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Sexta-feira, 15 de Abril de 2005 I Série - Número 8

X LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2005-2006)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 14 DE ABRIL DE 2005

Presidente: Ex.mo Sr. Jaime José Matos da Gama

Secretários: Ex. mos Srs. Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Fernando Santos Pereira
Artur Jorge da Silva Machado

S U M Á R I O


O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 10 minutos.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta da entrada na Mesa de requerimentos, das propostas de lei n.os 1/X (ALRA) e 2/X, dos projectos de lei n.os 26 a 28/X, dos projectos de resolução n.os 16 a 19/X.
Em declaração política, a Sr.ª Deputada Alda Macedo (BE), a propósito do anunciado aumento das tarifas de transportes, manifestou a sua preocupação pela política que lhe subjaz.
Também em declaração política, o Sr. Deputado João Pinho de Almeida (CDS-PP) condenou a decisão do Governo de revogar o despacho que estabelecia o regulamento do sistema de troca de manuais escolares dos segundo e terceiro ciclos do ensino básico e respondeu a pedidos de esclarecimento da Sr.ª Deputada Cristina Granada (PS).
Ao abrigo do n.º 2 do artigo 84.º do Regimento, o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Augusto Santos Silva) anunciou as opções do Governo relativas ao estabelecimento de novas regras e condições para o exercício de cargos públicos, tendo-se seguido um debate no qual intervieram, a diverso título, além do Sr. Ministro, os Srs. Deputados Alberto Martins (PS), António Montalvão Machado (PSD), Jorge Machado (PCP), Nuno Magalhães (CDS-PP), João Teixeira Lopes (BE) e Heloísa Apolónia (Os Verdes).
O Sr. Deputado Miguel Tiago (PCP) saudou a luta dos estudantes dos ensinos secundário e superior dos dias 13 e 14 de Abril.

Ordem do dia.- Foi discutido o projecto de resolução n.º 3/X - Aumento intercalar do salário mínimo nacional (PCP), que foi rejeitado, tendo usado da palavra os Srs. Deputados Francisco Lopes (PCP), Vítor Ramalho (PS), Carlos Andrade Miranda (PSD), Ricardo Freitas (PS), Teresa Vasconcelos Caeiro e Pedro Mota Soares (CDS-PP), Mariana Aiveca (BE) e Heloísa Apolónia (Os Verdes).
Procedeu-se ainda à discussão do projecto de resolução n.º 6/X - Recomenda o procedimento de avaliação de impacte ambiental do túnel do Marquês, que foi aprovado. Intervieram, a diverso título, os Srs. Deputados Francisco Madeira Lopes (Os Verdes), Jorge Moreira da Silva (PSD), Manuel Maria Carrilho (PS), José Eduardo Martins (PSD), Alda Macedo (BE), João Rebelo (CDS-PP), Manuel Tiago (PCP) e Miguel Coelho (PS).
Após ter sido apresentado pelo Deputado Melchior Moreira (PSD), foi aprovado o voto n.º 3/X - De congratulação pelo desempenho da atleta Naide Gomes no Campeonato da Europa de Atletismo em Pista Coberta (PSD).
Mereceu ainda aprovação o projecto de resolução n.º 15/X - Viagem do Presidente da República à Finlândia (Presidente da AR).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 18 horas e 20 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 10 minutos.

Srs. Deputados presentes à sessão:

Partido Socialista (PS):
Agostinho Moreira Gonçalves
Alberto Arons Braga de Carvalho
Alberto de Sousa Martins
Alberto Marques Antunes
Aldemira Maria Cabanita do Nascimento Bispo Pinho
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Ana Maria Ribeiro Gomes do Couto
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António José Ceia da Silva
António José Martins Seguro
António Ramos Preto
António Ribeiro Gameiro
Armando França Rodrigues Alves
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Carlos Alberto David dos Santos Lopes
Carlos Cardoso Lage
Cláudia Isabel Patrício do Couto Vieira
Deolinda Isabel da Costa Coutinho
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues
Elísio da Costa Amorim
Fernanda Maria Pereira Asseiceira
Fernando dos Santos Cabral
Fernando Manuel dos Santos Gomes
Glória Maria da Silva Araújo
Horácio André Antunes
Isabel Maria Batalha Vigia Polaco de Almeida
Isabel Maria Pinto Nunes Jorge
Jacinto Serrão de Freitas
Jaime José Matos da Gama
João Barroso Soares
João Cândido da Rocha Bernardo
João Cardona Gomes Cravinho
João Miguel de Melo Santos Taborda Serrano
João Raul Henriques Sousa Moura Portugal
Joaquim Augusto Nunes Pina Moura
Joaquim Barbosa Ferreira Couto
Joaquim Ventura Leite
Jorge Manuel Capela Gonçalves Fão
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Jorge Manuel Monteiro de Almeida
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego
José Apolinário Nunes Portada
José Augusto Clemente de Carvalho
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Carlos das Dores Zorrinho
José Eduardo Vera Cruz Jardim
José Luís Pereira Carneiro
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
Jovita de Fátima Romano Ladeira
Júlio Francisco Miranda Calha
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal

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Luís António Pita Ameixa
Luís Manuel Carvalho Carito
Luís Miguel Morgado Laranjeiro
Luísa Maria Neves Salgueiro
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Manuel Alegre de Melo Duarte
Manuel António Gonçalves Mota da Silva
Manuel Francisco Pizarro de Sampaio e Castro
Manuel Luís Gomes Vaz
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Marcos da Cunha e Lorena Perestrello de Vasconcellos
Marcos Sá Rodrigues
Maria Antónia Moreno Areias de Almeida Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Cidália Bastos Faustino
Maria Cristina Vicente Pires Granada
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria de Fátima Oliveira Pimenta
Maria de Lurdes Ruivo
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Maria Helena da Silva Ferreira Rodrigues
Maria Helena Terra de Oliveira Ferreira Dinis
Maria Hortense Nunes Martins
Maria Irene Marques Veloso
Maria Isabel Coelho Santos
Maria José Guerra Gamboa Campos
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Maria Matilde Pessoa de Magalhães Figueiredo de Sousa Franco
Maria Odete da Conceição João
Maria Teresa Alegre de Melo Duarte Portugal
Maria Teresa Filipe de Moraes Sarmento Diniz
Maximiano Alberto Rodrigues Martins
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Miguel João Pisoeiro de Freitas
Nelson Madeira Baltazar
Nuno André Araújo dos Santos Reis e Sá
Nuno Mário da Fonseca Oliveira Antão
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Barros Teixeira Santos
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Paula Cristina Nobre de Deus
Pedro Manuel Farmhouse Simões Alberto
Pedro Nuno de Oliveira Santos
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Renato Luís Pereira Leal
Ricardo Jorge Teixeira de Freitas
Ricardo Manuel de Amaral Rodrigues
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui António Ferreira da Cunha
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Sandra Marisa dos Santos Martins Catarino Costa
Sónia Isabel Fernandes Sanfona Cruz Mendes
Susana de Fátima Carvalho Amador
Teresa Maria Neto Venda
Victor Manuel Bento Baptista
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vítor Manuel Pinheiro Pereira
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho

Partido Social Democrata (PSD):

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Adão José Fonseca Silva
Agostinho Correia Branquinho
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
António Alfredo Delgado da Silva Preto
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Joaquim Almeida Henriques
Carlos Alberto Garcia Poço
Carlos Jorge Martins Pereira
Carlos Manuel de Andrade Miranda
Domingos Duarte Lima
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Emídio Guerreiro
Feliciano José Barreiras Duarte
Fernando dos Santos Antunes
Fernando Mimoso Negrão
Fernando Santos Pereira
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Henrique José Praia da Rocha de Freitas
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves
Hugo José Teixeira Velosa
Jaime Carlos Marta Soares
João Bosco Soares Mota Amaral
Joaquim Virgílio Leite Almeida Costa
Jorge Fernando Magalhães da Costa
Jorge José Varanda Pereira
Jorge Manuel Lopes Moreira da Silva
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado
José António Freire Antunes
José Eduardo Rego Mendes Martins
José Manuel Amaral Lopes
José Manuel de Matos Correia
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro
José Manuel Pereira da Costa
José Mendes Bota
José Pedro Correia de Aguiar Branco
José Raúl Guerreiro Mendes dos Santos
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Filipe Carloto Marques
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Luís Miguel Pais Antunes
Manuel Filipe Correia de Jesus
Marco António Ribeiro dos Santos Costa
Maria do Rosário da Silva Cardoso Águas
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Mário da Silva Coutinho Albuquerque
Mário Henrique de Almeida Santos David
Mário Patinha Antão
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas
Miguel Jorge Pignatelli de Ataíde Queiroz
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Paulo Artur dos Santos Castro de Campos Rangel
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Pedro Quartin Graça Simão José
Regina Maria Pinto da Fonseca Ramos Bastos
Ricardo Jorge Olímpio Martins
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva
Sérgio André da Costa Vieira
Vasco Manuel Henriques Cunha
Victor do Couto Cruz
Zita Maria de Seabra Roseiro

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Partido Comunista Português (PCP):
Agostinho Nuno de Azevedo Ferreira Lopes
António Filipe Gaião Rodrigues
Artur Jorge da Silva Machado
Bernardino José Torrão Soares
Francisco José de Almeida Lopes
Jerónimo Carvalho de Sousa
José Batista Mestre Soeiro
José Honório Faria Gonçalves Novo
Maria Luísa Raimundo Mesquita
Miguel Tiago Crispim Rosado

Partido Popular (CDS-PP):
Álvaro António Magalhães Ferrão de Castello-Branco
António Idalino Rodrigues Pereira
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Rodrigo Pinho de Almeida
José Miguel Nunes Anacoreta Correia
Luís Pedro Russo da Mota Soares
Nuno Miguel Miranda de Magalhães
Paulo Sacadura Cabral Portas
Teresa Margarida Figueiredo Vasconcelos Caeiro

Bloco de Esquerda (BE):
Alda Maria Gonçalves Pereira Macedo
Ana Isabel Drago Lobato
Fernando José Mendes Rosas
Francisco Anacleto Louçã
Helena Maria Moura Pinto
João Miguel Trancoso Vaz Teixeira Lopes
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda
Mariana Rosa Aiveca Ferreira

Partido Ecologista "Os Verdes" (PEV):
Francisco Miguel Baudoin Madeira Lopes
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a Sr. Secretária vai proceder à leitura do expediente.

A Sr.ª Secretária (Rosa Maria Albernaz): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, foram apresentados na Mesa diversos requerimentos.
Na reunião plenária de 7 de Abril e nos dias 8 e 12 de Abril - aos Ministérios dos Negócios Estrangeiros, da Educação e da Cultura, formulados pelos Srs. Deputados José Cesário, Luísa Mesquita e Alda Macedo; aos Ministérios das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional e das Finanças, formulados pelos Srs. Deputados José Soeiro e João Teixeira Lopes; à Secretaria de Estado da Juventude e Desportos e à Câmara Municipal da Lousã, formulados pelo Sr. Deputado Horácio Antunes.
Deram ainda entrada na Mesa, e foram admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: propostas de lei n.os 1/X - Quinta alteração à Lei Eleitoral para a Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores (ALRA), que baixou à 1.ª Comissão, e 2/X - Autoriza o Governo a legislar sobre distribuição, fora das farmácias, de medicamentos que não necessitem de receita médica; projectos de lei n.os 26/X - Institui um regime de licenciamento de actividade aplicável à realização do transporte colectivo de crianças (CDS-PP), que baixou à 9.ª Comissão, 27/X - Altera a Lei n.º 169/99, de 18 de Setembro, que estabelece o quadro de competências e o regime de funcionamento dos órgãos dos municípios e das freguesias, bem como a Lei n.º 27/96, de 1 de Agosto, que regula o regime jurídico da tutela administrativa (PS), que baixou à 7.ª Comissão, e 28/X - Alterações à Lei Eleitoral dos Órgãos das Autarquias Locais (PS), que baixou à 1.ª Comissão; projectos de resolução n.os 16/X - Pela construção de um hospital público para os concelhos do

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Seixal e Sesimbra (PCP), 17/X - Cumprimento do Estatuto da Carreira Docente relativamente aos professores de técnicas especiais (PCP), 18/X - Sobre Financiamento Extraordinário das Associações de Deficientes (PCP), e 19/X - Criação da Reserva Natural da Ria de Alvor (PCP).

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o período de antes da ordem do dia de hoje consta de duas declarações políticas, uma, do Bloco de Esquerda e, outra, do Partido Popular, e de uma intervenção do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, ao abrigo do n.º 2 do artigo 84.º do Regimento.
Para uma declaração política, tem a palavra a Sr.ª Deputada Alda Macedo.

A Sr.ª Alda Macedo (BE): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O anúncio, ontem divulgado pelo Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, do aumento de 3,7% das tarifas de transportes, a partir do mês de Maio, foi o pior sinal que o Governo podia ter dado em matéria de política de transportes, onde uma política de tarifas e preços de combustíveis desenha o eixo central dessa mesma política.
O Governo apresentou-se, há um mês, nesta Assembleia, como tendo uma preocupação central com a qualidade do ambiente e com o desenvolvimento sustentado. Ora, numa perspectiva de cumprir com esse compromisso, a política de transportes tem uma importância absolutamente essencial.
É a própria Agência Europeia do Ambiente que deixa muito claro que a única forma de combater a emissão de poluentes para a atmosfera e de minimizar os impactes ambientais passa por uma reforma radical nas políticas de transportes, de forma a criar entraves e mesmo normas de proibição da circulação de veículos particulares e de promoção do uso do transporte público, chegando mesmo a aconselhar um caminho no sentido da gratuitidade do transporte público.
Em Portugal, pelo contrário, o mesmo Governo que ainda há pouco se apresentou como paladino da modernidade e da sustentabilidade escolhe, como primeira medida do seu governo, aumentar as tarifas dos transportes públicos, e fá-lo num valor que é absolutamente inaceitável e injustificável à luz de qualquer argumentação.

Vozes do BE: - Muito bem!

A Oradora: - O Ministério justifica este valor com a intenção de fazer variar as tarifas de transportes com base no preço dos combustíveis.
Contudo, se se analisar a flutuação do preço do barril de crude, entre Outubro do ano passado - data do último aumento dos transportes, que, na altura, foram agravados em 2,9% - e agora, chegamos à conclusão de que, hoje, o combustível está sensivelmente ao mesmo preço que estava em Outubro, aquando da última actualização.
Em Outubro de 2004, o preço do barril - valores de Nova Iorque - era de 49 dólares; no dia 13 de Abril (isto é, ontem), situava-se nos 50 dólares.
Ao mesmo tempo, no período que medeia entre estas datas, a curva de preço é uma curva descendente, o que significa que houve reduções de preço do combustível, mas essa redução não correspondeu a uma redução do preço dos transportes.
Não se pode usar um argumento para aumentar os preços e ignorar esse mesmo argumento quando se trata de diminuí-los.

Vozes do BE: - Muito bem!

A Oradora: - Ainda de acordo com o Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, essa percentagem de 3,7% reflecte o valor da taxa de inflação, ajustada ao atraso de três meses sobre o mecanismo de actualização trimestral de preços, herdado do ex-Ministro António Mexia. Ora, isto não faz o menor sentido.
Em primeiro lugar, porque, perante uma taxa de inflação prevista de 2%, o máximo que podia ser imputado à variação do preço era um quarto desse valor, o que corresponde apenas a 0,5%.
Além disso, não pode esquecer-se que este é um aumento médio, praticado por cada empresa, o que significa que os operadores têm a possibilidade de introduzir aumentos variáveis para os diferentes títulos, desde que a ponderação média seja de 3,7, o que quer dizer que se está perante a possibilidade de alguns títulos de transporte sofrerem agravamentos de preço muito superiores a este valor.
Por outro lado, o mesmo Ministério vem adiantar a sua intenção de passar a revisão da variação dos preços de um mecanismo com periodicidade trimestral para uma periodicidade anual, o que é absolutamente contraditório com a argumentação agora apresentada para sustentar este agravamento de custos e se fundamenta sobre o atraso de três meses sobre a actualização.
É evidente, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados, que a única motivação subjacente a este aumento de tarifas corresponde a uma cedência do Governo perante a verdadeira chantagem que tem vindo a ser conduzida pelos operadores privados, particularmente na Grande Lisboa, de deixarem de aderir ao passe social a partir de Maio.

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Vozes do BE: - Muito bem!

A Oradora: - Existe, no que diz respeito à política de transportes, um problema de democracia que tem a ver com a obrigação do Estado de garantir o cumprimento do direito à mobilidade. E sobre esta matéria, como sobre tantas outras, há sempre, naturalmente, duas maneiras de olhar para o problema: 20% é a fatia que corresponde ao custo do transporte nos orçamentos familiares; 20%, curiosamente, é também a percentagem que as empresas despendem em combustíveis.
O Bloco de Esquerda opta por olhar para este problema do ponto de vista dos utentes, dos cidadãos e das cidadãs, defendendo, portanto, uma política de tarifas que deve tomar, em primeira instância, a variação dos rendimentos familiares como prioridade sobre a variação dos preços dos combustíveis.
Existe um custo social que o Estado tem de comportar, no sentido de promover o uso público do transporte, e os utentes devem ser motivados e apoiados, acabando com a verdadeira esquizofrenia dos aumentos trimestrais, da falta de parâmetros para os passes sociais, da diversidade de títulos e passes daqueles que têm de recorrer ao serviço público e ao serviço privado.

Vozes do BE: - Muito bem!

A Oradora: - O Bloco de Esquerda considera imperioso defender e alargar o sistema do passe social, como um imperativo constitucional e como corolário lógico de um Executivo que se diz preocupado com as práticas ambientais e com o incremento da qualidade de vida.
O Bloco de Esquerda espera que o Governo actue rapidamente, garantido o sistema do passe social em todas as operadoras de transportes, impondo medidas que impeçam a auto-exclusão de qualquer operadora do sistema do passe social, no sentido de melhorar a mobilidade dos cidadãos e a qualidade de vida nas grandes cidades.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado João Pinho de Almeida.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Governo do Partido Socialista, aquando da sua tomada de posse, pela voz do Sr. Primeiro-Ministro, anunciou o combate aos lobbies como uma prioridade fundamental do seu governo. E nós, dando desconto à demagogia barata contida nessa expressão e nesse propósito, registámos a intenção e pretendemos analisá-la na concretização das medidas por parte do mesmo Governo do Partido Socialista.
Entretanto, o Governo tomou a primeira decisão em matéria de educação. Convém vermos se é uma medida pró-activa - e não o é! Se é uma medida estruturante - e também não o é! Ou se poderia eventualmente ser uma medida que cumprisse esse tal propósito de combater os lobbies… A verdade é que o Partido Socialista decidiu suspender uma medida e um despacho do anterior governo, da anterior maioria, de que o CDS-PP fazia parte, despacho esse que permitia abrir caminho para a substituição e para o empréstimo dos manuais escolares às famílias mais carenciadas.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - O Partido Socialista escolheu, nesta sua primeira medida na área da educação, que caminho queria seguir. E esse caminho não foi o do combate a qualquer lobby mas àquilo que era uma medida que poderia facilitar a vida das famílias portuguesas e, principalmente, das famílias mais carenciadas.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): - É verdade!

O Orador: - Assim sendo, o Governo do Partido Socialista permitiu manter uma situação perfeitamente inaceitável: a de, anualmente, as famílias portuguesas gastarem 150 milhões de euros (30 milhões de contos) em 9 milhões de manuais escolares. Ou seja, perante um volume de negócios de 150 milhões de euros, envolvendo 9 milhões de manuais escolares, o Partido Socialista achou que aqui não havia espaço para combater lobbies, mas já haveria espaço para continuar a prejudicar as famílias portuguesas.
Mas não é só o encargo que as famílias portuguesas têm que está aqui em causa, já que estes 9 milhões de manuais escolares correspondem a 4500 t de papel. Este Governo do Partido Socialista, até pelo Primeiro-Ministro que tem, gosta muito de apregoar que é um Governo amigo do ambiente. Pois é, mas também é um Governo que permitiu que, na área ambiental, se continue a ter anualmente um dispêndio de 4500 t de papel em manuais escolares.
Particularizemos a questão para vermos a que é que corresponde, em relação a uma família específica, esta decisão do Partido Socialista. Cada família que tenha um filho a estudar no 7.º ano de escolaridade -

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apenas um filho - gasta, no mês de Setembro, cerca de 160€ em manuais escolares. Ora, em Portugal, onde o salário médio é de 645€, o que quer isto dizer? Que 25% do orçamento familiar de Setembro destas famílias se destina a manuais escolares, sem esquecermos que, para além dos manuais escolares, no mês de Setembro, estas famílias têm de comprar todo o restante material escolar, para que os seus filhos possam ter condições de frequentar o ensino!…
Foi esta insensibilidade que teve o Partido Socialista na primeira medida que tomou na área da educação.
Como o CDS já referiu várias vezes, o que se verifica, em Portugal, em relação aos manuais escolares, é totalmente diferente do que se verifica, com experiências de sucesso, noutros países. Olhemos, então, para outros países da Europa, com experiências todas elas diferentes, mas todas elas de sucesso.
Em França, talvez o país mais avançado - e o Partido Socialista, que tantas vezes gosta de se inspirar nos exemplos franceses e de os seguir, podia desta vez olhar para esse país -, já se faz uso do chip em vez do manual, sendo a forma de transmissão de conhecimentos nas escolas do ensino básico francês totalmente informatizada.
Na Alemanha, os livros pertencem à própria escola e é a escola que, anualmente, os cede aos alunos que a frequentam.
Em Inglaterra, não há manuais, há papers - por cada matéria, há um papel que é distribuído aos alunos, que é actual e lhes permite fazer o acompanhamento das matérias que são leccionadas.
É fundamental que, em Portugal, modernizemos a política dos manuais escolares e facilitemos a vida das famílias.
O Governo, ao revogar este despacho do governo anterior, anunciou, para Outubro, a apresentação das suas medidas em matéria de manuais escolares. Para nós, é tarde, muito tarde! Por isso, assumimos aqui o compromisso de, já no próximo mês, apresentar, em nome do CDS-PP, o nosso projecto para a modernização da política de manuais escolares, em Portugal.
É uma matéria muito importante, muito urgente, não podemos esperar por Outubro, até porque esperar por Outubro significa esperar mais um ano lectivo. Apresentar as propostas no próximo mês significa que ainda poderemos ir a tempo de implementar algumas dessas medidas no próximo ano lectivo.
Por isso, o desafio que aqui deixamos é muito claro: seja também o Governo capaz de responder a esse repto, que é o repto das famílias portuguesas, de fazermos este debate já no próximo mês e termos, a tempo, uma nova política de manuais escolares para o próximo ano lectivo.
Na nossa proposta, queremos assegurar vários pontos que são fundamentais. A saber: garantir a qualidade e a estabilidade dos programas de ensino; avaliar e fiscalizar a qualidade dos manuais escolares; fixar as regras a observar para atender aos alunos com dificuldades; assegurar a coesão e a solidariedade nacionais para com as famílias carenciadas, mas descentralizando a acção, responsabilizando a comunidade local e fiscalizando a respectiva execução.
Os manuais escolares são livros e devem, como tal, ser intensamente utilizados, mas também respeitados, evitando uma cultura de "uso e deita fora", que não é boa para os livros e muito menos para os estudantes do ensino básico.
O CDS sabe bem o que quer para uma política de manuais escolares, em Portugal: que ela seja mais moderna, mais eficaz, e que proteja as famílias portuguesas. É que no CDS continuamos a lutar pelas famílias portuguesas, principalmente pelas mais carenciadas.
O Partido Socialista ainda está a tempo de emendar a mão, ainda está a tempo de escolher o seu caminho. Mas convém que registe que o seu "estado de graça" começa a ter muito pouca graça para as famílias portuguesas.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cristina Granada.

