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Sexta-feira, 23 de Fevereiro de 2007 I Série — Número 52

X LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2006-2007)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 22 DE FEVEREIRO DE 2007

Presidente: Ex.mo Sr. Jaime José Matos da Gama

Secretários: Ex.mos Srs. Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Fernando Santos Pereira
Abel Lima Baptista

SUMÁRIO O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 10 minutos.
Antes da ordem do dia. — Deu-se conta da entrada na Mesa da proposta de lei n.º 116/X.
Em declaração política, o Sr. Deputado Honório Novo (PCP), a propósito da recente divulgação pelo Governo dos resultados financeiros das contas públicas de 2006, considerou que o cumprimento das metas orçamentais impostas pelo Pacto de Estabilidade tem e terão custos que penalizam e comprometem o desenvolvimento do País.
O Sr. Deputado Emídio Guerreiro (PSD) acusou o Presidente da Câmara Municipal de Cabeceiras de Basto de prepotência política para com os eleitos, nas últimas eleições autárquicas, para a Junta de Freguesia de Passos. Respondeu, depois, a um pedido de esclarecimento da Sr.ª Deputada Isabel Coutinho (PS), que também interpelou a Mesa sobre o mesmo assunto.
Ordem do dia. — Procedeu-se à discussão conjunta, na generalidade, dos seguintes diplomas, que baixaram à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdade e Garantias sem votação, a requerimento de todos os grupos parlamentares, pelo prazo de 90 dias: projectos de lei n.os 340/X — Providências de combate à corrupção mediante gestão preventiva dos riscos da sua ocorrência (Deputado João Cravinho e outros do PS), 341/X — Aprova alterações ao Código Penal e a legislação penal avulsa sobre prevenção e repressão da corrupção (Deputado João Cravinho e outros do PS), 343/X — Quarta alteração à Lei de Acesso aos Documentos Administrativos (Lei n.º 65/93, de 26 de Agosto, com as alterações introduzidas pelas Leis n.º 8/95, de 29 de Março, n.º 94/99, de 16 de Julho, e n.º 19/2006, de 12 de Junho (PS), 345/X — Combate à corrupção (PSD), 354/X — Altera as disposições da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, relativas à corrupção (BE), 355/X — Altera os artigos 372.º e 374.º do Código Penal, relativos aos crimes de corrupção, e revoga o artigo 373.º do mesmo Código (BE), 356/X — Determina regras de prestação de contas dos titulares de cargos políticos ou altos cargos públicos acerca do seu património (BE), 357/X — Define a cativação pública das mais-valias urbanísticas como medida preventiva de combate ao abuso de poder e à corrupção (BE), 358/X — Determina a divulgação dos resultados dos instrumentos de combate à corrupção e a sua comunicação ao Parlamento (BE), 360/X — Adopta medidas legais de combate à corrupção e à criminalidade económica e financeira (PCP), 361/X — Institui o programa nacional de prevenção da criminalidade económica e financeira (PCP), 362/X — Altera legislação no sentido do reforço dos instrumentos de combate à corrupção (PS) e 363/X — Altera o Decreto-Lei n.º 380/99, de 22 de Setembro, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 53/2000, de 7 de Abril, e pelo Decreto-Lei n.º 310/2003, de 10 de Dezembro, impondo a transcrição digital georreferenciada dos planos municipais de

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I SÉRIE — NÚMERO 52 __________________________________________________________________________________________________ 2 ordenamento do território (PS), bem como dos projectos de resolução n.os 177/X — Prevenção da corrupção (PSD), 178/X — Convenção das Nações Unidas Contra a Corrupção (Resolução n.º 58/4, da Assembleia Geral da ONU, de 31 de Outubro de 2003) (PCP) e 183/X — Medidas de combate à corrupção (CDS-PP).
Intervieram no debate, a diverso título, os Srs. Deputados Ricardo Rodrigues (PS), Diogo Feio (CDS-PP), António Filipe (PCP), Francisco Louçã (BE), Guilherme Silva e Fernando Negrão (PSD), Nuno Magalhães (CDSPP), Heloísa Apolónia (Os Verdes) e Vasco Franco e Irene Veloso (PS).
A Câmara aprovou o voto n.º 87/X — De evocação da memória de José Afonso (PS, PSD, PCP, CDS-PP, BE e Os Verdes).
O projecto de resolução n.º 182/X — Deslocação do Presidente da República, em visita de carácter oficial, ao Luxemburgo (Presidente da AR) foi também aprovado.
Em votação na generalidade, foram rejeitados os projectos de lei n.os 120/X (PCP) e 350/X (PSD) — Alteram a Lei n.º 30/2000, de 29 de Novembro, que «Define o regime jurídico aplicável ao consumo de estupefacientes e substâncias psicotrópicas, bem como a protecção sanitária e social das pessoas que consomem tais substâncias sem prescrição médica» e o projecto de lei n.º 281/X – Preços máximos de venda ao público dos medicamentos não sujeitos a receita médica (BE).
O projecto de resolução n.º 169/X – Recomenda a ratificação do Tratado da Antártida (Os Verdes) foi aprovado.
Também na generalidade, foram aprovados as propostas de lei n.º 113/X — Aprova o Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território e 98/X — Procede à vigésima primeira alteração ao Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de Setembro, e os projectos de lei n.º 211/X — Altera o Código Penal (PS), 219/X — Altera o Código Penal, eliminando a discriminação com base na orientação sexual existente no artigo 175.º (Os Verdes), 236/X — Altera o Código Penal (PSD), 239/X — Aprova o regime da responsabilidade penal das pessoas colectivas (PSD), 349/X — Altera o Código Penal em matéria ambiental (Os Verdes) e 353/X — Altera o Código Penal (BE), tendo o projecto de lei n.º 352/X — Altera o Código Penal (CDS-PP) sido rejeitado.
Foi ainda aprovada, na generalidade, a proposta de lei n.º 107/X — Cria um regime de mediação penal, em execução do artigo 10.º da Decisão-Quadro n.º 2001/220/JAI, do Conselho, de 15 de Março de 2001, relativa ao estatuto da vítima em processo penal.
Finalmente, foram aprovados vários pareceres da Comissão de Ética autorizando quatro Deputados do PSD a deporem por escrito, como testemunhas, em tribunal.
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 18 horas e 20 minutos.

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O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 10 minutos.

Srs. Deputados presentes à sessão:

Partido Socialista (PS)

Agostinho Moreira Gonçalves
Alberto Marques Antunes
Alberto de Sousa Martins
Aldemira Maria Cabanita do Nascimento Bispo Pinho
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Ana Maria Cardoso Duarte da Rocha Almeida Pereira
Ana Maria Ribeiro Gomes do Couto
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António José Ceia da Silva
António José Martins Seguro
António Ribeiro Gameiro
Armando França Rodrigues Alves
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Carlos Alberto David dos Santos Lopes
Cláudia Isabel Patrício do Couto Vieira
David Martins
Deolinda Isabel da Costa Coutinho
Elísio da Costa Amorim
Esmeralda Fátima Quitério Salero Ramires
Fernanda Maria Pereira Asseiceira
Fernando Manuel de Jesus
Fernando dos Santos Cabral
Horácio André Antunes
Hugo Miguel Guerreiro Nunes
Isabel Maria Batalha Vigia Polaco de Almeida
Isabel Maria Pinto Nunes Jorge
Jaime José Matos da Gama
Joana Fernanda Ferreira Lima
Joaquim Augusto Nunes Pina Moura
Joaquim Barbosa Ferreira Couto
Joaquim Ventura Leite
Jorge Filipe Teixeira Seguro Sanches
Jorge Manuel Capela Gonçalves Fão
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Jorge Manuel Monteiro de Almeida
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego
José Augusto Clemente de Carvalho
José Carlos Bravo Nico
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Eduardo Vera Cruz Jardim
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
Jovita de Fátima Romano Ladeira
João Carlos Vieira Gaspar
João Cândido da Rocha Bernardo
Júlio Francisco Miranda Calha
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís António Pita Ameixa
Luís Miguel Morgado Laranjeiro
Luísa Maria Neves Salgueiro
Lúcio Maia Ferreira

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Manuel Alegre de Melo Duarte
Manuel António Gonçalves Mota da Silva
Manuel José dos Mártires Rodrigues
Manuel Luís Gomes Vaz
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Marcos Sá Rodrigues
Maria Cidália Bastos Faustino
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria Helena Terra de Oliveira Ferreira Dinis
Maria Helena da Silva Ferreira Rodrigues
Maria Hortense Nunes Martins
Maria Irene Marques Veloso
Maria Isabel Coelho Santos
Maria José Guerra Gamboa Campos
Maria Júlia Gomes Henriques Caré
Maria Manuel Fernandes Francisco Oliveira
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Maria Matilde Pessoa de Magalhães Figueiredo de Sousa Franco
Maria Odete da Conceição João
Maria Teresa Alegre de Melo Duarte Portugal
Maria Teresa Filipe de Moraes Sarmento Diniz
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria de Fátima Oliveira Pimenta
Maria de Lurdes Ruivo
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Maximiano Alberto Rodrigues Martins
Nelson Madeira Baltazar
Nuno André Araújo dos Santos Reis e Sá
Nuno Mário da Fonseca Oliveira Antão
Paula Cristina Barros Teixeira Santos
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Paula Cristina Nobre de Deus
Pedro Manuel Farmhouse Simões Alberto
Pedro Nuno de Oliveira Santos
Renato Luís Pereira Leal
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Jorge Teixeira de Freitas
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Ricardo Manuel de Amaral Rodrigues
Rita Susana da Silva Guimarães Neves
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Sónia Isabel Fernandes Sanfona Cruz Mendes
Teresa Maria Neto Venda
Umberto Pereira Pacheco
Vasco Seixas Duarte Franco
Victor Manuel Bento Baptista
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vitor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Vítor Manuel Pinheiro Pereira

Partido Social Democrata (PSD)

Adão José Fonseca Silva
Agostinho Correia Branquinho
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Paulo Martins Pereira Coelho
António Ribeiro Cristóvão
Arménio dos Santos
Carlos Alberto Silva Gonçalves

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Carlos Jorge Martins Pereira
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Emídio Guerreiro
Feliciano José Barreiras Duarte
Fernando Mimoso Negrão
Fernando Santos Pereira
Fernando dos Santos Antunes
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Henrique José Praia da Rocha de Freitas
Hugo José Teixeira Velosa
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Joaquim Virgílio Leite Almeida Costa
Jorge Fernando Magalhães da Costa
Jorge José Varanda Pereira
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
José António Freire Antunes
José Luís Fazenda Arnaut Duarte
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro
José Manuel de Matos Correia
José Mendes Bota
José Raúl Guerreiro Mendes dos Santos
João Bosco Soares Mota Amaral
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Filipe Carloto Marques
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes
Luís Miguel Pereira de Almeida
Manuel Filipe Correia de Jesus
Maria Helena Passos Rosa Lopes da Costa
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria do Rosário da Silva Cardoso Águas
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas
Miguel Jorge Pignatelli de Ataíde Queiroz
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Mário Henrique de Almeida Santos David
Mário Patinha Antão
Mário da Silva Coutinho Albuquerque
Nuno Maria de Figueiredo Cabral da Câmara Pereira
Paulo Artur dos Santos Castro de Campos Rangel
Paulo Miguel da Silva Santos
Pedro Augusto Cunha Pinto
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Pedro Quartin Graça Simão José
Regina Maria Pinto da Fonseca Ramos Bastos
Ricardo Jorge Olímpio Martins
Sérgio André da Costa Vieira
Vasco Manuel Henriques Cunha

Partido Comunista Português (PCP)

Agostinho Nuno de Azevedo Ferreira Lopes
António Filipe Gaião Rodrigues
Bernardino José Torrão Soares
José Honório Faria Gonçalves Novo
João Guilherme Ramos Rosa de Oliveira
Maria Luísa Raimundo Mesquita
Maria Odete dos Santos
Miguel Tiago Crispim Rosado

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Partido Popular (CDS-PP)

Abel Lima Baptista
António Carlos Bivar Branco de Penha Monteiro
Diogo Nuno de Gouveia Torres Feio
José Paulo Ferreira Areia de Carvalho
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
Luís Pedro Russo da Mota Soares
Nuno Miguel Miranda de Magalhães
Paulo Sacadura Cabral Portas
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia

Bloco de Esquerda (BE)

Alda Maria Gonçalves Pereira Macedo
Fernando José Mendes Rosas
Francisco Anacleto Louçã
João Pedro Furtado da Cunha Semedo
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda
Maria Cecília Vicente Duarte Honório
Mariana Rosa Aiveca Ferreira

Partido Ecologista "Os Verdes" (PEV)

Francisco Miguel Baudoin Madeira Lopes
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, a Sr.ª Secretária vai proceder à leitura do expediente.

A Sr.ª Secretária (Rosa Maria Albernaz): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, deu entrada na Mesa, e foi admitida, a proposta de lei n.º 116/X — Aprova o regime jurídico que estabelece a qualificação profissional exigida aos técnicos responsáveis pela elaboração e subscrição de projectos, pela fiscalização da obra e pela direcção da obra que não esteja sujeita a legislação especial e os deveres que lhes são aplicáveis e revoga o Decreto-Lei n.º 73/73, de 28 de Fevereiro, que baixa à 9.ª Comissão.
É tudo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Arménio Santos.

Pausa.

Como o Sr. Deputado ainda não se encontra presente, tem a palavra, para o mesmo efeito, o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Não! Não é verdade que as rábulas de Carnaval tenham, este ano, tido epicentro exclusivo na cidade do Funchal. Também por cá houve algum foguetório e algumas tentativas de mascarar a crueza das políticas, neste caso com o resultado financeiro das contas públicas.
O Governo, pela mão e as palavras de uma troika – das Finanças, da Saúde e da Segurança Social –, veio antecipar os motivos da «festa», isto é, a possibilidade de o défice orçamental de 2006 ficar abaixo do previsto.
Exultou essa troika com o possível resultado. Esconderam todos os custos, mascarando as consequências para o País e para os portugueses. Esconderam, por exemplo, que só foi possível superar o défice previsto para 2006 à custa de cortes suplementares no investimento público.
As famosas circulares que os ministros das finanças costumam distribuir todos os anos em Outubro/Novembro foram, em 2006, feitas em Agosto.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É verdade!

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O Orador: — A partir daí, o cumprimento do PIDDAC, a conclusão de compromissos anunciados e a execução do já exíguo e insuficiente plano de investimentos públicos incluído no Orçamento de 2006 foram paralisados e anulados.
Quem pagou, afinal, o «festim» orçamental foi o País, que viu ainda mais comprometido o seu desenvolvimento e a construção de infra-estruturas que o próprio Governo tinha anunciado. É o País, são os portugueses e, de forma muito especial e injusta, os mais desfavorecidos quem paga e continuará a pagar os custos destes resultados orçamentais apresentados como se fossem a «jóia da coroa» da governação socialista.
Só foi possível superar o valor do défice orçamental à custa de cortes no investimento e de cortes impiedosos e cegos de despesas nas funções sociais do Estado, provocando a degradação da qualidade de vida e atacando direitos e o poder de compra de centenas de milhares de trabalhadores.
Só foi possível alcançar esses resultados à custa do encerramento injustificado e injustificável, por exemplo, de centenas de escolas e de cortes orçamentais quase criminosos no ensino superior, numa aposta muito clara na instabilidade profissional dos docentes e na degradação da escola pública em Portugal.
E só foi possível, só será possível prosseguir esta obsessão orçamental com o encerramento de maternidades e de centros de saúde, com o anunciado encerramento de esquadras da PSP e de postos da GNR e de direcções regionais e distritais de serviços públicos, que poderão, é certo, poupar mais uns milhares de «cobres», mas só irão aumentar a discriminação de largos sectores da população e agravar, certamente, assimetrias regionais, já de si inaceitáveis.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

O Orador: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O cumprimento das metas orçamentais impostas pelo Pacto de Estabilidade teve e continuará a ter custos inaceitáveis e crescentemente insuportáveis, que penalizam e comprometem o desenvolvimento do País.

O Sr. António Filipe (PCP): — É verdade!

