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Sexta-feira, 23 de Janeiro de 2009 I Série — Número 37

X LEGISLATURA 4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2008-2009)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 22 DE JANEIRO DE 2009

Presidente: Ex.mo Sr. Jaime José Matos da Gama

Secretários: Ex.mos Srs. Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Fernando Santos Pereira
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz

SUMÁRIO O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 10 minutos.
Deu-se conta da entrada na Mesa dos projectos de lei n.os 646 a 649/X (4.ª) e dos projectos de resolução n.os 418 e 420/X (4.ª).
Em declaração política, o Sr. Deputado Jorge Costa (PSD) referiu-se à grave crise económica que o País atravessa e à necessidade de avaliar o investimento público, tendo em vista a relação custo/benefício do mesmo, nomeadamente no caso da construção do TGV.
No fim, respondeu a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado Abel Baptista (CDS-PP).
Em declaração política, o Sr. Deputado José Junqueiro (PS), a propósito de declarações da líder do PSD, Dr.ª Manuela Ferreira Leite, contrárias à construção do TGV, criticou a posição assumida por este partido ao longo do tempo acerca deste tema, após o que respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Agostinho Branquinho (PSD) e Abel Baptista (CDS-PP).
Também em declaração política, o Sr. Deputado Fernando Rosas (BE) alertou para as consequências económicas e sociais da abertura de um novo canal de TV, de índole generalista, tendo respondido a pedidos de esclarecimentos dos Srs. Deputados Bruno Dias (PCP) e Alberto Arons de Carvalho (PS).
Igualmente em declaração política, o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP) trouxe à colação as principais conclusões do XXIII Congresso Nacional do seu partido realizado no passado fim-de-semana e, depois, deu resposta aos pedidos de esclarecimentos dos Srs. Deputados José de Aguiar Branco (PSD), Ricardo Rodrigues (PS), Bernardino Soares (PCP) e Luís Fazenda (BE).
Ainda em declaração política, o Sr. Deputado António Filipe (PCP) fez a defesa da liberdade de manifestação, que considerou estar a ser posta em causa pela acção de alguns governadores civis, no que foi secundado pelos Srs. Deputados Luís Fazenda (BE) e Guilherme Silva (PSD), a quem também prestou esclarecimentos. No final, o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Augusto

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Santos Silva) defendeu a honra do Governo relativamente a declarações do Sr. Deputado Guilherme Silva, que, por sua vez, deu explicações.
Procedeu-se à discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 238/X (4.ª) — Estabelece o regime jurídico da luta contra a dopagem no desporto, tendo-se pronunciado o Sr. Secretário de Estado da Juventude e do Desporto (Laurentino Dias) e os Srs. Deputados Hermínio Loureiro (PSD), José Paulo Carvalho (N insc.), Miguel Tiago (PCP) — que suscitou a defesa da honra do Sr.
Secretário de Estado —, Pedro Duarte (PSD), Helena Pinto (BE), Abel Baptista (CDS-PP) e Luísa Salgueiro (PS).
O projecto de lei n.º 481/X (3.ª) — Criação do programa Mulher Emigrante (PSD), foi igualmente discutido na generalidade, tendo usado da palavra os Srs. Deputados José Cesário (PSD), Maria Carrilho (PS), Jorge Machado (PCP), Helena Pinto (BE) e Helder Amaral (CDS-PP).
Procedeu-se à discussão conjunta, na generalidade, dos projectos de lei n.os 580/X (4.ª) — Prevê o plano que define a rede nacional de ciclovias (Os Verdes), 581/X (4.ª) — Altera as normas para velocípedes sem motor do Código da Estrada (Os Verdes) e 638/X (4.ª) — Afirma os direitos dos ciclistas e peões no Código da Estrada (BE) e dos projectos de resolução n.os 376/X (4.ª) — Plano nacional de promoção da bicicleta e outros modos de transporte suaves (Os Verdes) e 152/X (2.ª) — Recomenda ao Governo a promoção de redes de modos suaves a integrar nos planos de mobilidade urbana, previstos pela Lei de Bases do Sistema de Transportes Terrestres, Lei n.º 10/90, de 17 de Março, e o Decreto-Lei n.º 380/99, de 22 de Setembro (BE). Intervieram os Srs. Deputados Francisco Madeira Lopes (Os Verdes), Fernando Santos Pereira (PSD), Helena Pinto (BE), Bruno Dias (PCP), Abel Baptista (CDS-PP) e Isabel Jorge (PS).
Foi ainda discutido, na generalidade, o projecto de lei n.º 297/X (1.ª) — Estabelece o regime jurídico da segurança social dos trabalhadores das pedreiras, antecipando a idade de acesso à pensão por velhice (PCP), tendo usado da palavra, a diverso título, os Srs. Deputados Jorge Machado (PCP), Mariana Aiveca (BE), Pedro Quartin Graça (PSD), Pedro Mota Soares (CDSPP), Sónia Fertuzinhos (PS) e Heloísa Apolónia (Os Verdes).
A Mesa deu conta da retirada do projecto de resolução n.º 287/X (3.ª).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 18 horas e 50 minutos.

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O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 10 minutos.

Srs. Deputados presentes à sessão:

Partido Socialista (PS):
Agostinho Moreira Gonçalves
Alberto Arons Braga de Carvalho
Alberto Marques Antunes
Alberto de Sousa Martins
Alcídia Maria Cruz Sousa de Oliveira Lopes
Aldemira Maria Cabanita do Nascimento Bispo Pinho
Ana Maria Cardoso Duarte da Rocha
Ana Maria Ribeiro Gomes do Couto
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António José Martins Seguro
António Ramos Preto
António Ribeiro Gameiro
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Aurélio Paulo da Costa Henriques Barradas
Bruno Viriato Gonçalves Costa Veloso
Carlos Alberto David dos Santos Lopes
Cláudia Isabel Patrício do Couto Vieira
David Martins
Deolinda Isabel da Costa Coutinho
Elísio da Costa Amorim
Esmeralda Fátima Quitério Salero Ramires
Fernanda Maria Pereira Asseiceira
Fernando Manuel Amaro Pratas
Fernando Manuel de Jesus
Fernando dos Santos Cabral
Glória Maria da Silva Araújo
Horácio André Antunes
Hugo Miguel Guerreiro Nunes
Isabel Maria Batalha Vigia Polaco de Almeida
Isabel Maria Pinto Nunes Jorge
Jacinto Serrão de Freitas
Jaime José Matos da Gama
Joana Fernanda Ferreira Lima
Joaquim Barbosa Ferreira Couto
Joaquim Ventura Leite
Jorge Filipe Teixeira Seguro Sanches
Jorge Manuel Capela Gonçalves Fão
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Jorge Manuel Monteiro de Almeida
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego
José Augusto Clemente de Carvalho
José Carlos Bravo Nico
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
Jovita de Fátima Romano Ladeira
João Barroso Soares
João Carlos Vieira Gaspar
João Cândido da Rocha Bernardo
João Miguel de Melo Santos Taborda Serrano
João Raul Henriques Sousa Moura Portugal
Júlio Francisco Miranda Calha

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Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís António Pita Ameixa
Luís Miguel Morgado Laranjeiro
Luísa Maria Neves Salgueiro
Lúcio Maia Ferreira
Manuel Alegre de Melo Duarte
Manuel António Gonçalves Mota da Silva
Manuel José Mártires Rodrigues
Marcos Sá Rodrigues
Maria Antónia Moreno Areias de Almeida Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Cidália Bastos Faustino
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria Eugénia Simões Santana Alho
Maria Helena Terra de Oliveira Ferreira Dinis
Maria Helena da Silva Ferreira Rodrigues
Maria Hortense Nunes Martins
Maria Idalina Alves Trindade
Maria Isabel Coelho Santos
Maria Jesuína Carrilho Bernardo
Maria José Guerra Gamboa Campos
Maria Júlia Gomes Henriques Caré
Maria Manuel Fernandes Francisco Oliveira
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Maria Matilde Pessoa de Magalhães Figueiredo de Sousa Franco
Maria Odete da Conceição João
Maria Teresa Alegre de Melo Duarte Portugal
Maria Teresa Filipe de Moraes Sarmento
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria de Fátima Oliveira Pimenta
Maria de Lurdes Ruivo
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Marisa da Conceição Correia Macedo
Marta Sofia Caetano Lopes Rebelo
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Nuno André Araújo dos Santos Reis e Sá
Nuno Mário da Fonseca Oliveira Antão
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Barros Teixeira Santos
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Paula Cristina Nobre de Deus
Paulo José Fernandes Pedroso
Pedro Manuel Farmhouse Simões Alberto
Pedro Nuno de Oliveira Santos
Renato José Diniz Gonçalves
Renato Luís Pereira Leal
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Ricardo Manuel de Amaral Rodrigues
Rita Manuela Mascarenhas Falcão dos Santos Miguel
Rita Susana da Silva Guimarães Neves
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Sandra Marisa dos Santos Martins Catarino da Costa
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Sónia Isabel Fernandes Sanfona Cruz Mendes
Teresa Maria Neto Venda
Umberto Pereira Pacheco
Vasco Seixas Duarte Franco

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Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vítor Manuel Bento Baptista
Vítor Manuel Pinheiro Pereira

Partido Social Democrata (PSD):
Abílio André Brandão de Almeida Teixeira
Adão José Fonseca Silva
Agostinho Correia Branquinho
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
Ana Zita Barbas Marvão Alves Gomes
António Joaquim Almeida Henriques
António Ribeiro Cristóvão
Arménio dos Santos
Carlos Alberto Garcia Poço
Carlos Alberto Silva Gonçalves
Carlos Jorge Martins Pereira
Domingos Duarte Lima
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Emídio Guerreiro
Feliciano José Barreiras Duarte
Fernando Mimoso Negrão
Fernando Santos Pereira
Fernando dos Santos Antunes
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Helena Maria Andrade Cardoso Machado de Oliveira
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves
Hugo José Teixeira Velosa
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Joaquim Virgílio Leite Almeida Costa
Jorge Fernando Magalhães da Costa
Jorge José Varanda Pereira
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado
José António Freire Antunes
José Eduardo Rego Mendes Martins
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro
José Manuel Pereira da Costa
José Manuel de Matos Correia
José Pedro Correia de Aguiar Branco
José de Almeida Cesário
João Bosco Soares Mota Amaral
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Filipe Carloto Marques
Luís Miguel Pereira de Almeida
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Manuel Filipe Correia de Jesus
Maria Helena Passos Rosa Lopes da Costa
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria do Rosário da Silva Cardoso Águas
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas
Miguel Jorge Pignatelli de Ataíde Queiroz
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Mário Henrique de Almeida Santos David
Mário da Silva Coutinho Albuquerque
Nuno Maria de Figueiredo Cabral da Câmara Pereira
Pedro Augusto Cunha Pinto
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Pedro Miguel de Santana Lopes
Pedro Quartin Graça Simão José
Regina Maria Pinto da Fonseca Ramos Bastos

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Ricardo Jorge Olímpio Martins
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva
Sérgio André da Costa Vieira
Zita Maria de Seabra Roseiro

Partido Comunista Português (PCP):
António Filipe Gaião Rodrigues
Artur Jorge da Silva Machado
Bernardino José Torrão Soares
Bruno Ramos Dias
Jerónimo Carvalho de Sousa
José Alberto Azevedo Lourenço
José Batista Mestre Soeiro
José Honório Faria Gonçalves Novo
João Guilherme Ramos Rosa de Oliveira
Miguel Tiago Crispim Rosado

Partido Popular (CDS-PP):
Abel Lima Baptista
António Carlos Bivar Branco de Penha Monteiro
Diogo Nuno de Gouveia Torres Feio
José Helder do Amaral
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
Luís Pedro Russo da Mota Soares
Nuno Miguel Miranda de Magalhães
Paulo Sacadura Cabral Portas
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia
Teresa Margarida Figueiredo de Vasconcelos Caeiro

Bloco de Esquerda (BE):
Alda Maria Gonçalves Pereira Macedo
Fernando José Mendes Rosas
Francisco Anacleto Louçã
Helena Maria Moura Pinto
João Pedro Furtado da Cunha Semedo
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda
Maria Cecília Vicente Duarte Honório
Mariana Rosa Aiveca Ferreira

Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV):
Francisco Miguel Baudoin Madeira Lopes
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia

Deputados não inscritos em grupo parlamentar:
José Paulo Ferreira Areia de Carvalho
Maria Luísa Raimundo Mesquita

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, a Sr.ª Secretária vai proceder à leitura do expediente.

A Sr.ª Secretária (Celeste Correia): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: projectos de lei n.os 646/X (4.ª) — Protecção contra a exposição aos campos eléctricos e magnéticos derivados de linhas, de instalações e de equipamentos eléctricos (PSD), que baixou à 7.ª Comissão, 647/X (4.ª) — Integra o concelho de Mora na NUT III — Alentejo Central e o

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concelho de Sousel na NUT III — Alto Alentejo (PCP), que baixou à 7.ª Comissão, 648/X (4.ª) — Revoga o designado «factor de sustentabilidade» do sistema público de segurança social (BE), que baixou à 11.ª Comissão, e 649/X (4.ª) — Altera o regime jurídico de acesso às pensões de invalidez e velhice pelos trabalhadores da Empresa Nacional de Urânio, SA (PSD), que baixou à 11.ª Comissão; projectos de resolução n.os 418/X (4.ª) — Sobre a classificação da Linha Ferroviária do Tua (Os Verdes), que baixou à 9.ª Comissão, 419/X (4.ª) — Promoção da eficiência energética e da arquitectura bioclimática nos edifícios (PSD), que baixou à 7.ª Comissão, e 420/X (4.ª) — Pela garantia de construção do novo hospital de Évora (PCP), que baixou à 10.ª Comissão.
Em termos de expediente é tudo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, o primeiro ponto da nossa ordem do dia é constituído por declarações políticas.
Em primeiro lugar, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Costa.

O Sr. Jorge Costa (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Portugal vive hoje um momento difícil, e já não somos só nós que o afirmamos. A economia nacional está oficialmente em recessão, o que, de resto, só confirma o que a maioria dos economistas previa e o que os portugueses sentem no dia-a-dia.
Segundo a União Europeia, Portugal estará em recessão até 2010 e o excessivo endividamento vai pagarse caro, com um atraso na recuperação do crescimento do PIB.
Todos os dias ouvimos notícias de novas empresas que estão a fechar portas ou a dispensar pessoas; todos os dias vemos o desemprego a aumentar, sendo cada vez mais claro que, ao contrário das previsões optimistas do Governo, dificilmente ficará abaixo dos 10%.
Há uma dificuldade efectiva das empresas em obter financiamentos, apesar das promessas e dos sucessivos anúncios do Governo.
O FMI alertou as empresas europeias para se prepararem para uma muito forte contracção do crédito e até o Governador do Banco de Portugal referiu que «poderão ocorrer atrasos em alguns dos grandes projectos de investimento — casos do novo aeroporto e do TGV».
As dívidas ao estrangeiro já representam 90% — repito, 90% — do que Portugal produz num ano.
A redução do rating nacional implicará maiores encargos com os juros suportados pelo Estado, com reflexo no aumento da despesa anual, e crédito mais caro para todos.
Enquanto os portugueses lutam dia-a-dia para conseguir pagar as contas, o Governo prefere agora apostar no investimento público. A política continua a ser a de atirar dinheiro — que não tem — para cima dos problemas, o que só por acaso não resultará num agravamento maior da situação.
Dizia o Governo, há bem poucos meses, que a crise nos ia passar ao lado, que estávamos mais bem preparados, que ia ser mais suave em Portugal. Infelizmente, a realidade está aí para o desmentir.

Aplausos do PSD.

O elevado nível de endividamento nacional e as dificuldades de liquidez nos mercados financeiros acentuam a necessidade de se assegurar a qualidade do investimento público e a relevância da análise da sua relação custo/benefício.
O Governo pretende agora esgotar o crédito disponível no mercado em projectos escolhidos de forma pouco criteriosa, que a propaganda oficial se encarrega de vangloriar.
O Governo não pensa nos portugueses e no seu futuro. O Governo apenas se preocupa com o presente — o seu presente, o presente do Governo, bem entendido —, ao preço que tiver de ser. Para as gerações vindouras deixa as facturas, os pagamentos.

Aplausos do PSD.

Esperávamos que, depois da experiência com as SCUT, de outro governo também socialista, este Governo tivesse aprendido a lição. Prometeram-nos, na altura, que os encargos se pagavam a si próprios, que isso justificava o investimento. Puro engano: a factura está aí para pagarmos, e agora pretendem repetir a proeza.

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De mansinho, o Governo fez deslizar os encargos com as novas concessões rodoviárias, de 4000 milhões de euros, para que só comecem a ser pagas em 2013; o Governo andou a anunciar projectos avulsamente, sem se preocupar com a sua coerência e articulação e com a sua exequibilidade. Agora dá-se ao desplante de anunciar que vai realizar todos os projectos que deixou para o fim da Legislatura, em nada se incomodando com as responsabilidades futuras para os governos seguintes e para as gerações mais jovens. Isto é inaceitável! O Governo tem que fazer contas, tem de optar, tem de hierarquizar os projectos em função da sua valia efectiva para a contenção do desemprego ou para a criação de oportunidades de negócio para as empresas nacionais. Para conseguir realizar alguns projectos, os mais urgentes e prioritários, outros terão forçosamente que ficar pelo caminho. Se o não fizer o erro será muito mais grave.

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Muito bem!

O Sr. Jorge Costa (PSD): — Os tempos mudaram, a situação piorou. Não há, de facto, dinheiro para tudo e há que reequacionar os projectos que se lançam em função dos resultados que possam produzir, do momento em que os produzam e do custo que impliquem, seja ele actual ou a pagar pelas gerações futuras.
Este Governo, com a sua forma de agir, já deixou as gerações vindouras mais pobres.
O projecto da alta velocidade no actual contexto não pode continuar a ser visto da mesma maneira.

Aplausos do PSD.

Na actual conjuntura, com um défice externo no máximo, com uma dívida pública excessiva e com o crédito mais caro — e vai continuar a encarecer — não faz qualquer sentido a aposta num projecto de alta velocidade.

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Muito bem!

O Sr. Jorge Costa (PSD): — Um projecto que gera responsabilidades excessivas para mais de 15 anos e sem resultados imediatos ou de curto prazo na nossa economia, nas vendas das nossas empresas ou no emprego nacional.
Não aceitamos que se endivide o futuro de Portugal para atenuar o presente, ocultando-se a má gestão que o Governo fez nos últimos quatro anos.
O projecto de alta velocidade deverá, pois, ser posto de lado, mobilizando-se todas as energias e recursos para outros projectos geradores de emprego real e de aumento significativo de actividade económica imediata para as empresas nacionais, sobretudo para as PME.

Aplausos do PSD.

Governar é optar, e é um exercício de inteligência fazer as melhores opções, fundamentadas. Este Governo não as faz. Pura e simplesmente não as quer fazer, ignorando todos os avisos e conselhos — e não têm sido poucos, em particular neste último ano — de todos os sectores da sociedade civil, teimosamente contra tudo e contra todos. Infelizmente, o tempo se encarregará, mais uma vez, de demonstrar quem tem razão, que o PSD alertou — e continua a alertar — para os erros das políticas seguidas. Mas o Governo já cá não estará para pagar os erros grosseiros.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Abel Baptista.

O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Costa, as nossas felicitações pelo facto de trazer à discussão as questões do investimento público.
Pela nossa parte, o CDS tem vindo a afirmar consecutivamente, de há três anos a esta parte, que este Governo deveria ter uma política diferente no que diz respeito à questão dos impostos: em vez de os

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aumentar, deveria reduzi-los para a economia ficar mais forte; em vez de os agravar, deveria facilitar a vida das empresas, diminuindo a carga fiscal e tornando possível, assim, criar mais emprego.
Durante mais de três anos, este Governo andou a dizer que era por causa do défice orçamental, para reduzir o défice, que estava a praticar estas medidas e estava preparado para relançar a economia, até porque a crise não nos ia afectar, tendo havido até quem afirmasse que a crise já cá não estava.
O CDS não considera que todo o investimento público deve parar, mas, Sr. Deputado Jorge Costa, gostaria que comentasse uma afirmação do Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações. Quando se anunciava a grave situação do País, quando se anunciava a recessão, que já cá está, o Sr. Ministro dizia e afirmava: «não vamos alterar o calendário do investimento público, não vamos alterar nenhum tipo de investimento, todo ele se mantém como se nada tivesse acontecido». Ora, este argumento parece-nos completamente irresponsável. E tão irresponsável é que, há dias, ouvimos o Sr. Primeiro-Ministro dizer que assumia que os calendários devem ser alterados e revistos.
Face a isto, o PSD tem vindo a dizer que todos os investimentos deveriam ser reavaliados. Mas eles deveriam ser reavaliados na sua concretização ou na sua calendarização? Qual é efectivamente a posição do PSD? O PSD está mais próximo do Ministro Mário Lino ou do Primeiro-Ministro José Sócrates?

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Costa.

O Sr. Jorge Costa (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Abel Baptista, começo por agradecer a sua questão. Ainda bem que a coloca.
De facto, os impostos foram utilizados pelo Governo, em determinada altura, para conseguir a redução do défice da despesa pública, mas não se resolveu o problema estrutural do País. O País tem, de facto, um problema estrutural, e a crise está aí para o demonstrar em toda a sua plenitude.
Quero aqui reafirmar hoje, quanto à matéria do TGV, que a alta velocidade é um projecto que, em nossa opinião, deverá ser posto de lado.

Aplausos do Deputado do PSD Agostinho Branquinho.

Todos os esforços e energias do País têm de ser direccionados para projectos que promovam o emprego e a actividade económica, sobretudo das pequenas e médias empresas, com isso se conseguindo, mais facilmente, combater a crise. Esse deve ser o caminho, não aquele, como tem dito o Governo, de manter o calendário a toda a força, ignorando aquilo que está a passar-se, ignorando a crise que se atravessa, ignorando que a situação piorou.
Como referiu, o Sr. Ministro veio dizer que não alterava os calendários, mas já estamos habituados, da parte do Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, a declarações do tipo «jamais!», que não haveria aeroporto na margem sul e que a Ota era uma inevitabilidade. Ora, o País, a sociedade civil, veio a demonstrar que, de facto, não era assim, que não era inevitável aquilo que o Ministro e o Governo diziam.
Também nesta matéria estamos crentes que a actual situação económica que se vive no País deverá ser a razão para que o projecto de alta velocidade seja posto de lado neste momento, mobilizando-se todas as energias para aquilo que é importante para o País, ou seja, a actividade económica, o desempenho das empresas e o combate ao desemprego.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado José Junqueiro.

O Sr. José Junqueiro (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, «Vencer com a Verdade» é o nome do novo ciclo político que o PSD e a sua Presidente iniciaram em 2009. Para que o possam concretizar só falta mesmo «Vencer» e, sobretudo, só falta «Falar Verdade». E isso é coisa que têm muita dificuldade em

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fazer. Manuela Ferreira Leite disse que, a ser Primeira-Ministra, a primeira coisa que faria seria «riscar o TGV», acabar com o projecto.
Mas, para falar verdade, à líder do PSD falta dizer que, na Figueira da Foz, na Cimeira Durão Barroso-José Maria Aznar, foi ela que, como Ministra das Finanças, assinou o compromisso entre os dois Estados para a construção de todo o sistema de alta velocidade. E não assinou apenas uma linha TGV, assinou cinco, com calendário e tudo. E, no final, brindaram com espumante o evento. Jornais, rádios e televisões registaram pro memoria essas imagens de satisfação e gáudio!

Aplausos do PS.

