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Sexta-feira, 9 de Dezembro de 2011 I Série — Número 47

XII LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2011-2012)

REUNIÃOPLENÁRIADE7DEDEZEMBRODE 2011

Presidente: Ex.ma Sr.ª Maria da Assunção Andrade Esteves

Secretários: Ex.mos

Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco Rosa Maria da Silva Bastos de Horta Albernaz

S U M Á R I O

A Sr.ª Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas

e 12 minutos. Deu-se conta da entrada na Mesa dos projectos de lei

n.os

104 a 108/XII (1.ª) e dos projectos de resolução n.os

134 a 136/XII (1.ª).

Em declaração política, o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares (BE) criticou a transferência dos fundos de pensões dos bancos para o Estado, após o que respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Adolfo Mesquita Nunes (CDS-PP), João Galamba (PS), José Luís Ferreira (Os Verdes) e Luís Menezes (PSD).

Em declaração política, a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia (Os Verdes), a propósito da 17.ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas, a decorrer em Durban, na África do Sul, teceu críticas à falta de vontade política para a tomada de medidas a nível mundial que conduzam à diminuição da emissão de gazes com efeito de estufa, tendo, em seguida, respondido a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Paulo Sá (PCP) e Catarina Martins (BE).

Também em declaração política, o Sr. Deputado Carlos Abreu Amorim (PSD) chamou a atenção para a necessidade

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de reforma do poder local, tendo abordado algumas questões do Documento Verde da Reforma da Administração Local. No final, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Luís Fazenda (BE), Paula Santos (PCP), Mota Andrade (PS) e Altino Bessa (CDS-PP).

Igualmente em declaração política, o Sr. Deputado António Braga (PS) teceu considerações sobre a agenda da reunião do próximo Conselho Europeu e a necessidade de reconstrução do projecto europeu, após o que deu resposta a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados José Luís Ferreira (Os Verdes), João Serpa Oliva (CDS-PP), Ana Drago (BE) e António Rodrigues (PSD).

Ainda em declaração política, o Sr. Deputado Raúl de Almeida (CDS-PP), a propósito da comemoração do Ano Europeu do Voluntariado e da Cidadania Activa, falou da importância do voluntariado na sociedade portuguesa e, depois, respondeu a pedidos de esclarecimento da Sr.ª Deputada Francisca Almeida (PSD).

Em declaração política, o Sr. Deputado Agostinho Lopes (PCP) contestou a decisão do Governo de integrar nas suas contas uma parte dos fundos de pensões da banca, o que considerou contribuir para a descapitalização da segurança social, e respondeu a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado Pedro Jesus Marques (PS).

Procedeu-se à apreciação conjunta da proposta de resolução n.º 7/XII (1.ª) — Aprova a Decisão do Conselho Europeu de 25 de Março de 2011, que altera o artigo 136.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia no que respeita a um mecanismo de estabilidade para os

Estados-membros cuja moeda seja o euro, e do projecto de resolução n.º 135/XII (1.ª) — Sobre a decisão do Conselho Europeu de 25 de Março de 2011, que altera o artigo 136º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (BE). Usaram da palavra, além do Sr. Secretário de Estado Adjunto e dos Assuntos Europeus (Miguel Morais Leitão), os Srs. Deputados Ana Drago (BE), Carlos Costa Neves (PSD), Honório Novo (PCP), João Serpa Oliva (CDS-PP), Francisco de Assis (PS) e José Luís Ferreira (Os Verdes).

Foram ainda discutidos, em conjunto e na generalidade, os projectos de lei n.

os 99/XII (1.ª) — Acompanhamento,

apreciação e pronúncia pela Assembleia da República no âmbito do processo de construção da União Europeia (PS), 102/XII (1.ª) — Procede à alteração à Lei n.º 43/2006, de 25 de Agosto, relativa ao acompanhamento, apreciação e pronúncia pela Assembleia da República no âmbito do processo de construção da União Europeia (PSD), 105/XII (1.ª) — Altera a Lei n.º 43/2006, de 25 de Agosto, reforçando os meios de acompanhamento, apreciação e pronúncia pela Assembleia da República no âmbito do processo de construção da União Europeia (CDS-PP), e 108/XII (1.ª) — Altera a Lei n.º 43/2006, de 25 de Agosto, garantindo a adequada fiscalização parlamentar do Governo no âmbito do processo da União Europeia (BE). Intervieram os Srs. Deputados Vitalino Canas (PS), António Rodrigues (PSD), José Manuel Rodrigues (CDS-PP), Luís Fazenda (BE), Honório Novo (PCP) e José Luís Ferreira (Os Verdes).

A Sr.ª Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 16 minutos.

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A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que está aberta a sessão.

Eram 15 horas e 12 minutos.

Srs. Deputados presentes à sessão:

Partido Social Democrata (PSD)

Adriano Rafael de Sousa Moreira

Adão José Fonseca Silva

Afonso Gonçalves da Silva Oliveira

Amadeu Albertino Marques Soares Albergaria

Ana Sofia Fernandes Bettencourt

Andreia Carina Machado da Silva Neto

António Carlos Sousa Gomes da Silva Peixoto

António Costa Rodrigues

António Fernando Couto dos Santos

António Manuel Pimenta Prôa

Arménio dos Santos

Bruno Manuel Pereira Coimbra

Carina João Reis Oliveira

Carla Maria de Pinho Rodrigues

Carlos Eduardo Almeida de Abreu Amorim

Carlos Henrique da Costa Neves

Carlos Manuel Faia São Martinho Gomes

Carlos Manuel dos Santos Batista da Silva

Cláudia Sofia Gomes Monteiro de Aguiar

Cristóvão Duarte Nunes Guerreiro Norte

Cristóvão Simão Oliveira de Ribeiro

Cristóvão da Conceição Ventura Crespo

Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco

Eduardo Alexandre Ribeiro Gonçalves Teixeira

Elsa Maria Simas Cordeiro

Emídio Guerreiro

Emília de Fátima Moreira dos Santos

Fernando Mimoso Negrão

Fernando Nuno Fernandes Ribeiro dos Reis

Fernando Ribeiro Marques

Fernando Virgílio Cabral da Cruz Macedo

Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva

Hugo Alexandre Lopes Soares

Hugo José Teixeira Velosa

Hélder António Guerra de Sousa Silva

Joana Catarina Barata Reis Lopes

Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte

Jorge Paulo da Silva Oliveira

José Manuel de Albuquerque Portocarrero Canavarro

José Manuel de Matos Correia

João Bosco Soares Mota Amaral

João Carlos Figueiredo Antunes

João Manuel Lobo de Araújo

Laura Maria Santos de Sousa Esperança

Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves

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Luís Filipe Valenzuela Tavares Menezes Lopes

Luís Manuel Morais Leite Ramos

Luís Pedro Machado Sampaio de Sousa Pimentel

Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira

Lídia Maria Bulcão Rosa da Silveira Dutra

Manuel Augusto Meirinho Martins

Margarida Rosa Silva de Almeida

Maria Clara Gonçalves Marques Mendes

Maria Ester Vargas de Almeida e Silva

Maria Francisca Fernandes Almeida

Maria Isilda Videira Nogueira da Silva Aguincha

Maria José Quintela Ferreira Castelo Branco

Maria José Vieira Teodoro Moreno

Maria Manuela Pereira Tender

Maria Paula da Graça Cardoso

Maria da Assunção Andrade Esteves

Maria da Conceição Alves dos Santos Bessa Ruão Pinto

Maria da Conceição Vaz Barroso Carloto Caldeira

Maria da Graça Gonçalves da Mota

Maria das Mercês Gomes Borges da Silva Soares

Maurício Teixeira Marques

Mário José Magalhães Ferreira

Mário Nelson da Silva Vaz Simões

Mónica Sofia do Amaral Pinto Ferro

Nilza Marília Mouzinho de Sena

Nuno Filipe Miragaia Matias

Nuno Miguel Pestana Chaves e Castro da Encarnação

Nuno Rafael Marona de Carvalho Serra

Odete Maria Loureiro da Silva

Paulo Cardoso Correia da Mota Pinto

Paulo César Lima Cavaleiro

Paulo César Rios de Oliveira

Paulo Jorge Frazão Batista dos Santos

Paulo Jorge Simões Ribeiro

Paulo Miguel da Silva Santos

Pedro Alexandre Antunes Faustino Pimpão

Pedro Augusto Cunha Pinto

Pedro Augusto Lynce de Faria

Pedro Filipe dos Santos Alves

Pedro Manuel Tavares Lopes de Andrade Saraiva

Pedro do Ó Barradas de Oliveira Ramos

Ricardo Augustus Guerreiro Baptista Leite

Rosa Maria Pereira Araújo Arezes

Sérgio Sousa Lopes Freire de Azevedo

Teresa de Andrade Leal Coelho

Teresa de Jesus Costa Santos

Ulisses Manuel Brandão Pereira

Valter António Gaspar de Bernardino Ribeiro

Vasco Manuel Henriques Cunha

Ângela Maria Pinheiro Branquinho Guerra

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Partido Socialista (PS)

Acácio Santos da Fonseca Pinto

Alberto Bernardes Costa

Alberto de Sousa Martins

Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes

Ana Maria Teodoro Jorge

Ana Paula Mendes Vitorino

António Fernandes da Silva Braga

António José Martins Seguro

António Manuel Soares Serrano

António Ramos Preto

Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho

Basílio Adolfo de Mendonça Horta da Franca

Carlos Filipe de Andrade Neto Brandão

Carlos Manuel Pimentel Enes

Eduardo Arménio do Nascimento Cabrita

Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues

Elza Maria Henriques Deus Pais

Eurídice Maria de Sousa Pereira

Fernando Medina Maciel Almeida Correia

Fernando Pereira Serrasqueiro

Francisco José Pereira de Assis Miranda

Glória Maria da Silva Araújo

Idália Maria Marques Salvador Serrão de Menezes Moniz

Inês de Saint-Maurice de Esteves de Medeiros Vitorino de Almeida

Isabel de Lima Mayer Alves Moreira

Jacinto Serrão de Freitas

Jorge Lacão Costa

Jorge Manuel Capela Gonçalves Fão

José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro

José António Fonseca Vieira da Silva

José Carlos Correia Mota de Andrade

José Carlos das Dores Zorrinho

José Duarte Piteira Rica Silvestre Cordeiro

João Barroso Soares

João Paulo Feteira Pedrosa

João Raul Henriques Sousa Moura Portugal

João Saldanha de Azevedo Galamba

Laurentino José Monteiro Castro Dias

Luís António Pita Ameixa

Luís Miguel Morgado Laranjeiro

Luísa Maria Neves Salgueiro

Manuel Francisco Pizarro de Sampaio e Castro

Manuel José de Faria Seabra Monteiro

Manuel Pedro Cunha da Silva Pereira

Marcos da Cunha e Lorena Perestrello de Vasconcellos

Maria Antónia Moreno Areias de Almeida Santos

Maria Helena dos Santos André

Maria Hortense Nunes Martins

Maria Isabel Coelho Santos

Maria Isabel Solnado Porto Oneto

Maria Odete da Conceição João

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Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina

Miguel João Pisoeiro de Freitas

Mário Manuel Teixeira Guedes Ruivo

Nuno André Araújo dos Santos Reis e Sá

Nuno André Neves Figueiredo

Paulo Alexandre de Carvalho Pisco

Paulo Jorge Oliveira de Ribeiro Campos

Pedro Filipe Mota Delgado Simões Alves

Pedro Manuel Dias de Jesus Marques

Pedro Manuel Farmhouse Simões Alberto

Pedro Nuno de Oliveira Santos

Renato Luís de Araújo Forte Sampaio

Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz

Rui Jorge Cordeiro Gonçalves dos Santos

Rui Paulo da Silva Soeiro Figueiredo

Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto

Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos

Vitalino José Ferreira Prova Canas

Partido Popular (CDS-PP)

Abel Lima Baptista

Adolfo Miguel Baptista Mesquita Nunes

Altino Bernardo Lemos Bessa

Artur José Gomes Rêgo

Inês Dória Nóbrega Teotónio Pereira Bourbon Ribeiro

José Duarte de Almeida Ribeiro e Castro

José Helder do Amaral

José Lino Fonseca Ramos

José Manuel de Sousa Rodrigues

João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo

João Manuel de Serpa Oliva

João Paulo Barros Viegas

João Pedro Guimarães Gonçalves Pereira

Manuel Fialho Isaac

Maria Margarida Avelar Santos Nunes Marques Neto

Michael Lothar Mendes Seufert

Nuno Miguel Miranda de Magalhães

Raúl Mário Carvalho Camelo de Almeida

Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia

Teresa Margarida Figueiredo de Vasconcelos Caeiro

Teresa Maria de Moura Anjinho Tomás Ruivo

Vera Lúcia Alves Rodrigues

Partido Comunista Português (PCP)

Agostinho Nuno de Azevedo Ferreira Lopes

António Filipe Gaião Rodrigues

Artur Jorge da Silva Machado

Bernardino José Torrão Soares

Bruno Ramos Dias

Francisco José de Almeida Lopes

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Jerónimo Carvalho de Sousa

José Honório Faria Gonçalves Novo

João Augusto Espadeiro Ramos

João Guilherme Ramos Rosa de Oliveira

Miguel Tiago Crispim Rosado

Paula Alexandra Sobral Guerreiro Santos Barbosa

Paulo Miguel de Barros Pacheco Seara de Sá

Rita Rato Araújo Fonseca

Bloco de Esquerda (BE)

Ana Isabel Drago Lobato

Catarina Soares Martins

Francisco Anacleto Louçã

João Pedro Furtado da Cunha Semedo

Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda

Maria Cecília Vicente Duarte Honório

Mariana Rosa Aiveca

Pedro Filipe Gomes Soares

Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV)

Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia

José Luís Teixeira Ferreira

A Sr.ª Presidente: — Sr.as

e Srs. Deputados, antes de mais, peço ao Sr. Secretário que dê conta do

expediente.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa e

foram admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: projectos de lei n.os

104/XII (1.ª) — Revoga o Código

Florestal (PSD e CDS-PP), que baixou às 7.ª e 11.ª Comissões, 105/XII (1.ª) — Altera a Lei n.º 43/2006, de 25

de Agosto, reforçando os meios de acompanhamento, apreciação e pronúncia pela Assembleia da República

no âmbito do Processo de Construção da União Europeia (CDS-PP), que baixou à 4.ª Comissão, 106/XII (1.ª)

— Altera as normas para velocípedes sem motor do Código da Estrada (Os Verdes), que baixou à 6.ª

Comissão, 107/XII (1.ª) — Cria a obrigação de autoconsumo da energia produzida pelo cogerador, podendo

apenas ser vendida à rede a energia excedente não consumida — Segunda alteração ao Decreto-Lei n.º

23/2010, de 25 de Março (BE), que baixou à 6.ª Comissão, e 108/XII (1.ª) — Altera a Lei n.º 43/2006, de 25 de

Agosto, garantindo a adequada fiscalização parlamentar do Governo no âmbito do Processo da União

Europeia (BE), que baixou à 4.ª Comissão.

Deram ainda entrada os projectos de resolução n.os

134/XII (1.ª) — Recomenda ao Governo a alteração de

normas do Decreto-Lei n.º 61/2011, de 6 de Maio (PSD e CDS-PP), que baixou à 6.ª Comissão, 135/XII (1.ª)

— Sobre a decisão do Conselho Europeu de 25 de Março de 2011, que altera o artigo 136.º do Tratado sobre

o Funcionamento da União Europeia (BE), que baixou à 4.ª Comissão, e 136/XII (1.ª) –- Recomenda ao

Governo que estabeleça um novo prazo de candidatura às bolsas de acção social escolar no ensino superior

(BE), que baixou à 8.ª Comissão.

Em termos de expediente, é tudo, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, vamos dar início à ordem de trabalhos de hoje, cujo primeiro ponto é

preenchido por declarações políticas.

Para o efeito, a Mesa regista a inscrição dos Srs. Deputados Pedro Filipe Soares, do BE, Heloísa Apolónia,

de Os Verdes, Carlos Abreu Amorim, do PSD, António Braga, do PS, Raúl de Almeida, do CDS-PP e

Agostinho Lopes, do PCP.

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Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: O Governo anunciou a

transferência de 6000 milhões de euros dos fundos de pensões da banca para o perímetro de consolidação do

Estado.

Este negócio, há muito desejado pela banca, aparece na pior das alturas para o Estado. Desafiando toda a

lógica conhecida, CDS e PSD conseguiram provar que é possível o euromilhões bater duas vezes à mesma

porta: à dos bancos! Veja-se lá a feliz coincidência!… Depois do milionário plano de privatização de dinheiro

público para a recapitalização do sistema financeiro, a banca ganha agora novo jackpot com o negócio dos

fundos de pensões.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Muito bem!

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Do que é conhecido deste negócio, a transferência dos fundos de

pensões vai muito além do que seria necessário para o cumprimento do défice.

O valor de 6000 milhões de euros é mais do dobro do que seria forçoso para esse efeito e o Governo já

anunciou que uma parte considerável irá regressar direitinha à banca. Percebe-se, pois, que este negócio é

feito para assentar que nem um fato do melhor alfaiate nos interesses do sistema financeiro e nem somos nós

que o dizemos. Vale a pena ouvir um nome tão familiar às bancadas da direita como o de Bagão Félix, para

quem uma taxa de desconto superior a 3,5% já seria um negócio desastroso para o Estado, e fica bem à vista

quem perde com estas condições. Vê-se quem assessorou o governo na maior transferência para a segurança

social e percebemos que, mais uma vez, não há coincidências. Num negócio em que o Banco Espírito Santo

era um dos principais interessados, a escolha do Banco Espírito Santo Investimento para assessorar o

Governo neste processo levanta todas as suspeitas.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Um escândalo!

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Quem convida a raposa para guardar o galinheiro coloca a

transparência do negócio no centro do próprio debate.

Longe vão os tempos em que o PSD marcava conferências de imprensa, a propósito da transferência dos

fundos de pensões da PT, para exigir transparência e pedir explicações sobre «as responsabilidades que o

governo está a transferir para todos nós».

Relembrando uma máxima tornada famosa pelo futebol, para o PSD o que era verdade ontem, hoje já pode

ser mentira!… O que o PSD exigia, e bem, nessa altura, tem ainda mais razão de ser num negócio três vezes

maior e que, por isso, compromete decididamente o futuro das reformas de milhões de portugueses.

Senão, vejamos: segundo informações do próprio Primeiro-Ministro, dos 6000 milhões de euros

transferidos, 2,8 milhões serão para o cumprimento do défice, 800 milhões para o Fundo de Capitalização da

Segurança Social, 500 milhões para o pagamento das pensões aos 27 000 bancários no próximo ano e 2000

milhões de euros para o pagamento de dívidas. Assim, um terço da transferência dos fundos de pensões

poderá voltar direitinho para os cofres dos bancos. É caso para dizer que, em jogo que a banca jogue, o

prémio sai sempre à banca!

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Muito bem!

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Esta medida do Governo é a

mais extraordinária transferência de fundos de pensões da história deste País.

De uma só vez, o Governo quase iguala o valor de todas as transferências de fundos de pensões do

passado. Esta é a receita recorrente para os buracos orçamentais. Aconteceu com os fundos de pensões da

ANA, da NAV, dos CTT, da Caixa Geral de Depósitos ou da Portugal Telecom.

Depois de todos estes buracos serem tapados, os portugueses ganharam uma enorme cratera na

segurança social. É uma manta demasiado curta que é utilizada pelos sucessivos governos, sempre em nome

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de um acontecimento extraordinário, mas que destapa sempre as contas da segurança social. E é disso

mesmo que falamos com este negócio.

Afinal, depois de todos os planos governamentais para os 6000 milhões que transferirá, sabemos que

muito pouco irá caber à segurança social. No dia 1 de Janeiro de 2013, a segurança social terá 800 milhões de

euros para fazer face a compromissos de 5500 milhões de euros. Daqui a pouco mais de dois anos ficará bem

à vista o descalabro desta política. A data está marcada! Em Agosto de 2014 acabar-se-á o dinheiro e a partir

daí serão todos os contribuintes que passarão a assumir o buraco criado pelo PSD e CDS nas contas da

segurança social.

E este é o novo défice que este Governo cria. Um golpe profundo na sustentabilidade da segurança social.

Compreende-se! Quem sempre defendeu a privatização e a entrega da reforma dos portugueses nas mãos da

banca está a criar as condições para, daqui a uns anos, vir dizer que o sistema público de reformas não é

sustentável. É a cantiga do bandido que nunca mexeu uma palha em defesa da segurança social, que só um

sistema público de reformas, longe da especulação financeira, garante a milhões de portugueses.

Os portugueses sabem agora que, no futuro, sempre que lhes disserem que terão de trabalhar mais tempo

para que não sejam penalizados no valor das suas pensões, é a este Governo que terão de pedir

responsabilidades. Porque, em nome da sua cruzada ideológica contra tudo o que é público, este Governo não

hesitou em comprometer a rede de segurança que assegurava o futuro de todos para garantir um presente

risonho a muito poucos — os do costume, claro!

O Bloco de Esquerda considera que esta medida deve ter uma resposta em nome da sustentabilidade da

segurança social e, por isso mesmo, pedirá contas a este Governo, pelo que iremos requerer a presença do

Ministro da Segurança Social neste Parlamento para explicar este negócio, que serve aos bancos mas que

não serve ao País.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Adolfo Mesquita

Nunes, do CDS-PP, João Galamba, do PS, José Luís Ferreira, de Os Verdes, e Luís Filipe Menezes, do PSD,

sendo que o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares pretende responder um a um.

Tem a palavra o Sr. Deputado Adolfo Mesquita Nunes.

O Sr. Adolfo Mesquita Nunes (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Pedro Filipe Soares, ouvimo-lo

hoje, aqui, contestar uma medida extraordinária tomada pelo Governo relativamente aos fundos de pensões.

Que esta é uma medida extraordinária o próprio Governo já o anunciou e estamos perfeitamente conscientes

da extraordinariedade que a ela nos conduziu.

Mas a pergunta que gostava de lhe fazer, tendo em conta a situação das contas públicas nacionais, é esta:

o Sr. Deputado nega o efeito que esta medida, que o Governo anunciou, vai ter na sanação das contas

públicas nacionais? O Sr. Deputado nega o efeito que, do ponto de vista da liquidez do Estado, esta medida

vai trazer para a economia portuguesa?

Recordo-lhe que considero, também eu, que esta é uma medida que é e deve ser extraordinária, por isso

não estou a questionar o carácter extraordinário da medida nem a diferença ideológica que poderemos ter

relativamente a isto, mas a pergunta clara que gostava de lhe fazer é esta: tendo em conta a situação das

contas públicas nacionais, esta é ou não uma medida que vem, do seu ponto de vista, ajudar a sanar as

contas públicas e a ganhar liquidez na economia?

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Adolfo Mesquita Nunes, agradeço-lhe a

pergunta, mas deixe-me dizer-lhe que sempre que é anunciada uma transferência de um fundo de pensões

para a segurança social essa medida é apresentada como extraordinária. Aliás, é curioso como

«extraordinário» é dos adjectivos mais utilizados por este Governo, que quer fazer um milagre, porque quer

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garantir que, com medidas extraordinárias, vai conseguir fazer reformas estruturais. Cá estaremos para ver

como serão essas medidas extraordinárias e como conseguirá o Governo este desiderato.

Mas deixe-me dizer-lhe que, em nome das contas públicas, foi exactamente esse o cerne da intervenção

que tive há pouco, porque o que estamos a criar com esta transferência, agora, no presente, para a segurança

social é um buraco para os próximos anos. E tudo em nome de quê? Não em nome das contas públicas, nem

em nome da defesa dos portugueses. Desengane-se Sr. Deputado! É em nome da defesa da liquidez da

banca!

Ora, este é um jogo que já vimos e a banca ganha sempre. A banca ganha sempre! Temos visto que o

País e os portugueses perdem sempre com este jogo. Esta é a realidade! Por isso, o que percebemos também

é que o silêncio do CDS está do lado da sustentabilidade da segurança social, porque percebemos que há

uma vontade escondida — por vezes dita, por vezes tentando passar entre os pingos da chuva — que é a da

privatização da segurança social.

E, Sr. Deputado, dizer que este é o caminho para esse desiderato do CDS, nós estamos frontalmente

contra, porque só um sistema público de pensões, só um sistema público de reformas é que garante o direito

de todos nós a esse apoio na terceira idade, pois, de outra forma, não o conseguiremos e é isso que nos

distancia.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Galamba.

O Sr. João Galamba (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Pedro Filipe Soares, este fundo de pensões da

banca vai colmatar, sobretudo, uma falha e uma promessa quebrada pelo Sr. Primeiro-Ministro, que, aqui, no

debate do Programa do Governo, anunciou a esta Câmara que, para colmatar o tal desvio colossal, seriam

tomados dois tipos de medidas: a primeira, o imposto extraordinário; e a segunda, uns famosos cortes em

gorduras na ordem dos 1000 milhões de euros, que, misteriosamente, ainda não apareceram…

Continuaremos, pois, a aguardar que esses cortes surjam.

Mas, ao contrário do que diz aqui o Sr. Deputado Adolfo Mesquita Nunes, esta transferência dos fundos de

pensões não resolve qualquer problema das contas públicas, pois é uma medida meramente redistributiva,

que permite ficar bem na fotografia, em 2011, mas permite ver a incompetência deste Governo, que tomou, de

forma apressada, a medida do imposto extraordinário e sabemos hoje que o imposto era desnecessário,

porque o fundo de pensões podia ser utilizado. Portanto, a metade do subsídio de Natal que este Governo do

CDS e do PSD tiraram a todos os trabalhadores portugueses era absolutamente desnecessária, porque podia

ter sido utilizado o fundo de pensões da banca.

Bom, mas o que vai acontecer é que vão pagar as dívidas às empresas, e, obviamente, essa é uma boa

medida. No entanto, é uma medida que tem custos orçamentais graves, porque transfere o «buraco»

orçamental para o futuro.

Portanto, todos os partidos de direita que andaram aqui durante imenso tempo a dizer que a dívida pública

sobrecarrega as gerações futuras, a falarem do TGV, do investimento público…

O Sr. Luís Menezes (PSD): — A PT! A PT!

O Sr. João Galamba (PS): — Ó Sr. Deputado Luís Menezes, acalme-se um bocadinho!

O que o Governo se prepara para fazer com isto é colmatar um problema de tesouraria e liquidez,

sobrecarregando as gerações futuras e criando um «buraco» de cerca de 6000 milhões de euros na Caixa

Geral de Aposentações ou na segurança social. Bem sei que é uma medida que vos pode agradar, porque,

depois, permite justificar aquele famoso discurso de que a segurança social está falida. Mas, para deixar as

coisas bem claras, diria que ela ficará falida, sem dúvida, mas ficará falida se vocês insistirem neste tipo de

políticas, que é pegar em dinheiro da segurança social, pegar em dinheiro da Caixa Geral de Aposentações e

utilizá-lo para outros fins. Assim, PSD e CDS, a história, se calhar, acabará por vos dar razão, mas pelas

razões erradas.

