinha Antão
Paulo Jorge Frazão Batista dos Santos
Pedro Filipe dos Santos Alves
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Rodrigo Alexandre Cristóvão Ribeiro
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva
Rui Miguel Lopes Martins de Mendes Ribeiro
Salvador Manuel Correia Massano Cardoso
Sérgio André da Costa Vieira
Vasco Manuel Henriques Cunha
Vítor Manuel Roque Martins dos Reis

Partido Socialista (PS):
Alberto Arons Braga de Carvalho
Alberto Bernardes Costa
Alberto de Sousa Martins
Alberto Marques Antunes
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Ana Maria Benavente da Silva Nuno
Antero Gaspar de Paiva Vieira
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António Fernandes da Silva Braga
António José Martins Seguro
António Luís Santos da Costa
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Ascenso Luís Seixas Simões

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Augusto Ernesto Santos Silva
Carlos Manuel Luís
Edite Fátima Santos Marreiros Estrela
Eduardo Arménio do Nascimento Cabrita
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues
Elisa Maria da Costa Guimarães Ferreira
Fausto de Sousa Correia
Fernando dos Santos Cabral
Fernando Manuel dos Santos Gomes
Fernando Pereira Cabodeira
Fernando Pereira Serrasqueiro
Fernando Ribeiro Moniz
Francisco José Pereira de Assis Miranda
Guilherme Valdemar Pereira d'Oliveira Martins
Jaime José Matos da Gama
Jamila Bárbara Madeira e Madeira
Joaquim Augusto Nunes Pina Moura
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira
Jorge Lacão Costa
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José António Fonseca Vieira da Silva
José Apolinário Nunes Portada
José Augusto Clemente de Carvalho
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Eduardo Vera Cruz Jardim
José Manuel de Medeiros Ferreira
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
José Manuel Santos de Magalhães
José Maximiano de Albuquerque Almeida Leitão
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa
João Cardona Gomes Cravinho
João Rui Gaspar de Almeida
Júlio Francisco Miranda Calha
Laurentino José Monteiro Castro Dias
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís Alberto da Silva Miranda
Luís Manuel Capoulas Santos
Luís Manuel Carvalho Carito
Luísa Pinheiro Portugal
Manuel Alegre de Melo Duarte
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Manuel Pedro Cunha da Silva Pereira
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Cristina Vicente Pires Granada
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria do Carmo Romão Sacadura dos Santos
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Maximiano Alberto Rodrigues Martins
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Nelson da Cunha Correia
Nelson Madeira Baltazar

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Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Paulo José Fernandes Pedroso
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui António Ferreira da Cunha
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Teresa Maria Neto Venda
Victor Manuel Bento Baptista
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Zelinda Margarida Carmo Marouço Oliveira Semedo

Partido Popular (CDS-PP):
António Herculano Gonçalves
Diogo Nuno de Gouveia Torres Feio
Henrique Jorge Campos Cunha
Isabel Maria de Sousa Gonçalves dos Santos
José Miguel Nunes Anacoreta Correia
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
João Rodrigo Pinho de Almeida
Manuel de Almeida Cambra
Manuel Miguel Pinheiro Paiva
Narana Sinai Coissoró
Paulo Daniel Fugas Veiga
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia

Partido Comunista Português (PCP):
António Filipe Gaião Rodrigues
António João Rodeia Machado
Bernardino José Torrão Soares
Bruno Ramos Dias
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas
Jerónimo Carvalho de Sousa
José Honório Faria Gonçalves Novo
Maria Luísa Raimundo Mesquita
Ângela Ricardo Carriço Sabino

Bloco de Esquerda (BE):
Alda Maria Botelho Correia Sousa
Francisco Anacleto Louçã
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda

Partido Ecologista "Os Verdes" (PEV):
Isabel Maria de Almeida e Castro
Álvaro José de Oliveira Saraiva

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai proceder à leitura do expediente.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, foi enviada à Assembleia da República uma carta de Sua Ex.ª o Sr. Presidente da República, comunicando da não realização da sua viagem de carácter particular, marcada para os dias 11 a 23 do corrente mês de Julho, à Península

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da Indochina.
Deram também entrada na Mesa diversos requerimentos.
Na reuniões plenárias de 24 e 25 de Junho - ao Ministério da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, formulado pelo Sr. Deputado Gonçalo Breda Marques; ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, formulado pelo Sr. Deputado José Leitão; ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e Habitação, formulados pelos Srs. Deputados Alberto Antunes e José Miguel Medeiros; ao Ministro Adjunto do Primeiro-Ministro, formulado pelo Sr. Deputado Fernando Cabral; ao Sr. Primeiro-Ministro, formulado pelo Sr. Deputado António Galamba; ao Ministério da Saúde, formulados pelos Srs. Deputados Bruno Dias e Alda Sousa; ao Ministério da Segurança Social e do Trabalho, formulado pelo Sr. Deputado Francisco Louçã.
No dia 28 e nas reuniões plenárias de 25 e 30 de Junho - ao Sr. Primeiro Ministro e aos Ministérios das Obras Públicas, Transportes e Habitação, da Ciência e do Ensino Superior e da Educação, formulados pelos Srs. Deputados António Galamba, Ana Manso e Álvaro Saraiva; ao Ministério da Administração Interna, formulados pelos Srs. Deputados José Leitão e Abílio Almeida Costa; ao Ministério das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, ao Presidente da Comissão Coordenadora do Desenvolvimento Regional do Norte (CCDRN), ao Serviço Nacional de Bombeiros e Protecção Civil e a diversas Câmaras, formulados pelo Sr. Deputado Álvaro Castello-Branco; ao Ministério da Saúde, formulado pela Sr.ª Deputada Alda Sousa; aos Ministérios dos Negócios Estrangeiros, formulado pelo Sr. Deputado Francisco Louçã.
Foram igualmente apresentados os votos n.os 190/IX - De pesar pelo falecimento de Sophia de Mello Breyner Andresen (Presidente da AR, PS, PSD, CDS-PP, PCP, BE e Os Verdes), 191/IX - De congratulação pela elevação da paisagem da cultura da vinha do Pico ao estatuto de Património Mundial (PCP, PSD, PS, CDS-PP, BE e Os Verdes) e 192/IX - De saudação pelo êxito que significou a realização, em Portugal, do Euro 2004 (Presidente da AR, PSD, PS, CDS-PP, PCP, BE e Os Verdes), que hoje apreciaremos em primeiro lugar.
Deram ainda entrada na Mesa os seguintes diplomas: projectos de resolução n.os 268/IX - Participação da Assembleia da República na Assembleia Parlamentar Euro-Mediterrânica (Presidente da AR), 269/IX - Grupos de parlamentares conexos com organismos internacionais e grupos de parlamentares membros ou apoiantes de associações internacionais (Presidente da AR), 270/IX - Participação da Assembleia da República na UIP (Presidente da AR), 271/IX - Deslocações de Deputados (Presidente da AR e Deputados Presidente e membros do Conselho de Administração); projectos de lei n.os 471/IX - Criação da freguesia do Sítio, no concelho da Nazaré, distrito de Leiria (PSD), que baixou à 4.ª Comissão, 472/IX - Elevação da vila de Reguengos de Monsaraz, no concelho de Reguengos de Monsaraz, à categoria de cidade (PS), que baixou à 4.ª Comissão, 473/IX - Elevação da povoação de Monte Redondo, no concelho de Leiria, à categoria de vila (PSD), que baixou à 4.ª Comissão, e 474/IX - Alteração ao Decreto-Lei n.º 310/2003, de 10 de Dezembro, que altera e procede à republicação do Decreto-Lei n.º 380/99, de 22 de Setembro, relativo ao Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial (PCP), que baixou à 4.ª Comissão.
Sr. Presidente, passo também a dar conta de um relatório da Comissão de Ética referente à retoma de mandato do Sr. Deputado Ribeiro Cristovão (PSD), cessando o Sr. Deputado Francisco Pimentel, com efeitos a partir de 5 de Julho corrente, inclusive, sendo o respectivo parecer no sentido de a retoma de mandato em causa ser de admitir.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não havendo pedidos de palavra, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Sr.as e Srs. Deputados, hoje os nossos trabalhos vão ter uma ordenação diferente e excepcional pelas circunstâncias que todos, decerto, compreenderão.
Ao longo das últimas semanas, o nosso país viveu momentos de festa e de verdadeira exaltação cívica e - porque não dizê-lo também - patriótica. A Assembleia da República não pode, pois, de forma alguma, ficar de fora do reconhecimento que todo o País fez por aqueles que puseram de pé e levaram a efeito o Euro 2004.
Convidei, por isso, para estarem aqui, no começo da sessão, alguns dos responsáveis pela organização do Euro 2004, nomeadamente o Dr. Gilberto Madaíl, Presidente da Federação Portuguesa de Futebol, a Sociedade Euro 2004, a equipa técnica da nossa Selecção, à frente da qual se encontra o Sr. Comendador Luiz Felipe Scolari, que não precisa de apresentações, e a nossa Selecção, os jogadores, que não puderam vir, o que é pena, pela razão simples de estarem de férias.
Ficou combinado apresentar-se um voto de saudação, que subscrevo, em sintonia com os líderes de

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todos os grupos parlamentares.
Ficou também acordado que, por se tratar de uma circunstância tão excepcional, o tempo atribuído a cada grupo parlamentar será de 2 minutos e que para a apreciação dos outros dois votos cada grupo parlamentar disporá de 4 minutos.
Passo a ler o voto de saudação pelo êxito que significou a realização, em Portugal, do Euro 2004 (voto n.º 192/IX) e, a seguir, darei a palavra a quem dela quiser usar.
"A Assembleia da República reconheceu, desde o primeiro momento, a importância e o interesse nacional da realização em Portugal da fase final do Campeonato Europeu de Futebol UEFA Euro 2004.
Acompanhou a candidatura e a sua concretização, dedicando especial atenção à análise e fiscalização dos fundos públicos envolvidos na sua organização e promoção.
O Euro 2004 foi um enorme desafio, assumido com determinação, competência, ambição e confiança por todos os portugueses. E Portugal venceu esse desafio, afirmando ao mundo a sua capacidade de realização e reforçando a sua notoriedade como membro da União Europeia.
No melhor campeonato europeu de futebol de sempre - como foi unanimemente reconhecido -, Portugal obteve ainda a melhor classificação desportiva de sempre em resultado da extraordinária prestação da Selecção Nacional.
O Euro 2004 uniu os portugueses e reforçou a identidade nacional num ambiente de salutar espírito desportivo, hospitalidade e civismo, partilhado pelos milhares de pessoas que nos visitaram e testemunhado pela exposição mediática, sem precedentes, do nosso país.
Cabe realçar, pelo papel nuclear que tiveram no êxito do evento, o extraordinário desempenho das forças e serviços de segurança e dos serviços de saúde e socorro, quer na cuidada preparação levada a cabo quer na prontidão e operacionalidade demonstradas ao longo de todo o Campeonato.
A Assembleia da República congratula-se com o êxito que significou a realização, em Portugal, do Euro 2004, saudando todos quanto o tornaram possível, em particular os anterior e actual Governos, a Federação Portuguesa de Futebol, a Sociedade Euro 2004, SA, a Sociedade Portugal 2004, SA, e, bem assim, todos os atletas e técnicos que representaram desportivamente o País nesse torneio memorável para os portugueses."

Aplausos gerais, de pé.

Tem a palavra o Sr. Deputado Laurentino Dias.

O Sr. Laurentino Dias (PS): - Sr. Presidente, Srs. Ministros, Sr. Secretário de Estado do Desporto, Sr.as e Srs. Deputados: Tenho muita honra de, em nome do meu grupo parlamentar, dirigir umas palavras de saudação relativas ao Euro 2004. Olhando para trás, não podemos deixar de nos lembrar da aposta e do desafio que o governo liderado pelo Eng.º António Guterres, há quase seis anos, levou a cabo na candidatura de Portugal à realização do Euro 2004, vencendo o primeiro dos vários desafios que Portugal foi capaz de vencer ao longo destes seis anos.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Importa, pois, também render aqui esta homenagem a esse governo, ao seu Primeiro-Ministro e aos respectivos membros do governo que trabalharam para que o Euro 2004 fosse o êxito que foi, os actuais Deputados José Sócrates, Miranda Calha, Fernando Gomes e José Lello, bem como ao Dr. Armando Vara, então governantes, que fizeram transitar para o actual Governo, na pessoa do Sr. Ministro José Luís Arnaut, o encargo, a tarefa, certamente assumida com gosto,…

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - E êxito!

O Orador: - … e levada até ao fim, no sentido de, seis anos depois, naquilo que competia à esfera política, fazerem tudo o que fosse preciso para que este torneio fosse um êxito para os portugueses e para Portugal.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Este êxito teve muitos parceiros: a Sociedade Euro 2004, SA, a Sociedade Portugal 2004, SA, a Federação Portuguesa de Futebol, que cumprimento e saúdo na pessoa do seu Presidente, Dr. Gilberto Madaíl, que desde o primeiro dia não regateou esforços para que o Euro fosse o êxito que foi, e todos os portugueses que nele colaboraram, ou seja, os milhares de cidadãs e cidadãos, sobretudo jovens,

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que deram o seu contributo voluntário, interessado e esforçado para que os milhares de pessoas que nos visitaram se sentissem bem e para que os milhões de pessoas que nos viram lá longe percebessem bem a capacidade que Portugal tem de organizar grandes eventos, de se afirmar como um País dinâmico e moderno. A todos esses, sem excepção, o meu grupo parlamentar rende a devida homenagem.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Evidentemente, queremos também deixar uma palavra especial àqueles que, dentro do campo, tiveram a parte desportiva, não menos importante para o êxito do Euro 2004,…

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - … na pessoa do líder da equipa, o Sr. Comendador Luiz Felipe Scolari. Em nome do meu grupo parlamentar, apresento-lhe os parabéns pela participação e pelo êxito desportivo da nossa Selecção, mas também pelo que os seus colaboradores, os seus jogadores, contribuíram para puxar pelo País, para nos dar, durante estas últimas três semanas, um "bálsamo" bem-vindo e bem recebido em período que não tem sido fácil, de crise social e política.
Muito obrigado a todos os que, dentro do campo, honraram a camisola da Selecção Nacional, que honraram as cores verde e vermelho de Portugal.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Se nos é possível dizer que este Euro 2004 foi um êxito, também nos é possível esperar que deste evento possamos partir para outras aventuras e para outros desafios.
Segue-se, agora, o desafio dos Jogos Olímpicos. Quero, pois, desejar felicidades àqueles que, no próximo mês, vão representar Portugal nesses Jogos.
Fica o desafio para outras candidaturas, nomeadamente para o Campeonato Mundial de Futebol, que vamos disputar daqui a dois anos. Com o desafio do Euro 2004, Portugal demonstrou ser capaz de se afirmar como um País próspero, dinâmico e com futuro.
Parabéns a todos vós. Em nome do Grupo Parlamentar do PS, o meu muito obrigado.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Pereira.

O Sr. Jorge Pereira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Ministros, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Tenho a certeza que os portugueses reconhecem o esforço feito para o sucesso do Campeonato Europeu de Futebol, apontado pela UEFA como o melhor campeonato europeu de sempre.
O Campeonato Europeu de Futebol, ou seja, o Euro 2004, foi muito mais do que a construção de 10 estádios no País; foi momento de afirmação e projecção da imagem de Portugal no mundo.
É de salientar que, durante o evento, milhões de pessoas acompanharam Portugal nas televisões, rádios e jornais de todo o mundo.
Aproveito para salientar a excelente campanha de promoção que o Euro 2004 fez do nosso país na Europa e no mundo.
Este evento foi uma mais-valia para todos os portugueses. O País ficou com mais e melhores equipamentos, nomeadamente nas áreas da saúde, turismo, segurança e acessibilidades.
O Grupo Parlamentar do PSD saúda a nossa Selecção, toda a organização do Euro 2004 e todos os portugueses que fizeram com que o nosso país seja visto aos olhos do mundo como hospitaleiro, tolerante, isto é, um país a visitar.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, uso da palavra para me associar a este voto.
Não era fácil o desafio que a realização de uma competição como esta colocava. Porventura, nem todos acreditávamos que este projecto poderia ser possível nos moldes em que aconteceu, pelo que a sua realização é, seguramente, algo que nos deve honrar.

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Todos os cidadãos portugueses que participaram nos eventos desportivos, conseguiram, com o seu civismo, com a sua hospitalidade, fazer do desporto uma festa sem violência, sem agressividade. O desporto ficou honrado, o nosso país teve maior visibilidade e aquilo que nos parece que também ficou visível foi, de algum modo, a alegria de as pessoas se reverem - e sem imposições - nos símbolos nacionais: o verde e o vermelho, a cor da liberdade, que foi sinónimo de alegria.
Para todos aqueles que, como equipa, trabalharam, que tornaram possível este evento, que lhe deram corpo e conteúdo, e pelos resultados que alcançaram, e que são importantes para o futebol, mas que nós queremos que sejam também importantes para todo o desporto, vai o nosso voto de saudação neste momento.

Aplausos de Os Verdes, do PS e do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, Ilustres Convidados: Em nome do Grupo Parlamentar do CDS-PP, lembro hoje que o Euro 2004 foi, desde o seu início, uma aposta importante, uma aposta consensual e uma aposta unânime do País. Se quisermos, o Euro 2004 revelou um pouco do que é habitualmente Portugal, porque foi o desafio perante os grandes acontecimentos, foi a mobilização perante um desafio tão importante, apesar de - mesmo hoje não resisto a dizê-lo - algumas vozes cépticas que não deixámos de ouvir no início desta organização: os que achavam que não era boa ideia, os que achavam que não estávamos à altura, os que achavam que certos aspectos iriam funcionar mal.

Vozes do PS: - Vocês!

O Orador: - E destaco um aspecto que me parece da maior importância. Todos nos lembramos (não estou a falar de ninguém em concreto) daqueles que alertavam para os riscos do País, designadamente do ponto de vista da segurança, para os riscos do ponto de vista da saúde. Ora, temos hoje de dizer que tudo funcionou de forma impecável e que é extraordinário, designadamente no sector da segurança, o orgulho que temos no trabalho que foi feito pelas nossas forças de segurança ao longo do Euro.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Orador: - O Euro tem, naturalmente, uma parte desportiva e uma parte organizativa. Na parte desportiva, gostaria de salientar uma coisa muito simples: é verdade que queríamos ter ido um bocadinho de nada mais longe, mas também é verdade, Sr. Presidente da Federação Portuguesa de Futebol, Sr. Comendador Scolari, que nunca tínhamos ido tão longe! Pela primeira vez, Portugal esteve numa final de um acontecimento como o Euro 2004.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Nesse sentido, o orgulho que o País viveu, o orgulho que o País sentiu, a forma como saímos todos para as ruas e para os estádios, vestidos com a bandeira verde e rubra, é inesquecível, do nosso ponto de vista, como são inesquecíveis, vitória após vitória, todos os momentos que fomos vivendo nesse crescendo de alegria que a Selecção nos deu. Do ponto de vista desportivo, queria unicamente, em nome do CDS-PP, agradecer sinceramente o vosso trabalho. E uma vez que os jogadores não puderam estar aqui, queria pedir-lhe, Sr. Comendador, que dê um abraço aos "nossos rapazes" em nosso nome, porque eles mereceram.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Do ponto de vista organizativo, quero dizer que o mérito do Euro 2004 é de todos: é do Governo que o preparou e que apresentou a candidatura - e eu felicito, normalmente e com naturalidade, o Eng. José Sócrates como uma das pessoas que mais se empenhou nessa candidatura; mas é também do Governo que o organizou, que felicito nas pessoas do Sr. Ministro José Luís Arnaut, do Sr. Ministro Marques Mendes, como Ministro dos Assuntos Parlamentares, e do Sr. Secretário de Estado do Desporto, Hermínio Loureiro.
Tudo correu impecavelmente. Neste Campeonato Europeu de Futebol fomos mais longe do que alguma vez tínhamos ido; vimos, como eu vi, os nossos adversários saírem derrotados dos estádios mas a

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dizer "adorámos o vosso país, adorámos a vossa gente e estamos convosco até à final"! Vários adversários nossos saíam dos estádios a dizer isso, porque Portugal soube recebê-los, e isso é muito importante para um país turístico como é o nosso!
Mas o desporto continua: seguem-se os Jogos Olímpicos, o Campeonato do Mundo de Futebol e Portugal está na primeira linha da capacidade organizativa! É isso que celebramos hoje, é por isso que queremos felicitar as entidades responsáveis e os responsáveis desportivos.

Aplausos do CDS-PP, do PSD e do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, saudamos a Selecção Nacional presente no Euro 2004 e o seu êxito! Quem não vibrou com os jogos, com o inesperado, com o empréstimo de identidade à vida de um jogo que, por momentos, se sobrepôs a outros jogos da vida? Quem não sentiu o entusiasmo popular, até parecendo, na génese das nossas gentes, na sua identidade, que, na arbitrariedade de uma mundialização iníqua, há, pelo menos, algumas dimensões em que os países se podem afirmar por um prémio igual e num código igual? Talvez reflectindo aquilo que gostariam de ver numa mundialização diferente e talvez assim percebendo que o apego à bandeira fez de nós, por escassos momentos, bandeirantes de novas expedições internas, tributos à identidade, que são aspectos essenciais, que nós marcamos, destes tempos mais recentes.
Sr. Presidente, sem embargo da saudação à Selecção Nacional de Futebol, sem embargo das alegrias que partilhámos, não apagamos as críticas sobre critérios de despesa pública nem outros debates que teremos de ter, nomeadamente sobre as dívidas das autarquias e alguns passivos da realização deste evento. Por outro lado, gostaríamos de acentuar que a reincidência em eventos com projectos de mobilização nacional pode ter aspectos importantes, mas são, em si mesmo, uma efemeridade. O País precisa de projectos de mobilização nacional que não radiquem apenas em eventos, Portugal não pode ser apenas um país de eventualidades! É, por isso, dispensável uma certa retórica à volta daquilo que não é estruturante e que é apenas uma eventualidade.
Sr. Presidente da Assembleia da República, saudamos a Selecção Nacional de Futebol e o seu êxito no Euro 2004. Contudo, fazemos um voto: o de que este êxito desportivo, esta partilha de alegria, leve a um aumento da participação desportiva no nosso país, porque, como sabemos, de ano para ano, e há muitos anos, apesar de êxitos desportivos, a prática desportiva por parte da nossa população, das cidadãs e dos cidadãos, tem vindo a decair. O voto que fazemos é, pois, o de que sejam alteradas políticas de maneira a que se desenvolva a prática desportiva, a prática da cultura física na cidadania portuguesa.

Aplausos do BE e do Deputado do PS Laurentino Dias.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, o PCP não poderia deixar de saudar todos aqueles que, com o seu empenho, com o seu esforço, com a sua dedicação, fizeram deste Campeonato Europeu de Futebol o êxito assinalável que se verificou, tanto no plano desportivo como no planoorganizativo.
Houve quem se referisse a este torneio como um evento mediático, mas foi certamente muito mais do que isso; foi um momento de festa e de exaltação cívica, como disse o Sr. Presidente, que durante semanas exaltou o sentimento de pertença e afectividade do nosso povo para com o nosso país, a sua identidade nacional e a sua bandeira; foi um momento de regozijo e alegria para o País, uma alegria de vitórias que tanta falta tem feito e tanta falta fazia, que não aparece nos outros dias do ano.
Este excelente resultado da Selecção Nacional, o melhor resultado de sempre em competições da modalidade a este nível, é naturalmente algo que saudamos: saudamos os atletas, saudamos a equipa técnica, designadamente e com destaque o seleccionador nacional, a Federação Portuguesa de Futebol, que organizou e dirigiu este torneio, os milhares de voluntários que, com o seu trabalho, deram ânimo e vida a esta organização.
O que, neste momento, todos devemos desejar é a continuação de êxitos para os novos desafios que se aproximam também nesta vertente, designadamente nos Jogos Olímpicos, na qualificação para o Campeonato Mundial de Futebol de 2006, continuando com o fair-play e o espírito competitivo saudável que tem pautado e tem caracterizado a Selecção Nacional.
Estamos perante um acontecimento que mobilizou a população portuguesa e que esteve no centro das atenções do nosso país, da Europa e de todo o mundo. A projecção do País e da sua imagem no plano

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internacional é algo que é de registar e de sublinhar. É, de facto, com muita alegria, que valorizamos este bom resultado.
Queremos também fazer uma referência aos adeptos portugueses, que foram inexcedíveis no apoio à Selecção Nacional, que manifestaram, desde a primeira à última hora, um desportivismo saudável com uma festa que continuou para além do Euro, sem agressividade e sem violência. Foi dos adeptos também, e desde logo, esta festa do desporto.
Pela nossa parte, Sr. Presidente e Srs. Deputados, há igualmente que formular votos no sentido de que este evento deixe marcas para o futuro. Não estamos apenas a falar dos estádios, dos equipamentos, das infra-estruturas, mas sim de muito mais do que isso; falamos, desde logo, com certeza, da experiência acumulada para eventos futuros, que possam ser também uma realidade no futuro próximo, mas falamos de algo que, para nós, é mais importante do que termos muita gente (que já temos) mobilizada para ir ver um belo jogo de futebol: queremos cada vez mais gente a praticar desporto, futebol e outras modalidades. Temos de incrementar a prática desportiva no nosso país. E esta referência, que fazemos aos atletas que não são medalhados, aos técnicos que não são medalhados, que, no dia-a-dia, nos clubes e nas colectividades, vão dando vida ao desporto nacional, que vão promovendo a prática desportiva, que vão instigando os jovens do nosso país a praticar desporto, num país que seja mais saudável e mais amante da prática desportiva, é algo que deve merecer e recolher o empenho e o esforço de novas políticas que têm de ser implementadas.
O desporto é, em si, uma causa nobre e justa. Nós, hoje, estamos em festa; no futuro, temos de ter cada vez mais intervenção, cada vez mais trabalho, para que situações como esta sejam o corolário de uma política nacional de maior prática desportiva, de democratização do desporto. É por isso que nos batemos diariamente.

Aplausos do PCP e do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro Adjunto do Primeiro-Ministro.

O Sr. Ministro Adjunto do Primeiro-Ministro (José Luís Arnaut): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Saudamos a Assembleia da República por esta iniciativa e, principalmente, pela forma vigilante e rigorosa como sempre acompanhou todo o processo relativo ao Euro 2004. Um agradecimento muito especial a todos os Srs. Deputados que integraram a Comissão de Acompanhamento dos Recursos Públicos envolvidos no Euro 2004 e um agradecimento também àqueles que, sendo hoje Deputados, como antigos governantes permitiram viabilizar este evento em Portugal, com especial destaque para os Srs. Deputados José Sócrates e Miranda Calha.
Queria hoje, perante vós, fazer uma referência ao empenho e disponibilidade do Exército, da Força Aérea e da Marinha.
Destaco o trabalho do INEM bem como de todos os que trabalharam na área da saúde, desde a prevenção, passando pelo apoio psicológico, até aos hospitais de retaguarda.
Destaco a excelente prestação dos aeroportos, pois era uma área de particular preocupação - entre 10 de Junho e 5 de Julho, os aeroportos de Lisboa, Porto e Faro, em termos globais, registaram mais de 19.600 movimentos, por onde passaram qualquer coisa como 1,7 milhões de passageiros.
Ainda em termos de transportes, deixo um destaque especial à CP, à Refer, ao Metro de Lisboa e do Porto, à Carris e à Fertagus, bem como aos diversos serviços de transportes urbanos de todas as cidades envolvidas no Euro 2004.
Deixo, igualmente, uma referência para os serviços de apoio a visitas protocolares, pois acompanharam, de forma inexcedível e permanente, as cerca de 60 personalidades, desde casas reais, Parlamento Europeu, Comissão Europeia e vários membros de Governos e de diversos Parlamentos, que visitaram o nosso país.
Em matéria de segurança, faço uma referência muito especial, de reconhecimento e de agradecimento sincero, a todas as forças - PSP, GNR, Polícia Judiciária, SEF, SIS -, bem como a todas as entidades privadas que, com eficácia, colaboraram.
Uma palavra, ainda, para o sistema de justiça, que se mostrou sempre disponível e eficaz.
Uma última referência, muito especial, aos 4800 voluntários, sem os quais, sem a sua participação activa, a sua simpatia, a sua disponibilidade e competência o Euro 2004 jamais teria sido o que foi. Esse trabalho foi coordenado pelo Instituto Português da Juventude, que organizou, igualmente com sucesso, a animação das festas das cidades.
Dois minutos é muito pouco, mas é o tempo suficiente para vos dizer que fomos capazes.
Fomos capazes no domínio da organização. E, a esse nível, personalidades insuspeitas da UEFA e da FIFA consideraram o Euro 2004 o melhor campeonato europeu de futebol de sempre.

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Na pessoa do Dr. Gilberto Madaíl, cumprimento todos aqueles que trabalharam e que se disponibilizaram dedicadamente a esta organização.
Fomos também capazes no domínio desportivo. A nossa Selecção, liderada por esse grande homem que dá pelo nome de Scolari, foi simplesmente brilhante. Parabéns a todos eles.
Fomos igualmente capazes como povo. Provámos que somos um pequeno país e um pequeno território mas somos uma grande Nação. O povo português foi extraordinário. Ele permitiu o sucesso do Euro 2004. Por isso, obrigado Portugal.

Aplausos do PSD, do PS e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Sr. as e Srs. Deputados, julgo que, de alguma forma, este voto já foi aclamado. Mas, para que se cumpram as formalidades, vou submetê-lo à votação.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Aplausos gerais, de pé.

Sr.as e Srs. Deputados, nem só de momentos de grande entusiasmo e euforia se faz a vida de uma Nação. A comunidade nacional, nos últimos dias desta fase tão entusiástica, foi atingida, tendo sofrido sentidamente, com o falecimento da grande escritora Sophia de Mello Breyner Andresen, uma das mais distintas da língua portuguesa do século XX. Também foi Deputada à Assembleia Constituinte e guardo dela uma recordação indelével.
Poucas são as pessoas que obtêm aquele reconhecimento público, que as faz serem tratadas apenas pelo seu nome próprio. Sophia faz parte do património da língua portuguesa, faz parte do património de Portugal.
Saúdo os seus familiares aqui presentes.
Vou ler, com especial gosto, o voto de pesar n.º 190/IX - De pesar pelo falecimento de Sophia de Mello Breyner Andresen, que é subscrito por todos os grupos parlamentares e por mim próprio e que é da autoria do Sr. Vice Presidente e Deputado Manuel Alegre.
"'O artista não é, e nunca foi, um homem isolado que vive no alto de uma torre de marfim. O artista, mesmo aquele que se coloca à margem da convivência, influenciará necessariamente, através da sua obra, a vida e o destino dos outros.' Estas são palavras de Sophia de Mello Breyner Andresen, ou simplesmente Sophia, nome que se tornou sinónimo de poesia e que, pela sua obra e pela sua vida, influenciou como poucos o nosso destino colectivo.
A poesia foi, no dizer de Sophia, a sua explicação com o universo. Detestou sempre as palavras da literatura. Reabilitou a palavra poética e o sentido mágico do poema. A sua escrita foi uma constante perseguição do real. Por isso, está carregada de sabores, de cheiros, dos rumores da casa onde há sempre um deus fantástico, de pássaros que cantam no jardim, de memórias, de vivências, da presença-ausência do mar, das procelárias, dos ventos, dos barcos e dos barros, das ânforas, dos ofícios, dos rostos. E também dos homens, das suas cadeias, das suas injustiças, dos seus combates. Como ela própria diz: 'O poema não fala de uma vida ideal mas de uma vida concreta.' E nesse seu falar a transfigura. É a busca de uma 'relação justa com a pedra, com o rio, com a árvore.' E quem procura uma relação justa com as coisas procura 'uma relação justa com o homem.'
E por isso é que Sophia considera que 'a poesia é uma moral' e que 'o poeta é levado a buscar a justiça pela própria natureza da sua poesia.' Este é outro aspecto essencial da poesia de Sophia: o rigor, a comunhão, a partilha, a inteligência e a intransigência da liberdade e da justiça, a contenção, a tensão e a atenção, como sinal de exigência e da responsabilidade perante si e os outros.
Como os gregos antigos, ela achava que a poesia devia ter um sentido didáctico e pedagógico. Cantou a liberdade por uma necessidade íntima. Denunciou 'o tempo de silêncio e de mordaça' e disse que 'Nunca choraremos bastante quando vemos/O gesto criador ser impedido.' Falou do 'velho abutre que alisa as suas penas' e cujos discursos 'têm o dom de tornar as almas mais pequenas.' Criticou a guerra colonial e pediu 'A paz que nasce da verdade/A paz que nasce da justiça/A paz chamada liberdade/A paz sem vencedores e sem vencidos.'
Sophia nunca se encerrou em qualquer torre de marfim. Esteve sempre do lado dos que lutaram pela liberdade e pela justiça. Foi chamada à Pide, mas ninguém conseguiu impedi-la de fazer ouvir sempre a sua voz, reclamando 'uma vida limpa e um tempo justo' e uma Pátria de 'luz perfeita e clara.' Saudou a essência do 25 de Abril em quatro versos que hoje todos sabem de cor. Mas alertou contra a demagogia e aquilo a que chamou 'o capitalismo das palavras.'
Participou na fundação da democracia, como Deputada do Partido Socialista à Assembleia Constituinte.

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Apoiou activamente as candidaturas de Mário Soares e Jorge Sampaio à Presidência da República, de cujas Comissões de Honra fez parte. Esteve em muitos outros combates, antes e depois do 25 de Abril.
Assim foi Sophia, aquela que disse: 'A terra onde estamos - se ninguém a atraiçoasse - proporia/Cada dia a cada um a liberdade e o reino.'
O que dela fica é o esplendor da sua escrita. Mas fica também a beleza da sua pessoa e da sua vida.
A Assembleia da República presta homenagem a esta grande voz da poesia, da liberdade e de Portugal, sem dúvida uma das grandes vozes portuguesas de todos os tempos, e apresenta as mais sentidas condolências aos seus filhos Miguel, Isabel Sophia, Maria, Sophia e Xavier, aos seus netos e a toda a sua família."
Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Alegre.

