O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 806

Sexta-feira, 23 de Outubro de 2004 I Série - Número 16

IX LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2004-2005)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 22 DE OUTUBRO DE 2004

Presidente: Ex.mo Sr. Maria Leonor Couceiro P. Beleza M. Tavares

Secretários: Ex. mos Srs. Manuel Alves de Oliveira
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Henrique Jorge Campos Cunha
António João Rodeia Machado

S U M Á R I O


A Sr.ª Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas.
Foram aprovados os n.os 1 a 8 do Diário.
Na abertura do debate sobre a Conta Geral do Estado de 2002, intervieram o Sr. Deputado Pinho Cardão (PSD), na qualidade de relator da Comissão de Execução Orçamental, e o Sr. Secretário de Estado do Orçamento (Manuel Teixeira), tendo-se seguido no uso da palavra, a diverso título, além daqueles oradores, os Srs. Deputados Alexandre Simões (PSD), Irene Veloso (PS), Isabel Gonçalves (CDS-PP), Vasco Cunha, Duarte Pacheco e José Manuel Ribeiro (PSD), Teresa Venda (PS), Francisco Louçã (BE), Paulo Veiga (CDS-PP), Bernardino Soares (PCP) e Victor Baptista (PS).
No encerramento do debate, intervieram os Srs. Deputados Tavares Moreira (PSD), Joel Hasse Ferreira (PS), Isabel Gonçalves (CDS-PP) e o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.
Entretanto, foi aprovado um parecer da Comissão de Ética relativo à retoma de mandato de um Deputado do BE.
Deu-se, ainda, conta da entrada na Mesa da proposta de resolução n.º 82/IX e do projecto de lei n.º 511/IX.
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 12 horas e 40 minutos.

Página 807

0807 | I Série - Número 016 | 23 de Outubro de 2004

 

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 10 horas.

Srs. Deputados presentes à sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
Abílio Jorge Leite Almeida Costa
Adão José Fonseca Silva
Alexandre Bernardo Macedo Lopes Simões
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
Ana Paula Rodrigues Malojo
António Alfredo Delgado da Silva Preto
António Carlos de Sousa Pinto
António Henriques de Pinho Cardão
António Joaquim Almeida Henriques
António Manuel da Cruz Silva
António Pedro Roque da Visitação Oliveira
António Ribeiro Cristóvão
Bernardino da Costa Pereira
Bruno Jorge Viegas Vitorino
Carlos Alberto Rodrigues
Carlos Parente Antunes
Daniel Miguel Rebelo
Delmar Ramiro Palas
Diogo de Sousa Almeida da Luz
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Eduardo Artur Neves Moreira
Elvira da Costa Bernardino de Matos Figueiredo
Fernando José Pimenta Rodrigues
Fernando Manuel Lopes Penha Pereira
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho
Fernando Santos Pereira
Francisco José Fernandes Martins
Gonçalo Dinis Quaresma Sousa Capitão
Gonçalo Miguel Lopes Breda Marques
Hugo José Teixeira Velosa
Isménia Aurora Salgado dos Anjos Vieira Franco
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Joaquim Miguel Parelho Pimenta Raimundo
Jorge Nuno Fernandes Traila Monteiro de Sá
José Alberto Vasconcelos Tavares Moreira
José António Bessa Guerra
José António de Sousa e Silva
José David Gomes Justino
José Luís Campos Vieira de Castro
José Manuel de Lemos Pavão
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro
José Manuel Álvares da Costa e Oliveira
João Bosco Soares Mota Amaral
João José Gago Horta
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Filipe Garrido Pais de Sousa
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Manuel Alves de Oliveira
Manuel Filipe Correia de Jesus

Página 808

0808 | I Série - Número 016 | 23 de Outubro de 2004

 

Manuel Joaquim dos Santos Ferreira
Manuel Ricardo Dias dos Santos Fonseca de Almeida
Maria Aurora Moura Vieira
Maria Clara de Sá Morais Rodrigues Carneiro Veríssimo
Maria Leonor Couceiro Pizarro Beleza de Mendonça Tavares
Maria Natália Guterres V. Carrascalão da Conceição Antunes
Maria Teresa da Silva Morais
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Paulo Jorge Frazão Batista dos Santos
Ricardo Daniel Pinto Soares Vieira
Rodrigo Alexandre Cristóvão Ribeiro
Rui Miguel Lopes Martins de Mendes Ribeiro
Salvador Manuel Correia Massano Cardoso
Susana Maria de Moura Alves da Silva Toscano
Vasco Jorge Valdez Ferreira Matias
Vasco Manuel Henriques Cunha
Vítor Manuel Roque Martins dos Reis
Álvaro José Martins Viegas

Partido Socialista (PS):
Alberto Bernardes Costa
Alberto Marques Antunes
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Ana Maria Benavente da Silva Nuno
Antero Gaspar de Paiva Vieira
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António de Almeida Santos
António Jorge Gonçalves e Gama de Oliveira
António José Martins Seguro
António Ramos Preto
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Ascenso Luís Seixas Simões
Augusto Ernesto Santos Silva
Carlos Manuel Luís
Eduardo Arménio do Nascimento Cabrita
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues
Fernando dos Santos Cabral
Fernando Pereira Serrasqueiro
Fernando Ribeiro Moniz
Guilherme Valdemar Pereira d'Oliveira Martins
Gustavo Emanuel Alves de Figueiredo Carranca
Isabel Maria Batalha Vigia Polaco de Almeida
Isabel Maria Pinto Nunes Jorge
Jaime José Matos da Gama
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira
Jorge Lacão Costa
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José António Fonseca Vieira da Silva
José Augusto Clemente de Carvalho
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
José Maximiano de Albuquerque Almeida Leitão

Página 809

0809 | I Série - Número 016 | 23 de Outubro de 2004

 

José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
João Cardona Gomes Cravinho
João Rui Gaspar de Almeida
Júlio Francisco Miranda Calha
Laurentino José Monteiro Castro Dias
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís Alberto da Silva Miranda
Maria Cristina Vicente Pires Granada
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria do Carmo Romão Sacadura dos Santos
Maria Irene Marques Veloso
Maria Isabel da Silva Pires de Lima
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Nelson da Cunha Correia
Nelson Madeira Baltazar
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paulo José Fernandes Pedroso
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui António Ferreira da Cunha
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Teresa Maria Neto Venda
Vicente Jorge Lopes Gomes da Silva
Victor Manuel Bento Baptista
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vítor José Cabrita Neto
Vítor Manuel Barreto Marinho da Cunha
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Zelinda Margarida Carmo Marouço Oliveira Semedo

Partido Popular (CDS-PP):
António Herculano Gonçalves
Henrique Jorge Campos Cunha
Isabel Maria de Sousa Gonçalves dos Santos
José Marcelo Sanches Mendes Pinto
José Miguel Nunes Anacoreta Correia
João Maria Abrunhosa Sousa
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
João Rodrigo Pinho de Almeida
Manuel Miguel Pinheiro Paiva
Narana Sinai Coissoró
Paulo Daniel Fugas Veiga

Partido Comunista Português (PCP):
António Filipe Gaião Rodrigues
António João Rodeia Machado
Bernardino José Torrão Soares
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas
Jerónimo Carvalho de Sousa
José Honório Faria Gonçalves Novo
Maria Luísa Raimundo Mesquita
Ângela Ricarda Carriço Sabino

Página 810

0810 | I Série - Número 016 | 23 de Outubro de 2004

 

Bloco de Esquerda (BE):
Ana Isabel Drago Lobato
Francisco Anacleto Louçã
João Miguel Trancoso Vaz Teixeira Lopes

Partido Ecologista "Os Verdes" (PEV):
Francisco Miguel Baudoin Madeira Lopes
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, estão em aprovação os n.os 1 a 8 do Diário, respeitantes às reuniões plenárias dos dias 15, 16, 17, 22, 23, 24, 29 e 30 de Setembro.

Pausa.

Não havendo objecções, consideram-se aprovados.
A ordem do dia de hoje é totalmente preenchida, como sabem, com a apreciação da Conta Geral do Estado de 2002.
Para apresentar o respectivo relatório, tem a palavra o Sr. Deputado Pinho Cardão.

O Sr. Pinho Cardão (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Coube-me elaborar o relatório da Comissão de Execução Orçamental, referente à Conta Geral do Estado de 2002.
Dada a relevância da matéria, confirmada pela grelha de tempo que, este ano, lhe foi dada, e como forma de salientar essa importância, optei por apresentar o relatório desta tribuna.
A Conta Geral do Estado de 2002 foi apresentada pelo Governo ao Tribunal de Contas no dia 30 de Dezembro de 2003, dentro do prazo previsto na lei de enquadramento orçamental, para emissão de parecer, nos termos legais.
O parecer do Tribunal de Contas foi elaborado com data de 30 de Junho de 2004, também cumprindo os prazos legais, e remetido à Assembleia da República.
A Comissão de Execução Orçamental analisou a Conta em diversas reuniões, uma delas, logo em Julho de 2004, com o Presidente e alguns Conselheiros daquele Tribunal.
As suas conclusões foram aprovadas, por unanimidade, pelo PSD, pelo PS e pelo CDS-PP, grupos parlamentares presentes na reunião da Comissão do dia 20 de Outubro de 2004.
Apresentarei, seguidamente, o resumo das conclusões constantes do relatório aprovado.
Procurou-se, com o relatório elaborado, cumprir as disposições legais e regimentais que permitam à Assembleia da República "tomar as Contas do Estado" de 2002, ou de não as tomar, nos termos do artigo 162.º da Constituição.
O relator não pôde deixar de ter como referência fundamental para o seu trabalho o relatório do Tribunal de Contas, "(…) órgão supremo (…) da legalidade das despesas públicas e de julgamento das contas (…)", nos termos do artigo 214.º da Constituição.
A Conta Geral do Estado é um documento extremamente complexo, abrangendo uma miríade de situações diversas e cobrindo, para além das contas propriamente ditas, os movimentos referentes à Receita e à Despesa, aos Investimentos do Plano, à Dívida Pública, aos Activos e Passivos Financeiros, às Operações de Tesouraria, aos Fluxos com a União Europeia e Sector Público Empresarial e à Segurança Social e muitos outros relevantes.
São milhões de movimentos contabilísticos, processados por entidades diversas, sujeitos a uma extensíssima legislação, para mais dispersa e passível de interpretação vária.
Por outro lado, a gestão de movimentos com a mesma natureza, por exemplo, a gestão do património do Estado, dispersa-se por direcções-gerais e serviços diferentes, com rotinas próprias e regulamentação específica.
Existem ainda problemas de informatização, de integração de plataformas informáticas, de circuitos, de processos, de critérios contabilísticos, de organização e de controlo interno, entre outros constrangimentos relevantes.
Acresce que a Conta foi elaborada num quadro de mutações legislativas importantes, desde a lei de enquadramento orçamental às alterações no Plano de Contabilidade da Segurança Social.
Tais circunstâncias tornam naturalmente difícil a elaboração da Conta Geral do Estado de forma coerente, com procedimentos uniformes e controlo eficaz.
Estas razões pesam para que a Conta de 2002, como, aliás, as de anos anteriores, independentemente dos Governos que as elaboraram ou por elas foram responsáveis, sejam objecto de importantes reservas

Página 811

0811 | I Série - Número 016 | 23 de Outubro de 2004

 

por parte do Tribunal de Contas.
O Relator considera que a apreciação de um documento tão importante como a Conta Geral do Estado deve ser imune a quezílias partidárias, por isso procurou ser objectivo e isento e teve a preocupação de evidenciar as grandes linhas de força da Conta Geral do Estado e do relatório do Tribunal de Contas em cada um dos capítulos versados.
Nesse sentido, mencionou nos diversos capítulos do seu relatório algumas das observações feitas pelo Tribunal de Contas. Não podendo, obviamente, focar todas as observações do Tribunal, o relator foi, naturalmente, obrigado a seleccionar algumas que, na sua opinião, melhor lhe pareceram tipificar as situações descritas.
Algumas dessas observações e reservas à Conta Geral do Estado de 2002, como, aliás, a muitas outras anteriores, independentemente dos Governos que as elaboraram ou por elas foram responsáveis, foram transpostas para as conclusões, como, por exemplo: a posição de reserva do Tribunal sobre os valores da receita, devido à forma de contabilização efectuada; a assunção de encargos sem a devida cobertura orçamental; realizações incorrectas, sob o ponto de vista formal, de capital de empresas do Estado (Polis e Hospitais); e não integração plena das contas bancárias na tesouraria do Estado.
Certamente que alguns dos Srs. Deputados se referirão a estas ou a outras reservas do Tribunal.
Naturalmente, foram também incluídos alguns dos aspectos positivos evidenciados pelo Tribunal, bem como os aperfeiçoamentos e avanços conseguidos no ano, como, por exemplo: o início do processo de transferência para a conta do Tesouro dos saldos das contas bancárias existentes em nome de responsáveis por serviços; a entrada em funcionamento, em 2002, de um novo Sistema de Gestão de Receitas; a aprovação e entrada em vigor, em Janeiro de 2002, da legislação que aprovou o Plano Oficial de Contabilidade das Instituições de Solidariedade e Segurança Social; e a eliminação de observações de anos anteriores referentes, entre outros pontos, às transferências para a Segurança Social em espécie, que provocaram uma situação de desorçamentação.
Também, certamente, que alguns dos Srs. Deputados se referirão a estes ou a outros pontos positivos referidos pelo Tribunal.
Têm-se a consciência de que algumas das observações, reservas, irregularidades e ilegalidades não tiveram acolhimento ou pleno acolhimento por parte dos serviços visados, como se retira da análise do contraditório.
Tal situação tem muitas das suas causas numa legislação muito extensa e dispersa, como tal passível de diferentes interpretações por parte dos serviços e do Tribunal de Contas.
Por outro lado, a gestão e a relevação contabilísticas de muitos factos patrimoniais com a mesma natureza dispersa-se por direcções-gerais e serviços diferentes, com rotinas próprias e regulamentação específica, dificultando a coerência e o controlo dos movimentos, provocando, assim, as observações do Tribunal.
A selecção das observações, das reservas, das irregularidades e até das eventuais ilegalidades que, segundo o Tribunal de Contas, foram praticadas, e independentemente das situações já corrigidas, das medidas tomadas, dos progressos assinalados pelo Tribunal respeitantes às Contas de 2002 e até das dificuldades dos serviços mencionadas no ponto 2 das presentes conclusões, e não obstante mesmo a existência de factos eventualmente mal interpretados pelo Tribunal de Contas ou de especiosidades interpretativas deste Tribunal, é exemplificativa de situações que não podem ser ignoradas e a que urge colocar fim.
Algumas das observações de irregularidades, as que possam ter resultado de decisões ministeriais, serão as mais fáceis de atenuar ou de eliminar, mediante uma atenta e oportuna fiscalização da Assembleia da República.
Todavia, grande parte das outras, as que derivam dos procedimentos, dos regulamentos e dos constrangimentos informáticos, nunca poderão ser resolvidas se não houver uma forte vontade política para o efeito, que leve à tomada de medidas, consubstanciadas em programas e acções devidamente calendarizados.
Vêm existindo problemas com as Contas do Estado, e estes problemas não são só de 2002, como já não eram só de 2001, de 2000 ou de 1999. São problemas que vêm de há anos e que não se resolverão por acção de uma varinha mágica nos anos que se seguem.
É, assim, neste contexto, que o relator propõe que a Assembleia da República não ignore a posição do Tribunal de Contas.
Tem-se como natural que a elaboração de um documento de tal complexidade nunca possa ser uma obra perfeita. Mas todos reconhecemos que muita coisa há a fazer para que os erros de há muito diagnosticados e de causas conhecidas sejam definitivamente resolvidos.
Face à repetição das irregularidades e falta de controlo nas contas do Estado e à posição de reserva sobre as mesmas repetidamente afirmada, ao longo dos anos, pelo Tribunal de Contas, o relator sugere

