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I SÉRIE — NÚMERO 53

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O Sr. José Lello (PS): — Sr.ª Presidente, gostaria apenas de perguntar a V. Ex.ª se, eventualmente, terá

entrado na Mesa algum voto de pesar pela morte do «querido líder», Kim Jong-il.

Aplausos de Deputados do PS e do PSD.

Protestos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Sr. Deputado, interpreto a sua pergunta como uma declaração.

Srs. Deputados, vamos passar à apreciação do voto n.º 34/XII (1.ª) — De pesar pelo falecimento de

Cesária Évora (PSD, PS, CDS-PP, PCP, BE e Os Verdes).

Tem a palavra a Sr.ª Secretária para proceder à respectiva leitura.

A Sr.ª Secretária (Rosa Maria Albernaz): — Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, o voto é o seguinte:

«Frequentei bas-fonds, cantei em bares da ilha e de todo o arquipélago. Tive tantos maridos que lhes perdi

a conta. Mas percebi que a minha voz fazia vibrar e transmitia parcelas de felicidade. De certa forma, foi ela

que me puxou para cima. Hoje meço o caminho percorrido desde o orfanato que me acolheu com sete anos e

relembro todas as batalhas que travei para sair da miséria.»

Assim respondia Cesária Évora, a «diva dos pés descalços» como era conhecida, quando um jornalista a

interrogava sobre o que mais a marcara na vida, na última entrevista que concedeu, pouco tempo antes de

falecer, a 17 de Dezembro passado.

Nascida a 27 de Agosto de 1941, no Mindelo, Cesária Évora começa a cantar mornas e coladeiras aos 16

anos e rapidamente se apercebe do seu imenso talento de intérprete.

Nas ruas e bares do Mindelo cruza-se com músicos e poetas e aperfeiçoa a sua arte. Cesária canta a

tristeza e a melancolia do seu país e do seu povo, tantas vezes obrigado a emigrar para sobreviver. Ganha

notoriedade e rapidamente é proclamada a «rainha da morna».

Mas, apesar do reconhecimento, as contingências da miséria não deixaram de marcar profundamente o

seu percurso de vida.

Em 1975, ano em que Cabo Verde conquistou a independência, Cesária, frustrada por questões pessoais e

financeiras, aliadas à dificuldade económica e política do jovem país, deixa de cantar para sustentar a sua

família. Dez anos, «os anos negros», como ela própria refere, durante os quais Cesária Évora desiste da

carreira, como desiste, de certa forma, da vida. Vida que pensa destinada a um fim trágico.

A História virá a provar o contrário.

Em 1985, encorajada por Bana, cantor e empresário cabo-verdiano radicado em Portugal, Cesária Évora

voltou a actuar em Lisboa. É nessa altura que se cruza com o jovem de origem cabo-verdiana José da Silva,

que se torna o seu produtor e a convence a instalar-se em França.

Em 1988, Cesária grava o álbum La diva aux pied nus (A diva dos pés descalços), fazendo referência à

forma como sempre se apresenta em palco. «Para sentir a terra», explica.

A seu lado tem os maiores músicos do seu país, que nunca esquece e ao qual sempre regressa. Este disco

é saudado pela crítica, mas é em 1992, com o álbum Miss Perfumado, que Cesária Évora conhece o seu

primeiro grande sucesso internacional. A imprensa de todo o mundo fala desta diva e da sua vida difícil. Em

1993, enche, durante três noites seguidas, a mítica sala Olympia e, em 1995, é nomeada pela primeira vez,

com o disco Cesária Évora, para um Grammy Award. Voltará a ser nomeada diversas vezes e acabará por

receber o tão prestigiado prémio em 2003, com Voz de Amor.

Em 2009, é condecorada com a Legião de Honra pelo Estado francês.

Na voz doce e grave de Cesária, que canta os sonhos, as dores, as alegrias, a solidão e as esperanças do

seu povo, a sõdade, ou saudade, esse sentimento que se diz não ter definição possível mas que se sente

como nenhum, Cabo Verde encontrou a sua maior e melhor embaixadora.

Resumir a vida de Cesária Évora à designação de «conto de fadas» seria minimizar a força e o carácter

desta artista. Uma mulher que amou, sofreu, fraquejou mas nunca desistiu. Com o seu talento, desafiou e

venceu o destino. Com o seu desaparecimento, a música fica mais pobre, mas com o seu exemplo todos

ficámos mais ricos. E esse nunca morrerá.

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