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Quinta-feira, 6 de Janeiro de 2011 I Série — Número 34

XI LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2010-2011)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 5 DE JANEIRO DE 2011

Presidente: Ex.mo Sr. Jaime José Matos da Gama

Secretários: Ex.mos Srs. Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Abel Lima Baptista
Pedro Filipe Gomes Soares

SUMÁRIO O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 10 minutos.
Deu-se conta da entrada na Mesa da proposta de lei n.º 47/XI (2.ª), dos projectos de lei n.os 474 a 482/XI (2.ª), da apreciação parlamentar n.º 76/XI (2.ª), dos projectos de resolução n.os 341, 342 e 347 a 350/XI (2.ª).
A Câmara aprovou um parecer da Comissão de Ética, Sociedade e Cultura relativo à renúncia ao mandato de uma Deputada do PS e à respectiva substituição.
Em declaração política, o Sr. Deputado Luís Fazenda (BE) condenou a eliminação da isenção de taxas moderadoras do Serviço Nacional de Saúde para reformados, pensionistas e desempregados que tenham rendimentos médios acima do salário mínimo nacional, após o que respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Adão Silva (PSD), Bernardino Soares (PCP), Maria Antónia Almeida Santos (PS) e Pedro Mota Soares (CDS-PP).
Em declaração política, o Sr. Deputado Pedro Mota Soares (CDS-PP) teceu críticas à promoção, com efeitos retroactivos a 1 de Janeiro de 2010, de dirigentes de institutos da segurança social, aos aumentos de prémios às chefias do Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social, com a simultânea retirada de prémios aos outros trabalhadores, a falta de informação acerca da aplicação do Código Contributivo e ainda a alteração da metodologia de recolha de dados sobre desemprego pelo INE. No final, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Anabela Freitas (PS), Jorge Machado (PCP) e Maria das Mercês Soares (PSD).
Também em declaração política, o Sr. Deputado Luís Menezes (PSD) falou das finanças públicas, reclamando do Governo rigor no cumprimento do Orçamento do Estado e

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respondendo depois a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados João Pinho de Almeida (CDS-PP) e João Paulo Correia (PS).
Ainda em declaração política, o Sr. Deputado Jorge Seguro Sanches (PS) abordou a política energética nacional levada a cabo pelo Governo, cuja aposta nas energias renováveis elogiou. Em seguida, deu resposta a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Pedro Filipe Soares (BE), Nuno Reis (PSD), João Pinho de Almeida (CDS-PP), Agostinho Lopes (PCP) e Heloísa Apolónia (Os Verdes).
Em declaração política, a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia (Os Verdes) contestou a anunciada alteração do método usado pelo Instituto Nacional de Estatística (INE) para recolha de dados relativos ao emprego e respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Maria José Gambôa (PS) e Agostinho Lopes (PCP).
Em declaração política, o Sr. Deputado António Filipe (PCP) censurou o Governo pelo acordo que, segundo a comunicação social, celebrou com os Estados Unidos da América para que este país tenha acesso aos dados pessoais biométricos e biográficos que constam das bases de dados de identificação civil e criminal bem como da base de dados nacional de perfis de ADN do Estado português.
Respondeu, depois, a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Ricardo Rodrigues (PS), Helena Pinto (BE), Nuno Magalhães (CDS-PP) e Fernando Negrão (PSD).
Com a presença do Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros (Luís Amado), procedeu-se a um debate sobre assuntos europeus: apreciação do Conselho Europeu de 16 e 17 de Dezembro, balanço da Presidência belga da União Europeia e análise do Programa de Trabalho da Comissão Europeia para 2011. Usaram da palavra, a diverso título, além do Sr. Ministro, os Srs. Deputados Filipe Lobo d´Ávila (CDS-PP), Honório Novo (PCP), Cecília Honório (BE), Carlos Costa Neves (PSD), José de Bianchi (PS), João Serpa Oliva (CDS-PP) e Luís Montenegro (PSD).
Por fim, foram apreciados os inquéritos parlamentares n.os 5/XI (2.ª) — Constituição de uma Comissão Parlamentar de Inquérito à Tragédia de Camarate (PSD) e 6/XI (2.ª) — Constituição da IX Comissão Parlamentar de Inquérito à Tragédia de Camarate (CDS-PP), sobre os quais se pronunciaram os Srs. Deputados Fernando Negrão (PSD), José Ribeiro e Castro (CDS-PP), Catarina Martins (BE), Jorge Machado (PCP) e Ricardo Rodrigues (PS).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 18 horas e 58 minutos.

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O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 10 minutos.

Srs. Deputados presentes à sessão:

Partido Socialista (PS)
Acácio Santos da Fonseca Pinto
Alberto Bernardes Costa
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Ana Maria Ribeiro Gomes do Couto
Ana Paula Mendes Vitorino
Anabela Gaspar de Freitas
António Alves Marques Júnior
António José Martins Seguro
António Ramos Preto
António Ribeiro Gameiro
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Aurélio Paulo da Costa Henriques Barradas
Carlos Filipe de Andrade Neto Brandão
Catarina Marcelino Rosa da Silva
Deolinda Isabel da Costa Coutinho
Eduardo Arménio do Nascimento Cabrita
Eurídice Maria de Sousa Pereira
Fernando Manuel de Jesus
Frederico de Oliveira Castro
Glória Maria da Silva Araújo
Horácio André Antunes
Inês de Saint-Maurice de Esteves de Medeiros Vitorino de Almeida
Jaime José Matos da Gama
Jamila Bárbara Madeira e Madeira
Jorge Filipe Teixeira Seguro Sanches
Jorge Manuel Capela Gonçalves Fão
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Jorge Manuel Rosendo Gonçalves
José Carlos Bravo Nico
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Eduardo Vera Cruz Jardim
José João Pinhanços de Bianchi
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
José Manuel Pereira Ribeiro
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
José Rui Alves Duarte Cruz
João Barroso Soares
João Miguel de Melo Santos Taborda Serrano
João Paulo Feteira Pedrosa
João Paulo Moreira Correia
João Raul Henriques Sousa Moura Portugal
João Saldanha de Azevedo Galamba
Júlio Francisco Miranda Calha
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Luís António Pita Ameixa

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Luís Miguel Morgado Laranjeiro
Luís Miguel Soares de França
Luís Paulo Costa Maldonado Gonelha
Luísa Maria Neves Salgueiro
Lúcio Maia Ferreira
Manuel António Gonçalves Mota da Silva
Manuel José de Faria Seabra Monteiro
Marcos Sá Rodrigues
Maria Antónia Moreno Areias de Almeida Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Helena Figueiredo de Sousa Rebelo
Maria Hortense Nunes Martins
Maria Isabel Solnado Porto Oneto
Maria José Guerra Gamboa Campos
Maria Luísa de Jesus Silva Vilhena Roberto Santos
Maria Manuela de Almeida Costa Augusto
Maria Odete da Conceição João
Maria da Conceição Guerreiro Casa Nova
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria de Lurdes Ruivo
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Marisa da Conceição Correia Macedo
Miguel João Pisoeiro de Freitas
Mário Joaquim da Silva Mourão
Nuno André Araújo dos Santos Reis e Sá
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Barros Teixeira Santos
Paulo Alexandre de Carvalho Pisco
Pedro Manuel Farmhouse Simões Alberto
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Ricardo Manuel de Amaral Rodrigues
Rita Manuela Mascarenhas Falcão dos Santos Miguel
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui José Prudêncio
Rui José da Costa Pereira
Sérgio Constantino Gaspar Lopes de Paiva
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Teresa Maria Neto Venda
Teresa do Rosário Carvalho de Almeida Damásio
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vítor Manuel Brandão de Sousa Fontes

Partido Social Democrata (PSD)
Adriano Rafael de Sousa Moreira
Adão José Fonseca Silva
Amadeu Albertino Marques Soares Albergaria
Antonieta Paulino Felizardo Guerreiro
António Alfredo Delgado da Silva Preto

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António Carlos Sousa Gomes da Silva Peixoto
António Cândido Monteiro Cabeleira
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Fernando Couto dos Santos
António Joaquim Almeida Henriques
Arménio dos Santos
Carina João Reis Oliveira
Carla Maria Gomes Barros
Carla Maria de Pinho Rodrigues
Carlos Alberto Silva Gonçalves
Carlos António Páscoa Gonçalves
Carlos Henrique da Costa Neves
Carlos Manuel Faia São Martinho Gomes
Celeste Maria Reis Gaspar dos Santos Amaro
Cristóvão da Conceição Ventura Crespo
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Emídio Guerreiro
Fernando Mimoso Negrão
Fernando Nuno Fernandes Ribeiro dos Reis
Fernando Ribeiro Marques
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Hugo José Teixeira Velosa
Isabel Maria Nogueira Sequeira
Jorge Cláudio de Bacelar Gouveia
Jorge Fernando Magalhães da Costa
José Alberto Nunes Ferreira Gomes
José Eduardo Rego Mendes Martins
José Luís Fazenda Arnaut Duarte
José Manuel Marques de Matos Rosa
José Manuel de Matos Correia
José Mendes Bota
José Pedro Correia de Aguiar Branco
José de Almeida Cesário
José Álvaro Machado Pacheco Pereira
João Bosco Soares Mota Amaral
João Carlos Figueiredo Antunes
João José Pina Prata
Luís António Damásio Capoulas
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Filipe Valenzuela Tavares Menezes Lopes
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Manuel Filipe Correia de Jesus
Margarida Rosa Silva de Almeida
Maria Clara de Sá Morais Rodrigues Carneiro Veríssimo
Maria Francisca Fernandes Almeida
Maria Helena Passos Rosa Lopes da Costa
Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto
Maria Luísa Roseira da Nova Ferreira de Oliveira Gonçalves
Maria Manuela Dias Ferreira Leite
Maria Paula da Graça Cardoso

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Maria Teresa Machado Fernandes
Maria Teresa da Silva Morais
Maria da Conceição Feliciano Antunes Bretts Jardim Pereira
Maria das Mercês Gomes Borges da Silva Soares
Maria do Rosário da Silva Cardoso Águas
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Nuno Miguel Pestana Chaves e Castro da Encarnação
Paulo Cardoso Correia da Mota Pinto
Paulo César Lima Cavaleiro
Paulo Jorge Frazão Batista dos Santos
Pedro Augusto Lynce de Faria
Pedro Manuel Tavares Lopes de Andrade Saraiva
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Pedro Nuno Mazeda Pereira Neto Rodrigues
Teresa de Jesus Costa Santos
Ulisses Manuel Brandão Pereira
Vasco Manuel Henriques Cunha
Vânia Andrea de Castro Jesus

Partido Popular (CDS-PP)
Abel Lima Baptista
Artur José Gomes Rêgo
Durval Tiago Moreira Fonseca e Castro Ferreira
Filipe Tiago de Melo Sobral Lobo D' Ávila
Isabel Maria Mousinho de Almeida Galriça Neto
José Duarte de Almeida Ribeiro e Castro
José Helder do Amaral
José Manuel de Sousa Rodrigues
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Manuel de Serpa Oliva
João Rodrigo Pinho de Almeida
Luís Pedro Russo da Mota Soares
Michael Lothar Mendes Seufert
Nuno Miguel Miranda de Magalhães
Paulo Sacadura Cabral Portas
Pedro Manuel Brandão Rodrigues
Raúl Mário Carvalho Camelo de Almeida
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia
Teresa Margarida Figueiredo de Vasconcelos Caeiro

Bloco de Esquerda (BE)
Catarina Soares Martins
Francisco Anacleto Louçã
Heitor Nuno Patrício de Sousa e Castro
Helena Maria Moura Pinto
Jorge Duarte Gonçalves da Costa
José Borges de Araújo de Moura Soeiro
José Guilherme Figueiredo Nobre de Gusmão
José Manuel Marques da Silva Pureza

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João Pedro Furtado da Cunha Semedo
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda
Maria Cecília Vicente Duarte Honório
Mariana Rosa Aiveca
Pedro Filipe Gomes Soares
Pedro Manuel Bastos Rodrigues Soares
Rita Maria Oliveira Calvário

Partido Comunista Português (PCP)
Agostinho Nuno de Azevedo Ferreira Lopes
António Filipe Gaião Rodrigues
Artur Jorge da Silva Machado
Bernardino José Torrão Soares
Bruno Ramos Dias
Francisco José de Almeida Lopes
Jerónimo Carvalho de Sousa
José Honório Faria Gonçalves Novo
João Augusto Espadeiro Ramos
João Guilherme Ramos Rosa de Oliveira
Miguel Tiago Crispim Rosado
Paula Alexandra Sobral Guerreiro Santos Barbosa
Rita Rato Araújo Fonseca

Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV)
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
José Luís Teixeira Ferreira

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, a Sr.ª Secretária vai proceder ao acto ritual da leitura do expediente.

A Sr.ª Secretária (Celeste Correia): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: proposta de lei n.º 47/XI (2.ª) — Procede à quinta alteração à Lei de enquadramento orçamental, aprovada pela Lei n.º 91/2001, de 20 de Agosto, que baixou à 5.ª Comissão; projectos de lei n.os 474/XI (2.ª) — Estabelece um regime especial de segurança social e de reinserção profissional para os bailarinos da Companhia Nacional de Bailado (BE), que baixou à 11.ª Comissão, 475/XI (2.ª) — Primeira alteração ao Decreto-Lei n.º 349/99, de 2 de Setembro, que cria a Associação Nacional dos Engenheiros Técnicos, associação de Direito Público, e Aprova o respectivo Estatuto (PS), que baixou à 11.ª Comissão, 476/XI (2.ª) — Primeira alteração à Lei n.º 98/2009, de 3 de Setembro, que regulamenta o regime de reparação de acidentes de trabalho e de doenças profissionais, incluindo a reabilitação e reintegração profissionais, nos termos do artigo 284.º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro (PS), que baixou à 11.ª Comissão, 477/XI (2.ª) — Isenta de imposto do selo as garantias prestadas no âmbito de processos de execução fiscal (CDS-PP), que baixou à 5.ª Comissão, 478/XI (2.ª) — Redução do pagamento especial por conta em caso de criação líquida de emprego (CDS-PP), que baixou à 5.ª Comissão, 479/XI (2.ª) — Redução do pagamento especial por conta em caso de exportações, transmissões intracomunitárias ou reinvestimento (CDS-PP), que baixou à 5.ª Comissão, 480/XI (2.ª) — Revogação da possibilidade de penhora de créditos futuros (CDS-PP), que baixou à 5.ª Comissão, 481/XI (2.ª) — Clarificação do conceito de promotor para efeitos da isenção de IVA dos artistas (CDS-PP), que baixou à 5.ª Comissão, e 482/XI (2.ª) — Altera o regime jurídico de apropriação pública por via de nacionalização (BE), que baixou à 5.ª Comissão.

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Deram ainda entrada na Mesa, e foram admitidos, a apreciação parlamentar n.º 76/XI (2.ª) — Decreto-Lei n.º 126/2010, de 23 de Novembro, que estabelece o regime de implementação dos aproveitamentos hidroeléctricos a que se refere a Resolução do Conselho de Ministros n.º 72/2010, de 10 de Setembro (CDSPP), e os projectos de resolução n.os 341/XI (2.ª) — Recomenda ao Governo a candidatura da Mata Nacional do Buçaco a Património Mundial da Unesco (BE), que baixou à 13.ª Comissão, 342/XI (2.ª) — Recomenda ao Governo que assuma, em acordo com a Casa do Douro, o urgente saneamento financeiro desta instituição e viabilize o pagamento dos salários em atraso (BE), que baixou à 7.ª Comissão, 347/XI (2.ª) — Recomenda ao Governo que utilize sistemas de teleconferência e videoconferência em substituição de reuniões presenciais (PSD), que baixou à 11.ª Comissão, 348/XI (2.ª) — Recomenda ao Governo a suspensão das condições contidas na Portaria n.º 247/2010, de 3 de Maio, para a renovação da licença de pesca dos pescadores do rio Minho (BE), que baixou à 7.ª Comissão, 349/XI (2.ª) — Auditoria ao sistema informático de execuções fiscais (CDS-PP), que baixou à 5.ª Comissão, e 350/XI (2.ª) — Define condições de transparência para a actuação pública na gestão do BPN e para a decisão sobre o seu futuro (BE), que baixou à 5.ª Comissão.
Cumpre-me também informar que, na reunião da Comissão de Educação e Ciência do dia 21 de Dezembro de 2010 foram rejeitadas, com os votos contra do PS, votos a favor do BE e do PCP e abstenções do PSD e do CDS-PP, as propostas de alteração apresentadas pelo BE e pelo PCP no âmbito das apreciações parlamentares n.os 52/XI (1.ª) (BE) e 56/XI (1.ª) (PCP), relativas ao Decreto-Lei n.º 75/2010, de 23 de Junho, que procede à décima alteração ao Estatuto da Carreira dos Educadores de Infância e dos Professores dos Ensinos Básico e Secundário, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 139-A/90, de 28 de Abril. Assim, o processo de apreciação deve considerar-se caduco.
Por último, a Mesa dá conta do relatório e parecer da Comissão de Ética, Sociedade e Cultura que se refere à renúncia ao mandato, nos termos do artigo 7.º do Estatuto dos Deputados, com efeitos a partir de 1 de Janeiro de 2011, inclusive, da Sr.ª Deputada Manuela Melo (PS), círculo eleitoral de Lisboa, sendo substituída pelo Sr. Deputado Sérgio Gaspar Lopes de Paiva.
O parecer é no sentido de a renúncia e a substituição dos Deputados em causa serem de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, está em apreciação o parecer.

Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, vamos votá-lo.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, vamos dar início ao período de declarações políticas, sendo o primeiro orador inscrito, a intervir em nome do Bloco de Esquerda, o Sr. Deputado Luís Fazenda, a quem dou a palavra.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em cima do final do ano, o Governo decidiu eliminar a isenção das taxas moderadoras no Serviço Nacional de Saúde aos reformados e aos desempregados que tenham de rendimento médio algo superior ao salário mínimo nacional.
Custa a crer que a insensibilidade, a indiferença social do Governo seja de tal ordem que, na mesma altura em que, em relação aos desempregados, há cortes no subsídio de desemprego e no subsídio social de desemprego, se queira, por pouco euros a mais acima do salário mínimo nacional, obrigar os desempregados a pagarem taxas moderadoras.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Uma vergonha!

O Sr. Luís Fazenda (BE): — É extraordinário e choca a indiferença social do Governo, que, num momento em que se congelam pensões, em que se aumenta a incidência fiscal sobre as pensões dos reformados, quer também obrigar os reformados a pagar as taxas moderadoras de que estavam isentos no âmbito do Serviço Nacional de Saúde.

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O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Uma vergonha!

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Um distinto socialista e fundador do Serviço Nacional de Saúde, António Arnault, disse de imediato que o Governo se tinha metido por uma rua de sentido proibido. Pois meteu-se por uma rua de sentido proibido! É extraordinário porque verificamos que, do ponto de vista do impacto orçamental, esse efeito é insignificante nas receitas do Serviço Nacional de Saúde e, do ponto de vista político, ele tem um valor obviamente simbólico e muito marcante, num momento em que os reformados e os desempregados já têm de enfrentar o aumento do IVA, o aumento dos preços de produtos essenciais, o aumento extraordinário do preço do pão e das farinhas, o aumento extraordinário do preço dos transportes, do preço da electricidade e de todas as tarifas em geral.
É neste contexto e nestas circunstâncias que o Governo decide, e decide à socapa, de forma unilateral, inclusivamente, para além do que tinha sido o debate da política orçamental, do Orçamento aqui decidido pelo Partido Socialista e viabilizado pelo Partido Social Democrata.
Sr.as e Srs. Deputados, a medida é simbólica da indiferença social, é simbólica, até, pela sua inutilidade, pela sua ineficiência no que possa ser considerado como uma qualquer poupança no âmbito do Serviço Nacional de Saúde. Mas é pior do ponto de vista político, porque vai convalidando a ideia, no seio da população portuguesa, de que o Estado social é insustentável, de que ele, peça a peça, fatia a fatia, vai sendo cortado, porque não pode ser sustentado. E é o Partido Socialista, um partido que se reclama da defesa do Estado social, que vai convalidando essa ideia junto da população.

Vozes do BE: — Muito bem!

Protestos do PS.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Pois, o Estado social é sustentável. O que não é sustentável é a desigualdade social!

Aplausos do BE.

A desigualdade social, que tem vindo a aumentar, porque há uma desigualdade na distribuição dos rendimentos, por meios legais, por meios informais, por meios fraudulentos, e isso é que tem vindo a retirar a capacidade de financiamento das prestações e dos serviços do Estado social.
O nosso Estado social é uma conquista do 25 de Abril, é ainda incipiente, ele pode e deve fazer muito mais por aquilo que é uma democracia plena, porque os serviços públicos e as condições de apoio social são, evidentemente, um direito de cidadania elementar, numa democracia política. É este o «défice» que temos de combater! O Partido Socialista, ao fazer o papel do «cangalheiro» do Estado social, peça a peça, fatia a fatia, não está a contribuir para nenhuma política de esquerda, está, isso sim, a contribuir para uma política que tem vindo a deixar à direita o campo vago para propor o seu modelo privatístico, liberal e destruidor, esse sim, do Estado social.
Sr.as e Srs. Deputados, nestas circunstâncias, é necessário ter bem presente que uma política alternativa é uma política necessária de defesa do Estado social. Neste contexto, é justo, é necessário, é absolutamente elementar a contestação das populações, as contestações de cidadania à política governativa, a estes actos de absoluta insensibilidade social que o Governo vem praticando, sob o nome da «receita da austeridade» e da tentativa de comprazer e aquietar (assim se diz) os mercados financeiros.
Sr.as e Srs. Deputados, não podemos deixar de pensar, para além da contestação de cidadania, que as próximas eleições presidenciais têm aqui uma circunstância marcante, e as esquerdas devem unir-se no sentido de forçar uma segunda volta. Uma segunda volta das eleições presidenciais é um elemento absolutamente indispensável para uma nova oportunidade à defesa do Estado social. É nesse patamar, nessa trincheira de luta que se situa o Bloco de Esquerda, e aqui o comunica frontalmente.

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Sr.as e Srs. Deputados, torno a citar o fundador do Serviço Nacional de Saúde. Ele disse mais. Disse que a medida de eliminar as isenções das taxas moderadoras no Serviço Nacional de Saúde para pensionistas e reformados acima do valor do salário mínimo nacional era não só uma medida inconstitucional como (e espantou-se para além do limite da admiração) como era uma medida anti-ética. Pois é exactamente com essas palavras, com a sua crueza, com a força que elas têm, porque elas doem como pedras, que eu deixo este recado, hoje, aqui à bancada do Governo.

Aplausos do BE.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Guilherme Silva.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, a Mesa regista três pedidos de esclarecimento.
Agradecia que o Sr. Deputado Luís Fazenda informasse se pretende responder isoladamente ou em conjunto.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Responderei um a um, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Antes de dar a palavra ao primeiro orador inscrito para pedir esclarecimentos, queria, nesta circunstância de estar a presidir pela primeira vez neste novo ano, desejar aos Srs. Deputados um Bom Ano.
Tem a palavra o Sr. Deputado Adão Silva.

O Sr. Adão Silva (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, também aproveito para retribuir votos de um ano 2011 cheio de sucessos para todos nós.
O Sr. Deputado Luís Fazenda abordou a questão do Estado social e algumas das medidas que têm sido tomadas por este Governo nos últimos tempos, que tendem claramente para a destruição do Estado social.
Nós, Partido Social Democrata, defendemos inquestionavelmente o Estado social. Não o defenderemos com os mesmos meios, nem da mesma maneira, nem com as mesmas ópticas com que o defende o Bloco de Esquerda, mas defendemos, absolutamente, o Estado social. Contudo, o que não podemos aceitar é que haja esta hipocrisia da parte do Partido Socialista e do Governo, que se armam em grandes campeões na defesa do Estado social e depois é aquilo que se vê. Na verdade, não são campeões mas mutiladores do Estado social!

Protestos do PS.

Exemplos concretos? Estão aqui dois, bem patentes, na área da saúde. Por um lado, como disse V. Ex.ª, e bem, à socapa, alteraram através de uma portaria um decreto-lei de 2003, alargando a obrigação do pagamento das taxas moderadoras. Completamente errado, não apenas pela forma mas também pelo conteúdo, porque, sendo reformados e desempregados, são população em estado crítico, em estado socialmente delicado. Por isso, não podemos aceitar a forma como o Governo fez estas medidas.
Já agora concorro para os seus argumentos para demonstrar a forma como este Governo está a destruir o Estado social, referindo o Despacho n.º 19 264/2010, do Sr. Secretário de Estado da Saúde, que tem a ver com o transporte de doentes não urgentes.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Tem de terminar, Sr. Deputado.

