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Sexta-feira, 17 de Junho de 2005 I Série - Número 31

X LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2005-2006)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 16 DE JUNHO DE 2005

Presidente: Ex.mo Sr. Jaime José Matos da Gama

Secretários: Ex. mos Srs. Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Fernando Santos Pereira
Artur Jorge da Silva Machado
Abel Lima Baptista

S U M Á R I O


O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 10 minutos.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta da entrada na Mesa de requerimentos e da resposta a alguns outros, da proposta de lei n.º 15/X, da proposta de resolução n.º 4/X, dos projectos de lei n.os 110 a 116/X, dos projectos de resolução n.os 40 e 42 a 46/X, do projecto de deliberação n.º 4/X e do relatório da Comissão de Trabalho e Segurança Social informando da caducidade do processo relativo à apreciação parlamentar n.º 1/X na sequência da discussão e votação ocorrida na especialidade.
A Câmara foi informada da renúncia ao mandato de Deputado apresentada pelo Sr. Deputado Fernando Gomes (PS).
Foram lidas as actas da eleição de três membros para a Comissão Consultiva do Instituto do Ambiente e de um outro para a Comissão Nacional de Protecção de Dados, tendo sido proclamados eleitos, respectivamente, os candidatos João Paulo Tavares de Almeida Fernandes (PS), Ricardo Jorge Olímpio Martins (PSD) e António Fernando Rebelo Moreira (PS) e ainda, como suplente, José Norberto Rocha Januário (PSD), e o candidato Fernando José da Costa Salgado.
Em declaração política, o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP) trouxe à colação os incidentes ocorridos nas praias de Carcavelos e de Quarteira durante o fim-de-semana, após o que respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Ricardo Rodrigues (PS), Ana Drago (BE), António Filipe (PCP) e António Montalvão Machado (PSD).
Também em declaração política, a Sr.ª Deputada Alda Macedo (BE) teceu considerações sobre as recentes medidas aprovadas pelo Ministério da Educação. Depois deu resposta ao pedido de esclarecimento da Sr.ª Deputada Cristina Granada (PS).
Igualmente em declaração política, o Sr. Deputado Pedro Duarte (PSD) fez um balanço dos primeiros 100 dias de governo do Partido Socialista e respondeu aos pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados José Junqueiro (PS) e João Pinho de Almeida (CDS-PP).
Ainda em declaração política, o Sr. Deputado Miguel Ginestal (PS), referindo-se à reforma da tributação do património, com a criação do imposto municipal sobre as transmissões e do imposto municipal sobre imóveis, criticou a má aplicação desta reforma no que se refere aos imóveis, em Viseu. Respondeu, depois, ao pedido de esclarecimento do Sr. Deputado Almeida Henriques (PSD).

Ordem do dia. - Foram aprovados o projecto de resolução n.º 40/X - Viagem do Presidente da República ao Luxemburgo (Presidente da AR), o projecto de resolução n.º 42/X - Viagem do Presidente da República às Repúblicas do Paraguai e do Chile (Presidente da AR), o projecto de deliberação n.º 4/X - Prorrogação do período normal de funcionamento da Assembleia da República (Presidente da AR) e o projecto de resolução n.º 44/X - Constituição da Comissão Permanente (Presidente da AR).

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A Câmara procedeu à discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 14/X - Altera o Código do IVA, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 394-B/94, de 26 de Dezembro, e legislação complementar, procedendo ao aumento da taxa normal deste imposto. Usaram da palavra, além do Sr. Ministro de Estado e das Finanças, os Srs. Deputados Honório Novo (PCP), João Teixeira Lopes (BE), Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP), Victor Baptista (PS), Álvaro Castello-Branco (CDS-PP), Aldemira Pinho (PS), que fez a apresentação do relatório da Comissão de Orçamento e Finanças, José de Aguiar Branco (PSD), António Gameiro (PS), Honório Novo (PCP) e Heloísa Apolónia (Os Verdes). No final, a proposta de lei foi aprovada na generalidade, na especialidade e em votação final global com um aditamento ao artigo 3.º apresentado pelo PS, tendo ainda sido aprovado um requerimento daquele partido solicitando a dispensa de redacção final daquele diploma.
Foi aprovado o voto n.º 12/X - De pesar pelo falecimento do General Vasco Gonçalves (PCP), tendo usado da palavra os Srs. Deputados Luís Marques Guedes (PSD), Luís Fazenda (BE), Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP), Agostinho Lopes (PCP), Marques Júnior (PS) e Heloísa Apolónia (Os Verdes) e o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Augusto Santos Silva).
De seguida, a Câmara aprovou o voto n.º 11/X - De pesar pelo falecimento do poeta Eugénio de Andrade (Presidente da AR), tendo-se pronunciado os Srs. Deputados José Amaral Lopes (PSD), João Teixeira Lopes (BE), Honório Novo (PCP), Teresa Caeiro (CDS-PP), Teresa Portugal (PS) e Heloísa Apolónia (Os Verdes) e o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.
Foi, ainda, aprovado o voto n.º 13/X - De pesar pelo falecimento do Dr. Álvaro Cunhal (PCP), sobre o qual se pronunciaram, além dos Srs. Deputados Miguel Macedo (PSD), Francisco Louçã (BE), Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP), Alberto Martins (PS) e Heloísa Apolónia (Os Verdes) e do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa (PCP) e o Sr. Presidente.
No fim, a Câmara guardou 1 minuto de silêncio em homenagem aos três concidadãos falecidos.
Foi aprovado o projecto de resolução n.º 41/X - Programa de Estabilidade e Crescimento 2005-2009 (PS) e foram rejeitados os projectos de resolução n.os 43/X (BE), 45/X (PSD) e 46/X (PCP) sobre o mesmo tema.
Em votação final global, mereceu aprovação o texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos Económicos, Inovação e Desenvolvimento Regional, referente à proposta de lei n.º 5/X - Cria o SIFIDE - Sistema de Incentivos Fiscais em Investigação e Desenvolvimento Empresarial.
Foram aprovados pareceres da Comissão de Ética, autorizando dois Deputados do PS a prestarem depoimento por escrito e um Deputado do PSD a suspender o mandato para ser ouvido em tribunal.
A Câmara aprovou, ainda, um parecer da Comissão de Ética relativo à assunção de mandato de uma Deputada do PS e à substituição de um Deputado do PS.
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 35 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 10 minutos.

Srs. Deputados presentes à sessão:

Partido Socialista (PS):
Agostinho Moreira Gonçalves
Alberto Arons Braga de Carvalho
Alberto de Sousa Martins
Alberto Marques Antunes
Aldemira Maria Cabanita do Nascimento Bispo Pinho
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Ana Maria Ribeiro Gomes do Couto
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António José Ceia da Silva
António José Martins Seguro
António Ribeiro Gameiro
Armando França Rodrigues Alves
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Carlos Alberto David dos Santos Lopes
Carlos Cardoso Lage
Cláudia Isabel Patrício do Couto Vieira
Deolinda Isabel da Costa Coutinho
Elísio da Costa Amorim
Fernanda Maria Pereira Asseiceira
Fernando dos Santos Cabral
Glória Maria da Silva Araújo
Guilherme Valdemar Pereira de Oliveira Martins
Horácio André Antunes
Isabel Maria Batalha Vigia Polaco de Almeida
Isabel Maria Pinto Nunes Jorge
Jacinto Serrão de Freitas
Jaime José Matos da Gama
João Cândido da Rocha Bernardo
João Miguel de Melo Santos Taborda Serrano
João Raul Henriques Sousa Moura Portugal
Joaquim Augusto Nunes Pina Moura
Joaquim Barbosa Ferreira Couto
Joaquim Ventura Leite
Jorge Manuel Capela Gonçalves Fão
Jorge Manuel Monteiro de Almeida
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José Apolinário Nunes Portada
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Carlos das Dores Zorrinho
José Eduardo Vera Cruz Jardim
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
Jovita de Fátima Romano Ladeira
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Lúcio Maia Ferreira
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís António Pita Ameixa
Luís Garcia Braga da Cruz
Luís Manuel de Carvalho Carito
Luís Miguel Morgado Laranjeiro
Luísa Maria Neves Salgueiro
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Manuel Alegre de Melo Duarte
Manuel António Gonçalves Mota da Silva

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Manuel Luís Gomes Vaz
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Marcos da Cunha e Lorena Perestrello de Vasconcellos
Marcos Sá Rodrigues
Maria Antónia Moreno Areias de Almeida Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Cidália Bastos Faustino
Maria Cristina Vicente Pires Granada
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria de Fátima Oliveira Pimenta
Maria de Lurdes Ruivo
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Maria Helena da Silva Ferreira Rodrigues
Maria Helena Terra de Oliveira Ferreira Dinis
Maria Hortense Nunes Martins
Maria Isabel Coelho Santos
Maria José Guerra Gamboa Campos
Maria Júlia Gomes Henriques Caré
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Maria Odete da Conceição João
Maria Teresa Alegre de Melo Duarte Portugal
Maria Teresa Filipe de Moraes Sarmento Diniz
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Miguel João Pisoeiro de Freitas
Nelson Madeira Baltazar
Nuno André Araújo dos Santos Reis e Sá
Nuno Mário da Fonseca Oliveira Antão
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Barros Teixeira Santos
Paula Cristina Nobre de Deus
Pedro Manuel Farmhouse Simões Alberto
Pedro Nuno de Oliveira Santos
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Renato Luís Pereira Leal
Ricardo Manuel de Amaral Rodrigues
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui António Ferreira da Cunha
Sandra Marisa dos Santos Martins Catarino Costa
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Sónia Isabel Fernandes Sanfona Cruz Mendes
Susana de Fátima Carvalho Amador
Teresa Maria Neto Venda
Victor Manuel Bento Baptista
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vítor Manuel Pinheiro Pereira
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho

Partido Social Democrata (PSD):
Adão José Fonseca Silva
Agostinho Correia Branquinho
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Joaquim Almeida Henriques
Arménio dos Santos
Carlos Alberto Garcia Poço
Carlos Alberto Pinto
Carlos Jorge Martins Pereira
Carlos Manuel de Andrade Miranda
Domingos Duarte Lima

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Emídio Guerreiro
Feliciano José Barreiras Duarte
Fernando dos Santos Antunes
Fernando Mimoso Negrão
Fernando Santos Pereira
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Henrique José Praia da Rocha de Freitas
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves
Hugo José Teixeira Velosa
Jaime Carlos Marta Soares
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Joaquim Virgílio Leite Almeida Costa
Jorge Fernando Magalhães da Costa
Jorge José Varanda Pereira
Jorge Manuel Lopes Moreira da Silva
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado
José António Freire Antunes
José de Almeida Cesário
José Eduardo Rego Mendes Martins
José Manuel Amaral Lopes
José Manuel de Matos Correia
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro
José Manuel Marques de Matos Rosa
José Pedro Correia de Aguiar Branco
José Raúl Guerreiro Mendes dos Santos
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Filipe Carloto Marques
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Luís Miguel Pais Antunes
Manuel Filipe Correia de Jesus
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Mário da Silva Coutinho Albuquerque
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Miguel Jorge Pignatelli de Ataíde Queiroz
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Nuno Maria de Figueiredo Cabral da Câmara Pereira
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Pedro Quartin Graça Simão José
Ricardo Jorge Olímpio Martins
Sérgio André da Costa Vieira
Vasco Manuel Henriques Cunha
Zita Maria de Seabra Roseiro

Partido Comunista Português (PCP):
Abílio Miguel Joaquim Dias Fernandes
Agostinho Nuno de Azevedo Ferreira Lopes
António Filipe Gaião Rodrigues
Artur Jorge da Silva Machado
Bernardino José Torrão Soares
José Batista Mestre Soeiro
José Honório Faria Gonçalves Novo
Maria Luísa Raimundo Mesquita

Partido Popular (CDS-PP):
Abel Lima Baptista
Álvaro António Magalhães Ferrão de Castello-Branco
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
João Rodrigo Pinho de Almeida
José Miguel Nunes Anacoreta Correia
José Paulo Ferreira Areia de Carvalho

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Luís Pedro Russo da Mota Soares
Nuno Miguel Miranda de Magalhães
Teresa Margarida Figueiredo Vasconcelos Caeiro

Bloco de Esquerda (BE):
Alda Maria Gonçalves Pereira Macedo
Ana Isabel Drago Lobato
Fernando José Mendes Rosas
Francisco Anacleto Louçã
Helena Maria Moura Pinto
João Miguel Trancoso Vaz Teixeira Lopes
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda
Mariana Rosa Aiveca Ferreira

Partido Ecologista "Os Verdes" (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a Sr.ª Secretária vai proceder à leitura do expediente.

A Sr.ª Secretária (Rosa Maria Albernaz): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, foram apresentados na Mesa diversos requerimentos.
Na reunião plenária de 18 de Maio - ao Ministério da Educação, formulado pelo Sr. Deputado José Luís Carneiro; ao Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social, formulados pelos Srs. Deputados Agostinho Gonçalves e Agostinho Lopes; aos Ministérios da Defesa Nacional, do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional e da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior e à Câmara Municipal de Lisboa, formulados pelos Srs. Deputados António Filipe e José Soeiro; e ao Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, formulados pelo Sr. Deputado Armando Alves.
Na reunião plenária de 19 e no dia 20 de Maio - ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, à Secretaria de Estado das Obras Públicas e das Comunicações e à Direcção de Estradas do Distrito de Coimbra, formulados pelos Srs. Deputados Horácio Antunes e Honório Novo; ao Governo, formulado pelo Sr. Deputado Mota Amaral; aos Ministérios das Finanças, do Trabalho e da Solidariedade Social e dos Negócios Estrangeiros, formulados pelos Srs. Deputados Carlos Pinto, Pedro Mota Soares e Luís Fazenda; aos Ministérios da Saúde, da Economia e da Inovação e da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, formulados pelo Sr. Deputado José Soeiro; e ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, formulado pela Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.
No dia 23 de Maio - ao Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social, formulado pelo Sr. Deputado Jorge Machado; e ao Ministério da Cultura, formulado pela Sr.ª Deputada Mariana Aiveca.
Nos dias 20 e 24 e nas reuniões plenárias de 25 e 27 de Maio - aos Ministérios das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, da Administração Interna, à Secretaria de Estado das Obras Públicas e das Comunicações e à Direcção de Estradas do Distrito de Coimbra, formulados pelos Srs. Deputados Horácio Antunes, Jaime Soares, Francisco Lopes, Fernando Santos Pereira e Jorge Machado; aos Ministérios do Trabalho e da Solidariedade Social e dos Negócios Estrangeiros, formulados pelos Srs. Deputados Helena Pinto e Carlos Alberto Gonçalves; aos Ministérios da Educação e da Saúde, formulados pelos Srs. Deputados João Pinho de Almeida e Miguel Tiago; aos Ministérios das Finanças, da Cultura, da Economia e da Inovação, da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior e do Trabalho e da Solidariedade Social e à Câmara Municipal de Gondomar, formulados pelos Srs. Deputados Miguel Ginestal e Honório Novo; ao Governo, formulado pelo Sr. Deputado Mota Amaral; a diversos ministérios, formulados pelos Srs. Deputados Agostinho Lopes e José Soeiro; e aos Ministérios da Educação, do Trabalho e da Solidariedade Social, das Finanças e dos Negócios Estrangeiros, formulados pela Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.
Na reunião plenária de 27 e no dia 30 de Maio - ao Ministério da Saúde, formulados pelos Srs. Deputados Teresa Venda, Abílio Fernandes e José Soeiro; aos Ministérios dos Negócios Estrangeiros, do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional, da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas e da Cultura e à Câmara Municipal de Famalicão, formulados pelo Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes; aos Ministérios das Finanças, do Trabalho e da Solidariedade Social, da Economia e da Inovação e da Educação, formulados pelos Srs. Deputados António Filipe e Agostinho Lopes; e aos Ministérios das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, do Trabalho e da Solidariedade Social e do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional, formulados pelos Srs. Deputados Jorge Machado, Alda Macedo e João Teixeira Lopes.

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No dia 30 de Maio - ao Ministério da Justiça, formulado pelo Sr. Deputado Agostinho Lopes; aos Ministérios da Saúde e das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, formulados pelo Sr. Deputado José Soeiro.
Na reunião plenária de 1 de Junho - ao Ministério da Economia e da Inovação, formulado pelo Sr. Deputado Mário Albuquerque; aos Ministérios do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional, da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas e das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, formulados pelos Srs. Deputados José Eduardo Martins, José Soeiro e Álvaro Castello-Branco; e aos Ministérios das Finanças e da Administração Interna, formulados pelos Srs. Deputados Miguel Tiago e Nuno Magalhães.
No dia 31 de Maio e na reunião plenária de 2 de Junho - aos Ministérios do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional e do Trabalho e da Solidariedade Social, formulado pelo Sr. Deputado Marcos Sá; e aos Ministérios do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional, da Economia e da Inovação e da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas e à Câmara Municipal de Amares, formulados pelo Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes.
Nas reuniões plenárias de 2 e 3 de Junho - aos Ministérios dos Negócios Estrangeiros e da Administração Interna, formulado pelo Sr. Deputado José Cesário; ao Ministério da Defesa Nacional, formulados pelos Srs. Deputados Henrique Rocha de Freitas e António Filipe; aos Ministérios da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, da Educação e do Trabalho e da Solidariedade Social, formulados pelos Srs. Deputados Agostinho Lopes, João Teixeira Lopes e Adão Silva; aos Ministérios da Economia e da Inovação, do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional e dos Negócios Estrangeiros, formulados pelos Srs. Deputados Bernardino Soares, Jovita Ladeira, Emídio Guerreiro e Alda Macedo; ao Governo e aos Ministérios das Finanças, da Economia e da Inovação, das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, da Administração Interna, da Saúde e do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional, formulados pelos Srs. Deputados José Soeiro e Mota Amaral; aos Ministérios das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, do Trabalho e da Solidariedade Social, e aos Caminhos-de-Ferro Portugueses, E.P., formulados pelo Sr. Deputado Abel Baptista; à Secretaria de Estado do Desporto, formulado pelo Sr. Deputado Nuno Sá; e ao Ministro da Presidência e aos Ministérios das Finanças e da Administração Interna e à Câmara Municipal de Lisboa, formulados pelo Sr. Deputado Fernando Rosas.
Na reunião plenária de 3 e no dia 6 de Junho - ao Sr. Primeiro-Ministro e ao Ministério do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional, formulados pela Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia; e aos Ministérios do Trabalho e da Solidariedade Social e do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional, formulados pelo Sr. Deputado Agostinho Lopes.
Nos dias 6 e 7 de Junho - ao Ministério do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional, formulado pelo Sr. Deputado Jacinto Serrão; aos Ministérios da Administração Interna e da Saúde, formulados pelo Sr. Deputado Nuno Magalhães; ao Ministério da Cultura e ao Ministro dos Assuntos Parlamentares, formulados pelo Sr. Deputado João Teixeira Lopes; e ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, formulado pela Sr.ª Deputada Susana Amador.
Na reunião plenária de 18 de Junho - ao Ministério do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional e às Câmaras Municipais de Monção, Melgaço e Valença, formulados pelos Srs. Deputados José Eduardo Martins e Jorge Moreira da Silva; aos Ministérios da Saúde, da Administração Interna e do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional, formulados pelos Srs. Deputados Abílio Dias Fernandes e Abel Lima Baptista; ao Sr. Primeiro-Ministro, formulado pelo Sr. Deputado Agostinho Lopes; aos Ministérios das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, da Defesa Nacional, do Trabalho e da Solidariedade Social, da Administração Interna e à Secretaria de Estado do Desporto, formulados pelos Srs. Deputados António Filipe e Honório Novo; aos Ministérios dos Negócios Estrangeiros, da Educação e da Cultura, formulados pela Sr.ª Deputada Luísa Mesquita; aos Ministérios das Finanças, da Justiça, da Saúde e da Educação, formulados pelos Srs. Deputados Miguel Anacoreta Correia e Teresa Caeiro; e ao Governo, formulado pelo Sr. Deputado Agostinho Gonçalves.
Foi também recebida resposta a requerimentos apresentados por vários Srs. Deputados.
No dia 20 de Maio - Luísa Mesquita, Miguel Tiago e José Apolinário.
No dia 23 de Maio - Paulo Batista Santos, José Soeiro, José Apolinário, Teresa Caeiro, Luísa Mesquita e Helena Pinto.
No dia 24 de Maio - Paulo Batista Santos.
No dia 25 de Maio - Horácio Antunes e António Filipe.
No dia 1 de Junho - Bernardino Soares, Luísa Mesquita, Paula Nobre de Deus e Agostinho Lopes, e João Teixeira Lopes e José Soeiro.
No dia 6 de Junho - Jorge Machado, José Soeiro, António Filipe e Odete Santos.
No dia 7 de Junho - Francisco Madeira Lopes e António Galamba.
No dia 8 de Junho - Luísa Mesquita, José Soeiro, Fernando Santos Pereira, Honório Novo, Miranda Calha, Fernando Rosas, Agostinho Lopes e João Teixeira Lopes.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: proposta de lei n.º 15/X - Altera o Decreto-Lei n.º 62/2005, de 11 de Março, que transpõe para a

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ordem jurídica interna a Directiva n.º 2003/48/CE, do Conselho, de 3 de Junho de 2003, relativa à tributação dos rendimentos da poupança sob a forma de juros, que baixou à 5.ª Comissão; proposta de resolução n.º 4/X - Aprova, para ratificação, o Tratado de Amizade, Boa Vizinhança e Cooperação entre a República Portuguesa e a República Democrática e Popular da Argélia, assinado em Argel, em 8 de Janeiro de 2005, que baixou à 2.ª Comissão; projectos de lei n.os 110/X - Altera a Lei n.º 170/99, de 18 de Setembro, que adopta medidas de combate à propagação de doenças infecto-contagiosas em meio prisional (Os Verdes), que baixou à 10.ª Comissão, 111/X - Aplicação efectiva dos suplementos, compensações e outras regalias de risco, penosidade e insalubridade (PCP), que baixou à 11.ª Comissão, 112/X - Criação da universidade de Viseu (PCP), que baixou à 8.ª Comissão, 113/X - Aprova o sistema nacional de certificação energética e de qualidade do ar interior dos edifícios e as respectivas normas técnicas (PSD), que baixou à 7.ª Comissão, 114/X - Define o número máximo de alunos por turma no ensino não superior (BE), que baixou à 8.ª Comissão, 115/X - Define um sistema nacional de coadjuvação docente especializada nos estabelecimentos públicos do 1.º ciclo do ensino básico (BE), que baixou à 8.ª Comissão, e 116/X - Gestão das intervenções operacionais regionais do continente (IV Quadro Comunitário de Apoio e intervenções estruturais comunitárias) (PCP), que baixou à 6.ª Comissão; projectos de resolução n.os 40/X - Viagem do Presidente da República ao Luxemburgo (Presidente da AR), 42/X - Viagem do Presidente da República às Repúblicas do Paraguai e do Chile (Presidente da AR), 43/X - Programa de Estabilidade e Crescimento 2005-2009 (BE), 44/X - Constituição da Comissão Permanente (Presidente da AR), 45/X - Programa de Estabilidade e Crescimento 2005-2009 (PSD) e 46/X - Sobre o Programa de Crescimento para o período 2005-2009; e o projecto de deliberação n.º 4/X - Prorrogação do período normal de funcionamento da Assembleia da República (Presidente da AR).
Deu também entrada na Mesa o relatório da Comissão de Trabalho e Segurança Social relativo à discussão e votação, na especialidade, da apreciação parlamentar n.º 1/X (Decreto-Lei n.º 77/2005, de 13 de Abril, que estabelece o regime jurídico de protecção social na maternidade, paternidade e adopção no âmbito do subsistema previdencial de segurança social face ao regime preconizado na legislação de trabalho vigente). Vai este relatório no sentido de considerar caduco o referido processo de apreciação parlamentar, devendo o Plenário ser informado e ser remetida para publicação em Diário da República a respectiva declaração, nos termos regimentais aplicáveis.
Foi ainda recebida na Mesa, dirigida ao Sr. Presidente da Assembleia da República, uma carta do Sr. Deputado Fernando Gomes renunciando ao mandato de Deputado.
Por último, quero dar notícia à Câmara dos resultados das eleições efectuadas no dia 9 de Junho.
Relativamente à eleição de três membros para a Comissão Consultiva do Instituto do Ambiente, verificou-se o seguinte resultado: votaram 153 Srs. Deputados, tendo-se registado 128 votos "sim", 23 votos brancos e 2 votos nulos. Face aos resultados obtidos, foram eleitos os candidatos João Paulo Tavares de Almeida Fernandes (PS), Ricardo Jorge Olímpio Martins (PSD) e António Fernando Rebelo Moreira (PS). Como suplente, foi eleito o candidato José Norberto Rocha Januário (PSD).
No que concerne à eleição de um membro para a Comissão Nacional de Protecção de Dados, verificou-se o seguinte resultado: votaram 153 Srs. Deputados, tendo-se registado 112 votos "sim", 37 votos brancos e 4 votos nulos. Foi eleito o candidato Fernando José da Costa Salgado.
Em matéria de expediente é tudo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos agora passar às declarações políticas.
Para o efeito, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Dia 10 de Junho, Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades. Surpreendido, incrédulo, um País de brandos costumes não queria acreditar no que via: numa visão "terceiro-mundista", 500 delinquentes, numa iniciativa criminosa organizada, invadiram uma praia de Carcavelos, agrediram veraneantes e turistas e assaltaram pessoas. No dia seguinte, demonstrando o sentimento da maior impunidade, nova acção foi tentada nas praias da Quarteira.
As imagens correram o mundo e o dano causado ao País só muito dificilmente pode ser quantificado.
Da autarquia de Cascais e do Ministro da Administração Interna verificámos uma reacção que no imediato saudámos e, nos esforços anunciados, ficámos com a expectativa óbvia de alguns sucessos.
Já do Secretário de Estado do Turismo ouvimos o que neste momento, nestas circunstâncias, pelo que deste fenómeno já se conhece e pelo que está em causa, nunca poderíamos ouvir. Do Sr. Secretário de Estado do Turismo ouvimos dizer que se tratou de "casos isolados".

O Sr. Álvaro Castello-Branco (CDS-PP): - Uma vergonha!

O Orador: - Na verdade, se há realidade que não é nova é a da delinquência grupal, dos gangs, muitas vezes juvenil, sobretudo nascida nos grandes centros urbanos, sendo que aqui não podemos esquecer que a grande esmagadora maioria da população portuguesa vive precisamente nos grandes centros urbanos.

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Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - E, apesar de uma diminuição deste tipo de criminalidade ocorrida a partir de 2002, a verdade é que a mesma cresceu já 460 % nos últimos sete anos - nos transportes públicos, quase todas as semanas, em centros comerciais, junto às escolas e também nas praias. Por isso, se há coisa que a este propósito nunca se poderia fazer era a desvalorização do ocorrido, o "fazer de conta", a desculpa de ser um "facto isolado".

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Como se esta realidade não bastasse, a verdade é que a mesma vem sendo acompanhada por outra igualmente grave e que até a potencia: é que, em Portugal, infelizmente, é a própria autoridade do Estado que vem sendo posta em causa ano após ano, muitas vezes até neste Parlamento.
Dominado por um discurso que faz doutrina na esquerda chique, o tratamento público destas questões quase sempre inverte a ordem das prioridades.
Numa acção policial, qualquer excesso é razão de insistentes notícias e de muitas críticas.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - É verdade!

O Orador: - De resto, não há excesso policial que, de algumas bancadas, não mereça logo e imediatamente pronta reacção parlamentar, num ou noutro caso justificada. Só que quando o excesso vem do outro lado, quando seja justificado por quem viola a lei, por quem causa alarde social, nessa mesma "esquerda chique" o silêncio é quase sempre a regra.

Aplausos do CDS-PP.

