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Sexta-feira, 6 de janeiro de 2012 I Série — Número 55
XII LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2011-2012)
REUNIÃOPLENÁRIADE5DEJANEIRODE 2012
Presidente: Ex.ma Sr.ª Maria da Assunção Andrade Esteves
Secretários: Ex.mos
Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco Nuno André Araújo dos Santos Reis e Sá Abel Lima Baptista
S U M Á R I O
A Sr.ª Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas
e 8 minutos. Deu-se conta da entrada na Mesa dos projetos de
resolução n.os
166 a 171/XII (1.ª). Procedeu-se a um debate de urgência, solicitado pelo
PCP, sobre a entrada em funcionamento da televisão digital terrestre (TDT), tendo-se pronunciado, além do Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares (Miguel Relvas), os Srs. Deputados Bruno Dias (PCP), Carla Rodrigues (PSD), Inês de Medeiros (PS), Raúl de Almeida (CDS-PP), Bernardino Soares (PCP), Catarina Martins (BE), José Luís
Ferreira (Os Verdes), Rosa Arezes (PSD), Luís Pita Ameixa (PS) e Adolfo Mesquita Nunes (CDS-PP).
Foram discutidos em conjunto os projetos de resolução n.
os 167/XII (1.ª) — Recomenda ao Governo que, conforme
os termos da cláusula 9 do acordo de 20 de outubro de 2008 celebrado entre a ANACOM e a PT, seja dada cobertura universal do sinal digital, seja por TDT seja por satélite, sem custos adicionais para estes utilizadores, e que promova a abertura de mais canais para uma melhor e maior oferta da TDT tal como está a ser promovida na União Europeia (PS), 169/XII (1.ª) — Adiamento do processo de desligamento da
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rede analógica de televisão, pela garantia de acesso da população à TDT e ao serviço público de televisão em todo o território nacional (PCP), 170/XII (1.ª) — Recomenda ao Governo que adote as medidas necessárias a garantir que não existam cidadãos excluídos, particularmente por razões económicas, no acesso ao sinal digital de televisão, bem como que promova, através das entidades competentes, o incremento de ações de informação e de fiscalização sobre o processo de implementação da TDT (PSD e CDS-PP) e 171/XII (1.ª) — Recomenda o adiamento da interrupção do sinal analógico de televisão, uma oferta televisiva mais alargada e a garantia que a transição para a televisão digital terrestre não será suportada pelos cidadãos (BE). Usaram da palavra, a diverso título, os Srs. Deputados Inês de Medeiros (PS), Bruno Dias (PCP), Francisca Almeida (PSD), Catarina Martins (BE) e Raúl de Almeida (CDS-PP).
Procedeu-se à discussão conjunta, na generalidade, dos projetos de lei n.
os 85/XII (1.ª) — Primeira alteração à Lei n.º
17/2003, de 4 de junho (Iniciativa Legislativa de Cidadãos) (PCP), 123/XII (1.ª) — Altera a Lei n.º 17/2003, de 4 de junho, que regula a Iniciativa Legislativa de Cidadãos (Primeira alteração à Lei n.º 17/2003, de 4 de junho) (BE) e 128/XII (1.ª) — Torna acessível a Iniciativa Legislativa de
Cidadãos, com uma primeira alteração à Lei n.º 17/2003, de 4 de junho (Os Verdes), tendo intervindo os Srs. Deputados António Filipe (PCP), Cecília Honório (BE), Heloísa Apolónia (Os Verdes), Hugo Velosa (PSD), Luís Pita Ameixa (PS) e Telmo Correia (CDS-PP).
Foi discutido, na generalidade, o projeto de lei n.º 32/XII (1.ª) — Altera o Estatuto dos Deputados, aditando novos impedimentos (BE), sobre o qual se pronunciaram os Srs. Deputados Catarina Martins (BE), Telmo Correia (CDS-PP), João Oliveira (PCP), João Portugal (PS) e Sérgio Azevedo (PSD).
Por último, foram apreciados os projetos de resolução n.
os 151/XII (1.ª) — Em defesa do transporte ferroviário na
capital de distrito de Setúbal (Os Verdes) e 164/XII (1.ª) — Recomenda ao Governo a reposição dos locais de paragem do Intercidades em Setúbal e Alcácer do Sal e a restituição do serviço regional da linha do sul entre Barreiro e Tunes (BE), tendo proferido intervenções os Srs. Deputados Heloísa Apolónia (Os Verdes), Mariana Aiveca (BE), Adriano Rafael Moreira (PSD), Eduardo Cabrita (PS), Bruno Dias (PCP) e Nuno Magalhães (CDS-PP).