O Sr. Adão Silva (PSD): — V. Ex.ª conhece-o, com certeza, Sr. Deputado. E conhece, com certeza, a iniquidade, a injustiça, a desigualdade que está neste despacho, que penaliza fortemente as populações do interior, sobretudo, no acesso a cuidados de saúde.
Com este despacho, não se dá um passo, dão-se grandes passos no sentido de tornar o Serviço Nacional de Saúde cada vez menos geral e menos universal. Não podemos aceitar isso! Protestamos contra isso e

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protestamos particularmente contra este último despacho, feito também à socapa, na calada das festas de fim de ano.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Adão Silva, agradeço-lhe as questões colocadas.
Temos uma diferença de concepção acerca de Estado social. Vamos tentar torná-la clara e positiva.
O PSD entende como Estado social — salvo melhor opinião — um modelo misto, que inclui a oferta de serviços privados simultaneamente com a oferta de serviços públicos e papéis variáveis do Estado em relação a vários sectores de prestação e provisão públicas nos dias de hoje.
Não é essa a concepção que está na Constituição da República. A concepção que está na Constituição da República é a da universalidade dos serviços públicos e do papel central dos serviços do Estado no desenvolvimento das políticas sociais. Tanto assim é que o Partido Social Democrata sentiu necessidade de mudar a Constituição para tentar fazer passar a sua ideia de Estado social e, portanto, tem um projecto de revisão constitucional que descaracteriza a actual Constituição, criando um outro modelo.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Exactamente!

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Os méritos desse modelo não os podemos acompanhar, porque entendemos que diminui a protecção social. Portanto, não tem cabimento a frase lapidar de Pedro Passos Coelho ao dizer que não é sustentável o Estado social porque não se pode dar tudo a toda a gente. Esse Estado, que nunca deu tudo a toda a gente, não é o caminho que queremos seguir e, em particular, no que toca ao Serviço Nacional de Saúde, todos recordamos as palavras de Pedro Passos Coelho, que disse que pessoas de rendimento médio — e isso significa 700 €/mês — têm que passar a comparticipar e a co-financiar o Serviço Nacional de Saúde.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Pois é, pois é!

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Foi por isso que o projecto de revisão constitucional do PSD não teve assim tanto êxito, porque as pessoas olharam para os seus direitos, olharam para o balanço do seu orçamento familiar e acharam que não era bom negócio.
Portanto, sobre a vossa ideia de Estado social, creio que estamos conversados na linearidade das conclusões essenciais.
Porém, há um aspecto em relação ao qual devo concordar com o Partido Social Democrata e com qualquer pessoa: o Partido Socialista não pode proclamar o Estado social e sistematicamente vir depauperando esse Estado social, cortando-o sem critério e sem circunstância.
Nestas medidas, quer a que citou sobre as ambulâncias, quer aquelas que eu, com a indignação necessária, já trouxe a debate acerca das taxas moderadoras do Serviço Nacional de Saúde, o que custa a crer é o seu pouquíssimo impacto e significado orçamental, o que mostra que há aqui um excesso de zelo extraordinário. É preciso mostrar serviço, é preciso carregar nos que são sempre os castigados e punidos, que são os mais débeis, os mais fracos da nossa sociedade.
Esse é o grande problema do Partido Socialista: é preciso mostrar que se fazem os males todos de uma vez e mesmo que isso não tenha qualquer consequência, coerência ou significado, é isso que o Governo do Partido Socialista está pronto a fazer neste momento.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

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O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr. Presidente, retribuo os votos de Bom Ano para o Sr. Presidente e para todos os Srs. Deputados.
Quero fazer uma pergunta ao Sr. Deputado Luís Fazenda, que nos trouxe aqui, exemplificativamente, a questão da retirada da isenção de taxas moderadoras a populações desempregadas, que precisam desta isenção, para além de o PCP, tal como o Bloco de Esquerda, entender que as taxas moderadoras não fazem nenhum sentido, não moderam, são apenas um pagamento imposto às populações por um serviço que devia ser, pelo menos tendencialmente, gratuito.
Mas queria referir-me ainda a uma outra decisão, tomada também por estes dias, no sentido de que o mesmo grupo de população com rendimento superior ao salário mínimo nacional vai deixar de poder usufruir dos transportes de doentes. Ora, o que é isto? São transportes que as pessoas têm que fazer para se deslocarem aos hospitais, por exemplo, para tratamentos oncológicos, para a hemodiálise, para consultas de seguimento, que são indispensáveis para a prestação de cuidados de saúde e que custam dezenas e dezenas de euros, mesmo aqui na região de Lisboa, e custam certamente muito mais nas regiões onde as populações estão mais afastadas das unidades hospitalares por causa do encerramento de uma série de unidades nos últimos anos.
É também mais um castigo para as populações, que vão ter de passar a pagar muito para se deslocarem às suas consultas, aos seus tratamentos, que fazem parte dos cuidados de saúde.
Também queria ouvir a opinião do Bloco de Esquerda sobre esta matéria, ou seja, se não se trata de mais uma penalização que vai deixar fora do acesso aos serviços de saúde um conjunto de pessoas que não vai ter dinheiro para pagar estes transportes e que, por isso, vai deixar de fazer tratamentos, vai deixar de fazer as suas consultas de seguimento, com consequências dramáticas para a situação da sua saúde.
É verdade, como disse o Sr. Deputado Luís Fazenda, que há aqui dois pesos e duas medidas. Há dois pesos e duas medidas porque o Governo não retira a quem deve, não cobra os dividendos da PT, como o PCP propôs, não cobra à banca como devia, mas vai buscar aos desempregados e aos reformados. Há dois pesos e duas medidas porque o PSD, de cada vez que se fala de Estado social nesta Casa, lá vem com o discurso contra as medidas do Governo mas nenhuma das medidas que está a ser aplicada deixa de ser uma medida que tem o aval do PSD, tem o voto do PSD, tem o apoio do PSD e é da responsabilidade do PSD.
Essa hipocrisia de um discurso e de uma prática também tem que ser denunciada.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Bernardino Soares, tem inteira razão. As políticas de insensibilidade social, de indiferença em relação aos mais pobres e mais fracos, conduzem e colaboram para a exclusão social. Essa exclusão não é apenas um pecado, começa a ser uma matriz do Governo do Partido Socialista, que não promovia o Estado social em período de crescimento económico e que destrói, a par e passo, o Estado social em período de crise.
Aqueles que deveriam ser os mais protegidos em período de crise económica e social são exactamente os mais penalizados, como referiu, seja no transporte de doentes para tratamentos, nas taxas moderadoras, enfim, em todos os elementos essenciais daquilo que deve ser um direito de cidadania, a protecção, na proximidade, daqueles que são mais fracos e mais débeis na nossa sociedade.
O problema do financiamento do Estado social está intimamente ligado ao avanço ou ao retrocesso das políticas de igualdade. Quando há um fosso cada vez maior de rendimentos entre aqueles que são mais possidentes na sociedade e aqueles que estão crescentemente excluídos, aí começa toda a dificuldade do financiamento do Estado social. E isso acontece quer por meios legais, pelas formas orçamentais e de política económica que se vão praticando, quer pelas privatizações, pelas rendas do Estado, por todas as formas de transferência para o sector privado, mas também pela economia informal, que atinge 20% do produto e não é taxada, e também pelos meios fraudulentos que todos conhecemos e que estão intimamente ligados aos processos corruptivos.

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O Partido Socialista tem disto a responsabilidade política. O Partido Socialista tem disto a responsabilidade de se explicar perante o povo português. O Partido Socialista não consegue explicar porque é que as receitas da austeridade são só para os mais fracos, para aqueles que não têm. Essa política é que é verdadeiramente condenável.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Antónia Almeida Santos.

A Sr.ª Maria Antónia Almeida Santos (PS): — Sr. Presidente, quero aproveitar também para desejar um Bom Ano a todos os Srs. Deputados, a V. Ex.ª e a toda a Mesa.
Sr. Deputado Luís Fazenda, a questão que nos traz aqui é, de facto, uma questão dura. Porém, convinha dizer que é uma medida dura mas é para responder à situação que estamos a viver, que é uma situação excepcional.
As taxas moderadoras nunca puseram a justiça social em questão. Do que se trata é da escassez de recursos que estamos a viver – infelizmente, estamos a vivê-la de há uns anos para cá – e que, com a crise financeira que nos assombrou, está mais acentuada, estando agora confrontados com uma situação excepcional que implica também um esforço excepcional acrescido de rigor.
Os que menos têm vão continuar a estar isentos. Lembro que continuam isentos de taxas moderadoras mais de 55% dos utentes. Porém, a partir do momento em que aplicámos as regras sobre as condições de recursos a todos os beneficiários de prestações sociais, é compreensível que se englobem também, em sede de taxas moderadoras, os titulares de determinado rendimento médio, independentemente de se encontrarem ou não no mercado de trabalho. Eu sei e repito que é uma medida dura, mas é uma medida dura numa situação excepcional.
Sabendo que a saúde é um sector que absorve muitos recursos, quais são as medidas que o Bloco de Esquerda propõe para a sua sustentabilidade? Isto para não afectar a universalidade do acesso aos cuidados de saúde.
Lembro aqui que o Partido Socialista e os respectivos governos muito têm contribuído para que esse acesso se torne cada vez mais universal e qualificado. Houve há pouco tempo uma requalificação dos cuidados de saúde e quero lembrar ao Sr. Deputado que ainda hoje saiu um estudo que comprova que a maioria dos portugueses está satisfeita com a qualidade dos serviços de saúde a que tem acesso.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria Antónia Almeida Santos, julguei que nos ia explicar porque é que numa altura em que se cortou no subsídio de desemprego e no subsídio social de desemprego, os desempregados, a partir do montante do salário mínimo nacional, perderam a isenção das taxas moderadoras.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Exactamente!

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Julguei que nos ia explicar porque é que os pensionistas, que têm as suas pensões congeladas ou cortadas e têm uma maior incidência fiscal nos seus rendimentos, exactamente nessa altura, têm também cortada a isenção das taxas moderadoras pelo Governo do Partido Socialista.
Julguei que nos ia explicar porque é que, para além de cortar nas isenções das taxas moderadoras e nos transportes dos doentes, o Governo também corta nas comparticipações dos medicamentos do regime especial. Essa explicação seria qualquer coisa para que nos pudéssemos aqui entender! Sobre as propostas do Bloco de Esquerda, já as conhece de há muito: sobre o combate ao desperdício, o financiamento da universalidade, a prioridade da política orçamental em saúde, as alterações das relações

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entre o Estado, a indústria e o comércio, enfim, temos um vasto lote de medidas acerca do Serviço Nacional de Saúde.
Mas não será verdadeiramente isso que move neste momento a Sr.ª Deputada. O que devia mover a Sr.ª Deputada era explicar aos portugueses porque é que o Partido Socialista, sem qualquer impacto nas receitas do Serviço Nacional de Saúde, sem qualquer contributo útil para o «buraco» do Serviço Nacional de Saúde, toma medidas desta insensibilidade social.
Os Srs. Deputados do Partido Socialista certamente estarão a ver os rostos dos desempregados e os rostos dos pensionistas. É desses, em concreto, quando falamos de Estado social, que temos de nos lembrar.
As Sr.as e os Srs. Deputados do Partido Socialista deveriam explicar porque é que a taxa sobre a banca, que foi a «folha de parra» das vergonhas do Partido Socialista no último debate orçamental, não entrou em vigor»

O Sr. Francisco Louçã (BE): — Pois é!

O Sr. Luís Fazenda (BE): — » e ç já uma matçria de imensa controvérsia. E o que aqui se brandiu a taxa sobre os bancos! A tal medida dura, a tal arte de trazer alguma equidade á repartição de sacrifícios» Pois não há repartição de sacrifícios nem há taxa sobre os bancos. Aliás, os bancos encarregaram-se de imediato de ridicularizar as intenções do Partido Socialista.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Muito bem!

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr.ª Deputada, fala-me dos jornais de hoje. Pois leia também isso, que é a anedota e a confissão de que o Partido Socialista agiu com reserva mental e com má fç, do ponto de vista»

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Muito bem!

O Sr. Luís Fazenda (BE): — » da repartição de sacrifícios, numa situação de crise como aquela que estamos a viver.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Mota Soares.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, no passado dia 1 de Janeiro, tivemos uma boa demonstração do que é o socialismo real: no mesmo dia em que entrou em vigor o Código Contributivo e em que quem trabalha e quem emprega passou a pagar muito mais ao Estado só pelo facto de trabalhar ou de empregar, no mesmo dia em que os pensionistas da pensão mínima, da pensão social e da pensão rural, isto ç, quem recebe 246 €, 226 € ou 189 € mensais, viram, pela primeira vez na nossa história, as suas pensões ficarem congeladas, nesse mesmo dia, o Ministério responsável por estas duas medidas deu-se ao luxo de promover várias das suas chefias, com efeitos retroactivos e com aumentos de remunerações.
A Sr.ª Ministra do Trabalho já merece o prémio de defender o que é indefensável.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — A explicação do Governo sobre esta matéria é espantosa. Diz o Governo que nada mais está a fazer do que cobrir um vazio legal. Então, se é assim, de duas, uma: ou, durante um ano, o Governo andou ilegalmente a pagar a chefias que não tinham direito a receber e está a cometer uma ilegalidade,»

Aplausos do CDS-PP.

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» ou, eventualmente pior, está a cometer uma imoralidade, ao garantir que chefias da segurança social vão ter um aumento para compensar o corte salarial a que todos os trabalhadores da função pública vão ser sujeitos.

Aplausos do CDS-PP.

O CDS já exigiu explicações sobre todos os casos, caso a caso, chefia a chefia, verba a verba.
Mas, hoje, soubemos ainda mais, soubemos que, em 2010, o Ministério do Trabalho aumentou os prémios para as chefias, ao mesmo tempo que retirava os prémios aos trabalhadores.
Algo vai mal no Ministério do Trabalho!

Aplausos do CDS-PP.

Ser chefe é dar o exemplo; ser chefe não é só estar lá para receber o aumento.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Enquanto isto se passava, os portugueses tinham de fazer fila à porta da segurança social para receber informações sobre os aumentos das contribuições sociais que estavam previstas no Código Contributivo.
Como sempre dissemos, não é numa altura em que o desemprego é muito elevado e em que o cenário económico é de estagnação ou mesmo de recessão que se deve fazer um aumento das contribuições sociais.
A entrada em vigor deste Código Contributivo é da responsabilidade do Partido Socialista, mas tem também a assinatura do Partido Social Democrata, do Partido Comunista Português e do Bloco de Esquerda.
O CDS foi o único partido que propôs nesta Câmara, mas ficou sozinho, o adiamento por um ano da entrada em vigor do Código Contributivo.

Aplausos do CDS-PP.

Mas o mais espantoso é que não apareça agora ninguém para «dar a cara», para explicar aos portugueses o que vai acontecer. Passo referir três casos. Gostava que explicassem o que vai acontecer a um prestador de serviços, que, de repente, viu a sua taxa contributiva ser aumentada em mais cinco pontos percentuais, se ele, por desconhecimento, este mês, pagar a taxa antiga. O que vai lhe acontecer? O Governo vai impor-lhe uma coima? Num segundo caso, o que vai acontecer a um empresário, um verdadeiro empresário, empreendedor, que contrate, em Janeiro, mesmo perante a crise e perante os aumentos de impostos, trabalhadores e que tenha de comunicar à segurança social única e exclusivamente por via electrónica a contratação desses trabalhadores? E, se ele tiver de ir à segurança social pedir explicações e esta não lhas tiver dado, o que lhe acontece? Vai receber um auto? Vai ter a inspecção «à perna»?

Aplausos do CDS-PP.

Por exemplo, o que vai acontecer a um agricultor que contrate, para uma campanha agrícola, um conjunto de trabalhadores agrícolas, por cinco dias, e que tenha de, no prazo de 10 dias, comunicar, exclusivamente por via electrónica, à segurança social a contratação destes trabalhadores, se ele não tiver computador? E se ele não conseguir fazer esta comunicação? Vai ter um auto? Vai ter de pagar uma coima? É assim que se estimula o emprego?

Aplausos do CDS-PP.

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Entre o Código Contributivo e a sua regulamentação, que só foi publicada esta semana, são 376 novos artigos que ninguém sabe como se aplicam, nem sequer a segurança social. Várias vezes, muitos empresários e muitos trabalhadores têm-se dirigido à segurança social para pedir explicações, mas a segurança social nada sabe dizer, nada sabe explicar sobre o que vai acontecer.
No entanto, este papel do explicador do inexplicável, pelos vistos, já recompensou a Sr.ª Ministra do Trabalho. É que a Sr.ª Ministra do Trabalho, não fazendo aquela que é a sua primeiríssima obrigação, que é combater o desemprego, pelos vistos, teve este prémio: não conseguindo combater o desemprego, pelo menos, parece que agora pode alterar os números do desemprego e tentar artificialmente combater o seu aumento.

Aplausos do CDS-PP.

As alterações à metodologia do INE são, até este momento, completamente inexplicáveis. Os dados do INE não são um mero estudo sociológico ou académico, são, sim, uma fundamental ferramenta de governação.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — De facto, é através dos dados do INE que o Governo faz as suas projecções, por exemplo, para pagar prestações sociais que têm uma implicação nas contas do Estado e no Orçamento do Estado.
Não é numa altura em que o desemprego é muito elevado e em que a medição tem de ser milimétrica que se fazem estas alterações metodológicas.

Aplausos do CDS-PP.

Deixar de fazer entrevistas pessoais para passar a fazê-las por telefone terá obviamente consequências.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr. Deputado.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Termino já, Sr. Presidente.
A primeira consequência é a seguinte: se as entrevistas só forem feitas por telefone fixo, está a excluir-se uma grande parte da população activa que não tem telefone fixo. Mas também é verdade que, se as entrevistas só forem feitas por telemóvel, como é óbvio, não se consegue fazer a rastreabilidade de quem muda de número de telemóvel ou de quem, muitas vezes por causa da crise, deixou de ter telemóvel ou mesmo daqueles que, mesmo estando desempregados e muitas vezes sendo abusadores, têm dois, três ou quatro números de telemóvel e vão mudando consoante as circunstâncias.

Aplausos do CDS-PP.

Para terminar, Sr. Presidente, há dois problemas concretos de que temos de falar. O primeiro problema é que deixa de se poder comparar os dados do desemprego. Sabemos que, noutros países onde se mudou de modelo, o que aconteceu foi que, durante algum tempo, se mantiveram dois modelos em vigor para se poder sempre fazer a comparação dos números. Ora, isso não acontece em Portugal.
Mas também é verdade que estes números deixam de ter fiabilidade. Como é que se garante que quem responde à entrevista é o próprio? Como é que se garante que quem responde à entrevista por telefone está, de facto, a dizer a verdade? Como é que se garante esta fiabilidade?

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr. Deputado.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Este tema dos números do INE é, para nós, essencial.

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Como é óbvio, o Governo, que não consegue combater o desemprego, não pode é agora tentar combater artificialmente os números do desemprego.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Inscreveram-se dois Srs. Deputados para pedir esclarecimentos. O Sr. Deputado Mota Soares informará a Mesa se responderá isoladamente ou em conjunto.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Anabela Freitas.

A Sr.ª Anabela Freitas (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Mota Soares, o Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social teve oportunidade de informar todos os portugueses sobre o porquê da promoção das chefias feita na segurança social, assim como, ontem, na Comissão de Trabalho, Segurança Social e Administração Pública, como o Sr. Deputado muito bem sabe, o Partido Socialista não se opôs a que a Sr.ª Ministra viesse ao Parlamento prestar esclarecimentos quanto a esta matéria.
Relativamente à questão do Código Contributivo, Sr. Deputado, isto é a questão do «copo meio cheio ou meio vazio». É que o Sr. Deputado diz que as taxas contributivas aumentaram; nós dizemos que, sim senhor, aumentaram, mas que também diminuíram. No caso dos recibos verdes, passou de 32% para 29,6%, contemplando para todos a reparação na eventualidade da doença, bem como baixou a base de incidência de 1,5 IAS para 1 IAS. Portanto, é a questão do «copo meio cheio ou meio vazio».
Mas do que devemos efectivamente falar é do combate à fraude e evasão fiscal e do combate à economia informal. Mas, quanto a isso, nada ouvi o Sr. Deputado dizer.
Assim sendo, a minha questão é esta: quais os contributos que o CDS-PP está disposto a dar ao desígnio nacional que é o combate à fraude e evasão fiscal, o combate ao desemprego e a elevação do nível de qualificação dos portugueses?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Mota Soares.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Anabela Freitas, agradeço-lhe as suas questões.
Quanto à primeira questão, ainda bem que a Sr.ª Deputada reconhece que houve uma promoção de chefias. E essa promoção de chefias, feita em Dezembro, tem efeitos retroactivos ao dia 1 de Janeiro de 2010, com efeitos nos salários dessas chefias, Sr.ª Deputada. Ora, é exactamente sobre esta matéria que é preciso dar uma explicação. Quando se está a exigir sacrifícios a todos os portugueses, pelos vistos, as chefias da segurança social estão isentas desses sacrifícios.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sabe, Sr.ª Deputada, desde o ano passado, todas as promoções estão congeladas na Administração Pública. Muitos portugueses que são quadros da Administração Pública candidataram-se a subidas de posição e viram essas candidaturas ser congeladas — todos esses portugueses, com excepção dos da segurança social!»

Aplausos do CDS-PP.

E a Sr.ª Deputada acha que isto é uma explicação cabal? Acha que isto é razoável, Sr.ª Deputada? Isto é uma vergonha, do ponto de vista de quem exige sacrifícios aos portugueses.
Relativamente à segunda questão, ainda achei que a Sr.ª Deputada ia dizer que esta questão do Código Contributivo era como a das chefias: aumentam-se mas diminuem-se. Sr.ª Deputada, não é nada disso! Como sabe, neste momento, um prestador de serviços, um pequeno produtor ou um empresário em nome individual, que descontava numa base de 1,5 IAS, vai passar a pagar não sobre o indexante de apoio social

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mas sobre todo o seu volume de negócios. A Sr.ª Deputada acha justo que quem tem um volume de negócios grande mas tem um lucro pequeno, isto é, o seu verdadeiro rendimento é pequeno, passe a pagar mais 150% de impostos? Acha justo que um dono de um cafç, que tem um volume de negócios de 10 000 € mas só leva para casa cerca de 900 € e que pagava 140 € á segurança social, de repente, por causa deste Código Contributivo, passe a pagar qualquer coisa como 350 €? Acha justo, Sr.ª Deputada? Eu não acho!

Aplausos do CDS-PP.

Já agora, quanto à questão da economia formal, há uma coisa que está nos livros e está comprovada, que é o seguinte: quando se aumentam exponencialmente os impostos, quando se aumentam as contribuições para a segurança social de forma exponencial, sem ter em consideração a real dimensão da nossa economia,»

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr. Deputado.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — » aí, Sr.ª Deputada, ç que se aumenta a informalidade.

Vozes do CDS-PP: — Claro!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — E certamente que o meu grupo parlamentar, como o seu, não quererão contribuir para isso.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Machado.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Mota Soares, consideramos que uma das matérias aqui abordadas, que tem a ver com o aumento extraordinário das remunerações das chefias da segurança social, merece ser totalmente esclarecida. Não temos qualquer dúvida. Aliás, na Comissão de Trabalho, por proposta do PSD, foi efectivamente aprovada a vinda da Sr.ª Ministra para prestar esses esclarecimentos.
Mas ao mesmo tempo que falamos nos esclarecimentos que são necessários relativamente às chefias, queremos também deixar aqui uma mensagem a propósito daquilo que é uma injustiça, um crime social, que são os cortes nos salários dos restantes trabalhadores da Administração Pública. Não podemos deixar de referir que, sendo questões diferentes, também importa aqui denunciar aquilo que é um corte inaceitável nos salários dos trabalhadores.
Uma outra temática que queremos abordar e que fez parte da sua declaração política diz respeito ao Código Contributivo. Diz o CDS-PP que se perdeu uma oportunidade e que as restantes bancadas ficaram quietas. Ora, o que o CDS fez foi, permitam-me a expressão, «empurrar com a barriga» o problema, isto é, o que o CDS queria era adiar consecutivamente a entrada em vigor do Código Contributivo.
Ora, o CDS teve a oportunidade de corrigir os aspectos mais nefastos, aquilo que é o pior do pior do Código Contributivo, e não optou por essa via. Queria apenas adiar a sua entrada em vigor.
O PCP apresentou um conjunto de propostas de alteração, um projecto de lei que abordava várias matérias.

O Sr. João Oliveira (PCP): — É verdade!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — O Sr. Deputado falou dos agricultores. Então, por que não viabilizou as propostas do PCP relativamente à alteração do Código Contributivo, no que diz respeito aos agricultores? Dou-lhe ainda o exemplo dos pescadores, das IPSS e de todo o sector sem fins lucrativos, passando pelas mutualidades, pelas cooperativas e pelas associações.