A Sr.ª Cristina Granada (PS): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado do CDS-PP João Pinho de Almeida falou aqui em nome das famílias portuguesas e pareceu não ter percebido a lição que, no dia 20 de Fevereiro, foi dada ao seu partido.
As famílias portuguesas não mais se deixam levar pela vossa demagogia,…

Aplausos do PS.

… as famílias portuguesas pronunciaram-se, através do voto, pelo rigor e pela seriedade, e é por respeito pelas famílias portuguesas que desejamos que a situação dos manuais escolares seja encarada com toda a seriedade e rigor, com o maior respeito por todos os intervenientes, por todos os parceiros sociais e económicos envolvidos.
O Sr. Deputado conhece o modelo técnico dos manuais escolares? Será que sabe que, actualmente, os manuais escolares são autênticos cadernos de exercício, nos quais as crianças, os jovens, os meninos e as meninas fazem os seus trabalhos, que precisam de escrever neles e de estudar com eles, e que, portanto,

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não podem ser trocados? O modelo actual do manual escolar ainda não permite essa troca automática.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - E quem aprovou o actual modelo de manual escolar? Já se esqueceram!

A Oradora: - É evidente que se pode aperfeiçoar, é evidente que se deve estudar esta questão, mas não fale em demagogia, não fale em números nem em milhões, porque as famílias portuguesas sabem quanto lhes custa a demagogia, Sr. Deputado.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Pinho de Almeida.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Cristina Granada, é natural que, a propósito de educação, falemos de lições, mas a lição básica da democracia é que a legitimidade de quem exerce funções nesta Câmara é exactamente igual para aqueles que fazem parte da maioria que governa e para os que são eleitos para fazer oposição. Portanto, os que foram eleitos para fazer oposição têm todo o direito de, de entre as propostas eleitorais que foram sufragadas pelos eleitores e que lhes permitiram aqui estar a exercer o seu mandato, defender as políticas daqueles que legitimamente acreditaram neles.
É igual para todos!

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - O que lhe digo, Sr.ª Deputada, é que não nos resignamos a um modelo que V. Ex.ª diz existir e não permitir a substituição. Portanto, para si, é mais importante o imobilismo, a continuidade desse sistema.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

A Sr.ª Cristina Granada (PS): - Durante 3 anos estiveram no Governo e nada fizeram, nada!

O Orador: - Também me diz para não falar de números. Não lhe falo de números?!… Os números de que falo são os que saem das carteiras das famílias portuguesas, não são números meus! Não se trata de uma arma de arremesso mas, sim, do valor que as famílias portuguesas gastam com manuais escolares. Sabemos que em Inglaterra, em França ou na Alemanha as famílias não gastam tanto, mas também sabemos que, em Portugal, houve um governo que abriu caminho para que as famílias deixassem de gastar tanto - refiro-me ao governo anterior. E sabemos, agora, que há outro Governo que prefere manter tudo como está, prefere manter as famílias portuguesas a gastar e alguns - os lobbies - a ganhar.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Para nós, a situação é injusta e bater-nos-emos pela sua correcção.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, ao abrigo do n.º 2 do artigo 84.º do Regimento, tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, abrindo-se depois dela um período de debate.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Augusto Santos Silva): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Dirijo-me à Assembleia da República para lhe dar conta, imediata e directamente, de duas opções políticas de fundo tomadas pelo Governo que têm por objectivo comum a proposta de novas regras e condições para o exercício de cargos públicos.
Refiro-me, em primeiro lugar, à proposta de lei sobre a limitação dos mandatos dos titulares de cargos políticos executivos. Refiro-me, em segundo lugar, à proposta de lei que visará alterar o Estatuto do Pessoal Dirigente da Administração Pública, de modo a clarificar os cargos de nomeação e confiança política, a reduzir o seu número e a reintroduzir procedimentos concursais de selecção e recrutamento para os cargos de direcção intermédia.

Aplausos do PS.

Ambas as propostas foram aprovadas hoje, na generalidade, pelo Conselho de Ministros e serão objecto

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de aprovação final logo após o termo dos processos obrigatórios de consultas, dando então entrada nesta Assembleia.
Com estas decisões, o Governo procura dar cumprimento a pontos muito importantes do seu Programa. De um lado - e cito -, "acordar, a nível parlamentar, na definição dos cargos dirigentes de nomeação e sua vinculação ou autonomia em relação às mudanças eleitorais"; do outro lado - e cito também -, "prever a limitação de mandatos dos cargos executivos no sistema político", sendo que, neste caso, se regulará assim o artigo 118.º da nossa Constituição.
Mas o Governo apresentará as suas propostas de lei à Assembleia da República como ponto de partida para um debate que deseja aberto e resolvido num consenso político-parlamentar o mais amplo possível, ao que a Constituição obriga, num caso, mas a que sageza em ambos aconselha. E a razão é simples: trata-se das regras do jogo político sobre as quais é bom que se entendam os diferentes jogadores, quero dizer, as diferentes forças políticas.

O Sr. Mota Andrade (PS): - Muito bem!

O Orador: - Será, pois, com total abertura de espírito que o Governo apresentará as suas ideias nesta Câmara, para que possa apreciá-las e aperfeiçoá-las numa lógica de concertação e entendimento pluripartidário. Mas fá-lo o Governo com a firme convicção na urgência de intervir e no interesse das suas propostas.
Urgência de intervir: de facto, é preciso colocar na agenda questões tão críticas como a credibilização e renovação do sistema político e a modernização e profissionalização da Administração Pública. E, em vez de procurar miríficas reformas globais, aliás sempre adiadas para o momento seguinte, o Governo entende que o necessário é tomar desde já medidas certeiras e valendo, cada uma, por si mesma. Este é o nosso propósito.
Para nós, a limitação dos mandatos políticos ou a clarificação das condições de exercício dos cargos dirigentes da Administração Pública não podem ser degradadas como moedas de troca para a negociação de interesses meramente tácticos, em que um dado parceiro, sabendo que o seu voto é indispensável para chegar a um consenso ou a uma maioria qualificada, reduz tais medidas a instrumentos de luta conjuntural. Não, para o Governo! Elas (medidas) valem por si mesmas. E o Governo está certo de que a mesma lógica de interesse público estratégico presidirá também ao comportamento das oposições.
Depois, firmeza nas nossas convicções. O que proporemos ao Parlamento é um conjunto coerente de disposições normativas. No quadro da limitação dos mandatos, cumprindo escrupulosamente o preceito constitucional que restringe, com fundamentos que ninguém aqui contestará, a limitação dos mandatos aos cargos políticos executivos. Mas, dentro desta restrição, a nossa proposta é a de que nenhum cargo de comando político seja descurado. E é por isso mesmo que defendemos a limitação dos mandatos do Primeiro-Ministro, dos presidentes dos governos regionais e dos presidentes de câmaras municipais e de juntas de freguesia.
Para que a medida tenha sentido e os cidadãos a compreendam, é preciso que não se esgote num diferimento dos seus efeitos para daqui a mais 12 anos; para que respeite e valorize o esforço de governantes e autarcas que têm dado o melhor de si próprios à causa pública, importa que não se traduza num impedimento imediato. Por isso é que propomos que os limites (de 12 anos) agora determinados respeitem os mandatos em curso, assim como a possibilidade do exercício de funções por mais um mandato consecutivo.
Quanto ao estatuto do pessoal dirigente da Administração Pública, a nossa iniciativa é também inequívoca: clarificar, reduzir e profissionalizar.
Clarificar as regras de nomeação e de cessação de funções dos altos dirigentes que executam políticas públicas e, por isso, devem ter um laço de explícita confiança com os governos que definem tais políticas.
Reduzir o número de tais lugares de confiança política, primeiro porque se colocam à parte os serviços e organismos de funções predominantemente técnicas, depois porque se estabilizam os exercícios de secretários-gerais e inspectores-gerais.
Profissionalizar, seja reforçando o imperativo da necessidade de formação para o pessoal dirigente, seja limitando a área de recrutamento dos dirigentes máximos das secretarias-gerais e alargando o leque de incompatibilidades associadas ao cargo de inspectores-gerais, seja, e principalmente, através da opção assumida pela maior profissionalização e autonomia dos dirigentes intermédios, recrutados através de procedimentos de concurso adequados.
Ora, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o que é que há de comum entre estas iniciativas de que aqui vos quis dar imediatamente conta, em nome do Governo? A nosso ver, entre elas, há em comum duas preocupações maiores.
A primeira é a busca de um consenso entre todas as forças parlamentares. Os governos mudam, mas as regras essenciais devem permanecer. Por isso, a fixação dessas regras deve resultar, desejavelmente, do maior acordo possível.
A segunda preocupação é da ordem da ética política. Propondo a limitação dos mandatos e a clarificação, na Administração Pública, do que é de livre nomeação e do que deve ser independente dos ciclos

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eleitorais, o que o Governo faz é levar a sério os bons princípios republicanos da transparência e da renovação dos cargos públicos de natureza política, da prevenção dos riscos da excessiva personalização no exercício dos poderes, do rigor e do profissionalismo no conjunto da administração do Estado, da sobriedade e contenção no uso dos bens públicos.

Aplausos do PS.

Modernizar o Estado e a Administração e fazer deles exemplos concretos de rigor, transparência e sobriedade, eis uma ligação que está na base da própria ideia de república democrática. Podemos dar novos passos neste sentido todos em conjunto, porque a questão respeita a todos. O Governo apenas tomará a iniciativa, isto é, convidará toda a Câmara a percorrer este caminho que, como o do poeta, só se faz caminhando.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Martins.

O Sr. Alberto Martins (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, a bancada do Grupo Parlamentar do Partido Socialista quer saudá-lo e saudar o Governo vivamente por esta iniciativa, que é profundamente inovadora e corresponde a um entendimento do Estado republicano e do Estado de direito como Estado ético, com regras rigorosas quanto ao pessoal político e aos agentes políticos que dirigem esse Estado republicano. E é singular que, ao fim de todos estes anos de democracia, pela primeira vez tenhamos ancoradas na formação do Estado democrático regras muito precisas quanto aos titulares de cargos políticos e à limitação dos seus mandatos e quanto ao pessoal dirigente da Administração Pública, fixando de forma muito precisa, estabilizada e limitada os cargos que são de confiança política.
A partir de agora, e só a partir de agora, temos um quadro estabilizado do que é da política, do que é da Administração e de quais são os limites do exercício da política.
O princípio republicano do carácter não vitalício dos cargos políticos, que nasceu no combate à monarquia, tem aqui a sua expressão específica quanto à natureza transitória dos cargos político e tem, também, a sua expressão particular quanto à limitação dos cargos da alta Administração Pública.

Aplausos do PS.

Pela nossa parte, acompanhamos o Governo neste objectivo de credibilização e responsabilização da política e dos políticos, nesta ideia e neste esforço de transparência e rigor. Estamos igualmente consonantes com o procedimento participativo que chame à decisão todos os partidos políticos, todos os Deputados e que se procure alcançar um consenso o mais largo possível nesta matéria.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Como o Sr. Ministro disse, e nós estamos de acordo, há aqui uma ideia precisa que é nuclear e adequada. O Governo está a cumprir o seu Programa, que é igualmente o programa do Grupo Parlamentar do PS, e vai cumpri-lo num rumo determinado e decisivo. Os que quiserem participar nessa responsabilidade são bem-vindos e ajudam a uma melhoria das soluções; os que não o quiserem fazer, invocando razões de pequena táctica paroquial, assumirão as responsabilidades disso.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Pela nossa parte, não estamos incomodados. O nosso caminho é o Programa do Governo, sufragado pela maioria dos portugueses.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Montalvão Machado.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Sr. Presidente da Assembleia da República, permita-me que lhe dirija os meus respeitosíssimos cumprimentos nesta primeira vez que tenho a honra de usar da palavra na presente Legislatura.
Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr.as e Srs. Deputados: O Governo anuncia uma reforma da Administração Pública sobre a qual o Partido Social-Democrata, como partido responsável e sério que é, não pode nem quer deixar de tomar posição.
Sejamos frontais e claros: o PSD é favorável à transparência na Administração Pública, é favorável à transparência das nomeações na Administração pública e, no fundo, é favorável à transparência em tudo

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na causa pública. Por isso, estamos de acordo em entendermo-nos com o Partido Socialista, actualmente no poder, para que seja elaborada uma lista, concreta e definida, dos cargos que, por serem necessariamente de confiança política, devem cessar com a mudança de um determinado governo.
A eficácia do trabalho, a confiança pessoal, o conhecimento sobre as qualidades técnicas, profissionais e morais de cada um assim o aconselham e assim o impõem.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Foi por essa razão que o Partido Social-Democrata, nesse espírito de posição crítica, responsável mas também construtiva, participou em duas reuniões de trabalho com o Governo, tendo então verificado que poucas diferenças havia entre as opiniões dos dois maiores partidos da democracia portuguesa, aqueles que, afinal e verdadeiramente, têm tido vocação governamental, sem o mais pequeno menosprezo ou desmerecimento de qualquer outro ou das formações políticas representadas neste Parlamento (que aproveito para respeitosamente também cumprimentar).
Eram semelhantes as posições sobre o rigor e a transparência no exercício e nas nomeações dos cargos públicos, porém… - há sempre um "porém"! - é com indisfarçável surpresa que vemos que o Governo anunciou não o que atrás se referiu mas uma alteração profunda na Administração Pública, sobre a qual nada ponderou, nada ponderara nas ditas reuniões e sobre a qual não ouviu - porque não quis ouvir - o Partido Social-Democrata.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Esta alteração anunciada tem aspectos duvidosos, aspectos que vão enfrentar a nossa objecção e, sobretudo, vai contra uma importantíssima reforma de Estado que aqui fizemos há menos de um ano, uma reforma da Administração Pública.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Apenas quero citar dois exemplos. Em primeiro lugar, a iniciativa do Governo retoma (para dar os nomes correctos às coisas) os pseudoconcursos para a nomeação dos cargos de direcção intermédia da Administração. Eis, mais uma vez, a burocracia a imperar. Temos muitas e sérias dúvidas de que isso possa contribuir para a clareza e a qualidade do trabalho. Cremos mesmo que não contribui.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Tenho, contudo, a certeza de que, assim, não se olha ao mérito e às qualidades de quem trabalha. O que é importante para a Administração Pública e para o Estado é uma verdadeira reforma por objectivos, uma reforma que olhe para quem trabalhou, para a forma como o fez e para os resultados que alcançou. É tempo de o Estado olhar para o exemplo privado, aproveitando os conhecimentos e benefícios desse sector.
Darei um segundo e último exemplo, salientando que VV. Ex.as retomam a possibilidade de acumulação dos cargos e dos vencimentos de director-geral e de membro de um determinado conselho de fiscalização ou de um qualquer grupo de trabalho. Esta possibilidade tinha sido afastada na reforma aprovada há menos de um ano, pelo que este é um erro que tenho de denunciar.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr.as e Srs. Deputados, contem com o Partido Social-Democrata para a transparência e para a isenção nas nomeações para a Administração Pública, mas não contem connosco para, "à boleia", introduzirem alterações numa das mais importantes reformas levadas a cabo na Administração,…

O Sr. José Junqueiro (PS): - Mas que reforma foi essa?!

O Orador: - … ainda para mais quando essas alterações constituem um verdadeiro retrocesso do que se fez e vão contra o estudo, o trabalho e as provas dadas pelo anterior governo do Partido Social-Democrata e do Partido Popular. Continuamos dispostos a ajudar, mas não estamos disponíveis para apoiar novidades erradas, não estudadas e meramente demagógicas.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Machado.

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O Sr. Jorge Machado (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr.as e Srs. Deputados: O Sr. Ministro acaba de apresentar duas propostas, uma das quais sobre limitação de mandatos, em relação à qual nos pronunciaremos em devido tempo.
Quanto à segunda proposta apresentada, o Governo afirma pretender dar um passo relevante para a história da Administração Pública portuguesa, mas temos sérias dúvidas de que assim seja. Contudo, o PCP considera positivo que o Governo olhe para os problemas da Administração Pública e aponte como prioritária a alteração das regras de admissão e recrutamento dos dirigentes da administração superior e intermédia do Estado.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Os funcionários da Administração Pública são muitas vezes apresentados como a causa de todos os males, quando, na realidade, é neste sector da Administração Pública - o dos dirigentes superiores e intermédios - e não noutros que residem alguns dos mais graves problemas da nossa Administração.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Para o PCP, as nomeações na Administração Pública devem ser claramente uma excepção e não a regra. O bom senso e a necessidade de uma Administração capaz e independente clamam por concursos.
Sr. Ministro, Sr.as e Srs. Deputados, os portugueses não têm assistido nestes últimos anos a um espectáculo digno de se ver: o de sucessivos governos que têm vindo a minar a Administração Pública com nomeações, algumas da quais feitas mesmo momentos antes da tomada de posse do actual Governo, não fosse este desprezar a competência, o rigor e a qualidade dos dirigentes nomeados!… É urgente acabar com esta vergonha nacional e é necessário definir claramente as regras, não as alterando a "meio do jogo".

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Estaremos atentos a todas as equiparações à categoria de director-geral, em lei orgânica ou noutros diplomas, que ponham em causa o primado do concurso público.
Outra medida que tem de ser tomada é a alteração da Lei n.º 23/2004, de 22 de Junho, visto que de nada adianta limitar as nomeações quando depois se permite o recurso aos contratos de direito privado na Administração Pública, dotados de critérios de admissão mais permissivos.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Ora bem!

O Orador: - Sr. Ministro, Sr.as e Srs. Deputados: O PCP afirma-se disponível para, em sede de discussão parlamentar, apresentar um conjunto de contributos que permitam alcançar um consenso em torno desta questão. Todavia, não podemos deixar de afirmar aqui algumas das nossas preocupações. É praticamente consensual que a formação é um sector essencial para uma Administração capaz, mas importa esclarecer quais as instituições que estão em causa, os critérios de qualidade que serão utilizados e a que preço será fornecida essa formação. É preciso, de uma vez por todas, eliminar os obstáculos à formação para todos os sectores da Administração Pública.
Outro aspecto que irá merecer a nossa atenção e combate acérrimo é qualquer tentativa que vise permitir ao dirigente optar pelo vencimento do serviço de origem, visto que com este mecanismo estaremos a abrir a porta à contratação milionária tão severamente criticada pelo PS quando na oposição.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Ministro, gostaria, por fim, que esclarecesse o que entende o Governo pelo procedimento adequado de selecção e que nos dissesse quais os mecanismos que pensa criar para garantir a autonomia e a independência das diferentes inspecções-gerais. Pensamos que estas, dada a sua natureza e missão, deviam ter um regime próprio que assegurasse a sua autonomia e independência face ao Governo.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Magalhães.