E isso não se percebe! Como não se percebe que algumas acções criminosas, mesmo como as descritas, mereçam, em primeiro lugar, a desculpa complacente e só depois a censura, que, como regra, nunca poderia deixar de ser a primeira e desde logo veemente.
Neste mesmo caso do "arrastão" de Carcavelos, por exemplo, o aspecto principal de uma notícia televisiva era - veja-se bem! - não o acto criminoso mas o facto de, alegadamente, uma bastonada ter sido infligida a uma pessoa que não era delinquente, ou seja, valorado negativamente em primeiro lugar não foi o crime, não foi o acto hediondo de uma turba organizada, foi, isso sim, a bastonada do polícia em alguém que não era delinquente.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - E nem sequer a mais do que previsível tensão dos agentes nestas circunstâncias, ou seu reduzido número face aos criminosos, justificou melhor compreensão para o acto.
Só que, sejamos claros, mesmo a quem tem tão estranha visão do mundo há que explicar alguns limites muito elementares. E de entre tais limites um há que é a base de tudo: de um lado, estão os que nos defendem, os que combatem as perturbações da ordem pública, os que estão do lado das populações, que são os polícias, os agentes das forças de segurança; do outro lado, estão os que não cumprem a lei, os que nos causam dano, os que afectam a ordem pública e aterrorizam tantas vezes as populações - e esses são os bandidos, são os criminosos, são os delinquentes!

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - O Sr. Le Pen não diria melhor!...

O Orador: - E até podemos contemporizar com todos os discursos justificativos, com todas as explicações de natureza sociológica, integrativa, étnica ou quaisquer outras. Mas não nos confundamos sobre quem deve ser censurado nos seus actos e louvado nos seus esforços, porque, de outra forma, é a autoridade do próprio Estado que estamos a pôr todos os dias em causa, a pôr em causa, obviamente, até ao dia em que seja tarde de mais!
Neste assunto não permitiremos sequer que alguma extrema esquerda sempre derive na discussão destes casos concretos para apreciações raciais, de protecção de minorias, como se de cada vez que falamos de crimes cometidos por quaisquer etnias estivéssemos a pô-las em causa.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Temos o Sr. Le Pen entre nós...! Este é o discurso do Sr. Le Pen!

O Orador: - A este propósito, de resto, Ferreira Fernandes escreveu, muito recentemente, um comentário no Correio da Manhã que não resisto a citar: "Os polícias são o lado bom. Os bandidos o mau.

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Perante a extensão dos estragos, deve cometer-se a pequena injustiça de tratar aqueles bandidos só como casos de polícia. Eu sei que eles também são vítimas (como Al Capone o foi, filho de imigrante pobre). Mas não há tempo a perder. Gente capaz de fazer tão mal aos seus mais próximos - não se importando de sujar a maioria dos negros portugueses, com um labéu que eles, trabalhadores, não merecem -, gente que escolhe atacar a praia dos que nem posses têm para ir para as praias da outra banda, só pode ter um tratamento de choque. Com polícia. E esta - é um mínimo - tem de ter a certeza de que a sociedade a respeita." Obviamente à polícia!!
Se há coisa que não podemos admitir - Sr. Deputado João Teixeira Lopes, a quem vejo tão incomodado... - é que a autoridade do Estado seja debilitada, que nessa debilidade a acção das forças de segurança perca eficácia e que, depois de tudo, quando as coisas falham, a desculpa vá exactamente para quem prevarica.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Esse é o discurso do Sr. Le Pen!

O Orador: - Todos os dias assistimos, e cada vez mais, a casos de insultos, de agressões e até de mortes de agentes das forças de segurança.
Jorge Paulo Ferreira, Francisco Tavares Santo, João Manuel Melo, Óscar dos Santos Fragueiro, Augusto Joaquim Domingues, João José da Silva, Artur Barbosa, Felisberto Silva, António Carlos Abrantes, Paulo Jorge Alves, Irineu Dias, António Rodrigues e Caleiro Lopes são apenas alguns dos nomes dos agentes de todas as raças que, mais recentemente, morreram na luta pela defesa das nossas liberdades.

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Raças?...

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Não há "raças". Só há uma raça: a raça humana.

O Orador: - Agentes que, no combate à criminalidade, cada vez mais deparam com o comércio crescente de armas ilegais, com delinquentes melhor armados, com locais controlados por bandidos onde já não se pode entrar, com uma soberania do próprio País que, desta forma, é posta em causa.
É nossa obrigação, é obrigação de todos, inverter este estado de coisas. No discurso, mas também nos actos, no louvor pelo esforço de tão poucos em favor de tantos mais e no apoio material e organizativo às forças de segurança, a começar pela Assembleia da República.
O CDS-PP tem sido sempre claro sobre o lado em que está nesta luta pelas nossas liberdades. E se saudamos o facto de o Ministro da Administração Interna ter anunciado a possibilidade da instalação de câmaras de videovigilância, móveis e fixas, em algumas praias problemáticas do nosso país, lembramos que isso só foi possível graças a um projecto de lei que o CDS-PP agendou para discussão potestativa e que foi aprovado, o projecto de lei n.º 464/IX, que deu lugar à actual Lei n.º 1/2005, precisamente a lei que trata da questão da videovigilância.
Mas lembramos mais, lembramos que actos criminosos como o ocorrido em Carcavelos transcendem as próprias consequências imediatas para a segurança dos cidadãos. Neste caso concreto é também um sector fundamental e decisivo para o desenvolvimento estratégico de Portugal que é comprometido. Refiro-me, obviamente, ao sector do Turismo, que representa 10% do produto interno bruto do País e que, se afectado, porá em causa a sobrevivência de milhares de famílias portugueses.
Se há questão que prejudica o turismo em Portugal ou em qualquer país do mundo é a da segurança e a verdade, por muito que nos custe, é que as imagens do"arrastão" de Carcavelos correram mundo: no Brasil, nos Estados Unidos, em Inglaterra, em França, na Holanda, na Bélgica, na Austrália, na Alemanha, para dar alguns exemplos, estiveram em todas as principais estações televisivas e nos jornais de referência.
Houve mesmo um operador turístico que, em entrevista recente ao Jornal de Notícias disse: "Isto foi o pior que podia acontecer depois da crise económica. Portugal vai ser equiparado ao Brasil em termos de segurança, o que poderá ter graves repercussões no turismo."
Reservas houve de muitos turistas que foram já canceladas.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, queira concluir, por favor.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
Se nada for feito, e prontamente, pelo Governo deste país, o destino fica traçado.
Quando, em Outubro de 1992, foi registado o primeiro "arrastão" em Copacabana, o primeiro comentário público ali feito equivaleu ao proferido pelo nosso Secretário de Estado do Turismo: "foi um acto isolado".
Só que, decorridos estes anos, o fenómeno no Brasil é incontrolável e, hoje, as autoridades já assumem que não tem qualquer resolução possível.

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Saibam as autoridades portuguesas e o Governo ver neste exemplo de insucesso do combate à criminalidade grupal o primeiro estímulo para fazer melhor, para combater o problema nas suas causas e nos seus efeitos, com autoridade e com determinação.
Termino, Sr. Presidente, dizendo que o CDS-PP quer dar sobre esta matéria o seu contributo na Assembleia da República, como já deu na questão da lei que regula a videovigilância.
Reconhecemos a importância de iniciativas como o Programa Escolhas, de prevenção da criminalidade e de inserção dos jovens dos bairros mais vulneráveis dos distritos de Lisboa, Porto e Setúbal, mas verificamos que isto não chega. De resto, a circunstância de as pessoas que praticaram este acto concreto em Carcavelos serem oriundas, exactamente, das áreas que são objecto deste programa é a melhor demonstração de que ele, só por si, não tem resolvido coisa alguma, como normalmente este tipo de criminalidade também o indicia.
É preciso fazer mais e como o CDS-PP quer dar o seu contributo anunciamos já que iremos apresentar um projecto de resolução que sugerirá não só medidas de combate à exclusão mas também outras, no campo de crianças e jovens em risco, da segurança interna e da coordenação das forças e serviços de segurança.
Teremos também iniciativa legislativa em matéria penal. A questão da idade para efeitos da inimputabilidade será discutida nesta Assembleia, mais uma vez por nossa iniciativa.

Aplausos do CDS-PP.

E no final que sejamos todos capazes de reconhecer, como temos a certeza que o seremos no CDS-PP, que, no exercício dos nossos mandatos, o nosso esforço valeu a pena!

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Ricardo Rodrigues.

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo, da sua intervenção resultou clara a intenção própria de trazer para esta Casa e para o País o alarme que os portugueses não precisam.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Ou seja, V. Ex.ª, em vez de assumir uma posição de Estado - o seu partido é considerado por muitos como "da área do poder" -, rapidamente deixou o poder e passou para as franjas do antipoder.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Quero deixar algumas perguntas ao Sr. Deputado, mas antes, se me permite, gostaria de fazer algumas considerações sobre a sua intervenção.
Em primeiro a lugar, foi da sua bancada, que deixou o poder há pouco tempo, que saiu o anterior ministro do Turismo e se calhar o Sr. Deputado, antes de ter feito a sua intervenção, devia ter-lhe perguntado se era melhor para o País trazer aqui o alarme ou a segurança.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Não lê os jornais?!… É extraordinário!...

O Orador: - O Sr. Deputado criticou o Secretário de Estado do Turismo por ter considerado aquele evento perfeitamente ocasional. Então, no seu entender o Sr. Secretário de Estado devia dizer que estavam em causa todas as praias do País, que o turismo estava em causa? Essa é que é a visão do CDS-PP para o País? É essa a vossa a visão do desenvolvimento?

Aplausos do PS.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - É melhor enterrar a cabeça na areia e nada dizer?!

O Orador: - Depois, o Sr. Deputado inculca a ideia de que, em três meses, o País deixou o oásis da segurança e passou para o da insegurança. O Sr. Deputado, apesar de, pelos vistos, ter passado muito tempo a ver televisão este fim-de-semana,…

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - E o senhor não viu?!…

O Orador: - … não teve oportunidade de ouvir as perguntas feitas a alguns turistas, os quais responderam que se sentem perfeitamente seguros em Portugal, quer no Estoril quer em qualquer outro local. Foram os próprios turistas a afirmá-lo, comparando até o nosso país com os seus próprios países! E o Sr.

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Deputado, que é português e devia zelar pelos interesses de Portugal, está, no fundo, a zelas pelos interesses daqueles que não defendem o seu desenvolvimento.

Aplausos do PS.

Finalmente, Sr. Deputado, não lhe fica bem socorrer-se de argumentos populistas para trazer a esta Casa um assunto que é sério. Como sabe, o Governo socialista teve a firmeza - e fê-lo através do Ministro da Administração Interna - de reunir com o Presidente da Câmara Municipal de Cascais e com as forças de segurança, no sentido de a segurança ficar assegurada não só no concelho de Cascais mas em todos os concelhos. Portanto, o que nos desagradou na sua intervenção foi o alarmismo, porque, para nós, ele não se justifica.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago.

A Sr.ª Ana Drago (BE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo: As palavras são para ser utilizadas e a intervenção que o Sr. Deputado fez nesta Câmara é ao jeito e na tradição da direita populista, xenófoba e preconceituosa.

Aplausos do BE.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Xenófoba?!… Essa agora!…

A Oradora: - Nada de novo no CDS-PP, nada a que o CDS-PP não nos tenha habituado durante estes últimos anos. Só faltou, Sr. Deputado, apoiar explicitamente a manifestação de extrema-direita que vai ser feita em Portugal a propósito do "arrastão".

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - É uma vergonha!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Tudo isso é ridículo!

A Oradora: - Envergonha esta Câmara e envergonha o Estado de direito.
Mais: a sua intervenção foi baseada na intenção de provocar o pânico no país. Aliás, o senhor adulterou dados que hoje foram esclarecidos pela polícia. Não foram 500 assaltantes, foram menos. A situação é preocupante, mas não chegaram à centena,...

O Sr. Álvaro Castello-Branco (CDS-PP): - Ah!. Então já estamos mais descansados!

A Oradora: - ... quanto muito, foram algumas dezenas.
Aliás, foi apresentada uma única queixa na Polícia de Segurança Pública de Carcavelos. E pasme-se: a maioria destes assaltantes eram cidadãos portugueses!!
Portanto, as suas referências a minorias étnicas têm de ser reconsideradas.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

A Oradora: - De que é que falamos, Sr. Deputado? Falamos, provavelmente, de um problema a que o governo a que o senhor pertenceu nunca deu resposta, falamos da chamada terceira geração de imigrantes em Portugal, de jovens que nasceram em Portugal, que sempre aqui viveram, cujo comportamento existe porque a sociedade portuguesa é como é, porque o seu governo nunca fez uma política de integração. São jovens que se sentem desenraizados, são jovens que nasceram aqui e que não têm nacionalidade portuguesa porque a nossa Lei da Nacionalidade não lhes permite o acesso à integração plena, são jovens que viram, durante toda a sua vida, os pais trabalharem arduamente sem nunca conseguirem sair da pobreza, são jovens explícita, clara e ostensivamente excluídos pela sociedade portuguesa!!
É preciso rever as políticas de integração das comunidades imigrantes. Com ou sem media internacional, eles estiveram lá, eles estão lá, eles continuam a estar lá.
Mas o que é fundamental é que, neste momento, o problema da insegurança urbana tem de ter políticas activas de combate e de prevenção!
Não é aceitável que os cidadãos pobres ou remediados, exactamente aqueles que andam em transportes públicos, que vivem nas zonas suburbanas de Lisboa, sintam insegurança em andar na rua!
É fundamental que o Estado de direito e a sociedade portuguesa dêem uma resposta a este problema.

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Agora o discurso que os senhores fazem, o de criar uma relação de anátema entre criminoso e estrangeiro, entre comunidades de imigrantes e criminalidade,…

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Vocês não fazem isso?...

A Oradora: - … é absolutamente inaceitável!!

Aplausos do BE.

Hoje, aqui, o que os senhores fizeram foi dizer que há duas únicas soluções: ou aceitamos que a polícia, para prevenir estes aspectos de criminalidade, possa correr à bastonada quem é culpado e quem não é culpado, que tudo é aceitável para prevenir este género de acontecimentos, ou vamos encarcerar todos eles ou até mesmo expulsá-los.
Qual é a sua solução, Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo?
Não é aceitável que a sociedade portuguesa continue a ignorar e a excluir aqueles que são, ou que devem ser, cidadãos portugueses! O problema da integração das comunidades de imigrantes que vivem nas periferias das cidades…

O Sr. Presidente: - Queira concluir, Sr.ª Deputada.

A Oradora: - … tem de ser discutido de uma forma séria.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Ricardo Rodrigues, devo dizer-lhe, com franqueza, que temo pelo seu sentido de Estado, quando imagens como estas correram o mundo; foram referidas nas televisões e nos jornais de referência da Inglaterra, da Alemanha, da Holanda, da Bélgica, dos Estados Unidos, da Austrália, países responsáveis pela maior parte do fluxo turístico para o nosso país.
O Sr. Deputado considera que, tendo ocorrido um "arrastão" como este - que não tem paralelo na Europa e no mundo, em bom rigor, com os danos que ocorreram, praticamente só no Brasil -, a Assembleia da República se deveria alhear da questão?

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Deputado não vê televisão? O Sr. Deputado não lê os jornais? O Sr. Deputado considera que, na Assembleia da República, perante a gravidade destes factos, devíamos "meter a cabeça na areia" - visto ter-se tratado de um "arrastão" ocorrido numa praia deste país?
O Sr. Deputado sabe que o nosso sentido de responsabilidade, quanto mais não seja, não nos permitiria, perante este facto concreto, perante o que está em causa, perante as implicações para a segurança dos cidadãos e para o turismo em Portugal, deixar de reclamar já iniciativas por parte do Governo, enquanto estamos em tempo, para que, daqui a uns anos, não tenhamos de dizer, como no Brasil, que já nada podemos fazer e que não há forma alguma de combater este tipo de criminalidade.
O Sr. Deputado devia dar graças por termos desencadeado esta discussão na Assembleia da República e por, responsavelmente, numa lógica de Estado, querermos, junto do Governo, trabalhar nesse sentido.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Se tivesse tido um bocadinho de atenção e, até, de sentido de justiça, verificaria que o meu primeiro elogio foi para a declaração do Sr. Ministro da Administração Interna…

Vozes do CDS-PP: - Não ouviu!

O Orador: - … pela acção que disse que teria, nomeadamente em termos de videovigilância, nas praias portuguesas. Obviamente que, como reverso da medalha, também falei da declaração do Sr. Secretário de Estado do Turismo. Portanto, o Sr. Deputado podia tratar desta matéria com outro tipo de isenção e de imparcialidade.
Quando o Sr. Deputado estava a falar, lembrei-me de um artigo que li no Público, escrito precisamente por um socialista, António Barreto,...

Vozes do PS: - Socialista?...

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O Orador: - ... de que lhe vou ler um extracto, porque, renegando a direita a que não pertence, refere-se a alguma esquerda: "Não tenho muito respeito pela direita portuguesa, que pouco contribuiu no século XX para qualquer liberdade dos portugueses (…) nem qualquer fascínio pelos ricos e poderosos, mas não me reconheço nas políticas ditas de esquerda em vigor no meu País: não partilho da sua agressividade boçal nem da sua arrogância própria dos moralmente superiores e dos intelectualmente dotados."

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - "Não me revejo na sua dúplice atitude ou na sua complacência criminosa diante da violência e do terrorismo. Não aceito a sua permanente vontade de gastar o que não se produz e de distribuir o que não se poupou e lamento a sua confrangedora irresponsabilidade."

Vozes do CDS-PP: - Esta parte já é dirigida ao PS!

O Orador: - "Não me identifico com a sua viciosa propensão a recompensar a facilidade, a mediocridade e a aldrabice. Nem adopto a facilidade com que despreza o mérito ou é capaz de deixar entre parêntesis os direitos individuais,…" - nomeadamente os que estavam naquelas praias - "… o que não me transforma em homem de direita."
Para que não se sinta amesquinhado com este comentário, leio-lhe o comentário de alguém que é socialista e que reconhece como tal.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Socialista?!...

O Orador: - Sr. Deputado, reconheça o nosso esforço como o de quem quer fazer alguma coisa por este país perante factos tão graves.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - A Sr.ª Deputada Ana Drago falou em "direita populista e xenófoba". Sr.ª Deputada, pode insultar quem quiser, mas não nos insulta, porque, com toda a certeza, não tem essa capacidade. Nem é o facto de alguns noticiários, à noite, na ordem normal das entrevistas, colocarem o Bloco de Esquerda à frente do CDS-PP - que, por acaso, tem mais votos e mais Deputados - que altera esse estado de coisas...!

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Coitadinhos!…

O Orador: - Sabe uma coisa, Sr.ª Deputada? Só lhe posso pedir desculpa pelo facto de 500 jovens criminosos portugueses terem assaltado uma praia de gente pacata e trabalhadora, para lhes bater, os insultar e agredir.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Pura demagogia!

O Orador: - Mas não posso fazer mais do que isso!
Perceba a Sr.ª Deputada - e posso pedir-lhe desculpa por isso também - que o meu primeiro esforço de solidariedade vai para com essas pessoas que foram agredidas, que iam tranquilamente para a praia descansar, porque trabalham,…

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Demagogia!

O Orador: - … e não para quem invadiu essas praias e, de navalha, pau ou corrente na mão ou de insulto fácil, assaltou, bateu e pôs em causa direitos individuais de cidadania.
A Sr.ª Deputada, quando estão em causa esses direitos, quer colocar-se do lado dos bandidos, dos criminosos, dos delinquentes.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - É o discurso do Sr. Le Pen!!

O Orador: - Estamos do lado dos cidadãos e das forças de segurança que conseguiram pôr fim aos desacatos! Esta é uma grande diferença, de ontem e de hoje, e, se Deus quiser, enquanto estas duas

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bancadas tiverem assento parlamentar, é uma diferença que vai continuar a existir nesta Assembleia da República!

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Recebam cá o Sr. Le Pen!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo, entendemos que as questões da segurança dos cidadãos são importantes e devem ser tratadas nesta Assembleia, evidentemente, com preocupação, mas também com sentido de responsabilidade. E a forma como o Sr. Deputado colocou esta questão é alarmista e só contribui para criar um clima de medo, susceptível de fazer levantar todos os demónios de xenofobia e de racismo.

Vozes do PCP, do PS e do BE: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo, o que se passou em Carcavelos foi grave - não o negamos. Estamos também solidários com as vítimas da criminalidade que foi cometida.
Consideramos que deve haver uma actuação policial adequada, por forma a proteger as pessoas que vão à praia e os seus bens, mas também as pessoas que andam na rua, que fazem a sua vida normal, seja no trabalho, no lazer ou no seu local de residência.
Porém, se consideramos que o que se passou em Carcavelos foi grave, também temos de dizer que a sua intervenção não foi menos grave, Sr. Deputado,…

Aplausos do PCP.

Vozes do BE: - Muito bem!

Vozes do CDS-PP: - Que vergonha!

O Orador: - … porque agitar uma questão como esta, de uma forma alarmista e como "arma de arremesso" político-partidária, é o pior que se pode fazer para discutir estes problemas e para o nosso país.

Aplausos do PCP.

Vozes do PS e do BE: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Deputado veio dizer que a criminalidade grupal aumentou 460% em sete anos, mas esqueceu-se de dizer que, nesses sete anos, os senhores fizeram parte do governo em mais de três!

Vozes do CDS-PP: - Nessa altura diminuiu!

O Orador: - Pergunto se só agora é que os senhores sabem que existe esse problema.
O Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo referiu aqui vários agentes das forças de segurança que faleceram ao serviço dos cidadãos, a cumprir a sua missão - vários dos que citou faleceram enquanto os senhores foram governo!
Sempre tivemos aqui uma postura de solidariedade para com esses agentes, para com as suas famílias, para com as instituições a que pertenciam e ao serviço das quais deram a própria vida. Somos oposição hoje tal como fomos quando os senhores faziam parte do governo e nunca nos viram tratar esta questão da criminalidade com a irresponsabilidade com que o Sr. Deputado a tratou aqui, há pouco!

Vozes do PCP e do BE: - Muito bem!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - A vossa atitude é que é irresponsável!

O Orador: - Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo, vamos discutir, nesta Assembleia, com toda a seriedade, os problemas da qualidade de vida nas áreas metropolitanas, os meios que as nossas polícias têm, ou não, para fazer face a esses problemas, o estado em que os senhores deixaram as forças policiais, a contribuição que o governo a que pertenceram deu para agravar esses problemas.
Contudo, não vamos alinhar num tipo de discurso que não fica bem aqui.

Vozes do CDS-PP: - Não fica bem porque é incómodo!

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O Orador: - É um discurso muito típico da extrema-direita, que fica muito mal nesta Assembleia, que é, e deve continuar a ser, a Casa da democracia.
Aqui, o discurso da intolerância e da demagogia não fica nada bem, Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo!!

Aplausos do PCP, do BE e de alguns Deputados do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Montalvão Machado.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo, também o Partido Social-Democrata, aliás, como todos os portugueses, ficou estupefacto, admirado e preocupado com o episódio que ocorreu em Carcavelos não apenas pela sua dimensão, mas também pela sua gravidade e, até, violência.
Entende o Partido Social-Democrata - como supõe que todos os outros Srs. Deputados das várias bancadas devem entender - que a matéria da segurança pública não pode nem deve ser usada como matéria de arremesso político. Mas isso é um factor, outro é a questão ser aqui suscitada e ser apelidada de xenófoba, demasiado populista, de extrema-direita ou equiparada a um pedido de apoio a uma manifestação da extrema-direita.
Parece-me que esta matéria é um assunto de Estado, que deve ser tratado com elevação, com sentido de responsabilidade. Por isso, o Partido Social-Democrata quer deixar muito claro, aqui, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o nosso sentido de admiração pela pronta manifestação e intervenção do Sr. Ministro da Administração Interna e do Sr. Presidente da Câmara de Cascais.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - No entanto, é preciso passar das palavras aos actos.
Este fenómeno, Sr. Presidente e Srs. Deputados, tem já história, não surgiu de repente. Este fenómeno, infelizmente, vem de trás: o desenvolvimento das áreas suburbanas, a facilidade de aparecimentos de gangs, a facilidade de acesso e de viagens em comboios, os movimentos com maior facilidade...
Nesse sentido, é preciso assentarmos bem nestas ideias e continuarmos a discutir esta questão com a elevação que o assunto merece. É preciso haver múltipla informação interna das forças de segurança. É preciso que os meios de videovigilância, que belíssimo exemplo deram no decorrer do Euro 2004, sejam aproveitados e desenvolvidos para situações como esta.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - É por isso, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que o PSD, com sentido de responsabilidade, pretende continuar a discutir estas questões verdadeiramente importantes. É isso que o povo português espera de nós.

Aplausos do PSD.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, perante um aumento de mais de 400% desta delinquência grupal associada aos gangs, fenómeno que é crescente, V. Ex.ª cala-se e, com isso, consente…

O Sr. António Filipe (PCP): - Não me calo, não!

O Orador: - … e eu, que suscito a discussão no Parlamento, crio alarme social? Pensa que isto faz algum sentido?

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Perante um aumento deste tipo de criminalidade nas escolas, nos centros comerciais, nos transportes, nos comboios, nas praias, V. Ex.ª cala e, com isso, consente…

O Sr. António Filipe (PCP): - Eu não me calo!!

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O Orador: - … e nós, que queremos discutir o assunto neste Parlamento, que é o local apropriado, com isso criamos alarme social? O Sr. Deputado considera que isso faz algum sentido?
E fala em racismo, Sr. Deputado? Racismo por ordem de quem?

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Devo dizer-lhe que considero isso particularmente um insulto, porque não sou. Quem me conhece sabe que não sou e nesta bancada toda a gente sabe que ninguém é! Por muito que o Sr. Deputado quisesse que fossemos, não somos, infelizmente para si.
Diz que somos racistas porquê? Porque os delinquentes eram negros? Isso torna-nos racistas? Se a delinquência é praticada por alguém de uma determinada etnia, estamos proibidos de falar nela, porque, se falarmos, somos racistas?

O Sr. António Filipe (PCP): - Não são os senhores! É o vosso discurso!!

O Orador: - Só podemos falar de delinquência se for praticada por brancos?
Isso faz algum sentido, Sr. Deputado? Não faz nenhum sentido!
E deixe-me que lhe diga outra coisa, Sr. Deputado: havia naquela praia vítimas de várias raças; não falei de raça negra ou branca, mas de portugueses.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Só há uma raça, que é a raça humana!

O Orador: - Falei também de outra coisa, que devia merecer igualmente particular referência da sua parte. Falei de agentes mortos em serviço. Reparou que alguns desses agentes eram negros, Sr. Deputado? Isso não fez de mim racista? O Sr. Deputado tem noção da hipocrisia que traz para a discussão, quando se permite tratá-la nesses termos?

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Deputado António Filipe pode continuar a alinhar com a bancada um bocadinho mais à sua esquerda por razões de tratamento de causa e, porventura, de benefício eleitoral, mas a nossa questão não é eleitoral.

O Sr. António Filipe (PCP): - Ai não?

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - É, é!

O Orador: - É de sentido de Estado em relação a uma preocupação que é de todos, incluindo os que nos estão a ouvir, que, tenho a certeza, nos dão razão e o censuram exactamente neste momento.
Sr. Deputado António Montalvão Machado, não posso dizer muito mais que não seja concordar com tudo o que disse, desde a primeira à última palavra.
Sei que a preocupação do Sr. Deputado é a nossa preocupação. Sei que o Sr. Deputado valorou, na exacta medida, tudo aquilo que foi dito por mim, da tribuna. Sei que, quando o Sr. Deputado chamou a atenção para a circunstância de eu ter saudado a atitude do Sr. Ministro da Administração Interna, percebeu - e bem! - que o que está aqui em causa não é um ataque ao Governo, mas a tentativa de discutir, na Assembleia da República, onde o povo deste país tem representação alargada,...

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - É alargada, mas não é alarmada!

