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Sexta-feira, 24 de Junho de 2005 I Série - Número 33

X LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2005-2006)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 23 DE JUNHO DE 2005

Presidente: Ex.mo Sr. Jaime José Matos da Gama

Secretários: Ex. mos Srs. Maria Jesuína Carrilho Bernardo
Fernando Santos Pereira
Artur Jorge da Silva Machado
Abel Lima Baptista

S U M Á R I O


O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 15 minutos.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta da entrada na Mesa de requerimentos e de respostas a alguns outros e do projecto de resolução n.º 47/X.
Em declaração política, a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita (PCP) condenou as medidas que o Governo tem vindo a tomar ao arrepio de promessas eleitorais, nomeadamente as que levaram à greve dos professores. No fim, respondeu a pedidos de esclarecimento da Sr.ª Deputada Cristina Granada (PS).
Também em declaração política, a Sr.ª Deputada Ana Drago (BE), lembrando o "arrastão de Carcavelos", criticou notícias divulgadas pela comunicação social sobre o acontecimento que podem conduzir a atitudes xenófobas e racistas e preconizou a integração social como forma de reduzir este fenómeno. No final, respondeu a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP).
Ainda em declaração política, o Sr. Deputado Miguel Relvas (PSD) teceu críticas às propostas do PS acerca da descentralização administrativa do País, após o que respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Costa Andrade (PS) e Francisco Louçã (BE).
Finalmente, em declaração política, a Sr.ª Deputada Maria de Belém Roseira (PS) fez o balanço da acção do Governo desde a sua tomada de posse, tendo dado resposta a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Helena Pinto (BE), Bernardino Soares (PCP) e Pedro Duarte (PSD).

Ordem do dia.- Procedeu-se à discussão conjunta, na generalidade, da proposta de lei n.º 6/X - Estabelece regras para as nomeações dos altos cargos da Administração Pública, que foi aprovada, e dos projectos de lei n.os 32/X - Altera o Estatuto do Pessoal Dirigente dos Serviços e Organismos da Administração Central, Regional e Local do Estado, aprovado pela Lei n.º 2/2004, de 15 de Janeiro (BE), que foi igualmente aprovado, e 78/X - Estabelece normas sobre cessação da relação pública de emprego de cargos dirigentes (CDS-PP), que foi rejeitado. Intervieram no debate, a diverso título, além do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Augusto Santos Silva) e do Sr. Secretário de Estado da Administração Pública (João Figueiredo), os Srs. Deputados Fernando Rosas (BE), Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP), Luís Montenegro (PSD), Jorge Machado (PCP), António Gameiro (PS), António Montalvão Machado (PSD) e Francisco Madeira Lopes (Os Verdes).
Mereceu aprovação o voto n.º 16/X - De pesar pelo falecimento do Dr. Mário Corino de Andrade (PS, PSD, PCP, CDS-PP, BE e Os Verdes), tendo, no fim, a Câmara guardado 1 minuto de silêncio.
Na generalidade, foram aprovados os projectos de lei n.os 4/X - Estabelece o regime de mera gestão dos órgãos autárquicos (no período entre as eleições e a instalação dos novos órgãos) (PSD), 117/X - Estabelece o regime de gestão limitada dos órgãos das autarquias locais e seus

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titulares (PS) e 101/X - Décima quinta alteração ao regime jurídico da eleição do Presidente da República (PS).
Em votação final global, foi aprovado o texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, sobre a proposta de lei n.º 9/X - Segunda alteração do Decreto-Lei n.º 44/2004, de 3 de Março, que estabelece um regime especial de registo de prédios situados nos municípios do Corvo, de Lajes das Flores e de Santa Cruz das Flores, bem como dos direitos e ónus ou encargos sobre estes incidentes (ALRAA).
A Câmara aprovou pareceres da Comissão de Ética, autorizando dois Deputados, um do PSD e outro do PS, a deporem por escrito, como testemunha, em tribunal e um Deputado do PS a depor, por escrito, como arguido.
Foi, ainda, apreciada, na generalidade, a proposta de lei n.º 10/X - Altera o Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, o Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas, o Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado, a Lei Geral Tributária e o Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária, tendo usado da palavra, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (João Amaral Tomaz), os Srs. Deputados Victor Baptista (PS), Hugo Velosa (PSD), Francisco Louçã (BE), Teresa Venda (PS), Abel Baptista (CDS-PP), Honório Novo (PCP) e António Pires de Lima (CDS-PP).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 35 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 15 minutos.

Srs. Deputados presentes à sessão:

Partido Socialista (PS):
Agostinho Moreira Gonçalves
Alberto Arons Braga de Carvalho
Alberto de Sousa Martins
Alberto Marques Antunes
Aldemira Maria Cabanita do Nascimento Bispo Pinho
Ana Maria Ribeiro Gomes do Couto
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António José Ceia da Silva
António José Martins Seguro
António Ramos Preto
António Ribeiro Gameiro
Armando França Rodrigues Alves
Carlos Alberto David dos Santos Lopes
Carlos Cardoso Lage
Cláudia Isabel Patrício do Couto Vieira
Deolinda Isabel da Costa Coutinho
Elísio da Costa Amorim
Fernanda Maria Pereira Asseiceira
Fernando dos Santos Cabral
Glória Maria da Silva Araújo
Horácio André Antunes
Isabel Maria Batalha Vigia Polaco de Almeida
Isabel Maria Pinto Nunes Jorge
Jacinto Serrão de Freitas
João Cândido da Rocha Bernardo
João Cardona Gomes Cravinho
João Miguel de Melo Santos Taborda Serrano
João Raul Henriques Sousa Moura Portugal
Joaquim Barbosa Ferreira Couto
Joaquim Ventura Leite
Jorge Manuel Capela Gonçalves Fão
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Carlos das Dores Zorrinho
José Luís Pereira Carneiro
Jovita de Fátima Romano Ladeira
Júlio Francisco Miranda Calha
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Lúcio Maia Ferreira
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís Manuel de Carvalho Carito
Luís Miguel Morgado Laranjeiro
Luísa Maria Neves Salgueiro
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Manuel Alegre de Melo Duarte
Manuel António Gonçalves Mota da Silva
Manuel Francisco Pizarro de Sampaio e Castro
Manuel Luís Gomes Vaz
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Marcos da Cunha e Lorena Perestrello de Vasconcellos
Marcos Sá Rodrigues
Maria Antónia Moreno Areias de Almeida Santos

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Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Cidália Bastos Faustino
Maria Cristina Vicente Pires Granada
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria de Fátima Oliveira Pimenta
Maria de Lurdes Ruivo
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Maria Helena da Silva Ferreira Rodrigues
Maria Helena Terra de Oliveira Ferreira Dinis
Maria Hortense Nunes Martins
Maria Irene Marques Veloso
Maria Isabel Coelho Santos
Maria Jesuína Carrilho Bernardo
Maria José Guerra Gamboa Campos
Maria Júlia Gomes Henriques Caré
Maria Odete da Conceição João
Maria Teresa Alegre de Melo Duarte Portugal
Maria Teresa Filipe de Moraes Sarmento Diniz
Maximiano Alberto Rodrigues Martins
Miguel João Pisoeiro de Freitas
Nelson Madeira Baltazar
Nuno André Araújo dos Santos Reis e Sá
Nuno Mário da Fonseca Oliveira Antão
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Barros Teixeira Santos
Paula Cristina Nobre de Deus
Pedro Manuel Farmhouse Simões Alberto
Pedro Nuno de Oliveira Santos
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Renato Luís Pereira Leal
Ricardo Manuel de Amaral Rodrigues
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui António Ferreira da Cunha
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Sandra Marisa dos Santos Martins Catarino da Costa
Sónia Isabel Fernandes Sanfona Cruz Mendes
Victor Manuel Bento Baptista
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho

Partido Social Democrata (PSD):
Adão José Fonseca Silva
Agostinho Correia Branquinho
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Joaquim Almeida Henriques
António Paulo Martins Pereira Coelho
Arménio dos Santos
Carlos Alberto Garcia Poço
Carlos Alberto Silva Gonçalves
Carlos Jorge Martins Pereira
Carlos Manuel de Andrade Miranda
Domingos Duarte Lima
Emídio Guerreiro
Feliciano José Barreiras Duarte
Fernando dos Santos Antunes
Fernando Mimoso Negrão
Fernando Santos Pereira
Gonçalo Nuno Mendonça Perestrelo dos Santos
Henrique José Praia da Rocha de Freitas
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves

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Hugo José Teixeira Velosa
Jaime Carlos Marta Soares
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Jorge Fernando Magalhães da Costa
Jorge José Varanda Pereira
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
Jorge Manuel Lopes Moreira da Silva
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado
José António Freire Antunes
José de Almeida Cesário
José Eduardo Rego Mendes Martins
José Manuel Amaral Lopes
José Manuel de Matos Correia
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro
José Manuel Marques de Matos Rosa
José Manuel Pereira da Costa
José Raúl Guerreiro Mendes dos Santos
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Filipe Carloto Marques
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Luís Miguel Pais Antunes
Maria do Rosário da Silva Cardoso Águas
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Mário da Silva Coutinho Albuquerque
Mário Patinha Antão
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas
Miguel Jorge Pignatelli de Ataíde Queiroz
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Nuno Maria de Figueiredo Cabral da Câmara Pereira
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Pedro Quartin Graça Simão José
Regina Maria Pinto da Fonseca Ramos Bastos
Ricardo Jorge Olímpio Martins
Vasco Manuel Henriques Cunha

Partido Comunista Português (PCP):
Agostinho Nuno de Azevedo Ferreira Lopes
António Filipe Gaião Rodrigues
Artur Jorge da Silva Machado
Bernardino José Torrão Soares
José Batista Mestre Soeiro
José Honório Faria Gonçalves Novo
Maria Luísa Raimundo Mesquita
Maria Odete dos Santos
Miguel Tiago Crispim Rosado

Partido Popular (CDS-PP):
Abel Lima Baptista
Álvaro António Magalhães Ferrão de Castello-Branco
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
José Miguel Nunes Anacoreta Correia
Luís Pedro Russo da Mota Soares
Nuno Miguel Miranda de Magalhães
Teresa Margarida Figueiredo de Vasconcelos Caeiro

Bloco de Esquerda (BE):

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Alda Maria Gonçalves Pereira Macedo
Ana Isabel Drago Lobato
Fernando José Mendes Rosas
Francisco Anacleto Louçã
Helena Maria Moura Pinto
João Miguel Trancoso Vaz Teixeira Lopes
Mariana Rosa Aiveca Ferreira

Partido Ecologista "Os Verdes" (PEV):
Francisco Miguel Baudoin Madeira Lopes
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a Sr.ª Secretária vai proceder à leitura do expediente.

A Sr.ª Secretária (Maria Carrilho): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deu entrada na Mesa, e foi admitido, o projecto de resolução n.º 47/X - Pela criação de um programa de promoção, expansão e qualificação do ensino da língua e da cultura portuguesas no estrangeiro (PCP).
Foram também apresentados diversos requerimentos.
Na reunião plenária de 9 de Junho e no dia 14 de Junho - ao Ministério da Administração Interna, formulado pela Sr.ª Deputada Maria Helena Rodrigues; ao Governo, ao Ministro da Presidência e aos Ministérios das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, da Saúde, da Administração Interna, da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, da Economia e da Inovação e aos Caminhos de Ferro Portugueses, EP, formulados pelos Srs. Deputados Odete João, Mota Amaral, Agostinho Lopes, José Soeiro, Honório Novo, Miguel Tiago e Manuel Alegre; aos Ministérios da Educação, da Cultura e do Trabalho e da Solidariedade Social, formulados pelos Srs. Deputados Zita Seabra, Jorge Machado e Luísa Mesquita; ao Ministério do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional, formulados pelos Srs. Deputados Adão Silva, Francisco Lopes, Alda Macedo e Mariana Aiveca; aos Ministérios dos Negócios Estrangeiros e da Defesa Nacional, formulado pelo Sr. Deputado Fernando Rosas; a diversas câmaras, formulados pelos Srs. Deputados Telmo Correia, Abel Baptista e Nuno Rodrigues.
Na reunião plenária de 16 de Junho e no dia 20 de Junho - ao Ministro da Presidência e ao Ministério da Saúde, formulados pelos Srs. Deputados Manuel Mota e José Soeiro; ao Ministério do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional, formulados pelos Srs. Deputados Marcos Sá, Jorge Moreira da Silva e Paulo Portas; ao Ministério da Administração Interna, formulado pelo Sr. Deputado Vasco Cunha; ao Governo, formulado pelo Sr. Deputado Mota Amaral; ao Ministério da Economia e da Inovação, formulados pelos Srs. Deputados Jorge Machado, Abílio Fernandes e Bernardino Soares; ao Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social, formulado pela Sr.ª Deputada Luísa Mesquita; aos Ministérios das Obras Públicas, Transportes e Comunicações e da Cultura, formulado pelo Sr. Deputado Honório Novo; ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, formulado pelo Sr. Deputado José Cesário; ao Ministério da Educação, formulado pela Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.
O Governo respondeu a requerimentos apresentados por vários Srs. Deputados.
No dia 16 de Junho - Paulo Batista Santos, José Soeiro, Agostinho Lopes, Heloísa Apolónia, Luísa Mesquita, Mota Amaral, Manuel Pizarro e Teresa Caeiro.
No dia 22 de Junho - Ângela Sabino, Paulo Batista Santos, Bernardino Soares, Miguel Tiago, Helena Pinto, Alda Macedo, João Teixeira Lopes, Heloísa Apolónia, Agostinho Lopes, Jorge Machado, José Soeiro, Ana Drago, Miranda Calha, Luísa Mesquita, José Cesário, António Filipe, Henrique Rocha de Freitas e Zita Seabra.
Foi ainda recebida, no dia 22 de Junho, resposta ao requerimento apresentado pelo Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Governo tomou posse há três meses e os muitos portugueses que acreditaram ter contribuído para a mudança, aguardavam os primeiros sinais que contrariassem a difícil vida a que os últimos governos os haviam sujeitado.

O Sr. António Filipe (PCP): - Exactamente!

A Oradora: - Os problemas eram muitos e as medidas tardavam. O programa eleitoral fora ambíguo. A campanha pouco esclarecedora. E o Programa do Governo limitava-se a repetir as promessas que haviam fixado os votos para a maioria absoluta.

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O Governo precisava de mais algumas semanas. Era necessário encenar o drama. Era imprescindível seleccionar as vítimas, os figurantes e os disponíveis para os aplausos. Era desejável patrocinar um determinado estilo, que assegurasse as suficientes doses de arrogância, abusivamente confundidas com rigor e necessárias à publicidade enganosa das medidas gravosas que aí vinham. E tudo isto leva o seu tempo.
Cenário concluído - e colocados no sítio certo alguns escribas de serviço, sempre disponíveis para assumirem a pena de generalistas de tudo e especialistas de nada e que, a troco do muito que ganham e do espaço assegurado que têm, debitam fel nas vítimas de sempre e lambuzam de mel as políticas neoliberais dos diferentes governos -, faltava mesmo só confirmar o que muitos já sabiam e outros adivinhavam: as medidas. E elas aí estão, para gáudio de poucos e sofrimento de muitos. Inaceitáveis politicamente, porque o Governo prometeu e não vai cumprir, gravosas socialmente, porque o quotidiano dos mais desprotegidos, dos mais vulneráveis, dos mais pobres vai agravar-se, e muito, e inadequadas economicamente, porque não apostam no desenvolvimento e no crescimento do País mas, sim, nas imposições absurdas de Bruxelas.
Mas se tudo isto não constituiu surpresa para os mais avisados, outros quedaram-se estupefactos. Mas ainda não sabiam do mais que aí vinha.
E cidadãos e cidadãs de um Portugal democrático, que ajudaram a construir e pelo qual muitos lutaram em plena ditadura, fizeram seus os direitos e deveres que o texto constitucional lhes outorgou e manifestaram o seu descontentamento.
Estão convictos de que o Governo ainda é o que ganhou a sua confiança em Fevereiro, o socialista, a quem deram o seu voto, não para ficar tudo na mesma, porque para pior já bastava assim.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Mas descobriram, da forma mais dura e humilhante, que o Governo socialista não tem as melhores relações com o exercício dos direitos dos cidadãos, sobretudo quando esse exercício questiona o seu poder, diverge da sua actuação e não aceita o seu ponto de vista.
Que Governo estranho este que se permite juízos tão distorcidos e procedimentos tão enviesados para calar a voz dos descontentes!
Que Governo tão estranhamente socialista é este que quer impedir os trabalhadores de se manifestarem, de acordo com direitos que a ditadura negou mas que a democracia hoje consagra?!
Que Governo socialista é este que traduz direitos por privilégios, atropela estatutos profissionais e se propõe repor atentados à dignidade profissional definitivamente esquecidos após o fim da ditadura?!

O Sr. Honório Novo (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Que Governo socialista é este que alimenta de forma inaceitável algumas mentes ignaras e caluniosas, que não toleram que, para além delas, também os trabalhadores tenham conquistado duramente direitos e não estejam disponíveis para os alienar e muito menos em nome de interesses que não os do seu País?!
Que Governo é este que não percebe, como dizia um professor socialista, que "tudo pode ser negociável, menos a honra e a dignidade da profissão"?!
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: De facto, os últimos dias têm evidenciado os tiques autoritários e arrogantes do Governo, e mesmo a sua ausência de capacidade para gerir as consequências do conhecimento público das decisões tomadas em causa alheia mas por responsabilidade própria de quem governa e governou, decretou e aplicou as políticas causadoras dos estragos que, hoje, tardia mas finalmente, todos reconhecem.
O Governo, confrontado com a greve decidida pelas organizações representativas dos professores, perdeu a pose de Estado e pensou que, em democracia, vale tudo, sobretudo de quem governa: defendeu que a greve era ilícita, ignorando a legislação em vigor; insultou os sindicatos e, consequentemente, os sindicalizados; ameaçou os docentes, os educadores e os órgãos de gestão das escolas com faltas injustificadas e processos disciplinares; decretou serviços mínimos para a educação, sabendo que não é possível legalmente fixar esses serviços; produziu despachos ilegais e contraditórios, humilhando os professores e decretando a presença de todos nos estabelecimentos de ensino, incluindo os docentes dispensados da componente lectiva, exclusivamente para os pressionar; interrompeu as actividades lectivas em todos os estabelecimentos dos ensinos básico e secundário, prejudicando as aprendizagens de todos os alunos, quer tivessem ou não exames, com o objectivo único de manipulação da opinião pública, sobretudo dos pais e encarregados de educação;…

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - … e faltou à verdade, afirmando que os exames só poderiam ser repetidos em Agosto, tentando posicionar as famílias contra os docentes e os sindicatos.

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Mas mais cedo do que o Governo esperava, anunciam-se os fracassos das ameaças e caem as máscaras e os fantasmas que o próprio Governo criou nos últimos dias. O feitiço manifestou-se também contra o feiticeiro.
Em primeiro lugar, o número de exames não realizados é diminuto. "Fiasco da greve", correm a noticiar os tais escribas, sempre de serviço. Nada mais falso, Sr.as e Srs. Deputados! A greve abrangia o pré-escolar, os ensinos básico e secundário e atingiu diferentes espaços territoriais em diferentes dias, decisão fundamental para a diminuição, e muito, do impacto na realização dos exames. Os sindicatos disseram-no, os professores confirmaram-no, mas o Governo optou por não ouvir.
Em segundo lugar, as organizações representativas dos pais e encarregados de educação afirmam respeitar a legítima decisão de adesão à greve por parte dos professores, atitude que o Governo não foi capaz de assumir, e exigem que o Governo marque os exames o mais cedo possível e não em Agosto. E o Governo, se não o fizer, é porque não quer, ou porque pretende transformar um direito constitucional dos trabalhadores docentes em arremesso e oportunismo político.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Mas o Governo já deu o dito pelo não dito e, afinal, os exames serão nos próximos dias.
Em terceiro lugar, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Ponta Delgada ordenou a suspensão imediata dos efeitos do despacho do Sr. Secretário Regional da Educação e Ciência do Governo Regional dos Açores, após a interposição de providência cautelar pelas associações representativas dos educadores e professores.
A Sr.ª Ministra da Educação perdeu a noção das palavras ou não sabe acatar as decisões de um Estado de Direito democrático.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Por esta, não esperava ela!…
A Sr.ª Ministra afirmou, ontem, que a decisão do Tribunal de Ponta Delgada sobre a convocação de professores para cumprir os serviços mínimos "não respeita a República Portuguesa." E porquê? Tão-somente porque não subscreve a opinião do Governo.
O Presidente da Associação Sindical de Juízes já afirmou que "não é admissível uma gaffe que demonstra uma cultura pouco democrática" e acrescenta que "é inadmissível que um responsável do Governo, sobretudo sendo a Ministra da Educação, se permita proferir declarações destas levianamente" e, por isso, já pediu a intervenção urgente do Sr. Presidente da República.
O Secretário de Estado da Educação já veio emendar a Sr.ª Ministra, mas fora de prazo.
De facto, o Governo não sabe acatar o descontentamento dos trabalhadores portugueses e agora, e também, as decisões dos tribunais.
Por tudo isto, Sr.as e Srs. Deputados, particularmente do Partido Socialista, o Governo precisa de parar e reflectir.
O caminho é outro. É o caminho da defesa da escola pública, e para todos, com dignidade daqueles que são os seus actores, os alunos e os professores.
As greves não são uma aspiração dos trabalhadores, são antes um direito desses mesmos trabalhadores. E estamos num Estado de Direito democrático e não no Estado do "vale tudo".
Mas vale a pena que o Governo leia o processo cautelar do Tribunal Administrativo de Ponta Delgada. Deixo aqui o convite à reflexão, que bem lhe fica e muita falta lhe faz. Diz o juiz que "(…) qualquer Estado pode optar por consagrar ou não consagrar o direito à greve dos seus cidadãos trabalhadores. Mas ou se consagra ou não se consagra. Não há consagrações do direito à greve mais ou menos técnicas ou vazias de conteúdo. Ou sim, ou não. E se um Estado ou uma comunidade optam por consagrar tal instituto têm de arcar com os respectivos inconvenientes. E as virtualidades deste direito vêm sempre acompanhadas dos inconvenientes. É um preço que a comunidade tem que pagar por ter feito a opção. Não há como fugir daí". E acrescenta: "(…) as limitações ao exercício do respectivo direito não podem, pura e simplesmente, esvaziá-lo. Repetimos: ou há ou não há direito à greve; não pode é fazer-se de conta que há e não haver por esvaziamento."

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Mas vale a pena, Sr.as e Srs. Deputados do Partido Socialista, que o Governo leia também um parecer da Organização Internacional do Trabalho (OIT) sobre liberdade sindical, negociação colectiva e relações profissionais, que enuncia as áreas que devem ser objecto de definição de serviços mínimos. Elas estão lá, para quem sabe ler: a saúde, a segurança e a vida. Só quando estas áreas possam estar em risco deverão ser objecto de serviços mínimos.
Se assim não acontecer, diz a OIT, os Estados limitam um dos essenciais meios de pressão de que dispõem os trabalhadores para defender os seus legítimos interesses económicos e sociais.

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E foi isto, para vergonha do Estado democrático e de todos nós, que o Governo do Partido Socialista pretendeu fazer, 30 anos depois de Abril.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cristina Granada.

A Sr.ª Cristina Granada (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Luísa Mesquita, qual é este Governo? Este é o Governo que ganhou as eleições, com larga maioria, a 20 de Fevereiro, para que governasse.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Este é o Governo que se propõe governar, governar Portugal com todos os portugueses e para todos os portugueses. Este é o Governo que respeita o direito à greve. Este é o Governo a quem o tribunal reconhece razão, quando diz que está legal o despacho conjunto dos Ministérios do Trabalho e da Educação.
Este é o Governo a quem, na Região Autónoma dos Açores, se adia a aplicação do diploma entregue pelo governo regional. Na Região Autónoma dos Açores a decisão não foi contra o governo regional, foi de suspender para estudar a situação.
Este é o Governo que reconhece o direito das famílias, o direito dos alunos de fazerem exames, o direito dos professores de terem férias.

Aplausos do PS.

Este é o Governo que reconhece o direito dos trabalhadores de terem regularidade no seu desempenho.
Este é o Governo que quer aplicar medidas. Este é o Governo de quem não vão dizer que só aplica medidas a determinadas classes; este é o Governo que toma medidas em relação a todas as classes.
Sr.ª Deputada, a sua intervenção é de ataque puro e simples ao Governo…

O Sr. Luiz Fagundes Duarte (PS): - É da FENPROF!

A Oradora: - … ou é construtiva e visa trazer soluções?
Traga soluções para este Governo, Sr.ª Deputada!

Aplausos do PS.

Vozes do CDS-PP: - Bem precisa!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Cristina Granada, naturalmente entendo a sua desconfortável posição; como Deputada do Partido Socialista e como docente, entendo o seu desconforto.
Mas vamos aos factos, Sr.ª Deputada. O Partido Socialista conseguiu a maioria absoluta em Fevereiro de 2005. Esqueceu-se foi - tal como construiu programas ambíguos, quer eleitoral quer de Governo - de enunciar nesses programas algo indispensável, ou seja, que, depois de ser empossado, a primeira medida que ia tomar, em prol da educação pública, da defesa da escola pública, dos professores e da qualificação dos portugueses, era a de impedir os professores de terem direito à greve.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Exactamente!

Protestos do PS.

A Oradora: - Foi deste facto, Sr.ª Deputada, que o seu Governo se esqueceu.
Mas entendo que a Sr.ª Deputada tenha de fazer esse "frete" ao seu Governo. Agora, os professores deste país não têm de fazer "fretes" ao seu Governo - nem mesmo os professores socialistas, Sr.ª Deputada! Os professores socialistas não vão admitir que qualquer ministra da Educação, seja ela de que partido for, ou qualquer governo, dito supostamente socialista ou não, destrua a escola pública, a qualificação dos portugueses, a educação.

Aplausos do PCP.

Protestos do PS.

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Convença-se, Sr. Deputada, que isso não acontecerá, 30 anos depois de Abril!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago.

A Sr.ª Ana Drago (BE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em menos de quatro meses, o País vai a votos para escolher novos - e, sublinho, novos, esperamos- protagonistas do poder autárquico. O que o País espera das propostas políticas que lhe serão apresentadas é que se definam como projectos de vida para as cidades e a vida local, que sejam inclusivos, redistribuidores, dinâmicos e promotores da democracia e da participação na gestão local.
Trata-se, pois, de gizar um desenho de vida quotidiana que responda a cada uma das dificuldades que os cidadãos sentem no seu dia-a-dia: a mobilidade, a habitação, a articulação entre locais de trabalho e espaços de lazer, a segurança e a vivência da cidadania.
Aqui, no Parlamento, as alterações propostas ao arranjo legal da vida autárquica estão aparentemente congeladas. A limitação de mandatos autárquicos, prometida e anunciada "a sete ventos" pelo Partido Socialista e por outros, vai agora vegetando, em sede de especialidade. Sem arrojo e sem vontade política, tudo anuncia que teremos nas eleições autárquicas de 2005 mais do mesmo: mais dos mesmos todo-poderosos autarcas eternos, que se mantêm no poder sustentados nas teias de relações e clientelismos que gastaram décadas a construir.

Vozes do BE: - Muito bem!

A Oradora: - E mais do mesmo: sem respostas políticas para a mudança social que paulatinamente vai recriando o País, nas ruas, nos bairros, na macrocefalia dos grandes centros urbanos e na anemia crescente das vilas do interior.
Nas últimas duas semanas, uma dimensão muito específica da vida urbana tem feito correr tinta e alimentado polémicas. Desde os acontecimentos na praia de Carcavelos que o País discute a dimensão exacta, o impacto e o tratamento mediático dado ao que ficou conhecido pelo "arrastão de Carcavelos".
Nas televisões, alguns "directos" deram, então, eco às informações infundadas sobre os eventos na praia. Ao longo das últimas semanas, os telejornais abrem com imagens de assaltos em transportes públicos. Na opinião publicada, alguns comentadores são taxativos: expulsem quem não é português; prendam todos os outros e deitem fora a chave.
O CDS-PP, aqui, nesta Câmara, tentou estabelecer, aliás, o perigoso nexo entre imigração e criminalidade.

Vozes do BE: - Muito bem!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Isso é mentira, é falso! É mentirosa!

A Oradora: - A manipulação, a inexactidão no tratamento do chamado "arrastão" tem vindo a ser analisada à luz de novas informações. O próprio Comando Metropolitano da PSP de Lisboa veio, afinal, embora sete dias depois, reduzir o número dos assaltantes para menos de 10% do número anteriormente anunciado. "De um grande grupo de 400 ou 500 pessoas só 30 ou 40 praticaram ilícitos", afirmou este mesmo Comando. E disse, mais: "Muitos jovens que apareceram nas imagens televisivas e fotográficas a correr na praia de Carcavelos naquele dia não eram assaltantes, mas tão-só jovens que fugiam com os seus próprios haveres".

Vozes do BE: - Muito bem!

A Oradora: - Foram apresentadas apenas duas queixas. Na Assembleia Municipal de Lisboa, António Tavares, eleito pelo PSD, contou o relato do seu filho que estava na praia de Carcavelos: não houve arrastão, houve talvez furtos (que ele não pode atestar), mas o que aconteceu foi uma fuga de jovens de uma aparente carga policial indiscriminada.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Ah!…

Vozes do CDS-PP: - Prendam os polícias!