O Sr. Manuel Alegre (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Caros Xavier, Sophia, Maria, Isabel Sophia: Na missa de corpo presente, Frei Bento Domingues disse que, quando morrem, os artistas e os poetas são injustiçados, porque se fala das obras e se esquece as pessoas.
Eu não esqueço a pessoa de Sophia, não esqueço a beleza e a grandeza da sua pessoa, nem a festa e o milagre da sua amizade.
Também não esqueço que Sophia passou por esta Casa como Deputada do PS na Assembleia Constituinte.
Mas agora ela está na eternidade, enquanto houver língua portuguesa e enquanto houver poesia.
E não diria mais nada. Creio que este é o momento de fazer ouvir a palavra de Sophia.
"Dizer que a obra de arte faz parte da cultura é uma coisa um pouco escolar e artificial. A obra de arte faz parte do real e é destino, realização, salvação e vida.
Sempre a poesia foi para mim uma perseguição do real. Um poema foi sempre um círculo traçado à roda de uma coisa, um círculo onde o pássaro do real fica preso. E se a minha poesia, tendo partido do ar, do mar e da luz, evoluiu, evoluiu sempre dentro dessa busca atenta. Quem procura uma relação justa com a pedra, com a árvore, com o rio, é necessariamente levado, pelo espírito de verdade que o anima, a procurar uma relação justa com o homem. Aquele que vê o espantoso esplendor do mundo é logicamente levado a ver o espantoso sofrimento do mundo. Aquele que vê o fenómeno quer ver todo o fenómeno. É apenas uma questão de atenção, de sequência e de rigor.
E é por isso que a poesia é uma moral. E é por isso que o poeta é levado a buscar a justiça pela própria natureza da sua poesia. E a busca da justiça é desde sempre uma coordenada fundamental de toda a obra poética. Vemos que no teatro grego o tema da justiça é a própria respiração das palavras. Diz o coro de Ésquilo: 'Nenhuma muralha defenderá aquele que, embriegado com a sua riqueza, derruba o altar sagrado da justiça.' Pois a justiça se confunde com aquele equilíbrio das coisas, com aquela ordem do mundo onde o poeta quer integrar o seu canto. Confunde-se com aquele amor que, segundo Dante, move o sol e os outros astros. Confunde-se com a nossa confiança na evolução do homem, confunde-se com a nossa fé no universo. Se em frente do esplendor do mundo nos alegrarmos com paixão, também em frente do sofrimento do mundo nos revoltamos com paixão. Esta lógica é íntima, interior, consequente consigo própria, necessária, fiel a si mesma. O facto de sermos feitos de louvor e protesto testemunha a unidade da nossa consciência.
A moral do poema não depende de nenhum código, de nenhuma lei, de nenhum programa que lhe seja exterior, mas, porque é uma realidade vivida, integra-se no tempo vivido. E o tempo em que vivemos é o tempo duma profunda tomada de consciência. Depois de tantos séculos de pecado burguês a nossa época rejeita a herança do pecado organizado. Não aceitamos a fatalidade do mal. Como Antígona, a poesia do nosso tempo diz: 'Eu sou aquela que não aprendeu a ceder aos desastres.' Há um desejo de rigor e de verdade que é intrínseco à íntima estrutura do poema e que não pode aceitar uma ordem falsa.
Mesmo que o artista escolha o isolamento como melhor condição de trabalho e criação, pelo simples facto de fazer uma obra de rigor, de verdade e de consciência, ele irá contribuir para a formação duma consciência comum. Mesmo que ele fale somente de pedras ou de brisas, a obra do artista vem sempre dizer-nos isto: que não somos apenas animais acossados na luta pela sobrevivência mas que somos, por direito natural, herdeiros da liberdade e da dignidade do ser.
Acima de tudo estamos reunidos por aquilo a que o padre Teilhard de Chardin chamou a nossa confiança no progresso das coisas.
E não há nada que possa separar aqueles que estão unidos por uma fé e por uma esperança."

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.

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A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: De si, disse Sophia: "A terra, o sol, o vento, o mar/São minha biografia e são meu rosto/Por isso não me peçam cartão de identidade/Pois nenhum outro senão o mundo tenho/Não me peçam opiniões nem entrevistas/Não me perguntem datas nem moradas/De tudo quanto vejo me acrescento/E a hora da minha morte aflora lentamente/Cada dia preparada".
A voz de Sophia continuará, assim, em muitos de nós, a quem iniciou no espaço sem limites da sua poesia.
A força escultórica da palavra do seu poema teceu o real e o imaginário de muitas gerações, que aprendemos na depuração da palavra, a liberdade imensa que nenhum ditador proíbe ou silencia.
O poema a levará no tempo.
"Quando eu já não for eu passarei sozinha/Entre as mãos de quem lê/Mesmo que eu morra o poema encontrará/Uma praia onde quebrar as suas ondas".
Sophia avisou-nos que um dia acontece a partida, mas também o regresso, porque "Ressurgiremos ali onde as palavras/São o nome das coisas".
A palavra que foi, na sua vida, um registo de permanente tensão entre "Palavras sempre ditas com paixão/E pelo concreto silêncio limpo das palavras/Donde se erguem as coisas nomeadas/Pela nudez das palavras deslumbradas".
Aqueles que entrámos no seu território poético celebrámos com ela um pacto de descoberta alquímica da vida que foi construção das nossas próprias. Com ela interceptámos o visível, atingimos o interior do mundo e descobrimos o porquê das coisas, a ordem e a desordem do real.
Fizemo-lo "Por um país de pedra e vento duro/Por um país de luz perfeita e clara/Pelos rostos de silêncio e de paciência/Que a miséria longamente desenhou".
Sophia disse um dia: "Aquele que vê o espantoso esplendor do mundo é logicamente levado a ver o espantoso sofrimento do mundo (…). E é por isso que o poeta é levado a buscar a justiça pela própria natureza da sua poesia".
Sabemos que Sophia construiu esse pacto voluntário e solidário.
Longe das Torres de Marfim, mesmo nesse tempo "Da selva mais obscura/(onde)O ar azul se tornou grades/E a luz do sol se tornou impura/Tempo de medo e de traição/Tempo de injustiça e de vileza/Tempo de escravidão".
Disse Sophia: "Sou um escritor, a minha vocação é contar e não explicar, a arte não explica, implica".
Foi assim a sua vida.
Saiu à rua, agarrou pela palavra a intervenção cívica e política, sagrou a liberdade, contra a opressão.
"Porque os outros vão à sombra dos abrigos/E tu vais de mãos dadas com os perigos/Porque os outros calculam, mas tu não".
Porque a madrugada tão esperada viria em Abril, como "o dia inicial inteiro e limpo/Onde emergimos da noite e do silêncio/E livres habitamos a substância do tempo".
Nesta casa de um país de muitos homens e mulheres que não renunciaram, esteve também Sophia partilhando, comungando um outro tempo. Celebrou "a vitória: a treva/Foi exposta e sacrificada em grandes pátios brancos/O grito (…) purificou a cidade".
Era o ano de 1975 e ela tomou a palavra ali, na bancada do Partido Socialista, para dizer: "A cultura é uma das formas de libertação do homem. Por isso, perante a política, a cultura deve sempre ter a possibilidade de funcionar como anti-poder".
Por isso, estamos aqui, dizendo-lhe que nenhuma coisa se perdeu e com ela reaprendemos que a liberdade se renova e se defende na claridade e nas trevas de cada dia que vivemos.
Nestes dias de hoje, preocupados, incertos, expectantes, Sophia, a tua partida convocou-nos. Por isso estamos aqui hoje, e tu dirias, mais uma vez, tranquilamente, que os políticos constroem muito e também discursos, em vez do necessário. Mas hoje, desculpa-nos, é um dia diferente. Tu, Sophia, ocupaste o Parlamento e a política foi poesia.
À sua família, o Grupo Parlamentar do PCP envia as suas mais sentidas condolências.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Morais.

A Sr.ª Teresa Morais (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Sophia de Mello Breyner Andresen morreu.
Excepcional escritora e poetisa, deixou em todos nós uma imensa mágoa, a mágoa de ver partir alguém inesquecível, verdadeiramente insubstituível, como são todos os grandes poetas, como são todos os seres especiais.
Unida ao mar, ao vento e à lua, num pacto misterioso e encantador, descobriu a fórmula aparentemente perfeita de comunicar com a natureza e transmitiu-nos de um modo único esse caminho num percurso

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literário de mais de 50 anos.
Sophia escreveu sobre a beleza, a vida, o amor, a liberdade. Sophia era a própria beleza na imagem e na palavra e uma voz autêntica e genuína da própria liberdade.
Destacou-se na resistência à ditadura, empenhou-se na construção da democracia, como Deputada à Assembleia Constituinte e, depois, à Assembleia da República.
Foi uma mulher inteira, verdadeira e livre.
Consagrada pelos mais prestigiados prémios da crítica internacional, traduzida em inúmeras línguas, condecorada pela República. Todos os prémios foram merecidos, todos honrosos, todos foram poucos para o que lhe devemos.
Deixou uma vastíssima obra, que, para nosso bem, podemos recordar.
Quero destacar os livros chamados para crianças, que muitos adultos nunca esquecerão. A este propósito, permitam-me uma brevíssima nota pessoal: no dia da sua morte, e como forma de aligeirar, dei comigo a pensar como poderia eu homenagear Sophia e julgo que encontrei uma forma feliz de o fazer. Entrei numa livraria e saí com a fantasia na palma da mão: A Menina do Mar, A Fada Oriana, A Floresta e O Cavaleiro da Dinamarca. Ofereci-os à minha filha, que tem três anos, que não terá a felicidade de conhecer Sophia, e expliquei-lhe que aqueles livros foram escritos por uma linda mulher que partiu para longe, mas quis deixar às crianças um presente precioso para toda a vida.
O Grupo Parlamentar do PSD exprime o seu mais profundo pesar pelo falecimento de Sophia de Mello Breyner Andresen, uma enorme perda para todos nós e para a cultura portuguesa, e apresenta à sua família o seu profundo desgosto.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quando, daqui a algum tempo, olharmos para o passado dos dias que estamos a viver, sentiremos talvez que houve emoção desportiva e uma crise política, mas perceberemos sobretudo que, nestes momentos, ficamos mais pobres do futuro.
A perda de Sophia, "musa incandescente" - dizia Eduardo Lourenço -, diminuiu a cultura portuguesa tanto quanto a engrandeceu em vida a obra que nos deixou.
Para Sophia a poesia é essencial, a poesia é iluminação, a poesia é claridade, é magia e é acção.
Sophia, a sua família, a sua tradição anti-miguelista, anti-autoritária e contra a guerra, representou o melhor de Portugal durante toda a sua vida. Contra Salazar, "O velho abutre é sábio e alisa as suas penas/A podridão lhe agrada e seus discursos/Têm o dom de tornar as almas mais pequenas". Contra a guerra, contra a incompetência, contra a insensatez.
Sophia propôs-se transformar o mundo, porque sabia que só vive o mundo quem transforma esse mundo. Dizia ela: "Sei que seria possível construir o mundo justo/As cidades poderiam ser claras e lavadas" - e essa possibilidade era o seu programa -/"A terra onde estamos - se ninguém atraiçoasse - proporia/Cada dia a cada um a liberdade e o reino/Na concha na flor no homem e no fruto" - e esse era o seu programa, dela Sophia -/"Sei que seria possível construir a forma justa/De uma cidade humana que fosse/Fiel à perfeição do universo" - e esse programa era a escrita, era a poesia, era a força da palavra -/"Por isso recomeço sem cessar a partir da página em branco/E este é meu ofício de poeta para a reconstrução do mundo".
Devemos a Sophia ter começado, com outros, junto de outros, melhor do que outros, o que ninguém nunca acabará - a reconstrução do mundo. Fê-lo em nome de si própria, em nome de nós todos, por essa religião da luz e da esperança, que era ela própria, Sophia, a reconstrução do mundo.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Penso que tudo o que se pode dizer de Sophia corre o risco de excesso ou de escassez e da perda desse equilíbrio que Sophia tanto prezava.
Porventura, depois de tantas palavras ditas, aquilo que eu gostaria de lembrar é Sophia, ela própria, como A Menina do Mar. E, se calhar, lembrando A Menina do Mar, aquilo que me ocorre neste momento são as suas palavras e devolver-nos todos nós àquilo que ela própria escreveu nesse magnífico e belíssimo texto que acompanhou gerações e gerações, que povoou o nosso imaginário, que nos encantou, que foi a invisível companhia na nossa meninice, na dos nossos filhos e, seguramente, será, por muitas e muitas gerações, uma relíquia imensa que todos jamais deixaremos de partilhar.
E essas palavras são precisamente desse maravilhoso texto sobre a saudade: "Saudade é a tristeza que fica em nós quando as coisas de que gostamos se vão embora". Este comentário é, seguramente, aquele que me ocorre num momento, que é de dor, da partida de alguém que é imenso na poesia, na literatura e

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que é um grande património não só de Portugal, não só da língua portuguesa, mas também, seguramente, um património universal.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sinto-me demasiado pequeno para falar dessa grande Portuguesa, dessa grande Mulher, dessa grande Poeta, que foi Sophia.
Escreveu Eduardo Lourenço que ela nasceu predestinada para ser aquilo que foi, a começar pelo nome do seu baptismo. Dizia Eduardo Lourenço: "Sophia - sabedoria mais funda do que o simples 'saber', conhecimento íntimo, ao mesmo tempo atónico e luminoso do essencial, comunhão silenciosa e sem cessar reverberante com aquilo que, por original, a reflexão e os seus intérminos labirintos deixarão intactos". E assim foi toda a vida de Sophia.
Como diz o luminoso texto do Manuel Alegre que vamos votar, "O que dela fica é o esplendor da sua escrita. Mas fica também a beleza da sua pessoa e da sua vida". O esplendor da sua escrita, nós vimo-lo por estes dias elogiado e transcrito em inúmeras homenagens no profundo sentimento de respeito e de íntimo conhecimento que o povo português sente como que brotando do seu inconsciente, dos seus maiores.
No meio da sadia "loucura" e da alegria que o Euro 2004 trouxe - o povo parecia embriagado ao viver as nossas vitórias nos relvados -, no momento em que se soube que Sophia tinha deixado de existir, de repente, o País estremeceu, os jornais, todos eles, tanto os de esquerda como os de direita, os tablóides e os de referência, de artes e letras, dedicaram as suas primeiras páginas a esta grande figura da intelectualidade, escritora, poeta política e, acima de tudo, uma pessoa de enorme sensibilidade social, uma pessoa ideologicamente forte, uma pessoa que nunca se vergou perante os oportunismos ou os interesses.
Criticou tudo quanto quis criticar; criticou a esquerda quando foi preciso verberá-la; atacou sempre a direita; admoestou os amigos quando foi preciso chamá-los ao capítulo e louvou-os quando era preciso estimulá-los.
Na inteireza do seu carácter, era a pessoa que personificava aquilo que aqui hoje foi posto mais em destaque - o seu profundo sentido de justiça. Justiça na sociedade e como exigência da sua própria vida; justiça perante a sua família; justiça perante a vida dos que sofrem e são desprotegidos; justiça perante os amigos; justiça perante o País, como tarefa do Estado; e, acima de tudo, diria mais que tudo, a liberdade, a liberdade de ser o que foi e continuará a ser onde estiver.
Gostava de viajar, gostava de contemplar tudo quanto era português. Pude testemunhar a alegria que ela sentiu, por exemplo, quando chegou a Goa e pôde ver, por uns dias, aquela terra que, depois de 40 anos de silêncio sobre a retirada de Portugal, soube vibrar, como vibrou agora no Euro 2004. Também sei que lá na minha terra, Goa, se parou uns instantes quando se soube que Sophia já lá não voltaria mais, à mesma terra, às mesmas praias, ao mesmo mar tropical.
Por isso Sophia nos faz falta. Faz-nos falta nestes dias, em que é preciso escrever o grande poema do Euro. Só pela pena dela havia de ficar para a eternidade essa grande loucura colectiva, essa grande alegria que vivemos por uns dias pelo mundo português. Sophia partiu exactamente quando nós mais precisávamos da sua pena para deixar uma lembrança poética do Euro.
À família de Sophia vão os meus sinceros pêsames.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Luís Marques Mendes) - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Há coisas que se fazem porque é necessário fazer, e há outras que se fazem porque dá gosto fazer. É o caso desta minha pequena, mas sentida, intervenção, para, em nome pessoal e do Governo, prestar homenagem, associando-nos ao voto que esta Câmara vai votar relativamente a Sophia de Mello Breyner.
A homenagem, desde logo, à mulher combatente da liberdade e da justiça, como ficou patente, durante anos, na sua obra, no seu exemplo, na sua atitude, nas suas palavras, na sua passagem, há muitos anos, por esta Casa.
A homenagem à escritora de excepção já aqui lindamente recordada por tantos, à poetisa de rara beleza, a alguém que marcou, marca e marcará, de uma forma indelével, a nossa poesia, a nossa cultura.
Já aqui foi dito muito de importante, embora fique sempre muito por dizer. O confronto permanente entre opostos, o bem e a justiça, por um lado, o mal e a injustiça por outro, é, na minha opinião, uma das características mais marcantes da sua obra invulgar.
Mas o confronto entre a verdade e o fingimento é, porventura, dos traços de maior força da sua escrita,

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da sua poesia e é por muitas destas e muitas outras razões que pessoas como Sophia de Mello Breyner não morrem. Dir-se-á que a cultura portuguesa fica mais pobre, mas pessoas assim não morrem, vivem e viverão sempre, sobretudo enquanto as virtudes da justiça, da beleza, da verdade e da harmonia perdurarem entre os homens.
Por isso, a homenagem à sua obra e à mulher que partiu e a solidariedade à sua família, que pode ter orgulho em Sophia que agora nos deixou.

O Sr. Presidente: - Sr.as e Srs. Deputados, vamos votar o voto n.º 190/IX, que acabámos de discutir.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Sr.as e Srs. Deputados, peço a todos que se levantem, mas, desta vez, não peço que façam um minuto de silêncio, porque Sophia, grande poetisa, não morreu, devemos-lhe um grande aplauso.

A Câmara aplaudiu, de pé, durante 1 minuto.

Srs. Deputados, passamos ao voto n.º 191/IX - De congratulação pela elevação da paisagem da cultura da vinha do Pico ao estatuto de Património Mundial, apresentado pelo PCP, PSD, PS, CDS-PP, BE e por Os Verdes.
Antes de dar a palavra à Sr.ª Deputada Judite Jorge para se pronunciar sobre o mesmo, peço que respeitem o tempo atribuído a cada grupo parlamentar, que é de 2 minutos.
Tem a palavra, Sr.ª Deputada Judite Jorge.

A Sr.ª Judite Jorge (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Ao falar da paisagem da cultura da vinha do Pico, ao falar da sua consagração como património mundial, peço-vos licença para um registo pessoal e emocionado.
Este é um tema em que não posso, nem quero, ser neutra.
Nasci nessa ilha a que Raul Brandão chamou magnética; cresci no meio dessas vinhas que hoje são de toda a Humanidade, retalhos de verde entre o negro, muito negro, do basalto.
Sou herdeira dos que há mais de 500 anos chegaram a essa ilha, então selvagem, e desbravaram matos, abriram caminhos, levantaram paredes e tiveram a força e a coragem de transformar a bravia terra de lava em terra de pão e vinho e vida.
Sou irmã dos que, hoje, com tenacidade, suor e amor à terra, transportam viva essa memória; sou irmã dos que, em labuta incansável, conservam intacta e cuidada essa paisagem que é arte, paisagem que é história, paisagem que é expressão do homem local, paisagem que é espírito do homem universal.
Quando falamos da classificação pela UNESCO da paisagem da cultura da vinha do Pico é disto que falamos: do homem que povoou o Pico, do homem que no Pico se perpetuou e no Pico inaugurou um modo de ser tão sabiamente singelo, tão humanamente rico, tão exemplarmente são e generoso que Vitorino Nemésio, desse homem do Pico, disse ser a "nata do insulano", pois que "nenhum açoriano se lhe avantaja na concepção séria da vida, temperada, embora, por uma ingenuidade que é o segredo do triunfo nas lides a que se entrega".
A UNESCO não acaba de classificar uma paisagem natural, embora os elementos naturais dessa paisagem se mantenham em grande medida intocados.
Do que esta classificação trata é, sobretudo, da paisagem construída: vinhedos e adegas em perfeita sintonia com a natureza rude e prodigiosa. O que agora se consagra Património Mundial é uma paisagem fruto do labor e do carácter do português do Pico. Essa paisagem ilustra a minha, a nossa cultura, e é relato do homem autêntico, do homem integral.
Assim, para mim, este não é apenas um voto de congratulação, é um voto de confiança em Portugal, nos portugueses, porque um Portugal que pode oferecer ao mundo a prova de uma fibra humana tão verdadeira é, Sr.as e Srs. Deputados, um Portugal que está vivo, um Portugal que está de saúde, um Portugal a que podemos brindar com um copo de verdelho do Pico.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, este voto de congratulação é subscrito, como eu já disse, por todos os grupos parlamentares, mas partiu da iniciativa do Grupo Parlamentar do PCP, daí, portanto, eu apenas ir dar a palavra ao Sr. Deputado António Filipe em último lugar.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luiz Fagundes Duarte.

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O Sr. Luiz Fagundes Duarte (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Disse Vitorino Nemésio que nos Açores a geografia vale tanto como a História. E nós que lá nascemos, que lá vivemos, ou que por lá passámos, outra coisa não poderemos dizer: mais do que um conjunto de ilhas, os Açores são, na verdade, uma realidade geocultural que é necessário conhecer e preservar, até porque Portugal sem os Açores seria um país incompleto.
Conscientes que estão desta sua condição histórica no seio da mãe Pátria, os açorianos sempre têm procurado preservar o seu património seja ele cultural ou natural, porque, nos Açores, eles são as duas páginas de uma folha do grande livro do património português, onde se encontram registados, dia a dia, ano a ano, sismo a sismo, vulcão a vulcão, a memória de um povo que faz das fraquezas força, do isolamento solidariedade, do abandono progresso.
Agora, por iniciativa do Governo Regional dos Açores, vemos a paisagem da cultura da vinha da ilha do Pico receber a classificação de Património Mundial pela UNESCO, e aqui não estamos perante um mero monumento construído pelo homem ou esculpido pela natureza. Estamos, todos o sabemos, perante um imenso monumento que atesta a relação do homem com o seu meio envolvente, do homem com a natureza, do homem com a sua História, do homem com o seu todo. E nos Açores, parafraseando Ortega y Gasset, "o homem com toda a força e todo o merecimento é ele e as suas circunstâncias".
O Grupo Parlamentar do Partido Socialista subscreve este voto e orgulha-se por ter sido um governo do Partido Socialista a conseguir esta vitória que dignifica Portugal e que se deve, de um modo decisivo, à intervenção directa, constante e firme do Presidente Carlos César, e da sua equipa, que daqui cumprimentamos…

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - … e recordamos, em homenagem, o esforço do povo que no passado moldou a paisagem da vinha da ilha do Pico e o esforço daqueles que hoje a conservam e a valorizam para o futuro.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: É com muita honestidade que aqui nos congratulamos hoje, sem qualquer motivação política pelo voto que é apresentado. Um voto que nos honra a todos e cujo objecto, certamente, não é obra de ninguém em particular, até por razão da sua grandeza e do tempo que levou a consegui-la.
Sendo que é, por vezes, da adversidade que nascem as grandes obras, a paisagem da cultura da vinha do Pico é efectivamente um exemplo disto mesmo. Da adversidade da terra, das condicionantes da natureza, fizeram os naturais da ilha, e não só, uma grande obra; uma obra que hoje o mundo reconhece através da ONU, não apenas para orgulho dos Açores, não apenas, certamente, para orgulho de quem preside aos destinos do arquipélago mas, com toda a certeza, para orgulho de todo o Portugal e, seguramente até, para orgulho de todos aqueles que trabalhando, de forma muito árdua, a terra todos os dias permitiram que assim sucedesse.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Por este facto, também neste momento e através destes votos nos congratulamos, na certeza de que o faremos tantas vezes quantas estas razões do orgulho nacional o justifiquem.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para encerrar o debate, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, como V. Ex.ª já referiu, o Grupo Parlamentar do PCP, tomou a iniciativa de propor este voto - e congratulamo-nos muito com o facto de ele ser subscrito por todos os grupos parlamentares - quando tivemos conhecimento de que a paisagem da cultura da vinha do Pico tinha sido elevada ao estatuto de Património Mundial em reunião da UNESCO, realizada precisamente este mês. E fizemo-lo porque considerámos que esta é uma questão que, naturalmente, honra todo o País. Honra muito especialmente a população da ilha do Pico, as pessoas que ao longo de sucessivas gerações, com o seu esforço, o seu trabalho, a sua abnegação, construíram esta notável obra, mas honra também o triângulo insular em que a ilha do Pico se situa, a Região Autónoma dos Açores, e, fundamentalmente,

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o País inteiro. Daí entendermos que a Assembleia da República não deveria deixar de se associar, através da aprovação de um voto de congratulação, a este reconhecimento como património mundial.
Portanto, as palavras que agora aqui queremos deixar são fundamentalmente de saudação, de felicitação, em primeiro lugar, para as populações da ilha do Pico e, em segundo lugar, para as autarquias envolvidas e para os órgãos de governo próprio da Região Autónoma dos Açores, esperando que as populações possam beneficiar com esta elevação a património mundial, que este património possa ser valorizado e que todos nos possamos, obviamente, congratular, ainda mais, com este reconhecimento.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não há mais oradores inscritos, mas, antes de encerrar o debate do voto n.º 191/IX, quero também associar-me ao seu teor e felicitar, muito vivamente, as autoridades açorianas, os autarcas e todo o povo do Pico, porque, aliás, como muito bem foi dito, por vários oradores, este enriquecimento refere-se a todo o nosso país ou até à Humanidade, dado que se trata, de facto, de uma evidência, de um labor de gerações e gerações, durante séculos. Está ali, sem dúvida alguma, quase se pode dizer, o sangue, suor e lágrimas de todo um povo, que assim é preservado como exemplo para futuro.
Vamos, então, votar o voto n.º 191/IX - De congratulação pela elevação da paisagem da cultura da vinha do Pico ao estatuto de Património Mundial (PCP, PSD, PS, CDS-PP, BE e Os Verdes).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

É o seguinte:

Voto n.º 191/IX

De congratulação pela elevação da paisagem da cultura da vinha do Pico ao estatuto
de Património Mundial

A paisagem da cultura da vinha do Pico foi elevada ao estatuto de Património Mundial, em reunião do Comité do Património Mundial da ONU para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO) realizada na cidade japonesa de Suzhou no passado dia 2 de Julho do presente ano de 2004.
A decisão, tomada por unanimidade, implica que a paisagem da vinha do Pico fique a partir de agora sujeita a um plano de gestão próprio, seja alvo de legislação específica e beneficie de apoios financeiros acrescidos para a recuperação de vinhas abandonadas e requalificação de edifícios, abrangendo não apenas os currais de vinha mas igualmente as adegas, casas solarengas e zonas de produção de outras culturas.
O estatuto agora conferido valoriza substancialmente a ilha do Pico, o triângulo insular em que a ilha montanha está inserida, a Região Autónoma dos Açores e Portugal, constituindo motivo de congratulação para as autarquias envolvidas, para os órgãos de governo próprio dos Açores e para este órgão de soberania que representa todos os portugueses, sobretudo aqueles que, ao longo de séculos, sangraram as mãos na dureza da lava, plantaram o seu ganha-pão e, curral a curral, torreão a torreão, construíram a paisagem que o mundo agora reconhece ser dignamente protegida.
A Assembleia da República, reunida em Plenário em 8 de Julho de 2004, congratula-se com a elevação da cultura da vinha do Pico ao estatuto de Património Mundial e felicita o povo da ilha do Pico, as autarquias envolvidas e os órgãos de governo próprio dos Açores por esse honroso reconhecimento.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, antes de passarmos ao período destinado a declarações políticas, peço ao Sr. Secretário que anuncie, para que conste, os diplomas que, entretanto, deram entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: projectos de lei n.os 475/IX - Elevação de Alvarães à categoria de vila (PS), que baixou à 4.ª Comissão, 476/IX - Elevação da povoação de Vilar dos Prazeres, no município de Ourém, a vila (PSD), que baixou à 4.ª Comissão, 477/IX - Elevação da vila de Valbom à categoria de cidade (PSD), que baixou, igualmente, à 4.ª Comissão, e 478/IX - Elevação da vila de Castelo da Maia à categoria de cidade (PSD), que baixou à 4.ª Comissão; e projecto de resolução n.º 272/IX - Quadro e conteúdos funcionais do pessoal da Comissão Nacional de Protecção de Dados (PSD, PS, CDS-PP e PCP).

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O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, em nome do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, tem a palavra o Sr. Deputado Medeiros Ferreira.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr.as e Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do Partido Socialista realizou as suas Jornadas Parlamentares na cidade de Ponta Delgada. Estas Jornadas, nos Açores, demonstraram que o Partido Socialista está pronto para ser chamado a governar, após eleições antecipadas.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Estas Jornadas tiveram por lema "Junto das Pessoas" e por objectivo a análise do estado da Nação e do estado da Região Autónoma dos Açores. Esta análise destinava-se a preparar o grupo parlamentar para o debate anual sobre o estado da Nação, o qual estava programado para o Plenário da Assembleia da República de ontem.
Porém, a crise política instalada a nível nacional, com a demissão abrupta do Primeiro-Ministro Durão Barroso, alterou a agenda parlamentar, e esta é apenas a menor das consequências daquela demissão.
À alteração da normalidade do funcionamento da vida política portuguesa e à óbvia instabilidade política introduzida no Governo formado pela coligação de direita, responde o Partido Socialista com a manutenção das suas actividades programadas e com a sua presença firme e constante na procura de respostas para a crise política, económica e social gerada por dois anos de governo de direita.

Aplausos do PS.

Mantiveram-se, pois, estas Jornadas Parlamentares mas o seu espírito alterou-se para um debate mais aberto e largo, na perspectiva de preparar o Partido Socialista para qualquer eventualidade a curto prazo, nomeadamente para a antecipação de eleições legislativas.
O País necessita de um governo para quatro anos. Como disse Carlos César, nessas Jornadas, é preferível uma campanha eleitoral para um governo novo do que um velho governo em campanha eleitoral.

Aplausos do PS.

Hoje compreende-se melhor a recusa do Primeiro-Ministro do Luxemburgo em aceitar ser o elemento de consenso, como presidente da Comissão Europeia. Poupou, assim - o Primeiro-Ministro do Luxemburgo -, o seu país a uma crise política facultativa e exportou para outros a avaliação do "deve/haver" da operação.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!

O Orador: - Não foi este o entendimento de Durão Barroso. Enquanto anunciava o candidato português António Vitorino, não resistiu à cativação do seu nome, após a eliminação de outros primeiros-ministros. Como foi dito pelo Deputado Jorge Strecht, nesta Assembleia, o convite foi honroso, a sua aceitação já não tanto.
A crise política aberta em Portugal, com a decisão de Durão Barroso, deve, contudo, terminar com a tentação de se escolher um presidente da Comissão de entre os membros em exercício do Conselho Europeu. Até porque esse recrutamento do presidente da Comissão Europeia entre os próprios decisores pode introduzir elementos perversos e dificuldades acrescidas no futuro. Na resolução da crise política assim aberta, também se deve ter em conta este contributo português para uma teoria da decisão mais sadia no Conselho Europeu - uma espécie de aviso contra a endogamia política.
Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr.as e Srs. Deputados: O Governo de Durão Barroso encontrou uma fórmula original de se furtar ao balanço do seu mandato e à sua apreciação negativa nesta Assembleia da República no fim da Sessão Legislativa.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Uma vergonha!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - A apresentação desse balanço nas Jornadas Parlamentares do PS revelou que o Governo do PSD/PP não resolveu qualquer das questões a que se tinha proposto.

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Assim, quanto ao equilíbrio orçamental, nada de estrutural foi conseguido na possível redução da despesa e no necessário aumento de receitas e do investimento público. Também se apresentam desertos os resultados noutros domínios, como os da educação, da ciência e investigação e da sociedade do conhecimento, sectores tão importantes para uma mais qualificada inserção europeia e mundial dos portugueses.

Aplausos do PS.

Não é só no futebol que podemos ir mais além, Sr. Presidente.

Risos do PS e de Os Verdes.

Pelo contrário, como durante estas Jornadas ficou demonstrado, o Governo PSD/PP, primeiro, transformou uma questão orçamental numa recessão económica e, agora, mergulhou o País numa crise política. Uma sucessão de desastres!
Entretanto, aumentou o desemprego em todas as regiões do País, com a excepção da Região Autónoma dos Açores. Os cerca de 120 000 desempregados, em dois anos, alçam a percentagem de desemprego na República para 6,4%, enquanto que, nos Açores, o desemprego passou de 8%, em 1995, para 2,9%, em 2003.

Aplausos do PS.

Por contraste com o balanço do PSD e do PP, que mergulham o País na recessão e na incerteza, o estado da Região Autónoma dos Açores apresenta-se com um considerável crescimento. A comparação entre os dois modelos de governo demonstra a maior capacidade do Partido Socialista para fazer face à crise política, financeira, económica e social, da responsabilidade da malfadada coligação de direita.

Aplausos do PS.

Risos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Malfadada?!

O Orador: - Malfadada, no sentido de com falta de sorte.
O clima de recessão económica e de crise política que se vive a nível nacional não tem consequências mais graves nos Açores graças ao modo eficiente como se aplicam, naquela região, os valores e as políticas do Partido Socialista.

O Sr. Carlos Rodrigues (PSD): - Aprenderam com a Madeira!

O Orador: - O Partido Socialista saúda daqui os obreiros ancestrais da consagração, que se acaba de celebrar, a estatuto de Património Mundial da paisagem da cultura da vinha do Pico, bem como o Governo Regional.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - E, já agora, quem plantou a vinha!

O Orador: - Com o exemplo do Partido Socialista/Açores bem presente, as Jornadas Parlamentares permitiram um debate alargado sobre - e chamo a atenção dos Srs. Deputados - uma "alternativa de esperança" para Portugal, para a qual estamos a trabalhar.

O Sr. António José Seguro (PS): - Muito bem!

O Orador: - O PS não descuida o princípio da subordinação dos interesses particulares ao interesse geral e ao bem comum e deposita, num funcionamento eficaz dos poderes públicos, grande parte do seu esforço político e organizativo.
O progresso e o desenvolvimento serão obra de todos os cidadãos, com um Partido Socialista aberto às pessoas e à sociedade.

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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O PS sai das Jornadas Parlamentares de Ponta Delgada mais bem preparado para constituir uma "alternativa de esperança" para os portugueses e garantir…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, esgotou-se o tempo de que dispunha.

O Orador: - Estou mesmo a terminar, Sr. Presidente.
Como estava a dizer, o PS sai das Jornadas Parlamentares de Ponta Delgada mais bem preparado para constituir uma "alternativa de esperança" para os portugueses e garantir uma alternância tranquila do poder em Portugal.
Virar à esquerda é natural com o Partido Socialista. É este apelo dos Açores, lançado pelo PS, que queremos fazer chegar a todo o País. É necessário um bom governo de Portugal, liderado por um Partido Socialista que aprendeu com as lições do passado e do presente.
Junto das pessoas e com os cidadãos, estamos prontos para governar Portugal nestes tempos difíceis.
O Partido Socialista diz "presente!" ao anseio generalizado de eleições antecipadas.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Medeiros Ferreira, previno-o de que se inscreveram, para pedir esclarecimentos, cinco Srs. Deputados.
Tem a palavra, em primeiro lugar, a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Medeiros Ferreira, retive, da sua intervenção e das Jornadas Parlamentares do Partido Socialista realizadas na Região Autónoma dos Açores, variadíssimos recados, digamos assim, e mensagens, uma das quais é a de que o Partido Socialista está pronto a operar uma alternância tranquila. Espero que, mais do que uma alternância tranquila, seja simultaneamente uma alternativa, e uma alternativa interrogativa e inconformada. É este, sinceramente, o meu voto.
Mas a minha pergunta, Sr. Deputado, tem a ver com algo que sublinhou na sua intervenção e que me parece politicamente relevante. E sobre esta questão, até porque sobre ela muitos cidadãos se interrogam, gostaria de ouvir a sua opinião.
O Sr. Deputado revelou as condições em que o ex-Primeiro-Ministro de Portugal decidiu aceitar a sua condição de presidente acidental da Comissão Europeia: depois de várias recusas, que, aliás, foram protagonizadas por outros primeiros-ministros que não aceitaram fugir às responsabilidades e aos compromissos que tinham nos seus próprios países.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Bem lembrado!

