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Quinta-feira, 13 de Janeiro de 2011 I Série — Número 37

XI LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2010-2011)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 12 DE JANEIRO DE 2011

Presidente: Ex.mo Sr. Jaime José Matos da Gama

Secretários: Ex.mos Srs. Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Pedro Filipe Gomes Soares

SUMÁRIO O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 11 minutos.
Deu-se conta da entrada na Mesa da proposta de lei n.º 48/XI (2.ª), das propostas de resolução n.os 42 a 44/XI (2.ª), dos projectos de lei n.os 483 a 487/XI (2.ª), das apreciações parlamentares n.os 78 e 79/XI (2.ª) e dos projectos de resolução n.os 351 a 354/XI (2.ª).
Após o Sr. Presidente ter procedido à leitura da mensagem do Presidente da República sobre a devolução, sem promulgação, do Decreto da Assembleia da República n.º 68/XI — Cria o procedimento de mudança de sexo e de nome próprio no registo civil e procede à décima sétima alteração ao Código do Registo Civil, pronunciaram-se os Srs. Deputados Teresa Morais (PSD), José Moura Soeiro (BE), João Oliveira (PCP), Ana Catarina Mendonça (PS), Isabel Galriça Neto (CDS-PP) e José Luís Ferreira (Os Verdes).
Em declaração política, o Sr. Deputado José Manuel Rodrigues (CDS-PP) acusou o Governo de pôr em causa a liberdade de ensino ao querer alterar o modo de financiamento dos contratos de associação das escolas particulares e cooperativas. No final, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Rosalina Martins (PS), Rita Rato (PCP), Pedro Duarte (PSD) e Ana Drago (BE).
Também em declaração política, o Sr. Deputado Cristóvão Crespo (PSD) insurgiu-se pela ausência de políticas adequadas dos governos do Partido Socialista e respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Miranda Calha (PS) e João Rebelo (CDS-PP).

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Ainda em declaração política, o Sr. Deputado João Oliveira (PCP) criticou a falta de investimento do Governo na área da cultura, tendo respondido, depois, a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Amadeu Albergaria (PSD), Catarina Martins (BE), Teresa Caeiro (CDS-PP) e Inês de Medeiros (PS).
Procedeu-se ao debate, na generalidade, da proposta de lei n.º 47/XI (2.ª) — Procede à quinta alteração à Lei de enquadramento orçamental, aprovada pela Lei n.º 91/2001, de 20 de Agosto, tendo usado da palavra, a diverso título, além do Sr. Ministro de Estado e das Finanças (Teixeira dos Santos), os Srs. Deputados Duarte Pacheco (PSD), Jamila Madeira (PS), Pedro Mota Soares (CDS-PP), José Gusmão (BE), João Pinho de Almeida (CDS-PP), Honório Novo (PCP), Teresa Venda (PS) e Cecília Honório (BE).
Foi apreciada a petição n.º 56/XI (1.ª) — Apresentada por Paulo Alexandre Santos Coelho e outros, solicitando à Assembleia da República a repavimentação da ER361, no troço entre Alcanede e Alcanena. Intervieram os Srs. Deputados Anabela Freitas (PS), António Filipe (PCP), José Gusmão (BE), Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP), Carina Oliveira (PSD) e José Luís Ferreira (Os Verdes).
Foram ainda apreciados conjuntamente a petição n.º 61/XI (1.ª) — Apresentada por Hugo Alexandre Lopes Laibaças e outros, solicitando à Assembleia da República o não encerramento total da linha ferroviária entre Lisboa e Évora e, consequentemente, a manutenção da circulação do comboio intercidades que faz a ligação Évora/Lisboa/Évora, e o projecto de resolução n.º 351/XI (2.ª) — Defende a manutenção do serviço intercidades Lisboa/Évora e Lisboa/Beja e reclama a sua qualificação em termos de oferta e adequação de horários (PCP). Fizeram intervenções os Srs. Deputados João Oliveira (PCP), José Manuel Rodrigues (CDS-PP), Luís Rodrigues (PSD), Heitor Sousa (BE), Luís Gonelha (PS) e José Luís Ferreira (Os Verdes).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 23 minutos.

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O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 11 minutos.

Deputados presentes à sessão:

Partido Socialista (PS)
Acácio Santos da Fonseca Pinto
Alberto Bernardes Costa
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Ana Maria Ribeiro Gomes do Couto
Ana Paula Mendes Vitorino
Anabela Gaspar de Freitas
António Alves Marques Júnior
António José Martins Seguro
António Ramos Preto
António Ribeiro Gameiro
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Aurélio Paulo da Costa Henriques Barradas
Carlos Filipe de Andrade Neto Brandão
Catarina Marcelino Rosa da Silva
Defensor Oliveira Moura
Deolinda Isabel da Costa Coutinho
Eduardo Arménio do Nascimento Cabrita
Eurídice Maria de Sousa Pereira
Fernando Manuel de Jesus
Francisco José Pereira de Assis Miranda
Frederico de Oliveira Castro
Glória Maria da Silva Araújo
Horácio André Antunes
Inês de Saint-Maurice de Esteves de Medeiros Vitorino de Almeida
Jaime José Matos da Gama
Jamila Bárbara Madeira e Madeira
Jorge Filipe Teixeira Seguro Sanches
Jorge Manuel Capela Gonçalves Fão
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Jorge Manuel Rosendo Gonçalves
José Carlos Bravo Nico
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Eduardo Vera Cruz Jardim
José João Pinhanços de Bianchi
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
José Manuel Pereira Ribeiro
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
José Rui Alves Duarte Cruz
João Barroso Soares
João Miguel de Melo Santos Taborda Serrano
João Paulo Feteira Pedrosa
João Paulo Moreira Correia
João Raul Henriques Sousa Moura Portugal
João Saldanha de Azevedo Galamba
Júlio Francisco Miranda Calha

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Luiz Manuel Fagundes Duarte
Luís António Pita Ameixa
Luís Miguel Morgado Laranjeiro
Luís Miguel Soares de França
Luís Paulo Costa Maldonado Gonelha
Luísa Maria Neves Salgueiro
Lúcio Maia Ferreira
Manuel António Gonçalves Mota da Silva
Manuel José de Faria Seabra Monteiro
Marcos Sá Rodrigues
Maria Antónia Moreno Areias de Almeida Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria Helena Figueiredo de Sousa Rebelo
Maria Hortense Nunes Martins
Maria Isabel Solnado Porto Oneto
Maria José Guerra Gamboa Campos
Maria Luísa de Jesus Silva Vilhena Roberto Santos
Maria Manuela de Almeida Costa Augusto
Maria Odete da Conceição João
Maria da Conceição Guerreiro Casa Nova
Maria de Lurdes Ruivo
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Marisa da Conceição Correia Macedo
Miguel João Pisoeiro de Freitas
Mário Joaquim da Silva Mourão
Nuno André Araújo dos Santos Reis e Sá
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Barros Teixeira Santos
Paulo Alexandre de Carvalho Pisco
Pedro Manuel Farmhouse Simões Alberto
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Ricardo Manuel de Amaral Rodrigues
Rita Manuela Mascarenhas Falcão dos Santos Miguel
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui José Prudêncio
Rui José da Costa Pereira
Sérgio Constantino Gaspar Lopes de Paiva
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Teresa Maria Neto Venda
Teresa do Rosário Carvalho de Almeida Damásio
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vítor Manuel Bento Baptista
Vítor Manuel Brandão de Sousa Fontes

Partido Social Democrata (PSD)
Adriano Rafael de Sousa Moreira
Amadeu Albertino Marques Soares Albergaria

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Antonieta Paulino Felizardo Guerreiro
António Alfredo Delgado da Silva Preto
António Cândido Monteiro Cabeleira
António Fernando Couto dos Santos
António Joaquim Almeida Henriques
Arménio dos Santos
Carina João Reis Oliveira
Carla Maria Gomes Barros
Carla Maria de Pinho Rodrigues
Carlos Alberto Silva Gonçalves
Carlos António Páscoa Gonçalves
Carlos Henrique da Costa Neves
Carlos Manuel Faia São Martinho Gomes
Celeste Maria Reis Gaspar dos Santos Amaro
Cristóvão da Conceição Ventura Crespo
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Emídio Guerreiro
Fernando Mimoso Negrão
Fernando Nuno Fernandes Ribeiro dos Reis
Fernando Ribeiro Marques
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Hugo José Teixeira Velosa
Isabel Maria Nogueira Sequeira
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Jorge Cláudio de Bacelar Gouveia
Jorge Fernando Magalhães da Costa
José Alberto Nunes Ferreira Gomes
José Eduardo Rego Mendes Martins
José Luís Fazenda Arnaut Duarte
José Manuel Marques de Matos Rosa
José Manuel de Matos Correia
José Mendes Bota
José Pedro Correia de Aguiar Branco
José de Almeida Cesário
José Álvaro Machado Pacheco Pereira
João Bosco Soares Mota Amaral
João Carlos Figueiredo Antunes
Luís António Damásio Capoulas
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Filipe Valenzuela Tavares Menezes Lopes
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Manuel Filipe Correia de Jesus
Margarida Rosa Silva de Almeida
Maria Clara de Sá Morais Rodrigues Carneiro Veríssimo
Maria Francisca Fernandes Almeida
Maria Helena Passos Rosa Lopes da Costa
Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto
Maria Luísa Roseira da Nova Ferreira de Oliveira Gonçalves
Maria Manuela Dias Ferreira Leite
Maria Paula da Graça Cardoso

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Maria Teresa Machado Fernandes
Maria Teresa da Silva Morais
Maria da Conceição Feliciano Antunes Bretts Jardim Pereira
Maria das Mercês Gomes Borges da Silva Soares
Maria do Rosário da Silva Cardoso Águas
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Nuno Miguel Pestana Chaves e Castro da Encarnação
Paulo Cardoso Correia da Mota Pinto
Paulo César Lima Cavaleiro
Paulo Jorge Frazão Batista dos Santos
Pedro Augusto Lynce de Faria
Pedro Manuel Tavares Lopes de Andrade Saraiva
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Pedro Nuno Mazeda Pereira Neto Rodrigues
Teresa de Jesus Costa Santos
Ulisses Manuel Brandão Pereira
Vasco Manuel Henriques Cunha
Vânia Andrea de Castro Jesus

Partido Popular (CDS-PP)
Abel Lima Baptista
Artur José Gomes Rêgo
Durval Tiago Moreira Fonseca e Castro Ferreira
Filipe Tiago de Melo Sobral Lobo D' Ávila
Isabel Maria Mousinho de Almeida Galriça Neto
José Duarte de Almeida Ribeiro e Castro
José Manuel de Sousa Rodrigues
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Manuel de Serpa Oliva
João Rodrigo Pinho de Almeida
Luís Pedro Russo da Mota Soares
Nuno Miguel Miranda de Magalhães
Paulo Sacadura Cabral Portas
Pedro Manuel Brandão Rodrigues
Raúl Mário Carvalho Camelo de Almeida
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia
Teresa Margarida Figueiredo de Vasconcelos Caeiro

Bloco de Esquerda (BE)
Ana Isabel Drago Lobato
Catarina Soares Martins
Francisco Anacleto Louçã
Heitor Nuno Patrício de Sousa e Castro
Helena Maria Moura Pinto
Jorge Duarte Gonçalves da Costa
José Borges de Araújo de Moura Soeiro
José Guilherme Figueiredo Nobre de Gusmão
José Manuel Marques da Silva Pureza
João Pedro Furtado da Cunha Semedo

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Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda
Maria Cecília Vicente Duarte Honório
Mariana Rosa Aiveca
Pedro Filipe Gomes Soares
Pedro Manuel Bastos Rodrigues Soares
Rita Maria Oliveira Calvário

Partido Comunista Português (PCP)
Agostinho Nuno de Azevedo Ferreira Lopes
António Filipe Gaião Rodrigues
Artur Jorge da Silva Machado
Bernardino José Torrão Soares
Bruno Ramos Dias
José Honório Faria Gonçalves Novo
João Augusto Espadeiro Ramos
João Guilherme Ramos Rosa de Oliveira
Miguel Tiago Crispim Rosado
Paula Alexandra Sobral Guerreiro Santos Barbosa
Rita Rato Araújo Fonseca

Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV)
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
José Luís Teixeira Ferreira

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai proceder à leitura do expediente.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: proposta de lei n.º 48/XI (2.ª) — Aprova a lei da arbitragem voluntária, que baixou à 1.ª Comissão; propostas de resolução n.os 42/XI (2.ª) — Aprova o Acordo entre a República Portuguesa e a Comunidade da Dominica sobre Troca de Informações em Matéria Fiscal, assinado em Londres, a 5 de Outubro de 2010, que baixou à 2.ª Comissão, 43/XI (2.ª) — Aprova o Acordo entre a República Portuguesa e Belize sobre Troca de Informações em Matéria Fiscal, assinado em Londres, a 22 de Outubro de 2010, que baixou, também, à 2.ª Comissão, e 44/XI (2.ª) — Aprova o Acordo entre a República Portuguesa e Antigua e Barbuda sobre Troca de Informações em Matéria Fiscal, assinado em Londres, a 13 de Setembro de 2010, que baixou, igualmente, à 2.ª Comissão; projectos de lei n.os 483/XI (2.ª) — Cria o programa de remoção de obstáculos e armadilhas nas vias de circulação rodoviária (PCP), que baixou à 9.ª Comissão, 484/XI (2.ª) — Elevação da povoação de Santa Eulália, no concelho de Vizela, à categoria de vila (PS), que baixou à 12.ª Comissão, 485/XI (2.ª) — Extingue o cargo dirigente de director adjunto dos serviços do Instituto da Segurança social, IP (PSD), que baixou à 11.ª Comissão, 486/XI (2.ª) — Altera o regime de opção pelo regime de contabilidade organizada (CDS-PP), que baixou à 5.ª Comissão, e 487/XI (2.ª) — Garante o acesso gratuito de todos os cidadãos a serviços mínimos bancários e limita a cobrança de despesas de manutenção de conta por parte das instituições de crédito (Primeira alteração ao Decreto-Lei n.º 27-C/2000, de 10 de Março) (BE), que baixou à 5.ª Comissão; apreciações parlamentares n.os 78/XI (2.ª) — Requerimento do BE solicitando a apreciação pela Assembleia da República do Decreto-Lei n.º 140-B/2010, de 30 de Dezembro, que procede à transferência para o Estado das responsabilidades com pensões de trabalhadores da PT Comunicações, SA, oriundos dos Correios e Telecomunicações de Portugal, EP, e da Companhia Portuguesa Rádio Marconi, SA e 79/XI (2.ª) — Requerimento do BE solicitando a apreciação pela Assembleia da República do Decreto-Lei n.º 143/2010, de 31 de Dezembro, que procede à actualização do valor da retribuição mínima mensal garantida para 2011; e projectos de resolução n.os 351/XI (2.ª) — Defende a manutenção do serviço intercidades Lisboa/Évora e Lisboa/Beja e reclama a sua

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qualificação em termos de oferta e adequação de horário (PCP), que baixou à 9.ª Comissão, 352/XI (2.ª) — Recomenda ao Governo o reconhecimento do Estado da Palestina (BE), que baixou à 12.ª Comissão, 353/XI (2.ª) — Recomenda ao Governo uma avaliação do impacto económico-financeiro das taxas de recursos hídricos nos sectores económicos, onde as mesmas são aplicadas, desde 2008, assim como enquanto receita alocada às actividades de gestão das administrações das regiões hidrográficas, sugerindo-se, enquanto não forem conhecidos e analisados os resultados da avaliação, a suspensão da sua aplicação em 2011 (CDS-PP), que baixou à 6.ª Comissão, e 354/XI (2.ª) — Recomenda a alteração dos valores de financiamento aos contratos de associação, tendo por base os custos dos alunos nas escolas propriedade do Estado (CDS-PP), que baixou à 8.ª Comissão.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, passamos ao primeiro ponto da nossa ordem do dia, que consta da apreciação da mensagem do Presidente da República sobre a devolução, sem promulgação, do Decreto da Assembleia da República n.º 68/XI, que cria o procedimento de mudança de sexo e de nome próprio no registo civil e procede à décima sétima alteração ao Código do Registo Civil.
A mensagem, Sr.as e Srs. Deputados, é do seguinte teor: «Sr. Presidente da Assembleia da República, Excelência: Tendo recebido, para ser promulgado como lei, o Decreto n.º 68/XI da Assembleia da República, que cria o procedimento de mudança de sexo e de nome próprio no registo civil e procede à décima sétima alteração ao Código do Registo Civil, decidi, nos termos do artigo 136.º da Constituição, não promulgar aquele diploma, com os fundamentos seguintes: 1 — O regime submetido a promulgação apresenta graves insuficiências de natureza técnico-jurídica assim como procede a um enquadramento controverso das situações de perturbação de identidade de género, segundo a opinião colhida junto de especialistas nesta matéria. É, por isso, desejável que a Assembleia da República proceda a um novo debate que permita congregar as várias opiniões sobre um tema de tão grande relevância.
2 — Não se põe em causa a necessidade de existência de um regime jurídico que regule, designadamente para efeitos de registo civil, os casos medicamente comprovados de perturbação de identidade de género que assumam um perfil e uma natureza tais que justifiquem a tutela do Direito.
3 — O regime jurídico que regule esta realidade deve consagrar soluções normativas claras e adequadas à prossecução de dois objectivos: por um lado, salvaguardar a fidedignidade do sistema público de registo e, por outro, conferir uma tutela jurídica mais célere e eficaz àqueles que comprovadamente dela careçam.
4 — O Decreto n.º 68/XI, não assegurando que estes objectivos sejam alcançados, contribui, devido às deficiências técnico-jurídicas de que padece, para adensar situações de insegurança e de incerteza, inquestionavelmente lesivas para aqueles que, de uma forma comprovada com rigor, possuam uma perturbação da identidade de género.
5 — Nos termos do regime que o Decreto n.º 68/XI visava instituir, o requerimento a apresentar na conservatória do registo civil para mudança de sexo e de nome próprio deve ser acompanhado de um ‘relatório médico que comprove o diagnóstico de perturbação de identidade de género, também designada como transexualidade, elaborado por equipa clínica multidisciplinar de sexologia clínica em estabelecimento de saõde põblico ou privado, nacional ou estrangeiro.’ 6 — Porém, o diploma em apreço é, desde logo, omisso quanto aos critérios de diagnóstico da perturbação de identidade de género.
Não se definindo esta perturbação nem, tão-pouco, os respectivos critérios de diagnóstico, a interpretação da norma será deixada por inteiro à apreciação livre da entidade emitente do relatório o que, sem o devido controlo, não oferece as garantias de rigor técnico que devem estar presentes em casos particularmente delicados para a salvaguarda da dignidade da pessoa humana, como são os que ocorrem neste domínio.
7 — Não por acaso, de acordo com os critérios da classificação internacional de doenças — ICD10 — , e, bem assim, de acordo com as melhores práticas seguidas nesta área, o diagnóstico estrito de transexualismo só é considerado firme após a comprovação durante, pelo menos, dois anos da persistência da perturbação.
Esta é, de resto, a solução adoptada, por exemplo, pela lei que vigora em Espanha, a qual exige, inclusivamente, dois anos de acompanhamento médico para adequar as características físicas às do sexo pretendido.

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8 — Nos termos do regime que o Decreto n.º 68/XI se propunha estabelecer, as pessoas que detêm perturbação de identidade de género encontram-se desprotegidas relativamente a um eventual erro de diagnóstico ou à própria reponderação da sua decisão de mudança de sexo — a qual, segundo a opinião de especialistas, pode ocorrer nos estádios iniciais da referida perturbação.
9 — Muito problemática é, também, a ausência de critérios para a emissão do relatório clínico. De facto, sendo o requerimento acompanhado unicamente desse relatório e não dispondo o conservador de possibilidade de controlo substancial do mesmo, impunha-se que a lei fosse muito exigente quanto às condições para a sua emissão.
Ora, nos termos do regime aprovado, o relatório ç elaborado por ‘equipa multidisciplinar de sexologia clínica em estabelecimento de saõde põblico ou privado, nacional ou estrangeiro’.
Admite-se, pois, que profissionais sem a necessária especialização ou qualquer tipo de preparação para o acompanhamento de casos desta natureza, em regra muito complexos, possam constituir uma equipa multidisciplinar — cuja composição o Decreto em apreço não especifica — e emitam certificados que serão, obrigatoriamente, seguidos pelo conservador para o efeito da mudança de sexo e nome no registo.
Com efeito, a sexologia clínica não corresponde a uma especialidade médica reconhecida em Portugal e o Decreto é igualmente omisso quanto à qualificação profissional específica do psicólogo que integre a referida equipa.
Ainda mais grave, o mesmo relatório pode ser emitido em estabelecimento de saúde, público ou privado, estrangeiro, por clínicos cujas habilitações não são reconhecidas ou sequer controladas pelas autoridades portuguesas — ao contrário do que sucede, por exemplo, nas leis em vigor em Espanha ou no Reino Unido.
Assim, não existe qualquer possibilidade de sujeitar esses profissionais ao cumprimento mínimo de regras éticas e deontológicas, com claro prejuízo para o interesse público e para os direitos e interesses daqueles que pretendem efectuar a mudança de sexo.
10 — Não são, ainda, negligenciáveis os efeitos negativos deste regime na ordem jurídica, designadamente na confiança que inquestionavelmente deve estar associada ao sistema público de registo.
Na verdade, o registo tem por objectivo dar publicidade a determinados factos. Por esta razão, o regime do Decreto n.º 68/XI prevê a alteração do averbado no registo civil de modo a tornar o género registado conforme com a aparência demonstrada pela pessoa.
Ora, pelas razões mencionadas, a completa ausência de densidade normativa (v.g., na definição do conceito de perturbação de identidade de género ou dos critérios de diagnóstico) torna o registo, indesejavelmente, fonte de insegurança e de incerteza jurídicas. Permitir a mudança de sexo em casos não comprovados ou cujo diagnóstico se revele insuficiente será muito prejudicial para a confiança pública no sistema registal.
11 — Assim, o regime a aprovar nesta matéria não deve, de modo algum, pelas suas deficiências técnicojurídicas e pela sua ausência de clareza e densidade, contribuir para agravar a situação de quem possui perturbação de identidade de género, uma situação que, importa afirmá-lo, se reveste frequentemente de contornos dramáticos do ponto de vista da auto-realização individual e do direito ao livre desenvolvimento da personalidade.
12 — Por último, numa matéria deste melindre e complexidade, em que existe um grande desconhecimento do que verdadeiramente está em causa — na essência, uma perturbação de índole clínica — , importa que a comunidade compreenda o sentido e o alcance das intervenções do legislador, as quais devem primar pelo seu apuro técnico-jurídico e por uma real preocupação de salvaguarda dos interesses e direitos das pessoas.
Ora, tal não ocorre, manifestamente, com o Decreto n.º 68/XI, razão pela qual entendi devolvê-lo, sem promulgação, à Assembleia da República, de modo a que esta matéria seja objecto de uma análise mais aprofundada por parte dos Srs. Deputados, com vista a uma adequada ponderação dos interesses que comprovadamente se mostrem merecedores de tutela pelo Direito.
Com elevada consideração, Palácio de Belém, 6 de Janeiro de 2011 O Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva».
Sr.as e Srs. Deputados, sobre esta mensagem, como é habitual em casos precedentes, haverá intervenções por parte dos grupos parlamentares, dispondo cada um de 2 minutos.

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Tem a palavra, em primeiro lugar, a Sr.ª Deputada Teresa Morais.

A Sr.ª Teresa Morais (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: É sabido — ouvimos agora a leitura do texto remetido pela Presidência da República — que o Sr. Presidente da República decidiu devolver ao Parlamento, sem promulgação, o Decreto relativo à criação de um procedimento de mudança de sexo e de nome no registo civil.
Quero aqui lembrar que o PSD, desde o início deste processo legislativo, sempre chamou a atenção para as deficiências técnico-jurídicas dos textos que estavam em discussão.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — É verdade!

A Sr.ª Teresa Morais (PSD): — Este veto, portanto, não nos surpreendeu. Resulta de razões ponderosas muito próximas das preocupações e das reservas que, desde o início, manifestámos,»

O Sr. Pedro Duarte (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª Teresa Morais (PSD): — » com a preocupação aqui expressa de que se deveria aditar rigor e clareza aos textos que estavam em discussão.
Os partidos proponentes ou apoiantes das iniciativas legislativas em causa ignoraram as dúvidas suscitadas no processo legislativo e fizeram tábua rasa das audições realizadas em comissão, por iniciativa do PSD,»

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Teresa Morais (PSD): — » acabando por aprovar um texto que, em vez do rigor, acolhe a incerteza, que, em vez da clareza, reserva a dúvida.
O PSD, desde o início, concordou com a necessidade e a utilidade de se legislar sobre esta matçria,»

O Sr. Pedro Duarte (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª Teresa Morais (PSD): — » aliviando de demoras e de excessos um processo portador de sofrimento para aqueles que, verdadeira e genuinamente, são afectados por este problema,»

O Sr. Pedro Duarte (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª Teresa Morais (PSD): — » mas o certo ç que necessárias e õteis são apenas as boas leis.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª Teresa Morais (PSD): — As leis mal feitas, para além do prejuízo e do desprestígio que constituem para o legislador, suscitam a dúvida nos seus aplicadores e a insegurança na ordem jurídica. São, por isso, leis indesejáveis.
Por tudo isto, consideramos que esta devolução ao Parlamento deve ser entendida como uma segunda oportunidade. Lamenta-se, portanto, que os partidos que votaram favoravelmente o texto agora devolvido se tenham apressado a declarar que nada mudariam na lei,»

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — É uma irresponsabilidade!

A Sr.ª Teresa Morais (PSD): — » sem que tivessem sequer tomado o tempo suficiente para reflectir nos fundamentos deste veto.

Vozes do PSD: — Muito bem!

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A Sr.ª Teresa Morais (PSD): — Esta teimosia poderá, mesmo, vir a custar-lhes a resolução do problema, porque não é de escamotear a hipótese de que os conservadores, perante uma lei que lhes suscita sérias dúvidas, venham a resistir à aplicação desta lei e à alteração do registo dos requerentes.

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — Essa agora!

A Sr.ª Teresa Morais (PSD): — Mas, verdadeiramente surpreendente, devo dizer, foi a reacção do Governo ao veto do Sr. Presidente da República.
O Ministério da Justiça publicou, na sua página oficial, um texto de reacção ao veto presidencial sobre o qual o mínimo que se pode dizer é que é despropositado e desprovido de todo o rigor. O Governo, depois de lamentar o veto de um diploma que considera equilibrado — ora, nós não o acompanhamos nesta qualificação — , afirma que só pretendeu desburocratizar o procedimento de mudança de sexo, o que é, na verdade, falso, porque a desburocratização do processo não exigia a proposta imprudente com a qual o Governo se apresentou neste debate.
E, para citar apenas mais uma incorrecção, afirma que a solução pretendida já vigora numa série de países e cita, entre outros, a Itália e a Espanha, o que não é verdade.
A solução legislativa destes países não é esta. O texto neste Parlamento aprovado constituiria, seguramente, a lei menos exigente e mais equívoca de todas as leis em vigor na Europa.

O Sr. Pedro Duarte (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª Teresa Morais (PSD): — Termino, portanto, Sr. Presidente, apelando aos grupos parlamentares para que não se desperdice esta segunda oportunidade de, com uma ponderação séria, elaborar uma boa lei.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Moura Soeiro.

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Presidente da República invoca argumentos de natureza técnico-jurídica, mas este é um veto político e ideológico, aliás na senda das posições do Presidente da República sobre os direitos civis e o avanço nos direitos individuais.

Vozes do BE: — Exactamente!

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Lembremo-nos da paridade, do casamento entre pessoas do mesmo sexo ou da posição do Presidente sobre o divórcio.

Vozes do BE: — Exactamente!

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Este veto empurra o Presidente da República para o sector mais conservador e mais radical da nossa sociedade,»

Vozes do BE: — Muito bem!