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Ora, o PCP apresentou propostas concretas relativamente aos trabalhadores independentes e, nessa matéria, o CDS-PP não «mexeu uma palha», porque queria era adiar novamente o problema. Mas consideramos que, mais do que adiar o problema, era preciso enfrentá-lo, e o PCP assim o fez: apresentou propostas que resolviam o problema dessas pessoas. Infelizmente, o CDS-PP não nos acompanhou nesta matéria.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Mota Soares.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Machado, ainda bem que mais uma vez falou da questão das chefias. É uma vergonha nacional criar situações de excepção em que se promovem chefias em barda com efeitos retroactivos, quando se exigem sacrifícios a todos os portugueses! Nesta matéria estamos de acordo, mas sabíamos que quanto ao Código Contributivo teríamos uma divergência.
Numa altura em que o desemprego atinge quase 600 mil pessoas, em que o maior desafio na sociedade portuguesa é o de ser capaz de criar condições para se contratarem portugueses, para se criarem postos de trabalho, consideramos ser um enorme contra-senso estar a aumentar-se a contribuição social, a carga parafiscal que quer trabalhadores quer empregadores têm de pagar quando criam um novo posto de trabalho.
O PCP votou contra o adiamento do Código Contributivo — é importante que isso seja claramente explicado a todos os portugueses. Quando, agora, durante o mês de Janeiro, os portugueses começarem a receber muito mais impostos ou carga parafiscal para ter de pagar, é fundamental que saibam que também o devem ao Partido Comunista Português, porque o Partido Comunista Português teve a oportunidade de ajudar a adiar o Código por um ano e não quis.
Sr. Deputado, relativamente às propostas em concreto, como sabe, esta bancada votou favoravelmente todas as propostas que baixavam impostos ou cargas burocráticas para agricultores, para pequenos e médios trabalhadores, para pescadores, para instituições sociais, para tudo o que era economia social, para tudo o que é verdadeiro na nossa economia e que mexe.
O CDS esteve ao lado do desagravamento fiscal ou de carga parafiscal em todos os casos. O Sr. Deputado sabe disso, porque a discussão foi feita há muito pouco tempo, mas pelos vistos, de vez em quando, o Sr. Deputado esquece que o seu voto foi também responsável por não se conseguir adiar o Código Contributivo de 2011 para 2012.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria das Mercês Soares.

A Sr.ª Maria das Mercês Soares (PSD): — Sr. Presidente, começo por cumprimentar o Sr. Deputado e agradecer-lhe apresentação desta questão em Plenário.
Gostaria de dar conhecimento a V. Ex.ª, que, aliás, já o tem, de que o Partido Social-Democrata, em sede de Comissão de Trabalho, Segurança Social e Administração Pública, ainda ontem, apresentou um requerimento, que mereceu a concordância de todos os grupos parlamentares presentes, no sentido de a Sr.ª Ministra vir à Comissão justificar as razões — que, para nós, não são de todo compreensíveis, e muito menos entendidas — sobre a publicação destas portarias, que visam, única e exclusivamente, considerar o aumento e a elevação destas chefias nos seus cargos para efeitos remuneratórios.
Permita-me que lhe diga, Sr. Deputado, que consideramos pertinente ouvir as explicações da Sr.ª Ministra (e penso que o CDS também o deverá considerar), na medida em que o Ministério que tutela foi farto a cortar na despesa dos apoios sociais, mas muito suave no corte das despesas de funcionamento, nas despesas internas do Ministério.

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Nos apoios sociais, os cortes foram muitas vezes superiores a 30% e nas despesas de administração o corte foi apenas de 3,6%. O Partido Social-Democrata, em sede de discussão do Orçamento do Estado, denunciou claramente esta situação.
Quanto ao INE, permita-me que lhe diga, Sr. Deputado, que consideramos como um importante referencial os indicadores do desemprego, os dados estatísticos fornecidos pelo Instituto Nacional de Estatística. É um garante de transparência que permite uma comparação da taxa de desemprego em termos homólogos, quer a nível interno quer a nível externo.
A nossa preocupação em relação à metodologia apresentada é significativa, tanto mais que, queremos crer, nada disto visa disfarçar, ou outra situação similar, os indicadores do desemprego, numa altura em que este afecta tantas famílias, no ano delicado em que estamos e em que todos sabemos que, face à conjuntura económica, a situação social será de certo muito grave, nomeadamente em termos de aumento do desemprego.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Tem de terminar, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Maria das Mercês Soares (PSD): — Concluo já, Sr. Presidente.
Pergunto, pois, se, tal como nós, os senhores consideram que o INE deve garantir que esta transição seja feita com grande rigor e transparência e permitindo sempre a comparabilidade das taxas de desemprego em termos homólogos.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Mota Soares.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada, antes de mais, agradeço e começo pela questão relativa ao Instituto Nacional de Estatística.
Como a Sr.ª Deputada sabe, tal como eu, foi o próprio Instituto Nacional de Estatística que veio logo explicar que não é possível garantir a comparabilidade entre as duas séries. O próprio INE vem dizer que, com esta alteração de método, não é possível garantir que os dados do desemprego que vamos conhecer em 2011 possam ser comparados com os que se conhecem em 2010! Como a Sr.ª Deputada sabe noutros países, quando se muda de método, faz-se sempre uma coisa muito importante que é manter os dois métodos em paralelo para se poder comparar e para depois, numa fase de phasing out, se poder continuar a comparar já de acordo com o novo método. Mas isto não vai acontecer cá, Sr.ª Deputada. Por isso é que dizemos que a Sr.ª Ministra do Trabalho, que tem como primeira obrigação combater o desemprego, já recebeu um prémio, que é o de, pela primeira vez, na nossa história recente, ter uma quebra.
Certamente que a Sr.ª Ministra do Trabalho e da Solidariedade Social, quando tiver de comentar os nõmeros do desemprego, vai dizer que as sçries são diferentes»! Ora, isto não devia acontecer, numa altura em que o desemprego é tão elevado, num tempo em que o combate ao desemprego devia ser uma das primeiras tarefas, quer do ponto de vista económico quer do ponto de vista social.
Quanto à segunda questão, que é a das chefias, ainda bem que o PSD requereu a vinda da Ministra à Comissão (e nós acompanhámo-lo). Porquê? Porque todos estamos habituados ao que se passa no Ministério do Trabalho» Ainda nos lembramos da denõncia recente feita pelo CDS-PP, com factos provados, de um «enxame» de boys que «atacou» o Instituto de Emprego e Formação Profissional, daqueles boys do Partido Socialista que foram nomeados para cargos deste Instituto.
Agora, neste mesmo Ministério, temos um segundo caso, que é o das promoções em barda de chefias. E isto é ainda tanto mais estranho quanto, no Orçamento do Estado para 2010, questionámos o Governo sobre a subida de 14 milhões de euros, em 2010, nas despesas de administração do Ministério do Trabalho. Ora, a Sr.ª Deputada lembra-se, como eu me lembro, de que a Sr.ª Ministra do Trabalho não deu qualquer resposta a essa pergunta. Agora, facto a facto, verba a verba, número a número, promoção a promoção, começamos a perceber para onde é que está a ir o dinheiro dos nossos impostos e dos contribuintes portugueses!»

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Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Menezes.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Portugal vive, neste ano que agora se inicia, um período de grande incerteza face ao futuro mais próximo.
Os portugueses começam a sentir, a partir deste mês, as enormes restrições que o Orçamento de Estado para 2011 lhes vem impor.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Que lata»Atç parece que votaram contra o Orçamento!

O Sr. Luís Menezes (PSD): — E não vale a pena escamotear este facto com a alegação de que a nossa situação não é única no mundo.
Houve uma crise internacional que mexeu com as fundações de todo o sistema financeiro a nível mundial, mas, não sendo uma situação única, também não é uma situação generalizada.
Infelizmente, Portugal está enquadrado num pequeno lote de países que, como corolário de governações incapazes, apresentam défices gravíssimos das suas contas públicas. Alguns já perderam todo o controlo da sua soberania financeira, como são os casos da Grécia e da Irlanda, outros estão na iminência de a perder — entre estes estamos, para nossa preocupação, nós próprios, a Espanha e até a Itália.
Mas, no nosso país, o facto de termos chegado onde chegámos é muito mais grave, e é mais grave porque a situação a que o Governo socialista levou o País em 2009 há muito que vinha sendo referida como insustentável.
Durante esse ano, o PSD fez reiteradamente esse aviso ao Governo.
Em Julho e Agosto de 2009, já todos previam, desde a oposição em uníssono à grande maioria de economistas e entidades independentes, que o défice orçamental fosse para próximo dos 9% — todos, não!, porque o Governo е о Partido Socialista quiseram continuar a viver no «País das maravilhas«»! Dizia então o Sr. Primeiro-Ministro vezes sem conta que o País precisava de optimismo, que a oposição era o rosto do pessimismo e que não havia problema nenhum com as nossas contas públicas.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, neste ano que se inicia, podemos dizer com toda a certeza que aquilo de que o País precisava em 2009 era de realismo por parte de quem conduzia os destinos do Governo.
O que o País precisava em 2009 era de um governo que tivesse agido a tempo e horas e que tivesse dito a verdade aos portugueses sobre a real situação financeira do País.
Infelizmente, para todos os portugueses, o calculismo eleitoral do Governo socialista falou mais alto nesse ano; 2009 foi um ano onde о Governo foi pródigo no anúncio e concretização de medidas que tiveram tanto de eleitoralistas como, infelizmente, de irresponsáveis.
Podemos dizer, com clareza, que o Partido Socialista preferiu olhar para os seus interesses partidários, procurando assegurar a manutenção do poder a qualquer custo, preterindo, assim, o interesse primeiro do destino do País e do futuro dos portugueses.

Aplausos do PSD.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: É importante falar do passado recente para perceber como chegámos a esta situação.
O Orçamento do Estado para 2011, tal como foi apresentado, não era uma escolha entre o bem e o mal, ou entre o certo e o errado.
Os últimos 15 anos de governação socialista quase ininterrupta só permitiram escolher entre o «mal menor» e a «catástrofe iminente»! Foi neste momento, um dos mais difíceis da nossa vida em democracia, que o PSD assumiu o seu papel enquanto partido responsável e com vocação governativa.
Foi uma decisão difícil, mas no entender do PSD o caminho mais fácil traria sérias consequências para o País e para o futuro que queremos dar às gerações vindouras.

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O PSD, em 2010, teve de ter a coragem de «dar a mão» ao País, como o havia feito Marcelo Rebelo de Sousa, na aprovação dos orçamentos que viabilizara para a entrada de Portugal no euro, ou como o fez Mota Pinto, em 1983/85.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: 2011 será um ano de enormes restrições para todos os portugueses.
E é por todas estas restrições, impostas na vida das pessoas pela incúria da governação socialista, que cabe ao Estado, e a este Governo em particular, dar o exemplo. E o Governo tem uma forma muito simples de dar o exemplo, que é executando o Orçamento do Estado para 2011. E para executar este Orçamento o Governo terá de cortar nas mordomias, terá de cortar nos excessos, terá de adiar obras desnecessárias e sumptuosas, terá de implementar as centrais de compras que nunca conseguiu implementar, por exemplo, na saúde e noutros sectores da máquina estatal, e terá de impor rigor e disciplina na gestão das empresas públicas.

Aplausos do PSD.

Esperamos que o esteja a fazer desde o primeiro dia deste ano.
Para executar este Orçamento do Estado, o Governo terá de poupar, por dia, cerca de 21 milhões de euros face ao que gastou diariamente em 2010. Isto significa que ao dia de hoje, 5 de Janeiro de 2011, о Governo já terá de ter poupado cerca de 105 milhões de euros face ao ano de 2010.
Os números são, por isso, muito claros e falam por si. É tempo de agir e cabe a quem governa essa acção.
Foram dadas a este Governo todas as condições políticas necessárias para executar este Orçamento.
Por isso, a partir do dia 1 de Janeiro de 2011, o Governo deixou de ter desculpas para o falhanço das suas políticas.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O PSD não é, nem nunca foi, um partido do «quanto pior, melhor», pelo que nos cabe agora a responsabilidade de ir avaliando a cada momento a acção governativa, nomeadamente, a já referida execução orçamental.
O Governo que nos trouxe até esta situação não tem agora o direito de falhar.
Mas, não tendo este Governo a coragem ou a capacidade de solucionar os problemas que criou, os portugueses sabem que têm no PSD a alternativa necessária a esta governação errática.
Uma alternativa que acredita na capacidade empreendedora dos portugueses e que a procurará motivar; uma alternativa que já deu a Portugal, com Sá Carneiro e Cavaco Silva,»

O Sr. Jorge Seguro Sanches (PS): — E Santana Lopes?!

Risos do PS.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — » os melhores momentos de afirmação nacional em democracia; uma alternativa de esperança que mobilize os portugueses e seja capaz de iniciar um novo ciclo de transformação e de progresso em Portugal.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Sr. Deputado Luís Menezes, tem dois pedidos de esclarecimento, pelo que lhe peço que informe a Mesa sobre se responde isoladamente a cada um dos pedidos de esclarecimento ou se responde em conjunto.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Pinho de Almeida.

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O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Menezes, trouxe V. Ex.ª, mais uma vez e com pertinência, a esta Câmara a questão das finanças públicas e da situação do País em função delas.
É verdade que começámos um novo não diria ciclo mas microciclo a partir do dia 1 de Janeiro. E começámo-lo por responsabilidade do Partido Socialista e, há que dizê-lo também, por responsabilidade do Partido Social-Democrata, que viabilizou o Orçamento que o Sr. Deputado referiu e que, agora, defende que seja executado, mas do qual, como é público, nós divergimos substancialmente.
No entanto, há questões que são essenciais neste momento e que têm que ver, como muito bem disse, com a credibilidade do País, a qual tem de ser aferida pela credibilidade que têm os seus responsáveis.
Portanto, Sr. Deputado, à necessidade de rigor na execução, que todos acompanhamos, deste Orçamento a partir do dia 1 de Janeiro, eu acrescentaria que não é a partir de 1 de Janeiro que este Governo não tem desculpa. Este Governo não tem desculpa há muito tempo,»

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — » e não teve desculpa durante todo o ano passado,»

Aplausos do PSD.

» com sucessivas medidas extraordinárias, sobre medidas extraordinárias, com PEC sobre PEC, sem que os resultados tivessem qualquer consequência, por um lado, na melhoria da situação do País e na inversão da nossa situação de declínio, e, por outro, na melhoria da nossa situação de total ausência de credibilidade exterior junto dos mercados.
Portanto, a grande questão que se põe neste momento é a de saber como é que este Governo poderá recuperar essa credibilidade. É isso que eu pergunto, Sr. Deputado, aferindo isso, desde logo, por dois indicadores, um dos quais, já muito bem referido aqui pelo Sr. Deputado Pedro Mota Soares, tem a ver com o péssimo exemplo que já foi dado na segurança social, tentando contornar regras claras introduzidas no Orçamento do Estado, com promoções para, assim, contornar o congelamento de salários. Este é um primeiro indicador prático muito negativo relativamente a esta execução! O outro indicador, também ele claríssimo, foi a mensagem de Natal do Sr. Primeiro-Ministro. Mais uma vez, voltámos a ver o mesmo Primeiro-Ministro, em mais um ano, com um discurso totalmente desligado da realidade do País.

Aplausos do PSD.

Por isso, Sr. Deputado, a grande questão é esta: com exemplos práticos destes e com uma postura, mais uma vez, irresponsável de quem, em vez de mobilizar o País para as dificuldades que atravessamos e de explicar aos portugueses porque é que este ano, provavelmente, vão passar dificuldades que nunca passaram, fruto de erros que eram evitáveis, mas que foram cometidos»

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Sr. Deputado, tem de terminar.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Vou terminar, Sr. Presidente.
Como eu estava a dizer, com toda esta irresponsabilidade e com estes maus exemplos, como é que o Sr. Deputado acredita que este Governo poderá cumprir os princípios inscritos neste Orçamento e, assim, melhorar a situação do País?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Menezes.

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O Sr. Luís Menezes (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Pinho de Almeida, muito obrigado pela sua questão.
Sr. Deputado, não se trata de um problema de acreditarmos ou de não acreditarmos na capacidade deste Governo de executar o Orçamento, porque temos todos de acreditar, sob pena de, a qualquer momento, podermos perder a nossa soberania financeira e passarmos a ver o nosso futuro gerido por entidades internacionais e não pelo Governo legítimo de Portugal.
Mas disse o Sr. Deputado — e muito bem! — que o PS e este Governo há muito que já não têm desculpa para nos terem levado para a situação para que nos levaram. E o que é grave é que a sanha eleitoralista de 2009 fez com que muitas das medidas que, então, foram tomadas para ganharem as eleições, em 2010, para além de retiradas, foram retiradas quase em dobro.
Vou dar apenas dois exemplos concretos: primeiro, em 2009, a função pública foi aumentada em 2,9%, para não ser aumentada em 2010 e para lhe reduzir os salários agora, em 2011; e, segundo, em Maio de 2009, isto é, a cinco meses das eleições, aprovou-se também uma medida que reconhecia a gratuitidade de todos os medicamentos para idosos e pensionistas. E o que é que o Governo faz em 2010? Retira essa gratuitidade, mas, mais do que isso, impõe um regime de comparticipação, que vai ser altamente penoso para essas pessoas com rendimentos mais baixos e com dificuldades para continuarem a sobreviver.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Nós vamos apresentar essa proposta novamente e, então, vamos ver o que é que o PSD vai fazer!

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Como o Sr. Deputado disse — e bem! —, 2011 vai ser um ano de enormes dificuldades, mas, volto a repetir, quem nos trouxe para esta situação tem agora a obrigação moral e todas as condições políticas para executar o Orçamento que quis, para executar o Orçamento que impôs aos portugueses! Se não o fizer, não terá mesmo mais desculpas e os portugueses saberão que a culpa é do Partido Socialista e do Governo que trouxe este Orçamento para cima da mesa.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Paulo Correia.

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Menezes, V. Ex.ª trouxe-nos aqui um discurso pessimista e depressivo, ao melhor nível do PSD»

Protestos do PSD.

Mais: foi um discurso de fuga á responsabilidade! O PSD viabilizou o Orçamento do Estado para 2011,»

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Mas não o executa!

O Sr. João Paulo Correia (PS): — » pois absteve-se na votação, e, agora, o Sr. Deputado traz aqui um discurso de fuga à responsabilidade de quem viabilizou e se comprometeu com o Orçamento do Estado para 2011.

Aplausos do PS.

Sr. Deputado Luís Menezes, está ou não o PSD comprometido com o Orçamento do Estado para 2011? No nosso entender e no entender da opinião pública portuguesa, o PSD está comprometido com Orçamento do Estado para 2011, porque o viabilizou! O Sr. Deputado disse aqui, ainda agora, que a governação no ano de 2009 foi desastrosa. Mas a governação do ano de 2009 foi uma governação na mesma linha de todas as governações dos países da zona

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euro, dos países da União Europeia e também das grandes economias. Foi o primeiro ano de resposta à crise económica, à crise mais grave dos últimos 80 anos.
O Orçamento do Estado para 2011 é um orçamento de rigor e realista. É um Orçamento de rigor, porque traz com ele um conjunto de medidas de disciplina orçamental, tanto do lado da receita como do lado da despesa; é um Orçamento realista, porque responde, efectivamente, à crise mais grave dos últimos 80 anos.
O caminho que temos pela frente, Sr. Deputado, é um caminho exigente, de medidas duras, de medidas difíceis, de medidas impopulares, é um caminho que tem de devolver a confiança à nossa economia e também de recuperar a confiança dos mercados financeiros. E o contributo que o PSD dá para esse caminho é o de trazer permanentemente para a opinião pública portuguesa discursos depressivos e pessimistas e, agora, trazer uma nova versão de fuga às suas responsabilidades.
A execução orçamental que conhecemos de 2010 diz-nos que estamos no caminho certo para atingirmos o défice orçamental de 7,3%. A subida da receita acima daquilo que está programado no Orçamento do Estado para 2010 e também no PEC e a despesa mantida abaixo do parâmetro máximo em cerca de 2,6% significam que a execução orçamental de 2010 vai ser um momento de confiança, que vai, obviamente, recuperar a confiança na nossa economia também pelos mercados financeiros.
Sr. Deputado, este discurso do PSD parece-nos também mais uma tentativa de apagar»

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Vou terminar já, Sr. Presidente.
Este discurso do PSD parece-nos também mais uma tentativa de apagar da memória dos portugueses a má governação do último governo de direita de coligação PSD/CDS.
Convém recordar que, no ano de 2003, quando a Europa crescia, quando o mundo crescia, Portugal viveu uma das suas maiores recessões económicas. Os senhores levaram o nosso país, no ano de 2003, a uma recessão económica em contradição com a linha macroeconómica de todos os países da zona euro, da Europa e das grandes economias mundiais.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Tem mesmo de terminar, Sr. Deputado.

O Sr. João Paulo Correia (PS): — E também, quando entregaram o governo ao Partido Socialista no ano de 2005, apresentaram um défice orçamental de quase 7%.
A «grande» resposta que o PSD soube dar à crise no Verão passado foi anunciar uma proposta de revisão constitucional de desmantelamento do Estado social»!

Protestos do PSD.

Responda a estas três perguntas, Sr. Deputado.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Menezes.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Paulo Correia, obrigado pelas questões que me colocou.
Confesso que, quando me apercebi de que o Sr. Deputado iria pedir esclarecimentos em nome do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, pensei que já nos iria esclarecer sobre se hoje, dia 5 de Janeiro, os 105 milhões de euros que o Governo já tem de ter poupado para executar este Orçamento já foram, de facto, poupados e quais as medidas que estão a implementar e não fazer aquilo que o Sr. Deputado fez, que foi, ao 5.º dia deste ano, já estar a começar a preparar as desculpas para aquilo que vai ser o fracasso da vossa aparente execução orçamental! Nós, PSD, esperamos que a execução orçamental seja cumprida. Mas não comecem já a avançar com desculpas; tenham a coragem de assumir que estão no Governo, não tenham vergonha de governar.

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Preocupem-se com aquilo que têm de fazer: governem e imponham aquilo que é necessário para que o Orçamento do Estado possa vir a ser cumprido.
Mas, Sr. Deputado João Paulo Correia, quero falar-lhe ainda sobre duas questões.
Uma delas prende-se com a questão do Estado social. É inacreditável que, ao fim de apenas cinco dias deste ano, os senhores venham acenar com a «bandeira» do Estado social! Ora, vou recordar-lhe o que os senhores fizeram apenas em cinco dias: aumentaram as taxas moderadoras em mais de 2,5%, isto é, acima da inflação, quando o ano passado não as baixaram, porque a inflação foi negativa. Isto é que é o vosso Estado social?! O vosso Estado social é retirar a possibilidade de as pessoas de Mirandela, de Miranda do Corvo, de Viseu ou de Tondela receberem a comparticipação necessária para virem fazer os tratamentos de que tanto precisam aos IPO ou a outras unidades de saúde centrais, em Lisboa, no Porto ou em Coimbra!

Vozes do PSD: — Exactamente!

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Isto é o vosso Estado social! É retirar o acesso, é retirar a universalidade! E mais: esta medida que os senhores impuseram agora relativamente ao transporte de doentes é uma verdadeira vergonha, porque aquilo que os senhores fizeram foi achar que uma pessoa, morando no Porto ou morando em Mirandela, tem as mesmas condições ou tem os mesmos custos para poder ter os seus tratamentos médicos! Foi totalmente despropositado! É uma vergonha acenarem com a «bandeira» do Estado social, quando aquilo que têm feito todos os dias é retirar mais e mais direitos aos portugueses, que contribuem diariamente para manter o Estado.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Seguro Sanches.

O Sr. Jorge Seguro Sanches (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Um dos documentos mais importantes em discussão na União Europeia e também aqui, na Assembleia da República é a recente comunicação da Comissão «Energia 2020 — Estratégia para uma Energia Competitiva, Sustentável e Segura».
De uma forma absolutamente realista e para o qual me permito chamar a atenção de toda a Câmara, o documento anuncia um plano de acção para o reforço das políticas de energia europeias essenciais ao cumprimento dos resultados e das metas desejadas para 2020 — menos 20% de emissões de CO2, mais 20% de incorporação de energia renovável e menos 20% de consumo energético na Europa.
Indica-nos também algo que é importante e que os povos europeus devem ter em mente nas suas opções: a energia é o sangue vital da nossa sociedade.
Sr.as e Srs. Deputados: O mundo em que vivemos e toda a grande evolução civilizacional dos últimos 200 anos assentam totalmente em fontes de energia primária baseadas no carbono — primeiro no carvão, depois no petróleo e, mais recentemente, no gás natural. Este modelo, ambientalmente nocivo, mas também finito quanto aos seus recursos, caminha, cada dia que passa, para o seu fim, tornando-se, por isso, cada vez mais insustentável do ponto de vista económico, mas também perigoso do ponto de vista da segurança do abastecimento.
O que deverá, então, fazer um País que não tem reservas conhecidas de carvão, de petróleo ou de gás? Qual deverá ser a estratégia colectiva de um povo que, apesar de continuar a ser, per capita, o menos gastador de energia na Europa, só nos últimos anos conseguiu melhorar os seus índices de intensidade energética, ou seja, a capacidade de, com menos energia, criar mais riqueza? Estas perguntas são formuladas num momento em que o preço do petróleo parece estar preparado para, nos próximos meses, voltar a ultrapassar a barreira dos 100 dólares por barril, um efeito, ainda para mais, potenciado pela assinalável desvalorização do euro, face ao dólar, nos últimos anos. E a pergunta seguinte que devemos colocar é a de saber se estamos mais ou menos preparados para voltar a enfrentar um, sempre possível, novo choque petrolífero internacional.