O Orador: - ... um assunto que nos preocupa muito e que deveria preocupar todos, mas que infelizmente, ao que parece, só preocupa alguns.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado António Montalvão Machado, devo dizer-lhe que aquilo que menos me incomoda é a reacção das bancadas mais à esquerda, porque nos demonstra que vamos no caminho certo.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Quando tratamos as questões que verdadeiramente preocupam o País, e que a todos motivam, aquela bancada não fica muito entusiasmada, porque só sabe ver essas coisas numa perspectiva eleitoral, só está preocupada em ganhar votos, independentemente de defender o certo ou o errado - desde que "renda", insurge-se e invoca...!

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Vozes do CDS-PP: - Exactamente!

O Sr. António Filipe (PCP): - E o CDS-PP só está preocupado em perder votos, não?

O Orador: - O nosso interesse é outro: é tratar os problemas do País com sentido de Estado, numa perspectiva de justiça, com discussões que só hoje começaram, Srs. Deputados, por muito que isso lhes custe.
Hoje, chamamos a atenção para um problema que nos preocupa a todos, mas até ao final desta Legislatura apresentaremos iniciativas legislativas, projectos de resolução, que não deixarão que este assunto, por muito que lhes custe, caia no esquecimento, porque é nossa obrigação. Cumprimos o mandato com respeito pela vontade daqueles que nos elegeram. Estamos de consciência tranquila. Temos a certeza de que, no final do mandato, estaremos de consciência tranquila e com o orgulho que só conhece quem cumpriu o seu dever. Tenho a certeza de que, porventura, se os senhores continuarem por esse caminho, não poderão dizer o mesmo. Temos pena! Cumprimos o nosso dever e VV. Ex.as não. No final, saibam os portugueses avaliá-lo.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra a Sr.ª Deputada Alda Macedo.

A Sr.ª Alda Macedo (BE): - Sr. Presidente, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados: Toda a campanha eleitoral do Partido Socialista assentou na necessidade de estimular o crescimento económico, promover o emprego e qualificar o País através de um "choque tecnológico".
Há apenas três meses o Governo declarava o combate ao insucesso escolar como objectivo prioritário. Três meses depois, as medidas aprovadas pelo Ministério da Educação levam ao crescente envelhecimento dos professores no activo, aprofundam a desmotivação do corpo docente e reduzem a qualidade da formação dos professores.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

A Oradora: - É um choque, mas não é necessariamente um "choque tecnológico".

Aplausos do Deputado do BE João Teixeira Lopes.

Há apenas três meses o Governo comprometia-se com a criação, no mês de Junho, de emprego para 1000 jovens licenciados. Até hoje, e estamos a meio do mês, não só não se conhece uma linha deste programa como nem um só emprego foi criado.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

A Oradora: - A pretexto dos números do défice, que só deixaram "estupefacto" e "chocado" o Partido Socialista, o novo Governo produziu um programa de "estabilidade e muito pouco crescimento" que, entre outras coisas, prolonga a idade de reforma dos funcionários públicos, fechando a porta à entrada de jovens profissionais nos quadros da função pública.
O que isto significa para a docência - que é reconhecidamente uma actividade profissional de desgaste rápido e com elevado stress profissional - é a desvalorização do reconhecimento público e a incapacidade de proceder à renovação geracional dos quadros docentes, que seria vital para garantir uma oferta educativa, dinâmica e com renovadas energias inovadoras

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

A Oradora: - Três meses depois de ir a votos, com um programa que defendia a qualificação em detrimento das medidas da direita que acentuavam a recessão e a desqualificação, o mesmo Partido Socialista retira a redução da componente lectiva para o exercício de cargos pedagógicos.
O que isto significa é que funções de direcção de turma, coordenação de departamentos e de projectos, que são vitais para a qualificação da educação, deixam de contar como tempo incluído no horário profissional dos docentes. A acção pedagógica, com esta medida, passa a ser um mero cumprimento formal, sem reconhecimento nem dignidade.
Há três meses o Governo comprometia-se com uma aposta decidida na inovação e no desenvolvimento. Contudo, apenas três meses depois, a coberto da nova retórica do "grande susto" com as contas pública, é aos mesmos de sempre que o Governo do Partido Socialista faz pagar a factura da crise.

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São exactamente os mesmos docentes que, no fim dos longuíssimos dois anos de congelamento de salários impostos pela maioria de direita, são mais uma vez convocados para a mesma lógica de combate à crise com medidas que acentuam a recessão e reproduzem a própria crise.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

A Oradora: - Não é com profissionais sujeitos a um estigma social que se promove transformação inovadora. Congelar a progressão nas carreiras é uma derrota para a necessidade de mobilização dos docentes e para a aposta numa educação de qualidade.
Sr.as e Srs. Deputados: Nenhuma transformação no sentido da inovação e do progresso é possível se não puder contar com profissionais motivados, empenhados e com altos níveis de satisfação profissional.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

A Oradora: - O Governo está a somar erros políticos, uns sobre os outros. Como se não bastasse ter fechado a porta a processos negociais, quando agora é confrontado com a greve dos docentes, comporta-se de uma forma arbitrária como nem a direita ousou fazer.

Aplausos do BE.

Primeiro, a Ministra da Educação suspende todas as aulas para o dia de amanhã e faz convocar todos os docentes para o serviço de exames, numa clara manifestação de derrota antecipada.
Em seguida, o despacho conjunto dos Ministérios da Educação e do Trabalho impõe serviços mínimos nas escolas para o dia de amanhã. Este segundo despacho fundamenta-se nos artigos 598.º e 599.º do Código do Trabalho; porém, Sr.as e Srs. Deputados, este despacho atropela as próprias disposições do Código do Trabalho que não contempla serviços mínimos na educação.
É também uma trapalhada política porque o Governo do Partido Socialista, à primeira grande ameaça de manifestação e descontentamento social, não só não hesita em contornar a greve dos docentes como recorre ao mesmo Código do Trabalho que tanto criticou enquanto foi oposição.

Aplausos do Deputado do BE João Teixeira Lopes.

Este Governo arrisca-se a que lhe aconteça o mesmo que ao "caixeiro-viajante" de Kafka, que um dia acordou metamorfoseado em insecto.
Perder de vista a natureza da vossa composição social, a vontade e a expectativa de mudança sufragada pelos portugueses no dia 20 de Fevereiro, esquecer os compromissos mediante os quais se submeteram a sufrágio popular pode conduzir a uma penosa metamorfose e, mais grave do que isso, a custos sociais que agravem ainda mais o único défice que deve contar a sério. O défice do progresso, o défice da democracia, o défice social e cultural.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cristina Granada.

A Sr.ª Cristina Granada (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Alda Macedo, a questão que coloca refere-se a medidas apresentadas pelo Ministério da Educação que, de todo, não nos parecem distanciadas daquelas que se querem aplicar à globalidade dos trabalhadores deste país. É solicitado um esforço, uma solidariedade, um entendimento perante circunstancias nacionais gravosas. Apela-se a todos uma intervenção, um esforço para que, a nível nacional, se possa alcançar uma melhoria das circunstâncias de vida de todos os portugueses.
Não irei dizer que a situação dos professores não está pior do que a dos trabalhadores fabris, não irei fazer comparações a nenhum nível; apenas referirei que não se nos afigura lógico que não haja um apelo para uma classe profissional quando ele é feito a todas as outras.
No entanto, formulo a seguinte pergunta: tendo em conta todas as medidas que a Sr.ª Deputada elencou, tendo em conta as circunstâncias que enunciou e o esforço que é pedido a todos os portugueses, parecer-lhe-ia lógico que a classe docente fosse posta de parte, fosse considerada privilegiada, quando esse esforço é pedido a todos?
Além de mais, muitas medidas agora propostas pelo Ministério da Educação, designadamente as que se prendem com a organização das escolas, foram acolhidas e estão a ser devidamente atendidas por parte das escolas.
Sr.ª Deputada Alda Macedo, não considera oportuno que também os professores dêem o seu contributo neste trabalho conjunto que é o de recuperar Portugal?

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Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Alda Macedo.

A Sr.ª Alda Macedo (BE): - Sr. Presidente, a Sr.ª Deputada Cristina Granada comete um equívoco estrondoso. E digo-o porque, neste caso, não se trata de conceder privilégios nem de comparar condições de trabalho em sectores diferenciados da nossa sociedade mas, sim, de discutir uma opção política profundamente errada em relação a um sector estratégico para o progresso e para o desenvolvimento do nosso país.

Vozes do BE: - Muito bem!

A Oradora: - É disto que estamos a falar!
Discutimos, por exemplo, o que significa esta medida de recorrer à definição do serviço mínimo, porque a Sr.ª Deputada sabe perfeitamente que, em termos do que está predisposto na legislação, em particular no Código do Trabalho, não é possível definir serviços mínimos do conjunto de uma empresa que entre num processo de greve. E o próprio Código do Trabalho determina quais são os sectores onde é admissível e aceitável que haja uma definição de serviços mínimos que, em última instância, são negociados com as estruturas sindicais.

Vozes do BE: - Exactamente!

A Oradora: - Nesta situação, primeiro, não houve negociação com as estruturas sindicais mas, sim, uma decisão perfeitamente autoritária e arbitrária da parte do Governo…

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

A Oradora: - … e, segundo, há uma concepção de que a definição de serviços mínimos serve para mascarar um boicote muito deliberado a um combate político absolutamente legítimo de um segmento social que se bate pela defesa não de regalias mas de direitos profissionais adquiridos ao longo de muitos anos.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

A Oradora: - Alguns desses direitos contaram com o apoio de dirigentes sindicalistas do Partido Socialista, que, pelos vistos, hoje se esqueceram do quanto custou ganhar a dignidade e o valor deste sector profissional na nossa sociedade.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: - Também para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Duarte.

O Sr. Pedro Duarte (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Na próxima segunda-feira, completam-se 100 dias de governação socialista. É este, pois, o momento adequado para um primeiro balanço da actuação do Governo.
Na nossa óptica, uma avaliação justa e equilibrada passa por dividirmos estes 100 dias em três fases:
Um primeiro momento, o mais longo, em que o Governo optou pelo silêncio e pela ausência.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O Governo comportou-se como uma verdadeira comissão eleitoral do PS, gerindo a popularidade e fugindo à responsabilidade de assumir as decisões inevitáveis para o nosso futuro.
Perdeu-se tempo. Perdeu-se muito tempo.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - O Governo quis adiar as decisões e, com isso, adiou o País.

Aplausos do PSD.

Tivemos depois um segundo momento, em que o Governo, empurrado pela realidade, ensaiou uma verdadeira "mega-encenação", uma "farsa de Estado", sobre a situação das contas públicas.

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Para tal, diga-se, contou com uma lamentável cumplicidade do Sr. Governador do Banco de Portugal, numa atitude, diga-se também, mais própria de um país do Terceiro Mundo.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Exactamente!

Protestos do PS.

O Orador: - Não foi, Srs. Deputados, um exercício politicamente sério!

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - E, por último, um terceiro momento, em que o Governo se viu obrigado a começar a governar, tomando um conjunto de medidas de combate ao problema do défice orçamental.
Quanto a esta matéria, a posição do PSD é clara: abertura para apoiar as medidas que, responsavelmente, reduzam o peso do Estado na nossa economia, mas uma convicta e firme oposição ao aumento de impostos que terá, inevitavelmente, um efeito, o de que o Estado continuará a engordar e as famílias e as empresas continuarão a pagar!
O Partido Socialista já devia ter aprendido que não é este o caminho.

Aplausos do PSD.

Mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, convém lembrar que "há mais vida para além do Orçamento". E, nessas outras áreas, podemos afirmar que, em apenas 100 dias, se passou de uma ilusão cor-de-rosa para o início de uma grande decepção.
Fundamentando, vale a pena enunciar três paradigmáticas atitudes que definem, desde já, este Governo.
Em primeiro lugar, a "traição às promessas eleitorais".
O Eng.º Sócrates e o PS basearam a sua campanha eleitoral - e a sua vitória - em três grandes promessas: criariam 150 000 novos postos de trabalho,…

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Ou não!…

O Orador: - … retirariam da pobreza cerca de 300 000 pensionistas…

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Ou não!…

O Orador: - … e jamais - repito, jamais - aumentariam os impostos.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Ou não!…

O Orador: - Passados 100 dias, todos constatamos que o Governo aumentou os impostos, que o desemprego, infelizmente, vai continuar a aumentar e que o custo de vida dos pensionistas só tende, lamentavelmente, a piorar.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Três mentiras!

O Orador: - Os portugueses não gostam de ser enganados e assim, naturalmente, quebrou-se a sua relação de confiança com este Governo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Podemos classificar uma segunda atitude paradigmática como a "saga persecutória na busca de bodes expiatórios" perante a ausência de soluções para os problemas do País. O Governo empreendeu uma ofensiva aos funcionários públicos, tratando-os como os "suspeitos do costume".

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Na verdade, o Governo baseia a eliminação de direitos sociais há muito assegurados, não na situação difícil do País, não na defesa da sustentabilidade do sistema, mas, essencialmente, num porte moralista, confundindo legítimos direitos com supostas regalias. Não é verdade nem é séria esta postura.
De igual modo, merece uma crítica alusão o mais populista e violento ataque ao exercício da actividade política desde o 25 de Abril, encetado pelo actual Governo. Quando as convicções são fortes e o caminho é firme, não se torna necessário o recurso a populismos serôdios para sustentar as nossas opções.

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Aplausos do PSD.

Este, infelizmente, não parece ser o caso do actual Governo. Do nosso ponto de vista, a desejável dignificação da actividade política e do serviço à causa pública terá necessariamente de merecer uma abordagem diferente.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - A este propósito, será mesmo conveniente recordar que estes "tiques pseudo-justiceiros" costumam ter um inevitável "efeito boomerang", como, de resto, já pudemos verificar no tristíssimo episódio em torno da luxuosa reforma do Sr. Ministro das Finanças.

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Em terceiro lugar, evoco uma outra preocupante atitude deste Governo: a vertigem da apropriação do Estado pelo aparelho partidário do Partido Socialista. Poderíamos, a este propósito, recordar o que dizia há um ano atrás, só há um ano atrás, um político com grandes responsabilidades, quando se referiu às nomeações para os gabinetes governamentais. Passo a citar: "uma coisa assim nunca se viu. É vergonhoso e chocante, ainda por cima numa altura em que a despesa pública está a derrapar, como o próprio Ministro da Finanças admitiu." Não sei se todos estão cientes de quem foi o autor destas palavras. Posso esclarecer:…

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Então diga lá!

O Orador: - … foi o então Deputado, hoje Primeiro-Ministro, Engenheiro José Sócrates.

Vozes do PSD: - Uma vergonha!

O Orador: - Ora, Srs. Deputados, não consta que a despesa pública esteja nos carris, não consta que o Ministro das Finanças considere que estamos em tempo de "vacas gordas", pelo que se impõe a seguinte pergunta: o que terá levado o Engenheiro Sócrates a considerar, esta semana, "natural" que o seu Governo já tenha conseguido ultrapassar todos os recordes de nomeações políticas? Por que é que uma situação que no ano passado era "chocante e vergonhosa" - repito: "chocante e vergonhosa" -, quando agravada, se tornou misteriosamente "natural"? Fica a pergunta para quem quiser responder.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Contudo, se no que diz respeito a esta matéria podemos, infelizmente, rotulá-la de recorrente em vários governos, o mesmo não se pode afirmar sobre a gravidade de uma outra decisão. Refiro-me ao escandaloso assalto do Governo PS às presidências das comissões de coordenação e desenvolvimento regional (CCDR).

Vozes do PSD: - Uma vergonha!

O Orador: - Recordemos os factos: desde 2003, estes altos responsáveis da Administração passaram a ser escolhidos através de um processo democrático, por eleição dos autarcas da respectiva região. Foi um excepcional passo no caminho da descentralização. O actual Governo deu, pelo contrário, um inaceitável passo atrás, alterando a lei e assumindo a nomeação política destes responsáveis com critérios de estrita confiança partidária. Com todo o ênfase, temos de repugnar esta atitude centralista e mesmo "controleira". Assistimos aqui a um grave, despudorado e inaceitável retrocesso democrático, desrespeitando os autarcas e as autarquias em prol da colocação de comissários político-partidários.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Somos e seremos firmes na denúncia dos caminhos errados que, infelizmente, em muitos casos o Governo parece querer seguir.
Todavia, queremos afirmar que, de igual modo, saberemos apoiar todas as medidas e decisões positivas para o nosso país. O PSD, pela voz do seu líder, teve oportunidade de manifestar a sua disponibilidade para entendimentos com o Governo em áreas fundamentais, como a reforma do Estado e da Administração, a justiça ou a consolidação das contas públicas. Como é sabido, lamentável e inexplicavelmente, o Sr. Primeiro-Ministro rejeitou esta disponibilidade. Contudo, nem por isso o PSD alterará a sua posição. O interesse nacional estará, para nós, sempre em primeiro lugar. Naquelas matérias e em outras, como agora é o caso da

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segurança pública, hoje aqui já bem frisada pelo Sr. Deputado Montalvão Machado. Os recentes acontecimentos, como os assassinatos de agentes policiais ou o chamado "arrastão" na praia de Carcavelos, são bem reveladores de situações graves que temos todos de saber contrariar, pois com a segurança das pessoas não se brinca.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Esta jamais será, para nós, uma matéria de arremesso político, como já aqui hoje foi dito. O Governo poderá contar com o apoio do PSD em todas as medidas que reforcem a legitimação da autoridade das forças de segurança, que defendam a segurança das pessoas e dos seus bens e que persigam e punam os infractores.

Aplausos do PSD.

Fica, sem qualquer hesitação, esta nossa posição. O PSD, desde a sua fundação, aprendeu com Sá Carneiro a colocar os interesses do País acima de qualquer interesse partidário. Jamais trairemos este princípio. Como sempre, fazemo-lo por Portugal e pelos portugueses!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Pedro Duarte, inscreveram-se para lhe pedir esclarecimentos os Srs. Deputados José Junqueiro e João Pinho de Almeida.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Junqueiro.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Pedro Duarte, tenho sete ou oito questões para lhe colocar, em resultado da sua intervenção.

O Sr. Presidente: - Mas apenas dispõe de 3 minutos, Sr. Deputado!

Risos.

O Sr. José Manuel Ribeiro (PSD): - Tem de saber controlar essa despesa de tempo!

O Orador: - A primeira questão que lhe coloco é a de saber se o Sr. Deputado prefere o silêncio e o sentido de Estado do Primeiro-Ministro José Sócrates ou o estilo de Santana Lopes, a quem o actual presidente do seu partido nem sequer viabilizou a recandidatura à Câmara Municipal de Lisboa.

Protestos do PSD.

O Sr. Alberto Martins (PS): - Bem lembrado!

O Orador: - Em segundo lugar, em matéria de adiamento de decisões e de referências ao Banco de Portugal, queria perguntar-lhe por que é que os Srs. Deputados não viabilizaram, enquanto estavam no governo e tinham maioria, o relatório e a auditoria às contas públicas que o PS, nessa altura, propôs nesta Câmara que fosse feito pelo Banco de Portugal.

Aplausos do PS.

Em terceiro lugar, o senhor fala do aumento dos impostos e eu falo do embuste que os senhores criaram com o falso défice que, agora, é um verdadeiro défice de cerca de 7%! E o défice, Sr. Deputado? Como é que o senhor responde ao défice?!

Aplausos do PS.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Em quarto lugar, o Sr. Deputado fala dos desempregados e dos novos empregos, 150 000, para ser exacto, de que o Primeiro-Ministro falou na campanha eleitoral. Pois bem, estamos no início da Legislatura e, como tal, temos tempo para cumprir. De qualquer modo, pergunto-lhe: o que tem a dizer sobre os 500 000 desempregados que os senhores deixaram no País?!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Olhe que, entretanto, já apareceram mais alguns!

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O Orador: - O que é que os senhores dizem aos 500 000 desempregados que deixaram em Portugal?! O que é que os senhores dizem do aumento das pensões e do investimento de 600 milhões de euros que se esqueceram de inscrever no Orçamento do Estado?! Qual é a sua resposta para esta matéria, Sr. Deputado?! Creio que será uma resposta difícil!
O senhor diz que fizemos uma ofensiva aos funcionários públicos? Nós garantimos o emprego e a continuidade dos funcionários públicos e não criámos quadros de excedentários, como a Dr.ª Manuela Ferreira Leite e os senhores fizeram para despedir funcionários públicos!

O Sr. Pedro Duarte (PSD): - Tenha cuidado com o que está a dizer!

O Orador: - O que é que o Sr. Deputado diz, no entanto, quanto a isto?
E os 65 anos como idade de reforma são mais ou menos do que aqueles que os senhores propuseram em campanha eleitoral?! É que o Dr. Santana Lopes declarou que a idade de reforma devia ser de 70 anos!

Aplausos do PS.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Lá nisso são "gémeos"!

O Orador: - Em sexto lugar, o Sr. Deputado quer atacar o Ministro das Finanças, mas pergunto se V. Ex.ª está, porventura, a esquecer-se de Mira Amaral, de Celeste Cardona, de Manuela Ferreira Leite, de Bagão Félix! Onde é que estão esses senhores neste momento?! Para onde é que foram quando saíram do Governo?! Quem é que levou essas reformas e quem é que se candidatou a elas?!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Olhe, não estão na Galp!

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Olhe o Gomes!

O Orador: - Em sétimo lugar, falou de nomeações políticas. Muito bem! Quanto às nomeações políticas, gostava de saber por que é que os senhores acabaram com a lei que o Partido Socialista tinha aprovado no sentido de levar a que todos os provimentos passassem por concursos públicos. Os senhores acabaram com os concursos públicos e fizeram as nomeações políticas! E queria dizer-lhe também, Sr. Deputado, que há uma lei que vai ser aqui discutida para regular a questão das nomeações!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): - Para quê? Agora, já fizeram as nomeações!

O Orador: - Há, contudo, mais dois pontos que tenho de focar. Em primeiro lugar, para dizer que nas comissões de coordenação e desenvolvimento regional coordenação regional houve sempre uma tutela político-partidária. Em segundo lugar, para perguntar ao Sr. Deputado Pedro Duarte se é ou não verdade que na Administração Pública portuguesa e nas empresas públicas do nosso país 95% dos lugares de chefia estão preenchidos por elementos do PSD.

Aplausos do PS.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - É mentira! É falso!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Pinho de Almeida.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Duarte, como disponho de pouco tempo, colocar-lhe-ei algumas rápidas questões.
Como disse, e muito bem, na intervenção que fez, este é um Governo que tem especial apetência para a arte dramática. Tem, indiscutivelmente, jeito para o teatro. Começou, aliás, essa actividade dando ideia de que ia seguir o estilo da comédia. Começámos, portanto, por assistir às contradições entre o Sr. Ministro das Finanças e o Sr. Primeiro-Ministro sobre a existência ou não de um aumento de impostos, às contradições entre o Ministro dos Negócios Estrangeiros e o Sr. Primeiro-Ministro sobre o referendo europeu, às contradições do Sr. Ministro da Saúde sobre os hospitais e - caso que é mais flagrante - às contradições entre frases do Sr. Primeiro-Ministro sobre exactamente os mesmos assuntos antes e depois das eleições, antes dizendo uma coisa e depois outra. São vários, portanto, os episódios de comédia no início da governação socialista.
De todo o modo, rapidamente passámos para outro estilo, o da farsa, que se inaugura precisamente quando, na comédia, o Sr. Primeiro-Ministro começa a dizer o contrário de tudo o que tinha dito na campanha eleitoral.

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O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - E aí entram as más opções que fazem parte dessa farsa e que iniciam outro período, o da tragédia. Falo de más opções no campo da receita, como, por exemplo, do aumento do IVA, que vai penalizar os portugueses e atrasar o crescimento da economia, e de más opções no campo das despesas, com a manutenção obsessiva das SCUT e com tudo o que isso traz de injustiça para a distribuição do esforço que, de facto, é preciso fazer para, de uma vez por todas, resolvermos o problema do défice.
Mas, Sr. Deputado, o mais grave disto tudo é que esta tragédia tem um epílogo anunciado. Como tal, o que procuro saber é exactamente se o Sr. Deputado está ou não de acordo em afirmar que, se for seguido e continuado no mesmo sentido o caminho que foi agora iniciado, o epílogo desta tragédia se vai traduzir numa cobrança ainda maior dos portugueses, conseguindo ainda um menor crescimento do País.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Disse bem: ainda menor do que conseguiram os vossos governos!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Duarte.

O Sr. Pedro Duarte (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado José Junqueiro, agradeço, evidentemente, as suas questões e também a forma como as colocou, pois julgo que foi bem eloquente e clarificadora da postura, da posição e mesmo do desconforto da bancada do Partido Socialista perante o tema que trouxemos hoje.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Olhe que não!

O Orador: - Confesso que esperava, no momento em que proponho a esta Câmara um balanço dos 100 primeiros dias de governação socialista, que o Sr. Deputado, em nome do Partido Socialista, tivesse um pouco mais de orgulho na obra que tem vindo a ser realizada…

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Muito bem!

O Orador: - … e viesse aqui apresentar uma ou outra ideia ou medida que, de facto, pudessem ser emblemáticas. Todavia, o Sr. Deputado limitou-se a colocar algumas questões que nos remetem para outros tempos, que não estes 100 dias, e não teve capacidade para negar qualquer das afirmações que fiz da tribuna.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Porque não pode!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Julgo, portanto, que isso foi suficientemente clarificador e paradigmático da atitude do Partido Socialista e, portanto, do desconforto e das dificuldades que sentem quanto a esta matéria.
O Sr. Deputado José Junqueiro perguntou-me que silêncio é que prefiro, se o do Engenheiro Sócrates ou…

O Sr. José Junqueiro (PS): - Falei no sentido de Estado!

O Orador: - Desculpe! Perguntou-me se preferia o sentido de Estado do Engenheiro Sócrates ou de outros primeiros-ministros. Respondo-lhe dizendo que ao silêncio do Sr. Primeiro-Ministro prefiro, de longe, a coragem política do Sr. Ministro das Finanças quando, no dia da tomada de posse, anunciou que ia aumentar os impostos. Nesse mesmo dia, o Sr. Primeiro-Ministro mandou calar o Sr. Ministro das Finanças!

Aplausos do PSD.

Veio a perceber-se mais tarde que isso fazia parte da tal encenação para enganar e iludir os portugueses para a qual, aliás, o Sr. Deputado deu hoje um pequeno contributo quando resolveu dizer que agora conhecemos o verdadeiro défice de 2005.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Ora bem!

O Orador: - É que é uma obra verdadeiramente notável estar em Junho de 2005 e conhecer, como o Sr. Deputado, o valor do verdadeiro défice até final do ano, ou seja, aquele que vai ser concretizado em Janeiro, Fevereiro, Março e, se calhar, Abril de 2006. Gabo-lhe esta capacidade, Sr. Deputado José Junqueiro.

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O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - É adivinho!

O Orador: - Deixe-me dizer-lhe que é paradigmática a forma como os senhores basearam - e isto é que é lamentável - a vossa atitude política neste início de mandato numa ilusão, e isto com uma maioria absoluta que é confortável. Os portugueses deram-vos, na verdade, a possibilidade de governar com a serenidade e coragem suficientes para que, construtivamente, pudessem colaborar na construção de um melhor futuro para todos nós e os senhores optaram por iludir os portugueses, o que me parece verdadeiramente lamentável.
Já foi aqui dito, e passo, assim, a responder ao Sr. Deputado João Almeida, que o então candidato a Primeiro-Ministro José Sócrates baseou toda a sua campanha eleitoral - e, quer queiramos quer não, baseia nisso o seu resultado eleitoral - em promessas e em ilusões que foram vendidas aos portugueses. Ouvimo-lo na altura falar de confiança, de optimismo, de crescimento económico, criticando outros por terem uma obsessão pelo défice - imaginem! - e dizendo que o défice se combateria pelo lado da economia. Então e agora? Onde é que está a vida para além do défice, nas palavras do Partido Socialista? Esqueceram-se, provavelmente, desta vida para além do défice! Estão hoje a fazer exactamente o oposto daquilo que andaram a dizer durante a campanha eleitoral!
Há muito casos concretos, o Sr. Deputado João Pinho Almeida referiu alguns e poderíamos passar o resto da tarde a dar exemplos concretos de promessas socialistas não cumpridas - limitei-me a trazer três, por serem verdadeiramente emblemáticas, que o Sr. Deputado José Junqueiro, por muito esforço que enalteço, não conseguiu negar de forma alguma.
Os senhores prometeram 150 000 novos empregos e o senhor não me soube dizer quando e como vão ser criados. Gostava de ouvir a sua opinião, mas o Sr. Deputado fugiu manifestamente a essa questão.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Mas já acabou a Legislatura?!