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — » para uma posição de crueldade e de desinteresse, perante o sofrimento das pessoas transexuais, cujo único efeito é o de prolongar a humilhação, a discriminação e exclusão destas pessoas no acesso à saúde, ao trabalho, ao emprego e à habitação.
Esse sofrimento e essa exclusão existem por não haver até hoje uma lei que permita atribuir documentos correspondentes com aquilo que estas pessoas são.
Este veto mostra também que o Presidente da República não é, não quer ser, não tem capacidade para ser o Presidente de todos os portugueses!

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Vozes do BE: — Muito bem!

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Com este veto, o Presidente da República mostra que considera que há portugueses de primeira e de segunda, que há portugueses que têm direito à sua identidade e aos seus documentos e que há outros que não têm direito a essa identidade.

Protestos da Deputada do PSD Teresa Morais.

O Presidente da República deveria ser o Presidente de todos os portugueses. As pessoas transexuais são, evidentemente, cidadãs portuguesas.

A Sr.ª Teresa Morais (PSD): — Leia o texto!

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — As razões invocadas para este veto poderiam resumir-se a três, sendo a primeira um preconceito contra a autonomia e a capacidade de decisão das pessoas transexuais; a segunda razão é um desconhecimento profundo em relação ao objecto deste diploma, à realidade internacional e ao processo que esta Assembleia desenvolveu; a terceira ordem de razões invocada pelo Presidente da República poderia resumir-se a uma desconfiança profunda, face aos médicos, aos protocolos internacionais que estão estabelecidos»

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Exactamente!

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — » e em relação aos protocolos internacionais sobre o diagnóstico e sobre os processos clínicos.
O Presidente da República invoca a lei espanhola. Pois parece não saber — diz que esta lei é omissa quanto aos critérios do diagnóstico — que esta lei remete para os Harry Benjamin Standards of Care, tal como a lei espanhola e as outras leis internacionais.
Lamenta o Presidente da República que o conservador disponha apenas — apenas! — de um relatório de uma equipa multidisciplinar especializada, com, pelo menos, um médico e um psicólogo. Ou seja, em Portugal, é precisa uma declaração de um médico para passar uma certidão de óbito, mas é pouco uma equipa multidisciplinar para fazer uma alteração desta natureza.

Vozes do BE: — Muito bem!

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — A Assembleia da República ouviu, durante muitas horas, médicos, especialistas, notários, antropólogos, psicólogos clínicos, associações, os próprios transexuais; ouviu várias equipas jurídicas de alta competência.
A Assembleia deve devolver este veto ao Presidente da República e, utilizando as suas próprias palavras, «segundo a opinião colhida junto de especialistas nesta matéria», este é, basicamente, um veto mal feito; falta-lhe clareza e densidade.

Vozes do BE: — Muito bem!

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — A Assembleia da República deve rejeitar este veto conservador, deve rejeitar este veto mal feito e elaborado no quadro de uma campanha eleitoral.
O Parlamento deve reconfirmar, sem alterar uma vírgula, esta lei, porque, assim, estará a honrar a República.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.

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O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: De facto, não compreendemos os argumentos invocados pelo Sr. Presidente da República para vetar o Decreto da Assembleia da República, aprovado recentemente, que prevê o registo civil das pessoas transexuais.
Não compreendemos estes argumentos do Sr. Presidente da República porque consideramos que, neste caso em concreto, fez-se aquilo que, tantas e tantas vezes, a Assembleia da República não faz: deixou-se ao legislador aquilo que deve caber ao legislador e deixou-se à ciência, aos responsáveis científicos e aos responsáveis médicos e, obviamente, também do ponto de vista psicológico, as decisões que, desse ponto de vista, devem ser assumidas.
Aquilo de que estamos a tratar é de uma situação que tem uma relação directa com questões do foro clínico, questões médicas e psicológicas que a Organização Mundial da Saúde define e caracteriza devidamente e que devem ser remetidas para esse foro quer naquilo que diz respeito à definição de conceitos quer naquilo que diz respeito também à definição daquilo que são os critérios concretos que devem ser definidos para estas situações por aqueles que têm competência para o fazer.
O PCP entende que não deve ser a Assembleia da República a definir os critérios médicos, os critérios clínicos, os critérios psicológicos que devem estar na base da apreciação deste tipo de situações e que devem, sim, ser os médicos, os clínicos e as suas organizações profissionais a fazer essa definição, na medida em que entendam que a regulamentação internacional, particularmente da Organização Mundial da Saúde, não satisfaz essas exigências. Portanto, da parte do PCP, verificamos, com efeito, que este é um veto com fundamento político, que procura, obviamente, trazer para o debate político a posição de um Presidente da República que é também candidato às eleições presidenciais e que, lamentavelmente, desta forma, procura fazer apelo a um eleitorado mais retrógrado e mais conservador, remetendo para aquilo que é um debate eleitoral, no âmbito de uma campanha presidencial, a relação das pessoas consigo mesmas e a relação que o Estado deve ter com as pessoas no sentido da resolução dos problemas que atingem a sua vida em concreto e de aspectos fundamentais como aqueles que têm que ver com uma relação de identidade entre a aparência e a situação em que uma pessoa se encontra e aquilo que é o seu registo civil perante o Estado e os restantes cidadãos.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Catarina Mendonça.

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Para o Partido Socialista, é natural encarar o veto presidencial no quadro constitucional.
Mas, embora respeitemos os poderes constitucionais, não devemos deixar de fazer uma leitura política deste veto, apresentado na semana passada pelo Sr. Presidente da República.
Estamos em campanha eleitoral e o contexto é o de que, evidentemente, o Sr. Presidente da República, com manifesta má vontade em promulgar o casamento entre pessoas do mesmo sexo, entende que, depois das críticas do sector mais conservador da sociedade portuguesa, não podia, agora, promulgar esta lei.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O próprio veto reconhece a necessidade da existência de um regime jurídico que cubra a lacuna legal que existe, hoje, em Portugal, mas é o mesmo que, atrás da desculpa técnico-jurídica, se esconde no preconceito e no conservadorismo sobre esta matéria.

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Muito bem!

A Sr.ª Teresa Morais (PSD): — Não é isso que está em causa!

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — Por isso mesmo, o Partido Socialista quer esclarecer que a mudança de sexo já existe em Portugal. Mas, para que uma pessoa veja reconhecida essa mudança de sexo, é preciso passar anos nos tribunais portugueses e é com isso que o Partido Socialista quer acabar, ou seja, quer simplificar o processo burocrático.

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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Do que estamos a falar é de uma mudança de forma, é de preencher uma lacuna grave, mas de dar dignidade àqueles que mudam de sexo, porque estamos a falar de uma questão de respeito pelos direitos humanos e de dignidade humana.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, não há liberdade sem liberdades e não há liberdade sem respeito estrito pela condição humana e pela sua dignidade nem pelos direitos humanos. Por isso, prolongar este sofrimento é inútil, é absolutamente inútil! Depois de todos os especialistas que foram ouvidos, quer em sede de Governo, para a apresentação da sua proposta de lei, quer depois, na Assembleia da República, no âmbito da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, estão dados os passos essenciais, clínicos e científicos para que as pessoas, em Portugal, possam ver esta sua dignidade e este seu direito reconhecidos.

Protestos da Deputada do PSD Teresa Morais.

Sr.ª Deputada Teresa Morais, em democracia, é salutar a divergência. Uma das essências da democracia é mesmo a divergência de opiniões entre cada um dos partidos políticos.

Protestos da Deputada do PSD Teresa Morais.

O que não pode acontecer é que, em campanhas eleitorais, se troquem convicções ou que as convicções se coloquem em detrimento do respeito pelos direitos humanos. É desta matéria que estamos a falar.

Aplausos do PS.

Protestos da Deputada do PSD Teresa Morais.

Por isso mesmo, não é preciso esconder a realidade como se ela não existisse, dizendo que o problema deste diploma é técnico-jurídico. Evidentemente, tal como o veto presidencial, até a Sr.ª Deputada Teresa Morais teve dificuldade em explicar qual era o erro técnico-jurídico.

A Sr.ª Teresa Morais (PSD): — Nenhuma!

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — Termino, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, dizendo que o Partido Socialista retomará a discussão tão breve quanto possível e deseja que esta Assembleia da República volte a aprovar um diploma que restitui ou que dá dignidade às pessoas que, em Portugal, já hoje mudam de sexo.

Aplausos do PS.

Protestos do CDS-PP e da Deputada do PSD Teresa Morais.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Galriça Neto.

A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Aquando do debate da lei de mudança de sexo, o CDS teve oportunidade de chamar a atenção, penso que de uma forma clara, para três aspectos que consideramos essenciais nesta matéria.
O primeiro foi o reconhecimento de que se trata de uma matéria complexa, que exige que se legisle sobre ela pelas situações de inequívoco sofrimento que lhe estão associadas.
Tivemos também a oportunidade de dizer que respeitamos todos aqueles que venham a ser alvo desta lei e que reconhecemos que, em matéria de direitos humanos e de dignidade, tudo deve se feito para acautelar os seus direitos.

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Em terceiro lugar, falámos da necessidade de construir, pelo respeito e pela dignidade que estas pessoas nos merecem, uma lei rigorosa, clara, que contribuísse para melhorar a situação destas pessoas e não para lhes agravar os problemas.

O Sr. João Serpa Oliva (CDS-PP): — Muito bem!

A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — Nessa medida, o CDS teve a oportunidade de, em devido tempo, alertar para que uma lei que viesse a sair desta Casa não embarcasse em experimentalismos jurídicos, em erros técnico-científicos graves,»

O Sr. João Serpa Oliva (CDS-PP): — Muito bem!

A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — » que fosse consistente e que tivesse em conta, entre outros aspectos, a questão da irreversibilidade da decisão a tomar pelos alvos da lei e que acautelasse aspectos técnico-científicos que são, hoje, consensuais.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!

A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — Portanto, na linha daquilo para que tínhamos alertado e para que, nesta Casa, chamámos a atenção, entendemos que esta lei pode ser melhorada»

O Sr. João Serpa Oliva (CDS-PP): — Muito bem!

A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — » e que este veto representa, sobretudo para nós, uma oportunidade de construir uma lei que, em primeiro lugar, dignifique aqueles que dela venham a ser alvo e que não os menorize sendo uma lei enviesada e mal construída, e que, depois, dignifique a instituição que a produz.
Estamos disponíveis para, em sede própria, melhorar o articulado naquilo que hoje aqui referimos.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira para uma intervenção.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Sr. Presidente da República vetou o diploma que pretendia criar o procedimento de mudança de sexo e de nome próprio no registo civil.
A argumentação invocada na mensagem dirigida à Assembleia da República por parte do Sr. Presidente da República é, na perspectiva de Os Verdes, uma argumentação pobre, muito pobre, que mais parece querer disfarçar ou esconder a forma conservadora como estas matérias são encaradas do que propriamente fundamentar essa decisão.
O Presidente da República entende que seria desejável que esta Assembleia procedesse a um novo debate que permitisse congregar as várias opiniões sobre o assunto. A este propósito, Os Verdes lembram as várias audições que decorreram nesta Assembleia aquando da construção do diploma, para além, naturalmente, dos debates no Plenário que o assunto mereceu. Portanto, Os Verdes entendem que o debate está feito e lamentam a decisão do Presidente da República de vetar um diploma que mais não pretende do que remover complexas burocracias ao processo de reconhecimento de mudança de sexo e de nome próprio, solução que vai, aliás, no sentido da recomendação do Conselho da Europa e que é a solução que vigora já em muitos países.
O processo actualmente em vigor em Portugal — esse, sim, inundado de grandes insuficiências técnicojurídicas e outras — representa ainda um verdadeiro massacre para as pessoas, obrigando-as a percorrer dois longos e penosos caminhos: um processo em tribunal contra o Estado e um processo prévio que passa por vários anos de avaliação médica, por tratamentos destinados a sincronizar as suas características físicas às

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correspondentes ao sexo pretendido e, por fim, por aguardar por um parecer da Ordem dos Médicos cuja emissão pode demorar até três anos. Só depois se pode recorrer à via judicial.
Tudo somado, significa que o reconhecimento do género da pessoa em Portugal pode demorar quase uma década. É, a nosso ver, uma situação insustentável e injustificável, a que urge pôr termo.
Em jeito de conclusão, Os Verdes lamentam o veto do Presidente da República, não vislumbram quaisquer insuficiências técnico-jurídicas, consideram que o debate está feito e manifestam a sua completa disponibilidade para confirmar o diploma com a mesma redacção e nos mesmos termos com que foi objecto de aprovação nesta Assembleia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Muito bem!

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, depois de todos os grupos parlamentares se terem pronunciado sobre a mensagem do Presidente da República respeitante ao Decreto da Assembleia da República n.º 68/XI, vamos passar ao próximo ponto da nossa ordem do dia, que consiste em declarações políticas.
Em primeiro lugar, para o efeito, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Rodrigues.

O Sr. José Manuel Rodrigues (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A liberdade de ensino está hoje em causa em Portugal. O que o Governo do PS quer fazer com o financiamento dos contratos de associação das escolas particulares e cooperativas fere gravemente o princípio constitucional da garantia de apreender e ensinar e vai contra a própria Lei de Bases do Sistema Educativo, que integrou estes estabelecimentos na rede pública de ensino.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. José Manuel Rodrigues (CDS-PP): — E assim foi, e bem, durante três décadas, com estas escolas a prestarem, em nome do Estado, um ensino de qualidade em muitas regiões do País.

Aplausos do CDS-PP.

Nem nos tempos da revolução alguém ousou pôr em causa a missão educativa das escolas do ensino particular. Foi preciso chegar aos dias de hoje para que um Governo que proclama a sua paixão pela educação ponha em causa a liberdade de escolha na educação e o ensino de qualidade prestado pelas escolas particulares.

Aplausos do CDS-PP.

Numa primeira fase, o Governo tentou liquidar de uma só vez o ensino particular e cooperativo, quebrando os compromissos assumidos, reduzindo os contratos de associação a um ano e cortando 20% no seu financiamento, o dobro da redução que atingiu o Ministério da Educação. Esqueceu-se o Governo, porém, mas não o CDS, que estavam em risco 93 projectos educativos, o ensino de 57 000 alunos e o emprego estável de 8000 professores e auxiliares.
Estava, e está, em causa um ensino de qualidade, atestado por todos os rankings conhecidos; estava, e está, em causa a educação de milhares de alunos de famílias carenciadas, que recebem apoio social escolar para frequentar estas escolas;»

Aplausos do CDS-PP.

» estava, e estão, em causa os lugares de milhares de professores, que no ensino particular, ao fim de um máximo de 6 anos, estão no quadro, enquanto o Estado tem docentes contratados há mais de 20 anos; estava, e estão, em causa os investimentos que, ao longo dos anos, estas escolas realizaram em

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equipamentos e parques desportivos; estava, e está, em causa o bom uso dos dinheiros públicos para prestar um ensino de qualidade.
Foi preciso que o CDS e associações de escolas, professores, pais e alunos denunciassem esta realidade e a Assembleia da República aprovasse um projecto de lei do CDS para travar esta ofensiva estatizante do Governo no sector da educação. Em último recurso, e por pressão do Sr. Presidente da República, o Governo recuou e alterou o decreto-lei que, objectivamente, liquidava a curto prazo o ensino particular e cooperativo.

Aplausos do CDS-PP.

O Decreto-Lei n.º 138-C/2010, de 28 de Dezembro, já nada tem a ver com o decreto enviado originalmente à Presidência da República e, em grande medida, incorpora as propostas do CDS aprovadas nesta Assembleia, as quais, legitimamente, eram reclamadas pelas famílias, pelas associações e pelos profissionais do sector. Ou seja, no plano legislativo, foi possível impedir a tentativa de liquidar o ensino particular e cooperativo, só que o Governo não digeriu bem a derrota e, persistindo numa teimosia insensata, fez publicar, a 29 de Dezembro, uma portaria onde volta a reduzir de forma injusta o financiamento a estas escolas.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. José Manuel Rodrigues (CDS-PP): — Se, numa primeira fase, o Governo pretendia a morte súbita do ensino particular, agora, numa segunda fase, condena-o a uma morte lenta por via de uma progressiva asfixia financeira.

Aplausos do CDS-PP.

É muito curioso que seja este Governo, campeão das parcerias público-privadas, algumas ruinosas para o País, o mesmo que quer destruir uma parceria entre o Estado e os particulares que deu bons resultados ao longo de 30 anos.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. José Manuel Rodrigues (CDS-PP): — O CDS, com a mesma determinação com que impediu a liquidação imediata do ensino particular e cooperativo, lutará agora não só para que estas escolas não sejam sujeitas ao sufoco financeiro e à instabilidade, como combaterá para que as mesmas sejam reconhecidas e tratadas pelo Governo com equidade e justiça.
As escolas portuguesas do ensino particular e cooperativo não querem um tratamento de favor; desejam apenas e somente que o Governo as apoie nos mesmos termos e montantes com que financia as escolas do Estado.

Aplausos do CDS-PP.

Foi nesse sentido que o CDS já fez aprovar na Comissão de Educação e Ciência um requerimento para chamar a Sr.ª Ministra a prestar esclarecimentos e já apresentou, neste Parlamento, um projecto de resolução para que o Governo altere os montantes do apoio financeiro destinados às escolas particulares, porque, a não ser assim, inevitavelmente, muitos estabelecimentos terão que encerrar, muitos alunos ficarão sem escola em algumas regiões do País e muitos professores e funcionários serão dispensados.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Queremos que o Governo cumpra a lei; queremos que o Governo cumpra a lei que o CDS, a Assembleia e o Presidente da República o obrigaram a fazer. Exigimos a alteração da portaria que teimosamente o Governo persiste em manter.

Aplausos do CDS-PP.

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O CDS nunca desiste das suas batalhas, por mais duras que sejam e por mais tempo que elas durem. E não desistirá desta, em nome do ensino de qualidade das escolas particulares, da estabilidade dos projectos educativos dos alunos, do poder de escolha das famílias, do emprego de professores e funcionários mas, sobretudo, em nome da liberdade de aprender e ensinar, em nome da liberdade da educação em Portugal.

Aplausos do CDS-PP.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Guilherme Silva.

O Sr. Presidente: — Inscreveram-se quatro Srs. Deputados para pedir esclarecimentos.
Em primeiro lugar, tem a palavra a Sr.ª Deputada Rosalina Martins.

A Sr.ª Rosalina Martins (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Manuel Rodrigues, o CDS trouxe, mais uma vez, a esta Câmara a questão do ensino particular e cooperativo, que tem vindo a ser recorrente nestes últimos tempos.
O CDS sabe bem que o PS reconhece o papel desempenhado pelas escolas de ensino particular e cooperativo ao longo destes últimos anos, na medida em que muitas delas contribuíram para suprir carências da rede pública de educação. Porém, o PS, que aposta verdadeiramente na educação, entendeu que era chegado o momento de alterar o enquadramento jurídico destas escolas, tendo procedido à promulgação de um novo normativo, que, como o Sr. Deputado disse, foi negociado com o Sr. Presidente da República, tendo merecido a sua concordância e promulgação.
É certo que, neste momento, o grande ponto de divergência tem a ver com a portaria publicada, relativa aos financiamentos das escolas de ensino particular e cooperativo.
Sr. Deputado, não considera que, num momento em que estão a decorrer negociações do Ministério da Educação com as escolas, e atendendo às especificidades de cada uma, tanto ruído provoca alguma distorção num processo que se pretende que seja resolvido com serenidade e que leve a bom termo esta negociação? O Sr. Deputado disse que o CDS não desiste de nenhuma batalha. O PS também não, muito menos da batalha da educação.
Sr. Deputado, se considera que o PS está a reduzir os financiamentos de uma forma injusta, embora estando a negociar e a tentar encontrar uma solução com as escolas, também não considera injusto, em nome da equidade, que no sistema educativo haja formas de financiamento completamente distintas, com base nos relatórios apresentados tendo em vista os custos finais por aluno e turma em cada ano lectivo?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Rodrigues.

O Sr. José Manuel Rodrigues (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Rosalina Martins, em primeiro lugar, se o Governo reconhecesse o papel das escolas do ensino particular e cooperativo não teria mandado para a Presidência da República um decreto-lei que representava a morte quase imediata dos 93 contratos de associação que existem entre estes estabelecimentos de ensino e o Estado.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Bem lembrado!

O Sr. José Manuel Rodrigues (CDS-PP): — Em segundo lugar, Sr.ª Deputada, foi a pressão da Assembleia da República, por iniciativa do CDS, e do Sr. Presidente da República que levou o Governo a alterar o decreto-lei inicial enviado para a Presidência da República.
Diz a Sr.ª Deputada que o que está em causa agora são os valores do financiamento. É verdade, Sr.ª Deputada, mas eles já estão fixados na tal portaria de 29 de Dezembro. Vem agora a Sr.ª Deputada dizer que estão em negociações. Então, Sr.ª Deputada, faz sentido que, depois da publicação da portaria, agora é que

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se vá negociar com as associações dos estabelecimentos de ensino particular e cooperativo os valores para os contratos de associação? Não deveria ter sido ao contrário?

Vozes do CDS-PP: — Exactamente!

O Sr. José Manuel Rodrigues (CDS-PP): — Sr.ª Deputada, quanto aos custos nos ensinos particular e estatal, a verdade é que os números que se conhecem indicam que ao Estado custa menos ter um aluno no ensino particular ou cooperativo do que numa rede de uma das escolas do Estado. São os números conhecidos.
O CDS-PP quis apurar outros números ou confirmar estes números da OCDE, mas a verdade é que o Partido Socialista se opôs, na Comissão de Educação, a que fosse criado um grupo de trabalho para se apurar definitivamente quanto é que ao Estado custa um aluno no ensino particular e quanto é que custa um aluno na rede pública.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. José Manuel Rodrigues (CDS-PP): — O PS é que não quis, Sr. Deputado.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Rita Rato.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, a declaração política que o CDS traz sobre a situação no ensino particular e cooperativo, nomeadamente nas 93 escolas com contrato de associação, preocupa muitos professores destas escolas, muitos pais, muitos alunos, muitos funcionários, que viram o Governo alterar as regras a meio do jogo, quando o início do ano lectivo começou em Setembro e o Governo decidiu alterar as regras de financiamento em Novembro, não criando qualquer oportunidade às escolas para fazerem face às novas condições de financiamento, a compromissos que tinham assumido já no plano do reforço das condições materiais. O Governo não agiu de boa fé — entende o PCP — quando decidiu deliberadamente alterar as regras a meio do jogo para estas escolas.
A Assembleia da República e os portugueses conhecem a posição do PCP sobre o imperativo da escola pública — aliás, a nossa Constituição consagra-o.
A resposta, por parte da Ministra da Educação, é a de que o Governo não vai construir mais nenhuma escola nova; pelo contrário, o movimento e a dinâmica deste Ministério da Educação é mesmo encerrar e concentrar escolas.
O concelho de Arruda dos Vinhos, que não tem nem sequer uma escola pública, não vai passar a ter no próximo ano lectivo nem nos próximos meses, porque este Governo já disse que não ia garantir a oferta da rede pública naquele concelho.
Pergunta o PCP que culpa têm os jovens daquele concelho pelo facto de o Governo não querer investir ali numa escola pública, podendo os jovens apenas contar com este contrato de associação para garantir o acesso à escola pública.
É por isso que entendemos que tinha sido fundamental que este processo tivesse acontecido de uma forma gradual para o beneficiário, em que cada caso pudesse ter tido uma deliberação, uma negociação por parte do Ministério da Educação, também no sentido de estas escolas terem como objectivo a situação e a estabilidade dos seus projectos educativos, assim como obviar à situação dos professores, dos funcionários e dos alunos.
Se me permite, gostaria de lhe colocar a seguinte questão, Sr. Deputado José Manuel Rodrigues: ironicamente, no dia em que traz esta declaração política à Assembleia da República, foi discutido o veto do Sr. Presidente da República sobre o registo civil de pessoas transexuais.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Sr.ª Deputada, tem de terminar.

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A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Termino já, Sr. Presidente.
Pergunto, muito concretamente, se o CDS não entende que o candidato que apoia teria tido uma oportunidade importante de, em vez de vetar esse Decreto-Lei, travar toda esta instabilidade e dar um contributo decisivo para que as escolas se envolvessem numa resposta concreta, podendo o Governo esclarecer, de uma vez por todas, o que quer fazer com o reordenamento e com a oferta pública da rede escolar.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Rodrigues.

O Sr. José Manuel Rodrigues (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Rita Rato, a verdade é que todos, à excepção do Governo, cumprimos a nossa missão em defesa da liberdade do ensino em Portugal e da existência de escolas de ensino particular e cooperativo inseridas na rede pública e com contratos de associação com o Ministério da Educação.
A Assembleia da República aprovou, por proposta do CDS, um projecto de lei que alterava claramente as condições que o Governo inseria no decreto-lei que enviou para o Sr. Presidente da República promulgar e que iam no sentido de inverter essa tendência de financiar cada vez menos o ensino particular, o que iria provocar o encerramento de escolas.
O Sr. Presidente da República também cumpriu a sua missão, porque chamou o Governo e tentou que este negociasse um novo decreto-lei, com base naquilo que era pretendido legitimamente pelas associações do sector.
A verdade, Sr.ª Deputada, é que o decreto-lei que foi publicado em 28 de Dezembro incorpora a vontade desta Assembleia da República de que os contratos fossem plurianuais, de que os projectos educativos tivessem estabilidade e de que, naturalmente, houvesse um financiamento do Estado que fosse estável, ao longo de alguns anos, para essas mesmas escolas.
O que aconteceu foi que a posteriori, um dia depois, o Governo fez publicar uma portaria reduzindo drasticamente os montantes das verbas que são atribuídas a essas escolas para prestar o ensino em nome do Estado.
Portanto, o Sr. Presidente da República cumpriu o seu papel, a Assembleia da República cumpriu o seu papel. Quem nos andou a enganar — e espero que recue na portaria — foi o Governo do Partido Socialista.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. José Manuel Rodrigues (CDS-PP): — O Governo publicou uma portaria que conduzirá ao encerramento de muitas escolas e ao despedimento de profissionais do sector e de professores, caso essa portaria não seja revogada ou alterada.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Duarte.

O Sr. Pedro Duarte (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Deputado José Manuel Rodrigues, em primeiro lugar, gostaria de referir que para o PSD não é aceitável que haja qualquer regime de excepção, no que diz respeito a cortes orçamentais, para o ensino particular e cooperativo. O País está a viver uma fase difícil e todos temos de ser solidários e o ensino particular e cooperativo tem de colaborar nesse esforço colectivo de tentarmos melhorar as contas públicas no nosso País. Não admitimos excepções, seja para quem for.
Em segundo lugar, gostaria de deixar claro que, neste caso, não é disso que se trata. O que está em causa é uma vontade, já não disfarçada, por parte do Governo, não de impor cortes de forma equitativa ao ensino

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particular e cooperativo, como impõe a outros sectores da nossa vida social e cívica, ou como impõe, por exemplo, ao ensino público, mas de querer asfixiar, de querer, no fundo, por via administrativa, extinguir este modelo de ensino no nosso País, que confere, de facto, outra liberdade e outra aragem ao nosso sistema de ensino.
Para isso, é bom recordar que este Governo está a usar vários meios.
O primeiro deles é, pasme-se, começar por desrespeitar o próprio decreto-lei que foi publicado há meia dúzia de dias e aprovado pelo próprio Governo. Todos sabemos que o Governo aprovou esse decreto-lei por influência decisiva do Sr. Presidente da República. Fê-lo, provavelmente, a contragosto. Talvez por isso, passados meia dúzia de dias, publica uma portaria que contraria o que está estabelecido no próprio decretolei, ao não prever um mecanismo de financiamento equitativo entre o ensino público e o ensino particular e cooperativo.
Em terceiro lugar, é importante referir que o Governo está a ter esta atitude traindo aquilo que é o próprio pensamento genuíno, fundador do Partido Socialista, traindo o pensamento de dirigentes como Mário Soares, António Guterres, Guilherme d’Oliveira Martins, Marçal Grilo, Augusto Santos Silva e até, imagine-se, Maria de Lurdes Rodrigues.

