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Sexta-feira, 16 de Dezembro de 2011 I Série — Número 50
XII LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2011-2012)
REUNIÃOPLENÁRIADE15DEDEZEMBRODE 2011
Presidente: Ex.ma Sr.ª Maria da Assunção Andrade Esteves
Secretários: Ex.mos
Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco Rosa Maria da Silva Bastos de Horta Albernaz
S U M Á R I O
A Sr.ª Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas
e 16 minutos. Ao abrigo do artigo 72.º do Regimento da Assembleia da
República, procedeu-se a um debate de actualidade, requerido pelo BE, sobre as conclusões do Conselho Europeu, que teve lugar nos dias 8 e 9 de Dezembro, em Bruxelas, tendo usado da palavra, a diverso título, além do Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros (Paulo Portas), os Srs. Deputados Ana Drago (BE), Vitalino Canas (PS), António Rodrigues (PSD), Honório Novo (PCP), Luís Fazenda (BE) e Nuno Magalhães (CDS-PP).
Em declaração política, a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia (Os Verdes) contestou a nova proposta de estrutura curricular dos ensinos básico e secundário, tendo depois respondido a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Odete João (PS), Rita Rato (PCP) e Ana Drago (BE).
Em declaração política, o Sr. Deputado Nuno Encarnação (PSD) criticou afirmações de dirigentes do PS acerca da renegociação da dívida externa portuguesa. No final, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Paulo Sá (PCP), José Junqueiro (PS) e Hélder Amaral (CDS-PP).
Também em declaração política, a Sr.ª Deputada Inês de Medeiros (PS) teceu críticas à actuação do Governo no que respeita à alienação de um canal da RTP, após o que respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Bruno Dias (PCP), Carla Rodrigues (PSD), Raúl de Almeida (CDS-PP) e Catarina Martins (BE).
Igualmente em declaração política, o Sr. Deputado Abel Baptista (CDS-PP) congratulou-se com a conclusão da actualização do parcelário agrícola e com o pagamento de subsídios aos agricultores, após o que respondeu a pedidos
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de esclarecimento dos Srs. Deputados João Ramos (PCP), Miguel Freitas (PS) e Pedro do Ó Ramos (PSD).
Ainda em declaração política, o Sr. Deputado Miguel Tiago (PCP) aproveitou o anúncio feito pelo Governo da proposta-base da revisão da organização curricular dos 2.º e 3.º ciclos do ensino básico para criticar a política educativa. No fim, deu resposta a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Amadeu Soares Albergaria (PSD), Ana Drago (BE), Michael Seufert (CDS-PP), Heloísa Apolónia (Os Verdes) e Acácio Pinto (PS).
De seguida, os Srs. Deputados Pedro Nuno Santos e Basílio Horta (PS) usaram da palavra em defesa da honra relativamente à declaração política proferida pelo Sr. Deputado Nuno Encarnação (PSD), tendo ainda, a propósito, interpelado a Mesa os Srs. Deputados Nuno Magalhães (CDS-PP), Luís Montenegro (PSD) e Carlos Zorrinho (PS).
Foi debatida, na generalidade, a proposta de lei n.º
34/XII (1.ª) — Procede à terceira alteração à Lei n.º 1/2005, de 10 de Janeiro, que regula a utilização de câmaras de vídeo pelas forças e serviços de segurança em locais públicos de utilização comum, tendo-se pronunciado, a diverso título, o Sr. Ministro da Administração Interna (Miguel Macedo) e os Srs. Deputados Filipe Neto Brandão (PS), Teresa Leal Coelho (PSD), Cecília Honório (BE), António Filipe (PCP) e Telmo Correia (CDS-PP).
Foi discutido, na generalidade, o projecto de lei n.º 104/XII (1.ª) — Revoga o Código Florestal (PSD e CDS-PP), tendo intervindo os Srs. Deputados Paulo Batista Santos (PSD), Abel Baptista (CDS-PP), Luís Fazenda (BE), Isabel Santos (PS) e Agostinho Lopes (PCP).
Entretanto, deram entrada na Mesa os projectos de lei n.
os 118 e 119/XII (1.ª). A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro) encerrou a sessão
eram 19 horas e 59 minutos.
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A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que está aberta a sessão.
Eram 15 horas e 16 minutos.
Srs. Deputados presentes à sessão:
Partido Social Democrata (PSD)
Adriano Rafael de Sousa Moreira
Adão José Fonseca Silva
Afonso Gonçalves da Silva Oliveira
Amadeu Albertino Marques Soares Albergaria
Ana Sofia Fernandes Bettencourt
Andreia Carina Machado da Silva Neto
António Carlos Sousa Gomes da Silva Peixoto
António Costa Rodrigues
António Egrejas Leitão Amaro
António Fernando Couto dos Santos
António Manuel Pimenta Prôa
António Pedro Roque da Visitação Oliveira
Arménio dos Santos
Bruno Jorge Viegas Vitorino
Bruno Manuel Pereira Coimbra
Carina João Reis Oliveira
Carla Maria de Pinho Rodrigues
Carlos Alberto Silva Gonçalves
Carlos António Páscoa Gonçalves
Carlos Eduardo Almeida de Abreu Amorim
Carlos Henrique da Costa Neves
Carlos Manuel Faia São Martinho Gomes
Carlos Manuel dos Santos Batista da Silva
Cláudia Sofia Gomes Monteiro de Aguiar
Cristóvão Duarte Nunes Guerreiro Norte
Cristóvão Simão Oliveira de Ribeiro
Cristóvão da Conceição Ventura Crespo
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Eduardo Alexandre Ribeiro Gonçalves Teixeira
Elsa Maria Simas Cordeiro
Emídio Guerreiro
Emília de Fátima Moreira dos Santos
Fernando Luís de Sousa Machado Soares Vales
Fernando Mimoso Negrão
Fernando Nuno Fernandes Ribeiro dos Reis
Fernando Ribeiro Marques
Fernando Virgílio Cabral da Cruz Macedo
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Hugo Alexandre Lopes Soares
Hugo José Teixeira Velosa
Hélder António Guerra de Sousa Silva
Joana Catarina Barata Reis Lopes
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Jorge Paulo da Silva Oliveira
José Manuel Marques de Matos Rosa
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José Manuel de Albuquerque Portocarrero Canavarro
José Manuel de Matos Correia
José Mendes Bota
João Carlos Figueiredo Antunes
João Manuel Lobo de Araújo
Laura Maria Santos de Sousa Esperança
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Filipe Valenzuela Tavares Menezes Lopes
Luís Manuel Morais Leite Ramos
Luís Pedro Machado Sampaio de Sousa Pimentel
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Lídia Maria Bulcão Rosa da Silveira Dutra
Manuel Augusto Meirinho Martins
Manuel Filipe Correia de Jesus
Margarida Rosa Silva de Almeida
Maria Clara Gonçalves Marques Mendes
Maria Ester Vargas de Almeida e Silva
Maria Francisca Fernandes Almeida
Maria Isilda Videira Nogueira da Silva Aguincha
Maria José Quintela Ferreira Castelo Branco
Maria José Vieira Teodoro Moreno
Maria João Machado de Ávila
Maria Manuela Pereira Tender
Maria Paula da Graça Cardoso
Maria da Assunção Andrade Esteves
Maria da Conceição Alves dos Santos Bessa Ruão Pinto
Maria da Conceição Feliciano Antunes Bretts Jardim Pereira
Maria da Conceição Vaz Barroso Carloto Caldeira
Maria da Graça Gonçalves da Mota
Maria das Mercês Gomes Borges da Silva Soares
Maurício Teixeira Marques
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Mário José Magalhães Ferreira
Mário Nelson da Silva Vaz Simões
Mónica Sofia do Amaral Pinto Ferro
Nilza Marília Mouzinho de Sena
Nuno Filipe Miragaia Matias
Nuno Miguel Pestana Chaves e Castro da Encarnação
Nuno Rafael Marona de Carvalho Serra
Odete Maria Loureiro da Silva
Paulo Cardoso Correia da Mota Pinto
Paulo César Lima Cavaleiro
Paulo César Rios de Oliveira
Paulo Jorge Frazão Batista dos Santos
Paulo Jorge Simões Ribeiro
Paulo Miguel da Silva Santos
Pedro Alexandre Antunes Faustino Pimpão
Pedro Augusto Cunha Pinto
Pedro Augusto Lynce de Faria
Pedro Filipe dos Santos Alves
Pedro Manuel Tavares Lopes de Andrade Saraiva
Pedro do Ó Barradas de Oliveira Ramos
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Ricardo Augustus Guerreiro Baptista Leite
Rosa Maria Pereira Araújo Arezes
Sérgio Sousa Lopes Freire de Azevedo
Teresa de Andrade Leal Coelho
Teresa de Jesus Costa Santos
Ulisses Manuel Brandão Pereira
Valter António Gaspar de Bernardino Ribeiro
Vasco Manuel Henriques Cunha
Ângela Maria Pinheiro Branquinho Guerra
Partido Socialista (PS)
Acácio Santos da Fonseca Pinto
Alberto Bernardes Costa
Alberto de Sousa Martins
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Ana Maria Teodoro Jorge
Ana Paula Mendes Vitorino
António Fernandes da Silva Braga
António Manuel Soares Serrano
António Ramos Preto
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Basílio Adolfo de Mendonça Horta da Franca
Carlos Filipe de Andrade Neto Brandão
Carlos Manuel Pimentel Enes
Eduardo Arménio do Nascimento Cabrita
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues
Elza Maria Henriques Deus Pais
Eurídice Maria de Sousa Pereira
Fernando Manuel de Jesus
Fernando Medina Maciel Almeida Correia
Fernando Pereira Serrasqueiro
Francisco José Pereira de Assis Miranda
Glória Maria da Silva Araújo
Idália Maria Marques Salvador Serrão de Menezes Moniz
Inês de Saint-Maurice de Esteves de Medeiros Vitorino de Almeida
Isabel de Lima Mayer Alves Moreira
Jacinto Serrão de Freitas
Jorge Lacão Costa
Jorge Manuel Capela Gonçalves Fão
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José António Fonseca Vieira da Silva
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Carlos das Dores Zorrinho
José Duarte Piteira Rica Silvestre Cordeiro
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
João Barroso Soares
João Paulo Feteira Pedrosa
João Saldanha de Azevedo Galamba
Júlio Francisco Miranda Calha
Laurentino José Monteiro Castro Dias
Luís António Pita Ameixa
Luís Miguel Morgado Laranjeiro
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Luísa Maria Neves Salgueiro
Manuel Francisco Pizarro de Sampaio e Castro
Manuel José de Faria Seabra Monteiro
Manuel Pedro Cunha da Silva Pereira
Marcos da Cunha e Lorena Perestrello de Vasconcellos
Maria Antónia Moreno Areias de Almeida Santos
Maria Gabriela da Silveira Ferreira Canavilhas
Maria Helena dos Santos André
Maria Hortense Nunes Martins
Maria Isabel Coelho Santos
Maria Isabel Solnado Porto Oneto
Maria Odete da Conceição João
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Miguel João Pisoeiro de Freitas
Mário Manuel Teixeira Guedes Ruivo
Nuno André Araújo dos Santos Reis e Sá
Nuno André Neves Figueiredo
Paulo Alexandre de Carvalho Pisco
Paulo Jorge Oliveira de Ribeiro Campos
Pedro Filipe Mota Delgado Simões Alves
Pedro Manuel Dias de Jesus Marques
Pedro Manuel Farmhouse Simões Alberto
Pedro Nuno de Oliveira Santos
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel de Amaral Rodrigues
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rui Jorge Cordeiro Gonçalves dos Santos
Rui Paulo da Silva Soeiro Figueiredo
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Partido Popular (CDS-PP)
Abel Lima Baptista
Adolfo Miguel Baptista Mesquita Nunes
Altino Bernardo Lemos Bessa
Artur José Gomes Rêgo
Inês Dória Nóbrega Teotónio Pereira Bourbon Ribeiro
Isabel Maria Mousinho de Almeida Galriça Neto
José Duarte de Almeida Ribeiro e Castro
José Helder do Amaral
José Lino Fonseca Ramos
José Manuel de Sousa Rodrigues
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Manuel de Serpa Oliva
João Paulo Barros Viegas
João Pedro Guimarães Gonçalves Pereira
João Rodrigo Pinho de Almeida
Manuel Fialho Isaac
Maria Margarida Avelar Santos Nunes Marques Neto
Michael Lothar Mendes Seufert
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Nuno Miguel Miranda de Magalhães
Raúl Mário Carvalho Camelo de Almeida
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia
Teresa Margarida Figueiredo de Vasconcelos Caeiro
Teresa Maria de Moura Anjinho Tomás Ruivo
Vera Lúcia Alves Rodrigues
Partido Comunista Português (PCP)
Agostinho Nuno de Azevedo Ferreira Lopes
António Filipe Gaião Rodrigues
Artur Jorge da Silva Machado
Bernardino José Torrão Soares
Bruno Ramos Dias
Francisco José de Almeida Lopes
Jerónimo Carvalho de Sousa
José Honório Faria Gonçalves Novo
João Augusto Espadeiro Ramos
João Guilherme Ramos Rosa de Oliveira
Miguel Tiago Crispim Rosado
Paula Alexandra Sobral Guerreiro Santos Barbosa
Paulo Miguel de Barros Pacheco Seara de Sá
Rita Rato Araújo Fonseca
Bloco de Esquerda (BE)
Ana Isabel Drago Lobato
Catarina Soares Martins
Francisco Anacleto Louçã
João Pedro Furtado da Cunha Semedo
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda
Maria Cecília Vicente Duarte Honório
Mariana Rosa Aiveca
Pedro Filipe Gomes Soares
Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV)
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
José Luís Teixeira Ferreira
A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, como não há expediente, vamos passar, de imediato, ao primeiro
ponto da ordem do dia que, como os Srs. Deputados sabem, consiste na marcação do Bloco de Esquerda de
um debate de actualidade, ao abrigo do artigo 72.º do Regimento da Assembleia da República, sobre as
conclusões do Conselho Europeu, que teve lugar nos dias 8 e 9 de Dezembro, em Bruxelas.
Para abrir o debate, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago.
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, Sr.as
e Srs.
Deputados: O Bloco de Esquerda agendou para hoje a realização deste debate por entender que esta
Assembleia não pode deixar de discutir os aspectos centrais do processo político que decorre actualmente na
Europa.
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Mais do que nunca, a discussão política que fazemos nesta mesma Assembleia, cada proposta, cada
projecto de política social, de política económica, é condicionada pelo que acontece hoje no âmbito da
construção europeia. É, portanto, um debate central.
Verificamos e registamos que o Governo também valoriza este mesmo debate e eis que o Sr. Ministro
Paulo Portas, que, enfim, tem andado um pouco desaparecido destes debates parlamentares —…
Protestos do CDS-PP.
… havia mesmo quem especulasse que o Sr. Ministro era uma espécie de património imaterial deste
Governo! —, se materializou neste debate, e estamos satisfeitos.
Sr.as
e Srs. Deputados, creio que não há outra forma de dizer a não ser que os resultados do Conselho
Europeu de sexta-feira da semana passada são absolutamente catastróficos. Catastróficos para o processo de
construção europeia e catastróficos, em particular, para a sociedade portuguesa.
No contexto da maior crise, da maior dificuldade vivida do projecto europeu, quando temos tantas
economias sitiadas pela pressão dos mercados, a zona euro a viver à beira do precipício e a perspectiva
recessiva plenamente instalada em tantos países da zona euro, o Conselho Europeu entendeu que tinha que
decidir pela consagração do fundamentalismo ideológico, fazer a consagração de uma regra de ouro, que é
colocar, a nível constitucional, ou de forma equiparada, um limite ao défice dos Estados e das economias de
0,5%. Não tem outra leitura, Sr.as
e Srs. Deputados, senão a de atirar todos os países para uma espiral de
austeridade, de desemprego e de recessão.
Porém, havia outras alternativas. Economistas, cidadãos, especialistas, ex-chefes de Estado, actuais
chefes de Estado, têm apresentado outras alternativas: mutualizar as dívidas soberanas criando eurobonds e
dar um outro papel ao BCE. Nada disto foi decidido. Ao invés, e pela pressão da Alemanha e da Sr.ª Merkel,
sai uma proposta de consagração de limite máximo de 0,5% do défice do Estado, uma proposta
absolutamente irrealista, irresponsável e, creio mesmo, Srs. Deputados, completamente delirante neste
contexto.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Exactamente!
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Veja-se: nos últimos 10 anos, apenas dois países conseguiram cumprir sempre
o limite de 3% — já não falamos de 0,5% — no contexto da zona euro. Aliás, a própria Alemanha, em 7 dos 10
anos, não conseguiu, sequer, cumprir o limite dos 3% do Pacto de Estabilidade e Crescimento. Portanto,
estamos a falar de uma proposta absolutamente delirante.
Entendamo-nos, Srs. Deputados, sobre o que temos pela frente.
Já em Janeiro, a Itália vai recorrer aos mercados financeiros para fazer rolar a sua dívida no valor de 100
000 milhões de euros. Hoje, Dezembro de 2011, a Europa não tem qualquer instrumento para actuar num
contexto destes. Se a Itália falhar perante a pressão dos mercados, não há resposta no contexto europeu.
Olhando para os resultados do Conselho Europeu, é preciso ver que, se alguém quisesse destruir o
projecto europeu, não teria feito melhor do que isto.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Exactamente!
A Sr.ª Ana Drago (BE): — No meio desta tormenta e desta irresponsabilidade, os portugueses sabem bem
que estão a viver a mais grave crise social e económica da história da democracia. Trabalhadores, pequenos
empresários, famílias, cidadãos, sentem na pele o mote político deste Governo: empobrecer. E sabem o que
vem pela frente: empobrecer ainda mais. É por isso que olham com enorme estupefacção para a actuação do
Governo português no espaço europeu, que aceitou com um sorriso o castigo que é imposto pela Sr.ª Merkel
às economias mais fracas.
Portanto, percebe-se que a política lançada pelo Governo do PSD e do CDS é a austeridade permanente, e
nada mais. Consagrar um limite orçamental de 0,5% não é equilíbrio orçamental, mas condenar toda e
qualquer política de redistribuição de riqueza, toda e qualquer política de combate à pobreza, toda e qualquer
política de prover ao crescimento da economia e criar emprego.
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A posição do Sr. Primeiro-Ministro ficou clara, absolutamente cristalina. No contexto europeu, o Sr.
Primeiro-Ministro, o Governo do PSD e do CDS, não estão lá fora, no Conselho Europeu, a representar os
portugueses e as suas dificuldades, não, e vêm cá representar a política da Sr.ª Merkel de mais austeridade e
de mais recessão.
Sr.as
e Srs. Deputados, usando a terminologia do dia, não nos venham dizer que com isto salvam a Europa
ou a sociedade portuguesa, não, os senhores «marimbaram» na Europa e trazem de lá uma bomba atómica
para lançar na sociedade portuguesa.
Vozes do BE: — Muito bem!
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Os senhores recusaram sempre, sempre, qualquer articulação dos países
atacados pelos mercados para terem uma solução alternativa, recusaram sempre qualquer outro instrumento.
Têm uma única política: no final do programa da tróica, os portugueses vão estar mais pobres, a dívida pública
vai estar maior e vamos ter mais de um milhão de desempregados. É esta a vossa política.
Não posso terminar a minha intervenção, Sr.as
e Srs. Deputados, sem dizer que a posição assumida pelo
Partido Socialista aparece como chocante. O PS disse que não aceitaria consagrar constitucionalmente o
limite de 0,5% para o défice, mas disse que era possível fazê-lo numa lei de valor reforçado.
Sr.as
e Srs. Deputados, de duas, uma: ou os senhores entendem que é possível colocar o limite dos 0,5%
do défice numa lei e que é uma coisa para não levar a sério, uma espécie «para alemão ver» — mas, então,
isto é uma brincadeira de crianças e não um debate político! — ou, então, os senhores entendem que essa é
mesmo a vossa política. Défice de 0,5% é eliminar o papel do Estado enquanto actuante fundamental nas
políticas sociais, é eliminar o papel do Estado na capacidade de ter políticas de contraciclo, de gerar
crescimento económico, de gerar emprego.
Sr.as
e Srs. Deputados: É de uma total irresponsabilidade 0,5% de défice, é condenar a sociedade
portuguesa a um empobrecimento do qual não tem saída. Mas nós temos que sair desta armadilha de
austeridade, de recessão, de avolumar da dívida pública para mais austeridade e mais recessão.
Sr.as
e Srs. Deputados, este é o momento de cidadãos e forças políticas discutirem o futuro, porque o
precipício está no horizonte. Este é o momento de começar a auditar a dívida pública, a dívida soberana. Este
é o momento de começar a renegociação, a reestruturação da dívida pública. A não ser assim, Sr.as
e Srs.
Deputados, não temos outro caminho senão o da austeridade permanente, e isso é o que o PSD e o CDS nos
vêm aqui propor.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios
Estrangeiros.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros (Paulo Portas): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs.
Deputados: Permitam-me duas palavras à Sr.ª Deputada Ana Drago, uma a título mais pessoal, a outra a título
mais político.
Sr.ª Deputada, como sabe, o património imaterial é muito importante. Agradeço-lhe o elogio, porque,
verdadeiramente, não o esperava!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Risos do BE.
Queria dizer-lhe que, de facto, temos uma diferença, que é normal em democracia. Diz a Sr.ª Deputada que
0,5% de défice é uma irresponsabilidade. Eu acho que todos os portugueses, incluindo muitos dos que
partilham opiniões da Sr.ª Deputada, já perceberam que o que é uma verdadeira irresponsabilidade é deixar
um défice chegar a 10%.
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Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, as decisões do Conselho Europeu representam o acordo possível.
Era preferível uma revisão dos tratados a 27, mas não foi possível. A nossa obrigação é a de que o acordo
a que se chegou, tanto quanto possível, envolva 26 Estados e as instituições europeias.
Era preferível um acordo a 27, mas um acordo dos países do euro com países que não são do euro,
mesmo que não todos, é melhor do que acordo nenhum.
Alguns dirão — e eu não os contrario — que o momento requeria um Conselho mais profundo e
consensual, mas também é verdade que se o Conselho terminasse sem decisões, teríamos o caos instalado.
Dito isto, há elementos importantes nas conclusões do Conselho, porque, sendo evidente que, na crise do
euro, é patente que não basta ter a mesma moeda, é preciso ter e garantir uma coordenação económica
suficiente, há decisões que reforçam o caminho para uma união orçamental de estabilidade e é por isso que a
prioridade do interesse nacional é a de que este caminho seja feito com rapidez e sem sobressaltos.
Dentro dos limites que já enunciei sobre o acordo do Conselho, onde estão os passos mais importantes?
Sublinho quatro no âmbito dos mecanismos de estabilidade.
Primeiro, a antecipação da entrada em vigor do mecanismo de estabilidade europeu. O objectivo é Julho de
2012, o que torna disponível, mais cedo, os recursos para ajudar países em situação de necessidade. Portugal
teria preferido que este poder de fôlego face à especulação fosse ainda mais robusto.
Segundo, disponibilização ao Fundo Monetário Internacional de um reforço até 200 000 milhões de euros
para aumentar a capacidade de resposta às crises. Desde a primeira hora que Portugal considerou esta opção
viável, porque representa um poder de fôlego suplementar, que pode ser utilizado, em caso de necessidade,
na Europa, tendo presente a natureza do FMI.
Terceiro, do ponto de vista da confiança, tomou-se uma decisão de bom senso, circunscrevendo o
envolvimento do sector privado às boas regras internacionais consagradas, caminho que tinha sido
interrompido com a questão da Grécia. Devo acrescentar que esta solução sempre teve a preferência de
Portugal, porque tudo o que clarifique a natureza da participação do sector privado no mercado da dívida
pública é um factor de confiança, e a confiança é o bem mais preciso e mais precioso para ultrapassar esta
crise.
Quarto, devemos, em paralelo, registar decisões do Banco Central Europeu (BCE) relativas às garantias de
liquidez no sector bancário europeu. É evidente que quando o BCE decide ceder liquidez a três anos aos
bancos europeus e alargar o tipo de garantias — os chamados «colaterais» — que aceita para fazer esses
empréstimos, está a contribuir para recuperar condições de financiamento e de funcionamento das economias.
Para Portugal, este ponto é muito relevante. Todos sabemos que os bancos portugueses, nesta fase, têm
dificuldade em obter financiamento externo. Nessas condições, é difícil o financiamento à economia. Melhorar
as condições de financiamento externo significa — e este ponto, repito, é relevante para o nosso País —
melhorar as condições de financiamento e funcionamento da economia.
Em matéria de disciplina orçamental, trata-se, no essencial, de a credibilizar como valor essencial da
governação económica europeia. Devo salientar que se percebe menos bem a surpresa ou a divergência de
alguns nesta matéria quando, fundamentalmente, se trata de dar dignidade política e jurídica superior aos
compromissos que os países da União Europeia, e especialmente os países da zona euro, já tinham assumido
no âmbito do pacote das seis iniciativas legislativas que conformam o Semestre Europeu e o Pacto para o
Euro Mais.
Devo, em todo o caso, sublinhar dois ou três pontos.
Primeiro, a consagração constitucional, ou em lei equivalente, da regra do equilíbrio orçamental. O acordo
político que conformou a maioria que apoia o Governo já previa, a nosso ver lucidamente, esta possibilidade.
O Governo apela ao sentido de compromisso de todos os que, no arco europeu, percebem a importância
política de dar este sinal, o sinal de que a Europa percebe o risco dos Orçamentos desequilibrados e das
dívidas descontroladas.
Segundo, estando a crise do euro relacionada com o excesso de défice e com a dívida, avança-se para um
procedimento mais automático para evitar desrespeitos continuados. Se esta regra e estes procedimentos
tivessem existido há 10 anos, nem a Alemanha nem a França teriam violado o Pacto de Estabilidade sem
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consequências nem, provavelmente, Portugal se teria aproximado da situação extrema de ter de fazer um
pedido de auxílio externo.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — A tendência para o endividamento excessivo
dos Estados sofre um considerável revés com a obrigação de quem é membro do euro de reduzir anualmente
a sua dívida pública em 1/20 avos face à parcela que excede os 60% do Produto.
É por isso que estas regras não deveriam dividir os partidos que afirmam uma vocação de governo, na
exacta medida em que, nos próximos 20 anos, qualquer governo, desde que europeísta, terá de ir reduzindo
anualmente a dívida pública portuguesa, o que, do nosso ponto de vista, significa salvaguardar as próximas
gerações do nosso País.
São estes, de momento, os pontos que considero relevantes referir relativamente às conclusões do
Conselho.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Vitalino Canas.
O Sr. Vitalino Canas (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Começo por saudar o Bloco de
Esquerda por trazer este tema de inegável importância ao Plenário.
Quero também dizer que partilhamos com o Bloco de Esquerda alguma inquietude em relação às
conclusões deste Conselho Europeu. Não partilhamos os pressupostos, como se irá ver de seguida, mas
partilhamos alguma inquietude em relação aos resultados, uma vez que, embora não tenhamos manifestado
muito entusiasmo e muita expectativa em relação àquilo que poderia sair do Conselho, o certo é que o Partido
Socialista esperava que se pudesse ter chegado a conclusões mais fortes, mais robustas e mais favoráveis
para a Europa.
Permita-me que me dirija também ao Governo.
Saudamos a presença do Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros neste debate, o que não tem
sido muito frequente suceder em debates sobre a Europa, e aproveitamo-la para dizer que o Partido Socialista
está, obviamente, aberto e votado a manter o consenso nacional que tem havido entre os principais partidos
em torno das questões da Europa. Creio que estamos num momento em que esses consensos estão a ser
testados e em que é mais importante todos estarmos votados a que eles permaneçam.
Contudo, há alguns aspectos em relação aos quais não podemos deixar de manifestar alguma reticência,
alguma reserva, designadamente quanto à forma como o Governo tem agido neste contexto e até à
interpretação que o Governo dá das coisas.
O Sr. Ministro disse-nos que é melhor haver um acordo do que não haver acordo. Teoricamente, é possível
dizer-se assim. No entanto, quando esse acordo revela o profundo desacordo que existe na Europa, não sei
se é possível dizê-lo assim. Quando esse acordo mostra que há nesta altura, como nunca houve, na Europa,
países que estão prontos a romper mesmo que seja importante não romperem, não sei se o acordo é, de
facto, assim tão favorável. Creio que neste ponto estamos em divergência. Não creio que possamos
considerar este acordo positivo.
É certo que existem aspectos interessantes, existem aspectos importantes. A saber: a antecipação do
mecanismo de estabilidade europeia para meados de 2012 é interessante, bem como o fortalecimento e o
aumento do chamado «poder de fogo» do FMI.
Há, no entanto, aspectos que são totalmente perplexizantes.
O Sr. Ministro referiu o facto de, a partir destas conclusões do Conselho Europeu, os Estados-membros
estarem obrigados a que a chamada «regra de ouro» — não sei por que se chama assim!? — fique
consagrada ao nível constitucional ou a nível equivalente, embora ainda tenha de se fazer algum percurso
para que isso se concretize do ponto de vista jurídico.
Sr. Ministro, temos totais dúvidas sobre o que isso quer dizer. Cremos, aliás, que essas dúvidas só podem
ser ultrapassadas fortalecendo a posição que o Partido Socialista tem tido, ou seja, de que não é necessário
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recorrermos ao nível constitucional e que existem outros níveis a que podemos recorrer para que essa regra,
se ela é necessária, se ela dá segurança aos mercados, possa ser também concretizada em Portugal.
Contudo, é ainda necessário definir o que isso significa. Creio que não haverá nenhum constitucionalista em
Portugal e, se calhar, em França e na Alemanha que nos consiga dizer exactamente o que é «nível
equivalente» a nível constitucional.
Em relação ao Bloco de Esquerda, já saudei trazer este debate ao Plenário, mas também é bem-vindo em
dois aspectos. É bem-vindo, desde logo, em reconhecer que parte dos problemas que enfrentamos hoje em
dia só se ultrapassam com mais Europa, parte dos problemas que temos internamente são problemas que
requerem mais Europa. Mais solidariedade certamente, mas também mais integração, maior aprofundamento
ao nível da Europa.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Há anos que o dizemos!
O Sr. Vitalino Canas (PS): — Além disso, fiquei também a perceber que o Bloco de Esquerda está de
acordo com alguns mecanismos que o Partido Socialista e muitos outros têm defendido, designadamente a
nível dos eurobonds,…
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Muito antes!
O Sr. Vitalino Canas (PS): — … da mutualização da dívida, do reforço do papel do Banco Central
Europeu. Bem-vindos! Não sei se os Srs. Deputados estão disponíveis para ser consequentes, mas isso
significa maior transferência de soberania de Portugal para as instituições europeias.
Aplausos do PS.
Gostava de saber se os Srs. Deputados, quando defendem isto, estão disponíveis para assumir também
essa maior transferência de soberania para as instituições europeias.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Chegaram às eurobonds três anos depois de nós!
O Sr. Vitalino Canas (PS): — O Partido Socialista está! O Partido Socialista é consequente e está de
corpo inteiro com a Europa.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. Vitalino Canas (PS): — Gostava, contudo, de saber se os Srs. Deputados estão ou não também de
corpo inteiro com a Europa e se estão disponíveis para a transferência de soberania que irá implicar, se essas
ideias forem concretizadas.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Rodrigues.
O Sr. António Rodrigues (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: É
também um prazer, Sr. Ministro, vê-lo aqui a discutir connosco estas matérias, não obstante julgar que
começámos esta discussão com um pequeno equívoco. Julgo, aliás, que o Bloco de Esquerda deve ter visto
apenas as duas primeiras páginas das conclusões da Cimeira, porque só se referiu à matéria financeira e às
questões da zona euro. Digo isto, porque a matéria que esteve em discussão foi bem mais lata do que a que
nos veio trazer.
