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Quinta-feira, 04 de Novembro de 2010 I Série — Número 21

XI LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2010-2011)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 3 DE NOVEMBRO DE 2010

Presidente: Ex.mo Sr. Jaime José Matos da Gama

Secretários: Ex.mos Srs. Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Abel Lima Baptista

SUMÁRIO O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 9 minutos.
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças (Teixeira dos Santos) deu resposta aos Srs. Deputados José Gusmão (BE), Duarte Pacheco (PSD), Honório Novo (PCP), Pedro Mota Soares (CDS-PP) e Heloísa Apolónia (Os Verdes), que, sob a forma de interpelação à Mesa, questionaram o Governo sobre a apresentação de uma errata ao Relatório do Orçamento do Estado que deu entrada na Comissão de Orçamento e Finanças.
Concluiu-se a discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 42/XI (2.ª) — Orçamento do Estado para 2011, tendo-se pronunciado, a diverso título, além do Sr. Ministro da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento (Vieira da Silva), os Srs. Deputados Pedro Saraiva (PSD), João Paulo Correia (PS), Luís Menezes (PSD), António Filipe e Agostinho Lopes (PCP), Pedro Soares (BE), Almeida Henriques (PSD), Telmo Correia (CDS-PP), Heloísa Apolónia (Os Verdes), Manuela Ferreira Leite (PSD), Francisco Louçã (BE), Honório Novo (PCP), Afonso Candal e Francisco de Assis (PS), Miguel Macedo (PSD), José Manuel Pureza (BE), Catarina Martins (BE) e Assunção Cristas (CDS-PP).
A encerrar o debate, intervieram, além do Sr. Ministro da Defesa Nacional (Augusto Santos Silva), os Srs. Deputados José Luís Ferreira (Os Verdes), Bernardino Soares (PCP), Luís Fazenda (BE), Cecília Meireles (CDS-PP), Miguel Macedo (PSD) e Francisco de Assis (PS).
Em seguida, a Câmara aprovou, na generalidade, a proposta de lei n.º 42/XI (2.ª) — Orçamento do Estado para 2011.
Foi também aprovada, na generalidade, proposta de lei n.º 39/XI (2.ª) — Proíbe qualquer discriminação no acesso e no exercício do trabalho independente e transpõe a Directiva

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2000/43/CE, do Conselho, de 29 de Junho de 2000, a Directiva 2000/78/CE do Conselho, de 27 de Novembro de 2000, e a Directiva 2006/54/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de Julho de 2006.
Foi aprovado o texto final, elaborado pela Comissão de Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local, sobre o projecto de lei n.º 23/XI (1.ª) — Regime da prática de naturismo e da criação de espaços de naturismo (Os Verdes).
Após rejeição de um requerimento do Sr. Deputado António José Seguro (PS) solicitando o adiamento da votação do texto final, elaborado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo aos projectos de lei n.os 299/XI (1.ª) — Reduz as subvenções públicas e os limites máximos dos gastos nas campanhas eleitorais (Terceira alteração à Lei n.º 19/2003, de 20 de Junho, financiamento dos partidos políticos e das campanhas eleitorais) (BE) e 317/XI (1.ª) — Financiamento dos partidos (PCP) — sobre o qual também se pronunciou o Sr. Deputado Luís Montenegro (PSD) — , foi o mesmo texto final aprovado. Produziram declarações de voto os Srs. Deputados Bernardino Soares (PCP), João Pinho de Almeida (CDS-PP), Luís Montenegro (PSD), Pedro Soares (BE) e Ricardo Rodrigues (PS).
A Câmara aprovou ainda um parecer da Comissão de Ética, Sociedade e Cultura, autorizando um Deputado do PS a prestar depoimento, como testemunha, em tribunal.
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 17 horas e 26 minutos.

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O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 10 horas e 9 minutos.

Deputados presentes à sessão:

Partido Socialista (PS)
Acácio Santos da Fonseca Pinto
Alberto Bernardes Costa
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Ana Paula Mendes Vitorino
Anabela Gaspar de Freitas
António Alves Marques Júnior
António José Martins Seguro
António Ramos Preto
António Ribeiro Gameiro
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Aurélio Paulo da Costa Henriques Barradas
Carlos Filipe de Andrade Neto Brandão
Catarina Marcelino Rosa da Silva
Defensor Oliveira Moura
Deolinda Isabel da Costa Coutinho
Eduardo Arménio do Nascimento Cabrita
Eurídice Maria de Sousa Pereira
Fernando Manuel de Jesus
Francisco José Pereira de Assis Miranda
Frederico de Oliveira Castro
Glória Maria da Silva Araújo
Horácio André Antunes
Inês de Saint-Maurice de Esteves de Medeiros Vitorino de Almeida
Jaime José Matos da Gama
Jamila Bárbara Madeira e Madeira
Jorge Filipe Teixeira Seguro Sanches
Jorge Manuel Capela Gonçalves Fão
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Jorge Manuel Rosendo Gonçalves
José Carlos Bravo Nico
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Duarte Piteira Rica Silvestre Cordeiro
José Eduardo Vera Cruz Jardim
José João Pinhanços de Bianchi
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
José Manuel Pereira Ribeiro
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
José Rui Alves Duarte Cruz
João Miguel de Melo Santos Taborda Serrano
João Paulo Feteira Pedrosa
João Paulo Moreira Correia
João Pedro de Aleluia Gomes Sequeira
João Raul Henriques Sousa Moura Portugal
João Saldanha de Azevedo Galamba
Júlio Francisco Miranda Calha

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Luiz Manuel Fagundes Duarte
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís António Pita Ameixa
Luís Miguel Morgado Laranjeiro
Luís Miguel Soares de França
Luís Paulo Costa Maldonado Gonelha
Luísa Maria Neves Salgueiro
Lúcio Maia Ferreira
Manuel António Gonçalves Mota da Silva
Manuel José de Faria Seabra Monteiro
Marcos Sá Rodrigues
Maria Antónia Moreno Areias de Almeida Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria Helena Figueiredo de Sousa Rebelo
Maria Hortense Nunes Martins
Maria Isabel Solnado Porto Oneto
Maria José Guerra Gamboa Campos
Maria Luísa de Jesus Silva Vilhena Roberto Santos
Maria Manuela de Almeida Costa Augusto
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Maria Odete da Conceição João
Maria da Conceição Guerreiro Casa Nova
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria de Lurdes Ruivo
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Miguel João Pisoeiro de Freitas
Miguel de Matos Castanheira do Vale de Almeida
Mário Joaquim da Silva Mourão
Nuno André Araújo dos Santos Reis e Sá
Nuno Miguel da Costa Araújo
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Barros Teixeira Santos
Paulo Alexandre de Carvalho Pisco
Pedro Manuel Farmhouse Simões Alberto
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Ricardo Manuel de Amaral Rodrigues
Rita Manuela Mascarenhas Falcão dos Santos Miguel
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui José Prudêncio
Rui José da Costa Pereira
Sofia Isabel Diniz Pereira Conde Cabral
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Teresa Maria Neto Venda
Teresa do Rosário Carvalho de Almeida Damásio
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vítor Manuel Bento Baptista
Vítor Manuel Brandão de Sousa Fontes

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Partido Social Democrata (PSD)
Adriano Rafael de Sousa Moreira
Adão José Fonseca Silva
Amadeu Albertino Marques Soares Albergaria
Antonieta Paulino Felizardo Guerreiro
António Alfredo Delgado da Silva Preto
António Carlos Sousa Gomes da Silva Peixoto
António Cândido Monteiro Cabeleira
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Egrejas Leitão Amaro
António Fernando Couto dos Santos
António Joaquim Almeida Henriques
Arménio dos Santos
Carina João Reis Oliveira
Carla Maria Gomes Barros
Carla Maria de Pinho Rodrigues
Carlos Alberto Silva Gonçalves
Carlos António Páscoa Gonçalves
Carlos Henrique da Costa Neves
Carlos Manuel Faia São Martinho Gomes
Celeste Maria Reis Gaspar dos Santos Amaro
Cristóvão da Conceição Ventura Crespo
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Emídio Guerreiro
Fernando Luís de Sousa Machado Soares Vales
Fernando Mimoso Negrão
Fernando Nuno Fernandes Ribeiro dos Reis
Fernando Ribeiro Marques
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Hugo José Teixeira Velosa
Isabel Maria Nogueira Sequeira
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Jorge Cláudio de Bacelar Gouveia
Jorge Fernando Magalhães da Costa
José Alberto Nunes Ferreira Gomes
José Eduardo Rego Mendes Martins
José Luís Fazenda Arnaut Duarte
José Manuel Marques de Matos Rosa
José Manuel de Matos Correia
José Mendes Bota
José Pedro Correia de Aguiar Branco
José de Almeida Cesário
José Álvaro Machado Pacheco Pereira
João Bosco Soares Mota Amaral
João Carlos Figueiredo Antunes
João José Pina Prata
Luís António Damásio Capoulas
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Filipe Valenzuela Tavares Menezes Lopes
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira

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Manuel Filipe Correia de Jesus
Margarida Rosa Silva de Almeida
Maria Clara de Sá Morais Rodrigues Carneiro Veríssimo
Maria Francisca Fernandes Almeida
Maria Helena Passos Rosa Lopes da Costa
Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto
Maria Luísa Roseira da Nova Ferreira de Oliveira Gonçalves
Maria Manuela Dias Ferreira Leite
Maria Paula da Graça Cardoso
Maria Teresa Machado Fernandes
Maria Teresa da Silva Morais
Maria da Conceição Feliciano Antunes Bretts Jardim Pereira
Maria das Mercês Gomes Borges da Silva Soares
Maria do Rosário da Silva Cardoso Águas
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Nuno Miguel Pestana Chaves e Castro da Encarnação
Paulo Cardoso Correia da Mota Pinto
Paulo César Lima Cavaleiro
Paulo Jorge Frazão Batista dos Santos
Pedro Augusto Lynce de Faria
Pedro Manuel Tavares Lopes de Andrade Saraiva
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Pedro Nuno Mazeda Pereira Neto Rodrigues
Raquel Maria Martins de Oliveira Gomes Coelho
Sérgio André da Costa Vieira
Teresa de Jesus Costa Santos
Ulisses Manuel Brandão Pereira
Vasco Manuel Henriques Cunha
Vânia Andrea de Castro Jesus

Partido Popular (CDS-PP)
Abel Lima Baptista
Artur José Gomes Rêgo
Cecília Felgueiras de Meireles Graça
Durval Tiago Moreira Fonseca e Castro Ferreira
Filipe Tiago de Melo Sobral Lobo D' Ávila
Isabel Maria Mousinho de Almeida Galriça Neto
José Duarte de Almeida Ribeiro e Castro
José Helder do Amaral
José Manuel de Sousa Rodrigues
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Manuel de Serpa Oliva
João Rodrigo Pinho de Almeida
Luís Pedro Russo da Mota Soares
Maria de Assunção Oliveira Cristas Machado da Graça
Michael Lothar Mendes Seufert
Nuno Miguel Miranda de Magalhães
Paulo Sacadura Cabral Portas
Pedro Manuel Brandão Rodrigues
Raúl Mário Carvalho Camelo de Almeida

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Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia
Teresa Margarida Figueiredo de Vasconcelos Caeiro

Bloco de Esquerda (BE)
Ana Isabel Drago Lobato
Catarina Soares Martins
Francisco Anacleto Louçã
Heitor Nuno Patrício de Sousa e Castro
Helena Maria Moura Pinto
Jorge Duarte Gonçalves da Costa
José Borges de Araújo de Moura Soeiro
José Guilherme Figueiredo Nobre de Gusmão
José Manuel Marques da Silva Pureza
João Pedro Furtado da Cunha Semedo
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda
Maria Cecília Vicente Duarte Honório
Mariana Rosa Aiveca Ferreira
Pedro Filipe Gomes Soares
Pedro Manuel Bastos Rodrigues Soares
Rita Maria Oliveira Calvário

Partido Comunista Português (PCP)
Agostinho Nuno de Azevedo Ferreira Lopes
António Filipe Gaião Rodrigues
Artur Jorge da Silva Machado
Bernardino José Torrão Soares
Bruno Ramos Dias
Francisco José de Almeida Lopes
Jerónimo Carvalho de Sousa
José Honório Faria Gonçalves Novo
João Augusto Espadeiro Ramos
João Guilherme Ramos Rosa de Oliveira
Miguel Tiago Crispim Rosado
Paula Alexandra Sobral Guerreiro Santos Barbosa
Rita Rato Araújo Fonseca

Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV)
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
José Luís Teixeira Ferreira

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos iniciar a nossa reunião.
O Sr. Deputado José Gusmão pediu a palavra para uma interpelação à Mesa.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Gusmão (BE): — Sr. Presidente, ontem, durante o debate na generalidade do Orçamento do Estado, chegou aos Deputados da Comissão de Orçamento e Finanças uma errata ao Relatório do Orçamento com um conjunto bastante alargado de alterações, nomeadamente ao nível da despesa corrente, com um aumento de 551 milhões de euros, de outras despesas sociais, com um aumento de 642 milhões de euros, e de prestações sociais, de 256 milhões de euros, e também reduções nas despesas com pessoal, em menos

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674 milhões de euros, no consumo intermédio, de menos 262 milhões de euros, e uma alteração da despesa de capital no montante global de 317 milhões de euros.
Curiosamente, nessa errata constam também alterações ao nível da receita nas contribuições sociais de 982 milhões de euros e uma redução nas outras receitas correntes de menos 106 milhões de euros e menos 45 milhões de euros nas receitas de capital.
Todas as gralhas que constam desta errata, que altera a despesa total em 831 milhões de euros e a receita total também em 831 milhões de euros, têm um efeito nulo no saldo orçamental.
O Sr. Ministro das Finanças ontem entendeu que não valia a pena esclarecer a razão de todas estas gralhas e a feliz coincidência de todas estas gralhas juntas terem um impacto nulo no saldo orçamental, ou seja, compensarem-se mutuamente.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — É verdade!

O Sr. José Gusmão (BE): — O mais estranho de todas estas alterações é um aumento de quase 1000 milhões de euros nas contribuições para a segurança social quando, segundo sabemos, não há qualquer tipo de alteração no cenário macroeconómico e, portanto, na previsão do Governo para a evolução do desemprego, um indicador fundamental para apurar a evolução destas receitas.
Portanto, antes de prosseguir o debate na generalidade do Orçamento do Estado, gostaríamos que o Governo pudesse esclarecer quais as explicações para estas alterações: se se trata, efectivamente, de gralhas sem relevância política ou se há aqui números que foram alterados pelo surgimento de novas medidas ou se há números que foram «martelados» para que o saldo orçamental final pudesse continuar a ser o mesmo.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Muito bem!

O Sr. José Gusmão (BE): — Portanto, antes de prosseguir com o debate, gostaríamos que pudesse haver esclarecimentos por parte do Governo em relação ao conteúdo destas alterações.

Vozes do BE: — Muito bem!

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, também para uma interpelação à Mesa, o Sr. Deputado Duarte Pacheco.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Sr. Presidente, nos mesmos termos, gostaria de pedir, através da Mesa, que nos sejam fornecidas informações sobre a errata que ontem nos chegou.
Sr. Presidente, o Orçamento entrou praticamente no limite do tempo constitucional e uma parte já fora de horas. Foram apresentadas, depois, várias erratas, mas a que recebemos ontem ultrapassa o razoável e merece uma explicação à Câmara, porque aumenta a despesa em mais de 800 milhões de euros.
Sr. Presidente, se aquilo que parece for, ou seja, como é necessário corrigir a despesa em 800 milhões de euros, por milagre a receita aumenta no mesmo montante para que o défice não seja alterado, o Sr. Ministro já tem o problema resolvido para os 500 milhões de euros que diz que o acordo com o PSD possa ter gerado: precisa apenas de aumentar também a receita em 500 milhões de euros, porque, Sr. Ministro, contabilisticamente consegue-se sempre resolver tudo.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Também para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, somos surpreendidos todos os dias com inovações por parte do Governo.
Ontem, por exemplo, durante a primeira parte da discussão do Orçamento na generalidade, o Governo não foi capaz de dizer dentro desta Casa como é que iria compensar os 500 milhões de euros acordados com o

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PSD numa noite da semana passada, mas depois, lá fora, o Sr. Primeiro-Ministro já foi capaz de explicar, mesmo que parcialmente, que essa compensação se faria através da introdução de novas taxas e do resultado de uma concessão de uma mini-hídrica ou uma explicação deste tipo.
A verdade é que, seja qual for a explicação, o Sr. Primeiro-Ministro deu-a lá fora e não cá dentro. Essa é que é a questão.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

O Sr. Honório Novo (PCP): — Quanto à errata, é verdade que este Orçamento tem sofrido vicissitudes várias: chegou atrasado relativamente aos prazos constitucionais e é agora apresentado um conjunto substancial de erratas que exige, para além das explicações por parte do Governo e do Primeiro-Ministro aqui hoje, uma outra ponderação, Sr. Presidente, para a qual chamo a atenção.
Dada a natureza das alterações, não sei se elas podem ser aceites nesta Casa sob a forma de errata ou se o grupo parlamentar que apoia o Governo ou o Grupo Parlamentar do PSD, que está em parceria com o Governo, têm a responsabilidade de apresentar estas alterações sob a forma de propostas de alteração.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. Honório Novo (PCP): — O volume e a natureza das modificações que o Governo pretende corrigir no seu Orçamento não são passíveis de ser aceites desta forma e devem ser introduzidas sob a forma de propostas de alteração. Assim sim, sob a forma de propostas de alteração do Grupo Parlamentar do Partido Socialista ou do Grupo Parlamentar do PSD ou dos dois, porque também podia ser uma assinatura conjunta, poderemos aceitá-las.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma interpelação à Mesa, o Sr. Deputado Pedro Mota Soares.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, na semana passada, o CDS, numa declaração feita antes da ordem do dia pela Sr.ª Deputada Cecília Meireles, alertou a Câmara e o País que no Relatório do Orçamento do Estado faltava um conjunto de quadros e de dados, parte dos quais chegaram ontem.
Sucede, Sr. Presidente, que já na discussão deste Orçamento do Estado, na fase prévia à discussão na generalidade, ouvimos o Sr. Ministro das Finanças e a Sr.ª Ministra do Trabalho confirmarem um conjunto de dados que constavam do relatório inicial. Dou-lhe um exemplo, Sr. Presidente. A Sr.ª Ministra do Trabalho disse, na semana passada, aqui, na Câmara, que o impacto do Código Contributivo nas contas do Orçamento do Estado era de 70 milhões de euros. Hoje, olhando para os dados que constam da errata que o Governo ontem enviou à Câmara, descobrimos que a receita contributiva sobe 982 milhões de euros, isto é, 0,6% do PIB.
Gostávamos de saber, Sr. Presidente, de que Orçamento estamos, afinal, a falar: de um Orçamento que, de acordo com o Relatório inicial e com as palavras do Governo, para os trabalhadores independentes, para os agricultores, para os empresários, para os trabalhadores em geral, tem um acréscimo de uma carga parafiscal de 70 milhões de euros ou, ao contrário, de um Orçamento com um acréscimo de carga fiscal de quase 1000 milhões de euros.
Sr. Presidente, o Governo tem de dar uma explicação à Câmara nesta altura do debate. O que se está a passar não é aceitável. Já não bastava o atraso no envio do Relatório, como ainda temos de discutir um Orçamento com dados que hoje, face às circunstâncias, comprovadamente são errados e, nesse sentido, falsos.
Por isso mesmo, Sr. Presidente, neste momento, o Governo tem de dar uma explicação cabal à Câmara sobre o que se está a passar, senão, objectivamente, estaremos a discutir de forma inquinada este processo orçamental.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

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O Sr. Presidente: — Ainda para uma interpelação à Mesa, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, quero também aproveitar esta interpelação para manifestar profundo desagrado por parte de Os Verdes relativamente ao que se passa em torno da discussão do Orçamento do Estado.
Já não estamos a discutir apenas o Orçamento do Estado e os seus relatórios, mas também as suas erratas. É importante perceber o que é que, de facto, estamos a discutir. Ontem, ao final da tarde, recebemos no nosso mail uma errata com números que são relevantes, Sr. Ministro, porque 830 milhões não é um número qualquer. É-nos dito que entram 800 milhões de euros, que saem 800 milhões de euros, mas é preciso perceber exactamente o que estamos a discutir: ou estamos numa discussão formal ou estamos numa discussão séria.
Já percebi que o Governo tem dificuldade em promover esta discussão do Orçamento do Estado: teve dificuldade em entregá-lo, entregou-o fora de horas, o Sr. Primeiro-Ministro não responde às perguntas que lhe são colocadas, os documentos dão entrada atrasados e a meio da discussão do Orçamento do Estado. No entanto, como representantes dos eleitores, precisamos perceber os números e as orientações que nos são apresentados, assim como os portugueses que seguem esta discussão total ou parcialmente precisam de compreender o que o Governo está, de facto, a apresentar à Assembleia da República.
O Orçamento do Estado não é um documento qualquer. É um documento que tem repercussões muito concretas e, como sabemos, muito negativas na vida das pessoas no ano de 2011. Por isso, impõe-se um esclarecimento cabal. E é muito estranho que o Governo fuja às respostas sobre o Orçamento, sobre os relatórios e sobre as suas erratas. Não pode ser, Srs. Membros do Governo.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e das Finanças.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças (Teixeira dos Santos): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, gostaria de começar por recordar a esta Assembleia que, na passada quarta-feira, na reunião da Comissão de Orçamento e Finanças (COF) e, de facto, na sequência de uma questão suscitada pela Sr.ª Deputada Cecília Meireles, tive oportunidade de informar que iria enviar a esta Assembleia não só algumas informações que a Sr.ª Deputada tinha solicitado, como também algumas rectificações ao Relatório que importava fazer chegar à Assembleia. Essa informação foi enviada ao fim do dia de quinta-feira e seguiu a sua tramitação dentro da Assembleia. Portanto, a informação foi de imediato enviada para que pudesse ser disponibilizada aos Srs. Deputados em tempo para o debate que tem vindo a ocorrer.
Gostaria de chamar a atenção dos Srs. Deputados para um aspecto que me parece importante. Não estão em causa os mapas da lei que vão ser objecto de votação por parte dos Srs. Deputados. Não há alterações aos mapas da lei, não há alterações ao que é objecto de votação desta Assembleia. O que está em causa é a passagem da metodologia de contabilidade pública para contabilidade nacional.
Constatou-se que, na passagem da contabilidade pública à contabilidade nacional, não estava inteiramente reflectida a nova metodologia que entretanto foi preconizada pelo Instituto Nacional de Estatística na nova base que veio a público há dois ou três meses. Em particular, essa nova metodologia obriga a um tratamento diferente da Caixa Geral de Aposentações. Assim, de acordo com essa nova metodologia, há que aumentar a receita contributiva imputada à Caixa Geral de Aposentações por contrapartida no lado da despesa das prestações sociais que não em espécie. Esta é uma alteração de metodologia que mexe no lado da despesa sem alterar o défice. Foi, por isso, necessário proceder, nessa passagem da contabilidade pública à contabilidade nacional, a imputações e reclassificações que alteraram os valores que constavam do mapa inicialmente enviado.
Não há milagres. Não é assim que se resolvem os problemas que temos de resolver. Há, isso sim, reclassificações meramente contabilísticas que são neutras em termos de saldos.

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Chamo a atenção dos Srs. Deputados para o facto de todos os números que referi nas intervenções de ontem — quer em termos de redução da despesa primária na Administração Pública (recordo, quase 4100 milhões de euros), quer em termos de redução, na administração central, dos consumos intermédios e dos subsídios, da ordem dos 1500 milhões de euros, uma redução que representa um corte de 8% entre 2010 e 2011 — terem sido baseados nos números enviados a esta Assembleia e que entretanto foram actualizados.
Foi isso que serviu de base à minha intervenção.
Sem prejuízo de facultar à Assembleia, em particular à COF, uma nota mais pormenorizada sobre este assunto, chamo a atenção para o que disse: primeiro, que não há alteração dos mapas da lei objecto de votação e, segundo, que se trata de fazer reflectir, na passagem da contabilidade pública à contabilidade nacional, a nova metodologia apresentada pelo INE este ano e que não estava inteiramente reflectida, em particular no que se refere ao tratamento da Caixa Geral de Aposentações.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Será feita uma apreciação pela Comissão de Orçamento e Finanças que terá em conta estes esclarecimentos.
Tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, coloquei uma outra questão, que foi a da formalização destas correcções na Assembleia, ou seja, se elas podem ou não ser aceites enquanto erratas, ou se devem (e não é a primeira vez que isso sucede no passado recente) ser consideradas como alterações de facto que têm de ser suportadas pelos grupos parlamentares que apoiam esta proposta orçamental, seja o do PS, seja o do PSD.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Honório Novo, ouvi a sua argumentação, a que não sou de todo em todo insensível, mas devo dizer-lhe que não é o Plenário quem vai dirimir esse assunto. Aliás, tive o cuidado de dizer que deixamos agora a Comissão de Orçamento e Finanças absorver da melhor forma o entendimento mais correcto sobre esta matéria.
Srs. Deputados, vamos prosseguir com a discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 42/XI (2.ª) — Orçamento do Estado para 2011.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Saraiva.

O Sr. Pedro Saraiva (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Ministros, Srs. Deputados: A análise do Orçamento apresentado pelo Governo não pode nem deve passar ao lado da gestão dos fundos comunitários. Estes visam, em síntese, alcançar dois grandes objectivos: por um lado, promover o crescimento económico e, por outro lado, a coesão territorial e social.
Assim sendo, todos os indicadores objectivos mostram que, em Portugal, a aplicação de fundos estruturais está longe de poder ser considerada eficaz. Vivemos hoje num País com maiores assimetrias territoriais e sociais e cuja última década traduz um preocupante definhamento económico.
Porém, o futuro projectado pelo FMI até 2015 não é menos preocupante, apontando para um crescimento económico tão débil que só encontra paralelo, em todo o mundo, na Grécia e na Venezuela.
Estas constatações mostram à evidência como foram precipitadas e irresponsáveis as afirmações efectuadas tanto pelo Primeiro-Ministro como pelo Ministro da Economia quando proclamavam recentemente que Portugal — pasme-se! — era o campeão do crescimento económico.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Bem lembrado!

O Sr. Pedro Saraiva (PSD): — Atitudes de cigarra deste tipo em nada ajudam a ganhar credibilidade junto dos agentes económicos ou dos mercados internacionais! São conhecidos os baixos ritmos de concretização do QREN, que se prevê venha a fechar o ano de 2010 com uma taxa de execução situada na casa dos 20%, objectivo assumido pelo Governo, após múltiplas insistências da nossa parte, e considerado manifestamente insuficiente, entre outros, pelo Conselho

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Económico e Social. Tal mais não representa do que metade do que seria minimamente aceitável e indicia um eventual cenário, no final de 2013, em que perto de 10 mil milhões de euros de fundos comunitários estarão por aplicar, ou seja, quase metade dos valores disponibilizados pela União Europeia.
Face a esta preocupante situação, para que vimos alertando sucessivamente, importa examinar com atenção as perspectivas de evolução na gestão dos fundos comunitários associadas ao Orçamento, o que nos suscita desde logo um conjunto de questões.
Primeira: havendo reforços significativos de verbas destinadas às comissões de coordenação, na casa dos 30 a 50%, bem como de 82%, no caso do IFDR, com a fundamentação de tal corresponder a um incremento de execução dos programas operacionais, estranha-se que não seja apresentada qualquer meta para a taxa de execução do QREN que se ambiciona alcançar no final de 2011. Qual é o valor que o Governo assume pretender alcançar a este nível? Segunda questão: refere o Orçamento que vai ser dado um estímulo adicional aos pólos de competitividade e tecnologia e aos clusters dinamizados pelo QREN.
Por iniciativa do PSD, em sucessivas audições, temos tido oportunidade de ouvir, nesta Casa, os responsáveis destas estratégias de eficiência colectiva, que nos alertaram para os consecutivos atrasos verificados, constantes mudanças de regras, expectativas goradas e manifestas faltas de coordenação, o que se traduz numa concretização dos projectos que é ainda marginal, quase quatro anos volvidos sobre o período de programação financeira. O que vai o Governo fazer para alterar esta situação? Terceira e última questão: caso o bom senso venha a imperar, traduzindo-se numa suspensão imediata do projecto do TGV, qual vai ser a estratégia adoptada pelo Governo no sentido de renegociar os 955 milhões de euros do Fundo de Coesão que a Comissão Europeia já clarificou que podem ser reafectados a outros projectos? Sr. Presidente, ao não inviabilizar este Orçamento, com as alterações previamente acordadas, o PSD, responsavelmente, dá o seu contributo para evitar que o País se aproxime ainda mais do abismo a que o PS tem vindo a conduzir-nos, através do desgoverno que nos governa, por via de um Governo desgovernado, ao qual apresentamos, nós e o povo português, aqui e agora, um claríssimo «cartão amarelo»! Desejamos que o saiba interpretar com a humildade democrática que tanto lhe tem faltado.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Paulo Correia.

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O País discute o Orçamento do Estado provavelmente mais importante e determinante da nossa democracia, e isso tem tudo a ver com a actual conjuntura económica.
Portugal enfrenta um momento crucial, um momento de coragem e de determinação, um momento de respostas firmes e consequentes.
Os portugueses querem saber que melhor resposta pode ser dada para se ultrapassar este momento particularmente difícil que vivemos. Significa isto que os portugueses olham com especial atenção para este Orçamento, um Orçamento difícil para uma conjuntura extremamente difícil.
Contudo, olhar para este Orçamento e desenquadrá-lo da situação internacional, para além de irresponsável, é seguir o caminho mais fácil, é não encarar a dura realidade que, nos últimos anos, tomou conta da economia mundial.
Não adianta fingir. Não adianta ignorar a realidade. A crise económica que assolou o nosso país não teve origem interna. Portugal sofreu o efeito de contágio, a exemplo da Europa e da zona euro.
A verdade maior é que Portugal, a Europa e o mundo enfrentam a crise económica mais grave dos últimos 80 anos. Fechar os olhos a esta realidade é entrar em sessões de populismo barato e dizer o seu contrário é não querer compreender a realidade em que vivemos, é não compreender a Europa, é não compreender o mundo.

Aplausos do PS.

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Mas vamos aos factos: como consequência da crise económica, o ano orçamental de 2009 foi diferente para todos os países — para as economias avançadas, para os países em vias de desenvolvimento, para a União Europeia e para a zona euro.
Imperou a política orçamental expansionista. Em 2009, quase todos os países entraram em défice excessivo e viram a respectiva dívida pública derrapar para níveis elevados. Portugal não foi diferente; o Orçamento de 2009 pautou-se pelo combate à crise, pela ajuda às famílias e às empresas. Foi um remédio para atenuar os efeitos da crise.
A subida do défice orçamental, em 2009, para 9,3% explica-se desta forma. Mas explica-se desta forma não só para o nosso país, mas também para a Europa e para a economia mundial.
Pese embora 2009 ter sido um ano negro para a economia mundial, o facto é que o recuo do PIB português foi menor que a média europeia, bem como o défice orçamental esteve abaixo da média dos défices orçamentais dos congéneres europeus.
Já em reacção, o ano orçamental de 2010 apresentou-se, à escala europeia e mundial, com dois objectivos centrais: a consolidação das contas públicas e o relançamento da economia.
A Europa tem prosseguido convictamente estas metas, mesmo quando teve de responder às situações mais adversas, ou seja, à instabilidade dos mercados financeiros, instabilidade essa resultante da crise da dívida soberana da Grécia e, mais recentemente, da Irlanda.
Foi assim que um vasto conjunto de países da União Europeia avançou, em Maio passado, com as medidas do chamado PEC 2 e, mais recentemente, com as medidas do chamado PEC 3.
Foram tomadas medidas de austeridade, é certo. Foram tomadas medidas de subida da receita fiscal e de cortes na despesa. Mas acreditamos que foram tomadas as melhores respostas perante as ameaças à nossa economia.
Recorde-se que, para 2010, o Governo apresentou um Orçamento assente em dois objectivos principais: reduzir o défice e promover o crescimento económico e, sobre estes objectivos, ouvimos as maiores suspeitas, desenharam-se os cenários mais pessimistas e fizeram-se as conjecturas mais deprimentes.
Porém, olhando as estimativas mais recentes, em 2010, o défice vai reduzir para 7,3% e o PIB vai crescer acima de 1%.

Aplausos do PS.