Portanto, parar, deixar cair os braços, é a proposta permanente que o PSD faz ao País. E se essa atitude já não divide o País, essa atitude divide apenas agora o PSD.
Diz Pedro Passos Coelho, a este propósito, «A nossa ligação à alta velocidade europeia e, portanto, o TGV Lisboa/Madrid, é um projecto estrategicamente relevante e seria um erro trágico ficarmos desligados».
E o que dirá Rui Rio que tanto se bate pela ligação Porto/Vigo? Sim, o Presidente da Câmara do Porto, que tanto critica o Governo, ainda que sem razão, pelo atraso neste projecto – imagine-se! –, o que dirá agora? Estamos curiosos! Ficamos curiosos para ouvir Rui Rio! E o Presidente da Associação Nacional de Municípios, Fernando Ruas, que tanto invectiva o Governo por causa da ligação Aveiro, Viseu, Salamanca, o que dirá agora? Até agora ainda ninguém os ouviu, não porque tivessem mudado de opinião — creio eu — mas talvez porque ainda não saíram do estado de choque.
Sabemos, no entanto, o que já disse e assinou o Deputado Guilherme Silva, em nome da delegação parlamentar portuguesa, na semana passada, no Fórum Hispano-Português, com Ana Maria Pastor, do Partido Popular espanhol, Vice-Presidente do Congresso dos Deputados.
E foi isto que disse Guilherme Silva: «Instam-se os dois governos a acelerar os projectos de ligações rodoviárias e ferroviárias, aumentando, na medida do possível, as dotações orçamentais para poder cumprir o previsto nos projectos prioritários na Rede Transeuropeia de Transportes que afectam ambos os países». E repetiu à Lusa: «apesar da pressão económica actual é vital que se continuem a intensificar as ligações rodoviárias e ferroviárias entre Portugal e Espanha». Não podíamos estar mais de acordo.

Aplausos do PS.

Esta memória não é um ataque à líder do PSD. É prova de que, como candidata a Primeira-Ministra, é ouvida aqui pelos seus e, como exemplificarei, também é ouvida lá fora, por governantes e Deputados e, portanto, precisa de cuidar da sua credibilidade.
Disse Andrés Ayala, do Fórum Hispano-Português, porta-voz do Partido Popular espanhol, a este propósito, das palavras de Manuela Ferreira Leite, que são «incompreensíveis e surpreendentes» porque, continua, «o projecto TGV é uma questão de Estado acima das questões partidárias, foi inicialmente negociado por governos do PSD, em Portugal, e do seu partido» – o dele, Partido Popular espanhol – «em Espanha, e foi aprovado por subsequentes governos».
E Francisco Rodrigues, Deputado do Bloco Nacionalista Galego, também referiu: «as declarações da líder do PSD são especialmente inadequadas e merecem críticas. É um projecto fundamental do ponto de vista económico e das relações económicas entre Portugal e Espanha e, no seu caso,» – dele – «entre Portugal e a Galiza».
Acresce dizer, neste contexto, que, afinal, ninguém mandou nenhum jornalista da Lusa a Espanha ouvir os socialistas espanhóis, não só porque é mentira mas também porque a agência é independente e distinta de qualquer governo, facto que será estranho para a líder do PSD e para a sua teoria da «democracia intermitente», a tal que se pode interromper de seis em seis meses.

Aplausos do PS.

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Acresce dizer que, como se constata, foram ouvidos por um correspondente local da Lusa Deputados de todos os partidos portugueses e espanhóis, incluindo o Deputado Guilherme Silva do PSD.
Portanto, de facto, é preciso falar verdade para vencer com a verdade e, por isso, Manuela Ferreira Leite precisa de pedir desculpa ao País por ter faltado ao primeiro dos seus compromissos e à primeira das obrigações de quem almeja ser primeiro-ministro: respeitar sempre a verdade e falar sempre com verdade. É que, afinal, para além dos actos, também se peca por palavras e omissões.
O PSD é um partido com responsabilidades na democracia portuguesa e não deve, através de sucessivas lideranças, mutáveis quase anualmente, perder a sua história e a sua credibilidade. Na política não vale tudo, nem mesmo a tentação de utilizar linguagem própria de micro grupos de extrema-direita quando se refere aos seus adversários políticos.
É isso que falta a este PSD: equilíbrio, verdade, credibilidade, coerência, sentido de responsabilidade e, sobretudo, neste momento, liderança.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado José Junqueiro, tem dois pedidos de esclarecimento, pelo que tem, desde já, a palavra o Sr. Deputado Agostinho Branquinho.

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Junqueiro, estive a ouvir a sua intervenção e quando V. Ex.ª começou por enunciar que ia falar verdade – quero dizer, aqui, neste Parlamento, algo que hoje todos os portugueses sentem – pensei que ia pedir desculpa por aquilo que tem sido a governação trágica do Governo socialista e pela total ausência de cumprimento das principais promessas eleitorais que o Partido Socialista fez, nomeadamente no campo do emprego.
Ficava-lhe bem, Sr. Deputado, esse gesto de humildade democrática de pedir aqui, na Câmara, desculpas aos portugueses e falar, pela primeira vez em quatro anos, verdade.

Aplausos do PSD.

O Sr. Deputado, fora do contexto, citou um conjunto de leituras que andou a fazer, mas, Sr. Deputado, permita-me que lhe diga que, para além de não ter pedido desculpas e não ter falado verdade, V. Ex.ª anda a fazer as leituras erradas.
Vou-lhe ler dois pequenos extractos, sendo um de um ex-ministro deste Governo socialista, o Sr. Prof.
Campos e Cunha.

Vozes do PS: — Oh!

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Dizia o Sr. Prof. Campos e Cunha, há alguns dias, o seguinte: «o maior monstro, o TGV, não terá impactos directos significativos na economia nacional e se os tiver, possivelmente, serão negativos».
Vou ler-lhe um outro extracto, também de um insigne socialista, de um colega seu neste Parlamento, João Cravinho, que diz a dada altura o seguinte: «a ligação Lisboa/Madrid por TGV é um projecto ruinoso». Vou repetir, Sr. Deputado, «a ligação TGV Lisboa/Madrid é um projecto ruinoso». Estas são as palavras do exDeputado João Cravinho.
Por isso, Sr. Deputado José Junqueiro, a questão a que V. Ex.ª tem de responder aqui, hoje, falando verdade, aquilo que tem de dizer aos portugueses é o seguinte: é importante para resolvermos o problema da crise que hoje vivemos, do desemprego que aflige centenas de milhares de portugueses, que, do ponto de vista das prioridades da decisão política, ponhamos o TGV de lado e olhemos, sim, para projectos que possam criar emprego, que possam dinamizar a economia nacional e que possam ajudar as famílias.
Sr. Deputado, encarecidamente lhe peço que fale verdade e diga lá se não é um projecto ruinoso, um projecto negativo, continuar a aposta deste Governo no TGV.

Aplausos do PSD.

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O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Junqueiro.

O Sr. José Junqueiro (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Agostinho Branquinho, respondo com todo o gosto às observações que fez repetindo-lhe, em matéria de citações, aquilo que diz uma pessoa não de há uns anos atrás mas de agora, da actualidade, do seu partido.
Gostaria de saber o que é que o senhor pensa acerca desta afirmação: «a nossa ligação à alta velocidade europeia, e, portanto, o TGV Lisboa/Madrid, é um projecto estrategicamente relevante e seria um erro trágico ficarmos desligados». A minha questão é a seguinte: V. Ex.ª acredita mais nas palavras de Pedro Passos Coelho ou acredita mais nas palavras de Campos e Cunha? Esta é a primeira questão que lhe coloco.

Aplausos do PS.

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Fale verdade!

O Sr. José Junqueiro (PS): — Em segundo lugar, para falar verdade e com uma testemunha de peso a seu lado, o Sr. Deputado Jorge Costa, que na altura era secretário de Estado e foi quem mandou fazer estudos de mais de um milhão de euros para concretizar outras obras públicas, pergunto: o verbo honrar tem algum significado para o PSD? O que é que eu quero dizer com isto? Os senhores tiveram um primeiro-ministro do PSD, Durão Barroso, que, com o primeiro-ministro de Espanha, José Luís Aznar, celebrou, na Figueira da Foz um contrato entre dois países, um compromisso de honra. Mais tarde, Carmona Rodrigues, em Santiago de Compostela, ratificou-o e iniciaram esse processo de construção.
Os senhores assinaram um compromisso de honra entre dois Estados e aquilo que lhe pergunto, Sr. Deputado, é o seguinte: o PSD não verá agora, neste momento, uma oportunidade única de dizer se está ou não de acordo com o verbo honrar? Tem ou não significado, para o PSD, o verbo honrar?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Abel Baptista.

O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Junqueiro, ouvimo-lo com muita atenção a fazer confrontação com o Partido Social Democrata, mas o CDS, «para esse peditório, não tem de dar».

Vozes do PS: — Já deu!

O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Mas há algumas questões, relacionadas com o que V. Ex.ª aqui aflorou, relativamente às quais o CDS gostaria de o questionar.
Em primeiro lugar e a propósito de falar verdade, pergunto se falar verdade era a construção do novo aeroporto na Ota, que era irreversível e absolutamente inalterável e jamais na margem sul, porque era um deserto? Bastou um estudo preliminar de uma conferência empresarial e toda a argumentação caiu pela base! Afinal, o aeroporto, que não era para a margem sul, já é na margem sul.
Há dias, ouvimos o Sr. Ministro das Obras Públicas dizer que o projecto TGV é para avançar como está previsto e calendarizado, sem qualquer alteração. A seguir, ouvimos o Sr. Primeiro-Ministro dizer que vão rever a calendarização do projecto do TGV.
Vimos hoje nos jornais o Deputado Ventura Leite dizer, «Sr. Primeiro-Ministro, por favor tome conta do projecto TGV, do novo aeroporto de Lisboa, por causa das contrapartidas, porque o Eng.º Mário Lino, Ministro das Obras Públicas, não sabe fazer essa negociação».
Verificamos que o Governo diz que a terceira travessia do Tejo é uma travessia rodo/ferroviária mas temos um ex-ministro deste Governo, actual Presidente da Câmara de Lisboa, a dizer «calma lá, isso não pode ser, traz graves prejuízos para a cidade, vamos ter de alterar, tenham calma, não façam isso».

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Sr. Deputado José Junqueiro, afinal, em que é que ficamos? Como é que V. Ex.ª vai falar verdade aos portugueses, dentro de dias, quando lhes for dizer, em campanha eleitoral, «já criámos os 150 000 postos de trabalho que prometemos na campanha anterior, mas, apesar de criarmos esses, perdemos muitos mais e estamos com o desemprego muito pior do que aquilo que era nossa previsão»? Sr. Deputado José Junqueiro, falar verdade é aquilo que está no Orçamento do Estado, aprovado no mês de Dezembro e que está em vigor, ou é aquilo que será ser aprovado dentro de dias, na rectificação ao Orçamento do Estado? O que é que é falar verdade para o Partido Socialista?

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Junqueiro.

O Sr. José Junqueiro (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Abel Baptista, gostaria de lhe dizer, em primeiro lugar, que o tema «falar verdade» é um tema novo para o PSD e não para o PS. E, a propósito de falar verdade, importa aqui referir que, em matéria de «peditórios», o único partido, nesta Sala, que contribuiu para o «peditório» do PSD foi, exactamente, o CDS e o Sr. Deputado, quando fez, com o PSD, uma coligação governamental.

Vozes do PS: — É verdade!

O Sr. José Junqueiro (PS): — Esse é que foi um grande «peditório», porque pôs o País pedir, três anos depois!

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — E agora?

O Sr. José Junqueiro (PS): — Em segundo lugar, Sr. Deputado, em todos os orçamentos do Estado, V.
Ex.ª apresentou sempre uma proposta de alteração.

A Sr.ª Helena Terra (PS): — Muito bem!

O Sr. José Junqueiro (PS): — Os Srs. Deputados sabem qual era a proposta de alteração do Sr. Deputado Abel Baptista nos orçamentos do Estado? Importa saber! Está recordado, Sr. Deputado?

Protestos Deputado do CDS-PP Abel Baptista.

A sua proposta de alteração, em todos os orçamentos do Estado, era aumentar, reforçar a verba para a ligação do TGV Porto-Vigo! Esta foi sempre a sua proposta nos orçamentos do Estado! O Sr. Deputado retira ou mantém essa proposta? Em terceiro lugar, Sr. Deputado, a única matéria imprevisível em termos de desemprego é a que decorre de uma acção conjunta entre o CDS e o PSD. O Sr. Deputado considera que era previsível, quando assumiu funções governativas como «muleta» do PSD, que o desemprego tivesse aumentado de 4,4% para 7,5%, em três anos?

Aplausos do PS.

O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — E agora?

O Sr. José Junqueiro (PS): — O Sr. Deputado não considera isso previsível, não!...

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E também lhe faço a justiça de perceber que, finalmente, aprendeu a lição e que o grande lema do Congresso do CDS, neste último fim-de-semana, foi o de que o CDS não seria «muleta» do PSD. Espero bem que não e que o CDS se mantenha no caminho da responsabilidade.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma declaração política, pelo Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Rosas.

O Sr. Fernando Rosas (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Terminou há minutos o prazo de entrega de candidaturas para o quinto canal de televisão. Se dúvidas ainda existissem sobre o erro estratégico que esta concessão significa, o escasso interesse demonstrado pelos grupos de comunicação social aí está para o demonstrar e o maior despedimento colectivo da história do sector não vem senão confirmá-lo.
Poder-se-ia pensar que a entrada em funcionamento de mais um canal de televisão seria benéfico para a promoção do pluralismo informativo e a diversidade de opiniões. Não nos parece, neste caso concreto, bem pelo contrário.
Em plena crise financeira, com um mercado publicitário em acelerada retracção, no meio do maior despedimento colectivo de que há memória na comunicação social em Portugal e quando a discussão internacional se concentra no próprio futuro da imprensa escrita, o aparecimento de mais um canal televisivo terá como óbvia consequência a brutal diminuição das receitas publicitárias dos demais títulos, principalmente os da rádio e da imprensa escrita, constituindo, em si próprio, um novo factor de estrangulamento.

Vozes do BE: — Muito bem!

O Sr. Fernando Rosas (BE): — A independência política e a própria subsistência de vários títulos da imprensa escrita e da rádio pode considerar-se em risco perante a iminência de um quinto canal, reforçando o processo concentracionário já em curso e que a lei que amanhã será votada — convirá lembrá-lo — está, na realidade, longe de prevenir.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Muito bem!

O Sr. Fernando Rosas (BE): — Vale a pena recordar que Portugal tem o mercado publicitário mais distorcido da Europa. Em mais nenhum país europeu, como no nosso, as empresas concentram mais de metade do seu investimento publicitário nos canais televisivos, e só não o fazem de uma forma mais intensa porque existem limitações legais entre nós que assim o impedem.
A atribuição da licença para mais um canal de televisão em sinal aberto vai reforçar essa tendência, tornando ainda mais complicada a já debilitada situação financeira da maioria dos títulos da imprensa escrita.
Uma comunicação social em processo de concentração, que a crise actual não fará senão apressar — é bom lembrá-lo —, sem recursos e em permanente guerra para captar audiências e anunciantes, não deveria interessar a ninguém, a começar pelo direito do público a uma informação plural e de qualidade e a continuar, obviamente, pelos jornalistas e a sua situação socioprofissional: conduz à degradação da informação; conduz ao fim do jornalismo de investigação; conduz à diluição da autonomia dos seus profissionais; conduz à tendência para, em nome das sinergias de grupo, criar verdadeiras redacções únicas, como se está agora a ensaiar, diminuindo a pluralidade informativa e o acesso à diversidade de opiniões; conduz à diminuição da independência face ao poder político e económico; conduz à «tabloidização» de toda a imprensa, incluindo a de referência. Uma sociedade sem uma imprensa livre é uma sociedade adormecida; uma democracia sem o questionamento de uma imprensa independente é uma democracia fraca e vulnerável.

Vozes do BE: — Muito bem!

O Sr. Fernando Rosas (BE): — Abrir um canal televisivo em sinal aberto não é o mesmo que abrir uma padaria ou uma fábrica de curtumes. Tem profundas implicações no funcionamento do sistema democrático.

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É por isso que não podemos deixar de ficar alarmados perante as notícias que indicam que a ZON, o primeiro dos dois concorrentes conhecidos à licença do quinto canal (acabámos de saber que, afinal, há outro) se prepara para fazer do quinto canal uma estação de televisão low cost e a montra da televisão por cabo.
Sem produção própria e recorrendo, quase em exclusivo, ao material informativo e de entretenimento concessionado aos concorrentes, o novo canal prepara-se para ser uma montra, sim, mas uma montra para garantir mais direito de antena na televisão aos anunciantes, sem oferecer nada em troca aos portugueses pela concessão do bem público que lhes é oferecido.

Vozes do BE: — Muito bem!

O Sr. Fernando Rosas (BE): — Pensar que se pode criar um verdadeiro canal televisivo empregando 30, 40 ou 60 pessoas e com um orçamento três a quatro vezes inferior ao dos demais concorrentes privados é um embuste político e um atentado à qualidade da informação que o Bloco de Esquerda não pode deixar de denunciar e que deveria convocar toda a atenção do Estado e de quem compete concessionar o espaço público de televisão.
No momento em que um dos maiores grupos de comunicação social recorre ao maior despedimento colectivo de há memória no sector — despedindo 122 profissionais, mais de metade dos quais jornalistas —, a abertura de um novo canal nestes moldes ameaça a qualidade da oferta televisiva e a sobrevivência — é preciso dizê-lo! — de grande parte da imprensa e conduzirá a uma preocupante diminuição do pluralismo informativo. Conduz à degradação das condições do exercício profissional, à desvalorização social do papel dos jornalistas, à diminuição da autonomia desta classe profissional perante os poderes políticos e económicos.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Uma comunicação social sem meios de subsistência e com profissionais cada vez mais precarizados, cada vez mais ameaçados, cada vez mais cercados pela ameaça do desemprego, torna-se refém de todo o tipo de interesses, a começar pelos interesses dos mais fortes: os do Governo e os dos grandes grupos económicos. O que temos de perguntar é se é uma televisão deste tipo, uma imprensa deste tipo e uma rádio deste tipo que queremos ou que não queremos.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, dois Srs. Deputados.
Tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Fernando Rosas, a situação vivida actualmente no sector da comunicação social, em particular com esse inqualificável processo de despedimento do grupo Controlinveste, é, sem sombra de dúvida, uma matéria que se impõe discutir e denunciar, agindo e combatendo esta prática política e económica que o poder está a desenvolver.
Com efeito, o processo a que o País tem vindo a assistir nesta área é, seguramente, uma das mais profundas e mais vastas reconfigurações a todos os níveis — ao nível legislativo, ao nível sociolaboral, ao nível económico e ao nível político — que o sector da comunicação social alguma vez viveu na história da democracia portuguesa.
A situação concreta, inaceitável e lamentável do despedimento de 122 profissionais em vários órgãos de comunicação social deste grupo Controlinveste — que o PCP denunciou e sobre a qual tem vindo a intervir — é, sem sombra de dúvida, um sintoma concreto, uma prova evidente do que está a acontecer em resultado das decisões políticas e da legislação que está a ser aprovada por este Governo e por esta maioria parlamentar.
Apesar das risadas do Deputado Arons de Carvalho, ainda na semana passada o Ministro Augusto Santos Silva, confrontado pelo PCP sobre a fusão de redacções, sobre as famosas sinergias para rentabilizar meios, diminuindo pessoal e condições de trabalho para os jornalistas, assumiu a relação deste fenómeno com o próprio Estatuto do Jornalista, que criou condições novas para este tipo de problemas, nomeadamente com as redacções únicas, ou seja, com aquilo que, no grupo Controlinveste, agora se está a ensaiar.

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Desse ponto de vista, Sr. Deputado Fernando Rosas, estamos ou não perante a prova concreta e a realidade palpável que resulta de uma reconfiguração política, económica e legislativa que está a ser operada? Estamos ou não perante a circunstância — que é a moeda de troca para este País e esta sociedade — de serem tomadas decisões, como, por exemplo, a lei da concentração dos media, que vêm consagrar panoramas comunicacionais do nosso país profundamente lesivos da própria liberdade de imprensa, da diversidade e do pluralismo na comunicação social? Estamos a denunciar esta questão e, por isso, chamámos à Comissão de Ética o Sr. Presidente da Controlinveste e o Sindicato dos Jornalistas para a apurar. Neste momento, está cada vez mais à vista que a comunicação social livre, democrática, plural, em condições de trabalho justas e correctas é um factor decisivo para a própria vivência democrática. Assim, gostaria de saber se concorda que o nosso país e a nossa democracia ficam mais pobres com situações como a que estamos a atravessar.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Rosas.

O Sr. Fernando Rosas (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Bruno Dias, começo por lhe agradecer as questões que colocou.
Na realidade, penso que a crise económica em curso corre o risco de se transformar, no que respeita ao panorama da comunicação social em Portugal, num factor perverso de concentração dos órgãos de informação, com prejuízo da liberdade informativa e do pluralismo informativo.
O caso da Controlinveste, que referiu, é um caso paradigmático, porque se despedem 120 trabalhadores, 70 dos quais jornalistas. Na realidade, começa por se criar uma agência de fotógrafos, que é uma espécie de redacção única da fotografia, assumidamente com o propósito de passar essa experiência para o campo mais especificamente redactorial.
Evidentemente, a multiplicação deste processo faz com que a mesma redacção produza, pelas mesmas pessoas, as mesmas notícias para um conjunto enorme de órgãos de imprensa escrita e televisiva, ao mesmo tempo com manifesta limitação da liberdade de informação e do pluralismo informativo.
Ora, isto está à vista e é assumido como uma virtude por parte dos gestores, mas o que é extraordinário é que é assumido como uma virtude por parte do Governo.
Por isso, chamar cá, como também nós fizemos ontem, os patrões da Controlinveste é muito importante para saber o que se vai fazer, sobretudo quando eles assumiram o compromisso, antes do investimento, de não despedir ninguém e de não fazer o que neste momento estão a fazer.
Nesse sentido, pensamos que a actual formulação do Estatuto dos Jornalistas, contra à qual votámos, assim como a bancada do PCP, está a demonstrar que tínhamos razão, porque em situação financeira difícil os jornalistas vão para a rua e o patronato está a tomar atitudes de gestão que, na verdade, são lesivas da liberdade de informação e da liberdade de imprensa.
Ora, isso significa que a crise económica, em Portugal, no que toca aos órgãos de informação, pode traduzir-se também, se não forem tomadas medidas, numa crise do pluralismo informativo e da liberdade de expressão.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra Arons de Carvalho.

O Sr. Alberto Arons de Carvalho (PS): — Sr. Presidente, queria transmitir ao Sr. Deputado Fernando Rosas, em primeiro lugar, a minha profunda surpresa perante o teor da sua intervenção.
Aliás, começo por estranhar que o Sr. Deputado Fernando Rosas tenha aqui levantado esta questão, relacionada com a concentração, depois da estranha ausência do Bloco de Esquerda em todo o debate e votação, na especialidade, ontem, na Comissão Parlamentar que aprovou a lei da concentração.
Sr. Deputado, estranho muito que o Bloco de Esquerda esteja tão preocupado com a concentração na comunicação social e não entenda que a presença de um novo operador de televisão configura uma

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oportunidade para que haja mais pluralismo na comunicação social, da mesma forma como ninguém pode entender que o Bloco de Esquerda esteja preocupado com os despedimentos no Diário de Notícias e no Jornal de Notícias e não tenha uma atitude positiva em relação a novas oportunidades de emprego que advirão da existência de um novo operador no mercado das televisões, até agora circunscrito a dois operadores comerciais.
Aliás, queria perguntar ao Sr. Deputado Fernando Rosas — e esse é o essencial da questão — em que país europeu existe essa coisa espantosa da mudança da televisão analógica para a televisão digital não proporcionar um alargamento da oferta televisiva em sinal aberto. Isso não aconteceu em nenhum país europeu, sob pena de condenar ao fracasso a mudança da televisão analógica para a televisão digital.
Queria também dizer que o Sr. Deputado Fernando Rosas, na sua intervenção, ignorou completamente o teor das regras do concurso público que impõem ao novo operador de televisão exigências que não estavam sequer presentes no concurso público que, em 1990, admitiu a SIC e a TVI. Esse novo operador está sujeito, em matéria de programação, a obrigações de grande exigência que não estavam presentes na legislação portuguesa até agora.
Finalmente, Sr. Deputado Fernando Rosas, como sabe, tenho uma enorme consideração por si. Sei que é um emérito historiador mas já não creio que seja um especialista na comunicação social. Porém, sendo um emérito historiador, custa-me que esteja aqui a defender, no século XXI, uma forma absolutamente espantosa de condicionamento industrial na área da comunicação social.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Rosas.