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Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado João Galamba, agradeço a sua

pergunta, mas convirá que a transferência de fundos de pensões de privados para o Estado não é uma

originalidade deste Governo. E não o vi tão crítico, no passado, num negócio tão ruinoso como o da

transferência de fundos de pensões da PT para a segurança social.

Porém, devo dizer-lhe que estou de acordo com muito do que disse, porque a sustentabilidade da

segurança social é o que está em causa neste negócio e os bancos ficam sempre a sorrir em qualquer

fotografia, de qualquer prisma que analisemos este negócio. É que a banca ganha mas os pensionistas

perdem, a banca ganha mas o País perde e aqueles que trabalham sabem que terão de trabalhar mais, no

futuro, para terem acesso às pensões sem penalizações, porque, em nome da sustentabilidade da segurança

social, andaram a dar o que era de todos, ao desbarato, à banca.

Devo dizer-lhe também que não há nenhuma necessidade de medidas extraordinárias. O Bloco de

Esquerda apresentou, não uma mas várias propostas, todo um pacote fiscal, no âmbito do debate do

Orçamento do Estado — fizemo-lo no ano passado e este ano —, que demonstrava que havia alternativas que

defendiam quer o crescimento, quer o rendimento das famílias. Infelizmente, não vimos o PS disponível para

as propostas do Bloco de Esquerda, que evitariam até estarmos, hoje, aqui, a ter esta discussão sobre esta

matéria.

Mas é de segurança social que estamos a falar, é de um negócio ruinoso para o País, que, no fundo, é um

jackpot para a banca, é de um negócio sobre o qual Bagão Félix dizia que seria desastrosa para o Estado uma

taxa de desconto superior a 3,5%. Veja-se que, afinal, iremos pagar à banca uma taxa de 4%! E tudo isto, todo

este desastre para as contas nacionais e para as contas da segurança social, é feito por aqueles que, de um

lado, defendiam os reformados e, do outro, diziam defender os contribuintes. Pois são os reformados e os

contribuintes que irão pagar este desgoverno do PSD e do CDS e é esta realidade concreta que não

aceitamos.

Aplausos do BE.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente António Filipe.

O Sr. Presidente: — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís

Ferreira.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Filipe Soares, de facto, o

Governo decidiu integrar parte dos fundos de pensões da banca na segurança social e, a nosso ver, trata-se

de uma operação que, desde logo, liberta a banca dos seus compromissos no que diz respeito aos fundos de

pensões, nomeadamente do pagamento de reformas. O Estado recebe agora 6000 milhões para pagar, no

futuro, muito mais.

Mas, a nosso ver, trata-se de uma operação que não é isolada, ela integra-se numa operação mais vasta

de ajuda à banca, onde também se incluem os 12 000 milhões que foram dados de bandeja, na semana

passada ou há duas semanas, para recapitalizar a banca. Portanto, parece que, numa altura em que se diz

que não há dinheiro, para a banca aparece sempre.

De facto, esta operação é um excelente negócio para a banca e parece-nos que o é apenas para a banca.

Aliás, adaptando aqui um ditado, até diria: «sempre que vires um banqueiro atirar-se abaixo de uma janela, vai

atrás dele, porque, certamente, é um bom negócio».

Risos do Deputado do PCP Bruno Dias.

É, de facto, disso que se trata!

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Sr. Deputado Pedro Filipe Soares, o que lhe quero perguntar é o seguinte: esta operação, na sua

perspectiva, fragiliza ou não a sustentabilidade da segurança social?

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Luís Ferreira, agradeço a sua

pergunta e concordo com a ideia de que, neste «jogo», a banca sai sempre a ganhar à custa do interesse dos

portugueses e à custa dos próprios interesses do País. No entanto, aquilo que vemos é que a banca ainda se

vitimiza em todo este negócio, quando, na prática, ganha em dois «tabuleiros». Em primeiro lugar, ganha,

porque fica sem a responsabilidade do pagamento destes fundos de pensões, e todos sabemos que parte

deles eram, por um lado, produtos tóxicos e, por outro, tinham sido desvalorizados, em cerca de 30%, nos

últimos anos. Por isso, percebemos que a própria banca teria de capitalizar esses fundos muito mais do que

irá fazer agora.

Em segundo lugar, a banca também ganha porque vai arranjar liquidez para a sua actuação. Portanto, é o

Estado, com o dinheiro de todos nós, que vai financiar a banca, nestas duas vitórias.

Afinal de contas, aqueles que diziam defender os portugueses e os interesses do País, acima de tudo,

colocam a banca ainda acima dos interesses dos portugueses e do País.

Por outro lado, há uma realidade que é inquestionável: no Verão de 2014, o dinheiro que agora será

transferido para a segurança social acabará e o tempo está a contar. A cada segundo que passa, estamos a

perder dinheiro e o défice fica mais perto. Isto é criação deste Governo! Este défice na segurança social é uma

criação do PSD e do CDS! Quando, no futuro, nos disserem que não há sustentabilidade possível para a

segurança social, quando, no futuro, nos disserem que o caminho é a abertura a privados da segurança social,

lembrar-nos-emos desta realidade.

Esse futuro é criado pelas escolhas de um Governo que prefere proteger a banca em vez de proteger as

pessoas. E estas escolhas não serão as pessoas a pagar, porque essa responsabilidade é do PSD e do CDS,

é deste Governo.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Ainda para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís

Menezes.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Filipe Soares, antes de mais, gostaria

de começar por aquilo que referiu na sua intervenção. Ninguém quereria trazer este tipo de responsabilidades

para dentro do perímetro da segurança social do Estado, mas o facto é só um: houve um partido que negociou

um Memorando de Entendimento que determina que, no fim de 2011, é necessário que o défice orçamental do

Estado não ultrapasse os 5,9%.

Como tal, para chegarmos a essa meta e porque é preciso dinheiro para podermos continuar a fornecer os

serviços de saúde, que são tão necessários, a educação, que é tão importante, ou a justiça, que é essencial

para o funcionamento do nosso dia-a-dia, tivemos de obter financiamento. E quem nos financiou obrigou-nos a

determinado tipo de metas, que foram negociadas pelo anterior governo socialista e subscritas pela minha

bancada e pela bancada do CDS. Ora, esta medida é necessária para cumprirmos os compromissos que

temos com quem nos emprestou o dinheiro para continuarmos a financiar o nosso dia-a-dia.

Por isso, é com algum espanto que ouço o Partido Socialista a falar de «cosmética». Mas, então, o que foi,

em 2010, a transferência do fundo de pensões da PT para o perímetro do Estado?!

Vozes do PSD: — Bem lembrado!

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O Sr. Luís Menezes (PSD): — Srs. Deputados do Partido Socialista, tenham vergonha! Tenham vergonha,

porque é inadmissível que venham agora dizer que é cosmética aquilo que os senhores fizeram no ano

passado!

Aplausos do PSD.

Trata-se de uma necessidade, para cumprir os compromissos que os senhores negociaram e que mais de

85% dos portugueses sufragaram.

Mas, relativamente à questão do fundo de pensões, Sr. Deputado, diz que há dinheiro e que não era

necessário o fundo de pensões ter passado para o lado do Estado.

Sr. Deputado, já foi dito pelo Governo que esse dinheiro será aplicado na economia. O Estado deve

serviços que presta aos portugueses através de várias pequenas e médias empresas portuguesas, muitas das

quais enviam mails para várias bancadas deste Parlamento dizendo que estão a sofrer porque não têm

dinheiro para pagar salários ou para honrar os seus compromissos. É com este dinheiro que vamos pagar as

dívidas de um Estado que devia ser uma pessoa de bem e devia pagar a tempo e horas. Ou seja, vamos

ajudar a economia, vamos pôr dinheiro na economia.

Mas os senhores…

O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado, queira concluir.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Vou concluir, Sr. Presidente.

Como estava a dizer, os senhores vêm sempre com essa conversa, completamente mal concebida, dos

bancos e dos «malandros de cartola», mas foram esses malandros de cartola que fizeram com que os

senhores se acantonassem aos poucos votos que ainda têm. Do que os senhores têm de se lembrar é de uma

coisa: há um mundo lá fora, que é o mundo real, e a vossa retórica exibicionista já vos levou aos votos que

têm.

Temos de ter um debate ideológico nesta Câmara. Todos os votos são importantes, todas as opiniões

contam, mas é preciso realismo: é muito dinheiro que vai para a economia e para ajudar essas empresas a

sobreviverem. Mas, para essas empresas, o senhor não tem uma palavra nem uma medida, só retórica.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Menezes, agradeço a sua pergunta,

mas é curioso ouvi-lo falar sobre a campanha eleitoral e sobre as promessas eleitorais. Não me lembro de ter

ouvido, em nenhum momento, o Sr. Deputado ou algum dos candidatos do PSD dizer que ia cortar subsídios

aos portugueses,…

O Sr. Francisco Louçã (BE): — Ah, pois é!

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — … dizer que Portugal tinha de empobrecer. Não me lembro disso! Por

isso, acerca de seriedade, estamos conversados!

Não absolvemos o PS nesta matéria, mas falemos do que está em causa, vamos discutir o que é a

transferência do fundo de pensões. Falava o Sr. Deputado em cosmética, mas devo dizer-lhe que só se for

para maquilhar um mau negócio para o País, para os portugueses, e dizer que, afinal, nem é a banca que está

a ganhar com isso.

Dizia-nos Bagão Félix: «acima de 3,5% de taxa de desconto, é um mau negócio para o Estado». Quanto é

que vai pagar o Governo? Vai pagar 4%! Dizia Bagão Félix, não são palavras do Bloco de Esquerda!

Mas dizia também Nogueira Leite, em Setembro de 2009, sobre o fundo de pensões da PT, que «o

Governo tem a obrigação, porque se trata de responsabilidades de todos nós, agora e no futuro, de explicar

exactamente quais são as responsabilidades que está a transferir para todos nós».

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O Sr. Luís Menezes (PSD): — E tem! E tem!

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Devo dizer-lhe que não ouvimos essa explicação, por parte do

Governo. Não ouvimos dizer, sequer, uma palavra sobre o que acontecerá no Verão de 2014, quando este

défice bater fundo, na segurança social. Não ouvimos uma única palavra! Não ouvimos, sequer, o Governo

explicar por que é que, para o assessorar no negócio com a banca, pede ajuda a um dos bancos. É que foi o

Banco Espírito Santo de Investimento que foi pago para assessorar o Estado num negócio onde o próprio

Banco Espírito Santo de Investimento está envolvido. Diga-me lá onde está a transparência deste negócio, Sr.

Deputado?! É que nem com uma lupa lá consigo chegar!

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Chamem cá o Governo!

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Acerca de rigor e de transparência, estamos conversados: não há rigor

neste negócio, nem transparência — não existe! O que há é um ataque aos contribuintes, que terão de pagar,

no futuro, este «buraco» da segurança social, e aos pensionistas.

A banca ganha — queira ou não o Sr. Deputado maquilhar esta conclusão — e os pensionistas perdem.

Este é o resultado das políticas do PSD e do CDS!

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma declaração política, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa

Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Como certamente têm

conhecimento, está a decorrer em Durban, África do Sul, a 17.ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro

das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas.

A Conferência iniciou-se no dia 28 de Novembro; a componente ministerial, onde estarão representados os

Chefes de Estado e os Chefes de Governo, iniciou-se ontem mesmo, e esta Conferência terminará, em

princípio, no próximo dia 9 — quem sabe se, à semelhança de outras conferências, não se prolongará por

mais um dia e terminará no dia 10.

Esta introdução, para enquadrar o quadro negro em que vivemos, nesta matéria das alterações climáticas.

Estas Conferências das Partes quase começam a ser mais contribuintes para o fenómeno das alterações

climáticas do que propriamente palcos para as conter, porque implicam viagens, designadamente aéreas, de

vários representantes de mais de 190 países, e são cimeiras onde nunca se chega a bom porto. E talvez seja

importante questionarmo-nos por que é que não se chega a conclusões quando estamos no limite para atingir

soluções.

Em 2007, em Bali, parecia que tudo seria possível. Estávamos a entrar no primeiro período de

cumprimento do Protocolo de Quioto, que decorre de 2008 a 2012, e parece que os Chefes de Governo e os

Chefes de Estado estavam cheios de vontade de encontrar novas metas e soluções para o período pós-

Quioto.

Copenhaga foi a grande desilusão. Estavam expectativas criadas e todas foram frustradas. Revelaram-se

as verdadeiras intenções de muitos dos chefes de Estado e de governo de que não havia vontade política

concreta para solucionar a matéria das alterações climáticas. Em Cancun, as expectativas já não eram

grandes, as soluções foram praticamente nulas e agora, em Durban, as expectativas são, também elas,

praticamente nulas.

Agora, vou referir factos, Sr.as

e Srs. Deputados.

O primeiro período de cumprimento do Protocolo de Quioto está a esgotar-se, sendo que termina no ano

que vem. Durante esse período, deveríamos ter diminuído globalmente, em todo o mundo, em mais de 5% as

emissões de gases com efeito de estufa, mas o que se está a conseguir é exactamente o inverso, ou seja,

estamos a aumentar as emissões de gases a nível global. Só para terem uma ideia, de 2009 para 2010, as

emissões de gases com efeito de estufa aumentaram globalmente 6%.

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Infelizmente, a severidade climática já é perceptível para muitas pessoas neste mundo; ela «entrou portas

a dentro» e os extremos climáticos estão a fazer-se notar a grande velocidade: o degelo está a acelerar, a

desertificação de solos está a aumentar, e as estimativas também são negras. Em relação ao

Intergovernmental Panel on Climate Change (IPCC), enfim, quem segue estas matérias conhece bem quais

são os ditames para este século.

A Agência Internacional de Energia garante que as perspectivas estimadas para 2035 podem antecipar-se

em quase 20 anos no que respeita a fenómenos e a problemáticas climáticas se não se tomarem medidas

urgentes de diminuição, designadamente, da utilização de combustíveis fósseis.

A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) garante que duplicaremos as

emissões nos próximos 40 anos se pouco ou nada for feito.

O que se sabe é que a perda de solo útil agrícola é uma grande preocupação e uma grande realidade, o

que significa que haverá tendência para os preços dos alimentos dispararem, para a fome no mundo aumentar

e também para se porem em causa matérias de segurança alimentar.

Não se conhecem os resultados da Cimeira de Durban, pois ela está a decorrer, mas os indícios de

resultados são fracos.

Os Estados Unidos da América, que são nada mais, nada menos, do que o maior emissor de gases com

efeito de estufa per capita no mundo, já assumiram que secundarizam as matérias ambientais em benefício

das finanças — sempre as finanças a comandarem opções políticas.

A China, o maior emissor de gases com efeito de estufa ao nível global, só quer vincular-se após o ano

2020.

O Canadá, o Japão e a Rússia, subscritores do Protocolo de Quioto, já anunciaram que se desvincularão

de qualquer prolongamento do Protocolo, designadamente se os Estados Unidos continuarem afastados do

âmbito do mesmo. O Canadá ameaça até abandonar já no ano de 2011 os objectivos de Quioto.

A União Europeia, perdida nas suas próprias cimeiras e nos seus conselhos europeus, ou franco-alemães

— talvez se diga melhor assim —, nem sequer abrange na agenda do Conselho Europeu as matérias da

Cimeira de Durban e das alterações climáticas.

Por cá, as medidas que se vão tomando são também extraordinariamente preocupantes. Quero só realçar

aqui o famigerado Plano Estratégico de Transportes, que visa justamente uma redução dos serviços públicos

de transporte. Ora, estamos a falar nada mais, nada menos, do que do sector que mais tem contribuído para a

redução das emissões de gases com efeito de estufa. Portanto, andamos muito ao contrário daquilo que seria

desejável.

Sr.as

e Srs. Deputados, mesmo para terminar, quero dizer que as alterações climáticas, na perspectiva de

Os Verdes, são um assunto para levar a sério.

Estamos em risco, neste momento, de deitar fora tudo o que até aqui se moldou no combate às alterações

climáticas. E não foi muito, diga-se de passagem, porque, a benefício deste mundo, da sua biodiversidade e

da humanidade, era possível e desejável ter-se feito muito mais.

Veremos, no final da Cimeira de Durban, o que dela resultará. Mas uma coisa sabemos: as mudanças

climáticas não esperam por nós e a humanidade precisa muito mais deste planeta do que o planeta precisa da

humanidade.

Aplausos de Os Verdes e do PCP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Paulo

Sá e Catarina Martins.

A Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia informou a Mesa que responderá em conjunto.

Tem a palavra, para o primeiro pedido de esclarecimento, o Sr. Deputado Paulo Sá.

O Sr. Paulo Sá (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, colocou aqui uma questão muito

importante sobre as alterações climáticas e o seu impacto no Homem e na natureza. É hoje consensual que a

actividade humana, nos últimos séculos, tem produzido gases com efeito de estufa em grande quantidade,

quantidade tal que provoca um aumento significativo da temperatura da atmosfera, com todas as

consequências negativas que daí advêm.

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É desejável que, neste cenário, os Estados tentem adoptar medidas que contrariem esta tendência de

aumento da temperatura da atmosfera, em particular medidas que reduzam a emissão de gases com efeito de

estufa.

Contudo, em nossa opinião, as medidas adoptadas têm ido na direcção errada, ou seja, na direcção do

aprofundamento das linhas de mercantilização do ambiente em que o comércio das licenças de carbono é um

exemplo paradigmático.

Muitos dos principais actores neste processo parecem estar mais interessados em aproveitar as alterações

climáticas como uma lucrativa oportunidade de negócio, e também como um modo de conter potenciais ou

reais rivais, do que em tentar resolver os problemas ambientais que são criados por estes gases com efeito de

estufa.

Temos sérias dúvidas, Sr.ª Deputada, que a Conferência de Durban possa encontrar um solução

satisfatória para os problemas das alterações climáticas pelo simples facto de todas as soluções apontadas se

enquadrarem num sistema económico e social irracional que gerou estes próprios problemas, ou seja, no

quadro do sistema capitalista em que a obtenção do lucro e a acumulação de capital ocupam um papel mais

importante do que o bem-estar das populações, a defesa e a protecção da natureza.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exactamente!

O Sr. Paulo Sá (PCP): — Sr.ª Deputada, a questão que lhe queria colocar é exactamente se considera, ou

não, que a solução dos problemas das alterações climáticas, em discussão na Conferência de Durban, exige

uma rotura com o actual paradigma de desenvolvimento e a adopção de um quadro normativo específico que

distribua os esforços de redução de emissões de gases com efeito de estufa de forma justa, por sectores e por

países, sem recurso à mercantilização do ambiente.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina Martins.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, saúdo-a por ter hoje

trazido ao Plenário da Assembleia da República o tema de Cimeira de Durban. É muito importante que

possamos falar sobre o que está a acontecer nesta Cimeira, que é importantíssima no que diz respeito às

alterações climáticas, nomeadamente para a definição de um quadro pós-Quioto, e que todos esperamos —

embora já bastante desesperados também com o que vamos ouvindo — que não seja um fracasso, como foi a

Cimeira de Copenhaga.

Mais: sabemos bem que não nos podemos dar ao luxo de ter outro fracasso como o da Cimeira de

Copenhaga. Não há ninguém que não perceba a necessidade de redução da emissão de gases com efeito de

estufa, não há ninguém que não esteja alerta para os problemas climáticos, que se têm vindo a agravar, e

para problemas muito graves, como as crises alimentares, que se vão sucedendo. Portanto, percebemos hoje,

temos de perceber todos, a importância da Cimeira de Durban.

Mas temos que compreender que esta Cimeira é importante se formos capazes de dar passos

significativos. E a verdade é que, numa altura em que até a China parece já ter alguma abertura para dar

alguns passos, vemos que a União Europeia, que sempre teve posições mais avançadas, está a recuar e a

ceder à posição tradicional dos Estados Unidos da América ao bloquear a redução efectiva da emissão de

gases com efeito de estufa.

Por um lado, temos uma União Europeia que é incapaz de agir nesta agenda (acção que tem que ser já) e

de ter uma posição real e avançada na Cimeira de Durban, uma União Europeia que parece presa nesta

trajectória suicidária, seja na economia seja no ambiente, e por outro lado, temos o Governo português que

parece achar que nada pode dizer, nada por fazer e que em tudo tem de ser o bom aluno das más lições

franco-alemãs.

Portanto, Sr.ª Deputada, a pergunta que queria colocar-lhe é se considera, ou não, que a União Europeia

deveria manter as posições mais avançadas que tem tido e não deveria recuar, deveria ter posições

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avançadas na defesa do ambiente, na defesa do clima, contra as alterações climáticas, e se entende, ou não,

que o Governo português poderia também ter uma palavra e não ficar calado a ver o que acontece.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, tem a palavra, para responder.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, quero agradecer particularmente ao Sr. Deputado

Paulo Sá e à Sr.ª Deputada Catarina Martins o facto de terem feito mais algumas considerações e colocado

questões.

Queria começar por dizer que julgo que já não é possível falar de alterações climáticas sem discutir

modelos, sem discutir modelos de produção e de consumo e, portanto, sem perceber que o modelo que

actualmente domina no mundo, que provoca profundas desigualdades sociais, económicas e ambientais, é

gerador de maiores problemáticas ambientais, sociais e económicas.

Portanto, Sr. Deputado Paulo Sá, respondendo à sua pergunta, tenho a dizer-lhe que concordo.

Provavelmente, aqueles partidos que não estão interessados em discutir novos modelos, porque são partidos

deste sistema e não se conseguem desvincular do mesmo um milímetro que seja, por isso não colocam

questões, não fazem considerações, secundarizam também o que está a acontecer em Durban e, nitidamente,

as matérias ambientais.

De resto, quando se colocam questões, como sucede actualmente, sobre crises financeiras e económicas,

penso que vêm sempre ao de cima, pois é sempre muito revelador, as verdadeiras preocupações que os

diferentes partidos políticos têm relativamente às mais diversas matérias. E, se calhar, o discurso do

Presidente Obama seria notavelmente aplicado ao CDS, ao PSD ou ao PS, pois há uma secundarização

absoluta destas matérias.

Sr. Deputado Paulo Sá, é por isso que consideramos que repensar modelos de produção e de consumo é

extraordinariamente importante. Não é por acaso que, nesta fase, Os Verdes lançaram para a rua, ao nível da

sensibilização e vai traduzir-se também em iniciativas na Assembleia da República, uma campanha sobre o

consumo local, sobre a importância de produzir e consumir localmente, ao nível económico, ao nível social e

ao nível ambiental.

De uma vez por todas, precisamos de perceber que as questões ambientais não andam aí pelo céu, pelas

florestas e pelos mares, são questões que têm repercussões muito concretas na segurança das populações,

na saúde das populações e na diversidade biológica, que é extraordinariamente importante. Portanto, há todo

um conjunto de questões sociais e económicas que se entrecruzam. Não são questões estanques que se

discutem à parte; quando as apreciamos, temos que discutir modelos. E, quando falamos de uma crise

financeira global, de uma crise económica global, nacional, europeia, a qualquer escala que seja, temos que

incluir nesta discussão novos modelos de comportamento.

Ninguém quer voltar à Idade da Pedra, não é nada disso que se pede mas, sim, que repensemos novos

modelos mais eficazes, mais eficientes, e que de forma mais harmoniosa se consigam interligar com os

nossos recursos naturais, que são também a base da nossa subsistência. É disso que estamos a falar, da

nossa segurança e da nossa preservação como espécie! É só disso! Se para alguns parece que não tem

relevância absolutamente nenhuma, é só disso que estamos a falar.

Sr.ª Deputada Catarina Martins, respondo-lhe que é evidente que sim, que consideramos que qualquer

posição de recuo é extraordinariamente negativa.

Como referi na minha intervenção, é muito problemático que num Conselho Europeu, que decorrerá

justamente no mesmo dia em que terminará a Cimeira de Durban, a União Europeia nem sequer se dê ao

trabalho de integrar na sua agenda qualquer temática sobre essa questão. Há outras prioridades! Só que

ainda não perceberam que as outras prioridades também estão interligadas com esta! É da componente

económica, é da componente social, é da componente ambiental, é da componente patrimonial, é da

componente da vida! É da nossa sobrevivência que falamos quando apreciamos matérias ambientais,

designadamente a matéria das alterações climáticas!

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O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos

Abreu Amorim.

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: No passado mês de Setembro, o

Sr. Primeiro-Ministro, Pedro Passos Coelho, apresentou o Documento Verde da Reforma da Administração

Local, dando início a um intenso debate que colocou a sociedade portuguesa a reflectir sobre o poder local

democrático de um modo que já não se via há mais de 30 anos.

O Documento Verde nasceu para cumprir esse mesmo fim: ser uma proposta para debate, um pretexto

para que se repensasse o nosso modelo autárquico, tornando possível o seu aperfeiçoamento e remodelação.

E gostaria, desde já, de realçar uma evidência que tem sido demasiadas vezes omitida: o Documento Verde

não é, nem nunca pretendeu ser, um plano acabado e consumado, com soluções completas e inquestionáveis.

Pelo contrário! O Governo e a maioria parlamentar que o suporta sempre o projectaram como ponto de

partida para uma análise democrática participada acerca das muitas virtudes e de algumas disfunções das

nossas autarquias locais, e nunca como uma imposição vertical, indiscutível e inamovível. E essa ampla

discussão fez-se, e está a fazer-se, de norte a sul do País, com os muitos que entendem a democracia

moderna como um processo de aperfeiçoamento permanente das propostas, em que a disponibilidade para o

diálogo produtivo é factor essencial.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O PSD considera que as autarquias locais foram, e são, das melhores e mais profícuas conquistas do

regime democrático, o que não significa, nem nunca poderá indicar, uma recusa obstinada de

aperfeiçoamentos e adaptações àquilo que o País actualmente é, bem como às necessidades evolutivas do

interesse público local, hoje, não o esqueçamos, muito diferentes do que eram há 36 anos

A reforma da administração local tem quatro eixos principais, sendo que apenas um, de entre eles, versa

directamente as freguesias. Ou seja, ao invés daquilo que tem sido propalado por quem está sempre contra

qualquer esboço de mudança, quando esta reforma estiver concluída, nada será como dantes nos municípios

portugueses.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: A reforma vai racionalizar as empresas municipais e incrementar

esquemas de monitorização efectivos, ainda mais necessários agora que, finalmente, se conheceram alguns

dados muito inquietantes do Livro Branco do Sector Empresarial Local, que o anterior governo, em boa hora,

entendeu encomendar.

A reforma vai também transformar o associativismo municipal — hoje, multiplicado e amontoado, de forma

redundante —, concentrando-o em CIM (Comunidades Intermunicipais) robustecidas e nas duas Áreas

Metropolitanas de Lisboa e do Porto.