O Orador: — Uma alternativa estratégica, que deveria passar pela aposta na capacidade produtiva e no investimento e num forte crescimento económico do País, para permitir o combate ao desemprego e a melhoria da qualidade de vida dos portugueses, está completamente comprometida com o prosseguimento de políticas centradas no controlo orçamental a qualquer preço.
Os resultados mostram bem a dimensão das consequências destas políticas: O crescimento do PIB em Portugal é o pior da União Europeia a 27 países; A divergência relativamente à Europa ocorre desde 2001, dura há quase sete anos e vai continuar; O rendimento nacional baixou de 15.º para 18.º lugar — já fomos, inclusivamente, ultrapassados pela República Checa, pela Eslovénia e por Chipre — e, em 2008, o PIB português passará, muito provavelmente, a ser o 20.º da União Europeia; No plano social, Portugal tem 20% da sua população a viver abaixo do limiar da pobreza, está no fim da lista entre os países europeus onde o risco de pobreza é mais elevado e apresenta os maiores índices de desigualdade na distribuição da riqueza.
São estes, Sr.as e Srs. Deputados, os resultados a que nos conduzem anos a fio de obsessão orçamental.
Enquanto o Ministro do Trabalho e da Segurança Social exulta com os resultados do défice, os números do desemprego chegam aos piores valores dos últimos 20 anos.
Enquanto o Ministro do Trabalho e da Segurança Social aposta, agora, na flexibilidade ou na moda da flexissegurança, esquece a criminosa precaridade existente no País e passa ao largo dos índices do EUROSTAT, que mostram a situação social inaceitável que se vive em Portugal.
Enquanto o Ministro do Trabalho e da Segurança Social se prepara para pôr em prática as alterações na idade da reforma e no cálculo das pensões, faz de conta que nada tem a ver com a miragem, anunciada em tempos, da criação de 150 000 novos postos de trabalho.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Na troika do «festim» carnavalesco dos resultados orçamentais teve também assento o Ministro da Saúde. Como seria de esperar, teceu loas ao controlo orçamental na saúde, escondendo, igualmente, as consequências desta opção política. Escondeu, por exemplo, os efeitos e as consequências do encerramento de maternidades e de centros de saúde, a proliferação de taxas moderadoras, a diminuição da comparticipação em medicamentos e a crescente privatização e degradação do Serviço Nacional de Saúde.
Mas as mais recentes declarações do Ministro da Saúde relativas ao programa de encerramento de urgências hospitalares são, contudo, ainda mais preocupantes. É que o Ministro da Saúde não pode continuar a ameaçar as populações nem os seus representantes eleitos. O Ministro da Saúde não pode, por um lado, dizer que o anunciado programa de fecho de urgências está em negociação e, por outro, ameaçar aqueles que legitimamente protestam e se indignam com a proposta do Governo, dizendo que quem se manifesta «está a pôr-se fora das negociações».

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O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Um escândalo!

O Orador: — Esta é uma posição inaceitável e reveladora de uma pressão democraticamente inqualificável.
Perante a gravidade desta situação, o PCP aproveita esta declaração política para anunciar a intenção de apresentar uma iniciativa legislativa que recomende a suspensão do anunciado processo de encerramento de urgências…

O Sr. António Filipe (PCP): — Muito bem!

O Orador: — … até que o Governo apresente uma proposta que explicite e clarifique quais os critérios objectivos em que se diz basear para concretizar a reorganização da rede das urgências em Portugal.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Orador: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O «festim» carnavalesco da troika ministerial serviu para, mais uma vez, confirmar que a obsessão orçamental constitui, de facto, «o alfa e o ómega» da política deste Governo.
As consequências são visíveis e sentidas pelos portugueses. O País está a ser crescentemente prejudicado pela continuidade desta política.
Pode o Governo continuar a «olhar para o umbigo» e acenar com resultados orçamentais para mostrar e demonstrar a bondade das suas políticas, mas a verdade é que nem mesmo a diminuição de umas décimas nos valores dos défices orçamentais constituirão prova cabal da justeza e do acerto das suas opções. Nada, nem mesmo os resultados orçamentais, pode justificar ou servir de álibi para as políticas anti-sociais destes dois anos de governação socialista.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Como o Sr. Deputado Arménio Santos ainda não se encontra presente, vamos passar às intervenções de interesse político relevante.
Para o efeito, tem a palavra o Sr. Deputado Emídio Guerreiro.

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em pleno século XXI, com mais de 30 anos de democracia, assistimos no nosso país a exemplos de exercício de poder que devem envergonhar todos os democratas.
O grau de desenvolvimento e a maturidade da nossa democracia não se medem apenas pelas obras realizadas ou pelos discursos que os vários agentes políticos vão protagonizando. As atitudes e os comportamentos dos que, em determinado momento da sua vida, são escolhidos pelos seus concidadãos para desempenhar cargos públicos são elementos determinantes para a aferição da maturidade e do grau de desenvolvimento da democracia.
Mais importante do que enunciar grandes princípios democráticos é afirmá-los na prática diária. É no dia-adia que cada um de nós tem de demonstrar que merece a confiança dos outros. E quando nos deparamos com exemplos como o de Cabeceiras de Basto temos de estranhar.
Sabemos bem que Cabeceiras de Basto está longe dos centros de decisão, que é mais fácil esconder e omitir o que se vai por lá passando e também que, para os grandes órgãos de comunicação social não é interessante o que por lá se faz e se passa, mas sabemos também que calar é contribuir para a manutenção da situação. Diz o velho ditado popular «que quem cala consente». Pois que fique claro que não calamos nem consentimos.
Nas eleições autárquicas de 2005, uma pequena freguesia do concelho, de seu nome Passos, com menos de 300 eleitores, decidiu mudar de presidente de junta de freguesia, tendo optado por eleger um candidato de cor partidária diferente da do Sr. Presidente da Câmara. Nada mais normal em democracia. Cansadas de uma determinada equipa, as pessoas escolheram outra equipa.
O que depois sucedeu e que ainda hoje se mantém é que não é normal: o Presidente da Câmara, que até foi o mais votado na freguesia, decidiu vingar-se das gentes de Passos. Desde então, os novos eleitos não podem aceder à sua sede.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Parece brincadeira, mas não é! Ainda hoje, decorrido este tempo todo, os autarcas democraticamente eleitos não têm acesso ao edifício sede da junta de freguesia. A câmara não deu nem dá a chave. De todo o edifício possuem acesso apenas a um pequeno arrumo, onde procuram exercer o mandato para o qual foram eleitos. Nem o acesso às casas de banho lhes é permitido.

Protestos do PS.

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É claro que recorreram às instâncias judiciais e também é claro que nas instâncias por onde o processo já passou a justiça portuguesa deu razão à junta de freguesia. Mas, teimosamente, a câmara continua a recorrer a instâncias superiores e a negar os direitos mais básicos aos novos eleitos.
A vingança continua. O regular funcionamento das instituições não existe. E isto em 2007, num País democrático.
Mas será este o único exemplo do que se passa em Cabeceiras de Basto? Infelizmente não! Ao longo dos anos, o comportamento e a atitude do Sr. Presidente da Câmara tem-se pautado por polémicas estéreis, que não dignificam nada nem ninguém. É o quero, posso e mando. É o reino da prepotência, que procura esmagar tudo e todos que ousam discordar do pensamento e da acção do Sr. Presidente da Câmara. São perseguições a pessoas e a instituições, que se vão defendendo, esperando que a justiça e o bom senso impere.
E assim se vão acumulando processos e acusações. E assim se vai concluindo que, em Portugal, ainda existem municípios onde a democracia é imatura e pouco desenvolvida.
Mas será este protagonista um mero cacique rural perdido nas terras e nas serranias de Basto? Não! O pseudo-democrata que hoje denunciamos é Presidente da Federação Distrital do Partido Socialista de Braga e Presidente da Junta Metropolitana do Minho, ou seja, o rosto do actual líder do Governo no terceiro distrito do País.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Há uma inscrição para pedido de esclarecimento, mas o Sr. Deputado do PSD já não dispõe de tempo para responder.

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — O PS cede 2 minutos ao Sr. Deputado Emídio Guerreiro para ele poder responder.

O Sr. Presidente: — Então, para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Coutinho.

A Sr.ª Isabel Coutinho (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Emídio Guerreiro, é com muito pesar que constato que o PSD não tem temas interessantes para trazer ao período de antes da ordem do dia.
O Sr. Deputado devia ter mais cuidado ao falar de um excelente presidente de câmara — na minha opinião, um dos melhores presidentes de câmara que temos no nosso país -,…

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

… um homem que honra a democracia, um homem que honra os seus compromissos. Vir fazer esta chicana e este ataque pessoal ao Sr. Presidente da Câmara Municipal de Cabeceiras de Basto, desculpe que lhe diga, é uma vergonha.

O Sr. José Junqueiro (PS): — Muito bem!

A Oradora: — Aquilo que o Sr. Deputado disse da tribuna em relação a este processo da freguesia de Passos, que eu acompanhei, até porque, na altura, era Presidente da Comissão Política e, portanto, responsável pelas listas do Partido Socialista e pelo processo autárquico,…

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Ah! Eu vi logo!

A Oradora: — … é uma mentira.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Não, não é!

A Oradora: — Já sabe que é uma mentira. É mentira quando diz que os tribunais estão a dar razão à freguesia de Passos. Aliás, há já — deve ser do vosso conhecimento — um parecer do Procurador-Geral da República dando razão à câmara municipal. E estamos à espera da sentença.
Que fique bem claro, para que não restem dúvidas, que as instalações são da Câmara Municipal de Cabeceiras de Basto, que fez já várias diligências no sentido de o presidente da junta de freguesia se dirigir à câmara municipal para assinar um protocolo a fim de lhe serem entregues as chaves das instalações, mas este nunca se dirigiu lá, apenas fez arrombo de portões e outras coisas assim.
Ao falar de um assunto que toca numa pessoa, neste caso numa instituição do nosso país, o Sr. Deputado devia ter mais cuidado.

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Finalmente, gostava de lhe perguntar se o Sr. Deputado tem na sua mão todos os dados, se está convicto daquilo que disse e se se sente confortável no seu papel de acusador de um grande homem do nosso país, que nos devia orgulhar a todos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Emídio Guerreiro.

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Coutinho, ouvi com muita calma o seu agitado pedido de esclarecimento e quero dizer-lhe o seguinte: gostava imenso que aquilo que eu disse fosse mentira.

A Sr.ª Isabel Coutinho (PS): — E é mentira!

O Orador: — Adorava! Adorava que, de facto, os eleitos da freguesia de Passos pudessem estar a exercer o seu mandato de forma livre e no espaço que lhes é devido! Mas, infelizmente, não é mentira aquilo que eu disse, Sr.ª Deputada! Infelizmente, não é mentira! Lamento imenso, hoje até preferia ser eu o mentiroso. Não me custava nada, era até com prazer que hoje assumiria aqui que era mentiroso.

O Sr. José Junqueiro (PS): — Então, assuma!

O Orador: — Mas, infelizmente, para si, Sr.ª Deputada, a mentira está desse lado.
Quero dizer-lhe que a sua manobra de transformar um ataque político dirigido a quem não cumpre minimamente e não respeita a vontade dos eleitores numa questão pessoal é lamentável. Para nós a questão é predominantemente política e só política.
A questão é muito simples: houve um candidato à câmara que não gostou que as populações tivessem escolhido um presidente de junta suportado por outra cor partidária. A questão é só esta. E, ao fim de um ano e meio, os cidadãos que foram escolhidos pelos seus pares para desempenhar as suas funções na junta de freguesia são sistematicamente impedidos pela câmara de o fazer.
Se isto não é prepotência, Sr.ª Deputada, faça-me um desenho do que é prepotência! Se isto não é arrogância, então explique-me o que é arrogância! Quanto ao mais, Sr.ª Deputada, não vale a pena agitações, não vale a pena invocar falsos sentimentos, porque a realidade é esta, está lá, basta ir à freguesia de Passos, uma pequena aldeia com pouco mais de 200 eleitores. A verdade é triste, é nua e é crua, mas é esta, por mais que incomode os senhores do Partido Socialista.

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Isabel Coutinho (PS): — Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Isabel Coutinho (PS): — Sr. Presidente, é só para dizer que, na próxima semana, farei chegar à Mesa todo o processo que comprova que a verdade está deste lado, que sou eu que estou a dizer a verdade e que a verdade está do lado da câmara municipal, para que, depois, o possa mandar circular por todos os Srs. Deputados.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Trata-se do anúncio de uma entrega diferida de documentos. Mesmo assim, faremos uma recepção diferida de documentos e, na altura própria, eles serão distribuídos.
Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.

Eram 15 horas e 30 minutos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, da ordem do dia de hoje consta a discussão conjunta, na generalidade, dos seguintes diplomas: projectos de lei n.os 340/X — Providências de combate à corrupção mediante gestão preventiva dos riscos da sua ocorrência (Deputado João Cravinho e outros do PS), 341/X — Aprova alterações ao Código Penal e a legislação penal avulsa sobre prevenção e repressão da corrupção

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(Deputado João Cravinho e outros do PS), 343/X — Quarta alteração à Lei de Acesso aos Documentos Administrativos (Lei n.º 65/93, de 26 de Agosto, com as alterações introduzidas pelas Leis n.º 8/95, de 29 de Março, n.º 94/99, de 16 de Julho, e n.º 19/2006, de 12 de Junho (PS), 345/X — Combate à corrupção (PSD), 354/X — Altera as disposições da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, relativas à corrupção (BE), 355/X — Altera os artigos 372.º e 374.º do Código Penal, relativos aos crimes de corrupção, e revoga o artigo 373.º do mesmo Código (BE), 356/X — Determina regras de prestação de contas dos titulares de cargos políticos ou altos cargos públicos acerca do seu património (BE), 357/X — Define a cativação pública das mais-valias urbanísticas como medida preventiva de combate ao abuso de poder e à corrupção (BE), 358/X — Determina a divulgação dos resultados dos instrumentos de combate à corrupção e a sua comunicação ao Parlamento (BE), 360/X — Adopta medidas legais de combate à corrupção e à criminalidade económica e financeira (PCP), 361/X — Institui o programa nacional de prevenção da criminalidade económica e financeira (PCP), 362/X — Altera legislação no sentido do reforço dos instrumentos de combate à corrupção (PS) e 363/X — Altera o Decreto-Lei n.º 380/99, de 22 de Setembro, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 53/2000, de 7 de Abril, e pelo Decreto-Lei n.º 310/2003, de 10 de Dezembro, impondo a transcrição digital georeferenciada dos planos municipais de ordenamento do território (PS), bem como dos projectos de resolução n.os 177/X — Prevenção da corrupção (PSD), 178/X — Convenção das Nações Unidas Contra a Corrupção (Resolução n.º 58/4, da Assembleia Geral da ONU, de 31 de Outubro de 2003) (PCP) e 183/X — Medidas de combate à corrupção (CDS-PP).
O primeiro orador inscrito, para apresentar as iniciativas legislativas do Grupo Parlamentar do PS, é o Sr. Deputado Ricardo Rodrigues, a quem dou a palavra.