O Sr. Fernando Rosas (BE): — Sr. Presidente, em primeiro lugar, queria agradecer ao Sr. Deputado Arons de Carvalho as observações que teve a gentileza de me dirigir.
Sr. Deputado, a concessão de um novo operador de televisão é um acto de política informativa que deve ser adoptado de acordo com as circunstâncias e as condições de vida concretas em que o País vive.
Há circunstâncias em que é correcto, necessário, oportuno conceder um novo canal televisivo porque isso é um progresso e há circunstâncias em que pode ser um erro estratégico determinante. Não é bom ou mau em abstracto, é em função das circunstâncias.
Ora, o Sr. Deputado não argumenta com uma palavra a situação concreta que descrevi.
Primeiro: a concessão deste canal vai ou não arruinar operadores de rádio e de televisão escrita? Silêncio» Segundo: a abertura do novo canal vai ou não fazer novas pressões para o desemprego nos sectores adjacentes da comunicação social? Silêncio» Aliás, o Sr. Deputado responde com generalidades. Diz que o novo operador significa mais pluralismo» Pode significar ou não.

O Sr. Alberto Arons de Carvalho (PS): — Desculpe» Como?!

O Sr. Fernando Rosas (BE): — Se o Sr. Deputado prestasse atenção ao que estou a responder provavelmente não me fazia algumas das perguntas desnecessárias que me fez.
O Sr. Deputado perguntou-me se o novo operador significava mais pluralismo e eu digo que pode significar ou não. Estou convencido de que neste caso concreto não é, porque significa falência de órgãos de informação não no meio da televisão mas nos outros sectores que são prejudicados pela abertura do novo canal.
O Sr. Deputado é capaz de garantir aqui que não vai haver falências e despedimentos na rádio e na televisão pela abertura do novo canal? Sabe tão bem como eu, o senhor que ç um estudioso» Eu não sou especialista de coisa alguma, Sr. Deputado! Eu sou um Deputado da República que aqui defende os interesses dos meus constituintes.

A Sr.ª Alda Macedo (BE): — Muito bem!

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O Sr. Fernando Rosas (BE): — Mas devo dizer-lhe que os meus constituintes estão muito preocupados com o facto de este canal de televisão poder significar, em cima dos 120 despedidos, mais outros 120, mais outros 120 e mais outros 120» Ora, parece que o senhor não está nada preocupado com isso! A diferença é que nesta bancada preocupamo-nos com as pessoas, com o trabalho e com o futuro delas e os senhores preocupam-se com os esquemas da passagem da televisão analógica para televisão digital sem se preocuparem com os interesses das pessoas»! Neste caso e neste momento concretos abrir um novo canal de televisão pode significar falências, despedimentos e pior oferta do serviço de televisão.
A isso, «aos costumes» o Sr. Deputado disse nada!!

O Sr. Alberto Arons de Carvalho (PS): — Não concordo!

O Sr. Fernando Rosas (BE): — O Sr. Deputado «puxou dos seus galões» como especialista da matéria, mas em termos do interesse dos portugueses nada disse.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Este fim-de-semana, realizou-se, nas Caldas da Rainha, o XXIII Congresso Nacional do CDS-PP.
Foi um Congresso importante que aconteceu no ano de todas as eleições e que mostrou ao País o que, numa conjuntura tão difícil, do CDS se espera.
Portugal percebeu que o CDS é um partido mobilizado, independente, com uma liderança forte e legitimada, uma estratégia autónoma e vocação de crescimento. Equivale a dizer que o CDS deve aspirar a afirmar-se pelo que pode fazer por si, muito mais do que por aquilo que pode fazer com os outros.
Portugal também percebeu que o campo do CDS é o campo do não socialismo ou socialismos, conforme queiram. Equivale a dizer que queremos ser verdadeira alternativa e que no CDS há espaço para o descontentamento daqueles que aí, na prática experimentada da governação e de algumas oposições, já não encontram respostas.
Portugal percebeu ainda que o CDS é um partido que sabe o que quer e que poderá ser a solução para alguma da indiferenciação que já se nota ao centro.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: PS e PSD não são, evidentemente, partidos iguais, mas a verdade é que, em muitas das decisões políticas relevantes, não se têm mostrado diferentes.
Foi assim na justiça, com consequências no aumento da criminalidade e da insegurança, que muitos agentes judiciários denunciaram; foi assim na política fiscal, com declarações equivalentes em aspectos essenciais das medidas da governação; foi assim a propósito do referendo europeu, que em tempos defendiam, mas depois rejeitaram sem se perceber bem porquê; é assim na visão errada acerca do essencial dos erros das políticas do rendimento mínimo garantido; é assim, em parte, no facto de não quererem avaliar, com a urgência que o caso justifica, questões determinantes da supervisão bancária ou o papel excessivamente interventivo da Caixa Geral de Depósitos, quando não mesmo o problema de se tratar de dois partidos com uma visão muito instrumental da própria Administração Pública.

Aplausos do CDS-PP.

Neste contexto, compreende-se que o CDS deva e tenha de assumir a diferença ao centro e à direita que o País reclama.
Portugal não deseja mais uma alternância de iguais; precisa, isso sim, de uma alternância de diferenças.
O Congresso do CDS também mostrou todos os riscos de uma extrema-esquerda que, se algum dia fosse opção, só garantiria o agravamento de todos os problemas.

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Em Portugal a economia revela hoje um défice de confiança que se agrava e as pessoas temem a insegurança, que hoje sentem muito maior do que antes. São dois problemas prioritários do regime.
Ora, não será certamente na reciclagem de soluções típicas das economias planificadas, cujo fracasso a História já se encarregou de mostrar, que Portugal encontraria melhor rumo.

Aplausos do CDS-PP.

Como não se anteciparia, propriamente, uma extrema-esquerda, de repente, convertida aos méritos das políticas de segurança.
Numa outra evidência, quando a insegurança aumenta a direita tende a investir na autoridade. Já a extrema-esquerda se limita, quase sempre, a inovar na justificação sociológica, o que, convenhamos, nos tempos que correm, faria toda a diferença. De resto, sempre que o mundo optou pelas soluções à extremaesquerda nunca conseguiu outro resultado que não fossem o aumento da pobreza e a diminuição da liberdade.

Aplausos do CDS-PP.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Percebe-se, então, a diferença que, neste momento, o CDS justifica, na oposição, como na alternativa que quer ser. Porque na Legislatura, em alguns exemplos apenas, que também se recordam, ao CDS se deveu o primeiro combate ao sistema da avaliação dos professores e do Estatuto do Aluno; ao CDS se deveu a denúncia de alguns excessos da ASAE, com prejuízo, em muito, do melhor da nossa actividade económica; ao CDS se deveu a adopção da vacina contra o cancro do colo do útero e a dispensa de medicamentos em unidose; ao CDS se deveu o combate ao fanatismo de uma administração fiscal, que nem sequer dá o bom exemplo de si; ao CDS se deveu a publicação em lista das dívidas do Estado, apesar de todas as restrições que a maioria assegurou;»

Aplausos do CDS-PP.

» ao CDS se deve a voz que os agricultores não têm contra a incompetência de um Ministro que governa contra aqueles que tutela, o que não deixa de ser extraordinário.

Aplausos do CDS-PP.

E ao CDS se deve muito mais.
Compreende-se por isso que, aqui chegados, o CDS pretenda mais.
Para já, o CDS foi o primeiro dos partidos a antecipar aspectos decisivos de um futuro programa de governo. O Congresso revelou como o CDS defende um no novo contrato fiscal para a redução de impostos; como o CDS reclama um impulso radical às micro, às pequenas e às médias empresas, que constituem 90% das empresas nacionais e garantem 80% do emprego gerado; como o CDS reclama um movimento que retome o «elevador social», que parou. Hoje, em Portugal, quem tem menos dificilmente aspira a ascender, como seria suposto numa sociedade de mérito, sendo que a pobreza aumenta e a classe média continua a ser onerada com todos os encargos.
O CDS pretende igualmente lançar as bases de uma verdadeira política de educação, com liberdade de escolha para todos, independentemente de ser rico ou pobre, restituindo-se também a autoridade aos professores, sem a qual, seguramente, todo o sistema colapsa.
Recomendo, de resto, pela brevidade do tempo de que disponho, uma leitura atenta do projecto de orientação política, económica e social aprovado neste Congresso, porque está lá tudo, basta ir a www.cds.pt.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A terminar e para o que mais importa, há uma resposta que se oferece, no espaço do centro direita, que passa cada vez mais pelo CDS.
A opção alternada de mais ou menos iguais deixa, após terem passado trinta e alguns anos, pouca expectativa para quem queira uma nova diferença.
No CDS, trataremos de saber estar à altura.

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Possa, ao menos neste ano, que, volto a dizer, é o ano de todas as eleições, o País escolher.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Há quatro inscrições para pedidos de esclarecimento, a primeira das quais do Sr. Deputado Aguiar Branco, a quem concedo a palavra.

O Sr. José de Aguiar Branco (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Melo, naturalmente, saudamos o Centro Democrático Social-Partido Popular pela realização do seu Congresso, também pelos resultados do mesmo e, nomeadamente, pela categórica reeleição do Deputado Paulo Portas para Presidente do Partido Popular. Com isso, termino a parte das saudações.
Queria deixar apenas duas notas.
O CDS é um partido importante na democracia portuguesa, um partido que se situa à direita do PSD, um partido que acolhe o que, na sociedade, são os ideais da democracia-cristã e esse aprofundamento, que sei que foi feito neste Congresso, com certeza continuará a ser a linha de matriz do CDS para o futuro.
No passado, tem havido divergências e convergências entre os nossos dois partidos e, na actualidade, também temos tido algumas divergências e convergências.
Mas há uma coisa em que queremos continuar a acreditar e que estamos certos que saiu reforçada deste Congresso: a vontade comum de acabar com uma governação socialista que muito de mal tem feito ao País que, seguramente, vai continuar a ser uma das batalhas e um dos contributos que o CDS continuará a dar para bem da democracia portuguesa.
Portanto, deixo esta palavra de saudação, esta palavra de referência relativamente a uma linha estratégica que, estamos certos, o CDS prosseguirá, acreditando que continuará a dar um contributo para que a Partido Socialista deixe de ser Governo em Portugal.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Melo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Aguiar Branco, em primeiro lugar, agradeço a questão que coloca.
Reforço a ideia de que, obviamente, socialistas e social-democratas não são iguais. Ainda assim, tentei referir alguns dos momentos importantes em que, na Legislatura, estiveram de acordo, quanto a nós, mal.
De resto, saudamos com muita simpatia a presença do Dr. Aguiar Branco no nosso Congresso, agradecemos os méritos que vê no CDS e devolvemo-los, com equivalência, ao PSD pelo inestimável papel que tem desempenhado nestes anos de democracia portuguesa.
Isso não invalida que, nesta altura, o CDS queira significar também o seu caminho de diferença no combate a uma governação socialista que marca pela negativa o actual momento que o País atravessa.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP). — Muito bem!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — O CDS quer ser uma voz dessa diferença. O CDS salienta muito daquilo que, na oposição, foram as marcas dessa diferença e antecipa muitas das propostas que apresentará num Programa do Governo.
Isto porque, convenhamos, hoje vivemos no País de todas as propagandas, vivemos num País que parece que é mas não é.
Um País onde os portugueses sentem as dificuldades, mas, à noite, ouvem o Primeiro-Ministro e quase conseguem ler na sua mensagem que tudo está melhor, e não compreendem.
Um País onde 90% das empresas são pequenas e médias, mas onde o discurso do Governo é todo direccionado para os grandes investimentos públicos e apenas para algumas empresas.

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Um País onde essas pequenas e médias empresas não têm liquidez, têm dificuldades de tesouraria, mas onde se percebe, pelo Governo, que o essencial dos grandes programas de crédito se destina às poucas grandes empresas que tratarão das grandes empreitadas públicas.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — Um País onde o desemprego dispara, mas onde, ainda hoje, também se ouviu um outro Ministro que tenta justificar a não criação de 150 000 novos empregos, num cinismo que não tem nome.
Um País onde a agricultura é cada vez mais de subsistência e onde, na sua incompetência, o Ministro que a tutela, em vez de reclamar de Bruxelas os fundos que poderiam ajudar a fazer alguma diferença, pelo contrário, tenta justificar perante os agricultores aquilo que quer devolver a Bruxelas.

Aplausos do CDS-PP.

Este é um País mal governado.
Por ser um País mal governado necessita de uma alternativa.
O CDS quer ser essa alternativa.
Neste que é o ano de todas as eleições, o CDS tentará estar à altura do que o País precisa e da alternância que os portugueses desejam.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Ricardo Rodrigues.

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Melo, também o Grupo Parlamentar do Partido Socialista deseja saudar o Congresso do CDS-Partido Popular e, igualmente, a eleição do Sr. Deputado Paulo Portas como líder do PSD,»

O Sr. Presidente: — Líder do PSD, não! Líder do CDS...!

Risos.

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Era essa confusão que ia deixar clara... É um lapsus linguae, Sr.
Presidente..., «ainda» é um lapsus linguae»

Risos.

Mas, dizia eu, eleição como líder do CDS-PP.
Mas vamos às questões que interessam.
Da intervenção do Sr. Deputado Nuno Melo, percebi que, agora, o CDS pretende um projecto autónomo.
«Autónomo» significa o quê? Que os senhores vão apresentar-se às eleições como um projecto alternativo que pretende vencer as eleições e, por isso mesmo, não precisa de nenhuma coligação? Ou, pelo contrário, os senhores anunciam um projecto autónomo para, na curva seguinte, irem coligar-se com o PSD?

O Sr. José Junqueiro (PS): — Bem perguntado!

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Percebe-se agora, da intervenção do Sr. Deputado Aguiar Branco, que o «namoro» se mantém. O Sr. Deputado Nuno Melo, na resposta que deu, fala dos seus méritos e dos méritos do PSD», ou seja, mantçm-se essa linguagem ambígua.
Assim, pergunto-lhe claramente: vai haver ou não coligação antes das eleições e depois das eleições? Já que falou em várias eleições, pergunto: e nas autárquicas? Vão coligar-se ou não?

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Sr. Deputado, na sua intervenção, falou também nas várias iniciativas legislativas do CDS-PP nesta Casa, as quais considera um sucesso, e são-no, de facto.
Esses êxitos — e falo da vacina contra o cancro do colo do útero e das várias iniciativas que o Sr. Deputado enunciou — foram iniciativas legislativas do CDS mas, sem a aprovação do PS, não teriam tido êxito. Ou seja, não queremos reivindicar a iniciativa mas decerto queremos dizer que foi a nossa aprovação que permitiu o êxito que o CDS reclama para si próprio.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Portanto, convinha que esta questão também ficasse esclarecida.
Quanto à questão das coligações, que considero essencial, o que me parece é que o CDS não tem emenda. Vai coligar-se com o PSD, não digo já nas próximas eleições legislativas, porque, aí, o PS terá maioria absoluta novamente, mas com certeza vai esperar oportunidade para se coligar de novo com o PSD.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Melo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Ricardo Rodrigues, reafirmo a autonomia no discurso que o CDS deve ter, até porque se apenas nas maiorias absolutas se justificasse o que fosse, então, o próprio Partido Socialista encontraria muito pouco na sua história para justificar grande parte do seu trajecto na oposição.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP). — Muito bem!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — Este é um Parlamento pluripartidário onde, hoje, há quem apoie a maioria, e tenha maioria absoluta, há quem tenha peso relativo menos significativo e há quem tenha apenas 12 Deputados, agora 11, como o CDS, conseguindo, apesar disso, fazer toda a diferença.
Sr. Deputado, perceba que, na minha intervenção, fui tudo menos ambíguo. Não sou ambíguo quando digo que o País é mal governado porque entendo mesmo que assim é.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP). — Muito bem!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — Hoje, tudo está pior, Sr. Deputado!

Vozes do CDS-PP: — É verdade!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — O desemprego disparou; os salários, os rendimentos e as pensões estão a crescer abaixo da inflação; o preço dos bens essenciais cresce acima da inflação; as famílias estão mais endividadas; temos um banco que — veja lá! — foi nacionalizado, coisa muito peregrina passados que estão os tempos do PREC»! O Sr. Deputado tem todas as razões para alarme por soluções que este Governo não conseguiu encontrar e resultados que não consegue mostrar ao País.
De resto, temos um Governo que, quanto ao que é mau, diz que a culpa é da crise, mas quanto ao que de alguma forma vai sendo bom, vá lá, não invoca os méritos do CDS quando apresenta as propostas que o PS acabou por aprovar mas tenta chamá-las a si, nem sequer respeitando direitos de autor, o que não deixa de ser grave.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP). — Muito bem!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — E deixe que lhe diga outra coisa, Sr. Deputado.

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O Sr. Deputado fala em ambiguidade e invoca as coligações?! Olhe, se quer invocar coligações como exemplo de ambiguidade, dê lá uma palavrinha a propósito da Câmara de Lisboa e do que o Partido Socialista quer fazer com o Bloco de Esquerda»! Quer fazer parecer ao País que, afinal, o «Zç« já não serve ao Bloco mas, porventura, o Bloco já servirá ao PS»!

Aplausos do CDS-PP.

Vou dar-lhe outro exemplo do que não é ambíguo, Sr. Deputado.
Ontem mesmo, recebi um telefonema de um empresário que garante mais de 1000 postos de trabalho e que me ligou desesperado. Sabe porquê, Sr. Deputado? Porque, dizia-me ele, «no final do mês, tenho de pagar o salário aos trabalhadores da minha empresa. Não tenho como, porque o Estado está em atraso na devolução do IVA, que antecipei mas a que tenho direito». Não sou ambíguo quando lhe digo isto, Sr. Deputado! Mais ainda, invoco aqui, na pessoa deste empresário, a indignação que é de muitos para não dizer de quase todos.
Imoral é que o Estado, que é implacável quando cobra, seja relapso quando deve cumprir. Imoral é que o Estado que invoca a sua luta no combate ao desemprego seja o mesmo que, em muitas empresas, garante esse desemprego quase como uma inevitabilidade.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — É imoral que as empresas que querem garantir os postos de trabalho oiçam dizer no discurso do Governo, do Primeiro-Ministro ou do Ministro das Finanças, que vão ser aprovados planos extraordinários de combate à crise e de pagamento das dívidas do Estado e que, a partir de agora tudo vai ser diferente, quando, afinal, nada é diferente, tudo está pior.
Imoral é que as empresas, tendo de pagar salários, não o possam fazer, não porque não produzam riqueza mas porque a que produzem é antecipadamente paga ao Estado e, não sendo pertença do Estado, este não a devolve.
É imoral, reafirmo-lhe, e nisto não sou ambíguo, Sr. Deputado.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Melo, em primeiro lugar, os devidos cumprimentos pela realização do Congresso do CDS e pela eleição dos seus novos órgãos dirigentes, que cumprimento.
Sr. Deputado, eu estava com o coração um bocadinho «apertado» enquanto ouvia a intervenção do Deputado Ricardo Rodrigues. É porque ele falou tanto, tanto, tanto em coligações que ainda pensei, tendo em conta a temática que também esteve presente no Congresso do CDS, que vinha dali uma proposta antecipada para um futuro mais ou menos próximo. Mas, afinal, não»!

Risos.

Acho que o Sr. Deputado também estava preocupado com o andamento da conversa do Partido Socialista»

Risos do PCP.

Depois, tambçm respondeu com outras coligações» Olhe, aqui já cheirava a «queijo Limiano», Sr. Deputado»!

Risos.

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No que se refere à sua intervenção, queria ressaltar, em primeiro lugar, a definição do CDS feita pelo Sr. Deputado: é um partido não socialista — ora, aí está! —, querendo dizer, se entendi bem, que é um partido que quer diferenciar-se do Partido Socialista, que está no Governo, e da sua governação. Penso ter entendido bem.
O problema é que esta definição denuncia bem o que é a política, não do CDS, que é a habitual, mas do Partido Socialista.
Quando os partidos à direita já só têm, como campo para se diferenciarem, não as políticas seguidas na maior parte dos casos mas dizerem-se não socialistas, provavelmente, não estamos a definir bem a linha política ideológica do CDS mas estamos a definir na perfeição aquilo que é a política do Partido Socialista, uma política de direita, como o Sr. Deputado bem sabe.
Queria referir apenas um aspecto da moção vencedora do Congresso do CDS-PP que, nos tempos que correm, penso que vem muito propósito — enfim, estive a dar uma vista de olhos, para esta intervenção» Refiro-me à questão da conciliação entre a profissão e a família. Há propostas que lá fazem que merecem certamente discussão, mas é extraordinário, Sr. Deputado, que o aspecto essencial da conciliação entre a profissão e a família são os direitos dos trabalhadores face ao seu patrão e à entidade empregadora e, ontem, votámos, aqui, uma série de alterações que visavam em boa parte proteger o trabalhador, para não estar à mercê de horários selvagens, não estar à mercê de ter de se submeter a tudo porque se não «vai para a rua» e é despedido, e o CDS-PP não apoiou essas propostas do PCP!....
A postura do CDS-PP não é, de facto, de apoio à conciliação, porque quanto mais se diminuem os direitos dos trabalhadores menos possível é a conciliação entre a sua vida profissional e a sua vida familiar, e sobre isso não encontrámos rasto na moção de estratégia do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Bernardino Soares, quem temeu pelo «coração apertado» fui eu, mas, pela sua expressão, vejo que não tenho razão para ficar muito preocupado, nem sequer quando fala de coligações.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Não ia propor uma coligação!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — É porque, para falar de coligações, teríamos de começar por aquela que tem bem próximo, na sua bancada»

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Mas esta é assumida!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — Mas não queremos ir por aí, pois pensamos que não é propriamente a questão mais relevante do regime. Nem sequer nos interessa falar — não é porque tivéssemos qualquer problema nisso — da insinuação que fez ao queijo, que, parece-me, não se fabrica em Santarçm»

Risos do CDS-PP.

A esse propósito, o Sr. Deputado tambçm teria bem perto qualquer coisa para dizer»

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Olhe que o senhor sobre isso deve ter muito para falar! Fabrica-se no Porto, não?!...

Risos do PCP.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — Quanto ao Congresso do CDS, Sr. Deputado, ainda bem que leu a moção, fez muito bem e pode até ser que aprenda qualquer coisa. Não tenho é qualquer ilusão quanto

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àquilo que pode nela ter como bom, porque, em boa verdade, temos um PCP que ainda não ultrapassou aquele binómio da luta de classes que a História já demonstrou suficientemente não fazer qualquer sentido.
Temos um Partido Comunista Português que continua a insistir na vontade de ter empresas que criem trabalho mas sem patrões, porque são a materialização de todo o mal. Não faz sentido!! Acreditamos nas empresas como realidades onde patrões e trabalhadores estão do mesmo lado, onde uns e outros percebem que a riqueza criada é para vantagem deles e do País.
Neste partido, não beneficiamos em nada, nem queremos, com a instabilidade social, com o aumento do desemprego, com aquilo que, sendo razão de agravo de quem trabalha, possa fazer crescer o partido! A sedimentação das nossas empresas, a riqueza das nossas empresas, o sucesso e a produtividade das nossas empresas são bons para os trabalhadores, para as entidades patronais e para o País.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — À custa de quem?!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — Não queremos ganhar nem invocar a crise para benefício do que seja. E o que me alarma, isso, sim, é que, na expressão desse velho binómio da luta de classes, não haja, nessa bancada, um espacinho para perceber a importância da compatibilização, nos tempos que vivemos, da família e do trabalho.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — Porque nem só, Sr. Deputado, na rudeza da invocação do trabalho à antiga no discurso comunista se reflectem as exigências do trabalho dos tempos que correm. Hoje em dia, quando essa realidade do trabalho mudou, há muito quem queira ter família, mas não a possa conciliar com o emprego.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — E o senhor acha bem?