A reforma irá equilibrar o número de dirigentes municipais, que se encontra desproporcionado em tantos

municípios. Com idêntico propósito, a reforma intentará reduzir o número de cargos políticos, designadamente

de vereadores.

A reforma, por último, preconizará para a gestão municipal novos padrões de exigência e de rigor,

sobretudo no domínio das finanças locais.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: A mudança da lei eleitoral autárquica é um momento fulcral nesta reforma,

embora, como vimos, esta não se esgote num só passo.

Na última década, o Partido Socialista e o PSD ensaiaram, por duas vezes, a alteração da eleição

democrática dos órgãos municipais e a sua reconfiguração, para que se pudesse colocar termo a algumas

singularidades portuguesas que nem sempre deram boa conta de si:

Apenas entre nós, o órgão executivo municipal colegial é eleito por sufrágio directo e universal;…

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O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É democracia a mais?!

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — … somos também o único lugar onde existe a figura do vereador

da oposição; só em Portugal é que se gerou um desprestígio político e administrativo das assembleias

municipais, fenómeno democraticamente preocupante pois estes órgãos deliberativos restaram com poderes

de fiscalização exíguos. E o modelo português de poder municipal propagou uma lógica de presidencialismo

material, contrariando o seu desenho constitucional e legal que, recordemos, nem sequer refere o presidente

da câmara como órgão do município, no seu sentido formal.

Deste modo, Sr. Presidente e Srs. Deputados, urge transmutar as actuais assembleias municipais em

verdadeiros parlamentos locais, com poderes robustecidos, sobretudo de fiscalização, podendo nomear e

demitir os executivos.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Isso é que é democrático!

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Sr. Presidente e Srs. Deputados: Portugal não tem municípios a

mais. Na verdade, a relação entre população/território e número de municípios é das melhores da Europa.

Ainda assim, julgamos proveitoso agilizar um procedimento de agregação voluntária dos municípios que

entendam daí recolher vantagens para as suas populações.

Contudo, o nosso diagnóstico não é igual para as 4259 freguesias. O PSD entende as freguesias como

uma singularidade portuguesa que deverá ser defendida de forma sustentada. Defender as freguesias não é

querer deixar tudo como dantes. Defender as freguesias é coisa muito diferente de recusar a evolução do seu

figurino funcional e «competencial». Muito pelo contrário! Grande parte das freguesias portuguesas

encontram-se exauridas e fragilizadas, numa situação indigna que nega, a todo o tempo, a lógica da

autonomia local.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não há nada, na Constituição e na lei, que implique uma relação

hierárquica entre as freguesias e os municípios. Não há nada, na Constituição e na lei, que defina os

presidentes de junta como entidades mendicantes que, para prosseguirem os interesses das suas populações,

se vêem obrigados a esmolar benefícios, face aos presidentes de câmara. Contudo, infelizmente, é esse

quadro que vemos espalhado por todo o País!

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Muito bem!

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Esta reforma também será feita para pôr um fim a esta situação

deplorável.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — A reforma destina-se a defender as freguesias, retirando-lhes a

exiguidade, dotando-as de escala e de massa crítica que as torne capazes de receberem poderes e de

exercerem as funções exigíveis a uma entidade de poder local, numa administração de um País do primeiro

mundo, tal como o exemplo da reorganização administrativa de Lisboa acaba de demonstrar para as

freguesias urbanas.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr. Deputado.

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O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — A agregação de freguesias que a futura lei preconizará será

realizada num processo que privilegie a lógica decisória ascendente, em que cada autarquia será protagonista

da deliberação acerca da sua reorganização, sendo que o órgão essencial nessa decisão serão as

assembleias municipais.

A lei intensificará esse esforço nas áreas urbanas, flexibilizando-o nas áreas rurais, sem prescindir,

contudo, de um mínimo de escala.

Existirão soluções legais e institucionais que assegurem a representação política, a identidade, a história e

a cultura específicas das freguesias agregadas.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não fomos nós que anunciámos, reiteradamente, a necessidade de

eliminar as freguesias nem que colocámos essa condição e os seus prazos no Memorando de Entendimento

da tróica.

Protestos do Deputado do PCP Bernardino Soares.

Contudo, julgamos que estamos perante uma boa oportunidade de perfazer uma reforma de regime que

vise defender a autonomia local, tornando os municípios sustentáveis e dignificando as freguesias.

É nesse sentido que apelamos ao Partido Socialista para que se junte a nós neste esforço de mudança que

o anterior governo iniciou. Convocamos o PS, como grande partido autárquico, para que não se deixe

entrincheirar junto daqueles que apenas querem amparar o estado musguento das coisas, nem, muito menos,

que se permitam restar em companhia dos que anseiam pelo «quanto pior, melhor».

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Isso é o PSD!

O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado, tem de concluir.

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Terminarei já, Sr. Presidente. Esta reforma vai ser mesmo

concretizada e o PS não pode estacionar, tragicamente, no lado errado da história da liberdade local. O País e

as gerações futuras nunca o perdoariam!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Luís

Fazenda, Paula Santos, Mota Andrade e Altino Bessa.

Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Abreu Amorim, sem prejuízo do debate

político de um tema que é muito sensível no conhecimento da comunidade autárquica e das populações em

geral, melhor seria que já estivéssemos a discutir, sobre cada um dos itens que aqui apresentou, propostas

em concreto, e não um mero enunciado de intenções que pode ter uma escala larguíssima, pode ter uma

variabilidade enorme e da qual não sabemos com rigor, exactamente, o que vai sair, ou seja, qual é «o coelho

que vai sair da cartola» em cada uma das áreas que aqui nos trouxe é manifestamente um mistério.

Portanto, estamos a discutir o Livro Verde (que, por acaso, tem capa azul) mas estamos a discutir um

mistério, um aglomerado de intenções, que decorre já de outras posições que foram afirmadas pelo Sr.

Primeiro-Ministro, pelo Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares, etc.

Agora, pela parte do Bloco de Esquerda, tudo o que tem a ver com a diminuição substancial de empresas

municipais, praticamente a sua eliminação, não temos obstáculo. Há muitos anos que denunciamos essa

circunstância e teremos até alguma curiosidade em ver o PSD a fazê-lo, porque é o partido que deterá o maior

número de empresas municipais, em todo o País, nas câmaras municipais por si dirigidas.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É verdade!

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O Sr. Luís Fazenda (BE): — Mas isso é qualquer coisa que atingirá o próprio PSD, portanto, tem um efeito

boomerang — cá estamos para assistir.

Também não teremos dificuldade em entender a necessidade da redução do número de cargos dirigentes.

Por aí, não temos qualquer problema com esses enunciados.

Mas, na verdade, sobre a reorganização administrativa, aquilo que as freguesias — particularmente no

mundo rural, mas não só, também nos perímetros urbanos — têm, por antecipação, é que vai haver uma

elevada diminuição do número dessas autarquias e haverá a extinção (porque a palavra é essa) dessas

unidades territoriais, dessas unidades de participação política. Por razões orçamentais?! Alguém poderia ter

explicado à tróica que, na verdade, aquilo são «amendoins» do ponto de vista orçamental, não têm gasto

significativo, que estamos a cortar uma dimensão essencial de participação de milhares de portugueses na

coisa pública e que não faz qualquer sentido a extinção de freguesias.

Aqui ou além, por vontade própria das freguesias, agregarem-se para ganharem escala, para determinados

serviços, com certeza! Mas por vontade própria!

Queria perguntar-lhe como é que o PSD vai resolver o problema da consulta às próprias autarquias locais

sobre o desejo que elas possam ter de alterar as suas fronteiras, de se fundirem com outras ou de desejarem

não ser extintas. Ou será que vão rever a Constituição para impor isso a algumas freguesias?

O processo de Lisboa não consultou freguesias e eu gostaria de saber como é que o PSD vai resolver isso.

Bem assim, sem tomar posição de fundo sobre a lei eleitoral para os municípios, gostaria de perguntar ao

Sr. Deputado Carlos Abreu Amorim, como é que o PSD vai contornar a determinação constitucional de que as

assembleias municipais são constituídas por eleitos directos, em número superior ao dos presidentes das

juntas de freguesia lá representados. É que o Sr. Deputado disse, na Tribuna, que não haverá nenhum óbice

constitucional. Pois eu, no mínimo, tenho dois óbices constitucionais em relação às vossas propostas.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado, tem de concluir.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Portanto, hoje, seria o dia — à míngua dos projectos, em concreto, que, a

esta hora, já devíamos ter a possibilidade de discutir —, no seu cardápio de intenções, para sabermos,

exactamente, como contorna esses obstáculos constitucionais.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado Carlos Abreu Amorim, pretende responder a cada um

dos pedidos de esclarecimentos ou em conjunto?

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Sr. Presidente, responderei um a um.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem, então, a palavra para responder, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Fazenda, muito obrigado pelas

suas questões e observações.

Devo começar por dizer que, se não tivéssemos colocado este debate em cima da mesa e posto a

sociedade portuguesa a discutir o seu poder local democrático, após 36 anos, provavelmente, estávamos a ser

acusados (se calhar, até por V. Ex.ª) de estarmos a fazer uma reforma sem debate. Agora, como estamos a

fazer o debate, como proporcionamos esse debate, o Sr. Deputado aparece aqui a dizer: «afinal de contas,

isto é um mistério, não sabemos quais são as soluções».

Ora, as soluções estão em debate, as soluções têm uma matriz no Livro Verde, mas aquilo que consta

deste documento, como acabei de dizer, não está acabado e consumado. As soluções estão a fazer-se pela

lógica democrática do debate.

Vozes do PSD: — Claro!

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O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Dê-nos os seus contributos, Sr. Deputado, porque, com certeza,

eles poderão fazer a grande diferença no debate.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Mas não nos critique por estarmos a proporcionar o debate!

Aplausos do PSD.

A «eliminação» das freguesias — que o Sr. Deputado referiu — não é verdade. Isso não está escrito no

Documento Verde, não foi dito na declaração política que proferi, nem em qualquer declaração dos

responsáveis políticos, designadamente da bancada do PSD ou da do CDS-PP, nem sequer foi dito pelo Sr.

Ministro ou pelo Sr. Secretário de Estado! Trata-se, sim, de agregação de freguesias, no sentido de lhes

manter a identidade, a relação importantíssima que existe entre o cidadão e a freguesia, designadamente, nas

zonas rurais, a sua história, a sua cultura e a sua representatividade. Por isso, Sr. Deputado, não vale a pena

falar em «eliminação» das freguesias.

Do mesmo modo, não vale a pena dizer que tudo está bem no nosso modelo autárquico, porque não está!

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Eu não disse isso!

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — O melhor modo de defender as freguesias não é entrincheirarmo-

nos à volta do modelo que existe, mas percebermos que tudo muda, tudo evolui. Essa é a lei da vida e é,

também, a lei da vida das instituições, Sr. Deputado.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Paula

Santos.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Presidente, o Sr. Deputado Carlos Abreu Amorim veio falar-nos das

alterações e das propostas do Governo em relação ao Documento Verde — que é mais um «documento

negro» para o poder local democrático —,…

Vozes do PCP: — Muito bem!

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — … veio falar-nos de aperfeiçoamento e de democracia moderna, mas os

conceitos de aperfeiçoamento e de democracia moderna que o seu Governo quer propor significam atacar o

poder local democrático que foi conquistado pelo povo na Revolução de Abril; significam atacar a pluralidade,

a representatividade e a colegialidade no poder local democrático;…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — … significam reduzir a participação dos eleitos e privatizar! Este é o

entendimento de aperfeiçoamento e de democracia que os senhores têm!

Vozes do PCP: — Muito bem!

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Para o PCP, a democracia não é um problema, mas esse é o problema

central do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Exactamente!

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A Sr.ª Paula Santos (PCP): — O Sr. Deputado veio falar-nos de debate e de participação?! Diga-nos,

então, como vai ser considerada a moção que foi aprovada no Congresso da ANAFRE, que rejeita o

Documento Verde e é contra a extinção das freguesias? Como é que isto vai ser considerado nesse debate? A

participação não implica a discussão dos pressupostos? A «participação» que os senhores querem é aquela

em que se discuta somente, no local, a sua implementação. E se isso não for feito os senhores vão impor —

aliás, já fizeram várias declarações dizendo que, onde isso não for feito, esse processo vai ser feito de uma

forma administrativa.

O que os senhores querem não é mais democracia, não é mais participação,…

O Sr. Bruno Dias (PCP): — É menos!

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — … nem é o melhoramento do poder local democrático, mas, sim, um ataque

profundo às conquistas do 25 de Abril! É um ajuste de contas com uma importante conquista, a do poder local

democrático, visando regressar a 24 de Abril de 1974!

O PCP não concorda nem pode pactuar com isso.

Efectivamente, as freguesias e as populações estão a dar a sua opinião — certamente, também já

receberam as suas posições em relação a esta matéria —, mas o Governo não a está a ter em conta. Por isso,

não há um verdadeiro debate, há uma imposição! A pretexto da tróica e da actual situação do País, os

senhores querem subverter o regime democrático do nosso País.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Abreu Amorim.

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Sr. Presidente, a Sr.ª Deputada Paula Santos disse, e com razão,

que o poder local democrático era uma conquista de Abril. É verdade!

Vozes do PCP: — Não era, é!

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — É uma conquista de Abril! Pena é que, na Assembleia Constituinte

— como, aliás, a Sr.ª Deputada poderá confirmar, se consultar as Actas da Assembleia Constituinte —, o

partido que a Sr.ª Deputada aqui representa, na altura, tenha tentado privilegiar as entidades populares de

base em detrimento das autarquias locais, eleitas por sufrágio directo e universal!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Portanto, é uma conquista de Abril, mas foi contra a vontade do seu partido! Foi contra a vontade das

pessoas que então se sentavam nessa bancada!

Protestos do PCP.

O poder local democrático, tal como o temos neste momento, é resultado da vontade dos partidos

democráticos que sempre o sustentaram!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Eu estava cá, você não! É duvidoso!…

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Portanto, na bancada do PSD, não aceitamos lições de democracia

local nem interpretações de autonomia local por parte daqueles que, desde a primeira hora, não viram com

bons olhos esta grande conquista de Abril!

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Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos do PCP.

Sr.ª Deputada, o debate está a fazer-se, mas não com slogans, e está a fazer-se todos os dias.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Ainda hoje terei oportunidade de debater com o Sr. Presidente da

ANAFRE…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Que democrata…!

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Se quiser, venha também e participe no debate, Sr.ª Deputada.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Não seja mentiroso!

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — A Sr.ª Deputada falou na rejeição do Documento Verde pelo

Congresso da ANAFRE, mas eu penso que houve uma péssima interpretação.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Olha o democrata…!

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Sr.ª Deputada, não pode rejeitar-se um documento para debate,

porque isso é rejeitar a própria lógica e a essência da democracia.

Protestos do PCP.

O Documento Verde não é uma lei, não é um diploma, mas, sim, uma proposta para debate. Ora, a meu

ver, a ANAFRE errou profundamente, porque não apresentou qualquer alternativa, a não ser o adiamento, e o

País não pode esperar, Sr.ª Deputada!

Protestos da Deputada do PCP Paula Santos.

O País e a autonomia local não podem ser adiados, por isso esta reforma vai fazer-se.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Olha o democrata…!

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Os senhores só têm de escolher se vêm debater connosco ou se

ficam de fora, uma vez mais, como tantas vezes tem acontecido ao longo da vossa história.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Mota

Andrade.

O Sr. Mota Andrade (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Abreu Amorim, há muito que o Partido

Socialista defende uma reforma para todo o sector autárquico. E quero afirmar que defende essa reforma não

porque diabolize as autarquias, não porque tenha algo contra a forma como as autarquias têm desempenhado

um papel fundamental para que exista crescimento, progresso e desenvolvimento em muitos concelhos do

nosso País, mas porque, passados mais de 30 anos, é necessário fazer uma reforma no sector autárquico,

para lhe dar mais transparência e mais coerência.

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Portanto, começo por dizer ao Sr. Deputado Carlos Abreu Amorim — porque penso que aqui representou a

bancada do PSD — que é bem-vindo a este debate, porque há muito que o PS defende esta reforma.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Lá estão eles!…

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Só falta chamar os padrinhos!

O Sr. Mota Andrade (PS): — Defende, também, uma reforma global e sistémica, que tenha o maior

consenso possível e que não fique dependente, como V. Ex.ª agora afirmou, de maiorias conjunturais, que

hoje têm uma cor e amanhã terão outra, seguramente. Nós não defendemos isso, Sr. Deputado.

Defendemos, sim, que tem de haver o maior consenso possível para dar mais transparência e para que o

poder local seja um poder mais firme, que responda mais e melhor às populações.

Deixe-me dizer que partiu mal, não V. Ex.ª, que não é culpado, mas o Governo que a bancada de V. Ex.ª

apoia. E partiu mal porque partiu sozinho para esta reforma.

Esta é uma reforma que o Governo tentou fazer «a régua e esquadro», com base num mero estudo

académico. Nesta matéria, Sr. Deputado, não há estudo académico que resista se não tiver em atenção as

particularidades do território, se não ouvir as populações — e foi isto que VV. Ex.as

fizeram!

Deixe-me dizer-lhe qual é a nossa posição…

O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira fazer o favor de concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Mota Andrade (PS): — Termino já, Sr. Presidente, mas lembro que os outros Srs. Deputados que

me antecederam no uso da palavra tiveram um tempo francamente mais alargado.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado, não estou a tirar-lhe a palavra, estou só a pedir-lhe

para abreviar, porque já ultrapassou o tempo de intervenção de que dispunha.

O Sr. Mota Andrade (PS): — Vou abreviar, Sr. Presidente.

Sr. Deputado, vou dizer-lhe qual é a nossa posição, muito rapidamente.

O fio condutor de toda esta reforma tem de ser uma nova lei eleitoral autárquica, a constituição de um

executivo homogéneo e assembleias municipais com menos membros, mas com mais poderes de

fiscalização.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Nada de oposição, porque o que é bom é estar tudo escondidinho!…

O Sr. Mota Andrade (PS): — Depois disso, sim, discutiremos quais as atribuições e competências para os

executivos municipais, quais as atribuições e competências para as assembleias municipais e quais as

atribuições e competências que devem ser reforçadas nas juntas de freguesia. Esta é a nossa posição, Sr.

Deputado!

Sobre a agregação de freguesias, temos uma posição muito clara: não defendemos que qualquer junta,

qualquer assembleia de freguesia rural seja agregada se as populações não o desejarem, porque na maior

parte do território português a última presença do Estado já é a freguesia, e o Estado não pode abandonar

esse território, não pode abandonar essas populações.

Deixo-lhe a seguinte pergunta: há pouco, o Sr. Deputado disse que o Documento Verde é um ponto de

partida, mas, se assim é, porquê aqueles critérios? O Sr. Deputado concorda com os critérios que estão

plasmados no Documento Verde? O Sr. Deputado concorda com os critérios que interferem com a autonomia

das autarquias?

O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado, peço-lhe que abrevie, uma vez que já duplicou o tempo

de que dispunha.

O Sr. Mota Andrade (PS): — Termino já, Sr. Presidente.

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Nomeadamente, concorda com o que esse Documento prevê no que diz respeito ao número de dirigentes?

Estas são as perguntas cujas respostas eu gostava de obter de V. Ex.ª.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Abreu Amorim.

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Mota Andrade, deixe-me dizer-lhe que

as reformas políticas, sobretudo as de regime, devem ser sempre institucionais, devem ter um prisma

institucional. Mas as pessoas são importantes. E ter V. Ex.ª, na bancada do PS, na posição em que está, para

discutir e debater a reforma administrativa é, sem dúvida alguma, uma mais-valia, como agora se diz, porque

estou certo de que essa disponibilidade será profícua.

No entanto, não posso deixar de realçar que o Partido Socialista evoluiu — ainda bem! Sou sempre a favor

da evolução das espécies, dos partidos — mesmo daqueles que resistem mais a esse fenómeno natural… —

e, com certeza, das posições políticas.

Devo dizer que esta reforma não foi colocada por nós no Memorando assinado com a tróica, nem fomos

nós que iniciámos uma reforma que queria — a verdade tem de ser dita, Sr. Deputado Mota Andrade —

acabar com as freguesias mais pequenas.

Vozes do PS: — Não é verdade!

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PS): — O Partido Socialista anunciou, em 14 de Março de 2011, que ia

acabar com 1000 freguesias, todas aquelas que têm menos de 500 habitantes.

Aplausos do PSD.

Portanto, saúdo a disponibilidade actual do Partido Socialista, mas volto a dizer que não fomos nós que

iniciámos este processo, nem fomos nós que colocámos esta condição no Memorando assinado com a tróica.

Por outro lado, diz o Sr. Deputado que o Documento Verde começou mal, foi um mau ponto de partida, e

eu digo-lhe que o Documento Verde, desde o início, nasceu para ser ultrapassado pela própria dialéctica do

debate.

O que aqui foi dito e o que tem sido dito pelo Sr. Secretário de Estado, pelo Sr. Ministro e pelos

responsáveis do CDS-PP que estão, também, com esta reforma à sua cura foi, exactamente, que muitos dos

critérios de que V. Ex.ª falou acerca do Documento Verde fizeram o seu caminho, porque o caminho na

democracia faz-se caminhado, não se faz dizendo «eu estou contra», sem apresentar alternativas.

Aplausos do PSD.

O Sr. Mota Andrade (PS): — Foi o que fizeram no passado!

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PS): — Saúdo, uma vez mais, a ideia do Sr. Deputado Mota Andrade, mas

digo-lhe que o que importa não é o ponto de partida, mas, sim, o ponto de chegada. E o ponto de chegada tem

de ser consubstanciado com a presença do Partido Socialista, porque as suas enormes responsabilidades

como grande partido autárquico não podem ficar na oportunidade vã de um debate político que não interessa a

ninguém.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Altino

Bessa.

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O Sr. Altino Bessa (CDS-PP): — Sr. Presidente, quero felicitar o Sr. Deputado Carlos Abreu Amorim pelo

debate que hoje trouxe a esta Assembleia, um debate que é importante para as populações e para o poder

local.

Efectivamente, este Governo apresentou o Documento Verde sobre a Reforma da Administração Local,

que é uma proposta de trabalho, uma proposta de debate. É um documento que não está fechado: é, sim, um

ponto de partida para uma verdadeira discussão, ampla, aberta e que envolva todos os agentes.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Altino Bessa (CDS-PP): — Essa é a intenção deste Documento Verde e essa é a intenção do CDS.

Ficámos tristes e perplexos com o Partido Socialista, porque é tão cioso do acordo e do Memorando da

tróica, mas não vai confirmar aquilo que negociou no ponto 3.43, onde se propõe reorganizar e reduzir

significativamente o número de tais entidades. É pena que este Partido Socialista, que muitas vezes diz não

querer ir para além da tróica, nesta matéria não queira sequer aplicar aquilo que negociou e o que foram os

seus propósitos.

Com a mensagem política que tem dado, muito errada, aos seus dirigentes ao nível concelhio e distrital,

ainda no dia 30 de Novembro, a Assembleia Municipal de Barcelos aprovou uma moção, apresentada pelo PS,

intitulada «contra a reforma da administração local», rejeitando a proposta de reorganização administrativa da

proposta do Governo — logo em Barcelos, onde existem 84 freguesias,…

O Sr. Mota Andrade (PS): — Diga tudo! Diga que a seguir passam a ser duas!

O Sr. Altino Bessa (CDS-PP): — … em detrimento de uma proposta do CDS que falava na criação de um

grupo de trabalho para o estudo e a apresentação de uma proposta para a reorganização administrativa do

concelho.

Aplausos do CDS-PP.

Queríamos, e queremos, envolver todos os agentes, queremos envolver os seus representantes, mesmo

os que, por vezes, não se enquadrem na matriz que também defendemos, ou seja, que isto não pode ser feito

«a régua e esquadro», tem de ser feito envolvendo as populações. O sinal político que o PS tem dado é de

desresponsabilização nesta matéria, mas não pode continuar a fazê-lo, sob pena de ser castigado pelas

populações, que, mais tarde ou mais cedo, irão perceber a importância desta matéria.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado, peço-lhe que conclua.

O Sr. Altino Bessa (CDS-PP): — Concluo já, Sr. Presidente.

Sr. Deputado Carlos Abreu Amorim, gostava de fazer-lhe apenas uma pergunta. Para o CDS, isto também

é ponto de honra, ou seja, não admitiremos, não consentiremos que esta lei permita que se contorne a

limitação de mandatos estipulada. Gostávamos de saber qual é a posição do PSD relativamente a esta

matéria, para que, seja quais forem as alterações que venham a ser feitas, não se contorne esta lei, que é um

princípio que está estabelecido e que o CDS quer ver consagrado no futuro.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Abreu Amorim para responder.

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Altino Bessa, em resposta à pergunta

directa que me fez, devo dizer-lhe que esta reforma tem um calendário, apesar de tudo, extenso, isto é, a

reforma, em termos legislativos, só estará terminada em Junho do próximo ano, sendo que nem todas as leis

vão entrar em vigor ao mesmo tempo. As leis sobre o sector empresarial local entrarão em vigor

imediatamente, a lei das finanças locais entrará em vigor imediatamente mas, por exemplo, a agregação de

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freguesias e a lei eleitoral, que pretendemos que seja apoiada pelo arco da governabilidade, como se costuma

dizer, só entrarão em vigor nas próximas eleições autárquicas, em Setembro de 2013.

Em relação à limitação de mandatos, neste momento, a lei actual — que, a meu ver, revela algumas

imperfeições e lacunas — permite que os autarcas das entidades que forem agregadas, designadamente das

freguesias, concorram a uma autarquia, que será, em termos de corpo administrativo, uma autarquia diferente.

Na actual lei isso é permitido. O Governo, através dos seus responsáveis, por diversas vezes já tem dito que

pretende mudar esta possibilidade.

Esperamos — contando com o apoio absolutamente inequívoco e imprescindível do CDS-PP, e esperando

também o apoio do PS e de quem mais se quiser juntar, embora quanto a esta última parte tenha menos

esperança — que as correcções, as imperfeições e as lacunas da lei existente sejam remodeladas,

preenchidas e que esta possibilidade, que alguns observadores já têm classificado como uma fraude ao

espírito da lei, possa também ser eliminada, fazendo-se com que a limitação de mandatos o seja

verdadeiramente em relação às entidades agregadas.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado António

Braga.

O Sr. António Braga (PS): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: O próximo Conselho Europeu

decorrerá debaixo da maior pressão política da sua história, com origem nos designados mercados

financeiros. Na sua agenda está inscrita, dramaticamente, mais do que o modelo de construção da União,

agora e já, a sua própria «prova de vida».