A Oradora: - Quando o Rio de Janeiro parecia ter chegado a Lisboa, os números oficiais indicam o contrário: a criminalidade nas linhas de transportes suburbanos baixou consideravelmente, no último ano.
O mundo mediático parece ter dificuldade em acertar agulhas com o mundo dito real. Pior, recria e modela o mundo "real": no assalto exibido na televisão, os ferimentos sofridos pelos passageiros parecem ter

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resultado do pânico que se gerou nas carruagens. Nas rádios, muitos cidadãos, quando perguntados, dizem que vão deixar de utilizar transportes urbanos por terem medo.
A análise da fabricação do alarmismo é sempre importante. Muitos jornalistas, comentadores e cidadãos têm vindo também a fazê-la nos últimos dias, pesando o impacto das imagens, quando não contextualizadas, e dos relatos sensacionalistas na modelação da opinião pública.
É uma tarefa central para a democracia estabelecer, definir e reflectir as relações entre a sociedade e a comunicação social.
Mas também é certo que, fundado ou provocado, não podemos deixar de responder politicamente a duas questões centrais. A primeira é esta: como se combate a percepção de insegurança que existe hoje nas grandes cidades? A segunda é a seguinte: como se quebra o laço perverso estabelecido nas últimas semanas entre pertença étnica e criminalidade?
São respostas centrais para evitar a escalada de confronto social, de polarização social e de criação de sentimentos xenófobos e racistas.
E estes são problemas de estruturação social, de organização e segmentação da vida urbana, de discriminação continuada, de exclusão social. São problemas, questões e injustiças a que temos que dar resposta.
Até porque o sentimento de insegurança se instala, em geral, em torno do quotidiano dos pobres e dos remediados: é quem trabalha na cidade e regressa à noite nos transportes públicos para a periferia da cidade que receia pela sua segurança e não quem vive dentro do seu carro e do seu condomínio com o carimbo "segurança 24 horas por dia".
Deixar perdurar esse sentimento de insegurança é insustentável. Por isso, são precisas respostas sérias e capazes de reverter este jogo de espelhos.
Falemos, pois, do "Rio de Janeiro" que vai crescendo em torno de Lisboa: às favelas de lá contrapõem-se os guetos daqui, as zonas perigosas, os projectos de realojamento localizados nos confins da malha urbana, para onde muitos dos poderes autárquicos chutam as situações de exclusão social gritantes, feitas já de gerações que são postas à margem da vida da cidade.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

A Oradora: - E falemos dos jovens que ali habitam. Uns portugueses, outros na situação irreal de estrangeiros que nasceram, cresceram e sempre viveram em Portugal, mas a quem uma lei de nacionalidade baseada na primazia do sangue pretende manter de fora da comunidade nacional. São jovens que vivem onde a linha de comboio termina, para quem a escola sempre foi um espaço estranho que nada lhes deu para enfrentar a realidade das suas vidas; jovens que viram os pais trabalhar toda a vida em empregos desqualificados, sem nunca sair da pobreza.
A cor da pele, a condição de eterno estrangeiro, a situação social marca-os sempre no espaço público, no confronto com a autoridade e torna-os bodes expiatórios dos males da sociedade. O futuro não lhes promete nada, parecem não ter nada a perder - e é isso que assusta.
A responsabilização e a punição de jovens delinquentes é inquestionável, seja qual for a cor da pele. A exclusão social não justifica o furto, a agressão ou a intimidação, ou a criação de espaços sem lei. Mas a solução do CDS-PP não nos dará cidades mais seguras. Correr os jovens dos guetos à bastonada para que fiquem quietos nos seus bairros e não desçam à cidade não resulta. Eles estão lá, e, mais tarde ou mais cedo, voltarão à cidade. Trancá-los na prisão, só os tornará em criminosos encartados.
Precisamos, sim, de políticas de integração social e de integração urbana ambiciosas, capazes de reverter trajectórias de vida e segmentações enquistadas no tecido das cidades. Precisamos de dar futuro às cidades e respostas adequadas à diversidade social e cultural que as faz hoje. Que o fenómeno do "arrastão" nos traga, pelo menos, a compreensão do que dizem os próprios profissionais das forças de segurança: não mandem a polícia resolver problemas sociais. Não resulta.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Ana Drago, percebe-se que o Bloco de Esquerda volte a este tema porque, manifestamente, o último debate não lhes correu bem!

Vozes do CDS-PP: - Exactamente!

Risos do BE.

O Orador: - E sabe por que razão não correu bem, Sr.ª Deputada? Porque não se pode estar impunemente do lado dos criminosos, contra os polícias que existem para nos defender,…

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O Sr. Miguel Frasquilho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - … perante uma população assustada com o fenómeno crescente de aumento da criminalidade grupal - e, tudo isto, com esse sorriso na cara!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo, peço-lhe que seja muito breve, uma vez que já esgotou o tempo de que dispunha. Queira sintetizar.

O Orador: - É o que farei, Sr. Presidente.
Sr.ª Deputada Ana Drago, termino com uma nota acrescida: na política não vale tudo e, seguramente, não vale mentir. Esta é a primeira regra.
A Sr.ª Deputada até pode invocar outros debates, mas não pode pôr na minha boca o que quer que seja que eu não tenha dito, porque não lhe admito. Se quiser recorrer ao que foi dito nesse outro debate, recordará que não houve um único momento em que tivesse ligado a intervenção que fiz à questão da imigração. Um único momento!
Mais: demarquei-me dela, expressa e premeditadamente. Portanto, repito, não houve um único momento em que tivesse justificado em razões étnicas o que quer que fosse que aqui tenha dito. Nesse debate, fiz uma única distinção entre dois tipos de portugueses (mas todos portugueses!): os que cumprem a lei e os que não a cumprem; os que trabalham e que, naquele dia, gozavam legitimamente o seu direito ao descanso e a horda de criminosos que invadiu uma praia para os insultar, roubar e agredir.
Tal como naquele debate, eu e todos os demais desta bancada continuamos do lado dos cidadãos honestos e da polícia que está aqui para nos defender; continue a Sr.ª Deputada do lado dos criminosos, porque irá por bom caminho… Mas essa é uma distinção que só nos honra, Sr.ª Deputada.

Vozes do BE: - Aldrabão!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago.

A Sr.ª Ana Drago (BE): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo, é verdade que na política não vale tudo. E o que o senhor fez, nesta Câmara, há uma semana atrás, é indefensável: jogou com o pânico social, jogou com o alarmismo social.

Vozes do BE: - Muito bem!

A Oradora: - O senhor veio aqui apresentar números e factos que não estão atestados, porque não é capaz de travar um debate sério sobre a matéria.
Sobre a questão de estarmos ou não contra a polícia, basta ter presente a experiência que o Sr. Deputado Nuno Magalhães e eu própria tivemos ontem, frente à manifestação dos polícias: os Deputados do Bloco de Esquerda foram aplaudidos e conversaram com os dirigentes sindicais; já o Sr. Deputado Nuno Magalhães, que foi Secretário de Estado da Administração Interna e trabalhou directamente com as polícias e as forças de segurança, foi assobiado!

Aplausos do BE.

Tal significa que os senhores não estão de acordo com a polícia no que diz respeito aos problemas fundamentais, às respostas que devem ser dadas aos problemas da delinquência urbana.
O que os senhores querem, de facto, é expulsar quem não é português mas que sempre viveu em Portugal; o que os senhores querem é reproduzir o mesmo que acontece nos Açores: jovens portugueses que nasceram nos Estados Unidos e que cometeram delitos nos Estados Unidos são "chutados" para os Açores, onde nunca viveram, ficando numa situação de exclusão social absoluta.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): - A Sr.ª Deputada gostava que tivéssemos dito isso, mas não dissemos!

A Oradora: - Os senhores querem prender estes jovens em prisões, de onde saem meros criminosos, com a escola toda, "doutorados" em criminalidade!
A sua solução é impossível e politicamente inaceitável, Sr. Deputado.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Aldrabona! Estou a usar a mesma expressão e, portanto, não ofendo!

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): - Os senhores são desonestos!

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O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Miranda Relvas.

O Sr. Miguel Miranda Relvas (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Os governos liderados pelo PSD assumiram a política de descentralização administrativa como uma preocupação primeira da sua acção. Uma política que consideramos essencial no contexto da correcção das profundas assimetrias regionais ainda existentes. Uma política assente na transferência de competências e meios para entidades municipais e intermunicipais e na criação de novas áreas metropolitanas.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Para o PSD, descentralizar é uma prioridade; para o PSD, descentralizar é promover a coesão; para o PSD, descentralizar é desenvolver; para o PSD descentralizar é uma prioridade em todos os planos: político, económico, social e cultural. Uma prioridade indispensável na construção de um novo modelo de Estado e de sociedade que defendemos;…

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - … uma prioridade que não muda, estejamos no governo ou na oposição.
Num processo sem precedentes em Portugal, o Conselho de Ministros, reunido em Tomar no mês de Junho de 2002, aprovou o primeiro conjunto de orientações no plano da descentralização administrativa.
A isso seguiu-se a aprovação de um número amplo de diplomas concretos e o apoio à constituição das novas grandes áreas metropolitanas, comunidades urbanas e comunidades intermunicipais. Tais entidades - ao contrário do que nos quer fazer crer o Governo socialista - abrangem já mais de 95% da população portuguesa.

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - Muito bem!

O Orador: - A criação destas estruturas supramunicipais permitiu a instituição de inovadoras pessoas colectivas públicas de âmbito territorial, orientadas para a gestão integrada de espaços metropolitanos e urbanos de âmbito supramunicipal.
Dessa maneira, abriram-se novas oportunidades concretas para a resolução de problemas que ultrapassam claramente as fronteiras municipais, contrariando o individualismo e o isolacionismo que, por vezes, pauta o funcionamento das instituições autárquicas e promovendo relações de complementaridade e de solidariedade entre municípios territorialmente contíguos.
A nossa intenção, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, foi clara: quisemos que os municípios se associassem voluntariamente, criando pólos bem posicionados e bem preparados para enfrentar os desafios crescentes com que são confrontados nos dias de hoje, tanto no plano interno quanto no plano internacional.

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Mas também pretendemos criar as condições para consolidar diversos interesses municipais numa perspectiva de estabilidade, permitindo gerir e colocar à disposição dos cidadãos um manancial de programas, estruturas e infra-estruturas que anteriormente, porque agindo isoladamente, as câmaras municipais não conseguiam executar plenamente.
Nesta, como em muitas outras matérias, PSD e PS têm linhas de actuação política diametralmente opostas.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O PSD defende uma descentralização que reúne um amplo consenso de cidadãos e de autarcas, o PS pretende insistir numa regionalização que o povo chumbou em referendo;…

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - … o PSD bate-se por uma descentralização que vem de baixo para cima e que corresponde aos anseios das populações, o PS quer uma regionalização artificial imposta a partir do Terreiro do Paço; o PSD é por uma descentralização que já deu provas da sua mais-valia e que se insere na melhor tradição da História de Portugal, o PS obstina-se numa regionalização que divide e que traria mais problemas do que soluções.
Temos a certeza do caminho que elegemos. E agora que o PS, cego pelos seus preconceitos ideológicos, quer reavivar o "fantasma" da regionalização, reafirmamos com convicção a nossa posição.

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Aplausos do PSD.

Uma posição que assenta em três pilares fundamentais: prossecução do processo de descentralização administrativa, ampliando as transferências de competências para as grandes áreas metropolitanas e comunidades urbanas; aposta na formação ao nível das autarquias, contribuindo para a modernização administrativa e melhoria dos serviços prestados aos cidadãos e às empresas; promoção do planeamento estratégico ao nível das grandes áreas metropolitanas e comunidades urbanas, adequando os planos regionais de ordenamento do território a estas entidades territoriais, incentivando a sua estruturação, a coordenação de investimentos de interesse supramunicipal e a articulação da sua actuação, a todos os níveis, com os serviços da administração central.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Governo socialista não se limita apenas a atacar o processo de descentralização em curso. As suas mais recentes atitudes revelam, também, laivos de puro oportunismo político,…

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - Uma vergonha!

O Orador: - … como ficou patente no caso da proposta que visa alterar a forma de designação dos Presidentes das CCDR.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Na sua avidez de conquista de poder, o PS demonstra, de novo, falta de bom senso e falta de pudor. E confirma, como no passado, que a sua verdadeira intenção é apenas colocar verdadeiros comissários políticos…

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - Essa é que é a verdade!

O Orador: - … com a missão de controlar a acção dos municípios existentes na sua área de acção.

Aplausos do PSD.

Uma vez mais, o Partido Socialista mostra, em actos concretos, o seu verdadeiro rosto no que à regionalização concerne, afirmando-se como um partido centralista e jacobino. Os socialistas nem sequer se preocupam em respeitar o Presidente da República, pois pretendem obrigá-lo a aceitar uma lei diametralmente oposta à que promulgou há apenas dois anos atrás.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Pensam os socialistas que por terem um Governo novo podem desrespeitar um Presidente em fim de mandato. Logo o PS que tantas, tantas vezes se escudou no Presidente da República para tentar credibilizar as suas posições.
Mas esta não é uma luta entre poderes, na qual o PS, com sua democracia musculada, pensa que pode tudo, mas um debate sério e profundo sobre o Estado que queremos.
Também em matéria de descentralização, parar é estagnar, hesitar é paralisar, adiar é bloquear.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Por isso, queremos um modelo de descentralização virado para o futuro, não queremos soluções que signifiquem o regresso a um passado que não deixou saudades.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Não deixou saudades, não! Nenhumas!

O Orador: - Vejo que o Sr. Deputado José Junqueiro continua com as suas eternas dúvidas quanto a esta matéria!
Queremos uma descentralização aberta e dinâmica, não aceitamos modelos fechados, imobilizados e estáticos; queremos uma descentralização com rumo, não queremos um modelo feito de avanços e recuos; queremos uma descentralização que proporcione desenvolvimento, não queremos um modelo que fomente assimetrias ou desigualdades entre as regiões mais ricas e as mais pobres, entre os grandes municípios e os pequenos municípios.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O PS (todos o sabemos) tem, neste Parlamento, uma maioria absoluta.

O Sr. José Junqueiro (PS): - É verdade!

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O Orador: - Ainda há pouco, uma Sr.ª Deputada do Partido Socialista quis - ou pretendeu - recordar à Câmara essa realidade, uma realidade que decorre da vida democrática: existe uma maioria absoluta mas existem, também, oposições.
O Partido Socialista tem, neste Parlamento, uma maioria absoluta, e o seu estilo arrogante de exercício do poder certamente o levará a querer impor, nestas questões, as soluções em que teimosamente insiste, sem cuidar de saber se essas sãos as soluções que o País quer e que o País precisa.

O Sr. Alberto Martins (PS): - Sem dúvida!

O Orador: - Porém, fica o PS a saber que contará com a nossa frontal oposição.

O Sr. Alberto Martins (PS): - Não chega!

O Orador: - Como contará, estou certo, com a oposição dos autarcas e das populações que seriam afectadas negativamente pelas decisões erradas do PS. E acreditamos que contará, também, com a oposição do Sr. Presidente da República que, assumindo em toda a sua plenitude as funções que a Constituição lhe atribui, não deixará de ser coerente com as suas posições e, em consequência, seguramente não promulgará o decreto-lei do Governo exactamente em sentido oposto ao que promulgou há um ao e meio atrás!
Compreendemos que este Governo seja incompreendido pelos portugueses, pois muito do que faz é o contrário do que disse que ia fazer: quer que o Presidente da República faça o contrário do que já fez e prefere um Estado grande a um Estado eficaz, opta pela centralização enquanto os portugueses desejam mais descentralização.
Declaramos, com gosto e com convicção, a nossa diferença e assumimos com coerência a visão descentralizadora que tivemos e que temos.
Felizmente não somos iguais e felizmente a nossa visão do Estado é a da maioria dos portugueses, que são contra o Estado dominador, centralista, ineficaz e caduco do qual o PS, com a sua maioria absoluta, não quer abrir mão.
Com esta atitude, o Governo é o passado que está presente e quem, como nós, está contra, é o futuro inevitável que aí vem. Ao defender a velha visão do Estado, o PS demonstra que está velho.
Nós queremos um Estado moderno. E como o Governo está isolado, a nossa visão de um Estado moderno e descentralizado acabará por se impor.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos ao orador, inscreveram-se os Srs. Deputados Mota Andrade e Francisco Louçã.
Tem a palavra o Sr. Deputado Mota Andrade.

O Sr. Mota Andrade (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Relvas, começo por dizer-lhe que o Governo não está isolado. O Governo tem o suporte desta bancada, tem uma maioria na Assembleia da República a apoiá-lo e está determinado em levar para a frente um processo de descentralização sério, que culminará, como V. Ex.ª bem sabe, numa próxima legislatura, num processo de regionalização.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Isso é que era bom!

O Orador: - Esse é o Programa do Governo e foi com esse Programa do Governo que o PS teve maioria absoluta no dia 20 de Fevereiro!

Aplausos do PS.

Sr. Deputado Miguel Relvas, ao ouvi-lo, pensei que V. Ex.ª (porque teve altas e grandes responsabilidades no anterior executivo) estava a lembrar-se e a falar desse tempo. De facto, V. Ex.ª foi o "pai" da reforma que criou as comunidades municipais, intermunicipais e as áreas metropolitanas; V. Ex.ª foi o "pai" de uma "reforma de papel", porque fez uma reforma no papel, esqueceu-se de prever as competências a atribuir a essas entidades e não criou uma lei de financiamento para essas entidades. Pior do que isso: criou essas entidades sem qualquer legitimidade democrática!

O Sr. José Junqueiro (PS): - Esqueceu-se!

O Orador: - E nós batemo-nos sempre contra isso.

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É curioso: os senhores foram contra no debate e no referendo sobre a regionalização, pois acusavam-nos de dividir o País; agora V. Ex.ª, com essa fantástica reforma de papel, criou no País uma autêntica manta de retalhos!

Aplausos do PS.

Aliás, fez mais: conseguiu pôr autarcas contra autarcas! Conseguiu…

O Sr. Miguel Miranda Relvas (PSD): - Olhe que não!

O Orador: - Mas eu lembro-me! Olhe o caso de Trás-os-Montes e Alto Douro!
Conseguiu ressuscitar bairrismo serôdios, que em nada contribuem para o progresso, para o desenvolvimento, para o crescimento que queremos no País e para os quais um processo de descentralização deve ser um instrumento.
Tudo o que V. Ex.ª fez foi um verdadeiro desastre!

Aplausos do PS.

Mas há mais: V. Ex.ª tinha responsabilidades quando a anterior maioria, também em nome da descentralização e da regionalização, andou a "semear" secretarias de Estado pelo País e, no entanto, na altura, não ouvi uma palavra de V. Ex.ª sobre essa matéria. Concordou? Não concordou? Gostávamos de saber a sua posição sobre essa matéria.

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - E as CCR?

O Orador: - Sobre as Comissões de Coordenação Regional (CCR), vamos fazer algo que nos parece correcto. As CCR não são mais do que órgãos desconcentrados da administração do Estado. Não são mais do que isso! Como tal, vão ter responsáveis para responderem perante o Governo.
VV. Ex.as tentaram enganar todos, que foi isso que V. Ex.ª fez - e bem -, durante muito tempo, mas de uma forma fraca e má, através de uma lei que "não tinha pés para andar", que tinha de cair mais cedo ou mais tarde. Ora, ela caiu quando V. Ex.ª saiu do Governo. Nós não vamos fazer isso. VV. Ex.as tentaram arranjar uma "meia democracia", algo que não se sabia bem o que era, para as CCR. Nessa matéria, a nossa posição…

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - É a de instrumentalizar!

O Orador: - … é bem clara: as CCR não são mais do que órgãos da administração desconcentrada do Estado.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem agora a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Relvas, ouvi a sua intervenção sobre a descentralização e esse é, certamente, um assunto de grande importância para a República. Até porque seremos muitos os que consideram que não pode haver descentralização que não conduza à regionalização e não pode haver nem descentralizarão nem regionalização sem a eleição de órgãos próprios, de órgãos democráticos.
No entanto, é claro que alguns passos importantes podiam ter sido dados pelo governo anterior, mas não foram, e não sabemos se vão ser dados - parece que não - pelo Governo actual, como, por exemplo, eleger autoridades metropolitanas para a coordenação, nas grandes áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto, entre municípios, para assegurar os serviços de transportes ou outros serviços estratégicos. Sobre isso há, evidentemente, um défice e é importante que se tomem decisões. Pelo menos, nesse aspecto, estamos de acordo consigo.
Mas há uma questão que gostaria de lhe colocar. É que esta consolidação, que implica a descentralização, significa necessariamente transparência democrática, confiança. E há um aspecto a que não se referiu, mas sobre o qual queria saber a sua opinião. O PSD tem defendido a limitação de mandatos dos autarcas. Parecia haver um grande consenso, um quase consenso, nesta Assembleia, sobre limitação de mandatos. Estamos a três meses das eleições municipais e prepara-se, nesta Assembleia, uma fraude gigantesca. Ou seja, depois de terem sido aprovados, na generalidade, vários projectos sobre a limitação de mandatos, arriscamo-nos a chegar ao dia das eleições sem que nada se concretize, permitindo, portanto, mais quatro anos de prolongamento de uma situação em que não há limitação de mandatos para ninguém se não para o Presidente da República.

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Vozes do BE: - Muito bem!

O Orador: - A suspeita é que o PSD, que defende a limitação de mandatos, tem todos os seus autarcas contra a limitação de mandatos e o PS, que defende a limitação de mandatos, tem todos os seus autarcas contra a limitação de mandatos. Em consequência, os dois partidos, defendendo esse princípio, não querem que ele se concretize, não querem que comece um trabalho na especialidade, não querem que seja votada, em votação final, uma lei para ser apresentada à promulgação do Presidente da República.
Portanto, o risco é que se trate somente de um acto de entretenimento político, de promessas não consagradas e de garantias que não são levadas a seu termo.
Sr. Deputado, não leve a mal mas gostaria que me desse uma resposta em nome do PSD, e também em nome do PS, se não se importa.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Em nome do PS?!

O Orador: - Será que o PSD e o PS estão disponíveis para concretizar, até ao final desta sessão legislativa, até ao princípio de Julho, como é imperativo para que a lei da limitação de mandatos se aplique nas próximas eleições, ou vão continuar esta "valsa a dois" até ao momento em que a lei já não tenha qualquer utilidade?

Vozes do BE: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Relvas.

O Sr. Miguel Miranda Relvas (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Mota Andrade, é público a grande estima que tenho por si. Mas, quando o vi levantar-se a relembrar que o Partido Socialista tem maioria absoluta nesta Assembleia, lembrei-me daquela velha frase, dita há uns anos atrás: "Quem se mete com o PS leva!". Depois vi que o Sr. Deputado foi mais equilibrado.
De facto, o Sr. Deputado está numa situação difícil: um dia, dizem que querem extinguir municípios; noutro - está aqui, neste jornal que tenho na mão -, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista admite a criação de novos municípios; num dia, são a favor da regionalização… Dizia o Sr. Deputado há pouco - muitas vezes, os argumentos são perniciosos - que o PS defende a regionalização e teve a maioria absoluta. Então Sr. Deputado, o Eng.º Sócrates, quando diz que colocará o debate da regionalização em cima da mesa só depois de 2009, está a defraudar os portugueses!

Vozes do PS: - Não, não!

O Orador: - Não foi isso que ele prometeu!
Não contem connosco, não contem com o PSD, para recolocar na agenda política a matéria da regionalização, que foi chumbada em referendo pelos portugueses.

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado, há uma matéria em que os senhores são especialistas: a gestão artificial da agenda política. Não considera mais útil, mais importante tentar ter propostas concretas para os problemas que também são concretos?
Nesta matéria da descentralização, ao longo da última legislatura, poderíamos, e deveríamos, ter ido mais longe. Mas o senhor, que fez aqui o discurso do campeão, ao referir-se a Trás-os-Montes - é óbvio, limitado a um espaço territorial… -, da descentralização transmontana, o que tem a dizer às recentes medidas do seu Governo que retirou competências aos municípios em matéria de áreas protegidas? Mais: retirou competências aos municípios naquilo que é um princípio básico, ou seja, a audição dos municípios em matérias que são da sua competência. Sabe que o seu Governo aprovou uma nova Lei da Água e não ouviu sequer os municípios e a entidade que os representa?

O Sr. José Junqueiro (PS): - Vem aqui à Assembleia!

O Orador: - Não! Essa audição será depois feita pela Assembleia da República.

O Sr. Mota Andrade (PS): - Ah!

O Orador: - Não misture! São dois…

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Protestos do Deputado do PS José Junqueiro.

Sr. Deputado José Junqueiro, o senhor esteve vários anos no Governo. Os ministros passavam e o senhor ficava! Lembra-se? Portanto, o senhor sabe que há matérias que são da competência do Governo e outras que são da competência da Assembleia da República. E estamos a falar na Lei da Água, que, em baixa, é da competência exclusiva dos municípios, nem sequer é da administração central. Ora, o Governo legislou e nem ouviu os municípios.
Há pouco, o Sr. Deputado dizia que as Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR) são serviços desconcentrados da administração central. É verdade! Mas nada melhor do que criar condições para a partilha e complementaridade entre a administração central e a administração local.

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - Muito bem!

O Sr. Mota Andrade (PS): - Oh!

O Orador: - O senhor diz "Oh!" em desacordo. Então, vou lembrá-lo: sabe qual foi uma das decisões do governo do Partido Socialista, no seu último ano, quando era Primeiro-Ministro o Eng.º Guterres e era Ministro desta área o Eng.º Sócrates? Elevar os presidentes das CCDR à categoria de subsecretários de Estado! Vamos lá ver se nos entendemos. Ou são subsecretários de Estado e têm essa representatividade ou são serviços desconcentrados da Administração Pública. Sabe, Sr. Deputado, não se pode, consoante o momento e a circunstância, ter uma opinião ou outra. Dou-lhe um conselho: Sr. Deputado, o senhor que é uma pessoa coerente, seja igual a si mesmo e tenha, hoje, no poder, as mesmas atitudes e as mesmas posições que tinha quando era oposição.
Sr. Deputado Francisco Louçã, em relação à primeira parte da sua intervenção, mais técnica, estou naturalmente de acordo. Temos de criar condições no nosso país para que a prestação do serviço público ao cidadãos seja um serviço prestado com mais eficiência, mais qualidade, mais transparência e mais celeridade.
Para o cidadão, que tem o direito de exigir porque paga impostos, é indiferente quem lhe presta esse serviço. E não temos dúvidas que em relação a muitos serviços públicos e a muitas áreas do serviço público a administração local e a administração supramunicipal têm mais capacidade, mais eficiência, desde logo pela proximidade, para realizarem esse serviço público.
Quanto à outra questão que me colocou, posso responder-lhe na parte que compete ao Partido Social Democrata. Relativamente à do Partido Socialista, o senhor tem mais proximidade com ele, até porque andaram a negociar uma possível aliança em Lisboa. Portanto, tem mais contactos do que eu para poder ter essa resposta.
Em relação à responsabilidade do PSD, esteja o Partido Socialista disponível para rever a lei eleitoral - e essa é a responsabilidade e também a decisão que estão em cima da mesa -, o PSD tem hoje, como ontem, a mesma posição. Somos a favor da limitação de mandatos, mas, como sabe, a aprovação dessa lei exige dois terços. Ora, citando aqui o Sr. Deputado Mota Andrade, eles têm maioria absoluta e têm mais responsabilidade para contribuir para a maioria dos dois terços.

Aplausos do PSD.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Manuel Alegre.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria de Belém.

A Sr.ª Maria de Belém Roseira (PS): - Sr. Presidente, Sr.as Deputadas, Srs. Deputados: Completam-se hoje 100 dias de acção do Governo em plenitude de funções.
É altura, pois, de fazer um balanço aqui, na Assembleia da República, dadas as funções de fiscalização da acção governativa que incumbem a este órgão de soberania.
Dividirei a minha intervenção, em análise de forma e de conteúdo.
Quanto à forma, refiro o facto de a formação do Governo não ter sido feita na comunicação social. A inédita discrição e o respeito institucional que caracterizaram este processo imprimiram uma marca genética distintiva no sentido da recuperação do sentido de Estado e da credibilidade do Governo.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!

A Oradora: - O Governo caracteriza-se também pelo menor número de ministros e de secretários de Estado que o Governo anterior, e acabou com a deslocalização de gabinetes de secretários de Estado, experiência exótica, cara e indutora de maior dificuldade de relacionamento da administração, entre si, e dos cidadãos com a administração.

Aplausos do PS.

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Quanto ao discurso, o Governo fala mais do futuro do que do passado, embora não enjeite o combate político quando fustigado por acusações, sobretudo vindas daqueles que deram origem aos males que é necessário atacar.
O Governo não se queixa, pois, da pesada herança porque veio para governar o País e não para estar no Governo; veio para resolver os problemas do País e não para se deixar submergir por eles; veio para arrancar Portugal da cauda da Europa dos 15 e não para arrastar Portugal ou deixar ir Portugal para a cauda dos 25.
Tudo isto exige coragem e determinação, mas exige também actuação oportuna, ou seja, imediata.
Por isso, o Governo não caiu na tentação fácil de deixar o País continuar nesta difícil crise, aguardando o resultado das eleições autárquicas com medo do prejuízo que a impopularidade das medidas que se viu obrigado a tomar acarretasse prejuízos político-partidários.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!