Página 812

0812 | I Série - Número 016 | 23 de Outubro de 2004

 

que a Assembleia da República aprove uma resolução com os seguintes dois pontos:
Recomendação ao Governo que estabeleça uma programação de trabalhos que defina os principais constrangimentos legais, regulamentares, de sobreposição de competências, informáticos e outros que dificultam a elaboração da Conta Geral do Estado, bem como as medidas e as acções a desenvolver e o respectivo custo, de forma a que a elaboração da Conta Geral do Estado cumpra todos os preceitos técnicos, regulamentares e legais e o controlo seja eficaz;
Recomendação ao Governo que dê conta dessa programação ao Parlamento até à data de apresentação do Orçamento do Estado para 2006.
Tal não invalida que se emita o parecer de que a Conta Geral de Estado se encontra em conformidade para apreciação na generalidade e na especialidade, reservando os grupos parlamentares a apresentação das suas posições para o debate em Plenário.
Tem, agora, a palavra a Assembleia da República.
Quero deixar uma nota final: o presente relatório não traduz qualquer juízo de valor, a não ser de carácter político, sobre a natureza dos movimentos financeiros não considerados ou indevidamente considerados na Conta Geral do Estado de 2002, nem põe em causa a idoneidade pessoal dos responsáveis políticos - ministros ou altos funcionários - ou dos diversos intervenientes no processo de gestão do Orçamento do Estado e da elaboração da Conta Geral do Estado.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para abrir o debate, em nome do Governo, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento (Manuel Teixeira): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Dado que é a primeira vez que me dirijo a esta Câmara, quero cumprimentar a Mesa e todos os Srs. Deputados presentes.
Sr. Presidente, se me permite uma pequena nota pessoal no início desta intervenção: quero manifestar a minha satisfação em estar aqui a debater com esta Câmara a Conta Geral do Estado de 2002. Sou das pessoas que entendem que o escrutínio financeiro da actividade do Estado tem de estar baseado em documentos credíveis, rigorosos e transparentes, e quero crer que a Conta Geral do Estado de 2002 é um bom exemplo disso. Nesse sentido, considero que esta Conta pode ser a origem de um debate interessante e produtivo sobre as questões que têm estado pendentes sobre a contabilização.
Assim sendo, permitam-me que faça um breve enquadramento e apenas após esse enquadramento foque alguns aspectos relevantes da Conta.
Neste enquadramento abordarei aspectos legislativos, que, obviamente, são do vosso conhecimento, aspectos macroeconómicos e, por fim, a situação das finanças públicas nesse ano, após o que focarei aquilo que considero serem aspectos relevantes da Conta.
Em termos de enquadramento legislativo, é conhecido que o Orçamento do Estado para 2002 foi aprovado pela Lei n.º 109-D/2001, de 27 de Dezembro, sendo a proposta de lei apresentada pelo XIV Governo Constitucional. Esta lei foi depois alterada pela Lei n.º 16-A/2002, de 31 de Maio.
As principais alterações que esta lei introduziu foram essencialmente um acréscimo à Despesa e um acréscimo idêntico à Receita, sendo o montante desse acréscimo de 2.975,0 milhões de euros. Na Despesa as rubricas que suportaram esse acréscimo foram essencialmente as das Transferências, incorporando uma transferência significativa para o Serviço Nacional de Saúde. Na Receita a rubrica que dominantemente suportou esse acréscimo foi a rubrica correspondente à Emissão de Dívida, os passivos financeiros.
Esta alteração à lei incorporou também uma alteração à taxa do IVA, que passou de 17% para 19%, o que quer dizer que a execução orçamental teve de cumprir os requisitos que estavam nestas duas leis essencialmente e também, obviamente, os restantes normativos legais que é usual saírem na altura do Orçamento do Estado, o decreto-lei de execução orçamental, etc.
Em termos de enquadramento macroeconómico, quer recordar-vos que 2002 foi um ano com abrandamento da actividade económica, o PIB teria crescido 0,4%, aliás em linha com alguma desaceleração na actividade da economia internacional.
Em termos internos, as rubricas que suportaram o ajustamento foram essencialmente o Consumo Privado, que teria crescido 0,6%, e o Investimento, que teria decrescido 5%. Isto quer dizer que a execução orçamental deste ano foi, de facto, feita num contexto macroeconómico um pouco desfavorável e isto traduz-se nas contas de alguns subsectores, em particular, na Segurança Social, em que se verifica um acréscimo muito líquido do subsídio de desemprego, que nesse ano cresce 24%, mas também em algum abrandamento das receitas fiscais, se expurgarmos o efeito da regularização extraordinária de dívidas fiscais feita nesse ano, que atingiu o montante de cerca de 1.200,0 milhões de euros.

Página 813

0813 | I Série - Número 016 | 23 de Outubro de 2004

 

Por fim, fazendo um breve enquadramento sobre a situação das finanças públicas em Portugal nesse ano, está decerto na vossa memória que em 2002 Portugal cumpriu com as recomendações do Conselho Ecofin para pôr fim à situação de défice excessivo que se teria verificado em 2001. De facto, nesse ano, o défice das administrações públicas, na óptica das contas nacionais, teria atingido o montante de 2,7% do PIB, valor esse, aliás, confirmado na conta do INE recentemente saída a público, que confirma que o défice teria sido de 2,7% do PIB.
Para se atingir esse resultado teriam, obviamente, contribuído medidas de correcção à Despesa e à Receita. Na Receita já vos referi uma medida importante, que foi a subida da taxa normal do IVA, entre outras medidas, também elas importante e que, na minha perspectiva, se justificam por si - têm, de facto, uma racionalidade intrínseca, digamos assim. Entre essas medidas estão a alienação da rede fixa da PT, a introdução de portagens na CREL, as receitas advindas da extinção do IPE e igualmente, uma medida que já referi, que é a regularização extraordinária das dívidas fiscais. Este conjunto de medidas na Receita e na Despesa permitiram, de facto, a Portugal sair da situação de défice excessivo em que estava em 2001.
Agora, de uma forma muito sintética, deixem-me referir alguns aspectos relevantes da Conta Geral do Estado de 2002.
Desde logo, uma leitura atenta da Conta permite averiguar que os desvios entre o que foi orçamentado e o que foi executado são, de certa forma, pequenos. Aliás, no Estado, o desvio entre o que foi orçamentado e o que foi executado na despesa é traduzido pelo grau de execução da despesa, que foi de 94%, valor que é, de facto, elevado.
É uma realidade que a despesa corrente tem um grau de execução bem superior, de cerca de 98%, enquanto que a despesa de capital tem um grau de execução inferior, de cerca 90%. Isto faz com que os ministérios nos quais este tipo de despesa é mais marcante tenham um grau de execução inferior.
Aliás, um dos aspectos que se tem vindo a denotar na execução orçamental ao longo dos anos é o facto de a execução no plano de investimentos da Administração Central ter sempre algum grau de distância em relação ao que é orçamentado em termos iniciais.
Quanto às receitas, também se pode constatar que o desvio entre o que foi orçamentado e o que foi executado - em particular nas receitas correntes - é relativamente menor; nas receitas correntes este desvio é de 0,2%, mas nas receitas de capital o desvio também é grande. Isto deve-se ao facto de a emissão de dívida ter sido bem inferior àquilo que tinha sido suposto ser necessário em termos de orçamento inicial. Portanto, trata-se de um problema menor ou com pouca importância.
No que diz respeito aos desvios, a conclusão a retirar é a de que os desvios entre o que é executado e o que é orçamentado são pequenos, o que parece ser um aspecto bondoso da Conta.
Outro aspecto que me merece uma referência tem a ver com o que eu suponho ser uma evolução boa nesta Conta, que é a questão das relações financeiras com a própria União Europeia.
Nesta matéria, a informação que a Conta incorpora é bastante mais exaustiva e organizada do que o que era usual nos anos anteriores. O que é previsto é confrontado com o que é executado, sendo feito um escrutínio rigoroso, fundo a fundo, sobre as transferências feitas nesse ano.
Aliás, a informação que a Conta incorpora permite concluir que os recursos próprios da Comunidade - recursos próprios no sentido das receitas que o País liquida e que entrega à Comunidade - têm estagnado. Pelo contrário, nesse ano, as transferências feitas pela União aumentaram de forma muitíssimo expressiva, depois de dois anos de uma certa quebra.
Antes de terminar, devo dizer que a Conta é um documento complexo, existindo outras questões que me parecem relevantes, mas, como não tenho tempo de aprofundá-las, faço apenas um "sobrevoo" muito rápido.
Uma delas diz respeito ao avanço, em 2002, da centralização no Tesouro, que penso ser, em parte, consequência da resolução do Conselho de Ministros de 15 de Setembro desse ano.
Outro aspecto que me parece ser muito positivo é o da entrada em funcionamento do sistema de gestão de receita.
Por fim, haveria obviamente que fazer também um escrutínio das reservas que o Tribunal de Contas faz. Entre elas, existem reservas técnicas, que podemos elucidar no debate - na minha perspectiva, serão facilmente ultrapassáveis, algumas derivam mesmo de um diferente entendimento entre o tribunal e os serviços; outras são reservas mais substantivas, em particular a que diz respeito à desorçamentação.
Mas teremos depois tempo para aclarar estes aspectos no debate.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Vamos, então, dar início ao debate com pedidos de esclarecimento dirigidos ao Sr. Secretário de Estado.

Página 814

0814 | I Série - Número 016 | 23 de Outubro de 2004

 

Tem a palavra, em primeiro lugar, o Sr. Deputado Alexandre Simões.

O Sr. Alexandre Simões (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr. Secretário de Estado, compete à Assembleia da República apreciar as Contas do Estado e de mais entidades públicas com o respectivo parecer do Tribunal de Contas, desta feita relativamente ao ano de 2002, depois do exaustivo debate em sede de Comissão de Execução Orçamental.
Por isso, antes de formular a minha questão ao Sr. Secretário de Estado do Orçamento, gostaria de começar por cumprimentar o Relator, Sr. Deputado Pinho Cardão, responsável pela elaboração do relatório, que, pela seriedade do trabalho, isenção e sentido de Estado demonstrados, conseguiu, na Comissão, obter a aprovação unânime dos Deputados de todas as bancadas. Esta aprovação é a prova de que é possível ter uma visão imparcial, não partidária, numa matéria tão importante como esta.
Este aspecto é particularmente notável quando o Orçamento para 2002 foi por duas vezes rectificado e, finalmente, com a tomada de posse do XV Governo Constitucional, alterado, em Maio de 2002.
Saliente-se, ainda que a Conta Geral do Estado de 2002 foi apresentada dentro do prazo previsto na lei de enquadramento orçamental, algo - veja-se o insólito e pasme-se! - que o próprio Tribunal de Contas não deixou de destacar.
Isto é deveras importante, porque em matéria de rigor e disciplina orçamentais, temos claramente de fazer uma distinção entre o antes e o depois dos governos desta maioria. O antes nem vale a pena recordar, sendo sobejamente conhecido de todos os portugueses, pontificando os défices galopantes e o despesismo geneticamente cor-de-rosa; o depois esteve assente no controlo da despesa pública e do défice.
É verdade que o parecer do Tribunal de Contas sobre a Conta de 2002 apresentou várias conclusões e recomendações, levantando reservas sobre o modelo e os processos de contabilização.
O Tribunal de Contas tem feito, sistematicamente e ao longo de anos, recomendações aos diferentes governos sobre esta matéria. Mas é esta diferença, é esta distinção do antes e do depois, primeiro do laxismo e agora do rigor perante as contas públicas, que importa destacar neste debate.
Sr. Secretário de Estado, a pergunta que gostaria de colocar-lhe pretende-se com a implementação do sistema central de receitas e do sistema de gestão de receitas que apenas entraram em funcionamento no ano de 2002, mas que, em 2004, fruto de um esforço sério e sistemático de controlo e de gestão das receitas, estão já em total e pleno funcionamento, proporcionando informação correcta e fidedigna sobre os valores da receita, esforço esse que - reitere-se - nunca fez parte das prioridades dos governos socialistas.
Sr. Secretário de Estado, com esses novos sistemas, será possível, nos próximos debates sobre as Contas do Estado, darmos finalmente ao Tribunal de Contas, aos portugueses, aos contribuintes, de forma célere, a informação correcta que o rigor e a gestão séria dos dinheiros públicos impõem?

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento, que dispõe de 3 minutos.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Alexandre Simões, agradeço a questão que colocou.
De facto, o sistema de gestão das receitas é uma enorme evolução na capacidade de minimizar um erro muitíssimo usual nas contas anteriores, que consistia numa diferença nítida entre a cobrança segundo os dados do Tesouro e segundo os dos impostos. A diferença era de tal modo nítida que a decisão sobre o volume de receitas que devia incorporar a Conta era dada através de um despacho. Era um despacho que decidia qual o valor de receitas que devia ser expresso na Conta.
Portanto, é absolutamente óbvio que o facto de o sistema de gestão de receitas unificar o fluxo de informação do Tesouro com o dos impostos e, por fim, unir estes dois fluxos com o fluxo de informação que existe em termos orçamentais, vai, no futuro, permitir, que a Conta tenha, sobre a receita, dados absolutamente fiáveis, de tal forma que esta diferença que referi seja, em termos de tendência, zero.
De facto, nesta altura, a totalidade dos serviços que administram a receita já tem esta aplicação informática ao seu dispor; há agora que fazer com que este fluxo de informação circule de uma forma boa e contínua.
Nesta altura, e para ser completamente realista e sincero, dado que este fluxo de informação entre os impostos, a contabilidade pública e o Tesouro não é feito on line mas através de transferência de ficheiros, em certas alturas ele não se processa com a rapidez necessária, decorrendo ainda um certo prazo, que é, quanto muito, de um mês.
Se compararmos este mês com o processo anterior, que implicava a leitura exaustiva das guias de

Página 815

0815 | I Série - Número 016 | 23 de Outubro de 2004

 

receita (cada receita tinha uma guia e os serviços…

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Secretário de Estado, o tempo de que dispunha terminou. Peço-lhe que conclua, por favor.

O Orador: - De qualquer forma, penso que disse o essencial.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Irene Veloso.

A Sr.ª Irene Veloso (PS): - Sr.ª Presidente, Sr. Secretário de Estado do Orçamento, gostaria de colocar a V. Ex.ª uma questão que me parece indissociável do tema da nossa sessão de hoje, que é exactamente a apreciação da Conta de 2002.
Ora, acontece que o Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações acusou recentemente o Partido Socialista de ter cometido erros graves no que diz respeito a um dos mapas que apresentou sobre a evolução do orçamento do Instituto das Estradas de Portugal (IEP). Segundo o Sr. Ministro, nós teríamos somado à dotação do IEP as dotações do Instituto para a Construção Rodoviária (ICOR) quando, com efeito, elas fazem parte da dotação do IEP, devendo, pois, ter sido desagregadas.
Ora, aqui é que temos o drama. É que o Partido Socialista baseou-se exactamente nas Contas de 2002. E se consultarmos o mapa da receita de 2002, na página 294, vemos claramente distinto o Instituto para a Conservação e Exploração da Rede Rodoviária com outro montante, o Instituto das Estradas de Portugal com outro montante e o Instituto para a Construção Rodoviária com outro montante.
Depois, se passarmos ao mapa das despesas - lembro a V. Ex.ª que ele consta da página 303 -, voltamos a ver que o Instituto para a Conservação e Exploração da Rede Rodoviária tem um montante inscrito, o Instituto das Estradas de Portugal tem outro montante e o Instituto para a Construção Rodoviária tem outro montante.
Ora, assim sendo, a nossa perplexidade é grande: ou o Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações não cruzou os dados com o Ministério das Finanças e cometeu um lapso - que, de resto, é humano - ou, o que nos causa uma grande estupefacção e algum desconforto, como é que é possível que o Ministério das Finanças tenha cometido um lapso desta natureza, que, se não for esclarecido, pode ter consequências bastante difíceis de contornar?
Portanto, solicito a V. Ex.ª um esclarecimento sobre esta questão, que penso que não só ao Partido Socialista, a esta Câmara e a todos cidadãos interessa, pois este lapso pode induzir a graves erros e a tristes consequências.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Agradeço a questão que me colocou, Sr.ª Deputada Irene Veloso.
De facto, um destes princípios deste mapa das receitas e da despesa, de cada vez que aparece, em termos orgânicos, a referência aos vários institutos, é o de que os mapas não são consolidados, o que é normal; portanto, cada instituto tem uma determinada receita e esse instituto deve referir e contabilizar essa receita.
Acontece que em três serviços da Administração Pública processam-se fluxos financeiros e, então, se estivermos a tentar averiguar qual o total da dotação disponível daquele universo, em rigor, teremos de fazer esta consolidação, porque, caso contrário, cometeríamos aquele erro da família, ou seja, fazendo-se transferências do pai para o filho, quando vão tentar calcular o valor da dotação da família somam o valor que o pai tinha mais o valor que o filho tinha e não vêem que o valor que o filho tem vem do pai.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Exactamente!

O Orador: - Obviamente que esse valor tem de ser abatido e consolidado. Os mapas da conta, quando são feitos em termos orgânicos, é obvio que não podem fazer esta consolidação.

Página 816

0816 | I Série - Número 016 | 23 de Outubro de 2004

 

O Sr. José Junqueiro (PS): - Naturalmente!

O Orador: - Só fazem a consolidação, o que é lógico e, em termos técnicos absolutamente correcto, quando estão a calcular uma conta, que poderia ser a dos fundos e serviços autónomos. Nesse caso, sim, a consolidação já seria feita, porque àquele universo todo já teríamos de abater os fluxos que essas entidades fazem entre si.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Está claro!

O Orador: - Assim sendo e em conclusão, a conta está bem; se a intenção (que, no entanto, desconheço qual era) da calculatória que me referiu fosse tentar atingir qual era o montante de dotação disponível desse universo de três institutos, claro que o bom procedimento técnico era o de fazer a consolidação.