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Muito bem!

O Sr. Pedro Duarte (PSD): — Porque o Governo anterior, «versão Sócrates 1», se quisermos, do primeiro mandato do Eng.º Sócrates, acabou a legislatura no final do ano de 2009 publicando um despacho sobre esta matéria, a dos apoios a conceder às famílias no âmbito dos contratos de associação, contratos simples e outros da mesma natureza, subscrito pelo Secretário de Estado da Educação — que hoje se mantém neste Governo na qualidade de Secretário de Estado do Emprego e da Formação Profissional — , Valter Lemos, despacho, esse, que começa por dizer o seguinte, e leio: «Concretizando a determinação de que ao Estado compete apoiar as famílias (») relativamente á educação dos filhos, promovendo progressivamente»« — repito, «promovendo progressivamente» — «» o acesso ás escolas particulares em condições de igualdade com as põblicas, o Ministçrio da Educação»«»

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr. Deputado.

O Sr. Pedro Duarte (PSD): — » «» continua a apoiar as famílias que optam por estabelecimentos de ensino particular e cooperativo.» Como tal, para concluir, Sr. Presidente, pergunto ao Sr. Deputado o que lhe parece que motiva esta mudança estrutural no Partido Socialista, no fundo, este radicalismo, baseado em preconceitos que ultrapassam até, como já se viu aqui hoje, partidos que têm uma visão mais estatizante, diria pró-estalinista,»

Vozes do PCP: — Eh!

O Sr. Pedro Duarte (PSD): — » em coerência com aquilo que sempre defenderam, como ç, por exemplo, o Partido Comunista. A que se deve esse retrocesso ideológico, que não seja a um mero oportunismo por parte do Partido Socialista?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Rodrigues.

O Sr. José Manuel Rodrigues (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Pedro Duarte, também consideramos que no momento que o País atravessa, de difícil situação financeira, somos todos chamados a colaborar e que, neste sector da educação, também, a haver cortes, eles têm que ser equitativos e justos. Porém, não podemos admitir que o Orçamento do Estado tenha um corte de 11% no Ministério da

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Educação, isto é, nas verbas destinadas ao ensino prestado pelo Estado e de cerca de 22% nas verbas destinadas às escolas do ensino particular e cooperativo. É isto que está claramente errado! Sr. Deputado, vou ler o artigo do Decreto-Lei que foi publicado pelo Sr. Presidente da República — o Decreto-Lei n.º 138-C/2010, que, no seu artigo 15.º, n.º 4, alínea a), diz que a portaria a publicar deve «Fixar o valor do apoio financeiro, com base no princípio do financiamento anual por turma, tendo em consideração os custos das turmas das escolas públicas de nível e grau equivalentes.
Ora, um dia depois, o Governo violou o seu próprio Decreto-Lei, porque fez publicar uma portaria com um montante de apoio financeiro não do mesmo grau de ensino das escolas públicas mas do ensino profissional, quando sabemos que os custos das escolas de ensino particular e cooperativo ou do ensino secundário público nada têm a ver com o ensino profissional.
Quanto à sua questão, Sr. Deputado, só por preconceito ideológico ou por algum problema existente no Ministério da Educação é que se pode compreender esta ofensiva desse Ministério contra o ensino particular e cooperativo em Portugal, quando se sabe que este ensino é de qualidade. Os rankings assim o dizem — emprega 8000 pessoas, dá aulas a 57 000 alunos e chega a muitas regiões do País, substituindo-se ao Estado.
Quem quer acabar com este ensino que, ao longo de 30 anos, serviu a educação em Portugal só pode ter um preconceito ideológico, que já não é compreensível nos tempos de hoje.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago.

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado José Manuel Rodrigues, devo dizer-lhe que, de toda a sua intervenção, há um aspecto que creio ser um diagnóstico partilhado por muitos sectores da sociedade portuguesa.
Em 2011, a qualidade de ensino em Portugal, a qualidade da nossa educação, está em risco. O que eu não consigo entender, Sr. Deputado, é como é que ao longo de vários minutos de intervenção do CDS, perante a quantidade de medidas que temos no horizonte, que foram apresentadas pelo Ministério da Educação, o Sr. Deputado e o CDS tenham escolhido falar dos problemas de 93 colégios que têm contratos de associação e não falar dos problemas de 1300 estabelecimentos escolares que existem em Portugal.
Sr. Deputado, estou a falar-lhe da Resolução do Conselho de Ministros n.º 101-A/2010, que enumera um conjunto de cortes e medidas restritivas que vão ter impactos na degradação da qualidade de ensino; estou a falar-lhe dos projectos de revisão curricular que foram criticados como incompreensíveis, como medidas avulsas, por entidades especializadas, como o Conselho Nacional de Educação, e que foram classificadas por esse mesmo Conselho como um conjunto de medidas economicistas que vão ter impactos na qualidade educativa; estou a falar-lhe do projecto de despacho de organização do ano lectivo que aí vem — 2011-2012 — , que prevê exactamente a redução de professores nas escolas, a redução da capacidade de escolas trabalharem com os seus alunos.
Entendamo-nos bem! Em Setembro de 2011, o risco que existe é o do despedimento massivo de professores das escolas. É difícil fazer as contas. Sabemos que são 7000 já em EVT (Educação Visual e Tecnológica) que são «corridos» por esta reforma curricular, para além de muitos outros com redução de crédito de horas. Portanto, são entre 15 000 e 20 000 horários que podem, pura e simplesmente, desaparecer.
Quero lembrar-lhe, Sr. Deputado, as suas responsabilidades. O CDS juntou aqui o seu voto ao voto contra do PSD e do PS, inviabilizando, em sede de Orçamento do Estado, um processo de contratação dos 15 000 professores contratados que, hoje, asseguram o quotidiano das nossas escolas.

Vozes do BE: — Muito bem!

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Portanto, Sr. Deputado, temos de discutir isto com toda a dificuldade e complexidade que vai existir, no próximo ano, nas escolas portuguesas.

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Mas há apenas uma justificação que consigo encontrar para o discurso do CDS: é que temos uma campanha eleitoral no terreno e temos um candidato,»

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Olha quem fala!

A Sr.ª Ana Drago (BE): — » que achou que esta era a campanha certa, um candidato que falou de previsibilidade na relação com os parceiros — e tinha razão. Mas ele não vetou o Orçamento do Estado, que faz os cortes salariais, os cortes na acção social escolar, o corte nos apoios sociais às famílias, e que permitiu todas as medidas que vão tornar o ano lectivo que aí vem muitíssimo difícil.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Termino já, Sr. Presidente.
Portanto, Sr. Deputado, só me resta uma conclusão: falar apenas de 93 escolas é alinhar o discurso do CDS com a campanha eleitoral que está em curso. Mas se o CDS acha que aquilo que está a ser feito não resolve o problema, por que é que o CDS retirou o seu próprio projecto, que, como sabe, tinha aspectos muito negativos que nada têm a ver com o despacho promulgado pelo Sr. Presidente da República? Era isso que o senhor tinha de explicar-nos.
O CDS tinha uma iniciativa, que esta Assembleia pensou discutir, mas houve um momento em que entendeu que ela já não fazia sentido. E cito o Sr. Deputado, que, ontem, referiu na Comissão de Educação que este projecto já não deveria seguir avante.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Rodrigues.

O Sr. José Manuel Rodrigues (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Ana Drago, começo por lhe dizer que, para quem não fez qualquer declaração política sobre este tema da educação, estar a acusar o CDS de trazer a debate esta questão dos contratos de associação do ensino particular e cooperativo não lhe fica bem.

Aplausos do CDS-PP.

A Sr.ª Deputada acusa-nos de estarmos preocupados com esta questão dos contratos de associação do ensino particular e cooperativo e não com outras questões, que serão brevemente discutidas, designadamente a da reorganização curricular, a da organização do próximo ano lectivo ou a da possível dispensa de professores.
Sr.ª Deputada, naturalmente, também estamos preocupados com estas questões. A diferença é esta: o Bloco de Esquerda preocupa-se apenas com os alunos, os professores e os funcionários do Estado; o CDS preocupa-se com esses mas também com os 8000 professores e funcionários do ensino particular e cooperativo e com os 57 000 alunos destes estabelecimentos de ensino.

Aplausos do CDS-PP.

Protestos do BE.

Pergunta a Sr.ª Deputada por que razão retirámos o nosso projecto de lei. Fizemo-lo, Sr.ª Deputada, porque o Decreto-Lei que o Sr. Presidente da República promulgou incorpora as propostas que o CDS-PP fazia nesse projecto de lei, que eram as seguintes: dar estabilidade a estas escolas, através de contratos plurianuais; e financiar estas escolas tal como as escolas do ensino estatal e não apenas as escolas do ensino

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profissional. Ora, estes aspectos, que constavam do nosso projecto de lei, o qual alterava o decreto-lei inicial, do Governo, constam do Decreto-Lei que o Sr. Presidente da República resolveu promulgar.
Portanto, Sr.ª Deputada, não vale a pena estar a empurrar responsabilidades para o Sr. Presidente da República. As responsabilidades por estar em risco o ensino particular e cooperativo são do Governo do Partido Socialista. Não vale a pena desviar as atenções do candidato comum do Partido Socialista e do Bloco de Esquerda.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Cristóvão Crespo.

O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O que vos trago hoje aqui, a este Plenário da Assembleia da República, é uma convocatória! Pois é, Srs. Deputados, trago-vos uma convocatória para a realidade e, com destinatários, dirigida particularmente ao Governo e à bancada que o apoia.
É urgente perceber a realidade que existe e não o que o Governo tem fantasiado sobre ela.
Os portugueses exigem e merecem respeito. Não pode continuar a ser destruído o nosso futuro colectivo.
E o PSD não pactua com as leituras facilitistas e ligeiras da situação que vivemos, como, aliás, temos vindo a denunciar ao longo do tempo.
É urgente que o País não continue a assistir aos sucessivos anúncios de «boas notícias» do Sr. PrimeiroMinistro e sinta que perde cada vez mais capacidade de dirigir os seus destinos.
Cada deslocação que o Sr. Primeiro-Ministro ou o Sr. Ministro das Finanças efectua é destinada a hipotecar mais uma parcela da soberania nacional, tal foi a situação a que nos conduziram.
Qual «rei Midas» dos novos tempos, o Partido Socialista transforma não em ouro mas em desgraça quase tudo em que toca. Por isso, não nos admiramos que qualquer português sinta um arrepio cada vez que houve falar em «boas notícias», tal o desvirtuamento que conseguiu introduzir na expressão.
Mas, em passado relativamente recente, já os governos do Partido Socialista tinham demonstrado esta capacidade de transformar ideias e conceitos valorizados por toda a comunidade em expressões que marcaram, de forma extremamente negativa, o modo de governar.
Basta lembrar o famoso, e depois tão maltratado, diálogo que, na expressão dos vós próprios, nos levou à beira do «pântano», ou as necessárias e importantes parcerias público-privadas que os senhores transformaram na nossa ruína e no drama do nosso endividamento externo, ou o famoso Simplex, que muitas vezes complica onde deve facilitar e facilita onde é exigida ponderação, mas que nunca chega a tempo e horas aos interessados.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — Por tudo isto, Sr.as e Srs. Deputados, é tempo de perceber até onde a ausência de políticas adequadas dos governos do Partido Socialista trouxe o País.
Não podemos continuar a olhar para todas as tabelas e orgulharmo-nos de não sermos os últimos; não se pode ficar satisfeito, porque ainda há alguém pior do que nós. A nossa obrigação é olhar para os melhores e tentar alcançá-los.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — É urgente que as «boas notícias» sejam mesmo boas notícias e não exercícios que não convencem ninguém.

Vozes do PSD: — Muito bem!

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O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — Não pode continuar a acontecer o quadro que se nos depara hoje. Não podemos continuar a assistir ao implementar de medidas cegas e devastadoras para a coesão social, económica e territorial do País.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — Quando percorremos o País, de norte a sul, ou de este a oeste, verificamos as marcas profundas do desemprego, da insolvência empresarial e do crescimento das assimetrias regionais. Esta é a vossa marca! A suprema ironia acontece agora, quando se verifica — e como nós tínhamos alertado — que as exportações se mostram o vector mais dinâmico da nossa economia.
Aos senhores, defensores dos grandes projectos infra-estruturais de cariz público, entra-vos pelos olhos a constatação que, afinal, o PSD é que tinha razão.
Agora que o Estado desinvestiu em toda a linha, verificamos que os investidores privados mostram a fibra de que são feitos.

Aplausos do PSD.

Sr.as e Srs. Deputados do Partido Socialista: As exportações, que agora parcialmente vos redimem, são quem vos acusa. O êxito do sector exportador é a prova do vosso falhanço, a prova de que andaram distraídos demasiado tempo.
Mas é tudo assim tão mau? Não, Sr.as e Srs. Deputados, os portugueses são do melhor que há! Ainda nesta semana, no Alto Alentejo, no distrito de Portalegre, tivemos oportunidade de verificar que, apesar das maiores taxas de desemprego do País, das maiores taxas de insolvência do País, do maior recuo demográfico do País e do maior índice de envelhecimento do País, existe a força e determinação das suas gentes.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — Por tudo isso, não vamos soçobrar! É que, embora com muitas dúvidas, incertezas, receios e dificuldades, vamos continuar a trabalhar — seja os autarcas, que assumem a responsabilidade de principais impulsionadores da sustentabilidade local, seja os agricultores, que investem contra tornados climáticos e «tornados» ministeriais e burocracias, seja os empresários, que se modernizam e dão melhores perspectivas para o futuro.
O autarca de Marvão não pode continuar a ver equipamentos estruturais para o concelho, como poderão ser o golfe de Marvão, na área do turismo, ou o aproveitamento do perímetro de rega da barragem da Apartadura, presos à inacção do Governo.
O jovem de Castelo de Vide com exploração agrícola multifuncional, onde se incluem as estufas ou a criação de pecuária em regime extensivo, não pode estar à mercê de políticas na área de agricultura que desconheçam as respectivas realidades.
A exploração leiteira modelar que o jovem de Carreiras, em Portalegre, conseguir erguer não pode ser vítima de orientações e sinais errados que o Governo possa vir a definir no sector da agricultura e da pecuária.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — Assim o Governo não desperdice as potencialidades por aproveitar que estas regiões deprimidas também têm para oferecer à economia do País.
Por tudo isto, Sr.as e Srs. Deputados, como só podemos agir sobre a realidade e não sobre a ficção, aqui vos deixo esta convocatória para o Governo e para o Partido Socialista.

Aplausos do PSD.

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O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Inscreveram-se dois Srs. Deputados para pedir esclarecimentos.
Depois, o Sr. Deputado informará a Mesa se quer responder em conjunto ou individualmente.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Miranda Calha.

O Sr. Miranda Calha (PS): — Sr. Presidente, ouvi com todo o interesse a intervenção do Sr. Deputado Cristóvão Crespo, eleito, aliás, pelo mesmo círculo eleitoral que eu, e quero fazer uma ou outra consideração sobre aquele retrato que o Sr. Deputado traçou do País, que, evidentemente, não é o nosso, pois o nosso é bastante diferente.
O Sr. Deputado referiu-se a um conjunto de acções que estão a ser levadas a cabo no sentido de desenvolver o País, de enfrentarmos a crise e de contribuirmos para ultrapassar estes momentos mais difíceis, para que possamos à altura daquilo que são os interesses nacionais e prosseguir como um País desenvolvido e com progresso.
Quanto à sua intervenção, o Sr. Deputado limitou-se a apresentar alguns aspectos negativos, mas não apontou qualquer contributo do seu partido para que houvesse uma evolução diferente.
Como sabe, estamos a viver um momento grave, em termos nacionais, com a questão da intervenção ou não do Fundo Monetário Internacional (FMI), em Portugal. Ora, o que, ainda recentemente, o líder do seu partido veio dizer ao País foi que havia necessidade de fazer uma mudança de governo e, porventura, eleições, caso o FMI tivesse de intervir em Portugal.
O que é que isto quer dizer? É isto um contributo para a estabilidade e para a serenidade que era fundamental existirem neste momento importante da vida do País? Não, isto é precisamente uma ideia a contrario daquilo que é a expressão da confiança que deve ser transmitida para o exterior.
Portanto, Sr. Deputado, a sua intervenção é uma convocatória para nada. Ou, melhor, talvez seja uma convocatória para o PSD dizer ao País de que modo está interessado em contribuir para que possamos sair desta situação de crise e encarar o futuro com uma outra perspectiva, uma perspectiva mais positiva.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Cristóvão Crespo.

O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Miranda Calha, o senhor invoca a serenidade. Sr. Deputado, se alguém aqui pode invocar a serenidade é exactamente a bancada do PSD! De facto, nós é que tivemos a serenidade suficiente para arrastar todo um processo orçamental que conduziu a que, neste momento, o País pudesse ter um Orçamento do Estado. Portanto, não aceito como legítima essa imputação que o Sr. Deputado nos faz.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — O Sr. Deputado disse ainda que só referi aspectos negativos. Mas, Sr. Deputado, aspectos negativos nem os enunciei todos, porque ainda temos mais. Temos, por exemplo, o despacho do Sr. Secretário de Estado da Saúde, que, tendo em conta as dificuldades por que o nosso distrito está a passar, o Sr. Deputado sabe os condicionamentos que, em termos de transporte de doentes, vai provocar.
Por isso, ainda fui benévolo na análise que fiz, não tendo trazido à colação, por exemplo, esse despacho que o Sr. Deputado sabe quão grave é para as gentes do nosso distrito. Portanto, quanto à posição do Governo relativamente aos portalegrenses e aos habitantes do distrito, penso que, com esta acção do Governo, estamos, de facto, numa situação difícil.
Por outro lado, quando o Sr. Deputado invoca o futuro, devo dizer que é exactamente pelo futuro que o PSD está a lutar. De facto, toda a nossa estratégia tem sido no sentido de proteger o futuro tanto das nossas gentes como do País.
Portanto, para nós, esta questão da serenidade foi fundamental, nunca a descurámos.
Sr. Deputado, quando há pouco falávamos das «boas notícias», era exactamente a isso que queria referirme. Quando todos os indicadores que o Governo nos apresenta são gravosos, mesmo assim conseguimos

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«boas notícias». Não percebo como é que o Sr. Deputado subscreve esse tipo de discurso quando a despesa aumenta, quando a receita aumenta à custa dos impostos dos portugueses e quando conseguimos conter o défice fruto das medidas e de receitas extraordinárias.
Penso que não podemos viver neste caminho e neste tempo de ilusão!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Rebelo.

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Cristóvão Crespo, agradeço a sua intervenção.
Muitas vezes, falamos de assuntos muito importantes focados numa dinâmica nacional e é sempre importante quando nas intervenções se fala também da dinâmica de distritos e de regiões.
O Sr. Deputado falou de uma região que tem sido altamente afectada pelas péssimas políticas do Governo, que é a região do Alentejo, no caso concreto, no distrito de Portalegre.
O Sr. Deputado falou de vários assuntos e eu gostaria de referir dois: um, tem a ver com a GNR, com a segurança, e outro, tem a ver com a agricultura.
Dou-lhe um exemplo: a Escola Prática da GNR, localizada no concelho de Portalegre, está ameaçada de encerramento há, pelo menos, dois anos e meio. O CDS, através do Sr. Deputado Nuno Magalhães, já questionou, várias vezes, o Governo sobre esta questão. A resposta que obtivemos é fantástica, é mesmo o PS e o Governo PS no seu pior. Respondeu o Sr. Ministro, em 2009, que era falso, que não seria encerrada e, cito, «Estão no presente momento em plena actividade grupos de trabalho envolvendo o Gabinete de Sua Excelência o Secretário de Estado da Administrado Interna, a GNR, a Direcção-Geral de Infra-estruturas e Equipamentos, as empresas contratadas pelo Ministério da Administração Interna neste projecto, com a finalidade de definir o programa base do futuro centro de formação de Portalegre e a preparação do concurso para a constituição de uma parceria público-privada.» E acrescentou que o Governo estimava iniciar o procedimento adjudicatório em 2008 e que tudo estaria finalizado o mais tardar até finais de 2011. Ora, estamos no início de 2011 e nada disto aconteceu. Está aqui a prova do interesse que o Governo tem pelo distrito de Portalegre!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Bem lembrado!

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): — Já nem vamos falar do centro de reeducação de Vila Fernando, em Elvas, que foi encerrado porque o Governo se desinteressou, ou da Maternidade Mariano Martins, também em Elvas, de que o Governo também se desinteressou e fechou, ou mesmo da ligação à A23 e à A6. E há muitos casos destes» Na agricultura, o desinteresse é absolutamente lamentável, Sr. Deputado. Portalegre, como sabemos — e o Sr. Deputado sabe isto melhor porque é do distrito — , é um distrito com pouquíssima indústria e iminentemente agrícola. Segundo os últimos dados do PRODER em execução para a região do Alentejo, que também abrange Portalegre, somente 11% dos projectos foram pagos, até agora.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Uma vergonha!

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): — Já conhecemos a desgraça da política do Ministro Jaime Silva para todo o País, especificamente para o Alentejo.
Gostaria que o Sr. Deputado comentasse esta situação verdadeiramente lamentável que os agricultores de Portalegre estão a viver, às mãos do desgoverno socialista.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Cristóvão Crespo.

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O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Rebelo, agradeço as questões que colocou e que fazem todo o sentido.
Também aqui pecou talvez por omissão, tão vastos são os incumprimentos» Em relação ao centro de formação da GNR, também ele é um episódio. Desde há cinco anos que, sempre e reiteradamente, cada vez que um membro do Governo da área da Administração Interna se desloca a Portalegre fica a promessa de adiar mais um ou mais dois meses a construção do centro de formação.
Inclusivamente, na véspera das últimas eleições, em 2009, o Sr. Ministro teve a «lata» (desculpem-me a expressão) de ir apresentar a maqueta da construção. Aquilo que acontece é um incumprimento sucessivo e reiterado do que é prometido às populações.
De facto, esta situação tem acontecido sucessivamente e, depois, aquele que era inicialmente um projecto no âmbito das parcerias público-privadas, portanto, a promessa da parceria público-privada, deixa de o ser.
Na discussão do Orçamento do Estado do ano passado, confrontado com a inexistência, em sede de Orçamento do Estado, de qualquer referência à escola de formação da GNR, o Sr. Ministro afirmou que essa obra tinha deixado de ser uma parceria público-privada e tinha passado para o âmbito da PARPÚBLICA. O que acontece é que o tempo vai passando e continuamos sempre na mesma situação.
A questão do centro de reeducação de Vila Fernando é paradigmática da forma como o Partido Socialista e o Governo tratam o distrito de Portalegre. Como contrapartida do desinvestimento no centro de reabilitação de Vila Fernando, foi prometida a construção de um estabelecimento prisional, que tem tido dotação orçamental, umas vezes muito, outras vezes pouco. O facto é que o centro de Vila Fernando foi desactivado imediatamente e o único aspecto relativo ao estabelecimento prisional de Elvas, pura e simplesmente, consta do Orçamento do Estado em PIDDAC, mas, até ao momento, não foi gasto 1 cêntimo.

O Sr. Paulo Batista Santos (PSD): — É uma vergonha!

O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — Isto é uma vergonha, de facto.
O PRODER é a continuação da situação calamitosa que existe em todas as áreas.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr. Deputado.

O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — Penso que é insustentável a forma como o Governo vem tratando sucessivamente estas promessas, porque esta forma de estar na política descredibiliza-a. É uma forma de estar que promete em campanha eleitoral e que, passada a campanha eleitoral, pura e simplesmente, as obras não se concretizam e passam ao esquecimento.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Pela mão do Governo e dos partidos que defendem e sustentam as mesmas políticas de direita, o negócio e o lucro vão tomando conta do País e da vida nacional como critérios absolutos de decisão política.
Todos os aspectos da nossa vida colectiva são, em primeiro lugar, reduzidos ao mínimo denominador comum do cifrão para que se possa avaliar a sua importância à luz do critério e da oportunidade de negócio.
Numa segunda fase, dividem-se responsabilidades. Aos mercados e aos negócios caberá tudo o que puder ser explorado economicamente e der lucro, cabendo ao Estado apenas a responsabilidade de organizar o País de forma a tornar essa exploração comercial tão vasta e lucrativa quanto possível.
Tudo bem embrulhado num discurso modernaço em que conceitos como «políticas públicas», «racionalização» e «sustentabilidade» definem o âmbito marginal das responsabilidades do Estado, deixando campo aberto aos negócios privados que, com ou sem parcerias público-privadas, vão escancarando as «janelas de oportunidade» em incontáveis clusters económicos.

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Como um «toque de Midas», esta lógica neoliberal de mercantilização transforma em negócio e em lucro o que, antes, eram direitos dos cidadãos ou aspectos fundamentais de uma concepção pluridimensional da democracia.
É assim que a importância da cultura na organização da sociedade vai passando a ser avaliada em função do seu contributo para o PIB.
A preservação e valorização do património cultural, material e imaterial, passou a estar dependente da realização de empreitadas públicas ou a ser matéria de negócios privados no âmbito do chamado «turismo cultural».
A recuperação ou preservação do património edificado depende dos tostões recolhidos com o cheque-obra nas empreitadas públicas ou do interesse de algum grupo hoteleiro em instalar um hotel de charme num convento, palácio ou castelo, deixado pelo Governo ao abandono.
A política museológica e as opções que, a este nível, são tomadas passaram a ser matéria da competência da Secretaria de Estado do Turismo ou do Ministério da Economia, que impõem decisões de construção de museus e aumentos de preços nos bilhetes.
A promoção do livro e da leitura é apenas a afirmação retórica que procura esconder a desvalorização da literatura nos programas curriculares e a sujeição à lógica do negócio imposta pelos grupos editoriais num mercado livreiro cada vez mais concentrado.
Três teatros nacionais, uma orquestra e um coro de um teatro nacional e também a única companhia nacional de bailado clássico passaram a ser meros departamentos de uma grande empresa constituída pelo Governo para disfarçar o subfinanciamento imposto pelo Governo, aquilo que, nas palavras do Director da Companhia de Teatro de Almada, Joaquim Benite, deve ser considerado como uma censura financeira à liberdade de criação.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr.as e Srs. Deputados, a desresponsabilização do Estado atinge, com este Governo, limites que para muitos eram inimagináveis.
A meio de 2009, num momento de campanha eleitoral e com um tom verdadeiramente compungido, o Primeiro-Ministro, José Sócrates, afirmava, numa entrevista televisiva, que apenas carregava consigo o arrependimento de não ter investido mais na cultura. Seis meses depois, apresentava a esta Assembleia da República o Orçamento de Estado para 2010 que viria a ser o Orçamento de Estado com menor execução orçamental na área da cultura! Já depois disso apresentou-nos um Orçamento de Estado para 2011, que é o segundo mais baixo de sempre desde que há Ministério da Cultura e que, certamente, ultrapassará o de 2010 como o pior da história em termos de execução.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É um escândalo!

O Sr. João Oliveira (PCP): — No apoio às artes, a situação atinge agora contornos verdadeiramente dramáticos.
O Governo não só não cumpre a obrigação constitucional prevista no artigo 73.º da Constituição da República Portuguesa de promover «a democratização da cultura, incentivando e assegurando o acesso de todos os cidadãos à fruição e criação cultural», como está, de facto, a pôr em causa a liberdade de criação artística.
O Governo põe em causa a liberdade de criação artística quando estrangula financeiramente as estruturas de criação artística sob sua responsabilidade directa e quando adopta a mesma prática relativamente às estruturas apoiadas pelo Estado.
Utilizando uma táctica inaceitável de chantagem, a Ministra da Cultura impôs unilateralmente cortes de 23% em contratos já assinados e em cumprimento, com estruturas com apoios quadrienais, afirmando que, sem estes cortes, as restantes estruturas não poderão ser apoiadas.
Ontem, com a divulgação das listas provisórias de candidaturas admitidas e excluídas para apoios anuais e bienais, ficámos a saber que, mesmo assim, há menos estruturas apoiadas e que os apoios serão também reduzidos nos seus montantes.