A Oradora: - Colocou, assim, o interesse do País acima dos próprios interesses do partido que o sustenta, o que não deixa de ser uma atitude inédita e, a todos os títulos, louvável. Porque acima das nossas divergências ideológicas e político-partidárias estará sempre o facto de que somos todos portugueses e temos o dever de criar condições de vida melhores para todos e para as nossas gerações futuras.
Por isso, ao mesmo tempo que soube reagir com rapidez, seriedade e coragem ao relatório do Governador do Banco de Portugal, aprovando um Programa de Estabilidade e Crescimento credível, demonstrou ter uma estratégia para o futuro do País, assente na sua modernização e desenvolvimento, mas com sensibilidade social.

Aplausos do PS.

Neste contexto, a consolidação sustentada das contas públicas, que não pode ser adiada, não surge como um fim em si mesma, mas como um instrumento que permita a sustentabilidade do Estado social, de que cuja defesa e aperfeiçoamento o Partido Socialista não abdica.
Para finalizar a análise da forma, o Governo não sentiu quaisquer complexos ao ter dado continuidade a políticas que vinham do governo anterior, sem omitir os seus autores ou executores, sempre que considerou que elas obedeciam à defesa e promoção do interesse nacional.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!

A Oradora: - Em suma, o Governo não se amedrontou com a dimensão desconhecida - repito, desconhecida - da crise, não perdeu tempo a procurar culpados para neles encontrar refúgio e encontrou na crise capacidade e energias redobradas de acção.
Quanto ao conteúdo das medidas tomadas, não posso deixar de referir que elas surgem enquadradas numa estratégia ao serviço de um futuro para o País que se escreva com modernização, desenvolvimento e sustentabilidade do Estado social, o que constitui a opção ideológica do partido que sustenta a Governo.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!

A Oradora: - Isto obriga à tomada de decisões, muitas vezes impopulares, que constituem a ruptura com ciclos de crescimento em camada sempre sobreposta de benefícios assentes no poder reivindicativo, sem retorno equitativo para quem, em última análise, os suporta. A necessidade de reconquistar de imediato a credibilidade do País aos olhos da União Europeia em termos de contas públicas reclamava a reposição da sua verdade e transparência, sem adopção do recurso às operações contabilísticas que calassem o real valor do défice. Só fazendo a adequada equação do problema poderemos resolvê-lo.
E só falando verdade na União Europeia e apresentando um programa credível que investe na resolução estrutural das nossas debilidades ganharemos a possibilidade de reduzir o défice em três anos, em vez dos dois previstos pelas actuais regras, para que não sacrifiquemos mais a economia.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Saliento que o nosso Programa de Estabilidade é também um programa de crescimento, pois só este nos permitirá libertar o nosso Estado social do fantasma dos ciclos orçamentais negativos. E as reformas estruturais que estão a ser lançadas em todos os sectores da Administração e que passam necessariamente pela concertação, como está legalmente consagrado, visam a correcção estrutural dos problemas, com distribuição equitativa de sacrifícios e com um combate sem tréguas à fraude e à evasão fiscais, para garantia da sustentabilidade do Estado social, na linha do Programa do Governo.

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Aplausos do PS.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Não vou fugir à questão. Não, não vou fugir à questão, a única que as oposições elegeram, porque não têm outra. A do não cumprimento da promessa eleitoral de não aumentar os, impostos.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - E fomos nós que a elegemos?!

A Oradora: - Sobretudo, não admitimos essa crítica a quem prometeu baixar impostos e os subiu,…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Ah!

A Oradora: - … ou a quem, em coligação com esses, omitiu a inscrição no Orçamento de verbas várias que, no seu conjunto, atingem 5500 milhões de euros, situação absolutamente inimaginável.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Um pequeno esquecimento!

A Oradora: - Só a necessidade de evitar mal maior, ou seja, consequências mais gravosas para a economia, para as empresas e para as famílias, que adviriam de não tomar medida semelhante, podem justificar esse incumprimento. Ou seja, a medida foi tomada em situação de verdadeiro estado de necessidade desculpante e não apenas em mera situação de alteração superveniente de circunstâncias. Porque não foram só as circunstâncias que se alteraram. Teriam sido também gravíssimas as consequências para o País dessa alteração de circunstâncias.
Em conclusão, o Governo nasceu bem, tem trabalhado com afinco e determinação e já conquistou posições a nível europeu e, de forma mais alargada, internacional, mercê desse trabalho. Tem uma tarefa pela frente que exige redobrados esforços de explicitação, explicação e negociação para que colha colaboração alargada, condição necessária para o objectivo de construir um futuro para o País que se escreva com as letras das palavras modernidade, desenvolvimento e coesão social.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos à Sr.ª Deputada Maria de Belém Roseira, a Sr.ª Deputada Helena Pinto e os Srs. Deputados Bernardino Soares e Pedro Duarte.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Pinto.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Maria de Belém Roseira, V. Ex.ª veio apresentar-nos o balanço que o Partido Socialista faz dos primeiros 100 dias de governação do actual Governo. São 100 dias que significaram, aos olhos das portuguesas e dos portugueses, uma viragem completa em relação a tudo o que o Partido Socialista tinha prometido durante a campanha eleitoral.
Comecemos por uma das características destes 100 dias - a obsessão com o défice. A Sr.ª Deputada referiu-se a uma figura do Código Penal, o estado de necessidade desculpante, para justificar a opção do seu partido pelo défice, denotando, assim, a ausência de uma justificação política que esta questão implica e que os portugueses merecem.
Por outro lado, estes 100 dias trouxeram-nos também o conhecimento do Plano de Estabilidade e Crescimento, que, entre muitas e variadas coisas que o tempo não me permite agora abordar, esclarece que o desemprego aumentará nos próximos anos, não se vislumbrando, sequer, o momento em que o decréscimo desse desemprego - uma bandeira do Partido Socialista durante a campanha eleitoral - será uma realidade. Quais as medidas efectivas que este Governo apresentou para combater o flagelo nacional que é o desemprego?
Também não se vislumbra, Sr.ª Deputada, a disponibilidade deste Governo para rever o Código do Trabalho, que, como todas e todos sabemos, tem penalizado os portugueses. Essa disponibilidade não se vislumbrou, tão pouco, nos debates realizados nesta Câmara. Isto para não falarmos dos ataques aos trabalhadores da Administração Pública, que foram também uma imagem de marca deste Governo e que motivaram, como sabemos, uma resposta por parte destes trabalhadores nas ruas de Lisboa.
Permita-me que lhe coloque mais duas questões, Sr.ª Deputada, uma das quais já foi há pouco mencionada pelo Sr. Deputado Francisco Louçã, quando pediu esclarecimentos ao Sr. Deputado Miguel Relvas. Refiro-me à questão da limitação de mandatos, em relação à qual sabemos que foi aprovada aqui uma lei que está em "banho-maria". Como tal, gostaríamos de saber qual a disponibilidade do Partido Socialista para avançar decididamente com a limitação de mandatos a tempo das próximas eleições autárquicas.
Por fim, sabemos que o Partido Socialista substituiu e trocou o referendo ao aborto pelo referendo da Constituição Europeia, consulta que, aliás, não se vai realizar. Esta também deveria ter sido uma marca dos primeiros 100 dias deste Governo, uma marca de modernidade, de civilização e de defesa dos direitos das

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mulheres. Infelizmente, não foi. Porque esperamos que este problema seja devidamente resolvido em breve, perguntamos ao partido maioritário nesta Câmara, o partido que apoia o Governo, qual a sua disponibilidade para apoiar estas medidas.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria de Belém Roseira, julgo que se há balanço que se pode fazer destes 100 dias de Governo do Partido Socialista é o de que, provavelmente, nunca tão depressa e com tanta rapidez um Governo obteve contestação tão generalizada na sociedade portuguesa. Ainda por cima um Governo que detinha um capital de esperança na mudança da política, que foi, aliás, o que lhe deu a votação do povo português a 20 de Fevereiro. Pois em pouco mais de três meses o Governo desbaratou esse capital de esperança e tem hoje contra si e contra as suas medidas gravosas, que põem em causa o futuro e o desenvolvimento do País, o fundamental da sociedade portuguesa. No fundo, estas medidas vêm traduzir aquilo que sempre dissemos: que a maioria absoluta do Partido Socialista seria uma forma e um instrumento para manter uma política semelhante às que tivemos no passado, obra de sucessivos governos.
O Partido Socialista e muitos comentadores que analisam estes primeiros meses de Governo falam em três fases: a fase do silêncio, que leva a Sr.ª Deputada Maria de Belém, como, noutra ocasião, o Sr. Deputado Alberto Martins e muitos outros socialistas, a dizer que o Governo geriu muito bem a sua formação, com enorme capacidade de silêncio. Tal não se discute, mas isso não é o mais importante, porque depois vem a fase do número, o tal valor de 6,83%.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Isso não é um número! É uma encenação! Uma farsa!

O Orador: - E, com ele, vem aquele tão mal ensaiado espanto do Primeiro-Ministro José Sócrates, ao dizer que estava muito surpreendido por esse número, quando aqui, nesta Casa, ainda não há um ano, o então líder parlamentar do Partido Socialista disse que sabia que o défice se situava acima dos 6%.
Depois, veio a fase das medidas e quando esta chegou percebemos logo que, apesar de o Governo dizer que os sacrifícios, desta vez, eram para todos, na verdade, continuam a ser, e mais uma vez, para os mesmos. Para os de sempre, para os trabalhadores da Administração Pública e do sector privado, para os reformados e para os sectores sociais, as medidas são concretas e imediatas, têm aplicação imediata. Para os que nunca foram sacrificados, para os que aumentaram as suas benesses ao longo dos últimos anos de crise, as medidas nunca mais aparecem e, já se percebeu, vão ser puramente simbólicas e com pouco efeito prático.
Por isso é que o Governo tenta refugiar-se nesta táctica de pôr trabalhadores do sector público contra trabalhadores do sector privado e de pôr pais e estudantes contra professores, táctica com a qual quer disfarçar a sua política contra os interesses do País e contra os interesses do nosso desenvolvimento. Na realidade, o Governo quer disfarçar o facto de não ter querido romper com a política anterior nas questões decisivas e esse é que é o verdadeiro e triste balanço destes primeiros 100 dias de Governo do Partido Socialista.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Mota Andrade (PS): - Não apoiado!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Duarte.

O Sr. Pedro Duarte (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria Belém Roseira, cumprimento-a e registo o agrado e gosto com que o Partido Social Democrata a vê neste debate. Como sabe, iniciámos na semana passada um debate sobre o balanço dos primeiros 100 dias de governação socialista e percebemos que o Partido Socialista não tenha dado, na altura, uma resposta adequada, perdendo mais algum tempo a tentar encontrar melhores argumentos para defender este Governo. Digo-lhe também que julgo que esta sua intervenção foi suficientemente eloquente pela sua manifesta falta de entusiasmo no balanço que fez da actividade governativa.
Na verdade, já temos dito, e tal foi mesmo referido no pedido de esclarecimentos que lhe foi dirigido pelo Sr. Deputado Bernardino Soares, que o Governo teve uma primeira fase em que dispôs de circunstâncias particularmente favoráveis. Beneficiou da sua inquestionável maioria absoluta e beneficiou da boa vontade, que louvamos, do Sr. Presidente da República, da comunicação social, da sociedade em geral e dos próprios partidos da oposição. Recordo, aliás, que o PSD manifestou desde o primeiro minuto toda a disponibilidade para chegar a entendimentos com este Governo, em prol de um melhor futuro para o nosso país.

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O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Bem lembrado!

O Orador: - Infelizmente, tanto para o Partido Socialista como para o País, a determinado momento o Governo foi obrigado a governar e aí surgiram os problemas. Perdoe-me que lho diga, mas a Sr.ª Deputada omitiu estes factos, pois não disse que no momento em que teve de começar a governar, o Governo traiu as expectativas dos portugueses, nomeadamente dos que votaram no Partido Socialista.

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - Convém lembrar!

O Orador: - Traiu essas expectativas, sobretudo se tivermos em conta tudo aquilo que o Partido Socialista disse na oposição, e recordo que o discurso do Eng.º José Sócrates e do PS era, então, a antítese do que hoje dizem sobre o combate ao défice orçamental e o crescimento económico. Hoje dizem exactamente o oposto!
Traíram o que disseram na campanha eleitoral - e recordo que foi o Eng.º José Sócrates que o disse, tendo mesmo colocado esse propósito em cartazes por todo o País - sobre os tais 300 000 idosos que sairiam da pobreza. Sabemos hoje qual a resposta deste Governo para os pensionistas e para os idosos!
Disseram, durante a campanha eleitoral, que iriam criar 150 000 novos empregos e sabemos hoje que isso era uma ilusão; o Eng.º José Sócrates disse claramente que não aumentava os impostos e hoje todos sabemos que o Governo decidiu aumentar os impostos; disse que não aumentaria a idade da reforma até existirem estudos elaborados sobre a questão e, sendo certo que esses estudos não existem, o Governo já decidiu nesse sentido.
Há que falar ainda na traição que é o ataque que o Eng.º Sócrates já encetou aos funcionários públicos e de que, curiosamente, se esqueceu de falar durante a campanha eleitoral. Mesmo em relação à aposta na economia, apetece perguntar se a Sr.ª Deputada se lembra do choque tecnológico. É que não ouvi uma linha sobre isso na sua intervenção, apesar de essa ter sido a grande bandeira do Partido Socialista na campanha eleitoral.
Não contente com isto, o Governo, mais tarde, decidiu voltar a iludir os portugueses com a megaencenação de que já hoje se falou, a farsa em torno de um suposto número do défice orçamental. Posto isto, sustentar uma posição do Governo, para nós, é completamente inaceitável. O Governo quer continuar a "engordar" o Estado à custa dos portugueses, das famílias e das empresas.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Está a aumentar os impostos e os portugueses vão continuar a pagar para o Estado continuar a "engordar"! Isto, para nós, é totalmente inaceitável e, por isso, se há uma marca que fica destes primeiros 100 dias de governação, essa é a marca da traição à confiança que os portugueses depositaram no Partido Socialista.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria de Belém Roseira.

A Sr.ª Maria de Belém Roseira (PS): - Sr. Presidente, tentarei não omitir qualquer resposta, uma vez que as perguntas foram múltiplas e variadas. Contudo, se isso acontecer, peço que me relevem, pois noutra ocasião colmatarei essas lacunas.

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - Daqui por mais 100 dias!

A Oradora: - Não, não! De imediato!
Quanto às questões colocadas pela Sr.ª Deputada Helena Pinto, cumpre dizer, em primeiro lugar, que o Governo não tem uma obsessão pelo défice. O que sucede é que o Governo assume o défice e a honestidade das contas públicas como um instrumento indispensável para assegurar o crescimento da economia e para nos permitir, em sede de União Europeia, da união monetária, ter a credibilidade estritamente necessária para garantir todo um conjunto de acções que são imprescindíveis e que, obviamente, implicam uma série de limitações que, sendo nós o País que somos, devemos resolver, para podermos avançar com sustentabilidade para o Estado social. Do Estado social é que o Partido Socialista não abdica e o Governo também não quer dele abdicar.
Relativamente a isso, as medidas que constam do Programa de Estabilidade e Crescimento são claras e o desemprego, que necessariamente ocorrerá, na sequência de um conjunto de reformas que têm de ser levadas a cabo, terá de ser compensado com a criação de emprego noutras áreas. Mas a Sr.ª Deputada sabe que isso consta do Programa do Governo e de medidas já anunciadas e programadas, relativamente às quais

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também não desistiremos de lutar. A luta contra o desemprego e a pobreza é um tónos essencial da nossa acção.
Quanto à disponibilidade para a revisão do Código do Trabalho, ela vai iniciar-se já, penso eu, na próxima semana.
Relativamente à limitação dos mandatos e ao facto de estar, no dizer da Sr.ª Deputada, em "banho-maria" - e eu poderia dizer, eventualmente, em "banho-manel" -,…

Risos do PS.

… aquilo que lhe posso dizer é que avançaremos com ela, se não for possível um compromisso mais alargado, mas, obviamente, sendo uma lei que exige aprovação por dois terços, para avançarmos com ela teremos de obter sustentação para além de nós.
O que ouvi da parte do Sr. Deputado Bernardino Soares foi, novamente, o discurso que já hoje de manhã tinha ouvido a propósito da questão da educação. E a acusação que fez de que a maioria absoluta seria um instrumento para fazer aprovar medidas que não deveriam ser aprovadas não é verdadeira. O Sr. Deputado sabe bem que as medidas que o Governo está a tomar tinham de ser tomadas. O Sr. Deputado pode escolher as opções, pode escolher, digamos, as receitas em termos concretos - agradecemos até que sugira outras que, em sua opinião, seriam adequadas -, mas o que é facto é que sobretudo aquilo que disse quanto aos sacrifícios serem outra vez para os mesmos não é verdade.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - São, são!

A Oradora: - O Sr. Deputado sabe que há uma distribuição equitativa dos sacrifícios e que, pela primeira vez, foi encetado um conjunto de medidas que irá permitir atacar a fraude e a evasão fiscais de uma forma mais alargada, tendo sido aprovado um escalão superior de impostos para os cidadãos com maiores rendimentos e que vai haver cruzamento de dados.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Isso é o que todos os Governos dizem!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Conversa "furada"!

A Oradora: - Por exemplo, nós não o consideramos mas, muitas vezes, e sobretudo em relação à segurança social, a fraude é um problema dos trabalhadores mas é, principalmente, e também, um problema das entidades patronais.
Portanto, isto é muito claro, é absolutamente inequívoco e o que é um facto é que o Governo, ao contrário do que o Sr. Deputado disse, não está a pôr os interesses de uns contra os interesses de outros, não é mais do mesmo, é diferente. Aquilo que queremos, com as medidas que estão a ser tomadas, é, de facto, introduzir justiça e equidade.
Quanto às perguntas do Sr. Deputado Pedro Duarte, que também agradeço, gostaria de dizer que não é verdade o que referiu relativamente ao suposto número do défice orçamental e, como disse o Sr. Deputado Bernardino Soares, à encenação relativa a isso.

Protestos do PSD.

O Sr. Deputado tem a noção de que não foram inscritos no Orçamento cerca de 5,5 mil milhões de euros e que estavam inscritos 1,5 milhões de euros relativamente ao Serviço Nacional de Saúde, que não estavam inscritos os aumentos de pensões que foram anunciados, que não estavam inscritos os aumentos dos funcionários que foram negociados?!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não acredite nisso, Sr.ª Deputada! Isso é tudo conversa!

O Sr. Pedro Duarte (PSD): - Não se deixe enganar!

A Oradora: - Portanto, Sr. Deputado, se há, realmente, falsidade, não transparência, deturpação e manipulação de números isso não é com o Governo socialista mas, efectivamente, com o Governo que nos antecedeu.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.

Eram 16 horas e 35 minutos.

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ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, vamos passar à apreciação conjunta, na generalidade, da proposta de lei n.º 6/X - Estabelece regras para as nomeações dos altos cargos da Administração Pública e dos projectos de lei n.os 32/X - Altera o Estatuto do Pessoal Dirigente dos Serviços e Organismos da Administração Central, Regional e Local do Estado, aprovado pela Lei n.º 2/2004, de 15 de Janeiro (BE) e 78/X - Estabelece normas sobre cessação da relação pública de emprego de cargos dirigentes (CDS-PP).
Para apresentar a proposta de lei, tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Augusto Santos Silva): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A proposta de lei em discussão constitui uma peça central na modernização da Administração Pública. Propondo novas regras para as nomeações de altos cargos, prosseguimos quatro objectivos essenciais.
O primeiro objectivo é o da clarificação de uma vez por todas de quais são os cargos dirigentes que, por executarem políticas públicas definidas pelos governos, devem ter os seus mandatos vinculados aos mandatos dos governos que os nomeiam.
O segundo objectivo é o de reduzir o número, hoje demasiado lato, dos cargos que a prática transformou em cargos de confiança política. Este objectivo consegue-se com a previsão de regimes próprios, independentes das mudanças eleitorais, para os secretários-gerais e inspectores-gerais, bem como para a direcção de serviços de natureza predominantemente técnica.
O terceiro objectivo é o da introdução da "carta de missão" para os dirigentes máximos, definindo a missão que a cada um fica cometida e constituindo um instrumento fundamental para a avaliação do respectivo desempenho. Assim se estimulam a qualificação e a profissionalização da Administração Pública, assim se reforça a gestão por objectivos e a avaliação pelos resultados obtidos.
O quarto objectivo central da proposta de lei é o da reintrodução da lógica do concurso público na selecção e recrutamento para os cargos de direcção intermédia. A adopção de procedimentos concursais para a nomeação de directores de serviços e chefes de divisão, sem prejudicar a celeridade no respectivo recrutamento, garantirá a transparência e a independência da nomeação.
Aprovadas pelo Parlamento, estas regras representarão uma ruptura com o regime legal que se encontra em vigor, da responsabilidade da anterior coligação PSD/PP. Uma ruptura necessária e saudável.
De facto, o que até hoje vigorava, na prática, era a lógica da pura nomeação política: livre nomeação e exoneração, pelos membros do Governo, dos dirigentes máximos, independentemente do lugar ocupado e da natureza do serviço; e, depois, nomeação política em cascata, pela hierarquia abaixo, visto que os dirigentes intermédios eram, na prática, livremente escolhidos pelos dirigentes máximos, por sua vez livremente escolhidos pelos membros do Governo.
Esta lógica de comissariados político-partidários na estrutura dirigente da Administração Pública acaba hoje!

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Agora é que começa!

O Orador: - E acaba, porque, por um lado, o Parlamento definirá com rigor o tipo de funções que, por estarem investidas da execução de políticas definidas pelos Governos, devem ter os respectivos mandatos vinculados aos desses Governos e isentará dessa vinculação todas as restantes funções.
Simultaneamente, e de acordo com o espírito de contenção e sobriedade republicana que tem animado o Governo, resolver-se-á, finalmente, a questão do limite dos vencimentos auferíveis pelos dirigentes da Administração Pública: mesmo quando estes dirigentes optem pelos vencimentos da respectiva posição de origem, a sua remuneração não poderá exceder o vencimento-base do Primeiro-Ministro.
Na preparação desta lei, o Governo fez duas escolhas cumulativas. Por um lado, dialogou com todos os grupos parlamentares, procurando um consenso alargado sobre a definição dos cargos de confiança política e os processos de nomeação dos titulares dos restantes cargos. Do nosso ponto de vista, esse consenso verificou-se no primeiro caso (a definição dos cargos de confiança política), e respeitamo-lo na proposta de lei que apresentamos; não foi tão alargado o consenso no segundo caso, respeitante aos processos de nomeação dos dirigentes intermédios, mas assumimos, por isso, aqui, com toda a clareza, a nossa própria preferência por procedimentos de concurso adequados e eficazes.
Por outro lado, o Governo autovinculou-se à sua própria proposta; isto é, comprometeu-se a proceder, nas nomeações a fazer, como se a nova lei já estivesse em vigor. E assim o tem feito.

O Sr. Jaime Soares (PSD): - Foi logo na primeira linha!

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O Orador: - Não serão talvez alheias à dupla inovação contida nesta atitude - procurar consensos e vincular-se antecipadamente às novas regras propostas - as razões que motivaram recentes campanhas de imprensa e opinião, que tentaram desacreditar a posição do Executivo. Valeram todos os truques: desde contabilizar, como se de nomeações se tratasse, a simples constituição dos gabinetes dos membros do Governo, até considerar a indigitação para grupos de trabalho, como se se tratasse da nomeação para lugares da estrutura do Estado; desde contar, como nomeações do actual Governo, despachos de nomeação feitos pelo anterior, mas publicados depois de 12 de Março, até ignorar deliberadamente a necessidade de preencher lugares vagos ou substituir administrações de empresas cujos mandatos já tinham terminado;…

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Pois, pois! Nós sabemos disso!

O Orador: - … não faltou sequer a repetição intencional de falsidades, mesmo depois da evidência pública dessas falsidades.
Pois é altura de responder a esta operação de baixa política.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Já está tudo nomeado!

O Orador: - O actual Governo poderia ter utilizado a enorme margem de discricionariedade permitida pela lei em vigor, a Lei n.º 2/2004, do PSD e do CDS-PP, lei que lhe teria possibilitado mudar por completo a estrutura dirigente, superior e intermédia, da Administração Pública, mas não o fez, porque não concorda com essa discricionariedade. Por isso, elaborou esta proposta e vinculou-se a ela.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - É inútil! Já está tudo nomeado!

O Orador: - É claro que o Governo não se demitiu, nem se demite, de governar: constituiu gabinetes, evidentemente, reconduziu ou substituiu dirigentes ou administradores em fim de mandato, utilizou o regime da nomeação em regime de substituição, que é, por natureza, provisório (a Administração não pode parar!), nomeou novos dirigentes intermédios, quando os procedimentos de escolha tinham sido iniciados no tempo do anterior Governo e, portanto, os candidatos tinham-se apresentado, com expectativas legítimas de esses processos serem concluídos, formaram-se os grupos de trabalho e as estruturas de missão indispensáveis às políticas e, evidentemente, foram substituídos os dirigentes máximos dos organismos e serviços que executam políticas públicas, nos casos em que esses dirigentes eram contrários a essas novas políticas, porque nos parece evidente que não é possível lançar novas políticas com aqueles que a elas são contrários. Fora destes casos, o Governo nenhuma outra alteração provocou, porque queria e quer que o Parlamento se pronuncie sobre a modernização e a profissionalização da Administração Pública.
A nossa proposta é límpida: clarificar, de uma vez por todas, o que é de confiança política e como tal deve ser tratado, reduzir a amplitude do que deve ser tratado como de confiança política, escolher as direcções intermédias por processos de concurso, incentivar a formação dos dirigentes e avaliar o seu desempenho em função das missões que lhes sejam formal e publicamente atribuídas. Este é o caminho que propomos quanto às regras de nomeação, porque também nessas regras se joga a qualificação da Administração Pública.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para apresentar o projecto de lei n.º 32/X, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Rosas.

O Sr. Fernando Rosas (BE): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O projecto de lei apresentado pelo Bloco de Esquerda, alterando o regime de nomeações do pessoal dirigente dos serviços e organismos da administração central, regional e local, previsto pela Lei n.º 2/2004, de 15 de Janeiro, corresponde à urgente necessidade de pôr fim aos sucessivos escândalos de nomeações em cascata, por parte de governos em gestão, de clientes, seguidores e amigos, para cargos públicos, os mais diversos, frequentemente iludindo as disposições restritivas já existentes, desde logo o interdito constitucional do artigo 186.º, n.º 5.
Em Março de 2005, por exemplo, a imprensa noticiava que o Governo de Santana Lopes, em gestão, teria feito 788 nomeações em 65 dias, ou seja, 1 nomeação de 2 em 2 horas, desde que o Presidente da República anunciara a dissolução da Assembleia da República.
Entre 30 de Novembro de 2004, data do anúncio da dissolução, e 5 de Março de 2005, de acordo, novamente, com a imprensa, terão sido publicados 145 despachos de nomeação, muitos deles, presumivelmente, com data de assinatura forjada, para iludir as normas constitucionais e legais, uma vez que não há um prazo para a publicação em Diário da República dos despachos de nomeação.

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Protestos do PSD.

Impõe-se, pois, legislar com base na deplorável experiência do abuso, por parte dos governos de gestão, sejam PS ou PSD, superando as insuficiências da legislação em vigor, de acordo com as seguintes orientações.
Em primeiro lugar, fixar um limite temporal superior ao actualmente previsto pelo Estatuto: o presente projecto de lei propõe a nulidade de todas as nomeações ocorridas nos 6 meses que antecedem a realização de eleições no prazo normal, até à confirmação parlamentar do novo Governo.
Em segundo lugar, prever a hipótese de antecipação de eleições, caso em que a interdição de nomeações se verificaria a partir da demissão do Governo ou da convocação de eleições até à confirmação parlamentar do novo Executivo.
Em terceiro lugar, estabelecer um regime estrito e transparente para a publicitação das nomeações: o presente projecto de lei fixa um prazo de 15 dias para a publicação do despacho de nomeação.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Muito bem!