Aqui está um bom argumento para adocicar os mais pessimistas, dizendo-lhes também que o Orçamento do Estado para 2010, as medidas do PEC 2 e estas medidas do PEC 3 mereceram a chancela das instituições europeias e internacionais da matéria.
Srs. Deputados, o quadro económico dos últimos dois anos, centrado na crise mais grave dos últimos 80 anos, é o verdadeiro ponto de partida do Orçamento para 2011.
Não é, como faz crer toda a oposição, uma crise que começou em Portugal e que, por acaso, coincide com uma tal de crise mundial! Desenganem-se de vez, a crise que nos afecta é uma crise transversal a todos os povos europeus.

Aplausos do PS.

Vivemos, portanto, um momento muito exigente que impõe um Orçamento muito difícil.
Acreditamos que este Orçamento é a melhor resposta às ameaças que se têm colocado à nossa economia.
É um Orçamento de responsabilidade com os portugueses.
É um Orçamento que tem a coragem de assumir a responsabilidade de forma determinada.
Nestes termos, o Governo propõe à Assembleia da República um Orçamento do Estado para 2011 assente em dois objectivos principais: reforçar a consolidação das contas públicas e garantir o financiamento da nossa actividade económica.
O cumprimento destes objectivos assegurará, certamente, a sustentabilidade das políticas públicas e evitará a paragem da economia e o agravamento do desemprego.
O objectivo orçamental passa por reduzir o défice para 4,6% do PIB, num horizonte em que a previsão de crescimento do PIB ronda os 0,2%.

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Para tal, o contributo da despesa representa 2/3 do esforço da redução do défice.
Face a 2010, a despesa total cai 5,3%, a despesa corrente primária cai 6,2%, a despesa primária cai 7,3% e os consumos intermédios caem 4,4%.
É um Orçamento que dá continuidade à redução da despesa da administração central.
Ainda do lado da despesa, destacam-se as medidas de reorganização e racionalização do sector empresarial do Estado, nomeadamente fusão e extinção de algumas empresas públicas não financeiras.
Neste sentido, este Orçamento introduz um corte de 5% no vencimento dos gestores públicos, elimina os prémios dos gestores até 2013 e reduz em um quinto as chefias e os lugares dos conselhos de administração.
Este Orçamento introduz também uma redução de 15% nas despesas de funcionamento dessas empresas públicas não financeiras e reduz o seu limite ao seu endividamento, limite que será gradualmente reduzido até 2013.
Do lado da receita, o Orçamento segue a linha fiscal iniciada este ano, nomeadamente quando o Governo avançou com a criação do imposto sobre as mais-valias bolsistas e com a criação de um novo escalão máximo de IRS com a taxa de 45%.
Neste Orçamento, o aumento da receita contribui para cerca de um terço do esforço de redução do défice orçamental, sendo de assinalar um conjunto de medidas de justiça social e de equidade fiscal tais como: a entrada em vigor do novo código contributivo; a criação de impostos extraordinários sobre a banca, tanto o imposto que irá recair sobre o passivo bancário como o que irá recair sobre o valor nacional dos instrumentos financeiros derivados fora do balanço;»

Aplausos do PS.

» a tributação sobre todos os rendimentos de capital que sejam depositados nas chamadas contas ocultas; a subida da taxa de IMI para 5%, a pagar pelos donos de prédios sediados em offshore; a contribuição extraordinária de 10% para as pensões acima dos 5000 € sobre o valor que exceda esse montante;»

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Bem lembrado!

O Sr. João Paulo Correia (PS): — » e o aumento da restrição á isenção de imposto sobre as mais-valias sem domicílio no país, medida dirigida às SGPS.
Acreditamos neste Orçamento, sobretudo porque este é o Orçamento de que o País precisa na actual conjuntura para consolidar as contas púbicas, de modo a garantir o normal financiamento da nossa economia, isto é, das empresas e das famílias.
Os tempos que vivemos exigem o melhor dos políticos e da classe política, isto é, dos partidos políticos e dos seus dirigentes.
Pois bem, o PS e o Governo, mais uma vez, não fogem às suas responsabilidades. Agora, como no passado, o Governo faz aquilo que se exige num cenário adverso, que é tomar as medidas necessárias, mesmo que impopulares, de forma a salvaguardar o interesse nacional.
Recorde-se que, em 2005, quando o PS formou Governo, o País vivia uma situação de défice excessivo, fruto de uma desastrosa governação da coligação de direita PSD/CDS. E essa derrapagem orçamental não surgiu numa conjuntura parecida com a que vivemos hoje.
Em 2005, a situação orçamental portuguesa caminhava em terreno excessivo, ao mesmo passo que a Europa e o Mundo não derrapavam as suas contas públicas e ao mesmo passo que a economia mundial prosseguia em terreno de crescimento.
Agora, como nessa altura, o Governo vê-se na contingência de tomar medidas duras para as empresas e para as famílias; agora, como nessa altura, o Governa cumpre o papel que se lhe exige, em nome do interesse nacional.
É que, quando está em causa o interesse nacional, um governo, qualquer que ele seja, tem de assumir a responsabilidade dos tempos.
O nosso país precisa de um Orçamento. Os portugueses sabem e querem a viabilização deste Orçamento.
Mas o que vemos neste Parlamento? A direita populista juntou-se à extrema-esquerda e recusaram, preliminarmente, a viabilização do Orçamento do Estado para 2011.

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O PSD fez um acordo com o Governo, mas, de seguida, veio logo dizer que se trata de um mau Orçamento, que não se sente minimamente comprometido, e, depois, entra no debate na generalidade com um discurso surpreendentemente agressivo, ao melhor nível do radicalismo do Bloco de Esquerda.
Neste debate, muitas dúvidas têm sido lançadas em relação ao cumprimento da meta orçamental de 4,6% e ao ligeiro crescimento económico de 0,2% do PIB. Muitas vezes essas dúvidas são oriundas da direita, do PSD e do CDS, que, na sua última governação, mais concretamente em 2003, levou o País a uma recessão, em contraciclo com o desempenho económico da zona euro, da União Europeia e da economia mundial. Ou seja, a recessão de 2003 não coincidiu com qualquer crise, a não ser a crise da má governação da direita.

Aplausos do PS.

Tendo em conta a execução orçamental em curso e as estimativas mais recentes acerca do crescimento do PIB para 2010, o benefício da dúvida corre a favor de quem já demonstrou estar à altura desta grande responsabilidade.
As posturas deprimentes e os discursos depressivos não vencem crises em parte alguma.
O Orçamento do Estado para 2011 não abandona o investimento, prossegue os investimentos na rede escolar, o maior investimento público em obra no País, nos equipamentos sociais e nas infra-estruturas de transporte, de passageiros e de mercadorias.
É um Orçamento que mantém o apoio às empresas e é um Orçamento de grande coragem e determinação.
Este Orçamento irá assegurar o normal financiamento da nossa actividade económica e, com isso, evitar a paragem da economia e o agravamento do desemprego.
É o Orçamento que se impõe na actual conjuntura, a exemplo da linha orçamental dos nossos congéneres europeus.
É um Orçamento de sustentabilidade e, por isso, é o melhor caminho para a defesa do Estado social, a bem de Portugal e dos portugueses.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Menezes.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Paulo Correia, trouxe-nos aqui algumas questões que são de relevar.
Começo por referir que, no seu discurso, disse que este Orçamento evita o agravamento do desemprego.
Ora, até dentro das perspectivas macroeconómicas deste Governo, que todos sabemos que não são nada realistas, este Orçamento prevê um agravamento do desemprego. Portanto, este Orçamento, com estas perspectivas macroeconómicas, com as quais ninguém concorda, até prevê o agravamento do desemprego.
Mas, porque falou da direita populista e do populismo barato, gostava de lhe perguntar se não considera que populismo é dizer, antes das eleições, que os idosos vão ter medicamentos grátis e, depois das eleições, retirar esse benefício; que populismo é dizer, antes das eleições, que não vai haver portagens e, depois das eleições, colocar portagens; que populismo é, antes das eleições, haver uma proposta para cheques-bébé e que, depois das eleições, acabar por nunca «nascer».

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Paulo Correia.

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Menezes, agradeço a sua questão e começo por lhe responder resgatando um slogan que é tão caro ao PSD, que é «política de verdade».
A verdade é que o Sr. Deputado não foi capaz de se defender ou de defender a sua bancada e o seu partido das diversas acusações que foram avançadas relativamente à má prestação orçamental que os

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senhores tiveram no ano de 2005, quando o PS ganhou as eleições e herdou o País nas circunstâncias que todo o povo conhece.

Aplausos do PS.

A verdade é que foi incapaz de contestar a acusação que foi lançada, há pouco, ao PSD de que, no ano de 2003, levou o País a uma recessão, quando a Europa e o mundo caminhavam em crescimento económico.
Estava à espera que o Sr. Deputado viesse elogiar as medidas inscritas no Orçamento do Estado para 2011 em sede do sector empresarial do Estado, porque é recorrente o PSD vir pedir ao Governo para disciplinar e para adoptar medidas de racionalização, de reorganização e de sustentabilidade financeira nesse sector. O Sr. Deputado não se pronunciou em relação a essa matéria, mas quero recordar-lhe, mais uma vez, que este Orçamento do Estado propõe a redução de 5% dos vencimentos dos gestores, um corte de 15% nas despesas de funcionamento, um corte de 20% nas despesas com horas extraordinárias, uma redução de um quinto nos lugares de chefia e dos conselhos de administração do sector empresarial do Estado, como também aumenta o limite ao endividamento das empresas públicas do sector não financeiro.
Também estava à espera que o Sr. Deputado, em abono da tal «política de verdade», que serviu de chavão nas eleições legislativas de 2009, viesse dizer que outros países da Europa estão a adoptar a mesma postura orçamental de Portugal, como a Grécia, a Itália, a Espanha e a Irlanda, que congelaram e reduziram salários. Este Orçamento não aumenta a idade de reforma, como fazem países como a França e a Grécia. Há países que aumentam o IVA, como o Reino Unido, a Grçcia, a Espanha e a Irlanda,»

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — E Portugal!

O Sr. João Paulo Correia (PS): — » e outros que aumentam o IRS, como a França, e outros ainda, que fazem cortes drásticos no emprego público, como a França, que pensa despedir 100 000 funcionários, e o Reino Unido, que pensa despedir cerca de 500 000.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — E o cheque-bébé?! E os medicamentos grátis?!

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Significa isto, Sr. Deputado, que algumas medidas inscritas em sede de Orçamento do Estado são positivas e essas a bancada do PSD devia enaltecê-las. As propostas inscritas em sede de Orçamento do Estado contribuem, certamente, para a consolidação orçamental e para a sustentabilidade das contas públicas, isto tudo em abono da «política de verdade».

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Nós somos daqueles que consideramos que, de facto, os portugueses já não têm paciência para os políticos que querem fugir às suas próprias responsabilidades.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. António Filipe (PCP): — Os portugueses já não têm paciência para os políticos que se refugiam em meros confrontos verbais, para não terem de discutir o essencial que deve ser discutido e, sobretudo, para não serem confrontados com as suas próprias responsabilidades na situação a que o País chegou e que está bem espelhada nesta proposta de Orçamento que aqui é discutida.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

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O Sr. António Filipe (PCP): — Não temos paciência para esses discursos aqui, na Assembleia da República, nem para discursos proferidos através dessa nova ferramenta utilizada para conferências de imprensa tipo toca-e-foge, que são as páginas do Facebook.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Em política não há inevitabilidades, em política há escolhas. Este Orçamento do Estado não é uma inevitabilidade com que o País esteja confrontado. A aprovação desta proposta de Orçamento do Estado é uma opção deste Governo e a sua viabilização é uma opção do PSD. São opções políticas de fundo que ambos os partidos compartilham.
Os portugueses não podem aceitar que o País seja governado não por aqueles que foram eleitos mas, sim, pelos ditos mercados financeiros. Os mercados financeiros não respondem politicamente perante os portugueses, são os governos que respondem politicamente pela forma como enfrentam as ameaças que impendem sobre a economia portuguesa, incluindo as ameaças ditadas pelo capital especulativo que ataca a economia portuguesa.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. António Filipe (PCP): — O Governo não pode fugir às suas responsabilidades! Ao fim de seis anos de Governo do Partido Socialista, quase cinco dos quais em maioria absoluta, o Governo vem aqui apresentar uma proposta de Orçamento do Estado, cuja responsabilidade pretende imputar exclusivamente a factores externos. Não é aceitável! O Governo sabe que este Orçamento é péssimo, sabe que este Orçamento penaliza duramente a maioria dos portugueses, em particular aqueles que têm menos capacidade económica, mas pretende imputar todas as responsabilidades à dita crise internacional.
Só que o que é evidente é que a crise não é para todos. Ainda hoje vieram a público os lucros das maiores empresas portuguesas. Ficámos a saber que os quatro maiores bancos privados portugueses tiveram, nos primeiros nove meses de 2010, um lucro de 1122 milhões de euros.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Um escândalo!

O Sr. António Filipe (PCP): — Ou seja, os quatro maiores bancos privados portugueses lucram em cada dia que passa — sublinho, em cada dia que passa — 4,1 milhões de euros.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É a crise!

O Sr. António Filipe (PCP): — A PT lucrou 5617 milhões de euros nos primeiros nove meses do ano, o que corresponde a um aumento de 1407% em relação a igual período de 2009.
A BRISA lucrou 401,7 milhões de euros, o que corresponde a mais de 282% do que no ano passado.
A Galp lucrou 266 milhões de euros, o que corresponde a mais 48,5% do que no ano passado.
A Portucel lucrou mais 154, 3 milhões de euros.
A Jerónimo Martins lucrou mais 193 milhões de euros.
E, entretanto, a cobrança do IRC, na previsão do Governo, baixa 2,7%. Como é que isto é aceitável, Srs.
Membros do Governo?!

Aplausos do PCP.

Não é aceitável, de forma alguma, quando os portugueses vão ser privados de prestações sociais, que muita falta lhes fazem e que muito os vão prejudicar, e quando são feitos cortes na educação, na saúde, na segurança social e nas prestações sociais.
Bem se compreende o empenho que os banqueiros tiveram na aprovação deste Orçamento. Bem se compreende, porque este é o Orçamento da crise, mas a crise tem beneficiários e a crise não é para todos!

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O Orçamento contém medidas duras para os trabalhadores, para os desempregados, para os reformados, para as camadas sociais mais desfavorecidas. Mas, como se vê, os bancos e as maiores empresas não só não se queixam da crise, como beneficiam com ela.
Os senhores conduziram o País à situação em que se encontra. São inteiramente responsáveis por todas as opções de política económica que tiveram nestes últimos anos, pela situação em que o País se encontra, e têm de assumir total responsabilidade pelo Orçamento que aqui apresentam.
Este é um Orçamento censurado pelos portugueses, que se sentem ultrajados com esta proposta e que sentem que este Orçamento é, verdadeiramente, uma espoliação, um atentado às condições de vida dos portugueses mais desfavorecidos.
Os senhores sabem isso, mas não podem fugir às responsabilidades que têm perante o País e perante os portugueses!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento.

O Sr. Ministro da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento (Vieira da Silva): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O debate acerca do Orçamento do Estado para 2011 é um debate acerca da responsabilidade. Poucas vezes esta afirmação fez tanto sentido.
Quando o nosso país enfrenta sérias ameaças à capacidade de financiamento externo da nossa economia, falamos de responsabilidade: responsabilidade para com o Estado e as políticas públicas ameaçadas na sua profundidade e sustentabilidade; responsabilidade para com as nossas empresas que defrontam problemas de crédito e de financiamento que afectam o investimento e as exportações; responsabilidade para com as famílias, que vêem perigar o seu equilíbrio em lermos de endividamento e enfrentam as duras consequências do desemprego.
Mas há uma verdade que nenhuma reflexão séria pode afastar, nenhuma demagogia pode ultrapassar: sem que Portugal confirme a seriedade e a credibilidade do seu compromisso com o reequilíbrio das contas públicas, não poderá responder à crise de financiamento externo.
Portugal, membro da União Europeia e da zona euro, e ambicionando ser parte inteira desta Europa a que nos ligámos por opção, não tem neste momento opção distinta dessa. Ou melhor, se escolhesse outra que não essa, estaria a escolher definitivamente a subalternidade, a marginalização e o atraso económico e social.

Aplausos do PS.

Não, Sr.as e Srs. Deputados, hoje não falamos de obsessão com o défice, falamos de fidelidade aos melhores interesses do nosso presente e do nosso futuro. É por isso que falamos de responsabilidade quando falamos de Orçamento.
O Governo não receia nem se esconde do debate acerca do passado, acerca das razões que nos conduziram à urgência que enfrentamos, e para vos dizer, olhos nos olhos, que esse passado nos dá razões para acreditarmos que iremos ultrapassar esta crise, porque nada nem ninguém pode esconder que o nosso país já mostrou que é possível assumir e cumprir um programa de estabilidade e crescimento.
Fizemo-lo entre 2005 e 2007. Sim, é verdade! Nesse período, Portugal atingiu três grandes objectivos que tinha assumido e nos quais muitos não acreditavam: reduziu o seu défice público para 2,6% do PIB, e fê-lo com um forte controlo da despesa pública; recuperou a capacidade de crescimento e, principalmente, através da melhoria competitiva e exportadora que nos pôs, em 2007, a crescer a 2,4%, como há muito não acontecia; lançou reformas estruturais de profundo alcance para a sustentabilidade do crescimento — na ciência, na energia, na protecção social.
Eram essas as três grandes exigências — o défice, a recuperação do crescimento, a sustentabilidade da protecção social. Eram essas as exigências, e alcançámo-las.
Compreendo que, para a oposição, para um certo tipo de oposição, seja difícil reconhecê-lo.

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Protestos do PCP.

Mas hoje, face aos desafios e dificuldades que enfrentamos, reconhecer o que o País conseguiu recentemente já não é um mero debate político-partidário. Afirmar que sabemos equilibrar as contas públicas é um activo que temos o direito e o dever de jogar a nosso favor nas batalhas que hoje travamos.

Aplausos do PS.

Não, Sr.as e Srs. Deputados. Já não é um activo de um qualquer governo. É um activo de todo o País, particularmente neste exigente contexto europeu e internacional.
E aqueles que recusam valorizar esse activo, aqueles que o escondem, não servem o País, não servem a economia, não servem o emprego. Estão reféns das vistas curtas das suas ambições partidárias. Confundem os seus interesses com o interesse do País, e assim não servem Portugal.

Aplausos do PS.

É certo que a crise que vivemos nos afastou para outros e mais difíceis desafios. E é a eles que temos de dar hoje resposta.
De 2008 para 2009 o nosso défice das contas públicas cresceu muito, cresceu excessivamente, como, aliás, na generalidade dos países europeus.
Mas falemos claro e com números Desse crescimento do défice, 44% deveu-se à redução das receitas de natureza fiscal como resultado da contracção da actividade económica, 32% ao crescimento das prestações sociais, quer as que crescem automaticamente, quer as que foram fruto de políticas de amortecimento dos efeitos da crise e 17% ao aumento das despesas de capital, ao aumento do investimento. São estas as causas do agravamento do défice de 2008 para 2009.
Pergunto: quem é que aqui, na Assembleia da República, fez diferente em 2009 senão propor mais despesa, mais apoios, extensão das prestações sociais?

Aplausos do PS.

Quem é que aqui, da direita à esquerda, fez diferente dessas propostas? Quem é que aqui, nesta Assembleia, fez diferente de criticar o que diziam ser a escassa execução do programa de investimento e emprego? Tantas vezes é tão curta a memória e tão grande o despudor das bancadas de alguma oposição.

Aplausos do PS.

Mas, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, o Orçamento trata do futuro e a questão decisiva é a da responsabilidade Vozes várias, vindas por vezes de áreas surpreendentes, sugerem que o esforço de consolidação deveria ser mais lento, mais demorado. Talvez. Seria, decerto, mais fácil. Mas, infelizmente, não vivemos nesses tempos de facilidade.
Hesitar agora, na conjuntura que vivemos, sujeitos que estamos a um escrutínio duro, porventura injusto, mas tremendo nos seus riscos, seria mais que uma aventura, seria verdadeiramente «jogar aos dados» com o futuro da nossa economia, seria «jogar aos dados» com uma boa parte do futuro da nossa sociedade.

Aplausos do PS.

É por isso que ninguém tem coragem para apresentar uma séria alternativa ao esforço de consolidação que é proposto no Orçamento do Estado para 2011, simplesmente porque não a têm.

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20 | I Série - Número: 021 | 4 de Novembro de 2010

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Alguns falam na ausência de política económica no Orçamento do Estado. Esta é uma afirmação oca e puramente retórica.
Que outra coisa é o esforço de diminuir a dependência energética externa que asfixia o nosso potencial de crescimento senão política económica? Que outra coisa é o continuado investimento em ciência e tecnologia senão politica económica? E a continuação do apoio ao crédito para as pequenas e médias empresas, a criação de novas condições para a capitalização das empresas, o apoio aos nossos pólos de competitividade e as estratégias de eficiência colectiva, que outra coisa são senão apoio estratégico à modernização e competitividade da economia? Que outra coisa são senão política económica? Mas sejamos claros: hoje, não colocar o sucesso da consolidação orçamental como opção central da política económica significa nada entender da situação que vivemos. Ou, pior ainda, significa a ausência de coragem em assumir os custos do que temos de fazer.
Para a oposição, em particular a de direita, afirmar que são alternativa é fácil, é expressão de uma legítima ambição do poder, mas também de oportunismo no aproveitamento das dificuldades e da necessidade de assegurar tantas vezes o poder partidário interno.
Mas ser verdadeiramente alternativa é bem diferente. É estar à altura das responsabilidades dos tempos, das exigências do interesse nacional, é ter a coragem de o prosseguir sem vacilar.
O que o PSD e o CDS-PP aqui demonstraram foi claro e relativamente simples: a obsessão em não reconhecer o profundo impacto da crise financeira internacional sobre as economias dos países desenvolvidos, em particular dos países periféricos da União Europeia, e sobre as políticas públicas para os próximos anos; o oportunismo, quando afirmam «a preocupação pelo interesse nacional» ao mesmo tempo que se torna por demais clara a vontade, a pulsão, por uma crise política que lhes permita preparar um sonhado regresso ao poder a qualquer custo; mas, acima de tudo, uma profunda falta de coragem em não assumir a exigência e a dureza da conjuntura e das medidas que se impõem.

Aplausos do PS.

Acenam aos portugueses que há um caminho fácil, indolor até, para a consolidação das contas públicas; uns cortes aqui ou ali, nuns grupos mal-amados pela opinião pública, e o problema estaria resolvido. Nada mais falso, claro, num país em que mais de 70% da despesa pública se dirige a prestações sociais e a salários dos trabalhadores da Administração Pública.
Não têm credibilidade para falar de consolidação orçamental, de disciplina e rigor os mesmos actores que tiveram a oportunidade de a concretizar e falharam. Falharam nos instrumentos, falharam nas políticas e falharam nos resultados.

Aplausos do PS.

Este é um debate acerca de alternativas e de propostas. E todos sabemos que poucos debates são tão nobres na vida democrática como o debate orçamental.
Este é o espaço e o momento para debater alternativas, mas também para concertar opções. O Governo já demonstrou e reafirmou a sua disponibilidade para o fazer, mas que ninguém duvide que hoje, como poucas vezes no passado, o País precisa que os seus representantes saibam colocar o interesse geral à frente dos interesses particulares, saibam valorizar a importância de Portugal ter um orçamento e não um qualquer orçamento, mas um orçamento que seja um instrumento útil para enfrentarmos os desafios da urgência. Não o compreender é penalizar fortemente as condições para o sucesso, neste momento tão exigente para a nossa economia e para a nossa sociedade.
Portugal precisa não apenas de um orçamento aprovado, é também de sinais claros de que há condições para o cumprir. É essa a responsabilidade que todos temos de assumir, que o Governo assume como um dever, mas também como uma ambição, não receando o julgamento dos portugueses e acreditando em Portugal.

Aplausos do PS.

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O Sr. Presidente: — Inscreveram-se cinco Srs. Deputados para pedir esclarecimentos.
Em primeiro lugar, tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Lopes.

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Economia, o senhor não tem qualquer dúvida sobre o golpe brutal que significa este Orçamento para o mercado interno. Aliás, eu diria que quaisquer adjectivos que possamos utilizar são eufemismos comparados com aqueles que o Sr. Ministro, enquanto Deputado Vieira da Silva, na oposição, utilizou para caracterizar outros orçamentos.
O Sr. Ministro não tem também qualquer dúvida sobre os impactos desta restrição, desta brutal contracção do mercado interno para o sector produtivo e para as pequenas empresas, a imensa maioria do tecido económico português, que vive e trabalha para este mercado interno.
O Sr. Ministro também igualmente, até porque hoje já aqui o ouviu, que enquanto se verifica este afundamento na generalidade do tecido económico português há um conjunto de grandes empresas, as empresas do PSI 20, que continuam a afixar — afixaram nos primeiros nove meses deste ano — uma evolução dos lucros bastante apreciável. Podemos dizer que são empresas que passam ao lado da crise, estando entre elas as principais empresas do sector energético, concretamente a EDP, a REN e a Galp.
Ora, o Sr. Ministro sabe que aliviar os preços e as tarifas da energia poderia ser uma boa contribuição para aliviar a situação das pequenas e médias empresas portuguesas e, inclusive, poderia ser uma ajuda à competitividade de empresas nacionais, das empresas que exportam, cujo nome os senhores tantas vezes invocam, empresas essas que, em termos de competitividade, teriam muito a ganhar com o abaixamento dos preços dos combustíveis e das tarifas da electricidade e do gás.
Por isso, pergunto-lhe, Sr. Ministro: que medidas estão previstas no Orçamento do Estado ou que o Governo tenha em curso para aliviar a factura de energia das pequenas empresas e dos sectores produtivos? Não é, certamente, com a privatização da Galp, da EDP e da REN que tal vai acontecer, mas o Sr. Ministro sabe que esse alívio de custos na factura de energia nem sequer teria repercussão no Orçamento do Estado, ou seja não teria repercussão naquilo que vos aflige, na despesa pública.
Sr. Ministro, vai o Governo travar os brutais aumentos do gás natural para o sector industrial? Vai travar o aumento de 3,8%, previsto para a electricidade, para os consumidores domésticos — não se sabe quanto para os sectores industriais? Vai pôr fim ao escândalo dos preços da gasolina, do gasóleo, do fuel e da nafta para os sectores industriais?

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Soares.

O Sr. Pedro Soares (BE): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.
Ministro da Economia, Vieira da Silva, responsabilidade» É verdade! Esta proposta de lei do Orçamento do Estado para 2011 reduz os rendimentos da generalidade da população portuguesa — esta é uma questão de responsabilidade! Perto de 2 milhões de reformados verão as suas reformas congeladas — é uma questão de responsabilidade! Os trabalhadores da função pública sofrerão cortes salariais graves — é uma questão de responsabilidade! A acção social escolar e o abono de família deixarão de ser atribuídos a centenas de milhares de famílias — é uma questão de responsabilidade! A população verá os seus rendimentos diminuídos pela via de um aumento brutal do IVA, que afectará, principalmente, as famílias de menores recursos — é uma questão de responsabilidade! Este é um Orçamento que nos leva para uma situação de grave austeridade, que atinge, sobretudo, as famílias de menores recursos na nossa sociedade, que provoca um processo recessivo na nossa sociedade, que degradará a nossa economia e que levará ao aumento do desemprego — é uma questão de responsabilidade, Sr. Ministro! Mas, mesmo mantendo o objectivo da consolidação orçamental que o Governo propõe, queria questionar o Sr. Ministro sobre se não seria possível optar por, em vez de tantos sacrifícios, sempre para os mesmos, por outro tipo de medidas, que aumentassem o rendimento, que aumentassem a receita e que permitissem enfrentar a situação de crise, sem que sejam sempre os mesmos a sofrer.

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Sr. Ministro, depois de a administração da PT ter anunciado ao País que vai proceder a um pagamento de dividendos extraordinários aos seus accionistas no valor de 1500 milhões de euros, resultantes do encaixe da venda da Vivo no Brasil, bem como ao aumento de dividendos ordinários por acção já a partir do próximo ano, a questão que se coloca, Sr. Ministro, é a de saber, em definitivo, se o Governo está ou não determinado em cobrar à PT a respectiva receita fiscal em sede de IRC devida pelas mais-valias dessa venda, que poderá ultrapassar os 1000 milhões de euros, poupando, dessa forma, mais sacrifícios aos portugueses, mais sacrifícios às famílias em pior situação económica, em vez de estar, constantemente, a massacrar com mais sacrifícios aqueles que sempre têm pago a crise com os seus próprios sacrifícios.
Afinal, de quem é a responsabilidade, Sr. Ministro? Este Orçamento devia ter uma responsabilidade: proteger, em primeiro lugar, os portugueses, as famílias com mais dificuldades, mas tudo indica, Sr. Ministro, que o que este Orçamento pretende é proteger os grandes accionistas da PT.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Henriques.

O Sr. Almeida Henriques (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, Srs.
Ministros, Sr. Ministro da Economia, de facto, nunca vivemos um período tão difícil para, por um lado, concertar a consolidação das finanças públicas e, ao mesmo tempo, podermos dar o élan à economia para conseguirmos exportar mais e também para conseguirmos fazer a substituição de produtos importados por produtos nacionais.
Este é, claramente, o desafio que hoje temos, desafio difícil para o Governo e para todos aqueles que estão envolvidos no tecido económico e sobretudo muito difícil para as empresas.
Aquilo que quero dizer ao Sr. Ministro da Economia é que, na sua intervenção, faltou a resposta concreta a questões que os portugueses esperavam ver respondidas na sua intervenção.
Na verdade, mais de 99% das nossas empresas são micro, pequenas e médias empresas e a grande maioria vive, talvez, o período mais difícil das suas vidas, estando alguns empresários e comerciantes a delapidar o património que foram consolidando ao longo dos tempos, porque o negócio está mau e todos os dias as pessoas definham nas suas actividades.
E aquilo que as pessoas esperavam da intervenção do Sr. Ministro da Economia era que respondesse a questões concretas como estas: como é que se ajuda a resolver o problema do acesso ao crédito por parte destas empresas? Como é que se pode minorar os spreads, que já chegam a 10% e que sufocam qualquer actividade, pois nenhuma delas dá lucro necessário para poder suportar estas situações? Aquilo que se esperava, hoje, da intervenção do Sr. Ministro da Economia era que nos viesse dizer como é que quer atingir os 7,3% de aumento das exportações e se, finalmente, vai colocar no terreno os instrumentos que anuncia há mais de um ano e que, efectivamente, permitiriam alavancar a economia. Estou a referi-me, por exemplo, aos seguros de crédito às exportações e ao fundo para a internacionalização da economia portuguesa.
Sr. Ministro da Economia, aquilo que também se esperava hoje da sua intervenção era que nos viesse dizer como é que vamos ajudar a revitalizar os centros históricos das cidades que albergam muitos desses comerciantes, que todos os dias vêem a sua actividade a definhar e a ir por água abaixo.
Esperávamos também que nos dissesse como é que vai inverter a política do Governo das compras através da Central de Compras do Estado, que, cada vez mais, privilegia os grandes grupos económicos, as grandes empresas, e deixa de fora todas as micro empresas. Aliás, qualquer dia, para uma autarquia comprar um café tem de o fazer através da Central de Compras.
Eram respostas a estas questões que nós esperávamos hoje ouvir. E, Sr. Ministro, não nos venha falar dos clusters e dos pólos. Obviamente que essa é uma política importante e estruturante, mas o meu colega Pedro Saraiva, em intervenção anterior, referiu o resultado que apurámos nas audições que fizemos em sede da Comissão de Economia: dois anos perdidos, dois anos sem ritmo, muita propaganda e muito poucas concretizações.

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Infelizmente, tem sido essa a marca deste Governo. Por vezes, até anuncia situações que podiam ser boas se fossem concretizadas, mas pior do que o anúncio é haver um anúncio que cria expectativas e que, depois, não se concretiza.
Sr. Ministro da Economia, deixo-lhe só uma pergunta: como é que pretende ajudar a economia portuguesa a incrementar as exportações? Como é que pretende ajudar a economia portuguesa e as empresas a acederem ao crédito, a terem taxas de juro mais justas e, sobretudo, como é que elas podem resolver os graves problemas que hoje têm no seu dia-a-dia?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.
Ministro da Economia, em primeiro lugar, quero dar-lhe nota da satisfação que temos em vê-lo nesta Casa e neste edifício. No último mês e meio, tentámos por diversas vezes que V. Ex.ª aqui viesse para discutir um assunto que, para nós, é da maior importância: a abertura da União Europeia ao mercado dos têxteis do Paquistão, abertura essa que põe em risco todo o sector que representa 11% das exportações portuguesas.
Mas o Sr. Ministro não veio.
V. Ex.ª não veio, nem mesmo tendo sido aprovada a sua vinda por todos os partidos, incluindo o PS.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Foi lamentável, Sr. Ministro! Por isso, cumprimento-o por estar aqui agora.
V. Ex.ª vem um pouco nesse seu estilo de comentador político mais recente e, substituindo o papel de malhador, que em tempos foi do agora Ministro da Defesa, continua a atacar a oposição usando expressões como «despudor», por aí fora» Sr. Ministro, o que vejo neste Orçamento, designadamente na parte económica, na parte que lhe diz respeito, é de um optimismo tal, correspondente ao seu discurso — apoiar isto, apoiar aquilo, promover não sei o quê» — , que não tem qualquer correspondência com a realidade de um Orçamento que é recessivo e que é ruinoso para a economia portuguesa.