O Orador: - Disse-nos expressamente que iriam tirar da pobreza 300 000 idosos. Ora, que medidas é que existem para esse efeito? Todas as que conhecemos tendem exactamente para o efeito contrário, como, aliás, também hoje aqui reparámos neste debate.
Por outro lado, na melhor linha do famoso read my lips de um célebre presidente americano, o Eng.º José Sócrates disse: "não aumento os impostos". Ora, no primeiro dia de governação (sabemos hoje porque ouvimos o Sr. Ministro das Finanças), os senhores tinham já a intenção de aumentar os impostos, enganando assim os portugueses!

Aplausos do PSD.

Foi, de facto, uma farsa, foi uma encenação o que se passou.
Deixe-me dizer, Sr. Deputado José Junqueiro, que o Governo tem de, rapidamente, arrepiar caminho, porque, se assim não for, como dizia o Sr. Deputado João Almeida, o epílogo vai ser triste para todos nós. Vai ser triste para o Partido Socialista - provavelmente com justiça, se assim continuarem -, mas aquilo que nos preocupa é que vai ser triste para os portugueses, e aquilo que nos move aqui hoje, aquilo que sempre nos moveu, é o interesse nacional, como eu disse na intervenção.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Queremos colaborar construtivamente e por isso, Sr. Deputado José Junqueiro, por muito que lhe custe, vai contar com uma oposição firme desta bancada, porque é nosso dever e nossa obrigação, em prol de uma melhor vida para os portugueses, estarmos atentos, sabermos fiscalizar e apontar o dedo ao Partido Socialista quando trilha um caminho errado como aquele que parece trilhar neste momento.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Ginestal.

O Sr. Miguel Ginestal (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: As alterações na fiscalidade autárquica, introduzidas pela reforma da tributação do património, com a criação do imposto municipal sobre as transmissões (IMT), antiga sisa, e do imposto municipal sobre imóveis, que extinguiu a injustíssima contribuição autárquica, abriram caminho à definição de um novo método de avaliação dos imóveis, quer estes se destinem à habitação, comércio, serviços ou indústria.
Trata-se de uma reforma do património que introduz um processo objectivo de cálculo, igual para todos, visando a justiça e a equidade e o combate à fraude e à evasão fiscais, visando aproximar, até 2013, o valor dos imóveis entre 80 a 90% do valor de mercado. Mas uma reforma, mesmo um boa reforma, quando mal aplicada, tem resultados contrários. É pena!

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Foi o que aconteceu em Viseu. Porquê? Uma errada definição do zonamento, com base em diferentes coeficientes de localização, não só em termos territoriais como de afectação a usos, provocou, em Viseu, uma subida em flecha dos valores patrimoniais tributários dos imóveis, com inegáveis prejuízos para os contribuintes.
Não sendo possível iludir a crise económica em que o País está mergulhado, teria sido aconselhável a definição de um zonamento homogéneo, com coeficientes de localização mais baixos, como, de resto, fizeram muitos outros municípios.
Será razoável ter definido ilhas e adoptado coeficientes iguais ao centro de Lisboa e Porto dentro de zonas homogéneas em Viseu?
Mas por que é que na mesma rua existem prédios que se destinam, por exemplo, à habitação, com coeficientes de localização diferentes? Só porque se trata de imóveis novos e com maior qualidade? Esse não é um critério sustentado na lei.
Com valores patrimoniais tributários acima dos valores de mercado em, aproximadamente, 20%, violam-se os princípios da tributação com base no rendimento real e na equidade, distorce-se a realidade, com consequências gravosas para os rendimentos reais dos viseenses.
Deixem dar-vos um exemplo concreto: um T2 adquirido por 122 205 €, em Viseu, na Avenida Almirante Afonso Cerqueira, com um valor efectivamente pago na aquisição, foi avaliado com um valor patrimonial tributário de 132 300 €. Estamos a falar de um valor fiscal de apenas 8,3% acima do valor venal. Esta diferença tem só as seguintes consequências para o contribuinte: paga, a mais, 505 € de imposto municipal sobre transacções; paga a mais 80 € de imposto de selo; paga a mais 50 € de IMI, paga a mais 1984 €, devido à redução de seis para três anos do período de isenção; ou seja, tudo somado, quem compra paga mais 2620 € de impostos.
Por outro lado, quem vende, ou seja, o operador imobiliário, paga a mais em IRC pelo mesmo imóvel 2523 €.
É bom lembrar, Sr.as e Srs. Deputados, que em 2003, quando a Dr.ª Manuela Ferreira Leite decidiu fazer esta reforma do património, decidiu também, no mesmo momento, impedir as autarquias de se endividarem mais. O problema, para alguns, passou a ser onde ir buscar mais verbas. Os autarcas mais cautelosos adoptaram posturas de prudência e de bom senso, gradualismo nas taxas - sempre foi essa também a nossa opinião.
Em Viseu, onde o PSD aplica há 16 anos uma política de "impostos municipais máximos", a solução foi exactamente a inversa.
Como compreender que cidades intermédias como Braga, Bragança, Castelo Branco, Évora, Guarda, Portalegre, Santarém, Viana do Castelo e Vila Real tivessem definido coeficientes de localização máximos para a habitação, comércio e serviços inferiores aos de Viseu?
Alguém consegue explicar por que há-de uma loja de comércio, no centro da cidade de Viseu, pagar mais impostos do que uma loja congénere no centro de Braga? Por que é que uma casa na periferia de Viseu há-de pagar mais impostos do que uma casa congénere na cidade de Braga? E o mesmo se aplica aos serviços e à indústria.
O PSD diz que não tem nada a ver com isso, que até está de acordo comigo, que os coeficientes de localização estão muito elevados, que vai pedir ao Ministro das Finanças que os altere.
Mas, afinal, quem indicou um técnico para trabalhar com os peritos na definição dos critérios de zonamento? Afinal, quem teve a oportunidade para dar parecer sobre a proposta de coeficientes de localização que chegou à Câmara Municipal de Viseu? Afinal, quem deixou passar 2004 e metade de 2005 sem nada fazer? Afinal, quem definiu os critérios de localização?
O protocolo celebrado em 5 de Junho de 2003, entre a Associação Nacional de Municípios Portugueses e o Ministério das Finanças, é inequívoco: essa responsabilidade é das câmaras municipais.
A indignação em Viseu é crescente e ninguém aceita que haja imóveis avaliados por valores fiscais 20% acima dos preços de mercado. Aos viseenses que estão a receber notificações das finanças para corrigir o IRS ou para pagar mais IMT queremos dizer-lhes que essa responsabilidade é, sobretudo, da câmara municipal.

Aplausos do PS.

Estão mal a qualificação e a quantificação do zonamento e dos coeficientes de localização e também é muito insuficiente a redução, aprovada esta semana, de apenas 10% do IMI.
Mas perguntarão porquê agora. Pela razão simples de que, apesar de só ter implicações em 2006, a Assembleia Municipal, que até Novembro deveria fixar e comunicar à Direcção-Geral dos Impostos o valor da taxa do IMI, já só decorreria depois das eleições autárquicas, ou seja, tarde, e portanto a opção é simples: agora ou nunca.
É por isso que queremos dizer claramente que 10% é insuficiente para corrigir o erro que resultou na inflação dos valores patrimoniais dos imóveis em Viseu. São dois anos de prejuízo para todos e que está a conduzir a indústria e o comércio da construção civil a uma grave crise.

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Reafirmamos que 10% de redução no IMI é insuficiente, porque não compensa os prejuízos em sede de IRC, imposto de selo, IRS, IMT e nas taxas municipais de activação de água e saneamento, que antes custavam 40 contos e que hoje custam 8 a 9 vezes mais.
Quem é que paga este erro original? São os contribuintes. São os viseenses.
É por isso que digo com clareza: lutaremos para reduzir os coeficientes de localização para valores razoáveis, seguindo o exemplo de outras cidades com políticas fiscais municipais moderadas, como é o caso de Braga.
Do nosso ponto de vista, só com uma política activa de impostos municipais moderados e justos, com sensibilidade económica, social e territorial nas aldeias, nos bairros, na cidade e no centro histórico, será possível estimular a economia e a sociedade para ultrapassar a crise.
A reforma da tributação do património, uma reforma com profundas consequências sociais e urbanísticas, até poderia, se bem realizada, ser um instrumento de disciplina sobre a especulação e uma forma de combater a degradação patrimonial.
Da minha parte, não desisto e conto com a cooperação das autoridades, do Governo, a quem já dei conta do problema e a quem já apontei possíveis soluções. A bem de Viseu e dos viseenses.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Henriques.

O Sr. Almeida Henriques (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Deputado Miguel Ginestal, não sei se o deva cumprimentar na qualidade de Deputado ou de candidato à Câmara Municipal de Viseu. Pareceu-me mais ter esta última postura!

Risos do PSD.

Esperava que nos viesse fazer uma abordagem séria da questão do imposto municipal sobre imóveis e não a abordagem de campanha eleitoral que já o vi fazer em Viseu e que está a ser, no fundo, a sua "arma de arremesso" a uma autarquia que tem exactamente um problema idêntico a muitas outras no País, o qual tem de ser tratado em sede própria, com as correcções que a própria lei permite e com a informação que o Sr. Deputado também tem de que a autarquia local já tomou as suas medidas sobre a questão e de que, na próxima assembleia municipal, vai ser corrigida a taxa que estaria prevista neste momento.
Portanto, o Sr. Deputado veio aqui fazer demagogia com pouca autoridade moral. Que autoridade moral tem um Deputado de um partido que acaba de aumentar os impostos, penalizando os portugueses, para vir fazer uma intervenção como esta?!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Aliás, quando ouvi o Sr. Deputado falar sobre questões relativas a Viseu, pensei que vinha a este Plenário prestar-nos um esclarecimento sobre o facto de o Governo socialista ter enterrado o projecto da universidade pública de Viseu! Esperava um esclarecimento seu em relação a esta questão.

Aplausos do PSD.

Pensava também que o Sr. Deputado vinha aqui falar sobre as questões relacionadas com a área metropolitana de Viseu, que acaba também neste momento por ser enterrada pelo Partido Socialista.
Esperava, ainda, que viesse explicar, neste Plenário, por que é que se substituiu um presidente do conselho de administração do hospital que conseguiu catapultar o hospital de Viseu para uma categoria superior a nível nacional, reconhecida por sindicatos, pelos profissionais da instituição, e também para a categoria de hospital central. Pensei que era isto que o Sr. Deputado vinha aqui dizer. Ou, então, que viesse falar da ligação Viseu/Coimbra. Ficava-lhe bem, na qualidade de candidato a presidente da câmara de Viseu, fazer isso.
Por outro lado, já que subiu à tribuna, em vez de procurar enaltecer um aspecto que está a ser corrigido, esperaria que enaltecesse a grande valorização que Viseu teve, que é hoje considerada uma das cidades-modelo a nível nacional, com vias de acesso, com dinamismo, sendo uma autêntica capital de área metropolitana, com pujança, que se preocupa não só com as infra-estruturas mas também com a construção de um projecto para o futuro.
Sr. Deputado, já agora, também gostava de o ter ouvido defender os interesses verdadeiros de Viseu, designadamente quanto à questão da universidade pública, sobre a qual até agora, e apesar de o ter instigado na assembleia municipal a fazê-lo, nunca ouvi V. Ex.ª dizer fosse o que fosse.

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Portanto, o Sr. Deputado perdeu uma boa oportunidade para não fazer demagogia sobre uma questão conhecida das pessoas e vir aqui, eventualmente, aproveitar este "palco" de uma forma melhor do que aquela que fez.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Ginestal.

O Sr. Miguel Ginestal (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Almeida Henriques, agradeço as suas perguntas, que, julgo, foram feitas na qualidade de presidente da assembleia municipal de Viseu!

Aplausos do PS.

O Sr. Deputado referiu-se a três temas que deveriam fazer os senhores "corar de vergonha". Falou de uma ligação Viseu/Coimbra, que os senhores não fizeram e deixaram para o Governo do Partido Socialista fazer.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Claro!

O Orador: - Falou também de um projecto para uma universidade pública, que os senhores "enterraram" quando deram cabo do Instituto Universitário de Viseu.

Aplausos do PS.

Mas, Sr. Deputado, porque já falei desta matéria, vou ser sucinto. Os senhores têm as responsabilidades que têm e eu assumo as minhas. O que eu disse foi simples: defendi no passado, defendo agora e defenderei no futuro que este é um tema que nos deve unir a todos, em Viseu. Penso que o senhor, que também é empresário, deveria ler com atenção as conclusões registadas no segundo congresso de empresários, que teve lugar em Viseu, justamente porque nesse congresso foi pedido um consenso político-partidário, institucional, sobre a matéria do ensino superior, no sentido de haver uma definição clara da posição de Viseu, para que se fuja à situação que o senhor aqui hoje procurou de protagonismos fáceis e gratuitos, que não levam a lado algum!
Contem comigo para unir os viseenses, não conte comigo para dividir os viseenses!
Se prosseguirmos como lhe digo, Sr. Deputado Almeida Henriques, pode acreditar que, mais cedo ou mais tarde, chegaremos àquilo que, em Viseu, consideramos prioritário.
Mas o essencial neste momento é que o Sr. Deputado procurou fugir do debate que eu aqui trouxe. E o debate que eu aqui trouxe diz respeito ao erro de política municipal (que tem 16 anos) de impostos municipais máximos.
O senhor sabe quem assinou o protocolo com o anterior governo, com o Secretário de Estado Vasco Valdez, protocolo esse que permitiu justamente a intervenção das câmaras municipais, desde o primeiro passo em que os peritos locais foram para o terreno definir o zonamento e os coeficientes de localização? Olhe, Sr. Deputado, quem assinou esse protocolo, em nome da Associação Nacional de Municípios Portugueses, foi aquele que é simultaneamente Presidente desta associação e da Câmara Municipal de Viseu: o Dr. Fernando Carvalho Ruas.

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - Um grande presidente!

O Orador: - Portanto, não têm autoridade moral para falar desta questão, conforme já disse ao Dr. Fernando Ruas na assembleia municipal, pois há dois anos que podiam ter intervindo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Mas esta é a Assembleia da República, não é a Assembleia Municipal de Viseu!

O Orador: - E só não intervieram, porque há uma obsessão do PSD em Viseu que se traduz no seguinte: "impostos máximos, para obra máxima, com uso mínimo".
Por isso, há dois anos que os viseenses estão a pagar (contribuintes e investidores) por mais-valias, por valores patrimoniais que não correspondem aos valores de mercado!
Este é um erro e uma factura injusta que foi lançada sobre os viseenses nos dois últimos anos e que os senhores só estão a corrigir agora, porque sabem que há eleições em Outubro.

Protestos do PSD.

Vêm em bom tempo, mas vêm a reboque do candidato do Partido Socialista à Câmara Municipal de Viseu.

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Tenho propostas concretas, que discutirei, em Viseu, cara a cara, com o Sr. Presidente da Câmara.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Temos candidato à Câmara de Viseu!

O Orador: - O essencial é fazer propostas de correcção, isto é, propostas que visem a melhoria de um sector económico que é extremamente importante para Viseu e a correcção das injustiças que os senhores introduziram.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.

Eram 16 horas e 45 minutos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos dar início ao primeiro ponto da ordem do dia com a votação do projecto de resolução n.º 40/X - Viagem do Presidente da República ao Luxemburgo (Presidente da AR).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Passamos à votação do projecto de resolução n.º 42/X - Viagem do Presidente da República às Repúblicas do Paraguai e do Chile (Presidente da AR).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Seguidamente, vamos votar o projecto de deliberação n.º 4/X - Prorrogação do período normal de funcionamento da Assembleia da República (Presidente da AR).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Finalmente, vamos proceder à votação do projecto de resolução n.º 44/X - Constituição da Comissão Permanente (Presidente da AR).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Posto isto, Srs. Deputados, vamos passar ao segundo ponto da ordem do dia com a discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 14/X - Altera o Código do IVA, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 394-B/94, de 26 de Dezembro, e legislação complementar, procedendo ao aumento da taxa normal deste imposto.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e das Finanças.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças (Luís Campos e Cunha): - Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr.as e Srs. Deputados: Há poucos dias tive a oportunidade de apresentar e defender o Programa de Estabilidade e Crescimento, tanto em sede de Comissão como neste Plenário.
Com o Programa de Estabilidade e Crescimento, o Governo adoptou uma estratégia de desenvolvimento económico e de consolidação das contas públicas para o período de 2005-2009.
O Programa inclui medidas e reformas destinadas a enfrentar a actual situação orçamental, que é muito preocupante, e a criar as condições para um crescimento económico sustentado.
Como tenho muitas vezes referido, nada é mais falso do que a ilusão da "morte" do Programa de Estabilidade e Crescimento. Para reduzir o défice para 3%, a única alteração que o novo Programa de Estabilidade e Crescimento nos traz é: mais tempo. Mas não todo o tempo.
É, além disso, necessário garantir a credibilidade de Portugal junto dos investidores nacionais e estrangeiros e junto dos nossos parceiros da União Europeia.
Face à grave situação de partida, a credibilidade do Programa de Estabilidade e Crescimento depende da conjugação de três características em que o Programa se baseia.
A primeira característica do Programa consiste num pacote integrado de medidas com uma calendarização de implementação concreta, articulada e quantificada. Evidentemente, como verdadeiro plano plurianual de política orçamental, tem vários tipos de medidas: medidas de efeito imediato, de que é exemplo o aumento do IVA, hoje em discussão; medidas aprovadas desde já, mas para entrarem em vigor com o Orçamento do Estado para 2006; e medidas mais estruturais ou com processos legislativos demorados, que necessariamente levarão tempo a produzir efeitos mas que, desde já, fazem parte do nosso compromisso público e internacional.

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A segunda característica do Programa é ser front-loaded, ou seja, concentrar o esforço em 2005 e 2006. Deste modo, é essencial não adiar todo o esforço de consolidação orçamental para o final da Legislatura,…

O Sr. Guilherme d'Oliveira Martins (PS): - Muito bem!

O Orador: - … pois as medidas de impacto imediato são aquelas que garantem a credibilidade dos compromissos assumidos ao longo de todo o Programa.
A terceira característica do Programa é a de assentar na contenção da despesa pública. De facto, o Programa dá particular atenção aos custos de pessoal e à deterioração estrutural da segurança social, que tem vindo a ser observada nos anos mais recentes.
Por tudo isto, e pela dimensão previsível do desequilíbrio orçamental, foi inevitável complementar o pacote de medidas de contenção da despesa com outro conjunto de medidas destinadas a proporcionar um aumento imediato da receita.
Assim, dois impostos indirectos serão ajustados acima da inflação: o imposto sobre produtos petrolíferos e o imposto sobre o tabaco. Adicionalmente, prevê-se a criação de um novo escalão do IRS, assegurando assim um maior contributo para a consolidação orçamental por parte dos contribuintes com maiores rendimentos.
Mas, apesar destes aumentos da receita fiscal, apesar dos reconhecidos sucessos no combate à fraude e à evasão fiscais e apesar das medidas previstas do lado da despesa, que levarão algum tempo a produzir os seus efeitos, foi necessário compensar a deterioração da situação financeira da segurança social.
Assim, o Programa de Estabilidade e Crescimento prevê a subida da taxa normal do imposto sobre o valor acrescentado de 19% para 21%, a ser aplicada a partir do dia 1 de Julho de 2005.
Mais: o Governo decidiu ainda afectar este aumento da receita fiscal à segurança social e à Caixa Geral de Aposentações.
Além disso, o Governo decidiu não propor a alteração da taxa intermédia de 12%, que se aplica fundamentalmente à restauração, para salvaguardar a competitividade internacional da nossa indústria turística.
O Governo procurou, ainda, salvaguardar o rendimento dos mais pobres, pelo que decidiu igualmente não propor a alteração da taxa reduzida de 5%, que se aplica a bens de maior necessidade.
Em conclusão, Sr. Presidente, face à dimensão prospectiva e inusitada de um défice de 6,8%, face às exigências de urgência temporal dos efeitos das medidas, o Governo viu-se forçado a propor esta subida do IVA para acautelar a protecção dos mais pobres e assegurar o futuro próximo da segurança social.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado e das Finanças, permita-me que comente a sua introdução a este debate através da leitura de duas transcrições para as quais chamo a atenção especial de V. Ex.ª.
Primeira transcrição: "A situação orçamental com que nos deparamos exige o recurso a algumas medidas de efeito imediato. Não são por isso suficientes medidas do lado da despesa, cujo efeito é retardado no tempo. É neste contexto de verdadeira emergência que se impõe o recurso temporário ao aumento da taxa do IVA, deixando inalteradas as taxas reduzidas que incidem sobre bens essenciais."
Mais adiante, continua esta primeira transcrição: "Estamos conscientes de que este é o caminho para reanimar a actividade económica, para recuperar a confiança dos agentes económicos, para definir a sua perspectiva de longo prazo."
E a transcrição termina, dizendo: "Sabemos que os portugueses corresponderão ao esforço solidário que a todos pedimos para vencer os obstáculos que se nos deparam a fim de retomar decisivamente o caminho do progresso e do desenvolvimento económico."
Permita-me, Sr. Ministro, que lhe leia uma segunda transcrição: "O aumento do IVA afecta as expectativas dos agentes económicos, penaliza famílias de menores rendimentos, sobrecarrega a despesa pública nas aquisições de serviços e empreitadas de obras públicas e contribui, no quadro da obsessão financeira, para criar um ambiente propício à recessão económica a que Portugal escapou, mesmo no 11 de Setembro."
E continua: "Hoje, renova-se a opção pela dramatização e pelo confronto, um caminho que tem efeitos negativos sobre a economia, que vão muito para além de duvidosas vantagens orçamentais de medidas que produzem efeitos inflacionistas imediatos e penalizam as famílias de rendimentos médios e baixos."
Sr. Ministro, quero apenas que me responda e me tire esta dúvida: em qual dos dois discursos se revê o Governo e o Sr. Ministro? No primeiro discurso, que defende o aumento do IVA, cuja autoria é da Dr.ª Manuela Ferreira Leira, ou no segundo discurso, em que se defende que esse aumento iria prejudicar os mais desfavorecidos, cuja autoria é do ex-Deputado Eduardo Cabrita, hoje membro do seu Governo, e que acrescentava que esse aumento iria mesmo comprometer a economia e o crescimento económico? Em qual deles se revê V. Ex.ª?

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Aplausos do PCP.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Bem perguntado!

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Vamos ouvir a resposta!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Teixeira Lopes.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - O Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado e das Finanças, recorro, no início deste pedido de esclarecimento, a uma citação do então Deputado José Sócrates, num daqueles célebres debates a dois com Pedro Santana Lopes.
Dizia José Sócrates o seguinte: "É negativo para a confiança e não se esqueça que foi no momento da falha de promessa que tudo começou a ruir. Foi no momento de falha dessa promessa eleitoral, quando o governo chegou ao poder e decidiu aumentar o IVA, que a confiança veio por aí abaixo".O Sr. Ministro falou há pouco de credibilidade. Gostava de ouvir um comentário a estas afirmações do Sr. Primeiro-Ministro.
Como é possível dizer-se que Portugal quer credibilidade e, simultaneamente, ter-se afirmado que a credibilidade vinha "por aí abaixo" se o IVA fosse aumentado?
Por outro lado, Sr. Ministro, gostava de lhe colocar outra questão. Habitualmente, o Sr. Ministro tem dito que não há alternativa. Temos aqui o discurso thatcheriano de "não há alternativa, não há opção". Ora, o não haver opção é claramente o fim da política. Mas há alternativa, de facto. Há dois caminhos e o Sr. Ministro escolheu um.
Um primeiro caminho é aumentar a base tributável, isto é, os rendimentos sujeitos a impostos. E aqui podemos pensar num imposto sobre as grandes fortunas, e o Governo não criou; no levantamento do sigilo bancário, que foi aqui reprovado pelo Partido Socialista; na limitação do número de anos em que as empresas podem deduzir os prejuízos anteriores. Criou um novo escalão de rendimento para o IRS, respeitante a quem ultrapasse os 60 000/ano, que passa a pagar 42%, mas esta medida, sendo positiva, é claramente simbólica, porque há n formas de escapar a ela, como, por exemplo, criando uma empresa unipessoal, em que o detentor do rendimento pagará 25% de IRC ou, então, se levantar os lucros da empresa, só terá de pagar IRS sobre 50% do rendimento levantado. É por esta razão que tem um efeito simbólico.
E há um segundo caminho, que foi o caminho que o Sr. Ministro e o Governo escolheram: aumentar os impostos indirectos. Ora, aumentar os impostos indirectos é a medida exacta da injustiça social. O rico e o pobre - Belmiro de Azevedo e o trabalhador precário ou desempregado -, ao adquirirem o mesmo produto, pagam exactamente o mesmo imposto.
Por isso mesmo, sendo certo que os impostos indirectos representam 80% dos bens adquiridos, gostava que me dissesse como é que vai proteger os pobres, porque, Sr. Ministro, a sua última afirmação de protecção dos pobres ou é ironia ou é, perdoar-me-á, mau gosto.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado e das Finanças, eu, com franqueza, preferia citá-lo a si e com essas citações, ainda que com alguns meses de atraso, obter alguns esclarecimentos.
O Sr. Ministro recorda-se, certamente, de, no último debate que aqui tivemos a propósito do Programa de Estabilidade e Crescimento, lhe ter lembrado uma entrevista que deu ao semanário O Independente, onde assumia que o défice de partida para o Orçamento do Estado de 2005 era de 6,5%. Isto vem à colação para recordar que, quando o Partido Socialista fez a promessa aos portugueses de que não aumentaria os impostos, o fez já com o conhecimento desta previsão de défice, que, de resto, V. Ex.ª, como eminente catedrático, justificava mais à frente com muito pormenor.
Portanto, ainda que o Sr. Ministro nos venha agora dizer que não disse bem isso, a verdade é que lá se afirma que, quando se começou a preparar o Orçamento do Estado para 2005, se partiu de um défice base que andava à volta dos 6,5% e que, portanto, passar para 3% não era fácil.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): - Bem lembrado!

O Orador: - Mas há outras intervenções, do Sr. Primeiro-Ministro e de Deputados socialistas, em discussões neste Plenário, algumas das quais, por razões institucionais, não quero referir, e, portanto, a verdade é que o Partido Socialista sabia que o défice seria necessariamente superior a 6%, nos seus cálculos, que não necessariamente os do governo da maioria. Apesar disso, prometeu que não aumentaria os impostos, mas a verdade é que os aumentou.