O Orador: - É, sem dúvida, muito necessário moralizar, de acordo com uma ética republicana de serviço público, o regime de nomeações para os cargos superiores e intermédios da Administração Pública, sistematicamente sujeitas a lógicas de compadrio, de clientelismo e de falta de transparência, pelos governos anteriores.
A governação de António Guterres, após proclamar que não haveria "jobs for the boys", tornou a frase célebre pelo seu contrário: as nomeações políticas ascenderam, segundo fontes variadas, a 8884.
O Governo de Durão Barroso, em apenas dois anos e meio de poder, nomeou para cargos de confiança política e pessoal cerca de 6000 funcionários.
Quanto ao "apêndice santanista", já vimos como foi, e apenas em regime de gestão.
Impõe-se, a nosso ver, acabar com este escândalo, desde logo distinguindo o que são nomeações políticas legítimas e atendíveis (e não só para altos cargos) daquilo que devam ser nomeações determinadas pelo critério do mérito, em regime de concurso genuíno e transparente.
A proposta de lei do Governo, no nosso entender, é um passo nesse sentido, mas nela subsistem motivos de dúvida e de alguma perplexidade.
Por que não se prevêem limites orçamentais para as nomeações das assessorias políticas, campo onde, precisamente, se tem verificado a maior discricionariedade, abuso e delapidação irresponsável de dinheiros públicos?
Por que não se prevê, de forma taxativa, o rigor e a diversidade dos métodos de selecção em concurso, sobretudo quando a ele podem aceder candidatos exteriores à função pública, por forma a que este procedimento não venha a transformar-se na porta das traseiras para o recrutamento clientelar?
Por que se limita a avaliação dos dirigentes superiores em função do cumprimento formal dos objectivos da respectiva "carta de missão" e não da apreciação substantiva do seu desempenho?
Resta referir que mal se compreende a técnica legislativa adoptada pelo projecto de lei do PP, que opta, sem fundamento aparente, pela criação de um novo diploma, em vez de alterar, de acordo com a lógica que lhe preside, a Lei n.º 2/2004, de 15 de Janeiro, que regula a mesma matéria.
A nossa reserva, no entanto, não se limita à questão de forma. Não se entende a extensão, aparentemente pretendida, do projecto ao âmbito da administração local e regional, de forma que parece substancialmente desadequada. Assim como também não se compreende como se pode defender, e cito, o "interesse público na transparência e isenção da actividade da Administração Pública" e propor, como se faz no artigo 21.º-D do referido projecto de lei, o recurso a qualquer método de selecção previsto para as carreiras do regime geral, o que inclui, por exemplo, a entrevista e a avaliação curricular, dois dos métodos que, pela enorme subjectividade inerente, menos contribuem para a tal transparência e isenção. Isto parece confirmar estar esse projecto eivado de uma lógica de continuidade de uma concepção hierárquica e autoritária de nomeações, potencialmente contaminada por escolhas políticas.
Em suma, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, o Bloco de Esquerda entende que a aprovação, na generalidade, do seu projecto e da proposta de lei do Governo poderão permitir, em sede de especialidade, a melhoria do dispositivo legal e a moralização do regime de democracia e transparência na nomeação dos cargos da Administração Pública. Por entendermos não contribuir para esse propósito, votaremos contra o projecto de lei do CDS-PP.

Aplausos do BE.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Isso honra-nos muito! Muito obrigado!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para apresentar o projecto de lei n.º 78/X, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.

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O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O debate que hoje travamos deveria ser um dos momentos altos da Legislatura.
Em primeiro lugar, pelo que está em causa e que o projecto de lei do CDS bem demonstra; uma iniciativa legislativa que encontra justificação no interesse público, no sentido mais comum, mas também nas regras de transparência e isenção da actividade da própria Administração Pública.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Defendemos, por isso, a criação, por via legislativa, de uma lista de cargos cujos titulares são nomeados segundo critérios de livre escolha, a denominada nomeação política.
Estabelecemos os cargos relativamente aos quais a demissão do Governo ou a dissolução da Assembleia da República devem ser causa de cessação da respectiva comissão de serviço.
Aproveitamos para proceder à redefinição da área de recrutamento para o cargo de secretário-geral, abrindo a possibilidade de o recrutamento se realizar fora da Administração Pública.
E, no que respeita aos cargos intermédios, fazemos uma clara opção pela consagração do concurso, como instrumento adequado à selecção dos titulares destes cargos, alterando, ainda assim, as regras deste concurso para que se possa considerar verdadeiramente digno desse nome.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Mas o debate que hoje travamos encontra outra razão acrescida para justificar o que dele os portugueses esperam.
Falo do show mediático em que, há semanas, o Governo o envolveu e das garantias que, através dele, deu ao País. Todos temos presente como, através da comunicação social, o Governo convidou representantes de todos os grupos parlamentares para discutir os critérios futuros que iriam definir as nomeações políticas em Portugal.
O País, ainda atordoado por mais uma medida de um Governo que cada vez mais se anunciava mediaticamente como o moralizador do regime, aplaudia. Só que depois, também aqui, foi o que se viu. Na verdade, é o que se vê. Infelizmente, cada vez mais e em cada dia que passa. É que, também agora, o Governo se demonstrou, na prática, exactamente o contrário do que garantiu, desta feita com juras de Estado ao País.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - E o que é pior, em bom rigor, é que retirou mesmo quase todo o efeito útil à substância dos diplomas que hoje, aqui, poderíamos tratar de aprovar.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Pelo menos para o tempo desta Legislatura.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - E que até poderemos vir a aprovar, mas que entretanto já quase não terão a quem ser aplicados, porque o essencial das nomeações políticas até que já foi feito!
Só que isso não é sério!
Não é que não devêssemos estar já habituados. Porque o Governo socialista, que prometeu não aumentar impostos, aumentou, entre outros, o IVA, o imposto sobre os produtos petrolíferos (ISP), o IRS e o imposto sobre o tabaco.
O Governo, que disse que não recorreria a receitas extraordinárias, já admitiu que vai vender património e recorrer a privatizações.
O Governo, que disse que iria resolver o problema do desemprego, já não vai criar 150 000 novos postos de trabalho (antes eram 260 000) e tem, no Programa de Estabilidade e Crescimento, prevista para 2009 uma taxa de desemprego superior à de 2004. Facto extraordinário!
O Governo que aumenta a idade da reforma é o mesmo Governo que facilita o acesso ao rendimento mínimo garantido.
Enfim, por tudo isto, não é de estranhar que, mais uma vez, o Governo se tenha agora revelado, e pelos piores motivos.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): - Bem lembrado!

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O Orador: - Mas há aqui uma razão que faz toda a diferença. É que o Governo tinha admitido publicamente que, salvo em casos excepcionalíssimos, urgentes e justificados, não procederia a nomeações sem que as iniciativas legislativas que estamos aqui a discutir, ou pelo menos parte delas, fossem aprovadas.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - É verdade!

O Orador: - Só que, entretanto, foi o que se viu. Nomeações atrás de nomeações, para tudo e mais alguma coisa, em números recorde.
Há três semanas, ou pouco mais do que isso, aqui, na Assembleia da República, o CDS foi o primeiro partido a perguntar ao Primeiro-Ministro como justificava as mais de 650 nomeações feitas até então. Justificávamos a pergunta precisamente com a proposta de lei que o Governo dizia querer aprovar e a excepcionalidade das nomeações que, dizia, ia fazer.
Não tivemos qualquer resposta!
Uma semana depois, as nomeações já eram mais de 800. Hoje, já são mais de 1150. Com uma agravante: é que quando a vergonha procedimental já se tornava demasiado evidente para poder continuar a ser escondida, o Governo lá veio afirmar, pela voz do Primeiro-Ministro e de vários Ministros (cito agora o Ministro dos Assuntos Parlamentares), que o Governo "nomeou, cumprindo a palavra que deu: o Governo autovinculou-se às normas que propunha. Podia ter usado a lei vigente, mas já está a praticar a nova lei antes de ela ser aprovada".

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, isto é gravíssimo e é gravíssimo a dois níveis. Em primeiro lugar, pelo desrespeito inqualificável que demonstra pelo trabalho dos Deputados na Assembleia da República enquanto órgão de soberania.

Aplausos do CDS-PP.

É que o Governo, substituindo-se aos Deputados, afirma aplicar uma lei que a Assembleia da República ainda não discutiu nem aprovou. Não admite sequer a possibilidade de essa lei sofrer alterações em sede de especialidade - para não falar na possibilidade de ser chumbada. E em relação às outras iniciativas legislativas é como se não existissem!
Considerará até, porventura, o Governo que o processo legislativo da Assembleia da República - uma decisão que, como os Ministros devem saber, só cabe aos Deputados - também é um dos tais privilégios absolutamente injustificados com que devem querer acabar.

Risos do CDS-PP.

Só que as coisas não se passam assim. E não é ao Governo que cabe decidir antecipadamente quais as leis que o Parlamento vai ou não aprovar. Mesmo que considere os Deputados socialistas uma extensão da vontade governativa, coisa que, diga-se em abono da verdade, a Constituição até proíbe.
Porque, Srs. Ministros, em democracia, há regras! E o Governo, qualquer Governo num Estado de direito, não tem o direito de aplicar qualquer outra lei que não seja a lei vigente. Como é óbvio! Sendo que, quanto às outras, terá mesmo de esperar. Ou, pelo menos, teria….

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Mas, na prática, assim não foi. Porque o Governo confessou, com a maior impunidade, como decidiu não aplicar uma lei que está em vigor para aplicar uma outra que está no prelo e que não lhe compete aprovar.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Só que isto que o Governo afirma é igualmente grave a outro nível. É que nem sequer é verdade, mais uma vez.
Passo a demonstrá-lo: das mais de 1150 nomeações que já foram feitas, muitas nem sequer obedecem a este novo regime que o Governo propôs.

Vozes do CDS-PP: - Exactamente!

O Orador: - O Governo diz, na exposição de motivos da sua proposta de lei, que se estabelece um regime pelo qual ficarão "perfeitamente clarificados os cargos dirigentes cujo provimento se fará por

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escolha…" - as nomeações políticas - "… e aqueles em que se recorrerá a um procedimento concursal", e refere-se a todos os de direcção intermédia.
Pois é! Só que há inúmeros exemplos de nomeações políticas já feitas para lugares de direcção intermédia, apesar de, para o Governo, estes lugares só poderem ser ocupados por concurso.

Vozes do CDS-PP: - É verdade!

O Orador: - E nem sequer se diga que se trata de nomeações feitas por razão de particular urgência. A menos que o Governo considere as nomeações do director de serviços jurídicos da Direcção-Geral de Transportes Terrestres e Fluviais, do director de serviços da Delegação de Transportes do Centro, do chefe de divisão de administração geral do Centro de Estudos e Formação Autárquica, do director dos serviços administrativos do IPAD, do director de serviços de monitorização ambiental da ex-DRAOT, ou do chefe de divisão de estudos ambientais da direcção geral de infra-estruturas do Ministério da Justiça, só para dar alguns exemplos, casos de urgência manifesta.

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - Então para que é a lei?

Protestos do PS.

Seja como for, assim se percebe uma outra notícia que, infelizmente, passou despercebida a muita gente. A de que dirigentes federativos do PS criticaram violentamente o Ministro da Saúde, Correia de Campos - veja-se bem! -, porque, a propósito das nomeações, e cito uma notícia do Diário de Notícias de 14 de Maio: "querem dar sugestões e ele não ouve ninguém".

Risos do CDS-PP.

Como se num País, que por acaso é o nosso, fossem os presidentes das federações distritais do Partido Socialista a dizer aos Ministros quem, em razão do Estado e no interesse nacional, devem nomear para cargos públicos! Era o que mais faltava!

Aplausos do CDS-PP.

E sobre isto, coisa fantástica, ainda dão entrevistas muito indignados. O que não deixa de ser extraordinário!
Isto para não falar de outros casos tremendamente chocantes.
Invoca o Governo crise, pede sacrifícios a todos, aumenta os impostos, ataca os políticos (que até inclui na categoria de funcionários públicos), e depois o que é que faz? Outro exemplo: nomeia dezenas e dezenas de licenciados, com remunerações médias na ordem dos 750 contos e abonos suplementares, para darem pareceres técnico-jurídicos. Então, não estão já os ministérios suficientemente repletos de juristas, de advogados, de docentes, admitidos em razão dos seus currículos, suficientemente habilitados para darem pareceres técnico-jurídicos?

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - É preciso nomear mais dezenas, e dezenas, e dezenas, e dezenas de licenciados, sem que sequer se faça menção do currículo no despacho, para dar pareceres técnico-jurídicos?
É claro que é normal neste Governo. Mas não devia sê-lo!
Curioso mesmo é que só calculem uma previsão de défice para o final do ano, que é aquela que anunciaram ao País, porque, por este caminho, porventura, seria muito mais!
Isto para não falar de tudo aquilo que o Eng.º Sócrates, quando estava na oposição, disse a propósito das nomeações do governo anterior. Por exemplo, a propósito das nomeações feitas pelo Dr. Pedro Santana Lopes, das secretárias que nomeou, e tudo o mais! Mas quantas nomeou já? Dizia até o Eng.º José Sócrates: "Sim, senhor! Até em termos da lei orgânica poderá ser permitida essa nomeação".

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr. Deputado, lamento mas vou ter de o "desnomear", passe a expressão, porque o tempo de que dispunha terminou.

Vozes do CDS-PP: - Ainda dispõe de tempo.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
Mas o País vive um momento de crise. Como tal, não têm de ser todos nomeados.
Daria muitos outros exemplos, mas, infelizmente, o tempo não é bastante.

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Há, no entanto, um outro facto político que é relevante e que gostaria de referir.
Nas reuniões que houve entre o Governo e os grupos parlamentares, o Governo não tratou apenas das nomeações para a Administração directa, como aqui está em causa. Tratou o Governo, ou disse que trataria, dos institutos públicos, das unidades de missão, das autoridades administrativas independentes e das sociedades anónimas de capitais públicos, em simultâneo e em paralelo. A verdade é que não tratou de nada disto!
E agora percebe-se porquê. Porque, no exacto momento em que o Governo demonstrou os seus altos critérios de rigor, sentido de gestão e interesse público nas nomeações, demonstrou o Governo que temos. Por exemplo, em muitas empresas.
Para a GALP, o Ministro da Economia lá explicou que o Dr. Fernando Gomes foi nomeado porque adquiriu conhecimentos suficientes para o cargo ao gerir as verbas da Câmara do Porto.

Vozes do PSD: - Grande experiência!

O Orador: - Pena não ter conseguido convencer o Eng.º João Cravinho, que estranhou a nomeação em vez da de outro tipo de profissionais.

Protestos do PS.

E foi certamente o mesmo critério que justificou a escolha de Nuno Cardoso para a empresa Águas de Portugal. Outro grande quadro socialista que deve ter aprendido imenso na Câmara do Porto...

Protestos do PS.

Tanto que o facto de estar constituído arguido, precisamente por factos relativos a esta mesma gestão, não desaconselhou o Governo no que toca à decisão.

Aplausos do CDS-PP.

Mas, enfim, são critérios que se percebem cada vez mais neste Governo e que cada vez mais são a sua marca. Infelizmente, a sua má marca. Uma marca para o bom e para o mau.
Para terminar, digo que o CDS quis e quer dar efeito útil a esta discussão a que o Governo quase retirou a razão de ser.
Esta discussão terá razão de ser se formos rápidos, para que o Governo não nomeie os poucos que ainda falta nomear.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr. Deputado, já terminou o tempo de que dispunha mais os 2 minutos que lhe tinham sido cedidos pelo PSD.

O Orador: - Termino, dizendo que o CDS-PP vai requerer o processo de urgência destas iniciativas legislativas, que o Sr. Presidente deverá enviar à Comissão competente. Haverá, assim, se for aprovado, um prazo para exame, em sede de comissão, de um máximo de cinco dias e para a redacção final de dois dias. Para que o Governo não tenha mais desculpas.
Da nossa parte, sairemos daqui com a consciência tranquila. Esperamos bem que o Governo possa dizer o mesmo!

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para que efeito, Sr. Ministro?

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Para uma interpelação à Mesa sobre a condução dos trabalhos, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sobre que tema, Sr. Ministro?

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Sobre uma referência feita na intervenção anterior, que é factualmente falsa. Penso que é importante para o debate que essa falsidade seja corrigida, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Faça favor, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Muito obrigado, Sr. Presidente.

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Comunico, mais uma vez, agora à Câmara, que é falso que o Eng.º Nuno Cardoso tenha sido nomeado para a administração da empresa Águas de Portugal.
Essa informação é falsa, tendo sido desmentida logo no momento em que foi anunciada. Portanto, a bem da discussão, não devemos ter informações falsas.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Está comunicado, Sr. Ministro. Muito obrigado.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Peço a palavra para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, uso da palavra no mesmo sentido, para dizer ao Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares que ficámos muito satisfeitos em sabê-lo. Pelo menos, assim, não se perde tudo!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Montenegro.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Estamos hoje a discutir iniciativas legislativas tendentes a alterar as regras de nomeação dos altos cargos da Administração Pública.
O Governo, em particular, pretende concretizar o princípio, que definiu no seu Programa, segundo o qual era sua intenção "acordar, a nível parlamentar, a definição dos cargos dirigentes de nomeação e sua vinculação ou autonomia em relação às mudanças eleitorais".
A ideia era dotar os processos de transição dos executivos de maior transparência e objectividade, fixando os cargos cujo exercício, por lei, cessava com a mudança de Governo.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD):- Era!

O Orador: - Tendo por base esse desiderato e assumindo nós, PSD, que tais processos de transição no passado, mesmo os da nossa responsabilidade, não foram exemplares (assumimo-lo de forma clara), colocámo-nos numa posição de abertura e disponibilidade para se alcançar o referido acordo parlamentar.

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - É a diferença!

O Orador: - Sucede, porém, que uma vez mais o Governo e a maioria do Partido Socialista que o apoia quiseram usar a disponibilidade da oposição para encenar uma manobra de diversão que distraísse o País, a opinião pública, para no entretanto, na prática governativa, fazer exactamente o contrário do que anunciaram.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD):- Muito bem!

O Orador: - Senão vejamos: em primeiro lugar, o PSD definiu no seu último Congresso Nacional, em que elegeu um novo líder e sufragou a sua estratégia política, o objectivo de construir um entendimento nacional em áreas essenciais, quais sejam a justiça, a reforma do Estado e as finanças públicas.
O PSD e o seu líder quiseram com isso resistir à tentação irresponsável de instrumentalizar no debate político-partidário matérias fundamentais para o nosso futuro colectivo.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD):- Muito bem!

O Orador: - O PSD e o seu líder quiseram privilegiar a prossecução do interesse nacional, estabilizando políticas-chave fulcrais para o nosso desenvolvimento em detrimento do imediatismo efémero da luta partidária.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD):- Muito bem!

O Orador: - A esta postura e a esta disponibilidade o Sr. Primeiro-Ministro e a maioria absoluta que o acompanha responderam irresponsavelmente: "Não! Temos maioria, não queremos!".
Em segundo lugar, o País assistiu, desde o dia 12 de Março de 2005 até ao dia de hoje, a um Governo e a um Partido Socialista que dizem uma coisa e fazem descaradamente o seu contrário.

Vozes do PSD: - Muito bem!

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O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - Um escândalo!

O Orador: - De facto, o Governo e o PS anunciaram que esperariam a aprovação na Assembleia da República da nova lei para, em conformidade com ela, procederem às nomeações para altos cargos da Administração. Mas, objectivamente, não conseguiram suster o "apetite clientelar", e são já mais de 1000 as nomeações até hoje, dia em que aqui discutimos na generalidade esta proposta de lei. Alegam, quase anedoticamente, que é uma "situação normal" e que se trata de nomeações "estritamente políticas".

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - Um escândalo!

O Orador: - A questão é qualitativamente relevante porquanto, ao invés de limitar, o comportamento do Governo denota, incoerentemente, uma excessiva generalização dos cargos considerados de confiança política.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD):- Muito bem!

O Orador: - A questão é também quantitativamente relevante, na medida em que uma grande parte das nomeações, cerca de 200, respeita a cargos de direcção superior de primeiro grau (40), de direcção superior de segundo grau (70) e cargos intermédios (83).
São dados não da comunicação social mas recolhidos do Diário da República.

O Sr. Jaime Soares (PSD): - Isto é um atentado à República!

O Orador: - E, Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, como tem dito abundantemente o Sr. Primeiro-Ministro, cabe aos agentes políticos darem o exemplo.
É verdade que o Sr. Primeiro-Ministro o diz. Mas é ainda mais verdade, é uma evidência, que o Sr. Primeiro-Ministro não faz aquilo que diz!

Aplausos do PSD.

Em Agosto de 2004, dizia o então Deputado José Sócrates, a propósito da instalação dos gabinetes ministeriais do XVI Governo Constitucional: "São números inimagináveis, há falta de contenção e decoro, há assessores para tudo". E a respeito do facto de o então Primeiro-Ministro ter nomeado 13 secretárias pessoais acrescentava: "Constitui um sinal político muito negativo para o Governo e para o País que, num momento em que a despesa pública está descontrolada, o Primeiro-Ministro dê um exemplo de despesismo".

Protestos do Deputado do PS Ricardo Gonçalves.

Pessoalmente, não pretendo transformar esta discussão numa "contenda de mercearia", mas em matéria de exemplo, e para que conste, registam-se, só no Gabinete do Sr. Primeiro-Ministro, de acordo com despachos publicados no Diário da República, 17 nomeações de secretárias pessoais. É caso para dizer: "Que bem prega Frei Tomás! Olha para o que ele diz, não olhes para o que ele faz!"

Aplausos do PSD.

Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Em terceiro lugar, a proposta de lei do Governo, que - reitero - nasceu da intenção geral de dotar de mais transparência as nomeações de altos cargos dirigentes da Administração Pública em período de transição da força política dominante no governo, resvalou intencionalmente para uma tentativa de fazer implodir os princípios e o alcance da reforma empreendida em Janeiro de 2004 no estatuto do pessoal dirigente.
De facto, quando todos entenderam ser necessária a modernização da Administração Pública, a qualificação dos servidores do Estado e a melhoria da qualidade dos serviços prestados ao cidadão, que tivessem como resultado o aumento da produtividade do sector estatal, vários passos foram dados, numa evolução que é contínua, mas que deve ser prosseguida num contexto de estabilidade.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A reformulação dos métodos de trabalho e a gestão dos recursos da Administração são um elemento decisivo não só para promover mais bem-estar aos cidadãos mas também para elevar a competitividade da nossa economia.

O Sr. Jaime Soares (PSD): - Muito bem!

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O Orador: - Nessa medida, foi iniciado um processo de transformação centrado na exigência, na prevalência de critérios de mérito e na avaliação das estruturas e dos quadros da Administração. Para nós a implementação deste modelo implica liderança, qualificação e responsabilização.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Por isso, entre outras coisas, propugnámos por uma organização interna flexível, onde cabe aos dirigentes máximos mobilizar e organizar os serviços, por forma a serem avaliados individual e colectivamente pelos resultados obtidos.
Continuamos a entender que a mudança pressupõe o desenvolvimento das capacidades existentes, o que por si configura este processo não como um obstáculo mas como uma verdadeira oportunidade.

O Sr. Jaime Soares (PSD): - Muito bem!

O Orador: - A Lei n.º 2/2004, de 15 de Janeiro, consignou um modelo organizativo baseado na liderança qualificada e responsável, na formação de um corpo de dirigentes dotado de elevadas capacidades de gestão, com autonomia para a constituição das equipas, obviamente em conformidade com as disposições e requisitos legais de transparência, de isenção, de livre candidatura, de competência e confiança profissionais, para que, a todo o tempo - e esse é o grande objectivo -, se afiram os resultados conseguidos, como já referi, quer individual quer colectivamente.
Ora, pouco mais de um ano após a entrada em vigor desta lei, sem ser ainda possível avaliar os seus efeitos, o Governo quer, desde já, alterar e desvirtuar o espírito da mudança que está em curso.

O Sr. Jaime Soares (PSD): - Muito mal!

O Orador: - E pior do que isso, Sr.as e Srs. Deputados, quer o Governo criar mecanismos que introduzem mais burocracia e inoperância, em vez de se deter no essencial, que é reequacionar e rever a dimensão do Estado, eliminando desperdícios incomportáveis.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O caminho não passa por atacar os servidores do Estado, nem pela excessiva politização dos cargos dirigentes; o caminho passa por aproveitar as capacidades existentes, potenciá-las e capitalizá-las num ambiente de exigência e de maior produtividade, para reflectir essa acção na prestação de melhores serviços ao cidadão. O caminho do Governo é errado e, como tal, o Grupo Parlamentar do PSD reprová-lo-á e denunciá-lo-á.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Machado.

O Sr. Jorge Machado (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: No passado dia 14 de Abril o Governo fez a apresentação nesta Assembleia do diploma que hoje discutimos.
O Governo apresentou-o com um belo discurso de moralização da Administração Pública, um discurso cheio de floreados e anúncios de boas intenções.
Nessa altura - partimos com boa fé para este processo e demos contributos que, entretanto, não foram acolhidos -, considerámos positivo que o Governo olhasse para os problemas da Administração Pública e apontasse como prioritária a alteração das regras de admissão e recrutamento dos dirigentes da administração superior e intermédia do Estado.
Contudo foi sol de pouca dura porque, depois, tudo correu mal.
O Governo começou por não respeitar os prazos para os pedidos de parecer das estruturas sindicais, num claro sinal de que estes não eram para ser tidos em conta.
Depois, surgiram as verdadeiras propostas e "reformas" para a Administração Pública, um conjunto de medidas que são um ataque cerrado aos direitos dos trabalhadores da Administração Pública.
Quando dissemos, naquela altura, que era no sector dos dirigentes superiores e intermédios da Administração Pública, e não noutros, que residem os problemas da Administração Pública, já estávamos à espera do que a seguir aconteceu.
Afinal, os funcionários da Administração Pública são também, para este Governo, a causa de todos os males e o bode expiatório para poderem anunciar, à boca cheia, que "desta vez os sacrifícios são para todos".
Contudo, apesar de diversas vezes repetida, uma mentira nunca se transforma em verdade.

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Numa altura em que aos trabalhadores da Administração Pública são exigidos sacrifícios e mais sacrifícios, este diploma permite contratações milionárias, com regalias quanto baste e prémios de gestão pelo cumprimento de objectivos para os dirigentes, como se fossem eles, e só eles, os responsáveis pela concretização desses objectivos.
Quando chega a altura de pedir sacrifícios, este Governo, qual fiel aprendiz do anterior, vai bater à porta dos mesmos do costume, ou seja, dos trabalhadores, sejam eles do sector privado ou da Administração Pública.
Isto é: quando falamos em aumentar a idade de reforma, na subida do IVA, no congelamento das carreiras, aumentos que, na prática, são reduções salariais, então, quem é chamado a fazer os sacrifícios são os trabalhadores da Administração Pública.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Quando falamos em grandes salários, em regalias e em prémios pelo cumprimento, então, quem "sofre", quem se chama para fazer esses sacrifícios são os boys do PS, que estão dispostos a fazê-los a "bem da Nação".

O Sr. Jaime Soares (PSD): - E são tantos!…

O Orador: - Outro aspecto menos positivo é o facto de o Governo já ter feito um conjunto de nomeações de dirigentes intermédios. Convinha, pois, que o Governo esclarecesse quais as regras que aplicou. Foram nomeados ou procedeu-se a concurso?
Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr.as e Srs. Deputados: Se o objectivo central era a modernização da Administração Pública, então, o Governo falha redondamente.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Não se moderniza a Administração Pública aumentando a idade de reforma, congelando carreiras ou propondo aumentos salariais, que, na prática, são reduções salariais.
Este diploma também não ajuda a este objectivo, uma vez que alarga de uma forma muito significativa as nomeações, e não privilegia o concurso. É o cartão do Partido Socialista a sobrepor-se à competência, impondo, assim, restrições ao princípio da imparcialidade da Administração Pública e estabelecendo condições para a sua partidarização pelos governos.
Para o PCP, as nomeações na Administração Pública devem ser claramente uma excepção e não a regra, mas para o Governo as nomeações são claramente a regra e os concursos a excepção.

O Sr. Jaime Soares (PSD): - Já nem a esquerda quer nada com o PS!

O Orador: - Para o PCP, a modernização da Administração Pública faz-se com a melhoria das condições de trabalho e de remuneração dos seus trabalhadores; faz-se com uma formação profissional de qualidade e acessível para todos os trabalhadores; faz-se revogando a legislação no que se refere ao contrato individual de trabalho na Administração Pública; e faz-se também garantindo índices de participação dos trabalhadores na gestão da Administração Pública.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - A modernização da Administração Pública, em suma e em síntese, faz-se ao lado e com os trabalhadores da Administração Pública e não contra eles.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O presente diploma apresenta ainda um conjunto de aspectos negativos, que não podemos deixar de referir.
O primeiro aspecto diz respeito ao número de excepções que este diploma comporta. São de tal ordem e magnitude que se fica na dúvida sobre a quem é que se aplica efectivamente o presente diploma.
Na verdade, quando as excepções previstas abrangem mais de 50% da actividade da Administração Pública, então, a excepção é a regra.
Quando se estipula que não se aplica este diploma às áreas da saúde, da justiça, da educação, das forças de segurança e aos dirigentes de carreira, o que o Governo está efectivamente a fazer é a aumentar o número de nomeações.
Um exemplo, Sr. Ministro: na área da saúde, pode compreender-se a necessidade de haver nomeações para as administrações regionais de saúde, mas já nada justifica as nomeações para directores dos hospitais, de centros de saúde e das respectivas extensões. Tal só se pode explicar com a necessidade de saciar o aparelho partidário do PS.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Claro!