Aplausos do CDS-PP.

Sr. Ministro, é evidente que nós tínhamos razão desde o princípio: era preciso ir pela despesa e não pela receita, era preciso cortar na despesa e não aumentar a receita. Mas, mais uma vez, o PS vem fazer aquilo que sabe fazer: aumentar cada vez mais a receita.

O Sr. Francisco de Assis (PS): — Isso é um absurdo!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Ministro, que consequências é que este aumento de impostos — IRC, IRS, entrada em vigor do Código Contributivo, IVA — vai ter na política económica? O que é que vai acontecer às empresas portuguesas? Por outro lado, como aqui foi dito, a Linha PME Investe V esgotou em pouquíssimo tempo, 750 milhões esgotaram rapidamente.
A Linha PME Investe VI, de acordo com a informação que tenho, está a ter maiores dificuldades, é difícil comprometer os 1250 milhões. Porquê? Porque a banca fechou o crédito, a banca fechou a «torneira», o dinheiro, a liquidez não está a chegar às empresas. É a isto que V. Ex.ª tem de responder! Como é que vai resolver este problema? Que resposta tem para que o crédito chegue às empresas?

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

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O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Por último, Sr. Ministro, o QREN. Penso que será muito difícil cumprir os objectivos de 20% — que seja! — em 2010. Dê-nos esse resultado, por favor, é importante, mas parece-me muito difícil. Qual é o objectivo para 2011, Sr. Ministro? É que, se continuarmos assim, o risco é evidente: há possibilidade de perda de fundos na altura em que mais falta fazem à economia portuguesa. Digo-lhe, como já lhe disse antes, Sr. Ministro, que perder fundos europeus neste momento difícil, com a economia a entrar em recessão, é absolutamente imoral do ponto de vista económico.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Termino, Sr. Ministro, dizendo-lhe que creio que aquilo que V. Ex.ª aqui nos vem dizer, com mais apoios, mais incentivos, mais programas, mais apoios à exportação, é de tal forma distante da realidade, de um Orçamento que vai ser recessivo, que vai asfixiar a economia pela via dos impostos, que a conclusão é só uma: de facto, não há política económica e é por isso que V. Ex.ª tem aparecido pouco.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Ainda para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento, o Sr. Ministro, na sua intervenção, falou em despudor, relacionando-o com o facto de pensar que há várias pessoas ou vários partidos que entendem que a culpa da situação que vivemos actualmente é de uma crise interna e que ignoram completamente a crise internacional. Com franqueza, assisto a todos os debates, nunca vi ninguém afirmar isso e, portanto, essa é uma imagem criada pelo Governo para se descartar.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — É verdade!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — E porquê? Porque o Governo faz exactamente o contrário, o Governo incute toda a responsabilidade a uma crise internacional, como se as medidas internas que foram tomadas não tivessem nenhuma repercussão sobre a situação que vivemos actualmente.
Aquilo que é importante as pessoas perceberem é o seguinte: foi sendo seguido um determinado conjunto de políticas centradas fundamentalmente em quê? Na quebra sucessiva de investimento público e na contenção salarial, leia-se baixos salários.
Depois, a União Europeia e as suas políticas comuns, que foram feitas em função dos interesses dos grandes países, travaram imenso a nossa capacidade de produção de riqueza. Veja-se que, em 1986, dependíamos do exterior, a nível alimentar, em 25% e, actualmente, dependemos do exterior, a nível alimentar, em 75%.

O Sr. Ministro da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento: — O quê?! Essa estatística»

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sim, sim, Sr. Ministro, e o senhor sabe destas contas! Aquilo que sabemos é que nos tornámos cada vez mais dependentes do exterior. E o que é que fizemos? Fomos estrangulando a nossa capacidade de gerar riqueza.
Eis senão quando cai-nos uma crise internacional em cima. O que é que acontece? Já estávamos extremamente fragilizados e, como é evidente, as repercussões dessa crise internacional foram muito mais gravosas sobre o nosso País. Agora, não se descartem da vossa responsabilidade, porque essa fragilização decorreu das políticas que os sucessivos governos foram desenvolvendo! É isto que importa explicar para que o engodo, digamos assim, do discurso do Governo não convença ninguém, porque a culpa disto não é só de uma crise internacional.
E qual é a resposta do Governo a esta crise internacional? O mesmo remédio de sempre: salários para baixo, investimento público para baixo. É claro! O que é que faz o mesmo remédio? Fragiliza mais! É nesta

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situação que vivemos permanentemente! Não sei onde é que o Sr. Ministro vê essa grande política económica no Orçamento do Estado! Quer maior desincentivo à economia do que o aumento que os senhores propõem para o IVA?! Quer maior desincentivo à economia do que a quebra do poder de compra das famílias, designadamente através da redução dos salários e das pensões?! Quer maior desincentivo à economia do que a quebra que verificamos no sector da educação?! A quebra do investimento público?! Tudo isto são desincentivos, «mãos» de estrangulamento para a nossa economia! Ora bem, o que é que vai acontecer? Aquilo que o próprio Sr. Ministro das Finanças garantiu: no ano de 2011, vamos assistir a um montão de empresas a falir e a um montão de gente a entrar no desemprego! O que é que o Governo faz? Afasta-se e ainda diminui o subsídio de desemprego.
Portanto, se o Sr. Ministro considera que isto não é motivo de preocupação para o País, então, não sei o que pode ser motivo de preocupação!» Depois, aquilo que verificamos são permanentes injustiças. Hoje, nas notícias, e não apenas hoje mas sucessivamente, ouvimos que há dois grupos permanentemente salvos: o sector financeiro e os grandes grupos económicos, já hoje aqui referidos por diversos Deputados.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Nada lhes toca, só o lucro!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Esses não empobrecem, passam a vida a enriquecer, têm lucros perfeitamente chorudos. Mas o problema não é eles enriquecerem, o problema é quem empobrece! É que, à medida que eles enriquecem, ou seja, para se concentrar a riqueza neles, empobrece-se a generalidade da população. O que faz o Governo? Dá a mão a esta lógica, e é contra esta lógica que estamos, e o Orçamento vai nesta lógica, com o agravamento destas profundas injustiças.
Mais: o grande argumento do Governo em torno deste Orçamento do Estado é o dos mercados financeiros internacionais. Eles «engolem-nos», são o nosso «papão», e dizem assim: «nós precisamos de uma resposta, de uma viabilização do Orçamento do Estado, porque, se não, os juros da dívida vão por aí acima». Então, não é que, aos olhos da opinião pública, o Orçamento do Estado está viabilizado — isto vai verificar-se hoje! — , e os juros da dívida disparam por aí acima?!» Qual é a lógica? O vosso «papão» não serviu! Eles fazem de nós aquilo que quiserem, Sr. Ministro, eles engolem-nos, se for preciso. O que os senhores estão a fazer é a dar-lhes campo»

O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, faça favor de concluir, está em duplo défice.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Vou mesmo terminar, Sr. Presidente.
Como estava a dizer, o que os senhores estão a fazer é a dar-lhes campo para, a curto, médio e longo prazo, serem estabelecidas todas as condições para eles nos continuarem a explorar. É isto que é de lamentar e é isto que merece, verdadeiramente, uma grande condenação deste Orçamento do Estado.
Terminei, Sr. Presidente, e agradeço a sua tolerância.

Aplausos de Os Verdes e do PCP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento.

O Sr. Ministro da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Agostinho Lopes, no Governo, ninguém ignora, ninguém escamoteia que o conjunto de medidas associadas ao Orçamento do Estado para 2011 tem um impacto negativo no mercado interno. Ninguém o ignora! Infelizmente, é a necessidade de resposta que temos de dar a uma situação difícil e complexa, a qual, não sendo dada, poria o mercado interno, as empresas, o emprego e as famílias numa situação muitíssimo mais desfavorável.
Nós não vivemos uma situação fácil nem uma situação para a qual existam apenas respostas positivas. Há alturas em que a política adequada, a política necessária passa por medidas impopulares. Podia dar-lhe exemplos por todo o mundo, até poderia fugir àqueles que têm sido mais anunciados aqui, nesta Câmara, e ir

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para outras paragens do mundo, mais do gosto do Sr. Deputado, no que se refere às orientações políticas, para explicar»

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Já vi que não quer falar de política económica!

O Sr. Ministro da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento: — Lá estão os senhores!» Os senhores têm uma dificuldade de conviver com o mundo que é uma coisa fantástica, mas, enfim!»

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — E os senhores têm dificuldade em conviver com Portugal!

O Sr. Ministro da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento: — Sr. Deputado, aquilo que estamos a fazer tem esse objectivo, mas tem um outro: garantir o financiamento da economia portuguesa. E este financiamento é essencial para as pequenas, para as grandes e para as médias empresas. Nada tenho contra a existência de grandes empresas com capacidade competitiva, que obtenham resultados, que criem emprego e riqueza para o País e que paguem os impostos a que são obrigadas por lei.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Isso é que é pior!

O Sr. Ministro da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento: — O Orçamento do Estado para 2011 — não sei se os Srs. Deputados já repararam» — reforça as obrigações contributivas, particularmente das grandes empresas, reduzindo, de forma muito significativa, o montante de deduções que elas podem apresentar. Os Srs. Deputados ainda não viram isto!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Já vimos, já!

O Sr. Ministro da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento: — Relativamente às questões energéticas, Sr. Deputado, obviamente, o Governo tudo fará para aliviar a factura energética das empresas, em particular das pequenas empresas. E, como sabe, estamos a trabalhar nessas respostas, nomeadamente no domínio do gás.
Aquilo que o Governo não fará nem pode fazer é fingir que tem uma política energética muito favorável às empresas e às famílias, penalizando fortemente os desequilíbrios nos anos seguintes. Isto o Governo não fará! Haverá uma tarifa social na electricidade para as famílias com menos recursos, haverá medidas de estímulo à utilização, por exemplo, do gás natural, com alívio da carga das pequenas e médias empresas, mas não iremos empurrar para a frente défices que outros teriam de pagar.
O Sr. Deputado Pedro Soares falou na responsabilidade. Ó Sr. Deputado, eu não fiz outra coisa senão assumir a responsabilidade pelo Orçamento. Se o Sr. Deputado me pergunta se gostaria de apresentar aqui outras medidas, respondo-lhe que gostaria;»

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Mas não era a mesma coisa!»

O Sr. Ministro da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento: — » se o Sr. Deputado me pergunta se tenho alguma dificuldade em assumi-las aqui, respondo-lhe que não tenho, porque acredito.
O Sr. Deputado tem outra leitura, o Sr. Deputado faz uma interpretação muito particular, quase por obrigação da vossa inspiração política, que é a análise concreta das situações concretas. O Sr. Deputado faz uma análise que nada tem a ver com a realidade do País e os compromissos a que temos de responder e «navega» apenas na posição de um partido que não tem responsabilidades na governação do País.

O Sr. Francisco Louçã (BE): — 1500 milhões de euros!»

O Sr. Ministro da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento: — Sr. Deputado Almeida Henriques, é certo que é difícil fazer essa compatibilização, assim como é difícil fazer a consolidação orçamental, mas eu

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esperava que o Sr. Deputado também dissesse que, para as empresas portuguesas, a consolidação é necessária, é essencial, porque é isso que elas sentem.
Se o Sr. Deputado entende que o reforço das linhas de crédito às empresas, o reforço aos apoios fiscais à capitalização das pequenas e médias empresas, o reforço da aplicação dos fundos comunitários não é uma ajuda às pequenas e médias empresas, nesta situação concreta em que vivemos, Sr. Deputado, não sei o que lhe diga. Em todo o caso, estou bem convencido de que o Sr. Deputado, lá no fundo, sabe bem que há um conjunto de medidas que estão a ser tomadas, nomeadamente nos seguros ao crédito, que têm tido um efeito muito positivo na recuperação das exportações.
Sr. Deputado Telmo Correia, o Sr. Deputado agradeceu a minha vinda aqui e eu agradeço a sua pergunta.
Sr. Deputado, não escolho os Deputados do CDS que me fazem perguntas e o Sr. Deputado não escolhe os membros do Governo que vêm responder pelas políticas do Governo.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Foi convocado para cá vir e não veio!

O Sr. Ministro da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento: — E nunca nenhum pedido ficou sem resposta da parte do Ministério da Economia.
O Sr. Deputado diz que o Governo tem sempre a mesma resposta, mas o Sr. Deputado apenas repetiu slogans. Toda a gente sabe que este Orçamento não consolida principalmente do lado da receita, mas o Sr. Deputado diz que sim.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Infelizmente!

O Sr. Ministro da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento: — Sr. Deputado, essa leitura nem necessitava da leitura do Orçamento, já a tinha, já vinha preparado para dizer que o Governo do Partido Socialista consolida do lado da receita e não do lado da despesa.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Se os senhores mudarem de política, eu mudo de discurso!

O Sr. Ministro da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento: — Não é verdade! Todos o confirmam!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Ano após ano é igual!

O Sr. Ministro da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento: — Outra coisa que lhe quero dizer, Sr. Deputado Telmo Correia, é que lhe dou a garantia, e darei sempre, de que Portugal não terá nenhuma perda de fundos no QREN, até porque a grande maioria dos programas já cumpriu os objectivos para 2011. E, Sr. Deputado, não tenha dúvidas de que vamos atingir 20%, porque vamos atingir mais do que 20% e, nessa altura, fixaremos o objectivo para 2011.
Mas, Sr. Deputado, se falasse com os agentes económicos que estão ligados ao QREN sabia que esse risco está afastado e que Portugal vai cumprir, porque tem uma execução claramente acima da média da União Europeia e, em alguns casos, na linha da frente dessa execução. Portanto, Portugal não será afectado por cortes no âmbito do QREN.
A Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia faz a sua leitura da realidade, mas é a sua. A Sr.ª Deputada entende que podemos pôr para trás das costas todos os nossos compromissos e definir uma política que, peço-lhe desculpa, só posso definir como de «orgulhosamente sós»: «a Europa não presta», «a União Europeia é má», «as políticas europeias destroem a economia portuguesa«»

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Isso é verdade!

O Sr. Ministro da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento: — Ó Sr.ª Deputada, onde é que está a alternativa? É algum cataclismo que nos afaste da Europa, algum reposicionamento da Península Ibérica noutra zona do mundo? Não, Sr.ª Deputada! É aqui que estamos e é aqui que queremos estar! A Sr.ª

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Deputada não quer, eu sei, mas é aqui que os portugueses querem estar e é com estas políticas que temos que viver por muito duras que, por vezes, elas tenham que ser, porque a vantagem para Portugal em estar na moeda única e na União Europeia é indiscutível. Assim a União Europeia saiba, também ela, dar as respostas que a Europa necessita!

Aplausos do PS.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É uma questão de fé!

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr. Deputada Manuela Ferreira Leite.

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): — Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Deputados: Neste debate parlamentar sobre o Orçamento para 2011, a frase mais repetida pelo Governo e pelo Partido Socialista tem sido a de que «este é o Orçamento de que o País precisa». Não duvido que esta afirmação é a que melhor retrata a situação financeira do País.
Com efeito, se aquilo de que o País precisa é desta violenta receita é porque está muito doente, está mesmo muito mal! E está.

Protestos do Deputado do PS Afonso Candal.

A situação financeira do País é extremamente grave num quadro de enormes dificuldades de financiamento e é neste contexto que o Orçamento deve ser encarado. O nosso nível de endividamento aliado a um anémico crescimento potencial tornaram-nos reféns dos credores que estão a ditar as regras para continuarem a emprestar-nos dinheiro.
Não vale, portanto, a pena desgastarmo-nos em críticas ao poder dos mercados. Sempre soubemos que eles existem e que têm regras bem claras. Há quem considere que somos livres de fazer despesas à nossa vontade, mas a verdade é que quem manda é quem paga.
Se queremos ser economicamente independentes e nessa medida fazer a política que entendemos sem prestar contas a ninguém, a não ser a nós próprios, então, temos de nos conter dentro dos limites do que podemos pagar. Caso contrário, por muito que isso nos custe, não mandamos nada e temos de pagar a factura nos termos que nos exigem. É o que está a acontecer.

Aplausos do PSD.

Assim, este é o Orçamento de que o País precisa no sentido de que tenta corresponder ao que nos é exigido por terceiros, e é se queremos que nos financiem.
Por isso, a verdadeira questão política que se coloca neste debate é como é que foi possível que um Governo tivesse conduzido o País a um ponto tal que tornou inevitável este tratamento.

Aplausos do PSD.

Protestos do PS.

A esta questão o Governo responde sempre que a causa está na grave crise internacional, à qual é alheio, e que até parece que surgiu repentinamente, como um fenómeno natural que ninguém prevê nem cujas consequências pode controlar. Ninguçm nega a existência dessa crise,»

Vozes do PS: — Ah!»

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): — » mas tambçm ninguçm nega, nem pode negar, que ela se limitou a antecipar a ruptura de uma situação que já existia e para a qual se chamava há muito a atenção do Governo.

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Aplausos do PSD.

Protestos do PS.

Não foi por falta de avisos sobre quais seriam as consequências dessa crise nacional e internacional que o Governo não a viu ou, pelos menos, esforçou-se por não a ver.

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): — As crises antecipam-se e gerem-se; não se negam, nem muito menos paralisam os responsáveis. Há quanto tempo se alertava para a situação de emergência social para que o País caminhava, e aí está o drama do desemprego.

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): — Agora, a situação é a que todos conhecemos,»

O Sr. Horácio Antunes (PS): — É preciso ter «lata»!

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): — » porque a estamos a viver e de pouco adianta continuarmos a discuti-la. A história e os portugueses se encarregarão de julgar quem cegamente nos conduziu a este ponto.

Aplausos do PSD.

E não tenham dúvidas sobre este aspecto.
Com isto não estou a dispensar a importância do debate, mas o fundamental, agora, é que os portugueses entendam o sentido dos sacrifícios que lhes estão a ser pedidos e, sobretudo, que possam acreditar que eles não vão ser, uma vez mais, desbaratados. Os portugueses têm de ter consciência de que devem exigir aos políticos melhores esclarecimentos e maior transparência, ou seja, devem exigir dos políticos a verdade!

Aplausos do PSD.

E, para esta mudança de rumo, o começo não é o melhor: é que ainda não ouvi, neste debate, nem do Sr.
Primeiro-Ministro, nem do Ministro das Finanças, o aviso de que este Orçamento, aquele de que o País precisa, não é a salvação mas apenas o início de um caminho, não é um episódio esporádico ou um sonho mau do qual acordaremos em breve. Falta este alerta fundamental no discurso político, porque é isso que dá a dimensão da gravidade da situação em que nos encontramos.

Aplausos do PSD.

É necessário que se diga explicitamente aos portugueses que o caminho da correcção do que está errado é um percurso longo e muito exigente que não fica por 2013, porque a situação não se resolve em dois ou três anos.
Mais: é preciso que se diga que, para se chegar a bom termo, para que estes sacrifícios valham a pena, é necessário que não sejam desperdiçados em manobras políticas talvez convenientes, mas intoleráveis.

Aplausos do PSD.

É tempo de as tentações partidárias cederem aos interesses nacionais.

Vozes do PS: — Muito bem!

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A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): — É tempo de olhar a realidade para a enfrentarmos com menos sofrimento e com resultados no futuro. Para mal já basta o que basta.
É tempo de coerência nas políticas e de transparência na sua aplicação. Não se podem desperdiçar esforços iludindo-nos com factos irrelevantes ou decisões levianas. A dimensão dos sacrifícios pedidos aos portugueses exige uma escrupulosa execução orçamental com muito rigor, sem subterfúgios nem equívocos.
O País não comporta mais erros.
Tudo será inútil se, na ânsia de falsos louros, ao primeiro sinal positivo se recuar no rumo traçado, o que, como sabemos, tem sido sempre uma grande tentação deste Governo.

Aplausos do PSD.

O maior risco que se corre com este Orçamento é o de ele conseguir reduzir o défice para o valor anunciado e, de seguida, o Governo relaxar em relação a esse objectivo. Seria um desastre cuja consequência seria afundarmo-nos ainda mais.
A política seguida tem de poder construir uma base sólida que sustente o progresso no futuro. Nesta medida, as políticas têm de ter em conta o crescimento económico, sem o que a consolidação orçamental não é sustentável, e têm de fomentar a poupança, sem o que o investimento não gerará a tão necessária criação de emprego.
Por isso, é também fundamental que as iniciativas políticas se revistam da máxima transparência na sua execução, de que é um bom exemplo o destino das linhas de crédito às empresas, porque não pode haver dúvidas quanto ao seu destino que implica o destino dos nossos recursos.
O escrutínio sobre a sua aplicação num momento de enormes sacrifícios tem de ser extremamente exigente, porque só assim se melhora a eficácia da aplicação dos dinheiros dos contribuintes.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Deputados: O Partido Socialista conduziu-nos a uma dura encruzilhada, mas para a percorrermos temos de a apresentar com realismo. Para isso, é fundamental que não se criem ilusões, porque nada pior do que expectativas frustradas que alimentam a revolta. Este será o único modo de tratar os portugueses com o respeito e a seriedade que lhes são devidos e com a dimensão dos sacrifícios que agora se lhes pedem.
Se não se alterar radicalmente o comportamento dos que têm a responsabilidade de executar estas políticas, então os sacrifícios pedidos aos portugueses não servirão para desanuviar o nosso futuro mas apenas para o comprometer ainda mais.
Para isso é preciso confiança no comportamento dos protagonistas políticos, confiança essa que tem sido desbaratada. É, pois, aqui que se devem concentrar todas as nossas forças. É aqui, e não nos discursos, que se verá quem é que afinal tem coragem.

Aplausos do PSD, de pé.

O Sr. Presidente: — Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, três Srs. Deputados.
Tem a palavra, em primeiro lugar, o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, quero dar-lhe os parabéns pelo feito que conseguiu: ontem, a sua bancada garantiu que o Orçamento era péssimo, que o Orçamento «mutilava», «asfixiava», «castigava» e «matava»; hoje, a Sr.ª Deputada levantou a bancada garantindo que o Orçamento é inevitável e é o único caminho.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Exactamente!

O Sr. Francisco Louçã (BE). — Rápida mudança de opinião. Extraordinária mudança de opinião.

Aplausos do BE e de Deputados do PS.

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Mas, ao concentrar a sua argumentação sobre as culpas e não sobre as soluções, reforçou a ideia de que, na sua inevitabilidade, este Orçamento — foi a expressão que utilizou — é «o caminho» e pediu, mesmo, ao Governo que não recuasse no caminho que está a prosseguir, o pior era recuar. Siga esta orientação e que não haja dúvidas sobre ela.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Exactamente!

O Sr. Francisco Louçã (BE): — Sr.ª Deputada, estamos numa situação paradoxal: o Governo de José Sócrates transformou-se no governo provisório do PSD e o PSD é o governo presidencial de Cavaco Silva.

Vozes do BE: — Muito bem!

O Sr. Francisco Louçã (BE): — E ninguém tem dúvidas de que foi a voz avisada de Cavaco Silva que nós ouvimos, hoje, aqui: siga esta política!

Aplausos do BE.

Mas temos uma certeza — e eu tenho a certeza — de que a Sr.ª Deputada conhece o efeito desta política: é a recessão; e, como dizia Passos Coelho, «o pior está para vir». Mas o pior, que é a consequência desta orientação orçamental, está para vir e exigirá sempre mais medidas.
Já chegámos aqui, com as soluções que o PSD acordou com o PS: cortar no subsídio de desemprego, cortar no abono de família, cortar nos apoios sociais, cortar na economia, garantir recessão. Foi assim que chegámos aqui. E partimos daqui para o pior que está para vir, com uma política que assegura ao País esta tragédia que é a recessão.
Por isso, temos o direito, Sr.ª Deputada, de ouvir também a sua opinião sobre as soluções para esta crise.
O PSD começou a nova jornada da nova liderança propondo uma medida: que os desempregados sejam obrigados a limpar os jardins e a fazer trabalho gratuito, porque são desempregados; continuou propondo que a proibição de despedimento sem justa causa, protegida pela Constituição, fosse retirada para facilitar o desemprego, num momento do maior desemprego; acrescentou a privatização do Serviço Nacional de Saúde.

O Sr. Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Francisco Louçã (BE): — Vou concluir, Sr. Presidente.
Por isso, Sr.ª Deputada, bem podemos perguntar: entre a peste e a cólera, será que há uma solução? Será que não há uma alternativa para esta epidemia do desemprego, da recessão, dos cortes sociais, da crueldade social?

Protestos do PSD.

Na verdade, se nos dizem — e se nos diz a Sr.ª Deputada com a sua voz — que este é o caminho inevitável, temos que seguir por ele, temos que o reforçar e temos que o apoiar, não devem os portugueses perguntar se não há na economia, se não há na sociedade uma força capaz, uma resposta capaz, uma coragem capaz para dizer «economia contra a recessão«, «economia pela justiça fiscal«,»

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Muito bem!

O Sr. Francisco Louçã (BE): — » uma economia que não permita que 1500 milhões de euros sejam distribuídos em dividendos sem impostos ou que diga que, quando a banca acumula 4 milhões de euros por dia, deve pagar imposto, como todos os contribuintes?! Não deve e não pode haver essa força?! Essas soluções faltam e elas, Sr.ª Deputada, dão credibilidade ao debate político, dão alternativa às respostas, dão consistência a uma política que olha para o País e diz que as pessoas estão primeiro, a

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economia está acima dos interesses particulares que a têm vindo a colonizar, em nome da democracia, em nome do nosso País.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite.

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco Louçã, o senhor diz que, com certeza, eu tenho a certeza de que este Orçamento provoca uma recessão. Claro que tenho a certeza! E é exactamente porque tenho a certeza que não tenho capacidade de aligeirar a responsabilidade de um Governo que conduziu o País a esta situação.
Mas o Sr. Deputado também tem a certeza — e eu também tenho a certeza de que o senhor sabe — que, efectivamente, neste momento, não há outro caminho. E quando o senhor propõe várias soluções, está a propô-las porque sabe que elas não vão ser seguidas.
Vamos imaginar que o Sr. Deputado Francisco Louçã era eleito e que ia ser Primeiro-Ministro»

Risos do PSD, do PS e do CDS-PP.

Ninguém tem dúvidas de que ou o senhor apresentava um esquema algo recessivo, porque sempre as intervenções de controlo da economia são recessivas — sempre o foram, umas vezes mais sentidas, outras vezes (com a ilusão monetária) menos sentidas — , o senhor sabe isso, ou então, no dia seguinte, era a bancarrota deste País. Portanto, Sr. Deputado Francisco Louçã, não queremos imaginar o senhor como Primeiro-Ministro»!

Aplausos do PSD.

O Sr. Francisco Louçã (BE): — Na bancarrota, estamos nós, Sr.ª Deputada!

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): — Quando o senhor diz que eu exprimi, da tribuna, a opinião de que este caminho era inevitável, com certeza que num caminho há sempre várias soluções que são susceptíveis de ser feitas e outras não, mas a ideia, em conjunto, o objectivo, evidentemente que eu o considero inevitável.
Mas há um ponto que não pode continuar a prevalecer no nosso debate político, que é os efeitos das frases, das ideias» É evidente, Sr. Deputado, que toda a gente gosta de o ouvir dizer que estamos no desemprego, etc.» Todos sabemos isso, ninguçm o nega! Agora, como ç que lá vamos? Neste momento, não existe outra solução! Se o senhor ler a minha intervenção, verá que eu considero que não há outra solução — mais coisa, menos coisa, medidas melhores, medidas piores, opções assim, opções assado. Já me manifestei, algumas vezes sob discordância total, de algumas medidas tomadas; agora, não vou fazer a fantasia e muito menos a demagogia»

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): — » de dizer que há outras soluções que levam o País ao progresso, á riqueza» Temos que percorrer um caminho duro atç chegar a esse ponto. O senhor sabe que, hoje, isso não é possível e, ao saber que hoje isso não é possível, Sr. Deputado, não contribua mais para este espectáculo político. Vamos ser verdadeiros!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

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O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, «quem paga é quem manda», disse-o a Sr.ª Deputada, da tribuna.
A Sr.ª Deputada veio aqui ensaiar um pouco a teoria da inevitabilidade, e permita-me discordar. Não tem necessariamente que ser assim!

Vozes do CDS-PP: — Oh!»

O Sr. Honório Novo (PCP): — Não pode continuar a ser assim, Sr.ª Deputada. Porque há alternativas, e dou exemplos.
Primeiro, o financiamento da dívida pública, Sr.ª Deputada, não pode, obrigatoriamente, continuar a ser assim. Por que razão é que o nosso País não pode aceder directamente ao financiamento do Banco Central Europeu?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Boa pergunta!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Exactamente!

O Sr. Honório Novo (PCP): — Segundo: o financiamento da economia portuguesa, por que é que há-de continuar a ser assim? Por que é que os nossos bancos se financiam a 2% e as nossas empresas se financiam, nos bancos, a 9 e a 10%?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Boa pergunta!

O Sr. Honório Novo (PCP): — Não pode continuar a ser assim!

Vozes do PCP: — Exactamente!

O Sr. Honório Novo (PCP): — Eu bem sei que a Sr.ª Deputada tem razão quando desabafa implicitamente, na sua intervenção, dizendo que este Governo e este Primeiro-Ministro mudam de opinião como quem muda de camisa. Aí, estamos inteiramente de acordo! É buscar o exemplo das receitas extraordinárias deste Orçamento e ver o que aquele Primeiro-Ministro disse sobre as receitas extraordinárias que a senhora fez, enquanto foi ministra das Finanças.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — É verdade!

O Sr. Honório Novo (PCP): — Também sabemos o que disse este Primeiro-Ministro sobre os aumentos dos impostos ou, melhor, o não aumento de impostos e os aumentos de impostos que promoveu. E também aí há alguma ironia da sua parte, nesta intervenção, porque também no seu caso, depois de um choque fiscal, tiveram que (ou foram obrigados a, porventura pelos mercados), aumentar o IVA de 17% para 19%.
Há, portanto, uma ironia entre a sua intervenção, entre aquilo que são Orçamentos de um passado recente e este Orçamento que, hoje, temos pela frente quer no aumento dos impostos, quer nas receitas fiscais, quer na contracção das despesas públicas.
Mas eu gostava de lhe dizer que, também no que diz respeito às receitas deste Orçamento, há alternativas.
Já agora, gostava de apelar para o seu sentido ético e moral e colocar uma questão, já hoje aqui referida pelo Deputado António Filipe.
O BES anunciou que, nos primeiros nove meses deste ano, os seus lucros passaram de 360 milhões de euros para 405 milhões de euros.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É a crise»!

O Sr. Honório Novo (PCP): — Por que é que aumentaram tanto, perguntará a Dr.ª Manuela Ferreira Leite e pergunto eu. É o próprio BES que o explica. O próprio BES diz: a queda de impostos. Exactamente, Sr.

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Ministro das Finanças! Está a olhar para mim? A queda dos impostos é uma das duas razões para que o Banco Espírito Santo anuncie tantos aumentos de lucros.
Com isto, lhe digo, Sr.ª Deputada que, de facto, também aqui há alternativas! Importa é buscar essas alternativas! Só não há alternativas a quem, permanentemente — governos do PS, governos do PSD, Orçamentos do PSD, Orçamentos do PS e Orçamentos, agora conjuntos, do PS e do PSD — , vai por uma via, que é a de submeter o poder político à vontade do poder económico.
E vou citar, novamente, Ricardo Salgado, quando, ontem, ao Jornal de Negócios disse que este acordo orçamental vai no bom caminho» Diz ele, ainda, «fizemos bem as coisas«. «Fizemos bem as coisas» — diz Ricardo Salgado, a propósito do entendimento entre o PS e o PSD! Naturalmente, talvez este acordo sirva ao PS, sirva ao PSD, sirva ao sistema financeiro, mas, Sr.ª Deputada, discordo, e não nos venha dizer que este caminho é inevitável! O País, os portugueses têm que ter, de facto, uma solução alternativa que passe por uma solução que não submeta o interesse do País e dos portugueses aos interesses do sistema financeiro!

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite.