O Sr. Presidente (Guilherme Silva) encerrou a sessão eram 18 horas e 37 minutos.
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A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que está aberta a sessão.
Eram 15 horas e 8 minutos.
Srs. Deputados presentes à sessão:
Partido Social Democrata (PSD)
Adriano Rafael de Sousa Moreira
Adão José Fonseca Silva
Afonso Gonçalves da Silva Oliveira
Amadeu Albertino Marques Soares Albergaria
Ana Sofia Fernandes Bettencourt
Andreia Carina Machado da Silva Neto
António Carlos Sousa Gomes da Silva Peixoto
António Costa Rodrigues
António Egrejas Leitão Amaro
António Fernando Couto dos Santos
António Manuel Pimenta Prôa
António Pedro Roque da Visitação Oliveira
Arménio dos Santos
Bruno Jorge Viegas Vitorino
Bruno Manuel Pereira Coimbra
Carina João Reis Oliveira
Carla Maria de Pinho Rodrigues
Carlos Alberto Silva Gonçalves
Carlos António Páscoa Gonçalves
Carlos Eduardo Almeida de Abreu Amorim
Carlos Henrique da Costa Neves
Carlos Manuel Faia São Martinho Gomes
Carlos Manuel dos Santos Batista da Silva
Cláudia Sofia Gomes Monteiro de Aguiar
Cristóvão Duarte Nunes Guerreiro Norte
Cristóvão Simão Oliveira de Ribeiro
Cristóvão da Conceição Ventura Crespo
Duarte Filipe Batista de Matos Marques
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Eduardo Alexandre Ribeiro Gonçalves Teixeira
Elsa Maria Simas Cordeiro
Emídio Guerreiro
Emília de Fátima Moreira dos Santos
Fernando Luís de Sousa Machado Soares Vales
Fernando Mimoso Negrão
Fernando Nuno Fernandes Ribeiro dos Reis
Fernando Ribeiro Marques
Fernando Virgílio Cabral da Cruz Macedo
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Hugo Alexandre Lopes Soares
Hugo José Teixeira Velosa
Hélder António Guerra de Sousa Silva
Joana Catarina Barata Reis Lopes
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Jorge Paulo da Silva Oliveira
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José Manuel Marques de Matos Rosa
José Manuel de Albuquerque Portocarrero Canavarro
José Manuel de Matos Correia
José Mendes Bota
João Bosco Soares Mota Amaral
João Carlos Figueiredo Antunes
João Manuel Lobo de Araújo
Laura Maria Santos de Sousa Esperança
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Filipe Valenzuela Tavares Menezes Lopes
Luís Manuel Morais Leite Ramos
Luís Pedro Machado Sampaio de Sousa Pimentel
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Lídia Maria Bulcão Rosa da Silveira Dutra
Manuel Filipe Correia de Jesus
Margarida Rosa Silva de Almeida
Maria Clara Gonçalves Marques Mendes
Maria Ester Vargas de Almeida e Silva
Maria Francisca Fernandes Almeida
Maria Isilda Videira Nogueira da Silva Aguincha
Maria José Quintela Ferreira Castelo Branco
Maria José Vieira Teodoro Moreno
Maria João Machado de Ávila
Maria Manuela Pereira Tender
Maria Paula da Graça Cardoso
Maria da Assunção Andrade Esteves
Maria da Conceição Alves dos Santos Bessa Ruão Pinto
Maria da Conceição Feliciano Antunes Bretts Jardim Pereira
Maria da Conceição Vaz Barroso Carloto Caldeira
Maria da Graça Gonçalves da Mota
Maria das Mercês Gomes Borges da Silva Soares
Maurício Teixeira Marques
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Mário José Magalhães Ferreira
Mário Nelson da Silva Vaz Simões
Mónica Sofia do Amaral Pinto Ferro
Nilza Marília Mouzinho de Sena
Nuno Filipe Miragaia Matias
Nuno Miguel Pestana Chaves e Castro da Encarnação
Nuno Rafael Marona de Carvalho Serra
Odete Maria Loureiro da Silva
Paulo Cardoso Correia da Mota Pinto
Paulo César Rios de Oliveira
Paulo Jorge Frazão Batista dos Santos
Paulo Jorge Simões Ribeiro
Paulo Miguel da Silva Santos
Pedro Alexandre Antunes Faustino Pimpão
Pedro Augusto Cunha Pinto
Pedro Augusto Lynce de Faria
Pedro Filipe dos Santos Alves
Pedro Manuel Tavares Lopes de Andrade Saraiva
Pedro do Ó Barradas de Oliveira Ramos
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Ricardo Augustus Guerreiro Baptista Leite
Rosa Maria Pereira Araújo Arezes
Sérgio Sousa Lopes Freire de Azevedo
Teresa de Andrade Leal Coelho
Teresa de Jesus Costa Santos
Ulisses Manuel Brandão Pereira
Valter António Gaspar de Bernardino Ribeiro
Vasco Manuel Henriques Cunha
Ângela Maria Pinheiro Branquinho Guerra
Partido Socialista (PS)
Acácio Santos da Fonseca Pinto
Alberto Bernardes Costa
Alberto de Sousa Martins
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Ana Paula Mendes Vitorino