Espanto-me quando oiço aqui dizer que o Conselho falhou, quando o que estava em causa era matéria da
zona euro e os 17 Estados-membros da zona euro concordaram por inteiro nas conclusões que estavam em
cima da mesa, quando 26 dos 27 Estados-membros que estavam presentes estão de acordo com a matéria
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que está em discussão. E — pasme-se! —, numa Europa em catástrofe, em tormenta, em tempestade, em
desgraça, em que sombras negras desgraçam o nosso futuro, nos últimos 10 anos, 12 Estados aderiram à
Europa e, no último Conselho Europeu, houve um Estado que quis aderir a essa «desgraça», a essa
«catástrofe», a essa «tormenta», a essa «tempestade», porque os Estados são idiotas, são estúpidos e não
sabem no que se estão a meter!!
O que esteve em discussão neste Conselho Europeu? Esteve em discussão o rigor e a disciplina
orçamental — coisa que, pelos vistos, incomoda a esquerda e, principalmente, o Bloco de Esquerda. Esteve
em discussão a possibilidade de virem a ser assumidas sanções aos Estados incumpridores — o que
preocupa o Bloco de Esquerda, porque parte do princípio que quer incumprir. Nós não somos daqueles que
partem do pressuposto de que não querem pagar as dívidas. Nós assumimos o pagamento daquilo que
contraímos.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. António Rodrigues (PSD): — Mais do que isso: somos um partido que suporta um Governo que
esteve na Cimeira com o sentimento global de solidariedade entre todos os Estados-membros, preocupado em
encontrar soluções que a todos possam aproveitar. E parece que isso incomoda o Bloco de Esquerda, porque
é incapaz de ter uma posição de futuro que enquadre todos esses Estados a favor de uma Europa construída
na solidariedade, na comunhão de esforços e, acima de tudo, na nossa vontade de um futuro para todos.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo: Todos lhe dão umas especiais
boas-vindas, Sr. Ministro, e não serei eu que deixo de me associar desejando-lhe também boas-vindas a este
debate. Ainda há dias, em relação a uma alteração do Tratado da União Europeia, esperávamos todos que V.
Ex.ª estivesse presente. Infelizmente, não nos deu oportunidade de conversar consigo numa altura em que se
debatia uma questão essencial para o nosso País.
Sr. Ministro, hoje, esperávamos que viesse explicar, mas, de facto, infelizmente, veio aqui apenas servir,
sem ofensa naturalmente, de uma espécie de porta-voz das conclusões do Conselho Europeu, realizado na
passada semana. Aliás, duvido que seja porta-voz do Conselho. Penso que foi mesmo porta-voz de um
almoço entre a Sr.ª Merkel e o Sr. Sarkozy que aconteceu ainda antes deste Conselho Europeu!
Gostávamos que o Sr. Ministro tivesse explicado — e vou deixar que o faça, provavelmente, no debate da
próxima quinta-feira — como nos vai «vender» as imposições que a Sr.ª Merkel fez ao nosso País; como vai
justificar aqui, em Portugal, mais um passo de capitulação de aspectos centrais da nossa soberania; como vai
justificar a designada «união orçamental», não só já o visto prévio sobre as nossas opções constitucionais mas
também a fiscalização permanente da execução orçamental em Portugal, competência que — veja lá o crime,
Sr. Ministro…! — a lei e a Constituição da República atribuem, em exclusivo, à Assembleia da República;
como vai explicar por que razão vamos ter uma Constituição decalcada ou copiada da Constituição alemã;
como vai conseguir explicar que seja racional e aceitável rasgar a nossa Constituição para lá colocar o limite
do deficit e o limite da dívida apenas para tranquilizar o eixo franco-alemão, como vai conseguir explicar que
as opções legítimas do nosso povo para os futuros governos do nosso País, eleitos pelo povo, possam passar
a ser agora alvo de fiscalização de tribunais e como é possível imaginar que os tribunais nacionais, incluindo o
Tribunal Constitucional, possam passar a estar — veja-se lá! — subordinados à tutela de tribunais europeus.
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Era importante que o Sr. Ministro pudesse ter explicado isto, em vez de
servir de mero porta-voz!
As decisões tomadas no Conselho Europeu são, de facto, particularmente graves e inaceitáveis para
Portugal e para os povos dos Estados-membros da União Europeia. Se as decisões da passada semana
avançarem, Portugal transforma-se numa espécie de protectorado alemão E não é por causa da crise, porque
não será apenas durante a crise, como o CDS e o Dr. Paulo Portas gostam de invocar para «sacudir a água
do capote», omitindo e dissimulando as suas responsabilidades neste caminho de submissão nacional!
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Com estas decisões, Portugal pode, de facto, transformar-se numa espécie de protectorado permanente às
ordens de Berlim e de Paris. Portugal e boa parte dos Estados-membros da actual União Europeia ficarão às
ordens da Sr.ª Merkel. Praticamente, só falta passar a nomear em Lisboa um embaixador com cadeira
reservada nas reuniões do Conselho de Ministros, que pelo menos até agora são presididas pelo Dr. Passos
Coelho!!
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Como seria de esperar, o Conselho Europeu não deu nem podia dar
resposta alguma aos problemas centrais da União Europeia, como o crescimento económico, a coesão
económica e social, o combate ao desemprego, a travagem na degradação dos direitos e conquistas dos seus
povos.
Como seria de esperar, o Conselho Europeu empurrou os problemas com a barriga, dando uma resposta
em tudo semelhante às anteriores, julgando que o caminho da harmonização, o caminho forçado da
dominação federalista, o caminho em que se pretende tratar como iguais economias e realidades sociais tão
diferentes, o caminho do desprezo e da discriminação dos mais frágeis, o caminho dos interesses da
dominação vinculando as estratégias dos grupos económicos e financeiros, o caminho de degradação social
tem alguma coisa a ver com a igualdade entre os Estados ou com o progresso económico e o
desenvolvimento sustentável. Nada, Sr.ª Presidente e Srs. Deputados.
Percebemos recentemente que não foi só o Reino Unido que disse «Não!» a um novo tratado internacional,
a um novo tratado da União Europeia, Sr. Ministro. Gostava que explicasse como é que este tratado
internacional foi combinado, à margem das regras vigentes. Há outros países que começam agora a medir as
consequências nacionais de inaceitáveis imposições administrativas do eixo franco-alemão. Ainda bem que
começam a ter consciência!
Pela nossa parte, reafirmamos que é cada vez mais urgente alargar o debate, denunciar a vergonhosa
submissão que coloca em causa aspectos essenciais da nossa soberania, resistir e dizer «Não!» a este
processo de alienação da capacidade nacional de afirmar Portugal na Europa e no mundo.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, de uma
forma muito sucinta, direi que trouxemos a debate um de vários temas que resultam inescapáveis para todo o
debate político, para o escrutínio dos cidadãos nos próximos tempos. Trata-se de um primeiro debate sobre
este Conselho Europeu em concreto. Amanhã, teremos outros e haverá ainda outros debates.
Falámos de um défice delirante, que é impossível para Portugal e para a maior parte dos Estados-membros
da União Europeia. Um défice estrutural de 0,5% é desastroso, é uma catástrofe. Em Portugal, é o ataque
final, é o assalto ao Estado social: às prestações sociais, aos salários da função pública, aos reformados…
Como pode o Governo português assinar 0,5% de défice estrutural?! Não é possível! É esta a questão que
queremos sublinhar.
Para o comum dos cidadãos em Portugal, a questão está ainda nos problemas da dívida, da dificuldade em
a Europa unir-se numa resposta que seja consequente, que altere as condições de austeridade. Porém, já
estamos a perceber que passámos daquele défice de 3% do Produto para um défice muitíssimo inferior.
Estamos a tender ao défice zero, o que é desastroso, é catastrófico para Portugal.
É sobre esta matéria que queremos uma resposta do Governo. Por que razão o Governo aceita este
patamar? Este patamar é absolutamente inaceitável, este patamar é a desgraça da política social em Portugal,
este patamar é a desgraça de qualquer capacidade de investimento público em Portugal na próxima década,
Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros.
A outra questão que temos, de imediato, para lhe colocar é a da ratificação deste acordo, que, ao que se
diz, será elaborado até Março. A ratificação é parlamentar? Entende o Governo que há espaço e condições,
como reclamamos? Nada do que foi decidido nesse aspecto, no Conselho Europeu, altera a perspectiva? O
articulado constitucional acolhe-o? É possível um referendo a esse tratado intergovernamental. E directamente
ao tratado, sem necessidade de perguntas sobre assuntos relevantes. Defendemos essa reivindicação de
cidadania, de democracia elementar.
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Será que o Governo, o PSD e o CDS estão abertos à possibilidade de ser o povo português a falar, a
decidir se quer um défice de 0,5%, obrigatório, contra sanção automática, contra eventual perda de direito de
voto na União Europeia? Será que o Governo está aberto a essa perspectiva? É o desafio do Bloco de
Esquerda.
Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, a questão não é a de saber se essa matéria é inscrita
na Constituição, o que seria uma codificação de um princípio dogmático-ideológico-liberal, ou se está numa lei
equivalente. A questão é a de saber se o povo vota ou não e se o défice é de 0,5% ou se é outra coisa
qualquer. É disso que estamos a falar. Convirá não criarmos «cortinas de fumo».
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Magalhães.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros,
Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade, neste ponto de um debate que tem
como objectivo discutir conclusões do Conselho Europeu, importa relembrá-las.
Primeiro: houve ou não um acordo? Houve ou não um consenso? Houve! Havendo esse acordo e havendo
esse consenso, poderemos dizer que as perspectivas, no final do Conselho, foram bastante melhores do que
aquelas que existiam a meio desse mesmo Conselho. Como, de resto, já foi aqui dito, é preferível um acordo
do que a falta dele, numa situação em que a Europa se encontra.
Como também foi dito, foi um acordo que partiu a Europa ao meio, em três ou em quatro? Não! Foi um
acordo que abrangeu 26 dos 27 Estados-membros, uns pertencentes à zona euro, outros não. Portanto, pode
considerar-se um amplo consenso, um amplo acordo.
Foi ou não possível com esse amplo consenso e com esse amplo acordo alcançar uma posição comum, do
ponto de vista da União Europeia, para enfrentar uma situação de impasse que se arrastava há vários
conselhos? Foi possível! Isso também foi conseguido. É uma terceira conclusão que gostaríamos de sublinhar,
nomeadamente para aqueles, e ainda foram alguns, que julgaram que esta era a Cimeira do fim do euro ou,
até, para os mais catastrofistas, do fim da Europa. Parece-me que foram um pouco precipitados.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Resolverá esta Cimeira todos os problemas, que são muitos e
complexos? Não! Não resolverá! Mas — reconheçamo-lo com honestidade — não deixa de ser um passo em
frente haver maior coordenação económica e financeira onde já há uma união monetária.
Perante isto, vimos na esquerda mais à esquerda a continuação do discurso «Não falamos, não pagamos,
não propomos, mas gastamos». É uma equação impossível. É o caminho para o abismo e isto é que é, e
passo a citar, «fundamentalismo», «impossibilidade», «catastrófico» e, sobretudo, Sr.as
e Srs. Deputados,
«delirante».
Na esquerda menos à esquerda, nomeadamente em relação ao maior partido da oposição, registamos com
agrado a intervenção do Sr. Deputado Vitalino Canas, que reafirmou a necessidade de o consenso europeu,
que tem sido possível obter, manter-se e até reforçar-se, num tom bem diferente de outras intervenções que
ouvimos ultimamente.
Assim, sublinhamos esta disponibilidade e, pela nossa parte, devo dizer que também estamos disponíveis
para aquilo que é essencial e que tem a ver com a consagração da «regra de ouro» (ou qualquer outro nome
que lhe queiram atribuir) para Portugal poder dar um sinal de empenho por parte de uma maioria esmagadora
desta Câmara, que, certamente, mais do que ajudar o CDS, o PSD, o PS ou este Governo, ajudará a resolver
o problema de Portugal e dos portugueses.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios
Estrangeiros.
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O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados:
Queria enunciar algumas matérias que me parecem relevantes no decurso deste debate.
Refiro, desde logo, relativamente à intervenção do Partido Socialista, que, não colocando em causa a
essência do processo de disciplina orçamental, tem dúvidas quanto à referida localização, seja em lei
constitucional seja em lei de valor equivalente, e eu entendo que as dúvidas se esclarecem conversando…
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — … e que os consensos e os compromissos se
fazem com abertura e com disponibilidade de parte a parte.
O que está em causa para Portugal, que tem manifestamente interesse em que a crise do euro seja
ultrapassada — seja ultrapassada bem e seja ultrapassada depressa — é demasiado importante para não lhe
manifestar, também da nossa parte, a vontade de procurar um compromisso na área dos partidos que
defendem a vocação europeísta de Portugal para que a nossa resposta a estas decisões seja correcta.
Quero também sublinhar que, ao contrário do que tem sido referido, há dois ou três pontos a que Portugal
foi extremamente sensível, e continuará a ser, na fase da concretização das decisões que foram tomadas.
O primeiro tem a ver com a defesa do papel constitucional deste Parlamento em matéria de autoridade
orçamental, apesar das circunstâncias, que todos conhecemos, que decorrem do Programa de Assistência
Económica e Financeira ao nosso País, subscrito em Abril passado. Mas o Governo terá sempre presente a
defesa do papel constitucional do Parlamento nacional.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Quero igualmente sublinhar que, ao contrário
de ideias que chegaram a circular, Portugal sempre se opôs com veemência a que, por exemplo, determinado
tipo de sanções quanto a incumprimento pudesse atingir o direito de voto dos Estados no Conselho. Essa
posição deve ser mantida no período de concretização.
Quero ainda afirmar que Portugal tem defendido, de forma constante, o papel da Comissão no plano do
equilíbrio das soluções entre Estados que são mais prósperos e Estados que estão em maiores dificuldades,
que têm maior dimensão ou dimensão média ou mais pequena.
A Comissão poderá ter os seus defeitos, mas tem um papel mais equilibrado na União Europeia do que
qualquer projecto de directório e, nessa matéria, Portugal manterá uma posição constante a favor desse
equilíbrio.
O Sr. José Manuel Rodrigues (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Dirijo-me agora às bancadas mais à
esquerda. Há um ponto que nos separa, o que é normal e legítimo em democracia: a medida das soberanias
no século XXI também é a medida das dívidas que os Estados contraem e, sobretudo, da capacidade que os
Estados têm ou não para pagar essas dívidas.
É por isso que a melhor defesa da soberania de Portugal, hoje e amanhã, é não nos endividarmos demais
e invertermos a trajectória do endividamento, que, infelizmente, foi realizado. É isso que é defender a nossa
soberania.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Com menos dívida, somos mais soberanos. É por isso que países com a nossa dimensão populacional ou
com o nosso peso económico, mas que têm contas equilibradas, não abdicaram de soberania para além
daquela que voluntariamente partilham no quadro da União Europeia. Neste ponto, na verdade, existe uma
diferença.
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Devo dizer também, por fim, que faz pouco sentido dizer que este Conselho fica aquém do desejável, que é
uma enorme frustração, que não toma decisões relevantes e, depois, pedir um referendo.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Para encerrar o debate, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Nenhum
governo de direita na democracia em Portugal, Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, cumpriu
os critérios hoje enunciados pela Sr.ª Merkel e aqui tão apaixonadamente defendidos pelo Sr. Ministro.
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Bem lembrado!
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Nem mesmo um governo de que o Sr. Ministro fez parte anteriormente e que
era presidido pelo actual Presidente da Comissão Europeia.
Vozes do BE: — Exactamente!
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Enfim, é todo um mundo novo, inclusivamente para o dogmatismo, o
fundamentalismo radical da direita a que estamos a assistir nesta onda europeia e que é aqui sufragada pelo
Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros.
Não há, da parte do Bloco de Esquerda, uma expectativa gorada no Conselho Europeu, a que hoje se
queira uma atitude em contraponto. Não! Pelo contrário, já temíamos que tudo isto viesse a acontecer, mas,
pelo menos, esperaríamos que houvesse um papel mais robusto da parte do Banco Central Europeu. E essa
robustez era aconselhada pelo Presidente da República, à qual o Governo decidiu «virar as costas».
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Não é verdade!
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Mas as opiniões sensatas, no caso, não colheram.
Nós, Bloco de Esquerda, há muitos anos — aliás, num certo passado, acompanhados pelo CDS e pelo
PSD, para além do PS —, defendemos a realização de um referendo e, neste momento, era necessário
esmiuçar um pouco melhor, porque o tratado intergovernamental, à margem de alterações ao Tratado da
União Europeia, não escapa a um artigo das disposições transitórias da Constituição da República sobre a
possibilidade de referendo de um tratado que tenha a ver com o aprofundamento da União Europeia.
Portanto, há duas hipóteses em aberto: a ratificação parlamentar, que o Sr. Ministro dos Negócios
Estrangeiros já aqui indiciou — não sei se é a posição final do Governo!? —, e a possibilidade, que nós
reclamamos, de um referendo para dar a palavra ao povo sobre o caminho da Europa e sobre este tipo de
tratado intergovernamental.
Nós sublinhámos aqui, Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, que o défice de 0,5% — 0,5%
permanente, 0,5% eterno — é uma desgraça social para este País. E ninguém pode fugir disto.
Nós estamos, hoje, com um programa de austeridade gravíssimo, que todo o País conhece, que todos
sofrem com ele, e estamos a discutir défices da ordem dos 5,9% e dos 4,5%, não estamos a falar de 0,5%!
0,5% é o testamento da irresponsabilidade política e é o testamento da desagregação europeia, quer queriam
quer não, porque ninguém vai aguentar medidas deste género. O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros não
deu resposta a esta questão, e é isso que está em aberto.
Sr. Ministro, nós reclamamos o referendo, reclamamos a transparência e o debate completamente aberto
desta política europeia.
Por fim, queria dizer que achamos absolutamente extraordinário que o Partido Socialista discuta apenas
onde é que se põem os 0,5%. É porque o problema não é onde se põem os 0,5%; o problema está nos 0,5%!
E essa unidade que aqui se estabeleceu… Aliás, percebeu-se imediatamente que o Sr. Ministro dos Negócios
Estrangeiros, defendendo uma suposta «regra de ouro»,…
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A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — … preparou logo uma lei que não era de ouro, nem de prata; era só de
bronze. Essa lei de valor reforçado é uma lei de bronze, mas os 0,5% ficam lá!
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, concluído o debate, requerido pelo Bloco de Esquerda, sobre as
conclusões do Conselho Europeu, que teve lugar nos dias 8 e 9 de Dezembro, em Bruxelas, passamos às
declarações políticas.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: O Governo apresentou,
na passada segunda-feira, um documento que intitulou de Revisão da Estrutura Curricular, composto por duas
singelas páginas descritivas e mais três quadros referentes ao 2.º ciclo, ao 3.º ciclo e ao secundário. Este
documento é, na perspectiva de Os Verdes, uma aberração e representa um retrocesso da concepção de
ensino, como nunca se pensaria imaginar em pleno século XXI.
O que se defende aqui é que a escola seja uma fábrica com a seguinte linha de produção: os professores
passam conteúdos para os estudantes e os estudantes passam os conteúdos para as provas de avaliação.
Chegados aqui, temos o produto concluído.
Esta é uma concepção profundamente retrógrada que não privilegia as competências, mas apenas os
conteúdos momentâneos e a memorização imediata desses conteúdos. Ora, como nós, supostamente, não
estamos a formatar robôs mas, sim, crianças e jovens que, futuramente, serão o centro da actividade deste
País e que, tendo todos os defeitos e todas as virtudes de se ser humano, devem ter todas as suas
competências desenvolvidas para um amplo aproveitamento das suas capacidades, esta lógica torna-se,
então, profundamente preocupante.
É nesta lógica que o Ministério da Educação concebe que há disciplinas essenciais e que as outras são
meros «verbos de encher», como se costuma dizer.
Assim, a Formação Cívica sai do currículo, porque, provavelmente, aos olhos do Governo, ensaiar com os
alunos práticas de civismo, práticas de solidariedade, práticas de cooperação e vivências colectivas é uma
perda de tempo, mas a Educação Moral e Religiosa, essa, mantém-se em todos os níveis de ensino.
Por outro lado, o ensino artístico e tecnológico é completamente desvalorizado. Ora, é este ensino que
passa competências de «saber-fazer» para os estudantes, é o que lhes permite, por exemplo, o contacto com
os materiais, a identificação de matérias, as suas características e propriedades, o conhecimento das suas
formas, dimensões, texturas, a prática de montagem e desmontagem, medições, representações, as funções
técnicas dos objectos, as suas funções sociais, económicas, históricas, a sua técnica de manuseamento, e
tantas outras coisas. Considerar isto não essencial é de uma visão absolutamente restritiva do acto de educar.
Se recuarmos 20 anos, apercebemo-nos que os alunos tinham três tempos de 50 minutos de Educação
Visual com um professor e cinco tempos de 50 minutos de Trabalhos Manuais, aqui com dois professores. Em
1991, reduziu-se esta componente de ensino para cinco tempos de 50 minutos de Educação Visual e
Tecnológica com par pedagógico. Em 2001, a Educação Visual e Tecnológica (EVT) passou a quatro tempos
de 45 minutos, ainda com par pedagógico. Na Legislatura passada, as tentativas de eliminação do par
pedagógico foram imensas. E agora o que este Governo propõe é a separação da Educação Visual e da
Educação Tecnológica, integrando esta última com as Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC), que é
coisa bem distinta, com dois tempos de 45 minutos cada uma e com apenas um professor para cada, ou seja,
com o fim do par pedagógico. Percebe-se, nesta abordagem, de uma história de curto prazo, a desvalorização
que esta componente de ensino inadmissivelmente tem tido. Isto no 2.º ciclo, porque no último ano do 3.º ciclo
o Governo propõe-se acabar, pura e simplesmente, com a Educação Tecnológica e também em todo o 3.º
ciclo acabar com as Tecnologias de Informação e Comunicação.
De referir que também as Ciências da Natureza perdem relevância para o Governo, quando se acaba com
o desdobramento no 2.º ciclo, assumindo-se que a actividade experimental é perfeitamente passível de ser
feita com toda a turma. Ou seja, ter 14 crianças a proceder a experiências práticas ou ter 28 crianças em
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simultâneo a fazê-lo é completamente igual para o Ministério da Educação ao nível das aprendizagens. Mas,
segundo nos informaram professores reunidos com o Sr. Ministro da Educação, a explicação é lógica: é que
no 2.º ciclo a experimentação em Ciências da Natureza passa a ser feita pelo professor e os alunos só têm
que visualizar, mas experimentar não! Cá está a «técnica de empinar» levada ao extremo!
O que Os Verdes sentem profunda necessidade de afirmar neste momento é que o ensino é,
necessariamente, formado pelas mais diversas componentes que devem trabalhar competências e
conhecimentos e interligá-los de forma constante. O ensino trabalha desejavelmente a formação integral dos
indivíduos, gerando-lhes oportunidade de conhecer, de desenvolver, de melhorar e de aperfeiçoar
capacidades. É esse ensino que o Governo quer desprezar, remetendo-o à função central de ler, escrever e
contar! Não chega, é demasiado insuficiente e redutor!
Mas não sejamos ingénuos em toda esta história: a verdadeira função central desta dita revisão curricular é
reduzir o número de professores e de horários, poupando em salários e em gastos. Quando ouvimos o
Ministro da Educação, em entrevista, afirmar que, por exemplo, em Educação Visual e Tecnológica, ter dois
professores é um luxo — um luxo!! —, percebemos o objectivo e que a escola pública para o Governo é para
dar os mínimos possíveis, porque quem quer luxos, leia-se «boas aprendizagens», optará por escolas
privadas. É isto: o esvaziamento da qualidade da escola pública para o Governo não gastar recursos e porque
a garantia é que quem pode paga escolas privadas aos seus filhos.
Mesmo para finalizar, resta afirmar que Os Verdes consideram que importa melhorar a componente
curricular, mas isto é nitidamente piorá-la. Os Verdes desejam também que o projecto de resolução,
apresentado, em boa hora, pelo PCP no Parlamento, que prevê o alargamento da consulta pública deste
documento, a qual é manifestamente curta, seja discutido rapidamente e aprovado para garantir uma
verdadeira participação de todos os interessados.
Aplausos de Os Verdes e do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, as Sr.as
Deputadas Odete João, do PS,
Rita Rato, do PCP, e Ana Drago, do BE, e a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia responderá no fim aos pedidos
de esclarecimento.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete João.
A Sr.ª Odete João (PS): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados e Sr.as
Deputadas, Sr.ª Deputada Heloísa
Apolónia, o PS há muito tempo que vem defendendo a necessidade de proceder a alterações curriculares e de
adequá-las às necessidades de uma sociedade moderna, de uma sociedade que queremos seja desenvolvida,
de uma sociedade que queremos tecnologicamente avançada. Por isso, temos de adequar os currículos às
necessidades do País.
Mas este Ministério começou mal este processo. Começou mal por não ter, desde logo, chamado o
conjunto de parceiros e de instituições com as quais devia definir, à partida, um conjunto de princípios. Este
Ministério preferiu remeter este tema para audição pública, em vez de ouvir estas entidades. Vamos mal!
Este Ministério preferiu defender permanentemente a autonomia, mas aposta numa proposta de carga
curricular que retira às escolas a única possibilidade que têm dessa mesma autonomia em termos de currículo,
desde o logo a Educação Cívica e a Área de Projecto. Vamos mal neste caminho!
Portanto, este Ministério apregoa uma coisa, mas, na prática, tem uma acção distinta.
Vozes do PS: — Muito bem!
A Sr.ª Odete João (PS): — Este Ministério reduz, como a Sr.ª Deputada disse, a carga horária de áreas
que também consideramos importantes, nomeadamente na vertente artística, naquela que é a sensibilidade
estética, reduzindo a possibilidade de termos alunos que, em áreas muito específicas, podem encontrar na
escola o seu caminho, mas que, com esta carga curricular, verão goradas essas expectativas.
Portanto, Sr.ª Deputada, entendemos que, nesta matéria, há um caminho a fazer, mas que o início que o
Sr. Ministro da Educação nos mostrou não vai no rumo certo, porque despreza um conjunto de competências,
um conjunto de conhecimentos que são essenciais para a formação global dos nossos alunos.
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Cremos, no entanto, na necessidade de uma reforma curricular que consiga para os nossos alunos um
desenvolvimento completo, a capacidade de interpretação crítica do mundo que nos rodeia. Isso é essencial e
não pode ser feito apenas com base em algumas áreas, como prevê esta reforma curricular.
Portanto, Sr.ª Deputada, a pergunta que lhe coloco é a seguinte: qual a sua interpretação sobre a
competência da escola, tendo em conta a sua autonomia, quando lhe são retiradas duas áreas onde a escola
podia encontrar um conjunto de conteúdos que respondesse às necessidades regionais, às necessidades
locais, enfim, às necessidades dos alunos com vista à sua formação global?
Aplausos do PS.
Entretanto, assumiu a presidência a Sr.ª Vice-Presidente Teresa Caeiro.
A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Rita Rato.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, o PCP gostaria de saudar o Partido Ecologista
«Os Verdes» por trazer o tema da suposta revisão da estrutura curricular ao Plenário da Assembleia da
República.
O PCP, desde há muito, defende uma profunda revisão dos conteúdos e da organização dos currículos,
mas, objectivamente, no sentido da valorização da formação da cultura integral do indivíduo, naquele que é o
princípio consagrado na Constituição da República Portuguesa e na Lei de Bases do Sistema Educativo.
Coisa completamente diferente, que, aliás, a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia aqui frisou, é o que o Governo
apresentou à opinião pública — não apresentou à Assembleia da República, mas, repito, apresentou à opinião
pública. A suposta revisão da estrutura curricular tem claramente o objectivo não de valorização dos currículos
mas, sim, de desvalorização da escola pública democrática e de qualidade.
O que a revisão que o Governo quer apresentar tem como objectivo é o despedimento de milhares de
professores contratados, colocando milhares de professores do quadro com horários zero. O objectivo não é
outro se não aquele de cortar 109 milhões de euros com a revisão curricular.
Aliás, se dúvidas houvesse, ainda antes do Orçamento do Estado, o Sr. Ministro da Educação em
entrevista a um jornal diário de referência terá dito exactamente isto: com a suposta reforma curricular, o
Governo quer poupar cerca de 150 milhões de euros. Portanto, é hoje bem claro que o que está colocado em
cima da mesa é exactamente o que o governo anterior do Partido Socialista quis começar mas que a luta dos
professores de EVT, em bom tempo, travou.
A Sr.ª Deputada do Partido Socialista, hoje, parecer ter tido uma amnésia, ainda que curta e restrita,…
Vozes do PCP: — Selectiva!
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — … mas, de facto, lembro-me bem da luta dos professores de EVT, que, aliás, foi
uma luta que derrotou a intenção do governo. Lembro-me bem de ver os professores de EVT vestidos de
amarelo nas galerias, lembro-me bem de ver milhares de professores de EVT às portas da Assembleia da
República, a lutar pelo direito à qualidade dos currículos e à qualidade da escola pública. E o PS, o PSD e o
CDS-PP, sabem também que a luta dos professores de TIC, a luta dos professores de música, a luta dos
professores contratados está para continuar. É uma luta que incomoda, mas a luta dos estudantes e dos
professores terá como propósito a derrota destas políticas que têm como objectivo a degradação da escola
pública e a degradação dos currículos, para que, de facto, o aconteça na escola pública não seja a sua
desvalorização mas, pelo contrário, a sua valorização.
Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, a questão que lhe coloco é muito breve. Gostaria de saber se também
partilha com o PCP a profunda convicção de que só a luta dos professores é que pode e há-de, de facto,
derrotar esta suposta revisão curricular.
Aplausos do PCP.
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A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana
Drago.
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, começo por saudá-la pelo
tema que trouxe para debate no Plenário. Creio que é um dos temas centrais, hoje, quando discutimos
políticas de educação e o futuro da escola política.
Quero dizer-lhe que o Bloco de Esquerda está muitíssimo preocupado com aquilo que foram as propostas
apresentadas pelo Sr. Ministro. Isto porque entendemos que as mexidas ao nível curricular, porque mexem
com todo um programa que é uma matriz curricular que deve acompanhar o percurso, na escolaridade
obrigatória, de uma criança que se transforma num jovem e que define aquilo que são as escolhas centrais de
uma sociedade que entende que estes são os ensinamentos e as competências fundamentais a transmitir às
suas crianças e jovens, este programa, este percurso e matriz curricular não pode ser alterado pelo ímpeto ou
pelas vontades de um determinado ministro que pensa que tem de puxar mais uma hora dali e tirar outra
dacolá.
Fazer estas alterações sucessivas é muitíssimo negativo para a escola pública, cria uma instabilidade da
matriz curricular que prejudica a qualidade daquilo que é o percurso educativo.
Quando entrou em funções, o Sr. Ministro fez logo o acrescento de um conjunto de horas ao Português e à
Matemática; agora anuncia uma reorganização curricular intercalar e já disse que a seguir vai fazer uma
reforma mais profunda. Tudo isto nos parece muito mal pensado, muito mal preparado e muito irresponsável
no que toca à questão curricular, e, depois, não batem certo as próprias intenções enunciadas pelo ministério
e aquilo que é a proposta.
Disse o Sr. Ministro que «é preciso combater a dispersão por diferentes disciplinas». É até uma ideia
interessante e um debate que deveríamos ter, mas o Sr. Ministro pega na disciplina de EVT e divide uma única
disciplina em duas disciplinas. Mais: uma disciplina que tinha dois professores, para ter uma componente
prática, quando se transforma em duas, acaba com essa componente prática.
Disse o Sr. Ministro que há um conjunto de conhecimentos que são fundamentais, nomeadamente o
conhecimento científico, mas acaba com o desdobramento de turmas na áreas das Ciências da Natureza, da
Física e da Química que permitia ensino experimental, ou seja, aprendizagem e paixão pela ciência,
transformando estas disciplinas em mera exposição teórica, e, depois, acaba com a formação cívica, ou seja,
o espaço onde as escolas tinham exactamente a sua autonomia pedagógica para fazer a intersecção de
saberes e, portanto, a articulação de competências.
