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Quarta-feira, 28 de Julho de 2004 I Série - Número 106

IX LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2003-2004)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 27 DE JULHO DE 2004

Presidente: Ex.mo Sr. João Bosco Soares Mota Amaral

Secretários: Ex. mos Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Ascenso Luís Seixas Simões
Henrique Jorge Campos Cunha
António João Rodeia Machado

S U M Á R I O


O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas.
Deu-se conta da entrada na Mesa das moções de rejeição n.os 3 a 5/IX, bem como dos projectos de lei n.os 479 a 481/IX.
A Câmara aprovou sete pareceres da Comissão de Ética relativos a retoma, substituição e suspensão de mandatos de vários Deputados do PSD, do PS e do CDS-PP.
O Sr. Presidente informou a Câmara da alteração da data da deslocação do Sr. Presidente da República à República Democrática de São Tomé e Príncipe e da sua recusa de promulgação do Decreto n.º 184/IX - Lei de Bases da Educação.
O Sr. Primeiro-Ministro (Pedro Santana Lopes) procedeu à apresentação do Programa do XVI Governo Constitucional, tendo, de seguida, respondido a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados António José Seguro (PS) - que também exerceu o direito de defesa da honra da bancada -, Guilherme Silva (PSD), Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP), Carlos Carvalhas (PCP), Francisco Louçã (BE) - que também exerceu o direito de defesa da honra da bancada -, Isabel Castro (Os Verdes) - que exerceu, igualmente, o direito de defesa da honra da bancada -, Manuel Maria Carrilho (PS), Teresa Morais (PSD), Narana Coissoró (CDS-PP), Luísa Mesquita (PCP), Luís Fazenda (BE), Mota Andrade (PS), Jorge Neto (PSD), João Pinho de Almeida (CDS-PP), Bernardino Soares (PCP), Rui Cunha (PS), Hugo Velosa (PSD) e Ana Benavente (PS).
Seguiu-se o debate do Programa do XVI Governo Constitucional, tendo usado da palavra, a diverso título, além dos Srs. Ministros de Estado, das Actividades Económicas e do Trabalho (Álvaro Barreto), das Finanças e da Administração Pública (António Bagão Félix), da Justiça (José de Aguiar Branco), de Estado, da Defesa Nacional e dos Assuntos do Mar (Paulo Portas) e de Estado e da Presidência (Nuno Morais Sarmento), os Srs. Deputados Jorge Coelho (PS), Luís Fazenda (BE), Honório Novo (PCP), Maximiano Martins (PS), Miguel Paiva (CDS-PP), Isabel Castro (Os Verdes), Tavares Moreira (PSD), Joel Hasse Ferreira (PS), Álvaro Castello-Branco (CDS-PP), António Filipe (PCP), Francisco Louçã (BE), Guilherme d'Oliveira Martins (PS), Duarte Pacheco (PSD), Joaquim Pina Moura (PS), Pinho Cardão (PSD), Miguel Anacoreta Correia (CDS-PP), José Junqueiro (PS), Teresa Morais (PSD), Narana Coissoró (CDS-PP), Jorge Lacão (PS), Odete Santos (PCP), Vieira da Silva (PS), Luís Montenegro (PSD), Marques Júnior, José Apolinário e Jaime Gama (PS).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 21 horas e 5 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 10 horas.

Srs. Deputados presentes à sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
Abílio Jorge Leite Almeida Costa
Adriana Maria Bento de Aguiar Branco
Adão José Fonseca Silva
Alexandre Bernardo Macedo Lopes Simões
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
Ana Paula Rodrigues Malojo
António Joaquim Bastos Marques Mendes
António Carlos de Sousa Pinto
António da Silva Pinto de Nazaré Pereira
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Henriques de Pinho Cardão
António Joaquim Almeida Henriques
António Manuel da Cruz Silva
António Maria Almeida Braga Pinheiro Torres
António Pedro Roque da Visitação Oliveira
António Ribeiro Cristóvão
Arménio dos Santos
Bernardino da Costa Pereira
Bruno Jorge Viegas Vitorino
Carlos Alberto Rodrigues
Carlos Jorge Martins Pereira
Daniel Miguel Rebelo
Delmar Ramiro Palas
Diogo de Sousa Almeida da Luz
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Eduardo Artur Neves Moreira
Elvira da Costa Bernardino de Matos Figueiredo
Eugénio Fernando de Sá Cerqueira Marinho
Fernando António Esteves Charrua
Fernando José Pimenta Rodrigues
Fernando Manuel Lopes Penha Pereira
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho
Fernando Santos Pereira
Francisco José Fernandes Martins
Gonçalo Dinis Quaresma Sousa Capitão
Gonçalo Miguel Lopes Breda Marques
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Hugo José Teixeira Velosa
Isménia Aurora Salgado dos Anjos Vieira Franco
Joaquim Miguel Parelho Pimenta Raimundo
Joaquim Virgílio Leite Almeida da Costa
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
Jorge Nuno Fernandes Traila Monteiro de Sá
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado
José Alberto Vasconcelos Tavares Moreira
José António Bessa Guerra
José António de Sousa e Silva
José David Gomes Justino
José Luís Campos Vieira de Castro
José Manuel Carvalho Cordeiro
José Manuel de Matos Correia
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro

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José Manuel Álvares da Costa e Oliveira
João Bosco Soares Mota Amaral
João Carlos Barreiras Duarte
João Eduardo Guimarães Moura de Sá
João José Gago Horta
João Manuel Moura Rodrigues
Judite Maria Jorge da Silva
Luís Cirilo Amorim de Campos Carvalho
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Filipe Garrido Pais de Sousa
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Filipe Soromenho Gomes
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Manuel Alves de Oliveira
Manuel Filipe Correia de Jesus
Manuel Joaquim Dias Loureiro
Manuel Joaquim dos Santos Ferreira
Manuel Ricardo Dias dos Santos Fonseca de Almeida
Maria Aurora Moura Vieira
Maria Clara de Sá Morais Rodrigues Carneiro Veríssimo
Maria Eduarda de Almeida Azevedo
Maria Goreti Sá Maia da Costa Machado
Maria Isilda Viscata Lourenço de Oliveira Pegado
Maria João Vaz Osório Rodrigues da Fonseca
Maria Leonor Couceiro Pizarro Beleza de Mendonça Tavares
Maria Natália Guterres V. Carrascalão da Conceição Antunes
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria Teresa da Silva Morais
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Fernando Alves Ramos Coleta
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Paulo Jorge Frazão Batista dos Santos
Pedro Filipe dos Santos Alves
Pedro Manuel Cruz Roseta
Rodrigo Alexandre Cristóvão Ribeiro
Rui Miguel Lopes Martins de Mendes Ribeiro
Salvador Manuel Correia Massano Cardoso
Susana Maria de Moura Alves da Silva Toscano
Sérgio André da Costa Vieira
Vasco Jorge Valdez Ferreira Matias
Vítor Manuel Roque Martins dos Reis
Álvaro José Martins Viegas

Partido Socialista (PS):
Alberto Bernardes Costa
Alberto de Sousa Martins
Alberto Marques Antunes
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Ana Maria Benavente da Silva Nuno
Antero Gaspar de Paiva Vieira
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António de Almeida Santos
António Fernandes da Silva Braga
António José Martins Seguro
António Ramos Preto
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho

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Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Ascenso Luís Seixas Simões
Augusto Ernesto Santos Silva
Eduardo Arménio do Nascimento Cabrita
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues
Fernando dos Santos Cabral
Fernando Manuel dos Santos Gomes
Fernando Pereira Cabodeira
Fernando Pereira Serrasqueiro
Fernando Ribeiro Moniz
Guilherme Valdemar Pereira D'Oliveira Martins
Gustavo Emanuel Alves de Figueiredo Carranca
Isabel Maria Batalha Vigia Polaco D'Almeida
Isabel Maria Pinto Nunes Jorge Tinoco de Faria
Jaime José Matos da Gama
Joaquim Augusto Nunes Pina Moura
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira
Jorge Lacão Costa
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho
José Carlos das Dores Zorrinho
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José António Fonseca Vieira da Silva
José Apolinário Nunes Portada
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Eduardo Vera Cruz Jardim
José Manuel de Medeiros Ferreira
José Manuel Santos de Magalhães
José Maximiano de Albuquerque Almeida Leitão
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa
João Rui Gaspar de Almeida
Laurentino José Monteiro Castro Dias
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís Alberto da Silva Miranda
Luís Manuel Carvalho Carito
Luísa Pinheiro Portugal
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Manuel Pedro Cunha da Silva Pereira
Maria Amélia do Carmo Mota Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Cristina Vicente Pires Granada
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria do Carmo Romão Sacadura dos Santos
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta
Maria Irene Marques Veloso
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Maximiano Alberto Rodrigues Martins
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Nelson da Cunha Correia
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Paulo José Fernandes Pedroso
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui António Ferreira da Cunha
Rui do Nascimento Rabaça Vieira

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Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Teresa Maria Neto Venda
Vicente Jorge Lopes Gomes da Silva
Victor Manuel Barreto Marinho da Cunha
Victor Manuel Bento Baptista
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vítor José Cabrita Neto
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Zelinda Margarida Carmo Marouço Oliveira Semedo

Partido Popular (CDS-PP):
António Herculano Gonçalves
Henrique Jorge Campos Cunha
José Marcelo Sanches Mendes Pinto
José Miguel Nunes Anacoreta Correia
João Maria Abrunhosa Sousa
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
João Rodrigo Pinho de Almeida
Manuel de Almeida Cambra
Manuel Miguel Pinheiro Paiva
Maria Celeste Ferreira Lopes Cardona
Narana Sinai Coissoró
Paulo Daniel Fugas Veiga
Álvaro António Magalhães Ferrão de Castello-Branco

Partido Comunista Português (PCP):
António Filipe Gaião Rodrigues
António João Rodeia Machado
Bernardino José Torrão Soares
Bruno Ramos Dias
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas
Jerónimo Carvalho de Sousa
José Honório Faria Gonçalves Novo
Maria Luísa Raimundo Mesquita
Maria Odete dos Santos
Ângela Ricardo Carriço Sabino

Bloco de Esquerda (BE):
Francisco Anacleto Louçã
João Miguel Trancoso Vaz Teixeira Lopes
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda

Partido Ecologista "Os Verdes" (PEV):
Álvaro José de Oliveira Saraiva

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai proceder à leitura do expediente.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidos, o Programa do XVI Governo Constitucional e, na sequência, as moções de rejeição n.os 3/IX (BE), 4/IX (Os Verdes) e 5/IX (PCP).
Deram ainda entrada na Mesa, e foram admitidos, os projectos de lei n.os 479/IX - Princípios fundamentais sobre o Estatuto das Organizações Não-Governamentais de Cooperação para o Desenvolvimento (PCP), que baixou à 2.ª Comissão, 480/IX - Estabelece medidas para a regulação e alargamento do património público florestal (BE), que baixou à 10.ª Comissão, e 481/IX - Elevação da vila de Meda, no concelho de Meda, à categoria de cidade (PSD), que baixou à 4.ª Comissão.

O Sr. Presidente: - Sr.as e Srs. Deputados, há vários relatórios e pareceres da Comissão de Ética que

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devemos apreciar imediatamente, porque se referem a substituições de membros do Parlamento e convém que eles estejam presentes desde o início da nossa sessão de hoje.
Para proceder à sua leitura, tem a palavra o Sr. Secretário.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o primeiro relatório e parecer da Comissão de Ética refere-se às seguintes retomas de mandatos, nos termos do artigo 6.º, n.os 1 e 2, do Estatuto dos Deputados (Lei n.º 3/2001, de 23 de Fevereiro), com efeitos a 17 de Julho corrente, inclusive:
Grupo Parlamentar do Partido Social-Democrata (PSD) - Hermínio Loureiro (Círculo Eleitoral de Aveiro), cessando Pina Marques; Luís Marques Mendes (Círculo Eleitoral de Aveiro), cessando Jorge Tadeu Morgado; Adão Silva (Círculo Eleitoral de Bragança), cessando Miguel Miranda; Paulo Pereira Coelho (Círculo Eleitoral de Coimbra), cessando José Manuel Alves; Carlos Martins (Círculo Eleitoral de Faro), cessando Luís Gomes; Vasco Valdez (Círculo Eleitoral da Guarda), cessando Fernando Lopes; Feliciano Barreiras Duarte (Círculo Eleitoral de Leiria), cessando Daniel Rebelo; João Pedro Serra (Círculo Eleitoral de Lisboa), cessando Francisco José Martins; Susana Toscano (Círculo Eleitoral de Lisboa), cessando Rodrigo Ribeiro; David Justino (Círculo Eleitoral de Lisboa), cessando Vítor Reis; Pedro Roseta (Círculo Eleitoral de Lisboa), cessando João Pedro Serra; Manuela Ferreira Leite (Círculo Eleitoral de Lisboa), cessando Isilda Pegado; Durão Barroso (Círculo Eleitoral de Lisboa), cessando Costa e Oliveira; Rosário Cardoso Águas (Círculo Eleitoral do Porto), cessando Carlos Sousa Pinto; Teresa Patrício Gouveia (Círculo Eleitoral do Porto), cessando Maria João Fonseca; e José Cesário (Círculo Eleitoral de Viseu), cessando Elvira Figueiredo;
Grupo Parlamentar do Partido Popular (CDS-PP) - Maria Celeste Cardona (Círculo Eleitoral de Leiria), cessando Isabel Gonçalves, e Teresa Caeiro (Círculo Eleitoral de Lisboa), cessando Paulo Veiga.
O parecer da Comissão de Ética vai no sentido de que as retomas de mandato em causa são de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.

Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o próximo relatório e parecer da Comissão de Ética refere-se à substituição, nos termos do artigo 5.º, n.º 2, alínea d), do Estatuto dos Deputados (Lei n.º 3/2001, de 23 de Fevereiro), por um período não inferior a 50 (cinquenta) dias e não superior a 10 (dez) meses, com efeitos a 17 de Julho corrente, inclusive, da Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, do PSD (Círculo Eleitoral de Lisboa), por José Manuel Álvares da Costa e Oliveira.
O parecer da Comissão de Ética vai no sentido de que a substituição em causa é de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.

Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do CDS-PP, do PCP, do BE e de Os Verdes e votos contra do PS.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o próximo relatório e parecer da Comissão de Ética refere-se às seguintes substituições, nos termos do artigo 20.º, n.º 1, alínea a), do Estatuto dos Deputados (Lei n.º 3/2001, de 23 de Fevereiro), com efeitos a 17 de Julho corrente, inclusive:
Grupo Parlamentar do Partido Social-Democrata (PSD) - Álvaro Barreto (Círculo Eleitoral de Lisboa), por Isilda Pegado; Rui Gomes da Silva (Círculo Eleitoral de Lisboa), por João Pedro Serra; e Henrique Chaves (Círculo Eleitoral de Lisboa), por Vítor Reis;

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Grupo Parlamentar do Partido Popular (CDS-PP) - Telmo Correia (Círculo Eleitoral de Lisboa), por Paulo Veiga.
O parecer da Comissão de Ética vai no sentido de que as substituições em causa são de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.

Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o próximo relatório e parecer da Comissão de Ética refere-se às seguintes substituições, nos termos do artigo 7.º do Estatuto dos Deputados (Lei n.º 3/2001, de 23 de Fevereiro), com efeitos a 20 de Julho corrente, inclusive:
Grupo Parlamentar do Partido Social-Democrata (PSD) - Maria da Assunção Esteves (Círculo Eleitoral de Vila Real), por Delmar Ramiro Palas;
Grupo Parlamentar do Partido Socialista (PS) - Elisa Guimarães Ferreira (Círculo Eleitoral de Braga), por Isabel Tinoco Faria; Fausto Correia (Círculo Eleitoral de Coimbra), por Vítor da Cunha; Capoulas Santos (Círculo Eleitoral de Évora), por Carlos Zorrinho; Jamila Madeira (Círculo Eleitoral de Faro), por Vítor José Cabrita Neto; António Costa (Círculo Eleitoral de Leiria), por Isabel Vigia; Edite Estrela (Círculo Eleitoral de Lisboa), por Irene Veloso; e Francisco de Assis (Círculo Eleitoral do Porto), por Gustavo Carranca.
O parecer da Comissão de Ética vai no sentido de que as substituições em causa são de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.

Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o próximo relatório e parecer da Comissão de Ética refere-se às seguintes substituições, nos termos do artigo 20.º, n.º 1, alínea a), do Estatuto dos Deputados (Lei n.º 3/2001, de 23 de Fevereiro), com efeitos a 21 de Julho corrente, inclusive:
Grupo Parlamentar do Partido Social-Democrata (PSD) - Hermínio Loureiro (Círculo Eleitoral de Aveiro), por Jorge Tadeu Morgado; Paulo Pereira Coelho (Círculo Eleitoral de Coimbra), por Luís Pais de Sousa; Carlos Martins (Círculo Eleitoral de Faro), por Luís Gomes; Patinha Antão (Círculo Eleitoral de Faro), por Álvaro José Martins Viegas; Feliciano Barreiras Duarte (Círculo Eleitoral de Leiria), por Daniel Rebelo; Graça Proença de Carvalho (Círculo Eleitoral de Leiria), por Fernando José Pimenta Rodrigues; José Pereira da Costa (Círculo Eleitoral de Lisboa), por Rodrigo Ribeiro; Pedro Duarte (Círculo Eleitoral do Porto), por Maria João Fonseca; Rosário Cardoso Águas (Círculo Eleitoral do Porto), por Carlos Sousa Pinto; José Eduardo Martins (Círculo Eleitoral de Viana do Castelo), por Jorge Nuno Sá; José Cesário (Círculo Eleitoral de Viseu), por Elvira Figueiredo; e Carlos Alberto Gonçalves (Círculo Eleitoral da Europa), por Manuel Joaquim dos Santos Ferreira;
Grupo Parlamentar do Partido Popular (CDS-PP) - Teresa Caeiro (Círculo Eleitoral de Lisboa), por João Abrunhosa; e Diogo Feio (Círculo Eleitoral do Porto), por José Marcelo Sanches Mendes Pinto.
O parecer da Comissão de Ética vai no sentido de que as substituições em causa são de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.

Pausa.

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Não havendo pedidos de palavra, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o próximo relatório e parecer da Comissão de Ética refere-se à substituição, nos termos do artigo 7.º do Estatuto dos Deputados (Lei n.º 3/2001, de 23 de Fevereiro), com efeitos a 21 de Julho corrente, inclusive, do Sr. Deputado João Pedro Serra, do PSD (Círculo Eleitoral de Lisboa), por Francisco José Martins.
O parecer da Comissão de Ética vai no sentido de que a substituição em causa é de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.

Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o próximo relatório e parecer da Comissão de Ética refere-se à substituição, nos termos do artigo 5.º, n.º 2, alínea d), do Estatuto dos Deputados (Lei n.º 3/2001, de 23 de Fevereiro), por um período não inferior a 50 (cinquenta) dias e não superior a 10 (dez) meses, com efeitos a 22 de Julho corrente, inclusive, do Sr. Deputado Durão Barroso, do PSD (Círculo Eleitoral de Lisboa), por Alexandre Simões.
O parecer da Comissão de Ética vai no sentido de que a substituição em causa é de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.

Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Aos Srs. Deputados que foram agora destinados a outras funções, no Governo da República, no Parlamento Europeu e na Comissão Europeia, desejo as maiores felicidades; àqueles que entram de novo e que podem ocupar, desde já, os seus lugares, dou as boas-vindas.
Há ainda duas comunicações que vêm do Sr. Presidente da República. Uma delas, para referir apenas que a sua visita a São Tomé e Príncipe foi adiada de 25 para 26 deste mês, e, uma outra, para devolver, sem promulgação, o Decreto n.º 184/IX - Lei de Bases da Educação, com os fundamentos constantes da mensagem anexa a esta carta, de que já mandei dar conhecimento aos Srs. Deputados e que está publicada no Diário. Oportunamente, apreciaremos este assunto.
Sr. Primeiro-Ministro e Sr.as e Srs. Ministros, antes de mais, os meus cumprimentos, já que para muitos de vós é a primeira vez que se encontram nestas funções perante o Parlamento.
Sr.as e Srs. Deputados: Hoje, a Assembleia da República reúne, de alguma forma extraordinariamente, nos termos da Constituição, para apreciar o Programa do XVI Governo Constitucional.
Exactamente para apresentar o Programa do XVI Governo Constitucional - e, conforme dispõe o Regimento, não há limite de tempo para esta apresentação -, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

Aplausos do PSD e do CDS-PP, de pé.

Risos do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Ao menos esperem para ouvir o discurso!…

O Sr. Primeiro-Ministro (Pedro Santana Lopes): - Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.as e Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Representantes da Comunicação Social, Excelentíssimo Público: Na apresentação do Programa do XVI Governo Constitucional, quando me dirijo

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pela primeira vez ao Plenário da Assembleia da República como Primeiro-Ministro, quero dedicar uma saudação especial a V. Ex.ª, Sr. Presidente, e, através de V. Ex.ª, a todas as Deputadas e Deputados que integram os diferentes grupos parlamentares.
Regresso agora, no exercício de funções diferentes e de maior responsabilidade, a uma Casa que muito bem conheci, quer como Deputado quer como membro do Governo, uma Casa que representa todos os cidadãos portugueses, uma Casa que, desde sempre, me habituei a admirar e a respeitar.
Nesta ocasião, desejo reafirmar convictamente esse respeito e essa admiração. Não esqueço que, em Democracia, é o governo que depende da Assembleia e não o contrário.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Por isso, estarei sempre disponível - tal como os membros do Governo - para trabalhar com o Parlamento num espírito de colaboração leal e construtiva, que considero indispensável para garantir o regular funcionamento do nosso sistema político.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Esta atitude de franca colaboração com a Assembleia da República é a mesma que saberemos manter com os demais órgãos de soberania, no quadro das responsabilidades de cada um.
Desde logo, com o Sr. Presidente da República, que respeitamos como supremo magistrado da Nação portuguesa e a quem são atribuídas competências relevantes no equilíbrio de poderes estabelecido pela Lei Fundamental.
Mas também com os Tribunais, que constituem um pilar essencial do Estado de direito democrático e a garantia última dos direitos dos cidadãos.
É, pois, com uma atitude, genuína e sincera, de permanente abertura e com uma total disponibilidade para o diálogo institucional que podem contar da parte do Governo que me orgulho de liderar.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O XVI Governo Constitucional tomou posse como consequência de circunstâncias excepcionais, decorrentes da designação do antigo primeiro-ministro, Dr. José Manuel Durão Barroso, para as relevantíssimas funções de Presidente da Comissão Europeia.
A sua eleição, entretanto ocorrida, constitui para Portugal um motivo de orgulho. É, simultaneamente, uma forma relevante de contribuir para a afirmação internacional do nosso país, porquanto se trata, como se sabe, de um dos lugares mais importantes na actual ordem internacional.
Neste contexto, importa, desde logo, reafirmar que continua a existir em Portugal um projecto político, apoiado por uma maioria parlamentar, o qual vem sendo desenvolvido desde Abril de 2002, de acordo com uma estratégia de acção coerente.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Um projecto político de recuperação e de afirmação do nosso país, cujos resultados positivos são visíveis, de modo consistente e reconhecido.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

Protestos do PS.

O Orador: - Nada do que é essencial para esse projecto político mudou.
É certo que o Primeiro-Ministro foi substituído - repito, por razões de relevantíssimo interesse nacional -…

Vozes do PS: - Então e as palmas?…

O Orador: - Srs. Deputados da oposição, terei todo o gosto, no período que o Regimento destina a esse efeito, em responder às questões que quiserem colocar-me. Não esperam pela demora!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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Risos do PS.

Como dizia, é certo que o primeiro-ministro foi substituído e que, como novo Primeiro-Ministro, escolhi uma nova equipa governativa, como é imperativo constitucional.
Mas o novo Governo move-se exactamente no mesmo quadro do anterior. A legitimidade política de ambos é idêntica, porque ambos resultam da vontade dos portugueses, expressa em eleições legislativas, no momento adequado,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - … porque ambos são fruto de nomeação por parte do Presidente da República, porque ambos emanam da mesma maioria parlamentar, que se mantém unida e determinada a assegurar a indispensável estabilidade política e a assumir plenamente as suas responsabilidades perante os portugueses.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Partilhamos o compromisso solene de fazer cumprir um programa político, o Programa apresentado pelo XV Governo Constitucional, agora retomado e desenvolvido pelo XVI Governo Constitucional.
Estamos seguros de que, em 2006, os portugueses, quando forem chamados a pronunciar o seu juízo, saberão reconhecer o esforço e a dedicação de quem assumiu a condução dos destinos do nosso país - quando outros não puderam ou não quiseram fazê-lo -, no momento em que este atravessava uma gravíssima crise política, económica e de confiança, e foi capaz de recolocar Portugal nos caminhos do progresso e do desenvolvimento.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. José Magalhães (PS): - Que auto-satisfação arrogante!…

O Orador: - Sr. Presidente e Sr.as e Srs. Deputados, a actual maioria deixou claro, desde a primeira hora, que esta Legislatura seria dividida em duas fases distintas: a primeira, a decorrer até 2004, destinada a pôr ordem nas finanças públicas,…

Vozes do PS: - Não pôs!

O Orador: - … a lançar as reformas estruturais - por tanto tempo adiadas - e a construir as bases de um novo modelo de desenvolvimento económico.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O governo anterior assumiu perante os portugueses um compromisso de mudança,…

Vozes do PS: - Que não cumpriu!

O Orador: - … um compromisso que honrou e cujos resultados são hoje visíveis, no plano interno, na recuperação da imagem externa e, em particular, da credibilidade perante os nossos parceiros europeus.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A coragem e a determinação do anterior governo permitem-nos encarar esta nova fase da nossa vida colectiva de uma forma diferente, certos de que muitas dificuldades permanecem, mas certos também de que se abrem novas e mais propícias oportunidades.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Para que não restem quaisquer dúvidas, quero aqui reafirmar, solenemente, a nossa determinação em continuar o caminho que vem sendo seguido, nomeadamente na consolidação das finanças públicas e no controlo do défice orçamental.

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Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Ao mesmo tempo, afirmamos a nossa intenção, a nossa vontade férrea de explorar as possibilidades abertas pelo início do ciclo de crescimento económico, para, de uma forma ponderada e realista, ir ao encontro das necessidades dos portugueses, especialmente daqueles que se encontram em situação de maior dificuldade, eles e as suas famílias.
Também aqui somos coerentes com a mensagem de sempre desta maioria, segundo a qual se pedimos sacrifícios aos nossos compatriotas num prazo curto foi para que, no médio e no longo prazos, pudéssemos alcançar as condições de vida a que legitimamente aspiramos.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - É esse compromisso que estamos em condições de cumprir - sem abandono do rigor e sem cedências à demagogia ou ao facilitismo.

Risos do PS.

Fazemo-lo em homenagem à concepção personalista da política que sempre nos orientou, a uma concepção que vê o ser humano e a resolução dos seus problemas concretos como o fim da actividade política.
Por isso, nos não conformamos com a permanência de situações de pobreza e de exclusão.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

Vozes do PS: - Tem-se visto…!

O Orador: - Recusamos as teses derrotistas dos que afirmam que o nosso país não consegue travar, com êxito, os combates tão exigentes colocados por um mundo globalizado.
Somos, a sério, daqueles que acreditam na nossa capacidade para realizar o objectivo estratégico de fazer do nosso país um dos mais desenvolvidos da Europa.
Estamos conscientes, e sentimo-lo, de que podemos confiar em Portugal e nos portugueses.
Há alguns anos, falava-se do País de outro modo; agora, pode dizer-se de Portugal que tem razões para ter esperança.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Somos os melhores, sempre que nos confrontamos com um desafio. Não quero que digamos, não quero que pensemos: "temos de ser como os melhores". Somos os melhores! Somos os melhores, sempre que nos propomos a um objectivo concreto, sempre que estamos à prova. Conhecemos as nossas capacidades, como ainda há pouco tempo aconteceu, basta dar-lhes um sentido.
Mas não nos iludamos: só o trabalho, muito trabalho, e o talento nos trazem resultados. Ter sorte também dá muito trabalho. Por outras palavras: produtividade e qualidade são as palavras-chave da competitividade. O País precisa de produzir mais, Portugal tem de criar mais riqueza e a economia tem de crescer.
Acreditamos na nossa capacidade para "dar a volta" às dificuldades, apostando nesse trabalho, nesse rigor, na competência, no mérito, na exigência, no esforço individual e na solidariedade colectiva.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Esse é o nosso rumo, é o único caminho, aliás, que honra o nosso passado, que serve verdadeiramente o futuro dos nossos filhos e coloca Portugal no lugar que lhe é devido no concerto das nações, afirmando a sua cultura no Mundo.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, por tudo o que referi anteriormente, o Programa que o Governo vos apresenta é, assumidamente, um programa de continuidade com o do executivo que nos antecedeu: nos propósitos, nas políticas, nas decisões e aproveito para aqui exprimir publicamente o reconhecimento aos que serviram nesse governo e cessaram funções não tendo integrado o novo executivo.

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O Sr. José Magalhães (PS): - São muitos! 13!

O Orador: - Em muitos casos, o nosso Programa chega a ser, deliberadamente, uma transposição do documento que esta Assembleia analisou em Abril de 2002.
Não vou aqui proceder a uma análise exaustiva do seu conteúdo ou à enumeração das centenas de medidas que nele se apontam, até porque tivemos o gosto de ver que o Programa deste Governo, a sua orgânica, a sua estrutura, a composição, os nomes, tiveram um interesse, um tempo de debate, uma observação, uma análise, uma lupa, como nunca nenhuns outros mereceram em governos antecedentes e, por isso, não vamos fazer essa enumeração.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Quero, contudo, dar-vos conta de algumas ideias estruturantes em que o Programa assenta e que reputo de especialmente importantes, destacando, desde já, cinco: rigor nas finanças públicas; incentivo ao crescimento económico; reforço da justiça social; modernização do Estado e da Administração; e a aposta na qualificação dos portugueses.
A questão das finanças públicas foi enfrentada e já permitiu corrigir muitos dos desequilíbrios existentes.

O Sr. Afonso Candal (PS): - Quais?

O Orador: - Repito: determinação com que este problema foi enfrentado já permitiu corrigir muitos dos desequilíbrios existentes. Permitiu, designadamente, conduzir ao levantamento do procedimento por défice excessivo que havia sido desencadeado pela União Europeia e que, tal como foi anunciado pelo actual ministro do executivo do Partido Socialista Operário Espanhol, Portugal conseguiu corrigir a situação em que o governo anterior tinha colocado Portugal perante essa mesma União Europeia.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Trilhámos uma parcela importante do caminho e nele vamos permanecer de uma forma convicta, não porque tenhamos alguma obsessão orçamental ou financeira, mas pela simples razão de que o défice constitui, objectivamente, uma das principais causas de desequilíbrio da nossa economia e um dos maiores entraves - por razões óbvias - ao desenvolvimento que ambicionamos.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - A consolidação orçamental continuará, assim, no centro das preocupações deste Governo.

O Sr. José Magalhães (PS): - Pois claro!

O Orador: - Por isso, propomos aos portugueses a celebração de um verdadeiro contrato orçamental.

O Sr. José Magalhães (PS): - Certamente, para reconstruir a Arrábida!

O Orador: - Da parte da oposição esperamos o cumprimento de uma regra simples: que a cada proposta de despesa corresponda uma proposta de receita e que a cada baixa de receita façam o favor de dizer qual a alternativa de superação de despesa que consideram adequada para o exercício orçamental!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Risos do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

Proceder de outro modo estaria ao alcance de qualquer cidadão que não tivesse a responsabilidade política como imperativo ético de actuação e não tenho qualquer dúvida de que qualquer um dos Srs. Deputados tem esse imperativo da responsabilidade política, perante si próprio e perante os portugueses, como guia orientador da sua actuação.

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O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Um contrato orçamental assente na verdade, na transparência e no rigor; um contrato que rejeite a ideia de que é possível prometer facilidades a todos sem que isso envolva mais gastos para o Estado e, portanto, mais sacrifícios para os contribuintes; um contrato que assegure a diminuição quantitativa da despesa pública ao mesmo tempo que garanta a melhoria do investimento público reprodutivo; um contrato que nos permita canalizar, progressivamente, mais recursos para aqueles que verdadeiramente criam riqueza, os cidadãos, os agentes económicos, as empresas, em vez de os consumir, tantas vezes de forma inútil ou discutível, no plano estadual.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Estamos a voltar a viver uma situação de crescimento económico, mas temos ainda pela frente desafios que importa vencer para nos aproximarmos dos padrões médios de vida dos países que connosco partilham o projecto europeu.
Também aqui nos não move qualquer fixação economicista. A riqueza deve ser posta ao serviço das famílias e das empresas, pois só a riqueza permitirá criar mais emprego e assim combater um flagelo - o desemprego - que hoje afecta muitas famílias em Portugal, o que tanto preocupa este Governo e a todos nós, riqueza sem a qual não se pode ir ao encontro das necessidades dos que mais precisam e desenvolver uma verdadeira solidariedade social.
Também aqui a palavra-chave continua a ser produtividade. Se não formos capazes de recuperar o significativo diferencial que em matéria de produtividade apresentamos face aos nossos maiores concorrentes, o nosso atraso tomará proporções praticamente irreversíveis.
Essa é, portanto, uma tarefa nacional, que exige a cooperação de todos: Estado, trabalhadores e empresários. Valorizaremos a concertação social e negociaremos, até ao fim, para que o contributo do trabalho seja dignamente considerado na criação dessa riqueza que queremos distribuída. Consideramos, ainda, essencial, para a aplicação de soluções no mundo do trabalho, a celebração do contrato social para a competitividade e emprego e sabemos que só ganharemos a batalha da competitividade com acções de formação em todos os níveis profissionais.
O nosso país não pode mais assentar o seu modelo económico na tentativa de recurso à mão-de-obra barata e na produção de bens de baixo valor acrescentado. Importa continuar a apostar no incremento da nossa capacidade exportadora e na produção de bens transaccionáveis em condições de concorrência internacional.
Ora, para que esse objectivo se concretize necessitamos de empresas fortes, inovadoras e modernas. Aí, muito depende da iniciativa e do empenho dos nossos empresários, mas ao Estado cabe uma parcela importante da responsabilidade, através da criação de um ambiente favorável à acção das empresas.
Somos um Governo do século XXI e é para o século XXI que este Governo continuará a agir, na consolidação e no reforço da competitividade do tecido empresarial, no combate aos obstáculos que dificultam a formação de empresas e a sua actuação, no apoio à inovação e à qualificação profissional, na generalização do recurso às novas possibilidades geradas pela sociedade de informação.
A captação de investimento estrangeiro permanece, igualmente, no centro das preocupações da política económica do Governo.
O desenvolvimento sustentado da economia portuguesa muito beneficiará, também, da aposta em sectores que se apresentam à partida como importantes mais-valias.
Esse é, justamente, o caso do turismo, que reconhecemos como tal, constituindo hoje uma actividade com um peso significativo no PIB nacional. A inclusão na orgânica deste Governo de um Ministério do Turismo, inovação que reputo de especialmente importante, é, ao mesmo tempo, o reconhecimento do relevo que este sector apresenta e da importância crucial que pretendemos atribuir-lhe no âmbito da nossa economia.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, se há aspecto que assume, para nós, lugar central é, certamente, a determinação de fazer mais e melhor justiça social.
O sentido de justiça social é uma marca genética do corpo de valores que nos inspira e isso ficou bem patente ao longo dos últimos dois anos, pois mesmo em período de dificuldades e de contenção orçamental foram adoptadas decisões em áreas tão diversificadas como as pensões, o abono de família

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ou a política do medicamento, para dar alguns exemplos, que testemunham a prioridade dada aos mais fracos e aos mais carenciados.
Mas, manda a verdade que se diga que há ainda muito a fazer, que subsistem problemas sérios, que a própria desumanização das sociedades modernas tende a agravar-se. Prosseguiremos, pois, com maior determinação, ainda, o caminho que tem vindo a ser seguido em diversos campos.
Na saúde, trabalharemos para garantir uma melhor acessibilidade dos portugueses a estes serviços e para atribuir a cada pessoa o seu médico de família.

O Sr. José Magalhães (PS): - Ah…!

O Orador: - Aplicaremos o novo sistema para os doentes inscritos para cirurgias, tentando assegurar, até ao final da legislatura, que ninguém espere mais do que o prazo anunciado pela cirurgia de que carece.

Vozes do PS: - Qual prazo?

O Orador: - Os seis meses!
Aprofundaremos a experiência dos hospitais SA e prosseguiremos com o processo de parcerias público/privado para a construção de 10 novas unidades hospitalares.

Vozes do PSD: - Muito bem!

Vozes do PS: - Umas palminhas, vá lá…!

Risos do PS e do PCP.

O Orador: - Sr.as e Srs. Deputados da oposição, volto a dizer que verifico que os senhores estão com ansiedade por estabelecermos o diálogo democrático, mas o Regimento estabelece o tempo adequado para isso.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Orador: - Na segurança social há que prosseguir a reforma em curso para garantir a efectiva sustentabilidade do sistema, confrontado, cada vez mais, com os problemas decorrentes do aumento do número de beneficiários e da diminuição do número de contribuintes.
É nosso propósito firme concretizar, de forma absolutamente prioritária, o princípio da convergência entre as pensões mínima e social e o salário mínimo nacional, assim assegurando a todos os pensionistas condições compatíveis com a dignidade do ser humano.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Constitui ainda uma profunda preocupação de justiça social, que anima a nossa vontade, continuar a travar a batalha contra a fraude e a evasão fiscais.
É inaceitável - e digo-o como Primeiro-Ministro de Portugal - que alguns dos que mais podem continuem a esquivar-se às suas obrigações fiscais, sobrecarregando a imensa maioria que as cumpre e prejudicando, objectivamente, o esforço colectivo de solidariedade social.
O anterior governo desenvolveu aqui uma obra assinalável no plano da informatização e do cruzamento dos dados - tarefa que estava por realizar há muito - e estamos absolutamente determinados a prosseguir nesse caminho.
O quarto aspecto que queria destacar prende-se com a modernização do Estado e da Administração Pública.
Como disse, somos um Governo do século XXI e para o século XXI, mas, mau grado o esforço e a dedicação da maioria dos funcionários, o Estado está longe de responder de forma satisfatória às necessidades dos cidadãos.
Importa, desde logo, alterar o paradigma de organização do Estado, dele retirando as funções e tarefas que podem ser melhor desempenhadas por outros e assumindo, ao mesmo tempo, que a sua acção se deve concentrar nos domínios em que lhe cabe a responsabilidade exclusiva ou principal.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

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O Orador: - O desafio da modernidade não apaga a relevância das tradicionais funções de soberania: a defesa, a justiça e a segurança, domínios em que, pelo contrário, se pede o reforço da autoridade do Estado, tanto no plano externo como no domínio interno.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Prosseguiremos assim uma política de defesa nacional orientada pela preocupação de prestigiar as Forças Armadas e de colocar ao seu dispor meios necessários à defesa da independência nacional e à afirmação dos nossos interesses estratégicos.

O Sr. Afonso Candal (PS): - Já não era sem tempo!

O Orador: - Reforçaremos o nosso empenho na modernização da justiça, assumindo a importância dessa política para a criação de um ambiente favorável ao exercício pleno da cidadania; preocupar-nos-emos em continuar o processo de dignificação das nossas forças de segurança, porque valorizamos o seu papel determinante para a tranquilidade da vida em sociedade.
Por outro lado, nas reformas da Administração, preocupam-nos - e muito! - as assimetrias de desenvolvimento que continuam a registar-se entre as diferentes regiões do nosso país e que põem em causa a efectiva igualdade de oportunidades entre portugueses.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O Governo está determinado em prosseguir o processo de descentralização, em boa hora iniciado pelo governo anterior, designadamente através do desenvolvimento das grandes áreas metropolitanas e das comunidades urbanas e da intensificação do processo de transferências de atribuições e de competências.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A prossecução da reforma da Administração Pública será outra das nossas prioridades, pois não é possível agilizar o País mantendo uma Administração Pública burocrática, como não é possível garantir eficazmente os direitos dos cidadãos com um aparelho administrativo incapaz de responder em tempo útil às suas pretensões. Levaremos a cabo um conjunto de medidas que permitam dotar a Administração Pública de eficácia, tentando simplificar os procedimentos, aproximando a máquina dos cidadãos, aqueles a quem ela se destina, valorizando o contributo e o mérito dos que nela prestam serviço.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Aliás, a preocupação de proximidade levou a que uma das primeiras medidas adoptadas pelo Governo - e de que falaremos, certamente, com mais detalhe adiante - tenha sido a de colocar seis Secretarias de Estado em seis diferentes cidades do País, uma decisão que vale pelo significado político, mas que constitui, ao mesmo tempo, um primeiro passo num processo mais vasto de deslocalização de centros de decisão.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O último ponto a que quero fazer referência prende-se com a questão central da valorização dos recursos humanos.
A maior riqueza de uma nação são, certamente, as pessoas. Hoje, mais do que nunca, o desenvolvimento de qualquer país está dependente do investimento que for capaz de fazer nas pessoas, pois a grande divisão traça-se em torno da linha que separa aqueles que têm acesso à informação e ao saber e aqueles que deles estão excluídos.
Personalistas que somos, não vemos a questão da qualificação apenas na perspectiva do contributo para o progresso ou criação de riqueza, porque para nós a cultura e o saber são, antes do mais, contributos primeiros para a realização da personalidade de cada um e para a concretização dos seus direitos fundamentais.
Direitos que não distinguem cidadãos. Conto com todos, com os portugueses portadores de limitações físicas, com os cidadãos de mais idade, com fiéis de todos os credos e com os imigrantes das

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várias raças que escolheram o nosso país para aqui trabalharem e construírem um futuro melhor para as suas famílias.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Mas conto, de uma forma muito especial, com a juventude. Apostaremos na democratização do acesso à cultura e no incremento à fruição dos bens culturais; prosseguiremos o esforço de modernização e fixação das pessoas nas suas terras de origem, através do contributo do nosso sistema de ensino, modernizando e insistindo, especialmente, no combate ao abandono escolar e na necessidade de valorizar o rigor, a excelência e a disciplina,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - … mas dando, também, aos alunos, aos pais, aos docentes, às famílias a estabilidade que carecem nos currículos, nos programas, nas expectativas que têm para a sua formação, depois de tanta convulsão em anos anteriores.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Insistiremos na melhoria da qualidade do ensino superior, adaptando-o aos desafios suscitados pela Declaração de Bolonha e criando condições que permitam aos nossos jovens concorrer, em pé de igualdade, com os parceiros dos países mais desenvolvidos.
Apostaremos, cada vez mais - e falaremos desse tema com mais detalhe aquando da apresentação da proposta de lei do Orçamento do Estado -, na ciência e na inovação, condição indispensável para enfrentar as exigências da era da globalização. Continuaremos a cuidar do desenvolvimento da sociedade de informação, explorando em toda a latitude as inúmeras oportunidades que abre.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O XVI Governo Constitucional assume funções no contexto de uma situação internacional e europeia particularmente exigente. É sobretudo nos momentos de maior incerteza, de maior indefinição que devemos reafirmar os valores e os princípios que conduzem a nossa política externa e materializar as opções em que ela se traduz.
No plano global, as questões de paz e de segurança assumem hoje um papel prioritário, tendo em conta, muito especialmente, a ameaça do terrorismo nas suas diversas formas e manifestações. Em tal contexto reafirmamos, antes do mais, a importância central que reconhecemos às Nações Unidas e, ao mesmo tempo, sublinhamos a convicção de que a NATO deve constituir o elemento central para a garantia da segurança no espaço euro-atlântico e, nesse quadro, a especial importância da relação com os Estados Unidos da América.
Há muito que a Europa deixou de ser apenas uma opção de política externa para se transformar - o projecto da União Europeia - num verdadeiro desígnio nacional. O nosso futuro colectivo joga-se no tabuleiro europeu e a capacidade de nos afirmarmos, enquanto colectividade, está sobretudo dependente da capacidade que demonstrarmos para participar, de forma activa, no aprofundamento do processo de integração nesta União, que atravessa momentos de grande transformação.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Desde logo, em função do alargamento a 10 novos Estados, o que constituiu a realização de um imperativo político e histórico, mas que vai necessariamente envolver um esforço maior da nossa parte.
Pela frente, temos já uma batalha difícil: a negociação das perspectivas financeiras, no semestre da presidência holandesa, que há poucos dias teve o seu início e que vai exigir, como sempre, um trabalho rigoroso e complexo.
Por outro lado, foi adoptado um Tratado Constitucional, destinado justamente a adaptar a Europa às necessidades específicas de uma vivência a vinte e cinco Estados. O desafio mais imediato prende-se agora com a ratificação e entrada em vigor desse Tratado, o que, no caso português, requer, como foi afirmado pelo anterior governo, o estabelecimento de um acordo político quanto aos termos em que tal consulta popular se poderá realizar.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A nossa preocupação central é, pois, a de ancorar firmemente o nosso país na primeira linha da

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construção europeia. Não o dizemos, contudo, por exercício de retórica política. Repito: a defesa dos interesses estratégicos do nosso país depende essencialmente da sua capacidade de afirmação na Europa.
Contudo, esta tarefa não depende apenas do Governo, envolve a mobilização dos outros órgãos de soberania e, em termos mais gerais, da comunidade nacional. É no sentido de criar essa mobilização que iremos actuar, sensibilizando especialmente os nossos compatriotas para a importância que as questões europeias assumem - hoje e futuramente - na sua vida quotidiana.
E, a propósito dos nossos compatriotas que vivem fora de Portugal, deixem-me mencionar o facto importante de o Governo de Portugal integrar, pela primeira vez, um Secretário de Estado das Comunidades que é oriundo e membro dessas mesmas comunidades.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Mas se estamos por convicção no projecto europeu, nem por isso deixamos de valorizar o relacionamento com o espaço da lusofonia. Tal valorização contribui para o aprofundamento das relações da União com as zonas do mundo em que se inserem os países que falam o Português e reforça o nosso estatuto perante os outros membros da União Europeia.
O Governo vai, assim, aprofundar a relação com todos os países de língua oficial portuguesa. Iremos apostar no aumento da capacidade de intervenção da CPLP, que consideramos um instrumento essencial para a afirmação no mundo da língua e da cultura lusófonas.
Hoje mesmo, com o Sr. Presidente da República, o Ministro dos Negócios Estrangeiros participa, em São Tomé e Príncipe, num encontro com os nossos parceiros de privilégio, a quem nos une a língua, a amizade, o passado e o futuro dos nossos povos.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O XVI Governo Constitucional tem uma noção clara dos objectivos que pretende atingir. Identificamo-los no Programa que agora apresentamos e estamos determinados a levá-los à prática, dando seguimento ao trabalho de reconstrução nacional desenvolvido pelo anterior executivo.
Ao mesmo tempo, não ignoramos as dificuldades do percurso e a exigência das batalhas que temos pela frente. Assumimos funções com um espírito de total abertura, não pretendemos ter razão em todas as circunstâncias e sabemos dar razão aos outros quando a têm.
Compreendemos, além do mais, que muito do que tem de ser feito não depende apenas do Governo ou da maioria que o apoia - e que aqui quero saudar com convicção. Por isso, estamos certos de que todos ganharíamos com o estabelecimento, sempre que possível, de consensos políticos alargados, em particular no que se convencionou designar por "questões de regime", designadamente na política externa, na política de defesa, na política de finanças públicas ou na política de justiça, correspondendo quer à história e à tradição do nosso sistema político quer à vontade e aos desígnios do Sr. Presidente da República, em mensagens reiteradas a este Parlamento ou à opinião pública.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Nesse sentido, quero aqui deixar um apelo à oposição, em especial ao Partido Socialista, para que nos acompanhe na procura de soluções realistas, equilibradas e construtivas para os múltiplos desafios que o País enfrenta. A nossa disponibilidade para a construção de consensos é genuína e sincera. Trabalharei nesse sentido.
Repito, assumimos funções num quadro de legitimidade idêntico ao do governo anterior, mas devem as Sr.as e os Srs. Deputados reconhecer que foi um quadro de especial exigência, após umas eleições europeias, em que - reconhecemos - os partidos da coligação que apoia o Governo, como aconteceu por toda a Europa, tiveram resultados que penalizaram, no nosso caso, a acção patriótica que tivemos de desenvolver.

Risos do PS e do PCP.

Imediatamente após, o então primeiro-ministro de Portugal foi chamado a funções do mais relevante interesse nacional.
Passámos por cima de algumas atitudes em que lhe era negado o apoio para o exercício dessas funções, quando os partidos da coligação, o governo, desde sempre tinham declarado o seu apoio a uma

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outra possibilidade de exercício das mesmas funções por um militante de outro partido.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Fui designado, formámos Governo - Ministros, Secretários de Estado - e apresentámos o Programa do Governo num prazo sem precedentes na história do sistema democrático (tive oportunidade de o conferir)…

O Sr. Honório Novo (PCP): - O programa é o mesmo!…

O Orador: - Não conto, por isso - nem o solicito -, com especial tolerância nem com especial compreensão. Fizemos o que entendemos que devíamos fazer.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Estamos aqui com determinação e com espírito de resolver os problemas dos portugueses, mas queremos dizer, de modo claro: não somos daqueles que trazem para o País, em permanência, a imagem toldada ou o símbolo do pessimismo que alguns representam.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

Protestos do PS.

O Orador: - Queremos que o País sinta confiança em si próprio…

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Discurso da "tanga"!

O Orador: - … e, neste quadro, é bom que as posições de cada um fiquem claras.
Nós somos daqueles que confiam em Portugal; somos daqueles que dizem, com orgulho, que amam a Pátria;…

O Sr. José Magalhães (PS): - E nós não?!

O Orador: - … somos daqueles que dizem que têm fé no nosso futuro.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

Protestos do PS e do PCP.

O Orador: - As Sr.as e os Srs. Deputados dos partidos da oposição, pelo que foi noticiado, mesmo antes de conhecerem o debate parlamentar, anunciaram que iriam apresentar moções de rejeição, fizeram-no publicamente! Quero dizer aqui, no sítio próprio,…

Protestos do PS e do PCP.

Eu julgava que os Srs. Deputados estivessem mais calmos e confiantes neste debate, mas vejo-os muito agitados… Sinceramente, era o que eu julgava!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos do PS e do PCP.

O Sr. Deputado Francisco Louçã está calmo, mas vejo os outros muito agitados…
Quero dizer, às Sr.as e aos Srs. Deputados, o seguinte: foram anunciadas moções de rejeição do Programa do XVI Governo Constitucional…

A Sr.ª Maria Celeste Correia (PS): - E bem!

O Orador: - … e eu penso que é este o sítio próprio, como Primeiro-Ministro do XVI Governo

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Constitucional, para comunicar ao Parlamento, a sede nobre da Democracia, que iremos apresentar uma moção de confiança para ser aprovada pelos Deputados que apoiam este Governo.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Temos orgulho no nosso Programa, confiamos no futuro.

Aplausos do PSD e do CDS-PP, de pé.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, para iniciar o debate, começo por dar a palavra ao Presidente do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, o Sr. Deputado António José Seguro, que dispõe de 5 minutos, tal como disporão todos os primeiros oradores dos diversos grupos parlamentares. Na segunda volta, cada grupo parlamentar disporá de 3 minutos.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. António José Seguro (PS): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, em nome do Grupo Parlamentar do PS, quero cumprimentá-lo e tornar extensivo o cumprimento a todas as Sr.as e a todos os Srs. Membros do Governo.

Vozes do PS: - Que são muitos!

O Orador: - Quero dizer-lhe que o Partido Socialista entendeu bem as suas palavras e esperava que, nesta segunda oportunidade em que leu um discurso como Primeiro-Ministro, tivesse causado melhor impressão do que a que causou no seu discurso de tomada de posse.

Aplausos do PS.

Posso acrescentar que a sua intervenção de hoje foi um conjunto de vulgaridades, de banalidades e resume-se numa palavra: um flop. O discurso do Dr. Santana Lopes na Assembleia da República foi um flop!

Aplausos e risos do PS.

O Sr. Primeiro-Ministro disse que tínhamos todo o tempo do mundo para colocar questões. Mas não temos, Sr. Primeiro-Ministro. Temos apenas 5 minutos. Que o País fique a saber que a sua maioria, na primeira hora de debate, nesta Assembleia, apenas concedeu 5 minutos ao maior partido da oposição para que este lhe colocasse questões.
Isto não é um debate sério!

Aplausos do PS.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Primeiro-Ministro falou num contrato com os portugueses e eu coloco-lhe a seguinte questão: como é possível vir propor um contrato com os portugueses quando os senhores não cumpriram o principal contrato que fizeram com os portugueses, em Março de 2002, durante a campanha eleitoral? Refiro-me ao famoso choque fiscal.
Tenho comigo um exemplar de um documento da vossa campanha eleitoral, Uma Nova Política Económica para Portugal,…

O Sr. José Magalhães (PS): - Viu-se!

O Orador: - … que na página 49 propõe, entre os ajustamentos a fazer, uma descida da taxa do escalão mais elevado do IRS em 5 pontos percentuais, de 40% para 35%; que numa outra página, a 51, se refere à descida da tributação do IRC para 20%, já no Orçamento do Estado para 2003…!

O Sr. José Magalhães (PS): - Viu-se!

O Orador: - Dr. Santana Lopes, antes de avançar com mais promessas, pense bem e, sobretudo,

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cumpra aquelas que o seu partido prometeu - e em nome do qual está aí sentado - e que não cumpriu com os portugueses.

Aplausos do PS.

O senhor veio falar aqui em duas fases, em desenvolvimento e em consolidação das finanças públicas. É preciso não ter pudor! Desenvolvimento?!…
O senhor orgulha-se de que, ao fim destes dois anos, haja 450 000 desempregados, fruto das políticas erradas dos seus governos e dos seus colegas de Governo?…

Aplausos do PS.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O senhor orgulha-se de o seu antecessor ter prometido que, em dois anos, acabava com as listas de espera na saúde e, ao fim de dois anos, em vez de uma, há duas listas de espera e, em vez de 123 000 portugueses à espera de uma cirurgia, há mais de 150 000 portugueses à espera de uma cirurgia?!…

Aplausos do PS.

O senhor orgulha-se de o congelamento dos salários da função já ir no segundo ano consecutivo? O Sr. Primeiro-Ministro orgulha-se de o poder de compra das famílias em Portugal ter caído, no ano transacto, 0,8%?…
O Sr. Primeiro-Ministro orgulha-se de o País ter ficado para trás, em vez de ter convergido - como era vossa promessa - com a média dos países da União Europeia?…
Sr. Primeiro-Ministro, o senhor orgulha-se ou pensa que os portugueses têm alguma razão para se orgulhar de que, na sua primeira intervenção, tenha sido incapaz de dar uma palavra aos professores que esperam, excepcionalmente, pelos resultados de um concurso - uma trapalhada criada pelo vosso governo, que cria instabilidade -…

Aplausos do PS.

… que, fruto da vossa decisão, só a 15 dias do início do ano escolar é que estarão em condições - dizem! - de poder ser divulgados? Honestamente, parece-lhe que as escolas terão condições para, com estabilidade, proceder à abertura do ano escolar?…
Pensa que os portugueses têm confiança num Primeiro-Ministro que, numa altura em que o País está a arder, não teve uma palavra sequer sobre a política do Governo para combater os incêndios?!

Aplausos do PS.

Nós, Sr. Primeiro-Ministro, realizámos aqui, em Maio, um debate sobre esse tema, chamando a atenção do seu governo e da sua maioria. Riram-se de nós! Quisemos então que fosse criada uma comissão de acompanhamento, porque tínhamos receios fundados de que nada tinham feito e de que não tinham aprendido a lição com a catástrofe do ano passado.
Tenho de terminar, Sr. Primeiro-Ministro, porque só nos deram 5 míseros minutos na primeira hora,…

Vozes do CDS-PP: - Isso é mentira!

O Orador: - … mas não resisto a colocar-lhe duas questões.
Sr. Primeiro-Ministro, sei que V. Ex.ª é conhecido por dominar bem os dossiers…

Risos do PS, do PCP e do BE.

Neste sentido, gostava de saber concretamente qual é a estratégia para a negociação dos fundos estruturais que o senhor e nós consideramos importante e prioritária.
Em matéria de choque fiscal, o Governo, ao contrário do que prometeu, não baixou os impostos e, passados dois meses de tomar posse, aumentou o IVA de 17% para 19%, dizendo que era uma medida transitória. Pergunto: essa é uma medida transitória até quando? Ou é, infelizmente, mais uma mentira e

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uma medida definitiva?

Aplausos do PS, de pé.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado António José Seguro, queria lembrar a V. Ex.ª que em debates anteriores a primeira pergunta também dispôs de 5 minutos, inclusive nos tempos do governo do Partido Socialista.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Não quero chamar ironias, mas daquelas palavras já esperamos que venham a ser usadas.
O Sr. Deputado António José Seguro começou por falar nos discursos. Eu acho graça, pois o senhor junta-se ao coro daqueles que durante anos passaram o tempo a dizer que eu só sabia fazer grandes discursos e nada mais. O povo elegia-me nos actos eleitorais a que me apresentava, agora quero surpreendê-los.

Protestos do PS e do PCP.

Sr. Deputado António José Seguro, sei que o seu partido não está numa fase fácil,…

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

… mas o senhor, que é líder parlamentar e que admitiu ser candidato a líder do seu partido, tem a obrigação de assegurar que a sua bancada respeite os deveres de cortesia e ouça em silêncio a minha resposta como sempre o fazemos.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. António José Seguro (PS): - Com certeza!

O Orador: - O Sr. Deputado António José Seguro disse que o meu discurso continha um conjunto de referências a matérias banais. Fiquei a saber que para si é banal a exigência do rigor nas finanças públicas, a necessidade do crescimento económico, a valorização dos recursos humanos dos portugueses, a justiça social, o e-Government. Não vim para aqui tentar fazer os brilharetes que, porventura, alguns tentarão fazer hoje para impressionar ou conquistar não sei quem…! Quero garantir o apoio e a confiança dos portugueses nos objectivos que aqui trazemos!!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Parece-me de mau gosto que um líder parlamentar de um partido com a dimensão, a história, a tradição do PS comece a sua intervenção parlamentar tentando aproveitar a graça de um programa - muito bem feito - de humor, de sátira. Ao que os senhores chegaram!… Não esperava isso da vossa parte, Sr. Deputado António José Seguro!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos do PS.