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Os destinatários dos acordos tripartidos deviam ter ficado a saber, até ao final de Dezembro de 2010, com que financiamento podiam contar para 2011. Mas, até agora, nem sequer foram contactados pelo Ministério da Cultura.
São estas as opções do Governo, que põem em causa a actividade regular das estruturas de criação artística, que comprometem o seu futuro e o futuro de muitos dos seus trabalhadores, mas que põem também em causa a liberdade de criação artística.
Artistas, técnicos e criadores serão empurrados para o desemprego sem terem sequer acesso à protecção social garantida à generalidade dos trabalhadores porque neste sector continua a ser regra a contratação precária com a utilização de recibos verdes.
Há projectos que não chegarão a ver a luz dos palcos, outros serão interrompidos, adiados ou descontinuados, não porque as opções artísticas dos seus criadores se tenham alterado mas, sim, porque o Governo a isso obriga.
Na última audição na Assembleia da República, a Sr.ª Ministra da Cultura respondeu a uma questão do PCP desafiando-nos a convencer o Ministro das Finanças a mudar de opções.
Daqui lhe respondemos: não temos feito outra coisa, Sr.ª Ministra!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Essa declaração ficará para a história como a triste caricatura de um País cuja cultura está refém da lógica mercantilista neoliberal que tudo parece dominar e à qual a Sr.ª Ministra parece rendida.
Da parte do PCP, a resposta será, com certeza, outra. Será a resposta de quem tem afirmado nesta Assembleia uma política alternativa de valorização da cultura como uma dimensão fundamental da democracia, e não como mais um espaço de negócio.
Será a resposta de defesa de uma política cultural que respeite criadores e artistas, mas também os cidadãos a quem o Estado deve garantir o acesso à criação e fruição cultural.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Inscreveram-se quatro Srs. Deputados para pedir esclarecimentos, pelo que o Sr. Deputado João Oliveira informará a Mesa se responde individualmente ou em conjunto.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Amadeu Albergaria.

O Sr. Amadeu Albergaria (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Oliveira, gostava de assinalar de uma forma muito especial o facto de ter trazido até este nosso Plenário as questões da cultura e assinalá-lo porque o faz num momento tão particular e simbólico, momento em que existem fortes tentações no sentido de cortar no que é mais simples, por exemplo, as questões culturais.
Gostava, pois, de assinalar o facto de o PCP ter trazido a este Plenário as questões e as preocupações ligadas às matérias da cultura.
Muitas vezes, eu disse, na nossa Comissão de Cultura, que o PSD encara a cultura como um investimento que gera retorno económico.
De resto, várias vezes temos sublinhado a importância das indústrias culturais e criativas na criação de riqueza, sem esquecer que existe um núcleo de criatividade que deve ser mantido, preservado e apoiado.
Seria importante percebermos todos qual é o papel da cultura no combate à crise que o País enfrenta, mas a verdade é que se assiste, por parte do Ministério da Cultura, a uma total falta de estratégia, a medidas avulsas, a medidas que são preocupantes e que têm alarmado toda a comunidade cultural do País.
Recentemente, o PSD reuniu com um conjunto alargado de agentes culturais, que partilharam as suas preocupações e foram unânimes em assinalar esta falta de estratégia. Na ópera, no teatro, na dança, no cinema, nos museus e no património há falta de uma estratégia. Falta uma estratégia no Ministério da Cultura! Tal como estes agentes culturais, estamos todos conscientes de que o País precisa de fazer um esforço para colocar as suas contas públicas em ordem, e todos esses agentes culturais, todos eles, têm a perspectiva de que é necessário o seu contributo. No entanto, há um mínimo que é necessário salvaguardar, sob pena de

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destruirmos aquilo que é absolutamente essencial. Existe um limite abaixo do qual não se consegue preservar aquilo que é fundamental, e estes cortes não têm uma estratégia a presidi-los.
Sr. Deputado, o Ministério da Cultura deve contribuir para este esforço de rigor orçamental, mas é necessária esta estratégia. Pergunto-lhe se o PCP vislumbra alguma estratégia nesta actuação ziguezagueante do Ministério da Cultura e da Sr.ª Ministra da Cultura.
Como é que comenta também o facto, que nos deixa preocupados, de o Ministério da Cultura não cumprir as resoluções que são aprovadas e emanadas desta Assembleia da República? Finalmente, sem complexos de mercantilismo, porque já aqui assumimos que existe um núcleo fundamental que deve ser preservado na cultura,»

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Sr. Deputado, faça favor de terminar.

O Sr. Amadeu Albergaria (PSD): — » qual ç a perspectiva que tem em relação ás indõstrias culturais e criativas, sabendo nós que são geradoras de riqueza, criam empregos e podem ser um bom motivo para que o País e os portugueses se convençam de que investir na cultura é uma verdadeiro investimento, que gera retorno económico e pode ter um papel fundamental no combate à crise?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Amadeu Albergaria, agradeço-lhe as questões que colocou, mas tenho de começar por lhe dizer que não podíamos estar mais em desacordo. E não podíamos estar mais em desacordo porque o PCP não reconhece à estratégia deste Governo qualquer ziguezague, ela é até muito clara, destina-se a desresponsabilizar o Estado das suas obrigações, particularmente das suas obrigações constitucionais,».

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — » no sentido de tornar mercantilista um sector da vida da sociedade, em que há responsabilidades políticas, que não pode estar sujeita a critérios economicistas. Este é o primeiro ponto em que estamos em desacordo.
Mas compreendemos que o Sr. Deputado nos traga esse tipo de abordagem e esse tipo de discurso, que, aliás, não difere muito do PSD para o PS. Quando o Sr. Deputado refere os cortes na área da cultura como cortar nas questões mais simples, a apreciação da política cultural e a valorização da cultura como uma dimensão da criação de riqueza, é, uma vez mais, a lógica mercantilista que está subjacente ao discurso do PSD e que, obviamente, está também subjacente ao discurso do Partido Socialista.
Portanto, não há assim tantas diferenças. E a prova de que não há assim tantas diferenças é esta, Sr. Deputado Amadeu Albergaria: na anterior legislatura, o Partido Socialista tinha uma maioria absoluta e não precisava dos votos de qualquer outro partido para fazer aprovar as suas medidas nesta Assembleia da República, mas nesta legislatura a situação não é a mesma e o Partido Socialista não pode fazer aprovar aqui as suas propostas por si só, precisa de aliados, e os aliados que este Partido Socialista tem encontrado para impor no sector da cultura os cortes orçamentais que estrangulam financeiramente as estruturas de criação artística e põem em causa a política cultural como uma componente fundamental da nossa democracia, são o PSD e o CDS, que, quer em 2010, quer em 2011, viabilizaram os Orçamentos do Estado.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Portanto, Sr. Deputado Amadeu Albergaria, não serve de nada a retórica que os Deputados do PSD e do CDS aqui fazem repetidamente, criticando o Governo do Partido Socialista e as repercussões deste Orçamento do Estado, porque os senhores são directamente responsáveis por ele, porque contribuíram para a sua viabilização.

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Se os senhores tivessem tido outro tipo de atitude em relação ao Orçamento do Estado do Partido Socialista, as estruturas do teatro, da dança, da música, dos cruzamentos disciplinares não estariam hoje confrontadas com as dificuldades que têm pela frente e não estariam confrontadas com a necessidade de despedir trabalhadores e de pôr a sua actividade regular em risco.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Sr. Deputado, faça favor de terminar.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Por isso, Sr. Deputado Amadeu Albergaria — e vou concluir, Sr. Presidente — , aquilo que lhe digo é que da parte do PCP existe, de facto, uma perspectiva alternativa e, todos os anos, temos dado corpo a essa perspectiva alternativa nos orçamentos do Estado, com as propostas que aqui apresentamos. Pena é que o PSD se ponha sempre ao lado do Partido Socialista e nunca tenha disponibilidade para encarar a verdadeira política alternativa.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina Martins.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Oliveira, saúdo-o vivamente por ter trazido hoje, aqui, ao Plenário o tema da inexistente política cultural e do inexistente orçamento do Ministério da Cultura e também por ter mostrado claramente as contradições do Ministério da Cultura, que são mais aparentes do que reais, porque têm como único objectivo desresponsabilizar o Estado e destruir as instituições culturais do País.
Não posso deixar de lembrar os vários processos que começam e acabam sem nunca serem esclarecidos.
Para lá de um orçamento que vai minguando, mesmo depois de todas as declarações de intenção do Sr.
Primeiro-Ministro, temos vários outros processos que, entretanto, vão ficando obscuros.
Temos os processos de classificação do património, que caducaram em 31 de Dezembro de 2010, sem uma palavra a este Parlamento sobre o que está a acontecer, embora os pedidos de esclarecimento tenham sido feitos.
Temos os orçamentos dos museus, que estão praticamente a zero, ao que sabemos, e em relação aos quais já pedimos esclarecimentos e nada sabemos.
Temos um cheque-obra, que era a solução para o património, mas já sabemos que falhou e não há qualquer outra solução à vista para que o património, em Portugal, pura e simplesmente, não vá desaparecendo por falta de manutenção e de preservação.
Temos os contratos com a criação, que iam ser cortados, mas que, afinal, não iam, porque os vários ministérios eram solidários, com um pequeno recuo em 2010, mas que agora, em 2011, vemos que estamos a pagar os cortes de 2010, passando de cortes de 10% para 23%. Portanto, não existiu qualquer recuo, o que existiu foi, mais uma vez, uma política de «nuvem de pó» para esconder os cortes, a desresponsabilização e a liquidação das instituições culturais do País.
Temos os teatros nacionais, com estudos em que se diz que há números que provam que são sustentáveis e toda a gente sabe que não são, mas, ainda assim, os números e os estudos continuam sem aparecer.
Temos uma rede de cineteatros, que era uma prioridade e que, agora, afinal de contas, já não importa nada.
Tínhamos uma lei das bibliotecas prometida para Janeiro mas chegámos até agora sem a ter, questão que teremos oportunidade de discutir na próxima sexta-feira.
Temos também um Ministério da Cultura que se tem comportado como uma sala de visitas, um cicerone de interesses económicos, que nada tem a ver com a cultura. Na realidade, o que faz é isso mesmo. Vai desaparecendo a sua capacidade de intervenção e, entretanto, vamos ficando todos entretidos com uma ideia de cultura de sala de visitas, que nada tem a ver com a democracia e com o desenvolvimento económico.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr.ª Deputada.

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A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Temos também — para terminar, Sr. Presidente — um Partido Social Democrata que tem vindo a falar de indústrias criativas, de mão dada com o Partido Socialista.
E não posso deixar de lembrar aqui que o Presidente da República, no discurso do 25 de Abril, veio aqui falar-nos das indústrias criativas no Porto — quando era Primeiro-Ministro, a política cultural por que ficou mais famoso foi por censurar um livro de José Saramago — ,»

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — » cuja autarquia é, de todas as autarquias do País, aquela que tem a política mais hostil para com a cultura.
Por isso, Sr. Deputado João Oliveira, considera que esta aparente política errática do Ministério da Cultura é verdadeiramente errática ou é só uma «nuvem de pó» que esconde a completa desagregação do Ministério da Cultura?

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Catarina Martins, agradeço também as questões que me colocou.
É óbvio que não consideramos que esta seja uma política errática, ela tem, de facto, um «norte», um rumo, que é a desresponsabilização do Estado e a sujeição da política cultural a uma lógica mercantilista, tal como disse no início da resposta ao Sr. Deputado Amadeu Albergaria.
A Sr.ª Deputada Catarina Martins fez referência a vários aspectos em que se consubstancia essa desvalorização da política cultural e do Estado. Mas ela começa, obviamente, em primeiro lugar, com a escassez de meios postos ao dispor do Ministério da Cultura para execução daquilo que se devia chamar uma política cultural mas à qual temos alguma dificuldade em dar esse nome, de tão incipiente que é do ponto de vista de uma verdadeira política cultural. Portanto, Sr.ª Deputada, com orçamentos reduzidos e cada vez mais exíguos, obviamente que não há governo, não há ministério, que possa executar uma política cultural digna desse nome.
Com os meios orçamentais que são postos à disposição do Ministério da Cultura aquilo que é possível fazer é ir alijando responsabilidades, é ir passando para as «costas» de outros responsabilidades que deviam caber, em primeiro lugar, ao Governo e à administração central. E uma das dimensões desse alijamento de responsabilidades que o Governo vai promovendo é a transferência das responsabilidades do Governo para as autarquias.
De facto, Sr. Deputada Catarina Martins, devia envergonhar qualquer Deputado desta Assembleia da República dar apoio a um Governo que transfere para as «costas» de outros as responsabilidades que são suas, que transfere para as «costas» das autarquias as responsabilidades que devem caber a si próprio e à administração central.
Mas também é vergonhosa a forma como o Governo vai escondendo, por detrás de uma retórica que não tem qualquer correspondência com a realidade, esta prática de desresponsabilização política e de lógica mercantilista.
E o exemplo claríssimo que hoje temos pela frente é que, se se confirmar em 2011 este alijamento de responsabilidades por parte da administração central em relação ao apoio às estruturas de criação artística, elas ver-se-ão obrigadas a ter de recorrer às autarquias para se poderem manter em funcionamento, para poderem manter alguma actividade. Ora, se isto, de facto, acontecer, significa que vão ser as autarquias a ter de assumir uma responsabilidade que cabe, em primeiro lugar, ao Governo da República e não aos órgãos do poder local democrático.
Esta é também uma marca da orientação política deste Governo, que não é uma orientação política errática, não ç uma orientação política de ziguezague,»

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr. Deputado.

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O Sr. João Oliveira (PCP): — » ç uma orientação política bem clara, que, obviamente, contou com o apoio dos partidos da direita.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Caeiro.

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Oliveira, com toda a estima, que sabe que tenho por si, às vezes, devia mudar um bocadinho a cassete e não dizer sempre que foram determinados partidos que viabilizaram o Orçamento, quando o Sr. Deputado sabe perfeitamente que nós não o viabilizámos juntamente com o Governo.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Já ponho em replay!

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Mas numa coisa concordo consigo, Sr. Deputado: de facto, o arrependimento do Eng.º José Sócrates em relação à cultura demorou exactamente 10 minutos, que foram os minutos que demorou a intervenção em que o próprio Primeiro-Ministro disse que se havia um lamento que tinha era o de não ter investido mais na cultura.
De facto, se há algo que podemos registar nestes dois governos socialistas é uma total ausência de estratégia, uma total ausência de rumo e, sobretudo, uma escassez de meios. É preciso recuar 10 anos, quando a cultura tinha uma secretaria de Estado e não um ministério, para encontrarmos um orçamento tão baixo.
Sr. Deputado, convirá que, se pensarmos que a cultura é um eixo fundamental para o desenvolvimento de um país, é um factor de afirmação e de desenvolvimento de uma sociedade, para além de uma forma de afirmação da nossa identidade, percebemos que este Governo fez tudo exactamente ao contrário.
E qual é o cenário que temos hoje? É uma Ministra que, para além de não ter um rumo, de não ter uma estratégia e de não saber conciliar uma visão coerente para a cultura, tem as indústrias criativas e todos os agentes culturais contra ela e que se escuda na ausência de meios para não ter uma política coerente.
Por exemplo, o futuro Museu dos Coches é uma incógnita quanto aos custos, quanto ao planeamento e quanto ao seu futuro; os museus, em geral, não têm condições para funcionar; extingue-se um organismo que funcionava bem, a Direcção-Geral do Livro e das Bibliotecas; como vimos, a OPART que não pára de crescer sem que se tenha avaliado os resultados da OPART inicial, e o resultado que conhecemos é de uma total subalternização da Companhia Nacional de Bailado em relação à ópera, a qual não tem tido um rumo coerente, tendo havido uma clara degradação daquilo que é o nosso único teatro lírico. Enfim, temos, de facto, um descontentamento absolutamente generalizado.
Mas o que lhe pergunto, Sr. Deputado, é se não considera que, nesta altura e após tantas promessas, o estatuto dos profissionais das artes e do espectáculo já deveria estar concluído, não só em relação aos intermitentes, que, como sabemos, ficou muito aquém daquilo que seria desejável, mas também em relação, por exemplo, aos bailarinos da Companhia Nacional de Bailado, no que diz respeito à questão das reformas e à questão fiscal, porque, como sabemos, há seis anos que este estatuto anda a ser prometido e nunca mais vê na luz do dia.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Teresa Caeiro, muito obrigado pelas questões que me colocou.
Antes de passar à explicação dos formatos áudio, deixe-me começar pelo fim, para responder à questão do estatuto profissional e à protecção social dos trabalhadores das artes e do espectáculo, porque a crítica que fiz

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na minha declaração política não deixa de ter em conta que temos, neste momento, em discussão na Assembleia da República várias iniciativas legislativas, num processo que está a avançar e que envolve também o seu colega de bancada Artur Rego, que tem tido alguns avanços do ponto de vista da discussão, o que esperamos, sinceramente, que possa traduzir-se em alguns avanços em relação à lei de 2008.
Obviamente que a crítica que fiz, na declaração política que li, tem que ver com o facto de que esta questão já poder estar resolvida pelo menos desde 2008, se os governos do Partido Socialista tivessem decidido aprovar as matérias referentes à regulamentação da protecção social, coisa que não fizeram.
Portanto, esperamos que o processo legislativo que temos em mãos, na Assembleia da República, resolva de uma vez por todas estas questões.
Em relação à acusação da «cassete» e sabe-se lá mais o quê, Sr.ª Deputada, com o passar do tempo e com as inovações tecnológicas, esperava que houvesse, pelo menos da parte de quem usa esse discurso, uma actualização em relação ao formato, referindo-se a MP3 ou a algum tipo suporte áudio mais próximo do CD ou do DVD.
De qualquer forma, sempre lhe respondo em relação à repetição, dizendo-lhe, Sr.ª Deputada, que parece que a falta de memória que atinge o Governo, o Primeiro-Ministro e o Partido Socialista também atinge o CDS e a Sr.ª Deputada. A Sr.ª Deputada já está esquecida das propostas que o PCP apresentou no Orçamento do Estado para 2011 e que o CDS rejeitou? O PCP apresentou, em sede de PIDDAC, propostas que poderiam ter resolvido este problema dos cortes que estão a ser impostos às estruturas de criação artística, mas o CDS rejeitou-as! Sr.ª Deputada, o pior Orçamento da história do Ministério da Cultura foi o Orçamento do Estado para 2010.
Sabe com que votos foi aprovado esse Orçamento do Estado? Com os votos a favor do PS e as abstenções do PSD e do CDS-PP.
Portanto, quando a Sr.ª Deputada diz que o CDS não tem qualquer responsabilidade nos constrangimentos orçamentais do Ministério da Cultura, tenho de dizer-lhe que os senhores são directamente responsáveis por eles, quer agora quer enquanto estiveram no governo, porque enquanto estiveram no governo também contribuíram para esse rumo de cerceamento, de limitação dos recursos que são postos à disposição deste Ministério.
Sr.ª Deputada, há, de facto, inúmeras questões e inúmeros problemas que se colocam nesta matéria. Pena é que o CDS tantas e tantas vezes acompanhe a perspectiva programática e o projecto político que o Partido Socialista tem para apresentar. Dou-lhe um exemplo. A Sr.ª Deputada já está esquecida das afirmações que fez em variadíssimas audições com o Sr. Ministro da Cultura?

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — O Sr. Deputado já não tem muito tempo para exemplos, mas faça favor de concluir.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Vou concluir, Sr. Presidente.
A Sr.ª Deputada está esquecida do acompanhamento que fez nas discussões com o Sr. Ministro da Cultura relativamente à intenção de dar mais peso ao mecenato no financiamento das políticas culturais? Aí tem um exemplo de alinhamento do CDS com o Partido Socialista que se traduziu numa desresponsabilização do Estado e à transferência da política cultural para o âmbito do negócio e do lucro, quando a mesma deve ser entendida como um factor indispensável na construção de uma democracia.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de concluir, Sr. Deputado.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Concluindo, Sr. Presidente, gostaria de dizer que a questão central que se coloca é a de saber se o CDS está ou não disposto a inverter o rumo desta política. E, perdoe-me que lhe diga, Sr.ª Deputada Teresa Caeiro, mas, a avaliar pelas posições que têm tomado, não me parecem dispostos a isso.

Aplausos do PCP.

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O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Inês de Medeiros.

A Sr.ª Inês de Medeiros (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Oliveira, gostaria de começar por lhe agradecer o facto de ter trazido o tema da cultura a esta Câmara, porque o mesmo é sempre bem-vindo.
Pensava que o Sr. Deputado vinha trazer as questões concretas, mas afinal estamos perante uma discussão ideológica.
É evidente, Sr. Deputado, que não há Deputado nenhum nesta bancada que não lamente que não haja um reforço orçamental na área da cultura. Que isto fique muito claro! Aliás, a própria Ministra da Cultura o disse claramente.
Posto isto, talvez possamos começar a falar.
Penso que o PCP sabe e tem alguma consciência de qual é a situação actual do País e do esforço que todos os portugueses estão a fazer.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Todos?!

A Sr.ª Inês de Medeiros (PS): — Repito: que todos os portugueses estão a fazer! Mas, digo mais uma vez, penso que não há Deputado nenhum desta bancada que não lamente que não tenha havido um reforço no orçamento do Ministério da Cultura.
Mas o Sr. Deputado traz este debate para outras dimensões. Ficámos a saber que, para o PCP, isto não é um problema circunstancial — ou seja, não estamos a viver crise alguma e não temos de reduzir o défice — , esta é uma estratégia maléfica do Governo para se desresponsabilizar da área da cultura, estratégia essa que dura já há longos anos, porque é sabido que o Governo (e, na óptica do PCP, penso que é qualquer governo) só pode ter intenções maléficas.

Risos do Deputado do PCP João Oliveira.

É uma características um pouco sui generis, mas pelos vistos é assim.
Fiquei também a saber, para grande espanto meu, que o Sr. Deputado é contra a descentralização da cultura. De facto, temos tendência a ver o apoio acrescido das autarquias à cultura como um dado positivo, que em nada implica uma desresponsabilização do Estado central. E até defendemos muito claramente que há certos centros de decisão que deveriam passar para as regiões. Não vou aqui falar de regionalização, que é um tema sensível, mas este lado da descentralização é, para nós, uma prioridade.
Portanto, estamos em desacordo, Sr. Deputado. Nós somos, de facto, a favor do apoio das autarquias, mas o PCP, pelos vistos, é contra! Mas mais: também ficámos a saber que o PCP é contra a Lei do Mecenato. Ora, do nosso ponto de vista, tudo o que possa trazer mais meios para a cultura é bem-vindo. Para o PCP, não! Criar mecenas significa uma desresponsabilização e é mais um elemento deste plano maléfico.
Poderia continuar a elencar estas novidades que o Sr. Deputado aqui nos trouxe, mas há uma coisa que gostaria de dizer. O Sr. Deputado fez bem em lembrar que neste momento não há maioria absoluta, fez bem em lembrar que, hoje em dia, temos de arranjar consensos para chegar a certas soluções. Quero dizer-lhe que a Sr.ª Ministra da Cultura, por várias vezes, expôs ideias para serem discutidas e devo dizer que a oposição está toda junta para a contestação mas também está em conjunto para se opor a propor qualquer solução.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Inês de Medeiros (PS): — Vou terminar, Sr. Presidente.
Portanto, dentro deste seu discurso ideológico, Sr. Deputado, diga lá qual é o seu modelo, para não ser este modelo terrífico, neoliberal, qual é o modelo para uma política cultural, na óptica do PCP.

Aplausos do PS.

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O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Inês de Medeiros, agradeço as questões que colocou.
Em relação à estratégia maléfica, as palavras são suas. Se a Sr.ª Deputada entende qualificar assim a estratégia do Governo, não sou eu que vou travar a sua avaliação.

Protestos da Deputada do PS Inês de Medeiros.

No PCP, não fazemos avaliações sobre se as estratégias são maléficas ou deixam de ser. Estamos perante opções políticas e o que é preciso é que quem as toma as assuma. E isso é que era importante o Partido Socialista fazer.
Era importante que o Partido Socialista assumisse, de uma vez por todas, que não concorda com as responsabilidades que o Estado deve ter na definição da política cultural, não concorda com o texto da Constituição que responsabiliza o Estado pela garantia a todos os cidadãos do acesso à fruição e à criação cultural. Se o Partido Socialista assumisse isso, as pessoas podiam fazer as suas opções políticas mais facilmente em todos os momentos, incluindo o do voto.

Vozes do PCP: — Exactamente!

O Sr. João Oliveira (PCP): — A Sr.ª Deputada fez uma afirmação relativamente à transferência dos centros de decisão para as autarquias. Vou dar-lhe um exemplo daquilo que para o Partido Socialista significa «transferência de centros de decisão e transferência de responsabilidades para as autarquias».
O exemplo que lhe dou diz respeito ao Centro Dramático de Évora (CENDREV). O CENDREV tem este ano, 2011, pela via do Ministério da Cultura, um corte de 70 000 € no seu orçamento, que correspondem aos 23%.
Mas há mais: a gestão socialista da autarquia de Évora tem em dívida para com o CENDREV 130 000 €, Sr.ª Deputada. Portanto, a perspectiva que o Partido Socialista tem de transferência de responsabilidades e competências para as autarquias é esta e o que acontece é que nem as autarquias têm meios para fazer face às responsabilidades que são transferidas nem me parece que o Partido Socialista, na gestão das autarquias, tenha a intenção de cumprir os compromissos que assume.
Portanto, quando a Sr.ª Deputada fala nessa questão, seria bom que visse exactamente o que se passa, na prática, em relação à transferência de competências e qual é a prática das autarquias de gestão socialista em relação ao cumprimento dos seus compromissos.
Depois, a Sr.ª Deputada diz que o PCP é contra a descentralização?! A Sr.ª Deputada não deve conhecer o movimento de descentralização teatral, por exemplo, que surgiu logo após o 25 de Abril, e deve desconhecer por completo o contributo do PCP enquanto partido e de muitos dos seus militantes, para que esse fenómeno de descentralização ocorresse. Se me permite, dou particular relevo ao meu camarada Mário Barradas, falecido recentemente, que muito contribuiu para que o fenómeno da descentralização cultural fosse uma realidade não só do ponto de vista político mas também com o empenhamento de todos aqueles que são os verdadeiros fazedores da cultura portuguesa, os criadores, os artistas, os técnicos e todos os que estão envolvidos no processo de criação artística.
Por isso, quando a Sr.ª Deputada diz que o PCP está contra a descentralização cultural é não conhecer a realidade e é procurar ocultar as opções políticas no nosso partido.
Para terminar, gostaria de lhe dizer, Sr.ª Deputada, que o que é preciso é que haja opções que são feitas e assumidas. Vou-lhe dar um exemplo das possibilidades que o Partido Socialista teria à sua frente se quisesse, de facto, inverter o rumo da sua orientação política.
Se o Partido Socialista tivesse aprovado na Assembleia da República a proposta que o PCP apresentou para a tributação dos dividendos que foram distribuídos antecipadamente aos grandes grupos económicos, só com o imposto cobrado à PT pela distribuição antecipada de dividendos, o Estado arrecadava um valor igual do orçamento do Ministério da Cultura.

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Vozes do PCP e de Os Verdes: — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Portanto, veja a desvalorização a que os senhores votam as políticas culturais e veja um exemplo concreto de como poderiam facilmente inverter o rumo.

Aplausos do PCP.

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente, Jaime Gama.

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, vamos passar ao debate, na generalidade, da proposta de lei n.º 47/XI (2.ª) — Procede à quinta alteração à Lei de enquadramento orçamental, aprovada pela Lei n.º 91/2001, de 20 de Agosto.

Pausa.