A crise da zona euro ganhou dimensão e contornos inimagináveis para muitos. O conformismo das

instituições europeias e a tibieza das respostas que foram sendo encontradas em sede europeia alimentaram

a especulação, em detrimento de respostas aos reais problemas colocados inicialmente nos chamados países

periféricos. Foram avaliados à conta das fragilidades das economias mais fracas, até que a avalanche chegou

agora ao centro. Ruíram as abordagens dos directórios e as suas presunções.

A condução política que tem marcado o caminho dos últimos anos diante da crescente crise da zona euro,

pautada pela ausência de decisões e sempre caracterizada por uma «mundivisão», que coloca de um lado os

países de economias mais débeis e do outro lado os que presumidamente seriam inatingíveis pela sombra do

risco de notação financeira negativa, tem os dias contados, qualquer que seja o desfecho desta reunião. As

oportunidades para a tomada de decisão que levasse à construção de mecanismos capazes de suster a

contaminação aos mais fortes foram sendo perdidas e, hoje, aqueles que se consideravam os intocáveis já

não o são, por muito que isso escandalize os seus diáfanos dirigentes políticos.

Aplausos do PS.

Há cada vez mais europeus a sofrer as consequências da crise e do impasse que as indecisões trouxeram

à zona euro.

Depois de sucessivos e erráticos adiamentos, a União confronta-se com a imperiosa necessidade de

decidir entre dois caminhos: a decisão em favor daquilo que vem sendo seguido, ou seja, mais austeridade,

menos economia, menos crescimento e mais desemprego, com os resultados conhecidos; ou a decisão que

leve em conta a realidade da circunstância histórica, que abra a economia, estimule o crescimento económico

e favoreça o emprego, decisão que reconduza as finanças ao seu insubstituível papel de garantir o rigor

orçamental, decisão que dessacralize a austeridade como se ela fora o fim e o princípio de tudo, decisão em

favor da convergência e da coesão económica e social.

Perante isto, o Governo da República tem dado mais do que sinais de conformismo na Europa: desiste de

defender as causas em favor de seguir curtas e ensombradas ambições; desiste de afirmar a soberania do

pensamento estratégico em favor da subserviência aos que venera por serem mais fortes; desiste de afirmar o

caminho que Portugal deve percorrer para soçobrar diante de propostas feitas por medida e à medida para

outros, e na defesa de interesses alheios.

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Aplausos do PS.

Tem o Governo a obrigação e, agora, a oportunidade de esclarecer que caminho deseja para Portugal no

seio da União Europeia. A hora das decisões não pode mais ser adiada. Não há nenhuma razão, nem espaço,

para haver omissão ou submissão diante de projectos ou propostas que concorram para a divergência entre

as economias da zona euro, bem pelo contrário! O sentido e a oportunidade para Portugal estão na construção

de políticas dirigidas a consolidar o euro, certamente, mas garantindo o espaço de solidariedade, de coesão e

de convergência dos seus Estados-membros.

Avalizar uma eventualidade de a Europa ser dirigida por um directório, para além de constituir a mais

intolerável das desistências em prejuízo de Portugal, significa abandonar, sem glória, um trajecto

consubstanciado na democraticidade, na paz, na tolerância, na solidariedade e na compreensão dos povos

europeus.

Por sua vez, o PSD, que devia estimular o seu Governo para a participação activa na cimeira, perdeu, de

novo, a oportunidade de surpreender e, ao contrário, insiste em demonstrar o conformismo e o vazio quanto a

um pensamento estratégico para a Europa.

Aplausos do PS.

À saída da audiência com o Governo sobre a preparação da participação de Portugal no Conselho, quando

todos aguardavam conhecer as ideias ou propostas que deixaram em cima da mesa do Sr. Primeiro-Ministro,

ouviu-se a banalidade da crítica ao PS. Só encontro uma explicação: o PSD não tem propostas para a crise!

Aplausos do PS.

O PS não desiste de lutar pela Europa em que acredita e com a qual está comprometido, desde logo na

afirmação de uma política económica legitimada democraticamente, cujas regras favoreçam a coesão social e

o bem-estar de todos.

A via do crescimento sustentável que defendemos exige que Portugal defenda um plano de investimento

assente numa mais efectiva e democrática governação económica europeia. Ficou demonstrado que a

exclusiva redução da despesa pública é insuficiente para aplacar a crise.

Há outros instrumentos de regulação europeia e internacional que podem libertar a economia do jugo da

ganância e da especulação financeira, como o reforço do papel do Banco Central Europeu para assegurar a

sustentabilidade do mercado das dívidas soberanas, em articulação com medidas de integração orçamental e

a instituição da agência de notação europeia independente.

O Sr. Carlos Zorrinho (PS): — Muito bem!

O Sr. António Braga (PS): — Há outras soluções que a União pode, e deve, afirmar em prol do projecto

europeu e para sair do impasse em que se encontra, desde logo a obrigação de os Estados-membros

reinvestirem na economia, no crescimento e no emprego os excedentes financeiros de que disponham. O PS

já as apresentou e está disponível para debater aqui e noutros fóruns, como no seio da família política

europeia, estas e outras propostas.

Em qualquer caso, Portugal não pode ficar isolado ou de fora do debate quanto ao futuro da Europa. O

caminho para a competitividade não pode ser o que nos leva ao empobrecimento, e esta cimeira, Sr.

Presidente e Srs. Deputados, não deve, e não pode, ficar na história da União como o conselho das sanções

aos países com economias mais débeis, porque esse não é o objectivo da União, esse não é o projecto que

une os europeus.

Aplausos do PS.

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A responsabilidade da União é a de adoptar políticas que ajudem os países a não entrar em incumprimento

e a promover o crescimento económico e o emprego.

A verdadeira agenda que deverá ser colocada na mesa das negociações há-de levar em conta as pessoas,

para que a revisão dos tratados possa ser feita em seu nome e nunca como fruto da pressão dos mercados.

Vivemos tempos de incerteza, que nos mobilizam mais para a reconstrução do projecto europeu. Esta crise

é a oportunidade para regenerá-lo e libertar as instituições europeias para o ideal comum que vive na

esmagadora maioria dos cidadãos. Falta dar-lhe expressão em acções concretas para avivar o caminho que

nos trouxe um período duradouro de crescimento, de paz e de solidariedade na Europa como nunca havia

acontecido antes.

Aplausos do PS.

Entretanto, reassumiu a presidência a Sr.ª PresidenteMaria Assunção Esteves.

A Sr.ª Presidente: — Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos ao orador, os Srs. Deputados José Luís

Ferreira, João Serpa Oliva, Ana Drago e António Rodrigues.

Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado António Braga, também estamos

preocupados com o caminho que a Europa está a seguir: o de uma Europa cada vez menos democrática.

Temos a Alemanha e a França a decidirem o destino de todos os povos da Europa, sendo os restantes

Estados-membros remetidos para um papel completamente passivo, limitando-se a aceitar as decisões desse

directório.

Para além deste défice democrático, que agora ganha uma nova versão, menos democrática, ainda temos

este modelo neoliberal actualmente a dominar a União Europeia e que está a colocar os países em

dificuldades, completamente dependentes dos mercados. A esta situação não é certamente alheio o facto de o

Banco Central Europeu (BCE) não poder financiar os seus contribuintes, que são os Estados-membros. Nesta

circunstância, o que o Banco Central Europeu faz é emprestar dinheiro aos grandes bancos privados a uma

taxa de juro baixa para, depois, estes bancos o emprestarem aos Estados que precisam, mas a taxas de juro

muito mais altas. Portanto, na nossa perspectiva, este Conselho deveria centrar-se exactamente em remover

esta proibição do Banco Central Europeu para que ele possa financiar os Estados-membros e expurgar,

assim, do circuito estes bancos intermediários, que arrecadam milhões que são suportados pelos Estados.

Ultimamente, tem-se falado, sobretudo a França e a Alemanha, na necessidade de se proceder à revisão

dos tratados para que neles se consagre o que designam como «a cultura da disciplina orçamental

vinculativa», ou seja, o travão ao défice, o que significa, por exemplo, que esta Assembleia ficaria

condicionada na aprovação das suas políticas orçamentais. Esta função implicaria a transferência da nossa

soberania orçamental para a União Europeia.

Esta medida, como o Sr. Deputado saberá, implicará uma revisão da Constituição. Ontem, o Sr. Primeiro-

Ministro já disse que o PSD está disponível para proceder à abertura do processo de revisão da Constituição

para consagrar o travão ao défice, mas, como se sabe, o PSD e o CDS não chegam para fazer a revisão da

Constituição.

A pergunta que queria colocar ao Sr. Deputado era a de saber se o PS está ou não disponível para o caso

de o PSD querer avançar com um processo de revisão da Constituição, no sentido de proceder a

transferências da nossa soberania orçamental.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Braga.

O Sr. António Braga (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado José Luís Ferreira, queria, em primeiro lugar,

agradecer-lhe a forma como colocou as questões, porque, finalmente, vemos a esquerda à esquerda do PS,

não olhando para o Partido Socialista com a ideia da diabolização das suas posições políticas. Queria

sublinhar, particularmente, esse aspecto — naturalmente, esperamos o mesmo também do Partido Comunista

e do Bloco de Esquerda…!

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Devemos colocar a questão onde deve ser colocada, na discussão, justamente, deste momento

extraordinariamente relevante por que passa a construção do projecto europeu.

O Sr. Deputado coloca questões que o PS acompanhou. Designadamente, como tive ocasião de referir,

somos a favor da construção de uma Europa cada vez mais democrática, não apenas na construção dos

tratados, mas sobretudo na condução das políticas em concreto, no quotidiano! É aí que, de facto, se verifica

de que lado está a acontecer a realização das ambições dos povos que decidiram juntar-se na construção

deste projecto, que é extraordinariamente rico e que tem demonstrado ao mundo inteiro que é possível

conviver — no continente europeu que, tradicionalmente, não passava muitos anos sem guerras — da forma

que temos vindo a fazer, já há muitas décadas.

Sr. Deputado, não defendemos a existência de um directório; bem pelo contrário, condenamo-lo em

absoluto! Essa não é nem a matriz de referência da construção deste projecto europeu e, muito menos,

corresponde à ambição dos povos europeus,…

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. António Braga (PS): — … não apenas por sermos um País periférico, mas porque isso diminui a

própria democraticidade interna, de forma avassaladora, impedindo, inclusivamente, que haja a expressão das

vontades dos diferentes países,…

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. António Braga (PS): — … não apenas nas cimeiras e nos encontros multilaterais, mas sobretudo na

condução das políticas, como lhe referi.

Sr. Deputado, já propusemos alguns mecanismos que, do nosso ponto de vista, poderiam ajudar a que a

crise da zona euro fosse ultrapassada — evidentemente, temos todos de fazer um esforço conjunto —, mas se

tal sucedesse com a dedicação de políticas da própria União Europeia, como a que o Sr. Deputado referiu,

embora não estejamos inteiramente de acordo. Isto é, o Banco Central Europeu, como, aliás, nenhum banco

central no mundo, não financia directamente os Estados. O Banco Central Europeu financiará o Fundo e é

justamente através do Fundo que podemos intervir, ajudar e cooperar na recuperação das próprias

economias, pondo dinheiro na economia.

Fui claro ao dizer e afirmar — e nisso também o acompanho — que não foi por acaso que fizemos a

referência para que sejam injectados na economia os chamados excedentes, mas porque, justamente, tem a

ver com ideia, não apenas da solidariedade e da coesão entre todos os países, mas com a concretização

efectiva de um modelo de aproximação, de cooperação e competitividade entre todos os países da zona euro.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Serpa Oliva.

O Sr. João Serpa Oliva (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, Sr. Deputado António Braga,

em primeiro lugar, os meus agradecimentos por ter trazido este tema, tão do agrado e que deveria ser mais

vezes debatido nesta Assembleia.

Obviamente que a União Europeia e, em particular, a zona euro, vivem hoje uma encruzilhada estratégica e

uma crise de coesão.

Não há segurança, paz e desenvolvimento económico ou social sem União Europeia, concordará comigo.

O Sr. Deputado começou a sua intervenção, dizendo dramaticamente que o Conselho Europeu vai reunir

para fazer a sua «prova de vida»… Desse Conselho esperam-se decisões fortes e que os Estados se

comprometam com uma disciplina do ponto de vista das contas, que permita uma maior coordenação

orçamental e económica entre os vários países. É necessário que a União Europeia actue com solidariedade,

gerando confiança, que é a única forma de as economias crescerem e criarem emprego.

A pergunta, muito simples, que lhe coloco, Sr. Deputado António Braga, é exactamente esta: defender a

integração europeia é defender Portugal. Para isso, precisamos de fortalecer o consenso político-partidário em

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volta deste desígnio, e não o seu contrário. Queria perguntar-lhe se o Partido Socialista está ou não do lado

destes que pretendem que Portugal seja, efectivamente, um País europeu.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — Não é o vosso consenso, em si mesmo, que está em causa!… São as

propostas!

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Braga.

O Sr. António Braga (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Serpa Oliva, também lhe queria agradecer as

questões que coloca, sobretudo essa última, que nos permite clarificar, em absoluto, qual a abordagem que o

Partido Socialista faz, se se integra na construção desse projecto europeu, e da maneira o faz.

Em primeiro lugar, queria dizer-lhe, Sr. Deputado, que para nos aproximarmos é preciso que haja

propostas e, que eu saiba, do lado da maioria não conhecemos nenhuma proposta que possa conjugar-se

com as que o PS tem elaborado no seio da União Europeia.

O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — Muito bem!

O Sr. António Braga (PS): — Como sempre dissemos — deixe-me colocar um parêntesis —, esta crise

tem as principais respostas no conjunto e no contexto dos órgãos e das instituições europeias.

Ainda bem que o Sr. Deputado João Serpa Oliva agora vem ao encontro dessa nossa posição, que já não

é nova, ainda bem — infelizmente, pelas razões mais negativas…

O que eu disse na tribuna, também com muita clareza, foi que, nomeadamente o PSD, o principal partido

da maioria — se me permite essa comparação com o PS, que é o principal partido da oposição… —,…

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Da colaboração!

O Sr. António Braga (PS): — … não tem uma única proposta que se conheça, nomeadamente, no

Parlamento. Era importante que houvesse, porque sendo esta uma matéria que cabe, evidentemente, ao

Governo na sua relação com o Conselho Europeu, não é menos importante que o Parlamento, bem pelo

contrário, possa — não apenas na sua competência de fiscalização, mas também prepositiva — acompanhar,

discutir e debater propostas que possam ajudar a construir um quadro, desde logo, de consenso no

Parlamento. Nada temos contra, mas temos de nos pronunciar em concreto sobre as propostas!…

O Sr. Bruno Dias (PCP): — O Orçamento não é com propostas!

O Sr. António Braga (PS): — Para o Partido Socialista, não é integração pela integração.

O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — Claro!

O Sr. António Braga (PS): — Há um projecto prévio, a que aderimos. Não sei se o CDS-PP aderiu do

mesmo modo que o Partido Socialista o fez e tem feito, nomeadamente, nas famílias políticas da Europa, onde

temos vindo, insistentemente, a colocar estas questões e, novamente digo, não apenas agora, mas já com um

prazo razoável de história já feita no seio da família europeia do Partido Socialista.

Sr. Deputado, não há nenhuma dúvida! O PS está disponível para construir essas pontes, esses

consensos, assim apareçam essas propostas, para as debatermos.

A preocupação que eu aqui quis trazer hoje, Sr. Deputado, é acerca do vazio assustador, inquietante com

que acompanhamos a acção do Governo, designadamente na participação nestas cimeiras e nas reuniões do

Conselho Europeu…

O Sr. João Serpa Oliva (CDS-PP): — Isso não é bem assim!

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O Sr. António Braga (PS): — É, Sr. Deputado, olhe que é! Se tiver ocasião de interrogar melhor o Sr.

Primeiro-Ministro, vai perceber que é inquietante, por um complexo inaceitável: Portugal é um país com quase

900 anos de História! Não há nenhum complexo que algum governo possa ter diante dos outros países da

União Europeia. Não é pela circunstância de vivermos num período como o que vivemos, que nos cria

dificuldades bastante mais intensas do que a outros países da União Europeia, que pode sair diminuído o

nosso peso, ou o nosso papel de participação! Não! Valemos igualmente um voto no seio dessas instituições e

do voto valem também as nossas convicções.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago.

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado António Braga, houve um

momento em que quase me confundi na agenda que temos hoje para debate.

O Sr. Deputado vinha criticar a ausência de iniciativa e proposta política por parte do Governo. Tem toda a

razão! Mas hoje mesmo, em que esta Assembleia tem a possibilidade de discutir e, mais tarde, votar

propostas, projectos de resolução sobre questões europeias e a alteração de tratados de funcionamento da

União Europeia, olha-se para a agenda de projectos que estão em debate e o Partido Socialista prima pela

ausência de iniciativa!

O PS apresenta um conjunto de alterações no que toca ao modelo de acompanhamento e de discussão

por parte da Assembleia da República das questões relativas à União Europeia, mas, no que toca à proposta

de resolução de alteração dos tratados, ou seja, de mecanismos determinantes para resolvermos hoje a crise

financeira que o País e o espaço da zona euro atravessam, o Partido Socialista não «vem a jogo», nem a

debate.

Portanto, acho que uma das primeiras responsabilidades do Partido Socialista, neste momento crucial — e

o Sr. Deputado tem toda a razão —, absolutamente determinante para o futuro de Portugal e dos portugueses

e para o futuro da zona euro e da União Europeia, é a de avançar com as suas propostas de forma resoluta,…

O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — E tem feito, tem feito!

A Sr.ª Ana Drago (BE): — … as apresente e traga a debate nesta mesma Assembleia da República,

exactamente porque a questão da democracia é fundamental, pois o que vai estar em debate na Cimeira

Europeia dos próximos dias é a questão democrática. As propostas que são apresentadas, de «visto prévio»,

aos Orçamentos de Estado, de sanções automáticas que venham a ser estabelecidas a países que têm

dificuldades nos mercados financeiros, de imposição de reformas estruturais, anunciam e ameaçam as

competências soberanas desta mesma Assembleia da República! É uma retirada de poderes aos cidadãos

portugueses e ao papel que os Deputados, nesta mesma Assembleia, têm de desempenhar!

O papel da representação dos interesses portugueses cabe a esta Assembleia e não à Comissão Europeia!

Não pode ser o Tribunal de Justiça Europeu a fazer um sancionamento das escolhas democráticas

orçamentais para o futuro do País! O que é anunciado para o futuro da Europa é esta imposição de disciplina

orçamental, que ameaça ser uma austeridade eterna e cada vez mais galopante na vida dos portugueses. Há

todo um debate a fazer sobre quais são as políticas de crescimento económico para a Europa.

Sr. Deputado, há uma dúvida que, creio, não pode, hoje, persistir. O que é anunciado para a Cimeira

Europeia e para o Conselho Europeu são alterações a protocolos do Tratado que, dizem os burocratas

europeus, não vão exigir ratificação nacional, nem têm de ser discutidas pelos cidadãos da Europa.

Nós, BE, também conhecemos o passado do Partido Socialista, que prometeu um referendo na campanha

eleitoral e, no momento em que foi protagonista central do Tratado de Lisboa, entendeu que, afinal, os

cidadãos portugueses não tinham de pronunciar-se…!

O BE quer saber se o Partido Socialista de hoje, com a sua direcção hoje, no contexto europeu de hoje,

assume perante os portugueses que se houver alteração aos tratados da União Europeia — tratados de

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funcionamento, protocolos — ou seja, alterações com impactos profundos na capacidade de decisão

democrática dos cidadãos portugueses, se compromete ou não a levar a referendo essas mesmas alterações.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado António Braga.

O Sr. António Braga (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada, muito obrigado também pelas questões que

colocou.

Começava pela sua pergunta final, porque o Partido Socialista não se esconde atrás de nenhum biombo

para responder às questões que, aparentemente, a Sr.ª Deputada entende que serão difíceis ou delicadas.

Não! Do que não gostamos é de antecipar as coisas! Temos de avaliar o que vai ocorrer no Conselho e fazê-lo

de duas maneiras.

Já agora, Sr.ª Deputada Ana Drago, permita-me que lhe diga que, se o fizermos com o método que

propomos — e, como diz a Sr.ª Presidente, o método guarda muitas vezes a substância, é importante saber o

que vai ser discutido, mas não apenas! É importante, por princípio, dizer como queremos fazer a discussão.

Dizemos, com veemência, que não aceitamos o directório, nem a ordem de trabalhos que o directório nos

queria impor. Por isso é que as instituições são democráticas, independentemente da vontade que vai vigorar,

porque será a resultante da própria democracia interna dos órgãos! Não podemos aceitar que nos coloquem

previamente, por via do directório, essa questão da revisão do Tratado, ou outra questão.

Ainda ontem o Secretário-Geral do Partido Socialista foi bem claro ao dizer que essa não é a nossa

agenda…

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Era, era!

O Sr. António Braga (PS): — Essa não é a nossa posição relativamente a um directório, de que todos

falamos e que sabemos que é o Sr. Sarkozy e a Sr.ª Merkel.

O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — Claro!

O Sr. António Braga (PS): — Foram eles que decidiram propor ou fazer a proposta de uma eventual

revisão dos tratados. Nós não queremos, nem aceitamos que a democraticidade da Europa se reduza a um

directório, por muito importantes que sejam os países que constituem a União Europeia.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Isso é só doutrina!

O Sr. António Braga (PS): — Ó Sr. Deputado Luís Fazenda, mas é importante clarificar isto, porque se a

Sr.ª Deputada Ana Drago aceita, à partida, esta discussão, nestes termos, está a conceder. Está a conceder

nas condições de democraticidade interna de participação…

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Escusa de fazer esse jogo!

O Sr. António Braga (PS): — Mesmo quanto à forma, o Sr. Deputado sabe muito bem que não é de uma

questão de forma que se trata. É assim que se afirmam princípios e que se fazem valer as posições e as

convicções de cada país nas respectivas instituições!

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. António Braga (PS): — Esse é o nosso ponto de partida.

Quanto ao resto, Sr.ª Deputada Ana Drago, naturalmente que o Partido Socialista tem disponibilidade total

para participar nos debates oportunamente marcados. Quando as agendas nos são colocadas oportunamente,

não as discutimos e contribuímos também para elas. Sempre foi essa a postura do Partido Socialista.

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No entanto, não contam connosco para olhar para uma Europa que seja dirigida «de cima» por dois ou três

países. A Europa tem de permanecer igual àquilo que foi o sonho dos seus pais fundadores e o regresso

desse sonho não é uma utopia. Deve-se, evidentemente, revalorizá-lo, actualizá-lo e regenerá-lo à luz da

realidade dos nossos dias e é isso que o Partido Socialista quer ajudar a construir.

A seu tempo, Sr.ª Deputada, verá que o Partido Socialista tem as posições bem marcadas e definidas, mas

numa agenda em que todos participem com a vontade democrática que resulta justamente do encontro dessas

vontades.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Tem ainda a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado António Rodrigues.

O Sr. António Rodrigues (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado António Braga, agradeço-lhe ter-nos

trazido este tema tão a propósito da reunião do Conselho Europeu, embora não lhe ponha a carga do

dramatismo que coloca, porque penso que a Europa não vai acabar, vai continuar. Não ponho a imagem tão

negativa que coloca relativamente ao futuro da Europa, porque penso que todos ainda temos muita margem

para progressão na construção de um projecto colectivo, para o qual todos temos de contribuir.

Sou, no entanto, solidário consigo na imagem idealística e objectiva de criarmos um futuro melhor à volta

da Europa colectiva, mas não posso concordar que ela seja adequada ao dia de hoje.

O Sr. Deputado veio aqui trazer-nos hoje «uma mão cheia de nada e outra cheia de coisa nenhuma»…

Disse: «Queremos construir uma Europa, queremos alcançar um objectivo mais feliz», mas não nos trouxe

nada de concreto. Acusa os outros de não terem projectos, contudo disse-nos alguma coisa relativamente aos

projectos sobre a governação económica? Têm posição sobre o six pack? Têm posições directas

relativamente a esta matéria?

Vozes do PSD: — Não têm!

O Sr. António Rodrigues (PSD): — Têm posições directas relativamente a resolver os problemas da

Europa já ou preferem falar, como falou, da revisão dos tratados que há-de ser daqui a três anos?

Têm uma posição relativamente à regra da unanimidade ou vamos ter uma decisão maioritária para

podermos evoluir? Têm uma posição concreta relativamente ao que querem da Europa, isto é, querem discutir

o modelo e o formato económico ou querem o reforço político?

Diga-nos, por favor, em concreto, o que querem. Do discurso do Partido Socialista, não consigo perceber,

num só momento, o que quer para a Europa, a não ser uma coisa: como sistematicamente, em todos os

Estados-membros, perde poder, olha para a Europa como se fosse o último local onde pudesse vir a ter algum

poder. Mas não tem, Sr. Deputado!!

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. António Rodrigues (PSD): — Tem cada vez menos poder, por uma simples razão: por onde o

Partido Socialista passou, resultou o acordo de assistência técnica e de apoio económico e financeiro, porque

falhou o modelo socialista.

Risos do PS.

Na Europa, onde tentou construir alguma coisa, falhou sistematicamente. No entanto, fala-nos na

necessidade de olharmos para a Europa. Qual Europa, Sr. Deputado? A sua Europa ou a de todos os

europeus? Não sei qual é a sua e duvido que venhamos a saber.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra, para responder, o Sr. Deputado António Braga.

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O Sr. António Braga (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado António Rodrigues, o senhor foi a imagem e o

rosto do vazio a que o PSD está vocacionado nesta discussão sobre a Europa.

Aplausos do PS.

O Sr. Deputado bem sabe — não lhe faço a injustiça de dizer que não lê e não acompanha a actividade

político-partidária — qual a posição do Partido Socialista e o modelo da Europa que defendemos. Há muito

que foi anunciado que defendemos um federalismo para a Europa.

No entanto, anunciei propostas concretas já não na ideia do modelo, mas para sairmos da crise, para

ajudar a resolver a crise da zona euro. Disse-o com clareza. O Sr. Deputado far-me-á o favor de reconhecer

que, nos debates sobre a Europa, se há algum partido que tem iluminado bem as suas propostas é o Partido

Socialista. E temo-lo feito não apenas em Portugal. Recentemente, o Secretário-Geral do Partido Socialista fez

um périplo pela Europa, nomeadamente pela família partidária europeia, onde foi profusa a divulgação das

suas propostas.

O Sr. Mota Andrade (PS): — Bem lembrado!

O Sr. António Braga (PS): — Sr. Deputado, falámos na taxação das transacções financeiras,…

Protestos do Deputado do PSD António Rodrigues.

O Sr. Deputado tem de se organizar. Se me pergunta outra vez quais são as nossas propostas e lhe digo

quais são, ao menos tem de as ouvir, nem que seja do ponto de vista académico. Aceito que o Sr. Deputado

não concorde com elas, mas são estas, existem e já não é a primeira vez que as propomos.