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Este debate deverá, desde logo, ser iniciado pela clarificação de uma ideia: a de que o actual modo de vida europeia e mundial se viciou num tipo e num modo de consumo de energia que, em fracções de segundo, queimam carbono que demorou milhões de anos na sua formação.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Jorge Seguro Sanches (PS): — » e que ç, sem dõvida, o principal suporte da surpreendente e admirável revolução civilizacional construída no nosso planeta, nos últimos 200 anos.
O nosso país vive nesta época este desafio: toda a energia fóssil consumível é de origem exterior ao País, o que, desde logo, nos deixa um aviso de garantia, ou de falta dela, de segurança no abastecimento.
Mas, por outro lado, esta questão resulta noutra mais complicada, em especial nos dias que correm: a do défice externo produzido pelo enorme volume de importações de carvão, petróleo e gás, sempre com preços não determinados por quem consome mas, sim, por quem detém os recursos naturais. É por isso que, em 2008, o saldo líquido da factura energética portuguesa era de 8219 milhões de euros, um aumento de custo face a 10 anos antes, a 1998, de 322%, quando o aumento, em termos de matéria-prima, pouco foi acima do crescimento da economia, de 23 208 para 24 430, falando em 10 000 milhares de toneladas equivalentes a petróleo.
E, Sr.as e Srs. Deputados, Portugal tem, nesse aspecto, resultados que devem reforçar a nossa aposta nas energias renováveis. No sector da energia eléctrica, 2010 foi o ano com o saldo comercial mais favorável da década, sendo que, actualmente, é de 52% a média anual de consumo de energia renovável, produzida em Portugal.

Aplausos do PS.

Por outro lado, e para todos os especialistas, é unânime que as melhores e mais sólidas políticas energéticas devem apostar num mix eficiente mas dominado, acima de tudo, pela racionalidade. Estes dados afirmam a correcção da opção renovável nas políticas portuguesas de energia, mas também deve responsabilizar todos os agentes políticos em quererem mais e melhor. E é isso que, com esta declaração política, o Grupo Parlamentar do PS afirma: quer mais e melhor política energética, como aquela que tem sido praticada no nosso país, nos últimos cinco anos.

Aplausos do PS.

Mais e melhor, no desenvolvimento tecnológico do aproveitamento energético das renováveis. Afinal, só a energia radioactiva solar, recebida pelo nosso planeta, durante um ano, é 7700 vezes superior ao total da energia primária, utilizada em todo o mundo, no ano 2008.
Mais e melhor, na transparência do funcionamento dos mercados e na informação aos consumidores, apostando na sensibilização e na informação sobre as consequências dos consumos, e apostando, cada vez mais, na eficiência energética.
Mais e melhor, apostando na interligação internacional de Espanha com França, possibilitando, dessa forma, o escoamento da produção renovável de Portugal e da Península Ibérica.
Mais ou melhor, ao apostar no funcionamento, a partir do próximo ano, de uma rede de abastecimento de transportes e de mobilidade eléctrica no nosso país, mas também reforçando a componente da eficácia energética no sector dos transportes.
Mais e melhor, no rigor e no controlo dos custos associados à energia, trabalho que esta Assembleia da República tem produzido de uma forma muito construtiva, quer no sector dos combustíveis quer no da electricidade.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Termino afirmando a esta Câmara a justeza de um caminho que, não sendo o óptimo, é o melhor, apostando na criação de infra-estruturas de produção, de transporte e de optimização do consumo, capazes de dar um melhor futuro às novas gerações, que, seguramente, terão combustíveis fósseis mais escassos e, por isso, os mais caros.

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O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Sr. Deputado, agradeço que conclua.

O Sr. Jorge Seguro Sanches (PS): — Termino, Sr. Presidente, dizendo que a aposta nas energias renováveis é a aposta em energias nacionais endógenas, que são também a garantia de melhor podermos cumprir os objectivos ambientais e de preservação do planeta, mas são também, em termos económicos, um investimento de retorno assegurado.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — A Mesa regista cinco pedidos de esclarecimentos. Sr. Deputado Jorge Seguro Sanches, fará o favor de informar a Mesa sobre se pretende responder isoladamente ou em conjunto.

O Sr. Jorge Seguro Sanches (PS): — Responderei um a um, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Deputado Jorge Seguro Sanches, falar de política energética, neste que é o ano de austeridade, é falar dos aumentos dos combustíveis, ç falar dos aumentos da electricidade,»

Vozes do BE: — Muito bem!

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — » que as políticas põblicas europeias têm patrocinado, ano após ano, para os portugueses.
Dizia-nos, há pouco, o que é que devemos ter em conta, quando se define a Estratégia Nacional para a Energia, para a Europa, aquilo que devemos perspectivar até 2020. Mas nós chegámos cá, já com o caminho ínvio que os portugueses, penosamente, têm de cumprir: foi o caminho escolhido pelo PS, pelo PSD e pelo CDS, foi o caminho das privatizações, foi o caminho da liberalização, é o caminho que onera cada vez mais os portugueses a pagar aquilo que as vossas bancadas quiseram criar, que é o mercado.
Basta perguntar, nos aumentos propostos, naquilo que é a factura média mensal de electricidade, por exemplo, quanto é que custa administrativamente o mercado para as portuguesas e para os portugueses. E a resposta ç simples: numa factura de 40 €, são pagos 8 €, não por qualquer incentivo á produção das renováveis, não por qualquer produção efectiva de energia limpa mas, sim, para remuneração das empresas que têm ao seu serviço os centros electroprodutores, ainda baseados nas energias não-renováveis.

Vozes do BE: — Exactamente!

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — E esta é a política que PS, PSD e CDS têm levado a cabo, esta é a política que os portugueses têm de pagar para que o sacrossanto mercado seja criado.

Vozes do BE: — Exactamente!

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — A pergunta que lhe deixo é muito simples: afinal, que faz o PS sobre esta matéria? Vamos ter algum volte-face, no caminho da liberalização e da privatização? Vamos ter algum volte-face, na construção de uma política pública para a energia que seja efectivamente direccionada para os portugueses, para a economia, para o relançamento do País? Ou continuaremos a ter o Partido Socialista a apadrinhar mecanismos de garantias de potências? Que CMEC (custos para a manutenção do equilíbrio contratual) para aqueles que são os centros termoeléctricos, centros ainda baseados em fuel ou em carvão? Ou teremos, ainda, a criação de mais taxas administrativas, como aquela que aconteceu no passado mês de Agosto, para proteger o mercado? É a isto que é necessário responder, neste ano de austeridade!

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Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Seguro Sanches.

O Sr. Jorge Seguro Sanches (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Filipe Soares, cumprimento-o pela questão que colocou.
A posição do Bloco de Esquerda é uma posição muito confortável neste debate: é a posição de quem nunca assumiu a responsabilidade de liderar qualquer tipo de política para o País.

Protestos do BE.

E quando se tomam responsabilidades na nossa vida, quer na nossa vida particular quer na gestão do Governo, há que tomar, por vezes, medidas que não são as mais simpáticas para todos, mas que apostam no futuro. E a nossa aposta nas renováveis, Sr. Deputado, ç uma aposta no futuro e que garante para o futuro»

Protestos do Deputado do BE Pedro Filipe Soares.

Se eu puder terminar, Sr. Deputado» Eu ouvi-o em silêncio, agradeço-lhe se puder continuar.
Mas eu queria dizer-lhe o seguinte: para nós, é importante que a energia esteja a um preço baixo, essa foi, aliás, a nossa intenção quando chamámos ao Parlamento instituições o sector» Foi para ver com elas o preço dos combustíveis. De resto, o Partido Socialista tem estado a pressionar no sentido de que o mercado lowcost dos combustíveis seja uma realidade em Portugal — e, nisso, gostava de ter o Bloco de Esquerda ao lado do Partido Socialista, a pugnar para que os consumidores possam escolher combustíveis mais baratos e não, apenas, combustíveis aditivados quer pelos pontos quer por aditivos que não são aqueles mais importantes»

Protestos do Deputado do PCP Honório Novo.

Mas queria dizer-lhe que era importante que o Bloco de Esquerda se associasse ao Partido Socialista nesta questão, porque é uma questão importante para os consumidores! Em relação ao mercado da electricidade, Sr. Deputado Pedro Filipe Soares, é verdade que os consumidores domésticos em Portugal têm um sobrecusto naquilo que é o custo da electricidade. É verdade!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — É verdade»! E, então?!

O Sr. Jorge Seguro Sanches (PS): — Mas isso significa — e o Sr. Deputado estará de acordo, com certeza — que se faça um investimento nesta questão quanto ao futuro dos portugueses»

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Ahhh»!

O Sr. Jorge Seguro Sanches (PS): — » porque Portugal não tem, como sabemos, energias fósseis; Portugal não tem petróleo, infelizmente; Portugal não tem gás natural e não tem carvão. Isso significa que nós próprios temos de ter a capacidade de criar uma rede alternativa de produção de energia primária, para que o País não só não fique dependente do fornecimento, mas não fique dependente do próprio custo que a energia vai custar.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Jorge Seguro Sanches (PS): — E, como o Sr. Deputado sabe, tão bem como eu, o custo nos próximos anos vai ser acrescido. E, portanto, é preciso que os portugueses, hoje, percebam que o

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investimento que, hoje, fazem na área da energia tenha de ter garantia, que essa garantia seja para o futuro dos cidadãos portugueses.

Aplausos do PS.

Protestos do BE.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Reis.

O Sr. Nuno Reis (PSD): — Sr. Presidente, gostaria, em primeiro lugar, de saudar o Partido Socialista e, em particular, o Sr. Deputado Jorge Seguro Sanches pela oportunidade de ter trazido a Plenário este tema neste preciso momento. É um momento em que os portugueses estão, como o Sr. Deputado sabe, a «sentir na pele» mais um aumento do preço dos combustíveis; um momento em que o previsível aumento do preço de petróleo põe em causa a frágil retoma da economia mundial; o momento em que até a própria agência internacional de energia faz um apelo a esse verdadeiro cartel que é a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP), no sentido de aumentarem a produção e, dessa forma, aliviarem a pressão sobre os preços do crude. É, por isso, adequado o momento em que V. Ex.ª traz aqui este debate.
No entanto, permita-me que lhe diga que o grande «pecado», o «pecado capital» da sua intervenção é o de que ignora, olimpicamente, o facto de a energia mais barata ser aquela que não chega a ser gasta.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Nuno Reis (PSD): — Durante toda a sua intervenção, V. Ex.ª continuou a vender a ideia — bem socialista, de resto — de um País de sucesso nas renováveis, esquecendo, olimpicamente, repito, que o País continua sem apostar verdadeiramente na racionalização e na poupança da energia.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Nuno Reis (PSD): — É importante que se lhe diga que, neste momento, se analisarmos o Plano Nacional de Acção para a Eficiência Energética, globalmente, nos seus vários eixos, verificamos que o Estado continua com uma mísera taxa de 8% de execução nos seus próprios objectivos.
É importante que se diga também que, até agora, não foi posta em prática nenhuma das medidas a serem implementadas em termos de aprovisionamento verde e nos de redução de consumo nos transportes.
E é por tudo isto, Sr. Deputado Jorge Seguro Sanches, que eu gostava que explicasse à bancada do PSD como é que considera ser compaginável uma política de aposta, uma política de gestão de oferta da energia que aposta nas renováveis, enquanto opção ambiental mais adequada (apesar de, como sabe, terem um sobrecusto que os portugueses estão a pagar pela sua tarifa de electricidade), como concilia, pois, essa política de oferta de produção de energia com uma verdadeira derrota por falta de comparência no campeonato da promoção da poupança energética e da eficiência energética que é aquele «campeonato» que o Partido Socialista e o seu Governo continuam sem travar, infelizmente, para o País.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Seguro Sanches.

O Sr. Jorge Seguro Sanches (PS): — Sr. Presidente, eu, inicialmente, quando ouvia a intervenção do Sr. Deputado Nuno Reis, pensei que ele ia esclarecer o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares do Bloco de Esquerda sobre os CMEC uma realidade que é um sobrecusto para todos os consumidores, que é a responsabilidade dos governos, que, na altura, criaram um regime legal para o seu funcionamento e que são os governos do PSD.

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Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Jorge Seguro Sanches (PS): — Nós entendíamos que talvez uma boa altura de o PSD poder explicar que, quando fala em sobrecusto, não pode dizer que não tem uma responsabilidade no sobrecusto.
Tem-na, efectivamente! O PS tem também uma responsabilidade no sobrecusto, mas tem-na, especialmente, nas renováveis, porque entendemos que isso é muito importante para o País. Um país que aposta não só na produção de energia verde, mas que aposta também na produção de energia nacional está a fazer uma aposta muito clara na redução do seu desequilíbrio da balança comercial.
Penso que o Sr. Deputado Nuno Reis estará com o PS nessa satisfação, e não só na satisfação mas também na exigência. O Sr. Deputado referiu que eu fiz uma intervenção, dizendo que o País era um país de sucesso, mas não tenho essa perspectiva. Considero que, acima de tudo, deve ser um país de exigência, e é isso que espero também da parte do PSD, ou seja, exigência no cumprimento destes objectivos a que todos nós, como país, nos propomos! O PSD, na Legislatura anterior, sempre que se falava em energias renováveis, dizia que todos os concursos tinham sido lançados pelo PSD e não pelo PS. Mas agora já não tem esse discurso, agora já diz que não, que isso já não é do PSD, que isso agora é do PS. Era bom que ficássemos esclarecidos quanto a essa questão.
Gostava também de obter um esclarecimento da parte do PSD — a Assembleia da República só ganha em fazer esse debate — sobre a sua posição e, nomeadamente, a do Presidente do PSD sobre a questão da política nuclear. Gostava de saber se o PSD defende ou não o nuclear, porque no livro que o presidente do PSD apresentou quando se candidatou a presidente do partido demonstrou uma grande simpatia pela energia nuclear. É certo que isso já foi há muito tempo — para vocês é muito tempo; este é um líder que já está há muito tempo em funções —, mas eu gostava de perceber qual é a posição final do PSD, ou seja, se às segundas, quartas e sextas é uma e se às terças e quintas é outra.
Para terminar, queria dizer ao Sr. Deputado Nuno Reis o seguinte: o Sr. Deputado falou na questão da OPEP e acho que é muito sério aquilo que referiu, porque nós, no mundo, não vamos conseguir controlar a formação dos preços do petróleo e, portanto, temos de ser capazes de nos agarrar àquilo que é nacional para nos defendermos em termos de futuro.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Pinho de Almeida.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Seguro Sanches, quero saudá-lo pela intervenção que fez e até pelo tom que introduziu, defendendo aquelas que são as posições em que acredita, sem o fazer de forma panfletária, como muitas vezes estas discussões são feitas, o que prejudica em muito a discussão. Por isso, o tom em que o Sr. Deputado colocou a questão é certíssimo, mas não impede, naturalmente, a divergência.
Antes de falarmos nas opções do ponto de vista energético, frisadas pelo Sr. Deputado, creio que temos de falar na questão do consumo. O Sr. Deputado citou, e muito bem, os 20% de redução do consumo no âmbito da União Europeia. Ora, acontece que, infelizmente, essa redução de consumo não é acompanhada por Portugal, ou seja, nós não só não acompanhamos os 20% como nem sequer acompanhamos a redução.
Infelizmente, somos ainda um dos poucos países na União Europeia que continua a aumentar o seu consumo de energia de ano para ano, e isso tem de ser visto também como um dado essencial da avaliação da política energética.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

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O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Na avaliação dessa política energética, a total incapacidade para promover a eficiência energética, de forma a que poupemos energia antes de, sequer, optarmos por qual das energias vamos consumir, é uma falha inegável e é, obviamente, uma área em que há muito para fazer e onde esta política falhou completamente.
Depois, coloca-se também a questão das opções. A este respeito, quero dizer que há opções que questionamos de forma bastante clara. A opção de fazer toda esta substituição de energias fósseis por energias renováveis é uma opção que não questionamos, mas o ritmo e a forma são, obviamente, discutíveis.
Porque é que imputamos todo esse custo ao consumidor? Esta é uma das questões essenciais.
Se acompanhamos a mudança estrutural, é óbvio que ela não pode ser indiferente à conjuntura. E a conjuntura, neste momento, quer para famílias, quer para empresas, é muito negativa. E o que acontece é que nós, em conjuntura muito negativa, estamos a fazer essa alteração, imputando todo o seu custo aos consumidores, reduzindo, assim, ainda mais, a margem para as empresas e reduzindo ainda mais o poder de compra para as famílias.
Por outro lado, em muitos dos concursos, o primeiro factor de ponderação não é sequer o factor técnico, mas, sim, o factor financeiro e, essencialmente, os pagamentos à cabeça. Ou seja, em muitos dos concursos a política energética está a servir para financiar o défice das contas públicas e não para financiar, por exemplo, o défice tarifário.
E é sobre esta opção de incluir a política de energia no combate ao défice das contas públicas sem conseguir daí retirar o verdadeiro retorno no que diz respeito a uma política energética que eu questiono o Sr. Deputado, perguntando-lhe se não considera essencial esta transparência e separar, claramente, o que é política energética e o retorno que daí advenha e aquilo que é combate ao défice público.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Seguro Sanches.

O Sr. Jorge Seguro Sanches (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Pinho de Almeida, agradeço a questão que colocou e quero começar por dizer-lhe que o CDS tem, nesta matéria, uma posição ambígua: para as auto-estradas sempre defendeu uma política do utilizador/pagador, mas em relação à energia deixa de defender a política do utilizador/pagador e passa a defender a política de pagarem os contribuintes.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Nas estradas, é o utilizador que decide se as usa ou não.

O Sr. Jorge Seguro Sanches (PS): — Não acho que seja assim. Considero que o consumidor tem, nesta questão, uma grande importância.
O Sr. Deputado disse que há determinadas parcelas do sobrecusto que devem ser consideradas. Ora, quero lembrar-lhe que, no passado dia 22, o Governo esteve presente numa audição parlamentar na Assembleia da República em que mostrou toda a abertura — aliás, como o PS — no sentido de, primeiro, os consumidores terem mais informação sobre a sua factura energética e de, por outro lado, discutirmos cada uma dessas parcelas.
Não acredito que o Sr. Deputado ache que a parcela da compensação que é feita às Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira seja daquelas que deva terminar. Ou uma daquelas que têm a ver com as autarquias» Não me parece que seja isso.
Considero que esta discussão entre todos os grupos parlamentares, de uma forma absolutamente transparente — entendemos que a iniciativa da DECO faz todo o sentido —, é uma boa oportunidade para a Assembleia da República poder discutir essa questão.
Sr. Deputado, lamento dizer-lhe que não acho que o nosso consumo tenha vindo a aumentar nos últimos anos. O consumo de energia no nosso país — remeto-o para a insuspeita revista Energia e Futuro — reduziuse desde 2005 até 2008. Mas isso não significa que, ao nível da eficiência energética, estamos satisfeitos. De maneira alguma! Aliás, quero dizer-lhe que a própria comunicação da União Europeia, que referi no início da

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minha intervenção, faz referência à insatisfação generalizada em relação a todos os planos nacionais de eficiência energética de todos os países da Europa e, portanto, devemos querer mais.
Mas, quero dizer-lhe o seguinte: apesar disso, o plano nacional português é o mais ambicioso. E foi um governo do PS o primeiro governo em Portugal que apresentou um plano nacional para a eficiência energética!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Igualmente para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Lopes.

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Seguro Sanches, saúdo os ciclópicos esforços discursivos no sentido de garantir a bondade da política energética do Governo ao povo português.
Mas não tenha dúvida de que, com os aumentos previstos para a electricidade, para o gás natural, para os aumentos brutais verificados na gasolina e no gasóleo, não há discurso, não há palavras que consigam convencer o povo português de que a política energética do Governo é a adequada.
Sr. Deputado Jorge Seguro Sanches, os senhores valorizam a estratégia para as renováveis e nós até saudamos a descoberta tardia dos governos do PS das energias renováveis. Há mais de 30 anos que o PCP tem, em documentação, que, aliás, o Sr. Deputado conhece, colocado o problema da energia eólica, da energia geotérmica, da energia hídrica, inclusive reclamando, no seu discurso político, a concretização do aproveitamento dos recursos endógenos e renováveis no nosso país. Mas o problema que se coloca é o de saber quem é que suporta e quem paga essa estratégia.
Ora, em vez de olharem para as energias renováveis há 20 ou 30 anos, os senhores, e também o PSD e o CDS, andavam envolvidos noutra guerra, que era a da privatização das grandes empresas públicas do sistema energético português, na liberalização dos mercados e até na desestruturação deste sector, através da segmentação da cadeia de valor, concretamente no sistema electroprodutor nacional.
Daí decorre que, hoje, os senhores não têm, aparentemente, outras respostas que não sejam as de sobrecarregar os consumidores portugueses com os custos desses incentivos — 1000 milhões de euros, segundo a ERSE. E isso acarreta problemas graves, como o Sr. Deputado bem conhece, não apenas para o bolso dos consumidores portugueses como também para a competitividade da economia nacional.
Este é, sem dúvida, em muitos sectores industriais, em muitos sectores produtivos, um dos problemas mais graves face a outros países da União Europeia.
Sr. Deputado Jorge Seguro Sanches, podíamos ter incentivos às renováveis e ter preços mais baixos na energia? Podíamos. Aliás, eu até pensava que o Sr. Deputado vinha hoje aqui anunciar-nos que, fruto das negociações do Governo com a Galp, esta ia montar, rapidamente, uma rede de bombas low-cost por todos os distritos do país, a começar pelos do interior, para que os seus habitantes não precisem de ir a Espanha abastecer! Até pensava que também vinha hoje comunicar-nos que os preços do gás natural para a indústria iam, de facto, baixar e não subir neste ano! E até pensava que vinha dizer-nos que a abertura que o Governo manifestou para rever a factura da energia eléctrica em matéria de incentivos às renováveis ia já, com urgência, ser resolvida no sentido de que os portugueses não tivessem qualquer aumento nas tarifas da energia eléctrica em 2011.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva). — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Seguro Sanches.

O Sr. Jorge Seguro Sanches (PS): — Sr. Presidente, em primeiro lugar, quero cumprimentar o Sr. Deputado Agostinho Lopes e dizer que fico satisfeito por sentir que o Grupo Parlamentar do PCP adere à ideia do PS no sentido de que o comércio de combustíveis em Portugal deve ter, também, a possibilidade de dar aos consumidores a opção por combustíveis não aditivados. Que eu saiba, esta é a primeira vez que o PCP toma esta posição.

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Portanto, eu queria dar nota disso à Assembleia da República, dizendo que, nesta questão, é importante que o PCP siga o PS.
Sr. Deputado, sinto o seguinte em relação à sua intervenção: por um lado, o Sr. Deputado quis dizer que não concordava com a política de energia das renováveis seguida pelo Governo do PS, mas, por outro lado, quis dizer, noutra parte da sua intervenção, que estas políticas todas, no fundo, já tinham sido pensadas, gizadas e propostas pelo PCP há 30 anos.
Ora, isso significa que o PCP está aqui numa postura de, não podendo criticar porque são propostas com as quais concorda, sentir uma dificuldade enorme em criticá-las. Isso significa que o PCP tem uma posição séria quanto à discussão da política energética em Portugal. Queria fazer essa referência, dizendo que o senti, ou seja, senti que o PCP quis dizer, hoje, que há uma política que está a ser seguida, na qual o PCP se revê pelo menos há 30 anos. Não sei se agora não se revê, mas nessa altura revia-se. Portanto, Sr. Deputado, registo essas duas questões.
Sr. Deputado, temos tido uma postura o mais proactiva possível no sentido de que os reguladores venham à Assembleia da República para que os Deputados possam dispor de uma análise ao momento sobre a forma como são formados os preços, em Portugal, na área da energia.
Desde sempre, nesta Legislatura ou na anterior, ou por iniciativa do PS, ou mesmo quando o PS não estava de acordo, o PS sempre foi defendendo que os reguladores aqui viessem e que discutíssemos o preço e a forma como o preço era e é formado.
Finalmente, quero dizer-lhe que, da parte do PS, há toda a disponibilidade para, em qualquer momento, discutirmos as questões que têm a ver com o preço da energia. É, de facto, uma área muito importante para a economia e para a vida dos portugueses.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Ainda para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Seguro Sanches, fez algumas afirmações que demonstram algum desconhecimento da realidade ou, então, são uma forma de procurar dar a volta à questão, sem assumir a responsabilidade que o Governo tem, naturalmente, nesta matéria.
O Sr. Deputado diz que o preço da energia resulta do facto de não termos petróleo. Pois! Aquilo que os portugueses sabem é que, quando o preço do petróleo sobe o preço da energia sobe e que quando o preço do petróleo desce o preço da energia sobe.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Exactamente!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — É isto que os portugueses sabem e sentem, designadamente na sua factura de electricidade e quando vão a uma estação de serviço abastecer o seu carro de combustível. É ou não é, Sr. Deputado?! Aquilo que o Sr. Deputado sabe e que os portugueses também sabem, quando olham para a sua factura de electricidade, é que uma parte do preço que lá consta vai directamente, como lucro, para os accionistas das empresas. Mais nada, Sr. Deputado! Ou seja, os portugueses, os consumidores estão a pagar o preço da privatização de um sector fundamental, em Portugal,»

Vozes do PCP: — Exactamente!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — » e ç isto que o Sr. Deputado não quer reconhecer.
Mas, Sr. Deputado, vamos lá ser sérios: estamos a pagar os custos da liberalização de um sector pela qual os Srs. Deputados tanto se bateram, enquanto nós alertávamos para as consequências. Agora, parece que todos acordaram, que todos se apercebem dessas consequências. Pois é! A liberalização sai cara aos consumidores — quais alternativas, quais quê, Sr. Deputado! — e sai muito boa para o bolso dos accionistas das empresas. É claro que sabemos disso!