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Os vários projectos de lei que deram entrada nesta Assembleia consubstanciam 27 iniciativas concretas, tendo em vista o combate à corrupção. Destas, 21 tiveram origem no Grupo Parlamentar do Partido Socialista, quer se tratem de iniciativas próprias do partido quer de iniciativas assinadas pelo nosso camarada João Cravinho e outros Deputados do Partido Socialista.
Convém que fique desde já claro que o próprio Deputado João Cravinho deixou cair a sua proposta de enriquecimento ilícito, a qual consubstanciava a inversão do ónus da prova, ou seja, punha em causa o princípio da presunção de inocência, basilar de todo o nosso ordenamento penal.
Para que fique também claro, esclareço que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista votará, em sede de especialidade, contra qualquer iniciativa que ponha em causa as regras do Estado de direito democrático. O mesmo é dizer que votaremos contra o projecto de lei do PCP relativo a enriquecimento injustificado e o projecto de lei n.º 356/X, do BE, sobre a mesma matéria, porquanto os mesmos fazem recair no arguido a prova da sua inocência, o que é, para nós, inaceitável.
Acresce ainda, quanto à matéria da prevenção, que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista admite analisar e votar favoravelmente a proposta, provinda também do nosso grupo parlamentar, que para nós gera consenso. Desde que a comissão da prevenção não seja uma entidade independente a vigorar em paralelo com a Assembleia da República e que possa configurar um sistema de observatório para a prevenção, nada temos a opor.
Aquilo que nos divide e do que discordamos é da figura institucional, por entendermos que não tem equivalente nesse regime de entidade independente, e porque muitas das funções previstas para essa alegada entidade independente já estão enquadradas nas competências do Ministério Público e da Polícia Judiciária.
Resta-nos, ainda, as questões apresentadas pelos nossos camaradas e que não obtiveram consenso no Grupo Parlamentar do Partido Socialista, relativas à alteração do Código Penal e, em concreto, à tipificação dos crimes de corrupção.
Neste domínio, fica também claro que, estando em curso o processo legislativo relativo ao Código Penal, entendemos que este assunto deve ser analisado em sede de especialidade, ao que acresce que respeitamos o acordo de incidência parlamentar com o PSD, o qual prevê regras próprias entre os dois partidos, que o PSD manifestamente violou.
E porque o PSD violou o acordado nas suas regras comportamentais, não só nos coloca na posição de podermos comentar esta violação, como nos permite fazer a seguinte análise, sem prejuízo de se manter válido o acordo entre nós estabelecido. Para este debate, o PSD apresentou nove iniciativas: três «copiou» do Grupo Parlamentar do Partido Socialista e cinco do camarada João Cravinho. E a única que não plagiou foi, penso eu, beber inspiração ao projecto de lei do PCP, na parte relativa à apreensão dos bens. Ou seja, o PSD apresentou nove iniciativas legislativas em relação a esta matéria, o que nos apraz registar, mas nenhuma tem a sua ideia original! Sendo o PSD um partido responsável, é com algum lamento que aqui dizemos que não tem ideias originais e se apropria de outras ideias. Só resta saber qual vai ser o seu sentido de voto em relação a essas iniciativas.
Vota por simpatia para com o Eng.º João Cravinho? Ou vota pelas suas próprias convicções? Enfim, ziguezagues próprios de uma oposição, neste caso do PSD, sem o crédito que em algum tempo lhe reconhecemos.

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Quanto ao Partido Comunista, também tem de ficar claro que, das suas sete iniciativas, apenas duas não foram beber inspiração ao Grupo Parlamentar do Partido Socialista. Uma, que cria o tipo de crime de enriquecimento injustificado, contra a qual, pelas razões já aduzidas, votaremos contra, e outra, um projecto de resolução para aprovarmos um tratado internacional. Os senhores, que são tão legalistas, deviam saber que a iniciativa de aprovação de tratados internacionais não cabe aos grupos parlamentares mas, sim, ao Governo.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Onde é que isso está?

O Orador: — Está no Regimento, Sr. Deputado, leia com atenção.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Não, não está!

O Orador: — A sua proposta é manifestamente ilegal.
Mas não é por isso que deixamos de concordar com ela. E o Governo vai aprovar, em próximo Conselho de Ministros, o tratado que teremos a oportunidade de ratificar, também aqui no Parlamento, sobre essa matéria da corrupção.
Das 13 iniciativas do BE, 10 delas também têm coincidência com as do Partido Socialista. Os próprios Srs. Deputados reconheceram que iam repescar as ideias que nós trabalhámos. Quanto às outras três, que não têm essa matriz do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, devo dizer — para que fique claro — que votaremos contra uma delas, a que tem a ver com a inversão do ónus da prova e com a presunção de inocência, no que diz respeito aos rendimentos e ao património dos titulares de cargos políticos. As outras iremos analisá-las em sede de comissão, naturalmente, mas a que diz respeito à agência como entidade independente também tem o nosso desacordo.

O Sr. Francisco Louçã (BE): — Que confusão!

O Orador: — Não tem confusão nenhuma, Sr. Deputado.
O CDS-PP não apresentou uma iniciativa propriamente legislativa, apresentou uma resolução que votaremos também em conformidade. Não é uma iniciativa legislativa, é uma recomendação ao Governo.
Nessa matéria, o CDS entende que já temos leis que cheguem e que, portanto, não precisamos de mais.
Como ficou demonstrado, dando uma panorâmica geral de todas as iniciativas apresentadas, assumimos as nossas responsabilidades. Sem preconceitos, manifestámos as nossas divergências internas, mas cada um assumiu, afinal, as suas posições.
Sempre quisemos fazer este debate de forma aberta e responsável. Assumimos colectivamente as divergências, mas o Grupo Parlamentar do PS está coeso no combate à corrupção e está determinado a, na especialidade, fazer aprovar uma série de iniciativas legislativas que, de forma coerente e sem pôr em causa os princípios do Estado de direito democrático, possam contribuir para um combate concreto à corrupção.
Uma última ideia-chave: na matéria de combate à corrupção não há superioridades morais a impor; não há os mais nem os menos favoráveis ao combate à corrupção. Este é um combate da democracia e dos democratas que vamos assumir em sede de especialidade.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Há três inscrições para pedidos de esclarecimento.
Em primeiro lugar, tem a palavra Sr. Deputado Diogo Feio.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Ricardo Rodrigues, aproveito esta ocasião para, desde logo, sublinhar a importância que o CDS dá à matéria do combate à corrupção. É um elemento essencial da nossa sociedade política; numa democracia é, com toda a certeza, fundamental combater a economia negra.
Recordo, aliás, alguém que disse: «Tenho a sensação de que a direita é muito mais sensível ao combate à corrupção do que a esquerda, que tem uma dependência crónica do aparelho do Estado e das suas funções sociais. Para a direita, o combate à corrupção está associado à autoridade do Estado e à defesa do ordem e da lei.» Disse bem a Dr.ª Maria José Morgado! E nós aqui estamos para, claramente, marcar a nossa posição quanto a essa matéria.
Permito-me dizer, Sr. Deputado, que este é mais um passo daquele que tem sido um longo processo.
Recordo-me de discursos que fez o Sr. Presidente Jorge Sampaio em relação a esta matéria; recordo-me de um passo inicial que foi dado por um conjunto de projectos, já nesta Legislatura, apresentados pelo Sr. Deputado João Cravinho; recordo-me também do discurso feito, e bem, pelo actual Sr. Presidente da República, o Prof. Cavaco Silva, em relação a esta matéria. E eu estranho um pouco toda a turbulência que,

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aparentemente, surgiu no Grupo Parlamentar do Partido Socialista em relação àquilo que, em concreto, se pretendia propor quanto ao combate à corrupção. Porque houve vários qualificativos que não foram, com toda a certeza, os de maior concórdia sobre esta matéria.
O Sr. Deputado Ricardo Rodrigues, como uma espécie de comentador dos vários projectos, como uma espécie de Mastermind legislativo, falou há pouco do combate à corrupção, e eu tenho, desde logo, uma grande questão a colocar-lhe: considera o Sr. Deputado que a matéria do combate à corrupção é fundamentalmente de natureza legislativa ou de natureza administrativa e de meios para os órgãos que têm de combater a corrupção?

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Orador: — Em relação a essa matéria, gostaria de saber — não posso colocar essa pergunta ao Governo porque não se encontra presente — se o Partido Socialista está ou não disponível para que exista um acordo de médio prazo sobre aquelas que devem ser as dotações de natureza orçamental para os órgãos que, em Portugal, têm a principal função de combate à corrupção. E gostaria de saber se não é esse o caminho fundamental para conseguirmos ter sucesso quanto a essa matéria.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Orador: — VV. Ex.as (o Partido Socialista e o Governo) fizeram um negócio de natureza política, a que chamaram «pacto para a justiça», em que estranhamente não aparecia uma única medida de combate à corrupção. Será que, por aí, não se está a admitir, precisamente, como o Sr. Deputado disse, que não é preciso mais leis? Se calhar, o que é preciso é medidas concretas eficazes que têm, com toda a certeza, uma natureza orçamental. É com esses meios, com esses efeitos, que vamos conseguir combater bem a corrupção.
E no que toca ao combate à corrupção, Sr. Deputado, que fique muito claro: esta Câmara poderá sempre contar com a bancada do CDS!

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Ricardo Rodrigues, o Sr. Deputado usou da palavra para, esperávamos nós, apresentar os projectos de lei do Partido Socialista que estão hoje em debate.

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Que os senhores copiaram!

O Orador: — Em vez disso, nada! Mas o Sr. Deputado não apresentou as iniciativas do Partido Socialista, tendo-se ficado pela crítica às iniciativas dos outros grupos parlamentares. Nalguns casos criticou-as por falta de originalidade; no nosso caso criticou-nos por sermos originais em excesso.

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Não. Está enganado!

O Orador: — Relativamente à convenção internacional, Sr. Deputado, o Governo do Partido Socialista é que está em falta nesta matéria.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Claro!

O Orador: — Esta convenção internacional foi assinada, em 2003, nas Nações Unidas, pelo Estado português, sendo inconcebível que, até à data, o Governo não tenha apresentado uma proposta de resolução para que a Assembleia a aprove, para ratificação! Sabemos que é esse o procedimento normal, mas o Governo não o fez. E, como não o fez, entendemos que a Assembleia da República tem de chamar a si essa responsabilidade. E a nossa iniciativa teve, pelo menos, o mérito de fazer o Sr. Deputado anunciar que o Governo, em breve, o vai fazer. Folgamos muito com isso! Quanto ao enriquecimento injustificado, queria deixar muito claro, Sr. Deputado Ricardo Rodrigues, que nós não copiámos nada que tenha sido apresentado pelo Sr. Deputado João Cravinho — nem este nem nenhum outro projecto de iniciativa legislativa que apresentamos. Aliás, o Sr. Deputado João Cravinho nada apresentou sobre esta matéria.

Vozes do PCP: — Exactamente!

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O Orador: — Falou-se nos jornais que o Sr. Deputado João Cravinho pretenderia apresentar uma iniciativa sobre enriquecimento ilícito, mas não o fez, portanto desconhecemos se chegou a redigir alguma coisa. Nunca tivemos acesso a esse texto, se ele alguma vez existiu! Aquilo em que nos inspirámos, Sr. Deputado, foi numa norma que vigorava na ordem jurídica de Macau numa altura em que ainda estava sob responsabilidade e administração portuguesa e em que os princípios constitucionais portugueses se lhe aplicavam plenamente. Aliás, quem defende essa disposição, quem considera que o crime de enriquecimento ilícito não constitui uma inversão do ónus da prova nem põe em causa a presunção de inocência — isso consta de um estudo recentemente publicado — é o Dr. Júlio Pereira, que é, aliás, o Secretário-Geral dos Serviços de Informações da República Portuguesa. Portanto, o Sr. Deputado achará, com certeza, que, nesta matéria, não estamos mal acompanhados.
O Sr. Deputado Ricardo Rodrigues — e estou a terminar, Sr. Presidente -, apesar das iniciativas legislativas irem baixar à comissão sem votação — nós próprios, e sob proposta sua, acabámos de subscrever um requerimento conjunto para que todas as iniciativas legislativas possam baixar à comissão sem votação — já foi dizer da tribuna como é que vai votar as iniciativas legislativas dos outros grupos parlamentares! E já que o Sr. Deputado anunciou o seu sentido de voto relativamente a algumas iniciativas pergunto-lhe se não quer também anunciar qual vai ser o sentido de voto do Partido Socialista relativamente a algumas propostas que são subscritas por Deputados do próprio Partido Socialista.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Isso é que nós gostávamos de saber!

O Orador: — Não nos quererá elucidar sobre essa matéria? Seria muito útil para este debate.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Ricardo Rodrigues, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista tinha uma opção, que era a de apresentar os seus projectos, discutir o seu conteúdo e o seu mérito e, naturalmente, pronunciar-se sobre os outros, mas escolheu uma estratégia alternativa: foi fazer um inventário ocultante da sua posição sobre as propostas do próprio grupo parlamentar e, portanto, surpreendenos tanto pelo que diz como pelo que não diz.
Não diz que posição tem acerca das matérias que enuncia. Fala-nos da herança das propostas Cravinho, das quais, uma parte, é retomada pelo Partido Socialista e, outra parte, rejeitada pelo Partido Socialista, e não quer ir ao mérito da discussão, que era e tem de ser a função deste debate. Desse ponto de vista, o Sr. Deputado entra numa contradição que vale a pena explicitar desde o primeiro momento.
O Partido Socialista pretende que não haja votação sobre nenhuma das iniciativas legislativas, promovendo a sua baixa à comissão, sem votação. No entanto, contraditoriamente, veio dizer-nos quais são as iniciativas legislativas que quer rejeitar na comissão.
Das duas, uma: ou estamos a fazer um exercício de pura ocultação, ou seja, de abafamento das iniciativas legislativas, para que finjamos que elas vão a discussão, já sabendo que não vão ser discutidas — o Partido Socialista não as quer discutir, só quer rejeitá-las desde o princípio e, então, quer evitar o ónus que ter de votar contra, mas diz-nos que, baixando à comissão, o destino delas é só o de serem recusadas e, portanto, de serem «abafadas», e isso é desleal para com a Assembleia da República — ou, então, o Partido Socialista pretende que haja uma discussão na comissão que seja convergente e que seja um trabalho em profundidade sobre todas as propostas.
Sr. Deputado, o que não pode fazer é pedir-nos que não votemos para que todas sejam discutidas, sabendo que não vão ser todas discutidas! Portanto, convém que esclareça desde já se o que o Partido Socialista faz é da boa-fé da vontade do debate parlamentar, sobre diferenças naturalmente, ou se, pelo contrário, só quer evitar o ónus de ter de votar propostas que rejeita, porque são do seu grupo parlamentar e porque foram postas à discussão pública pelo Deputado João Cravinho e por outros Deputados.
A segunda questão, Sr. Deputado, tem a ver com a inversão do ónus da prova.
A proposta do Bloco de Esquerda diz o seguinte: «Os titulares de cargos públicos, ou outros equiparados, têm o dever de justificar os incrementos patrimoniais que estão sujeitos a declaração ao Tribunal Constitucional ou a declaração fiscal.» O senhor chama a isto inversão do ónus da prova. Mas pergunto-lhe que sentido é que tem a obrigação de declaração se, perante incoerências, perante a não declaração, ou perante incompatibilidade entres as declarações e a situação real do contribuinte ou do declarante, não há, associado ao poder de exercer um cargo público, o dever concomitante de ter de apresentar justificação, que decorre da obrigação de prestar declarações ao Tribunal Constitucional.
É exclusivamente esta a proposta do Bloco de Esquerda. Dela decorrem, naturalmente, muitas sanções possíveis: pode ser uma sanção penal — logo discutiremos; pode ser uma sanção meramente fiscal; pode ser uma sanção de perda dos bens não declarados ou não justificados. Estão todas as hipóteses em aberto. O

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que não podemos aceitar é que, em nome da República, se possa permitir que haja não declarações ou declarações falsas e que delas não seja obrigado o detentor de cargo público à justificação por ser detentor de cargo público.
Naturalmente, isto parece incomodar o Sr. Deputado Ricardo Rodrigues. Sr. Deputado, pode-lhe chamar o que quiser, mas inversão do ónus da prova é que não.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Ricardo Rodrigues.

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Sr. Presidente, começarei por responder ao Sr. Deputado António Filipe e à bancada do PCP lendo o artigo 298.º do Regimento da Assembleia da República, que diz, no seu n.º 1, que «As convenções e os tratados sujeitos à aprovação da Assembleia da República, (…) são enviados pelo Governo à Assembleia da República.».
Portanto, respondo à primeira questão: quando disse que era ilegal, disse-o porque é! Está no nosso Regimento!!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Então, por que é que não recorreu?

O Orador: — Agora, vem a resposta. Essa era só a parte formal, que tem pouca importância.
O Conselho de Ministros de hoje aprovou a proposta de resolução que aprova a convenção contra a corrupção, adoptada pela Assembleia Geral das Nações Unidas.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Já valeu a pena!

O Orador: — Ou seja, vamos ter oportunidade de votar.
Sr. Deputado, não há qualquer discordância sobre essa matéria. Era uma questão de forma: os senhores queriam que aprovássemos, aqui, uma resolução que aprovasse o tratado, o que não é tecnicamente correcto, mas vamos seguir o caminho certo para atingir o mesmo objectivo.
Portanto, sobre essa matéria, estamos conversados.