António Fernandes da Silva Braga
António José Martins Seguro
António Manuel Soares Serrano
António Ramos Preto
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Basílio Adolfo de Mendonça Horta da Franca
Carlos Filipe de Andrade Neto Brandão
Carlos Manuel Pimentel Enes
Eduardo Arménio do Nascimento Cabrita
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues
Elza Maria Henriques Deus Pais
Eurídice Maria de Sousa Pereira
Fernando Manuel de Jesus
Fernando Medina Maciel Almeida Correia
Fernando Pereira Serrasqueiro
Francisco José Pereira de Assis Miranda
Glória Maria da Silva Araújo
Idália Maria Marques Salvador Serrão
Inês de Saint-Maurice de Esteves de Medeiros Vitorino de Almeida
Isabel de Lima Mayer Alves Moreira
Jacinto Serrão de Freitas
Jorge Lacão Costa
Jorge Manuel Capela Gonçalves Fão
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José António Fonseca Vieira da Silva
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Carlos das Dores Zorrinho
José Duarte Piteira Rica Silvestre Cordeiro
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
João Barroso Soares
João Paulo Feteira Pedrosa
João Raul Henriques Sousa Moura Portugal
João Saldanha de Azevedo Galamba
Júlio Francisco Miranda Calha
Laurentino José Monteiro Castro Dias
Luís António Pita Ameixa
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Luís Miguel Morgado Laranjeiro
Luísa Maria Neves Salgueiro
Manuel Francisco Pizarro de Sampaio e Castro
Manuel José de Faria Seabra Monteiro
Manuel Pedro Cunha da Silva Pereira
Marcos da Cunha e Lorena Perestrello de Vasconcellos
Maria Antónia Moreno Areias de Almeida Santos
Maria Gabriela da Silveira Ferreira Canavilhas
Maria Helena dos Santos André
Maria Hortense Nunes Martins
Maria Isabel Coelho Santos
Maria Isabel Solnado Porto Oneto
Maria Odete da Conceição João
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Miguel João Pisoeiro de Freitas
Mário Manuel Teixeira Guedes Ruivo
Nuno André Araújo dos Santos Reis e Sá
Nuno André Neves Figueiredo
Paulo Alexandre de Carvalho Pisco
Paulo Jorge Oliveira de Ribeiro Campos
Pedro Filipe Mota Delgado Simões Alves
Pedro Manuel Dias de Jesus Marques
Pedro Manuel Farmhouse Simões Alberto
Pedro Nuno de Oliveira Santos
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel de Amaral Rodrigues
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rui Jorge Cordeiro Gonçalves dos Santos
Rui Paulo da Silva Soeiro Figueiredo
Rui Pedro Gonçalves Duarte
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Partido Popular (CDS-PP)
Abel Lima Baptista
Adolfo Miguel Baptista Mesquita Nunes
Altino Bernardo Lemos Bessa
Artur José Gomes Rêgo
Inês Dória Nóbrega Teotónio Pereira Bourbon Ribeiro
Isabel Maria Mousinho de Almeida Galriça Neto
José Duarte de Almeida Ribeiro e Castro
José Helder do Amaral
José Lino Fonseca Ramos
José Manuel de Sousa Rodrigues
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Manuel de Serpa Oliva
João Paulo Barros Viegas
João Pedro Guimarães Gonçalves Pereira
João Rodrigo Pinho de Almeida
Manuel Fialho Isaac
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Maria Margarida Avelar Santos Nunes Marques Neto
Michael Lothar Mendes Seufert
Nuno Miguel Miranda de Magalhães
Raúl Mário Carvalho Camelo de Almeida
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia
Teresa Margarida Figueiredo de Vasconcelos Caeiro
Teresa Maria de Moura Anjinho Tomás Ruivo
Vera Lúcia Alves Rodrigues
Partido Comunista Português (PCP)
Agostinho Nuno de Azevedo Ferreira Lopes
António Filipe Gaião Rodrigues
Artur Jorge da Silva Machado
Bernardino José Torrão Soares
Bruno Ramos Dias
Francisco José de Almeida Lopes
Jerónimo Carvalho de Sousa
José Honório Faria Gonçalves Novo
João Augusto Espadeiro Ramos
João Guilherme Ramos Rosa de Oliveira
Miguel Tiago Crispim Rosado
Paula Alexandra Sobral Guerreiro Santos Barbosa
Paulo Miguel de Barros Pacheco Seara de Sá
Rita Rato Araújo Fonseca
Bloco de Esquerda (BE)
Ana Isabel Drago Lobato
Catarina Soares Martins
Francisco Anacleto Louçã
João Pedro Furtado da Cunha Semedo
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda
Maria Cecília Vicente Duarte Honório
Mariana Rosa Aiveca
Pedro Filipe Gomes Soares
Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV)
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
José Luís Teixeira Ferreira
A Sr.ª Presidente: — O Sr. Secretário vai proceder à leitura do expediente.