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Honório Novo, vamos ver se nos entendemos e se eu deixo muito clara a minha posição sobre esta matéria.
Talvez não haja muita gente, nesta Sala, que discorde tanto do conteúdo deste Orçamento quanto eu.
Podem discordar tanto quanto eu, discordar mais vai ser difícil!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): — Discordo totalmente do conteúdo deste Orçamento — »

O Sr. Francisco Louçã (BE): — Tem dias»!

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): — » aliás, nem poderia deixar de ser porque ele ç recessivo, ç injusto, é tudo o que o senhor quiser. Tudo aquilo de que o País não precisa está neste Orçamento.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Vai daí»!

Vozes do PCP: — Mas»

O Sr. Francisco Louçã (BE): — Vota-se!

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): — Vai daí, como o Sr. Deputado Honório Novo se lembrou de referir, quem paga é quem manda. É aquilo que o senhor faz lá em casa aos seus filhos.

Risos e aplausos do PSD.

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): — Enquanto estiveres cá em casa, mando eu!

O Sr. Honório Novo (PCP): — Eu não faço!

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): — Ó Sr. Deputado, se não faz, devia fazer, porque era um bom sistema de educação dos seus filhos!

Risos e aplausos do PSD.

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O Sr. Francisco Louçã (BE): — Não somos «filhos» do FMI!

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): — Quero deixar muito claro que o Orçamento é péssimo, mas também quero deixar claro que estamos a atravessar uma enorme crise de financiamento que o Sr. Deputado resolve perguntando por que é que nós não pedimos ao BCE e eu respondo que não pedimos, porque não!

Protestos do BE, do PCP e de Os Verdes.

Porque as regras não são essas.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Mudem-se as regras!

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): — As regras não são essas.

Protestos do Deputado do PCP Honório Novo.

Sr. Deputado, não vale a pena! Perante esta situação, este Orçamento, com coisas mais negativas e outras que podiam ser mais positivas — não tenho dúvida acerca disso, também já o referi — , é inevitável, se não queremos entrar em ruptura financeira. É exactamente por este motivo que o PSD discorda do Orçamento, mas não o discute, no seu conteúdo! Eu não o discuti no seu conteúdo. Aquilo que nós temos que discutir é o que está em causa. E o que está em causa é o País e é em nome do interesse nacional que nós viabilizamos o Orçamento!

Aplausos do PSD.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Há soluções e há alternativas!

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): — Aquilo que considero que devem ser as motivações dos portugueses — e os políticos têm a responsabilidade pedagógica de dizer isso aos portugueses — é que estes sacrifícios que nos são pedidos e que, neste momento, se tornaram inevitáveis em resultado de políticas erradas, não podem ser desbaratados, não podem ser em vão! E aí nós temos que os ajudar! E nós não os ajudamos quando lhes vendemos ilusões que não existem.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): — O senhor diz que há soluções para isto e soluções para aquilo quando sabe que não há!

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): — É nesse sentido que continuo a considerar que, para evitarmos crises desta natureza que conduzem, inevitavelmente, ao empobrecimento das populações, temos a obrigação de ajudar os portugueses a perceber que os sacrifícios que lhes são pedidos não podem ser desbaratados. E considero que o papel dos partidos, muito especialmente do PSD, neste momento, deverá ser exactamente esse, o de saber se os sacrifícios estão ou não a ser desbaratados, se vale ou não a pena o que está a fazerse. Todos temos a obrigação — quem viabilizar o Orçamento — de o fazer! Os outros continuarão a vender ilusões, mas as ilusões não cobram lucros suficientes que valham a pena.
Quando o Sr. Deputado pergunta se há outras soluções, eu respondo-lhe que há, com certeza, outras soluções.

O Sr. Honório Novo (PCP): — E alternativas!

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A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): — Alternativas, neste momento, Sr. Deputado» Mais uma vez, refiro — e não vale a pena insistir — que nós estamos em ruptura financeira e quem o encobrir não está a falar verdade aos portugueses!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Afonso Candal.

O Sr. Afonso Candal (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, penso que a sua intervenção foi de extrema importância para este debate orçamental.

Vozes do PSD: — Ahh!»

O Sr. Afonso Candal (PS): — Poderia mesmo subscrever grande parte — não direi na íntegra — da sua intervenção, mas, acima de tudo, partilhar de grande parte das suas preocupações.

Vozes do BE e do PCP: — De todas!

O Sr. Afonso Candal (PS): — Devo dizer-lhe que não deixa de ser relevante que V. Ex.ª, para além de sugestões e até recomendações ao Governo, também tenha dado ao Governo (e ao País) um estímulo para enfrentar os desafios que tem pela frente.
Também foi com grande clareza que V. Ex.ª marcou aqui a sua posição, mas que temo que, infelizmente, ainda hoje ou amanhã, possa vir a ser reinterpretada por alguém do seu partido passando a mensagem exactamente contrária, como tem vindo a acontecer.

O Sr. Francisco de Assis (PS): — Muito bem!

O Sr. Afonso Candal (PS): — Isso não tira mérito aos seus apontamentos nem às recomendações e sugestões que lançou internamente ao seu partido, a este grupo parlamentar do PSD ou, porventura, a outros membros com mais responsabilidades no seu próprio partido.
Diz V. Ex.ª que este é o início de um caminho, mas não é o início de um caminho, é uma «pedra» num caminho que tem muitos anos! E V. Ex.ª tem uma vastíssima experiência, até em termos governativos, para saber que um País — ainda ontem o referi — , que em 36 anos não encontra um ano em que possa gastar menos do que o que tem para gastar, um dia encontra uma «pedra« no caminho, maior, menor» Mas a questão que aqui se põe é a de mobilizar as forças e a inteligência do País e de quem tem as competências executivas para pôr em marcha as necessárias soluções (os governos) para que, todos juntos, liderados pelo governo que tem essa capacidade executiva, possamos contornar essa «pedra» e, porventura, escolher caminhos que, num primeiro momento, podem ser mais penosos, mas que evitarão penosidades maiores no futuro. Isto em nome de quem está cá hoje mas, principalmente, em nome do futuro e das novas gerações.
Aquilo a que temos assistido, na discussão deste Orçamento do Estado, não corresponde a essa sua visão, não corresponde ao que V. Ex.ª aqui enunciou como uma necessidade de confiança, de estabilidade num percurso, porque a verdade é que a mensagem que é passada pelo maior partido da oposição é a de que o caminho não devia ser este, mas concordando depois consigo, ao não apresentar alternativas, porque elas não correspondem às necessidades do País.
Este ç, de facto, um Orçamento muito próprio. Não ç mau,»

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — É péssimo!

O Sr. Afonso Candal (PS): — » má ç a situação em que nos encontramos.

Vozes do PSD: — Ahh!

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O Sr. Afonso Candal (PS): — Este Orçamento é uma resposta à situação em que nos encontramos e, como V. Ex.ª de alguma forma o diz, é uma boa resposta à situação em que nos encontramos, que não é fruto de erros deste Governo ou do Governo anterior,»

Protestos do PSD.

» mas, sim, fruto de debilidades do País e de erros sucessivos, alguns com muitos anos mas que ainda hoje saem muito caros ao País!

Aplausos do PS.

O que é importante e dá condições para ultrapassarmos os problemas é, de facto, a confiança que resulta também da estabilidade e das condições de governabilidade para ter políticas com curso que ultrapassem os problemas estruturais. Infelizmente, o que o País vive hoje, muito por responsabilidade do maior partido da oposição, não é isso.

Vozes do PS: — Muito bem!

Protestos do PSD.

O Sr. Afonso Candal (PS): — V. Ex.ª, nesse aspecto, tem um passado que lhe dá autoridade, pela viabilização do Orçamento, pela viabilização do PEC 2, independentemente das críticas que faz. Mas não é isso que acontece hoje, infelizmente! Das conversações, do esforço repetido, do triplo esforço por parte do Governo para encontrar no PSD um parceiro de entendimento em torno do Orçamento, o que resultou como entendimento razoavelmente minimalista, ainda que importante, é que o PSD entende que algumas das propostas do Governo não são razoáveis e que é preciso aliviar e facilitar, exactamente ao arrepio daquelas que são as suas preocupações de mensagem política passada ao País. Ou seja, o que resulta das propostas do PSD não é uma visão alternativa, porque não nos diz onde poderia compensar-se aquilo que entende que é menos justo; o que o PSD faz, pura simplesmente, é eliminar receita, aumentar despesa e gerar um novo problema que estava resolvido na versão inicial deste Orçamento.

O Sr. Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Afonso Candal (PS): — Termino já, Sr. Presidente.
Espero, sinceramente, que a sua intervenção tenha eco junto do Governo, com as recomendações e sugestões que deu, com o apoio e o estímulo que também dirigiu a este Governo, mas que tenha eco, principalmente, no processo de especialidade, junto da liderança da sua bancada, da sua bancada e do seu próprio partido.
Temos, de facto, nas nossas divergências, de unir esforços para ultrapassar este problema, e outros, porque os nossos problemas não terminarão hoje com a votação deste Orçamento, não terminarão em 2011.
É preciso que haja responsabilidade, capacidade de concertação, mesmo com divergências de partida, quando o que está em causa são os mais altos interesses do País e o nosso futuro colectivo.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite.

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): — Sr. Presidente, o Sr. Deputado Afonso Candal subscreve toda a minha intervenção a partir do momento em que eu não analisei propriamente o conteúdo do Orçamento.

O Sr. Afonso Candal (PS): — Se quiser analisar outras coisas, também estou disponível!

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A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): — E na parte em que a intervenção não se refere à forma como chegámos a este ponto.
Sr. Deputado, penso que está claro que é o interesse nacional que move o PSD a viabilizar este Orçamento.

O Sr. Horácio Antunes (PS): — Nem todos do PSD, nem todos!

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): — E espero, também, que seja esse o motivo que leva o Partido Socialista a ter negociado com o PSD.

Vozes do PSD: — Exactamente!

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): — Portanto, se o Sr. Deputado tem algum problema com o PSD, alguma desconfiança, alguma falta de crença no PSD, não o diga publicamente, finja, finja que estamos todos muito amigos!

Risos do PSD.

Sabe porquê, Sr. Deputado? Porque nós, ao viabilizarmos o Orçamento, temos o objectivo de fazer crer aos mercados que temos aqui algo que é necessário ser concretizado. Não podemos nós fazer este esforço em nome do interesse nacional e os senhores, imediatamente, discordarem disso e dizerem que estão desconfiados de nós! Não percebo como é que se consegue essa viabilização.
Devo dizer que, se houve coisas negativas ontem aqui, neste Parlamento — peço desculpa, Sr. Ministro das Finanças — , foi quando o Sr. Ministro das Finanças, da bancada do Governo, aludiu à ideia de que estava preparado algum «golpe» no sentido de haver uma crise política nos próximos seis ou oito meses.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Exactamente!

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): — Se o Sr. Ministro das Finanças pensa isso, peço desculpa mas não deve dizê-lo publicamente!

Aplausos do PSD.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — O melhor ç fingir, Sr. Ministro! É a arte do fingimento»

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): — É que eu acredito, Sr. Ministro, que os mercados olhem muito mais às afirmações do Sr. Ministro das Finanças do que às afirmações que fazem os Deputados. E a sua afirmação é uma descrença total para os mercados: os mercados não funcionam com o que acontece hoje, funcionam, no mínimo, a seis meses, e o senhor já lhes anunciou que daqui a seis meses, na sua perspectiva, há uma crise política.
Não é possível haver um Ministro das Finanças que diga isto no momento em que o que queremos é a viabilidade do Orçamento!

Aplausos do PSD.

Protestos do PS.

Sr. Deputado Afonso Candal, eu também disse que a história, com certeza, mostrará a realidade: a razão por que estamos na situação em que nos encontramos e quem nos conduziu a ela.
Além de mais, Sr. Deputado, não vou deixar de dizer isto a toda a hora. Sabe porquê? Porque, efectivamente, o PSD é um partido alternativo ao poder e eu vou lutar com todas as minhas forças para que,

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ao fim de dois meses de estarmos num governo (quando lá chegarmos), seja dito que a culpa do que está a fazer-se é vossa. É preciso dizer às pessoas que a crise vai levar vários anos a ser solucionada e que o PSD, se Deus quiser, há-de lá chegar ainda sem a solução estar encontrada. E não pode ser por culpa nossa! Estamos a tratar um «doente» que os senhores quase «mataram»!

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): — É por esse motivo que não me cansarei de mostrar que este tratamento não é de um ano nem de dois anos, coisa que, neste momento, não se ouve no discurso do Governo e que me parece ser o ponto mais grave. Ou seja, o Governo não diz que este Orçamento é de sacrifícios»

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Não diz?! Disse-o eu!

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): — » e quase dá a entender que, em 2013, estaremos todos bem.
Não vamos estar todos bem, porque não é possível resolver-se este problema até 2013! É preciso que os portugueses saibam que, se encontrarmos estes problemas, não fomos nós que os criámos. Os problemas estão lá porque este Governo nos conduziu a essa situação!

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): — Estiveram quatro anos e meio no governo com maioria absoluta e tinham mais do que obrigação de ter resolvido o problema!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco de Assis.

O Sr. Francisco de Assis (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Deputados: Uso da palavra na sequência da intervenção que agora acabou de ser proferida pela Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite.
Quero começar por dizer que foi com agrado que observei a atenção com que a Câmara acompanhou a sua intervenção. Significa que a Dr.ª Manuela Ferreira Leite adquiriu um estatuto especial na vida política portuguesa, o que é bom para o País porque todos nós, independentemente das nossas divergências, precisamos de referências na nossa vida nacional.

Aplausos do PSD.

Quero, justamente, salientar isso neste momento.
Também não é tão comum que um ex-líder partidário se disponha a assumir as funções de Deputado com esta humildade, pelo que quero igualmente salientar isso nestas circunstâncias.

Aplausos do PSD.

Não concordo, naturalmente, com muito do que a Dr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite acabou de dizer, mas há uma coisa com que concordo, com que todos concordamos, com que o Partido Socialista e o Governo concordam: este é o Orçamento necessário, o Orçamento que se impõe face às circunstâncias extraordinárias que estamos a viver. E o apoio a este Orçamento não pode decorrer apenas da constatação das dificuldades.
Quem apoia este Orçamento apoia-o porque reconhece nele as respostas necessárias para enfrentar estas dificuldades.

A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — Muito bem!

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O Sr. Francisco de Assis (PS): — É isso que o PSD pode e deve dizer, se quer contribuir para a resolução dos problemas com que hoje nos confrontamos.
Este é um Orçamento corajoso, um Orçamento difícil, um Orçamento que adopta medidas impopulares, mas é aquele que, em absoluto, o País hoje precisa. E o Governo — este Governo em concreto e este Primeiro-Ministro em particular — teve a coragem de adoptar essas medidas! Este é um elemento fundamental que aqui tem de ser salientado.

Aplausos do PS.

Também concordo com a apreciação que fez de que nos esperam tempos difíceis. Não apenas a nós, em Portugal, mas à Europa em geral. Não estamos apenas perante uma crise orçamental — também estamos — , que carece de uma resolução urgente e destas medidas imediatas e de emergência, estamos perante uma grave crise económica mais geral. Creio mesmo que estamos perante a primeira grande crise de adaptação da União Europeia ao processo de globalização em curso. A Europa vai viver tempos difíceis, e quem disser o contrário está a enganar os povos.
Temos, pois, de fazer um discurso sério, responsável e de apelo, justamente, à mobilização das pessoas para enfrentarmos as dificuldades que, inevitavelmente, nos esperam no horizonte. Isso exige lideranças firmes, exige lideranças fortes, exige lideranças capazes de assumirem o ónus da impopularidade.
É isso que este Governo está a fazer e é isso que este Primeiro-Ministro, em concreto, está a fazer.

Aplausos do PS.

Por isso merece a nossa admiração e o nosso apoio.
Compreendo que alguém que adquiriu o estatuto que a Sr.ª Deputada adquiriu se permita, com toda a legitimidade, enviar mensagens quer ao Governo quer ao seu próprio partido.
Em relação ao PSD, o que se espera é que tenha uma atitude consentânea com o que, no essencial, foi o teor do discurso que aqui acabou de proferir, mas que não foi o que marcou ontem, na generalidade, a intervenção político-parlamentar do PSD, a qual, aliás, esteve mesmo nos antípodas daquilo que a senhora aqui acabou de fazer.

Aplausos do PS.

Não pedimos ao PSD que se co-responsabilize connosco pela governação do País, porque isso só seria possível se tivéssemos um governo de coligação, se verdadeiramente o PS e o PSD estivessem coligados e se existissem membros do governo do PSD. O que pedimos ao PSD é que assuma inteiramente as suas responsabilidades.
Não é aceitável que o primeiro partido da oposição venha aqui teorizar o princípio da crise permanente; não é aceitável que o maior partido da oposição venha aqui dizer que aprova, hoje, o Orçamento para abrir, amanhã, uma gravíssima crise política;»

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Francisco de Assis (PS): — » não ç aceitável que o maior partido político da oposição venha aqui dizer que «dá a mão» ao País mas que, amanhã, vai pôr em causa o Governo e a estabilidade política do País, porque isso é que põe em causa a nossa credibilidade externa e porque essa não é uma forma séria de enfrentar os problemas e de contribuir para a sua resolução.

Aplausos do PS.

A minha divergência consigo, Sr.ª Deputada, tem a ver com a avaliação do que conduziu a esta situação. O que conduziu a esta situação não foram os governos presididos pelo Eng.º Sócrates.

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Vozes do PSD: — Ah!»

O Sr. Francisco de Assis (PS): — A resposta a isso é muito simples e passa por números muito exactos e muito objectivos.
Qual era o valor do défice orçamental quando o primeiro governo de José Sócrates tomou posse? Qual era o valor do défice orçamental três anos depois, na sequência da acção desse governo?

O Sr. Luís Menezes (PSD): — E agora?!

O Sr. Francisco de Assis (PS): — E, entretanto, emergiu a gravíssima crise internacional, que ninguém desconhece e que o PSD, às vezes, quer fazer de conta que não existiu.

Aplausos do PS.

Aliás, o único reduto da humanidade que desvaloriza a importância dessa crise é, por vezes, o PSD, por razões que não são sérias e que também não concorrem para enfrentarmos com a devida capacidade e competência os problemas com que nos confrontamos.
Por isso, a questão essencial é que hoje temos dificuldades, que decorrem de muitos factores: de uma grave crise orçamental; de um problema de ajustamento orçamental de vários países europeus, o qual resulta da necessidade que houve de prosseguir uma política orçamental expansionista numa fase anterior, quando estávamos confrontados com uma gravíssima crise económica e que ameaçava transformar-se numa crise social não menos grave.
Estamos, portanto, confrontados com problemas sérios. Primeiro, temos um problema gravíssimo no nosso País de competitividade económica, o qual, estou convencido, só conseguiremos resolver se estabelecermos alguns consensos mínimos neste Parlamento e se formos capazes de construir alguns entendimentos suprapartidários. Creio que todos devemos estar disponíveis para isso, porque não é algo que esteja ao alcance de um só governo ou de uma só maioria, é algo que exige a participação e o empenhamento de todos na diversidade dos seus pontos de vista e dos seus contributos, naturalmente.
Temos também um outro problema, que se refere à forma com a Europa reage à sua nova inserção internacional. E vamos ter mais, porque isso não vai esgotar-se no domínio meramente económico, vai colocar-se também no domínio político das relações externas do espaço europeu com outras regiões do mundo.
Portanto, vamos ter tempos difíceis à nossa frente, e a melhor maneira de os enfrentar é com seriedade, verdade e coragem. É isso que este Governo tem vindo a fazer. Mas o Governo não pode fazê-lo sozinho. Por isso, saliento a importância desta intervenção, que fica a marcar o debate e espero também que fique também a marcar o comportamento futuro do PSD como grande partido de oposição, que não deve deixar de ser, no nosso País.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Inscreveram-se dois Srs. Deputados para pedir esclarecimentos.
Em primeiro lugar, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco Assis, registo a intervenção que acabou de fazer, a qual julgo muito apropriada e que, no fundo, reconduz as questões aos termos em que ontem, no início deste debate, tive oportunidade de as colocar aqui, na Assembleia da República.
Ontem disse, e hoje repito, que este é um mau Orçamento e que é um Orçamento do Governo, mas disse que o Partido Social Democrata, como sempre, porque isso está na sua génese, nos seus princípios, vai viabilizá-lo em homenagem à nossa interpretação do interesse nacional.

Aplausos do PSD.

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Mais: disse que o fazíamos também porque estávamos numa situação de emergência financeira e porque sabíamos bem quais as consequências para o País, e sobretudo para os portugueses, de, não viabilizando este Orçamento, admitir a situação de bancarrota e de caos financeiro do País.
Nessa ocasião, quem mais perderia seriam aqueles que menos possibilidades económicas têm no nosso País; aqueles que, como sabemos, vão hoje às farmácias e não podem aviar a receita toda porque não têm dinheiro para pagar todos os medicamentos de que necessitam; aqueles que, às vezes, em situações dramáticas de pobreza, deixam de pagar hoje a factura da electricidade porque não têm dinheiro para a pagar; aqueles que hoje, penalizados pelos cortes na parte social, não compraram ainda todos os livros de que os filhos precisam, estando à espera do próximo subsídio de Natal para comprar o resto dos livros; aqueles que hoje estão numa situação de pobreza, porque é disso que falamos em Portugal. Basta falar com as instituições de solidariedade social em Portugal para perceber do que estamos a falar e a dimensão que tem este problema.
Por isso, Sr. Deputado Francisco Assis, hoje estamos confrontados com esta situação: divergimos na análise. O senhor acha que o Governo não tem nada a ver com este problema; nós sabemos, julgo que com realismo, atribuir as responsabilidades a políticas erradas deste Governo, durante anos consecutivos, que conduziram o País a esta inevitabilidade de um percurso que é duro.
Sr. Deputado Afonso Candal, isto não é uma «pedra no caminho» que amanhã se possa chutar para afastar o problema. Como disse, e bem, a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, este vai ser um percurso duro, de anos, que é preciso, de forma consequente e responsável, prosseguir.
Aquilo que temos reclamado nestes debates tem sido sempre que o Governo abandone o discurso da fantasia, assuma a responsabilidade e fale claro aos portugueses para que todos possamos interiorizar um percurso de exigência mas que também pode e vai ser um percurso de confiança para um Portugal mais justo e mais solidário no futuro.
Quanto à estabilidade, ninguém levantou nenhuma bandeira da instabilidade. Quero, aliás, dizer, a propósito da instabilidade, que é curioso que os senhores não registem algumas coisas essenciais. Primeiro, que num curto espaço de tempo, pela segunda vez, o Partido Social Democrata, como maior partido da oposição, é caso único da Europa a viabilizar um Orçamento de um governo minoritário.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Isso é verdade! Pela segunda vez! Não lembra a ninguém!

O Sr. Miguel Macedo (PSD): — Em segundo lugar, que os senhores se tenham esquecido que quem pela primeira vez falou em demissão do Governo foi o Sr. Ministro da Presidência, à saída de um Conselho de Ministros.

Aplausos do PSD.

De resto, logo repetido pelo Sr. Primeiro-Ministro. Em que sítio? No «coração» dos mercados financeiros, em Nova Iorque. E viram-se os senhores para nós a falar em estabilidade política?! Não há nenhuma — quero já dizer-vos muito claramente. Nenhuma! Cumpram com rigor este Orçamento, executem com rigor este Orçamento, dêem sentido ao sacrifício que hoje estamos a pedir aos portugueses, que tem de ser um sentido útil, e não temam nenhuma instabilidade política. No entanto, se fizerem o que fizeram em 2009, em que começaram com um Orçamento com um défice de 2,2% do PIB e que acabou em 9,3%, e em 2010, em que têm a desgraçada execução orçamental que os senhores hoje podem apresentar ao País, não peçam a nossa colaboração para sacrifícios inúteis dos portugueses. É isto que quero dizer.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco de Assis.

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O Sr. Francisco de Assis (PS): — Sr. Presidente, verifico com agrado que o Sr. Deputado Miguel Macedo fez agora, perante a Câmara e o País, uma reinterpretação dos discursos do PSD de ontem, à luz da declaração política feita hoje pela Dr.ª Manuela Ferreira Leite.

Aplausos do PS.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): — Não, não!

O Sr. Francisco de Assis (PS): — Isso é uma evolução e fico muito satisfeito, porque acho que é mesmo esse o caminho. Nunca iremos entender-nos em relação à avaliação do passado recente, mas também não acho que isso seja o mais importante. Não vivo obcecado com a imputação de culpas seja a quem for, porque mais do que encontrar culpados a nossa responsabilidade é construir caminhos para o futuro.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Francisco de Assis (PS): — Por isso mesmo, a nossa preocupação, neste momento, é a de criar condições para que responsavelmente possamos todos contribuir para a resolução dos problemas com que nos defrontamos. Inaceitável é que o PSD prosseguisse pela teoria da crise permanente, da ameaça constante, porque isso debilitava a nossa imagem externa e punha em causa a concretização dos nossos objectivos.
Verifico agora que o PSD adopta um outro discurso, um outro tom e, aparentemente, uma nova linha de orientação neste debate parlamentar. Só tenho razões para estar satisfeito e incentivo-os a prosseguirem por essa via.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Pureza.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco Assis, compreendo bem o elogio rasgado que entendeu fazer à intervenção da Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite. Tem toda a razão de ser do ponto de vista da sua bancada, dado que a intervenção até agora mais elogiosa, de maior apoio e de apoio mais consistente ao Orçamento do Estado foi inquestionavelmente a da Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite. Apoio, aliás, superior àquele que vimos em intervenções da própria bancada do Partido Socialista.

A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Não exagere!

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Sr. Deputado, quero registar, contudo, que o clima que aqui ontem se viveu no debate, de um verdadeiro tiroteio político entre as bancadas do PS e do PSD, tem agora uma alteração de clima substancial. E essa alteração de clima ficou sintetizada nas palavras que marcam este debate e que vieram da Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite: nestas circunstâncias, mais vale fingir. Ora, é sobre isso que gostaria de o questionar, Sr. Deputado.
Do meu ponto de vista, o fingimento, num momento como este que o País vive, é o pior serviço que podemos prestar à democracia. Na verdade, não queremos fingir que a PT vai pagar o imposto que deve pelo negócio da Vivo; não queremos fingir que não vai haver cortes nos salários, nas pensões, nas reformas, nos apoios sociais; não queremos fingir que o cenário macroeconómico não aponta para um desemprego crescente. Fingir a este respeito, Sr. Deputado, seria a pior coisa que poderíamos fazer à democracia e ao País.
Portugal precisa, neste momento mais do que nunca, de uma política de rigor e de verdade, e isso não se compadece com qualquer discurso ou qualquer conselho de fingimento. Na verdade, rigor não tem de rimar com injustiça; rigor não tem de rimar com opacidade das contas públicas; rigor não tem de rimar com falta de solidariedade; rigor não tem de rimar com falta de apoio àqueles que dele mais carecem. Por isso, Sr.

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Deputado, desta bancada digo com clareza: há lá fora um País que vai sofrer como nunca o impacto deste Orçamento, que vai sofrer extraordinariamente. Esse País é um país real, não é um país a fingir.
Sr. Deputado, gostava de o ouvir a este respeito.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco de Assis para responder.

O Sr. Francisco de Assis (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Manuel Pureza, há uma coisa relativamente à qual não tenho qualquer expectativa: que algum dia o Bloco de Esquerda deixe de fingir que tem soluções para este País.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Francisco de Assis (PS): — Não tem soluções absolutamente nenhumas para os problemas mais graves com que nos confrontamos do ponto de vista económico e financeiro. Esse é o fingimento mais profundo!

Aplausos do PS.

Não vou defendê-la, mas o fingimento a que aludia a Sr.ª Dr.ª Manuela Ferreira Leite era em sentido metafórico»

O Sr. Francisco Louçã (BE): — Claro! Claro!

O Sr. Francisco de Assis (PS): — » e toda a Càmara, naturalmente, o entendeu.
Sr. Deputado, lamento que tenhamos uma extrema-esquerda completamente inoperativa do ponto de vista do contributo para soluções sérias e responsáveis de esquerda para enfrentarmos os problemas reais que se nos deparam.
Os senhores estão permanentemente enclausurados em dogmas ultrapassados, incapazes de compreender a realidade, com meras proclamações que não têm qualquer tipo de aplicação prática viável.
É esse verdadeiramente o grande problema da extrema-esquerda que temos, uma extrema-esquerda que parou no tempo. E, Sr. Deputado, não há pior forma de fingir do que ignorar, em absoluto, a realidade, e é disso que vos acuso.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina Martins.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Estranho o debate de hoje, em que a mais vibrante intervenção de apoio ao Governo foi a da Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite.
Inevitável, dizem; precisamos de recessão, dizem; precisamos de reduzir os salários, dizem; precisamos de aumento do IVA, dizem. Somos filhos do FMI e não temos direito ao nosso País, diz-nos hoje o PSD.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Mas este Orçamento do Estado, que vamos votar dentro de poucas horas, responde a um País concreto: aplica as exigências de entidades que não têm rosto (os tais mercados financeiros internacionais), mas as suas consequências são sobre pessoas reais. Não é, portanto, demais lembrar que a crise económica que enfrentamos — a pior dos últimos 80 anos, nas palavras do Primeiro-

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Ministro — já teve efeitos devastadores sobre as pessoas mais pobres. É, então, inaceitável que o Governo continue a castigar essas pessoas que são já vítimas da crise.
Dizia o Primeiro-Ministro que a pobreza diminuiu em Portugal. Gigantesco embuste. Hoje, uma em cada quatro crianças vive em situação de carência.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Exactamente!

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Cerca de um terço das pessoas que recebe ajuda do Banco Alimentar contra a Fome são crianças. Quase metade dos beneficiários do rendimento social de inserção são menores de 18 anos. Temos 2,2 milhões de pobres em Portugal e sabemos todos que este número vai aumentar já no próximo ano. Os novos pobres, filhos da crise, são já mais 400 000.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Para responder à pobreza, o Governo agrava-a com o novo modelo de cálculo de rendimentos e de capitação que impôs a conta absurda em que há pessoas que valem 0,7 de pessoa e em que as crianças só valem meia pessoa, negando a inúmeras famílias carenciadas o acesso às prestações sociais.
Tudo o que o Governo e o PSD têm para dizer a quem mais sofre é que os mercados exigem mais sacrifícios. A solução da crise é, assim, agravar a crise.
Este Orçamento do Estado penaliza hoje e cava ainda mais o fosso das desigualdades no futuro. As crianças e jovens carenciados sem direito a acção social escolar e bolsa de estudo não têm direito à educação. Esta política promove o abandono escolar e a desqualificação. Este Orçamento desistiu do País.
Os cortes no abono de família afectam, desde há dois dias, 1,383 milhões de beneficiários. Com as políticas deste Governo é um luxo ter filhos e é um risco ser criança.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — E, dos mais novos aos mais velhos, este Orçamento penaliza todos os que menos têm. Este é o Orçamento do ataque às pensões: 1,8 milhões de pensões congeladas, com medicamentos mais caros, com aumento dos impostos. Este é o Orçamento do ataque aos desempregados e desempregadas, com cortes cegos no subsídio de desemprego: 250 000 sem acesso a qualquer apoio, quando se sabe que o risco de pobreza aumentou entre as pessoas na situação de desemprego.
Esta é a pergunta que fazemos hoje: para quê? Em nome de quê? Para quê obrigar milhares de estudantes a deixar de o ser? Em nome de quê se recusa aos mais pobres o acesso a medicamentos? O que se ganha ao desistir dos serviços públicos? Não há neste Orçamento nenhuma esperança, nenhuma ideia de futuro. Não há redistribuição, só penalização, penalização dos trabalhadores, dos reformados e dos contribuintes. Não há, neste Orçamento, crescimento, só há recessão. O Governo sabe que a sua política recessiva criará mais desemprego e mais pobreza. Quantos mais pobres sairão do acordo PS-PSD? PS e PSD uniram-se para exigir sacrifícios a quem menos tem e tudo o que têm para oferecer é mais sacrifícios no futuro.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Exactamente!

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Não mostram nenhuma coragem mas têm toda a prepotência e toda a desistência. É no abono de família, na acção social escolar, no subsídio social de desemprego, no rendimento social de inserção, no complemento solidário para idosos que o Governo espera poupar um quarto do que já gastou à tripa forra no BPN. Mas o BPN vai ficar barato, garantiu ontem o Ministro das Finanças. Sabemos, assim, que a irresponsabilidade não tem limite. Esta opção cruel é inaceitável!

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Como diria Eça de Queirós, este Orçamento não há-de cair porque não é um edifício; porque é uma nódoa, só pode sair com benzina. O voto contra, em nome da alternativa de um Orçamento contra a recessão e a greve geral unificada do dia 24, são a benzina de que o País precisa.