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — Acho mal! Sabe, Sr. Deputado: faça uma pesquisa sobre as iniciativas de protecção à família que este Parlamento regista e verificará na grande parte delas os direitos de autor do CDS-PP e em muito poucas os do PCP!

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Deputado Nuno Melo, gostaria, em nome do Bloco de Esquerda, de saudar a realização do Congresso do CDS, os seus órgãos eleitos e o presidente do CDS-PP, já anteriormente eleito em eleições directas.
Neste ensejo, gostaria de dirigir duas notas ao CDS-PP.
Uma delas tem a ver com o facto de, neste debate, me ter sentido reconfortado na posição do Dr. Ribeiro e Castro: a política de imigração do CDS-PP paredes-meias com a política de segurança é de extrema-direita, é securitária, enfim, é xenófoba. Não diríamos melhor! Dissemo-lo aqui em diversos debates parlamentares.
Quase me senti ultrapassado pela esquerda perante essa posição do ex-líder do CDS-PP e actual eurodeputado.
Uma segunda nota tem a ver com a forma, que pensamos ser gentil, com que o CDS-PP invocou, embora em vão, o Bloco de Esquerda no seu Congresso, sempre com um objectivo, que, aliás, foi hoje reiterado pelo Sr. Deputado. É que o CDS-PP quer ser útil à governação desde que Satanás, desde que Belzebu» — abrenõncio se o Bloco de Esquerda tem alguma coisa a ver com isso!» —, eles aí estão disponíveis para o Partido Socialista! Foi uma forma gentil de invocarem o Bloco de Esquerda no vosso Congresso. Só posso agradecer a deferência.

Aplausos do BE.

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O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Fazenda, agradeço-lhe a simpatia no comentário a propósito do Congresso do CDS-PP.
O Sr. Deputado quer sentir-se reconfortado com as declarações de quem seja e eu preferia saber se ainda se sentiria reconfortado, porventura, na posição programática de tempos idos do Enver Hoxha, por exemplo.

Risos do BE.

Faz mais sentido por aquilo que representa para o País, e que na minha intervenção quis significar, do que outra coisa qualquer, na expressão daquilo que, nas soluções da extrema-esquerda experimentadas na História, hoje, já não retiraríamos nada de novo e naquilo que o País precisa certamente não encontrámos resposta para coisa alguma.
Estamos em lados opostos deste Hemiciclo, o que faz sentido. E quando, hoje, se percebe que se governa mal e ao País se vai pedir a apreciação sobre a alternância que Portugal justifica, nós significamos essa alternância e exprimimos no Bloco de Esquerda tudo aquilo que o País não deseja ou de que , pelo menos, não precisa!

O Sr. João Semedo (BE): — Do CDS!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — Enuncie o Sr. Deputado os «crimes» da governação, as marcas que este Governo não consegue imprimir e adiante depois as soluções que apresenta e o País avaliará, porque o Sr. Deputado argumenta com a crise e com a falta de confiança na economia. Gostava de saber o que ainda vê nas economias planificadas que hoje pudesse ser resposta para o que fosse. Não encontro! Mas sei que não tem outras respostas.
O País, hoje, sente e vive um aumento da criminalidade. O CDS insiste na necessidade de aumentar o investimento nas forças de segurança. Gostava de saber o que é que o Bloco de Esquerda propõe como alternativa, para além de algumas teorizações sociológicas sobre os complexos de origem.
Sr. Deputado, deixe-me que lhe diga outra coisa: de Satanás e Belzebu sei muito pouco» e nem sequer elevei à categoria das prioridades da agenda política retirarem-se crucifixos dos hospitais!

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — Mesmo quando para alguns, às vezes, um crucifixo pode significar o único momento de conforto que encontram quando sofrem e quando não sabem o que lhes vai acontecer nas horas seguintes.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — As nossas prioridades são muitas outras! Mas também lhe digo outra coisa, Sr. Deputado: é a este Bloco de Esquerda, quando fala de coligações, que tenho de me dirigir quando há muito pouco tempo dizia a este País que «o Zé fazia falta», que o «Zé» era a solução para todos os males»! Hoje, percebe-se que, afinal, o «Zé» não faz falta, nenhuma! O que faz falta saber é o seguinte: e do «Zé», o que é que vem? Seria uma boa altura de, sobre isto, o Sr. Deputado dizer também qualquer coisinha.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para uma última declaração política, tem a palavra o Sr. António Filipe, em nome do PCP.

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O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Subimos hoje a esta tribuna em defesa da liberdade de manifestação. É insólito ter de o fazer quase 35 anos depois do 25 de Abril, mas a vida a isso nos obriga.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Exacto!

O Sr. António Filipe (PCP): — Teve lugar, anteontem, em Guimarães, uma audiência de julgamento de um processo em que são arguidos quatro dirigentes da União dos Sindicatos de Braga, acusados de desobediência qualificada pelo Governador Civil, por alegadamente terem promovido uma manifestação ilegal.
O caso é que o Governador Civil de Braga, na véspera da realização de uma greve geral, e oito meses depois de uma acção popular de protesto contra a política do Governo em Guimarães, mandou a PSP processar criminalmente quatro dirigentes sindicais sob a acusação de terem promovido uma manifestação não autorizada. Perante o arquivamento do processo, o mesmo Governador Civil assumiu ter pressionado o Ministério Público para forçar a sua reabertura, o que veio efectivamente a acontecer, e não foi demitido.
Também, anteontem mesmo, três cidadãos pertencentes ao Movimento de Utentes de Transportes Públicos da Área Metropolitana do Porto foram ouvidos pelo Ministério Público por terem sido acusados pela Governadora Civil de terem promovido uma manifestação ilegal porque, alegadamente, o número de subscritores da comunicação ao Governo Civil seria inferior ao exigido por lei.
Também no Porto, três dirigentes da União dos Sindicatos, incluindo o respectivo coordenador, foram notificados de um processo que existe contra eles por, alegadamente, terem participado numa manifestação ilegal, e esta semana, ainda no Porto, uma jovem estudante de 18 anos foi ouvida pela PSP e pelo Ministério Público sob a acusação de uma alegada desobediência por ter promovido uma manifestação em que foram cumpridas todas as exigências legais. Simplesmente, a Governadora Civil do Porto arrogou-se o direito de ser ela a decidir o trajecto da manifestação e comunicou-o à PSP, sem sequer se ter dado ao trabalho de o comunicar aos manifestantes, que foram acusados de desobediência por se terem manifestado, seguindo o percurso que tinham comunicado ao Governo Civil.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Um escândalo!

O Sr. António Filipe (PCP): — Estes casos, infelizmente, somam-se a outros. Foi o caso da Governadora Civil de Lisboa, que pretendeu proibir a montagem simbólica de tendas por agricultores, junto da Assembleia da República, com o argumento caricato de que a montagem de tendas só pode ser feita em parques de campismo; foi o caso da decisão tomada pelo comando da PSP de avançar com um processo-crime contra dois dirigentes do PCP, sob a acusação de terem promovido uma manifestação ilegal por terem entregue um abaixo-assinado na Residência Oficial do Primeiro-Ministro; foi o caso da Governadora Civil de Castelo Branco, que achou normal que a PSP se tenha deslocado ao Sindicato dos Professores na Covilhã para obter informações sobre a manifestação que reuniu em Lisboa mais de 100 000 professores contra o regime de avaliação; foi o caso grotesco, passado em Montemor-o-Velho, onde o Secretário-Geral da Federação Nacional dos Sindicatos de Professores (FENPROF), Mário Nogueira, ao passar por uma manifestação não de professores mas de agricultores, foi identificado pela GNR por ser conhecido, e foi constituído arguido.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Um escândalo!

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: A atitude persecutória dos governadores civis e de algumas autoridades policiais, por cuja actuação o Governo é inteiramente responsável, perante o exercício legítimo do direito de manifestação é absolutamente intolerável. A democracia não suporta estas atitudes prepotentes. O exercício do direito de manifestação tem uma protecção constitucional directa, que não pode ser limitada por governantes agastados com o protesto popular contra as suas políticas ou por governadores civis que convivem mal com as liberdades democráticas e que pensam que o exercício do direito de manifestação depende da sua autorização.
Era bom que o Ministro da Administração Interna, enquanto responsável político pela actuação dos governadores civis, mandasse afixar na parede dos seus gabinetes, em local bem visível, o artigo 45.º da

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Constituição, onde se pode ler que os cidadãos têm o direito de se reunir, pacificamente e sem armas, mesmo em lugares abertos ao público, sem necessidade de qualquer autorização e que a todos os cidadãos é reconhecido o direito de manifestação.
O problema é que há governadores civis que se arrogam o direito de autorizar manifestações, de definir os respectivos trajectos, de questionar os manifestantes sobre as palavras de ordem e de ordenar actuações policiais contra cidadãos que se manifestam, e que não ignoram, porque não podem ignorar, que estão a actuar à margem da Constituição e da lei.
Não ignoram, porque não podem ignorar, que a lei que regula o direito de manifestação e que fixa os respectivos trâmites legais não foi feita para limitar ou condicionar o direito de manifestação, mas, bem pelo contrário, para garantir o seu exercício. Em democracia, não há manifestações pacíficas que sejam ilegais ou que precisem de ser autorizadas seja por quem for.

Aplausos do PCP.

O problema é que para o Governo e para os governadores civis a seu mando há dois tipos de manifestantes: os que aplaudem os membros do Governo são manifestantes bons — podem manifestar-se sem autorização e têm direito a passadeira vermelha e protecção policial; os que protestam contra as políticas do Governo, à mesma hora e no mesmo local, são manifestantes maus — cometem crimes de desobediência, são incomodados pela polícia, são alvo de intimidações policiais, são acusados e levados a tribunal porque se manifestaram sem autorização.
Não é tolerável que, no Portugal democrático, o legítimo protesto social seja levado ao banco dos réus por acção de responsáveis políticos.
A Assembleia da República, enquanto órgão de soberania representativo de todos os portugueses, não pode deixar de assumir as suas responsabilidades quando há cidadãos que são levados a tribunal sob a única acusação de terem cometido o crime de exercer os seus direitos cívicos e políticos que a Constituição lhes confere.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. António Filipe (PCP): — Anuncio, por isso, que o Grupo Parlamentar do PCP vai requerer a comparência dos Governadores Civis de Lisboa, do Porto e de Braga, na Comissão Parlamentar de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, para os questionar sobre as atitudes persecutórias que têm vindo a desenvolver contra o legítimo exercício do direito de manifestação, e esperamos que esta iniciativa conte com o apoio de todos os Deputados que se prezam de respeitar as liberdades públicas e os direitos dos cidadãos.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Inscreveram-se dois Srs. Deputados para pedir esclarecimentos, o primeiro dos quais é o Sr. Deputado Luís Fazenda.
Tem a palavra.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, acompanhamos a sua intervenção e a denúncia que ela contém.
Há uma distorção dos dispositivos legais por parte dos governos civis e há uma interpretação que não é legal por parte dos comandos da PSP, quanto ao exercício do direito à livre manifestação.
Ainda esta semana, em Almada, num espaço pedonal, uma manifestação espontânea de moradores, por não quererem que uma zona pedonal seja invadida por automóveis, sofreu uma carga policial, da qual resultaram feridos. Porquê? Porque houve uma interpretação por parte da polícia de que, como não era uma manifestação autorizada, teria de ser reprimida.
Este entendimento que tem vindo a desenvolver-se não é, contudo, um tique, um excesso de zelo do «aparelho rosa»; vem directamente da figura do Primeiro-Ministro e é uma atitude de política cultural em

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relação ao exercício dos direitos democráticos e, em particular, do direito de manifestação. O Sr. PrimeiroMinistro irrita-se quando vê manifestações, ele não pode ver manifestações! Quando elas acontecem, ele diz imediatamente na televisão «eu sei, eu conheço-os, são sempre os mesmos!». É o único Primeiro-Ministro, em toda a Europa, que afronta as manifestações.
Hoje de manhã, em Zamora, à beira da cimeira luso-espanhola, houve uma manifestação de espanhóis, os quais, enfim, lá estavam dizendo os seus recados ao Presidente do Conselho, Zapatero, mas, ao que consta, não houve repressão policial, não foram abertos processos, nenhum espanhol foi considerado em desobediência qualificada.
De que vale, então, depois, escreverem moções, a falar de regresso ao diálogo sindical, à cultura sindical, se, a cada passo e em todo o lado, se estão a discriminar sindicalistas e a levá-los a tribunal?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. Luís Fazenda (BE): — É, pelo menos, um paradoxo extraordinário e demonstra bem como não está enraizada neste Governo uma cultura que saiba conviver com aquilo que é o livre exercício do direito de manifestação, entre outros direitos democráticos.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. Luís Fazenda (BE): — E como o PS é habitualmente useiro e vezeiro — e não contestamos isso — em dizer que não recebe lições de democracia, penso que todos os mecanismos regimentais e outros, que possam ser utilizados na Assembleia da República para discutir com os governadores civis, têm a sua melhor utilidade neste momento, para prevenirmos aquilo que está a acontecer e que tem vindo a generalizar-se.

Aplausos do BE.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Fazenda, muito obrigado pela questão que colocou, que considero muito pertinente e que permite até precisar alguns aspectos que não tive oportunidade de referir na minha intervenção. É porque, no caso agora em julgamento, da manifestação de Guimarães, havia duas manifestações no local. Foi, segundo nos lembramos, na altura da Presidência Portuguesa, aquando de uma reunião de Ministros da União Europeia, que se realizou em Guimarães. E havia duas manifestações: uma, para aplaudir e, outra, para protestar. Ora, creio que a autorização, ou a falta dela, terá sido idêntica para as duas. Simplesmente, quem aplaude, muito bem, mas quem protesta é processado criminalmente, em idênticas circunstâncias. Ora, isto só tem uma leitura: a motivação da instauração do processo-crime é uma motivação política.

Vozes do PCP: — Exactamente!

O Sr. António Filipe (PCP): — E isso é que é intolerável! O que está aqui em causa não é o facto de as pessoas se manifestarem, mas o de se manifestarem contra o Governo. Isso é que é intolerável, porque é pela sua opinião, pela opinião manifesta. É porque ainda não vi ninguém, ninguém, ser processado por governadores civis pelo facto de, não autorizadamente, ir aplaudir o Primeiro-Ministro onde ele se desloca!!

Aplausos do PCP.

São estes os «dois pesos e duas medidas».

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E é particularmente chocante que isto seja uma novidade precisamente deste Governo, porque há mais de três décadas que os portugueses se manifestam em democracia. Aliás, lembro-me muito bem de, perante algum agastamento manifestado por um Primeiro-Ministro, há alguns anos, contra manifestações, mas que não chegou a este ponto, o Presidente da República, na altura, o Dr. Mário Soares, ter dito que as pessoas têm o seu direito à indignação.
Ora, gostaria de saber onde é que o Partido Socialista, agora, meteu o direito à indignação que reconhecia às pessoas, porquanto, perante qualquer protesto dos cidadãos, por mais legítimo e compreensível que seja, aquilo com que se deparam é com atitudes de intimidação, com atitudes persecutórias e com a tentativa de ir aos tribunais processar criminalmente as pessoas que protestam.
Isto é uma péssima novidade no nosso regime democrático e este Governo está a ficar conotado com este tipo de atitude por parte das autoridades policiais, o que é manifestamente inconcebível por parte de quem, ainda há alguns meses, nesta Assembleia, perante uma interpelação do PCP ao Governo sobre o exercício das liberdades, dizia que não recebia lições de democracia de ninguém. Não é isso que, na prática, estão a demonstrar.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, quero começar por prestar homenagem à sua intervenção, por duas razões. Todos temos memória do que tem sido o comportamento desta maioria relativamente aos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos, ao longo desta Legislatura. E a verdade é que o Eng.º Sócrates iniciou, por razões óbvias, um esforço, particularmente em termos de propaganda e de informação, para apagar essa imagem que tinha ficado bem patente ao longo da Legislatura, e começou a aparecer com um ar tolerante, com um ar de cumpridor e zelador dos direitos dos cidadãos, que não é e demonstra que não foi, ao longo desta Legislatura.
Portanto, o primeiro aspecto que quero homenagear é o facto de V. Ex.ª, com a pertinência desta sua intervenção, ter lembrado que este foi um comportamento não de agora, não incidental, mas que marcou, de uma forma triste e profundamente negativa, esta Legislatura.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): — Fizemos o 25 de Abril para que não acontecessem situações como estas e não as consentimos! Não consentimos, ainda por cima, a um partido que teve as maiores responsabilidades na instauração do 25 de Abril que tenha esquecido o seu próprio passado histórico para ter este tipo de comportamentos.

Aplausos do PSD.

O segundo aspecto da sua intervenção que quero homenagear tem a ver com o seguinte: felizmente que as autoridades policiais, de uma forma geral, têm e adquiriram um estatuto conforme à nossa democracia. Mas é este Governo que também instrumentaliza as autoridades policiais, não, como era seu dever, para garantir os direitos e as liberdades dos cidadãos, mas para reprimir liberdades de manifestação e liberdades de expressão, coisa que não podemos aceitar.
E é bom que neste momento, em que o Eng.º Sócrates pretende apresentar de novo essa curva de angélico perante os portugueses, não se permita que ele o faça impunemente.
Temos todos de recordar o que foi, ao longo desta Legislatura, o cercear de liberdades fundamentais dos cidadãos.

O Sr. Luís Campos Ferreira (PSD): — Bem lembrado!

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O Sr. Guilherme Silva (PSD): — Temos presente o «caso Charrua», temos presente o caso de um centro de saúde onde se controlava a correspondência dos funcionários, temos presentes muitos mais casos que são a revelação de uma atitude que não é democrática, no sentido profundo da democracia que instaurámos no 25 de Abril.
Para terminar, quero fazer-lhe uma pergunta.
A moção que o Sr. Primeiro-Ministro, aliás, Sr. Secretário-Geral do Partido Socialista, agora apresentou tem um capítulo próprio dedicado à garantia de uma melhor qualidade da democracia. O que lhe pergunto, Sr. Deputado, é se, face a este exercício efectivo de acção política desta maioria do Eng.º Sócrates, isto não é um exercício do mais puro cinismo político, que envergonha a história do próprio Partido Socialista.

Aplausos do PSD.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Para que efeito, Sr. Ministro?

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Para defender a honra e consideração do Governo, quando o Sr. Presidente autorizar.
É que considero que a expressão segundo a qual o Governo instrumentaliza as forças policiais para reprimir as liberdades fundamentais ofende a honra do Governo.

Aplausos do PS.

Vozes do PSD: — Oh!

O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, preferia que, primeiro, o Sr. Deputado António Filipe respondesse ao Sr. Deputado Guilherme Silva. Depois disso, o Sr. Ministro usaria do seu direito de defesa da honra e, obviamente, o Sr. Deputado Guilherme Silva daria explicações.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Quando o Sr. Presidente entender.

O Sr. Presidente: — Então, para responder ao Sr. Deputado Guilherme Silva, tem a palavra, Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, teria todo o gosto em que o Sr. Ministro falasse desde já, atç porque, como não houve qualquer pergunta por parte do Partido Socialista,»

O Sr. Bruno Dias (PCP): — O que é significativo!

O Sr. António Filipe (PCP): — » era uma forma de o PS intervir nesta matçria.
Sr. Deputado Guilherme Silva, quero agradecer as considerações que fez a propósito da minha intervenção e gostaria de compartilhar as preocupações que aqui manifestou. De facto, Sr. Deputado, é absolutamente intolerável que um cidadão que se manifesta num país democrático (seja por que razão for, desde que seja pacificamente) e que sabe que tem uma Constituição que garante o direito de manifestação, independentemente de qualquer autorização, seja identificado pela polícia. E identificado porquê? Porque se está a manifestar. Isto é absolutamente intolerável e não tem qualquer base legal, nem constitucional! Infelizmente, o que verificamos, até por documentos escritos, é que há governadores civis que pensam que têm o direito de autorizar manifestações e que fazem ofícios, que assinam, a dizer «não autorizo».

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

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O Sr. António Filipe (PCP): — Como se alguma lei deste País lhes conferisse o direito de serem eles a decidir se autorizam ou não autorizam manifestações!» Alguns deles até se arrogam o direito de dizer «por este trajecto não, por aquele» e até de perguntar telefonicamente aos promotores das manifestações quais vão ser as palavras de ordem! Isto passou-se relativamente a manifestações realizadas no Porto.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

O Sr. António Filipe (PCP): — Ora, isto é absolutamente intolerável.
Mas, Sr. Deputado, não quero acreditar que o Partido Socialista se oponha a estas audições que aqui propomos. Há poucos dias, na 1.ª Comissão, foi proposta a audição de um director-geral e o Partido Socialista decidiu que ele não podia vir sozinho, que tinha de vir com o respectivo membro do Governo — não fosse ele dizer alguma coisa que o Governo não gostasse de ouvir»

O Sr. Luís Campos Ferreira (PSD): — Bem lembrado!

O Sr. António Filipe (PCP): — Então, veio o director-geral, mas veio também o membro do Governo.
Neste caso, até digo: se os senhores quiserem impor que também venha o membro do Governo, teremos todo o gosto. Ele que venha e que explique como é que os governadores civis, que estão sob a sua tutela, tomam estas atitudes. Teremos todo o gosto em que venham todos.
Mas, no que não queremos acreditar é que o Partido Socialista não vote favoravelmente a proposta destas audições. É que, se o fizer, então, algo de muito mau se está a passar nesta Assembleia quanto às responsabilidades que este órgão de soberania tem de assumir em matéria de defesa de direitos, liberdades e garantias dos cidadãos.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares para exercer o direito de defesa da honra do Governo em relação a declarações proferidas pelo Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Sr. Presidente, desejo tornar claro, como, aliás, decorre do meu pedido e da altura em que o formulei, que considero que a honra do Governo foi ofendida pela declaração do Sr. Deputado Guilherme Silva segundo a qual este Governo instrumentalizaria as forças de segurança para reprimir as liberdades fundamentais.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Se não faz, parece!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Julgo, aliás, que essa sua afirmação ofende duplamente.
Ofende o Governo e ofende as forças de segurança, porque as forças de segurança portuguesas não se deixam instrumentalizar e existem justamente para defender as liberdades fundamentais e para assegurar as condições de segurança que são indispensáveis para que a liberdade das pessoas seja respeitada e a sua participação e o seu bem-estar sejam acautelados.

A Sr.ª Helena Terra (PS): — Muito bem!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — No que diz respeito à ofensa dirigida ao Governo, considero essa expressão ofensiva, porque se há coisa que caracteriza o mandato deste Governo assim como o da maioria parlamentar que o apoia são justamente os avanços que foram feitos e que continuarão a ser feitos, assim o eleitorado nos renove o seu voto, no sentido de qualificar a democracia portuguesa, começando pelo espaço essencial dessa qualificação, que é o Parlamento.

O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Não é isso que se nota!

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O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — É nesse sentido que temos trabalhado, com o apoio do Parlamento, no sentido de qualificar a democracia portuguesa e de assegurar a todos o pleno exercício das suas liberdades fundamentais.
E estranho mais que esse comentário venha do Sr. Deputado. É que o Sr. Deputado aqui representa os eleitores da Madeira,»

O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Só os da Madeira?!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — » que nos merecem tambçm todo o respeito e que puderam assistir a uma vergonhosa tentativa, feita na assembleia legislativa regional, de negar a um Deputado eleito os seus mais elementares direitos de participação política.