A Oradora: - Tenho para mim que não é, seguramente, tranquilo, nem um factor de estabilidade política, qualquer outra solução que não seja a devolução aos cidadãos da capacidade de escolher. E isto porque não me parece que possa ter legitimidade política quem se furta ao confronto - e criou essas condições por sua livre escolha e liberdade -, quem se furta a, no plano político, aqui, na Assembleia da República, prestar contas, no âmbito daquilo que, hoje, era suposto ser um debate sobre o estado da Nação. O falhanço é óbvio! Não me parece que possa ter qualquer legitimidade ou sustentação, do ponto de vista político e ético, qualquer novo governo que venha a ser constituído de forma administrativa, com um novo líder, um novo candidato que não se apresentou a eleições,…

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - A Sr.ª Deputada apresentou-se às eleições?!

A Oradora: - … por uma coligação que, como tal, não falou verdade perante as pessoas e que teria de submeter um novo programa de governo, também ele, ao Parlamento.
Dito isto, pergunto se, em sua opinião, a estabilidade é importante para que, finalmente, haja uma visão prospectiva e uma solução dos problemas das pessoas, capaz de melhorar a sua vida e não continuar a agravá-la, como esta maioria permitiu e qualquer outra solução que não seja a de eleições encerrará, ela própria, um factor de instabilidade e de perturbação no nosso país.

Vozes de Os Verdes: - Muito bem!

O Sr. José Junqueiro (PS): - Boa pergunta!

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O Sr. Presidente: - Partindo do princípio de que o Sr. Deputado Medeiros Ferreira pretende responder no fim de cada um dos pedidos de esclarecimento, tem a palavra.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Deduziu muito bem a minha posição, Sr. Presidente. De facto, é assim que pretendo fazer.

O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado. Conheço muito bem V. Ex.ª e há muitos anos.

Risos.

O Orador: - Em primeiro lugar, agradeço à Sr.ª Deputada Isabel Castro as considerações que fez e a questão fundamental que me colocou, a qual resumo do seguinte modo: estará o Partido Socialista preparado para uma alternância de poder? Está, Sr.ª Deputada! O Partido Socialista aprendeu com as lições do passado; aprendeu com a sua própria experiência governativa e com a sua experiência como grande partido da oposição, nestes dois anos. E com esta síntese de experiências, quer no Governo, quer a fazer oposição à coligação de direita, terá, certamente, um novo projecto para apresentar aos portugueses.
Em segundo lugar, no que diz respeito à solução política para a actual crise, só gostaria de dizer que creio que o sistema está viciado desde as eleições antecipadas de há dois anos. Essas eleições obrigam a que o País vá, de novo, a eleições. É dessa transparência que o sistema político necessita neste momento, não só por razões de ordem doutrinária mas também por razões de ordem conjuntural.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Extraordinário!…

O Orador: - O País está numa grande crise económica e social e basta andar na rua para se ver como os portugueses anseiam por corrigir o voto de 2002.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!

O Orador: - Um voto, aliás, forçado na direita.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Forçado?!

O Orador: - Sim! Um voto forçado, um voto sugerido, um voto com base numa campanha eleitoral em que até um Chefe do Estado-Maior da Armada deu ordens para que os navios da Armada portuguesa encostassem ao Alfeite por falta de verbas.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - E, portanto, os eleitores, aqueles destituídos mentais, votaram mal!

O Orador: - Essa sugestão, de que o País, num momento tão grave, estava a ser incapaz de garantir a sua segurança marítima, teve, certamente, efeitos na opinião pública.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): - Isso é que é respeito pelos eleitores!…

O Orador: - Foi um pronunciamento, foi sim, senhor! Se têm qualquer dúvida, eu não tenho!
Também o facto de ter havido, nessa altura, uma interpretação restritiva dos critérios estritos do Pacto de Estabilidade e Crescimento teve um efeito óbvio no voto dos portugueses. E foi por isto que o Partido Socialista, logo após o resultado destas eleições - estou à vontade para o referir porque esta foi uma das primeiras conversas que tive o Secretário-Geral Eduardo Ferro Rodrigues -, começou a lutar para alteração desses critérios do Pacto de Estabilidade e Crescimento e das suas normas de avaliação.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Era para não cumprir!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço-lhe que conclua, pois já esgotou o tempo de que dispunha.

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O Orador: - Concluo já, Sr. Presidente.
Esperemos que, agora, o novo presidente da Comissão Europeia, Durão Barroso, esteja também atento a esta nova mudança dos critérios do Pacto de Estabilidade e Crescimento.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Medeiros Ferreira,…

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Não vale a pena esforçar-se muito que a coligação é com o Bloco de Esquerda!

O Orador: - … as causas da crise política em que o País está mergulhado são conhecidas. O ainda Primeiro-Ministro, embora em gestão, Dr. Durão Barroso, na noite das eleições europeias, anunciou que iria ler os sinais do eleitorado, e se bem o pensou melhor o fez: aproveitou a primeira oportunidade para, interpretando esses sinais, abandonar o Governo.
Crise económica e social já tínhamos, da responsabilidade do Governo liderado pelo Dr. Durão Barroso, passámos a ter o que ainda não tínhamos, uma crise política. E, neste momento, temos uma crise em todas as vertentes, uma crise económica e social e também uma crise política, da responsabilidade exclusiva do Dr. José Manuel Durão Barroso.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Temos é uma crise na oposição!

O Orador: - Por isso esta maioria tem tanto receio que, neste momento, seja dada a voz ao povo, que seja o povo a ter um veredicto para pôr termo à crise que o País atravessa.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - O povo fala de quatro em quatro anos! É o que diz a Constituição!

O Orador: - Coloca-se aqui a questão da estabilidade política, sobre a qual eu gostaria de interrogar o Sr. Deputado Medeiros Ferreira.
Curiosamente, a preocupação com a estabilidade parece surgir da parte da maioria, que é em exclusivo responsável pela falta de estabilidade política em que o País presentemente se encontra, pela falta de estabilidade que o País vive a todos níveis.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Parece que a direita está muito preocupada com a estabilidade do nosso país!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Temos uma instabilidade enorme!

O Orador: - Sr. Deputado, qual é a melhor garantia de estabilidade no momento em que nos encontramos? É viabilizar um governo de uma maioria em que os portugueses manifestamente já não confiam,…

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Ai, não?! Como é que sabe?!

O Orador: - … como ficou claramente demonstrado pelos resultados das eleições europeias de há três semanas?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - É um governo chefiado por um presidente de câmara itinerante - aliás, neste momento, o município que lidera está numa situação manifestamente pior do que aquela em que estava quando foi eleito presidente de câmara? E este governo irá realizar uma campanha eleitoral, de um ano e meio, até às eleições legislativas de 2006.
Será esta a melhor solução para garantir a estabilidade do País ou, pelo contrário, a melhor garantia será a de dar de imediato a palavra aos portugueses para que sejam eles a pronunciarem-se sobre a solução

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política e governativa que querem para os próximos quatro anos?
É esta a questão que lhe deixo, Sr. Deputado Medeiros Ferreira.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Medeiros Ferreira.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, a minha resposta é muito simples: só eleições antecipadas poderão clarificar e permitir a ultrapassagem da actual crise política, tanto mais que, parafraseando alguém, eu sei que haverá eleições antecipadas,…

Vozes do PSD: - Sabe?!

O Orador: - … só não sei quando.

Risos do PS.

Vozes do PSD: - Ah!…

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - É capaz de ser em 2006!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - A outra coisa que não sabe é quem vai ganhar!

O Orador: - Portanto, deste ponto de vista, havendo quase a certeza absoluta de que daqui até Outubro de 2005 haverá certamente eleições antecipadas…

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Em 2006!

O Orador: - Não, eu disse Outubro de 2005 e sei o que estou a dizer!
Como eu estava a dizer, havendo quase a certeza absoluta de que daqui até Outubro de 2005 haverá certamente eleições antecipadas, creio que a melhor solução é clarificar desde já esta situação política. Aliás, não percebo por que é que o PSD (em relação ao PP ainda percebo) tem tanto receio de ir às urnas!

Vozes do PSD: - Está enganado! Não tem, não!

O Orador: - Qual é o problema que têm com o povo português neste momento? Não se sentem bem amados? Não se sentem muito amados pela população portuguesa? Têm alguns indicadores de que o povo está desafecto a VV. Ex.as?

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Olhe que, às vezes, o "tiro sai pela culatra"!

O Orador: - E, portanto, deste ponto de vista, não tenho qualquer dúvida de que a solução que permitiria ultrapassar a crise política seria a de convocar eleições. O povo português já deu sinais suficientes de que não quer a direita no governo, pelo que terá de se encontrar uma outra maioria nesta Assembleia.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Ó diabo!…

O Orador: - A tal alternância tranquila, Sr. Deputado, será conseguida, certamente, com o resultado do Partido Socialista nas eleições, capaz de chamar a si só a maioria absoluta, como se indica…

Aplausos do PS.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, façam o favor de guardar silêncio por forma a ouvirmos as conclusões do Sr. Deputado Medeiros Ferreira, e estamos todos ansiosos por isso.

O Orador: - Portanto, o PS irá lutar por uma maioria absoluta nas próximas eleições, mas uma coisa vos garanto: não ficaremos auto-limitados por qualquer tabu de ordem política.

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Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para formular o seu pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Medeiros Ferreira, como eleito pelo círculo eleitoral dos Açores, tinha uma responsabilidade acrescida de, como resultado das jornadas parlamentares do seu partido, ter trazido aqui algo de novo. Porém, nada trouxe de novo, mantém o mesmo disco…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Em novidades ninguém bate o PSD!

O Orador: - Lamento que não tenha conseguido imprimir esse iodo atlântico que nós, insulares, conseguimos emprestar à vida política nacional.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Deputado esteve a fazer comparações do incomparável. Esteve a comparar a situação actual com o momento em que o Eng.º Guterres abandonou o governo, dizendo que, nessa altura, houve eleições antecipadas e que, consequentemente, agora também deverá haver. Só que o Sr. Deputado esquece-se de diferenças fundamentais. A primeira delas é que o Eng.º Guterres fugiu, abandonou o governo.

Risos do PS.

Vozes do PSD: - É verdade!

Vozes do PS: - Não é, não!

O Orador: - O Dr. Durão Barroso traz um valor acrescentado, que é o de assumir a presidência da Comissão Europeia como a escolha, apenas e só, de 25 Chefes de Estado e de Governo da União Europeia, que VV. Ex.as tratam como entes menores, para não dizer pior do que isto, na sua opção e na escolha que fizeram.
Sr. Deputado Medeiros Ferreira, há uma outra diferença: nós estamos aqui, e estamos coesos, para continuar o nosso trabalho - uma maioria capaz de dar cobertura a um governo e de concluir a Legislatura.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

E há uma injustiça que não faço, a de dizer que foi apenas o Eng.º Guterres que fugiu. Não! Foram os senhores todos que fugiram!

Risos do PS.

Os senhores fugiram todos com o Eng.º Guterres!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Sr. Deputado Medeiros Ferreira, já chega da conversa de que havia uma pequena crise orçamental e de que nós é que criámos a recessão económica!

Vozes do PS: - É verdade!

O Orador: - Sr. Deputado, tenho em meu poder o Decreto-Lei n.º 60/2002, de 20 de Março, sobre o regime jurídico dos fundos de investimento imobiliário, em cujo preâmbulo se pode ler: "A importância das alterações que o presente diploma consagra para o reforço da eficiência, integridade, (…), particularmente importantes num momento de recessão económica, (…)". Sabe quem assinou este diploma? Nada mais nada menos do que o Sr. Eng.º António Guterres, o Sr. Dr. Guilherme d'Oliveira Martins e o

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seu líder parlamentar, António José Seguro.

Risos do PSD e do CDS-PP.

Pergunto-lhe, Sr. Deputado: tem V. Ex.ª a coragem de, perante a Câmara, reconhecer que a recessão económica existente foi a que herdámos dos senhores e que, agora, felizmente, estamos a sair dela graças à acção do nosso Governo?

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Medeiros Ferreira.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Guilherme Silva, como Deputado eleito pelo círculo eleitoral da Região Autónoma da Madeira,…

Vozes do PS: - Não parece!

O Orador: - … tem uma particular emulação sempre que falo.

Vozes do CDS-PP: - Emulação?!

O Orador: - Presumo que isso se deva exactamente à emulação entre insulares. Saúdo, deste ponto de vista, a sua pronta reacção.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Preferia, como diria o Sr. Presidente, uma cumplicidade oculta!

O Orador: - Transparente! Gosto de cumplicidades transparentes!
Sr. Deputado, relativamente ao que afirmou, gostava, muito rapidamente, de lhe dizer várias coisas.
Em primeiro lugar, o Eng.º António Guterres foi talvez o primeiro português a recusar a possibilidade de ser presidente da Comissão Europeia.

O Sr. António José Seguro (PS): - Ora bem!

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Orador: - Incomoda-vos?!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, peço-vos que deixem falar o orador.

O Orador: - O Eng.º António Guterres foi convidado e tinha muitas hipóteses…

Protestos do PSD.

Por que é que não me deixam finalizar?

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - As actas da União Europeia têm outra versão!

O Orador: - Portanto, se o Eng.º António Guterres tem aceite, lá se teria perdido a oportunidade de o Dr. Durão Barroso ter aceite o início de um processo de consenso…

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Ah! O início!

O Orador: - Como o Dr. Durão Barroso! Como o Dr. Durão Barroso, que aproveitou, maliciosamente, o nome de um honrado Comissário Europeu, o Dr. António Vitorino, para se insinuar na negociação…

Aplausos do PS.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

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Sim, sim! Têm alguma dúvida?!

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Usou a técnica utilizada no atletismo e na maratona! Foi o facto de haver uma candidatura portuguesa, um comissário português prestigiado como António Vitorino…

Protestos do PSD.

Lembram-se de alguma referência, na imprensa internacional, a outros comissários portugueses na Comissão Europeia?

Protestos do PSD.

Qual é o grande Comissário português referido constantemente na imprensa de referência internacional? António Vitorino!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Por isso o apoiámos!

O Orador: - Srs. Deputados, quero dizer-vos, muito rapidamente…

Vozes do PS: - Estão muito inquietos!

O Orador: - É verdade! Estão muito inquietos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, peço-vos que não interrompam o orador, pois há muitos Srs. Deputados inscritos para usarem da palavra e temos uma ordem do dia muito extensa.
Faça favor de prosseguir, Sr. Deputado.

O Orador: - Srs. Deputados, relativamente ao facto de o vosso bem amado líder, este grande educador do povo, ter deixado abruptamente as funções de Primeiro-Ministro para ir para a Comissão Europeia, quero dizer-vos que só desejo que o seu mandato, no caso de vir a ser empossado, seja feliz e eficaz, critério que se verá daqui a cinco anos, para o caso de ele poder ser, ou não, eleito uma outra vez.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - E a recessão económica?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se. Faça o favor de terminar.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Caro Deputado e Presidente do Grupo Parlamentar do PSD, há também uma coisa que todos os portugueses sabem neste momento: o PS não fugiu, está presente e pronto a disputar eleições! Os senhores é que não estão!

Aplausos do PS.

Risos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se. Peço-lhe que conclua, senão terei de desligar o microfone.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Esta recessão económica era internacional, agora é nacional!

Aplausos do PS.

Risos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.

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O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Medeiros Ferreira, em primeiro lugar, quero agradecer-lhe, sinceramente, a sua intervenção, que tem, logo à partida, dois méritos. O primeiro foi o de nos dar a conhecer os trabalhos das jornadas parlamentares do PS realizadas nos Açores, das quais, não fosse a intervenção de V. Ex.ª, pouco nos teríamos apercebido (sou completamente sincero nesta matéria).

O Sr. António José Seguro (PS): - Vamos convidá-lo para a próxima!

O Orador: - O segundo mérito foi demonstrar-nos o enorme entusiasmo que vai na sua bancada e o enorme empenho com que o PS está neste momento.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Vê-se!

O Orador: - O Sr. Deputado, em cada resposta que dá, diz: eleições antecipadas… eleições antecipadas… eleições antecipadas.
Há uma enorme contradição entre quem diz, e tem andado a dizer (tive ocasião de ouvir as vossas declarações, designadamente as do Secretário-Geral do Partido Socialista à saída do Palácio de Belém), que é preciso serenidade, tranquilidade e não fazer pressões e, depois, vem para aqui passar metade da tarde a clamar por eleições antecipadas.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Exactamente!

O Orador: - Há um processo que está a decorrer, os partidos foram ouvidos,…

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Exactamente!

O Orador: - … cada um disse o que muito bem entendeu, concorde-se ou não (nós não concordamos convosco e os senhores não concordam connosco), e os argumentos estão expendidos.
Sr. Deputado Medeiros Ferreira, pergunto-lhe: não considera que este é o momento para ter calma,…

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - … para deixar o Sr. Presidente da República fazer a sua reflexão serenamente, aguardar por essa decisão e respeitá-la, como dissemos desde o início, seja ela qual for?

Vozes do CDS-PP: -Muito bem!

O Orador: - É, provavelmente, o momento para isso.

Protestos de Deputados do PS e do Deputado do PCP António Filipe.

Mas já que o senhor insiste em algumas malfadadas ideias, não deixarei de lhe dizer que, na essência do seu discurso, V. Ex.ª acaba por fazer a diferença entre o que é a maioria e o que é o Partido Socialista.
V. Ex.ª disse que o Eng.º António Guterres foi convidado, ou melhor, teria tido a hipótese de ser presidente da Comissão Europeia e que recusou. A seguir o Eng.º António Guterres tinha a hipótese de ter continuado a governar o País, mas também recusou.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Exactamente!

O Orador: - Mais: sabemos até que houve um momento em que o Partido Socialista poderia ter indicado um novo Primeiro-Ministro para continuar a governar o País, o que também recusou.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Exactamente!

O Orador: - Esta é a diferença entre nós, Sr. Deputado Medeiros Ferreira: os senhores recusam, recusam, recusam, e nós assumimos, não fugimos e queremos continuar a governar Portugal.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

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É a diferença absoluta! O senhor encontrou essa diferença absoluta, os meus parabéns por isso.
Há uma questão de legitimidade. Há, Sr. Deputado. E a maioria não teme coisa alguma, mas acredita que tem não só a obrigação de continuar como o dever de o fazer, porque os mandatos são de quatro anos, estamos a meio de um mandato e queremos ser julgados no final desse mesmo mandato.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Como é evidente!

Vozes do PSD: - Exactamente!

O Orador: - Para terminar, pergunto-lhe ainda duas coisas…

O Sr. Presidente: - O seu tempo acabou, Sr. Deputado. Peço-lhe que conclua.

O Orador: - São só mais 10 segundos, Sr. Presidente.
Pergunto-lhe, Sr. Deputado, se V. Ex.ª tem ouvido os economistas, os industriais, os responsáveis económicos, que dizem duas coisas: primeiro, há sinais de retoma; e, segundo, é bom que a estabilidade se mantenha.
Para terminar, Sr. Deputado, quero dizer-lhe o seguinte: V. Ex.ª está muito animado com a ideia das eleições, mas, se eu fosse a si, retirava o "equídeo da pluviosidade", porque, seja qual for a decisão, nunca tivemos medo de eleições, logo V. Ex.ª não deve tomar os resultados como tão certos. Nunca tivemos medo de eleições e, se calhar, vai ver que se engana, e nós voltaremos a ganhar.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Medeiros Ferreira.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Sr. Presidente, começo por saudar o Sr. Deputado Telmo Correia, Presidente do Grupo Parlamentar do CDS-PP, e por dizer que, à primeira vista, vejo que o CDS-PP não tem receio de disputar eleições, encoberto nas listas da coligação,…

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Quem é que disse isso? Ninguém disse isso!

O Orador: - … o que, para nós, é um dado a ter também em conta.
Portanto, a haver eleições, o CDS-PP lá estará, mais uma vez, em coligação com o PSD,…

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Isso não é problema seu!

O Orador: - … a contar os seus Deputados como adquiridos e a atribuir as culpas por qualquer diminuição do número destes ao próprio PSD, como já fez nas eleições para o Parlamento Europeu.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Afinal quem é que está com medo?

O Orador: - Em relação ao facto de o Sr. Deputado não ter tido notícia do apelo dos Açores e das jornadas parlamentares do Partido Socialista realizadas na Região Autónoma dos Açores, não me admira, porque o CDS-PP não escuta o que vem dos Açores.

Aplausos do PS.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Está a ser injusto para com o Dr. Mota Amaral!

O Orador: - Portanto, Sr. Deputado Telmo Correia, tive muito gosto em dar-lhe essas notícias dos Açores, porque as vão ter cada vez menos, sobretudo a partir das eleições regionais.
Por outro lado, Sr. Deputado Telmo Correia, não vejo como é que pode falar de declarações à saída do Palácio de Belém,…

O Sr. António José Seguro (PS): - Muito bem!

O Orador: - … quando as declarações feitas pelo seu líder…

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O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - E pelo seu!

O Orador: - … sobre o que o Presidente da República deveria ou não fazer é, antes de mais, um acto de indelicadeza política,…

Vozes do PS: - Claro!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - E então as vossas declarações e atitudes?!

O Orador: - … porque, em princípio, quando vamos à sede de um órgão de soberania, devemos fazer declarações consentâneas com o facto de estarmos a ser recebidos por esse órgão de soberania.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - E as suas declarações hoje? Aqui, onde estamos, não é um órgão de soberania?!

O Orador: - Aqui não!…

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Não?! Esta Casa não é um órgão de soberania?!

O Orador: - Ó Sr. Deputado, eu lutei para que a Assembleia da República fosse um órgão de soberania,…

Vozes do PS: - Nessa altura os senhores nem cá andavam!!

O Orador: - … como dificilmente é capaz de encontrar muitos mais.
Portanto, em relação à Assembleia da República e ao seu papel entre os órgãos de soberania em Portugal, acho que estamos esclarecidos daqui por diante.
Não creio ainda que seja compreensível que o CDS-PP olhe para o Partido Socialista como um partido que está intranquilo. Pelo contrário, o Partido Socialista é aquele que diz aos portugueses que está a preparar uma alternativa de esperança,…

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Vê-se!

O Orador: - … que está a preparar uma alternativa de tranquilidade, que está a preparar um programa de governo…

Vozes do CDS-PP: - Para daqui a quanto tempo?!

O Orador: - … assente na experiência que tivemos com algumas negociações com o CDS-PP quando éramos governo.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Exactamente!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo está largamente esgotado. Peço-lhe que conclua de imediato.

O Orador: - Portanto, deste ponto de vista, creio que o CDS-PP terá muito a perder.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Medeiros Ferreira, nós partilhamos o desejo de eleições antecipadas para clarificar a situação política, para terminar com o "pântano", para que haja escolhas claras de um governo que era irremodelável, de políticas que eram inalteráveis e de situações, que foram confirmadas nas eleições europeias, sobre aquilo que podemos pressentir de novas maiorias sociais.
Todavia, a legitimidade formal não estava esgotada, ela esgota-se com a demissão do Primeiro-Ministro, provocando uma crise política. E, neste aspecto, a sua intervenção foi clara: o responsável pela crise política é o Primeiro-Ministro demissionário, Dr. Durão Barroso.

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Contudo, a direita tem-se refugiado em argumentos, em larga medida mistificatórios, sobre a relevância do cargo que o Dr. José Manuel Barroso aceitou na União Europeia, o de presidente da Comissão, deixando subentender a existência de uma relevância nacional, de uma imbricação com um desígnio nacional, com um mandato que terá a ver com a soberania portuguesa, e que isto seria a razão da aceitação de tal cargo. Além de que, leviana e ligeiramente, alguns dirigentes do PSD têm agora chamado ao Dr. José Manuel Barroso "presidente da União Europeia", como se tal cargo existisse, e reparei até que na sua intervenção falou da perversidade da nomeação inter pares do Conselho Europeu e do que isto poderá significar na arquitectura da União Europeia em próximo ou mais longínquo futuro.
Mas esta questão é absolutamente relevante.
Há uma aceitação pessoal que desencadeia uma crise política e, contudo, isto não é feito em nome de Portugal, como nos querem fazer crer, terá sido, supostamente, em nome do interesse europeu, de um consenso actualmente dominante mas que não ilibe a crise política que foi criada e que está substancialmente colocada em planos completamente diferentes. E é a não aceitação desta tese que leva, sistemática e mistificatoriamente, a direita a dizer sempre que não há uma crise política - Santana Lopes chama-lhe até "uma não questão".
Em todo o caso, Sr. Deputado Medeiros Ferreira, creio que seria importante acentuar não só isto, para que não restem dúvidas às portuguesas e aos portugueses sobre a responsabilidade da crise política, mas também o arrojo com que se fala aqui do condicionamento da posição do Sr. Presidente da República. Isto porque quando um documento extensíssimo do CDS-PP, que foi divulgado à comunicação social como tendo sido entregue ao Sr. Presidente da República, diz expressamente que se a decisão for no sentido da realização de eleições antecipadas será uma sabotagem à candidatura do Primeiro-Ministro demissionário, estamos conversados sobre aquilo que significa o condicionamento da posição do Sr. Presidente da República.
Batemo-nos por eleições antecipadas e aceitamos os poderes constitucionais do Sr. Presidente da República; contudo, não fazemos pressão sobre a posição do Sr. Presidente da República.
Sr. Deputado Medeiros Ferreira, estaremos ou não em condições de poder, desta forma,…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se.

O Orador: - … apresentar a verdade aos portugueses?
É esta a questão que directamente lhe coloco.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Medeiros Ferreira.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Sr. Presidente, começo por saudar o Sr. Deputado Luís Fazenda e por felicitar, já que tenho a oportunidade de o fazer em público, o Bloco de Esquerda pelo resultado…

Vozes do PSD: - Oh!…

O Orador: - … eleitoral que obteve nas últimas eleições europeias.

Risos do PSD e do CDS-PP.

Este é um dado significativo, que quer dizer que o Governo e as políticas de direita têm vindo a dividir o País em dois pólos, aliás desiguais, um mais pequeno, que é o de direita, e um outro cada vez maior, que é o de esquerda.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Ora, esse resultado das eleições para o Parlamento Europeu tem muito a ver, embora indirectamente, com o acumular de factores da crise política.
Na verdade, na noite das eleições, o Primeiro-Ministro, Durão Barroso, disse que não iria fugir, que não se iria demitir de Primeiro-Ministro por causa do resultado dessas eleições, mas o certo é que, ao primeiro pretexto, saiu de Primeiro-Ministro e criou um problema, não para nós, porque estamos prontos para eleições antecipadas, mas para a coligação de direita,…

O Sr. Luiz Fagundes Duarte (PS): - Estão com medo!

O Orador: - … que deve estar bastante aflita, neste momento, em relação à possível decisão do Sr.

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Presidente da República.
Uma coisa é certa: o Partido Socialista não faz pressão sobre o Presidente da República;…

Vozes do PSD: - Não?!…

O Orador: - … limita-se a dizer, claramente, que está pronto a governar Portugal e que, em sua opinião, deve haver eleições antecipadas.
O nosso respeito pelo Presidente da República e pela decisão que ele irá tomar é um respeito político e institucional. É um respeito político porque o Presidente da República nasceu entre nós politicamente.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Ah!…

O Orador: - Sim, há mais de 40 anos que ele é um homem de empenhamento cívico responsável. Ele não foi dos que fizeram de conta que não havia ditadura em Portugal!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Portanto, temos todo o respeito pelo Presidente da República! O que o Partido Socialista diz ao Presidente da República é que quer eleições antecipadas e que está pronto a governar imediatamente - é o contrário da tese de "não queremos governar", e o País está numa situação difícil. Mas respeitaremos a decisão do Sr. Presidente da República, e a normalidade da vida democrática também estará assegurada através da atitude do Partido Socialista.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quanto mais se prolonga a crise mais se generaliza a convicção popular de que a convocação de eleições antecipadas é indispensável, não só porque esta é a solução que garante a legitimidade democrática de um novo governo e respeita a vontade popular soberana, mas também porque cada vez mais portugueses querem pôr fim a esta política e a este Governo e exigem a possibilidade de escolher um outro caminho.
A justa reivindicação de convocação de eleições não se funda, pela nossa parte, em interesses partidários, é uma exigência de interesse nacional, indispensável para abrir a possibilidade de um futuro melhor para os portugueses e para o País.
É que, independentemente de todas as considerações sobre a crise política desencadeada pela demissão do Primeiro-Ministro, a verdade é que este Governo é responsável pelo afundamento do País numa gravíssima crise económica e social.
Foi este Governo que, com a sua política de espartilho orçamental e consequente diminuição do investimento e restrição dos salários e reformas dos portugueses, acentuou a crise económica. Mais do que isso: a política do Governo condiciona a retoma económica. As previsões apontam para que o crescimento da economia portuguesa venha a ser, mais uma vez, inferior ao da média europeia, o que quer dizer que continuaremos a estar sujeitos à divergência em relação às economias dos restantes países da União Europeia. A sistematicamente anunciada retoma arrisca-se a não ser mais do que uma pálida amostra do que o País necessitaria e a consolidar, de facto, o atraso de Portugal em relação aos restantes países da União Europeia.
Foi este Governo que, com a sua política, provocou a mais alta taxa de crescimento do desemprego da União Europeia, havendo perspectivas de que continuará a aumentar.
Foi este Governo que acentuou a desigualdade na distribuição da riqueza, que degradou reformas e salários mais baixos, mas que, ao mesmo tempo, aumentou os benefícios fiscais da banca e do sector financeiro.

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Bem lembrado!

O Orador: - Foi este Governo que, afinal, degradou as condições de vida dos portugueses e que, também por isso, deve por eles ser julgado.

Vozes do PCP: - Muito bem!

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O Orador: - É espantoso que este Governo, agora formalmente mas há vários dias politicamente em situação de gestão, tenha o atrevimento de continuar a tomar medidas que condicionam seriamente o futuro do País. É o caso das decisões a propósito de privatizações, da GALP e outras. Ou a transferência de competências das finanças para o Governo Regional da Madeira, aprovada já neste período. Mas também de apressadas nomeações, como a recondução do Presidente da Parpública, ao que parece no dia seguinte a ter assumido o compromisso em relação à privatização da GALP, ou da ex-secretária de Estado da segurança social nomeada em 1 de Julho passado, por 5 anos, para a entidade reguladora do sector eléctrico.
Estas decisões não se enquadram no conceito de "actos estritamente necessários" e são, por isso, inaceitáveis. Pela nossa parte, queremos relembrar que a Assembleia da República mantém todos os poderes de fiscalização do Governo, mesmo que ele seja de gestão, e que os Deputados do PCP os exercerão sempre que entenderem estar em causa a violação da margem limitada de decisão que os executivos têm nesta situação.

Aplausos do PCP.

Entretanto, é visível que a maioria desespera nos seus argumentos.
O mais utilizado é o argumento da estabilidade de que o País precisaria. Mas a verdade é que, mesmo antes da demissão de Durão Barroso, o País não vivia em estabilidade. O País vivia na instabilidade económica e social. Não há estabilidade num país em que o desemprego aumenta para meio milhão de pessoas.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Não há estabilidade num país em que, perante o aumento do custo de vida, descem os salários e as reformas se mantêm degradadas. Não há estabilidade num país que conta com mais de meio milhão de desempregados e 2 milhões de pobres.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Por isso, as eleições antecipadas são um factor indispensável para garantir a estabilidade, porque só elas podem interromper esta política e a acção desta maioria e dar ao povo a hipótese de escolher outro rumo para o seu país.
A estabilidade que a direita pretende garantir é a estabilidade de uma política favorável aos grandes grupos económicos e à banca. Para o povo o que isso significa é a estabilidade na miséria, no desemprego e na pobreza. Quanto mais estabilidade tiver esta maioria, menos estabilidade terão os portugueses nas suas vidas.
Mas em todo este processo ninguém pode esquecer que a instabilidade política que se veio juntar à instabilidade económica e social teve um único responsável: Durão Barroso. Foi o Primeiro-Ministro demissionário que decidiu demitir-se e criou a crise política. Não foi nenhum partido da oposição nem o Sr. Presidente da República.

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Essa é que é essa!

O Orador: - A instabilidade veio da própria maioria e do seu agora deposto líder.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Outro argumento recorrente é o da legitimidade constitucional da maioria para indicar outro governo. Todos os portugueses sabem que a Constituição permite duas decisões ao Presidente da República, mesmo apesar dos esforços da maioria para nos convencer de que só seria aceitável uma solução.
Mas a verdade é que não pode ser ignorado o resultado político das últimas eleições para o Parlamento Europeu, em que a direita coligada averbou a maior derrota de sempre, obtendo apenas um terço dos votos expressos contra 60% do conjunto dos partidos da oposição.
Diz a maioria que não se podem daí retirar consequências para a governação do País. É evidente que o voto de 13 de Junho foi também um voto de protesto contra a política do Governo. Se assim não fosse e se esse resultado nada significasse em relação à situação política nacional, o Primeiro-Ministro demissionário

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não teria dito, na noite das eleições, ter percebido o recado dos portugueses. Tanto percebeu que resolveu ir-se embora. E, se fosse realmente como argumenta a maioria, então, não teriam de recear, como receiam, o voto popular para a eleição de uma nova Assembleia da República.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - E muitos portugueses certamente perguntam se Durão Barroso teria aceite tão facilmente a presidência da Comissão Europeia se não tivesse sido tão negativo o resultado eleitoral da coligação de direita.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - A legitimidade política exige eleições antecipadas. A continuidade de um governo desta maioria seria uma solução sem legitimidade dada pelo povo.
E nem mesmo o argumento da coesão da maioria convence. Tanto é assim que PSD e CDS sentiram necessidade de encenar uma reunião conjunta para ouvir as intervenções dos respectivos líderes, tanto mais que há uma semana assistimos neste Hemiciclo a uma inédita divisão dos partidos da maioria e à primeira derrota do partido maioritário nesta legislatura, provocada pela posição divergente do CDS em relação a um projecto do PCP. É uma coesão precária e apenas alimentada pelo instinto de apego ao poder e da sua manutenção.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Pela nossa parte, nunca nos resignámos à inevitabilidade de esta maioria não poder ser derrotada antes de 2006. Com essa legitimidade, afirmamos que não há que ter medo de eleições antecipadas. É preciso devolver a decisão ao povo, quer porque está aberta uma grave crise política que exige essa legitimação quer porque os portugueses já deram sinais de querer romper com esta política e com este Governo, que já não reúne o apoio popular.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, também para uma declaração política, o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr. Presidente, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados: Não deixa de ser extraordinário que, na última sessão parlamentar, em plena crise política, a direita fuja ao debate, não tenha intervenções políticas, não procure o contraditório aqui, na Assembleia da República, a discussão dos problemas que afligem os portugueses. É um sinal substancial da dificuldade, do nervosismo, da contradição em que a direita está mergulhada nos seus próprios argumentos e, sobretudo, na sua inacção.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, os responsáveis do PPD e do CDS consideram, contra todas as evidências, não existir uma crise política. Apesar da demissão do Governo, Santana Lopes diz que a crise é uma não questão. Será, então, o quê? Uma invenção do Presidente da República? Da oposição? Da generalidade dos cidadãos?
Se a intenção prevista é a vitimização da coligação da direita, só se podem queixar da demissão do Primeiro-Ministro, que abandonou as suas responsabilidades, quebrou os seus compromissos. Aceitou um convite para presidente da Comissão Europeia, ao contrário de outros primeiros-ministros da União Europeia e, até, de outras personalidades. A decisão foi pessoal, não foi nacional.
Mas verifica-se, com estupefacção, que a peça chave na campanha de tentar apresentar a situação de crise política como uma não questão é a valorização do próximo cargo de Durão Barroso como de interesse nacional. O cargo a que se propõe Durão Barroso poderá ser de interesse europeu, de acordo com a política e o consenso dominantes na União Europeia, mas todos sabemos que não tem qualquer acréscimo na quota de influência de Portugal. A leitura simples das coisas mostra mesmo que reforçadamente o presidente da Comissão tem de distanciar-se de interesses nacionais directos para não ferir a imagem de isenção da Comissão. Alguns dirigentes do PPD chegam a apontar José Manuel Barroso como "presidente da Europa", cargo inexistente, e dentro de alguns anos, se entrar em vigor a dita Constituição Europeia, estará vagamente atribuído ao Presidente do Conselho em permanência, nunca ao presidente da Comissão.