Aplausos do BE.

O Sr. João Serpa Oliva (CDS-PP): — Isto nem com benzina lá vai!

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Assunção Cristas.

A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Ministros, Sr.as e Srs. Deputados: Lembro-me bem do Orçamento para 2010, aprovado em Março deste ano. Lembro-me das circunstâncias que o rodearam, da grande exigência que era começar a corrigir o descalabro de 9,3% do défice, do receio dos mercados e do medo do corte de rating da República.
Na altura, acreditava-se que era decisivo dar um sinal de estabilidade para o exterior e esse sinal estava, à partida, justificado por eleições muito recentes. Do ponto de vista do CDS, fazia sentido que Governo empossado na sequência das eleições de Setembro tivesse condições para começar a emendar os erros que ele próprio tinha conscientemente cometido.
O Orçamento foi aprovado no dia 12 de Março e, logo no dia 25 de Março, a Fitch cortou o rating de Portugal sem apelo nem agravo; depois, a 27 de Abril, foi a vez da Standard & Poor’s e, por fim, a Moody´s cortou a 14 de Julho.
Se houve ideia que caiu por terra foi a de que o Orçamento aprovado é o suficiente para convencer os mercados.

Aplausos do CDS-PP.

Que os mercados olham para a estabilidade política, é inegável. Mas antes disso olham para a execução orçamental, olham para os rácios da dívida e, sobretudo, olham para as perspectivas de crescimento económico.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — Ora, a execução orçamental de 2010 foi um desastre que ainda está por explicar. A dívida, longe de diminuir o seu peso no PIB, aumentou. O crescimento económico não existirá em 2011, sendo mais do que provável um cenário de recessão como, aliás, o próprio Governo prefere antever para efeito de receitas fiscais.
Não crescemos de forma sustentada em 2010 e, previsivelmente, não cresceremos de forma sustentada em 2011. Não haverá criação de emprego e, ao invés, o desemprego crescerá.
Por isso, não espanta que, mesmo com as perspectivas de viabilização do Orçamento, as agências de notação de risco tenham vindo sucessivamente a afirmar que tal poderia não ser suficiente e que, mesmo com Orçamento aprovado, poderiam cortar no rating de Portugal. Não é por acaso que, garantida a viabilização do Orçamento do Estado pelo PSD, os juros da dívida pública continuaram a subir acima dos 6%. Ainda hoje a colocação da dívida a curto prazo conheceu menos procura e viu o juro subir consideravelmente, face à última colocação. Depois deste leilão, a dívida a 10 anos subiu para 6,36% e não vale a pena fingir que não está a acontecer.

Aplausos do CDS-PP.

Sr.as e Srs. Deputados: «redução do défice» é o núcleo e a periferia deste Orçamento.
Tudo nesta proposta do Orçamento do Estado é feito com o objectivo de reduzir os tais 2,7%, de forma a atingir os famosos 4,6% com que o Governo comprometeu o País.

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Tudo neste Orçamento se esgota neste objectivo e, para o atingir, vale ir buscar dinheiro a todo o lado, nem que seja de forma cega e intransigente: do corte de salários ao congelamento de pensões, mesmo as mais baixas, de 189, de 227 e de 247€,»

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — » passando pelo aumento de impostos para todos os portugueses e pelo corte nas prestações sociais, tais como o abono de família.
Este é um Orçamento desesperado. Um Orçamento desesperado por dinheiro a todo o custo, com uma extraordinária insensibilidade social e um claríssimo abuso fiscal.

Aplausos do CDS-PP.

Paradoxalmente, «crescimento económico» é a maior urgência de Portugal e a grande omissão deste Orçamento. A maior urgência porque não há crise financeira que seja pior do que o nosso crescimento anémico, consecutivo, em divergência acentuada da Europa, há mais de 10 anos.
Esta é a verdadeira crise portuguesa, aquela que o Governo teima em não querer ver, em desconsiderar, em esperar que a outra, a que enche os jornais mundiais, lhe ocupe o espaço.
Ora, o crescimento é o primeiro e o melhor garante da credibilidade.

Aplausos do CDS-PP.

Estivéssemos nós a crescer a 2% ou a 3% e não haveria problemas de maior com os nossos credores; teríamos muitos a quererem emprestar dinheiro e a bom preço, porque a produção de riqueza dava toda a garantia do cumprimento pontual das obrigações.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem!

A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — Mas o Governo apresentou a esta Câmara uma proposta de Orçamento do Estado que, ao omitir uma estratégia de crescimento económico, nega esta nossa maior urgência.
Este erro de base, esta teimosia em não querer compreender os nossos problemas anteriores à crise internacional e persistentes, levou o Governo a arrastar o País, ao longo dos dois últimos anos, num jogo de escondidas em que ora se escondia a realidade aos portugueses, fintando-os com a descida do IVA e os aumentos da função pública em 2009, ora se procurava desvalorizá-la aos olhos dos nossos pares europeus e dos credores internacionais.
Este Governo nunca antecipou o que quer que fosse, nunca tratou de cortar séria e corajosamente na despesa do Estado, actuando sempre tarde, no limite, quando já não tinha mais por onde esconder que nada estava a fazer para colocar as contas em ordem.
É assim que, em 2011, enquanto outros sairão da crise, enquanto a Europa espera crescer 1,5%, nós não a acompanharemos tão cedo (e muito menos com esta política), porque o nosso problema é mais sério e fundo do que o resultante da crise financeira internacional.

Aplausos do CDS-PP.

O primeiro passo para resolver um problema é, obviamente, reconhecê-lo. Não será este Governo a fazêlo, pois nem agora, que a realidade se impõe cruamente, está disposto a esse reconhecimento, porque lhe falta um pingo de humildade.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A 9 de Outubro passado, o Sr. Ministro das Finanças afirmava na imprensa que se os juros atingissem os 7% recorreria ao fundo europeu e ao FMI. Afirmava também que se os mercados não se convencessem com este Orçamento, não saberia mais o que fazer.

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Importa, pois, dizer ao Sr. Ministro das Finanças que o comportamento dos mercados em linha com o que os portugueses sentem: que o Governo não serve, que o Governo não consegue garantir nada a ninguém, que não lhe é reconhecida capacidade no estrangeiro, como não é reconhecida em Portugal.

Aplausos do CDS-PP.

Só o Governo parece ainda não ter percebido e insiste no seu discurso arrogante, monocórdico, estafado.
À grande pergunta que hoje os portugueses querem ver respondida, a de saber se todos os sacrifícios por que já estão a passar e que se vão agravar em 2011 resolvem ou não os problemas do nosso país, o Governo responde que talvez sejam necessárias mais medidas, porque as que anuncia são sempre e sistematicamente as penúltimas.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!

A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — Nisto o Governo tem razão: este «pacote de austeridade Sócrates» não resolve os nossos problemas, porque se demite de os atacar de forma séria, rigorosa, exigente e verdadeiramente corajosa.
À custa da redução do rendimento dos portugueses, pelas suas diversas vias, o Governo pode conseguir reduzir o défice, mas não conseguirá lançar o País numa rota de crescimento económico.

Aplausos do CDS-PP.

Não consegue, desde logo, porque o Governo continua a preferir emagrecer os recursos dos portugueses do que os seus excessos, porque, em vez de fazer um trabalho sério de corte de despesa supérflua, prefere cortar salários e aumentar impostos e porque não olha estrategicamente e impulsiona os nossos sectores produtivos. No fim da linha, teremos mais dívida e mais desemprego.
Esperava-se muito mais deste Orçamento e do acordo que o viabilizou. Infelizmente, este «Orçamento do leite achocolatado» fará o seu caminho e, quando o leite se derramar em definitivo, o Governo não pode ficar espantado! Quando a recessão nos bater à porta e nos esvaziar de vez os bolsos, o Governo não poderá reclamar pois foi ele que escolheu o caminho!

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — Sr.as e Srs. Deputados: Da nossa parte, continuaremos a exigir e a dizer a verdade; da nossa parte, continuaremos a mostrar que há alternativa; da nossa parte, continuaremos a insistir que é possível fazer de outra maneira, com mais rigor, com mais eficácia, com mais justiça social, com mais atenção às famílias, aos idosos e aos mais pobres. Por isso, continuaremos a apresentar propostas muito concretas de corte no desperdício e de atenção às famílias e aos idosos que mais precisam.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — Da nossa parte, continuamos a distinguir a liderança política incapaz e estafada, que Portugal tem neste momento, dos portugueses empenhados, capazes, trabalhadores,»

Aplausos do CDS-PP.

» que fazem mexer as empresas, que se esforçam por criar riqueza, que se empenham nas instituições de solidariedade social, que continuam a constituir famílias e a ensinar aos filhos que Portugal pode ser um grande País.

Aplausos do CDS-PP.

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No CDS, continuaremos sempre a acreditar em Portugal e continuaremos a lutar por Portugal e pelos portugueses, os de agora e os de amanhã.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Não havendo mais oradores inscritos, a sugestão da Mesa é que façamos agora uma interrupção e retomemos os trabalhos às 15 horas.
Está interrompida a sessão.

Eram 12 horas e 56 minutos.

Sr.as e Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 15 horas e 7 minutos.

Vamos retomar os nossos trabalhos, ainda para apreciação, na generalidade, da proposta de lei n.º 42/XI (2.ª) — Orçamento do Estado para 2011.
A Mesa não regista inscrições, apesar de ainda haver tempo para vários oradores poderem intervir. Por isso, a Mesa apela, mas não obriga, à clarificação deste ponto. É que não havendo inscrições para este ponto, passaremos ao encerramento.

Pausa.

Podemos, então, concluir, de uma forma inteiramente sã e transparente, que não há mais oradores inscritos.
Assim sendo, é legítimo passarmos ao período de encerramento.
Para uma intervenção, no período de encerramento, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Chegados ao fim da discussão, na generalidade, do Orçamento do Estado para 2011, ç altura para dizer: Era uma vez» Era uma vez um Orçamento que, tal como a «pescada», antes de o ser, já o era. Pouco importava o seu conteúdo, as suas propostas, as suas medidas; o que interessava era que passasse. Pouco importava se era bom ou se era mau para os portugueses; o que era preciso era garantir a sua aprovação.
E perante esta imperativa premissa, soou o alarme e o mundo mobilizou-se: o Presidente da República chama os partidos a Belém; os banqueiros (os tais que fizeram tudo muito bem feito) apressam-se e reúnem com quem não aceita ou, melhor, com quem não aceitava mais aumentos de impostos; os grandes patrões manifestam inquietação, estão preocupados.
O Orçamento do Estado, que cedo chegou às redacções da imprensa, tardou a chegar à Assembleia da República — houve, de facto, tempo para umas pizzas. E quando chegou, tarde, ocorreu o grande choque tecnológico: afinal, a pen não trazia o Orçamento todo, parte do essencial não veio, o relatório não foi entregue. O Sr. Ministro das Finanças adia a sua comunicação para o outro dia e, depois, para mais tarde.
Mas, à quarta, foi de vez.
Entretanto, decorriam negociações entre aqueles que não aceitavam mais aumentos de impostos e aqueles que, num dia, se demitiam se o Orçamento não fosse aprovado e, no outro, nunca viravam a cara à luta. Arrufos e zangas. Ruptura nas negociações. O Presidente da República convoca de emergência o Conselho de Estado. Comentadores e analistas discutem e escrevem detalhadamente sobre os prós e prós da aprovação. Nas televisões, a todo o instante, passa o aviso: «Última hora: há orçamento»; «Última hora: Orçamento em risco».

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Retoma das conversas: reuniões dentro e fora da Assembleia. Mas, entre telefonemas e recados mais ou menos indirectos, surgiu o acordo. E para que ninguém pudesse escapar às responsabilidades, até o momento ficou registado no telemóvel, com hora e tudo.
Lá estavam todos: os «pobres e mal-agradecidos» e aqueles que «não dão a terceira oportunidade», os mesmos que não aceitavam aumento de impostos. Ao fundo, com esforço, ainda se podia presumir a presença dos mercados financeiros. De fora do retrato, ficaram os portugueses e os problemas do País.
Mas o mundo respira finalmente de alívio e os mercados financeiros acalmam.
É, de facto, uma história com todos os ingredientes e, sobretudo, com artistas de primeira. Mas uma história, às vezes, a lembrar uma obra do Kafka, outras, a lembrar A Guerra, do Raul Solnado. Tanto esforço, tanto empenho, tanto enredo, apenas e tão-só para não aborrecer os mercados financeiros.
E, no meio desta azáfama, é caso para perguntar: onde ficam os portugueses, no meio disto tudo? As pessoas e as famílias não fazem parte dessa história? Não interessam? Não contam para nada? Pelos vistos, não. Definitivamente, o bloco central deixou de se preocupar com as pessoas. Agora, só os mercados financeiros interessam, e interessa, sobretudo, que não se aborreçam. E, claro, eles só se acalmam se lhes fizerem as vontades.
É exactamente isso o que PS e PSD se preparam para fazer. Fazer a vontade aos únicos que continuam a ganhar com esta crise, os mesmos que a criaram e pela qual são os grandes responsáveis.
Este Orçamento é, assim, antes de mais, um reflexo, um indício, da supremacia do poder económico sobre o poder político. Mas um reflexo a que não são alheias as políticas que os governos têm vindo a praticar. Pelo contrário, de certa forma, puseram-se a jeito. E são exactamente essas políticas que é necessário mudar, porque de nada adianta procurar resolver os problemas com a mesma receita que levou à situação que vivemos.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Este é o Orçamento que esquece os portugueses e só tem a preocupação dos mercados, que ignora completamente as pessoas e os problemas do País. É o Orçamento que não vem dar resposta ao mais grave problema com que hoje nos confrontamos, o desemprego; que corta a eito nas despesas sociais, sobretudo na educação e na saúde; que vem impor novos e pesados sacrifícios à generalidade dos portugueses; que representa a maior carga fiscal de que há memória; que impõe penosos cortes nos salários dos funcionários públicos mais mal pagos da Europa; que limita cada vez mais pessoas do acesso aos apoios sociais.
É um Orçamento que congela todas as pensões, mesmo as pensões sociais; que não procura combater, de forma eficaz, a fuga e a evasão fiscais; que deixa andar os paraísos fiscais; que se basta com a parca tributação efectiva do sector financeiro e dos seus muitos milhões de lucros, ao mesmo tempo que permite o alastrar dos níveis de pobreza e a persistência de um dos maiores níveis de desigualdade social e de distribuição de riqueza de toda a União Europeia.
É um Orçamento que a Associação Nacional de Municípios Portugueses considera desastroso para o poder local e que poderá colocar em causa a prestação de muitos serviços públicos; que transforma o ambiente, passando de parente pobre a um vizinho distante; que remete centenas de quilómetros de ferrovia convencional para o mais completo abandono e que, ao nível da agricultura, inscreve verbas claramente insuficientes para recuperar o atraso do PRODER, correndo-se o risco, insólito, de ter de se devolver verbas a Bruxelas.
Para terminar, Sr. Presidente, quero dizer que Os Verdes consideram que estamos diante de um Orçamento que vem impor novos e pesados sacrifícios à generalidade das famílias portuguesas, com especial incidência nas pessoas com rendimentos mais baixos.
E o pior é que, apesar da imposição destes sacrifícios, este Orçamento não vem dar resposta aos graves problemas do País e dos portugueses. É, portanto, um mau Orçamento.
E, como somos responsáveis, se achamos que este Orçamento é mau, sem rodeios, sem histórias, sem fintas, sem dramas e sem retratos, vamos votar contra.

Aplausos de Os Verdes.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

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O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há poucos dias, um diário espanhol noticiava que, de entre 180 países, Portugal ocupava um dos três últimos lugares, em relação ao crescimento económico na última década. Chamava-lhe: «A década perdida de Portugal». Esta década perdida é, sem dúvida, o resultado da política dos que estiveram no governo neste período, mas também dos que estiveram antes e, há mais de 30 anos, contribuem para a destruição da nossa economia.
A culpa, tão falada neste debate, não morre de facto solteira, vive em bigamia com o PS e o PSD e, sempre que necessário, também com o CDS.

Aplausos do PCP.

Desta vez, é o PSD que viabiliza a continuação da política de direita, tal como fez com o Orçamento que está a ser aplicado, com o PEC e muitas outras medidas. Desta vez, folga o CDS, que também viabilizou, lembre-se, o Orçamento actual, que os portugueses estão a sofrer neste momento.
Bem se percebe o discurso de justificação do PSD e, em particular, da Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite. A Sr.ª Deputada quer ajudar o PS a convencer os portugueses que têm de se resignar com esta política e este Orçamento, usando até o truque habitual de comparar a economia do País com a economia de uma família.
Sabem todos muito bem que isto é uma demagogia e uma mistificação, porque um Estado tem recursos e instrumentos que uma família não tem, mesmo que os governos do PS e do PSD vão abdicando de os usar para os entregar ao directório da União Europeia.
O PSD inventou até uma nova versão do discurso da «pesada herança», que é, mais ou menos, este: «quando lá estivermos» — vai prevenindo o PSD — , «vamos ter de continuar a mesma política, mas a culpa é dos que lá estão agora». É a «pesada herança» para memória futura. É o PSD com um olho no Orçamento e outro nas eleições.
E se querem falar de fingimento, então, nós dizemos que o PSD finge que não está de acordo com o Orçamento que vai aprovar, mas está.
O PS e o PSD estão de acordo: com a recessão e o aumento do desemprego que este Orçamento provoca; com o corte nos salários; o congelamento e, portanto, a diminuição real das reformas e pensões; com o estrangulamento dos serviços públicos; com o aumento dos impostos; com o corte no subsídio de desemprego; com a retirada do abono de família; com o corte no investimento público; com as privatizações e com a manutenção dos benefícios à banca e aos grandes grupos económicos.
Pela parte do PCP, não vamos deixar de apresentar, na especialidade, propostas alternativas às medidas do Orçamento. E veremos o que vai fazer o PSD.
Hoje, o PCP denunciou aqui os escandalosos lucros da banca e dos principais grupos económicos, nos primeiros nove meses de 2010: os quatro maiores bancos privados tiveram 1122 milhões de euros de lucro, 4,1 milhões de euros por dia, um aumento de 5% em relação ao ano anterior; a PT mais de 5600 milhões de euros, um aumento de mais de 1400%, sendo que vai distribuir já 1500 milhões de euros aos accionistas — e isto sem pagar um tostão, que se saiba, sobre a venda da VIVO, feita através de uma sociedade holandesa;»

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Um escândalo!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — » a Brisa mais de 400 milhões de euros, um aumento do lucro de mais de 280%; a Galp 266 milhões de euros, um aumento de 50%; a Portucel mais de 150 milhões de euros, um aumento de 112%; a Jerónimo Martins 193 milhões de euros, um aumento de 40%.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Isto ç que vai uma crise!»

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — E, perante tudo isto, a receita do IRC, em 2011, vai descer 2,7%. Isto é, quanto mais aumentam os lucros, mais descem os impostos pagos pelas grandes empresas e nalguns casos, como declarou Ricardo Salgado, os lucros aumentam à conta dos impostos que se pagam a menos. É por isso que o Governo se recusa a dizer quanto vai ser a receita da nova contribuição dos bancos. É que se chegar de facto a existir será irrisória.

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Como é que alguém, com estes números, se atreve a vir pedir mais sacrifícios aos portugueses?

Aplausos do PCP.

Diz o PSD que este Orçamento tem de ser aprovado porque «quem paga é quem manda». Mas, Srs. Deputados, a verdade ç que quem paga esta crise ç o povo e afinal quem manda ç o capital,»

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Essa é que é essa!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — » que dá ordens ao Governo e ao PSD, como todos vimos nas últimas semanas.

Aplausos do PCP.

Não, Srs. Deputados! Com esta política quem ganha é quem manda (os banqueiros, os especuladores, os grupos económicos) e quem paga é quem perde (os trabalhadores, o povo e o País).

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Apesar do acordo, da fotografia e das declarações do Governo, do PSD e de Cavaco Silva, os juros da dívida portuguesa voltaram a subir. Quando não há acordo, sobem; quando há acordo, sobem também. Quando não há Orçamento, sobem os juros; quando há Orçamento, sobem também. O Orçamento que as agências exigem conduz à recessão, mas as mesmas agências ameaçam baixar a notação da dívida porque não há crescimento económico.
Parece inexplicável mas não é. É que os chamados «mercados» não querem saber da economia nem do risco, só querem saber do seu lucro e é sempre isso que conduz a sua acção.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Muito bem!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Foi também tema de debate a questão das prestações sociais.
O Primeiro-Ministro perguntou ontem, mas não quis ouvir a resposta, com o que é que não estamos de acordo na chamada condição de recursos. Mas vai ouvi-la agora. É que a condição de recursos não é só nem fundamentalmente o requisito dos 100 mil euros no banco que é o único que o Governo refere.
Não concordamos com a alteração do conceito de agregado familiar nem com a alteração da fórmula de cálculo com base nos rendimentos do agregado, que faz com que as mesmas famílias, com os mesmos ou menores rendimentos, percam direito às prestações.
Não concordamos com a contabilização da habitação social e dos apoios em espécie. A atribuição de apoios em espécie, de habitação social, é ela mesma o reconhecimento da pobreza extrema e a concretização de direitos fundamentais de todos os cidadãos, não podendo ser considerada um rendimento.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Ora aí está!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Não concordamos que o facto de um idoso ter complemento solidário para idosos seja contabilizado para retirar apoio escolar a uma criança do mesmo agregado, para comprar livros ou para a alimentação.
Não concordamos que a prestação para pagamento de propinas de um estudante carenciado no ensino superior seja contabilizada para retirar o apoio para medicamentos de um idoso que deles necessita.
E em muitas prestações, como é o caso do abono de família, mais ainda do que a condição de recursos, o Governo eliminou liminarmente o direito das crianças portuguesas a terem esse apoio a partir de 629 euros de rendimento dos seus pais. Para o Governo, as famílias com 629 euros não podem ter abono de família, mas a banca, com 4,1 milhões de lucros por dia, não tem de pagar mais impostos!

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Aplausos do PCP.

Nesta matéria, o Governo usa de forma despudorada, como vimos neste debate, os argumentos mais reaccionários do CDS e do Deputado Paulo Portas para cortar nas prestações sociais.
Já sabíamos que o PS fazia a política da direita. Porém, este debate demonstrou que o PS já não tem só a política da direita mas também usa o discurso da direita para justificar as suas medidas.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — O Primeiro-Ministro quis ontem demonstrar que não havia diminuição nas prestações sociais neste Orçamento.
As prestações sociais, mesmo com a errata que foi ontem distribuída, baixam o seu peso em relação ao PIB de 22,4% para 21,6% — é ver, Sr. Primeiro-Ministro, a tal página 95 do Relatório. Não se mantém igual, como ontem tentou convencer-nos.
Mas como o Sr. Primeiro-Ministro bem sabe, ontem falámos do peso no Orçamento das funções sociais em percentagem do PIB. É na página 116. E mesmo descontando o facto de o Governo usar nesta página um valor do PIB diferente do que usa na página 95, ambos diferentes do que é apontado pelo INE, não há maneira de concluir outra coisa senão que as funções sociais do Estado perdem quase 2 pontos percentuais de 2010 para 2011.
O Sr. Primeiro-Ministro e o seu Governo não são os defensores do Estado social, são antes os carrascos do Estado social.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Os coveiros!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — O certo é que, nas funções sociais, o corte será de pelo menos 3000 milhões de euros.
E podemos ver o que se passa na saúde. No SNS a verba inscrita para 2011 é de 8140 milhões, menos cerca de 550 milhões do que o orçamentado para 2010. Sabe-se agora que a despesa, em 2010, derrapou, segundo o Governo, mais 500 milhões, isto é, terá sido de cerca de 9200 milhões. Isso significa que o orçamento para 2011 para o SNS é inferior em mais de 1050 milhões à estimativa de execução para 2010. É um corte de 11,5% ou 13,7% se considerarmos a inflação prevista.
Com este corte vão ser drasticamente reduzidos os serviços de saúde e as suas respostas e a população que deles precisa vai ficar ainda mais arredada do acesso aos cuidados de saúde.
O discurso do Governo, do PSD e dos seus apoiantes é baseado na lógica do «tem de ser». Corta-se nos salários porque tem de ser; congelam-se as pensões porque tem de ser; corta-se o abono de família porque tem de ser.
Hoje tivemos outra versão da mesma política: é a lógica do «porque não», da Sra. Deputada Manuela Ferreira Leite. Os Estados não podem pedir dinheiro ao BCE» porque não. Os filhos, muitas vezes, quando lhes respondemos com um «porque não» a um pedido, costumam retorquir — não sei se no seu caso também, Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite — «porque não, não é resposta». Também neste caso «porque não» não é resposta

Aplausos do PCP.

Existem alternativas para esta política. O Governo e o PSD é que escolheram este caminho que nos impõem há mais de 30 anos.
É por isso que dizemos a todos os portugueses que não se resignem com esta política, não aceitem este caminho e lutem por mais justiça social, pelo desenvolvimento do País, por uma vida melhor; que lutem contra este Orçamento, contra a baixa dos salários, contra o aumento do custo de vida; que participem na greve geral do dia 24 de Novembro, justa e indispensável resposta a esta política do PS e do PSD.
O PS e o PSD querem conduzir o País debaixo de uma espécie de ditadura do inevitável, tudo justificando com o argumento de que não há alternativa.

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Mas nós afirmamos que, sim, há alternativa! O que não é possível é não haver alternativa, porque isso significaria não haver esperança e não haver futuro.
Não desistimos de lutar por uma política patriótica e de esquerda porque este País tem futuro. E é pelo futuro de Portugal que votamos contra este Orçamento do PS e do PSD.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados: Quem não recorda da última campanha eleitoral do Partido Socialista? Dois grandes argumentos: primeiro, investimento público para relançar a economia, criar emprego; segundo, reforço das políticas sociais, reforço das medidas sociais.
Era o Partido Socialista que se ufanava de primeiro sair da recessão técnica, era este o Governo que poderia tirar-nos mais depressa da crise. Hoje, todos podemos olhar para essa campanha eleitoral e para a sua validade, para o mérito desse argumento político. E aqui, aqui exactamente, na Assembleia da República, no debate deste Orçamento do Estado, já na sequência do debate do Orçamento do Estado para 2010, verificamos a retracção do investimento público, o corte drástico das medidas sociais, o apagamento das políticas sociais e a diminuição, em concreto, de qualquer possibilidade de escapar da recessão. É o afundamento da economia portuguesa.
Daqui há que retirar algumas ilações, Sr.as Deputadas e Sr. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, não apenas da violação do contrato eleitoral, que é algo que se foi banalizando. Aquilo que se promete não tem qualquer valor, não tem qualquer adesão ao discurso político, não tem qualquer continuidade na acção do Executivo.
Não é apenas isso, não é apenas um certo equívoco acerca do soberano: se o soberano é aquele, o do sufrágio, aquele que delega o seu poder, ou se é Moody's ou a Standard & Poor's.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Muito bem!

O Sr. Luís Fazenda (BE): — É que conviria teorizar algo acerca dessa questão e tentar perceber que não é «quem paga manda«, porque a democracia, o poder político devem subordinar o poder económico»

Aplausos do BE.

» e a União Europeia foi tambçm constituída tendo por base valores matriciais de democracia política e de poder constituinte. Portanto, não há aqui uma subordinação umbilical ao poder económico.
Esta espécie de ditadura dos mercados, dessa entidade abstracta e afinal tão concreta na punição que faz ao povo português e aos povos da Europa, não pode continuar.
Não podemos continuar a assistir, também, a um Governo português completamente «de joelhos» na União Europeia para renegociar as condições, as características, as circunstâncias em que se exerce a política portuguesa e aquilo que é fundamental no desenvolvimento da União Europeia.
Mas o mais gravoso de tudo não é a violação do contrato eleitoral, não é o facto de não se distinguirem os soberanos e de não haver qualquer acção consequente na defesa da democracia política e da sua relação com o poder económico. É o facto de o Primeiro-Ministro José Sócrates e do Partido Socialista já saberem, ao tempo da campanha eleitoral, que, a manter-se a política, a manter-se o rumo, não podiam cumprir aquilo que diziam às portuguesas e aos portugueses. Não iriam cumprir! Portanto, foi um programa eleitoral de má fé, foi um programa eleitoral de reserva mental, é uma questão de falsidade da parte do Partido Socialista.
Hoje, quando o Partido Socialista se esboroa,»

O Sr. Francisco de Assis (PS): — Esboroa?! O Partido Socialista?!

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O Sr. Luís Fazenda (BE): — » quando o Partido Socialista ç confrontado e causticado pela opinião pública por incumprimento das suas promessas, por descaracterização da sua posição fundamental, é bom que o Partido Socialista perceba isso e venha ao debate e ao confronto político.
Srs. Deputado do Partido Socialista, não vale a pena! Quanto mais o Partido Socialista vai perdendo capacidade, quanto mais o Partido Socialista se vai esboroando aos nossos olhos, mais arrogante se torna o Partido Socialista e mais procura desvalorizar e espezinhar a oposição, demonstrando a sua inutilidade política.

O Sr. Francisco de Assis (PS): — Absurdo!

O Sr. Luís Fazenda (BE): — O Partido Socialista, na última campanha eleitoral, sabia que, mantendo este curso, não poderia cumprir o programa com que se estava a comprometer para com os portugueses.
Srs. Deputado do Partido Socialista, Srs. Deputado do PSD, falam-nos de realismo, que é preciso uma posição realista. Pois o realismo é o que nos tem trazido de mal a pior ao longo desta década de estagnação económica. Porquê? Devido às políticas europeias. Há uma convergência nominal, mas não há compensação do ponto de vista do diferencial do investimento.
Portanto, fatalmente, enquanto não houver essa compensação, há o problema de perda de competitividade da economia portuguesa estrutural. Não temos tido alternativa, a esse nível, na União Europeia mas apenas quem paga manda. Não pode ser assim! Mas também foram as políticas das privatizações, que nos foram tirando do erário público tudo aquilo que poderia dar rendimento essencial ao Estado e hoje não dá, do ponto de vista das receitas não fiscais. Se tivéssemos mantido algumas das empresas estratégicas do País no sector público, hoje, rir-nos-íamos dos défices e da capacidade de endividamento que o País não tem nem pode suportar, neste momento.

Aplausos do BE.

Essa política de privatizações a eito foi uma política ruinosa para o País e para a política orçamental portuguesa, assim como as parcerias público-privadas e todos esses mecanismos de «drenagem» para os capitais privados, incluindo o laxismo das entidades de supervisão, do Banco de Portugal e outras, bem como de quem consentiu, quem autorizou, quem foi complacente em relação à circunstância de a dívida privada ao exterior, da banca e das empresas, ser superior à dívida pública portuguesa.
Por que razão, do ponto de vista do poder democrático, do poder delegado pelos portugueses e pelas portuguesas, estamos a suportar, numa espécie de aval hipócrita para o qual não fomos chamados, uma imensa dívida privada ao exterior para a qual não tivemos voto na matéria? Os portugueses não tiveram qualquer capacidade de exprimir a sua posição política e a sua vontade.
Sr.as e Srs. Deputados, nas actuais circunstâncias, discutir se o FMI aterra ou não na Portela é um jogo de sombras. O PEC 4 já aí está, na execução deste Orçamento, e o que vamos tendo é o FMI «a prestações».
Essa é a receita que conhecemos e que é hoje aqui abraçada e acarinhada por ambos os partidos do bloco central.
É curioso que esse bloco central — ironia das ironias! — tenha agora como pitonisa a Deputada Manuela Ferreira Leite. São circunstâncias da vida política, são as voltas que o mundo dá.
Provavelmente para acalmar os mercados, é necessário que o Sr. Ministro das Finanças não ameace reagir a crises políticas. Provavelmente é também com esse magnífico intuito de obstar à excitação e aos nervos dos mercados financeiros que a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite até considerou que quem fez este Orçamento — julgo que o Sr. Ministro das Finanças — devia estar preso. Esse deve ser um calmante suplementar para os mercados financeiros. Mas assim vamos, assim vamos!» Dizem-nos Deputados do Partido Socialista que as soluções que o Bloco de Esquerda adianta não são úteis, não são aceitáveis. Diz-nos a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite que talvez tenhamos ilusões ou procuremos disseminar ilusões. No entanto, o que propomos é factível, é executável e é até executado noutros países da União Europeia.
Propomos o IRC da banca aos valores de qualquer empresa; propomos que as mais-valias das sociedades gestoras de participações sociais sejam tributadas como são os contribuintes individuais; propomos que haja

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uma taxa especial sobre as transferências para offshore; propomos o englobamento dos rendimentos para efeitos fiscais; propomos a renegociação, ao menos para os valores dos juros da dívida pública, das parcerias público-privadas; propomos dinamização económica, com efeito imediato no emprego, na reabilitação urbana, na ferrovia de mercadorias; propomos o alívio social que, como se sabe, não só é justo do ponto de vista social, como ajuda, numa situação difícil, em contraciclo, a dinamizar a procura interna, a alargar o mercado interno, a impedir-nos de regressar à recessão e a um desemprego ainda mais gravoso.
Estas medidas não são úteis?! Não são possíveis?! Estão fora da órbita da capacidade política?! Não! O que se passa é que o Partido Socialista está hoje a caminhar cada vez mais para as políticas liberais, tão bem advogadas aqui pela Dr.ª Manuela Ferreira Leite. Por isso, está ínsito no Orçamento do Estado o vosso programa de privatizações, que desmente os discursos contra o neoliberalismo.
Este Partido Socialista, ao caminhar para a direita, ao caminhar para as políticas liberais, na verdade, traznos uma circunstância de submissão total aos mercados, ao que não é a economia de mercado mas a sociedade de mercado que a social democracia dizia combater e perante a qual está completamente submissa e impossível de se resgatar a si própria.
Não há viragens à esquerda, não há viragens keynesianas do Partido Socialista. Houve aqui um total ajoelhar às políticas da direita, às políticas liberais.