O Sr. Deputado Honório Novo pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Honório Novo (PCP): — Para uma interpelação à Mesa sobre a condução dos trabalhos, Sr.
Presidente.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, como bem sabe, a proposta de lei em debate, relativa à Lei de Enquadramento Orçamental, tem a ver com alterações profundas nos orçamentos do Estado do futuro, isto é, com a administração central mas também com a administração local e com as regiões autónomas.
Como julgo que o Governo não terá colhido pareceres nem da Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) nem das regiões autónomas antes de formular a proposta de lei que hoje vamos começar a discutir, como não possuo qualquer parecer com origem nem na ANMP, nem na assembleia ou governo regional da Madeira ou dos Açores, gostaria de saber se, porventura, terá chegado à Mesa entretanto, sem que tenha chegado ao Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, algum parecer sobre a proposta de lei em causa, oriunda de alguma destas instituições.

O Sr. Presidente: — Posso assegurar ao Sr. Deputado que foi pedido parecer aos órgãos de governo próprios das regiões autónomas e durante o debate poderei dar-lhe o esclarecimento sobre se já chegaram ou não os pareceres.
Quanto à ANMP, em princípio, esse parecer é pedido pela Comissão de Orçamento e Finanças.
Aguardo, então, uma informação detalhada, que farei chegar ao Sr. Deputado.
Tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Pacheco.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Sr. Presidente, em interpelação à Mesa, quero informar V. Ex.ª, se me permite, que hoje mesmo, no relatório que a Comissão de Orçamento e Finanças aprovou, foi tomada essa decisão.
Assim sendo, o processo irá decorrer o seu curso e até ao final da aprovação desta legislação certamente que esse parecer estará na Assembleia.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Honório Novo, quanto à ANMP o pedido de parecer foi desencadeado com a aprovação do relatório na Comissão de Orçamento e Finanças, como acabámos de ouvir, e quanto aos pedidos de parecer às regiões autónomas esse pedido está desencadeado desde o início da recepção da proposta de lei na Assembleia da República, pois essa é uma responsabilidade do Presidente da Assembleia da República.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Ah! Mas por iniciativa do Presidente da Assembleia da República.

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O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, para apresentar a proposta de lei n.º 47/XI (2.ª) — Procede à quinta alteração à Lei de Enquadramento Orçamental, aprovada pela Lei n.º 91/2001, de 20 de Agosto, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e das Finanças.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças (Teixeira dos Santos): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O actual processo orçamental é um processo muito fragmentado, insuficientemente planeado a médio prazo, muito centrado na utilização de recursos e não tanto nos resultados, baseado num sistema contabilístico ainda incompleto e é um processo que necessita de ser melhorado.
É com o objectivo de fazer face aos problemas referidos e de, assim, contribuir para o reforço da governação e transparência deste processo e para a sustentabilidade de longo prazo das contas públicas, que o Governo apresenta esta proposta de revisão da Lei de Enquadramento Orçamental, enquanto instrumento legal de referência na definição do quadro orçamental vigente.
Esta proposta de lei prossegue um conjunto de objectivos centrais: por um lado, a necessidade de aperfeiçoamento e melhoria do sistema e do processo de elaboração e aprovação do Orçamento do Estado, através, designadamente, da implementação de um processo orçamental top-down; por outro lado, o reforço do papel da Assembleia da República na definição dos limites de despesa e no escrutínio dos resultados da aplicação dos dinheiros públicos, reforçando-se a responsabilização de cada membro do governo pela execução do seu programa orçamental.
Em termos mais operacionais, pretende-se a aproximação do universo da contabilidade pública do universo relevante para as contas nacionais. E, como objectivo último, pretende-se que esta lei contribua para garantir a contenção do défice orçamental e o controlo da dívida pública, restabelecendo os necessários equilíbrios orçamentais.
Esta proposta de lei vem, assim, introduzir alterações em matérias como: o processo que conduz à elaboração e aprovação do Orçamento do Estado; o universo de entidades a que a lei se aplica; os princípios e regras orçamentais; a orçamentação por programas, bem como quanto à informação a prestar pelas entidades que compõem o sector público.
Mas esta proposta de lei enquadra-se, igualmente, nos novos requisitos ao nível da União Europeia conducentes à melhoria da coordenação das políticas económicas dos Estados-membros, desenvolvidos na sequência da crise económica e financeira que afectou a Europa e tornou mais visíveis as fragilidades do actual sistema de governação.
Neste contexto, o Conselho Europeu de Outubro endossou um relatório que, entre outros aspectos, recomenda a definição de requisitos mínimos obrigatórios, incluindo a imposição de regras orçamentais numéricas e de um enquadramento plurianual, e um conjunto de requisitos não vinculativos, incluindo regras orçamentais mais específicas, como as regras de despesa, e a existência de entidades capazes de levar a cabo análises independentes relacionadas com questões de política orçamental.
Como já ontem tive oportunidade de referir aos Srs. Deputados presentes na Comissão de Orçamento e Finanças, é essencial que Portugal alinhe o seu processo orçamental com o dos seus colegas europeus, integrando-se numa adequada coordenação da política económica.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em termos concretos, a presente proposta de lei procede ao alargamento do âmbito subjectivo da Lei de Enquadramento Orçamental, identificando, dentro do sector público administrativo, os subsectores que o integram, incluindo os serviços e fundos autónomos que não apliquem o Plano Oficial de Contabilidade Pública, e as entidades que, independentemente da sua natureza e forma, tenham sido incluídas em cada subsector no âmbito do Sistema Europeu de Contas Nacionais e Regionais.
Procede-se, igualmente, ao alargamento a todo o Orçamento dos princípios da estabilidade orçamental, da solidariedade recíproca e da transparência orçamental, que foram introduzidos na Lei de Enquadramento Orçamental pela chamada lei da estabilidade.
Com a actual proposta procede-se, ainda, à introdução de regras orçamentais com o objectivo de corrigir, pelo menos parcialmente, os enviesamentos favoráveis ao crescimento da despesa.

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Passa a fixar-se uma regra sobre o saldo orçamental conjunto das administrações públicas, estabelecendose um limite mínimo para o seu valor, compatível com os compromissos assumidos por Portugal no quadro europeu, tendo em vista a sustentabilidade das finanças públicas nacionais.
Assim, o saldo orçamental não pode ser inferior ao objectivo de médio prazo. O cumprimento desta regra contribui não só para uma maior atenção ao défice mas também para uma trajectória sustentável do rácio da dívida pública; quando o limite mínimo para o saldo for violado, a diferença terá que ser corrigida nos anos seguintes, conforme se propõe.
Cria-se, igualmente, uma regra de despesa, concretizada através da apresentação por cada governo de um quadro orçamental plurianual para o horizonte temporal do seu mandato.
A introdução, em cada ano, de um limite da despesa até ao quarto ano seguinte, reforça a programação e a previsibilidade da despesa pública, contribuindo para evitar expansões da despesa, designadamente em resposta a eventuais aumentos não esperados da receita fiscal.
O processo que conduz à elaboração e aprovação do Orçamento do Estado iniciar-se-á com a apresentação ao Parlamento da revisão do Programa de Estabilidade e Crescimento e do quadro plurianual de programação orçamental, que o Governo apresenta à Assembleia da República, de harmonia com as Grandes Opções do Plano.
Este quadro plurianual é actualizado, anualmente, na Lei do Orçamento do Estado, para os quatro anos seguintes, em consonância com os objectivos estabelecidos no referido Programa de Estabilidade e Crescimento. Com esse fim, o Governo passa a incluir na revisão anual do Programa de Estabilidade e Crescimento um projecto de actualização do quadro plurianual.
O quadro plurianual define os limites de despesa para cada programa orçamental, para cada agrupamento de programas e para o conjunto de todos os programas.
O estabelecimento de regras orçamentais torna necessária a avaliação do seu cumprimento com base em critérios técnicos rigorosos, que deverá ficar entregue a uma entidade independente.
Propõe-se, neste sentido, a criação de um conselho das finanças públicas, cuja missão consiste em avaliar a consistência dos objectivos relativamente aos cenários macroeconómico e orçamental, à sustentabilidade de longo prazo das finanças públicas e ao cumprimento da regra sobre o saldo e da regra sobre a despesa da administração central, bem como das regras de endividamento das regiões autónomas e das autarquias locais previstas nas respectivas leis de financiamento.
Este conselho deverá ser integrado por personalidades de reconhecido mérito, com experiência nas áreas económica e de finanças públicas.
De acordo com o proposto, todo o Orçamento passará a ser estruturado, obrigatoriamente, por programas, terminando-se com a distinção entre o orçamento do PIDDAC e o orçamento de funcionamento.
Em termos de reforço da transparência, propõe-se que o Governo apresente no Parlamento até 31 de Março um relatório da execução dos programas orçamentais no ano anterior. Este relatório integra os relatórios de cada ministério, assegurando-se, assim, uma maior accountability dos responsáveis pela efectiva execução de cada programa.
Por fim — e refiro-a apenas por ser uma das questões mais sensíveis e onde é mais difícil proceder à avaliação de impacto da medida — , estabelece-se que as propostas de criação ou alargamento de benefícios fiscais apenas serão admitidas à discussão e votação quando acompanhadas da estimativa da receita cessante, da sua justificação económica e social e das medidas destinadas à cobertura da receita cessante.
Estou plenamente convencido que os melhoramentos que se introduzirão no quadro orçamental nacional com a aprovação da presente proposta de lei de revisão da Lei de Enquadramento Orçamental contribuirão para um reforço do rigor e transparência do processo orçamental português e para o reequilíbrio das nossas contas públicas.
O facto de Portugal proceder, no actual momento, a esta ambiciosa revisão implicará igualmente, a meu ver, um reforço na confiança de que o nosso país continuará a implementar as medidas necessárias para atingir plenamente os objectivos de controlo das contas públicas com que se comprometeu.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, seis Srs. Deputados.

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Tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Pacheco.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados: Em primeiro lugar, quero dizer-lhe, Sr. Ministro, que temos a consciência de que nada é imutável, que é sempre possível fazer melhorias em todo o tipo de legislação e de procedimentos, e aquilo que possa ser feito para melhorar o controlo e a transparência das contas públicas merecerá sempre a nossa concordância.
Mas, Sr. Ministro, temos de dizer duas coisas: em primeiro lugar, estas melhorias têm de ser feitas quando se encontre necessidade de as efectuar e não propriamente para que lá fora, no contexto externo, alguém se aperceba que estamos aqui a fazer alguma coisa.
Em segundo lugar, Sr. Ministro, estas melhorias têm de ser feitas independentemente do momento e temos a consciência de que foi escolhido um timing para a apresentação desta iniciativa legislativa que, de algum modo, tenta responder ao contexto externo. Porquê? Porque muito daquilo que hoje aqui nos é proposto já podia ser feito.
De facto, a nossa convicção é a de que muito daquilo que aqui está proposto já podia ser feito, independentemente de estar na letra da lei, que nada impedia o Ministro das Finanças de o fazer»

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — » e que a necessidade porem isto na lei resulta de um tique desta governação socialista, que é: perante um problema muda-se a lei. Isto é, aumenta a criminalidade, mexe-se, de imediato, no Código Penal; há problemas de incêndios, vamos à legislação; há problemas de controlo de execução orçamental, muda-se a Lei de Enquadramento Orçamental. Não é esta a nossa maneira de ver as questões.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Coloco agora três questões concretas, Sr. Ministro, em relação ao que nos propõe.
Em primeiro lugar, diz o próprio Grupo de Trabalho, nomeado pelo Governo, que alterar o processo orçamental é muito mais do que alterar a Lei de Enquadramento Orçamental. Daí que lhe pergunte que mais vai ser feito, que mais está a ser feito, para melhorar o processo, para além de uma simples alteração legislativa? Segunda questão: diz-se que é necessário responsabilizar, cada vez mais, os ministros sectoriais e o Sr.
Ministro argumenta dizendo que a própria gestão por programas já vai nesse sentido, que a necessidade de esses ministros virem a apresentar um relatório da execução já vai nesse sentido. Mas, Sr. Ministro, temos de responsabilizar esses ministros sectoriais durante a execução e não só a posteriori, porque, depois, muitas vezes, os factos já estão consumados, a tragédia já ocorreu e a capacidade de remediar é muito mais limitada.
Terceira e última questão é sobre o conselho das finanças públicas. Sr. Ministro, resultou do acordo entre o PS e o PSD a necessidade de criar uma entidade que possa, de algum modo, aprimorar o controlo da execução orçamental.
Ora, sabemos que está criado um Grupo de Trabalho, liderado pelo Prof. Pinto Barbosa, que tem na sua missão trazer o resultado concreto daquela que poderá ser essa entidade.
A minha pergunta é a seguinte: esta exigência, que já está na lei, da criação desse conselho das finanças públicas não pode estar a dar as conclusões antes de esse grupo de trabalho ter concluído o seu trabalho? É que isso nós não poderemos aceitar, Sr. Ministro.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Jamila Madeira.

A Sr.ª Jamila Madeira (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Caros Colegas: Antes de mais, permita-me, Sr. Ministro, que o felicite pelo leilão da dívida pública desta manhã.

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Foi, certamente, um bom resultado, que veio complementar e credibilizar aquilo que muitos gostariam que assim não fosse» Mas foram os mercados a dar confiança, foram os «famigerados mercados« — permitamme que o diga» — a demonstrar e a confirmar os importantes resultados da execução orçamental ainda ontem anunciada»

Aplausos do PS.

» e que, claramente, vem comprovar aquilo que o Partido Socialista aqui tem afirmado sucessivas vezes, isto é, que temos paulatinamente cumprido um caminho difícil, mas um caminho de rigor, de credibilização e de credibilidade de Portugal, em termos financeiros, pelo que gostaria de felicitá-lo.
Mas eu gostaria também de sublinhar que estes elementos da execução orçamental de ontem superaram as expectativas que os mais pessimistas colocavam em cima da mesa. Assim, contrariando esses arautos da desgraça, esses elementos demonstraram que cumprimos os objectivos e que, mais do que cumprimos os objectivos, tivemos uma folga de cerca meio ponto percentual do PIB, cerca de 800 milhões de euros.

Aplausos do PS.

Esses são excelentes resultados dos quais nos devemos orgulhar! Sim, o seu empenho, enquanto Ministro das Finanças, o empenho de todo o Governo, mas — e permitamme que o sublinhe também — o contributo de todos os portugueses, nunca desistindo de lutar, foi particularmente relevante! Por isso, esta proposta de lei que hoje aqui temos em discussão é absolutamente crucial para a transparência e para continuarmos este trabalho de afirmar a credibilidade de Portugal e das finanças portuguesas no mundo e também — e isto é particularmente importante — perante os cidadãos portugueses.
Felicito-o, Sr. Ministro, pela oportunidade e pela coragem que teve. Ao contrário do Partido SocialDemocrata, creio que este momento difícil deveria levar-nos a não colocar este tipo de tema na agenda,»

O Sr. Francisco de Assis (PS): — Muito bem!

A Sr.ª Jamila Madeira (PS): — » porque esta era a oportunidade para, com coragem determinante, aproveitar o momento em que é preciso continuar a credibilizar Portugal e as finanças portuguesas. Por isso, este momento e esta oportunidade são cruciais, pelo que, repito, felicito-o, Sr. Ministro!

Aplausos do PS.

Como o Sr. Ministro aqui disse, esta iniciativa permite incorporar na nossa legislação desafios europeus, mas permite também incorporar uma visão de médio e de longo prazos para os investimentos públicos, tal como permite que todos os agentes económicos se centrem num objectivo: crescimento económico. E esse é um contributo para esta proposta de lei de médio e de longo prazos, fazendo um claro plurianual.
Neste sentido, eu gostaria de perguntar-lhe aquilo que os portugueses querem saber depois de terem contributo para os excelentes números de execução orçamental: de que forma devem eles agir no sentido de continuar a contribuir com o seu esforço, com o seu empenho, para agora consolidar um cada vez melhor sucesso em termos de crescimento económico do nosso país para que possamos deixar para trás estes momentos difíceis que se verificaram nos últimos tempos?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Mota Soares.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado e das Finanças, sem prejuízo de uma intervenção que o Deputado João Pinho de Almeida vai fazer e de uma pergunta que lhe vai

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colocar, há um ponto específico sobre o qual eu gostava de lhe dirigir uma pergunta: é sobre o conselho das finanças públicas.
Hoje, quem se pronuncia sobre o cenário e os quadros macroeconómicos que o Governo inscreve no Orçamento do Estado é a UTAO, uma unidade técnica, uma unidade independente que funciona de forma suprapartidária na Assembleia da República, sempre com uma garantia de isenção. Aliás, é uma Unidade cujos meios e competências a Assembleia tem tentado mesmo reforçar, que pode fazer o escrutínio da execução orçamental e que, acima de tudo, muitas vezes capacita a Assembleia com um conjunto de dados e de números, que muitas vezes o próprio Governo não faz chegar à Assembleia.
Ora, o que os senhores agora parecem querer fazer nesta proposta de lei é, por decreto-lei, sem controlo do Parlamento, sem sequer uma audição parlamentar, fazer um conselho das finanças públicas, que é nomeado directamente pelo Governo, e será esse mesmo conselho que, sendo nomeado pelo Governo, terá de se pronunciar sobre a política orçamental do Governo.
Sr. Ministro, isto parece-me um contra-senso, parece-me que é, obviamente, retirar imparcialidade, retirar isenção, retirar uma garantia de transparência à fiscalização que o Parlamento tem de fazer em sede do Orçamento do Estado.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Parece-me até, Sr. Ministro, que não foi nada disso que os senhores, pelos vistos, negociaram com o PSD — e ouvimos isso agora aqui pela voz do PSD.
Por isso mesmo, Sr. Ministro, a pergunta concreta que lhe faço é a de saber se o Governo está ou não disposto a alterar o que consta do artigo 12.º-I da sua proposta de lei, relativamente ao Conselho das finanças públicas, garantindo que o Parlamento tem, de facto, as condições para, de forma isenta, imparcial e transparente, garantir um escrutínio do quadro macroeconómico que o Governo envia para a Assembleia.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro do Estado e das Finanças.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Duarte Pacheco, aquilo que neste momento estamos a concretizar com esta proposta de alteração da Lei do Enquadramento Orçamental é o resultado de muitos anos de trabalho e de reflexão sobre esta matéria.
Em primeiro lugar, iniciamos estas melhorias com um conjunto de mudanças muito significativas no sistema de acompanhamento, de reporte da informação, realçando o papel da autoridade de estatística nacional em colaboração com o Banco de Portugal e com a própria Direcção-Geral do Orçamento, como não podia deixar de ser.
Ganhámos com isso um reforço da confiança nos dados da execução orçamental portuguesa, a ponto de o Eurostat não mais ter apresentado reservas quanto à informação que lhe tem vindo a ser fornecida nos últimos anos, coisa que não acontecia no passado.
Por outro lado, Sr. Deputado, no seguimento desse trabalho, contámos com a colaboração da OCDE, pois solicitámos-lhe colaboração e cooperação neste domínio, organização que nos deu uma grande assistência técnica, com o conhecimento que tem de experiências e de modelos em variados países. Contámos com o apoio da OCDE que fez uma análise no processo orçamental em Portugal, que participou activamente num grupo de trabalho sobre esta matéria e, finalmente, criámos um grupo de trabalho para concretizar em propostas legislativas aquilo que se traduz agora na proposta do Governo.
Foi um trabalho longo, ponderado, bem reflectido, não é uma proposta feita «em cima do joelho».
Por outro lado, é também uma proposta que tem muito em linha de conta aquilo que são iniciativas a nível europeu no sentido de harmonizar e coordenar os processos orçamentais nos Estados-membros para assim reforçarmos a confiança na zona euro que é fundamental para a própria estabilidade do euro — e nós queremos fazer parte desse processo e desse esforço comum.

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Sr. Deputado, aquilo que é possível fazer nós temos vindo a fazer. Já fazemos orçamentação por programas — o Orçamento já está estruturado em programas — e essa foi uma mudança muito significativa que já foi operada com o Orçamento de 2010 e novamente com o Orçamento para 2011.
Os ministros sectoriais são chamados a responder pelos resultados e também pela execução. O sistema de controlo é aperfeiçoado, o acompanhamento é aperfeiçoado até com uma periodicidade mais exigente e, Sr. Deputado, nada impede que a Assembleia exerça os seus poderes de fiscalização perante os membros do Governo. Essa é uma matéria que compete à Assembleia e nada é limitado.
Respondendo ao Sr. Deputado Pedro Mota Soares, relativamente ao grupo de trabalho, gostaria de chamar a atenção para o seguinte: aquilo que eu assinei com o Dr. Catroga em termos de acordo, e o que consta do acordo não é a criação de um grupo para fiscalizar a execução orçamental, mas é a criação de um grupo que vai avaliar — tal como eu disse e é dito na proposta de lei — a consistência dos objectivos relativamente aos cenários macroeconómico e orçamental e à sustentabilidade de longo prazo das finanças públicas, em linha com aquilo que é, eu diria, a onda de mudanças institucionais neste domínio a nível europeu e que são as recomendações da Comissão Europeia.
Não estamos aqui a desviar-nos, de forma alguma, daquilo que foi acordado com o PSD.
Gostaria também de referir, Sr. Deputado Pedro Mota Soares, que o Parlamento em nada vê beliscadas as suas funções de acompanhamento, de fiscalização e de opinião, relativamente a estas matérias. Penso que só ficamos a ganhar em termos uma UTAO que faz o trabalho que tem vindo a fazer aqui, no Parlamento,»

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — E que é meritório!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — » e em termos tambçm uma entidade que, não sendo uma entidade associada ao Parlamento, nem ao Governo, é uma entidade independente que também dá a sua opinião.
Aliás, inúmeras entidades dão opinião: as agências de rating, as instituições internacionais, os centros de estudos de universidades, de associações empresariais» E acho que isso em nada afecta, ou minimiza, ou limita, o poder do Parlamento para se pronunciar, também, sobre as mesmas matérias. Não sei do que é que tem medo, Sr. Deputado!» Não há que ter medo disso. Pelo contrário, teremos um elemento adicional que só pode enriquecer e ajudar à nossa reflexão e à nossa discussão.
Sr.ª Deputada Jamila Madeira, agradeço as suas palavras de felicitação quanto ao sucesso da operação de hoje, mas penso que, acima de tudo, somos todos nós que devemos ser objecto de felicitação. Este é um resultado de um trabalho do País, dos portugueses, que tem implicado muitos sacrifícios para todos. Repito: somos todos nós que devemos merecer essa felicitação.

Aplausos do PS.

Por outro lado, Sr.ª Deputada, gostaria de referir que ao sucesso da operação de hoje não é alheio o facto de termos informação de que, em 2010, as coisas correram melhor do que o esperado e isso foi importante.
Correu melhor do que o esperado em termos de crescimento, correu melhor do que o esperado em termos de execução orçamental» Isto mostra que os esforços que estamos a fazer valem a pena, que há que continuar e há que continuar a mostrar bons resultados.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Gusmão.

O Sr. José Gusmão (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado e das Finanças, o Partido Socialista e o Governo, aproveitaram este debate para nos falar do leilão de dívida pública que ocorreu esta manhã e que foi, de facto, uma boa notícia para o País, porque representa uma baixa dos juros que são cobrados pela emissão de dívida pública portuguesa, embora esses juros continuem a situar-se a mais do triplo das taxas de juro que eram praticadas acerca de um ano. Portanto, não há razão para grandes euforias. Mesmo assim, não

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deixa de ser extraordinária a desilusão que a direita não consegue disfarçar com o resultado desse leilão, porque a direita tem estado entusiasmada»

O Sr. José Galamba (PS): — A salivar! Eles salivam»!

O Sr. José Gusmão (BE): — » e mobilizada, com a dificuldade do País perante a acção de agentes especuladores e com a perspectiva de poder ter cá o FMI.
Isto por razões muito simples: a direita sabe que a política do FMI é a política da direita e o PSD sonha com a possibilidade de governar com o FMI em Portugal para poder aplicar as suas escolhas, as suas propostas políticas e atirar as responsabilidades para cima do FMI.
O PSD quer governar em regime de outsourcing!»

Vozes do BE: — Muito bem!

O Sr. José Gusmão (BE): — E o Sr. Ministro e o Partido Socialista aproveitaram este debate para nos falar do leilão da dívida pública, mas não aproveitaram a oportunidade para falar das estimativas para o desemprego em 2011 e da estimativa do Banco de Portugal para a evolução do PIB que traçam um quadro negro de recessão.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Não dá para falar sobre tudo!

O Sr. José Gusmão (BE): — Um quadro que é muito pertinente quando se discutem contas públicas, porque a recessão e o desemprego repercutem-se de uma forma muito negativa nas contas públicas e inclusive na capacidade de nos defendermos dos agentes especuladores dos mercados financeiros. São, portanto, escolhas e é de escolhas de política económica que falamos quando falamos de uma lei de enquadramento orçamental.
A Lei do Enquadramento Orçamental deve assegurar a transparência e o rigor dos processos de elaboração e de execução orçamental, não deve determinar e cristalizar escolhas de natureza política.

Vozes do BE: — Muito bem!

O Sr. José Gusmão (BE): — Uma lei de enquadramento orçamental não deve, não pode ser uma lei de enquadramento ideológico»

Vozes do BE: — Muito bem!

O Sr. José Gusmão (BE): — » e apesar de haver aspectos positivos na proposta que o Governo hoje aqui nos traz há outros muito negativos e que determinam de forma muito perigosa a política orçamental para os próximos anos, uma delas é a regra do saldo orçamental que aí está definida, que é uma regra que proíbe as políticas anticrise e torna obrigatória a política de austeridade. Aliás, de acordo com esta regra, se este diploma já estivesse em vigor, o Governo actual, o Governo que teve 9,3% de défice em 2009 e 7,3% ou 6,8% em 2010 e que prevê 4,6% para 2011, este Governo, que é o Governo que temos, já estaria fora da lei.
Portanto, a primeira questão que lhe quero colocar, sem prejuízo da abordagem de outros temas mais à frente, é a de se saber se o Governo considera sensato, até com as lições que podemos extrair da actual crise, aprovar uma lei que vai amarrar as mãos a futuros governos, quando estiverem confrontados com contextos de crise económica.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Pinho de Almeida.

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O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado e das Finanças, a proposta de lei que agora discutimos, para além das matérias de organização do enquadramento orçamental, contém também algumas opções políticas e, de entre essas opções políticas, há uma, concreta, que gostaria de abordar, relativa à receita. Consagra-se, nesta proposta de lei, a imutabilidade da receita, ou seja, a partir do momento em que fosse aprovada, nos termos em que está, haveria uma coisa garantida: o nível de receita que viesse previsto numa proposta de Orçamento do Estado à Assembleia da República teria de ser, pelo menos, o mesmo que sairia daqui a final, depois de aprovado esse Orçamento, e só poderia aumentar, o que, para o contribuinte, significaria que o debate do Orçamento do Estado e as propostas que fossem apresentadas só poderiam piorar, isto é, só poderiam aumentar ainda mais o esforço do contribuinte, o que é absolutamente inaceitável.
Mas esta proposta de lei consagra ainda o princípio de que para cortar uma receita é preciso propor outra receita alternativa, ou seja, um partido que, de acordo com o seu programa eleitoral, aqui queira propor uma redução da carga fiscal, num ou noutro imposto, para ajudar as famílias ou as empresas, só o poderá fazer se aumentar a carga fiscal num outro imposto.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Exactamente!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Isto diz muito sobre a forma como o Partido Socialista e esta governação vêem as contas públicas.
No nosso entendimento, tem de ser exactamente ao contrário, isto é, para reduzir uma receita é necessário cortar uma despesa,»

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — » porque tem de ser esse o objectivo. O objectivo tem de ser, de uma vez por todas, reduzir a despesa, que está, como sabemos, totalmente descontrolada.

O Sr. João Galamba (PS): — De onde é que tirou essa ideia?!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — E não vale a pena vir dizer que o aumento da despesa ficou abaixo do previsto, porque o que é evidente é que a despesa continua sempre a aumentar e que esta governação é totalmente incapaz de, de uma vez por todas, inverter esse ciclo de crescimento da despesa.

Aplausos do CDS-PP.