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1255 | I Série - Número 031 | 17 de Junho de 2005

 

A primeira questão que lhe coloco, parafraseando o Sr. Deputado Ferro Rodrigues num debate parlamentar na altura, é se V. Ex.ª não acha que, se tivesse dito a verdade aos portugueses em campanha eleitoral, não estaria, certamente, sentado aí nessa cadeira. Esta é uma preocupação que é minha, mas relevando ainda, passados alguns meses, uma indignação do Sr. Deputado Ferro Rodrigues.
Uma outra questão que lhe deixo, Sr. Ministro, é em relação à solução que V. Ex.ª apresentava para as finanças públicas em Portugal, que nesta notícia se percebe bem e que, suponho eu, nas soluções governativas ainda nem sequer foi debatida. A esta questão da jornalista: "Portugal vai ter de usar receitas extraordinárias. Tem alguma ideia de quais poderão ser?", V. Ex.ª respondeu que "a imaginação tem-me ultrapassado, mas a forma mais barata de financiar um défice não é pelas receitas extraordinárias mas através de obrigações do tesouro(...)". E acrescentava V. Ex.ª: "(…) porque isso significa assumir o défice tal como ele é, financiá-lo por emissão da dívida pública. É a forma mais barata, mas não permite mascarar o défice, os 3% quando ele é de facto de 5%. O actual Governo já assumiu algumas dívidas comerciais e transformou-as em dívida pública, o que foi um passo importante na direcção certa. (…)" - obviamente que aqui V. Ex.ª refere 5% e mais à frente explica porque é que nos seus cálculos seria de 6,5% - "(…) As obrigações do tesouro são produtos muito líquidos que podem ser vendidos em todo o mundo e em mercados regulados (…)".
Era esta a fórmula para todos os males que V. Ex.ª, também como académico e como catedrático, preconizava para o País. Mas V. Ex.ª hoje é ministro e confesso-lhe que, em relação a obrigações do tesouro, nas últimas semanas e nos últimos meses, não tenho ouvido coisa alguma. Em bom rigor, a partir desta entrevista não tenho ouvido quase nada com o mesmo ênfase que dá a todas as outras medidas.
Para terminar, Sr. Ministro, existem outras preocupações, que são minhas e que serão também, certamente, do actual Presidente da Comissão de Assuntos Económicos, Inovação e Desenvolvimento Regional da Assembleia da República, Deputado João Cravinho, que, aqui há alguns dias, vociferava violentamente contra o ex-Ministro Bagão Félix, como se ele não tivesse dito grandes verdades, que disse efectivamente.
As preocupações que lhe deixo são as seguintes: a subida do IVA é ou não uma medida fácil mas injusta? A subida do IVA é ou não uma medida que sobrecarrega sobretudo os portugueses de menores recursos? O IVA é um imposto muito mais pesado para os pobres do que para os ricos? A subida do IVA não fará subir os preços e reduzir o poder de compra dos salários? A subida do IVA não vai diminuir a competitividade face a Espanha? Desta vez acompanhado pelo Secretário de Estado Eduardo Cabrita, queria saber também se o IVA sobrecarregará ou não a despesa pública nas aquisições de serviços de empreitada de obras pública e se contribuirá, no quadro da obsessão financeira urgente, para criar em 2005…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo, peço-lhe que conclua.

O Orador: - … um ambiente propício à recessão económica, a que Portugal escapou mesmo após o 11 de Setembro.
É que estes, Sr. Ministro, foram os gravíssimos inconvenientes que uma Deputada europeia, um Presidente de uma comissão parlamentar e um Secretário de Estado socialista de hoje assinalavam à Ministra Ferreira Leite, quando aqui se discutiu o aumento do IVA em dois pontos percentuais.
Sei que V. Ex.ª, até por razões de honestidade intelectual, pelo seu passado e pelo seu curriculum, não deixará de comentar com verdade, ainda que dirigindo-se a socialistas que, certamente, por razões de impedimento, não poderão fazê-lo agora, estas apreciações que naquela data foram feitas.
Portanto, se o Sr. Ministro puder, de facto, responder a estas questões, se a elas não fugir, estará, certamente, a prestar um serviço ao País, porque, por um lado, estará a aplicar aquela que é a sua medida e, por outro, também a corrigir algum desconforto que o Partido Socialista deve estar a sentir neste momento.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Em qual dos discursos se revê, Sr. Ministro?!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e das Finanças.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: - Sr. Presidente, Srs. Deputados, a grande diferença entre o que estamos a fazer hoje e o que foi feito há dois anos é que nós temos um conjunto de medidas para quatro anos que atacam a raiz do problema e não pretendem mascará-lo. Este o primeiro aspecto.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Então, o IVA mascara o problema ou ataca o problema?

O Orador: - O segundo aspecto, muito importante, é que não herdámos um défice de 4,1%, que era o que, na altura, era estimado para 2002, apesar das alterações contabilísticas. Não! Herdámos um défice prospectivo de 6,8%, o que é significativamente diferente.
Terceiro aspecto: não utilizaremos receitas extraordinárias que empurrem os problemas para o futuro,…

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O Sr. Honório Novo (PCP): - Ninguém está a falar disso!

O Orador: - … e este é também um aspecto crucial e muito importante neste pacote de medidas.
Fazemos o aumento de vários impostos, incluindo do IVA, mas temos também a preocupação de manter os níveis de investimento nacionais, como tive oportunidade de referir aquando da discussão do Programa de Estabilidade e Crescimento.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Mas isso também a Manuel Ferreira Leite dizia! Acabei de o ler! Está aqui, no Diário!

O Orador: - Além disso, o Partido Socialista não prometeu baixar impostos, não fez o "discurso da tanga".

Protestos do PSD.

Qual seria a alternativa a este pacote de medidas? A conclusão, aquando da discussão do Programa de Estabilidade e Crescimento, foi clara, no sentido de que não havia alternativa a este pacote de medidas.

Vozes do PSD: - Não é verdade! Não é verdade! Já vai ver!

O Orador: - Portanto, atacar apenas um ponto de um conjunto de medidas não é razoável nem é uma boa discussão.
A reputação internacional do País está em causa com um défice de 6,8%.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Qual défice?!

O Orador: - A alternativa é os mercados internacionais penalizarem seriamente a economia portuguesa, mais ainda do que o estão a fazer. E, evidentemente, nessa altura, com a subida das taxas de juro, seria muitíssimo pior porque, para além dos impactos orçamentais que isso teria, o investimento privado seria penalizado e os orçamentos das famílias também o seriam fortemente.
Portanto, a melhor maneira de protegermos os pobres é exactamente ter um Estado sólido e finanças públicas sãs, que possam garantir a segurança social.

Aplausos do PS.

Já tive oportunidade, pelo menos em duas situações, e vou fazê-lo pela terceira vez, de esclarecer o que disse e está escrito, não no título mas na entrevista que referiu. O que eu disse foi que o início da preparação do Orçamento para 2006 partia de um nível de 6,5% e, …

Vozes do PSD: - Do Orçamento para 2005!

O Orador: - … portanto, era necessário tomar medidas para o baixar, e também disse que, para baixar para 3%, não via como. Foi isso que foi dito e que lá está! Para elaborar o Orçamento para 2005 partia-se de um nível de défice de 6,5%.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Ah!…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Nem os socialistas acreditam!

O Orador: - É bom citar o que lá está e não apenas o título!
Quanto às receitas extraordinárias, já respondi.
Quanto às obrigações do tesouro e à forma de financiamento, Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo, o IGCP faz regularmente leilões de dívida e, portanto, é exactamente com dívida que estamos a financiar as necessidades do Estado e não com operações financeiras estranhas, difíceis de compreender e que apenas geram receitas extraordinárias à custa de défices maiores e mais complicados no futuro, como estamos hoje a assistir com, por exemplo, a securitização ou a titularização dos créditos fiscais.
O IVA é, de facto, um imposto que afecta a generalidade da população, mas tivemos o cuidado de isolar os segmentos mais pobres ao não aumentar o IVA de 5%, que afecta exactamente os medicamentos e a alimentação.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Mas isso também a Manuela Ferreira Leite fez!

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O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - A Manuela Ferreira Leite também não aumentou!

O Orador: - Quanto à competitividade, devo dizer que se trata de um falso problema, porque as empresas exportam sem IVA e, portanto, uma empresa portuguesa que vai para Espanha, quando chega lá, paga o IVA espanhol, pelo que está em igualdade de circunstâncias com as empresas espanholas.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): - E os factores produtivos?!

O Orador: - Da mesma forma, uma empresa espanhola, quando exporta para Portugal, paga o IVA português, ou seja, passará a pagar os tais 21%, o que significa que está em igualdade de circunstâncias com as empresas portuguesas. Portanto, o problema da competitividade internacional não se põe com o IVA.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Victor Baptista.

O Sr. Victor Baptista (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado e das Finanças, é sempre difícil ser Ministro das Finanças num Governo que tem a grave missão de equilibrar, de forma sustentada, as finanças públicas do País.
Quero dizer, desde já, que bem ao contrário de um outro governo ainda bem recente, que, embora consciente das dificuldades, apresentou aqui, na Assembleia da República, um Orçamento para o ano de 2005 em que até propôs a descida de alguns impostos…
Realço, na oportunidade, a intervenção feita na altura pelo hoje Primeiro-Ministro José Sócrates, enquanto líder do Partido Socialista, que aqui disse bem alto que o Partido Socialista não acompanharia - e na altura na aprovação do Orçamento para 2005 não acompanhou - a baixa dos impostos.
Rapidamente compreendemos quais eram os factos que estavam subjacentes, e que já eram visíveis, à situação financeira para onde o País estava a caminhar. Um défice de 4,1% é bem diferente de um défice de 6,8%, e ainda é mais diferente sobretudo quando temos um défice de 6,8% e o Orçamento apontava para um défice de 2,8%. Estamos a falar de 186%! O erro é tão pequeno, é apenas de 186%!...
Sr. Ministro, há uma semana, debatemos aqui o Programa de Estabilidade e Crescimento e foi evidente, ao contrário do que algumas vozes dizem, que ele prevê um acerto também do lado da despesa de 10 000 milhões de euros, ou seja, de mais de 45% dos impactos directos que estão previstos no Programa de Estabilidade e Crescimento.
Portanto, a proposta de lei n.º 14/X, que vem hoje à Assembleia da República, insere-se no documento que aqui foi debatido, do ponto de vista político, há uma semana. Esta é uma medida que está prevista nesse Programa.
É evidente que o Sr. Ministro, a meu ver, salvaguardou questões fundamentais, de imediato, nos bens de primeira necessidade, para que aqueles que mais sofrem não sejam tão penalizados, mantendo a taxa de 5%; manteve a taxa de 12%, para salvaguarda do turismo (como eu já disse) e aumentou o taxa geral de 19% para 21%.
A primeira questão que coloco, que penso ser fundamental, é esta: o Sr. Ministro afirmou aqui que este aumento de 19% para 21% é, sobretudo, uma receita consignada. Portanto, pergunto se ela é, ou não, uma receita consignada, que terminará em 2009, para salvaguardar o Estado social e a Caixa Geral de Aposentações, pois estamos em presença de uma verdadeira consignação para este efeito.
Depois, uma outra questão que desejo colocar-lhe é a de saber quais as medidas de combate à fraude e à evasão fiscais, concretamente quanto ao IVA, uma vez que estamos aqui a debater o aumento do IVA.
Para terminar, Sr. Ministro de Estado e das Finanças, há algumas vozes que discordam completamente da sua política.

Vozes do PSD: - Pudera!

O Orador: - Mas é curioso que Victor Martins, Pacheco Pereira, Cavaco Silva, Lobo Xavier, todos eles a reconhecem e dizem que não há outra saída e que a política que V. Ex.ª propõe é a adequada.

Protestos do PSD.

Pergunto às bancadas da oposição, sobretudo às da direita, se, afinal, já não reconhecem personalidades destas, com impacto na opinião pública, que apoiam concretamente a política do Governo?!

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

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O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Álvaro Castello-Branco.

O Sr. Álvaro Castello-Branco (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Hoje é um "dia negro" da governação socialista mas, muito pior, um "dia negro" para todos os portugueses.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Digo isto porque o Governo socialista vai hoje optar por aprovar um aumento de impostos, concentrando o esforço da consolidação orçamental do lado da receita, ao invés de fazer aquilo que é realmente necessário e que, repetidamente, o CDS já o disse, que é concentrá-lo do lado da despesa.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - O Governo socialista vai hoje optar pelo aumento da taxa normal do IVA, que é, de todos os impostos, o mais regressivo, concentrando o ónus do aumento da carga fiscal naqueles que menos têm e na classe média portuguesa.
O Governo socialista vai hoje optar pelo aumento do imposto cujo impacto na economia real se adivinha fortemente negativo, afectando assim o crescimento de toda a economia portuguesa, numa altura em que ela se apresenta ainda bastante débil.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - O Governo socialista vai terminar hoje com uma inflação generalizada muito próxima dos dois pontos percentuais e também se tornará hoje, com esta medida, responsável pelo aumento do desemprego, fruto de empresas que encerrarão as portas por perda de competitividade. No momento oportuno, Sr. Ministro, pediremos contas ao Governo, por esta irresponsabilidade.
Sr. Ministro de Estado e das Finanças, por si só, tudo o que referi seria já muito mais do que suficiente para que nos opuséssemos de forma determinada a esta medida. Infelizmente, levantam-se ainda outros problemas.
Em primeiro lugar, é necessário sabermos que garantias nos pode dar o Sr. Ministro da Finanças de que a receita adicional que conseguirá, em 2005, com este aumento será, de facto, de 400 milhões de euros, como referiu.
Levou V. Ex.ª em conta, nos seus cálculos, que a margem de manobra do IVA se encontra já esgotada, devido ao aumento da taxa normal de 17% para 19%, que foi efectuada em 2002?
Teve em atenção os efeitos negativos que este aumento vai produzir seguramente no consumo? Pode, em boa verdade, garantir-nos que este aumento se traduzirá num efectivo efeito positivo na receita e que esta vai de facto crescer?

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Em segundo lugar, poderá ainda V. Ex.ª esclarecer-nos quanto ao cumprimento da lei das finanças locais, que prevê que uma percentagem de determinadas receitas fiscais, nas quais se inclui a receita de IVA, será afecta às autarquias? Para este cálculo, vai contar a receita proveniente deste aumento?
Como é que vai cumprir esta exigência legal e, ao mesmo tempo, consignar a totalidade das receitas à segurança social e à Caixa Geral de Aposentações?
Sr. Ministro, são estas as questões que queria deixar-lhe aqui, com uma grande preocupação por esta medida, profundamente irresponsável,…

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - E injusta!

O Orador: - … profundamente nociva para a economia portuguesa, que o Governo socialista resolveu tomar, defraudando com isso a relação de confiança que os eleitores, no dia 20 de Fevereiro, estabeleceram com o Partido Socialista, tendo sido determinante nessa relação de confiança o facto de terem afirmado não que iam baixar os impostos mas que não os iam aumentar,…

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - … o que é uma questão completamente diferente. Foi isto o afirmado pelo Partido Socialista e não está a ser cumprido!

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Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e das Finanças.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: A receita do IVA será consignada para suportar despesas na área da segurança social, num sentido lato, ou seja, segurança social/Caixa Geral de Aposentações, até 2009.
Pela lei de financiamento das regiões, há uma parte que será efectivamente transferida para as regiões, que tem um impacto não despiciendo mas que, de qualquer forma, não será particularmente gravoso.
Quanto ao financiamento das autarquias, apenas passados dois anos é que teria esse impacto. Entretanto, como hoje há possibilidade de haver consignação de receitas por um período delimitado no tempo, e isso está previsto, é essa a modalidade que estamos a pensar seguir.
Quanto ao combate à evasão, de facto, esta é uma das prioridades do Governo, e mais tarde, em sede de especialidade, poderemos voltar a discutir este assunto. No entanto, gostaria apenas de chamar a atenção para dois aspectos, sendo que um deles é um aumento da cooperação com Espanha, o que é particularmente importante por causa dos movimentos transfronteiriços, para, evidentemente, aumentarmos a colecta do IVA. O segundo aspecto é o de promover uma maior obrigatoriedade de entrega de facturas (ela existe, mas não é muito cumprida), promovendo o cumprimento da obrigatoriedade de entrega de facturas, nomeadamente até por parte de restaurantes e noutras pequenas transacções. Estamos a trabalhar na resolução destas questões e em breve apresentaremos soluções, aliás, inspiradas no modelo internacional.
Em resposta às questões suscitadas pelo Sr. Deputado Álvaro Castello-Branco, gostaria de dizer, relativamente à consolidação orçamental em 2009, que se o Sr. Deputado olhar para o quadro 4.2 ou 4.5 (já não me recordo bem) do Programa de Estabilidade, tal como eu disse na altura, verá que as receitas correntes aumentam 1,9% do PIB e as despesas correntes primárias caem 2,5% do PIB.
É que ler o quadro 3.2 sem ler o que está no título dá direito a não perceber, porque o primeiro quadro é o dos efeitos directos, o dos efeitos iniciais. Os efeitos indirectos, obviamente, têm em consideração que algumas destas medidas, nomeadamente a do aumento de impostos, têm evidente impacto sobre a economia, sobre o consumo, e esses valores serão sempre, obviamente, menores no final, como, aliás está implícito nos referidos quadros 4.2 e 4.5.
Julgo que os Srs. Deputados, tal como o Sr. Deputado Álvaro Castello-Branco, aprovaram já um aumento do IVA. Não percebo, agora, porquê tanto ódio em relação a este!

O Sr. Álvaro Castello-Branco (CDS-PP): - Ódio?!

O Orador: - Devo, aliás, dizer que países muito desenvolvidos…
Peço desculpa, tenho de terminar porque o meu tempo esgotou-se.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - "Esgotou-se", foi o argumento!

O Sr. Presidente: - Para intervir na qualidade de relatora da Comissão de Orçamento e Finanças, tem a palavra a Sr.ª Deputada Aldemira Pinho.

A Sr.ª Aldemira Pinho (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Na sequência do despacho de admissibilidade do Sr. Presidente da Assembleia da República, a proposta de lei n.º 14/X, em debate nesta sessão plenária, baixou à Comissão Parlamentar de Orçamento e Finanças para efeitos de emissão do competente relatório e parecer.
Emitido o respectivo relatório, que foi analisado e aprovado, por unanimidade, na reunião da Comissão de Orçamento e Finanças, realizada no dia 15 de Junho, passo a apresentá-lo.
Do relatório, em termos de nota preliminar, começo por referir que a proposta de lei n.º 14/X - Altera o Código do IVA, aprovado pelo Decreto-lei n.º 394-B/84, de 26 de Dezembro, e legislação complementar, procedendo ao aumento da taxa normal deste imposto, foi apresentada ao abrigo dos normativos em vigor, reunindo os respectivos requisitos formais.
Importa sublinhar que o Governo, na exposição de motivos que antecede a proposta de lei, invoca a necessidade de o processo de apreciação desta medida, no âmbito da Assembleia da República, ser iniciado e concluído com carácter de urgência.
Com esta proposta de lei, o Governo visa proceder ao aumento da taxa normal de IVA, alterando o Código do IVA, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 394-B/84, de 26 de Dezembro, e legislação complementar.
A exposição de motivos que antecede a proposta de lei vertente refere que o aumento da taxa normal do IVA é assumido pelo Governo como uma medida excepcional indispensável para a consolidação orçamental mas particularmente dirigida à prossecução da equidade e da sustentabilidade dos sistemas da segurança social e da Caixa Geral de Aposentações.
Nos termos da Constituição da República Portuguesa, constituem objectivos fundamentais do sistema fiscal a satisfação das necessidades financeiras do Estado e uma justa repartição dos rendimentos e da riqueza.

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A criação de impostos, sistema fiscal e regime geral das taxas e demais contribuições financeiras a favor de entidades públicas é da exclusiva competência da Assembleia da República.
Tendo em consideração que a proposta de lei estabelece, no seu artigo 3.º, a consignação de receita resultante do aumento da taxa normal do IVA, importa ter presente o regime jurídico estabelecido na Lei de Enquadramento Orçamental. É, pois, à luz deste enquadramento jurídico que o Governo apresenta esta proposta de lei.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Do relatório, e atentos os considerandos já referenciados, conclui-se que o Governo tomou a iniciativa de apresentar a proposta de lei n.º 14/X - Altera o Código do IVA, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 394-B, de 26 de Dezembro, e legislação complementar, procedendo ao aumento da taxa normal deste imposto.
Através do competente despacho de admissibilidade, a proposta de lei baixou à respectiva comissão parlamentar para emissão do respectivo parecer.
Com esta proposta, o Governo visa: a alteração dos artigos 18.º e 49.º do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 394-B/84, de 26 de Dezembro, e a alteração do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 347/85, de 23 de Agosto, com vista ao aumento da taxa normal de IVA de 19% para 21 %, no continente, e de 13% para 15%, nas Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira; a consignação da receita resultante do aumento da taxa normal à segurança social e à Caixa Geral de Aposentações em igual proporção; e, por último, a entrada em vigor em 1 de Julho de 2005 das alterações introduzidas pelo presente diploma, derrogando o disposto no n.º 9 do artigo 18.º do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado.
Ainda uma última conclusão: a consignação da receita deverá ser excepcional e temporária.
No debate no âmbito da Comissão, o Grupo Parlamentar do PS assumiu que irá apresentar em Plenário uma proposta de aditamento ao artigo 3.º da proposta de lei, definindo o prazo de aplicação da medida, em conformidade com a Lei de Enquadramento Orçamental.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José de Aguiar Branco.

O Sr. José de Aguiar Branco (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A proposta de lei que trata do aumento da taxa normal do imposto sobre o valor acrescentado e que motiva esta minha intervenção, regista de forma marcante a linha de rumo, ora incoerente, ora atordoada, ora demagógica ou manifestamente errada com que o Governo tem tratado a matéria do combate ao défice das finanças públicas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Não cuidarei, porque isso agora interessa pouco aos portugueses, da incoerência desta proposta face às sucessivas juras eleitorais de não aumento dos impostos. No momento certo, os portugueses saberão sancionar esse facto.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Não tratarei, porque isso agora interessa pouco aos portugueses, dos atordoados e surpresos desconhecimentos do Sr. Primeiro-Ministro, que não do Sr. Ministro de Estado e das Finanças, sobre o real valor do défice. No momento oportuno, os portugueses saberão cobrar com juros esse alegado, mas não crível, desconhecimento.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Não abordarei tão pouco, embora isso pudesse interessar desde já aos portugueses, a perigosa demagogia com que o Sr. Primeiro-Ministro tem tratado, nesta sede do combate ao défice,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - … a matéria do que diz serem os privilégios imorais e injustificados dos funcionários públicos e da classe política, metendo "no mesmo saco" situações totalmente distintas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Com isso, o Sr. Primeiro-Ministro coloca em causa a dignidade do exercício dos cargos públicos, nomeadamente o de Primeiro-Ministro, e contribui para uma incorrecta avaliação, estimulando a crítica negativa, sobre o carácter de todos aqueles que de boa-fé se dispõem a servir a causa pública.

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Aplausos do PSD.

Direi, por todos, que o suposto desprendimento de privilégios que o Sr. Primeiro-Ministro invoca para si próprio, ou antes para o cargo de Primeiro-Ministro, é a prova mais acabada da confusão do interesse particular com o do Estado.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Não é admissível que ao exercício dessa alta e nobre função só possam aceder os cidadãos mais ricos ou que a dignidade do Estado seja compatível com o eventual cenário de um ex-primeiro-ministro ir à busca de emprego numa qualquer empresa ou instituição por ter, precisamente, prestado serviços relevantes ao País.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - No momento próprio, será possível aquilatar do superavit demagógico com que esta matéria tem sido tratada e anunciada, com manifesto prejuízo para que cidadãos de bem se dediquem à causa pública.

Aplausos do PSD.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vou limitar-me, assim, porque isso interessa, e muito, aos portugueses, a demonstrar, ainda que de forma sintética, por que é errado aumentar o imposto sobre o valor acrescentado e por que seria desejável que fosse outra a solução proposta para obter a necessária receita extraordinária.
Aumentar o IVA é anti-social, anti-económico e anti-cívico, mais ainda quando se anuncia, sem cuidar do absurdo da afirmação, que se trata de uma medida "excepcional" e temporária para durar, pasme-se, até ao fim da legislatura,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Exactamente!

O Orador: - … como se fosse possível, qual tique de arrogante maioria, impor a medida para lá desse período.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A natureza do nosso défice, estrutural e directamente relacionado com o peso excessivo do Estado, impunha, para que os portugueses pudessem ver para lá do horizonte negro do traço vermelho das finanças públicas, que o Governo demonstrasse, imediata e consistentemente, possuir, por um lado, uma estratégia inequívoca de redução do peso do Estado na economia e acreditar, por outro lado, que é nos nossos empresários que está a chave da mudança, que são eles que melhor sabem mobilizar os recursos, as competências e as energias para que os projectos que criam verdadeiramente riqueza e emprego apareçam e se desenvolvam.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Ora, o Governo não só nada diz de concreto quanto ao emagrecimento do Estado como impõe medidas que agravam as condições para que os empresários tenham sucesso.
O peso excessivo do Estado traduz-se por uma inoperância generalizada, proporciona a dispersão de esforços e favorece o descontrolo da gestão pública.
A escolha cuidada das verdadeiras prioridades do Estado é, assim, absolutamente indispensável para uma concentração de esforços e de recursos que garanta um alto nível de qualidade e de eficácia.
A carga fiscal, já muito elevada no nosso país, deve impor um limite muito claro não só às ambições de expansão do sector público como também um rumo inequívoco de contenção e de redução das respectivas despesas.
Com um volume de impostos excessivo, os custos, em termos de perda de eficiência económica, tornam-se incomportáveis e tendem a generalizar-se os comportamentos anti-sociais de revolta e de evasão fiscal, que são totalmente contrários ao bem comum.

Vozes do PSD: - Muito bem!

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O Orador: - Neste quadro, o aumento do IVA, se significa no imediato uma efectiva receita extraordinária, traduz-se, pela sua anunciada "provisoriedade definitiva", num aumento da asfixia estruturante do Estado sobre a iniciativa privada,…

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Exactamente!

O Orador: - … o que constitui, sem dúvida, mais uma condicionante gravíssima para o principal motor do nosso crescimento económico.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Não é por aí que o Governo deve ir.
O que se impõe é que se alcancem verdadeiras receitas extraordinárias que não afectem, mas antes favoreçam, se possível, a afirmação do sucesso da iniciativa privada.
O que se impõe é que essas receitas não sejam meras soluções de contabilidade pública que, concertando os números, não resolvem a essência do problema.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O que se impõe é que o Governo seleccione criteriosamente os activos que não faz sentido que o Estado continue a deter e que, alienando-os, contribua, por um lado, para a obtenção da receita extraordinária que careça para combater o défice e, por outro, para a redução do seu próprio peso na economia.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Não obstante, não deixaremos de apoiar o Governo no que vise a redução do défice nas contas públicas, sendo que, no momento certo, estaremos atentos para a rigorosa avaliação se o combate não se quedar apenas pela subida dos impostos.

Aplausos do PSD.

Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Menos Estado, melhor Estado; não agravamento da carga fiscal; estabilidade de regras, para que se estimule a concorrência e a competitividade das nossas empresas; combate sem tréguas ao desperdício que resulta da má gestão dos dinheiros públicos e luta determinada contra a evasão fiscal são as nossas linhas mestras de orientação, para que os portugueses aceitem que vale a pena acreditar no futuro. Daí a nossa discordância em relação a este diploma.
E termino, Sr. Presidente e Srs. Deputados, lembrando, mais uma vez, as palavras cuidadas de Fernando Pessoa, que aqui me parecem particularmente certeiras: "O princípio da cura está na consciência da doença, o da verdade no conhecimento do erro.".

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Gameiro.