De qualquer maneira, mesmo que as palavras tivessem sido flop, a minha preocupação é que a nossa acção não o seja, é que os portugueses sintam que os resultados das medidas e do caminho que aqui tracei sejam um sucesso, sejam um êxito.

O Sr. Afonso Candal (PS): - Responda às perguntas!

O Orador: - Era isso que esperava que o Sr. Deputado quisesse debater comigo.
Sr. Deputado, quanto às questões do tempo, há-de reconhecer que gosto muito de debate, como bem o

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sabe um candidato à liderança do seu partido que está na sua bancada e como o sabem outros. Adoro ter o tempo todo do mundo para debater…, mas as regras do Parlamento são com o Parlamento, por isso, essa questão transcende o Governo.

O Sr. Afonso Candal (PS): - Responda às perguntas!

O Orador: - Posso garantir-lhe, sob minha palavra, que o Governo nada teve a ver com isso. É com o Parlamento…

Protestos do PS.

Não temos a ver com a organização dos trabalhos da Assembleia.
Vamos, então, à questão do contrato com os portugueses.

Protestos do PS.

Sr. Presidente da Assembleia, gostava de pedir a sua colaboração, se fosse possível, em relação a estes Srs. Deputados.

Risos do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: - Sr. Primeiro-Ministro, V. Ex.ª tem capacidade suficiente para se debater com todas as circunstâncias. Em todo o caso, peço a todos os Srs. Deputados o favor de ouvirem com atenção não apenas o Sr. Primeiro-Ministro mas todos os oradores.
Há tempo para replicar, para apresentar as questões. Com toda a franqueza, é um apelo repetido, mas por ser repetido não deixo de o fazer. Cada um fala por sua vez.
Sr. Primeiro-Ministro, tenha a bondade de continuar.

O Orador: - Sr. Deputado António José Seguro, eu não queria voltar a esses tempos do passado…, mas o senhor falou do contrato com os portugueses e no choque fiscal. O Sr. Deputado António José Seguro sabe que o País sofreu, nessa altura, um choque muito diferente, de natureza muito diferente. Ou seja, a revelação das contas que tinham sido ocultadas pelo governo socialista. Ora, quando elas foram reveladas é que tivemos de rever o nosso Programa.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos do PS.

Sr. Deputado, factos são factos!! Foi a própria Comissão Europeia que o reconheceu!
O desemprego é uma matéria que me preocupa e fiz referência a esse facto. Mas, graças à acção do governo anterior, estamos, neste momento, a inverter a tendência.

Protestos do PS.

Não pode comparar Junho deste ano com o do ano anterior, mas deve fazê-lo com o mês anterior. No primeiro caso, com certeza, o desemprego aumentou. Tem é de comparar Junho com o mês imediatamente anterior. Aí, surgiram 20 000 novos postos de trabalho…

Protestos do PS.

Sr. Deputado, como sabe, é uma dimensão completamente diferente, mas nós invertemos o ciclo.
Quanto às listas de espera, ouço o líder parlamentar do Partido Socialista falar de uma realidade política evidente, dizendo: "Os senhores, em dois anos, não foram capazes de acabar com as listas de espera que existem.". Ora, isto depois de os senhores terem estado cinco anos no governo e de não terem conseguido resolver esse problema!…

O Sr. José Magalhães (PS): - Façam melhor!

O Orador: - É o que se conclui das vossas afirmações.

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Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos do PS.

Em relação aos incêndios…

Vozes do PS: - Responda às perguntas.

O Orador: - Adiante responderei às suas perguntas.

Protestos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, por favor, façam silêncio. Este debate ainda está no começo e há muito tempo para cada um ouvir as opiniões dos outros.
Faça favor de continuar, Sr. Primeiro-Ministro.

O Orador: - Sr.as e Srs. Deputados, pode ter havido outras práticas neste Parlamento, mas posso garantir-vos que, como Primeiro-Ministro e líder do principal partido da coligação - e estou certo que é uma opinião partilhada por quem é responsável pelo outro partido da coligação -, entendo que os nossos debates se devem travar ouvindo-nos reciprocamente, respeitando as opiniões uns dos outros, o que enriquece a democracia portuguesa.
Tem havido muitos debates, muitas palavras sobre os incêndios, mas quero dizer, hoje, aqui, perante o Parlamento, que estive o fim-de-semana todo a trabalhar com os Srs. Ministros da Administração Interna, da Defesa Nacional e com o Chefe de Estado Maior General das Forças Armadas, no domingo, de forma a acompanhar a acção e a tentar orientar a intervenção pública num rumo que até aqui nunca tinha sido conseguido nestes termos, ou seja, garantir maior intervenção dos efectivos das forças armadas na prevenção, na fiscalização, ainda mais do que tinha sido conseguido pelo governo anterior.

O Sr. António José Seguro (PS): - É uma crítica ao governo anterior!

O Sr. Presidente: - Esgotou o tempo de que dispunha, Sr. Primeiro-Ministro.

O Orador: - Sr. António José Seguro, como vê, não é só o Sr. Deputado que não tem o tempo que pretende. Nós também não temos e sou confrontado com esta realidade.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para defender a consideração da sua bancada, tem a palavra o Sr. Deputado António José Seguro.

O Sr. António José Seguro (PS): - Sr. Presidente, antes disso gostaria de fazer uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. António José Seguro (PS): - Sr. Presidente, coloquei duas questões muito concretas ao Sr. Primeiro-Ministro: sobre o IVA e sobre a estratégia de negociação das perspectivas financeiras para o período 2007-2012. Ora, quero que fique em registado no Diário que o Sr. Primeiro-Ministro, em 7 minutos, não respondeu a qualquer dessas duas questões.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, qualquer interpelação à Mesa tem uma resposta da Mesa e a resposta é esta: cada orador formulará as perguntas que pretende; a pessoa interpelada responde como entende. Cada um tira as suas consequências políticas, mas as coisas são assim mesmo. São as regras do Regimento.
Tem agora a palavra para a defesa da consideração da sua bancada, Sr. Deputado.

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O Sr. António José Seguro (PS): - Sr. Presidente, o Sr. Primeiro-Ministro referiu-se à situação interna do Partido Socialista.

Vozes do PSD: - É mentira!

O Orador: - Sr. Primeiro-Ministro, quero dizer-lhe com muita clareza que num partido democrático é normal que haja eleições internas para escolher o líder. No nosso partido não elegemos o líder na nossa Comissão Nacional. Há votos e os militantes escolhem.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado António José Seguro, quando fiz a referência à situação que o seu partido atravessa fi-la com todo o respeito. Se há matéria que conheço é essa, por experiência própria. Com franqueza, tenho todo o respeito pela situação e assisto com todo o interesse, fazendo votos para que o Partido Socialista rapidamente encontre aquele que vai ser o seu líder e que possa debater comigo as matérias fundamentais de Portugal.
Já agora, adiante no debate, dar-lhe-ei exemplos de como não foi sempre assim na história do seu partido quanto à substituição de líderes.
Quanto às duas questões a que o Sr. Presidente da Assembleia se referiu, o Sr. Deputado usou uma estratégia: fez cinco referências e depois formulou duas perguntas. Para mim, foram sete questões a que tinha de responder-lhe.
Quanto ao IVA, neste momento, não temos margem para alterá-lo. Privilegiaremos, se houver margem, o IRS, o imposto que atinge directamente as famílias. É aí que a questão da justiça mais se coloca.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Honório Novo (PCP): - É que o IVA atinge as "coisas"…!

O Orador: - Quanto às perspectivas financeiras, a negociação abriu-se agora e prolongar-se-á, como se sabe, no próximo ano, sendo que tentaremos, obviamente, fazer uma estratégia de negociação global que abranja todas as áreas, tendo em conta que sabemos que aumentou o número de Estados-membros. As primeiras notícias que temos - e o Sr. Deputado conhece-as - permitem-nos não nos sentirmos pessimista quanto aos resultados dessa negociação. Vamos apreciar a proposta da Comissão Europeia. Foi apresentado, no dia 14 de Julho, o projecto de regulamento sobre os fundos estruturais e vai seguir-se um período de trabalho muito árduo.
Evidentemente, a nossa estratégia é assegurar a defesa dos interesses de Portugal, adequando a nossa organização interna àquelas que serão as novas áreas que os fundos estruturais privilegiarão no próximo quadro comunitário de apoio. Neste momento, como sabe, nada mais é possível dizer.
Sr. Deputado, são as respostas que tenho para dar-lhe, com todo o gosto e toda a consideração democrática.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, queria aqui realçar esta circunstância que ficou aqui patente na intervenção do Sr. Deputado António José Seguro.

O Sr. Afonso Candal (PS): - É uma pergunta?

O Orador: - O Partido Socialista continua a não saber fazer contas… Pensou que tinha 16 minutos nesta fase e que tinha 96 minutos, ao todo, para o debate.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Deputado diz que tem 5 minutos e percebe-se por que é que o disse: porque quis justificar os incidentes que entretanto levantou, ou seja, a interpelação, a defesa da honra…

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Já temos aqui o retrato do que vai ser este debate por parte do maior partido da oposição: os incidentes regimentais, as questões processuais, a arruaça.

Protestos do PS.

Nem uma só ideia nem uma só discussão…

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos do PS.

Como dizia, nem uma só discussão das questões substantivas. VV. Ex.as têm tempo demais para isto. Não merecem o tempo que têm, sabemos disso. VV. Ex.as precisam de muito tempo para tudo. Por isso, precisam de muito tempo para estar na oposição e vão estar muito tempo na oposição.

Aplausos e risos do PSD e do CDS-PP.

Sr. Primeiro-Ministro, é bom que se lembre do significado deste momento, é bom que se lembre por que razão neste momento há um novo Governo a apresentar o seu Programa na Assembleia da República: é porque esta maioria tem um sentido muito profundo do interesse nacional e não hesitou em conciliar as soluções que pudessem garantir a Portugal a Presidência da Comissão Europeia e um Governo que assegure a continuidade das políticas sufragadas pelos portugueses.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Nós não excluímos, nunca, qualquer hipótese de defender, interna e externamente, aquilo que é melhor para Portugal.
É esta a razão por que temos aqui um novo Governo, é esta a razão por que estamos aqui a debater o Programa do Governo.
Queria aqui, em nome da minha bancada, endereçar uma palavra ao Dr. Durão Barroso por tudo quanto fez por Portugal nos dois anos em que foi primeiro-ministro e por aquilo que, seguramente, está já a fazer por Portugal, representando numa instância internacional das mais relevantes - a presidência da Comissão Europeia -, aquilo que devia ser o orgulho de todos nós. E todos nós teríamos o mesmo orgulho - é essa a nossa postura - se fosse o Sr. Dr. António Vitorino, ele é um português.
VV. Ex.as, até quando se trata de defender Portugal, são sectários!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. José Magalhães (PS): - "Roeram a corda" ao António Vitorino!

O Orador: - Sr. Primeiro-Ministro, o Sr. Presidente da República, quando optou por encarregar a maioria, especificamente o PSD, para indigitar um Primeiro-Ministro e formar governo, fez questão de salientar que se registavam condições de coesão na maioria parlamentar e que, portanto, havia condições para dar apoio ao novo Governo formado pela maioria.
Quero dizer-lhe, desde já, que, com esta equipa, com o Programa que veio apresentar aqui hoje, pode contar com a mesma lealdade, com a mesma solidariedade, com o mesmo apoio dado ao anterior governo para concluir esta Legislatura, realizando o Programa que foi sufragado pelos portugueses e que a oposição queria ver interrompido, numa atitude que não era democrática, que não respeitava os prazos constitucionais da Legislatura.

O Sr. José Magalhães (PS): - Que tonteria!

O Orador: - Sr. Primeiro-Ministro, nós vivemos há pouco tempo um acontecimento da maior relevância que revela que a alma portuguesa está viva e empenhada - o EURO 2004. Os profetas da desgraça diziam que ia correr tudo mal, que não havia condições de segurança, que Portugal ia ficar mal perante aqueles que nos visitavam. E foi o sucesso que todos nós vimos!
Há uma coisa de que eu tenho a certeza: V. Ex.ª e o seu Governo, que estão aqui a anunciar as medidas para os próximos dois anos para Portugal, vão certamente aproveitar esta sensibilidade apurada dos portugueses para, também em relação a esta competição, a este desafio de modernizar Portugal, a este

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desafio de recuperar a situação económica e social do País,…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se.

O Orador: - … conseguir galvanizar os portugueses para esta tarefa e deixar bem patente que os portugueses entusiasmam-se não apenas com a questão desportiva mas também quando têm um projecto, quando há credibilidade. E a credibilidade de Portugal ficou bem afirmada pelo governo anterior quando conseguiu que o processo que foi instaurado pelo incumprimento do Partido Socialista fosse arquivado, quando conseguiu, ao fim e ao cabo, com essa credibilidade acrescida, pôr na presidência da União Europeia um português, o Dr. Durão Barroso, que tinha esta percepção à frente do governo de Portugal e que a União Europeia conhecia e reconhecia pelas suas qualidades e pelas suas capacidades.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Guilherme Silva, o seu tempo está esgotadíssimo.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
Sr. Primeiro-Ministro, para além da apresentação que V. Ex.ª fez e sendo esta uma questão que se coloca muito concretamente a este Governo, pergunto o que vai ser a continuidade relativamente às políticas - algo que incomodou a oposição por ser uma preocupação legítima do Sr. Presidente da República! - e o que vai ser novidade, o que vai ser mudança, por parte deste Governo.
São estas duas questões que coloco.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Guilherme Silva, em primeiro lugar, agradeço as palavras que me transmitiu.
Quanto à maioria parlamentar e à sua coesão, não tenho dúvidas sobre isso. Quero não só agradecer a expressão desse testemunho mas também dizer, perante o País, que nos honramos da prova de maturidade que o sistema político deu. É que, depois desta situação gerada por esse motivo de relevante interesse nacional, passado um mês, aqui estamos com a formação de um novo Governo, com as instituições a funcionarem plenamente, com a maioria a assumir as suas responsabilidades, incluindo nela membros do anterior governo, que estão coesos e solidários nesse mesmo apoio.
Nós não apoiamos ou deixamos de apoiar governos por estarmos no poder ou não. Nós apoiamos governos quando concordamos com o seu programa, com os seus objectivos, quando entendemos que servem o interesse nacional.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Quanto ao que o Sr. Deputado Guilherme Silva referiu acerca do EURO 2004, quero dizer que é um bom exemplo, de facto. É um bom exemplo o EURO 2004, a organização do Campeonato Europeu de Futebol, e é um bom exemplo também o Euro e o modo como temos conseguido integrar-nos no sistema monetário europeu.
Esses vários exemplos que temos tido nos últimos anos demonstram aquilo a que fiz referência há pouco: que podemos pensar de nós próprios, sempre com humildade, nunca com vaidade, que somos capazes de ser os melhores, mesmo em condições muito difíceis. Num País que passou de uma ditadura para a democracia, que descolonizou, que adoptou uma moeda única - e isto quase tudo em simultâneo num mesmo período histórico -, nós temos conseguido afirmar-nos, ter estabilidade, ter paz, relacionar-nos com os países de expressão oficial portuguesa, as ex-colónias, e criar laços políticos, culturais e económicos com esses mesmos países. Portanto, aí uma vertente da continuidade a que o Sr. Deputado fez referência.
Mas também continuidade na política externa, assumindo os compromissos estabelecidos na defesa nacional, nomeadamente o reequipamento das Forças Armadas, a Lei de Programação Militar, que mereceu um acordo tão amplo por parte das várias forças políticas.
E também na política de justiça, que exigirá, especialmente nos tempos que vivemos, essa tal participação num pacto de regime entre as forças políticas, todos os protagonistas e agentes judiciais para conseguirmos um novo tempo, para a justiça respeitar os direitos do cidadão e ser mais eficaz em relação à sociedade. Mas, para isso, é necessário que tenha meios de que hoje não dispõe.
E em relação à administração interna (já falei das finanças e da economia), lembro as palavras ditas

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ontem, em S. Tomé, pelo Sr. Presidente da República de que os resultados de uma verdadeira política florestal não se conseguem em seis meses. Foi o Sr. Presidente da República quem o disse. Pode demorar uma década. Ora, nós estamos a trabalhar para assegurar a continuidade onde ela deve existir mas num ponto, quer se queira quer não, vai ser diferente daquilo que, se calhar, esperariam: menos palavras, mais actos!
Em matéria de incêndios, as portuguesas e os portugueses sabem que a situação tem sido difícil. As condições climatéricas - deixem-me dizer-vos isto, Srs. Deputados - foram um dos primeiros pontos de situação que pedi em Conselho de Ministros. No ano passado, o grau de risco fornecido pelos serviços de meteorologia era de 2.01, como média dos dias mais críticos; neste ano, desde 1 de Junho, tivemos dias, antes desta vaga mais crítica de incêndios, com grau de risco de 2.56 e, no passado fim-de-semana, o factor "risco", medido pelas diferentes condições climatéricas e do solo, chegou a atingir, nalguns distritos, o nível 5, absolutamente sem precedentes, condições absolutamente adversas.
Julgo que todas e todos temos o amor por Portugal suficiente para sabermos reconhecer que só com um esforço concertado, conjugado, em que não façamos de questões sérias matéria de chicana política, podemos ter êxito na acção que queremos desenvolver. É isso que estou a procurar levar a cabo.
Falei há pouco na produtividade, no que é necessário que todos - trabalhadores, empresários, portugueses em geral - dêem mais do seu esforço para podermos ter mais riqueza para distribuir. Sou e serei o primeiro a dar o exemplo, trabalhando cada vez mais, mesmo quando não é tornado público.
Deixem-me dizer isto: fartos de muitos anos, de muitas palavras, de muitos sectores políticos está o povo português. O povo português quer resultados!

O Sr. José Magalhães (PS): - Exacto!

O Orador: - Deixem-me também dizer-vos que, em relação ao primeiro semestre deste ano, de 1 de Janeiro a 19 de Julho, em termos dos números fornecidos pelos serviços florestais, houve menos área ardida; só sete incêndios é que demoraram mais de 24 horas a ser combatidos. Portanto, houve uma capacidade de resposta completamente diferente. Os meios aéreos estiveram todos no ar. Tivemos 18 distritos com incêndios, simultaneamente. Pedimos reforços, naturalmente. Pedimo-los a Itália que, numa primeira fase, disponibilizou mas que está com o espectro da subida de temperatura para os próximos dias. Chegam hoje dois meios aéreos que a Grécia nos cedeu. Todos os meios estão mobilizados. Os Secretários de Estado têm estado nas frentes mais exigentes, por força da realidade do País em termos de incêndio.
Deixem-me reafirmar a ideia do Sr. Presidente da República: esta é uma tarefa nacional que não se resolve em seis meses.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Mas eu quero dizer às portuguesas e aos portugueses que não vou trabalhar devagar lá por sabermos que é assim. Vamos trabalhar muito e o mais depressa possível no sentido de obter resultados tão rápidos quanto as portuguesas e os portugueses desejam.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente. Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Ministros, Sr.as e Srs. Deputados, nesta minha primeira intervenção, na pessoa de V. Ex.ª, Sr. Presidente, saúdo a Câmara e, enquanto português, o Governo.
Saúdo o Governo na pessoa do Sr. Primeiro-Ministro, naturalmente, mas também na pessoa de cada um dos seus ministros e dos seus secretários de Estado, aqueles que transitaram do anterior governo para o actual mas também aqueles, muitos, que, por reconhecida competência, assumem pela primeira vez funções.
E não o faço por qualquer razão despicienda. Faço-o porque, há bem pouco tempo, na oposição, havia muito quem reclamasse grandes mudanças, grandes remodelações,…

O Sr. Afonso Candal (PS):- E tínhamos razão!

O Orador: - … quem argumentasse que tudo estava mal.

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O Sr. José Magalhães (PS): - E com razão!

O Orador: - Hoje, por razões conjunturais, que o interesse nacional determinou, temos um novo Governo, com novos protagonistas, cujo mérito e capacidade foi reconhecida na vida de cada um dos seus protagonistas,…

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - … e a oposição, afinal, o que já acha é que o Governo mudou demais! O que não deixa de ser significativo em abono do Governo e relativamente àquilo que se espera da oposição, que há-de ser, certamente, muito pouco!…

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Sempre devo dizer, Sr. Primeiro-Ministro, que este Governo nos tranquiliza e, principalmente, devolveu aos portugueses a esperada tranquilidade. É um governo que expressa uma vontade demonstrada em urnas nas últimas eleições legislativas, como é suposto em democracia, e que demonstrou o amadurecimento que hoje temos nessa mesma democracia - uma democracia que já não cede a imprevistos ou a ímpetos mais ou menos irresponsáveis…

O Sr. José Magalhães (PS): - Isso é em relação à Sr.ª Secretária de Estado Teresa Caeiro?!

O Orador: - … mais ou menos revolucionários.
Há poucos meses, o Sr. Primeiro-Ministro cessante aceitou um desafio determinado exclusivamente pelo interesse nacional.

O Sr. Afonso Candal (PS): - Perdeu e partiu!

O Orador: - Foi um exemplo de um Portugal que hoje, como já não sucedia há muitos anos, conta e é ouvido.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Um português foi chamado pela primeira vez para presidir aos destinos da União Europeia.

O Sr. Afonso Candal (PS): - Perdeu e partiu!

O Orador: - Curiosamente, a razão do nosso orgulho, a razão do orgulho dos portugueses, é a razão de constrangimento, de aborrecimento, de insatisfação da oposição ou, pelo menos, de grande parte dela.
Sr. Primeiro-Ministro, o PSD e o CDS, nesse momento como hoje, compreendendo a importância do momento que se vivia em Portugal, demonstraram-se coesos, afirmaram a sua determinação, a sua vontade, na constituição de um novo Governo, de um Governo credível, do Governo que hoje temos.
A oposição disse que não. Disse até que, afinal, aquele primeiro-ministro, que devia ter ido embora mas que, pelos vistos, devia ter ficado, fez mal ao ir para a Europa, sendo que, curiosamente, a oposição que dizia que a maioria estava frágil, que estava dividida, que quis vencer na secretaria aquilo que não conseguiu nas urnas, que se afirmou forte, é a mesma que, pela simples circunstância de não ter conseguido aquilo a que se propunha, está hoje, ela sim, dividida, frágil, porventura sem rumo ou, pelo menos, não se vê que o consiga alcançar num futuro mais próximo.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Hoje, como sempre afirmámos, a maioria está aqui, está pronta, está firme,…

O Sr. José Magalhães (PS): - Está "firme" e hirta!

O Orador: - … está unida para governar Portugal.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

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O Orador: - Portugal que tem hoje um novo Governo pronto para os desafios da modernidade.
Recordo que há pouco mais de dois anos o Dr. Telmo Correia, então presidente desta bancada, lembrava que o governo socialista tinha gasto, tinha gasto, tinha gasto… e, porque não tinha mais para gastar, foi embora.
Hoje, com muita satisfação, e olhando também para trás, posso verificar a existência de um outro governo - um governo que poupou, um governo que geriu com critério, um governo que devolveu a Portugal condições para o desenvolvimento e que, por isso, teve, inclusivamente, em relação ao seu principal responsável, um chamamento para presidir aos próprios destinos da União Europeia, e isso é muito significativo.
Termino, colocando-lhe uma questão, Sr. Primeiro-Ministro. Verifica-se que, nesta nova era, novas prioridades também foram encontradas. A par, obviamente, de preocupações já antigas com as finanças, novas preocupações com o mar como desígnio nacional, com o ambiente como condição essencial para o nosso desenvolvimento, com o turismo como condição essencial de criação de riqueza foram elevadas à condição de matérias de dignidade ministerial e, por isso, têm titulares específicos para o seu tratamento.
Pergunto, Sr. Primeiro-Ministro, o que levou o Governo a ponderar essa questão. Digo-o até com o orgulho de quem vê hoje, na bancada do Governo, democratas-cristãos a quem foram cometidas tais responsabilidades: o Dr. Bagão Félix, o Dr. Paulo Portas, o Dr. Luís Nobre Guedes, o Dr. Telmo Correia, todos eles de idoneidade e competência insuspeitas, que certamente serão de muito relevo e de muito peso no Governo. Mas, quanto a estas matérias, Sr. Primeiro-Ministro, pergunto: porquê esta dignidade que lhes dá? Porquê a relevância que lhes conferiu?
Já agora, Sr. Primeiro-Ministro, e termino, desejo muita boa sorte para o seu Governo, muito boa sorte para Portugal!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Melo, em primeiro lugar, permita-me que, em nome do Governo, o saúde pela sua eleição e lhe deseje as maiores felicidades para o exercício das suas funções. Viu-se agora, pela intervenção inicial, que certamente esse exercício de funções correrá à altura daquilo que o Parlamento merece e que o debate democrático exige.
O Sr. Deputado Nuno Melo fez referência a algo estranho que se passou nas últimas semanas na política portuguesa,…

O Sr. Francisco Louçã (BE): - É estranho, de facto!

O Orador: - … que foi um repentino apego, de quem tão mal dizia do governo anterior, ao Dr. Durão Barroso, à anterior ministra das Finanças,…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Esqueceu-se do Dr. Marques Mendes!

O Orador: … a um conjunto de ministras e ministros que antes tão atacados eram mas, de repente, foi considerado um factor de perturbação nacional não continuarem no exercício das respectivas funções!!

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Eu diria que se perturbasse alguém - e certamente incomodou - seria a nós mesmos, que sentíamos orgulho de apoiar o governo anterior, do qual faziam parte membros cuja competência atestávamos e nos empenhávamos a todo o momento em saudar e reconhecer, porque ela se impunha por si própria. Por isso, era natural que os mais incomodados até fossemos nós. Mas, repito, foi um fenómeno estranho.
Nós procurámos assumir as nossas responsabilidades, olhar para diante e tivemos ainda por cima de cuidar de algumas "feridas" daqueles que se entristeceram com a partida de quem antes tanto censuravam!!
Em relação à estrutura e composição do Governo, permitam-me uma nota. Na sexta-feira à noite, num debate a propósito do tal interesse, sem precedentes, pela estrutura do Governo, ouvi quatro personalidades comentarem como era estranho, a meio da Legislatura, haver um Governo com uma estrutura completamente nova…

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O Sr. Francisco Louçã (BE): - É estranho, de facto!

O Orador: - … e quais seriam as razões da opção do Primeiro-Ministro.
Fui pegar, de novo, na estrutura do Governo e comecei a pensar no Ministério da Defesa Nacional, no Ministério da Educação, no Ministério da Saúde, no próprio Ministro da Presidência, no Ministro Adjunto, no Ministro dos Assuntos Parlamentares, no Ministro dos Negócios Estrangeiros e das Comunidades Portuguesas, tantos que mantêm exactamente a mesma estrutura, até a mesma designação.
Portanto, é natural…

O Sr. Honório Novo (PCP): - E o do Mar?!

O Orador: - Já lá vou!
Portanto, é natural que num novo Governo existam algumas mudanças. Mas falava-se como se fosse um Governo completamente novo e, no entanto, é um Governo onde, de facto, existe estabilidade, mesmo em matéria de estrutura orgânica.
E refiro também o Ministério da Cultura, para dar mais um exemplo, e tantos outros.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - O Ministério da Cultura tem mais uma secretaria de Estado!

O Orador: - Em relação ao mar e ao ambiente, matérias que o Sr. Deputado Nuno Melo saudou, eu sempre disse, sempre defendi publicamente em várias intervenções, e mantenho esse entendimento e essa convicção, que Portugal sempre respirou, sempre se sentiu completo assumindo o mar como parte do seu ser, como parte do seu dia-a-dia, como parte do seu desígnio de futuro.
Hoje em dia, o mar é património e elemento fundamental da nossa História, do nosso passado, mas é fundamental que Portugal assuma o mar, tendo uma zona económica exclusiva como poucos países têm no mundo, representando o mar, no século XXI, aquilo que vai representar para todo o mundo e podendo ter um estatuto de nação pioneira, de Estado pioneiro, como a convenção de Montego Bay o prevê.
Devo dizer que eu próprio, tendo sido assistente de Direito do Mar nos primeiros tempos da minha actividade profissional, tive a honra de ser assistente do Professor Doutor Armando Marques Guedes na primeira vez que essa cadeira foi leccionada numa faculdade portuguesa, na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, e, portanto, não escondo a especial sensibilidade que tenho para essa matéria.
Conseguimos agora a Agência Europeia de Segurança Marítima. Para além do trabalho desenvolvido em torno do projecto da Comissão dos Oceanos - a Expo 98 teve esse lema -, principalmente, temos o mar, esse mar que cultural e geograficamente nos une a tantos outros povos do mundo. Mas no século XXI uma boa parte das riquezas da humanidade virá do fundo do mar, da plataforma continental, tendo de ser extraídas em condições por vezes adversas mas já ao alcance das novas tecnologias.
Quero, queremos, que Portugal assuma os assuntos do mar como um verdadeiro desígnio nacional. É algo que nos distingue de outros Estados, distingue-nos por bem, pelo que o devemos aproveitar e ter constantemente presente na nossa acção governativa.
Os assuntos do mar ficam com o Sr. Ministro de Estado, da Defesa Nacional e dos Assuntos do Mar e penso que ele com certeza se sentirá honrado por ter esta matéria sob sua tutela, até porque tem também a da defesa nacional, embora a matéria respeitante aos assuntos do mar ultrapasse o foro militar.
Em relação ao turismo, representa, hoje em dia, cerca de 12% do PIB. Mas não é só por isso que esta matéria é importante. Na estratégia de desenvolvimento, sabemos todos o que representa a componente "serviços" no desenvolvimento da nossa economia. Portanto, valorizar o turismo e criar as condições para uma oferta turística cada vez mais capaz, cada vez mais à altura da procura que o País tem e terá, na sequência, nomeadamente, das últimas organizações, penso que é um imperativo base na organização do Governo.

O Sr. Presidente: - Sr. Primeiro-Ministro, o seu tempo esgotou-se.

O Orador: - Quanto ao ambiente, gostaria de deixar também uma nota. A pasta do ambiente está hoje entregue a um ministro do CDS-PP, mas esta é uma pasta que o Governo assume, independentemente da configuração orgânica do seu titular, como património de todos e não de um partido. De qualquer forma, honrará com certeza o seu partido ter, hoje em dia, um militante seu a assumir essa pasta, na qual o PPD/PSD tem tido um papel especial, em Portugal, ao longo dos anos. Mas nós não temos a noção que alguns têm de que cada pasta pode ser "feudo" ou "quinta" de alguém ou que só pode encarregar-se dela um licenciado ou um doutorado na matéria em causa. Sabemos que não é isso que acontece na generalidade

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das democracias, não é isso que acontece na generalidade dos países europeus. Nós queremos ser uma democracia normal, uma democracia adulta, uma democracia maior.
O ambiente é uma causa colectiva e posso garantir, Sr. Deputado, que o Ministro do Ambiente e todos nós - e temos um programa muito vasto, de que falaremos adiante -, quando algo estiver em conflito com o interesse ambiental, decidiremos sempre a favor do ambiente e nunca a favor de outros interesses.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Carvalhas.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, não vou questioná-lo sobre discursos, nem sobre as suas primeiras e únicas escolhas, nem sobre o Governo que devia ter minguado e que cresceu, nem sobre o imbróglio dos secretários de Estado em que o Sr. Primeiro-Ministro anulou aquele momento de glória ao Ministro da Defesa quando, em soundbyte, dizia aos portugueses: "pela primeira vez, vamos ter uma mulher, uma mulher neta e filha de militares, no Ministério da Defesa."!!

O Sr. Ministro de Estado, da Defesa Nacional e dos Assuntos do Mar (Paulo Portas): - Tem algum mal?!

O Orador: - Sr. Primeiro-Ministro, isto não se faz a um ministro que hoje é "eurocalmo" mas que, em soundbytes, continua a fazer aquilo que fazia no passado quando falava dos velhinhos, dos remédios, da lavoura, do subsídio de risco para os polícias…!
Mas todas estas são questões vossas, do vosso "teatro"…
Quero colocar-lhe questões concretas, algumas das quais estão em andamento, porque o Governo é o mesmo, foi remodelado com a remodelação do primeiro-ministro, é o mesmo governo que nos mentiu sobre o Iraque, sobre o crescimento económico, sobre a redução dos impostos, sobre a igualização das pensões mínimas ao salário mínimo…

O Sr. António Filipe (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Por isso, a primeira questão que coloco é esta: pensa o Sr. Primeiro-Ministro rectificar alguma coisa? Pensa rectificar, por exemplo, o subsídio de doença ou as questões mais gravosas do código laboral? Ou vai continuar com o aumento da precariedade, da desregulamentação, como diz o Programa, e, então, as palavras-chave que fazem parte do seu Governo, isto é, produtividade, qualidade, não passarão de produtividade e qualidade pela intensificação da exploração dos trabalhadores?!

O Sr. António Filipe (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Olhe que não se mobiliza os trabalhadores assim, nem é assim que se consegue o crescimento económico que deseja! Com essa política, nunca mais terá os dois pontos acima da média europeia!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Vai o Sr. Primeiro-Ministro recuar alguma coisa em relação à privatização da Galp, ou em relação à privatização das lezírias, ou em relação à privatização das águas?!
Vai o Sr. Primeiro-Ministro alterar alguma coisa em relação ao subsídio de desemprego ou em relação aos passes sociais, como dizia o anterior governo, muito ao jeito da "justiça social" de Bagão Feliz, que é fazer uma pequena "diferenciaçãozinha" para depois pôr todos os portugueses a pagar muito mais pelos serviços e pelos bens públicos?!

Vozes do PCP:- Muito bem!

O Orador: - Quanto ao Ministro da Saúde, que é o mesmo, vamos ter as mesmas listas de espera, a mesma propaganda, mas com menos médicos e com menos trabalhadores da saúde, que, no próximo ano, vão atingir um mínimo que é perigoso. Chamo a sua atenção para esta questão.
Em relação à agricultura, coloco-lhe uma única questão. Vai o Sr. Primeiro-Ministro olhar para a organização institucional do Douro, que continua a liquidar os pequenos produtores em benefício dos grandes e das casas exportadoras? Amanhã, há um protesto, aliás, justo, da pequena lavoura. Peço também

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a sua atenção e, em especial, do Sr. Ministro da Agricultura para esta questão.
Em relação à elaboração do Orçamento do Estado, coloco duas questões, a primeira das quais sobre os incêndios. E não estou a referir-me à política florestal, à reflorestação, pois essa demora muitos anos, mas a uma questão muito central, a da prevenção, Sr. Primeiro-Ministro.
Vai o Sr. Primeiro-Ministro ter mais atenção a que as verbas orçamentais cheguem atempadamente para não acontecer o mesmo que aconteceu com aquela célebre agência de prevenção em relação à qual a única acção que se conhece foi a de ter "dado à luz" um novo secretário de Estado, e mais nada?!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Não se cumpriu o Livro Branco, nem o relatório que foi aqui elaborado por iniciativa do meu partido.
Por último, uma questão sobre a descentralização "à novo ministro". O Sr. Primeiro-Ministro, no seguimento do que fez em Lisboa, pensa multiplicar pelo País aqueles outdoors, com os novos gabinetes das secretarias de Estado de fora de Lisboa, a dizer: "Estamos a alindar Portugal!"?

Risos do PCP.

E, Sr. Primeiro-Ministro, se responder positivamente a tudo, excepto a esta última pergunta, então, terá da nossa parte um compromisso histórico e solene, da Assembleia da República perante a maioria, que será a afirmação concreta, simples e clara de que estamos perante um novo Governo.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Carvalhas, quero também saudá-lo. Apetecia-me começar a minha resposta com a pergunta: "E então?…". Não sei se essa sua sugestão do compromisso histórico tem alguma consequência.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Só se responder "sim" a todas as perguntas!

O Orador: - Gosto de lidar com todos os dados políticos para decidir e, portanto, se o que diz tem correspondência com a realidade, tomo boa nota, porque, como disse, estou aberto a considerar todas as propostas vindas de todos os sectores. Estou a falar sinceramente! Outra coisa não poderia acontecer.

O Sr. António Filipe (PCP): - Então, até aqui não estava?!

O Sr. José Magalhães (PS): - Vocês tenham cuidado que isto ainda vai acabar mal!

Risos do PCP.

O Sr. José Magalhães (PS): - Estão a ser assediados!

O Orador: - Em relação ao código laboral, Sr. Deputado Carlos Carvalhas, compreendo as suas preocupações e compreendo as preocupações da generalidade dos trabalhadores quando é dito, como foi dito durante o debate da revisão da legislação laboral, que aquilo que se pretende é pôr em causa os seus postos de trabalho.
Quanto a esta questão, permito-me responder-lhe que não acredito numa visão fixista do emprego. Defendo a mobilidade social e defendo, também, a mobilidade laboral. Devo dizer que considero que é muito importante o respeito pelas garantias e pelos direitos dos trabalhadores, mas entendo que é fundamental conseguir uma captação de investimento que dê a esses mesmos trabalhadores a perspectiva de poderem melhorar a sua vida e de poderem, às vezes, mudar de posto de trabalho. O que têm é de ter garantidos os seus direitos quando acontecem situações, como aconteceu em Portugal recentemente, de agravamento da taxa de desemprego.
Portanto, Sr. Deputado, não vejo o novo código laboral como um problema. Ele está regulamentado e tem uma visão. Diria que o seu conteúdo é mais moderado do que aquele que está adoptado pela generalidade dos governos europeus de partidos que são da mesma "família" política do Partido Socialista.
A este propósito, e a propósito de algumas considerações que foram feitas em público sobre a opção

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orgânica de, no Ministério das Actividades Económicas, estar também incluído o do Trabalho, ouvi várias intervenções interessantes e li artigos curiosos dizendo que esta opção reflecte uma perspectiva liberal da economia, e gostaria de dizer que, tendo estudado a orgânica de todos os governos europeus antes de fazer as opções que fiz para a respectiva estrutura, cheguei à conclusão de que foi na Alemanha de Schröeder que me inspirei - e devo dizer que considero um bom exemplo o Wirtschaft und Arbeit, de entender a empresa como uma comunidade de interesses, com objectivos próprios, contribuindo para o crescimento da economia nacional -, e não foi em nenhum modelo de governo de direita que fui buscar essa inspiração.
Assumo esta posição com orgulho. Parece-me uma boa solução. E não tem nada a ver com qualquer diminuição da perspectiva social na consideração do trabalho e do papel dos trabalhadores na sociedade portuguesa. Este é um primeiro ponto que gostava de deixar claro a propósito de várias intervenções que ouvi sobre esta matéria.
Quanto às privatizações, o Sr. Deputado Carlos Carvalhas fez referência a uma que estava - e está, pelos dados de que disponho - decidida, no fundamental, pelo governo anterior.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Decidida já com o governo em gestão!

O Orador: - Portanto, com certeza que tenho lido todos os dossiers respeitantes a esta matéria.
Como é sabido, há neste momento formalizações entre a PARPÚBLICA e aqueles que irão adquirir a participação que pertencia ao Estado, e a este propósito, devo dizer, até, com um desfecho que não foi o vaticinado aqui, nesta Assembleia, nalguns debates parlamentares.
Quanto às outras privatizações a que fez alusão, como é o caso da Companhia das Lezírias, não quero ainda pronunciar-me, pois entendo que não o devo fazer.
Falou também na organização institucional…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Do Douro!

O Orador: - Exactamente, do Douro.
Em relação a esta questão, partilho da sua preocupação, Sr. Deputado. Sabemos que o governo anterior desenvolveu um trabalho, como outros procuraram fazer, para resolver este problema que se arrasta há anos e anos e que, a meu ver, é dramático, principalmente para os pequenos agricultores. Portanto, o problema não está resolvido, partilho da sua preocupação e iremos continuar a trabalhar na solução do problema que vários governos não conseguiram solucionar de vez.
O Sr. Deputado falou também na questão da prevenção dos incêndios. Também neste ponto, volto a dizer que temos muito a fazer. Não vou cantar aqui um cântico de "hossana" a tudo o que se fez até hoje em Portugal. Impressionou-me, nalguma medida, nestes primeiros dias de exercício de funções, o trabalho que ainda há para fazer nesta matéria.

O Sr. Afonso Candal (PS): - Já lá vão dois anos e meio!

O Orador: - Não é fácil para um Primeiro-Ministro estar a tentar coordenar todas as operações, ter incêndios em 18 distritos e não ter, apesar do esforço feito no ano passado, nem meios humanos, nem meios aéreos, nem outros que permitam acorrer àquilo que se passa por força das alterações climatéricas.
Temos 10 Puma, que não são meios aéreos de combate a incêndios mas que podem ajudar no transporte de pessoas e para outras finalidades. Desses 10 Puma,…

O Sr. Presidente: - Sr. Primeiro-Ministro, o tempo de que dispunha esgotou-se.

O Orador: - … 4 estão nos Açores e 1 está na Região Autónoma da Madeira, sendo utilizados em operações de busca e salvamento, o que é importante nesta época balnear, portanto é muito difícil "esticar" os meios existentes ou tomar decisões que os desloquem de onde podem ser necessários.
Quanto aos outdoors, Sr. Deputado Carlos Carvalhas, quero dizer-lhe que não renuncio a eles. Quero é os resultados da governação.
Por fim, a propósito da tomada de posse de secretários de Estado, tenho comigo um recorte de jornal interessante da altura de um governo dirigido pelo Eng. Guterres (isto acontece!) em que o Secretário de Estado Miranda Calha era para tomar posse no desporto, foi vetado por um ministro e à última hora foi posto pelo Ministro da Defesa como Secretário de Estado da Defesa. E este recorte de jornal diz: "O Primeiro-Ministro soube da mudança pelos jornais"!

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O Sr. Honório Novo (PCP): - Isso não tem a ver connosco!

O Orador: - Eu sei! Mas diz respeito à democracia portuguesa!
Posso garantir que o Primeiro-Ministro deste Governo, o Ministro de Estado e da Defesa e, principalmente, o Sr. Presidente da República não souberam dessa mudança pelos jornais. Participámos na decisão e o Sr. Presidente da República soube em primeiro lugar, ao contrário do que se passava noutros tempos!…

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Dr. Santana Lopes, o Parlamento ouviu o discurso mais insípido de inauguração de um Primeiro-Ministro de todos os tempos da democracia.
Mas não é por acaso: o Dr. Santana Lopes apresenta-se a este Parlamento fragilizado como nunca se apresentou um Primeiro-Ministro. Por duas razões: primeira, o Governo resulta de uma debandada. Dizia o Dr. José Manuel Barroso, há dois anos, no discurso de tomada de posse, aqui, na Assembleia: "Apercebendo-se da encruzilhada e do pântano em que havia mergulhado o País, o Primeiro-Ministro decidiu, a meio da legislatura, 'abandonar o barco' e fugir às suas responsabilidades". Mal ele sabia que antecipava a sua própria fuga!…

Vozes do PSD: - Não é verdade!

O Orador: - Depois de uma queda de 14% no investimento, depois do maior aumento do desemprego da União Europeia, depois de uma queda do Produto, depois de um atraso, depois de uma divergência, o Primeiro-Ministro fugiu e, por isso, este Governo está aqui tão fraco!

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

O Orador: - Mas, Dr. Santana Lopes, aparece também fragilizado por uma outra razão que é só sua. Da primeira vez que foi "Primeiro-Ministro", há muito tempo atrás, foi escolhido por uma única pessoa: um produtor de programas de televisão. Da segunda vez, agora, está um pouco menos mal: foi escolhido por uma pessoa, o Presidente da República, mais 103 pessoas, que são os barões e chefes do PSD!

Protestos do PSD.

O que faltou foi a democracia portuguesa!

Protestos do PSD.

E agora vão juntar-se alguns dos Deputados que berram tanto dali, daquela bancada!

Protestos do PSD.

Mas eu percebo por que é que só quer ser escolhido por estas pessoas e tem medo do voto dos portugueses! É que, Dr. Santana Lopes, foi talvez por isso que nos veio aqui dizer - o que é extraordinário, é mesmo extraordinário - que o voto popular que penalizou a coligação da direita nestas eleições perturbou o trabalho patriótico do Governo. Frase extraordinária!

O Sr. José Magalhães (PS): - Exacto!

O Orador: - Porque o senhor e os outros dirigentes do PSD e do PP arrastaram o Governo para uma derrota histórica, com dois terços dos portugueses contra estas políticas, e por isso têm medo de eleições. Como é que não haviam de ter medo de eleições?! E, por isso, preferem, naturalmente, ser escolhidos pelos directórios partidários! Mas cada vez que aqui falar, Sr. Dr. Santana Lopes, lembrar-se-á que vem aqui por medo de eleições.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

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O Orador: - Por isso mesmo, quero colocar-lhe questões concretas sobre o Programa deste Governo para que se saiba o que, não tendo a confiança dos portugueses, pretende fazer.
Primeira questão: diz-se na pág. 119 do seu Programa que "a opção passou por evoluir do conceito de SNS para um novo paradigma de sistema de saúde misto".

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - E muito bem!

O Orador: - Atenção, durante 2 anos, o Ministro da Saúde veio aqui dizer que tudo o que fazia na privatização da saúde só tinha um objectivo: salvar o Serviço Nacional de Saúde!

Vozes do PSD: - Exactamente!

O Orador: - Agora, o mesmo Ministro já não quer salvar mas passar o Serviço Nacional de Saúde para um sistema misto.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Não percebeu nada!

O Orador: - Como o Ministro é o mesmo e como amanhã vai ser entregue, imaginemos que ao Grupo Mello, a gestão do Hospital de Loures (Grupo de que vem esse Ministro!), queria perguntar-lhe se é assim que entende um cuidado de saúde prioritário em Portugal.

O Sr. José Magalhães (PS): - É!

O Orador: - Segunda questão, que também permite resposta (e espero que a dê): diz-nos, no Programa do Governo, na pág. 22, que há a "possibilidade de um referendo". Nós já sabemos o que são as suas "possibilidades". É que havia uma possibilidade de o Ministro da Economia ir para o Porto e de o Ministro da Agricultura ir para Santarém…! As suas possibilidades, permita-me que lhe diga, normalmente são impossibilidades! Ficamos, pois, preocupados quando nos fala na "possibilidade de um referendo".
Ora, o referendo foi prometido - tem de ser proposto pelo Governo ou pela Assembleia ao Presidente e submetido ao Tribunal Constitucional -, e foi prometido para Janeiro. Se agora, no dia 27 de Julho, o Primeiro-Ministro ainda não sabe se há referendo ou não, quando é que vai decidir? Tem poucas semanas para tomar a decisão. Já nos veio dizer que isso depende de um acordo político. Um acordo com quem? Vale a pena ter resposta clara, porque ou saímos daqui com a certeza de que há um referendo ou saímos com a certeza de que os direitos democráticos dos portugueses estão a ser roubados!
Última questão: falou-nos de rigor e de combate à fraude. A Associação Portuguesa de Bancos anunciou hoje um sucesso: a taxa de IRC da banca passou de 14% para 13%. Pagam metade da taxa normal! O que o Governo nos sugere é - traduzido em português, porque as frases estão ditas de forma a que ninguém as perceba - que não vai mexer mais no IRC (que não é pago por muitas empresas), mas vai mexer no IRS em relação àquelas pessoas que ganham 500, 1000, 5000 ou 10 000 contos.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o tempo de que dispunha esgotou-se. Tenha a bondade de concluir.

O Orador: - Concluirei, Sr. Presidente.
Em relação a essas pessoas, vai baixar-se o IRS. Ou seja, mantém-se todo o IRS de quem paga 80, 100 ou 150 contos. Rouba-se aos pobres para dar aos ricos!

Vozes do BE: - Muito bem!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Que vergonha!

O Orador: - Por isso mesmo, quero dizer-lhe: isto é aumento do benefício fiscal, é aumento da fraude!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Tenha vergonha!

O Orador: - Finalmente, Sr. Primeiro-Ministro, anunciou-nos uma moção de confiança. Se estas são as suas políticas, vote depressa a moção de confiança. Porque tenha consciência de uma coisa: depois

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do seu discurso, depois da sua intervenção e depois deste Programa, este Governo começou a morrer hoje. Está a morrer lentamente à nossa frente!

Protestos do PSD.

Vote depressa, antes que ele desapareça!
Em todo o caso, tem a minha solidariedade. Paz à sua alma!

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco Louçã, permita-me que o saúde democraticamente.
Trato-o por Deputado Francisco Louçã. Não sei se me leva a mal tratá-lo pelo cargo. Se quiser, trato-o por Dr. Francisco Louçã… Não sei o que prefere.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Não há problema!

O Orador: - Mas eu, apesar de termos sido colegas de liceu, desde os 10 anos, e de turma e de nos conhecermos há muitos anos, por respeito democrático, trato-o pelas funções que ocupa, e não levará a mal.
Portanto, Sr. Deputado Francisco Louçã, estava a ouvi-lo e a pensar: "Eu já ouvi isto! Já ouvi isto várias vezes!". Acho que o estilo do Sr. Deputado é sempre o mesmo.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É o estilo "cassete"!

O Orador: - O Sr. Deputado achou o meu discurso insípido -parece-me que foi esse o termo que empregou. Acontece que eu já o tinha ouvido dizer o mesmo ao anterior primeiro-ministro Durão Barroso em debates que não vou dizer que ganhou ou perdeu mas em que, com convicção, expôs os pontos de vista do seu governo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Portanto, Sr. Deputado, conheço o seu estilo, reconhecendo embora que hoje é mais falador do que era noutros tempos.

Risos do PSD e do CDS-PP.

Mas o seu estilo, Sr. Deputado Francisco Louçã, diz sempre o mesmo, independentemente do Primeiro-Ministro, ou do discurso, ou dos governos.
Há três coisas que diz sempre: primeira, que aquilo que foi dito é banal e não tem interesse nenhum; segunda, está ligado a interesses e, portanto, ou é o grupo A ou o grupo B… Aliás, se o Sr. Deputado, um dia destes, fizer uma conferência sobre este assunto, irei assistir com todo o gosto, porque já vi que sabe muito da matéria. Mas eu confesso que isso é assunto que não quero saber o que o Sr. Deputado sabe. Quero ter a noção da economia… É que eu oiço-o sempre falar do grupo… Há uns anos era outro partido que falava num conjunto de famílias - Mello, Champalimaud… -, agora é o Sr. Deputado Francisco Louçã que acha sempre que há uma ligação…! Olhe, eu não sei, por exemplo, como é que surgiram tantos outdoors do Bloco de Esquerda por todo o País! Eu não sei fazer essas ligações do Bloco de Esquerda com interesses!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos do Deputado do BE João Teixeira Lopes.

Não sei! Não faço ideia!
Por isso, um dia destes, como eu disse, estou disposto a ir a uma conferência sua sobre a ligação entre

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grupos económicos e actividade política, porque vejo que sabe bastante do assunto!…
O Sr. Deputado falou no sistema de saúde misto. Confesso que foi V. Ex.ª que se trocou um pouco nas palavras que disse, porque, de facto, continuamos a defender um sistema misto: a existência de um Serviço Nacional de Saúde, que permita o acesso dos portugueses, nomeadamente daqueles que têm maiores carências económicas, e, ao mesmo tempo, a oferta de serviços de saúde que sejam geridos pelo sistema privado e que assegurem, no seu conjunto, esse tal carácter misto que está no nosso Programa do Governo e que já constava do Programa do governo anterior.
Quanto ao referendo, compreendo, sinceramente, a sua preocupação. Trata-se de uma matéria que preocupa a generalidade dos países europeus. Como sabe, há uns que, pela sua Constituição, não o podem realizar, há outros que já o marcaram para o primeiro semestre do próximo ano e há outros, ainda, que estão a prevê-lo para o segundo semestre.
Ora, nós sempre dissemos - e foi um processo que envolveu a generalidade das forças políticas e que o Sr. Presidente da República acompanhou de um modo particular, tal como o Sr. Presidente da Assembleia e todas as forças parlamentares - que é desejável um acordo político que garanta que quer a pergunta que venha a ser feita quer os termos em que vai ocorrer o referendo e o esclarecimento a propósito destas matérias tenham uma efectiva correspondência com os imperativos de uma consulta democrática.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E V. Ex.ª sabe como estamos limitados, até pelos calendários eleitorais, nos termos da lei do referendo.
Vamos procurar a melhor data, vamos estabelecer esse acordo. Neste momento, não posso anunciar a minha posição nem a do Governo sobre uma data e sobre as condições de um referendo, que todos desejamos que aconteça.
Permita-me, a este propósito, dizer-lhe o seguinte: Sr. Deputado Francisco Louçã - e acredite que o digo com cordialidade -, nunca pense que tenho medo de eleições. Eu é que tenho uma leve ideia de que, neste momento, o Bloco de Esquerda sente que, com a mudança de Governo e talvez do perfil do Primeiro-Ministro ou de outros membros do Governo, se calhar, não está tão tranquilo no seu processo de crescimento quanto o estava antes.

Risos do BE e de Deputados do PS.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - É verdade!

O Orador: - Confesso que quero que vários dos eleitores que agora acreditaram em si passem a acreditar nas propostas que defendo. É o jogo normal da democracia! Isso faz parte da democracia! E o Sr. Deputado Francisco Louçã fará o contrário, e o mesmo acontecerá com o PS. Eu acredito que sou capaz de o fazer e irei trabalhar nesse sentido.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Porque muitos dos eleitores que votam em partidos que têm determinadas propostas estão insatisfeitos por verem que, por mais votações políticas que haja, as suas legítimas expectativas não são satisfeitas. E quero acreditar, estou convicto e confiante, que, daqui a dois anos, muita dessa juventude que agora, reconheço, olhou com simpatia para as propostas do seu partido pensará de outra maneira! É a minha convicção.

O Sr. José Magalhães (PS): - Ainda vai acabar a defender o aborto e as uniões homossexuais!

O Orador: - Quero deixar-lhe uma última nota: não pense que o que eu disse sobre o que o Sr. Deputado constantemente explica sobre a questão dos interesses leva a pôr minimamente em causa a consideração que devo à sua honra, como pessoa, como Deputado e como dirigente partidário. Parto sempre do princípio sagrado - e, em 25 anos de vida pública, nunca ofendi ninguém - de que as pessoas são sérias, e sei que o Sr. Deputado o é também. Por isso, não parta de um pressuposto diferente em relação a nós. Eu não tomo decisões por causa de interesses poderosos, tomo decisões em função daquilo que acredito que é o interesse de Portugal.

Vozes do PSD: - Muito bem!

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O Orador: - Conceda-me esse direito, porque eu também lhe reconheço esse mesmo direito, porque sei que é um homem sério que luta pelas suas convicções. Reconheça-me o mesmo direito a mim.
Eu não mudei de vida por estar na política há 25 anos, não passei a ser rico, tenho as mesmas condições de vida e espero mantê-las assim até ao resto dos meus dias.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, o Sr. Primeiro-Ministro, na primeiras parte da sua intervenção, entendeu referir-se à campanha eleitoral do Bloco de Esquerda em termos que suscitam a defesa da honra da minha bancada.

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado. Peço-lhe, no entanto, que seja breve.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, registo as suas últimas palavras.
Nós estamos aqui num debate político, um debate de confrontação. Portugal está farto de meias palavras! Portugal está farto de "paninhos quentes"! A dimensão da crise do País exige o esclarecimento de alternativas, e é com isso que nos comprometemos.
Por isso, a questão da saúde e a questão do referendo constitucional são questões democráticas de igual relevo, repito, de igual relevo. Os portugueses têm direito de votar num referendo sobre a Constituição Europeia, isso foi-lhe prometido e, portanto, não aceitaremos que este referendo não exista.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, isso nada tem a ver com a questão que levantou.
Eu dei-lhe a palavra para uma questão relacionada com a campanha do seu partido.

O Orador: - Mas eu tenho de enquadrar a resposta, Sr. Presidente. Agradeço a sua atenção.

O Sr. Presidente: - É que, senão, corto-lhe a palavra, Sr. Deputado.

O Orador: - É por isso que a sua referência, Sr. Primeiro-Ministro, é de extraordinário mau gosto.
Mas eu dou-lhe todos os dados: colocámos 100 outdoors de 3x8 - posso dar-lhe a lista dos locais onde o fizemos e submetê-la a controlo -, 200 outdoors pequenos, mas cada distrital do PSD colocou números superiores.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): - É mentira!

O Orador: - Mas entendamo-nos bem! Percebo o seu incómodo. Havia um cartaz que falava da lista dos mentirosos, que dizia: "Eles mentem. Eles perdem". Lá estava Aznar, Blair, Bush e Durão Barroso. E os senhores não toleram que vos apontem a vossa responsabilidade!

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Agora, se têm a mínima dúvida, o que, pelos vistos, os Deputados que estão a protestar nem querem saber, deixo-lhe um desafio, Dr. Santana Lopes, que tem a ver com a proposta que fizemos, que mantemos e para a qual estamos sempre dispostos, no que diz respeito à Lei do Financiamento dos Partidos e das Campanhas Eleitorais: aceitamos e queremos que todos os responsáveis políticos, do Major Valentim Loureiro à pessoa mais decente do PSD e do PP, passando por todos os dirigentes do Bloco de Esquerda, todos sem excepção, tenham as suas contas bancárias verificadas por qualquer autoridade judicial do Tribunal de Contas ou do Tribunal Constitucional. Propusemo-lo e estamos dispostos a voltar a fazê-lo.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

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O Orador: - E tenha cuidado, Dr. Santana Lopes, porque se não tem qualquer interesse, como espero que não tenha e como é preciso que não tenha, é preciso que o Governo também não os tenha!

