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0387 | I Série - Número 008 | 01 de Outubro de 2004

 

A Oradora: - E explicou porquê: a Concordata de 1940 pertence à "espécie" (foi o termo que utilizou) das que foram "estabelecidas pelos Estados em que (…) não se encontra assegurado o exercício efectivo das liberdades fundamentais. Nesses casos as concordatas visam dar (…) à Igreja aquilo que é negado à generalidade dos cidadãos e das instituições". E concluiu: "A existência de acordos com a Santa Sê não deriva, portanto, do carácter tradicionalmente católico da Nação". Antes se deveu, como Sá Carneiro bem sabia, ao carácter antidemocrático do regime.

Vozes do BE: - Muito bem!

A Oradora: - Aqui está, pois, aflorada, tal como era possível na altura, a razão e a essência política da celebração da Concordata em 1940, pela mão de Salazar: por via da Concordata, a ditadura de Salazar oferecia à Igreja Católica uma situação de privilégio, em troca da sua aprovação, da sua legitimação, da sua cumplicidade ideológica ou, pelo menos, do seu silêncio perante a repressão e as perseguições do Estado Novo. Por essa mesma razão, por esse silêncio, por essa cumplicidade, a Concordata foi para milhares de portugueses e para milhares de católicos, um pacto de vergonha. Sá Carneiro, católico e liberal, sabia-o.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

A Oradora: - Há ironias que a História e as circunstâncias nos oferecem, que não devem ser esquecidas. Temos, hoje, como principais responsáveis políticos do actual Governo, dois homens que, repetidamente, se têm reivindicado politicamente inspirados pelo pensamento de Sá Carneiro: Pedro Santana Lopes, hoje Primeiro-Ministro, e Paulo Portas, hoje líder do CDS-PP. A ambos nos habituámos a ouvir evocar Sá Carneiro, citar as suas palavras e até, pelo menos a um deles, olhar as estrelas em busca da sua aprovação.
Hoje, o texto que aqui discutimos inclui, na sua nota preambular, um descarado elogio à Concordata de 1940, ao modo como supostamente contribuiu para reforçar os laços históricos entre Portugal e a Santa Sé. Quem o apresenta é o Governo, liderado por dois sá-carneiristas. Fica claro que, afinal, a evocação do mentor é nada mais nada menos do que balofa: a inspiração não foi suficiente e nada aprenderam da vontade liberal que animou o pensamento de Sá Carneiro no que toca à relação entre o Estado e a Igreja.

Aplausos do BE.

Por isso, 30 anos depois do fim do Estado Novo e do nascimento da democracia e 28 anos após a aprovação da Constituição que nos funda como comunidade política democrática, pretendem estes senhores que esta Câmara volte a ratificar um tratado que, no seu teor, é anacrónico, despropositado e desajustado da realidade social portuguesa,…

Vozes do BE: - Muito bem!

A Oradora: - … que fere o princípio da laicidade do Estado e que, nesse sentido, envergonha os católicos que sabem a história da celebração das Concordatas e dos acordos concordatórios neste país.
O que discutimos hoje, Srs. Deputados, não é e não pode ser tratado como uma questão de religião, e não é e também não pode ser tratado apenas como uma questão de direito. É uma opção política de fundo que, hoje, afronta e defronta esta Câmara.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

A Oradora: - O que temos de assumir aqui, e esclarecer de modo claro, sem recurso a inércias históricas ou argumentos tradicionalistas, é o papel do Estado na sua relação com as igrejas e as confissões religiosas.
Essa questão, em princípio, já deveria ter sido respondida na Constituição da República, desde 1976. E para quem quis fazer uma clarificação dessa relação, aqui tivemos, há pouco mais de três anos, a especificação, a codificação e a densificação de conceitos, na Lei da Liberdade Religiosa, aprovada nesta Câmara.
A Concordata, tanto a velha como a nova hoje em discussão, pretende contudo dar uma resposta diferente: vincular a República Portuguesa a fazer à Igreja Católica a oferenda de um regime privativo, um regime só seu, um regime de privilégio.

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