Tudo isto está muitíssimo mal pensado e, portanto, pergunto porque é que há esta reorganização curricular
intercalar. Percebe-se porquê: tinha de se cumprir o programa que foi estabelecido no Orçamento do Estado e
é preciso despedir professores, custe o que custar.
Mas, Sr.ª Deputada, não quero terminar esta minha intervenção sem lhe lançar um desafio: esta
reorganização curricular vai ter de ter um diploma e creio que esta Assembleia tem de discutir esse diploma.
Portanto, o que lhe pergunto é se o Grupo Parlamentar do Partido Ecologista «Os Verdes» está disposto a
juntar as suas assinaturas às assinaturas dos Deputados do Bloco de Esquerda para pedir a apreciação
parlamentar do decreto-lei que venha a regular esta reorganização curricular.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, começo por
agradecer às Sr.as
Deputadas Odete João, Rita Rato e Ana Drago as questões que me colocaram.
Concordo com as observações que fizeram, algumas das quais já tinha frisado na intervenção que fiz da
tribuna, mas há uma coisa que me parece certa, que nos deve preocupar e que deve preocupar também o
PSD e o CDS, porque, na legislatura passada, era isso que diziam. Agora não vos oiço, desejo ouvir-vos e não
vos consigo ouvir porque os senhores calam-se, amordaçam-se, talvez falem só quando o Ministro da
Educação vos der autorização para o efeito. Mas era importante ouvir-vos antes porque, na legislatura
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passada, os senhores também juntavam a vossa voz à nossa quando contestávamos aquelas alterações que
queriam fazer, como o fim do par pedagógico em EVT e outras alterações feitas pelo anterior governo.
Na altura, dizíamos que eram razões meramente economicistas que estavam na base dessas decisões e
não razões pedagógicas e os senhores salientavam também essa questão até ao limite; agora, deixámos de
vos ouvir, mas a verdade é que as alterações que estamos a verificar agora, de facto, têm também um
objectivo economicista: números, contas, salários, aquilo que tem de se pagar, professores para a rua, já,
quantos menos melhor, independentemente do resultado nas aprendizagens que daí advier. Ora, isto é
absolutamente inadmissível.
Não foi por acaso que iniciei a minha intervenção a falar, de alguma forma irónica, das duas páginas
descritivas desta dita revisão curricular, porque aquilo não tem fundamento pedagógico absolutamente
nenhum — nada, nem com três pares de óculos conseguimos vislumbrar alguma coisa, nem com muito boa
vontade. Absolutamente nada! Aquilo é uma coisa descritiva, é até confrangedora, não justifica absolutamente
nada e, portanto, provavelmente, os Srs. Deputados do PSD e do CDS-PP não sabem o que dizer
relativamente a esta matéria.
Estamos aqui perante uma proposta que tem como único objectivo, de facto, matérias orçamentais, aquilo
que a tróica ditou. Aquilo que o Governo quer fazer não tem qualquer sustentabilidade pedagógica.
Despedimento de professores, professores em horário zero, é este o resultado, é este o grande objectivo!
Por outro lado, gostava ainda de dizer uma coisa: pela boca do Sr. Ministro, isto é uma coisa intercalar e a
grande reforma há-de vir aí. Até nos assustamos com isto mas, enfim, a questão é a seguinte: qualquer
revisão ou reforma curricular — chamemos-lhe aquilo que entendermos —, não funcionará, mas nunca
funcionará, se as escolas não se dotarem de meios para promover as aprendizagens. Ou seja, podemos até
fazer brilhantes reformas curriculares — não é o caso do que aqui é apresentado— mas, se as turmas tiverem
um número absurdo de alunos, se as componentes práticas forem eliminadas, se não houver professores
suficientes, se não tivermos auxiliares de educação suficientes nas escolas, se a escola não for um mundo
composto por uma série de factores que interagem entre si, e todos são relevantíssimos para as diversas e
diferentes aprendizagens dos alunos, nós falhamos.
A grande preocupação que Os Verdes têm é que, de facto, parece que há aqui forças políticas que não têm
qualquer preocupação com esse falhanço. Parece que têm outro objectivo à frente, que é a degradação da
escola pública, porque estão descansados: aqueles que podem, colocarão sempre os seus filhos em escolas
privadas, prosseguindo o seu percurso naturalmente. Mas não é assim que se promove igualdade, não é
assim que se promovem oportunidades para todas as crianças, para formarmos bons adultos que hão-de ser o
centro de actividade deste País.
Ora, é isto que queremos e gostávamos muito de participar numa reforma curricular que tivesse a
participação de todos os interessados e de todos aqueles que se envolvem no sistema educativo e, a partir
daí, melhorássemos sempre. Mas não é esse o objectivo, o objectivo é sempre cortar, cortar, cortar e nunca
melhorar, melhorar, melhorar e promover a qualidade no ensino, logo, das nossas crianças e dos nosso
jovens.
Lamentavelmente, é esse o percurso que os sucessivos governos têm seguido e, lamentavelmente, é esse
o resultado daquilo que aqui nos é apresentado.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno
Encarnação.
O Sr. Nuno Encarnação (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: «É muito importante que todos
os países da zona euro se comprometam com o rigor e disciplina orçamental, e o Partido Socialista defende
esse rigor e essa disciplina orçamental.» Estas são palavras de António José Seguro a um diário, numa
entrevista concedida na passada semana.
Vozes do PSD: — Muito bem!
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O Sr. Nuno Encarnação (PSD): — Se, por um lado, esta frase parecia encaminhar o PS no caminho da
responsabilidade política, por outro e passadas poucas linhas da mesma entrevista, essa ideia desapareceu
num nevoeiro profundo de novas afirmações.
A última Cimeira Europeia ditou um conjunto de regras, subscritas por uma imensa maioria, onde se prevê
que o Reino Unido seja o único País a primar pelo seu isolamento, de modo a deixar claro que os futuros
governos de cada país não poderão falhar, como no passado recente aconteceu.
Restabelecer a confiança e a sua credibilidade neste conjunto de países é a prioridade das prioridades. O
limite da dívida deverá, por isso, ser inscrito ao nível da Constituição ou equivalente.
O Sr. Primeiro-Ministro já o disse: Portugal não deve ter medo de dar este exemplo; quem não deve não
teme!
Portugal, apesar de muito dever, não deve temer em comprometer o seu Estado, os seus governantes, os
futuros governantes, a bem de todos os portugueses. É esta a primeira responsabilidade de um governo e de
um Primeiro-Ministro.
Estes últimos seis anos demonstraram que até agora assim não aconteceu. Ao não termos um
compromisso escrito e consagrado na Constituição, como compromisso maior com o povo português, tudo foi
permitido. Demo-nos ao luxo de devermos tudo a todos e de chegarmos a uma altura de não saber como
pagar tanta dívida acumulada.
E perante isto — pasme-se! — ainda hoje de manhã acordámos com declarações notáveis de um Vice-
Presidente da Bancada Socialista, Pedro Nuno Santos, que afirmava que «Na situação em que nós vivemos,
estou-me marimbando para os nossos credores, estou-me marimbando para o banco alemão que emprestou
dinheiro a Portugal nas condições em que emprestou (…) ou os senhores se põem finos ou não pagamos (…)
as pernas dos banqueiros alemães até tremem!»
António José Seguro só pode estar chocado com estas afirmações. Nós estamos, Srs. Deputados!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Estamos porque sabemos, tal como o PS sabe, que sem o dinheiro da ajuda internacional não podemos
pagar salários ou pensões; sem cumprirmos os nossos compromissos quem treme são os trabalhadores e os
pensionistas!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Partido Socialista foi pedir dinheiro, no início deste ano, para salvar este País e, passados meses, diz
querer pagar as dívidas. Lavam as mãos como Pilatos!
Perante tudo isto, temos ainda um antigo primeiro-ministro que, tal como Édith Piaf afirmava, vois la vie en
rose. Mas a vida, infelizmente, não se tem mostrado cor-de-rosa para todos ou para quase nenhuns.
Todos nós sabemos — até as crianças de hoje — que teremos de pagar uma dívida e sabemos que a
dívida do Estado é hoje, finalmente, «pública».
A dívida deste País não é uma mera ideia, é uma certeza com que teremos de conviver e que teremos de
saldar rapidamente.
Este Governo, ao contrário do que o Secretário-Geral do Partido Socialista afirma, bem como os seus vice-
presidentes, neste Plenário, não é apaixonado pela austeridade, mas sabe que tem de a fazer para salvar o
País de um colapso, que era certo no início deste ano.
As paixões duram pouco, o amor é sempre mais duradouro.
Nos últimos seis anos, o governo anterior amava as PPP e os seus encargos loucos, amava o TGV, um
novo aeroporto, uma nova travessia do Tejo, um aeroporto em Beja, os Magalhães, os custos das
apresentações do Museu dos Coches, as auto-estradas à porta de cada cidade, amava endividar o Estado a
um ritmo de 39 milhões de euros/dia, entre 2007 a 2011. Amor é, ou, melhor, era, tudo isto para o Partido
Socialista!…
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
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Um País que chega aos 700 000 desempregados, a um défice recorde, a um ritmo diário nunca antes visto
de falências de empresas ou a cerca de 5200 famílias entregarem, este ano, aos bancos, as suas casas, por
incapacidade de cumprimento da sua dívida, tem, de facto, de ter medidas excepcionais e de mudar de vida.
E mais à esquerda a que é que temos assistido? A uma esquerda sempre contra tudo! Um dia, talvez,
quando forem contra o contra, serão a favor de qualquer coisa.
O Sr. Luís Menezes (PSD): — Muito bem!
O Sr. Nuno Encarnação (PSD): — Uma esquerda que, por um lado, diz lutar a favor dos trabalhadores
mas é a primeira a incitar às greves neste País; que percebe que o País tem de ser mais produtivo, para salvar
o maior número de postos de trabalho, mas apela aos trabalhadores para não trabalharem e se manifestarem,
perdendo, eles próprios, a remuneração desse dia de trabalho. Isto será ser de esquerda? Então, Sr.as
e Srs.
Deputados, não se percebe o que é ser de esquerda!
O Sr. Luís Menezes (PSD): — Muito bem!
O Sr. Nuno Encarnação (PSD): — Isto é precariedade! Isto não é falar verdade aos trabalhadores!
Portugal não podia continuar a navegar nessa «jangada de pedra». Ia ao fundo num instante, tal era o peso
da sua construção.
Portugal sem rumo, sem rota, sem destino e sem pontuação não era, de facto, um País Nobel.
Um País pequeno, como Portugal (como diria Sócrates), tinha défices acima da média europeia e taxas de
crescimento da sua economia sempre abaixo da mesma.
A conclusão a que chegámos foi a de que Portugal se endividou em projectos que não fizeram crescer o
País como deviam, projectos que, para além de deixarem dívida, deixaram encargos com os seus custos, que
hoje temos de pagar, e encargos com as suas manutenções.
O Sr. Luís Menezes (PSD): — Muito bem!
O Sr. Nuno Encarnação (PSD): — Eras um projecto que criava emprego, qualquer que fosse o teu custo?
Adjudicávamos na hora! Eras um projecto que deixava dívida às crianças deste País? Pagaríamos, quando
pudéssemos! Eras um projecto com custos mais elevados? Nada fazíamos, era isso mesmo!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Foi com tudo isto que aqui chegámos, é com tudo isto que temos de viver.
Os partidos da oposição têm, hoje, essa enorme responsabilidade consigo, a de ajudar Portugal e os
portugueses.
Os governos não têm sempre a razão do seu lado, mas cabe à oposição, como alternativa democrática,
apresentar sempre alternativas credíveis que melhorem a governação deste País.
O Sr. Mota Andrade (PS): — Foi o que fizemos!
O Sr. Nuno Encarnação (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Hoje, é tão responsável quem
governa como quem se senta nas bancadas da oposição.
As medidas que temos aplicado, muitas delas provocam recessão, mas, por outro lado, contêm reformas
de que o País tanto necessita.
Estamos certos de que este é o único caminho possível para o nosso País. Para percorrer este caminho
precisamos de trabalhar em conjunto, sem recurso a qualquer «bomba atómica».
Os portugueses esperam do Governo e da oposição uma postura responsável, coerente e de
compromisso. Somos um povo com palavra e honra.
Vozes do PSD: — Muito bem!
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O Sr. Nuno Encarnação (PSD): — Cumprimos as nossas obrigações e nenhum português consegue
compreender que, em nome do confronto político e do discurso partidário, se coloquem em segundo plano os
interesses nacionais.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Todos devemos ser responsabilizados pelos nossos actos e palavras. O Partido Socialista tem, hoje, esta
obrigação perante o País.
Há declarações que, para além de inoportunas, são profundamente infelizes! Portugal e os portugueses
não podem perder tempo com protagonismos estéreis e discursos insensatos.
A união faz a força, as ideias constroem um País, as acções e as suas políticas são determinantes para
que o mesmo saia de um coma profundo.
Portugal não pode ser uma ilusão, nem tão-pouco os portugueses podem, jamais, ser iludidos de novo
pelos seus governantes.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Srs. Deputados, a Mesa regista a inscrição dos Srs. Deputados
Paulo Sá, José Junqueiro e Hélder Amaral, para formularem pedidos de esclarecimento ao Sr. Deputado Nuno
Encarnação.
Tem a palavra, em primeiro lugar, o Sr. Deputado Paulo Sá.
O Sr. Paulo Sá (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Nuno Encarnação, na sua declaração política, o
Sr. Deputado referiu-se às declarações do Deputado Pedro Nuno Santos, do PS, sobre o pagamento da dívida
externa de Portugal. Entendemos estas declarações do Vice-Presidente do Grupo Parlamentar do PS como o
reconhecimento — tardio, é verdade, mas o reconhecimento — de que o único caminho para tirar Portugal do
atoleiro em que se encontra é o caminho da renegociação da dívida externa.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. Paulo Sá (PCP): — Lembro aqui que foi o PCP o primeiro partido a propor a renegociação da dívida,
no dia 5 de Abril, em alternativa ao programa de agressão que o PS, o PSD e o CDS se preparavam para
negociar com a tróica externa. Dissemos, na altura, e reiteramo-lo hoje, aqui, que a renegociação da dívida era
absolutamente necessária para que Portugal pudesse canalizar recursos para a dinamização da produção
nacional. Só assim poderemos recolocar Portugal no caminho do desenvolvimento económico e do progresso
social.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. Paulo Sá (PCP): — Nessa altura, o PS e, aliás, os restantes partidos da política de direita disseram
«cobras e lagartos» da nossa proposta de renegociação da dívida, considerando-a irrealista e até
irresponsável. Vemos hoje, com agrado, que, embora tardiamente, o PS começa a perceber que o único
caminho possível é o da renegociação da dívida.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Ora aí está!
O Sr. Paulo Sá (PCP): — E a pergunta que lhe quero fazer, Sr. Deputado Nuno Encarnação, é a seguinte:
quando é que o PSD vai, finalmente, perceber aquilo que já é evidente para um número cada vez maior de
pessoas?
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Isso é complicado!
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O Sr. Paulo Sá (PCP): — Quando é que o PSD vai, finalmente, reconhecer que Portugal só terá futuro se
renegociar a sua dívida externa?!
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Srs. Deputados, a Mesa foi informada de que o Sr. Deputado Nuno
Encarnação opta por responder, em conjunto, aos três pedidos de esclarecimento, pelo que tem a palavra o
Sr. Deputado José Junqueiro.
O Sr. José Junqueiro (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Nuno Encarnação, a sua declaração política
não ilustra muito a sua pessoa, como Deputado, porque numa apreciação da vida política do País, invocou um
fait divers…
Vozes do PSD: — Um fait divers?!
O Sr. José Junqueiro (PS): — … para esconder o que era essencial.
Quero dizer-lhe o seguinte: estamos comprometidos com o rigor e a disciplina orçamental,…
Vozes do PSD: — Ah!
O Sr. José Junqueiro (PS): — … mas não podemos aprovar um Conselho Europeu em que, em vez de a
uma agenda para o crescimento e o emprego,…
O Sr. Mota Andrade (PS): — Muito bem!
O Sr. José Junqueiro (PS): — … os senhores se submetem a um desemprego imparável e a políticas de
austeridade que se somam a políticas de austeridade.
Aplausos do PS.
Protestos do PSD e do CDS-PP.
Gostaria de lhe dizer, a esse propósito, para invocar terceiros, que os senhores também não são
acompanhados, neste Orçamento do Estado para 2012, por personalidades importantes do PSD, como
Manuela Ferreira Leite, que não aprova a política orçamental e diz que, se existe consciência social, por parte
do PSD, isso não está espelhado no Orçamento do Estado para 2012.
Mas, ainda ontem, e hoje, Eduardo Catroga também diz que este Orçamento do Estado para 2012 não tem
qualquer solução para o crescimento e o emprego.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Teixeira dos Santos e Daniel Bessa dizem que é bom!
O Sr. José Junqueiro (PS): — Como é que o Sr. Deputado explica que o próprio Governo, nas suas
projecções, diga que o desemprego, para lá de 2025, continuará a ser superior a 10% e diga mesmo que o
desemprego estrutural, ou seja, o mínimo, aquele que existirá em Portugal mesmo com crescimento
económico, nunca cairá abaixo dos 7,3%?!
A minha pergunta é esta: Sr. Deputado, o que é que o Governo está a fazer? Onde é que está a agenda
para o crescimento e o emprego? Onde é que está a resolução dos problemas fundamentais do País? Está
nisto, em fait divers que o senhor traz a este Parlamento, apenas para tentar ofender Deputados, num
oportunismo inexplicável e inaceitável?!
Aplausos do PS.
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Protestos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado Hélder Amaral.
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Nuno Encarnação, quero felicitá-lo pela
declaração política que aqui fez, porque me permite não falar dos episódios lamentáveis a que fez referência.
A esse respeito, quero apenas dizer que, ainda agora, assistimos a um debate sobre a Cimeira Europeia e se
há conclusão que se pode tirar dessa Cimeira é a de que acabou a brincadeira.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — Não acabou, não! Infelizmente!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Ah! Isto era uma brincadeira?!
O Sr. João Oliveira (PCP): — Andavam a brincar?!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Voltamos à realidade e àquilo que, como o próprio Partido Comunista
acabou de dizer, deve ser o rigor, a serenidade, a exigência e o trabalho.
O Sr. Deputado Nuno Encarnação repetiu, duas vezes, no seu discurso, que é preciso convocar todos. O
Governo costuma dizer que não quer deixar ninguém para trás, e vai cumpri-lo, em relação a todo o País e a
todos os portugueses. Mas é preciso convocar todos os partidos da oposição, principalmente o maior partido
da oposição, para aquilo que deve ser uma excelente execução do Orçamento do Estado, de modo a que
possamos ter, a breve trecho, o tão desejado crescimento económico e a tão desejada recuperação da
economia.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É já a seguir! Até já estou a vê-la!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Podia citar aqui ex-ministros do Partido Socialista mas não o vou fazer,
porque entendo que não é isso que conta para a discussão de hoje. Aquilo que importa dizer hoje, nesta
discussão, é que há uma margem de crescimento. Ainda hoje, a União Europeia aceitou a reprogramação do
Quadro de Referência Estratégico Nacional (QREN) — são 600 000 € que teremos, só de retroactivos, e uma
comparticipação com 85%.
Quero convocar todos os partidos da oposição para que possamos fazer uma melhor execução do QREN
e, com isso, investir em empresas inovadoras e empreendedoras e, com isso, promover a criação de emprego.
Sei bem que isto não é matéria que vos interesse discutir, mas é isto que interessa às empresas, às famílias e
ao País.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Há medidas para capital de risco, principalmente para as empresas
inovadoras, há uma via rápida para o investimento e estranha-se que o Partido Socialista não o queira assumir
porque foi ele que assinou o Memorando e sabe o que é o Memorando. Mas também aqui importa fazer uma
mudança de discurso: precisamos de consenso para captar investimento estrangeiro e precisamos de
serenidade e bom senso para segurar os investimentos que existem.
Com isto, já agora, aproveito para lamentar — e pergunto-lhe se é ou não verdade, Sr. Deputado — porque
no Memorando com a tróica estão inscritas não só reduções de apoio ao sector automóvel mas também
aumento da tributação sobre a energia e, inclusivamente, o fim do apoio à compra, por exemplo, de carros
eléctricos.
O Sr. José Junqueiro (PS): — Não está lá nada disso! Nada disso está no Memorando!
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O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — E gostava de chamar à atenção do Partido Socialista, e à sua
responsabilidade, para que não tente baralhar a opinião pública e diga se o fim, a mudança ou o adiamento do
plano de investimentos de uma empresa é feito a pensar apenas e só no mercado nacional, depende apenas e
só do mercado nacional,…
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Claro que não!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — … depende apenas e só da vontade de um governo ou tem a ver com
uma ideia muito mais alargada do mercado global e da estratégia de investimento.
Termino, Sr.ª Presidente, dizendo o seguinte: os antigos responsáveis, que apelavam à serenidade, ao
bom senso e ao sentido patriótico para segurar o investimento estrangeiro, agora, prestam-se a algumas
afirmações que nada protegem aquilo que, no passado, defendiam. É esse esforço que solicitamos aos
partidos da oposição, porque só há uma forma de sairmos disto: todos juntos! Ninguém ficará satisfeito se
falharmos.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Encarnação.
O Sr. Nuno Encarnação (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado José Junqueiro, não fui eu que ofendi
alguém! Se houve alguém que ofendeu os portugueses, ao dizer que não queria cumprir o serviço da dívida,
foi o seu colega, que está sentado ao seu lado. Foi ele que, hoje, afirmou isso!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Mas alguém, neste País, pode imaginar que o Partido Socialista, que foi pedir dinheiro lá fora, no início do
ano, para que Portugal sobrevivesse, tem uma pessoa no seu núcleo duro, junto e próximo do seu líder, que
diga as enormidades que disse?!
O Sr. José Junqueiro (PS): — Responda ao que lhe perguntei!
O Sr. Nuno Encarnação (PSD): — «Não pagamos!»?! Antigamente, dizíamos «Não pagamos!» às
propinas! Há 20 anos atrás era assim! Mas «não pagamos» uma dívida de 78 000 milhões de euros?! O que é
que vem a ser isto, Sr. Deputado?!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Era o que o Passos Coelho dizia! Era o Passos Coelho que dizia «Não
pagamos!» às propinas!
O Sr. Nuno Encarnação (PSD): — Mais, Sr. Deputado, deixe-me que lhe diga que o Deputado Carlos
Zorrinho, hoje de manhã, veio em defesa do seu colega e disse uma coisa que me fez acrescer ainda mais
dúvidas. Disse o seguinte: a dívida tem de ser paga, mas não pode ser paga a qualquer preço. Então, mas,
afinal, o que é que está escrito no Memorando com a tróica? É que pagamos a dívida quando queremos? Não,
Sr. Deputado! Pagamos a dívida quando quisermos e quando nos apetecer?! É esta a dúvida que assalta o
PSD.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. José Junqueiro (PS): — Os senhores estão a pagar à custa do desemprego dos portugueses! É isto
que estão a fazer!
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O Sr. Nuno Encarnação (PSD): — Sr. Deputado Paulo Sá, as pessoas, os portugueses já perceberam
qual é o problema deles. É que, de facto, estão endividados até ao topo e têm de trabalhar mais e produzir
mais para haver maior riqueza e conseguirem safar-se disto rapidamente. É isto que o nosso Governo
pretende fazer!
O Sr. João Oliveira (PCP): — Os senhores assinam o cheque e os outros é que pagam!
O Sr. Nuno Encarnação (PSD): — Ainda bem que o Deputado Hélder Amaral recorda o episódio de ontem
da Nissan, porque também vos quero recordar o seguinte: ontem falou, pelo Partido Socialista, o Deputado
Basílio Horta, que foi ex-dirigente da AICEP (Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal) e
ex-dirigente da AIP (Agência Portuguesa para o Investimento)…
Vozes do PS: — E ainda é!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — E ex-dirigente do CDS!
O Sr. Nuno Encarnação (PSD): — Lembro-me que, em 2009, o Sr. Deputado Basílio Horta, em tempos,
trouxe, de facto, muitos investimentos para Portugal, e houve outros investimentos que não conseguiu trazer.
É normal, é natural que isso aconteça. E, ontem mesmo, foi explicado pelo governante português que a Nissan
adiou o seu projecto.
Pois recordo que o Sr. Deputado Basílio Horta, quando tivemos a conclusão do processo da empresa
AGNI, relativamente a um investimento que era feito em Montemor, no meu distrito de Coimbra, teve as
seguintes palavras, quando este projecto não foi para a frente. Mais, ainda: o projecto chegou a avançar, tem
uma nave construída e não chegou a ir para a frente por razões de dificuldade económica da própria empresa.
Ora, o Sr. Deputado Basílio Horta, na altura, referindo-se a esta empresa AGNI, disse o seguinte (que citarei
de uma notícia do semanário Sol): «Não vai haver nenhuma indemnização, pois não lhes demos um único
tostão». E disse mais: «As pilhas eram uma boa solução mas, por razões financeiras e tecnológicas, o
investimento foi suspenso».
Que diferença entre estas declarações e as declarações de ontem! Ontem, quis fazer um aproveitamento
político da situação. Há uns anos, não o fez.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — A Mesa tem conhecimento de que há dois Srs. Deputados da
bancada do Partido Socialista, o Sr. Deputado Pedro Nuno Santos e o Sr. Deputado Basílio Horta, que
pediram a defesa da honra pessoal. Nesse sentido, esses pedidos de esclarecimentos de defesa da honra
deverão ocorrer no fim do período das declarações políticas, mas já se encontram registados.
Sr.ª Deputada Inês de Medeiros, tem a palavra para uma declaração política.
A Sr.ª Inês de Medeiros (PS): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: «Agora, acabou a brincadeira!», dizem.
Então, vamos a isso!
Winston Churchill tinha uma máxima muito simples…
Protestos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Inês de Medeiros (PS): — Srs. Deputados, o meu tempo é escasso, portanto, agradeço que me
deixem prosseguir.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Aí é que acabou a brincadeira!
A Sr.ª Inês de Medeiros (PS): — Estou a citar Churchill, posso?…
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Protestos do PSD e do CDS-PP.
Winston Churchill tinha uma máxima muito simples que nenhum governo devia esquecer. Dizia ele: «A
estratégia pode ser bela mas não se esqueçam dos resultados.»
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Calma, calma!…
O problema com o actual Governo é que, em demasiadas matérias, nem a estratégia nem os resultados se
anunciam belos e nem salvaguardam o interesse nacional.
Aplausos do PS.
Protestos do PSD.
É o caso que, hoje, aqui trazemos e que tem suscitado numerosas reacções críticas na vida pública
portuguesa.
Mesmo usando argumentos diferentes, todas elas convergem no sentido de considerar que a obstinação
do Governo e, muito particularmente, do Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares, o Dr. Miguel
Relvas, em alienar um canal da RTP não faz sentido no contexto de grave crise económica que atravessamos
e pode vir ser perniciosa em termos de soberania nacional, não faz sentido face ao desempenho e à
consolidação orçamental da empresa RTP SA desde 2003; não faz sentido no contexto europeu. Nada o
justifica, nada o sustenta.
A estratégia desastrada, segundo a qual o Ministro Miguel Relvas tem conduzido este processo, devia
alertar-nos para a leviandade, a opacidade, a impreparação ou brincadeira com que o Governo se prepara
para fazer a alienação de bens estratégicos para o País. Os resultados anunciam-se, por isso mesmo,
desastrosos.
Não posso deixar de lembrar aqui as declarações do ex-ministro do PSD, Nuno Morais Sarmento, que,
numa entrevista concedida à Antena 1, há menos de um ano, afirmava, e passo a citar: «a privatização da
RTP só é falada ou por ignorância ou por defesa de interesses privados.»
Aplausos do PS.
Pedia, ainda, o antigo ministro que «os adiantados mentais que defendem a privatização» o elucidassem
sobre a relação custos-benefícios de tal operação.
Mesmo assim, o novo PSD, surdo as suas próprias vozes internas, insistiu no estranho desígnio de
desmantelar o serviço público de televisão.
Perante a evidente escassez de argumentos sólidos e credíveis que sustentem a sua intenção, o Sr.
Ministro Miguel Relvas criou um petit comité de sábios, porventura muito qualificados noutras matérias mas
não, certamente, nestas, na esperança de que estes lhe arranjassem as tão desejadas justificações.
Segundo as palavras do próprio coordenador, a premissa imposta para toda e qualquer reflexão era
sempre a mesma: a inevitabilidade da alienação de um canal. Perante tal condição, as pessoas mais
qualificadas naquele grupo demitiram-se e o relatório final foi o que se viu.
O melhor que se pode desejar àquele aglomerado de opiniões subjectivas e pouco fundamentadas, feitas
felizmente pro bono, é que nunca mais venha a ser citado.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Foram pro bono mas podem sair muito caras!
A Sr.ª Inês de Medeiros (PS): — Mas de qualquer maneira, aos olhos do Sr. Ministro, as conclusões do
grupo de trabalho já eram irrelevantes antes mesmo de existirem. Só assim se percebe que tenha pedido, em
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simultâneo, à Administração da RTP que elaborasse um plano de sustentabilidade económica e financeira
com a mesma premissa inicial.
Também aqui o resultado não foi brilhante. O chamado plano de sustentabilidade reduz-se a quatro
míseras folhinhas, sem um único orçamento ou estudo de impacto económico que o sustente. Mesmo assim, o
incansável Ministro Miguel Relvas optou por também desautorizar a Administração que acabara de reconduzir
e por descredibilizar o plano que acabara de aprovar.
Ao retirar a publicidade ao único canal de serviço público em sinal aberto, o Ministro pretendia atender a
interesses de grupos económicos, não hesitando, para isso, em penalizar o contribuinte, retirando à RTP um
dos pilares de sustentabilidade económica e financeira da empresa. Só que esses mesmos interesses
continuam cépticos quanto à oportunidade da sua intenção.
Apesar de tão empolgante folhetim, o facto é que continuamos sem perceber porque considera o Governo
uma prioridade alienar um canal da RTP. Que benefícios acha que vai trazer para o País desmantelar e tornar
residual uma empresa que representa 75 anos de história da rádio e 50 anos de história da televisão? Porque
se insiste em penalizar desta forma a única empresa pública que em Portugal foi reestruturada, de modo a dar
indicadores positivos quer em termos de eficiência de gestão quer em resultados operacionais? Que
vantagens encontra o Governo na introdução, neste preciso momento, de um novo operador?
Ainda segundo Morais Sarmento: «A plataforma tecnológica da RTP nas mãos de um operador privado
representa um desequilíbrio absoluto e uma vantagem posicional e técnica que seria incomportável para os
outros operadores.» Onde está, então, a racionalidade e transparência deste negócio? Será que o Governo
não sabe as consequências desastrosas que isso terá para o já fragilizado sector da comunicação social, dada
a diminuição do mercado publicitário, atingindo em cadeia televisões, rádios e jornais, sejam eles públicos ou
privados?
Mais: que vantagem acha o Governo que Portugal pode vir a ter em passar a ser o único país da Europa
cujo serviço público de televisão se reduz a um único canal aberto, de acesso não condicionado?
Incapaz de responder a qualquer uma destas questões, o Sr. Ministro optou por intoxicar a opinião pública
e até os Deputados da sua própria bancada com números faraónicos, o famoso milhão por dia que custaria a
RTP ao contribuinte português. O único senão desta linha de argumentação é que estes números não
correspondem à verdade. E quem o afirma é o Tribunal de Contas.
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: O PS sempre esteve disponível para apresentar uma estratégia de
redução de custos, mas ela só pode ser feita com seriedade, com base em números reais, não confundido
serviço da dívida e custos operacionais, não misturando, intencionalmente, os custos da televisão e custos da
rádio, não atribuindo os custos globais de todo o universo de oferta da RTP-RDP ao principal canal de acesso
livre que é a RTP 1, não inventando gangrenas para justificar uma amputação.