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Agitam-se, assim, umas emoções para despertar o orgulho nacional, mas sem rigor e na pura lógica do truque e da patranha política.
Essa campanha de hiperbolização de José Manuel Barroso - absolutamente hipócrita, quando se sabe que a sua base de apoio ficou órfã e disso se queixa em privado e cada vez mais em público - chega ao cúmulo pela atitude do CDS e de Paulo Portas de acusar qualquer decisão presidencial de eleições antecipadas como uma sabotagem da candidatura, ou do trabalho, do ex-Primeiro-Ministro. Como se ficássemos todos pendentes das orientações que, de Bruxelas, José Manuel Barroso nos for dando sobre a política portuguesa, que, a seu tempo, se apressou a abandonar.
O patriotismo de contrafacção fala por si sobre o que é realmente o populismo. A direita decide e manda publicar. Só eles sabem, só eles decretam o que é patriótico, acusando as oposições de anti-patrióticas e envolvendo, até, nessa cominação o próprio Presidente da República. É espantoso!
Se a demissão do Primeiro-Ministro foi a fuga para trás, a campanha de Santana Lopes e Paulo Portas é a fuga para a frente, para o confronto e para a manipulação da opinião pública.
Se a decisão do Primeiro-Ministro, com desculpas de mau pagador sobre a alegada convicção de continuidade da estabilidade política, atenta contra a autonomia e os poderes próprios do Presidente da República, a atitude de força de Santana Lopes e Paulo Portas só pode ser classificada como de arrogância e de inadmissível chantagem, meço a palavra, sobre um órgão de soberania e as suas prerrogativas constitucionais. Não se admirem, pois, de não terem o apoio de vários ex-presidentes do PPD-PSD e de vários ex-presidentes do CDS-PP.
O despudor dessa campanha acintosa atingiu o extremo de o CDS citar parcialmente, e com insidiosa parcialidade, textos de reflexão do Presidente da República sobre as condições de dissolução do Parlamento, omitindo todos os critérios que não eram convenientes para quem está agarrado ao poder pelo poder.
O regime é semi-presidencialista. É escusado tentar acentuar o pendor parlamentarista por razões de interesse conjuntural. A quem interessa antepor um estatuto decorativo ao Presidente da República, uma espécie de função notarial da maioria parlamentar?
Se a crise política é uma não questão, então a solução da maioria é uma não resposta.
Ninguém questionou que, do ponto de vista formal, a actual maioria possa formar um novo governo. A questão é de legitimidade política, de consenso com a cidadania. Quem responde em eleições legislativas: o ex-Primeiro-Ministro, que tinha projectos para duas legislaturas - recordam-se aqui de o ouvir vezes sem conta?! - ou o Primeiro-Ministro de turno, que se desculpará da governação anterior? Tem de haver uma ética de responsabilidade no exercício da política, sob pena do agravamento da crise da política, ela própria. Os governos, regra geral, têm bilhete de ida e volta às urnas, não tiram apenas de ida.
São conhecidas as posições diferenciadas de Santana Lopes sobre o Pacto de Estabilidade e Crescimento e a política orçamental relativamente às posições de Durão Barroso, Manuela Ferreira Leite e do Governo demissionário. Não está em causa, aqui, o conteúdo, o mérito ou demérito de tais posições. Está em causa o direito de os eleitores julgarem uma política orçamental que, na prática, leva três anos de vida. Uma política orçamental que marca profundamente a vida nacional, que lançou a estagnação sobre a recessão, que diminuiu o poder de compra das famílias, que fez um intenso corte de despesas sociais. É aqui que radica a legitimidade política, a necessidade de clarificação, a possibilidade de fazer escolhas.
O PPD-PSD queria eleições antecipadas na sequência das eleições locais de 2001, mesmo antes de o Primeiro-Ministro em funções ter anunciado a sua demissão. Invocou, ao tempo, a legitimidade política, desvalorizou a estabilidade. Por que não usam, hoje, o mesmo critério? Por razões, única e simplesmente, de cinismo político e de super-cola dos lugares no poder.
Sr. Presidente, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados: Defendemos, junto do Sr. Presidente da República, a realização de eleições antecipadas. Consultar o povo para uma nova legitimidade da Assembleia da República. Não condicionamos, obviamente, a decisão constitucional do Sr. Presidente da República.
Chamamos a atenção da opinião pública para a gravidade da crise política de representação, para o aumento do desemprego e da crise social; da necessidade de uma viragem.
E aí nos concentramos: com ou sem eleições, batalhando pela reforma fiscal, por um Orçamento que dinamize o emprego e a economia, pelos direitos sociais, por uma política externa de paz - é urgente que o País possa mudar de orientação e de políticas.
É certo que, mesmo em tempos em que é necessária a clareza, surgem elementos de confusão. Da parte do Bloco de Esquerda, agradecemos a publicidade política dos últimos dias, mas não somos candidatos a coligações. Somos candidatos a eleições. Somos candidatos a escolhas claras de programas diferentes - programas diferentes antes e depois de eleições. No respeito rigoroso de compromissos votados nas urnas. As especulações podem ser divertidas, mas não nos atingem, porque os nossos actos são sérios e levamos muito a sério a confiança dos cidadãos.

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Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: - A Mesa não regista mais inscrições.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Isso tem piada!

O Sr. António José Seguro (PS): - O PSD e o CDS-PP não têm nada a dizer?!

Pausa.

O Sr. Presidente: - Pelos vistos, há efectivamente mais uma inscrição, mas não constava da lista. Peço desculpa à Sr.ª Deputada Isabel Castro.
Para uma declaração política, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: De facto, eu era última das inscritas na lista de que tive conhecimento ao fim da manhã. No entanto, essa lista incluía também os Srs. Deputados do PSD e do PP, que, constatamos, não querem agora fazer uso da palavra e estão, efectivamente, desligados e pouco interessados em debater os problemas do País.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Só faltava agora ser a Sr.ª Deputada a decidir por nós!

A Oradora: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: "Dentro de um ano, quando aqui voltar para outro debate sobre o estado da Nação, posso garantir-vos que desmentiremos o derrotismo compulsivo, posso garantir-vos que Portugal estará melhor. Se somarmos ao trabalho e à iniciativa deste ano a ambição e a mobilização das nossas energias colectivas, tenho a certeza que vamos vencer."
As palavras não são propriamente de um anónimo. Foram proferidas a 3 de Julho de 2003. O seu autor não é difícil adivinhar: Durão Barroso, o agora mister José Manuel Barroso em versão recauchutada e para facilitar o trabalho de tradução. O ex-Primeiro-Ministro, líder do PSD, o partido da direita no Governo, que dizia ter como lema a coerência, a coragem, a persistência. Coerência nos valores. Coragem nas atitudes. Persistência em torno das decisões que melhor servissem o interesse nacional.
Durão Barroso, aquele que fez cavalo de batalha e bandeira da sua campanha eleitoral o cumprimento dos compromissos para com os cidadãos eleitores; aquele que não abandonava o País; aqueles que, após o primeiro teste eleitoral à sua governação e depois da tremenda derrota sofrida em 13 de Junho, reduzido que ficou o seu eleitorado a um terço, fez a leitura dos sinais políticos e aproveitou a primeira oportunidade para abandonar o exercício das suas funções.
Gerou, assim, por sua livre vontade e escolha, a sua própria demissão e, consequentemente, a queda do Governo, o que provocou uma crise política. Uma crise política que se veio somar às outras - as crises sociais, ambientais e económicas - que já tinham sido desencadeadas ao longo de mais de dois anos de governação.
Esta é uma atitude de total irresponsabilidade que furta hoje o Governo, todo o Executivo, à prestação de contas perante o Parlamento, às suas responsabilidades e à sua comparência e participação no debate que hoje era suposto ser o debate do estado da Nação.
Esta atitude de total irresponsabilidade que só se ultrapassa, do nosso ponto de vista, não com pseudo-soluções ou falhas de democraticidade, mas com a devolução aos cidadãos, que são soberanos nesta matéria, do direito de escolha, qualquer que ele seja.
Um direito de escolha não se confunde com o prolongamento de algo que está falho de legitimidade, um Governo que perdeu dois terços do seu eleitorado, um Governo constituído com base numa coligação que não se submeteu às eleições, um Governo cujo rosto e maior partido perdeu o seu líder, um Governo, portanto, que não pode artificialmente ser mantido nem ter qualquer passagem administrativa sem que, previamente, os cidadãos sejam chamados a pronunciar-se.
Uma pronúncia que, naturalmente, não pode passar à margem daquela que é a realidade do nosso país - a realidade que hoje estaríamos a discutir em condições normais.
Um Governo que, ao longo de dois anos, jogou o nosso futuro e a possibilidade de um desenvolvimento socialmente justo e ecologicamente equilibrado.
Um Governo que atentou contra um património de direitos civilizacionais, que se envolveu de modo acrítico numa guerra no Iraque.

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Um Governo que, por suprema hipocrisia, continua a manter uma lei que faz com que mulheres continuem a ser tratadas como criminosas e a ser julgadas pela prática do aborto.
Um Governo que aprovou uma nova lei do trabalho que não é da modernidade, antes desrespeita a dignidade da pessoa humana e representa um retrocesso civilizacional.
Um Governo que tem considerado a investigação científica um luxo, um Governo que, violando a própria Constituição da República, aprovou, recentemente, uma lei de bases da educação que descompromete o Estado em relação a um investimento que era suposto, num país como o nosso em particular, ser considerado um factor decisivo para o desenvolvimento do País.
Mas também um Governo que revelou, num domínio essencial, não ter um plano, não ter uma ideia, não ter uma estratégia para o ambiente capaz de assegurar sustentabilidade, bem-estar e saúde aos cidadãos.
O falhanço político traduzido em dois anos de Governo, que viu desfilar à frente do Ministério do Ambiente três ministros, totalmente invisíveis, qual deles o pior.
Um Governo que deixa, por isso, como herança o avolumar de dossiers essenciais e que seriam fundamentais para transformar a sociedade e acompanhar os desafios civilizacionais, designadamente os compromissos europeus, que são importantes para a nossa segurança, para o bem-estar dos cidadãos, para a nossa qualidade de vida.
Um Governo que perde um Primeiro-Ministro, que, na Europa, vai ter, seguramente, enormes dificuldades em acompanhar Quioto e o dossier das alterações climáticas, que lhe é tão estranho.
Um governo que deixa atrás de si as áreas protegidas paralisadas e em degradação permanente, um Governo incapaz de compreender o desafio energético e de operar transformações a esse nível, um Governo embrulhado num negócio opaco em torno da privatização da água, esse bem essencial para o desenvolvimento transformado em mera mercadoria para favorecer o negócio do milénio.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A situação que hoje se vive é politicamente inaceitável e por isso os cidadãos devem ser chamados a julgar, a pronunciar-se sobre o que lhes foi prometido, sobre o que foi feito ao longo dos últimos dois anos que, seguramente, deixam uma marca amarga em todos aqueles em que tem crescido o descrédito nas instituições e que, perante a forma de fazer política desta maioria e desta direita, vão ter mais dificuldades em rever-se nessa política.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António José Seguro.

O Sr. António José Seguro (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Castro, iniciou a sua intervenção expressando perplexidade e condenando a forma como as bancadas do PSD e do CDS-PP estão a comportar-se neste debate, isto é, faltando ao debate político democrático e ao contraditório, num momento fulcral da vida política do País.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Já não é a primeira vez que assim procedem. Na semana passada, numa concertação de cartel político, decidiram que não colocariam nenhuma pergunta a nenhum de nós, para evitar o embaraço, a incomodidade. Nós percebemos essa incomodidade, assim como percebemos a incomodidade que sentem no caso de haver eleições. Não somos apenas nós que o percebemos, mas também os portugueses percebem essa incomodidade. E é isso que mais dói aos Deputados da actual maioria.
Mas poderia colocar-se outra hipótese para justificar este silêncio da maioria. Essa justificação vem directamente do Funchal, da Madeira. Na verdade, a Agência Lusa dá-nos conta de declarações, que vou citar, do líder do PSD/Madeira, de que, aliás, faz parte o Dr. Guilherme Silva.
Diz o líder do PSD/Madeira que há uma instabilidade que dura há quinze dias por causa de alguém não gostar de outro alguém que pode vir a ser indigitado como líder do partido maioritário da coligação para formar governo.
Instado a explicitar quem é esse "alguém que não gosta de outro alguém" e a quem o Dr. Alberto João atribui a instabilidade política, a resposta é "o Sr. Presidente da República".

O Sr. Mota Andrade (PS): - Uma vergonha!

O Orador: - É inaceitável, repito, inaceitável, que um dos principais dirigentes do PSD, que já tinha aconselhado a maioria a não ir a votos no caso de haver eleições,…

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O Sr. José Magalhães (PS): - Bem lembrado!

O Orador: - … sendo membro do Conselho de Estado, num momento em que se sabe que o Sr. Presidente da República determinou que seria de reflexão, venha fazer estas chantagens, inaceitáveis, repito.
Assim, Sr.ª Deputada, gostaria de ouvir o seu comentário, sabendo já que, da nossa direita, o comentário será o silêncio porque ficaram ainda mais incomodados ou, então, combinaram a estratégia de fazer silêncio nesta sede para que aquela voz do Funchal se ouvisse com mais nitidez.
A terminar este debate,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Qual debate? Só se for entre o PS e Os Verdes!

O Orador: - … quero reafirmar, mais uma vez, que é conhecida a posição do PS a favor de eleições.
No entanto, quero dizer que respeitaremos, em qualquer circunstância, a decisão que o Sr. Presidente da República tomar, sendo certo que o Partido Socialista, como partido da democracia e do regime democrático, condena estas práticas e não aceita nem compreende o "respeito" destes dois partidos, em particular o do PSD que é também um partido democrático do sistema. A democracia não se enriquece com o vosso silêncio. Mesmo incomodados, deveriam ter vindo ao debate.

Aplausos do PS.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Mas qual debate?!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António José Seguro, começo por agradecer a questão que formulou.
Penso que é evidente, e não deixa de ter um significado político, o facto de este debate…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Mas qual debate?!

A Oradora: - É que continua a ser um debate qualquer que seja o número de participantes! O uso da palavra, Srs. Deputados da maioria, é um direito, é um dever. Há debate político na Assembleia da República, não obstante uma parte ter hibernado, ter-se silenciado e, pura e simplesmente, não assumir o confronto político porque está metida num beco sem saída e porque foi vergonhosamente colocada nessa situação pelo ex-líder do maior partido, o qual faltou à verdade, tratou das suas próprias questões e não vos avisou em tempo útil.
Sr. Deputado, penso que este silêncio tem a ver com a situação de incómodo e também, seguramente, com o mal-estar e a agitação de alguns que se inquietam com a possibilidade de abandono do poder.
Aliás, se a maioria tivesse a consciência tranquila de que tinha honrado os seus compromissos, de que tinha agido no sentido da satisfação dos problemas das pessoas, não estaria temerosa de enfrentar as eleições, estaria confiante e, portanto, seria a própria a reivindicar que os cidadãos pudessem exprimir-se livremente e validar a sua confiança através de eleições.
A questão que o Sr. Deputado coloca remete-nos para o que é há muito um problema gravíssimo na nossa democracia, em relação ao qual penso que a tolerância, porventura ao longo de anos, foi excessiva. Refiro-me ao que se passa na Região Autónoma da Madeira e às sistemáticas afirmações do respectivo Presidente do Governo Regional que são uma afronta à democracia e, neste caso concreto, ao Sr. Presidente da República.
Tais declarações são gravíssimas e inaceitáveis, mas, Sr. Deputado, sendo-o, penso que, porventura, não divergem muito de outras situações a que assistimos nesta semana, desde logo, no início deste processo, com leituras sibilinas através das quais se procurou incutir na opinião pública que haveria hipotéticos acordos entre o Sr. Presidente da República e o ex-líder do PSD.
Penso que o que aconteceu nesta semana com o CDS-PP e o seu líder, com a truncagem, vergonhosa, do pensamento político do Sr. Presidente,…

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, o seu tempo esgotou-se.

A Oradora: - … constitui para todos e muito em particular, penso, para os militantes e os Deputados do CDS-PP uma vergonha, e ainda não ouvimos um pedido de desculpas formal.

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Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.

Eram 17 horas e 35 minutos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o primeiro ponto da ordem do dia é preenchido com a discussão, na generalidade, do projecto de lei n.º 28/IX - Informação genética pessoal e informação de saúde (BE).
Para proceder à apresentação do projecto de lei, tem a palavra a Sr.ª Deputada Alda Sousa.

A Sr.ª Alda Sousa (BE): - Sr. Presidente, Sr.as Deputadas, Srs. Deputados: A sequenciação praticamente completa do genoma humano veio revolucionar a biologia e a forma como olhamos tanto para a nossa própria espécie como para as outras.
Trouxe-nos o conhecimento espantoso de que, na nossa espécie, são maiores as diferenças dentro de uma mesma população do que as que existem entre populações, deitando fora o obsoleto conceito de "raças" que tinha estado presente na biologia do século XIX e parte do século XX.
Trouxe-nos, ainda, a possibilidade de novos meios de diagnóstico mas também a ameaça da possibilidade de revelar informação sobre uma doença futura num indivíduo ainda saudável, com todo o potencial discriminatório que isso pode acarretar.
Vale a pena delimitar o âmbito do projecto de lei que aqui discutimos hoje: não falamos de genética forense, aspectos também eles essenciais e sobre os quais é necessária uma legislação específica que também ela tarda. Nem se procura aqui abarcar todos os aspectos da investigação em genética.
O projecto de lei circunscreve-se aos aspectos relacionados com a genética e a medicina e com a garantia de direitos fundamentais: direito à informação, direito ao atendimento médico qualificado, direito à qualidade no diagnóstico, direito à privacidade e confidencialidade, direito a não ser discriminado em função do património genético, nem no emprego, nem no acesso à saúde ou aos seguros de vida.
Pretendemos criar um quadro de responsabilidade que é fundamental para evitar a instrumentalização da informação genética para efeitos mercantis e para a exploração das pessoas.
Não vou enumerar todos os diplomas nacionais e internacionais que configuram um quadro normativo no qual se insere este projecto de lei.
Gostaria, contudo, de citar e de realçar o parecer sobre o projecto de lei que o Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida aprovou, por unanimidade, na sua reunião plenária de 11 de Maio último: "Deve saudar-se a iniciativa legislativa da Assembleia da República por trazer à colação tão importante, tão actual e tão pertinente matéria que tem motivado dos mais intensos debates na sociedade portuguesa."
Sr. Presidente, Sr.as Deputadas, Srs. Deputados: Decidi contar-vos uma história, que podia bem ser assim:
A Joana é aluna da Faculdade de Direito de Lisboa. Excelente aluna, mas a sua verdadeira paixão é a guitarra, em particular a música folk americana. Fã de Woody Guthrie, encontra um dia a biografia dele escrita por Marjorie Guthrie, sua viúva, onde é descrita em detalhe a terrível doença de que padeceu o músico e de que acabou por morrer. Num testemunho comovente, Marjorie Guthrie fala dessa misteriosa "doença de Huntington" que se pode manifestar tarde na vida e se caracteriza por problemas neurológicos, mas também por graves alterações do comportamento e demenciação.
À medida que a leitura vai avançando, Joana vai ficando angustiada e preocupada, porque se lembra, ainda que vagamente, da tia Rosa, a irmã mais velha do pai, e de alguns comportamentos estranhos que lhe viu ter, como ter roubado um guarda-chuva lá em casa e ter tido um acesso de fúria porque, de repente, parecia não conhecer o próprio irmão.
Joana tenta fazer perguntas, à mesa, mas estas são tidas como inoportunas e a conversa é sempre desviada. Nem o pai nem a mãe parecem dispostos ou interessados em relembrar a doença da tia Rosa.
Esse silêncio, esse segredo de família começa a incomodar Joana, que salta para a Internet à procura de informação. Percebe que, se for verdade que essa era a doença da tia Rosa, então, o pai, que é ainda saudável aos 45 anos, pode também ser portador do gene e ainda não o ter manifestado e que ela própria pode ter herdado o gene do pai.
Joana vê na Internet o endereço de uma companhia que oferece o teste genético e encomenda o kit que contém instruções para colher e enviar uma amostra de saliva. Joana segue todos os procedimentos e, dois meses mais tarde, recebe em casa, na caixa de correio, o veredicto. Embora escrito numa linguagem

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algo cifrada ("o seu número de tripletos CAG é de 41"), percebe que é portadora do gene. Joana entra em depressão.
Ao fim de alguns dias, dá-se conta que, para além de si própria, o resultado deste teste significa que o seu pai também é portador do gene mutado. De repente, Joana possui informação genética sobre o seu pai que este não só não sabe como, visivelmente, não quer saber.
A angústia de Joana aumenta até que um dia já não aguenta mais e decide falar com a médica de família que lhe sugere que recorra a uma consulta de aconselhamento genético.
A história familiar é, então, analisada desde o início. O pai, que toda a vida tinha procurado viver não querendo saber se era ou não portador da doença que afectou a sua irmã e outros familiares, decide-se a fazer o teste por causa dos filhos. Segue as consultas de aconselhamento, faz o teste pré-sintomático e, ao fim de umas semanas, vem saber o resultado: é, de facto, portador do gene mutante, embora continue saudável. É ele próprio que o confirma aos filhos. O seu outro filho, Rui, decide fazer o teste e o resultado é "não portador", ou seja, não possui o gene mutante, o que significa que ele próprio e a toda a sua descendência estão livres de risco para esta doença.
A Joana pede apoio e inicia um seguimento psicológico. Mas o geneticista, que já viu muita coisa na vida, tem dúvidas sobre a fiabilidade de um teste vendido na Internet e feito pelo correio. A Joana só tinha vindo à consulta para apoio psicológico, mas decide-se a repetir o teste. O resultado (desta vez realizado em duas amostras separadas) é surpreendente: afinal, Joana não é portadora!!!
Uma semana depois, ainda a tentar digerir a notícia, recebe pelo correio uma outra carta da companhia da Internet a dizer que, afinal, tinha havido um erro, uma troca de amostra, e a enviar um novo resultado.
Sr.as Deputadas, Srs. Deputados: Esta é uma história ficcionada, mas podia muito bem passar-se em Portugal um destes dias.
Procurei ilustrar alguns dos aspectos mais delicados, mais particulares e mais problemáticos que podem ocorrer na ausência de legislação específica nesta matéria, como sejam a sensibilidade da informação genética, o impacto psicológico que ela pode ter sobre o próprio, as implicações da informação genética para os familiares não testados, a necessidade de aconselhamento genético, alguns problemas possíveis com a venda directa de testes ao público, a possibilidade de erros num teste que se faz uma vez na vida e a necessidade de um controlo e garantia de qualidade adequados nestes procedimentos laboratoriais.
De todos estes assuntos trata este projecto, tendo procurado fundamento e inspiração em textos internacionais e nacionais fundamentais, bem como em recomendações de organizações profissionais, como a European Society of Human Genetics e o Colégio de Especialidade da Ordem dos Médicos. Neste contexto, também o Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida faz várias sugestões, que estamos disponíveis para acolher em sede de especialidade, em conjunto com todas as outras.
Passo a citar o último parágrafo do parecer do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida, relativo a este projecto: "Este projecto de lei enquadra-se no mais profundo respeito pela dignidade da pessoa humana, pretendendo salvaguardar os seus direitos fundamentais no âmbito da genética. Na esteira das convenções e declarações internacionais sobre esta matéria, o espírito deste diploma tem em atenção que a genética deve concorrer sempre para melhorar as condições de existência da humanidade, respeitando a identidade do sujeito e a da espécie a que pertence. Esta linha de pensamento está na base da edificação daquilo que hoje conhecemos e valorizamos por direitos humanos fundamentais. E estes mais não são do que o reconhecimento expresso de um marco axiológico fundamental, que é o valor intrínseco, inquestionável, da pessoa humana."
Sr.as e Srs. Deputados: É tempo de colmatar este vazio legislativo, é tempo de virar a página!
É tempo de, nesta matéria, Portugal fazer a sua entrada no século XXI.

Aplausos do BE e de Deputados do PS e do PCP.

Entretanto, assumiu a presidência a Sr.ª Vice-Presidente Leonor Beleza.

A Sr.ª Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Massano Cardoso.

O Sr. Massano Cardoso (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Jacques Monod, geneticista e Prémio Nobel francês, escreveu em 1970 um ensaio cujo título foi inspirado numa expressão de Demócrito: "Tudo o que existe no Universo é fruto do Acaso e da Necessidade".
Na sua obra, O Acaso e a Necessidade, Monod afirma que "(...) o homem, finalmente, sabe que está sozinho na imensidão indiferente do Universo, do qual emergiu por acaso. Seu dever, como seu destino, não está escrito em lugar nenhum (…)".
Ao longo das suas reflexões e análises, o ensaísta estabelece a importância e o primado do genoma, o

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qual, cerca de três décadas depois, acabou por ser sequenciado.
A fragilidade humana e a angústia a ela associada perseguem-nos desde todo o sempre. Um dos grandes objectivos do homem é prever o futuro. É o sonho do divino, de Pítia, o sonho mais antigo da humanidade: conhecer o futuro biológico dos seres vivos. O poder de prever.
A genética abriu um campo em que é possível ter poder para diagnosticar doenças, antes mesmo de uma criança nascer. Poder para impedir que venham a sofrer graves problemas. Poder de conhecer outras características dos pequeninos seres. Poder para intervir deliberadamente sobre o próprio futuro.
O mito do divino, a possibilidade de prever o futuro biológico dos homens, é o maior desafio colocado às nossas sociedades. A razão por que o consideramos o maior desafio prende-se com o facto de encerrar em si preocupantes ameaças sociais e éticas, se não tomarmos as devidas precauções. E, mesmo que venham a ser tomadas, através de várias medidas legislativas, das quais destaco o presente projecto de lei, nada nos garante que não irão ocorrer interferências deliberadas, susceptíveis de repercussão no futuro biológico, social e ético do homem.
Somos frutos de um acaso e de uma necessidade, mas, a partir do momento em que sentimos ter o poder dos deuses nas nossas mãos, acabamos por assumir a responsabilidade de ter de garantir o nosso próprio futuro.
O projecto de lei do Bloco de Esquerda aborda a problemática da informação genética pessoal e informação de saúde. O acesso e o domínio de qualquer tipo de informação constituem, só por si, fonte de poder, mas, quando toca à informação genética, o poder assume particular relevância, já que lidamos com a fonte da vida, da morte e do destino da própria natureza dos seres vivos, com as inevitáveis repercussões sociais e políticas da mesma.
A História já nos proporcionou episódios tristes, resultantes do mau uso e incorrecta interpretação da genética, em épocas cujos conhecimentos não se equiparavam aos actuais. Convém, ainda que sumariamente, recordar alguns desses momentos. O eugenismo, termo criado por Galton no princípio do século XIX, traduz um conjunto de conceitos que sempre existiram, desde os primórdios. Fonte de inspiração de correntes racistas e de sistemas políticos acabou por contribuir para as páginas mais negras da civilização. A intromissão abusiva da ideologia política na evolução da genética, tentando a todo o custo impedir a expressão da verdade científica, originou fenómenos lamentáveis dos quais o Lysenkismo soviético é paradigmático.
A ciência e a tecnologia têm expressões próprias que assentam na busca da verdade ou das verdades e no bem-estar. Mas, como em tudo, não há bela sem senão e a face oculta das grandes descobertas encerra preocupações e efeitos que podem ser muito perigosos, podendo, inclusive, limitar ou neutralizar os efeitos positivos das mesmas. Por estas razões, têm de entrar em cena os políticos, os eticistas, a legislação, os regulamentos, enfim, uma parafernália de atitudes, reflexões e de normas conducentes a evitar desastres de toda a ordem.
No tocante ao presente projecto de lei, há uma natural preocupação face, precisamente, ao uso da informação genética e dos inovadores testes genéticos, que são cada vez mais acessíveis.
O preâmbulo, rico, embora excessivo, descreve de uma forma correcta, sob o ponto de vista científico e técnico, a situação actual referente a vários problemas, às normas jurídicas nacionais e internacionais, a pareceres e projectos de resolução, além, como é óbvio, da problemática da utilização e acesso dos testes genéticos.
A leitura atenta e criteriosa deste documento aponta para alguns aspectos que necessitam de ser corrigidos e até modificados de forma, por exemplo, a compatibilizá-lo com leis já vigentes, caso da Lei da Protecção de Dados Pessoais. Existe mesmo alguma incongruência no que toca à propriedade da informação no seu todo ou em parte. Há necessidade de incluir os testes preditivos no âmbito da prática médica e os rastreios neo-natais, assim como acentuar a licitude da dimensão da terapêutica génica, reforçar a ilicitude do melhoramento genético, retirar o diagnóstico genético pré-implantação para o diploma sobre procriação medicamente assistida e adequar o projecto de lei em discussão à Declaração Internacional sobre Dados Genéticos Humanos. Também não podíamos deixar de manifestar alguma oposição à constituição de uma comissão permanente de genética médica, já que as funções a atribuir a este órgão são já do domínio e competência do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida. Muitas outras considerações poderiam ser ainda enunciadas.
Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A necessidade de legislar e regulamentar a informação genética é vital, a fim de evitar o estiolamento das sociedades, constrangidas a eventuais medidas de interdição, motivadas pelos resultados dos testes genéticos. O conhecimento de predisposições individuais, face a inúmeras doenças, tais como doenças cardiovasculares, cancro, doença de Alzheimer, diabetes, hipertensão, entre muitas outras, poderá condicionar a interacção indivíduo-meio ambiente, responsabilizando muitos comportamentos e atitudes ao ponto de pôr em causa a liberdade e o livre arbítrio. Não podemos esquecer que, hoje em dia, a área mais sensível e susceptível a medidas totalitárias é precisamente a da

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saúde.
A apetência para avaliar os riscos individuais é enorme. Motivos de interesse económico na vulgarização de testes genéticos, mostrando à população quais os benefícios decorrentes dos mesmos, face a doenças graves, tais como o cancro, as doenças cardiovasculares ou demências, contribui para a constituição de grupos de pressão de forma a serem incentivados e realizados a nível dos sistemas de saúde.
Neste caso, temos a convicção de que os prejuízos poderão ser maiores do que os benefícios. A aplicação dos testes genéticos e sua interpretação terão que se efectuar em contextos bastante precisos, a nível individual e nunca a nível colectivo, à excepção, naturalmente, de estudos de investigação científica anonimizados.
Ninguém discute a utilidade óbvia dos testes genéticos aplicados em circunstâncias científica e eticamente correctas.
Outras áreas com apetência para a utilização dos testes genéticos são a saúde ocupacional e o sector de seguros. O facto de ser possível identificar o perfil genético mais permeável e sensível a agressões ambientais no local do trabalho poderia levar os interessados a seleccionar os trabalhadores mais resistentes, evitando a contratação dos susceptíveis, provocando uma situação obscena de verdadeiro eugenismo laboral. Acresce, ainda, a bondade em proteger a saúde dos trabalhadores, em vez da modificação das condições ambientais preconizada pelos defensores desta opção.
Quanto às seguradoras, o problema é igualmente complexo e perturbador. Às actuais exigências na realização de testes para efeitos de seguro de vida, os quais impedem a sua obtenção ou originam agravamento dos prémios, em caso de positividade, adicionar-se-iam o potencial dos testes genéticos, originando uma verdadeira discriminação e até injustiça, já que o facto de alguém ser portador de um determinado gene, ou genes, susceptível de originar com mais probabilidade uma doença não é sinónimo da mesma. Trata-se de uma questão probabilística e não determinística. Mas, mesmo assim, as seguradoras não iriam deixar de as utilizar, embora conhecendo estes pormenores. Existe uma preocupação em evitar situações deste género, através de medidas de carácter legislativo.
Têm sido descritos vários comprovativos desta tendência, a qual necessita de ser contrariada.
Como existe um perigo real em discriminar os cidadãos, importa impedir quaisquer medidas que possam pôr em causa o artigo 1.º da Declaração Universal dos Direitos Humanos, segundo o qual "Todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos (…)."
Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A informação genética e as suas implicações em termos médicos, sociais e éticos exigem uma profunda reflexão a fim de produzir legislação adequada, em conformidade com muitos dos princípios já enunciados e de sintonizá-la com as convenções internacionais de modo a garantir à humanidade um equilíbrio e respeito pela sua própria natureza.
Agora que se avizinha a possibilidade de conhecer a essência e os mecanismos da vida de uma forma nunca pensada, compete ao Homem, na imensidão indiferente do Universo, o dever de escrever o seu próprio destino.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria de Belém Roseira.

A Sr.ª Maria de Belém Roseira (PS): - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A descoberta da sequenciação do genoma humano em Fevereiro de 2001 foi oportunamente objecto de atenção por parte desta Assembleia, que, de imediato, alertou para o enorme impacto previsível deste acontecimento.
Para além das resoluções então aprovadas, de iniciativa de grupos parlamentares, foi possível organizar, já no decurso desta sessão legislativa, no âmbito da 1.ª Comissão, um colóquio que se debruçou não só sobre a análise das potencialidades deste novo conhecimento como dos seus enormes riscos, o que é inerente a qualquer descoberta científica.
Como recorda a Organização Mundial de Saúde, basta pensar na utilização das descobertas na Física, no princípio do séc. XX, para atentarmos no potencial que deve estar sempre presente do uso indevido destas descobertas por razões políticas.
Apesar de o uso indevido da biologia estar proibido desde 1975 (Convenção das Armas Biológicas e Tóxicas) e de essa proibição ser hoje aceite por mais de 140 Estados-Parte, os mesmos não têm aceite mecanismos efectivos de verificação.
Por isso, a Organização Mundial de Saúde continua a insistir na reedição da sua publicação Aspectos de saúde das armas químicas e biológicas. Com efeito, a manipulação de agentes patogénicos, ou potencialmente patogénicos, está muito disseminada e constitui um risco no domínio da defesa, sistematicamente subavaliado, que necessita com urgência de controle.