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco Louçã, quanto às questões democráticas relevantes, é bom o debate e a confrontação e quanto a quem fala mais ou melhor e mais vezes ou com mais sentido na oposição é um combate que não nos diz respeito, será travado por quem tem de o travar. Nós tratamos de nós e de responder por aquilo que fazemos.
Quanto aos outdoors, quero dizer-lhe o seguinte: fiz referência a esses outdoors, mas isso não envolve qualquer suspeita, porque, como disse…

O Sr. Afonso Candal (PS): - Não?!…

O Orador: - Não, não! Essa é que é a diferença de mentalidade. Lembro a mensagem do Sr. Presidente da República a este Parlamento e as iniciativas que tomou, pedindo para que o debate entre todos nós respeite os patamares devidos em relação à dignidade de cada um.
O facto de o Bloco de Esquerda ter mais ou menos outdoors respeita ao Bloco de Esquerda, que cumprirá os seus deveres perante a lei. Nós só podemos pensar dos outros aquilo que nós próprios éramos capazes de fazer e não me passa pela cabeça que esses outdoors surjam por qualquer forma menos digna. Naturalmente que há explicações e que isso será visto e conferido nos termos da lei. Mas lá que eram muitos, eram!
O Sr. Deputado diz que nos causaram incómodo ao dizerem "Eles mentem. Eles perdem".

O Sr. Francisco Louçã (BE): - E perdeu!

O Orador: - É por isso que estou animado em relação ao futuro,…

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Fugiu!

O Orador: - … porque mesmo aí nesse cartaz, que parecia politicamente eficaz, falharam.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Fogem todos!

O Orador: - Estava lá a cara do Dr. Durão Barroso e dizia "Eles mentem. Eles perdem". Bem, se acha que é perder ser eleito daquele modo pela Europa e ganhar, quando os senhores diziam que ele estava liquidado na Europa!!…

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Risos do BE.

Para a próxima vez, sugiro que tenham cuidado com as caras que põem nos vossos cartazes, porque pode ser bom augúrio.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Não sei se é isso que os senhores pretendem!?

Risos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Até agora, resultou!

O Orador: - Lembram-se quando os senhores diziam que ele estava completamente isolado na Europa e que, nomeadamente, a nova Europa não estava com a velha Europa? Olhe, estiveram todos com ele! Todos o apoiaram e reconheceram que o então primeiro-ministro de Portugal estava à altura daquele cargo.

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Deixe-me também dizer o seguinte: entendo que o facto de o Dr. António Vitorino ter podido ser presidente da Comissão e o facto de o Dr. Durão Barroso o ser deve fazer-nos pensar sobre o que representa aqueles que desenvolvem a actividade política em Portugal, independentemente da respectiva ideologia ou do sector político a que pertencem. Entendo que há um conjunto de provas de reconhecimento do valor das pessoas que desenvolvem a actividade política em Portugal que pode e deve fazer todos pensar e meditar no assunto.
Quanto ao sigilo bancário, é matéria que, como sabe, tem o seu enquadramento legal e, portanto, não me vou referir a ele. No entanto, porque o Sr. Deputado fez referência a uma pessoa, quero dizer-lhe que qualquer pessoa, até trânsito em julgado de uma sentença que a condene, presume-se inocente.
Portanto, na minha vida, nunca falarei de ninguém, mesmo que seja arguido, esteja a ser investigado ou seja pronunciado, como culpado. Quando digo que acredito num Estado democrático de direito, acredito a sério e, portanto, até alguém ter uma sentença transitada em julgado para mim é inocente. Nós, às vezes, só damos valores a estas coisas quando não as temos. É o valor que dará à liberdade quem não a tenha e quem em regimes ditatoriais esteja encostado à parede a ser fuzilado, sem se poder defender.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Sr. Primeiro-Ministro, o seu tempo esgotou-se.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
Dar valor ao que tem valor é o que este Governo também tentará fazer. Dar valor aos valores e aos interesses legítimos que existem em qualquer sociedade e não a quaisquer interesses. Mas, Sr. Deputado Francisco Louçã, se souber de alguma hipótese de decisão ou de alguma decisão ilegítima do meu Governo, mande-me dizer imediatamente.

O Sr. Afonso Candal (PS): - O antigo Ministro da Saúde dizia o mesmo!

O Orador: - Não tenha dúvidas sobre qual será a minha atitude.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Cá estaremos!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, na sua longuíssima intervenção, independentemente do modo leve, digamos assim, como falou das condições em que se encontra à frente do Executivo, que, queira ou não, são condições de enorme fragilidade, porque a única vez que a coligação que suporta o poder foi a votos perdeu dois terços do eleitorado…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - E a Sr.ª Deputada nunca foi a votos!

O Sr. Jorge Nuno Sá (PSD): - Quando é que a Sr.ª Deputada vai a votos?!

A Oradora: - Poderá não ter importância para o Sr. Primeiro-Ministro e para alguns membros do seu Governo, mas a ética é uma coisa importante e, no entendimento de Os Verdes, não deixa de ser grave que alguém que tinha dito que tinham um compromisso político para com o País, que exigiu reformas e sacrifícios e que sempre alegou que nunca abandonaria as suas funções o tenha feito. Mas, enfim, há, seguramente, diferentes valores entre a sua bancada e a de Os Verdes, mas não é por aí que vou.
Vou colocar-lhe uma questão, Sr. Primeiro-Ministro, que tem a ver com modernidade, uma vez que falou muito deste termo. Acho importante que fale de modernidade e até que o Governo queira ser um Governo para o século XXI, pois é no século XXI que estamos e, por isso, é suposto que é neste século que deve andar.
Mas, Sr. Primeiro-Ministro, na minha opinião, a modernidade não é propriamente um acessório de moda que se utiliza porque é politicamente correcto ou porque fica bem, é algo de concreto. E, quando falamos em modernidade, encontramos no seu longuíssimo discurso uma ausência enorme daquilo que são questões essenciais contemporâneas, em relação às quais não vemos como é que em algum país um primeiro-ministro pode deixar de se pronunciar sobre elas.

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Direitos das mulheres: em Portugal os direitos sexuais e reprodutivos não são garantidos e há a vergonha de as mulheres, pela prática do aborto, se sentarem no banco dos réus. Sr. Primeiro-Ministro, acho que seria bom que dissesse alguma coisa sobre isto. Isto é modernidade? A violação dos direitos fundamentais das mulheres é uma vergonha para o País!
E parece-me que é também uma vergonha para o País que, em relação a questões que estão hoje na agenda política, como são as questões da segurança alimentar, não diga nada sobre o fiasco, repito, o fiasco, que é, ao fim de dois anos e meio, a Agência para a Qualidade e Segurança Alimentar continuar por instalar. Não há uma palavra sobre isto. Julgo que têm de prestar contas, porque se trata de um Governo de continuidade, que, por isso, tem de prestar contas sobre esta matéria.
Aliás, penso que também já era altura, já que o mar é tão importante, de nos ser explicado porque é que, ao fim de dois anos e meio, continua a trapalhada de um país que atribui muita importância ao mar, mas, até hoje, ainda não tem um sistema de vigilância costeiro instalado. É uma vergonha. Pedem-se explicações.
A terceira questão, Sr. Primeiro-Ministro - e quero perceber o seu pensamento sobre isto - tem a ver com o facto de o seu antecessor, na Assembleia da República, ter repetido inúmeras vezes, em resposta a Os Verdes, que, em relação ao incumprimento do Governo do decidido em Quioto, havia pouco que Portugal pudesse fazer ou que a Europa pudesse fazer e que seria uma lástima enquanto os Estados Unidos não adoptassem medidas.
O Presidente da Comissão Europeia, não em Lisboa mas em Bruxelas, não no Parlamento nacional mas no Parlamento Europeu diz, pelo contrário, que a Europa tem um papel importantíssimo e impulsionador e que há um compromisso. Mais: criticou a intolerância, a arrogância e o unilateralismo dos Estados Unidos.
Sr. Primeiro-Ministro, quero perceber se, nesta matéria, se identifica com Barroso (Durão) ou com Barroso (José Manuel), no seu novo discurso sobre esta questão que, para nós, é essencial.
Questão igualmente essencial, Sr. Primeiro-Ministro, é saber o que significa esta separação das cidades do ambiente. Enfim, este Governo é muito dinâmico, um dia diz-se uma coisa, depois, não é bem assim, há uma dinâmica enorme e, nesta dinâmica, importa perceber por que é que, sendo tão importante quanto era, há dois anos, as cidades estarem ligadas ao ordenamento do território e ao ambiente - como é evidente, em qualquer país -, isso deixou de suceder. Ou seja, importa perceber se, afinal, as coisas são feitas à medida dos cargos que há para ocupar ou pelo facto de serem absolutamente necessárias para garantir o bem-estar.
Por último, Sr. Primeiro-Ministro, vou às questões de ambiente. O Sr. Primeiro-Ministro escolheu atribuir ao PP a tutela desta área -…

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): - E muito bem!

O Orador: - … escolheu atribui-la ao único partido que, no Parlamento, votou contra a Lei de Bases de 1986, que, aliás, é excelente…

Vozes do CDS-PP: - Ah!

A Oradora: - … e na qual o PSD, na altura bem diferente do actual, teve uma importância decisiva, mas, para nós, há perguntas que têm de ser respondidas e que não se colocam no plano jurídico mas em algo que pode não ter enquadramento legal e que pode estar em vias de extinção mas que, mesmo assim, Os Verdes entendem que deve ser protegido: a ética, a autonomia e a total independência.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Pergunte ao seu colega vereador!

A Oradora: - Pergunto-lhe, Sr. Primeiro-Ministro: tendo o Ministério do Ambiente de decidir num determinado sentido, em domínios como, por exemplo, o da Sociedade Ponto Verde, em que medida considera que há ou não razão para que sejam suscitadas dúvidas sobre se a pessoa indicada para tomar essa decisão é alguém que, no plano profissional, prestou assessoria precisamente a essa empresa?

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Castro, falou várias vezes na ética, nomeadamente a propósito de ir a votos. Penso que a Sr.ª Deputada não quer que lhe responda.

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A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Quero, quero!

O Orador: - Posso perguntar-lhe quantas vezes o seu partido foi a votos?!

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Sr.ª Deputada, nós já fomos a votos muitas vezes, por nós, sabendo a nossa dimensão, a vários níveis. Já fomos sozinhos e não precisamos de ir "pendurados" em ninguém.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Quanto a algumas matérias às quais a Sr.ª Deputada fez alusão, devo dizer-lhe que partilho do seu entendimento de que é necessária maior exigência e mais resultados, nomeadamente no que diz respeito aos trabalhos da Agência para a Qualidade e Segurança Alimentar. Trata-se de uma matéria relativamente à qual, todos nós, cidadãos, sentimos que é preciso termos mais garantias e mais eficácia no trabalho das instituições públicas, na fiscalização e no controlo.
Houve outras matérias que referiu, como a da vigilância costeira, para as quais já o governo anterior estava devidamente sensibilizado. Aliás, sabe que foram decididos e encomendados 2 navios para o combate à poluição, os quais estarão prontos em 2006, e 10 patrulhões que desempenharão a actividade fundamental de fiscalização das nossas águas territoriais. Portanto, essa sensibilidade em relação à fiscalização das nossas riquezas na zona económica exclusiva existe, o Governo está mais do que sensibilizado para isso.
Quanto à questão das cidades e do ambiente e do ordenamento do território, Sr.ª Deputada, com todo o respeito, como lhe disse, li e estudei a orgânica de todos os Governos europeus e, ao contrário do que a Sr.ª Deputada referiu, o Ministério das Cidades é uma criação que tem alguma inspiração francófona e que, devo dizer-lhe, não existe na generalidade dos países.

Risos da Deputada de Os Verdes Isabel Castro.

Portanto, quero dizer-lhe que, na minha opinião, e na opinião de muitos, independentemente da fusão das CCR e das DRAOT que deu origem às CCDR e em relação às quais o governo anterior criou um quadro legal que levou a uma descentralização nunca antes conseguida, nomeadamente quanto à eleição dos seus responsáveis, o que leva a que no tempo de Governo dos partidos da actual coligação, em Lisboa, por exemplo, o Presidente da CCDR seja um destacado elemento do Partido Socialista - isto é a democracia a funcionar mas com uma lógica de descentralização que foi permitida pelo trabalho do anterior governo e pelos documentos legislativos aprovados -, não é assim tão habitual as cidades estarem ligadas ao ambiente. Aliás, às vezes, nem estão ligadas a nada, pelo simples facto de não existir, sequer, Ministério das Cidades, e, tendo em atenção a opinião várias vezes expendida quanto ao peso excessivo do anterior Ministério, considerei mais adequado que o ambiente e o ordenamento do território ficassem ligados, pois devem estar sempre ligados, existindo também o ministério das cidades, do desenvolvimento regional e da habitação. A política da habitação, essa, sim, é cada vez mais uma política das cidades, a qual deve ser assumida pelas autarquias e com elas ser desenvolvido o trabalho fundamental. Naturalmente, em relação às CCDR, haverá, como existe em muitas matérias, uma responsabilização de ambos os ministérios, embora variando em função do grau de atribuições e de competências que estão definidas. Mas a lei orgânica do Governo será tratada no próximo Conselho de Ministros.
Quanto à questão da ética, Sr.ª Deputada, no que diz respeito ao Sr. Ministro do Ambiente, o Sr. Ministro do Ambiente sabe falar muito bem a propósito dele próprio. E ouvi até, no passado sábado, um membro do seu partido, julgo que vereador da Câmara Municipal de Setúbal,…

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - E ex-Deputado!

O Orador: - … falar com muito rigor sobre a pessoa, o trabalho e a actividade profissional do Sr. Ministro do Ambiente. Portanto, quase me atreveria a dizer que faço minhas as palavras desse vereador do seu partido na Câmara Municipal de Setúbal ou, até, do próprio Sr. Presidente da Câmara Municipal de Setúbal.
Sabe, Sr.ª Deputada, a minha atitude perante essas matérias é a seguinte: estou descansado quanto aos que se sabe o que fazem, àqueles que cumprem a lei e declaram os seus rendimentos, àqueles cuja actividade profissional é conhecida. Os que me preocupam, neste País, são os que não declaram, aqueles

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cujo trabalho não se conhece e que, às vezes, pugnam por interesses ilegítimos de um modo que a lei não permite.
A lei do Estado democrático de direito prevê os casos em que há incompatibilidade na decisão, pelo que, se essa questão se colocar, o Ministro em causa respeitará a lei. Mas, se a não respeitar, obviamente, o Estado democrático de direito prevê os mecanismos inerentes. Isto é assim para o Ministro do Ambiente como para qualquer Ministro ou Secretário de Estado, para o Primeiro-Ministro ou para qualquer Deputado. Temos uma lei! Agora, entendo que o vereador do seu partido na Câmara Municipal de Setúbal, nesta matéria, foi exemplar.
O Ministro do Ambiente já defendeu empresas privadas, já defendeu empresas públicas contra multinacionais, em processos judiciais, e já defendeu câmaras que nada têm a ver com o seu partido. Mas isso, para mim, são factos que estão ao lado daquela que, na minha opinião, é a questão essencial: é uma pessoa íntegra, como somos todos, como o é a Sr.ª Deputada.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Se o Sr. Ministro do Ambiente sentir alguma incompatibilidade, ele conhece a lei e agirá em conformidade. Por isso, Sr.ª Deputada, nesta matéria, estou tranquilo e nada me preocupa.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, permite-me o uso da palavra?

O Sr. Presidente: - Pede a palavra para que efeito, Sr.ª Deputada?

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Para defesa da honra, Sr. Presidente.

Risos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, começo por lhe dizer que fui a votos numa coligação que falou verdade e que, como tal, se apresentou ao eleitorado. O Sr. Primeiro-Ministro não se apresentou numa coligação mas é Governo e não foi sufragado na base dos dois partidos que acordaram numa solução de poder.

Vozes do PS: - Exactamente!

A Oradora: - Há uma enorme diferença entre uma coligação de verdade e uma coligação que não falou verdade perante os eleitores. Esta questão é de enorme clareza, pelo que gostaria que ficasse, desde já, definitivamente esclarecida.
Mas há outra questão, Sr. Primeiro-Ministro, passando, enfim, todos os estados de alma que aqui revelou e que não esclarecem uma vírgula sobre por que é que, ao fim de dois anos e meio, a Agência para a Qualidade e Segurança Alimentar ainda se está a instalar, não se sabendo também, aliás, por que é que a outra Agência para a Prevenção dos Fogos Florestais não funciona,…

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, esta matéria, que eu saiba, não diz respeito à sua honra.

A Oradora: - … em relação à qual tenho de o esclarecer. Aquilo que o meu companheiro de partido disse foi o que nós dissemos: o Sr. Ministro do Ambiente trabalha profissionalmente neste sector e, no caso, concretamente com uma empresa e com a administração local. O problema está naquilo que nós percebemos, que o Sr. Primeiro-Ministro percebeu e que qualquer cidadão, neste País, percebe, que é alguém, não já no plano pessoal mas enquanto Estado, ter de tomar uma decisão num determinado sentido, quando está amarrado àqueles que foram compromissos defendidos no plano privado. Isto, em nossa opinião, não é saudável e não é sinal de uma democracia amadurecida que o Estado possa ficar refém da menor sombra de dúvida em relação a esta questão. É disto que se trata e há muita clareza nesta matéria, Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

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O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Castro, o que disse é verdade, ou seja, trata-se de realidades muito diferentes: nós fizemos uma coligação entre dois partidos que já várias vezes foram sozinhos a votos. E não estou a dizer isto para ofender, são opções do seu partido, que, tenho ideia, nunca foi sozinho a votos.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Nem vai!

O Orador: - Aliás, sabendo-se como Os Verdes até são uma realidade política que, normalmente, tem apoio nos países europeus, devo dizer-lhe, sem querer "meter a foice em seara alheia", que considero uma pena que isso não tenha sucedido, porque calculo a sua curiosidade em saber, ao certo, quantos votos poderia obter se não concorresse sempre em coligação. Calculo que sim!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Em relação ao Sr. Ministro do Ambiente, quero dizer o seguinte: o meu Governo não cairá na tentação, como outros, de responder àquilo que considero uma tentativa de agitar os alicerces de uma sociedade livre, de uma sociedade democrática, de uma economia aberta.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Esse tipo de questões levaria a que um dia começássemos todos a dizer quem trabalha com quem ou que escritórios trabalharam com que entidades. Nós não vamos por aí, esses são os interesses de quem, eventualmente, poderia gostar de ver instalado um determinado clima na sociedade portuguesa em que nós não vamos entrar. Pelo contrário, responsavelmente, iremos pelo caminho oposto, ou seja, cumpriremos a lei e aquilo que o Estado democrático de direito prevê.
Já agora, nesta intervenção, quero também afastar a ideia, que tem sido propalada, de que para cada pasta só pode ir um especialista ou doutorado na matéria.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Ninguém disse isso!

O Orador: - Isto é não conhecer o funcionamento da generalidade das democracias europeias. E podemos ir ao exemplo francês, que tanto tem inspirado a nossa jurisprudência, a nossa doutrina e, portanto, o nosso corpo jurídico, para ver quantos ministros socialistas ou de centro ou de direita assumem diferentes responsabilidades e em diferentes pastas. Estou a lembrar-me do Ministro Jacques Lang, de quem fui contemporâneo no Conselho de Ministros da Cultura na União Europeia, e das diferentes responsabilidades que já assumiu, em diferentes pastas, independentemente da sua formação de base. Ainda agora, em Espanha, o mesmo se passou com o Governo de Aznar e certamente se passará com o Governo do Presidente Zapatero.
Portanto, quanto a estas ideias supostamente novas que se pretendem introduzir na democracia portuguesa, nós não vamos cair na armadilha de aceitar, sequer, debatê-las. Os Ministros e os Secretários de Estado são pessoas que têm de ser sérias, têm de ter capacidade de decisão, têm de conhecer os dossiers e decidir sempre em nome do interesse nacional,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - … como sucede com a generalidade de todas as Sr.as Deputadas e de todos os Srs. Deputados. Isto é a vida política, a vida pública no seu sentido nobre. É assim que a entendo, foi assim que formei Governo e é assim que continuarei a trabalhar.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Sr.as e Srs. Deputados, antes de prosseguirmos o debate, gostaria de chamar a atenção de todos para que são quase 12 horas e 30 minutos, faltando ainda cerca hora e meia para a conclusão desta fase do debate. Tenho, por isso, de ser muito rigoroso na aplicação do Regimento quanto aos tempos distribuídos a cada Deputado e ao Sr. Primeiro-Ministro.
Tendo em conta os tempos que ainda faltam, terminaremos esta fase do debate cerca das 14 horas. Depois, retomaremos os nossos trabalhos às 15 horas.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

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O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, gostaria de interpelar a Mesa sobre a questão que V. Ex.ª acaba de equacionar.
Mesmo que a Mesa seja extraordinariamente rigorosa, como, aliás, é natural que seja, os direitos regimentais normais dos partidos levariam a que as rondas de perguntas previstas durassem, seguramente, mais do que é razoável nas presentes circunstâncias.
Julgo, pois, que nenhuma circunstância anormal justifica que a interrupção não tenha lugar à hora regimental usual, continuando da parte da tarde, nos termos da lei.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não há hora regimental usual para terminar a sessão da manhã.

O Orador: - Fica à sua consideração, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Maria Carrilho.

O Sr. Manuel Maria Carrilho (PS): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, estamos hoje aqui para o ouvir dar resposta aos principais problemas do País, mas não é o que tem acontecido até agora. Compreendo porquê: o Sr. Primeiro-Ministro chega aqui numa posição frágil, dado não ter sido eleito, dado não dirigir uma coligação que tenha organizado; vem como um Primeiro-Ministro sobresselente, chefiando uma maioria exausta, que não se conseguiu renovar e remodelar.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - E a situação foi a tal ponto que o próprio ex-Primeiro-Ministro optou por se auto-remodelar, desertando do País e rasgando os compromissos nacionais que tinha assumido com os portugueses.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Claro que essa foi uma estratégia para evitar o balanço da governação, sobre o qual os portugueses se pronunciaram claramente em Junho. Evitou esse balanço, mas o Sr. Primeiro-Ministro arrasta hoje, aqui, um pesado cadastro, que tem que ver com o desemprego, com a pobreza, a qual, de resto, não lhe merece uma palavra no seu Programa do Governo, e que tem a ver com a desqualificação nacional a que a maioria tem conduzido o País.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não leu o Programa do Governo!

O Orador: - Contrariamente ao que aconteceu entre 1995 e 2002, período em que melhoraram todos os índices que dizem respeito à qualificação dos portugueses, nos últimos dois anos todos eles pioraram.
Sr. Primeiro-Ministro, sobre o Programa do Governo que temos hoje aqui em debate, o qual, de resto, parece mais um manifesto eleitoral, gostaria de colocar três perguntas precisas, que constituem uma oportunidade para V. Ex.ª nos dizer alguma coisa de concreto para lá da retórica vazia e das generalidades que inundam este Programa.

O Sr. António José Seguro (PS): - Muito bem!

O Orador: - Essas três questões dizem respeito à educação de adultos, à Lei de Bases da Educação e ao sistema de investigação.
Em relação à educação de adultos, não há, no seu Programa do Governo, uma única palavra, uma única meta quantificada, um único objectivo explícito. O que pretende o Sr. Primeiro-Ministro fazer quando, no quadro europeu, temos a situação gravíssima de possuirmos apenas 20% da nossa população entre os 25 e os 64 anos habilitada com ensino secundário? Qual é a sua meta? Ou não tem nenhuma? E não se esconda em retóricas vazias!

Protestos do PSD.

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Em relação à nova Lei de Bases da Educação, que foi vetada pelo Presidente da República, o Governo não hesitou e começou a moldar todo o novo ano escolar com base numa lei que não foi promulgada, lançando o caos no sistema de ensino. Sr. Primeiro-Ministro, qual é a sua orientação e o que pensa sobre esta matéria? Diga-me agora, pois estas são as questões que ocupam os verdadeiros primeiros-ministros da Europa, qual a sua orientação no que diz respeito à Lei de Bases da Educação? O que é que pensa sobre o ensino obrigatório? Diga-nos de uma maneira muito clara.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço-lhe que termine, pois já esgotou o tempo de que dispunha.

O Orador: - Termino de imediato, Sr. Presidente.
No domínio da investigação, a maioria também andou para trás nos últimos dois anos,…

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - É mentira!

O Orador: - … apesar de o Governo ter assinado a declaração final da Cimeira de Barcelona, que, como sabe, fixa para 2010 um objectivo de 3% de financiamento à investigação nacional.
A pergunta precisa, concreta, que lhe faço, Sr. Primeiro-Ministro, é a seguinte: nós, que não estamos em 1% de financiamento para a investigação nacional e que temos diminuído nos últimos anos, a que ritmo nos vamos aproximar dessa meta? Ou será que se trata de mais uma palavra vazia, sem sentido, deste Programa de banalidades que hoje nos traz aqui?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Maria Carrilho, o facto de o Sr. Presidente da República ter decidido vetar a nova Lei de Bases da Educação merece o nosso respeito, como já tivemos ocasião de afirmar.
Pela informação que tenho, houve negociações intensas…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Fizemos tudo!

O Orador: - … dos grupos parlamentares da maioria com o PS para se conseguir chegar a um entendimento numa daquelas áreas em que é desejável que esse entendimento exista, para além das barreiras do apoio a este ou àquele governo. Infelizmente, não foi possível alcançar esse consenso alargado.
O Sr. Presidente da República decidiu vetar a lei…

O Sr. Ricardo Gonçalves (PS): - O Presidente da República está atento ao que o Primeiro-Ministro faz!

O Orador: - …, portanto devemos agora trabalhar no sentido de se conseguir, se os Srs. Deputados do Partido Socialista revirem a sua posição, um entendimento mais amplo, que permita dotar essa área fundamental de qualquer sociedade desse instrumento normativo que seja a sua base jurídica e a base da sua estruturação.
Parecem-me curiosas as intervenções de alguns Srs. Deputados, que ora dizem que a minha intervenção inicial foi longa ora dizem que não falei do tema a, do tema b, do tema c, do tema d.
Nomeadamente em relação à formação de adultos, o Sr. Deputado Manuel Maria Carrilho fala na quantificação de objectivos.
Na minha intervenção inicial, falei da educação, tendo referido o que considero ser a tónica fundamental da actuação deste Governo. Neste caso a continuidade coloca-se de uma maneira especial, porque as famílias, os alunos e os pais necessitam de estabilidade - estabilidade nos manuais, nos curricula e em relação aos respectivos estabelecimentos de ensino.
A formação de adultos e, portanto, a recuperação dos nossos índices de formação, dos graus de escolaridade, para níveis compatíveis com os de algumas sociedades da União Europeia (alguns dos Estados-membros que aderiram recentemente à União Europeia estão à nossa frente nalguns desses vectores) é, obviamente, uma obrigação deste Governo.
Impressiona-me, por exemplo, o desaproveitamento considerável do Programa Foral. É necessário um empenho forte das autarquias para a formação profissional e a valorização dos cidadãos, que podem progredir

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nas suas carreiras mediante a formação que recebam.
Com certeza que a quantificação de objectivos, que deve ser estabelecida agora em função do andamento da primeira metade da Legislatura, será uma tarefa que iremos levar a Conselho de Ministros e que a Sr.ª Ministra da Educação e eu próprio anunciaremos brevemente.

O Sr. Presidente: - Sr. Primeiro-Ministro, peço-lhe que conclua, pois já esgotou o tempo de que dispunha.

O Orador: - Concluo já, Sr. Presidente.
Sr. Deputado Manuel Maria Carrilho, a nossa preocupação é exactamente a de não fazermos retórica…

Vozes do PS: - Não têm feito mais nada!

O Orador: - … em relação àquilo que é exigente e sério. Os objectivos de uma política de educação, nomeadamente no que se refere à educação de adultos,…

Vozes do PS: - E no que se refere à ciência e tecnologia?

O Orador: - Da ciência e da tecnologia falarei aquando do próximo Orçamento do Estado. Nessa altura trarei a posição deste Governo, de reforço das prioridades, nomeadamente financeiras, alocadas a esse sector, que constituirá, estou certo, uma agradável surpresa para quem pensa que esse sector deve ser uma aposta permanente de Portugal e da governação do País.
Sr. Deputado Manuel Maria Carrilho, no Programa do Governo não devemos ter metas estabelecidas para tudo em termos quantitativos, temos as orientações programáticas.
Já agora, quero dizer-lhe que citou com verdade a evolução de alguns índices de desenvolvimento referidos no relatório das Nações Unidas, nomeadamente da respectiva agência, em relação ao período 1995/2002; porém, os relativos aos últimos dois anos, os resultantes da acção do governo anterior, não surgiram ainda, não podendo o Sr. Deputado fazer essa comparação.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Morais.

A Sr.ª Teresa Morais (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, neste debate de apresentação do Programa do Governo, que é um primeiro e fundamental momento da sua presença perante o Parlamento, permita-me uma saudação especial a si, pessoalmente, e a toda a sua equipa para lhe desejar um excelente trabalho por Portugal, pelo desenvolvimento e pelo incremento da qualidade de vida dos portugueses. Qualidade de vida que, como sabemos todos, só se atinge com uma eficaz coordenação de políticas sectoriais, que são diversas mas entre si tão obrigatoriamente dependentes, como a económica e a social.
A propósito desta ligação, permita-me, Sr. Primeiro-Ministro, que lembre um amigo que temos em comum na política, que costuma dizer que o desenvolvimento é económico para se tornar social. Acredito que é assim, mas acrescento que, então, o impulso económico é urgente, deve arrebatar todas as nossas energias, porque o social é, em muitos sectores, de premência absoluta e não pode, de todo, esperar.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - É na área social, que sei ser a sua prioridade, e mais especificamente sobre a matéria dos direitos das crianças, da protecção da infância, da garantia do bom acolhimento das crianças que não têm família ou que a têm mas que é incapaz de zelar por elas, que se situa a questão que gostaria de dirigir-lhe.
O Programa do Governo realça bem que é dever do Estado encarar a criança como sujeito de direitos, que deverão conduzir à definição de políticas próprias que atendam às carências, fragilidades e condições do seu crescimento, e na política de protecção à infância quase tudo é urgente. Foi essa urgência e a nossa comum consciência dela que nos levou a aprovar, nesta Câmara, num tempo procedimental muito curto, uma nova lei da adopção, em vigor desde Setembro de 2003, a qual, enfatizando o critério do superior interesse da criança e encurtando prazos que eram pesados e burocráticos, está já a produzir bons resultados.

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O relatório da Comissão de Acompanhamento da Execução da Lei da Adopção dá conta de que o processo de avaliação de candidatos à adopção se reduziu em termos gerais e que se resolveu uma lista de espera que representa, em termos gerais, uma redução de 70 a 80% dos casos. Em Lisboa, entre a Segurança Social e a Santa Casa da Misericórdia, a recuperação das avaliações pendentes é da ordem dos 99%.
No entanto, outras deficiências subsistem no sistema, pelo que insisto na necessidade de uma clarificação do papel do Estado na área do acolhimento das crianças em risco, na definição dos seus projectos de vida, em geral na política de protecção à infância, em que a responsabilidade do Estado é final e inalienável, porque respeita a seres especialmente vulneráveis.
O Programa do Governo, em boa hora, afirma a necessidade de mudar o que qualifica como uma tradicional e danosa postura depositária e institucional das crianças. É verdadeiramente fundamental fazê-lo, Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, o seu tempo esgotou-se. Peço-lhe que termine.

A Oradora: - Termino já, Sr. Presidente.
Sr. Primeiro-Ministro, gostaria de colocar-lhe algumas questões concretas. Como entende o seu Governo o papel do Estado na protecção da infância, sobretudo das que se encontram em risco, na infância mais debilitada? Como tenciona o seu Governo concretizar esse princípio fundamental, que entende e assume a criança como sujeito de direitos fundamentais? Como é que pretende contribuir para mudar a dita cultura institucional depositária das crianças, que persiste para além da lei e, muitas vezes, é indiferente a ela?

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Teresa Morais, nas suas considerações disse algo do que nós podemos e devemos dizer sobre um assunto que representa também uma inovação na designação de um ministério e que, essa, sim, tem precedentes. De facto, há vários governos de vários países europeus, do Norte, Centro e Sul da Europa, que têm a criança como preocupação de um ministério, estando incluída também na respectiva designação.
Quando a nova designação do Ministério da Segurança Social surgiu em público ouvi comentários jocosos, tendo até havido quem dissesse que só faltava no nome do Ministério algo que não vou referir. Devo dizer que, muitas vezes, alguns debates que se ouvem em Portugal resultam de falta de informação e de saber sobre o que é normal da vida, para além de convicções próprias sobre a matéria.
Quem foi autarca - e orgulho-me de o ter sido - sabe o trabalho que as autarquias, para além do Estado ao nível central, as instituições de solidariedade social e as misericórdias desempenham neste domínio.
Ainda como Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, poucos dias antes de ser empossado como Primeiro-Ministro, numa cerimónia onde também esteve o Sr. Ministro Nuno Morais Sarmento, assisti à inauguração de uma casa da instituição Ajuda de Berço que acolherá aquelas crianças que ficam sem família e são abandonadas no meio de processos marcantes para o resto das suas vidas.
Entendemos que é necessário uma maior coordenação de todos estes esforços da parte de entidades privadas de solidariedade social mas também da parte do poder político. Por isso, é com honra que temos um ministério chamado "da Segurança Social, da Família e da Criança".
O trabalho, nomeadamente do governo anterior e da maioria que o apoiava, foi no sentido de conseguir um regime de adopção que leve a encurtar prazos, que leve a que as crianças fiquem cada vez menos tempo fora da família que os acolherá, cada vez menos tempo entregues a instituições, independentemente da excelência do trabalho que essas instituições desenvolvem.
Queremos, de facto, que as garantias dessa celeridade no acolhimento possam ser efectivadas. Há muito trabalho a desenvolver no sentido da construção do País, tomando a criança como pilar fundamental da acção de qualquer governo.
Neste ponto, lembro sempre as sugestões do Prof. Dr. Gomes Pedro, conhecido pediatra, pessoa respeitada, julgo eu pela generalidade dos sectores políticos, que quando me candidatei à Câmara Municipal de Lisboa - e já antes o tinha feito - me transmitiu a preocupação de que devia haver, assumida pelo Estado, esta preocupação com a criança, mesmo a nível central.
O Sr. Ministro Fernando Negrão - quando o convidei para as funções que exerce dei-lhe conta da designação definitiva do seu ministério -, tem, com certeza, honra em ser o ministro que, pela primeira

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vez, é titular de um ministério que assume esta responsabilidade a nível central, nomeadamente na respectiva designação. Sei bem que mais importante do que a designação, do que a semântica, é a substância da acção que iremos desenvolver, procurando continuar o trabalho que já vinha sendo feito anteriormente.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Primeiro-Ministro, em primeiro lugar, quero saudar V. Ex.ª e, na sua pessoa, todo o Governo, pelo comando que toma dos destinos da Nação, desejando-lhe felicidades.
Permita-me que me dirija também, em especial, a duas pessoas: em primeiro lugar, ao Sr. Ministro da Defesa e dos Assuntos do Mar, Dr. Paulo Portas,…

O Sr. António Filipe (PCP): - Estava a ver que se esquecia!

O Orador: - … pelo trabalho que desenvolveu no anterior governo e pelas suas novas responsabilidades - aliás, ele já as tinha, em parte, assumido - na tutela de todos os assuntos relativos ao mar, que desde sempre representaram para ele uma grande preocupação; em segundo lugar, ao meu querido amigo, Eng.º Álvaro Barreto, que é dos mais antigos Deputados e dos mais antigos governantes e homens de Estado. Todos os primeiros-ministros que passaram pela bancada do Governo o louvaram e ele a todos serviu, porque serviu Portugal em muitas pastas e ocupar agora a pasta que ocupa é a garantia de que este é um Governo de grandes homens de Estado.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Sr. Primeiro-Ministro, as questões que lhe quero colocar têm a ver com a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP).
Devemos ao Dr. Jaime Gama a ideia do nascimento da CPLP. Dizem os manuais que foi numa reunião de Abril de 1983 que o Dr. Jaime Gama e João Aparício tiveram, pela primeira vez, a ideia de fundá-la.
No entanto, esta Comunidade, que foi institucionalizada há já oito anos, tem mostrado grandes dificuldades de enraizamento, em primeiro lugar porque se trata de uma organização constituída por países descontínuos, dispersos por quatro continentes, que têm forças centrífugas que as animam, em vez de forças centrípetas.
Na verdade, cada um dos países que a constituem têm os blocos regionais a que pertencem e, muitas vezes, são mais atraídos por estes blocos regionais próprios do que pela chamada força centrípeta, à volta dos países africanos, do país asiático Timor e de Portugal.
Contudo, esta organização tem feito bastante, apesar de ter poucos recursos materiais. Basta pensar que S. Tomé só pôde organizar a cimeira que neste momento decorre com o auxílio, imagine-se, de Taiwan. Para organizar esta cimeira foi preciso que Taiwan lhe fornecesse dinheiro.
Devemos também felicitar o Chefe do Estado, Dr. Jorge Sampaio, pelo êxito que teve a ideia que lançou na Cimeira de Brasília, no ano de 2000: a de trazer a CPLP para o plano da pessoas.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se.

O Orador: - O seu desígnio de, no domínio da saúde, fazer uma grande campanha contra a SIDA, mostra que a comunidade das nações baixou do plano do governo para o plano da sociedade civil.
Quero só dizer a V. Ex.ª o seguinte: é fundamental que a CPLP se dedique à divulgação da língua e da cultura portuguesas. O Instituto Internacional da Língua Portuguesa, sediado em Cabo Verde, vai passar para o Brasil e é preciso saber se esse será o seu melhor caminho na medida em que aquele país tem dado pouca atenção à CPLP. A defesa da língua portuguesa como língua de instrumento depende da CPLP e precisamos, todos, de unir-nos para que este Instituto de língua e cultura portuguesas esteja, efectivamente, em boas mãos.
V. Ex.ª dedicou algumas páginas à CPLP no novo Programa do Governo. As suas ideias sobre a defesa da ligação de Portugal a África são bastante conhecidas - muitas vezes tem defendido que não podemos viver numa claustrofobia de Europa e Estados Unidos e devemos ter uma efectiva ligação a África e a Timor -, como sobre devemos tirar todos os efeitos da sinergia para defesa da cultura e, principalmente,

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da língua portuguesa, através de África, através do mundo, como língua de instrumento.
A minha pergunta, Sr. Primeiro-Ministro, é esta: V. Ex.ª tem ideia do que é que vai fazer do Instituto Internacional de Língua Portuguesa?

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Narana Coissoró, permita que, em nome dos ministros em questão, agradeça as referências simpáticas que fez e permita também que exprima o respeito e a consideração que todos temos pela sua figura de Deputado, que os portugueses tão bem conhecem, sempre jovem mas com muitos anos de serviço nesta Casa.
Em relação à questão que me colocou sobre a CPLP devo dizer-lhe o seguinte: está a decorrer a cimeira a que fez referência - tenho pena de não poder estar presente, mas estão lá o Sr. Presidente da República e o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros - e todas a informações que temos do modo como os trabalhos decorreram até ontem à noite - sobre os de hoje de manhã ainda não estou informado, mas falei ontem à noite, já tarde, com o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros - apontam para que estão a decorrer em excelente clima e que as provas de empenho do Presidente do Brasil, Lula da Silva, na CPLP são manifestas. Eu próprio fico contente com o regresso da importância desses temas - da dimensão da língua, da cultura - à agenda da CPLP.
Lembro que o Presidente da República Mário Soares deu especial atenção ao Instituto Internacional da Língua Portuguesa, quando o Brasil tinha como Presidente José Sarney, no encontro que tiveram, no Maranhão. Depois, fui eu que, em 1990 - era, então, Secretário de Estado da Cultura -, assinei o acordo internacional que levou à criação desse Instituto.
Essas matérias estão, neste momento, em cima da mesa e têm sido tratadas quer em reuniões bilaterais quer agora na cimeira que decorre em S. Tomé e Príncipe.
Quero também salientar que acolher esta cimeira, levar a cabo uma organização desta dimensão, representa para S. Tomé e Príncipe um esforço significativo, mas, por todas as notícias que temos, aquele país tem-se saído muitíssimo bem e este seu propósito, que a todos honra, deixa-nos satisfeitos.
Permita-me dizer que acredito - e muito em breve terei a oportunidade de estar com o Presidente Lula da Silva - no empenho do actual Governo do Brasil na solidificação dos laços e da vertente cultural da CPLP.
O Presidente Lula da Silva, que anunciou já várias iniciativas para os próximos meses - em S. Tomé e Príncipe anunciou iniciativas contra a fome e contra a pobreza, que quer tratar em Nova Iorque no mês de Setembro -, pôs um especial empenho em trazer de novo para cima da mesa estes instrumentos culturais. Nomeadamente em relação ao acordo ortográfico, que foi ratificado por três Estados - Portugal, Brasil e Cabo Verde - o empenho do Presidente Lula da Silva é o de que se dinamizem todos os instrumentos de cooperação nesse domínio.
Por isso, acredito que se o Brasil assumir responsabilidades novas, nomeadamente em relação ao Instituto Internacional da Língua Portuguesa, esse organismo fica bem entregue. Será um bom sinal para o futuro da CPLP o fortalecimento do empenho do Brasil nesta comunidade a que pertencemos e em que temos especiais responsabilidades.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, "Investir na qualificação dos portugueses (…)" - era assim que rezava um outro programa de governo, o de Abril de 2002. E assim reza o seu, Sr. Primeiro-Ministro.
Gostaria de, nesta curta intervenção de 3 minutos, dar-lhe um conjunto de exemplos que evidenciam o combate pela desqualificação da população portuguesa e pelo desinvestimento nas escolas portuguesas, que foi aquilo que o governo da sua coligação fez nestes dois anos de governação. E é do domínio público, Sr. Primeiro-Ministro, que estrangularam o funcionamento das escolas e das universidades, pondo em causa a qualidade das aprendizagens, criaram dificuldades no acesso, motivando e promovendo a desigualdade de oportunidades, estrangularam o financiamento e o funcionamento dos centros de investigação universitária e dos laboratórios de Estado e que hoje reina o descalabro.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

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A Oradora: - Não há memória de tanta trapalhada e de tanta incompetência. O próximo ano lectivo está dependente de um concurso que deveria ter-se iniciado em Janeiro de 2004. Já lá vão sete meses e a "procissão está no adro".
Cerca de 50% dos professores dos ensinos básico e secundário - são só, Sr. Primeiro-Ministro, mais de 70 000, indispensáveis ao funcionamento das escolas! - continuam à espera que a incompetência do seu Governo e da sua coligação termine. Não se pode fazer nada nas escolas: nem preparar o ano, nem fazer horários, nem colocar professores.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - E o senhor o que é que fez para além do relatório? Apurou responsabilidades? Tomou medidas? Sabe o que está a passar-se nas escolas?
Mas esta não é a única história deste concurso tão longo, que já levou aos contribuintes portugueses 600 000€, provavelmente um preço especial feito pela conta da qual é administrador um senhor ex-ministro da educação, que o Sr. Primeiro-Ministro deve conhecer porque é do tempo de um governo cavaquista, portanto de um governo seu também.
Todavia, Sr. Primeiro-Ministro, esta não é a única desgraça, a única tragédia do ensino em Portugal. As ilegalidades, as irregularidades, foram a regra do anterior Governo.
A reforma do ensino secundário está no terreno, mas não tem programas, não tem enquadramento legislativo. No espaço de dois meses, a sua coligação e o governo de Durão Barroso apresentaram dois ensinos secundários, um de acordo com a lei que está em vigor e outro de acordo com a lei que a maioria queria e que o Sr. Presidente da República vetou. Com o qual, destes, o senhor está de acordo? Prefere algum ou não prefere nenhum, porque não os conhece?
Relativamente à desqualificação dos portugueses e da população, Sr. Primeiro-Ministro, não vou contar-lhe todas as histórias que conheço, porque o tempo o não permite, mas contar-lhe-ei só uma, de que tive conhecimento há poucas horas: foi dirigida uma carta às escolas profissionais de Lisboa e Vale do Tejo informando que nenhuma delas está em condições de terminar a formação das turmas que se candidataram, e que o governo da sua coligação aprovou, por falta de condições financeiras. O que é que o Sr. Primeiro-Ministro tem a dizer acerca desta matéria?
Dar-lhe-ei um último exemplo, Sr. Primeiro-Ministro: há neste momento empresas escolares formadas ilegalmente, não cumprindo a legislação em vigor. Têm cerca de 3000/4000 alunos…

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, o seu tempo esgotou-se.

A Oradora: - Vou terminar, Sr. Presidente,
Como dizia, têm cerca de 3000/4000 alunos e são cerca de 70 ou 80 empresas-escolas. O que é que o Sr. Primeiro-Ministro tem a dizer acerca disto, no que se refere à qualidade das aprendizagens e à desqualificação da população portuguesa?
Sr. Primeiro-Ministro, deixe-se das banalidades da sua intervenção e diga alguma coisa acerca da miséria e da tragédia que é o nosso atraso em termos de qualificação, de produtividade e de competitividade do País.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Luísa Mesquita, a Sr.ª Deputada disse que do programa do governo anterior já constava o que deste consta. Por outro lado, tenho a informação, de fonte segura, que, no debate do programa do governo anterior, das suas palavras já constava o que hoje consta, ou seja, a crítica a essas mesmas orientações.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Está enganado, Sr. Primeiro-Ministro!

O Orador: - Portanto, nessa matéria, não há novidades, nem de um lado, nem do outro.
Sr.ª Deputada, quero dizer-lhe o seguinte: no primeiro Conselho de Ministros a que presidi, um dos pontos de situação que pedi fosse feito foi justamente o do início do novo ano lectivo e da colocação de professores. No Conselho de Ministros que se realizou quatro dias depois, a Sr.ª Ministra da Educação fez esse mesmo ponto de situação, o que já nos levou a assumir publicamente que todo o processo de

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colocação de professores não poderá estar concluído antes do final do mês de Agosto.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Já sabia!

O Orador: - A Sr.ª Deputada já sabia, mas os portugueses, colectivamente, não o sabiam. E penso que fica bem a um governo, a quem está na vida pública, assumir com humildade o que corre melhor e o que corre menos bem.
Neste caso, penso que a equipa anteriormente responsável pelo Ministério da Educação reconheceu o óbvio: foi um processo que correu de modo manifestamente infeliz e que causou insatisfação quer junto dos professores - e, de um modo muito particular, quero aqui saudar o seu esforço, a sua dedicação e o seu contributo para o desenvolvimento da sociedade portuguesa - quer junto de muitas famílias.
Por isso, reforçámos meios. Tenho comigo o relatório apresentado em Conselho de Ministros, na sequência do qual foi decidido o reforço das equipas de análise de reclamações - foram apresentadas muitas dezenas de milhares (julgo que cerca de 30 000 em 110 000 casos) -, tendo sido aprovado, também em Conselho de Ministros, o diploma que prevê os formulários electrónicos, de modo a que passem a ser feitas por essa via as candidaturas que devam ser apresentadas, e os novos postos de atendimento (cinco) para manifestação dessas preferências.
Portanto, posso dizer-lhe que, a nível quer informático quer de equipas, foi decidido pelo Conselho de Ministros o respectivo reforço, para assegurarmos que as colocações, embora causando transtorno e não sendo um processo deste Governo, terão a sua continuidade e serão por nós assumidas. Não assumimos, pois, só o que é bom; assumimos o que correu melhor e o que correu menos bem. Julgo que é isso que manda a ética democrática. Este processo não correu bem e, por isso, estamos a trabalhar para corrigi-lo, de modo a que o próximo ano lectivo possa iniciar-se no dia previsto, ou seja, 16 de Setembro.

Risos da Deputada do PCP Luísa Mesquita.

Compreendo o sorriso da Sr.ª Deputada. Trata-se de uma tarefa árdua, mas garanto que tudo faremos para que assim aconteça.
A Sr.ª Deputada fez referência a uma caso pessoal, que desconheço, pelo que agradeço que dele me dê conta, por esta via ou particularmente.
O que lhe posso garantir é que a Sr.ª Ministra da Educação está a trabalhar arduamente, tendo já tomado todas as medidas nesse sentido. É que o nosso interesse não é como políticos; é como portugueses, como pais, como membros de famílias que querem essa estabilidade e que o ano lectivo se inicie normalmente no próximo dia 16 de Setembro.
Sr.ª Deputada, não tenho tempo para responder a todas as outras questões que me colocou, mas não quero deixar de lhe dizer que não podemos ignorar a nova realidade colocada pelo veto do Sr. Presidente da República à Lei de Bases da Educação, o que terá, certamente, consequências no nosso trabalho num futuro próximo. Como eu disse, ou conseguimos rapidamente um novo entendimento, uma solução que leve a que esse quadro estruturador possa vigorar, ou teremos de trabalhar com o quadro que imediatamente o antecedeu, o que existia anteriormente e que, por força do veto a esta Lei, existe.
Assim sendo, o que quero dizer-lhe - e julgo ser isso que preocupa a generalidade das famílias - é que as aulas abrirão a 16 de Setembro. É esse o meu propósito, o da Sr.ª Ministra da Educação e o de todo o Governo.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - E as escolas profissionais?!

O Sr. Presidente: - A Sr.ª Deputada fez a pergunta, agora tem de aguardar a resposta.

O Orador: - Sr.ª Deputada, partindo do tempo de que disponho - e sei que o Primeiro-Ministro nunca pode ausentar-se nesta fase do debate, independentemente de quaisquer razões de Estado ou outras -, ouvi todas as suas perguntas e respondo àquela que é a questão essencial que preocupa as famílias portuguesas, sublinhando que o Governo está a trabalhar para que o novo ano lectivo comece a tempo e horas. É isso que as portuguesas e os portugueses querem ouvir, agora que, aqueles que podem (e lembremo-nos dos que não podem), irão ou estão a gozar as suas férias. Repito: tudo estará pronto para que o início do novo ano lectivo comece sem sobressaltos.
Sr.ª Deputada, como viu, reconheci o que de mal correu, não procurei disfarçá-lo nem "pintá-lo com outras cores".

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, após a resposta do Sr. Primeiro-Ministro ao próximo pedido de esclarecimento, apelo à Câmara no sentido de fazermos uma pequena interrupção dos trabalhos por breves minutos.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, vamos percebendo um pouco como vai ser o estilo da sua governação: naquilo que é conveniente, fala-se em continuidade do governo anterior; naquilo que não é conveniente, há a novidade do actual Governo.
Constatamos isso, claramente, em relação à questão do referendo à Constituição Europeia, em que insistimos. O anterior Sr. Primeiro-Ministro, a ex-Ministra dos Negócios Estrangeiros, todo o anterior governo e esta Câmara sublinharam a necessidade desse referendo - finalmente, acediam à sua realização! - ao Tratado Constitucional Europeu, tendo sido projectada uma data possível, Janeiro.
Ora, o Sr. Primeiro-Ministro, veio hoje aqui invocar vagamente prazos constitucionais, sabendo que não há qualquer obstáculo à realização desse referendo - aliás, a Espanha vai fazer esse referendo em Janeiro.
Então, o que é que fica de pé?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se. Tenha a bondade de concluir.

O Orador: - Já não um compromisso, mas um "logo se vê".
É nestas circunstâncias que faria um desafio à maioria, já que há aqui um raciocínio político de que o Governo se alterou, mas a maioria se mantém. A maioria assumiu esse compromisso, a maioria pode apresentar uma proposta de resolução para a realização do referendo, independentemente da posição do Governo.

Vozes do BE: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Fazenda, quero reafirmar o que aqui disse há pouco: não duvide das nossas intenções de realizarmos o referendo. Há, de facto, na própria lei do referendo condicionantes temporais que se ligam à realização, nomeadamente, de vários actos eleitorais, nos próximos tempos.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - É por isso que tem de ser em Janeiro!

O Orador: - Por isso, a única ressalva que fiz não o é em relação ao propósito. Limitei-me a dizer que temos de chegar a um entendimento quanto à data e às condições em que vamos realizar esse referendo, uma das quais, obviamente importante, é a pergunta. Em relação à vontade de realizar o referendo, não fiz qualquer ressalva. Se, no actual quadro europeu e no actual quadro nacional, chegarmos a um consenso com todos os órgãos de soberania e com todas as forças políticas quanto à data adequada, da parte do Governo nada obsta (pelo contrário, temos empenho) a que o referendo se concretize.
Trata-se, no entanto, de um processo que tem de ser completado, porque não o encontrámos completo - não havia uma data anunciada, nem a pergunta estava feita. É isso que falta fazer.
Se todos nos empenharmos em que isso seja concretizado, teremos o referendo numa data… Como já referi, a generalidade dos nossos parceiros da União Europeia, os que podem fazê-lo, vão escolher datas muito diferentes. Nós escolheremos a nossa, em inteira liberdade e espero que com consenso alargado sobre a matéria. Trata-se de uma matéria que o Sr. Presidente da República acompanha particularmente, por razões óbvias.
Assim sendo, repito, falta só realizar esse trabalho de conclusão da parte dos vários órgãos de soberania - é o que está em causa. Quanto à vontade de realizar o referendo, nada obsta a que essa vontade continue forte, exactamente igual à do governo anterior, com outro Primeiro-Ministro. Neste caso a continuidade existe, como existe na generalidade das políticas. Se houver inovação, é em algo que não seja fundamental e que resulte do estilo que é próprio de cada um.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos, então, interromper agora os nossos trabalhos por alguns minutos.
Entretanto, aproveitando esta pequena interrupção, agradeço que os Srs. Presidentes dos Grupos

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Parlamentares se dirijam à Mesa, pois temos um assunto importantíssimo a tratar sobre o trabalho de amanhã.
Srs. Deputados, está interrompida a sessão.

Eram 13 horas e 10 minutos.

Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 13 horas e 15 minutos.

Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, vamos retomar a apreciação do Programa do XVI Governo Constitucional.
Para pedir esclarecimentos ao Sr. Primeiro-Ministro, tem a palavra o Sr. Deputado Mota Andrade.

O Sr. Mota Andrade (PS): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, a sua intervenção inicial foi longa, mas, curiosamente, dedicou meia dúzia de linhas à temática da descentralização. Sei que VV. Ex.as, depois destes 27 meses, têm muito trabalho feito nessa área, porque conseguiram descentralizar, aumentando de forma incrível, desde o litoral até ao interior mais profundo, até à fronteira, o problema do desemprego, o problema das falências das empresas, o problema, já aqui abordado, dos professores. Isso está, de facto, descentralizado pelo País inteiro, isso cobre o País inteiro.
O problema dos alunos e das famílias, que não sabem quando é que as aulas vão ter início, e o problema da segurança, isso, VV. Ex.as descentralizaram. Quanto à segurança, deixe-me dizer-lhe, Sr. Primeiro-Ministro, que o País está a arder. Sei que é impossível mudar a época dos fogos, ela coincide com o tempo quente, com as temperaturas elevadas. Mas VV. Ex.as, nesta matéria, nada fizeram!

O Sr. Miguel Paiva (CDS-PP): - Essa agora!

O Orador: - Os fogos florestais combatem-se com a prevenção.

O Sr. José Magalhães (PS): - Exacto!

O Orador: - Quero lembrar-lhe que VV. Ex.as anunciaram, em Outubro de 2003, a instituição da Agência para a Prevenção dos Fogos Florestais, mas só depois, em 21 de Abril de 2004, foi publicado o diploma da sua criação, e - pasme-se! - só em 30 de Junho, no início da época dos fogos florestais, teve lugar a primeira reunião do conselho de representantes.
Era inevitável que os fogos fossem o flagelo que, mais uma vez, estão a ser - foi incúria da vossa parte.
Relativamente à descentralização de serviços públicos, VV. Ex.as não fizeram absolutamente nada. Criaram uma lei, a lei das comunidades intermunicipais, que é um exemplo de vacuidade no plano institucional e na instalação da desordem. Desde logo, porque, em democracia, como o Sr. Primeiro-Ministro sabe, a escolha dos dirigentes de qualquer órgão do poder político fica vazia de sentido e de substância se não for realizada através de sufrágio universal. Mais - ironia do destino para quem nos acusava de dividir o País em 1998 -, criaram uma autêntica manta de retalhos. Por último, essa lei nada traz de novo, pois não atribui novas competências, nem tão-pouco consubstancia um quadro financeiro.
A pergunta que quero fazer-lhe, Sr. Primeiro-Ministro - faço-lha, pois, contrariamente a alguns colegas do seu partido, acredito que V. Ex.ª estuda os dossiers -, é muito simples e tem a ver com o seguinte: V. Ex.ª deslocalizou seis secretarias de Estado. Diga-me, por favor, em que estudos se baseou. Quais foram os critérios que adoptou aquando da escolha dessas secretarias de Estado e das cidades que vão acolhê-las? Por último, qual é o custo que isso terá para o País e para os portugueses?