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Sr. Deputado, sabe o que interessa? Interessa perceber a diferença entre um sector estratégico ou não estratégico para um Estado e perceber, na perspectiva das pessoas, o que dá lugar a um bem essencial ou a um bem de luxo. E a energia é um bem essencial, Sr. Deputado! Depois, o Sr. Deputado disse: «Está bem, nós agora não podemos fazer nada, mas valha-nos tudo, temos os reguladores». E o que é fazem os reguladores, Sr. Deputado? Então, vamos passar a vida a ouvi-los? Eles não fazem nada! Não regulam absolutamente nada! Isto é um desnorte autêntico! Aquilo que sabemos é que os consumidores pagam essa factura, pagam a factura da vossa opção política de liberalização de um sector estratégico para o Estado.
Há ainda outra questão de que o Sr. Deputado»

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Termino já, Sr. Presidente.
Como estava a dizer, há ainda outra questão de que o Sr. Deputado não falou na sua declaração política mas que já deu lugar a alguns esclarecimentos, em resposta aos pedidos que lhe foram feitos, que tem a ver com a eficiência energética. Pois é, nós continuamos a ser dos países que mais gastamos, em termos energéticos, para produzir uma unidade de produção. Nós não conseguimos dar a volta ao nível da eficiência energética. O que lhe pergunto é: porquê? Está bem, já aqui ficou claro que o Plano Nacional de Acção para a Eficiência Energética não está cumprido, nem de perto nem de longe, ou está cumprido numa ínfima parte, quase nada. Aquilo que lhe pergunto, Sr. Deputado — dê a cara! — é: porquê? Por que é que não batalhamos na eficiência energética em Portugal? É porque isso não dá lucro a alguém? Porquê? Explique, Sr. Deputado, por que é que essa, que era uma forma de enriquecer Portugal, ao nível energético, não tem sido uma prioridade governativa.

Aplausos de Os Verdes e do PCP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Seguro Sanches.

O Sr. Jorge Seguro Sanches (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, antes de mais, cumprimento-a pelo seu pedido de esclarecimento. Estava a ver que acabava por não falar na eficiência energçtica»

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Falo sempre!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É uma intervenção eficiente!

O Sr. Jorge Seguro Sanches (PS): — » ou por não falar, como não falou, na importància das energias renováveis para cumprirmos objectivos que eu acreditava estarem na génese do partido a que a Sr.ª Deputada pertence.
Sr.ª Deputada, nos últimos cinco anos, Portugal tem vindo a melhorar os valores da intensidade energética — não é a mesma coisa de que falámos antes, a eficiência energética. A Sr.ª Deputada disse que se trata de uma parte ínfima, mas, com certeza, a Sr.ª Deputada não tem acompanhado os estudos e os relatórios que têm a ver com a aplicação do Plano Nacional de Acção para a Eficiência Energética no nosso País, porque, caso contrário, saberia que cerca de 18% do Plano já estão executados,»

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Isso é uma barbaridade!

O Sr. Jorge Seguro Sanches (PS): — » tratando-se de um Plano até 2015, como a Sr.ª Deputada, eventualmente, saberá.
Sr.ª Deputada, gostava de conhecer, da parte do vosso partido, propostas que tenham a ver com a eficiência energçtica,»

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A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — No Orçamento do Estado!

O Sr. Jorge Seguro Sanches (PS): — » porque sou capaz de me lembrar de duas ou três apresentadas pelo Partido Socialista ou pelo Governo, nesta Assembleia da República, as quais são muito importantes e, por isso, a Sr.ª Deputada também as deveria ter referido, se, efectivamente, estivesse preocupada com a questão da eficiência energética.
Relativamente ao imposto automóvel, como sabe, Portugal é dos países da Europa que tem o imposto automóvel mais amigo do ambiente — a Sr.ª Deputada não o referiu.
Em relação aos planos de substituição de lâmpadas, a Sr.ª Deputada acha mal, concorda com eles, acha que são bons? Gostava de ouvir a sua opinião.
Mesmo em relação à Assembleia da República, às propostas que têm a ver com a eficiência energética na Assembleia da República, a Sr.ª Deputada sabe que têm na sua génese o Grupo Parlamentar do Partido Socialista.
Portanto, Sr.ª Deputada, dizer mal por dizer mal não me parece ser a melhor forma de discutirmos política energética em Portugal. E a Sr.ª Deputada permitir-me-á que lhe diga que fala na questão da liberalização, fala na questão da privatização, mas penso que não foi isso que discutimos neste debate. O que discutimos neste debate foram opções de um país sobre o tipo de energia que quer ter para desenvolver a sua economia e o bem-estar das gerações futuras.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma declaração política, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os Verdes querem voltar aqui à discussão da alteração do método usado pelo Instituto Nacional de Estatística (INE) para recolha de dados do inquérito ao emprego. Não queremos fazer discussão por discussão, mas queremos regressar a esta temática, porque pretendemos anunciar à Câmara uma proposta que Os Verdes vão apresentar, na Assembleia da República, para dar sequência à informação que todos tivemos e que bastante nos preocupa.
O certo é que estes inquéritos eram feitos presencialmente e, segundo a informação que temos, passam a ser feitos por telefone. Ora, isto implica com o universo daqueles que são inquiridos, isto é, esse universo tende imediatamente a ser deturpado e incertamente definido. Mais: o inquérito será feito através de telefones fixos — muitas pessoas não o têm — ou será feito através de telefones móveis? E de quem? Uns não os têm, outros têm um, dois, três ou quatro, não importa. Que critério de utilização desses números telefónicos? Ou seja, aquilo que sabemos, e muitas são as dúvidas que já aqui foram suscitadas e que podem ser suscitadas, é que se pode deixar de fora uma boa faixa da população.
Depois, sabemos também que o conteúdo do inquérito será alterado. Em que moldes? Em que sentido? Não sabemos absolutamente nada.
Por isso, quero aqui louvar a iniciativa já tomada pelo PCP de chamar o Ministro da Presidência à Assembleia da República, no sentido de podermos obter mais esclarecimentos. Penso que é um primeiro passo extraordinariamente relevante e que deve ser levado muito a sério por todos os grupos parlamentares.
Ora bem, aquilo que se pede, ao nível do emprego, e porque não estamos a viver um momento qualquer, é a fiabilidade de dados, a verdade do desemprego em Portugal e a possibilidade da comparação de dados, porque tudo isto é relevantíssimo para a definição, para moldar políticas de emprego e caminhos a trilhar ao nível do emprego, ou seja, conhecer seriamente a situação, no sentido de lhe poder dar resposta, e não deturpá-la, para se dar a resposta que convém dar, em dado momento, a algum Governo.
Ora, quando o próprio INE informa publicamente que os dados não serão comparáveis com os anteriores, isto merece a nossa preocupação. Quando o próprio INE admite não ser possível calcular o impacto que a alteração terá nos indicadores do emprego, isto deve merecer, seriamente, a nossa preocupação. Aquilo que sabemos é que os únicos dados fiáveis que temos hoje ao nível das estatísticas do desemprego são, justamente, os do INE. Os dados do Instituto do Emprego e Formação Profissional não são fiáveis, não

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conhecemos as regras da sua elaboração, desaparecem, como sabemos, dezenas de milhares de desempregados sem se saber exactamente porquê nem como — se é por via de actualizações, às vezes as actualizações são estranhíssimas — e aquilo que sabemos é que, muitas vezes, por via deste Instituto, são dadas muitas mãos ao Governo naquilo que apetece em matéria de emprego ou desemprego. Não é isso que esperamos do INE e não queremos passar de estatísticas mais fiáveis para estatísticas que possam dar jeito a alguns Governos ou a alguns momentos políticos.
O certo é que esta alteração não aparece num momento qualquer. Aparece num momento em que os níveis de desemprego atingem valores record, sendo as estimativas para este ano as de que o desemprego continua a aumentar, a galopar, em prejuízo, naturalmente, dos nossos diversos concidadãos que se vierem a encontrar — e alguns já se encontram, de resto muitos, na ordem dos 600 000 — nessa situação perfeitamente degradante do ponto de vista pessoal, social e familiar.
Ora, não se poderem comparar dados e perder-se completamente o norte à evolução do desemprego é extraordinariamente mau, e mau demais para que a Assembleia da República se silencie e não procure dar uma resposta concreta a esta situação.
O INE vem alegar que este método está proposto desde o ano de 2007. Então, a pergunta que se impõe colocar é esta: porquê alterar agora, porquê aplicá-lo neste período crítico em que o desemprego sobe desta forma? Dirá o INE que qualquer altura será má, que em qualquer altura serão feitas críticas — se é porque o desemprego desce, é porque desce; se é porque sobe, é porque sobe.
O que Os Verdes entendem é que, em qualquer altura, aquilo em que é preciso acreditar é que estamos perante um método fiável. E não podemos arrecadar um método para começar a implementar outro, que não tem, à partida, qualquer fiabilidade. Então, aquilo que Os Verdes propõem é que ou não seja aplicado desde já este método e que comece a ser aplicado quando os portugueses, de facto, conhecerem e perceberem o que está em causa, ou, então, que sejam aplicados os dois métodos em simultâneo, durante, por exemplo, o período de um ano, de modo a que possamos comparar as suas conclusões e perceber qual a fiabilidade de um e de outro ou de um em relação ao outro. É o mínimo que a Assembleia da República pode pedir, no sentido de credibilizar os dados estatísticos sobre o emprego e o desemprego em Portugal.
Não podemos tolerar métodos completamente falíveis, caso contrário, Sr.as e Srs. Deputados, qualquer dia temos as estatísticas do desemprego a serem feitas por via da Internet e em que não respondemos com nomes, respondemos com nicknames, nem sabendo a quem estamos, de facto, a perguntar. Não podemos seguir o caminho que nos leve a uma situação dessa natureza. Rosto com rosto é importante para a elaboração e para a realização de estatísticas.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr.ª Deputada

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Vou terminar, Sr. Presidente, dizendo, então, que Os Verdes vão apresentar um projecto de resolução na Assembleia da República justamente no sentido de que este método não seja aplicado para já até que o conheçamos verdadeiramente ou de que, em alternativa, sejam aplicados, simultaneamente, os dois métodos, para percebermos, de facto, as conclusões de um e de outro e a fiabilidade que este novo método que agora é proposto nos apresenta.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Sr.ª Deputada, a Mesa regista a inscrição de dois Srs. Deputados para formularem pedidos de esclarecimento, pelo que gostávamos de saber se a Sr.ª Deputada responderá individualmente ou em conjunto.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Em conjunto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Assim sendo, para pedir esclarecimentos, tem a palavra, em primeiro lugar, a Sr.ª Deputada Maria José Gambôa.

A Sr.ª Maria José Gambôa (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, relativamente ao método da entrevista telefónica assistida por computador, que hoje faz parte das suas preocupações, quero relembrar-lhe duas questões centrais, tendo em conta a nossa longa experiência de relacionamento com o

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INE. A primeira é a de que estamos a falar de um método de trabalho controlado pelos técnicos, pelo seu saber e pelas suas competências. Portanto, esta não é uma questão do Governo. Aliás, é até uma ofensa para os trabalhadores do INE que se estabeleça uma relação destas com o Governo, porque os trabalhadores do INE não trabalham por encomenda do Governo, são trabalhadores iguais aos outros, produzem saber a partir da sua própria sabedoria e do seu compromisso científico com a estatística em Portugal. E nós temos tido, durante muitos anos, um trabalho próximo e afincado com este grupo de trabalhadores, que também tem constituído para nós uma fonte de sabedoria. Por isso, relacionar isto com o Governo é mau, é muito mau, Sr.ª Deputada. E é tão mau que lhe deixo aqui uma questão.
Percebo que a Sr.ª Deputada — deixou-o muito claro, é legítimo da sua parte — coloque a questão de mais saber. Precisamos todos de mais saber. O povo costuma dizer que «o saber não ocupa lugar» e também nesta Câmara «o saber não ocupa lugar». Por isso, pergunto-lhe porque não pensam Os Verdes chamar aqui a Sr.ª Presidente do INE, pois é ela, verdadeiramente, a técnica responsável pelo saber, pelo método, pela opção no tempo e no espaço do INE, por toda a sua trajectória que desde 2006/2007, como disse hoje a comunicação social, o INE tem vindo a trilhar.
Desta forma, o Partido Socialista está absolutamente disponível para uma sessão de trabalho nesta matriz, para aprendermos todos sobre este método. Eventualmente, não seremos muito mais competentes uns do que outros nesta matéria, porque o importante aqui é perceber quais são as razões acrescidas em saber, em benefício, em rigor para a estatística que o Instituto Nacional de Estatística tem neste momento a oferecer aos portugueses.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Lopes.

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, começava por saudar a oportunidade da declaração política de Os Verdes perante o escândalo de que ontem o País tomou conhecimento relativo à alteração dos métodos de recolha da informação sobre o desemprego pelo INE.
A tentativa de ocultar, de subestimar os números dramáticos do desemprego em Portugal é conhecida. O Primeiro-Ministro, por exemplo, acabou de fazer uma intervenção de fim de ano em que conseguiu não dizer uma palavra sobre a questão do desemprego, o que é verdadeiramente notável.
Mas podemos dizer mais: o Governo tem sido «useiro e vezeiro» na manipulação de dados estatísticos na tentativa de os conformar com a sua própria propaganda. Não estamos perante um facto isolado.
Lembro, por exemplo, em matéria de emprego, a manipulação dos dados do desemprego através dos ficheiros do Instituto do Emprego e Formação Profissional. Lembro os problemas do atraso consecutivo na divulgação dos inquéritos às famílias em matéria de rendimentos e despesas, que ocorreram durante anos, que tiveram consequências ao nível do cálculo da taxa da inflação pelo mesmo INE.
Lembro a tentativa do Primeiro-Ministro e de outros membros do Governo, durante os anos de 2007 e 2008, de compararem o incomparável. Tentaram «comparar alhos com bugalhos» ao calcularem o crescimento do emprego comparando números de trimestres não homólogos.
Srs. Deputados, agora podemos perceber melhor os alertas que o PCP fez nesta Casa, em Outubro de 2007, aquando da discussão da proposta de lei n.º 54/X, altura em que se alterou o Sistema Estatístico Nacional. Avisámos sobre a tentativa de governamentalização do INE, que estava em curso, peça central do Sistema Estatístico Nacional! Infelizmente, desde essa data, os factos dão-nos razão.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr. Deputado.

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Vou terminar, Sr. Presidente, perguntando à Sr.ª Deputado Heloísa Apolónia se está de acordo com a iniciativa do Grupo Parlamentar do PCP no sentido de chamar para audição, na Comissão de Orçamento e Finanças, o Sr. Ministro da Presidência Pedro da Silva Pereira, que tutela o INE, para prestar esclarecimentos sobre este assunto, que não é um problema menor, é um problema político e grave deste Governo!

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Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria José Gambôa, não me parece assim tão despropositado relacionar esta matéria com o Governo. Para já, porque o Governo tutela o INE. Mas a Sr.ª Deputada poderá dizer assim: «Está bem, mas é uma autonomia, tem que ser respeitada».
Respeito imenso os técnicos do INE e todo o trabalho que fazem, contudo ocorre uma coisa que a Sr.ª Deputada não referiu: é que, segundo o que veio a público, o INE fez agora esta proposta no sentido de iniciar a prática desta metodologia por razões financeiras, ou seja, para poupar. Essa não é uma questão de somenos importância.
A alteração do método e uma eventual menor fiabilidade dos dados — acho que são dúvidas legítimas que hoje aqui foram levantadas, a Sr. Deputada reconhecê-lo-á — não nos deve merecer uma grande preocupação? E o facto de o INE o fazer por razões financeiras deve merecer a nossa brutal preocupação, Sr.ª Deputada! É, por isso, importante ouvir o Governo sobre esta matéria.
E, Sr.ª Deputada, se entende que devemos chamar cá responsáveis do INE, pois com certeza. Acho que todos teremos interesse em esclarecer esta matéria ao máximo e em perceber, designadamente, as razões que levam o INE a praticar esta metodologia. Mas a Sr.ª Deputada não pode descartar aqui a responsabilidade do Governo, que tem, necessariamente, que dar uma resposta em relação a esta matéria.
O que não podemos é ouvir a notícia, apercebermo-nos das falhas daquilo que pode estar em causa, de termos dúvidas legítimas em relação a esta matéria, e chegarmos aqui e não fazermos absolutamente nada! O que me parece, considerando o que li, é que o método está a ser aplicado, ou vai sê-lo, no 1.º trimestre de 2011! E a Assembleia da República, como órgão de soberania, julgo que deve — perdoe-me a expressão, Sr.ª Deputada — «meter uma mão» no sentido travar, de alguma forma, o que pode acontecer sem a comparação dos dois métodos em simultâneo ou, então, aplicando-se o método anterior até que percebamos exactamente aquilo que está em causa.
Na sequência da resposta à Sr.ª Deputada, digo também ao Sr. Deputado Agostinho Lopes, como de resto referi na minha intervenção, que julgo louvável a iniciativa que o PCP imediatamente tomou no sentido de chamar o Sr. Ministro da Presidência, porque urge que se prestem esclarecimentos e que se percebam as responsabilidades políticas, designadamente em relação à questão do financiamento. Logo, o que queremos é que o Sr. Ministro da Presidência venha rapidamente à Assembleia da República para que esses esclarecimentos possam ser prestados.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Chegou ao conhecimento público, através da comunicação social, a existência de um acordo bilateral que terá sido assinado entre o Governo português e as autoridades dos Estados Unidos da América dando acolhimento à pretensão destas últimas de, em nome do combate ao terrorismo, ter acesso aos dados pessoais, biométricos e biográficos que constam das bases de dados de identificação civil e criminal do Estado português, bem como da base de dados nacional de perfis de ADN.
Ainda segundo a comunicação social, as negociações bilaterais entre os Estados Unidos e diversos Estados-membros da União Europeia, como será o caso do Estado português, têm sido o expediente encontrado pelos Estados Unidos para contornar dificuldades relacionadas com as objecções de vários Estados-membros e das próprias instituições da União Europeia à cedência desse tipo de dados.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. António Filipe (PCP): — Esta ideia é, aliás, corroborada por personalidades insuspeitas de qualquer antiamericanismo, como o Deputado português ao Parlamento Europeu Carlos Coelho.

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O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

O Sr. António Filipe (PCP): — Referem as notícias que o Governo português aceitou a solicitação norteamericana em 2009, mas só em Novembro de 2010 solicitou parecer à Comissão Nacional de Protecção de Dados (CNPD) sobre a matéria.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Pois claro!

O Sr. António Filipe (PCP): — Estas notícias são muito preocupantes e não podem passar sem um sério juízo de censura à actuação do Governo português. Desde logo porque a matéria referente ao tratamento de dados pessoais tem em Portugal tutela constitucional expressa, que proíbe a interconexão não autorizada de ficheiros de dados pessoais e que garante a sua protecção através de autoridade administrativa independente.
Não se vê, portanto, como podem os dados em causa ser fornecidos a um Estado terceiro indiscriminadamente sem que haja uma flagrante violação de direitos fundamentais constitucionalmente garantidos.
Na verdade, a Constituição Portuguesa, no seu artigo 35.º, n.º 4, proíbe o acesso a dados pessoais de terceiros, salvo em casos excepcionais previstos na lei. Esta proibição visa proteger os cidadãos contra o uso disfuncional dos seus dados pessoais para fins que os interessados não conhecem e perante os quais não têm qualquer possibilidade de intervenção. E qualquer excepção a esta proibição tem de respeitar o regime constitucional das restrições de direitos, liberdades e garantias.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. António Filipe (PCP): — Ou seja, tem de ser previsto na lei, tem de se limitar ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos e não pode diminuir a extensão e o alcance do conteúdo essencial dos preceitos constitucionais.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. António Filipe (PCP): — Nada disto é compatível com o acesso de outros Estados a bases de dados pessoais de cidadãos nacionais.
Depois, causa enorme estranheza que, tendo sido esta matéria negociada em 2009 com as autoridades dos Estados Unidos da América, essa negociação tenha sido rodeada de secretismo e não tenha sido solicitado em tempo o parecer da CNPD.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Por boa razão não foi!

O Sr. António Filipe (PCP): — Esta atitude não é aceitável. A protecção de dados pessoais é, nos termos constitucionais, assegurada por uma entidade administrativa independente, que no caso é a CNPD. Visa esta disposição constitucional subtrair à discricionariedade do poder político a tutela de uma questão sensível do ponto de vista dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos. Não poderia, portanto, o Governo assumir compromissos no plano internacional que tenham implicações em matéria de dados pessoais sem que haja qualquer possibilidade de a CNPD se pronunciar em tempo útil sobre a matéria em causa.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Muito bem!

O Sr. António Filipe (PCP): — Finalmente, sendo esta matéria da competência reservada da Assembleia da República quer por se tratar de um acordo internacional, quer por se tratar de matéria relativa a direitos, liberdades e garantias, é de estranhar e de lamentar que não tenha sido dada a este órgão de soberania qualquer informação acerca do processo negocial em curso.

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É uma evidência que, a ser verdade que o Governo assumiu perante as autoridades dos Estados Unidos o compromisso de lhes facultar os dados constantes das bases de dados nacionais referentes à identificação civil, à identificação criminal e aos perfis de ADN sem consulta à CNPD e sem qualquer acompanhamento parlamentar desse processo (e isso não é desmentido), estamos perante uma atitude inadmissível de desrespeito do Governo para com princípios fundamentais do Estado de direito democrático.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. António Filipe (PCP): — Ao actuar desta forma, o Governo não só actuou de forma ilegítima como actuou de má consciência. Não podendo ignorar o repúdio que tais compromissos para com um Estado estrangeiro, seja ele qual for, suscitariam, e que na verdade suscitam, da parte de todos os cidadãos com um mínimo de cultura democrática e de bom senso, o Governo preferiu agir em segredo e confrontar tudo e todos com uma situação de facto consumado.
Queremos, por isso, aqui afirmar com total clareza que o PCP rejeita em absoluto qualquer possibilidade de cedência indiscriminada de dados pessoais dos cidadãos portugueses a autoridades de outro país seja a que pretexto for.
Uma coisa é a cooperação judiciária internacional feita numa base de reciprocidade, através dos órgãos próprios de cada Estado, e no respeito pelas garantias dos cidadãos e pelos princípios do Estado de direito democrático. Essa cooperação é desejável e contará sempre com a nossa concordância.
Outra coisa é, em nome do combate ao terrorismo, ou seja em nome do que for, tornar o Estado português numa filial do FBI e tratar todos os cidadãos portugueses como suspeitos de terrorismo, entregando-os à devassa discricionária das autoridades de um Estado que, nos últimos anos, tem dado ao mundo os mais tristes exemplos de desrespeito pelo direitos humanos — Abu-Graib, Guantanamo, prisões em alto-mar, voos secretos e leis de excepção, estão aí, tristemente, para o demonstrar.
Impõe-se, por isso, que o Governo preste a esta Assembleia e ao País esclarecimentos cabais e rigorosos sobre as posições que assumiu nas negociações bilaterais com os Estados Unidos quanto à cedência de dados pessoais dos cidadãos portugueses às autoridades desse país e faculte de imediato à Assembleia da República qualquer texto a que tenha dado o seu acordo.
Impõe-se também que o Governo explique por que razão não solicitou em tempo útil o parecer da CNPD sobre esta matéria e por que razão nunca informou a Assembleia da República sobre essas negociações.
Finalmente, queremos deixar muito claro que o PCP considera que o Estado português não deve ratificar nenhum acordo de cedência indiscriminada de dados pessoais dos cidadãos portugueses a outros Estados.
Afirmamos, por isso, que na Assembleia da República o Grupo Parlamentar do PCP votará contra a aprovação de qualquer acordo internacional nesse sentido e entendemos que, caso a Assembleia da República o aprove, constituirá um dever democrático indeclinável do Presidente da República recusar a sua ratificação.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Sr. Deputado António Filipe, inscreveram-se três Srs. Deputados para lhe pedirem esclarecimentos. Solicito que informe a Mesa se pretende responder em conjunto ou isoladamente.
Para o efeito, tem a palavra, em primeiro lugar, o Sr. Deputado Ricardo Rodrigues.