O Sr. António Filipe (PCP): — Claro!

O Orador: — Respondo agora aos Srs. Deputados António Filipe e Francisco Louçã, relativamente à inversão do ónus da prova.
Caros Srs. Deputados, o que temos hoje, aqui, é a discussão, na generalidade, das propostas. Ora, a discussão, na generalidade, das propostas é falar delas genericamente.
Como o que se verifica é coincidência (vou ser mais meigo nas palavras) entre a maioria das propostas apresentadas pelo Grupo Parlamentar do Partido Socialista e as propostas apresentadas pelo PSD e as vossas, dispensei-me de falar das nossas, porque os senhores todos já as apresentaram.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Ahhh!…

Risos do BE.

O Orador: — Portanto, estamos todos esclarecidos sobre essa matéria: os senhores copiaram!

Vozes do PS: — Exactamente!

Risos do BE.

O Orador: — Tenho de esclarecer alguma coisa acerca das propostas que eram nossas e que são agora da vossa autoria?

Aplausos do PS.

Nada tenho de esclarecer, nada, Srs. Deputados!!

O Sr. Francisco Louçã (BE): — Tem de explicar por que é que vai votar contra!

O Orador: — Então, vamos à parte de fundo.
O Partido Socialista mudou de ideias? O Partido Socialista disse ao seu camarada João Cravinho que não queria a inversão do ónus da prova, para depois vir aqui aprovar as vossas propostas, que são as dele?

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Claro que não!! Nós não mudamos de ideias! E isso tinha de ficar claro desde o princípio! Questões de princípio: Estado de direito democrático! Inversão do ónus da prova: obrigar a pessoa a dizer aquilo que não quer. Nós não vamos por aí! São as regras ocidentais de um sistema penal, portanto, não vamos por aí! Qual é a dúvida em anunciar esse voto? Não vejo dúvida alguma! Nós não mudamos de opinião! Bem, mas é possível aproveitar alguma coisa? Claro que é, por isso é que as propostas vão baixar à comissão para apreciação na especialidade! A proposta do Bloco de Esquerda, que diz que a pessoa tem o dever de informar, claro que tem as consequências que o Sr. Deputado Francisco Louçã aqui tentou realçar. Quais são elas? Vamos ver, na especialidade! Se consubstanciar uma verdadeira inversão do ónus da prova, não contam connosco; se não consubstanciar, claro que a analisaremos.
Não temos dúvidas sobre essa matéria, o que não queremos é subverter o regime democrático, não queremos subverter o Estado de direito democrático. É essa a nossa baliza, portanto, para isso é que os senhores não contam connosco.
O Sr. Deputado Diogo Feio referiu a turbulência do PS. Ó Sr. Deputado, melhor era que estivesse calado, peço desculpa por dizer-lhe.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Ah, sim?!...

O Orador: — A turbulência no PS? Então, e o senhores que autoridade moral têm para falar em turbulência,…

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Toda!

O Orador: — … quando têm co-líderes, o presidente contra o grupo parlamentar, não há eleições, há demissão?...

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — De que mais vai querer falar?

O Orador: — Ó Sr. Deputado, não me meto nessa questão interna do CDS, pois é uma questão que aos senhores diz respeito; não me quero meter nessa questão porque é uma matéria partidária pura e simples.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Nem teve piada!

O Orador: — Contudo, digo-lhe que o Partido Socialista convive bem com os seus modos de ser. Temos divergências, assumimo-las com toda a transparência, mas, tratando-se de questões de princípio, não vergamos! E aí temos a coesão do grupo parlamentar! Não tenha dúvidas sobre essa matéria: o grupo parlamentar está coeso!

Aplausos do PS.

Depois, perguntou se eram precisas mais medidas legislativas ou se bastavam as administrativas.
Sr. Deputado, já percebemos que a vossa ideia é a de que bastam as administrativas.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Não dissemos que bastavam!

O Orador: — Vamos ver como votam, na especialidade. Vamos ver se votam contra todas as medidas aqui anunciadas, porque algumas delas parecem-me ter toda a pertinência, quer sejam as apresentadas pelo PS, quer sejam as copiadas ou as emendadas dos outros grupos parlamentares. E os senhores verão que, se calhar, vão votar a favor de algumas.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — E então?...

O Orador: — Está a ver? Até concorda.
Então, se calhar, é preciso também dar uma ajuda legislativa, Sr. Deputado. É isso que esta Câmara está fazendo.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — E o dinheiro?

O Orador: — Por último, gostaria de realçar que essa nossa discussão vai ter resultados para Portugal. É disso que estamos convencidos,…

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O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Com estas propostas?

O Orador: — … é esse o empenhamento do Partido Socialista.
E superioridades morais da direita?

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Não fomos nós que o dissemos! Vem no Diário de Notícias!

O Orador: — Ó Sr. Deputado, só a transcrição não serve: ou o Sr. Deputado concorda ou não. Ler aquilo que está escrito num jornal a mim diz-me pouco…

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Pois…!

O Orador: — Ou o Sr. Deputado concorda ou não.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Orador: — Por último, gostaria de salientar, também, a iniciativa do Sr. Presidente da Assembleia da República de levar a cabo uma conferência internacional sobre o tema, que nós também apoiamos, bem como todos os grupos parlamentares. Ou seja, é um empenhamento da Assembleia da República, no sentido de poder dar um contributo para combater esse flagelo. O combate à corrupção é um combate da democracia, dos democratas e, nessa matéria, não recebemos lições de ninguém.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Vamos, hoje, discutir neste Plenário, nada mais, nada menos, do que 16 iniciativas visando a adopção de novas medidas de combate à corrupção, seja para assegurar maior eficácia da prevenção seja com vista a garantir maior sucesso na repressão daquela criminalidade.
Este volume de projectos, por um lado, faz-me lembrar o adágio popular «de que não há fome que não dê em fartura»; por outro lado, torna difícil que não se faça uma menos desejável associação à máxima de Tácito, consignada nos Anais: «Corruptissima Respublica, Plurimae Leges».
Não deixa, porém, de ser inédito e, naturalmente, também significativo que entre as 16 iniciativas em debate não haja uma única proposta de lei do Governo. Tal só pode significar que o Governo acha que está tudo bem no âmbito do quadro legislativo e dos instrumentos de combate ao crime de corrupção e à sua investigação.
Aliás, já assim entendeu o Governo quando, na discussão do Orçamento do Estado, recusou a proposta do PSD de reforço de meios da direcção do combate à corrupção da Polícia Judiciária.
A total omissão do Governo em matéria desta importância para a transparência da vida pública, para a credibilidade das instituições e para o reforço do rigor, da exigência e da necessária responsabilização na gestão da coisa pública, é preocupante e elucidativa: nem um só membro do Governo está presente neste debate.
Compreendem-se, assim, melhor as hesitações, os avanços e os recuos a que, nesta matéria, se tem assistido no seio da maioria socialista.
Percebe-se, assim, mais facilmente a necessidade que isoladamente um ex-Deputado da maioria sentiu de ultrapassar a pesada inércia do seu grupo parlamentar, apresentando ele as suas iniciativas para um combate que, estamos certos, queria que fosse, logo à partida, de todos os seus pares, mas que a fria e dura realidade mostra que era só de alguns, e muito poucos.
É, assim, tardiamente e numa tentativa de suprir a omissão de um Governo ausente, que a maioria socialista nesta Assembleia, empurrada à força, um pouco e isoladamente por dentro, mas acima de tudo por fora, pelo maior partido da oposição e também pelos demais, se viu obrigada em último lugar, qual «lanterna vermelha», a apresentar o projecto de lei n.º 362/X. E, como o aluno cábula, copiou mesmo pelo colega do lado, mais estudioso e mais adiantado.
Em qualquer caso, a circunstância de praticamente todos os grupos parlamentares terem iniciativas diferenciadas, com um ou outro aspecto coincidente, mas com propostas distintas, enriquece este debate.
Por outro lado, é democraticamente saudável registar uma larga convergência de propósitos no combate a um fenómeno grave e intolerável, como é a corrupção.
Por isso, achamos que as iniciativas em debate devem ser, desde já, todas viabilizadas, na generalidade, na esperança de que o contributo de todos e de cada um permita que, na especialidade, nos ponhamos de acordo no essencial, aprovando as medidas mais adequadas a servirem de novas respostas e a assegurarem maior eficácia no combate a esta criminalidade.

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Só assim reforçaremos a credibilidade das instituições, impedindo que grasse impunemente a corrupção. E é isso que os portugueses esperam de nós e desta Câmara que os representa.
Só assim impediremos generalizações abusivas, que se transformam num anátema indiscriminado sobre os responsáveis políticos e titulares de cargos públicos. Não «distinguir o trigo do joio» ou «confundir a árvore com a floresta» é também, em si mesmo, uma forma de corrupção social que corrói, igualmente, a sociedade e as suas instituições.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Não vos vou apresentar em pormenor as iniciativas do PSD em debate, tarefa que caberá ao meu companheiro de bancada, bem mais apto a fazê-lo, o Sr. Deputado Fernando Negrão.
Como não vou apreciar o conteúdo técnico, jurídico e normativo das demais iniciativas, tarefa que devemos fazer, com a maior atenção e cuidado, em Comissão, na especialidade.
Permitam-me, antes, que discorra um pouco mais sobre esta temática e que lembre aqui alguns dos antecedentes do percurso legislativo que vimos seguindo neste âmbito do combate à corrupção e à criminalidade económicas.
Vão longe os tempos em que, contrastando com a ausência de iniciativas do actual Governo, o primeiroministro, humilde, mas convictamente, veio a esta Câmara apresentar uma proposta de lei de autorização legislativa (depois transformada em proposta de lei material), que visava aprovar importantes medidas de combate à corrupção. Refiro-me à proposta de lei n.º 48/VI, que depois deu lugar à proposta de lei n.º 60/VI, aqui ineditamente apresentada, neste Plenário, em 14 de Março de 1993, pelo então primeiro-ministro e actual Presidente da República, Prof. Cavaco Silva, que tem, também, por isso, ética acrescida nas razões de empenhamento e nas preocupações que vem revelando por este combate.
É bom lembrar que foi dessa iniciativa que saiu um dos mais importantes reforços de meios de sempre no combate à corrupção.
Como é bom lembrar, também, que foi essa lei que criou, e esse seu governo que implementou, o Departamento de Perícia Financeira e Contabilística, essencial no apoio à investigação deste tipo de criminalidade, reforçando também as competências da Direcção Central para o Combate à Corrupção, Fraudes e Infracções Económicas e Financeiras.
E deve ser igualmente recordado que, apesar de ser assim, essa lei foi votada, nesta Assembleia, isoladamente, apenas e só pelo PSD. Não chegámos, pois, só agora, nem esperámos por ninguém, para nos empenharmos neste combate em que estamos desde sempre.
Sabemos das dificuldades da investigação e da detecção deste tipo de criminalidade, bem como da forma insidiosa como se desenvolve.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Quando nos batemos por valores e por princípios que temos de salvaguardar colectivamente — e espero que assim seja pela parte de todas as iniciativas que estamos a discutir —, não o devemos fazer atropelando ou preterindo outros valores e princípios essenciais da pessoa, que num Estado de direito devem ser igualmente prezados. Este é um dilema com que o legislador sempre se depara nestas matérias.
Trata-se muitas vezes de consagrar formas que, no plano ético, deixam alguma reserva. É o caso, por exemplo, da atenuação e dos benefícios com que se premeiam os arguidos colaborantes. Não será, porventura, essa a medida mais problemática.
Em todo o caso, também é bom lembrar o que refere o ilustre Magistrado, Dr. Manuel Lopes Rocha: «Pense-se o que se quiser deste expediente, dificilmente o legislador poderá sacrificar conveniências de política criminal a considerações de ordem moral.» Não tenhamos, porém, a ilusão de que o combate à corrupção se esgota nos instrumentos legislativos e jurídicos ou mesmo nos meios humanos e materiais afectos aos órgãos de investigação e de instrução criminal. Este problema hoje, mais do que nunca, assume natureza cultural e tem que ver com os valores que, em cada momento, enformam as comunidades.
Não queremos uma sociedade em que os valores do poder e do prestígio são ajuizados em termos meramente materiais, superando os valores da honestidade, da lisura, da lealdade e da competência. Essa, sim, é uma sociedade geradora de corrupção.
Significa isto que, também neste particular, continuam válidas e actuais as nossas preocupações em relação à escola e à família, depositárias desses valores.
Revemo-nos em William Shakespeare, quando refere, em O Mercador de Veneza, que «Ninguém deve enganar a fortuna ou recolher as honras, sem que tenha o cunho do mérito, ninguém sonhe com dignidades que não mereça. Quanto seria para desejar que riqueza, postos e empregos não fossem devidos à corrupção, que todas as obras fossem justificadas pelo merecimento daquele que as recebe.» Mas o respeito por princípios fundamentais do Estado de direito é exigível a todos.
Não pactuaremos com o desrespeito pelo princípio da presunção da inocência.
Não pactuaremos com as constantes violações do segredo de justiça, nem com os pré-julgamentos, cada vez mais frequentes, na comunicação social.

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O Estado de direito e princípios como o da separação de poderes e a credibilização das instituições judiciárias implicam que este combate não seja desvirtuado, comprometido ou posto em causa pela indevida «justicialização» da política ou pela indesejável politização da justiça.
Mas não culpemos apenas os outros, designadamente os media, pelos desvios que não desejamos. Cabenos, antes de mais, dar o exemplo e não fazer destas questões meras «armas de arremesso político» ou «terreno de luta político-partidária».
Nesta matéria, respeitemos e deixemos funcionar as instituições. Mas que fique claro: que nada sirva de pretexto para enfraquecer ou protelar um mais eficaz combate à corrupção! Nesta matéria, não abdicaremos da exigência de que todos, sem hesitações, suscitem os seus efectivos poderes no âmbito das suas competências legais e constitucionais, com a firmeza que se impõe num combate sem tréguas à corrupção, que queremos implacável e exemplar.
Só assim vale a pena apostar em novas propostas.
Só assim tem sentido apresentar, com inovação, soluções com as quais queremos contribuir para esse combate em que acreditamos, de que não desistimos e que é sempre autêntico e igualmente empenhado, quer estejamos no poder quer estejamos na oposição.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O conjunto de projectos que apreciamos, hoje, tem algumas zonas importantes de convergência e algumas diferenças, que importa esclarecer, para que fique claro qual é o âmbito do trabalho da Comissão, quando esta os apreciar, na especialidade.
Parece consensual, na Assembleia da República, a necessidade de uma alteração ao Código Penal, bem como a necessidade de alterações, decorrentes dessa, na lei que determina a punição dos crimes de responsabilidade de titulares de cargos públicos; de outras matérias na Lei Geral Tributária e no Regime Geral das Infracções Tributárias; e de algumas das orientações para a prestação de contas de todas as entidades, da Procuradoria-Geral da República, do Governo, de outras entidades de investigação e de combate à corrupção.
Os passos que são dados através desses acordos são substanciais e a bancada do Bloco de Esquerda associa-se a essas iniciativas e pretende reforçá-las e apoiá-las no debate da especialidade.
Existem, no entanto, diferenças substanciais que queria trazer à discussão.
A primeira delas diz respeito ao Código Penal.
O Código Penal actual, como é bem sabido, estabelece uma diferenciação, na moldura penal, entre a punição do crime de corrupção passiva e a punição do crime de corrupção activa, bem como uma tipologia diferente para a corrupção passiva, quando se trate de acto lícito ou de acto ilícito.
A proposta do Bloco de Esquerda pretende definir um único contexto, considerando corrupção passiva quer aquela iniciativa que pretenda obter vantagem num acto lícito quer a que implique um acto ilícito, pela simples razão de que não nos parece possível diferenciar as «luvas» e os pequenos subornos instituídos institucionalmente, no contexto dos actos de corrupção passiva, porque, em todos, se trata de uma intenção e de uma vantagem ilegal.
No mesmo sentido, pretendemos que a mesma pena seja aplicada aos casos de corrupção passiva e de corrupção activa e que os instrumentos do Código de Processo Penal e de outras formas de investigação sejam os mesmos quando se trata de combater uma e outra forma de crime, porque elas estão directamente associadas e devem ser punidas na mesma medida. Daí decorrem, aliás, algumas das propostas que fazemos no quadro da lei que pune os crimes da responsabilidade de titulares.
Já tivemos uma segunda discussão, brevemente suscitada pela intervenção do Partido Socialista, a respeito da inversão do ónus da prova. E registo o recuo do Partido Socialista na forma como aprecia a iniciativa que o Bloco de Esquerda apresenta a este respeito.
Nós sublinhámos — e eu já o disse aqui, no debate com o Primeiro-Ministro — que o princípio da inversão do ónus da prova já existe no quadro e no âmbito da lei fiscal. E é indispensável que exista, que seja aplicado e que seja aplicado de uma forma generalizada. O que acrescentamos — como o Sr. Deputado Ricardo Rodrigues acabou de reconhecer — é a obrigação, decorrente do exercício de um cargo público de responsabilidade, aquele que dá um poder especial ao detentor desse cargo público, de prestar informação sobre todas as mutações do património e sobre todos os incrementos patrimoniais. Parece-nos irrecusável, parece-nos absolutamente de bom senso, porque a lei já estabelece que esses cidadãos têm uma obrigação declarativa única e, como têm essa obrigação, têm, portanto, o dever de justificar aquilo que sejam transformações patrimoniais.
O Sr. Deputado Ricardo Rodrigues quis atribuir-nos a formação de uma entidade. Enganou-se! Nós não criamos entidade alguma! Apreciamos as três propostas que aqui aparecem para uma Comissão para a Prevenção da Corrupção, dos Deputados que colaboraram com o ex-Deputado João Cravinho, para uma Agência Anticorrupção, do PSD e para uma Comissão Nacional da Prevenção da Criminalidade Económica e Financeira, do PCP, mas não fazemos qualquer proposta nesse sentido. Em contrapartida, insistimos na

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necessidade da existência de planos, de políticas e de orientações tornadas públicas e verificáveis, no combate à corrupção e na sua prevenção.
Registo ainda que o Partido Socialista apresentou algumas propostas que não chegou a trazer a Plenário e que, no afã de, em algum momento, somar muitas propostas à sua intervenção anticorrupção, chegou a enunciar como propostas contra a corrupção uma alteração do regime do segredo bancário, que, entretanto, acabou por desaparecer,…

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Está na 1.ª Comissão!