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Mota Andrade, em relação aos incêndios florestais, permita-me dizer-lhe o seguinte: foi já revelado publicamente o esforço financeiro, superior a 100 milhões de euros, realizado pelo Governo, em novos meios colocados à disposição das equipas que, com generosidade e entrega, combatem este flagelo que, desde há vários anos, assola o País.
Não vou fazer deste tema matéria de confrontação política. Naturalmente, pela acção que desenvolvemos,

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temos contas a prestar como governo. Porém, não vou falar de outros anos, de anos passados, nem sujeitar esta matéria àquela que é a lógica normal da confrontação política. Devo dizer-lhe que o governo anterior fez esses investimentos de um ano para o outro - só o Ministério da Administração Interna investiu 72 milhões de euros, este ano, em matéria de prevenção e fiscalização. Como sabe, a própria engenharia militar colaborou na abertura de muitos caminhos e na limpeza de outros.
Penso ser bom que quer o Governo quer a oposição falem sempre verdade sobre as atribuições e competências de cada um.
Temos condicionantes. Para mim, o principal não são os recursos financeiros novos postos à disposição, é uma questão de organização, de mobilização de vontades; é uma questão de mais meios, seguramente, mas temos de eliminar algumas condicionantes legislativas que são muito complicadas para a eficácia na actuação.
Gostava de lembrar, até como anterior autarca, que as autarquias têm uma responsabilidade muito especial no domínio da protecção civil. Esta é uma responsabilidade colectiva - não sou Primeiro-Ministro para dizer só o que é agradável, nomeadamente àqueles de quem me honro ter sido colega. Fui presidente de câmara de uma terra com uma mancha florestal muito grande, para não falar da de Lisboa, e sei os esquemas preventivos que foram instaurados e como esse modelo preventivo no domínio da protecção civil foi considerado exemplar.
Mas há, de facto, condicionantes legislativas que impedem essa eficácia e com as quais temos de lidar com cuidado. A proibição de entrarmos em matas particulares para o exercício da prevenção e para as actuações necessárias nesta matéria é uma condicionante complicada e depois, na altura em que acontecem estas calamidades, vêm pedir-se, naturalmente, responsabilidades às autoridades públicas, que, por lei, não dispõem dos meios que lhes permita entrar nessas propriedades.
Hoje de manhã, ouvi, confesso que "por alto" (não pude ouvir em detalhe), o Sr. Presidente da Câmara de Monchique criticar uma decisão do Governo em relação à afectação de meios. Mas devo dizer que, sem responsabilizar ninguém - é por isso que digo que é um processo que demora tempo -, vi no Domingo imagens televisivas de toros de madeira acumulados.
De facto, o concelho de Monchique foi um dos casos em que os carros de bombeiros - e isto não tem que ver com partidos, acontece em vários concelhos, onde também existe responsabilidade partidária nossa - não puderam progredir, não puderam seguir o seu trajecto, por força de material combustível acumulado devido aos trabalhos que ali decorrem desde o ano anterior - isto está identificado e fará parte de um relatório. Todos vimos, em imagens televisivas, os montes de toros de madeira que impediam a progressão dos carros de bombeiros. É por isso que eu digo que há responsabilidade do Estado, há responsabilidade do Governo, mas quem disser que só o Governo, sozinho, pelos seus meios, consegue resolver este problema está a ser demagogo e a fazer política de uma maneira que não é a mais aconselhável.

O Sr. Presidente: - Sr. Primeiro-Ministro, o seu tempo esgotou-se. Queira concluir, por favor.

O Orador: - Sr. Presidente, se me permite, queria só referir-me à descentralização de seis secretarias de estado.
A Secretaria de Estado da Juventude está em Braga devido à elevada taxa de população universitária e juventude que aquela cidade tem.
A Secretaria de Estado da Educação está em Aveiro. Julgo que é indispensável, numa autarquia socialista, falar sobre o que representa no sistema universitário português a realidade que é a Universidade de Aveiro.
A Secretaria de Estado da Administração Local está em Coimbra, porque é nessa cidade que se encontra a sede da Associação Nacional dos Municípios Portugueses.
A Secretaria de Estado da Agricultura está em Santarém por razões óbvias.
A Secretaria de Estado dos Bens Culturais está em Évora porque esta cidade é património mundial.
A Secretaria de Estado do Turismo está em Faro, a capital do Algarve, também por razões evidentes.
Essa descentralização foi feita com critério, com razões, com ponderação. Não olhámos a cores partidárias das respectivas autarquias, decidimos com equilíbrio, num primeiro passo, de acordo com o interesse nacional.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Neto.

O Sr. Jorge Neto (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, em primeiro lugar, permita-me que o felicite pelas funções que acaba de assumir, formulando, desde já, os votos do maior êxito e do maior sucesso no desempenho dessas mesmas funções. Não porque esse êxito ou sucesso seja importante de per

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si, seguramente que é porque o enobrece e porque o mérito é seu, mas, sobretudo, porque é o êxito e o sucesso de Portugal, é o êxito e o sucesso dos portugueses que está em causa e é por ele que nós todos lutamos.
Quando V. Ex.ª foi indigitado Primeiro-Ministro não faltaram as vozes agoirentas que, desde logo, lobrigaram no horizonte uma deriva despesista, deitando a perder todo o esforço de consolidação orçamental destes dois últimos anos.
É até curioso verificar - ironia do destino - que alguns dos que suscitaram este argumento, de uma forma recorrente, e até com algum acinte, eram exactamente os mesmos que, no passado, criticavam o Governo pela obsessão do défice orçamental, pela obsessão da concepção orçamental.
Verificando o Programa do Governo, constata-se, efectivamente, a existência de uma centralidade concreta no incremento da competitividade e da produtividade das empresas, uma maior atenção, uma maior ênfase, às empresas, à micro-economia, à consolidação dos grupos económicos, por um lado, e, por outro, sem desprimor, de uma maior justiça social, de um maior equilíbrio, de uma maior preocupação com os desfavorecidos, com os desprotegidos, com os excluídos.
Aqui chegados, importa ponderar, Sr. Primeiro-Ministro, se do contexto do Governo há algum sinal, algures, que determine ou perscrute uma menor ênfase na questão da consolidação orçamental ou se, pelo contrário, não há qualquer inflexão nesse domínio por parte do Governo e se o esforço da consolidação orçamental continua a ser uma prioridade nodal, uma prioridade central da acção deste Governo.
Esta questão é tanto mais importante quando se sabe - o Relatório do Banco de Portugal, recentemente, acentuou-o - que o esforço da consolidação orçamental não está concluído, é um esforço contínuo, é um esforço perene, que tem de ser prosseguido, particularmente do lado da despesa. Seria, de facto, uma tontaria se, neste momento, a ênfase fosse colocada apenas na justiça social e na economia deitando por terra todo o esforço da consolidação orçamental anterior.
Termino, perguntando a V. Ex.ª se, efectivamente, há algum sinal, por mais ténue e por mais remoto que seja, de inflexão nesse domínio ou se V. Ex.ª, de uma forma perseverante, tenaz, audaz, como, aliás, é seu timbre, vai prosseguir esse esforço. É que esse esforço é fundamental para se conseguir a retoma económica, para se aproveitar o ciclo económico do progresso, de forma a ter-se um desenvolvimento económico sustentado em Portugal.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Neto, aquilo que acabou de perguntar ao Governo tem, se me permite, uma resposta clara: não vamos diminuir, num milímetro que seja, o esforço, a preocupação, o trabalho para se conseguir a efectiva consolidação orçamental.
Agradeço as palavras que me dirigiu, mas quero dizer-lhe o seguinte: a credibilidade das contas públicas, como dizia há dias o Sr. Ministro das Finanças, é um imperativo de sempre. Não deve ser por causa do ponto a que chegou o desequilíbrio do Orçamento e dos compromissos que assumimos no Pacto de Estabilidade e Crescimento que nos devemos sentir obrigados a atingir esse desiderato.
Para essa credibilidade é importante o equilíbrio, é importante diminuir o peso do Estado em responsabilidades por vezes despiciendas na vida portuguesa, é importante diminuir aquilo que o Estado absorve daquilo que é a criação de riqueza nacional.
Mas permita-me também dizer que para essa credibilidade é fundamental a transparência. E para essa transparência - disse-o no primeiro Conselho de Ministros que dirigi - considero também ser essencial que o Estado mude de vida em alguns aspectos. Por exemplo, na prestação das contas do Estado: a verdade nas contas do Estado, o conhecimento atempado dessas mesmas contas, a não existência de confusão entre o PIDDAC nacional e o PIDDAC regionalizado, sabermos o que é investimento da Administração Central, o que deve estar ao nível dos PIDDAC regionalizados e o que deve estar no domínio da administração do Estado.
Estas omissões ou confusões durante anos também não tem ajudado a essa credibilidade de tudo o que é a gestão das finanças públicas, apesar do trabalho denodado dos ministros que antecederam o Ministro Bagão Félix, nomeadamente (permitam-me que a cite por razões especiais) da Ministra Manuela Ferreira Leite.
Quero, pois, dizer-lhe que não tendo nós qualquer obsessão, temos a convicção de que é importante para Portugal que o Estado não gaste demasiado, que a despesa pública não cresça desmesuradamente, como aconteceu noutros tempos, que não vou aqui referir por não querer abrir frentes de debate que não se justificam no tempo de hoje.
É bom termos a noção de que a despesa primária, a despesa de funcionamento, as despesas correntes,

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principalmente a despesa de pessoal, é praticamente incomprimível. Como dizia o Sr. Ministro das Finanças, devemos poder baixar a despesa, tem sido feito um esforço nesse sentido, mas para trabalharmos do lado da receita temos de ter, como também o Sr. Presidente da República e o Sr. Governador do Banco de Portugal referiram, êxito nesse trabalho do lado da despesa pública.
Não vemos a questão do défice como um objectivo em si mesmo. É importante, mas ele é para nós não só um objectivo em si mesmo, mas também um instrumento para permitir o tal crescimento económico, a credibilidade externa do País e a confiança dos agentes económicos para poderem investir e para saberem que existem condições para esse investimento.
O Pacto de Estabilidade, como é sabido, está em reponderação. Foi o anterior presidente da Comissão Europeia que disse que era um Pacto… Eu vou dizer "não inteligente" para não utilizar uma palavra mais desagradável.
Sabemos qual foi a decisão do Tribunal de Justiça em relação ao incumprimento por parte de Estados-membros da União Europeia. E se era previsível que do Tribunal pudesse sair essa decisão, ela não deixa de constituir um facto relevante na jurisprudência comunitária e na própria garantia de que as normas são para serem cumpridas. Por isso mesmo, há o empenho do Governo, não por razões dos nossos compromissos no âmbito da União Europeia, mas também por razões internas, em prosseguir objectivos que são muito ambiciosos.
Seria talvez fácil ao novo Governo chegar aqui e dizer: "Houve algumas revisões em alta das previsões do Banco de Portugal quanto à evolução da economia portuguesa, e nós, até porque sabemos que é difícil e o problema não está resolvido, vamos dar aqui um acerto no nosso objectivo em relação ao défice orçamental.". Queria sublinhar que não o faremos e que assumiremos o mesmo objectivo de trabalhar para alcançar a mesma meta do Governo anterior. Tenho a noção de que, com certeza, no final do ano, o problema estrutural não estará ainda todo resolvido, mas honraremos o compromisso de, no final do ano, termos um défice que não atinja os 3%, mas, enfim, os 2,8% anunciados.
É um ponto de honra para este Governo e julgo que para Portugal!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Pinho de Almeida.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, em primeiro lugar, gostaria de, em nome da Juventude Popular, organização de juventude que aqui represento, felicitá-lo, a si e ao seu Governo, dizendo-lhe que este é um Governo que se quer de esperança e de futuro. E sendo um Governo que se quer de esperança e de futuro, é um Governo que, naturalmente, diz muito às novas gerações.
Quero falar-lhe agora de algo que se passou há pouco tempo no nosso país: o Campeonato Europeu de Futebol, Euro 2004.
Nessa altura, Portugal mostrou ter capacidade para realizar eventos, para conseguir afirmar-se, de uma forma que, muitas vezes, julgamos não ser capazes ou não ser eficazes.
Nessa altura, ficou demonstrado que Portugal tem uma parte da sua sociedade que se julga arauto do realismo e que não consegue levar o País a lado nenhum, mas que, do outro lado, temos pessoas que são, muitas vezes, ridicularizadas por serem ambiciosas. Provámos que aqueles que muitas vezes são ridicularizados por serem ambiciosos têm o seu espaço e conseguem triunfar.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Tratou-se, claramente, da vitória de uma visão do País sobre a outra, da vitória daqueles que vêem um Portugal a cores contra aqueles que só vêem e vivem num Portugal monocromático que tem duas variações: a variação monótona e cinzenta e a variação arrogante e vermelha. Nenhuma dessas serve ao País, nenhuma dessas serve às nossas gerações!
De facto, são duas atitudes diferentes: de um lado, a auto-confiança, o "empreendedorismo" e a ambição; do outro lado, o derrotismo, a injustiça igualitarista e o reaccionarismo. E quem, neste momento, assume o Governo do País tem de ter uma palavra para as novas gerações, tem de dizer de que lado está.
Nós sabemos de que lado está este Governo, mas é importante que o País o sinta, vendo respondidas, por exemplo, algumas questões que duram há muito tempo. E uma das razões que faz com que, por vezes, as pessoas não se revejam nos políticos nem, muitas vezes, acreditem no próprio País é a de não encontrarem resposta para questões que se põem há muitos anos. Vou falar de duas que têm a ver com juventude.

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Por um lado, a educação e a questão dos manuais escolares. Há quantos anos todos os agentes educativos, principalmente as famílias, se queixam da qualidade e dos conteúdos dos manuais escolares no nosso sistema de ensino? Queria perguntar-lhe directamente, Sr. Primeiro-Ministro, se com este Governo vai ser possível fazer uma avaliação dos manuais escolares e retirar consequências do resultado dessa avaliação.
Por outro lado, pergunto se vai ser com este Primeiro-Ministro, com este Ministro de Estado e da Defesa Nacional que vamos conseguir, em Novembro deste ano, pôr fim ao serviço militar obrigatório e, mais importante do que isso - porque isso significa cumprir um objectivo -, garantir que as Forças Armadas têm capacidade de recrutamento e conseguem cumprir o objectivo da profissionalização, porque só assim responderemos a um objectivo estratégico e não a um mero cumprimento de promessas.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - É o cumprimento destas promessas, Sr. Primeiro-Ministro, que gera a credibilidade dos políticos e é isso que faz as novas gerações acreditarem neles.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado João Pinho de Almeida,…

Risos do PCP, do BE e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Quero dizer ao Sr. Presidente para não levar a mal este meu avanço… É que, em ocasiões anteriores, demorei um pouco a responder e o Sr. Presidente - e muito bem - chamou-me a atenção para esse facto. Digo-o com todo o respeito por V. Ex.ª.
Sr. Deputado João Pinho de Almeida, teceu considerações sobre o optimismo e o pessimismo e eu não posso deixar de estar de acordo consigo sobre o que não teríamos de ouvir, da parte dos chamados "arautos da desgraça", se as organizações que o País assumiu (desde logo no que respeita ao Euro 2004, desde o seu lançamento até à sua conclusão, envolvendo várias forças políticas) não tivessem corrido como correram! Foi uma boa decisão trazer o Euro para Portugal. Correu muitíssimo bem a organização e o País deve sentir-se orgulhoso.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - No que respeita à questão da avaliação dos manuais escolares, permita-me que diga o seguinte neste momento: sou pai e, muitas vezes, os meus filhos pedem-me para os acompanhar nos estudos, como acontece a qualquer pai. Obviamente, não nos é fácil, neste tempo de transição de métodos, de novas tecnologias, mergulhar por inteiro nos manuais escolares de hoje, responder aos filhos e acompanhá-los como os nossos pais nos acompanhavam a nós. Por vezes, olhamos os manuais como se fosse uma completa surpresa para nós! E não vou dizer que parte do que lá está também nos surpreende pela falta de lógica na sistematização, na coerência do currículo de cada cadeira e do modo como é feita a distribuição da matéria pelos diferentes anos, ou mesmo em cada ano escolar.
Porém, permita-me que, nesta fase da vida de Portugal, privilegie a estabilidade. A avaliação deve ser permanente: deve haver uma comissão nos respectivos departamentos que olhe para a possibilidade de aperfeiçoamento dos manuais existentes. Mas não quero que prolifere um negócio de sucesso dos manuais, prejudicando os interesses legítimos de estabilidade das famílias portuguesas.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - E, neste momento, o valor principal que quero sublinhar é o da estabilidade, para que, durante uns anos, as crianças, os pais e os avós possam dizer "eu sei por qual manual o meu filho vai estudar daqui a dois, três ou quatro anos", com todo o respeito pelos direitos das editoras e dos autores, porque isso está fora de questão.
Quanto ao serviço militar obrigatório e à questão da profissionalização, deixe-me que lhe diga que tenho ao meu lado quem é Ministro de Estado, da Defesa Nacional e dos Assuntos do Mar e que, graças a estas circunstâncias de mudança de Governo, viu reconhecido, mesmo da parte daqueles que não o reconheciam,

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o facto de ser um bom Ministro da Defesa Nacional.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Foi mais um acquis, uma aquisição deste tempo político que vivemos, mesmo para aqueles que tinham dúvidas sobre essa matéria - o que não era o nosso caso.
Essa meta que o Governo vai poder alcançar, graças ao trabalho do governo anterior, honra-nos. Foi uma meta que muitos anunciaram - lá está: a retórica, as palavras - mas que nós vamos cumprir. Em Maio foi atingido o que muitos não pensavam possível: o mínimo operacional de contratados para ser efectiva a profissionalização das Forças Armadas.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - E, no próximo mês de Novembro, vamos ter o fim do serviço militar obrigatório, objectivo que tão importante é para a juventude portuguesa.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Foi este Governo, e o Governo dirigido por Durão Barroso, com Paulo Portas como Ministro da Defesa Nacional, que conseguiu chegar a este ponto, há tanto tempo reivindicado.
Como Primeiro-Ministro do novo Governo, resta-me tão-só partilhar o orgulho e garantir a Portugal e aos jovens portugueses que esse trabalho dará frutos já nos próximos meses, visto que passaremos a um novo quadro que a juventude portuguesa ambicionava, sem nunca esquecer os deveres para com a defesa nacional, para com o respeito pela Pátria e para com os seus interesses estratégicos.
Temos orgulho em confirmá-lo.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, V. Ex.ª andou num frenesim, antes e depois da tomada de posse, a anunciar certas promessas e medidas que, mais tarde, em certo momento, nos veio dizer que não passavam de possibilidades, que não eram ainda certezas. É por isso que, neste momento do debate, todos podemos perguntar se, também aqui, nos tem estado a falar de possibilidades ou de certezas. Isto é, se tudo o que promete não vai ser visto, mais tarde, como uma mera possibilidade…

O Sr. Honório Novo (PCP): - Muito bem!

O Orador: - No PCP, Sr. Primeiro-Ministro, temos algumas certezas em relação à política do Governo.
Desde logo, temos a certeza de que o Governo vai manter a opção cega pelos critérios do défice e do Pacto de Estabilidade e Crescimento, apesar de o Sr. Primeiro-Ministro ter dito em 2003, numa entrevista, o seguinte: "Eu ando a dizer há anos que o PEC é desajustado da realidade europeia e, principalmente, da realidade nacional. É como entregar bicicletas a pessoas de diferentes condições físicas e dizer-lhes que têm todas de chegar à meta ao mesmo tempo".
Pergunto, Sr. Primeiro-Ministro, por que é que no Programa do Governo não se faz uma única referência à necessidade de o nosso país lutar por um Pacto de Estabilidade e Crescimento diferente, que tenha em conta a economia nacional e as nossas necessidades de desenvolvimento.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Afonso Candal (PS): - Responda lá a esta!

O Orador: - Sr. Primeiro-Ministro, também temos a certeza de que este Governo pretende continuar o ataque aos direitos dos trabalhadores e vai governamentalizar a iniciativa "Compromisso Portugal", de que, aliás, tem alguns representantes no Governo, numa linha de "lei da selva" no Direito do Trabalho, para permitir mais lucro à custa de mais exploração.
Sabemos também, Sr. Primeiro-Ministro, que este foi um Governo - o processo da sua formação

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bem o diz - feito da seguinte forma: em vez de o Sr. Primeiro-Ministro ter procurado governantes de que necessitava para o Governo, adaptou o Governo aos governantes que já tinha!

O Sr. António Filipe (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Por último, o Sr. Primeiro-Ministro fala agora de uma preocupação social. Pergunto-lhe se um Governo com preocupação social pode não ter uma única palavra, no Programa do Governo, para uma das questões mais importantes do País, a falta de recursos humanos na área da saúde. Não há uma palavra para a necessidade de formar mais recursos humanos na área da saúde!

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Exactamente!

O Orador: - E referiu-se às listas de espera já por duas vezes neste debate! Sr. Primeiro-Ministro, o problema das listas de espera não está resolvido mas, sim, agravado.
Vou dar-lhe um exemplo do que é a política deste Governo para combater as listas de espera.

O Sr. António Filipe (PCP): - Oiça, oiça!

O Orador: - Num telegrama enviado a um cidadão, que já direi quem é, pode ler-se o seguinte: "Informamos marcação de cateterismo cardíaco no dia 18/06/2004. Pede-se confirmação até ao dia 16/06/2004" - foi há poucas semanas. Este telegrama foi dirigido ao Sr. Fernando Lopes Graça, ao maestro Fernando Lopes Graça, que já morreu há quase 10 anos!

O Sr. Honório Novo (PCP): - Um escândalo!

O Orador: - Portanto, esta é a política de combate às listas de espera do seu Governo, do Governo que agora chefia e que é a continuação do anterior. Uma política que não resolveu nenhum problema na saúde e que apenas pretende, com o mesmo Ministro, entregar mais uma "fatia" da saúde dos portugueses aos critérios, aos interesses privados.
Este é um bom exemplo da política de saúde do seu Governo, é um escandaloso exemplo de como não cuida, nem cuidará, dos interesses dos portugueses.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Bernardino Soares, V. Ex.ª citou palavras que penso que têm a ver com a afirmação que aqui proferi há pouco. De facto, há anos que penso, defendo e sustento, em intervenções em várias instâncias, que o Pacto de Estabilidade e Crescimento, tal como existia, era desadequado da realidade. Era um entendimento não maioritário mas, de facto, sempre o disse, mesmo quando todos estavam eufóricos e entusiasmados com esse Pacto.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Todos não!

O Orador: - Eu disse "muitos"! Mas isso não invalida que os objectivos essenciais desse Pacto sejam correctos, que os objectivos que permitiram a Portugal sustentar o desenvolvimento da sua economia e fazer face à nova realidade de uma unificação monetária estejam, nos seus pressupostos, correctos.
Procurei chamar a atenção para a necessidade de correcção de algumas exigências que eram feitas no mesmo Pacto.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Onde é que isso está no Programa do Governo?!

O Orador: - Sr. Deputado, em política externa, como sabe, na negociação do Pacto de Estabilidade e Crescimento que está, neste momento, em cima da mesa na agenda da União Europeia não se fala, age-se; não se diz, actua-se! Portanto, já dissemos e conseguimos, no último Conselho Europeu, atingir os objectivos fundamentais a que Portugal se propunha. Já foi dito, e eu assumo, como Primeiro-Ministro de Portugal, essa orientação, isto é, que o conceito "coesão social", que tem muitos anos e que desapareceu um pouco do discurso e das preocupações de algumas decisões, deve voltar à primeira linha das orientações dos órgãos comunitários e dos Governos dos Estados-membros.

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Devemos falar em crescimento, sem dúvida, mas também em coesão. Isso foi conseguido no último Conselho Europeu, tal como foi conseguido o respeito pelo princípio do método comunitário, o respeito pelo princípio da igualdade entre os Estados-membros. Portugal conseguiu, nesse Conselho Europeu, que as decisões tomadas respeitassem o essencial das suas posições.
Por isso, quero dizer-lhe, Sr. Deputado Bernardino Soares, que mantenho essa imagem a que fez referência, pois não considero que seja justo pedir a uma pessoa que, à partida, tem condições diferentes para, exactamente com a mesma bicicleta, chegar ao mesmo tempo à meta. Mas essa é matéria que os Governos devem tratar nas instâncias competentes, no âmbito da União Europeia, com cujos objectivos somos solidários. E é uma questão que não só o Governo português coloca neste momento, embora…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Só o Governo português não coloca!

O Orador: - Não, não!
Peço desculpa, Sr. Deputado, mas até lhe posso dizer que o meu antecessor levou ao Conselho de Ministros de Copenhaga, há dois anos atrás, a consideração da situação da agricultura portuguesa e depositou o instrumento necessário para que a agricultura portuguesa (e as consequências da revisão de 1992 da PAC) pudesse ser tomada como prioridade por parte dos órgãos competentes da União Europeia.
Portanto, não é correcto dizer-se que o Governo, quer o anterior quer o actual, não tem uma posição de realismo em relação às consequências das políticas europeias comuns. O que se fez em relação ao sector agrícola também irá ser feito neste momento, mantendo nós - tal como disse - o objectivo de o défice se situar abaixo dos 3%. Veremos como isso vai ser possível, mas com certeza os Srs. Deputados terão acesso a toda a informação necessária para esse efeito.
Referiu-se ainda o Sr. Deputado Bernardino Soares à questão da formação do Governo e, devo dizer, citou uma frase que sempre enunciei…

O Sr. Presidente: - Sr. Primeiro-Ministro, o tempo de que dispunha esgotou-se. Queira terminar.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Como princípio permanente, convido pessoas para o Governo, não faço Governos para pessoas.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Nota-se!

O Orador: - Pode notar mesmo, Sr. Deputado!
Não sei se o mesmo terá acontecido convosco, mas sei que há uns anos não acontece por opção do povo,…

Risos do PSD e do CDS-PP.

… mas gostaria de saber, se um dia acontecesse, qual era o critério que seguiriam. Eu quero acreditar que seguiriam o mesmo, o de convidar pessoas para o Governo, com a estrutura que considerassem adequada aos objectivos que tivessem como importantes para a defesa dos interesses nacionais.
Não tenha quaisquer dúvidas que foi o que fiz.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. José Apolinário (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a sua interpelação é sobre as questões que estão a ser debatidas? Senão só lhe darei a palavra no final da sessão, para não prejudicar os oradores inscritos para o debate.

O Sr. José Apolinário (PS): - Sr. Presidente, é sobre a condução dos trabalhos…

O Sr. Presidente: - Se é assim, tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Apolinário (PS): - … e para entregar na Mesa um documento para juntar à Acta.
Sr. Presidente, o Sr. Primeiro-Ministro, ao referir-se à catástrofe dos incêndios, deixou implícita uma posição muito pouco precisa sobre a Câmara Municipal de Monchique.
Há pouco, tive ocasião de falar com o Sr. Presidente da Câmara Municipal de Monchique e julgo conveniente o Sr. Primeiro-Ministro ter conhecimento de um artigo publicado hoje no Diário de Notícias,

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onde os produtores florestais responsabilizam o Ministério da Agricultura sobre esta matéria.
Neste sentido, quero entregar na Mesa, para juntar à Acta, este documento e sugerir que o Sr. Primeiro-Ministro contacte o Sr. Presidente da Câmara Municipal de Monchique para que, antes de atribuir responsabilidades, possa saber, de viva voz, o que se passa no terreno.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, efectivamente, a sua intervenção foi um requerimento à Mesa.
Em todo caso, agradeço que faça chegar à Mesa o documento, para que o possa fazer circular.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, peço a palavra também para uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: - Se é para o mesmo efeito, tem a palavra, Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, agradeço que me tenha concedido a palavra para uma interpelação à Mesa, porque quero dizer, para que fique claro - não o faço a ninguém e não gosto que o façam connosco -, que não responsabilizo qualquer dirigente político, nomeadamente de outro partido, pelas circunstâncias extremamente graves que têm levado à realidade que todos conhecemos neste momento.

O Sr. António José Seguro (PS): - Estamos esclarecidos.

O Orador: - Conheço bem o Presidente da Câmara Municipal de Monchique, o meu amigo Carlos Tuta, e o trabalho que faz. E acontecimentos desses, realidades dessas - e eu disse que vi imagens na televisão -, infelizmente, ainda acontecem um pouco por todo o País.
Não está em causa o trabalho feito, nem o respeito devido à pessoa e ao político.
Gostava que isto ficasse claro.

O Sr. Presidente: - Prosseguindo o debate, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Cunha para pedir esclarecimentos ao Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Rui Cunha (PS): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, os meus cumprimentos.
O Sr. Primeiro-Ministro tem, no seu Programa do Governo, um capítulo sob a epígrafe Reforçar a Justiça Social e hoje já aqui se referiu às suas preocupações de justiça social, tendo mesmo avançado com o termo "solidariedade social".
Todavia, encontramos aqui várias contradições.
O Sr. Primeiro-Ministro, ao longo de 40 minutos do seu discurso inicial, fez uma referência, tímida e fugaz, à questão da pobreza. Porém, lendo e relendo o Programa do Governo, temos a situação bizarra de encontrarmos apenas uma vez uma referência à pobreza - a pobreza é quase tabu neste Programa do Governo.
No dia 21 de Março, apenas há quatro meses, o jornal Público titulava Há pelo menos 200 000 pessoas com fome em Portugal, o que não esgota os pobres, mostra apenas a franja mais grave da situação dos pobres. Nessa mesma publicação, o Público dizia ainda "Instituições de solidariedade garantem que a situação tem vindo a agravar-se.".
Portanto, não é a oposição que inventa que a situação se agravou nos últimos dois anos, são os próprios promotores sociais a reconhecerem que a situação se tem vindo a agravar nos últimos dois anos.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Primeiro-Ministro, um programa do governo tem de se dirigir a um país real, a um país concreto e não a um país de faz-de-conta.
Neste sentido, gostaria de saber se este Governo assume a situação de pobreza em Portugal, que é uma ferida grave na sociedade portuguesa, e, assumindo a situação, quais as linhas e programas de combate à pobreza, dado que, infelizmente, todos os dias, encontramos famílias que tiveram a sua integração através de programas de luta contra a pobreza e que, neste momento, contra a sua vontade, estão de novo a cair em situações de exclusão social.

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Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Hoje, o Sr. Primeiro-Ministro já nos falou muito de modelos nórdicos e da Europa central, que são modelos de elevada protecção social.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Mas, o que vejo, pela prática e no Programa, é que, em vez de convergirmos para esses modelos de elevada protecção social, estamos a divergir. Se, em relação a esses modelos, o nosso já era um modelo fraco, se já não se conseguia sequer atingir 50% dos objectivos desses mesmos modelos, com as medidas tomadas - onde o subsídio de doença vem agravar a situação de 90% dos trabalhadores portugueses em situação de doença, o subsídio de desemprego vem prejudicar os portugueses que caiem no desemprego, sobretudo os que se encontram na faixa etária dos 40 aos 50 anos, que é a que mais dificuldade tem em arranjar novo emprego -, estamos ainda a fragilizar mais o que já de si é um débil sistema de protecção social.
Em suma, estamos a divergir do modelo que o Sr. Primeiro-Ministro aqui nos apontou, e não a convergir para ele.
Além disso, estamos numa situação terrível, porque verificamos que, devido à existência do Código do Trabalho, nos primeiros quatro meses de aplicação do Código o volume de emprego coberto por convenções colectivas de trabalho é de 22% da média do período homólogo dos quatro anos anteriores, o que significa que este facto é de uma gravidade sem precedentes nos 30 anos de democracia. E isto porque, se a situação prosseguir assim, no início do próximo ano, 78% dos trabalhadores portugueses estarão com os seus direitos reduzidos apenas ao mínimo legal e sem os direitos que as convenções colectivas lhes conferiam.
Sr. Primeiro-Ministro, como vai inverter esta situação? Como é que esta situação se coaduna com o modelo que aqui nos apresentou?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Rui Cunha, permita-me que lhe retribua os cumprimentos.
Sr. Deputado, confirme-me só a que estudo se refere esse artigo do Público. Qual é a data do estudo?

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Não sabe!

O Sr. Rui Cunha (PS): - Não sei! Não tenho-o aqui…!

O Orador: - Creio que é de 2001, Sr. Deputado!

O Sr. Rui Cunha (PS): - Talvez!

Risos do PSD e do CDS-PP.

O Orador: - Portanto, respeita aos anos em que V. Ex.ª tinha responsabilidades governativas.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

De qualquer modo, Sr. Deputado, e digo-o com toda a franqueza, a matéria que colocou é séria de mais para estar circunscrita a datas de artigos de jornais, porque, obviamente, a pobreza é uma realidade que continua e que, em alguns casos, fruto da evolução da situação económica, até se agravou. E, portanto, a nossa preocupação é maior do que aquela que V. Ex.ª teria na altura em que desempenhou responsabilidades governativas e se deparou com essa realidade.
Porém, para atingir os nossos objectivos, é importante mantermos as medidas sociais de apoio e é importante fazê-lo com sentido. Li vários artigos, nos últimos dias, sobre a exclusão dos mais pobres do rendimento social de inserção, por exemplo, e devo dizer-lhe que me parece razoável uma medida que leve a que sejam integrados neste esquema aqueles que há 12 meses estão sem remuneração e não só os que se encontram nesta situação nos três meses imediatamente anteriores, apesar de, na medida proposta,

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a ponderação dos três primeiros meses - se bem me lembro dos dados fornecidos pelo Sr. Ministro - ser de 61%, em relação ao total dos 12 meses. É uma situação mais equitativa, mais justa, que revela a continuidade da preocupação social, mas há que fazer correcções, quando é necessário, para, por exemplo, não integrarmos neste esquema do rendimento social de inserção pessoas que só há três meses estejam desempregadas, o que, às vezes, pode ser fruto de outras circunstâncias.
Este é o nosso entendimento, e parece-nos um sistema mais justo.
Por outro lado, continuamos empenhados - e conheço bem o trabalho autárquico - no apoio aos sem-abrigo, no apoio a essas manchas de excluídos ou de pobreza, naquela que é a cooperação entre diferentes níveis da Administração em relação aos que têm os seus rendimentos diminuídos ou que, às vezes, nem os têm.
Sr. Deputado, o Governo continua a assumir como seu o objectivo estratégico da convergência das pensões com o salário mínimo nacional.

O Sr. António José Seguro (PS): - Vamos ver!

O Orador: - Este objectivo, que, eu diria, é inovador e histórico no quadro da democracia portuguesa, também no quadro das exigências que coloca no campo das finanças públicas, poderia, se a maneira de estar na política de quem aqui está fosse outra, ser retirado do primeiro plano do enunciado dos objectivos.

Protestos do Deputado do PS Rui Cunha.

Não! Não são possibilidades, são objectivos assumidos como metas fundamentais de trabalho dessa convergência.
Portanto, Sr. Deputado, esperamos que as manchas de pobreza desapareçam, o que significa que conseguimos criar mais riqueza, mais investimento.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Não é só da nossa responsabilidade a contratação colectiva. Se, hoje em dia, existem só 22% de empregados abrangidos por esses instrumentos, não assaquem responsabilidades principalmente ao Governo e ao Estado. Está fundamentalmente nas mãos dos empregadores e dos trabalhadores, embora com o papel do Estado, conseguir esses instrumentos de conciliação, e é o que desejamos. Mas desejamos, fundamentalmente, criar um clima de confiança, de optimismo, de fé em nós próprios que leve a investir quem tem ou pode fazê-lo mas num quadro de justiça social, de correcção, pela via da política fiscal e da política orçamental, dessas desigualdades, que permita, de facto, construir essa sociedade mais justa.
Não ponho em dúvida que tenham sido estes os objectivos do seu trabalho e do governo de que fez parte, mas foi o Sr. Deputado quem citou os números desse estudo de 2001.
Quero acreditar, pelos números do crescimento…

O Sr. Presidente: - Sr. Primeiro-Ministro, o seu tempo esgotou-se. Peço-lhe que conclua.

O Orador: - Como se sabe, neste momento, o Banco de Portugal admite um crescimento económico superior a 1% para este ano em Portugal, depois da revisão das previsões feitas, e esperamos que, com a continuidade deste rumo, as manchas de pobreza desapareçam, que surjam novos empregos, que quem não tem emprego possa voltar a ter um salário e não só um subsídio de desemprego, ao qual pode recorrer face a esta situação, que a todos entristece.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Hugo Velosa.

O Sr. Hugo Velosa (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, cabe-me esta difícil tarefa de interpelar V. Ex.ª numa hora em que esta Câmara já pensa no almoço.
Todavia, gostaria de frisar aqui que, para nós, é muito importante o apelo que V. Ex.ª fez, nesta Câmara, na sua intervenção inicial e em várias passagens posteriores, a consensos, sobretudo ao Partido Socialista. Quero realçar este aspecto porque, recordo, o líder parlamentar do Partido Socialista, Deputado António José Seguro, na sua primeira intervenção, não falou do Programa deste Governo mas, sim, do

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Programa do Governo anterior.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - É o mesmo!

O Orador: - E aquilo que se exigia na discussão do Programa do XVI Governo era que o maior partido da oposição falasse deste Programa e interpelasse V. Ex.ª sobre o mesmo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - É o mesmo!

O Orador: - É este o problema de base nesta discussão do Programa do Governo, neste Parlamento.
A oposição está habituada a maldizer, a criticar tudo e todos! Critica a forma e não o conteúdo! O que importa é dizer mal! E, portanto, tudo o que esta maioria faz e que V. Ex.ª fizer como Primeiro-Ministro não serve, mesmo antes de estar feito ou, sequer, anunciado.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Para nós, a oposição engana-se. Com V. Ex.ª e este Governo, temos a certeza de que Portugal pode ter esperança e ambição.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Temos a certeza de que Portugal vai avançar mesmo contra a vontade da oposição.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A questão que quero colocar a V. Ex.ª tem a ver com a matéria fiscal, com o IRS.
Aquando das discussões dos Orçamentos do Estado para 2003 e para 2004, o governo anterior foi aqui muito criticado pela oposição, que dizia que havia sempre aumentos do IRS e que não havia, da parte do governo, capacidade para alterar este estado de coisas.

O Sr. José Magalhães (PCP): - E não havia!

O Orador: - Já foi anunciado no Programa do Governo alterações nesta matéria - esperamos agora que a oposição, na altura, tenha uma posição diferente, que fique do lado do Governo e da maioria, já que critica que o IRS aumenta, se, efectivamente, houver alterações no IRS.

O Sr. José Magalhães (PS): - Vamos ver!

O Orador: - Como o Programa do Governo prevê alterações para o IRS, gostaria de colocar-lhe algumas questões, Sr. Primeiro-Ministro.
Há alguma previsão segura de que o Orçamento do Estado para 2005 possa conter ajustamentos no IRS?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se. Peço-lhe que conclua.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
Se houver alguma revisão no imposto sobre o rendimento das pessoas singulares, como se pode valorizar a família em relação a essas alterações? Todos nós, a maioria, aqui, no Parlamento, esperamos ver no Orçamento essas alterações, em termos do IRS, para bem dos portugueses com mais dificuldades em termos fiscais.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Hugo Velosa colocou uma questão que é importante para as famílias portuguesas e talvez uma das questões a que elas dão mais atenção nos debates

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políticos, como o que estamos a travar, principalmente desde que a matéria foi retomada com a posse deste Governo. Mas quero aqui fazer a devida justiça ao meu antecessor e à sua equipa, que sempre disseram que pretendiam seguir esse caminho: numa primeira fase, em função daquilo que foi a realidade que tiveram de assumir - sobre a qual não farei comentários -, consolidada a recuperação, mexer no IRC e, logo que possível (o Dr. Durão Barroso disse-o várias vezes), mexer no IRS, num sentido favorável às pessoas, às famílias. E, portanto, lembro, não é uma ideia nova, aqui também há continuidade. Contudo, eu disse, desde que tomei posse, e até mesmo antes de a tomar, que procuraremos fazê-lo se encontrarmos folga para o efeito.
Agora, deixe-me dar-lhe este dado: a descida do IRC, que foi decidida pelo governo anterior, terá, segundo previsões das entidades competentes, um efeito de 0,4% no PIB do próximo ano, que é o primeiro ano em que se repercute. E eu diria que se trata de uma verdadeira medida de choque fiscal. Quando uma medida de desagravamento da carga tributária tem um efeito destes, é logo um pequeno choque que se verifica em relação àquelas que são as necessidades de financiamento do Estado.
Mas a nossa preocupação - não só a minha, nem a de todo o Governo, incluindo o Sr. Ministro das Finanças, mas a de todos nós - é olharmos de frente para esta realidade da vida dos portugueses, é sabermos que o Estado, quando olha para o rendimento das famílias, para a situação das famílias, fá-lo fundamentalmente para o lado da receita, para os seus rendimentos, e nós, como membros de uma família, sabemos que a realidade é muito diferente. Logo, custa-nos saber que agregados familiares com rendimentos na ordem dos 1000 ou 1500 €/mês chegam a atingir taxas marginais bem superiores aos 30%. Sabemos todos que há algo de muito errado no sistema de deduções em Portugal, e é para estas famílias, que têm um ou dois salários mas que têm encargos fixos com a renda da sua casa, com a educação dos seus filhos, encargos em relação aos quais não pode haver dispensa de obrigação, que temos de pensar que não pode continuar uma situação em que ainda tenham de pagar imposto de mais de 30%, quando, muitas vezes, o dinheiro não chega ao fim do mês quanto mais pagar ainda imposto sobre os rendimentos que obtiveram.
A maneira de conseguir atingir essa justiça fiscal é trabalhar muito no combate à evasão fiscal e na correcção dessas desigualdades.
A este propósito, vou falar-vos de factos resultantes não de acção minha mas do governo anterior: os primeiros números - e confirmei-os com o Sr. Governador do Banco de Portugal, em reunião com o Sr. Ministro das Finanças -, no que respeita à receita do 1.º semestre deste ano, dão indicações positivas quanto ao comportamento de vários impostos que devemos ter em consideração, com níveis de aumento de receita que permitem extrair algumas conclusões quanto a alguma eficácia no combate à evasão fiscal.
O Sr. Deputado, a seu tempo, terá os dados em concreto divulgados pelas entidades competentes,…

O Sr. Presidente: - Sr. Primeiro-Ministro, o seu tempo esgotou-se. Faça o favor de concluir.

O Orador: - … mas já pode aceder-lhes.
No entanto, espero que se congratule com estas notícias, pois a receita não tem essas más notícias e algumas das notícias que existem permitem-nos concluir a todos, como comunidade, como Estado, que o combate à evasão começa a produzir alguns resultados. Se assim for, se se confirmar a contenção da despesa e o bom comportamento da receita, poderá haver alguma margem para se poder mexer nesse "miolo" do IRS, olhando para o lado das deduções e, a pouco e pouco, indo ao encontro daquelas que são as expectativas das famílias portuguesas e as suas reais necessidades.

Aplausos dos PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Benavente.

A Sr.ª Ana Benavente (PS): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, a pergunta que quero fazer-lhe é muito curta, forçosamente, pelo tempo de que dispomos, tem a ver com o programa relativo à educação, que é um conjunto de intenções mais do que de objectivos em relação aos quais não se definem estratégias e muito menos a sua concretização, o que não deixa de ser estranho após dois anos de governo.
Sr. Primeiro-Ministro, na pág. 185 do Programa do Governo - vamos ao Programa sem adjectivos -, é afirmado que o ensino tecnológico e profissional se vai desenvolver para todos os alunos que concluem a escolaridade básica. Sabendo que, entre a actualidade e a vossa proposta de lei de bases, não há correspondência na escolaridade básica, nem na escolaridade obrigatória, peço-lhe, Sr. Primeiro-Ministro, que esclareça este conceito. Ou seja, qual é a actual escolaridade básica, a que está prevista na lei de bases? Quando é que os alunos vão ser orientados para o ensino tecnológico e profissional?

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Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Ana Benavente, obviamente que não pode ser a da nova lei de bases, ela não está em vigor! Foi vetada! Portanto, temos de trabalhar com base no quadro jurídico anterior.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, como não há mais oradores inscritos, vamos interromper os nossos trabalhos, que serão retomados à tarde, às 15 horas e 30 minutos.
Srs. Deputados, está suspensa a sessão.

Eram 14 horas e 10 minutos.

O Sr.Presidente: - Srs. Deputados, declaro reaberta a sessão.

Eram 15 horas e 30 minutos.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Coelho.

O Sr. Jorge Coelho (PS): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Formalmente, estamos a discutir o programa de um novo governo. Mas, na verdade, não é isto que se passa. Este Governo, que hoje estamos a ter capacidade de ver a apresentação do seu Programa, está em funções, na realidade, há 2 anos, 3 meses e 21 dias, e as horas e os minutos em aqui já se encontram hoje.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. José Magalhães (PS): - É uma verdade!

O Orador: - O que estamos a debater é o programa de um governo remodelado, com a substituição do Primeiro-Ministro e de outras figuras do executivo. Esta é, aliás, uma remodelação muito original: a base de apoio do Governo é a mesma, como também parte substancial do Programa do Governo; alguns ministros permanecem; o que muda, essencialmente, é o estilo. Foi isto que o Sr. Primeiro-Ministro prometeu aos portugueses.
No entanto, o que verificamos não é bem assim. Estão - e hoje já se viu - a tentar projectar um novo governo, como se o que foi feito no passado não tivesse paternidade. E, relativamente ao seu Programa, a razão de fundo da sua rápida apresentação é simples: o Programa é, mais coisa menos coisa, o mesmo; foi-lhe mudado o preâmbulo e os objectivos. O mesmo Programa, que, durante dois anos e meio, promoveu o desemprego e a recessão, agora, porque o preâmbulo mudou, promove o crescimento e a justiça social.

Aplausos do PS.

Será mágica?! Pura demagogia?! Ou atestado de menoridade aos portugueses?!
Nada do que foi prometido está a ser feito! A realidade é: mais de 450 000 desempregados; mais de 150 000 cidadãos em listas de espera; centenas de milhares de trabalhadores com salários congelados há mais de dois anos; impostos a subir; promessas não cumpridas quanto a pensionistas e reformados. Mas, em abono da verdade, impostos a subir, "não" para todos. A marca deste Governo está, aqui: em 2003, a generalidade dos portugueses pagou mais impostos; a banca foi o sector que teve mais lucros e pagou menos impostos.
Factos são factos e o resto é conversa! Esta é a marca do Governo da direita em Portugal.

Aplausos do PS.

Um dos casos mais gritantes é na área da saúde: prometeram acabar com as listas de espera e, em vez de uma, agora, temos duas; disseram que a primeira lista terminava em Março deste ano e já adiaram

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mais uma vez o prazo para o final do ano; há cada vez mais portugueses à espera de uma cirurgia; todas as semanas mais 6600 pessoas ficam a aguardar por cirurgia, e os últimos números apontam, como já disse, para cerca de 150 000 pessoas em lista de espera.
Este é um fracasso que não pode ser ocultado porque milhares de portugueses, além de terem sido enganados, estão a sofrer, todos os dias, devido à incompetência do Governo.

O Sr. António José Seguro (PS): - Muito bem!

O Orador: - O descontentamento não se cinge aos doentes; médicos, enfermeiros e gestores partilham esta descrença. É total e absoluta a desmotivação dos profissionais da área da saúde. E, sem estes homens e mulheres motivados, não há sistema que se aguente, nem há condições para melhorar a qualidade de vida dos portugueses na área da saúde.

O Sr. António José Seguro (PS): - Muito bem!

O Orador: - Quem paga são os doentes, e é contra isto que nos indignamos.
Até parece que o PSD e o PP não estiveram no Executivo anterior!
Mas, mais grave ainda, a liderança deste Executivo, como podemos ver - não podemos ver completamente porque faltam alguns -,…

Risos do PS.

… é constituída por pessoas que eram e continuam a ser dirigentes máximos dos partidos da coligação governamental. O PSD, o PP e os membros deste Governo têm de assumir a herança que deixaram. Andam agora, como se de mágica se tratasse, a prometer o paraíso quando são culpados do inferno que os portugueses viveram nestes últimos dois anos. Não foi apenas Durão Barroso que fez campanha eleitoral e que andou estes dois anos e meio a apoiar as políticas do anterior Executivo, foram também VV. Ex.as, em particular o Dr. Santana Lopes e o Dr. Paulo Portas, os responsáveis de tudo o que foi prometido e não cumprido nos últimos dois anos e meio.

Aplausos do PS.

Por isso, têm de responder pelo estado em que deixaram o País e a tragédia em que transformaram a vida da maioria dos portugueses.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Deputados: Nos principais hospitais portugueses há contestação, protestos e greves. Escolheram para a gestão de alguns hospitais pessoas que, nesta matéria, primam pela ignorância total da função que estão a exercer. Prometeram rigor na saúde, mas, segundo os dados divulgados na semana passada, as dívidas dos hospitais públicos aos laboratórios farmacêuticos bateu novo recorde e atingiu os 850 milhões de euros. Os tão famosos hospitais SA, cujas contas ninguém, até agora, percebeu mas que são apresentadas pelo Governo como um exemplo a seguir, já devem 200 milhões de euros. Assim se compreende porque, descobertos os buracos, as contas não batem certo. O próprio Observatório Português dos Sistemas de Saúde chamou recentemente a atenção para este problema ao denunciar que não foram traçadas as metas para os hospitais SA e que a avaliação feita no primeiro ano não foi independente.
Mas o problema não é apenas de contabilidade, a que tentaram reduzir a política de saúde em Portugal. O problema, tal como referiu o Prof. Manuel Antunes, e passo a citar, é que "apenas por motivos económicos, há hospitais SA a rejeitar doentes". É vergonhoso e revoltante num estado democrático, e nós não aceitamos isto!

Aplausos do PS.

O Governo a que V. Ex.ª preside, Sr. Primeiro-Ministro, está a destruir premeditadamente o Serviço Nacional de Saúde, com objectivos claros, para prejuízo evidente da maioria dos portugueses, nomeadamente dos mais desfavorecidos. Desde já lhe afirmo que, em nome do PS, de todo o PS, assumimos a responsabilidade de tudo fazer para impedir que aquela que consideramos uma das maiores conquistas do 25 de Abril seja destruída por uma política neoliberal e atentatória dos interesses da esmagadora maioria dos portugueses.

Aplausos do PS.

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Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Deputados: Mas, se a situação na saúde é altamente preocupante, o que se pode dizer das suas afirmações de que vai haver continuidade nas políticas, nos propósitos, nas decisões? Os portugueses só podem esperar, nos tempos que faltam para o fim da Legislatura, mais do mesmo. E isto é trágico e mau de mais para as famílias e para as empresas.
Há pouco mais de dois anos, antes de tomar posse, o antecessor de V. Ex.ª disse, e passo a citar: "é preciso uma nova energia, um novo começo, uma nova esperança para Portugal". É exactamente esta a mensagem que, hoje, estão a tentar transmitir. Por outras palavras, estão a passar um atestado de incompetência ao Executivo anterior - pelo menos, neste aspecto, juntam-se à voz da oposição e da maioria dos portugueses que, nas últimas eleições, passaram um "cartão amarelo" ao vosso governo, antes da remodelação. Têm toda a razão! Nestes dois anos, nada foi feito em prol de uma nova energia, de um novo começo, de uma nova esperança para Portugal.
Do PS os portugueses podem esperar, hoje como sempre, luta, trabalho, determinação para estarmos à altura das nossas responsabilidades e dar forma a uma alternativa credível que combata e derrote esta política neoliberal, que põe o País na situação em que, infelizmente, se encontra, e que promova uma sociedade mais justa, mais solidária, mais humana e mais moderna.

Aplausos do PS.

Este é o nosso desafio! Este é o nosso objectivo! Este é e vai ser o nosso combate!
Estou certo de que, para bem de Portugal, com os portugueses, vamos vencê-lo.

Aplausos do PS, de pé.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado, das Actividades Económicas e do Trabalho.

O Sr. Ministro de Estado, das Actividades Económicas e do Trabalho (Álvaro Barreto): - Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Permitam-me que, antes de apresentar o Programa do Governo para a área do meu Ministério, dirija a todos os Srs. Deputados uma saudação muito calorosa.
Durante os 22 anos de intervenção política que tive, passei 11 deles na bancada dos Deputados e outros 11 deste lado, na bancada do governo, e é com grande prazer que verifico que, para além dos debates e das trocas de opiniões que tivemos (muitas das vezes acesas), tenho um respeito enorme por todos os Srs. Deputados e considero muitos, independentemente das cores políticas e das posições que representaram, como verdadeiros amigos.
Portanto, muito calorosamente saúdo esta Assembleia, e, para mim, é um enorme prazer estar hoje aqui, uma vez mais, agora na bancada do Governo, a apresentar o Programa do Governo.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Quero, obviamente, começar também por agradecer as palavras simpáticas que o Sr. Deputado Narana Coissoró hoje me dirigiu, indevidamente, porque, na realidade, não as mereço, é somente a nossa grande amizade que justifica essa sua posição.
Ditas estas palavras, que, podem crer, são muito sinceras, passo à apresentação da política e das orientações que tencionamos imprimir no Ministério dos Assuntos Económicos e do Trabalho.
Tal como o Sr. Primeiro-Ministro esta manhã disse, o objectivo principal do Governo, e obviamente da política económica, é melhorar o nível de vida dos portugueses e conseguir, o mais rapidamente possível, aproximá-lo da média da União Europeia. É verdade que para isso é essencial que, do ponto vista económico, se tomem medidas no sentido de melhorar a produtividade e a competitividade da nossa economia.
Todos os indicadores existentes, quer a nível nacional, quer a nível internacional, mostram que a competitividade de Portugal desceu fortemente deste 1999 até ao presente ano; houve realmente um decréscimo da nossa competitividade e, sem recuperarmos esse atraso, não é possível, de maneira alguma, voltar a dar o incremento à economia portuguesa que permita criar condições mais adequadas e de nível a todos os portugueses.
São diversas as razões pelas quais a nossa economia, nos últimos anos, sofreu um decréscimo - e não vou falar do passado, não vou culpar ninguém, porque, a meu ver, o importante é olharmos para o futuro e vermos o que temos de fazer para alterar esta situação. São por demais conhecidos os diagnósticos

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sobre as razões que levaram a esta perda de competitividade, já estão feitos há muito tempo; todos nós temos estudos desses, quer de ordem interna quer de ordem internacional. São diversos factores e não é fácil, é muito complexo, alterar esta situação.
Há um problema de burocracia, que, na realidade, é algo que faz perder uma energia extraordinária a todos aqueles que vivem em Portugal, em especial aos agentes económicos. Cada vez mais é difícil conseguir rapidamente a resolução de problemas, que noutros países são solucionados com a maior facilidade.
Há um problema de educação e de formação profissional. Não é um problema de falta de verbas, porque as verbas que temos para a educação são, em termos de percentagem do PIB, comparadas com outros países, mais do que suficientes, mas, sim, de má utilização dessas verbas.
Há também um problema de formação profissional. A qualificação dos portugueses está, especialmente ao nível empresarial, nos quadros intermédios das empresas, abaixo da dos nossos principais concorrentes, pelo que é necessário alterar esta situação.
Há um problema de inovação e de investigação. O investimento em Portugal, independentemente do que foi assumido na Agenda de Lisboa, continua a ser muito baixo; há que dinamizar, há que aumentar. É na inovação e é na investigação que podemos encontrar o que é necessário às nossas empresas para poderem triunfar neste ambiente de globalização, que temos de aceitar como um dado do problema irreversível. Cada vez mais a nossa economia tem de funcionar em globalização.
Há um problema de estruturas deficientes; os nossos portos não funcionam bem, os caminhos-de-ferro não têm a eficiência que deveriam ter, o que também nos cria uma desvantagem comparativa relativamente a todos os nossos concorrentes.
Há um mau funcionamento da justiça. Quem não conhece os problemas que a justiça coloca ao mundo empresarial cada vez que há uma questão para resolver e o tempo que leva a ser resolvida - e sabemos que demoram anos?! Tudo isto cria um clima de insegurança a todos os empresários, o que, obviamente, afecta a vida empresarial e a confiança naquilo que é necessário para podermos ter uma economia competitiva e florescente.
Há um problema nos preços dos serviços que temos de fornecer aos empresários e às empresas (electricidade, gás, etc.), que são relativamente superiores aos dos nossos concorrentes. E estamos a falar de um mercado aberto, de um mercado globalizado, onde todos estes elementos são importantes.
Há ainda um problema de rigidez da legislação laboral. Não há dúvida alguma de que houve um enorme progresso (do qual falarei mais à frente) com o novo código laboral, mas, mesmo assim, se compararmos com os restantes países, tendo principalmente em conta o recente alargamento da União Europeia, verificamos que, independentemente do que foi conseguido com o notável trabalho da revisão do código laboral, ainda estamos longe de muitos regimes que existem noutros países. E estou a falar sem qualquer demagogia, estou a falar com sinceridade e sem qualquer outro intuito, pois todos os que me conhecem nesta Assembleia sabem que a última coisa que farei é apresentar os problemas sem ser com verdade e transparência.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Por outro lado, independentemente da delicadeza deste problema, temos, ou tínhamos, um regime fiscal não competitivo. E isto é importante na medida em que os novos países têm apresentado regimes extraordinariamente favoráveis, o que, do ponto de vista do investimento estrangeiro (sobre o qual falarei mais à frente), é extraordinariamente importante. Já se deram passos importantes - e alguns deles no seguimento, inclusive, de decisões de governos de outra cor política -, tal como, por exemplo, o de, neste momento, já nos encontrarmos numa situação em que a taxa de 40% do IRC passou para 25%. É um passo importante, mas temos de, no respeito integral da contenção do Orçamento do Estado, continuar, sempre que houver possibilidade, a caminhar no sentido de um sistema fiscal mais competitivo.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Dito isto, e, como já disse, isto é um diagnóstico generalizado - e penso que não há ninguém que, com seriedade, o possa contestar, embora eu pudesse dizer muito mais coisas, mas não me interessa fazer o diagnóstico -, quero apenas enunciar os objectivos do actual Governo.
Independentemente de o Programa do Governo, ora em discussão, ser, obviamente, a sequência do Programa do XV Governo, o do anterior governo - não só porque a equipa governamental concorda com essas orientações como eu também concordo, pois, como Deputado da bancada da maioria, aprovei-as, e, portanto, seria incoerente se hoje, aqui, viesse dizer que discordava das orientações dadas durante estes anos -, devo dizer, como síntese deste Programa, que o Governo tem, nesta área, cinco grandes

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linhas orientadoras da sua acção, sendo a principal a da criação de um ambiente favorável à actividade empresarial.
É fundamental, para que os nossos empresários funcionem e consigamos atrair investimento estrangeiro, criar, em Portugal, aquilo que a nível europeu se chama "o ambiente favorável à actividade empresarial".
Daremos também um grande apoio ao investimento privado de qualidade, aquele que privilegie os produtos transaccionáveis de valor acrescentado e de mais elevada tecnologia. Não podemos continuar a querer competir num mundo globalizado, quando se abrem as portas a países do Extremo Oriente, como a China, na base de uma indústria ou de uma economia que se baseia nos baixos salários das empresas.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Faremos uma aposta no reforço da qualificação dos portugueses, com grande ênfase na formação profissional, onde consideramos que há um grande esforço a fazer. Foi feito muito trabalho nos últimos dois anos, houve uma melhoria substancial do número de trabalhadores sujeitos a programas de qualificação profissional - só, em 2002, eram 300 000 trabalhadores e, em 2003, o número de trabalhadores subiu para 700 000.
Reforçaremos as funções do Estado na vertente reguladora e fiscalizadora, sendo esta, do nosso ponto de vista, a grande função do Estado. Na realidade, a grande função do Estado é garantir que, através de uma regulação correcta e de uma fiscalização rigorosa, os agentes económicos se desenvolverão sem causar prejuízos a outras empresas.
Finalmente, consideraremos a concertação social como um meio privilegiado para a implementação das políticas do Governo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Perguntar-me-ão os Srs. Deputados se isto é novo, eu direi que não. O governo anterior - de uma maneira diferente, talvez - lançou as bases da orientação, a qual representará uma nova política económica, e foi através do Programa para a Produtividade e Crescimento da Economia (PPCE), que foi apresentado para o período 2002/2006, que muitas destas orientações foram já introduzidas.