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Esta é, efectivamente, uma das áreas de risco, cuja avaliação não está a ser suficientemente feita a nível global, o que deverá ser objecto de ponderação nas comissões parlamentares adequadas, pois é matéria de importância ímpar no contexto da multilateralidade das relações internacionais.
O potencial da genómica para os cuidados de saúde é grande. Embora não possa ser predito na sua totalidade, o facto de ter sido grande a evolução do estudo da doença a nível celular e molecular nos últimos 20 anos, mesmo antes do conhecimento da totalidade da sequenciação do genoma humano, faz pressupor com razoabilidade que esse progresso possa ser cada vez mais rápido.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Os campos de aplicação identificados e já em acção são variados: doenças monogénicas, doenças transmissíveis, cancro, doenças complexas multifactoriais, atraso e distúrbios no desenvolvimento mental, envelhecimento, fármaco-genética, terapia genética, terapia com células estaminais, medicina forense, biotecnologia, etc., etc.
A genómica também está já a demonstrar a sua importância na explicação da evolução da biologia. Mas, acima de tudo, o estudo da diversidade do genoma demonstra que cada um de nós é único e, à medida que cada vez mais se sabe que cada um de nós é uma realidade única e irrepetível, cada vez é menos importante o conceito de "raça".
Mas o trabalho de base para toda esta fantástica janela panorâmica sobre o futuro só é possível se for recolhida informação genética.
Como nos ensina Jorge Sequeiros, a especificidade desta informação caracteriza-se da seguinte forma: ela é pessoal mas também é familiar; é poderosa; é permanente; é possivelmente preditiva e potencialmente discriminatória.
Pelo seu potencial discriminatório mas também pelas limitações no âmbito da determinação das susceptibilidades, o tratamento desta informação deve ser rodeado de extremas cautelas.
É que a complexidade biológica é, porventura, a nossa última defesa, como também diz Jorge Sequeiros, e muitas das nossas características humanas não podem, pela sua natureza complexa, ser reduzidas a simples sequências de DNA.
Mas pode haver tentação, para os ignorantes e para os atrevidos, características que, como sabemos, estão normalmente interligadas para não ter disso a noção.
Por isso, este é bem um campo em que as questões técnicas, económicas e éticas estão, ou devem estar, exemplarmente ligadas.
Por tudo isto, é tão bem-vindo o projecto de lei hoje em análise, saudado no magnífico parecer emitido em Maio último pelo Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida, a solicitação desta Assembleia.
Aliás, esta iniciativa cruza bem com a cominação aos parlamentos nacionais feita no ponto 2.1 da Declaração Universal sobre o Genoma Humano e os Direitos Humanos, adoptada pela Conferência Geral da UNESCO em 1997, que estabelece os princípios básicos relacionados com a pesquisa em genética e biologia e a aplicação dos seus resultados. Aí se recomenda a disseminação dos princípios, o mais ampla possível, especialmente universidades e órgãos tomadores de decisão, como, por exemplo, os parlamentos.
Disponíveis que estão os seus autores para proceder a alterações na especialidade sugeridas pelo Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida, aqui deixo mais algumas sugestões que revelam bem a complexidade e o melindre da matéria e que me foram também sugeridas pela aturada reflexão que a esta matéria tem delicado o Centro de Direito Biomédico da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, especialmente nas pessoas dos Mestres Helena Moniz e André Pereira.
A primeira, num magnífico trabalho que em breve será publicado, discorre abundantemente sobre a relação entre o direito à privacidade e os bens jurídico-socialmente vinculados, tese que permitirá, em meu entender, o desenho equilibrado do sigilo da informação e das cominações respectivas.
Discorre, ainda, sobre os modelos - o legal e o médico - relativos à comunicação da informação genética aos familiares, sugerindo uma formulação que consagra expressamente as situações limite que justificam a divulgação da informação com indicação precisa dos pressupostos da informação.
Por sua vez, o Mestre André Pereira sugere:
No artigo 3.º, a substituição do termo "utente" por "paciente", porque a lei também terá que aplicar-se ao sector privado;
O acautelamento, em disposição autónoma, na boa linha do Direito Comparado, dos interesses legítimos à confidencialidade das anotações pessoais dos médicos e às informações relativas a terceiros;
Uma outra redacção do artigo 9.º, que permita estabelecer a regra de que os teste genéticos são acessíveis a todos os cidadãos - os benefícios dos testes genéticos devem ser facultados a todos. Porém, os

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menores e incapazes por anomalia psíquica devem ser protegidos face aos perigos da discriminação (dentro da própria família, derivados de testes de doenças incuráveis).
Justifica através dos seguintes exemplos:
D, 39 anos, interdita por surdez-mudez, engravidou; a sua tutora e ela própria desejam fazer uma amniocentese para testar eventual trissomia 21 do feto. Quid Juris?;
J, toxicodependente de 34 anos, sujeita a inabilitação por prodigalidade; ela gostaria de fazer o teste BRCA 1 e BRCA 2 (cancro da mama). Quid Juris?;
M, oligofrénico e interdito; o tutor e a família desejam investigar: a) Se M é portadora assintomática do gene da doença de Huntington. Quid Juris?
De acordo com o presente projecto de lei, em todos estes casos se poderia interpretar no sentido de proibir os testes. Ora, uma proibição absoluta é inadequada.
Em todos estes casos só o último deveria ser proibido, já que não haverá qualquer vantagem para o interdito; pelo contrário, há o risco da sua discriminação. Nos outros casos, trata-se de conceder àqueles cidadãos o acesso aos cuidados de saúde!
Mais se sugere a clarificação das noções de família, no artigo 19.º - será só a consanguínea? -, da anonimização das amostras biológicas por forma a conseguir a total impossibilidade de reconstruir a origem pessoal do material biológico, no artigo 20.º, n.º 1, e a identificação do responsável pelo banco de produtos biológicos, no n.º 5 do mesmo artigo.
O projecto de lei deve também remeter para legislação especial o tratamento dos bancos de dados para efeitos médico-legais.
Esta matéria tem vindo a assumir crescente importância em termos nacionais, europeus e no âmbito das relações internacionais, por força do combate ao terrorismos e à grande criminalidade.
Necessita, com urgência, de regulamentação e beneficiará com a aprovação do presente projecto, que deveria, aliás, ao seu artigo 20.º, acrescentar um número que remetesse para legislação especial o armazenamento de amostras biológicas, com vista a fins de investigação criminal e a fins de identificação civil.
Por sua vez, a alteração ao Código Penal poderia, com vantagem, pela remissão para o regime já constante dos artigos 17.º e 47.º da Lei de Protecção de Dados Pessoais, permitir uma melhor coerência do sistema jurídico.
Termino saudando mais uma vez a iniciativa e sublinhando a sublime importância da matéria com ela envolvida. Como nos lembra a OMS, a investigação e a prática médica convencionais não devem ser negligenciadas enquanto evolui a exploração do potencial da genómica.
Emergiu um quadro sobreoptimista que deve ser controlado em termos de expectativas a curto prazo. Contudo, algumas aplicações já estão em uso. Chegou, para nós, a altura de planear como é que esta tecnologia pode ser distribuída harmonicamente a toda a humanidade.
A actual situação de patenteamento dos genes está a promover a cultura de propriedade que pode conduzir às mais profundas desigualdades na prestação de cuidados de saúde. Exige-se regulamentação sobre todas as formas de tecnologia recombinante de DNA. As sociedades devem preparar-se para as complexidades éticas deste campo emergente da medicina e todos os sectores da sociedade, incluindo políticos, profissionais de saúde, educadores e o público, têm de ser alertados sobre os princípios fundamentais da investigação genética, os riscos a ela inerentes e as questões éticas que tal investigação coloca.
Como referiu Helena Moniz, "O pensamento genético é considerado como uma forma de compreender o mundo. A prática genética é a forma de imaginar o futuro".

Aplausos do PS e do BE.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: As prodigiosas descobertas relativamente ao genoma humano trouxeram à humanidade novas possibilidades de debelar algumas das causas do seu sofrimento.
Se a revolução científica e tecnológica da era moderna permitiu ao ser humano modificar radicalmente a natureza que o cerca, a revolução biológica e médica abre ao ser humano a possibilidade de intervir sobre a sua própria natureza.
Não nos é possível, no curto tempo de que dispomos para a intervenção, tratar de questões importantes como a da mercantilização da saúde, designadamente a comercialização da genética.
Por ora, os avanços nas biotecnologias contribuem para aumentar o fosso entre pobres e ricos. E com este problema se prende a questão das patentes de descobertas, e não de invenções, de genes e de sequência

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de genes, coisa que o nosso Código de Propriedade Industrial também permite.
Queremos, no entanto, referir-nos a duas questões, principalmente à questão dos dados genéticos no contexto do emprego, mas ainda à questão da terapia génica relativamente à linha germinativa do ser humano.
Quanto a esta última questão, consideramos que a lei não deve "fechar as portas" à possibilidade de modificações da linha germinativa em caso de afecções.
Conhecemos o intenso debate que há nesta matéria. Mas a verdade é que há afecções genéticas que só podem ser tratadas através de modificações na linha germinativa. Ora, o que está proposto, que é a proibição absoluta, influencia negativamente a própria investigação científica.
No entanto, é quanto às questões dos testes genéticos no contexto do emprego que o projecto de lei nos causa grandes preocupações.
De facto, apesar das proibições que num artigo se inscrevem, a verdade é que o projecto de lei é, nesse aspecto e mesmo assim, uma peneira de malha muito larga que, no contexto em que hoje se desenvolvem as relações de trabalho, permite que um trabalhador seja sujeito, no caso de riscos muito graves, a toda e qualquer espécie de teste genético. O artigo não restringe a possibilidade de testes a uma das espécies de teste genético. Podem ser efectuados testes preditivos de qualquer espécie, e não apenas os testes de susceptibilidade, sem qualquer interesse ou com reduzido interesse no contexto do emprego. Aí, seriam, quanto muito, os testes de susceptibilidade para as doenças multifactoriais aqueles que eram interessantes, porque estudam a interligação entre os genes e o ambiente.
Ora, o artigo 12.º da Convenção de Oviedo proíbe a realização de testes preditivos pré-sintomáticos, de predisposição ou de susceptibilidade, excepto para fins médicos ou de investigação. E, quanto a quaisquer testes genéticos no contexto do emprego, instâncias internacionais de peritos têm vindo a pronunciar-se no sentido de que devem ser proibidos.
Nesse sentido se pronunciou a OIT e o grupo de trabalho para protecção dos dados pessoais criado no âmbito da União Europeia. Citaremos, entre todos, o parecer do Grupo Europeu de Ética das Ciências e das Novas Tecnologias, criado também no âmbito da Comissão Europeia, de Julho de 2003, no qual se refere que "A despistagem genética é um tipo de exame médico. Tem em vista o futuro potencial estado de saúde da pessoa que a ele se submete. De uma maneira geral, o Grupo é de parecer que só o estado de saúde actual do trabalhador deve ser tomado em consideração no contexto do emprego."
Diz ainda o parecer que "Para além disso, não existe até à presente data qualquer prova verdadeiramente probatória da pertinência e da fiabilidade dos testes genéticos existentes no contexto do emprego. O seu valor preditivo continua incerto."
No parecer diz-se também que "O Grupo considera que a utilização de testes genéticos no contexto do emprego, assim como a divulgação dos seus resultados, são em geral inaceitáveis do ponto de vista ético. Com efeito, o empregador pode dar cumprimento aos seus deveres e satisfazer os seus legítimos direitos em matéria de protecção da saúde e de avaliação das aptidões por meio de um exame médico, mas sem praticar testes genéticos. O empregador deve, em princípio, abster-se de proceder a uma despistagem genética ou de solicitar ao trabalhador que se submeta aos testes."
É claro que se dirá que o projecto de lei apenas admite os testes genéticos a título de excepção e para garantir a saúde do trabalhador ou a protecção de terceiros. Mesmo aqui valerá a afirmação feita no parecer referido de que não existe a tal prova verdadeiramente probatória da pertinência e da fiabilidade dos testes genéticos existentes.
Mesmo para os casos excepcionais, a que, em segunda linha, o parecer se reporta, não acolheu o projecto de lei, em nossa opinião, as cautelas exigíveis para garantir a realização dos testes só em caso de estrita necessidade. Não basta dizer que os testes são voluntários e que o trabalhador tem de dar o seu consentimento - todos sabemos o que é o consentimento "livre" no contexto do emprego! -, nem basta dizer-se que se referem a riscos muito graves, nem é suficiente a criação de uma autoridade independente, coisa que o parecer também refere.
O parecer coloca a exigência de se obter o consentimento da organização profissional a que o trabalhador pertence, e, por outro lado, é necessário, também de acordo com o parecer citado, que se encontrem preenchidas cumulativamente condições fundamentais como as seguintes: em primeiro lugar, que a realização do teste seja necessária para garantir a protecção da saúde e da segurança do trabalhador ou de terceiros; em segundo lugar, que existam provas científicas segundo as quais o teste genético é válido e constitui o único método para obter informações; em terceiro lugar, que a realização do teste não comprometa o objectivo de melhorar as condições no local de trabalho - de facto, corre-se o risco de recorrer a testes com objectivos meramente economicistas sob a capa de protecção do trabalhador; em quarto lugar, que o princípio da proporcionalidade seja respeitado no que concerne às motivações invocadas para efectuar o teste; em quinto lugar, que o princípio da não discriminação não seja infringido.
Se se quiser abrir mão da interdição absoluta da realização de testes, então, terá de acautelar-se o trabalhador

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contra pretensões inadmissíveis quanto à realização de testes genéticos.
Entendemos, no entanto, que deve ser proibida, sem quaisquer excepções, a realização de testes genéticos no contexto do emprego, pelos motivos indicados no parecer.
Num contexto de precarização das relações laborais, de uma maneira geral, os testes genéticos dificilmente visarão a protecção do trabalhador e de terceiros, pois serão determinados por motivos meramente economicistas.
O PCP já teve ocasião de apresentar propostas relativamente aos testes genéticos nesta área, estabelecendo a sua proibição quer no Código do Trabalho, quer na sua regulamentação.
Rejeitadas as propostas, ficou, em obediência aos ditames neo-liberais, a aberração do artigo 19.º do Código, permitindo todos e quaisquer testes, e portanto também os genéticos, ao candidato ao emprego e ao trabalhador, artigo que contraria, por exemplo, a Convenção de Oviedo, ratificada por Portugal, e que é inconstitucional.
Contudo, riscos de utilização perversa da genética, nomeadamente no mundo do trabalho, não calam a esperança que motiva a aventura humana visando o domínio da vida.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Paiva.

O Sr. Miguel Paiva (CDS-PP): - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Voltamos hoje a discutir a genética, as suas aplicações, os seus limites e a implicação da evolução do conhecimento nas várias dimensões que existem no ser humano.
E digo voltamos porque este tema já aqui foi discutido na anterior Legislatura, vindo o então projecto de lei do Bloco de Esquerda acompanhado, na discussão, de dois projectos de resolução, respectivamente do PSD e do PS, ambos sobre a protecção da informação genética pessoal.
Os autores do diploma que agora analisamos e discutimos chamam a atenção para o facto de que a aplicação de testes genéticos em pessoas saudáveis é adequada, desde que tal seja a vontade expressa dessas pessoas e se os testes de susceptibilidade e pré-sintomáticos forem medicamente indicados, mas entendem igualmente ser necessário estabelecer condições de acompanhamento psicológico e social no caso particular das doenças com início na vida adulta e ainda sem cura ou tratamento possível.
É neste contexto que organismos internacionais têm vindo a definir os princípios que devem regular a utilização da informação genética, nomeadamente impondo restrições à possibilidade de utilização dessa informação para outros fins que não os da prestação dos melhores cuidados de saúde, tendo mesmo diversos Estados tomado medidas (legislativas e outras) destinadas a impedir que o conhecimento de informação genética possa permitir a introdução de qualquer forma de discriminação entre cidadãos.
Neste ponto, socorremo-nos do completíssimo relatório apresentado em sede de 1.ª Comissão, da autoria da Sr.ª Deputada Maria de Belém Roseira - a quem saúdo pelo excelente trabalho desenvolvido -, para deixar uma palavra sobre os mais importantes instrumentos normativos internacionais nesta matéria.
De entre eles, o mais importante é, sem dúvida, a Convenção para a Protecção dos Direitos do Homem e da Dignidade do Ser Humano face às Aplicações da Biologia e da Medicina, também conhecida, e já aqui falada, por Convenção sobre os Direitos do Homem e a Biomedicina, ou por Convenção de Oviedo, já que aí foi adoptada.
Esta Convenção tem por objectivo assegurar a protecção do ser humano na sua dignidade e na sua identidade e garantir a qualquer pessoa o respeito pela sua integridade e pelos seus outros direitos e liberdades fundamentais face às aplicações da biologia e da medicina, prevendo, designadamente, que: o interesse e o bem do ser humano deve prevalecer sobre o interesse da sociedade ou da ciência; é interdita toda a forma de discriminação de uma pessoa devida ao seu património genético; só devem ser efectuados testes preditivos de doenças genéticas para fins médicos ou de investigação médica, sob reserva de acompanhamento genético apropriado.
Mas esta Convenção funda-se e inspira-se também noutros instrumentos jurídicos internacionais igualmente importantes na área dos direitos humanos e liberdades fundamentais, designadamente na Declaração Universal dos Direitos do Homem, na Convenção para a Salvaguarda dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, na Carta Social Europeia, no Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos e no Pacto Internacional sobre o Direitos Económicos, Sociais e Culturais, na Convenção para a Protecção das Pessoas relativamente ao tratamento automatizado de dados de carácter pessoal e na Convenção sobre os Direitos da Criança.
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Aqui chegados, cumpre perguntar quais são, no fundo, as preocupações dos autores do projecto de lei. Basicamente, a de impedir a utilização da informação genética para

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introduzir qualquer forma de discriminação entre cidadãos, desde logo, impedindo o estabelecimento de restrições ou diferenças de preço no acesso a contratos de seguro, sendo uma preocupação que as condições dos seguros de vida não sejam determinadas pelo acesso à informação genética.
Alegam os autores do projecto que as seguradoras contabilizam já, de qualquer modo, os seus próprios riscos nos montantes dos prémios que estabelecem, e, em razão disso, não julgam aceitável que a realização de testes genéticos seja imposta como condicionante do estabelecimento de contratos de seguros.
Em segundo lugar, entendem que os testes genéticos não podem ser considerados para efeitos de contrato de trabalho, tornando-se por isso necessário regulamentar o acesso a informação e a testes genéticos no trabalho. Duvidam os autores do projecto de lei - e bem! - do valor do consentimento em situações de vulnerabilidade social, como são as das relações laborais, do emprego e da estabilidade económica.
Por fim, referem que a probabilidade de detecção através de testes genéticos realizados para uma destas finalidades de indivíduos saudáveis que, no futuro, possam vir a ser afectados com uma doença grave suscita questões relevantes de ordem ética, atendendo às possibilidades de discriminação social ou económica, na medida em que empresas, empregadores e agências de adopção possam ter acesso privilegiado a essa informação para minorarem os seus riscos ou aumentarem os seus proveitos.
Com tais fundamentos, construíram um projecto de lei que acolhe as sugestões das várias entidades ouvidas a propósito desta e da anterior iniciativa que apresentaram na VIII Legislatura, nomeadamente o Colégio de Especialidade de Genética Médica da Ordem dos Médicos, a Comissão Nacional de Protecção de Dados e o Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida.
Por outro lado, também acolheram os princípios e critérios essenciais que foram sufragados pela Assembleia através da aprovação, na generalidade, dos projectos de resolução apresentados na VIII Legislatura, que aqui já referi.
Registamos, com particular agrado que as palavras que o Deputado Narana Coissoró verteu, neste Plenário, na altura da discussão, a propósito do "black-out total", foram acolhidas e portanto não "caíram em saco roto". De facto, o artigo 16.º do projecto de lei define o conceito de investigação médica, sujeita-a a aprovação dos comités de ética da instalação hospitalar, universitária ou de investigação e requer o consentimento informado e escrito dos pacientes, com excepção das situações de urgência, obviamente.
Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: As preocupações subjacentes a este projecto de lei são também, e no essencial, sentidas pelo CDS-PP.
Também o CDS-PP entende que se devem definir regras claras para a separação entre informação médica e informação genética preditiva e pré-sintomática.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Também o CDS-PP entende que se deve legislar sobre o uso da técnica dos testes genéticos e sobre a aplicação destes testes aos cidadãos, assegurando o seu consentimento informado e a não introdução de qualquer forma de discriminação, quer em matéria de contratos de seguro, quer em matéria de emprego, quer noutras que se venham a revelar susceptíveis de propiciar tais medidas discriminatórias.
Porque também o CDS-PP compartilha do ponto de vista de que o cidadão é proprietário de toda a informação em saúde e de que a informação genética deve ser mantida confidencial, entende igualmente que devem ser definidas regras para os pedidos de informação genética por parte de seguradoras, empregadores e outros.
Assim sendo, saudamos esta iniciativa. Deste modo, em consonância com isso e com tudo o que aqui fui dizendo, apenas quero protestar o empenho do CDS-PP, em sede de especialidade, em colaborar e dar a sua participação activa na concretização de uma escorreita lei de informação genética pessoal e de saúde.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A Assembleia da República está hoje a debater uma questão que consideramos da maior importância e que nos remete para um problema dos nossos tempos, aquele que resulta da extraordinariamente rápida evolução no domínio técnico-científico e da necessidade de a equacionar à luz da ética, ou seja, uma vez mais, a questão que se coloca é saber em que medida é que deve ser usado aquilo que o conhecimento nos vai proporcionando. Por isso, temos de discutir não só o que é possível fazer mas também o que se deve fazer.

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Ora, esta discussão é suscitada devido a um passo extraordinariamente importante, do nosso ponto de vista, que resulta da descodificação do genoma humano, ou seja, a possibilidade de identificação da sequência do genoma humano, que se traduz num passo decisivo para que possamos atingir um novo patamar para o conhecimento da biologia e da medicina, e que, além disso, possibilita o seu uso e a sua manipulação com a finalidade suprema que, no entendimento de Os Verdes, deve pautar e servir de referência à humanidade, que é o seu progresso, a sua liberdade e o aumento do seu bem-estar de uma forma equitativa e justa.
Dito isto, gostaria de referir que este projecto de lei, que vem identificar e colocar na agenda política esta preocupação, tem a precedê-lo, neste caso de uma forma positiva, iniciativas anteriores, que já foram referidas, ou seja, projectos de resolução apresentados pelo PS e pelo PSD, que procuravam chamar a atenção para a necessidade do uso desta transformação, do nosso ponto de vista muitíssimo grande, de forma a balizá-la, garantindo a não discriminação ou o uso indevido (até porque a história da Humanidade tem atrás de si exemplos suficientemente negativos para que não possam ser ignorados), numa perspectiva de melhoria dos cuidados e saúde e de maior bem-estar.
Portanto, aquilo que hoje estamos a discutir é um projecto que procura definir um outro enquadramento, um outro quadro legal, o quadro jurídico dentro do qual se pretende que as modificações do conhecimento da informação genética possam ser utilizadas.
Gostava de dizer - e essa referência é feita no excelente relatório que suporta este projecto de lei e que o acompanha - que esta questão, que já foi aqui suscitada em várias intervenções, cruza com outros domínios em relação aos quais a Assembleia tem centrado a sua atenção: desde logo, as questões que têm a ver com o acesso dos cidadãos aos dados e à informação, com a Lei de Protecção dos Dados Pessoais, e ainda com um diploma que hoje não foi aqui referido, ou melhor, com vários diplomas, um dos quais suscitava esta questão, visando a proibição de todas as formas de discriminação não só em função da deficiência como em função da existência de risco agravado de saúde.
No fundo, de algum modo com um enfoque diferente, coloca-se na ordem do dia a importância de prevenir, de todo em todo, situações de discriminação, para as quais, aliás, este diploma chama a atenção e é um dos seus objectivos e razão de ser.
Julgo que todos temos consciência - e a discussão do Código do Trabalho permitiu que esse debate fosse feito - do risco imenso que hoje os cidadãos enquanto trabalhadores têm de ser discriminados em razão da sua ficha clínica, da sua situação de doença ou, neste caso, da informação genética pessoal e informação de saúde que possa ser detida por outros e usada, nomeadamente, contra a sua possibilidade de acesso ao emprego. Este é um perigo real, e é um perigo tanto mais real - e a sua discussão é oportuna - quanto sabemos que se faz, despistagem de determinado tipo de doenças contra a vontade dos cidadãos, condicionando o seu resultado a possibilidade do acesso ao emprego.
Por isso, esta questão é, do nosso ponto de vista, uma parte do debate que este projecto de lei suscita. De forma genérica, ele merece a nossa aprovação, sendo naturalmente um diploma que, pela complexidade das questões para que remete e para a própria formulação de algumas das propostas, deve, em nosso entendimento, sofrer significativas melhorias em termos da especialidade, designadamente acolhendo o parecer do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr.ª Deputada, o seu tempo terminou. Faça o favor de concluir.

A Oradora: - Termino já, Sr.ª Presidente.
Por isso, Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, se, porventura, este processo legislativo vier a ser concluído, gostaríamos que este diploma fosse melhorado; caso o não seja (e esperamos que tal não aconteça), em todo o caso, o seu debate no Parlamento é uma questão de actualidade, é pertinente e, por isso mesmo, do nosso ponto de vista, é de saudar.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma segunda intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Alda Sousa.

A Sr.ª Alda Sousa (BE): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados. Evidentemente que registo com agrado o consenso bastante alargado que parece existir nesta Câmara em relação a vários destes problemas e aos enunciados deste projecto de lei. É evidente que eles vêm também retomando as resoluções que a Assembleia da República aprovou em Junho de 2001, na mesma altura em que aprovou o projecto de lei apresentado pelo BE que depois não chegou a ter concluído o processo na especialidade.
Houve várias sugestões e achegas que foram feitas nas intervenções que consideramos muito importantes e que podem ser retomadas em sede de especialidade, por forma a melhorar substancialmente o projecto, dando-lhe uma maior abrangência e, ao mesmo tempo, limitando o seu campo. Desde logo, tudo

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aquilo que tenha a ver com medidas que possam ser protectoras de eventuais ou potenciais situações de discriminação será evidentemente bem-vindo.
Quanto à sugestão que o Sr. Deputado Massano Cardoso fez relativamente às questões do diagnóstico pré-implantatório, do nosso ponto de vista, é evidente que não há nenhum problema referi-lo num outro diploma - aliás, até já fizemos um diploma sobre o diagnóstico pré-implantatório. Portanto, parece-nos que isso poderá perfeitamente transitar para outro diploma, e fará sentido. Na verdade, na altura em que o escrevemos, há dois anos, talvez tenhamos tido a tendência de meter demasiadas coisas neste projecto.
Aliás, também em relação a alguns aspectos da genética forense, eles não cabem, de facto, aqui e deverá haver, com certeza, uma referência que remeta para a necessidade de legislação específica nessa área, mas é demasiado complexa para poder ser misturada e confundida com as situações muito mais do foro médico ou de saúde - são de outra natureza e levantam outro tipo de questões. Portanto, os bancos médico-legais necessitariam, sem dúvida, de um diploma próprio, que pensamos que será necessário vir a ser feito.
Gostaria de apelar a propostas para a especialidade, que possam vir a melhorar o texto, algumas já foram feitas no decurso das intervenções. Creio que há aqui algumas questões que são eventualmente mais complicadas, como, por exemplo, a questão que a Sr.ª Deputada Maria de Belém Roseira colocava e que é complexa, sobre o sigilo, a informação aos familiares, sobre quais são os limites dessas situações, algumas complicadas. Na verdade, ainda há relativamente pouco tempo, no âmbito de um colóquio, estivemos a debater esta questão, no Porto. Penso que será algo que valerá a pena ser tratado em detalhe e com profundidade, em sede de especialidade.
Também em relação aos aspectos do que é que é família, se são apenas os consanguíneos ou não, penso que teremos de ver igualmente como é que isso poderá ser analisado.
Respondendo ainda à Sr.ª Deputada Odete Santos, em relação aos testes no trabalho, penso que o projecto é bastante categórico, mas estaremos dispostos a medidas que reforcem a não discriminação, que não permitam as situações de discriminação, porque o projecto diz claramente que não podem ser feitos, nunca, testes no trabalho a pedido da entidade empregadora - isso seria, de facto, um "genismo" laboral de que há pouco estávamos a falar.
Portanto, estes testes não poderiam nunca ser feitos a pedido do empregador. Poderiam ser feitos em situações - que, aliás, ainda estão bastante por provar - em que haja susceptibilidades genéticas ou predisposições herdadas que possam ser gravemente agravadas pelo ambiente de trabalho, mas, se calhar, aí, o que seria mais correcto era alterar as condições de trabalho e não propriamente fazer testes… Mas pode haver situações, e o projecto tem de pensar um pouco no futuro, se a ciência vier a descobrir essas situações.
A solução que encontrámos foi a de que, em situações que pudessem ser do estrito benefício do trabalhador, os testes nunca pudessem ser feitos a pedido da entidade empregadora mas, eventualmente, a pedido do próprio trabalhador e por uma entidade ou serviço de saúde completamente exterior à empresa.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr.ª Deputada, o seu tempo terminou. Faça o favor de concluir.

A Oradora: - Termino já, Sr.ª Presidente.
É evidente que o tempo é curto para questões tão complexas, mas será com certeza possível, numa outra oportunidade, em especialidade, aprofundar e debater algumas delas. De qualquer modo, seria importante que, numa primeira fase, isto pudesse ser concluído, em termos de ser considerado um passo importante na legislação portuguesa.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, chegámos ao fim da apreciação do projecto de lei n.º 28/IX, que será votado, na generalidade, no fim do debate.
Vamos agora passar à apreciação do Decreto-Lei n.º 108/2004, de 11 de Maio, que altera o Decreto-Lei n.º 83/2000, de 11 de Maio, que aprova o regime legal da concessão e emissão de passaportes [apreciações parlamentares n.os 78/IX (PS) e 79/IX (PCP)]. Informo a Câmara que deu entrada na Mesa uma declaração de interesses, ao abrigo do artigo 27.º do Estatuto dos Deputados, do Sr. Deputado Carlos Gonçalves.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Luís.

O Sr. Carlos Luís (PS): - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, foi publicado, no passado dia 11 de Maio de 2004, no Diário da República, o Decreto-Lei n.º 108/2004, que alterou o Decreto-Lei n.º 83/2000, de 11 de Maio.

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Como é consabido, o passaporte constitui um instrumento fundamental para a mobilidade e circulação territorial dos cidadãos na medida em que permite aos respectivos titulares a entrada e saída do território nacional, bem como do território de outros Estados que o reconheçam para tal efeito. Nessa medida, a sua concessão encontra-se expressamente regulada no plano jurídico-legal, devendo obediência aos princípios da legalidade e da autenticidade, assim como da veracidade e segurança dos dados nele contidos.
Entre nós, a concessão de passaporte encontra-se prevista e regulada no Decreto-Lei n.º 82/2000, de 11 de Maio. No que concerne ao passaporte especial, modalidade próxima do passaporte diplomático, o artigo 30.º do citado diploma legal excluía do seu âmbito de aplicação as categorias de Vice-Cônsul e de Cônsul Honorário bem como as de funcionários e pessoal não integrado no quadro dos serviços internos do Ministério dos Negócios Estrangeiros que, com carácter de permanência, exercem funções dos serviços externos daquele Ministério.
Trata-se de uma lacuna que importa suprir dado estarem em causa cidadãos que desempenham funções de natureza pública que, nalguns casos, podem envolver até mesmo o exercício de poderes de autoridade ou de representação externa do Estado. Nessa medida, o Grupo Parlamentar do PS apresentou na presente legislatura um projecto de lei reconhecendo àqueles cidadãos o direito à titularidade de passaporte especial.
Ora, de uma análise ao Decreto-Lei n.º 108/2004, de 11 de Maio, agora publicado, constata-se que o mesmo, embora reconheça o direito a passaporte especial àquelas categorias de cidadãos, no que especificamente respeita aos funcionários e pessoal que integram os quadros únicos de vinculação ou contratação dos serviços externos do Ministério dos Negócios Estrangeiros, faz depender tal direito da exigência de titularidade de passaporte por parte das autoridades locais dos países em que residem. Trata-se, pois, de uma solução normativa desajustada e desequilibrada quer do ponto de vista dos direitos e interesses dos cidadãos em causa, quer do ponto de vista do próprio exercício de funções públicas. Foi nesse sentido que, em nome do Grupo Parlamentar do PS, solicitei a apreciação parlamentar do diploma em apreço.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Sr. Presidente, Sr.as Deputadas, Srs. Deputados: Segundo a Convenção de Viena sobre as relações diplomáticas, os Estados Partes "persuadidos que uma Convenção Internacional sobre relações, privilégios e imunidades diplomáticas contribuirá para o desenvolvimento de relações amistosas entre as nações…" reconhecem "que a finalidade de tais privilégios e imunidades não é beneficiar indivíduos mas, sim, a de garantir o eficaz desempenho das funções das missões diplomáticas, em seu carácter de representantes dos Estados".
É neste sentido que todos os Estados da União Europeia criam condições para garantir o eficaz desempenho aos cidadãos e cidadãs que exercem funções nas diferentes missões diplomáticas.
No entanto, Portugal optou por reduzir essas condições de eficiência, criando dificuldades no exercício das respectivas funções a um lato número de funcionários do Ministério dos Negócios Estrangeiros. Foi assim que, durante o ano de 2003, o País soube, através da comunicação social, que alguns portugueses no exercício destas funções, quer em embaixadas, quer em consulados, eram sujeitos a humilhações públicas no estrangeiro, com total cumplicidade do governo português. Foi assim que o País soube que um funcionário do Ministério dos Negócios Estrangeiros deslocado para os Estados Unidos foi retido e mandado sair do país porque, não obstante ser um funcionário ao serviço de Portugal num país estrangeiro, possuía um bilhete de avião de ida e volta como se de turista se tratasse. Foi assim também que uma funcionária, deslocada para trabalhar ao serviço do Ministério dos Negócios Estrangeiros na Suíça, viu ser apreendida toda a sua bagagem, por desconhecimento do Estado que a recebia e incompetência do governo português, e ainda se viu impossibilitada de realizar de um contrato de aluguer de uma residência para si e para a sua família e até a não possibilidade de matricular os filhos nos adequados estabelecimentos de ensino.
Foi neste contexto, inadmissível no século XXI, que o Grupo Parlamentar do PCP apresentou um projecto de lei que pretendia contribuir para, pelo menos nesta área, dignificar o trabalho de todos os que, ao serviço de Portugal, desempenham, nas missões diplomáticas e nos postos consulares, funções da Administração Pública.
O projecto de lei que apresentámos tinha como objectivo criar as condições para que fosse concedido, como já o foi anteriormente até final da década de 70, passaporte especial a estes trabalhadores.
Como é sabido, o regime de concessão de passaportes está sujeito ao princípio da legalidade, previsto no Decreto-Lei n.º 83/2000, de forma a garantir autenticidade, veracidade e segurança, e o passaporte

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especial é uma das categorias previstas. É uma modalidade próxima do passaporte diplomático e a sua concessão é reservada por lei a um universo limitado de pessoas. Por um lado, a titulares e membros de outros órgãos do Estado, da administração regional autónoma e da administração local, bem como a outras pessoas ao abrigo de lei especial, e, por outro, a um segundo grupo, em que a concessão se justifica por razões de ordem funcional ligadas a específicas missões de serviço público a realizar fora do território nacional e confiadas pelo Estado português a certas pessoas, designadamente a alguns funcionários do Ministério dos Negócios Estrangeiros.
É exactamente no âmbito do artigo 30.º deste diploma que se exclui o pessoal não integrado no quadro dos serviços internos do Ministério dos Negócios Estrangeiros que, com carácter de permanência, exerce funções nos serviços externos daquele Ministério.
Parece-nos uma omissão incorrecta, porque os regimes de acreditação e de imunidades, prerrogativas e privilégios aplicáveis a estes trabalhadores, resultariam na concessão e emissão de passaporte diplomático, a exemplo do que acontece com os trabalhadores dos serviços internos com os mesmos direitos.
Trata-se de uma omissão inexplicável relativamente a um conjunto de trabalhadores que desempenham funções de natureza pública, que pode, inclusive, envolver o exercício de poderes de autoridade ou de representação externa do Estado.
Não se entende porque não se consagram outras categorias de pessoal, igualmente investido em cargos de chefia.
Entretanto, em sede de Comissão de Assuntos Europeus e Política Externa, aquando de uma audiência concedida ao Sindicato dos Trabalhadores Consulares e das Missões Diplomáticas, os partidos da maioria disponibilizaram-se para também apresentar uma iniciativa legislativa nesta área, com o objectivo de resolver as dificuldades que enquadravam as funções destes trabalhadores em países estrangeiros pela não concessão do passaporte especial.
Esta promessa não foi cumprida, como tantas outras, e posteriormente, o Governo publicou, em 11 de Maio último, alterações ao decreto-lei já referido, relativo ao regime legal de concessão e emissão dos passaportes.
Quando se aguardaria que o Governo produzisse um diploma que resolvesse os problemas com que se confrontam estes trabalhadores no exercício das suas funções, nomeadamente pondo fim à repetição dos lamentáveis acontecimentos ocorridos em 2003 - retenção na fronteira e ordem de abandono do país, nos Estados Unidos, e retenção de bagagem na alfândega suíça -, o Governo optou por não decidir e entrega a decisão ao critério da "análise casuística", o que, na prática, significa o seguinte: anteriormente, o decreto-lei excluía o pessoal que, com carácter de permanência, exerce funções nos serviços externos do Ministério dos Negócios Estrangeiros, ou seja, os trabalhadores dos postos consulares e das missões diplomáticas não integrado no quadro dos serviços internos do mesmo ministério; agora, continua a excluí-lo mas, se os trabalhadores forem expulsos do país, retidos nos aeroportos, confiscadas as bagagens, sujeitos a interrogatórios policiais, aí, perante a humilhação pública, o Governo, generosamente, concede-lhes um passaporte especial.
E porquê?! Não é por falta de recursos financeiros, porque, quando estes incidentes ocorrem, como por exemplo a bagagem confiscada, posteriormente ao esclarecimento da situação, o Estado português pode ter que pagar, por exemplo, 4000 euros, o que já aconteceu.
E quanto custa ao Estado português a emissão de cerca de 900 passaportes especiais - é este exactamente o número de trabalhadores - para garantir a credibilidade do País e o respeito por aqueles que o representam?! Cerca de 4000 euros também. Portanto, o Governo não quer, simplesmente porque não quer.
Enumerámos as razões que sustentam a apreciação parlamentar do diploma do Governo. Porque, enquanto o Governo, teimosamente, continuar a defender esta aberração, os incidentes lamentáveis irão suceder-se.
Actualmente, sem passaporte especial, por exemplo, vários funcionários colocados na Suíça não podem renovar a sua carta de legitimação, que é tão-só o documento que lhes permite trabalhar na representação diplomática portuguesa e que, em alguns casos, já caducou há mais de um ano.
Mas, nessa carta, os funcionários estão acreditados erradamente como auxiliares de serviço, não o sendo de facto, porque a Suíça só aceita o verdadeiro estatuto profissional destes trabalhadores se os mesmos se apresentarem com passaporte especial.
Por exemplo, uma tradutora/intérprete, transferida de Abidjan também para a Suíça, está legitimada como pessoal doméstico, o que é falso. Como não possui passaporte especial, o Estado português falseia as funções dos trabalhadores que mantém ao seu serviço, pedindo-lhes que o representem e credibilizem.