O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as
e Srs. Deputados,
entraram na Mesa, e foram admitidos pela Sr.ª Presidente, os seguintes projetos de resolução: n.o 166/XII (1.ª)
— Apoio à candidatura de Portugal à dieta mediterrânica incluída na Lista Representativa do Património
Imaterial da Humanidade (CDS-PP), que baixou às 6.ª, 7.ª e 9.ª Comissões; n.º 167/XII (1.ª) — Recomenda ao
Governo que, conforme os termos da cláusula 9 do acordo de 20 de outubro de 2008 celebrado entre a
ANACOM e a PT, seja dada cobertura universal do sinal digital, seja por TDT seja por satélite, sem custos
adicionais para estes utilizadores e que promova a abertura de mais canais para uma melhor e maior oferta da
TDT tal como está a ser promovida na União Europeia (PS), que baixou à 12.ª Comissão; n.º 168/XII (1.ª) —
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Recomenda ao Governo que as instalações do Governo Civil da Guarda sejam utilizadas para instalar
condignamente o Comando Distrital da PSP (PCP), que baixou à 1.ª Comissão; n.º 169/XII (1.ª) — Adiamento
do processo de desligamento da rede analógica de televisão, pela garantia de acesso da população à TDT e
ao serviço público de televisão em todo o território nacional (PCP), que baixou à 12.ª Comissão; n.º 170/XII
(1.ª) — Recomenda ao Governo que adote as medidas necessárias a garantir que não existam cidadãos
excluídos, particularmente por razões económicas, no acesso ao sinal digital de televisão, bem como que
promova, através das entidades competentes, o incremento de ações de informação e de fiscalização sobre o
processo de implementação da TDT (PSD e CDS-PP), que baixou à 12.ª Comissão; e n.º 171/XII (1.ª) —
Recomenda o adiamento da interrupção do sinal analógico de televisão, uma oferta televisiva mais alargada e
a garantia de que a transição para a televisão digital terrestre não será suportada pelos cidadãos (BE), que
baixou também à 12.ª Comissão.
A Sr.ª Presidente: — O primeiro ponto da nossa ordem do dia de hoje consta de um debate de urgência,
solicitado pelo PCP, sobre a entrada em funcionamento da televisão digital terrestre (TDT).
Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Bruno Dias.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as
e Srs. Deputados: Se nada
for feito imediatamente, o processo de introdução da televisão digital terrestre em Portugal e o correspondente
desligamento das atuais emissões analógicas ficará recordado como um dos negócios mais vergonhosos,
mais desastrosos, com impactos diretos para a vida das pessoas.
É um verdadeiro escândalo nacional que continua a acontecer como se nada fosse, apesar dos sucessivos
alertas, das reuniões e audições nesta Assembleia, onde o problema se colocou ao longo do tempo.
Apesar dos alertas de autarcas, de especialistas, de trabalhadores e de organizações de trabalhadores do
setor, o primeiro responsável desta situação é o PS, que estava no governo e que decidiu esta questão em
2008. O principal responsável atual é o Governo PSD/CDS, que deixou correr o problema e, em novembro
passado, vendeu em leilão as frequências para a rede 4G, aproveitando o apagão analógico, que interessa (e
muito!) às operadoras.
Temos, portanto, que, de hoje a uma semana, é desligada a emissão analógica da televisão em sinal
aberto na vasta e altamente povoada faixa do território litoral do País.
Na cobertura das emissões terrestres da TDT, a situação é da maior gravidade. Milhares de pessoas que
atualmente estão cobertas por sinal analógico, pura e simplesmente veem os emissores e retransmissores das
suas regiões desligados. São inúmeros os retransmissores que atualmente servem as populações com
qualidade e que vão ser, pura e simplesmente, desligados.