Aplausos do BE.

Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Deputados: Ontem, o Sr. Primeiro-Ministro parecia estar num confronto contra uma manobra de uma OPA hostil, ao mesmo tempo que o líder parlamentar do PS parecia propor um contacto sem intermitências do bloco central. Mas hoje tudo se alterou. Talvez a fingir — o fingimento é algo que partilham políticos e poetas — , chegou-se a um acordo em que realmente parece ter sido garantido, pelo menos «para português ver», que não vai haver crise política e que, na verdade, o Orçamento irmana os partidos dele signatários. Porquê? Porque os banqueiros assim disseram. Louve-se a honestidade de quem falou pelo PSD. Louve-se a honestidade de quem vem falando pelo Partido Socialista.
Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, Sr. Primeiro-Ministro: A alternativa é outra política, a alternativa é outra dimensão na Europa, a alternativa não é a inevitabilidade.
Pertenço a uma geração que combateu as inevitabilidades. Fui daqueles, como muitos, que foram criados a acreditar que nada podia ser alterado. Chegarmos hoje aqui, com mais de 30 anos de democracia política, e dizer-lhes que este é o caminho inevitável, que este é o Orçamento que não pode deixar de ser, que este é o castigo dos deuses, não! A democracia política é o caminho humanista, é o caminho das escolhas, é o caminho da responsabilidade política, é o caminho da coragem!

Vozes do BE: — Muito bem!

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sei bem o que significaram ministros das Finanças e primeiros-ministros do passado. Todo esse património político está envolvido na responsabilidade deste Orçamento.
A mobilização social tem de acompanhar essa outra política. A greve geral que se aproxima é um primeiro passo. É necessária a participação, é necessário despertar a luta dos portugueses e das portuguesas, é necessária a insubmissão cívica em relação a esta política.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Hoje de manhã, fiquei admirado com a versatilidade e até o virtuosismo do candidato Cavaco Silva emergindo no Facebook. Dizia o candidato Cavaco Silva que é preciso tomar cuidado com o desprestígio da classe política. Como continuo a ser sempre um ingénuo na política, pensei, logo de imediato e de supetão, que estava a falar do ex-conselheiro de Estado Dias Loureiro, seguramente, e desse «pessoal político», da «turma do BPN» que tanto enobreceu o cavaquismo governamental.

Vozes do BE: — Muito bem!

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Contudo, se isso é o passado e a vinculação à responsabilidade, no presente é o mistério deste Governo, porque, faça o que fizer este Primeiro-Ministro e este Ministro das Finanças, estão

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colados ao BPN, aos 5000 milhões de euros do BPN. Isso é muito mais do que tudo o que se corta aos portugueses, prometendo-lhes coisa nenhuma, porque para o ano estarão pior do que estão este ano, daqui a dois anos estarão pior do que estão este ano, e a pitonisa do bloco central, com o devido respeito, já nos anuncia a melhoria só para 2015.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Meireles.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Chegámos ao fim do debate, na generalidade, de um Orçamento do Estado que foi provavelmente um dos orçamentos mais discutidos da história portuguesa. Tal não aconteceu por acaso. Estamos perante um dos maiores aumentos de impostos de sempre, diante de um dos maiores sacrifícios exigidos a Portugal e confrontados com um dos maiores ataques de sempre às famílias, à natalidade, às empresas e ao emprego.

Aplausos do CDS-PP.

Estas constatações não são mera retórica. Muito pelo contrário, são uma realidade bem dura que todos os portugueses vão sentir na pele durante o próximo ano.
A verdade, porém, é ainda mais penosa e inquietante. É que os efeitos deste Orçamento vão fazer-se sentir muito para além do próximo ano. Mais grave ainda do que o desgraçado estado a que este Governo conduziu as finanças públicas, é o estado da economia portuguesa e o impacto que nela vão ter as medidas anunciadas, absolutamente concentradas em pedir sacrifícios às pessoas e às empresas e completamente distraídas no que toca a exigir austeridade ao próprio Estado e às suas empresas.

Aplausos do CDS-PP.

Na verdade, a dimensão da máquina do Estado atingiu uma proporção verdadeiramente impensável. Se contarmos todo o verdadeiro perímetro orçamental, chegamos à conclusão de que há 13 740 entidades que movimentam dinheiros públicos: só na administração central há mais de 5000; no sector público empresarial há mais de 1000; institutos públicos são 350; fundações são mais de 600 e empresas municipais e regionais são 343. É preciso dizer, com toda a clareza: isto não é possível!

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Mas algo nos diz que, se isto continuar a depender apenas do PS e do PSD, vai continuar a ser possível.

Aplausos do CDS-PP.

É evidente que a economia não pode deixar de se ressentir com tudo isto. Nos últimos 10 anos, e olhando para os dados referentes às paridades do poder de compra, vemos que Portugal tem mantido completamente inalterada a sua distância face à média europeia, ao contrário do que aconteceu com países que hoje apresentam situações financeiras semelhantes à nossa, como é o caso da Irlanda ou da Grécia.
Até nesses países o poder de compra é superior ao português e, portanto, a sua resistência à crise substancialmente maior. O problema de Portugal, em matéria económica, é estrutural. O Governo não só nada fez para o resolver como conseguiu agora juntar-lhe um outro problema, que demorará anos a resolver: o de finanças públicas.
Ouvimos inúmeras vezes da parte do Governo e da bancada do Partido Socialista que a dimensão da crise é europeia e mundial. Não é verdade. Não é, pura e simplesmente, verdade! Aliás, o próprio Relatório do Orçamento aponta para um cenário de crescimento de 1,7% na União Europeia e de 2,2% nas economias

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avançadas. O que é que os nossos 0,2% de evolução no próximo ano (na melhor das melhores das melhores das hipóteses) têm a ver com a média europeia de crescimento de 1,7%?

Aplausos do CDS-PP.

O PS, com ajuda do PSD, pode estar à beira de conseguir um Nobel de incompetência: fazer com que Portugal volte à recessão menos de um ano depois de ter saído dela. Isso é que seria verdadeiramente inédito na Europa.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — O Governo conduziu-nos a uma situação verdadeiramente impossível: é que nunca conseguiremos consolidar as finanças públicas sem crescimento económico mas, por outro lado, nunca conseguiremos crescer com esta consolidação orçamental. É um completo ciclo vicioso do qual este Governo não faz a mínima ideia como há-de sair.
Mesmo perante este cenário, o Governo continua a alucinadamente insistir que este Orçamento é de confiança.
Como é que se pode falar em confiança quando se olha para a recessão futura com absoluto conformismo, como se estivesse escrito nas estrelas que o destino de Portugal é ser economicamente sofrível?

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Como é que se pode falar em confiança quando fomos colocados numa situação de protectorado — uma Nação de oito séculos em que, neste momento, quem dita as regras são os credores e aos portugueses não resta praticamente nenhuma margem de liberdade? Como é que se pode falar em confiança quando a dívida pública — apenas a oficial — atinge quase os 90% do PIB, quando precisamos todos de trabalhar quase um ano para pagar não o que o Estado vai gastar mas o que o Estado já gastou?

Aplausos do CDS-PP.

Srs. Deputados, temos falado até agora daquilo que se sabe, mas aquilo que não se sabe é igualmente grave. E há cinco falhas muito concretas que saem deste debate. O CDS orgulha-se de ter ajudado a destapar o que estava escondido e a clarificar o que era equívoco.
A primeira incógnita deste Orçamento é saber de onde virão os 500 milhões de euros acordados entre PS e PSD.
Há um ponto prévio que não pode deixar de ser salientado: o universo de aumento de impostos e contribuições que permanece inalterado no Orçamento é substancialmente superior, são cerca de 2000 milhões de euros. Por cada euro que foi negociado, há mais quatro que os portugueses vão pagar com o seu trabalho em impostos e taxas.
Contudo, voltando aos famosos 500 milhões, o Governo refugia-se em palavras vagas acerca de cortes e atrás do eufemismo receitas não fiscais, ficando explicar o óbvio: que receitas não fiscais? Estamos a falar de contribuições? De que natureza? O Governo está a pensar em aumentos de taxas? Mais taxas ainda, para além as inúmeras que já estão previstas?

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Nesta matéria, temos de ser muito claros. Para o CDS, há uma alternativa ao aumento de contribuições e taxas.
Sr. Primeiro-Ministro, corte 100 milhões de euros nos consultores e nos pareceres e poupe as famílias a novos sacrifícios.

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Aplausos do CDS-PP.

Corte 150 milhões de euros em publicidade, seminários, eventos e outros serviços e poupe a quem trabalha novos sacrifícios.
Corte 100 milhões de euros em transportes, em comunicações, em representações e deslocações, em assistência técnica e poupe a classe média a mais empobrecimento.
Corte 250 milhões de euros em locações de edifícios, encargos de instalações e outros trabalhos especializados (o que quer que isso seja!) e poupe os portugueses que já vão ter dificuldades que cheguem para conseguirem viver com esta hecatombe orçamental.
A segunda questão central que fica por esclarecer é o destino do TGV. Assistimos, durante este debate, ao verdadeiro insólito de termos duas partes de um mesmo e recente acordo — PS e PSD — darem dele duas versões completamente diferentes. Para o PSD o TGV foi adiado sine die. Para o PS o TGV vai continuar placidamente. Quanto ao troço Poceirão/Caia, tudo indica que vai avançar candidamente, fingindo convenientemente o Governo que esta obra não torna inevitáveis as outras obras e os restantes projectos, como se passasse pela cabeça de alguém que Portugal pudesse ficar com um TGV no Poceirão, vindo os passageiros de autocarro ou de bicicleta para Lisboa.

Aplausos do CDS-PP.

Já todos percebemos que este acordo foi para «mercado ver» e que não há a mínima intenção de o cumprir. São coisas como estas que destroem a credibilidade da política.
O terceiro ponto que fica por esclarecer é o estranho caso do BPN. Nesta matéria, não ouvimos nada neste debate que não fosse a retórica oca da necessidade da nacionalização e não foi avançado um número sequer, para amostra.
O Governo recusa-se liminarmente, e também ilegitimamente, diga-se de passagem, a esclarecer quanto é que toda a operação do BPN vai custar. Só sabemos duas coisas: a primeira é que o montante total está já a anos-luz dos 700 milhões de euros de que o inimputável Dr. Constàncio falava inicialmente;»

Aplausos do CDS-PP.

» a segunda ç que este ano o Governo vai injectar novamente dinheiro — não se sabe quanto, mas suspeita-se que sejam pelo menos 400 milhões de euros.
Aliás, o Governo não se recusa apenas a dizer quanto vai custar o BPN, nem sequer diz quanto é que pode vir a impactar nas contas públicas.
Se há alguma coisa que este período triste das finanças públicas que estamos a passar nos ensinou é que a conta chega sempre. Pode chegar mais cedo ou mais tarde, de uma forma ou de outra, mas a factura acaba inexoravelmente por aparecer e, no caso do BPN, vão ser todos os portugueses que terão de a pagar.
Que o Governo não se digne incomodar-se a dar sequer uma estimativa do seu montante é a demonstração inelutável de falta de respeito não por este Parlamento mas por todos os portugueses, que são quem vai pagar a conta.
A quarta incógnita diz respeito ao sector empresarial do Estado. A relutância do Governo em fornecer dados quanto a esta matéria é já um clássico orçamental.
No ano passado, por exemplo, só a muito custo soubemos que o esforço financeiro líquido do Estado com este sector iria aumentar mais de 1130 milhões de euros. Este ano, a situação é ainda mais grave do que o habitual.
Não há aqui ninguém que não saiba que, se o Governo fosse mesmo gastar menos dinheiro com as suas empresas públicas, seria o primeiro a anunciá-lo, com pompa e circunstância. Também não há aqui ninguém que não perceba que a determinação tenaz do Governo em esconder dos portugueses o custo das suas empresas em 2011 só pode querer dizer uma coisa: as empresas públicas vão custar mais dinheiro aos contribuintes.

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É, pura e simplesmente, inaceitável que continue a existir, em Portugal, uma parte do Estado que não dá satisfações ao Parlamento, que recusa informações aos portugueses, que presta contas tarde e a más horas e que, na realidade, só dá notícias quando se trata de vir colher o seu quinhão do Orçamento.

Aplausos do CDS-PP.

É uma vergonha que se peça ao Parlamento para autorizar aumentos de impostos sem que o Parlamento saiba quantos vão aumentar para pagar despesas de empresas públicas.

Aplausos do CDS-PP.

A quinta e mais inesperada confusão orçamental poderia ser cómica não fosse a situação trágica em que nos encontramos. Já não chegava a entrega tarde e más horas do Orçamento, já não chegavam os erros e omissões no Relatório, aparece agora uma errata que, misteriosamente, «tira da cartola» 831 milhões de euros.
Ficamos, assim, a saber, como se fosse um mero pormenor de somenos, que a despesa do Governo vai aumentar nesse montante, concentrando-se os aumentos noutras despesas correntes e de capital.
Convenhamos: nem à procura com uma lupa seria possível encontrar rubricas menos esclarecedoras. Só mesmo o aparecimento de receita no mesmo montante para cobrir este 800 milhões consegue ser tão misteriosa e inusitada» Mas o mais grave é que, para além das discrepâncias técnicas, numa altura em que o Governo clama que aposta tudo na credibilidade, no rigor e na confiança, falha clamorosamente não apenas nos grandes cenários macroeconómicos traçados mas também na credibilidade da sua política orçamental, constantemente a ser corrigida e emendada.
Aliás, a reacção dos mercados a que temos assistido é bem demonstrativa do que está a acontecer. No CDS não exageramos em críticas fáceis aos mercados e não fazemos críticas ideológicas à economia de mercado. Pelo contrário, sabemos que, em relação a estes mercados financeiros em particular, só há uma crítica séria, rigorosa e consequente: é dever-lhes o menos possível e depender deles o menos possível.

Aplausos do CDS-PP.

É resolver o problema com actos em vez de retórica. É nunca mais, mas mesmo nunca mais, estarmos outra vez nesta lamentável situação de descrédito total em que o Governo do Partido Socialista nos colocou.
Nesta matéria, há um outro aspecto deste Orçamento que não pode deixar de ser realçado: é que ele só existe porque um acordo entre o PS e o PSD o viabilizou — segundo nos disseram, para acalmar os mercados. Só que a verdade é que os mercados não estão a acalmar-se. Tudo indica que eles estão mesmo mais nervosos.
Aquilo que PS e o PSD nos disseram foi que só o rating justificava o acordo para viabilizar este Orçamento.
Aquilo que vemos é que os mercados não estão a responder.
E se daqui a uns meses tivermos um PEC 5 e um orçamento rectificativo, é a credibilidade e o rating do PS e PSD que vão ser seriamente afectados.

Aplausos do CDS-PP.

Há vários anos que, em cada orçamento do Estado, os governos olham para o próximo ano e não para os próximos 10 anos. O problema da dependência de Portugal em relação aos credores e aos mercados saltou agora para as luzes da ribalta mas não começou agora. Começou há muitos, muitos anos.
Para este problema, só há uma solução: é tornarmos Portugal num País que cresce mais e num País que deve menos. Este Orçamento torna Portugal num País que cresce menos e deve mais.
Portanto, o PS faz o que for preciso para se manter no poder. O PSD considera que o caminho é péssimo mas é bom. O CDS tem a coerência de dizer e de demonstrar que este caminho é e está errado.

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Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Deputados: Daqui a instantes vamos votar um Orçamento que o País não merecia. Este Orçamento é um mau Orçamento: um Orçamento que fomenta uma nova recessão económica em 2011; um Orçamento que volta a elevar a carga fiscal; um Orçamento que penaliza injustamente as pessoas, as famílias e as empresas; um Orçamento que fará novas vítimas indefesas, ou seja, todos os portugueses que são hoje vítimas das más políticas deste Governo.

Aplausos do PSD.

A origem deste Orçamento tem uma história, uma história triste e penosa que deve fazer reflectir o Governo.
Este Orçamento só é necessário porque, ao longo de quase seis anos de mandato socialista, o Governo delapidou todo o património político que tinha, adiando e não reformando, fazendo da pirotecnia política a sua arma quotidiana e da propaganda o seu único instrumento de actuação.
Este Orçamento só é necessário porque, em 2009, o Primeiro-Ministro deixou descontrolar as finanças públicas com o único propósito de conquistar votos e ganhar eleições.

Aplausos do PSD.

Este Orçamento só é inevitável porque este ano, em 2010, o Governo consentiu um descontrolo orçamental de enorme dimensão e sem paralelo na nossa história recente.
Conclusão: se não tivessem sido seis anos perdidos, se não tivesse sido a irresponsabilidade de 2009, se não fosse a incompetência de 2010, não seria necessário um Orçamento tão mau e tão negativo como este.

Aplausos do PSD.

Os portugueses ficam, assim, a saber que vão pagar mais impostos, ter reduções nos salários da função pública e no complemento de pensões de reforma porque o Governo andou, durante anos, a fazer navegação à vista e, nos últimos tempos, a «brincar com o fogo».
Pior: o País vai voltar a ter uma nova recessão económica, mais desemprego e a extensão das actuais dificuldades não pode ser, em exclusivo, assacada à crise internacional.
A verdade é que à crise internacional somou-se a irresponsabilidade e a leviandade política e financeira deste Governo. É esta a história deste Orçamento, uma história nada edificante para o Governo e profundamente penalizadora da generalidade dos portugueses.
Só que, Sr. Presidente e Srs. Deputados, a irresponsabilidade do Governo não é acompanhada pelo PSD.
Nós temos sentido de Estado e temos demonstrado que temos uma noção clara do que é o interesse nacional.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Miguel Macedo (PSD): — O «chumbo» deste Orçamento poderia servir os interesses tácticos do Governo mas não serviria o interesse estratégico de Portugal.

Aplausos do PSD.

No momento dificílimo que vivemos, a alternativa ao «chumbo» do orçamento era a bancarrota, o bloqueamento dos bancos, a falta de crédito para as empresas, a falta de recursos para pagar salários e pensões de reforma.

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Se, hoje, por culpa da irresponsabilidade governativa de 2009 e de 2010, os funcionários públicos vão ter cortes nos seus salários, sem Orçamento teríamos, seguramente, em 2012, mais cortes de salários, cortes de salários ainda maiores e mais penalizadores.
Se, hoje, por culpa do descontrolo financeiro de 2009 e 2010, vamos ter novos aumentos de impostos, sem Orçamento teríamos, seguramente, no futuro, novos e ainda maiores aumentos da carga fiscal.
Esta é a verdade dos factos, a verdade que nos leva a viabilizar este Orçamento para evitar lançar o País numa crise ainda mais dura e mais dolorosa, para evitar o caos.
É esta a matriz essencial do PSD. Colocamos sempre o interesse nacional acima do interesse partidário de circunstância.

Aplausos do PSD.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Com o propósito de nunca assumir responsabilidades, o Governo atribui à crise internacional, aos especuladores e aos mercados a culpa pelo carácter injusto e penalizador deste Orçamento.
Já estamos habituados a isto: este Governo nunca tem culpa de nada. Tudo o que de mal sucede ou é culpa da oposição, ou da crise ou dos mercados. Mas é preciso dizer com toda a clareza: essa explicação é a mais pura das ficções.
Os mercados que hoje «torcem o nariz» a emprestar-nos dinheiro e que obrigam à subida das taxas de juro, são os mesmos que ontem nos financiavam em melhores condições. A diferença que existe é esta: hoje desconfiam de Portugal, hoje desconfiam do Governo. Hoje desconfiam da capacidade do Governo para colocar ordem nas contas do Estado e saldar compromissos no futuro. Tudo porque Portugal não fez o seu trabalho de casa; tudo porque se adiaram reformas essenciais; tudo porque o País se deixou endividar para além dos limites do razoável; tudo porque o Estado vive demasiado acima das suas possibilidades, sem controlo e sem rigor, num regabofe financeiro que é hoje orçamentalmente insustentável, politicamente inadmissível e eticamente intolerável.

Aplausos do PSD.

Se houver um mínimo de inteligência, competência e responsabilidade por parte do Governo, então, deverse-á, ao menos, transformar esta crise numa oportunidade: a oportunidade para emagrecer o Estado, reduzindo o seu tamanho, cortando nas suas «gorduras» improdutivas e liquidando as suas mordomias inúteis; a oportunidade para estimular o sector exportador da nossa economia, única forma de melhorar a competitividade nacional; a oportunidade de perceber que é tempo de fomentar e apoiar o investimento privado de qualidade em vez de teimar nos megainvestimentos públicos que enchem o olho mas não criam riqueza e ainda agravam o endividamento nacional; a oportunidade de fazer as reformas que se impõem — na justiça, na educação, na administração e na máquina do Estado — , única forma sustentável para atrair, de novo, investimento estrangeiro com valor acrescentado; a oportunidade para criar as condições que nos permitam evitar uma nova década de estagnação económica, com as graves consequências que conhecemos no desemprego e no agravamento das assimetrias e desigualdades sociais.

Aplausos do PSD.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O PSD demonstrou, desde a apresentação do Orçamento, duas coisas essenciais: por um lado, que o Estado pode e deve gastar menos, pode e deve gastar melhor, pode e deve dar o exemplo de rigor e contenção; por outro lado, que os sacrifícios pedidos às pessoas, às famílias e às empresas podem ser mais justos e equitativos.
Por intervenção do PSD, mais de 1,6 milhões de famílias continuarão a deduzir nos seus impostos as despesas essenciais de saúde, educação e habitação.
Por intervenção do PSD, os portugueses serão poupados a uma tributação injusta do seu cabaz alimentar, uma decisão que protege a economia social e o relevante sector agro-alimentar e a agricultura portuguesa.

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Por intervenção do PSD, serão rigorosamente avaliados os impactos para as gerações futuras de todas as grandes obras públicas, incluindo o TGV.
Por intervenção do PSD, o Estado assume o compromisso de pagar a tempo e horas, salvaguardando o interesse de milhares e milhares de pequenas e médias empresas, e de milhares e milhares de postos de trabalho.
Por intervenção do PSD, a evolução das contas públicas e da execução orçamental será auditada num quadro de mais rigor e transparência, única forma de devolver credibilidade às contas do Estado.
Em suma, nas difíceis condições actuais, a intervenção responsável e exigente do PSD atenuou injustiças e não deixou de ponderar relevantes interesses sociais.

Aplausos do PSD.

Mas, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, ao mesmo tempo, convém não esquecer uma última verdade elementar: o País vai ter Orçamento, mas não sabe se o Governo vai ser capaz de cumprir o seu Orçamento! Em função do que sucedeu em 2009 e 2010, a dúvida é mais do que legítima. Está nas mãos do Governo desfazer esta dúvida e, com isso, desfazer a desastrosa imagem que criou nestes últimos anos.
Pela nossa parte, com a autoridade moral e política de quem viabiliza um Orçamento que não é o seu e do qual discorda, queremos dizer ao Governo: ajudámos o País em Maio com o PEC 2 e voltamos a ajudar agora com o Orçamento para 2011! Mas é o Governo que tem de provar a sua capacidade de executar o Orçamento que apresentou a esta Assembleia.
Não somos adeptos da política de «terra queimada». Não contem connosco para uma política de «quanto pior melhor»!

Aplausos do PSD.

Mas temos um dever para com os cidadãos: o dever de não consentir mais falhanços, que custam sempre mais e mais sacrifícios aos portugueses! A partir de agora, se o Governo falhar a execução deste Orçamento, não terá nem desculpa nem perdão.
Tem as condições políticas necessárias para o executar e os portugueses não toleram mais oportunidades perdidas.
Porque é responsabilidade dos políticos e, em primeiro lugar, do Governo dar sentido e utilidade aos sacrifícios que oneram a vida dos portugueses.
Porque é preciso devolver a esperança e a confiança no futuro, pelos portugueses e por Portugal!

Aplausos do PSD, de pé.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco de Assis.

O Sr. Francisco de Assis (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Daqui a poucos instantes, o Parlamento será chamado a votar a proposta de Orçamento do Estado para o próximo ano. Ninguém ignora ou deve ignorar a importância deste acto político, este ano especialmente responsabilizante, não apenas pela natureza do Orçamento em causa mas também por motivos que transcendem a simples apreciação do objecto da votação.
O País atravessa um momento especial, quer no plano político quer nos domínios económico e financeiro.
O impacto de uma eventual reprovação do Orçamento seria de tal ordem que se exige hoje aos partidos políticos uma particular precaução na abordagem deste assunto.
Sejamos, por isso, claros na avaliação das responsabilidades políticas que incubem aos partidos com representação parlamentar, em geral, e ao Governo, em particular. Este — o Governo — assenta numa maioria relativa, incapaz, por si só, de garantir no plano aritmético a aprovação do que quer que seja, incluindo, naturalmente, uma proposta de Orçamento do Estado, o que significa que o Governo tinha e tem uma dupla obrigação: a de elaborar um Orçamento que, em sua convicção, corresponda às necessidades

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presentes do País e a de promover as diligências necessárias para a concretização da sua aprovação no plano parlamentar.
Do lado das oposições, na sua diversidade e reciprocamente, colocam-se também duas obrigações: a da elaboração de um juízo crítico sério sobre o Orçamento, com a inerente publicitação das suas próprias linhas alternativas, e a de abertura para uma negociação conducente à sua ratificação parlamentar, de modo a garantir a estabilidade política do País, se este for um valor a ser tido em consideração por parte destas.
É verdade que, no limite, pode sempre ocorrer uma situação em que as divergências da apreciação programática do Orçamento ou um radical desencontro na leitura do interesse político do País conduzam a uma confrontação, com consequências fatais para a sobrevivência da solução política em vigor.
Ora, esta questão tanto se coloca ao Governo como às oposições. Desde logo, o Governo — este ou qualquer outro — tem o direito, senão mesmo o dever, de avaliar o custo das alterações a incorporar para garantir a adesão de outra ou de outras forças partidárias, bem como de interpretar criticamente a natureza das condições em que lhe é dado subsistir. Pela circunstância de ter ganho eleições, nenhum partido e nenhum governo daí resultante podem aceitar o peso insuportável de uma responsabilidade política castradora da sua identidade mais profunda.

Aplausos do PS.

A tese de que aos vencedores incumbe uma responsabilidade asfixiante e aos derrotados uma liberdade ilimitada é absurda e institucionalmente perigosa.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Francisco de Assis (PS): — Por isso mesmo, em circunstâncias normais — que não se verificam — , este Governo, que tem sido alvo de ataques tão violentos e, em muitos casos, tão incompreensíveis, e que se tem deparado com tantas resistências parlamentares à vontade dialogante que vem exibindo desde a primeira hora, poderia ponderar a apresentação de uma moção de confiança associada à discussão e à votação do Orçamento do Estado, para confrontar todos os intervenientes parlamentares com as suas próprias responsabilidades e para exigir publicamente, perante o País inteiro, a manifestação de um mínimo de solidariedade institucional, que a peculiar composição do Parlamento, de certa forma, reclama.
Porém, não vivemos hoje num contexto que permita este exercício de clarificação, por uma razão muito simples e facilmente entendível: o que hoje se ganharia com uma crise é infinitamente menor do que o que se perderia por causa dela!

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Francisco de Assis (PS): — Como tal, devemos saudar — e saudamos! — a atitude responsável e séria deste Governo, que enfrenta as dificuldades, não ilude as suas responsabilidades e aceita mesmo o diálogo para lá daquilo que é normalmente suportável.

Aplausos do PS.

Já as oposições se comportaram em todo este processo de forma diferente, uns rejeitando liminarmente o Orçamento, outros ensaiando movimentos de aproximação e afastamento, de acordo com incompreensíveis variações do seu próprio humor político. E é a avaliação desses comportamentos que também hoje aqui deve ser feita, porque ela tem implicação no nosso futuro próximo.
A extrema-esquerda parlamentar agiu como sempre age: excessiva nas proclamações, inútil nas contribuições!

Aplausos do PS.

Protestos do BE e do PCP.

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Fiéis a uma opção de vida política quase monacal, fecham-se em dogmas ultrapassados, ignoram simplesmente a evolução e a pressão dessa coisa desprezível que é a realidade e preservam a sua aparente pureza, recusando qualquer participação activa na construção de uma governação de esquerda responsável»

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Que vai caminhando para a social-democracia!

O Sr. Francisco de Assis (PS): — Infelizmente, tem sido sempre assim e, num ano de especiais dificuldades, não era de esperar comportamento diverso.
Foi claro, desde o início, que se empenharam em combater o Governo e o PS, com uma violência inibidora de um qualquer esforço de aproximação aceitável.
Não deixou, aliás, de ser curioso que, na intervenção que há poucos minutos acabou aqui de proferir, o Sr. Deputado Luís Fazenda tenha acabado por fazer um elogio da social-democracia e até venha defender e preconizar uma via humanista para a esquerda portuguesa».

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Veja bem»!

O Sr. Francisco de Assis (PS): — Como vai longe o Sr. Deputado Luís Fazenda daquilo que eram as suas posições historicamente conhecidas atç há muito pouco tempo»!

Aplausos do PS.

Risos do BE.

Se isso significa uma primeira abertura para uma reconfiguração doutrinária do Bloco de Esquerda, só temos de saudar essa abertura e exprimir a expectativa de que essa mudança se possa vir a consolidar.

Aplausos do PS.

Risos do BE.

É sempre tempo para se aproximarem da «esquerda do possível», da esquerda que historicamente tanto combateram,»

Vozes do BE: — Ahhh»!

O Sr. Francisco de Assis (PS): — » mas a õnica esquerda que, verdadeiramente, esteve á altura das suas responsabilidades e concorreu para grandes avanços no plano civilizacional.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Abandonaram a social-democracia»

Risos do BE.

O Sr. Francisco de Assis (PS): — Por isso, saúdo essa abertura e vejo tanto entusiasmo na bancada do Bloco de Esquerda,»

Risos do BE.

» que só tem como efeito aumentar a minha expectativa em relação aos vossos comportamentos futuros.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Bem pode esperar sentado!

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O Sr. Francisco de Assis (PS): — Já à direita observamos comportamentos distintos.
O CDS-PP, para quem toda a representação do mundo parece decorrer de um esforço de singularização face ao PSD, vê-se obrigado a reflectir estrategicamente as hesitações e as contradições deste partido. O mundo visto pelo Sr. Deputado Paulo Portas — que de momento não se encontra presente na Sala» — »

Risos do PS.

» está sempre dependente das opções momentâneas do partido a quem disputa a representação política na direita portuguesa, o que pode fazer — e não raro faz — do CDS-PP refém de estados de alma alheios e o que prejudica o seu contributo crítico para o debate político nacional.
Isto, unido a um impulso populista que se manifesta muitas vezes de forma aparentemente incontrolável, faz deste partido, demasiadas vezes, a versão à direita de uma corrente tribunícia no palco da vida política portuguesa.

Risos do CDS-PP.

É pena que assim seja, porque há alguns momentos em que temos a sensação de que não tem de ser, necessariamente, assim.

Risos e aplausos do PS.