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O Orador: - Assim, quando o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares dizia que se iria reduzir o número de lugares de confiança política e aumentar os concursos, tal não tem correspondência neste diploma, bem pelo contrário.
Quanto à formação dos dirigentes, esta tem-se mostrado claramente insuficiente. Este diploma permite que as instituições de ensino superior possam ministrar os cursos, contudo, falta estipular os critérios, os currículos, quem pode aceder a essa formação e, principalmente, com que custos.
Se a formação continuar a ser um negócio, quer para o INA quer para as universidades, onde os preços tornam incomportável o acesso aos cursos, então, a formação vai continuar a ser uma miragem para a maioria dos trabalhadores da Administração Pública.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - O presente diploma estipula que a carta de missão pode atribuir prémios de gestão para os serviços e/ou para o titular do cargo. Contudo, sendo admissível que o serviço receba esse prémio, já nada justifica que o mesmo aconteça para o titular do cargo, uma vez que estamos face uma forma dissimulada de remunerar o dirigente e de atribuir um prémio ao dirigente pelo trabalho, que é, forçosamente, resultado do esforço colectivo dos trabalhadores do serviço.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Outro aspecto negativo prende-se com o facto de, nos concursos para os cargos de direcção intermédia, não se proceder à ordenação dos candidatos, nem haver audição dos interessados. Não compreendemos a utilização de um concurso que não dá aos concorrentes as necessárias e indispensáveis garantias de recurso.
Uns dos aspectos mais negativos deste diploma é o facto de, por um lado, serem abonadas despesas de representação e prémios cujo montante é discricionário e, por outro lado, permitir-se que o dirigente opte pelo vencimento do serviço de origem. Com estes mecanismos estaremos a abrir a porta a contratações milionárias, tão severamente criticadas pelo PS, quando estava na oposição.
Um dos problemas que nem sequer foi abordado diz respeito ao facto de sucessivos governos terem vindo a minar a Administração Pública com nomeações, algumas das quais feitas momentos antes da tomada de posse de um novo governo. Este diploma não responde ao problema das nomeações feitas perto de períodos eleitorais, quando podia e devia ter-se criado um período de "nojo" dentro do qual não fossem permitidas nomeações.
Outro problema que fica por resolver - e o Governo não disse uma palavra sobre este aspecto - diz respeito à alteração à Lei n.º 23/2004. De nada adianta limitar as nomeações se, depois, se permitem os contratos de direito privado na Administração Pública, onde os critérios de admissão são claramente permissivos.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Exactamente!

O Orador: - E, por fim, o diploma não criou os mecanismos necessários para garantir a autonomia e a independência das diferentes inspecções. Estas, dada a sua natureza, deviam ter um regime próprio que assegurasse as suas autonomia e independência face ao Governo.
O Governo, aquando da apresentação do presente diploma, afirmou que pretendia dar um passo relevante para a história da Administração Pública portuguesa, mas da análise do diploma resulta claramente que o Governo perdeu uma excelente oportunidade para o fazer.

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Gameiro.

O Sr. António Gameiro (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr. Secretário de Estado da Administração Pública, Sr.as e Srs. Deputados: O Sr. Primeiro-Ministro assumiu frontal e firmemente nesta Câmara e perante os portugueses que o Governo iria encetar um programa de reestruturação e modernização da Administração Pública.

O Sr. Jaime Soares (PSD): - Mas esqueceu-se!

O Orador: - Desse vasto e profundo conjunto de medidas então enunciadas, estamos em condições, hoje, de discutir as alterações propostas ao estatuto do pessoal dos serviços e organismos da administração

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central, regional e local do Estado, enquanto primeiro passo para introduzir maior transparência, justiça, verdade e dignidade ao estatuto dos dirigentes da Administração Pública.
A reforma da Administração Pública tornou-se numa das mais importantes reformas estruturais que este Governo se compromete realizar e a que, com pequenos passos, com alterações de regimes e melhoria de soluções já existentes, à volta das quais se tem vindo a gerar um consenso quase unânime quanto à sua necessidade - daí a necessidade desta proposta de lei -, se seguirão outras igualmente fundamentais e que constituirão um novo quadro de acção e de relacionamento com os cidadãos, mais transparente e moderno.
Esta proposta de lei encerra em si e concretiza eficazmente a filosofia da mudança protagonizada pelo Governo na área da organização, da liderança e da responsabilidade.
Na Administração Pública, como noutros sectores de actividade, a mudança deve ser encarada como um campo de oportunidades, de afirmação profissional e de desenvolvimento de capacidades, razões pelas quais existe hoje a necessidade de cumprir o prometido no Programa de Governo, que foi: "Acordar a nível parlamentar na definição dos cargos dirigentes de nomeação e sua vinculação ou autonomia em relação às mudanças eleitorais" e "Restabelecer prémios de honra e pecuniários ao mérito e à excelência no desempenho de funções públicas". Esta proposta de lei cumpre mais uma promessa do PS, com a qual obteve a vitória a 20 de Fevereiro último.
Todavia - há que recordá-lo -, o anterior governo do PSD e do CDS-PP muito pregaram nesta matéria, mas muito pouco fizeram. Em três anos de actividade governativa apenas três diplomas foram aprovados por esta Câmara sobre a então tão assumida promessa de tudo reformar em nome da recuperação da capacidade competitiva do nosso país.
Mas nós, quer seja através do Governo do PS ou do seu Grupo Parlamentar, não criticamos por criticar e acautelamos que, quanto à Lei n.º 2/2004, de 15 de Janeiro, ela encerra, a nosso ver, uma boa base de trabalho já efectuado, mas necessita de aperfeiçoamentos, e são essas alterações de regime que estamos hoje aqui a discutir. É pena que os Srs. Deputados da direita só saibam discutir números, em vez da proposta em concreto. Falam em tudo, mas denotam que não sabem falar de nada.
A nossa responsabilidade face aos momentos que se vivem hoje leva-nos a aproveitar aquilo que de melhor se fez e se faz pelos portugueses.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Com a proposta de lei, estão hoje em discussão outras duas iniciativas legislativas nesta matéria, sendo uma do Bloco de Esquerda e outra do CDS-PP.
Contudo, Meu Caro Deputado Nuno Teixeira de Melo, é preciso ter descaramento para vir afirmar aqui o que afirmou. Recordo-lhe as palavras da actual candidata do CDS-PP à Câmara Municipal de Lisboa, aquando da discussão da Lei n.º 49/99: "Não basta vir aqui dizer que, como o meu ministério é complexo, vou buscar à banca; como se trata do Instituto de Gestão Financeira vou buscar à banca, porque não tenho ninguém na função pública. Não é verdade! Este ponto prende-se com a dignificação da função pública e com a sua autonomia".
Ora, o Sr. Deputado vem aqui apresentar uma proposta que contradita tudo aquilo que disseram entre 1996 e 2001, dizendo hoje que estão a favor de concursos públicos, quando aqui pregaram, à viva voz, contra esses mesmos concursos públicos. Isto é uma indignidade, é uma contradição nos termos. Os senhores deviam ter vergonha!

Aplausos do PS.

Mas gostava de dizer mais: o senhor ainda não viu na comunicação social qualquer notícia deste teor: "Governo…" - Bagão Félix - "… substitui metade dos dirigentes regionais da Inspecção-Geral do Trabalho". Viu isto no Governo do PS?! Viu alguma notícia neste sentido?!
Olhe, gostava ainda de dizer-lhe, relativamente à forma como temos tratado esta matéria, que, até este momento, o Governo nomeou 148 dirigentes, todos eles enquadrados aqui pela intervenção do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, mas em situação alguma, até prova em contrário, os senhores conseguem comprovar que houve nomeações para a administração directa regional ou local para lugares que não tivessem vagado nas circunstâncias que o Sr. Ministro aqui trouxe.
Quanto ao projecto de lei do BE, ele enquadra em si medidas de moralização destas matérias assentes em três traves mestras: propõe a nulidade de todas as nomeações ocorridas nos seis meses que antecedem a realização de eleições legislativas, salvaguardando o caso das nomeações em substituição com carácter de urgência; propõe que, em caso de antecipação de eleições legislativas, todas as nomeações ocorridas entre a demissão do governo ou a convocação das eleições e a confirmação parlamentar do governo recém-nomeado sejam tidas como nulas; e estabelece um prazo - e muito bem! - para a publicação dos respectivos despachos de nomeação dos dirigentes, de forma a obviar ao contorno dos limites temporais estabelecidos pela própria lei.
Este projecto de lei enquadra um conjunto de medidas com as quais concordamos e às quais damos, em geral, o nosso acordo, pois, efectivamente, é fundamental moralizar o regime das nomeações para os cargos de direcção superior da Administração Pública e evitar o que o governo de gestão anterior levou a efeito, que a todos nos deve obrigar a reflectir construtivamente na procura de soluções que evitem o abuso e a

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desonestidade política de nomear dirigentes, sabendo que, com eles, nenhum projecto político se irá realizar ou executar.
Em sede de especialidade, tomaremos em mãos esse trabalho de aperfeiçoamento conjunto, sendo certo que do regime proposto ressalta a dúvida de saber qual o regime aplicável às remunerações percebidas entretanto, se é certo que, sendo nulas as nomeações, o acto administrativo que lhe dá origem não produz qualquer efeito.
Quanto ao projecto de lei do CDS-PP, ele estabelece dois regimes jurídicos material e formalmente distintos: o regime jurídico da cessação da relação pública de emprego de cargos dirigentes e um conjunto de alterações ao estatuto do pessoal dirigente dos serviços e organismos da administração central, regional e local do Estado, aprovado pela Lei n.º 2/2004, de 15 de Janeiro, embora, por lapso, se afirme que se trata dos cargos dirigentes da administração central, local e regional do Estado, que é uma coisa diferente. Este diploma terá a nossa discordância, porque não tem qualidade jurídica ou tem pouca qualidade jurídica para merecer a nossa aprovação. Aliás, este erro é detectado ao longo do diploma em diversas normas e pode ter um outro significado jurídico completamente distinto do pretensamente pretendido.
Quanto ao regime jurídico da cessação da relação pública de emprego de cargos dirigentes, entendemos que, política e tecnicamente, as soluções encontradas nos diplomas do Governo e do Bloco de Esquerda respondem melhor à necessidade de moralizar esta questão e que o CDS-PP aproveita agora para fazer mea culpa do que fez e defendeu enquanto esteve no governo.
Quanto às alterações à lei actual, elas são assumidas pelo CDS-PP, sobretudo pela alteração à redacção dos artigos 20.º e 21.º, onde se entende agora propor que o cargo de subdirector-geral se mantenha em plenas funções, não obstante a cessação da comissão de serviço do director-geral por força da mudança de governo.
Todavia, somos de opinião de que o director-geral e o subdirector-geral têm de formar uma equipa coesa e sintonizada pelos mesmos objectivos e metodologias, razão por que não deve ser imposto àquele que trabalhe com quem, porventura, não tenha aquela sintonia. Tal não impede, naturalmente, que o novo director decida querer manter o subdirector. Mas é importante dar-lhe liberdade para tomar essa opção.
Noutro sentido, este projecto de lei assume que o recrutamento dos dirigentes de direcção intermédia possa ser efectuado de entre indivíduos licenciados não vinculados à Administração Pública, postura que contende, a nosso ver, com a redacção defendida pelo CDS-PP na lei em vigor, que foi aprovada com os seus votos favoráveis, que contradita a noção mais consensual já habilitada na lei de que se trata, em princípio, de cargos com elevada tecnicidade e especificidade que se adquire ao longo da carreira na Administração Pública e muito mais facilmente por quem tenha experiência na Administração Pública.
Por outro lado, este projecto de lei do PP pretende reinstituir o concurso de recrutamento de titulares de cargos de direcção intermédia, tal como foi configurado na lei de 1999. Seria o maior erro que se poderia cometer nesta matéria!
Ficou à vista de todos que tal sistema burocrático não só não permitiu a imparcialidade e a isenção que, aparentemente, propiciava como constituiu uma profunda machadada na celeridade reivindicada, que era essencial assegurar no procedimento. Não se compreende por que razão pode alguém pretender repor o referido sistema - aliás, sistema muito criticado por diversas vozes do CDS-PP, aquando da discussão da Lei n.º 49/99.
Os senhores defenderam uma coisa entre 1996 e 2001 na oposição ao governo do PS; depois foram para o governo e defenderam, fizeram e aprovaram uma lei de livre escolha dos dirigentes; e hoje - pasme-se!... - defendem exactamente o regime que criticaram entre 1996 e 2001!
Os portugueses não percebem e os senhores demonstram nada perceber sobre a vossa própria percepção. É pena!

Aplausos do PS.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Não me entusiasmam!

O Orador: - Meu caro amigo e Deputado Luís Montenegro: "manobra de diversão", "contrário do que prometemos", "incoerência", por nomear 200 dirigentes em situações já justificadas na intervenção do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares?! São situações completamente urgentes e de necessidade da gestão da Administração Pública.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): - Porquê?

O Orador: - Então, gostaria que o Sr. Deputado me contraditasse o seguinte, que vou citar: "Se há alguém no PSD que ao longo dos últimos 30 anos sempre se preocupou em colocar os amigos no aparelho de Estado, aqui e além, é o Dr. Marques Mendes". Quem o diz? Isaltino Morais!

Vozes do PS: - Bem lembrado!

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O Orador: - "Pressionou-me, a mim, e ao próprio Primeiro-Ministro, então, Durão Barroso, para designar uma determinada pessoa para a presidência das Águas de Portugal (…)"…

Protestos do PSD.

… "(…) indicado por Marques Mendes, não tinha competência técnica, por isso, não o nomeei" - disse Isaltino Morais. Esta é que é a isenção que os senhores demonstram!
Mas gostava de dizer que 200 nomeações num universo de 7457, ou seja, menos de 2,5% dos cargos dirigentes da Administração Pública foram nomeados por este Governo, por razões e com o enquadramento como já disse o Sr. Ministro. E os senhores não têm vergonha, têm a desfaçatez de vir aqui pôr isto em causa. Tenham decoro, tenham calma, que o Governo só está a governar há 100 dias!

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

Mas, então, é hoje premente fazer-lhe uma pergunta, meu caro Deputado Luís Montenegro, porque falou aqui do trabalho feito pelo Governo na área da Administração Pública. É que a Dr.ª Manuela Ferreira Leite dizia que os concursos de então, feitos ao brigo da Lei n.º 49/99, de 22 de Junho, que o PS fez aprovar nesta Assembleia, eram concursos burocráticos e paralisantes; mas o PP, que está - ou esteve - em coligação com VV. Ex.as, acha, hoje, que não o eram e que são concursos bons.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): - Mas nós não achamos!

O Orador: - Gostava de dizer-lhe, então, que seria bom que na reforma da Administração Pública - que é uma tarefa de todos nós, como dizia a Dr.ª Manuela Ferreira Leite, que respeita a todos -, ninguém com sentido de responsabilidade pudesse ilegitimamente alhear-se em nome dos superiores interesses do País. Isto dizia ela, mas o senhor anunciou aqui que votam contra. É uma irresponsabilidade!

Protestos do Deputado do PSD Luís Montenegro.

Gostava de dizer-lhe também que, na altura da discussão da Lei n.º 2/2004, de 15 de Janeiro, o líder parlamentar do PS afirmou nesta Assembleia que dava o acordo à lei em nome da responsabilidade e do sentido de Estado que o PS aqui trouxe. Aliás, o PS, ao invés de VV. Ex.as, trouxe aqui um projecto de lei alternativo ao vosso, aquilo que os senhores não conseguiram nem quiseram fazer neste debate.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): - Está em vigor!

O Orador: - Mas mais, perguntava o então Deputado e actual líder parlamentar do PS, e com legitimidade: onde está a programação da abertura ao público das novas lojas do cidadão, em especial nas capitais de distrito ainda não contempladas, como é o caso de Leiria, Bragança, Beja e Faro?

O Sr. Luís Montenegro (PSD): - Falava de pensões também, nesse debate!

O Orador: - Em três anos, nem uma loja do cidadão! Tenham decoro!
Onde está o reforço da oferta de serviços dos postos de atendimento ao cidadão que permanecem, hoje, praticamente, no mesmo registo em que os deixámos? Onde estão, respondam lá!
Etc., etc... Os senhores estiveram no governo e na Administração Pública e deixaram muito a desejar.

Vozes do CDS-PP: - É para desviar as atenções!

O Orador: - Mas, ainda aqui, Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo, para responder-lhe ao seguinte: 3000€ é muito? Então, e a assessora Rosário Abreu Lima, a assessora do Ministro Marques Mendes, 3900€?!... Então, e dos cerca de 10 assessores do Ministro Paulo Portas, com remunerações acima de 4500€, já se esqueceu?!...
Haja decoro!

Aplausos do PS.

Protestos do CDS-PP.

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Mostro, está aqui, e até lhe digo o nome: Secretário-Geral Bernardo Marques, 38 anos, requisitado, em Agosto de 2002, aos quadros da Portugal Telecom - vencimento: 10 000€; Director-Geral da Polícia de Defesa Nacional, Tenente-General José Luís Pinto Ramalho: 3500€; Director-Geral de Pessoal e Recrutamento Militar: 4000€; etc., etc…

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): - Não se aplica às forças armadas!

O Orador: - Se quiser, também advogados: Dr. Bernardo Diniz Ayala, etc... Mas não vou ter a desfaçatez de estar aqui a comentar isto.

Protestos do CDS-PP.

Nesta matéria, importa enquadrar que a proposta de lei assume, desde logo, três desígnios fundamentais que urge alterar em nome de outros tantos valores democráticos.
O primeiro desígnio é transparência: o actual Estatuto do Pessoal Dirigente permite que todos os titulares de cargos dirigentes, de direcção superior ou intermédia, na administração directa ou indirecta do Estado, sejam livremente nomeados pelo membro do Governo competente ou pelo dirigente máximo do serviço, pois o procedimento de selecção prima muito pouco pela transparência, como é notório e reconhecido largamente na sociedade portuguesa. Além disso, o Estatuto permite igualmente que, quase livremente, sejam ou possam ser exonerados, uma vez que as razões que podem motivar a cessação da respectiva comissão de serviço são de tal forma amplas e subjectivas que permitem fundamentar qualquer exoneração.
Nesta matéria, esta proposta de lei determina uma clarificação absoluta sobre quais os cargos dirigentes cujo provimento se fará por escolha, apenas os de direcção superior, e aqueles em que se recorrerá a um procedimento concursal que assenta em premissas de celeridade no recrutamento aliada à garantia de transparência e independência da nomeação para os de direcção intermédia;
Quanto ao segundo desígnio, estabilidade: face à prática de nomeações em catadupa por governos de gestão, foi assumido, em campanha eleitoral, tendo o PS sido mandatado pelo voto expresso da maioria dos portugueses para alterar tão inqualificável comportamento que bem pôs a nu algumas das falhas do nosso regime legal nesta matéria. Esta realidade é alterada e o PS e o seu Governo, com coragem, assumem esta imposição dos valores democráticos e da mais sentida cidadania.
Por outro lado, esta proposta de lei cumpre também a promessa de distinção dos cargos de direcção superior entre aqueles que mantêm autonomia quanto às mudanças eleitorais e os restantes, cujos dirigentes cessam automaticamente funções pela mudança de governo. Pretende-se com este novo regime reforçar as condições de estabilidade das administrações públicas e da eficiência do seu funcionamento, restringindo-se os cargos sujeitos a variações de natureza eleitoral.
Neste sentido, os cargos de secretário-geral ficam exclusivamente reservados a funcionários públicos, em razão das particulares responsabilidades atribuídas a essas funções.
Quanto ao terceiro desígnio, qualidade da gestão: prevê-se agora que os diplomas orgânicos ou estatutários dos serviços e organismos, cujas atribuições tenham natureza predominantemente técnica, adoptem particular exigência na definição da área de recrutamento dos respectivos dirigentes, tendo em vista a sua autonomia face às mudanças eleitorais. Neste sentido, limitam-se os casos em que, no decurso da comissão de serviço, esta possa ser dada como finda, consagrando uma maior objectivação das causas de tal hipótese poder vir a ocorrer e impondo que o respectivo dirigente seja previamente ouvido.
Só se permitirá a abertura da área de recrutamento dos cargos de direcção intermédia a não vinculados à Administração Pública - e isto é muito importante - quando não existam funcionários que reúnam as necessárias condições para serem nomeados por via concursal - o que não acontecia, até aqui, e que permitiu que, durante o governo do PSD e do PP, tivessem sido nomeadas centenas de quadros da GALP, dos CTT, da PT e de outras empresas e instituições, que, completamente alheados da realidade e vida da Administração Pública, em praticamente todos os casos, nenhum valor acrescentado trouxeram e imputaram, apesar de perceberem remunerações muito acima das estabelecidas para os cargos desempenhados, chegando mesmo a valores incompreensíveis. Foi por atitudes destas que, em 20 de Fevereiro, os portugueses e funcionários públicos disseram: basta!

O Sr. António Filipe (PCP): - E, agora, estão a dizer outra vez!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): - É o que estão a dizer, agora!

O Orador: - Nesta proposta de lei, condensa-se sistematizadamente todo o regime da exclusividade, acumulação, impedimentos, incompatibilidades e inibições do pessoal dirigente.
Face a estas medidas de qualificação das condições de desempenho e de qualificação e responsabilização da gestão pública, acresce que é introduzida uma medida fundamental, reclamada, aliás, por todos os sectores da sociedade e constante do Programa de Governo.

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Em suma, esta proposta de lei merece o nosso total apoio e aplauso, por, sem demagogia, resolver eficazmente um vasto conjunto de problemas e questões, que há muitos anos todos abordavam, mas que ninguém, até hoje, teve a coragem de assumir com frontalidade e pragmatismo.
O PS, o seu grupo parlamentar e o seu Governo estão bem cientes da importância destas medidas face aos critérios da direita que permitiram a livre escolha e nomeação de todos os dirigentes da Administração Pública da sua cor política.
O Governo ponderará também, se assim o entender, eventualmente, a nomeação de dirigentes com base no critério da confiança política e das qualidades de gestão e de liderança, mas queremos que os directores de serviço e chefes de divisão sejam concursados por um procedimento e júri independente, transparente, público, mas assumindo que é fundamental que seja célere.
Esta medida legislativa, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, encerra em si um simbolismo muito significativo para nós e para todos os portugueses. Estas medidas são o cumprimento do prometido e a execução rigorosa do Programa, sufragado a 20 de Fevereiro deste ano, e são o melhor exemplo de transparência, coragem e vontade de reformar o Estado e as suas administrações, de forma frontal e aberta e em diálogo com todos os que queiram melhorar as soluções encontradas sem desvirtuar a filosofia de aprofundamento da transparência democrática na Administração Pública.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - O Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo pediu a palavra para defender a honra da bancada. Tem a palavra, Sr. Deputado.

Vozes do PS: - Mas qual honra?!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Muito obrigado, Sr. Presidente.
O Sr. Deputado António Gameiro é novo nessa bancada e talvez por isso tenha caído aqui na tentação de invocar exemplos do passado, o que nesse passado tão criticado foi por essa bancada, quando, por alguma razão, de alguma destas bancadas eram invocados exemplos passados.

O Sr. Afonso Candal (PS): - Mas são verdades!

O Orador: - Permita-me que lhe diga uma coisa: mesmo cedendo a essa tentação, quando o fizer, faça-o com verdade, porque isso não é verdade. Aliás, a questão é que, de facto, não é verdade.
Sr. Deputado, em primeiro lugar, não deu os tais exemplos que ia dar; dizia que eram 10, mas só citou dois…

Vozes do PS: - Mas pode citar mais!

O Orador: - … e, desses, dois que citou foram particularmente significativos. Em primeiro lugar, Sr. Deputado, não me traga notícias de jornais , traga-me o Diário da República.

O Sr. António Filipe (PCP): - Um "lindo" jornal!

O Orador: - Em segundo lugar, o Sr. Deputado citou o exemplo de directores-gerais e isso é muito significativo. O exemplo que o Sr. Deputado deu foi de um director-geral, ou seja, o de um funcionário público de carreira, no caso concreto.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Exacto!

O Orador: - Sabe como é que o Sr. Deputado deu esse exemplo? Foi comparativo…

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo, desculpe-me interrompê-lo, mas sucede que não lhe perguntei - e deveria tê-lo feito - quais os termos em que se consideravam ofendidos. Porém, não me parece que a sua intervenção seja propriamente uma defesa da honra... Agradecia, pois, que se cingisse à defesa da honra da sua bancada.

O Orador: - Sr. Presidente, talvez V. Ex.ª com uma explicação prévia perceba onde é que quero chegar e, porventura, dar-me-á razão.
O Sr. Deputado António Gameiro acabou de fazer um ataque a alguém que foi Ministro da Defesa, que foi presidente do partido - e isto a propósito do tema que aqui tratamos, nomeadamente das nomeações feitas a esse propósito, porque considerou…

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Então, Sr. Deputado, faça o favor de cingir-se a esse tema.

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O Orador: - … e, como o Sr. Presidente compreenderá, compete-me estabelecer a comparação, que é para verificar se o exemplo colhe ou não - se V. Ex.ª me deixar terminar, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Muito bem, Sr. Deputado.

O Orador: - Sr. Deputado António Gameiro, V. Ex.ª para justificar a nomeação de pessoas que estão encarregadas de elaborar pareceres técnico-jurídicos, quando os ministérios estão cheios deles, a ganharem 700 contos, estabelece a comparação com um director-geral. É exactamente isto que está errado.

Aplausos do CDS-PP.

Protestos do PS.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): - Um bocadinho de Direito Administrativo não era mau!

O Orador: - A comparação que o Sr. Deputado encontra para os vencimentos de 700 contos, de recém-licenciadas em Direito,…

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - E ignorantes!

O Orador: - … que vão fazer uns jeitos de uns pareceres técnico-jurídicos para justificarem o seu sustento, é a comparação entre um director-geral e um funcionário público de carreira da Administração Pública. O Sr. Deputado não considera isto um ataque injustificável à Administração Pública?

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Já agora, Sr. Deputado António Gameiro, se quer falar de notícias de jornais, en passant, a propósito da Dr.ª Maria José Nogueira Pinto, para dizer-lhe que o que a Dr.ª Maria José Nogueira Pinto defendeu é exactamente o que nós aqui tratamos.

Vozes do CDS-PP: - Exactamente!

O Orador: - O que defendemos no nosso projecto de lei é o recurso à iniciativa privada, porque entendemos que na iniciativa privada em alguns casos se justifica o recrutamento de pessoal, coisa que, extraordinariamente, a proposta de lei do seu Governo também prevê! Por exemplo, no caso de os concursos ficarem desertos, vão chegar à conclusão de que as pessoas não têm qualidade técnica. Portanto, o Sr. Deputado está a criticar em nós aquilo que defende?! Já para não falar do anteprojecto que, entretanto, alterou à pressa.
Mas se quer falar de notícias de jornais, então, falemos de notícias de jornais para mostrar aquilo que consideramos uma vergonha. O que consideramos uma vergonha, vindo de quem vem, é este título de jornal: "Sócrates bate Santana"?! - tendo em conta aquilo que os senhores disseram do Dr. Santana Lopes neste Plenário, há tão pouco tempo.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - 12,7 nomeações ao dia!
O senhor recorda-se do que, nomeadamente o Eng.º José Sócrates disse, desde a vossa bancada e fora do Plenário, em campanha eleitoral? Sabe o que é uma vergonha? São as indemnizações milionárias que estão a pagar a gente vossa para empresas públicas.
Repare neste outro título de jornal: "Meio milhão de euros, por exemplo, só para as Águas de Portugal"! Isto, sim, é uma vergonha! É um desperdício do erário público, Sr. Deputado!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Pessoas, que foram nomeadas por razão técnica, classificadas, e que os senhores despedem, pagando indemnizações exorbitantes para admitirem gente vossa, em razão do vosso cartão! Isto, sim, é que é uma vergonha Sr. Deputado!
Sabe o que é que é mais uma vergonha? É, de cada vez que a comunicação social…

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se. Tem de terminar.

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1385 | I Série - Número 033 | 24 de Junho de 2005

 

O Orador: - Termino, Sr. Presidente, dizendo que uma vergonha é cada vez que a comunicação social noticia que Governo não cumpriu regra que quer impor na Administração Pública. Isto, sim, é uma vergonha..., já para não falar nas tais secretárias que tanto foram criticadas, exactamente no gabinete do primeiro-ministro cessante que acabei de citar... E termino, em beleza...

Risos.

... - acho eu -… com as manifestações de indignação dos vossos dirigentes federativos na parte em que criticam ministros da República porque não nomeiam de acordo com as indicações que a estrutura do PS entende que serve melhor o partido. Isso, sim, é uma vergonha, Sr. Deputado!!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr. Deputado, o seu tempo está largamente ultrapassado, tem mesmo de concluir.

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para dar explicações, querendo, tem a palavra o Sr. Deputado António Gameiro.

O Sr. António Gameiro (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo, não tenho por hábito citar pessoas - e tenho de pedir desculpa à Câmara por isso -, não gosto de citar…

Vozes do CDS-PP: - E às pessoas!

O Orador: - E às pessoas, exactamente.
De qualquer maneira, vou responder-lhe no mesmo tom em que fez a sua intervenção, dizendo-lhe, em primeiro lugar, que não vou citar, mas vou fazer chegar-lhe os despachos de nomeação assim que terminar o debate.
Depois, quero perguntar-lhe se foi público ou não que os assessores de imprensa do Dr. Paulo Portas ganhavam mais do que o Primeiro-Ministro: foi público ou não?

Vozes do CDS-PP: - Foi, é verdade!

O Orador: - Portanto, bastava este exemplo.
Mas eu não gostava que fizéssemos um debate acerca da lei dos cargos dirigentes, falando dos Membros do Governo. Não gostava, realmente, e só fui a esse campo porque o Sr. Deputado fez essa referência na sua intervenção, tal como o Deputado Luís Montenegro.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Não foi para os regimes de aposentação, senão, aí é que ia ver!