O tempo é curto e muito fica ainda por dizer.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — De facto, Sr.ª Deputada, já ultrapassou largamente o seu tempo.
A Sr.ª Inês de Medeiros (PS): — Vou já terminar, Sr.ª Presidente, mas não posso terminar sem relembrar
o consenso europeu sobre o que é e deve ser um serviço público de rádio difusão.
Um serviço público de rádio difusão saudável e sustentável é a garantia da coesão nacional, é um
elemento essencial para a defesa intransigente da liberdade de expressão e da protecção da diversidade e do
pluralismo, é, sobretudo, a garantia e um pilar do sistema democrático.
Pode um único canal aberto, de acesso não condicionado, cumprir essa missão? A resposta foi dada, há
poucos dias, pelo Sr. Presidente da Administração da RTP (agora, reconduzido), numa conferência, no último
dia 6 de Dezembro. Dizia ele: «Não faz sentido considerar o argumento financeiro para fechar um canal. Isso
significa uma redução drástica da escolha dos espectadores e uma perda de valor económico, prejuízo para o
Estado e para o contribuinte».
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr.ª Deputada, vai mesmo ter de concluir.
A Sr.ª Inês de Medeiros (PS): — A conclusão é apenas uma: estamos perante uma evidência, uma
péssima estratégia que só pode conduzir a péssimos resultados.
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Muito obrigada pela tolerância, Sr.ª Presidente.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — A Mesa regista inscrições para quatro pedidos de esclarecimentos,
por parte dos Srs. Deputados Bruno Dias, do PCP, Carla Rodrigues, do PSD, Raúl de Almeida, do CDS-PP, e
Catarina Martins, do BE.
Começo por dar a palavra ao primeiro orador inscrito, Sr. Deputado Bruno Dias. Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Inês de Medeiros, gostaria de começar por
saudar a intervenção que nos trouxe, por saudar a rejeição e a denúncia que aqui fez contra a privatização da
RTP.
Desde logo, porque ouvir o PS a intervir e a lutar contra as privatizações é um privilégio cada vez mais raro,
nos tempos que correm.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. Bruno Dias (PCP): — E bem gostaríamos de ter tido o PS na luta contra a privatização da EDP,
contra a privatização da REN, contra a privatização da TAP, contra a privatização dos Correios, contra a
privatização da ANA — Aeroportos de Portugal. Gostaríamos muito de ter tido o PS ao nosso lado na luta
contra as privatizações destas empresas estratégicas para o nosso País, para a economia nacional, para o
interesse do nosso povo e para o nosso futuro colectivo.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Infelizmente, tivemos o PS como agente activo da acção pela privatização
dessas empresas e desses serviços públicos, mas é muito gratificante termos o PS ao nosso lado na luta
contra a privatização da RTP. E dizemos isto com verdade, ao saber da importância que têm as convergências
de todas as forças que estejam na intervenção contra o ataque e contra o desmantelamento de que estão a
ser alvo o serviço público de rádio e de televisão e a estação pública de rádio e de televisão no nosso País.
Sabemos que vem de longe este ataque ao serviço público, vem do tempo do governo de Cavaco Silva,
nos anos 90, a referência no Programa do Governo da altura a um serviço público mínimo na comunicação
social, a um espaço mínimo para o serviço público, e no Governo PSD e CDS de Durão Barroso, no início da
década de 2000, havia a ideia da criação de apenas um canal generalista na RTP.
Portanto, esta é uma ideia que crise veio trazer como pretexto e como argumento mas para servir um
projecto e um objectivo que já vêm de longe. E apesar de o CDS, durante a campanha eleitoral e antes dela,
se ter pronunciado contra a privatização da RTP e de alguns dos seus canais, aqui temos um silêncio cúmplice
de um perigosíssimo atentado ao interesse nacional e à cultura portuguesa.
Gostaria de recordar que, há pouco mais de dois meses, o PCP voltou a trazer ao Plenário da Assembleia
da República, em declaração política, o nosso alerta contra essa ameaça da dita reestruturação, que foi
anunciada como plano de sustentabilidade, e esta semana o Sr. Presidente do Conselho de Opinião da RTP
veio dizer — e bem, no nosso entendimento — que nem é plano nem é de sustentabilidade, é um cenário,
como pode haver outros. E logo a seguir veio outro cenário, que era o fim da publicidade na RTP, ou seja, a
dívida da RTP seria paga não com o dinheiro da publicidade mas, sim, com o dinheiro dos contribuintes.
Portanto, há aqui uma falta total de credibilidade, há aqui uma falta total de seriedade e há aqui,
inclusivamente, uma falta total de respeito pela Assembleia da República, pelo País e pelos trabalhadores da
RTP.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr. Deputado, pedia-lhe que tivesse também respeito pelos tempos.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Agradeço-lhe a tolerância e peço desculpa, Sr.ª Presidente.
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Termino dizendo que ficámos a saber esta semana — e isto é muito grave para a Assembleia da República
— que, afinal de contas, existe um processo de reestruturação oficialmente desencadeado pelo Governo junto
dos sindicatos, desmentindo as próprias palavras proferidas pelo Sr. Ministro nesta Casa, pelo que importa
clarificar e esclarecer o que está a acontecer. Gostava de ouvir uma palavra da Sr.ª Deputada Inês de
Medeiros a este respeito.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — A Sr.ª Deputada Inês de Medeiros informou a Mesa que pretende
responder a grupos de dois pedidos de esclarecimento, pelo que tem agora a palavra a Sr.ª Deputada Carla
Rodrigues, para efectuar o seu pedido de esclarecimento.
A Sr.ª Carla Rodrigues (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Inês de Medeiros, há, de facto, grandes
diferenças entre o PS e o PSD e essas diferenças ficaram bem evidentes na sua declaração política: o PS
conduziu o País a um défice nunca antes visto, o PSD está a trabalhar para o reduzir; o PS está a marimbar-
se para a dívida e para os credores, o PSD está a assumir os nossos compromissos e a recuperar a
credibilidade do País;…
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
… o PS defende a RTP com discursos exaltados, com palavras duras, com agitação, o PSD defende a
RTP com actos corajosos, com medidas concretas, com a serenidade que os argumentos nos conferem. Estas
são muitas das diferenças que existem entre nós.
Sr.ª Deputada, a sua declaração política é precipitada e contraditória. É precipitada porque ainda o
Governo não anunciou o que vai fazer e como vai fazer e já o PS, à falta de outros argumentos para marcar a
agenda política, se apressa a criticar, se apressa a atacar acerrimamente, se apressa a arregimentar tropas
para o combate; e é contraditória porque, por um lado, antecipa-se às medidas e, por outro lado, queixa-se de
que não sabe os pormenores dessas mesmas medidas, que ainda não foram tomadas.
Vozes do PSD: — Muito bem!
A Sr.ª Carla Rodrigues (PSD): — Sr.ª Deputada, sabemos que este assunto é, de facto, apaixonante, pois
a RTP é muito querida de todos os portugueses e é muito querida também do PSD, mas não deixemos que as
paixões nos toldem a razão.
Vozes do PSD: — Muito bem!
A Sr.ª Carla Rodrigues (PSD): — Por isso, pergunto-lhe, Sr.ª Deputada: será que a existência de dois
canais é por si só garante de melhor serviço público? Será que devemos privilegiar a quantidade em
detrimento da qualidade? Não estará a Sr.ª Deputada a esquecer-se da RTP Internacional e da RTP África?
Isso não é serviço público? Isso é serviço residual, nas suas palavras? O Governo já manifestou a intenção de
reforçar esses serviços. Isto não lhe merece nenhum comentário?
A RTP, Sr.ª Deputada, não é só o canal 1 ou o canal 2, há todo um universo de serviços, de canais, de
rádio, de que V. Ex.ª se está a esquecer. Todos estes serviços, no seu entendimento, são residuais?
Sr.ª Deputada, onde estava a paixão do PS pela RTP quando conduziu o País à situação em que nos
encontramos e que nos obriga a tomar medidas duras, a exigir sacrifícios aos portugueses e também a exigir
sacrifícios às empresas públicas? Onde estava a paixão do PS pela RTP nesse momento?
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Inês de Medeiros.
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A Sr.ª Inês de Medeiros (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Bruno Dias e Sr.ª Deputada Carla
Rodrigues, agradeço as questões que me colocaram.
Sr. Deputado Bruno Dias, começando por responder à questão que me colocou no final da sua intervenção,
diria que é evidente que estamos interessados em saber se existe esse plano de reestruturação, que não
conhecemos. Nesse sentido, vamos pedir também essa informação e até acompanhamos o PCP, que já fez
esse pedido. Só lamento, Sr. Deputado, que na sua intervenção volte a esquecer isto e ache prioritário
começar por atacar o PS, em vez de concentrar-se na questão que aqui nos une de forma indiscutível, a
defesa absoluta do serviço público.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Não vão ter muita sorte!…
A Sr.ª Inês de Medeiros (PS): — Não há muita coisa que nos una, Sr. Deputado, por isso, pelo menos,
salvaguardemos as poucas que existem!
Sr.ª Deputada Carla Rodrigues, é evidente que há grandes, grandes diferenças entre o PS e o PSD —
quanto a isto não tenha menor dúvida!…
Vozes do PSD: — Ainda bem!
A Sr.ª Inês de Medeiros (PS): — Porém, há menos diferenças entre o PS e certos elementos, certos
dirigentes importantes, certos antigos ministros do PSD do que entre o PS e o actual PSD, e isso é que acho
estranho! Se ouviu bem, citei o Dr. Nuno Morais Sarmento, com quem não posso estar mais de acordo quanto
a tudo o que ele disse! Portanto, se há aqui uma divergência não é entre mim e o Dr. Nuno Morais Sarmento,
que, pelo que sei, ainda é do PSD, é entre a Sr.ª Deputada, a sua bancada e o Dr. Nuno Morais Sarmento —
e, já agora, o Sr. Ministro Miguel Relvas.
Sr.ª Deputada, esse discurso de misturar com esta questão a ruína do País, o fosso da dívida… Sr.ª
Deputada, não temos feito outra coisa senão pedir números! Sr.ª Deputada, diga-me quanto é que o País vai
ganhar com esta alienação. Quanto?
A Sr.ª Carla Rodrigues (PSD): — Esperem para ver!
A Sr.ª Inês de Medeiros (PS): — Quanto é que a RTP vai ganhar com essa alienação? Quanto é que vão
ganhar os contribuintes portugueses por o Estado retirar a publicidade da RTP?
Sabe, Sr.ª Deputada, não basta dizer que se reduz um canal, não basta dizer que se retira a publicidade.
Quem é que acha que vai pagar o montante da publicidade que não é coberto? Não serão os contribuintes
portugueses? Explique isso!
A Sr.ª Carla Rodrigues (PSD): — Espere!
A Sr.ª Inês de Medeiros (PS): — Estamos mais do que disponíveis para que os senhores e o Sr. Ministro
Miguel Relvas nos venham dizer claramente, em vez de apresentar quatro folhinhas miseráveis — já fizemos
este pedido várias vezes e não obtivemos resposta –, qual é o orçamento, qual é o plano económico-
financeiro. Se a Sr.ª Deputada tiver essa informação, agradecia-lhe que ma desse.
Portanto, retribuo-lhe a pergunta: quanto é que o País vai poupar com isto? Quanto é que o contribuinte vai
poupar com isto?
Uma voz do PSD: — Quanto é que paga agora?
A Sr.ª Inês de Medeiros (PS): — Quanto é que a RTP vai ganhar com isto?
Sr.ª Deputada, estamos a falar de um canal de acesso livre. Não venha falar-me da RTP Internacional, que
é muito importante, da RTP Informação, que será muito importante. Estamos a falar de um canal de acesso
livre para todo e qualquer português, e é esse canal que estamos a amputar, é essa liberdade de escolha que
estamos a limitar.
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A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr.ª Deputada, peço-lhe que conclua.
A Sr.ª Inês de Medeiros (PS): — Sr.ª Deputada, como isto é uma extraordinária bizarria no contexto
europeu, espero que o PSD e o CDS — que, aliás, tem estado estranhamento calado em relação a anteriores
posições — me expliquem qual é a vantagem de sermos tão inovadores nesta matéria, ficando isolados.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem a palavra o Sr. Deputado Raúl de Almeida para um pedido de
esclarecimento.
O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Inês de Medeiros, devo confessar-lhe
que tive as melhores expectativas quanto à intervenção de V. Ex.ª quando começou por citar Winston
Churchill.
Vozes do CDS-PP: — Exactamente!
O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — Infelizmente, a partir daí foi sempre a descer!
Vozes do PS: — Ah!…
O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — Sr.ª Deputada, se tivesse querido trazer aqui a discussão do serviço
público, sublinhando a importância de um bom serviço público de rádio e televisão em Portugal, teria
certamente o nosso aplauso, a nossa colaboração. Porém, Sr.ª Deputada, não acreditamos que seja sério
mascarar uma discussão de manutenção e de preservação de um bom serviço público com a criação deste
sofisma da eventual alienação de um dos canais de televisão em Portugal.
Devo lembrar-lhe, Sr.ª Deputada, que a reestruturação da RTP resulta de um plano de reestruturação e de
sustentabilidade apresentado pelo conselho de administração da empresa. E devo lembrar-lhe também que
esse conselho de administração, que tem vindo a fazer um bom trabalho, não é sequer uma invenção do PSD,
do CDS ou do Governo actual.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — O que nos interessa, Sr.ª Deputada, é saber se estamos aqui unidos
pelo interesse de manter um serviço público de televisão com qualidade, onde seja defendida a cultura, onde
sejam defendidas as artes, onde seja defendido o cinema de produção nacional e europeia, onde sejam
protegidas as diferentes modalidades desportivas, onde as diferentes regiões do País tenham
representatividade e onde haja uma informação séria, credível e rigorosa, ou se, pelo contrário, andamos aqui
à volta a dizer que isto é impossível de fazer com um canal ou que isto é possível fazer com dois canais.
Parece-nos que é de uma pobreza confrangedora, Sr.ª Deputada, tentar reduzir esta questão à existência de
dois ou de um canal. É que posso perguntar-lhe se o que existe hoje é serviço público de qualidade, em
termos de televisão e de rádio em Portugal.
O que nos interessa para o futuro, Sr.ª Deputada — e é isto que é importante sabermos –, são os
conteúdos. O serviço público está baseado ou não, definitivamente, na qualidade e no conteúdo daquilo que é
fornecido ao telespectador ou na quantidade, no número de canais?
Por fim, porque o dinheiro é importante — os canais podem ser de livre acesso mas o dinheiro vem sempre
dos contribuintes, e somos todos nós que pagamos a televisão que temos –, há que saber se não é mais
lógico, se não é mais racional e responsável projectarmos para o futuro uma RTP que seja sustentável, cuja
existência seja prolongável no tempo e na prestação de serviço público ou se vamos manter um status quo de
despesismo e que o País e os contribuintes portugueses manifestamente não têm dinheiro para pagar.
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Aplausos do CDS-PP e do PSD.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada
Catarina Martins.
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Inês de Medeiros, começo por
cumprimentar o PS por ter trazido o tema da RTP hoje a debate no Plenário.
Vou dizer algo que é óbvio para os Srs. Deputados da maioria, que estão a fazer um esforço tremendo e
que, se calhar, se clarificássemos as coisas, isto ficava tão mais fácil para todos nós! O plano que o Governo
anunciou não tem nada a ver com o serviço público de rádio e televisão, como sabem, tem a ver com uma
promessa que o Ministro Miguel Relvas fez a alguém de lhe entregar um canal da RTP!
O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — Isso é falso!
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Portanto, vamos ser claros: sabemos que esta ideia obtusa não tem
qualquer apoio, nem sequer na maioria que suporta o Governo! Sabemos disso porque sabemos que esta é
uma ideia completamente estapafúrdia, que vai contra toda a experiência, que vai contra toda a sensatez, que
vai contra até o universo das possibilidades. Há um Ministro que prometeu um canal a alguém e quer fazer
uma batota gigantesca para entregar esse canal, mas não tem apoio e não pode ter apoio! É disso que se está
aqui a falar!
Estamos a dizer que na altura da introdução da televisão digital terrestre em Portugal, numa altura de
multiplataformas, numa altura em que o serviço público de rádio e de televisão em todo o mundo se multiplica,
a RTP vai ficar com menos um canal? Mas isto faz sentido na cabeça de alguém?!
Estão a dizer-nos que há um plano para alterar a RTP com base em contas que não correspondem à
verdade, nem sequer àquelas que são ditas pelo Tribunal de Contas, quanto mais para uma análise mais
profunda e para uma projecção no tempo do que é o sector da comunicação social.
Estão a dizer-nos que vamos alterar a RTP com base num plano que se chama de sustentabilidade
económico e financeira e não tem um único número? Mais: é um plano que dizia que a RTP mantinha a
publicidade, mas o Sr. Ministro já veio dizer que, afinal, a RTP não vai ter publicidade!
Os Srs. Deputados da maioria ficaram tão espantados como o Bloco de Esquerda quando souberam que a
RTP estava em reestruturação, porque o BE tinha pedido o plano de reestruturação da RTP e o Ministro
Miguel Relvas disse que não havia nenhuma reestruturação. Mentiu ao Parlamento, mentiu ao BE mas mentiu
também aos Deputados da maioria!
É disto que estamos a falar, da teimosia de um Ministro que fez uma promessa que não explica, que está
por explicar e tem de ser explicada, de entregar um canal. Para a RTP não está em jogo ficar tudo como está
ou fazer este plano. Não!
Pergunto ao PS se não concorda que está na altura de fazermos um debate sobre o que é o serviço
público de rádio e televisão. O BE já tentou começar este debate antes, porque é um debate que é preciso
fazer. Vivemos numa realidade tecnológica nova, numa realidade social nova e um serviço público de rádio e
televisão tem de responder a essa necessidade, mas para isso temos de ter duas coisas certas: não se aliena
um canal numa altura em que todos os serviços têm de ter mais canais — é ilógico; altera-se a RTP fazendo
discussão pública sobre serviço público e não por promessas de algum Sr. Ministro não se sabe muito bem a
quem.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Inês de Medeiros para responder.
A Sr.ª Inês de Medeiros (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Raúl de Almeida, penso que o CDS
sempre se pronunciou, até esta Legislatura e este Governo de coligação, frontalmente contra a privatização da
RTP. Não estou errada, pois não? É que me lembro de uma declarações da agora Secretária de Estado
Cecília Meireles peremptoriamente contra. Quero só relembrar isto porque houve uma grande alteração.
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Queria ainda relembrar — até para responder a uma questão da Sr.ª Deputada Carla Rodrigues, à qual não
tinha respondido, quando diz que os números que apresento ainda não foram anunciados pelo Governo —
que o PS pediu a vinda do Sr. Ministro ao Parlamento para explicar e, curiosamente, foram os partidos da
maioria que chumbaram a vinda do próprio Ministro para vir dar explicações. Também não estou errada, pois
não?… Queria só esclarecer este pequeno assunto.
Depois, relembro outra coisa: pedem-me para justificar a necessidade da existência de um só canal
televisivo. Permito-me reverter a questão, porque é de uma tal originalidade! Aliás, com a televisão digital
terrestre, todos os países aumentaram a sua oferta de serviços públicos em canal aberto, e nós seremos o
único país da Europa, senão mesmo do mundo, a decidir reduzir essa oferta. Não acham que, se calhar,
seriam os senhores que deveriam justificar o bem fundado desta decisão? É porque posso dar-lhe imensos
relatórios internacionais a explicar-lhe o porquê: a evolução tecnológica, as novas técnicas de programação
para as diversas plataformas… Mas não tenho tempo para isso, Sr. Deputado. Se estiver interessado, mando-
lhe imensos links, imensas referências, mas acho que são os partidos da maioria que devem explicar por que
razão insistem nesta ideia, Sr. Deputado, que é abstrusa, incoerente e economicamente insustentável!!
E continuo a dizer que, se querem manter a RTP, quanto vai custar essa manutenção? O que vamos fazer:
dar parte a um privado? Vamos criar uma parceria público-privada, com a nova empresa de Meios dentro da
RTP? É a isto que os senhores chamam «boa gestão»? Vamos saldar a dívida, que será paga e deve ser
paga, já sabemos, pelos contribuintes, para não haver problemas, para depois tirar a publicidade, uma fonte
de financiamento e onerar ainda mais o contribuinte? Onde está a lógica financeira? Repito: onde está a lógica
financeira?!…
Sr.ª Deputada Catarina Martins, como sabe, estamos sempre disponíveis para discutir o que é um serviço
público, sobretudo nesta nova fase, e achamos, de facto, necessário. Mas os senhores também sabem até
que ponto os partidos da maioria têm sistematicamente vetado qualquer possibilidade de reflexão séria, não
unicamente numa perspectiva que não é nacional, mas absolutamente local, e que se resume, no fundo, à
obsessão de um Ministro…
Não vou especular sobre as razões, só constato que há uma obsessão de um Ministro que se recusa a
encarar a produção de conteúdos, a questão internacional, a questão dos direitos dos jornalistas, a questão da
produção nacional.
Tudo isto fica de fora. Acho extraordinário que depois aqui, em Plenário, venham falar nesses temas que
recusaram debater em sede própria.
Aplausos do PS.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Só é pena não falar do resto das PPP — a TAP, a REN, a ANA…!
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Abel
Baptista.
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Neste, que é o último dia em
que há declarações políticas no ano de 2011, o CDS traz a este Plenário, novamente, o tema da agricultura.
Habitualmente vinha aqui apontar falhas e erros ao Ministério da Agricultura. Felizmente, agora é diferente:
existe um Ministério que em seis meses deu resposta a algumas falhas que o governo sob a liderança do PS
não resolveu ou criou, nos últimos seis anos.
Aplausos do CDS-PP.
Continuamos a defender e a achar que um país tem de ter uma agricultura produtiva e competitiva, tem de
ter práticas e políticas que ajudem os agricultores e que evitem a devolução de verbas à União Europeia ou o
pagamento de multas por omissão de Portugal.
Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: O sector primário é o alicerce da actividade económica em diversas
vertentes.
No CDS não esquecemos que é prioritário que o Estado pague atempadamente aos agricultores.
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No CDS não esquecemos que nos comprometemos a investir a parcela nacional (via Orçamento do
Estado) que viabiliza a aplicação dos fundos comunitários.
No CDS não esquecemos que a agricultura é estratégica na recuperação económica.
No CDS não esquecemos que a agricultura, segundo dados da OCDE, representa mais de 10% do produto
e mais de 15% do emprego.
No presente cenário económico, a agricultura e a floresta podem dar um contributo enorme para o
crescimento e a redução do endividamento.
Por isso saudamos o Governo pelas medidas positivas que tem vindo a implementar nestes primeiros
meses de funções.
No caso do parcelário agrícola, estamos no caminho certo, com o pagamento de 80% das ajudas directas
em Dezembro deste ano, ao qual as mesmas dizem respeito, o que é de saudar.
O Ministério da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território iniciou, em Julho, um
trabalho de grande vulto para resolver, de uma vez por todas, os erros do parcelário agrícola. Desde essa data
que, em conjunto com as associações de agricultores e direcções regionais, foram já revistas um total de
cerca de 1 370 000 parcelas, num universo de 1 600 000, ou seja, mais de 85% do parcelário agrícola. É
admirável!
Quero aqui deixar, porque é justo e merecido, uma palavra de apreço e reconhecimento aos funcionários
das direcções regionais e às associações de agricultores pelo excelente e proveitoso trabalho desempenhado.
O PS não resolveu este problema, aliás, foi quem o criou, porque o parcelário estava cheio de erros e
esteve na base de avultadas multas que a Comissão Europeia aplicou e quer aplicar a Portugal. O evitar pagar
mais multas e negociar a redução das anteriores é uma das grandes prioridades nacionais, manifestada pelo
Governo.
Este trabalho de resolver os erros do parcelário é tanto mais importante quanto o facto de que, se não
fosse realizado, não haveria lugar a qualquer pagamento das ajudas directas, onde se inclui o RPU (Regime
de Pagamento Único), no mês de Dezembro, que só foi possível graças às correcções feitas ao parcelário.
Estava, assim, em risco o Estado não poder honrar os seus compromissos por negligência da governação
do PS, que anunciava medidas e fixava datas para pagamento sem dotar o Orçamento das verbas
necessárias para as concretizar, quando as medidas exigiam uma comparticipação nacional, e sem resolver
os problemas de fundo, como é o caso dos erros do parcelário, que poriam em causa as verbas 100%
comunitárias dos nossos agricultores.
Ora, seguindo as políticas e inacção do anterior executivo, não seria possível, neste mês, o pagamento de
315 milhões de euros de RPU, e para o total das ajudas directas, onde se inclui esse mesmo RPU, de quase
400 milhões de euros. Sim, são 400 milhões de euros pagos aos agricultores que têm direito a estas ajudas,
correspondendo a 80% do valor, e já na posse dos agricultores, pagamento feito na passada semana!
É verdade que, sem este esforço de corrigir o parcelário, a União Europeia não permitiria fazer quaisquer
pagamentos.
E sabem porque é que o Estado não pôde pagar na totalidade aos agricultores, ou seja, os 100%? Porque
é preciso fechar o trabalho e revalidá-lo, trabalho que não foi feito durante os governos socialistas, durante
seis anos! Repito: não foi feito pelo Partido Socialista durante seis anos!!
Em seis meses, com o actual Governo, resolveu-se um grave problema e garantiu-se o pagamento duma
parte substancial, 80%, o qual, se nada se tivesse feito, não teria sido pago e de certeza que ao Estado
português seriam aplicadas novamente multas.
É ainda de realçar que está em curso a finalização de todo o processo de correcção do parcelário, o
posterior controlo de qualidade e o seu fecho global no princípio do próximo ano, altura em que serão
liquidados os restantes 20% aos agricultores.
Por fim, e uma vez que o Ministério da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território
resolveu este problema deixado pelo PS, vai o pagamento das ajudas directas devido aos agricultores passar
a ser feito sempre em Dezembro do ano a que a ajuda diz respeito. Pela primeira vez,…
O Sr. Miguel Freitas (PS): — Não é verdade!
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O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — … depois de tantos anos, pagar a tempo e horas aos agricultores será
um lema do actual Governo, inscrito no seu Programa e cumprido!
O Sr. Miguel Freitas (PS): — Não é verdade!
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: No que ao Programa de
Desenvolvimento Rural (PRODER) diz respeito, o Governo conseguiu desbloquear, em Outubro, os 38
milhões de euros para o Ministério da Agricultura que eram necessários para acomodar a comparticipação
nacional do Programa de Desenvolvimento Regional, o que significa que se conseguirão executar os 153
milhões de euros previstos no Orçamento do Estado de 2011 para o PRODER, cuja verba inscrita no
Orçamento deste ano, como se lembrarão, foi lá colocada por pressão do CDS, e agora é de louvar que o
Ministério da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território execute toda essa verba e que,
no actual contexto de fracas disponibilidades financeiras, tenha conseguido desbloquear mais 38 milhões de
euros e executar toda a mesma verba.
Absolutamente central, como é o investimento, o Orçamento não encolheu, estando-se, assim, a apoiar a
agricultura e os agricultores e a dinamizar a economia.
Os 153 milhões de euros executados em 2011 permitirão alavancar uma despesa pública de quase 700
milhões de euros de apoio ao investimento. Isto é um sinal positivo para os agricultores e agricultura
portugueses: é sinal de que a agricultura é uma área que o Governo vê como de investimento e crescimento
económico, é uma área onde podemos encontrar alicerces para sair da crise e na qual o Governo fortemente
aposta.
Para terminar, quero deixar uma nota de que este trabalho tem sido feito, com total empenho, pelo
Ministério da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território, em colaboração com as
organizações de produtores. O Ministério da Agricultura é hoje um parceiro dos agricultores e das suas
organizações.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Srs. Deputados, neste momento a Mesa regista dois pedidos de
esclarecimento, do Sr. Deputado João Ramos e do Sr. Deputado Miguel Freitas.
Tem a palavra o Sr. Deputado João Ramos.
O Sr. João Ramos (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Abel Baptista, quero saudá-lo
por trazer aqui a temática da agricultura e, efectivamente, traz uma matéria pertinente, que é a do parcelário
agrícola, cuja resolução é importante para a agricultura portuguesa. Até estranhamos que o CDS, mas
também o PSD, não tenham já resolvido mais problemas, porque enquanto eram oposição pareciam ter as
soluções para todos os problemas!…
Protestos do CDS-PP.
Agora bastava que implementassem as propostas que fizeram para podermos estar mais adiante.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Ora bem!
O Sr. João Ramos (PCP): — O Sr. Deputado traz-nos também a questão do PRODER, mas esquece-se
de um pequeno problema: o de que, com a redução dos 25% para 15% da comparticipação nacional, Portugal
e a agricultura portuguesa perdem 300 milhões de euros de investimento público…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Ora bem! Ora bem!
O Sr. João Ramos (PCP): — Aí o Governo não contestou esta redução!
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Mas o Sr. Deputado também não falou dos 2 milhões de euros de redução, no âmbito da rede rural
nacional, com problemas que é preciso resolver e os 20% de RPU que é preciso pagar. Aqui a
responsabilidade não é do anterior governo, porque foi já este Governo que prometeu pagar aos agricultores
estes 20% e ainda não o fez.
Protestos do CDS-PP e do PSD.
O Sr. Deputado esqueceu-se também de referir uma matéria importante, que é a questão do sector leiteiro,
para o qual o CDS sempre exigiu um plano de emergência. No entanto, já está há estes meses todos no
Governo e o plano de emergência ainda não foi gizado!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Não emergiu!
O Sr. João Ramos (PCP): — Por isso, o que dizemos é que o Sr. Deputado começou por dizer que
costumava ir à tribuna fazer críticas à política agrícola e à política do governo sobre matéria de agricultura,
hoje não o fez, mas não é porque não haja problemas na agricultura. Hoje só não o fez, porque o Sr. Deputado
antes estava na oposição e agora o seu partido está no Governo e tem claras responsabilidades em matéria
de agricultura.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Freitas.
O Sr. Miguel Freitas (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados, Sr. Deputado Abel Baptista, por
simpatia, gostaria de começar esta minha intervenção com qualquer coisa com a qual concordasse na sua
intervenção, mas, na verdade, hoje tenho alguma dificuldade, porque não reconheci, na sua intervenção,
nenhuma verdade.
A primeira das confusões que o Sr. Deputado fez foi na relação entre o pagamento de RPU e as
correcções do parcelário agrícola. Uma coisa nada tem a ver com a outra!
As correcções do parcelário têm a ver com as multas; pagamentos de multas e subutilizações. Nada têm a
ver com o pagamento, que é feito independentemente da correcção do parcelário.
Gostaria que, sobre esta matéria, fossemos sérios no que dizemos.
Em segundo lugar, disse o Sr. Deputado que nunca foram pagos os RPU nos prazos. Sr. Deputado, foram
sempre pagos dentro do prazo estipulado.
Protestos do CDS-PP.
O ano passado foi pago a 2 de Dezembro e este ano, como sabe, foi pago no último dia, a 9 de Dezembro.
Gostaria de até me congratular com o Governo por ter feito isso, porque é importante para os agricultores
terem acesso a essa verba.
Ainda sobre o parcelário, Sr. Deputado, o que ouvi do discurso do Governo, durante estes últimos meses, é
que iriam fazer em seis meses o que o governo do PS não tinha feito em seis anos. Parece que, afinal, não
fizeram… Ou seja, o Sr. Deputado vem dizer hoje à Assembleia da República que o Governo não cumpriu com
o que se tinha comprometido com os agricultores portugueses, porque o parcelário não vai estar pronto a 31
de Dezembro.
Neste ponto, tenho, naturalmente, uma preocupação, que é o facto de o CDS ser vítima daquilo que foi o
seu discurso permanente no passado. Em vez de diabolizar os governos portugueses sobre esta questão,
devia ter dito muito claramente a Bruxelas que, de facto, este sistema das pequenas agriculturas não
corresponde às necessidades do País.