Vozes do PS: - Exactamente!

O Orador: - Portanto, se a consolidação não foi feita na calculatória inicial, existe um erro técnico.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Gonçalves.

A Sr.ª Isabel Gonçalves (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado do Orçamento: O princípio da unidade de tesouraria, consagrado no regime da tesouraria do Estado (RTE), é transversal a todo o sector público administrativo e constitui um factor importante para o cumprimento dos objectivos do Pacto de Estabilidade e Crescimento.
Na verdade, a redução do défice público passa necessariamente pela optimização da gestão global dos fundos públicos, de que a unidade de tesouraria é instrumento decisivo.
Sabemos que se trata de um processo longo, necessariamente gradual, a que o XV Governo deu um importante impulso mas em que ainda não se chegou a uma integração plena.
Neste sentido e porque é uma área crítica para a matéria que discutimos, gostaria que o Sr. Secretário de Estado nos desse conta da evolução registada, face a anos anteriores, e nos dissesse para quando podemos esperar a conclusão desse processo.
Gostaria ainda de colocar-lhe uma outra questão, relacionada de perto com esta que acabei de enunciar.
Como é sabido, a Direcção-Geral do Tesouro, enquanto tesouraria central do Estado, é a entidade responsável pela execução operacional dos pagamentos e dos recebimentos dos serviços públicos, cabendo-lhe a gestão das disponibilidades financeiras do Estado.
Esta estratégia de centralização na tesouraria do Estado de todos os recursos financeiros administrados pelos serviços públicos exige uma articulação eficaz com cada organismo "cliente" do Tesouro, de forma a optimizar os resultados decorrentes da sua actividade.
Para tal, é necessário um conjunto de serviços que não só possibilite a execução de pagamentos e a cobrança de receitas mas que igualmente disponibilize toda a informação necessária para os sistemas próprios de gestão de cada organismo.
Perante as alterações entretanto operadas, diversos serviços e organismos públicos têm manifestado algumas dificuldades em adaptar-se, nomeadamente na integração da informação disponível com os seus próprios sistemas de gestão.
Em conclusão, Sr. Secretário de Estado, a questão que quero abordar relativamente a esta matéria é esta: que medidas foram, entretanto, implementadas para dotar os serviços públicos, integrados ou com autonomia financeira, dos meios de gestão da informação adequados à sua integração nos sistemas informáticos centrais, da Direcção-Geral do Tesouro?

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.

Página 817

0817 | I Série - Número 016 | 23 de Outubro de 2004

 

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: - Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Gonçalves, de facto, este tema da tesouraria única é um tema de uma grande relevância, na minha perspectiva.
Como enunciei na minha intervenção inicial, sou de parecer que, em 2002, se deu um impulso muito substancial ao processo de unificação da tesouraria.
A Resolução n.º 115/2002, do Conselho de Ministro, de 5 de Setembro, se não me engano, veio obrigar os serviços e fundos autónomos a terem os seus saldos depositados no Tesouro. Este facto teve uma consequência nítida logo nesse ano: se averiguarmos as disponibilidades finais do Tesouro, no final de 2002, e as compararmos com os saldos disponíveis no Tesouro, no final de 2001, verificamos que houve um acréscimo de cerca de 1800 milhões de euros, o que representa realmente um acréscimo muitíssimo nítido, dado que o nível de saldo tradicional, no Tesouro, rondava os cerca de 2000 milhões de euros. Há aqui de facto um saldo muitíssimo nítido.
É claro que o facto de os saldos das várias entidades estarem depositados no Tesouro tem, desde logo, uma consequência muitíssimo nítida, que é a seguinte: o Estado não tem de emitir tanta dívida pública, logo, diminui a despesa em juros.
Existe também uma consequência colateral, que é o facto de a diferença entre as taxas passivas e as taxas activas, no caso destes serviços, ser negativa para o Estado, ou seja, o Estado recebia menos do que aquilo que entregava. Ora, esse efeito foi, ou está a ser, anulado de forma evolutiva, digamos assim.
Também é óbvio que o processo ainda não foi terminado, pois ainda existem alguns serviços que, em grande medida, estão fora deste processo. Entre esse conjunto de serviços, se me permitem, talvez destacasse as Universidades. Os saldos das Universidades não estão de facto a ser aplicados no Tesouro, sendo, por enquanto, ainda aplicados na banca, tal como era a prática dos restantes serviços no passado.
Referi estes aspectos, para responder à primeira questão.
Quanto à segunda questão que me suscita, na verdade, tem-se verificado uma grande evolução. Desde logo, o facto de o Tesouro disponibilizar uma aplicação (que, aliás, os outros bancos privados também fornecem aos seus principais clientes) que permite a cada um dos serviços fazer a gestão da sua tesouraria e, deste modo, acompanhar, de forma muito exaustiva e completamente ao dia, quais são os saldos que possuem, quais as aplicações que fizeram, quais os prazos dessas aplicações, a que taxas é que as aplicações são feitas, em que prazo é que vencem. Neste momento…

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Secretário de Estado, o seu tempo esgotou-se. Conclua, por favor.

O Orador: - Muito bem, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Vasco Cunha.

O Sr. Vasco Cunha (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr. Secretário de Estado do Orçamento: A execução do Orçamento da Segurança Social foi influenciada, no exercício de 2002, por um conjunto de factores de natureza excepcional e diversificada que determinaram que esse exercício fosse considerado atípico, com um conjunto de consequências relevantes quer para a prestação de contas quer para a elaboração do parecer do Tribunal de Contas.
Analisemos, então, alguns destes factores. Em primeiro lugar, a moldura legislativa, pelo seu impacto no que se refere à elaboração e apresentação dos mapas orçamentais e de prestação de contas, mas também no que se refere às demonstrações financeiras.
Estas alterações legislativas resultaram essencialmente dos quatro novos enquadramentos que a seguir resumo: a publicação da Lei de Enquadramento Orçamental, Lei n.º 91/2001, de 20 de Agosto, cuja aplicação foi derrogada pela conjugação dos artigos 93.º e 94.º da Lei Orgânica n.º 2/2002, de 28 de Agosto, a Lei da Estabilidade Orçamental, que a alterou; a alteração da Lei de Bases da Segurança Social, dado que a Lei n.º 28/84, de 14 de Agosto, deu lugar à Lei n.º 17/2000, de 8 de Agosto, que, por sua vez, foi revogada pela Lei n.º 32/2002, de 20 de Dezembro; o Decreto-Lei n.º 12/2002, de 25 de Janeiro, que aprovou o Plano Oficial de Contabilidade das Instituições do Sistema de Solidariedade e Segurança Social, implicando a substituição do Plano de Contas das Instituições de Segurança Social, que vigorava desde 1988, e permitindo que as reservas levantadas pelo Tribunal de Contas em anteriores pareceres - incluindo o de 2001 - pudessem finalmente ser ultrapassadas, nomeadamente no que se refere aos princípios contabilísticos, dando satisfação às medidas preconizadas ao longo da última década; por último, o novo enquadramento jurídico do financiamento do sistema da segurança social, através da publicação do Decreto-Lei n.º 331/2001, de 20 de Dezembro, procurando regulamentar, nesta matéria, a Lei n.º

Página 818

0818 | I Série - Número 016 | 23 de Outubro de 2004

 

17/2000, de 8 de Agosto, a chamada lei de bases.
Em segundo lugar, e do ponto de vista operacional, o sistema contabilístico e financeiro da segurança social foi confrontado com a introdução do euro e especialmente com a implementação do novo Sistema de Informação Financeira (SIF).
Esta nova aplicação informática, orientada para as vertentes orçamental, financeira e administrativa, e que se relaciona com os subsistemas de apoio operacional, registou grandes dificuldades ao entrar em produção, especialmente ao nível da introdução dos registos contabilísticos e do processo administrativo, tendo - como consequência no curto prazo - a perda qualitativa da apresentação de contas.
Assim, em Janeiro de 2002, este sistema arrancou em produção, sem qualquer paralelo que salvaguardasse a informação do anterior sistema - o que se pode considerar, no mínimo, bizarro -, sem garantir que a interacção do SIF com os subsistemas de apoio, como o Sistema de Gestão de Contribuintes (SGC) ou a Gestão de Tesourarias (GT), estivessem totalmente operacionais.
Deste conjunto particular de razões - reforçadas pela auditoria efectuada pelo Tribunal de Contas - resultou que a execução orçamental de 2002 tenha merecido várias reservas e a qualificação de pouco fiável.
Nesta sequência e previsivelmente, a apresentação das contas ao Tribunal por parte das instituições integrantes do perímetro de consolidação da segurança social registou um assinalável atraso, porque muitos dos organismos não cumpriram os prazos legais.
Aconteceu assim nos Açores, com as contas do Centro de Gestão Financeira da Segurança Social, que deram entrada na Secção Regional em 10 de Maio de 2004, e na Madeira…

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, agradeço que conclua, pois o seu tempo terminou.

O Orador: - Vou concluir, Sr.ª Presidente.
Dizia eu que o mesmo tipo de atraso aconteceu na Madeira, onde até 18 de Maio de 2004 o Centro de Segurança Social ainda não tinha apresentado as contas de 2002.
Neste sentido, Sr. Secretário de Estado, quero perguntar-lhe o seguinte: em face destes resultados, é fundamental que se saiba se o Governo está, ou não, disposto a acatar as reservas e recomendações enunciadas pelo Tribunal de Contas; a efectivar, ou não, o aperfeiçoamento dos sistemas de controlo interno da segurança social; a adequar os meios legais e operacionais às necessidades e a tornar mais transparentes as contas da segurança social; e, por fim, a disponibilizar informação ao Tribunal de Contas que permita definitivamente ultrapassar o carácter provisório das contas.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Vasco Cunha, é facto que as contas da segurança social, em 2002, sofreram um atraso significativo, resultado da implementação do sistema de informação financeira, do SIF, o qual, ao ser implementado, desde Janeiro desse ano, sobre a totalidade das instituições desse universo - um universo complexo, vasto - provocou, como era, aliás, expectável, enorme distúrbio na actividade de registo.
Essa questão foi sendo ultrapassada, em termos de fluxo de informação e do próprio sistema de informação. A questão que impendia era, desde logo, a de fazer os interfaces com a totalidade das outras aplicações adjacentes, quer das aplicações ligadas aos contribuintes, ao sistema de gestão dos contribuintes, quer a aplicação ligada ao sistema de gestão da tesouraria, e, neste momento, esses interfaces estão feitos e concluídos, o que significa que, se fizéssemos a análise no presente, verificaríamos que estavam completamente ultrapassadas as questões que provocaram atrasos e imperfeições na conta da segurança social de 2002.
Contudo, há também aqui outros ponto a referir. Nesse ano, em 2002, as alterações foram não apenas no sistema de informação - aliás, o Sr. Deputado também referiu esse aspecto - mas também em termos legais, de uma forma muitíssimo profunda. A própria lei de enquadramento veio alterar os mapas que a segurança social deveria apresentar, deixando de exigir um mapa que era tradicional, o mapa IX, e passando a exigir uma série de mapas de acordo com a classificação económica e funcional, os quais o Tribunal de Contas considera que são mais opacos do que o mapa IX.
É óbvio que o mapa IX era mais claro. Porquê? Porque havia uma mistura de orgânica e de economia. Distinguia os regimes, distinguia as prestações e é óbvio que, agora, nos mapas legais, este tipo de informação

Página 819

0819 | I Série - Número 016 | 23 de Outubro de 2004

 

fica muito diluída na classificação económica. Se a despesa é com o pessoal, o que lá aparece é "pessoal", se são pensões ou subsídio de desemprego, etc., aparece como sendo uma transferência, mas isso é uma alteração legal.
Por sua vez, a Lei de Bases da Segurança Social veio também introduzir a exigência de que as contas da segurança social fossem apresentadas por subsistemas. E o que são os subsistemas? Enfim, eles são quatro, desde o subsistema ligado à protecção à família, o subsistema ligado à acção social, o subsistema ligado à capitalização… Ou seja, neste momento, a exigência de prestação de contas que a segurança social enfrenta é bastante mais complexa do que aquela que era no passado recente. Em qualquer caso, e por forma a concluir, posso referir que, neste momento, em termos das dificuldades informáticas, elas estão ultrapassadas, e a vontade do Governo é que as contas de 2004 já sejam apresentadas em tempo, de forma clara e transparente, incluindo a totalidade da informação que o Tribunal de Contas considera necessária e útil.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Pacheco.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, gostaria de dizer uma primeira palavra de saudação, e de saudação dupla: em primeiro lugar, ao Governo, pela execução financeira que levou a cabo, ao longo de 2002, e que esta conta espelha, pois a realidade é que a conta do Estado de 2002 torna clara que quer a execução das receitas quer a execução da despesa está de acordo com os padrões orçamentados. Aqui pode haver divergência na priorização das despesas, pode haver críticas quanto ao sistema fiscal, mas não é isso que está a ser avaliado. O que estamos a avaliar é a adequação de uma execução a um Orçamento e o que aqui temos é uma boa execução e o Governo está de parabéns.
A segunda saudação decorre de todas as informações e da forma séria, sincera e franca com que o Sr. Secretário de Estado está aqui neste debate, procurando responder de modo muito concreto e técnico às questões que lhe são colocadas. Por vezes, o tempo impede-o de concluir raciocínios, mas isso é normal aqui, no nosso Parlamento.
Sr. Secretário de Estado, a realidade é que a atenção que nos deveria merecer a Conta Geral do Estado tem sido desviada para um elemento relevante, que é o parecer do Tribunal de Contas. E frequentemente, mesmo nestes debates, mais do que a própria Conta, tem merecido essa atenção o parecer do Tribunal de Contas.
A verdade é que este parecer do Tribunal de Contas, reiterando críticas, reafirmando que há procedimentos que ferem a lei, procedimentos que deveriam ser corrigidos, também evidencia melhorias, apontando claramente para a resposta a algumas das críticas e problemas que, ao longo de anos, tem vindo a colocar.
Logo, devemos olhar para o futuro. E olhar para o futuro significa que o ideal é que estas questões recorrentes que o Tribunal de Contas levanta sejam abordadas de uma vez por todas, sejam identificadas soluções, de modo a que essa parcela do debate possa desaparecer e a concentração seja efectivamente na execução financeira do Estado.
Há uma proposta em cima da mesa, apresentada pelo Sr. Relator, que aqui também saúdo, que mereceu o apoio unânime na nossa Comissão, no sentido que a Assembleia da República aprove brevemente uma recomendação ao Governo para que este, até Outubro do próximo ano, nos traga um plano de acções, identificando as críticas, uma a uma, que o Tribunal de Contas tem levantado e as acções para resolver as questões colocadas, ou contrariando-as, se considerar que não são úteis.
Concorda o Governo e está disponível para aceitar este desafio, resolvendo assim, de uma vez por todas, esta questão? Esta é a pergunta que deixo e para a qual gostaria de ouvir uma resposta.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Duarte Pacheco, o Governo aceita-o e considera útil a proposta. De facto, é chegada a altura em que as reservas não podem "cair em saco roto". Obviamente, existem reservas que o Tribunal de Contas tem vindo a levantar ao longo do tempo que são diferentes interpretações técnicas. E quando fazemos a análise da interpretação que o Tribunal de Contas faz e da interpretação que os serviços fazem, vemos que ambas têm razão de ser

Página 820

0820 | I Série - Número 016 | 23 de Outubro de 2004

 

e que a lógica e a própria verdade não pendem para nenhum dos lados.
Existem mesmo casos em que o Tribunal de Contas reitera reservas e críticas quando o tempo já não as devia permitir. Só para vos dar um exemplo lembro que o Tribunal de Contas, na Conta de 2000, volta a referir as contas de ordem, quando, nitidamente, no contexto, as contas de ordem já não fazem sentido. As contas de ordem faziam sentido quando os fundos e serviços autónomos tinham saldos não depositados no Tesouro e a forma de os contabilizar na Conta Geral do Estado era colocá-los em contas de ordem. Quando o Tribunal de Contas coloca a reserva em relação à Direcção-Geral do Orçamento pelo facto de não estar a fazer esse registo, neste caso, claramente, o serviço tem razão. O serviço está no presente e, neste caso em particular e na minha perspectiva, o Tribunal de Contas ainda está no passado.
Contudo, há outros casos em que as reservas do Tribunal de Contas, suscitando dúvida técnica, têm de ser ponderadas, escrutinadas. Nesse sentido, a resposta do Governo à recomendação poderá fazer esse elenco e poderá, e deverá, apresentar as medidas que permitem ultrapassá-las. Assim, será possível que uma Conta Geral do Estado, num futuro muito próximo, valha não só por si, podendo ser lida exactamente por aquilo que vale, mas também minimize as reservas que o Tribunal de Contas tem vindo a fazer ao longo do tempo.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Ribeiro.