O Orador: - De qualquer maneira, aquilo que ficou patente neste debate foi que os senhores não têm qualquer ideia sobre este assunto. O PSD alheou-se da discussão, com uma intervenção vaga e abstracta sobre aquilo que gostariam de ter feito quando estiveram no governo, mas não fizeram. Tivessem-no feito!
Os Srs. Deputados do CDS-PP fizeram uma intervenção falando de tudo menos do diploma que estamos aqui a discutir. E o que eu gostava era que os senhores contraditassem esta ideia, que é fulcral! Os senhores, entre 1996 e 2001, diziam que não queriam concursos, porque eles eram burocráticos e paralisantes, mas hoje defendem-nos! Isto é que não é compreensível, porque nessa altura, entre 1995 e 2001, o PS assumiu uma atitude progressista de trazer, pela primeira vez, uma medida inovadora para a Administração Pública que credibilizava e dignificava a função de dirigente, e evoluímos para um procedimento concursal que, mantendo esses princípios, é célere e permite ao Governo nomear os dirigentes de que precisa para executar as suas políticas. E sobre esta matéria, a matéria de fundo e substancial, os senhores disseram zero, nada de novo trouxeram a este debate, e é pena que se refugiem nesse tipo de argumentos!

Aplausos do PS.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): - Nós mudamos, os senhores evoluem!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Que vergonha!

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente António Filipe.

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1386 | I Série - Número 033 | 24 de Junho de 2005

 

O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado António Montalvão Machado.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Gameiro, devo dizer-lhe que ouvi com atenção a sua intervenção e que ela me deixou um pouco perplexo.
V. Ex.ª utilizou várias vezes as expressões "é preciso ter vergonha", "foi uma falta de vergonha", "deveriam ter vergonha" e devo dizer-lhe que essa é uma linguagem que nós consideramos imprópria e, além disso, falsa. É falsa porque aqui ficou demonstrado, não pelo recurso à comunicação social mas, sim, ao Diário da República,…

O Sr. António Gameiro (PS): - Também tenho o Diário da República!

O Orador: - … que este Governo, em três meses, cometeu o despautério de nomear 200 dirigentes, sem a mais pequena espécie de justificação, sem a mais pequena espécie de urgência. Poderá dizer-se mesmo que quando esta lei entrar em vigor já estaremos perante uma autêntica inutilidade superveniente da lide, ou seja, que quando ela entrar em vigor já não tem destinatários, porque estão todos nomeados.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Isto, sim, é que é escandaloso!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - É uma vergonha!

O Orador: - E falar aqui em nomes, como V. Ex.ª fez, citando nomes completos de pessoas?… Fez bem em emendar a mão, até porque não é esse o seu estilo! Tenho trabalhado com V. Ex.ª na 1.ª Comissão e percebi que tem um estilo de prudência e de serenidade, que aqui não exibiu!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): - É verdade, é surpreendente!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - É um arruaceiro!

O Orador: - Mas o que ainda é mais impróprio, se me permite, Sr. Deputado, é que à falta de argumentação, à falta de razoabilidade, à falta de fundamentação da vossa proposta, V. Ex.ª vá aquela Tribuna tentar lançar a intriga entre um candidato independente a uma câmara municipal e o Presidente do Partido Social-Democrata! Isso demonstra a sua falta de razoabilidade, a sua falta de argumentação!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - A falta de nível!

O Orador: - E até queria perguntar-lhe, Sr. Deputado, já que V. Ex.ª, considerou que, afinal, a lei de 2004 - são palavras suas - "é uma boa base de trabalho", se porventura se recorda de qual foi o sentido de voto do Partido Socialista relativamente a essa lei.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): - Não foi há muito tempo!

Vozes do CDS-PP: - Muito bem, "evoluíram"...!

O Sr. Presidente (António Filipe): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Gameiro.

O Sr. António Gameiro (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Montalvão Machado, é com muita honra que lhe digo que evoluímos, portanto, não temos qualquer problema em admiti-lo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Depende da evolução!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Isso é o que nós esperamos!

O Orador: - Mas, se VV. Ex.as não têm honra e orgulho em evoluir, tenho muita pena; eu tenho e penso que o PS também tem. É com a evolução e o progresso que construiremos um Portugal melhor…

Vozes do PS: - Muito bem!

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O Orador: - … e não com críticas laterais, que são completamente despiciendas, neste debate.
Gostava de dizer-lhe que também tenho os despachos do Diário da República que V. Ex.ª refere.
Então, o senhor pensa que o despacho de nomeação, porque há um lugar vago, de um técnico para Chefe da Divisão de Gestão Financeira e Controlo Orçamental da Direcção Regional de Agricultura do Alentejo, com efeitos a 10 de Janeiro (a nomeação é de 19 de Abril, mas o despacho do Sr. Director Regional Luís Telo Rasquilha de Abreu é datado de 7 de Março,…

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - São 200!

O Orador: - … data anterior à tomada de posse do Governo), pode ser contabilizado para este efeito?

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Outra vez?!

O Orador: - Pensa que um despacho de 7 de Março pode ser contabilizado para este efeito?!

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - É menos um!

O Orador: - É que desses 200 despachos, mais de duas dezenas têm data anterior à da tomada de posse do Governo do PS!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Tenho aqui tantos nomes!

O Orador: - Por outro lado, havia um conjunto de lugares vagos na Administração Pública porque as pessoas tiveram a honra de demitir-se ou pensaram que deveriam fazê-lo.
Eu também fiz o mesmo. Dou o meu testemunho pessoal já que, enquanto Subinspector-Geral da Administração Pública, e demiti no dia 2 de Abril, data da tomada de posse do Sr. Secretário de Estado do vosso Governo, porque pensei que deveria ser outro a executar aquela medida. Por isso, tenho legitimidade para hoje, aqui, defender à exaustão estas medidas, porque são dignas e trazem transparência e mais-valia à discussão que aqui estamos a fazer, mas, sobretudo, à vida da Administração Pública, que é o que mais importa.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - A vossa atitude só revela falta de independência no exercício da função!

O Orador: - Sr. Deputado, gostaria ainda de dizer-lhe que no seu partido é que há intriga, porque não li declarações de ninguém do meu partido mas, sim, do seu e quanto isso não posso fazer nada. É verdade, está escrito e é público, portanto, nada tenho a dizer.

O Sr. Presidente (António Filipe): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes.

O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O tema que discutimos aqui, hoje, é, no entender de Os Verdes, da maior importância.
É da maior importância porque Portugal precisa, para vencer as dificuldades do presente e os desafios do futuro, sem abdicar das conquistas de direitos sociais e dos progressos civilizacionais, de uma Administração Pública forte, competente, isenta, estável e motivada, para que o Estado possa cumprir cabalmente os objectivos programáticos, aos mais diferentes níveis, que a nossa Constituição nobremente lhe confiou.
E essa Administração Pública competente, estável e motivada implica, necessariamente, um regime de acesso às suas carreiras e cargos justo, transparente, tão célere quanto possível, sem prejudicar as garantias dos que concorrem a esses lugares, e guiado pela busca dos mais competentes para os lugares certos. Tal desiderato deve ser perseguido, na maior extensão possível, através de concursos públicos que permitam seleccionar os mais bem preparados e com mais experiência, em suma, aqueles que serão mais capazes de melhor servir o interesse público, independentemente do seu género, orientação sexual,…

Vozes do CDS-PP: - Orientação sexual?

O Orador: - … raça, credo religioso, clube desportivo, lobbie, congregação secretista ou partido político.
Num momento em que o Governo exige contenção, sempre mais a uns do que outros, sempre mais aos mesmos; num momento em que a função pública, em geral, e os chamados corpos especiais, em particular, sofrem o mais desavergonhado ataque aos seus direitos adquiridos e legitimamente consolidados durante anos de dedicação e entrega à causa pública, sem qualquer reconhecimento por parte do executivo; num momento em que a real ameaça de aumento de desemprego paira sobre os portugueses e em que continua de pé a promessa do Governo do PS de extinguir 75 000 postos de trabalho na função pública, Os Verdes

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afirmam que são totalmente favoráveis a todas as medidas que visem moralizar e dignificar o acesso aos mais altos cargos da Administração Pública, os cargos dirigentes.
É, aliás, caricato que sejam precisamente os partidos que ficarão na História do regime democrático do pós-25 de Abril como os introdutores da moda dos "jobs for the boys" que vêm, depois, defender que "é preciso emagrecer o Estado e reduzir o seu peso enquanto empregador".
É também caricato ver, hoje, o PSD e o CDS-PP a criticarem o PS por ter a mesma conduta que eles próprios tiveram quando estavam no governo.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Muito bem!

O Orador: - Não que a crítica não assente ao PS, pois, infelizmente, nesta matéria, o Governo prometeu muito, mas, mais uma vez, não está a cumprir com o que prometeu. Começou este mandato apresentando um Governo com menos ministros do que os anteriores, tendo ainda prometido então, de acordo com o seu programa eleitoral, "Acordar a nível parlamentar na definição dos cargos dirigentes de nomeação e sua vinculação ou autonomia em relação às mudanças eleitorais". E ao longo destas semanas, desde que tiveram lugar as rondas realizadas por todos os partidos com assento parlamentar, bem se esforçou o Governo para, na comunicação social, tentar passar a ideia de que a proposta apresentada reunia o consenso de todas as bancadas.
Mas a verdade é outra, Srs. Deputados: se, de facto, esta proposta repõe de forma correcta a situação de recrutamento por concurso para as chefias intermédias - os directores de serviço e chefes de divisão - e se corrige ainda a gravosa situação referente às chorudas indemnizações costumeiras na famosa "dança das cadeiras" sempre que há eleições, a verdade é que o diploma que o Governo nos apresentou, afinal, vem defraudar por completo as expectativas criadas, pecando por falta de extensão e de visão relativamente ao que deve ser uma Administração Pública moderna, isenta, rigorosa e eficaz.
Infelizmente, não é ainda com esta proposta de lei que se irão moralizar as admissões realizadas através de nomeação política. É que o diploma apresentado não deixa qualquer margem para dúvidas, pois, logo na primeira alteração proposta para o artigo n.º 1 da Lei n.º 2/2004 se cria toda uma panóplia de regimes de excepção que, pela sua extensão e pela grandeza de números que implicam, tornam a excepção em regra e a regra em excepção, desvirtuando por completo as boas intenções anunciadas.
O Governo PS pretende, assim, fazer um truque de ilusionismo, faz desaparecer umas nomeações políticas de um lado para logo a seguir as fazer reaparecer noutro lado. Mas se de facto ainda houvesse dúvidas relativamente às intenções do Governo bastaria olhar o quadro total abarcando não só a proposta de lei mas aquela que tem sido a sua conduta desde que tomou posse.
Com efeito, como foi bastamente noticiado na comunicação social, o Governo Sócrates já nomeou 1100 pessoas para cargos públicos em dois meses e meio, a uma média de 12,7 nomeações por dia, das quais mais de 800 para gabinetes ministeriais, não se deixando, assim, ficar atrás dos dois anteriores governos da direita, demonstrando mais uma vez que é mais aquilo que os une do que aquilo que os separa.
O Sr. Primeiro-Ministro, inclusivamente, preocupado em dar o exemplo, foi nesta matéria anunciado como o vencedor e recordista, com a melhor marca pessoal desta Legislatura, com 47 colaboradores directos.
Bem pode o Governo dizer que todas as nomeações foram de confiança política e que estão dentro da lei. Mal seria que o Governo tivesse violado frontalmente a lei, é absolutamente normal e desmerecedor de quaisquer encómios que o Governo cumpra a lei. O que aqui está em causa é precisamente a lei e a situação que actualmente existe, manifestamente iníqua nesta matéria, e saber se as alterações agora propostas vêm corrigir esta situação ou não. E a nossa resposta, infelizmente, Srs. Deputados é que não vem. Fica claramente aquém do que se impunha, demonstrando uma postura politicamente fraca e pouco frontal.
E isto é tão mais grave quanto é sabido que não basta fazer leis recheadas de boas intenções se depois, como já se assistiu anteriormente, se vier com futura legislação avulsa, designadamente com as leis orgânicas dos entes da Administração Pública, a introduzir distorções e contornos aos poucos bons princípios enunciados, permitindo a entrada franca pela "porta do cavalo" a todos os boys que deixarão de entrar pela porta da frente.
Ou seja, importaria que o Governo, na sua actuação, aplicasse na prática os bons princípios que teoricamente defende, o que, com a postura que tem adoptado nesta matéria até este momento, quer do ponto de vista legislativo, quer do ponto de vista da sua actuação, já demonstrou não estar empenhado em fazer.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Muito bem!

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Manuel Alegre.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem agora a palavra o Sr. Secretário de Estado da Administração Pública.

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O Sr. Secretário de Estado da Administração Pública (João Figueiredo): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Sendo esta a primeira vez que tomo a palavra perante a Assembleia da República reunida em Plenário, devo dizer o quanto honrado me sinto por poder fazê-lo diante dos representantes do povo português numa atitude de completa disponibilidade para apresentar as razões que fundamentam as iniciativas do Governo no âmbito da Administração Pública e prestar os esclarecimentos que me forem solicitados nesta sessão e em qualquer circunstância futura.
Por isso, permita-me também, Sr. Presidente, nesta sessão que tanto significado tem para mim, que dirija uma especial saudação a V. Ex.ª e a todas e todos os Srs. Deputados presentes.
Não me tendo sido formulada qualquer pergunta directamente, gostaria, no entanto, de utilizar o tempo que resta ao Governo para fazer alguns comentários ou observações relativamente às intervenções aqui feitas, que segui atentamente.
A alteração do estatuto do pessoal dirigente da Administração Pública é, de facto, uma das medidas mais marcantes da política do Governo relativamente à Administração Pública. Mas as medidas que o Governo pretende tomar relativamente à Administração Pública, contrariamente ao que tem sido voz mais corrente, não se restringem às relacionadas com a função pública; também haverá medidas, que serão do vosso conhecimento futuro, relativas à estruturação da própria Administração e às questões estruturais de gestão e de procedimentos.
A presente proposta significa, de facto, uma ruptura, uma ruptura relativamente ao regime actualmente existente, mas também relativamente à prática que o regime permitiu, na medida em que se faz um esforço no sentido de separar os cargos que estão vinculados aos ciclos de vida governamental dos cargos que o não estão e, por essa via, criar uma dinâmica de progressiva despolitização de muitos níveis da Administração Pública.
E devo dizer, Srs. Deputados, que, num breve bosquejo pelas experiências que no plano internacional se verificam nesta área, o projecto que apresentamos perante VV. Ex.as está sintonizado com os grandes movimentos de reforma das administrações públicas mais avançadas do mundo.
Permitam-me, Srs. Deputados, que destaque alguns outros aspectos que não foram abordados nas vossas intervenções ou que tendo sido não o foram com o rigor que considero necessário; refiro-me, especialmente, à questão das excepções.
É óbvio que este diploma, ou esta iniciativa legislativa, não poderia aplicar-se a todas as realidades da Administração Pública, porque é manifesto que há certas realidades da Administração Pública que escapam à lógica da nomeação.
Em primeiro lugar, certamente que os Srs. Deputados não gostariam de ver a lógica da nomeação, por exemplo, no sistema de ensino, tal como a mesma lógica, subjacente neste diploma, não poderia aplicar-se às Forças de Segurança, às Forças Armadas ou ao aparelho diplomático.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Então e a saúde?

O Orador: - Todas essas realidades administrativas exigem, necessariamente, regimes específicos, e regimes específicos que têm uma forte tradição na nossa Administração.
Mas gostaria de dizer que o presente diploma clarifica e reforça as competências dos dirigentes, e esse é um aspecto que dignifica o exercício das funções dirigentes porque ainda não tinham sido fixadas de maneira clara as competências próprias dos dirigentes, sobretudo dos intermédios.
O projecto de diploma clarifica também - e isso é bom para o exercício e para a dignificação de funções dirigentes - o regime de exclusividade, de acumulação de funções, de incompatibilidades, de impedimentos e de inibições, e o facto de o fazer de uma maneira disciplinada contribui para o prestígio do exercício das funções dirigentes.
Refira-se também que o procedimento concursal que conseguimos conceber e construir parece-nos ser um equilíbrio adequado entre preocupações de garantias de celeridade e de transparência. E na transparência refiram-se os mecanismos de publicitação, a forma como deve ser constituído o júri e - permito-me sublinhá-lo - o facto de o procedimento concursal terminar com entrevistas públicas e não privadas.
Finalmente, outra forma de contribuir para o prestígio do exercício de funções dirigentes da Administração Pública está nas restrições que foram introduzidas às situações que permitem aos titulares de cargos políticos darem por findas as comissões de serviço. Foram restringidas essas situações, o que só contribui para a autonomia, para a independência e para o prestígio do exercício de funções dirigentes na Administração Pública.
Foram estas as questões que me pareceram relevantes destacar nesta intervenção, para além de outros aspectos que não foram aqui abordados, designadamente o alargamento das soluções relacionadas com a formação dos dirigentes e que, na minha opinião, vão de encontro a algumas críticas anteriormente formuladas.
Várias bancadas abordaram aqui a problemática das nomeações feitas pelo Governo. Penso que a questão merece uma atenção e uma abordagem serena. E se quisermos fazer uma abordagem das nomeações feitas pelo Governo permitam-me os Srs. Deputados que diga, em primeiro lugar, que estaremos de acordo que não falece legitimidade ao Governo em fazer nomeações para os seus gabinetes - não é isso que está em causa.

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Penso que os Srs. Deputados também estarão de acordo que não falece legitimidade ao Governo, face ao regime actual e ao futuro regime, para nomear para os cargos superiores da Administração Pública.
Então onde é que pode falecer legitimidade ao Governo para fazer nomeações? Aos cargos intermédios - certamente responderão. Mas, quanto aos cargos intermédios, estaremos todos de acordo, não basta vermos os artigos publicados na comunicação social, é preciso dar atenção ao Diário da República. Mas, Srs. Deputados, também não basta fazer uma leitura rápida ao Diário da República, é preciso ler atentamente as disposições normativas que cada despacho de nomeação invoca. E muitas vezes não basta isso, é preciso ler atentamente os currículos anexos aos despachos de nomeação.
Para além disso, Srs. Deputados, muitas vezes não basta ler o Diário da República, é preciso consultar a bolsa de emprego público para se saber quando se iniciou o procedimento, e só na sequência de todos estes passos se pode fazer a avaliação de uma nomeação. E por isso não receio fazer a análise das nomeações, uma a uma, que foram feitas para cargos intermédios, sabendo logo à partida que essas nomeações não são da competência do Governo, mas, sim, da dos dirigentes máximos da Administração. Repito, não receio fazer a análise dessas nomeações, uma a uma, com estes cuidados.
Gostaria de concluir dizendo que, com esta medida, o Governo pretende atingir um objectivo fundamental, que é o de promover a dignificação do exercício de funções dirigentes da Administração Pública.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Muito obrigado, Sr. Secretário de Estado, pelas suas saudações.
Para encerrar o debate, tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, Srs. Deputados, para encerrar o debate, permitam-me que refira três questões políticas que foram colocadas no debate e que devem ser totalmente esclarecidas.
A primeira questão política é relativa ao tipo de informação que usamos. Verificámos aqui a utilização de vários dados que são factualmente falsos e gostaria de repisá-los: é falsa a informação relativa a uma suposta nomeação para uma empresa pública, que nunca foi feita. A anedótica referência à existência de 17 secretárias pessoais do Sr. Primeiro-Ministro também é falsa. O Sr. Primeiro-Ministro tem 3 secretárias pessoais, o que, comparado com anteriores primeiros-ministros, é de uma sobriedade absolutamente franciscana…!
Para além disto, a utilização intencionalmente manipulatória do fantástico número de 13 nomeações por dia não tem em conta que esse número baralha realidades completamente diferentes. Não há governo algum que funcione sem gabinetes. O que aconteceu foi uma redução da dimensão dos gabinetes, em primeiro lugar, porque este Governo tem menos três ministros, menos dois ministérios, menos três secretários de Estado, não tem secretarias de Estado deslocalizadas, nenhum dos três ministros de Estado tem gabinetes próprios, o que representou imediatamente uma poupança de milhões de euros ao erário público. Esta é que é a realidade dos factos!

Aplausos do PS.

Quanto à suposta comparação entre as mais de 1000 nomeações feitas nos três primeiros meses pelo governo Santana Lopes, que comparariam com umas nomeações superiores a algumas dezenas com o Governo José Sócrates,…

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Dezenas?!

O Orador: - … o que é de espantar nesse número é que o governo Santana Lopes, cuja maioria dos ministros transitava do governo anterior, mesmo assim tivesse feito novas mil nomeações logo nos três primeiros meses.

Aplausos do PS.

E nós sabemos bem a qualidade dessas nomeações! E nós sabemos bem a inexistência de quaisquer limites aos vencimentos. Esta é uma proposta feita agora, sobre a qual não ouvi ninguém pronunciar-se.

O Sr. António Gameiro (PS): - Muito bem!

O Orador: - O que é que pensam as bancadas da oposição da proposta agora apresentada pelo Governo, segundo a qual nenhum membro de gabinete, mesmo que prefira o vencimento de origem, deve receber mais do que o Primeiro-Ministro? Estão de acordo, ou não?

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Protestos do PSD.

Se estiverem de acordo contradizem a vossa política, mas é uma evolução positiva que deve ser saudada.

Aplausos do PS.

Sobre a autovinculação do Governo, o Governo procedeu como disse nas rondas parlamentares que iria proceder.
O Governo podia utilizar a lei actual. Não o faz porquê? Porque a lei actual tem uma margem de discricionariedade tal que torna a mudança da estrutura dirigente da Administração Pública possível por simples decisão de cada governo. Ora, nós concordamos com isso. Portanto, o que fizemos não foi infringir a lei actual, mas onde a lei actual permite o "mais" também permite o "menos".

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Faça favor de concluir, Sr. Deputado.

O Orador: - Foi esse "menos" que nós aplicámos. Dissemos que só se devia proceder à nomeação dos cargos de dirigentes máximos. É esta a nossa política e é isso que temos cumprido.

Aplausos do PS.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, gostaria de, por intermédio de V. Ex.ª, se assim o entender, lembrar ao Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares que, por força de lei, a mudança de governo implica que os membros dos gabinetes sejam exonerados e de novo nomeados. É uma questão de seriedade no debate, que fica bem a quem representa o Governo neste Parlamento.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentes, recordo que esta é a hora regimental das votações e por isso não vou permitir que esta discussão se alargue por muito mais tempo.
Tem a palavra, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, usando a mesma figura regimental, gostaria de dizer ao Sr. Deputado Nuno Melo que o mesmo raciocínio que fez agora deveria fazê-lo aplicando-o à sua intervenção. Lembro-lhe também que o número de membros de gabinete não excede, à luz da lei, os 800. E, repito, num mesmo governo de coligação, quando o Primeiro-Ministro mudou, procedeu logo, nos primeiros dois meses, a mais 200 nomeações!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Os Srs. Deputados não estão a facilitar os trabalhos à Mesa.
Para uma intervenção, dispondo de 48 segundos, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Machado.

O Sr. Jorge Machado (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, é só para dizer que há, efectivamente, uma excepção àquela regra de os vencimentos não ultrapassarem o do Sr. Primeiro-Ministro, prevista no n.º 4 do artigo 31.º, que refere que os dirigentes da direcção intermédia que não tenham vínculo à Administração Pública podem ter vencimento acima do Primeiro-Ministro.
Para terminar, uma vez que tenho pouco tempo, devo dizer que esta Câmara assistiu a um autêntico jogo de pinguepongue. Um atira com 3500 € e o outro responde: "Não, não! São 4000 €"; depois, um diz: "Foram 17 nomeações por minuto" e o outro diz "Foram 14 nomeações por minuto"; um atira com a Galp e outras empresas públicas e o outro com as Águas de Portugal!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Ora, aquilo que verificamos nesta Assembleia - e o povo português está a ouvir e comprova-o facilmente - é que, em relação a esta questão, são todos "farinha do mesmo saco". Isto é, competem em relação a quem nomeia mais e quem recebe mais, mas não limitam essas nomeações a sério, como deveriam fazê-lo!

Aplausos do PCP.

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1392 | I Série - Número 033 | 24 de Junho de 2005

 

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, vamos entrar no período regimental de votações.
Antes de mais, vamos proceder à verificação do quórum, utilizando o cartão electrónico.

Pausa.

Srs. Deputados, o quadro electrónico regista 133 presenças, pelo que temos quórum para proceder às votações.
Em primeiro lugar, dou a palavra ao Sr. Secretário para proceder à leitura do voto n.º 16/X - De pesar pelo falecimento do Dr. Mário Corino de Andrade.
Tem a palavra, Sr. Secretário.

O Sr. Secretário (Fernando Santos Pereira): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o voto é do seguinte teor:

Poucos dias após ter completado 99 anos de idade, faleceu, no passado dia 16 de Junho, o Dr. Mário Corino de Andrade, um dos maiores vultos da ciência em Portugal.
Homem de inteligência notável, investigador perseverante, mas também neurologista emérito, o Dr. Corino de Andrade constituiu um alto exemplo de devoção humana e de coragem cívica.
Nascido no Alentejo, a 10 de Junho de 1906, o Dr. Corino de Andrade, após a licenciatura em Medicina e Cirurgia, trabalhou no Laboratório de Neuropatologia da Faculdade de Medicina de Estrasburgo - onde obteve o Prémio Déjerine -, regressando a Portugal no final dos anos 30 e radicando-se desde então na cidade do Porto.
Neurologista no Hospital de Santo António a partir de 1938, o Dr. Corino de Andrade fundou e dirigiu o serviço de neurologia daquele estabelecimento hospitalar, tendo-se distinguido ainda como professor de Biomédicas, ao formar, ao longo de décadas, gerações de médicos e cientistas portugueses.
Esteve na origem da fundação do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar, espaço de convivência de ciências que contribuiu notavelmente para o prestígio científico da academia nacional e, em particular, da Universidade do Porto.
A sua capacidade de observação permitiu-lhe descobrir em 1939 "algo de novo" numa doente que tinha uma história clínica que não se enquadrava em nada do que se conhecia e estava descrito até aí. Publicou o resumo das suas investigações em 1954 na revista científica Brain.
As suas descobertas enquanto cientista, em particular a da identificação da polineuropatia amiloidótica familiar (PAF), doença genética mais conhecida como paramiloidose, doença dos pezinhos ou mesmo doença de Andrade, não resultaram somente de um natural desejo do cientista: conhecer mais os mistérios do ser.
Essas descobertas foram despertadas pela angústia que a um espírito genial causou o sofrimento humano.
Corino de Andrade notabiliza-se ao tipificar cientificamente a paramiloidose, apercebendo-se também de que essa grave doença neurológica tem transmissão familiar e que, por infeliz circunstância, acompanha, de um modo geral, o movimento geográfico da diáspora lusitana.
Veio a trabalhar mais tarde, na sequência de deslocação aos Açores, numa outra doença neurológica - a doença de Machado Joseph.
Desenvolveu actividade política de oposição ao Estado Novo, integrando um grupo de cientistas do Porto, encabeçado pelo Prof. Abel Salazar, que intervinha civicamente, o que lhe valeu a perseguição da polícia política do regime.
Costumava dizer, aliás, que tinha vivido os tempos da I e da II Grandes Guerras, tinha escapado ao nazismo, mas não tinha escapado à polícia política. Tirara, no entanto, muito proveitos da prisão, porque os meses que lá passara serviram-lhe para muita informação e muita reflexão.
Durante a sua vida, foi distinguido com o Grau de Grande Oficial da Ordem Militar de Santiago de Espada (1979), a Grã-Cruz da Ordem de Mérito (1990), o Grande Prémio da Fundação Oriente de Ciência e o Prémio Excelência de uma Vida e Obra da Fundação Glaxo Wellcome.
A relevância e o prestígio do seu nome deram origem à criação, pela Secção Regional do Norte da Ordem dos Médicos, de um prémio destinado a distinguir instituições ou personalidades não médicas que tenham prestado serviços de grande relevância à Medicina.
Corino de Andrade é de há muito uma indiscutível referência para a comunidade científica mundial.
Importa que seja, também, para os portugueses, o exemplo do muito que a inteligência nacional pode dar para o progresso e elevação da humanidade.
Daí a homenagem que esta Câmara presta ao grande português que foi Mário Corino de Andrade.
À sua família e à Universidade do Porto, a Assembleia da República apresenta as sentidas condolências.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Gostaria de informar a Câmara que o voto n.º 16/X, que resultou de uma síntese de dois votos, um apresentado pelo PS e outro pelo PSD, é subscrito por todos os grupos parlamentares, a que se junta, evidentemente, a Mesa.
Vamos votá-lo.

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Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, vamos guardar 1 minuto de silêncio.

A Câmara guardou, de pé, 1 minuto de silêncio.

O voto será enviado à respectiva família.
Srs. Deputados, vamos agora votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 4/X - Estabelece o regime de mera gestão dos órgãos autárquicos (no período entre as eleições e a instalação dos novos órgãos) (PSD).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O diploma baixa à 7.ª Comissão.
Srs. Deputados, vamos votar, também na generalidade, o projecto de lei n.º 117/X - Estabelece o regime de gestão limitada dos órgãos das autarquias locais e seus titulares (PS).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD, do PCP, do BE e de Os Verdes e a abstenção do CDS-PP.