O que nos preocupa e é deveras inquietante é que o maior partido que suporta o Governo tenha um vazio

absoluto.

Sr. Deputado, tragam ideias. Vamos discuti-las.

Os senhores não só não apresentam uma única ideia, como apresentam uma desistência.

Vou dar-lhe um exemplo: o Sr. Primeiro-Ministro saiu um dia, não há muito tempo, de Portugal e foi

encontrar-se com a Sr.ª Merkel. Todos o ouvimos dizer, de forma «musculada», que era muito a favor dos

eurobonds,…

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. António Braga (PS): — … que essa era uma solução que podia ajudar enormemente Portugal —

entre outras coisas…

O Sr. Mota Andrade (PS): — Bem lembrado!

O Sr. António Braga (PS): — Contudo, o Sr. Primeiro-Ministro foi à reunião com a Sr.ª Merkel e saiu a

dizer exactamente o contrário.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. António Braga (PS): — Sr. Deputado, não estou a dizer que não se pode mudar de opinião. Não!

Estou a dizer que o Sr. Primeiro-Ministro — o principal responsável pelo Governo, evidentemente — devia ter

ido à reunião com a Sr.ª Merkel para convencê-la e que, se não a convenceu, não tinha necessariamente de

sair convencido. Podia não ser convencido.

Aplausos do PS.

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Contudo, o Sr. Primeiro-Ministro foi à reunião e veio convencido, o que é muito inquietante, porque dá boa

nota da impreparação das propostas que são levadas ou da falta de convicção que com elas se vai batalhar

democraticamente — porque é disso que se trata — no seio das instituições europeias em benefício dos

interesses de Portugal e também da zona euro no seu conjunto.

Sr. Deputado, a visão dicotómica e um pouco peregrina de que os países da periferia com as economias

mais fracas poderão caminhar a uma velocidade diferente da dos outros é completamente contrária ao

princípio da construção da União Europeia. E o Sr. Primeiro-Ministro bem o sabe, assim como também sabe

que a criação dos eurobonds tem sido proposta não só por muitas e qualificadas personalidades em Portugal,

incluindo do seu partido, como por muitos dirigentes de outros países da própria União Europeia e não apenas

dos que são considerados de economias mais débeis. Essa é que é a questão, Sr. Deputado.

Para terminar, Sr.ª Presidente, Sr. Deputado, não é aceitável que o principal partido que suporta o Governo

crie um vazio absoluto sobre propostas para sairmos deste impasse em que a própria União Europeia se

colocou.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Raúl de Almeida.

O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Uma primeira palavra para

saudar V. Ex.ª, Sr.ª Presidente, por, em conjunto com a 12.ª Comissão desta Assembleia, ter trazido no dia de

ontem o voluntariado a esta Casa.

Chamar aqueles que nas diferentes áreas se tornam disponíveis para a sociedade em serviço voluntário,

dar-lhes o palco e a palavra, valorizar o seu testemunho de vida, foi um modo particularmente feliz de evocar

na Assembleia da República, Casa da democracia, o Ano Europeu do Voluntariado e da Cidadania Activa.

Se o mote deste Ano Europeu é «Sê voluntário! Faz a diferença!», os testemunhos que tivemos o privilégio

de ouvir são uma interpelação que não podemos ignorar.

Face ao momento que vivemos, aos desafios que enfrentamos, são da maior importância uma reflexão e

uma discussão sérias sobre o voluntariado e o seu papel na sociedade.

O voluntariado é fundamental para alcançarmos um País mais justo, mais coeso e mais solidário.

Não, não se trata, nem por um segundo, de eximir ou aligeirar o Estado das suas responsabilidades, das

obrigações que assumiu perante os cidadãos. Independentemente da orientação política do Estado, mais

socialista ou mais liberal, o rosto humano do voluntariado é único e insubstituível.

O voluntário vai ao encontro das necessidades do próximo sem pedir nada em troca. Ao fazê-lo, está a

crescer como pessoa, a enriquecer-se humanamente, mas também a participar na construção do bem comum,

a patrocinar de forma activa a coesão social.

Aplausos do CDS-PP.

Reforçar, pela acção e pelo exemplo, valores como a solidariedade, a não-descriminação e a participação

social são activos de cidadania a que a busca permanente de uma sociedade mais justa não pode dispensar.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — É por isso dever do Estado criar medidas e meios facilitadores da

prática do voluntariado.

É por isso que o Governo, através do Ministério da Solidariedade e Segurança Social, contempla no

Programa de Emergência Social medidas que visam facilitar e estimular a prática do voluntariado.

Primeiro: a lei do voluntariado. Trata-se de uma criação, por via de mudança da lei, de incentivos ao

voluntariado na área social, como, por exemplo, os bancos de horas nas empresas ou prioridade no acesso a

programas de educação e formação, valorizando e reconhecendo acções de voluntariado.

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Segundo: as horas de voluntariado nos certificados escolares, criando um complemento ao diploma do

ensino secundário, onde constem, como mais-valia, as actividades extracurriculares que possam ser tidas em

conta para formação cívica e social, reconhecendo formalmente a importância destas acções.

Terceiro: o voluntariado jovem, valorizando a solidariedade intergeracional, baixando a idade do seguro

social voluntário. Através da alteração à Lei n.º 71/98, fixar nos 16 anos a idade a partir da qual é permitido o

acesso a um seguro de voluntariado, valorizando a participação de jovem e de estudantes.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — Quarto e último: a promoção da responsabilidade social na

Administração Pública. Promover um programa nacional de responsabilidade social e voluntariado para

trabalhadores em funções públicas, envolvendo os serviços e representantes dos trabalhadores, e estudar a

possibilidade de consagrar bancos de horas sociais para trabalhadores em funções públicas, tal como já é

praticado, e muitíssimo bem, no mundo empresarial no sector privado.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — Ao agir proactivamente nesta área, o Estado está a promover um

factor de crescimento e desenvolvimento social, está a permitir que seja a própria sociedade a gerar

espontaneamente mais coesão social.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

É muito importante, Sr.as

e Srs. Deputados, termos, neste momento, uma noção muito clara do que é o

voluntariado em pleno século XXI, no ano de 2011 em que nos encontramos.

É certamente valiosíssimo o trabalho que tantos e tantos desenvolvem nos nossos hospitais, a

generosidade que muitos põem na visitação regular dos reclusos mais solitários, a disponibilidade com que

quadros qualificados se empenham todos os dias no apoio à vítima, a dádiva cada vez mais evidente no

amparo aos idosos, a opção preferencial pelos mais pobres de entre os pobres, pelos sem-abrigo, pelos que

vivem à margem, o apoio às mães solteiras em dificuldades.

O nosso agradecimento a todos estes voluntários deverá ser permanente e consciente. O serviço social

que prestam ao Estado, à Nação e à sociedade a todos aproveita, porque a todos beneficia uma sociedade

mais justa e solidária.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — Mas em 2011 o voluntariado é mais do que esta valiosa resposta a

situações de emergência social; é também a chamada cidadania activa, a participação activa nas escolas e no

ensino, e há milhares de voluntários nesta área ao longo do nosso País; a participação empenhada na cultura,

factor fundamental para o nosso desenvolvimento colectivo; a entrega nas diferentes colectividades, das

tradicionais de bairro e de freguesia às temáticas, recreativas e desportivas; a acção enquadrada e organizada

na integração das comunidades imigrantes; a disponibilidade para integrar a organização de eventos que

melhoram a imagem de Portugal e dos portugueses no mundo. Isto só para citar alguns exemplos.

Permito-me referir, para termos noção de até que ponto e em que áreas menos lembradas o voluntariado

pode ter um papel fundamental, os Leigos para o Desenvolvimento. São um exemplo, entre outros, de grande

qualidade. Pensarmos que actuam em países de língua portuguesa em desenvolvimento, que ajudam as

populações mais desfavorecidas desses países a construir uma sociedade mais justa, mais equitativa, mais

desenvolvida através da satisfação de necessidades básicas, mas sobretudo através da educação.

Estes jovens, homens e mulheres, são dos mais activos e valiosos embaixadores da língua e da cultura

portuguesas no mundo. São actores fundamentais da manutenção de laços profundos e duradoiros desta

grande comunidade intercontinental, desta grande pátria que é a língua portuguesa.

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Por fim, um justo agradecimento a todos os voluntários, lembrando a cada um de nós que às vezes basta

uma hora por semana para fazermos a diferença, que os tempos difíceis que atravessamos devem despertar o

que há de melhor em cada um, que ninguém, ao seu modo, com as suas opções políticas e ideológicas,

crenças religiosas ou ausência delas, diferentes opções de vida, se encontre longe deste apelo de participação

e construção social.

Portugal, a Europa, o mundo reclamam que rapidamente se substitua a sociedade da competição pela

sociedade da cooperação.

Aplausos do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Francisca Almeida.

A Sr.ª Francisca Almeida (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Raúl de Almeida, quero, antes de mais,

felicitá-lo pelo tema que trouxe a este Plenário, assim como a Assembleia, na pessoa da Sr.ª Presidente, pela

circunstância de também este Parlamento se ter associado ao Ano Europeu do Voluntariado.

Gostaria ainda de saudar a circunstância de, contrariamente ao que se sucedeu no passado, com inúmeras

efemérides europeias, desta vez este Governo não ter passado ao lado de 2011 — Ano Europeu do

Voluntariado.

Como bem referiu o Sr. Deputado Raúl de Almeida, o Sr. Ministro da Solidariedade e da Segurança Social

já anunciou a criação de um plano de nacional de voluntariado. Trata-se de um plano destinado a chamar a

atenção para acções de responsabilidade social dentro do próprio Estado, destinado a estimular o voluntariado

de jovens e de estudantes, destinado, em suma, a promover o desenvolvimento de uma cultura de

voluntariado que envolva todos, capaz de congregar todos — Estado, sector empresarial do Estado,

trabalhadores e estudantes.

Numa altura tão difícil quanto a que presentemente atravessamos, creio que a cultura do voluntariado

assume, como o Sr. Deputado bem referiu, uma dimensão e até uma importância acrescidas.

Não é demais lembrar que Portugal é já, neste particular, um case study a nível europeu quer em número

de pessoas, quer em número de instituições, quer também em qualidade de pessoas e instituições que

dedicam o seu tempo e o seu empenho a causas voluntárias.

Este plano nacional de voluntariado espelha, como aliás já o faz o Plano de Emergência Social, uma

vontade determinada do Governo de alterar um certo paradigma da relação entre o Estado e os cidadãos,

entre o Estado e as instituições. Trata-se de uma relação que deve passar a estar assente na confiança e na

cooperação mútuas. Daí o papel atribuído às instituições particulares de solidariedade social (IPSS) e às

respostas de proximidade do Plano de Emergência Social. Por isso, também esta vontade do Governo e do

Estado em associar os seus agentes ao papel do voluntário e ao empreendedorismo voluntário.

Sr. Deputado Raúl Almeida, para terminar, pergunto se não considera estar na hora de o Estado deixar de

colocar entraves sucessivos aos cidadãos e de desconfiar permanentemente das instituições, nomeadamente

das IPSS, reconhecendo o trabalho inestimável que fazem no terreno, junto das pessoas, junto daqueles que

mais precisam, estimulando esse trabalho e criando condições para que se faça mais e melhor,

contrariamente ao que sucedia no passado.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Raúl de Almeida.

O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Francisca Almeida, agradeço a

questão que colocou.

Com este Governo, assistimos a uma mudança de atitude, a uma mudança de encarar os agentes sociais e

o seu papel na sociedade e, diria mesmo, à quebra de um complexo.

O Estado continua a ter as suas obrigações, conforme disse na minha intervenção. O Estado não se quer

eximir de responsabilidades. O Estado reconhece, de forma clara, o valor dos agentes sociais, das instituições

particulares de solidariedade social, das diferentes formas de organização do voluntariado e apoia estes

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agentes, acabando, como muito bem disse a Sr.ª Deputada, com a desconfiança que existia

permanentemente.

Havia uma dicotomia e uma separação entre o Estado e a prestação de serviços públicos, que, quanto a

nós, não era razoável nem benéfica. Neste momento, temos um Governo que olha para os agentes sociais

como parceiros, que confia nesses agentes, que confia em atitudes de coesão social e nacional, como o

voluntariado, havendo um «dar de mãos» em benefício colectivo.

Há também a questão económica e de poupança — é verdade que gere-se melhor, poupa-se mais e

consegue-se mais. Este é também o papel do Governo e do Estado. Não podemos, de modo algum, esquecer-

nos disto e este Governo está a fazê-lo de forma exemplar através do Ministério da Solidariedade e da

Segurança Social.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — Portanto, penso que a quebra desta tradição negativa de separação

entre o Estado e os agentes sociais nas suas diversas formas pode conduzir-nos, felizmente, a um patamar de

progressão social de sucesso no combate às desigualdades e no apoio às maiores dificuldades.

Por outro lado, outro aspecto também muito importante, conforme referi na minha intervenção, é o da

dinamização cultural, desportiva e de participação social global, que conduzirá inevitavelmente a uma

sociedade mais desenvolvida, em crescimento e mais consciente de si própria, sendo disso que Portugal e os

portugueses precisam para enfrentar os desafios.

Aplausos do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente— Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Lopes.

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Esta é a segunda declaração política

de hoje sobre os fundos de pensões, mas o futuro da segurança social portuguesa bem o exige.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Muito bem!

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — «Para pagamento das responsabilidades assumidas pela segurança

social, são transmitidos para o Estado activos dos fundos de pensões em causa, de acordo com os prazos e

valores definidos no âmbito do processo de audição que envolveu o Governo, a Associação Portuguesa de

Bancos e as instituições de crédito». Foi assim que o Conselho de Ministros de sexta-feira nos informou

acerca de um negócio extraordinário, onde todos ganham, como o Ministro das Finanças teve ocasião de

afirmar nesta Casa, no encerramento do debate do Orçamento do Estado para 2012.

De facto, a decisão do Governo de integrar nas suas contas uma parte (cerca de 6000 milhões de euros)

dos fundos de pensões da banca — a parte referente aos compromissos assumidos com o pagamento das

reformas aos actuais reformados bancários —, obedece a uma imposição inscrita no «pacto de agressão»,

assumido com a União Europeia e o FMI, de redução do défice para 5,9% no final de 2011. Mas claramente

converge com os interesses dos banqueiros, que há muito procuram libertar-se dos compromissos assumidos

no âmbito dos fundos de pensões, nomeadamente do pagamento das reformas.

Depois, diga-se, esse é um filme velho e revelho. Desde 2003 que os governos do PS, do PSD e do CDS-

PP têm vindo a utilizar os fundos de pensões — dos CTT, da Caixa Geral de Depósitos (CGD), da NAV, da

ANA e, no ano passado, com o governo PS/Sócrates, da Portugal Telecom (PT) —, num valor global de mais

de 7800 milhões de euros, com o único objectivo de tapar buracos do Orçamento do Estado e de reduzir o

défice orçamental.

Trata-se de receitas extraordinárias que esses partidos, estando na oposição, dizem sempre que não irão

utilizar e que depois utilizam, dizendo sempre — é sempre a mesma promessa — que é a última vez! Algum

dia será!

Bem se pode dizer que uns, os banqueiros, contribuem para abrir os buracos no Orçamento e aumentar o

défice das contas públicas e ainda são apoiados com os dinheiros públicos. Outros, os trabalhadores e os

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reformados, tapam os buracos e ainda por cima são penalizados através do corte de rendimentos e de direitos

e do agravamento dos seus impostos.

Tudo indica que, dos cerca de 6000 milhões de euros, perto de 50% serão contabilizados como receita

extraordinária do Estado e que o resto servirá para pagar dívida pública aos bancos, pelo que esta verba só

não entrará onde deveria entrar, ou seja, nas contas da segurança social.

Afinal, uma parte significativa do dinheiro sai dos fundos de pensões para voltar a entrar nos próprios

bancos. Este é, de facto, mais um grande negócio para os banqueiros, apesar das suas reclamações.

E para que não se sintam abandonados, lá estão os 12 000 milhões da recapitalização da tróica para dar

algum conforto!

Desta forma, Srs. Deputados, teremos a segurança social com a responsabilidade de atribuir reformas a

partir do próximo dia 1 de Janeiro — em 2010, o valor destas reformas totalizou mais de 500 milhões de euros

—, mas nem um só euro dos fundos a transferir entrará nas contas da segurança social. Esta é mais uma

operação de descapitalização da segurança social, cujas consequências não deixarão de ser utilizadas no

futuro para justificar mais medidas restritivas nos apoios sociais e alteração à legislação relativa ao valor das

pensões e mesmo da idade de reforma.

Esta situação irá agravar-se pela possível insuficiência dos activos transferidos, pela transferência de

activos a valores nominais e não de mercado, por cálculos acturiais realizados na base de pressupostos —

tábua de mortalidade e taxa de desconto — favoráveis às pretensões da banca, pela dificuldade do Estado, no

quadro da crise económica que, tudo indica, vai ser prolongada, em repor nos fundos da segurança social

activos agora canalizados para outros destinos.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Estamos perante uma bomba relógio que é introduzida no regime de

segurança social, com sérias consequências na sua sustentabilidade financeira, afectando, assim, todos os

reformados, sejam os actuais e futuros reformados da banca, sejam todos os outros trabalhadores que já

estão ou venham a integrar o regime geral.

Acresce que, como é sabido, uma parte das responsabilidades irá permanecer nos fundos de pensões dos

bancos. Desconhece-se como será garantido no futuro, nessa componente, o pagamento das prestações

sociais a todos os bancários, incluindo alguns compromissos com reformados e familiares que não passam

para a segurança social, nomeadamente quem paga a diferença entre o valor da reforma atribuída pela

segurança social e o valor que resulta dos aumentos decididos no âmbito da contratação colectiva dos

bancários.

As dúvidas crescem quando se sabe que nos activos que ficam nos fundos de pensões dos bancos há

muito lixo tóxico e nenhuma garantia de que os bancos os actualizem de acordo com os compromissos

assumidos.

Por outro lado, é absolutamente inaceitável, ilegal mesmo, que o Governo tenha consolidado o negócio

com a banca em diploma oficial sem o envolvimento e o acordo dos trabalhadores e sindicatos.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É verdade!

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Banca e Governo tratam dos fundos de pensões como se se tratasse de

dinheiro seu e como se não fossem os fundos constituídos em grande parte por descontos dos trabalhadores

bancários.

Não houve, que se saiba, uma só reunião de trabalhadores bancários para debater o problema. As

estruturas sindicais negam a existência de qualquer acordo tripartido ou mesmo que tenham, até ontem, um

documento do Governo a informá-las de pressupostos e condições do negócio.

O PCP tudo fará para que o Governo esclareça todos os pormenores do negócio. O Governo tem de dar

conhecimento de quais os valores envolvidos, como foram actualizados os fundos de acordo com os

compromissos assumidos com os reformados da banca, bem como dos modelos actuariais, nomeadamente a

tabela de mortalidade e a taxa de desconto.

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O Governo deve informar dos impactos negativos e da dimensão dos riscos para o sistema público da

segurança social, ou seja, das consequências do negócio para a sua sustentabilidade futura.

Estas são razões mais que suficientes para que o PCP se oponha a mais esta negociata entre o Governo e

os banqueiros e não deixará de a combater por todos os meios ao seu alcance. Exigirá o seu escrutínio nesta

Assembleia da República com a presença dos necessários membros do Governo e a possível chamada do

decreto-lei a apreciação parlamentar.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Jesus Marques.

O Sr. Pedro Jesus Marques (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Agostinho Lopes, há vários meses que

o Partido Socialista acompanha de muito perto este assunto. Há mais de dois meses questionámos o Governo

sobre esta matéria e tivemos resposta vaga. Depois de várias insistências, lá nos enviaram uma resposta vaga

a dizer: «Estamos a negociar e, portanto, é prematuro informar sobre as condições de transferência do fundo

de pensões da banca para a segurança social pública.»

Aguardámos, pois, pela conclusão das negociações e exigiremos — acho que esta Câmara faz bem em

assim o solicitar — o total escrutínio parlamentar desta opção, porque se trata, efectivamente, da transferência

de milhares de milhões de euros de fundos de pensões de um sector privado, neste caso do sector financeiro,

para a segurança social pública.

Queremos avaliar com muito detalhe as condições em que, de acordo com o Governo, está garantido o

interesse público. Vamos analisar com muito cuidado que condições foram negociadas com o sector

financeiro. Do que sabemos, do mal o menos, a Comissão Europeia terá defendido o interesse do Estado

português ao impedir a transferência das obrigações de dívida soberana ao valor nominal. Do mal o menos, a

Comissão Europeia, nesta negociação, defendeu o interesse público do Estado português.

Mas, Sr. Deputado, queremos conhecer as condições deste acordo, desta transferência, quando ela estiver

completamente concluída. Do nosso ponto de vista, são manifestamente exageradas as notícias de que houve

um acordo tripartido para a transferência de fundos de pensões da banca para o Estado. Pelas notícias que

nos chegam, não há nenhum acordo tripartido, porque, tanto quanto sabemos, até agora não houve nenhum

acordo com os sindicatos dos trabalhadores do sector bancário, pelo menos com os principais sindicatos

representativos do sector.

Estamos muito atentos e continuaremos, porque esta história está muito mal explicada, nomeadamente o

propalado acordo tripartido relativamente à transferência dos fundos. Julgamos que muita água correrá ainda

por baixo da ponte relativamente a esta matéria. Faltam poucas semanas até ao fim do ano, estamos à espera

dessa informação, estamos à espera que esse acordo efectivamente aconteça.

O que é certo é que o Governo andou mal ao falar pouco e tardiamente com os sindicatos do sector. E

deixamos uma preocupação: que se fale muito, de uma forma bondosa, apenas dos pagamentos de dívidas,

com o tal excedente gerado pela transferência dos fundos de pensões. O pagamento de dívidas que se faça,

mas tenha-se a noção de que isso significa descapitalizar o fundo que, no futuro, iria pagar as pensões dos

trabalhadores do sector bancário. Daqui a cinco, seis ou sete anos, o Estado terá de estar a injectar dinheiro

da dívida pública para pagar estas pensões, porque não há milagres: se o dinheiro for agora gasto, não

teremos, no futuro, dinheiro para pagar essas pensões dos trabalhadores do sector bancário. E esse dinheiro

terá de vir de algum lado: ou vem do Estado, através da dívida pública, ou virá (no que não queremos

acreditar) do fundo de reserva da segurança social de todos os trabalhadores do sector privado, o que é

inaceitável. Mas estaremos muito atentos às regras de transferência. Estamos muito vigilantes em relação a

esta opção do Governo.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Lopes.

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O Sr. Agostinho Lopes (PCP). — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Pedro Marques, agradeço-lhe a questão

que colocou, até porque, nesta matéria, o PS tem culpas velhas no cartório…

O Sr. Honório Novo (PCP): — Tem uma larga experiência!

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Tem larga experiência!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Estão sempre a ver se sacodem a água do capote!

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Tem experiência relativamente ao passado. E não sabemos quais os

impactos efectivos desse passado na sustentabilidade futura da segurança social.

O PS diz que vem acompanhando a questão há uns meses, mas o problema não é o de estar a

acompanhar o problema, é o de saber como é que interrompemos um processo que põe em causa pelo

menos duas questões de grande gravidade: a sustentabilidade futura do sistema público de segurança social,

questão que interessa a todos os trabalhadores e a todos os reformados deste País — diria que interessa a

toda a população do País —, e como é que este dossier respeita ou não os direitos dos trabalhadores

bancários. E esta é uma questão central a que o Governo não responde.

O Governo não responde a essa questão, embora seja claro. O Sr. Ministro das Finanças veio a esta Casa

dizer — e di-lo também em entrevistas nos jornais — que o assunto tinha sido negociado com o sector

bancário, com os sindicatos bancários. Mas os sindicatos bancários já vieram afirmar que isso não é verdade.

Aliás, seria estranho que tivesse havido essa negociação e que o comunicado do Conselho de Ministros que

traduz essa resolução não o exprimisse.

O que diz a resolução do conselho de Ministros é que o acordo foi realizado com o envolvimento da

Associação Portuguesa de Bancos e das instituições bancárias. Portanto, não fala em estruturas de

trabalhadores, o que, além de ser um atropelo monstruoso à abordagem deste problema, dado que os fundos

de pensões são fundos autónomos negociados entre os trabalhadores e os bancos, cujos regulamentos estão

inseridos e inscritos nos próprios acordos de contratação colectiva, assume a responsabilidade de pôr em

causa direitos sem que os trabalhadores sejam informados.

Por isso, pensamos que não podemos esperar que isto seja completa e definitivamente consolidado sem

que se interrompa este processo, sem que se assegure a sustentabilidade futura do sistema público de

segurança social e sem que os direitos dos trabalhadores bancários sejam também devidamente respeitados.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, com a intervenção do Sr. Deputado Agostinho Lopes terminámos o

primeiro ponto da nossa ordem do dia.

Segue-se a discussão conjunta da proposta de resolução n.º 7/XII (1.ª) — Aprova a Decisão do Conselho

Europeu de 25 de Março de 2011, que altera o artigo 136.º do Tratado sobre o Funcionamento da União

Europeia no que respeita a um mecanismo de estabilidade para os Estados-membros cuja moeda seja o euro,

e do projecto de resolução n.º 135/XII (1.ª) — Sobre a decisão do Conselho Europeu de 25 de Março de 2011,

que altera o artigo 136º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (BE).

O Governo far-se-á representar neste debate pela Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e

pelo Sr. Secretário de Estado Adjunto e dos Assuntos Europeus, a quem cumprimento.

Para apresentar a proposta de resolução, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto e dos Assuntos

Europeus.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Hoje também não vem o Ministro? A um debate destes?!

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e dos Assuntos Europeus (Miguel Morais Leitão): — Sr.ª

Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: O Governo propõe hoje a esta Assembleia a aprovação da decisão do

Conselho Europeu que tem por objectivo alterar o Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia de

forma a permitir a criação de um mecanismo europeu de estabilidade.

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Este mecanismo reveste-se da maior relevância, na medida em que constitui um elemento essencial de

reforço da estabilidade financeira da zona euro, que o Governo português subscreve.

Com a constituição de um mecanismo permanente de estabilidade financeira poderá ser fornecida

assistência financeira aos países da zona euro com problemas graves de financiamento, através de um

quadro permanente de resolução de crises, assim se ultrapassando o actual quadro provisório.

A alteração limitada ao Tratado tornou-se necessária devido à interpretação que o artigo 125.º do Tratado,

mais conhecido por cláusula de nobailout, não permitia a criação de um mecanismo permanente de

assistência financeira.

Assim, optou-se por acrescentar um terceiro número ao artigo 136.º do Tratado, passando a prever,

expressamente, uma base jurídica que possibilita a criação do mecanismo.