Afirma-se que a cobertura TDT atual chega a 90% da população (muito abaixo dos atuais 98% de
cobertura da RTP1), mas a verdade é outra Os dados da ANACOM baseiam-se em simulações feitas em
computador, ignorando variáveis como condições meteorológicas, variações locais de relevo ou obstrução das
antenas.
Chegam-nos testemunhos de que, em muitas áreas supostamente cobertas, não é possível captar a TDT.
Noutras zonas, por exemplo dentro da zona piloto de Alenquer (com inúmeras reclamações sem resposta
efetiva da ANACOM), em condições meteorológicas adversas o sinal cai completamente.
A PT, empresa concessionária da rede TDT em Portugal, colocou um mínimo de emissores no território,
concentrou-os nas áreas de maior densidade populacional de modo a maximizar com um mínimo de custos a
quota de cobertura a que estava obrigada, mas deixando vastas áreas geográficas sem emissão terrestre.
Há concelhos inteiros que, na verdade, não têm alternativa se não o acesso à televisão por satélite, como
se estivessem na floresta amazónica ou no deserto do Saara. Apenas a título de exemplo, refiro os casos de
Vila Praia de Âncora, Paredes de Coura, Vieira do Minho, Arganil, Manteigas, Portel, Ferreira do Alentejo,
Almodôvar e Alcoutim. É também o caso do grupo ocidental do arquipélago dos Açores! É ainda o caso da
maior parte do território, de concelhos como Oliveira do Hospital, Seia, Vouzela, Castro Daire, Grândola e
Ourique. E veja-se o caso das ilhas das Flores e do Corvo, totalmente privadas de televisão terrestre!
Alega a ANACOM que toda a população excluída da TDT tem cobertura via satélite. Mas quanto custa a
instalação para esse acesso? Cerca de 116 € por equipamento para um só televisor!
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Entretanto, é claro que a PT tem o exclusivo da venda dos recetores de satélite, e quando as autarquias
denunciam este escandaloso abandono das populações e exigem soluções concretas aparece a PT a oferecer
à câmara os seus serviços.
O último caso que nos chegou foi o da proposta à Câmara Municipal de Vouzela de instalação de três
pontos emissores de microcobertura a povoações do concelho pela módica quantia de 90 mil euros. Chama-se
a isto criar dificuldades para vender soluções!
Aplausos do PCP.
Nos últimos dias têm chegado a ser frenéticos os contactos telefónicos para a casa das pessoas a
impingirem-lhes assinaturas do serviço de acesso pago das várias operadoras. Ligam a dizer que vão desligar
a televisão e que, para que possam ver a nova televisão, têm de subscrever uma nova assinatura.
Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as
e Srs. Deputados: Mais uma vez reafirmamos o alerta
quanto à oportunidade perdida que tem sido o processo da televisão digital terrestre e a ameaça de
degradação que pode até daí resultar para a acessibilidade ao serviço público de televisão.
A verdade que se está a escamotear é a de que com a TDT poderíamos ter mais serviço público em sinal
aberto e não menos, poderíamos ter economias de escala e gerir melhor os recursos, com mais e melhor
oferta. Tudo isso foi ignorado.
Se ao serviço público fosse atribuído um multiplex próprio, a população poderia aceder de forma livre e
gratuita a todos os canais da televisão pública, incluindo aqueles que hoje estão disponíveis apenas na
televisão de acesso pago! Esta possibilidade nunca foi considerada.
A TDT poderia ser a oportunidade para uma oferta televisiva para todos que incluísse em todas as
emissões a possibilidade de acesso a tradução para a língua gestual, a legendagem em direto e a
audiodescrição. Tudo isto foi ignorado.
Portugal terá como triste distinção o facto de ser o País europeu com o menor número de canais nesta
plataforma digital.
Por toda a Europa, a introdução da TDT foi fator de maior variedade de oferta televisiva: em Espanha, há
20 canais de acesso gratuito, cinco dos quais do serviço público; no Reino Unido, há 38 canais de acesso
gratuito, nove dos quais do serviço público; em Itália, há 27 canais de acesso gratuito, oito dos quais do
serviço público; em França, há 29 canais de acesso gratuito, oito dos quais do serviço público; na Alemanha,
há 20 canais de acesso gratuito com a maior abrangência nacional, nove dos quais do serviço público.
Este processo está, na verdade, a transformar-se num gigantesco mecanismo de angariação de clientes
para a MEO, do Grupo PT, e para outras operadoras, de venda de recetores de satélite fornecidos pela PT, de
venda e instalação de pontos emissores de microcobertura, fornecidos pela PT, e de libertação de frequências
para o negócio das comunicações móveis 4G, para a Vodafone, para a Optimus/Sonaecom e, claro, para a
PT.