Vozes do PCP: - Uma vergonha!

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A Oradora: - É assim também na Missão de Portugal junto das Nações Unidas, em Genebra, na UNESCO e em muitas outras representações de Portugal no estrangeiro. Este é o estado a que isto chegou nas mãos da maioria!
No entanto, os trabalhadores, nesta lamentável e insustentável situação, tudo têm feito para a resolver. Ainda recentemente formularam requerimentos ao Governo a solicitar a emissão do passaporte especial, condição indispensável à resolução de muitos destes incidentes. E qual foi a resposta? Nenhuma, silêncio! Ainda hoje esperam resposta.
Por isso, Srs. Deputados da maioria, urge respeitar o País e aqueles que, no exterior, o representam, e, para isso, é preciso e urgente alterar o diploma governamental, e isso está nas vossa mãos.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Nazaré Pereira.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCDP): - O Sr. Deputado Carlos Gonçalves não fala?!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Quando fala, fala sempre bem!

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Está bloqueado!

O Sr. António Nazaré Pereira (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Os pedidos de apreciação parlamentar n.os 78/IX e 79/IX do Decreto-Lei 108/2004, de 11 de Maio, que altera o Decreto-Lei n.º 83/2000, de 11 de Maio, que aprova o regime legal de concessão e emissão de passaportes, apresentadas, respectivamente, pelo Partido Socialista e pelo Partido Comunista Português, revelam, de uma forma evidente, a falta de coerência destes partidos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

Protestos do PCP e do Deputado do PS Carlos Luís.

O Orador: - Falta de coerência, Srs. Deputados - que estão tão nervosos! -, que resulta de flutuações ao sabor das vontades individuais; falta de coerência que os Srs. Deputados do Partido Socialista e do Partido Comunista que me antecederam tentaram escamotear nas suas intervenções.
É verdade, Sr. Deputado e Sr.ª Deputada, que essa incoerência resulta mais da inconsistência de atitudes dos próprios partidos a que VV. Ex.as pertencem do que da vontade pessoal como intervenientes, que eu creio que é voluntarista e bem intencionada.
Tenho, porém, pena, Srs. Deputados, que as vossas vozes e a vossa vontade em resolver um problema criado pela iniciativa do governo do Partido Socialista em 2000 - é bom lembrar que este problema foi criado por uma vossa iniciativa, em 2000 - não tivesse vencimento ou nem se tivesse feito ouvir em ocasiões anteriores.

O Sr. Carlos Gonçalves (PSD): - Essa é que é essa!

O Orador: - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Partido Socialista e o Partido Comunista Português reconhecem nos respectivos pedidos de apreciação parlamentar que a concessão de passaporte especial se encontrava prevista e regulada no Decreto-Lei n.º 83/2000, de 11 de Maio.
O Partido Socialista reconhece mesmo que esse diploma excluía do seu âmbito de aplicação as categorias de vice-cônsul e de cônsul honorário, bem como os funcionários e pessoal não integrado no quadro dos serviços internos do Ministério dos Negócios Estrangeiros que, com carácter de permanência, exercem funções nos serviços externos daquele Ministério. E reconhece também no seu pedido de apreciação parlamentar que tal constituía uma lacuna que importava suprir.
No entanto, o Partido Socialista omite que esse decreto-lei é da responsabilidade de um governo do próprio Partido Socialista e que, enquanto o Partido Socialista esteve no governo, essa lacuna nunca tinha sido corrigida.

O Sr. Carlos Gonçalves (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Agora, o Partido Socialista descobriu a lacuna. E, Srs. Deputados, mais que não fosse,

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a capacidade governativa do Partido Social Democrata e do CDS-PP serve para que o Partido Socialista se confronte com as lacunas da sua própria governação.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Srs. Deputados, trata-se de uma atitude enquanto governo e de outra enquanto partido sem responsabilidade governativa. Uma incoerência que nos deixa a legítima questão de saber qual é, afinal, a verdadeira posição do Partido Socialista: a que praticava enquanto governo ou aquela que agora proclama enquanto partido da oposição.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - E desconhecemos também, Sr.ª Deputada do Partido Comunista Português, qualquer iniciativa do seu partido para alterar o texto do Decreto-Lei n.º 83/2000, de 11 de Março, enquanto o governo do Partido Socialista estava em funções.

O Sr. Carlos Gonçalves (PSD): - É verdade!

O Orador: - O Partido Comunista Português também só descobriu agora a necessidade de resolver todas as dificuldades com que se defrontam os trabalhadores dos serviços externos do Ministério dos Negócios Estrangeiros no exercício das suas funções.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Não estuda, não sabe!

O Orador: - O mínimo que se pode verificar, Sr.ª Deputada - estais extremamente incomodados, pelo que vejo! -, é que, durante pelo menos dois anos, entre 2000 e 2002, o partido, que se dizia dos trabalhadores, ignorava o problema dos trabalhadores.

Vozes do PSD: - Bem lembrado!

O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Não diga asneiras!

O Orador: - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A governação da coligação PSD e CDS-PP consubstancia um compromisso de mudança sufragado maioritariamente pelos portugueses.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O Programa Eleitoral do Governo que o Partido Social Democrata apresentou aos portugueses em 2002 explicitava claramente as medidas concretas para assumir a importância estratégica das comunidades portuguesas, nomeadamente a necessidade de "melhorar os serviços consulares, através da respectiva informatização, da qualidade do atendimento aos cidadãos e da desburocratização (…)".
Para alcançar esse objectivo, é necessário corrigir o Decreto-Lei n.º 83/2000, criando condições para que os funcionários consulares sejam dotados dos meios necessários ao efectivo exercício das suas funções ao serviço do Estado português.
Com efeito, como aqui já foi citado, aliás, a Convenção de Viena sobre relações consulares reconhece um conjunto de relações, privilégios e imunidades consulares que contribuem para o desenvolvimento de relações amistosas entre os países e esse é um objectivo de Portugal. Mas essa Convenção também reconhece que a finalidade de tais privilégios e imunidades não é beneficiar indivíduos mas, sim, assegurar o eficaz desempenho das funções dos postos consulares.
A verdade, Sr.as e Srs. Deputados, é que o Decreto-Lei n.º 83/2000, de 11 de Maio, não tinha em consideração o Decreto-Lei n.º 444/99, de 3 de Novembro, que consagra o estatuto profissional do pessoal dos serviços externos do Ministério dos Negócios Estrangeiros, e, à luz dessa legislação do Partido Socialista, o pessoal desses serviços externos não tinha, por regra, direito à atribuição de passaporte diplomático.

O Sr. João Moura (PSD): - Uma vergonha!

O Orador: - O Decreto-Lei n.º 108/2004, de 11 de Maio, veio formalmente resolver esse problema, quer a oposição o queira reconhecer quer não.

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O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - É um passo no bom sentido, no sentido de permitir aos funcionários do serviço externo o direito à emissão de passaporte especial quando se torne indispensável ao exercício das respectivas funções.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - É falso!

O Orador: - Fê-lo, Sr.as e Srs. Deputados, de uma forma, eventualmente, limitativa e casuística. É verdade! Fê-lo de uma forma, eventualmente, menos perfeita. Não temos qualquer problema em o admitir! Fê-lo de uma forma que pode ser aperfeiçoada.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - É verdade!

O Orador: - A obra humana, Sr.as e Srs. Deputados, raramente é perfeita, e, quando o é, trata-se de arte ou de religião e não da comum acção legislativa.
O Partido Social Democrata, porém, está firmemente convencido de que o prestígio da representação de Portugal no estrangeiro, o reforço da capacidade de protecção consular e a segurança de funcionários que exercem funções nos mais variados países beneficiam de uma clara regulamentação das condições de acesso e concessão do passaporte especial ao pessoal de nacionalidade portuguesa dos serviços externos do Ministério dos Negócios Estrangeiros, tornando mais geral o seu acesso.
Acresce que o Partido Social Democrata está também firmemente convencido de que a titularidade do passaporte especial pode contribuir para a correcta acreditação do pessoal dos serviços externos do Ministério dos Negócios Estrangeiros junto das autoridades locais, de acordo com o direito internacional público vigente e a prática localmente seguida neste domínio, conforme o previsto no Decreto-Lei n.º 444/99 e, em consequência, contribuir para assegurar o mais eficaz desempenho das funções dos postos consulares.
O Partido Social Democrata viabilizará, portanto, os pedidos de apreciação parlamentar n.os 78/IX e 79/IX, apesar de ser evidente, como há pouco afirmei, que os fundamentos de tais pedidos se baseiam em atitudes politicamente incoerentes.
Tal é a nossa convicção da importância em tornar processualmente expedita a emissão de passaporte a funcionários do Ministério dos Negócios Estrangeiros que, revendo a legislação de 2000, que impedia, na prática, essa emissão, nós próprios, em acção conjunta do PSD e do CDS-PP, faremos entrega na Mesa da Assembleia de propostas de alteração ao texto hoje legalmente em vigor.
Esperamos convictamente, Srs. Deputados, que seja possível, em trabalho de comissão, colaborar com todos os partidos representados nesta Assembleia, para que se alcance um texto final claro, isento de ambiguidades, mas ao mesmo tempo capaz de responder à sensibilidade do problema. Um texto que permita melhorar a eficácia da actuação dos funcionários do Estado português que, diariamente, com o seu esforço e dedicação, cuidam da representação de Portugal no exterior, em contacto permanente com serviços de outros Estados e com a grande comunidade de portugueses emigrantes. Este será benéfico para Portugal e para os portugueses.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Carlos Luís e Luísa Mesquita.
Para o efeito, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Luís.

O Sr. Carlos Luís (PS): - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado António Nazaré Pereira, pensava eu que a intervenção fosse feita por um dos três Deputados eleitos pelas comunidades portuguesas pelo círculo da Europa ou pelo círculo de fora da Europa, mas V. Ex.ª ou essa bancada têm silenciado as vozes desses três Deputados,…

Protestos do Deputado do PSD Carlos Gonçalves.

… porque é um problema que diz respeito às comunidades portuguesas, e, no meu entender, devem ser aqueles que foram eleitos pelas comunidades a tratar dele. No entanto, habituámo-nos, durante dois anos e três meses, a que silenciassem aqui esses Deputados, não lhes dando voz.

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A Sr.ª Luísa Portugal (PS): - Muito bem!

O Orador: - E aqui acresce uma maior responsabilidade, porquanto o Sr. Deputado Carlos Gonçalves é funcionário consular e foi, e penso que ainda é, delegado sindical ou com responsabilidades sindicais. Enquanto delegado sindical ou com responsabilidades sindicais tem um discurso, mas, uma vez eleito para um órgão de soberania, onde podia resolver atempadamente eventuais problemas sobre esta matéria, é o silêncio absoluto nesse órgão de soberania, que é a Assembleia da República.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Mas lembro a V. Ex.ª, Sr. Deputado Nazaré Pereira, que no I Governo Constitucional, do Partido Socialista, o então Ministro dos Negócios Estrangeiros, Medeiros Ferreira, atribuiu a todos os funcionários dos consulados e das embaixadas, ao tempo assalariados e contratados localmente, ainda sem o estatuto de funcionários públicos, o passaporte especial de serviço.
Mas - pasme-se, Sr. Deputado! -, uma vez eleita a maioria da Aliança Democrática, que era formada pelos mesmos partidos que constituem hoje a maioria, o PSD e o CDS-PP, esta retirou-lhes os passaportes especiais de serviço.
Mais, Sr. Deputado Nazaré Pereira: foi o PSD e o ainda Primeiro-Ministro demissionário que negaram sempre o direito de cidadania aos funcionários consulares e das missões diplomáticas. A um universo de 1600 funcionários, nunca lhes quis atribuir o estatuto de funcionário público.
Ora, em 1985, Jaime Gama, Ministro dos Negócios Estrangeiros, atribuiu-lhes o estatuto de funcionários públicos. O que é que fez o Dr. Durão Barroso como Ministro dos Negócios Estrangeiros? Congelou esse estatuto, esse diploma, de funcionários públicos…

Protestos do Deputado do PSD Carlos Gonçalves.

Tenha calma, Sr. Deputado, não se enerve!
Como eu estava a dizer, o Dr. Durão Barroso congelou-lhes o estatuto de funcionários públicos, e foi necessário vir novamente o Partido Socialista para dignificar o papel extraordinário que os funcionários consulares e das missões diplomáticas desempenham no estrangeiro.

O Sr. José Magalhães (PS): - Bem lembrado!.

O Orador: - Já aqui foi dito que VV. Ex.as não lhes reconhecem esse estatuto de cidadania. Como é possível…

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se. Peço-lhe que conclua.

O Orador: - Termino já, Sr.ª Presidente.
Como é possível, Sr. Deputado Nazaré Pereira, que estes funcionários tenham sido tão humilhados e que o Estado português tenha sido envergonhado quando um funcionário foi transferido para o Consulado nos Estados Unidos e foi detido na fronteira? Sr. Deputado Nazaré Pereira, foi detido porquê? Porque não estava devidamente acreditado.
Em toda a História diplomática e consular não há registo de tanta humilhação e de tanta vergonha para os funcionários consulares e das missões diplomáticas.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - O Sr. Deputado António Nazaré Pereira fez saber à Mesa que responde no final aos dois pedidos de esclarecimento.
Quero apenas, em relação a uma alusão que o Sr. Deputado Carlos Luís fez ao Sr. Deputado Carlos Gonçalves, relembrar o que disse há momentos, ou seja, que deu entrada na Mesa uma declaração de interesses deste Sr. Deputado em relação a este ponto.

O Sr. Carlos Gonçalves (PSD): - Mas ele não ouviu, estava distraído!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.

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A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado António Nazaré Pereira, eu gostaria de o lembrar de alguns factos, porque parto do princípio de que a sua intervenção foi feita, naturalmente, na convicção de que aquilo que estava a dizer seria verdadeiro e se não enunciou alguns factos foi por distracção ou por uma indisponibilidade de verificar os elementos.
O Sr. Deputado desconhece, naturalmente, que fomos nós que apresentámos um projecto de lei exactamente para alterar o decreto-lei de 2000.

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Exactamente!

A Oradora: - Naturalmente que o Sr. Deputado Carlos Gonçalves não o informou.
Também fomos nós que apresentámos o pedido de apreciação parlamentar do decreto-lei publicado pelo seu Governo em Maio passado. Naturalmente que o Sr. Deputado isso saberá.
Portanto, Sr. Deputado, sejamos claros e sérios: os senhores nada fizeram, o que fizeram foi mal feito e nós tudo fizemos para alterar o que de errado os senhores fizeram! Esta é que é a questão e estes é que são os factos! Tão simples como isto, Sr. Deputado.
Outra questão: o senhor diz que está disponível para fazer alterações àquilo que considera serem erros no decreto-lei publicado em Maio pelo Governo, àquilo que considera uma ausência de respeito do Governo relativamente aos funcionários do Ministério dos Negócios Estrangeiros que o seu Governo tem humilhado publicamente nos mais diversos locais do mundo.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Portanto, o Sr. Deputado diz que está disponível não só para que nenhum funcionário do Ministério dos Negócios Estrangeiros possa sair do País para trabalhar numa missão portuguesa com passaporte de turista,…

O Sr. António Nazaré Pereira (PSD): - O que é isso de "passaporte de turista"?!

A Oradora: - … para que mais nenhum funcionário do Ministério dos Negócios Estrangeiros possa ser preso num aeroporto internacional, para que mais nenhum funcionário do Ministério dos Negócios Estrangeiros possa ter na sua carta de legitimação que é funcionário doméstico e não tradutor, intérprete ou funcionário administrativo mas também para que o seu Governo não continue a mentir, vergonhosa e escandalosamente, como tem feito, aos Estados e a outros governos da Europa e fora da Europa.
O Sr. Deputado conhece, com certeza, uma carta enviada pela Embaixada portuguesa em Berna e a resposta dada pelo Governo suíço, chamando a atenção do seu Governo no sentido de que não pode mentir a um outro Estado, de que tem de ser sério nas informações que presta acerca das funções dos funcionários que trabalham no Ministério dos Negócios Estrangeiros.
Portanto, o Sr. Deputado está disponível para, como o povo diz, "limpar a cara" de tantos escândalos e de tantos incidentes lamentáveis a que têm sido sujeitos publicamente esses funcionários.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr.ª Deputada, o tempo de que dispunha terminou. Conclua, por favor.

A Oradora: - Vou terminar, Sr.ª Presidente.
Pergunto, Sr. Deputado, se, com tanta generosidade - e faço fé em acreditar que não será igual à do seu Governo, que, depois de humilhar os funcionários, disponibilizou-se a passar o passaporte especial -, está disponível para, hoje, repito, hoje, porque podemos fazê-lo, apreciarmos as propostas de alteração ao Decreto-Lei em discussão e resolvermos definitivamente esta questão.
É esta disponibilidade que gostaríamos de ter da sua parte.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para responder aos dois pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado António Nazaré Pereira, dispondo, para o efeito, de 3 minutos cedidos pelo CDS-PP.

O Sr. António Nazaré Pereira (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Carlos Luís, permita-me que das suas palavras me aperceba da importância que o Partido Socialista atribui às comunidades portuguesas:…

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O Sr. Carlos Luís (PS): - Toda!

O Orador: - … limita-a a dois Deputados.

Protestos do Deputado do PS Carlos Luís.

Sr. Deputado, essa não é a atitude do Partido Social Democrata! No Partido Social Democrata as questões das comunidades portuguesas são tratadas por todo o grupo parlamentar com toda a dignidade, porque entendemos que as comunidades portuguesas são uma parte da Nação que se encontra fora do País, é verdade, mas em íntima relação com todo o País.

Vozes do PSD: - Muito bem!

Protestos do Deputado do PS Carlos Luís.

O Orador: - Os Deputados são eleitos pelos círculos eleitorais, representam a Nação. Os Deputados da emigração não têm o exclusivo dos temas das comunidades portuguesas, porque os temas das comunidades portuguesas dizem respeito a todo o grupo parlamentar.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Mas, Sr. Deputado Carlos Luís, vejo que essa não é a atitude do Partido Socialista!
O Sr. Deputado referiu questões sobre o funcionamento da acreditação de funcionários e eu pergunto-lhe, revertendo a questão que me colocou, quem era governo em 2000.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Quem é que publicou o Decreto-Lei n.º 83/2000?
Tanto quanto sei, Sr. Deputado Carlos Luís, era o Partido Socialista! E tanto quanto sei - e o Sr. Deputado também sabe, mas não o diz - é à luz dessa legislação, isto é, do Decreto-Lei n.º 83/2000, do Partido Socialista, que o pessoal dos serviços externos não tem, por regra, direito à atribuição de passaporte diplomático!
Ora, foi com base nessa mesma legislação, Sr.ª Deputada Luísa Mesquita, que funcionários dos serviços externos ficaram detidos e tiveram dificuldades! Foi à luz dessa legislação publicada pelo Partido Socialista!
Sr.ª Deputada Luísa Mesquita e Sr. Deputado Carlos Luís, assumam as vossas responsabilidades, porque já é altura de as assumir.

Vozes do PSD: - Muito bem!

Protestos dos Deputados do PS Carlos Luís e do PCP Luísa Mesquita.

O Orador: - Aliás, a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita referiu-se a uma série de questões que, peço-lhe desculpa, demonstram um certo desconhecimento, que eu não esperava de si, do funcionamento do Regimento desta Assembleia.
A Sr.ª Deputada deve saber - a Sr.ª Deputada sabe de certeza, mas quis criar confusão! - que os pedidos de apreciação parlamentar, uma vez apreciados em Plenário, baixam automaticamente às comissões para aí serem apreciados e votados na especialidade e depois subirem a Plenário para votação.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - O senhor é que não sabia que as apreciações parlamentares eram votadas!

O Orador: - Se a Sr.ª Deputada tivesse prestado atenção àquilo que eu disse na intervenção, saberia que entregámos, e já deu entrada na Mesa, uma proposta de alteração ao Decreto-Lei. Se a Sr.ª Deputada entregou uma proposta de alteração e se o Partido Socialista entregou outra, o caminho normal, previsto no Regimento desta Assembleia, não pode ser outro que não o de essas propostas baixarem à comissão e não serem discutidas aqui hoje. Serem discutidas e votadas aqui hoje não é possível!

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Vozes do PCP: - Pode, pode!

O Orador: - A Sr.ª Deputada, sistematicamente, engana as outras pessoas, engana os funcionários consulares, engana aqueles que representam o Estado português!

Vozes do PSD: - Muito bem!

Protestos do Deputado do PCP Bernardino Soares, batendo com as mãos no tampo da bancada.

O Orador: - Sr.ª Deputada, V. Ex.ª também se refere às razões que estiveram por trás de toda a questão levantada relativamente a funcionários consulares e diz que eu desconheço a sua iniciativa.
Sr.ª Deputada, diga a data em que a sua iniciativa foi tomada. A sua iniciativa é o projecto de lei n.º 369/IX, de 20 de Outubro de 2003. Porque é que a Sr.ª Deputada não tomou a iniciativa em 2000?!

Vozes do PSD: - Uma vergonha!

Protestos do PCP e do Deputado do PS Carlos Luís.

O Orador: - Porque é que a Sr.ª Deputada, entre 2002 e 2003, omitiu por completo a questão que se coloca aos funcionários da delegação portuguesa?
É que, Sr.ª Deputada, sempre que oiço falar na defesa de trabalhadores e depois vejo a tentativa oportunística de utilizar os trabalhadores para uma luta que não é honesta nem real, não posso calar a minha voz, porque a minha voz é a voz da razão, é a voz de quem defende aqueles que têm feito um esforço muito significativo para, junto das comunidades portuguesas, representarem Portugal e darem dignidade ao Estado português.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Anacoreta Correia.

O Sr. Miguel Anacoreta Correia (CDS-PP): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Os pedidos de apreciação parlamentar, apresentados pelo PS e pelo PCP, do Decreto-Lei n.º 108/2004, que altera o Decreto-Lei n.º 83/2000, revelam, como aqui já foi afirmado, alguns aspectos de falta de coerência política.
O PS é autor da legislação de 2000, que não melhorou a política de gestão dos recursos humanos do Ministério dos Negócios Estrangeiros que o decreto-lei de 2004 veio procurar resolver - e resolveu, pelo menos, em parte.
Dito isto, é bom deixarmos assinalados dois ou três pontos.
Primeiro, esta legislação visa dignificar e melhorar a eficácia da acção dos funcionários consulares e não beneficiar individualmente os agentes. Procura, sim, promover o eficaz desempenho dos funcionários dos nossos postos consulares, e isto para nós é um ponto importante.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Segundo, o decreto-lei cuja apreciação é agora pedida representa, há que ser reconhecido, um passo na boa direcção: permite o direito à emissão de passaporte especial, quando se torne indispensável ao exercício das respectivas funções.
Terceiro, este passo em frente é susceptível de ser aperfeiçoado. Reconhecemo-lo sem qualquer dificuldade e, por isso, os dois partidos da maioria entregaram propostas de alteração da legislação em vigor, propostas que não têm a pretensão de ser definitivas nem de cobrir a totalidade dos problemas, mas visam aperfeiçoar o Decreto-Lei hoje em apreciação, cujos preceitos merecem ser melhorados.

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Entendemos que esta matéria deve ser tratada com sentido de Estado e, por isso, vamos viabilizar os pedidos de apreciação parlamentar do PS e do PCP - hoje, apenas podemos viabilizar estes pedidos de apreciação parlamentar, e nada mais -,…

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Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Não é verdade!

O Orador: - … na esperança de que, em comissão, todos os partidos conjuntamente possam convergir num texto claro, capaz de responder definitivamente aos problemas que se põem.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Tudo quanto possa melhorar a eficácia das nossas representações diplomáticas deve ser feito. É o Estado que o pede e os nossos emigrantes que o exigem.

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A nossa posição é construtiva. Trata-se de um problema de âmbito de Estado em que os partidos devem esforçar-se para encontrar a melhor solução.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente, Mota Amaral.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, uma vez que não há mais oradores inscritos, dou por encerrada a apreciação do Decreto-Lei n.º 108/2004, de 11 de Maio, que altera o Decreto-Lei n.º 83/2000, de 11 de Maio, que aprova o regime legal da concessão e emissão de passaportes [apreciações parlamentares n.os 78/IX (PS) e 79/IX (PCP)].
Comunico à Câmara que deram entrada na Mesa propostas de alteração a diversos preceitos do Decreto-Lei em apreciação, as quais, juntamente como o Decreto-Lei, vão baixar à 2.ª Comissão para o respectivo debate.
Srs. Deputados, vamos passar à apreciação da petição n.º 80/VIII (3.ª) - Apresentada pela Associação Nacional dos Doentes com Artrite Reumatóide (ANDAR), solicitando que a Assembleia da República legisle no sentido de poderem beneficiar da comparticipação de 100% nos medicamentos prescritos, nomeadamente imunosupressores, imunomoduladores e corticoesteroides.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Pavão.

O Sr. José Manuel Pavão (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Algumas semanas antes de me ser distribuído este dossier sobre a artrite reumatóide, recebi um telefonema de uma cidadã respeitável - por coincidência, amiga pessoal -, informando-me que as suas análises indicavam estar afectada por esta doença.
Algumas semanas antes, durante alguns meses, esta cidadã, sofria o incómodo de dores pouco características, de uma fadiga matinal pouco definida, enfim, um mal-estar geral que lhe perturbou o seu quotidiano e a sua vida familiar e profissional.
Graça de seu nome, esta cidadã minha amiga é agora uma das 40 000 portuguesas afectadas por esta doença músculo-esquelética de causa desconhecida e, se as estatísticas que possuímos falarem verdade, dentro de cinco anos, estará remetida para alguma incapacidade no seu trabalho e pertencerá aos 72% destes doentes para quem as actividades correntes da sua vida pessoal, familiar e profissional ficarão profundamente afectadas.
De facto, esta ameaçadora e incompreensível doença afecta a capacidade produtiva dos doentes e a sua relação com o trabalho. Implica um acompanhamento constante e uma assistência médica periódica que, rapidamente, os atira para uma precoce invalidez.
Assim sendo, torna-se fácil deduzir como devem ser tomados em conta os custos sociais e económicos desta doença, razão pela qual o diagnóstico precoce e uma terapêutica específica se impõem não apenas como benéfico mas para os próprios doentes, sobretudo para a sociedade a que pertencemos.
Numa só palavra: prevenir para remediar.
Explicada que está sumariamente a sua doença, avaliada a sua dimensão epidemiológica, feito o alerta sobre as implicações sociais, há que tomar medidas, fazendo justiça.
Por isso, esta petição destes 8000 cidadãos que aqui reclamam uma discriminação positiva no acesso aos medicamentos e igualdade de direitos tem, a meu ver, toda a validade, não obstante estarem já, aqui e além, consagradas a montante e no regime especial uma ou outra comparticipação destes medicamentos. É que, convém recordar, são apenas oito os hospitais do Serviço Nacional de Saúde que têm a especialidade

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de reumatologia, nos quais é possível ter acesso à medicação como os imunosupressores, os imunomoduladores ou os corticoesteroides, que constituem a tríade fundamental nesta terapêutica.
Atento aos progressos científicos da terapêutica desta doença e assumindo aqui o dever de proporcionar aos nossos concidadãos a bondade dos melhores e mais modernos tratamentos, registamos com apreço o trabalho efectuado pelo INFARMED na avaliação rigorosa dos medicamentos, que é um passo prévio ao circuito comercial.
A meu ver, cabe aqui também uma palavra de muito apreço pelo labor desinteressado e pela dedicação de quantos, voluntariamente, se têm multiplicado em acções na defesa legítima dos direitos dos doentes e da conquista do seu bem-estar, como é o exemplo generoso da ANDAR - Associação Nacional dos Doentes com Artrite.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o tempo de que dispunha esgotou-se.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
É necessário, com celeridade, continuar a dar a estes doentes afectados pela artrite reumatóide o apoio na sua dor e no seu sofrimento para que não se sintam discriminados.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Portugal.

A Sr.ª Luísa Portugal (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Por iniciativa da ANDAR - Associação Nacional dos Doentes com Artrite Reumatóide, foi apresentada nesta Assembleia uma petição subscrita por cerca de 8000 cidadãos, que solicitam o acesso a medicamentos em equidade e igualdade de direitos com outras doenças incapacitantes que já beneficiam de protecção especial consagrada em legislação específica.
Em concreto, pretendem que todos os medicamentos com indicação terapêutica nesta patologia sejam comparticipados a 100%, incluindo os novos medicamentos biológicos, independentemente do local de prescrição e do serviço de saúde em que são atendidos.
A artrite reumatóide é uma doença inflamatória crónica de causa ainda desconhecida, que afecta mais mulheres do que homens e que tem um efeito evolutivo no sentido da incapacidade se não tratada ou se o seu tratamento for descurado. Se tivermos em atenção que a maioria dos doentes diagnosticados são jovens adultos, percebemos o efeito negativo que pode acontecer na capacidade produtiva dos doentes na sua vida familiar e social, com todo um caudal de dificuldades que pode tornar impossível o seu quotidiano laboral, afectivo e de tarefas da vida diária.
Procurando entender esta doença, dou voz ao Gonçalo, que nos diz: "Aos 25 anos, constatei que me tornara um inválido. Sem forças para estudar ou trabalhar, e sem tratamento eficaz, as perspectivas de futuro reduziram-se a um grande sofrimento físico e mental, à infelicidade e solidão. Um dia, com um novo tratamento, durante as férias, vivi o deslumbramento de poder movimentar-me. Julguei-me vítima de uma ilusão quando vi que a deformação das minhas mãos, dos meus dedos, regredia. Mas era verdade… E eu ressuscitei."
É esta a fotografia tipo do doente com artrite reumatóide: a revolta, o espanto, a labilidade emocional, a incapacidade mas também a esperança. E esta esperança tem que ser real, em muito dependendo de terapêutica precoce e eficaz. Numa relação custo/benefício, podemos dizer que se o custo económico é grande os benefícios gerados são ainda maiores. É desta esperança e nesta esperança que vive a petição que hoje apreciamos.
Sendo uma doença crónica, tem tratamento, mas não tratada de forma precoce e atempada pode levar a uma incapacidade e dependência extremas com custos económicos e sociais de grande importância.
A esperança para estes doentes depende também de uma rede nacional de referenciação hospitalar de reumatologia, que, embora aprovada, aguarda a sua implementação no terreno, acrescentando às dificuldades inerentes à doença de que os mesmos sofrem todas as desigualdades criadas por um planeamento sistematicamente adiado.
Somos sensíveis a todos estes problemas apresentados pelas doenças osteoarticulares no seu conjunto e da artrite reumatóide em particular.
Somos também sensíveis às petições que, da iniciativa dos cidadãos, nos mostram as desigualdades que ainda existem na sociedade, que queremos que seja fraterna e solidária.
Mas também sabemos que a existência de um plano nacional de controlo das doenças reumáticas que comporte a dimensão preventiva, o tratamento e a reabilitação, com um conjunto de equipamentos articulados e com técnicos especializados e sensibilizados, não chega para resolver todos os problemas médicos

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e sociais inerentes a estas patologias. Será necessário que se concretize em medidas visíveis e que melhore a prestação de cuidados de saúde e o acesso aos medicamentos e tratamentos apropriados a cada doente como forma de melhorar a qualidade de vida e minimizar as complicações daquelas doenças.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, o tempo de que dispunha esgotou-se.

A Oradora: - Termino já, Sr. Presidente.
A vida, a qualidade de vida e a dignidade na doença é também uma decisão política. Ao contrário das catástrofes naturais, o sofrimento humano é evitável, e neste sofrimento temos que incluir a doença, mas também as perturbações laborais, familiares, emocionais e sociais por ela causadas.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Alda Sousa.