Esta alteração foi lançada segundo o processo de revisão simplificado previsto no artigo 48.º, n.º 6, que

pode ser utilizado desde que a alteração respeite as seguintes condições: altere as disposições da Parte III do

Tratado de funcionamento, como é o caso da União Económica e Monetária; não aumente as competências

da União Europeia, que é o que acontece neste caso; a sua entrada em vigor esteja dependente da aprovação

pelos Estados-membros nos termos das suas normas constitucionais.

Assim, o Conselho Europeu, após parecer do Parlamento Europeu, da Comissão Europeia e do Banco

Central Europeu, aprovou o seguinte texto do novo n.º 3 do artigo 136.º: «Os Estados-membros cuja moeda

seja o euro podem criar um mecanismo de estabilidade a accionar caso seja indispensável para salvaguardar

a estabilidade da área do euro no seu todo. A concessão de qualquer assistência financeira necessária ao

abrigo do mecanismo ficará sujeita a rigorosa condicionalidade.»

O futuro mecanismo europeu de estabilidade substituirá os actuais: facilidade europeia de estabilidade

financeira e mecanismo europeu de estabilidade financeira, de onde, relembro, provêem dois terços do apoio

concedido a Portugal ao abrigo do programa de assistência financeira.

Foi, entretanto, acordado pelos chefes de estado e de governo que a flexibilização decidida para a

facilidade europeia será extensível ao futuro mecanismo, incluindo o refinanciamento das instituições

financeiras através da possibilidade de concessão de empréstimos mesmo nos Estados-membros que não se

encontrem submetidos a programas de assistência e, em segundo lugar, a intervenção, em circunstâncias

excepcionais, nos mercados secundários de dívida soberana.

Também foi decidido o apoio, a título preventivo, e através de linhas de crédito, aos países que cumpram

os respectivos programas de consolidação orçamental, mas que enfrentem problemas de liquidez.

E, finalmente, foi decidido estender a abrangência deste mecanismo relativamente à extensão dos prazos e

de redução das taxas de juro.

Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, são estas razões — políticas, jurídicas e financeiras — que justificam

plenamente, na opinião do Governo, a aprovação por esta Assembleia desta proposta de resolução.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Para apresentar o projecto de resolução n.º 135/XII (1.ª), tem a palavra a Sr.ª

Deputada Ana Drago.

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr.ª Presidente, Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados: Não deixo de notar

que, num dos debates mais importantes sobre a questão da União Europeia e da zona euro, o Sr. Ministro dos

Negócios Estrangeiros, mais uma vez, prime pela ausência.

Nós conhecemos o percurso do CDS em matéria europeia: de eurocépticos, passaram a eurocalmos e,

neste momento, são euroausentes. Não se ouve por parte do Ministro dos Negócios Estrangeiros, parceiro

central na coligação do Governo, uma única palavra sobre a questão da zona euro. Houve uma altura em que

o Sr. Ministro disse que os eurobonds eram uma questão importante e interessante, mas foi imediatamente

desmentido pelo Sr. Primeiro-Ministro e, a partir daí, nada mais disse sobre a questão europeia.

Mas há uma certa ironia em que, no exacto dia em que discutimos uma alteração ao Tratado sobre o

Funcionamento da União Europeia, ela esteja, desde logo, ultrapassada pelo decorrer dos eventos, uma vez

que já estão anunciadas novas tomadas de decisão no processo e alterações ao Tratado Europeu pelo

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directório de Paris e de Berlim, que transformam o que estamos hoje a debater num processo absolutamente

anacrónico.

Mas o que creio ser mais preocupante neste debate é a postura que o Sr. Secretário de Estado Adjunto e

dos Assuntos Europeus sucessivamente assume nestes debates na Assembleia da República. O Sr.

Secretário de Estado insiste em fazer um papel de uma espécie de assessor de imprensa da Comissão

Europeia e do Eurogrupo, no âmbito dos debates na Assembleia da República. O Sr. Secretário de Estado

anuncia as decisões que estão a ser debatidas, as propostas que estão anunciadas para o futuro, dá um

conjunto de informação, mas sobre a estratégia política do Governo, nada, zero, euroausência mais uma vez!

Sr. Secretário de Estado, creio que aquilo que os portugueses querem hoje — aliás, esse foi o mandato

que atribuíram ao Governo — é que o Governo seja o representante dos interesses dos cidadãos portugueses

no processo de construção europeia e na crise das dívidas soberanas, que, neste momento, atinge Portugal

de uma forma absolutamente devastadora.

As propostas que temos em cima da mesa para a cimeira do próximo dia 9 são muitíssimo preocupantes,

pois representam uma limitação brutal da soberania, da capacidade de decisão democrática dos cidadãos

europeus: visto prévio sobre o Orçamento do Estado, imposição de reformas estruturais, sanções automáticas.

Era interessante saber que sanções o Governo entende que seriam aplicáveis ao Estado português, e justas,

no que diz respeito aos cidadãos portugueses. Limitação no acesso a fundos? Limitação nos direitos de voto?

O que é que o Governo considera defensável aplicar a um país como Portugal?

Sr. Secretário de Estado, o Governo representa os portugueses no processo de construção europeia, não

representa o processo junto dos portugueses. Portanto, num País com 2 milhões de pobres, com 700 000

desempregados, com uma recessão técnica que já está em vigor, precisamos de saber o que vai acontecer

para futuro. Apenas, e só, disciplina orçamental mais dura? Sanções mais duras? Não há qualquer ilação do

processo político de 10 anos de implementação de uma moeda única?

Sr. Secretário de Estado, aquilo que o Bloco de Esquerda hoje apresenta, para que esta Assembleia se

pronuncie e vote, é uma resolução para parar esta lógica de austeridade em cima de austeridade, para que os

portugueses se possam pronunciar sobre alterações que vão limitar a sua soberania, para dizer, de uma vez

por todas, ao Dr. Passos Coelho que ele não é o representante da Sr.ª Merkel junto dos portugueses.

O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — Mas parece!

A Sr.ª Ana Drago (BE): — O Dr. Passos Coelho tem de representar os interesses dos portugueses junto da

União Europeia.

Esta austeridade, esta limitação de soberania é um desastre para a democracia portuguesa.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, a Mesa regista a inscrição, para intervenções, dos Srs. Deputados

Carlos Costa Neves, Honório Novo, João Serpa Oliva, Francisco de Assis e José Luís Ferreira.

Tem a palavra, em primeiro lugar, o Sr. Deputado Carlos Costa Neves.

O Sr. Carlos Costa Neves (PSD): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs. Deputados:

Na minha primeira intervenção em Plenário, nesta Legislatura, que coincide com a primeira vez que se debate

o tema «União Europeia» em Plenário, cumprimento a Sr.ª Presidente da Assembleia da República, no que é

uma boa praxe parlamentar. Quero dizer-lhe, nesta oportunidade, Sr.ª Presidente — peço desculpa por estar

de costas —,…

Risos.

… que contamos muito com a sua sensibilidade, a sua experiência, a sua competência no necessário

reforço do envolvimento da Assembleia da República no acompanhamento do processo de construção

europeia, quer a nível das comissões, quer a nível do Plenário da Assembleia da República. É este, aliás, o

sentido do Tratado de Lisboa quanto ao envolvimento dos parlamentos nacionais, que não se pode ficar pela

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mera avaliação, por vezes administrativa ou burocrática, do cumprimento do princípio da subsidiariedade. Diria

que é mesmo decisivo o envolvimento dos Parlamentos nacionais. Os cidadãos só estarão mais próximos se e

na medida em que os parlamentos nacionais estiverem mais próximos da construção europeia.

Estamos, hoje, a debater uma alteração cirúrgica do Tratado de funcionamento da União Europeia, que é

entendida, por alguns, como necessária, visando criar um mecanismo europeu de estabilidade.

Adopta-se um procedimento simplificado para esta revisão, procedimento só possível porque não se criam

novos poderes para a União Europeia. É um procedimento, de qualquer forma, excepcional, que, pensamos,

neste caso se justifica, mas que, ainda assim, deverá ser sempre encarado como um procedimento

excepcional. Apesar de simplificado, ainda assim é longo, muito longo, de mais de dois anos.

Senão, vejamos.

Em 28 de Outubro de 2010, o Conselho Europeu reconheceu a necessidade de criar um mecanismo

permanente de resolução de crises para salvaguardar a estabilidade financeira de toda a zona euro.

Hoje, 7 de Dezembro de 2011, 14 meses depois do Conselho Europeu, debatemo-lo aqui, no Parlamento

português. A entrada em vigor está prevista para 1 de Janeiro de 2013. Ou seja, de Outubro de 2010 a Janeiro

de 2013 — façam-se as contas! —, são 26 meses para uma revisão cirúrgica, usando um procedimento

simplificado, 26 meses para rever um número de um artigo do Tratado de funcionamento da União Europeia.

Quando se pensa em novas revisões, provavelmente, ou desejavelmente, não simplificadas, convirá ter esta

experiência em conta.

O Grupo Parlamentar do PSD votará a favor da resolução proposta pelo Governo, convicto de que, embora

chegando tarde, o mecanismo de estabilidade financeira é um elemento indispensável à sustentabilidade do

euro, tão indispensável como insuficiente. São, aliás, as razões de indispensabilidade que nos levam a votar a

favor. Mas as razões que justificam este nosso apoio à proposta do Governo são as mesmas, sem tirar nem

pôr, que nos levam a recusar o projecto de resolução do Bloco de Esquerda, que reprova o mecanismo de

estabilidade financeira e, ao mesmo tempo, pretende sujeitá-lo a referendo, isto é, reprova-se o que se sujeita

a referendo — não faz mesmo sentido, Sr.as

e Srs. Deputados.

Protestos do BE.

Afirmei que o mecanismo de estabilidade financeira é necessário, e acrescento que é uma necessidade

que não é de agora, para responder à crise das dívidas soberanas. É uma necessidade que vem desde o dia

da entrada em circulação do euro, já lá vai mais de uma década. Na verdade, a união monetária está

incompleta desde o seu lançamento ou, como recentemente afirmou Jacques Delors, está defeituosa desde o

seu lançamento. Delors tem uma reforçada legitimidade para o afirmar, pois presidiu ao Comité para o estudo

da União Económica e Monetária, formado por representantes dos vários Estados-membros, que elaborou o

Relatório para o estudo da união económica e monetária, o qual ficou conhecido pelo nome do presidente do

Comité, exactamente Relatório Delors. Foi concluído em 17 de Abril de 1989, já lá vão 22 anos, mas ainda

vale a pena tomá-lo como referência em muitas das questões que aborda. Muito do que hoje se debate e se

considera necessário está lá plasmado, tem lá resposta. Fala, por exemplo, da referência à necessidade de

supervisão dos orçamentos nacionais, aquilo que hoje se chama «semestre europeu»; fala também do

indispensável paralelismo entre a evolução da união monetária e da união económica, que todos, hoje,

reconhecem necessária; fala da perspectiva de reforço da coesão, através do reforço do crescimento e do

emprego, que continua a ser um dos elementos essenciais; fala da criação de um fundo de reserva europeu,

que hoje estamos aqui a discutir; fala da preocupação com os choques assimétricos, que, neste momento,

estão a acontecer; fala da necessidade de regulação bancária, também um elemento de actualidade. Dez

anos antes de o euro começar a circular, em 1989, sabia-se que tudo isto era necessário, sabia-se que tudo

isto teria de acontecer.

O mecanismo de estabilidade financeira é, pois, necessário mas não suficiente, e quero também eu

assumi-lo. Precisamos de mais Banco Central Europeu, precisamos de mais convergência, de mais coesão na

união económica, precisamos de mais união política…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Mais ainda?!

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O Sr. Carlos Costa Neves (PSD): — … e, de caminho, há que clarificar o modelo institucional da União

Europeia — quem, como e quando decide o quê! Não tenho dúvidas quanto a esta questão! É preciso

devolver centralidade à Comissão Europeia, é preciso reconduzir o Conselho à função de salvaguarda do

princípio de igualdade entre os Estados-membros, é preciso adoptar a maioria como regra, no processo de

decisão, e a unanimidade como excepção, nomeadamente nos domínios da governação económica.

A justificar-se nova revisão do Tratado, há que actuar em dois tempos: contar com dois ou três anos para

rever o Tratado e, entretanto, adoptar as medidas que são urgentes e a que me referi.

Assim sendo, é indispensável um compromisso firme entre os Estados-membros, entre todos os Estados-

membros, à volta de um road map capaz de devolver a confiança aos Estados-membros, mas, sobretudo,

capaz de devolver a confiança aos cidadãos, capaz de devolver a confiança aos europeus.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Confiança que é, a um tempo, essencial à União Europeia e essencial aos Estados-membros,

nomeadamente a Portugal. E não são discursos maniqueístas, como aqueles que acabámos de ouvir ao Bloco

de Esquerda e ao Partido Socialista, que fazem retomar essa confiança, que é essencial neste nosso mundo

cada vez mais pequeno.

Que o Conselho Europeu que amanhã se inicia possa representar um momento de viragem!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros,…

Risos.

Perdão, tinha assim escrito.

Sr.ª Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as

e Srs. Deputados: Até agora faziam-se alterações aos

tratados com toda a pompa e circunstância.

É certo que os objectivos finais eram quase sempre os mesmos e previamente anunciados: reforçar o

federalismo e os poderes do directório dos países mais poderosos, desprezar os interesses das economias

mais débeis, concretizar as políticas que melhor servissem os grandes grupos económicos e financeiros,

avançar em estratégias intervencionistas à escala planetária, destruir qualquer rasto de coesão económica e

social.

Invariavelmente, a cada nova alteração se associava a (falsa) ideia de aprofundamento democrático para

tornar as decisões mais fáceis e escrutináveis, se organizava um suporte de (pura) propaganda para fazer crer

que era tudo do interesse dos povos, se apregoava a crescente identificação dos cidadãos com as instituições,

se dizia que as alterações eram o passe de mágica para o crescimento económico e o combate ao

desemprego.

Foi assim também com a alteração que deu origem ao Tratado de Lisboa, em vigor desde 2009. Neste

caso, ainda hoje ecoam a retórica que o anunciava como «Tratado para uma geração» e as patéticas

expressões de contentamento por mais um passo na rota de uma construção europeia feita na base da

imposição aos mais fracos dos interesses dos mais fortes.

Cada nova alteração dos tratados se encarregou, porém, de desmentir os paraísos pré-anunciados. As

consequências das suas políticas demonstram-no de forma eloquente: crescimento económico medíocre;

reforço dos desequilíbrios internos; austeridades cegas e estagnação ou recessão dos mais frágeis; aumento

incessante do desemprego, da exclusão social e da pobreza; degradação generalizada dos direitos sociais e

laborais dos povos europeus; violação e usurpação de interesses nacionais soberanos, quase tudo sempre ao

sabor do insaciável eixo franco-alemão.

As consequências negativas associadas a cada nova alteração fizeram com que novas modificações

passassem a ter mais sobressaltos. Bastou para isso que, por erro de cálculo ou por raro cumprimento de

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compromissos, as alterações passassem pelo voto popular. Só que os exemplos, cada vez mais frequentes,

de rejeição popular de propostas de alteração aos Tratados, na França, na Holanda e na Irlanda, tiveram

imediata resposta de todos aqueles que nem sequer querem ouvir falar em democracia quanto mais em

mudança de rumo ou em ruptura com este caminho federal.

O Tratado de Lisboa é, aliás, também exemplo desta inflexão táctica perante a crescente indignação dos

povos. Votar alterações aos tratados passou a ser proscrito. «Isto de alterações aos Tratados é coisa

complexa, só acessível a especialistas, só aprovável por maiorias seguidistas que garantam a ratificação

assegurada e anunciada» — esta passou a ser a posição oficiosa dos fervorosos adeptos desta democrática

integração europeia. E para que não surgissem riscos, para que as alterações fossem aprovadas mais no

recato dos gabinetes, longe do debate público alargado, criou-se a figura perversa das alterações simplificadas

do Tratado.

Nestes casos, que passarão certamente a ser regra geral, as decisões são do Conselho Europeu (isto é, do

directório franco-alemão), os debates nacionais deixam de existir, a ratificação ocorre no mais completo

desconhecimento do que em concreto está em causa. Tudo, aliás, como hoje está a suceder.

O que se propõe neste novo processo simplificado de modificar os Tratados (sem discussão, sem

participação e sem democracia) é aditar uma nova disposição ao Tratado que cria um mecanismo permanente

de estabilidade financeira utilizável sob rigorosa condicionalidade.

Dito de outra forma, trata-se de uma «ligeira» alteração (na linguagem franco-alemã, aliás «aprovada de

cruz» pelo Governo português em Março passado), cujo conceito de solidariedade se traduz numa ajuda

financeira que retira competências e interfere na governação dos Estados, particularmente nas áreas

orçamentais, sociais e laborais, impondo-lhes um rigoroso programa de ajustamento orçamental. Se isto não é

um aumento das competências da União Europeia, são capazes, Sr. Deputado Carlos Costa Neves e Sr.

Secretário de Estado, de me dizer o que é aumento das competências da União Europeia?

Em Portugal, conhecemos bem as consequências desta rigorosa condicionalidade. Em particular, traduziu-

se no Memorando da tróica e nas imposições que a União Europeia, o Banco Central Europeu e o Fundo

Monetário Internacional nos quiseram impor. E pode mesmo dizer-se que nem o Fundo Monetário

Internacional deixa de participar no desenho da rigorosa condicionalidade associada a este novo mecanismo

permanente agora integrado nos Tratados.

Quando esta ligeira alteração chega ao nosso Parlamento já o eixo franco-alemão entretanto cozinhou e

anunciou uma nova modificação, igualmente ligeira, que sirva ainda mais e melhor o directório que dita regras

aos restantes: trata-se, agora, de modificar a Constituição para lhe introduzir uma norma que limite

constitucionalmente o défice e a dívida, prevendo sanções automáticas para os prevaricadores; trata-se

também de eliminar todas as decisões por unanimidade; trata-se de criar a designada união orçamental, com

um eventual ministro das finanças europeu, e a possibilidade de fiscalização permanente e presencial do

processo de execução orçamental nos diferentes Estados-membros.

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, Srs. Secretários de Estado: Há quem diga que esta semana,

amanhã e depois, vai ocorrer um Conselho Europeu. Há quem diga, contudo, que tal Conselho se vai limitar a

ratificar o que o directório franco-alemão já decidiu. Pela nossa parte, é urgente pôr termo a este desvario

autoritário de um caminho federalista, antidemocrático e violador das soberanias que a União Europeia

continua a percorrer.

O Sr. António Filipe (PCP): — Muito bem!

O Sr. Honório Novo (PCP): — Mas o caminho para essa ruptura terá que ser desbravado pela luta dos

povos, não certamente pelos governos que amanhã se reúnem em Bruxelas.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Pra uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Serpa Oliva.

O Sr. João Serpa Oliva (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as

e Srs. Deputados:

A União Europeia, e em particular a zona euro, vivem hoje uma encruzilhada estratégica e uma crise de

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coesão. Portugal, em particular, parece ter passado de uma era de optimismo e prosperidade para uma fase

de ansiedade e pessimismo contagiantes.

A história da Europa da paz, da segurança e do desenvolvimento confunde-se com a história da integração

europeia. Não há segurança, paz e desenvolvimento económico ou social sem a União Europeia, e os

portugueses sabem bem o que quero dizer. Sem a integração europeia de Portugal teria sido muito mais difícil

a nossa consolidação democrática, o desenvolvimento económico que tivemos nas últimas décadas, a

melhoria dos serviços de saúde ou de educação, em última análise o nosso próprio Estado social.

Defender a integração europeia é defender Portugal. Para isso, precisamos de fortalecer o consenso

político-partidário em volta deste desígnio e não o seu contrário. E é também por essa razão que o mecanismo

permanente de resolução de crises, sobre o qual incide a proposta de resolução que hoje o Governo traz a

esta Câmara, é tão relevante.

Na reunião do Conselho Europeu de 28 e 29 de Outubro de 2010, os chefes de estado e de governo

acordaram na necessidade de os Estados-membros criarem um mecanismo permanente de resolução de

crises para salvaguardar a estabilidade financeira da área do euro no seu todo e convidaram o Presidente do

Conselho Europeu a proceder a consultas com os membros do Conselho Europeu sobre uma alteração

limitada do Tratado, necessária para esse efeito.

Posteriormente, na Cimeira da União Europeia de 16 e 17 de Dezembro de 2010, os Estados-membros

chegaram a um acordo unânime sobre o projecto de decisão que introduz uma alteração limitada do Tratado,

por forma a permitir aos Estados-membros da área do euro a criação de um mecanismo permanente para

salvaguardar a estabilidade financeira da área do euro no seu todo.

A presente proposta de resolução, apresentada pelo Governo, aprova a decisão do Conselho Europeu de

25 de Março de 2011, que altera o artigo 136.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, no que

respeita à criação de um mecanismo de estabilidade para os Estados-membros cuja moeda seja o euro.

Pela presente decisão é aditado um n.º 3 ao artigo 136.º do referido Tratado, segundo o qual os Estados-

membros cuja moeda seja o euro podem criar um mecanismo de estabilidade a accionar caso tal se revele

indispensável para salvaguardar a estabilidade da área do euro no seu todo.

De acordo ainda com esta decisão, a concessão de qualquer assistência financeira necessária ao abrigo

do mecanismo de estabilidade ficará sujeita a rigorosa condicionalidade, isto é, a uma análise profunda da

sustentabilidade da dívida pública.

A decisão em causa é adoptada com base no n.º 6 do artigo 48.º do Tratado da União Europeia, que

permite que o Conselho Europeu, deliberando por unanimidade, após consulta ao Parlamento Europeu, à

Comissão e, em certos casos, ao Banco Central Europeu, adopte uma decisão que altere todas ou parte das

disposições da Parte III do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia.

Ainda ao abrigo do n.º 6 do artigo 48.º do Tratado da União Europeia, uma alteração prevista a uma

disposição contida na Parte III do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia não implica o aumento

das competências atribuídas à União Europeia pelos Tratados.

De referir que a revisão dos tratados depende da vontade dos Estados-membros e, num processo de

revisão simplificado, como é o caso deste projecto de resolução apresentado pelo Governo, qualquer Estado-

membro, o Parlamento Europeu ou a Comissão Europeia podem submeter ao Conselho projectos de revisão

de todas ou de parte das disposições do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia relativas às

políticas internas da União Europeia.

Mesmo sendo o CDS defensor da estabilidade normativa, reconhecemos que o momento excepcional que

Portugal e a Europa atravessam implica o apoio à alteração do artigo 136.º, agora proposta, na exacta medida

em que permite a criação de um mecanismo permanente para a salvaguarda da estabilidade da zona euro.

Sr.ª Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as

e Srs. Deputados: Em momentos excepcionais da vida

dos Estados, como aquele que atravessamos, é obrigação de todos encontrar respostas adequadas e

ambiciosas aos desafios que se nos colocam.

Aplausos do CDS-PP.

A crise da dívida, com a qual a Europa se debate, exige medidas excepcionais e a maturidade institucional

necessária que permitam dar ao euro a estabilidade e a solidez necessárias, ancoradas na disciplina

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orçamental, na coordenação das políticas macroeconómicas e na existência de políticas que promovam um

crescimento sustentável.

É importante frisar que o funcionamento deste mecanismo deve respeitar os princípios essenciais do

processo de decisão democrático, como a transparência, o controlo parlamentar e a responsabilidade política.

Além disso, este mecanismo constitui um elemento importante de um pacote global de medidas cuja

finalidade passa por definir um novo quadro capaz de reforçar a disciplina orçamental e a coordenação das

políticas económicas e financeiras dos Estados-membros, o qual deve incluir a promoção de uma resposta

conjunta da União Europeia aos desafios do seu crescimento e ultrapassar desequilíbrios económicos e

sociais com vista a melhorar a sua competitividade.

A alteração não aumenta as competências da União e só afecta os membros da área do euro. Terá que ser

aprovada por todos os Estados-membros em conformidade com as respectivas normas constitucionais e será

adoptada por um processo de revisão simplificado, devendo entrar em vigor a 1 de Janeiro de 2013, de modo

a que o mecanismo possa entrar em funcionamento em Junho de 2013.

Sobre este calendário, o CDS não pode deixar de alertar para o sinal de morosidade dado no processo de

decisão europeu, tendo em conta o momento delicado que a Europa atravessa e a celeridade exigida no

combate à crise. Pese embora este ponto, entendemos que esta proposta de resolução apresentada pelo

Governo justifica a sua aprovação nesta Câmara.

Sr.as

e Srs. Deputados, este espaço, onde residem cerca de 500 milhões de cidadãos, é seguramente o

maior espaço de liberdade, democracia, paz e prosperidade que faz os Estados europeus integrarem o maior

bloco económico do mundo. Unidos, estou certo, conseguiremos, após a passagem do «cabo das tormentas»,

salvaguardar um modelo de integração social, económico e político único na história, capaz de influenciar

outra regiões e outros povos, e aí poderemos dizer que as dificuldades que enfrentamos valeram a pena.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente: — Tem agora a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Francisco de Assis.

O Sr. Francisco de Assis (PS): — Sr.ª Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as

e Srs. Deputados:

Sendo esta a minha primeira intervenção na presente Legislatura, quero fazer, porque é da praxe e porque

corresponde à minha vontade mais genuína, uma saudação muito especial à Sr.ª Presidente da Assembleia

da República e dizer-lhe que tenho plena consciência de quanto a sua inteligência, a sua cultura e a sua

imaginação são necessárias ao País nos tempos que correm.

Sr.as

e Srs. Deputados: Quero, a começar, dizer uma coisa muito simples àqueles que aqui vieram, com

toda a legitimidade, advogar o referendo como o mecanismo mais adequado para assegurar o tratamento, a

apreciação e a votação de alterações aos tratados europeus. Têm toda a legitimidade para o fazer e até devo

reconhecer que o têm feito com grande coerência ao longo do tempo. O que já não lhes assiste é o direito de

porem em causa a legitimidade desta Câmara para garantir esse mesmo tratamento e essa mesma

aprovação.

Aplausos do PS.

Isto porque nunca devemos esquecer que esta não é uma Casa clandestina, esta é a sede da

representação nacional, e nós temos toda a legitimidade para fazer aqui a apreciação e a votação das

alterações aos tratados europeus.

Sr.as

e Srs. Deputados: Estamos a discutir esta proposta de alteração ao Tratado num momento muito

especial da vida da União Europeia. O antigo ChancelerHelmut Schmidt — referência central da social-

democracia alemã, grande construtor do projecto europeu nos anos 70, de que alguns, nesta Casa, ainda

certamente, se recordarão, figura moral de elevado prestígio, regressou, no domingo passado, por breves

horas, ao centro da vida pública do seu país, proferindo um longo e brilhante discurso no Congresso do SPD,

realizado em Berlim.