Vozes do PS: - Não se nota!

O Sr. José Magalhães (PS): - Só se nota a recessão!

O Orador: - Na linha dos cinco grandes objectivos salientarei algumas das medidas que o governo anterior introduziu e com as quais estamos totalmente de acordo.
Primeiro, a política de incentivos ao investimento de conteúdo tecnológico, através do programa PRIME, do Programa Dínamo, do PRASD, e o lançamento da medida Empresas de Capital de Risco para as pequenas e médias empresas, que consta do PPCE e é uma medida importante.
Segundo, o apoio ao investimento estrangeiro, através da Agência Portuguesa para o Investimento, na qual se delegou e centralizou toda a atracção de investimentos acima de determinado valor. É uma acção decisiva que tem tido resultados positivos - ainda ontem fui informado de que o investimento estrangeiro em Portugal cresceu, relativamente aos primeiros cinco meses do ano anterior, 22%, dos quais 80% a 90% correspondem a investimentos em empresas produtivas. Portanto, não são investimentos especulativos, nem investimentos que sejam possíveis de reverter.
Terceiro, o apoio à internacionalização da economia portuguesa, que tem sido centrado através do ICEP, e uma grande dinamização da diplomacia económica. Acreditamos, sinceramente, que é da conjugação dos diversos organismos do Estado, do ICEP e das nossas embaixadas, à semelhança daquilo que as embaixadas estrangeiras fazem em Portugal, que poderemos ajudar os empresários portugueses na sua internacionalização.
Quarto, o apoio à inovação e à investigação. Não será um "choque tecnológico", que alguém quer lançar, como li recentemente na imprensa, mas, sim, medidas concretas de apoio, porque, sem inovação, sem investigação, sem novas tecnologias não haverá empresas que produzam bens de maior conteúdo tecnológico.

O Sr. José Magalhães (PS): - É um facto!

O Orador: - No caso da concorrência e regulação, o governo anterior criou a Autoridade da

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Concorrência e a Entidade Reguladora do Sector Eléctrico. Trata-se de entidades independentes do Governo, que têm, à luz da nova lei da concorrência e das regras do mercado eléctrico, uma função reguladora do mercado, nomeadamente dos combustíveis, onde também há que ter uma posição bastante importante.
No que diz respeito à política energética, temos de caminhar no sentido de garantir aos empresários portugueses condições de fornecimento de energia eléctrica competitivas. E, hoje, sabemos que os nossos empresários pagam a energia eléctrica, que muitas vezes é um factor importante nos custos de produção, a valores sensivelmente superiores aos que são pagos pela nossa concorrência. Daí darmos prioridade absoluta à liberalização do mercado, onde joga um papel muito importante a criação do Mercado Ibérico.
O Mercado Ibérico, lançado também pelo anterior governo, tem encontrado algumas dificuldades, que resultam em parte da mudança de governo que se verificou no país vizinho e também de algumas burocracias que temos encontrado em Bruxelas na resolução de problemas absolutamente essenciais para a liberalização do mercado, como é o caso da renegociação dos Contratos de Aquisição de Energia Eléctrica (CAE) ou dos Custos de Manutenção do Equilíbrio Contratual (CMEC), que são contratos de energia a longo prazo.
Já referi a questão da burocracia, que é, digamos, algo que temos de ultrapassar. E, neste sentido, o governo anterior também fez a reestruturação de um ministério, que, de acordo com a análise que fizemos nestes escassos oito dias de governação, merece a nossa concordância. Trata-se de uma estrutura com funções bem definidas, que permite ter uma actuação mais leve, o que terá certamente um efeito muito positivo no apoio aos empresários.
Oportunamente, em sede da Comissão de Economia e Finanças, terei o maior prazer em debater, com mais detalhe e pormenor, a criação de novas empresas e todos esses problemas.
Quanto à revisão da legislação laboral, foi adoptado um código, o Código do Trabalho, havendo grandes discordâncias sobre se ele é ou não aquilo de que o País precisa. Mas este foi o Código que foi negociado no âmbito da concertação social. No entanto, eu sei que há muitas pessoas que entendem - e isto ainda foi dito na semana passada num seminário - que não fomos tão longe quanto era necessário ir e que há muitas outras que entendem que fomos longe demais e que criámos um sentido precário ao emprego.
O Código do Trabalho está aprovado e a regulamentação foi recentemente não só aprovada como, inclusive, ratificada pelo Sr. Presidente da República. E a nossa posição é a de, não estando fechados a novas alterações, não introduzirmos grandes mudanças no Código. Temos bastante tempo para ver o resultado da sua aplicação. O próprio código laboral prevê a sua revisão em 2007. Vamos prosseguir; receberemos as críticas, quer dos sindicatos, quer das confederações patronais, e não deixaremos de introduzir aquilo que for necessário, mas não vamos fazer uma revisão profunda.
Ainda nesta área, não deixaremos de fazer a regulamentação no campo dos acidentes de trabalho, doenças profissionais e reabilitação profissional, como também implementaremos o Código de Processo do Trabalho.
No que diz respeito ao apoio à formação profissional, matéria que considero muito importante, criaremos o sistema nacional de formação profissional, faremos a revisão do sistema nacional de certificação e do sistema jurídico da formação e cooperação e travaremos uma luta em relação àquilo que consideramos importante, que é a luta contra o desemprego.
Não me guio pelas estatísticas - muita gente compara favoravelmente os 6,4% de nível de desemprego em Portugal com a média europeia. Não me satisfaço com esta situação. Sei o que é o drama do desemprego, sei o que um desempregado sofre, e, portanto, não deixarei de apoiar tudo o que seja essencial para lutar contra o desemprego.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Em nossa opinião, a luta contra o desemprego passa (e já sei que os partidos da oposição dirão que é uma visão liberal a minha maneira de pensar) pela criação de novos investimentos, de novos postos de trabalho e de empregos estáveis. No entanto, também não deixaremos de olhar para outras formas de combater o desemprego, estaremos na primeira fila dessa luta, porque é algo que considero um drama. Portanto, contem com o Governo para tal.
Quanto às privatizações, é sabida a nossa opinião, de que o Estado, como já disse, deve concentrar-se na sua função reguladora e fiscalizadora. O Estado não é um bom accionista. O Estado não é um bom gestor. E, portanto, apesar de todos os cuidados que vamos ter na defesa dos interesses nacionais, não deixaremos de continuar uma política de privatização.
Temos o problema da privatização da EDP, da GALP, temos a última fase da privatização da Portucel, temos o problema da privatização da REN, hoje falou-se também da Companhia das Lezírias, mas tudo faremos na defesa dos interesses nacionais, sem nunca ceder a quaisquer pressões ou lobbies de

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outras forças.
Finalmente, ainda no âmbito da concertação social, continuaremos a trabalhar para, o mais rapidamente possível, assinarmos o Contrato Social para a Competitividade e Emprego. Foi apresentado aos parceiros sociais o estudo Portugal 2010, que foi bem aceite por todos.
Penso que esta luta para criar melhores condições a todos os portugueses é uma luta de todos nós - e quando digo "de todos nós" refiro-me não só aos parceiros sociais como a todos os empresários portugueses e também à Assembleia da República.
É evidente que a evolução da economia portuguesa, como economia fechada e pequena, depende muito daquilo da evolução da economia mundial, mas há sinais de que, quer os Estados Unidos da América, quer o Japão, quer a própria União Europeia, esta a um ritmo mais baixo, iniciaram uma retoma. E, neste momento, nós também temos sinais muito positivos de que o relançamento da economia portuguesa já se iniciou. É o próprio Governador do Banco de Portugal e todos os estudos apresentados que o dizem - ainda hoje foi comunicado que, pela primeira vez, no último trimestre, houve um aumento de 0,33% na produtividade das empresas da economia portuguesa, e sei que está projectado para este ano um crescimento de 1,25%.
Temos de encarar o relançamento da economia com prudência, não podemos estar com euforias. Mas penso que, com a reestruturação que já foi feita, com as mudanças que vão ser introduzidas e, acima de tudo, com uma aplicação mais eficiente de muitos dos incentivos que já existem, a economia portuguesa tem condições para se relançar mais rapidamente. Temos a certeza de que dentro de dois anos a economia portuguesa e os portugueses estarão em melhores condições do que estão hoje. Para isso conto com todos!
Quero dirigir uma palavra de confiança aos portugueses e aos empresários portugueses: com a ajuda da Assembleia da República - mais que não seja através das suas críticas, porque dou muito valor às críticas e às divergências que existem em relação à nossa orientação -, dos parceiros sociais e, acima de tudo, de todos os portugueses estou certo de que dentro de dois anos a nossa economia e o nível de vida dos portugueses serão melhores do que aquele que existiu durante os últimos anos.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, dispondo de 3 minutos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr. Presidente, o Sr. Ministro de Estado, das Actividades Económicas e do Trabalho, antecipando as críticas, defendeu-se logo dizendo que, provavelmente, acharíamos a posição do Governo, designadamente na sua área, como que possuída por uma visão liberal. E fez bem em assumir, desde logo, que é uma óptica liberal que enforma o Programa do Governo, designadamente nesta área.
De concreto, o que nos disse o Sr. Ministro das Actividades Económicas e do Trabalho? Que continua a onda das privatizações e que o trabalho, agora desvalorizado nesta ligação às actividades económicas, à economia, continuará a ser precarizado.
Apesar de só em sétimo lugar o Sr. Ministro se referir àquilo a que chama um excesso de rigidez da legislação laboral, das regras laborais, não deixou de acentuar desenvolvidamente que, embora, podendo respeitar o horizonte da revisão do Código do Trabalho, não se coibiria de introduzir alterações que viessem no sentido de uma maior precarização da força de trabalho em Portugal.
Isto não são boas notícias tanto mais quando se sabe que a integração da área do trabalho no Ministério das Actividades Económicas, na economia, redunda na desvalorização do trabalho na sociedade portuguesa. Aliás, no seu discurso, referiu-se, prolixamente, às condições que os investidores, que as empresas, devem ter para o desenvolvimento económico, e reparo que não tem propostas nem medidas concretas na área do trabalho.
Disse-nos que vai haver alguma coisa sobre a formação profissional e sobre os regimes de acidentes de trabalho e doenças profissionais, que, há muito, deveriam estar regulamentados, mas não nos falou aqui dos direitos do trabalho, de como monitorizar a contratação colectiva, de como obviar a problemas gravíssimos da falta da actividade inspectiva do Estado, no cumprimento da legislação do trabalho, e de como valorizar o trabalho na sociedade portuguesa.
Trata-se, assim, Sr. Ministro, Eng.º Álvaro Barreto, de uma visão liberal, a que nos opomos. Porquê? porque ela traz-nos uma maior precarização do trabalho e um maior dualismo social por efeito das privatizações.
Sr. Ministro das Actividades Económicas e do Trabalho, o que temos pela frente é um conjunto de condições da parte do Governo para a retoma do investimento privado, e, no entanto, não ouvimos uma

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palavra sobre aquilo que possa ser o investimento público.
Diz-nos o Sr. Ministro, também dentro dessa visão liberal, que ao Estado, cada vez mais, só compete uma função reguladora, uma função fiscalizadora e não concebe, ao menos, um reforço do investimento público para obviar ao drama do desemprego, que diz conhecer, mas do qual nos deixou apenas aqui uma imagem pictórica, que nada tem a ver com o drama da sociedade, com os 450 000 desempregados que hoje existem e que estão à espera da retoma, como quem espera por Godot. Não há, nem nos trouxe aqui, medidas concretas.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se. Queira concluir.

O Orador: - Havia uns programas, que caíram quase no esquecimento, sobre apoios em zonas deprimidas, em sectores deprimidos. Quais são as medidas deste Governo? Afinal é a continuidade do último: o esquecimento, sempre o esquecimento.
É, realmente, como diz, uma visão liberal da economia, do trabalho e da política económica.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado, das Actividades Económicas e do Trabalho.

O Sr. Ministro de Estado, das Actividades Económicas e do Trabalho: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Fazenda, fico bastante sossegado por V. Ex.ª discordar da minha intervenção. Ficaria preocupadíssimo se aquilo que eu disse merecesse a sua concordância.

O Sr. Miguel Paiva (CDS-PP): - Exactamente!

O Orador: - Discuto, não por uma questão pessoal mas por uma questão de concepção, a nossa visão do mundo empresarial.
Eu diria que a melhor luta contra o desemprego é quando diz que privilegio o investimento nas empresas, pois, quando o faço, olho para a empresa como um todo. A empresa - e, graças a Deus, tenho grande experiência empresarial - não é só o investidor, não é só o accionista. Para mim, tão ou mais importante do que o accionista são as pessoas que lá trabalham. E, portanto, quando o Governo dá incentivos ao investimento privado, está a fazê-lo para criar empregos de melhor qualidade, para garantir os postos de trabalho e para, na realidade, favorecer os trabalhadores.
Quando diz que o ministério do trabalho ficou desvalorizado, não é verdade! O Sr. Primeiro-Ministro já hoje disse que, ao introduzi-lo nas Actividades Económicas, pretendeu que, na visão do desenvolvimento da economia, se levem em linha de conta os problemas dos trabalhadores. E, se falar com as empresas onde trabalhei, com muitos trabalhadores, como a Lisnave, a Setenave e muitas outras, verá que foi sempre esta a nossa concepção, a de que, juntamente com os interesses dos accionistas, há que ter em linha de conta os interesses dos trabalhadores.
No que se refere à luta contra o desemprego, devo dizer que os desempregados são 444 684, de acordo com a última estatística.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Fora os outros!

O Orador: - São 20 000 a menos do que eram no ano passado, e, portanto, o desemprego reduziu. Este é também um indicador no sentido de uma inversão. Olho para este indicador com as maiores cautelas, porque não vou "lançar foguetes" antes de tempo, no entanto as indicações que temos em relação à evolução do Produto, à evolução da confiança, à evolução do investimento estrangeiro e à redução ou à atenuação do desemprego são sintomas que vejo de uma maneira positiva.
O investimento público é muito importante e tem de fazer face a muitas necessidades da sociedade portuguesa, mas, ao nível das empresas, pela minha experiência - como sabe, e ao contrário do que muitos dizem, passei os últimos 20 anos como representante do Estado numa empresa portuguesa -, o que interessa é a visão do investidor privado de procura da melhor eficiência, porque esta é a melhor maneira de garantirmos uma economia saudável e uma economia competitiva.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

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O Sr. Honório Novo (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado, das Actividades Económicas e do Trabalho, certamente que V. Ex.ª não é obrigado a conhecer as afirmações públicas do Sr. Primeiro-Ministro, por isso vou recordar duas.
Quanto à necessidade que o Estado tem de manter o controle sobre alguns sectores da economia, o Sr. Primeiro-Ministro respondeu: "Sim. Concordo que sim".
Também numa carta dirigida ao antigo Primeiro-Ministro António Guterres, o Sr. Primeiro-Ministro dizia, em desabafo, que cada mais as nossas empresas e as nossas riquezas vão parar às mãos de outros estrangeiros europeus.
Ora, Sr. Ministro Álvaro Barreto, é sabido que o Programa do Governo - basta lê-lo - está cheio de privatizações, é uma onda de privatizações de uma ponta a outra. Não acredito que o Ministro de Estado, que é, simultaneamente, o n.º 2 do Governo, esteja em desacordo em matéria tão grave com aquela que é a opinião do Sr. Primeiro-Ministro.
Sendo assim, esclareça-nos, hoje e agora, quais são os sectores do Estado que devem permanecer no Estado. É a GALP? É a Portucel? É a Companhia das Lezírias? É a TAP? É a REN? É o sector das águas, impedindo que a Vivendi ou a Lyonnaise des Eaux se apropriem dele? Quais são, afinal, os sectores, Sr. Ministro Álvaro Barreto?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Boa pergunta!

O Orador: - É fundamental saber, para ver se o Sr. Primeiro-Ministro é, pelo menos, ouvido pelos seus próprios Ministros!
Segunda questão: vou dar-lhe dois exemplos de duas multinacionais que encerraram portas e que despediram, no seu conjunto, cerca de 700 trabalhadores. O Ministério da Economia, em respostas que aqui tenho, disse-me, tanto num caso como noutro, que havia apoios públicos e comunitários a essas multinacionais. Elas fecharam, despediram trabalhadores e deslocalizaram-se, Sr. Ministro, e vão continuar a receber apoios comunitários noutras paragens. Pergunto-lhe, Sr. Ministro: é com este investimento estrangeiro que o Governo conta para reanimar a economia?! É com este investimento estrangeiro saltimbanco que o Governo conta?!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - É com este investimento que continua a fazer o que quer em Portugal, agindo tranquilamente fora da lei, na total passividade do ministério do trabalho e do ministério da economia, que o Governo conta para reanimar a economia?!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - É com esta legislação laboral, que, pelos vistos, tudo permite, que o Governo conta para criar uma economia moderna e competitiva?!
Sr. Ministro Álvaro Barreto, uma última questão: o Governo anuncia, logo à cabeça do seu programa económico, que o aumento do poder de compra dos portugueses é objectivo central na área económica. É fundamental clarificar esta afirmação, Sr. Ministro. Vai ou não haver aumento de salários acima da inflação? Os funcionários públicos vão ou não recuperar o poder de compra perdido durante dois anos por congelamento de salários?

O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Os aumentos de salários são para valer ou serão apenas uma pequena possibilidade? Serão maiores do que a inflação ou menores do que ela? Ou dependerão de uma qualquer folga orçamental?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se. Tenha a bondade de concluir.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
Para o Governo o que são, afinal, os aumentos salariais? São uma folga ou uma opção necessária para milhares de portugueses que não vêem o seu poder de compra aumentado nos últimos anos?

Aplausos do PCP.

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O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado, das Actividades Económicas e do Trabalho.

O Sr. Ministro de Estado, das Actividades Económicas e do Trabalho: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Honório Novo, agradeço-lhe a sua pergunta e quero referir-lhe…

O Sr. Honório Novo (PCP): - São três temas!

O Orador: - Sim, são três temas. Tentarei responder a todas as suas perguntas.
Como eu estava a dizer, quero referir-lhe que existe a onda de privatizações que já referi, mas isto não significa que, naquelas que são consideradas empresas estratégicas nacionais, e embora se faça a privatização, o Governo não mantenha uma posição, através de acordos parassociais, que lhe garanta que terá uma palavra a dizer nos programas de expansão ou nos programas estratégicos dessas empresas. A nossa orientação é a de que a gestão do dia-a-dia das empresas seja controlada pelos privados.
O Sr. Deputado Honório Novo sabe a consideração pessoal que tenho por si e ouvi-o com toda a atenção. A única coisa que lhe digo é que não deixaremos em circunstância alguma de defender aquilo que consideramos empresas importantes para a economia portuguesa. Mas há várias maneiras de as defender, não é só através da maioria do capital social -essa é uma visão ultrapassada, há hoje processos, através de acordos parassociais, que garantem uma acção fiscalizadora e de influência nas decisões principais. Será esta a nossa orientação.
Não iremos fazer as privatizações, pode crer, Sr. Deputado, sem que sejam defendidos os interesses de todos os portugueses, através de métodos que hoje existem, que não o simples método de uma maioria do capital ou de ser uma empresa estatal.
Portanto, pode crer que na nossa orientação vamos prosseguir com as privatizações, mas não deixaremos de defender os interesses dos portugueses.
Relativamente ao apoio às multinacionais - e eu, no passado, já tive um problema desses, pois, em 24 de Maio de 1980, assinei um contrato com vários benefícios com a Renault e, mais tarde, vi-a deslocar a sua produção para outros locais - nós, no Governo, não deixaremos de olhar com atenção para todos estes casos de empresas que receberam fortes contribuições do Estado e tentaremos accioná-las, dentro das regras internacionais, porque temos de respeitar aquilo que são as regras de jogo internacionais, sempre que elas se possam afastar, fechando as portas e lançando no desemprego muitos trabalhadores. Não as deixaremos fazer isso, mas vamos fazê-lo dentro das regras do funcionamento do mercado e daquilo que são as regras empresariais comuns a toda a Comunidade.

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, o seu tempo esgotou-se.

O Orador: - Sr. Presidente, estou a terminar. Tenho pena de não poder ter mais tempo, mas teremos muitas outras oportunidades de esclarecer estas questões, o que normalmente é feito a nível de comissão.
Quanto ao aumento do poder de compra, não temos a mínima dúvida, e até temos a certeza, de que a intenção de qualquer governo é não prejudicar os trabalhadores, principalmente os trabalhadores da função pública…

O Sr. Jorge Nuno Sá (PSD): - Muito bem!

O Orador: - … e, portanto, não deixaremos de trabalhar para poder fazer - e isso já foi prometido pelo governo anterior, e nós estamos na mesma linha - aumentos salariais para o ano de 2005, mas nunca poremos em causa o equilíbrio orçamental e os compromissos internacionais que assumimos. E, acima de tudo, durante os anos que vou passar nesta pasta, não posso e não tenho o direito de pôr em causa a competitividade da economia portuguesa.
Portanto, o equilíbrio entre a justeza dos aumentos salariais e a não perda de competitividade será uma preocupação nossa.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Maximiano Martins.

O Sr. Maximiano Martins (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado, das Actividades Económicas e do Trabalho, neste debate não está em causa a consideração pessoal que lhe é devida, que é um

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pressuposto do nosso debate; o que está em causa aqui é o julgamento político da política económica presente, passada e futura deste Governo. Estaremos atentos a todas estas componentes da vossa acção.
A sua intervenção, Sr. Ministro, apresenta um diagnóstico da situação - e teremos, certamente, oportunidade de, em Comissão de Economia e Finanças, ir ao fundo de muitas das questões, uma vez que agora não temos tempo de o fazer - que constitui em si mesmo uma avaliação arrasadora - involuntária, imagino eu - da política económica do Governo.
O Sr. Ministro trouxe aqui nota da perda de competitividade na economia portuguesa, da falta de ganhos de produtividade, das quebras do investimento, da falta de capacidade de atracção do investimento estrangeiro…

O Sr. José Magalhães (PS): - Exacto!

O Orador: - … e do falhanço nas metas de exportação.
Não falou, mas poderia ter falado, do falhanço nas metas do turismo e de um sistema fiscal não atractivo para o investimento. Então, o que é que andaram a fazer?!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Essa é a questão que se põe e que nós continuaremos a pôr.
De resto, o Programa do Governo, curiosamente, continua a falar do PPCE. Ora o PPCE deveria estar substancialmente, para não dizer a 100%, realizado neste momento. O Sr. Ministro terá o fardo de continuar com o trabalho do ex-Ministro Carlos Tavares, que prometeu muito, mas nada fez!!
A primeira questão que lhe deixo é saber da sua disponibilidade para trazer à Assembleia da República a avaliação do PPCE. Os senhores propuseram-se fazer regularmente a avaliação do Programa para a Produtividade e o Crescimento Económico, mas deixaram de fazê-lo.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Espero que o Sr. Ministro traga a esta Casa a avaliação que faz da aplicação daquele Programa.
A segunda questão tem a ver com a inovação e com a ciência e tecnologia, de que o Sr. Ministro falou no seu discurso. Onde é que estão as referências ao Programa ao PRASD ou ao Programa Dínamo. Propuseram-se fazer coisas, mas neste momento o Programa do Governo é omisso relativamente a essas matérias.
O que se passa com as infra-estruturas tecnológicas e com os centros tecnológicos? O Ministério da Economia deixou de ter centros tecnológicos?! Deixaram de existir no seu programa e na sua estratégia?! Qual é a sua ideia? Esta questão, evidentemente, tem de ser colocada. E o Instituto Geológico Mineiro? O Sr. Ministro está na disposição de rever a decisão inqualificável de dar cabo de uma entidade centenária e do maior interesse para o País?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Essa é boa!…

O Orador: - Finalmente, Sr. Ministro, quanto à internacionalização, sabe qual é a posição dos empresários deste País relativamente à diplomacia económica? Não funciona! E, entretanto, o ICEP foi desactivado, como instrumento de actuação do Governo. O Sr. Ministro está na disponibilidade de recuar nessa estratégia avançada de desactivação do Ministério e, em particular, do ICEP?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado, das Actividades Económicas e do Trabalho.

O Sr. Ministro de Estado, das Actividades Económicas e do Trabalho: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Maximiano Martins, antes de mais, agradeço as suas perguntas.
Gostaria de dizer que, tanto quanto era minha intenção, e talvez não me tenha expressado bem, não tinha qualquer intuito nem é o meu pensamento arrasar a política do governo anterior. Pelo contrário,…

O Sr. Maximiano Martins (PS): - Mas arrasou!

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O Orador: - … comecei por dizer que concordava integralmente com o PPCE, com as medidas que foram tomadas, com o PRIME, com o Dínamo, com o IDEIA, com o NEST, com tudo aquilo que foi implementado e que, na realidade, iríamos prosseguir exactamente essa política.
Reconheci também, embora não tão claramente, que talvez a eficácia da aplicação dessas medidas não tenha sido a desejável, não só porque a estruturação do ministério era recente como os mecanismos introduzidos eram novos. A própria aplicação do PRIME, depois da transição do POE para o PRIME, é capaz de não ter sido feita eficientemente.
Assim, o meu compromisso com esta Assembleia e com os portugueses é o de, utilizando as políticas, os instrumentos e os programas do governo anterior, promover a sua aplicação de uma forma mais eficiente.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Sobre o PPCE, é evidente que o Ministro Carlos Tavares prometeu o envio regular dos seus resultados e, pela nossa parte, iremos tentar manter a informação desta Assembleia, através da Comissão de Economia e Finanças.

O Sr. Maximiano Martins (PS): - Manter não chega!

O Orador: - Em relação à perda de competitividade, Sr. Deputado Maximiano Martins, não gosto - e os Srs. Deputados conhecem-me muito bem - de acusar o passado por aquilo que acontece no futuro mas a perda de competitividade começou em 1999. Se ler hoje os indicadores que foram feitos, a maior queda situa-se entre 1999 e 2001 e, pela primeira vez, no último trimestre, embora eu continue a olhar para isto com muitas cautelas, deu-se uma inversão que representa mais um sinal positivo. Portanto, a queda já se iniciou há muito e não foi o anterior Governo que teve essa responsabilidade, pelo contrário, as medidas introduzidas pelo anterior governo foram no sentido de lutar contra a perda de competitividade. E, pela minha parte, estou 100% de acordo com a política do anterior governo, pelo que se olhar para o Programa do Governo verá que não é mais do que uma continuidade do passado.
Em relação à inovação e tecnologia, referi que temos como orientação dinamizar a inovação e tecnologia, porque, na nossa concepção, é através da inovação e tecnologia que se progride. Daremos, pois, apoio à COTEC, mas é uma política que depende também do Ministério da Ciência e, por isso, iremos desenvolvê-la e aplicá-la em conjunto, porque esta equipa ministerial irá trabalhar em equipa. E estou certo de que se irá registar uma evolução essencial e muito mais positiva do que aquela que se verificou nos últimos dois anos.
Portanto, o que disse foi que estou de acordo com a concepção dos programas, entendo é que não foram aplicados de forma tão eficiente como poderiam ter sido e, nessa medida, o resultado não terá sido o possível. Mas é natural que assim fosse, porque a estruturação era nova, os programas eram novos e tudo isto tem efeito a médio prazo. Estou, pois, convencido de que, muito brevemente, como já agora se começou a verificar, no aproveitamento da retoma internacional, a economia portuguesa vai beneficiar dessa actuação.

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, esgotou-se o tempo de que dispunha.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Em relação ao INETI, não tenho intenção de alterar a estrutura que está implantada no Ministério das Actividades Económicas e do Trabalho. Temos pouco tempo à nossa frente, temos de aproveitar as estruturas que existem e, portanto, não vou perder tempo com alterações de estruturas.

O Sr. José Magalhães (PS): - Isso é um bom conselho para alguns dos seus colegas!

O Orador: - As estruturas, como sucede nas empresas, funcionam sempre bem, de acordo com os diversos organigramas. Tenho 35 anos de experiência empresarial, tenho funcionado com estruturas diferentes, o que interessa é fazê-las funcionar como estão…

O Sr. José Magalhães (PS): - Diga isso ao Primeiro-Ministro!

O Orador: - … e é isso que a actual equipa do Ministério das Actividades Económicas e do Trabalho, onde conto com três colaboradores de excepcional qualidade - que, além disso, têm a vantagem de baixar a média etária do meu Ministério para 48 anos,…

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Risos do PSD, do PS e do CDS-PP.

… o que é uma vantagem muito importante -, irá fazer. Vamos trabalhar activamente nesse sentido, não vamos introduzir perturbações, nesta fase, com a mudança de estruturas.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Maximiano Martins (PS): - Sensato!

O Sr. José Magalhães (PS): - O Sr. Ministro das Finanças agradece!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, antes de prosseguirmos, previno que o Sr. Ministro, por uma questão de gestão do tempo do Governo, responderá aos dois oradores seguintes em conjunto.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Paiva.

O Sr. Miguel Paiva (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado, das Actividades Económicas e do Trabalho, permita-me que comece por dar-lhe conta do enorme gosto que é vê-lo aqui, nestas funções, e que saúde, sobretudo, o rigor, a seriedade e a grande humildade democrática com que aqui nos aparece, que são, de resto, características da sua personalidade, aliadas, neste caso, a uma visão global, abrangente e pragmática, o que, desde já, augura uma acção de acrescida eficácia e de resultados efectivos. Isto é tanto mais importante quanto este debate surge num momento que representa, efectivamente, a entrada num novo ciclo, porque, para todos os efeitos, este é um novo Governo, porque esta é uma segunda fase de um percurso que, desde início, foi assim programado e claramente assumido, porque discutimos agora um Programa do Governo que assenta, obviamente, no anterior mas actualiza-o, desenvolve-o e dá-lhe, permita-me que o diga, mais ambição - e, se dúvidas houvesse, as palavras do Sr. Primeiro-Ministro, no período da manhã, foram claras quanto a este aspecto -, porque o contexto económico é outro, é diferente e é melhor. E V. Ex.ª, na intervenção que fez, também nos deu conta disto, ou seja, as exportações estão a aumentar, as empresas estão mais fortes, o desequilíbrio externo diminui, a confiança das famílias, das empresas e do País, em geral, cresce.

O Sr. Maximiano Martins (PS): - Isso é um país imaginário!

O Orador: - Os indicadores da retoma, todos os indicadores - disse V. Ex.ª -, são evidentes e a todos os níveis e são, pois, coerentes. A título ilustrativo refira-se que, por exemplo, o número de desempregados inscritos nos centros de emprego, em Abril, desceu 1,9% relativamente ao mês anterior, isto é, a Março. Também o grande dinamismo na criação de empresas, o aumento da produtividade em geral e muitos outros aspectos são indicadores dessa mesma situação.
É, pois, a prossecução desta estratégia que importa assegurar, com medidas como a da redução do tempo médio de criação de empresas, no Centro de Formalidades de Empresas, que passou de 30 dias, em 2001, para 15 dias, em Maio de 2004,…

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - … e também do regime do licenciamento industrial, que, em termos de celeridade, tem assinaláveis progressos.
A pergunta que faço a V. Ex.ª, Sr. Ministro, no fundo, é um desenvolvimento daquilo que disse: como perspectiva V. Ex.ª o reforço de uma política económica que se quer agora ainda mais virada para as empresas? E porquê? Porque são as empresas que, de facto, de forma mais célere e com melhores resultados, podem gerar desenvolvimento, podem criar riqueza e dar melhores condições de vida às famílias, que é, esse, sim, o grande objectivo, a grande prioridade do Governo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - De facto, este é o meio que melhor e mais rapidamente permite aumentar a qualidade de vida dos nossos concidadãos, objectivo que, registo com particular agrado, V. Ex.ª fez questão de sublinhar dessa tribuna e do qual, com certeza, todos comungaremos.
Tudo isto inserido num contexto mais amplo e coerente, obviamente, de reforma da Administração Pública que conduza à justiça social, porque, efectivamente, só assim se conseguirá ter sucesso nesta

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política, como desejamos e acreditamos que todos os portugueses também desejam.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Ministro de Estado, das Actividades Económicas e do Trabalho: - Sr. Presidente, se me permite…

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Ministro, mas havia comunicado à Mesa que responderia, conjuntamente, ao Sr. Deputado Miguel Paiva e à Sr.ª Deputada Isabel Castro.

O Sr. Ministro de Estado, das Actividades Económicas e do Trabalho: - Sim, sim, Sr. Presidente, mas quero apenas pedir desculpa ao Sr. Deputado Miguel Paiva e à Sr.ª Deputada Isabel Castro pelo facto de lhes responder, em conjunto, apenas por questões de tempo, e só por isso, e não por menor consideração por ambos.

O Sr. Presidente: - Julgo que já havia dito isso, Sr. Ministro.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado, das Actividades Económicas e do Trabalho, registo, na sua intervenção, a tentativa de deixar uma imagem positiva e de esperança para os empresários mas penso que concordará - e a sua experiência profissional deveria aconselhá-lo - que o sucesso da sua pasta implica o envolvimento dos próprios trabalhadores. As empresas bem sucedidas são empresas que apostaram na formação, que apostaram na qualificação, que envolveram os cidadãos, que os fizeram participar e que pagam aos seus trabalhadores de forma digna.
Por isso, Sr. Ministro, em face dos aspectos genéricos deste Programa, demasiado genéricos, para o nosso gosto, gostaria que concretizasse, porque tem, com certeza, a experiência de trabalhar por objectivos e rotinas de avaliação, o que é que vai fazer, como e quando, em termos de formação e qualificação, sendo certo que, nestes anos, houve desinvestimento nessas áreas, o que é grave.
Há ainda uma outra questão sobre a qual gostaria que se pronunciasse, que tem a ver com energia. Os custos de energia são importantes, ao nível dos custos de produção, e o Governo, nestes dois anos, desperdiçou a alteração de processos produtivos, a modernização, a introdução da ecoeficiência nas empresas. Isto é grave, isto paga-se do ponto de vista ambiental, mas, na nossa opinião, paga-se também em termos sociais e económicos. Por isso, sobre esta questão em concreto, gostaria que precisasse que tipo de objectivos, que tipo de compromissos vão ser assumidos. É que, naturalmente, o Plano Nacional para as Alterações Climáticas é um rol muito interessante de intenções mas não é um plano de trabalho, não é um plano de acção e é disto que estamos, há demasiado tempo, à espera.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado, das Actividades Económicas e do Trabalho.

O Sr. Ministro de Estado, das Actividades Económicas e do Trabalho: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Paiva, em primeiro lugar, agradeço as palavras que me dirigiu e a pergunta que me fez, que, no fundo, é no sentido de eu concretizar e ampliar aquilo que disse sobre a perspectiva da política económica.
Como disse, o nosso grande objectivo é o de contribuir para a melhoria do nível de vida de todos os portugueses. Iremos trabalhar nesse sentido, aplicaremos, como também já disse, as políticas que foram definidas e enquadradas pelo Governo anterior e iremos tentar fazê-lo de uma forma mais eficaz e eficiente mas com o objectivo de, na realidade, podermos vir a ter uma economia muito mais saudável dentro de dois anos, através do investimento privado, através do investimento nas áreas das novas tecnologias, de maior valor acrescentado e com a atracção do investimento estrangeiro.
Há, neste momento, perspectivas muito positivas; todos os indicadores que recebi, na última semana, são, todos eles, no mesmo sentido, isto é, são, todos eles, positivos. Não gosto, como já disse, de um debate de grandes euforias, mas temos todas as indicações de que a perspectiva económica do nosso País vai evoluir positivamente, aliás, de acordo com aquilo que o próprio Governador do Banco de Portugal já afirmou, e no sentido de atingirmos o nosso objectivo da melhoria do nível de vida dos portugueses.
Sr.ª Deputada Isabel Castro, V. Ex.ª disse que eu tentei dar uma imagem positiva. Sr.ª Deputada,

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não tento dar imagens positivas nem negativas; tento dar a imagem da verdade e daquilo que, sinceramente, eu e o Governo pensamos. E se olhar, embora não tenha a obrigação de o fazer, para a minha maneira de trabalhar e para as empresas… Há aqui, em todas as bancadas, muitas pessoas - alguns trabalharam comigo, no passado, como a Deputada Elisa Damião, o Deputado José Manuel Maia, do Partido Comunista… - que sabem perfeitamente que, na minha opinião, para que haja sucesso em qualquer política, tem de haver um envolvimento dos trabalhadores, não podemos desenvolver políticas contra os trabalhadores.
As políticas que tencionamos levar a cabo não são contra os trabalhadores, são a favor dos trabalhadores: mais formação profissional, mais investimento, criação de melhores empregos, criação de um clima favorável à evolução da economia. Tudo isto é a favor dos trabalhadores e nunca deixaremos de olhar para estes objectivos.
Relativamente à ecoeficiência, diria o seguinte: é evidente que, na apresentação do Programa do Governo, não podemos ser exaustivos sobre tudo mas a nossa orientação, e não disse isso na apresentação que fiz, é a de um apoio claro às empresas de energias renováveis.
Na realidade, pensamos que a origem da energia, hoje, no mundo ocidental, é excessivamente dependente do factor petróleo, que, estrategicamente, é algo muito aleatório, razão pela qual temos de diversificar. Portanto, iremos apoiar as energias renováveis, dentro de uma concepção de desenvolvimento sustentável da economia.
Tive o grato prazer de uma empresa a que presidi ter sido uma das primeiras a aderir ao movimento World Business Council for Sustainable Development, no qual as empresas se comprometem a fazer o seu desenvolvimento com respeito integral pelo ambiente e por todos os problemas do desenvolvimento sustentável.
Se fiz isso como gestor - e nunca passei de gestor, nunca fui empresário -, pode ter a certeza de que seguirei agora exactamente a mesma política, em conjunto com o resto dos meus colegas do Governo, no sentido do desenvolvimento de uma economia que seja sustentável, que cumpra o Protocolo de Quioto e todas as obrigações que o País tem de satisfazer. Não podemos, no entanto, neste aspecto ser ingénuos.
Sou totalmente favorável ao Protocolo de Quioto - aliás, estamos a ver a sua importância pelo aquecimento que o País tem neste momento, mas não podemos entrar nisso sem que os nossos concorrentes todos também entrem, porque dessa forma estamos a criar condições desfavoráveis à concorrência das nossas empresas e ao emprego nas nossas empresas, e isso vira-se contra todos os que nelas trabalham.
Olho para as empresas como uma comunidade, onde estão em conjunto os interesses dos accionistas mas também, o que é prioridade para mim, os interesses dos trabalhadores.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Tavares Moreira.

O Sr. Tavares Moreira (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Há pouco mais de dois anos, quando o XV Governo Constitucional iniciava funções, a economia do País encontrava-se mergulhada numa gravíssima crise, cujos contornos foram já objecto da mais ampla discussão e análise.

O Sr. José Magalhães (PS): - Um discurso arcaico!

O Orador: - É interessante notar, entretanto, que essa crise apresentava pontos comuns e pontos importantes de diferença em relação às três crises económicas anteriores, do período pós 25 de Abril.
Como pontos comuns vale a pena recordar a origem da crise, uma vez mais decorrente de um enorme desfasamento entre o nível da despesa e a capacidade da oferta de bens e serviços da economia, bem como a forte desaceleração da actividade económica interna e externa, traduzindo-se num ambiente recessivo - aliás, expressamente reconhecido em diploma legal dos últimos dias do governo socialista, o Decreto-Lei n.º 60/2002, de 20 de Março, que num exercício curioso e muito pouco vulgar de confissão e de reconhecimento de uma realidade adversa confessava essa recessão.
Com o passar do tempo, porém, essa declaração autêntica da existência de um clima de recessão económica foi a pouco e pouco sendo convertida num processo de acusação ao novo governo, que a oposição pretendeu responsabilizar por uma situação que ela própria tinha inequivocamente reconhecido existir antes mesmo de o governo iniciar funções! Estranha forma essa de fazer política!
Mas essa crise apresentava pontos de diferença importantes em relação às anteriores que é bom

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recordar também: em primeiro lugar, pela primeira vez a crise não estava associada a uma situação de falta de confiança na moeda, uma crise cambial, com as crónicas saídas de capitais para o exterior, não suscitando, por isso, uma subida das taxas de juro nem a correcção da taxa de câmbio. A razão é simples: estávamos já em ambiente de moeda única, ao abrigo de um novo regime económico e financeiro.
Em segundo lugar, verificava-se um crescimento sem precedentes do endividamento dos agentes económicos, em especial das famílias, explicável pelas novas perspectivas económicas associadas à moeda única e pelo nível muito baixo das taxas de juro, que proporcionava uma redução das restrições de liquidez.
Em terceiro lugar, o País encontrava-se sujeito a uma nova disciplina financeira e orçamental, colectivamente definida e assumida no quadro da União Europeia - zona euro em especial -, a qual incluía parâmetros estritos para a dimensão do défice publico e para o nível da dívida pública total.
Este novo enquadramento da crise económica portuguesa do início de 2002 se, por um lado, permitia que essa crise não apresentasse a mesma nota de emergência das crises anteriores, com a consequente sujeição aos ditames do FMI, por outro lado impunha dificuldades acrescidas na condução da política económica, agora desprovida dos instrumentos tradicionais de regulação - as taxas de juro e a taxa de câmbio -, que tão decisivas e eficazes tinham sido na correcção das anteriores crises e desequilíbrios económicos.
Para retirar a economia de uma situação tão complexa e difícil de uma descrença total dos agentes económicos restavam ao Governo a política orçamental e a política de persuasão, procurando com esses instrumentos corrigir o nível excessivo da despesa pública e da procura interna, influenciando coerentemente as expectativas dos agentes económicos.
Sempre entendi, por isso, e continuo a entender, que o famoso "discurso da tanga" proferido pelo então primeiro-ministro nesta Assembleia, em Maio de 2002, foi um discurso oportuno, lúcido e corajoso.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. José Magalhães (PS): - Está desactualizado! Ainda não foi "santanizado"!

O Orador: - Talvez por isso mesmo esse discurso tenha sido tão atacado, em especial pelas oposições.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A tarefa que o XV Governo tinha pela frente no campo económico configurava uma verdadeira quadratura do círculo. Em ambiente económico recessivo impunha-se, ao mesmo tempo, restaurar a disciplina das finanças públicas, superando a dificílima situação resultante do facto de termos sido o primeiro País da União Europeia a violar as regras de disciplina orçamental do Pacto de Estabilidade e Crescimento; corrigir os insustentáveis desequilíbrios entre a despesa e a produção de bens e serviços, que tinham feito subir em flecha o défice externo e lançado o País num processo de endividamento de alto risco; e criar, no mais breve prazo, as condições para a retoma de um crescimento económico sustentado e saudável, recuperando, logo que possível, o processo de convergência para o nível médio de rendimento real da União Europeia a Quinze.
Esta quadratura do círculo viria ainda a ser agravada com a forte valorização do euro ao longo de 2003, que contrariava seriamente a estratégia de recuperação assumida, e logo a seguir pela forte subida dos preços do petróleo, com efeitos adversos semelhantes.
É da mais elementar justiça reconhecer hoje o mérito do XV Governo no cumprimento da sua estratégia de política económica, tendo conseguido em apenas dois anos, contra todas as vicissitudes, transformar uma situação de crise profunda, quase sem esperança, numa situação de clara recuperação,…

O Sr. José Magalhães (PS): - Que falsidade!

O Orador: - … insofismavelmente reconhecida por todos os institutos independentes que têm acompanhado a evolução da nossa economia, internos e externos.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Esses institutos apontam, para 2004, uma taxa de crescimento superior à que o próprio governo tinha apresentado e, para 2005, já uma taxa de crescimento em linha com a da União Europeia.
Este resultado deve muito, mas muito mesmo, ao trabalho excepcional do XV Governo e, em especial,

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da sua ministra das finanças, a quem aqui presto uma sincera homenagem, que creio ser mais do que merecida.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Ela foi capaz de protagonizar de forma ímpar esse tremendo esforço de mudança da política económica, sabendo interpretar e executar, de forma escrupulosa, as verdadeiras prioridades da política, pondo sempre em primeiro lugar os superiores interesses do País. Ela cumpriu, de forma absolutamente exemplar, uma das mais árduas tarefas que no domínio da política económica foram alguma vez confiadas a um governante em Portugal.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Deputados: As mais recentes informações da conjuntura económica, designadamente as que foram divulgadas pelo Instituto Nacional de Estatística (INE) para o mês de Junho, mostram uma actividade económica em franca recuperação, registando no segundo trimestre deste ano uma aceleração em relação ao primeiro, pelo que é previsível, nesse período, uma taxa de crescimento do PIB mais elevada, tanto em cadeia como, sobretudo, em termos homólogos.
Os desequilíbrios económicos estão contidos, não obstante essa recuperação da actividade, e a própria evolução do desemprego, normalmente a última variável a responder na fase de recuperação, dá os primeiros sinais de inversão.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Por sua vez, os dados da execução orçamental até Junho constituem igualmente um sinal muito positivo.
Neste novo quadro, o XVI Governo tornou já bem claras as suas prioridades em matéria de política económica: em primeiro lugar, o prosseguimento do rigor orçamental; em segundo lugar, o aprofundamento das reformas estruturais; e, em terceiro lugar, uma aposta agora reforçada no crescimento económico e em medidas do lado da oferta.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O rigor orçamental tem que ver com o prosseguimento do esforço de consolidação orçamental, matéria que foi abundantemente tratada no discurso do Sr. Presidente da República por ocasião da posse do Governo. Julgo essencial termos presente que a consolidação orçamental diz respeito, em primeiro lugar e acima de tudo, ao controlo do crescimento da despesa pública, com natural relevo, mas não exclusivamente, para a despesa corrente primária.
A este propósito parece-me esclarecedora a citação da seguinte passagem do último relatório da Comissão Europeia sobre a política económica portuguesa, intitulado The Portuguese Economy After the Boom. Diz o seguinte: "Uma estratégia de consolidação orçamental, para ser bem sucedida, só pode ser conseguida através da contenção do crescimento da despesa corrente primária, a qual, por sua vez, requer a introdução de um programa de reformas estruturais. Tal estratégia é conforme às Orientações Gerais de Política Económica, nas quais se advoga uma consolidação orçamental assente fundamentalmente no controlo da despesa orçamental; até porque a experiência tem demonstrado que, para além de limitar os custos de ineficiência associados a elevadas taxas marginais de imposto, essa consolidação orçamental tem uma resistência bem maior às flutuações do ciclo económico". Ser mais claro creio que não é possível!
Assim, no curto prazo importa conter as despesas correntes compressíveis e também, sem complexos, ser bastante selectivo nas despesas catalogadas como de investimento, realizando apenas aquelas que apresentem um retorno económico ou social mais relevante. Nestas incluo, sem qualquer dúvida, o sistema de climatização desta Sala!…

Aplausos e risos do PSD e do CDS-PP.

Nos médio e longo prazos, a consolidação orçamental implica, fundamentalmente, o prosseguimento e o aprofundamento das reformas estruturais, especialmente em três domínios: a Administração Pública; a segurança social; e a saúde.
Estamos aqui também a tratar da sustentabilidade das finanças públicas no longo prazo, a qual é requerida, entre outras razões, pelo princípio da equidade intergeracional.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Deputados: Do que antecede parece ainda claro que o prosseguimento do objectivo de consolidação orçamental não é incompatível com algumas medidas de

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alívio fiscal, designadamente no que respeita à tributação do rendimento das famílias e das empresas. Julgo mesmo que algum alívio fiscal para as famílias poderá constituir um tónico importante para que o prosseguimento de esforço de consolidação orçamental, que vai levar anos - não tenhamos ilusões -, seja melhor compreendido e aceite pelos cidadãos. É preciso dar sinais concretos de que esse esforço e os sacrifícios que lhe são inerentes valem a pena, que são retribuídos. E que melhor sinal para transmitir esse entendimento do que uma redução do imposto sobre o rendimento? Isso não porá em causa o objectivo de consolidação orçamental que todos devemos defender, nem me parece também que possa pôr em causa os equilíbrios económicos que tanto trabalho deram a repor.
O Governo melhor do que ninguém saberá, estou certo, tomar as medidas adequadas, já no próximo Orçamento do Estado, para concretizar algumas dessas ideias, prosseguindo a trajectória de consolidação orçamental.
Finalmente, a ênfase que no Programa do Governo é colocada nos objectivos de crescimento económico e em medidas do lado da oferta para melhorar a competitividade das empresas, com a reafirmação do Programa para a Produtividade e Crescimento da Economia, afigura-se inteiramente justificada. Esse já constituía - recordo - o objectivo final da política do XV Governo, só que para atingir esse objectivo era imprescindível resolver algumas pré-condições, cumprir algumas etapas intermédias, que a pouco e pouco vão sendo cumpridas. Por isso uma referência mais enfática ao crescimento, como aquela que agora é feita neste Programa, se torna, dia-a-dia, mais justificada.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Nestes termos, não temos quaisquer dúvidas em dizer que o Governo pode contar com o apoio do Grupo Parlamentar do PSD para a execução do seu programa económico, da mesma forma que apoiámos sem reservas o programa do anterior governo. Desejamos-lhe, Sr. Primeiro-Ministro, a si e ao seu Governo, muito boa sorte, também bastante necessária para o cumprimento deste Programa, cuja aprovação vamos votar.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Tavares Moreira, quero congratular-me com a capacidade ficcional demonstrada por V. Ex.ª, embora com algum desfasamento político - não apanhou bem o tom deste Governo remodelado, chamemos-lhe assim, e portanto, manteve algumas características ficcionais do discurso anterior.
Também nós gostaríamos muito de ver aqui a Sr.ª Dr.ª Manuela Ferreira Leite - tanto que votámos contra a sua substituição - discutir estas políticas, gostaríamos de ver se o Sr. Deputado Tavares Moreira falaria efectivamente da mesma maneira.

O Sr. António José Seguro (PS): - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Deputado fez o elogio da política recessiva, do "discurso da tanga". Quem abre a crise profunda que existiu é, de facto, o governo de José Manuel Barroso (assim conhecido hoje…), que transformou as dificuldades orçamentais que existiam numa crise económica.

O Sr. José Magalhães (PS): - Exactamente!

Vozes do PSD: - Ahhh…!

O Orador: - Como há dias explicava na televisão o Sr. Dr. Vítor Bento, o défice que interessa para estas coisas é de 5,3%.

O Sr. José Magalhães (PS): - Exacto!

O Orador: - Conforme todos nós sabemos, o IRS foi agravado drasticamente em dois anos pelo governo de Durão Barroso; conforme todos nós sabemos, a economia foi lançada na recessão mais prolongada desde há anos; conforme todos nós sabemos, uma boa parte do tecido económico foi efectivamente destruído.

O Sr. Jorge Nuno Sá (PSD): - A situação internacional nada teve que ver com isso!

O Orador: - Vemos neste Governo quem pareça querer fazer alguma inflexão nas políticas. Cá

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estaremos para ver! Porém, como é claro e como disse o meu camarada, companheiro e amigo Maximiano Martins, isso é a constatação de que a política económica do anterior governo, do "violinista político" Dr. Carlos Tavares (violinista do Titanic, claro!…)…

Risos do PS.

… e da Dr.ª Manuela Ferreira Leite, foi uma política altamente negativa, como o foi a do ministro das obras públicas, transportes e habitação, que não "otava" nem "desotava".

Risos do PS.

O Sr. Jorge Nuno Sá (PSD): - Que piada engraçada!…

O Orador: - Portanto, gostaríamos de ver aqui a ex-ministra das Finanças.
Com a continuidade que este Governo apresenta face ao anterior estamos completamente em desacordo, com as esperanças que parece querer abrir vamos ver o que se passará.
Algumas das matérias mereceriam clarificação, mas não sabemos se o Sr. Deputado Tavares Moreira está à altura de nos explicar…

Vozes do PSD: - Está, está!

O Orador: - … esta inflexão quanto à ideia de alargar o IRS e de romper o compromisso quanto ao IRC, se está em condições de efectivamente explicar o que se passa quanto ao IVA, se passou a definitiva a taxa máxima, se está em condições de explicar como vai ser a intervenção no reequacionamento e na formulação do Pacto de Estabilidade e Crescimento e se está ou não em condições de assumir que o que se passou nos dois anos anteriores foi uma trajectória de falsa consolidação financeira.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente: - Uma vez que o orador pretende responder conjuntamente, tem a palavra o Sr. Deputado Álvaro Castello-Branco para formular o seu pedido de esclarecimento.

O Sr. Álvaro Castello-Branco (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Tavares Moreira, antes de mais, quero cumprimentá-lo pela intervenção que acabou de fazer, pois, para além de realçar o facto público da reconhecida competência que V. Ex.ª tem nestas matérias traduziu de forma verdadeira e concisa o trabalho do XV Governo Constitucional, que foi, sem dúvida alguma, um trabalho de grande mérito, já que partindo de uma situação extremamente difícil, que todos conhecemos, em dois anos consolidou as finanças portuguesas e criou as condições para o relançamento da nossa economia.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Hoje, sem dúvida alguma, os sinais da retoma económica são já visíveis e, Sr. Deputado Tavares Moreira, não sou só eu, o Governo ou a maioria parlamentar a dizê-lo. Instituições como o Banco de Portugal confirmam-no e muitos indicadores mostram-no. As exportações estão a aumentar, o desequilíbrio externo diminuiu, os indicadores de confiança estão a crescer. Em conclusão, já se iniciaram a inversão do ciclo, a recuperação e o crescimento.
Assim, Portugal está hoje melhor preparado do que há dois anos atrás, as empresas portuguesas estão mais fortes e os ajustamentos que havia a fazer, e que eram inevitáveis, foram e estão a ser feitos. Estamos actualmente numa fase de crescimento, de início da consolidação da retoma e para que esses importantíssimos objectivos possam ser prosseguidos com sucesso é necessário continuar a manter o caminho do aumento da produtividade e da competitividade, a aposta no crescimento das exportações e o objectivo estratégico de reduzir a carga fiscal se e quando houver condições para tal.
É exactamente sobre esta matéria da diminuição da carga fiscal que quero colocar uma questão a V. Ex.ª. Referiu o Sr. Deputado na sua intervenção - e bem! - que os factores determinantes para a consolidação orçamental são a contenção, o controlo da despesa e as reformas estruturais - é este o caminho a seguir para que possamos ter finanças saudáveis. Assim, a questão que lhe coloco é a seguinte: entende V. Ex.ª que é possível haver diminuição da carga fiscal sobre as famílias e sobre as empresas sem pôr em

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causa a consolidação orçamental, ou seja, sem que isto se traduza em desequilíbrio orçamental?

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder aos dois pedidos de esclarecimento no tempo máximo de 5 minutos, tem a palavra o Sr. Deputado Tavares Moreira.

O Sr. Tavares Moreira (PSD): - Sr. Presidente, creio que não esgotarei os 5 minutos. De qualquer modo, agradeço aos dois Srs. Deputados as questões que suscitaram.
O Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira colocou-me numa posição difícil, porque disse que tinha dúvidas sobre se eu seria capaz de lhe dar uma explicação. Certamente que não serei capaz de explicar nos termos que o Sr. Deputado pretende, mas irei ser capaz de explicar nos termos que me parecem os mais correctos.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Deputado começou por qualificar o meu discurso como ficcional e eu admito que o Sr. Deputado possa ser sincero nessa afirmação. Mas esqueceu-se de uma referência muito concreta da minha intervenção: o Decreto-Lei n.º 60/2002, um dos últimos diplomas aprovados pelo governo socialista, no preâmbulo do qual é expressamente reconhecido, mas de forma absolutamente expressa, a existência de uma situação de recessão económica em Portugal.
Portanto, considero absolutamente extraordinário uma confissão destas num diploma legal - é uma coisa completamente anormal -, pois isso "quase não lembra ao diabo". Mas lembrou ao governo de então! E foi, obviamente, uma declaração sincera! De outra forma não podia explicar-se que num diploma legal daquela importância fosse feito um reconhecimento desse tipo da situação existente.
Como é possível que, reconhecendo a existência de uma situação destas, logo a seguir o mesmo partido venha, ao longo de dois anos, acusar o governo seguinte…

O Sr. José Magalhães (PS): - E com razão!

O Orador: - … de contribuir para uma situação que já existia antes?

O Sr. José Magalhães (PS): - Mas o senhor negou durante ano e meio!