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O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr.as e Srs. Deputados: Dada a complexidade da matéria e o tempo de que disponho, tentarei ser breve e sintético, começando por saudar o Sr. Ministro e o Governo pela apresentação da proposta de lei relativa à limitação dos cargos dirigentes. Faço-o com particular à-vontade, porquanto foi o CDS, através do seu Presidente, o Dr. Paulo Portas, que, em Janeiro de 2005, pela primeira vez abordou esta questão. Como tal, Sr. Deputado Alberto Martins, a ideia pode ser boa, mas não é inovadora e não deixo de constatar que o Partido Socialista está hoje de acordo com aquilo que, na altura, considerou demagógico.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Estamos absolutamente à vontade para falar desta matéria!
É evidente que consideramos que existem cargos de inquestionável confiança política que devem mudar de titular com uma mudança de governo. Refiro-me a cargos de dirigentes superiores e a outros equiparados. De todo o modo, pensamos que, em nome da meritocracia e de forma a combater a perpetuação do clientelismo partidário na Administração Pública, nada justifica que essa limitação se estenda a cargos superiores de segundo grau.
Não tanto por falta de disponibilidade para dialogar ou por termos discordâncias de fundo com algumas das propostas que conhecemos, mas porque fomos, em nome dos que em nós confiaram, os primeiros a falar nesta matéria, iremos apresentar muito brevemente uma iniciativa quanto a esta questão, não deixando, contudo, de nos disponibilizarmos para debatê-la.
Ouvindo e lendo o que o Governo tem dito e escrito sobre esta matéria, não podemos deixar de, desde já, partilhar algumas das nossas preocupações. Em primeiro lugar, destacamos o facto de o Governo não ter optado pelo concurso puro para os cargos de direcção intermédia. Percebemos que vai haver um processo especial de selecção que não será um concurso pessoal por três razões: em primeiro lugar, porque, segundo julgamos saber, não existe uma audiência de interessados; em segundo lugar, porque não há ordenação de candidatos; em terceiro lugar, porque - o que é gravoso - o recurso hierárquico não tem efeito suspensivo. Para além das dúvidas que temos sobre a conformidade constitucional desta solução, também dúvidas políticas se nos suscitam, visto que, a ser assim, contrariamente ao que o Governo e V. Ex.ª vieram anunciar, estaremos perante uma nomeação por escolha encapotada, feita por interposta pessoa, neste caso, o director-geral do serviço ou organismo cujo quadro deva ser provido.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Neste contexto, se há uma urgência que domina todo este procedimento, por que razão o Governo não conferiu igual premência ao meio contencioso de impugnação? Imaginemos, Sr. Ministro, que, dois anos após a impugnação contenciosa desta designação, o tribunal dá razão ao impugnante. Como dará o Governo execução a essa decisão? Substituindo o director do serviço envolvido na impugnação?!
Sr. Ministro, no que respeita à questão da limitação de mandatos, agradou-nos saber da disponibilidade do Governo para dialogar connosco na Assembleia da República. Como sabe, o CDS, a exemplo do que fizeram outras forças partidárias, nomeadamente no âmbito da última revisão constitucional, propôs a limitação de mandatos. Já fizéramos essa proposta aquando de outra revisão constitucional, ainda no tempo do Governo do Engenheiro Guterres, mas o PS não a aceitou. Verificamos que rectificou, agora, a sua posição. Ainda bem! Sejam bem-vindos! Cá estaremos para trabalhar convosco!
Ainda neste domínio, estendemos a proposta relativa à limitação de mandatos às autarquias, tendo sempre defendido que o primeiro mandato era necessário para lançar uma obra, o segundo para a sua execução, podendo, contudo, o terceiro ser um mandato de estagnação. Estamos, também nesta matéria, disponíveis para trabalhar com o Governo, na certeza de que defenderemos sempre a transparência, a independência e a valorização das funções políticas, onde quer que elas sejam exercidas.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Teixeira Lopes.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr.as e Srs. Deputados: O Bloco de Esquerda sempre defendeu intransigentemente a noção de serviço público, que corresponde precisamente ao contrário do "servir-se publicamente" que tem feito a rotina do arco de governabilidade desde há muitos anos.
A lei em vigor é um autêntico escândalo, permitindo a nomeação política dos cargos de direcção superior e intermédia. A lista destes cargos é infindável - director-geral, secretário-geral, inspector-geral, presidente, subdirector-geral, adjunto do secretário-geral, subinspector-geral, vice-presidente e vogal de direcção, director de serviços e chefe de divisão! Todos os titulares destes cargos são ou podem ser nomeados politicamente, tal é a fome das clientelas partidárias.
As propostas do Governo têm aspectos muito positivos, de entre os quais salientamos os seguintes: a

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limitação de mandatos, que sempre defendemos; a limitação dos cargos de livre nomeação e de livre exoneração aos cargos de dirigentes superiores; a autonomização das secretarias-gerais e das inspecções-gerais, que são alicerces da imparcialidade da Administração Pública, face aos ciclos eleitorais; a selecção por concurso das direcções intermédias; a formação como requisito essencial para a escolha do pessoal de direcção; a instituição de uma carta de missão de serviço público para o pessoal dirigente, apesar de ser pouco clara e muito vaga nos seus contornos; uma maior responsabilização e delegação de poderes das direcções intermédias; e uma espécie de "período de nojo", que determina que quem tenha exercido funções de soberania nos três anos imediatamente interiores fique inibido de exercer funções de inspector-geral ou de subinspector-geral, por serem cargos que requerem imparcialidade total.
As propostas do Governo são, contudo, insuficientes, pelo que apresentamos hoje mesmo contributos que as aprofundam e complementam. Deixem-me ler apenas dois excertos da comunicação social relativos ao anterior governo: "788 nomeações em 65 dias" e "Governo de gestão faz uma nomeação de 2 em 2 horas desde que Jorge Sampaio anunciou a dissolução do Parlamento". E quem não se lembra dos assessores do Dr. Paulo Portas, com vencimentos superiores aos do Presidente da República?

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): - Isso já é obsessão!

O Orador: - Entre a data do anúncio da dissolução do Parlamento, a 30 de Novembro, e o dia 20 de Janeiro tinham sido publicados em Diário da República 89 despachos de nomeação. Desde essa altura até ao dia 5 de Março, ainda antes de o actual Governo tomar posse, foram publicados pelo menos mais 56 despachos com datas de assinatura que variam entre o Verão de 2004 e o mês de Fevereiro.

O Sr. Mota Andrade (PS): - Um escândalo!

O Orador: - Propomos, por isso, a nulidade de todas as nomeações ocorridas nos seis meses que antecedem a realização de eleições e gostávamos que o Governo também partilhasse esta posição.
Propomos igualmente que o período de tempo que decorre entre a data de assinatura dos despachos de nomeação e a data da sua publicação não possa ser superior a 15 dias. Desta forma, acaba o frenesim das clientelas famintas, impondo-se o princípio do serviço público.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, V. Ex.ª falou, na sua intervenção, na necessidade de serem tomadas medidas certeiras. Deixe-me dizer-lhe, Sr. Ministro, que, na perspectiva de Os Verdes, as medidas certeiras teriam de resolver efectivamente os problemas com os quais os portugueses se confrontam. Ora, não me parece que estas medidas que o Sr. Ministro veio hoje anunciar se inscrevam nessa linha.
Deixe-me dizer-lhe ainda, com alguma franqueza, que dar prioridade à renovação do sistema político, domínio no qual o Governo inclui a limitação de mandatos, na situação em que o País se encontra, com profundos problemas sociais e ambientais, é mesmo próprio de quem não tem mais com que se preocupar ou de quem quer escamotear outros problemas, o que pode ser, em si, um problema…!
Por outro lado, relativamente à questão das nomeações dos dirigentes da Administração Pública, consideramos que a medida é positiva, mas que o Governo poderia ter ido muito mais longe. Podia, por exemplo, ter acolhido o que referimos nas reuniões preparatórias que levou a cabo com os diferentes grupos parlamentares, relativamente à possibilidade de sujeitar a concurso público os presidentes de alguns institutos públicos de carácter eminentemente técnico, casos em que se deve valorizar a competência técnica.
Penso, contudo, que, lá fora, a sociedade não encontra imoralidade apenas nestas questões das nomeações ou dos concursos públicos, mas também na criação e proliferação de institutos, gabinetes e comissões nos quais, muitas vezes, a entrada é determinada pelo cartão partidário, no número de assessores que se encontram em diversos gabinetes, nomeadamente governamentais, ou mesmo na lógica dos altos e chorudos salários de muitos gestores públicos ou equiparados, que não têm qualquer relação com os míseros salários e com os índices de pobreza com que muitos portugueses se confrontam.
Sr. Ministro, termino dizendo que teria sido mais positivo que o Governo tivesse vindo anunciar, por exemplo, o número de assessores que visa cortar em alguns dos gabinetes governamentais.

O Sr. Presidente: - Para uma segunda intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, a quem o Grupo Parlamentar do PS cedeu o tempo de que dispunha.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, Srs. Deputados, se me permitem começaria por me referir à intervenção da Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, dizendo que registo com profunda tristeza que questões essenciais como a qualificação da democracia e da Administração Pública que

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servem os cidadãos são consideradas por Os Verdes questões menores para o País. Para nós, estas são questões centrais para Portugal!

Aplausos do PS.

Também gostaria de lhe dizer, a propósito da proliferação dos gabinetes e dos salários elevados, que, em matéria de austeridade governamental, este Governo não anuncia, pratica! Os termos de comparação são óbvios. Sucedemos a outro governo e é com ele que temos de nos comparar. Como tal, gostaria de recordar à Sr.ª Deputada e a toda a Câmara que, quando este Primeiro-Ministro reduziu em três o número de ministros, reduziu igualmente em três o número de gabinetes ministeriais. Por outro lado, quando reduziu em três o número de secretarias de Estado, fez o mesmo com os gabinetes dos respectivos secretários de Estado. Neste Governo nenhum dos três Ministros de Estado tem, enquanto tal, gabinete próprio, ao contrário do que acontecia em governos anteriores. A experiência desastrosa, do ponto de vista do bom uso dos fundos públicos, que foi a pseudodeslocalização de seis secretarias de Estado acabou no dia em que este Governo fez o seu primeiro Conselho de Ministros.

Aplausos do PS.

Portanto, em matéria de austeridade governamental nós não anunciamos, cumprimos, porque isso faz parte das nossas obrigações e das nossas capacidades.
Quanto às iniciativas de que aqui falei, essas não são iniciativas que o Governo possa ou queira tomar por si próprio; são competências da Assembleia da República e, portanto, o Governo o que faz é tomar a iniciativa de apresentar propostas de lei à Assembleia da República com o desejo de que aquilo a que a Constituição obriga - e bem! -, no que diz respeito à limitação de mandatos, que é a maioria qualificada, possa também cumprir-se noutro aspecto decisivo como é o das regras de recrutamento e das condições de exercício dos altos cargos da Administração Pública.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - É à base deste consenso que queremos que as mudanças se façam e para isso temos trabalhado.
Registo, aliás, com muito agrado, e agradeço, todas as intervenções dos grupos parlamentares que têm, todas elas, este sinal de disponibilidade para trabalhar no consenso.
O consenso também parte necessariamente da identificação de divergências. Não deve haver qualquer surpresa no espírito do Grupo Parlamentar do PSD, porque, logo na primeira reunião, na primeira ronda de contactos, se tornou claro, primeiro, que o Partido Popular - e bem! -, no uso do seu direito próprio, não abdicaria de apresentar o seu projecto de lei, e que a primeira ideia com que tínhamos partido, que era tentar até chegar a um projecto de lei que pudesse ser subscrito por todas as bancadas parlamentares, tinha de ser posta de parte e, portanto, o Governo avançaria com a sua proposta e os diferentes grupos parlamentares com as devidas alterações.
Mas também se identificou logo na primeira ronda uma zona de consenso muito lata, muito ampla com o PSD e outra zona de duas divergências de fundo, uma das quais foi agora referida pelo Sr. Deputado António Montalvão Machado, cuja intervenção agradeço, relativa ao modo como os dois partidos concebem os cargos intermédios da Administração Pública.
Os senhores fizeram uma lei (tinham a maioria) que respeita a vossa doutrina, que, do nosso ponto de vista, imagina uma lógica de nomeação política em cascata em todos os escalões da direcção da Administração Pública. São nomeados politicamente os directores-gerais e subdirectores-gerais, como nós também pensamos ser óbvio, e depois estes directores-gerais nomeiam os respectivos directores de serviço e chefes de divisão. Isto é: há uma lógica de nomeação política em cascata. Ora, é exactamente isto que queremos interromper!

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Não é nada disso!

O Orador: - Não queremos isso! Achamos que isso é incompatível com o processo de profissionalização da Administração Pública.
Esta divergência foi identificada no primeiro momento, temos de trabalhar com ela, e repito o que disse do alto da tribuna: há uma total abertura de espírito da parte do Governo para chegar ao consenso o mais amplo possível.
O Sr. Deputado também verificará quando conhecer a proposta de lei que os seus receios a respeito do regime de acumulações não são fundados, mas, repito, quando for feita a discussão da proposta de lei, haverá certamente tempo e oportunidade para esclarecer.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Ainda bem!

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O Orador: - Registo, finalmente - porque nos discursos que fazemos tanto interessa aquilo que dizemos como o que calamos… -, que não houve um segundo dedicado, na intervenção do Grupo Parlamentar do PSD, à outra proposta de lei relativa à limitação dos mandatos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Ora, não nos passa pelo espírito pensar que o PSD, obreiro, com o PS e com os outros grupos parlamentares, da última revisão constitucional, que expressamente determina a possibilidade dos limites à renovação dos mandatos dos titulares de cargos políticos e executivos, se queira pôr agora de fora ou não tenha opinião sobre esta matéria!… Estou certo de que também neste assunto chegaremos rapidamente a um consenso.
Respondo agora às questões colocadas pelo Sr. Deputado Jorge Machado, cuja intervenção também agradeço.
O Sr. Deputado disse que os concursos devem ser a regra e nós estamos totalmente de acordo. Por isso é que propomos que haja estabilização nos cargos de nomeação, que não têm de cessar automaticamente funções com a mudança de governo, e que haja um conjunto de institutos, que, por terem funções de natureza predominantemente técnica, não devem estar vinculados aos ciclos eleitorais, porque não se percebe que, tendo essas funções, a sua direcção tenha de estar dependente dos resultados eleitorais de cada momento.
Quanto às regras do jogo - foi outra questão colocada -, claro que o Governo vai apresentar uma proposta de lei que será discutida e aperfeiçoada pela Assembleia da República, que, se assim o entender, a aprovará. Mas o Governo diz já que se autovincula previamente ao espírito da sua proposta de lei, porque a lei que existe hoje dá um poder de grande discricionariedade nas políticas de nomeações, e o Governo não quer esta discricionariedade tão larga, quer uma discricionariedade bem balizada e balizada em função de regras acordadas por todos.
Portanto, nós fazemos a proposta, mas dizemos também - dissemo-lo desde o primeiro momento -, repito, que nos autovinculamos ao espírito da nossa proposta de lei e também àqueles que nos parecem ser alguns princípios consensualizados nesta discussão entre os diferentes partidos ou entre os partidos da oposição e o Governo.
Relativamente às questões colocadas pelo Sr. Deputado Nuno Magalhães, evidentemente aguardaremos a apresentação do projecto de lei do CDS-PP, tendo toda a disponibilidade para o discutir em conjunto com o Governo.
Temos também, nesta matéria, uma divergência que foi identificada logo no primeiro momento: a proposta do CDS-PP é no sentido de o director-geral continuar a ser de nomeação política, assim como os presidentes dos institutos, e de o subdirector-geral e os vogais das direcções dos institutos não o serem. Parece-nos que há aqui uma incongruência.
Repare, Sr. Deputado: teremos um director-geral cujos subdirectores poderiam acusar de ser uma espécie de comissário político ou teremos uma direcção heterogénea à frente dos institutos públicos - um nomeado pelo governo e os outros reconduzidos por concurso público… Mas, enfim, veremos o texto, havendo, repito, toda a disponibilidade do Governo para considerar as propostas que forem feitas.
Também registo a disponibilidade de todas as câmaras para acordarem rapidamente a limitação de mandatos, portanto, estou certo de que não vamos ter uma votação por maioria de dois terços, vamos ter se calhar até uma votação por unanimidade. Seria óptimo que assim fosse, pois trata-se de fixar regras de jogo, com as quais os jogadores devem estar de acordo.
Quanto às questões colocadas pelo Bloco de Esquerda, agradeço a referência aos muitos aspectos positivos (julgo que estou a citar correctamente) que encontram nas nossas iniciativas, manifestando também igual disponibilidade para considerar as propostas de alteração que o Bloco de Esquerda venha a fazer, desde que sejam razoáveis. Por exemplo, não é possível admitir uma previsão legal de que nos últimos seis meses antes de umas eleições um governo não possa fazer nomeações, pela simples razão de que nenhum governo consegue garantir por si só, em lei, os mandatos das eleições - como sabe, de vez em quando há eleições antecipadas, e ainda bem!…
Gostaria ainda de fazer uma referência à expressão utilizada pelo Sr. Deputado João Teixeira Lopes, que me pareceu excessiva, mas, enfim, própria do debate parlamentar, e o meu comentário permite-me trazer um melhor fecho à intervenção.
O Sr. Deputado João Teixeira Lopes começou por acusar o arco da governabilidade de servir-se publicamente dos bens públicos. Gostaria de dizer, em primeiro lugar, que não é esse o entendimento do PS, que não foi essa a prática do PS - julgo, aliás, que não é essa, em geral, a prática daqueles que ocupam cargos públicos. Mas a maneira de saber se temos ou não disponibilidade, sem reserva mental, para resolver de vez estes problemas é chegarmos rapidamente a acordo sobre estas duas propostas estruturantes.
Acabo como comecei dizendo que não se trata de questões menores da democracia portuguesa mas, sim, de questões essenciais da democracia portuguesa!

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Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos entrar no período de antes da ordem do dia destinado ao tratamento de assuntos de interesse político relevante.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Tiago.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): - Sr. Presidentes, Sr.as e Srs. Deputados: Queremos daqui dirigir uma saudação aos milhares de estudantes dos ensinos superior e secundário de todo o País que, durante os dias de ontem e de hoje, levaram a cabo mais uma jornada de mobilização contra um conjunto de medidas, pacotes legislativos e políticas que têm vindo a ser postos em prática ao longo dos últimos anos.
Os estudantes do ensino secundário protestam contra as provas eliminatórias a que estão sujeitos, contra o sistema de numerus clausus enquanto triagem social no acesso ao ensino superior.
Os estudantes do ensino superior levam a cabo, hoje, mais uma jornada de luta, na continuidade da sua já longa contestação à legislação em vigor que versa sobre o ensino superior, nomeadamente à Lei de Bases do Financiamento do Ensino Superior.
São já muitas as iniciativas de contestação estudantil em torno destas reivindicações e é já preocupante a continuada atitude antidiálogo tomada pelo anterior governo e ainda não assumidamente rejeitada pelo actual.
As passadas eleições legislativas representaram uma possibilidade de viragem política para aqueles que assumiram uma ruptura com a anterior linha, expressa tão claramente nos resultados eleitorais. No entanto, o Governo ainda não divergiu claramente da postura - contraditória, inclusive, com as suas próprias aspirações no campo do desenvolvimento tecnológico - de prepotência perante os estudantes.
O Governo ainda não afirmou a ruptura e ainda não afirmou inequivocamente que se dispõe a construir um verdadeiro diálogo na construção de uma legislação mais justa.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O Partido Comunista Português saúda os estudantes dos ensinos secundário e superior que, durante ontem e hoje, tomaram em suas mãos o direito à manifestação democrática, contestando uma linha de elitização do ensino, tão nefasta para o desenvolvimento do País.
O Partido Comunista solidariza-se com os estudantes e com as suas acções de contestação, reconhecendo-lhes justiça, e desafia o Governo do Partido Socialista a romper com as políticas para a educação do anterior governo, começando por reconhecer os estudantes como importantes parceiros na construção de legislação que essencialmente a eles tocará.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.

Eram 16 horas e 15 minutos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Vamos dar início à apreciação do projecto de resolução n.º 3/X - Aumento intercalar do salário mínimo nacional (PCP).
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Lopes.

O Sr. Francisco Lopes (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PCP propõe o aumento intercalar da retribuição mínima mensal fixando o seu valor em 400 € a partir de 1 de Julho de 2005. É uma proposta que se insere no objectivo mais amplo da valorização dos salários. Múltiplas razões justificam e dão grande actualidade a esta iniciativa do PCP.
Em Portugal, mais de 300 000 pessoas passam fome e há mais de 2,3 milhões de portugueses em situação de pobreza: são reformados com pensões baixas, são excluídos e marginalizados da sociedade, mas são também centenas de milhares de trabalhadores que, auferindo o salário mínimo nacional ou uma remuneração próxima do seu valor, empobrecem a trabalhar.
Portugal tem o maior fosso entre os 20% mais ricos e os 20% mais pobres no âmbito da União Europeia.
No ano 2000, o salário mínimo nacional correspondia a 51,8% do salário médio, quando no ano de 1990 representava 59,4%, numa evidente demonstração do agravamento das desigualdades salariais e da depreciação do salário mínimo.
Este, quando foi criado em 1974, com o valor de 3300$, beneficiou cerca de 50% da população activa, mas, por acção de sucessivos governos, foi degradado no seu valor real em cerca de 29%. Para que tivesse hoje a capacidade aquisitiva de 1974 deveria ter um valor de cerca de 500 €, quando na realidade o seu

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valor é apenas de 374 euros mensais.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Os baixos salários têm incidências que ultrapassam o seu efeito imediato. Os baixos salários provocam pensões de reforma muito mais baixas, determinando novas gerações de reformados que vão ficar na miséria, e aos baixos salários correspondem também baixos subsídios de doença e de desemprego, afectando duplamente os trabalhadores nestas situações.
Nada justifica que esta situação continue. A riqueza produzida e os ganhos de produtividade são cada vez mais canalizados para os lucros das empresas, em prejuízo dos rendimentos do trabalho.
É particularmente chocante, quando se degrada o poder aquisitivo dos salários, ver que os lucros dos grupos económicos e financeiros não param de subir. No ano passado, ano de quebra dos salários reais e de degradação do poder de compra da população, os lucros das empresas cotadas em bolsa dispararam, a banca teve dos melhores resultados de sempre e apenas quatro empresas (EDP, PT, Brisa e GALP) tiveram mais de 1400 milhões de euros de lucro, que corresponderam, por sua vez, à distribuição de volumosos dividendos.
Por outro lado, ao longo dos últimos anos, o aumento dos bens e serviços de primeira necessidade foi muito superior ao aumento nominal dos salários. Com o governo PSD/CDS-PP, acentuou-se a política de depreciação do salário mínimo, designadamente com o recurso a previsões fictícias dos valores da inflação, que eram usadas para calcular a evolução do salário mínimo.
E os aumentos de preços continuam. Exemplo disso é o aumento dos transportes públicos em 3,7%, ontem anunciado pelo Governo, a que se soma muitos outros numa escalada de encarecimento dos transportes públicos.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - É necessário dizer ainda que, comparado com outros países da Europa, o salário mínimo nacional em Portugal não só fica a léguas do praticado na generalidade dos países como o seu crescimento relativo é dos menores, ao contrário do que se passa, por exemplo, com a vizinha Espanha.
O aumento intercalar do salário mínimo nacional e dos salários em geral é, assim, um importante instrumento de justiça social no combate à pobreza e às carências económicas e sociais que é urgente accionar.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Muito bem!