O Orador: — … porque foi recusada pelo próprio PS, em comissão, na medida em que quis reduzir a alteração do segredo bancário a quem faz uma reclamação administrativa ou judicial e, portanto, não há qualquer alteração do segredo bancário nem aqui, nem pendente na comissão, porque foi rejeitada, assim como chegou a dizer que queria estabelecer uma obrigação de declaração de transferências para os offshore, apesar de se ter verificado que se tratava de um «divertimento» legislativo, visto que, quando se viu a lei, a declaração de transferências para os offshore era só para aqueles para os quais não há transferências de rendimentos e, portanto, tratava-se de declarar coisa nenhuma, visto que, em Portugal, não existe qualquer transferência de rendimentos para os offshore da lista negra, que são aqueles que são obrigados a declaração, mas há para os outros, que, neste contexto, não são obrigados a declaração.
Dito isto, há, no entanto, um problema que tem a ver com duas iniciativas legislativas, uma do PS e outra do Bloco de Esquerda, que é central neste contexto, e quero referir-me a ele em detalhe.
Nós podemos apreciar a corrupção de duas formas: como um acto irregular, desviante, episódico e raro dos agentes económicos e, então, olhamos para ele apenas no ângulo da política criminal e do Código Penal e, deste modo, não conseguimos combater a corrupção, andamos a correr atrás do dinheiro da corrupção; ou, para além de todo o rigor penal e criminal, podemos considerar que a corrupção é já, em Portugal, um sistema de poder e, neste caso, não se trata só de combater as excepções, trata-se também de combater as excepções, não se trata só de combater os casos raros e únicos, trata-se também de os combater e de compreender que a corrupção se tornou um sistema de vantagens privadas indevidas E é esse sistema que tem de ser parado, em nome da transparência e da democracia! Não é uma questão de penas, é uma questão de democracia! O Partido Socialista, durante algum tempo, tentou opor-se ao agendamento do projecto de lei do Bloco de Esquerda sobre a cativação pública das mais-valias da especulação imobiliária, mas, finalmente, foi aceite que ele viesse a este debate.
Porém, agora, acrescentou — e ainda bem — o projecto de lei n.º 363/X, que versa sobre transcrição digital georreferenciada dos planos municipais de ordenamento do território. E importa explicar por que é que isto aqui aparece — e o Partido Socialista explicar-nos-á —, por que é que, no debate da corrupção, há um projecto sobre transcrição digital (transparência!) dos PDM. Tem toda a justificação, mas o Partido Socialista deverá explicar-nos porquê e, ao explicar, só dará razão à iniciativa do Bloco de Esquerda.
Nós pretendemos que o combate ao sistema da corrupção comece por ser um combate à origem dos enriquecimentos indevidos e ao sistema que promove o favorecimento de alguns detentores de cargos públicos e que gera o enriquecimento da corrupção.
Exemplos: a Quinta das Fontaínhas tem 27 ha, era da rede ecológica nacional, foi comprada por 300 000 euros, mas, com a revisão do PDM, passou a valer 26 milhões de euros — 10 000% de lucro; a Quinta da Rocha foi comprada por 500 000 euros, mas, com a revisão do registo dos prédios urbanos, foi vendida por 15 milhões de euros — 3000% de lucro; a Sociedade Cabo Raso comprou 270 ha por 3 milhões de euros e pede ao Estado uma indemnização de 374 milhões de euros, porque queria uma revisão do PDM para reclassificar os terrenos — 10 000% de lucro; a Herdade da Vargem Seca foi comprada, ao tempo, por 78$/m
2
, foi vendida por 16 000$/m
2 — 20 000% de lucro; em Marvila, a Obriverca compra um terreno por 26 milhões de euros, logo a seguir, vende uma parte desse terreno (dois terços) por 56 milhões de euros; em Gondomar verificou-se a compra de um terreno por 1 milhão de euros, o qual, duas semanas depois, foi desafectado da reserva agrícola nacional e vendido por 4 milhões de euros — 400% de lucro, em duas semanas!! Sr.as e Srs. Deputados: 3000% de lucro, 20 000% de lucro, 30 000% de lucro é o que a especulação imobiliária pode permitir em negócios, alguns, certamente, legítimos, mas permitidos por uma lei permissiva, e outros facilitados pelo favorecimento, que, neste contexto, tem sempre ou pode ter um preço.
É por isso que o nosso projecto de lei, fazendo o que se faz em Espanha ou na Alemanha ou na Holanda, pretende, simplesmente, impedir que o acto administrativo que valoriza terrenos na ordem dos 30 000% seja beneficiador de um empresário para além do que é a razoável valorização de mercado. É neste contexto exacto que surge o nosso projecto! O Partido Socialista dá-nos razão ao reconhecer que o debate dos PDM tem de entrar no debate da questão da corrupção. Resta saber: se o fazemos, é para quê? Se há transparência, o que é que ela nos permite? Se nós conhecemos os PDM, como devem ser conhecidos por qualquer cidadão ou qualquer munícipe, qual é a consequência que temos destas valorizações exorbitantes, de um enriquecimento que é impossível em qualquer outro contexto na sociedade portuguesa? E perguntar é responder! É que quando há

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um enriquecimento deste tipo, que só depende de uma decisão de um funcionário, de uma câmara ou de um conselho de Ministros, então, a possibilidade de favorecer o favorecimento é gigantesca e é isso que faz o sistema da corrupção.
Portanto, o que pretendemos é que, numa legislação inovadora e transformadora da política dos solos em Portugal, se comece o combate à corrupção onde ele existe e que é um sistema.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começo por saudar este agendamento.
Em 7 de Julho de 2006, realizou-se aqui um debate de urgência sobre este mesmo tema, então, por iniciativa do PCP, depois de ter sido conhecido o segundo relatório do Grupo de Estados contra a Corrupção, do Conselho da Europa, que formulou um juízo muito severo e negativo sobre a situação da corrupção em Portugal e sobre a insuficiência e ineficiência das medidas adoptadas entre nós para prevenir e combater este fenómeno.
A nossa preocupação com este problema não é de hoje nem de 2006. Já em 1994 suscitámos um debate de urgência neste Plenário sobre a situação da corrupção em Portugal e o que é preocupante é que o diagnóstico que, então, fizemos poderia hoje ser repetido e manteria toda a actualidade.
Não quero, com isto, dizer que, de 1994 até hoje, nada se avançou. Não seria justo dizê-lo. Em matéria legislativa, registaram-se alguns progressos. É inquestionável que os mecanismos legais de combate à criminalidade têm vindo a ser aperfeiçoados. Não estamos perante um vazio legal, em matéria de combate à corrupção. Não é por falta de lei que os crimes de corrupção ficam por punir. O problema será mais de prevenção, de coordenação, de suficiência de meios.
O que importa, fundamentalmente, é precisar o diagnóstico, verificar os problemas, detectar os estrangulamentos, as disfunções, as insuficiências dos mecanismos legais e práticos de combate à corrupção.
Mas, feito o diagnóstico, é necessário agir e passar dos problemas para as soluções.
Só com um combate eficaz à corrupção e às suas expressões concretas será possível ultrapassar um clima, que nada tem de saudável, em que, à sombra da impunidade de alguns, a suspeição recai sobre todos.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Orador: — O «relatório GRECO» avança já com boa parte do diagnóstico e também refere que o problema não está fundamentalmente na lei mas nas dificuldades práticas da sua aplicação. Esse relatório refere que, desde 2002, as autoridades policiais portuguesas desencadearam 1521 investigações de casos de corrupção, tendo completado 407. No entanto, o número de apreensões e de somas envolvidas foi mínimo.
Em 2005, não se verificou um único caso de confisco de bens ilicitamente obtidos pela prática de crimes de natureza económica ou financeira.
Procurando encontrar explicações para este facto, os relatores concluíram que as investigações sobre este tipo de crimes foram, muitas vezes, abandonadas, por falta de recursos, ou atrasadas, devido a falta de comunicação adequada entre entidades públicas e privadas. Apesar dos poderes estabelecidos na lei quanto ao acesso a elementos de natureza bancária e fiscal, estes chegaram, muitas vezes, demasiado tarde.
Por outro lado, a investigação sobre os bens suspeitos de terem sido ilicitamente obtidos não foi feita de forma sistemática, por falta de recursos e por não ser considerada uma prioridade.
Apesar de existir legislação que obriga a participar, às autoridades judiciárias, as operações financeiras suspeitas, apenas dois casos suspeitos de corrupção foram comunicados em 2005, o que, segundo os relatores, revela a falta de uma relação estruturada entre as instituições que estão obrigadas a comunicar transacções suspeitas e o Ministério Público, a polícia, as autoridades de supervisão financeira e outras entidades reguladoras. Para além de que as entidades sujeitas à obrigação de comunicar operações suspeitas não recebem qualquer indicação ou preparação específica que as ajude a estabelecer conexões entre as operações de que tomam conhecimento e a possível ocorrência de actos de corrupção.
No âmbito da Administração Pública, o relatório refere a ausência de coordenação entre diversas entidades que poderiam e deveriam ter um papel determinante na prevenção da corrupção. Chama a atenção para os perigos de algumas medidas ditas de modernização e de simplificação administrativa e para os riscos de corrupção que tais medidas podem propiciar.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

O Orador: — Refere a insuficiência da fiscalização de conflitos de interesses entre o exercício de cargos públicos e a prossecução de interesses privados e considera insatisfatória a regulação daquilo a que chama a «migração» do sector público para o sector privado. Considera ainda que aqueles que de boa fé denunciem actos de corrupção não têm garantida a protecção legal adequada contra possíveis actos de retaliação.

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O desafio com que hoje estamos confrontados, como legisladores, é o de contribuir para resolver melhor estes problemas, criando novos mecanismos legais e aperfeiçoando os já existentes, com vista à obtenção de mais e melhores resultados. É por isso que saudamos este debate.
Estamos perante 14 iniciativas parlamentares que visam melhorar os mecanismos de combate à corrupção.
São iniciativas de natureza diversa, de âmbitos diferentes e de valia, seguramente, distinta, mas, em todo o caso, todas elas constituem matéria para debate e para decisão que deve ser devidamente considerada e ponderada.
O Grupo Parlamentar do PCP participa neste debate com três iniciativas concretas, que passo a referir sinteticamente.
Apresentamos um projecto de resolução que propõe que o Estado português ratifique, sem mais demora, a Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção, conhecida por Convenção de Mérida. Esta Convenção foi negociada entre 21 de Janeiro de 2002 e 1 de Outubro de 2003 e veio a ser adoptada por Resolução das Nações Unidas de 31 de Outubro de 2003 e aberta à assinatura em Dezembro desse mesmo ano.
Constituem finalidades desta Convenção das Nações Unidas «promover e fortalecer as medidas para prevenir e combater mais eficaz e eficientemente a corrupção; promover, facilitar e apoiar a cooperação internacional e a assistência técnica na prevenção e na luta contra a corrupção, incluindo a recuperação dos activos; promover a integridade, a obrigação de prestar contas e respectiva gestão nas matérias e bens públicos».
Em 14 de Dezembro de 2005, esta Convenção entrou em vigor, após o depósito do 30.º instrumento de ratificação.
Não faz sentido algum que o Estado português ainda não tenha ratificado esta Convenção e, assim, dado que o Governo ainda não apresentou qualquer proposta de resolução com esse objectivo, o PCP tomou a iniciativa de apresentar um projecto de resolução propondo a aprovação para ratificação dessa Convenção internacional.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Orador: — O PCP apresenta também um projecto de lei que propõe a adopção de um programa nacional de prevenção e combate à criminalidade económica e financeira, a levar a cabo através de uma comissão nacional criada para esse efeito.
O PCP não propõe a criação de uma estrutura burocrática, que seria mais uma, nem de uma comissão emanada do poder político e submetida à vontade de maiorias conjunturais, nem de uma agência de emprego para clientelas políticas. Não se pretende com esta comissão criar uma superestrutura que se substitua às entidades que têm competências e responsabilidades próprias no combate à corrupção e à criminalidade económica e financeira. O que se propõe é tão-só — e não é pouco! — promover a coordenação de esforços entre essas entidades no respeito pelas competências próprias de cada uma.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Orador: — Finalmente, o PCP apresenta um projecto de lei que propõe três coisas, a primeira das quais é a tipificação de um crime de enriquecimento injustificado. Trata-se de aditar ao Código Penal um tipo de crime mediante o qual os cidadãos que exercem funções públicas e que disponham de rendimentos e património manifestamente incompatíveis com os que constem das respectivas declarações devem demonstrar a sua origem lícita.
Um cidadão que está ao serviço do Estado, pelo cargo que exerce ou pelas funções que desempenha, que apresenta uma declaração de rendimentos e de património e que apresenta uma declaração para efeitos de IRS mas relativamente a quem se verifica que dispõe de bens e rendimentos manifestamente superiores aos declarados, incorre no crime de enriquecimento injustificado.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Orador: — Mas obviamente que a ilicitude estará excluída se for demonstrado que os bens foram obtidos de forma lícita.
Não ignoramos as objecções que têm sido opostas à consagração deste tipo de crime, baseadas na presunção de inocência,…

O Sr. Honório Novo (PCP): — Quem não deve não teme!

O Orador: — Mas também não ignoramos a refutação dessas objecções em ordens jurídicas que a consagraram.
O elemento constitutivo do crime é a posse de riqueza injustificada.

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O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

O Orador: — Até que a existência dessa riqueza seja provada em tribunal, o arguido presume-se inocente.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Claro!