A Sr.ª Alda Sousa (BE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A petição que dá origem à presente discussão foi enviada à Assembleia da República pela ANDAR - Associação Nacional dos Doentes com Artrite Reumatóide, tendo sido assinada por mais de 8000 cidadãos, que, por este meio, reivindicam o direito de comparticipação a 100% dos fármacos necessários ao controle de sintomas e da evolução da artrite reumatóide, situação que se verifica para outras doenças crónicas.
A artrite reumatóide é uma doença inflamatória crónica, de causa ainda desconhecida, envolvendo particularmente as articulações. Caracterizando-se por provocar dor e, a médio e a longo prazos, impotência funcional das articulações, especialmente nas mãos, punhos, cotovelos, joelhos e pés, podendo afectar qualquer outra, esta doença pode afectar também outros órgãos, como os olhos, coração, pulmões, rins e também o sistema nervoso periférico.
Em Portugal, estima-se em cerca de 100 000 as pessoas que sofrem desta patologia, a qual, pelas suas características, pode limitar actos simples que fazemos todos os dias vezes sem conta, tais como abrir uma porta, agarrar numa caneta ou calçar os sapatos, pondo em risco a capacidade produtiva dos indivíduos, bem como a sua vida familiar e social e, até, a sua autonomia, nalguns casos. No entanto, esta é uma doença cujos sintomas podem ser controlados e a evolução retardada pela acção de fármacos, cujo desenvolvimento, nos últimos anos, tem sido bastante significativo. Falamos de corticosteróides, anti-inflamatórios, imunosupressores e imunomoduladores.
No relatório que a Sr.ª Deputada Luísa Portugal apresentou à Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais encontra-se referência a informações prestadas pelo Ministério da Saúde sobre a petição em discussão. Pode ler-se que o Ministério afirma sentir "a necessidade de conferir um maior rigor na fixação dos pressupostos que levam à concessão de benefícios especiais, centrando-nos no doente crónico e não na doença crónica (…) fazendo depender estes benefícios, não da simples existência da doença mas, sim, da avaliação periódica do grau de incapacidade resultante."
Adianta-se, ainda, que "não podemos fazer depender os benefícios a atribuir aos doentes crónicos da maior ou menor capacidade de reivindicação das suas associações representativas, sob pena de acentuarmos as desigualdades existentes."
Ora, tendo de recorrer com bastante frequência a medicamentos que, pela sua complexidade, são caros, o tratamento de suporte para esta patologia torna-se muito oneroso para os doentes e suas famílias, chegando este custo a ser incomportável. Justifica-se, portanto, que exista um aumento de direitos para estes doentes, nomeadamente o alargamento da comparticipação dos seus medicamentos.
A satisfação desta exigência, que se relaciona com uma doença cuja realidade o Governo parece desconhecer, ao ponto de usar expressões como "a simples existência da doença", trará benefícios não só para os cidadãos que dela beneficiarem como também para o próprio Estado, que poderá, através da prevenção, tirar dividendos. Lá diz a frase "na prevenção está o ganho".
A decisão da comparticipação de medicamentes destinados ao controle de sintomas e da evolução de qualquer doença crónica é, por lei, da competência exclusiva do Governo. No entanto, ao debater iniciativas como esta, além de estarmos a valorizar a intervenção cidadã - aquela que o Governo parece não considerar assim tão importante -, estamos a chamar toda a temática em questão à ribalta, fazendo com que se discuta abertamente sobre uma doença que é o dia-a-dia de muita gente.
Mesmo não tendo capacidade decisória, estaremos mais atentos depois deste esforço levado a cabo pela ANDAR, porque reconhecemos justiça nesta reivindicação, porque, na nossa óptica, o Estado deve ser igualmente solidário e promover o bem-estar das cidadãs e dos cidadãos.

Vozes do BE: - Muito bem!

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O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Gonçalves para uma intervenção.

A Sr.ª Isabel Gonçalves (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A petição n.º 80/VIII (3.ª) é da iniciativa da ANDAR - Associação Nacional dos Doentes com Artrite Reumatóide, nela se solicitando o acesso a medicamentos em equidade e igualdade de direitos com outras doenças incapacitantes que já beneficiam de protecção especial.
Nesta iniciativa, os peticionantes pretendem que seja fixada uma comparticipação a 100% de todos os medicamentos com indicação terapêutica específica naquela patologia, incluindo os novos medicamentos biológicos só cedidos em algumas farmácias hospitalares.
A artrite reumatóide é uma doença crónica músculo-esquelética de causa desconhecida, sistémica. Caracteriza-se por causar inflamações articulares, mas frequentemente atinge outros órgãos com manifestações clínicas diversas, mostrando, nalgumas fases da doença, uma incapacidade funcional para actividades da vida diária.
Esta doença afecta a capacidade produtiva dos doentes, a sua relação com o trabalho e com a família e, consequentemente, a sua normal inserção na sociedade.
A artrite reumatóide, quando não tratada, pode levar a uma incapacidade e dependência extremas.
Em Portugal, há cerca de 100 000 pessoas que sofrem de artrite reumatóide, sendo que 72% dos doentes estão incapacitados para o trabalho cinco anos após o diagnóstico.
Os custos sociais e económicos desta doença são muito elevados, pelo que todo o esforço no controlo da progressão da doença através de um diagnóstico precoce e de um tratamento atempado, correcto e eficaz, não apenas sintomático, trará benefícios directos para os doentes e também para a sociedade.
É precisamente neste sentido que se formou um grupo de peritos para analisar um conjunto de doenças crónicas, onde se inclui a artrite reumatóide.
Entendemos também, como afirmou o Ministério da Saúde, "a necessidade de conferir um maior rigor na fixação dos pressupostos que levam à concessão de benefícios especiais, centrando-se no doente crónico e não na doença crónica (…) fazendo depender estes benefícios, não da simples existência da doença mas, sim, da avaliação periódica do grau de incapacidade resultante."
Podemos concluir, então, que este tema está a ser estudado no sentido de se encontrar uma solução integral que visa a globalidade das doenças crónicas, nas quais, naturalmente, se inclui a artrite reumatóide, numa perspectiva nunca antes abordada - a do doente e não simplesmente a da doença.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A petição que hoje discutimos tem na base uma situação de enorme importância na nossa sociedade, que se estima afectar cerca de 100 000 pessoas, aproximadamente 1% do total da população, com consequências graves nas suas vidas e, pela sua dimensão, com consequências e custos graves para a sociedade.
É precisamente por isso, pelo facto de os custos desta doença terem importância e um impacto muito grande na sociedade, que mais fundamentadamente pode dizer-se que o investimento no seu tratamento é altamente reprodutível em todos os aspectos da vida social, para além de ser um direito dos que sofrem desta doença.
Penso que as questões que nos são colocadas na petição podem objectivamente ser concentradas a dois aspectos. Ao primeiro podemos chamar o aspecto social de acesso à medicamentação e à comparticipação.
Se entendemos que qualquer comparticipação, sobretudo num meio em que o poder e a pressão da indústria farmacêutica são muito grandes, deve ser fundamentada cientificamente e ter esse crivo científico decisivo, também é verdade que essa decisão, como aparece acontecer neste caso, não pode ser protelada indefinidamente, não pode continuar a não ser tomada e, por outro lado, não pode estar à espera também que existam, e devem existir, mecanismo de controlo que assegurem a boa aplicação dos recursos públicos nesta matéria.
No fundo, o que tem de ser preservado nesta matéria não são princípios economicistas no tratamento da questão mas, em primeiro lugar, o princípio do direito à saúde das populações, do direito à saúde dos doentes com artrite reumatóide. De resto, quando se fala repetidamente em privilegiar o doente crónico e não a doença crónica está a desprezar-se a importância que, na saúde pública, tem o tratamento da doença crónica na sua globalidade e o impacto que ela tem independentemente da situação individual de cada um na própria sociedade.

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O outro aspecto é o geográfico. Falta, evidentemente, a regulamentação da rede de referenciação que está prometida há muito tempo. O acesso a estes medicamentos em hospitais pode, e deve, ser melhorado mesmo na base da rede de hospitais públicos. Pensamos que esse deve ser o princípio seguido para os medicamentos estarem mais acessíveis a estes doentes.
É absolutamente inacreditável a resposta do Ministério da Saúde, já aqui mencionada, em que se refere ao facto de não poder fazer depender os benefícios a atribuir a doentes crónicos da capacidade de reivindicação das suas associações. É uma resposta inacreditável, porque quer dizer que não atendem a essas reivindicações nem quando as associações são reivindicativas nem quando elas não o são. Essa é a situação que, de facto, temos.
Finalmente, mais esta situação vem pôr a nu a falta que temos, no nosso país, de um regime geral que, mesmo com aplicações específicas, possa enquadrar o problema de várias doenças crónicas e dos aspectos que elas implicam em termos de medicamentos e em muitos outros níveis.
Essa bitola geral continua a faltar, o que, depois, tem prejuízos em cada caso de cada doença concreta.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Não havendo mais oradores inscritos, dou por encerrada a apreciação da petição n.º 80/VIII (3.ª).
Pelas várias posições expressas estou certo de que se seguirá alguma iniciativa sobre a matéria, a tomar no âmbito da maioria ou da oposição, cada um conforme as suas responsabilidades, em diálogo com o Governo, tendo em vista dar resposta às questões que nos são suscitadas pelos peticionários.
Vejo que na galeria se encontram diversas pessoas que se identificam como estando ligadas à associação promotora desta petição. Aliás, verifico que algumas delas não só pertencem à associação como sofrem de artrite reumatóide, e de maneira bastante visível.
Dirijo-lhes os meus cumprimentos, em nome da Câmara, e uma saudação amiga e solidária.
Vamos passar à apreciação da petição n.º 70/IX (2.ª) - Apresentada pelo Movimento de Cidadãos pró-Cuidados Paliativos, reclamando que o acesso aos cuidados paliativos seja considerado como um direito inquestionável de todos os cidadãos e incluído na Constituição da República Portuguesa.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Clara Carneiro.

A Sr.ª Clara Carneiro (PSD): - Sr. Presidente, estamos a apreciar uma petição sobre cuidados paliativos e o PSD congratula-se com o seu conteúdo, sobretudo porque surge do Movimento de Cidadãos pró-Cuidados Paliativos, Movimento do qual eu tive conhecimento através do meu colega de bancada Dr. António Pinheiro Torres.
Trata-se de um movimento que nasceu pela positiva, ou seja, é constituído por um conjunto de cidadãos que, tendo usufruído de cuidados paliativos para as suas famílias, entendeu que os cuidados paliativos não deviam ser só para eles mas também para toda a população portuguesa.
Actualmente, em Portugal só estamos a praticar cuidados paliativos no IPO do Porto, que o faz há 10 anos, no Centro de Saúde de Odivelas, na Santa Casa da Misericórdia da Amadora, no IPO de Coimbra, no Hospital da Cova de Beira e, muito recentemente, na Santa Casa da Misericórdia de Azeitão.
Este Movimento de Cidadãos pró-Cuidados Paliativos recolheu 24 000 assinatura num tempo recorde (em 3 semana) e eu felicito a sua primeira subscritora, que se encontra a assistir à sessão na galeria.
Apesar de a cultura dos países do Sul, como é o nosso, lidar mal com a morte - ainda hoje, não gostamos de ouvir falar da morte e os cuidados paliativo significam, exactamente, morrer sem sofrimento -, apesar de a morte ainda ser uma realidade tabu, o PSD vê com muito bons olhos esta iniciativa.
Hoje em dia, em Portugal, morrer com menos de 75 anos é considerado morte prematura. Temos estatísticas que apontam no sentido de que, a partir de 2010, o grupo etário dominante em Portugal vai ser, exactamente, o que tem mais de 75 anos de idade, que vai ultrapassar o grupo etário dos adolescentes, até aos 18 anos. E neste grupo acima dos 75 anos de idade vai verificar-se o envelhecimento de topo, ou seja, mais de metade desse grupo terá uma idade superior a 75 anos. De forma que, cada vez mais, os cuidados paliativos são uma necessidade.
Ora, foi Governo do PSD que, pela primeira vez, legislou sobre esta matéria e criou uma rede de cuidados continuados, na qual estão integrados, naturalmente, os cuidados paliativos. No entanto, como este tipo de cuidados requer uma qualificação técnica e uma preparação multidisciplinar, a grande aposta vai para a formação de técnicos, por forma a que os cuidados paliativos sejam uma excrescência melhor equipada e preparada dos cuidados continuados.
Foi também este Governo que aprovou, há pouco tempo, o Programa Nacional de Educação Continuada em Dor e Cuidados Paliativos, que faz parte integrante do Plano Nacional de Saúde e que vai ter aplicação entre os anos de 2004 e 2010, apesar de os cuidados paliativos já fazerem parte integrante do

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Plano Oncológico Nacional.
Vemos, pois, com muito bons olhos esta petição e esperamos que, muito em breve, porque tal não aconteceu na última revisão constitucional, os cuidados paliativos possam vir a estar incluídos no artigo 64.º da Constituição da República Portuguesa, muito embora, pessoalmente, entenda que eles são mais operacionais do que objecto de inclusão na nossa Constituição.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria de Belém Roseira.

A Sr.ª Maria de Belém Roseira (PS): - Sr. Presidente, as minhas primeiras palavras são para saudar esta iniciativa. Penso não só que este Parlamente se enriquece quando vira o seu olhar e dedica o seu tempo às iniciativas dos cidadãos que reclamam a atenção dos Deputados para a resolução de problemas com os quais se debatem mas também que esta matéria é reconhecida, unanimemente, de enorme importância.
Porém, não quero referir-me a ela, avocando louros para mim própria enquanto membro do anterior governo como vi agora avocar para o actual Governo. Penso que o importante é referir que esta é uma área mais de operacionalidade do que de legislação, como foi dito.
Podia ainda, a este propósito, referir que a unidade de cuidados paliativos do IPO do Porto foi criada por mim, que a unidade de cuidados paliativos, que teve grande influência na elaboração desta petição da Dr.ª Isabel Galriça Neto, foi nomeada também durante o meu mandato, que o Dia Nacional da Luta Contra a Dor também foi estabelecido nessa altura, porque considero…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - E não queria avocar louros para si!…

A Oradora: - Mas isso não tem importância nenhuma! Penso que não há que invocar louros políticos relativamente a pontuações. Em meu entender, esta matéria, pela sua delicadeza, pela sua importância, pelo enorme sofrimento que gera e pela nossa ainda incapacidade, em termos de meios, para lhe fazer face, reclama de todos uma enorme atenção. E essa atenção reclama muito mais em termos de garantia de que, progressivamente, os nossos recursos se irão distribuindo e formando no sentido de fazer face a uma necessidade crescente do que propriamente em termos de alterações na Constituição. O artigo 64.º da Constituição tem uma definição do direito à saúde que deve ser interpretada de forma abrangente e não há dúvida de que os cuidados paliativos também se integram no conceito de cuidados de saúde. Nenhum de nós, interrogado sobre a matéria, seria capaz de dizer "aquele cidadão que sofre". E em causa não estão só os mais velhos. Infelizmente, temos o problema do controlo da dor à medida que aumentam não só a taxa de incidência do cancro, por exemplo, nas camadas mais jovens mas também outras doenças que matam de forma muito dolorosa, muito agressiva, por vezes de forma extraordinariamente lenta - e quanto mais lenta mais dolorosa.
Portanto, esta matéria reclama de todos nós carinho, compreensão, atenção e, sobretudo, um dar de nós no sentido de que todos estamos interessados no aperfeiçoamento, na valorização e no aumento dos meios que temos para fazer face a esta problemática.
Por isso, o Partido Socialista encara esta questão como responsabilidade também do seu grupo parlamentar,…

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, o seu tempo esgotou-se.

A Oradora: - … no sentido de melhorar e de aperfeiçoar cada vez mais os níveis de atenção à qualidade de vida e ao sofrimento humano, que é um dever de todos garantir.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Discutimos hoje, aqui e agora, uma petição assinada por mais de 24 000 cidadãs e cidadãos, enviada a esta Assembleia pelo Movimento de Cidadãos pró-Cuidados Paliativos, que saudamos.
Pretendem os peticionantes que a temática dos cuidados paliativos seja colocada na ordem do dia, nomeadamente que estes se tornem numa preocupação dos serviços de saúde, um direito efectivo e constitucionalmente garantido a todos os cidadãos e cidadãs.

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Ao longo do último século, a evolução do conhecimento técnico e científico permitiu um aumento da qualidade e da quantidade na prestação de cuidados de saúde, levando a que as pessoas tenham ao seu dispor meios que lhes permitam viver mais e melhor.
Esta é uma premissa que se tem verificado nos países desenvolvidos, especialmente naqueles em que o acesso universal à saúde é democraticamente garantido pelo funcionamento dos sistemas de saúde.
Para lá dos benefícios obtidos, verifica-se que o progresso das ciências médicas se deu, tendencialmente, no sentido da ciência curativa da doença, da técnica infalível contra a dor, que, apesar da abordagem humanista de que se foi revestindo, deixou para segundo plano os aspectos relacionados com as doenças incuráveis, nomeadamente no que respeita ao acompanhamento da fase terminal e da morte de doentes e apoio aos familiares que delas padecem.
Esta tendência da medicina, produto de uma cultura científica alimentada pela competitividade e pela necessidade de resultados positivos imediatos, é, no nosso país, directamente influenciada por uma clara dificuldade no relacionamento com questões ligadas com a morte e o sofrimento, dificuldade essa que radica em factores culturais que, de futuro, deverão ser trabalhados no sentido de uma mudança.
Porque quando falamos de cuidados paliativos falamos, directa ou implicitamente, nesse tema quase tabu que é a morte. A morte como uma fase da vida em que os efeitos do sofrimento e a dor podem ser reduzidos; a morte enquanto um processo que se prolonga no tempo e cuja vivência envolve não só o indivíduo como também a sua família, quem lhes está próximo e os serviços de saúde; a morte como um momento alargado em que cada um e cada uma tem direito ao conforto e à dignidade.
Segundo a Sociedade Espanhola de Cuidados Paliativos, estes definem-se como a atenção integral, individualizada e continuada de pessoas em situação de doença avançada ou terminal, bem como das pessoas a elas vinculadas por razões familiares ou de proximidade. Esta situação de doença caracteriza-se pela presença de múltiplos sintomas, com origem em diversos factores e em evolução, com alto impacto emocional, social espiritual, condicionando uma elevada necessidade e procura de cuidados. É através dos cuidados paliativos que se dá uma resposta efectiva a estas necessidades.
Esta é uma definição sintética e elucidativa do propósito que se quer alcançar e da alteração que os signatários desta petição procuram introduzir no Serviço Nacional de Saúde. Passado que está o período de revisão constitucional, a intenção de assumir os cuidados paliativos como direito constitucional ficará, necessariamente, adiada. No entanto, a porta da mudança foi já aberta.
Dando uma vista de olhos nas orientações estratégicas para o sector, encontram-se referências breves a cuidados paliativos no recente Plano Nacional de Saúde e no 76.º dos 100 Compromissos para uma Política de Família, documentos da responsabilidade dos até agora ministros Luís Filipe Pereira e Bagão Félix, e no Plano Oncológico Nacional, iniciativa do último Executivo chefiado por António Guterres.
No relatório que a Sr.ª Deputada Maria Clara Carneiro faz à Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais, encontra-se ainda referência a um plano nacional de cuidados paliativos que estará em preparação. Que contornos tem este plano? Quem está a ser ouvido na sua elaboração? A que necessidades procurará dar resposta? Ainda nada se conhece desta iniciativa… Em que modelos de prestação de cuidados se irá basear? No modelo canadiano? No modelo espanhol? No modelo francês? Em todos? Será um novo e inovador? Será que é apenas uma ideia ou já existe alguma coisa de facto?
Sr. Presidente, o Bloco de Esquerda está de acordo com a necessidade da criação de mecanismos de resposta do Serviço Nacional de Saúde no que respeita aos cuidados paliativos, considerando que este se deve tornar num direito universal e gratuito.
Consideramos, também, que esta Assembleia, e termino, pode e deve ter um papel preponderante na procura de respostas nesta área, pelo que preparou um projecto de resolução, entregue hoje na Mesa, onde se propõe a elaboração de um estudo preliminar, em tempo razoável, para a implementação de uma rede nacional prestadora de cuidados paliativos.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Gonçalves.

A Sr.ª Isabel Gonçalves (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Na petição n.º 70/IX (2.ª), os peticionantes pretendem que o acesso aos cuidados paliativos seja considerado um direito inquestionável de todos os cidadãos e incluído na Constituição da República Portuguesa.
Importa referir a Organização Mundial de Saúde que descreve os cuidados paliativos como "uma resposta à necessidade dos indivíduos que apresentam doença avançada, incurável e progressiva, com múltiplos sintomas em evolução, tendo como objectivo principal a garantia da melhor qualidade de vida ao doente e sua família."
Apesar de haver já medidas pontuais em prol dos cuidados paliativos no que respeita à humanização dos cuidados de saúde e do seu inequívoco interesse público, o certo é que hoje, no século XXI, este tipo de cuidados não está ainda suficientemente divulgado e acessível a todos aqueles que deles carecem.

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Em Portugal, têm vindo a ser desenvolvidos esforços pontuais nesta matéria. No entanto, os serviços qualificados e devidamente organizados são escassos e insuficientes para as necessidades detectadas.
Para além disso, importa reforçar que os cuidados paliativos são prestados com base nas necessidades dos doentes e famílias e não com base, muitas vezes, no seu diagnóstico. E são muitos os doentes que carecem destes cuidados. Estamos a falar de um problema que atinge muitos milhares de famílias portuguesas.
A questão dos cuidados na doença progressiva, na doença avançada e na doença terminal é um problema universal - tão universal como os cuidados pré-natais e de infância.
É por sentir estas preocupações que tem estado a ser elaborado um programa nacional de cuidados paliativos, que vai no sentido de uma recomendação da Organização Mundial de Saúde e do Conselho da Europa com o objectivo de inclusão dos cuidados paliativos nos sistemas de saúde.
Entendemos que este programa nacional de cuidados paliativos deverá ser implementado gradualmente, em complemento da rede de cuidados continuados vocacionada para a prestação de cuidados de recuperação global, centrados na reabilitação, readaptação e reintegração.
Resta-nos afirmar que o CDS tem abraçado esta preocupação e que tudo faremos para que, num futuro próximo, os cuidados paliativos sejam uma realidade ao serviço de todos aqueles que deles carecem.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta petição, subscrita por 24 000 cidadãos, apresenta-nos dois objectivos.
Em primeiro lugar, a inclusão do direito aos cuidados paliativos na Constituição da República Portuguesa. Obviamente que os subscritores da petição queriam aproveitar um período em que estávamos em processo de revisão constitucional, mas essa alteração não se produziu. Não obstante, é possível dizer que nada disso significa que não esteja já incluído no espírito e na letra do artigo 64.º da Constituição o direito aos cuidados paliativos. É assim que o entendemos, pelo que pensamos que a Constituição não peca por esse facto.
De igual modo, entendemos que não há nenhuma falha de sustentação na Constituição para se garantir aquilo que é o segundo objectivo desta petição, que é o de garantir o direito aos cuidados paliativos a todos os cidadãos. Esse deve ser, de facto, um direito inquestionável.
Quero aqui lembrar que, em requerimento entregue pelo PCP em 10 de Dezembro de 2003, precisamente sobre a rede de tratamentos e de cuidados paliativos, abordávamos esta questão. Este requerimento não foi ainda respondido mas o Governo, mesmo em gestão, pode responder a requerimentos. Pode ser que se digne responder a este, porque a questão é, de facto, muito importante.
É evidente que a rede pública que temos é muito limitada: existem apenas quatro ou cinco estabelecimentos públicos, trabalhando, embora, com muita qualidade e com enorme esforço e dedicação dos seus profissionais. Mas estamos muito longe, quer em termos de planificação quer em termos de resposta no Serviço Nacional de Saúde, da realidade que seria necessária e da existência de uma rede básica vocacionada, de facto, para os cuidados paliativos.
É evidente que num panorama político gerido numa lógica economicista, em que as orientações da política de saúde se viram mais para as questões da empresarialização, da diminuição de custos, do aumento das receitas próprias das unidades, as unidades de cuidados paliativos são muito pouco apetecíveis.
É também evidente que, no que diz respeito à rede de cuidados continuados, a prática está muito longe daquilo que são os objectivos anunciados pelo Governo nesta matéria. E, se isto é assim em relação à rede de cuidados continuados, em relação ao aspecto específico dos cuidados paliativos o problema é ainda mais grave.
Na verdade, o que se está a fazer é apostar apenas em protocolos com entidades do sector privado ou social - que têm, certamente, o seu papel nesta matéria -, não investindo em unidades públicas que tenham um papel importante nesta questão.
Pela nossa parte, não deixaremos de abordar esta matéria, porque ela é justa e deve ter uma resposta por parte dos governos e também da Assembleia da República. Entendemos que os cidadãos portugueses devem ter direito a uma rede de cuidados paliativos que seja tomada não como uma necessidade menor ou supérflua no nosso Serviço Nacional de Saúde mas como uma prioridade com tanta importância como outras áreas do Serviço Nacional de Saúde e da prestação de cuidados de saúde.

Vozes do PCP: - Muito bem!

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O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Gostaria de me pronunciar de uma forma breve, neste Plenário, sobre esta petição que mais de 24 000 pessoas dirigem à Assembleia da República, dando, aliás, continuidade àquilo que tem sido o seu esforço de chamar a atenção dos decisores políticos, do Governo e do Parlamento sobre a necessidade de garantir os cuidados paliativos.
Esta petição visa a constitucionalização do acesso a estes cuidados. É nosso entendimento que, não obstante a Constituição não ter consagrado esse direito, o simples facto de hoje já garantir o direito à saúde deve ser sinónimo do acesso universal e em todas as dimensões à saúde no que ela implica, donde também a uma rede de cuidados paliativos. No nosso entender, não é da consagração constitucional ou não destes cuidados que depende aquilo que consideramos um objectivo e uma reivindicação absolutamente justa e desejável, que é a garantia destes cuidados às pessoas que deles carecem.
Este é um problema que exige atenção (e esta questão já foi aflorada) e uma outra atitude em relação à dor e à necessidade de mobilizar todos os meios para a minimizar e garantir às pessoas, individualmente consideradas, uma resposta integrada que permita, no fundo, a sua assistência no momento porventura mais doloroso da sua vida - a morte.
Gostava de dizer também que, em nossa opinião, o acesso a cuidados paliativos deve estar intimamente ligado com aquilo que é ainda hoje um mero compromisso de papel, ou seja, a garantia de uma rede de cuidados continuados. Esta rede tem enorme importância, como se compreende, numa sociedade como a nossa, em que há, como é desejável, um prolongamento da esperança de vida das pessoas, mas também, simultaneamente, uma resposta cada vez menor da sociedade em relação aos mais idosos, que exigem respostas que não estão, de modo tradicional, nas unidades de saúde e nas unidades hospitalares e que, por isso, carecem, na retaguarda, de um apoio integrado que hoje não existe.
Do nosso ponto de vista, aquilo que foi protocolado muito recentemente pelo Ministério da Saúde com as misericórdias é uma resposta pontual, manifestamente incipiente para a dimensão de um problema que é de saúde, mas também social e humano.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, o tempo de que dispunha esgotou-se.

A Oradora: - A concluir, gostaria de dizer que esta questão é importante e tem, seguramente, de ser considerada por aquele que vier a ser o futuro governo, visto que a discussão está hoje a ser feita num momento algo singular.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, se o que se pretende é a alteração da Constituição, isso só poderá ser tratado na próxima revisão constitucional.
Terminamos, assim, a apreciação da petição n.º 70/IX (2.ª).
Srs. Deputados, informo que deu entrada na Mesa o projecto de resolução n.º 273/IX - Propõe a elaboração de um estudo preliminar à implementação de uma rede nacional prestadora de cuidados paliativos, apresentado pelo Bloco de Esquerda.
Gostava, ainda, de assinalar à Câmara o seguinte: hoje, depois de debatidas estas petições, ficam pendentes de outras legislaturas apenas quatro petições que exigem debate em Plenário, ou seja, subscritas por mais de 4000 cidadãos. Elas estão em comissão, que em breve apresentarão os seus relatórios. Conseguimos, portanto, fazer uma grande recuperação em relação ao trabalho atrasado. Há 13 petições de anteriores legislaturas em comissão com menos de 4000 assinaturas, pelo que, em princípio, não serão submetidas a debate em Plenário.
Da IX Legislatura entraram, até agora, 93 petições, das quais estão pendentes 47: 18 assinadas por mais 4000 cidadãos, pelo que terão de ser obrigatoriamente debatidas em Plenário; e 29 não preenchem esse requisito, pelo que serão apenas apreciadas em comissão, respondendo-se aos peticionários nos termos da lei.
Julgo, portanto, que temos feito um bom trabalho para pôr esta área das nossas responsabilidades - a interactividade com os nossos concidadãos - em dia.
Passamos agora à apreciação do relatório da Comissão Eventual para a Análise e a Fiscalização dos Recursos Públicos Envolvidos na Organização do EURO 2004.
Para apresentar o relatório, tem a palavra o Sr. Presidente da Comissão, Sr. Deputado Laurentino Dias. Dispõe de 3 minutos.

O Sr. Laurentino Dias (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Quando a Comissão Eventual para a Análise e a Fiscalização dos Recursos Públicos Envolvidos na Organização do EURO 2004 tomou

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posse há cerca de dois anos e meio creio que ficou claro para todos os seus membros que o mandato conferido pelo Plenário nos deveria conduzir a duas preocupações primeiras: a de acompanhar, analisando e fiscalizando os fundos públicos carreados para o Euro 2004 nas diversas áreas de intervenção deste evento - as infra-estruturas, o turismo, a saúde, a segurança, etc.; e a de que esta Comissão pudesse ser um fórum de acompanhamento, discussão e informação permanente das diversas forças políticas quanto a um desafio forte como o Euro 2004 e quanto à procura de consensos e de convergências extraordinariamente úteis para que o Parlamento tivesse também uma participação positiva no concretizar dos objectivos do Euro.

Neste momento, regista-se burburinho na Sala.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Laurentino Dias, permita-me uma interrupção. Peço o silêncio da Câmara. Eu próprio estou com grande dificuldade em ouvir o orador e temos todos muito interesse, de certo, em tomar conhecimento deste relatório que encerra os trabalhos desta Comissão Eventual. É auspicioso: temos um princípio, um meio e um fim nesta Comissão.
Pode continuar, Sr. Deputado.

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Creio que estas duas preocupações foram cumpridas integralmente no trabalho da Comissão e estão vertidas no relatório final.
Permita-me, Sr. Presidente, que relegue para as intervenções dos Srs. Deputados dos diferentes grupos parlamentares as referências que entendam convenientes quanto ao teor do relatório, que, em súmula, é positivo quanto ao trabalho da Comissão, e que me fique, enquanto Presidente da Comissão, por fazer alguns agradecimentos aqui, em Plenário.
Em primeiro lugar, gostaria de agradecer aos Srs. Deputados que foram membros desta Comissão pela participação que tiveram, pelo trabalho que produziram, e aos funcionários da Casa que foram inexcedíveis na criação de condições para que esta Comissão pudesse funcionar - e recordo que funcionou não apenas nas paredes do Parlamento mas teve muitas e muitas intervenções de natureza pública que, se não fosse a participação dos funcionários de forma activa e diligente, não teriam sido possíveis.

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Finalmente, gostaria de agradecer a V. Ex.ª, Sr. Presidente, em nome pessoal e da Comissão, a forma empenhada como connosco colaborou e como ajudou a criar condições para que esta Comissão cumprisse, como pensamos que cumpriu, cabalmente o mandato que lhe foi conferido pelo Plenário.

Aplausos do PS, do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Hugo Velosa.

O Sr. Hugo Velosa (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Uma primeira nota para dizer que, do ponto de vista do Grupo Parlamentar do PSD, esta Comissão deu um excelente contributo para o êxito do Euro 2004 através dos trabalhos que desenvolveu.
Por outro lado, devo dizer que todos nós, os que fizemos parte desta Comissão, devemos estar de consciência tranquila porque o trabalho foi excelente e aproveito também para agradecer aos grupos parlamentares que integraram a Comissão.
Não há dúvida de que a Comissão Eventual para a Análise e a Fiscalização dos Recursos Públicos na Organização do Euro 2004 teve muito trabalho: em cerca de dois anos, fez 84 reuniões; fez o acompanhamento das obras nos estádios, das acessibilidades; promoveu muitas audições e muitos debates sobre questões relacionadas com o Euro 2004, nomeadamente, nas áreas da saúde, da segurança e das acções promocionais; fez a análise das auditorias financeiras ao Euro 2004. Enfim, a Comissão cumpriu cabalmente os objectivos para que foi criada e, portanto, em termos parlamentares, penso que todos devemos estar satisfeitos com o trabalho desenvolvido.
Como já disse, foram feitas dezenas de audições e a Comissão fez, efectivamente, um trabalho de análise e de fiscalização dos recursos envolvidos na organização do Euro 2004.
Aliás, é bom lembrar neste momento que a Comissão promoveu uma exposição sobre o Euro 2004, na Assembleia da República, com o apoio do Sr. Presidente da Assembleia, exposição essa que foi um sucesso.

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A Comissão deu, pois, um contributo activo para o sucesso do Euro 2004, nomeadamente na área da segurança, da promoção e da imagem de Portugal.
Daí que tenhamos aceite o que consta do relatório final da Comissão em que é feita uma avaliação positiva da participação do Estado português na organização do Euro 2004, positiva quanto à forma como se construiu este campeonato em termos institucionais, positiva, também, quanto aos contratos e todos os documentos que consubstanciaram e fundamentaram o Euro 2004, positiva, ainda, quanto à inexistência das chamadas "derrapagens", considerando que, até agora, a administração central cumpriu com todas as suas obrigações.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Portanto, o trabalho é positivo, a Comissão deu o contributo parlamentar para o êxito do Euro 2004 e prestigiou esta Assembleia.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias.