O Orador: - O aumento dos salários é necessário para responder ao dia-a-dia de muitas famílias de reduzidas possibilidades financeiras sujeitas às necessidades elementares e ao consumo induzido por uma agressiva propaganda.
O aumento dos salários é indispensável para enfrentar o elevado grau de endividamento das famílias.
O aumento dos salários é necessário para evitar o prolongamento das jornadas de trabalho, o duplo emprego e outras formas de obter remunerações que se possam associar ao salário diminuto e que estão na base da economia subterrânea, do cansaço e desgaste dos trabalhadores, provocando redução da capacidade de trabalho, acidentes de trabalho, ausência de acompanhamento familiar.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Mas, para além dos efeitos sociais, o aumento do salário mínimo nacional e o aumento dos salários constituem um importante factor para a dinamização da economia, a elevação da produtividade e o estímulo à qualificação e à formação profissionais para o alargamento do mercado interno, que tanto se impõe, na actualidade, no nosso país.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O PCP propõe, hoje, o aumento intercalar do salário mínimo nacional como medida imediata, mas avança ao mesmo tempo com a necessidade mais profunda de revalorização do salário mínimo nacional nos próximos anos, com prazos e compromissos claros de montantes a atingir, que restabeleçam o poder aquisitivo que perdeu.
Nada pode justificar o agravamento das desigualdades e a desvalorização do trabalho. Não é possível uma família viver com 374 euros mensais, os cerca de 75 contos que representa o valor actual do salário mínimo nacional.
Aumentar já, a partir de 1 de Julho, o salário mínimo nacional para 400 €, tomar medidas para a recuperação do poder de compra perdido pelo salário mínimo nacional desde a sua criação, apostar na valorização

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geral dos salários é uma necessidade premente, um factor de justiça social e de desenvolvimento económico.
Numa sociedade como aquela em que vivemos, guiada pelos valores do agravamento da exploração, das políticas anti-sociais, do privilégio aos ganhos espúrios, à especulação bolsista, cujos proveitos muitas vezes nem sequer são sujeitos a impostos, tem grande importância a afirmação de outros valores.
A proposta do PCP de aumento do salário mínimo, de aumento dos salários, é também um forte sinal de valorização dos trabalhadores, de valorização do trabalho, esse elemento fundamental de criação de riqueza, de realização e progresso humano.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Vítor Ramalho.

O Sr. Vítor Ramalho (PS): - Sr. Presidente, para nós, Partido Socialista e Grupo Parlamentar do Partido Socialista, esta questão é completamente clara, e neste domínio somos absolutamente coerentes.
Em primeiro lugar, e de uma forma absolutamente inequívoca, somos contra os baixos salários em Portugal, somos contra uma competitividade que assente em baixos salários.
Mas a questão que se levanta, aqui e agora, é a de saber se, porventura, a solução dos problemas está em darmos "peixe a famintos" ou, eventualmente, em ensiná-los a "pescar". E esta é uma questão de estratégia e não de táctica. A questão que se levanta é a de saber se, neste momento, aqui e agora, conhecendo a realidade que o País atravessa, é superável, em termos de aumento de rendimento das pessoas que trabalham e que auferem vários salários, a actualização do salário mínimo nacional nos termos e pela forma propostos, ou se, pelo contrário, é através de uma linha estratégica que combata denodadamente a pobreza, que estimule a superação dos factores de bloqueio da nossa economia, que reforce de forma absolutamente inequívoca o crescimento da riqueza nacional em ordem à superação da debilidade dos sectores mais afectados da sociedade portuguesa.
Compreendemos claramente a posição do Partido Comunista e, mais, pensamos que é estimulante que o Partido Comunista traga à colação esta realidade. Só que, neste momento, em função do Programa do Governo (e apenas por isso), que balizou uma linha estratégica absolutamente clara de combate à pobreza, numa lógica que não é meramente táctica, não duvidamos que, a prazo, esta questão levantada pelo Partido Comunista Português será ultrapassada pela superação do desenvolvimento económico em Portugal.
É por isso, apenas por isso, que agora, embora compreendendo a questão, não podemos votar a favor, como fizemos no passado, do aumento intercalar do salário mínimo nacional. A situação é completamente diferente: no passado recente, havia mera táctica de resposta a um problema que se sumia no afundamento da própria economia; agora, há uma perspectiva de futuro risonha.
Por esta razão, só por esta razão, embora saudando a iniciativa do Partido Comunista e compreendendo a sua vigilância, não podemos votar a favor dela.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Andrade Miranda.

O Sr. Carlos Andrade Miranda (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O PCP brinda, de novo, esta Assembleia com a mesma iniciativa com que, ciclicamente, abriu as primeiras sessões das últimas legislaturas.
Na abertura da VIII Legislatura, avançou com o projecto de lei n.º 1/VIII, tendente a aumentar o salário mínimo nacional; na abertura da IX Legislatura, avançou no mesmo sentido com o projecto de lei n.º 6/IX; ainda na IX Legislatura, apresentou um projecto de lei e um projecto de resolução, que deu azo a um debate parlamentar em 18 de Junho de 2004 sobre esta matéria. Enfim, ainda há menos de um ano, foi esta Assembleia chamada a pronunciar-se sobre a pretensão do PCP de condicionar o governo a rever o salário mínimo nacional de forma intercalar.
Neste seu projecto, o PCP limita-se a reproduzir o mesmíssimo texto que vem oferecendo, desde pelo menos 1999,…

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Parece que é pouco!…

O Orador: - … como sustentação desta sua proposta, sem considerar as mudanças entretanto ocorridas na sociedade e na economia portuguesas, fazendo tábua rasa, quer da evolução salarial, quer da marcha da produtividade.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - A falta de cuidado e de um mínimo de esforço fundamentador com que o PCP apresenta este projecto é sintomático de quanto o PCP está consciente da inviabilidade prática da sua proposta,…

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O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - … sendo certo, porém, que não podemos ficar indiferentes perante a realidade que o PCP procura retratar com o projecto de resolução ora apresentado.
O salário mínimo nacional actual de 374,70 € não constitui, em muitos casos, uma remuneração capaz de assegurar um nível de vida decente e o facto de abranger apenas cerca de 6% da população activa não nos permite esquecer que envolve cerca de 200 000 famílias.
Importa que fique aqui muito claramente percebido que o PSD entende que o salário mínimo nacional deve aproximar-se rapidamente da média europeia, mas também sabemos que isso tem de ocorrer de forma gradual e sustentada.
Estou certo de que todas as Sr.as e todos os Srs. Deputados partilham comigo a ideia de que é necessário fazer tudo o que estiver ao nosso alcance para que se produzam as mudanças na nossa estrutura jurídica e política que favoreçam um desenvolvimento sustentado da nossa economia como único meio de superar a debilidade das remunerações do trabalho em Portugal. Só há uma forma de o País progredir: produzindo mais, com mais qualidade e com menos recursos. Com maior produtividade, portanto. Esta produtividade é precisamente um dos factores que directamente influenciam as remunerações e, por sua vez, o salário mínimo nacional.
O salário mínimo nacional é muito baixo, porque Portugal é, infelizmente, um país economicamente muito pouco produtivo. E esta situação não se altera por decreto, como o PCP pretenderia. A realidade não se altera na medida dos nossos desejos, por mais generosos que eles sejam.
Ao contrário do PCP, o PSD reconhece que a fixação do salário mínimo nacional pertence exclusivamente ao Governo. E, ao contrário do PS que, no debate do passado dia 18 de Junho de 2004 sobre esta mesma matéria, enfileirava a reboque do PCP no sentido de legitimar essa interferência na área governativa, o PSD, por muito que gostasse ver melhorar as remunerações dos trabalhadores, continua a entender que é o Governo que se encontra em melhores condições para ajuizar sobre o salário mínimo nacional.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É que é o Governo que tem de pautar-se, desde logo, pelos ditames dos artigos 59.º da Constituição e 266.º do Código do Trabalho, sem deixar de atender ao parecer da Comissão Permanente de Concertação Social e sem se esquecer da repercussão ao nível da despesa pública, designadamente em matéria de prestações sociais.
Na definição do salário mínimo nacional, tem o Governo de ponderar, designadamente, o aumento do custo de vida, o nível de desenvolvimento das forças produtivas, as exigências da estabilidade económica e financeira e a evolução da produtividade. E é neste aspecto que a situação nos parece mais preocupante.
De acordo com as previsões da Primavera da Comissão Europeia, no último ano, ter-se-á assistido em Portugal a um aumento real dos salários da ordem dos 0,6%, enquanto que na zona euro não passou de 0,2% e na Alemanha de 0,1%. Em contrapartida, porém, o aumento da produtividade nacional sentida no último ano foi apenas de 0,9%, valor este abaixo da média europeia, com o que se assistiu a uma deficiente redução dos custos unitários do trabalho e, em consequência, a uma perda de competitividade.
Se nos é permitido fazer nesta sede uma recomendação ao Governo, diríamos que não há tempo a perder. Não é tempo para o Governo se refugiar na meditação introspectiva estéril, adiando as acções que têm de ser urgentemente tomadas. Todos os diagnosticados custos do contexto em que mergulha a economia portuguesa têm de ser drasticamente reduzidos, em especial a desburocratização e a qualificação.
Se o Governo do Partido Socialista impulsionar bem e depressa as reformas necessárias, em breve, o salário mínimo nacional poderá assegurar a sua função muito mais condignamente.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para reagir às perguntas formuladas há pouco pelo Sr. Deputado Vítor Ramalho, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Lopes.

O Sr. Francisco Lopes (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Vítor Ramalho, fiquei um pouco surpreendido e pouco esclarecido com a sua intervenção, designadamente no que se refere à mudança de posição do Partido Socialista relativa a uma opção anterior sobre o salário mínimo nacional.

Vozes do PCP: - Exactamente!

O Orador: - Resta, talvez, como razão para esta mudança de opinião o facto de o Partido Socialista ter

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votado favoravelmente quando estava na oposição e agora, estando no Governo, assumir uma posição diferente. À falta de explicações mais desenvolvidas, parece ser esta a única ilação que podemos tirar!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Isto porque há todas as razões e justificações para ser adoptada uma medida de aumento intercalar do salário mínimo nacional. Por um lado, pela situação objectiva em que vivem centenas de milhares de trabalhadores e, por outro, por estarem a verificar-se aumentos de preços de bens essenciais e de serviços, como o caso aqui evidenciado do aumento dos transportes públicos em 3,7%, ontem anunciado. Ora, isto penaliza os trabalhadores, a população e também aqueles que auferem o salário mínimo nacional. Não se pode estar à espera do próximo ano, com todas as consequências que isto tem, para fazer a actualização do salário mínimo nacional!
Por sua vez, sabemos que o País tem um problema de criação de riqueza. É necessário mais produtividade e mais criação de riqueza. Mas há também um grave problema de distribuição da riqueza que é criada…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - … e não há justificação para se manter um salário mínimo nacional de 374 €, quando verificamos os lucros escandalosos dos grupos económicos e financeiros, designadamente da banca, estes 1400 milhões de euros de lucro, em 2004, apenas de quatro empresas.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Se se distribuir melhor a riqueza, é possível dar resposta a um aumento intercalar do salário mínimo nacional!

Aplausos do PCP.

Finalmente, é necessário dizer que a proposta do PCP, com uma larga fundamentação, se insere numa perspectiva mais ampla. Não nos limitamos à proposta de aumento intercalar do salário mínimo nacional, que agora está a ser apreciada. Entendemos indispensável uma revalorização do salário mínimo nacional que reponha o poder de compra perdido. Também nesta matéria, é necessário que haja resposta, designadamente por parte do Partido Socialista, quanto a prazos e a compromissos de valores a atingir para que não fique apenas, como palavra vã, a ideia de revalorização do salário mínimo nacional.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Ricardo Freitas.

O Sr. Ricardo Freitas (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O projecto de resolução n.º 3/X, apresentado pelo Grupo Parlamentar do PCP, visa promover a discussão de uma temática já recorrente nesta Câmara: o aumento intercalar do salário mínimo nacional como mecanismo de recuperação do poder real de compra dos trabalhadores portugueses.
Com a presente iniciativa legislativa, visam os seus proponentes recomendar ao Governo um aumento do salário mínimo nacional, fixando-o em 400 €, medida que consideram imperiosa por razões de justiça social e susceptível de dinamizar a economia e favorecer um maior nível de consumo.
Trata-se de uma medida que já foi amplamente discutida no quadro da legislatura anterior e que permitiu ao Partido Socialista reafirmar o seu entendimento quanto ao papel e importância do salário mínimo nacional no quadro do desenvolvimento económico do nosso país e no plano do reforço da coesão social.
O salário mínimo nacional, direito elevado à dignidade constitucional, constitui, como é consabido, um instrumento fundamental de melhoria dos níveis de vida dos trabalhadores portugueses, devendo a sua actualização anual ter em devida conta, para além de outros factores, as necessidades dos trabalhadores, o aumento do custo de vida, a evolução das condições de produtividade e a necessária estabilidade económica e financeira do nosso país.
Enquanto rendimento de garantia de um quadro de vida decente comporta importantes reflexos no plano do combate à exclusão social dos cidadãos no activo. Esta dimensão social do salário mínimo nacional, que gostaríamos de sublinhar, é tanto mais importante quando sabemos ser significativo o número de trabalhadores abrangidos pelo mesmo.
Por isso mesmo, sempre defendemos que a actualização anual, não intercalar, do salário mínimo nacional deve ser justa e equitativa por forma a garantir aos trabalhadores estes objectivos, sem, todavia, pôr em causa o desenvolvimento do tecido empresarial e os níveis de emprego.

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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Estivéssemos num tempo e espaço onde a ausência de um conjunto coerente de políticas fosse a dura e crua realidade com que teríamos de nos debater; estivéssemos hoje a debater-nos com uma circunstância onde o planeamento fosse um instrumento não de gestão mas, sim, uma figura de retórica, quanto muito útil para qualquer sofista ou, quiçá, para certos políticos pouco dados ao trabalho com programação e com poucos objectivos claros, e seria admissível, por motivos, diria, que de ordem táctica, que a aprovação deste projecto de resolução fosse concretizada.
Estivéssemos a constatar que teriam decorrido meses sobre a aprovação do Programa de Governo - que, recordo, espelha em concreto a proposta eleitoral do Partido Socialista, sufragada pela maioria do povo português -, sem que o mesmo fosse respeitado e cumprido pelo Governo que aqui sustentamos, e seria admissível a aprovação do projecto em discussão.
Contudo, não é esta a realidade em que vivemos e com que hoje nos deparamos. Já não vivemos nesse período e estamos no exercício de um poder político que começou agora. Por isso, a alteração intercalar que se pretende desencadear, dado as pensões estarem indexadas ao salário mínimo, iria provocar claramente graves aumentos e situações de desequilíbrio profundo. Essa acção incoerente era, anteriormente, muitas vezes desenvolvida com pseudopreocupações de ordem social mas, passado o tempo necessário à análise e avaliação, podíamos todos concluir que os resultados eram negativos para um desenvolvimento harmonioso da sociedade portuguesa e para com o bem comum. Era muito esse o tempo do governo PPD/PSD-CDS/PP.
Agora o tempo é diferente, estamos, efectivamente, noutro patamar, com outra política e com outra determinação.
Por isso, afirmamos no Programa Eleitoral do PS, sufragado pelos portugueses, "… que é indispensável que o salário mínimo nacional cumpra a função que lhe cabe como factor de imunidade à pobreza."
Definimos no Programa do Governo os grandes objectivos que queremos alcançar: qualificar as pessoas e promover o emprego; adaptar as empresas e o trabalho; tornar o trabalho um factor de cidadania.
O Governo comprometeu-se com um conjunto de medidas e politicas que, no seu todo, constituem uma estratégia, e não uma mera táctica, para podermos, com sustentabilidade, transformar Portugal numa sociedade mais competitiva, mais rica e mais justa. Foi esse o compromisso que o PS estabeleceu com os portugueses, é esse compromisso que o PS pretende cumprir.
Mas deixem-nos pôr em acção as nossas políticas, respeitando o nosso calendário e as nossas prioridades.
Compreendam que, sendo legítimo que apontem outros caminhos ou outros métodos, devem reconhecer que deverá o Governo dispor do tempo mínimo necessário para o lançamento da sua política.
Recordo aqui os compromissos do PS com as políticas sociais, que abrangem desde os jovens aos idosos, desde as políticas de qualificação e de combate à exclusão às políticas de igualdade de oportunidades, de género, etc.
Como ainda ontem vimos no debate aqui realizado com o Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social, o PS não está indiferente ao papel que os parceiros sociais devem desempenhar num quadro de modernização do País. Definimos de forma clara o papel da concertação e da negociação colectiva, e é esse o caminho que queremos trilhar.
O Partido Socialista orgulha-se das políticas salariais que, no passado, implementou e que se traduziram num significativo aumento real dos salários em Portugal e da sua convergência com os da União Europeia, levando a uma melhoria considerável das condições de vida dos portugueses.
O Partido Socialista orgulha-se de ter contribuído para uma progressão francamente positiva do valor do salário mínimo nacional, aproximando-o dos valores médios praticados ao nível da União Europeia.
Os números falam por si. Durante a governação do Partido Socialista, entre 1995 e 2001, o salário mínimo nacional registou um crescimento sem precedentes na nossa jovem democracia, ou seja, teve um acréscimo real da ordem dos 29,12 €, crescendo a uma taxa média anual de 1,2%, totalizando um aumento global da ordem dos 8,6%.
Este legado permite aos portugueses encarar o futuro com confiança e as medidas que o Governo do Partido Socialista, em momento adequado, irá implementar para cumprimento do seu Programa.
Em suma, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista reafirma a convicção de que o Governo contribuirá activamente com as suas políticas para uma progressão positiva dos salários em geral e do salário mínimo nacional em particular, de modo a que este possa cumprir a sua vocação social enquanto instrumento de combate à pobreza e de melhoria do nível geral de vida dos portugueses.
Dada a extemporaneidade da medida aqui proposta, é natural que o nosso sentido de voto seja contra.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Caeiro.

A Sr.ª Teresa Vasconcelos Caeiro (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Ricardo Freitas, já todos estamos habituados a que, no início de cada legislatura ou mesmo da cada sessão legislativa, o

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PCP retire do "congelador" uma proposta, que é sempre igual, no sentido do aumento intercalar do salário mínimo nacional. Tomáramos nós todos poder fazer isso!… No entanto, todos os partidos que têm tido responsabilidades governamentais sabem que isto não se pode fazer por uma varinha mágica e que não basta "descongelar" uma iniciativa, como os senhores o fazem!…
Mas a minha pergunta é dirigida ao Grupo Parlamentar do PS. Conhecem, com certeza, a história da "Olívia patroa" e da "Olívia empregada". Ora, isto aplica-se ao Grupo Parlamentar do Partido Socialista. Senão, vejamos: quando o Partido Socialista está na posição de "Olívia empregada" considera, por todos os motivos, que o salário mínimo nacional é, "(…) como é consabido, um importante instrumento de coesão social e um indicador sobre a evolução da situação económica, social e laboral do País. (…).
O salário mínimo nacional surge, assim, como um instrumento fundamental de melhoria das condições de vida dos cidadãos (…). Assim, uma medida de correcção do salário mínimo nacional que garanta algum ganho em termos de poder de compra é socialmente justa e não distorce a posição concorrencial do nosso País."

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - E diz, ainda - versão "Olívia empregada": "(…) por considerarem que esta medida de carácter excepcional …" - o aumento intercalar do salário mínimo nacional - "… encontra justificação no momento actual, nomeadamente como factor dinamizador da economia portuguesa e mecanismo de reforço social." votam favoravelmente.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Jorge Strecht (PS): - Não é verdade!

A Oradora: - Isto numa declaração de voto assinada pelo então Sr. Deputado Vieira da Silva.
Já uma posição diferente tem o Partido Socialista na versão "Olívia patroa", que é o estado em que se encontra actualmente, quando diz que "Muito embora apenas cerca de 6% dos trabalhadores sejam abrangidos pelo salário mínimo nacional, o certo é que (…) as actualizações (…) devem revestir-se de especial atenção", nomeadamente por causa dos efeitos que têm "(…) em microempresas com menos de 10 trabalhadores, tradicionalmente débeis em termos económicos e com mão-de-obra intensiva."
Por outro lado, "Esta dupla função do salário mínimo nacional justifica (…) que, ao serem fixados os novos valores de actualização, sejam levados em conta os critérios de racionalidade económica e social (…)".
E aqui reside a nossa perplexidade: em que ficamos?! O PS, quando está na posição de "Olívia patroa", vota contra os aumentos intercalares do salário mínimo,…

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Muito bem!

A Oradora: - … quando está na posição de "Olívia empregada", vota, indiscutivelmente, a favor desses aumentos.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Muito bem!

A Oradora: - Gostaria de saber quais são essas fundamentações e em que ficamos.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. António Filipe (PCP): - O CDS prefere a "Olívia patroa"!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Andrade Miranda.

O Sr. Carlos Andrade Miranda (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Ricardo Freitas, o meu pedido de esclarecimento vai precisamente no mesmo sentido do da Sr.ª Deputada Teresa Caeiro. É que quem ouviu, como eu ouvi, em 18 de Junho de 2004, no debate que aqui ocorreu precisamente sobre esta mesma matéria, o discurso então proferido pelo Sr. Deputado Artur Penedos e as considerações justíssimas produzidas hoje pelo Sr. Deputado Vítor Ramalho e, depois, ouve V. Ex.ª na intervenção que acaba de fazer fica definitivamente sem perceber com o que esta Câmara pode contar durante a presente Legislatura ou nas próximas legislaturas e se o Partido Socialista confere a si próprio legitimidade para, em plena Legislatura, fora da discussão do Orçamento do Estado e de qualquer questão orçamental que bula com a receita ou com a despesa do Estado, tomar a posição que vimos tomar em 18 de Junho de

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2004, no sentido de imediatamente, a reboque do PCP, entender que é o momento próprio para forçar o Governo a alterar a sua estratégia em matéria de salário mínimo nacional ou se, pelo contrário, aquilo com que a Câmara pode efectivamente contar a partir de hoje é que, em coerência, estas matérias serão, de alguma forma, arredadas da nossa discussão.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Ricardo Freitas.