O Orador: - Isso, realmente, é completamente incompreensível e creio que reflecte bem uma forma de fazer política que, a meu ver, deveria ser erradicada da vida portuguesa.
Relativamente à terceira questão que me suscitou, em relação ao IRS e à sua compatibilização com o Plano de Estabilidade e Crescimento, é evidente que qualquer medida de alívio fiscal tem de ser enquadrada nos objectivos e exigências de cumprimento dos nossos objectivos no âmbito do Plano de Estabilidade e Crescimento.
Entendo - já agora aproveito para responder ao Sr. Deputado Álvaro Castello-Branco -, com absoluta convicção, que, hoje, no plano dos princípios o prosseguimento dos objectivos de consolidação orçamental em nada são postos em causa com uma redução da carga fiscal, nomeadamente sobre o rendimento das famílias e também das empresas. De resto, isso já aconteceu o ano passado, com uma redução significativa do IRC e, curiosamente, uma das características da execução orçamental até Junho é o forte aumento da receita nesse imposto sobre as empresas.
De qualquer modo, entendo - e não sou eu a única pessoa a entender, há muitas pessoas que o entendem e a Comissão Europeia, de uma forma que me parece absolutamente iniludível, tornou isso claro no último relatório que apresentou sobre a política económica em Portugal - que controlo orçamental e consolidação orçamental se fazem pelo lado da despesa, que ou se fazem pelo lado da despesa ou não se fazem.
Reparem que até podíamos, por exemplo em 1999/2000, com um bocadinho de sorte, ter chegado ao equilíbrio orçamental. Mas isso não significava de forma alguma que tivéssemos conseguido a consolidação orçamental, pela simples razão de que a despesa não estava contida, não estava de forma alguma controlada, e evidentemente que logo a seguir, com a desaceleração da actividade económica, era inevitável que o buraco orçamental aparecesse.
Portanto, a única forma de fazer consolidação orçamental a sério é através do controlo da despesa, o que implica, como a Comissão Europeia bem salienta, aprofundar e prosseguir as reformas estruturais, nomeadamente no âmbito da Administração Pública, da Saúde e da Segurança Social, porque é aí, essencialmente

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aí, que se joga o controlo da despesa pública a médio e a longo prazos.
Aliás, até acredito que algum alívio da carga fiscal sobre a família constitua um estímulo, como há pouco disse, para que as pessoas entendam melhor esta necessidade de prosseguir um certo sacrifício a médio e a longo prazos.
Lembro que a política económica não se faz em laboratório, faz-se numa sociedade constituída por pessoas que têm sentimentos, que têm reacções, que têm opiniões. Isso tem de ser tomado em consideração e convém que as pessoas percebam que este esforço tem alguma retribuição, porque assim estarão muito mais preparadas e mais dispostas a aceitar o prosseguimento desse esforço a médio e a longo prazos.
É este o meu entendimento, mas é evidente que ao Governo cabe agora avaliar a situação concreta, avaliar a perspectiva de evolução das receitas e das despesas e tomar as medidas adequadas no sentido de compatibilizar este desejo de um alívio da carga fiscal com as exigências do equilíbrio orçamental.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, apenas para dizer a V. Ex.ª que vou fazer chegar à Mesa um mapa do INE, que, para quem esteja um pouco adormecido, tem mesmo um gráfico que identifica os valores do crescimento positivo e negativo da economia portuguesa trimestre a trimestre e que desmente, em meu entender, a tese do Dr. Tavares Moreira sobre a recessão.

O Sr. Jorge Nuno Sá (PSD): - "No seu entender"!

O Orador: - Até o Presidente da JSD vai perceber este gráfico!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Jorge Nuno Sá (PSD): - Obrigado!

O Sr. Presidente: - Tenha, então, a bondade de fazer chegar esse documento à Mesa, Sr. Deputado. A sua intervenção foi um requerimento oral e, como tal, desconta no tempo do Partido Socialista.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Se fosse por vontade dos portugueses não estávamos hoje a debater aqui o Programa deste Governo. Estamos a debater o Programa do Governo de uma maioria que os portugueses já repudiaram nas urnas, um Governo que não tem legitimidade própria e que só tem o apoio declarado dos liberais mais fundamentalistas e das gentes do aparelho, que se agarram a este Governo com a convicção dos náufragos que se agarram a uma tábua à deriva como se de um salva-vidas se tratasse.
O governo do Dr. Durão Barroso conduziu o nosso país a uma profunda recessão económica, a um enorme retrocesso social e a uma grave crise de credibilidade do sistema político. O Governo do Dr. Santana Lopes promete ser um Governo de involução na continuidade. À fórmula propagandística do anterior governo, "Portugal em acção", sucederá, provavelmente, a fórmula, mais sugestiva, de "Portugal em re-acção".

Aplausos do PCP.

Estamos, na verdade, perante o Programa do Governo mais reaccionário da democracia portuguesa. E isto é muito mais preocupante do que as trapalhadas que já marcaram o início de funções deste Executivo, e que foram muitas.
Primeiro, foi dito que o Governo seria o mais pequeno, mas, afinal, será o maior; depois, foi o futuro Primeiro-Ministro, ainda nem sequer indigitado, a dizer que ia deslocalizar ministérios; depois, foi o Ministro de Estado e da Defesa Nacional a abrir a boca de espanto quando, no acto de posse, soube que também ia ser Ministro dos Assuntos do Mar; depois, foi o Primeiro-Ministro já indigitado a avisar a comunicação social de que as possibilidades que anuncia não são para levar a sério; depois, foi o Ministro da Defesa a anunciar o momento histórico em que Portugal ia ter uma Secretária de Estado da Defesa

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Nacional, filha e neta de militares; depois, foi a tomada de posse dos Secretários de Estado adiada, à espera que o Primeiro-Ministro inventasse, à pressão, uma nova Secretaria de Estado para encaixar a Secretária de Estado que, afinal, em consequência da remodelação governamental mais célere da História, foi substituída por mais um homem; depois, foi a disputa, digna da comédia à portuguesa, entre os Ministros das Cidades e do Ambiente pela posse do mesmo gabinete, com o Ministro das Cidades a chegar primeiro que o Ministro do Ambiente e a descarregar-lhe os melindrosos dossiers nos corredores do Ministério;…

O Sr. José Magalhães (PS): - À estalada!

O Orador: - … depois, foi a já famosa decisão de deslocalizar o gabinete de seis Secretários de Estado, tendo como único critério visível a tendencial proximidade com o local de residência dos próprios!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Estas trapalhadas dão aos portugueses a ideia de um Governo sem nexo, feito em cima do joelho e ao sabor de "amiguismos". Mas, pior do que isso, o que a organização e o Programa revelam é um Governo assente numa concepção ideológica ultraliberal.
Este Governo acaba com o ministério do Trabalho, como que a culminar a ofensiva desencadeada pelo Ministro Bagão Félix contra os direitos de quem trabalha. Esta opção de subordinar o mundo do trabalho aos ditames da economia encara os trabalhadores como peças de uma engrenagem para usar e deitar fora em função dos interesses do grande patronato.
Mais: este Governo separa a segurança social do trabalho, deixando de a encarar como um direito dos trabalhadores, como algo a que os trabalhadores têm direito em contrapartida dos descontos que efectuaram ao longo da sua vida de trabalho, para passar a ser encarada numa perspectiva meramente assistencial ou caritativa.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O que este Governo apresenta à Assembleia da República é um Programa de retrocesso social: privatizar tudo, o que pode e o que não pode ser privatizado. A saúde, a educação, a segurança social, as infra-estruturas básicas de interesse colectivo, tudo é para entregar a privados, consumando uma real operação de saque do património e de bens públicos e um autêntico assalto à bolsa dos portugueses que, para além de massacrados por um sistema fiscal injusto, que só penaliza quem trabalha, se vêem a braços com os encargos de sistemas de saúde e de educação cada vez mais onerosos e inacessíveis, com os aumentos dos custos dos transportes, com a multiplicação das portagens nas vias rodoviárias, com a redução da protecção social quando em situação de doença, de desemprego ou de pobreza.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - O capítulo do Programa do Governo referente à Administração Pública não podia ser mais claro quando se propõe reservar para o Estado as funções que envolvem o exercício do poder de autoridade, remetendo-o, quanto ao mais, para funções de regulação, auditoria e fiscalização. Ou seja, para o Estado ficam as Forças Armadas, as polícias e a cobrança de impostos e para os privados tudo o resto. Nunca se foi tão longe no ataque aos direitos dos cidadãos consagrados na Constituição da República.
O Sr. Primeiro-Ministro já anunciou que para o ano, se houver folga, pode ser que desagrave o IRS. Cá estaremos para ver se essa intenção será uma realidade ou apenas mais uma possibilidade. Mas importa deixar claro que o agravamento ou o desagravamento do IRS não é uma questão de folga financeira mas de vontade política. Se o Governo quer ter folga para desagravar o IRS, combata a fraude e a evasão fiscais, reduza os benefícios fiscais sobre a especulação financeira, agrave a carga fiscal sobre os lucros dos bancos, ponha cobro às escandalosas operações offshore e verá que terá folga mais do que suficiente para reduzir o IRS sobre quem trabalha.

Aplausos do PCP.

Mas o que vemos no Programa do Governo não é isso. Nele não vemos nenhum compromisso de baixar o IRS para os trabalhadores e as camadas mais desfavorecidas, nem sequer de compensar o aumento

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da carga fiscal que ocorreu nos últimos anos. O que vemos é o compromisso de favorecer os grandes grupos económicos, isentando, por exemplo, as operações de concentração.
Este Governo vai continuar a dizer o que o anterior já dizia há mais de um ano: que vem aí a retoma. Mas o que os portugueses sentem é que estão a viver pior. Quem sente a retoma é quem compra casas e carros de centenas de milhares de euros e quem passeia, insultuosamente, os sinais exteriores de riqueza nas festas dos novos e velhos ricos. Quem está no desemprego, quem vive do seu trabalho ou da sua reforma, tem de contar os cêntimos para fazer face aos encargos familiares básicos, com os bens de primeira necessidade cada vez mais caros e com os salários e as pensões cada vez mais degradados.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Os portugueses não acreditam neste Governo, como não acreditavam no anterior. Foram muitas as promessas feitas e não cumpridas. Tantas promessas de prevenção dos fogos florestais, depois da tragédia do ano passado, e este ano a situação está, como se sabe, ainda pior. Tantas promessas de que os serviços públicos funcionariam, todos, on-line no prazo de um ano, a contar de Abril de 2002, e, passados três anos, os candidatos ao ensino superior tiveram de ir para a fila às seis da manhã para apresentar as suas candidaturas. Tantas promessas de celeridade da justiça, e ainda nesta semana vimos os trabalhadores de uma empresa receber salários em atraso, sem juros, com 20 anos de atraso.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - É uma vergonha!

O Orador: - Tanta promessa de redução das listas de espera e tanta gente sem acesso a cuidados de saúde e sem dinheiro para medicamentos. Tanta promessa de melhorar o sistema educativo e tanta trapalhada nos concursos de professores. Tanta promessa e tanto descontentamento dos funcionários públicos, que não são aumentados há três anos, dos polícias, que ainda não recebem o célebre subsídio de risco, dos antigos combatentes, que ainda não receberam nada, dos militares, que não podem progredir nas carreiras. Tanta solenidade na promessa do anterior Primeiro-Ministro de que haveria um referendo sobre o Tratado de Constituição Europeia, para o referendo passar agora a ser mais uma mera possibilidade.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Este Governo não merece a confiança dos portugueses e confrontar-se-á no dia-a-dia com o descontentamento que a sua governação não deixará de gerar. O PCP, que defendeu o direito do povo português de decidir soberanamente da solução para a crise e para a instabilidade que com este Governo não deixará de se agravar, fará a este Governo a oposição firme, coerente e enérgica que os portugueses exigem e exprimirá aqui frontalmente a rejeição que este Governo merece.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças e da Administração Pública.

O Sr. Ministro das Finanças e da Administração Pública (António Bagão Félix): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Não há desenvolvimento humano sem crescimento económico, embora este, por si, não seja suficiente. Não há crescimento sustentado sem finanças públicas disciplinadas.
Por isso, o Programa do Governo é claro quanto à interdependência dos vectores do desenvolvimento, ao dizer que a saúde orçamental, as reformas de fundo e o aprofundamento da justiça social constituirão sempre as bases da política coordenada do Governo, tendo em vista o primado de um modelo de crescimento sustentado pelas exportações e por investimentos verdadeiramente reprodutivos.
Tudo isto, Srs. Deputados, com realismo, com prudência, com transparência e com sustentação. Sem a criação de falsas promessas, mas também sem o pessimismo doentio de certas mentes. Com muito esforço e trabalho, exemplo e autoridade, perseverança e convicção. E também com o sentido do dever e o notável esforço, de que a minha antecessora, Dr.ª Manuela Ferreira Leite, deu sobejas provas.
As finanças públicas não precisam sequer de argumentos para serem seriamente conduzidas; precisam de ideias claras, de motivação e de patriotismo. Não se alimentam da tentação de um futuro sem esforço, pelo qual tudo é oferecido numa bandeja de ilusões.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

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O Orador: - Como se fosse possível tudo ao mesmo tempo: mais despesa pública, menos impostos, menos défice público, mais crescimento, mais emprego, menor endividamento externo, juros baixos e rating da República alto.
A consolidação das contas públicas, Srs. Deputados, não é uma circunstância, nem sequer uma exigência ditada pela conjuntura ou pelas regras europeias; é um imperativo permanente, um desafio de alcance geracional, independente - repito, independente - do valor do défice.
O orçamento do sector público administrativo (SPA) deve, como tal, ser, ao mesmo tempo, financeiramente exigente, economicamente estimulante, socialmente justo e, cívica e eticamente, responsabilizador.
Exigência financeira que significa não apenas a contenção quantitativa dos gastos públicos mas também a avaliação permanente da necessidade e da justeza da despesa em função da sua eficácia.
Estímulo económico, pois que não é tolerável, como modelo de futuro para Portugal, que o Estado continue a absorver em excesso recursos que deveriam ser investidos melhor na economia.
Justiça social que crie condições para erradicar a pior das iniquidades que consiste em igualar o que é diferente.
Responsabilidade ética e cívica para que se estimule a cidadania e se elimine a ideia, egoísta e perversa, de os direitos para alguns e os deveres para os outros.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - É difícil, Srs. Deputados? Sem dúvida que o é.
Mas no maior equilíbrio possível entre estes quatro fins reside sempre a melhor solução, o que significa que, mais do que um fim em si mesmo, o orçamento é um instrumento ao serviço do desenvolvimento.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Com uma consequência: a de que o orçamento, como expressão por excelência da política de finanças públicas, jamais pode ser um somatório artificial de desejos sectoriais, de interesses de corporação e de voluntarismos perniciosos.
As finanças públicas devem exprimir, antes, opções claras, corajosas e determinadas.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Não navegando sobre fantasias que quase sempre vão desembocar à quadratura do círculo; caminhando seguramente e com disciplina.
É nossa convicção de que não existe alternativa a este caminho. Como tal, a esta disciplina nos ateremos de forma consciente e tenaz, ainda que saibamos que o percurso é difícil, exigente e até, por vezes, incompreendido.
Sr.as e Srs. Deputados: Sabemos da necessidade de responder com rapidez, justeza e humanismo aos problemas conjunturais que enfrentamos.
Dispomos de instrumentos que possibilitam caminhar na direcção apontada: a Lei da estabilidade orçamental e o Programa de Estabilidade e Crescimento para o período de 2004-2007.
Dispomos da credibilidade adquirida no contexto da União Europeia, com o levantamento por parte da Comissão Europeia do procedimento relativo aos défices excessivos.
Necessitamos do empenho solidário de todos os sectores das administrações públicas, sem excepção, e da vontade firme dos portugueses de sustentarem uma política de responsabilização e de exigência.
Por isso, Srs. Deputados, o Governo procurará criar as condições para o desenvolvimento do eixo central de uma política orçamental virada para o progresso: menos despesa pública para menos impostos e menor endividamento, e não mais impostos e dívida para financiar mais e pior despesa pública.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - É que a má despesa, o desperdício e a ineficiência são os verdadeiros impostos.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Há já sinais seguros de uma mudança nas expectativas económicas, como, ainda há pouco, o referiu o

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Sr. Ministro de Estado e das Actividades Económicas e, ainda há dias, o revelou a Síntese Económica de Conjuntura do INE relativa ao segundo trimestre deste ano e também a revisão em alta do Banco de Portugal sobre o crescimento do Produto. Sem euforias contraproducentes, é nítido já o resultado da política seguida nos últimos dois anos. Necessário se torna, pois, não abrandar os aspectos da política orçamental necessários para consolidar aquela tendência.
Ainda em matéria financeira, o Programa do Governo é, igualmente, claro quanto a outros objectivos, de que citaria alguns.
Começando pela transparência na prestação das contas de todas as entidades incluídas no Orçamento, o que, numa sociedade democrática, é absolutamente indispensável. A apresentação do balanço e dos resultados de cada gestão, conjuntamente com a informação sobre os compromissos assumidos com efeitos nos anos futuros, devidamente certificados, constitui um factor de credibilidade acrescida no processo político e responsabiliza os eleitos face aos eleitores.
Também se torna necessário prosseguir o esforço de reforma da gestão da tesouraria do Estado, desenvolvendo o processo de centralização de fundos financeiros. Bem como a resolução dos atrasos nos pagamentos do Estado, que, para além de implicarem graves prejuízos à capacidade negocial do Estado, representam um mau exemplo para toda a sociedade, dando origem a um efeito multiplicador que provoca sérios entraves e problemas à economia.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Necessária se torna, ainda, a melhoria da gestão patrimonial do Estado, rentabilizando os activos imobiliários e imputando, com verdade, os custos da sua utilização pelos serviços, bem como a continuação da reforma do processo de compra de bens pelo Estado, centralizando procedimentos, racionalizando critérios e maximizando as compras electrónicas.
Sr. Presidente e Sr.as e Srs. Deputados, em matéria de política fiscal, o Governo norteará as suas decisões e acções por cinco objectivos centrais: eficácia e suficiência de receitas, equidade tributária, neutralidade económica, simplicidade e capacidade concorrencial numa economia aberta.
Actuará consciente da impossibilidade de tudo se conseguir ao mesmo tempo, mas apontando caminhos. E sem pôr em causa o valor da estabilidade dos regimes fiscais, há ainda um importante trajecto a percorrer no sentido da simplicidade e visibilidade dos mesmos.
Há um excesso de regimes especiais para situações ditas especiais, das quais alguns só por inércia continuam a existir, hoje completamente desajustadas do novo quadro económico nacional e mundial.
Mas não se peça ao sistema fiscal que concentre em si demasiados objectivos estritamente sociais. Importa, sobretudo, assegurar a equidade horizontal, designadamente pelo alargamento justo da base tributária, pois que, quanto à equidade vertical, o Estado tem, designadamente na protecção social, instrumentos mais adequados e mais justos.
A complexidade da legislação e da regulamentação tem sido identificada como um sério constrangimento à eficiência da administração fiscal, o que aponta no sentido de um maior esforço de simplificação da legislação, dos regulamentos e dos processos.
Sr.as e Srs. Deputados: O Programa do Governo é claro quanto à prioridade dada ao IRS. Não que se questione a justeza da descida da taxa do IRC. Ciente de que se trata de uma matéria naturalmente controversa, há, no entanto, que reconhecer que o IRC já atinge, neste momento, com a redução de 5%, uma taxa mais competitiva, sem prejuízo necessariamente de se estar atento aos regimes dos outros países mais concorrenciais. Aliás, qualquer alteração futura da taxa do IRC não se pode dissociar da necessidade de uma base tributária alargada, pelo que se torna necessário analisar, concomitantemente, a possibilidade de aproximação da taxa legal à taxa efectiva de tributação.
Quanto ao IRS, o que está escrito no Programa do Governo é claro. Caso, nos próximos dois anos, haja possibilidade orçamental - condição sine qua non -, tudo se fará para racionalizar e reduzir ou eliminar algumas deduções à colecta, por forma a permitir, ainda que gradualmente, um ajustamento dos escalões - que não das taxas - que oneram excessivamente os rendimentos baixos e médios.
A "engenharia sociofiscal", com a sua panóplia interminável de regimes específicos, deduções e abatimentos, favorece as "indústrias de benefício fiscal", provoca a erosão das bases de incidência, dificulta a administração tributária, facilita o uso de escapatórias legais, favorece os mais poderosos e ricos e intensifica a evasão fiscal.

O Sr. Miguel Anacoreta Correia (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Simplificar a lei, racionalizando o leque de benefícios, constitui um objectivo essencial de justiça fiscal e de fácil reconhecimento do quadro legal por parte dos contribuintes.

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E é bom ter presente que benefícios fiscais para alguns são quase sempre penalizações fiscais para outros -…

O Sr. Miguel Anacoreta Correia (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - … nem sempre com a justiça necessária e quase sempre prejudicando os mais pobres.
Sr.as e Srs. Deputados: Nos Estados modernos, a Administração Pública é um dos pilares em que assenta a relação sociedade/Estado. Valorizá-la é, antes de tudo, reforçar essa ligação política, cívica e identitária.
A Administração Pública enquadra a vida das pessoas e das empresas, envolve, condiciona, determina. É, por isso, transversalmente, condição do êxito ou do "inêxito" das políticas, em rigor, de todas as políticas.
Em Portugal, há muito que se reconhece a premência da intervenção governativa nesta área. Nesta medida, e no essencial, os diagnósticos estão feitos (e bem feitos), os problemas são conhecidos, as causas foram identificadas, as soluções estão propostas.
É, portanto, hora de fazer. Continuando o que se iniciou, o que implica, necessariamente, ter disponibilidade para ir afinando tudo o que for necessário, em função da aprendizagem permitida pelo caminho feito. Mas também abrindo para outras frentes; orientando a acção para aqueles que são a razão de ser da Administração, os cidadãos e as empresas. Cidadãos que a Administração deve servir e satisfazer, cidadãos que devem ser chamados a uma atitude de exigência construtiva face a essa mesma Administração.
Nesta perspectiva, a acção do Governo privilegiará três vertentes.
A primeira é a redefinição do papel do Estado, através: da desconcentração e descentralização da actividade administrativa; da externalização de funções susceptíveis de melhor desenvolvimento pela sociedade; e da racionalização de competências e desburocratização dos procedimentos decisórios.
A segunda é a formação e qualificação dos funcionários por via: da prioridade dada aos planos e trajectos formativos; do incentivo ao desempenho, mediante definição de objectivos e avaliação de resultados; e da responsabilização dos funcionários e agentes, no quadro das exigências impostas por uma ética de serviço público.
A terceira é o investimento na relação Estado/sociedade, pela óptica dos cidadãos e empresas como clientes da Administração, causa e fim da existência dos serviços públicos e da prossecução da actividade administrativa; pela elaboração de programa de simplificação de actos e procedimentos na relação entre o Estado e as pessoas, famílias e empresas; pelo aprofundamento da utilização das tecnologias de informação e do Governo Electrónico; e pela promoção do benchmarking em serviços públicos, com a sua inerente seriação.
Gostaria, por fim, de salientar a medida expressa no Programa do Governo de desenvolvimento de mecanismos de articulação entre as necessidades de quadros na Administração Pública e a bolsa de desempregados qualificados inscritos nos centros de emprego, substituindo prestações de desemprego por trabalho público.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Estamos perante enormes desafios. Por isso, a ambição e a convicção são condições de êxito. Acreditamos firmemente que vamos continuar a mudar Portugal. Não temos uma visão céptica do seu futuro e muito menos do dos portugueses. Continuaremos a trabalhar com a consciência do dever patriótico e da vontade inquebrantável de construir a esperança.
Portugal precisa de esperança. Os portugueses anseiam pela esperança. É essa esperança que queremos ajudar a fortalecer.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se sete Srs. Deputados para pedir esclarecimentos.
Em primeiro lugar, dou a palavra ao Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, registei que até agora o Governo fez uma escolha, a começar pela intervenção do Primeiro-Ministro e a acabar na sua, de fazer uma actualização doutrinária, de fazer aqui um debate genérico. Alguns poderão interpretar isto como reduzir o Parlamento a uma modorra, mas é, certamente, uma estratégia política de nunca tratar o Programa em concreto.
Por isso, quero fazer-lhe perguntas para as quais tenho a certeza de que o Sr. Ministro tem os números e a convicção para responder e que permitirão um esclarecimento melhor deste Programa.
Primeira questão, no domingo passado, um dos mais destacados e, certamente, o mais veemente apoiante deste Governo, o Presidente do Governo Regional da Madeira, Alberto João Jardim, cobrou uma

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factura de 26 milhões de contos, ou seja, 130 milhões de euros.
Queria só que me dissesse, Sr. Ministro, se vai pagar essa dívida anunciada, se a dívida não existe, se não vai pagar, em que estado é que estamos, porque nos disse - e tenho que crer que é verdade! - que vai impor transparência nas conta públicas. Paga ou não paga?
Segunda questão, o Sr. Primeiro-Ministro disse, hoje de manhã, que afinal sempre tinha havido um choque fiscal e que a redução de 5% do IRC vai motivar no próximo ano um aumento do Produto de 0,4%.
Entendamos bem, então, porque os números são certamente seus. Como é que se espera que ocorra este aumento do Produto em 0,4%? Porque, certamente, diminuindo as receitas do Estado, diminui os gastos públicos, reduz-se o Produto; se, em contrapartida, aumentarem os dividendos pode, porventura, aumentar o consumo e ainda se aumentar o investimento privado pode, porventura, aumentar o Produto. Mas como é que, na perspectiva do Governo, faz as contas para nos dar esta garantia? Tanto mais que há uma novidade que o Governo está a dar aqui, que é a de que abandonou a redução do IRC para 20%. Ficou claríssimo da sua intervenção, como ficou claríssimo no Programa do Governo, que a redução de 30% para 25% terminou e que já não passará para 20%. É uma estratégia, que, aliás, foi explicada e vale a pena discuti-la.
Constatando isso, importa saber como é que se constroem as perspectivas do Governo e, sobretudo, em matéria do IRC, porque é que o Governo não está disponível para tomar aquela que é, obviamente, a medida mais essencial para responder ao problema da fuga, que é a de controlar, inspeccionar, todas as empresas que declararam, no segundo, no terceiro, no quarto ou quinto anos consecutivos, prejuízo.
A última questão é esta: o Sr. Primeiro-Ministro falou das pessoas que têm 300 contos por mês de salário, não nos falou das que têm 70, 80 ou 100 contos.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se.

O Orador: - Concluirei, Sr. Presidente.
Certamente, reconhecerá que estas têm muito mais dificuldades do que aquelas que têm 300 contos. Como é que quer fazer o reajustamento dos escalões do IRS? Porque, Sr. Ministro, se se trata de evitar o aumento dos imposto, tem o nosso acordo, mas, no Orçamento do Estado, opôs-se à proposta das oposições de que se reajustasse os escalões em função da inflação. Não quiseram e, por isso, aumentou o imposto. Mas se o que nos quer dizer, e assim concluo, é que vai agilizar os escalões para aumentar o benefício fiscal das famílias que têm 300 contos, ou muito mais, de salário tem a nossa oposição.
Não será aceitável uma situação destas e a resposta estaria, Sr. Ministro, no englobamento, que é um preceito constitucional. E aí tem uma segunda proposta concreta: se todos os rendimentos pagassem por igual, então, não haveria esta selva de deduções e esta selva da fraude fiscal e teríamos a verdade.
Afinal, não é a verdade que deve ser o princípio da justiça no sistema fiscal?

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Ministro das Finanças e da Administração Pública informou a Mesa que, por uma questão de gestão do tempo do Governo, responde aos pedidos de esclarecimento em grupos de dois.
Sendo assim, para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins.

O Sr. Guilherme d'Oliveira Martins (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, ouvimos com atenção a sua intervenção que é profundamente autocrítica. E é-o uma vez que começa por nos dizer, e bem, que as finanças públicas são um instrumento.
Primeira questão: como interpreta a subalternização das finanças à economia neste Governo? Significa uma primeira autocrítica?

O Sr. António José Seguro (PS): - Muito bem!

O Orador: - Segunda questão: é um bom princípio a transparência na prestação de contas de todas as entidades incluídas no Orçamento. Está disponível, Sr. Ministro, para debater aqui, no Parlamento, e connosco, as propostas que existem nesta matéria,…

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - … designadamente, para garantir que não ocorra mais aquilo que, no relatório de 2002,

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a propósito das contas da segurança social, o Tribunal de Contas diz, ou seja, de que a transparência pode estar em causa?

O Sr. António José Seguro (PS): - Muito bem!

O Sr. José Magalhães (PS): - Bem lembrado!

O Orador: - A terceira questão, Sr. Ministro das Finanças e da Administração Pública, tem a ver com a revisão do Pacto de Estabilidade e Crescimento. Por ironia das ironias, será o Sr. Presidente da Comissão, nessa altura em exercício, o Dr. Durão Barroso, a apresentar os regulamentos que traduzem o Pacto de Estabilidade e Crescimento. Sr. Ministro das Finanças, o que pensa o Governo português relativamente a essa reforma? Quais os pontos fundamentais? A articulação efectiva entre o défice e a dívida? O cumprimento da regra de ouro das finanças públicas? A garantia, afinal, de que o investimento e o emprego não possam ser sacrificados?

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - A quarta questão tem a ver com o sistema fiscal. Há pouco, o Deputado Tavares Moreira citou um documento de trabalho da Comissão, mas esqueceu-se de o citar completamente. Esse documento de trabalho da Comissão diz que a consolidação das finanças públicas passa, naturalmente, pela redução da despesa corrente, mas diz também, cautela, é indispensável que a receita seja devidamente acompanhada e não se podem tomar medidas ou fazer anúncios imprudentes no que se refere à receita, designadamente pondo em causa a justiça fiscal ou pondo em causa o combate à fraude e evasão fiscal.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Este documento di-lo claramente, e estes dois aspectos são fundamentais.
Sr. Ministro das Finanças e da Administração Pública, isto leva-me a perguntar-lhe o seguinte: primeiro, em concreto, quais as áreas, se houver margem de manobra - e diga-nos qual é essa margem de manobra - em que pretende intervir no IRS?
Depois, quero reforçar a pergunta já aqui feita pelo meu colega Deputado Francisco Louçã: vai esquecer as promessas relativamente ao imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas, sobre as sociedades?

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

Neste momento, assumiu a presidência a Sr.ª Vice-Presidente Leonor Beleza.

A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado o seu tempo terminou. Conclua, por favor.

O Orador: - Vou concluir, Sr.ª Presidente.
Última questão: relativamente à margem de manobra, está a pensar o Sr. Ministro das Finanças e da Administração Pública naquela margem de manobra mirífica em que falavam os artífices do velho e defunto "choque fiscal", que era, afinal, a margem de manobra dada pelos benefícios da Região Autónomas da Madeira?

O Sr. José Magalhães (PS): - Boa pergunta!

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para responder aos dois primeiros pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças e da Administração Pública.

O Sr. Ministro das Finanças e da Administração Pública: - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados Francisco Louçã e Guilherme d'Oliveira Martins, agradeço as vossas questões e vou tentar responder, muito sinteticamente, a todas elas.
O Sr. Deputado Francisco Louçã - e não vou seguir a ordem das perguntas mas, repito, procurarei responder a todas - falou do aumento de 0,4% do PIB em 2005 pela descida da taxa de IRC de 30% para 25%. Creio que não percebeu como é que as contas são feitas.

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O Sr. Francisco Louçã (BE): - Estou à espera que me explique!

O Orador: - Isto é, se, por acaso, houver o mesmo nível de eficácia fiscal - e permita-me falar em contos -, como o IRC são 700 milhões de contos, ou seja, 3500 milhões de euros, e como a passagem de 30% para 25% significa uma redução de 18%, multiplique 18% por 700 milhões de contos, dá-lhe 110 milhões de contos, divida por 30 000 milhões de contos e tem 0,4% do PIB.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Que disparate! Era o que eu pensava: não faz ideia do que fala!

O Orador: - Em segundo lugar, e esta é também uma questão que de algum modo o Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins colocou, eu não disse - certamente não estiveram com atenção à minha intervenção - que abandonávamos a descida da taxa de IRC. Pelo contrário, eu, além de ter dito que era bem-vinda a descida da taxa para 25%, disse também que era relativamente "competitiva", utilizei esse termo, designadamente no contexto da União Europeia a 25 Estados, face às taxas dos outros países. Evidentemente que a prioridade é dada ao IRS, e o Sr. Primeiro-Ministro já o exprimiu várias vezes e já explicou as razões dessa prioridade.
A questão da fuga e evasão fiscal é importante e vale a pena salientar aqui aspectos determinantes para lutar contra este flagelo determinados pelo anterior governo, dos quais cito, designadamente, a intercomunicação e a articulação entre dados fiscais da segurança social e outros, que, certamente, vão produzir resultados acrescidos. Creio, também, que tudo o que seja simplificar e tornar mais visível os direitos e os deveres dos contribuintes perante o Estado e do Estado perante os contribuintes é positivo e é uma forma de lutar contra a evasão contributiva.
Já agora, Sr. Deputado Francisco Louçã, quero dizer-lhe que sou mais ambicioso do que o senhor, porque, juntamente com o meu Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, já falei com ele, determinei que vamos investigar e fiscalizar todas as empresas que acima de uma determinada facturação apresentem, nos últimos três anos, prejuízos fiscais.
Gostaria de referir também, sobre a questão da taxa marginal do IRS, o seguinte: compreendo o seu ponto de vista ideológico, mas é preciso não esquecer que o IRS não é apenas para indivíduos, é também para famílias. Portanto, não se pode ver apenas os escalões em função de uma pessoa mas em função de duas, designadamente.
Ora bem, o que é dramático no IRS é que a taxa marginal de 34% se aplique a rendimentos superiores a 15 999 euros. Ou seja, se dividir os 16 000 euros por 14 e por duas pessoas, dá-lhe um ordenado de cerca de 550 euros. Isto é, uma pessoa com mais de 550 euros, 110 contos, já apanha uma taxa marginal de 34%.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Não apanha nada!

O Orador: - Creio que, nesta Câmara e no País, ninguém estará satisfeito e cómodo com uma situação destas. Se temos ou não condições para, de algum modo, actualizar mais os escalões é uma questão que iremos averiguar. Agora, que essa é a nossa convicção, que esse é o caminho que queremos prosseguir passo a passo com segurança e com firmeza é-o indiscutivelmente.
O Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins falou da subalternização das finanças à economia. Confesso que de algum modo estava à espera dessa questão. É que não há qualquer subalternização, como se compreende, aliás, do Programa do Governo e das intervenções do Sr. Primeiro-Ministro, do Sr. Ministro de Estado e das Actividades Económicas e de mim próprio. Esse é um cliché e se está preocupado com hierarquias, devo dizer que eu apenas estou preocupado com o meu trabalho e o meu dever como Ministro das Finanças e da Administração Pública.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Quanto à questão da transparência das contas, entendo que é um aspecto em que o Governo e esta Câmara devem colaborar activamente, porque a transparência das contas tem de ser vista como uma causa nacional e um património do País. Portanto, sou favorável, na perspectiva do contrato orçamental de que falou o Sr. Primeiro-Ministro durante a manhã de hoje.
Quanto à questão da revisão do Pacto de Estabilidade e Crescimento, em primeiro lugar, é preciso dizer que o Pacto de Estabilidade e Crescimento não é uma questão do Governo ou da maioria, é uma

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questão do País e foi uma questão vossa enquanto governo. Portanto, é uma questão nacional, como certamente o Sr. Deputado compreende. Aliás, foi nessa perspectiva que compreendi a sua questão.
Quero dizer-lhe, e o Sr. Primeiro-Ministro, hoje de manhã, já respondeu a essa questão, que eu, pessoalmente, não me importo de ser confrontado com coisas que pensei e escrevi há sete ou oito anos, aliás, há seis anos mais precisamente…

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Ministro, o seu tempo terminou. Peço-lhe que conclua, por favor.

O Orador: - Vou terminar, Sr.ª Presidente.
Como estava a dizer, não me importo de ser confrontado com aquilo que pensei e escrevi, ou seja, que tenho pena que os critérios de Maastricht e, depois, o Pacto de Estabilidade e Crescimento não sejam mais sensíveis à variável "desemprego", ou seja, a uma tónica social que dê mais plasticidade, mais flexibilidade, dentro da regra que é o primado da contenção dos défices e do equilíbrio financeiro.
Quanto à questão da Madeira, já recebi uma carta do Sr. Presidente do Governo Regional, carta essa suficientemente explicativa. Certamente, terei de analisar o problema, mas posso garantir-lhe que se, de facto, for devido, nas condições de compromissos anteriores, será pago. A partir do momento em que, no Estado, não pagamos compromissos assumidos deixamos de considerar o Estado uma pessoa de bem.
Nesse aspecto, pode estar descansado porque iremos introduzir o máximo rigor e a máxima capacidade de solver os compromissos a que o Estado tenha ficado ligado.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Álvaro Castello-Branco.

O Sr. Álvaro Castello-Branco (CDS-PP): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro das Finanças e da Administração Pública, em primeiro lugar e antes de mais, queria saudar V. Ex.ª não só pelo excelente trabalho desenvolvido enquanto membro do anterior governo em áreas de grande sensibilidade, como são as da segurança social e do trabalho, e onde demonstrou um grande espírito reformador e grande consciência social em benefício dos portugueses,…

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - … mas também por esta nova e difícil missão que agora entendeu aceitar, a de ser o responsável pelas finanças públicas portuguesas. Estou certo, conhecendo a sua competência, rigor e trabalho, de que se tratará de mais uma missão que desempenhará de modo competente e eficaz.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Ministro, quando o anterior governo assumiu funções definiu objectivos, e o objectivo estratégico então definido foi o de aproximar Portugal, no espaço de uma década, do nível médio de desenvolvimento da União Europeia. Para alcançar este objectivo de médio prazo e combater a grave crise que o País então enfrentava ficaram, desde logo, definidos dois períodos: o primeiro, compreendido entre 2002 e 2004, destinado a colocar ordem nas finanças públicas e a iniciar o processo de reformas estruturais, criando as tão necessárias condições para o crescimento; o segundo, compreendido entre 2004 e 2006, correspondente ao período de início da retoma económica e de garantir as condições para a competitividade do País.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - A realidade mostra-nos que, decorridos dois anos, desde 2002 até hoje, o défice orçamental foi controlado, ou seja, em dois anos seguidos, o Governo prometeu e cumpriu (o défice situou-se abaixo dos 3% do PIB), iniciou-se o processo de consolidação orçamental e a redução da despesa pública, o ECOFIN, sob recomendação da Comissão, revogou a decisão de abrir contra Portugal o procedimento por défice excessivo, o défice corrigido do ciclo reduziu-se de 5,5%, em 2001, para 3%, em 2002,…

O Sr. José Magalhães (PS): - Falso!

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O Orador: - … e 1,6%, em 2003.

O Sr. José Magalhães (PS): - Falso!

O Orador: - É verdadeiro, tal como os Srs. Deputados do Partido Socialista bem sabem!
Hoje, já há sinais evidentes de que os principais desequilíbrios macroeconómicos foram corrigidos e a economia portuguesa está agora preparada para uma retoma sustentada.
O XVI Governo Constitucional defendeu, no seu Programa - e bem, no entender do CDS -, que a consolidação orçamental é um objectivo instrumental de primeira prioridade.
Nesse sentido, Sr. Ministro, a primeira pergunta que lhe quero formular é a seguinte: neste ciclo em que se inicia a retoma, que medidas, que políticas pretende V. Ex.ª desenvolver para impulsionar a economia portuguesa sem comprometer o equilíbrio das contas públicas, ou seja, mantendo a política desejável e que o Governo anunciou como seu objectivo instrumental de rigor orçamental?
Por fim, Sr. Ministro, coloco-lhe uma outra questão que tem a ver com a eventualidade de uma diminuição da carga fiscal. É recorrentemente referida pela oposição, nomeadamente pelo Partido Socialista, a questão do IVA. Sr. Ministro, caso existam condições para alguma diminuição da carga fiscal, que prioridade tem o IVA em eventuais futuras alterações às taxas tributárias?

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. José Magalhães (PS): - Esta pergunta era para o Ministro Álvaro Barreto. Enganou-se no envelope!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro das Finanças e da Administração Pública, permita-me que utilize um pouco uma linguagem cinematográfica para lhe dizer o seguinte: no "casting" da formação do novo Governo, foi-lhe atribuído um novo papel - de Ministro do Trabalho passou a Ministro das Finanças. Diz quem sabe que foi uma promoção e, inclusivamente, um reforço da componente CDS no novo Governo. Mas, promoção ou não, deixe-me dizer-lhe, com toda a frontalidade, que ela não é, certamente, do agrado dos trabalhadores nem do País, porque estes têm a experiência, durante estes dois anos, da forma como o Sr. Ministro, enquanto Ministro do Trabalho, atacou ferozmente os direitos dos trabalhadores deste país.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Ministro, passemos a falar do PEC.
É verdade que já respondeu, embora de modo incompleto, na minha opinião, a algumas questões postas pelo Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins, mas recordo que ouvimos hoje, pela voz do Sr. Primeiro-Ministro, a mais severa crítica que foi feita nos últimos tempos, por parte do PSD, à política desenvolvida pela ex-ministra Manuela Ferreira Leite.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Hoje de manhã, o Sr. Primeiro-Ministro confirmou que, ao contrário de Manuela Ferreira Leite, detesta o PEC e até concorda com aqueles que dizem que o PEC é um fenómeno absolutamente estúpido! E acrescenta que o PEC é quase uma questão de bicicletas: depende da bicicleta que cada um usa!… Portanto, assistimos hoje a uma violenta crítica do Sr. Primeiro-Ministro contra a posição da Dr.ª Manuela Ferreira Leite.
Só que, Sr. Ministro das Finanças, o Programa do Governo não fala do PEC e, então, importa saber o que é que o Governo pretende fazer: quer ou não quer mudar o PEC? Tem alguma estratégia para o mudar e em que sentido, Sr. Ministro das Finanças?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Uma outra questão tem a ver com o que o Governo designa por "política fiscal com mais verdade" - estou a reproduzir o que está escrito no Programa do Governo. Por outro lado, o Sr.

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Ministro disse que benefícios fiscais para alguns são penalizações fiscais para todos…

O Sr. Ministro das Finanças e da Administração Pública: - Eu disse "para outros"!

O Orador: - Para os outros…

O Sr. Ministro das Finanças e da Administração Pública: - Eu disse "para outros"!

O Orador: - Para a maior parte das pessoas! Foi esta a ideia que o senhor exprimiu.
Então, vamos esclarecer o que é que o Governo e o Sr. Ministro das Finanças tencionam fazer em matéria de benefícios fiscais, por exemplo, no sector bancário e financeiro, que tão bem conhece.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, o tempo de que dispunha terminou. Conclua, por favor.

O Orador: - Vou concluir, Sr.ª Presidente.
O Sr. Ministro vai alterar as taxas efectivas de IRC, dos 10%, 11% , 12%, escandalosos, para valores mais humanos? Vai passar a tributar as mais-valias bolsistas? É que, Sr. Ministro, a verdade das contas públicas não se faz só à custa de corte cego das despesas, faz-se também à custa do aumento das receitas, incluindo as receitas fiscais, eliminando benefícios eticamente ilegítimos e socialmente injustos.
Estamos à espera de uma resposta para ver qual é a posição do Governo sobre esta matéria, embora lhe diga, Sr. Ministro das Finanças, que não temos grandes ilusões quanto à natureza das respostas.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças e da Administração Pública.

O Sr. Ministro das Finanças e da Administração Pública: - Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, permitia-me voltar à última questão formulada pelo Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins, pela muita consideração que me merece e, também, pela maneira como colocou as questões.
No que se refere ao IRS, perguntou-me o Sr. Deputado quais as margens de actuação, as áreas em que iríamos, eventualmente, ter possibilidade de intervenção. Primeiro, e repito, só haverá alteração nos escalões, para além da actualização da taxa de inflação, se houver em 2005 e/ou 2006 margem orçamental para isso - é um ponto essencial. Segundo, pode ser feita alguma reafectação dentro do próprio imposto, porque se há deduções que se justificam, outras há que carecem de qualquer sentido à luz do século XXI e dos desafios que temos à frente.
Foi nesse sentido, precisamente, também pegando na questão colocada pelo Sr. Deputado Honório Novo, que referi que benefícios fiscais para alguns são, muitas vezes, penalizações fiscais para outros - e não para os outros. E o Sr. Deputado sabe bem que é assim, porque alguns dos benefícios fiscais favorecem quem tem mais dinheiro, quem mais poupa e, certamente, quem mais poupa não são os pobres.
Por isso mesmo, também dentro do próprio sistema endógeno do IRS pode fazer-se maior justiça social, mantendo potencialmente a mesma capacidade de receita.

O Sr. Honório Novo (PCP): - E o sistema bancário?

O Orador: - Estava a tentar responder em sintonia com as questões colocadas pelo Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins.
Sr. Deputado Álvaro Castello-Branco, quero agradecer-lhe muito as suas palavras de estímulo. Farei todo o esforço que estiver ao meu alcance para ser delas merecedor.
Queria dizer que a política orçamental é uma política fundamental e, ao mesmo tempo, instrumental, porque o grande objectivo de um país é o desenvolvimento. Também como referi há pouco, o desenvolvimento não é o mero crescimento económico: não é por acaso que à palavra "crescimento" se liga o adjectivo "económico" e à palavra "desenvolvimento" se liga o adjectivo "humano". É dessa perspectiva tripla, de disciplina financeira, de estímulo à economia e de justiça social que, na medida do possível, a política financeira deve exprimir a sua presença nas políticas públicas.
Quanto à questão do IVA, fez-me uma pergunta muito concreta, à qual não quero fugir, embora deva dizer, em relação a algumas das questões, como certamente compreenderão, que estamos na discussão do Programa do Governo e não na discussão da lei do Orçamento do Estado. Mas posso adiantar-lhe algumas

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ideias, designadamente que penso, repito, que é prioritária a redução no IRS e que não considero tão prioritária a redução no IVA.
Aliás, repare bem, nos países da Escandinávia, e cito apenas a Suécia e a Dinamarca, a taxa do IVA é única e de 25%. E ninguém pode acusar esses países de não terem um modelo social adequado no contexto europeu!

O Sr. Francisco Louçã (BE): - 65% de IRS!

O Orador: - A taxa do IVA é de 25%, os 65% dizem respeito à estrutura dos impostos, que é uma realidade bem diferente.
O Sr. Deputado gosta de confundir números, mas não me confunde com facilidade!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Dizia eu que o IVA é um imposto indirecto de grande equidade horizontal, não fazendo, é certo, justiça vertical, mas é o que menos beneficia os mais poderosos na evasão fiscal. Esse é um aspecto que devemos ter em conta na revisão fiscal e nos aspectos de abordagem fiscal que iremos estudar e apresentar na lei do Orçamento.
O Sr. Deputado Honório Novo disse que, eventualmente, haveria aqui um "erro de casting". Ora, no vosso caso, nunca há "erro de casting": independentemente dos filmes, o texto é sempre o mesmo!

Risos do PSD e do CDS-PP.

De facto, os senhores não erram no casting porque o "CD-ROM" - agora, numa visão mais moderna - é imutável desde há muitas décadas.
Quanto ao Programa de Estabilidade e Crescimento, o Sr. Primeiro-Ministro foi muito claro, ao dizer que concordava - como é óbvio, é o que acontece com grande parte desta Câmara - com os pressupostos, os objectivos e as finalidades que estão subjacentes ao PEC. Mas uma coisa são essas grandes linhas, outra coisa são as adaptações! E mudar, por vezes, em aspectos instrumentais, mantendo o mesmo objectivo central, não é nenhum mal, antes é um acto de lucidez, um acto de inteligência e de adaptação aos novos desafios, porque a Europa de hoje não é, por exemplo, a Europa de há quatro ou cinco anos.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Finalmente, quanto à questão do IRC, certamente o Sr. Deputado Honório Novo não ouviu com muita atenção a minha intervenção. Referi-me à ideia de, tanto quanto possível, fazer aproximar a base tributável do lucro real ao lucro fiscal.
Por outro lado, a questão das mais-valias é sempre recorrente em vós, justamente por uma questão muito simples: os senhores vivem fechados num castelo e julgam que Portugal não é uma economia aberta, em que os capitais não saem nem entram. Realmente, é um exercício teórico interessantíssimo, mas que, provavelmente, será interessantíssimo para a escola primária do marxismo!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Pacheco.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro das Finanças e da Administração Pública, permitam-me que também saúde a equipa das Finanças, em especial o Sr. Ministro, pelo Programa que nos apresentou, pela intervenção que aqui fez e pelos esclarecimentos que tem dado à Câmara em resposta às perguntas que lhe têm sido feitas, nomeadamente aquelas que, como por exemplo as do Partido Socialista, foram recorrentes de simples frustração - digo, frustração política, que é para que ninguém se ofenda e não venha já pedir a palavra para defesa da honra e da consideração.
Referiram-se os Deputados do Partido Socialista às críticas que o Tribunal de Contas fez à falta de transparência das contas públicas. Ora, durante seis anos e meio nunca se preocuparam com essas críticas e pouco fizeram em relação a essa matéria! Assinaram um Pacto de Estabilidade e Crescimento, em que hoje não se revêem e têm quase "epiderme" quando olham para ele! São, hoje, mais papistas que o Papa na defesa do défice orçamental, quando foram os campeões do despesismo!
Sr. Ministro, permita-me que lhe coloque questões concretas sobre uma área importante para todos

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nós, para os portugueses, e que até aqui ainda não mereceu nenhuma atenção por parte dos partidos da oposição: a Administração Pública.
Na linha do que já vinha do programa do governo anterior, a Administração Pública volta a ser uma prioridade para este Governo, nomeadamente apresentando como objectivos a dignificação dos funcionários públicos, a criação de uma Administração Pública amiga da economia, que apoie o desenvolvimento económico e, ainda por cima, que aposte na melhoria da qualidade de vida dos cidadãos, colocando-os no centro da actividade da Administração Pública, como deve ser para nos servir. Esses objectivos estão, pois, expressos no Programa do Governo de forma clara.
As medidas aprovadas no âmbito do governo anterior estão a ser implementadas. No entanto, a realidade é que, no âmbito de um universo tão amplo como é este, decerto haverá questões que andarão a ritmos diferentes. Daí que lhe coloque uma pergunta que interessa a milhares de funcionários públicos e a todos os portugueses, para que todos fiquemos conscientes de mais uma reforma concreta que vai ser implementado por este Governo: qual é a prioridade das prioridades que este Governo coloca na reforma da Administração Pública?

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Pina Moura.

O Sr. Joaquim Pina Moura (PS): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro das Finanças, começo por saudar a presença do Governo neste Parlamento.
Sr. Ministro das Finanças, queria dirigir-lhe questões breves em torno de três temas: o primeiro tem a ver com a política de consolidação das finanças públicas; o segundo, com a estratégia de desagravamento fiscal; o terceiro, com a questão dos pagamentos em atraso aos fornecedores do Estado.
Em relação à política de consolidação de finanças públicas, a questão central que, do meu ponto de vista, se coloca, e à qual a intervenção do Sr. Ministro não respondeu, ou, pelo menos, ainda não respondeu, é a de como passar de um caminho de consolidação das finanças públicas (nos últimos dois anos) frágil, incompleta e, em alguns aspectos, incorrecta para um caminho sólido, duradouro e mais ajustado. Ora, do meu ponto de vista, isso merece uma resposta e a definição de um caminho muito concreto quanto a, pelo menos, dois aspectos essenciais: como reduzir gradualmente, mas sustentadamente, os défices das empresas do sector empresarial do Estado fora do perímetro do sector público administrativo - gostava de ouvir do Sr. Ministro qual o caminho e quais as ideias, qual a estratégia que tem neste domínio; o segundo aspecto tem a ver com um tema que sei que lhe é caro, até pelas funções que desempenhou anteriormente, ou seja, com o necessário processo de convergência do sistema de pensões da função pública, da Caixa Geral de Aposentações, para o regime geral da segurança social. Que caminho, como percorrê-lo, com que etapas, em que prazo, com que garantias sociais?
Sr. Ministro, ainda no que respeita à política de consolidação das finanças públicas, queria manifestar-lhe a minha preocupação pelos sinais contraditórios evidenciados. Gostava de saber que verosimilhança têm no que respeita a algum relaxamento no exercício da disciplina e da solidariedade orçamental entre os vários sectores do sector público administrativo, nomeadamente no que respeita às autarquias locais.
Relativamente ao desagravamento fiscal, começo por dizer que, em princípio, todos somos pelo desagravamento fiscal. O Partido Socialista, nos seus seis anos de Governo, foi responsável por uma política activa e bem sucedida de desagravamento fiscal tanto em relação às pessoas, como em relação às famílias, como em relação às empresas. A questão está em saber qual o limite para além do qual o desagravamento fiscal se traduz em incapacidade efectiva ou de consolidar as finanças públicas e/ou de garantir o financiamento dos regimes das prestações e dos serviços sociais, não tanto no curto prazo, mas no médio e no longo prazo. É esse o limite e é sobre esse limite que importa discutir em concreto a famosa questão da margem de manobra para reduzir o IRS com o cuidado, que penso ser indispensável, de, por falta de margem de manobra, não se cair em manobras na margem do próprio desagravamento fiscal, que, em minha opinião, não existirão nos próximos dois anos.
Finalmente, sobre o atraso dos pagamentos do Estado aos seus fornecedores, há, neste domínio, um mistério que me parece absolutamente indispensável ser esclarecido, ou aqui ou na Comissão de Economia e Finanças. O mistério é o seguinte: por que se geraram e onde se geraram, em 2003 e 2004, estes atrasos, na medida em que o Orçamento rectificativo para 2002 dotou o governo de meios e autorização para pagar todos os pagamentos em atraso?
Estas eram as questões que queria colocar ao Sr. Ministro.

Aplausos do PS.

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A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Pinho Cardão.

O Sr. Pinho Cardão (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro das Finanças, gostaria de lhe colocar duas questões, começando por lhe apresentar dois factos.
No primeiro semestre, verificou-se uma recuperação da actividade económica com o crescimento do PIB, cuja evolução foi, aliás, até revista em alta. Também no primeiro semestre, a receita fiscal aumentou cerca de 6,2%, para o qual contribuíram os impostos directos com 9,8% e os impostos indirectos com 3,7%. Nos impostos directos, o IRS subiu, em relação ao período homólogo do ano anterior, 6,9% e o IRC teve um aumento notável de 21,1%. Este é o primeiro facto.
Segundo facto: das três grandes economias mundiais (Estados Unidos da América, Europa e Japão) a que mais cresceu na última década foi a economia americana, que cresceu cerca de 40%, e curiosamente, ou não, a despesa pública, medida pelo ratio dívida pública/PIB, desceu de forma significativa. Ao contrário, também no mesmo período, a economia que menos cresceu foi a economia japonesa (cerca de 15%), tendo a respectiva despesa pública aumentado dramaticamente, sendo que, medida também em ratio de dívida pública sobre o PIB, ultrapassa largamente o PIB. Donde se vê que a relação entre o crescimento económico é inversamente proporcional ao crescimento da despesa pública.
Se olharmos para a economia europeia, verificaremos que esta cresceu menos que a dos Estados Unidos da América (cerca de metade). Em contrapartida, a despesa pública, em vez de diminuir, subiu e a economia europeia cresceu mais que a japonesa; mas na economia japonesa cresceu mais a despesa pública do que na economia europeia.
Ora, isto significa que os países que mais cresceram foram aqueles que deixaram meios financeiros na posse dos cidadãos e procederam à redução de impostos em vez de fazerem o crescimento através da despesa pública.
A primeira questão que lhe coloco é, pois, a seguinte: dada a evolução da receita fiscal, não seria este o tempo e a oportunidade de começar a fazer reverter para os cidadãos meios financeiros, através de uma baixa de impostos, com ou sem choque fiscal, de forma a compensar os sacrifícios feitos, mas sobretudo, em termos de futuro, como forma de provocar o crescimento económico através do consumo e do investimento privado, a exemplo, aliás, das economias mais modernas e que reduziram a despesa para crescer?
A segunda questão tem a ver com o seguinte: verificamos que, em Portugal, cerca de 170 000 empresas, ou seja, cerca de metade das empresas portuguesas, nunca pagaram IRC. Além disso, dezenas de milhares de contribuintes em nome individual e profissionais liberais pagam um imposto médio de cerca de 80€. Portanto, há aqui uma fraude e evasão fiscal imensa, que a anterior Ministra das Finanças muitas vezes referiu.
Julgo que em Portugal se impunha não um, mas dois choques fiscais. Um choque fiscal para quem não paga e um choque fiscal para quem está a pagar exageradamente.
O que pensa o Governo fazer no que respeita à luta contra a fraude e evasão fiscal, que, aliás, está a funcionar, como prova também o aumento de receitas já evidenciado no primeiro semestre?

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças e da Administração Pública.