Restava e resta o PSD. E é aqui que se vai colocar a questão decisiva para os próximos tempos da vida política portuguesa.
Tal como nós, o PSD tinha e tem a obrigação de não abrir irresponsavelmente uma crise. Se o Governo não devia apresentar uma moção de confiança, o PSD tinha a obrigação de não apresentar uma moção de censura, nem de agir de forma a torná-la efectiva, mesmo prescindindo formalmente da mesma pela via da reprovação do Orçamento do Estado. E isto porque todos temos consciência do momento extraordinário que estamos a atravessar em Portugal, na Europa e no mundo.
É por isso necessário clarificar o grau de responsabilidade de um partido com a história, o peso e as legítimas expectativas do PSD neste processo. Trata-se, do nosso ponto de vista, de uma responsabilidade de elevadíssimo grau, que não pode nem deve ser alienada, não ao ponto, naturalmente, de lhe exigirmos uma co-responsabilização pela governação do País, mas instando-o a uma clarificação dos fundamentos e da natureza dos compromissos que publicamente parece ter assumido e que assumiu, de facto, nos últimos dias.
É verdade que, ao fim de um longo e complexo processo, o PSD se dispôs a celebrar um entendimento que vai permitir a aprovação deste Orçamento. Há nessa atitude responsabilidade e elevação, que convém, publicamente, saudar e salientar. Mas, ao longo destes dias, assistimos demasiadas vezes, com um interregno que eu próprio tive oportunidade de saudar, configurado numa relevante intervenção da Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, à produção de um discurso radical e simplista, por vezes até mesmo aventureiro, e de todo em todo incongruente com a posição adoptada.
Dessa contradição resultam dúvidas: o PSD actua neste processo por convicção ou por cálculo? Age em obediência à sua interpretação do interesse nacional ou para promover apenas os seus interesses partidários? Está disponível para o diálogo ou pretende seguir pela via da ameaça? Quer evitar hoje a crise com o único intuito de a abrir de forma estrondosa amanhã? Vamos, infelizmente, sair daqui sem respostas absolutamente claras a tais interrogações, mas temos o dever de as fazer e de confrontar o PSD com as suas próprias responsabilidades, que são imensas, dados o peso, a dimensão e a história deste partido, que nós, de forma tão clara, respeitamos.
Fica, porém, o PSD, seja qual for a sua resposta, a saber, desde já, uma coisa: nunca responderemos à ameaça com medo, nem à arrogância com subserviência.

Aplausos do PS.

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Estamos aqui por um projecto e por Portugal. Não fugimos, não abdicamos! Resistimos, combatemos, dialogamos, mas também não desertaremos de ser nós próprios! Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Este Orçamento tem como marca fundamental a promoção da consolidação das contas públicas de forma a projectar uma imagem de confiança indispensável para a alteração das condições de obtenção do financiamento externo. Em cada momento, os responsáveis políticos têm a obrigação de definir prioridades em função dos temas e problemas que se lhes deparam. E hoje esta tem de ser a nossa prioridade urgente inadiável: reduzir o défice para o valor de 4,6%, constante dos compromissos assumidos no Programa de Estabilidade e Crescimento! Uma redução tão drástica do valor de défice implica a adopção de medidas especialmente duras que não deixarão de impor sacrifícios aos seus destinatários. É imperioso que esses sacrifícios sejam distribuídos em obediência a critérios de justiça social, procurando atingir menos os sectores mais vulneráveis da população portuguesa. Tal preocupação tem estado subjacente às múltiplas decisões do Governo neste processo.
Mas não nos iludamos: temos à nossa frente tempos difíceis e exigentes! O País não tem apenas um problema orçamental conjuntural; tem reais problemas estruturais, que se tornam mais evidentes num mundo mais aberto e competitivo. A forte crise que o mundo atravessa assola especialmente o espaço em que estamos inseridos e representa em grande parte o primeiro grande choque de adaptação ao processo de globalização. Da forma como a Europa vai reagir a este impacto, da forma como vai ela própria regular internamente e na sua relação com o exterior este processo de adaptação à globalização depende grande parte o nosso futuro nacional. É por isso que consideramos fundamental a manutenção da opção europeia — por muitas que sejam as dificuldades queremos enfrentá-las dentro e não fora da zona euro, participando activamente no processo europeu e não ficando à sua margem.
Temos consciência de que diversos espectros percorrem hoje a Europa, mas, apesar de tudo, é no projecto europeu que podemos encontrar o caminho para a resolução dos principais problemas que nos afectam.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Dentro de instantes, este Orçamento do Estado será aprovado. O País precisa dele. É o Orçamento necessário para enfrentar uma conjuntura especialmente adversa. É um Orçamento onde prevalece o sentido da responsabilidade pública e da seriedade política.
O Governo não iludiu as dificuldades nem se atemorizou perante elas; revelou carácter, determinação e coragem. Virtudes tão necessárias nos tempos difíceis que correm!

Aplausos do PS.

Sairemos daqui com um Orçamento aprovado e uma esperança para concretizar: a esperança renovada do triunfo de uma cultura do compromisso democrático e da afirmação de uma justa partilha das responsabilidades que nos estão cometidas. Portugal precisa disso: precisa de menos sectarismo, de menos populismo, de menos conflitualidade gratuita; e de mais abertura, tolerância e disponibilidade para o entendimento! Há na vida política e na história dos povos tempos para tudo: tempos para a ruptura e tempos para o compromisso; tempos para a solidão política e tempos para o consenso! E este deve ser um tempo de compromisso, mas um compromisso com honra, porque para a honra é que só há um tempo: o nosso tempo de todos os dias!

Aplausos do PS, de pé.

O Sr. Presidente: — Para encerrar o debate, em nome do Governo, tem a palavra, na defesa da proposta de lei do Orçamento do Estado, o Sr. Ministro da Defesa Nacional.

Aplausos do PS.

Risos do PSD e do BE.

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O Sr. Ministro da Defesa Nacional (Augusto Santos Silva): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A proposta de lei do Orçamento de Estado para 2011 responde a uma urgência — a urgência de resolver o problema do financiamento do Estado e da economia portuguesa! Precisamos de acelerar o processo de consolidação das contas públicas para colocar o nosso país ao abrigo da turbulência dos mercados financeiros internacionais.
Retirar Portugal da «zona de perigo» e garantir a confiança dos mercados, indispensável ao financiamento, constituem condições necessárias para o prosseguimento das políticas públicas de estímulo ao crescimento da economia e do emprego, de desenvolvimento do modelo social e de qualificação e modernização estrutural.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Vê-se!

O Sr. Ministro da Defesa Nacional: — A consolidação orçamental não é um fim em si mesmo; é uma condição das políticas económicas e sociais. Mas é uma condição necessária, pois, nas actuais condições de mercado, a mínima hesitação na consolidação teria efeitos devastadores sobre a capacidade do País para afirmar e aplicar autonomamente a sua vontade e as suas escolhas.
Por isso, este é um tempo de particular exigência. Uma consolidação com o ritmo e a intensidade como a que temos de fazer — a qual significa diminuir, num só ano, em quase 5000 milhões de euros a despesa pública primária — tem custos económicos e sociais que ninguém pode ignorar ou desvalorizar; impõe restrições severas ao crescimento da economia, ao rendimento disponível das famílias, ao emprego dos trabalhadores, ao nível das transferências sociais, à gestão dos serviços públicos. O Governo sabe-o, e não o esconde. Mas, porque tem a consciência da necessidade e urgência das medidas de consolidação (duras, difíceis, impopulares), sabe também que este é um tempo de particular exigência para quem tem a responsabilidade de agir, de conduzir o País, de mobilizar toda a sociedade para um esforço que só será bem sucedido se for nacional, quer dizer, se for um esforço de todos nós.
A primeira grande questão política é, pois, a de saber quem está à altura da exigência da hora presente.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — O Espírito Santo»!

O Sr. Ministro da Defesa Nacional: — O Governo apresenta, modestamente, os seus créditos: créditos demonstrados não em vãs palavras, mas nas acções concretas! Em primeiro lugar, a capacidade que evidenciou para atacar e resolver a grave crise orçamental que herdou em 2005 dos governos de centro-direita,»

Aplausos do PS.

Vozes do PSD: — Ohhh!»

O Sr. Ministro da Defesa Nacional: — » levando o dçfice de 6,8% para 2,6% em apenas dois anos, ao mesmo tempo que induzia o crescimento e se tornava, pela primeira vez, positiva a balança tecnológica da economia portuguesa.
Depois, a capacidade de enfrentar imediatamente o risco de descalabro em todo o sistema financeiro, que irrompeu no segundo semestre de 2008, impedindo, com a intervenção pública, as consequências devastadoras que o colapso do sistema financeiro teria sobre o crédito e as poupanças.
E, ao longo de 2009, em linha com o que fizeram todos os governos do mundo desenvolvido, a capacidade de pôr em prática as medidas de protecção social, apoio às famílias, investimento público e crédito às empresas, que limitaram a envergadura da recessão e impediram uma crise social de proporções equivalentes às de outras depressões do passado.
O que isto quer dizer é muito simples: é que este Governo nunca governou senão em tempos difíceis, em tempos de necessidade e de exigência. Foi neles que forjou a sua têmpera. E é essa têmpera que tem a oferecer, em penhor, aos portugueses, agora que, mais uma vez, é preciso meter mãos à obra e superar mais um grande desafio: a aceleração da consolidação das contas públicas.

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É porque a acção em prol da saúde financeira do Estado está muito longe de ser, para nós, uma novidade.
Pelo contrário, é uma marca da nossa governação.
Antes da crise de 2008-2009, já o Governo conduzia reformas verdadeiramente estruturais, em pontos críticos para a sustentabilidade das finanças públicas e das políticas sociais: fizemos a reforma da segurança social; procedemos à convergência dos regimes de protecção da função pública com os do sector privado; alterámos a legislação laboral; extinguimos um em cada quatro organismos públicos e um em cada quatro cargos dirigentes; racionalizámos a rede escolar e introduzimos a avaliação do desempenho de docentes e de escolas; reestruturámos a rede de cuidados de saúde primários.
E a pergunta política central é esta: em quem deve o País confiar neste novo tempo de exigência?

Risos do PSD.

Em quem, como o Governo e a maioria do PS, impulsionou as reformas necessárias, no tempo próprio, assim atacando causas estruturais de ineficiência e desperdício no Estado ou em quem, como as diversas forças de oposição, sempre se manifestou contra tais reformas?

Aplausos do PS.

Mas há uma segunda questão política central deste debate: é a questão de saber quem melhor compreende as causas e a dimensão da crise que atravessamos, porque só quem compreender bem a presente crise estará em condições de superá-la.
Ora bem, dos dois lados do Hemiciclo ouvimos exprimir-se o mesmo erro fatal: a crise seria exclusivamente portuguesa, a responsabilidade pela crise pertenceria exclusivamente ao Governo português, a causa fundamental da crise radicaria na natureza e na dimensão do Estado português. A cegueira do preconceito é de tal monta que não há evidência que a ilumine. Bem se pode chamar a atenção para realidades básicas — que 24 dos 27 países da União Europeia e 15 dos 16 parceiros da zona euro têm hoje défices excessivos, que 11 dos 27 Estados-membros sobem (ouviram bem, Srs. Deputados, sobem!) os seus défices em 2010 e que Portugal está entre os que mais reduzem o défice em 2010 e os que mais reduzirão, em 2011 — ,»

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Quantos estão em recessão?

O Sr. Ministro da Defesa Nacional: — » bem se pode lembrar estas evidências simples, que os nossos opositores se limitarão a repetir que o actual Governo deve ser destruído, com a mesma monotonia com que, na Antiguidade, Catão fazia questão de encerrar os seus discursos, fosse qual fosse o tema, com a exortação ritual à destruição de Cartago.
Mas não compreender a dimensão internacional da crise é não compreender o que verdadeiramente nos ameaça à escala europeia: o ataque sem precedentes às dívidas soberanas e à estabilidade monetária! Não é, Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, o mercado ter regras. É exactamente o contrário, é os mercados financeiros hoje estarem desregulados, e é não compreender o quadro europeu de referência na resposta à crise por via da aceleração da consolidação orçamental, o quadro de referência da nossa acção que só os «vendedores de ilusões» negarão, e que tem levado, por toda a Europa, à adopção de medidas duras de reforma e contenção equivalentes às de Portugal.
E eu pergunto: quem, entre nós, insiste em recusar compreender a natureza europeia da crise saberá enfrentá-la? Entendo que não. E não é, pobre de mim, porque ache que lhe faltam engenho e arte. O ponto é outro: é porque algumas forças de oposição ao Governo da esquerda democrática portuguesa olham para a crise menos como uma emergência nacional a que é preciso acudir com presteza, destemor e responsabilidade, e mais como uma oportunidade caída dos céus para desgastar e, quiçá, derrubar este Governo. Isto é: em vez de se firmarem contra a crise, deleitam-se com a crise; em vez de verem na resposta à crise um ensejo estratégico para retirar o País da zona de risco e corrigir alguns dos seus desequilíbrios estruturais, vêem na crise a oportunidade táctica de cavalgar o protesto, capitalizar o descontentamento ou até, tão-somente, ganhar uns «pozinhos» de popularidade.

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É como se a crise, em vez de ser um problema, lhes parecesse ser uma espécie de oxigénio para uma oposição sempre tão anémica em ideias e propostas positivas.

Aplausos do PS.

Terceira questão política em torno do Orçamento: a questão dos objectivos. Para que fazemos a consolidação? Para que queremos reduzir o défice? Para que queremos, depois de dois anos em que a crise provocou quebra da receita e exigiu aumento do investimento, do incentivo económico e da despesa social, para que queremos repor a saúde das contas públicas? A resposta a esta pergunta capital divide as correntes políticas representadas neste Parlamento.
Do lado mais extremo à esquerda, pura e simplesmente, responde-se que não, que não se quer a consolidação orçamental. O mais que se consegue fazer são umas tiradas de um simplismo político aflitivo — e, aliás, num tom pujadista que o manto diáfano do radicalismo não logra disfarçar.
À direita, vê-se nisto a oportunidade de pôr em causa o Estado, o serviço público e a política social. Não é por acaso que as duas propostas por que mais se bateu, nas últimas semanas, o PSD foram a manutenção das deduções fiscais para os escalões mais elevados do IRS, isto é, o financiamento público da despesa privada com saúde e educação, e o corte nos consumos intermédios que, em 70% do seu valor, decorrem da cobertura de cuidados de saúde.
O projecto de revisão constitucional apresentado pelo PSD é, a este respeito, absolutamente cristalino: fim do Serviço Nacional de Saúde e da escola, tal como nós hoje a conhecemos, isto é, acolhendo todos e financiada por todos, e maior desprotecção dos trabalhadores face ao risco de despedimento sem justa causa.
O Programa do Governo é bem diferente: queremos a consolidação orçamental como condição necessária do crescimento económico e do emprego. Mas queremos também fazer uma verdadeira consolidação social, isto é, uma calibragem sustentável das funções sociais do Estado, sendo que queremos defender o Estado social.
Em matéria de políticas sociais, a verdade é que há um antes e haverá um depois da governação do PS: há um antes e um depois da valorização da família como instituição pluriforme, resultado da livre escolha de seres humanos auto-determinados; há um antes e um depois da plena garantia de acesso dos imigrantes à cidadania e aos direitos sociais; há um antes e um depois da criação do Complemento Solidário para Idosos; há um antes e um depois da criação do abono pré-natal; há um antes e um depois do lançamento da rede de cuidados continuados;»

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — O «depois» foi quando desapareceram!

O Sr. Ministro da Defesa Nacional: — » há um antes e um depois da criação de bolsas para o ensino secundário.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — O «depois» foi quando foram extintas!

O Sr. Ministro da Defesa Nacional: — Antes nenhuma destas medidas existia; agora elas existem e constituem um novo patamar qualitativo no nosso Estado social.

Aplausos do PS.

Protestos do CDS-PP.

Risos do BE.

No seu conjunto, as despesas sociais do Estado passaram de 17,8% do PIB, em 2005, para 22,4%, em 2010, e atingirão os 21,6% em 2011, isto é, ligeiramente acima do valor de 2009.
O que estamos a fazer é, pois, a consolidar, em sentido próprio, as políticas sociais e fazemo-lo de três maneiras complementares: em primeiro lugar, aperfeiçoamos a fiscalização das prestações e a

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contratualização das medidas de integração, porque só assim garantimos o uso apropriado e eficiente de recursos públicos, que são sempre escassos; em segundo lugar, impomos em todas as prestações nãocontributivas a condição de recursos, porque só assim garantimos que os apoios sociais chegam, efectivamente, aos que deles precisam; e, em terceiro lugar, racionalizamos os gastos, porque só a gestão económica e prudente garante a sustentabilidade financeira e a própria continuidade da política social.
Precisaríamos de mais recursos financeiros? Sim, precisaríamos! A intensidade do ajustamento implica sacrifício nas famílias? Sim! Seria mais fácil se o ajustamento não tivesse de ser tão brusco, mas eu pergunto: e o que é que aconteceria se tivesse triunfado a insensata deriva da direita e da extrema-esquerda que, no dia 27 de Novembro de 2009, aqui, no Parlamento, convergiram para aumentar a despesa e diminuir a receita do Estado em valores próximos dos 1000 milhões de euros, e que só não foi para a frente porque o Governo se lhe opôs energicamente?!

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Fantástico»!

O Sr. Ministro da Defesa Nacional: — O que aconteceria, agora, se vingasse a proposta do PSD, a tese do PSD, de que nenhuma redução do défice se poderia fazer por melhoria da receita e, portanto, mais e mais profundos cortes haveriam de ser feitos na educação, na saúde, na segurança e solidariedade social? É que, Srs. Deputados, quem acha que o Estado social é um Levitan pode bem conviver com a sua ilusão!»

Protestos do Deputado do PSD Pacheco Pereira.

Quem acha que o Estado social deve ser só garantia, minimalista, reservado aos pobrezinhos pode bem conviver com a degradação das suas condições financeiras! E quem, nas duas bandas do espectro parlamentar, só pensa na capitalização dos protestos do momento pode bem conviver com a consciência — a que, certamente, não escapa — de que está a transferir os custos da benesse e dos adiamentos de agora para as gerações futuras.

Protestos de alguns Deputados do PSD.

Mas, quem ama o Estado social, quem entende que o Estado social é a marca identitária da Europa democrática e é o «factor número 1» da combinação entre crescimento e bem-estar que singulariza a Europa, esses sabem que cuidar da legitimidade e cuidar da sustentabilidade do Estado social é cuidar do futuro do Estado social.

Aplausos do PS.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Este debate decorreu sob vários signos.
No pólo extremo da esquerda parlamentar imperou a negação: a negação da realidade, a negação do quadro europeu, a negação das restrições financeiras, a negação dos condicionalismos de mercado, a negação dos desequilíbrios estruturais da economia e da sociedade portuguesas! E a denegação é tão funda que o discurso político da extrema-esquerda — lamento dizê-lo! — cada vez mais se substitui à argumentação contraditável pela oca jactância moralista.

Aplausos do PS.

Risos do BE.

À direita, mais direitista, e por extraordinária opção da própria, o signo que predominou foi — e a palavra não é minha — o signo do pimba.

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Bem pode o Dr. Paulo Portas esforçar-se por ganhar o «Óscar dos melhores efeitos especiais» para disfarçar o lugar de não-responsabilidade que escolheu nesta hora difícil para a Nação, bem pode tentar apagar o seu próprio passado e pela ençsima vez fingir de Fçnix renascida,»

O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Já tínhamos saudades disto»!

O Sr. Ministro da Defesa Nacional: — » bem pode fazer isso e muito mais, debalde!

Risos do PS.

A revelação do debate pelo lado do CDS foi, verdadeiramente, a de que há quem no CDS prefira à teatralidade histriónica e blasé de Paulo Portas a chã e honesta brejeirice de Quim Barreiros.

Risos e aplausos do PS.

Risos do CDS-PP.

Ironias à parte, Srs. Deputados da direita, o que resta deste debate é que, numa hora que a todos exigia responsabilidade nacional, a direita se recusou a dizer «presente!». É isto que resta deste debate!! E o PSD? O PSD começou o debate como Marte — o deus da guerra e do afrontamento — e acabou como Jano — a divindade da dupla face, símbolo da incoerência e da indecisão.

Risos do PSD.

Começou, ontem, como Marte, com pose agressiva, rasgando as suas próprias vestes de signatário do entendimento e ameaçando com um novo e fatal recontro para daqui a uns poucos meses — isto é, profetizando, instabilidade e confrontação — , e acabou vítima, hoje, de uma admoestação pública da sua expresidente, que lhe repetiu, desta mesma Tribuna, os avisos, há muito, provenientes do Governo.

Risos do PSD.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Ohhh»!

O Sr. Ministro da Defesa Nacional: — A saber: que este é o Orçamento de que o País precisa; que mais importante até do que a sua aprovação será a sua execução; que essa execução é da responsabilidade do Governo e não pode ser prejudicada, cito, «por nenhuma manobra política»; e que é preciso saber colocar, no próximo futuro, como foi colocado agora, o interesse nacional acima do interesse meramente partidário.

Aplausos do PS.

Risos do PSD.

Pois bem, serei o primeiro a compreender que o PSD sinta extremas dificuldades em reconhecer a razão destes argumentos quando os ouve da boca do Governo; mas peço, ao menos, que a reconheça quando ouve os mesmos argumentos a uma sua e tão ilustre Deputada.

Risos e aplausos do PS.

Protestos de alguns Deputados do PSD, batendo com os pés no chão.

Que a Sr.ª Deputada possa ser nesta hora um Mercúrio capaz de transmitir ao indeciso Jano palavras de sensatez e de responsabilidade.

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O Sr. Luís Fazenda (BE): — Para quem falava de jactància»

Risos do BE.

O Sr. Ministro da Defesa Nacional: — A hesitação, as contradições, os tabus criados pela liderança do PSD já custaram semanas e semanas de incerteza ao País, numa questão politicamente tão decisiva como é a aprovação do Orçamento, e os portugueses pagaram já, por isso, um custo totalmente inútil.

Protestos do PSD.

Não pode, agora, o PSD querer prolongá-la por mais tempo! Tem de decidir-se entre a responsabilidade e a pusilanimidade, entre a coerência e a hipocrisia política — não pode é ficar na condição de uma espécie de «oximoro político», conjunção ilógica de opostos, ao mesmo tempo concordante e discordante, parceiro e adversário, aliado e inimigo, contente e descontente até consigo próprio! Não pode é ficar aquém do limiar da responsabilidade, eternamente indeciso, falando a várias vozes e olhando em contrárias direcções, como Jano da Mitologia.
Não! Os tempos não são tempos de «quase»! Os tempos não são tempos de ficar pela metade! Os tempos são tempos de se ser inteiro! Os tempos não toleram nem a bravata de Marte nem a indecisão de Jano! Os tempos pedem a sabedoria e a coragem de Minerva!

Aplausos do PS.

Risos do BE e do PCP.

O interesse nacional, do nosso ponto de vista, exige a aprovação do Orçamento e exige ainda mais a sua execução bem sucedida! E, portanto, o sentido de responsabilidade e a valorização da estabilidade política, a cultura institucional e de compromisso têm de orientar a acção dos agentes políticos também ao longo do próximo ano.
E o que posso garantir, Sr.as e Srs. Deputados, é a total disponibilidade do Governo para isso: para assumir integralmente a sua responsabilidade, para conduzir a aplicação rigorosa e inflexível deste Orçamento, para procurar e construir os consensos institucionais e políticos necessários à estabilidade e à confiança! Porque é isso que verdadeiramente nos move: a confiança! A confiança no nosso querer e na nossa energia, na nossa determinação, mas, sobretudo, a confiança nos Portugueses.
Fernando Pessoa escreveu»

Vozes do PSD: — Ohhh»!

O Sr. Ministro da Defesa Nacional: — Fernando Pessoa escreveu: «Eu sou do tamanho do que vejo, não do tamanho da minha altura.«»

Protestos de alguns Deputados do PSD.

É este o desafio que se nos coloca a todos nós: estarmos à altura do que podemos ver no futuro à nossa frente! Sim, os tempos são difíceis, estão difíceis os tempos! São difíceis as condições internacionais, os nossos próprios desequilíbrios estruturais, a que se soma a debilidade da cultura política de compromisso em Portugal e a inexistência de um pacto social de médio prazo, mas dizer, apenas, que os tempos são difíceis é dizer pouco ou dizer nada!! A questão é o que fazemos nestes tempos e, frente a eles, há quem proponha: livrem-se do Estado social, e há quem proponha que nada se faça, que nada se corrija, que nada se reforme.

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Nenhuma destas atitudes permite sair da crise — ambas simétricas uma da outra! A única atitude que nos permite responder à crise é tomar bem consciência da responsabilidade que nos cabe: a responsabilidade de aprovar este Orçamento e a responsabilidade de executá-lo com rigor e com determinação; a responsabilidade de garantir a estabilidade política e a cultura de concertação e compromisso, que são os factores indispensáveis de governabilidade e de confiança económica e social!! Responsabilidade, pois, responsabilidade política. Esta é a escolha do Governo, porque esta é a nossa obrigação, a obrigação de todos nós perante Portugal e perante os portugueses!

Aplausos do PS, de pé.

Protestos de alguns Deputados do PSD, batendo com os pés no chão.

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, findo o período de encerramento do debate na generalidade da proposta de lei de Orçamento do Estado para 2011, vamos dar início às votações, para o que importa, antes de mais, proceder à verificação electrónica do quórum de deliberação.
Os Srs. Deputados que, por qualquer razão, não puderem proceder ao registo electrónico da sua presença devem assinalá-lo à Mesa e proceder, depois, ao registo presencial, junto dos serviços.

Pausa.

Sr.as e Srs. Deputados, o quadro electrónico regista a presença de 226 Deputados e a Mesa regista a presença de mais três (96 do PS, 81 do PSD, 21 do CDS-PP, 16 do BE, 13 do PCP e 2 de Os Verdes), o que perfaz um total de 229 Srs. Deputados presentes, havendo, por isso, quórum de deliberação suficiente.
Começamos, então, por votar, na generalidade, a proposta de lei n.º 42/XI (2.ª) — Orçamento do Estado para 2011.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, votos contra do CDS-PP, do BE, do PCP e de Os Verdes e a abstenção do PSD.

Srs. Deputados, a referida proposta de lei baixa à 5.ª Comissão.

Aplausos do PS.

Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Rodrigues.

O Sr. Pedro Rodrigues (PSD): — Sr. Presidente, quero apenas informar a Câmara de que apresentarei uma declaração de voto, em meu nome e no de outros Srs. Deputados do PSD.

O Sr. Presidente: — Fica registado, Sr. Deputado.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Cabeleira.

O Sr. António Cabeleira (PSD): — Sr. Presidente, do mesmo modo, quero informar que apresentarei uma declaração de voto, em meu nome e no dos Srs. Deputados António Montalvão Machado e Isabel Sequeira.

O Sr. Presidente: — Muito bem, Sr. Deputado.
Tem, agora, a palavra a Sr.ª Deputada Vânia Jesus.

A Sr.ª Vânia Jesus (PSD): — Sr. Presidente, quero anunciar que os Deputados do PSD eleitos pelo Círculo Eleitoral da Região Autónoma da Madeira irão apresentar uma declaração de voto.

Vozes do PS: — Ahhh»!

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O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Mourão.

O Sr. Mário Mourão (PS): — Sr. Presidente, quero também informar V. Ex.ª de que apresentarei uma declaração de voto por escrito.

Vozes do PSD: — Ahhh»!

O Sr. Presidente: — Fica registado, Sr. Deputado.
Passamos à votação, na generalidade, da proposta de lei n.º 39/XI (2.ª) — Proíbe qualquer discriminação no acesso e no exercício do trabalho independente e transpõe a Directiva 2000/43/CE, do Conselho, de 29 de Junho de 2000, a Directiva 2000/78/CE, do Conselho, de 27 de Novembro de 2000, e a Directiva 2006/54/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de Julho de 2006.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PSD e do CDS-PP, e abstenções do BE, do PCP e de Os Verdes.

A proposta de lei baixa à 11.ª Comissão.
Vamos, agora, votar o texto final, elaborado pela Comissão de Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local, sobre o projecto de lei n.º 23/XI (1.ª) — Regime da prática de naturismo e da criação de espaços de naturismo (Os Verdes).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Passamos à votação do texto final, elaborado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo aos projectos de lei n.os 299/XI (1.ª) — Reduz as subvenções públicas e os limites máximos dos gastos nas campanhas eleitorais (Terceira alteração à Lei n.º 19/2003, de 20 de Junho, financiamento dos partidos políticos e das campanhas eleitorais) (BE) e 317/XI (1.ª) — Financiamento dos partidos (PCP).

O Sr. António José Seguro (PS): — Sr. Presidente, permite-me uma interpelação à Mesa?

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. António José Seguro (PS): — Sr. Presidente, tendo em consideração o tempo que mediou entre a disponibilização deste texto e o momento desta votação, gostava de colocar à consideração do Sr. Presidente e de toda a Câmara a possibilidade de apenas votarmos o artigo 3.º, que diz respeito à diminuição do financiamento público para os partidos, as campanhas e os grupos parlamentares.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, esse seu pedido é interessante, mas não é praticável, porque o Sr. Deputado pede que se vote apenas um artigo de uma iniciativa.
O seu requerimento de adiamento é inteiramente legítimo e vou já submetê-lo à consideração do Plenário, mas, antes, terá de me dizer por quantos dias pretende o adiamento. Talvez até à próxima votação regimental»

O Sr. António José Seguro (PS): — Adivinhou o meu pensamento, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Quanto a isolarmos um artigo, Sr. Deputado, entendo que não podemos votar na especialidade um texto que nos é enviado por uma comissão para votação final global, porque isso seria uma subversão do nosso processo regimental de elaboração das leis, que o Sr. Deputado bem conhece.
Em todo o caso, vou já submeter ao voto do Plenário o seu requerimento verbal no sentido do adiamento desta votação.

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O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr. Presidente, peço desculpa, mas permite-me também uma interpelação à Mesa?

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr. Presidente, a propósito deste requerimento, quero apenas dizer duas coisas muito simples, a primeira das quais é a de que todos os prazos aplicáveis ao «endosso» do relatório da Comissão para a Mesa, para que esta votação se pudesse realizar, foram cumpridos. De resto, dá-se até a circunstância de já termos votado a proposta de lei n.º 39/XI (1.ª), cujo relatório, esse, sim, chegou já depois deste, cuja votação vamos agora iniciar, e de nenhum Deputado ter suscitado, nessa altura, a vontade de aprofundar mais a discussão deste diploma.
Por essa razão, não compreendemos, efectivamente, o alcance deste requerimento e não o votaremos favoravelmente.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, a Mesa também tem a consciência de que este guião de votações foi organizado e distribuído dentro dos prazos estipulados no Regimento e que os procedimentos realizados pela Comissão decorreram nos prazos normais.
Em todo o caso, a Mesa não quer deixar de submeter à votação o requerimento verbal do Sr. Deputado António José Seguro, no sentido de que se adie, até à próxima votação regimental, a votação do texto final, elaborado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo aos projectos de lei n.os 299/XI (1.ª) — Reduz as subvenções públicas e os limites máximos dos gastos nas campanhas eleitorais (Terceira alteração à Lei n.º 19/2003, de 20 de Junho, financiamento dos partidos políticos e das campanhas eleitorais) (BE) e 317/XI (1.ª) — Financiamento dos partidos (PCP), pelo que vamos votar.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD, do CDS-PP e do PCP e votos a favor do BE, de Os Verdes e de 36 Deputados do PS.

Tendo sido rejeitado o requerimento de adiamento, vamos votar o referido texto final»

O Sr. António José Seguro (PS): — Sr. Presidente, peço desculpa»

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado António José Seguro, no decurso de uma votação não pode haver interrupções. Peço a sua atenção para a observação dessa disposição do Regimento.

O Sr. António José Seguro (PS): — Serei escrupulosamente cumpridor, Sr. Presidente. A única coisa que requeiro é que haja uma separação e que o artigo 3.º possa ser votado separadamente.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, isso já foi decidido antes.

O Sr. António José Seguro (PS): — Não, Sr. Presidente. Foi decidido o adiamento»

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, o seu requerimento seria global; não poderia haver uma votação de especialidade, quando se está a proceder a uma votação final global.
Neste momento, estamos a votar. Não pode haver interrupções num processo de votação, pelo que vamos votar o referido texto final.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS e do PSD, votos contra do BE, do PCP e de Os Verdes e abstenções do CDS-PP e de 9 Deputados do PS.

Srs. Deputados, importa ainda apreciar e votar um parecer da Comissão de Ética, Sociedade e Cultura, pelo que peço á Sr.ª Secretária que nos dê conta do referido parecer»

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O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Sr. Presidente, peço desculpa, mas permite-me o uso da palavra?

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Sr. Presidente, quero apenas informar que o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda se inscreve para uma declaração de voto sobre a matéria que acabámos de votar.

O Sr. Presidente: — Fica registado, Sr. Deputado.
A Mesa registou também a inscrição do Sr. Deputado Bernardino Soares. Pede a palavra para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr. Presidente, pretendo usar da palavra para proferir uma declaração de voto oral sobre esta última votação.