O Sr. António Gameiro (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado e das Finanças, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Sr. as e Srs. Deputados: O Sr. Primeiro-Ministro assumiu frontalmente, nesta Câmara e perante os portugueses, que o plano inicial do Governo para a consolidação orçamental não incluía o aumento de qualquer dos impostos mas que, face ao défice que foi determinado pela Comissão para a Análise da Situação Orçamental e aos cerca de 5,5 mil milhões de euros que faltam ao Orçamento de 2005, o Governo não tem outra solução possível, que permita obter resultados em tempo útil e consolidar as finanças públicas de forma credível e séria, senão proceder ao aumento da taxa do IVA de 19% para 21%.
É certo que o PS, na legislatura passada, se opôs ao aumento da taxa de IVA de 17% para 19%, num cenário em que o défice era de 4,1% ou de 3,5%, conforme a perspectiva contabilística de análise assumida. É certo que essa oposição se deveu, sobretudo, ao estado da economia nesse momento e ao facto de o governo do PSD/CDS-PP de então ter assente a sua estratégia de combate ao défice orçamental num conjunto de medidas que transformaram a existência de um défice excessivo num determinado ano - e diga-se, em abono da verdade, após cerca de seis anos de redução do défice e de um acelerado crescimento económico acima da média da União Europeia - numa grave crise financeira e económica que se veio a agravar mais com as

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medidas tomadas pela Dr.ª Manuela Ferreira Leite e pelo Dr. Bagão Félix, como o relatório da Comissão para a Análise da Situação Orçamental bem o demonstra e patenteia.
O governo PSD/CDS-PP começou então a sua estratégia por um corte abrupto do investimento público em geral e hoje o PSD advoga, igualmente, um corte do investimento público não comparticipado em 10%?! É caso para perguntar: os Srs. Deputados não aprenderam nada com os erros que fizeram no governo, nos últimos três anos?
Neste enquadramento, com a determinação do Governo e a frontalidade que o melindre desta matéria exige, urge afirmar o primado da verdade em detrimento da demagogia.
O Governo já afirmou que se o défice estivesse estimado em parâmetros próximos dos 5%, como era expectável, hoje não estaríamos, aqui, a debater esta matéria, porque seria possível evitar a subida dos impostos.
Todavia, esta é a realidade que temos de enfrentar, aprendendo com os erros do passado e retirando daí as lições devidas, perspectivando um novo rumo para a consolidação das finanças públicas através de um programa credível e adequado ao efeito.
O Governo, como já ficou demonstrado, foi confrontado com uma situação orçamental que justifica a todos os títulos a opção inevitável de aumentar a taxa máxima do IVA.
É do conhecimento público, e colhe foros de elevada notoriedade, a ideia de que o Governo não tinha mais nenhuma alternativa credível e eficaz para, no curto prazo, obter receita que permitisse obviar e combater um défice perspectivado de 6,83%.
O PS e o seu Governo gostariam de manter a promessa de não aumentar os impostos.
O PS e o seu Governo assumem o aumento do IVA como uma medida excepcional, indispensável e transitória, para a consolidação orçamental, mas particularmente dirigida à prossecução da equidade e da sustentabilidade dos sistemas da segurança social e da Caixa Geral de Aposentações, a cujos orçamentos ficará consignada a respectiva receita fiscal até 2009.
Esta medida foi adoptada, Sr. Presidente e Srs. Deputados, após uma profunda reflexão acerca das alternativas e o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais já demonstrou que todas as alternativas equacionadas pelo Governo, bem como as apresentadas por académicos e por especialistas fiscais, deixavam a receita fiscal a várias centenas de milhões de euros da receita que poderá potencialmente ser percebida pelo Estado através desta medida, pelo que as vozes que equacionam outras soluções não podem estar, no que toca à receita fiscal, munidas de todos os elementos, ou, se o estão, demonstram à exaustão pouca vontade de resolver o problema da consolidação orçamental.
Todavia, esta medida enquadra também um factor acrescido de credibilidade internacional do Programa de Estabilidade e Crescimento, apresentado nesta Câmara na passada semana, porquanto demonstra que, paralelamente a um vasto conjunto de medidas de redução da despesa pública, o Governo encetou também um extenso e coerente pacote de medidas de combate efectivo à fraude e evasão fiscais, promovendo uma melhor justiça social e equidade fiscal.
Com esta medida, o Governo prevê arrecadar 400 milhões de euros ainda em 2005 e 900 milhões de euros ano no período entre 2006 e 2009, contribuindo desse modo para uma redução do défice público em igual montante. Para poder concretizá-la, apresentou, no passado dia 2 de Junho, a presente proposta de lei à Assembleia da República.
A credibilidade internacional de Portugal estava - em 2001 - e está em causa, como afirmou a Dr.ª Manuela Ferreira Leite no debate do orçamento rectificativo de 2002.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Deixe lá a Dr.ª Manuela Ferreira Leite!

O Orador: - Dizia ela: "(…) não constitui surpresa para ninguém de boa-fé que a situação orçamental com que nos deparámos e o curto prazo de tempo de seis meses de que dispomos para a corrigir exigem o recurso a algumas medidas de efeito imediato. Não são, por isso, suficientes medidas do lado da despesa, cujo efeito é retardado no tempo. Mas o que não tardará, o que não se fará esperar é o prazo limite do fim do ano para ter um défice orçamental inferior a 3%. É neste contexto de verdadeira emergência que se impõe o recurso temporário ao aumento da taxa do IVA (...)". "É este o dilema que o Governo e a oposição são chamados hoje, aqui, a discutir sem demagogia e com a noção da pesada responsabilidade que recai sobre todos nós.".
É aqui que bate o ponto! Como explicam os Srs. Deputados do PSD que face a um défice de 4,1%, determinado pela Comissão Constâncio em 2002, tenham aumentado a taxa do IVA de 17% para 19% e que hoje, face a um défice previsto de pelo menos 6,83%, digam que estão contra esta medida do Governo do PS, sem darem qua1quer solução que ajude a resolver de vez o problema, sem assumirem o tão propagandeado sentido de Estado que dizem ser-vos intrínseco? Respondam lá!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, tenha a bondade de concluir, porque já excedeu o seu tempo.

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O Orador: - Está claro que com VV. Ex.as no governo o aumento do IVA não chegou para reduzir o défice, porque ele era uma obsessão em si mesmo e porque algumas medidas acertadas de combate à despesa pública, que encetaram em 2002, logo ficaram pelo caminho.
Hoje, face ao deserto de ideias nesta matéria, resta-vos o argumento das SCUT. Muito bem, todos percebemos já que a vossa obsessão e aposta seria fazer com que quem utilizasse essas vias pagasse os erros cometidos durante três anos por VV. Ex.as!

Protestos do PSD.

Por estas razões, sabemos que os portugueses compreenderão o esforço solidário que a todos é pedido para vencer os obstáculos que se nos deparam, a fim de retomar e de potenciar o caminho do progresso e do crescimento económico desde há 3 anos adiado.
Por estas razões, o Grupo Parlamentar do PS apoia sem reservas esta medida do Governo, porque apesar de não gostar de aprovar medidas de aumento de impostos o interesse nacional assim o impõe, uma vez que é, afinal, o futuro de todos nós que está em causa, o futuro de Portugal.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O aumento do IVA parece ser o recurso fácil e eficaz de que sucessivos governos se servem para penalizar os portugueses, em especial os trabalhadores e os mais desfavorecidos. Sempre que chegam ao governo, lá descobrem que as contas públicas estão, afinal, pior do que pensavam e, por isso, em vez de diminuírem ou de não aumentarem impostos, lá dão mais uma pequena contribuição na subida das taxas dos mesmos, que penalizam o País e os portugueses.
No passado, Manuela Ferreira Leite invocou o défice para fazer subir o IVA de 17% para 19%. Na altura, a medida também era transitória, também fazia um apelo aos portugueses em nome do crescimento económico e também era para equilibrar as contas e respeitar o Pacto de Estabilidade, tal como acabei de citar.
Agora, com José Sócrates, os pretextos são os mesmos, os argumentos são iguais, os objectivos são idênticos: o espartilho do Pacto de Estabilidade, apesar das suas mais do que insuficientes e recentes alterações (Sr. Ministro, estou de acordo consigo neste aspecto!), é novamente o alfa e o ómega da obediência e da obsessão orçamental. A única diferença é que, em 2002; a taxa subiu de 17% para 19% e agora passa de 19% para 21%.
O IVA, o imposto que "está mais à mão", o tal imposto cego e injusto que penaliza sobretudo os mais desfavorecidos e as famílias de menores recursos, é de novo o expediente do Governo, a mais importante das medidas fiscais que constam do Programa de Estabilidade e Crescimento aprovado no início do mês, mas essa é uma solução errada no plano social e no plano económico.
O Governo nem quer ouvir falar dos efeitos do aumento do IVA na competitividade da economia portuguesa. Quando importa moderar salários ou atacar direitos de trabalhadores interessa invocar, mesmo que de forma falsa, a competitividade da economia portuguesa, mas quando se aumenta o IVA e se faz com que a sua taxa normal seja, por exemplo, superior em 5 pontos percentuais à praticada no vizinho ibérico, a competitividade da economia portuguesa já não conta, especialmente, Sr. Ministro, para todas as zonas fronteiriças de Portugal, que é quase todo o país, passe a expressão.
O Governo também não quer ouvir falar dos efeitos do IVA na evasão fiscal. E o curioso, mas que dá bem a noção da gestão, sobretudo mediática, que o Governo faz da aprovação das suas políticas, é que no mesmíssimo dia em que pela enésima vez se anuncia um pacote de medidas de combate à evasão fiscal - oxalá ele seja finalmente cumprido e positivo - esteja simultaneamente a ser debatido, e vá ser aprovado, o aumento de um imposto que é exactamente o campeão da fuga fiscal…

O Sr. António Filipe (PCP): - Exactamente!

O Orador: - … e para cujo aumento vai certamente contribuir este agravamento de taxas.
Sr. Ministro, a melhor maneira de promover a evasão fiscal no IVA é certamente a escolhida pelo Governo ao aumentar a taxa do IVA de 19% para 21%!
Ao optar pelo aumento do IVA, o Governo nem sequer avaliou, e não parece interessado em avaliar, os impactos negativos que esse agravamento fiscal terá no consumo e as consequências que em cadeia poderão surgir e fazer-se sentir no crescimento económico.
Quanto às consequências sociais, os efeitos são, infelizmente, conhecidos. Mesmo admitindo a necessidade de aumentar impostos - e não está provada, Sr. Ministro! -, o Governo toma partido contra os mais desfavorecidos: em vez de subir os impostos directos, que penalizariam os que mais ganham e têm, o Governo opta por voltar a aumentar os impostos indirectos, cujos efeitos atingem, sobretudo, quem já paga e

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pouco pode; em vez de tributar o património mobiliário ou as grandes fortunas, o Governo "assobia para o lado" e serve-se do imposto "cego" que atinge, sobretudo, os mais pobres.
As repercussões do aumento do IVA no acréscimo da inflação e na penalização directa dos mais desfavorecidos mostram bem quem vai ser penalizado.
A opção pelo aumento da taxa do IVA como medida central do Programa de Estabilidade e Crescimento confirma bem a total insensibilidade social do Programa e mostra que os sacrifícios, afinal, não são para todos, porque vão, sobretudo, afectar os mais desfavorecidos, as famílias de menores rendimentos, os trabalhadores deste país. Esta é a marca profundamente injusta do aumento do IVA e do Programa de Estabilidade e Crescimento que lhe está na origem e lhe designa a paternidade.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (OS Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Ministros, Srs. Deputados: Durante a campanha eleitoral, vários partidos foram confrontados com a seguinte questão por parte de um órgão da nossa imprensa escrita: "O seu partido propõe aumentar os impostos?". Resposta do Partido Socialista: "Não.".
Em Maio de 2005, no dia 25 mais precisamente, o Sr. Primeiro-Ministro veio à Assembleia da República anunciar a situação orçamental e financeira do País, tendo referido expressamente o seguinte: "Por isso, quero anunciar que o Governo decidiu proceder também ao aumento dos impostos; vamos assim ter de aumentar a taxa normal do IVA em dois pontos percentuais, de 19% para 21%", portanto, em incongruência relativamente àquilo que foi dito em campanha eleitoral. Aquela que foi, afinal, tal como no governo anterior, também uma das primeiras medidas do Governo está achada e será, com certeza, julgada por parte dos portugueses.
Mas, então, é preciso que nos pronunciemos sobre o aumento do IVA. E eu, para o efeito, se os Srs. Deputados me permitem - sei que as citações têm sido muito usadas neste debate -, farei minhas as palavras de um conjunto de Deputados do Partido Socialista, todas proferidas em vários meses do ano de 2002.
O Sr. Deputado Eduardo Cabrita dizia o seguinte: "O aumento do IVA afecta as expectativas dos agentes económicos, penaliza as famílias de menores rendimentos, sobrecarrega a despesa pública nas aquisições de serviços e empreitadas de obras públicas e contribui, no quadro da obsessão financeira vigente, para criar um ambiente propício à recessão económica, a que Portugal escapou mesmo após o 11 de Setembro.".
O Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira dizia, a propósito da discussão do orçamento rectificativo: "É um orçamento que ataca os grupos sociais, as famílias, os jovens e as pessoas com mais carências e dificuldades, de que é exemplo o aumento em dois pontos da taxa máxima do IVA.".
O Sr. Deputado Fernando Serrasqueiro dizia: "Havia alternativas ao agravamento do IVA, o que nos leva a considerar que esta medida, para além de injusta, terá sérias consequências no tecido social e económico.".
O Sr. Deputado João Cravinho dizia: "A subida do IVA é uma medida fácil mas claramente injusta. A subida do IVA é uma medida que sobrecarrega sobretudo os portugueses de menores recursos. O IVA é um imposto muito mais pesado para os pobres do que para os ricos e o aumento do IVA fará subir os preços e reduzirá o poder de compra dos salários. A subida do IVA vai diminuir a competitividade face à Espanha de uma grande gama de empresas das mais diversas actividades.".
O Sr. Deputado José Sócrates também disse que "o aumento do IVA foi uma decisão errada que em muito veio contribuir para o actual clima de estagnação económica".
Percebemos, então, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que não se tratou de uma intervenção, de uma afirmação pontual, por parte de um Deputado do Partido Socialista, foram, de facto, diversas as intervenções que o PS teve, enquanto oposição, a condenar veementemente o aumento do IVA em 2%.
Ora, aquilo que penso estar por explicar aos portugueses é que todos esses efeitos que os Srs. Deputados do Partido Socialista denunciaram, relativamente ao aumento do IVA, não podem ter cessado de repente só porque já não é o governo do PSD/CDS-PP a apresentar esse aumento mas o do Partido Socialista. Ou seja, a justiça ou a injustiça das medidas não pode decorrer da autoria da sua apresentação mas, sim, criteriosa e objectivamente, dos seus efeitos concretos.
É claro que este Governo vem, por um lado, dramatizar a questão, referindo que não se trata de um défice de quatro e tal por cento mas, sim, de 6,8%, e, por outro, dizendo que esta medida está integrada num pacote de medidas.
Porém, o certo é que os efeitos concretos do aumento do IVA foram bem denunciados pelos senhores em 2002 e, com certeza, serão exactamente os mesmos em 2005. O problema é que os senhores sabem que daí decorre uma injustiça social grande mas denota-se bem que, para os senhores, isto é um efeito colateral daquele que consideram ser o objectivo principal, que é o combate ao défice.
Quero também dizer, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que é relevante que do pacote de medidas apresentado esta tenha sido a primeira a vir à Assembleia da República. E é importante dizer também que se tratou de uma opção por parte do Governo, porque havia outras alternativas, a que, aliás, nós, aqui, já nos referimos várias vezes. Trata-se, pois, de uma questão de opção por parte do Governo, porque, quanto a um

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imposto sobre as grandes fortunas, nem se pronunciam; quanto à tributação das mais-valias, nada dizem; quanto à revisão da tributação a que a Banca está sujeita, nada fazem. Portanto, de facto, havia outras alternativas a que este Governo não tem coragem de recorrer.
Quanto à limitação no tempo da medida que nos é proposta, penso que este Governo, se se trata de uma medida transitória, deveria ter a coragem de considerar, no decurso deste mandato, a diminuição da taxa do IVA. Penso que Dezembro de 2009 já será, com certeza, um pouco tarde e que deveriam assumir, com coragem, a transitoriedade desse aumento, que nós condenamos, evidentemente, mas isso não sucederá no vosso tempo.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Teixeira Lopes.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A "Comissão Constâncio" elaborou uma previsão de receitas fiscais para 2005 inferior - pasme-se! - à do próprio Orçamento do último Governo PSD/PP, mas a verdade é que em cada 100 € de impostos cobrados 65 € terão origem em impostos indirectos. E vamos ver quem paga impostos em Portugal.
Segundo dados do Ministério das Finanças - dados de 2003 sobre os rendimentos médios anuais declarados pelos contribuintes para efeito de IRS -, verifica-se que os trabalhadores por conta de outrem pagam 11 350 €, os reformados pagam 8500 €, os profissionais livres e empresários pagam 6000 €, os detentores de rendimentos de capitais pagam 590 € e os detentores de mais-valias pagam 5600 €. Temos aqui, Sr. Ministro, toda a base da injustiça fiscal, que é a base da injustiça social. E temos um país onde o índice de Gini mostra bem a distância que vai dos mais pobres aos mais ricos, a maior distância, precisamente, dos países da União Europeia a quinze, os maiores pólos de concentração de riqueza e os maiores pólos de concentração de pobreza. No ano passado - pasme-se! - tivemos 400 novos milionários!
Ora, o Programa do Governo vai aumentar a inflação, vai aumentar a injustiça fiscal, vai criar obstáculos ao crescimento da economia. É todo um programa de agravamento das desigualdades sociais.
Disse o Sr. Ministro: "É para proteger os pobres". Sr. Ministro, os pobres têm inteligência!

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: - Sr.as e Srs. Deputados, concluímos o debate, na generalidade, da proposta de lei n.º 14/X.
Vamos dar início ao período regimental de votações, inclusive da votação, na especialidade, do diploma que acabámos de apreciar, pelo que importa, antes de mais, proceder à verificação do quórum, utilizando o cartão electrónico.
Os Srs. Deputados que não tiverem consigo o referido cartão, e que, portanto, se "auto-excluam" da sociedade da informação,…

Risos.

… farão o favor de assinalar artesanalmente, à Mesa, a sua presença.

Pausa.

Srs. Deputados, o quadro electrónico regista 118 presenças, registando ainda a Mesa a presença de um elevado número de "info-excluídos",…

Risos.

… pelo que há, claramente, quórum de deliberação.
Vamos, então, proceder às votações, começando pela votação, na generalidade, da proposta de lei n.º 14/X - Altera o Código do IVA, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 394-B/94, de 26 de Dezembro, e legislação complementar, procedendo ao aumento da taxa normal deste imposto.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS e votos contra do PSD, do PCP, do CDS-PP, do BE e de Os Verdes.

Vamos agora proceder à votação, na especialidade, da mesma proposta de lei, a qual será precedida de um curto período de discussão, dispondo cada grupo parlamentar e o Governo de 3 minutos.

Pausa.

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Srs. Deputados, a Mesa não regista inscrições para o debate na especialidade da referida proposta de lei, pelo que podemos passar, de imediato, à votação artigo a artigo ou, se houver consenso, de todos os artigos em conjunto.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, permite-me o uso da palavra?

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, solicitamos a votação isolada do artigo 3.º e da proposta de alteração, apresentada pelo PS, que adita um n.º 3 ao mesmo artigo.

O Sr. Presidente: - Assim sendo, Srs. Deputados, podemos proceder à votação agregada de todos os artigos, com excepção do artigo 3.º.

Pausa.

Uma vez que não há objecções, vamos votar.

Submetidos à votação, foram aprovados, com votos a favor do PS e votos contra do PSD, do PCP, do CDS-PP, do BE e de Os Verdes.

Vamos, agora, votar o artigo 3.º da proposta de lei n.º 14/X.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, votos contra do PSD e do CDS-PP e abstenções do PCP, do BE e de Os Verdes.

Passamos à votação da proposta, apresentada pelo PS, de aditamento de um n.º 3 ao artigo 3.º.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, votos contra do PSD e do CDS-PP e abstenções do PCP, do BE e de Os Verdes.

É a seguinte:

3 - A consignação das receitas estabelecida no n.º 1 tem carácter excepcional e vigorará até 31 de Dezembro de 2009.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos proceder à votação final global da proposta de lei.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS e votos contra do PSD, do PCP, do CDS-PP, do BE e de Os Verdes.

Srs. Deputados, importa agora votar um requerimento, apresentado pelo Grupo Parlamentar do PS, o qual foi oportunamente distribuído, para dispensa de redacção final relativamente à proposta de lei que acabámos de aprovar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, seguem-se três votos de pesar, que serão objecto de apreciação e votação em separado pelo Plenário, dispondo cada bancada e o Governo, para o efeito, de 2 minutos. Após a apreciação de todos os votos, a Câmara guardará 1 minuto de silêncio.
Começamos pelo voto n.º 12/X - De pesar pelo falecimento do General Vasco Gonçalves (PCP), que o Sr. Secretário vai ler.

O Sr. Secretário (Jorge Machado): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o voto é o seguinte:

Aos 83 anos morreu o General Vasco Gonçalves.
Militar de Abril, ficou por essa via ligado, de forma indelével, a esse acontecimento maior da História do nosso país, que foi o derrubamento da ditadura fascista e a instauração da liberdade e da democracia em 25 de Abril de 1974 e à obra colectiva que foi a Revolução dos Cravos.
O General Vasco Gonçalves desempenhou as mais altas responsabilidades na preparação e concretização da Revolução de Abril. Sendo coronel, foi o mais graduado dos militares que integraram as estruturas do

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Movimento das Forças Armadas antes de Abril de 1974, tendo pertencido à sua comissão coordenadora. Integrou ainda a comissão de redacção do Programa do MFA.
O General Vasco Gonçalves sempre afirmou ter sido a sua adesão ao MFA ditada por um grande sentido de responsabilidade, por uma profunda aversão à ditadura fascista e pelos objectivos que o Movimento se propunha realizar.
Após o 25 de Abril, foi membro do Conselho da Revolução e primeiro-ministro nos II, III, IV e V Governos Provisórios.
Homem de causas e convicções, generoso, de grande honestidade e desprovido de ambições pessoais, o General Vasco Gonçalves pautou a sua acção, como cidadão, como militar e como estadista, pelos seus ideais e por aquilo que acreditava corresponder às necessidades do País e à construção de um Portugal democrático próspero e soberano.
A Assembleia da República manifesta o seu pesar pelo falecimento do General Vasco Gonçalves e apresenta à sua família as mais sentidas condolências.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O General Vasco Gonçalves foi um dos mais destacados militares de Abril por ter exercido as funções de primeiro-ministro no período revolucionário, pouco após o 25 de Abril.
Tivemos, em relação à sua política, profundíssimas divergências e até um grande antagonismo relativamente aos seus conceitos de liberdade, de democracia e de modelo de sociedade para o nosso país. Felizmente que as suas ideias, os seus conceitos e o seu modelo de sociedade não prevaleceram, embora tenham deixado prejuízos muito graves e sequelas muito negativas para o futuro de Portugal.
Não podemos, por isso, acompanhar quaisquer elogios ou sequer a apologia da sua actividade política. Acompanharemos, sim, o respeito devido à sua morte e a apresentação de condolências à sua família.
Peço, por isso, Sr. Presidente, que seja votado em separado o parágrafo final deste voto de pesar, relativo à apresentação de condolências.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr.as e Srs. Deputados: Através deste voto de pesar, homenageamos o General Vasco Gonçalves pela sua activa e pertinaz colaboração na preparação do 25 de Abril, na Revolução democrática que nos libertou da ditadura colonial fascista. Homenageamos também o General Vasco Gonçalves pela chefia de vários governos provisórios num período exaltante da História de Portugal, durante o qual, sob o impulso popular, as mais importantes conquistas políticas, sociais, económicas e culturais tiveram lugar e que vieram a ser vertidas na Constituição da República
Percebemos a incomodidade e a agressividade, percebemos até a alergia política e social com que as direitas encaram a figura e a memória do General Vasco Gonçalves - inventaram até a "herança gonçalvista" -, mas isso é apenas uma forma, e uma forma diminuída, de não conterem nem comportarem as conquistas do 25 de Abril.
É certo que divergimos de muitas avaliações do General Vasco Gonçalves do período do "Verão quente" e até da crise político-militar que conduziu ao golpe do 25 de Novembro, mas o facto de termos tido apreciações diferentes não nos faz ensombrar esse período da História de Portugal, não nos provoca qualquer tipo de diminuição dos seus conteúdos e do progressismo da História portuguesa próxima.
O General Vasco Gonçalves era um homem frontal, um patriota e um homem que inseriu, como poucos, na sua leitura a Revolução do 25 de Abril, na continuidade do liberalismo e da implantação da República.
Expressamos as nossas condolências à família e, mais uma vez, curvamo-nos perante o espírito republicano, o espírito do 25 de Abril que o General Vasco Gonçalves bem trouxe com ele.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr.as e Srs. Deputados: A morte é sempre, para nós, obviamente, razão de pesar, só que aquilo que o PCP hoje aqui nos propõe é muito mais do que uma simples manifestação de pesar.
É evidente que assinalamos esse pesar, apresentando, por isso mesmo, à família do General Vasco Gonçalves sentidos pêsames, mas o mais que este voto contempla, naquilo que é valorativo, em tudo aquilo que transcende a própria circunstância da morte, determinará, necessariamente, o nosso sentido de voto.

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O Sr. Deputado Bernardino Soares pertence, penso, à minha geração. Ora, para quem, como nós, cresceu a maior parte da vida em liberdade não deveria admissível, ou pelo menos justificável, a invocação de qualquer outra forma de alcançar o poder que não a assente na legitimidade democrática.
Ora, neste voto, o PCP invoca uma legitimidade revolucionária de conquista do poder.

O Sr. António Filipe (PCP): - Que disparate!

O Orador: - Nós apenas admitimos como forma de conquista do poder a legitimidade democrática.
O PCP, neste voto, vai para além da invocação morte e da manifestação de pesar, e aí, obviamente, há um mar que nos separa e que não poderíamos deixar de relevar.
Quando, para além da morte, temos de apreciar valorativamente o percurso do homem e do político que conquistou o poder com base numa designação do MFA, não assentando, portanto, esse poder na legitimidade democrática, teremos de lembrar aquilo que nos separa: o COPCON; as prisões arbitrárias; o ataque a forças políticas pela simples circunstância de serem adversárias; a vontade de indeferir a realização de eleições; a afixação popular de listas de suspeitos; a ocupação de empresas e de herdades; os saneamentos na comunicação social, na Rádio Nascença; as prisões sem culpa formada; as nacionalizações.
Por isso, damos tanto valor ao 25 de Novembro. Outros lembrarão aqui, porventura com mais saudade, o 11 de Março, mas também isso nos separa.
Termino, dizendo que, no que diz respeito a assinalar a data e a manifestar o nosso pesar, obviamente estaremos solidários e concordantes - tenho a certeza - com toda a Câmara. No mais, no que seja politicamente valorativo, estaremos separados. De resto, não há nisto nada de novo. O PCP já esteve, noutros tempos, separado de votos de pesar apresentados pelo CDS-PP, tendo, com iguais considerações, justificado o seu sentido de voto negativo.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Lopes.

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não decretaram dia de luto nacional na tua morte, General Vasco Gonçalves, e por uma vez, pelos piores motivos, tiveram razão. O povo que te amava queria que esse luto, essa dor, essas lágrimas lhe pertencessem. Que ninguém as decretasse em seu nome, que nenhuma página do Diário da República decidisse do que cabia a si decidir.
Tu, nosso General maior desta Pátria, tiveste o teu luto nas milhares de vozes, mãos e cravos vermelhos que te saudaram, gritando por ti, pelo teu nome, por Abril, pela liberdade e pela democracia que ajudaste a construir.
Tu, construtor da Revolução de Abril.
Tu, que nos trouxeste "(…) a madrugada que eu esperava / O dia inicial inteiro e limpo / Onde emergimos da noite e do silêncio (...)", como Sophia cantou no mais belo poema de Abril.
Tu, que foste homem inicial, homem inteiro, homem limpo, no exercício das mais altas responsabilidades deste país.
Tu, de facto, companheiro Vasco, não precisavas de lutos oficiais a que tinhas direito e que inteiramente merecias.
Se é natural que alguns te esqueçam e nem te queiram lembrar, como é visível aqui, neste Plenário, como poderia o povo esquecer quem ergueu do chão os humilhados e ofendidos deste país e que, com o seu nome, assinou a Lei dos Baldios, a Lei do Arrendamento Rural, a Lei da Reforma Agrária, a lei das nacionalizações? Como queriam que os trabalhadores e o povo esquecessem quem os libertou do poder totalitário de grupos monopolistas e do latifúndio, quem concretizou grandes progressos nos seus direitos económicos e sociais? Como poderiam esquecer as mães e os pais deste país o fim da guerra colonial, esquecer Abril e o obreiro principal de Abril, que puseram fim ao pesadelo e às angústias das ausências, aos temores da morte e das mutilações que aconteceram a milhares de jovens portugueses?
Soldado de causas e convicções, militar do MFA, entregaste-te com enorme coragem cívica, rectidão e lucidez à difícil tarefa da governação do País, que a luta de décadas do povo português e a acção do MFA acabavam de libertar do fascismo. E governaste, contrariando usos e costumes antes de ti e depois de ti, para aqueles a quem, em geral, se pede o voto para serem esquecidos logo após.
Não choraremos bastante este homem bom, generoso, para quem a Pátria portuguesa tem uma enorme dívida de gratidão. Que a sua figura de cidadão exemplar e de patriota íntegro, que a sua inteireza de carácter e a sua extraordinária dimensão humana possam servir de exemplo aos jovens portugueses.
À família e aos militares de Abril, com muita emoção e respeito, as nossas sentidas homenagens.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Marques Júnior.