O Sr. Deputado deu aqui a ideia de que o problema está resolvido e de que para o ano não vamos pagar
multas. Espero que seja assim, Sr. Deputado. Vamos hoje, neste debate, marcar essa sua intervenção, ou
seja, de que parece que tudo está feito e de que no próximo ano não vão existir penalizações.
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No entanto, receio que assim não seja e que as penalizações no próximo ano sejam gravíssimas, porque
os senhores, quando chegaram ao Governo, em vez de terem aproveitado o que já estava feito pelo governo
anterior, reviram todos os protocolos que existiam com as associações de agricultores, começaram tudo de
novo, atrasaram dois meses na revisão do parcelário e, portanto, corremos o risco, de facto, de não
corresponder às exigências da União Europeia.
Sr. Deputado, quero ainda chamar-lhe a atenção para uma outra questão que aqui não trouxe e que tem a
ver com o PRODER, que, neste momento, tem atrasados 80 milhões de euros de pagamentos aos
agricultores. Desde o dia 31 de Agosto que não pagam um tostão de PRODER — um tostão!!
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr. Deputado, peço-lhe para concluir, pois já ultrapassou em mais de
1 minuto o tempo de que dispunha.
O Sr. Miguel Freitas (PS): — Vou terminar, Sr.ª Presidente. Permita-me apenas que conclua uma última
ideia.
Os senhores dizem que têm mais 38 milhões de euros. Sr. Deputado, estou aqui hoje a dizer-lhe, olhos nos
olhos, que não os vão utilizar até ao final do ano. Mas, no princípio do ano, cá estaremos para voltar a
conversar sobre o assunto!
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Pedro do
Ó Ramos.
O Sr. Pedro do Ó Ramos (PSD): — Sr.ª Presidente, relativamente à questão do parcelário agrícola, o Sr.
Deputado Miguel Freitas vem dizer uma coisa espantosa: que só se irão concretizar 85%!…. No entanto, Sr.
Deputado, em seis anos, os senhores fizeram zero! O governo do Partido Socialista deixou protocolos
assinados, mas de trabalho efectivo fez zero! E agora vem dizer que 85% é curto?… É espantoso!!
Aplausos do PSD.
Sr. Deputado, é muito difícil explicar aos agricultores portugueses que os 160 milhões de euros de coimas
que temos de pagar não são aplicados directamente na agricultura portuguesa, porque temos de os inscrever
para pagar multas a Bruxelas. Percebemos, hoje de manhã, que, para o Partido Socialista, pagar a dívida não
interessa…, assim como já percebemos que não receber dinheiro de Bruxelas também não interessa! Ou seja,
correr o risco de não receber verbas da União Europeia é absolutamente indiferente para o Partido Socialista.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Pedro do Ó Ramos (PSD): — Para nós, é fundamental cumprir com este acordo, porque sabemos,
assim como o Sr. Deputado sabe, que estava em causa o Regime de Pagamento Único. O anterior governo foi
avisado de que, se não corrigisse o parcelário, estava em causa o pagamento do RPU. Sr. Deputado, não
venha agora dizer que uma coisa não tem nada a ver com a outra!!
A verdade é que este Governo teve de fazer isso em seis meses com a dificuldade acrescida de ter de
envolver as associações de agricultores e as direcções regionais de agricultura.
Sr. Deputado, arrumar a casa, fazer os pagamentos do PRODER, corrigir o parcelário agrícola, pagar as
medidas agro-ambientais é uma enorme diferença relativamente aos anteriores governos. Agora, os
agricultores portugueses precisam de estabilidade e de questões previsíveis,…
O Sr. Miguel Freitas (PS): — De pagamentos!
O Sr. Pedro do Ó Ramos (PSD): — … e com os anteriores governos não tínhamos estabilidade nem
questões previsíveis.
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Com este Governo, sabemos com o que contamos e que os agricultores, de certeza absoluta, vão ter
dinheiro para investir na agricultura, ao contrário do anterior governo que deixou buracos na agricultura e
executou os programas em 0%.
Sr. Deputado Abel Baptista, pergunto-lhe, para terminar, se não considera um erro político, um «suicídio»
político e financeiro que se tivesse começado a pagar o RPU sem se iniciar o processo de revisão do
parcelário. Provavelmente, isso não seria aceite e, do ponto de vista da credibilidade externa do Estado
português, seria um grande «suicídio».
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Abel Baptista.
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Miguel Freitas, sei que sou da província e
que, às vezes, não uso uma linguagem tão erudita quanto V. Ex.ª, mas acredito que falei em português e que
referi factos e verdades.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Vou dar-lhe algumas informações sobre matérias que o Sr. Deputado
questionou.
É verdade que o Governo não paga PRODER desde Agosto, mas vou explicar-lhe porquê: porque o
governo anterior não tinha inscrito no Orçamento do Estado a verba necessária para poder disponibilizar o
dinheiro para pagar aos agricultores!
O Sr. Miguel Freitas (PS): — Não é verdade!
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Por isso é que foi necessário disponibilizar 38 milhões de euros que vão
agora ser pagos para executar o PRODER a 100%. No ano passado estavam inscritos 153 milhões de euros.
Sr. Deputado, era muito fácil dizer que se fazia, mas depois não se inscreviam as verbas no Orçamento.
Percebemos isso e até percebemos que é muito fácil dizer «não pagamos»… Mas agora paga-se e vai pagar-
se!!
O Sr. Deputado diz também que não é importante, que o parcelário agrícola nada tem a ver com o RPU.
Pois não, mas se o parcelário não estivesse executado sabe o que é que aconteceria, nos termos do artigo
17.º do Regulamento CE n.º 1290/2005? Haveria a suspensão do pagamento de verbas por parte da União
Europeia! Era, pura e simplesmente, isso! Ou seja, Portugal deixava de receber as verbas destinadas aos
agricultores portugueses, porque o Governo português não tinha cumprido!
O governo do PS tinha-se comprometido a actualizar o parcelário até ao fim de Dezembro de 2010. O que
é que fez? Não fez! Depois, a inspecção da União Europeia verificou que VV. Ex.as
se teriam comprometido,
eventualmente, a executá-lo até ao fim de 2012.
Em seis meses, este Governo fez 85% desse parcelário, mas o Sr. Deputado vem dizer que atrasámos
dois meses e que, se não se tivéssemos atrasado os dois meses, provavelmente estaria pronto. Sabe,
contudo, que há coisas que não transitam do governo anterior.
Portanto, meu caro Deputado Miguel Freitas, tenho imensa pena de não poder concordar consigo, porque o
tenho por um homem correcto e sensato. No entanto, V. Ex.ª tem dificuldade em defender o que foi feito no
passado.
Sr. Deputado Pedro do Ó Ramos, é óbvio que, se não tivéssemos feito o trabalho do parcelário, não
poderíamos efectuar o pagamento, e este não era um problema do Governo, mas dos agricultores. Durante
muitos anos, o governo do Partido Socialista criou este problema aos agricultores. Se o governo não pagasse,
ficaria provavelmente com um encaixe financeiro, mas o problema é que os agricultores precisam do dinheiro.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
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O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — O Sr. Deputado João Ramos estranha que eu não traga aqui soluções.
Sr. Deputado, tenho muito gosto em dizer-lhe que não trazemos soluções, mas trazemos execuções.
Vozes do PCP e do BE: — Eh lá…!
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Já está feito!
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — O que é mais importante!
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Uma parte importante do que dizemos no nosso Programa do Governo
está feita, Sr. Deputado, e vai continuar a ser feita!
Sabe que, ao contrário de outros, fazemos o trabalho de casa, apresentando soluções e executando. É isso
que está a acontecer com este Governo.
Infelizmente, não temos uma varinha mágica para resolver todos os problemas. E há problemas que não se
resolvem por decreto. É necessário fazer trabalho de reorganização, porque este PRODER, pela forma como
foi executado e como foram gizadas as medidas, não é da responsabilidade do Governo. Temos de nos
adaptar a ele. No entanto, podemos agilizá-lo, que é o que está a ser feito; podemos pelo menos cumpri-lo,
que é o que está a ser feito; e podemos tentar renegociar muitas das multas que já nos foram aplicadas para
evitar que sejam tão altas e evitar que venham mais.
O Sr. Deputado Miguel Freitas acabou por fazer um discurso com o qual, de certeza absoluta, no seu
íntimo, não está de acordo. Tem muitas vezes de defender o que não é verdadeiramente a sua opinião…!
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Ainda para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado
Miguel Tiago.
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Depois de criado um certo furor em
torno de uma suposta reestruturação, reforma ou revisão curricular, que se apresentava como uma «autêntica
reforma do ensino orientada para a qualidade e para a exigência», eis que «a montanha pariu um rato»!…
Vozes do PCP: — Exactamente!
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Afinal de contas, estamos perante um ajuste do currículo ao Orçamento. O
Governo não apresenta, nem teve essa intenção, uma visão estratégica para o sistema público de ensino;
antes encontra as medidas avulsas necessárias para ir buscar os 102 milhões de euros com que se
comprometeu com as forças ocupantes do FMI e da União Europeia.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exactamente!
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Uma reforma curricular e uma revisão curricular verdadeiras exigem uma
ampla e profunda participação dos agentes educativos — dos professores, dos estudantes, dos pais e do
próprio sector científico; exigem uma ponderação e um tempo, um debate alargado e a sua associação a uma
estratégia bem definida.
Vozes do PCP: — Exactamente!
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — A política educativa dos últimos governos, tanto pela mão do PS, como
agora pelas mãos do PSD e do CDS, tem vindo a assentar precisamente numa visão oposta, estritamente
economicista, buscando, por essa via, encontrar o pretexto político para o desmantelamento da escola pública
como a conhecemos e como a construímos a partir da Revolução de Abril.
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Vozes do PCP: — Muito bem!
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Este é mais um passo nesse caminho de destruição. A estratégia do
Governo para a escola pública é a ausência de uma estratégica. Com medidas desgarradas, desestruturadas,
economicistas, cegas, injustas, vai degradando a escola no seu todo. Abandona-se, progressiva mas
aceleradamente, a orientação para a formação da cultura integral do indivíduo e acentua-se o papel da escola
como a «antecâmara da exploração e da submissão».
Depois de continuar com a constituição de mega agrupamentos, de aumentar o número de alunos por
turma, de permitir que os contratos de milhares de funcionários nas escolas terminem sem horizonte de
renovação, de persistir na organização lectiva que retirou dezenas de horas em créditos para as actividades
circum-escolares, de fazer alastrar o desemprego entre os professores, este Governo vem demonstrar que
não passa de um executante, de um bom aluno da tróica, esquecendo-se de que, em Portugal, quem vota não
é o FMI, o BCE ou a Comissão Europeia!
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Quem votou foram os milhares de professores que pensavam que o PSD e o
CDS defendiam a suspensão da avaliação, os milhares de professores a quem PSD e CDS garantiram não
pôr fim ao par pedagógico em educação visual e tecnológica.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Garantiram?!…
Risos de Deputados do PSD.
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Quem votou foram os pais e as mães a quem PSD e CDS disseram não
tolerar mais sacrifícios. Eis, pois, que, afinal, PSD e a sua «muleta» de extrema-direita despedem professores,
roubam salários e subsídios a pais, funcionários e professores, extinguem disciplinas sem fundamento, põem
fim ao par pedagógico em EVT, aos desdobramentos de turmas em aulas de Ciências Naturais e Físico-
Química, entre outras muitas malfeitorias que, a pretexto de uma revisão, não são mais do que um
ajustamento aos mandamentos da tróica.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exactamente!
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Uma real e desejada revisão ou reforma curricular tem de ser realizada com
uma visão ampla e nacional do sistema de ensino, subordinada apenas aos objectivos da melhoria da
qualidade e aos objectivos constitucionais.
O Governo ignora a Lei de Bases do Sistema Educativo, deixando de fora do currículo do 1.º ciclo do
ensino básico as expressões artísticas e a actividade físico-motora, e nos restantes ciclos de ensino tudo o
que faz apenas denuncia o objectivo de poupar, de despedir professores e de degradar a qualidade!
Não é possível, ao contrário do que tenta vender Nuno Crato, resolver os problemas educativos mais
graves da Europa com o orçamento para a educação mais baixo da Europa!
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exactamente!
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Um ano de pré-escolar longe da universalidade e que deveria ser obrigatório,
mas não é!
Um 1.º ciclo que continua a desenvolver-se em escolas degradadas nos centros das grandes cidades e em
escolas distantes das pequenas povoações do interior, e que perde a oportunidade de integrar conteúdos,
como prevê, aliás, a Lei de Bases do Sistema Educativo!
Um 2.º e um 3.º ciclos depauperados, com menos professores, menos funcionários, reduzidos à doutrina
de saber ler, escrever e contar!
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Um secundário assente na triagem entre a profissionalização de «banda estreita» e o prosseguimento de
estudos para quem possa pagar, agora igualmente fragilizado por este remendo aos currículos feito pelo
Governo.
Quando se exigia uma resposta audaz para vencer as dificuldades, eis que o Governo desiste da
educação. Ao invés de apostar na escola como factor para a emancipação individual e colectiva, aceita a
concepção retrógrada imposta pela tróica, que vê a escola pública como um empecilho, um gasto supérfluo!
Foi contra essa perspectiva de miséria, de um Governo ao serviço de interesses alheios a Portugal e
antidemocráticos que o PCP apresentou um projecto de resolução para alargamento do prazo de discussão
pública da chamada reforma curricular, permitindo que todos se mobilizem contra esta nova «machadada» na
escola pública e que professores, pais e estudantes possam participar num processo que se quer maturado e
democrático, e não, como pretende o Governo, imposto unilateralmente, rapidamente e em força!
Foi também contra esta perspectiva de submissão que o PCP apresentou na Comissão de Educação,
Ciência e Cultura um requerimento para que a Assembleia da República faça o que o Governo não quer fazer:
uma audição pública para uma real reforma curricular, requerimento que será votado amanhã de manhã, em
Comissão nesta Assembleia.
Para o PCP, alargar o prazo de discussão pública e realizar uma audição pública são exigências colocadas
a esta Assembleia para que não se faça passar por «reforma curricular» o que é apenas um ajuste de horários
para o despedir professores!
Protestos do PSD.
Foi e será contra essa política de destruição da escola pública, de afronta aos professores e de ataque aos
direitos dos estudantes que o PCP, dentro e fora da Assembleia da República, se bateu e se baterá!
Esta luta precisará da voz de todos os ofendidos: dos professores do quadro, dos professores contratados
ainda mais agredidos, dos pais, dos funcionários e dos estudantes, dizendo e mostrando que não abdicam dos
seus direitos e da escola pública, gratuita e de qualidade para todos. Nessa luta, contarão, certamente, como
até aqui, com o PCP!
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Inscreveram-se cinco Srs. Deputados para pedir esclarecimentos.
Assim sendo, tem a palavra, em primeiro lugar, o Sr. Deputado Amadeu Soares Albergaria.
O Sr. Amadeu Soares Albergaria (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados, Sr. Deputado Miguel
Tiago, os objectivos propostos no Programa do Governo na área da educação estão centrados na melhoria do
ensino.
O Ministério da Educação e da Ciência tem trabalhado com todos: com os professores, com os pais, com
as escolas, com as autarquias locais e, trabalhando com todos, coloca acima de tudo as necessidades dos
alunos.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Nota-se!
O Sr. Amadeu Soares Albergaria (PSD): — E foi a pensar nos alunos que o Governo apresentou uma
proposta-base para a revisão da estrutura curricular.
Esta proposta procura adequar os currículos à exigência de melhoramos os resultados dos nossos alunos.
Esta revisão, ao contrário do que já foi dito, reduz a dispersão curricular, focalizando mais o currículo nos
conhecimentos fundamentais e reforçando a aprendizagem nas disciplinas essenciais.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Amadeu Soares Albergaria (PSD): — Esta revisão tem como um dos seus principais princípios
reduzir o controlo central do sistema educativo, ou seja, Sr. Deputado Miguel Tiago,…
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Vozes do PSD: — Muito bem!
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Despedir professores!…
O Sr. Pedro Alves (PSD): — O PCP é que é contra a autonomia!
O Sr. Amadeu Soares Albergaria (PSD): — … apostar na autonomia gradual das escolas, a aposta no
profissionalismo dos professores e na liberdade dos métodos de ensino.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Amadeu Soares Albergaria (PSD): — Esta revisão, entre outras medidas, reforça o ensino do
Português e da Matemática. Estão contra isto, Sr. Deputado?
O Sr. Pedro Alves (PSD): — Claro!
O Sr. Amadeu Soares Albergaria (PSD): — Esta revisão antecipa a aprendizagem das Tecnologias de
Informação e Comunicação, presta mais atenção aos alunos do 2.º ciclo através da oferta do apoio diário ao
estudo,…
O Sr. Pedro Alves (PSD): — Muito bem!
O Sr. Amadeu Soares Albergaria (PSD): — … reforça as horas de ensino nas disciplinas de História e
Geografia. Estão contra isto, Srs. Deputados?
Aplausos do PSD.
Ao contrário do que aqui foi dito, dá maior liberdade à escola na decisão da distribuição da carga horária,
introduz maior rigor na avaliação.
O Sr. Emídio Guerreio (PSD): — No PCP, leram o documento?
O Sr. Amadeu Soares Albergaria (PSD): — Srs. Deputados do PCP, que fique bem esclarecido que este
processo é decisivo para o futuro dos nossos alunos…
O Sr. Emídio Guerreio (PSD): — Muito bem!
O Sr. Amadeu Soares Albergaria (PSD): — … e que esta revisão só pode ser feita com o empenho dos
professores, dos alunos, dos encarregados de educação e toda a restante comunidade educativa. É
fundamental e, de resto, os portugueses têm pedido que todos os envolvidos no processo educativo debatam
e contribuam para a construção de um consenso alargado.
O PSD, como sempre tem feito, dará o seu contributo e já solicitou a presença do Sr. Ministro da Educação
e Ciência à Comissão de Educação, Ciência e Cultura para debater esta reforma.
Protestos da Deputada do PCP Rita Rato.
Sr. Deputado, a pergunta é simples: o Sr. Deputado e o Grupo Parlamentar do PCP estão disponíveis para
este debate, mas para um debate sem desconfianças logo à partida, sem debates ideológicos carregados logo
à partida, essencialmente para um debate que coloque acima de tudo os nossos alunos, que isso é que é o
fundamental?!
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Aplausos do PSD.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana
Drago.
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Miguel Tiago, já anteriormente,
aquando da declaração política do Partido Ecologista «Os Verdes» tive oportunidade de fazer um conjunto de
apreciações sobre a proposta de reorganização curricular apresentada pelo Ministro Nuno Crato.
Creio que o Sr. Deputado fez um bom apanhado e caracteriza bem o sentido geral desta proposta que é
apresentada pelo Ministério: é, de facto, fazer um acerto de horários, de modo de despedir o máximo de
professores possível para o próximo ano lectivo!
É esse o objectivo do Ministério! Não é qualificar, não é que os nossos alunos possam adquirir novas
competências, não é responder aos novos desafios e exigências que são colocados à educação pública. Não!
Tudo está desenhado para potenciar ao máximo o despedimento de professores contratados para o próximo
ano lectivo!
Portanto, penso que temos pela frente, com esta reorganização curricular, um grave perigo para a escola
pública no próximo lectivo.
Nesse sentido, o Bloco de Esquerda apresentou também nesta Assembleia um projecto de resolução não
só para que o prazo de discussão desta proposta seja alargado — nesse sentido, seguimos a proposta do
PCP de alargamento do prazo de discussão —, mas para que seja feita uma avaliação da aplicação da matriz
curricular vigente na última década e o início de um processo alargado de debate com a participação da
sociedade civil, das comunidades educativas, dos professores, dos pais, dos próprios alunos para que a
sociedade portuguesa possa definir, para futuro, qual deve ser a matriz curricular que dure e que responda às
exigências que se colocam hoje no âmbito da escolaridade obrigatória.
Creio, contudo, que o Sr. Deputado Amadeu Soares Albergaria pode apresentar e enunciar um conjunto de
princípios, mas a verdade é esta: olhando para as propostas apresentadas pelo Ministério da Educação, elas
não representam mais qualidade, nem aprofundamento do conhecimento científico; pelo contrário, acabam
com o ensino experimental! Isto não é combater a dispersão curricular! Não!
O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Não é?!
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Não! Ele multiplica disciplinas! É o acabar com todas as componentes práticas!
E há uma coisa que parece absolutamente óbvia, até pela medida hoje anunciada, em que o Ministério
revogou as orientações curriculares para o ensino básico: é este regresso a uma escola salazarenta, a uma
escola que não aposta na aquisição de competências dos alunos,…
O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Não?!…
A Sr.ª Ana Drago (BE): — … na articulação dos saberes, na capacidade de cruzamento multidisciplinar de
várias áreas de conhecimento. Não! É o regresso ao saber ler, contar e escrever, e nada mais interessa para o
mercado de trabalho!
É isto que o Ministro Nuno Crato nos vem dizer!
Portanto, Sr. Deputado Miguel Tiago, termino dizendo que temos de ser capazes de chamar toda a
sociedade civil e todos os agentes do campo educativo para o debate que temos pela frente, porque uma
coisa é certa: com o somatório destas medidas — de despedimento de professores e de organizações
curriculares —, que «não têm pés nem cabeça», a escola pública está em causa!
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Tiago.
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O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Amadeu Soares Albergaria, foi o Ministério da
Educação e Ciência que começou por, na sua apresentação deste debate, dizer logo quem é que queria
excluir dele… Nem sequer foi o PCP que aqui veio acusar… Foi o próprio Ministério que disse que nesta
matéria nem sequer lhe interessa ouvir os sindicatos, que são curiosamente a maior organização de
professores que existem a Portugal!…
O Sr. João Oliveira (PCP): — Bem lembrado!
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Portanto, bem pode fazer esse esforço ou essa tentativa de peripécia, de
tentar fazer crer que, da parte do Ministério, existe toda a disponibilidade…, porque eu também lhe digo, Sr.
Deputado, que estranho essa «disponibilidade toda» para ouvir quando, ainda na terça-feira passada, os
senhores impediram a discussão de um requerimento do PCP para que se realizasse uma audição pública
ouvindo todas as pessoas, todos os agentes nesta Assembleia da República.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Bem lembrado!
Protestos dos Deputados do PSD Emídio Guerreiro e Pedro Santos Pereira.
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Esperemos que até amanhã vão a tempo de repensar essa estratégia e de
viabilizar essa audição pública, que, curiosamente, o PSD não propõe e não me parece que venha a propor…!
O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Então, esta revisão não reforça o ensino do Português e da
Matemática?!
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr. Deputado Amadeu Soares Albergaria, dizer que está empenhado no
debate alargado com todas as pessoas e com todos os agentes é directamente oposto, é contraditório com o
próprio prazo que o Ministério da Educação e Ciência definiu para a discussão púbica.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exactamente!
O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Então, e o Português e a Matemática?!
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Vamos lá ver: então, o Ministério propõe aquilo a que chama uma «grande
revisão para a qualidade, para a excelência» — aliás, mais tarde disse que era cirúrgica…, mas já
percebemos que afinal é mesmo só para despedir professores… —, apresenta-a como uma revisão curricular
e quer que num mês, até 31 de Janeiro, se definam as bases para uma nova matriz curricular, para uma «nova
forma de estar (de acordo com o Governo) no sistema público de ensino»?…
O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — E o Português e a Matemática?!
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Aí está também a fragilidade dessa «disponibilidade toda» para discutir!…
O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — E o Português e a Matemática?!
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Querem que num mês, mês esse coincidente com a pausa lectiva de Natal,
o lançamento das notas dos alunos e as avaliações, com um trabalho nas escolas que corresponde à
mudança do 1.º para o 2.º período, querem que durante esse mês as escolas tenham a capacidade de
participar efectivamente, empenhadamente num alargado debate sobre a questão mais fundamental do ensino
que é a organização curricular e a organização dos ciclos?!…
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Não querem, não querem!
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O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — E o Português e a Matemática?!
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr. Deputado, tenha a bondade de reconhecer que é um processo expedito
de imposição e não é um processo de envolvimento. Aliás, veremos a disponibilidade do PSD para viabilizar a
proposta do PCP para uma adição com todos os agentes.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exactamente!
O Sr. Amadeu Soares Albergaria (PSD): — E para o debate disse nada!
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr.ª Deputada Ana Drago, como sabe, o PCP apresentou, na terça-feira
passada um projecto de resolução nesta Assembleia para o alargamento do prazo de discussão pública desta
iniciativa, e mais: o PCP, prevendo que a maioria parlamentar utilizará alguns expedientes para não viabilizar
essa audição, anunciou que o próprio Grupo Parlamentar do PCP realizará, de forma descentralizada pelo
País, um conjunto de audições a todos os agentes educativos que queiram partilhar com o PCP e com a
Assembleia da República, através do PCP, as suas opiniões sobre esta matéria.
O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Outra vez?!
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — É porque não vamos brincar com esta matéria, que é o cerne de todo o
sistema público educativo!!
O Sr. Pedro Alves (PSD): — Quem tem brincado são vocês!
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — O PSD e o CDS, muitas vezes com o apoio do PS e a com a política que o
PS tem praticado, querem uma escola para a submissão, querem uma escola para a exploração!
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr. Deputado, queira concluir. Vai ter oportunidade de se pronunciar
mais tarde.
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Termino já, Sr.ª Presidente.
Fazemos aqui um desafio não à Sr.ª Deputada Ana Drago mas ao PSD e ao CDS-PP: recordem as escolas
técnicas, recordem os liceus, recordem o «ler, escrever e contar» e comparem com o que se passa hoje!
Querem uma escola para a submissão e para a exploração, mas a Constituição da República e a
Revolução de Abril trouxeram ao povo português, pela sua própria conquista, uma escola para a emancipação
do indivíduo e do colectivo!
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado
Michael Seufert.
O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, o PCP falou do CDS como «a muleta
de extrema-direita» do Governo. O Bloco de Esquerda fala do regresso à escola bolorenta, salazarenta… Sr.ª
Presidente, aquilo que se percebe é que o que incomoda a esquerda neste Parlamento é que é a direita que
está a fazer a modernização do sistema escolar e a transformar a escola pública para o século XXI.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
Percebemos que isso custe, porque, nos seis anos em que a esquerda esteve no governo, nada fez ou
aquilo que fez foi verdadeiramente para piorar o sistema público.
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O Sr. Bernardino Soares (PCP): — A esquerda?! Não era a esquerda, era o PS!
O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Também ouvimos, da parte do PCP, a grande defesa dos sindicatos
como parceiros neste processo, porque querem transformar a questão da revisão curricular numa questão
corporativa e de sindicalismo, e isso não pode acontecer! Aquilo que é dos sindicatos aos sindicatos! Aquilo
que e das associações científicas e das associações de professores e dos directores da escola, aos
directores, às associações científicas e às associações de professores!!
Sr.ª Presidente, o que esta reforma curricular pretende é aumentar o que é preciso aumentar: é aumentar
os tempos da História, da Geografia, das Ciências, como já aumentámos o Português e a Matemática; é
antecipar as Tecnologias de Informação para um momento na vida dos jovens em que eles ainda estão a
tomar conhecimento com essas tecnologias…
É — pasme-se, para grande escândalo da esquerda! — aumentar a autonomia das escolas, como o CDS
sempre defendeu.
Isto, Sr.ª Presidente, não vem por acaso. E não vem por acaso, porque, no seu manifesto eleitoral, o CDS
defendia ipsis verbis não era mais autonomia, era «muito mais autonomia no ensino público», citando o nosso
programa sobre a revisão curricular. Aí defendíamos «a concentração da aprendizagem dos alunos em torno
de um núcleo de disciplinas estruturantes»!
Nada disto vem por acaso! E tudo isto, Sr.ª Presidente, os portugueses que deram o seu voto ao CDS
sabiam que iria acontecer, tal como sabiam, aliás, que fomos nós que travámos o aumento dos mega
agrupamentos, a fusão das escolas, para pensar, quando é preciso pensar, e para executar depois de pensar.
Vou terminar, Sr.ª Presidente, dizendo uma coisa evidente: quando se abre um processo de consulta
pública, o PCP acha que a proposta inicial é aquela em que não se vai mexer mais… Nós sabemos que é a
maneira de funcionar — enfim, «à comité central»…! — das nossas forças mais à esquerda, é a sua maneira
de tomarem uma posição… A proposta inicial é única, não se mexa!
Protestos do PCP.
Ora, nós mexemos e acreditamos que o Governo tem toda a abertura para mexer na proposta inicial e é
por isso que nós, CDS, queremos ouvir na Comissão de Educação, Ciência e Cultura o Governo.
Protestos do PCP.
Finalmente, a pergunta que deixo ao PCP, ao Sr. Deputado Miguel Tiago, é a seguinte: queria que o CDS
no Governo agisse de forma diferente daquela a que se propôs governar?
Aplausos do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados, em particular Sr.
Deputado Miguel Tiago, queria felicitá-lo pela declaração política que fez e lembrá-lo de que Os Verdes, no
início deste período de declarações políticas, fizeram uma intervenção sobre o mesmo tema, porque
consideramos relevantíssimo que esta questão se debata já na Assembleia da República e na sociedade,
embora não pareça ser essa a vontade do Governo.
Ainda assim, temos de dar um contributo nesse sentido, por isso felicito as iniciativas que o PCP tomou
relativamente à audição pública e ao alargamento do prazo de consulta pública do documento apresentado
pelo Governo.
Ouvimos, finalmente, o pronunciamento do PSD e do CDS sobre a matéria, que, entretanto, de uma
declaração política a outra, talvez tenham tido tempo de ler as duas páginas apresentadas no documento do
Governo sobre a revisão curricular…
Risos do PSD e do CDS-PP.
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E digo isto porquê? Porque a intervenção da maioria, designadamente do PSD, foi ipsis verbis o que vem
nessas ditas duas páginas, não se desviou nem um milímetro…. Sim, Srs. Deputados do PSD, parabéns!
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — E depois ainda dizem que o «comité central» é que é daqui…
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sim, a intervenção da maioria é seguidista o suficiente!…
Mas porque é que eu digo isto? Porque é importante ver que, nessas duas páginas, não vem nem um único
argumento de ordem pedagógica para esta alteração, e nem o PSD nem o CDS o apresentou aqui! E não o
fizeram porque não puderam, porque a ordem para esta revisão é meramente economicista.
O Sr. Deputado Miguel Tiago disse — e muito bem! — que o objectivo é pôr professores com horário zero e
é despedir professores.
Protestos do PSD.
Porquê? Para poupar em salários, para poupar porque a tróica manda e o Ministério faz assim,
independentemente dos resultados.
E foi também engraçado, porque faz parte do debate e até gera maior dinâmica no debate, ouvir, enquanto
o Sr. Deputado fazia a declaração política e dava as respectivas respostas às questões que lhe foram
colocadas, aqueles apartes, perfeitamente regimentais, que o PSD ia lançando… Não sei se o Sr. Deputado
teve oportunidade de ouvir, mas os Srs. Deputados do PSD só diziam assim: «Então, não se aumenta o
horário do ensino do Português?», «Então, não se aumenta o horário do ensino do da Matemática?», «Então,
não se aumenta o horário do ensino de História e de Geografia?», «Então, os senhores não ficam contentes
com isso?»…
Olhe, Sr. Deputado, eu até estava à espera de ouvir nesses apartes dizer coisas do género: «Então, não se
acaba com a Formação Cívica?», «Então, não há menos Educação Tecnológica?», «Então, não há menos
Educação Visual, não há menos educação artística?», «Então, não se acaba no 2.º ciclo com as experiências,
com a experimentação feita pelos próprios alunos?»… Mas, Sr. Deputado, não ouvi absolutamente nada disso
e estranho que o PSD e o CDS não se tenham pronunciado sobre a matéria.