O Sr. José Manuel Ribeiro (PSD): - Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Estamos hoje a apreciar a Conta Geral do Estado de 2002, dando cumprimento ao estabelecido na Constituição da República, que atribui ao Parlamento uma importante prerrogativa de acção fiscalizadora.
Queria, antes de mais, cumprimentar o Sr. Deputado Pinho Cardão e salientar a elevada qualidade do relatório que apresentou. É um documento isento e independente, que tem a grande virtude de não entrar em querelas e quezílias partidárias e que mereceu a aprovação unânime na Comissão de Execução Orçamental.
O parecer do Tribunal de Contas sobre a Conta Geral do Estado é objecto de várias reservas quanto à adequação dos procedimentos utilizados pelos serviços no registo e controlo das operações e faz também menção de ilegalidades.
Estas são situações que se observam em todos os seus capítulos, sendo recorrentes, visto que, na sua grande maioria, já se encontram em pareceres de anos transactos.
A Conta Geral do Estado é um documento complexo, longo e muito abrangente, pelo que nesta intervenção só irei abordar algumas das suas matérias.
Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A análise do Tribunal de Contas à execução do Orçamento da Receita registada na Conta Geral do Estado de 2002 mantém uma posição de reserva sobre os valores nela inscritos porque o respectivo modelo de contabilização continuou a não assegurar o registo integral, tempestivo, fiável e consistente da informação, contrariando o disposto na Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado, que determina a sua elaboração com clareza, exactidão e simplicidade.
O Tribunal de Contas recomenda que a contabilização deve evoluir para um modelo sustentado por um sistema informático de registo das receitas, capaz de as controlar através da conciliação integral da informação relativa à emissão e anulação de documentos de cobrança e de reembolso com a informação relativa aos correspondentes recebimentos e pagamentos.
Em sentido positivo, o Tribunal de Contas salienta o avanço que constituiu a entrada em funcionamento, em 2002, dos Sistemas de Gestão e Central de Receitas, sistema esse que vinha a ser recomendado insistentemente em anteriores pareces do Tribunal de Contas.
No que se refere à execução do Orçamento da Despesa, o Tribunal de Contas enuncia várias dúvidas e reservas, a esmagadora maioria delas transitadas também de anos anteriores. Contudo, também reconhece que foram dados importantes passos no sentido de uma maior transparência das contas públicas, destacando que, em 2002, pela primeira vez, foi criada uma actividade, designada "Despesas de anos anteriores" que serve para identificar "os compromissos assumidos em anos anteriores e cujo pagamento tenha sido diferido para 2002, por conta do Orçamento do Estado deste ano".
Salienta, ainda, a criação de uma alínea na classificação económica, a "das dívidas vencidas e não pagas em 2002 que transitaram para 2003".
Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: No que se refere ao capítulo da dívida pública, é de referir que o acréscimo global do endividamento directo do Estado foi de 7023,6 milhões de euros, respeitando o limite máximo estabelecido na Lei do Orçamento do Estado para 2002. O

Página 821

0821 | I Série - Número 016 | 23 de Outubro de 2004

 

referido acréscimo corresponde a um aumento de 9,7% face ao ano anterior.
Desta evolução resultou que o rácio da dívida pública sobre o PIB atingisse 58,1 % no final do ano, e não o valor que o Tribunal de Contas apresenta no Parecer da Conta Geral do Estado, que foi de 61,5%. As regras de cálculo deste rácio estão definidas pelo Eurostat, o que me leva a exortar o Tribunal de Contas a efectuar um maior esforço de modernização, de actualização de critérios, tendo em conta as práticas internacionais.
Por outro lado, na análise dos riscos associados à dívida pública, envolvendo os riscos cambial, de refinanciamento, de taxa de juro e de crédito, o Tribunal de Contas concluiu que, em termos globais, foram respeitados os parâmetros aplicáveis, em 2002, à gestão da dívida directa do Estado.
Em termos de análise de custos, também concluiu o Tribunal que a gestão da dívida pública efectuada pelo Instituto de Gestão de Crédito Público (IGCP), em 2002, conduziu a um desempenho mais favorável do que o apresentado pela carteira benchmark, o que não deixa, obviamente, de ser positivo e temos de o registar.
Na verdade, o custo da carteira foi inferior ao do benchmark, tendo também os custos das emissões efectuadas pela carteira real sido mais vantajosos do que os apresentados pela carteira de referência.
No ano de 2002, foram prestadas pelo Estado, através da Direcção-Geral do Tesouro, garantias pessoais no montante global de 1006 milhões de euros, respeitando o limite máximo consagrado na Lei do Orçamento do Estado.
Nesta matéria, o Tribunal de Contas efectua um alerta para o custo de financiamento excessivamente elevado, facto que se veio a verificar em dois casos, pelo que deverá assegurar-se que as condições dos financiamentos garantidos são compatíveis com o risco das operações, que, na prática, como é sabido, é inexistente.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Os spreads da dívida portuguesa face à dívida alemã das obrigações do tesouro a 10 anos atingiram, neste ano, um máximo de 30 pontos base, na primeira metade de Agosto, e terminou o ano em níveis próximos de 13 pontos base, o que representava, a esta data, um novo mínimo histórico.
No que concerne ao rating da República, deve salientar-se que as principais agências internacionais de rating confirmaram neste ano as suas últimas avaliações, pelo que o rating continua com uma boa cotação e com boas perspectivas de estabilidade.
Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: No capítulo do património financeiro, o Tribunal de Contas refere que a sua análise e parecer são prejudicadas, dado a inventariação do património do Estado ainda não se encontrar concluída e a Conta Geral do Estado não ser acompanhada de um balanço entre os valores activos e os passivos.
No seu parecer, o Tribunal de Contas destaca positivamente, e bem, a extinção da Investimentos e Participações Empresariais, S.A. (IPE). O modelo adoptado desta extinção permitiu ao Estado antecipar 200 milhões de euros de receitas correntes que, de outro modo, teriam sido arrecadadas em 2003, tendo em conta as consequentes implicações na redução do défice de 2002. Permitiu, ainda, utilizar activos financeiros adquiridos à IPE sem quaisquer encargos para o Orçamento de 2002 em diversas operações, como, por exemplo, a realização do capital estatutário da Agência Portuguesa para o Investimento (API), na qual foram utilizados títulos no valor de 162,8 milhões de euros.
Este é nitidamente um bom exemplo e uma demonstração clara de uma reestruturação rápida e eficiente. É a aplicação do princípio "value for money".
Por outro lado, no que respeita à aplicação das receitas das privatizações, o Tribunal de Contas refere que as mesmas ascenderam a 685,9 milhões de euros, dos quais 397,7 milhões de euros foram destinados a amortização de dívida pública, pelo que, na sua óptica, o limite máximo estabelecido para as aplicações em novas participações de capital teria sido excedido.
No contraditório, o Instituto de Gestão de Crédito Público justificou que entrou em linha de conta com os saldos transitados, considerando assim ter aplicado a lei. O meu entendimento nesta matéria acompanha e coincide com o do Instituto de Gestão de Crédito Público. Julgo que a lei foi de facto respeitada e o limite não foi excedido.
No capítulo das Operações de Tesouraria, o Tribunal de Contas analisou a Contabilidade do Tesouro de 2002, concluindo que a implementação do Regime da Tesouraria do Estado continua por finalizar.
De facto, não se verificou a implementação total do disposto no n.º 2 do artigo 2.° do Regime da Tesouraria do Estado, que estabelece a obrigatoriedade dos serviços e fundos autónomos disporem de contas abertas na Direcção-Geral do Tesouro, através das quais promovam as respectivas operações de cobrança e pagamento e onde mantenham depositados os seus excedentes e disponibilidades de tesouraria.

Página 822

0822 | I Série - Número 016 | 23 de Outubro de 2004

 

Apesar de se estar no bom caminho e muitos serviços autónomos estarem a cumprir com o disposto na lei e estarem perfeitamente adaptados ao sistema da centralização da tesouraria do Estado, ainda existem alguns que teimam em não o fazer.
A lei e as regras aplicam-se a todos, e a todos se exige o esforço solidário no sentido da consolidação orçamental. Deve o Governo saber quem são os prevaricadores e actuar, exigindo que todos cumpram com o dispositivo legal.
Também neste capítulo, o Tribunal de Contas salienta que, apesar de ainda não terem sido obtidos resultados compatíveis com o disposto no regime legal, a Direcção-Geral do Tesouro continuou a evoluir de forma positiva, valorizando os meios colocados à sua disposição e procurando dar satisfação ao conjunto de recomendações por si produzidas.
Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Termino, dando o devido relevo à proposta do Sr. Deputado Pinho Cardão, expressa no seu relatório, sugerindo que a Assembleia da República aprove uma resolução no sentido de recomendar ao Governo que estabeleça uma programação dos trabalhos que defina os principais constrangimentos legais, regulamentares, de sobreposição de competências, informáticos e outros que dificultam a elaboração da Conta Geral do Estado, bem como as medidas e as acções a desenvolver e o respectivo custo, de forma a que a elaboração da Conta cumpra todos os preceitos técnicos, regulamentares e legais e o controlo seja eficaz, e dessa programação dê conta ao Parlamento até à data de apresentação do Orçamento do Estado para 2006.
Aliás, não posso deixar de aproveitar o momento, depois de ter ouvido o Sr. Secretário de Estado responder ao Sr. Deputado Duarte Pacheco, para demonstrar a minha grande satisfação.
Penso que desta forma o Governo dá também um passo significativo e, julgo, irá resolver muitas das recomendações que o Tribunal de Contas tem vindo a fazer ao longo deste tempo.
É uma proposta positiva, de facto, no bom caminho, e que tem como objectivo fulcral a prossecução de uma maior transparência nas contas do Estado.
É, em suma, uma proposta que honra e dignifica a Assembleia da República e à qual, obviamente, as bancadas da maioria se associam.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Antes de prosseguirmos o debate, peço a atenção dos colegas para um relatório e parecer da Comissão de Ética, o qual tem de ser votado hoje, e do qual peço ao Sr. Secretário que dê conta à Câmara.

O Sr. Secretário (Manuel Oliveira): - Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, o relatório refere-se à retoma do mandato, nos termos do artigo 6.º, n.os 1 e 2, do Estatuto dos Deputados, do Deputado Luís Fazenda (BE), eleito pelo círculo eleitoral de Lisboa, cessando a Sr.ª Deputada Ana Drago, com efeitos a 4 de Novembro de 2004, inclusive, sendo o parecer no sentido de que a retoma do mandato em causa é de admitir.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, está em apreciação.

Pausa.

Não havendo objecções, vamos votar o referido parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, prosseguindo o debate, tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Teresa Venda.

A Sr.ª Teresa Venda (PS): - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Começo por lamentar o estado da minha voz, pois encontro-me bastante rouca, e dizer que, apesar disso, espero conseguir chegar até ao final da minha intervenção.
Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Estamos hoje a apreciar a primeira Conta Geral do Estado da responsabilidade do Governo que resultou das eleições de 17 de Março de 2002 e que conta com o apoio da actual maioria parlamentar.
Gostava de cumprimentar, antes de mais, o Sr. Deputado Pinho Cardão, autor do respectivo relatório e que, suportado fundamentalmente no parecer do Tribunal de Contas, suscitou e possibilitou amplo debate na Comissão de Execução Orçamental.

Página 823

0823 | I Série - Número 016 | 23 de Outubro de 2004

 

Em síntese, sobre a Conta de 2002 o parecer do Tribunal de Contas conclui pela não fiabilidade e consistência de alguns dos valores constantes na Conta Geral do Estado, quer em relação à receita, quer em relação à despesa e, portanto, ao défice.
Mais se salienta ainda, relativamente às contas da segurança social, que as mesmas foram apresentadas como provisórias, o que, só por si, significa que não traduzem de forma verdadeira e apropriada a situação patrimonial e financeira subjacente.
Consideramos, contudo, que a apreciação da Conta Geral do Estado ultrapassa a análise que sobre ela é feita pelo Tribunal de Contas.
O papel da Assembleia da República na apreciação da Conta deve ser eminentemente político e, em termos políticos, há muito que dizer sobre o primeiro ano de gestão do Governo suportado pela actual maioria.
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Com o objectivo determinado de denegrir a oposição e para justificar o não cumprimento das promessas eleitorais, nomeadamente o famoso "choque fiscal", o Primeiro-Ministro Durão Barroso traçou um quadro negro da situação do País, desprezou o efeito recessivo do discurso e das medidas tomadas, que arrastaram o País para a maior crise económica de sempre.
O País entrou no 2.º semestre de 2002 em prolongada recessão. Seis trimestres consecutivos de queda do PIB. Situação única na Europa. A Espanha cresceu acima de 2%, a Grécia cresceu acima de 3,8%, o Reino Unido cresceu acima de 1%, etc.
O PIB per capita de Portugal estagnou, em 2002, em 71% da média comunitária.
A taxa de desemprego cresceu para 5,1%, ou seja, mais 56 700 desempregados.
No ranking de competitividade das nações descemos uma posição em 2002 e sete posições até 2004.
Enfim, os indicadores de confiança dos portugueses desceram a mínimos históricos.

A Sr.ª Leonor Coutinho (PS): - Muito bem!

A Oradora: - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Governo elegeu como um dos seus objectivos prioritários a consolidação orçamental, não apenas decorrente dos compromissos assumidos no âmbito do Pacto de Estabilidade e Crescimento mas enquanto condição essencial para o progresso e desenvolvimento sustentado da economia.
Como sabemos, e os portugueses sentem-no, no seu dia-a-dia, falhou completamente a política de contenção orçamental e o cumprimento dos objectivos a que o Governo se propôs. E falhou, porque se pôs em causa a credibilidade das instituições, porque se denegriu o trabalho da Administração e dos seus funcionários. Falhou, porque os portugueses perderam a confiança no futuro.
O Governo defendeu ainda, na apresentação do Orçamento Rectificativo na Assembleia da República, em Maio de 2002, a necessidade de introduzir uma política orçamental assente na contenção da despesa, para, e cito "Ainda no decurso do ano orçamental em curso, inverter a tendência de aumento do défice das Administrações Públicas em percentagem do PIB". Isto, porque controlar o défice era fundamental para não aumentar o endividamento público, conforme foi reiteradamente aqui afirmado pela Sr.ª ex-Ministra das Finanças.

A Sr.ª Leonor Coutinho (PS): - Bem lembrado!