O Orador: — A demonstração da sua origem lícita exclui a ilicitude.
Tomemos como exemplo a posse de arma proibida. Também aí a ilicitude está na posse, independentemente da forma como a arma foi obtida e do uso que o agente pretenda fazer dela.
A posse de bens e rendimentos manifestamente superiores aos declarados por parte de quem exerça funções públicas deve ser, só por si, punida por lei, com a ressalva de que a prova de que tais bens ou rendimentos foram licitamente obtidos constitui causa de exclusão da ilicitude. Srs. Deputados, é tão simples e tão claro como isto!!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Orador: — Segunda: a aplicação aos crimes de corrupção de todas as possibilidades de protecção de testemunhas já previstas na lei para outras formas graves de criminalidade. Aqui o objectivo é evidente: tratase de assegurar que quem de boa-fé denuncie actos de corrupção seja justamente defendido de eventuais actos de retaliação que possam ter lugar.
Terceira: a previsão da possibilidade de apreensão e perda para o Estado dos bens adquiridos por via da prática de crimes de corrupção.
Estas são as nossas propostas, mas não deixamos, obviamente, de ponderar todas as outras.
Seguramente que concordamos com algumas, seguramente que com outras nem tanto.
Este debate surge, em termos mediáticos, muito associado a propostas, umas, publicitadas e, outras, apresentadas pelo então Deputado João Cravinho e às contradições no interior do Partido Socialista em torno dessas propostas.
Quero deixar aqui muito claro que o Engenheiro João Cravinho e as suas propostas nos merecem toda a consideração e que as que foram efectivamente apresentadas — porque nem todas o foram — estão aqui para nossa apreciação. Concordamos com umas e discordamos de outras, mas nunca nos passou pela cabeça fazer uma «OPA» sobre as propostas do Engenheiro João Cravinho para explorar as contradições do Partido Socialista.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Orador: — O PCP apresenta as suas próprias propostas e apenas essas. Apresenta as propostas que considera justas e adequadas para resolver os problemas do País e não para arremessar à cabeça do PS ou de qualquer outro partido. Os Srs. Deputados do PS dizem que os copiámos. Hão-de dizer-nos, se fazem favor, onde está o original.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

O Orador: — De todo o acervo de propostas que temos para discussão achamos aceitável a ideia do alargamento dos prazos de prescrição dos crimes de corrupção,…

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Essa é a nossa ideia!

O Orador: — … mas pensamos que deve ser bem discutida a alteração dos tipos de crime de corrupção passiva já previstos no Código Penal, transformando a actual distinção entre corrupção para a prática de acto lícito ou de acto ilícito por corrupção para a prática de acto determinado ou em razão das funções. Não excluímos a ideia, mas não achamos que a actual formulação do Código Penal, que, aliás, foi aprovada em 2001, constitua algum obstáculo à punição dos crimes de corrupção.
Há muitas outras propostas que terão a nossa concordância. Tudo o que contribua para aumentar a transparência no exercício de funções públicas, para reduzir os espaços de impunidade no abuso dessas funções em proveito próprio ou para dotar de mais e melhores meios, materiais e legais, quem tem por missão lutar contra a corrupção e a criminalidade em geral merece o nosso apoio, venha de onde vier.
Há, no entanto, algumas prevenções que importa fazer. Há, desde logo, que evitar a criação de estruturas burocráticas à sombra do combate à corrupção ou a criação de estruturas concorrenciais com entidades já existentes, que, apesar das suas boas intenções, pudessem vir a criar novos factores de atrito, de confusão e de guerras de competências. Há estruturas, agências e comissões propostas — aliás, nós próprios propomos uma —, pelo que temos de cuidar muito bem da coerência do sistema que instituímos para que ele seja parte da solução e não venha a ser mais uma parte do problema.

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O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Orador: — O mesmo se diga quanto aos relatórios, aos planos e às orientações estratégicas. Sem excluir nada à partida, basta somar os relatórios, os planos e as orientações propostos para verificar que, se tudo fosse aprovado no final, estaríamos a criar uma burocracia do combate à corrupção que passaria a vida «a redigir orientações, a elaborar planos para cumprir as orientações e a escrever relatórios sobre a execução dos planos»… Nada temos contra os planos nem contra os relatórios, mas é óbvio que há que ter em conta a justa medida para que esses instrumentos possam ter alguma eficácia.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Orador: — Em todo o caso, Sr. Presidente e Srs. Deputados, achamos que este trabalho vale a pena. O combate à corrupção é um combate de cidadania que merece a pena ser travado, em nome da democracia e de uma sociedade mais decente em que queremos viver.
Pela nossa parte, estamos firmemente empenhados em dar o nosso melhor contributo para que o trabalho que agora se inicia possa produzir bons resultados.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Negrão.

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Voltamos hoje a apresentar iniciativas relativas ao combate à corrupção, após longos meses de discussões internas no interior do Partido Socialista relativas a propostas de um seu ilustre ex-Deputado com conteúdo positivo nesta área e que tiveram como resultado a sua rejeição por parte da maioria. E não nos envergonha apresentar propostas que tenham origem num nosso adversário político,…

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Muito bem!

O Orador: — … porque as consideramos importantes para Portugal e para os portugueses. Envergonhanos, sim, ver um Deputado da Assembleia da República aqui vir fazer jogo de palavras e truques de ideias que não interessam nem a Portugal nem aos portugueses.

Aplausos do PSD.

Nesse longo período de tempo, voltamos a lembrar a recusa do Governo à nossa proposta de incluir no orçamento da Polícia Judiciária um aumento de 4 milhões de euros com vista a preencher conhecidas lacunas na operacionalização dos meios de combate à corrupção, bem como as hesitações e recusa à nossa iniciativa de audição do Sr. Procurador-Geral da República e do Sr. Director Nacional da Polícia Judiciária, com o objectivo de nos dotar de um conhecimento provindo de experiência feito, e, ainda, o silêncio do Governo e do Partido Socialista como forma de resposta ao discurso do Sr. Presidente da República proferido no passado dia 5 de Outubro, nas comemorações dos 96 anos da proclamação da República, que, aludindo ao fenómeno da corrupção, nos diz que «existem sinais que nos obrigam a reflectir seriamente sobre se o combate a esse fenómeno tem sido travado de forma eficaz e satisfatória, seja no plano preventivo da instauração de uma cultura de dever e responsabilidade, seja no plano repressivo da perseguição criminal». E acrescenta: «A corrupção tem um potencial corrosivo para a qualidade da democracia que não pode ser menosprezado. Como tal, todos devem ser chamados a travar a batalha da moralização da vida pública, a bem da democracia e a bem da República.

O Sr. Pedro Duarte (PSD): — Muito bem!

O Orador: — São, por isso, de saudar todas as iniciativas que, de uma forma séria, contribuam para debelar o fenómeno da corrupção».

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Bem lembrado!

O Orador: — Estamos cientes da dimensão política que o fenómeno da corrupção atingiu, da sua expansão em várias áreas do domínio público, alimentando práticas de governo ilícitas, debilitando a economia, causando crises institucionais, aumentando a distância e o desinteresse pela política e suas instituições, em suma, ameaçando os alicerces da democracia.

Vozes do PSD: — Muito bem!

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O Orador: — É, pois, neste espírito, e no seguimento de apresentação anterior de um projecto de lei de combate à corrupção no mundo do desporto, que o PSD vem agora apresentar duas iniciativas legislativas quanto à corrupção em geral, sendo uma de carácter preventivo e outra de natureza repressiva. E fá-lo de uma forma consistente, responsável e firme, insistindo que a passividade nesta matéria é o equivalente ao minar da democracia, ao definhar do crescimento económico e à degradação do Estado de direito.

Aplausos do PSD.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: No plano preventivo e por força da norma travão da Constituição, que impõe a impossibilidade de aprovar para o corrente ano orçamental, de uma proposta para a criação de uma nova entidade pública, sob a forma de «recomendação» propõe-se a criação de uma agência anticorrupção». Agência esta dotada de uma estrutura simples e flexível, composta por um reduzido número de elementos, a funcionar junto da Assembleia da República, dotada da capacidade de exigir colaboração de todas as entidades do Estado ou a ele ligadas e com um prazo concreto de apresentação de um relatório sobre a adopção de medidas no combate à corrupção. E esse relatório conterá recomendações dirigidas aos seguintes vectores de intervenção: protecção aos denunciantes de suspeitas de corrupção;…

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Isso é importante!

O Orador: — … adopção de claras regras em matéria de conflitos de interesses e de migração abusiva do sector público para o sector privado; elaboração de códigos de conduta, com referências explícitas a aspectos deontológicos, a riscos de prática de corrupção e a um regime de sanções adequado no caso do seu desrespeito;…

O Sr. Paulo Rangel (PSD): — Muito bem!

O Orador: — … análise dos riscos de corrupção em todo o sector público, tendo em vista a aplicação de medidas preventivas;…

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Exactamente!

O Orador: — … revisão do regime legal de detecção, apreensão e perda dos produtos obtidos por via da prática de corrupção; reforço sistemático das investigações financeiras e patrimoniais, designadamente através da mobilização plena de meios jurídicos, técnicos e humanos; reforço do diagnóstico antibranqueamento e a sua articulação com o combate à corrupção, quer no plano de serem declaradas transacções suspeitas quer na formação adequada à detecção e ao reporte de indícios de corrupção.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Muito bem!

O Orador: — Esta agência é de primordial importância, pois constituirá o meio de suprir as deficiências e carências da nossa estrutura administrativa, apontadas pelo Grupo de Estados Contra a Corrupção (GRECO) em Maio de 2006 e que nos convida a fazer o ponto da situação a 30 de Novembro do corrente ano.
Chama-se, por isso, a atenção do Governo para a situação de atraso em que já nos encontramos e que, a continuar, não só transmitirá uma imagem de desleixo como também nos manterá como um Estado sem mecanismos sérios de prevenção ou de gestão preventiva de riscos na área da corrupção.

Aplausos do PSD.

No plano repressivo, acolhendo embora algumas das ideias defendidas pelo então Deputado João Cravinho, que tanto embaraço causaram ao Governo e ao Grupo Parlamentar do PS, o PSD avança com firmeza e responsabilidade com propostas de carácter inovador, que podem vir a constituir o começo de um caminho novo, mais sólido e mais eficaz no combate à corrupção.
Alarga-se o prazo de prescrição para 15 anos, não porque a morosidade da justiça seja a justificação, o que seria um mau princípio, mas, sim, porque a complexidade deste tipo de crime, seja no tempo da sua denúncia ou detecção seja no tempo das diligências de investigação, levam à necessidade de um prazo mais alargado.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Orador: — Dá-se for finda a distinção entre corrupção por acto ilícito e corrupção por acto lícito, passando a diferença a fazer-se entre corrupção por acto determinado e em razão das funções, o que tem por consequência não deixar de fora situações de corrupção até aqui não previstas.

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O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Muito bem!

O Orador: — Sendo que a tal mudança, bem como aos crimes de corrupção activa e passiva e ao regime de responsabilidade dos titulares de cargos políticos, se faz corresponder um agravamento das respectivas penas, no sentido de reforçar o desvalor de tais condutas.
Passa a sujeitar-se ao regime especial de recolha de prova, de quebra de sigilo profissional e de perda de bens a favor do Estado, previsto na Lei n.º 5/2002, de 11 de Janeiro, os crimes de tráfico de influência e concussão e integrando agora directamente também os crimes de corrupção activa e de participação económica em negócio.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Muito bem!

O Orador: — Prevê-se a obrigação de os funcionários da Administração Pública denunciarem ao Ministério Público a prática de crimes de que tenham conhecimento no exercício das suas funções inspectivas ou de fiscalização.
Mais ousada, mantendo-se embora no estrito campo do que constitucionalmente é permitido, é a proposta de criação de uma nova medida de coacção, que se traduz na possibilidade de o juiz determinar a apreensão de bens móveis ou imóveis do arguido…

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Muito bem!

O Orador: — … sendo que — e é neste aspecto que reside a inovação — o pressuposto para a sua aplicação é o da existência de perigo de ocultação, alienação ou oneração de bens móveis ou imóveis aquando da existência de fortes indícios de que o património móvel ou imóvel do arguido é manifestamente superior ao que resulta da avaliação dos seus rendimentos.
Consideramos não existir qualquer tipo de colisão com os princípios constitucionais de presunção de inocência ou da estrutura acusatória do processo penal, uma vez que na fase de inquérito as medidas a aplicar são de «cautela» e baseadas em indícios e, por isso, longe da ideia de inversão do ónus da prova.
Esta é a novidade num processo penal em que constitucionalmente se consagra a estrutura acusatória e em que a presunção de inocência do arguido se presume até ao trânsito em julgado da sentença condenatória.
Continuaremos a trilhar o caminho que podemos iniciar com a nova medida do coacção e a consagração dos respectivos pressupostos, cientes embora das limitações que acima ficaram apontadas.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Orador: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A corrupção tem definitivamente de deixar de ser olhada como o resultado de práticas ilícitas e ocasionais, produto de sectores residuais da sociedade, para passar a ser considerada como um fenómeno complexo e sistémico.
E realça-se a importância das chamadas «boas práticas», pois que não basta um adequado quadro legislativo, precisamos de um sistema integrado de informação criminal que não seja objecto de disputas policiais, judiciais ou políticas e que, devidamente fiscalizado, faça o seu trabalho de recolha, tratamento e difusão de informação de natureza estritamente criminal.
É preciso aperfeiçoar de forma sistemática os mecanismos de articulação entre os diversos corpos de polícia e entre quem dirige a investigação e quem investiga, de forma a evitar a duplicação de investigações, a ocorrência de disputas estéreis, bem como a morosidade ou a precipitação investigatória.
Chama-se a atenção para o facto de os designados «megaprocessos» serem o produto de uma visão burocrática do funcionamento da investigação criminal, sendo necessário para contrariar tal tendência melhores e mais assessorias técnicas e formação adequada por forma a resultarem investigações geríveis, eficazes e com resultados concretos e em tempo útil no que à prevenção geral diz respeito.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Muito bem!

O Orador: — Não desistiremos por isso de, com sentido de responsabilidade e respeito pela lei, continuar a aperfeiçoar e a inovar nos respectivos instrumentos legais e operacionais, cientes também de que só com um quadro legal adequado e a dotação de meios para a sua operacionalização poderemos ser intransigentes na defesa dos direitos, liberdades e garantias.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Magalhães.

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O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Fernando Negrão, começo por o saudar, sendo esta, aliás, a primeira vez que, desde os nossos debates em Setúbal, nos encontramos, agora nesta sede.
Gostaria de saudar em parte o discurso que fez em duas matérias. Em primeiro lugar, pela forma como terminou, como sublinhou a necessidade de uma maior e mais eficaz partilha e cooperação entre as forças e serviços de segurança.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Orador: — Ora, é justamente isso que o CDS-PP propõe no seu projecto de resolução. A primeira pergunta é: está ou não o Partido Social Democrata de acordo com a nossa proposta e está ou não em condições de a votar favoravelmente?

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Orador: — Segundo ponto: V. Ex.ª também fez bem lembrar a recusa sistemática do Partido Socialista, em sede de discussão orçamental, a propostas provindas não só do PSD mas também do CDS-PP para um reforço de verbas destinadas ao combate à corrupção e aos agentes que fazem esse combate, nomeadamente à Polícia Judiciária.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Bem lembrado!

O Orador: — Ora, nesse ponto também estamos de acordo. Razão pela qual o CDS-PP prevê uma dotação orçamental a médio e a longo prazos, bem estudada, bem elaborada, com uma previsão baseada em dados concretos, para que não esteja dependente, avulsa e anualmente, de um orçamento do Estado em que este ou aquele partido apresentam propostas. Estão ou não VV. Ex.as de acordo com esta nossa proposta?

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Esperemos que sim!