O Sr. Ricardo Freitas (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, permitam-me que comece com uma afirmação bem clara: todos poderão contar indiscutivelmente, na presente Legislatura, com o cumprimento integral do Programa do Partido Socialista.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - É essa a nossa disposição; é essa a nossa determinação.
Já agora, aproveito para esclarecer que agora as coisas estão um pouco diferentes.
Recordou aqui a posição tomada no passado pelo Partido Socialista nessa recomendação ao governo, quando havia um desnorte evidente, passados que eram já alguns meses, pois não estávamos no início do processo da legislatura, e onde não se reflectia, de maneira nenhuma, a posição clara do instrumento que era o salário mínimo nacional. Nessa altura, era tacticamente legítimo, porque havia um desnorte e uma descoordenação e não uma estratégia global assumida pelo governo PPD/PSD, que tivéssemos essa posição. Agora é diferente: temos uma orientação clara e precisa e também não estamos interessados em criar, numa situação em que o Orçamento nem sequer é nosso, situações que, por estarem indexadas, como sabem, ao salário mínimo nacional, poderiam criar grave perturbação.

A Sr.ª Teresa Vasconcelos Caeiro (CDS-PP): - Agora estão em versão "Olívia patroa"!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, queira concluir, porque já terminou o seu tempo.

O Orador: - Termino, Sr. Presidente.
Entendemos que, na altura certa, em termos de revisão anual do salário mínimo nacional, o Governo irá proceder às correcções necessárias para repor o poder de compra dos trabalhadores.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Mota Soares.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ainda que esta seja a terceira ou a quarta vez que o Partido Comunista apresenta este projecto em Plenário, ainda que geralmente a apresentação ou a votação destes projectos coincida com os finais do mês de Abril, o que certamente não demonstra mais do que o apego do Partido Comunista Português à Primavera e às andorinhas que por aí povoam,…

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Ao 25 de Abril!

O Orador: - … nós, nesta bancada, não pomos em causa a preocupação legítima dos comunistas com a evolução dos salários, principalmente dos salários mais baixos.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Não parece!

O Orador: - É legítima esta preocupação, que, aliás, é partilhada por esta bancada, com o diferencial existente entre o salário mínimo nacional relativamente aos países mais prósperos da União Europeia.
Por nossa vontade, por nosso desejo, há muito que os trabalhadores portugueses estariam com salários ao nível dos que existem em Espanha, no Reino Unido ou, mesmo, em França. Só que um problema desta natureza não se resolve só ao nível dos nossos desejos ou da nossa vontade.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Posição "Olívia patroa!

O Orador: - Temos, infelizmente, salários baixos porque temos um modelo económico assente numa indústria e em serviços de pouco valor acrescentado, com poucos avanços tecnológicos e com recurso, em muitos casos, à mão de obra intensiva.

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Temos, infelizmente, salários baixos porque a nossas empresas não são competitivas à escala global; porque a nossa produtividade é reduzida, ficando aquém da média dos restantes países da União Europeia.
Temos, infelizmente, salários baixos porque a qualificação e a formação profissional dos nossos recursos humanos continua a ser baixa.
Só que, ao contrário do PCP, não acreditamos que a criação de riqueza, o aumento de produtividade, a qualificação dos nossos trabalhadores e da nossa indústria ou, mesmo, o acréscimo da nossa competitividade se possa fazer por decreto.
Para nós, tudo isto é desejável e fundamental, mas assenta, acima de tudo, numa construção que se faz com trabalho, com esforço, respeitando o desenvolvimento sustentável, e no quadro de uma economia social de mercado.
Para nós, tudo isto se faz criando as condições para que cresça o investimento em Portugal, reduzindo a carga fiscal sobre as empresas, modernizando e flexibilizando as leis do trabalho, apostando na qualificação dos nossos recursos humanos.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Ora, sobre estas matérias conhecemos muito bem o pensamento da esquerda e da extrema-esquerda parlamentar.
O aumento dos salários tem sempre de ter em conta o aumento da produtividade, sob pena de estarmos a condenar à falência grande parte do nosso sector produtivo e a condenar muitos trabalhadores ao desemprego.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - É por isso que temos de deixar aqui algumas perguntas ao PCP.
O Partido Comunista estudou o financiamento desta proposta? O Partido Comunista estudou as consequências que esta proposta teria, porventura, no aumento da inflação? Parece-nos que não.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É por tudo isto que nós, nesta bancada, não recebemos lições do PCP. Porque a diferença entre a nossa visão do mundo e a visão do comunismo está à vista. É comparar o nível de vida, de riqueza e de felicidade entre os países da Europa Ocidental, da economia de mercado, com as condições de vida, ainda hoje, 15 anos após a queda do Muro de Berlim, nos países que foram subjugados ao comunismo.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Nos países onde a democracia cristã conseguiu imprimir a sua marca na governação, cresceu a riqueza e diminuiu a pobreza; nos países que foram subjugados ao manto do comunismo, combatia-se a riqueza e a única coisa verdadeiramente democrática era a pobreza.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - É por isso mesmo, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que percebemos o voluntarismo desta proposta por parte do PCP e concordamos com a necessidade de, gradualmente, se fazer o aumento do salário mínimo nacional.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - "Gradualmente"!

O Orador: - Mas não esquecemos que a fixação deste valor é, acima de tudo, da competência do Governo, ouvindo os parceiros sociais em sede de concertação, com as entidades patronais e com os sindicatos, e definindo anualmente o que é possível e razoável.
Defendemos isso no passado e mantemos esta posição, ao contrário, ao que parece, do Partido Socialista que, quando está na oposição, defende uma coisa mas, quando chega ao poder, defende exactamente o seu contrário.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Nós, nesta bancada, não temos esses "zigues" e esses "zagues", tão característicos do Partido Socialista.

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O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Dupla personalidade!

O Orador: - Somos uma oposição responsável e realista…

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - … e por isso mesmo não podemos acompanhar esta proposta que, em última análise, podia levar a que parte do nosso sector produtivo atravessasse muitas dificuldades, levando, inclusivamente, a que as primeiras vítimas pudessem ser os trabalhadores portugueses.

Aplausos do CDS-PP.

Protestos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Aiveca.

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O salário mínimo nacional foi, do ponto de vista histórico e social, uma insistente reivindicação dos trabalhadores portugueses durante as lutas laborais no tempo do regime fascista, que veio a impor-se por via da negociação e contratação colectiva, sector a sector, permitindo assim a futura estipulação de um salário mínimo socioprofissional.
A expressão de "soberania popular", que resultou da Revolução do 25 de Abril, trouxe a imposição, a 27 de Maio de 1974, do salário mínimo nacional no valor de 3300$ para todos os trabalhadores. No entanto, tem vindo a perder continuamente poder de compra e tem-se afastado do salário médio.
Em 2000, o salário mínimo nacional representava apenas 51,8% do salário médio, quando 10 anos antes representava 59,4%, o que indica que as desigualdades salariais têm vindo a agravar-se e a actualização que teve, em Janeiro de 2004 e de 2005, de apenas 9,30 € foi claramente insuficiente para compensar as perdas verificadas e fazer aproximar o salário mínimo ao salário médio.
O salário mínimo nacional é apenas de 374,70 € e ao sofrer uma actualização de 2,5% não traduziu em qualquer ganho real do salário mínimo em termos de poder de compra. Estes valores não são compatíveis com o cumprimento da Convenção n.º 135 da OIT, ratificada por Portugal, que manda também ter em conta a situação económica.
O salário mínimo nacional que, em 1974, se traduziu em 3300$, a manter-se o valor equivalente ao do poder de compra de hoje, corresponderia a um valor superior a 550 €.
A perda de poder de compra dos salários significa um cada vez maior empobrecimento da população trabalhadora e um crescimento das desigualdades, o que tem consequências negativas no desenvolvimento do País.
Na análise da distribuição da riqueza em Portugal, pode, desde logo, afirmar-se que a mesma é injusta e que os trabalhadores não são pagos de acordo com aquilo que produzem. Dois em cada 10 portugueses estão em "risco de pobreza" ou sobrevivem com menos de 60% da média nacional de rendimentos, de acordo com um relatório da agência Habitat, das Nações Unidas.
O estudo, que avalia o estado das cidades do planeta, coloca a população portuguesa em segundo lugar - entre os antigos 15 membros da União Europeia e apenas atrás da Grécia - nos níveis de pobreza europeus.
Os dados disponíveis, fornecidos pelo EUROSTAT e pelo Banco de Portugal, dizem-nos que a repartição da riqueza no nosso país é injusta e desigual, tendo em conta a evolução da distribuição dos lucros e dos salários no PIB, no período que vai de 1970 a 2002.
Veja-se como evolui a distribuição da riqueza. Os dados referidos deixam claro que a riqueza produzida no nosso país tem tido uma distribuição desigual, variando em razão do poder político a cada momento, atingindo o patamar mais elevado em favor dos salários, no ano de 1975, com 59%, para depois começar a descer, invertendo-se em favor da rubrica dos lucros, para atingir, no ano 2002, o patamar mais baixo.
Analisando-se a distribuição da riqueza por segmentos da população, em dados mais recentes, a partir de um estudo do Instituto Nacional de Estatística designado Rendimento, Desigualdade e Pobreza, temos que os 20% da população mais pobre recebem 5% do rendimento líquido nacional e os 20% da população mais rica recebem 44,9%. Ou seja, os 20% da população mais rica recebem 7,6 vezes mais do que os 20% mais pobres. Tal facto resulta da falência do modelo subalterno de desenvolvimento em que vive o nosso país, baseado em baixas qualificações, em elevada precariedade e em baixos salários.
Portugal tem o salário mínimo nacional mais baixo de entre os Estados-membros da União Europeia a Quinze. O quadro comparativo do EUROSTAT dos salários mínimos mensais na União Europeia, em 2005, demonstra, igualmente, uma intolerável distância entre os valores pagos em Portugal e nos restantes Estados-membros.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Bloco de Esquerda apoia o aumento intercalar dos salários,

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em particular do salário mínimo nacional ora proposto, tornando-se, pois, imperioso, por razões de justiça social e como factor dinamizador da economia, favorecer o poder de compra dos portugueses.
É preciso dignificar o salário mínimo nacional, torná-lo como o "mínimo vital" da sobrevivência humana, rejeitando os seus casuísticos aumentos por forma a apresentar a fraude social, promovida pelo governo das direitas de Portas e Bagão, de convergência das pensões com o salário mínimo nacional. Fraude social que foi posta a nu e profundamente derrotada pelos portugueses nas eleições de 20 de Fevereiro.
Ao Governo do Partido Socialista cabe a enorme responsabilidade de dar resposta à gravíssima situação social que se vive no nosso país.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente António Filipe.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, terminou o seu tempo. Tem de concluir.

A Oradora: - É preciso promover a dignificação humana e social. O aumento intercalar do salário mínimo nacional tem um efeito importante e directo nos sectores e por isso votaremos a favor do projecto de resolução.

Aplausos do BE

O Sr. Presidente (António Filipe): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Talvez começasse por perguntar ao Sr. Deputado do CDS-PP se, na altura, o governo do PSD/PP teve o cuidado de conhecer os problemas que as vossas políticas trouxeram aos portugueses por via dos inúmeros sacrifícios que lhes foram pedidos, quando, afinal, se mantiveram os baixos níveis de produtividade ou, até, conseguiram o aumento do défice.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Agora vai melhorar!…

A Oradora: - Mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, este novo ciclo parlamentar começa de uma forma confrangedora: o Partido Socialista assume que, quando era oposição, apoiava esta medida de aumento intercalar do salário mínimo; agora, como Governo e como maioria parlamentar, rejeita-a.

Vozes do PS: - Não é verdade!

A Oradora: - Falamos tanto, em inúmeras circunstâncias, da credibilização da vida política. Pois aqui está uma atitude, hoje demonstrada, que claramente descredibiliza a vida política. É esta chamada de atenção que gostaria de deixar aqui.
O Sr. Deputado Vítor Ramalho referiu há pouco que, tendo em conta a situação em que o País se encontra, agora, não é possível apoiar o projecto de resolução que o PCP apresenta. Vejamos, então, em que situação o País se encontra.
O número de pobres ascende a mais de 2 milhões, uma pobreza causada pela inexistência ou insuficiência de rendimentos, de meios de subsistência dos inúmeros desempregados, dos que recebem o salário mínimo ou daqueles que recebem pensões altamente degradadas; o fosso entre ricos e pobres é dos mais significativos; comparativamente com outros países da União Europeia a Quinze, somos o país com os salários mais baixos; o abandono escolar também não pode ser desligado daquilo que as famílias portuguesas pagam pelo ensino, nomeadamente, e até, no ensino obrigatório; os gastos com a saúde são imensos e os transportes não param de aumentar de ano para ano e várias vezes por ano, como este Governo vem fazer, de novo.
O Partido Socialista diz: esta medida, neste momento, "não"! A pergunta que Os Verdes deixam é esta: Srs. Deputados, quando chegará o tempo em que o modelo económico não se baseie nos baixos salários, em que se perceba que não é a "moderação salarial", como gostam de chamar à manutenção dos salários baixos, que promove o emprego?! Quando chegará o tempo de acabar com este modelo esgotado, com este modelo de insucesso para a generalidade das pessoas?! Quando chegará o tempo, Srs. Deputados, de agir pela justiça social?! Penso que houve pessoas que próximo de 20 de Fevereiro terão considerado que esse momento estaria a chegar com a expectativa de mudança que interiorizaram. Se calhar, vão ganhar uma nova desilusão. O PS o dirá!

Vozes do PCP: - Muito bem!

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O Sr. Presidente (António Filipe): - Para uma segunda intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Lopes.

O Sr. Francisco Lopes (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pelas intervenções aqui feitas, aparentemente, pareceu haver uma preocupação e uma sensibilidade quanto à iniciativa que o PCP hoje trouxe de valorização do salário mínimo nacional. No entanto, vê-se que, na prática, desde o PS ao PSD passando pelo CDS, há uma atitude contrária a essa primeira impressão. E perde-se aqui uma grande oportunidade de, aprovando esta proposta do PCP, dar um sinal de justiça social, de contributo para o desenvolvimento económico, mas também de valorização do trabalho e dos trabalhadores.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Num tempo em que se promovem as desigualdades sociais, num tempo em que se promove a exploração, num tempo em que se promove a especulação bolsista, é fundamental que se afirmem os valores do trabalho, que se valorize o trabalho, e o aumento do salário mínimo nacional é também um sinal para a valorização do trabalho.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Por outro lado, referiu-se aqui o carácter intercalar desta proposta como sendo um óbice. Srs. Deputados, esta proposta que fazemos não é inédita, houve governos que decidiram aumentos intercalares do salário mínimo. Portanto, este não é um problema, e os Srs. Deputados do PSD são capazes de estar recordados deste facto.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Também não é razão a comparação com os outros países da Europa - aliás, a comparação justificaria que se tomasse, desde já, esta medida. É que não são só os países mais desenvolvidos que têm um salário mínimo acima do salário mínimo português. A vizinha Espanha, que tem um salário mínimo muito acima do nosso, decidiu recentemente um aumento extraordinário que nos diferencia ainda mais desse país. Mas outros países, como o Chipre, têm hoje salários mínimos acima do que é praticado em Portugal.
Portanto, há aqui um problema não apenas de criação de riqueza mas uma opção na distribuição da riqueza, uma opção que está mal feita e tem de ser corrigida.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Cabe ainda dizer que aquilo que propomos relativamente ao salário mínimo nacional tem uma preocupação social e é necessário os Srs. Deputados interrogarem-se no sentido de saber como é possível uma família viver com 374 € por mês!… Ora, a proposta que fazemos é faseada, é um aumento intercalar, e tem o valor de apenas mais 25 €, de apenas mais 5 contos por mês. É um passo para uma revalorização mais profunda do salário mínimo nacional que aqui é necessário assumir como compromisso quer quanto a prazos quer quanto a montantes.
Termino, referindo que há, de facto, um problema de congelamento. Na prática, o salário mínimo nacional não só tem sido congelado como tem sido desvalorizado. E o PCP tomará as iniciativas que forem necessárias, com toda a convicção, para descongelar o salário mínimo nacional, para descongelar o progresso e a justiça social. Tomaremos todas as medidas nesse sentido, e esta é uma delas.

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente (António Filipe): - Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, dou por encerrado o debate do projecto de resolução n.º 3/X - Aumento intercalar do salário mínimo nacional (PCP), que será votado à hora regimental.
Srs. Deputados, passamos ao ponto seguinte da ordem de trabalhos, ou seja, à discussão do projecto de resolução n.º 6/X - Recomenda o procedimento de avaliação de impacte ambiental do túnel do Marquês.
Para introduzir o debate, em representação do seu grupo parlamentar, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes.

O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): - Sr. Presidente e Srs. Deputados: O projecto do desnivelamento da Avenida Duarte Pacheco, Rua Joaquim António de Aguiar e Avenida Fontes Pereira de Melo, vulgarmente designado por túnel do Marquês, é uma questão que muita polémica e interesse tem

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suscitado nos últimos tempos.
Com efeito, o de novo actual Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, Dr. Santana Lopes, ainda enquanto candidato, assumiu desde logo a "bandeira" de construir em pleno coração da cidade de Lisboa, numa área já de si extremamente sobrecarregada do ponto de vista urbanístico e viário, com óbvios impactos negativos na qualidade de vida e no ambiente urbano daquela zona, uma grande obra de betão, o famigerado túnel do Marquês.
Desde o início, este projecto foi contestado pela oposição, por associações ambientalistas e por muitos cidadãos a título individual e, apesar da sua enorme dimensão e dos riscos necessariamente inerentes a uma obra desta envergadura, apesar das suas características particulares e das altamente discutíveis opções técnicas apontadas ou da zona de implantação da mesma, nem o dono da obra, a Câmara Municipal de Lisboa, nem o governo, ambos de maioria de direita PSD/PP, entenderam que seria necessário ou útil, a fim de salvaguardar os múltiplos interesses públicos em causa, promover a realização de um estudo de avaliação do impacte ambiental para este projecto e do respectivo procedimento.
Com efeito, foi preciso que um tribunal administrativo e fiscal obrigasse o Estado português a abrir o procedimento de avaliação do impacte ambiental. Isto é algo que nos parece extremamente grave!
É extremamente grave que não o tenha feito o governo, que é a primeira figura da Administração Pública e que, consequente, deveria ser o primeiro a procurar proteger o interesse público e a salvaguardar os bens públicos em causa, assegurando um processo transparente, acompanhado de um estudo profundo e bem sustentado em prospecções no terreno realizadas por técnicos competentes, reunindo contributos de várias entidades públicas, competentes e idóneas e, natural e necessariamente, dotar o projecto de um estudo de impacte ambiental.
Tendo finalmente arrancado o procedimento de avaliação do impacte ambiental, tendo sido colocado o respectivo estudo a consulta pública em Julho do ano passado, durante o qual tantos e tão valiosos contributos, entre relatórios e pareceres oriundos das mais diversas entidades públicas e privadas, vieram não só enriquecer o debate mas suscitar importantes e pertinentes questões relativamente aos impactos que o projecto trará para aquela zona em particular mas também para toda a cidade e para a região envolvente, também é extremamente grave que o governo, em 29 de Janeiro deste ano, pela mão do, então, Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro do Ambiente e do Ordenamento do Território, Jorge Moreira da Silva, através do Despacho n.º 3749/2005, tenha decidido declarar a extinção do procedimento de avaliação do impacte ambiental ao túnel do Marquês.
Mas fê-lo porquê? Para poupar dinheiro aos contribuintes, como pretende fazer-nos crer no texto do referido despacho? A isso deveríamos responder que "o mais barato às vezes sai mais caro"… Ou seria talvez porque, uma vez que a obra já está a decorrer, não fazia sentido sujeitá-la a estudo do impacte ambiental? A isto temos que contrapor que o que foi profundamente errado foi iniciar a obra sem que existisse o referido estudo.
No entanto, o principal fundamento que sustentou essa decisão, conforme decorre do texto de fundamentação do próprio despacho, foi o entendimento de que o Supremo Tribunal Administrativo, por Acórdão de 24 de Novembro de 2004, terá decidido, de forma inequívoca e peremptória que, no caso em apreço, a lei não obrigaria a realização de procedimento de avaliação do impacte ambiental.
Quanto a isto, temos que lembrar, em primeiro lugar, que o referido acórdão não permite, em nosso entender e salvo melhor opinião, tal conclusão, mas sim e apenas a de que a situação em análise não se subsume na previsão da alínea h), do ponto 10, do Anexo II do Decreto-Lei n.º 69/2000, de 3 de Maio, diploma que aprova o regime jurídico da avaliação do impacte ambiental. Aliás, o acórdão referido vai mais longe, reconhecendo claramente a existência de um regime aberto, no n.º 3 do artigo 1.º do mesmo diploma, que pode e deve ser usado sempre que as especiais características, dimensão e natureza do projecto a tal aconselhem.
Em segundo lugar, convém lembrar que a decisão do STA diz respeito apenas e tão só a um procedimento cautelar, continuando, neste momento, a decorrer em sede judicial a acção principal.
Finalmente e acima de tudo, o que está aqui verdadeiramente em causa é uma questão política e não exclusivamente jurídica, ou seja, é reconhecer que, pela sua dimensão, pela sua localização, pelas suas características particulares e pelos impactos que certamente implicará, e cuja verdadeira dimensão desconhecemos neste momento, a obra conhecida como túnel do Marquês deve ser obrigatoriamente sujeita à devida avaliação de impacte, por entrar na previsão do regime aberto do Decreto-Lei n.º 69/2000.
Por outro lado, seria extremamente preocupante que, tendo já sido efectuados diversos estudos que consubstanciam uma avaliação do impacte ambiental e tendo sido iniciado um processo de discussão pública sobre os mesmos - no âmbito do qual havia já diversas contribuições que não podem, de forma alguma, deixar de ser tidas em consideração -, se inutilizassem todas as diligências e elementos políticos e técnicos até hoje produzidos, designadamente quando vários relatórios e pareceres produzidos por entidades públicas acima de qualquer suspeita, como o Instituto de Estradas de Portugal, o INETI, a CCDRLVT, o Metro de Lisboa, a Carris, o INAG, o IPPAR, a Direcção-Geral do Turismo, levantam questões tão graves e preocupantes.
Pelos possíveis impactos nos túneis do metropolitano de Lisboa, que se desenvolvem na zona do Marquês de Pombal/Fontes Pereira de Melo, designadamente na intersecção entre a Linha Azul e a

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Amarela; pelo aumento de tráfego, por parte do automóvel particular, designadamente na A5 e no Eixo Norte-Sul, em detrimento do uso do transporte colectivo, com as respectivas consequências nefastas em termos ambientais; pelos perigos relativos à segurança rodoviária, no que concerne às acentuadas inclinações previstas para o traçado e, mais concretamente, a uma curva que já é apontada como futuro local de grande sinistralidade; pelas interferências que pode ter a nível das linhas eléctricas de alta, média e baixa tensão; pelos riscos já assinalados no património edificado; pela ausência de uma correcta avaliação dos perigos sísmicos; pela falta de saídas de emergência; pelos escapes de gases; pelas medidas de combate a incêndio e socorro a acidentes, que não estão previstas nem asseguradas, o que é extremamente preocupante, tendo em conta o comprimento previsto para o túnel; pela ausência, enfim, de dados geológicos suficientes, designadamente no que respeita aos impactos na e da rede hídrica subterrânea, para uma correcta avaliação da própria estabilidade e viabilidade da obra; por tudo isto, entendemos que é indispensável que o Governo decida levar até ao fim o estudo de avaliação de impacte ambiental e, por isso, Os Verdes apresentam este projecto de resolução.