Mas o Sr. Deputado tem toda a razão: o objectivo é degradar a escola pública! Não há razão pedagógica
que sustente esta proposta do Governo. Ela tem um único objectivo: obediência à tróica, despedimento de
professores e acabar com a escola pública, porque os ricos terão sempre a alternativa da escola privada!
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exactamente!
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — E isto tem de ser denunciado. Este País precisa de se
movimentar contra este absoluto escândalo!
Aplausos do PCP.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Vai é haver alemão obrigatório!
Risos.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Acácio
Pinto.
O Sr. Acácio Pinto (PS): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Consolidar a organização curricular da
educação básica e secundária sem roturas sempre foi o objectivo do PS e eu queria saudar o Deputado
Miguel Tiago pelo facto de trazer esta questão a debate.
Consolidar a organização curricular sem roturas é, efectivamente, aquilo que se deseja numa escola que se
pretende que não esteja instabilizada.
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Agora, não vou cometer aqui a deselegância de dizer que o PSD e o CDS, através do Governo, querem,
com esta revisão curricular que nos propõem, que não é mais do que uma mexida aritmética em cargas
horárias, desviar a nossa atenção dos principais e fundamentais assuntos que, neste momento, o PSD, o CDS
e o Governo estão a lançar na escola pública, quer seja na escola a tempo inteiro, que está a ser fortemente
atacada, quer seja na formação ao longo da vida, através das Novas Oportunidades e dos CNO (Centros de
Novas Oportunidades), quer seja através do apoio que não é dado à inclusão.
Mas gostaria de me fixar na questão que o Sr. Deputado aqui levantou sobre a revisão curricular e dizer-lhe
que nos parece que há um paradoxo fundamental no que nos é apresentado nestas curtas e escassas páginas
sobre a revisão curricular que o Ministério colocou em debate público.
Na verdade, a dado momento, refere-se a eliminação da disciplina de Formação Cívica nos 2.º e 3.º ciclos
e no ensino secundário e, depois, acrescenta-se que não se retira a relevância a esta disciplina… Pergunto:
como é que, eliminando, não se retira a relevância?
Este é um paradoxo que nos deixa completamente sem palavras e era sobre isto que gostaria que o Sr.
Deputado Miguel Tiago nos pudesse dar a opinião do PCP, porquanto a Formação Cívica é uma plataforma de
intervenção da cidadania, cidadania que é uma área que deve ser muito acompanhada e que deve ser tida
como fundamental, porque através dela o princípio da legitimidade política pode ser passado para os nossos
jovens, o princípio da construção da identidade pode ser passado para os alunos… É todo um conjunto de
valores que, nessa plataforma, pode ser passado para os alunos através das escolas, sendo por isso a
Formação Cívica uma plataforma de autonomia dos currículos das próprias escolas.
Termino, colocando, então, esta questão: qual é a perspectiva que o PCP tem para estas áreas e para este
corte que a Formação Cívica leva nos 2.º e 3.º ciclos e no ensino secundário?
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Tiago.
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, começaria por responder ao Sr. Deputado
Michael Seufert, do CDS-PP, dizendo que, curiosamente, ou me escapou ou o Sr. Deputado não se referiu ao
fim do par pedagógico e ao fim da disciplina de Educação Visual e Tecnológica,…
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Ah, pois não…!
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — … porque, talvez, terá sido essa uma daquelas questões de que o CDS —
se bem me recordo — quase que terá feito «bandeira» dela!… Aliás, lembro-me de ter visitado uma escola
onde assisti a uma aula de EVT em que estavam presentes Deputados do CDS a quem quase que lhes
vieram as lágrimas aos olhos ao ver que o PS estava prestes a extinguir o par pedagógico em EVT…
Assim se vê também como a mentira vos é útil para disfarçar a vossa política e as vossas verdadeiras
intenções.
Protestos do Deputado do CDS-PP Nuno Magalhães.
Sr. Deputado Michael Seufert, do CDS-PP, se modernização para si — e compreendo que tenha essa
perspectiva, porque se enquadra no seu partido — é recuperar a escola bafienta do regime fascista, então não
podia estar mais de acordo, porque estão num rumo de «modernização» extraordinário…!
Se essa é a sua perspectiva de futuro,…
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — A «Primavera de Praga» é que era preciso…!
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — … deixe-me dizer-lhe que está em contraponto com aquilo que a sociedade
portuguesa preconiza para si própria, que é o progresso, que é o largar essas amarras do passado e do bafio
rumo à emancipação individual e colectiva dos portugueses, para que todos possam dar o seu contributo,
independentemente de serem pobres ou ricos, para o desenvolvimento económico e social do País.
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Vozes do PCP: — Muito bem!
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Isso só pode ser feito, Sr. Deputado, com a escola pública, não é sem a
escola pública nem é contra a escola pública!
Deixe-me dizer-lhe, ainda, Sr. Deputado, que a concepção que o senhor tem de sindicalismo também é
bafienta. Aliás, essa tentativa de acantonar os sindicatos a corporações também há-de ter alguma raiz no seu
pensamento… Mas deixe-me dizer-lhe que não é dessa maneira que concebemos as organizações sindicais,
nenhumas delas, pois todas elas têm um contributo a dar em todas as áreas!
Também não entendemos, Sr. Deputado, que o sistema de ensino seja apenas uma bolsa de emprego.
Aliás, o CDS e o PSD é que entenderam que a revisão curricular é apenas uma forma de destruir o emprego.
Vozes do PCP: — Exactamente!
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — E aí é que está a questão.
Sr. Deputado Acácio Pinto, quero agradecer-lhe por ter trazido, embora um pouco ao lado do âmbito da
intervenção, a questão dos Centros de Novas Oportunidades, a educação e formação de adultos e os CEFP,
porque, como bem sabe, o PCP tem uma divergência com alguns dos métodos que foram postos em prática
nas Novas Oportunidades, mas também aí se demonstra o que o PSD e o CDS querem para tudo o que é
sistema público de ensino.
Aliás, ainda hoje estão por começar cursos de educação e formação de adultos, estão CNO sem saberem
o que vai ser da vida deles e dos seus formadores, porque este Governo entende que a formação e a
educação são um gasto supérfluo, são um luxo, provavelmente para quem possa pagar nas escolas do ensino
particular, do ensino privado…!
Queria ainda dizer ao Sr. Deputado Acácio Pinto que, da nossa parte, nem há grande paradoxo entre a
extinção da Formação Cívica e o seu reforço, porque nós sabemos bem que tipo de formação cívica quer a
direita: quer uma formação cívica para a submissão, para a obediência e para a exploração.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exactamente!
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Para isso nada melhor do que acabar com todas as disciplinas que sirvam
para formar o carácter do indivíduo e a formação da sua cultura integral, numa perspectiva abrangente,
tocando todas as áreas do saber, do lazer, do desporto e do conhecimento.
Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, queria dizer-lhe que, subscrevendo, na prática, todas as palavras que aqui
nos deixou e saudando a sua intervenção de hoje no período de declarações políticas, estou particularmente
de acordo com a última frase do seu pedido de esclarecimento: é preciso mobilizar a população,
particularmente aqueles que são directamente afectados por estas políticas, para que percebam que é
chamando às suas próprias mãos o seu destino que poderemos derrotar o pacto de agressão imposto aos
portugueses, que destrói a escola pública pelas mãos do PSD e do CDS, mas sem disfarçar o papel que o PS
teve na sua assinatura e na consolidação dessas políticas enquanto esteve no governo.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Srs. Deputados, concluímos assim o período de declarações
políticas, sendo que, como a Mesa anunciou anteriormente, no decurso deste ponto, foram suscitados pedidos
de defesa da honra pessoal por parte dos Srs. Deputados Pedro Nuno Santos e Basílio Horta, do PS.
Nos termos do n.º 3 do artigo 84.º do Regimento da Assembleia da República, os Srs. Deputados dispõem
de dois minutos para proceder à defesa da honra e se o Deputado que terá ofendido os Srs. Deputados
pretender pronunciar-se terá igualmente dois minutos para o fazer.
Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Nuno Santos.
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O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Sei bem como é que o que
disse pode ser usado contra mim, e o Sr. Deputado fez isso neste debate, mas também sei o que disse, o que
quis dizer e reafirmo o que quis dizer.
O debate sobre a dívida pública é um debate sobre uma negociação política e as partes dessa negociação
usam as armas que têm ao seu dispor na defesa dos seus interesses.
Sr.as
e Srs. Deputados: Há limites para os sacrifícios que se impõem a um povo, há limites para o
sofrimento que se impõem a um povo…
Protestos do PSD.
… e um governo deve usar todas as armas negociais que tiver ao seu dispor na defesa do seu povo, na
defesa de condições menos gravosas para o seu povo, na defesa de condições menos recessivas para a
economia, na defesa de condições que melhor permitam ao País pagar a dívida que contraiu.
Sr.as
e Srs. Deputados, não se consegue pagar a dívida sem crescimento económico, e não há crescimento
económico com austeridade em cima de austeridade!
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — Tem sido imposto ao País um espartilho de austeridade, austeridade
essa que prejudica o crescimento económico e a falta de crescimento económico impede o País de honrar os
seus compromissos.
Infelizmente, não temos líderes na periferia, não temos um líder em Portugal que ponha os interesses dos
portugueses em primeiro lugar.
Protestos do PSD e do CDS-PP.
Esse é o drama que os portugueses enfrentam hoje, no nosso País, e é o drama que enfrentam todos os
povos dos países da periferia da Europa. Os países da periferia não conseguiram ainda constituir também
uma aliança, como a aliança franco-alemã. E, perante as reuniões de antecipação de Angela Merkel e
Sarkozy, para prepararem e decidirem antecipadamente o que os 27 vão decidir passados alguns dias,
infelizmente, na periferia, não temos líderes que façam exactamente o mesmo, que preparem as cimeiras com
antecipação, que concertem posições para, mais facilmente, poderem defender os interesses dos seus povos.
Protestos do PSD e do CDS-PP.
Sr.as
e Srs. Deputados, que não haja a menor dúvida de que, enquanto estiver na política, se tiver de optar
entre credores e o povo português, optarei sempre pela defesa dos interesses do povo português.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Apesar de não ter sido proferido o nome do Sr. Deputado Nuno
Encarnação, penso que será de concluir que foi a pessoa visada pela defesa da honra que o Sr. Deputado
Pedro Nuno Santos acaba de fazer.
Tem, pois, a palavra, para dar explicações, se assim o entender, o Sr. Deputado Nuno Encarnação.
O Sr. Nuno Encarnação (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Pedro Nuno Santos, de facto, citando-o,
ofendo-o?! Apenas o citei na minha declaração política!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
E o Sr. Deputado sente-se ofendido com o que o senhor disse?!
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O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — Não!
O Sr. Nuno Encarnação (PSD): — Não?! Então, se não, vou citá-lo novamente.
Risos do PSD e do CDS-PP.
Perante isto, pasme-se, Sr. Deputado, porque são declarações suas: «Na situação em que nós vivemos,
estou-me marimbando para os nossos credores, estou-me marimbando para o banco alemão que emprestou
dinheiro a Portugal, nas condições em que emprestou. Ou os senhores se põem finos ou nós não pagamos.
As pernas dos banqueiros alemães até tremem» — estas são apenas algumas partes das suas declarações.
Sr. Deputado, deixe-me que lhe diga que, hoje, perdeu a oportunidade de se retractar, perante esta
Câmara, por aquilo que disse, porque isto não se diz a este País e a ninguém.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Deputado está num país livre e é livre de dizer o que bem entender, só que a sua liberdade e a sua
maneira de a exprimir, do modo como o fez, ofendeu milhões e milhões de portugueses.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Nuno Encarnação (PSD): — Esta é que é a diferença entre nós!
Por isso, Sr. Deputado, não houve qualquer ofensa da honra, apenas o citei e o Sr. Deputado continua a
manter exactamente aquilo que disse. Isto é que é extraordinário!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Também para defender a sua honra pessoal, dispondo, para o efeito,
de 2 minutos, tem a palavra o Sr. Deputado Basílio Horta.
O Sr. Basílio Horta (PS): — Sr.ª Presidente, a minha defesa da honra é, efectivamente, em relação a
afirmações feitas pelo Sr. Deputado Nuno Encarnação.
Tenho de começar por dizer que o Sr. Deputado Nuno Encarnação gosta muito de citar, tem feito aqui
várias citações. Também andei à procura de alguma citação que pudesse fazer dele, mas, estranhamente, não
encontrei nenhuma, deve ser defeito meu, com certeza,…
Protestos do PSD.
Estão muito excitados os Srs. Deputados.
Como estava a dizer, realmente, não encontrei nenhuma citação que pudesse fazer de si, mas o Sr.
Deputado talvez possa fazer o favor de me mandar alguma coisa que eu possa vir a citar.
Protestos do PSD e do CDS-PP.
Em relação ao que foi dito, começo por lhe dizer o seguinte: o tom a que o Sr. Deputado nos tem habituado
é muito diferente daquele que foi utilizado pelo Deputado Hélder Amaral. O Deputado Hélder Amaral fez uma
excelente intervenção, consistente — e também me citou —, mas não uma intervenção puramente politiqueira,
como a que foi feita pelo Sr. Deputado Nuno Encarnação.
Só quero esclarecer o Sr. Deputado Hélder Amaral, porque merece esse esclarecimento, de duas coisas:
primeiro, a tróica não proíbe o apoio aos carros eléctricos, apenas impõe que sejam revistos os incentivos
fiscais. É só isto! Aliás, num sector tecnologicamente tão importante, os apoios seriam, seguramente, aceites.
O segundo ponto, Sr. Deputado Hélder Amaral, porque o senhor merece esse esclarecimento, tem a ver
com o seguinte: não embandeire em arco com os 600 milhões do QREN, porque o QREN está comprometido
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em cerca de 80% e aplicado em 35%. É que há uma parte que tem de ser utilizada pelas empresas, e as
empresas não têm crédito, Sr. Deputado, estão a morrer à exiguidade de crédito. Estamos a caminhar para
uma miséria económica, Sr. Deputado! Ainda pensámos que a Cimeira da União Europeia pudesse trazer uma
resposta, mas não, nem redemption act, nem sequer qualquer hipótese de recorrer a financiamento.
Portanto, Sr. Deputado, ponha-se fino — utilizando uma expressão, hoje, muito em voga —, tenha cuidado,
veja…
Protestos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Srs. Deputados, por favor criem condições para que o Sr. Deputado
Basílio Horta, que, aliás, já excedeu largamente o tempo de que dispunha, possa concluir.
Queira concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Basílio Horta (PS): — Concluo já, Sr.ª Presidente.
Só quero dizer que é, pois, fundamental o crédito às empresas.
Em relação ao Sr. Deputado Nuno Encarnação,…
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — O Sr. Deputado dispunha de 2 minutos e já passaram 3 minutos e 12
segundos.
O Sr. Basílio Horta (PS): — Peço desculpa e termino já, Sr.ª Presidente.
Se o Sr. Deputado Nuno Encarnação tivesse ouvido a intervenção que proferi hoje na Comissão de
Economia não dizia o que disse. Não utilizámos o caso da Nissan para atacar ninguém. O que aconteceu com
a Nissan foi um caso único: há meia dúzia de meses, o responsável da empresa disse que queria fazer 50 000
baterias em Portugal e um upgrade tecnológico; fez um investimento de alguns milhões numa nave, pôs
pessoal em formação e, de um momento para outro, diz que se vai embora.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Ó Sr.ª Presidente, o tempo do Sr. Deputado já se esgotou!
O Sr. Basílio Horta (PS): — O Governo, por seu lado, diz que soube disto na véspera. Ora, nós temos de
saber porquê!
E quando o Sr. Primeiro-Ministro disse que ainda havia uma oportunidade de voltarem para cá, o Grupo
Parlamentar do Partido Socialista disse, imediatamente, «se for necessário qualquer apoio, pelo conhecimento
que temos dos dossiers, disponha desse apoio».
Protestos do PSD e do CDS-PP.
Finalmente, não compare a Agni com a Nissan. Em relação à Agni, fomos nós que dissemos que não
queríamos fazer aquele investimento, não obstante haver uma certificação tecnológica de um instituto, aliás,
creio que presidido por uma militante do seu partido, no sentido de que era bom, depois de vir da Malásia…
Informe-se! Portanto, não confunda a Agni com a Nissan.
Protestos do PSD e do CDS-PP.
Não gostam de ouvir, mas têm de ouvir!
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr. Deputado, queira concluir.
O Sr. Basílio Horta (PS): — Muito obrigado, Sr.ª Presidente.
Aplausos do PS.
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A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — A Mesa, por uma questão de equidade, atribui exactamente 4
minutos e 35 segundos ao Sr. Deputado Nuno Encarnação para dar explicações.
Protestos do PCP.
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Não é isso que resolve a situação!
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem a palavra, Sr. Deputado Nuno Encarnação.
O Sr. Nuno Encarnação (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Basílio Horta, do CDS-PP,…
Risos do PSD.
Perdão, do Partido Socialista.
Sr. Deputado, parece que não ouviu o que eu disse…
O Sr. Basílio Horta (PS): — O senhor é um ordinário!
A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — Até porque já não existe CDS!
Vozes do CDS-PP: — Mas o que é isto?!
Protestos do PSD e do CDS-PP, tendo o Deputado do CDS-PP Nuno Magalhães batido com as mãos no
tampo da bancada.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr.as
e Srs. Deputados, há um Sr. Deputado que está no uso da
palavra e não penso que seja tolerável que qualquer Deputado, nesta Casa, utilize mecanismos que impeçam
ou ultrapassem o Sr. Deputado que está no uso da palavra. Agradeço que criem condições.
Sr. Deputado Nuno Encarnação, faça favor de prosseguir.
O Sr. Nuno Encarnação (PSD): — Sr.ª Presidente, peço desculpa, mas, de facto, nas citações que fiz do
Deputado Basílio Horta das declarações que fez ao Sol, em 14 de Agosto de 2009, também não vejo nenhum
motivo para defesa da honra.
Se o Sr. Deputado Basílio Horta não se lembra do que disse, tenho comigo uma cópia, que peço à Mesa o
favor de mandar distribuir.
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Muito bem!
O Sr. Nuno Encarnação (PSD): — Tal como também tenho comigo o Diário da República de 15 de
Outubro de 2007 com a aprovação das minutas do contrato de investimento entre o Estado e a Agni, coisa de
que o Sr. Deputado Basílio Horta também não se deve lembrar.
Mas aquele que era, em 1991, um homem às direitas tornou-se num homem diferente, à esquerda, como
sucede agora com o Sr. Deputado Basílio Horta.
Há, no entanto, uma coisa que sempre me ensinaram, que foi a ter respeito pelas pessoas e por aquilo que
as pessoas pensam. Ninguém ofendeu ninguém nesta Sala,…
O Sr. Luís Menezes (PSD): — Muito bem!
O Sr. Nuno Encarnação (PSD): — … apenas citei o Deputado Basílio Horta e aquilo que disse no
passado, porque é bom que se lembre muito do passado quem também quer tanto futuro, como o Sr.
Deputado Basílio Horta.
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Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno
Magalhães.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, quero solicitar-lhe que esclareça algumas das Sr.as
Deputadas e alguns dos Srs. Deputados aqui presentes que, por regra, nesta Casa, quando um Deputado fala,
podemos gostar mais ou podemos gostar menos, mas não ligamos os microfones para interromper esse
mesmo Deputado.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — E para insultar!
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — E, Sr.ª Presidente, neste momento lamentável para este Parlamento
e para a democracia,…
Vozes do PS: — Eh!…
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — … gostaria também de lhe dizer que a Sr.ª Presidente deveria
solicitar à 1.ª Comissão, para onde baixou, ontem mesmo, um conjunto de diplomas apresentados pelo Partido
Socialista, e que foram aprovados, um dos quais propunha que fosse criado, nesta Casa, um código de boa
conduta,…
O Sr. Luís Menezes (PSD): — Muito bem!
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — … que a essa boa conduta e ética juntasse também as boas
maneiras.
Aplausos do CDS-PP, do PSD e da Deputada do PS Isabel Alves Moreira.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr. Deputado Nuno Magalhães, de facto, se é certo que os apartes
fazem parte da praxe parlamentar, comportamentos como aquele a que assistimos, tal como frisei na altura,
não são admissíveis.
A Mesa irá diligenciar no sentido de saber qual o ponto processual em que se encontram as iniciativas que
referiu. Penso que «para bom entendedor, meia palavra basta».
Podemos continuar, se assim entenderem,…
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr.ª Presidente, peço desculpa, permite-me uma brevíssima interpelação
à Mesa sobre a condução dos trabalhos?
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr.ª Presidente, quero fazer chegar a V. Ex.ª a nossa posição, segundo
a qual o uso da figura regimental da defesa da honra deve ser criterioso. Aquilo que hoje aqui aconteceu — e
não vou entrar no detalhe das posições políticas que foram expressas — foi uma utilização abusiva dessa
figura regimental,…
Vozes do PSD e do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — … porquanto nenhum dos Deputados que interveio, usando da palavra
para defender a sua honra, o fez, objectivamente, nas suas intervenções. E penso que a Mesa, uma vez que
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terminou o incidente suscitado por esses Deputados, tem o dever de alertar todos os demais para que, no
futuro, esta situação não se volte a repetir. É que quem não consegue, no âmbito dos debates, aprofundar e
acentuar os seus pontos de vista, não deve ter uma segunda oportunidade para os reforçar. A oportunidade
que foi concedida a estes Deputados foi para defenderem a sua honra e, objectivamente, a defesa da sua
honra esteve muito longe das suas intervenções.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr. Deputado Luís Montenegro, a Mesa pressupõe que qualquer
Deputado conhece a Constituição da República Portuguesa, o Regimento da Assembleia da República e os
termos em que pode utilizar os mecanismos regimentais.
O Sr. Luís Menezes (PSD): — Pelos vistos, não!
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — A Mesa não tem é a capacidade de antecipar o que vai ser dito e
confia que cada um dos Srs. Deputados eleitos para a Assembleia da República tenha o discernimento para
fazer coincidir as suas palavras, que são da sua responsabilidade, com os instrumentos de que dispõe no
Regimento.
Podemos, assim, dar por concluído este incidente.
Vamos passar ao terceiro ponto…
O Sr. Carlos Zorrinho (PS): — Sr.ª Presidente, peço desculpa, permite-me uma interpelação à Mesa?
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. Carlos Zorrinho (PS): — Sobre a condução dos trabalhos, Sr.ª Presidente.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Carlos Zorrinho (PS): — Sr.ª Presidente, quero dizer-lhe que não há nenhum documento legal que a
possa habilitar a julgar, por antecipação, o sentimento de honra ou desonra dos Deputados.
Aplausos do PS.
Os Deputados que aqui defenderam a sua honra defenderam-na de forma legítima, porque houve
intervenções do Sr. Deputado Nuno Encarnação que citaram excertos descontextualizados das suas
afirmações.
Portanto, não aceitamos que seja a Sr.ª Vice-Presidente,…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Presidente!
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Nem eu pretendi fazê-lo. Disse apenas que a Mesa não tinha
capacidade para antecipar o que cada um dos Srs. Deputados iria dizer na sua intervenção.
O Sr. Carlos Zorrinho (PS): — Peço desculpa, mas posso continuar?
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Foi exactamente isso que eu disse.
Muito obrigada, Sr. Deputado. Vamos prosseguir com os nossos trabalhos.
O Sr. Carlos Zorrinho (PS): — Peço desculpa, mas quero continuar no uso da palavra.
Também não aceitamos que seja o líder parlamentar, Luís Montenegro,…
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A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr. Deputado, vou retirar-lhe a palavra.
O Sr. Carlos Zorrinho (PS): — … a estabelecer o código de ética ou o código de honra.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr. Deputado, este ponto da ordem do dia está concluído.
Vamos continuar os nossos trabalhos com o terceiro ponto da ordem do dia, que consta da discussão, na
generalidade, da proposta de lei n.º 34/XII (1.ª) — Procede à terceira alteração à Lei n.º 1/2005, de 10 de
Janeiro, que regula a utilização de câmaras de vídeo pelas forças e serviços de segurança em locais públicos
de utilização comum.
Tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna, a quem saúdo e dou a palavra para fazer a
apresentação desta iniciativa legislativa.
O Sr. Ministro da Administração Interna (Miguel Macedo): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: A
proposta de lei de videoprotecção que o Governo apresenta a esta Assembleia da República tem gerado
assinalável polémica.
Não desconhecemos os termos dessa polémica e não fugimos à discussão dos aspectos mais
significativos que se prendem com o objecto desta iniciativa legislativa. Com este propósito, o Governo quer
contribuir para um debate exaustivo e esclarecedor sobre as opções que formulou. Mas esta é também a
ocasião para responder a críticas, juízos de valor, opiniões e escritos, que, as mais das vezes, são (e têm
sido) sustentados em meros preconceitos.
O objecto essencial desta proposta de lei traduz-se no seguinte: alargar o recurso da videoprotecção a
situações de vigilância das florestas e detecção de fogos florestais e à protecção de instalações com interesse
para a segurança. É este o alargamento do âmbito de aplicação da presente proposta de lei.
Por outro lado, esta iniciativa legislativa intenta ainda clarificar as responsabilidades de cada interveniente
no processo de autorização, utilização e fiscalização do recurso à videoprotecção. E, nesta matéria, o País
exige clareza, transparência e identificação precisa dessas responsabilidades.
No quadro da lei actual, a Comissão Nacional de Protecção de Dados (CNPD), entidade administrativa
independente, emite parecer vinculativo sobre a instalação de câmaras de videoprotecção. A autorização para
esta instalação é, no entanto, da competência do Ministro da Administração Interna. É este o regime em vigor,
não é outro.
Com este regime, Portugal tem, hoje, instaladas 25 câmaras em espaços públicos e tem mais de 23 000
autorizações de instalação de câmaras de videoprotecção em locais de acesso público. Ou seja, em Portugal,
há 25 câmaras em espaços públicos (praças públicas, outros espaços públicos) e há um incontável número de
câmaras de videoprotecção, operadas por empresas de segurança privadas, em espaços como aeroportos,
hospitais, centros comerciais, bancos, estações de serviço, discotecas e estabelecimentos comerciais. Pode,
pois, afirmar-se que a lei actual confere à vigilância privada mais possibilidades de recurso e meios de
videoprotecção do que às próprias forças de segurança pública.
No quadro da lei actual, a Comissão Nacional de Protecção de Dados tem competência para conhecer das
características técnicas do equipamento, dos locais públicos objecto da observação pelas câmaras, dos
procedimentos de informação ao público sobre a existência do sistema, dos critérios para a conservação dos
dados registados, dos mecanismos tendentes a assegurar o correcto tratamento de dados conservados e o
período de conservação desses mesmos dados. Nenhum destes poderes é afectado com esta iniciativa
legislativa, que preserva, integralmente, os poderes de fiscalização da Comissão Nacional de Protecção de
Dados sobre todos os dispositivos.
Conclusão: o essencial da actividade fiscalizadora sobre procedimentos, adequação do equipamento a
instalar, verificação do funcionamento do sistema e controlo da utilização, gravação e destruição dos dados
mantém-se na Comissão Nacional de Protecção de Dados. Não colhem, por isso, as críticas que sustentam
que esta proposta de lei conduz a um esvaziamento dos poderes de controlo e de fiscalização da Comissão
Nacional de Protecção de Dados.
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O Sr. Luís Fazenda (BE): — Que ideia…!
O Sr. Ministro da Administração Interna: — A lei actual determina, ainda, no seu artigo 7.º, que «A
utilização de câmaras de vídeo rege-se pelo princípio da proporcionalidade» e que a sua utilização é
autorizada «quando tal meio se mostre o mais adequado para a manutenção da segurança e ordem públicas e
para a prevenção da prática de crimes».
A verificação destes dois princípios inscritos no artigo 7.º da lei actual é da competência do Ministro da
Administração Interna, nos termos do n.º 9 desse mesmo artigo 7.º. Estão, assim, equivocados todos aqueles
que têm defendido que a Comissão Nacional de Protecção de Dados é despojada da apreciação do princípio
da proporcionalidade, pela simples razão de que essa competência, na lei actual, já é do Ministro da
Administração Interna.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Ministro da Administração Interna: — Conclusão: a Comissão Nacional de Protecção de Dados
tem invocado poderes e competências que a actual lei lhe não atribui em exclusivo, e que são, como devem
ser, competências também do poder executivo.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Esta linha de fronteira tem de ficar clara e nítida neste debate, porque se o poder executivo não quer
beliscar nenhuma das competências de fiscalização da Comissão Nacional de Protecção de Dados também
não aceita prescindir de qualquer dos seus poderes.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Ministro da Administração Interna: — A lei actual determina que o recurso à videoprotecção seja
feito com fundamento na necessidade e conveniência da instalação destes sistemas, para efeitos de
manutenção da ordem pública e prevenção da prática de crimes — tudo com base nos pareceres técnicos das
forças de segurança.
A este propósito, apetece-me citar a Sr.ª Secretária de Estado da Administração Interna do anterior
governo, que, em 15 de Março deste ano, afirmou: «À Comissão Nacional de Protecção de Dados não
compete avaliar o rácio de segurança entre criminalidade participada e habitantes». E concluía ainda a mesma
Secretária de Estado: «Cada entidade deve estar no seu patamar». Não posso deixar de subscrever estas
afirmações.
Que fique claro que é nosso entendimento que, nesta matéria, não pode deixar de haver uma adequada
ponderação entre os valores da segurança e a protecção de direitos, liberdades e garantias. Mas é também
nosso entendimento que essa ponderação pode e deve ser feita pelo Ministro da Administração Interna, com a
sujeição das suas concretas decisões ao controlo democrático desta Assembleia e ao controlo jurisdicional
dos tribunais.
Sublinho esta questão: do ponto de vista da legalidade democrática, o controlo efectivo de cada decisão
não é menos escortinado se essa competência residir no Ministro da Administração Interna. Pelo contrário, o
controlo democrático desta Assembleia torna-se muito mais efectivo sem prejuízo do recurso à via jurisdicional
e à fiscalização cometida por lei à Comissão Nacional de Protecção de Dados.
Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Em democracias consolidadas, a videoprotecção em espaços
públicos é, hoje, uma realidade. No Reino Unido, estão instaladas cerca de 50 000 câmaras de videoprotecção
em mais de 500 cidades; em Bolonha, na Itália, estão instaladas 291 câmaras; em Lyon, na França, 219
câmaras; e em Roterdão, na Holanda, 289 câmaras.
O Sr. António Filipe (PCP): — Por isso é que deixou de haver crimes…
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O Sr. Ministro da Administração Interna: — Cito estes exemplos não como metas a atingir mas para
expressar que alguns receios, juízos de valor e preconceitos colidem com modelos de segurança já adoptados
em muitas sociedades democráticas.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Ministro da Administração Interna: — Ninguém ousa questionar os valores democráticos e o
respeito pelos direitos individuais dos cidadãos em sociedades como as do Reino Unido, da França ou da
Holanda. Acresce que Portugal, neste particular, tem (e continuará a ter) uma Comissão Nacional de
Protecção de Dados, com efectivos poderes de fiscalização, que vão muito para além daquilo que se verifica
na generalidade das suas congéneres europeias.
Não há, pois, razão para receios, porque Portugal continua a ter um dos sistemas mais escrutinados e
fiscalizados de protecção de dados, e a vontade do Governo é a de que assim continue a ser.
Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Repudio, por isso, com indignação, as palavras de responsáveis
públicos que insinuaram que esta proposta de lei pode ter como objectivo limitar o direito de manifestação.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Ministro da Administração Interna: — Esta insinuação é grave, porque é falsa, e é ainda mais
grave porque traduz uma desconfiança ao controlo democrático, exercido por este Parlamento. É, finalmente,
grave, porque ignora todos os poderes que a própria Comissão Nacional de Protecção de Dados e os tribunais
mantêm na nossa proposta de lei.
Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: O Governo vem para este debate sem esconder as suas propostas,
mas com espirito democrático para encontrar as melhores soluções. Este é um debate que deve ser feito com
rigor e com exigência, não é um debate para declarações panfletárias. Estão em causa direitos constitucionais
dos cidadãos e a exigência de segurança, que é também condição de liberdade.