A Oradora: - Que aconteceu na realidade? O défice das administrações públicas situou-se nos 4,25% do PIB ou, considerando as receitas extraordinárias e irrepetíveis (cobrança de dívidas do Estado, no valor de 1366 milhões de euros, com base num perdão fiscal; alienação da rede fixa de telecomunicações no valor de 365 milhões de euros; contrapartida pela reintrodução do pagamento de portagens na CREL, no valor de 288 milhões de euros), diz-se que o défice ficou nos 2,7% do PIB.
Mas o parecer do Tribunal de Contas enumera outras operações de desorçamentação que põem em causa a dimensão do défice apurado, algumas das quais já foram, aliás, aqui referidas, mas não é demais salientá-las. A saber: dívidas vencidas e não pagas em 2002, as quais passaram para 2003, de 112 milhões de euros; transferência de verbas para o Instituto de Gestão Informática e Financeira da Saúde, por operações específicas do Tesouro, no valor de 444 milhões de euros.
Enfim, como todos temos presente, o Governo recusou a certificação do défice de 2002 por entidade independente.
Paralelamente, assistimos ao crescimento da dívida pública. O rácio da dívida das administrações públicas subiu para 58,7% do PIB, ou seja, mais 2,6 pontos percentuais.
O Governo defendeu também, na apresentação do Orçamento Rectificativo na Assembleia da República, medidas para melhorar a eficiência na luta contra a evasão fiscal.
Que aconteceu na realidade? Assistimos à operação de perdão fiscal, para arrecadar a vultosa receita

Página 824

0824 | I Série - Número 016 | 23 de Outubro de 2004

 

fiscal extraordinária já referida, premiando os contribuintes faltosos.
Simultaneamente, o Tribunal de Contas alerta para o crescimento de dívidas fiscais. Nos impostos sobre o rendimento, as dívidas crescem 17,7%, isto é, mais 698 milhões de euros; no IVA, a dívida cresce 407,7%, mais 2463 milhões de euros.
Podemos perguntar: que medidas tomou, de facto, o Governo para melhorar a eficiência da administração fiscal?
Em detrimento de incentivar a administração fiscal, no seu papel fundamental de cobrança de receitas, o Governo optou, no Orçamento Rectificativo, por recorrer à prática mais fácil: sobrecarregou o contribuinte com o aumento da taxa nominal do IVA, de 17% para 19%. Tratou-se de uma medida negativa, em termos de justiça social, que estimulou a evasão e comprimiu o consumo, que afectou, significativamente, o rendimento das famílias de mais baixos recursos e que degradou, nomeadamente, a competitividade transfronteiriça com Espanha.
Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O ano de 2002 salda-se por uma estratégia errada.
Pondo o equilíbrio financeiro no centro das preocupações, o Governo descurou as políticas de emprego e de desenvolvimento estrutural, nas quais assentava o Orçamento inicial de 2002, o qual visava impulsionar a confiança para atenuar o impacto do abrandamento da economia internacional e, assim, manter a criação de riqueza, o emprego e o rendimento disponível das famílias.
O Governo diagnosticou um Estado doente mas, em vez de tratar o Estado doente, pôs o País doente.
É óbvia a necessidade de reformulação da despesa, lutando contra o desperdício, mas aquilo a que se assistiu foi ao corte cego na despesa, acabando por se cortar no investimento, no crescimento, no desenvolvimento e no emprego.
Os problemas estruturais do País tornaram-se óbvios mas continuamos a lutar contra o óbvio, arranjando mezinhas para resolver a tesouraria.
O Governo diagnosticou um Estado doente e seleccionou como slogan a reforma da Administração Pública, quando essa reforma apenas abrange uma parte significativa dos funcionários públicos.
Srs. Deputados, andamos à procura de sustentar um Estado doente mas precisamos de combater a doença, avaliando e melhorando o sistema de educação, avaliando e melhorando o sistema de saúde, avaliando e melhorando o sistema de justiça e de defesa, enfim, avaliando e melhorando o registo e controlo das contas públicas.
Introduzir o conceito do value for money na reforma do Estado, bem como a avaliação ex post dos resultados obtidos são os desafios que, pragmaticamente, deixo ao Governo e à maioria, para começar a recuperação do doente e, assim, melhorar a competitividade, promover o desenvolvimento e, eventualmente, conter a despesa.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Pacheco.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Teresa Venda, antes de mais, espero não contribuir para o agravamento do estado da sua voz, mas sou forçado a fazer-lhe uma pergunta.
Tenho a Sr.ª Deputada como uma pessoa séria e, nesse sentido, gostaria que me dissesse como é que consegue conciliar a intervenção que hoje aqui fez com aquilo que vem expresso no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 60/2002, ainda da responsabilidade do Governo socialista, referente a fundos de investimento, onde se decreta que existe um clima recessivo em Portugal, o qual se tem vindo a agravar. Ou seja, em Março de 2002, é um decreto governamental que reconhece, expressamente, que existe uma recessão, a qual se tem vindo a agravar. E a Sr.ª Deputada deve saber que resolver o problema de uma recessão não é como carregar num interruptor, isto é, se ela vem a agravar-se, não é o Governo que toma posse em Abril e que começa, de facto, a governar em Maio que pode ser responsabilizado pelo clima recessivo que já era reconhecido anteriormente.
Logo, Sr.ª Deputada, pode argumentar sobre a Conta Geral do Estado, dizendo que há aspectos positivos e negativos, concordar ou discordar das opções políticas, nomeadamente da elevação da taxa do IVA, o que não pode é imputar-nos aquilo que é da responsabilidade do Governo socialista, por indicadores que vinham a deteriorar-se desde Maio de 2000.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Por isso mesmo, cada um deve ficar com as suas responsabilidades. O Partido Socialista foi o grande responsável pela recessão que se viveu a partir de 2000 e que, a partir de 2002, ficou clara

Página 825

0825 | I Série - Número 016 | 23 de Outubro de 2004

 

aos olhos de todos os portugueses.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Venda.

A Sr.ª Teresa Venda (PS): - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Duarte Pacheco, agradeço a sua pergunta e o reconhecimento de que fiz uma intervenção séria.
Quero dizer-lhe que gostava também de responder seriamente à sua pergunta mas, para isso, precisava de ter aqui o preâmbulo do diploma que referiu, e não o tenho, apesar de também não saber se truncou essa informação.
Em todo o caso, quero referir que, aquando da discussão do Orçamento do Estado para o ano de 2002, aqui, na Assembleia - tive o privilégio de participar nessa discussão -, foi aceite que havia um abrandamento da economia. E isso já se havia verificado em 2001, aliás, está expresso. Ora, o abrandamento da economia combate-se com medidas para estimular essa economia e por isso é que o Orçamento inicial para 2002 previa medidas de estímulo ao investimento, precisamente para, como disse na minha intervenção, não reduzir a capacidade financeira disponível das famílias e não reduzir o desemprego.
Porém, havendo um clima de abrandamento da economia na Europa em 2002, fomos o único país a entrar em recessão, em face do discurso que foi assumido pelo Governo que esta maioria suporta. Isto é que é preciso registar! Foi isso que aconteceu! O impacto do discurso é que agravou a situação da economia. Outras economias, como a nossa, recuperaram, ultrapassaram a situação de abrandamento da economia internacional que se registou e não entraram em recessão. O problema é que nós entrámos em recessão em seis semestres consecutivos e isso deve-se às opções erradas do Governo.

Protestos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, por favor, deixem a Sr.ª Deputada Teresa Venda concluir, porque ela está com problemas de voz e, assim, é um bocadinho mais difícil.

A Oradora: - Mas, se alguma dúvida tínhamos, na Conta Geral do Estado há um capítulo que é curioso, que é o dos investimentos, do qual ninguém falou, sobretudo a maioria, que teve aqui uma participação muito relevante, a expressar o que foi a evolução da Conta Geral do Estado. É que, de facto, a evolução do investimento feito no País é catastrófica, tendo ficado ao nível de 50%. Foi isto que colocou o País em recessão! O vosso discurso baixou a confiança dos investidores e dos consumidores e, de facto, hoje, o País ainda está em recessão.
Portanto, Sr. Deputado Duarte Pacheco, não me venha citar um diploma que, tenho de confessar, não tenho comigo mas posso fazer distribuir um documento que aqui tenho, o qual elenca a evolução do PIB de 60 economias nos últimos anos, considerando, nomeadamente, o ano de 2003. E em 60 economias do mundo ocidental e civilizado, Portugal, em 2003, está na última posição, com 0,8% de descida do PIB, só seguido pela Venezuela!

Vozes do PSD: - Foi a vossa herança!

A Oradora: - Sr. Deputado, nunca isto aconteceu nos anos anteriores. Talvez tenhamos, eventualmente, de recuar ao tempo de Salazar para encontrarmos uma recessão como esta. Desde que acompanho a evolução da economia nunca isto aconteceu!
Trata-se de um documento útil para vos fazer distribuir.
Foi, pois, de facto, o vosso discurso que incentivou a recessão do País.

Protestos do PSD.

O vosso discurso e a falta de práticas concretas para combater…

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr.ª Deputada, tenho de lhe lembrar que o tempo de que dispunha terminou.

A Oradora: - Muito obrigada, Sr.ª Presidente.

Aplausos do PS.

Página 826

0826 | I Série - Número 016 | 23 de Outubro de 2004

 

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Está em discussão a Conta Geral do Estado relativa a 2002, introduzida por um relatório, aliás elaborado de forma muito rigorosa e cuidada, que é um bom ponto de partida para esta discussão.
Até agora tem-se argumentado, como aconteceu na intervenção inicial do Sr. Secretário de Estado, acerca de alguns detalhes do parecer do Tribunal de Contas e dos procedimentos que se devem adoptar na Conta Geral do Estado, bem como, posteriormente, na intervenção da Sr.ª Deputada Teresa Venda e no pedido de esclarecimento do Deputado Duarte Pacheco, acerca da avaliação da conjuntura económica.
Começarei por esta última questão, que referirei brevemente, para depois, e mais em detalhe, me pronunciar sobre o parecer do Tribunal de Contas e respectivas sugestões, que creio devermos avaliar aqui para, sobre elas, se tomar uma decisão.
Devo começar por dizer, aliás, que o relatório escolhe não discutir muito em detalhe o contexto económico em que se desenvolve esta Conta Geral do Estado. No entanto, não deixa de o fazer, e bem, pelo menos na matéria do défice das contas públicas. O relatório sublinha que o défice final é de 2,7%, tendo sido operacionalizadas algumas medidas extraordinárias que reduziram o défice de 4,25% para 2,7%, citando o valor dessas medidas extraordinárias, designadamente da venda da rede fixa de telecomunicações, da contabilização de dívidas anteriores ao fisco e à segurança social e das portagens na CREL. Fá-lo com rigor, e é assim que deve ser! Aliás, felicito o autor, o Sr. Deputado Pinho Cardão, que já aqui tinha defendido que as receitas extraordinárias deveriam deixar de ser consideradas extraordinárias e deveriam passar a ser consideradas ordinárias, por manter no seu relatório esta tipologia, que é a adequada, estando esta situação perfeitamente identificada.
É nesse campo que o relatório trata desta matéria. No entanto, agora, a discussão deu uma abrangência mais vasta à análise da evolução económica.
É certo que, pouco depois das eleições de Março de 2002 e de o Governo ter tomado posse, já os sintomas recessivos estavam instalados na economia portuguesa. Já é menos certo, Sr. Deputado Duarte Pacheco, que em 2000 tivesse começado a recessão. Na primavera de 2000 começa uma crise bolsista, uma crise importante nas mercados financeiros e que tem um efeito de arrastamento, mais tarde, sobre a recessão no desenvolvimento do Produto.
Portanto, em 2002 estamos em recessão. O que temos de avaliar é como, em 2002 - ou até preventivamente, mas sobretudo a partir de 2002 -, a governação respondeu a esta crise, seja o governo que esteve no poder até Março, seja o governo que depois tomou posse, aliás, com grandes promessas sobre a convergência real em prazo curto, apesar desses sintomas recessivos. Não nos esqueçamos que o Dr. José Manuel Barroso prometeu que cresceríamos sempre acima da média europeia para uma convergência rápida, apesar de ter conhecimento dessa circunstância.
O facto, no entanto, é que de 2002 a 2004 Portugal cresceu 0,4% do Produto acumulado nestes anos, enquanto que a média da zona euro foi de 3,1% e em Espanha esse crescimento foi de 7,4%. Portanto, Portugal teve uma recessão muito mais grave do que a zona euro e incomparavelmente mais grave do que Espanha, o que nos diz alguma coisa sobre a dificuldade, a incapacidade ou a incompetência das medidas económicas e da política económica nesse período.
Estamos num debate político sobre a avaliação das orientações, mas o que não podemos fazer, como aconteceu na intervenção do PSD, é sugerir ao Tribunal de Contas que mude os seus critérios para modernizar a contabilidade da dívida do Estado.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - O próprio Ministério das Finanças reconheceu, no dia 28 de Agosto deste ano, que a dívida pública já ultrapassou 60% no ano corrente, prevendo que ultrapasse muito no ano de 2005. Isto são os dados, são as contas!
Portanto, a partir daqui, claro que todas as instituições têm de modernizar os seus critérios - com certeza que sim -, mas não creio que possamos "tapar o sol com a peneira" a este respeito.
Assim sendo, o ponto de partida desta discussão é o seguinte: 2002 foi o primeiro ano de uma gravíssima recessão que se arrastou por mais tempo e que foi mais profunda do que as recessões anteriores que tínhamos conhecido; é desse ponto de vista que avaliamos estas políticas.
Em segundo lugar, o relatório e a intervenção do Sr. Secretário de Estado dedicaram-se a alguns dos detalhes sugeridos pelo Tribunal de Contas. É certo - disse-nos o Sr. Secretário de Estado - que a queixa do Tribunal de Contas sobre a falsa transparência das contas dos regimes de segurança social correspondem

Página 827

0827 | I Série - Número 016 | 23 de Outubro de 2004

 

à mudança do padrão da apresentação das contas a este respeito, mas o alerta do Tribunal de Contas não deixa de ser importante no sentido de nos permitir conduzir a uma melhor transparência das contas públicas, publicando, ou como anexo ou como informação, as contas destes vários regimes, porque assim se pode melhor avaliar o seu desenvolvimento.
Por fim, o Tribunal de Contas - e o parecer di-lo - acentua alguns aspectos exclusivamente da responsabilidade do Governo do PSD. Por exemplo, a repetida assunção de encargos sem cobertura orçamental e políticas de "desorçamentação" (refere-se a algumas especificamente) dos últimos dois terços do ano, correspondentes ao período do Governo do PSD.
Chamo a atenção para outro aspecto de grande importância. Em particular, o parecer do Tribunal de Contas (e o relatório da comissão parlamentar continua a acentuar, na página 58, esse aspecto) sublinha que a transformação de hospitais públicos em sociedades anónimas de capital exclusivamente público foi suportada por "imprecisões, ilegalidades e incorrecções", sobretudo nas datas de realização do capital social subscrito pelo Estado. Isso permitiu uma falta de transparência, de correcção e de rigor nestas contas, o que é de enorme importância, porque nesse ano foram aprovados estes diplomas e nesse ano foi completada a subscrição do capital social à luz do novo decreto-lei.
Portanto, desse ponto de vista, este alerta é extraordinariamente importante, até porque a partir desta tarde, que abre o período do debate orçamental, estamos confrontados em grande medida com as consequências desta política.
Finalmente, para concluir, sublinho que as sugestões aqui apresentadas pelo Sr. Deputado relator são correctas, no sentido de ser aprovada uma resolução da Assembleia da República. Queria, no entanto, sugerir que essa proposta fosse operacionalizada em termos práticos. Se a comissão competente for encarregue de propor um texto a este respeito para que o possamos votar quando apreciarmos, daqui a mais de duas semanas, no voto, a Conta Geral do Estado, creio que só ganharemos. Para não adiar para calendas futuras uma iniciativa desta ordem, então que estas propostas sejam consagradas num projecto de resolução em tempo útil, ou seja, quando formos votar esta resolução, para que todas estas medidas possam ser consagradas, havendo, naturalmente, acordo na Câmara sobre elas.

Aplausos do Deputado do PS Joel Hasse Ferreira.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Veiga.

O Sr. Paulo Veiga (CDS-PP): - Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Em primeiro lugar, quero elogiar a qualidade muito elevada do relatório apresentado pelo Sr. Deputado Pinho Cardão. É de simples justiça fazê-lo, uma vez que se trata de um relatório cuja análise mostra o muito trabalho que nele foi aplicado e que, para além disso, foi elaborado numa perspectiva de defesa do interesse do Estado, com isenção e independência, sem cedências a questiúnculas partidárias. Penso que se trata de um documento que honra e dignifica a Assembleia da República.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - A importância deste debate é inequívoca e talvez não tenha assumido em tempos, nesta Câmara, a concretização exigível do primado financeiro do Parlamento.
Com a discussão de hoje, relativa ao ano de 2002, não podemos deixar de valorizar uma maior normalização na avaliação política das contas públicas, que, em resultado do cumprimento dos prazos de apresentação, só dignifica esta Câmara.
Registamos com agrado a continuação da normalização do processo de discussão e aprovação das contas do Estado, um instrumento que permite a apreciação da gestão financeira do Estado e a avaliação sobre a utilização dos dinheiros públicos, à luz do critério da economia, da eficiência e da eficácia. Assume, assim, a maior importância e constitui uma garantia fundamental para os cidadãos quanto ao controlo da aplicação dos recursos financeiros públicos.
Representa precisamente a tradução quantificada da actividade económica e financeira da Administração Pública durante cada exercício económico, e é, por isso, um instrumento sobre o qual deve ser exercido o controlo político que cabe à Assembleia da República.
O que se trata de discutir nesta sede é uma matéria de elevada complexidade, em que, para além das Contas em sentido próprio, se incluem desde os movimentos relativos à dívida pública aos fluxos com a União Europeia, passando pelos activos e passivos financeiros e a segurança social.
Esta discussão, eminentemente técnica, foi devidamente desenvolvida pelo Tribunal de Contas através do parecer que integra o relatório da Comissão de Execução Orçamental.

