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I SÉRIE — NÚMERO 23

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deixar de registar que esses projectos me suscitam sérias dúvidas, quer no plano da sua conformidade

constitucional, quer no da conveniência político-criminal.

Quanto ao primeiro, suscitam de forma clara o problema da compatibilidade de uma criminalização que

assenta na falta de prova, pelo arguido, da origem lícita dos seus rendimentos ou património, com a regra da

presunção de inocência, constitucionalmente consagrada. Essa conformidade não me parece assegurada nos

projectos em causa, ao presumirem a origem ilícita dos rendimentos ou património (e o que se pune é

justamente o «enriquecimento ilícito») se a sua proveniência lícita não for provada pelo arguido.

No plano da política criminal (e da política legislativa em geral), entendo que a criação de crimes

específicos — de um direito penal especial — para titulares de cargos políticos (ou mesmo para funcionários)

se deve conter nos limites estritos de um princípio de necessidade de protecção de bens jurídicos

identificados, sob pena de passar a ser o próprio legislador a fomentar uma atitude de desconfiança e de

suspeita em relação aos representantes eleitos pelo povo. Não me parece que estas iniciativas de

criminalização tenham realmente como efeito a promoção da ética republicana, ou, sequer, a consolidação de

instituições políticas fortes e respeitadas.

O Deputado do PSD, Paulo Mota Pinto.

——

Os signatários, Deputados do Grupo Parlamentar do PS, votaram a favor do projecto de lei n.º 76/XII (1.ª)

(PS), abstiveram-se relativamente ao projecto de lei n.º 72/XII (1.ª) (PSD/CDS-PP) e votaram contra os

projecto de lei n.os

4/XII (1.ª) (BE) e 11/XII (1.ª) (PCP), relativas à criação do crime de enriquecimento ilícito e

às «manifestações de fortuna e outros acréscimos patrimoniais não justificados ou não declarados».

Os signatários consideram que a criminalização dos fenómenos de valorização patrimonial injustificada

constitui um tema de indiscutível relevância jurídica, política e de reforço das garantias de transparência de

exercício de funções públicas que determina a necessidade de um debate e estudo aprofundados visando a

adopção de uma medida legislativa eficaz e conforme aos princípios constitucionais.

O Partido Socialista tem nesta matéria um legado a defender na defesa da ética republicana, de afirmação

da transparência no exercício de funções públicas na esteira de medidas adoptadas, designadamente nos

governos de António Guterres e de José Sócrates.

A questão da criminalização do enriquecimento injustificado foi considerada como uma prioridade pelo

Presidente Jorge Sampaio face à percepção da grave perturbação da credibilidade do sistema político

decorrente da verificação pública de situações de variação patrimonial manifestamente desconformes com as

funções exercidas e os rendimentos conhecidos cuja tutela jurídica é manifestamente ineficaz através dos

mecanismos administrativos previstos na Lei n.º 4/83, de 2 de Abril, relativa ao controlo público da riqueza dos

titulares de cargos públicos.

A criminalização do enriquecimento ilícito está consagrada no artigo 20.º da Convenção das Nações Unidas

Contra a Corrupção e a matéria tem sido acompanhada nos trabalhos do GAFI (Grupo de Acção Financeira

Internacional) e do GRECO (Grupo de Estudos contra a Corrupção) do Conselho da Europa.

A criminalização como tipo penal autónomo das valorizações patrimoniais provenientes de ganhos ilícitos é

questão abordada de forma recorrente no âmbito das formas de prevenção e repressão da criminalidade

económico-financeira, designadamente do branqueamento de capitais ou do enriquecimento ilícito.

O Direito Penal Internacional tem constituído fonte privilegiada da evolução legislativa ocorrida nos últimos

anos , designadamente através da Convenção das Nações Unidas sobre a Criminalidade Organizada

Transnacional, adoptada em 2000 e ratificada por Portugal em 2004, e da Convenção das Nações Unidas

contra a Corrupção, adoptada em 2004 e ratificada por Portugal em 2007, as quais influenciaram na ordem

jurídica interna as Leis n.º 5/2002, de 11 de Janeiro, sobre combate à criminalidade organizada e económico-

financeira, e n.º 11/2004, de 27 de Março, sobre prevenção e repressão do branqueamento de capitais de

proveniência ilícita.

O artigo 7.º da Lei n.º 7/2002, de 11 de Janeiro, aprovada por iniciativa de Governo do Partido Socialista,

prevê expressamente a possibilidade de perda de bens como sanção pela presunção de valorização

patrimonial ilícita.

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