O diploma baixa, igualmente, à 7.ª Comissão.
Vamos agora votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 101/X - Décima quinta alteração ao regime jurídico da eleição do Presidente da República (PS). Trata-se de uma lei orgânica, pelo que, na votação na generalidade, basta a maioria simples mas, na votação na especialidade, necessitará de dois terços dos votos.
Vamos, então, votar na generalidade.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O diploma baixa à 1.ª Comissão.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, é para requerer à Mesa que fique acertado em Plenário que tanto o projecto de lei n.º 101/X como os projectos de lei n.os 4/X e 117/X, dada a óbvia urgência, por força dos calendários eleitorais que temos pela frente, baixam às comissões que o Sr. Presidente anunciou por 15 dias, para poderem ser votados antes do encerramento, para férias, da Assembleia.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Alguma bancada parlamentar se opõe a que assim se proceda?

Pausa.

Como não há oposição, assim se fará.
Srs. Deputados, passamos à votação, na generalidade, da proposta de lei n.º 6/X - Estabelece regras para as nomeações dos altos cargos da Administração Pública.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS e do BE e votos contra do PSD, do PCP, do CDS-PP e de Os Verdes.

O diploma baixa à 1.ª Comissão.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Sr. Presidente, peço a palavra para anunciar que o Grupo Parlamentar do CDS-PP vai apresentar na Mesa uma declaração de voto escrita.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Com certeza, Sr. Deputado.
Vamos votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 32/X - Altera o Estatuto do Pessoal Dirigente dos Serviços e Organismos da Administração Central, Regional e Local do Estado, aprovado pela Lei n.º 2/2004, de 15 de Janeiro (BE).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes e votos contra do PSD e do CDS-PP.

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O diploma baixa, igualmente, à 1.ª Comissão.
Srs. Deputados, vamos votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 78/X - Estabelece normas sobre cessação da relação pública de emprego de cargos dirigentes (CDS-PP).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD e do BE, votos a favor do CDS-PP e abstenções do PCP e de Os Verdes.

Srs. Deputados, passamos à votação final global do texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, sobre a proposta de lei n.º 9/X - Segunda alteração, por apreciação parlamentar, do Decreto-Lei n.º 44/2004, de 3 de Março, que estabelece um regime especial de registo de prédios situados nos municípios do Corvo, de Lajes das Flores e de Santa Cruz das Flores, bem como dos direitos e ónus ou encargos sobre estes incidentes (ALRAA). Informo que foi solicitada a dispensa da redacção final devido ao processo de urgência.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Sr. Presidente, na leitura que V. Ex.ª fez, e não por culpa sua mas porque, apesar de solicitado, não terá sido corrigido oportunamente, aparece a indicação de que a alteração é "por apreciação parlamentar". Ora, essa expressão é um lapso e tem de ser retirada. Deverá só ficar "Segunda alteração".

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr. Deputado, mas está aqui "Segunda alteração".

O Orador: - Sr. Presidente, mas é evidente que a expressão que se segue, ou seja, "por apreciação parlamentar" foi um lapso, que tem de ser corrigido, com origem na Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Com certeza, Sr. Deputado.
Alguma bancada se opõe?

Pausa.

Como não há objecções, assim se fará.
Srs. Deputados, vamos, então, votar o texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, sobre a proposta de lei n.º 9/X - Segunda alteração do Decreto-Lei n.º 44/2004, de 3 de Março, que estabelece um regime especial de registo de prédios situados nos municípios do Corvo, Lajes das Flores e de Santa Cruz das Flores, bem como dos direitos e ónus ou encargos sobre estes incidentes (ALRAA).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, informo que, em relação a este texto final, foi dispensada a redacção final.
A Sr.ª Secretária vai preceder à leitura de três pareceres da Comissão de Ética.
Faça favor, Sr.ª Secretária.

A Sr.ª Secretária (Maria Carrilho): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo 3.º Juízo do Tribunal Judicial de Ponta Delgada - Processo n.º 343/03.1 - PTPDL, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Ricardo Rodrigues (PS) a prestar depoimento por escrito, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, está em apreciação.

Pausa.

Não havendo objecções, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

A Sr.ª Secretária (Maria Carrilho): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo 1.º Juízo do Tribunal Judicial de Cantanhede - Processo n.º 209/04.8 - TACNT, a Comissão de Ética decidiu

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emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Miguel Pignatelli (PSD) a prestar depoimento por escrito, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, está em apreciação.

Pausa.

Não havendo objecções, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

A Sr.ª Secretária (Maria Carrilho): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social - Gabinete do Auditor Jurídico, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar, ao abrigo do n.º 2 do artigo 11.º do Estatuto dos Deputados, e nos termos pretendidos, a audição, por escrito, do Sr. Deputado Luís Carito (PS), com arguido, no processo disciplinar que contra ele corre naquele Ministério.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.

Pausa.

Não havendo objecções, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, vamos passar à apreciação, na generalidade, da proposta de lei n.º 10/X - Altera o Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, o Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas, o Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado, a Lei Geral Tributária e o Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (João Amaral Tomaz): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Tenho hoje a oportunidade de apresentar um conjunto de propostas legislativas centradas no combate à evasão e à fraude fiscais, na supressão de normas inúteis ou contraproducentes e na correcção de lacunas.
No actual quadro das finanças públicas, a luta contra a fraude e a evasão fiscais é uma verdadeira obrigação pública e por cujos resultados se deve prestar contas.
A fraude causa distorções na actividade desenvolvida pelos diversos operadores económicos, limita a qualidade da prestação de serviços públicos e da dimensão social do Estado e determina o aumento da carga fiscal suportada pelos contribuintes cumpridores.
Estas propostas legislativas no domínio do combate à evasão e à fraude fiscais são uma condição necessária para alcançar resultados positivos.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O combate a este flagelo requer uma actuação permanente, activa e eficaz. As alterações agora propostas para o regime complementar do procedimento da Inspecção Tributária são importantes para a clarificação e reforço dos poderes de actuação da actividade inspectiva, dotando-a de mais meios para o combate à evasão e à fraude.
O Governo não pretende atacar de forma persecutória qualquer sector específico da actividade económica. Pretende, isso sim, impedir e reprimir a actuação de organizações criminosas sem actividade económica, cujo único objectivo é defraudar o fisco através da realização de sofisticadas operações fraudulentas. Este constitui o nível 1 de risco, e é nesta área que deverão desenvolver-se os maiores esforços.
Um segundo nível de risco corresponde ao planeamento fiscal agressivo, fenómeno a que não se tem dado em Portugal a importância que a questão merece em termos de erosão da receita fiscal. A fronteira entre a elisão e a evasão é, na maioria dos casos, muito ténue. Note-se que, mesmo a nível internacional, esta questão não tem tido a devida atenção e só nos últimos anos começaram a surgir nalguns países mais desenvolvidos planos específicos de fiscalização destas situações.
Um terceiro nível tem a ver com os contribuintes que, exercendo actividades económicas, são omissos para efeitos fiscais, não se encontram abrangidos, nem foram detectados pelo sistema e engrossam os números da chamada "economia informal". Aí as atenções devem dirigir-se, particularmente, para os destinatários dessas actividades, estimulando-se os adquirentes dos bens ou serviços prestados a colaborar na alteração das situações desta natureza, designadamente por via da exigência de facturação.
Um quarto nível respeita às empresas que, sistemática e continuadamente, não apresentam lucros tributáveis. As cartas enviadas aos contribuintes, alertando-os para o facto de serem automaticamente

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seleccionados para fiscalização, caso apresentassem prejuízos pelo terceiro ano consecutivo, terão, ao que tudo indica, surtido efeito. As muitas empresas que não ligaram ao aviso serão, obviamente, fiscalizadas.
Por fim, num quinto nível destes fenómenos evasivos situam-se os contribuintes que declaram lucros e volumes de negócios inferiores aos efectivamente obtidos. Nesta área, quer o aprofundamento dos cruzamentos de dados ao nível de diversas autoridades quer a tributação por indicadores objectivos para certas actividades empresariais e profissionais, que se encontra em preparação, podem surtir grandes sucessos.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A proposta de lei que hoje se submete à consideração desta Câmara é uma prioridade governativa essencial.
O que está em causa é rever algumas das alterações recentemente introduzidas no quadro fiscal que carecem de aperfeiçoamento urgente e, em simultâneo, colmatar outro tipo de deficiências susceptíveis de comprometer o rigor e a transparência exigíveis na interpretação e aplicação da lei fiscal, gerando controvérsias indesejáveis entre a administração tributária e os contribuintes.
Do conteúdo da proposta, permito-me destacar alguns aspectos.
Em primeiro lugar, a reintrodução de uma alínea no Código do IRC que, eventualmente por lapso, foi eliminada e que conduz à inexistência da obrigação de imposto quanto aos incrementos patrimoniais resultantes de doações de direitos imobiliários e mobiliários ocorridas em território português.
Em segundo lugar, a eliminação da possibilidade de deferimento tácito do requerimento para obter benefícios relativos à transmissão de prejuízos no âmbito de fusões, cisões e entradas de activos entre empresas.
Em terceiro lugar, o retomar da redacção anterior do n.º 1 do artigo 74.º da Lei Geral Tributária, afastando a expressão que havia sido aditada a esta norma pela Lei do Orçamento de Estado para 2005, por se reconhecer que a inversão do ónus da prova das situações de não sujeição não revelava, na prática, qualquer utilidade na definição da respectiva situação tributária - era também uma fonte injustificada de litígios entre a administração fiscal e os contribuintes.
A este propósito, é de referir a alteração que irá ser proposta, no Orçamento rectificativo, ao Código do Imposto do Selo no sentido de eliminar a actual não sujeição das transmissões gratuitas de valores monetários.
Em quarto lugar, a revisão global e os aperfeiçoamentos sistemáticos que se pretendem introduzir no Regime Complementar do Procedimento da Inspecção Tributária, simplificando e clarificando, de modo a obter quer ganhos acrescidos no universo de direitos e garantias dos contribuintes quer, naturalmente, uma maior eficácia da actuação da administração tributária.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Estima-se que a economia informal gere, em Portugal, um produto superior a 20% do PIB; conhecem-se as dificuldades na arrecadação de receitas em relação a determinados grupos de contribuintes ou de rendimentos; estão diagnosticadas as principais ineficiências da administração fiscal; tem sido lento o desenvolvimento no cruzamento de informações entre as diversas autoridades.
Enfim, a complacência da lei e da organização em relação à fraude e à evasão fiscais é uma realidade inquestionáve1 que urge modificar.
Uma maior moralização no campo fiscal deve ser assumida como um desígnio nacional, para cuja prossecução importa envolver todos os esforços e canalizar todo o empenho. Por isso, o Governo não deixará de registar com apreço e ponderar devidamente todos os contributos válidos que, neste domínio, venham a ser suscitados por VV. Ex.as.

Aplausos do PS.

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente António Filipe.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Victor Baptista.

O Sr. Victor Baptista (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, a fraude e a evasão fiscais provoca distorções na actividade dos operadores económicos e contribui, de alguma forma, para reduzir a dimensão do Estado social. Para que a dimensão do Estado social não seja reduzida o único recurso que existe é a obrigação de um maior esforço por parte daqueles que já pagam os seus impostos.
O combate à evasão e à fraude fiscais é, de alguma forma, condição necessária para que exista justiça fiscal. E, nessa medida, registamos de bom grado o facto de o Governo não atacar persecutoriamente qualquer sector específico da actividade económica. Antes, pelo contrário, tem sido visível que pretende reprimir a actuação de organizações criminosas sem actividade económica, cujo único objectivo tem sido o de defraudar a administração fiscal através da realização de sofisticadas operações fraudulentas.
A presente proposta de lei tem várias vantagens. Desde logo, para além de algum eventual esquecimento, permitam-me destacar a reintrodução, em sede do IRC, da exigência de imposto quando estão em causa aumentos patrimoniais resultantes de doações. Por outro lado, a eliminação da possibilidade de deferimento tácito do requerimento para obter benefícios relativos à transmissão de prejuízos fiscais no âmbito das fusões

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- e sabemos como, nos últimos tempos, têm sido feitas alguma dessas fusões, transmitindo alguns prejuízos para empresas rentáveis, com as consequências evidentes em termos de receitas do próprio Estado.
Nos últimos tempos, o Governo tem vindo a assumir publicamente algumas medidas no combate à evasão e à fraude fiscais, como o controlo da "fraude carrossel", nomeadamente na análise de reembolsos, o que se traduziu na detecção recente de algumas situações envolvendo montantes significativos, e também o reforço da actuação da Polícia Judiciária, designadamente através da vigilância de redes organizadas de "fraude carrossel", utilizando a informação comunitária, detectando a abertura de sociedades e o pedido de reembolso de empresas envolvidas nesta matéria.
Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, que medidas estão, neste momento, a ser preconizadas pelo Governo, para assumir no final deste ano e no próximo, de combate à evasão e à fraude fiscais?

O Sr. Presidente (António Filipe): - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Victor Baptista, o Governo vai apresentar, no âmbito do Orçamento rectificativo, algumas propostas concretas de medidas que, não sendo verdadeiramente de combate à evasão e à fraude fiscais, são de "planeamento fiscal agressivo", designadamente em relação à chamada "lavagem de dividendo".
De qualquer modo, neste momento, a preocupação de curto prazo irá ser tomar medidas activas para evitar que haja uma erosão como ocorreu no passado quando da subida da taxa do IVA, em termos da diminuição da tributação efectiva do IVA, ficando bastante aquém da cobrança potencial.
Nesse sentido, já estamos a efectuar, relativamente ao controlo das chamadas "aquisições intracomunitárias", trabalho directo com a administração espanhola: tivemos uma reunião entre as alfândegas espanhola e portuguesa, na semana passada; vamos ter reuniões com a Direcção-Geral dos Impostos e com a Agência Tributária espanhola, dentro de poucos dias - isto a nível de uma colaboração que é fundamental no combate a determinado tido de situações evasivas. Vamos, ainda, publicitar determinado tipo de situações de fraude que foram detectadas recentemente e que justificam, em parte, por que é que, em 2002, a receita do IVA ficou aquém do potencial. Portanto, detectámos recentemente situações quase impensáveis de sofisticação e que, em grande medida, justificam por que é que, em 2002, não se cobrou tanto como seria desejável.
De qualquer modo, em relação à "fraude carrossel", como alguns Srs. Deputados sabem, há cerca de 15 dias, foi pela primeira vez condenada em Portugal uma organização de "fraude carrossel" a uma pena de prisão efectiva, em que o cabecilha foi condenado a 4 anos de prisão efectiva. Divulgámos esta situação no site da Direcção-Geral dos Impostos, publicitando que existe mais uma série de situações como esta que foram detectadas, em colaboração, pela administração tributária e pela Polícia Judiciária, e que estão, neste momento, em preparação para irem a julgamento em tempo oportuno. No entanto, penso que o facto de o tribunal ter condenado pela primeira vez, em Portugal, os responsáveis por este tipo de fraude dá-nos alguma esperança de que, no futuro, casos similares sejam condenados com a mesma rigidez.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Hugo Velosa.

O Sr. Hugo Velosa (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Sr.as e Srs. Deputados: O Governo apresenta esta proposta de lei no cumprimento da promessa de revogar e alterar três normas dispersas e pontuais que haviam sido introduzidas pelos governos anteriores.
Ora, isto levanta muitas dúvidas, pois, sobre matéria fiscal (e penso que o Sr. Secretário de Estado concordará), as alterações nunca devem ser pontuais mas, sim, resultar de uma completa avaliação dos resultados, do que aconteceu com a introdução dessas normas. Portanto, não nos parece aceitável que o Governo actue por impulso de promessas e, neste caso, desgarradamente. Aliás, o Sr. Secretário de Estado acabou de anunciar que vão ser introduzidas novas normas no Orçamento rectificativo e ainda ontem ouvi a notícia de que também já tinham dado entrada no Parlamento alterações pontuais, em termos fiscais, no âmbito do Código do IVA, o que, com muita sinceridade, nos parece um pouco preocupante.
Não há dúvida de que é público que este Governo encontrou uma máquina fiscal e um combate eficiente à fraude e à evasão fiscais, como nenhum outro - e estou a citar o próprio Sr. Secretário de Estado, que afirmou isso na Comissão de Orçamento e Finanças. O que quer dizer que o Grupo Parlamentar do PSD, em relação aos governos anteriores, está à-vontade nesta matéria, porque o trabalho que fez levou a que este Governo encontrasse uma situação de combate efectivo à fraude e à evasão fiscais.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Portanto, nesta matéria estamos à-vontade.

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No entanto, temos dúvidas sobre a eficácia de medidas desgarradas e dispersas no actual quadro legislativo e no funcionamento da administração fiscal.
Ora, quem lê o objecto desta proposta de lei pode pensar que se trata de uma profunda alteração aos Códigos do IRC, do IRS e do IVA, à Lei Geral Tributária e ao Regime Complementar do Procedimento da Inspecção Tributária. Mas não é assim. O Governo limita-se a promover pequenas alterações e, principalmente, a revogar algumas normas que haviam sido aprovadas na legislatura anterior - ou seja, durante os governos da anterior maioria -, o que contraria, claramente, os objectivos definidos pelo Governo na "Exposição de motivos" da proposta de lei.
O Governo afirma que é prioritária a estabilidade legislativa do quadro fiscal. No entanto, não é isso que parece que vai acontecer face a esta proposta de lei e ao que nos disse o Sr. Secretário de Estado. Estamos de acordo que a estabilidade legislativa do quadro fiscal deve ser prioritária, mas não nos parece que seja assim que ela é assegurada.
Na verdade, a presente proposta de lei não aponta nesse sentido: contém meras alterações dispersas e pouco substanciais que se afastam do objectivo que referi.
A estabilidade legislativa só deve ceder ao princípio da simplificação fiscal - este, sim, um objectivo que o Governo deveria assumir e não assume: uniformizar e corrigir legislação que torne simples e eficaz, para a administração fiscal e para os contribuintes, principalmente os Códigos do IRC, do IRS e do IVA.
Ora, os dois princípios da estabilidade e da simplificação fiscais justificavam que o Governo não apresentasse já alguns aperfeiçoamentos dispersos e procurasse corrigir meras deficiências. Era, naturalmente, preferível que o Governo, em termos de legislação fiscal, não perdesse tempo com pormenores e fizesse a reforma fiscal de fundo que se impõe, em vez do que agora apresenta, ou seja, revogar normas dispersas e isoladas.
É certo que o Governo afirma que vai passar a legislar fora dos Orçamentos. Esta é uma boa notícia, é um óptimo princípio. Mas, Srs. Membros do Governo, trata-se de um desafio difícil que, aquando da discussão dos Orçamentos de Estado, vamos ver se será cumprido ou se, como em tantos outros casos, não passará de uma boa intenção não concretizada ou de uma promessa não cumprida, como outras. Veja-se o que se passou com o aumento do IVA e de outros impostos que aí vêm.
Sinceramente, o que se espera é que, em matéria fiscal, este Governo não comece aos ziguezagues, como aconteceu com os governos do Engenheiro António Guterres.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Isto não quer dizer que o Grupo Parlamentar do PSD não esteja de acordo, por exemplo, com a reintrodução da norma de incidência relativa aos incrementos patrimoniais derivados de aquisições a título gratuito de direitos imobiliários e mobiliários, porque, certamente, como disse o Sr. Secretário de Estado, foi uma norma introduzida no Orçamento de Estado por lapso.
Neste caso, o Governo faz uma boa opção legislativa, que é correcta do ponto de vista dos interesses públicos em sede de IRC e se enquadra melhor nas regras de incidência do imposto.
O mesmo já não podemos dizer da alteração proposta ao artigo 74.º da Lei Geral Tributária. Diz o Governo que se "retoma o princípio de legalidade" ao revogar-se a única situação de inversão do ónus da prova, que é a da não sujeição, que actualmente recai sobre o contribuinte. Entendemos que o actual sistema de inversão constitui uma forma de proteger a administração fiscal e o interesse público, sem pôr em causa direitos do contribuinte, enquadrando-se melhor numa estratégia de combate à fraude e à evasão fiscais. Aliás, na anterior legislatura, só o Partido Socialista votou contra a introdução desta norma.
Em sentido contrário, o Governo quer acabar com o deferimento táctico ao pedido de aplicação do benefício fiscal em sede de transmissão de prejuízos, no âmbito de fusões e cisões de empresas e entradas de activos, em sede de IRC.
Na verdade, a alteração pretendida ofende direitos dos contribuintes, cabendo aqui lembrar que o sistema de deferimento tácito já havia sido introduzido em 2001, durante o último governo do Engenheiro António Guterres. Pelo menos no deferimento tácito, este Governo parece querer marcar a diferença daquele outro.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Compreende-se que o Governo queira alterar e republicar o Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária. É positivo.
É certo que, para além da intenção de clarificar normas e de integrar outras que estão dispersas (o que seria pouco), o Governo procura melhorar as regras de funcionamento dos serviços de inspecção tributária, o que se regista com agrado.
Não estamos perante uma alteração de fundo e substancial. Para além de pequenas alterações normais, outras parecem ser correctas e positivas. Estão neste caso as propostas referentes aos artigos 15.º, 28.º, 29.º e 30.º do RCPIT (Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária).
O que se espera é que esta proposta de lei, repito, não seja a primeira em ziguezagues fiscais.
Aumenta-se o IVA e outros impostos após declarações repetidas de não aumento de impostos. Eis, pois, a dificuldade que sentimos em aceitar esta forma de legislar em matéria fiscal.

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Agora, o Governo quer promover alterações dispersas e de pormenor quando, no seu Programa, relativamente à fiscalidade, prometeu estabilidade, equidade, transparência, simplicidade e eficiência. Convenhamos que não é com esta proposta de lei n.º 10/X que o Governo vai atingir algum destes cinco objectivos. Antes pelo contrário. Temos de esperar, mas os primeiros indícios não são positivos!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Exactamente!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PSD, co-responsável pela actual eficácia da máquina fiscal e do combate à fraude e à evasão fiscais, não vai votar contra esta proposta de lei, até porque, como se disse, embora não se concorde com o método - e que isto fique registado! -, o seu sentido de Estado obriga-o a colaborar em todos os aspectos da legislação fiscal que possam contribuir para melhorar ainda mais aquele combate, e insere-se neste caso, por exemplo, o novo regime em relação à inspecção tributária.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (António Filipe): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Sr.as e Srs. Deputados: O Governo apresenta, através desta proposta de lei, um conjunto de propostas que suscitam, em primeiro lugar, uma interrogação acerca da sua vontade reformadora em matéria de combate à fraude fiscal e, em geral, no que toca à simplificação e ao ganho de eficiência que a administração tributária requer.
É certo que é vantajoso que o discutamos agora e não no âmbito do Orçamento. De há muito tempo a esta parte, sucessivamente, tem-se perdido a oportunidade de fazer estas alterações em sede de discussão específica e tem-se confundido estas matérias com o Orçamento, mas também é certo que ficamos a saber, Sr. Secretário de Estado, que, até ao fim da presente sessão legislativa, não haverá qualquer outra iniciativa do Governo quanto ao que tinha sido prometido no Programa.
O Programa prometia-nos que, nesta matéria, o Governo procuraria apresentar a concretização, em Portugal, das melhores práticas europeias. Ora, não só o Governo já se recusou a fazê-lo em matérias tão sensíveis e tão importantes como a do segredo bancário como não apresenta senão estas quatro medidas cuja importância é significativa, mais num caso do que nos outros. No entanto, como terá de reconhecer, estamos muito longe das melhores práticas europeias, mesmo considerando propostas que o Partido Socialista aqui tinha apresentado enquanto na oposição mas que, agora, não são recuperadas nem desenvolvidas. A seu tempo lá se voltará.
Não há, portanto, uma visão de conjunto. Falta fôlego, falta ousadia, deste ponto de vista.
Aliás, na opinião do Bloco de Esquerda, as quatro medidas são contraditórias entre si. Algumas são necessárias e têm a nossa aprovação e o nosso aplauso, outras são mal defendidas e são paradoxais.
Apoiamos duas delas.
A ideia da redução da extensão das obrigações tributárias era errada. Criticámo-la em relação ao governo anterior, nomeadamente quanto aos incrementos patrimoniais por aquisições a título gratuito. Tem todo o sentido que seja estendida a obrigação tributária também nesses casos. Nenhuma razão justificava que assim não fosse. Desse ponto de vista, esta medida introduzida no Código do IRC é justificável e é necessária.
Em segundo lugar, o fim do deferimento tácito quanto ao regime de transição dos prejuízos resultantes no contexto de fusões ou cisões é também uma boa medida. Qualquer deferimento tácito é sempre errado. É vantajoso que haja ou critérios impostos pela lei ou a obrigação de assumir a responsabilidade administrativa e a responsabilidade política da decisão por órgãos competentes.
Em terceiro lugar, surge, na Lei Geral Tributária, o fim da inversão do ónus da prova. Em contrapartida, esta medida suscita-nos grandes reservas. Não só o Partido Socialista, na altura, se opôs a esta orientação, sem fundamentação suficiente e sem argumentação consistente, como, agora, também essa argumentação não surge.
O Governo diz que, mesmo que haja inversão do ónus da prova, ainda assim, a administração tributária terá de provar a fundamentação do seu processo - é certo que é assim - e argumenta, em segundo lugar, que pode ser uma fonte de litígio, portanto, que pode haver um aumento de litigância em sede tributária por causa desta medida. Também é certo. Não são razões suficientes porque se prevê, obviamente, que a inexistência da obrigação tributária primeira, e, portanto, a inversão do ónus da prova, cria uma cultura de exigência e de transparência da parte do contribuinte numa matéria que é fundamental.
Mas o Governo vai ainda mais longe. Diz que a proposta de lei retoma o princípio da legalidade e que, portanto, a inversão do ónus da prova seria um vício em relação ao princípio da legalidade. Isto é extremamente preocupante, porque pode discutir-se como é que se aplicou e o que é que a experiência concreta nos ensina sobre a aplicação deste princípio. Essa discussão é, naturalmente, bem-vinda. As medidas do combate ao abuso fiscal suscitam outras formas de abuso e a aprendizagem nesse combate é indispensável. Estamos, portanto, disponíveis, Sr. Secretário de Estado, para toda essa discussão.

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Mas se o Sr. Secretário de Estado quer manter a ideia de que qualquer inversão do ónus da prova em si própria vicia o princípio da legalidade, vai impedir-se, em toda e qualquer circunstância, a utilização desse instrumento que é, por si próprio, uma das melhores práticas europeias. Como sabe, em todos os países europeus, utiliza-se, com mais ou menos extensão, a obrigação da responsabilidade directa e primeira do contribuinte em relação, por exemplo, a justificar formas de enriquecimento ou em relação à tributação da propriedade.
Portanto, desse ponto de vista, a justificação do Governo não só é errada como muito perigosa. Quando, um dia, o Governo quiser discutir uma estratégia de combate à fraude fiscal de uma forma mais ampla do que a que agora está preparado para fazer e que não tem aceite fazer, então, teremos este entrave, porque o Governo está errado quanto a isto e quer criar aqui uma "rolha", um bloqueio, que nos impede de utilizar estas boas práticas europeias.
Finalmente, estamos de acordo com as alterações das competências e a clarificação sobre a inspecção tributária, não deixando de sublinhar essa enorme contradição do Governo que, apesar de ter recusado que tivesse havido alterações significativas ao regime do segredo bancário, veio apresentar-nos a proposta de lei que visa adequar a legislação portuguesa à Directiva da Poupança, que entretanto entra em vigor, permitindo, portanto, que, em Portugal, haja dois regimes que são contraditórios do ponto de vista da transparência bancária - um que incide sobre os residentes no território português, que não são abrangidos pela Directiva, e um outro que incide sobre os residentes noutro território fiscal, relativamente aos quais a banca passa a ter uma obrigação automática de prestação de informação. Esta contradição diz tudo sobre a dificuldade do Governo em utilizar estas boas práticas que já conhecemos noutros países europeus, em alguns casos, há dezenas de anos.
Não será agora, mas pode ser que, um dia, o Governo ainda queira discutir como é que essas boas práticas venham a concretizar-se.

O Sr. Presidente (António Filipe): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Venda.