O Sr. Presidente: — Muito bem, Sr. Deputado, dar-lhe-ei a palavra, mas, se não se importa, procederemos primeiro à apreciação e à votação do parecer da Comissão de Ética.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, peço desculpa, mas, já agora, quero também inscrever o Sr. Deputado João Pinho de Almeida para proferir uma declaração de voto oral sobre a mesma matéria.

O Sr. Presidente: — Muito bem, Sr. Deputado.
As declarações de voto serão proferidas depois da votação do parecer da Comissão de Ética, pelo que peço à Sr.ª Secretária que nos dê conta do referido parecer.

A Sr.ª Secretária (Celeste Correia): — Sr. Presidente, Srs. Deputados e Sr.as Deputadas, de acordo com o solicitado pela Inspecção-Geral do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Processo n.º ISCTE.01/09.092-2010, a Comissão de Ética, Sociedade e Cultura decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Miguel Vale Almeida a prestar depoimento presencialmente, como testemunha, no âmbito dos referidos autos.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, está em apreciação.

Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, vamos votar o referido parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Passamos, então, às declarações de voto sobre a votação do texto final, elaborado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo aos projectos de lei n.os 299/XI (1.ª) — Reduz as subvenções públicas e os limites máximos dos gastos nas campanhas eleitorais (Terceira alteração à Lei n.º 19/2003, de 20 de Junho, financiamento dos partidos políticos e das campanhas eleitorais) (BE) e 317/XI (1.ª) — Financiamento dos partidos (PCP).
Tem a palavra, em primeiro lugar, o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Terminou este processo de apreciação de uma alteração à lei de financiamento dos partidos, uma lei que, fruto da convergência, em 2003, do PS, do PSD e do CDS-PP, se traduziu num grave atentado ao regime democrático, designadamente em dois aspectos fundamentais: por um lado, aumentou brutalmente as subvenções públicas aos partidos e às campanhas eleitorais, bem como os respectivos limites; por outro, consagrou regras absurdas e

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antidemocráticas, visando, no fundamental, o PCP, as suas características e actividade, com particular destaque para a Festa do Avante! Durante estes anos, o PCP sempre lutou contra esta lei e isto, entre outras razões, levou a que, na anterior Legislatura, se tivesse desenvolvido um processo de discussão da lei e da sua alteração na Assembleia da República, em que foram reconhecidos, mesmo pelos proponentes, alguns dos erros desta lei, tendo-se chegado a um consenso no sentido de alterar algumas das regras mais gravosas, consenso que na anterior legislatura reuniu a unanimidade de todas as forças parlamentares. Eram alterações que não resolviam de todo a injustiça criada por esta legislação, mas eram, apesar de tudo, um avanço no sentido de minimizar uma parte das suas graves consequências.
Como se sabe, o Presidente da República vetou esta lei deixando intacta a inaceitável legislação de 2003 e fazendo, por exemplo, com que as verbas dos grupos parlamentares não fossem reindexadas ao indexante de apoios sociais e aumentassem, estes anos, na mesma proporção em que aumentou o salário mínimo nacional.
O actual processo legislativo mereceu por parte do PCP a apresentação de um projecto de lei com propostas em dois sentidos fundamentais: por um lado, fazer regressar os montantes das subvenções de lei e os limites de despesas aos montantes e limites existentes antes da lei de 2003, reindexando também as verbas para os grupos parlamentares ao indexante de apoios sociais, em vez de ao salário mínimo nacional; por outro lado, introduzir, mesmo que de forma limitada, alguma correcção às normas mais gravosas da lei em vigor, aproveitando até o consenso do processo legislativo da legislatura anterior.
O PCP, lembre-se, tinha o único projecto de lei que continha, para além do corte nas subvenções eleitorais, um corte nas subvenções anuais dos partidos.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Bem lembrado!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — No que diz respeito em concreto aos cortes nas subvenções públicas, a proposta do PCP implicava uma redução de 6,8 milhões de euros na subvenção anual aos partidos e de 38 milhões de euros nas subvenções eleitorais para um ciclo eleitoral completo das várias eleições.
As propostas aprovadas ficaram muito aquém desta proposta do PCP, ficando-se apenas pelos 10% de cada uma das subvenções: aos 38 milhões, que significariam a poupança decorrente das propostas do PCP, contrapõem-se os 6,3 milhões de euros, mais 1,7 milhões das subvenções anuais, a que corresponde o corte que aqui propuseram e aprovaram o PS e o PSD.
Num momento em que o PS e o PSD querem impor — ainda agora votámos o Orçamento do Estado — aos portugueses brutais penalizações dos salários, das reformas e das prestações sociais, estes cortes são por isso escandalosamente baixos.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Exactamente!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Mas neste processo esteve também à beira do consenso uma ligeira melhoria nos limites das receitas das iniciativas de angariação de fundos e das receitas em numerário. Era insuficiente e estava aquém até do consenso obtido na anterior legislatura, mas ainda assim era um pequeno avanço em sentido positivo.
É preciso dizer que o consenso à volta da alteração destas matérias foi inviabilizado pela rejeição do BE, declarando que estava apenas disponível para o corte nas subvenções eleitorais. PS, PSD e CDS recuaram então na intenção de consagrar estas alterações que seriam admitidas em caso de consenso. Desta vez, foi o BE que impediu, que bloqueou alguma melhoria destas tão injustas normas.
O BE esteve em 2003 contra esta lei, aprovou as alterações na anterior legislatura, as quais foram aprovadas por unanimidade, nesta Câmara, e depois vetadas pelo Presidente da República, e agora esteve contra uma pequena melhoria, aquém até do que tinha sido aprovado na legislatura anterior.
Sabemos que o PS, o PSD, o CDS-PP e também o BE vivem no fundamental das subvenções públicas do Estado para o seu financiamento. Estão no seu direito, não queremos impedir que isso aconteça, cada um deve organizar-se de acordo com a sua filosofia e com a sua liberdade de auto-organização. Agora, o que não aceitamos é que se perpetue uma lei que impede outros, como o PCP, de viverem de acordo com a sua natureza e com a sua filosofia! Trata-se de garantir a todos os partidos a possibilidade de desenvolverem

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livremente a sua actividade, e do nosso ponto de vista — e penso que isso é absolutamente claro — as quotas de militantes e as receitas da Festa do Avante nada têm de pouco transparente nem de ilegal, e é inaceitável que continuem a ser tratadas com tal por esta lei.

O Sr. Presidente: — Tem de concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Vou já terminar, Sr. Presidente.
Neste processo o PS, o PSD e o CDS, e agora também o BE, impediram que essas normas fossem alteradas, mas o PCP não deixará de lutar pela alteração destas normas tão gravosas, defendendo a transparência e a liberdade de auto-organização dos partidos.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para proferir uma declaração voto, o Sr. Deputado João Pinho de Almeida.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Este foi um processo legislativo que, infelizmente, terminou frustrando completamente aquelas que eram as suas intenções, pelo menos as dos partidos proponentes.
Começou por ser frustrante logo no debate, na generalidade, quando o PS, o PSD, o BE e o PCP chumbaram uma iniciativa legislativa do CDS»

Vozes do CDS-PP: — Bem lembrado!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — » que permitiria acabar com um dos meios de campanha não só mais dispendiosos como mais lesivos da sustentabilidade das campanhas eleitorais.
Quando apresentámos um projecto de lei para que se reduzisse a subvenção pública para os outdoors, todos os partidos desta Assembleia, sem excepção, o chumbaram e serão responsáveis por aquilo que vier a acontecer nas próximas campanhas: mais uma vez, teremos as vilas, cidades e aldeias do País cheias de outdoors num espectáculo que é absolutamente lamentável e que em nada contribui para o esclarecimento dos cidadãos!

Aplausos do CDS-PP.

Mas há pior: durante o processo de discussão, na especialidade, perante propostas e iniciativas do CDSPP, do BE e do PCP, o PS e o PSD uniram-se para frustrar todos os objectivos dessas iniciativas legislativas.
E sabemos que em processos desta natureza quando normalmente PS e PSD se unem não sai bom resultado. E mais uma vez isso aconteceu! Quebrando um princípio fundamental de que leis eleitorais e leis de financiamento de partidos devem ser o mais possível abrangentes por razões de transparência e de equilíbrio do sistema político, PS e PSD quiseram impor a sua versão: uma versão minimalista e limitada no tempo de uma redução que se pretendia muito mais profunda! Perante uma proposta do CDS que cortava em mais de 1/3 o valor das subvenções públicas para campanhas eleitorais, PS e PSD obrigaram a uma redução de apenas 10%, uma redução que tem muito pouca expressão!! Mas não se contentaram com isso: para além de só reduzirem 10%, limitaram essa redução até ao ano de 2013 fazendo com que a partir de 2014 se possa gastar outra vez à vontade, se possa continuar com as campanhas esbanjadoras e continue a não se perceber que enquanto os partidos não interiorizarem algo que a sociedade já interiorizou há muito tempo — isto é, que o modelo de fazer campanhas eleitorais em Portugal está totalmente desfasado dos objectivos de esclarecimento dos cidadãos — a classe política vai continuar a contribuir para o descrédito de si própria!

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

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O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — E foi para o descrédito da classe política que PS e PSD contribuíram com este processo legislativo!

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para proferir uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Montenegro.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Queria clarificar de uma forma muito telegráfica a posição do Partido Social Democrata sobre este processo legislativo.
Este processo legislativo não nasceu por impulso do PSD — é o primeiro facto que queria aqui registar — mas teve um mérito, que é o principal mérito destas iniciativas legislativas: num momento difícil do País do ponto de vista económico e financeiro — aliás, estamos num dia onde não é preciso dissertar muito a esse propósito, porque já foi abundantemente tratado esse tema — , o Parlamento aprova uma legislação que visa reduzir as subvenções públicas para o funcionamento dos partidos e das campanhas eleitorais.
Isso corresponde a um objectivo relativamente ao qual o PSD é sensível, por isso o PSD, desde o debate na generalidade, não se eximiu a contribuir para que se encontrasse uma solução.

O Sr. Pedro Soares (BE): — Má solução!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — E essa solução é a que aqui, hoje, aprovámos: uma redução de 10% em todas as subvenções! Repito: uma redução de 10% em todas as subvenções para o funcionamento dos partidos, dos grupos parlamentares e das campanhas eleitorais.
Alguns partidos, por exemplo o BE, queriam aquilo que designaria por um «fato feito à medida» que visava reduzir aquelas subvenções onde são menos implicados e manter, tal qual estão hoje em vigor, aquelas subvenções de que tiram mais benefícios.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Essa é uma evidência deste processo legislativo.
Queria dizer também que estranho muito que hoje se tentasse adiar a votação e a aprovação deste diploma, chegando assim ao fim este processo legislativo no que à Assembleia da República diz respeito, porque houve sempre de uma forma consensual no espírito de todas as bancadas, e em especial no espírito da bancada do BE, a intenção de que estas regras se pudessem aplicar à próxima campanha presidencial, a qual de resto está no terreno.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — O Sr. Deputado Pedro Soares inclusivamente, no âmbito dos trabalhos de especialidade, chegou a dizer: «Mas será que votando a 29 de Outubro (»)« — na altura, era a primeira data da votação do Orçamento — «(») vai ser possível que o processo termine, com o trànsito para a Presidência da República, com a eventual promulgação e publicação da lei, a tempo de entrar em vigor para a próxima campanha das eleições presidenciais?». Ele tinha dúvidas sobre se, caso esta votação ocorresse a 29 de Outubro, haveria tempo útil para pôr a lei em vigor a tempo de ser aplicada para a próxima campanha presidencial. Hoje — pasme-se! — , queria adiar por mais três ou quatro semanas esta aprovação, inviabilizando aquele que era o seu próprio desiderato!

Protestos do BE.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Objectivamente, a principal medida legislativa que hoje, aqui, tomamos é a de promover de imediato uma redução do montante das subvenções, uma redução universal

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para todas as campanhas, para todos os grupos parlamentares e também para o funcionamento dos próprios partidos.
Mas foi ainda por iniciativa dos proponentes, PCP e BE, que se aproveitou para fazer pequenos ajustamentos que melhoram alguns aspectos técnicos da lei, aliás, reunindo grande consenso. Se formos fazer uma avaliação de todas as propostas que foram votadas na especialidade, chegamos à conclusão de que a maioria delas foi até aprovada por unanimidade, Sr.as e Srs. Deputados! Esses ajustamentos visam, do nosso ponto de vista, introduzir alguns melhoramentos, os quais devem sempre salvaguardar aquilo que é essencial numa lei tão importante como esta, nomeadamente manter a filosofia do financiamento tendencialmente público. Porquê? Porque é aquele que melhor garante a transparência, é aquele que melhor garante os mecanismos de fiscalização e é aquele que melhor garante a igualdade de oportunidades: a de todas as forças políticas poderem em campanha eleitoral apresentar, à disposição dos eleitores, as suas soluções e a sua vontade política.
Esses são os objectivos desta lei e não acredito que haja alguém que possa concluir, no fim deste processo legislativo, que esses objectivos serão agora mais difíceis de alcançar do que eram antes deste processo legislativo. E foi por isso que o PSD votou favoravelmente esta iniciativa.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma declaração de voto, o Sr. Deputado Pedro Soares.

O Sr. Pedro Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr.as Deputadas, Srs. Deputados: O Bloco de Esquerda apresentou um projecto de lei com o objectivo claro de redução das subvenções públicas e dos limites máximos nos gastos das campanhas eleitorais.
Aceitámos até adiar o agendamento deste projecto de lei, que acabou por ser debatido e votado em Plenário a 23 de Junho, para permitir que outros grupos parlamentares apresentassem os seus próprios projectos, não obstante termos tornado claro que pretendíamos que a redução nas subvenções e nos limites das campanhas tivesse incidência já na próxima eleição para a Presidência da República.
Acabámos de votar um texto de substituição ao projecto de lei do Bloco que consubstancia, no essencial, a proposta do PS e do PSD de redução em apenas 10% das subvenções e dos limites de gastos nas campanhas e no financiamento público dos partidos, que no global fica muito aquém da proposta do Bloco de Esquerda.
Rejeitámos este texto de substituição naquilo que lhe é essencial. Reprovámos o tímido corte, absolutamente insuficiente e meramente transitório, pois tudo voltará ao mesmo em 2013, nas subvenções e nos limites da despesa nas campanhas eleitorais. Servirá apenas para manter gastos desmesurados dos partidos que usam e abusam da política-espectáculo nas campanhas. Este é que é o «fato feito à medida»! É o «fato feito à medida» do PSD e do PS, Sr. Deputado Luís Montenegro!!

Vozes do BE: — Exactamente!

O Sr. Pedro Soares (BE): — Aliás, são os candidatos à Presidência da República que se adiantam à Assembleia da República e se propõem um corte para metade das suas despesas de campanha, tal como constava no projecto de lei do Bloco de Esquerda.
É por isso, Srs. Deputados, que agora o tempo de aprovação desta lei é absolutamente irrelevante.
De facto, os candidatos adiantaram-se, e muito, à Assembleia da República.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — É verdade!

O Sr. Pedro Soares (BE): — Por outro lado, não podemos acompanhar alterações à lei que cairiam no âmbito de um veto presidencial anunciado e que, dessa forma, colocariam em causa o objectivo da firme redução das subvenções e dos limites de gastos nas campanhas eleitorais.

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O Bloco de Esquerda cumpriu o seu compromisso eleitoral, propôs um corte de 40 milhões de euros nas subvenções para as campanhas, já a partir do ciclo eleitoral que agora se inicia, e a diminuição em 50% dos limites nos respectivos gastos partidários.
Não aderimos a consensos que desvirtuam o projecto de lei do Bloco de Esquerda, aqui aprovado na generalidade,»

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Exactamente!

O Sr. Pedro Soares (BE): — » nem pactuamos com cortes que se ficam por pouco mais do que a retórica da diminuição dos gastos das campanhas.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Também para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Ricardo Rodrigues.

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Recordo à Câmara que este processo legislativo se iniciou com um projecto de lei do Bloco de Esquerda, ao qual todos ou, pelo menos, quase todos os grupos parlamentares deram contributos e acrescentos que não eram dispensáveis.
A verdade é que, iniciado o processo, já não era mais possível contê-lo naquela iniciativa que o Bloco de Esquerda tinha, que era apenas para campanhas eleitorais. Houve várias propostas e constituímos um grupo de trabalho, com todos os partidos representados, como é bem costume ser feito na Assembleia da República, e tentámos, por todas as vias encontrar consensos.
A verdade também é que esta é uma lei estruturante do nosso sistema político e era necessário fazer esse esforço no sentido de encontrarmos as melhores soluções, e quanto mais consensuais melhor para todo o sistema e para a democracia.
Verificámos, no grupo de trabalho, que não era possível encontrar esse consenso, umas vezes porque não obtínhamos o acordo do Bloco de Esquerda, outras vezes porque não tínhamos o acordo do Partido Socialista ou de outros grupos parlamentares.

Protestos do Deputado do CDS-PP Pedro Mota Soares.

Assim, tivemos de encontrar o maior denominador comum para uma lei que era necessária ao nosso sistema político.
A verdade é que todos concordavam em cortar no financiamento das campanhas eleitorais, uns e outros, não só no financiamento das campanhas eleitorais mas também no dos partidos e dos grupos parlamentares.
Era um gesto de solidariedade para com a crise que o País atravessa e para cujo esforço colectivo de contenção das despesas todos queríamos contribuir, segundo os nossos meios.
Ouvimos já, várias vezes, o Bloco de Esquerda falar do receio do veto presidencial. Já tive oportunidade de dizer, não só nesse acto eleitoral, nesse processo legislativo, mas também no que diz respeito ao processo legislativo para a eleição presidencial, que se nós, órgão de soberania Assembleia da República, legislássemos com o receio dos vetos presidenciais, não fazíamos outra coisa senão ter receio de dizer, com toda a plenitude, que esta Assembleia da República é um órgão de soberania por excelência e não temos de ter receio de quem vota ou promulga as leis. Cada um exerce as suas competências, e assim deve ser.
Agora, também gostava de tornar claro outro equívoco, que passou nesta Casa, ainda hoje. Não era possível, técnica e legalmente, votarmos o artigo 3.º da proposta de lei. Isso foi tentado no grupo de trabalho.
Na verdade, tratava-se de um texto de substituição e assim, votando um artigo, todo o processo legislativo caía, relativamente a todas as outras propostas e a todos os outros artigos. Assim, não podíamos votar um artigo, ficando em suspenso todo o articulado que vinha da Comissão. Por conseguinte, era tecnicamente impossível votar exclusivamente o artigo 3.º.

Protestos do BE.

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Mas a lei ficou melhor? Ficou, sim! Ficou melhor porque todos contribuímos para um corte do financiamento público num momento de crise; ficou melhor porque todos contribuímos para a maior transparência das contas do partido; ficou melhor também porque nos submetemos a uma maior fiscalização e à uniformização dos critérios de fiscalização do Tribunal Constitucional.
Por todas essas razões, o Partido Socialista votou a favor e está satisfeito.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, não havendo mais inscrições para declarações de voto sobre o diploma que foi aprovado, chegamos ao fim dos nossos trabalhos.
A próxima reunião plenária realizar-se-á às 10 horas do dia 23, tendo como ordem do dia a discussão e a votação, na especialidade, em Plenário, da proposta de lei n.º 42/XI (2.ª) — Orçamento do Estado para 2011, à luz do novo Regimento e dos novos mecanismos de votação.
Está encerrada a sessão.

Eram 17 horas e 26 minutos.

Declarações de voto enviadas à Mesa para publicação

Relativas à proposta de lei n.º 42/XI (2.ª):

Este é um mau Orçamento. Não me revejo nele, mas a sua não viabilização significaria fazer mergulhar o
País numa situação ainda mais grave, com consequências cujas repercussões negativas são neste momento
impossíveis de aquilatar.
Com efeito, se este Parlamento rejeitasse o Orçamento do Estado para 2011 abriria as portas às
escâncaras para que o Fundo Monetário Internacional aí viesse em velocidade e em força, espalhando sem
cerimónia as medidas que lhe são peculiares, designadamente no que à completa degradação das relações
de trabalho diz respeito, e fazendo com que as desigualdades sociais sofressem um agravamento inaceitável.
Não é difícil imaginar que uma das primeiras medidas do FMI seria um feroz ataque ao Código do Trabalho,
impondo, entre outras decisões, aquilo que metaforicamente é chamado «flexibilização» mas que de mais não
se trata do que uma verdadeira «escravatura à moda do século XXI».
Mas, repito, o Orçamento é mau! É facto que regista medidas concretas no domínio do aumento das
receitas, mas considero-as francamente tíbias, carecendo de coragem política para conseguir uma maior
justiça fiscal, penalizando sobretudo os rendimentos mais elevados. Por outro lado, o combate à fraude fiscal
não está devidamente adequado à dimensão deste flagelo, particularmente no que se refere à economia
clandestina, que atinge mais de 20% do produto interno bruto.
O mesmo se diga quanto ao combate à fraude no pagamento do IVA, fraude que se regista com grande
monta nas importações e na obrigação da emissão de factura.
Num outro aspecto, não se pode entender a redução dos benefícios fiscais em sede de IRC, que apenas
contribuem para o aumento dos lucros, ao mesmo tempo que seria de primeiríssima importância uma forte
penalização dos lucros não reinvestidos.
Mas o Orçamento impõe também uma redução inaceitável dos salários dos trabalhadores da administração
pública, conduzindo à redução nominal dos rendimentos dos trabalhadores de mais baixos salários, que
passam a descontar mais 1% para a Caixa Geral de Aposentações, atacando os direitos dos pensionistas com
o congelamento indiscriminado das reformas e o agravamento da carga fiscal, reduzindo direitos na Saúde e
não renovando contratos precários.
Contas feitas, este Orçamento coloca a redução do défice sobretudo no lado da despesa, exigindo
sacrifícios intoleráveis às famílias mais desfavorecidas, já afectadas pelos cortes nos medicamentos, no abono
de família e nas prestações sociais.

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Por último, embora saúde a introdução de um imposto sobre as transacções financeiras, não posso deixar
de lamentar com toda a veemência o facto de o Orçamento omitir qualquer referência ao controlo das
transferências de capitais — em especial para os paraísos fiscais — e à regulação do sector financeiro.

O Deputado do PS, Mário Mourão.

——

O Orçamento do Estado para 2011 é um péssimo orçamento, manifestamente incapaz de responder aos
desafios económicos e sociais de Portugal.
É um orçamento em que o Governo do Partido Socialista, reconhecendo, embora timidamente, que algo
deve ser mudado, não assume nas propostas apresentadas o propósito de corrigir o desastre da governação
dos últimos seis anos, em que Portugal continuou a divergir da Europa e perdeu competitividade, continuou a
aumentar as desigualdades sociais e a acentuar as assimetrias regionais.
Com este Orçamento aumentarão a dívida pública e o desemprego.
As medidas de apoio às pequenas e médias empresas são insuficientes, bem como as medidas de
promoção ao investimento e às exportações.
Com este Orçamento, retiram-se direitos sociais às pessoas, nomeadamente os direitos às prestações
sociais de abono de família, à reforma e à aposentação.
No capítulo do investimento, em particular, o Governo mantém a obstinação das parcerias público-privadas,
como o TGV, comprometendo os orçamentos de muitos e longos anos e secundarizando os investimentos de
proximidade, particularmente importantes no interior do País.
É escandaloso que os investimentos previstos em PIDDAC para o distrito de Vila Real voltem a ser
reduzidos em 31,11%, quando já no Orçamento para 2010 sofreram uma redução de 90,14 %. Assume
particular gravidade a análise da distribuição per capita, onde para o distrito de Vila Real está previsto um
investimento de € 22,1 quando a mçdia nacional ç de € 48,06. O distrito de Vila Real receberá menos de
metade do que a média nacional, quatro vezes menos do que o distrito de Lisboa e sete vezes menos do que
o distrito de Faro.
Porém, apesar de tudo, movidos por um elevado sentido patriótico, os Deputados abaixo assinados, eleitos
pelos círculos eleitorais de Vila Real e de Portalegre, acompanham, de forma consciente e responsável, o
sentido de voto de abstenção do PSD que viabiliza o Orçamento do Estado para o ano de 2011.

Os Deputados do PSD, António Montalvão Machado — António Cabeleira — Cristóvão Crespo — Isabel
Sequeira.

——

Os Deputados do PSD eleitos pelo Círculo da Madeira abaixo assinados abstiveram-se na votação, na
generalidade, da proposta de lei do Orçamento do Estado para 2011 pelas seguintes razões:
— Para não colidir nem causar embaraço à Direcção Nacional do Partido quanto ao compromisso de
viabilização do Orçamento do Estado para 2011 assumido com o Governo e o Partido Socialista;
— Para dar oportunidade a que, na especialidade, se operem as necessárias rectificações e melhorias, não
só quanto ao acordado com o PSD, mas ainda relativamente às questões respeitantes à Região Autónoma da
Madeira que serão objecto de propostas a apresentar pelos signatários;
— Porque só a viabilização, que se espera, de tais propostas poderá atenuar a posição de total
discordância dos signatários relativamente às opções de fundo do Orçamento do Estado para 2011, ainda que
amortecidas pelas condições impostas e obtidas pelo PSD na negociação com o Governo;
— Efectivamente, são inadmissíveis o incomportável aumento de impostos, os cortes cegos nas áreas
sociais, designadamente nos abonos de família, nas pensões de reforma, nos vencimentos dos funcionários
públicos, na saúde e na educação, com graves e indesejáveis efeitos recessivos na economia, fruto doloroso
de uma governação desastrosa e irresponsável que caracteriza o Partido Socialista, particularmente agravada
nos últimos seis anos;

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— No que à Região Autónoma da Madeira diz respeito, saliente-se a gravíssima decisão do Governo da
República de abandonar as negociações, no âmbito da Comissão Europeia, relativas à Zona Franca da
Madeira, comprometendo, de forma grave, a sua competitividade e obrigando a Região, ou seja, o País, a
perder uma receita anual da ordem dos 80 milhões de euros;
— A par dessa situação e revelando uma inadmissível discriminação político-partidária por parte do
Governo da República, acresce que o PIDDAC, ou seja, o investimento directo da Administração Central
previsto no Orçamento do Estado para 2011, enquanto nos Açores, com uma população inferior à da Madeira,
é de 9 606 282 euros, na Madeira é de 567 000 euros, sendo que 11% desta importância é consignada à
conservação da moradia do chamado «Representante da República» — o Palácio de São Lourenço!
Isto é: no âmbito do PIDDAC, a República Portuguesa investe 2,29 euros por habitante, na Madeira, e
investe nos Açores 39,15 euros por habitante.
A evolução que a proposta de lei do Orçamento do Estado para 2011 venha a ter, na especialidade, em
particular no que às questões supra referidas diz respeito, será determinante para a posição a adoptar pelos
signatários na votação final global.

Os Deputados do PSD, Guilherme Silva — Correia de Jesus — Vânia Jesus — Hugo Velosa.

— —

O País atingiu uma situação dramática que prejudica, acima de tudo, os jovens e as futuras gerações. O
desemprego jovem atinge o nível assustador de 21%, o endividamento externo pesará no futuro das novas
gerações e limitará as suas opções.
Compreendemos que a crise financeira e a crise de confiança dos mercados internacionais ameaçam o
País e justificam a adopção de excepcionais medidas de forte contenção.
Todavia, as medidas de contenção devem incidir fundamentalmente no corte da despesa, evitando novos
aumentos de impostos que onerem mais as empresas e as famílias portuguesas que já suportam um esforço
fiscal enorme que não tem correspondência com razoáveis prestações e actividade estaduais.
Embora o aumento do esforço fiscal tenha impacto recessivo na economia, o Governo socialista tem vindo
a optar por sufocar fiscalmente a economia e os portugueses, com as consequências negativas que isso
representa na competitividade, no crescimento económico, no nível de vida da população e no desemprego.
Acresce que é inaceitável o corte previsto nos abonos de família ordinários e extraordinários.
Num momento em que o País precisa de incentivar a natalidade, decisões desta natureza configuram-se
como rudes golpes no futuro do País. Um Governo que começa por cortar nas despesas que promovem a
renovação e a capacitação geracional é um Governo que não acredita no futuro do País.
A natalidade é a condição da existência futura de Portugal e de Portugueses, e os apoios financeiros ao
nascimento são comprovadamente os maiores incentivos que os jovens reconhecem para decidirem ter filhos.
O fim do abono de família é um enorme desincentivo à natalidade.

Os Deputados do PSD, Pedro Rodrigues — Maria José Nogueira Pinto — António Leitão Amaro.

— ——

Relativa ao texto final, elaborado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e
Garantias, sobre os projectos de lei n.os 299/XI (1.ª) e 317/XI (1.ª):

Abstive-me na votação deste texto final, relativo à alteração da lei do financiamento dos partidos políticos e
das campanhas eleitorais, por me ter sido impossível esclarecer diversas dúvidas. Essa impossibilidade
resultou do facto de o texto final apenas me ter sido disponibilizado às 17 horas do dia anterior ao da votação
e no meio do debate na generalidade da proposta de lei do Orçamento do Estado para 2011.
É a segunda vez que um texto final de alterações à lei do financiamento dos partidos políticos e das
campanhas eleitorais é disponibilizado na véspera do dia da votação, o que me parece uma má prática e um
procedimento que em nada contribui para um voto esclarecido.

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Solicitei em Plenário o adiamento da votação, mas a maioria dos Deputados rejeitou esse pedido.
Não obstante, e ao contrário do que aconteceu na Legislatura anterior, não escrutinei com rigor e de forma
definitiva qualquer alteração que permitisse explicitamente o aumento da entrada de dinheiro vivo nos partidos
políticos, razão pela qual não voltei a votar contra. Mas o pouco tempo de que dispus não foi suficiente para
efectuar o necessário aprofundamento das alterações introduzidas e das suas consequências.
Expresso a minha discordância pelo facto de os grupos parlamentares passarem a ser tratados como
«estruturas dos partidos políticos» em vez de «organizações de Deputados». Trata-se de um rude golpe na
autonomia dos Deputados e contraria o sentido da Reforma do Parlamento efectuada em 2007.
Concordo com a redução da subvenção pública. É uma atitude convergente com o esforço que é exigido à
maioria dos portugueses.
Não encontro motivos para que, a pretexto da redução das subvenções públicas, se tenham introduzido
outras alterações que manifestamente não eram reivindicadas.
Expresso dúvidas quanto às alterações introduzidas nos artigos 3.º, 5.º, 6.º, 16.º, 18.º e 26.º da actual lei e
na disposição transitória.

O Deputado do PS, António José Seguro.

— —

Concordando com a necessidade de os partidos políticos se associarem ao esforço nacional para enfrentar
as dificuldades económico-financeiras que afectam o mundo e, em particular, Portugal; e
Concordando com a necessidade de reduzir as subvenções públicas e os limites máximos dos gastos nas
campanhas eleitores,
Não podemos, no entanto, deixar de alertar para a necessidade de salvaguardar a transparência em todo
esse processo.
As alterações à Lei n.º 19/2003, de 20 de Junho, nomeadamente a alínea b) do artigo 3.º ao acrescentar a
contribuição em numerário dos candidatos à contribuição que já era permitida aos eleitos, deveriam, em nosso
entender, ser acompanhadas de mecanismos de maior controlo, já que existem vários perigos à subversão do
espírito da lei»
De igual forma, não podemos deixar de expressar a mesma preocupação em relação à alínea e) do mesmo
artigo no que concerne, nomeadamente, às aplicações financeiras, que, em nosso entender, podem subverter
a lógica da existência dos próprios partidos políticos.

Os Deputados do PS, Manuel Mota — Lúcio Ferreira.

———

Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:

Partido Socialista (PS)
João Barroso Soares

Deputados que faltaram à verificação do quórum de deliberação (n.º 29 da Resolução n.º 77/2003, de 11 de
Outubro):

Partido Social Democrata (PSD)
Antonieta Paulino Felizardo Guerreiro

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Rectificações

Ao n.º 20 do Diário, de 29 de Novembro de 2008:

No início da pág. 109, onde se lê «Penso que podemos votar, em conjunto, as propostas 1027-P e 1134-P,
apresentadas pelo PS, na parte em que emendam aquele Mapa.» deve ler-se «Penso que podemos votar, em
conjunto, as propostas 1027-P, 1028-P e 1134-P, apresentadas pelo PS, na parte em que emendam aquele
Mapa.».

Ao n.º 83 do Diário, de 23 de Julho de 2010:

Na pág. 61, onde se lê «O Deputado do PSD, João Figueiredo.» deve ler-se «Os Deputados do PSD, Jorge
Costa — Carina Oliveira — Pedro Saraiva — Adriano Rafael Moreira — Emídio Guerreiro — Vasco Cunha —
Francisca Almeida — Paulo Cavaleiro — João Figueiredo — José de Matos Rosa — Teresa Fernandes —
Nuno Reis.»
A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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