Por isso, a pergunta que fazemos vai no sentido de saber se, na especialidade, o Governo está disposto a uma coisa que é essencial: reconhecer ao Parlamento a liberdade que este deve ter para, num debate orçamental, poder reduzir a receita. E isto por uma razão simples: porque entende que o contribuinte tem direito a ter mais liberdade e que é o Estado que é responsável por reduzir o excesso de despesa, que, infelizmente, ainda continua a ter.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Ainda para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado e das Finanças, começo por me referir, naturalmente, aos parabéns dirigidos pela Deputada Jamila Madeira ao Governo pela colocação da dívida soberana no mercado e fazendo três comentários.
Primeiro: com juros de 6,72% não há, de facto, nenhum especulador no mercado que não compre dívidas soberanas, sejam elas de Portugal ou de outro país qualquer!!» Segundo: o problema não é quem compra e quem vende! O problema é como é que o País vai pagar os juros e, sobretudo, quem é que, no País, vai pagar esses juros!!»

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Terceiro comentário: interrogo-me sobre porque é que a Sr.ª Deputada e o Sr. Ministro não exultaram com a perspectiva do Banco de Portugal, que prevê, para este ano, uma recessão de 1,3 e uma perda de emprego muito maior do que o dobro daquela que o Governo previu no Orçamento deste ano»! Bom!, mas acabemos com a girândola de foguetes da Sr.ª Deputada Jamila Madeira e do Sr. Ministro das Finanças — que talvez não tenha razão para a fazer» — e voltemo-nos para o debate da proposta de lei n.º 47/XI (2.ª).
No início do debate, o Deputado Duarte Pacheco e eu próprio fizemos uma interpelação que colocou bem a nu como esta proposta chega a esta Casa sem ter colhido os pareceres prévios, como deveria ter colhido, da Associação Nacional de Municípios Portugueses e das Regiões Autónomas, sobre matéria que lhes diz respeito, e de uma forma muito importante.
Mas, diz o Governo, esta proposta de lei quer estruturar o Orçamento do Estado na base da programação plurianual. Até aqui, e se fosse só isto, era, de facto, uma boa ideia, mas diz também o Governo que esta alteração procura aumentar a transparência e permitir uma melhor avaliação sobre a execução orçamental — diz o Governo, mas não é verdade! Isto já não é verdade, isto é falso! O Governo quer acabar com o Mapa XV, o do PIDDAC, o Governo quer que o País deixe de conhecer, com precisão, o investimento público na saúde, na educação, na segurança social, na infra-estruturação do País!» O Governo quer que o Orçamento do Estado por programas, com despesas plurianuais, passe a integrar tudo, isto é, despesas de investimento e despesas de funcionamento, tudo no mesmo molho, e que, naturalmente, não se possa fazer uma distinção completa — insisto, Sr. Ministro! — , uma distinção completa entre o que é investimento e o que é funcionamento!! Disse o Governo ontem, nesta Casa, que não, que há os mapas com a classificação económica, etc. Mas isto não é suficiente! Isto é falso! Isto nada acrescenta à transparência! Se o Governo diz que não quer esconder o investimento público na programação plurianual, tem de se comprometer por escrito, na lei, e não apenas por palavras, Sr. Ministro — é porque fartos de palavras estamos nós! — , a distinguir, na programação plurianual e nas diferentes medidas, o que é despesa de investimento e o que é despesa de funcionamento. O Governo quer transparência ou quer esconder, de facto, o investimento? Está ou não o Governo disposto e disponível para garantir, na lei, esta distinção entre programas?!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e das Finanças.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Gusmão, começo por lhe dizer, com toda a sinceridade, que estou muito de acordo com as suas observações quanto à operação de financiamento de hoje. Sim!, nas actuais circunstâncias, é razão para estarmos satisfeitos! Claro que a taxa é elevada, mas é a taxa que o mercado nos impõe, e impõe, de facto, custos acrescidos — não o ignoro — , sendo um factor de dificuldades para o País. Porém, nestas circunstâncias, neste contexto, e atentas até as expectativas que se estavam a gerar, o que aconteceu — importa reconhecê-lo — foi, efectivamente, positivo.
Partilho inteiramente da sua opinião, Sr. Deputado José Gusmão, de que, de facto, a direita se mostra profundamente desiludida com o sucesso da operação de hoje.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Nem falámos sobre isso!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Temos consciência de que é necessário continuar a pedir sacrifícios aos portugueses para ultrapassarmos estas dificuldades e o Governo não tem medo, não tem vergonha de pedir aos portugueses esses sacrifícios»

O Sr. João Oliveira (PCP): — Que não tem vergonha já nós sabíamos!»

O Sr. Honório Novo (PCP): — Mas devia ter vergonha, Sr. Ministro!

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O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Mas não, não tem! É porque o Governo tem consciência das dificuldades e foi, por isso, claramente, que pediu aos portugueses que fizéssemos sacrifícios importantes para ultrapassarmos as dificuldades. Vergonha tem a direita, que, nestas circunstâncias, é incapaz de defender medidas que imponham sacrifícios!

Aplausos do PS.

Mais: a direita tem vergonha de dar a cara por medidas que possam ser impopulares e que exijam sacrifícios; entende que ç mais fácil governar com o Fundo Monetário Internacional,»

Aplausos do PS.

» porque o Fundo Monetário Internacional é um bom bode expiatório para suportar as políticas relativamente às quais não tem a coragem de dar a cara.
Sr. Deputado Josç Gusmão, a regra não proíbe políticas anticrise»

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Ai não!»

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — A regra refere bem que é utilizado um critério assente no conceito do défice ajustado do ciclo. Por outro lado, a regra prevê que possa não ser respeitada, tem é de ser corrigida nos anos a seguir. Portanto, na eventualidade de uma conjuntura económica mais desfavorável, podem adoptar-se medidas de estímulo anticrise que ultrapassem a regra, que vão para além da regra, desde que, depois, se corrija o desvio, entretanto, operado.
Sr. Deputado, rigor e disciplina orçamental para mim não são uma questão ideológica; trata-se de uma questão fundamental para assegurar um quadro macroeconómico que garanta confiança e que garanta condições de crescimento da economia.
O Sr. Deputado João Pinho de Almeida deturpou a questão da receita, porque não é aqui dito que a receita terá, necessariamente, de aumentar.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Diz que não pode diminuir!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Não! A evolução da economia, a evolução orçamental permitirá que as propostas de Orçamento possam, de facto, conter reduções da carga fiscal! O que aqui é dito é o seguinte: temos de ter regras de rigor e disciplina orçamental, as quais se traduzem num critério que tem a ver com o saldo orçamental, e não podemos permitir que as alterações ao Orçamento ponham em causa o cumprimento dessas regras que têm a ver com o saldo orçamental, porque corremos o risco de descredibilizar a política orçamental e de minar a confiança dos agentes económicos.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Mas isto não é rigor nenhum!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Recordo ao Sr. Deputado que a reserva é absoluta, por parte da Assembleia da República, quanto à receita fiscal, e essa reserva não é retirada.
Sr. Deputado João Pinho de Almeida, o Sr. Deputado acusa o Governo de ter a despesa sem controlo e de aumentar a despesa»

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Não foi disso que o acusei, foi de não conseguir reduzi-la!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Permita-me que lhe diga «olha quem fala»!» É porque se há coisa em que não têm qualquer autoridade e credibilidade para falar é no controlo da despesa. O Governo do Partido Socialista foi o único que, na década passada, desceu a despesa e o peso da despesa no PIB.

Aplausos do PS.

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Os governos que mais aumentaram a despesa foram os governos do PSD e do CDS-PP»

Vozes do PSD: — Não é verdade!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — » e, por isso, não têm, de forma nenhuma, qualquer credibilidade ou autoridade para acusar este Governo de não saber controlar a despesa, porque os senhores, quando estiveram no governo, fizeram aumentar a despesa de uma forma vergonhosa! Sr. Deputado Honório Novo, e termino a minha resposta, permita-me que lhe diga, mais uma vez, como lhe disse ontem, na Comissão de Orçamento e Finanças, que não tem razão. Nós teremos de continuar a apresentar a Conta das Administrações Públicas, quer em Contabilidade Pública, quer em Contabilidade Nacional,»

O Sr. Honório Novo (PCP): — Isso é a Conta!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — » com a discriminação da despesa de investimento — isto resulta do sistema contabilístico, do sistema de contas apurado — , pelo que seremos sempre capazes de identificar quanto é que se gasta em investimento e em funcionamento.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Isso é Conta e não falei dela. Falei da proposta de lei do Orçamento do Estado!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — E, Sr. Deputado, vir invocar que é importante manter a distinção em PIDDAC, para podermos saber quanto se gasta em investimento, dizer que o PIDDAC é um sinal de investimento, sinceramente, dá-me vontade de rir.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Pacheco.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Três notas prévias, antes de irmos à Lei de Enquadramento Orçamental.
Sr. Ministro das Finanças, só o stress que o senhor está a viver pode desculpar o estilo e o conteúdo da sua intervenção»

Vozes do PSD: — Bem dito!

O Sr. João Galamba (PS): — Vem no Financial Times»

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Foi lamentável, Sr. Ministro!

Vozes do PSD: — Muito bem!

Protestos do PS.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Em primeiro lugar, nós estamos numa discussão, que queríamos séria, mas o Sr. Ministro facilmente «descansa» no debate partidário, no pior sentido da palavra.

Protestos do PS.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Ohhh!» Como não gostam dizem que não ç sçria!

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O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Em primeiro lugar, Sr. Ministro, sobre o leilão de hoje importa referir que Portugal vai colocar dívida pública no mercado praticamente todas as semanas, e é má para o País, é má para Portugal a pressão que foi colocada sobre esta operação. É preciso retirar esta pressão, de modo a que a operação possa ocorrer de uma forma sistemática, sensata e sem o stress que muitos agora puseram nela.
Em segundo lugar, também é importante dizer que o PSD, naturalmente, mostra agrado pela forma como foi colocada esta dívida pública, sem problemas de maior, com o facto de, a médio prazo, termos alcançado uma taxa de juro inferior à anterior e pelo facto de o Banco Central Europeu ter actuado de uma forma construtiva para se encontrar uma operação bem sucedida.

Protestos do Deputado do BE José Gusmão.

Quanto ao valor do défice de 2010, ainda no final, que ontem o senhor e o Sr. Primeiro-Ministro tiveram ocasião de anunciar ao País, também é importante dizer, Sr. Ministro, que se o objectivo foi alcançado — e ainda bem! — foi graças ao aumento de impostos que foi feito — e devemos agradecer aos portugueses por isso mesmo — ,»

Vozes do PSD: — Exactamente!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — » aumento de impostos esse que, por acaso, foi esquecido por V. Ex.ª, ontem,»

Vozes do PSD: — Bem lembrado!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — » e tambçm graças á PT e ao Fundos de Pensões do Grupo PT, que foram transferidos e de que, também ontem, os senhores se esqueceram.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento (Emanuel Augusto dos Santos): — E aos submarinos»!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Foi graças a isto tudo que foi alcançado o objectivo — e ainda bem que esse objectivo foi alcançado!

O Sr. Paulo Batista Santos (PSD): — Sim, porque a despesa não diminuiu!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Finalmente, Sr. Ministro, há poucos meses, foi o Sr. Ministro de Estado e das Finanças que, de uma forma inusitada, numa entrevista, falou de 7% como valor de referência para a entrada do Fundo Monetário Internacional.
Só há uma pergunta a fazer (para utilizar a linguagem de um colega seu do Grupo Parlamentar do PS): já estava a «salivar» quando deu essa entrevista?

Aplausos do PSD.

É bom fazer essa pergunta, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Fica-lhe muito bem usar essa linguagem»! É mesmo de «grande elevação«»

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Agora, quanto à Lei de Enquadramento Orçamental, Sr. Ministro, repito aquilo que já transmiti a VV. Ex.as: num processo orçamental, há sempre melhorias. Entendemos que essas melhorias têm de ser muito mais vastas que uma simples alteração à Lei de Enquadramento Orçamental, que a proposta de lei que aqui está ultrapassa aquilo que, para nós, devia ser uma lei de enquadramento: uma lei

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de enquadramento deve enquadrar os princípios gerais e não transformar-se num manual de instruções que é aquilo em que, na prática, esta lei se está a transformar.

O Sr. Paulo Batista Santos (PSD): — É»!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Mas também dissemos mais: dissemos que tem aspectos positivos e outros que nós pretendemos, durante o processo de especialidade, alterar. E por isso dizemos: entendendo nós que esta lei não é fundamental para que o Governo possa cumprir com eficácia o controlo da despesa pública e o controlo orçamental, mas se o Governo assim a considera não vai ficar sem esse instrumento, pois o princípio de responsabilidade sempre norteia a actuação do Partido Social-Democrata.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Sabemos que o controlo do processo orçamental é difícil: são mais de 700 as unidades orçamentais, muitas delas com»

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento: — São menos de 700!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Sr. Secretário de Estado, se tiver oportunidade, de certo, poderá colocarme as questões que entender e tentarei responder-lhe também.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Mas, dizia eu, são mais de 700 unidades orçamentais, pela sua complexidade o processo orçamental coloca naturais desafios de coordenação e de responsabilização. Logo, é positivo tudo aquilo que apareça como acções de reforço da transparência e do controlo da acção governativa. Muitas destas propostas resultam, inequivocamente, quer da colaboração que a OECE já nos tinha dado quer do grupo de trabalho que foi criado por iniciativa do Governo, mas só algumas foram contempladas, outras não, e durante o processo na especialidade de certo iremos confrontar o Governo e o Partido Socialista com muitas dessas outras recomendações que não foram contempladas na presente iniciativa legislativa.
Aspectos positivos? Já tive ocasião de referir.
Orçamentação por programas? Óptimo! Não era obrigatório estar na lei. Podia sê-lo feito, está. Nada a opor!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Já está a ser feito!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Já está a ser feito, não precisava, sequer, de vir, agora, na lei. Mas tudo bem, temos muito prazer em que isso aconteça — e, aliás, com o consequente fim do PIDDAC. Tal como consideramos positivo que os diversos ministros tenham, no primeiro trimestre de cada ano, de apresentar um relatório sobre a execução do programa.
Mas subsistem dúvidas, subsistem normas que merecem as nossas reservas na presente iniciativa. Por um lado, um conselho das finanças públicas, tal como está aqui exposto, porque nem sequer aguarda as recomendações, o resultado do grupo de trabalho das contas públicas que tem isso no seu mandato. Nós entendemos que devemos saber aquilo que esse grupo de trabalho está a preparar e que esse conselho das finanças públicas só deve ser criado depois de as recomendações desse grupo de trabalho terem sido apresentadas, terem sido discutidas entre nós e terem sido aprovadas pela maioria dos Deputados desta Casa.
Em segundo lugar, sobre o limite ao poder de emenda da Assembleia da República, em propostas de Orçamento do Estado, nós temos muitas dúvidas sobre a própria constitucionalidade desta proposta que está na presente iniciativa legislativa. A Assembleia da República é soberana para alterar o Orçamento e, tal como já foi referido ainda ontem em sede de Comissão de Orçamento e Finanças, aquilo que demonstraram estes

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(já 36!) anos de democracia foi que o sentido de responsabilidade esteve sempre presente, em todos os partidos políticos, e que nenhum Orçamento do Estado foi aprovado aqui, nesta Casa, em que o Governo se sentisse com o orçamento desvirtuado e que tivesse de assumir consequências. Não é necessária esta norma que vem coarctar o livre trabalho, o livre escrutínio, a livre apresentação, o livre poder de emenda que o Parlamento deve ter!! Finalmente, há um conjunto de questões técnicas, colocadas ainda hoje pela UTAO, que vão merecer a nossa reflexão.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Sabemos que a implementação desta medida vai demorar o seu tempo e que o impacto desta Lei de Enquadramento Orçamental não é imediato — porventura, nem sequer será já na presente execução orçamental.
Para além disso, sabemos que o impacto não é tão grande como, porventura, alguns podem estimar, porque muito daquilo que é o controlo do processo orçamental está fora do âmbito da lei de enquadramento.
Sabemos que muito do que de importante está nesta lei já hoje podia ser feito sem necessidade de o pôr na letra da lei, e que isso só acontece porque um Governo fraco procura força nas iniciativas legislativas.

O Sr. Paulo Batista Santos (PSD): — Muito bem!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Mas termino dizendo que se o Governo considera que necessita deste instrumento para melhor executar um controlo das contas públicas, o PSD, com o sentido de responsabilidade que sempre demonstrou, irá viabilizar esta iniciativa, sempre, sempre a pensar nos interesses de Portugal.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Venda.

A Sr.ª Teresa Venda (PS): — Sr.as e Srs. Deputados: A Lei de Enquadramento Orçamental é uma lei estruturante do processo orçamental e — recordo também aos Srs. Deputados — é uma lei cuja competência de aprovação é exclusiva do Parlamento.
Portanto, o que hoje estamos aqui a analisar é uma iniciativa do Governo no âmbito das suas competências para proceder a uma alteração da Lei de Enquadramento Orçamental. Aliás, conforme é salientado na «Exposição de motivos» da proposta de lei em apreço, a prática vinha demonstrando a necessidade de introduzir alterações significativas na Lei de Enquadramento Orçamental. E os temas que esta lei contempla têm sido, aliás, acompanhados pelo Parlamento e foram-no na anterior legislatura.
Hoje, temos mais consciência de que o processo orçamental que promova a eficiência e a eficácia da despesa pública e prossiga a sustentabilidade das contas públicas contribuiu decididamente para a estabilidade macroeconómica e para o aumento da produtividade e do potencial crescimento da economia.
Podemos, por isso, dizer que era aguardada com expectativa esta proposta de lei e, por isso, tenho de referir que não concordo com a intervenção inicial do Sr. Deputado Duarte Pacheco, que se esqueceu do trabalho que foi desenvolvido na anterior legislatura,»

A Sr.ª Jamila Madeira (PS): — Muito bem!

A Sr.ª Teresa Venda (PS): — » no àmbito da Comissão de Orçamento e Finanças, para promover, de facto, a actualização desta Lei.

A Sr.ª Jamila Madeira (PS): — Bem lembrado!

A Sr.ª Teresa Venda (PS): — De facto, o resultado da recepção feita na anterior legislatura, quer no âmbito da Comissão de Orçamento e Finanças quer no da comissão extraordinária que reviu o Regimento, fez sentir a necessidade de proceder à revisão desta lei. E, por isso, não posso deixar de estranhar o seu comentário inicial, Sr. Deputado Duarte Pacheco.

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Salienta-se, aliás, que o Governo foi dando conhecimento à Comissão de Orçamento e Finanças das diligências desenvolvidas no sentido de identificar o modelo mais adequado à concretização da orçamentação pró programas, da apresentação de base plurianual e do reforço dos mecanismos de prestação de contas, designadamente.
Recordam-se, ainda, alguns dos trabalhos que acompanhámos: tivemos a oportunidade de acompanhar, porque nos foi apresentado, o relatório elaborado pela comissão para orçamentação por programas, em 2007; tivemos a oportunidade também de acompanhar — nomeadamente a Unidade Técnica de Apoio Orçamental que participou nele — o relatório de avaliação do processo orçamental português, produzido pela OCDE a encomenda do Governo, que data de 2008; e ainda tivemos a oportunidade de acompanhar um documento elaborado pelo grupo de trabalho nomeado para a revisão da Lei de Enquadramento Orçamental e coordenado pelo Dr. Luís Morais Sarmento.
Por último, recordo ainda o parecer que nos foi apresentado pelo Conselho Económico e Social que reviu a finalidade e o conteúdo das Grandes Opções do Plano e que foi também objecto de debate em âmbito de comissão orçamental.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Esta breve síntese enquadradora do processo que conduziu à proposta de lei em discussão revela a importância da matéria em causa e revela que quer o Parlamento quer o Governo sentiram a necessidade de alterar e de introduzir na Lei de Enquadramento Orçamental as melhores práticas no contexto internacional as melhores práticas no contexto internacional. Aliás, essa importância é reforçada na situação actual em que se deve assegurar a todos os níveis da administração do Estado maior disciplina e maior rigor na gestão orçamental e reforço na transparência das finanças públicas.
Da proposta em análise destacam-se das seguintes alterações que introduzem as mais profundas alterações ao processo orçamental em vigor: desde logo, a criação do quadro plurianual de programação orçamental com um horizonte de quatro anos, que será debatido e apresentado simultaneamente com a primeira proposta de lei do Orçamento do Estado, apresentado após a tomada de posse de um novo governo.
Este quadro plurianual definirá os limites da despesa de cada programa orçamental»

O Sr. Honório Novo (PCP): — Fale das actualizações, Sr.ª Deputada, que é uma coisa de que o Sr.
Ministro não quer sequer falar! O Sr. Ministro quando não quer responder utiliza umas boas estratçgias»

A Sr.ª Teresa Venda (PS): — Já vou falar, a seguir»

A Sr.ª Jamila Madeira (PS): — Tenha calma, Sr. Deputado Honório Novo!

A Sr.ª Teresa Venda (PS): — Este quadro plurianual definirá os limites da despesa de cada programa orçamental executado de forma vertical e actualizado, anualmente,»

O Sr. Honório Novo (PCP): — E como é que é feita?

A Sr.ª Teresa Venda (PS): — Vamos ver, vamos ver»

O Sr. Honório Novo (PCP): — Vá, vá» Vamos lá a ver!

A Sr.ª Teresa Venda (PS): — Dizia eu que este quadro plurianual definirá os limites da despesa de cada programa orçamental executado de forma vertical e actualizado, anualmente, em consonância com os objectivos estabelecidos no Programa de Estabilidade e Crescimento.
Recordo ainda que este projecto de revisão da Lei de Enquadramento Orçamental prevê que o princípio do processo orçamental se inicie com a revisão anual do Programa de Estabilidade e Crescimento, elaborado pelo Governo, efectuado de acordo com a regulamentação comunitária, especificando, concretamente, medidas de política económica e orçamental, apresentando de forma suficiente os efeitos financeiros, devidamente justificados, e o respectivo calendário de execução.
A imposição de uma regra de saldo orçamental no conjunto das administrações públicas é também um indicador que procura promover a segurança e a estabilidade do controlo das contas públicas, estabelecendo

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um limite mínimo para o seu valor, compatível com os compromissos assumidos por Portugal no âmbito do processo europeu.
Outra alteração proposta é a clarificação das normas sobre o limite de endividamento das autarquias locais e das regiões autónomas, com ressalva, apenas, dos procedimentos excepcionais que já se prevêem na lei para garantir a estabilidade orçamental.
É ainda de salientar o alargamento do universo das entidades orçamentais ao qual é aplicável a disciplina orçamental, porque deverá incluir todas as entidades que sejam consideradas para efeitos do sistema europeu de contas nacionais e regionais.
Esta alargamento de carácter imperativo a todo o universo orçamental dos princípios de estabilidade orçamental, de solidariedade recíproca e de transparência orçamental — princípios estes que estavam só de forma indicativa na Lei de Estabilidade Orçamental — passa a ter um carácter imperativo.
Recordo aos Srs. Deputados que a transparência no domínio orçamental implica que a disponibilização de informação é completa, é fiável, é compreensível e deve ser de fácil acesso sobre todas as actividades do sector público. Ora, isto é, de facto, um reforço no escrutínio da despesa pública! A existência desta informação permite melhorar a qualidade das decisões da política económica e melhora o acesso e a definição de novas políticas. É de salientar ainda a criação do conselho de finanças públicas, cujos objectivos já foram aqui abordados no debate.
Finalmente, salientava, em matéria de prestação de contas, dois novos compromissos do Governo: a apresentação, até 31 de Março, do relatório de execução dos programas, que nos permite perceber onde foram utilizados os recursos e com que resultados, o que constitui um processo bastante inovador deste nosso projecto; e a apresentação antecipada, em pelo menos um mês, da Conta Geral do Estado, que deverá ser apresentada até 31 de Maio do ano seguinte a que respeita.
Na sequência do debate na generalidade e na Comissão de Orçamento e Finanças, já tivemos oportunidade de recolher alguns comentários para melhorar esta proposta de lei. Verificámos, aliás, que há matérias de amplo consenso e outras que suscitam dúvidas e que precisam de clarificação.
Conforme comecei por referir, esta é uma lei da competência exclusiva da Assembleia da República. Na especialidade, poderemos aprofundar estes problemas, que devem poder ser clarificados e obter um consenso mais generalizado.
Regista-se, aliás, a abertura do PSD, no âmbito do processo de revisão constitucional em curso, para se reverem os artigos que remetem ainda hoje para o plano e para a lei das Grandes Opções do Plano. Este é um instrumento de planeamento claramente caído em desuso e agora ainda mais desajustado face ao compromisso de criar uma metodologia de quadro plurianual de programação orçamental com metas quantificadas e adequadas ao Programa do Governo para a Legislatura.
Estou certa de que, no âmbito da discussão na especialidade, encontraremos as formulações mais apropriadas para virmos a dispor de uma Lei de Enquadramento Orçamental com os mecanismos mais adequados à coordenação e extensão da disciplina do enquadramento orçamental a todos os subsectores da administração central do Estado; de uma lei que promova o reforço do controlo financeiro e a concretização da programação plurianual, bem como a responsabilização dos resultados alcançados; de uma lei que reforce o escrutínio de aplicação dos dinheiros públicos e que credibilize o controlo das contas do Estado interna e externamente.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Honório.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Esta alteração à Lei de Enquadramento Orçamental responde ao modelo de governação económica da União Europeia, a um modelo de governação económica que assenta na austeridade. Por isso, a discussão a que aqui procedemos hoje não é uma discussão técnica, não é uma discussão de menor importância, é uma discussão sobre as grandes escolhas políticas de Portugal e da União Europeia.
Quero recordar que este modelo de governação económica, que assenta na austeridade sobre austeridade, vive destes dois grandes passos: por um lado, o semestre o europeu, relativamente ao qual o

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Governo irá a exame na próxima Primavera, tendo de dar conta se tem sido um bom aluno — o Sr. Ministro diz hoje que foi; por outro lado, um outro passo fundamental é a reforma estrutural do Pacto de Estabilidade e Crescimento, reforma essa que retira qualquer componente preventivo ao Pacto de Estabilidade e Crescimento e dá-lhe claramente o formato de normalização, de formatação dos orçamentos nacionais e de condicionamento das grandes opções nacionais.
A verdade, Sr. Ministro e demais membros do Governo presentes, é que o País deveria conhecer hoje porque e como é que o seu Governo vai conseguir, em dois anos, a redução do défice para 3%, a redução da dívida para 60% — a imposição é esta — e o condicionamento, entretanto total, da despesa pública sobre o princípio da prudência orçamental,»

O Sr. José Gusmão (BE): — Exactamente!

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — » este famoso princípio da prudência orçamental, que prç-condiciona todas as grandes opções, nomeadamente da despesa que os governos podem fazer. A menção desta despesa, por referência ao PIB, é feita por Bruxelas, não pelo Sr. Ministro das Finanças.
Portanto, estamos a discutir o modelo de governo económico para a Europa, que é um modelo de fiscalização, de controlo, de condicionamento das opções fundamentais dos países e que assenta numa política de disciplina e de sanções, sanções essas que, convém recordar, são o prémio dos países cumpridores desta disciplina férrea, deste garrote da austeridade.
Sr. Ministro, é disto que estamos a falar! É esta questão que estamos hoje aqui a discutir no quadro da exigência da resposta à crise. A verdade, Sr. Ministro das Finanças, é que hoje pode dizer que acabou temporariamente o suspiro da direita pela vinda do FMI. Suspiram todos os dias: vem hoje? Não vem hoje? Vem amanhã? Vem depois de amanhã? Temporariamente, o suspiro foi contido.
A verdade é que a resposta teria de ser um outro modelo de governação económica para a Europa, que retivesse completamente todo este jogo manipulador, em que o chefe do Deustche Bank diz «acabou a credibilidade de Portugal, tem de pedir ajuda externa», em que o Eurogrupo diz exactamente a mesma coisa, ou seja, que Portugal tem de pedir ajuda externa, e em que o Sr. Durão Barroso diz «fiquem caladinhos que a Comissão Europeia estará a tratar do fundo de auxílio dos 100 000 milhões de euros a Portugal e, portanto, estamos a tratar do assunto».
É só com um outro modelo de governação económica, que não este, que Portugal e a Europa podem encontrar um caminho alternativo.