Aplausos do PS.

E no dia em que o Sr. Deputado considerar, como deve, com os adjectivos apropriados, essa tentativa e mostrar, na prática, que a combate, pode, talvez, passar a ter mais autoridade para se pronunciar sobre outros.
Sr. Deputado, sintetizando, este Governo não recebe lições de ninguém em matéria de respeito pelas liberdades fundamentais, muito menos recebe de V. Ex.ª.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): — Sr. Presidente, noto que o Governo, hoje, está particularmente sensível a estas matérias, ao contrário do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, que esteve ausente e não se envolveu neste debate. Nem instou o Sr. Deputado António Filipe!

O Sr. Honório Novo (PCP): — Ninguém fala!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): — Mas quero dizer-lhe esta coisa muito simples, Sr. Ministro: «Bem prega Frei Tomás». V. Ex.ª, ao ter necessidade, para defender a honra do Governo, de chamar à colação a questão do incidente na Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira, revela bem a falta de argumentos no terreno de actuação do Governo para defender a honra.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Já estamos ao nível da Madeira!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): — Ou então que o Governo tem uma fraca honra para ser defendida.
Alguma coisa está mal, tendo em conta a necessidade que V. Ex.ª teve de sair do terreno de actuação do Governo para ir buscar o argumento da assembleia legislativa regional para defender o Governo.
Sr. Ministro, se quisesse, noutra circunstância, levantar essa questão, eu compreenderia. Nesta circunstância, de defesa da honra, V. Ex.ª fez a demonstração de que é indefensável o comportamento que o Governo tem tido nesta matéria.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): — Quero dizer-lhe que fui muito claro quando, no início da minha intervenção, referi que, de uma forma geral, a actuação da nossa polícia tem sido exemplar. Mas nós, infelizmente, conhecemos os constrangimentos que muitas vezes acontecem pelo exercício abusivo do poder.
Portanto, estas situações não são minimamente acusatórias para com a polícia, que é efectivamente servida por gente que é capaz e que está identificada com a democracia, mas que, infelizmente, tem um poder, por

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vezes perverso, que leva a estas situações, como foi o exemplo da intervenção da polícia no sindicato da Covilhã, a propósito das manifestações dos professores. Lembra-se dessa situação, Sr. Ministro? Sr. Ministro, para a próxima, quando quiser defender o Governo, defenda-o com razões do Governo, não com razões da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, concluído o período para declarações políticas, passamos à discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 238/X (4.ª) — Estabelece o regime jurídico da luta contra a dopagem no desporto.
Para apresentar o projecto de diploma, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Juventude e do Desporto.

O Sr. Secretário de Estado da Juventude e do Desporto (Laurentino Dias): — Sr. Presidente, Sr.
Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr.as e Srs. Deputados: O Governo vem à Assembleia da República apresentar uma proposta de lei que estabelece o regime jurídico do combate à dopagem no desporto.
É uma proposta que tem a ver com a ética, com a saúde pública, com a saúde dos desportistas, com os princípios mais elementares da prática desportiva, com o jogo limpo, com a verdade desportiva.
Portugal tem ocupado, na área do combate à dopagem, uma função de primeira linha na Europa e no mundo. Temos todos, felizmente, de nos congratular com essa honra.
Portugal foi membro fundador da Agência Mundial Antidopagem. Portugal mantém, nos órgãos centrais da Agência, figuras de relevo como Rosa Mota, na Comissão de Atletas, e Luís Horta, na Comissão de Laboratórios.
Portugal acompanhou activamente a criação do Código Mundial Antidopagem, tendo participado nas conferências mundiais anti-doping: na primeira, que instituiu o Código, e na segunda, em Dezembro de 2007, que procedeu à sua revisão.
Portugal ratificou já a Convenção da Unesco contra o Doping Estamos, por isso, com esta proposta, a prosseguir no empenhamento e na afirmação de Portugal enquanto país de primeira linha num combate que, como disse, é, antes do mais, ético e pela verdade desportiva, pela saúde pública e pela saúde dos atletas.
Esta proposta tem um conjunto de inovações, das quais eu gostaria, no tempo de que disponho, realçar duas.
A primeira, no âmbito da tipificação dos comportamentos que devem ser prossegidos numa lei antidopagem. Pela primeira vez, faz-se a tipificação, como crime, do tráfico de substâncias dopantes ou de métodos proibidos.
Esta lei significa também um endurecimento claro das sanções previstas, mas significa, ao mesmo tempo, um acréscimo igualmente claro de condições de defesa dos atletas, dos agentes desportivos, condições de transparência, de imparcialidade e de verdade no apuramento de resultados e de verdade no apuramento de responsabilidades disciplinares.
Esta proposta de lei cria aquilo que a lei de bases definiu dever ser a estrutura central e nacional de combate à dopagem em Portugal: a Autoridade Antidopagem de Portugal, uma estrutura que renova aquilo que eram as competências do Conselho Nacional Antidopagem (CNAD); uma estrutura que terá o Laboratório enquanto entidade que cientificamente fica com as obrigações próprias de uma área desta natureza; e também uma estrutura de suporte, que cuidará de todo o trabalho complementar de relação com as federações e de acompanhamento disciplinar e jurídico de todas as questões relacionadas com o doping. São duas áreas centrais nesta proposta de lei que nos merecem, em abertura de debate, o maior relevo.
Gostaria de dizer também às Sr.as e Srs. Deputados que esta proposta de lei foi presente, inicialmente, ao Conselho Nacional do Desporto, que obteve do Conselho variadíssimas sugestões e recomendações que foram por nós acolhidas no texto final, aprovado em Conselho de Ministros, e estamos seguros de que, do debate de hoje, bem como do debate em sede de especialidade, que vai fazer-se aqui no Parlamento, resultarão benefícios que transformarão esta proposta de lei numa proposta à altura daquilo que vem sendo, durante todos estes anos, o papel de primeira linha de Portugal no combate à dopagem no desporto.

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Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Hermínio Loureiro.

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr. Secretário de Estado da Juventude e do Desporto, Sr.as e Srs. Deputados: Todos somos poucos para combater a dopagem no desporto. Felizmente que Portugal continua na vanguarda, ou seja, estamos na primeira linha no combate ao doping.
Mas não podemos dar tréguas à batota e não podemos dar trégua aos batoteiros. A nossa tolerância terá de ser sempre «tolerância zero».
Estamos no bom caminho no que diz respeito à criminalização de um conjunto de novas situações e ao agravamento de algumas sanções agora proposto. Mas este diploma não pode ser encarado como um ponto de chegada. Temos de estar permanentemente em alerta para os avanços, pois os batoteiros estão sempre a procurar forma de contornar a legislação que está em vigor. Esses avanços correm mais depressa do que a legislação.
Portugal tem hoje outras responsabilidades. Conforme o Sr. Secretário de Estado da Juventude e do Desporto acabou de dizer, Portugal tem participado activamente, desde 2003, na Conferência Mundial contra a Dopagem, tendo aí sido subscrita, em nome de Portugal, a Declaração de Copenhaga. Tive eu muito prazer em representar o País nessa mesma altura.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): — Importa realçar que a eliminação do doping no desporto também depende em muito da harmonização legislativa e que essa harmonização tem de ser permanente na cooperação que tem de existir a nível nacional e a nível mundial.
Não podemos pactuar com um combate a duas velocidades. Não podemos admitir que existam competições ou países que sejam permissivos em relação ao doping, ou seja, que sejam um paraíso para o doping.
Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Felizmente, temos em Portugal um laboratório acreditado pelas instâncias internacionais, temos recursos humanos respeitados pelas organizações internacionais, temos pessoas da nossa Administração Pública a desempenhar funções de enorme relevância internacional. Mas não podemos parar esta luta, onde temos a responsabilidade de preservar a saúde dos atletas, a verdade desportiva e o princípio do jogo limpo.
Devemos criar condições para aumentar os controlos realizados fora de competição e apostar decididamente na formação e numa prevenção cada vez mais eficaz.
Na escola, devemos incentivar os jovens ao jogo limpo, com campanhas de alerta e esclarecimento para o malefício do uso de substâncias dopantes.
Portugal tem de continuar na linha da frente. Compete ao Governo, à Assembleia da República e aos agentes desportivos não darem tréguas aos batoteiros.
Estamos a cumprir a nossa missão. O PSD esteve no passado, está no presente e estará no futuro totalmente disponível e empenhado na luta contra a dopagem.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Paulo Carvalho.

O Sr. José Paulo Carvalho (N insc.): — Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr.
Secretário de Estado da Juventude e do Desporto, Sr.as e Srs. Deputados: A proposta de lei que hoje o Governo aqui apresenta é meritória e é de saudar.

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Antes de mais nada, como, aliás, aqui já foi dito, o que está em causa é salvaguardar condições para haver verdade desportiva, proteger a saúde dos desportistas e também, de alguma forma, combater o tráfico lucrativo de substâncias ilícitas. Tudo isto está em causa, por isso é de saudar.
A proposta de lei, que, em meu entender, merece acolhimento, como que tenta transpor para Portugal disposições da nova versão do Código Mundial Antidopagem e, por isso, o Governo com isto também desenvolve os compromissos assumidos na já aqui referida convenção internacional contra a dopagem no desporto.
Mas a questão que se coloca, Sr. Secretário de Estado, é esta: aquilo que dizem as pessoas que estão no terreno é que o problema não está nas leis. Esta lei, em concreto, também é positiva e merece acolhimento. E nós, como já aqui foi dito, estamos na vanguarda do combate ao doping. Só que a questão está na diferença entre a teoria e a prática. Ou seja, não basta ter sistemas interessantes do ponto de vista legislativo, interessa, sim, alocar meios para que a fiscalização seja efectiva mas que, por outro lado, tenha efeito dissuasor sobre os próprios atletas com tendência prevaricadora. Por outro lado, cumpre apostar muito mais, também, na vertente da formação e da prevenção, porque é fundamental que os próprios atletas percebam que estão a agir mal e estão a fazer mal a si próprios!

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Tiago.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo: Folgamos em ver que, desta feita, o Parlamento foi mais importante para o Sr. Secretário de Estado do que os protocolos publicitários! Começamos também por saudar a apresentação desta proposta de lei, ainda que não possamos, de facto, defendê-la em todos os seus aspectos, por algumas reservas que nos provoca, e que deixarei claras durante esta intervenção.
O que o Governo acaba de fazer, ao apresentar esta proposta de lei, é quase que uma tradução da Convenção Internacional contra o Doping no Desporto. Isso não nos levanta qualquer reserva.
O que nos levanta alguma reserva é o facto de esta proposta de lei provar que existe, nesta Convenção, um conjunto de matérias que são, efectivamente, da competência desta Assembleia. E isto levanta-nos uma dúvida: porque não trouxe o Governo a Convenção a esta Assembleia? Ora, por decreto, o Governo anunciou a adesão de Portugal a essa Convenção; esperemos que, agora, com o trabalho que esta Assembleia fará em torno desta proposta de lei, todo esse problema fique resolvido.
Ainda assim, persiste a dúvida: porque não trouxe a Convenção a esta Assembleia da República. Esta Assembleia poderia fazer um acompanhamento mais permanente, mais sério e, porventura, até, mais cuidado, a toda esta matéria, porque ela, de facto, merece.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Exactamente!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Durante a minha intervenção, certamente ficarão levantadas algumas reservas que o PCP tem perante esta proposta de lei, mas desde já quero deixar bem claro que, em momento algum, temos o objectivo de pôr em causa a necessidade, a dignidade e a importância da salvaguarda da verdade desportiva.
Na verdade, independentemente do facto de o Sr. Deputado José Paulo Carvalho ter muita razão, quando diz que o está também em causa e (até mais) em falta são, mais do que legislação, medidas no terreno que garantam a viabilidade destas ramificações legislativas que vamos tendo, dos Códigos internacionais normativos e também daquilo que se vai transpondo para a nossa ordem jurídica. Independentemente disso tudo, tal não implica que a lei deva ficar estagnada e não deva progredir.
Levantam-se-nos algumas reservas, nomeadamente a sacralização da verdade desportiva que o Governo aqui coloca, sacrificando todas as outras matérias, nomeadamente a privacidade, direitos, liberdades e garantias dos desportistas — estas são as que nos levantam maiores dúvidas. E gostava ainda, se possível, que o Governo pudesse clarificar se há ou não disponibilidade para trabalhar soluções que equilibrem esta proposta de lei.

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O Governo propõe, de alguma maneira, um sistema de acompanhamento aos praticantes desportivos, que, em alguns casos, é mais forte e mais punitivo do que algumas medidas de coacção que estão previstas no sistema legal português.
Uma outra dúvida que também levantamos é, muito embora o diploma a preveja, a discrepância entre a componente pedagógica e todas as outras vertentes. Seria talvez útil — e sem pôr em causa alguns esforços que têm sido feitos — que, nesta legislação, pudesse vir mais dignificado o papel da vertente pedagógica da dissuasão e, afinal de contas, da prevenção.

O Sr. Presidente: — Tem de concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Para terminar, Sr. Presidente, deixo um apelo para que o trabalho na especialidade, em sede da Comissão de Educação e Ciência — que, estou certo, se virá a fazer —, possa ser feito com grande acompanhamento da 1.ª Comissão, tendo em conta que esta proposta de lei está muito caracterizada por alterações penais, por criação de novos ilícitos criminais.
Também era bastante importante que a Comissão Nacional de Protecção de Dados pudesse dar um parecer sobre esta proposta de lei exactamente por causa das reservas que levantei.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — O Sr. Secretário de Estado inscreveu-se para usar da palavra em defesa da honra do Governo.
Tem a palavra, Sr. Secretário de Estado da Juventude e do Desporto.

O Sr. Secretário de Estado da Juventude e do Desporto: — Sr. Presidente, pedi, efectivamente, a palavra para defesa da honra em virtude de uma expressão que o Sr. Deputado Miguel Tiago usou no início da sua intervenção, mas que não tem a ver com o tema em discussão.
Se V. Ex.ª, Sr. Presidente, entender que só deva usar da palavra no final do debate desta proposta de lei, com certeza. Mas pedia-lhe que me concedesse a palavra nessa altura.

O Sr. Presidente: — Sr. Secretário de Estado, tem desde já a palavra para defesa da honra.

O Sr. Secretário de Estado da Juventude e do Desporto: — De imediato, Sr. Presidente. Muito obrigado.
Sr. Deputado Miguel Tiago, V. Ex.ª iniciou a sua intervenção dizendo que folgava ter reparado que o Governo, hoje, preferiu o Parlamento a um protocolo publicitário.
Sei ao que V. Ex.ª se refere: ontem, no exterior deste Parlamento, uma juventude partidária fez uma apresentação cénica, na qual pretendia dizer que eu tinha faltado à Comissão de Educação e Ciência, preferindo ir a uma reunião numa cervejeira. Fez, aliás, um comunicado sobre essa matéria que vem expresso em jornais de hoje.
Isso é absolutamente falso, é absolutamente insultuoso! Por respeito para com o Parlamento, eu não ia sequer falar desse assunto, mas, assim, tenho que dizer o seguinte: por razões de trabalho pessoal, não estive, na terça-feira passada, presente na reunião da Comissão de Educação e Ciência, tendo solicitado, por telefone e por escrito, ao presidente da Comissão, que fosse alterada a data da minha audição. E a data foi alterada para 10 de Fevereiro. Não faltei, pois, à Comissão, não faltei a essa reunião! Não deixei de respeitar o Parlamento! Já agora, diga-se que, às 15 horas de terça-feira, eu estava a presidir à apresentação da nova marca turística para a região do Porto e Norte de Portugal, a convite de uma entidade presidida pelo Sr. Deputado (até esse dia) Melchior Moreira. Às 16 horas, estava na cerimónia de assinatura de um protocolo celebrado com a Liga Portuguesa de Futebol Não Profissional, presidida pelo Sr. Dr. Eugénio Dias Ferreira, talvez conhecido de muitos dos presentes. Ou seja, estava a cumprir a minha função! Não faltei, por isso, ao Parlamento, entidade que respeito desde há muitos anos!

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Considero, sinceramente, Sr. Presidente, que a cena que teve lugar lá fora, de que as Sr.as e os Srs. Deputados não têm responsabilidade alguma, foi um mau momento para aquilo que significa — e deve sempre significar para todos nós — o respeito para com o Parlamento! Na passada semana, solicitei, pois, por razões de trabalho de natureza pessoal — não só essas, outras até —, que essa audição fosse adiada. E essa audição foi adiada previamente, por isso ela não estava na minha agenda desde a semana passada e por isso eu não faltei.
Não mereço, pois, que alguém venha dizer, publicamente e nos jornais, que «o Sr. Secretário de Estado trocou o Parlamento por uma cerveja» ou que «se escondeu atrás de uma cerveja para não vir ao Parlamento»! Eu não mereço isso, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados! Em relação a este Parlamento, tenho dado, ao longo de muitos anos, provas do maior respeito!

O Sr. Presidente: — Tem de concluir, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado da Juventude e do Desporto: — Sr. Deputado Miguel Tiago, não ia dizer que lhe agradeço a boutade, ou a graça, do início da sua intervenção, porque, confesso, não ia falar deste assunto neste debate, embora me apetecesse falar.
Mas ficou o meu desabafo e a minha indignação! Muito obrigado, Sr. Presidente!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Tiago, para dar explicações.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr. Secretário de Estado, sobre o que se passou fora da Assembleia da República, não poderei testemunhar, nem julgo que deva responder.
E se entende fazer a defesa da honra em função de alguma acusação que dirigiram ao Secretário de Estado, ou ao Governo, fora desta Assembleia, julgo que deverá fazê-lo noutro fórum.
Aquilo que aqui coloquei, em jeito, obviamente, de graça,»

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — De insinuação!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — » não deixa, ainda assim, de ser verdade, Sr. Secretário de Estado. E isso ç que é grave! Quanto à questão de semântica, se faltou, se não faltou» Eu tambçm não disse que faltou, disse que trocou! E também não disse que foi por cerveja, Sr. Secretário de Estado!

O Sr. Secretário de Estado da Juventude e do Desporto: — Sei que não!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Os Deputados da Comissão de Educação e Ciência foram informados de que o Sr. Secretário de Estado tinha pedido o adiamento da reunião. E, ao mesmo tempo, foi noticiada e dada a conhecer a agenda do Sr. Secretário de Estado,»

O Sr. Secretário de Estado da Juventude e do Desporto: — Na semana passada!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — » dizendo que estaria num outro evento, porventura de carácter publicitário.
Foi o que me ouviu, aqui, dizer.
Não referi cervejas, nem me referi a qualquer juventude partidária — nem teria de o fazer, tendo em conta que nem sequer se refere à do meu partido.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Muito bem!

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O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Ainda assim, persiste esta questão: o Sr. Secretário de Estado, em determinada altura, entendeu que alguns compromissos do seu trabalho — e disse, agora, que estava cumprindo o seu trabalho, e não colocamos isso em causa — se sobrepuseram à necessidade de cumprir com as datas que estavam previstas com a Comissão de Educação e Ciência.

O Sr. Secretário de Estado da Juventude e do Desporto: — Não, não!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — E, Sr. Secretário de Estado, já agora informo-o de que não ficou agendada nova data para 10 de Fevereiro, como julga,»

O Sr. Secretário de Estado da Juventude e do Desporto: — Foi o que me disseram!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — » porque ainda está a ser ponderada, tendo em conta que a Comissão de Educação e Ciência, felizmente, tem uma agenda tão ocupada ou mais do que a sua.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. Secretário de Estado da Juventude e do Desporto: — Foi o que me informaram!

O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado Pedro Duarte inscreveu-se para interpelar a Mesa sobre a condução dos trabalhos.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Pedro Duarte (PSD): — Sr. Presidente, precisamente porque me quero referir aos nossos trabalhos parlamentares, não me referirei, naturalmente, a iniciativas de juventudes partidárias que ocorreram fora do Parlamento. Considero que isso não nos compete.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Basta pedir desculpa!

O Sr. Pedro Duarte (PSD): — Pretendo apenas trazer à colação, porque a matéria foi aqui abordada, que, na passada reunião da Comissão Parlamentar de Educação e Ciência, o Grupo Parlamentar do PSD teve a oportunidade de expressar o seu protesto pelo facto de — e vou referir-me, factualmente, ao que está em causa —, à hora a que estava previsto o início de uma audiência com o Sr. Secretário de Estado da Juventude e do Desporto, isto é, às 16 horas da passada terça-feira, termos tido conhecimento, através da comunicação social, através do site oficial do Governo, que o Sr. Secretário de Estado estaria, a essa hora, presente numa iniciativa de um protocolo com uma empresa privada, como já aqui foi dito.
Expressámos esse protesto na medida em que nos foi explicado que, na sexta-feira anterior, o Sr.
Secretário de Estado, comunicou ao Sr. Presidente da Comissão que, por razões imprevistas, não poderia deslocar-se à Assembleia da República. Os grupos parlamentares tiveram conhecimento disso mesmo na véspera da reunião da Comissão de Educação e Ciência e por esse facto é que expressámos na altura — e reiteramo-lo hoje — esse protesto.
Em suma, quero dizer-lhe, Sr. Secretário de Estado, que os factos são estes. Não vale a pena tentar contornar a realidade. A realidade é exactamente a que expressei, e julgo que estão aqui vários Srs. Deputados que o podem confirmar.

O Sr. Presidente: — Também para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Juventude e do Desporto.
Espero que, com isto, se conclua o round das interpelações e passemos ao orador seguinte.

O Sr. Secretário de Estado da Juventude e do Desporto: — Com certeza, Sr. Presidente.
Peço desculpa, porque eu não queria fazer qualquer polémica. Apenas queria certificar o seguinte: quando está convencionada uma data para uma reunião, seja ela qual for, é ou não é possível, com uns dias de

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antecedência, perguntar se é possível mudar a data? E quando nos é respondido «é possível mudar a data» e se comunica isso por telefone e por escrito, nós devemos ficar amarrados a essa data e, portanto, nesse dia, faltamos, quer queiram quer não?! Sr. Presidente, resta-me esperar que não aconteça com mais ninguém uma situação desta natureza.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Pinto.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Penso que é simples encontrar consenso na condenação da dopagem no desporto e na necessidade de punição desse tipo de comportamento, assim como em relação ao tráfico. Aliás, pensamos e sublinhamos como importante o reconhecimento, nesta proposta de lei, da criminalização do tráfico, em nome da verdade desportiva, como aqui já foi dito, e em nome da saúde dos atletas.
Mas não podemos esquecer que o fenómeno da dopagem encontra também a sua origem na vertigem pelo sucesso, custe o que custar, que é, infelizmente, uma característica das sociedades contemporâneas e que atinge, de forma muito significativa, o desporto profissional e a indústria em seu redor.
Penso, Sr. Secretário de Estado da Juventude e do Desporto, que é muito importante termos este parâmetro, até para, depois, medirmos também a importância da necessidade de medidas na área da educação e da formação sobre esta questão, que tem incidência na dopagem no desporto e não só.
Apoiamos, no geral, a proposta de lei, mas queremos, no entanto, chamar a atenção para alguns aspectos que se poderão vir a revelar como excessivos.
Como a própria exposição de motivos refere, algumas das medidas constantes do Código Mundial Antidopagem, agora transpostas para nossa ordem interna, podem vir a fragilizar o sistema ou a ser mal integradas nas normas nacionais. E é este alerta que também nos faz ter alguma preocupação relativamente a alguns aspectos.
Dou alguns exemplos, porque o tempo de que disponho não é muito: a gestão e responsabilidade sobre as bases de dados, questão que consideramos não estar suficientemente tratada; a possibilidade de cedência de dados e a garantia da confidencialidade desses mesmos dados — aliás, o artigo 41.º suscita-nos mesmo muitas reservas.
Outro aspecto que não deixa de ser importante, porque o combate à dopagem não se faz apenas com o enunciar de 1001 medidas, é o de que estas medidas devem ser exequíveis e é também pelo seu grau de exequibilidade que se pode vir a medir o seu sucesso. E, por exemplo, algumas destas medidas são, eventualmente, excessivas, como o n.º 1 do artigo 7.º. Aliás, hoje, foi possível saber aqui exactamente onde é que o Sr. Secretário de Estado andou na semana passada, mas não sei se o mesmo será possível em relação aos desportistas, sobretudo no prazo alargado de três meses.