O Orador: — Esperemos, obviamente, que assim seja, porque entendemos que elas são benfeitorias neste combate à corrupção.
Sr. Deputado, permita-me que lhe diga que não podemos comungar de uma matéria que também nos apresentou e que consta do projecto de lei do PSD. Nessa matéria, até por aquilo que disse e que tem a ver com a necessidade de agilizar e reforçar a cooperação entre os diversos agentes judiciários nas estruturas já existentes, parece-nos que a criação de mais órgãos, mais relatórios, mais agências, mais estudos poderá ser uma factor que, ao invés de ajudar no seu combate, só vem impedir a celeridade que o crime de corrupção e o seu combate exigem.
Da parte do Partido Comunista, já esperávamos esse comportamento. Da parte do Partido Socialista, apesar das divisões internas — e, nesta matéria, essas divisões não se percebem tão bem, porque a luta contra a corrupção é uma questão que deveria ser consensual —, também não surpreende. Da parte do Partido Social Democrata, permita-me que lhe diga que nos surpreende, tanto mais que criam mais uma entidade administrativa, cujo funcionamento e estatuto é definido pela Assembleia da República, mas que compete, apenas e só, à Assembleia da República eleger o presidente — é o único eleito desta agência anticorrupção que o PSD vem agora propor. Portanto, funcionam junto da Assembleia da República, têm um único membro eleito por esta mesma Casa, que é o seu presidente, sendo os demais exteriores à Assembleia.
Não considera V. Ex.ª que este funcionamento poderá colidir com competências que já existem de outros órgãos que também já existem e que, inclusivamente, são autónomos desta própria Assembleia? Não considera V. Ex.ª que esta agência poderá ser mais um factor perturbador da cooperação que é essencial estabelecer entre os diversos órgãos do Estado, ao invés de ser um factor adicional de combate à corrupção? Nós julgamos que sim, que será mais um factor perturbador e não um factor que contribua para a solução.
Termino, Sr. Deputado Fernando Negrão, perguntando-lhe se não concorda, porque nós concordamos, com o que a Sr.ª Juíza Fátima Mata-Mouros escreve, no seu recente livro Direito à Inocência: «De nada serve remendar a norma penal, se a evolução dos regimes administrativos e do direito empresarial persiste em percorrer o labirinto normativo ainda que disfarçado de um propagandístico invólucro denominado Simplex.» Parece que, nesta matéria, o PSD está a enveredar por este caminho, que só conhecíamos do Partido Socialista, e isso não terá, com certeza, o nosso acordo.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Negrão.

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Magalhães, começo por lhe dizer que não terá compreendido o sentido da criação da agência anticorrupção, uma vez que a considerou como

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um órgão burocrático com um período de vigência intemporal. É o que retiro da sua pergunta e das suas observações.
Quanto às observações que fez de que isto seria mais natural por parte do Partido Comunista ou do Partido Socialista,…

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Mais do PS!

O Orador: — … cada um tem as suas iniciativas e a natureza delas difere muitas vezes na constituição e na forma de funcionamento.
Esta agência, que propomos, de luta contra a corrupção, a ser aprovada, terminará os seus trabalhos em finais deste ano. E isto por uma razão: porque é criada por via de uma inspecção feita à máquina administrativa do Estado português por um grupo de peritos junto do Conselho da Europa, que constituem o GRECO, que fez uma avaliação e recomendações e que quer, no fim do ano, fazer uma nova fiscalização para saber se Portugal cumpriu, ou não, as recomendações anteriores.
Portanto, é esta a natureza desta agência anticorrupção: pouco burocrática, com poucos elementos — um eleito pela Assembleia da República e os outros indicados por vários órgãos —, com a missão de, até ao fim do ano, propor recomendações na área da prevenção contra a corrupção ao Governo de Portugal.

O Sr. Paulo Rangel (PSD): — Muito bem!

O Orador: — Quanto ao reforço de verbas, não podia estar mais de acordo com o Sr. Deputado. E volto a referir a iniciativa do Partido Social Democrata, aquando da discussão do Orçamento, de um reforço de verba para a Polícia Judiciária no valor de 4 milhões de euros,…

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Bem lembrado!

O Orador: — … que foi rejeitado pelo Partido Socialista, como é do conhecimento geral.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — O PS votou contra!

O Orador: — A maior articulação entre as forças de segurança é uma necessidade.
Sr. Deputado Nuno Magalhães, as alterações legislativas são importantes, as inovações legislativas são fundamentais, um quadro legislativo adequado ao combate à corrupção em Portugal é fundamental e importante, mas também não posso deixar de estar de acordo quando nos fala da necessidade de, administrativamente, operacionalizar o quadro legislativo, e a perspectiva do PSD é a de encontrar meios adequados para a operacionalização desse quadro legislativo. Estas duas medidas não funcionam uma sem a outra.
Por isso, concordamos com as propostas apresentadas pelo CDS-PP e não inviabilizaremos nenhuma das iniciativas em debate para que sejam discutidas em sede de especialidade.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Magalhães.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A corrupção é a negação da ética política e a sua existência, tal como as suas causas, remontam à criação de sociedades política e juridicamente estratificadas, com poderes separados e independentes, organizados num Estado com organismos desconcentrados e atribuições e competências delimitadas.
O alargamento das áreas de intervenção do Estado acentuou a tendência de reforço de poderes e é este conjunto alargado de atribuições e competências que torna premente a existência de mecanismos que garantam o cumprimento da lei e a isenção do exercício da função pública, executando escrupulosamente o princípio fundamental da igualdade de todos os cidadãos perante a lei.
Tornou-se, assim, necessário criar um regime que garantisse formas de relacionamento transparente entre os servidores do Estado e os cidadãos, num equilíbrio que, reconhecemos, nem sempre é fácil de alcançar.
Mas por tudo isto o combate à corrupção é um dever de todos aqueles que defendem o Estado de direito democrático.
Nesse sentido, hoje, discutimos um pacote de 16 diplomas, oriundos de todos os grupos parlamentares, o que não surpreende, ao contrário da ensurdecedora ausência do Governo deste debate, que, confesso, não esperávamos.

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Muito bem!

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O Orador: — Do Governo nem propostas de lei nem, tão-pouco, a voz do Sr. Ministro da Justiça. Ficamos, assim, a saber que, nesta área, aos costumes o Governo diz nada!

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Orador: — Para o CDS-PP este combate é de sempre.
Ao contrário de outros, não reivindicamos para nós o monopólio da vontade de combater a corrupção, mas não deixamos de sublinhar que não acordámos para o problema no ano passado, em qualquer dia feriado.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Muito bem!

O Orador: — Já apresentámos alguns projectos nesta Casa, que estão entre a cerca de duas dezenas de diplomas, apresentados também por outros partidos, que, entre 1991 e 2005, foram aqui discutidos.
Por outro lado também, não podemos deixar de relembrar que, em Outubro do ano transacto, uma organização intergovernamental que promove medidas de combate ao branqueamento de capitais e ao financiamento de actos terroristas divulgou um relatório onde concluía que Portugal tem os mecanismos legais necessários e suficientes para o combate ao crime de branqueamento de capitais e actividades terroristas, mas falha — sublinho — na sua aplicação e execução.
De acordo com este relatório, uma das deficiências do nosso sistema é a falta de meios da Polícia Judiciária e do Ministério Público na prevenção e na punição destes crimes, concluindo que «(…) faltam as estruturas, meios humanos e recursos financeiros para a correspondente investigação». Nada de novo! Já em 2005, os avaliadores do Grupo de Estados contra a Corrupção (GRECO), do Conselho da Europa, tinha concluído pela ausência de estratégia no combate à corrupção, pela falta dos necessários meios materiais, financeiros e humanos e, até mesmo, por insuficiências na investigação.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!

O Orador: — Ora, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, estes relatórios elaborados por entidades internacionais insuspeitas confirmam a convicção do CDS de que as razões do insucesso do combate à corrupção recaem não tanto na insuficiência do quadro legal existente mas, sim, na falta de recursos, coordenação, cooperação e partilha de informação.

Aplausos do CDS-PP.

Foram estas as causas do abandono, nos últimos anos, de diversas investigações em curso. De acordo com o citado relatório do GRECO, dos 1521 inquéritos iniciados desde 2002, apenas 407 investigações foram finalizadas, não tendo sido alguma vez emitida qualquer ordem de confisco, apesar de ser obrigatória nesta área da corrupção.
E são, justamente, estas as nossas intenções — fazer executar as leis existentes — que estão plasmadas no projecto de resolução, que ora apresentamos e que assentam em três eixos fundamentais: primeiro, no reforço de meios materiais, humanos e financeiros das entidades que combatem a corrupção; segundo, no reforço da cooperação e partilha de informação entre as diversas forças e serviços de segurança, aproveitando entidades já existentes e evitando a duplicação de competências, que acontecem tantas e tantas vezes e que acabam por encruzilhar-se umas nas outras, não sabendo bem quem tem competência para o quê. Não duplicamos tarefas, acrescentamos tarefas a quem já as tem — isto é que é o Simplex!

Aplausos do CDS-PP.

Sem prejuízo da baixa, sem votação, à respectiva comissão de todos os diplomas em discussão, seria também importante que, ao abrigo da Lei-Quadro de Política Criminal, pudéssemos, de forma unânime, considerar incluir na lista de prioridades das investigações o crime de corrupção.
Srs. Deputados, sistematicamente são evidenciadas as insuficiências dos meios destinados à prevenção e à investigação da corrupção e, por isso, lamentamos, como já aqui dissemos, que a nossa proposta de reforço do orçamento da Polícia Judiciária para 2007 tenha sido chumbada pelo Partido Socialista. Tratava-se de uma medida importante, no nosso entender, e que não perdeu actualidade, pelo que nela insistimos, agora sob a forma de recomendação ao Governo e com um revestimento a médio e a longo prazos. Lamentamos que, mais uma vez, hoje, o Partido Socialista não nos tenha esclarecido se concorda, ou não, com esta matéria.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Zero!

O Orador: — Por outro lado, a clarificação de competências que se pretende diz respeito ao funcionamento, repito, de um órgão que já existe — o Gabinete Coordenador de Segurança, cuja eficácia na coordenação da acção das diversas forças e serviços de segurança, por manifesta falta de competências

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legais e de meios materiais, tem sido, a nosso ver, insuficiente. Não é necessário inventar a roda, basta aproveitar o que temos e dar-lhes meios jurídicos legais e materiais para que possam exercer, eficaz e cabalmente, as suas competências.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O CDS-PP está, como sempre esteve, disponível para, de forma serena, séria e sem demagogias fáceis, realizar um debate profundo sobre as formas de prevenir e de combater a corrupção.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Muito bem!

O Orador: — Por isso, entendemos prudente que todas estas iniciativas baixem à respectiva comissão, sem votação, mas não podemos deixar de dizer que de algumas, para não dizer de muitas, discordamos frontalmente. No entanto, não nos opusemos à baixa dos diplomas à respectiva comissão, justamente para que, de uma vez por todas, nesta Casa, que é a Casa da democracia, se possa realizar um debate amplo, sério, plural e, sobretudo, eficaz sobre esta matéria. Aliás, Srs. Deputados, o pior exemplo que daríamos ao País seria, no final desta discussão, tal como o Governo, esta Assembleia, sobre o combate e prevenção à corrupção, aos costumes dizer nada.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O entendimento de Os Verdes é o de que, em Portugal, o problema da corrupção não se situa na falta de um enquadramento legal que propicie o seu combate. Em Portugal, não estamos destituídos de instrumentos importantes para o combate à corrupção.
Em simultâneo com este entendimento, é preciso avaliar os resultados dos mecanismos legais e dos meios disponíveis para pôr em prática os referidos instrumentos, tendo como objectivo melhorar e dotar o sistema de instrumentos cada vez mais eficazes para garantir sempre melhores resultados, o mesmo é dizer garantir mais justiça.
Ora, o Grupo de Estados contra a Corrupção, do Conselho da Europa, já deu conta, num relatório, dos preocupantes resultados que temos, em Portugal, no combate à corrupção.
Segundo aquele relatório, em Portugal, os resultados da prevenção e do combate à corrupção não têm sido animadores, devido a investigações de casos de corrupção que não chegam ao fim, investigações feitas de forma não sistemática, processos que se arrastam indefinidamente, poucos processos concluídos, reduzido número de apreensões e de confisco de bens ilicitamente obtidos.
Para além disso, o referido relatório aponta falhas claras do nosso sistema: falta de coordenação entre entidades responsáveis pelo combate e a prevenção da corrupção; falta de meios que levem essas mesmas entidades a actuar com mais eficácia; promiscuidade entre o exercício de cargos públicos e a garantia de interesses privados; dificuldade de acesso, por parte dos cidadãos, a documentos da Administração, apesar do que está consagrado na nossa legislação; desprotecção dos que denunciam actos de corrupção. E muitos mais exemplos poderemos encontrar no mesmo relatório.
Isto para dizer que a avaliação dos resultados é extraordinariamente importante no caso de uma matéria como esta que é assumida como prioritária.
Por isso, Os Verdes entendem que a criação de uma comissão de prevenção, coordenação e análise dos resultados do combate à corrupção — e dê-se o nome que se der — é uma proposta profundamente positiva.
Não se trata de criar comissões a propósito de tudo e de nada, mas de entender que há uma prioridade que deve ser coordenada e avaliada e que tem de se encontrar um mecanismo eficaz para atingir esse resultado.
Por outro lado, em relação ao crime de enriquecimento injustificado, Os Verdes entendem que, se o detentor de cargo público tem de preencher uma declaração conforme com os rendimentos e o património de que dispõe, tal deve dar azo a uma justificação por parte do declarante. Fazê-lo é uma obrigação ética e deve ser uma obrigação legal. Olhar essa desconformidade, fingindo que não se vê, não é normal.
A não declaração de património leva ao pressuposto legítimo de que se está a omitir algo e, evidentemente, essa omissão não deve ocorrer por boas razões. É por isso, também, que consideramos que devemos «agarrar» bem estes mecanismos adequados ao combate à corrupção e reforçá-los.
Consideramos, pois, que não há que proceder como, por exemplo, no domínio do levantamento do sigilo bancário que foi «puxado a saca-rolhas» e, ainda assim, ficou submetido à dependência da reclamação, ou seja, não foi garantido o levantamento alargado do sigilo bancário.
Se não «agarrarmos» bem estes mecanismos extraordinariamente importantes para o combate à fraude, continuaremos a deixar escapes abertos no nosso sistema que, justamente, fomentarão a abertura de «portas» a essa mesma fraude.
No que se refere a matéria já aqui sobejamente discutida, Os Verdes consideram muito importante reforçar meios e mecanismos de coordenação de entidades responsáveis pelo combate à corrupção. A este propósito,

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gostaríamos de reforçar a necessidade de garantia da independência dessas entidades, designadamente ao nível do Ministério Público.
De igual modo, é determinante fomentar uma cultura cívica de combate à corrupção. Por um lado, há que levar os cidadãos a abominarem o uso abusivo de posições influentes e alertar consciências para a prevenção da corrupção, enquanto, por outro lado, há que evitar o risco da generalização, isto é, há que não aceitar a ideia de todos os detentores de cargos públicos serem suspeitos de corrupção ou entendidos como potenciais corruptos.
Portanto, é determinante direccionar as consciências para o que verdadeiramente deve estar em causa e deve levar a suspeitas e a desconfianças. Por isso, agregada a esta preocupação, também consideramos importante o reforço da protecção das pessoas que denunciam actos de corrupção.
Somos favoráveis, também, a que seja semelhante o entendimento no que se refere à prática tanto de corrupção em actos lícitos como de corrupção em actos ilícitos, pois o acto de favorecimento ilícito não é maior ou menor num caso ou no outro.
Somos favoráveis, ainda, ao alargamento do prazo de prescrição dos crimes de corrupção, até pela própria lentidão em determinar a suspeita que pode estar associada a um acto de corrupção.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pronunciámo-nos sobre algumas das propostas que estão em causa.
Outras, naturalmente, serão discutidas em sede de especialidade, de resto, como estas.
Consideramos que, neste momento, a Assembleia da República tem condições para promover e criar uma sociedade em que seja reforçado o crédito na justiça e no Estado de direito, como garante de direitos e da igualdade entre os cidadãos.
Por isso, não devemos desperdiçar esta oportunidade para o combate à corrupção e, se ficarmos pelas propostas mais minimalistas e não aceitarmos as mais ousadas, com certeza perderemos uma oportunidade de ouro para o País dar um passo determinante no reforço do combate à corrupção e na prevenção da mesma.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Telmo Correia.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Vasco Franco.

O Sr. Vasco Franco (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A corrupção é um fenómeno que mina as sociedades e que desacredita as instituições. Nos últimos anos, foram dados passos, visando tornar mais eficaz o combate a esta chaga social. A opinião pública ficou também mais desperta, mais crítica, mais exigente. Mas a percepção de que os resultados alcançados ficam aquém das necessidades do confronto com uma realidade mutante e cada vez mais sofisticada, deve levar-nos a procurar ir mais longe, tão longe quanto possível, no respeito pelas regras do Estado de direito, da democracia e da liberdade. Sem pressões conjunturais, sempre más conselheiras! Estamos perante um combate com várias frentes: a frente das causas que alimentam o fenómeno e que é preciso eliminar; a trincheira da prevenção que é preciso erguer; a frente da investigação e do julgamento que há que dotar dos melhores instrumentos possíveis.
O actual Governo tem contribuído, como nenhum outro antes, para atacar na génese o problema da corrupção. A reforma do aparelho do Estado, o aperfeiçoamento dos mecanismos de transparência na gestão da coisa pública, a simplificação procedimental e a eliminação de burocracias inúteis são exemplos eloquentes desse contributo.