Demonstra-se, assim, mais uma vez, como o poder político está, e continua, ao serviço do poder
económico e como o poder económico, e neste caso a PT, está a viver muito acima das nossas possibilidades!
Aplausos do PCP.
Não será por falta de aviso que o Governo não atua. Ainda tem uma semana para intervir. Mais adiante
discutiremos o projeto de resolução do PCP e apresentaremos propostas concretas para resolver esta
situação. Mas para já exige-se que o Governo assuma as suas próprias responsabilidades.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Tem agora a palavra, para uma intervenção, o Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos
Parlamentares.
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O Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares (Miguel Relvas): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs.
Deputados: Devo dizer que este debate é extraordinariamente positivo, sendo de alerta para a decisão que
vamos ter de assumir dentro de oito dias — a migração da televisão analógica para a televisão digital.
Mais vale tarde do que nunca. A verdade é que iniciei esta avaliação no dia da transferência de
competências para o meu cargo de ministro, em que o meu antecessor me informou da realidade da televisão
digital terrestre.
É importante lembrar que a PT ganhou um concurso, que foi público e transparente, e que este processo
foi acompanhado, ao longo de toda a sua evolução, pela ANACOM, que é uma entidade reguladora
independente.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Neste caso, nos termos da lei, não é!
O Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares: — A ANACOM acompanhou todo este processo
e sabemos, pelos estudos que possuímos, que 95% dos portugueses sabem da realidade com que estão
confrontados.
Sabemos também que foi feito um investimento muito significativo em campanhas de promoção: a
ANACOM fez um investimento de 2,5 milhões de euros e a Portugal Telecom fez um investimento de 4
milhões de euros.
Portanto, a realidade que temos é no sentido de avançar com atenção em relação a todas as
circunstâncias que daqui decorrem.
Tivemos consciência do impacto social que esta medida iria ter e, por isso, no início de setembro, tive
oportunidade de reunir com os três operadores de televisão (a RTP, a SIC e a TVI), com a ANACOM e com a
PT. De uma forma muito clara, ponderou-se o adiamento, ou não, até 31 de dezembro de 2012, mas fomos
todos confrontados com a realidade que decorre dos contratos assumidos por cada um dos operadores —
independentemente da posição do Estado — pela SIC, pela TVI e pela RTP, com a PT, os quais implicam
obrigações de parte a parte. A obrigação da PT, de cobertura de 90% do território, está cumprida, bem como
dos restantes 10% por satélite.
A questão colocada foi a de que se o adiamento fosse uma matéria que estivesse em cima da mesa, a PT
não estava em condições de cumprir o contrato que foi estabelecido. Esse mesmo contrato era para cinco
canais e só se vai verificar a receita de quatro canais, porque, como sabem, há um processo judicial a decorrer
em relação ao quinto canal e a PT, estando em condições de fornecer este serviço, entendia que ele deveria
ser pago a partir do dia 12 de janeiro pelos três operadores.
Tendo sido confrontados com esta realidade, coube-me a mim tomar a decisão de manter a data de 12 de
janeiro.
Como sabem, este processo será assumido ao longo de três fases, até Abril deste ano. Temo-lo trabalhado
em permanência com a ANACOM, tal como com a PT e com os operadores, no sentido de, em primeiro lugar,
iniciar um processo de divulgação junto dos portugueses da realidade com que seriam confrontados a partir do
dia 12 de janeiro, e de, em segundo lugar, a cobertura ser iniciada gradualmente até Abril, tendo em atenção a
possibilidade de, nos casos mais difíceis, o switch-off ser feito só em Abril para podermos fazer a cobertura
dessas regiões mais delicadas.
Estamos em condições de dizer que acreditamos que, com o empenhamento da Portugal Telecom, que foi
quem ganhou o concurso, e com o acompanhamento técnico da ANACOM, este processo atingirá os seus
objetivos a partir do dia 12 de Janeiro com uma primeira cobertura na zona da faixa do litoral do País e,
depois, com a fase de evolução que referi.
É importante (e os operadores estão a colaborar também nesse sentido) fazer campanhas de informação.
Este foi o caminho seguido e as campanhas de divulgação terão um reforço de uma verba suplementar da
ANACOM para que todos os portugueses conheçam a realidade com que serão confrontados ao longo das
três fases entre janeiro e abril.