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O Sr. Marques Júnior (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Falar do General Vasco Gonçalves não é tarefa fácil para quem, como eu, teve a oportunidade de conviver com ele, partilhando alguns dos momentos mais exaltantes da nossa História e, simultaneamente, divergindo noutros, em que o nosso futuro colectivo viveu situações de grande incerteza.
Falar de Vasco Gonçalves é revisitar um pouco a Revolução de Abril naquilo que ela teve de mais belo e generoso da utopia e do sonho e, ao mesmo tempo, recordar os tempos de todas as verdades, do derrube de todos os tabus, dos ideais tornados realidade, da eliminação de todas as barreiras e também dos erros, das manipulações, da instrumentalização, dos confrontos imaginados ou reais, dos golpes e contragolpes, é recordar a dinâmica de uma Revolução que superou tudo o que a nossa imaginação, por mais fértil que fosse, podia prever.
Vasco Gonçalves teve em tudo isto um papel importante, sendo justo reconhecer que sempre orientado pelos valores da justiça social e da dignificação do homem. Foi, enquanto primeiro-ministro, um político que se bateu intransigentemente pelos seus ideais, sem qualquer tipo de aproveitamento pessoal, que teve a dignidade e a humildade que outros, noutras circunstâncias, não tiveram: a de, depois de retirado, não ter tido qualquer altitude que procurasse influenciar, de forma ilegítima, o decurso da nossa vida política.
Podemos discordar de muitas das suas posições, principalmente da forma e até dos métodos como pretendia alcançar os seus objectivos. Não podemos, no entanto, esquecer-nos que vivíamos num período revolucionário e pré-constitucional, nem podemos negar-lhe o idealismo e a generosidade com que se bateu pelos valores em que acreditava. É minha profunda convicção que Vasco Gonçalves acreditava sinceramente na possibilidade de, na prática, concretizar rapidamente os objectivos do 25 de Abril e, em particular, a justiça social, como objectivo primeiro do programa do Movimento das Forças Armadas, objectivo que, infelizmente, ainda hoje estamos tão longe de conseguir. E talvez hoje, aqui, também seja a altura de muitos de nós colocarem a mão na consciência antes de fazerem certas críticas.
Foi este o sentido das reformas que procurou levar à prática como primeiro-ministro. É um facto que muitos discordaram da forma como pretendia concretizar esses objectivos, sendo certo que não é possível analisar a situação que se vivia em Portugal nessa altura com os parâmetros de referência que temos hoje, quer nacionais quer internacionais. Mas é necessário, por simples honestidade intelectual, fazer uma análise enquadrada na conjuntura que se vivia e reconhecer que até as medidas económicas mais polémicas tiveram o apoio da maior parte dos partidos ainda hoje representados nesta Câmara. Podia ser questionada a racionalidade económica, mas a verdade é que a dinâmica política condicionou, de forma inexorável, as decisões que foram tomadas.
O General Vasco Gonçalves foi o rosto e a referência para muitos portugueses que lutavam por condições mínimas de dignidade, em particular para as classes mais desfavorecidas da nossa sociedade.
Vasco Gonçalves, de quem discordei muitas vezes, foi, inegavelmente, um grande patriota que lutou pelos seus ideais e procurou, à sua maneira, concretizar os objectivos mais generosos da Revolução de Abril. Nessa altura, mesmo quando não teve sucesso, não podemos negar-lhe a determinação, a coerência e a utopia tão característica dos militares de Abril. Quando, por divergências políticas profundas com outros militares de Abril, abandonou as suas funções, aceitou democraticamente a situação, não abdicando, contudo, do direito de cidadania que ajudou a conquistar. E, nesse quadro, continuou a ter uma intervenção cívica muitas vezes crítica, mas sempre no respeito pelas instituições democráticas e em defesa do povo português.
Vasco Gonçalves será recordado pela generosidade da sua acção política e pela identificação com os grandes problemas e sofrimentos dos mais desfavorecidos.
Vasco Gonçalves, um militar de Abril.
À família enlutada o Partido Socialista apresenta sentidas condolências.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Deputados: "Nós não podemos dar com a nossa economia em pantanas, nós temos de a consolidar. Não se exige só sacrifícios dos trabalhadores, é preciso exigir-se também sacrifícios dos detentores do capital."
Quem o disse foi Vasco Gonçalves.
Esta citação reflecte bem o sentido de justiça social e de exigência de empenho para promover o desenvolvimento do País, um esforço de todos para todos e não o que, infelizmente, nos habituámos a ver posteriormente, ou seja, a exigência de sacrifício dos mesmos trabalhadores para aliviar os detentores do capital.
Vasco Gonçalves esteve com o povo. Como não valorizar um homem que serviu o povo? Que povo aceitaria um pedido de jornadas de trabalho gratuitas para acelerar um processo de desenvolvimento que estava atrasado por força de uma ditadura de 48 anos? Que povo aceitaria trabalhar gratuitamente em prol da sua comunidade quando os serviços públicos ainda não estavam aptos, como se desejaria que viessem a estar, para dar resposta às necessidades dos cidadãos? Certamente só um povo que enaltece os objectivos que se propunham atingir.

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No dia da morte de Vasco Gonçalves, numa reportagem televisiva, pessoas anónimas, nossos concidadãos, foram entrevistados para perceber o que lhes deixara Vasco Gonçalves. Vários deram conta dos direitos que tinham adquirido nos tempos do governo de Vasco Gonçalves: as primeiras férias, a primeira viagem ao Algarve, que até então tinha sido só para os mais ricos, a aquisição de casa, a possibilidade de rechear a casa com equipamentos básicos, a melhoria de condições de vida e de trabalho e mais igualdade de oportunidades.
Estes testemunhos são por demais importantes para repor algumas verdades históricas e para nos consciencializarmos de que houve quem acreditasse - e por isso tivesse procurado implementar - que era possível haver desenvolvimento com justiça social.
Vasco Gonçalves foi um engenheiro da justiça social. Enquanto alguns remeteram os inúmeros sonhos de Abril para a ordem dos mitos e das utopias, Vasco Gonçalves representa aqueles que acreditaram - e legaram essa crença para muitos outros - que o espírito de Abril era possível e concretizável.
O General Vasco Gonçalves está inequivocamente ligado à Revolução do 25 de Abril, ao MFA e a avanços extraordinários do ponto de vista social. Serviu o povo, e o povo, certa e genuinamente, reconhece-lhe isso. Todos lhe reconhecem convicção e lealdade.
A Vasco Gonçalves prestamos a nossa sentida homenagem e à sua família o Partido Ecologista "Os Verdes" apresenta as mais sentidas condolências.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Augusto Santos Silva): - Sr. Presidente, o Governo associa-se também à homenagem que a Assembleia da República presta à memória do General Vasco Gonçalves.
E encontro três razões fundamentais para fazê-lo. Em primeiro lugar, trata-se de celebrar a memória de um militar de Abril, de alguém que contribuiu activamente para a libertação do povo português de uma ditadura de várias décadas.
Em segundo lugar, trata-se de alguém que ocupou funções da maior responsabilidade durante o período revolucionário, tendo sido Primeiro-Ministro de vários governos provisórios. Bem sei que a legitimidade desses governos era de tipo revolucionária, mas também não me esqueço que, sem revolução, não teria havido democracia em Portugal.
A terceira razão é de ordem pessoal. Alguns dos traços essenciais do carácter do General Vasco Gonçalves devem ser recordados e encarecidos, em particular o seu sentido de serviço ao interesse público, tal como o interpretava, e o seu desprendimento pessoal.
Não podemos esquecer que a democracia portuguesa, tal como existe hoje, resulta da derrota do projecto político que o General Vasco Gonçalves também protagonizou. No entanto, penso ser preferível combater em vida os adversários e respeitá-los e homenageá-los no seu desaparecimento, porque a democracia faz-se da pluralidade de todos. E nós todos, que nos combatemos, que nos confrontamos e que lutamos, em paz, pelas nossas ideias, devemos, na hora da morte, respeitarmo-nos e homenagearmo-nos uns aos outros.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à votação do voto n.º 12/X - De pesar pelo falecimento do General Vasco Gonçalves (PCP).
O Grupo Parlamentar do PSD pediu à Mesa a votação, em separado, de todo o corpo do voto e da parte dispositiva final.
Vamos, pois, começar por votar todo o corpo do voto.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes, votos contra do CDS-PP e a abstenção do PSD.

Passamos, agora, à votação da parte final e dispositiva do voto.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

Srs. Deputados, passamos ao voto n.º 11/X - De pesar pelo falecimento do poeta Eugénio de Andrade, que passo a ler: "A morte não quer palavras. Antes o silêncio.
Escreveu durante décadas, publicou dúzias de títulos, traduzidos em inúmeras línguas em todos os continentes!
Morreu Eugénio de Andrade, senhor de leituras várias, escritor de rigorosa busca da linguagem exacta, amante da cultura grega e mediterrânica, que encarava a poesia como a melhor forma de falar com os amigos.
Morreu um homem de bem!
Viveu uma vida, nas suas palavras, 'sem ênfase, sem ruído', sempre próximo da terra e dos camponeses, do José Fontinhas que nascera na Póvoa da Atalaia, perto do Fundão, em 1923…

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Tornou-se num homem culto, sensível, modesto, asceta, avesso à mediocridade, amante do sol e do sul que encontrou nas sombras graníticas e chuvosas do Norte o porto de abrigo, que o acolheria como seu durante longos 55 anos da sua vida.
Habitando em frente ao mar imenso da Foz e do imaginário nacional, o poeta da terra sonhava porventura com a sua casinha natal da Beira Baixa e com o mar das searas de trigo a perder de vista!
No Porto, sem parar, ouve música, cultiva amizades, escreve poesia! 'Faço aquilo de que realmente gosto', diz um dia o poeta, um dos maiores da língua pátria!
Aparece raramente em público, mantém ciosamente a sua independência, a sua distância do poder, dos microfones, do 'falar por falar', nas suas sóbrias palavras!
Morreu um português de lei, um cidadão exemplar, um profeta dos nossos dias, um poeta sensível e sensato que um dia escreveu:
'No prato da balança um verso basta / Para pesar no outro a minha vida!'
Fuit vir bonus, diriam os latinos! Foi um homem bom!
O seu honrado nome foi - e será - objecto de profundo respeito e de justa veneração.
Como portugueses e como Deputados, curvemo-nos perante a perda do homem de bem e prestemos a sentida homenagem desta Câmara ao poeta maior que ficará connosco para sempre!"
Tem a palavra o Sr. Deputado José Amaral Lopes.

O Sr. José Amaral Lopes (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Tendo consciência da distância que me separa, mas procurando aproximar-me, de quem homenageamos hoje, recorro, por isso, a quem é muito maior do que eu, começando por citar Goethe: "Como o artista deve procurar erguer-se acima da sua personalidade, deve procurar levantar-se fora da sua época." Lembrando que, como pessoa, retomamos a consciência de que a poesia é o lugar privilegiado para as pulsões que emanam da condição humana mais pungente.
Citando Maria Alzira Seixo: "Eugénio tem a faculdade de articular o circunstancial com o absoluto, de perceber num ambiente concreto a voz de comunicação que o levará à inscrição poética, à transfiguração modelar, numa expressão límpida e pura muito própria."
Lembremos Eugénio de Andrade como o poeta que, de forma harmoniosa, soube conciliar valores estéticos e éticos, através da articulação do verso com que a palavra nos premeia na demanda incessante de harmonia, de absoluto, e que permanecerá na nossa memória através da sua obra, que será eterna.
Com Eugénio de Andrade, o espiritual e o material persistem no desencontro a que Cervantes deu voz e que Almeida Garrett soube compreender para continuar a exprimir a dialéctica da intemporalidade humana.
A morte de Eugénio de Andrade constitui para nós apenas a perda da pessoa. Ele permanecerá vivo e estará presente sempre que for lido.
Eugénio de Andrade - e perdoem-me o cliché - é um dos que "da lei da morte se libertou".

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Teixeira Lopes.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para Eugénio de Andrade a poesia era um ofício - um ofício de paciência, de austeridade, de sobriedade -, uma escultura permanente, mas também experimentação.
Do outro lado, a poesia era exaltação, libertação dos sentidos, libertação do desejo, libertação do corpo. E Eugénio de Andrade lutou, pelas palavras e pela sua acção cívica, contra todas as formas de repressão, mesmo aquelas e principalmente aquelas que se inscrevem no corpo.
Fez do Porto a sua terra de acolhimento e deixou entrar na sua poesia a experiência anódina do quotidiano: o granito da cidade, a luz da Foz, os gatos, os jardins, a experiência das pessoas simples com quem contactava.
Óscar Lopes cedo pressentiu o que era a sua poesia: poesia/música. E Eugénio de Andrade está agora no limiar do silêncio - matéria solar, essa outra música.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Sr. Presidente: "(…) A poesia de Eugénio de Andrade sabe-nos à vitória, passo a passo, da plenitude e da esperança. Vitória conseguida de modo conscientemente precário sobre todo o negativo, mas conseguida (…)" - assim escreveu sobre Eugénio de Andrade e a sua obra Óscar Lopes, um dos seus maiores estudiosos.
Cantor do corpo, das exaltações do desejo e das suas sombras, Eugénio de Andrade sustentou a sua escrita num complexo de audaciosas imagens ligadas ao corpo, à terra e aos seus frutos, à luz, às aves e aos barcos, à água e ao lume, ao ar e aos rumores do mundo… Imagens que acabaram por o impor também como um poeta dos elementos, capaz de apreender como poucos a secreta música da terra. E que, por certo, moldaram a inegável fortuna que a sua poesia conheceu mesmo junto de públicos não especializados, onde tornou, por certo, possível um certo reencontro com a escrita poética dos nossos dias.

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Vivemos tempos conturbados que não cessam de nos assombrar os dias. Razão para também recordar outros eixos que sempre percorreram a poesia do autor de As Mãos e os Frutos, seja a pulsão cívica ou o amor à liberdade que tão fundo se encontram nas suas Homenagens e Outros Epitáfios dedicados a figuras como Che Guevara, José Dias Coelho, Pasolini e Chico Mendes; ou então noutras homenagens com que quis sublinhar "o gesto vital de Catarina" ou a dimensão ética do General-Soldado que também nos deixou no passado fim-de-semana.
"Ao Miguel, no seu 4.º aniversário, e contra o nuclear, naturalmente", assim começa o poema dirigido a Miguel, seu afilhado, em que Eugénio de Andrade enuncia uma atitude antibelicista que, depois, amplia e reforça na rejeição da "sociedade mercantil" que se descobre no texto com que abre a antologia Coração Habitado e que ganha, nos dias de hoje, acrescida actualidade.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, permitam-me que termine citando José António Gomes, crítico literário do Jornal de Notícias desta terça-feira: "Quiseram os deuses (sempre cruéis mas tantas vezes certeiros nas suas disposições) que Eugénio de Andrade, um dos poetas mais lidos por aqueles que o fascismo perseguiu e encarcerou, nos deixasse no preciso dia em que partiu também essa figura ímpar do combate à ditadura salazarista-marcelista e da luta pelos direitos dos mais pobres que foi Álvaro Cunhal".
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Neste momento em que, do poeta, deveremos guardar para os dias futuros o fulgor da escrita que nos legou, o Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português associa-se às manifestações de pesar pela perda que a sua morte representa para a cultura e para a literatura portuguesas e apresenta sentidas condolências à família.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Caeiro.

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Eugénio de Andrade deixou-nos. Com a perda de um génio, a Humanidade só não fica mais pobre porque lhe deixou a sua extraordinária obra em herança.
Neste momento de tristeza para Portugal e para a cultura, o CDS faz questão de se curvar, em sentida homenagem, perante a memória bem presente de um dos mais extraordinários poetas portugueses de todos os tempos.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Muito bem!

A Oradora: - Disse, em tempos, o próprio: "Sou filho de camponeses, (…) desde pequeno, de abundante só conheci o sol e a água. Nesse tempo, (…) aprendi que poucas coisas há absolutamente necessárias. São essas pequenas coisas que os meus versos amam e exaltam". E foi exactamente no seio desta abundância que surgiu uma personalidade grandiosa da literatura contemporânea mundial.
Todos os portugueses devem hoje inclinar-se respeitosamente perante o raro talento e a excepcional qualidade de uma obra e de um percurso de permanente entrega à literatura e à poesia de Portugal. Grandioso, também, pelas suas características pessoais de modéstia, de humildade, de sobriedade absoluta, sempre alheio às inúmeras homenagens e actos de reconhecimento público.
Como o próprio Eugénio de Andrade dizia, escrever poesia "exige muito trabalho e disciplina, ao contrário do que muitas pessoas pensam". E foi este trabalho e esta disciplina a que o poeta sempre se obrigou, como que relegando para um segundo plano o seu extraordinário génio.
Considerado como um dos autores de culto, no actual contexto europeu, Eugénio de Andrade ficará para sempre na História da Literatura Portuguesa. Depois de mais de meio século de edições, e de mais de 20 títulos lançados, o mais lido e mais traduzido dos poetas portugueses sempre dizia ter cumprido o que lhe era exigido.
Quão reconfortante é saber que, em Portugal, no meio de uma mera abundância de "sol e água", surgem personalidades como a de Eugénio de Andrade. Quão reconfortante é saber que o seu talento e mérito próprio foram reconhecidos em vida. Que privilégio termos sido contemporâneos de um tamanho talento. Que privilégio podermos usufruir do seu legado literário na versão original.
Cuidemos, enquanto sociedade, para que todos os talentos possam desenvolver-se como o de Eugénio de Andrade, sobretudo aqueles que nascem na mera abundância de "sol e água".
Damos graças, por isso, à "fatalidade" - nas próprias palavras do autor - que o levou a escrever sem parar desde os 19 anos, quando publicou o seu primeiro livro de poemas, livro que deu origem a uma das mais brilhantes e profícuas obras poéticas que Portugal conheceu nas últimas décadas.
Eugénio de Andrade deixou-nos com serenidade, elevação e em paz com a vida. Que descanse em paz.
O CDS-PP associa-se à sua família em profundas condolências e respeito.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Portugal.

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A Sr.ª Teresa Portugal (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: É verdade, a morte não quer palavras. Antes o silêncio.
Para Eugénio de Andrade bastaria talvez devolver-lhe a última palavra, a que sobrevive ao lado do silêncio e dizer-lhe só o "Adeus" de Os Amantes sem Dinheiro.
Também nós "Já gastámos as palavras (…) / e o que nos ficou não chega / para afastar o frio de quatro paredes. / gastámos tudo menos o silêncio".
Impossível dizer mais, imperdoável escrever mais para o poeta a quem bastavam "três ou quatro sílabas de cal viva junto à água" para ser Poesia e ser Poética.
Eugénio de Andrade, o poeta da claridade, da leveza e da música, deixa uma vasta obra. A poesia está toda aí: dos clássicos e madrigais a Shelley, Keats ou Rilke, na marca depurada e singular de Eugénio de Andrade.
Mas há sempre um livro de onde tudo parte e ao qual é obrigatório voltar. No caso de Eugénio de Andrade, esse livro é As Mãos e os Frutos.
Eduardo Lourenço disse-o: "Com As Mãos e os Frutos nasceu uma poesia diferente".
E Jorge de Sena confirma-o: "As Mãos e os Frutos é o primeiro na lista da sua obra poética.
Escrita por um homem na força da sua juventude, no momento raro em que a adolescência não murchou de amarga, nem a maturidade já se fez de triste. Versos musicais, fluidos, firmes, a que a rima dá por vezes a marcação da dança, uma poesia do ser e do amar, entre a carne e o espírito."
Que não me levem a mal os nascidos no Fundão, mais propriamente na Póvoa da Atalaia, terra natal do poeta, ou os da sua cidade de acolhimento, A Cidade de Garrett, sobre a qual Eugénio de Andrade, considerando-se embora um homem do Sul, dizia: "Só esta cidade, o Alentejo e o Douro têm ainda carácter".
Que não me levem a mal por me situar em Coimbra, cidade onde escreveu As Mãos e os Frutos, ponto de encontro com os amigos Miguel Torga, Joaquim Namorado (com quem tinha lições de Matemática três vezes por semana), Carlos de Oliveira, a quem depois pediria: "Lá onde estás chegaste antes de mim / O sítio deve ser mais asseado: / Guarda-me lugar perto de ti", mas também com Eduardo Lourenço e Vitorino Nemésio, para quem escreve um afectuoso lamento: "Ninguém te lê os versos, tão admiráveis alguns, e a prosa não tem muitos leitores, embora todos reconheçam, mesmo os que nunca te leram, que é magnífica".
Seria em Coimbra, na cidade "tão provinciana", como lhe chamava, que na igreja de Santiago sentiria a paixão de D. Pedro e chama a si a divisa do rei - Désir:
"Eu não tenho nada. / Amei o desejo / Com o corpo todo."
Em Coimbra, para onde, no dizer do poeta, a guerra o empurrou, viveu Eugénio de Andrade, na Casa das Lapas: "Alcandorada sobre um abismo surpreendente de mágica e de cujos terraços se domina todo o fértil e risonho Vale do Ceira."
É lá também que Torga o leva ao Parque, para lhe mostrar a canforeira, e aí, atravessando o canteiro, foi colher uma flor para lhe dar: "Foi por essa flor que comecei a querer-lhe bem."
Em todos os lugares o poeta buscava um jardim, as araucárias, os jacarandás ou, como no Porto, "a musicalidade dentro dos seus jardins murados." Merecia ter ficado num jardim. Por isso, fica a promessa: quando voltar a Coimbra, irei à canforeira e hei-de provar os frutos da cerejeira da Casa das Lapas.
Em nota à 2.ª edição de Antologia Pessoal da Poesia Portuguesa, Eugénio de Andrade escreveu: "Santo Agostinho afirmou que a beleza é o esplendor da verdade. Gostaria que, onde o Santo escreveu beleza, se lesse poesia."
Em Eugénio de Andrade a poesia é toda a beleza e toda a luz. A luz que ele gostaria de levar nos olhos quando morresse: "a luz do mar da Foz, atravessada por duas gaivotas."
É por isso que hoje estamos de luto pela poesia.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Deputados: Eugénio de Andrade continuará a falar através das palavras que deixou escritas na sua vasta obra literária. Escritas depois de criteriosamente escolhidas, a expressar mensagens claras com uma bela simplicidade. A dizer a todos e a chegar a todos. Deixa uma obra de respeito e diversas publicações traduzidas em várias línguas. Um poeta que encontrou na relação com os elementos naturais e também na natureza humana uma fonte inesgotável de amor, de alegria e de música, traduzindo-as na sua poesia, eivada de sensibilidade e de simplicidade, tal como o que de mais natural há.
Foi um homem que dispensou a projecção pública, tendo aparecido raras vezes em público, devido, como disse, "a essa debilidade do coração que é a amizade". Contudo, a sua projecção pública é inerente à genialidade da sua produção artística, reconhecida com diversos e prestigiantes prémios nacionais e internacionais, aos quais nunca concorreu. Uma obra desta envergadura não se guarda, vive-se! E nisso o nosso sistema de ensino tem uma responsabilidade grande, a de fazer viver essa obra: "Estou contente, não devo nada à vida, / e a vida deve-me apenas / dez réis de mel coado. / Estamos quites, assim / o corpo já pode descansar". Já descansa.
À família de Eugénio de Andrade, o Partido Ecologista "Os Verdes" manifesta sentidas condolências.

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O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, a cultura portuguesa sofreu nos últimos dias perdas importantes. Estou certo de que Eugénio de Andrade gostaria que também aproveitássemos esta ocasião para lamentar a morte do pintor René Bertholo.
Não tenho nada a acrescentar às palavras expressivas com que já foi caracterizada hoje a sua poesia. Permito-me acrescentar, contudo, como motivo bastante para o encarecimento da memória de Eugénio de Andrade, a sua acção em prol da promoção da leitura e da audição da leitura de poesia. Seja através da sua Fundação, a Fundação Eugénio de Andrade, e das sessões de dizer e de ouvir dizer poesia que ela regularmente patrocinava e continuará, certamente, a patrocinar, seja através da presença amiúde do poeta em escolas básicas e secundárias, explicando aos alunos como deveriam dizer e ouvir dizer poesia. Não me esquecerei do sorriso traquina com que ele tantas vezes dizia que "as sílabas têm veneno" e que, portanto, não as podemos "comer" quando dizemos poesia. Esse é também um motivo muito importante para homenagearmos hoje Eugénio de Andrade.
E a melhor homenagem que lhe podemos fazer talvez seja a de recordar alguns dos seus versos, em particular os versos lindíssimos que dizem: "Colhe / todo o oiro do dia / na haste mais alta / da melancolia." Este País, que "sabe às amoras bravas no Verão", a melhor homenagem que pode fazer a Eugénio de Andrade é justamente a de "colher o oiro do dia na haste mais alta da melancolia" e perceber que a melhor forma de o fazer é continuar a dizer e a ouvir dizer poesia.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos proceder à votação do voto n.º 11/X - De pesar pelo falecimento do poeta Eugénio de Andrade (Presidente da AR).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, vamos, agora, passar à apreciação do voto n.º 13/X - De pesar pelo falecimento do Dr. Álvaro Cunhal (PCP).
Tem a palavra o Sr. Secretário para proceder à respectiva leitura.

O Sr. Secretário (Jorge Machado): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o voto é o seguinte:

Álvaro Cunhal faleceu na passada segunda-feira, aos 91 anos de idade.
Álvaro Cunhal nasceu em Coimbra, em 1913, sendo membro do Partido Comunista Português desde 1931. Iniciou a sua actividade política enquanto estudante da Faculdade de Direito de Lisboa. Participou no movimento associativo e foi eleito, em 1934, representante dos estudantes no Senado Universitário. Militou na Federação da Juventude Comunista Portuguesa, de que foi eleito Secretário-Geral em 1935, ano em que passou à clandestinidade.
Álvaro Cunhal foi preso em 1937 e 1940, sendo submetido a torturas. Libertado após alguns meses de prisão, retomou de imediato a sua luta contra o regime fascista. Participou na reorganização do PCP em 1940/41 e, vivendo de novo na clandestinidade, integrou o Secretariado deste Partido de 1942 a 1949.
Sendo novamente preso em 1949, fez no tribunal fascista que o julgou uma severa acusação à ditadura fascista e uma defesa da política do PCP. Foi condenado, tendo então permanecido 11 anos na prisão, dos quais quase 8 em completo isolamento. Em 3 de Janeiro de 1960 evadiu-se, com um grupo de destacados militantes comunistas, da prisão-fortaleza de Peniche. Sendo de novo chamado ao Secretariado do Comité Central do PCP, foi eleito Secretário-Geral em 1961.
Depois do derrubamento da ditadura fascista em 25 de Abril de 1974, foi Ministro sem Pasta do I, II, III e IV Governos Provisórios e eleito Deputado à Assembleia da República em 1976, 1979, 1980, 1983, 1985 e 1987. Foi membro do Conselho de Estado. Em 1992, no XIV Congresso do PCP, deixou de ser Secretário-Geral do PCP, sendo eleito então Presidente do Conselho Nacional deste Partido, mantendo-se no seu Comité Central até aos dias de hoje.
Álvaro Cunhal foi, ao mesmo tempo, autor de vasta obra, quer publicada, seja no campo político e ideológico, seja no campo literário - nomeadamente com o pseudónimo Manuel Tiago -, quer no plano das artes plásticas.
Álvaro Cunhal dedicou toda a sua vida ao ideal e ao projecto comunistas, mantendo um compromisso e dedicação sem limites aos interesses dos trabalhadores e do povo português, e à soberania e independência do seu país.
Intervindo com o seu partido de sempre - o PCP - ao longo de mais de 74 anos de acção e intervenção política, assumiu um papel principal na história portuguesa do século XX, na resistência antifascista, na luta pela liberdade e pela democracia, nas transformações da Revolução de Abril e na defesa de uma sociedade mais justa. Os seus percurso e intervenção tiveram igualmente, no plano internacional, significativo impacto e reconhecimento.