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, vamos aos factos.
Para já, começo por distinguir dois assuntos, porque são diferentes: um, é o acordo de transferência de dados de passageiros; o outro, é o acordo de transferência de dados relativos a crimes, ao terrorismo e a crimes graves cometidos quer em Portugal quer nos Estados Unidos da América. Estamos a falar de situações distintas, que não convém confundir.
O segundo acordo continua nas mãos da Comissão Europeia, em negociação com os Estados Unidos da América, e o primeiro acordo, esse a que se referiu, iniciou as suas negociações entre o Governo português e o Governo dos Estados Unidos da América em 2008. Em Junho de 2009, esse acordo foi assinado pelo Ministro da Administração Interna e pelo Ministro da Justiça e foi solicitado parecer à Comissão Nacional de

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Protecção de Dados, que até hoje ainda não o facultou. Mas o Sr. Deputado e todos nós — portanto, a Câmara — vamos ter oportunidade de conhecer todo o processo. Tudo o que se diz nos jornais muitas vezes é verdade, outras vezes, enfim, não é tão verdade quanto isso, porque faltam factos.
A questão que se passa é outra. Na verdade, o acordo assinado, como sabe e bem disse, não pode entrar em vigor sem ser ratificado por esta Assembleia da República, por se tratar de matéria de direitos, liberdades e garantias. Portanto, o acordo não está em vigor. Porém, ficamos a saber que o Sr. Deputado António Filipe, bem como o Partido Comunista, sem conhecerem o acordo, vão votar contra! Pelo menos, aguarde que o acordo chegue a esta Câmara, que corra os trâmites normais até chegar à Assembleia da República. Nessa altura, a Assembleia terá oportunidade de opinar sobre a matéria e, em relação às questões que colocou — de resto, pertinentes, muitas delas —, de as discutir, em primeiro lugar, na Comissão de Negócios Estrangeiros e depois, eventualmente, se se tratar de uma questão de direitos, liberdades e garantias, também na Comissão de Assuntos Constitucionais, Liberdades e Garantias, como é bom de ver.
Portanto, os factos são estes: o acordo assinado não está em vigor, aguarda parecer da Comissão Nacional de Protecção de Dados, como é de lei, e o parecer ainda não foi emitido. Depois, o acordo dará entrada na Assembleia da República, todos os grupos parlamentares terão oportunidade de se debruçar sobre o conteúdo do mesmo e o Governo — que tem toda a legitimidade para negociar os acordos, não é a Assembleia da República que negoceia com o Governo dos Estados Unidos da América —, negociou o acordo, uma vez que, repito, tem toda a legitimidade para o fazer, com a competência própria e a orgânica que os ministérios têm. O acordo foi negociado pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros, naturalmente acompanhado pelo Ministério da Administração Interna e pelo Ministério da Justiça, e chegará à Assembleia da República, onde essa discussão terá lugar em devido tempo. Nessa altura, estaremos todos aqui para darmos o contributo no sentido de saber se o acordo é legal, ilegal, se cumpre a Constituição e os direitos fundamentais.

Entretanto reassumiu a presidência o Sr. Presidente, Jaime Gama.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Ricardo Rodrigues, quero registar, desde logo, como positivo o facto de o Sr. Deputado não ter dado já o seu apoio entusiástico a este acordo que o Governo português terá assinado com as autoridades dos Estados Unidos da América.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. António Filipe (PCP): — Eu não confundo esta matéria com a da transferência de dados de passageiros, que também tem muito que se lhe diga, mas essa é outra matéria, também muito sensível, mas não estamos a confundir as coisas.
Parece-nos que esta matéria é extraordinariamente sensível. Estamos a falar de dados pessoais que são constitucionalmente protegidos, através da existência, constitucionalmente prevista, de uma entidade administrativa independente.
Portanto, entendemos que o Governo não pode, não tem legitimidade para decidir sobre essa matéria, para comprometer o Estado português perante um outro Estado, sem que haja o acompanhamento, em tempo útil, quer da Assembleia da República, que é o órgão de soberania competente em matéria de direitos, liberdades e garantias, quer pela Comissão Nacional de Protecção de Dados. E isso não foi feito. A Assembleia da República não foi, de forma nenhuma, informada da discussão desta matéria e o parecer à Comissão Nacional de Protecção de Dados, segundo foi tornado público, foi solicitado no passado mês de Novembro de 2010, quando estas negociações decorriam desde 2008»

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Afinal o Sr. Deputado sabia!

O Sr. António Filipe (PCP): — » e o Governo ter-se-á comprometido com a assinatura de um acordo em 2009.

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Portanto, não é aceitável que o Governo tenha procedido desta forma.
É evidente que, tratando-se de um acordo internacional cuja ratificação do Estado português carecerá de aprovação por parte da Assembleia da República, declaramos, desde já, que, se o que consta do acordo é aquilo que foi publicitado através da comunicação social portuguesa, não concordamos de maneira nenhuma com ele e achamos que esse acordo está, evidentemente, ferido de inconstitucionalidade. É essa a posição que queremos registar aqui. Não se trata de dizer que discordamos antes de conhecer, trata-se de dizer que, se é verdade o que está publicitado acerca dele, não podemos ter outra posição que não seja a de repudiar frontalmente e votar contra a sua ratificação.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Pinto.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, a sua intervenção trouxe-me à memória uma frase do Presidente da Comissão Nacional de Protecção de Dados que, há cerca de 1 ano, deu uma entrevista onde afirmou peremptoriamente: «Os cidadãos são cada vez mais tratados como se fossem todos suspeitos.» Era este o enquadramento que o Presidente da Comissão Nacional de Protecção de Dados fazia perante o avolumar de medidas que têm a ver com os dados pessoais e que nos últimos anos, quer a nível nacional, quer a nível internacional, todos nós vemos florescer.
A protecção dos dados pessoais é uma garantia dos direitos dos cidadãos e das cidadãs. Mas é mais do que isso: é também a garantia da própria liberdade colectiva e dos princípios do Estado de direito.

O Sr. Francisco Louçã (BE): — Exactamente!

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Não é um capricho proteccionista. Isto tem que ficar muito claro.

O Sr. Heitor Sousa (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr. Deputado, nós também não confundimos os processos e muito menos não pomos de lado a legitimidade absoluta da Assembleia da República em decidir sobre esta matéria, mas enquanto Assembleia da República temos o direito de questionar as atitudes do Governo ao negociar com países acordos bilaterais. Mas disso o Sr. Deputado Ricardo Rodrigues parece que se esqueceu quando falou sobre esta matéria.
É totalmente legítimo que esta Assembleia questione, desde já, o que o Governo anda a fazer, pelos vistos há quase três anos e em segredo.

Vozes do BE: — Muito bem!

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — É preciso perguntar a razão da necessidade de fornecer aos Estados Unidos da América informação sobre pessoas que não foram condenadas.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Isso é verdade!

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Porquê fornecer dados pessoais a um país que não garante a protecção dos dados dos estrangeiros? Não deixa de ser caricato, Sr. Deputado — também gostaria de colocar esta questão — que, nestes tempos que correm, quando o assunto é wikileaks, que grande afronta se faz à privacidade dos Estados; quando o assunto é a vida privada de milhões de cidadãos e de cidadãs, está tudo bem!!

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Exactamente!

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A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Aguardaremos, com certeza, pelo acordo que esperemos que o Governo faça chegar rapidamente à Assembleia da República, mas só vejo uma explicação para esta postura do Governo, sendo esse o comentário que gostaria de ter do Sr. Deputado António Filipe. A única explicação é a submissão completa do Governo português aos Estados Unidos da América em relação a uma questão tão importante para os cidadãos e para as cidadãs como é a protecção dos seus dados pessoais.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Helena Pinto, agradeço as questões muito pertinentes que colocou.
O que está em causa é, desde logo, o facto de todos os cidadãos serem tratados como suspeitos.
Trata-se também de uma questão até de cultura democrática. Como se sabe, nos Estados Unidos da América o direito à privacidade não tem a mesma tutela constitucional legal que tem na maioria dos países europeus»

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Exactamente!

O Sr. António Filipe (PCP): — »em que esta questão é, efectivamente, tratada e é um motivo de preocupação. Aliás, tem-se traduzido na existência de entidades administrativas independentes, como é o caso, em Portugal, da CNPD. Isto para dizer que a protecção dos cidadãos contra a utilização abusiva dos seus dados pessoais é mais forte na Europa do que nos Estados Unidos da América, com a agravante de que nos Estados Unidos da América, apesar de a tutela ser menor, apenas os cidadãos norte-americanos têm direito a essa protecção. Ou seja, nenhum cidadão que não seja norte-americano tem o direito de, perante as autoridades desse Estado, fazer valer o seu direito à protecção dos dados pessoais. Isto é muito relevante quando o Estado com quem se está a denunciar um acordo bilateral é precisamente um Estado como os Estados Unidos da América.
Mas a questão que também se coloca é esta: se estamos a falar de cooperação judiciária, o que falta? Ou seja, se as autoridades norte-americanas solicitarem a colaboração das autoridades judiciárias portuguesas para a perseguição de alguém que seja suspeito de qualquer acto terrorista, será que as autoridades portuguesas recusam essa colaboração?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Claro que não!

O Sr. António Filipe (PCP): — Será que não temos mecanismos de cooperação judiciária que garantam que se o FBI fizer uma solicitação, a Polícia Judiciária não responde e diga que não tem nada a responder, que não tem nada a ver com isso? A realidade não é essa.
Portanto, a questão que se coloca é esta: o que pretendem mais? O que falta na cooperação judiciária? Isso não é explicado.
O que é solicitado é que os dados existentes nas bases de dados portuguesas possam ser postos à disposição das autoridades norte-americanas.
Ora, isso nós não aceitamos, nem em relação aos Estados Unidos da América, nem em relação a qualquer outro país do mundo, porque esta é uma questão de princípio, que não está associada a ser este país mas a um qualquer que seja. O que registamos é a total subserviência do Governo português em tudo o que se relaciona com os Estados Unidos da América. Isso também é um facto objectivo.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Magalhães.

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O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, traz um tema que é relevante, ainda que com uma posição um pouco estranha mas já de alguma forma corrigida, porque já meteu um «se». Eu diria que anunciou um voto sobre um tratado que desconhece. Não sobre uma ciência que desconhece, como dizia o outro, mas um voto sobre um tratado que desconhece.
Gostaria que nos entendêssemos num ponto que creio não ter sido suficientemente sublinhado na intervenção que fez, embora espere que acompanhe as minhas palavras.
O combate ao terrorismo ç um desígnio estratçgico mundial para o qual todos devem contribuir;»

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — » o combate á criminalidade transnacional organizada, idem; e o tráfico de seres humanos, também. São flagelos que carecem de uma resposta global, porquanto ganharam uma realidade global.
Assim, é preciso — não sei se o Sr. Deputado me acompanha, mas creio que sim — cooperação na troca de dados, partilha de informações e, até, coordenação ao nível da investigação criminal, porquanto os crimes cada vez mais são cometidos de forma transnacional.
Nesse aspecto, a utilização e a troca de perfis de ADN, desde que respeitem os princípios da proporcionalidade e adequação, podem revelar-se (e revelam-se muitas vezes) muito importantes para a investigação criminal e a descoberta de crimes.
Portanto, Sr. Deputado, não vamos criar fantasmas onde não existem.
O que o Sr. Deputado nos veio dizer é que falta um parecer da Comissão Nacional de Protecção de Dados, que só muito recentemente foi consultada.
Bom, mas também o histórico da Comissão Nacional de Protecção de Dados, permita-me dizer-lhe, não tem sido brilhante. Veja o caso da videovigilância na ribeira do Porto, em que num ano fez a criminalidade reduziu 50% e que agora não funciona, porque a Comissão Nacional de Protecção de Dados, com base numa avaliação completamente, diria, excessiva desses princípios, não quer que assim aconteça.
Também não diabolizo o FBI, que, por acaso, é um serviço de segurança, por acaso, de um país democrático que é, por acaso, amigo de Portugal, nem, de alguma forma, faço a apologia da Comissão Nacional de Protecção de Dados que, em muitas matérias, tem tomado posições que vão contra um direito fundamental, que é o da segurança dos portugueses.
Da parte do CDS, desde que tenham sido respeitados princípios de adequação e proporcionalidade, estamos disponíveis para, com base nestes princípios, a saber, cooperação entre os Estados, uniformização de posições, reciprocidade entre os Estados e transparência no processo, avaliar este tipo de tratado, quando cá chegar.
Pergunto, e com isto termino: o Sr. Deputado acha ou não (nós achamos) que o facto de Portugal ter feito esta negociação unilateralmente, fora do quadro da União Europeia, ou, pelo menos, paralelamente àquilo que a Comissão, mandatada pelo Conselho, tem feito, enfraquece a nossa posição? É porque, em caso afirmativo, podemos estar perante uma situação em que, do ponto de vista da União Europeia, não estamos a cumprir o chamado «princípio da cooperação leal».
Portanto, o que gostaria de saber da parte de V. Ex.ª e do Partido Comunista Português é se consideram ou não que aqui a Comissão Europeia, as instâncias europeias têm um papel fundamental na negociação, de acordo com estes princípios de proporcionalidade e adequação, deste tratado com os Estados Unidos da América.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Magalhães, as questões que coloca são pertinentes.
Vou começar por responder à sua última questão, que é a de, havendo uma negociação europeia e órgãos da União Europeia mandatados para negociar essa questão com os Estados Unidos da América, haver

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Estados-membros da União Europeia que, fazendo de conta que esse mandato existe, negoceiam bilateralmente.
A este respeito, quero dizer duas coisas. Em primeiro lugar, quanto à questão de fundo, o facto de a negociação com os Estados Unidos da América ser feita no quadro das instituições da União Europeia não nos tranquiliza, porque isso é o que está a acontecer quanto à transmissão de dados de passageiros e não estamos nada tranquilos relativamente àquilo que venha a ser o conteúdo desse acordo.
Portanto, quanto à questão de fundo, quanto ao conteúdo, é precisamente tendo em conta o que lá está escrito e o que é acordado que nos pronunciaremos.
Mas também não consideramos que os Estados não tenham a legitimidade para negociar bilateralmente questões que sejam de relevância nacional. Não é aí que está o problema.
O problema está na matéria sensível que está em causa e no facto de o Governo português, preterindo competências próprias de uma autoridade independente e preterindo a Assembleia da República nesta matéria, ao não dar conhecimento daquilo que estava a ser negociado com as autoridades norte-americanas, ter assumido compromissos que geram junto do Estado — neste caso, os Estados Unidos da América — a expectativa de que aquilo que negociaram com o Governo venha a ser efectivamente aprovado, criando, desta forma, uma situação de quase facto consumado que não aceitamos.
Relativamente à primeira questão que colocou, o desígnio do combate ao terrorismo, achamos que Portugal deve colaborar, na medida das suas possibilidades, no combate ao terrorismo e cooperar com quaisquer Estados ou quaisquer entidades que estejam seriamente empenhadas nesse combate.
Questão muito diferente é reconhecer aos Estados Unidos da América um papel de polícia global, de polícia do mundo, naquilo que eles consideram ser o combate ao terrorismo.
Sabemos que o critério seguido pelos Estados Unidos da América, quanto à definição de terrorismo é, no mínimo, muito discutível (e digo «no mínimo», para não abrir aqui outra discussão), mas há outros países com os quais é absolutamente necessário haver uma acção concertada no combate ao terrorismo — basta falarmos na nossa vizinha Espanha. Portanto, os Estados Unidos da América não têm aqui qualquer papel que deva reconhecer-se acima de quaisquer outros Estados, acima da cooperação bilateral e acima da cooperação com respeito pelas competências próprias das autoridades judiciárias. É que, quando se trata de direitos, liberdades e garantias, como é o caso, não pode negociar-se por critérios de política externa, tem de negociar-se por critérios de respeito pelos direitos fundamentais dos cidadãos e de respeito pela esfera de actuação própria das autoridades judiciárias de cada Estado. Não é apenas uma questão de política externa; é também uma questão de respeito pelos direitos e pela forma como, designadamente, a investigação criminal e o tratamento de dados estão, constitucional e legalmente, organizados, em Portugal.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Negrão.

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, em primeiro lugar, quero felicitá-lo por trazer este tema à discussão, porque, sempre que os temas tenham a ver com os direitos individuais, é importante que sejam discutidos na Assembleia.
Cremos, porém, que o Sr. Deputado não o tenha feito por preconceito ideológico mas, sim, porque está efectivamente preocupado com esta matéria dos direitos individuais/combate ao terrorismo.
O Sr. Deputado António Filipe teve o cuidado de, na sua intervenção, referir que as notícias de que dispõe têm origem na comunicação social. Isto porque será da maior gravidade que venhamos a confirmar que o Governo celebrou acordos bilaterais com países terceiros sem dar qualquer informação à Assembleia da República, sendo esta matéria da competência da Assembleia da República.
Será igualmente grave se se vier a confirmar que o Governo, com um enorme atraso, pede o parecer à Comissão Nacional de Protecção de Dados.
Por isso, é nosso dever, na Assembleia da República, enquanto Deputados, estar atentos a estas notícias e à sua confirmação para censurar o Governo, se efectivamente for essa a realidade.
Contudo, Sr. Deputado António Filipe, para além desta realidade, existe a realidade do terrorismo internacional. E uma vez que a realidade do terrorismo internacional é uma realidade cada vez mais

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disseminada pelo mundo, ela necessita, «como de pão para a boca», de informação e de troca de informação, para ser combatida. E a informação que podemos dar neste combate, que é hoje um combate de todos os países, é uma informação fundamental para não claudicarmos perante a realidade do terrorismo.
A actualidade é a de que a própria Comissão Europeia está a negociar com os Estados Unidos da América a troca desta informação. A Comissão Europeia exige aos Estados Unidos da América, conforme informação que vamos tendo na comunicação social, determinadas condições para que sejam dadas essas informações pedidas pelas autoridades americanas.
Por isso, Sr. Deputado António Filipe, pergunto-lhe se, havendo um parecer favorável da Comissão Nacional de Protecção de Dados e uma decisão favorável por parte da Comissão Europeia, o Partido Comunista Português admite, ou não, votar favoravelmente esta troca de dados entre Portugal e os Estados Unidos da América.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Fernando Negrão, agradeço igualmente as questões que colocou.
Começo por registar que o Sr. Deputado fez a justiça de considerar que não colocámos esta questão aqui por qualquer preconceito ideológico — nós temos ideologia, mas não temos preconceitos.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. António Filipe (PCP): — Aliás, há pouco, tive oportunidade de dizer que teríamos as mesmas preocupações, fosse qual fosse o Estado que fizesse esta solicitação às autoridades portuguesas. Não sei é se todos os partidos poderão dizer o mesmo,»

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

O Sr. António Filipe (PCP): — » não sei se todos teriam a mesma benevolência caso esta solicitação viesse de qualquer outro Estado que não os Estados Unidos da Amçrica»!? Mas essa ç outra questão.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Olhe que não!»

O Sr. António Filipe (PCP): — Agora, Sr. Deputado, achamos que a Assembleia da República deveria ter sido envolvida neste processo e que a CNPD deveria ter sido chamada a dar parecer em tempo útil e não agora, depois de o Governo se ter comprometido no plano bilateral.
No entanto, isso não nos condiciona. E nunca deixaríamos, nem deixaremos, de ter a nossa posição própria relativamente ao acordo, tendo em conta estritamente o seu conteúdo e não o facto de a União Europeia concordar com ele ou de a CNPD concordar ou deixar de concordar com ele. Teríamos evidentemente em consideração todas essas opiniões, mas não abdicaríamos da nossa opinião e da nossa posição, tendo em conta o conteúdo concreto do acordo em causa — e é essa a posição que iremos ter quando esse acordo aqui vier, se vier.
Quanto à outra questão que referiu, diria que o problema não se coloca só relativamente ao terrorismo mas também em relação a toda a criminalidade organizada e transnacional. Pensamos que deve haver, evidentemente, uma colaboração por parte do Estado português, das autoridades judiciárias portuguesas na cooperação internacional contra a criminalidade organizada e transnacional, seja ela qual for — e para isso é que existe a Interpol, para isso é que existe a cooperação policial. Ora, pensamos que é nesse quadro que este relacionamento deve ser travado, com respeito pela soberania própria de cada um, pela legislação própria de cada Estado. Nesse quadro, deve haver evidentemente uma cooperação. Ou seja, não deve haver aqui uma espécie de diktat imposto pelo Estado mais forte contra os outros, para que possa usufruir de todos os

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mecanismos de informações que eles tenham. Não. Isso deve ser feito no respeito pela soberania, pelas competências próprias de cada Estado.
Termino, Sr. Presidente e Srs. Deputados, reiterando — e agora que até temos a presença do Governo nesta Sala — aquilo que referimos há pouco, ou seja, que o Governo deveria enviar, quanto antes, a esta Assembleia o texto que acordou com os Estados Unidos da América, como forma de podermos, embora tardiamente, recuperar uma informação a que a Assembleia já deveria ter tido acesso, e não teve.
Não sei se os Srs. Ministros aqui presentes me ouviram — de qualquer maneira, poderão consultar a Acta —, mas faço apelo a que, urgentemente, enviem a esta Assembleia, para conhecimento, o texto que foi acordado com as autoridades norte-americanas acerca do acesso a dados pessoais constantes da identificação civil e criminal e das bases de dados de ADN.
Fica aqui o pedido de viva voz.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, passamos ao segundo ponto da nossa ordem do dia, que consta de um debate sobre assuntos europeus: apreciação do Conselho Europeu de 16 e 17 de Dezembro, o balanço da Presidência belga da União Europeia e análise do Programa de Trabalho da Comissão Europeia para 2011, o que, aliás, esteve hoje em apreciação numa reunião conduzida pela nossa Comissão de Assuntos Europeus, em que participaram representantes das Assembleias Regionais dos Açores e da Madeira e Deputados portugueses do Parlamento Europeu.
Para introduzir o debate, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, Luís Amado.

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros (Luís Amado): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Dado o constrangimento do tempo regimental que me é atribuído, 6 minutos, para falar do balanço do Conselho Europeu de Dezembro e da Presidência belga da União Europeia e também das perspectivas do programa legislativo da Comissão Europeia para 2011, dada a escassez do tempo de que disponho, repito, sobretudo tendo em consideração a gravidade da situação europeia, vou ser muito directo em relação à agenda que me é proposta.
Começo por avaliar o que foi o Conselho Europeu, de Dezembro, fixando-me na sua conclusão essencial e importantíssima, a do acordo para a criação de um mecanismo europeu de estabilidade e a adaptação ao Tratado do funcionamento da União Europeia, que se impõe. Essa adaptação deve ser feita, como sabem, até ao Conselho Europeu, de Março, para que os processos de ratificação possam ocorrer durante o ano de 2012 e para que o acordo de estabilidade europeu possa entrar em vigor em 1 de Janeiro de 2013.
Trata-se, por isso, de um acordo da maior importância para o futuro e para a estabilidade do euro, em particular num momento de crise profunda que se instalou na zona euro depois da crise sobre a dívida soberana grega.
Todos sabemos que a crise do euro suscitou, pelo seu impacto, perspectivas diferentes em relação ao desenvolvimento do projecto europeu. Sabemos que gerou tensões internas em todos os Estados, nos mais e nos menos desenvolvidos, com mais e com menos equilíbrio das suas contas públicas; e gerou tensões intergovernamentais, que importa acompanhar com particular atenção, do ponto de vista político, ao longo dos próximos meses, não apenas entre os países do euro e os países exteriores à zona euro, não apenas entre os países do centro e da periferia da zona euro, mas também, e mais preocupantemente, entre países do centro da zona euro com diferentes perspectivas sobre o rumo a tomar para estabilizar a zona euro.
Mas independentemente disso, há que reconhecer que todos estes desenvolvimentos ocorreram sob pressão e sob escrutínio permanente dos mercados financeiros — e nós sabemos como a racionalidade dos mercados financeiros é perturbada, sempre que estão em causa factores de incerteza, de instabilidade e de insegurança como aqueles que dominam a vida política europeia presentemente.
Por isso, gostaria de realçar o facto de o Conselho ter aprovado, de forma expedita e sem grande controvérsia — independentemente da controvérsia que o antecedeu sobre outras opções que poderiam ser adoptadas para estabilizar a zona euro —, esse mecanismo, bem como o processo de adaptação ao Tratado que ele exige. É muito importante que o tenha feito para garantir justamente a estabilidade e a confiança nos

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mercados que, neste momento, se impõem, se quisermos continuar a gerir todo o processo de reabilitação da zona euro, depois da crise financeira, com sucesso e eficácia.
Gostaria também de registar que o impacto que todo este processo tem tido nas relações dentro da União Europeia nos confronta com uma exigência absolutamente incontornável, a de que as questões europeias estarão, seguramente, no centro da agenda política interna dos Estados-membros ao longo dos próximos meses e, certamente, ao longo do próximo ano e, também, no centro da actividade dos parlamentos nacionais, atendendo, sobretudo, a que a governação económica, que resulta dos trabalhos desenvolvidos durante a Presidência belga, não deixará de ter um impacto muito grande na actividade das assembleias nacionais, tendo em consideração muitas das competências sobre muitas das matérias económica, fiscal, orçamental que estão em causa quando discutimos o modelo de governação económica que está em estruturação, neste momento.
Gostaria de registar, no âmbito da avaliação que fazemos da Presidência belga, que, apesar da instabilidade política interna, alguns importantes objectivos foram conseguidos, designadamente o que respeita à aprovação do «semestre europeu», absolutamente indispensável para garantir as decisões necessárias para a estabilidade do euro em 2011, e também o sucesso em relação ao pacote de supervisão financeira, que, como sabemos, é uma exigência para a estabilização financeira de todos os sectores financeiros que estão mais afectados pela crise internacional.
Sobre o programa legislativo da Comissão, daria apenas uma nota final muito breve para referir, primeiro, que, pela primeira vez, a aprovação deste programa legislativo decorre de um compromisso com o Parlamento Europeu, o que, pela primeira vez, se verifica à luz do Tratado de Lisboa, criando uma dinâmica nova de responsabilização política da Comissão e do Parlamento.
Sublinharia o facto de as prioridades se orientarem para o que entendemos ser absolutamente indispensável para garantir a estabilidade da zona euro e do projecto europeu, em 2011: o facto de dar prioridade à reabilitação económica e financeira da União Europeia e, ao mesmo tempo, garantir um programa de crescimento económico e de emprego, também absolutamente indispensável para a estabilidade da zona euro.
São, no essencial, estas prioridades que o Governo faz suas, até porque a coordenação das suas opções de política interna, com as opções de política da União Europeia e das suas instituições, é absolutamente instrumental para podermos responder aos desafios com que estamos confrontado no processo de integração europeia.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Inscreveram-se três Srs. Deputados para pedir esclarecimentos.
Tem a palavra, em primeiro lugar, o Sr. Deputado Filipe Lobo d’Ávila.