Página 828

0828 | I Série - Número 016 | 23 de Outubro de 2004

 

Gostaria de evidenciar certos aspectos constantes do parecer do Tribunal de Contas, os quais merecem uma reflexão a todos os Deputados. Em primeiro lugar, e no que respeita à execução do orçamento das receitas, destaco a recomendação no sentido de o modelo de contabilização das receitas passar a ser sustentado por um sistema informático de registo dessas próprias receitas, capaz de assegurar o registo integral e tempestivo da informação relevante.
Este aspecto é de grande importância de modo a que possam ser conhecidos, analisados e criticados os elementos fundamentais do comportamento dos contribuintes e da administração fiscal e, nessa medida, avaliar a eficácia de todo o sistema fiscal, informação que todos sabemos ser indispensável para apurar e concluir acerca dos fenómenos de evasão e fraude fiscais.
Sublinho que o reforço desta informação teria sido, a vários títulos, de extrema importância para fundamentar, de forma rigorosa, as questões que estiveram em debate a propósito da reforma da tributação nos impostos sobre o rendimento.
Também segundo o parecer, existem algumas lacunas, designadamente na troca de informação e documentação entre a Direcção-Geral das Contribuições e Impostos, a Direcção-Geral do Tesouro e a Direcção-Geral do Orçamento, bem como na deficiência dos sectores auditados no que respeita à carência de recursos humanos e materiais, à inadequação da generalidade do equipamento informático e à necessidade de formação.
Em suma, a conclusão que me parece resultar da análise do parecer do Tribunal de Contas é a de que existem procedimentos e irregularidades a corrigir - e que, decerto, serão tidos em consideração pelos serviços visados - mas, sobretudo, que certas irregularidades ou contrariedades na execução orçamental resultam da ineficiência dos serviços administrativos.
Quanto a este último aspecto, e para além da prossecução de uma adequada política financeira, é igualmente importante não ignorar problemas de base e de ineficiência do sistema, sem a resolução dos quais, por mais que se prossiga uma efectiva política de rigor orçamental e de transparência nas contas públicas, não se logrará obter quaisquer resultados.
É preciso não esquecer que a fiscalização financeira e política não se resume apenas à discussão deste debate. Ela vai-se efectivando ao longo do ano, na Assembleia, com o apoio da Comissão de Execução Orçamental.
Nesta matéria, quero realçar o contributo da maioria na discussão das alterações à lei de enquadramento orçamental, norteado por três princípios fundamentais: maior rigor e clareza das contas públicas; aumento do grau de responsabilização política relativamente à realização de despesas públicas; e, por último, um maior acompanhamento político da execução orçamental por parte da Assembleia da República.
O papel da Assembleia da República nesta apreciação deve ser de carácter sobretudo político, relacionando essa análise política com os aspectos económicas e financeiros que relevam da análise estruturada das próprias Contas, permitindo contextualizar o parecer do Tribunal de Contas e a própria Conta Geral do Estado.
Importa, por isso, recordar o contexto em que decorreu a mudança de governo no ano em análise, a forma como o governo anterior cessou funções, as circunstâncias que tornaram patente a necessidade imperativa de uma inversão da política orçamental e as implicações daí decorrentes na economia e na vida dos cidadãos.
Deve lembrar-se que, com um esforço extraordinário mas extremamente responsável por parte do XV Governo face à situação herdada, foi possível que o défice das Contas do Estado de 2002 "apurado na notificação dos procedimento dos défices excessivos de Março de 2003, se situasse nos 2,7% do PIB", como, aliás, refere o Banco de Portugal no seu relatório de 2002.
Alcançar este valor foi apenas possível pela determinação em levar a cabo uma série de medidas extraordinárias, entre as quais refiro apenas algumas: a regularização de dívidas fiscais, sem juros de mora ou compensatórios; as receitas, no valor de 1366 milhões de euros, significaram cerca de 1,24% do PIB; a alienação da rede fixa de telecomunicações por 365 milhões de euros, equivalente a 0,3% do PIB; ou ainda a reintrodução do pagamento de portagens na CREL, o que levou a concessionária a entregar ao Estado 288 milhões de euros, equivalente a 0,2% do PIB.
Num ano em que Portugal cumpriu a recomendação do Conselho ECOFIN de pôr fim à situação de défice orçamental excessivo, o saldo global do sector das administrações públicas, na óptica da contabilidade nacional, atingiu em 2002 os 3500 milhões de euros, correspondendo a 2,7% do PIB.
Este indicador representou, face a 2001, uma redução de 1,5 pontos percentuais, reflectindo um desvio de 0,1 pontos percentuais do PIB abaixo do objectivo definido no Orçamento rectificativo de Maio de 2002 (2,8%), bem como o estipulado no Programa de Estabilidade e Crescimento 2003-2006.
O ano de 2002 continuou ainda marcado pelo clima de retracção económica na União Europeia, traduzido num crescimento económico que se situou em torno de 1% do PIB.

Página 829

0829 | I Série - Número 016 | 23 de Outubro de 2004

 

Importa também referir os aspectos positivos e os progressos que em 2002 se registaram nesta matéria e que, como já foi referido, o próprio Tribunal de Contas demonstra. Designadamente, a entrada em funcionamento de um novo sistema de gestão de receitas, que corresponde a uma exigência legal e que vai ao encontro das recomendações expressas em sucessivos pareceres daquele Tribunal; ou, quanto à Despesa, a criação de uma conta-despesas de anos anteriores, que de algum modo responde também a algumas das reservas manifestadas pelo Tribunal, uma vez que permite identificar os compromissos assumidos em anos anteriores e cujo pagamento tenha sido adiado ou diferido para o ano em causa.
A verificação ex post do grau e do modo de concretização da previsão orçamental constitui um requisito fundamental para formular um juízo sobre a gestão financeira mas também económica dos recursos públicos e da adequação das políticas públicas neste âmbito.
Nesta matéria, não obstante os muitos progressos registados desde 2002, entendemos que o Parlamento tem um papel fundamental, uma vez que é não só legítimo como totalmente razoável que se exija que o registo das contas públicas seja completo, exaustivo e transparente.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: A Conta Geral do Estado que hoje analisamos é sui generis, porque é relativa a um ano dividido por dois governos, um ano em que foi apresentado um Orçamento rectificativo pelo meio que alterou factores fundamentais do Orçamento do Estado inicial e em que, na parte que coube ao Governo PSD/CDS-PP, houve uma obsessão em inflacionar o défice, pelo menos formalmente, em cortar na despesa pública, em corrigir uma situação, que de facto existia, de sobreavaliação das receitas e de desorçamentação de algumas despesas, mas recaindo este Governo nalguns dos mesmos erros que criticava ao governo anterior.
É verdade também que a Conta Geral do Estado de 2002 que hoje analisamos se refere a um ano de uma política de incentivo à crise, a um ano de corte no investimento público, de aumento do imposto sobre o valor acrescentado, de imposição de cortes e de dramatização do cenário económico e orçamental para justificar as medidas gravosas que depois vieram a ser tomadas, não sem se manterem todos os privilégios, designadamente em relação à não tributação das mais-valias e outros benefícios fiscais, que se mantiveram intactos, apesar da crise invocada e, de facto, incentivada por este Governo, que já foi responsável por boa parte do ano 2002.
De facto, o Tribunal Constitucional volta a apresentar algumas das críticas que tem feito em pareceres relativos a várias Contas, designadamente sobre informação insuficiente, informação em falta, ou tardia, ou hermética, ou com pouca fiabilidade em muitos dos seus elementos, com destaque para o carácter provisório das contas da segurança social, o que é amplamente referido pelo Tribunal de Contas, assumindo este Tribunal uma posição de reserva sobre o orçamento da receita e de crítica à falta de registo da despesa.
De facto, também se verificam, apesar de, na altura e posteriormente, terem sido sucessivamente negados pelo Governo, fenómenos de assunção de encargos sem dotação e de desorçamentação.
Aqui temos a comprovação da passagem de dívidas contraídas em 2002 para 2003, no valor de 112 milhões de euros, que, aliás, levaram também - e estão ligadas - aos congelamentos que o Ministério das Finanças impôs a vários sectores da Administração Pública e que eram aqui, na Assembleia, sucessivamente negados, quer pelos então membros do Governo, quer pelos Deputados da maioria. Quando dizíamos que estavam a ser dadas orientações para que as escolas não pudessem comprar bens e serviços indispensáveis ao seu funcionamento, para que pusessem em causa alguns pagamentos, para que, no sector da saúde, horas extraordinárias e outros pagamentos ao pessoal fossem postos em causa, especialmente no final de 2002, o que nos respondiam era que não era verdade e que não havia qualquer orientação neste sentido.
Ora, o parecer do Tribunal de Contas vem comprovar que havia essa orientação e que, de facto, o Governo impediu o funcionamento normal de muitos dos serviços públicos, com sérios prejuízos para aquilo que fazem e para os cidadãos que deles dependem.
Estes congelamentos e a passagem das dívidas para o ano seguinte, certamente, motivaram a existência de juros de mora, cujo quantitativo não sabemos, e configuram uma situação grave.
Aliás, no Orçamento rectificativo, agora apresentado pelo Governo, pelo Ministério das Finanças, há ainda um pagamento de dívidas de anos anteriores. É preciso que seja especificado pelo Governo a que anos se reportam estas dívidas, porque é legítimo suspeitar que elas não sejam apenas do Orçamento anterior e que algumas delas, que já transitaram de 2002, ainda estejam por pagar e venham agora a ser

Página 830

0830 | I Série - Número 016 | 23 de Outubro de 2004

 

corrigidas no Orçamento rectificativo de 2004.
Por isso, é indispensável que, também por esta razão, sejam discriminados os anos a que correspondem as dívidas que o Governo agora se propõe pagar, passando-as para a dívida pública.
É apontada igualmente a continuação da insuficiente orçamentação das despesas com pessoal.
Um outro factor importante e significativo é o crescimento das dívidas fiscais nos impostos sobre o rendimento - mais 17,7% -, o que indicia que todo o discurso do combate à fraude e à evasão fiscais pouco efeito teve, porque aumentam as dívidas fiscais no ano de 2002.
Por outro lado ainda, do ponto de vista do investimento, temos uma baixa execução do financiamento nacional do Capítulo 50 do PIDDAC, com prejuízos, designadamente, para a área da saúde - e foi um prejuízo grave -, onde o incumprimento da regra n+2, em relação aos fundos comunitários, custou ao nosso país a perda de 1,1 milhões de euros; dinheiro perdido em fundos comunitários para investimentos na saúde, porque este Governo não investiu a contrapartida nacional suficiente para dar resposta ao aproveitamento destas verbas.
Outra nota significativa é, evidentemente, a comprovação de que já em 2002 a dívida pública tinha ultrapassado 60% do PIB, apesar dos reparos ao Tribunal de Contas feitos agora pela bancada do PSD. Este é, realmente, um factor que não se pode esconder e que será muito importante para a análise do Orçamento que começará a ser discutido hoje à tarde e que discutiremos nas próximas semanas.
Uma outra nota tem a ver com a importância que neste Orçamento rectificativo teve o aumento de verbas para a saúde - é um problema que se verificou em 2002 e que mantém plena actualidade, porque continuamos a ter uma situação de suborçamentação do sector da saúde -, para mostrar, na altura da apresentação dos orçamentos, grandes vantagens das medidas da política da saúde tomadas pelo Governo mas que, depois, se verifica que não correspondem à realidade, acabando por ter de se compensar o aumento dos gastos quando já não é possível escondê-lo mais, como acontece novamente este ano com os orçamentos do Serviço Nacional de Saúde e da Saúde.
Finalmente, uma nota para os atrasos na realização do capital social nas sociedade Polis, mas, especialmente, nos hospitais SA. Esta é uma matéria que, sucessivamente, tendo vindo a ser levantada pela Assembleia e que sucessivamente tem sido negada pelo Ministério da Saúde. Provamos agora que, de facto, o capital social, que teria, obrigatoriamente, de ser transferido para os hospitais SA, não foi realizado na data prevista pela lei, e isto mesmo o Tribunal de Contas acaba por constatar. Aliás, suponho que o Tribunal de Contas continua - e continuará - a ter muita dificuldade em verificar a situação real do capital social de cada hospital sociedade anónima, em saber quanto desse capital foi utilizado para pagar dívidas, quanto desse capital está empenhado em tal endividamento, porque continuamos a não ter dados seguros do Ministério da Saúde, nem do Ministério das Finanças, sobre esta matéria.
Termino dizendo que as Contas do Estado devem ter um paradigma de rigor e de clareza, porque isso é indispensável não só para o controlo jurisdicional que o Tribunal de Contas faz mas também, e sobretudo, para o controlo democrático que a Assembleia da República tem de fazer. E deste ponto de vista continuamos a estar muito aquém daquilo que seria desejável e exigível.

Aplausos do PCP.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pinho Cardão.

O Sr. Pinho Cardão (PSD): - Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Nesta minha segunda intervenção gostaria de me referir ao futuro - e só ao futuro -, porque é a ele que temos de nos referir. Mas, dadas algumas menções ao passado, à Conta Geral do Estado de 2002, não posso deixar de passar por cima delas, e, assim, vou referir-me, em primeiro lugar, àquilo que a Sr.ª Deputada Teresa Venda disse.
Sr.ª Deputada Teresa Venda, tenho uma simpatia muito grande por si.

A Sr.ª Teresa Venda (PS): - Muito obrigado!

O Orador: - Aliás, já lhe disse uma vez que quando olho para a Sr.ª Deputada me lembro da minha mãe, que, coitada, já morreu, quando era nova, e até por isso tenho simpatia por si. Portanto, é uma questão afectiva ou sentimental.
Mas, Sr.ª Deputada, da sua intervenção retira-se apenas que a Conta Geral do Estado de 2002 enfermou das observações, das anomalias, das irregularidades do Tribunal de Contas. Ora, eu tenho aqui,

Página 831

0831 | I Série - Número 016 | 23 de Outubro de 2004

 

comigo, dois volumes de relatórios do Tribunal de Contas, o Relatório da Conta de 2002 e o Relatório da Conta de 1999, estive a compará-los, não vi o peso,…

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Isso não é a peso, Sr. Deputado!

O Orador: - … mas julgo que são mais ou menos idênticos! Se há alguma diferença é para menos,…

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Ah!…

O Orador: - … e verifica-se no Relatório da Conta de 2002! Mas digamos que são idênticos!
Donde, as observações que estão no Relatório da Conta de 2002 eram as que estavam no Relatório da Conta de 1999, e a Sr.ª Deputada esqueceu-as! Estão aqui nestes volumes, não lhos ofereço porque preciso deles.
A Sr.ª Deputada falou na Dr.ª Manuela Ferreira Leite. E eu julgo que todos nós, pelo menos os Deputados do PSD, homenageamos a Dr.ª Manuela Ferreira Leite como grande ministra das Finanças que foi…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Isso no PSD!

O Orador: - … e que impediu o descalabro das contas públicas nos anos de 2002 e de 2003.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Quero também agradecer as menções ao relatório da Comissão que elaborei. De facto, tive alguma preocupação, ou muita preocupação, de rigor.
Também foi falada a questão do défice, um assunto que vem sempre à baila. Tanto o Partido Socialista como os outros partidos estão com a obsessão do défice.

Risos do PS, do PCP e do BE.

Temos de ultrapassar esta questão.
Relativamente a este aspecto, eu até gostava de vos lembrar o que Ramalho Ortigão escreveu em 1888 - há 120 anos - no seu livro As Farpas. Diz ele: "Reunidas as Câmaras e abertas, perante elas, o Orçamento do Estado, começa-se, invariavelmente, por constatar num trémulo elegíaco de sinfonia fúnebre, que continua a existir o défice" - isto em 1880. "Cada um dos três governos,…" - na altura eram três, agora são dois - "… a quem a coroa, alternativamente, adjudica a mamadeira do sistema, encarrega-se de explicar aos taquígrafos esta ocorrência, aliás desagradável, cumpre dizê-lo, mas que ele, governo em exercício, não tem culpa. A responsabilidade cabe ao governo transacto, bem conhecido pelos seus esbanjamentos e pela sua incúria. Para cada um destes três governos sucessivamente encarregados de trazerem o défice em tal regaço da representação nacional, o governo que imediatamente o precedeu nesse mesmo encargo é o último dos imbecis. Tal é o conceito formidável em que cada um dos referidos três governos tem os outros dois. A coroa, por sua parte, e este é o mais augusto de todos os seus privilégios, é sucessivamente da opinião de todos os três ministérios".
Basta de défice! Olhemos para o futuro, sobretudo porque não só o Partido Socialista como também os outros partidos falam do défice, mas ainda hoje, nesta mesma sessão, falaram da crise económica por não ter havido mais despesa pública! Isto é: por um lado, dizem que o défice é elevado; por outro lado, invectivam a chamadas "receitas extraordinárias"; e, ainda por outro lado, dizem que o défice é elevado. De facto, não percebo tão grande harmonia, e julgo que isto é uma grande contradição.
Por falar em receitas ordinárias ou extraordinárias, algumas das receitas ditas extraordinárias são, de facto, ordinárias, são mesmo ordinaríssimas!

Risos.

A questão da titularização, que permitiu que se recebessem verbas de contribuintes relapsos é uma receita ordinária apenas recebida de modo não habitual.
Esta é, de facto, a questão.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Página 832

0832 | I Série - Número 016 | 23 de Outubro de 2004

 

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Pergunte ao Secretário de Estado se é da mesma opinião!

O Orador: - Falou-se de desorçamentação. De facto, o Tribunal de Contas diz que há alguma desorçamentação, e haverá realmente desorçamentação, simplesmente não reveste materialidade, como se quis fazer crer. Um exemplo de desorçamentação é o porte-pago. O porte-pago tem alguma importância para os jornais, para a comunicação social, mas não tem um valor tão grande que revista materialidade para alterar a Conta Geral do Estado.
Embora não me agrade falar no passado, sobre esta matéria, gostaria de lembrar que, no que respeita às Contas de 1999, o Tribunal de Contas disse só isto: "Nestas condições, a única certeza que é possível ter sobre a receita orçamental é que o respectivo valor não corresponde ao que se encontra inscrito na Conta Geral do Estado".
Acho que isto é lapidar! O Tribunal de Contas nunca tornou, tanto quanto sei, de 1999 a 2002, a dizer estas coisas e desta forma.