O Sr. Ministro das Finanças e da Administração Pública: - Sr.ª Presidente, começo por agradecer aos Srs. Deputados as questões que me colocaram.
Sr. Deputado Duarte Pacheco, agradeço as suas palavras de encorajamento. Colocou-me o Sr. Deputado uma questão relacionada com a Administração Pública, no sentido de ser amiga da economia, das pessoas, do desenvolvimento do País, tendo-me questionado sobre qual a prioridade das prioridades.
Penso que, nos últimos dois anos, avançou-se muito em termos de medidas de bases estruturantes da reforma da Administração Pública, quer quanto à avaliação, quer quanto ao contrato individual de trabalho, quer quanto à apreciação do mérito, quer quanto às regras relacionadas com os institutos públicos e outras leis estruturantes.
Entretanto, a Comissão de Acompanhamento da Reforma da Administração Pública também fez um belo e notável trabalho, que tem de ser posto em prática. Isto para lhe dizer que penso que já está tudo feito ao nível dos grandes diagnósticos. E, na medida em que não temos tempo a perder, o que desejo privilegiar, como Ministro responsável por essa área no Governo, é uma reforma que "entre em casa" das pessoas e das empresas. Ou seja, considerar uma série de actos da relação entre o Estado e a sociedade e

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simplificá-los, tornando a vida das pessoas mais simples, a vida das empresas mais adequada aos tempos modernos. Com isso, a reforma da Administração Pública será compreendida pelas pessoas e será responsabilizadora para os agentes e dirigentes da Administração do Estado

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Deputado Pina Moura levantou uma série de questões muito importantes, às quais procurarei responder.
Quanto à questão da política de conciliação das finanças públicas - falou-me de questões muito importantes, sem dúvida: a Caixa Geral de Aposentações é uma questão, do ponto de vista macro (não estou a falar concretamente das pessoas em si), que temos de enfrentar seriamente. Basta dizer que na segurança social há cerca de 2,5 milhões de pensionistas, com uma despesa total de 2000 milhões de contos (10 000 milhões de euros). Ora, a Caixa Geral de Aposentações ainda não atingiu 500 000 aposentados e tem uma despesa, resultante da dotação do Estado e da contribuição arrecadada junto dos funcionários, de cerca de 5000 milhões de euros.
Esta desproporção é de uma grande iniquidade. Em todo o caso, ao longo da última década, foram tomadas medidas importantes, nomeadamente em 1993, com a alteração da fórmula de cálculo das pensões dos funcionários públicos e também com a medida corajosamente tomada pelo anterior governo, que, certamente, terá implicações no sentido de aliviar e de não fazer crescer exponencialmente os aposentados da função pública. Essa é, sem dúvida, uma questão séria.
Quanto à questão da solidariedade das várias administrações sectoriais públicas (fundos e serviços autónomos, administrações regionais, autarquias locais, administração central do Estado), está na Lei de Estabilidade Orçamental, está no Programa do Governo - e disse-o na minha intervenção -, que terá de haver um esforço proporcional de todas estas entidades para a prossecução do objectivo de as contas públicas serem consolidadas.
Sr. Deputado, concordo consigo quando refere que a consolidação das finanças públicas tem de continuar a avançar. Faz-se, sobretudo, como ainda há pouco o Sr. Deputado Tavares Moreira referiu, do lado das despesas. Ora, aí também temos de dizer seriamente que, se é esse o caminho, também está aí a grande dificuldade, porque uma parte muito significativa do gasto público é inelástico, é, muitas vezes, de difícil mudança no curto prazo. Em todo o caso, continuaremos nesse caminho.
Quanto às empresas públicas com défice, é uma questão que não se relaciona apenas com o meu Ministério mas, quanto ao Ministério das Finanças, a ideia é escolher as empresas que, através de injecção de capitais resultantes de receitas de privatizações, possam efectivamente dar um salto positivo e não adiar um problema, transformando essa situação numa má solução.
Quanto à questão dos pagamentos em atraso aos fornecedores relativos a 2003 e 2004, estamos a fazer esse levantamento. O objectivo é o seguinte: grande parte desses créditos de empresas ou de fornecedores já está inscrito como despesa, pelo que não irá, certamente, afectar o défice. Esse levantamento está a ser feito, através de mecanismos e de engenharias financeiras transparentes e adequadas à resolução deste problema.
Quanto ao desajustamento fiscal, continuo a dizer que a questão do IRS - vale a pena referir - só pode ser abordada em contexto de não prejuízo da consolidação das contas. Se essa questão estiver em causa, não haverá um ajustamento nos escalões maior que a inflação ou em 2005 ou em 2006 - certamente será mais fácil em 2006 do que em 2005, como o Sr. Deputado reconhece. Não entraremos numa perspectiva arriscada e perturbadora daquilo que é fundamental ao nosso país, que é a consolidação das contas públicas.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Ministro, peço-lhe o favor de concluir.

O Orador: - Vou já terminar, Sr.ª Presidente, respondendo muito rapidamente ao Sr. Deputado Pinho Cardão.
Os números que o Sr. Deputado apresentou são, claramente, elucidativos de que os resultados positivos do combate à evasão e à fraude fiscais estão a dar sinais muito claros. De facto, o IRC está a crescer no primeiro semestre a uma taxa de 21,1%; o IRS, a 6,9%. Ora bem, os salários não tiveram esse aumento, bem como os lucros das empresas também não tiveram este aumento. Há, de facto, uma redobrada eficiência da máquina fiscal na recuperação de situações de evasão ou de atraso.
Finalmente, gostaria de dizer, quanto à evolução da receita fiscal, que mesmo que ela seja muito boa, Sr. Deputado, nós temos de ser muito prudentes, muito prudentes! Certamente, a última coisa que este Governo poderia deixar de errado para o País e para os portugueses era tomar medidas demasiado ousadas e imprudentes do ponto de vista fiscal. Para isso não queremos contribuir, porque esta é uma questão

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fundamental para o desenvolvimento do País e para a consolidação da justiça social.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - O Sr. Deputado Afonso Candal inscreveu-se para interpelar a Mesa. É sobre a condução dos trabalhos, Sr. Deputado?

O Sr. Afonso Candal (PS): - Sr.ª Presidente, com certeza.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Afonso Candal (PS): - Sr.ª Presidente, o Sr. Ministro das Finanças e da Administração Pública há pouco errou, e eu gostaria de dar oportunidade ao Sr. Ministro de corrigir o seu erro.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, não está manifestamente a interpelar a Mesa.

O Sr. Afonso Candal (PS): - Sr.ª Presidente, gostaria de entregar na Mesa elementos de que disponho e gostaria também de dar conta de que elementos se tratam.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, faça-os chegar à Mesa, que depois procederá à respectiva distribuição.

O Sr. Afonso Candal (PS): - Sr.ª Presidente, não me permite dizer ao que venho?

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, não se trata de uma interpelação, mas sim de uma intervenção. O Sr. Deputado fará o favor de fazer chegar à Mesa os elementos que referiu, que a Mesa procederá imediatamente à sua distribuição.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Anacoreta Correia.

O Sr. Miguel Anacoreta Correia (CDS-PP): - Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O Programa de Governo, que agora analisamos, e que expressa de forma clara aquelas que vão ser as linhas gerais de acção do XVI Governo Constitucional, reafirma de forma inequívoca uma continuidade desejável do trabalho realizado pelo XV Governo Constitucional. Reflecte ainda uma necessária adaptação a um segundo ciclo governativo há muito previsto. Um segundo ciclo que esperamos seja inequivocamente marcado pela já sentida "retoma", fruto da acção do XV Governo, principalmente no que diz respeito ao controlo das contas públicas e ao relançamento sustentado da economia.
Reconquistámos e solidificámos a nossa credibilidade externa;…

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - … executámos com coragem reformas estruturais necessárias e restaurámos a crença dos portugueses em Portugal; somos um país responsável, ambicioso e optimista. Responsável, porque reabituado a cumprir aquilo que são os nossos compromissos internacionais mais elementares; ambicioso, porque hoje todos sabemos que não podemos desperdiçar qualquer oportunidade de nos tornarmos mais competitivos e de nos afirmarmos na Europa e no Mundo; optimista, porque, criadas as condições para o crescimento real da economia, só possível por sermos hoje mais competitivos e produtivos, um país preparado e confiante no futuro.
O compromisso de mudança assumido pelo anterior governo é hoje sublinhado: a modernização e o aumento da produtividade continuam a ser desafios prioritários; a justiça e a equidade social são indispensáveis para podermos melhorar a qualidade de vida dos mais desfavorecidos e, assim, fazer de Portugal um dos países desenvolvidos da Europa, objectivo final de um exercício governativo que se quer baseado numa cultura de rigor e de acção responsável.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Mas, apesar do traço comum com o Programa de Governo anterior, e fruto da experiência governativa adquirida por esta maioria, cumpre salientar áreas em que este Governo não recusou inovar. O CDS tem, com gosto, responsabilidades nalgumas dessas pastas onde se inovou, e disso temos

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orgulho.
No que diz respeito ao Ambiente, hoje separado das Cidades, a acção deve ser sempre acompanhada por perseverança e arrojo: perseverança na decisão, sempre em defesa de uma melhor qualidade de vida, aproveitando a cada vez maior sensibilização dos portugueses para este sector; arrojo nas soluções, na defesa e no estímulo, por exemplo do investimento em energias renováveis ou limpas. Já aqui hoje foi referido - e eu reafirmo - que, no quadro desta década, decisões corajosas terão de ser tomadas no campo da energia a nível europeu e a nível nacional.
Opção estruturante e estratégica do XVI Governo Constitucional, a criação do Ministério do Turismo, sinal de reconhecimento a um sector essencial para a nossa economia, assume uma importância fulcral. O sector do turismo, uma real janela de oportunidade da nossa economia, motor de desenvolvimento e sinergias, terá inequivocamente um papel indispensável no âmbito da retoma da economia. O desafio para o turismo é o de potenciar história, tradição, cultura, paisagem, mas modernidade, aproveitando a nossa capacidade de acolhimento, evidenciando a nossa hospitalidade, respondendo a velhos e clássicos tipos de procura mas também a novos tipos de procura que já se fazem sentir no nosso país. Num ano em que Portugal se afirmou com a realização de eventos que trouxeram muitos milhares de turistas ao nosso país, a criação deste Ministério é um sinal muito positivo.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - A criação de uma Secretaria de Estado dos Assuntos do Mar, na dependência do Ministro de Estado e da Defesa Nacional, é uma aposta estratégica deste Governo, como, aliás, vem expresso no Programa. Durante muitos anos, durante décadas, Portugal voltou as costas ao mar, atitude pouco condizente com a nossa história, desperdiçando oportunidades e postos de trabalho. As questões ligadas aos oceanos, quer na vertente económica (indústria e transportes), quer na vertente científica, estão intimamente ligadas com o nosso passado e têm, obrigatoriamente, de estar ligadas ao nosso futuro.
Por último, gostaria, talvez por vocação ou por deformação profissional, de referir sinteticamente três áreas no sector dos transportes, que têm uma marca indubitável do XV Governo Constitucional e que importa destacar, quer pela sua importância, quer pela necessária continuidade: o arranque do TGV, o obrigatório estudo do sistema de financiamento das concessões de auto-estradas e as autoridades metropolitanas de transportes.
A introdução da alta velocidade ferroviária em Portugal apresenta-se como um importante factor de desenvolvimento do País, constituindo uma componente essencial da estratégia delineada no Plano Nacional de Desenvolvimento Económico e Social, a nível dos transportes e acessibilidades.
As concessões de auto-estradas carecem de uma avaliação sobre a sua economia, eficiência e eficácia. Os custos com as portagens virtuais, se nada se fizer, causarão um sério problema orçamental uma vez que os mesmos representarão, no período compreendido entre 2007 e 2025, um valor superior a 600 milhões de euros em cada ano desse período de 18 anos. É matéria que urge resolver, e as soluções encontradas devem privilegiar discriminações positivas e devem ter por base o mais amplo consenso das forças políticas e institucionais.
As autoridades metropolitanas de transportes são, na concepção do meu partido, decisivas para se alcançar uma mobilidade sustentada no quadro de 40% da população portuguesa. É essencial alicerçar a qualidade do sistema em vectores fundamentais. E a questão fundamental das autoridades metropolitanas de transportes é a de as dotar de estruturas adequadas de gestão, que foram criadas vencendo um impasse de mais de 15 anos mas que ainda não estão dotadas das estruturas de gestão. Que façam a gestão articulada da oferta e da procura em tudo o que diz respeito aos transportes.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Deputados: Continuidade e inovação não são contraditórias. Este Programa traduz um esforço para construir um País mais aberto, mais competitivo e mais moderno. É este o desafio que temos de vencer!
Desejo ao Sr. Primeiro-Ministro, a todos os membros do Governo, Ministros e Secretários de Estado, as maiores felicidades. Com o CDS, podem contar num esforço para, com todas as portuguesas e portugueses, construirmos, no quadro deste Governo de coligação, um País mais dinâmico, mais presente no Mundo mas, acima de tudo, mais justo.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Junqueiro.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Membros do

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Governo, Sr. Deputado Miguel Anacoreta Correia, a propósito da sua intervenção, há algumas preocupações que gostaria de partilhar consigo.
Em primeiro lugar, estou de acordo quando o Sr. Deputado diz que este é um Governo de continuidade. Mas também é de contrariedades. É de continuidade naquilo que não deveria ser continuado. E dou alguns exemplos: fala o Governo, no seu Programa, de uma rede nacional de plataformas logísticas, mas já falava nela há 27 meses - está falida, sem dinheiro, não há nenhuma dotação orçamental para ela funcionar.
Depois, fala no Plano Rodoviário 2000 e em novas centralidades, pelo que pergunto: mas quais? Quais são as novas centralidades? Onde é que isso está definido? E como é que se adequa o Plano Rodoviário 2000 às novas centralidades se nem um está reconvertido nem as novas centralidades estão definidas?
Quanto às portagens, a melhor justiça fiscal e social reside no sistema que está instituído. Dando as estradas cinco ou seis vezes mais em receitas fiscais ao Estado (o Estado agora está apenas a investir um quinto daquilo que recebe), os utentes não têm de ser penalizados, além dos impostos que pagam e das dificuldades que têm, sobretudo os das zonas mais deprimidas, onde, agora, o Governo tenta introduzir portagens. Como já se viu, por parte dos agentes económicos e das autarquias em geral há uma discordância em relação a esse ponto de vista.
E permita que lhe diga, Sr. Deputado Miguel Anacoreta Correia, que os números que apresentou, como sabe, não são adequados, porque não se aplicam à extensão do período de concessão.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Por outro lado, em relação à Secretaria de Estado dos Assuntos do Mar, há um retrocesso, e não uma continuidade (é mais uma contradição deste Governo), que é o seguinte: há 30 anos que o País luta - todos os partidos e todos os governos - para criar um avanço nesta matéria, e o Governo, ao criar essa Secretaria de Estado e ao colocá-la na dependência do Ministério da Defesa está a fazer esse retrocesso em matéria de segurança marítima, em matéria de autoridade marítima nacional… Aliás, se o Governo quisesse falar em segurança marítima, teria evitado o contencioso comunitário que foi aberto a partir do dia 1 de Julho, por ausência de transposição das directivas comunitárias sobre segurança marítima.
E mais: parece-me perfeitamente inadequado, num país como o nosso, europeu, democrático, que a própria Agência Europeia para a Segurança Marítima passe para o Ministério da Defesa Nacional, quando - e é isso que está no Programa do Governo -, Sr. Deputado (e com isto termino), a holding para o sector marítimo tem dois intérpretes sem uma solução, a agência para a promoção do transporte marítimo de curta distância, de que se fala no Programa do Governo, está absolutamente falida e havendo, quanto à questão das linhas de separação de tráfego, como sabe, uma impossibilidade de as reivindicar e determinar, com o imbróglio que é conhecido e com esta última decisão do Supremo Tribunal Administrativo, por causa dos radares de costa.
Sr. Deputado, a última pergunta que lhe faço é no sentido de saber se não o preocupa, no meio destes problemas que não estão resolvidos, e que são uma continuidade da inoperância do Governo, que, num País que se quer desenvolver económica e turisticamente, não haja uma política de mobilidade intermodal, conforme dispõem as próprias orientações comunitárias.
É a falência total do Programa deste XVI Governo para o domínio das obras públicas, mas penso, com toda a justiça, que o Sr. Ministro da pasta respectiva não terá culpa, porque, certamente, não foi ele que redigiu este Programa, que é um copyright, não actualizado, do anterior.

Aplausos do PS.

Vozes do CDS-PP: - Copyright?!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Anacoreta Correia.

O Sr. Miguel Anacoreta Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Junqueiro, agradeço as questões que me colocou.
Temos preocupações comuns sobre a importância dos transportes em Portugal e o futuro do sistema de transportes, mas, neste caso, não partilhamos essas preocupações. E vou dizer-lhe porquê.
Na intervenção que fiz em nome do meu partido, comecei por afirmar que este Governo segue uma linha de continuidade na inovação, na qual o meu partido tinha o maior prazer e a maior honra de ter uma

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quota-parte importante de responsabilidades, tendo-me limitado a citar três casos em que o XV Governo tomou decisões sobre as quais se registava, em alguns casos, um longo patinar de quase duas décadas de indecisão.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - É o caso das autoridades metropolitanas de transportes, cuja indefinição vem já desde a lei de bases do transportes terrestres, que neste momento estão criadas e a dar os primeiros passos.

Protestos do Deputado do PS José Magalhães.

O Orador: - Sr. Deputado José Magalhães, sem se dar o primeiro passo não há percurso, e o primeiro, o segundo e o terceiro passos estão dados. Não se preocupe com a gestão circular, porque vai ver que as autoridades metropolitanas vão surgir com força e vão resultar.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - A segunda questão a que me queria referir tem a ver com o TGV, em relação à qual se acabou por decidir um pouco à pressão (eu mesmo já o disse), sobre o mito dos problemas e da pressão das decisões que tinham sido tomadas por Espanha que, afinal de contas, não eram decisões tão concisas.
Efectivamente, há uma questão curiosa neste debate: é que não foi pronunciada a expressão "ameaça espanhola". Desde que o governo de Espanha é socialista parece que os nossos amigos do PS consideram que de Espanha não vem qualquer tipo de ameaça, que Espanha está neste momento neutralizada graças ao governo socialista.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Relativamente ao arranque do TGV, para o que já foram feitos estudos e projectos, foi já tomada uma decisão.

O Sr. José Magalhães (PS): - Já arrancou no papel!

O Orador: - Tenho muito gosto em partilhar outras preocupações com o Sr. Deputado, mas gostaria apenas de dizer que o programa da Secretaria de Estado dos Assuntos Mar tem de ser melhor lido e digerido. Por exemplo, queria dizer-lhe que a Agência Europeia para a Segurança Marítima não depende do Governo português; é uma agência independente, que não está colocada no Ministério da Defesa Nacional, ao contrário do que o Sr. Deputado José Junqueiro disse.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Está, está!

O Orador: - Não, a agência é independente.

Protestos do PS.

O Orador: - Se me permitirem, direi que as questões do mar estão sedeadas junto do Ministro de Estado que é cumulativamente Ministro da Defesa Nacional. Ora, isto não tem grande ciência, é fácil de compreender, basta ler o Programa pela segunda vez e com mais atenção.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

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A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro da Justiça.

O Sr. Ministro da Justiça (José de Aguiar Branco): - Sr.ª Presidente da Assembleia da República, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados: As minhas primeiras palavras dirigem-se à Sr.ª Deputada Maria Celeste Cardona, a quem desejo manifestar o reconhecimento pelo trabalho que desenvolveu à frente do Ministério da Justiça e que todos sabemos que, em determinados momentos, foi de grande sacrifício pessoal. Por isso daqui lhe dirijo um bem-haja!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Programa do XVI Governo Constitucional para a área da justiça fundamenta-se numa mundividência humanista, reclama-se da melhor tradição democrática e organiza e estrutura uma política reformista.
Fundamenta-se numa mundividência humanista, porque visa servir o ser humano, preservar a sua dignidade e dar conteúdo prático e efectivo aos seus direitos.
Seja numa simples alteração administrativa ou técnica, seja numa ampla reforma legislativa global, seja na configuração crucial do estatuto da vítima, do recluso ou do arguido, é o homem, o ser humano o princípio e o fim da nossa política.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Reclama-se da melhor tradição democrática, porque, sendo a justiça a área do Governo em que mais se testa e põe à prova o princípio da separação dos poderes, fica, aqui e desde já, garantida a firme disposição de promover, aos mais variados níveis, a concertação institucional.
O Governo, valorizando a cuidada atenção que ao tema tem dedicado o Sr. Presidente da República, estabelecerá canais de comunicação franca e permanente com os restantes órgãos de soberania; com as magistraturas e respectivos conselhos superiores; com a totalidade das profissões jurídicas ou envolvidas na administração da justiça (aproveitando, aliás, o que de melhor teve o Congresso da Justiça); com a generalidade das forças políticas, designadamente as da oposição parlamentar; e também com as mais diversas expressões da sociedade civil.
Por fim, organiza e estrutura uma política reformista, porque o XVI Governo vai continuar, completar e desenvolver o vastíssimo projecto reformador do gabinete que o antecedeu.
Na verdade, temos a aguda consciência de que o conjunto de reformas iniciadas pela anterior equipa ministerial se afigura decisivo - diria mesmo, indispensável - para realizar os principais desígnios do Governo.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - A saber: o desígnio de reforçar a confiança e a legitimidade em todos os patamares do sistema judicial; o desígnio de modernizar o aparelho judiciário e o sector administrativo da justiça, com vista a melhorar os níveis de cidadania e a dinamizar a economia; o desígnio de, através de um aumento sensível da celeridade processual nos tribunais e da celeridade procedimental na chamada administração pública da justiça, pôr termo a muitos dos estrangulamentos já endémicos.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Sr.ª Presidente, Sr.as Deputadas, Srs. Deputados: No quadro da política criminal, o Governo vai dar seguimento às reformas largamente consensuais que estavam em pleno curso.
Assim, mantém-se, com redobrado empenho, a reforma do sistema prisional, cumprindo as linhas de orientação resultantes da comissão da reforma.
Serão agendadas as iniciativas legislativas previstas, quer em matéria penitenciária quer em matéria penal e processual penal.
Vai reforçar-se a aposta no carácter excepcional da prisão preventiva e no encurtamento dos seus prazos, no recurso à vigilância electrónica, no uso alargado de penas alternativas à prisão e na introdução da mediação penal para jovens delinquentes, no programa de reconversão do parque judiciário e na erradicação, até 2006, do nefando "balde higiénico".
De salientar ainda a promoção das alterações processuais - cirúrgicas, mas universalmente tidas como necessárias - em sede de segredo de justiça e de escutas telefónicas.
No âmbito das reformas legislativas, com ampla repercussão na organização da justiça portuguesa, conserva-se a matriz da reforma da acção executiva e continua-se a execução da profunda alteração do contencioso administrativo, em especial do quadro organizativo dos tribunais administrativos e fiscais.
O sistema de acompanhamento, avaliação e monitorização destas reformas merece também especial atenção, de modo a poder intervir, pontual e oportunamente, no sentido de assegurar que os objectivos definidos venham efectivamente a ser atingidos.
Na área económica, destaca-se a entrada em vigor do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, a criação de novos tribunais de comércio e um eventual ajustamento das respectivas competências.
O programa de privatização da função notarial - um caso de sucesso de modernização da justiça

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- será concluído nos termos do modelo previamente definido que garante o acesso universal ao serviço público. A informatização das conservatórias e, bem assim, a rede de interconexão com os cartórios e os tribunais permanecerá como finalidade do Programa de Governo.
Importa, aliás, acrescentar que será dada toda a prioridade à informatização do sistema judicial no sentido de acelerar e de universalizar a modernização dos tribunais e dos seus serviços de apoio.
A reforma das custas judiciais, já em curso, será finalmente acompanhada do novo quadro do apoio judiciário, assente na parceria com a Ordem dos Advogados e na organização do Instituto de Acesso ao Direito.
No campo da administração judiciária propriamente dita, entre uma panóplia imensa de medidas, insiste-se no programa de reconversão do parque judicial, no recrutamento de novos magistrados, na qualificação dos técnicos de justiça e das suas competências a nível processual, numa cuidada alocação de competências aos tribunais superiores e na aposta nos meios não jurisdicionais de composição dos conflitos.
Sr.as Deputadas, Srs. Deputados: Os desafios que acabo de elencar são mais do que suficientes para que um Governo considere dispor, na área da justiça, de um programa de reforma global.
Mas, ainda assim - e em obediência à matriz que aqui se começou por enunciar -, o Governo valora como imprescindíveis três novos desafios.
O primeiro diz respeito à revisão do mapa judicial, para adequar os tribunais e as respectivas circunscrições ao volume da demanda ou procura judicial.
Eis uma revisão que todos reputam de urgente, mas que, em face do seu previsível carácter impopular, poucos querem assumir.

Vozes do PSD e do CDS-PP: -Muito bem!

O Orador: - O novo Governo vai levá-la por diante e compromete-se a tê-la pronta em 2006.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O segundo refere-se à formação de magistrados, seguramente um dos temas mais delicados do nosso Estado de direito. Em estreita concertação e articulação institucional, o Governo compromete-se a patrocinar, até Outubro de 2006, a reforma da formação dos magistrados. Os propósitos de uma tal reforma serão os de, por um lado, melhorar a qualidade e qualificação dos formandos e, por outro, preservar, a todo o transe, a sua independência, autonomia e legitimidade.
Finalmente, o terceiro consistirá no lançamento das bases para uma mudança de paradigma do processo civil. A ideia de que o processo civil vigente não se adequa às exigências do tráfego jurídico e económico do século XXI constitui um lugar comum.
É, pois, tempo de promover uma alteração global da legislação processual - do seu paradigma - que não se traduza num mero arranjo ou remendo de circunstância.
Trata-se aqui de uma tarefa ciclópica e, por isso mesmo, o Governo compromete-se apenas a lançar, durante o seu mandato, as suas bases.
Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: É este o Programa do Governo para a justiça, Programa que, reitera-se, se filia numa filosofia política humanista, na tradição democrática da separação e da concertação de poderes e numa ideologia reformista que privilegia a confiança no sistema, a celeridade de processos e a modernização económica.
Sr.ª Presidente, Sr.as Deputadas, Srs. Deputados: Neste momento final de apreciação do Programa do Governo, ocorrem-me as palavras do primeiro discurso político do advogado Francisco Sá Carneiro, em 1969: "Corremos um risco, assumimos uma responsabilidade; temos a consciência de cumprir um dever".

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Informo a Câmara que se inscreveram, para pedir esclarecimentos, cinco Srs. Deputados, sendo a primeira a Sr.ª Deputada Teresa Morais.
Tem a palavra, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Teresa Morais (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Justiça, permita-me que, nesta sua primeira presença no Parlamento, o cumprimente pela importantíssima pasta que ocupa e lhe deseje o maior sucesso no desempenho da sua função, que, sabemos todos, é uma função especialmente difícil, até por ser a justiça, neste momento, uma matéria excessivamente mediatizada que, também por isso,

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coloca preocupações frequentemente distorcidas aos cidadãos e constitui uma preocupação central da vida dos portugueses.
O anterior governo tomou em mãos a tarefa de empreender uma reforma profunda do sistema prisional. Na altura, tivemos oportunidade de saudar o governo por uma decisão que muitos consideraram ser uma decisão corajosa.
Quero, neste momento, reiterar este cumprimento e pessoalizá-lo na ex-Ministra da Justiça, que assumiu com particular empenho a avaliação séria e detalhada do estado do sistema prisional português e a aprovação desta reforma.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Trata-se de uma obra de fundo que há muito deveria ter sido realizada, num País que já comemorou 30 anos de democracia e que não conhece uma reforma penitenciária que seja digna desse nome, pelo menos, desde 1979. Na verdade, após 30 anos passados em democracia, o sistema prisional português mantém traços de um arcaísmo, que é preocupante, próprios de prisões degradadas do passado, mas que são inaceitáveis numa democracia europeia do século XXI.
Nos 55 estabelecimentos prisionais que temos, distribuídos em centrais, especiais e regionais, a situação não é homogénea - e devo realçar que há bons exemplos no sistema prisional que nos encorajam. No entanto, a sobrelotação média do sistema ainda é próxima dos 120%, e a situação é especialmente grave nos estabelecimentos regionais, onde as condições físicas dos estabelecimento e as condições de vida da população prisional são muitas vezes degradantes.
Não nos podemos esquecer, e o Sr. Ministro não o esqueceu aqui hoje, que persiste o balde higiénico nas prisões portuguesas, área em que o anterior governo assumiu também um compromisso de urgência no sentido da sua rápida erradicação, compromisso que hoje, aqui, também, com muito gosto, ouvimos ser reafirmado.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - A decisão desta reforma foi um momento essencial, diria mesmo que foi um momento fundamental, na vida de alguns de nós especialmente atentos às questões do sistema prisional, no sentido da sua dignificação, da sua humanização, da adequação do nosso sistema prisional às exigências de um Estado de direito democrático e europeu.
O Programa deste Governo mantém a reforma do sistema prisional como sua prioridade e, conforme afirmou o Sr. Ministro, uma prioridade em que colocará um redobrado empenho - o que, mais uma vez, ouvimos com muito gosto. Como, especialmente, ouvimos com gosto a reiteração da ideia de que a reinserção social tem de ser mais eficaz, aspecto central da reforma do sistema prisional pelo qual também o saúdo.
As questões que lhe coloco, Sr. Ministro (e algumas outras existiam, mas o Sr. Ministro resolveu-as na sua intervenção), são: primeiro, como, em concreto, pretende levar a cabo a reforma do sistema penitenciário propriamente dito? E, no que diz respeito ao calendário, como podemos nós esperar que ele aconteça relativamente àquilo que era a lei-quadro do sistema prisional apresentada pelo anterior governo e que o Sr. Ministro já disse que aceita e continua?

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Justiça, em primeiro lugar, como jurista, advogado e Deputado, quero saudar V. Ex.ª pelo cargo que vem agora ocupar, pela aura com que se apresenta e foi apresentado pela comunicação social e pelos responsáveis do sector, pela sua longa experiência na Ordem dos Advogados e no foro e pelo respeito que merece de toda a classe forense e judicial.
Agradeço também - já que a Dr.ª Celeste Cardona, por decoro, não pode pedir a palavra - as palavras justíssimas com que se referiu à ex-Ministra do seu pelouro.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - As reformas por ela feitas foram notáveis e deixarão, com certeza, uma marca indelével

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da sua passagem por aquela pasta.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Como ela própria disse, alguns dias antes de sair do governo, "as sementes não germinam logo, num curto espaço de tempo".

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Teremos todos ocasião de ver o fruto do trabalho que ela fez, e V. Ex.ª poderá aproveitar muito daquilo que está ainda por completar.
As duas perguntas que lhe quero fazer, Sr. Ministro, são as seguintes: em primeiro lugar, V. Ex.ª não se referiu ao problema candente que diz respeito à revisão do mapa judicial. Pergunto-lhe: V. Ex.ª tem alguma ideia (com certeza que tem), e pode dizer-nos, de como vai fazer a chamada "geografia judicial do País"?
A segunda vexata quaestio refere-se à formação dos magistrados, a que V. Ex.ª se referiu na parte final da sua intervenção. V. Ex.ª é apologista do tronco comum para as três magistraturas, ou profissões (procurador, juiz e advogado)? Ou defende que deve seguir-se o exemplo actual? Ou tem uma chamada "terceira via" (o Partido Socialista não gosta desta expressão…) para este problema?

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para responder aos dois primeiros pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Ministro da Justiça.

Neste momento, registou-se uma avaria no sistema de som.

O Sr. Ministro da Justiça: - Já tiraram a voz ao Ministro da Justiça?

Vozes do PS: - Não!…

O Orador: - Ainda não!

O Sr. José Magalhães (PS): - Isso é só ao fim de um ano!

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Ainda tem um ano para mostrar o que vale!

O Orador: - Como advogado, hei-de ter sempre voz!

Risos.

Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Teresa Morais, começo por agradecer as suas palavras.
Sr.ª Deputada, de facto, incomoda muito um cidadão verificar que aquilo que deveria ser a recuperação de alguém, que em determinado momento da sua vida teve a infelicidade de falhar, se transforma não num momento de recuperação mas num momento de exclusão ainda mais profundo.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Qualquer cidadão que tenha estado fora do governo, como eu estive até agora, e que seja chamado a exercer estas funções sente que os problemas com que se debatia e debate o sistema prisional carecem de uma rápida e profunda reforma. É este espírito humanista, é esta sensação que todos temos de que é necessário recuperar e não excluir que nos obriga a dar prioridade absoluta àquilo que é o homem, o cidadão. Por isso, não faço mais do que aquilo que estava previsto, e bem previsto, pela anterior Ministra que ocupou este cargo. E será no âmbito da lei-quadro, que caducou mas que iremos agendar novamente no próximo Conselho de Ministros, que irão desenvolver-se as outras iniciativas legislativas que têm se ser tomadas em conta.
Portanto, é uma aposta absolutamente inequívoca e é uma linha de orientação do novo titular deste Ministério, que irá ser prosseguida até às últimas consequências.
Agradeço também as palavras de referência do Sr. Deputado Narana Coissoró, que só tenho o

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prazer de conhecer pela televisão, dos muitos debates que acompanhei ao longo da sua já longa actividade política, e permito-me saudá-lo aqui, também, com todo o respeito de quem está pela primeira vez a exercer estas funções e até a entrar no Hemiciclo.
Vou responder e não responder às suas questões e já vai perceber porquê.
Quanto ao mapa judicial, ele irá ser objecto de uma comissão, que não será uma "comissão de nada fazer", porque tenho um compromisso, que assumi publicamente, no sentido de, até 2006, o apresentar, que pretende avaliar com toda a seriedade os estudos, as pendências, os recursos humanos existentes e aquilo que é a possibilidade de afectar recursos financeiros e humanos às diversas circunscrições que têm de ser alteradas. Por esta razão, não me permito, desde já, dizer qual é o quadro desse novo mapa judicial, pois não iria, com certeza, ser uma promessa séria. É, seguramente, uma promessa séria dizer que ele vai existir até 2006 e que obedecerá ao requisito de prosseguir uma melhor satisfação das necessidades das populações e promover uma justiça mais célere, que é aquela que, ao fim e ao cabo, todas as pessoas que estão lá fora, o cidadão, a pessoa, exigem de um titular do Ministério da Justiça.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Quanto à formação, se tivesse de responder já, iria negar tudo aquilo que disse ali da tribuna, ou seja, que pretendo fazer uma lógica muito forte de concertação, que pretendo auscultar as pessoas, que as instituições e os organismos que, sobre esta matéria, devem opinar, pois esta é uma matéria extraordinariamente sensível.
Tenho as minhas ideias, mas entendo que não as devo dizer aqui neste momento. Não irão faltar oportunidades, mas vejo com seriedade o exercício desta função. E, como não quero fazer promessas, nem violar o princípio e o método, de que falei ali da tribuna, de ouvir, falar e tentar o máximo consenso possível, porque esta é uma pasta essencial no pilar do Estado de direito, é uma pasta que exige, como todos dizem, que se tente fazer pactos de regime, serei um ministro que vai tentar, até às últimas consequências, conseguir isso.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Se for possível fazê-lo, fá-lo-ei; se não for possível fazê-lo, em 2006 regressarei ao meu escritório de advogado e para junto dos meus cinco filhos, que ficaram no Porto, e outro ministro virá.
Portanto, Srs. Deputados, o que quero dizer muito claramente é que esta é uma matéria que está no Programa do Governo, que irá ser cumprido, e, até 2006, terão, com certeza, novidades a este propósito.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Justiça, no primeiro momento em que tenho ocasião de me dirigir a V. Ex.ª, quero, desde já, dizer, em meu nome e em nome da minha bancada, que para nós a matéria de justiça é claramente um daqueles domínios de responsabilidade de Estado onde o concurso de todos é, obviamente, indispensável, para se poder realizar, com tranquilidade, mas, simultaneamente, com eficiência, uma reforma profunda que a justiça cabalmente merece.
E, por isso, nunca será, Sr. Ministro da Justiça, por desatenção ou falta de cooperação que não encontrará da parte do principal partido da oposição eco para uma reforma da justiça, tal como todos neste país esperam e exigem.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Mas dito isto, Sr. Ministro, desde já lhe digo o seguinte: se em alguma coisa as suas palavras iniciais surpreenderam foi pelo facto de ter vindo aqui evocar muitos dos mesmos temas recorrentemente expressos pela então Ministra da Justiça, Celeste Cardona, no sentido de agora o Sr. Ministro apenas vir alterar os prazos do compromisso. Em relação àquilo que antigamente a Sr.ª Ministra assumiu como compromisso realizar durante o ano de 2004 ou, no limite, até 2005, o Sr. Ministro da Justiça veio aqui deslizar o calendário para o final de 2006.
Por isso, Sr. Ministro, não posso deixar de lhe recomendar a leitura, que suponho que fará com atenção, do último Relatório do Conselho Superior da Magistratura para aí verificar o desespero institucional

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com que o órgão representativo dos juízes portugueses avalia a ineficácia completa que foi a gestão da pasta da justiça até este momento. E se me reporto ao Relatório do Conselho Superior da Magistratura é para lhe dizer, Sr. Ministro, que já aí há um projecto e um programa para a revisão em concreto do mapa judiciário, e se alguma coisa estranhamos é que o Governo revele que nem o conhece e que só agora vá lançar os estudos daquilo que vai fazer no final da Legislatura.
Por outro lado, em matéria de formação de magistrados, há um anteprojecto de lei há muitíssimo tempo discutido entre os parceiros institucionais e, no entanto, o Sr. Ministro da Justiça vem aqui dizer que não se considera em condições de revelar uma única ideia acerca das soluções que deveremos concretizar.
O Sr. Ministro também nada disse relativamente à definição prioritária do regime de gestão alternativa de conflitos, uma matéria igualmente da maior importância.
E, ao ter sublinhado a reforma do notariado,…

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, peço-lhe que conclua.

O Orador: - … acabou por escamotear que, afinal de contas, esta reforma é a oportunidade perdida para a desformalização, para a simplificação e para a verdadeira modernização dos actos de registo em Portugal.
Sr. Ministro, porque o tempo não me permite mais, vou concluir: queira V. Ex.ª tomar conhecimento, e com urgência, de tudo aquilo que, há muitos meses, os parceiros institucionais da justiça já colocaram em cima da mesa. Não nos faça perder mais dois anos como os dois que, infelizmente, perdemos até agora.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Justiça, o Programa do XVI Governo é a continuação do Programa do XV Governo e, por isso, enferma, bem como a intervenção de V. Ex.ª, das mesmas contradições que deram origem ao aprofundamento do caos na área da justiça.
V. Ex.ª é advogado e, por isso, sabe muito bem que a própria Ordem dos Advogados tem na Internet uma página chamada "Galeria dos Horrores", onde estão inscritas bastantes reclamações dos advogados portugueses relativamente à reforma da acção executiva.
De facto, o seu discurso é contraditório, na medida em que fala muito em atacar a morosidade da justiça - isso toda a gente quer fazer -, como uma forma de legitimar o poder judicial, mas a verdade é que, depois, todos os caminhos conduzem a que se agrave a morosidade da justiça, porque aquilo que se privilegia é uma justiça mercantil, é a mercantilização da justiça, em algumas reformas que representam verdadeiramente a privatização na área da justiça, aproveitando a estrutura pública do Estado, dos tribunais, pondo particulares a servir-se dela para seu proveito.
Um dos exemplos é, de facto, a reforma da acção executiva, cujo negócio foi entregue aos solicitadores, que é uma actividade privada, tendo deixado os tribunais sem funcionários e meios suficientes para, efectivamente, darem resposta aos processos. E, depois, vem a "Galeria dos Horrores", dos mails recebidos, às centenas, relativos a acções, que os tribunais, os funcionários, não podem abrir. E aqui surge, de facto, o longo calvário de uma acção executiva, quando todos os meios - os armazéns, o dinheiro para eles, etc. - são colocados à disposição dos solicitadores.
Mas a mercantilização da justiça não acaba aqui, pois ela também existe na privatização do notariado, porque, de facto, o Estado perdeu uma fatia substancial de receitas entregando-a a privados, quando todas as reformas contra a burocracia poderiam ter beneficiado os notários públicos. Então, por que é que se beneficiam os privados?!
Mas há ainda privatização nos próprios julgados de paz, quando uma actividade de mediação, que nada tem a ver com processos, é exercida - e é exercida dentro da lei - à custa da estrutura dos julgados de paz.
Depois de tudo isto - e tenho de terminar, porque não tenho mais tempo -, coloco a V. Ex.ª duas questões.
Sr. Ministro da Justiça, pensa que este caminho vai combater a morosidade, quando sabemos que na máquina do Estado, do Estado mal gerido, até há morosidade, por exemplo, na atribuição do rendimento social de inserção? Pensa que é desta maneira que se combate a morosidade? E o que pensa fazer em relação à questão do segredo de justiça? A partir de que ponto é que acaba o segredo de justiça?

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O Programa do Governo não nos responde a estas perguntas.
É por isso, Sr. Ministro da Justiça, que também nós ficamos à espera da reforma do Código das Custas Judiciais. Mas espero que, mais uma vez, não se aumentem as custas judiciais para arrecadar receitas, quando, depois, se vai gastar infinitamente mais na concessão de apoio judiciário.
Por último, Sr. Ministro, pensa que a actual estrutura do Instituto de Acesso ao Direito, em que o Estado se demite das suas funções, responde ao que vem na Constituição? Pensa que este Programa do Governo garante a administração pública da justiça?

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para responder aos dois pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Ministro da Justiça.

O Sr. Ministro da Justiça: - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Jorge Lacão, irei testar sempre essa manifestação de princípio, porque, se for genuinamente fidedigna, como é a minha, vamos, com certeza, conseguir encontrar plataformas para ajudar a resolver os problemas da justiça em Portugal.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - A vossa já não precisa de ser testada!

O Orador: - No que diz respeito às suas referências aos estudos, é evidente que temos conhecimento deles, tanto do Conselho Superior da Magistratura como de outros, só que desejamos levar a cabo todas estas iniciativas em concertação com os vários operadores judiciários, tentando seguir uma lógica que vá ao encontro daquilo que é a informação de outras carreiras jurídicas, e, portanto, a nossa missão no Ministério da Justiça é pegar, concertar e não seguir acriticamente um estudo ou uma proposta, venha ela de que sector venha dos operadores judiciários. É isto que se espera de quem apregoa, como nós, a concertação e tenta arranjar o maior denominador comum naquilo que possa servir não sectores corporativos individuais mas, sim, a justiça, porque todos nós só existimos para o cidadão, para que o cidadão tenha uma justiça melhor.
Sr.ª Deputada Odete Santos, confesso que não consegui apreender tudo aquilo que V. Ex.ª disse - deve ser da minha pouca prática do Parlamento -, mas há uma coisa de que a Sr.ª Deputada pode ter a certeza: não temos qualquer preconceito quanto à lógica de ser privado ou nacionalizado,…

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Não é o que parece!

O Orador: - … o que nos preocupa é que seja eficaz e que vá ao encontro das necessidades das pessoas e de uma melhor situação para a justiça. Não temos preconceitos desta natureza.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - É por isso que nem tudo deve ser privado e nem tudo deve estar no Estado. É este o paradigma que sempre será seguido por nós. E em todas as matérias que V. Ex.ª referiu será isto que será prosseguido.
V. Ex.ª refere, nomeadamente, uma matéria que eu também conheço bem, que é a do Instituto de Acesso ao Direito. Eu sei que há quem entenda que deveria haver um defensor oficioso, que deveria haver mais uma situação onde se pusesse em causa o princípio da independência e da liberdade do exercício do patrocínio forense.

Protestos da Deputada do PCP Odete Santos.

Eu sei! Eram mais funcionários públicos!

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - O projecto do PCP não era esse!

O Orador: - Mas nós pretendemos que quem exerce o patrocínio e a defesa do cidadão o faça com total independência e liberdade, o mais parecido possível com o paradigma daquilo que é o patrocínio de um mandatário. Queremos que o apoio oficioso seja igual àquele que os mais ricos podem ter, quando recorrem a um advogado independente do Estado. É isto que desejamos, é isto que vai ser protocolarizado com a Ordem dos Advogados e é isto que, com certeza, vai ajudar a que cada um possa ser melhor defendido na barra dos tribunais.

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Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Vieira da Silva.

O Sr. Vieira da Silva (PS): - Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Estamos hoje a iniciar um processo, que é um processo contínuo, de avaliação do Programa do Governo da coligação PSD/CDS.
Mas atenção, depois de 27 meses de políticas erradas, de compromissos falhados e de promessas enterradas no esquecimento, o Governo PSD/CDS tem hoje aqui não uma espécie de 2.ª chamada mas, antes, uma espécie de 2.ª frequência. Mas esta é uma 2.ª frequência a que o Governo da maioria chega com várias notas averbadas na caderneta.
O Governo desta maioria é o Governo da maior recessão da União Europeia e da recente história económica portuguesa, da mais dramática quebra de investimento das últimas décadas e do mais rápido crescimento do desemprego da União Europeia.
O Governo desta maioria parlamentar é o Governo da desorganização dos ministérios, da incompetência na organização dos serviços públicos essenciais, do agravamento das desigualdades sociais e do recuo generalizado da qualidade de vida dos mais pobres e da classe média.

O Sr. José Magalhães (PS): - É um facto!

O Orador: - Mas o Governo desta maioria parlamentar tem mais, na caderneta com que chega a esta 2.ª frequência: tem uma avaliação já feita, e feita por quem de direito, tem uma avaliação feita pelo povo português e nela, na dura, mas transparente verdade dos votos, o Governo desta maioria chumbou,…

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - … e chumbou com uma nota muito baixa.

Aplausos do PS.

Era de esperar que, agora, o Governo da maioria PPD/CDS viesse melhor preparado. Infelizmente, para Portugal e para os portugueses, não veio.
Onde se esperavam compromissos sérios para que o Estado assumisse um papel activo no apoio à recuperação económica de milhares de pequenas e médias empresas, estranguladas pela política da tanga, o Governo da coligação de direita faz um catálogo de boas intenções e promete, mais uma vez, reformar-se a si próprio.
Onde se deveriam esperar propostas claras de combate ao desemprego, compromissos e metas para responder ao drama de centenas de milhares de famílias, o Governo oferece vagos objectivos e uma retórica de aluno que mal leu os manuais.

O Sr. António José Seguro (PS): - Muito bem!

O Orador: - Mais: o Governo desta maioria, tão cioso da sua muito recente vocação europeia, não conhece os seus compromissos em matéria de políticas sociais europeias. Onde está o Plano Nacional de Emprego e os seus compromissos? O Governo esqueceu-se, ou entende que, já que são compromissos para não cumprir, é melhor nem falar deles?!

O Sr. José Magalhães (PS): - Meteu na gaveta!

O Orador: - Nós não deixaremos que tal aconteça.
No que se refere ao Plano Nacional de Emprego, apresentado em Bruxelas, o Governo assumiu o compromisso de, até 2006, fazer com que 6% da população adulta participe em acções de aprendizagem ao longo da vida. Aí, o Governo assumiu o compromisso de reduzir em um terço o diferencial de desemprego entre mulheres e homens, até 2006. Onde estão estes compromissos, no Programa do Governo desta maioria parlamentar?

O Sr. António José Seguro (PS): - Muito bem!

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O Orador: - Será por estes e por muitos outros compromissos que o Governo será julgado e não pela vacuidade da retórica do discurso de hoje do Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Sobre as políticas sociais, é bem pesado o balanço destes 27 meses e, infelizmente, não é melhor a perspectiva para o futuro. Apenas alguns exemplos.
Uma crise prolongada das receitas da segurança social levou o Governo desta maioria a reconhecer que, pela primeira vez, nos últimos oito anos, não haverá excedente para reforçar o fundo de capitalização da segurança social.
Há um corte generalizado de direitos sociais, como o subsídio de doença, onde um falso conceito de discriminação positiva tem vindo a servir para reduzir, efectivamente, a qualidade de vida de centenas de milhares de portugueses, dos que têm mais dificuldades.
Há um agravamento das condições de vida dos mais pobres de entre os pobres, condenados, de novo, a dependerem de subsídios eventuais, em virtude de opções erradas, que tantas vezes aqui denunciámos, no que respeita ao chamado "rendimento social de inserção".
Mas não importa referir apenas a ausência dramática de qualquer referência ao combate à pobreza, inaceitável para quem reafirma a dimensão personalista das suas políticas, verifica-se também outro esquecimento imperdoável, que é o desaparecimento de qualquer compromisso de concretização do Plano Nacional de Inclusão. Também ele é um compromisso europeu que o Governo desta maioria teima em desvalorizar.

Aplausos do PS.

Para o futuro, e acerca das desigualdades sociais, ouvimos, com muita preocupação, o agora Sr. Ministro das Finanças afirmar que o que se pretende do sistema fiscal é mais proporcionalidade e menos carácter progressivo, porque para redistribuir lá está a segurança social. Não é este o caminho do modelo social europeu, não é este o caminho da Europa, não é este o caminho que os portugueses merecem.

O Sr. Guilherme d'Oliveira Martins (PS): - Muito bem!

O Orador: - O que podem, então, os portugueses esperar deste Governo e deste Programa? Um Estado mais moderno e eficaz, mais próximo do cidadão e parceiro activo na convergência com a União Europeia?

O Sr. José Magalhães (PS): - Nada disso!

O Orador: - Não! Infelizmente, não! O que o Governo da maioria PPD/CDS descobriu foi o folclore, inconsequente e irresponsável, de semear uns tantos gabinetes de Secretários de Estado pelo País,…

O Sr. Miguel Relvas (PSD): - Que visão retrógrada!

O Orador: - … para que não se veja o óbvio do que está a acontecer: uma tendência clara para a desertificação efectiva de amplas zonas do País, que se vêem empobrecidas nos seus recursos e na sua capacidade de responder às necessidades de desenvolvimento.
Mas o Governo apresenta mais. Apresenta mudanças na organização de vários ministérios, alguns deles já castigados por 27 meses de indefinições de equipas em rápida rotação, sempre com muitas assessorias externas mas com uma total ausência de rumo.
Podem os portugueses esperar alguma ideia de progresso, uma visão integrada de um país que se desenvolve de forma coesa e ambiciosa? Podem esperar isto do Programa desta maioria parlamentar? Não! Infelizmente, não podem! Há apenas mais promessas de mudanças nas políticas de apoio ao esforço das empresas, grande parte das quais ficará à espera de novos programas ou novos ministros.
Podem os portugueses esperar políticas sociais que, efectivamente, garantam a promoção do emprego de qualidade e a solidariedade com as famílias que dela necessitam? Não! Infelizmente, não podem! Apenas cosmética na organização governamental, ou, pior, uma desvalorização efectiva do papel do Estado na garantia de relações laborais equilibradas e um reforço na lógica assistencialista, em detrimento de uma política efectiva de promoção dos direitos sociais.
Não, Sr. Primeiro-Ministro! Infelizmente, não é o modelo alemão que a desagregação do ministério

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do trabalho anuncia. Se fosse, onde está a lógica da parceria social, como existe na Alemanha, da gestão participada, do investimento na formação? E - atenção! - o Governo desta maioria foi o Governo que, em 27 meses, nem um único acordo de concertação social foi capaz de promover.

Aplausos do PS.

O Sr. José Magalhães (PS): - Bem lembrado!

O Orador: - Com o Governo desta maioria, fundir trabalho e economia representa, efectivamente, subordinar as políticas de emprego e formação aos empregos hoje existentes, o que significa não ousar investir no futuro e conformar o Estado com um tipo de neocorporativismo que não deve existir na sociedade portuguesa.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Muito bem!

O Orador: - O PS rejeita este Programa porque ele é o resultado de uma coligação enfraquecida na sua credibilidade, sem ideias e sem ambição.
Seremos oposição firme e serena, mas determinada, a este Programa e a este Governo, porque queremos uma política económica capaz de investir no crescimento e na inovação, sem penalizar os equilíbrios macroeconómicos e os equilíbrios sociais, porque queremos modernizar a Administração para melhorar os serviços públicos e não para os desmantelar, porque queremos uma economia mais competitiva mas acreditamos que ela pode e deve ser cúmplice de uma sociedade mais justa, mais igual e mais solidária.
É por estes princípios que faremos oposição e estamos certos de que, hoje, temos o povo português connosco, como estará nas próximas eleições, talvez em 2006.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado, da Defesa Nacional e dos Assuntos do Mar.

Vozes do PS: - Do Mar?!…

O Sr. Ministro de Estado, da Defesa Nacional e dos Assuntos do Mar (Paulo Portas): - Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Deputados: Há dois anos, quando tomei posse como Ministro da Defesa, fui recebido com um proverbial e até compreensível cepticismo.

Vozes do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes: - Não!…

O Orador: - Não era do sector, não tinha o diploma de auditor, não escolhera as chefias militares e fazia parte, e ainda bem, de uma geração que, graças à liberdade, foi passada à reserva territorial. Acresce que, para dificultar a tarefa, a defesa nacional, em geral, e as Forças Armadas, em particular, tinham sofrido com um certo declínio a que, imprudentemente, o mundo, pós-queda do Muro de Berlim, votou as urgências da segurança e da defesa, com uma secundarização perigosa dos valores da segurança face à prioridade absoluta do económico e, entre nós, com a instabilidade crónica que levou a que, num só ciclo político, fossem demais os ministros a ocupar a pasta e com um défice de confiança por parte da instituição militar, castigada, como foi, por indecisões e adiamentos que foram tornando o equipamento das Forças Armadas obsoleto, a sua organização inadequada e o salto para a profissionalização inconsistente, se nada mais fosse feito.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Citei, deliberadamente, o factor humano, o factor material e o factor organizativo, decisivos, cada qual à sua medida, para a articulação da política de defesa.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - O que foi feito nos últimos dois anos é tributário do apoio do Primeiro-Ministro Dr. José Manuel Durão Barroso, que aqui quero significar, passou por uma permanente articulação, persuasão e compreensão da nova geração de chefias militares, que quero também significar, e - permitam-me

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uma palavra especial - é obra de uma equipa onde quero realçar o papel do Sr. Secretário de Estado da Defesa e Antigos Combatentes.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. José Magalhães (PS): - Que se transferiu!

O Orador: - Era difícil, parecia impossível, para muitos críticos, mas, no entanto, considero que bastante se fez e o que falta fazer é preciso garantir que seja bem terminado.
Produzir uma política de defesa nacional implica, necessariamente, uma dose de sacrifício quanto àquilo que alguns apontam como a popularidade imediata. Mas a credibilidade de uma política de Estado não se compadece senão com um investimento de fundo e a prazo e pode, hoje, dizer-se que há fundadas esperanças de que a vontade de modernizar, transformar, reequipar ou operacionalizar as Forças Armadas não tem retorno, é irreversível, para a dignidade das Forças Armadas e para o prestígio de Portugal.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Quero reafirmar, perante a Assembleia da República, os três princípios que devem marcar uma atitude política na defesa nacional, para lá de quaisquer divergências doutrinárias.
Primeiro: a defesa nacional implica um esforço de coordenação, que nunca se esgota, entre o Governo, que tem a responsabilidade de a conduzir, e o Presidente da República, que é Comandante Supremo das Forças Armadas. Assim foi e assim será, pois não há espaço, não há vantagem e, sobretudo, não há qualquer vontade para dissídios institucionais numa área tão sensível como esta.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Segundo: a defesa nacional é uma política de Estado e, assim sendo, deve obedecer à procura do mais amplo consenso possível, nomeadamente com o maior partido da oposição, que partilha, com a área política da maioria, das opções essenciais da nossa geografia de alianças.
Em todos os documentos estruturantes desta política privilegiámos e privilegiaremos o diálogo com a maioria e com o Partido Socialista. Assim foi, assim continuará a ser.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Terceiro: a defesa nacional implica estabilidade nas alianças. O último exame multilateral da Aliança Atlântica a Portugal não foi um exercício de paciente ilusão, foi um acto refundador da confiança num País que quer ser respeitado e que, para ser respeitado, sabe honrar os seus compromissos.
O nosso empenhamento na Agência Europeia de Defesa é outro exemplo de que não aceitaremos somar, à visão de uma certa periferia geográfica, a distância das decisões ou a irrelevância tecnológica e industrial. Numa palavra, manteremos um nível de ambição com uma imagem próxima naquilo a que tenho chamado "Portugal com três fronteiras": a fronteira europeia, onde o nosso destino se joga todos os dias; a fronteira atlântica, onde temos um lugar privilegiado que não tencionamos concessionar a mais ninguém; e a fronteira da lusofonia, onde são acrescidas as nossas responsabilidades.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - A isto somamos empenhamento determinado, sem hesitações e sem cedências ao politicamente correcto, na luta contra o terrorismo, porque esta não é apenas - e seria o bastante - uma causa de direitos humanos, é uma causa de modernidade contra a regressão civilizacional que, à força do sangue, os terroristas nos querem impor,…

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - … e uma atenção especialíssima à questão do Magrebe, para protecção da segurança comum.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Com os princípios orientadores que enunciei - articulação com o Comandante Supremo das Forças Armadas, bom relacionamento com o Parlamento, procura do máximo consenso de Estado nesta área, fidelidade às alianças estratégicas de Portugal -, quero também

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deixar aqui, na Assembleia da República, Casa Nobre da democracia, os objectivos essenciais do mandato do XVI Governo Constitucional em matéria de política de defesa nacional.
Primeiro: Portugal terá, no final deste ano, uma nova doutrina de defesa, completa, aprovada e, na parte que é possível, publicada.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Está feito o novo conceito estratégico de defesa nacional, aprovado com uma única abstenção; está consagrado o novo conceito estratégico militar, aprovado por unanimidade no órgão próprio; o Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas trar-me-á, a tempo do próximo Conselho Superior de Defesa Nacional, o projecto de missões específicas das Forças Armadas, que está a elaborar em conjunto com os chefes dos vários ramos; terminará, ainda em 2004, o dispositivo e o sistema de forças.
Entre 2002 e 2004, os cinco documentos estruturantes da defesa nacional são novos e ficarão prontos. Pela primeira vez, em muito tempo, Portugal recuperará a coerência com os ciclos de planeamento das alianças estratégicas em que está integrado.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Segundo: o reequipamento das Forças Armadas é uma decisão irreversível e atingirá velocidade de cruzeiro.
Na área militar, não decidir uma vez pode custar, em termos operacionais, 10 anos. Decidir, com coragem, algo que se atrasou só se materializa dentro de alguns anos mas é absolutamente necessário decidir, adiar é o mais fácil.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Falo neste aspecto com a autoridade de uma equipa que devolveu credibilidade à Lei de Programação Militar,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - … ao atingir as taxas de execução da Lei de Programação Militar mais elevadas - 66% e 67% -, desde que a avaliação parlamentar é feita.

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): - Muito bem!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - O Deputado Marques Júnior sabe disso!

O Orador: - E gostaria de acrescentar que, na revisão ordinária da Lei de Programação Militar, a qual será feita este ano, procuraremos equilibrar as necessidades operacionais com um modelo financeiro em que, mais uma vez, a margem que apoia o reequipamento seja reduzida, de modo a que a factura do contribuinte não seja aumentada.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Ainda em 2004, tão cedo quanto o Governo deixe de estar em gestão, se merecer e receber a confiança deste Parlamento, amanhã, como esperamos,…

O Sr. José Magalhães (PS): - Suspense!

O Orador: - … está pronto para assinatura o contrato de instalação do radar da Madeira, primeiro passo decisivo no controlo pleno da defesa aérea nacional.

Risos do PS e do PCP.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - O Sr. Ministro vai à inauguração?!

O Orador: - VV. Ex.as sorriem mas o assunto é sério demais para merecer a vossa indiferença.