O Sr. Secretário de Estado da Juventude e do Desporto: — Às vezes não é fácil!

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Portanto, penso que estas e outras questões devem ser ponderadas e esperamos vê-las aclaradas em sede de especialidade.
Do mesmo modo, também apoiamos a necessidade de realização de um conjunto de audições, sendo, entre outras, indispensável, a da Comissão Nacional de Protecção de Dados.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Também para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Abel Baptista.

O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Obviamente, o CDS acompanha, no essencial, o que é apontado na proposta de lei n.º 238/X, no que diz respeito ao controlo e ao combate da dopagem desportiva.
De acordo com o Programa Mundial Antidopagem, os objectivos de todas as legislações nacionais devem ser os de contribuir para proteger o direito fundamental de os praticantes desportivos participarem em competições sem dopagem, promovendo, assim, a saúde e a verdade desportiva, e apoiar programas de

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harmonização, coordenação e eficácia a nível nacional e internacional, no âmbito da detecção, punição e prevenção da dopagem.
Esta proposta de lei vem no seguimento do Programa e do Código Mundial Antidopagem e, ainda, na sequência da Lei de Bases da Actividade Física e do Desporto, onde já era consagrada a Autoridade Antidopagem de Portugal (ADoP).
Cada vez mais existem novas substâncias esteróides, anabolizantes e outras que podem contribuir para a dopagem desportiva.
A União Europeia e os vários organismos mundiais que se dedicam à área do desporto têm vindo a dar ênfase à necessidade de se trabalhar esta área. Várias convenções alertam os Estados para o necessário combate à falta de verdade desportiva.
Em Portugal, o Conselho Nacional Antidopagem (CNAD) desenvolveu e continua a desenvolver um excelente trabalho nesta área. Dentro das suas possibilidades técnicas e humanas, travou uma luta contra a falta de verdade desportiva.
Com esta nova legislação, é possível que o CNAD desenvolva as suas competências técnicas e científicas.
O novo Código Mundial Antidopagem, aprovado em Novembro de 2007, vem criar uma plataforma mundial para o combate ao doping, Código este em que se baseia a actual proposta de lei, como já referi.
Novidade é também o reconhecimento mútuo entre a ADoP e as federações, no que respeita aos controlos, às autorizações de utilização terapêutica e aos resultados das audições que estejam em conformidade com o Código Mundial Antidopagem.
Por outro lado, existe um endurecimento das penas ou sanções, que pode levar, no limite, a uma suspensão por 20 anos.
De alertar para as consequências práticas que pode ter a aplicação do artigo 7.º, segundo o qual os atletas têm, e cito, de «(») fornecer informação precisa e actualizada sobre a sua localização durante os três meses seguintes (»)«. Ou seja, há aqui quase como que uma espionagem constante do atleta, cuja constitucionalidade nos suscita algumas dúvidas e, por isso, esperamos que, em sede de discussão na especialidade, possa vir a ser alterada.
O Governo propõe uma política de agravamento das penas, mesmo no ilícito criminal, como forma de combate a este tipo de flagelo. Não deixamos, nesta matéria, de acompanhar o Governo, mas, neste caso, o Governo defende o agravamento de penas como forma de combate e prevenção, noutras áreas criminais não tem o mesmo pensamento, ao contrário do que o CDS tem vindo a defender.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Nesta matéria, estamos de acordo com o Governo e vamos acompanhar esta proposta, sobretudo pelo seu contributo para o que deve ser a verdade desportiva, o desporto sem drogas e, sobretudo, a prevenção na saúde.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Ainda para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Salgueiro.

A Sr.ª Luísa Salgueiro (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O combate à dopagem no desporto é uma tarefa que merece o esforço e o empenho de todos, porquanto estão em causa princípios de ordem ética, a verdade desportiva e, sobretudo, a defesa da saúde e bem-estar dos atletas. E, não obstante, nos últimos anos, termos verificado um decréscimo, em termos percentuais, do número de casos positivos detectados, importa continuar este caminho e adoptar medidas de prevenção e combate a estas situações.
Por isso, saudamos a iniciativa legislativa que o Governo traz, hoje, a discussão nesta Câmara, que vem, aliás, na sequência de outras medidas que a Secretaria de Estado da Juventude e o Governo já têm produzido, e que muito têm contribuído para qualificar o desporto em Portugal. Por escassez de tempo, refiro apenas a Lei de Bases da Actividade Física e do Desporto e o Regime Jurídico das Federações Desportivas.

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Não destacamos apenas as alterações introduzidas no ordenamento jurídico nacional mas também, e sobretudo, o procedimento que o Governo tem adoptado na sua preparação.
Recorde-se que, logo após o início da Legislatura, o Sr. Secretário de Estado da Juventude e do Desporto começou por convocar o Congresso Nacional do Desporto e, ao longo de todo o País, permitiu que todos os praticantes desportivos, agentes desportivos e decisores participassem na discussão dos grandes assuntos do desporto em Portugal, para, assim, melhor preparar a sua acção governativa. E, no que toca à preparação deste diploma em concreto, começou o Governo por remeter a sua matriz ao Conselho Nacional do Desporto e ouvir todos os contributos, de forma a enriquecer esta proposta, e só depois a apresentou a esta Assembleia.
Ouvidos os responsáveis intervenientes nesta área, o Governo traz-nos, então, uma proposta de lei que incorpora as alterações introduzidas no Código Mundial Antidopagem e que, indo ao encontro da Lei de Bases da Actividade Física e do Desporto, permitirá a Portugal, como aqui já foi bem dito, continuar na linha da frente no combate a este fenómeno.
Quanto ao conteúdo da iniciativa, em face do tempo disponível, destaco apenas três medidas: a punição do tráfico de qualquer substância ou método proibido, enquanto violação das normas antidopagem, matéria que assume particular relevância e que, por isso, é enquadrada na proposta como crime; a manutenção como crime da administração de substâncias e métodos proibidos mas agravando-se a pena quando a vítima se encontrar em situação de especial vulnerabilidade; e, em matéria de sanções, cumpre registar o significativo endurecimento das sanções a aplicar que, no seu limite máximo, poderão levar a uma suspensão pelo período de 20 anos.
Em face do que aqui fica dito, não só o Governo pode contar com o Grupo Parlamentar do Partido Socialista mas também os atletas e os agentes desportivos que contribuíram para esta iniciativa.
Estamos convictos de que estas medidas contribuirão, com sentido de responsabilidade, de rigor e de isenção, para credibilizar e dignificar a prática desportiva em Portugal.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, não havendo mais oradores inscritos, passamos à apreciação, na generalidade, do projecto de lei n.º 481/X (3.ª) — Criação do programa Mulher Emigrante (PSD).
Para apresentar o diploma, tem a palavra o Sr. Deputado José Cesário.

O Sr. José Cesário (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O PSD apresenta hoje mais uma iniciativa legislativa dirigida aos portugueses da diáspora. É a nona vez que o fazemos nesta Legislatura, procurando concretizar em medidas concretas a nossa alternativa à desastrosa governação socialista nesta área.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. José Cesário (PSD): — Ao longo destes quatro anos, o Governo socialista, acolitado pela bancada parlamentar do PS, acabou com a conta poupança-emigrante, reduziu quase a zero os apoios ao porte pago para o envio de publicações portuguesas para o estrangeiro,»

O Sr. Ricardo Martins (PSD): — Bem lembrado!

O Sr. José Cesário (PSD): — » encerrou ou desqualificou 25 postos consulares, retirou, na prática, aos portugueses residentes longe dos postos consulares a possibilidade de votarem nas eleições legislativas e anunciou sucessivas medidas e acções que nunca implementou, atirando-as intencionalmente para o fim do seu mandato.
Tudo isto, com o silêncio e a conivência, por vezes activa, dos Deputados socialistas.
Ao invés, o PSD apresentou nesta Câmara contributos concretos para uma política diferente, que iniciámos em 2004 e que, desde então, discutimos e partilhámos com as nossas comunidades.

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Apresentámos aqui soluções concretas no domínio do ensino do Português no estrangeiro, do associativismo da nossa diáspora, da aquisição da nacionalidade pelos netos dos nossos emigrantes, do alargamento do direito de voto nas eleições autárquicas, da organização do Conselho das Comunidades Portuguesas, dos incentivos à comunicação social em língua portuguesa, do acompanhamento dos nossos fluxos migratórios, entre outras questões. Mas, Srs. Deputados, sempre com a sistemática e atávica oposição do Partido Socialista, por vezes — nem sempre! — apoiado por uma extrema esquerda sempre indecisa e desconfiada em relação às nossas comunidades, progressista e vanguardista nas palavras mas, normalmente, retrógrada e dogmática nas atitudes.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Que disparate!

O Sr. José Cesário (PSD): — Por isso, Sr.as e Srs. Deputados, aqui voltamos hoje com mais uma iniciativa, desta feita dirigida às mulheres emigrantes.
Trata-se de um projecto baseado na extraordinária experiência da Associação Mulher Migrante e da acção de uma mão cheia de activistas dos direitos das mulheres portuguesas, um pouco por todo o mundo.
Para nós, a problemática da igualdade de género possui uma actualidade indesmentível.
Trata-se, assim, de desenvolver políticas que promovam a igualdade efectiva entre homens e mulheres, sem esquecer as questões de inserção profissional e de violência de género.
Neste âmbito, afigura-se fundamental contemplar a situação específica da mulher emigrante, inserida, em regra, em meios estranhos, muitas vezes fragilizada e seriamente exposta ao mais variado tipo de discriminações.
Deste modo, propomos a criação do programa Mulher Emigrante, através do qual se pretende responsabilizar mais o Estado, no sentido de aumentar a sua colaboração com o mais variado tipo de entidades ligadas às nossas comunidades, particularmente o movimento associativo, para uma acção mais eficaz e produtiva em defesa dos direitos da mulher emigrante.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Muito bem!

O Sr. José Cesário (PSD): — Através de tal programa, entendemos que o Estado deverá incentivar a realização de seminários e acções de formação, de acções de prática laboral realizadas em empresas, de estudos e investigações, de iniciativas informativas, de campanhas de sensibilização das famílias e dos jovens portugueses no exterior, de acções informativas e formativas no âmbito de órgãos de comunicação social.
Tudo isto, em iniciativas propostas e realizadas por entidades diversas, como federações, associações, clubes, escolas comunitárias, entidades ligadas à formação profissional, sindicatos e associações profissionais.
Esperamos, assim, dar mais um contributo válido para a concretização de uma verdadeira política integrada dirigida aos portugueses da nossa diáspora.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Carrilho.

A Sr.ª Maria Carrilho (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Sr. Deputado José Cesário pouco falou da sua proposta e, portanto, deduzo que também não lhe deve dar uma importância por aí além.
Na história da emigração portuguesa, as mulheres lutaram, as mulheres fizeram enormes sacrifícios e muito se lhes deve quanto à melhoria das condições de vida das suas famílias, das suas terras de origem e do nosso País.
Os percursos da nossa emigração são diferenciados, de continente para continente, mas, na maior parte dos casos, as mulheres portuguesas passaram de um meio rural, da economia familiar agrícola, onde o seu trabalho não era, muitas vezes, remunerado, para situações de mão-de-obra e de prestação de serviços

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remunerados, em que o seu contributo passou a ser, efectivamente, mais valorizado no seio da família e da sociedade.
Foi, na maior parte dos casos, o início de um caminho extremamente árduo para a emancipação das próprias mulheres e de que só agora, talvez, as segundas e terceiras gerações estejam a colher os resultados.
Recorde-se que, em relação ao que estão a propor e a outras iniciativas, diria, pleonásticas, onde mais se concentra a emigração portuguesa é precisamente em países democráticos cujo nível de vida e índice de aplicação de práticas democráticas são dos mais elevados em todo o mundo.
Ora bem, devemos, isso sim, continuar vigilantes para que tais práticas sejam efectivadas entre os nossos emigrantes, designadamente aqueles que estão mais vulnerabilizados.
Para fazer face aos problemas da emigração, só com a implantação da democracia e, depois, com a integração europeia o nosso Estado implementou vários instrumentos. E devo dizer, Srs. Deputados, que mais poderia ter sido feito se o PSD tivesse cumprido melhor as suas funções governativas.

O Sr. Afonso Candal (PS): — É verdade!

A Sr.ª Maria Carrilho (PS): — Agora, este projecto do PSD aparece atrasado e pouco consistente; duplica, inclusive, instrumentos já existentes.
Na realidade, os objectivos e apoios a que o projecto se refere já estão contemplados pela existência do Regulamento de atribuição de apoio pela Direcção-Geral dos Assuntos Consulares e Comunidades Portuguesas.
Outro instrumento que já iniciou o seu trabalho é o Observatório para a Emigração.
E, deixem-me que lhes diga, parece que não atenderam também ao trabalho e aos estudos da Comissão para a Igualdade e para os Direitos das Mulheres durante o próprio governo do PSD. Deviam ter lido as actas dos seminários.

Vozes do PS: — Muito bem!

A Sr.ª Maria Carrilho (PS): — Ora bem, em conclusão, parece-me que não há qualquer razão para votar favoravelmente a vossa proposta.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Machado.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Queria salientar que o PSD iniciou a sua intervenção e gastou mais de metade do tempo que dispunha não a defender o seu projecto de lei, que hoje se discute, mas a apresentar estatísticas, números, mais preocupado, com certeza, com o próximo acto eleitoral do que propriamente em defender o seu projecto de lei.
Mas passemos nós à discussão da iniciativa.
A iniciativa legislativa aborda problemas e preocupações legítimas. Todas as medidas de combate à discriminação e à violência propostas são, no nosso entender, consideradas positivas.
Importa lembrar não só os salários, em que verificamos que se pratica fortemente a discriminação em relação às mulheres — em Portugal, o salário das mulheres é inferior ao salário dos homens, em média, entre 25 a 30% —, mas também a violência, que é claramente um problema grave que tem, com certeza, abordagens quer em Portugal quer a nível internacional.
A iniciativa propõe campanhas de sensibilização junto das comunidades, o que é positivo.
Contudo, não podemos deixar de salientar a profunda contradição do PSD, que hoje apresenta este projecto de lei, mas no passado tomou algumas medidas que passarei a enunciar.
A saber: foi o PSD que aumentou a idade de reforma das mulheres dos 62 para os 65 anos; foi o PSD — acompanhado pelo PS, recentemente — que alterou a licença de maternidade que era paga a 100% para 80%; foi o PSD — agora tambçm acompanhado, vejam lá a coincidência!» — que aprovou legislação laboral que fragiliza a posição das mulheres no mundo laboral e que torna as suas vidas mais precárias; foram o PSD

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e o PS que votaram contra o subsídio social de maternidade proposto pelo PCP; foi o PSD, enquanto teve responsabilidades no governo, que nada fez para atacar a discriminação de que as mulheres são alvo.
Não obstante estas profundas contradições, não obstante esta iniciativa dever ser um projecto de resolução e não um projecto de lei, somos sensíveis a esta questão.
Bem sabemos que as mulheres portuguesas que vivem no estrangeiro são, na sua grande generalidade, discriminadas. E são-no por dois factores: primeiro, porque são emigrantes; segundo, porque são mulheres.
Essa dupla discriminação é, na nossa opinião, absolutamente inaceitável.
A igualdade de todos, o fim da discriminação das mulheres e o fim da exploração de todos os trabalhadores só se consegue, na nossa opinião, com profundas transformações sociais e políticas, e nós tudo faremos para que essas transformações ocorram.
Este projecto de lei é um passo do PSD, um pequeno passo com profundas contradições relativamente àquela que tem sido a sua prática, mas não deixa de ser um pequeno passo positivo e, por isso, apoiá-loemos.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Pinto.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O PSD apresenta, hoje, um projecto de lei em que, na «Exposição de motivos», logo no primeiro parágrafo, afirma que a igualdade de género é «alvo permanente das preocupações do Partido Social Democrata.
Em primeiro lugar, Sr. Deputado José Cesário, permita-me que o saúde e lhe dê as boas-vindas ao capítulo da defesa e da luta pela igualdade de género! Mas, Sr. Deputado, às vezes, custa um pouco encaixar uma coisa na outra. Estou-me a lembrar, por exemplo, do comportamento de parte — é verdade que não foi da totalidade — da bancada do PSD quando se discutiu, neste Parlamento, a paridade e qual foi a posição da actual líder do PSD, Manuela Ferreira Leite, no que toca a direitos das mulheres e à participação paritária das mulheres nos órgãos de decisão política! Por isso, seja bem-vindo nesse aspecto, embora não tenha directamente a ver com o objecto do projecto de lei.
Aliás, se calhar, não é por acaso que, nos objectivos do programa que os senhores propõem, esquecem a participação política e a participação cívica das mulheres nas nossas comunidades no estrangeiro! Falta isso no projecto de lei. Espero que aceite esta simples e humilde sugestão! Contudo, Sr. Deputado José Cesário, não deixou de ser também com alguma perplexidade que vi — e também apoio o que disse o Sr. Deputado Jorge Machado, ou seja, que provavelmente esta iniciativa deveria ser um projecto de resolução a recomendar ao Governo a adopção de algumas medidas — o artigo 7.º deste projecto de lei, que estabelece qual a entidade responsável pelo desenvolvimento do Programa.
Sr. Deputado José Cesário, então, vamos promover um programa que tem uma tutela exclusiva por parte do membro do governo que acompanha a política relativa às comunidades?! Então, queremos um programa para favorecer as mulheres emigrantes, para estimulá-las à participação política nas comunidades e, depois, damos-lhe uma tutela governamental?! Sr. Deputado, o que é que a Associação Mulher Migrante, que conhece tão bem quanto eu (a qual, aliás, até já foi dirigida por uma camarada sua de bancada, a Dr.ª Manuela Aguiar), dirá de um programa tutelado pelo governo?! Por isso, Sr. Deputado, pesem as boas intenções, que não quer dizer que este projecto não tenha, pesem as intenções eleitorais da bancada do PSD em relação a este projecto de lei, ele não terá a oposição do Bloco de Esquerda, porque, acima de tudo — e vou deixar de parte os comentários que o Sr. Deputado fez no que respeita à visão que poderemos ter ou não sobre as nossas comunidades emigrantes, que, pode ter a certeza absoluta, não encaixa em nada do que o senhor disse —, interessa-nos que existam os instrumentos necessários para incentivar a participação das comunidades portuguesas no estrangeiro e com especial enfoque das mulheres emigrantes portuguesas por esse mundo fora.

Aplausos do BE.

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O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Helder Amaral.

O Sr. Helder Amaral (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Pesem embora as contradições, as perplexidades e até outros interesses não confessados, no plano dos princípios, este projecto merece a nossa aprovação. Direi mesmo que a responsabilidade do combate a esta desigualdade é de todos e também do Estado.
Gostaria de referir — já aqui foi dito — que, de facto, as mulheres encontram-se duplamente discriminadas, pois são mulheres e são, ao mesmo tempo, emigrantes.
Além de mais, também não colhe o argumento de que estão emigradas em países normalmente democráticos ou em que os valores democráticos estão perfeitamente interiorizados, porque Portugal é só o segundo país com maior diferença salarial entre homens e mulheres. Os homens ganham, em média, mais 25,4% do que as mulheres, sendo a média europeia de 15,5%, se não me falha a memória. Mas é bom recordar que em países para onde há forte emigração, onde a nossa comunidade é grande, como a Alemanha e a Holanda, essa diferença salarial é de 20%.
Portanto, fazem sentido medidas que possam ajudar as mulheres a terem condições de igualdade de acesso aos mais elementares direitos. Por isso, julgamos que o diploma em discussão deveria ser, porventura, mais um projecto de resolução do que um projecto de lei e ir até um pouco mais longe nas sugestões, embora concorde genericamente, como disse, com as iniciativas que apresenta.
Julgo que falta neste projecto de lei uma coisa elementar, que é o apoio jurídico.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Exactamente!

O Sr. Helder Amaral (CDS-PP): — Com a ideia do Partido Socialista de reduzir a rede consular,»

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Exactamente!

O Sr. Helder Amaral (CDS-PP): — » afastando os portugueses e as portuguesas que possam sentir necessidade de ajuda da Mãe-Pátria, muitas vezes as nossas mulheres, em situações de dificuldade, sentem essa distância. Portanto, poderia ser útil incluir no projecto o apoio jurídico e até o apoio familiar.
De resto, julgo que todas as medidas que visam chamar a atenção para este problema nos parecem razoáveis.
Espero apenas que, eventualmente, o projecto de lei possa ser discutido em Comissão e, aí sim, teremos total disponibilidade para colaborar, para dar as nossas sugestões, não no sentido de avaliar quais são as intenções subjacentes ao diploma, nem a prática passada de um ou de outro partido, nem tão-pouco vir com ideias, eventualmente, de introdução de quotas ou outras matérias do género (que não haja qualquer confusão!),» A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Vocês não gostam! Tremem todos!

O Sr. Helder Amaral (CDS-PP): — » mas para proteger, não na retórica mas na prática, as mulheres, nomeadamente, as emigrantes portuguesas.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, passamos à apreciação conjunta, na generalidade, dos projectos de lei n.os 580/X (4.ª) — Prevê o plano que define a rede nacional de ciclovias (Os Verdes), 581/X (4.ª) — Altera as normas para velocípedes sem motor do Código da Estrada (Os Verdes) e 638/X (4.ª) — Afirma os direitos dos ciclistas e peões no Código da Estrada (BE) e dos projectos de resolução n.os 376/X (4.ª) — Plano nacional de promoção da bicicleta e outros modos de transporte suaves (Os Verdes) e 152/X (2.ª) — Recomenda ao Governo a promoção de redes de modos suaves a integrar nos planos de mobilidade urbana,

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previstos pela Lei de Bases do Sistema de Transportes Terrestres, Lei n.º 10/90, de 17 de Março, e o DecretoLei n.º 380/99, de 22 de Setembro (BE).
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes.