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Ministro, não obstante a intervenção que o Sr. Deputado Serpa Oliva fará sobre o tema, como entendemos que também há vida para além do euro, não quero deixar de aproveitar a oportunidade de o termos cá para lhe colocar uma pergunta relativamente a um tema da actualidade e que entendemos ser extremamente importante para todos os países civilizados, para todos os países europeus. Refiro-me ao ataque criminoso à minoria cristã no Egipto, que, aliás, vem na sequência de outros relatos de perseguições religiosas verificadas em diferentes países, como o Líbano, o Paquistão, a Indonésia ou a Nigéria.
Sr. Ministro, este ataque já foi peremptoriamente condenado pelo Presidente do Parlamento Europeu, pela Alta Representante da União Europeia para os Negócios Estrangeiros e por diferentes governos, como o americano, o francês, o italiano, o espanhol, o britânico ou, mesmo, o alemão.
Não tenho conhecimento de qualquer posição que tenha sido assumida pelo Governo português e, na breve pesquisa que tive oportunidade de fazer no site do Ministério dos Negócios Estrangeiros, confesso que nada consegui ver.
Sr. Ministro, aproveitando a oportunidade de o ter cá e atendendo, sobretudo, aos valores que estão em causa, desde logo, o princípio da liberdade religiosa e também o da dignidade humana, entre muitos outros,

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não posso deixar passar a ocasião para lhe pedir que o Governo português tome uma posição clara de condenação por actos que são praticados contra pessoas, única e exclusivamente pela sua fé.

Aplausos do CDS-PP.

Por isso mesmo, partindo do princípio de que esta será uma matéria consensual que não dividirá, certamente, humanistas-cristãos e humanistas-laicos e de que, obviamente, em pleno século XXI, não é admissível que estes actos e estas perseguições ocorram, é também evidente que é uma matéria onde não pode haver silêncios.
O apelo que lhe faço é o de que o Governo português possa condenar, rapidamente e de forma clara, estes actos.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, o Conselho Europeu de Dezembro passado mostra, cada vez mais, que a União Europeia anda à imagem e semelhança dos países mais fortes, em particular da Alemanha.
Cada vez mais podemos dizer que a União Europeia é o que interessa à Alemanha, traduz o interesse nacional alemão e dos grupos económicos e financeiros. É a isto que estamos a assistir, desde a introdução da moeda única, pode dizer-se — lamento ter de o dizer — perante a complacência e a passividades dos sucessivos governos portugueses.
Repare que a moeda única foi concebida segundo as imposições alemãs: ou era aquilo ou não era nada; a morda única era forte para servir a economia alemão; a moeda única tinha de ter associado o pacto para servir a competitividade alemã.
Repare também que o alargamento aos países de Leste foi feito daquela forma rápida, sem colher os impactos, necessariamente para responder aos interesses da economia alemã e dos grupos económicos e financeiros alemães; a alteração do Tratado de Lisboa foi concebida para dar voz e peso determinante aos países mais fortes, com a Alemanha à cabeça; o modelo de governação económica, Srs. Deputados, impondo austeridades, violando, eventualmente, normas constitucionais, substituindo-se às competências nacionais, é concebido para responder às imposições e aos interesses alemães; e, finalmente, é também imposta pela Alemanha, e só depois pela França, é verdade, uma nova alteração do Tratado de Lisboa — o tal que era para 50 anos» — e que agora está, ou, pelo menos, julga-se estar, em debate. Naturalmente, traz atrelada a esta alteração a ideia de transformar uma espécie de protectorado os países que venham a necessitar do chamado «mecanismo de apoio permanente».
Gostaria de perceber o que o Governo quer fazer, designadamente, sobre esta última matéria. Como pensa o Governo lançar o debate sobre esta alteração ao Tratado? Como pensa o Governo dar conta ao País e a esta Assembleia do debate sobre as disposições que estão a ser feitas e que condicionarão a utilização do mecanismo financeiro permanente? Vai o Governo colocar o País perante factos consumados, como fez relativamente à governação económica? Finalmente, Sr. Ministro, faço uma pergunta que cada vez mais entra na ordem do dia. Tem o Governo pensada alguma estratégia de resposta nacional e comunitária, nacional ou comunitária, perante um eventual cenário de saída controlada e/ou negociada do nosso País da zona euro?

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Honório.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiro, há um ano, o Sr. Ministro dizia ao País que a saída da crise ia ser «complexa e difícil».

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Nessa mesma altura, o Conselho Europeu já tinha dito que era para sair das políticas alargadas de apoio à crise nos diferentes países.
Nessa mesma altura, o Sr. Ministro estava muito satisfeito com a tranquilidade do processo do Tratado de Lisboa e tinha expectativas muito optimistas sobre o modelo de supervisão financeira então em debate.
No final do ano, o Sr. Primeiro-Ministro foi, a correr, entregar 50 medidas, entre as quais um fundo em que os desempregados vão afinal apoiar o potencial desemprego que sofrerão no futuro.
Um ano depois, Sr. Ministro, o Tratado de Lisboa foi revisto, a jeito da Alemanha.
Um ano depois, Sr. Ministro, a dívida vai ao mercado com juros record e, ao mesmo tempo, como bem sabe, os mordomos do FMI estão aí e todos os dias falam alto.
Um ano depois, Sr. Ministro, os trabalhadores, os desempregados, os pensionistas dirão, certamente, que a saída da crise não é «complexa e difícil» para todos, garantidamente, e que, da parte deles, ela é absolutamente insustentável.
Esta é, por isso, a hora de o seu Governo explicar claramente ao País por que é que hipotecou as opções políticas que deveriam ser feitas no âmbito da discussão orçamental, no âmbito do «semestre europeu». É altura de assumir responsabilidade desta hipoteca da democracia e da responsabilidade que deve ser pedida ao seu Governo e não, certamente, aos poderes que estão lá fora.
Um ano depois, é necessário explicar aos portugueses, aos trabalhadores, aos desempregados, àqueles que estão a sofrer na pele as políticas cegas de austeridade como é que este Governo se comprometeu com um modelo de governação económica duríssimo, com uma política de sanções pesadíssima para o País e como é que vai chegar, daqui a muito pouco tempo, a um défice de 2,8%, a uma dívida de 60%, com o patamar da despesa pública que é definido por Bruxelas e não pelo seu próprio Governo.
Esta é a oportunidade de explicar como é que este Governo se mantém tão silencioso perante estas opções de fundo que põem em causa o futuro do nosso País.
Sr. Ministro, muito obrigada pela sua atenção.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros.

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Presidente, tenho muito pouco tempo para responder a questões tão pertinentes e tão exigentes do ponto de vista da resposta política, nesta Câmara.
Muito sinteticamente, em relação à questão concreta posta pelo Deputado Filipe Lobo d´Ávila, direi que, na segunda-feira, assinei uma carta para o meu colega egípcio chamando a atenção para a gravidade da situação e para a necessidade de, em conjunto com todos os aliados da região, designadamente, controlar uma situação que se torna absolutamente insustentável. Lamento se ela não está no site do Ministério, mas dar-lhe-ei conta da carta que, em tempo oportuno, de imediato, enviei ao meu colega egípcio.
Quanto às questões colocadas pelo Deputado Honório Novo, já tive oportunidade de debater pessoalmente com o Sr. Deputado. Dir-lhe-ei apenas, quanto à questão relativa à condicionante da Alemanha e que decorre da interpretação feita sobre os limites constitucionais alemães, que encontramos a resposta na sua própria questão, É porque, como sublinhou, a moeda única foi criada e aceite por nós — e temos de honrar os compromissos por nós assumidos — em condições que, de alguma forma, são condicionadas pelas posições políticas da Alemanha. Mas foi um compromisso que assumimos relativamente à União Monetária e que todos os Estados-membros da zona euro assumiram.
O que está em causa, neste momento, não é quem dita as regras da União Económica e Monetária, são os tratados e os compromissos que assumidos. É, pura e simplesmente, aí que nos devemos concentrar, independentemente da relação de forças que se estabelece numa comunidade que tem uma dinâmica multilateral própria e que sempre conhecemos.
Por isso, temos de ter sempre em consideração que o que nos vincula em termos de responsabilidade política são os tratados e os compromissos que firmámos, independentemente das interpretações políticas mais ou menos pertinentes que, em cada circunstância e em que cada conjuntura, justificam a maior ou menor

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capacidade deste ou daquele Estado para gerir a sua relação de forças no contexto multilateral europeu. É sempre assim em toda a dinâmica multilateral.
Por isso, dir-lhe-ei apenas que o que está em causa, neste momento, é saber se somos ou não capazes de honrar os compromissos que assumimos ao aceitar partilhar a soberania na gestão da nossa integração na União Económica e Monetária.
Sr.ª Deputada Cecília Honório, é verdade. Eu disse aqui, no início do ano, que a saída da crise, depois de uma acção coordenada e massiva ao nível da economia mundial e de intervenções públicas dos Estados, para que pudéssemos impedir que uma grande recessão como a que se viveu em 2009 se transformasse numa prolongada depressão mundial, que, essa sim, lançaria na tragédia sociedades inteiras, a saída dessa situação ia ser difícil, longa e complexa. Eu disse isso! É verdade! E até disse que seria perigosa.
Portanto, não sou, de forma alguma, surpreendido pela situação em que nos encontramos. Mas temos de ter a noção de que o problema com que a União Europeia foi confrontada foi o de ter uma união monetária imperfeita, precisamente porque não tem o pilar de sustentação da união económica e da união política, absolutamente indispensáveis para sustentar a estabilidade da zona euro.
Por isso, sem um modelo de governação económica, não teremos condições para garantir a estabilidade do euro e para superar a crise do euro. Por isso, o «semestre europeu» é um instrumento fundamental, a par de outros instrumentos, que se insere, justamente, na dinâmica de resposta à crise e de sustentabilidade do euro, desde já, ao longo do próximo ano.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Honório.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Percebi que evitou esta parte da corrida do Governo português e do Sr. Primeiro-Ministro e a entrega das ditas 50 medidas, a pedido, nomeadamente com o dito fundo de despedimentos. Mas quero falar-lhe sobre as políticas do silêncio e sobre o poder da palavra.
Recentemente, Durão Barroso dirigiu-se aos políticos europeus pedindo-lhes que estivessem calados. É certo que o Sr. Ministro sabe bem que as suas tentações coligacionistas provocaram, no passado recente, algum ruído político. Mas aquilo que Durão Barroso disse foi: «Não falem. Há demasiada opinião sobre a crise e a verdade é que os mercados financeiros estão a ouvir.» E o que eu e qualquer português perguntamos é o que é que os mercados financeiros estão a ouvir. Estão a ouvir o estrondo sobre a continuidade do ataque às dívidas soberanas dos países? Estão a ouvir o sussurro de Pitonisa da Sr.ª Merkel, que, na sua mensagem de final de ano, vem dizer que, afinal, o euro é importante e deve ser fortalecido? E isto, quando, assumidamente, quer a França quer a Alemanha não reconhecem que uma das respostas e das estratégias fundamentais e inevitáveis para se sair deste quadro é a emissão de títulos de dívida soberana europeia.
Este pedido de silêncio continua a convidar à pergunta, Sr. Ministro, porque não respondeu, efectivamente.
Diz-nos que não há estabilidade do euro sem modelo de governação económica. Ora, a governação económica que está no pacote extenso que estamos a analisar não é uma governação económica tendente ao crescimento e à criação de emprego. Esta é a hipocrisia política que está consagrada no próprio programa da Comissão Europeia e que é, verdadeiramente, inaceitável.
O modelo de governação económica consagrado, quer através do «semestre europeu», quer na forma do Pacto de Estabilidade e Crescimento, é um modelo da guilhotina da austeridade, da contracção dos direitos fundamentais e das conquistas dos povos nos últimos tempos.
A verdade é esta, Sr. Ministro! A verdade é que o preço está a ser pago pelos mais fracos, pelos trabalhadores, pelos desempregados, pelos pensionistas. Este é o preço que se está a pagar hoje e é o preço que se irá pagar nos próximos tempos, se este modelo de governação económica, em relação ao qual o seu Governo permanece caladinho, for, efectivamente, implementado. Isto exigiria uma postura de coragem diferente na defesa da qualificação da democracia.
Penso que desta vez, Sr. Ministro, pelo menos desta vez, não nos vem dizer que o desejo de uma Europa de cidadania e de aprofundamento democrático é pelouro do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros ou do

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Partido Socialista. Penso que o que, desta vez, o Sr. Ministro deve assumir perante o País é a explicação das implicações deste modelo, das sanções, das exigências, da guilhotina da despesa pública que é imposta por Bruxelas, do IVA sobre o leite com chocolate, que não se poderá negociar doravante. O Sr. Ministro sabe muito bem que isso vem ditado de Bruxelas e que não é decidido aqui e nem é uma responsabilidade que devia ser exigida aos responsáveis políticos, aos governos, que tomam as decisões com os acordos que fazem, quando os fazem.
Este é o debate que se impõe no dia em que o temos aqui para discutir, ao fim de um ano que começou com promessas e acabou, evidentemente, com mais austeridade, mais desemprego e uma falta de perspectiva total para este projecto europeu, aliás, presidido daqui a muito pouco tempo por um país no qual a própria liberdade de expressão, como bem sabe, está seriamente comprometida.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Costa Neves.

O Sr. Carlos Costa Neves (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Ministros, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Este debate ocorre num momento por todos considerado crucial. O tempo é de crise, crise que apanhou a União Europeia, nomeadamente a união económica e monetária, com uma estrutura bastante frágil, quer sob o ponto de vista institucional, quer sob ponto de vista estrutural, e que encontrou Portugal numa situação de especial vulnerabilidade, que decorre, nomeadamente, do facto de termos as nossas finanças públicas desequilibradas — e não falo só do défice, falo do défice e da dívida pública —, isto é, que apanhou Portugal numa situação que resulta do facto de termos gasto mais do que tínhamos, de termos gasto o que tínhamos e o que não tínhamos.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Carlos Costa Neves (PSD): — No interesse comum, que é evidente, a União Europeia está a fazer o seu caminho. Com hesitações, é verdade, e nem sempre ao ritmo que todos gostaríamos, também é verdade, mas a fazer o seu caminho.
É neste contexto que a União Europeia está a preparar e tem tomado medidas de defesa e de protecção do euro; é neste contexto que aparecem as propostas relativas à governação económica, que entendo como um reforço necessário da união política; e é neste contexto que prepara a Agenda Europa 2020, que distingo aqui por aquilo que ela pode representar de reforço da competitividade, do crescimento e do emprego, desde que tenha os meios financeiros necessários.
Passo, assim, para o ponto seguinte desta Agenda, que é, exactamente, o ponto das perspectivas financeiras, em relação ao qual a Comissão apresentará um primeiro relatório até ao fim do 1.º semestre deste ano e em relação ao qual temos de ter especial atenção, porque não se podem manter as prioridades tradicionais, as novas ambições e as ambições da abordagem da Agenda 2020 com os actuais meios orçamentais.
Também é preciso continuar a seguir com atenção a questão do alargamento, porque não está fora de causa ainda a discussão entre diluição e necessidade de aprofundamento.
Portanto, esta exigente Agenda europeia tem de ser olhada como parte essencial das agendas nacionais, logo, das agendas dos parlamentos nacionais, logo, da Assembleia da República.
E convenhamos que para abordar todas estas questões, como, há pouco, o Sr. Ministro referia, 5 minutos ou 4 minutos, como acontece no meu caso, são manifestamente insuficientes.
Neste contexto do desafio à Assembleia da República incluo o escrutínio de todas as posições das instituições europeias e de todas as posições do Governo português em matéria de União Europeia.
Quanto ao Governo, temos de saber, cada vez com mais pormenor, o que pensa, o que quer, o que vai propor e que resultados tem obtido no contexto europeu. Hoje, a sensação que temos é que estamos cada vez mais reactivos, cada vez mais concentrados na resposta às questões que têm a ver com as medidas de contenção de despesa junto da União Europeia, que nos chegam, aliás, de forma vaga e não calendarizada,

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do que propriamente no grande debate das questões europeias, dos caminhos da União Europeia e para onde vai esta União Europeia.
Para concluir, a Assembleia da República, até pelo seu próprio empenho, tem de passar a saber mais, com mais detalhe e a tempo e horas tudo o que se relaciona com o processo de construção europeia.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Registei que o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros não quis responder a duas questões que lhe coloquei, mas vou repeti-las.
Como pensa o Governo lançar o debate sobre a alteração do Tratado que está em discussão e, sobretudo, sobre as disposições que vão condicionar a aplicação do mecanismo europeu? E lancei-lhe um repto, que não vou deixar de repetir: o Governo tem pensada alguma estratégia, nacional ou comunitária, perante um cenário eventual de saída negociada da zona euro? Sr. Ministro, nesta minha intervenção, quero também abordar o Programa da Comissão. Quem lê o Programa da Comissão parece estar perante um conto de fadas. Lendo e relendo o documento, parece nada se passar à volta dos corredores em que se continua a congeminar o pensamento único sobre o futuro da União Europeia. Ali está toda a retórica que nos conduziu a esta crise, toda a panóplia de promessas adiadas de crescimento e de criação de emprego, retórica que, se não for erradicada, nos conduzirá, inevitavelmente, às crises seguintes.
Fala-se de governação económica e passa-se uma «esponja» sobre os mecanismos em aprovação, os quais, para além da colisão com princípios constitucionais ou com competências deste Parlamento, podem determinar, no caso português, a aplicação de multas anuais, que variam entre 175 e 850 milhões de euros anuais, a reverter para os chamados países cumpridores, de uma forma proporcional à sua riqueza. Isto é, para quem nos ouve, o quinhão maior do dinheiro das nossas multas será dado aos países mais ricos.
Fala-se de completar a reforma da regulação financeira e fica para a história a prometida proibição de todos os mecanismos de investimento especulativo, de criação de um imposto sobre transacções financeiras, passando-se uma outra «esponja» sobre a anunciada restrição do funcionamento de paraísos fiscais, de offshore e de zonas francas, permitindo-se, por exemplo, que o reforço dos sistemas legalizados de fuga aos impostos — passe a expressão —, que estiveram na base de fraudes no BCP, no BPP e no BPN, possa ser defendido, como o foi anteontem, pelo candidato Cavaco Silva num comício de campanha eleitoral realizado na Região Autónoma da Madeira.
Fala-se do novo orçamento comunitário — até se lhe chama moderno, veja-se! — e passa-se uma «esponja» sobre o anunciado congelamento das perspectivas financeiras até 2020, já apresentadas pelo trio do directório europeu, constituído pela Alemanha, pela França e pelo Reino Unido.
No Programa da Comissão, Sr. Presidente e Sr. Ministro, parece que se fala de tudo mas, na verdade, omite-se o essencial. É que, com políticas de austeridade impostas de forma arbitrária e violenta, em especial aos países mais débeis, não se promove a recuperação nem o crescimento, não se combate o desemprego, antes se fomenta a estagnação e a recessão, quando muito o crescimento medíocre ou pífio, e, em consequência, gerar-se-ão inevitavelmente novos desequilíbrios orçamentais e maiores dependências externas.
No Programa da Comissão, Sr. Ministro, omite-se até a nova revisão para alterar o Tratado, que era para durar 50 anos.
Importa, por isso, urgentemente, mudar de políticas e de orientações. Neste contexto, como eu disse ao Sr.
Secretário de Estado hoje de manhã, mas ele não me ouviu e preferiu dar a volta às minhas afirmações, importa «dar um murro na mesa» e fazer com que a construção europeia seja feita para os povos e não continue a ser feita para os países mais poderosos ou em nome daquilo que são os interesses dos grupos económicos e financeiros.

Aplausos do PSD.

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O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José de Bianchi.

O Sr. José de Bianchi (PS): — Sr. Presidente, Srs. Ministros, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Quando assinala o 25º aniversário da sua plena integração na grande comunidade dos povos europeus, mantendo o desígnio nacional de aprofundamento e reforço dos laços que definem a sua singular vocação universalista, Portugal, com a concordância activa da imensa maioria dos portugueses, reencontrou, na Europa, a sua identidade e a sua razão de ser, como povo autónomo que sabe que só no concerto internacional dos esforços, a começar pela cooperação entre os europeus, será possível firmar esperanças realistas de mais liberdade, de mais justiça social e de mais bem-estar.
Na evolução mais recente da vida europeia, a força das coisas e dos acontecimentos, superando hesitações e impasses, tornou inteiramente visível a necessidade de ponderar políticas e de criar instâncias de coordenação e governo que permitam executar as medidas de reequilíbrio orçamental, de fomento do crescimento económico, de prevenção e reparação de choques assimétricos e de promoção da coesão social e territorial, requeridas pela integração económica.
No cenário imediato, de combate à crise, é essencial continuar a agir eficazmente no plano macroeconómico, com vista à atenuação dos desequilíbrios das contas públicas e à contenção das dívidas nacionais, tanto quanto no âmbito da competitividade externa da União e no estímulo, verdadeiramente crucial, da procura interna dos países com níveis de rendimento mais altos, cuja dinamização é vital para as restantes economias nacionais que mais precisam de crescer.
Simultaneamente, é necessário progredir em direcção à integração política que sustente a coerência global da acção da União Europeia quer como um todo, enquanto interlocutor válido e útil no grande fórum da política internacional e agente activo de regulação do mercado mundial, quer no que se refere à compatibilização dos interesses e das necessidades dos Estados-membros.
Para os que acreditam, como nós acreditamos, que o mais importante é fazer avançar o projecto da União Europeia tal como já existe, no quadro de soberanias partilhadas que fomos edificando, há todas as razões para preservar o amplo consenso interpartidário que temos mantido em torno da economia social de mercado, verdadeiro timbre do modelo europeu a que aderimos, por adesão aos princípios guias da democracia, dos direitos humanos, do comércio livre e justo, da solidariedade e reciprocidade e da coesão social e territorial. E há todas as razões para continuar a subordinar a nossa intervenção política à percepção conjunta das linhas mestras do interesse nacional, mantendo a unidade em torno da acção do Estado português.
Sr.as e Srs. Deputados, a Assembleia da República, cumprindo a missão de acompanhamento, apreciação e pronúncia, que a Constituição e a lei lhe atribuem, tem escrutinado minuciosamente a actividade do Governo no âmbito do processo de construção europeia.
Graças à convergência da maioria dos grupos parlamentares, e também — é justo lembrá-lo — graças à permanente e diligente disponibilidade do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros e do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Europeus, a Comissão Parlamentar competente tem tomado conhecimento detalhado da acção governativa nesse domínio e, mais do que isso, tem podido apoiá-la, nas suas orientações mais significativas.
Estou certo de que, em conjunto, continuaremos a assumir a nossa responsabilidade perante o futuro, a nossa obrigação de traçar e prosseguir caminhos que conduzam ao que, por deliberação democrática, possamos tomar como desejável.
Desde já, no início do «semestre europeu», em que a apreciação do PEC e do Plano Nacional de Reformas condicionará o futuro próximo, estou certo de que a Assembleia da República, renovando os consensos que tem sido capaz de criar, continuará a contribuir para a adequação e para a eficácia da actuação do Governo no plano europeu, contribuindo assim para que Portugal se realize e se realizem inteiramente as aspirações de todos os portugueses.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Serpa Oliva.