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Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Ficará também pronto, para assinatura, o contrato do primeiro lote de rádios tácticos para o Exército português, concebidos e produzidos em Portugal, dando postos de trabalho a quadros e a engenheiros portugueses que vão equipar o nosso Exército para atingir os seus objectivos no quadro da NRF, que é a nossa ambição primeira para 2005 e 2006.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Ainda este ano, será tomada decisão sobre as viaturas blindadas de rodas que substituem as antigas chaimites; lançar-se-á o concurso da arma ligeira que substitui as antigas G3; será fechado o dossier dos helicópteros do Exército; serão recebidas - esperamos - as fragatas Perry, que foram negociadas em boas condições com os Estados Unidos da América; e prosseguir-se-á esse programa decisivo de construção, nos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, dos patrulhas, que substituem as corvetas com quase 40 anos de idade, e dos navios de combate à poluição, que darão a Portugal uma capacidade de combate aos crimes ecológicos que nunca tivemos.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Tal como previsto, será também considerada prioritária a substituição do avião táctico.
Em terceiro lugar, o serviço militar obrigatório terminará em 19 de Novembro de 2004, conforme prescrevem a Constituição e a lei.
Foram tomadas medidas, que implicaram um esforço financeiro, para garantir a competitividade salarial dos contratados, a saída profissional para a Guarda Nacional Republicana dos contratados e a reinserção social dos militares no final do seu contrato. Por esses motivos, e ainda outros, os resultados são globalmente positivos.

O Sr. José Magalhães (PS): - Ainda falta falar dos ex-combatentes!

O Orador: - Já lá vamos, Sr. Deputado!
Como estava a dizer, os resultados são globalmente positivos.
Deu-se um salto enorme - e gostaria de, mais uma vez, chamar a atenção da Câmara para este ponto. Passar do regime de conscrição para a profissionalização das Forças Armadas é algo que põe em risco e mede a credibilidade da instituição militar e do Estado de soberania pura na sua relação com uma sociedade no século XXI.
Não posso deixar de dizer que, ao contrário do que estimavam os críticos habituais, como hoje afirmou o Sr. Primeiro-Ministro, o Exército português atingiu o mínimo operacional necessário seis meses antes da data do fim do serviço militar obrigatório.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Neste esforço, que é nacional, cabe a este Governo poder dizer às famílias portuguesas que o serviço militar obrigatório termina e garantir às Forças Armadas de Portugal que a sua capacidade de recrutamento não sofreu por esse efeito.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Isto significa que esta política, a política de incentivos e de competitividade no mercado tem de ser uma política sustentada, porque a profissionalização não é um desafio de 2004, é um desafio de 2004 e de todos os anos que se seguem.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Em quarto lugar, no que se refere às indústrias de defesa, recebi-as em estado de falência técnica, como é conhecido de todos. Estão no bom caminho, serão internacionalizadas e constituirão uma marca de prestígio para Portugal.
Recordo a esta Câmara que, em Maio de 2002, as indústrias de defesa portuguesas tinham um passivo de 34 milhões de contos; não havia um euro para pagar salários e a ameaça de fecho das empresas era

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diária - aliás, foi-me aqui várias vezes colocada como questão, como se tivéssemos nisso alguma responsabilidade…!
Devo dizer que a decisão de não fechar essas empresas, a decisão de recuperá-las e de as reestruturá-las, aguentando protestos e greves, foi uma decisão social de quem tem consciência social. Portugal não deve ser apenas cliente, deve ser também produtor do ponto de vista das indústrias de defesa. Temos marcas excelentes, tivemos, nos últimos dois anos, administrações eficientes!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Neste momento, o passivo dessas empresas está limpo, as propostas de internacionalização serão recebidas no mês de Agosto, a decisão será tomada em função dos projectos industriais que melhor sirvam Portugal e a sua indústria, nomeadamente de reparação, manutenção e fabrico aeronáutico.
Em quinto lugar, até Outubro, pela primeira vez em 30 anos, o Estado pagará aos antigos combatentes uma remuneração pelo seu esforço em favor da bandeira de Portugal…

O Sr. José Magalhães (PS): - Mas qual?

O Orador: - … e contará os anos de combate para efeitos de reforma.
É uma decisão moral, com um enorme esforço financeiro. Em dois anos fez-se o que se estimava que custasse 10 anos a completar: o recenseamento de meio milhão de antigos combatentes; a certificação de fichas militares de meio milhão de antigos combatentes; o alargamento do âmbito pessoal da lei e a sua regulamentação.
A primeira decisão que tomarei nesta área, em articulação com os meus colegas de Governo, logo que este deixe de estar em gestão, será a constituição da portaria que cria o Fundo dos Antigos Combatentes. Cumprimos e cumpriremos, honradamente!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Em sexto lugar, a política das forças nacionais destacadas manter-se-á prudentemente estável em 2004. Como todos sabem, houve desequilíbrios financeiros sérios: em 2001, na ordem dos 45 milhões de euros; em 2002, na ordem dos 30 milhões de euros; em 2003, ainda na ordem dos 20 milhões de euros.
Queremos atingir o equilíbrio entre a despesa e o financiamento alocado às forças nacionais destacadas em 2004. Por isso temos critérios prudenciais quanto ao empenhamento das nossas forças, estando, naturalmente, atentos à circunstância de a saída do contingente militar de Timor Leste implicar um reforço da cooperação técnico-militar; à primeira operação em grande escala com a bandeira da União Europeia, a da Bósnia, no final do ano; e, naturalmente, à presença, no quadro do Afeganistão, da International Security Assistance Force (ISAF), onde, aliás, a continuidade da política externa portuguesa é admirável, visto que foi ainda o governo do PS que incluiu essa opção para as nossas forças nacionais destacadas.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Em sétimo lugar, a melhoria dos processos de gestão na Defesa Nacional tem em 2004 e 2005, anos decisivos, primeiro, na instalação definitiva da central de compras do Ministério - divulgarei esta semana o balanço de nove meses de compras conjuntas de material não militar. A única coisa que posso, e devo, dizer com muito orgulho a esta Câmara é que o nível médio de poupança foi de 12% por se ter instalado um sistema transparente e eficiente, em que o Ministério faz as compras conjuntamente e não cada ramo por si.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Também é relevante, e fica feito, o sistema integrado de gestão, que servirá a qualquer ministro, de qualquer governo, de qualquer legislatura, para ter visibilidade sobre a organização, uma visibilidade que sem ele não existe, por enquanto.
Em oitavo lugar, quero dar, nesta segunda fase da Legislatura, e para isso conto com o Sr. Secretário de Estado da Defesa e Antigos Combatentes em especial, mais relevo às questões de pessoal, às questões estatutárias e à protecção do factor humano nas Forças Armadas. Por isso mantêm-se, e brevemente conhecerão a forma institucional adequada, os projectos, já discutidos em Conselho de Chefes de Estado-Maior e em Conselho Superior de Defesa Nacional, para valorizar estatutariamente os

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militares e evitar alguns estrangulamentos que são conhecidos.
Em nono lugar, quero ainda dar particular ênfase, nesta segunda metade da Legislatura, à reforma da saúde e do ensino militar, tal como estava escrito no Programa do XV Governo e continua a estar no Programa do XVI Governo.
Em último lugar, na política de defesa nacional foi ainda relevante - e digo-o apenas no limite do que posso dizer - que as informações produzidas na área militar estejam hoje sob escrutínio democrático impecável, o que não acontecia antes, e que haja uma considerável melhoria da eficiência da informação estratégica que protege os interesses do Estado português. Mais não devo dizer, mas qualquer decisor ou especialista do sector sabe ao que me refiro.
Obviamente, acompanhamos, porque sempre foi esse o nosso pensamento, a reforma dos serviços, que mereceu um consenso tão alargado no quadro do anterior governo.
Ou seja, em termos de Defesa Nacional nada está parado, muitas coisas estão em fase de ultimar ou terminar, tudo implica sentido de Estado e uma vontade enorme de fazer e, se possível, bem fazer.
Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Toda a vida, por visão e convicção, acreditei em Portugal como um País marítimo.

Vozes do PS: - Ahhh…!

O Orador: - Fui até criticado por excessos de atlantismo por alguns que ainda não perceberam que a fronteira atlântica também é uma fronteira europeia.
Na minha visão da História, Portugal fez-se pela ocupação do território. O papel dos nossos exércitos é, por isso, insubstituível. Mas tenho a fundada convicção de que Portugal nunca teria sido universalista sem a condição marítima e que Portugal, sem o mar, não teria, em certos momentos, protegido a sua liberdade e recuperado a sua dignidade.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Ao longo dos últimos dois anos, tive o privilégio de conhecer, conviver, ajudar a decidir e perceber melhor a questão do mar como extraordinário potencial estratégico para Portugal, e é fácil de o explicar ou de o demonstrar.
Pela Defesa Nacional passou o relançamento da indústria portuguesa de construção naval,…

O Sr. Jorge Nuno Sá (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - … porque é esta que está a construir os patrulhas e os navios de combate à poluição.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Pela Defesa Nacional passou a possibilidade de termos navios de investigação, que nos tinham sido cedidos por um país amigo, a navegar e a investigar - um, em 2004 e, outro, em 2005 - e não encostados, durante anos e anos, como os encontrámos. Foi preciso encontrar os recursos para que os investigadores possam investigar, e isso é decisivo para a constituição do dossier português de alargamento da plataforma continental.
Pela Defesa Nacional passou a questão muitíssimo delicada da segurança marítima e da protecção contra os crimes ecológicos. Foi este governo que decidiu lançar o contrato de construção dos navios de combate à poluição, e isso é financiado, entre outros documentos, pela Lei de Programação Militar.
É a tutela da Marinha que me permite ter o contacto diário entre a Autoridade Marítima Nacional e as administrações portuárias. Também na fiscalização é evidente o contacto entre quem fiscaliza e quem autoriza. Não preciso de descrever com mais detalhe que se, porventura, fosse acrescentado no âmbito do Ministério da Defesa Nacional um departamento do mar criar-se-ia um equívoco, porque a Defesa Nacional é una e indivisível e os três ramos são igualmente importantes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Julgo que é uma oportunidade para o País - e digo-o com modéstia - que a mesma pessoa que tem a responsabilidade, por tutela orgânica, da Defesa Nacional possa ter também responsabilidades, como o Sr. Primeiro-Ministro desde o primeiro dia me solicitou, em políticas marítimas, que são decisivas para o crescimento económico de Portugal e para o nosso desenvolvimento tecnológico.

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É por isso que, sendo para mim óbvias as sinergias, evidente a oportunidade e grande o entusiasmo, vemos os assuntos do mar como uma alavanca industrial, como um promotor científico, como um garante da segurança, como um agente de modernidade quanto às regras, quer as que devemos transpor para a legislação nacional quer aquelas que devemos legislar, do ponto de vista da protecção nossa costa, para sermos também um factor de crescimento económico e defensores, como somos, de um modelo muito mais descentralizado de administração portuária em Portugal, que dê a quem de direito a gestão nessa matéria.
Seguindo o documento da estratégia dos oceanos, muitíssimo bem feito e em cuja elaboração, mais uma vez, a Defesa Nacional estava qualificadamente representada, considero que a política do mar é a vocação marítima de Portugal, é uma aposta correcta deste Governo.
Permitam-me terminar, Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, dizendo apenas isto: o mar de Pessoa e de Camões, de Mário Sá Carneiro ou de Sofia de Mello Breyner, o mar dos navegadores portugueses, o mar das canções dos exilados políticos, o mar que não tem cor política, o mar que não tem ideologia, pode muitíssimo bem transformar-se numa bandeira que una Portugal.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. António Filipe (PCP): - Esqueceu-se do Mar da Palha!
Este é um verdadeiro "discurso da palha".

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente Mota Amaral.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Montenegro.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado, da Defesa Nacional e dos Assuntos do Mar: Como V. Ex.ª teve oportunidade de dizer - e já noutras ocasiões o fez - vivemos hoje um tempo em que, quer na Europa quer no Mundo, se verifica uma evolução significativa ao nível dos riscos e das ameaças à paz e à segurança, um tempo onde esses riscos e ameaças são extraordinariamente difusos e fortemente imprevisíveis, um tempo em que o terrorismo é um perigo global, que usa métodos sofisticados e impiedosos, um tempo em que a fronteira entre a segurança interna e a segurança externa é cada vez mais ténue, quando não imperceptível, um tempo em que, mais do que nunca, se justificam a actualização e a adaptação dos instrumentos de defesa nacional, tarefa que, muito bem, o XV Governo Constitucional já iniciou aos níveis da adequação e reformulação do conceito estratégico de defesa nacional, da cooperação técnico-militar com os PALOP e com Timor-Leste, da profissionalização das Forças Armadas, da gestão das indústrias de defesa, da justiça, prometida e realizada, àqueles que combateram pela Pátria e, finalmente, da necessidade de proceder a um eficaz processo de reequipamento das Forças Armadas, de que as taxas de execução e de realização da Lei de Programação Militar são um cabal exemplo. De resto, entre 1998 e 2001, essas taxas rondavam os 42%, em média, e, em 2002 e 2003, subiram significativamente para 66% e 67%.
Sr. Ministro, é no âmbito desta matéria, o reequipamento das Forças Armadas, que lhe coloco três breves questões.
Primeira pergunta: no que tange ao contrato-programa entre a Marinha e os Estaleiros Navais de Viana do Castelo, gostava de saber se V. Ex.ª está em condições de nos dar informações sobre as "traves mestras" que norteiam esse clausulado.
Segunda pergunta: quando o Sr. Ministro afirma - e fê-lo há pouco - que as fragatas Perry foram negociadas em condições favoráveis, no que é que consistem essas condições?
Terceira e última pergunta: no horizonte temporal - e aqui registo que V. Ex.ª tem tratado muito bem o factor tempo, porque tem sido rápido a decidir e a pôr em prática todos os programas -, quando é que o Governo decidirá sobre a aquisição das viaturas blindadas de rodas?

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Ministro comunicou à Mesa que responderá conjuntamente às várias questões que lhe forem colocadas.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado, da Defesa e dos Assuntos do Mar: Creio que o Sr. Ministro não se dá conta da incredibilidade da maioria dos cidadãos e precisamente hoje foi infeliz na sua intervenção. De facto, quando nos desfiou, na continuidade, aliás, de outros documentos,

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o principal reequipamento militar para servir o que chama as alianças estratégicas, vulgo a NATO e as suas operações, não se deu conta da contradição enorme que existe entre a sua intervenção e a situação de visível atrapalhação em que esteve o Sr. Primeiro-Ministro, neste mesmo dia, ao dizer que lhe faltavam uns aviões para combater os incêndios florestais, que talvez viessem dois da Itália, que talvez viessem dois da Grécia, que talvez viessem daqui ou de além.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Jorge Nuno Sá (PSD): - Está a brincar com coisas sérias, Sr. Deputado!

O Orador: - O que o cidadão percebe é que está desprotegido face a ameaças reais. No entanto, ouve a sua tese de incremento da despesa média em equipamento militar ao nível da despesa média dos países europeus da NATO, essa chamada inversão da decadência. Como é que isso se lhes explica, quando nós temos enormes carências a nível da protecção, em medidas sociais e em equipamentos noutro tipo de estruturas?
Sr. Ministro de Estado, da Defesa Nacional e dos Assuntos do Mar, a maioria dos cidadãos portugueses não entende essa tese, não compreende essa política do Governo!!
Digo-lhe mais sobre isto: acontece que, nestas circunstâncias, o que podemos e devemos exigir é uma explicação. Em parte alguma do Programa do Governo há uma expectativa de crescimento do investimento público ou da despesa pública! Há algumas indicações numa ou noutra área, particularmente em despesas que tenham a ver com a reprodução de equipamentos ao serviço do Estado português. Curiosamente, só na área da Defesa há uma precisão mais ou menos assinalável desse crescimento de despesa.
Entende-se! Entende-se que não haja qualquer convergência para a média da protecção social europeia! Mas há uma convergência para a média dos gastos militares europeus!

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

O Orador: - Significa isso uma política que favorece as famílias, hoje aqui tão faladas, os cidadãos, os direitos de cidadania ou é, realmente, uma desproporção e a verdade da política deste Governo?
Ouvimos, há pouco, o Sr. Ministro das Finanças e da Administração Pública dizer, de uma forma indistinta, que era preciso cortar na despesa e ouvimos agora o Sr. Ministro de Estado, da Defesa Nacional e dos Assuntos do Mar…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo terminou.

O Orador: - … acentuar a componente despesista.
Afinal de contas, a racionalização da despesa é um problema de critério político: não se quer gastar onde se deve gastar e quer-se gastar onde não se deve gastar!!…

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Marques Júnior.

O Sr. Marques Júnior (PS): - Sr. Presidente, em primeiro lugar, uma saudação ao Sr. Primeiro-Ministro e aos Srs. Membros do Governo.
Sr. Ministro de Estado, da Defesa Nacional e dos Assuntos do Mar, peço desculpa por não me referir aos "Assuntos do Mar", mas não sei exactamente do que é que se trata.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): - Vá à Lei Orgânica!

O Sr. José Magalhães (PS): - Não há!

O Orador: - Talvez no próximo Orçamento do Estado saibamos exactamente qual é o conteúdo da célebre rubrica "Assuntos do Mar".
Nas questões da Defesa Nacional, estamos de acordo em que a defesa nacional é uma política de Estado. Sobre esse ponto de vista creio que não há dúvida alguma e também o Sr. Primeiro-Ministro, na sua intervenção, valorizou especialmente esta relação com as Forças Armadas.
O Sr. Ministro da Defesa Nacional deu-nos conta de um conjunto alargado de realizações na área da

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Defesa, mas, se compararmos o que estava no Programa do XV Governo com o que está no do XVI Governo, verificamos que as coisas que lá estão são quase as mesmas. Praticamente não houve qualquer evolução significativa de um governo para o outro!

O Sr. Honório Novo (PCP): - Ele agora vai fazer a dobrar!

O Orador: - Sr. Ministro da Defesa Nacional, como sabe os documentos estruturantes de que falou já deviam estar feitos há muito tempo.

O Sr. José Magalhães (PS): - Já!

O Orador: - O Sr. Ministro sabe que o conceito estratégico de defesa nacional aprovado implicava que, quase de imediato, os outros documentos tivessem sido elaborados. Mas não foram feitos!

O Sr. José Magalhães (PS): - Atrasou-se!

O Orador: - O Sr. Ministro falou no problema das Forças Armadas, mas, curiosamente, não se referiu a um aspecto absolutamente essencial: a suborçamentação e o subfinanciamento das Forças Armadas.

O Sr. José Magalhães (PS): - Não foi por acaso!…

O Orador: - O Sr. Ministro não ignora que esta questão é gravíssima nas Forças Armadas.

O Sr. José Magalhães (PS): - É a bancarrota!…

O Orador: - Eventualmente será grave noutros sectores da Administração Pública, mas ao nível das Forças Armadas tem a ver não só com questões de operacionalidade como também com a qualificação especial das Forças Armadas enquanto instituição nacional.

O Sr. José Magalhães (PS): - Exactamente!…

O Orador: - Gostava que o Sr. Ministro da Defesa dissesse alguma coisa sobre esta matéria, que, como sabe - já lhe coloquei várias vezes este assunto -, é de uma gravidade extrema, e que nomeadamente relacionasse isto com as forças nacionais destacadas, de que o Sr. Ministro tanto fala, cujas dívidas são enormes e a cargo, fundamentalmente, do Exército.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem lembrado!…

O Orador: - O Sr. Ministro anunciou hoje, pela "enésima" vez, as célebres viaturas blindadas de rodas. Se calhar o Sr. Ministro não se lembra, mas eu recordo-lhe que o senhor levou o Sr. Primeiro-Ministro a anunciar,…

O Sr. Ministro de Estado, da Defesa Nacional e dos Assuntos do Mar: - No dia 14 de Agosto.

O Orador: -Exactamente, no dia 14 de Agosto, está a fazer um ano.
Como dizia, o Sr. Ministro levou o Sr. Primeiro-Ministro a anunciar a abertura do concurso internacional para a aquisição destas viaturas. Ora, nós nada sabemos sobre as viaturas!

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): - Isso não é verdade!

O Orador: - O que se sabe é que, relativamente ao que o Sr. Ministro tem proposto e tem falado, tem havido sempre adiamentos.
O Sr. Ministro referiu-se aos ex-combatentes, reivindicando para si a resolução dessa questão, mas, como sabe, essa é uma matéria que consta de lei que foi aprovada, por unanimidade, na Assembleia da República, e o Sr. Ministro sabe também que as expectativas dos ex-combatentes ficaram altamente frustradas com as propostas e soluções que acabou por apresentar.
Sr. Ministro, uma vez que falou nos ex-combatentes…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se.

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O Orador: - Peço desculpa, Sr. Presidente, mas vou terminar com esta questão a que, creio, o Sr. Ministro da Defesa Nacional é muito sensível.
Sr. Ministro da Defesa Nacional, o que é feito da lei da rede nacional de apoio aos stress pós-traumático?

O Sr. José Magalhães (PS): - Bem perguntado!

O Orador: - Sr. Ministro, relativamente a esta matéria, o que é que foi feito no que respeita à questão dos ex-combatentes que são vítimas de problemas de saúde e que vivem em situações verdadeiramente dramáticas?

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): - E o que é que vocês fizeram?!…

O Orador: - Já gora, como Sr. Ministro fala muito da Lei de Programação Militar, gostava que respondesse à questão seguinte: para quando prevê a revisão da política das contrapartidas da LPM, que é absolutamente essencial, que o Sr. Ministro ficou de apresentar há já mais de um ano e sem a qual a LPM é nada ou quase nada?

Aplausos do PS.

O Sr. José Magalhães (PS): - Boas perguntas!

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): - Têm uma "lata" fantástica!…

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado, da Defesa Nacional e dos Assuntos do Mar, a quem lembro que vai haver uma segunda ronda de perguntas.

O Sr. Ministro de Estado, da Defesa Nacional e dos Assuntos do Mar: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Relativamente à negociação do contrato-programa com os Estaleiros Navais de Viana do Castelo o que posso dizer é que se pudermos contratualizar, a anos de distância, o que os estaleiros necessitam do ponto de vista de materiais, obedecendo aos requisitos da Marinha, para 10 navios patrulha e dois navios de combate à poluição, a aquisição dos materiais sai muito mais em conta. Daí a vantagem de um contrato-programa.
Devo dizer-lhe que, do ponto de vista de reestruturação e recuperação, acho perfeitamente possível, com algumas adaptações jurídicas, fazer nos Estaleiros Navais de Viana do Castelo o que se fez nas Oficinas Gerais de Manutenção Aeronáutica.
Em relação às fragatas, gostava de dizer ao Sr. Deputado Luís Montenegro que Portugal não tem dinheiro para comprar fragatas novas - sempre o disse - e estávamos em risco de perder metade do nosso sistema de forças nessa área, porque as fragatas da classe João Belo estão, neste momento, praticamente sem valor militar e uma fragata custa muito mais do que um submarino. Assim, teremos duas fragatas em segunda mão - não é o ideal mas é o possível - por 16% do preço, incluindo o upgrade do que seriam as fragatas novas. É o que podemos fazer para compatibilizar as possibilidades com as necessidades.
Em relação às viaturas blindadas de rodas, Sr. Deputado e meu querido amigo, Marques Júnior, tantos anos que estiveram no governo!… Nós lançámos o concurso o ano passado, no Dia do Exército; vamos anunciar a decisão este ano, no Dia do Exército; o concurso está em testes… E ainda vem pedir-me mais rapidez?!… E então a vossa demora?!…
A verdade é que com os XV e XVI Governos as chaimites passarão a ser peças de museu. Graças a Deus! Em termos operacionais, Portugal passará a ter viaturas blindadas de rodas para o Exército e para a Marinha. As necessárias, as possíveis, mas modernizadas.

O Sr. José Magalhães (PS): - Venham elas!

O Orador: - Sr. Deputado Luís Fazenda, o Bloco de Esquerda nunca comparece na Comissão de Defesa Nacional, não se interessa por esse assunto, e depois diz coisas que não têm qualquer nexo com a realidade!

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Não têm para si!…

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O Orador: - Já lhe disse isto várias vezes e digo-o com amizade!
Sr. Deputado, em primeiro lugar, a Força Aérea foi retirada, em 1998, do sistema de combate a incêndios, por decisão que nada tem a ver com este Governo nem com o anterior!
Em segundo lugar, então o senhor não considera positivo que este ano, ao contrário do que era costume, o exército português, mais exactamente a engenharia militar, fizesse 400 km de aceiros e de caminhos abertos para a prevenção dos fogos? Não considera positivo que o Exército faça, pela primeira vez, patrulhamento de matas públicas, que é aquilo a que a lei nos autoriza?…

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Eu não disse isso!…

O Orador: - Não considera positivo que estejamos a construir os navios de combate à poluição e os patrulhas oceânicos, para defender a fiscalização na nossa costa?
Muitos falam, há outros que tomam decisões e, nesta área, obviamente que as decisões demoram alguns anos a materializar.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Finalmente, meu caro Marques Júnior, obviamente o programa de governo havia de manter uma continuidade no seguinte se fosse feito pela mesma pessoa. Portanto, não estranhe que na área da Defesa Nacional o Programa do Governo tenha linhas de continuidade muito impressivas!…
Agora, há algo para que quero chamar a sua atenção, Sr. Deputado Marques Júnior: diz o Sr. Deputado que o conceito estratégico devia ter dado lugar imediatamente aos outros documentos - os quais, aliás, como sabe, são de origem militar, pelo que é preciso respeitar os órgãos próprios da instituição militar -, quando VV. Ex.as estiveram seis anos no governo, viram o 11 de Setembro, viram a transformação da NATO, viram a independência de Timor e nunca vos ocorreu mudar esse conceito estratégico de defesa nacional?!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Marques Júnior (PS): - Os estudos estão todos feitos!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Defesa Nacional e dos Assuntos do Mar, não fossem algumas vulgaridades que o Sr. Ministro nos trouxe aqui sobre os assuntos do mar, nada de novo nos teria trazido no seu discurso. É que o discurso que o Sr. Ministro aqui fez sobre a defesa nacional já o ouvimos várias vezes.
Sr. Ministro, esta Assembleia aprovou a Lei de Programação Militar e sabe muito bem o que aprovou. Por isso, o Sr. Ministro não precisa de vir aqui dezenas de vezes falar dos mesmos patrulhões, dos mesmos helicópteros, dos mesmos submarinos e dos mesmos blindados do Exército.

Risos do PCP.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Já o ouvimos dezenas de vezes, Sr. Ministro! Quem não souber, é capaz de julgar que são outros. Não são, Sr. Ministro! São rigorosamente os mesmos, são os únicos que estão na Lei de Programação Militar!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Ministro fez um discurso triunfalista sobre a sua acção no Ministério da Defesa. Quero dizer-lhe que não tem razão para o fazer. Por que é que o Sr. Ministro não nos fala do descontentamento do pessoal dos três ramos das Forças Armadas, que é manifesto?

Protestos do CDS-PP.

Por que é que o Sr. Ministro não nos fala da petição entregue nesta Assembleia por todas as associações militares? Por que é que o Sr. Ministro não cumpre a "lei dos complementos de reforma", aprovada

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por unanimidade nesta Assembleia? Por que é que o Governo mantém a estagnação das carreiras dos militares e não resolve qualquer dos problemas que as várias associações militares têm suscitado?

O Sr. Honório Novo (PCP): - Bem lembrado!

O Orador: - Por que é que o Sr. Ministro não nos fala da situação financeira com que as Forças Armadas se confrontam para o seu funcionamento normal?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Ministro, apesar de sabermos que a Armada tem uma frota manifestamente insuficiente para patrulhar as nossas extensas costas, apesar de sabermos que a Força Aérea não tem os pilotos de que necessitaria (isso é por todos reconhecido), apesar de sabermos que o Exército tem um número de efectivos manifestamente insuficiente (isso é por todos reconhecido), apesar disso, a Armada não tem dinheiro para pagar as horas extraordinárias, neste mês de Julho, a 1000 funcionários da Autoridade Marítima (vem nos jornais e era bom que o Sr. Ministro se referisse a isso), a Força Aérea não tem dinheiro para que os pilotos possam voar o número de horas considerado necessário e o Exército está numa situação aflitiva (os jornais referiam, há poucos meses, que o Exército tinha uma conta a descoberto de 15 milhões de euros e vivia da benevolência de uma instituição bancária).
Ora, a isto, o Sr. Ministro não se refere. O Sr. Ministro podia dizer…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
O Sr. Ministro podia dizer: não temos dinheiro. Então, diga isso! Não diga é que está a resolver os problemas, porque manifestamente não está.
Sr. Presidente, com a benevolência da Mesa, que, desde já, agradeço, gostaria de fazer só uma última pergunta ao Sr. Ministro. Diz respeito aos antigos combatentes, que, sei, é uma questão muito cara ao Sr. Ministro.
A lei sobre esta matéria, que datava de Fevereiro de 2002, foi regulamentada a dois meses das eleições de Junho de 2004, para evitar um descalabro eleitoral (poderá ter evitado o do CDS, mas não evitou o do PSD, que teve um descalabro que chegou para os dois!). Mas esta Assembleia aprovou…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não abuse, por favor!

O Orador: - Mas esta Assembleia acabou de aprovar uma lei que manda aplicar a "lei dos combatentes" aos emigrantes e aos subscritores de regimes privativos de segurança social. O prazo aqui aprovado para a regulamentação termina daqui a duas semanas, a 10 de Agosto. O que pergunto ao Sr. Ministro é se já tem pronta essa regulamentação.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Apolinário.

O Sr. José Apolinário (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado, da Defesa Nacional e dos Assuntos do Mar, quero fazer-lhe três perguntas muito directas.
Em primeiro lugar, o Sr. Ministro, enquanto Deputado, foi eleito pelo Círculo Eleitoral de Aveiro, e, embora nós representemos todo o País, gostava que o Sr. Ministro nos esclarecesse aqui sobre qual é a sua opinião acerca da extinção da Secretaria de Estado das Pescas.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Não foi bem extinta!

O Orador: - Gostaria que o Sr. Ministro, que apresentou aqui como grande prioridade a questão do mar, o Sr. Ministro que foi eleito Deputado pelo Círculo Eleitoral de Aveiro, esclarecesse qual é a sua posição e que resposta dá aos eleitores do distrito de Aveiro sobre essa matéria.
Em segundo lugar, sobre a política dos oceanos, o Sr. Ministro Arnaut, há alguns meses, tornou claro que, no futuro, era preciso apresentar uma campanha de identidade do País a partir da política dos oceanos.
Por outro lado, se bem li aquilo que é o Programa do Governo aqui apresentado, uma das incumbências

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da nova secretaria de Estado é a de levar a Conselho de Ministros o relatório da Comissão Estratégica dos Oceanos.
Ora, o que quero saber é qual é a opinião do Sr. Ministro sobre esta matéria, nomeadamente sobre a imagem do País em termos de turismo, porque, enfim, fico sem saber se essa componente da promoção do País cabe ao Sr. Ministro do Turismo ou ao Sr. Ministro de Estado, da Defesa Nacional e dos Assuntos do Mar.
Em terceiro lugar, o Sr. Ministro fez aqui um discurso como se, só agora, tivéssemos descoberto a política do mar. Recordo-lhe, por um lado, que a política do mar esteve, de facto, no Ministério da Marinha (portanto, apenas na área da Defesa), numa fase da nossa história, mas já existiu um Ministério do Mar nos governos do Dr. Mário Soares e do Professor Cavaco Silva, e, por outro, que um dos marcos importantes em termos da política dos oceanos foi o relatório da Comissão Mundial dos Oceanos, sob a presidência do Dr. Mário Soares, que, aliás, vai reencontrar nessa Comissão dos Oceanos.
Por isso, o Sr. Ministro não pode aqui falar como se tivesse descoberto agora o caminho marítimo, o caminho para o mar.
É que, Sr. Ministro, que articulação vai fazer-se em matéria de política portuária?

O Sr. José Magalhães (PS): - Boa!

O Orador: - Que articulação vai fazer-se em matéria de reservas marítimas protegidas? Em matéria de política do ambiente, que articulação vai fazer-se com o Programa Finisterra? Que articulação vai fazer-se com a Secretaria de Estado que desaparece? Que articulação vai fazer-se em relação aos cruzeiros e ao turismo náutico?
Sr. Ministro, V. Ex.ª tem uma Secretaria de Estado com um grande nome, muita imagem, mas com uma mão-cheia de nada e outra de coisa nenhuma.
Felizmente, reconheceu aqui a importância das questões do mar, mas, já agora, permita-me que, no final, lhe dê um conselho: leia novamente o relatório da Comissão Mundial dos Oceanos, do Dr. Mário Soares,…

O Sr. Ministro de Estado, da Defesa Nacional e dos Assuntos do Mar: - Não é o único!

O Orador: - … pois isso talvez o inspire na sua governação e naquilo que vai fazer nos próximos dois anos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado, da Defesa Nacional e dos Assuntos do Mar.

O Sr. Ministro de Estado, da Defesa Nacional e dos Assuntos do Mar: - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Apolinário, quero dizer-lhe o seguinte: não preciso de ler o documento que citou, mas recomendo-lhe vivamente a leitura do relatório e das propostas da Comissão Estratégica dos Oceanos. É um pouco mais actual e verificará que esse excelente trabalho, feito por uma comissão com enorme qualificação técnica, pode bem servir como orientador de um conjunto de definições na área da política marítima de que o País, seja qual for o governo, pode beneficiar.
Quanto à questão das pescas - e estou muito à vontade, porque, como diz, pertencemos, um e outro, a distritos muito interessados e empenhados nessa matéria -, devo dizer-lhe o seguinte: acho excelente que seja o Ministro a assumir o dossier das pescas, até porque se trata de um exímio negociador comunitário…

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - … e o essencial da protecção das pescas passa-se nas negociações, em Bruxelas, no âmbito da política comum.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Agora, uma vez que disponho de pouco tempo, passando já à intervenção do Sr. Deputado António Filipe, quero dizer-lhe, Sr. Deputado, que ficamos neste pé e fazemos este contrato: V. Ex.ª acha que eu sou vulgar, V. Ex.ª será genial. Ficamos assim, não me importo nada: V. Ex.ª é genial, eu sou vulgar. A

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mim compete-me governar, a V. Ex.ª compete-lhe criticar.
É que V. Ex.ª, Sr. Deputado António Filipe, cita como problemas deste Governo matérias que têm, às vezes, 10 anos. E se ler com atenção essas petições, reparará onde está a origem desses problemas.
Em segundo lugar, o senhor há-de, um dia, perceber, se, um dia, quiser ter alguma responsabilidade nesta área,…

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Nunca!

O Orador: - … que a política de defesa se faz em articulação com as chefias militares. Uma coisa é ouvir as associações; outra coisa é que a hierarquia e a articulação cabem às chefias militares - essa é a regra da instituição.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Em terceiro lugar, Sr. Deputado António Filipe, quanto aos antigos combatentes, acho que V. Ex.ª vai arrepender-se, cada vez mais, da acidez que usa, do carácter abrasivo das suas declarações sobre essa matéria. É que, ao fim de 30 anos, sem qualquer complexo, sem fazer qualquer invocação ideológica, fez-se um esforço enorme para recensear meio milhão de pessoas, para certificar. Vá ao Exército! Informe-se sobre quanto tempo demoraria a certificar meio milhão de fichas de antigos militares portugueses, com todos os dados relevantes para efeitos da contagem de tempo ou da melhoria da pensão!
Fez-se a regulamentação. Mas eu não cometeria o erro de decidir, em gestão, matérias que podem transcender o que um governo de gestão pode fazer. Por isso mesmo, não perde pela demora: muito rapidamente verá que os prazos se cumprirão e que nós cumpriremos. Nós cumprimos com os antigos combatentes, porque acreditamos, sem qualquer complexo, no serviço que eles prestaram a Portugal, independentemente de ninguém lhes ter perguntado a sua opinião sobre uma guerra. Foi uma política do Estado português e é uma promessa do Estado português quanto à sua dignificação estatutária que estamos a cumprir, depois de 30 anos de esquecimento.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Nunca porventura como hoje, de uma forma tão visível, as questões ambientais estiveram na agenda política e estão a marcar o dia-a-dia no nosso país. São os incêndios, é a poluição tornada uma rotina, é o caos urbanístico, é a degradação da paisagem, é a consequência e os sinais que se acumulam da mudança climática.
Mas também simultaneamente, nunca como hoje, um governo se revelou, neste domínio, tão incapaz, sem uma política, sem uma ideia, sem uma estratégia.
Foi este o cenário, durante dois anos e meio de governo desta coligação: dois anos, com três titulares à frente desta pasta, três titulares que são, eles próprios, o sinal porventura mais eloquente daquilo que foi o falhanço absoluto do governo neste domínio tão essencial.
Veio, hoje, o Sr. Primeiro-Ministro dizer-se continuador nesta matéria. E não são seguramente estas boas notícias para nós, porque continuador, neste domínio, só pode significar invisibilidade, políticas ultra-residuais, menor capacidade para responder àquilo que são desafios, no plano nacional e internacional, que são decisivos para a qualidade de vida, para o bem-estar, para a saúde e, no fundo, para aquilo que a modernidade e um desenvolvimento digno desse nome podem implicar.
Passados praticamente três anos, esta pasta vai receber agora um quarto ministro. Os Verdes fizeram críticas a esta escolha; outros, de um dos partidos da maioria, disseram que não tínhamos razão, aliás, disseram que explicações seriam dadas ao País que nos deixariam "de cara à banda".
Pois bem, Sr. Presidente e Srs. Deputados, findo um dia, o primeiro do debate do Programa do Governo, "de cara à banda" ficamos seguramente com o silêncio sobre aquilo que são as propostas concretas deste Governo neste domínio.
Sabemos que é um Governo que procura dar a ideia e apresentar-se em estado de graça, como se nada tivesse a ver com os dois anos e meio que estão para trás. Mas este é um Governo que, em domínios essenciais, seja na questão do mar, seja na questão das alterações climáticas, seja no dossier da energia, seja no dossier da conservação da natureza, seja na política das cidades, se se evidenciou, foi pela negativa.
Dois anos de um governo em permanente marasmo e a anunciar medidas ora em vias de estudo, ora

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em vias de elaboração, ora em vias de conclusão, ora em vias de publicação, ora em vias de uma qualquer outra coisa que significava sempre a paralisação total.
Perante esta situação, a questão é evidente e, hoje, o silêncio do Sr. Primeiro-Ministro não é, seguramente, esclarecedor.
Perguntámos, em relação às alterações climáticas - esse domínio essencial cujos efeitos estamos a viver no nosso quotidiano, que são um problema de saúde e de segurança no futuro próximo do nosso país -, o que o Sr. Primeiro-Ministro pensava sobre o assunto. Se, tal como o seu antecessor Durão Barroso, achava que Portugal poderia continuar a manter o incumprimento em relação a Quioto e a acumular problemas em relação à União Europeia, nada fazendo neste domínio, ou se o Sr. Primeiro-Ministro se identificava com José Manuel Barroso, antes Durão Barroso, agora mais entusiasta e, finalmente, um adepto do combate às alterações climáticas.
Pois bem, lamentavelmente, o Sr. Primeiro-Ministro não conseguiu, neste debate, esclarecer-nos não só o que pensa sobre este assunto mas também o que pensa sobre a conservação da natureza e a defesa da biodiversidade.
O que vemos no Programa é uma proposta, pela enésima vez apresentada, de que vai apresentar e fazer publicar uma estratégia nacional.
O que vemos, e o que é visível para todos os cidadãos, é que áreas protegidas estão a ser destruídas.
O que sabemos é que um parque natural corre o risco de ser desclassificado.
O que sabemos é que o Parque Nacional da Arrábida está a ser destruído pelo fogo, um parque que, como a generalidade dos parques do nosso país, não tem vigilantes, porque há cortes gravíssimos naquilo que são as políticas públicas de conservação e de defesa da biodiversidade, um parque em que os vigilantes foram substituídos pelos sistemas de videovigilância e daí resultaram as consequências que este Governo foi incapaz de prevenir e que está, pura e simplesmente, de uma forma definitiva, a destruir.
O que sabemos, em relação ao dossier dos resíduos industriais - um dossier tão crítico -, é que aquilo que o Governo nos vem apresentar ao fim de dois anos e meio de invisibilidade é que vai apresentar um plano nacional para a gestão dos resíduos. Ou seja, ao fim de dois anos ainda se propõe exigir e pedir mais tempo para fazer aquilo que não foi capaz de fazer.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, o seu tempo esgotou-se. Tenha a bondade de concluir.

A Oradora: - Aquilo que verificamos ao nível ao nível das políticas nacionais para o ordenamento do território é a invisibilidade, é a incompetência, e a surpresa da nova escolha pelo silêncio não é, seguramente um bom sinal.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jaime Gama.

O Sr. Jaime Gama (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, cumprimento-os nesta cerimónia de investidura parlamentar.
Não podemos fazer o debate do estado da Nação por razões que todos conhecem, mas, a meio da Legislatura, é-nos possível fazer o balanço do estado da desilusão.
Não vou referir os indicadores sociais e económicos sobre os dois anos da governação anterior,…

O Sr. José Magalhães (PS): - São maus!

O Orador: - … eles são do conhecimento geral, e esta remodelação que era esperada por alguns e que acabou por incluir, nela mesma, o próprio anterior primeiro-ministro, se afirma a continuidade com o apagamento do Executivo anterior, é certo, isso apenas se justifica para a criação de uma aparência necessária a estancar a ideia da realização de eleições em mau momento, como todos sabem.
A dois anos de desilusão a resposta devia ser um projecto coerente e determinado de acção. Mas o que é possível verificar é que a resposta vem claramente noutro registo: o da ilusão.
O Primeiro-Ministro é, naturalmente, uma pessoa querida no PSD, ascende a líder do partido e a chefe do Governo, sem congresso e sem eleições…

Protestos do PSD.

Isso não é uma heterodoxia absoluta… Aliás, não partilho da ideia oriunda do próprio PSD, ou de alguns dos seus membros, de que o actual Primeiro-Ministro é uma pessoa impossibilitada de desempenhar

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essas funções, nunca tive essa ideia, não a tenho, não a defendo, mas, na verdade, há que reconhecer que, com esta liderança, o actual Governo é verdadeiramente uma incógnita e em amplos sectores do País é visto como uma incógnita.
Quais foram os sinais dados até aqui que adensam um pouco essa ideia?
Em primeiro lugar, a ausência de uma linha directriz. Agora, o método é o da hipótese/erro/inflexão/recuo, o que acentua enormes características de imprevisibilidade, de incerteza e, até, de errância quanto ao futuro da acção do Governo.
A ideia não é sobre aquilo que o Governo deve fazer mas mais sobre o que gostaríamos que tivesse acontecido nas nossas vidas em cada momento por benesse de um governo. Ou seja, há uma opção entre o que seria uma exigência de governantes consequentes por um tropismo face a utentes lúdicos da acção governativa.

Risos do PS, do PCP e do BE.

Depois, o recurso continuado à noção de promessa rolante. Ou seja, promete-se, cria-se uma expectativa, não se cumpre e a forma de iludir o não cumprimento ou de matar essa promessa é gerar outra promessa.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - E de promessa rolante em promessa rolante se vai gerando um novo estilo de exercício virtual da acção governativa.

Aplausos do PS.

Depois, é a consequente desresponsabilização através do fascínio, da sedução, pela criação permanente de factos sem substância, mas de grande potencial de entretenimento.
Ou seja, os sinais dados até aqui sobre o que vai ser este Governo preocupam e, se a primeira fase da Legislatura foi dominada pela desilusão, a segunda arrisca-se a ser fortemente contaminada pela ilusão!
O fascínio pela ilusão está, aliás, patente em três momentos importantes: em primeiro lugar, a ilusão quanto ao mérito da coligação. Estão menos convictos do seu valor. Surgiram incidentes: o CDS conquista posições governativa, o PSD descobre, protesta, o CDS mantém, mas cala porque há o risco de haver um plano B…

Risos do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

… que, tendo em consideração o karma de que o Sr. Primeiro-Ministro se encontra investido, num determinado momento, possa levar a uma opção por uma antecipação eleitoral, com anulação da coligação e aí com uma confrontação no terreno algo penosa para alguns dos participantes no exercício!…
Daí, aliás, que o Ministro de Estado e da Defesa se tenha refugiado hoje numa intervenção muito técnica, no final também muito poética, mas não numa intervenção de endosso ao valor e ao mérito da coligação e à sua reactualização com este Governo, e o Primeiro-Ministro também o não fez.
Depois, ilusão quanto às políticas preconizadas, o que gera algum clima de irresponsabilidade, apesar das referências genéricas ao sentido de responsabilidade do Governo.
Irresponsabilidade demonstrada quanto a mensagens de estímulo ao endividamento das câmaras municipais, ao endividamento, pelo menos, de uma das regiões autónomas - aliás, o actual Primeiro-Ministro tem uma boa experiência de governo municipal com grande abundância e algum laxismo de recursos orçamentais,…

Risos do Deputado do PCP Honório Novo.

…o que espero não seja agora a matriz de funcionamento e de transposição para a acção governativa…!
Nada sobre o endividamento crescente do Estado, que era de 52% do PIB e agora já bate os 60%, cresce dois pontos por ano com a governação da maioria e nada sobre a necessidade da sua travagem.
Também uma mensagem de pouca responsabilidade em relação aos critérios a seguir quanto ao necessário desagravamento fiscal que, naturalmente, tem que ter em consideração a consolidação das finanças públicas, a competitividade das empresas portuguesas e da atracção de investimento doméstico externo ao nosso país e, também, a sustentabilidade das políticas sociais e não uma lógica de mera

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previsibilidade eleitoralista, oportunista, sobre a gestão das mesmas políticas fiscais.
Nada sobre a redução da despesa corrente e nada, também, sobre o grave problema dos défices crónicos e crescentes do sector empresarial do Estado.
Ou seja, uma mensagem, neste caso, muito pouco tranquilizadora sobre o cerne de uma política que define a credibilidade dos governos perante os agentes económicos e, até, perante as próprias instâncias da União Europeia e da comunidade financeira internacional.
Depois, ilusão quanto aos métodos governativos. Porque a forma como o Governo foi, e está, constituído, as ideias que foram lançadas nesse método de ensaio/tentativa/erro/correcção sobre a deslocalização de ministérios, depois corrigida com a criação de gabinetes deslocalizados de atendimento dos secretários de Estado e, até, de um gabinete deslocalizado de atendimento do Primeiro-Ministro, para já não falar da ideia do Governo por teleconferência (como se essa fosse a grande prova de modernidade num País com a dimensão do nosso!!) sobre os métodos da acção governativa (e que, aliás, foi já deixada cair, porque de certa forma morreu com a sua própria apresentação e com as ondas de choque que ela mesmo provocou!!…), pois bem, toda essa ilusão quanto aos métodos governativos, poderá, enfim, ter muito que ver com a confiança que o Primeiro-Ministro tem nos astros (e ele é um adepto desse tipo de relacionamento e até faço votos para que essas "consultas" o beneficiem!!…) mas, na verdade, acentuam muito o carácter ilusório, de ilusão, com que todas estas orientações estão a ser criadas.
A ida do anterior primeiro-ministro para Bruxelas, na verdade, precipitou uma crise muito rápida, mas falta agora - e isso o País sente - uma prova de densidade, de substância, de responsabilidade e de coerência na linha governativa.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - E nós esperávamos que isso viesse a ser a mais-valia deste debate, porque o Governo também tinha tirado a conclusão do que havia sido a cerimónia da sua investidura perante o Presidente da República e, consequentemente, desejaria chegar aqui para responder positivamente à incógnita que o Governo e o seu estilo de acção governativa está a gerar no País.
Podíamos discordar do antigo Primeiro-Ministro e da anterior Ministra das Finanças, mas a verdade é que tinham uma linha sobre a acção governativa. Discordávamos e exercemos a nossa oposição, mas reconhecemos o mérito de uma linha de coerência.
Agora, essa linha de coerência é abandonada e trocada pela espera de um ou vários milagres do acaso. E os milagres do acaso, por mais que se queira aduzir a eles a expectativa da ilusão, não são bons conselheiros quanto à acção governativa.
Naturalmente, Sr.as e Srs. Deputados, como oposição, vamos estar atentos, exigentes, construtivos, a preparar a alternativa que é bem necessária ao País, porque o pior que nos poderia acontecer seria somar dois anos de desilusão com mais algum tempo da frustração que resultará necessariamente de um multiplicar de ilusões - como aquele que nos está a ser apresentado,…

O Sr. José Magalhães (PS): - Claro!

O Orador: - … aliás, sem grande convicção, sem grande apoio, sem grande aplauso, sem grande energia.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sem "chama"!

O Orador: - Necessariamente, mais do que convicção da oposição e do País, é hoje já convicção da maioria que apoia este seu segundo Governo que ele não só não vai chegar aos resultados do anterior como se arrisca a ser - e isso é mau para o País - um Governo bem pior do que o anterior.

Aplausos do PS, de pé.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e da Presidência.

O Sr. Ministro de Estado e da Presidência (Nuno Morais Sarmento): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, e muito em particular Sr. Deputado Jaime Gama, no momento da sua inscrição aguardámos com expectativa uma intervenção com a qualidade que recordamos em matéria de política externa, ou até de defesa.

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O Sr. José Magalhães (PS): - Foi o caso!

O Orador: - Mas foi essa a primeira desilusão. A desilusão de quem começou por nos falar de dois anos de desilusão, num exercício de psicanálise (que, aliás, continuou ao longo da intervenção) e que espelhava, por detrás das palavras que proferia, provavelmente a desilusão de dois anos de liderança do Partido Socialista, que agora cessaram, mas em relação aos quais se deve dizer, em abono da verdade, que não conheceram, em muitos momentos, o apoio, a palavra, o empenho e a determinação que agora V. Ex.ª vem mostrar.
São outros tempos, é preciso marcar posições e, às vezes, bem se percebe a posição daqueles que, finalmente, saem da última fila da bancada para nos brindar com a sua superior sapiência.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - A sapiência de alguém que vem dizer que o Governo é uma incógnita…

O Sr. José Magalhães (PS): - E é!

O Orador: - … e em que a resposta não pode ser outra, permita-me que lhe diga, depois deste dia de debate, que não esta: se o Governo é uma incógnita, a oposição é uma certeza,…

Risos do PSD e do CDS-PP.

… a certeza de não nos trazer, infelizmente - este dia de debate provou-o -, uma ideia válida, construtiva, concreta. Nem uma única proposta apresentou!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Prefiro, por isso, a incógnita daqueles que agora iniciam funções à certeza dos que, com os dois anos que levam de oposição, mostram não ter aprendido nada até ao momento.
O Sr. Deputado Jaime Gama passou depois a um outro exercício - sempre irónico -, de um Governo que, durante dois anos, foi de promessa em promessa. Penso que, mais uma vez, era a psicanálise…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - … de quem recordava seis anos de governação, em que fomos, "de buraco em buraco", até ao "buraco" final da demissão do Eng.º António Guterres.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

Protestos do Deputado do PS Joel Hasse Ferreira.

O Orador: - Daí passou para um exercício de análise política sobre o PSD e o CDS, sobre a duração do Governo, um exercício de análise política, permita-me que lhe diga, Sr. Deputado, que vai ser bem mais necessário nos tempos que se aproximam de vivência interna do Partido Socialista do que para a coligação, que se mantém sólida, determinada e com os mesmos propósitos do momento inicial.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Olhe que no PS não há "trespasses"!

O Orador: - Depois de tudo isto, deixe-me dizer-lhe, ficou a desilusão final. Restava-nos ainda a esperança - porque é essa a opinião de muitos que, ao longo do tempo, acompanham a sua carreira política - de que fosse aqui apresentada mais uma candidatura à liderança do Partido Socialista.

Aplausos do Deputado do PSD Guilherme Silva.

Ficou de reserva, como noutros momentos. E é bom que assim seja, que exista quem fique na reserva!

Risos do PSD e do CDS-PP.

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Protestos do PS.

Deixe-me dizer-lhe, Sr. Deputado Jaime Gama, ao vazio de alternativas, de propostas concretas, de ideias que respondessem ao convite que o Primeiro-Ministro, no início deste debate, dirigiu a todos, independentemente dos partidos políticos, que foi o de pensarmos em conjunto sobre os problemas e os desafios com que o País se confronta, deste dia retiro a conclusão de que na maioria e no Governo existe confiança e nas oposições não existe alternativa.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jaime Gama.

O Sr. Jaime Gama (PS): - Sr. Presidente, serei muito breve.
Queria apenas dizer que o papel simples da minha intervenção foi o de ter provocado uma intervenção do Sr. Ministro de Estado e da Presidência, o que é importante. Aliás, ele começou hoje a defender o Governo - fê-lo desta forma e, seguramente, também o fará no futuro, com o mesmo grau de consequência.
Mas, porventura, de algumas das pequenas coisas que referi - e que, talvez, menos tenham irritado o Governo -, ficou já provada nesta intervenção, em relação aos dois anos anteriores e aos tempos que se vão seguir, a diferença entre o Ministro de Estado e o Dr. Marques Mendes na resposta ao Parlamento e à oposição em matéria de debates políticos.
É tudo o que tenho a dizer, Sr. Presidente.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma segunda intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e da Presidência.

O Sr. Ministro de Estado e da Presidência: - Sr. Presidente, devo dizer que não percebi - deficiência minha - o alcance das palavras do Sr. Deputado Jaime Gama.

Vozes do PS: - Oh!

O Orador: - A única ou a primeira referência perceptível foi a relativa à intervenção que fiz na defesa deste Governo. Sabe, Sr. Deputado, nesta maioria não estamos por famílias nem por subgrupos;…

Risos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. José Magalhães (PS): - Não?!

O Sr. João Teixeira Lopes (BE):- São tribos!

O Orador: - …nesta maioria estamos por um projecto! É essa a diferença e é, talvez, esse o ponto que à oposição, ao longo dos últimos dois anos - e, pelo que vemos, dos próximos dois e dos quatro seguintes - continuará a fazer confusão.
Estamos aqui por um projecto e estaremos sempre disponíveis, na bancada do Governo ou noutra, para o defender.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Quanto a isso, não temos qualquer hesitação. Aqueles que estiveram no Governo e cessaram funções estão agora nas bancadas do Parlamento a defender o mesmo projecto.

Vozes do PS: - Não, não!

O Orador: - O que nos faz confusão é constatar que aqueles que, no Partido Socialista, mais responsabilidades pretendem assumir num futuro muito próximo não tenham tido uma palavra neste debate.

Página 5812

5812 | I Série - Número 106 | 28 de Julho de 2004

 

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, chegámos ao fim dos trabalhos de hoje.
A próxima reunião plenária realiza-se amanhã, às 10 horas, e terá como ordem do dia o encerramento do debate do Programa do XVI Governo Constitucional.
Está encerrada a sessão.

Eram 21 horas e 5 minutos.

Artigo de jornal enviado à Mesa, para publicação, pelo Sr. Deputado do PS José Apolinário, em resposta a declarações do Sr. Primeiro-Ministro

"Serra de Monchique
Produtores florestais acusam ex-ministro

O incêndio que desde domingo já consumiu cerca de 1500 hectares de floresta na serra de Monchique, é resultado da 'incúria, da incompetência, da arrogância e da prepotência do ex-ministro da Agricultura, Sevinate Pinto. Ele é o maior incendiário que podemos considerar nesta zona do Algarve'.
A acusação partiu do presidente da direcção da Associação dos Produtores Florestais do Barlavento Algarvio (Aspafobal), Emídio Vidigal, que, em declarações ao DN, lembrou o facto de Monchique ter sido 'excluído de todas as programações e prioridades florestais', nomeadamente ao nível da Carta de Risco de Incêndio, apoio de limpeza das matas e vigilância a cargo de militares. Isto sem esquecer a ausência, em 2004, de um helicóptero do Serviço Nacional de Bombeiros durante a época de fogos florestais.
'Alegaram que tais medidas não se justificavam nesta área porque já tinha ardido tudo nos incêndios no Verão passado', lamentou aquele responsável. E aproveitou para recordar que Sevinate Pinto 'foi informado sobre as debilidades existentes no Algarve, mas nada fez' para enfrentar a situação.
Há cerca de três semanas, a Aspafobal informou o então responsável da Agricultura que '80% da madeira de pinho ardida não tinha sido retirada das matas'. Mas, segundo o presidente daquela associação, Sevinate Pinto 'mentiu', ao enviar-lhe uma carta referindo que tal situação não correspondia à realidade. 'O senhor ministro da Agricultura, arrogante e com um grau de incompetência a todos os níveis, disse que era mentira e que o ministério já tinha retirado desses terrenos toda a madeira de pinho', o que, como sublinhou, é falso. E 'além de não nos atender e não colaborar connosco, ainda ligou para a comunicação social dando informações não verdadeiras', acrescentou Emídio Vidigal.
Na serra de Monchique, tem sido devastada pelas chamas parte do que restava da área florestal deste concelho 'e aquilo que já tinha ardido em 2003 e que dizíamos que devia ser retirado. Mas nem uma vara de eucalipto foi retirada das matas', garantiu.
Após uma noite em que os bombeiros ainda conseguiram salvar algumas moradias em Cercadas, perto dos Casais, com parte da estrada em chamas, o dia de ontem voltou a ser crítico para a serra de Monchique. Uma vivenda foi salva in extremis no sítio de Castelo da Nave, enquanto vários bombeiros de Portimão tiveram de receber assistência no Centro de Saúde de Monchique devido a problemas oculares. À hora de fecho desta edição, cerca de 70 turistas estavam a ser evacuados da estação termal das Caldas de Monchique para uma unidade hoteleira de Alvor, Portimão."
(In Diário de Notícias de 27 de Julho de 2004).

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
António Alfredo Delgado da Silva Preto
Carlos Parente Antunes
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
José Manuel de Lemos Pavão
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Marco António Ribeiro dos Santos Costa
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira
Vasco Manuel Henriques Cunha

Partido Socialista (PS):

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5813 | I Série - Número 106 | 28 de Julho de 2004

 

Alberto Arons Braga de Carvalho
Carlos Manuel Luís
José Augusto Clemente de Carvalho
José da Conceição Saraiva
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
João Barroso Soares
Júlio Francisco Miranda Calha
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Manuel Alegre de Melo Duarte
Maria Isabel da Silva Pires de Lima
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves

Partido Popular (CDS-PP):
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo

Partido Ecologista "Os Verdes" (PEV):
Isabel Maria de Almeida e Castro

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
Carlos Manuel de Andrade Miranda

Partido Socialista (PS):
João Cardona Gomes Cravinho
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Nelson Madeira Baltazar

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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