O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O advento do automóvel e do motor de explosão por combustão mudou radicalmente o nosso mundo, o nosso espaço urbano, a nossa vida e o próprio Homem, a vários níveis.
Se, por um lado, teve inegáveis impactos positivos pela possibilidade que permitiu, a todos os níveis, o transporte de pessoas e bens, a verdade é que a sua generalização e expansão do uso que conheceu na segunda metade do século XX e que continua, hoje em dia, a acentuar-se revelam que tem um peso e custos elevadíssimos não só a nível ambiental mas também económico e social.
De facto, o crescimento exponencial do trânsito automóvel, agravado pela falta de investimento e de aposta que tem existido a nível dos transportes públicos colectivos, trouxe consigo problemas graves, tão variados como o congestionamento de trânsito, a sinistralidade rodoviária, o problema da saúde pública causado pela poluição, o stress ou a diminuição de exercício físico.
Além disso, condicionou o ordenamento viário e urbano, roubando tantas vezes espaço aos peões, e, provavelmente, o mais grave de tudo, constitui, hoje, um dos principais responsáveis pela dependência energética de que padecemos, pelas emissões de gases com efeito de estufa responsáveis pelas alterações climáticas e em boa parte — em cerca de um terço — pelo nosso não cumprimento dos compromissos do Protocolo do Quioto.
A verdade, Srs. Deputados, é que existem alternativas para combater este problema, designadamente a aposta nos transportes públicos, mas também a aposta clara a nível da mobilidade suave. E, dentro da mobilidade suave, muito concretamente, a aposta no uso da bicicleta, porque esta pode ser uma alternativa ao automóvel com claras vantagens, designadamente em pequenos trajectos.
A bicicleta apresenta uma tecnologia relativamente barata e acessível na aquisição e na manutenção; é um meio democrático de transporte ao alcance de todos, de todas as idades, pois é fácil de usar; é silencioso, não polui, só consome as calorias do ciclista, contribuindo para a sua saúde; ajuda a reduzir o número de automóveis em meio urbano, melhorando-o mesmo, tornando-o mais seguro, saudável e humanizado.
Por outro lado, o cicloturismo, em crescente expansão, é uma forma sustentável de turismo com ganhos económicos apreciáveis. Aliás, a Alemanha calcula os seus ganhos anuais, a nível de cicloturismo, em cerca de 5 milhões de euros/ano. Portugal, por seu lado, é um grande produtor e exportador de bicicletas de qualidade.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: Hoje, por iniciativa de Os Verdes, voltamos, mais uma vez, a discutir a importância da mobilidade suave, em geral, e o potencial da bicicleta, em concreto, em complementaridade com o pedestrianismo e os transportes públicos, para responder aos desafios energéticos, ambientais e de mobilidade do presente.
Depois de, em 2001, ter sido discutido, na Assembleia da República, o nosso projecto de lei n.º 67/VIII, que previa o plano da rede nacional de pistas dedicadas à circulação de velocípedes, hoje, voltamos a apresentar um projecto de lei para a criação de uma rede nacional de ciclovias, instrumento importantíssimo para garantir o direito dos ciclistas a pedalarem em segurança, separando-os, sempre que possível, do trânsito automóvel.
Todavia, não ficamos por aqui. Apresentamos, ainda, um projecto de lei para alteração do Código da Estrada, correspondendo ao apelo e propostas da Plataforma para a Promoção do Uso da Bicicleta e procurando garantir os direitos dos ciclistas quando circulam na estrada, que não são um «veículo de 2.ª» e têm tanto direito como os automóveis.
Apresentamos também um projecto de resolução que visa a criação de um plano que permita a sensibilização e o incentivo do uso dos meios de mobilidade suave e, em concreto, da bicicleta no nosso País.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É fundamental reconhecer que a bicicleta, para além de um meio de lazer, também pode ser um instrumento poderosíssimo ao nosso alcance para atingir os níveis ambientais e energéticos de que carecemos.

Vozes do PCP: — Muito bem!

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O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Santos Pereira.

O Sr. Fernando Santos Pereira (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes, a propósito da proposta do Partido Ecologista «Os Verdes», gostava de ouvir um esclarecimento sobre a diferenciação que existe entre as regras de prioridade dos velocípedes, isto é, entre a que existe actualmente no Código da Estrada e a que agora nos é apresentada pelo Partido Ecologista «Os Verdes».
O que pensa o Sr. Deputado sobre isto?

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes.

O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Fernando Santos Pereira, o tempo de que disponho é muito curto para explicar uma questão que, não sendo complexa, em sede de especialidade, poderemos apreciar, certamente. Mas o que está em causa — e muitos cicloturistas e federações têm chamado a atenção para isto mesmo — é o facto de a bicicleta, ao contrário de outros veículos, não gozar da regra geral de prioridade face ao automóvel individual, o que a coloca em perigo em muitas situações de entroncamentos, de cruzamentos e de rotundas. Está provado, cientificamente, que esse facto conduz a acidentes! Esta é uma questão que, certamente, poderemos aprofundar em sede de especialidade, mas acreditamos que ela é fundamental para garantir a segurança do ciclista, sem retirar espaço ao automóvel. Antes pelo contrário, compatibiliza-os como meios equiparados a nível da circulação viária.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Muito bem!

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Pinto.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: É hoje praticamente consensual, em tese, que a mobilidade é um direito democrático.
Os constrangimentos ecológicos e económicos colocam novos desafios à concretização deste direito.
A intensificação das taxas de motorização tem conduzido, sobretudo nas nossas cidades, a situações de autêntico caos, com os prejuízos ambientais, para a saúde pública e, mesmo, para economia, que me dispenso agora de enumerar.
Já ninguém duvida da necessidade de repensar a mobilidade urbana, e repensar sem recorrer sistematicamente à construção de novas vias ou ao alargamento das existentes. Não podemos colocar estradas em cima de estradas, nem carros atrás de carros para resolver o problema dos movimentos pendulares.
O desafio está na aposta no transporte público colectivo e, também, no incentivo ao uso da bicicleta e mesmo a andar a pé, o que é plausível e mesmo aconselhado para as pequenas deslocações urbanas, que, por sua vez, podem e devem ser articulados com os vários modos de transporte.
Segundo um documento da Agência Europeia de Ambiente, Portugal apresenta os piores resultados da União Europeia no que diz respeito a andar de bicicleta e a pé. Um dos grandes obstáculos ao desenvolvimento destes modos de transporte centra-se na segurança, não sendo aqui de descurar os indicadores que apontam claramente que, no nosso País, peões e ciclistas ocupam um lugar de destaque no sector dos mais vulneráveis em termos de segurança rodoviária.
Por isso, é necessário actualizar os conceitos de gestão de tráfego urbano, nomeadamente no que diz respeito à não segregação forçada entre modos de transporte e à criação de zonas de velocidade reduzida.
É absolutamente necessário que se concretizem alterações ao Código da Estrada no sentido de fazer corresponder aos princípios enunciados normas claras. Este é o primeiro dos contributos necessários para que se alterem práticas e comportamentos.
Já na última revisão do Código da Estrada se devia ter introduzido esta vertente. Foi uma oportunidade perdida, mas há agora que retomar esta questão.
O Bloco de Esquerda entregou, na sessão legislativa passada, um projecto de lei, que foi sujeito a audição da Autoridade Nacional para a Segurança Rodoviária, do Instituto da Mobilidade e dos Transportes Terrestres,

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da Associação Nacional de Municípios Portugueses e da Associação Nacional de Freguesias, que, unanimemente, deram o seu acordo geral ao projecto e sublinharam a sua importância.
Os vários contributos recebidos foram já integrados nesta segunda versão do projecto de lei que hoje debatemos.
Propomos a introdução do princípio da protecção dos mais vulneráveis ao longo do texto do Código da Estrada, em particular em função da velocidade, o que também visa combater a sinistralidade rodoviária, num dos seus aspectos particulares, mas cada vez mais importante — a sinistralidade de peões.
Propomos a introdução de conceitos de gestão e acalmia do trânsito, traduzidos em alterações do desenho urbano, em zonas pedonais, em zonas de estadia e nas chamadas «zonas 20» e «zonas 30».
Propomos, ainda, que a bicicleta seja considerada como um veículo que pode ocupar toda a via de trânsito.
Nesse sentido, propõem-se regras específicas em termos de posição de marcha, cedência de passagem, ultrapassagem e circulação.
Alterar o Código da Estrada é apenas um passo naquilo que é preciso fazer para vencer o desafio da mobilidade e dos modos de transporte alternativos ao automóvel. Mas é um passo que tem que ser dado e que é fundamental para que se sigam os outros no mesmo sentido.
O Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda está convicto da oportunidade e da importância desta iniciativa.
No mesmo sentido vai o projecto de resolução que apresentamos ao recomendar ao Governo que crie um quadro regulador dos planos de mobilidade dos municípios que contemple as redes de modos suaves de transporte, como um passo indispensável para que se avance neste domínio, pois não é admissível que os quadros normativos dos instrumentos de ordenamento do território sejam omissos neste aspecto, o que revela a ausência de reconhecimento da sua importância.
Termino como comecei, Sr.as e Srs. Deputados: há que dar importância substantiva e forma ao direito de mobilidade, ele mesmo também um direito de cidadania.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Também para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: A utilização da bicicleta, opção saudável, racional, amiga do ambiente, é muitas vezes considerada — erradamente — como apenas uma actividade de lazer para dias de sol ou, então, como uma vaga e distante memória de outros tempos, quando as pessoas se deslocavam de bicicleta porque não havia outro meio.
A verdade é que no nosso País, ao contrário, aliás, do que se passa na maioria dos outros Estados da União Europeia, a bicicleta é oficialmente considerada como um objecto de lazer e não como meio de transporte. Ora, essa diferença é significativa não apenas no plano simbólico mas, desde logo, em aspectos muito concretos, inclusive ao nível da circulação, mas também ao nível dos próprios custos para os utilizadores, ambos com evidentes implicações para a acessibilidade e a atractividade desta opção.
Nesta última matéria, o apoio e o reconhecimento da importância da utilização de modos de transporte suaves traduziu-se já, pela parte do PCP, em propostas concretas que apresentámos em sede de Orçamento do Estado, nomeadamente no sentido de apoiar despesas para a sua aquisição ao nível de deduções em sede de IRS. Infelizmente, o Governo, que fez propaganda sobre veículos eléctricos e atribuiu-lhes benefícios fiscais, não aceitou a elementar justiça da proposta do PCP para apoiar a opção pela bicicleta.
Pensamos que as iniciativas, as propostas concretas agendadas pelo Partido Ecologista «Os Verdes» e, de um modo geral, os objectivos e as motivações expressas nos vários projectos em debate merecem ser considerados, aprofundados e acolhidos no debate da especialidade, sendo certo que, até agora, há um trabalho e uma experiência de grande valor que têm sido desenvolvidos ao nível de vários municípios, no poder local democrático, com projectos e decisões de grande qualidade e uma visão de planeamento, inclusive de planeamento de trânsito, favorável a esta opção.
Nesta matéria, é preciso ouvir o poder locar e conhecer estas experiências, apoiá-las e incentivar a sua disseminação, criando para isso as condições necessárias, o que não está a ser feito por parte do actual Governo.

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Assim como, ao nível do Código da Estrada, há que considerar e tomar as medidas concretas que criem condições para uma circulação em segurança da bicicleta nas estradas e nas cidades, enquadrando aqui, de forma construtiva, as várias soluções possíveis e necessárias. Teremos de ponderar, por exemplo, a melhor forma de salvaguardar a segurança nos muitos casos de corredores bus nas cidades, entre outras matérias.
Todavia, o essencial desta matéria é, efectivamente, a possibilidade, a necessidade e a justeza de tomar medidas que criem condições para que esta seja uma opção não só considerada, respeitada, mas incentivada.
E, nesse sentido, estamos, naturalmente, disponíveis para dar o nosso contributo.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Santos Pereira.

O Sr. Fernando Santos Pereira (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as Deputadas, Srs. Deputados: As primeiras palavras do PSD são para dizer que esta é, para nós, uma matéria que consideramos importante.
A matéria da segurança rodoviária tem grande relevância: em Portugal, por dia, morrem, em média, cerca de duas pessoas e, a cada hora que passa, ficam cinco pessoas feridas nas estradas nacionais. Portanto, tudo o que tem a ver com segurança rodoviária é, para o Partido Social Democrata, matéria importante.
No que respeita aos projectos de resolução, podemos discordar relativamente ao método mas sublinhamos e comungamos dos objectivos.
Desde logo, as alterações propostas para o Código da Estrada em matéria de velocípedes devem merecer uma reflexão profunda.
Vivemos num País em que a bicicleta caiu. A bicicleta, que era um modo de transporte ou um modo de utilização para as pessoas se movimentarem no espaço, caiu: as bicicletas tinham identificação e deixaram de a ter; havia uma licença de circulação de velocípede e essa licença deixou de existir.
Houve países em que a circulação em bicicleta não caiu, como a Holanda e a Bélgica, que são países de automobilistas e, simultaneamente, de ciclistas.
Mas nós não temos esta tradição em Portugal. Por isso, a introdução da bicicleta, que deve ser um objectivo comungado por todos, é a introdução de um corpo estranho nas nossas vias e daí que deva ser rodeada de um especial cuidado. Só assim os números que atingimos com a redução da sinistralidade no que respeita aos peões não virão a ser prejudicados no que respeita aos velocípedes.
Portanto, repito, devemos ter aqui um especial cuidado.
Vou dar um exemplo muito simples, que até foi motivo da questão inicial que apresentei sobre a regra da prioridade: mudar as regras de prioridade sobre os velocípedes será correcto? Será esse o caminho correcto? Será que todos aqui reconhecemos que não estamos habituados à presença desse corpo estranho nas estradas nacionais? Será que todos sabemos qual é a regra de prioridade que está prevista entre o artigo 30.º e o artigo 32.º do Código da Estrada, relativamente aos velocípedes? Há muitas dúvidas sobre o caminho que devemos prosseguir.
Questiono se este caminho de dar uma absoluta e total primazia de prioridade ao velocípede não pode criar no ciclista uma sensação de falsa segurança e aumentar, precisamente, o índice de sinistralidade devido à sensação, como disse, de falsa segurança que existe através da introdução e a mudança desta regra de prioridade. Por isso, os belgas têm uma regra no Código da Estrada que estabelece que os ciclistas não devem abusar da regra de prioridade.
Outra nota que queríamos deixar diz respeito à obrigatoriedade do uso de capacetes, porque há um projecto que também o defende. Aqui, não temos dúvidas de que a obrigatoriedade do uso do capacete é algo de importante para a redução da sinistralidade. É importante que tal venha a acontecer.
Todavia, temos dúvidas sobre a fixação da idade mínima e, se calhar, quem apresentou a proposta também terá essas mesmas dúvidas: porquê 10 anos? Por que não 12 anos, que é quando são obrigatórios os sistemas de retenção? E por que não de forma universal? Todas estas são dúvidas que nos assistem e que gostaríamos de ver discutidas em sede de especialidade.
Estamos disponíveis para esse debate na especialidade, mas gostaríamos de saber se algumas das questões que aqui são afloradas também já foram discutidas com profundidade antes de serem aqui trazidas.

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Em suma, para o Partido Social Democrata não interessam apenas os direitos. São importantes os direitos dos velocípedes, mas também nos interessa a falsa sensação de segurança que esses mesmos direitos podem acarretar. Importa, por isso, que exista nas vias públicas uma certa co-existência pacífica entre todos os utilizadores.

O Sr. Presidente: — Queira concluir. Sr. Deputado.

O Sr. Fernando Santos Pereira (PSD): — Vou concluir, Sr. Presidente.
Através de quê? Através do equilíbrio de direitos e deveres de todos os utilizadores das vias públicas.
Para isso, o Partido Social Democrata está disponível.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Abel Baptista.

O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O CDS acolhe com satisfação a discussão que, hoje, aqui fazemos sobre os diversos diplomas em discussão, que, no essencial, pretendem criar mecanismos de promoção e garantia para os utilizadores da bicicleta.
A utilização da bicicleta é, hoje, feita, sobretudo, como uma forma de lazer e de desporto.
O uso da bicicleta como meio de transporte merece o apoio do CDS, por isso acolhemos com satisfação estes diplomas.
As vantagens do uso da bicicleta, face a outros meios de transporte, são várias. Desde logo por contribuírem para hábitos saudáveis, porque contribuem para o exercício físico, para a diminuição da sinistralidade rodoviária, nomeadamente em meio urbano,»

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — » onde a sinistralidade grave e mortal tem aumentado, ao contrário da tendência geral de diminuição, e para a diminuição da nossa dependência energética externa, sobretudo se substituir transportes movidos a energias fósseis, o que traz vantagens evidentes a nível ambiental.
O CDS entende que no sector ambiental e à custa deste já se fizeram muitas leis, algumas delas cheias de proibições e de arrazoados morais e, no fim de contas, quase tudo ficou na mesma.
No caso dos diplomas ora apresentados, salienta-se que são feitos de uma forma promocional e não proibitiva.
Acompanhamos, na generalidade, os presentes diplomas e, no âmbito da discussão na especialidade, esperamos encontrar melhorias, de forma a que todos os diplomas sejam conjugados com as condições de segurança, de funcionalidade e de concretização.
No âmbito da segurança, é necessário encontrar e definir as condições de utilização do velocípede, como, por exemplo, o uso de capacete, o seguro de responsabilidade civil, o uso de material reflector, a iluminação e outras.
No âmbito da funcionalidade, é necessário que fiquem estabelecidas campanhas de sensibilização, sobretudo no meio escolar, onde, obviamente, deve começar a sensibilização para as condições de circulação das bicicletas não só em termos legais mas também, e sobretudo, em termos de segurança, e normas de planeamento urbano, por forma a que a deslocação em bicicleta seja realmente adoptada.
Ao nível da concretização, é necessário encontrar as soluções que permitam gerir as actuais ciclovias, construídas sobretudo para fins de lazer, como vias de circulação entre as residências e os locais de destino — locais de trabalho, locais de estudo, áreas comerciais — e, inclusive, criar nos locais de destino, sobretudo nas zonas em que se tomam outros meios de transporte, como centros coordenadores de transportes e estações de caminhos-de-ferro, parques de estacionamento especialmente destinados a velocípedes.
Mais do que regras no Código da Estrada, é preciso, sobretudo, estabelecer regras de planeamento e de gestão urbana.

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Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Por isso, o CDS aprovará estes diplomas na generalidade e, na discussão na especialidade, espera ver melhorada a sua eficácia e a sua concretização para que possam ser realmente aplicados em Portugal.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Jorge.

A Sr.ª Isabel Jorge (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Debatemos, hoje, os projectos de lei n.os 580/X (4.ª) e 581/X (4.ª), de Os Verdes, e 638/X (4.ª), do BE, e os projectos de resolução n.os 376/X (4.ª), de Os Verdes, e 152/X (2.ª), do BE.
Embora as matérias apresentem alguma especificidade, todos os diplomas, na sua filosofia, visam regular a mobilidade dos cidadãos que optem pela locomoção a pé ou com recurso a velocípedes e outros meios de transporte denominados «suaves».
Pretende-se, assim, incentivar a utilização destes meios de locomoção, tendo presente e como finalidade uma mobilidade alternativa, saudável, não poluente e praticada em segurança.
Refira-se, aliás, que a questão da segurança tem sido uma das prioridades deste Governo, de forma a reduzir o número de vítimas, quer mortais, quer feridas, bem como a proteger as populações mais expostas, designadamente os grupos mais susceptíveis, como as crianças, os idosos e os utilizadores de veículos de mobilidade suave.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Plano Nacional de Prevenção Rodoviária, aprovado em 2003, atingiu e até ultrapassou os objectivos traçados antes da data prevista, antecipando-a em três anos.
Neste momento, encontra-se em fase de discussão pública, que decorrerá até meados de Fevereiro, a Nova Estratégia Nacional de Segurança Rodoviária para o período 2008/2015. Dos contributos trazidos para este documento, sairão novas regras e disposições legais a introduzir na revisão do Código da Estrada. Ora, do nosso ponto de vista, cremos que será neste texto legal que deverão ficar plasmadas todas as disposições legais que disciplinam e regulam a condução e o trânsito.
Note-se que o Bloco de Esquerda se mostrou sensível a esta posição, porque aceitou trabalhar as suas propostas em sede da Subcomissão da Segurança Rodoviária, visando dar o seu contributo em matéria tão sensível como a sinistralidade. Todos os contributos, sugestões e críticas visam salvar vidas, sobretudo, reafirme-se, nas populações mais expostas.
Daqui lançamos, pois, o repto ao Partido Ecologista «Os Verdes» para que nos acompanhem nos trabalhos da Subcomissão, de forma a enriquecermos ainda mais a próxima alteração ao Código da Estrada.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O tempo de que dispomos é curto para nos debruçarmos mais detalhadamente sobre a matéria hoje em apreço.
Contudo, não queremos deixar de nos pronunciar sobre o projecto de lei n.º 580/X (4.ª), que propõe, no seu artigo 6.º, a criação de um programa de benefícios fiscais a conceder aos municípios. Ora, os municípios, em boa parte, já estão sensibilizados para esta problemática e têm desenvolvido e incrementado medidas urbanísticas muito louváveis.
Ao impor opções de ordem urbanística e de execução de planos de pormenor e directores, que os diplomas de Os Verdes contemplam, o Governo estaria a invadir a esfera da competência que as autarquias detêm nesta área. Assim, não podemos acompanhar este projecto de lei de Os Verdes, pelo que votaremos contra.
Por último, no que concerne aos projectos de resolução, quer de Os Verdes, quer do BE, o PS acompanhará o voto destes partidos, pois encara os diplomas como bons, úteis e com grandes contributos.
Termino, Sr. Presidente, reafirmando e elogiando o trabalho que tem sido feito por todas as forças partidárias no seio da Subcomissão de Segurança Rodoviária e desejando que o debate de hoje em Plenário seja mais um passo e um efectivo contributo para uma melhor e mais segura política de segurança rodoviária.

Aplausos do PS.

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O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes.

O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Para encerrar o debate, quero notar que houve uma evolução positiva, desde o debate que tivemos em 2001 até hoje, relativamente a esta matéria, pois praticamente todas as bancadas reconhecem agora que esta matéria é profundamente importante, pelo que contamos com o apoio de todos para, na especialidade, discutir estas questões e resolver as dúvidas que possam existir.

A Sr. Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Muito bem!

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, terminado o debate deste conjunto de diplomas, vamos passar à apreciação, na generalidade, do projecto de lei n.º 297/X (1.ª) — Estabelece o regime jurídico da segurança social dos trabalhadores das pedreiras, antecipando a idade de acesso à pensão por velhice (PCP).
Para apresentar o diploma, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Machado.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero, em primeira lugar, saudar, em nome do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, os trabalhadores das pedreiras aqui presentes e que esperaram até ao final da nossa agenda de hoje.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Entre nuvens de pó, os trabalhadores das pedreiras transformam a pedra e criam riqueza para os patrões e para o País, mas deixam as marcas do seu trabalho no corpo, na sua saúde.
A transformação da pedra, cujas condições de desgaste importa minorar, envolve, necessariamente, perigos para a saúde destes trabalhadores, a quem não resta outra actividade senão esta. Na verdade, não há medidas possíveis que impeçam ou diminuam o perigo da silicose que afecta estes trabalhadores e que a muitos lhe ceifa a vida prematuramente.
Esta justa reivindicação dos trabalhadores das pedreiras levou à criação de um movimento que promoveu debates, sensibilizou a população, fez aprovar, por unanimidade, moções nas Assembleias Municipais do Marco de Canaveses e de Penafiel, recolheu assinaturas e apresentou uma petição, com mais de 5000 assinaturas, à Assembleia da República.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Bem lembrado!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — O que exigem é simples: a diminuição da idade de reforma dos trabalhadores das pedreiras, exigindo que lhes seja aplicado o mesmo regime dos mineiros.
Seguindo as preocupações destes trabalhadores e respondendo a esta legítima aspiração, o PCP apresenta, hoje, este projecto de lei, em que propõe que a idade normal de reforma por velhice seja reduzida em um ano por cada dois anos de serviço efectivo na indústria das pedreiras e estabelecendo a idade de 55 anos a partir da qual pode ser reconhecido o direito à pensão de velhice.
Mais: propomos que o montante da pensão de invalidez seja calculado com um acréscimo à taxa de formação de 2,2% por cada dois anos de serviço efectivo nesta indústria.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Bem sabemos que o caminho que o Governo PS traçou para os trabalhadores portugueses é o chamado «envelhecimento activo»; bem sabemos que o Governo aumentou a idade real da reforma, obrigando a trabalhar mais para receber menos, mas é neste cenário, extremamente penalizante para todos trabalhadores, que importa colocar o problema dos trabalhadores das pedreiras.
Quem, como o PCP, contactar com a realidade dos trabalhadores das pedreiras do Marco de Canaveses, de Paredes e de Penafiel pode constatar as condições de trabalho que estes trabalhadores enfrentam no seu dia-a-dia e a necessidade imperiosa de melhorar as condições de acesso à reforma. Na verdade, estes trabalhadores das pedreiras passam todo o seu dia de trabalho envolvidos numa nuvem de pó, uma nuvem de quartzo, e expostos a elevados níveis de ruído.
A utilização de novos e mais modernos instrumentos de trabalho aumenta, ainda mais, o risco de silicose, pelo que é inteiramente justificável a aplicação do mesmo regime que existe para os mineiros.