Vozes do PS: — É verdade!

O Orador: — O projecto de lei n.º 340/X, de iniciativa de João Cravinho, que subscrevo com outros Deputados do meu partido, visa a área da prevenção.
As instituições internacionais que se têm debruçado sobre o fenómeno da corrupção consideram que o mesmo deve ser encarado como um risco que pode e deve ser prevenido. Nesta linha, propomos basicamente dois mecanismos: a criação de uma comissão independente, junto da Assembleia da República, com a missão de recolher informação, analisar o fenómeno e propor medidas para o prevenir e combater; a elaboração de planos de prevenção por parte das entidades públicas que exerçam actividade em sectores considerados de risco agravado.
Entendemos os argumentos daqueles que julgam desadequado que tal comissão funcione junto ao Parlamento. Não nos custa admitir uma solução mais consensual e igualmente eficaz, como a criação de um observatório independente, sedeado, por exemplo, numa instituição universitária de prestígio.
Acreditamos que com estes dois instrumentos fica preenchido um vazio manifesto no combate à corrupção.
Acreditamos também que o conjunto de importantes medidas hoje em discussão, de iniciativa do PS, representa um avanço muito relevante no plano legislativo, em linha com as medidas que o Governo tem vindo a adoptar.

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Uma última nota para sublinhar a importância de todo este debate decorrer em clima de serenidade, com o maior sentido de responsabilidade, tendo sempre presentes os intocáveis princípios do Estado de direito democrático.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Telmo Correia): — Antes de dar a palavra ao orador que se segue, chamo a atenção da Câmara para o facto de, mesmo que o debate termine antes das 18 horas, hora a que estão previstas as votação regimentais, o que é possível, uma vez que, neste momento, só há uma inscrição, as votações terão lugar às 18 horas, conforme foi anunciado e está divulgado.
Feito este aviso, dou, então, a palavra à Sr.ª Deputada Irene Veloso, para uma intervenção.

A Sr.ª Irene Veloso (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Dada a escassez do tempo, dispensome de teorizar sobre o fenómeno da corrupção e o seu efeito pernicioso na sociedade.
Está assumido nesta Câmara que a luta contra a corrupção é prioridade de todos os Estados de direito democrático, portanto, sê-lo-á também do nosso.
Assim, passarei à explicitação do que considero ser o fundamental do projecto de lei n.º 341/X, apresentado pelo Deputado João Cravinho, subscrito por mim própria e por mais dois colegas.
Não se nos afigura que exista qualquer razão para distinguir, em sede de tipicidade, a corrupção para acto lícito da corrupção para acto ilícito, designadamente, porque a corrupção para o acto lícito não deixa de provocar um sentimento de enfraquecimento da ética democrática.
A aceitação de vantagem patrimonial ou não patrimonial ou a sua promessa por parte de quem exerce determinadas funções que se prendem com o interesse público é tão grave quanto a corrupção para a prática de acto ilícito, porque ali se revela uma predisposição para a aceitação de benefícios que não lhe são devidos.
À dificuldade probatória e à complexidade do crime acresce, com frequência, a existência do pacto de silêncio, o que leva a que a suspeita só surja muito tardiamente, com benefícios inaceitáveis para os agentes, uma vez que, actualmente, a prescrição se conta da data da prática do acto, pelo que se propõe a dilação do prazo de prescrição.
Paralelamente a estas alterações que se relacionam com o Código Penal, apresentam-se também outros dispositivos, dos quais destaco: a extensão aos titulares de altos cargos públicos do regime aplicado aos titulares de cargos políticos, por ser da mais elementar justiça dadas as que quaisquer uns exercem; a obrigatoriedade de acrescentar às declarações de controlo público de riqueza as contas bancárias à ordem; a alteração do regime geral de inspecção tributária no sentido de agilizar o apuramento de responsabilidades conexas à prática de crime tributário, quando ocorrer a suspensão do processo tributário.
Na convicção de que estas propostas irão contribuir para a melhoria da eficácia, quer da actuação dos tribunais quer da prevenção, agradecemos a sua consideração por esta Câmara e a sua apreciação em sede de especialidade.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Telmo Correia): — Sr.as e Srs. Deputados, não há mais inscrições, pelo que vamos interromper os trabalhos e retomá-los às 18 horas.
Uma vez que há outros interesses a que alguns Srs. Deputados também querem atender hoje, chamo a atenção dos grupos parlamentares para a necessidade de haver pontualidade, para as votações decorrerem de forma célere e podermos cumprir o horário.
Está interrompida a sessão.

Eram 17 horas e 20 minutos.

Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 18 horas.

Srs. Deputados, vamos entrar no período regimental de votações.
Antes de mais, vamos proceder à verificação do quórum, utilizando o cartão electrónico.

Pausa.

Recordo aos Srs. Deputados que não puderem utilizar os meios electrónicos, por não terem o cartão ou por o sistema não funcionar, que deverão assinalar à Mesa a respectiva presença e, depois, assinar junto dos serviços de apoio ao Plenário.

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Pausa.

Srs. Deputados, o quadro electrónico regista 189 presenças, às quais se somam 9 registadas pela Mesa, pelo que temos quórum para proceder às votações.
Começamos pela apreciação do voto n.º 87/X — De evocação da memória de José Afonso (PS, PSD, PCP, CDS-PP, BE e Os Verdes).
Para proceder à respectiva leitura, tem a palavra a Sr.ª Secretária.

A Sr.ª Secretária (Rosa Maria Albernaz): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, o voto é do seguinte teor:

José Afonso morreu há 20 anos, em 23 de Fevereiro de 1987.
Se o País o recorda e celebra em múltiplas realizações, não poderia a Assembleia da República alhear-se desta efeméride.
Avisa-nos a faceta transgressora de José Afonso que este não é o seu sítio — incomodá-lo-iam o ritual, a compostura, a cerimónia. Homem da margem e do despojamento, dava-se bem com os simples e os marginais, mas era avesso a regras e a dogmas. Só que a Assembleia não seria hoje a Casa da Democracia sem, entre tantos outros, ter também o inestimável contributo de um novo som, que, falando do proibido, cantava o mundo dos renegados e dos aflitos e marcaria o compasso do 25 de Abril.
«Eu sou aquilo que fiz», disse ele um dia. Foi isto que ele fez: dar um som e um ritmo ao Portugal de Abril.
Mas fez mais ainda: a riqueza e a modernidade musicais de José Afonso abriram caminho a um novo percurso na nossa música contemporânea. O seu nome passou fronteiras e tem hoje o reconhecimento artístico de outros cantos do mundo, da Galiza a África, da América do Sul a França e ao Brasil.
Entre nós, são os jovens artistas portugueses, dos mais diversos quadrantes musicais, que o redescobrem para o recriar, numa mostra viva de que a obra de José Afonso resiste e sobrevive à prova do tempo.
Afinal, limitou-se a escrever, a fazer música, a cantar e a estar onde outros evitaram estar. Com isso, incomodou e desarrumou a ordem e o sistema. Por isso o prenderam e impediram de exercer a sua profissão de professor.
José Afonso deixou uma falta que não é só a da voz do trinado quase inatingível ou daquela música inquieta, sempre em busca de novas formas e de uma outra sonoridade.
Em tempo de pragmatismos, faz-nos falta ainda o cidadão que buscava no dia-a-dia a utopia dos impossíveis.
Vinte anos após a sua morte, a Assembleia da República presta-lhe homenagem.

O Sr. Presidente (Telmo Correia): — Srs. Deputados, vamos votar o voto que acabou de ser lido.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Aplausos gerais.

Passamos à votação do projecto de resolução n.º 182/X — Deslocação do Presidente da República, em visita de carácter oficial, ao Luxemburgo (Presidente da AR).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Vamos agora votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 120/X — Altera a Lei n.º 30/2000, de 29 de Novembro, que «Define o regime jurídico aplicável ao consumo de estupefacientes e substâncias psicotrópicas, bem como a protecção sanitária e social das pessoas que consomem tais substâncias sem prescrição médica» (PCP).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS e do CDS-PP, votos a favor do PSD, do PCP e de Os Verdes e a abstenção do BE.

Vamos proceder à votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 350/X — Altera a Lei n.º 30/2000, de 29 de Novembro, que «Define o regime jurídico aplicável ao consumo de estupefacientes e substâncias psicotrópicas, bem como a protecção sanitária e social das pessoas que consomem tais substâncias sem prescrição médica» (PSD).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do CDS-PP e do BE e votos a favor do PSD, do PCP e de Os Verdes.

Vamos votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 281/X — Preços máximos de venda ao público dos medicamentos não sujeitos a receita médica (BE).

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Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PCP, do BE e de Os Verdes.

Srs. Deputados, passamos à votação do projecto de resolução n.º 169/X — Recomenda a ratificação do Tratado da Antártida (Os Verdes).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Vamos agora votar, na generalidade, a proposta de lei n.º 113/X — Aprova o Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, votos contra do PCP, do BE e de Os Verdes e abstenções do PSD e do CDS-PP.

Srs. Deputados, este diploma baixa à 7.ª Comissão.
Vamos proceder à votação, na generalidade, da proposta de lei n.º 98/X — Procede à vigésima primeira alteração ao Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de Setembro.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS e do PSD e abstenções do PCP, do CDS-PP, do BE e de Os Verdes.

Srs. Deputados, este diploma baixa à 1.ª Comissão.
Passamos à votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 211/X — Altera o Código Penal (PS).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS e do PSD e abstenções do PCP, do CDS-PP, do BE e de Os Verdes.

Srs. Deputados, este diploma baixa igualmente à 1.ª Comissão.
Vamos votar o projecto de lei n.º 219/X — Altera o Código Penal, eliminando a discriminação com base na orientação sexual existente no artigo 175.º (Os Verdes).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PCP, do BE e de Os Verdes e abstenções do PS, do PSD e do CDS-PP.

Este diploma baixa à 1.ª Comissão.
Passamos à votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 236/X — Altera o Código Penal (PSD).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS e do PSD e abstenções do PCP, do CDS-PP, do BE e de Os Verdes.

O diploma baixa à 1.ª Comissão.
Vamos votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 239/X — Aprova o regime da responsabilidade penal das pessoas colectivas (PSD).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS e do PSD e abstenções do PCP, do CDS-PP, do BE e de Os Verdes.

O diploma baixa igualmente à 1.ª Comissão.
Vamos agora votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 349/X — Altera o Código Penal em matéria ambiental (Os Verdes).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PCP, do BE e de Os Verdes e abstenções do PS, do PSD e do CDS-PP.

Este diploma baixa à 1.ª Comissão.
Segue-se a votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 352/X — Altera o Código Penal (CDS-PP).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PCP, do BE e de Os Verdes, votos a favor do CDS-PP e abstenções do PS e do PSD.

Vamos agora votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 353/X — Altera o Código Penal (BE).

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Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PCP, do BE e de Os Verdes, votos contra do CDS-PP e abstenções do PS e do PSD.

O diploma que acabámos de aprovar baixa à 1.ª Comissão.
Segue-se a votação, na generalidade, da proposta de lei n.º 107/X — Cria um regime de mediação penal, em execução do artigo 10.º da Decisão-Quadro n.º 2001/220/JAI, do Conselho, de 15 de Março de 2001, relativa ao estatuto da vítima em processo penal.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PSD, do CDS-PP e do BE e votos contra do PCP e de Os Verdes.

Este diploma baixa à 1.ª Comissão.
Srs. Deputados, passamos à votação de um requerimento, apresentado por todos os grupos parlamentares, solicitando a baixa, sem votação, à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, pelo período de 90 dias, dos projectos de leis n.os 340/X (PS), 341/X (PS), 343/X (PS), 345/X (PSD), 354/X (BE), 355/X (BE), 356/X (BE), 357/X (BE), 358/X (BE), 360/X (PCP), 361/X (PCP), 362/X (PS) e 363/X (PS), bem como dos projectos de resolução n.os 177/X (PSD), 178/X (PCP) e 183/X (CDS-PP).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, a Sr.ª Secretária vai dar conta de vários pareceres da Comissão de Ética, que serão votados após a respectiva leitura.

A Sr.ª Secretária (Rosa Maria Albernaz): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pela 3.ª Secção do 2.º Juízo Criminal de Lisboa, Processo n.º 4627/04.3 — TDLSB, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Pedro Santana Lopes (PSD) a prestar depoimento por escrito, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente (Telmo Correia): — Srs. Deputados, está em apreciação.

Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

A Sr.ª Secretária (Rosa Maria Albernaz): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, a solicitação da 1.ª Secção do 1.º Juízo Criminal do Porto, Processo n.º 142/03.0 — SGLDB, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado António Montalvão Machado (PSD) a prestar depoimento por escrito, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente (Telmo Correia): — Srs. Deputados, está em apreciação.

Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

A Sr.ª Secretária (Rosa Maria Albernaz): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, a solicitação do 2.º Juízo Criminal do Tribunal de Família e Menores e de Comarca de Cascais, Processo n.º 689/06.7 — PBCSC, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Pedro Pinto (PSD) a prestar depoimento por escrito, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente (Telmo Correia): — Srs. Deputados, está em apreciação.

Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

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A Sr.ª Secretária (Rosa Maria Albernaz): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo 1.º Juízo Cível do Tribunal de Família e Menores e de Comarca do Seixal, Processo n.º 1113/1999, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Luís Rodrigues (PSD) a prestar depoimento por escrito, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente (Telmo Correia): — Srs. Deputados, está em apreciação.

Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, concluídas as votações, resta-me anunciar que a próxima reunião plenária se realiza amanhã, às10 horas, tendo como ordem do dia um debate sectorial com o Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.
Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 20 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Partido Socialista (PS)

Alberto Arons Braga de Carvalho
João Miguel de Melo Santos Taborda Serrano
João Raul Henriques Sousa Moura Portugal
Manuel Francisco Pizarro de Sampaio e Castro
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Sandra Marisa dos Santos Martins Catarino da Costa

Partido Social Democrata (PSD)

António Alfredo Delgado da Silva Preto
Carlos Alberto Garcia Poço
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves
José Eduardo Rego Mendes Martins
José Manuel Pereira da Costa
Luís Miguel Pais Antunes
Pedro Miguel de Santana Lopes
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva

Partido Comunista Português (PCP)

Artur Jorge da Silva Machado
Francisco José de Almeida Lopes
Jerónimo Carvalho de Sousa

Partido Popular (CDS-PP)

José Helder do Amaral

Bloco de Esquerda (BE)

Helena Maria Moura Pinto

Srs. Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:

Partido Socialista (PS)

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António Ramos Preto
João Barroso Soares
Marcos da Cunha e Lorena Perestrello de Vasconcellos
Maria Antónia Moreno Areias de Almeida Santos
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro

Partido Social Democrata (PSD)

António Joaquim Almeida Henriques
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira

Partido Comunista Português (PCP)

José Batista Mestre Soeiro

Srs. Deputados que faltaram à verificação do quórum de deliberação (n.º 29 da Resolução n.º 77/2003, de
11 de Outubro):

Partido Socialista (PS)

Manuel Alegre de Melo Duarte

Partido Social Democrata (PSD)

Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Partido Socialista (PS)

Alcídia Maria Cruz Sousa de Oliveira Lopes
Glória Maria da Silva Araújo
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Jesuína Carrilho Bernardo
Rosalina Maria Barbosa Martins

Partido Social Democrata (PSD)

Carlos António Páscoa Gonçalves
Carlos Manuel de Andrade Miranda
Domingos Duarte Lima
José de Almeida Cesário
José Pedro Correia de Aguiar Branco
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Zita Maria de Seabra Roseiro

Partido Popular (CDS-PP)

Teresa Margarida Figueiredo de Vasconcelos Caeiro

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL

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