Vozes de Os Verdes: - Muito bem!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente (António Filipe): - Inscreveu-se, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Jorge Moreira da Silva. Tem a palavra.

O Sr. Jorge Moreira da Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes, penso que o que está aqui em causa, como se percebe tanto do teor do projecto de resolução quanto da intervenção que acabámos de ouvir, não é uma questão ambiental mas pré-eleitoral.
Não deixa de ser curioso que, na mesma semana em que aqui é apresentado este projecto, idêntica iniciativa tenha sido apresentada na Assembleia Municipal de Lisboa e ainda ontem se tenham iniciado as negociações entre a CDU e o PS, com vista a uma coligação autárquica para as eleições, na autarquia de Lisboa.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Está enganado! A coligação é entre o PCP e o PS!

O Sr. Miguel Anacoreta Correia (CDS-PP): - Estão cheios de esperança!

O Orador: - São coincidências!
No entanto, faz sentido afirmar que a campanha eleitoral não justifica tudo e não admite que, com um tipo de projecto de resolução como o apresentado, se coloque em causa a idoneidade e a competência técnica do Instituto do Ambiente, que é a autoridade nacional para avaliação de impacte ambiental e foi quem propôs à tutela que extinguisse o procedimento, decisão que foi ratificada pela tutela, com a ambição de tornar públicos todos os pareceres que foram recolhidos durante a fase de discussão pública, para aumentar o grau de escrutínio por parte dos cidadãos relativamente à obra.
Em segundo lugar, a campanha eleitoral não justifica que se convoque o alarmismo em torno de eventuais riscos e insegurança, quando, como o Sr. Deputado sabe, ou devia saber, não é pela avaliação de impacte ambiental que se escrutina a segurança das obras públicas mas através de regulamentos aprovados por este Parlamento e pelo governo e ensinados nos bancos das faculdades de Engenharia em Portugal.

Vozes do PSD: - Muito bem! Não sabe para que servem!

O Orador: - Como também não sabe, pelos vistos, que foi assinado um protocolo entre o LNEC, presidido pelo actual Ministro do Ambiente, e a Câmara Municipal de Lisboa, para validar todas as opções construtivas na fase de execução.
Por último, não é aceitável que, por estarmos em fase de quase campanha eleitoral, se desrespeite o poder judicial.
O Supremo Tribunal Administrativo revogou, de forma clara, as medidas cautelares que haviam sido decididas em 1.ª instância, medidas, essas, que obrigavam à avaliação de impacte ambiental.
Portanto, a questão fundamental que se coloca, Sr. Deputado, é a de saber se, a partir de agora, não estamos a criar um precedente que fará desta Assembleia uma câmara de recurso sobre o procedimento de avaliação de impacte ambiental.
Por ano, são decididos mais de 200 processos de avaliação de impacte ambiental: uns têm decisão favorável, outros têm decisão desfavorável, outros são extintos. Pergunto se, a partir de agora, vamos utilizar

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este Parlamento para pôr em causa decisões que são determinadas por razões técnicas, designadamente pelo Instituto do Ambiente.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (António Filipe): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes.

O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Moreira da Silva, agradeço as questões que me colocou.
Devo dizer, antes de mais nada, que não foi o Partido Ecologista "Os Verdes" que trouxe para aqui a campanha eleitoral, foi o Sr. Deputado, com o seu discurso.
O projecto que foi apresentado é sério, visa salvaguardar impactos que esta obra, certamente, vai ter naquela zona e em toda a cidade de Lisboa, pelo que estamos perfeitamente conscientes e tranquilos no que a isto diz respeito. Os senhores é que podem, enfim, ter algum problema ou algum peso na consciência em relação a todo este processo.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Não é algum, é muito! Muito peso!

O Orador: - O Sr. Deputado referiu que é inadmissível atacar o Instituto do Ambiente, mas eu nem sequer referi nada, na minha intervenção, sobre o Instituto do Ambiente. De qualquer forma, como o Sr. Deputado também disse, a responsabilidade última é da tutela.
Por outro lado, gostaria de lembrar que o que está aqui em causa não é uma questão jurídica mas política, porque a entrada desta obra na previsão do n.º 3 do artigo 1.º do diploma do regime jurídico da avaliação de impacte ambiental é uma decisão política.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Ele sabe disso muito bem, está é a disfarçar!

O Orador: - E nós entendemos que uma obra desta dimensão deveria ter sido sujeita a avaliação de impacte ambiental. É só este o "sim" deste projecto de resolução, ou seja, que esta obra seja sujeita a avaliação de impacte ambiental, como desde sempre deveria ter sido.
Agora, por que é que os senhores não promoveram esse estudo… É que, a priori, não é suficiente o acompanhamento da obra, nem é suficiente ver o final. O estudo devia ter sido prévio ao avanço da obra, é para isso que serve o estudo, para avaliar as consequências, os impactos positivos e negativos, e tentar minorar os negativos. Foi isto que não feito e que deveria ter sido!
Quero apenas referir que esta Assembleia não será uma câmara de recurso, como o Sr. Deputado disse, e não penso que isto tenha a ver com a abertura de um precedente, porque, na realidade, aquele procedimento de avaliação de impacte ambiental nunca chegou, efectivamente, ao fim, uma vez que foi extinto antes.

O Sr. Jorge Moreira da Silva (PSD): - Por proposta do Instituto do Ambiente!

O Sr. Presidente (António Filipe): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Maria Carrilho.

O Sr. Manuel Maria Carrilho (PS): - Ex.mo Sr. Presidente, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados: Lisboa é hoje uma cidade à deriva, sem liderança nem projecto. E, quando não há projecto, não pode haver sucesso na resolução dos problemas.

Aplausos do PS.

A discussão da resolução que recomenda o procedimento de avaliação de impacte ambiental do túnel do Marquês ocorre num momento particular da vida da cidade de Lisboa e da sua Câmara Municipal. Trata-se de um momento particularmente grave, tanto pelas suas características como pelas suas consequências.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Bem lembrado!

O Sr. Jaime Soares (PSD): - Gravíssimo!

O Orador: - Pelas suas características, porque os responsáveis máximos da Câmara Municipal de Lisboa se têm envolvido numa disputa que os descredibiliza, desmotivando a administração e desanimando os

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cidadãos.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!

O Orador: - Mas é também um momento grave pelas suas consequências, que são, hoje, a paralisação administrativa, o bloqueio da gestão e a inércia política, de que todos os dias se multiplicam a evidência global e os exemplos concretos.

Aplausos do PS.

Não admira, pois, que o relatório de gestão da Câmara Municipal de Lisboa referente a 2004, que acaba, de resto, de ser publicado, nos deixe perante um conjunto de dados de inquietante significado.
Ficamos a saber, por exemplo, que a Câmara Municipal de Lisboa tem dívidas a fornecedores que atingem, neste momento, os 211 milhões de euros;…

O Sr. Jaime Soares (PSD): - Elas já lá estavam!

O Orador: - … que a execução, quanto a investimentos, caiu 35% e, quanto a actividades, caiu mais de 46%; que a receita global caiu mais de 10% e a despesa subiu mais de 16%.
Trata-se da pior execução orçamental de sempre, quer do plano plurianual de investimentos, quer do plano anual de actividades,…

O Sr. José Junqueiro (PS): - Uma vergonha!

O Orador: - … e trata-se também da maior dívida de sempre a fornecedores.

O Sr. José Junqueiro (PS): - À PSD!

O Orador: - Com este quadro, as afirmações de Carmona Rodrigues, em entrevista ao Diário de Notícias, na passada semana, cruzadas agora com as declarações de Pedro Santana Lopes, no recente Congresso do PSD, dão aos cidadãos de Lisboa e aos portugueses em geral um inverosímil e lamentável retrato do bloqueio a que chegou a Câmara Municipal de Lisboa, uma cidade, repito, sem liderança nem projecto.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O caso do túnel do Marquês de Pombal ilustra bem algumas das principais actuações do PSD, na Câmara Municipal de Lisboa, às mãos da dupla Santana Lopes/Carmona Rodrigues, de que destaco, nomeadamente, o seu carácter caprichoso, a sua marca de irresponsabilidade e a sua permanente deriva.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

Vale a pena sublinhar que este caso do túnel, gerido pela dupla Santana Lopes/Carmona Rodrigues, no vaivém em que transformaram o seu mandato autárquico, já conheceu uma variedade de episódios que passaram por um concurso público anulado, por alterações do caderno de encargos, que apresentava uma nítida desorçamentação, sendo que, posteriormente, foi superior em 5 milhões de euros, pela posterior adjudicação directa da obra, por modificações que não respeitavam o que o Tribunal de Contas havia aprovado, pela desvalorização de várias recomendações da avaliação de impacte ambiental.
Mas, a isso, é preciso acrescentar ainda o desprezo pelas recomendações que - é bom lembrá-lo - apontavam para a implementação de 40 medidas para que o túnel pudesse ser considerado efectivamente seguro, pela anulação posterior, por parte do secretário de Estado do governo anterior, em finais de Janeiro, da necessidade de ser emitida uma avaliação de impacte ambiental.
Os cidadãos de Lisboa continuam, assim, sem qualquer resposta às graves e angustiantes dúvidas que se levantam face à poluição do ar, à intensificação do ruído, aos impactos que o aumento do tráfego desencadeará.
Mas os cidadãos de Lisboa permanecem também sem resposta em relação às questões fundamentais da segurança, às questões hidrogeológicas que a construção do túnel levanta, à questão da sua perigosa proximidade face ao túnel do metropolitano, bem como ao inaceitável grau de inclinação do túnel, que é mais do dobro do aconselhável.

Aplausos do PS.

A pendente chega a atingir, como sabem, cerca de 9,3% e, em certos pontos, cerca de 10%, quando os

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números recomendáveis são entre 3,5% a 5%.
Sr. Presidente, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados: Nestas condições, o Partido Socialista não tem quaisquer dúvidas em votar favoravelmente o texto da resolução agora apresentada.

Aplausos do PS.

Vozes do PSD: - Ah!

O Orador: - É tempo de se respeitarem os pareceres técnicos e de se ouvirem as cada vez maiores preocupações dos cidadãos.
O Partido Socialista votará favoravelmente a resolução agora apresentada, e fá-lo com a esperança de que ela contribua, nas suas consequências, para conter e minorar os danos e perigos que a obra do túnel do Marquês, indiscutivelmente, ainda apresenta. Mas fá-lo também consciente de que este é já o momento de começar a preparar uma alternativa…

Vozes do PSD: - Ah!

O Orador: - … ao lamentável estado a que a gestão da dupla Santana Lopes/Carmona Rodrigues conduziu Lisboa. Uma alternativa que se sustente num novo projecto de cidade, tão solidário como competitivo, tão cosmopolita como competente, que relance a esperança, a ambição e a qualidade de vida da nossa capital.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Eduardo Martins.

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Se fosse ainda preciso provar a justeza e acerto da intervenção de há poucos minutos do Sr. Deputado Jorge Moreira da Silva ela ficava agora demonstrada. De facto, hoje não somos aqui convocados para discutir um projecto de resolução mas, sim, para participar na tentativa do Partido Ecologista "Os Verdes" de conseguir um lugar na primeira fila na Assembleia Municipal de Lisboa, ao lado do Sr. Deputado Manuel Maria Carrilho.

Aplausos do PSD.

Como já perdi a esperança de ver Os Verdes eleitos directamente pelo voto popular e os vejo sempre à procura de uma coligação, francamente, isso não me espanta.
Independentemente disso, temos boas razões para chumbar este projecto de resolução do Partido Ecologista "Os Verdes". Em primeiro lugar, não estamos na Assembleia Municipal de Lisboa, e sendo esta uma matéria com toda a dignidade para aí ser tratada, não é matéria, seguramente, com dignidade para ser tratada por este Parlamento.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Essa é boa!

O Orador: - Se não, pergunto se para a semana falaremos do túnel da Avenida de Ceuta e, depois, do túnel do Rossio, transformando a discussão plenária numa discussão de "toupeiras"!…

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Em segundo lugar, é bom que Os Verdes se habituem - e que todos nós nos habituemos - a não fazer do Parlamento uma caixa de reacção contra as decisões judiciais. É que sobre esta matéria e sobre as decisões de dois ex-Secretários de Estado, um dos quais este vosso humilde interlocutor, correu muita tinta. O Deputado do PS que hoje ocupa as funções de Ministro da Presidência teve ocasião de dizer, a propósito deste tema, que eu teria mentido ao presidente da Câmara Municipal de Lisboa quando lhe disse aquilo que, em Novembro, o Supremo Tribunal Administrativo também veio dizer, ou seja, que por nenhuma das alíneas do Decreto-Lei n.º 69/2000, de 3 de Maio, estava este projecto sujeito a avaliação de impacte ambiental obrigatória.

O Sr. Jaime Soares (PSD): - Tome lá!

O Orador: - No fundo, o que o actual Ministro da Presidência queria que eu fizesse era algo semelhante a isto: cada vez que eu parasse num sinal vermelho, telefonava à polícia a dizer "olhem, acabei de parar

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num sinal vermelho"!…
A lei cumpre-se ao ser executada todos os dias, não é preciso fazer declarações do seu cumprimento.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - E, sobre esta matéria, quer os serviços da Administração Pública (todos eles, Inspecção-Geral do Ambiente, Instituto do Ambiente) quer os tribunais, a quem esta Assembleia não deve nem pode substituir-se, já disseram definitivamente o que há a dizer.
Em terceiro lugar, Os Verdes não têm razão do ponto de vista formal, mas, sobretudo, não têm razão do ponto de vista substancial. E sobre esta matéria há que nos pronunciarmos - agora, sim -, com inteira liberdade, nesta Câmara sobre a utilidade, ou a falta dela, da construção desta obra em Lisboa.
Os Verdes vêm colocar em cima da mesa um alarmismo que nada justifica e que, como bem sublinhou o Sr. Deputado Jorge Moreira da Silva, se resolve pelo conjunto dos instrumentos do licenciamento da obra, que não têm necessariamente que ver com a avaliação de impacte ambiental. Os problemas relativos à segurança, ao ruído, a todas as normas técnicas de construção e à curvatura - tudo isso! - estão a ser acompanhados pelo Laboratório Nacional de Engenharia Civil, que era, até há bem pouco tempo, presidido pelo actual Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional.
Chegados a esta fase, cumpre perguntar ao Sr. Deputado Manuel Maria Carrilho "por que carga de água" precisa o PS, hoje que é Governo, de votar favoravelmente esta resolução de Os Verdes. Então, o Sr. Deputado não tem falado com o Sr. Ministro do Ambiente?!

Aplausos do PSD.

Se esta é uma convicção partilhada por todos os socialistas, então, o Sr. Deputado não precisa de votar favoravelmente este projecto de resolução, basta que o Sr. Ministro do Ambiente decida fazer isto no âmbito do poder discricionário - citado pelo Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes - que lhe confere o artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 69/2000.
Deixe também que lhe pergunte o seguinte, Sr. Deputado Manuel Maria Carrilho: ao fim de todo este tempo de disputa interna para conseguir a "grelha de partida" na candidatura à Câmara Municipal de Lisboa, em que teve sucesso dentro do seu partido depois de muita luta, reconheça-se (mas isso é normal e democrático), o senhor lança a sua candidatura neste momento, na Assembleia da República, a reboque de Os Verdes, falando contra quem não se pode defender, falando do orçamento da Câmara Municipal de Lisboa e do túnel do Marquês?!

Aplausos do PSD.

Se esta é a base da sua campanha, Sr. Deputado Manuel Maria Carrilho, vai ter um Natal amargo!
No que respeita ao túnel do Marquês, Sr. Deputado, há 20 anos que não se mexe nesta zona de Lisboa, e é sobre isso que importa falar agora um bocadinho. Há 20 anos que não se mexe nesta zona de Lisboa, onde hoje entram 60 000 veículos/dia.
O aumento, ou não, da entrada de tráfego em Lisboa não tem que ver com esta questão mas, sim, com muitas outras. Seria, por isso, útil que Os Verdes - isso, sim - viessem discutir…

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - E quantas vezes viemos aqui discutir isso?

O Orador: - … de que forma está este Governo disponível para cumprir o Programa Nacional para as Alterações Climáticas e o conjunto de medidas corajosas aí apontadas, as quais - essas, sim - são capazes de resolver o problema do excesso de veículos em Lisboa.
Na hora de ponta, o número de veículos naquela zona ultrapassa 3500/hora/sentido; os veículos ligeiros são 93% do número de veículos que ali passam.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Com o túnel vão diminuir?!

O Orador: - A verdade é que o plano de mobilidade de Lisboa é essencial para a qualidade de vida da cidade, assentando o mesmo na construção deste túnel e nos seus três pressupostos essenciais: a melhoria global das condições de circulação nesta zona de Lisboa; a execução do plano de urbanização da Avenida da Liberdade e da zona envolvente; e um conjunto articulado de medidas que visa a criação da designada "circular das colinas" para melhorar o trânsito em Lisboa.
Estes são assuntos importantes, mas do candidato do PS à Câmara Municipal de Lisboa não conseguimos ouvir nada. Pode ser que ainda haja outra oportunidade para tal, mas, como alguém disse e muito bem, não há segunda oportunidade para causar uma primeira boa impressão.

Aplausos do PSD.

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O Sr. José Junqueiro (PS): - Que falta de imaginação!

O Sr. Presidente (António Filipe): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Alda Macedo.

A Sr.ª Alda Macedo (BE): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Eduardo Martins, ouvimos com a maior atenção a sua intervenção, sobre a qual gostaria de colocar duas ou três questões.
A primeira dessas questões tem a ver justamente com algo que disse no início da sua intervenção, quando afirmou que esta é uma matéria para ser discutida no âmbito da Assembleia Municipal de Lisboa. Nessa lógica de raciocínio, explique-me, então, por que é que estamos aqui a discutir um despacho emitido não pela Assembleia Municipal de Lisboa mas, sim, por um antigo Secretário de Estado, que se encontra sentado ao seu lado e que é quem hoje tem de se defender.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Bem lembrado!

A Oradora: - Não foi nenhum ausente mas, sim, esse ex-Secretário de Estado que emitiu um despacho que fez parar um processo de estudo de impacte ambiental, matéria que se prende com uma convergência para o desastre entre o governo e Câmara Municipal de Lisboa.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Muito bem!

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): - E Supremo Tribunal Administrativo!

A Oradora: - E é esta convergência para o desastre o que está de facto a ser discutido aqui, hoje.
O Sr. Deputado diz que esta é uma matéria legal, que o problema que aqui se coloca é de fundo legal. Devo dizer-lhe que não se trata de um problema legal. Em nossa opinião, esta é uma matéria que se prende sobretudo com uma questão política central, que tem que ver com a garantia da segurança daqueles que vão estar implicados na obra em curso.
Sr. Deputado José Eduardo Martins, peço-lhe que deixe bem claro quem é que, afinal de contas, está aqui para ser defendido: temos um despacho e temos, depois, um projecto de resolução de revogação desse despacho, dando, no fundo, encaminhamento ao estudo de impacte ambiental.
Relativamente a um ponto sobre o qual o ex-Secretário de Estado Jorge Moreira da Silva, há pouco, interrogava o orador inicial, gostava de dizer que foi o Instituto do Ambiente que produziu um plano com 40 medidas. E foi este plano de 40 medidas que o despacho deste ex-Secretário de Estado acabou por isentar a Câmara Municipal de Lisboa de cumprir. Esta é, portanto, a questão que está a ser discutida.

Vozes do BE: - Muito bem!

O Sr. Presidente (António Filipe): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Eduardo Martins.