O Sr. José Gusmão (BE): — Exactamente!

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Já agora, Sr. Ministro, este caminho exige resposta clara aos dados que evitou neste debate, porque a austeridade só tem conduzido à recessão. Não falou sobre os números do desemprego, sobre a quebra do PIB.
A austeridade tem sido a recessão, tem sido a «pele» dos trabalhadores, dos pensionistas, dos mais fracos. A questão, Sr. Ministro, é se, para além da «pele», vem a «carne» e vêm os «ossos». Este é o debate que hoje estamos a aqui a fazer, com esta alteração à Lei de Enquadramento Orçamental.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Ministro, hoje parece não estar de muito bom humor. Julgo que mesmo as notícias da colocação da dívida soberana não fizeram alterar o seu humor. Provavelmente, é porque, ao lado dessas boas notícias, ainda está a pensar nas previsões do Banco de Portugal e do aumento do desemprego em Portugal.
Sr. Ministro, não deve ter ouvido, ou ouviu mal, as minhas questões. Falei, de facto, no Mapa XV, mas falei sobretudo na distinção de investimento público em saúde, em educação, em segurança social, em infra-

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estruturação do País e do conjunto das despesas dos programas e das medidas plurianuais. Há que fazer essa distinção.
Desafiei-o a distinguir claramente, a fazer a discriminação e a desagregação das verbas nos programas. E respondeu-me como? Com as contas! Ó Sr. Ministro, concluo também de forma clara: o Governo está, ou parece estar, a menos que dê provas em sentido contrário, interessado em esconder o investimento público tanto quanto puder esconder. Esta é a verdade! Sr. Ministro, esta proposta de lei é muito mais do que apenas uma estruturação, em programas plurianuais, do Orçamento do Estado. Esta proposta de lei verte na lei o conjunto de imposições a que a União Europeia, com o acordo deste Governo, quer obrigar este Parlamento e este País. Estas imposições traduzem-se, na prática — vou falar para o Governo mas também para a Sr.ª Deputada Teresa Venda — , em remeter também para Bruxelas, juntamente com as actualizações anuais (actualizações, Sr.ª Deputada!) do Programa de Estabilidade e Crescimento, os projectos das actualizações anuais (ouviu, Sr.ª Deputada?) do quadro plurianual de programação orçamental.
Estas actualizações anuais da programação orçamental serão, portanto, remetidas para Bruxelas em Abril/Maio de cada ano. Na altura, serão apenas debatidas no Parlamento, não serão votadas. Serão depois observadas, analisadas e, eventualmente, corrigidas em Bruxelas, recebendo ou não o ok do directório francoalemão. É o que está na proposta de lei.
Só depois de corrigidas ou confirmadas por entidades externas ao País serão votadas, juntamente com a lei do Orçamento do Estado seguinte às actualizações. É exactamente isto que está proposto.
Ontem, coloquei a seguinte questão ao Sr. Ministro, que não respondeu porque não pode responder: «Confirma que será assim com as actualizações do quadro plurianual de despesas?». Respondeu nem «sim» nem «sopas», silêncio.
Naturalmente, podemos concluir que o Governo quer impor a este Parlamento a sua versão das suas competências orçamentais plenas. Se assim for, se assim se confirmar, se isso não for alterado em sede de especialidade — e suponho que não será porque, quanto a isto, o bloco central, alargado ao CDS, está de acordo, apesar das «cobras e lagartos» que o CDS disse, em 2004, sobre uma solução exactamente deste tipo, já então proposta pelo PS (agora esquecem-se, mas vão, se calhar, estar de acordo) — , estarão a subverter-se as competências do Parlamento português ao arrepio da Constituição, nomeadamente dos artigos 161.º a 164.º.
Esperemos que, por uma vez, o Presidente/candidato Cavaco Silva não apadrinhe esta solução.
Esta proposta de lei, porém, é bem mais perversa do que apenas o que eu disse — e já era muito se fosse isto apenas! Esta proposta de lei visa aumentar a opacidade em vez de, como anuncia, promover a transparência; visa escamotear a percepção rigorosa, como disse, do investimento público nos diversos sectores da administração central. A menos que demonstrem o contrário, a menos que estejam disponíveis para fazer o contrário na especialidade, é isto que diz.
Visa também governamentalizar o debate orçamental, impondo condicionamentos e imposições à apresentação de propostas de alteração orçamental, por exemplo em matéria de benefícios fiscais, o que, como já aqui foi referido, e bem, faria com que o governo passasse a ser a única entidade em condições de facto de apresentar alterações em certas matérias no debate do Orçamento do Estado, o que parece ser, de novo, e mais uma vez, completamente inconstitucional.
Visa transformar em definitivas as consignações das receitas criadas por lei ordinária.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, peço-lhe que conclua.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Concluo já, Sr. Presidente.
Visa ainda criar uma comissão de peritos, o chamado conselho de finanças públicas, que toda esta Câmara, com excepção do PS, é verdade, em 2004, acusou de ser um factor de condicionamento do debate orçamental e de limitação às balizas do pensamento único e das orientações do Pacto de Estabilidade e Crescimento.
Estas propostas não parecem, assim, ser uma proposta de lei, parecem antes ser uma proposta de subversão da lei democrática que dá voz a este Parlamento.

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Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Pinho de Almeida.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Conforme tivemos já oportunidade de dizer aqui, esta é uma proposta de lei que, se tem como objectivo disciplinar as contas públicas, está longe de atingir esse objectivo.
Voltamos a dizer que a forma como tenta introduzir mecanismos de controlo da despesa é exageradamente burocrática e muito pouco eficaz do ponto de vista concreto. A forma como trata a receita permite que esta vá aumentando sem qualquer controlo, sendo o contribuinte o principal prejudicado com essa opção.
O que foi dito, contra-respondendo ao que disse o Sr. Ministro, não foi que o Parlamento está obrigado a aumentar a despesa. Não, o problema é que o Parlamento não a pode reduzir. Nos termos desta proposta, o Parlamento, dentro da sua liberdade, não conseguir reduzir a despesa.
Como diz, e bem, o Sr. Ministro, de facto, é poder exclusivo do Parlamento aprovar, por exemplo, a criação de impostos. Acontece que, com esta lei, se o Parlamento quiser reduzir a carga fiscal que o Governo propõe não o pode fazer, e isso é de todo inaceitável.
Como já foi dito também, quase tudo o que esta lei consagra de novo já estava na disponibilidade do Governo. O exemplo mais claro disso é o Orçamento por programas, sendo que, noutras áreas, aquilo que também entra de novo na proposta de lei são questões que estávamos obrigados a transpor para a legislação nacional por imposição de legislação europeia. Ou seja, o esforço do Governo é indiferente à aprovação desta proposta de lei e não constitui nenhuma novidade para o quadro em que já nos regíamos para o enquadramento orçamental.
A proposta de lei muda pormenores, mas mantém o essencial. Se formos ver o resultado final desta lei, tirando as críticas que fazemos, de bom pouco ou nada se retira. Se assim for, podemos, no máximo dos máximos, dar o benefício da dúvida, mas nunca podemos aprovar, em texto final, uma lei com este conteúdo.
Quanto à questão do Conselho, o Sr. Ministro diz que existem inúmeras entidades que dão a sua opinião e o seu parecer. É verdade. O que parece que o Governo quer é ter também a sua entidade para dar opinião e parecer. Sr. Ministro, se assim for, não acrescenta absolutamente nada, é totalmente desnecessário, cria mais um órgão que, a bem da transparência de uma análise profunda, não beneficia em muito e que apenas trará mais ruído a uma discussão que nada beneficia com isso.

Aplausos do CDS-PP.

Se já há várias entidades (e há entidades independentes) que se pronunciam, o que ganhamos com a opinião de uma entidade que tem a sua génese dentro do próprio Governo? Relativamente ao poder de emenda, não estamos disponíveis para abdicar daquilo que é o poder de intervenção do Parlamento, em sede de alteração às propostas orçamentais. Não aceitamos de forma nenhuma as restrições que aqui se apresentam porque o que se põe em causa não tem a ver com o saldo, tem a ver com a limitação do poder do Parlamento de, em relação à receita, fazer opções políticas claras e, antes de tudo, fazer uma opção política clara de ir reduzindo gradualmente a despesa. Não aceitamos prescindir dessa possibilidade.
Esta proposta não introduz limitações que para nós eram fundamentais: não introduz um limite à carga fiscal e não introduz um limite à despesa. Esses eram limites essenciais. Se queríamos ser rigorosos, se queríamos mudar alguma coisa do ponto de vista da política orçamental, então que puséssemos um limite na despesa e na carga fiscal.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Assim, sim, estávamos a dar sinais de mudança e estávamos, concretamente, a mudar a política orçamental em Portugal.

Aplausos do CDS-PP.

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A forma burocrática como introduz o controlo da despesa faz com que se concentre a responsabilidade no Ministro das Finanças, impedindo o escrutínio sector a sector e a responsabilidade de ministro a ministro nas diferentes áreas sectoriais, o que também não é positivo para a transparência nem para o papel do Parlamento de fiscalização de cada uma dessas áreas.
Também é muito insatisfatório o que se introduz para informação do Parlamento na discussão de tudo aquilo que está fora do perímetro orçamental. É que saber o que se passa plurianualmente não é suficiente através do Orçamento. É preciso saber os encargos plurianuais das parcerias público-privadas, é preciso saber os encargos plurianuais do sector empresarial do Estado e haver também transparência em relação a estas áreas que estão fora do perímetro orçamental.
É preciso igualmente disciplinar o regime das cativações para que estas não distorçam o efeito final de um Orçamento que, discutindo-se com um determinado nível de cativações, pode ser aquilo, mas pode ser também outra coisa, se as cativações forem geridas de uma ou de outra forma, como acontece neste momento.
No que diz respeito às questões fiscais, já dissemos e propusemos, sem a concordância do Governo, é certo, que se deveria discutir, anualmente, desencontrado do debate orçamental, uma informação sobre política fiscal para que todos os anos se soubesse qual é a política fiscal de um governo, quais são as opções fiscais relativamente às famílias e às empresas e para que anualmente também se pudesse fazer o escrutínio da eficácia dessas políticas. Também relativamente a isso não se introduz nada de novo.
Quanto à questão da retenção na fonte, esta tem sido usada — porque é feita por portaria — para perverter ou desvirtuar aquilo que é aprovado em sede de Orçamento do Estado, introduzindo no impacto da política fiscal nas famílias ou nas empresas variáveis que o Parlamento não consegue discutir porque essas tabelas de retenção na fonte são aprovadas por portaria.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — É por isso que, no limite, daremos o benefício da dúvida a esta lei, mas se ela continuar a optar pela burocratização do controlo da despesa e continuar a dar via verde ao aumento da receita, não estaremos dispostos a votá-la em sede de votação final.

Aplausos do CDS-PP.

Se não aumentar a transparência, se não criar regras claras de redução da despesa e da carga fiscal, esta é uma lei que nunca poderá contar com o apoio do CDS.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e das Finanças.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, gostaria de começar por clarificar alguns aspectos quanto a execução orçamental e quanto a despesa.
Gostaria de dizer, de uma forma muito clara, que os governos do Partido Socialista sabem o que é controlar a despesa e têm-na controlado, o que contrasta com a prática do governo PSD/CDS. Gostaria de relembrar — e de acordo com as estatísticas das contas públicas do Instituto Nacional de Estatística — que em dois anos, nos anos de 2003 e 2004, o governo PSD/CDS aumentou a despesa pública em 7216 milhões de euros. Repito: em dois anos, 7216 milhões de euros! E, que eu saiba, não ocorreu nessa altura uma crise internacional grave com as sérias repercussões económicas e sociais da crise que nos afecta desde 2008.
Esclareço também, no que se refere à execução de 2010, que temos uma melhoria da execução face ao esperado de 0,5% do PIB. Isto não conta com qualquer efeito da PT; foi, pura e simplesmente, do lado da despesa, da receita fiscal e do desempenho da segurança social. Desta melhoria, metade corresponde à despesa do Estado inferior àquela que era esperada. Não há aqui qualquer elemento extraordinário que esteja a influenciar este melhor desempenho.

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Constato que o PSD, há uns meses, reclamava que queria ver resultados do PEC revisto, que apoiou.
Agora desdenha dos resultados obtidos pelas medidas que combinámos.

Aplausos do PS.

O mote central desta revisão da lei é o de, indubitavelmente, termos um quadro de maior rigor e disciplina.
E gostaria de esclarecer a Sr.ª Deputada do Bloco de Esquerda que para isso é fundamental reduzir o défice e a dívida. Vejo que para a Sr.ª Deputada isso é secundário. Mas, claramente, se há algo para que esta crise nos alerta e nos exige é uma correcção. O País não pode continuar a gastar recursos que não tem, e isso implica austeridade. E esta austeridade é incontornável, com ou sem União Europeia, com este modelo de governação ou com qualquer outro que a Sr.ª Deputada defende, mas que não explicitou.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Mas explicitar como?

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Finalmente, Sr. Deputado João Pinho de Almeida, ouvi-o falar sobre o Conselho de Finanças Públicas, sobre cativações, sobre controlo de despesa, sobre impostos, e devo dizer que o Sr. Deputado ignora completamente a experiência de outros países nesta matéria. O Sr. Deputado falou, falou, mas claramente mostrou que não sabe do que está a falar.

Aplausos do PS.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Isso nem parece seu, Sr. Ministro!

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Gusmão.

O Sr. José Gusmão (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, há pouco contestou a posição do Bloco de Esquerda de que esta lei de enquadramento orçamental proíbe políticas anti-crise e apresentou, para esse efeito, dois argumentos: o primeiro é o de que a regra que é aplicada ao saldo orçamental é aplicada ao saldo orçamental corrigido dos efeitos cíclicos e de operações extraordinárias. Mas, de acordo com o quadro das contas das administrações públicas de 2009-2011, sendo certo que 2010 é uma estimativa e 2011 uma previsão, que constava do Orçamento do Estado para 2011, o saldo estrutural é, de facto, inferior para os anos de 2009 e 2011 (para o ano de 2010 é superior), mas em qualquer destes anos mantém-se significativamente acima dos objectivos de médio prazo para o défice das nossas contas públicas.
Em qualquer destes três anos, o nosso saldo estrutural, nos termos em que está definido na lei, está acima dos objectivos de médio prazo. Em 2009, tivemos um défice corrigido dos efeitos cíclicos e de operações extraordinárias de 8,3%. A correcção não ocorreu, de facto, nos dois exercícios posteriores e, portanto, o Governo, caso esta lei estivesse actualmente em vigor, estaria, de facto, fora da lei, como disse na intervenção inicial, quer do ponto de vista da utilização do saldo orçamental tal como ele está definido neste projecto de lei, quer do ponto de vista da sua correcção em exercícios posteriores.
O Sr. Ministro disse que é necessário sempre rigor e disciplina orçamental e que a lei de enquadramento orçamental deve impor esse rigor e disciplina orçamental. Estamos de acordo com essa perspectiva. Mas não há nenhuma relação entre uma política expansionista e falta de rigor orçamental como não há nenhuma relação entre uma política de austeridade e uma política rigorosa de combate ao desperdício. Umas e outras não têm, de forma alguma, que estar ligadas e, por exemplo, a tarefa que é dada ao Conselho das Finanças Públicas tem toda a relevância desse ponto de vista.
Não nos opomos a que uma entidade possa supervisionar o rigor da execução orçamental, do combate aos desperdícios e da imposição, da disciplina em relação às escolhas que foram assumidas. Já é totalmente diferente que um organismo que não está sujeito ao controlo democrático, ao controlo das escolhas políticas que os portugueses fizeram em momento próprio, possa pronunciar-se sobre a sustentabilidade de longo prazo das contas públicas. É que a sustentabilidade de longo prazo das contas públicas implica um conjunto de variáveis de elevada complexidade como seja o crescimento da economia, a evolução do desemprego e

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outras variáveis de natureza macroeconómica que estão subordinadas a escolhas, que são escolhas políticas e que não têm nada de técnico.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem de concluir.

O Sr. José Gusmão (BE): — Vou concluir, Sr. Presidente.
Quando discutimos sustentabilidade de longo prazo das contas públicas, estamos a discutir escolhas fundamentais de política económica. Não é verdade que o Conselho das Finanças Públicas, tal como está definido nesta proposta de lei, seja de facto um Conselho eminentemente técnico e que acompanhe os aspectos puramente técnicos da execução orçamental.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Pacheco.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro, a sua última intervenção obriga-me a fazer aqui algumas precisões face aos dados que referiu.
Em primeiro lugar, em relação à execução, repito o que disse, Sr. Ministro: saudamos o facto de o objectivo ter sido alcançado. Não esquecemos nenhum dos contributos que são dados para que esse objectivo tivesse sido alcançado e lamentamos que ontem, na conferência de imprensa, o objectivo tivesse sido realçado, esquecendo-se, tanto o Sr. Primeiro-Ministro como o Sr. Ministro das Finanças, de salientar todos os contributos que ocorreram, nomeadamente o aumento de impostos efectuado, que foi fundamental e que mereceu a nossa viabilização para se alcançar este objectivo.
Temos que agradecer aos portugueses o contributo que todos deram para que esse objectivo nacional tivesse sido alcançado.
Sr. Ministro, embora estejamos mais preocupados com o futuro do que com o passado, não podemos esquecer o que tem sido o passado recente. O Sr. Ministro fez referência ao aumento da despesa entre 2002 e 2004, dizendo que a despesa cresceu 2,3% do PIB, mas esqueceu-se de dizer que entre 2008 e 2010 cresceu 5,3% do PIB, 9400 milhões de euros, um aumento maior do que o que referiu para o período anterior.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Diga-me que crise é que tiveram!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Sr. Ministro, a verdade é esta: há sempre justificações para tudo aquilo que aconteça. Mas há um dado que é factual: se a vossa governação, ao longo destes anos, tivesse sido exemplar, a dívida pública não tinha evoluído como evoluiu.
E a verdade é também esta: quando os senhores chegaram ao poder, a dívida pública correspondia a cerca de 57% a 58% do PIB; e, hoje, ultrapassa os 86% do PIB.

O Sr. Paulo Batista Santos (PSD): — É verdade!

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento: — Com uma crise pelo meio!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Os factos são os factos, Sr. Ministro, para o bem e para o mal.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Venda.

A Sr.ª Teresa Venda (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Na conclusão deste debate, quero somente salientar dois pontos. Por um lado, verifico que há acordo relativamente a algumas propostas que integram esta proposta de lei e que, em sede de comissão, na

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especialidade, teremos hipótese de chegar a uma lei estruturante, mais actual e mais moderna, do processo orçamental.
Mas não posso deixar de estranhar a desvalorização que o Parlamento, da direita à esquerda, faz de uma proposta da iniciativa do Governo que claramente reforça o escrutínio do poder do Parlamento na despesa pública e no controlo do Orçamento do Estado.

Aplausos do PS.

Protestos do Deputado do PCP Honório Novo.

Apesar de dizerem que nada seria necessário fazer, que esta lei para nada seria necessária, saliento, pelo menos, uma questão fundamental, em que esta lei é profundamente inovadora e segue as melhores práticas internacionais, de que estávamos muito afastados, e que tem a ver com a plurianualidade introduzida por esta lei. Esta plurianualidade permite acompanhar a execução da despesa no dia-a-dia e analisar o impacto a médio e a longo prazos. Permite, aliás, combater desperdícios, coisa que a direita tanto parece querer prosseguir, mas não querer que fique escrito em termos de lei.

Aplausos do PS.

Relativamente à esquerda, não posso deixar de registar que há Deputados e grupos parlamentares neste Parlamento que pensam que o Governo português, inserido numa comunidade económica e monetária, não deve respeitar os compromissos assumidos, a saber, não deve promover uma política orçamental equilibrada e conter as despesas ao nível das receitas que é possível mobilizar junto dos cidadãos portugueses.
Isso é lamentável e penso que a lei a sair do debate, na especialidade, não pode abdicar dessa responsabilidade, pois é essa responsabilidade que nos permite ter um modelo de crescimento sustentado e suportado a nível internacional.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e das Finanças.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Gostaria de começar por comentar o esclarecimento dado pelo Sr. Deputado Duarte Pacheco.
Sr. Deputado, há uma diferença muito grande entre gastar em dois anos aquilo que referiu na governação do Partido Socialista, com uma gravíssima crise, e gastar esse dinheiro para apoiar e estimular a economia e apoiar milhares e milhares de famílias portuguesas afectadas pela crise.
De facto, não sei que razão válida tiveram, durante a vossa governação, em termos sociais e económicos, para aumentar a despesa em mais de 7000 milhões de euros.

Aplausos do PS.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Foi a crise de 2003!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A crise internacional teve consequências orçamentais nos vários países da Europa e no mundo. Em particular na Europa, os desenvolvimentos orçamentais estão a afectar a estabilidade do euro, o que requer que a Europa tome iniciativas no sentido de reforçar o rigor e a disciplina orçamentais.
Esta é uma reforma estrutural europeia fundamental. Portugal não pode ficar de fora desta reforma e tem de fazer a sua própria reforma. Se partilhamos o euro, temos de partilhar as responsabilidades, acompanhando estas reformas.
Isto requer maior coordenação e cooperação europeia. Sim, temos de participar no Semestre Europeu para reforçarmos a credibilidade do euro e a sua estabilidade.

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As propostas aqui apresentadas querem, de facto, definir um quadro de maior rigor e disciplina, um quadro de maior transparência e de responsabilização. E quanto a transparência, esclareço, mais uma vez, o Sr. Deputado Honório Novo, de que não tem razão.

O Sr. Presidente: — Queira concluir, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Deputado, no artigo 32.º da Lei de enquadramento orçamental, diz-se: «(») Mapa IV, ‘Despesas dos serviços integrados, por classificação económica’; (») Mapa IX, ‘Despesas dos serviços e fundos autónomos, por classificação económica’; (») Mapa XII, ‘Despesas da segurança social, por classificação económica’; (») Mapa XIV, ‘Despesas de cada subsistema, por classificação económica’; (»)«. E aqui a distinção entre despesas correntes e despesas de investimento terá de ser feita.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Esta iniciativa reforça a credibilidade do nosso processo orçamental, reforça a nossa capacidade de promover a sustentabilidade das finanças públicas.
Registo, com agrado, a posição do PSD, no sentido de viabilizar estas melhorias da proposta de lei que altera a Lei de enquadramento orçamental e estou certo de que os demais Deputados compreenderão a importância desta mudança para reforçarmos a credibilidade do País e para podermos enfrentar os desafios que temos pela frente.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, está encerrado o debate, na generalidade, da proposta de lei n.º 47/XI (2.ª) — Procede à quinta alteração à Lei de enquadramento orçamental, aprovada pela Lei n.º 91/2001, de 20 de Agosto.
Sr.as e Srs. Deputados, passamos à apreciação da petição n.º 56/XI (1.ª) — Apresentada por Paulo Alexandre Santos Coelho e outros, solicitando à Assembleia da República a repavimentação da ER361, no troço entre Alcanede e Alcanena.
Dado que o Sr. Deputado António Filipe, que era o primeiro orador inscrito, não se encontra neste momento no Hemiciclo, tem a palavra a Sr.ª Deputada Anabela Freitas.

A Sr.ª Anabela Freitas (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Começo por saudar os mais de 4600 peticionários por este acto de cidadania.
Manifestam-se os peticionários contra a degradação da estrada regional n.º 361, no troço entre Alcanede e Alcanena, considerando, e bem, que o seu estado actual põe em causa a segurança de pessoas e bens e lesa o tecido empresarial da região.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Estamos perante um troço de cerca de 16 km, troço rodoviário estruturante para um vasto conjunto de cidadãos e de empresas e absolutamente essencial como via de acesso à A1, à A23, à A15 e às linhas ferroviárias do Norte e Leste.
Acresce o facto de parte do troço estar sinalizado como local de elevada sinistralidade ao nível da segurança rodoviária, tendo, inclusive, já ocorrido alguns acidentes mortais.
Parte do troço insere-se no Parque Natural das Serras de Aire e Candeeiros e no Sítio da Rede Natura 2000, troço esse que, para além das obras de beneficiação, prevê a correcção do traçado em dois segmentos particularmente sinuosos, o que parece obrigar a uma avaliação de impacte ambiental (AIA), suportada num estudo de impacte ambiental (EIA).
No sentido de não adiar, uma vez mais, a requalificação da via, que se arrasta à décadas, o Governo deu indicações à Estradas de Portugal, no sentido de iniciar os procedimentos necessários, pelo que o projecto foi subdividido em dois: um lanço de Alcanede a Amiais de Cima e um lanço Amiais de Cima a Alcanena.
Quanto ao primeiro lanço, encontra-se já em fase de contratação a respectiva empreitada.
Quanto ao segundo lanço, prevê-se que o estudo de impacte ambiental esteja concluído em meados de Junho deste ano, estudo esse que servirá de base à avaliação de impacte ambiental por parte do ICNB, passo essencial para a concretização da obra.

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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Estamos perante um avanço significativo na resolução de um problema que se arrasta há décadas, mas, apesar de todos os esforços feitos pelos cidadãos, empresários e autarcas, ainda não foi possível dar cumprimento cabal aos anseios das populações.
Trata-se de uma via, como já dissemos, estruturante a nível regional, e a não resolução cabal desta situação põe em causa a segurança rodoviária de cidadãos, a competitividade das empresas e a consequente não manutenção e criação de empregos.
Pese embora as obrigações decorrentes da classificação de Sítio da Rede Natura 2000, importa ponderar o superior interesse da vida humana e das condições de desenvolvimento económico e social, especialmente relevantes numa época de dificuldades acrescidas. Não pode, por isso, o Partido Socialista deixar de se associar aos peticionários e à população em geral e tudo fazer para que, rapidamente, seja implementada uma solução definitiva, a bem de todos os utilizadores da estrada regional n.º 361.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, sei que já fui chamado para intervir e peço desculpa por não estar presente, mas estava a participar nos trabalhos da Comissão Eventual para a Revisão Constitucional e vim logo que me foi possível.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, quero, em primeiro lugar, em nome do Grupo Parlamentar do PCP, saudar os peticionários e felicitá-los por terem tomado esta iniciativa. Este é um daqueles casos em que os cidadãos — conhecedores de um problema, sentindo-o no seu dia-a-dia e tendo consciência das perturbações que o mau estado de uma estrada representa para as populações, para a indústria, para o comércio e para a vida local — decidiram exercer o seu direito de petição para chamar a atenção da Assembleia da República para um problema e, assim, conseguir que ele seja mais rapidamente resolvido.
Quero felicitá-los por essa iniciativa, porque se, hoje em dia, as coisas estão encaminhadas — pelo menos, desde já, relativamente a uma parte do troço — , isso deve-se naturalmente à iniciativa que os cidadãos levaram a cabo.
Nós próprios procurámos inteirar-nos dessa situação. Conhecemos a estrada de que se trata e procurámos, aqui também, designadamente em sede de discussão do Orçamento do Estado, chamar a atenção para esse problema e para a necessidade de consagrar as verbas necessárias para a realização dessa obra.
Mas, apesar de haver resposta por parte das entidades responsáveis e de haver algumas perspectivas de resolução, esta é uma questão que, em nosso entender, a Assembleia da República deve continuar a acompanhar, desde logo porque, no que se refere ao segundo troço identificado desta via de ligação entre Amiais de Cima e Alcanena, o problema ainda não está resolvido, há ainda aspectos do foro administrativo pendentes, e é bom que não se encontrem aqui subterfúgios para que a obra não avance. Mas mesmo relativamente ao primeiro troço da estrada, entre Alcanede e Amiais de Cima, também aí, as coisas estão a avançar, mas, ao que sabemos, o contrato entre a Estradas de Portugal e o empreiteiro não estará ainda assinado.
Importa, pois, que esse processo se conclua e que, de hoje para amanhã, não venha invocar-se a situação de crise financeira do País e de contenção orçamental para que este problema não venha a ser resolvido.
A ideia que temos é que, de facto, as coisas estão encaminhadas, mas não estão concretizadas. Por isso, importa que, até que o problema fique efectivamente resolvido, esta Assembleia não deixe de acompanhar este assunto.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Gusmão.