Schmidt, com a autoridade da sua inteligência, da sua reconhecida competência e da sua experiência, fez

uma histórica exortação à nação alemã e lembrou-nos a todos, alemães e não alemães, com palavras sábias

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e simples, que há uma outra Alemanha para além da Alemanha um pouco paroquial e fechada que parece

dominar o universo mental dos seus actuais governantes.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Francisco de Assis (PS): — Há uma Alemanha que fez — e não podemos esquecê-lo —, nos

últimos 60 anos, um percurso histórico notável, reconquistando, por direito próprio, um lugar de relevo no

concerto das nações, edificando uma democracia interna exemplar, promovendo relações profundamente

solidárias com os seus vizinhos. Essa Alemanha soube superar os traumas do terror nazi e suscitou a

admiração justa dos demais povos europeus. Essa Alemanha, de Adenauer a Khol, passando por Willy Brandt

e pelo próprio Helmut Schmidt, governada, ora pela direita democrática, ora pela esquerda democrática,

alicerçou todo o seu processo de reafirmação internacional numa opção clara e essencial. No caso alemão, foi

mesmo uma opção existencial, a opção pela Europa.

Helmut Schmidt, o homem que, com Giscard d'Estaing, encarnou uma das fases virtuosas do

imprescindível entendimento franco-alemão, ousou mesmo afirmar o que nenhum não alemão está autorizado

a dizer: que a Alemanha, pelo seu passado, não é um país normal, verberando fortemente aquilo que

designou como a vanidade nacionalista de alguns dos seus actuais governantes. Nenhum povo pode

transportar consigo uma inexpiável culpa colectiva e seria inadmissível que o passado alemão fosse invocado

para condicionar ilegitimamente o seu futuro. Mas as palavras do antigo Chanceler têm um significado claro: a

Alemanha não deve contribuir, pelo seu comportamento altivo e egoísta, para ressuscitar fantasmas

adormecidos em toda a Europa.

Para além desta advertência de ordem histórica, Schmidt, após uma lúcida divagação sobre a História

europeia do século XVII até aos nossos dias, pronunciou, referindo-se ao presente, uma frase lapidar e do

maior alcance. Ele disse o seguinte: «Os nossos excedentes são os deficits dos outros».

Aplausos do PS.

Com isto, pôs em causa, objectivamente, a principal linha de actuação da política europeia actual, que

acentua, quase exclusivamente, a imposição de políticas orçamentais restritivas aos países devedores, não

apelando à adopção de medidas que incrementem o crescimento económico. As sábias palavras desta grande

figura da política alemã também devem ter ressonância entre nós e, por isso, as invoco hoje, aqui, nesta

discussão parlamentar, porque elas contêm uma mensagem simples, mas fundamental: há outra Alemanha e

é possível construir outra Europa!

Aplausos do PS.

E isso depende dos europeus, de todos os europeus, sem excepção, e também depende de nós,

portugueses.

Enfrentamos, hoje, uma gravíssima crise europeia. Alguns, por miopia, outros, por oportunismo, recusaram-

se a percebê-la em toda a sua extensão. Não foi o caso do Partido Socialista.

Sem desvalorizarmos a importância das nossas insuficiências internas tornadas mais visíveis pelo impacto

de factores externos novos, sempre considerámos que a crise das dívidas soberanas só poderia ser

cabalmente resolvida à escala europeia, já que ela assentava, em grande parte, no aproveitamento, por parte

dos mercados financeiros, de dificuldades estruturais associadas ao funcionamento da zona monetária em que

estamos inseridos.

A união monetária tem óbvias debilidades, que foram ainda há poucos dias reconhecidas, como já aqui foi

recordado pelo Sr. Deputado Costa Neves, pelo antigo presidente da Comissão Europeia, o Sr. Jacques

Delors: a inexistência de um governo económico europeu, o estatuto do Banco Central, a incapacidade de

garantir o aprofundamento da integração política criaram uma situação que colocou a Europa à beira do

abismo. Infelizmente, as respostas têm tardado e não se têm revelado as mais adequadas.

A alteração ao Tratado que estamos agora a apreciar destina-se a contribuir para isso, acomodando a

criação de um mecanismo de estabilidade financeira que pretende acorrer às dificuldades da zona euro. Neste

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momento, esta solução parece, de alguma forma, já desactualizada. Nesse sentido, não há dúvida de que

estamos a travar um debate um pouco datado, mas pela simples razão de que são tão complexas as questões

que estamos levados a enfrentar que a União Europeia tem de reagir, tem de avançar, tem de encontrar novas

soluções.

Tem sido, de facto, vertiginoso o ritmo das mudanças que se têm vindo a verificar. Temos plena

consciência da especial dificuldade associada ao processo da decisão europeia, mas consideramos que,

perante a dimensão da crise que neste momento estamos a enfrentar, temos todos de ter a coragem de fazer

grandes rupturas, até algumas de ordem institucional, para que a União Europeia tenha à sua disposição os

mecanismos e os meios indispensáveis para enfrentar estas dificuldades.

O Partido Socialista tem posições muito claras sobre este assunto, e fazemos isto sem qualquer tipo de

sectarismo. Assumimos as nossas posições, não receamos as divergências com as outras bancadas, mas não

vamos cultivar o sectarismo e lamentamos quando vemos o sectarismo ser cultivado por outras forças políticas

e parlamentares.

Aplausos do PS.

Por uma razão muito simples: a Europa, nos seus melhores momentos, não se fez numa lógica de

oposição de uns contra os outros. A Europa do Estado de direito, a Europa da democracia liberal, a Europa do

mercado social, a Europa do Estado social, essa Europa foi construída ao longo dos anos com o contributo

histórico da direita democrática e da esquerda democrática e também com o contributo daqueles que, não

concordando nunca inteiramente, souberam, pelo menos, colocar bem as questões, mesmo quando erravam,

na maior parte dos casos, nas respostas que iam dando para cada uma soluções que iam sendo

apresentadas.

O Partido Socialista tem hoje, pois, posições muito claras em relação a esse assunto. São posições que

apontam, claramente, para a mutualização das dívidas públicas europeias e, por isso, preconizamos, desde há

muito tempo, a possibilidade de lançamento de euro-obrigações e defendemos uma alteração do

comportamento do Banco Central Europeu, pedindo uma coisa muito simples: que passe a actuar da mesma

forma como actuam os demais bancos centrais mundiais, apoiando a moeda e a respectiva economia e

criando condições para que, a partir daqui, se possa dar uma resposta mais categórica ao problema europeu.

Temos, porém, consciência do estado difícil em que a Europa se encontra. A Europa vive, de alguma

maneira, num verdadeiro momento de emergência profunda. Só assim se compreende que o eixo franco-

alemão se tenha, indevidamente e com alguma falta de pudor até, auto-atribuído uma função de verdadeiro

directório europeu! Só assim se compreende que a Comissão Europeia tenha adoptado uma postura algo

secundária,…

Protestos do Deputado do PCP Honório Novo.

… mau grado os esforços, que aqui quero salientar e realçar, do Presidente da Comissão Europeia, o Dr.

Durão Barroso, que, nas últimas semanas, tem proferido importantes intervenções e tem dado um contributo

para uma reorientação do processo europeu, no melhor sentido.

Por isso mesmo, Sr.as

e Srs. Deputados, a terminar, o que vos quero dizer é algo muito simples.

Queremos fazer parte de um consenso europeu e achamos que devemos todos fazer um esforço sério

para participar nesse consenso europeu. Ele não se alcança pela desistência, não se alcança pela demissão

das nossas responsabilidades; alcança-se com propostas, com ideias e com capacidade de aproximarmos as

nossas diferentes posições.

Ao longo dos últimos vinte e tal anos, foi isso que conseguimos fazer na vida pública portuguesa. Julgo,

mesmo, que o consenso europeu entre os dois maiores partidos é um dos principais adquiridos do nosso

património democrático mais recente. Seria muito mau, num momento de crise como aquele que estamos a

viver, que decaíssemos desse consenso.

Por isso, julgo que devemos fazer um esforço sério de aproximação de posições. E, para lá chegarmos,

temos de saber interpretar muito bem aquilo que são, neste momento, as principais exigências que se colocam

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a Portugal e as principais exigências que se colocam à Europa, em nome da salvaguarda da protecção e da

projecção dos legítimos interesses de Portugal.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Aproveito esta oportunidade para agradecer aos Srs. Deputados Francisco de Assis

e Costa Neves os cumprimentos pessoais que me dirigiram.

A Mesa não regista pedidos de esclarecimentos, pelo que vou dar a palavra, para uma intervenção, ao Sr.

Deputado José Luís Ferreira.

Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr.ª Presidente: O Governo apresenta-nos, para discussão, uma

proposta com vista a aprovar a Decisão do Conselho Europeu de 25 de Março de 2011, que altera o artigo

136.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia.

Com esta proposta, o que está verdadeiramente em causa é a criação de um mecanismo que pretende

submeter os programas de intervenção nos países em dificuldade a situações de verdadeira e penosa

austeridade e, até, à imposição de alterações às políticas sociais desses Estados-membros.

Contudo, desde Março, muita coisa mudou na Europa. Mudou tanta coisa que os próprios Governos da

França e da Alemanha já estão noutro patamar da discussão. Falam, agora, de um «governo económico» e da

necessidade de proceder à revisão dos tratados da União Europeia com vista a consagrar aquilo a que

chamam a «cultura da disciplina orçamental vinculativa», o tal «travão à dívida».

Parece-nos, assim, que a ambição subiu de fasquia e que, agora, pretendem controlar totalmente a política

económica dos Estados-membros. Nessa perspectiva, a proposta que o Governo, hoje, nos apresenta está

completamente desfasada do tempo.

Mas há mais: desde que o Conselho Europeu tomou a decisão de alterar o artigo 136.º do Tratado sobre o

Funcionamento da União Europeia, até aos dias de hoje, «muita água passou debaixo da ponte». Passou,

pelo menos, a água suficiente para se conseguir perceber o alcance e as consequências das políticas de

austeridade que foram impostas pela tróica aos países em dificuldade, como é o caso de Portugal, que

assiste, actualmente, ao agravar dos efeitos recessivos na nossa economia.

Está, assim, mais do que visto que estas políticas de austeridade apenas trazem sacrifício atrás de

sacrifício para os povos da Europa e que nada resolvem, constituindo, até, um factor de agravamento da

situação económica dos Estados-membros que estão em dificuldade.

Neste sentido, Os Verdes consideram que esta Assembleia, em vez de estar a aprovar alterações ao

Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia no sentido de criar mecanismos de austeridade aos países

em dificuldade, deveria manifestar a sua exigência para com a União Europeia para que esta introduzisse os

conceitos de coesão e de solidariedade no seu vocabulário. E esta Assembleia também deveria manifestar, de

forma clara, a sua recusa em proceder a mais transferências de soberania para a União Europeia e, desde

logo, a sua soberania orçamental, que é a questão-chave de qualquer povo em termos de soberania.

Para Os Verdes continua a ser imprescindível que esta Assembleia continue a definir, sem quaisquer

condicionalismos, as suas políticas económicas, as suas políticas sociais e as suas políticas orçamentais.

Em relação à proposta do Governo, Os Verdes vão votar contra, porque criar mecanismos que tragam mais

austeridade aos países em dificuldade é criar mais dificuldade a esses Estados-membros e, sobretudo, impor

mais sacrifícios aos povos da Europa, sem nada resolver, como, aliás, está a ver-se na Grécia e também em

Portugal, ainda que noutra escala.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Muito bem!

A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto e dos

Assuntos Europeus.

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O Sr. Secretário de Estado Adjunto e dos Assuntos Europeus: — Sr.ª Presidente: Muito rapidamente,

queria sublinhar alguns pontos que me parecem relevantes no âmbito desta alteração do Tratado sobre o

Funcionamento da União Europeia.

Desde logo, o ponto do consenso parece-me fundamental face à gravidade da situação que se vive na

Europa. Portugal detém a tradição de ter um grande consenso partidário em matéria de assuntos europeus, e

esse é um factor muito importante que nos distingue de outros países e que nos permite encarar os desafios

da União Europeia com outras perspectivas e com outra solidez.

Portanto, estou totalmente de acordo com a busca de soluções de consenso e de agregação de esforços

das várias forças partidárias na defesa de um projecto europeu único e consensual.

Relativamente à questão do mecanismo, em si, queria sublinhar que esta é uma das peças que foi

identificada como faltando no actual edifício estrutural da União Europeia.

Construímos uma união monetária, mas não completámos todo o edifício, e isso é particularmente evidente

face à gravidade da situação e da crise ocorrida nos últimos anos, tendo esse mecanismo sido identificado

como uma das peças que faltava para actuar em casos de emergência de financiamento dos países. Foram

criadas soluções provisórias e agora dá-se o passo de criar uma solução definitiva e final, que nos parece da

maior importância, tendo em vista um edifício estrutural que possibilite uma união monetária e uma moeda

única mais sólida, que nos permita sobreviver melhor às crises.

O Sr. Pedro Lynce (PSD): — Muito bem!

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e dos Assuntos Europeus: — Finalmente, queria referir o seguinte

ponto: o mecanismo europeu de estabilidade irá ser sujeito a um tratado que será aprovado por esta Câmara.

A Assembleia da República tem toda a legitimidade para apreciar esta alteração do Tratado e irá apreciar,

também, os detalhes do funcionamento deste mecanismo. O que estamos a aprovar hoje é o simples artigo

que permite a criação do mecanismo; a forma de funcionar do mecanismo irá ser apresentada e aprovada por

esta Câmara, com toda sua legitimidade democrática.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago.

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr.ª Presidente, Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados: Tenhamos

consciência do que estamos hoje a discutir.

Estamos a discutir a apresentação de um mecanismo europeu de estabilização que foi apresentado na

altura, a 25 de Março, como sendo a solução definitiva, o ponto final, na crise das dívidas soberanas da

Europa.

Seguiram-se as decisões que foram tomadas a 21 de Junho, com a resolução (supostamente) da crise da

Grécia — era aquele o momento do ponto final na crise das dívidas soberanas: o euro estava salvo!

E, há pouco tempo, tivemos a Cimeira de 26 de Outubro, que era o momento em que se estancava a crise

europeia.

Temos agora a Cimeira de 8 e 9 de Dezembro e o que continua a estar ausente é uma intervenção do BCE

ao nível do mercado primário da dívida pública. É isso que estamos a discutir, e nada menos do que isso.

Portanto, quando o Partido Socialista faz uma intervenção sobre a questão do consenso europeu e o Sr.

Secretário de Estado apresenta uma decisão que esta Assembleia vai votar agora, mas que já não é sequer a

solução definitiva, o que estamos a discutir é a manutenção, não por irresponsabilidade, mas por vontade

política da Alemanha, de não ter um papel para o Banco Central Europeu como qualquer banco central.

Se o Partido Socialista entender que o consenso europeu é fazer este mecanismo europeu de

estabilização, está a negar as palavras do Deputado Francisco Assis, que disse que era favorável a uma

intervenção do Banco Central Europeu como credor de última instância e, portanto, funcionando como um

banco central.

Diria mais: também o Presidente da República, Professor Cavaco Silva — e não é apenas o Bloco de

Esquerda e um conjunto de economistas de diferentes meios e proveniências — tem alertado o Governo e o

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Primeiro-Ministro para ler com maior atenção as lições de Introdução à Economia! Ou seja, entender que uma

intervenção do Banco Central Europeu, funcionando como um banco central, como a reserva federal, pode

criar um processo inflacionário é não compreender bem os mecanismos da economia.

Portanto, é disto que estamos a falar: da necessidade de eurobonds, da necessidade de o Banco Central

Europeu funcionar, de facto, como credor de última instância e da necessidade de políticas de relançamento

do crescimento económico e de modernização do tecido económico.

Termino, Sr.ª Presidente, relembrando o Partido Socialista que, em tempos, teve uma direcção política que

entendia que a Europa só podia construir-se nas costas da legitimação democrática dos cidadãos do espaço

europeu e que isso era fundamental para a sua sustentabilidade, para o seu crescimento e fortalecimento no

futuro — é verdade que houve um momento em que deixou de acreditar nisso. Mas, mais do que nunca, o

sonho de uma Europa assente no modelo social europeu, no Estado social, no direito dos cidadãos, nos

direitos dos trabalhadores está em causa. O paradigma político dos últimos 25 anos da política portuguesa, do

vosso consenso, está em causa!

Este é o momento de o Partido Socialista decidir se considera que a Europa é só um problema de

mercados ou se é um problema de política. E, se é um problema de política, não pode, jamais, ser construído

na opacidade e no silêncio dos cidadãos europeus.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, não havendo mais inscrições para intervir sobre a proposta de

resolução n.º 7/XII (1.ª) e o projecto de resolução n.º 135/XII (1.ª), vamos iniciar a discussão, conjunta e na

generalidade, dos projectos de lei n.os

99/XII (1.ª) — Acompanhamento, apreciação e pronúncia pela

Assembleia da República no âmbito do processo de construção da União Europeia (PS), 102/XII (1.ª) —

Procede à alteração à Lei n.º 43/2006, de 25 de Agosto, relativa ao acompanhamento, apreciação e pronúncia

pela Assembleia da República no âmbito do processo de construção da União Europeia (PSD), 105/XII (1.ª) —

Altera a Lei n.º 43/2006, de 25 de Agosto, reforçando os meios de acompanhamento, apreciação e pronúncia

pela Assembleia da República no âmbito do processo de construção da União Europeia (CDS-PP), e 108/XII

(1.ª) — Altera a Lei n.º 43/2006, de 25 de Agosto, garantindo a adequada fiscalização parlamentar do Governo

no âmbito do processo da União Europeia (BE).

Para fazer a apresentação do projecto de lei n.º 99/XII (1.ª), do PS, tem a palavra o Sr. Deputado Vitalino

Canas.

O Sr. Vitalino Canas (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: A Lei n.º 43/2006, de 25 de Agosto,

que nos acompanhou ao longo de mais de cinco anos, cumpriu respeitavelmente o seu propósito: contribuiu e

contribui para que a Assembleia da República crie rotinas e regularidades na discussão de temas europeus.

Assegurou que o debate sobre essas matérias saísse para fora das quatro paredes da Comissão de Assuntos

Europeus e se alargasse a outras comissões, a outros Deputados e ao Plenário. E é de sublinhar que aquela

Lei antecipava já desenvolvimentos relevantes que se previam para a Europa, mas que ainda não se tinham

materializado no momento da sua aprovação.

Agora é necessário dar mais alguns passos. Passos que talvez possam, inclusive, colocar em causa o

próprio paradigma da intervenção da Assembleia nas questões europeias, paradigma que até aqui tem estado

assente num princípio de intervenção não vinculativa da Assembleia da República.

O projecto do Partido Socialista não se afasta desse paradigma, mas não fugiremos ao debate sobre se ele

deve ou não ser substituído por uma maior responsabilização, ou maior vinculação, do Governo, em relação a

orientações que a Assembleia queira traçar com vista a processos de decisão europeus.

A nossa proposta não altera esse paradigma, mas altera significativamente a sistemática da Lei em vigor.

Não por mera vontade de reorganizar, mas porque é importante marcar que, hoje, a Assembleia da República

dispõe de duas fontes de legitimidade para a pronúncia sobre temas que se relacionam com as questões

europeias: uma, é a legitimidade que decorre da Constituição Portuguesa; outra, é a legitimidade que lhe foi

inovatoriamente reconhecida pelo Tratado de Lisboa.

Com a força da primeira, a Assembleia da República fiscaliza o Governo e a sua actuação no contexto

europeu.

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Fundada na segunda, a Assembleia da República acompanha, fiscaliza, controla e aprecia actos de

instituições europeias que dantes escapavam à sua alçada. Estes dois grandes núcleos de competências

ficarão bem delimitados em dois capítulos distintos, se for seguida a técnica que propomos.

Mas não queremos assegurar simplesmente uma melhor arrumação sistemática, com o significado material

que acabei de referir. Queremos ir mais longe no tocante às competências de fiscalização do Governo pela

Assembleia da República; clarificar alguns mecanismos; robustecer outros; e ir até ao limite do juridicamente

admissível no que toca à exploração de todas as faculdades que os tratados conferem aos parlamentos

nacionais por via do Tratado de Lisboa.

No contexto do primeiro grupo de matérias — competências da Assembleia da República no que toca ao

acompanhamento e à apreciação da participação portuguesa no processo de construção da União Europeia —

, é de realçar a afirmação da prerrogativa do conhecimento de todos os assuntos e posições a debater nas

instituições europeias, bem como das propostas em discussão e das negociações em curso. Este princípio,

embora se deva ter já como vigente, não está claramente afirmado na lei e por vezes não é observado.

No quadro do reforço dos mecanismos de governação económica, é vital que a Assembleia participe

activamente em todos os momentos relevantes, designadamente no quadro do chamado «Semestre

Europeu». Por isso, propomos que a Assembleia prepare e aprove parecer sobre os documentos pertinentes

que o Governo lhe submeta, ou esteja obrigado a submeter a instituições da União, desse modo assegurando

que a Assembleia mantém salvaguardadas as suas competências exclusivas em matéria orçamental.

Aplausos do PS.

Esta competência ganha importância adicional, agora que se anunciam novos mecanismos, novos

desenvolvimentos de união orçamental e de união económica.

Ainda dentro do núcleo de competências de fiscalização do Governo, clarificam-se alguns aspectos ligados

à audição de personalidades nomeadas ou designadas pelo Governo para cargos da União, esclarecendo-se

que, em casos de recondução de personalidades que já exerçam o cargo, não é necessário o envio de três

nomes alternativos e estatuindo-se que o desenlace da audição consistirá sempre na emissão de um parecer

genérico sobre o preenchimento dos requisitos para o exercício do cargo.

Tendo em conta que os parlamentos nacionais são agora notificados dos projectos de actos legislativos da

União para se pronunciarem sobre o cumprimento do princípio da subsidiariedade, define-se adequadamente

os termos em que tal pronúncia se materializa, incorporando e clarificando práticas já vigentes.

Consagra-se, ainda, a possibilidade de a Assembleia se pronunciar sobre o sentido e o conteúdo das

opções de política legislativa espelhadas nos projectos de actos legislativos e sobre o respeito pelo princípio

da proporcionalidade, não obstante o facto de isso não ser expressamente referido nos tratados.

No tocante ao núcleo normativo respeitante aos poderes da Assembleia enunciados no Tratado da União

Europeia e, em alguns casos, especificados ou desenvolvidos no Tratado sobre o Funcionamento da União

Europeia ou nos Protocolos, a lei passa a mencioná-los expressamente e de forma exaustiva.

Finalmente, quanto à Comissão de Assuntos Europeus, confirma-se o seu papel de pivot no

acompanhamento e apreciação global dos assuntos europeus, sem prejuízo da competência do Plenário e das

outras comissões permanentes, adaptando-se as suas competências às novas competências que a

Assembleia da República recebeu directamente dos tratados.

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Repetidas vezes — até já hoje, aqui — temos criticado a actual

preferência pelo directório, de dois Estados, em detrimento do método comunitário ou até da democrática

regra de que, numa Europa a 27, vale a vontade de 27 e não de 2.

Aplausos do PS.

Muitas vezes temos dito que o afastamento da Comissão do centro de decisão europeia, a lateralização do

Parlamento Europeu, o ofuscamento de instituições como, por exemplo, o Presidente do Conselho Europeu,

podem fazer acrescentar uma crise institucional a outras crises que vão desgastando a Europa.

Indiferente a isso, o directório segue, é certo, imperturbável.

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Não deixa de ser, porém, muito significativo que, apesar disso, apesar da facilidade com que se inventam

mecanismos de decisão alternativos, não fundados nas normas europeias e em constante mutação, há algo

que fica: a centralidade de alguns parlamentos nacionais. A chanceler alemã, recentemente, quando quis

anunciar novas iniciativas para combater a crise do euro, quando quis apresentar a sua proposta de revisão

dos tratados, não deu uma entrevista, não escreveu um comunicado, não discursou numa conferência; foi ao

Parlamento alemão debater com os Deputados.

O Parlamento alemão está no centro do debate sobre a Europa na Alemanha, está no centro do debate

europeu.

É também a centralidade da Assembleia da República no debate sobre a Europa que buscamos com o

nosso projecto de lei n.º 99/XII (1.ª). Centralidade que não é em prejuízo das instituições europeias e dos

tratados, antes visando contribuir para a consolidação e o aprofundamento do projecto europeu.

Aplausos do PS.

Alguns podem pensar que não estamos no momento de falar disto. Não concordo.

Sr.as

e Srs. Deputados, este é o exacto momento para lutarmos pelo aprofundamento do projecto europeu e

contra o definhamento desse mesmo projecto.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Para fazer a apresentação do projecto de lei n.º 102/XII (1.ª), do PSD, tem a palavra

o Sr. Deputado António Rodrigues.

O Sr. António Rodrigues (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Nas vésperas de um Conselho

Europeu que pode ser decisivo para o futuro da construção europeia, somos chamados a debater qual o papel

que reservamos ao nosso Parlamento para esse debate. E se existe debate mais actual, é este: qual o futuro

da consolidação da União Europeia?

Ainda mais importante do que qualquer projecto, é essencial assumir o projecto colectivo da construção

europeia, a aposta na «solidariedade de facto», tal como dizia Robert Schuman, na sua célebre declaração de

9 de Maio.

A solidariedade entre Estados e entre povos, com direitos e com deveres recíprocos, é o nosso intuito.

Há quem reconduza o debate europeu às questões financeiras, se fixe nos eurobonds ou na taxa

financeira. Podem ser matérias relevantes, mas são secundárias face à questão essencial: qual o modelo

europeu de decisão? Como consolidar culturas e ponderar políticas distintas numa grande unidade?

O debate europeu não se pode travar apenas à volta de um banco central, de uma moeda única ou de uma

eventual directiva. O futuro da União terá de ser construído com regras claras, simples, de lideranças

institucionais e não eventuais, assegurando que os Estados tenham palavra e que as instituições se

consolidem.

Aplausos do PSD.

O emaranhado de tratados, de mecanismos derrogatórios, de regras não contornáveis ou de hesitações

institucionais e políticas apenas contribuem para a falta de sentido único de uma Europa que se quer solidária

e coesa.

Contudo, a construção de uma estrutura de topo não pode, nem deve, esquecer o controlo, o empenho e a

participação dos Estados-membros. É o que fazemos hoje ao apreciar um conjunto de diplomas sobre a

participação do Parlamento nacional na tarefa da consolidação europeia.

Todos os projectos de lei visam o mesmo fim: manifestar o nosso empenho parlamentar na discussão de

matérias europeias.