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Já no decurso dos trabalhos desta tarde e a propósito do voto apresentado pelo Sr. Presidente, o Plenário teve oportunidade de abordar, em jeito de balanço, o assinalável êxito que foi a realização do Campeonato Europeu de Futebol.
Agora, voltamos ao assunto para nos pronunciarmos sobre o relatório da Comissão, que foi aprovado por unanimidade, sendo que a avaliação que ali se faz dos processos institucionais, organizativos, de concretização das infra-estruturas e dos equipamentos envolvidos neste torneio, do ponto de vista da análise da informação disponibilizada até ao momento, é o balanço possível, muito adiantado, que cumpria à Comissão fazer.
Com este relatório, a Comissão cumpre o essencial do mandato que este Plenário lhe conferiu quando, nesta IX Legislatura, resolveu criar novamente esta Comissão enquanto mecanismo de acompanhamento, discussão, reflexão sobre as iniciativas que a organização deste torneio envolveu.
Tratou-se de um processo longo, diversificado e intenso que esta Comissão foi desenvolvendo. Acreditamos que se tratou de um importante contributo desta Assembleia, tendo demonstrado, mais uma vez, que é útil, relevante e necessária a iniciativa do Parlamento no sentido de acompanhar matérias de relevância da vida nacional, não fechando tal reflexão nos gabinetes ministeriais.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Relativamente à matéria deste relatório, reiteramos a consideração que expressámos já hoje quanto ao êxito assinalável do Euro 2004 nas vertentes desportiva, organizativa, de cumprimento da programação e da execução financeira dos recursos públicos envolvidos nos empreendimentos directamente associados ao Euro 2004.
Entretanto, o encerramento, a breve prazo, dos mecanismos e processos de controlo financeiro, previstos, aliás, nos próprios contratos-programa, irá permitir a confirmação dessa perspectiva, sendo que há a fazer uma outra avaliação, muito mais complexa mas não menos importante, não só sobre o impacto mais amplo ao nível económico e social como quanto ao impacto e ao potencial deste evento para a promoção da prática desportiva no nosso país.
Na sessão de hoje, eu próprio já abordei a importância efectiva e a indispensabilidade do alargamento da prática desportiva a todo o povo português. No que diz respeito a essa outra avaliação, cá estaremos para fazê-la, no presente e no futuro próximo.
Não podemos deixar de constatar que há uma consideração unânime da importância dessa vertente mas que a política desportiva que tem sido seguida vem numa espécie de contra-vapor. A este propósito, veja-se o caso da lei de bases do desporto que, em nosso entender, não deve entrar em vigor.
Repito que cá estamos, e estaremos, para defender uma outra política desportiva que possa também merecer uma avaliação positiva.
Uma última palavra, Sr. Presidente e Srs. Deputados, para registar, reconhecer e valorizar o papel de quem contribuiu directamente para o trabalho desta Comissão, o êxito dos respectivos trabalhos e o bom funcionamento registado. Destacamos, naturalmente, o trabalho do Sr. Presidente da Comissão e de todos os Srs. Deputados que a integraram e, ainda, o dos funcionários desta Casa que, pelo seu empenho diário, permitiram que a mesma tenha funcionado de uma forma que também avaliamos positivamente.

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Aplausos do PCP, do PSD e do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Pinho de Almeida.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Esta Comissão cessa agora o seu trabalho e, nesta altura, é importante que assinalemos a forma sempre empenhada e democrática como correram os trabalhos. Esta Comissão teve uma missão específica, a qual se esgota precisamente neste momento.
É importante que reconheçamos também o contributo de todos que contribuíram para este trabalho, antes de mais, o dos funcionários da Assembleia da República que, sempre diligentemente, permitiram que a Comissão fizesse o seu trabalho, essencial para que cumpríssemos os objectivos.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Há que reconhecer o trabalho desenvolvido por todos os Srs. Deputados que integraram esta Comissão, nomeadamente o seu Presidente, que cumpriram o mandato que foi conferido pelo Plenário. Assinalamos o papel do Sr. Presidente da Assembleia da República que colaborou estreitamente com a Comissão, nomeadamente na organização da exposição montada neste Parlamento e que permitiu dar a conhecer um pouco melhor, não só a quem cá trabalha mas também a todos os cidadãos que vieram visitá-la, qual era o empenhamento público, o que é que estava a ser construído em Portugal relativamente a este Campeonato da Europa de Futebol.
Portanto, queremos realçar todo esse trabalho.
Por outro lado, queremos relevar o trabalho específico da Comissão que, como já foi dito, constou não só em acompanhar as obras dos estádios, face mais visível, durante grande parte deste percurso, do que era a realidade do Euro 2004, mas também todas as envolvências relativas à segurança, à saúde, ao turismo, às acessibilidades e aos transportes, tudo realidades que foram suscitando questões numa fase ainda de preparação deste evento.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Esta Comissão contribuiu sempre para o esclarecimento da opinião pública em relação a estas matérias.
Em muitas ocasiões, tal esclarecimento da opinião pública revelou-se fundamental. Questões que foram surgindo, tal como dúvidas naturais ou até receios que também poderiam justificar-se, contaram sempre, por parte desta Comissão, com um trabalho no sentido do esclarecimento público.
Melhor termina este trabalho quanto foi um êxito a realização do Euro 2004, em Portugal.
Por parte do Grupo Parlamentar do CDS-PP, queremos reconhecer o êxito que foi o Euro 2004 em todas estas vertentes, não só quanto ao que aconteceu no nosso país durante aproximadamente um mês mas quanto a tudo o que ficou para o País em termos de recursos, em termos de estima que as pessoas sentem neste momento e que é diferente do que sentiam há uns tempos e, ainda, quanto ao que significou de promoção de Portugal no estrangeiro. Tudo isso é o património que fica do Euro 2004.
Naturalmente, esta Assembleia da República deve honrar-se por ter contribuído para que o trabalho desta Comissão tenho sido o que foi.

Aplausos do CDS-PP, do PSD e do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Galamba.

O Sr. António Galamba (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Encerramos hoje um ciclo. A Comissão Eventual para a Análise e a Fiscalização dos Recursos Públicos envolvidos na Organização do Euro 2004 submete à apreciação o relatório final das suas actividades.
Agora que o evento terminou, com inequívoco êxito organizativo e desportivo, importa sublinhar a visão dos governos PS que souberam conquistar para Portugal a organização do evento, o empenho do Governo PSD/PP em tudo fazer para concretizar o objectivo de organizar "o melhor europeu de sempre" e a intervenção do Parlamento, constituindo-se em parte da solução dos problemas e dos desafios colocados aos portugueses e a Portugal.
Já hoje saudámos o trabalho desenvolvido pelos promotores dos estádios, pela Federação Portuguesa de Futebol, pela Sociedade EURO 2004, pela Sociedade Portugal 2004, pelo seleccionador nacional e restante equipa técnica e pelos nossos jogadores.

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Já hoje agradecemos o contributo decisivo de milhares de portugueses que, na saúde, na segurança, no turismo, nos transportes e no voluntariado, concorreram para êxito do Euro 2004.
Já hoje sublinhámos a paixão e a adesão dos portugueses no apoio à sua Selecção e a notável capacidade de bem receber e projectar Portugal na Europa e no mundo.
Agora, que é tempo de balanço, é justo realçar o debate construtivo, a análise rigorosa e a avaliação diligente que caracterizaram a esmagadora maioria das iniciativas e dos trabalhos desenvolvidos no quadro da comissão parlamentar.
É justo afirmar que o êxito do Euro 2004 não foi conseguido contra ventos e marés, mas contou com alguns marinheiros que, investidos em Velhos do Restelo, questionaram, por exemplo, o número de estádios construídos.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - E bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Comissão do Euro 2004 dissolve-se hoje. Em nome do Grupo Parlamentar do PS, gostaria de relevar a presidência desenvolvida pelo Sr. Deputado Laurentino Dias, cumprimentar os Srs. Deputados que integraram a Comissão, agradecer aos funcionários o apoio prestado, muito para além do normal, e acentuar o papel do Parlamento como factor de mobilização e concretização do evento: nas audições temáticas realizadas; nas visitas aos estádios efectuadas; na exposição que a Assembleia da República acolheu; nos contributos dados em diversos debates e fóruns onde se equacionou a organização do terceiro maior evento desportivo mundial.
A Comissão parlamentar do Euro 2004, porque sempre entendeu o seu mandato muito para além da construção ou remodelação dos estádios, lega um acervo patrimonial que reflecte um trabalho sério, sereno e determinado, em que as diferenças partidárias foram afirmadas sem nunca perder o sentido do interesse nacional e a noção do essencial.
Invocando Nelly Furtado, no hino do Euro 2004, desde a preparação da candidatura à organização do evento, até à sua conclusão, sentiu-se uma força que ninguém pôde parar. É tempo de não deixar esmorecer essa força, é tempo de colocar essa força ao serviço de Portugal e dos portugueses, no desporto como em tantas outras áreas da vida dos cidadãos.

Aplausos do PS, do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não há mais oradores inscritos, pelo que dou por encerrado o debate, felicitando todos os membros do Parlamento que participaram nos trabalhos desta Comissão Eventual e, de uma forma especial, o respectivo Presidente. Congratulo-me com o facto de termos levado a bom termo uma tarefa que é muito importante e que veio da anterior legislatura.
Passamos agora ao período regimental de votações.
Desde já, chamo a atenção da Câmara de que, a propósito da lei sobre o exercício do direito de associação profissional dos militares da GNR, há um preceito que terá de ser aprovado por maioria qualificada, isto é, por dois terços dos Deputados presentes, o que será verificado através de meio electrónico. Faço esta chamada de atenção no sentido de pedir a colaboração de todos para levarmos até ao fim, com a presença de todos, as votações.

Pausa.

Srs. Deputados, vamos, antes de mais, proceder à verificação do quórum, utilizando o cartão electrónico.

Pausa.

O quadro electrónico regista 179 presenças, pelo que temos quórum para proceder às votações.
Em primeiro lugar, vamos proceder à votação do projecto de resolução n.º 67/IX - Medidas para combate à violência doméstica (PCP).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

A Sr.ª Teresa Morais (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr.ª Deputada?

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A Sr.ª Teresa Morais (PSD): - Sr. Presidente, é para anunciar à Mesa que entregaremos de imediato uma declaração de voto escrita, explicativa do sentido de voto da minha bancada.

O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr.ª Deputada. Agradeço que a faça chegar à Mesa para lhe darmos a divulgação devida.
Srs. Deputados, passamos à votação do projecto de resolução n.º 200/IX - Cria uma comissão eventual de acompanhamento das medidas de combate às listas de espera (PS).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

Vamos agora proceder à votação do projecto de resolução n.º 201/IX - Realização de um estudo de âmbito nacional sobre as listas de espera (PS).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

Segue-se a votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 378/IX - Alteração da imagem feminina nos manuais escolares (Os Verdes).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Este diploma baixa à 7.ª Comissão para discussão na especialidade.
Vamos votar agora, na generalidade, o projecto de lei n.º 28/IX - Informação genética pessoal e informação de saúde (BE).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O diploma baixa à 8.ª Comissão para discussão na especialidade.
Passamos à votação, na especialidade, do texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo à proposta de lei n.º 124/IX - Estabelece e regula os princípios e bases gerais do exercício do direito de associação profissional dos militares da Guarda Nacional Republicana e ao projecto de lei n.º 445/IX - Direito de associação profissional do pessoal da GNR (PS).
Srs. Deputados, este diploma tem uma especificidade muito própria: é que o artigo 6.º do texto final da Comissão está abrangido pelo disposto no artigo 168.º, n.º 4, que diz que o artigo a que esta matéria diz respeito tem de ser votado na especialidade pelo Plenário, e n.º 6 da Constituição, que diz que esta matéria carece de aprovação por maioria de dois terços dos Deputados presentes, desde que superior à maioria absoluta dos Deputados em efectividade de funções.
Vamos votar, na especialidade, o artigo 6.º, que, como referi, está abrangido pelo artigo 168.º, n.os 4 e 6, da Constituição.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, interpelo a Mesa no sentido de acautelar que, como essa votação é feita electronicamente, seja votado primeiro o artigo 6.º e depois, em globo, os restantes artigos.

O Sr. Presidente: - Muito bem. Foi a minha sugestão.
Srs. Deputados, vamos proceder à votação, na especialidade, do artigo 6.º do texto final da Comissão, cuja verificação terá de ser feita através de meio electrónico.

Submetido à votação, obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado 169 votos a favor (98 PSD, 62 PS e 9 CDS-PP) e 11 abstenções (6 PCP, 3 BE e de 2 Os Verdes).

Srs. Deputado, o artigo 6.º foi, pois, aprovado, uma vez que preenche, e em larga margem, o requisito

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constitucional.
Passamos à votação, na especialidade, dos restantes artigos do texto do final da Comissão, cuja votação será apurada por maioria simples.

Submetidos à votação, foram aprovados por unanimidade.

Srs. Deputados, segue-se a votação final global do texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Vamos agora proceder à votação final global do texto, apresentado pela Comissão de Educação, Ciência e Cultura, relativo ao projecto de lei n.º 415/IX - Altera o Decreto-Lei n.º 123/99, de 20 de Abril, que aprova o Estatuto do Bolseiro de Investigação (PCP).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PS e do CDS-PP e abstenções do PCP, do BE e de Os Verdes.

Vamos votar, em votação final global, o texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo à proposta de lei n.º 123/IX - Define o sentido e o alcance dos actos próprios dos advogados e dos solicitadores e tipifica o crime de procuradoria ilícita.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Também em votação final global, vamos proceder à votação do texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo à proposta de lei n.º 127/IX - Estabelece o regime jurídico das perícias médico-legais e forenses.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PS, do CDS-PP, do PCP e de Os Verdes e a abstenção do BE.

Igualmente em votação final global, vamos proceder à votação do texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo ao projecto de lei n.º 425/IX - Lei de organização e funcionamento da Comissão Nacional de Protecção de Dados (PSD e CDS-PP).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Ainda em votação final global, passamos à votação do texto final, apresentado pela Comissão de Educação, Ciência e Cultura, relativo à proposta de lei n.º 120/IX - Aprova a Lei-Quadro dos Museus Portugueses.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, vamos votar o projecto de resolução n.º 268/IX - Participação da Assembleia da República na Assembleia Parlamentar Euro-Mediterrânica (Presidente da AR).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Vamos passar à votação do projecto de resolução n.º 269/IX - Grupos parlamentares conexos com organismos internacionais e grupos de parlamentares membros ou apoiantes de associações internacionais (Presidente da AR).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Passamos à votação do projecto de resolução n.º 270/IX - Participação da Assembleia da República na UIP (Presidente da AR).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

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Srs. Deputados, vamos votar o projecto de resolução n.º 271/IX - Deslocações de Deputados (Presidente da AR e Presidente e Deputados membros do Conselho de Administração).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Vamos proceder à votação do projecto de resolução n.º 272/IX - Quadro e conteúdos funcionais do pessoal da Comissão Nacional de Protecção de Dados (PSD, PS, CDS-PP e PCP).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Passamos, agora, à votação final global do texto final, apresentado pela Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais, relativo à proposta de lei n.º 116/IX - Aprova o regime jurídico aplicável à realização de ensaios clínicos com medicamentos de uso humano.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PS, do CDS-PP, do PCP e de Os Verdes e a abstenção do BE.

Srs. Deputados, vamos votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 381/IX - Regula o acesso aos documentos da Administração (Os Verdes).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes e abstenções do PSD e do CDS-PP.

Este diploma baixa à 1.ª Comissão.
Vamos votar o projecto de resolução n.º 29/IX - Sobre a imagem da mulher na publicidade (Os Verdes).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

Srs. Deputados, deram entrada na Mesa cinco requerimentos de avocação a Plenário, apresentados pelo PS, para votação, na especialidade, dos artigos 10.º, 11.º, 15.º, 18.º a 31.º e 57.º do texto final, apresentado pela Comissão de Economia e Finanças, relativo aos projectos de lei n.os 416/IX - Terceira alteração à Lei n.º 91/2001, de 20 de Agosto (Lei de enquadramento orçamental) (PS), e 440/IX - Terceira alteração à Lei de enquadramento orçamental (PSD e CDS-PP).
Para apresentar o requerimento de avocação a Plenário do artigo 10.º, tem a palavra o Sr. Deputado Eduardo Cabrita. Dispõe de 2 minutos.

O Sr. Eduardo Cabrita (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A Lei de enquadramento orçamental, aprovada pela Assembleia da República em 2001, procurou introduzir alterações no processo orçamental que possibilitassem uma maior transparência do Orçamento do Estado e um maior controlo das finanças públicas.
Cerca de três anos volvidos sobre a sua aprovação, a experiência revela insuficiências que importa colmatar, de forma a tornar o processo orçamental mais transparente, prudente e mais responsabilizador das forças políticas com assento parlamentar, quer do Governo, quer da oposição.
Nestes termos, o Partido Socialista apresentou uma proposta de alteração à Lei de enquadramento orçamental com diversas inovações, designadamente a introdução de novos princípios orçamentais. De entre estes, destaca-se o princípio da prudência, ou seja, a garantia de que assenta na prudência dos cenários que servem de base à elaboração do Orçamento.
Durante as discussões na Comissão não foi, infelizmente e pese embora os esforços dos Deputados do Partido Socialista, possível demover os Deputados da maioria de forma a encontrar os consensos adequados que esta matéria mereceria. A irredutibilidade da maioria não se coaduna, de facto, com o tão propalado espírito de abertura que anuncia em relação às soluções a adoptar na procura das melhores soluções para garantir a estabilidade, o rigor e a transparência orçamental.
Nestes termos, os Deputados do Partido Socialista requerem, ao abrigo do artigo 164.º do Regimento, que seja avocada pelo Plenário a votação, na especialidade, da nova redacção do artigo 10.º da Lei de enquadramento orçamental, como consta do texto discutido e votado na especialidade na Comissão de Economia e Finanças, referente ao projecto de lei n.º 416/IX - Terceira alteração à Lei n.º 91/2001, de

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20 de Agosto (Lei de enquadramento orçamental) (PS).

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar o requerimento de avocação a Plenário do artigo 10.º do texto final, apresentado pela Comissão de Economia e Finanças.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

Tem a palavra o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira para apresentar o requerimento de avocação a Plenário do artigo 11.º.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Volvidos três anos sobre a entrada em vigor da Lei de enquadramento orçamental, entendemos fundamentá-lo e introduzir-lhe várias alterações.
Neste sentido, apresentámos propostas com diversas inovações, designadamente com a introdução de novos princípios orçamentais. De entre destacamos o que não mereceu o acordo da maioria, o princípio da sustentabilidade. Entendemos que o Orçamento do Estado se deve inscrever numa perspectiva de sustentabilidade a prazo das finanças públicas, devendo esta, para o efeito, ser aferida pelo valor da dívida pública em percentagem do produto interno bruto. É, aliás, um princípio consagrado no Tratado da União Europeia, como ainda hoje sublinhou Vítor Constâncio, tendo a Comissão Europeia aconselhado a sua consagração na eleições nacionais.
Relembre-se também que Nicolas Sarkosy, Ministro de Estado, Ministro da Economia, das Finanças e da Indústria de França, ministro da direita, mas de uma direita inteligente,…

Risos.

… acaba de anunciar a sua adesão à importância deste tema.
Assim, os Deputados do Partido Socialista abaixo assinado requerem, ao abrigo do disposto no artigo 164.º do Regimento, que seja avocada pelo Plenário a votação, na especialidade, da nova redacção do artigo 11.º da Lei n.º 91/2001, de 20 de Agosto (Lei de enquadramento orçamental), com as alterações introduzidas pela Lei Orgânica n.º 2/2002 (Lei da estabilidade orçamental), de 28 de Agosto, e pela Lei n.º 23/2003, de 2 de Julho, como consta do texto discutido e votado na especialidade, e assim se reponha o equilíbrio da introdução do princípio da sustentabilidade que foi recusado indevidamente, podendo até admitir-se que foi por lapso, pela maioria parlamentar.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos proceder à votação deste requerimento de avocação a Plenário do artigo 11.º do texto final, apresentado pela Comissão de Economia e Finanças.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

Para apresentar o requerimento de avocação a Plenário, para votação na especialidade, do artigo 15.º do texto final, tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Venda.

A Sr.ª Teresa Venda (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A Lei de enquadramento orçamental é um instrumento fundamental às finanças públicas e prossecução de boas práticas financeiras.
O Partido Socialista apresentou uma proposta de alteração à Lei de enquadramento orçamental com diversas inovações, designadamente a introdução de novos princípios orçamentais. De entre estes destaque para a consagração do princípio da avaliação.
Com tal consagração, as medidas e políticas que integram as propostas de lei de orientação da despesa pública e do Orçamento do Estado passarão a ser objecto de avaliação prévia quanto ao seu impacto orçamental, seja no curto prazo, para o que serão considerados os três anos subsequentes, seja no longo prazo.
O Governo, nos termos deste novo princípio, passará a ter de proceder, três anos após a adopção da medida em causa, à avaliação sucessiva do respectivo impacto orçamental, analisando os desvios que se revelem significativos. Trata-se de uma medida essencial para o acompanhamento rigoroso da execução orçamental.

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Contudo, não foi possível encontrar com os Deputados do PSD e do PP, por intransigência destes, os consensos adequados à consagração deste princípio na lei.
Nestes termos, os Deputados do Partido Socialista abaixo assinados requerem, ao abrigo do disposto no artigo 164.º do Regimento, que seja avocada pelo Plenário a votação, na especialidade, da nova redacção do artigo 15.º da Lei de enquadramento orçamental, como consta do texto discutido e votado na especialidade, na Comissão de Economia e Finanças, referente ao projecto de lei n.º 416/IX - Terceira alteração à Lei n.º 91/2001, de 20 de Agosto (Lei de enquadramento orçamental) (PS).

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar este requerimento, que acaba de ser apresentado, de avocação a Plenário do artigo 15.º do texto final, apresentado pela Comissão de Economia e Finanças.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

Tem a palavra a Sr. Deputado Maximiano Martins para apresentar o requerimento de avocação a Plenário, para votação na especialidade, dos artigos 18.º a 31.º.

O Sr. Maximiano Martins (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A discussão em torno da orientação da despesa pública é um processo essencial à garantia da estabilidade orçamental.
Detectando insuficiências no processo de debate desta matéria, o Partido Socialista apresentou uma proposta de alteração que visa valorizar e elevar o debate em torno da orientação da despesa pública. Passa a exigir-se que tal debate pressuponha a elaboração pelo governo de uma proposta de lei que anexará o relatório devidamente fundamentado e desenvolvido, tendo por objecto a orientação da despesa pública a médio e longo prazo, em conformidade com os princípios orçamentais e os critérios de economia, eficiência e eficácia da despesa, de forma a apresentar uma melhor satisfação das necessidades colectivas, com especial incidência sobre a reforma da Administração Pública e a realização dos objectivos previstos nas Grandes Opções do Plano, em articulação com a consolidação das finanças públicas.
A proposta de lei de orientação da despesa pública fixará igualmente para cada um dos três ano seguintes e a preços correntes, os limites do endividamento do sector empresarial do Estado com garantia do Estado.
Para avaliar da adequação da proposta de lei, o projecto de lei, da autoria do PS, prevê que a Assembleia da República solicite parecer a uma comissão de peritos, integrada por cinco individualidades de reconhecida independência em matérias económicas e financeiras, nomeados pela Assembleia da República, individualmente e por maioria de dois terços, para mandatos de cinco anos.
Contudo, não foi possível obter o consenso dos Deputados da maioria do PSD e do PP.
Nestes termos, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista requer, ao abrigo do disposto no artigo 164.º do Regimento, que seja avocada pelo Plenário a votação, na especialidade, da nova redacção dos artigos 18.º a 31.º da lei em referência.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos proceder à votação deste requerimento de avocação a Plenário dos artigos 18.º a 31.º do texto final, apresentado pela Comissão de Economia e Finanças.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

Para apresentar o requerimento de avocação a Plenário do artigo 57.º, tem a palavra a Sr. Deputado Fernando Serrasqueiro.

O Sr. Fernando Serrasqueiro (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A Lei de enquadramento orçamental, aprovada pela Assembleia da República, em 2001, introduziu alterações importantes no nosso processo de aprovação e execução orçamental que possibilitaram uma maior transparência e um crescente controlo das finanças públicas.
O Partido Socialista apresentou, na presente Legislatura, uma proposta de alteração à Lei de enquadramento orçamental com diversas inovações, designadamente incrementando o processo de controlo do processo orçamental.

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O Partido Socialista propôs, assim, a criação de uma unidade de apoio técnico-orçamental que terá por missão apoiar a Assembleia da República no exercício das suas competências, designadamente através da análise semestral da execução orçamental, do estudo prospectivo da política orçamental e da avaliação do impacto orçamental de propostas legislativas relevantes, seguindo, aliás muito de perto, o proposto por insignes economistas como Teodora Cardoso, e dotando o Parlamento português de mecanismos de apoio técnico já existentes noutros países europeus. Contudo, durante os trabalhos e as discussões na Comissão de Economia e Finanças, não foi possível reunir consensos com os Deputados do PSD e do PP por intransigência destes, adequados para a consagração em lei destes novos mecanismos.
Nestes termos, os Deputados do PS requerem, ao abrigo do disposto no artigo 164.º do Regimento, que seja avocada pelo Plenário a votação na especialidade da nova redacção do artigo 57.º da Lei do enquadramento orçamental, com as alterações introduzidas pela Lei de estabilidade orçamental, como consta do texto discutido e votado na especialidade na Comissão de Economia e Finanças referente ao projecto de lei n.º 416/IX - Terceira alteração à Lei n.º 91/2001, de 20 de Agosto (Lei de enquadramento orçamental).

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à votação do requerimento de avocação a Plenário do artigo 57.º do texto final, apresentado pela Comissão de Economia e Finanças, que acaba de ser apresentado pelo Sr. Deputado Fernando Serrasqueiro.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

Srs. Deputados, vamos proceder à votação final global do texto final, apresentado pelo Comissão de Economia e Finanças, relativo aos projectos de lei n.os 416/IX - Terceira alteração à Lei n.º 91/2001, de 20 de Agosto (Lei de enquadramento orçamental) (PS), e 440/IX - Terceira alteração à Lei de enquadramento orçamental (PSD e CDS-PP).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD e do CDS-PP e votos contra do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

Srs. Deputados, há, para apreciar e votar, três pareceres da Comissão de Ética.
Para proceder à respectiva leitura, tem a palavra o Sr. Secretário da Mesa.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, o relatório e parecer refere-se à retoma de mandato do Sr. Deputado João Teixeira Lopes (BE) (círculo eleitoral do Porto), cessando Alda Sousa, com efeitos a 9 de Julho, inclusive.
O parecer da Comissão de Ética é no sentido de que a retoma de mandato em causa é de admitir.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em discussão.

Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo 1.º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca do Cartaxo - Processo n.º 687/02.0TACTX -, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Rodrigo Ribeiro (PSD) a prestar depoimento por escrito, na qualidade de testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o parecer está em discussão.

Pausa.

Uma vez que não há pedidos de palavra, vamos votá-lo.

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Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo 2.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial do Funchal - Processo n.º 393/02.5TAFUN -, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de não autorizar o Sr. Deputado Manuel Alegre (PS) a prestar depoimento, na qualidade de testemunha, no âmbito do processo em referência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em discussão o parecer.

Pausa.

Visto não haver pedidos de palavra, vamos proceder à sua votação.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Sr.as Deputadas e Srs. Deputados, com isto, chegámos ao fim dos trabalhos de hoje e também ao fim dos trabalhos, em sessão plenária, desta 2.ª Sessão Legislativa da IX Legislatura.
Está prevista uma reunião da Comissão Permanente para o dia 29 de Julho e para o dia 2 de Setembro. Entretanto, decorrerão as férias parlamentares, e desejo, muito cordialmente, a todos umas boas férias na companhia das respectivas famílias.
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 20 horas e 45 minutos.

--

Declarações de voto enviadas à Mesa, para publicação, relativas:
À votação do projecto de resolução n.º 67/IX

O projecto de resolução n.º 67/IX, apresentado pelo PCP, e discutido em Plenário em 2 de Julho passado, foi agendado com uma versão inicial que, tal como o PSD salientou na sua intervenção, está completamente desactualizada e desprovida de conteúdo útil.
Na verdade, tanto a recomendação ao Governo no sentido de elaborar um novo Plano Nacional de Combate à Violência Doméstica, como a de se dever proceder à elaboração anual de um relatório sobre a matéria, estão hoje cumpridas.
O II Plano Nacional está em vigor há um ano e é esse mesmo Plano que prevê a elaboração do referido relatório anual, caracterizador da situação e do seu ponto de execução.
No preciso momento em que se iniciava o debate, o PCP apresentou aquilo a que chamou propostas de alteração do texto. Na verdade, do que se tratava era de uma completamente nova versão do projecto de resolução, em que apenas uma parte dos considerandos se manteve e em que toda a parte deliberativa foi substituída.
Esta nova versão apressadamente elaborada propõe a revisão do II Plano Nacional, designadamente prevendo a constituição de comissões de carácter regional ou local, sem que seja minimamente explicado como seriam constituídas ou que competências teriam, e pretendendo alargar o Plano de Combate à Violência Doméstica a um conjunto de circunstâncias e de vítimas sobre as quais nunca poderia ser a Comissão para a Igualdade e para os Direitos das Mulheres, pela especificidade das suas competências, a implementar a execução do Plano.
Outras das propostas novas apresentadas nesta versão do projecto são medidas neste momento já em curso, designadamente a generalização das secções de atendimento às mulheres vítimas de violência junto das forças de segurança ou a definição de indicadores que permitam a avaliação e compreensão do fenómeno da violência doméstica, pelo que, mais uma vez, o projecto é redundante.
No momento em que o II Plano Nacional vigora apenas há um ano, não sendo por isso razoável propor nesta altura qualquer revisão, sem que esteja avaliado o seu impacto e se possa saber com rigor se alguma coisa existe que mereça revisão futura, a única medida proposta que se afigura razoável é a de recomendar que o relatório anual sobre a execução do Plano seja enviado à Assembleia da República.
Ora, esta solicitação pode ser sempre feita, por qualquer Deputado, à tutela, suscitando, se tal for considerado relevante, a discussão do mesmo relatório. Assim, não se afigura necessário um projecto de resolução com este único objectivo.
Por fim, deve dizer-se que as ONG, pertencentes ao Conselho Consultivo da CIDM, foram, todas

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elas, convidadas a participar directamente na execução do II Plano e muitas delas, todas as que entenderam aceitar, estão neste momento a trabalhar, integradas no Grupo Sociedade Civil, um dos que tem a seu cargo a execução de parte específica do Plano.
Assim, entende o Grupo Parlamentar do PSD, não dever viabilizar um projecto de resolução, apresentado nas circunstâncias já descritas, que ignora completamente o trabalho intenso de todos quantos ao longo de um ano levaram a cabo a implementação do II Plano Nacional de Combate à Violência Doméstica e que, sem qualquer razoabilidade, pretende rever um Plano em vigor apenas há um ano e que necessariamente deverá ser avaliado antes de qualquer alteração.
O agendamento do projecto de resolução, do PCP, valeu pela importância do tema e não pelo seu conteúdo concreto, tal como ficou claramente afirmado pela bancada do PSD no debate em Plenário.

Os Deputados do PSD, Graça Proença de Carvalho - Natália Carrascalão - Adriana Aguiar Branco - Paula Malojo - Leonor Beleza - Teresa Morais - Maria Ofélia Moleiro - Massano Cardoso - José Manuel Alves - Luís Marques Guedes - Vieira de Castro - António Montalvão Machado - Miguel Coleta - Clara Carneiro - Francisco José Martins.

--

À votação, na especialidade e final global, do texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos
Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo à proposta de lei n.º 124/IX e ao projecto de lei n.º 445/IX

1 - Desde há muitos anos que o PCP se tem batido pela consagração e adequada regulação do direito dos profissionais da GNR à constituição de associações de representação socioprofissional, tendo para isso apresentado diversas iniciativas legislativas. Com esse objectivo, já na presente Legislatura, o Grupo Parlamentar do PCP apresentou, por duas vezes, iniciativas legislativas sobre o regime de exercício de direito de associação pelos profissionais da GNR, sempre rejeitadas na generalidade pela maioria parlamentar PSD/CDS-PP.
2 - Para o PCP, a regulação do direito de associação na GNR deveria ter em conta a natureza própria dessa instituição enquanto força de segurança. E, para esse efeito, importaria levar em devida conta a experiência da PSP que, ao longo de vários anos, se regulou nessa matéria pela Lei n.º 6/90, de 20 de Fevereiro, demonstrando a completa compatibilidade entre o exercício do direito de associação e a eficácia da respectiva Força. Sendo certo que, para os profissionais da PSP, esse regime se revelou excessivamente restritivo, tendo acabado por evoluir para o reconhecimento legal do direito à constituição de sindicatos, o PCP considera que, tendo em conta as características actuais da GNR, o regime de direitos associativos que deu provas na PSP era o mais adequado nesta fase para os profissionais da Guarda.
3 - Não foi esse o caminho acordado entre a maioria parlamentar e o PS, que seguiram um modelo de regulação do direito de associação decalcado de perto do regime consagrado para as associações de militares das Forças Armadas.
4 - Porém, apesar de discordar desse modelo, o PCP não pode deixar de reconhecer que a aprovação, pela primeira vez, de uma lei reguladora do direito de associação profissional na GNR, constitui um passo de importância histórica no reconhecimento legal de uma realidade associativa que, apesar da repressão dos seus dirigentes e activistas, de há muito se impôs na vida da GNR, sendo reconhecida de facto pela generalidade dos poderes públicos. Trata-se de um momento que vem coroar uma luta de muitos anos dos profissionais da GNR e pelo qual o PCP de há muito se vem batendo na Assembleia da República.
5 - Importa registar positivamente que, no processo de votação na especialidade, embora subsistam no texto final algumas opções contestáveis, foram alteradas algumas das disposições mais negativas que constavam do texto apresentado inicialmente pelo Governo.
6 - E importa saudar muito particularmente a aprovação de uma disposição que determina a reavaliação, à luz da nova lei, de todos os processos disciplinares não transitados em julgado que tenham por objecto actos praticados em representação de associações já constituídas. Sendo também certo que, segundo os princípios gerais do direito penal, a nova lei mais favorável se aplica de imediato a processos-crime que estejam em curso. O PCP, que desde o início deste processo legislativo defendeu uma norma com este objectivo, congratula-se vivamente com a sua aprovação, fazendo votos que deste modo se encerrem de vez os efeitos de um ciclo particularmente negativo no relacionamento entre o Comando da GNR e os representantes legítimos dos seus profissionais.
7 - Assim, em coerência com os fundamentos expostos, o Grupo Parlamentar do PCP absteve-se na votação das normas relativas às restrições de direitos que impendem sobre as associações de profissionais

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da GNR, considerando-as excessivamente restritivas do direito de associação, e votou favoravelmente, em votação final global, o texto globalmente aprovado, considerando o progresso que, apesar de tudo, ele representa, no reconhecimento do direito de associação dos profissionais da GNR.

A Deputada do PCP, Ângela Sabino.

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Rectificação ao n.º 79, de 24 de Abril de 2004.

- Na pág. 4371, l. 34, onde se lê "alterações relativas ao n.º 4 do artigo 7.° e ao n.º 2 do artigo 8.°. " deve ler-se "alterações relativas ao n.º 6 do artigo 7.° e ao n.º 4 do artigo 8.°.".

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Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
António Alfredo Delgado da Silva Preto
António Maria Almeida Braga Pinheiro Torres
Manuel Joaquim Dias Loureiro
Marco António Ribeiro dos Santos Costa
Maria Isilda Viscaia Lourenço de Oliveira Pegado
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto

Partido Socialista (PS):
Maria Isabel da Silva Pires de Lima
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves

Partido Popular (CDS-PP):
Álvaro António Magalhães Ferrão de Castello-Branco

Partido Comunista Português (PCP):
Maria Odete dos Santos

Srs. Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:

Partido Social Democrata (PSD):
Abílio Jorge Leite Almeida Costa
Eugénio Fernando de Sá Cerqueira Marinho
Manuel Filipe Correia de Jesus
Maria Eduarda de Almeida Azevedo

Partido Socialista (PS):
José da Conceição Saraiva
João Barroso Soares
Maria Amélia do Carmo Mota Santos

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
Melchior Ribeiro Pereira Moreira

Partido Socialista (PS):
António de Almeida Santos

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António Ramos Preto
Vicente Jorge Lopes Gomes da Silva

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