Gostaria de lembrar àqueles que despertaram para esta realidade, acredito que mais preocupados com o
calendário político do que com a realidade, que este debate poderia ter sido feito há um mês, há dois…
Quando reuni com os operadores, com a ANACOM e com a PT, no início de setembro, fi-lo com uma evidente
preocupação: se adiávamos ou não. E, se não adiássemos, tínhamos ou não condições de poder prestar o
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serviço público de televisão? Isto porque, em primeiro lugar, o Estado é aqui diretamente interveniente pelo
facto de deter dois canais generalistas de televisão.
Já agora, quero aqui dizer que se fosse assumido o adiamento isso teria custos muito significativos para a
própria RTP, para além de custos para os operadores, que têm hoje condições de poder cumprir.
Portanto, a questão que se coloca não é a de olhar para o passado, não é a de dizer de quem é a
responsabilidade. De facto, o processo iniciou-se em 2008, o calendário foi desde logo estabelecido e
sabemos que no dia 12 de janeiro estaremos em condições de os portugueses poderem migrar para a
televisão digital terrestre.
Por outro lado, quanto à questão dos apoios, ainda hoje a PT, numa atitude suplementar, reduziu em 15 €
o custo do descodificador, sendo também público que há um apoio muito significativo para as famílias mais
carenciadas. Mais importante do que a cobertura do território nacional é a cobertura do número de famílias
que estão abrangidas.
Aliás, quero também lembrar que Portugal é dos países na Europa com maior área de cobertura de
televisão paga: temos uma cobertura de 70%, em contraponto com 40% em Itália, 22% em Espanha e 45% no
Reino Unido.
Temos, portanto, condições para que este processo, com tranquilidade, com equilíbrio, com estabilidade e
com informação, possa vir a decorrer dentro daquilo que foi definido deste o início.
Mas é importante aqui referir que houve um concurso público, que esse concurso foi transparente e que
ambas as partes exerceram aquelas que eram as suas competências: a ANACOM tem a competência de
acompanhamento e de fiscalização de todo o processo e a PT está hoje em condições de poder assumir os
compromissos do concurso público que ganhou.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Encontram-se inscritos, para proferirem intervenções, os Srs. Deputados Carla
Rodrigues, do PSD, Inês de Medeiros, do PS, Raúl de Almeida, do CDS-PP, Bernardino Soares, do PCP,
Catarina Martins, do BE, e José Luís Ferreira, de Os Verdes.
Tem, pois, a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Carla Rodrigues.
A Sr.ª Carla Rodrigues (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, Sr.as
e Srs.
Deputados: Finalmente o problema da implantação da televisão digital terrestre em Portugal começa a ser
uma preocupação partilhada por todos. Mas, infelizmente, esta preocupação generalizada surge da pressão
do calendário e das gritantes evidências que já ninguém pode ignorar.
Esta preocupação generalizada surge quando estamos a escassos dias do primeiro desligamento
analógico de parte do território nacional, ou seja, surge tarde e a más horas.
Diga-se, em abono da verdade, que o PSD foi a primeira voz, nesta Casa, a alertar para os erros que
estavam a ser cometidos, e fê-lo há mais de um ano, ou seja, quando ainda havia tempo para reverter este
processo.
Vozes do PSD: — Muito bem!
Protestos do PCP.
A Sr.ª Carla Rodrigues (PSD): — Lembro que, em fevereiro de 2011, há cerca de um ano, numa audição
parlamentar ao então ministro da tutela, hoje Deputado Jorge Lacão, eu própria manifestei a nossa profunda
desilusão com a forma como o processo estava a decorrer. Mais: acrescentei que, se nada fosse feito, a TDT,
em Portugal, arriscava-se a ser um colossal fracasso.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — E o que é que foi feito?
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A Sr.ª Carla Rodrigues (PSD): — E lembram-se da resposta que aquele ministro do governo do PS me
deu? Disse: «A mais de um ano dessa data, a sua afirmação é intempestiva!». Era esta a posição do governo
de então, corroborada pelo Partido Socialista.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — E vai daí…?
A Sr.ª Carla Rodrigues (PSD): — Infelizmente, a minha afirmação não era intempestiva e o tempo veio a
dar-nos razão.
Vozes do PSD: — Muito bem!
A Sr.ª Carla Rodrigues (PSD): — Por isso, esta súbita preocupação do PS com a TDT, com a
apresentação de um projeto de resolução, que hoje será discutido, com várias recomendações ao Governo, só
pode ser interpretada como um ato de contrição, porque o PS só pode estar arrependido de não nos ter dado
ouvidos, o PS só pode estar arrependido de ter negligenciado o acompanhamento deste processo e de ter
sido cúmplice de todos os erros que foram cometidos.