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Estas condições de perigosidade foram reconhecidas, inclusivamente, pelo Centro Nacional de Protecção contra Riscos Profissionais, chegando mesmo à conclusão de que «existem riscos generalizados de silicose e de surdez».
A silicose — invasão de sílica nos pulmões — vai, como dizem os trabalhadores das pedreiras, «entupindo» os pulmões de pó e estes vão perdendo capacidade respiratória e, lentamente, vão sufocando, à medida que os pulmões ficam bloqueados.
A consequência é que uma significativa maioria dos trabalhadores das pedreiras não atinge a idade normal de reforma em condições aceitáveis de saúde e muitos dos trabalhadores morrem prematuramente.

O Sr. Honório Novo (PCP): — É verdade!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Assim, para estes trabalhadores não é possível o «envelhecimento activo». Para muitos destes trabalhadores não é possível a reforma aos 65 anos, com as penalizações que o Governo PS impõe, porque, pura e simplesmente, muitos deles não vivem o tempo suficiente.
É, assim, da mais elementar justiça que se crie um regime especial de reforma para estes trabalhadores.
Como afirmámos aquando da discussão da petição promovida por estes trabalhadores, «só quem não conhece a realidade, as vidas ceifadas pelas nuvens de quartzo; só quem não ouviu os relatos das famílias enlutadas pela morte prematura é que pode não considerar legítima esta pretensão».

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Aiveca.

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A Lei de Bases da Segurança Social prevê que, por motivos de natureza especialmente penosa e desgastante, se possam fazer alterações aos regimes de atribuição e de acesso às pensões de velhice.
O que hoje debatemos é exactamente a criação de um regime excepcional, que já existe para outras profissões, que, por sinal, são bastante semelhantes no sentido dos riscos a que estão sujeitas.
Os trabalhadores das pedreiras, como bem é reconhecido pelo Centro Nacional de Protecção contra Riscos Profissionais, estão sujeitos a níveis impressionantes e que ultrapassam todos os limites da qualidade do ar que respiram. Naturalmente que esta exposição provoca nestes trabalhadores doenças irreversíveis, como a silicose e a surdez.
Faz, portanto, todo sentido que, para um grupo de cerca de 15 000 profissionais, a segurança social dê resposta a este problema.
Virá sempre, por parte do Governo e da bancada do Partido Socialista, o argumento, que já conhecemos, da sustentabilidade do sistema de segurança social e da falta de dinheiro. Chegados aqui, e neste momento, em que este dinheiro abunda para tanta coisa e para tanto desgoverno, era altura de sensibilizarem quer o Partido Socialista quer o Governo para uma alteração, que é urgente e emergente, para estes trabalhadores.
Já aqui foi referido que esta exposição provoca, muitas vezes, a morte precoce. Muitos trabalhadores não terão sequer direito às pensões por esta razão. Por isso também os movimentos que em torno desta questão têm acontecido e a petição, já discutida neste Parlamento, subscrita por 5039 cidadãos, merecem respeito.
Sr.as e Srs. Deputados do Partido Socialista, importa que, nesta altura, em que há uma lei da segurança social que prevê estes regimes de excepção, se dê resposta e se tenha respeito por aqueles que mais sofrem, por aqueles que são absolutamente necessários devido à natureza das suas funções, mas que merecem todo o nosso respeito e que a lei dê, efectivamente, corpo e voz a estes problemas e seja alterada.
O que se reivindica é muito simples: que estas pessoas tenham direito à pensão aos 55 anos. Muitos deles, relembro, começaram na pedreira muito cedo, muitos deles trabalham lá há 30 e 40 anos, porque muitos deles, com 55 anos, já trabalharam 40 anos. Não há nenhuma justificação razoável para que não se tenha para estas pessoas o máximo de respeito.

O Sr. Francisco Louçã (BE): — Muito bem!

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A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — É simplesmente isto que eles exigem, que este projecto de lei prevê e que nós, total e convictamente, subscrevemos.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Quartin Graça.

O Sr. Pedro Quartin Graça (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O PCP submete a esta Assembleia o projecto de lei n.º 297/X (1.ª), que estabelece o regime jurídico da segurança social dos trabalhadores das pedreiras, antecipando a idade de acesso à pensão por velhice.
Na «Exposição de motivos», o PCP explica bem as razões de ser desta pretendida antecipação, a saber: a especial penosidade do trabalho nas pedreiras; e, particularmente, a grande perigosidade do ar respirado em tal ambiente de trabalho.
Trata-se, em concreto, da contínua exposição a condições de trabalho em que existe o risco generalizado de silicose e de surdez, como foi estudado e aferido pelo Departamento de Avaliação e Prevenção de Riscos Profissionais do Centro Nacional de Protecção Contra os Riscos Profissionais.
De resto, e como é igualmente referido no preâmbulo do projecto de lei, o então Ministro do Trabalho e da Solidariedade, em 2001, tornou públicos dados confirmativos daqueles riscos profissionais. Estamos, portanto, no quadro de uma situação de excepção face ao comum das profissões,»

O Sr. Honório Novo (PCP): — Exactamente!

O Sr. Pedro Quartin Graça (PSD): — » tal como no caso dos trabalhadores das minas de urânio para quem o Grupo Parlamentar do PSD tem defendido, e continua a defender, um regime excepcional. Aliás, para além da bondade do presente projecto de lei, é entendimento do Grupo Parlamentar do PSD que o Governo devia, ele próprio, elencar quais as profissões com especiais riscos de perigosidade, nomeadamente quanto à saúde, e promover um regime especial que as abrangesse.
É que tratar de igual forma o que é desigual conduz, necessariamente, a injustiças, que esta Câmara não pode nem deve defender. Tratar de forma desigual o que é desigual torna-se, objectivamente, um dever de justiça, que Grupo Parlamentar do PSD acompanha e defende.
É por isso que me permito anunciar, nesta ocasião, a entrada na Mesa de um novo projecto de lei do Grupo Parlamentar do PSD, que se propõe alterar o regime jurídico de acesso às pensões de invalidez e velhice para os trabalhadores da Empresa Nacional de Urânio, SA.
Trata-se de uma iniciativa que peca por ser avulsa, como a que hoje analisamos, mas que tem a vantagem de colmatar, ainda que imperfeitamente, porque não é uma solução global, a falha do Governo, que, não fazendo o trabalho de casa, nomeadamente não promovendo a realização de estudos sobre este tipo de profissões, leva a que existam flagrantes injustiças, que as bancadas dos diversos partidos têm de ir tentando suprir ao longo do trabalho desenvolvido nesta Legislatura.
Assim, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, a bancada do PSD acompanhará o diploma em análise e alerta o Governo para a necessidade de promover uma solução global para as profissões perigosas.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Mota Soares.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O projecto de lei que o PCP nos traz aqui, hoje, trata de uma matéria muito sensível, relacionada com diversas áreas, a qual tem de ser estudada, pensada e debatida com muita atenção e cuidado. Não é uma matéria que possa tratar-se de forma um pouco mais superficial.
Objectivamente, trata-se de uma matéria à qual o Grupo Parlamentar do CDS é muito sensível, porque conhecemos os estudos, alguns até científicos, sobre as consequências físicas, ao nível da audição e da capacidade pulmonar, a que estes trabalhadores estão sujeitos. E, por isso mesmo, também não nos

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esquecemos de que este projecto de lei vem no seguimento de uma petição discutida nesta Câmara em 5 de Janeiro de 2007, na qual o CDS expressou uma opinião que, passados dois anos, mantém.
As condições em que os trabalhadores das pedreiras exercem as suas funções são de uma enorme dificuldade e penosidade. Não nos esquecemos de que, infelizmente, há outros trabalhadores, noutros sectores, cujas condições de desempenho das suas funções também são especialmente difíceis. Podíamos falar, por exemplo, dos trabalhadores das indústrias dos cimentos, dos fibrocimentos, das cerâmicas, das madeiras, das cortiças ou até, numa questão colocada mais recentemente, dos trabalhadores aéreos.
Sabemos que nos termos da actual Lei de Bases da Segurança Social é preciso que sejam preenchidos três requisitos essenciais: a especialidade da actividade; a razão concreta pela qual a actividade tem um índice elevado de penosidade ou de agravação para a saúde; e, por último, também muito importante, a forma de assegurar o respectivo financiamento dessa mesma antecipação.
Infelizmente, a estes três critérios o Grupo Parlamentar do Partido Comunista não dá já uma resposta. Por isso mesmo, parece-nos que esta matéria deveria ser aprofundadamente discutida na Comissão Parlamentar de Trabalho, Segurança Social e Administração Pública, permitindo que aí seja dada uma resposta, que o Governo, atç hoje»

Protestos do Deputado do PCP Honório Novo.

Não esteja nervoso, Sr. Deputado Honório Novo!... Estamos a fazer uma discussão séria! O Sr. Deputado pode querer fazer, nesta matéria, uma discussão de gritos, uma discussão para tentar condicionar as pessoas, mas o Grupo Parlamentar do CDS recusa-se a discutir uma matéria desta importância dessa forma. Sabemos que, muitas vezes, o Grupo Parlamentar do PCP acha que estas matérias, que são muito importantes para a vida das pessoas, para a vida dos trabalhadores, devem ser discutidas no meio de uma gritaria, mas recusamos fazê-lo, Sr. Deputado.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Não!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — E, por isso mesmo, parece-nos que na especialidade é possível responder»

O Sr. Honório Novo (PCP): — Está a ver?

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — » a um conjunto destes aspectos, nomeadamente quando o Governo, tendo-se comprometido, desde 2006, a indicar quais são os critérios de penosidade, até agora não o fez. E, provavelmente, vai ter de ser a Assembleia da República a substituir-se ao papel do Governo. Mas o CDS não foge a esse desafio; pelo contrário, tentaremos dar uma resposta a este desafio no sítio certo, que é a comissão.
Lamentamos, Sr. Deputado Honório Novo, que o Partido Comunista não tenha dado já uma resposta.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Já deu!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Lamentamo-lo, mas cá estaremos para, de forma séria, fazer esta discussão em sede de especialidade.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Fale verdade!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Não estejam nervosos, Srs. Deputados! Não tentem fazer neste Plenário, de uma discussão séria, única e exclusivamente a instrumentalização de trabalhadores, porque nisso não os acompanhamos. Acompanhamos a preocupação de tentar melhorar a vida destas pessoas, não acompanhamos uma manobra de instrumentalização, que, muitas vezes, o PCP faz aos trabalhadores portugueses.

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Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Sónia Fertuzinhos.

A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Dois pontos importa analisar neste debate, debate que tem tudo a ganhar quanto mais objectivo conseguir ser e que tem tudo a perder se se resumir a um debate de mera instrumentalização de objectivos político-partidários.
O primeiro ponto é o da exclusividade da antecipação da reforma para os trabalhadores das pedreiras. O segundo é o da estratégia que se deve adoptar para melhor proteger a saúde dos trabalhadores que, de alguma forma, estão em contacto com a sílica e que, por isso, correm risco de silicose.
Quanto à questão da exclusividade da antecipação da reforma para os trabalhadores das pedreiras, importa perguntar: as pedreiras são o único sector de actividade em contacto com a sílica, sendo os trabalhadores das pedreiras os únicos trabalhadores expostos aos riscos de silicose? A sílica está presente em todas as pedreiras? Todos os trabalhadores de uma pedreira estão inevitavelmente em contacto com a sílica, correndo todos igual risco de silicose? A resposta a estas três perguntas é clara e é «não!». A sílica não está presente em todas as pedreiras, porque nem todas as rochas têm sílica, nem todos os trabalhadores das pedreiras estão em contacto com esta substância e as pedreiras não são — e estão longe de ser — o único sector de actividade com sílica.
Aliás, a petição que está na origem desta proposta do PCP fala de outros sectores a que o PCP neste projecto de lei não dá resposta e eu pergunto-lhe se está à espera de uma petição para cada um destes sectores, para depois um a um apresentar projectos de lei.

Vozes do PS: — Muito bem!

A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — Mas, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, importa ainda analisar esta iniciativa na perspectiva da melhor estratégia para proteger a saúde de todos os trabalhadores e não apenas dos trabalhadores das pedreiras, que lidam com materiais, produtos ou matérias-primas que, contendo sílica, provocam o risco de silicose.
Pergunto de novo: a silicose é inevitável uma vez que há contacto com a sílica? A melhor estratégia de protecção da saúde dos trabalhadores de todos os sectores que lidam com a sílica é prevenir e eliminar o risco, ou desistir da prevenção, contratualizar o risco e antecipar a reforma de trabalhadores, aceitando à partida que vão ser trabalhadores doentes e que o melhor que podemos fazer é mandá-los, doentes, mais cedo para casa?

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Que grande hipócrita que é! Para quem passou quatro anos a resolver um problema de saõde»!

A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — Finalmente, Sr.as e Srs. Deputados, existem ou não meios»

Protestos do PCP.

Srs. Deputados, oiçam, podemos todos ter opinião diferente, mas temos de saber ouvir a opinião dos outros.
Terceira pergunta: existem ou não meios para eliminar ou reduzir a níveis residuais o risco da sílica em todos os sectores de actividade, desde logo nas pedreiras? O único estudo que os senhores apontam é de 2001 — estamos em 2009, já passaram oito anos!!...

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Vários estudos!

A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — A resposta a estas perguntas — se me quiserem ouvir agradeço — é clara: os riscos da sílica, a silicose, são evitáveis. No sector das pedreiras existem hoje meios e medidas de

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protecção colectiva, ao nível dos equipamentos e das máquinas utilizadas, e meios e medidas de protecção individual que evitam e eliminam os riscos da sílica.
Por isso, a melhor estratégia de protecção da saúde dos trabalhadores é a da intransigência na prevenção»

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Exactamente! É isso que vocês não fazem!

A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — » e na eliminação do risco na sua origem, e não, como o PCP propõe, em regimes especiais da segurança social para os trabalhadores, e muito menos para os trabalhadores de um só sector de actividade, como o PCP faz nesta proposta.
O projecto do PCP falha em todas as suas possíveis intenções: falha quanto à justiça da sua proposta e falha na eficácia da sua proposta.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Discutam-na na especialidade!

A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, a União Europeia é considerada como tendo a legislação mais avançada e completa nesta matéria.
E deve merecer a nossa reflexão o facto de nenhum país da União Europeia ter adoptado medidas deste género na protecção destes trabalhadores.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Não sabe do que está a falar!

O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, queira concluir.

A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — Termino, Sr. Presidente.
Proponho aos Srs. e às Sr.as Deputadas que leiam o acordo estabelecido em 2006, e não 2001, um bocadinho mais actual, no âmbito do diálogo europeu, entre associações empresariais e representantes dos trabalhadores, federações sindicais europeias, relativo à protecção da saúde dos trabalhadores que lidam com a sílica.
Lá pode ler-se que «as partes reconhecem a necessidade de uma estratégia de prevenção relativa à sílica cristalina respirável. Tal não significa, no entanto, que a assinatura deste acordo deva ser considerada como o reconhecimento da existência de uma exposição não controlada no sector em questão ou de uma exposição efectiva em todo o sector».

O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, queira terminar.

A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — Termino, Sr. Presidente.
Tal não significa, no entanto, que a assinatura deste acordo deva ser considerada como o reconhecimento da existência de uma exposição não controlada no sector em questão ou de uma exposição efectiva em todo o sector.
Não há qualquer proposta assinada por empregadores e representantes dos trabalhadores da qual também fazem parte representantes dos trabalhadores portugueses.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Vá lá às pedreiras falar com os trabalhadores! Devia ter vergonha, há trabalhadores a morrer por causa disso!

A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — Portanto, Sr.as e Srs. Deputados, a ACT (Autoridade para as Condições de Trabalho) está neste momento a trabalhar, tal como tem feito ao longo dos anos, esta questão.
Esta proposta não é justa, não é eficaz na protecção da saúde dos trabalhadores e não faz sentido!

O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, já excedeu largamente o seu tempo.

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A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — » e, sobretudo, não faz sentido a instrumentalização dos trabalhadores por parte do PCP.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, quero, em primeiro lugar, em nome do Grupo Parlamentar do Partido Ecologista «Os Verdes», saudar os trabalhadores das pedreiras que se encontram nas galerias e que, pacientemente, têm assistido a todos os trabalhos parlamentares do dia de hoje, até a este triste espectáculo a que acabámos de assistir com algumas intervenções.
Reparem bem, Srs. Deputados, que alguns vêm para aqui apresentar as suas inúmeras preocupações em relação a esta questão sem apresentar soluções. Ficamos à espera que qualquer coisa nos «caia na cabeça».

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Ficamos à espera que alguém encontre melhores condições de trabalho.
Há, no entanto, quem tenha apresentado aqui uma solução concreta, que não abarcará todas as situações necessárias, mas que resolve uma parte do problema.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exactamente!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Por isso, temos aqui um projecto de lei do PCP que propõe, justamente, a aprovação de um regime de antecipação da idade de acesso à reforma. E os senhores, com o pretexto de que as condições de trabalho continuam degradantes, não aceitam este princípio. Mas são coisas absolutamente diferentes!

Protestos do PS.

Nós estamos a falar das condições de trabalho em que actualmente estes trabalhadores laboram e em que têm laborado há muitos e longos anos. Está em causa a questão do desgaste profissional destes trabalhadores, mas também o grave risco de saúde pública. E sabemos que há determinados regimes profissionais, em Portugal, que já gozam de uma antecipação da idade da reforma,»

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exactamente!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — » justamente por terem estas características no seu trabalho.
Sr.ª Deputada Sónia Fertuzinhos, sabe que a discussão que agora levantou, sobre se serão só estes trabalhadores que estão em causa, também se colocava quando se discutiu a questão dos mineiros,»

Vozes do PCP: — Exactamente!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — » porque, primeiro, só se considerava quem laborava dentro das minas, mas depois, mais tarde, teve de se reconhecer que também era preciso um regime desta natureza para aqueles que trabalhavam fora das minas.

Vozes do PCP: — Exactamente!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — E reconheceu-se essa necessidade para os trabalhadores da Empresa Nacional de Urânio, mas só para aqueles que, até à data dessa decisão, tinham relações contratuais.

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No que se refere aos outros, os senhores, por mais que não queiram, vão ter de reconhecer que também têm de ter direito a esta antecipação da idade da reforma!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Estamos a falar de excepções!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Portanto, os senhores, sob o pretexto de que temos de fazer para todos, afinal, acabam por não fazer para ninguém.

A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — Não foi isso que eu disse!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — É fundamental reconhecer a justeza dos princípios enunciados neste projecto de lei e entender que, de facto, há aqui uma situação de desgaste rápido, de grave risco da saúde, que se trata de pessoas que acabam por falecer antes de atingir a idade da reforma, que são muito vítimas, como todos aqui referimos, da silicose e de graves doenças respiratórias. E das duas uma: ou entendemos fechar os olhos e continuar impávidos e serenos o caminho, sem ligar a esta situação, ou entendemos apresentar soluções.
Está uma solução em cima da mesa. Quem está, verdadeiramente, preocupado com a situação, votá-la-á favoravelmente. Quem finge que está preocupado e não apresenta qualquer outra solução demonstra, claramente, que não tem preocupação alguma com esta situação. E mais: continua mais absorvido pelas questões do défice do que, provavelmente, pelas condições de vida das populações portuguesas!

Aplausos de Os Verdes e do PCP.

O Sr. Presidente: — A Sr.ª Deputada Sónia Fertuzinhos pediu a palavra para interpelar a Mesa.
Tem a palavra, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — Sr. Presidente, peço-lhe o favor de mandar distribuir o acordo a que fiz referência e que resulta do diálogo social europeu relativo à protecção da saúde dos trabalhadores através da utilização e manuseamento correctos de sílica cristalina e produtos contendo sílica cristalina, que não tem qualquer medida de protecção como propõe o PCP, o que será por alguma razão que não só as do PS.

Aplausos do PS.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Acrescente isso ao nosso projecto!

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Machado. Dispõe de 9 segundos.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, queria apenas deixar duas notas.
A primeira é a de que consideramos absolutamente inaceitável que o Partido Socialista nas assembleias municipais onde esta questão foi discutida tenha votado a favor, tendo demonstrado um claro apoio aos trabalhadores das pedreiras, e nesta Assembleia da República dê o dito por não dito e vote contra um projecto de lei que é extremamente justo para os trabalhadores das pedreiras. Consideramos isso absolutamente inaceitável e de uma profunda contradição demagógica que importa aqui denunciar!

Protestos da Deputada do PS Sónia Fertuzinhos.

A segunda é a de que a Sr.ª Deputada fala em prevenção. A petição dos trabalhadores foi discutida aqui, nesta Assembleia, há dois anos atrás. Que medidas de prevenção é que o Governo tomou sobre este sector? Zero, Sr.ª Deputada! Sr.ª Deputada, invocar a prevenção nos trabalhadores das pedreiras para chumbar um projecto de lei do PCP é imoral, tendo em conta que estes trabalhadores morrem a trabalhar! O Grupo Parlamentar do Partido Socialista é insensível a esta matéria!

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Aplausos do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: — Concluímos, assim, este ponto da ordem de trabalhos.
Srs. Deputados, a Sr.ª Secretária vai dar conta da retirada de um diploma.

A Sr.ª Secretária (Rosa Maria Albernaz): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda anuncia a retirada do projecto de resolução n.º 287/X (3.ª) — Recomenda ao Governo a implementação de medidas urgentes para melhorar o salvamento marítimo e socorro a náufragos (BE).

O Sr. Presidente: — Sendo assim, Srs. Deputados, estão concluídos os nossos trabalhos de hoje.
A nossa próxima reunião plenária terá lugar amanhã, às 10 horas. Da ordem do dia contará a discussão conjunta, na generalidade, dos projectos de lei n.os 619/X (4.ª) — Estabelece a pensão de reforma por inteiro com 40 anos de descontos, sem penalização (BE) e 643/X (4.ª) — Protege as carreiras contributivas longas garantindo o direito a uma reforma sem penalizações (PCP); a apreciação do projecto de resolução n.º 415/X (4.ª) — Abertura da Base Aérea de Monte Real (BA5) à aviação civil (PSD); a discussão, na generalidade, do projecto de lei n.º 631/X (4.ª) — Simplificação do modelo de avaliação do desempenho do pessoal docente, para o ano lectivo 2008/2009 (CDS-PP); discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 239/X (4.ª) — Cria o apoio extraordinário para as famílias com dificuldades decorrentes das responsabilidades do crédito com habitação própria permanente (ALRAM); e a apreciação do projecto de deliberação n.º 16/X (4.ª) — Segunda alteração à Deliberação n.º 3-PL/2007, aprovada em 8 de Novembro (Composição das Comissões Parlamentares Permanentes) (Presidente AR). Haverá, ainda, votações às 12 horas.
Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 50 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Partido Socialista (PS):
Maria Isabel da Silva Pires de Lima

Partido Social Democrata (PSD):
José Luís Fazenda Arnaut Duarte
José Raúl Guerreiro Mendes dos Santos
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Miguel Pais Antunes
Mário Patinha Antão
Paulo Miguel da Silva Santos
Vasco Manuel Henriques Cunha

Partido Comunista Português (PCP):
Agostinho Nuno de Azevedo Ferreira Lopes

Srs. Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:

Partido Socialista (PS):
Maximiano Alberto Rodrigues Martins

Partido Social Democrata (PSD):
José Mendes Bota

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Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Partido Socialista (PS):
José Eduardo Vera Cruz Jardim

Partido Social Democrata (PSD):
António Alfredo Delgado da Silva Preto
António Paulo Martins Pereira Coelho
Carlos António Páscoa Gonçalves
Carlos Manuel de Andrade Miranda
Henrique José Praia da Rocha de Freitas
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Paulo Artur dos Santos Castro de Campos Rangel

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL

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