Assumimos as nossas responsabilidades enquanto Governo, legislando em conformidade com os nossos
compromissos. Confiamos nas nossas polícias e nos instrumentos que lhes são disponibilizados na missão de
assegurar aos cidadãos um espaço livre em segurança. São estes os nossos propósitos, são estas as nossas
opções.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — A Mesa aproveita para saudar o Sr. Secretário de Estado da
Administração Interna, que se encontra igualmente presente.
Informo que se inscreveram três Srs. Deputados para pedirem esclarecimentos, mas o Sr. Ministro já não
dispõe de tempo para responder. No entanto, o PSD fez saber à Mesa que cede 3 minutos ao Sr. Ministro.
Tem a palavra o Sr. Deputado Filipe Neto Brandão para formular o primeiro pedido de esclarecimento.
O Sr. Filipe Neto Brandão (PS): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as
e Srs. Deputados, o
Sr. Ministro da Administração Interna vem a este Plenário disposto a quebrar um consenso. Trata-se do
consenso político que deu origem a esta lei.
Esse consenso político partiu de um pressuposto, aliás expresso pelo Sr. Deputado do PSD que então
interveio em nome do PSD, que disse que a prudência de pedir um parecer prévio vinculativo à Comissão
Nacional de Protecção de Dados era a garantia do cidadão contra o abuso dos poderes públicos.
O Sr. Ministro veio criticar responsáveis públicos por terem criticado esta proposta e não teve a
amabilidade de precisar a quem se dirigia. A primeira pergunta que lhe dirijo é, pois, no sentido de saber se o
Sr. Ministro está a referir-se ao Conselho Superior do Ministério Público quando escreve, a folhas 7 do seu
parecer, que a proposta que V. Ex.ª veio propor a esta Assembleia permite eventuais usos abusivos ou
desproporcionados do sistema.
Esta conclusão soma-se às conclusões dos pareceres da Ordem dos Advogados e da Comissão Nacional
de Protecção de Dados.
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Sr. Ministro, entendamo-nos: o facto de V. Ex.ª insistir nesta proposta, depois do parecer da Comissão
Nacional de Protecção de Dados, poderia, eventualmente, ser sinal de convicção. Depois do parecer da
Ordem dos Advogados, diriam os espíritos tolerantes que V. Ex.ª era uma pessoa persistente. Mas, Sr.
Ministro, depois do parecer do Conselho Superior do Ministério Público, que rechaça completamente a sua
proposta, insistir na mesma só pode ser sinal de teimosia.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada
Teresa Leal Coelho.
A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, a Constituição da
República Portuguesa, ao estabelecer um regime garantístico em matéria de protecção de dados, garante, no
entanto, à Assembleia da República que exerça o seu poder de conformação legislativa em matéria de
concretização de mecanismos de protecção de dados.
Não obstante todos os pareceres citados pelo Sr. Deputado Filipe Neto Brandão, cada um dos Deputados,
na Assembleia da República, que tem a tarefa de legislar, deve ter capacidade própria para interpretar a
Constituição.
Não temos qualquer dúvida de que a Constituição da República Portuguesa garantiu um poder de
conformação legislativa a este Parlamento em matéria de concretização de instrumentos necessários à
protecção de dados. Ao estabelecer essa liberdade de conformação, permite que a Assembleia da República
legisle dentro do parâmetro constitucional como entender, fazendo o seu próprio juízo de ponderação da
proporcionalidade, da necessidade e da adequação. E é isso que este grupo parlamentar vai fazer.
É nosso entendimento que qualquer norma constitucional que atribua uma competência a uma entidade
administrativa independente o faz sem, no entanto, pretender diminuir, e muito menos substituir, as
competências constitucionalmente atribuídas a órgãos constitucionais, concretamente a órgãos de soberania
com legitimidade democrática, como o são este Parlamento e o Governo. É, assim, nosso entendimento que a
ponderação da proporcionalidade, da necessidade e da adequação deve ser feita por estes órgãos e não por
entidades administrativas cometidas de pareceres para estas matérias. Neste parâmetro, com certeza que
consultamos todos os pareceres que nos são remetidos nesta matéria, mas não deixamos de fazer o nosso
próprio julgamento, e para isso estamos legitimados, em primeira linha, pela Constituição.
Concretamente no que respeita a esta proposta de lei, entendemos que deve ser a Assembleia da
República a fazer um primeiro juízo legislativo e o Governo a fazer um segundo juízo, na concretização
legislativa, no exercício de funções enquanto garante da liberdade e da segurança, o que compete em
especial ao Sr. Ministro da Administração Interna.
Por isso mesmo, entendemos que os pareceres devem ser solicitados a quaisquer entidades que tenham
competência funcional nesta matéria, mas esses pareceres não devem condicionar quem, em primeira linha,
deve salvaguardar os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos portugueses: a Assembleia da República e
o Governo.
Desta forma, acolhemos a solução legislativa que o Sr. Ministro nos apresenta mas, tratando-se de um
processo legislativo que põe em confronto direitos, liberdades e garantias e a segurança, não podemos deixar
de lhe perguntar se não concorda com a nossa posição de que deverá ser estabelecido neste diploma que a
videoprotecção deve operar no âmbito da prevenção de crimes em locais em que existe efectivamente um
risco razoável da sua ocorrência, já que é nossa intenção aduzir esta expressão ao diploma que agora propõe.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna para
responder.
O Sr. Ministro da Administração Interna: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Filipe Neto Brandão e Sr.ª
Deputada Teresa Leal Coelho, agradeço as questões que me colocaram.
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Srs. Deputados, queria aproveitar este ensejo para clarificar dois ou três aspectos.
Disse o Sr. Deputado Filipe Neto Brandão, que aproveito para cumprimentar, que vim aqui rasgar um
consenso sobre esta matéria. Sr. Deputado, não vim aqui rasgar consenso nenhum, mas não é em nome de
um consenso que vou abdicar das ideias que defendo em relação a esta matéria, Sr. Deputado!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Quero dizer-lhe, a este propósito, que não partilho a opinião de que um Ministro da Administração Interna,
que é, em último caso, o responsável pela segurança no País, tenha de ficar dependente de um parecer da
Comissão Nacional de Protecção de Dados, a qual, para além de fazer aquilo que tem de fazer e que, do meu
ponto de vista, é inquestionável que deve continuar a fazer, se pronuncia também em concreto sobre as
efectivas condições de segurança que se verificam num local ou noutro. Sr. Deputado, com isso não concordo!
Citei na minha intervenção declarações de um membro do anterior governo sobre esta matéria que defendia
exactamente a mesma coisa.
Sr. Deputado, este não é um debate sobre quem quer uma sociedade securitária ou não. O Sr. Deputado
não me vai dizer que a Holanda, que tem o número de câmaras que citei, em várias cidades, é uma sociedade
securitária, que o Reino Unido é uma sociedade securitária, que a França, que tem em curso um programa de
instalação de 35 000 câmaras de videovigilância para os próximos anos, é uma sociedade securitária! Não é.
E sabe porquê, Sr. Deputado? Porque há um escrutínio democrático sobre isso.
Sr. Deputado, o que digo — e a este ponto ninguém responde —, é o seguinte: os pareceres referem que,
na proposta de lei que aqui trazemos, o Ministro quer chamar a si, quer resolver por si a questão da
proporcionalidade entre direitos do cidadão e segurança. E eu disse no meu discurso, e repito agora, que a lei
actual já concede ao Ministro da Administração Interna, ao ministro responsável pelas forças de segurança, a
adequação proporcionada de cada uma dessas decisões.
E digo mais, Sr. Deputado: esta proposta de lei, ao contrário daquilo que tem sido propalado, confere, do
ponto de vista democrático, muitas mais garantias do que a lei que temos neste momento. Por uma simples
razão: a cada momento, o Ministro da Administração Interna decide a instalação de um conjunto de câmaras
onde quer que seja, e essa decisão pode ser prontamente escrutinada neste Plenário. E pergunto eu ao Sr.
Deputado: quem escrutina as decisões da Comissão Nacional de Protecção de Dados de instalar e de não
instalar?
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Isso é outro tema!
O Sr. Ministro da Administração Interna: — Quem responde por essas decisões? Diz-me o Sr. Deputado
que a Comissão Nacional de Protecção de Dados manda um relatório no fim do ano para a Assembleia da
República. Ó Sr. Deputado, essa fiscalização, comparada com a fiscalização democrática que cabe em
exclusivo a este Parlamento, é muito menor do que aquela que vem inscrita na nossa proposta de lei!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Sr. Deputado queria sublinhar este ponto, como queria sublinhar — e o Sr. Deputado não me desmentiu —
que em nenhum aspecto a Comissão Nacional de Protecção de Dados fica amputada de concretos poderes de
fiscalização nos termos da nossa proposta de lei.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Fica, fica!
O Sr. Ministro da Administração Interna: — Em nenhum aspecto em concreto fica amputada desses
poderes.
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Sr.ª Deputada Teresa Leal Coelho, percebo as questões que colocou, que são questões importantes e
relevantes, mas retomo a linha do discurso que fiz. Quero vir a esta Assembleia da República discutir de forma
aberta este diploma,…
O Sr. Luís Menezes (PSD): — Muito bem!
O Sr. Ministro da Administração Interna: — … cada uma das soluções. Tenho consciência plena da
delicadeza desta matéria, da polémica, da dificuldade que ela gera, e deve ser assim numa sociedade
democrática. A tensão entre o valor da segurança e os valores supremos dos direitos, liberdades e garantias
dos cidadãos é muito importante numa sociedade democrática e todo o escrutínio que se faça não é demais
em relação às decisões em concreto que se tomam a este propósito. Mas esse escrutínio não pode impedir a
decisão e a responsabilidade de quem decide.
Sr.ª Deputada, podem ser feitas alterações, a Assembleia é dona da proposta que o Governo fez. O que sai
na lei é aquilo que a Assembleia quiser que saia — é assim do ponto de vista democrático. Por nós, estaremos
aqui as vezes que forem precisas a debater na especialidade este diploma, mas quero dizer-lhe, Sr.ª
Deputada, que não acho que fiquem abalados os princípios de um Estado de direito democrático se eu
recusar, enquanto responsável político, ser mero notário das decisões de uma comissão independente.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Honório para uma
intervenção.
A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as
e Srs. Deputados: Cada
intervenção, cada declaração sobre esta proposta de lei é mais preocupante do que a anterior.
O que o Sr. Ministro aqui trouxe hoje foi uma interpretação da proposta de lei apresentada pelo Governo,
que é um diploma que, de facto, abre todas as portas a um «big brother» e que tem vários ingredientes,
nomeadamente até uma novilíngua: deixámos de falar de videovigilância e passámos a falar, afinal, em
videoprotecção. Quem o ouviu e quem o ouve, Sr. Ministro!
O que é extraordinário é que, de facto, o Governo estava e permanece incomodadíssimo com a
independência de um órgão como a Comissão Nacional de Protecção de Dados, que tem um grupo de juristas
altamente qualificados e que produz pareceres técnicos. Surpreendentemente, o PSD vem aqui defender a
extinção da Comissão Nacional de Protecção de Dados, que é preciso mudar a Constituição. Sr. Ministro, tem
de se mudar a Constituição porque, na verdade, o n.º 2 do seu artigo 35.º é claro quanto ao papel de uma
entidade…
O Sr. Ministro da Administração Interna: — Leia, leia!
A Sr.ª Cecília Honório (BE): — … que tem esta mesma vocação constitucional de garantir os direitos
fundamentais, nomeadamente no que diz respeito à reserva da privacidade, quando estão em causa matérias
que têm a ver com os dados pessoais. Esta foi, efectivamente, a proposta que o PSD aqui apresentou.
Na verdade, Sr. Ministro, este incómodo perante a independência e a natureza técnica do parecer está
sustentado pela extinção da natureza vinculativa dos pareceres desta mesma Comissão, porque esta natureza
vinculativa é o que garante — e não há argumentário que o conteste — que há condições para se cumprir o
princípio da proporcionalidade, segundo o artigo 18.º da nossa Constituição.
O Sr. Ministro da Administração Interna: — Não é verdade!
A Sr.ª Cecília Honório (BE): — O Sr. Ministro quer concentrar todos os poderes em si, ou seja, quer tutelar
as forças de segurança, quer tutelar os critérios da instalação da videovigilância e quer ser a fonte de
legitimidade de todo este processo. Não é possível, Sr. Ministro! Não é possível, nomeadamente, quando, por
exemplo, chamou ao parecer da Comissão Nacional de Protecção de Dados uma declaração política,…
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O Sr. Ministro da Administração Interna: — Exactamente!
A Sr.ª Cecília Honório (BE): — … o que é de muito mau gosto e de enorme irresponsabilidade política,
mas não nos diz aqui hoje se também acha que o parecer do Conselho Superior do Ministério Público é uma
mera declaração política, que não passa de uma declaração política e de um conjunto de juízos de valor. Diga-
nos, Sr. Ministro, qual o valor que atribui a este parecer!
O que nos parece objectivamente é que a coligação ressuscitou as famosas forças de bloqueio. Ou estas
comissões e estas entidades dão pareceres favoráveis às políticas e às medidas do Governo e dizem «ámen»
ou, então, não servem e só produzem juízos de valor! Isto é irresponsabilidade política, Sr. Ministro!
Ainda hoje estamos à espera, por exemplo, dos estudos que pedimos que demonstrem — e o Sr. Ministro
sabe que não existem —, com dados objectivos, que a introdução de câmaras de videovigilância diminui os
índices de criminalidade. Onde estão esses dados, Sr. Ministro? Onde estão os estudos que pedimos ao
Governo e que ainda hoje esperamos?
Relativamente a esta questão tão preocupante, que é a apresentação de uma proposta de lei que abre um
estado de excepção, em que cada um é uma suspeita e que, por isso mesmo, pode ser vigiado com toda esta
franqueza, quero perguntar-lhe se há alguma capacidade por parte do Governo para alterar alguns dos pilares
mais preocupantes deste diploma. O Sr. Ministro, com esta proposta de lei, extingue algo que está consagrado
na lei, que é a possibilidade de as câmaras poderem ser implementadas em local em que exista razoável risco
de ocorrência de crimes, o que é uma abertura inaceitável à arbitrariedade, e, por isso, é preciso saber qual a
vossa disponibilidade para alterações.
É criado, no n.º 10 do artigo 7.º, um regime excepcional em que se prevê que um dirigente máximo de uma
força ou de um serviço de segurança pode instalar câmaras e pedir as autorizações depois. O que é que isto
significa exactamente? Que arbitrariedade é esta prevista nesta proposta de lei? E a abertura, ao nível do
artigo 2.º, para a prevenção de actos de terrorismo, trata-se, objectivamente, de um reforço? Sr. Ministro, é
preciso que esclareça quais as competências que prevê alargar a outros níveis, nomeadamente no plano dos
serviços de informações.
Qual a necessidade que o Governo tem de acrescentar esta prevenção no âmbito desta mesma lei? Não
faz sentido, a não ser que a perspectiva seja, efectivamente, outra.
Sr. Ministro, a democracia não aceita a proposta de lei que estamos a discutir com esta estrutura, que abre
todas as portas a que cada um de nós seja observado, seja escutado, seja identificado, porque a junção de
meios técnicos que estará em causa é muito preocupante sobre o nosso futuro. Sem qualquer critério, sem
fiscalização objectiva, não podemos aceitar este estado de excepção, que atropela direitos fundamentais,
nomeadamente a reserva da privacidade, que é um bem sagrado de cada português e de cada portuguesa.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Também para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado
António Filipe.
O Sr. António Filipe (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Administração Interna, Srs. Membros do
Governo, Srs. Deputados: O Sr. Ministro trouxe-nos uma proposta que eu não diria polémica, mas que reúne
um razoável consenso contra ela.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!
O Sr. António Filipe (PCP): — Efectivamente, as entidades que se pronunciaram sobre esta proposta de
lei — refiro-me à Comissão Nacional de Protecção de Dados, ao Conselho Superior do Ministério Público e à
Ordem dos Advogados — têm pareceres contundentemente críticos em relação esta proposta de lei, que só o
Governo e a maioria parlamentar defendem.
Sr. Ministro, este debate não é entre os que são a favor da videovigilância e os que são contra. Este debate
está a ser feito pelos que pretendem utilizar a videovigilância sem controlo e para qualquer finalidade contra os
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que consideram — estando em causa, de um lado, a segurança e, do outro lado, a privacidade — que tem de
haver uma solução equilibrada.
Ninguém, aqui, é contra a videovigilância — aliás, ela existe e está a ser utilizada —, mas somos contra
uma utilização discricionária da videovigilância, que é ao que conduz a proposta de lei do Governo.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. António Filipe (PCP): — De facto, o que está aqui em causa, quais as principais questões?
Como muito bem refere o Conselho Superior do Ministério Público no seu parecer, as vias pelas quais o
legislador pode assegurar o equilíbrio entre a privacidade e a segurança tem que ver, por um lado, com a
limitação taxativa das finalidades admissíveis para a instalação da videovigilância e, por outro, pela
necessidade de parecer vinculativo de uma entidade independente. Portanto, estão aqui colocadas estas duas
questões. Ora, o que acontece é que o Governo pretende relegar a Comissão Nacional de Protecção de
Dados para um papel de mera assessoria técnica das decisões do Governo.
O Sr. Ministro da Administração Interna: — Essa é boa!
O Sr. António Filipe (PCP). — Isso não tem nada a ver com o estatuto constitucional e legal para a qual foi
criada a Comissão Nacional de Protecção de Dados.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. António Filipe (PCP): — Não tem nada a ver! Aliás, é referido no parecer, não no da CNPD, mas no
do Conselho Superior do Ministério Público, que a intervenção da Comissão Nacional de Protecção de Dados
fundamenta-se na necessidade de fiscalização da actividade administrativa policial por uma entidade
independente do Governo e que se trata de um desenho institucional absolutamente crucial (sublinho
«absolutamente crucial») para garantir que o juízo de proporcionalidade não fique subalternizado face a
critérios de segurança ou policiais.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Ora bem!
O Sr. António Filipe (PCP): — E diz mais adiante: «Esta partilha de competências, que reflecte, em termos
institucionais, a tensão entre os valores da segurança e da privacidade, fica completamente prejudicada com a
proposta em análise.»
O Sr. Ministro da Administração Interna: — Eu discordo!
O Sr. António Filipe (PCP): — Este é o parecer do Conselho Superior do Ministério Público, Sr. Ministro,
ao qual o senhor devia dar a devida atenção.
O Sr. Ministro da Administração Interna: — E daí?
O Sr. António Filipe (PCP): — Porque, então, pergunta-se: afinal de que se queixa o Governo? Da
morosidade das decisões da CNPD?
Sr. Ministro, o parecer da CNPD, que teve como relator o Dr. Luís Durão Barroso, diz o seguinte: «Verifica-
se, em algumas situações, a circunstância de a CNPD emitir parecer positivo, mas de os respectivos sistemas
estarem por instalar por períodos de tempo superiores ao prazo da própria autorização: veja-se o caso da
Ribeira do Porto, onde o sistema esteve por instalar por mais de um ano e ainda, paradigmático, o caso do
Bairro Alto — a CNPD emitiu parecer positivo há mais de dois anos e, ainda assim, o sistema encontra-se por
instalar.»
A pressa é tanta, a CNPD emperra os processos, não há vigilância por culpa da CNPD, que dá parecer
positivo e, ao fim de dois anos o sistema não está instalado.
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O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Ora bem!
O Sr. António Filipe (PCP): — Tanta era a pressa!
Portanto, o Governo não se queixa da morosidade, quer é decidir.
A segunda questão tem a ver com os valores em presença. Ou seja, para que serve a videovigilância?
Serve, evidentemente, para prevenir a criminalidade. Estamos de acordo com isso. O local onde as câmaras
são instaladas tem de ser ajustado a essa finalidade. Mas, então, por que razão quer o Governo suprimir a
expressão constante da alínea c) do artigo 2.º, que diz: «Protecção da segurança das pessoas e bens,
públicos ou privados, e prevenção da prática de crimes em locais em que exista razoável risco da sua
ocorrência.»? Portanto, já não há um juízo de adequação.
As câmaras devem estar onde são necessárias, porque naquele local existe razoável risco de ocorrência
de crimes, mas o Governo suprime esta disposição.
Como também diz, e bem, o Ministério Público, um crime pode ocorrer em qualquer lugar. Ora, se não há
critério relativamente à localização, o Governo pode perfeitamente decidir que podem ser instaladas câmaras
de videovigilância seja onde for, desde que considere que é adequado.
O Sr. Ministro perguntava há pouco quem fiscaliza a CNPD. Sr. Ministro, as decisões da CNPD não são
irrecorríveis. É uma entidade administrativa independente e, como tal — creio que isto é unânime na nossa
doutrina constitucional e administrativa —, dos pareceres, das entidades e das decisões tomadas por
entidades públicas e empresas já há recursos para os tribunais.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Ora bem!
O Sr. António Filipe (PCP): — Não cabe é recurso para o Ministério da Administração Interna, Sr. Ministro.
Essa é que é a questão!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Ora bem!
O Sr. António Filipe (PCP): — O Sr. Ministro fez uma afirmação que considero grave: disse que não aceita
ser notário das decisões de uma entidade independente. Sr. Ministro, ninguém lhe pede que seja notário de
ninguém. O que se lhe pede é que respeite as decisões das entidades independentes, porque foi para isso
que foram criadas.
As entidades são independentes, dotadas de poderes constitucionais ilegais, mas depois o Governo vem
dizer que não está para respeitar as decisões dessas entidades. O que o Governo quer é o poder absoluto.
É preciso que os poderes dessas entidades sejam reconhecidos, para que haja, de facto, Estado de direito
e para que a democracia possa funcionar, porque não aceitamos que haja poderes absolutos num regime
democrático. É para isso, também, que estas entidades são criadas, aliás dentro da boa tradição europeia de
incumbir entidades independentes para fiscalizar a aplicação de matérias legais sensíveis como esta, da
defesa da privacidade em face do tratamento de dados pessoais.
Sr. Ministro, para nós, PCP, esta proposta de lei é inaceitável, mas esperamos que se a maioria a aprovar
na generalidade tenha em devida atenção os pareceres fundamentados que esta Assembleia recebeu e que
apontam para inconstitucionalidades graves.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Igualmente para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado
Telmo Correia.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Administração Interna, Sr. Secretário de
Estado da Administração Interna, Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade, Sr.as
e Srs. Deputados: Há uma questão neste debate que se coloca, de alguma forma, como uma questão prévia,
mas que é também um esclarecimento que nos parece fundamental.
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Neste debate — e ainda agora ouvimos os partidos mais à esquerda —, há um equívoco que tem de ser
desfeito e que é o seguinte: a teórica oposição entre liberdade, privacidade e segurança.
Não há oposição entre liberdade e segurança.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Pelo contrário!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Mais: só havendo segurança é que se pode garantir a liberdade.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Esse é, de todos, o primeiro equívoco que tem de ser desfeito.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Só havendo liberdade é que há segurança!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Liberdade como há nas democracias e como há em Portugal. Mas não
em outros modelos que os senhores bem conhecem.
Em segundo lugar, quem decide esta matéria? Estamos a…
O Sr. António Filipe (PCP): — Em Portugal, conhecemos a ditadura e lutámos pela liberdade muitos anos!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Exactamente! Conhecemos, mas acabou em Portugal antes de ter
acabado na União Soviética, Sr. Deputado António Filipe.
Aplausos do CDS-PP.
Protestos do PCP.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — E em Cuba ainda está para acabar!
Esse é, pois, o primeiro equívoco que tem de ser desfeito.
O segundo equívoco, Sr. Deputado António Filipe, …
O Sr. António Filipe (PCP): — Não foi o CDS que lutou pela liberdade.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Foram os portugueses, Sr. Deputado.
O segundo equívoco, Sr. Deputado António Filipe, é o seguinte: quem deve decidir sobre esta matéria.
Tenho estado aqui a ouvir, ao longo da tarde, que esta lei, este novo regime de videoprotecção não pode
ser decidido porque existe uma entidade independente, a Comissão Nacional de Protecção de Dados, ou
qualquer outra entidade independente, que se opõe a esta nova lei. É que o que estamos a discutir é uma lei,
não é onde se vai colocar a câmara!
O Sr. Nuno Magalhães: — Exactamente!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — O que estamos a discutir é uma lei e, Srs. Deputados, a lei, em
Portugal, tem duas autoridades: a primeira autoridade é o povo, que vota nas eleições; a segunda autoridade
somos nós, a Assembleia da República. Não estou, em nada, diminuído na minha autoridade enquanto
Deputado. Se os senhores se sentem diminuídos pela Comissão Nacional de Protecção de Dados, é problema
vosso. Nós não estamos! Nós somos representantes do povo, temos mandato para isso.
O Governo propõe e quem decide a lei é a Assembleia da República no uso das suas competências.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Só para a tróica é que isso não serve.
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O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Em segundo lugar, quem decide a lei é a Assembleia da República,
mas quem decide a política criminal é o Ministério da Administração Interna. E a decisão sobre a utilização de
câmaras de vigilância e até a sua localização é uma decisão de política criminal…
O Sr. António Filipe (PCP): — Essa agora!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — … e é uma decisão de política de segurança, como é evidente, Srs.
Deputados!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Se é criminal, é como Ministério da Justiça!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Srs. Deputados, a democracia consiste também em ouvir os outros um
bocadinho!
Protestos do PCP.
Portanto, quem decide da política de segurança é o Governo.
Em terceiro lugar, quem conhece a realidade da segurança? Quem sabe onde é que o crime está a
aumentar ou não? Quem sabe onde o risco é maior e onde é menor? São as forças de segurança, porque são
elas que estão todos os dias no terreno, arriscando a vida para combater o crime. Não é nenhuma entidade
administrativa independente.
Há também um dado curioso com o qual vale a pena confrontar a Câmara, relativamente ao qual até seria
bom que o Governo nos esclarecesse mais: qual é a posição das populações? Qual é a posição dos
comerciantes? É que, curiosamente, são a favor.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — E depois? Nós também!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — As populações querem a videovigilância. Ouçam o que dizem os
comerciantes da baixa de Lisboa, ou da ribeira do Porto, ou de Setúbal, só para falarmos das maiores cidades.
Eles são, normalmente, e por princípio, a favor.
O Sr. António Filipe (PCP): — Nós também somos a favor!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Mas não são só eles. As câmaras, Srs. Deputados, também são a
favor. Não são as câmaras de videovigilância, mas as câmaras municipais, aquelas que vão a votos.
E até os partidos são a favor, Sr. Deputado António Filipe. O senhor, aqui, é pela privacidade, é contra este
modelo, mas o PCP, em Setúbal, quando há uma moção na assembleia municipal, vota a favor da instalação
de câmaras de vigilância.
Aplausos do CDS-PP.
Tal como acontece, diga-se de passagem, Srs. Deputados, com o Partido Socialista no Porto. No Porto,
quando houve uma votação sobre, designadamente, os prazos — porque o prazo de avaliação de um ano é
curto —, quando foram levados a decisão autárquica e a decisão municipal, o PS votou, obviamente, a favor
da instalação das câmaras.
É preciso que se compreendam estas divergências. Porque, Srs. Deputados, há aqui um histórico.
Obviamente que o histórico não é o respeito que devemos ter por uma Comissão que é constitucional, que tem
competências e que faça bem o seu trabalho, que é proteger estes dados, garantir a sua privacidade, garantir
o seu armazenamento, e garantir até, mais importante ainda, a sua destruição findo o prazo em que eles
podem estar guardados. É isso que a Comissão de Protecção de Dados deve fazer. Mas, sistematicamente,
sempre que se coloca a hipótese de colocação de câmaras, por regra, politicamente, porque houve uma
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orientação política que se foi estabelecendo nesta Comissão que tem sido sempre crítica, acha sempre
desproporcional, quando a desproporcionalidade não faz sentido.
Vejam o caso de Londres, com os milhares de câmaras que tem! Todos sabemos que o atentado terrorista
de Londres, em 2005, em larga medida, tanto os homens que o estavam a preparar como os danos para a
cidade de Londres foram detectados porque o sistema de videoprotecção funcionou nessa cidade. Como
funciona em Lille, onde o PS francês governa, e como funciona em muitas outras cidades da Europa.
Por isso, este histórico é absolutamente relevante do nosso ponto de vista.
Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, termino dizendo que achamos que o País vai ter
uma nova lei e um novo regime de videoprotecção.
Consideramos que, no âmbito desse regime, quem decide politicamente é quem vem aqui depois, como
disse o Sr. Ministro e bem, responder politicamente pela política de segurança. O Governo tem de ter esse
instrumento. E quem faz a avaliação no terreno são as forças de segurança, porque são elas que arriscam a
vida.
Srs. Deputados, termino como comecei: não há opção entre liberdade e segurança. Não se trata de uma
questão de opção. Queremos liberdade e queremos segurança. A opção é entre saber se temos uma política
de segurança preventiva, que previne o crime — e, para isso, a videoprotecção é importante —, ou se temos
uma política de segurança meramente reactiva, que corre atrás dos prejuízos, que corre atrás do crime depois
de ele acontecer.
A nossa opção é, obviamente, por uma política preventiva e, por isso, este projecto tem inequivocamente,
como o CDS sempre defendeu no passado, o nosso apoio.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr.as
Deputadas e Srs. Deputados, o Sr. Deputado António Filipe
informou a Mesa que pretende fazer uma defesa da honra da bancada.
Nesse sentido, tem imediatamente a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. António Filipe (PCP): — Sr.ª Presidente, quero desfazer o equívoco que o Sr. Deputado Telmo
Correia lançou acerca das reais intenções da bancada do PCP neste debate, ao colocar em evidência o facto
de que, em Setúbal, os autarcas comunistas, que consideramos que têm uma obra muito meritória, defendem
a instalação de sistemas de videovigilância na respectiva cidade. Muito bem! Não contestamos isso. Como
disse no início deste debate, não somos contra a videovigilância.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Claro!
O Sr. António Filipe (PCP): — Consideramos que os autarcas têm toda a legitimidade para propor a
instalação de sistemas de videovigilância nas suas cidades, nos locais que considerem adequados e sensíveis
do ponto de vista da criminalidade. No entanto, consideramos que, nessa matéria, a lei deve ser respeitada,
assim como as competências da Comissão Nacional de Protecção de Dados, não devendo ser apenas o
Governo a decidir.
Não há aqui qualquer contradição, Sr. Deputado Telmo Correia. A oposição que quis estabelecer entre a
posição dos comunistas em Setúbal e a posição dos comunistas aqui, na Assembleia da República, parte da
ideia errada de que os comunistas na Assembleia da República são, por princípio, contra a videovigilância e
que se opõem sempre que alguma autarquia, ou seja quem for, proponha a instalação de câmaras de
videovigilância.
Sr. Deputado, pedi a defesa da honra para corrigir este ponto, porque, para nós, não há qualquer dilema
entre a salvaguarda da segurança dos cidadãos e a salvaguarda dos direitos fundamentais dos cidadãos.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. António Filipe (PCP): — Por outro lado, parece que os senhores têm um dilema quando apresentam
uma proposta que faz prevalecer a segurança com sacrifício de direitos fundamentais.
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Aplausos do PCP.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Ora bem!
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr. Deputado António Filipe, de facto, só uma interpretação muito
generosa e ampla da figura da defesa da honra da bancada é que permite que os seus esclarecimentos sejam
assim considerados.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Não é verdade! A defesa da honra não é só para insultos!
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — O Sr. Deputado interpelado pretende responder?
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sim, Sr.ª Presidente.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem, então, a palavra, Sr. Deputado. Dispõe de 2 minutos.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, concordo com o que foi dito por V. Ex.ª, no sentido de
que, de facto, vejo pouco sentido para a defesa da honra da bancada do PCP.
Protestos do PCP.
Comecei por pensar que tinha a ver com a parte de Cuba. Mas, não sendo, vejo pouco sentido.
No entanto, respondo-lhe.