O Sr. José Gusmão (BE): — Sr. Presidente, antes de mais, quero cumprimentar os peticionários e a iniciativa que levaram a cabo, que não só suscitou este debate como, ainda antes disso, suscitou alguma

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aceleração dos procedimentos e chamou a atenção para este problema. Ora, esta é, sem dúvida, uma primeira vitória deste exercício de cidadania.
Com efeito, as informações que a comissão parlamentar recebeu da parte da Estradas de Portugal dão conta da diferenciação de dois troços dentro do percurso referido, um dos quais será ainda submetido a uma avaliação de impacte ambiental.
No entanto, e apesar dos progressos entretanto verificados, convém recordar que, nem num caso, nem no outro, isto é, nem no caso do troço entre Alcanede e Amiais de Cima, nem no caso do troço entre Amiais de Cima e Alcanena (embora este segundo esteja mais avançado), estamos perante o início das obras.
Portanto, penso que as posições até agora manifestadas e as que eventualmente vierem a manifestar-se devem assinalar não apenas a pertinência e a justeza desta petição mas também um compromisso da parte de todas as bancadas a solicitar do Governo todas as diligências no sentido de que estas obras possam prosseguir no ritmo mais acelerado possível — naturalmente, no respeito pelas obrigações legais pertinentes — e de que este investimento, absolutamente estratégico, não venha a ser, em circunstância alguma, comprometido pelos constrangimentos orçamentais que sistematicamente têm sido invocados para adiar investimentos desta importância.
Convém ter em conta que esta é uma estrada que serve várias empresas de quatro freguesias de grande importância e que criam emprego na região e que a não resolução deste problema tem impactos na estrutura de custos dessas empresas, nomeadamente ao nível da degradação das suas frotas e cria não apenas incómodos mas problemas de segurança a todos os cidadãos e trabalhadores que a utilizam quotidianamente.
Portanto, pensamos que, não apenas por uma questão justiça social mas até de racionalidade económica, a solução para este problema deve ser encontrada e concretizada no mais curto espaço de tempo.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Filipe Lobo d’Ávila.

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Começo por cumprimentar os peticionários e dizer que, do ponto de vista do CDS, o tema da repavimentação da estrada regional n.º 361, no troço entre Alcanede e Alcanena, é extremamente importante, em primeiro lugar, para todas pessoas de Alcanede e também, consequentemente, para toda a região.
Para quem conhece aquele troço e — não posso deixar de dizê-lo — todos os outros que fazem a ligação a Alcanede chega rapidamente à conclusão de que não só esta petição é pertinente como deve merecer, obviamente, a atenção de todas as bancadas parlamentares.
Estamos a falar de cerca de 16 km praticamente intransitáveis, que apresentam uma degradação que põe em risco bens e pessoas — aliás, tem havido inúmeros acidentes com diversas vítimas — ; estamos a falar de um troço que constitui um entrave ao desenvolvimento económico da região, que lesa o tecido industrial, o qual está degradado e que tanto tem sido fustigado por um conjunto de políticas de mais impostos; estamos a falar, sobretudo, de um troço que tem vindo a degradar a qualidade de vida das populações.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, as péssimas acessibilidades de Alcanede, ligadas à inexistência de uma esquadra ou de um posto de uma qualquer força de segurança, para além de criar uma ideia de isolamento, têm potenciado um aumento da criminalidade e, obviamente, um sentimento de insegurança daquelas populações.
Por isso mesmo, como é evidente, o CDS não podia deixar de se associar às preocupações que foram, e são, manifestadas por todos os peticionários.
Sabemos que já foi lançada a empreitada, mas importa saber quando é que verdadeiramente a obra começa e, sobretudo, quando é que passa do anúncio à realidade.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — Julgo que o País está cansado de anúncios. Aquilo de que precisamos é que estas obras, rapidamente, cheguem a ser uma realidade para as populações.

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Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Carina Oliveira.

A Sr.ª Carina Oliveira (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, dirijo um cumprimento inicial aos cerca de 30 peticionários que estão aqui presentes, incluindo o Sr. Presidente da Junta de Freguesia de Alcanede, do concelho e distrito de Santarém, que, deste modo o PSD cumprimenta.
Para que se perceba o desespero destas gentes que se associaram em marchas lentes, em recolhas de assinaturas, em protestos vários e que, por diversas vezes, fizeram visitas à Assembleia da República, seria preciso conhecer de perto o estado do pavimento a que chegou a estrada regional n.º 361.
Não se pense que é uma estrada de somenos importância, pequena ou interior. Basta perguntar a qualquer empresário do sector da pedra que tem de efectuar este percurso para saber que dela depende para a exportação dos seus bens e serviços. É uma estrada no Ribatejo, no centro do País, que faz ligação à capital do distrito, bem como á A1, á A23, á linha ferroviária do Norte, á Beira Interior» E está assim há 10 anos. Foi uma estrada esquecida. Infelizmente, muitas mais têm sido, numa política mais apostada em novas autoestradas e em megainvestimentos do que na conservação e na manutenção do seu património rodoviário existente.

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Carina Oliveira (PSD): — Iniciado o processo de beneficiação, esta estrada teve outro azar: atravessa o Parque Natural das Serras de Aire e Candeeiros, mais uma teia burocrática, a acrescentar ao calvário percorrido entre a decisão do projecto e a efectiva concretização da obra.
Por isso, tem também outro senão: está apenas a andar meia obra, meio projecto, meio troço Ameais/Alcanede, porque o outro meio ainda vai ter de esperar, segundo dizem. É o espelho das obras públicas neste País: meias obras, meias metades, coisinhas de cada vez, aos bochechos e devagarinho! Este processo é também o mau espelho de muitos processos remetidos a entidades tuteladas pelo Ministério das Obras Públicas. Até à data, ainda não houve qualquer resposta do Instituto de Infra-estruturas Rodoviárias (INIR) à Assembleia da República.
Que espécie de regulador do sistema é este?! Existe?! Alguma vez existiu?! No caso da estrada regional n.º 361, ficámos sem saber o que tem a dizer sobre o assunto. Pede-se apenas celeridade e eficiência. Assim devem funcionar os organismos públicos neste País, assim pedimos também para o caso da estrada regional n.º 361.
É este o propósito desta petição e, mais uma vez, louvamos o espírito de cidadania que presidiu aos peticionários em deslocarem-se à Assembleia da República.
Da parte do PSD, tudo faremos no sentido de o assunto não ser esquecido para que, em vez de meia obra, meia estrada, se consiga ter alguma coisa decente.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em nome do Grupo Parlamentar do Partido Ecologista «Os Verdes», quero saudar os mais de 4500 peticionantes, em especial os que estão presentes, que se envolveram na organização da petição que estamos a discutir e que reclamam a repavimentação da estrada regional n.º 361, no troço entre Alcanede e Alcanena.
De facto, a degradação da estrada regional n.º 361 é muito visível e coloca mesmo em causa a segurança das pessoas e bens daquela região, sobretudo das populações das freguesias de Alcanede, Abrã, Amiais de Baixo e Gançaria, no concelho de Santarém, bem como as populações da freguesia de Monsanto, no concelho de Alcanena.

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Parece-nos claro que a Estradas de Portugal não tem vindo a assegurar os padrões mínimos de qualidade do pavimento e bermas daquela estrada, facto que, aliás, é reconhecido pela própria empresa Estradas de Portugal.
De nada adianta invocar como desculpa para esta situação o procedimento de Avaliação de Impacte Ambiental, uma vez que, como muito bem salienta o Instituto da Conservação da Natureza e da Biodiversidade (ICNB), apenas o troço Amiais de Cima/Alcanena está sujeito a procedimento de Avaliação de Impacte Ambiental porque só aqui é que há interferência com o Parque Natural das Serras de Aire e Candeeiros e com a Reserva Natura 2000. O que significa que o outro troço, entre Alcanede e Amiais de Cima, não está já a ser objecto de intervenção no terreno, porque a Estradas de Portugal continua a arrastar o processo e, pelos vistos, só agora é que, pelo menos aparentemente, procedeu ao lançamento da empreitada para o lanço entre Alcanede e Amiais de Cima.
Antes de terminar, não quero deixar de sublinhar o facto, que me parece importante, de o Instituto Nacional de Infra-Estruturas Rodoviárias não ter respondido aos pedidos de informação que, sobre o assunto, lhe foram dirigidos por esta Assembleia da República, apesar da insistência.
Por fim, devo dizer que Os Verdes acompanham os propósitos e as preocupações que os subscritores desta petição nos trouxeram hoje a Plenário para discussão e esperam que o Governo assuma as diligências necessárias junto da Estradas de Portugal e de outras instâncias, com vista a resolver o mais rapidamente possível este problema, que já se arrasta há muitos anos.

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, passamos à apreciação conjunta da petição n.º 61/XI (1.ª) — Apresentada por Hugo Alexandre Lopes Laibaças e outros, solicitando à Assembleia da República o não encerramento total da linha ferroviária entre Lisboa e Évora e, consequentemente, a manutenção da circulação do comboio intercidades que faz a ligação Évora/Lisboa/Évora, e o projecto de resolução n.º 351/XI (2.ª) — Defende a manutenção do serviço intercidades Lisboa/Évora e Lisboa/Beja e reclama a sua qualificação em termos de oferta e adequação de horários (PCP).
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Começamos, obviamente, por saudar, em nome do PCP, os peticionários que entregaram na Assembleia da República esta petição com mais de 4000 assinaturas, que dá bem nota do descontentamento dos alentejanos em relação ao Partido Socialista. De facto, o descontentamento dos alentejanos em relação ao Partido Socialista é um sentimento legítimo, porque os alentejanos têm sido enganados por este e outros governos do Partido Socialista.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Em 2006, a actual Deputada Ana Paula Vitorino, na altura Secretária de Estado, inaugurava a ligação intercidades entre Lisboa e Évora, anunciando uma revolução na mobilidade do Alentejo e que se tratava de um compromisso do Governo no sentido de melhorar as ligações ferroviárias entre as capitais de distrito.
Três anos depois, a linha é encerrada com a desculpa de novos investimentos, novas obras que tinham de ser feitas, sobre as quais não temos dúvidas. Mas encerrou-se a linha para se fazerem obras, quando podia não se ter encerrado, quando se podia ter mantido a linha em funcionamento.
Hoje, percebe-se qual era a verdadeira intenção. Confrontados com o projecto de plano de actividades da CP para 2011, percebemos que há uma intenção de acabar com o serviço intercidades e de integrar esta ligação nas ligações regionais.
O projecto de resolução que o PCP hoje apresenta propõe à Assembleia da República que o caminho do Governo seja outro, o de recusar este plano de degradação da ligação ferroviária entre Lisboa e Évora,»

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — » de recusar um plano que propõe o fim da ligação intercidades e a integração desse serviço no serviço regional, tal como acontece em relação à ligação Lisboa/Beja.

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Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Rodrigues.

O Sr. José Manuel Rodrigues (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Saudamos os subscritores desta petição sobre a ligação intercidades entre Lisboa e Évora.
Entendemos que esta ligação ferroviária, assegurada pela CP, entre Évora, Beja, algumas outras localidades da região do Alentejo e Lisboa, é um serviço importante que aproxima o interior da capital do País.
Esta ligação ferroviária, nomeadamente o serviço intercidades, é utilizada por muitos utentes, em regime diário, semanal ou ocasional, que procuram, no litoral, serviços e desafios, que, pela desertificação do interior do País, já não encontram na sua localidade de origem.
No final do ano de 2009, foi decidida a realização de uma empreitada de beneficiação da via férrea que implicaria a suspensão do serviço intercidades Lisboa/Évora pelo período de um ano. O serviço alternativo passou a ser assegurado pela via rodoviária, tornando-se, simultaneamente, mais morosa e menos confortável. Acresce a isto o facto de não serem asseguradas paragens em algumas das estações anteriormente servidas e de os horários propostos não serem idênticos aos anteriormente existentes.
Não declinando a importância de uma intervenção que vise a melhoria do serviço prestado pela CP e pela REFER, nem, obviamente, as questões técnicas que levaram à suspensão da ligação intercidades entre Évora e Lisboa, o CDS não pode deixar de estranhar a pouca informação prestada aos utentes e a deficiente planificação desta obra.
A verdade é que esta interrupção aconteceu há três anos e meio depois de a CP inaugurar, com pompa e circunstância, o serviço intercidades entre Lisboa e Évora e de o Governo ter anunciado uma autêntica revolução na mobilidade do Alentejo, afirmando, então, que era um compromisso do Governo, PS, melhorar as ligações ferroviárias entre as capitais de distrito.
Nessa altura, foram também inauguradas ligações directas entre Évora e Beja, que também foram interrompidas.
Assim, o CDS-PP entende que o Governo deve tomar as medidas necessárias no sentido de prestar aos utentes da linha Lisboa/Évora um cabal esclarecimento quanto ao calendário da obra e também quanto ao restabelecimento desta ligação intercidades entre a capital portuguesa e a cidade de Évora, património mundial.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Rodrigues.

O Sr. Luís Rodrigues (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em nome do PSD, quero, em primeiro lugar, saudar os peticionários desta iniciativa que entendo ser oportuna, pois obriga a que o Parlamento debata as alterações ao serviço da CP no Alentejo, a valorização e a reabilitação do património abandonado e permita abordar as opções da rede ferroviária fundamental na sua ligação internacional através desta região.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Luís Rodrigues (PSD): — O PSD considera que a obra em curso, que contempla a electrificação da linha e a renovação da plataforma em grande parte do troço, é fundamental para o nível de serviço a prestar no futuro próximo às populações e às empresas.
Sabemos que os trabalhos estão atrasados relativamente ao calendário inicial e também é público que a CP se prepara para proceder a alterações significativas no serviço de ligação de Lisboa a Évora e a Beja.
Sabemos que a promessa da CP, de Outubro de 2010, de electrificar a ligação a Beja pode não se concretizar e, de acordo com a informação que tenho dos autarcas do PSD do distrito de Évora, também

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sabemos que a população não conhece a totalidade do projecto, nomeadamente as passagens desniveladas/atravessamentos da linha.
Assim, informo o Parlamento e os peticionantes que vou solicitar com urgência uma visita às obras em curso e a realização de uma reunião com a REFER e com a CP para, no terreno, avaliar as melhores opções do transporte ferroviário para as populações envolvidas, considerando o seu enquadramento na melhor utilização dos recursos do erário público.
Considero ser uma prioridade, nesta reunião com a REFER, a análise do património abandonado por esta em todo o Alentejo, que pode e deve ser valorizado, eventualmente, para outros fins de interesse público, de acordo com as autarquias respectivas.
Não podemos esquecer as linhas e os ramais abandonados, os respectivos apeadeiros e estações, bem como as obras de arte que são as pontes metálicas desse rico património colectivo.
O PCP, não sendo um partido que tenha a responsabilidade de gerir os dinheiros públicos agora ou no futuro, pode propor o que entender, nem que seja uma enorme irresponsabilidade política e técnica, como é o caso.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Fala o democrata!

O Sr. Luís Rodrigues (PSD): — A obra está em curso — atrasada, é certo — e o PCP vem, agora, a meio dos trabalhos propor, mais ou menos veladamente, que se retome o serviço, que a obra derrape ainda mais, quer do ponto de vista do prazo, quer do ponto de vista do custo.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Devia ter ouvido a intervenção!

O Sr. Luís Rodrigues (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Neste debate não posso deixar de falar nos projectos que este Governo tem para a rede ferroviária, na sua ligação internacional, através desta região.
Considerando o momento difícil do País, a que o Governo do Partido Socialista nos tem conduzido, avançar com grandes investimentos de retorno no mínimo duvidoso, pode hipotecar ainda mais o nosso futuro.
No entanto, esta inevitável paragem deve permitir ao País e aos seus responsáveis políticos reavaliar e corrigir erros, que considero que lesam gravemente o interesse público.
Não posso entender que este Governo, com o apoio do PCP e do BE — vá lá saber-se porquê! — , tenha nos seus planos construir, no mesmo corredor de ligação a Espanha, uma linha de mercadorias em bitola ibérica e, paralelamente, uma nova linha de mercadorias em bitola europeia.
Pergunto porquê e para quê. Os portugueses estão fartos e já não admitem mais que se continuem a desbaratar os dinheiros públicos, que são de todos. Exige-se que o Governo tenha a coragem de optar por soluções responsáveis, coerentes e eficazes do ponto de vista do interesse das populações do Alentejo e, principalmente, do ponto de vista de todos os portugueses.
Sr. Presidente — e vou terminar — , dos resultados da reunião e da visita que amanhã vou solicitar à CP e à REFER darei conta publicamente, a bem da valorização do património público, da boa utilização dos dinheiros públicos e dos legítimos interesses das populações do interior do Alentejo.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Heitor Sousa.

O Sr. Heitor Sousa (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A presente petição, subscrita por mais de 4000 cidadãos — que aproveito para saudar — , tem por objectivo «reivindicar o não encerramento total da linha ferroviária e, por conseguinte, a manutenção da circulação do comboio intercidades que faz a ligação Évora/Lisboa/Évora».
O Bloco de Esquerda não pode deixar de considerar como justo o objectivo desta petição e, num certo sentido, considera-a mesmo premonitória, face ao que se perspectiva de redução de serviços de transporte

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que o Governo pretende impor à CP, no âmbito das medidas recessivas aprovadas no quadro do PEC 3, com o apoio do PSD.

Vozes do BE: — Muito bem!

O Sr. Heitor Sousa (BE): — É premonitória neste sentido: é que, segundo o Plano de Acção da CP para 2011, as medidas enunciadas para «um novo modelo de oferta na linha do Alentejo, após a reabertura da linha à exploração ferroviária», só nos podem deixar, a todos, extremamente preocupados. Daí a importância da discussão desta matéria a propósito da petição, em boa hora entregue a este Parlamento.
É certo que a realização do processo de requalificação do troço Bombel/Casa Branca/Évora, que inclui intervenções em profundidade na própria plataforma da linha, não seria compatível com a manutenção da circulação de composições ferroviárias nos troços intervencionados, atentas as características da própria linha, a qual, como é sabido, se desenvolve em via única, não electrificada. Por isso, a manutenção de um serviço rodoviário de substituição é o mínimo que a REFER deve e tem a obrigação de assegurar enquanto durarem as obras.
Mas as más notícias estão aí, para nos interpelarem e reclamarem do Governo uma clarificação imediata.
Em primeiro lugar, o prazo da interrupção do serviço entre Bombel e Casa Branca, inicialmente anunciado para seis meses, já deslizou para o dobro, ou seja, para um ano. Porquê? Qual a razão do desvio? Obras a mais ou erro de previsão? É importante que se saiba a razão.
Em segundo lugar, a CP, no Plano de Actividades para 2011, anuncia para a CP Longo Curso, «com o objectivo de reduzir gastos», a cessação da «exploração da linha do Alentejo (fim dos transbordos rodoviários) a partir de 1 de Maio de 2011». Ou seja, a CP perspectiva a eliminação, pura e simples, do serviço Intercidades entre Lisboa, Évora e Beja.
Isto é totalmente inaceitável! Significa, mais uma vez, fazer tábua rasa dos compromissos assumidos pelo próprio Governo aquando do encerramento parcial, para obras, do troço entre Bombel, Casa Branca e Évora.
Infelizmente, esta atitude não é nova, mas tem de ser combatida em nome da dignidade do Estado e da decência. Basta de mentiras e de inaugurações, com festas e bolos, para engano de alguns e prejuízo de todos.
O serviço ferroviário intercidades Lisboa/Évora/Beja não pode acabar.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. Heitor Sousa (BE): — Pelo contrário, o que deve acontecer é a modernização e a electrificação do resto da linha, para oferecer um serviço intercidades de maior qualidade, rapidez, frequência e conforto às ligações principais entre o Alentejo e Lisboa e o Sul, via Funcheira.
É em nome dessas razões que votamos favoravelmente o projecto de resolução do PCP, e esperamos a formação de uma maioria parlamentar que obrigue o Governo a cumprir os seus compromissos.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Gonelha.

O Sr. Luís Gonelha (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Quero, em primeiro lugar, saudar os mais de 4000 peticionários.
Esta petição prende-se com uma ambição que estes peticionários têm de que se retome o serviço ferroviário na linha do Alentejo entre Évora, Bombel, Casa Branca, Vendas Novas e Lisboa.
Contudo, no início, quando se estudou a intervenção nesta obra, a REFER equacionou diferentes cenários, tendo concluído que o encerramento temporário era aquele que melhor respondia às múltiplas questões técnicas inerentes à realização da obra e que menor desconforto causaria aos utentes do caminho-de-ferro.
Nessa supressão foram salvaguardados junto da CP os transportes alternativos, os seus horários foram estudados e discutidos com as respectivas autarquias e com as comissões de utilizadores.

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Gostaria de reafirmar e de sublinhar aqui a importância que o Partido Socialista e este Governo dão a esta linha. Por isso mesmo apostaram nesta obra, porque entendem que esta é uma linha fundamental não só para o desenvolvimento do Alentejo mas também para a futura ligação do porto de Sines a Caia, porque também será utilizada para transporte de mercadorias.
Nesse sentido, o anterior governo do Partido Socialista fez uma aposta na electrificação e na modernização desta linha, que também é uma mais-valia para as populações residentes quer em Vendas Novas, quer em Évora, quer em Beja, porque terão, naturalmente, com a reabilitação desta via, um melhor serviço, mais comodidade e será muito mais rápida a ligação entre Évora e Lisboa.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, em nome do Grupo Parlamentar de Os Verdes, quero saudar os cerca de 4500 subscritores da petição que agora estamos a discutir, que expressam os seus legítimos receios no que diz respeito ao encerramento da rota ferroviária Évora/Lisboa/Évora no serviço intercidades.
Os peticionantes solicitam ou exigem — na nossa perspectiva, com toda a justiça — o não encerramento total da linha ferroviária entre Lisboa e Évora e, portanto, a manutenção da circulação do comboio Intercidades que faz a ligação Évora/Lisboa/Évora.
De facto, esta ameaça, a concretizar-se, vai trazer graves prejuízos não só para os regulares utilizadores do comboio, sobretudo para as populações de Évora, Casa Branca, Vendas Novas e Pinhal Novo, mas também para o ambiente, sendo mais um contributo para agravar a nossa dependência energética do exterior e para engrossar o volume de emissões de gases com efeito estufa, com todas as consequências que daí advêm.
Mas a CP e o Governo parecem continuar a ignorar não só os utentes dessa linha como os efeitos que, em termos ambientais, o encerramento da linha provocará, porque estão mais interessados na redução dos custos com a exploração da linha.
Se é verdade que é necessário melhorar os serviços prestados, sobretudo com a modernização e electrificação da linha existente, também é verdade que não é líquido que essas obras obriguem à sua suspensão total, como, aliás, tem vindo a suceder em obras de dimensão idêntica ou mesmo superior noutras linhas, onde foi possível proceder às obras e não foi necessário suprimir a circulação total dos comboios.
Portanto, Os Verdes acompanham as preocupações e os objectivos dos peticionantes e vão votar a favor do projecto de resolução que o Partido Comunista Português apresenta hoje também para discussão, no sentido de recomendar ao Governo que garanta a manutenção do serviço Intercidades Évora/Lisboa/Évora e Lisboa/Beja, requalificando-o, em termos de oferta e de adequação de horários, aos interesses dos utentes e das populações.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Sr. Deputado Luís Rodrigues, do PSD, pelos vistos, não conhece a realidade, mas também não percebeu exactamente a proposta do PCP. Por isso, vou repetir a explicação.
Aquilo que aconteceu foi que a linha ferroviária foi encerrada e a sua reabertura vai ocorrer, em princípio, em Maio deste ano, mas o problema é que a CP propõe que acabe o serviço intercidades e que a ligação Lisboa/Évora e Lisboa/Beja passe a ser feita através do serviço regional.
Se o Sr. Deputado vai pedir a reunião à CP, tenho todo o prazer em oferecer-lhe o Plano de Actividades de 2011 da CP, que está à espera da aprovação do Governo, onde esse desígnio é assumido pela CP.
A proposta do PCP vai exactamente em sentido contrário. A proposta do PCP, Sr. Deputado Luís Rodrigues, não é que a linha seja imediatamente reaberta, é que, quando for reaberta, o serviço intercidades

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seja garantido e, mais, seja requalificado, quer em termos da oferta que é prestada, quer em termos de adequação dos horários.
A verdade — e o Sr. Deputado Luís Rodrigues tem razão nessa matéria — é que as obras já duraram mais do estava previsto e também se confirma agora que, afinal, a intenção, quer da CP, quer do próprio Governo, quando optaram pelo encerramento da linha, porque as obras podiam ter sido feitas sem que tivesse sido encerrada a linha, era reduzir os custos de exploração da linha, obviamente reduzindo o serviço, se isso fosse necessário.
Esta intenção da CP de acabar com o serviço intercidades e substituí-lo pelo serviço regional, que é isso que está no Plano de Actividades da CP — está na página 34, Sr. Deputado Luís Rodrigues — , tem apenas como fundamento poupar custos à custa do serviço público que é prestado aos cidadãos. É por isso que existe a proposta do PCP.
Para concluir, faz sentido que, em relação a esta luta dos peticionários e a esta proposta do PCP, se faça também uma referência à luta dos próprios trabalhadores ferroviários pela requalificação e pela melhoria do serviço ferroviário. Ainda hoje, estes trabalhadores realizaram a maior manifestação, desde há muitos anos, não só para reivindicar os seus direitos laborais mas também para reivindicar uma melhoria do transporte ferroviário, em Portugal, obviamente em benefício do País.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, concluído este ponto, estão terminados nos nossos trabalhos de hoje.
A próxima sessão plenária, realizar-se-á amanhã, dia 13, às 15 horas, tendo como ordem de trabalhos declarações políticas; o debate de urgência, requerido pelo Grupo Parlamentar do PCP, sobre «Aumento dos preços dos bens essenciais»; a discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 45/XI (2.ª) — Altera os Estatutos dos Magistrados Judiciais e do Ministério Público, em matéria de aposentação, reforma e jubilação, define as condições de atribuição do suplemento de fixação e do novo suplemento que substitui o subsídio de compensação e altera os respectivos regimes de substituição e acumulação; a discussão conjunta, na generalidade, do projecto de lei 264/XI (1.ª) — Segunda alteração à Lei n.º 31/86, de 29 de Agosto (Lei de Arbitragem Voluntária) (CDS-PP) e da proposta de lei n.º 48/XI (2.ª) — Aprova a Lei da Arbitragem Voluntária, e ainda a discussão do projecto de resolução n.º 302/XI (2.ª) — Suspende o processo de introdução de portagens na Via do Infante (BE).
Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 23 minutos.

Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:

Partido Socialista (PS)
João Pedro de Aleluia Gomes Sequeira
Nuno Miguel da Costa Araújo
Sofia Isabel Diniz Pereira Conde Cabral

Partido Social Democrata (PSD)
António Egrejas Leitão Amaro
Fernando Luís de Sousa Machado Soares Vales

Partido Popular (CDS-PP)
Cecília Felgueiras de Meireles Graça
Maria de Assunção Oliveira Cristas Machado da Graça

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Deputados que faltaram à sessão:

Partido Socialista (PS)
José Duarte Piteira Rica Silvestre Cordeiro
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina

Partido Social Democrata (PSD)
Adão José Fonseca Silva
António Carlos Sousa Gomes da Silva Peixoto
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
João José Pina Prata
Raquel Maria Martins de Oliveira Gomes Coelho
Sérgio André da Costa Vieira

Partido Popular (CDS-PP)
José Helder do Amaral
Michael Lothar Mendes Seufert

Partido Comunista Português (PCP)
Francisco José de Almeida Lopes
Jerónimo Carvalho de Sousa
A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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