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): - Sr. Presidente, antes de mais, e agradecendo desde já as questões que me foram colocadas, gostaria de pedir à Mesa o favor de entregar um exemplar da Constituição da República Portuguesa à Sr.ª Deputada Alda Macedo. É que no dia em que os projectos de resolução revogarem despachos de governos passados, manifestamente, estaremos a inaugurar um campo novo de discussão na Assembleia da República, e uma miríade de iniciativas podem surgir. Infelizmente, não podem, Sr.ª Deputada!
Sr.ª Deputada, se o que estamos a discutir é uma questão jurídica, então, vou entregar na Mesa o despacho do meu colega Jorge Moreira da Silva e a proposta do Instituto do Ambiente que o fundamenta.

O Sr. Jaime Soares (PSD): - Convém ler!

O Orador: - A Sr.ª Deputada, em matéria de legalidade, esqueceu-se de se referir a um detalhezinho essencial: a decisão é do Supremo Tribunal Administrativo!

Vozes do PSD: - Convém ler!

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - Sabe o que isso é?

O Orador: - O Supremo Tribunal Administrativo considerou que o causídico José Sá Fernandes não tinha razão, que não há nenhuma obrigatoriedade de realização de estudo de impacte ambiental.

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Diz a Sr.ª Deputada que a questão não é legal mas, sim, política e que, não havendo uma obrigatoriedade legal de o fazer, o então governo poderia, no uso do seu poder discricionário, ter imposto o estudo de impacte ambiental.
Sabe o que é que acontecia se isso tivesse sido feito? Uma coisa muito simples: um desequilíbrio e uma desigualdade relativamente a outras decisões iguais, tomadas de forma igual no passado. A circular da Pontinha, que tem as mesmas características, não foi sujeita a avaliação de impacte ambiental, tal como a circular de Coimbra e a circular da Maia.
Não podia a Administração Pública, Sr.ª Deputada - e por isso é que se devia pugnar -, tomar, perante situações idênticas, decisões diferentes. Ora, era isso o que teria feito se tivesse sujeito a avaliação de impacte ambiental, como parece que agora o PS quer, a construção do túnel do Marquês.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (António Filipe): - Sr. Deputado, a Assembleia da República teve já oportunidade de facultar um exemplar da Constituição a cada um dos Srs. Deputados, pelo que se presume que seja a mesma do conhecimento de todos e, já agora, também do povo!

Risos.

Aplausos do Deputado do BE Luís Fazenda.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Rebelo.

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): - Sr. Presidente, antes de mais, nesta minha primeira intervenção na nova Legislatura, gostaria de cumprimentar, através de V. Ex.ª, os restantes colegas Deputados de todas as bancadas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A avaliação do impacte ambiental é um instrumento preventivo da política de ambiente e do ordenamento do território. Permite assegurar que as prováveis consequências sobre o ambiente de um determinado projecto de investimento sejam analisadas e tomadas em consideração no seu processo de aprovação.
Fornece, desta forma, ao decisor informação objectiva e clara sobre as implicações ambientais significativas de determinadas acções propostas, devendo também sugerir modificações de acções com vista à eliminação ou minimização dos impactes negativos inevitáveis e à potenciação dos impactes positivos antes de a decisão ser tomada.
As implicações ambientais são, assim, encaradas de uma forma global, contemplando os efeitos físicos, biológicos, socio-económicos e outros, de modo a que a decisão final se baseie numa avaliação sistemática integrada.
O processo de avaliação de impacte ambiental do túnel do Marquês, quer pela importância da obra quer pela óbvia mediatização a que foi sujeito, aparece aos olhos dos lisboetas e dos portugueses envolto no maior tumulto. Várias vezes questões eminentemente técnicas são baralhadas com "manifestações políticas", que em nada contribuem para a resolução do problema.
Farei, em seguida, uma breve análise factual de todas estas questões.
Primeiro: foi considerado, e amplamente explicado por parte do Instituto do Ambiente, com base na legislação sobre avaliação de impacte ambiental, que o projecto do túnel do Marquês não carecia da aplicação dos procedimentos de avaliação do impacte ambiental. Como foi explicado já por outros colegas, tanto o Decreto-Lei n.º 69/2000, que transpõe para o direito português as directivas comunitárias sobre esta matéria, como a própria legislação comunitária não referem nunca a necessidade de realizar este estudo numa obra como a do túnel do Marquês.
O Decreto-Lei n.º 69/2000 estipula objectivamente que a avaliação de impacte ambiental é obrigatória apenas nos casos em que o projecto se localize numa área considerada sensível, quando se trate de um itinerário principal ou itinerário complementar ou quando se trate de uma auto-estrada ou de uma estrada destinada ao tráfego motorizado, com duas faixas de rodagem, com separador e, pelo menos, duas vias, sendo, neste último caso, com mais de 10 km.
Segundo: o Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa, como é também do conhecimento público, deliberou em sentido contrário, levando à total paragem das obras do túnel.
Terceiro: a Câmara Municipal de Lisboa, enquanto recorria desta decisão, apresentou em 30 de Julho de 2004, em cumprimento da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa, junto do Instituto do Ambiente, o estudo de impacte ambiental, provando assim a sua boa fé e clara intenção em concluir uma obra de vital importância para a cidade de Lisboa.
Quarto: este estudo, entregue pela Câmara Municipal de Lisboa, aponta claramente para a importância desta obra, salientando que "(…) as vias localizadas na zona da Praça do Marquês de Pombal, enquanto principais acessos utilizados para entrar em Lisboa, já atingiram os seus limites do ponto de vista rodoviário - cerca de 60 000 viaturas por dia, nos dois sentidos (…)". Salienta também que "(…)

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estas entradas e saídas, nas horas de ponta, se fazem a velocidades inferiores a 10 km/h, com consequentes demoras e problemas ambientais, libertação de gases e de ruído."
Assim, e tal como vem referido no mesmo estudo, o futuro túnel do Marquês contribuirá decisivamente para "uma poupança de 300 000 horas/ano aos utentes da zona" e para "a redução do ruído ambiente na zona do projecto rodoviário, que actualmente atinge valores bastante superiores ao permitido por lei".
Nesta obra, efectuada a análise de risco, verifica-se que "os riscos dominantes estão dentro dos níveis considerados aceitáveis."
Quinto: o Supremo Tribunal Administrativo, por Acórdão de 24 de Novembro de 2004, decidiu de forma inequívoca e peremptória que, no caso em apreço, a lei não obriga à realização de procedimento de avaliação de impacte ambiental, o que levou ao reinício das obras, até então paradas.
Sexto: no seguimento desta decisão do Supremo Tribunal Administrativo, o então Secretário de Estado Adjunto do Ministro do Ambiente e do Ordenamento do Território, em despacho de 29 de Janeiro de 2005, propõe, no seguimento de uma informação do Instituto do Ambiente, a extinção do procedimento de avaliação de impacte ambiental relativo ao projecto do túnel do Marquês. Realça ainda que este sempre foi o entendimento dos serviços do Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território.
O debate que agora estamos a ter, bem como todas as vicissitudes do processo "túnel do Marquês", não pode ser pretexto ou expediente para ocultar a realidade subjacente a toda esta polémica. Existe um executivo camarário, democraticamente eleito, que prometeu e explicou inúmeras vezes o que pretendia com este projecto. Relembro, aliás, que este foi um dos temas centrais da campanha eleitoral das últimas eleições autárquicas no concelho de Lisboa.
O túnel do Marquês foi sempre assumido como uma obra de referência e de importância estratégica, o que é também evidenciado pelas conclusões da avaliação de impacte ambiental hoje conhecidas.
Quando começa uma nova Legislatura, finda que está uma campanha eleitoral onde muitas promessas foram feitas, parece-me essencial sublinhar que cumprir o prometido aos eleitores é motivo de orgulho para qualquer decisor político. Construir o túnel do Marquês é cumprir uma promessa eleitoral. Compreendo que isso cause estranheza à esquerda parlamentar.
A não exigência de uma avaliação de impacte ambiental não é deliberação da Câmara Municipal de Lisboa, é apenas, como agora foi atestado pelo Supremo Tribunal Administrativo, o cumprimento da lei.
Esta situação sui generis leva-me a recordar nesta Câmara todos os túneis construídos em Lisboa na década de 90, ou seja, já com o quadro legislativo de avaliação de impacte ambiental: o túnel da Avenida João XXI (1995/97); o túnel da Avenida da República (1991/93); e o túnel do Campo Grande (1992/93). Todos eles foram construídos sem avaliação de impacte ambiental.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Para concluir a minha intervenção, queria salientar que esta infra-estrutura é uma oportunidade estratégica para a cidade de Lisboa, capaz de contribuir para uma real gestão das acessibilidades e da mobilidade desta cidade.
Como é natural, num projecto desta complexidade existem evoluções naturais e oportunidades de melhoria, e isso aconteceu também relativamente ao acompanhamento deste processo por parte das várias entidades envolvidas. Estou certo de que serão todas levadas em conta.
Destaco também aqui o papel importante não só de todos os movimentos ligados à defesa dos moradores de Lisboa mas também as associações ambientais que têm estas preocupações e que, naturalmente, as colocam.
Nesta fase, retomadas que foram as obras no túnel do Marquês, o CDS-PP apela ao bom senso e razoabilidade de todos. É a melhor forma de resolver este problema e de oferecer aos lisboetas e a todos os que visitam esta cidade, melhores condições e reais respostas a problemas que urge resolver.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (António Filipe): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Alda Macedo.

A Sr.ª Alda Macedo (BE): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A obra do túnel do Marquês tem uma história que se vai tornando um pouco longa e que, de alguma forma, é emblemática de como tudo o que ocorre com a cidade de Lisboa acaba por ter reflexos nacionais significativos.
Aliás, de outra forma, como se explicaria que a discussão que aqui está a ser travada hoje acabasse por suscitar que, de algum modo, o Sr. Deputado Manuel Maria Carrilho nos viesse a antecipar nesta Câmara algum "cheirinho" de um discurso pré-eleitoral? E como, de outra forma, se explicaria também que o antigo Secretário de Estado do Ambiente rejeitasse a ideia de um estudo de impacte ambiental, o que é uma coisa verdadeiramente extraordinária, para já não falar, naturalmente, do incómodo que o PSD sempre sente quando alguma coisa "mexe" com Pedro Santana Lopes?

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Vale a pena retomar um pouco esta história, porque de entre as várias coisa que foram sendo ditas algumas tenderam a alterar um pouco a sequência cronológica dos acontecimentos.

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - Não é verdade!

A Oradora: - De facto, foi mesmo assim! Em 2001, a candidatura de Pedro Santana Lopes à Câmara Municipal de Lisboa apresentava a construção do túnel do Marquês como a sua grande obra de regime. As obras foram iniciadas em 2003 e tiveram de ser interrompidas em 2004, por decisão do Tribunal Administrativo de Lisboa, em resposta à providência cautelar interposta pelo advogado José Sá Fernandes, cuja causa residia na falta de um estudo de impacte ambiental, apesar de ter havido sucessivas recomendações da Assembleia Municipal de Lisboa nesse sentido.
Posteriormente, o Supremo Tribunal Administrativo considera improcedente aquela providência cautelar e dá autorização para a continuação das obras. Só que o estudo de impacte ambiental, entretanto concluído e em fase de discussão pública, tinha já chegado a um plano que indicava 40 fragilidades nesta obra e cuja solução era imperiosa para o projecto, que exigiam, de facto, um plano de minimização de impactos negativos, o que a Câmara Municipal de Lisboa escolheu ignorar, com uma pequena ajuda, já em Janeiro de 2005, do Secretário de Estado Adjunto do Ministro do Ambiente e do Ordenamento do Território de um governo já demissionário, que assinou um despacho que extingue a avaliação ambiental do projecto e obras do túnel do Marquês.
Esta é a história!
Sr.as e Srs. Deputados, viver "no fio da navalha" não é minimamente admissível como forma de organizar a nossa vida colectiva e não é uma opção que seja aceitável quando se trata do funcionamento do Estado.
Portugal não pode ser um país onde se admita o risco de que alguma coisa possa correr bem ou possa correr mal ao sabor dos bons ventos, simplesmente porque a falta de responsabilidade ou a "sede" de mostrar obra feita do executivo camarário conta com o patrocínio de um secretário de Estado de um governo demissionário, presidido pelo mesmo Pedro Santana Lopes que tinha sido o presidente da câmara que lançou a obra. Isto é a chamada "pescadinha de rabo na boca".

O Sr. Presidente (António Filipe): - Sr.ª Deputada, terminou o seu tempo.

A Oradora: - Estou a terminar, Sr. Presidente.
Por estas razões e de acordo com aquilo que é histórico e que aqui foi sendo traçado, entende o Bloco de Esquerda que corrigir o erro cometido é uma obrigação absolutamente imperiosa para todos os que não transigem nem com o populismo político nem com a inobservância de regras de funcionamento de um Estado que se quer certamente empreendedor mas, sobretudo, empenhado em garantir a segurança dos cidadãos e das cidadãs.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (António Filipe): - Sr. Deputado Jorge Moreira da Silva, pede a palavra para que efeito?

O Sr. Jorge Moreira da Silva (PSD): - Sr. Presidente, para, ao abrigo do direito regimental, exercer o direito de defesa da honra.

O Sr. Presidente (António Filipe): - Sr. Deputado, de defesa da honra da bancada ou da sua honra pessoal?

O Sr. O Sr. Jorge Moreira da Silva (PSD): - Da minha honra pessoal, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (António Filipe): - Nesse caso, terei de dar-lhe a palavra no final do debate.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Tiago.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Todo o processo relativo à construção da obra de desnivelamento da Avenida Duarte Pacheco, da Rua Joaquim António de Aguiar e da Avenida Fontes Pereira de Meio, conhecida como o túnel do Marquês, tem sido desenvolvido em circunstâncias problemáticas desde a fase de concurso público. Muitas foram as reviravoltas e os mecanismos de autêntica engenharia orçamental que foram utilizados para levar cabo, ainda que de formas pouco consensuais, a obra em questão.
Esta obra começa por ser alvitrada como um grande passo em frente na resolução de um problema de trânsito e cedo se torna, manifestado num vasto conjunto de opiniões, no próprio problema. Uma obra

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desta envergadura não pode ser desenvolvida com base numa visão estrita e solitária e deve, antes, recolher consensos e opiniões junto de todas as entidades.
Todo o processo tem merecido do Partido Comunista Português, em todas as instâncias, um acompanhamento atento, uma preocupação fundada e uma posição de salvaguarda dos interesses da população de Lisboa. A ideia de que esta obra virá a proporcionar benefícios para a fluidez do tráfego rodoviário não é de todo consensual e são muitas as dúvidas levantadas em torno das questões de segurança rodoviária durante o avanço, concretização e utilização posterior da obra.
A concessão da obra por ajuste directo, como veio a ser adjudicada, sem a execução do desvio das infra-estruturas do subsolo, coloca mais uma dificuldade a resolver no plano orçamental, que surgirá a curto prazo como mais um obstáculo a ultrapassar. Muitas personalidades e entidades têm vindo a levantar o problema da segurança e estabilidade não só no plano rodoviário mas também no da geotecnia, e tem vindo também a ser discutido o impacto desta obra e sua consequente utilização no ambiente, nomeadamente a nível de emissões gasosas e concentração atmosférica de poluentes na área circundante.
Há muito que consideramos que esta obra, como está planificada e como se prevê concretizada, não serve os objectivos a que se propõe. Ora, uma obra desta importância e envergadura orçamental, geográfica e ambiental deve ver aprofundado o estudo do seu impacte em todas as vertentes ao invés de ser acelerada.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O processo de avaliação de impacte ambiental, que seguia dentro da normalidade, é cancelado por decreto de um Secretário de Estado nas semanas que precederam as últimas eleições legislativas. Todo o conjunto de documentos entretanto produzidos ficou, assim, na gaveta, bem como todos os relatórios provenientes desse processo.
Há pouco tempo atrás, uma associação ambientalista, a Quercus, avisou o nosso grupo parlamentar que os relatórios das campanhas de prospecção geotécnica do Laboratório Nacional de Engenharia Civil não estavam a ser disponibilizados como regularmente são e como deveriam ser também neste caso.
Levantam-se muitas questões sobre a própria obra e sobre todo o processo que lhe diz respeito. É exactamente por isso que consideramos que a retoma do processo de avaliação de impacte ambiental poderia esclarecer um conjunto de dúvidas e apontar formas e medidas de mitigação para solucionar os problemas que têm vindo a ser levantados.
Para além dos argumentos legais que enquadram esta obra num projecto que, em função das suas especiais características, dimensão e natureza, é passível de ser alvo de processo de avaliação de impacte ambiental, surgem todas as outras razões decorrentes das dúvidas suscitadas em torno deste projecto, um projecto que, mesmo da parte do anterior governo, não foi tratado com a devida transparência e seriedade, dado que, num acto de legitimação rápida da vontade da Câmara Municipal de Lisboa, extingue o processo de avaliação de impacte ambiental que decorria com normalidade.
A extinção do processo de avaliação de impacte ambiental sugere uma conivência governamental com a insensibilidade e irresponsabilidade da Câmara Municipal de Lisboa, cujo tratamento do processo levanta grandes dúvidas no quadro da desejável transparência e justificação da gestão autárquica.
Desta forma, consideramos de inteira justiça que a Assembleia da República recomende ao Governo a reabertura do processo, como sugerido no projecto de resolução que hoje discutimos.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (António Filipe): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Coelho.

O Sr. Miguel Coelho (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Contrariamente ao que aqui já foi dito, a questão relacionada com o túnel do Marquês e com a sua avaliação de impacte ambiental não é um problema da cidade de Lisboa exclusivamente, é uma questão de foro nacional. Tudo aquilo que tenha a ver com a qualidade de vida ambiental, com a segurança das pessoas e com as políticas de mobilidade nas áreas metropolitanas são assuntos nobres que carecem de discussão neste Parlamento, porque têm a ver com o modelo que pretendemos também para a gestão das nossas áreas metropolitanas.
Mas sendo uma questão nacional, naturalmente é um problema da cidade de Lisboa e, mais do que isso, é um problema do PSD, porque é a maior das trapalhadas que jamais foi feita nesta cidade. Usando uma linguagem talvez desportiva, fazer este túnel era como marcar um penalty numa baliza sem guarda-redes. Era só construí-lo, mesmo estando nós contra, porque, sendo uma obra que não carecia de aprovação na Assembleia Municipal, bastava fazer as coisas bem feitas para que Lisboa não tivesse mergulhado nesta enorme trapalhada que a todos está a prejudicar.
Portanto, Sr.as e Srs. Deputados, este assunto merece reflexão e, evidentemente, o nosso debate.

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Depois das inúmeras recusas, depois de todos os pormenores e de todos os passos já aqui detalhados na brilhante intervenção do meu camarada, Prof. Manuel Maria Carrilho, a verdade é que, a determinado momento, a Câmara Municipal de Lisboa encomendou um estudo de impacte ambiental, que sugeriu 40 medidas para que o túnel pudesse ser considerado aceitável do ponto de vista da segurança, do ponto de vista dos impactes ambientais. Algumas dessas medidas estavam mesmo baseadas na sustentação de que alguns dos estudos hidrogeológicos eram considerados insuficientes pelos próprios autores do estudo de impacte ambiental, autores esses que foram contratados pelo Sr. Presidente da Câmara e pelo Sr. Prof. Carmona Rodrigues, que são insuspeitos. Repito, os estudos eram considerados insuficientes e poderiam pôr em causa a própria segurança do túnel do metropolitano.
Portanto, há aqui uma questão muito elementar: por que é que o governo do PSD/CDS-PP e por que é que o Dr. Santana Lopes tiveram medo de esperar pela avaliação do impacte ambiental? Por que é que, à pressa, a quatro ou cinco dias das eleições legislativas, num governo já demissionário, num governo já de gestão, se tomou uma decisão que veio provocar um atraso? Se não tivessem tomado essa decisão já tinha saído a avaliação de impacte ambiental! Por que é que tiveram medo do resultado final? Esta é a questão fundamental a ser aqui colocada.
Muito naturalmente, Sr.as e Srs. Deputados, com a segurança das pessoas não se deve brincar, com a segurança dos utentes do metropolitano de Lisboa não se deve brincar, com a segurança dos possíveis utilizadores do túnel rodoviário do Marquês, se ele vier a ser construído, não se deve brincar!

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - Pois não!

O Orador: - Portanto, Sr.as e Srs. Deputados, deveria ter-se esperado pela avaliação de impacte ambiental. Em minha opinião, se não tivessem tomado a iniciativa de tornar desnecessária essa avaliação, ela já estaria feita e já se saberia se esse túnel poderia ou não ser construído.
Muito naturalmente, o Partido Socialista tem as mesmas posições quando está na oposição ou quando suporta o Governo. Por isso, não podemos deixar de aprovar o projecto de resolução n.º 6/X, de Os Verdes, solicitando ao Governo, que é do PS, que proceda à avaliação de impacte ambiental, tal como ontem fizemos na Assembleia Municipal de Lisboa, onde apresentámos uma moção nesse mesmo sentido.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma segunda intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes.

O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os Verdes apresentaram o presente projecto de resolução convencidos da absoluta necessidade de que o processo de avaliação de impacte ambiental chegue ao fim e dele se retirem as devidas ilações. Não se trata aqui de desrespeitar o poder judicial, concretamente a decisão do Supremo Tribunal Administrativo, que diz respeito a um caso muito concreto de uma providência cautelar - e relembro que o processo principal continua a correr nos tribunais. Não tem nada a ver com isso, é uma questão política, como já disse e reafirmo, nem tem nada a ver com o usurpar o poder local.
Gostaria igualmente de relembrar que Lisboa também é País. Aliás, não há parcela alguma do nosso território que não pertença a uma freguesia ou a um concelho e não é por causa disso que os problemas que dizem respeito a essa freguesia, a esse concelho, a essa região, devem deixar de ser tratados aqui, nesta Casa, sempre e quando os Deputados assim o entenderem.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Muito bem!