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Álvaro Cunhal revelou durante toda a sua vida, mesmo sendo sujeito às maiores provações, a mais de 12 anos de prisão, a bárbaras torturas e às duras condições da vida clandestina, qualidades excepcionais como político, militante comunista e como ser humano.
Álvaro Cunhal assumiu o seu intenso percurso de muitas décadas de luta e intervenção, em todas as circunstâncias e até aos últimos dias da sua vida, sempre com uma enorme confiança no futuro.
Com o falecimento de Álvaro Cunhal desaparece um dos mais consequentes e abnegados protagonistas da vida política nacional, que representa para muitos portugueses um exemplo de convicção e combatividade na luta pelos seus ideais.
A Assembleia da República manifesta o seu mais profundo pesar pelo falecimento de Álvaro Cunhal, endereçando à sua família e ao Partido Comunista Português sentidas condolências.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr.as e Srs. Deputados: O Dr. Álvaro Cunhal foi uma figura incontornável da política portuguesa das últimas décadas.
Primeiro, na oposição e resistência ao regime deposto no 25 de Abril, oposição e resistência que pagou com a clandestinidade e com a prisão.
Depois do 25 de Abril, na liderança do PCP, defendendo com persistência um projecto de sociedade com o qual, de resto, temos profundas divergências.
Separam-nos diferenças políticas profundas, frontais e claras. Diferenças, entre outras, no projecto da sociedade, na concepção da democracia, do papel do Estado e na liberdade da iniciativa privada da economia.
Compreende-se, por isso, com inteira honestidade política, que o PSD não acompanhe os elogios políticos contidos no voto de pesar, razão pela qual solicitamos, de resto, que seja votado em separado o último parágrafo do voto de pesar.
Nada disto impede que, com inteiro respeito, no momento da morte do Dr. Álvaro Cunhal, nos associemos às condolências à sua família e ao Partido Comunista Português.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr.as e Srs. Deputados: O olhar sobre a morte distingue-nos certamente no debate político mas também nas atitudes, e começaria por elogiar a atitude do Estado português, que soube estar à altura da homenagem a um dirigente político tão importante e tão impressionante como Álvaro Cunhal, ao contrário de um governo que recentemente excluiu das honras do funeral de Estado uma ex-primeira-ministra, Maria de Lourdes Pintasilgo. Também nas atitudes se sabe ver a diferença...!
Álvaro Cunhal foi homenageado pelo Estado português, mas foi-o sobretudo pelo povo português.
Vivemos ontem, nas ruas de Lisboa, o que terá sido, sem dúvida, o funeral mais participado e mais emotivo que a democracia portuguesa viveu até hoje.
Pode lembrar-se Álvaro Cunhal de várias formas: certamente pelo seu contributo artístico, uma vez que foi pintor, escritor, amou a literatura clássica, foi tradutor de Shakespeare, mas será sobretudo lembrado como dirigente político da luta antifascista.
Por isso mesmo importa dizer da coerência política desse combate, que implicou um empenhamento pessoal como poucas outras pessoas para ele contribuíram. Foi tão único que por isso mesmo foi destacado pelos portugueses.
Não aceitaremos a ideia da historiografia revisora que olha para trás banalizando as diferenças, como se Álvaro Cunhal pudesse ser comparado com Salazar, como se a luta pela libertação pudesse ser uma alma gémea distinta da opressão…
Não iludamos as diferenças, porque foram essas diferenças que construíram a democracia e, nesse combate, Álvaro Cunhal foi um dos maiores, assim como foi, na coerência das suas posições, um construtor do Partido Comunista Português e das lutas políticas e sociais que marcaram os anos do fim da ditadura e do princípio da democracia e as décadas seguintes.
Lembramo-lo em todas estas condições, pelas convergências e pelas divergências que com ele tivemos, homenageando aquele que foi um contributo ímpar para a história portuguesa do século XX e para a revolução democrática que nos permite estar aqui hoje.
Álvaro Cunhal viveu um tempo em que o mundo mudou e fez parte dessa mudança, com coerência e com cabeça erguida, toda a sua vida, dedicando 70 anos ao seu partido, a quem endereçamos as nossas sinceras condolências bem como à sua família.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.

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O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Por indicação do Presidente do meu partido, apresentámos no local próprio sentidos pêsames pela morte do Dr. Álvaro Cunhal à sua família e ao PCP.
Manifestámos, por isso, pesar no momento da morte e assinalámos o papel histórico desta personalidade, que hoje, de resto, reafirmamos. Mas não nos peçam para fazer uma apreciação valorativa do seu percurso político, porque, como todos compreenderão, o Dr. Álvaro Cunhal tinha uma visão do mundo que não era a nossa e que, de resto, a história, acabou por demonstrar ser profundamente errada. É o próprio alcance da democracia representativa que nos separa.
Votaremos, por isso, em razão de coerência, favoravelmente o voto de pesar, tendo em conta a separação já requerida pelo Grupo Parlamentar do PSD quanto ao último parágrafo, sendo que relativamente aos demais parágrafos, pelo que acabei de expor, cada um dos Deputados do Grupo Parlamentar do CDS-PP terá inteira liberdade de voto.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Martins.

O Sr. Alberto Martins (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, caros Colegas: Morreu um grande português.
Em nome do Partido Socialista, quero assinalar a dimensão histórica de Álvaro Cunhal, uma figura marcante do século XX em Portugal.
Foi um homem de cultura, uma figura lendária da resistência à ditadura e esteve na fundação do regime democrático do 25 de Abril. Foi uma personalidade controversa, de que discordámos muitas vezes, mas a quem queremos homenagear na sua dimensão e na coerência dos seus ideais de sempre.
À sua família, à Direcção do PCP e aos comunistas em geral endereçamos os nossos sentimentos de pesar e o tributo de honra pela sua memória.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Ministro e Srs. Deputados, ontem à tarde, ao som de A Internacional e de A Portuguesa, com notórias emoções envoltas em grandes convicções, milhares e milhares de pessoas prestaram uma grandiosa homenagem a Álvaro Cunhal, coberto com a bandeira do Partido Comunista Português, a que se dedicou plenamente durante a sua vida.
Só um homem amado e respeitado encaixa neste cenário.
Álvaro Cunhal é, inegavelmente, uma referência na luta contra o fascismo, pela liberdade, pela democracia e pelo combate às injustiças sociais.
Mas não é uma referência qualquer. Porque só um homem profundamente humano poderia ter dedicado a sua vida por inteiro a um projecto de transformação social no sentido da dignificação dos homens e mulheres e contra a exploração.
Só um homem profundamente inteligente poderia ser o resistente que Álvaro Cunhal foi, que o levou à clandestinidade e a ser vítima de tantos anos de prisão e de atrozes formas de tortura, sem que a palavra "desistir" integrasse o dicionário da sua vida.
Álvaro Cunhal granjeou uma admiração enorme, como se tem visto, entre comunistas e não comunistas. Foi uma figura ímpar do século XX, sem dúvida, mas não será justo afirmar que este homem ficou no século XX. Desde logo, porque, enquanto houver explorados e oprimidos, flagelo que sempre combateu, enquanto o sistema privilegiar uns e negar a outros o que de mais básico requer a vida humana, não pode desistir-se de um projecto de transformação social que imponha justiça. Por isso, os não conformados com o sistema são actuais. Por isso, a luta a que este homem se dedicou continua inegavelmente válida.
Para além disso, quem olha para a tese apresentada em 1940, destinada a defender a tese de Direito Penal, em exame do 5.º ano da Faculdade de Direito de Lisboa, tese intitulada O aborto: causas e soluções, da autoria de Álvaro Cunhal, percebe que este homem cedo, muito cedo, soube interpretar uma realidade e apontar-lhe soluções que, 65 anos depois, o poder instalado, esse sim, continua a adiar, insistindo em prolongar e em perpetuar problemas do século XX para o século XXI.
Conheci, pessoalmente, Álvaro Cunhal apenas no quadro da coligação Os Verdes/PCP, em iniciativas da CDU. Se tivesse de realçar um dos aspectos que mais me habituei a admirar nele, porque era constante, seleccionaria a forma como valorizava o colectivo como um todo e a capacidade que tinha de valorizar cada um no trabalho colectivo. Sempre encontrei nele um profundo respeito pelas diferenças.
Respeitava-nos a nós, não comunistas. Mas porque tinha um profundo apego ao seu projecto, também exigia o mesmo respeito pelo colectivo que o corporizava. A isto acho que se chama integridade. E é básico para a solidariedade.
A melhor forma de continuar a homenagear Álvaro Cunhal é, como ele dizia, continuar a ter confiança no futuro, na Humanidade e no seu País.
À família de Álvaro Cunhal, designadamente à sua filha, à sua companheira, à sua irmã e a todos os militantes do Partido Comunista Português, o Partido Ecologista "Os Verdes" manifesta as suas mais sentidas condolências.

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O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, Srs. Deputados, o Governo apresenta condolências à família do Dr. Álvaro Cunhal e ao Partido Comunista Português, que perdeu o seu dirigente histórico, e associa-se à homenagem, mais do que justa, que a Assembleia da República agora lhe presta.
Álvaro Cunhal foi uma figura ímpar do século XX, em Portugal, foi um protagonista de processos políticos em Portugal, desde os anos 30 até à actualidade e, a esse título, faz parte do nosso presente. Mas também faz parte do nosso presente por outras razões, nomeadamente por razões que têm a ver com a sua resistência à ditadura fascista. Teria sido muito mais difícil derrubar o Estado Novo sem a presença e a liderança de Álvaro Cunhal, bem como do esforço da organização que ajudou a desenvolver e a reconstruir.
Álvaro Cunhal teve também um papel de destaque no Portugal pós-25 de Abril onde ocupou lugares muito importantes e onde conduziu a força política, que é a sua, no cumprimento do respectivo programa. Neste sentido, Álvaro Cunhal, como muitos outros, é um dos construtores da democracia portuguesa, tal como ela hoje existe.
Mas a melhor maneira de homenagear Álvaro Cunhal é homenagear aqueles que o homenagearam ontem. E esta é uma forma que Álvaro Cunhal gostaria que seguíssemos.
Basta ler livros como, por exemplo, Levantado do Chão, de José Saramago, e a descrição que aí se faz do que eram as reuniões das células nos anos 40 e 50, no Alentejo, para perceber a força anímica e política que figuras como Álvaro Cunhal deram a muitos milhares de injustiçados e explorados da nossa sociedade.
Álvaro Cunhal, que poderia ter sido um brilhantíssimo advogado ou pintor, um excelente romancista ou contista, escolheu tomar partido. E tomou partido pelo ponto de vista daqueles que lhe pareciam (e eram objectivamente) os dominados de então, os "danados da terra" de então. Tomou o partido por esse ponto de vista e acreditou que era possível mudar as situações que denunciava.
Tentou mudar, segundo a sua visão do mundo, que não é necessariamente igual à de nós todos - não é igual à minha, mas também se as minhas homenagens se limitassem a homenagear aqueles que têm a minha visão do mundo, elas não poderiam ser chamadas homenagens mas, sim, seguidismo -, e lutou da forma como entendeu, segundo as perspectivas que entendeu.
Ganhou umas batalhas e perdeu outras. Felizmente ganhou umas e felizmente perdeu outras, mas fê-lo a partir desta posição inicial de tomada de partido a favor daqueles que são os mais humildes, os mais pobres, e acreditando que era possível mudar a sua situação. Esta foi, do meu ponto de vista, a homenagem que um larguíssimo conjunto da sociedade portuguesa e a opinião pública portuguesa no seu todo prestaram ontem a Álvaro Cunhal. E, repito, a melhor maneira de homenagear Álvaro Cunhal é homenagear essa gente que assim o homenageou.

Aplausos do PS e da Deputada do PCP Luísa Mesquita.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr.as e Srs. Deputados: Em duas singelas páginas o meu camarada Álvaro Cunhal expressou aquilo que considerou como a sua última vontade: ser-lhe-ia muito grato, para além de não haver pronunciamento de discursos, que no funeral estivessem presentes os seus camaradas, dos mais responsáveis aos mais modestos e desconhecidos, junto dos quais lutou antes e depois do 25 de Abril, até aos últimos dias da sua vida, os familiares a quem muito amava, amigos sem partido, homens e mulheres e jovens que se habituou a estimar e a respeitar e outros que quisessem estar presentes com respeito que, como comunista, foi toda a sua vida, com virtudes e defeitos, méritos e deméritos como todo o ser humano.
Quiseram os comunistas, os trabalhadores, os jovens, os democratas, os patriotas, o povo português não só corresponder ao seu desejo como ultrapassá-lo pela grandeza, participando num acto de homenagem incomparável na sua história.
A própria forma como decidiu do destino dos seus restos mortais revela o seu carácter de recusa do mito e do culto da personalidade. Não ficaremos com as suas cinzas. Guardaremos a sua imagem e o seu exemplo no coração da nossa memória, acolhendo as suas ideias e a sua obra como um legado intrínseco ao nosso projecto e à nossa luta, ao nosso Partido, à democracia, como instrumentos de trabalho e de análise ligados à vida, ao tempo que vivemos e ao devir colectivo.
A sua morte física provoca-nos um profundo sentimento de dor e perda.
Perdemos um grande homem, um obreiro de causas e projecto libertadores.
É certo que o tempo de vida de uma pessoa é sempre um tempo curto no processo histórico e na evolução da sociedade humana. Também o foi a vida de Álvaro Cunhal. Mas ele teve o privilégio de viver tempos fascinantes e dramáticos carregados de acontecimentos onde não se limitou a observar e a interpretar mas antes a ser um protagonista na luta pela liberdade do seu povo e pela democracia do seu País, sem abdicar das suas visão e dimensão internacionalistas.

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Recusou sempre, mesmo nos momentos mais difíceis e nas derrotas mais duras, o fatalismo e o determinismo do fim da história.
No quadro do grande colectivo que desde sempre e para toda a vida abraçou, que a sua inteligência, coragem política, ideológica, moral e física ajudou a erguer, o meu camarada Álvaro Cunhal deu uma contribuição de alcance histórico à luta do povo português no derrube da ditadura fascista e o seu nome ficará para sempre ligado à Revolução Portuguesa do 25 de Abril.
A sua força resultava de convicções inabaláveis. Incapazes de o matarem fisicamente os servidores repressivos do fascismo tentaram vencê-lo pela destruição psíquica e intelectual, isolando-o do mundo, da família e dos seus camaradas durante anos e anos seguidos de prisão! Mas ele não só resistiu como voltou sempre ao combate.
A sua determinação revolucionária, a firmeza na defesa dos princípios, a dureza de tantos combates não deixaram muitas vezes que se revelasse a sua dimensão humanista para com os mais fracos, os mais pobres e explorados e particularmente para com as crianças para quem o seu afecto tocante surpreendia na aparente contradição com a sua tenacidade e determinação.
Um dia, durante a visita ao nosso país de um Secretário-Geral de um Partido Comunista da América Latina, exilado por força da implantação de uma ditadura no seu país, um encontro com o então primeiro-ministro Mário Soares, no Salão Nobre da Assembleia, prolongou-se excessivamente, impedindo um convívio com crianças e jovens que o aguardavam aqui um pouco mais acima, na Calçada da Estrela.
Nas conversações finais, Álvaro Cunhal, depois da saudação fraterna ao camarada e ao seu partido e ao seu povo, disse-lhe que um dirigente comunista que troca mais meia hora de encontro institucional por um encontro fraterno com crianças e jovens que o esperavam subestimava a dimensão humanista de um dirigente revolucionário…
As suas criatividade e obra artística revelavam a grandeza da sua alma, manifestada tantas vezes num livro, num desenho feito na prisão ou num intervalo de uma reunião, comprovativo também da frase que um dia pronunciou da inexistência de zonas brancas na sua vida.
Se não dava tréguas aos adversários no combate político e ideológico, tinha sempre por eles o respeito devido. Nunca teve sequer um sentimento de ódio ou de ajuste de contas para com aqueles que, inclusive, o brutalizaram, o torturavam ou o ofenderam na sua dignidade.
A marca da superior dimensão política, ideológica, intelectual e humana do camarada Álvaro Cunhal ficou impressivamente gravada neste partido, que é o nosso, neste colectivo partidário firme nos seus ideais e nos seus princípios; neste colectivo partidário fraterno e solidário, unido num imenso abraço de camaradagem e amizade.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Alguns, procurando datar a sua obra e as suas ideias tão-só até ao tempo em que nos deixou, subestimam uma das (suas) lições e ensinamentos mais importantes da sua concepção comunista. Afirmava Álvaro Cunhal que a chave do segredo da longevidade e do futuro do nosso partido e do seu projecto, para além do mérito e da valiosa contribuição de tal ou tal militante, de tal ou tal dirigente, residirá sempre e fundamentalmente na capacidade colectiva, na unidade e coesão e no generoso empenhamento e capacidade de nos ligarmos aos trabalhadores e ao povo, de viver os seus problemas e aspirações, de agir e lutar pela sua resolução e realização e de partir sempre da nossa luta nacional para desenvolver a nossa solidariedade também no plano internacional.
Quem esteve ou quem viu ontem aquela incontável manifestação de homenagem ao camarada Álvaro Cunhal sentiu a nossa dor, o nosso sentimento de perda, mas também um sentimento de confiança.
O que de melhor tem o ser humano transbordou à escala de uma imensa multidão que reconhece valores, coerência e verticalidade e que não desiste de acreditar num País e num mundo melhor, mais justo e democrático e que, tal como a vida, a luta continua.

O S. Presidente: - Sr.as e Srs. Deputados, quero também expressar novamente as minhas condolências ao Grupo Parlamentar do PCP neste momento em que rendemos uma homenagem formal do Parlamento português àquele que, abraçando uma causa, foi um exemplo na firmeza das suas convicções e na capacidade, ao limite do sacrifício, por uma batalha política, com abnegação e com capacidade para enfrentar a rudeza da vida clandestina, o resultado imprevisível da fuga da prisão, o sofrimento, o isolamento, o exílio, a tortura e as várias formas insidiosas de humilhação ritual da ditadura. Ditadura de que ele foi um dos mais tenazes e consequentes adversários e um dos mais valorosos artífices do seu fim.
Por isso, no dia de ontem e de anteontem, assistimos da parte de todas as forças políticas, o que é extremamente louvável, e da parte dos órgãos do Estado democrático a uma homenagem em sua memória. Uma homenagem ao político português que brilhou bem alto na constelação e no firmamento europeu e mundial da sua própria família política, o que, naturalmente, é também um motivo de orgulho para o nosso país.
O seu funeral foi uma grande expressão cívica. Expressão cívica dos seus militantes, dos seus apoiantes e dos comunistas portugueses, para quem, em anos anteriores, quando o nosso país era um país atrasado e sem democracia, ele foi mais do que um referencial de esperança. Mas, na dura confrontação das desigualdades sociais, soube também ser para muitos milhares de portugueses um referencial de dignidade.

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A dignidade é também a base da democracia e, por isso, o funeral de ontem foi também uma lição de democracia, pelo civismo com que decorreu, pela liberdade do País em que se realizou, sem perseguidos nem perseguidores, e também pelo próprio facto de todo o País, partindo de campos políticos muito diversos, ter parado, ter reflectido e, na divergência plural - o que é salutar - das suas perspectivas, ter também sabido prestar homenagem a um homem de convicções.
Sr.as e Srs. Deputados, vamos passar à votação deste voto de pesar. O Grupo Parlamentar do PSD pede que se faça igualmente a votação em separado da parte preambular e da parte dispositiva do voto.
Assim, vamos votar, em primeiro lugar, a parte preambular do voto.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes e abstenções do PSD, do CDS-PP e do Deputado do PS Ricardo Gonçalves.

Vamos, agora, votar a parte dispositiva do voto.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

Sr.as e Srs. Deputados, vamos, agora, para o conjunto de todos os votos de pesar aprovados pela Assembleia da República na sessão de hoje, guardar, em respeito pela memória dos nossos concidadãos falecidos, 1 minuto de silêncio.

A Câmara guardou, de pé, 1 minuto de silêncio.

Sr.as e Srs. Deputados, os projectos de resolução n.os 37/X e 4/X foram retirados pelos proponentes, pelo que vamos votar o projecto de resolução n.º 41/X - Programa de Estabilidade e Crescimento 2005-2009 (PS).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS e votos contra do PSD, do PCP, do CDS-PP, do BE e de Os Verdes.

Vamos votar agora o projecto de resolução n.º 43/X - Programa de Estabilidade e Crescimento 2005-2009 (BE).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PCP, do BE e de Os Verdes.

Vamos votar o projecto de resolução n.º 45/X - Programa de Estabilidade e Crescimento 2005-2009 (PSD).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes e votos a favor do PSD e do CDS-PP.

Seguidamente, vamos votar o projecto de resolução n.º 46/X - Programa de Estabilidade e Crescimento 2005-2009 (PCP).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PCP, do BE e de Os Verdes.

Srs. Deputados, vamos agora proceder à votação final global do texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos Económicos, Inovação e Desenvolvimento Regional, referente à proposta de lei n.º 5/X - Cria o SIFIDE - Sistema de Incentivos Fiscais em Investigação e Desenvolvimento Empresarial.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes e abstenções do PSD e do CDS-PP.

Srs. Deputados, a Sr.ª Secretária vai proceder à leitura de quatro pareceres da Comissão de Ética.

A Sr.ª Secretária (Rosa Maria Albernaz): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelos Serviços do Ministério Público de Resende - Unidade de Apoio - Processo n.º 6/05.3 - TARSD, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar a Sr.ª Deputada Cláudia Couto Vieira (PS) a prestar depoimento por escrito, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o parecer está em apreciação.

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Pausa.

Não havendo objecções, vamos votá-lo.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

A Sr.ª Secretária (Rosa Maria Albernaz): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo 4.º Juízo do Tribunal Judicial de Ponta Delgada - Processo n.º 132/2002, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Ricardo Rodrigues (PS) a prestar depoimento por escrito, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.

Pausa.

Não havendo objecções, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

A Sr.ª Secretária (Rosa Maria Albernaz): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pela Secção Única do Tribunal Judicial de Almodôvar - Processo n.º 4/03.1 - TAORQ, a Comissão de Ética decidiu emitir o seguinte parecer:
"a) Que a suspensão do mandato do Sr. Deputado José Raúl Guerreiro Mendes dos Santos deve ser autorizada para efeito do prosseguimento do processo n.º 4/03.1 - TAORQ, da Secção Única do Tribunal Judicial de Almodôvar;
b) Que tal suspensão deve ser limitada ao tempo estritamente necessário à realização do julgamento, nos seguintes termos:
1) Em caso de adiamento da audiência do julgamento, a suspensão cessará no final do dia designado, apenas se iniciando nova suspensão no dia da nova data agendada;
2) Na hipótese do julgamento em causa ser iniciado e concluído num único dia, a suspensão deverá ser limitada ao período de um dia, sendo certo que se o julgamento se prolongar por mais dias, então:
2.1 - Caso o julgamento tenha continuação no dia ou nos dias imediatamente subsequentes ao do seu início, a suspensão manter-se-á até ao final do dia da respectiva conclusão.
2.2 - Caso o julgamento apenas tenha continuação noutro ou noutros dias, que não os imediatamente subsequentes, a suspensão deverá cessar no final do dia designado para a primeira audiência, apenas se iniciando nova suspensão no dia da nova data designada e até à respectiva conclusão, aplicando-se, na hipótese da necessidade de nova continuação, o referido nas alíneas antecedentes."

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.

Pausa.

Não havendo objecções, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

A Sr.ª Secretária (Rosa Maria Albernaz): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, temos agora um relatório e parecer da Comissão de Ética referente à:
Assunção de mandato, nos termos do artigo 6.º, n.os 1 e 2, do Estatuto dos Deputados, com efeitos desde 16 de Junho corrente, inclusive, de Maria Júlia Caré (PS), círculo eleitoral da Madeira, cessando Ricardo Freitas;
Substituição, nos termos do artigo 7.º do Estatuto dos Deputados, com início na data de anúncio em Plenário, de Fernando Gomes (PS), círculo eleitoral do Porto, mediante renúncia de mandato, por Lúcio Maia Ferreira.
O parecer é no sentido de que as assunção e renúncia de mandatos em causa são de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, antes de dar por findos os trabalhos, quero desejar ao Partido Socialista bom resultado para as suas Jornadas Parlamentares, nos próximos sexta-feira e sábado, no Algarve, e anunciar que a

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próxima sessão plenária se realiza dia 22, quarta-feira, às 15 horas e terá como ordem do dia o debate de urgência sobre os resultados do Conselho Europeu, reunido hoje e amanhã, a discussão, e posterior votação, do texto emanado da Comissão Eventual para a Revisão Constitucional Extraordinária e, ainda, a discussão, na generalidade, do projecto de lei n.º 4/X - Estabelece o regime de mera gestão dos órgãos autárquicos (no período entre as eleições e a instalação dos novos órgãos) (PSD) e a discussão, também na generalidade, do projecto de lei n.º 101/X - Décima quinta alteração ao regime jurídico da eleição do Presidente da República (PS).
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 35 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Partido Socialista (PS):
António Manuel de Carvalho Ferreira Vitorino
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues
João Cardona Gomes Cravinho
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
José Augusto Clemente de Carvalho
José Luís Pereira Carneiro
Manuel Francisco Pizarro de Sampaio e Castro
Rui do Nascimento Rabaça Vieira

Partido Social Democrata (PSD):
António Paulo Martins Pereira Coelho
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Manuel Joaquim Dias Loureiro
Marco António Ribeiro dos Santos Costa
Regina Maria Pinto da Fonseca Ramos Bastos
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva

Partido Comunista Português (PCP):
Francisco José de Almeida Lopes
Jerónimo Carvalho de Sousa
Maria Odete dos Santos
Miguel Tiago Crispim Rosado

Partido Popular (CDS-PP):
Paulo Sacadura Cabral Portas

Srs. Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:

Partido Socialista (PS):
António Ramos Preto
Júlio Francisco Miranda Calha
Maximiano Alberto Rodrigues Martins

Partido Social Democrata (PSD):
João Bosco Soares Mota Amaral
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
José Luís Fazenda Arnaut Duarte
José Mendes Bota
Maria do Rosário da Silva Cardoso Águas
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas

Partido Popular (CDS-PP):
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia

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Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Partido Socialista (PS):
João Barroso Soares
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego
Maria Irene Marques Veloso
Maria Jesuína Carrilho Bernardo
Maria Matilde Pessoa de Magalhães Figueiredo de Sousa Franco
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte

Partido Social Democrata (PSD):
Carlos Alberto Silva Gonçalves
Gonçalo Nuno Mendonça Perestrelo dos Santos
José Manuel Pereira da Costa
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes
Mário Henrique de Almeida Santos David
Mário Patinha Antão
Paulo Artur dos Santos Castro de Campos Rangel

Partido Ecologista "Os Verdes" (PEV):
Francisco Miguel Baudoin Madeira Lopes

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL

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