O Sr. Victor Baptista (PS): - Simpatia!

O Orador: - Portanto, quanto ao passado julgo que estamos realmente conversados.
Também se falou do capital social dos hospitais, mas aqui as irregularidades são meramente formais, nada têm a ver com realização de capital. O capital entrou e o que aconteceu foi que ou foi mal contabilizado ou não foi correctamente contabilizado, de acordo com o que o Tribunal de Contas pretendia. Mas, em termos substanciais, o dinheiro entrou nos hospitais.
No que respeita aos Polis, as irregularidades também são formais, nada têm de substância.
Julgo que devemos, de facto, ir ao futuro. Há muitos aspectos positivos que se verificaram este ano e que irão, certamente, augurar um futuro mais radioso nas Contas do Estado.
O primeiro aspecto positivo, do meu ponto de vista, é o tempo do debate. A Assembleia da República reservava para o debate da Conta Geral do Estado um tempo mínimo que era inferior ao da grelha E.
Evidenciei este ponto quando apresentei o relatório sobre a Conta Geral do Estado de 2001. Nessa altura, referi que o debate da Conta Geral do Estado deveria ser uma ocasião exemplar para exercer uma das grandes competências da Assembleia da República, que é a fiscalização dos actos do Governo, apreciando a correspondência entre o programa de acção, traduzido no Orçamento, e o programa efectivado, traduzido na Conta. E não era o que vinha a acontecer.
A Conta Geral do Estado era, na altura, um mero exercício burocrático indispensável e, talvez por isso, mantinha as deficiências de ano para ano, algo que queremos ultrapassar.
Portanto, a alteração é extremamente positiva, e felicito os líderes parlamentares e o Presidente da Assembleia da República pelo facto.
Como segundo aspecto positivo, saliento o facto de o debate da Conta Geral do Estado de 2002 se efectuar antes de decorridos dois anos sobre a data a que a mesma se refere, o que inédito de há muito tempo para cá.
O debate da Conta Geral do Estado de 1999 foi feito em Dezembro de 2002, 36 meses após o período a que se refere; o da Conta de 2001 foi feito em Janeiro de 2004, 25 meses após o período a que se refere; e o da Conta de 2002 foi feito 22 meses após o período a que a mesma se refere.
O debate sobre a Conta Geral do Estado de 2003 está previsto para o 1.º trimestre de 2005, o que significa que será feito 15 meses, no máximo, após o encerramento do ano, e irá cumprir totalmente aquilo que está estabelecido na lei de execução orçamental.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se. Tenha a bondade de concluir.

O Orador: - Vou terminar, Sr.ª Presidente.
Estes são os aspectos positivos, que devemos valorar e sobre os quais realmente terá importância falar.
O passado é passado, e as lições do passado devem servir-nos para construir um futuro melhor e para não andarmos sempre em autoflagelação.
Olhemos para o futuro e com alguma confiança!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Victor

Página 833

0833 | I Série - Número 016 | 23 de Outubro de 2004

 

Baptista.

O Sr. Victor Baptista (PS): - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Analisar a Conta Geral do Estado de 2002 é, evidentemente, comparar aquilo que foi o Orçamento do Estado para 2002 com um Orçamento rectificativo pelo meio e, naturalmente, a sua execução. Mas mais importante que os números é ter um pouco a consciência de que a execução de um orçamento insere em si um conjunto de políticas macroeconómicas e de que avaliar a Conta Geral do Estado é também avaliar o efeito dessas mesmas políticas macroeconómicas.
Em 2002, verificou-se claramente um abrandamento da actividade económica - e, neste ano, não houve uma recessão, quanto muito, começou a configurar-se uma recessão no último trimestre do ano.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - No relatório do Banco de Portugal de 2002, o produto interno bruto registou um crescimento real de 0,4%, bem diferente do crescimento real de 1,7%, em 2001, e de 3,7%, em 2000. Portanto, tínhamos a desaceleração da actividade económica, que foi particularmente expressiva em termos intra-anuais, com uma variação homóloga do PIB negativa no 2.º semestre de 2002.
No decurso do ano de 2002, a taxa de desemprego situou-se em 5,1%, mais 1% do que no ano anterior. Em termos intra-anuais, a subida do desemprego foi mais pronunciada no 4.º trimestre de 2002, com este indicador a situar-se nos 6,2%, mais 2% do que o observado trimestre homólogo de 2001.
Em 19 de Dezembro de 2002, sobre a Conta Geral do Estado de 2000, afirmava, nesta Assembleia, a então Deputada Rosário Cardoso Águas, hoje Secretária de Estado Adjunta do Ministro da Segurança Social, da Família e da Criança, o seguinte: "O Tribunal de Contas detectou, em relação à Conta do ano 2000, a existência de deficiências graves no sistema de apuramento das receitas e despesas públicas, a utilização de práticas de desorçamentação e o desrespeito pelos princípios contabilísticos aplicáveis.
Por estas razões e porque os documentos não traduzem com exactidão a situação financeira das operações realizadas, a posição do Tribunal de Contas é de reserva quanto aos valores apresentados na Conta Geral do Estado de 2000 para a despesa, para a receita e, consequentemente, para o deficit".
Sr.ª Presidente e Sr.as e Srs. Deputados, as palavras da então Sr.ª Deputada Rosário Águas fazem-nos recordar o velho ditado popular: "pela boca morre o peixe"!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Senão, vejamos: a apresentação da Conta Geral do Estado de 2002 é da responsabilidade do Executivo, de maioria PSD/PP, e, segundo o relatório do Tribunal de Contas - pág. 13 do volume Conclusões e Recomendações -, este Tribunal conclui: "pela não fiabilidade e consistência de alguns valores constantes da Conta Geral do Estado, quer em relação à receita quer em relação à despesa e, consequentemente, ao défice".
Mais diz o Tribunal de Contas sobre a assunção de encargos sem dotação orçamental e realização de despesas à margem do Orçamento do Estado: "De notar que transitaram para 2003…" - como aqui já foi referenciado - "… dívidas vencidas e não pagas no valor de 112,3 milhões de euros (…)", aos quais podíamos adicionar 444 milhões de euros, que foram transferidos para o IGIF (Instituto de Gestão Informática e Financeira da Saúde) no âmbito do Ministério da Saúde.
Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em boa verdade, em nome da transparência das contas públicas, esta Assembleia é soberana em termos da aprovação da Conta Geral do Estado e deveria exigir a constituição de uma comissão independente para a avaliação anual do défice público. Mas a maioria PSD/PP a isto se vem, sistematicamente, opondo e também não assumiu as conclusões do relatório da Comissão para Análise das Contas Públicas, que foi presidida pelo Dr. Vítor Constâncio.
Tal qual o Governo de maioria PSD/PP exigiu a avaliação das Contas de 2001, em face das reservas referenciadas e implícitas no relatório do Tribunal de Contas, também esta Assembleia deveria exigir a aplicação do mesmo critério às Contas de 2002 e de 2003.
A Conta Geral do Estado de 2002 registou um défice de 5873,4 milhões de euros, o que representa um forte agravamento (mais 31,4%), relativamente ao registado em 2001.
Não deixa de ser surpreendente o que se pode verificar na pág. 52 do parecer do Tribunal de Contas sobre a Conta Geral do Estado de 2002, onde se inferem os artifícios estratégicos utilizados pelo Governo para a obtenção do défice em 2002, nomeadamente a antecipação de receitas correntes de 200 milhões de euros, resultantes da extinção do Instituto das Participações do Estado, para redução do défice de 2002 em prejuízo do défice de 2003.
Mais do que nunca, e porque são oportunas para as Contas de 2002, recordo as palavras, nesta

Página 834

0834 | I Série - Número 016 | 23 de Outubro de 2004

 

Assembleia, do Deputado Pinho Cardão, sobre as Contas de 1999: "A Conta Geral do Estado é objecto de importantes reservas no parecer do Tribunal de Contas. (…) Sendo um elemento essencial, torna-se necessário que os Srs. Deputados tomem conhecimento de que, no relatório do Tribunal de Contas, expressam-se, de forma continuada e incisiva, notas de observações, de irregularidades, de reservas (…)". Pela "boca morre o peixe", Sr. Deputado.

Vozes do PS: - Mais um peixe!

O Orador: - Termino, recordando as palavras do Sr. Deputado Pinho Cardão: "Já dizia o filósofo grego Aristóteles: "É, pois, claro que a virtude do bom cidadão não é a virtude do governante. Nós chamamos homem bom e prudente ao governante responsável e dizemos que o político deve ser prudente. (…)". Acrescento, Sr. Deputado, como se vê, "bem prudente", porque "pela boca morre o peixe" e, como acabou de confirmar, aí estão as Contas de 2002 não muito diferentes, nas observações do Tribunal de Contas, das Contas de 1999 e de 2000.

Aplausos do PS.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): - Mas com melhorias!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Vamos, agora, entrar na fase de encerramento do debate.
Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Tavares Moreira.

O Sr. Tavares Moreira (PSD): - Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Estamos a finalizar este debate da Conta Geral do Estado de 2002, durante o qual pudemos apreciar, com bastante extensão e alguma profundidade, os principais aspectos críticos - uns positivos, outros negativos - da gestão financeira do Estado nesse ano, pelo que é momento de extrair algumas breves conclusões.
Em primeiro lugar, cumpre salientar que se tratou do primeiro debate, digno deste nome, sobre a Conta Geral do Estado, desde há muitos anos. E, nesta Legislatura, esta é já a quarta Conta Geral do Estado que temos oportunidade de apreciar, e que iremos, depois, votar - recuperando o trabalho atrasado de legislaturas anteriores -, mas é a primeira que merece um debate com apropriada relevância e também a que tem a participação do Governo.
Trata-se, pois, de uma evolução muito positiva, que deve ser assinalada, competindo, em especial, saudar a atenção que o Sr. Presidente da Assembleia da República resolveu atribuir ao debate desta questão. E é uma evolução que também tem de ser prosseguida (não está concluída), permitindo, finalmente, que a apreciação e a votação da Conta sejam realizadas de acordo com o calendário (não isento de dúvidas, mas referir-me-ei a isto mais adiante, no final) prescrito na Lei de enquadramento orçamental. Isto é, a elaboração e apresentação da Conta pelo Governo no prazo de seis meses após o final do exercício a que a mesma respeita - o que aconteceu pela primeira vez, cumpre desde já registar, com a Conta de 2003 - e, depois, a sua discussão e votação pela Assembleia da Republica, precedendo a apreciação do relatório do Tribunal de Contas, até final do ano ou início do ano subsequente.
A segunda conclusão breve é para sublinhar que a Conta continua, como resultou claro deste debate, a evidenciar muitos problemas e insuficiências, no tocante à fiabilidade dos valores apresentados, bem como à eficácia dos sistemas de controlo referentes quer à realização da despesa quer à arrecadação de receita. Devemos admitir, como também me parece ter ficado claro, que nem sempre as críticas do Tribunal de Contas são inteiramente rigorosas ou justificadas, mas certamente que em muitos casos o serão. Há, por isso, um trabalho importante a fazer, no sentido de aperfeiçoar os mecanismos de contabilização e de controlo. Tem-se a noção, aliás, de que este trabalho deve ser extensivo ao aspecto da apreciação da eficiência na utilização dos recursos públicos - o tal princípio do value for money -, pois existem ainda muitas zonas da Administração Pública em que falta rigor na utilização dos recursos públicos.
Por isso, a importância da proposta apresentada pelo Sr. Deputado Relator - cujo esforço e seriedade na elaboração do importante documento que aqui apresentou muito me apraz sublinhar -, para que a Assembleia da República aprove a tal resolução recomendando ao Governo a apresentação, no prazo de um ano, de um plano de acção para eliminar as insuficiências da Conta Geral do Estado. Esta proposta parece-me muito construtiva e susceptível de contribuir para que, dentro de 2 a 3 anos, as referidas insuficiências na elaboração da Conta sejam ultrapassadas - o que seria um acontecimento notável, depois de tantos e tantos anos de reparos sucessivos da entidade fiscalizadora.
A terceira e penúltima conclusão é para dizer que o trabalho da Comissão de Execução Orçamental na apreciação da Conta também pode e deve ser melhorado em próximas edições, designadamente: introduzindo

Página 835

0835 | I Série - Número 016 | 23 de Outubro de 2004

 

algum exercício de contraditório durante a discussão da Conta em sede de Comissão, após a apreciação do relatório do Tribunal de Contas; abrangendo a audição, por exemplo, da Direcção-Geral do Orçamento, da Direcção-Geral do Tesouro, do Instituto de Gestão do Crédito Público e, porventura, de outras entidades com relevância na gestão das operações de receita ou despesa.
Uma breve nota, finalmente, acerca de algumas disposições da Lei de enquadramento orçamental relativas a esta matéria que me parecem carecer de alguma reflexão ou, mesmo, revisão. Refiro-me, concretamente, aos artigos 72.º e 73.º da Lei de enquadramento orçamental.
O artigo 72.º tem uma disposição que me parece absolutamente inócua, uma vez que diz que a Assembleia da República pode, para efeitos da efectivação de eventuais responsabilidades financeiras ou criminais decorrentes da execução do Orçamento do Estado, deliberar remeter às entidades competentes o parecer do Tribunal de Contas sobre a Conta Geral do Estado. Trata-se de deliberar remeter um parecer que está publicado no Diário da República, e, portanto, não compreendo a necessidade, seja em que circunstâncias for, de a Assembleia tomar uma tal deliberação.
O artigo 73.º tem a ver com os prazos de apresentação e de discussão da Conta. Referem-se dois prazos com a mesma expressão "no ano seguinte" e fica a dúvida se o "ano seguinte" é o mesmo. Ou seja, se a apresentação da Conta e a sua discussão devem decorrer dentro do mesmo ano (e sabemos que a apresentação da Conta tem de ser feita até 30 de Junho), o prazo é manifestamente curto; se se refere efectivamente ao ano seguinte, o prazo é parece-me manifestamente exagerado, uma vez que, neste caso, o Governo teria apenas seis meses para a apresentação da Conta e, depois, a Assembleia da República teria 18 meses para a apreciar. Qualquer coisa tem de ser revista neste capítulo.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Saudamos o tempo e a atenção que o Plenário da Assembleia da República finalmente dedica ao debate das contas públicas, pela primeira vez desde há muitos anos.
Uma reflexão sobre as Contas de 2002, enquadrada na evolução das contas do Estado e do sector público administrativo, leva-nos a concluir que 2002 é um ponto de inflexão entre uma gestão criteriosa das finanças públicas (com uma derrapagem no último ano, é certo, por razões que não são as mais vulgarmente apontadas) e uma fase de descalabro que têm tentado camuflar.
Em 2002, inicia-se uma estranha forma de gestão das finanças públicas, sem paralelo na década de governação do Prof. Cavaco Silva e muito menos na meia dúzia de anos de governo do Eng.º Guterres.
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Com o actual Executivo de coligação das direitas, passa-se a recorrer de forma sistemática a receitas extraordinárias, o que é feito contrariamente a declarações e promessas sucessivamente feitas. Entretanto, aumenta-se o saldo negativo das contas públicas, ou seja, o verdadeiro défice antes de receitas extraordinárias, de uma forma claramente excessiva. O respeito pelo défice acordado em termos europeus passa a ser apenas formal, o défice, apesar de vivido obsessivamente, não é respeitado.
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: A evolução do saldo negativo antes de receitas extraordinárias, do verdadeiro défice, recebe um novo impulso em 2002, conforme é demonstrado no próprio relatório do Orçamento do Estado para 2004. O défice efectivo, em 2003, é de 5,4% do PIB, conforme diz o relatório do Orçamento do Estado para 2005; em 2004, é de 4,8%; em 2005, de 4,2%. Em suma, só quando este Governo tiver acabado, em 2007 - assim Deus nos oiça e o povo vote! -, é que o défice se deverá contrair abaixo de 3%.
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Isto foi conseguido através de um elevadíssimo volume de receitas extraordinárias, concretamente, 2,5% do PIB - pasme-se! -, em 2003, e 2% do PIB, em 2004 (continuo a citar o relatório do Orçamento).
Mas não é só isto.
Quanto à dívida pública, a análise da evolução, por exemplo, nos últimos 12 anos, permite verificar que na fase final do governo PSD/Cavaco Silva o aumento da dívida foi muito claro, enquanto que durante a governação do PS, com Guterres em primeiro-ministro, a dívida pública desceu drasticamente - por exemplo, de 1995 a 2000, desceu 11 pontos percentuais. Com a Ministra Ferreira Leite, a dívida voltou a subir, "encostou" timidamente aos 60%, tentando, com manobras várias, não ultrapassar esse limite. Com o Ministro Bagão Félix, a coligação das direitas cavalga, entusiástica e despreocupadamente, o limite dos 60% também acordado no plano europeu, confessando 62%, em 2004, e que poderá rondar os 64%, em 2005.