O projecto do PSD assenta em três princípios-base: primeiro, a participação parlamentar deve ser mais

presente e prospectiva, isto é, deve discutir o futuro e não o passado; segundo, as discussões parlamentares

devem ser mais visíveis e públicas, trazendo a Plenário um conjunto de matérias que antes se reservavam

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apenas e só para o seio da Comissão de Assuntos Europeus; terceiro, a participação parlamentar deve ser

mais alargada, propondo mais do que adaptar as matérias do Tratado de Lisboa, como o Semestre Europeu e

as questões relativas à governação económica, antes inovando pela introdução de um debate sobre o estado

da União, que nos transporta de imediato para o centro da actualidade da discussão política europeia.

Aplausos do PSD.

Assumimos a necessidade de discutir, com a presença do Governo e de forma pública, os programas das

presidências europeias, projectos e ideias para a concretização de um ideal europeu conjunto. Assumimos

debater de forma convicta e decidida, de forma prospectiva e não reactiva, o que vai e está a passar-se na

Europa.

Somos europeus por convicção, empenho e determinação e não por mero interesse comercial ou

económico; somos europeus porque comungamos num projecto comum de construção de um espaço único,

por influência geográfica, mas inspirados pela História.

Queremos participar de forma activa nesta construção, não deixando aos outros a decisão de algo que é

conjunto — a construção do nosso futuro. Queremos envolver todos os agentes neste processo, incluindo as

Assembleias Legislativas Regionais dos Açores e da Madeira, muitas vezes esquecidas em matéria de

pronúncia europeia.

O debate não pode cingir-se à Comissão de Assuntos Europeus e para ser nacional e participada, deve ser

pública. O Governo, no seu todo e não apenas o Primeiro-Ministro, deve ser convocado para este debate.

A discussão tem de ser geral, mas não genérica, pública e publicitada, política e não apenas económica.

Todos somos chamados a participar neste debate, e só existe uma certeza: nos próximos anos, todos temos

de participar neste desafio.

Hoje, aqui e agora, respondemos «presente», porque, sendo europeus, queremos participar neste projecto

de construção de uma verdadeira e única União Europeia.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente: — Para fazer a apresentação do projecto de lei n.º 105/XII (1.ª), do CDS-PP, tem a

palavra o Sr. Deputado José Manuel Rodrigues.

O Sr. José Manuel Rodrigues (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Discutimos, hoje, três

projectos de lei — do PSD, do CDS e do BE — com vista a alterar a Lei n.º 43/2006, de 25 de Agosto, de

acompanhamento, apreciação e pronúncia pela Assembleia da República no âmbito do processo de

construção da União Europeia, e um outro diploma, do Partido Socialista, que pretende revogar essa mesma

Lei.

A iniciativa do Partido Socialista propõe a revogação da Lei e pauta-se, essencialmente, por uma

reestruturação das suas matérias, mantendo, porém, as normas fundamentais que têm servido de base ao

acompanhamento dos assuntos europeus pela Assembleia da República. Este projecto de lei propõe uma

sistematização distinta da lei em vigor, separando as competências da Assembleia da República de

acompanhamento e fiscalização do Governo das competências respeitantes ao acompanhamento do

funcionamento de instituições e organismos da União Europeia.

Por seu lado, a iniciativa do PSD propõe a consagração de quatro sessões plenárias por ano dedicadas

aos assuntos europeus: um debate sobre a presidência do Conselho da União Europeia e o programa de

trabalho da Comissão Europeia; um debate sobre o Semestre Europeu; a discussão sobre a presidência do

Conselho da União Europeia e o relatório do Governo sobre a participação de Portugal na União Europeia; e,

no último trimestre, um debate sobre o estado da União. Para além deste calendário de debates em Plenário,

o projecto de lei do PSD pretende introduzir na lei uma base jurídica para o escrutínio do princípio da

proporcionalidade, até agora inexistente e apenas consagrado ao princípio da subsidiariedade.

O CDS está em crer que todos eles procuram tornar o debate sobre assuntos europeus mais presente e

periódico no plano nacional, reforçando a responsabilização dos representantes políticos portugueses face às

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matérias determinantes que, quotidianamente, são suscitadas, apresentadas, votadas e decididas nas

instâncias comunitárias.

Quanto ao projecto de lei do Bloco de Esquerda, apresentado posteriormente ao do CDS, ele versa sobre a

mesma proposta do nosso, sendo que privilegia os debates em comissão em detrimento do Plenário,

contrariamente ao que propõe o CDS.

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: A centralidade das diversas políticas europeias nas orientações e

debates definidos no interior dos Estados-membros tem vindo a justificar a importância de um aprofundamento

no acompanhamento da Assembleia da República sobre o processo de construção da Europa, potenciando o

novo papel atribuído aos parlamentos nacionais pelo Tratado de Lisboa, em articulação com os parlamentos

regionais quando se tratar de matérias que lhes digam respeito, mas também fomentando a troca permanente

de informações e perspectivas entre os Deputados à Assembleia da República e ao Parlamento Europeu, de

forma presencial ou através do recurso às novas tecnologias, como, aliás, o CDS propõe no seu projecto de

lei.

Além disto, importa actualizar o modelo de discussão e debate em Plenário às práticas da União Europeia,

alargando o acompanhamento do Parlamento nacional à discussão em Plenário sobre o estado da União, com

a presença do Governo, posteriormente ao debate realizado no Parlamento Europeu, bem como sobre as

presidências semestrais e respectivos programas e a análise anual de crescimento criada no âmbito do

Semestre Europeu, proposto em 2010, em substituição da estratégia política anual da Comissão Europeia,

cuja apresentação deixou, entretanto, de ser feita pela mesma. Neste âmbito, os projectos de lei hoje em

discussão convergem no mesmo sentido; contudo, o projecto de lei do CDS pretende ir um pouco mais longe.

A presença em Comissão de Assuntos Europeus de membros do Governo antes e depois de cada

Conselho Europeu, assim como os encontros do Primeiro-Ministro com delegações dos diferentes partidos e

parceiros sociais revelam-se insuficientes no acompanhamento de matérias simultaneamente tão complexas e

cruciais para a vida dos portugueses. A verdade é que, nos últimos anos, os assuntos europeus foram sendo

progressivamente alvo de um processo de decisão centrado na esfera política do Primeiro-Ministro.

Tendo em conta a institucionalização e permanência da presidência do Conselho Europeu e respectiva

centralidade no edifício político da União Europeia, mas também através da diminuição de áreas de actuação

das sucessivas presidências rotativas semestrais, o Conselho Europeu passou a representar o centro dos

mais importantes debates e decisões entre Estados-membros, palco onde apenas os chefes de Estado e de

governo têm lugar. A prova disto mesmo é a importância vital que tem o próximo Conselho Europeu desta

sexta-feira, que todos acompanharemos, com certeza, com extrema atenção, preocupação e esperança.

Tendo presente este contexto, parece-nos preferível um modelo assente num debate parlamentar com a

presença do Primeiro-Ministro previamente à realização dos Conselhos Europeus, como é prática em diversos

Estados-membros. Este debate pode mesmo substituir a habitual ronda pelos partidos, mas não nos parece

que deva substituir a consulta aos parceiros sociais.

Aplausos do CDS-PP.

Esta fórmula permitiria centrar os assuntos europeus no debate parlamentar com a importância e dignidade

que os mesmos representam, dar-se-ia um salto no nível de acompanhamento da Assembleia da República,

como está previsto no Tratado de Lisboa, e reforçar-se-ia o binómio responsabilidade/fiscalização política,

sobre o qual assenta a relação institucional entre o Governo e o Parlamento.

Neste momento crítico que Portugal e a União Europeia atravessam, é da mais elementar sensatez reforçar

o institucionalismo e não o seu contrário; fortalecer os mecanismos democráticos e não o seu inverso;

aproximar eleitos e eleitores e não contribuir ainda mais para o seu afastamento.

Aplausos do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Para fazer a apresentação do projecto de lei n.º 108/XII (1.ª), do BE, tem a palavra o

Sr. Deputado Luís Fazenda.

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O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: A lei que estrutura a participação da

Assembleia da República nos actos da União Europeia é, a vários títulos, um desenvolvimento da filosofia

regimental do Parlamento, porquanto estipula o funcionamento da Assembleia da República de acordo com

matéria derivada da Constituição, de uma alguma legislação e, sobretudo, dos tratados nos quais Portugal se

insere. Portanto, esta lei tem uma filosofia regimental intrínseca, mas tem um valor reforçado, o valor da lei,

coisa que o Regimento da Assembleia da República não tem. Neste sentido, creio que esta lei deve ser

tratada com todo o interesse e com toda a exigência, mas precisando exactamente qual é o seu papel nas

instituições e, em particular, no processo de pronúncia, que é o mais delicado da Assembleia da República,

sem prejuízo das outras faculdades.

O Bloco de Esquerda não acompanhou, inicialmente, as iniciativas acerca da revisão desta lei, sem

prejuízo de considerar, sobretudo quanto à audição de personalidades nacionais que possam ser indicadas

para cargos na União, que alguns mecanismos devem ser aperfeiçoados e que aqui ou além há adaptações

quase de ordem semântica, porque entretanto houve revisões dos tratados. Mas, na verdade, o que quer o

CDS, quer o PSD, quer o PS querem é acomodar neste «super-Regimento», nesta lei, o Semestre Económico,

as limitações que ainda estão em debate político. Veremos o que sai da próxima Cimeira Europeia e da

próxima alteração de tratados.

Portanto, há aqui uma adaptação a uma nova realidade, de que discordamos do ponto de vista político e

metodológico.

No entanto, a apresentação das várias iniciativas trouxe a debate uma outra questão, que é a da

responsabilidade política do Governo. Nessa medida, decidimos também participar nesta discussão, porquanto

já na elaboração da lei, em 2006, revendo a lei anterior de 1994, o Bloco de Esquerda tinha previsto e

proposto a presença do Primeiro-Ministro em Plenário para debater política europeia.

Mais tarde, até na anterior legislatura, sobre uma outra modalidade, para ver se conseguia alguma

aprovação mais abrangente, que debalde aconteceu, tentámos introduzir a figura da vinda do Primeiro-Ministro

a Plenário para discutir a política europeia.

Pareceu-nos e parece-nos, há muitos anos, um absoluto contra-senso democrático que, sendo o Primeiro-

Ministro o principal responsável da política de um Estado-membro no Conselho Europeu, não venha ao seu

próprio Parlamento debater as posições que toma nesse Conselho. Parece-nos, isto, uma entorse no edifício

democrático constituído no nosso País. Daí propormos, sistematicamente, que haja a possibilidade de debater

directamente com o Primeiro-Ministro.

O CDS, que nos acompanhou, em anteriores momentos, nessas posições, tendo votado sempre

favoravelmente esta nossa proposta, apresenta agora a proposta de que o Primeiro-Ministro venha a debate

antes dos conselhos europeus, no Hemiciclo. Nós sustentamos uma perspectiva inversa, a de que venha

depois dos conselhos europeus. Esta posição parece-nos mais avisada, porquanto, como não existe mandato

vinculativo do Parlamento sobre o Governo — figura existente noutros parlamentos da União Europeia, mas

não existe no Parlamento português, não existe na ordem constitucional portuguesa —, o debate prévio a um

Conselho Europeu pode ser interessante do ponto de vista do desenho, das questões que estejam em jogo,

das várias hipóteses. No entanto, isso não vincula nem pode condicionar o Governo. Esse debate será, salvo

melhor opinião, bastante inconclusivo e até razoavelmente incaracterístico, porque, como é bom de perceber,

se houver alguma margem negocial da parte do Governo, não irá dizê-lo na Assembleia da República, nesta

ou naquela outra questão.

Ao invés, o debate posterior aos conselhos, particularmente os conselhos europeus que fecham as

presidências rotativas, permite um debate objectivo sobre as conclusões, sobre o processo legislativo europeu,

sobre o funcionamento das instituições, sobre o sentido de voto nacional, sobre a posição do Governo

português, em que podemos, inclusivamente, apreciar posições sectoriais do nosso Governo em várias

formações de conselhos de ministros, etc. Isso seria muitíssimo mais produtivo, além de que a prática tem

demonstrado que as consultas prévias aos partidos antes de cada cimeira europeia são interessantes do

ponto de vista dos partidos da oposição. Porquê? Porque é fácil depreender que, nessa circunstância, se pode

obter alguma informação que não a que vem na imprensa internacional e nacional. Isso ajuda à formulação da

opinião e da posição dos vários partidos. Um debate em Plenário, um debate absolutamente público, diminui a

capacidade de informação dos partidos da oposição.

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Assim, o Bloco de Esquerda regressa a este debate, propondo, exactamente, a presença do Primeiro-

Ministro. Ainda há pouco, o Sr. Deputado Vitalino Canas dizia-nos da possibilidade de a chanceler Merkel ir ao

Bundestag apresentar as propostas que vai levar à União Europeu. Pois é isso que o Bloco de Esquerda quer

ver desde há muitos anos, ou seja, que os primeiros-ministros portugueses venham à Assembleia da

República e possam discutir a política europeia, o que nunca aconteceu. Tem sido uma espécie de privilégio,

quase hereditário, dos ministros dos negócios estrangeiros. Seria útil e necessário que fosse alterado, em

nome da responsabilidade de uma adequada fiscalização política da participação de Portugal no processo da

União Europeia.

Nessa circunstância, manifestando a nossa abertura para melhoramentos técnicos, que a vida tornou

necessários, queremos também evidenciar bem a nossa oposição, quer pela oportunidade, que é a pior

possível, quer pelo modelo da adaptação ao Semestre Económico nas várias propostas.

Em todo o caso, contribuiremos e estaremos abertos a propostas e a sugestões que a lei possa trazer, de

um aumento do escrutínio do Governo na Assembleia da República, designadamente da presença do

Primeiro-Ministro nos momentos cruciais em que, objectivamente, o Governo português possa ser escrutinado.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Estão ainda inscritos, para intervenções, os Srs. Deputados Honório, José Luís

Ferreira e, de novo, Vitalino Canas.

Tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Há poucos meses, em Março, parecia

haver um consenso sobre o facto de a actual Lei n.º 43/2006, de 25 de Agosto, que, na altura, aliás, mereceu

a unanimidade deste Parlamento, continuar a servir, de forma adequada, as possibilidades de intervenção da

Assembleia em questões europeias.

«É uma boa lei», diziam, a uma só voz, o Deputado Costa Neves, do PSD, e o Deputado José Bianchi, do

PS, a propósito de iniciativas do BE e do CDS, apresentadas em Março deste ano, que acabaram por ser

rejeitadas sem a adesão de qualquer destes dois partidos.

Neste contexto e por isso, espanta-nos um pouco o facto de o PS ter avançado agora, apenas oito meses

depois, com um projecto de lei, digamos assim, «radical», que «destrói» a estrutura da actual lei e, pura e

simplesmente, a revoga.

Não se compreende muito bem esta opção, muito menos se ela se sustenta na necessidade de adequar a

actual legislação ao estipulado no Tratado de Lisboa.

Na realidade, o Tratado de Lisboa já estava em vigor em Março, como toda a gente sabe, e na altura o PS

afirmava que a Lei n.º 43/2006 era «uma boa lei», e nós estamos de acordo.

Assim, se esta iniciativa for só para adequar o texto da actual lei ao Tratado de Lisboa, então, se calhar, o

melhor é esperar um pouco mais…

Risos do PCP:

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Exactamente!

O Sr. Honório Novo (PCP): — … e ter em atenção que hoje mesmo discutimos uma nova alteração ao

texto, e que o eixo franco-alemão já anunciou um novo tratado para poder impor a todos os outros as regras

que melhor servem os interesses económicos e financeiros que representam.

Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Claro que é sempre possível e desejável melhorar a actual legislação. Na

iniciativa do Partido Socialista, isso é também visível, e bem visível, por exemplo, na clarificação do processo

de auscultação das personalidades indicadas ou nomeadas pelo Governo para exercerem cargos europeus, é

um caso; ou num melhor enquadramento do método e das implicações do processo de verificação dos

princípios de subsidiariedade e de proporcionalidade.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É verdade!

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O Sr. Honório Novo (PCP): — Aliás, também nos outros projectos, do PSD, do BE e do CDS, se vêm

propostas positivas, como as que avançam para levar a Plenário alguns debates com relevância política

nacional e europeia, seja com o Governo, seja com a presença do Primeiro-Ministro, retomando o CDS, neste

ponto muito concreto, a proposta que apresentou em Março e que na altura, recordo, mereceu a rejeição e

oposição clara de uma parte do PS e também, chamemos-lhe assim, uma «abstenção distante» por parte do

PSD.

Mas, Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, há também alguns retrocessos ou algumas omissões significativas

nestas iniciativas, que convinha abordar.

Por exemplo, para o PSD, uma grande lacuna na aplicação da lei actual residia, em Março, no facto de o

Governo, antes ou depois das reuniões dos Conselhos de Ministros Europeus nas suas diversas formações,

como agricultura, ambiente, energia, transportes, finanças, dever ser obrigatoriamente ouvido pelas comissões

parlamentares competentes.

O cumprimento desta obrigação constitui, aliás, em nossa opinião, uma quase letra morta. Basta, a

propósito, lembrar o que ocorreu com o anterior governo, com o designado «Semestre Europeu» — todos se

recordam — ou com a não utilização da língua portuguesa na legislação sobre patentes industriais. Basta,

também, neste plano, recordar que este Governo também desprezou qualquer consulta ou parecer deste

Parlamento quando, em Julho passado, foi alterado o acordo quadro de Junho de 2010, que deu origem ao

Fundo Europeu de Estabilidade Financeira. O respeito por esta norma legal constitui uma obrigação que

deveria ser cumprida e atendida pelos governos e que não deveria ser, nunca, esquecida pelo Parlamento.

Estranhamente, porém, esta obrigação «é despromovida», chamemos-lhe assim, e passa a ser meramente

facultativa nas versões propostas pelo PSD e pelo PS nos seus projectos de lei. Confesso, meus Caros

Colegas, que não entendemos nem, naturalmente, aceitamos.

Outra questão que continua quase esquecida é a da eficácia da pronúncia da Assembleia da República em

questões de competência legislativa reservada. O Governo, na esmagadora maioria dos casos, continua a não

informar, a tempo, o Parlamento sobre as posições nacionais neste âmbito, impedindo assim que este possa

emitir pareceres em tempo útil. Nestas questões de eminente relevância política, o texto legal é quase letra

morta e seria aqui que uma alteração metodológica — mais do que no corpo da lei — se poderia e deveria

justificar, o que não sucede em nenhuma das iniciativas.

Finalmente, Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, uma advertência da nossa parte. Face à prática corrente da

aplicação da lei actual, e não obstante algumas medidas de contenção entretanto já adoptadas, a Comissão

de Assuntos Europeus e o Parlamento continuam numa encruzilhada: ou permanecem quase submersas na

preocupação de emitir inúmeros pareceres de efeito político prático nulo sobre a verificação do cumprimento

do princípio da subsidiariedade, ocupando, assim, tempo e energias num processo de reforço virtual de

competências que o texto do Tratado de Lisboa parece ter introduzido, ou, então, passam a prestar mais

atenção e a exercer uma mais firme e clara fiscalização política da acção governativa em matérias europeias,

obrigando o Executivo a ter atempadamente em conta as opiniões e as reservas do Parlamento no processo

decisório comunitário com reflexos directos na nossa vida.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Muito bem!

O Sr. Honório Novo (PCP): — Quanto a nós, Sr.ª Presidente, é aqui que a Lei n.º 43/2006 continua a

falhar na sua aplicação e é por falta de vontades políticas, não obstante — insisto neste aspecto — as

advertências que temos repetidamente feito sobre esta matéria.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr.ª Presidente: Discutimos, agora, várias iniciativas legislativas,

de vários grupos parlamentares, mas todas a incidir sobre o mesmo objecto, ou seja, o acompanhamento,

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apreciação e pronúncia, pela Assembleia da República, no âmbito do processo de construção da União

Europeia.

A primeira nota que Os Verdes querem deixar sobre esta matéria é que também consideramos que a Lei

n.º 43/2006, de 25 de Agosto, pode, de facto, ser objecto de alguns ajustes no sentido de reforçar o

acompanhamento desta Assembleia face ao processo de construção europeia.

Sem pretender desvalorizar a presença, na Comissão de Assuntos Europeus, de membros do Governo,

antes e depois de cada Conselho Europeu, que, aliás, consideramos da maior importância, e também, muito

menos, sem pretender desvalorizar os encontros do Governo com os diversos partidos políticos e com os

parceiros sociais antes de cada Conselho Europeu, a verdade é que estas reuniões e estes encontros, apesar

da importância que revestem, cada vez se tornam mais insuficientes relativamente ao acompanhamento, por

parte desta Assembleia, de matérias com a importância que as mesmas revestem para o País, mas também

para os portugueses.

Dada a importância que estas matérias representam, mas também porque o principal responsável político

do Governo português no Conselho Europeu é o Primeiro-Ministro, parece-nos de toda a oportunidade que

este apresente, no Plenário da Assembleia da República, o balanço do último Conselho Europeu de cada

presidência. Parece-nos que seria oportuno.

Mas esta alteração no acompanhamento da Assembleia da República face ao processo de construção

europeia, na nossa perspectiva, não pode nem deve substituir a presença, na Comissão de Assuntos

Europeus, dos membros do Governo antes e depois de cada Conselho e também não pode substituir os

actuais encontros dos partidos políticos com o Sr. Primeiro-Ministro e com os parceiros sociais antes de cada

Conselho Europeu, que, como disse, se reveste da maior importância.

Parece-me que era esta a proposta que estava incluída no projecto de lei do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Vitalino Canas.

O Sr. Vitalino Canas (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Queria apenas, muito brevemente,

salientar a complementaridade dos vários projectos apresentados.

Temos a certeza, depois de estes projectos serem apresentados, discutidos e devidamente articulados ao

nível da Comissão, que iremos ter capacidade, ao nível da Assembleia da República, para o melhor

acompanhamento das questões europeias dentro desta Assembleia.

Haverá mais debate em Plenário, haverá mais debate em comissão, haverá mais informação, haverá

também, certamente, a possibilidade de trazermos as questões europeias mais profusamente para a

Assembleia da República. Creio que existe complementaridade. Poderemos fazer esse trabalho na comissão.

Essa complementaridade não exclui o projecto do Bloco de Esquerda, em relação ao qual temos apenas a

dizer que, existindo complementaridade com os restantes projectos, não há, obviamente, complementaridade

ao nível do discurso. Aliás, fiquei perplexo quando ouvi o Sr. Deputado Luís Fazenda referir que não lhe

parece bem o tratamento que damos à questão do semestre europeu, ou seja, trazer o semestre europeu para

dentro da Assembleia da República. Depois de muito tempo a ouvirmos os partidos à esquerda,

designadamente o Bloco de Esquerda, contestar o facto de a Assembleia da República poder ser afastada das

questões europeias, agora, que queremos trazer para dentro da Assembleia da República as questões do

semestre europeu, estão a protestar.

Protestos do Deputado do BE Luís Fazenda.

No entanto, parece-me que o vosso projecto também tem algumas virtualidades que saberemos

certamente aproveitar para melhorar o trabalho de acompanhamento e de aprofundamento dos temas e das

questões sobre a União Europeia na Assembleia da República.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, chegámos ao fim dos nossos

trabalhos.

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Antes de encerrar formalmente a sessão, gostaria de dizer aos Srs. Deputados que não integrem as quatro

comissões que sei que ainda vão reunir e aos Srs. Funcionários que, a seguir a esta sessão, haverá uns

momentos de celebração do reconhecimento do fado como Património Imaterial da Humanidade num dos

espaços do nosso Parlamento.

A próxima reunião plenária realizar-se-á na sexta-feira, dia 9, às 10 horas, e, para além do debate de

urgência, requerido pelo Grupo Parlamentar do Partido Ecologista «Os Verdes», serão debatidos, na

generalidade, os seguintes diplomas: a proposta de lei n.º 29/XII (1.ª) — Procede à sexta alteração ao

Regulamento das Custas Processuais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de Fevereiro; a proposta

de lei n.º 33/XII (1.ª) — Institui o Sistema de Informação dos Certificados de Óbito (SICO), com vista a permitir

a desmaterialização dos certificados médicos de óbito e a sua emissão em suporte electrónico; o projecto de

lei n.º 94/XII (1.ª) — Regula o direito de associação na Guarda Nacional Republicana (PCP); em conjunto, os

projectos de lei n.os

84/XII (1.ª) — Cria o regime de vinculação dos professores contratados e estabelece o

concurso de ingresso de professores para necessidades permanentes do sistema educativo (BE), 91/XII (1.ª)

— Torna obrigatória a publicação das listas de colocação ao abrigo da bolsa de recrutamento (quarta alteração

ao Decreto-Lei n.º 20/2006, de 31 de Janeiro) (BE), 77/XII (1.ª) — Garante a vinculação dos professores

contratados e promove a estabilidade do corpo docente das escolas (PCP) e 83/XII (1.ª) — Concurso de

ingresso e mobilidade de professores (PCP) e o projecto de resolução n.º 139/XII (1.ª) — Recomenda ao

Governo que promova a estabilidade e qualificação do corpo docente nas escolas (PS); em conjunto, os

projectos de lei n.os

81/XII (1.ª) — Procede à segunda alteração ao Decreto-Lei n.º 23/2010, de 25 de Março,

alterado pela Lei n.º 19/2010, de 23 de Agosto, que estabelece o regime jurídico e remuneratório aplicável à

energia eléctrica e mecânica e de calor útil produzidos em co-geração, transpondo para a ordem jurídica

interna a Directiva 2004/8/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de Fevereiro (PS) e 107/XII (1.ª)

— Cria a obrigação de autoconsumo da energia produzida pelo cogerador, podendo apenas ser vendida à

rede a energia excedente não consumida (segunda alteração ao Decreto-Lei n.º 23/2010, de 25 de Março)

(BE).

Haverá votações regimentais às 12 horas.

Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 16 minutos.

Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:

Partido Social Democrata (PSD)

António Egrejas Leitão Amaro

José Mendes Bota

Manuel Filipe Correia de Jesus

Partido Socialista (PS)

Fernando Manuel de Jesus

José Manuel Lello Ribeiro de Almeida

Júlio Francisco Miranda Calha

Ricardo Manuel de Amaral Rodrigues

Deputados que faltaram à sessão:

Partido Social Democrata (PSD)

António Pedro Roque da Visitação Oliveira

Bruno Jorge Viegas Vitorino

Carlos Alberto Silva Gonçalves

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Carlos António Páscoa Gonçalves

Duarte Filipe Batista de Matos Marques

Fernando Luís de Sousa Machado Soares Vales

José Manuel Marques de Matos Rosa

Maria da Conceição Feliciano Antunes Bretts Jardim Pereira

Maria João Machado de Ávila

Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho

Partido Socialista (PS)

Maria Gabriela da Silveira Ferreira Canavilhas

Partido Popular (CDS-PP)

Isabel Maria Mousinho de Almeida Galriça Neto

João Rodrigo Pinho de Almeida

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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