A Sr.ª Teresa Venda (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Sr.as e Srs. Deputados: O Governo vem, ao abrigo das competentes disposições constitucionais, apresentar à Assembleia da Republica uma proposta de lei que visa fundamentalmente corrigir lacunas da lei e introduzir melhorias nas normas da administração e fiscalização tributária centradas no combate à fraude e à evasão.
O combate à fraude e à evasão fiscais é uma prioridade nacional.
A eficiência e a justiça na arrecadação das receitas fiscais são essenciais para incentivar a competitividade da economia portuguesa, reforçar a confiança dos agentes económicos e contribuir para uma justa repartição do rendimento.
Por outro lado, a actual situação das finanças públicas exige que a estratégia de consolidação orçamental tenha necessidade de recorrer a um conjunto de medidas de aumento de receita, de forma a permitir uma trajectória mais rápida do decréscimo do défice.
Assim, o acréscimo da receita em consequência das medidas de combate à evasão e da melhoria da eficácia da máquina fiscal é fundamental para evitar que o aumento da carga fiscal seja suportado pelos contribuintes cumpridores.
Recordo que, no Programa de Estabilidade e Crescimento para 2005-2009, o Governo prevê arrecadar receitas adicionais de 2550 milhões de euros resultantes do combate à evasão e à fraude fiscais. Em 2007 e nos anos seguintes, o acréscimo de receita proveniente desse combate estabilizará em 600 milhões de euros por ano.
São metas ambiciosas mas que consideramos realistas.
É neste contexto que a presente proposta de lei revê substancialmente o Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária.
Introduz melhorias num instrumento essencial para garantir quer a eficácia da actuação dos serviços quer a defesa dos direitos e garantias que assistem aos contribuintes objecto da actividade inspectora: procura a melhor sistematização da acção fiscalizadora; visa incrementar a sua eficiência e eficácia, bem como a segurança do procedimento de inspecção; diminui, assim, a margem de discricionariedade.
A proposta de lei que estamos a apreciar visa, por outro lado, introduzir ajustamentos pontuais mas de relevância significativa em sede de imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas. Destaco, designadamente, o artigo 4.º (Extensão de obrigação de imposto) e o artigo 69.º (Transmissibilidade dos prejuízos fiscais).
Quanto à introdução da obrigação de imposto relativo aos incrementos patrimoniais resultantes de doações de direitos imobiliários e mobiliários ocorridos em território português, entende-se como uma reposição adequada da justiça fiscal, uma vez que nada justifica o tratamento privilegiado destes acréscimos patrimoniais em sede de IRC.
Quanto à restrição introduzida com a eliminação da possibilidade de deferimento tácito no regime de fusões, cisões e entradas de activos entre empresas, entende-se justificada por razões de salvaguarda da

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receita fiscal, face à experiência recolhida e dos respectivos objectivos em termos de efeitos fiscais no controlo à evasão.
Finalmente, e no domínio das garantias dos contribuintes, repõe-se a redacção anterior do n.º 1 do artigo 74.º da Lei Geral Tributária. A este propósito, faço aqui um parêntesis para dizer que não estamos de acordo, Sr. Deputado Francisco Louçã,…

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Eu sei!

A Oradora: - …e vou tentar explicar o nosso entendimento.
Como dizia, com esta medida, retoma-se o princípio da legalidade no que respeita ao ónus da prova das situações de não sujeição em que a administração tributária terá sempre de provar que, numa determinada situação, se verificam os pressupostos de incidência do imposto em causa.
Conforme foi salientado ao tempo, no relatório da Comissão para a Reforma Fiscal, coordenada pelo Dr. Silva Lopes - se quiser lê-lo, verificará que está lá esta justificação -, impor ao contribuinte, em todas as circunstâncias, o encargo da prova em processo tributário é alimentar situações de injustiça que produzem, além do mais, o efeito negativo de enfraquecimento do necessário consenso social em torno dos impostos.
"Levada ao extremo,…" - e cito palavras do relatório - "… esta solução redundará frequentemente na exigência do contribuinte fazer uma quase prova diabólica", uma vez que representa provar factos negativos.
O reconhecimento do ónus de prova da administração fiscal é, normalmente, o corolário de amplitude das prerrogativas de informação que aquela detém.
Fora do âmbito delimitado pela declaração do contribuinte, caberá, portanto, à administração fiscal provar, em caso de dúvida, que as declarações não reflectem a verdadeira situação tributária do contribuinte.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Esta iniciativa legislativa do Governo é a primeira de um plano mais vasto de medidas de melhoria da administração fiscal tributária, que visa o alargamento da eficiência e do combate à evasão e à fraude fiscais. Aproveito para dizer que não concordo com a intervenção do Sr. Deputado Hugo Velosa, porque não podemos estar sempre à espera da reforma fiscal miraculosa. Consideramos que, na administração tributária portuguesa, já existe um quadro legal muito completo, mas que exige aperfeiçoamentos e avaliação permanente. Esta é uma das soluções que a nós, no Parlamento, cabe executar.

O Sr. Victor Baptista (PS): - Muito bem!

A Oradora: - Este é, de facto, um combate permanente e só pode ter sucesso com acções concretas e uma vontade política séria e determinada em reintroduzir na sociedade elementos de credibilidade, confiança e estabilidade.
A hipótese sugerida de uma super-reforma fiscal parece-me que não é o que devemos advogar se queremos, de facto, caminhar no sentido do combate à evasão fiscal.
Assim, aprovaremos, na generalidade, esta iniciativa legislativa, pois contribui para a estabilidade e a confiança que permitem relançar o investimento e a economia e colocar o País, definitivamente, no caminho do desenvolvimento e da convergência com os países mais desenvolvidos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Abel Baptista.

O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Sr.as e Srs. Deputados: Em primeiro lugar, saudamos o facto de o Governo reconhecer que vem apresentar uma iniciativa legislativa que é um complemento de propostas do anterior governo quanto à matéria de fraude e evasão fiscais.
Saudamos também as afirmações do Sr. Secretário de Estado ao ter dito que, independentemente da apresentação desta proposta de lei, o Partido Socialista está disponível para, em sede de especialidade, discutir aperfeiçoamentos no que toca a esta matéria.
É bom saber isto e é bom que assim seja porque, nos últimos tempos, não tem sido essa a prática deste Governo.

Vozes do CDS-PP: - É verdade!

O Orador: - Pelo contrário, o Governo tem-se colocado apenas numa perspectiva de aumento de impostos e de retirar aos portugueses alguns dos direitos e benefícios fiscais, pretendendo assim aumentar as suas próprias receitas para poder continuar a gastar mais nas suas despesas, muitas vezes desnecessárias e, na maioria das vezes, excessivas.
Pede o Governo aos cidadãos que paguem mais impostos, deixando-lhes ficar menos dinheiro para a sua vida pessoal, para aquilo que os portugueses pretendem, poupar ou gastar.

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A título de exemplo, disse aqui, há dias, o Sr. Ministro que o aumento do IVA e do imposto sobre os produtos petrolíferos (ISP), em Portugal, não iria ter qualquer consequência para os empresários portugueses. No entanto, quem se encontra, neste momento, muito feliz com este aumento do IVA e do ISP são os nossos vizinhos espanhóis, que, graças ao aumento destes dois impostos (um, já em prática e, outro, a entrar em vigor muito brevemente), estão já a ganhar, a exemplo do que, no dia 11 deste mês, dizia a TV Galicia quanto àquilo que se passou no dia 10 de Junho, feriado nacional, ao referir que esse foi um grande dia de comércio para os espanhóis.
Acontece ainda que, no âmbito destas medidas (medidas meramente avulsas, mas algumas delas com alguma relevância), não podemos estar de acordo com o reconhecimento por parte da administração fiscal da sua própria incapacidade ou ineficiência. Efectivamente, não creio que esteja bem o Governo quando, relativamente àquilo que, neste momento, é o deferimento tácito, previsto no artigo 69.º do Código do IRC, no que diz respeito à autorização a conceder por parte do Ministro das Finanças para a transmissibilidade dos prejuízos fiscais no caso de fusão, o Governo vem decretar, por falta de resposta, o indeferimento tácito.
Acho que o Governo, de duas, uma: ou melhora a eficácia da sua administração e responde dentro do prazo estipulado, ou, então, só pode deferir aquilo que é pedido em termos de autorização. Não me parece que possa ser de outra forma, sob pena de estar a prejudicar o contribuinte quando a culpa é da administração.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Por outro lado, parece-me que esta é mais uma machadada, mais um revés na possibilidade de criação de um corpo empresarial sustentado e sustentável, em Portugal. Creio que por isso mesmo a Espanha, verificando esta circunstância, começa já a aprovar e a aplicar medidas de incentivo ao estabelecimento de empresas no seu próprio país, baixando a fiscalidade, no caso das estrangeiras, para captar as mesmas. Isto pode confirmar-se nas notícias vindas a lume na própria imprensa espanhola.
Sr. Ministro, Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Se o Governo estiver disponível para aperfeiçoar estas medidas, nomeadamente no que diz respeito à questão dos deferimentos tácitos, estaremos igualmente disponíveis para fazer aprovar algumas destas medidas. Porém, não podemos passar um "cheque em branco" a esta medida.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (António Filipe): - Para uma intervenção, tem a palavra o Srs. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Ouvi o Sr. Secretário de Estado anunciar um conjunto de propostas legislativas centradas no combate à evasão e fraude fiscais. Bom, anunciado desta maneira, devo dizer-lhe muito claramente que aquilo que o Governo nos apresenta hoje, com a proposta de lei n.º 10/X, é, antes, uma espécie de pacotinho fiscal, nada mais do que um pacotinho fiscal.
O Governo pretende alterar algumas normas do Código do IRS, do IRC e do IVA e ainda normas da Lei Geral Tributária e do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária.
Não obstante o grande número de códigos, leis e regulamentos com incidência fiscal que hoje são, pretensamente, profundamente alterados, a verdade é que, em substância, essas alterações são ou bem poucas, ou mínimas e de pormenor, ou somente de arrumação e de redacção.
Depois de, na semana passada, com o aumento do IVA, termos assistido a mais uma espécie de, passo a expressão, "assalto" à bolsa dos portugueses mais desfavorecidos, depois de, repetidamente - até quase à exaustão, diga-se -, o Governo continuar a insistir em anúncios de medidas para combater e eliminar privilégios e benefícios fiscais, depois de tudo isto, não estava à espera que o Sr. Secretário de Estado viesse aqui hoje apresentar apenas um pacotinho fiscal.
E o que mais espanta é que esta proposta seja anunciada como uma "aposta decisiva e central no combate à evasão e fraude fiscais", para utilizar a expressão do Sr. Secretário de Estado. É que se for por aqui que o Governo quer avançar neste combate, desiluda-se, Sr. Secretário de Estado, porque não vai certamente muito longe.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Mas vamos por partes.
No Regime Complementar do Procedimento da Inspecção Tributária, que regula a administração tributária no exercício das suas competências de averiguação e fiscalização dos actos e factos de natureza fiscal, são, no fundamental, feitas apenas alterações de pormenor e de redacção, e sobretudo de integração no novo regulamento de um conjunto de normas já existentes e que constavam de forma extensiva, embora necessariamente repetitiva, nos Códigos do IRS, do IRC e do IVA.

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Por isso, a quase totalidade das alterações nestes códigos limita-se tão-somente à remissão para o novo texto do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária dos normativos relativos ao "dever de fiscalização".
E estes, os deveres e as normas de fiscalização, não temos dúvidas de que são importantes, Sr. Secretário de Estado, são-no certamente, mas são sobretudo normas que, no fundamental, já existiam. Importa é que elas funcionem, que a fiscalização actue. Mas isso, Sr. Secretário de Estado, não é, no fundamental, um resultado desta proposta, mas um resultado da vontade ou não vontade política em fazê-la actuar.
Não há, portanto, alterações significativas; há essencialmente uma arrumação mais lógica e uma simplificação (e encurtamento) dos Códigos do IRS, do IVA e do IRC.
E a isto se limitam, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, as propostas de alteração aos Códigos do IRS e do IVA, que hoje estamos a debater.
Quanto ao IRC, são também introduzidas mais duas modificações, propondo-se alterações aos artigos 4.º e 69.º.
No caso do artigo 4.º, volta a existir a obrigação de imposto sobre as mais-valias patrimoniais derivadas de aquisições a título gratuito de direitos imobiliários e mobiliários. Norma que, sublinhe-se, porque é curioso, tinha andado em bolandas, de "Pilatos para Caifás", durante o governo de Durão Barroso. Uma norma em tudo idêntica, que submetia a imposto os incrementos patrimoniais daquela natureza e origem, tinha sido criada, em Novembro de 2003 (curioso!), com o Decreto-Lei n.º 287, mas eclipsou-se, no mesmo ano, logo um mês depois, no final de Dezembro, com a aprovação do Orçamento do Estado para 2004. Um mês bastou para que esta norma tivesse ido parar ao caixote do lixo. Regressa agora, Sr. Secretário de Estado - ainda bem!
Ainda no Código do IRC, é eliminada a possibilidade de deferimento tácito dos requerimentos para permitir a transmissão de prejuízos no âmbito de fusões e cisões de empresas.
Em vez de se limitar, anular ou, porventura, apenas admitir em casos muito excepcionais e balizados por critérios precisos, transparentes e muito objectivos, a possibilidade de transmissão de prejuízos - uma via muito utilizada para diminuir artificialmente lucros de certas empresas e grupos empresariais -, em vez de se atacar o essencial, o Governo lá se fica pelo acessório, pelo superficial (mesmo que positivo), deixando de fora e não atacando as questões centrais. É que a pendência genérica de interesse económico para justificar o deferimento - mesmo que agora não tácito - não impede, na verdade, que a transmissão de prejuízos, a maioria das vezes sem justificação, se continue a processar paulatinamente, e que com ela prossiga, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, a utilização de meios legais para diminuir lucros tributáveis, e, consequentemente, diminuir sem justificação receitas fiscais, as quais, transformadas por esta e outras vias em exíguas, têm que, depois, ser obtidas e compensadas com aumentos de IVA ou, então, com a contracção de despesas sociais e outras despesas essenciais para o País.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para coroar este "pacote" de medidas fiscais temos uma terceira e última alteração mais significativa, aquela que, invocando fonte de litígios entre a administração fiscal e contribuintes, pretende agora anular a redacção aprovada no último Orçamento. Esta norma, aprovada na altura exclusivamente com votos contra do Partido Socialista, sofre agora nova alteração, pela mão do Governo do PS, regressando à formulação anterior a Dezembro de 2004.
Sem prejuízo das garantias dos contribuintes - sublinhe-se -, sem prejuízo dos seus direitos, a verdade é que, nos caos de não sujeição a impostos e apenas nestes, importava que fossem os contribuintes a demonstrar a razão de ser (ou não) do valor do imposto que pagam ou que deviam pagar!
O argumento invocado não convence, Sr.ª Deputada Teresa Venda. Diria mais, o pretexto invocado pelo Governo, dos conflitos e litígios na relação com os contribuintes, decididamente não colhe. É que são bem preferíveis esses conflitos se deles resultar maior eficiência fiscal e uma cobrança mais justa e equitativa. E a verdade é que não é com quem paga, não é com quem não foge, nem pode fugir aos impostos, que existem tais conflitos. Quem cria litígios e se sente eventualmente atacado nos seus direitos é quem tem "rabos de palha", Sr. Secretário de Estado, e não consegue demonstrar a exiguidade dos rendimentos que declara face aos pequeníssimos níveis de impostos que paga!
Por isso, ontem como hoje, não aceitaremos esta alteração e procuraremos eliminá-la em sede de especialidade. Para tal, contamos com a sensatez do Grupo Parlamentar do Partido Socialista.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (António Filipe): - Para uma segunda intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vou tentar responder às diversas questões pela ordem com que elas foram apresentadas, mas queria começar por fazer uma introdução, que responde, de certo modo, a algumas das perguntas que me foram formuladas.
Na Comissão de Orçamento e Finanças tinha anunciado - e é uma promessa que irei cumprir todas as vezes que me deslocar a esta Casa - que nunca me irão ouvir criticar governos anteriores em relação à matéria da fiscalidade.

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O Sr. Hugo Velosa (PSD): - Nem elogiar!

O Orador: - Herdei aquilo que herdei, tenho a obrigação de fazer mais e melhor. É esse o compromisso.

Aplausos do PS.

Relativamente à questão sobre a equidade, Sr. Deputado Hugo Velosa, há aqui um certo equívoco, porque não há contradição alguma entre estabilidade e as medidas que estão a ser tomadas. Em meu entender, não posso subordinar, por razões de estabilidade do sistema, situações de vazio legal, situações de fraude que passariam completamente impunes. É por isso que, contrariamente ao que se diz, não temos estado quietos.
Tudo o que era possível corrigir, mesmo sem alteração legislativa, foi feito.
Uma das áreas onde há maior erosão a nível dos impostos sobre o rendimento das pessoas colectivas tem a ver com uma questão que já foi diagnosticada por algumas bancadas em intervenções anteriores, a da transmissão de prejuízos. Com efeito, a transmissão de prejuízos transformou-se na "alfaia" privilegiada a nível de planeamento fiscal de algumas operações. Muitas vezes, nada tem a ver com reestruturações empresariais - nada disso!
O que acontece é que, passados 15 ou 20 anos, está a repetir-se aquilo que foi publicado, há cerca de 15 anos, num artigo de um semanário - O Jornal -, com o título bombástico: "Se não quer pagar impostos compre uma empresa falida". O que se passou a verificar foi a manutenção, a perpetuação dessa situação.
Todavia, contrariamente ao que o Sr. Deputado Honório Novo disse, o que foi feito não se traduziu apenas num pequeno ajustamento: o despacho que elaborei diminui significativamente o reporte de prejuízos, fazendo com que haja uma proporção entre os prejuízos e o capital que a empresa absorvida vai ter na quota do capital social da empresa absorvente, o que limita aquela situação. Não a reduz a zero, mas quase! Atinge, pelo menos, alguns grupos que iam comprar uma empresa que, muitas vezes, era mais valiosa quanto mais prejuízos fiscais tivesse.
Portanto, com a limitação introduzida por despacho, foi completamente ultrapassada - ou quase -essa situação.
Por outro lado, já que estamos a falar do artigo 69.º, como disse, e bem, o Sr. Deputado Francisco Louçã, o que se fez foi pôr um "travão", que era perfeitamente indispensável, em relação a situações que, por inércia, pudessem ser automaticamente deferidas, através da inclusão em "gaveta" de um processo que acabava por ser aprovado sem ter qualquer mérito ou sem ser apreciado, dado que, ao fim de seis meses, era automaticamente aprovado, ou deferido tacitamente. Portanto, contrariamente ao que foi dito, é um "travão" em relação à evasão e fraude fiscais.
Dizem que estas medidas pecam por defeito, mas elas correspondem ao que é possível fazer neste momento. Dizem, por outro lado, que estas medidas são avulsas, mas a verdade é que isto corresponde ao compromisso de tentar trazer à discussão as correcções absolutamente indispensáveis, ao mesmo tempo que as tentamos levar a cabo.
Em relação ao artigo 74.º da lei geral tributária, há aqui um equívoco bastante grande. A história que me foi contada pelo responsável por este artigo, ou seja, pelo legislador, foi que, em virtude do "buraco" criado no Código do Imposto de Selo com a não tributação das doações em valores monetários, foi necessário tentar uma correcção (porque não houve coragem para atacar frontalmente aquela lacuna) através da inclusão de um artigo como este. Na prática, isto significa que, se um contribuinte fizer uma escritura em que diz que doou determinado montante em dinheiro a outro contribuinte, essa escritura serve como elemento de prova e aquela doação não é tributada em nenhuma cédula de tributação, não é tributada em sede de imposto sobre o rendimento.
Ora, o que estamos a fazer agora e que vamos incluir no orçamento rectificativo, é acabar com esta situação escandalosa.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): - O Sr. Deputado António Pires de Lima inscreveu-se para pedir esclarecimentos ao Sr. Secretário de Estado. Apesar de o Governo não dispor de mais tempo, se o Sr. Deputado mantiver o pedido de esclarecimentos, a Mesa concederá 1 minuto ao Sr. Secretário de Estado.

O Sr. António Pires de Lima (CDS-PP): - Como o esclarecimento de que necessito é muito breve, penso que 1 minuto será suficiente para o Sr. Secretário de Estado me responder, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (António Filipe): - Tem, então, a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. António Pires de Lima (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, estou um pouco surpreendido com este seu discurso antiempresa, típico do Bloco de Esquerda e do Partido Comunista,…

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O Sr. Francisco Louçã (BE): - Olhe que não! Olhe que não!

O Orador: - … que vê em cada empresa uma espécie de bandido fiscal que procura sistematicamente usar todos os artifícios para fugir aos impostos.
Realmente, o discurso do Governo em matéria fiscal relativamente às empresas oscila permanentemente entre algumas medidas de bom senso e que, do nosso ponto de vista, tendem a melhorar a eficiência fiscal - foi nesse sentido, aliás, que o meu colega Deputado Abel Baptista, se pronunciou a favor de muitas das medidas sugeridas neste "pacotinho" fiscal, para usar as palavras do Deputado Honório Novo - e um conjunto de pressupostos e preconceitos sobre as empresas que, do nosso ponto de vista, merecem alguma clarificação da sua parte.
O Sr. Secretário de Estado tem algum problema com o facto de uma empresa em risco de falir poder ser comprada e adquirida por outra, usando esta como um dos argumentos para a compra o aproveitamento dos prejuízos fiscais? Prefere que a empresa passível de ser comprada abra falência e atire os seus empregados para o desemprego?!

O Sr. Honório Novo (PCP): - Não brinque comigo!

O Orador: - O Sr. Secretário de Estado já se deu ao trabalho de comparar a legislação que procura aplicar agora, em Portugal, com a que está em vigor noutros países da Europa, para perceber se estamos a criar mais dificuldades aos fenómenos de aquisição que permitam salvar essas empresas?
Penso que é preciso ter um discurso dirigido à competitividade das empresas e creio que o Sr. Secretário de Estado estará de acordo comigo se eu afirmar que houve um esforço significativo ao longo dos últimos 10 anos no sentido de melhorar a eficiência fiscal. Aliás, o nível de IRC, em Portugal, tem aumentado cerca de 15% por ano, correspondendo já a uma das maiores taxas europeias, dado que a esquerda, sistematicamente, escamoteia. Penso, portanto, que é absolutamente discricionário atribuir aos serviços do Ministério das Finanças, não se sabendo, sequer, com que critérios, este poder determinativo de saber se uma empresa, quando compra outra, pode ou não usar os prejuízos fiscais existentes. De facto, estava mais satisfeito com a determinação anterior.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Olhe que isso não é alterado! O senhor vai poder continuar a fazer o mesmo!

O Orador: - Em suma, o que quero saber é se o Governo está em condições de ouvir a oposição nesta matéria, revendo a sua postura, de forma a que o CDS possa, eventualmente, vir a aprovar esta proposta de lei na especialidade.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (António Filipe): - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: - Sr. Presidente, Sr. Deputado, devo dizer que não resultou minimamente da minha exposição qualquer intuito de perseguição às empresas, como, aliás, disse na intervenção que produzi há pouco. Aquilo que disse foi que há situações perfeitamente escandalosas a que se pôs um travão, o que é algo completamente diferente. Em relação a essas, é claríssimo que não havia outra solução.
Apesar de podermos sobre isto travar uma discussão longuíssima, devo dizer que o direito comparado foi estudado e que, ao contrário do que o Sr. Deputado afirmou há pouco, não existe em Espanha uma norma semelhante à que está prevista no artigo 69.º do Código do IRC.

O Sr. António Pires de Lima (CDS-PP): - Em Espanha, têm oito anos para usar os prejuízos fiscais!

O Orador: - Tenho a certeza absoluta do que estou a dizer! Não me estou a referir às Entidades de Tenência de Valores Estranjeros (ETVE). Não há em Espanha qualquer norma semelhante à do artigo 69.º do Código do IRC. Em termos de direito comparado, o que existe é uma directiva sobre fusões e cisões, que vários países seguem, tal como nós, mas somos dos poucos países que tem uma norma deste timbre especificamente consagrada nos códigos de impostos sobre o rendimento de pessoas colectivas.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): - Srs. Deputados, esta proposta de lei será submetida à votação na próxima quinta-feira.

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1406 | I Série - Número 033 | 24 de Junho de 2005

 

A próxima reunião plenária realiza-se amanhã, às 10 horas, e terá como ordem do dia o debate mensal com o Sr. Primeiro-Ministro.
Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 35 minutos.

Declaração de voto enviada à Mesa, para publicação, relativa à votação, na generalidade,
da proposta de lei n.º 6/X

O CDS-PP votou, na generalidade, contra a proposta de lei n.º 6/X, do Governo, fundamentalmente pela forma como conduziu, apresentou e defendeu a referida proposta de lei, e, sobretudo, executou as suas políticas, no mínimo contraditórias e incoerentes com o que pretendeu verter em forma de lei.
A proposta de lei n.º 6/X teve por base a intenção de imunizar certos cargos de nomeação governamental aquando mudanças de governo, por vezes abruptas, colocando as respectivas nomeações ao abrigo da cessação por esse motivo.
Assim se conseguiria o desiderato de conferir estabilidade a alguns cargos dirigentes da Administração Pública e de alguns institutos públicos, evitando-se as bem conhecidas "mudanças repentinas" que ocorrem no início de cada ciclo governativo, garantindo a independência necessária à concretização de tarefas de elevada responsabilidade.
Já no que respeitava a outros cargos, designadamente em empresas públicas ou com capitais públicos, em estruturas de missão e outros cargos de nomeação governamental, estabelecer-se-ia a regra que cessariam as respectivas nomeações e comissões de serviço quando ocorresse a queda do governo, sem prejuízo de uma eventual confirmação pelo novo governo.
Sucede que a proposta de lei n.º 6/X não traduz estas intenções de forma expressa, nela não existindo, designadamente, qualquer menção às nomeações para as empresas públicas, entidades públicas empresariais e sociedades participadas. Exclui-se assim deste regime estes casos em que as regras do jogo ficariam perfeitamente esclarecidas e conhecidas de toda a gente, ficando todos os cidadãos a saber que, por exemplo, quem aceitasse integrar o conselho de administração de uma sociedade anónima de capitais públicas ou com participação estadual não poderia ganhar mais que o primeiro-ministro, regra essa que vem consagrada na proposta de lei n.º 6/X.
Na verdade, o CDS-PP poderia acolher estar regra se ela fosse universal, ou seja, se abrangesse todos os titulares de cargos de nomeação governamental e não apenas os que se integram na Administração Pública. Mas a prática do Governo - e é essa a segunda razão pela qual votamos contra a proposta de lei n.º 6/X - tem sido precisamente a inversa: a de excluir do âmbito de aplicação da proposta de lei os cargos mais bem remunerados, precisamente os das empresas públicas, além de que não consagrou um concurso público para cargos intermédios verdadeiramente rigoroso e transparente e não abriu alguns desses cargo intermédios ao sector privado, contrariamente àquilo de que tinha dado indícios em reuniões havidas com representantes dos partidos da oposição.
Ficou bem patente no debate na generalidade, por outro lado, que o Governo pretende forçar a passagem desta iniciativa tal como está, não se tendo predisposto a admitir alterações às soluções gizadas por parte dos partidos da oposição. É uma consequência da maioria absoluta, de que o Governo deu sinal bem claro que vai usar e abusar durante a presente Legislatura.
Acresce ainda, como o CDS-PP demonstrou de forma inequívoca durante o debate, que grande parte das nomeações abrangidas por este diploma já se encontravam realizadas à data, ao contrario do compromisso assumido pelo Sr. Ministro de Estado e da Administração Interna em reuniões tidas como o CDS-PP e os demais partidos, o que, na prática, faz com que o presente diploma tenha aplicação apenas para o próximo governo, reiterando o carácter de instabilidade superveniente da aprovação deste regime.
Ora, tal comportamento é anti-democrático e intolerante e não pode merecer o beneplácito ou a indiferença do CDS-PP. Nestes termos, não nos restou senão votarmos contra.

Os Deputados do CDS-PP, Nuno Teixeira Melo - Nuno Magalhães - João Rebelo - Abel Baptista - João Pinho de Almeida - Teresa Caeiro - Telmo Correia - Miguel Anacoreta Correia - António Pires de Lima.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Partido Socialista (PS):
António Manuel de Carvalho Ferreira Vitorino
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Jorge Manuel Monteiro de Almeida
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego
José Apolinário Nunes Portada

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José Augusto Clemente de Carvalho
Luís António Pita Ameixa
Luís Garcia Braga da Cruz
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Susana de Fátima Carvalho Amador
Teresa Maria Neto Venda
Vítor Manuel Pinheiro Pereira

Partido Social Democrata (PSD):
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Manuel Joaquim Dias Loureiro
Marco António Ribeiro dos Santos Costa
Mário Henrique de Almeida Santos David
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva
Sérgio André da Costa Vieira
Zita Maria de Seabra Roseiro

Partido Comunista Português (PCP):
Jerónimo Carvalho de Sousa

Partido Popular (CDS-PP):
António de Magalhães Pires de Lima
João Rodrigo Pinho de Almeida

Srs. Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:

Partido Socialista (PS):
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues
Jaime José Matos da Gama
José Eduardo Vera Cruz Jardim
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz

Partido Social Democrata (PSD):
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
João Bosco Soares Mota Amaral
José Luís Fazenda Arnaut Duarte
José Mendes Bota
Manuel Filipe Correia de Jesus

Partido Comunista Português (PCP):
Abílio Miguel Joaquim Dias Fernandes

Partido Popular (CDS-PP):
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Partido Socialista (PS):
Guilherme Valdemar Pereira de Oliveira Martins
João Barroso Soares
Joaquim Augusto Nunes Pina Moura
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
Maria Matilde Pessoa de Magalhães Figueiredo de Sousa Franco
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte

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Partido Social Democrata (PSD):
Carlos Alberto Pinto
Joaquim Virgílio Leite Almeida Costa
José Pedro Correia de Aguiar Branco
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Paulo Artur dos Santos Castro de Campos Rangel

Partido Comunista Português (PCP):
Francisco José de Almeida Lopes

Partido Popular (CDS-PP):
Paulo Sacadura Cabral Portas

Bloco de Esquerda (BE):
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda

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