O Orador: - Também rejeitamos profundamente as acusações de que Os Verdes não trazem a esta Assembleia, quando o têm feito com tanta frequência, os problemas de tráfego de todo o País e não só da cidade de Lisboa (mas, neste caso, da cidade de Lisboa), e está por demonstrar que é com o aumento de vias ou com o aumento da entrada de automóveis particulares em Lisboa que se resolvem os problemas de mobilidade ou que se melhora o ambiente urbano. Esse melhora-se investindo nos transportes colectivos públicos.
Por isso, Os Verdes estão tranquilos na apresentação deste projecto de resolução e esperam que venha a ser aprovado.

Vozes de Os Verdes: - Muito bem!

O Sr. Presidente (António Filipe): - Tem, agora, a palavra, para defesa da sua honra pessoal, na sequência da intervenção da Sr.ª Deputada Alda Macedo, o Sr. Deputado Jorge Moreira da Silva.

O Sr. Jorge Moreira da Silva (PSD): - Sr. Presidente, cada um tem a sua cartilha, o seu quadro de

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valores e a sua chave de leitura. No entanto, penso que não vale tudo, Sr.ª Deputada Alda Macedo.
A Sr.ª Deputada afirmou, de uma forma clara - não foi uma insinuação -, que a decisão que tomei não radicou em nenhuma avaliação técnica mas, única e exclusivamente, no facto de o Dr. Pedro Santana Lopes ter sido Presidente da Câmara de Lisboa e ser, na altura, Primeiro-Ministro.

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - É muito grave!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Uma vergonha!

O Orador: - Nesse sentido, pergunto-lhe se confirma que, no exercício dos poderes que me foram atribuídos e confirmados pelo Sr. Presidente da República, tomei actos ilegítimos do ponto de vista ético. É que, se o fizer, não é nesta Câmara que a questão se resolve.

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - Se o confirmar!

O Orador: - Se não o confirmar, agradecia que esclarecesse, porque, desde o início até ao fim da sua intervenção, não fez mais nada senão um processo de intenção.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Ora, processos de intenção não são aceitáveis nesta Assembleia da República.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

E, se os fizer, está a fazê-los também a toda a estrutura do Instituto do Ambiente, designadamente à directora do gabinete jurídico, que me propôs que extinguisse o procedimento de avaliação de impacte ambiental, ao Presidente do Instituto do Ambiente, que me pediu que extinguisse o procedimento de avaliação de impacte ambiental, e ao Supremo Tribunal Administrativo. Aliás, Sr. Presidente, pedia que distribuísse à Sr.ª Deputada uma cópia do Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (António Filipe): - Para dar explicações, se assim o entender, tem a palavra a Sr.ª Deputada Alda Macedo.

A Sr.ª Alda Macedo (BE): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Moreira da Silva, a apreciação que fiz não é, de todo, uma apreciação ética nem sobre a sua pessoa nem sobre a qualidade do seu carácter ou de qualquer outra pessoa.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Ah!

A Oradora: - Fiz uma apreciação política de um acto praticado por um secretário de Estado de um governo de gestão, como compete a um Deputado da República, sem que a sua honra pessoal seja minimamente beliscada por isso.
O que estamos aqui a discutir, Sr. Deputado, é a segurança das pessoas e a importância de o fazer dá um sentido significativo àquilo que é este debate, porque o que é importante é garantir que se faça aquilo que é certo, para cumprir o que um relevante conjunto de organismos do próprio aparelho do Estado indicaram como recomendações de segurança. Desde a empresa Metropolitano de Lisboa até ao Instituto das Estradas de Portugal, passando pelo Instituto Nacional de Engenharia, Tecnologia e Inovação e pela Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional, todas estas instituições proferiram recomendações, em relação à obra do túnel do Marquês, que apontam insuficiências no projecto que está em desenvolvimento e também para a premência de uma avaliação de impacte ambiental no sentido de assegurar que, do ponto de vista geomorfológico, de hidrologia, de sismologia e das repercussões ao nível do tráfego e da poluição, sejam acauteladas todas as situações de risco.
O Sr. Deputado convirá que o que faz falta é garantir que não haja margem de risco, para que não venhamos, um dia, a "chorar sobre o leite derramado".

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (António Filipe): - Srs. Deputados, concluída a apreciação do projecto de resolução n.º 6/X, vamos entrar no período regimental de votações.
Antes de mais, vamos proceder à verificação do quórum, utilizando o cartão electrónico.

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Pausa.

Srs. Deputados, o quadro electrónico regista 187 presenças, pelo que temos quórum para proceder às votações.
Vamos começar pelo voto n.º 3/X - De congratulação pelo desempenho da atleta Naide Gomes no Campeonato da Europa de Atletismo em Pista Coberta, apresentado pelo PSD.
Para proceder à respectiva leitura, tem a palavra o Sr. Deputado Melchior Moreira.

O Sr. Melchior Moreira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Naide Gomes, nascida em São Tomé, é uma referência no atletismo nacional.
Naide Gomes começou a praticar a modalidade com 13 anos, um ano após ter chegado a Portugal. Encontrou no desporto escolar um grande incentivo para desenvolver a sua aptidão natural para a actividade física. No início da sua carreira, passou por clubes como o Clamo, em 1994, o Ginásio Clube do Sul, em 1995, o Belenenses, em 1996, o Joma, em1997, até se fixar no Sporting Clube de Portugal, em 1998, sob a orientação técnica de Abreu Matos.
Desenvolveu a sua versatilidade, treinou o saltou em altura, o salto em comprimento, o lançamento do peso, decidida a apostar tudo no atletismo. O seu talento viria a ser unanimemente reconhecido.
Participou nos Jogos Olímpicos de Sydney, em 2000, na prova de 100 m barreiras. Em 2002, conquistou a medalha de prata no pentatlo, durante o Campeonato da Europa em Pista Coberta, em Viena. Sagrou-se campeã mundial da modalidade em 2004, no Campeonato do Mundo, em Budapeste. Nos Jogos Olímpicos de Atenas alcançou o 13.º lugar no heptatlo.
Foi com orgulho acrescido que os portugueses assistiram ao magnífico desempenho da atleta no Campeonato da Europa de Atletismo em Pista Coberta, em Madrid. Naide Gomes conquistou a medalha de ouro e o título de campeã europeia no salto em comprimento, coroando de êxito toda uma carreira de esforço e dedicação.
Os episódios burlescos, que chegaram a colocar em causa esta brilhante vitória, foram, felizmente, solucionados, permitindo a Portugal desfrutar, uma vez mais, de um momento de regozijo colectivo que enaltece o trabalho de grande qualidade desenvolvido pela atleta, pelo seu treinador e pelos responsáveis da Federação Portuguesa de Atletismo.
O Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata congratula-se vivamente com mais este feito e reitera os votos de felicitações, esperando que esta conquista de Naide Gomes tenha sido apenas mais uma etapa no brilhante caminho trilhado pela atleta portuguesa na sua ímpar carreira desportiva.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente (António Filipe): - Sr. Deputado, a Mesa condescendeu com uma confusão da sua parte. É que tinha-lhe concedido a palavra para proceder à leitura do voto e não, propriamente, para uma intervenção.
Pergunto, pois, aos Srs. Deputados se dispensam a leitura do voto, na medida em que ele foi distribuído.

Pausa.

Sendo dispensada a leitura do voto, podemos passar à sua votação.
Srs. Deputados, vamos votar o voto n.º 3/X - De congratulação pelo desempenho da atleta Naide Gomes no Campeonato da Europa de Atletismo em Pista Coberta (PSD).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

É o seguinte:

Voto n.º 3/X
De congratulação pelo desempenho da atleta Naide Gomes no Campeonato da Europa de Atletismo em Pista Coberta

Foi com natural orgulho que os portugueses assistiram ao magnífico desempenho da atleta Naide Gomes no Campeonato da Europa de Atletismo em Pista Coberta que decorreu no passado fim-de-semana em Madrid.
O extraordinário concurso do salto em comprimento feminino protagonizado pela nossa atleta, coroado com a conquista do título de campeã europeia e respectiva medalha de ouro, reforça o seu lugar na galeria dos grandes campeões que têm honrado o atletismo e o desporto nacionais.
Os episódios burlescos que chegaram a colocar em causa uma brilhante vitória de Naide Gomes foram,

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felizmente, solucionados, permitindo a Portugal desfrutar, uma vez mais, de um momento de regozijo colectivo que enaltece o trabalho de grande qualidade desenvolvido pela atleta, pelo seu treinador e pelos responsáveis da Federação Portuguesa de Atletismo.
A Assembleia da República congratula-se vivamente com mais este feito e reitera os votos de felicitações, esperando que esta conquista de Naide Gomes tenha sido apenas mais uma etapa no brilhante caminho trilhado pela atleta portuguesa na sua ímpar carreira desportiva.

O Sr. Presidente (António Filipe): - Srs. Deputados, segue-se a votação do projecto de resolução n.º 3/X - Aumento intercalar do salário mínimo nacional (PCP).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PCP, do BE e de Os Verdes.

Vamos proceder à votação do projecto de resolução n.º 6/X - Recomenda o procedimento de avaliação de impacte ambiental do túnel do Marquês (Os Verdes).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PCP, do BE, de Os Verdes e de dois Deputados do PSD e votos contra do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (António Filipe): - O Sr. Deputado Jorge Moreira da Silva pede a palavra para que efeito?

O Sr. Jorge Moreira da Silva (PSD): - Sr. Presidente, é para anunciar que, juntamente com o Sr. Deputado José Eduardo Martins, apresentarei na Mesa uma declaração de voto por escrito.

O Sr. Presidente (António Filipe): - O Sr. Deputado Pedro Simão José pede a palavra para que efeito?

O Sr. Pedro Quartin Graça (PSD): - Presidente, é também para anunciar que, juntamente com o Sr. Deputado Luís Marques, farei entrega na Mesa de uma declaração de voto por escrito.

O Sr. Presidente (António Filipe): - Fica registada a apresentação das declarações de voto.
Srs. Deputados, passamos, por fim, à votação do projecto de resolução n.º 15/X - Viagem do Presidente da República à Finlândia (Presidente da AR).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, chegámos ao fim dos nossos trabalhos de hoje.
A próxima reunião plenária terá lugar amanhã, pelas 10 horas, e será inteiramente preenchida com perguntas ao Governo.
Nada mais havendo a tratar, está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 20 minutos.

Declarações de voto enviadas à Mesa para publicação relativas à votação do projecto de resolução n.º 6/X

Percebe-se que existe uma claríssima intenção eleitoralista na base deste projecto de resolução apresentado por Os Verdes. É tanto mais óbvio quando, também nesta semana, foi apresentado uma proposta idêntica na Assembleia Municipal de Lisboa e foram iniciadas as negociações PS-CDU com vista a uma coligação eleitoral autárquica em Lisboa.
Ora, a proximidade da campanha eleitoral autárquica não é justificação suficiente para tudo.
Não é justificação suficiente para que se coloquem em causa a idoneidade e a competência técnica da autoridade nacional para a avaliação do impacte ambiental - o Instituto do Ambiente (IA) -, esquecendo que todas as decisões da tutela do Ministério do Ambiente - no XV como no XVI Governos Constitucionais - foram tomadas tendo por base o parecer do IA.
Não é justificação suficiente para que se promova o alarmismo em torno de eventuais riscos de insegurança, esquecendo que não é em sede de avaliação de impacte ambiental que se escrutina a segurança das instalações e obras públicas mas antes no cumprimento dos regulamentos e normas aprovados e ensinados nas faculdades de engenharia e que estão a ser respeitados pela Câmara Municipal de Lisboa (CML), bem como que todas as propostas construtivas dos serviços da CML relativamente às fundações na zona do Marquês e à passagem do túnel nas imediações do metropolitano estão a ser alvo de validação por parte do Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC), com o qual foi assinado um protocolo de acompanhamento da obra. E, por fim, não é justificação suficiente para que se desrespeite o poder judicial que decidiu de modo peremptório, por

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sentença do Supremo Tribunal de Justiça.
Vale a pena esclarecer, face às omissões e ao menor rigor do projecto de resolução, que relativamente à obrigatoriedade de realização da avaliação de impacte ambiental e à decisão de extinção do procedimento dessa avaliação sempre foi entendimento dos serviços do Ministério do Ambiente que, no caso em apreço, não era legalmente exigida a avaliação de impacto ambiental uma vez que a obra não se inscrevia em nenhuma das situações tipificadas nos anexos I e II do Decreto-Lei n.º 69/2000.
O procedimento de avaliação de impacto ambiental só foi iniciado em Agosto de 2004 em cumprimento da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa (TAFL), proferida no âmbito de uma providência cautelar, que determinou a suspensão das obras e a obrigatoriedade de sujeição da obra a prévia avaliação de impacto ambiental.
Ora, por acórdão de 24 de Novembro de 2004, o Supremo Tribunal Administrativo (STA) revogou aquela decisão, assumindo, de forma inequívoca e peremptória, que, no caso em apreço, a lei não obriga à realização de procedimento de avaliação de impacte ambiental, indeferindo as providências cautelares requeridas, permitindo que a CML reiniciasse de imediato as obras.
Com base nesta decisão do STA, o Instituto do Ambiente propôs à tutela, através da Informação n.º 53/04/GJUR, de 15-12-2004, a extinção do procedimento de avaliação de impacto ambiental relativo ao projecto do túnel do Marquês, uma vez que, por um lado, aquele apenas foi iniciado por decisão judicial, a qual foi revogada, e, por outro, porque o facto de as obras estarem já a ser executadas (na sequência do decidido no supra referido acórdão do STA) tornaria inútil a emissão posterior de uma declaração de impacte ambiental que a lei nem sequer exige.
Ainda que concordando com a proposta formulada pelo IA de extinção do procedimento de avaliação de impacto ambiental, o membro da tutela entendeu, no entanto, que a população, em geral, e o promotor, em particular, deveriam beneficiar da informação solicitada e produzida no âmbito da fase de discussão pública. Assim, foi extinto o procedimento de avaliação de impacto ambiental - como proposto pelo IA -, mas foi igualmente determinado pelo membro do Governo que fosse tornado público e remetido à Câmara Municipal de Lisboa, para os efeitos que esta tenha por convenientes, o relatório da consulta pública entretanto realizada, assim como todos os pareceres e relatórios técnicos solicitados e já produzidos. Fariam, pois, melhor Os Verdes se questionassem o município de Lisboa quanto à integração no projecto e na execução da obra de elementos que permitam ultrapassar as dúvidas levantadas nos pareceres tornados públicos.
Sobre a importância do túnel do Marquês, o estudo de impacte ambiental entregue pela CML, e que obteve uma declaração de conformidade por parte da Comissão composta pelo IA, pelo Instituto Português de Arqueologia (IPA), pelo Instituto Português do Património Arquitectónico (IPPAR), pela Comissão de Coordenação e Desenvolvimento da Região de Lisboa e Vale do Tejo (CCDR-LVT) e pelo Instituto da Água (INAG), aponta para a elevada importância da obra atendendo a que: "Se tem verificado que o conjunto de vias localizadas na zona da praça Marquês de Pombal, enquanto principais acessos utilizados para entrar em Lisboa, já atingiu os seus limites do ponto de vista rodoviário - cerca de 60 000 viaturas por dia, nos dois sentidos, o utilizam para entrada e saída da cidade durante a semana. Frequentemente, estas entradas e saídas, nas horas de ponta, fazem-se a velocidades inferiores a 10 Km/h, com consequentes demoras e problemas ambientais - libertação de gases e ruído".
O túnel contribuirá, refere o Estudo, para: "Uma poupança de 300.000 h/ano aos utentes da zona" dado que haverá lugar a "um aumento da velocidade média nos períodos de ponta e à consequente redução do tempo de congestionamento na rua Joaquim António de Aguiar, na Praça Marquês de Pombal, na avenida Fontes Pereira de Melo e na avenida António Augusto Aguiar; a redução do ruído ambiente na zona envolvente do projecto rodoviário; a melhoria geral da qualidade do ar, exceptuando o caso dos óxidos de azoto; a indução de impactes socio-económicos positivos, designadamente ao nível dos benefícios salariais (1,8 milhões de euros/ano) e do produto interno bruto (7,3 milhões de euros/ano), derivados dos ganhos de tempo obtidos com a implantação do túnel".
Sobre a alegada insegurança e impactes da obra, existe legislação específica - regulamento e leis - relativa a empreitadas de obras públicas e à construção de vias de comunicação terrestres e instalações de apoio que enquadram e determinam as modalidades de construção que nesta como em todas as obras é obrigatório verificar.
Para minimizar os efeitos da obra existe um Programa de Gestão Ambiental que assegura as medidas de minimização de impactes durante a fase de obra.
Foi efectuada uma análise de risco onde se verificou que os riscos dominantes estão dentro dos níveis considerados aceitáveis, e, para a fase da construção tem havido lugar - com base num protocolo específico celebrado entre a CML e o LNEC - à validação das propostas construtivas pelos serviços da CML e pelo LNEC quanto às fundações na zona do Marquês e à passagem do túnel nas proximidades do metropolitano no início da avenida Fontes Pereira de Melo.
O declive no arruamento, sendo elevado, é inferior ao actualmente existente na rua Joaquim António Aguiar e, mais importante, a transição de declives é mais suave e o raio de curvatura mais longo do que os existentes em variadíssimas vias e túneis construídos em Lisboa durante a gestão do PS.
Fazem, assim, mal aqueles que, com o apoio a esta resolução, criam um precedente que pode transformar

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este Parlamento numa instância de recurso relativa às centenas de procedimentos de avaliação de impacto ambiental decididos anualmente pelo Ministério do Ambiente.

Os Deputados do PSD, Jorge Moreira da Silva - José Eduardo Martins.

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Desde a década de 80 que aqueles que hoje estão reunidos à volta do projecto político consubstanciado pelo MPT-Partido da Terra desenvolvem a sua actividade política, entre outros aspectos igualmente relevantes para a vida da sociedade portuguesa, em torno de uma nova ideia de cidade, em que esta seja, na realidade, devolvida aos cidadãos.
O MPT-Partido da Terra deu o exemplo de participação cívica dos munícipes nos assuntos da urbe ao liderar o debate acerca de obras públicas como o túnel da Praça do Comércio e o elevador do Castelo de S. Jorge, projectos estes que enfermavam de vários problemas de carácter técnico e jurídico, com nefastas consequências para a baixa pombalina da cidade de Lisboa e para os alfacinhas em geral.
Então, como hoje, defendemos a necessidade da existência de um amplo debate público com a população de Lisboa sobre os projectos que lhe eram propostos pelos governos e executivos municipais.
No caso concreto do tristemente famoso elevador do Castelo, essa luta levou mesmo ao abandono, por parte da Câmara Municipal de Lisboa, do projecto proposto.
Trazem, nesta ocasião, os Srs. Deputados Heloísa Apolónia e Francisco Madeira Lopes ao Plenário da Assembleia da República um projecto de resolução acerca do reinício do processo de avaliação de impacte ambiental do designado túnel do Marquês, o qual, recorde-se, foi extinto em 29 de Janeiro do corrente ano por despacho governamental.
Curiosamente, recorde-se, a coligação de que fazem parte os referidos Srs. Deputados e o partido que ambos representam, não trouxe à Assembleia da República, noutras ocasiões, quaisquer projectos de resolução para que procedesse à avaliação do impacte ambiental das referidas obras municipais promovidas pela Câmara Municipal de Lisboa ou pelo governo, apesar de ser a referida coligação eleitoral PS-CDU que sustentava, à época, o executivo que se encontrava à frente do município de Lisboa.
Inversamente, e no caso presente, o MPT solicitou, desde o início, que fosse aberto um período de discussão pública sobre a construção do túnel do Marquês e que se procedesse à avaliação do seu impacte ambiental.
E isto porque, desde sempre considerámos essencial a participação dos cidadãos na análise de projectos com implicações no ambiente, da forma como está prevista e regulamentada pelo Decreto-Lei n.º 69/2000, diploma este que transpôs para o direito nacional as Directivas Comunitárias 85/337/CEE e 97/11/CE.
Daqui se conclui que o projecto de resolução ora apresentado por Os Verdes apenas agora foi apresentado por estritas razões de oportunismo político e eleitoral, não traduzindo minimamente uma real vontade dos seus subscritores em debater o impacte ambiental do túnel em causa.
Pese embora este lamentável facto, o que está em causa nesta resolução é, não os pressupostos políticos dos autores, mas a parte deliberativa da resolução a ser enviada ao Governo, se for aprovada pelo Parlamento.
E, nesta matéria, na medida em que os Deputados representantes do MPT na Assembleia da República, de acordo com a plataforma de incidência política e eleitoral celebrada com o Partido Social Democrata, concordam com o reinício do estudo de impacte ambiental do túnel do Marquês, votaram assim, na consonância lógica do que tem sido, no passado e no presente, a sua posição publicamente conhecida nesta matéria, favoravelmente o referido projecto de resolução.

Os Deputados do PSD, Pedro Quartin Graça - Luís Carloto Marques.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Partido Socialista (PS):
António Manuel de Carvalho Ferreira Vitorino
Guilherme Valdemar Pereira de Oliveira Martins
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos

Partido Social Democrata (PSD):
António Paulo Martins Pereira Coelho
Arménio dos Santos
José de Almeida Cesário
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva

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Nuno Albuquerque Morais Sarmento
Nuno Maria de Figueiredo Cabral da Câmara Pereira
Partido Comunista Português (PCP):
Maria Odete dos Santos

Partido Popular (CDS-PP):
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia

Srs. Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:

Partido Socialista (PS):
Maria Jesuína Carrilho Bernardo

Partido Social Democrata (PSD):
Carlos Alberto Silva Gonçalves
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
Melchior Ribeiro Pereira Moreira

Partido Comunista Português (PCP):
Abílio Miguel Joaquim Dias Fernandes

Partido Popular (CDS-PP):
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Partido Socialista (PS):
Luís Garcia Braga da Cruz

Partido Social Democrata (PSD):
Gonçalo Nuno Mendonça Perestrelo dos Santos
José Luís Fazenda Arnaut Duarte
Manuel Joaquim Dias Loureiro

Partido Popular (CDS-PP):
António de Magalhães Pires de Lima

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL

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