O Sr. António Filipe (PCP): — Isso é irrelevante!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Isso é um disparate!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Não, não é um disparate, é muito grave. Lá é até muito grave.
Vou, no entanto, responder ao Sr. Deputado António Filipe, porque merece resposta nas considerações
que faz.
Sr. Deputado António Filipe, o que aqui temos, de facto, não é uma questão de defesa da honra. Temos
uma divergência de posições em relação a esta matéria. E quem sou eu para considerar que há comunistas
com opiniões diferentes por este País fora ou até pelo mundo fora. Sabemos que têm, normalmente, sempre a
mesma opinião, sendo muito difícil terem opiniões diferentes. Mas não foi isso que eu disse.
O Sr. António Filipe (PCP): — Os senhores é que só têm a opinião do Portas!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Eu não disse que os autarcas pensam uma coisa e que os outros
pensam outra.
Em relação a esta matéria, os senhores dizem: «há um problema com a democracia», «há uma
dificuldade», «o sistema até é bom, mas não pode ser assim, porque há um problema com a democracia».
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Não vale a pena ter um debate sério!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Por outro lado, os autarcas — os vossos, os dos outros partidos, os do
PS, os nossos, provavelmente —, no terreno,…
Protestos do PCP.
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… sentem os entraves a este sistema, porque ele é aprovado, mas depois, na prática, não existe. Ou seja,
na ribeira do Porto chegou a existir, mas desapareceu; em Matosinhos, foi aprovado e não existe; na
Amadora, foi aprovado e não existe. A partir destes casos, podemos ter uma leitura diferente em relação a
esta matéria. Nesse sentido, considero que esta lei resolve o problema e o Sr. Deputado António Filipe está no
seu direito de dizer que não resolve.
O facto é que, no terreno, os autarcas queixam-se do regime actual e da dificuldade de implementação. Foi
isso que eu disse. E, quando me refiro aos autarcas, falo de todos, incluindo os do PCP, porque, como é
evidente, eles — os vossos, como os dos outros partidos — defendem o interesse local e o interesse das
populações. Faço-lhes essa justiça. No entanto, os entraves existem.
Sr. Deputado António Filipe, também discordo quando diz que este diploma é um perigo para a
democracia, porque constitucionalmente já existe uma entidade.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Queira concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Vou concluir, Sr.ª Presidente.
Contudo, o bom exemplo de que não é um entrave para a democracia é a lei prever agora que os autarcas
podem submeter as decisões sobre esta matéria a referendo e à opinião da população.
A Sr.ª Cecília Honório (BE): — A consulta pública!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Isto não é menos democracia, Sr. Deputado. Antes pelo contrário, com
esta lei, temos mais democracia.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Depois destes esclarecimentos, vamos retomar as intervenções.
Tem a palavra o Sr. Deputado Filipe Neto Brandão.
O Sr. Filipe Neto Brandão (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Administração Interna, Sr.ª e Srs.
Secretários de Estado, Sr.as
e Srs. Deputados: O actual enquadramento legal do regime da videovigilância em
espaços públicos resultou do alargado consenso desta Assembleia e consagra um modelo de checks and
balances, de pesos e contrapesos, que assegura um justo equilíbrio entre direitos, prevenindo o risco de
abuso dos poderes públicos.
O direito à privacidade não se circunscreve à casa de cada um, àquele «pequeno mundo do qual cada um
é rei e senhor». Ao contrário, ele persiste mesmo em lugares públicos. Abrange as suas saídas e entradas em
casa, onde e com quem se encontra, por onde circula.
Sendo o homem um ser social, poder-se-á mesmo dizer que parte substancial da sua privacidade se
desenrolará, ao longo da vida, em espaços públicos.
Nenhuma discussão séria pode, pois, ser encetada em matéria de videovigilância sem que seja
previamente reconhecido por todos o enorme potencial de dano para a liberdade de cada um que resulta de
um discurso facilitador da compressão dos direitos que a nossa Constituição justamente designou de
fundamentais, isto é, onde se alicerça a construção do nosso Estado de direito.
Não ignoramos que defender o direito à intimidade de cada um contra os riscos de devassa não se
afigurará como tarefa fácil num momento em que as sociedades contemporâneas — e a nossa não é
excepção — assistem ao sucesso de programas de entretenimento que disponibilizam às massas, com
indisfarçável gáudio, a total devassa da privacidade daqueles que para tal se voluntariaram e onde não
parece, aliás, existir míngua de candidatos para continuar a alimentar tal oferta.
Defender o direito fundamental à privacidade em espaços públicos, havendo tanto quem, aparentemente,
esteja disposto a não atribuir grande valor a um tal direito, mesmo quando exercido em espaços supostamente
íntimos, é claramente uma tarefa que corre o risco de ser incompreendida por muitos.
Mas política — a política — faz-se de causas e valores, não de aplausos. E só quando assim sucede é que
ela vale a pena.
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Sr.as
e Srs. Deputados: Segurança é o primeiro garante da liberdade. Ninguém será verdadeiramente livre
se não se sentir seguro e é função do Estado garantir que todo o seu território seja espaço de liberdade.
Entende o Governo que a sua proposta de revisão da lei que regula a videovigilância contribuirá para uma
maior segurança. O que para os Deputados hoje importa assegurar é também que dela não resulte um risco
de compressão nos direitos fundamentais à imagem e à reserva da vida privada que seja constitucionalmente
intolerável.
O que nos disse a Comissão Nacional de Protecção de Dados, em parecer enviado a esta Casa — logo
exuberantemente rotulado de panfletário pelo Sr. Ministro da Administração Interna —, é que sim, a proposta
governamental traduz-se numa diminuição inaceitável das garantias dos cidadãos e, como tal, é
inconstitucional.
Ontem mesmo, veio o parecer do Conselho Superior do Ministério Público — e de que o acusará agora o
Sr. Ministro? — engrossar este coro, afirmando que a proposta governamental, pondo em causa normativos
constitucionais, permite «eventuais usos abusivos ou usos desproporcionados do sistema».
Ao afastar, nos termos em que o faz, a intervenção vinculativa da entidade administrativa independente à
qual a Constituição atribuiu o papel de protecção dos dados pessoais, o Governo vem alterar o paradigma
constitucional de protecção de dados pessoais e põe irremediavelmente em causa o equilíbrio do actual
modelo, fixado no n.º 2 do artigo 35.º da Constituição.
O Sr. Ministro da Administração Interna: — Isso está na lei! Não está na Constituição!
O Sr. Filipe Neto Brandão (PS): — Se o legislador constitucional quis — e quis, efectivamente — reforçar
a protecção deste tipo de dados, tal só pode suceder se a intervenção da autoridade administrativa
independente criada com esse escopo continuar a vincular não apenas entidades privadas, mas também os
poderes públicos. Qualquer outra interpretação esvaziaria de sentido o pretendido reforço constitucional de
protecção de dados, que se convolaria destarte numa mera redundância procedimental.
É assim que a Constituição estatui e é bom que assim seja.
Sejamos claros: a actual lei pode ser aprimorada. Consideramos, porém, que é um erro — e um erro grave
ou, como alguém diria, colossal — pretender que, numa matéria onde é enorme o risco de lesão de direitos
fundamentais, possa ser afastada a intervenção morigeradora de uma entidade administrativa independente
para passar a confiar a defesa desses direitos apenas ao escrúpulo democrático do membro do Governo que
tutela as forças de segurança. Tal significaria, para voltar a citar o parecer do Conselho Superior do Ministério
Público, abrir a porta a «eventuais usos abusivos ou desproporcionados do sistema».
Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Pretender passar de um modelo onde é necessário obter a
aquiescência de uma entidade administrativa independente, criada por imperativo constitucional para
protecção de dados pessoais, para um outro modelo onde a criação de sistemas potencialmente lesivos de
direitos fundamentais prescinde dessa intervenção vinculante para legitimar a instalação desses sistemas por
mero critério governamental, para mais prescindindo de uma legal qualificação do risco de ocorrência de
crimes, é querer trilhar um caminho que sabemos antecipadamente desconforme ao espírito e letra da
Constituição e que, pelos perigos que nele habitam, não pode deixar de merecer a nossa mais frontal
discordância.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro da Administração
Interna.
O Sr. Ministro da Administração Interna: — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: no fim deste debate,
não quero deixar de responder a duas ou três questões que aqui foram colocadas.
Começo por salientar que a Constituição não impõe que o parecer de uma autoridade independente, como
é a Comissão Nacional de Protecção de Dados, seja vinculativo. Não impõe.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Exactamente!
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O Sr. Ministro da Administração Interna: — Já agora, Sr.ª Deputada Cecília Honório, se me permite, para
sermos muito simples na concepção democrática que cada um tem, eu não me engano. O garante dos direitos
fundamentais de um cidadão em democracia não é a Comissão Nacional de Protecção de Dados.
A Sr.ª Cecília Honório (BE): — É a Constituição!
O Sr. Ministro da Administração Interna: — São os tribunais e a lei. Só isso!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Comissão Nacional de Protecção de Dados tem, no ordenamento jurídico português, uma relevantíssima
e intocada tarefa e competência de fiscalizar tudo o que tem a ver com protecção de dados. Mantem intocada
essa capacidade fiscalizadora. E, Sr.ª Deputada, não era, de certeza, este Ministro da Administração Interna
que traria aqui uma compressão de competências da Comissão Nacional de Protecção de Dados quanto ao
seu objecto. Coisa diferente é saber se no sítio a, b ou c devem ou não ser colocados sistemas de
videovigilância.
Sr.ª Deputada, o que eu não aceito é que a ponderação de uma autoridade independente possa ser mais
valiosa do que a ponderação democrática desta Câmara…
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Protestos do BE.
… ou do que a sujeição à lei e às regras constitucionais de um membro de um governo português, qualquer
que ele seja. Não tem maior sujeição do que a de um qualquer membro do Governo. Não tem mais escrutínio.
Desde logo, não tem o escrutínio democrático que cabe a esta Câmara.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr. Ministro, terminou o tempo.
O Sr. Ministro da Administração Interna: — Portanto, Sr.ª Deputada Cecília Honório, é panfletária a
afirmação que fez no início da intervenção de que a proposta do Governo tendia a extinguir a Comissão
Nacional de Protecção de Dados. Isso é falso, isso é panfletário. Pode ser bonito, pode até abrir os telejornais,
mas é falso!
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, deixem-me dar nota de uma questão que foi colocada…
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr. Ministro, o tempo de que dispunha é que já se extinguiu mesmo.
O Sr. Ministro da Administração Interna: — Sr.ª Presidente, peço-lhe só mais 10 segundos, porque não
quero deixar sem resposta uma das questões que foi colocada pelo Sr. Deputado António Filipe e que está, de
resto, no parecer da Comissão Nacional de Protecção de Dados.
Pergunta a Comissão Nacional de Protecção de Dados: «Se demos autorização para instalar câmaras no
Bairro Alto e no Porto, por que é que não instalaram? A resposta é simples, Sr. Deputado António Filipe: o
custo da instalação de um sistema destes não é compatível com a autorização por seis meses ou por um ano,
podendo ser a todo o momento revogada pela Comissão Nacional de Protecção de Dados, nos termos
constantes da lei. Justamente por isso, Sr. Deputado, é que alteramos essa parte da lei.
Sabe uma coisa, Sr. Deputado? Tenho a certeza de que, no fim do debate na especialidade deste diploma,
vamos fazer uma lei ponderada, sensata, respeitadora dos direitos dos cidadãos, mas que não esquece as
exigências das sociedades de hoje.
Só mais uma nota.
Perguntava o Sr. Deputado por valores.
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A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr. Ministro, tem mesmo de terminar.
O Sr. Ministro da Administração Interna: — Sr.ª Presidente, estou a dar uma informação à Assembleia.
A Sr.ª Presidente: — Nós compreendemos. Só que — e peço desculpa — há tempos regimentais que
temos de cumprir.
O Sr. Ministro da Administração Interna: — Na Baixa de Coimbra, depois da instalação do sistema de
videovigilância, em média, durante o tempo em que houve videovigilância, a criminalidade desceu 29%. São
dados das forças de segurança. Julgo que isto é importante.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Filipe Neto
Brandão.
O Sr. Filipe Neto Brandão (PS): — Sr.ª Presidente, como o Sr. Ministro da Administração Interna já não
tem tempo para responder, uso o pouco tempo de que disponho para dizer ao Sr. Ministro que, no decurso das
suas várias intervenções, podemos perceber por que é que persiste numa proposta que é manifestamente
inconstitucional.
Sr. Ministro, é verdade que são os tribunais, em primeira ordem, o garante dos direitos, liberdades e
garantias. No entanto, permitir-me-á elucidá-lo — e vou terminar — com uma curta leitura de uma pessoa que,
modestamente, se debruçou sobre o estudo da nossa Constituição, o Prof. Gomes Canotilho, que diz: «A
protecção…» — refere-se aos direitos fundamentais — «… incumbirá desde logo aos órgãos públicos com
competência geral para a defesa dos direitos, liberdades e garantias.» — o Sr. Professor refere-se,
obviamente, aos tribunais.
O Sr. Ministro da Administração Interna: — Claro!
O Sr. Filipe Neto Brandão (PS): — E acrescenta: «Perante a insuficiência da exclusiva protecção
jurisdicional, a revisão constitucional de 1997 faz expressa alusão à protecção através da entidade
administrativa independente», que é, como sabe, a Comissão Nacional de Protecção de Dados.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Queira concluir, Sr. Deputado. Acabou o tempo de que dispunha.
Protestos do PS.
O Sr. Filipe Neto Brandão (PS): — De facto, acabou o tempo de que eu dispunha. No entanto, gastei
muito menos tempo que o Sr. Ministro.
Porém, respeitando V. Ex.ª, termino.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Uma vez que não há mais inscrições, está concluída a discussão, na
generalidade, da proposta de lei n.º 34/XII (1.ª). Aproveito para me despedir, em nome da Mesa, do Sr.
Ministro da Administração Interna, do Sr. Secretário de Estado e da Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos
Parlamentares e da Igualdade.
Vamos prosseguir a ordem do dia com a discussão, na generalidade, do projecto de lei n.º 104/XII (1.ª) —
Revoga o Código Florestal (PSD e CDS-PP).
Cada grupo parlamentar dispõe de 3 minutos, sendo que o PSD e o CDS-PP, como co-autores, dispõem
de mais 1 minuto.
Para fazer a apresentação desta iniciativa legislativa, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Batista Santos.
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O Sr. Paulo Batista Santos (PSD): — Sr.ª Presidente, bem sei que a nossa reunião já vai longa. De toda a
maneira, o tema que trazemos a debate é substancialmente importante e, por isso, vale a pena gastar um
minuto da nossa reflexão.
Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: De facto, a floresta portuguesa ocupa mais de 3,4 milhões de
hectares, o que corresponde, aproximadamente, a dois terços do território nacional e representa, em termos
da União Europeia, a 12.ª maior mancha florestal.
Pela sua evidente importância, a floresta deve ser reconhecida, do ponto de vista ambiental, económico e
social, pela sua contribuição para a promoção da biodiversidade, para o combate à erosão, na sua função de
absorção do carbono, mas, sobretudo, no peso que desempenha para a economia do nosso País.
Neste particular, relativamente ao peso da actividade florestal na economia nacional, sabe-se que esta
representa 11% das exportações totais portuguesas, 3% do produto interno bruto. Bem sei que o valor está
abaixo dos 5% da Finlândia e da Suécia; de qualquer forma, é um peso muito significativo e comparável com
outros sectores exportadores relevantes.
Sabe-se também que este é o terceiro sector exportador, que assegura o emprego a mais de 260 000
pessoas, directa ou indirectamente, e que registou, em 2010, um crescimento das exportações na ordem dos
68,7%.
Numa palavra, Sr.ª Presidente, no momento em que o País necessita de investimento, de emprego e de
exportações, o sector florestal reúne todas as condições para assumir este desafio e contribuir para a
recuperação económica do País.
Para tanto, neste domínio, quanto ao papel do Estado, em sentido lato, diga-se, mais do que produzir
legislação complexa e, muitas vezes, contraditória, como sucedia com algumas normas do Código Florestal,
ou na multiplicação de programas, estratégias e planos com muita fraca execução, é essencial uma visão
estratégica e uma definição de uma política florestal simples e que tenha aplicação prática.
De facto, nos últimos anos, as políticas públicas nesse sector têm constituído um factor de perturbação ao
nível do desenvolvimento de uma política florestal consistente e adequada à realidade nacional, onde a maior
parte da área florestal pertence a privados.
Deste modo, o Estado, neste sector, como em tantos outros — sublinhe-se —, deve deixar de ser o
problema para participar na parte da solução que a floresta portuguesa merece e exige.
A este propósito, recordo as palavras sábias do escritor Eça de Queirós, que, no século XIX, afirmava: «A
agricultura aqui, em Portugal…» — e eu acrescento: o sector florestal — «… é a arte de assistir impassível ao
trabalho da natureza». Este é um bom retrato da política florestal no passado recente onde a arte de meras
proclamações se sobrepunha a qualquer medida concreta. Em seu lugar, propunham-se grandes estratégias,
densos e ilegíveis normativos de intenções, que, na prática, não passavam disso mesmo.
Por isso, o Grupo Parlamentar do PSD subscreve o diploma em discussão, que preconiza a revogação do
Código Florestal. Na prática, consubstancia mais uma mera intenção do anterior governo. Refira-se — e
sejamos precisos — uma intenção muito individualizada no ex-ministro Jaime Silva e que o governo do mesmo
partido, passados dois anos, também não quis regulamentar.
Perante esta evidência, mais não restava do que «dar a bênção» e «enterrar» o Código Florestal, que um
dia «saiu a terreiro», mas que, na verdade, já estava «morto» à partida.
Para terminar, Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados, embora reconhecendo que vários instrumentos
legais e de planeamento devem ser revistos e, sobretudo, simplificados, queremos, no entanto, neste debate,
deixar uma forte ênfase em três medidas concretas.
O que o sector florestal precisa, Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, é de associativismo florestal, de
emparcelamento funcional e de gestão colectiva como instrumentos essenciais para o equilíbrio do tecido
florestal.
O que o sector florestal precisa é da redinamização das zonas de intervenção florestal (ZIF).
O que o sector florestal precisa é do cadastro florestal realizado e da criação de um mecanismo de
segurança e de gestão de riscos como forma de redução dos riscos de incêndio.
É este debate que hoje também recuperamos.
Aplausos do PSD.
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A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Abel Baptista.
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: O objectivo de qualquer política
florestal passa por consolidar, melhorar a multifuncionalidade da floresta, garantindo e aumentando a sua
valorização económica, ambiental e social.
Neste momento, urge concretizar a prevenção estrutural dos fogos florestais, recuperar a floresta ardida,
apoiar a gestão florestal, adaptando as medidas de política à realidade da propriedade florestal nacional,
investir no sector, modernizando-o. Em suma, executar uma política florestal que deverá ser simplificada e
bem delineada no sentido da concretização efectiva dos objectivos que se pretendem ver atingidos através
dessa política.
O objectivo do Código Florestal, que hoje propomos revogar, era o de que ele fosse um documento
estruturante para o sector que definisse a política florestal e um conjunto de investimentos e instrumentos de
política que permitissem a sua execução.
Porém, dada a sua abrangência, a sua densidade, os seus impactos e a complexidade da sua
regulamentação, a Assembleia da República decidiu, através da Lei n.º 116/2009, de 23 de Dezembro,
prorrogá-lo por um período de 360 dias para permitir uma participação e uma reflexão mais profunda e aturada
por parte do Governo de então, sendo que, através da Assembleia da República e das entidades ligadas ao
sector, igualmente através da Lei n.º 1/2011, de 14 de Janeiro, foi prorrogado por mais 365 dias, situação que,
na nossa opinião, denota uma fraca adequabilidade do Código Florestal às necessidades do sector.
Daí que, não tendo o Partido Socialista, durante dois anos, conseguido nem regulamentar, nem reavaliar,
nem rever, faz hoje todo o sentido que o Código seja revogado de forma a permitir que o Governo apresente
legislação sistematizada, regulamentada, bem orientada para podermos ter, talvez não um código mas, pelo
menos, legislação que seja compatível com o que a floresta precisa, nomeadamente, no que diz respeito à
forma de organização e de gestão da propriedade e, como dizia o Sr. Deputado Paulo Batista Santos, à forma
como deve ser feito o cadastro.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as
Deputadas, Srs. Deputados: O Bloco de Esquerda votou
contra o Código Florestal, votou a favor das suas suspensões e encara com a maior das naturalidades a
«certidão de óbito» que está hoje, aqui, a expressar-se acerca do Código Florestal. Não sobre a ideia em si,
porque a dispersão legislativa que afecta a floresta portuguesa é também um obstáculo à sua produtividade, à
sua conservação e à sua salvaguarda.
Na verdade, este Código Florestal não veio resolver este problema e ele acabou por morrer sem se
consumar e, portanto, consumiu-se a si próprio, pelo que, neste momento, o caso não merece muito mais
comentário.
O que é exigível, neste preciso momento, é que o Governo e a maioria apresentem, de facto, com unidade
legislativa, com coerência interna, uma sistematização legislativa que possa ajudar os agentes económicos e
todos aqueles que querem proteger e salvaguardar a floresta portuguesa.
O nosso voto é também um voto nessa exigência que faremos ao enterrar este Código Florestal
imprestável e contra o qual estivemos.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Santos.
A Sr.ª Isabel Santos (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Em 2009, por acção do governo do
Partido Socialista, foi apresentado um Código Florestal. Este Código Florestal veio revogar mais de 50
decretos-leis, leis e portarias, veio criar um instrumento regulador para um sector que é fundamental no
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desenvolvimento no nosso País. Basta lembrar que é o terceiro sector exportador, que representa mais de
12% das exportações portuguesas e que tem pela frente todo um potencial de crescimento desta actividade,
que todos nós bem conhecemos e bem avaliamos. Trata-se, pois, de um instrumento regulador, coerente,
consistente e de fácil manuseamento por todos os operadores do sector.
É evidente que esta é uma tarefa hercúlea. Estávamos a rever legislação com mais de 100 anos. Gerou-se
um instrumento com uma tal densidade, complexidade e impactos diferenciados que tornou difícil a sua
regulamentação.
Porém, o trabalho foi feito, a discussão com os parceiros está feita, os contributos foram recolhidos, já
estava feito imenso trabalho no que tem a ver com a revisão de algumas falhas detectadas neste Código, que,
em algumas matérias, foi além do que era expectável um código ir, noutras matérias ficou aquém e noutras
ainda gerou imensas dúvidas em todos os parceiros.
Este processo foi ultrapassado. Neste momento, há condições para fazer a revisão deste Código e a sua
regulamentação com base no trabalho que foi feito, envolvendo todos os parceiros do Conselho Florestal
Nacional.
O que não se compreende, neste momento, ou, melhor, compreende-se bem em função de uma certa
deriva que domina a maioria que nos governa de apagar tudo o que foi feito, querendo-se, pura e
simplesmente, esquecer este Código e, ainda pior do que isso, esquecer a ideia de termos um Código e
passarmos a ter, de novo, legislação avulsa.
Assim, questiono: que garantias é que os senhores nos dão, neste momento, de que, revogando este
Código, vão apresentar um outro código? E, caso assim não seja, que garantias nos podem dar de
sistematização e de adequação da revisão da legislação, que aqui dão a entender querer fazer?
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho
Lopes.
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: O PCP esteve coerentemente contra
este Código Florestal, pela forma como foi elaborado e pelo seu conteúdo, contrariamente às bancadas que
agora subscrevem este projecto de lei, que apenas se abstiveram na votação do Código e que têm uma
argumentação pouco coerente com aquilo que subscreveram no preâmbulo deste projecto de lei.
Somos por um código que tenha um processo de larga auscultação e participação de personalidades e
entidades ligadas à floresta, que respeite a Constituição da República e promova um largo consenso técnico,
económico e político.
Dito isto, julgo que parece pouco razoável a argumentação do projecto de lei, que é incoerente com aquilo
que aqui disseram no debate da proposta de lei que aprovou este Código, que é incoerente com o texto que
subscreveram nos projectos de lei com que suspendemos o Código por duas vezes, e falta solidez à
argumentação.
É um problema de fraca adequabilidade do Código Florestal às necessidades do sector que leva à sua
eliminação? Então, se o Código não esteve em prática, que adequabilidade pode ou não haver? Não se
verificou!…
Mas não são boas, do nosso ponto de vista, e é muito pior do que isto, as razões invocadas pelo PSD e
pelo CDS para acabar com um projecto de código florestal. Julgo que são fracos e falsos os argumentos e o
que nos estão a prometer é uma contra reforma legislativa contra a floresta, contra os compartes dos baldios,
contra a pequena propriedade florestal.
De facto, grave, grave é o que está no preâmbulo do projecto de lei em nome da eliminação de todos os
constrangimentos à execução da política florestal, isto é, o que se está a propor é a desregulação, a
desregulamentação, a liberalização da política florestal para servir os interesses, sempre muito interessados,
dos monopólios das celuloses, dos aglomerados de madeira e da cortiça, que querem, naturalmente, madeira
barata, cortiça barata e espécies de crescimento rápido, rápido e em força.
Os Srs. Deputados falam da falta de adequabilidade dos instrumentos legais de planeamento.
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Srs. Deputados, é um problema de legislação que os PROF (Planos Regionais de Ordenamento Florestal),
os PGF (Planos de Gestão Florestal), os PUB (Planos de Utilização de Baldios) e as ZIF não tenham sido
levadas à prática, não tenham sido concretizadas? É um problema de legislação ou foi o desmantelamento
dos serviços florestais, que os senhores prosseguem alegremente neste Governo? Ou foi o problema da falta
de meios financeiros para apoiar, por exemplo, a concretização das ZIF? Foi a legislação de certeza
absoluta?!…
Os senhores dizem que urge concretizar o investimento no sector. E o problema do investimento no sector
foi de legislação, Srs. Deputados? Mas, então, porque é que os senhores não realizam a reprogramação do
PRODER para a floresta, que continua, tal como no governo do PS, por avançar? Que continua com taxas de
execução ridículas, abaixo de 5%? Porquê essa falta de medidas na reprogramação do PRODER? Não é na
legislação florestal, é na reprogramação do PRODER e na tomada de medidas para que o PRODER florestal
possa ser aplicado.
Mas mais greve, Srs. Deputados, é dizer que os problemas resultam da falta de adequabilidade à realidade
da propriedade florestal nacional. Sim, eu acho que o que os senhores querem dizer é que falta adequação
aos interesses do grande capital da fileira florestal nacional, a que já fiz referência.
De facto, a pequena propriedade florestal, as terras baldias de propriedade dos compartes, são os
obstáculos que não servem esses interesses e os senhores pretendem, ao revogar o Código Florestal, dar
cobertura a uma futura revogação desses obstáculos.
Mas quero dizer-vos que já outros tentaram, durante muitos anos, e não o conseguiram e eu julgo que
vocês, mais uma vez, não vão conseguir fazer aquilo que pretendem com esta aparente revogação do Código
Florestal para servir os interesses dos monopólios da fileira florestal da madeira.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Abel Baptista.
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Agostinho Lopes, deixe-me começar por
dizer que há tantos anos que o senhor acusa o CDS de estar metido com o grande capital e é curioso que eu
estou sempre com o pequeno capital… É uma coisa muito curiosa, e, pessoalmente, tenho cada vez menos
capital… Veja bem a nossa grande desgraça!…
Risos.
O Sr. Deputado vê neste pedido de revogação de um Código, com o qual não concorda, contra o qual
votou…
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Não, não sou contra a revogação!…
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Nós ainda demos o benefício da dúvida ao Código, porque entendíamos
que se ele pudesse ser regulamentado talvez pudesse ser melhorado, mas V. Ex.ª votou contra, e agora,
porque nós queremos revogá-lo, V Ex.ª já é a favor…
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Vocês é que propõem a revogação!…
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Enfim, contradições!…
A Sr.ª Deputada Isabel Santos veio aqui fazer a defesa do Código Florestal, o que lhe foi difícil,
convenhamos. Durante mais de dois anos, o governo do PS criou um Código que não o era verdadeiramente,
era mais uma compilação de legislação que remetia para regulamentação posterior, regulamentação essa que
nunca foi feita, até porque era difícil ser feita, com consulta aos parceiros do sector, mas a grande maioria não
concordavam com o Código.
Portanto, há aqui um conjunto de informações e de práticas erradas.
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O que é que se pretende, neste momento? Pretende-se enterrar, como já aqui foi dito, definitivamente este
Código, partir de novo para a elaboração de nova legislação que tenha a ver com aquilo que é a legislação de
âmbito florestal, organizar esta legislação, sistematizá-la. Agora, quanto a ser um código, se calhar, até refiro
que seja um compêndio de legislação, porque não é pelo simples facto de se fazer uma coisa a que se chama
código que ele se transforma num código… Se calhar, era preferível uma lei de bases, se calhar, era preferível
uma lei-quadro; agora, não é necessariamente relevante que seja um código.
Agora, Sr.ª Deputada, em breve, será apresentada aqui legislação que tem a ver com a área florestal que
irá permitir termos políticas florestais que, espero e tenho a certeza, não serão as políticas florestais do
Governo mas, sim, as políticas florestais do País.
Por isso, apelo ao consenso do PS, como ao dos outros partidos, que será muito bem-vindo para
poderemos ter a legislação florestal nacional de que o País precisa, de que a floresta precisa e de que a
economia tem necessidade para poder crescer e valorizar-se.
Aplausos do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Srs. Deputados, a Mesa não regista mais inscrições, pelo que está
encerrado este ponto da nossa ordem de trabalhos.
Temos ainda mais dois pontos inscritos na nossa ordem do dia, para os quais não estão previstos tempos
para discussão e que iremos votar amanhã, o projecto de lei n.º 109/XII (1.ª) — Procede à oitava alteração à
Lei de Organização e Processo do Tribunal de Contas, aprovada pela Lei n.º 98/97, de 26 de Agosto (PSD,
PS, CDS-PP, PCP, BE e Os Verdes) e o projecto de resolução n.º 130/XII (1.ª) — Quarta alteração à
Resolução da Assembleia da República n.º 57/2004, de 6 de Agosto (PSD, CDS-PP, PCP, BE e Os Verdes).
A Sr.ª Secretária vai ler o expediente que deu entrada durante a sessão.
A Sr.ª Secretária (Maria Paula Cardoso): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, deram entrada na Mesa e
foram admitidos os projectos de lei n.os
118/XII (1.ª) — Aprova o regime jurídico da cópia privada e altera o
artigo 47.º do Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos (Sétima alteração ao Decreto-Lei n.º 63/85,
de 14 de Março) (PS), que baixou às 1.ª e 8.ª Comissões, e 119/XII (1.ª) — Aprova as bases gerais da política
pública de apoio e desenvolvimento das actividades cinematográficas e audiovisuais (PS), que baixa à 8.ª
Comissão.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Srs. Deputados, encontra-se na Assembleia da República o Grupo
de Cantares e Danças de Santa Cruz de Riba Tâmega. Estiveram toda a tarde a aguardar o fim dos nossos
trabalhos para que pudéssemos assistir a uma intervenção artística no átrio do Parlamento. Faço, pois, este
apelo aos Srs. Deputados, mesmo sabendo que a hora já vai muito adiantada, mas não esqueçamos que são
pessoas que se deslocaram de longe.
A nossa ordem de trabalhos para amanhã consiste no debate quinzenal com o Primeiro-Ministro
subordinado ao tema «As conclusões da Cimeira e dos desafios europeus», sendo que no final do debate
haverá votações regimentais.
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.
Eram 19 horas e 59 minutos.
Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:
Partido Social Democrata (PSD)
João Bosco Soares Mota Amaral
Deputados que faltaram à sessão:
Partido Social Democrata (PSD)
Duarte Filipe Batista de Matos Marques
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I SÉRIE — NÚMERO 50
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Partido Socialista (PS)
António José Martins Seguro
João Raul Henriques Sousa Moura Portugal
A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.