Página 836

0836 | I Série - Número 016 | 23 de Outubro de 2004

 

Ou seja, nos dois últimos anos da governação de Cavaco Silva a dívida tinha passado de 59% para 64,3%; com o governo do PS a dívida desce de 64,3% até 53,3%, em 2000, tendo aumentado um pouco na última fase de governação; com o actual Governo, a dívida aumenta de 58,4% para 62% e irá aproximar-se de 64%, no ano 2005. É obra conseguir fazer isto em tão pouco tempo!
O que se passa é que estamos na fase em que, de acordo com as propostas da Comissão Europeia de reformulação do Pacto, a dívida pública passa a ser um critério central de análise da sustentabilidade do processo de consolidação das contas públicas e da sua articulação com o processo de desenvolvimento económico. É isto que o actual Governo parece não querer perceber ou, então, está "embrulhado" numa deriva populista e eleitoralista, apresentando um Orçamento que, em si mesmo, encerra o princípio do contraditório, o que agradará ao Ministro Gomes da Silva, mas que, efectivamente, não vai cumprir.
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: É claro que toda esta reflexão nos conduz à velha questão já hoje suscitada nesta Câmara e que insistimos que voltem a ouvir. Porque não quer o PSD, porque não deseja o PP que se estabeleça um processo isento de verificação das contas públicas por uma comissão independente, como já o propusemos nesta Assembleia e os senhores recusaram? É porque querem continuar com a sistemática manipulação das contas públicas a vosso bel-prazer. E isso não nos cansaremos de denunciar.
Felizmente, este relatório do Orçamento apelida mesmo de défice o défice real que os senhores têm andado a tentar ocultar ao povo português mas que já não escapa a nenhum comentador.
Para terminar, Sr.ª Presidente, estranhamos que o Sr. Ministro das Finanças não tenha tido possibilidade de estar aqui presente. Esperamos que não seja uma atitude de menosprezo pelo relevante debate parlamentar sobre as contas públicas.
Pela nossa parte, procuramos levar muito a sério este debate e os que se seguirão, nomeadamente durante o mês e meio que temos pela frente.

Aplausos do PS.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Presidente, Mota Amaral.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Gonçalves.

A Sr.ª Isabel Gonçalves (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: No encerramento deste debate sobre a Conta Geral do Estado de 2002, cumpre-me salientar que o parecer do Tribunal de Contas, para além de uma análise profunda da evolução das principais rubricas da Conta do Estado, alerta para as principais deficiências do sistema de apuramento das contas públicas, tanto nos procedimentos de controlo interno como na aplicação dos critérios contabilísticos, por forma a chamar a atenção para a necessidade de reformar os procedimentos e as normas de funcionamento das instituições envolvidas.
Ainda na sequência da apreciação feita pelo Tribunal de Contas, gostaria de destacar aspectos que me parecem positivos em relação ao exercício de 2002.
Podemos encontrar, nas contas aqui apresentadas, alguns aspectos que não podem deixar de se salientar - como faz, e bem, o relator que aproveito para cumprimentar pelo excelente trabalho realizado -, aspectos que o próprio Tribunal de Contas refere como "os avanços conseguidos" e "consideráveis aspectos positivos", e que passo a enumerar.
Desde logo, os progressos realizados no sentido da integração das contas bancárias dos diversos serviços e fundos na Tesouraria do Estado, pondo fim a uma situação que se arrastava há já alguns anos.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - A entrada em funcionamento do novo sistema de gestão de receitas, em conformidade com anteriores recomendações do Tribunal de Contas, constitui o suporte do modelo contabilístico que a lei determina.
A criação, pela primeira vez, de uma conta - Despesas de anos anteriores - que permite reconhecer os compromissos assumidos em anos anteriores e cujo pagamento tenha sido diferido para o ano em causa.
Ainda, a aprovação do Decreto-Lei n.º 12/2002, de 25 de Janeiro, que aprova o Plano Oficial de Contabilidade das Instituições do Sistema de Solidariedade e de Segurança Social (POCISSS), entre outros aspectos que poderia apontar.
Por outro lado, como já referimos, a leitura dos relatórios do Tribunal de Contas de anos sucessivos mostra-nos a repetição do diagnóstico, das mesmas falhas de controlo interno, da pouca fiabilidade dos registos e das recomendações.

Página 837

0837 | I Série - Número 016 | 23 de Outubro de 2004

 

Ora, se o Tribunal de Contas cumpre a sua missão, auditando, informando, relatando e recomendando, é imperioso que a Assembleia da República faça a apreciação política dos documentos em tempo útil e retire conclusões que permitam a responsabilização política dos intervenientes mas que, acima de tudo, contribua para a melhoria e a reforma dos procedimentos, por forma a assegurar a boa aplicação dos recursos públicos e a sua gestão rigorosa e transparente.
Só assim, prestando contas, é possível credibilizar o Estado e o sistema político, ultrapassando as reservas que, muitas vezes, os cidadãos manifestam.
As opiniões expressas pelo Tribunal de Contas no seu parecer decorrem de exame profundo aos procedimentos administrativos e contabilísticos utilizados pela Direcção-Geral do Orçamento e pelos serviços da Administração Pública e do confronto numérico entre os valores inscritos na Conta Geral do Estado e os efectivamente apurados pelos serviços processadores da informação e de algumas auditorias específicas a organismos do Estado.
As observações produzidas a esse propósito, apontando as irregularidades e até as eventuais ilegalidades que, segundo o Tribunal de Contas, foram praticadas, e sem prejuízo das medidas de correcção e dos avanços assinalados no que respeita às contas de 2002, evidencia algumas destas situações que não se podem ignorar.
Sr.as e Srs. Deputados: Como se afirma no relatório da Comissão de Execução Orçamental, trata-se de uma situação que não é nova. Verificam-se os mesmos problemas desde há vários anos. É uma situação que já vem de anos anteriores e que não se resolverá de um dia para o outro.
Cabe à Assembleia da República a responsabilidade de analisar, fiscalizar e debater, com a necessária ênfase, as contas públicas para que as contas do Estado espelhem com rigor as operações económicas e financeiras do Estado e possam merecer a confiança inequívoca e o parecer favorável dos organismos responsáveis pela auditoria técnica.
Parece-me, por isso, da maior importância a sugestão expressa no relatório da Comissão de Execução Orçamental, que acompanhamos, para que a Assembleia da República aprove uma resolução no sentido de o Governo estabelecer uma programação de trabalhos que defina os principais constrangimentos legais regulamentares de sobreposição de competências, informáticos e outros que dificultam a elaboração da Conta Geral do Estado, para que a mesma passe a ser absolutamente rigorosa e transparente.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para encerrar o debate, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tive uma imensa honra em participar num debate que me pareceu interessante e profundo. De acordo com o que escutei nesta Câmara, creio que terá sido o primeiro debate sobre uma Conta Geral do Estado.
Em debates desta natureza existe uma postura séria, que é a de tentar detectar as dificuldades objetivas, as ameaças mas também as oportunidades. Essa postura séria implica, perante as dificuldades, desenhar um conjunto de medidas que as ultrapassem.
No encerramento deste debate, o que me parece importante sublinhar é o tal olhar em relação ao futuro para enfrentar esse desafio. Como é óbvio, enfrentar esse desafio significa completar as plataformas informáticas que ainda não estão completas, implementar o POCP (Plano Oficial de Contabilidade Pública) que, ao ser universalizado, irá ultrapassar em grande medida muitas das dificuldades aqui apontadas e até algumas "esquizofrenias" (se me permitem usar este termo) entre os conceitos, isto é, assistir às pessoas a dizerem verdades mas em conceitos diversos. É esse o caso, por exemplo, em relação à dívida.
Na verdade, no que diz respeito à dívida pública, existe um conceito segundo o qual a mesma significa apenas a dívida directa do Estado e de acordo com o qual o rácio seriam os tais 61,4. Coisa diversa seria o conceito de acordo com as contas nacionais, ou seja, o conceito que importa no reporte dos deficit excessivos. De acordo com este último conceito, que já não significa a dívida do Estado mas a dívida total do sector público administrativo, o que quer dizer que consolida certos stocks que serviços das administrações tenham, o rácio já seria apenas de 58,2.
É óbvio que se o POCP estivesse implementado, a grelha de classificação seria absolutamente clara, parte de algum diálogo seria inútil e ganhava-se em clareza e em verdade; perdia-se talvez em alguma emoção, digamos. Em qualquer caso, quero supor que o País ganhava.
Como é óbvio, há outras medidas que é necessário implementar. A própria implementação do POCP, dada a exigência técnica que implica, obriga a uma certa reforma do Estado.
E reforma do Estado em que sentido? É nítido que um plano desta grandeza só pode ser implementado de acordo com uma metodologia de serviços partilhados. Esta filosofia de serviços partilhados, sendo

Página 838

0838 | I Série - Número 016 | 23 de Outubro de 2004

 

aplicada não só à contabilidade mas também a outras áreas, implicará imensas poupanças de recursos. Ou seja, estamos a provocar melhorias na Conta Geral do Estado e, simultaneamente, estamos a provocar avanços na própria estrutura do Estado, a reformá-lo de forma intrínseca.
Desde logo, isto permitirá depois ultrapassar outras deficiências aqui não tratadas, como o facto de o património do Estado não estar suficientemente e de forma exaustiva contabilizado.
Por fim, este conjunto de medidas permitem, no futuro, ultrapassar algumas das dificuldades que a Conta Geral do Estado tem evidenciado ao longo destes anos, sendo o último desafio adaptá-la àquele formato que o Orçamento do Estado para 2004 e o Orçamento do Estado para 2005, em gérmen, já transportam.
No momento em que a Conta Geral do Estado passar a estar, também ela, organizada de acordo com os programas, as medidas e os projectos e, nesses programas, nessas medidas e nesses projectos estiverem referenciados os objectivos, os recursos e os resultados, em grande medida a discussão que aqui tivemos hoje será feita de uma forma muito mais iluminada e a discussão das estratégias e das decisões terá um suporte claro e objectivo. Neste momento, isso ainda não é possível.
Em qualquer caso, quero agradecer-vos por me terem dado o prazer de estar convosco.

Aplausos do PSD, do PS e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Não havendo mais oradores inscritos, declaro encerrado o debate sobre a Conta Geral do Estado de 2002.
Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta de diplomas que deram entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (Manuel Oliveira): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: proposta de resolução n.º 82/IX - Aprova, para ratificação, a alteração do artigo 1.º do Acordo Constitutivo do Banco Europeu para a Reconstrução e Desenvolvimento (BERD), que visa admitir a Mongólia como país beneficiário, conforme Resolução n.º 90, de 30 de Janeiro de 2004, aprovada pelo Conselho de Governadores do Banco, que baixou à 2.ª Comissão, e projecto de lei n.º 511/IX - Estabelece o regime de mera gestão dos órgãos autárquicos (no período entre as eleições e a instalação dos novos órgãos) (PSD e CDS-PP), que baixou às 1.ª e 4.ª Comissões.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, tenho igualmente alguns anúncios a fazer à Câmara. Um deles é que autorizei a realização, esta manhã, a partir das 11 horas e 30 minutos, de uma reunião da Comissão de Assuntos Europeus e Política Externa com Deputados do Parlamento Europeu. Essa reunião ainda está a decorrer e eu próprio tenho participado nela. Penso que este diálogo entre os Deputados da Assembleia da República e os Deputados do Parlamento Europeu é extremamente útil, pelo que devemos e tenho a intenção de mantê-lo (aliás, com o assentimento dos nossos parlamentares europeus), e julgo que deve ser mesmo estendido (essa é uma das conclusões dos nossos trabalhos desta manhã) a um diálogo regular com as próprias comissões especializadas da Assembleia da República, a fazer precisamente às sextas-feiras de manhã, que é o dia que melhor convém aos Deputados europeus. Depois acertaremos isto e, por esse motivo excepcional, autorizarei a realização destas reuniões às sextas-feiras, de manhã, durante a sessão plenária.
No próximo dia 26, não haverá Conferência de Líderes, porque já foi antecipada, nem Conferência dos Presidentes das Comissões Parlamentares, porque, nesse dia, há muito trabalho de várias comissões para discutirem o Orçamento do Estado para 2005.
Retomaremos, pois, as reuniões regulares destas Conferências, de Líderes e dos Presidentes das Comissões Parlamentares, no dia 9 de Novembro, terça-feira, às horas habituais.
Dado ser um assunto que interessa a todos os Srs. Deputados, comunico à Câmara que, hoje, às 14 horas e 45 minutos, receberei o Sr. Ministro das Cidades, Administração Local, Habitação e Desenvolvimento Regional, José Luís Arnaut, que virá entregar o PIDDAC à Assembleia da República, o qual será imediatamente disponibilizado na Internet, de modo a que todos os Srs. Deputados possam, desde logo, começar a estudá-lo.
Hoje, interrompem-se as reuniões plenárias porque se inicia o calendário, extremamente exigente, do debate, em sede de comissão, das propostas de lei de Orçamento do Estado para 2005 e das Grandes Opções do Plano para 2005.
A nossa próxima sessão plenária realiza-se no dia 17 de Novembro, prolongando-se no dia 18, para a apreciação, na generalidade, desses diplomas fundamentais, as propostas de lei de Orçamento do Estado para 2005 e das Grandes Opções do Plano para 2005.
Entretanto, mantêm-se obviamente a trabalhar todas as comissões parlamentares, tal como os grupos

Página 839

0839 | I Série - Número 016 | 23 de Outubro de 2004

 

parlamentares. Digo isto para que não fiquem dúvidas de que não vamos entrar agora de férias - era o que faltava! -, quando há tanto trabalho a fazer no desempenho das nossas funções.
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 12 horas e 40 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
Arménio dos Santos
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Judite Maria Jorge da Silva
Luís Filipe Soromenho Gomes
Maria João Vaz Osório Rodrigues da Fonseca
Pedro Manuel Cruz Roseta

Partido Socialista (PS):
Alberto Arons Braga de Carvalho
José Apolinário Nunes Portada
José Carlos das Dores Zorrinho
João Barroso Soares
Luís Manuel Carvalho Carito
Manuel Alegre de Melo Duarte
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves

Partido Popular (CDS-PP):
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo

Partido Comunista Português (PCP):
Bruno Ramos Dias

Srs. Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:

Partido Social Democrata (PSD):
Adriana Maria Bento de Aguiar Branco
António da Silva Pinto de Nazaré Pereira
Carlos Manuel de Andrade Miranda
Fernando António Esteves Charrua
João Carlos Barreiras Duarte
João Manuel Moura Rodrigues
Maria Eduarda de Almeida Azevedo
Maria Isilda Viscaia Lourenço de Oliveira Pegado
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira
Pedro Filipe dos Santos Alves

Partido Socialista (PS):
Alberto de Sousa Martins
António Fernandes da Silva Braga
Fernando Manuel dos Santos Gomes
José Eduardo Vera Cruz Jardim
José Manuel de Medeiros Ferreira
José Manuel Santos de Magalhães
Maria Amélia do Carmo Mota Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina

Página 840

0840 | I Série - Número 016 | 23 de Outubro de 2004

 

Partido Popular (CDS-PP):
Manuel de Almeida Cambra

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Maria Almeida Braga Pinheiro Torres
Carlos Jorge Martins Pereira
Eugénio Fernando de Sá Cerqueira Marinho
Joaquim Virgílio Leite Almeida da Costa
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado
José Manuel Carvalho Cordeiro
José Manuel de Matos Correia
Luís Cirilo Amorim de Campos Carvalho
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Manuel Joaquim Dias Loureiro
Marco António Ribeiro dos Santos Costa
Maria Goreti Sá Maia da Costa Machado
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Miguel Fernando Alves Ramos Coleta
Sérgio André da Costa Vieira

Partido Socialista (PS):
Joaquim Augusto Nunes Pina Moura
José da Conceição Saraiva
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa
Luísa Pinheiro Portugal
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Manuel Pedro Cunha da Silva Pereira
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta
Maximiano Alberto Rodrigues Martins
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte

Partido Popular (CDS-PP):
Álvaro António Magalhães Ferrão de Castello-Branco

Partido Comunista Português (PCP):
Maria Odete dos Santos

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL

Páginas Relacionadas
Página 0820:
0820 | I Série - Número 016 | 23 de Outubro de 2004   e que a lógica e a próp
Página 0821:
0821 | I Série - Número 016 | 23 de Outubro de 2004   referido acréscimo corr
Página 0822:
0822 | I Série - Número 016 | 23 de Outubro de 2004   Apesar de se estar no b

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×