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O Sr. João Serpa Oliva (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Portugal comemorou, há dias, os 25 anos de adesão às Comunidades Europeias. Neste quarto de século, o País melhorou significativamente em inúmeros indicadores económicos, sociais e políticos. Habituámo-nos a padrões de desenvolvimento mais exigentes, a cumprir novas regras e a encontrar soluções para um conjunto de problemas, de forma concertada e em solidariedade com os restantes Estados-membros.
Assistimos ao fim da União Soviçtica e tudo o que isso representa a bem de milhões de cidadãos,»

O Sr. João Oliveira (PCP): — Vê-se!

O Sr. João Serpa Oliva (CDS-PP): — » ao nascimento de países,»

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. João Serpa Oliva (CDS-PP): — » á independência e autonomia de outros, a duas guerras sangrentas no coração da Europa. Vimos a União Europeia alargar-se e a partilhar princípios e valores. As fronteiras dissiparam-se.
25 anos depois, muita coisa podia ter corrido melhor, muitas decisões podiam ter sido mais céleres, inúmeros erros podiam ter sido evitados, mas a democracia não é um sistema imaculado nem a natureza humana um poço sem fundo de virtudes. A Europa soube, aos poucos, sarar profundas feridas do seu passado recente e redesenhar-se politicamente como um imenso espaço de liberdades, oportunidades e compromissos.
25 anos depois, muitos europeus estão desiludidos, angustiados com as dificuldades, defraudados com certas expectativas criadas. O ano que agora começa ainda mal nasceu e já tem o seu calvário traçado.
Permitam-me, por isso, que centre esta minha intervenção não nas dificuldades que nos esperam mas nas oportunidades que a integração europeia continua a abraçar. O discurso político sobre os assuntos europeus tem de mudar radicalmente em Portugal. É preciso interiorizar que os temas da União Europeia não são domínios que se esgotam na política externa nacional e, por isso, estranhos ao quotidiano dos portugueses.
Antes de uma visão de futuro, quero deixar claro que o CDS acompanha globalmente o Programa de Trabalho da Comissão Europeia para 2011: na reforma da regulação financeira, no reforço do mercado comum, no desenvolvimento de uma acção externa eficaz, pensando ser necessário acrescentar uma área, a que somos muito sensíveis, que é a questão demográfica.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. João Serpa Oliva (CDS-PP): — Já não há tempo para adiar mais esta questão, Sr. Ministro.
Demos, ao longo da nossa História, inúmeros sinais de que somos um povo generoso e politicamente maduro.
Sr. Presidente, importa, mais uma vez, neste início de 2011, olhar em frente e acreditar nos portugueses, sobretudo numa geração europeia, nascida e crescida com a integração de Portugal na União Europeia, educada na diversidade política, na liberdade de acção e pensamento, no contacto diário com outros europeus, estudando nas suas universidades, viajando com eles, debatendo com eles, aprendendo com eles.
Falta, no nosso país, um discurso político virado para esta geração, a geração Erasmus, que se mede pelos padrões de exigência de realidades mais desenvolvidas e competitivas, que não tem medo de ir e ficar, que arrisca e procura criar riqueza;»

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. João Serpa Oliva (CDS-PP): — » que, infelizmente, muitas vezes, já não volta para Portugal, não porque deixe de gostar do seu país mas porque as condições que aqui encontra são, muitas vezes, desmotivadoras para seguirem os seus objectivos.

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É para esta geração Erasmus que um ano de crise, como 2011, também se deve focar: que as nossas decisões enquanto representantes políticos e legisladores consigam inverter a saída de muitos milhares de jovens e os consiga motivar por Portugal; que sejam incentivados a participar nas soluções e a ultrapassar os problemas; que sejam atraídos para a criação de conhecimento e riqueza, num ambiente fiscal motivante; que interiorizem ser possível criar um País melhor, uma economia mais sustentável e criativa, fazendo dos problemas oportunidades e, do pessimismo, soluções.
Termino, citando um colega meu, Miguel Torga: «Recomeça, se puderes, sem angústia e sem pressa e os passos que deres nesse caminho duro do futuro, dá-os em liberdade, enquanto não alcances, não descanses.
De nenhum fruto queiras só metade».

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Não há mais oradores inscritos, de momento, mas reconheço o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros como orador inscrito. Tem a palavra.

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tive a oportunidade de sublinhar e de acentuar a gravidade e a complexidade da crise europeia que vivemos e tive a oportunidade de sublinhar, por essa circunstância também, a necessidade absoluta, face à natureza da crise que estamos a viver, com as implicações que tem também na crise nacional, independentemente de reconhecermos, de forma por vezes diferenciada, os elementos estruturais da crise portuguesa, de não podermos ignorar o impacto que a crise europeia tem, hoje, na dinâmica de superação dos nossos próprios problemas e de construção do nosso futuro colectivo.
Por isso, chamei a atenção para a necessidade de as questões europeias estarem cada vez mais (e estarão, seguramente, ao longo deste ano) no centro da agenda política nacional e estarão, seguramente, no centro da agenda deste Parlamento e desta Assembleia.
O Governo, seja através do Ministério dos Negócios Estrangeiros, da Secretaria de Estado dos Assuntos Europeus, seja de outras áreas da governação, tem a responsabilidade e o compromisso de acompanhar, ao longo deste ano, necessariamente, os desenvolvimentos extraordinários que o projecto europeu vai ter, como consequência, justamente, dos desenvolvimentos desta crise na estabilidade da zona euro, e em tudo o que diz respeito, sobretudo ao modelo de governação económica, a uma exigência de estabilidade para a construção e para a salvaguarda do projecto europeu.
Coincidindo esse modelo de governação económica com áreas de competência que são dos parlamentos nacionais, é absolutamente indispensável, naturalmente, que a Assembleia assuma as suas responsabilidades e que o Governo assuma as suas responsabilidades nesta Assembleia.
Porém, não tenhamos dúvidas de que o que se vai passar na Europa, ao longo deste ano, é um exercício de resposta delicada a uma situação inesperada com que o projecto europeu se confronta, com enormes implicações em todas as economias nacionais, sejam elas de que natureza forem, e que essas alterações são uma exigência de a crise europeia ser enquadrada por uma crise de reajustamento macroeconómico da economia mundial, com profundas dinâmicas de redistribuição da riqueza à escala global, que exercem uma pressão extraordinária sobre o modelo social europeu e sobre o modelo económico europeu.
Por isso, não temos outra saída que não seja a de acompanhar o esforço de reforma do modelo de governação económico,»

Protestos do Deputado do PCP Honório Novo.

» como contraponto a uma União Monetária imperfeita e que não tem forma de sobreviver se não for capaz de contrariar uma dinâmica de renacionalização da política europeia que em muitos Estados se efectiva, através de um esforço mais integrador nas áreas fiscal, orçamental e económica. Por isso, não temos outra alternativa.
Compreendo que a Deputada Cecília Honório questione o modelo de governação económica. O modelo de governação económica não é, seguramente também, um modelo de governação económica que a bancada socialista gostaria de ver desenvolvido, mas»

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A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Olhe que não parece!»

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — » a matriz de governação económica europeia, numa base democrática, Sr.ª Deputada, reflecte, necessariamente, a natureza da relação de forças na Europa, e a natureza da relação de forças na Europa tem uma perspectiva para o desenvolvimento do projecto europeu, da economia europeia e do modelo social europeu que é aquele que, naturalmente, se vai traduzir no programa legislativo que vamos ter pela frente.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — E há quem manda e quem obedece!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Por isso, se queremos ser democratas, do ponto de vista europeu, temos que saber ajustar a nossa realidade política à realidade política europeia, que, circunstancialmente, estabelece uma relação de forças determinada e que imprime um sentido ilógico, até, e político à construção do pilar económico da União.
É essa a realidade e nós temos de ser muito realistas e muito pragmáticos. Aliás, é nesse sentido que qualquer governo tem respeitar os pressupostos de permanência no processo de construção europeia. É por isso que este Governo continuará firme no propósito de se manter alinhado com as exigências que a construção europeia hoje lhe impõe. É porque manter Portugal na rota da integração europeia, manter Portugal no centro da construção europeia, até como país e como economia periférica que é, é, hoje, como era há 25 anos, uma realidade incontestável, que as principais forças integracionistas do País na União Europeia continuam a defender.
E essa é naturalmente a nossa posição, que é diferente da posição do BE e é diferente da posição do PCP como foram sempre diferentes as nossas posições em matéria de integração europeia.
Por isso, Sr. Deputado, e para não dizer que fica sem resposta, digo-lhe que a saída da zona euro, para nós, não é uma opção. Assim sendo, não tenho de definir cenários nesse domínio.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Por último, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Rodrigues.

O Sr. Luís Rodrigues (PSD). — Sr. Presidente, Srs. Ministros, Sr. Secretário de Estado: No final do debate, gostaria ainda de fazer uma pequena pergunta ao Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros»

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — Que já não tem tempo para lhe responder»!

O Sr. Luís Rodrigues (PSD): — » que vem na sequência da que já coloquei hoje de manhã, em Comissão, ao Sr. Secretário de Estado.
Portugal é um país que não tem conseguido cumprir e atingir os objectivos a que se tem proposto em termos orçamentais. No entanto, o PSD, com sentido de responsabilidade e atendendo ao interesse nacional, permitiu — e fê-lo recentemente — que o Orçamento do Estado fosse viabilizado. Para quê? Para que o PS pudesse atingir, junto da União Europeia e também junto dos portugueses, os objectivos a que se propôs.

O Sr. Honório Novo (PCP): — O Sr. Deputado Luís Menezes, há pouco, não dizia bem a mesma coisa! A bancada do PSD fala a várias vozes!

O Sr. Luís Rodrigues (PSD): — A questão é esta, Sr. Ministro: se, ao fim de seis meses, Portugal não conseguir cumprir os objectivos a que se propôs, qual é a resposta que o Governo vai dar à União Europeia e aos portugueses? Admite, Sr. Ministro, se Portugal não conseguir cumprir esses objectivos, recorrer ao FMI?

Aplausos do PSD.

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O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, vamos agora passar ao ponto seguinte da nossa ordem de trabalhos com a apreciação dos inquéritos parlamentares n.os 5/XI (2.ª) e 6/XI (2.ª), apresentados, respectivamente, pelo PSD e pelo CDS-PP, sobre a constituição de uma comissão parlamentar de inquérito à tragédia de Camarate.
Tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Negrão.

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Quando se fala na constituição de mais uma comissão parlamentar de inquérito para o conhecido caso Camarate ouve-se sempre a pergunta: para quê mais uma comissão? E esta é uma pergunta legítima, porque já lá vão oito comissões e vamos a caminho da nona comissão parlamentar de inquérito.
Contudo, e olhando para o trabalho destas oito comissões, parece-me que podemos dividi-lo em duas partes: uma primeira que funcionou em simultâneo com a investigação feita pelos tribunais — e eu diria que essas primeiras comissões de inquérito funcionaram de forma menos profunda, com uma investigação mais cautelosa, dada a existência de uma investigação judicial, e, terminada esta por arquivamento, por parte das autoridades judiciárias – e uma segunda parte em que as comissões de inquérito começaram a trabalhar com mais profundidade e deram resultados mais substanciais.
Eu diria mesmo que a VIII Comissão, que terminou na legislatura anterior, foi a que constituiu um marco no âmbito do funcionamento das oito comissões de inquérito, em primeiro lugar, porque ficou confirmada a presunção de que o acidente da aeronave foi causado por um engenho explosivo — à semelhança, aliás, do que já tinha acontecido nas conclusões da VI Comissão — e não por razões acidentais; e foi igualmente um marco, porque deixou recomendações para o trabalho a continuar noutra comissão (se ela fosse constituída, uma vez que houve eleições antecipadas para a Assembleia da República), no sentido de serem ouvidos os peritos internacionais que foram designados para integrar a comissão multidisciplinar de peritos e que só não foram atempadamente ouvidos em virtude da anunciada dissolução da Assembleia da República, e recomendando também que fosse efectuado um aprofundamento da investigação acerca das operações de comércio de armamento em que estivesse envolvido o Estado português ou empresas portuguesas.
Existem, por isso, razões para continuar este trabalho e para constituir uma nova comissão parlamentar de inquérito. Na verdade, o Estado tem o dever de identificar as causas deste acidente que matou um primeiroministro de Portugal, o Dr. Sá Carneiro, um ministro da defesa de Portugal, o Eng.º Amaro da Costa, e seus acompanhantes.
Portanto, como já referi, a Comissão anterior deixou recomendações no sentido de se continuar o trabalho profícuo que ela levara a cabo e, por isso, é preciso dar-lhes seguimento.
Por tudo isto, por razões de Estado e de justiça, esgotada que foi a intervenção da justiça, cabe ainda à política e aos políticos fazer todos os esforços para chegar mais longe. É esse o nosso dever, que cumpriremos!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Ribeiro e Castro.

O Sr. José Ribeiro e Castro (CDS-PP): — Sr. Presidente e Srs. Deputados: A melhor razão que fundamenta a constituição da nova comissão parlamentar de inquérito sobre Camarate encontra-se nas conclusões da VIII Comissão Parlamentar de Inquérito. Esta, depois de referir que confirmara estarmos perante um atentado, perante a deflagração «de um engenho explosivo que incapacitou a aeronave e/ou os seus tripulantes de condução do voo», nos termos das conclusões da comissão multidisciplinar de peritos, depois de ter considerado comprovado que «o Fundo de Defesa Militar do Ultramar continuava a ser utilizado de forma irregular, apresentando movimentos não relevados contabilisticamente e discrepâncias muito significativas entre saldos reais e valor orçamentados», considerou «comprovado que o Eng.º Adelino Amaro da Costa» — então ministro da defesa nacional — «estava particularmente atento às operações de venda de armamento que envolviam o Estado português, tendo vetado várias operações», que identifica, «e tendo pedido, a 2 de Dezembro de 1980, esclarecimentos adicionais acerca da venda de armas ao Irão, operações que se verificaram a 9 de Dezembro de 1980 e a 22 de Janeiro de 1981». E, assim, recomendou a VIII

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Comissão Parlamentar de Inquérito que «seja efectuado um aprofundamento da investigação acerca das operações de comércio de armamento em que estivessem envolvidos o Estado português ou empresas portuguesas».
É este, portanto, no nosso entender, o principal objecto da comissão, ou seja, dar seguimento ao que a comissão anterior não pôde concluir e, sem prejuízo disso, obviamente, tal como nas outras anteriores, oferecer-se à apreciação de qualquer facto novo que nos seja presente.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. José Ribeiro e Castro (CDS-PP): — Creio, pois, que este dever nos assiste.
A Assembleia da República não está entre aqueles de quem pode ser dito que quis obstar ao conhecimento da verdade sobre Camarate.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. José Ribeiro e Castro (CDS-PP): — Pelo contrário, a homenagem que podemos fazer à Assembleia da República e a todas as comissões de inquérito parlamentar anteriores é a de que aquilo que se conhece da factualidade, do aprofundamento sob diferentes ângulos (de prova testemunhal, de prova material, de prova pericial) pôde ser feito graças ao trabalho dessas comissões de inquérito parlamentar.

Aplausos do CDS-PP.

Gostaria também de corrigir uma ideia que, muitas vezes, é realçada ao dizer-se que «são muitas comissões». Bom, são muitas comissões, porque, de legislatura em legislatura, elas se renovam, não há uma continuidade. E é necessário ter presente também que muitas das comissões não puderam concluir os seus trabalhos, porque houve até interrupção da respectiva legislatura. Isso aconteceu logo com a II Comissão Parlamentar de Inquérito — que só concluiu os seus trabalhos na III Comissão Parlamentar de Inquérito, ou seja, a II e a III Comissões de Inquérito formam um bloco —, aconteceu com a VII Comissão Parlamentar de Inquérito — que nem chegou a apresentar relatório — e aconteceu com a VIII Comissão Parlamentar de Inquérito — que deixou os seus trabalhos incompletos, e por isso nós, agora, temos de concluí-los.
Mas é igualmente necessário corrigir a ideia de que houve uma oscilação no sentido de que ora se optava pelo atentado, ora pelo acidente consoante a maioria parlamentar era de direita ou de esquerda. Nada de mais errado!! Há, de facto, uma continuidade no trabalho das comissões de inquérito, como se pode constatar pela leitura dos relatórios que estão publicados num volume já editado pela Assembleia da República, sendo que desde a IV Comissão Parlamentar de Inquérito que se reconhece, então por maioria, e a partir da V Comissão Parlamentar de Inquérito, por unanimidade, que houve um atentado, que houve factos artificiais estranhos que se produziram e que deviam, aliás, a seu tempo ter sido conhecidos no devido processo judicial.
Mas nem por o processo judicial ser impossível, pela sua prescrição, nós devemos afastar-nos do dever público, do dever perante a História e perante a opinião pública, de conhecer a verdade tão extensamente quanto seja possível ainda conhecer e aprofundar. É esse o nosso dever!

Aplausos do CDS-PP.

Por fim, Sr. Presidente, uma breve nota relativamente à presença dos representantes dos familiares das vítimas.
Para nós, isso é indispensável. É algo que tem sido parte das comissões desde a II Comissão Parlamentar de Inquérito. Desde 1984, isto é, desde que as comissões se debruçaram sobre a matéria de facto, sobre a apreciação da factualidade e não sobre a apreciação crítica da administração pública, que foi sempre assim — aliás, esta foi sempre uma matéria pacífica na II, na III, na IV, na V, na VI, na VII e na VIII Comissões.
Portanto, acredito que isso não será posto em causa e que os representantes dos familiares das vítimas, que têm aqui um estatuto homólogo ao de assistente em processo penal, terão no funcionamento da próxima comissão parlamentar de inquérito o mesmo estatuto que sempre tiveram em todas as anteriores.

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Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina Martins.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: As conclusões das últimas comissões parlamentares de inquérito à tragédia de Camarate foram unânimes em considerar que existiam indícios criminais e que, portanto, estaríamos perante uma acção criminosa — aliás, estas conclusões, antes de mais, instavam o Ministério Público a intervir, a agir, a investigar.
Todavia, estamos perante o cenário da prescrição e, portanto, ao que tudo indica, não temos já essa possibilidade, que seria a primeira possibilidade que foi aberta pelos relatórios de todas as comissões parlamentares de inquérito.
O BE não inviabiliza a existência de uma comissão parlamentar de inquérito, porque acha necessário que se averigúe toda a verdade dos factos naquilo que é ainda possível averiguar, estando nós perante uma acção criminosa, como esta que Assembleia da República já constatou, e tendo o BE, obviamente, todo o interesse em apurar a verdade sobre, ao que tudo indica, um atentado bombista, seja este ou outros atentados bombistas que vitimaram tantos democratas.
Nesse sentido e considerando que os partidos que agora propõem uma nova comissão parlamentar de inquérito terão, com certeza, pensado e verificado a existência de factos sobre os quais nos possamos debruçar, agora, para levar mais longe a averiguação de todos os factos, o BE não vai inviabilizar a constituição da comissão parlamentar de inquérito.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Machado.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr. Presidente e Srs. Deputados: O PCP tem uma posição clara relativamente a esta matéria, já anunciada, que é a de optar pela abstenção, fundamentando-se esta nossa posição de voto até naquilo que aqui foi dito pelas bancadas do PSD e do CDS-PP. Ou seja: foi elogiado o trabalho da VIII Comissão Parlamentar de Inquérito e vamos partir para a nona comissão quando os próprios documentos e intervenções dos Srs. Deputados dizem, claramente, que todas as diligências permitiram à VIII Comissão Parlamentar de Inquérito concluir no sentido da confirmação de todas as conclusões a que a VII Comissão Parlamentar de Inquérito chegara! Portanto, se a VII Comissão Parlamentar de Inquérito já tinha chegado a umas conclusões e se a VIII Comissão confirmou essas mesmas conclusões, nós temos sérias dúvidas sobre a necessidade e a utilidade de uma nova comissão parlamentar de inquérito.
É este, pois, o motivo que justifica o nosso sentido de voto, sendo que não somos, todavia, obstáculo ao apuramento da verdade em nenhuma destas matérias — aliás, votámos sempre a favor da constituição das anteriores comissões parlamentares de inquérito —, mas chegámos a uma situação em que a VIII Comissão chegou a conclusões — bem ou mal, não importa aqui discutir isso — que foram aprovadas, e, nessa medida, não vemos utilidade na constituição de uma nova comissão parlamentar de inquérito.
Mais: como não é claro o que é que esta nova comissão parlamentar de inquérito vai trazer de novo às conclusões e à matéria que já foi aprovada no passado, isso leva-nos a ter este sentido de voto, que é o da abstenção.
No que diz respeito à participação dos familiares das vítimas, questão já aqui abordada, importa dizer que o PCP considera que chegou o momento de reflectir sobre esta matéria. E não podemos concordar com uma perspectiva de equiparação da participação dos familiares, cujos moldes devem ser ponderados e reflectidos, à participação dos diferentes grupos parlamentares. Esta é uma matéria que, na nossa opinião, merece uma séria reflexão, porque os familiares devem ser envolvidos, devem ser chamados e ouvidos, deve ser-lhes dada toda a informação relativa ao evoluir do trabalho da comissão parlamentar de inquérito, mas equipará-los aos grupos parlamentares é uma questão que merece, na nossa opinião, mais reflexão, a qual irá, com certeza, concretizar-se no âmbito do trabalho da próxima comissão parlamentar de inquérito.

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O sentido do nosso voto de abstenção não tem, pois, a ver com nenhuma matéria de fundo; consideramos é que a VIII Comissão, como refere a própria iniciativa do PSD e do CDS-PP, concluiu no sentido da confirmação de todas as conclusões para que a VII Comissão Parlamentar de Inquérito havia apontado. É, pois, esse o sentido do nosso voto de abstenção relativamente à constituição desta nova comissão parlamentar de inquérito.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Ricardo Rodrigues.

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Dois grupos parlamentares apresentaram uma iniciativa para a constituição de uma comissão parlamentar de inquérito na Assembleia da República. Na verdade, apresentaram uma proposta de resolução que tem como objecto a investigação do «caso Camarate». E, ao que sabemos, a constituir-se a comissão, será a IX Comissão Parlamentar de Inquérito a esse evento.
A verdade é que o Partido Socialista acredita que os dois grupos parlamentares têm, naturalmente, factos novos para trazer ao conhecimento do Parlamento e que isso pode ser o «alimento» desta nova comissão de parlamentar de inquérito. Nós, Partido Socialista, não duvidamos de que todo o esclarecimento deve ser feito e também queremos que não exista a mínima dúvida sobre o que aconteceu naquele fatídico dia. Por isso, não inviabilizaremos a constituição desta nova comissão parlamentar de inquérito e temos a convicção de que, durante os primeiros dias de trabalho, encontraremos, consensualmente, o seu modo de funcionamento.
Como todos sabemos, o Regime Jurídico dos Inquéritos Parlamentares sofreu uma alteração ainda há pouco tempo — há cerca de dois anos — e não ficou expressamente prevista, para ser claro, a questão da participação de terceiros nas comissões parlamentares de inquérito. Existe, portanto, uma lacuna legislativa sobre essa matéria, mas o Partido Socialista está disponível para abordá-la — e não ignora que, em anteriores comissões, os familiares das vítimas foram ouvidos. Trata-se de uma tradição nesta Assembleia da República e, a par dessa tradição, existe uma lei nova sobre inquéritos parlamentares, pelo que o Partido Socialista dará o seu contributo, em sede de comissão, para encontrar uma forma de funcionamento consensual, que não ponha em causa quaisquer direitos e que permita que se investigue por completo o facto que ocorreu em 4 de Dezembro de 1980.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, assim se concluem os nossos trabalhos de hoje.
A próxima sessão plenária realizar-se-á amanhã, às 15 horas, e o agendamento corresponde a uma marcação do Bloco de Esquerda para apreciação, na generalidade, do projecto de lei n.º 482/XI (2.ª) — Altera o regime jurídico de apropriação pública por via de nacionalização (BE) e do projecto de resolução n.º 350/XI (2.ª) — Define condições de transparência para a actuação pública na gestão do BPN e para a decisão sobre o seu futuro (BE). Procederemos, eventualmente, à votação destes diplomas no final do debate, se assim o requerer o grupo parlamentar que cativou o agendamento, e haverá ainda lugar a votações regimentais.
Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 58 minutos.

Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:

Partido Socialista (PS)
João Pedro de Aleluia Gomes Sequeira
Nuno Miguel da Costa Araújo
Sofia Isabel Diniz Pereira Conde Cabral

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Partido Popular (CDS-PP)
Cecília Felgueiras de Meireles Graça
Maria de Assunção Oliveira Cristas Machado da Graça

Deputados que faltaram à sessão:

Partido Socialista (PS)
Defensor Oliveira Moura
Francisco José Pereira de Assis Miranda
José Duarte Piteira Rica Silvestre Cordeiro
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Vítor Manuel Bento Baptista

Partido Social Democrata (PSD)
António Egrejas Leitão Amaro
Fernando Luís de Sousa Machado Soares Vales
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Raquel Maria Martins de Oliveira Gomes Coelho
Sérgio André da Costa Vieira

Bloco de Esquerda (BE)
Ana Isabel Drago Lobato
A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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59 | I Série - Número: 034 | 6 de Janeiro de 2011 O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputado

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