O PS vem, agora, recomendar ao Governo que, em poucos dias, faça aquilo que o seu governo não fez ao
longo de mais de quatro anos. Mas já se esqueceram que foi o governo do PS que esteve à frente deste
processo desde o seu arranque em Portugal?
Portugal foi um dos últimos países da Europa a avançar com o processo de implantação da televisão digital
terrestre e é também um dos países com um período de simulcast mais curto.
Só em Abril de 2009 foi efetivamente lançada em Portugal a TDT. O prazo para a cobertura de todo o
território nacional era dezembro de 2010, mas foi adiado. O primeiro desligamento piloto, que estava previsto
para Alenquer para 3 de Fevereiro de 2011, foi adiado. O segundo desligamento, que estava previsto para o
Cacém para 7 de Abril, foi adiado. O terceiro desligamento foi adiado. A primeira campanha de esclarecimento
às populações, que estava prevista para o fim do verão de 2010, foi adiada, tendo sido depois reagendada
para início de 2011, mas também foi adiada. Perante isto, o ministro da tutela de então entendia que as
preocupações do PSD eram intempestivas!…
É este o brevíssimo historial dos fracassos deste processo: atraso generalizado, sucessivos adiamentos,
incumprimento do operador, falta de regulação, negligência e passividade do governo do PS.
Já nesta Legislatura, na primeira audição do Sr. Ministro Miguel Relvas na Comissão para a Ética, a
Cidadania e a Comunicação, voltámos a chamar a atenção do Governo para este atraso generalizado, para a
falta de informação das populações e para os incumprimentos e práticas fraudulentas que se vinham a
verificar.
Há pouco mais de três meses, o Grupo Parlamentar do PSD requereu a vinda da ANACOM a este
Parlamento para prestar alguns esclarecimentos relativamente ao procedimento das lojas da PT sobre a
aquisição de equipamentos e sobre as portas de informação à população, pelo que o Grupo Parlamentar do
PSD não esperou pela véspera do apagão analógico para agir.
E, Sr.as
e Srs. Deputados, o Governo também não esperou. Este Governo, assim que iniciou funções, há
seis meses, tomou de imediato em mãos este assunto, reunindo com a RTP, com a PT Comunicações e com
a ANACOM, tudo fazendo para recuperar o tempo perdido.
As campanhas, efetivamente, estão no terreno, a informação já está a chegar às populações, os órgãos de
comunicação social, mormente a RTP, estão a colaborar neste processo de esclarecimento e informação e
estamos cientes de que tudo será feito por este Governo para que ninguém fique excluído deste processo de
transição.
Mas não esperemos milagres, Srs. Deputados! Sejamos realistas: o processo começou mal, continuou
ainda pior, mas estamos agora confiantes de que este Governo tudo fará para que acabe o melhor possível.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Isso é que é esperança!
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A Sr.ª Carla Rodrigues (PSD): — Arriscaria mesmo dizer que este Governo fez mais em seis meses pelo
esclarecimento das populações e por todo este processo da televisão digital terrestre em Portugal do que o
governo socialista fez ao longo de quatro anos.
Vozes do PSD: — Muito bem!
A Sr.ª Carla Rodrigues (PSD): — Fala-se agora no adiamento do apagão. O Sr. Ministro Miguel Relvas
não excluiu essa hipótese no início e muniu-se de toda a informação necessária à tomada de decisão. Mas,
pergunto: teremos todos consciência das implicações e dos custos deste adiamento? Teremos todos
consciência de que este adiamento só será possível por alguns meses, ou seja, até dezembro, e se as
vantagens deste adiamento seriam superiores aos prejuízos que este adiamento nos traria, sabendo-se que só
poderia ser feito até dezembro?
Outros vêm agora falar da problemática das «zonas sombra» e da introdução de mais canais no serviço de
TDT. É caso para dizer: esta preocupação é que é, de facto, intempestiva e de má consciência.
Vozes do PSD: — Muito bem!
A Sr.ª Carla Rodrigues (PSD): — Mas não nos ficamos pelo «nós bem avisámos!». Nós não baixamos os
braços e continuamos tão ou mais preocupados do que estávamos na altura e estamos, sobretudo, de
consciência tranquila, porque tudo fizemos para alertar para o curso dos acontecimentos.
Hoje apresentaremos um projeto de resolução e estamos a fazer o que é possível, com determinação, ao
lado das populações e ao lado da televisão gratuita em Portugal, mas não podemos branquear a história. E se
chegámos onde chegámos foi porque alguém assim o permitiu e o responsável todos nós sabemos quem é.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Lá isso é verdade!
A Sr.ª Carla Rodrigues (PSD): — Vamos, então, todos, tentar recuperar o tempo perdido.
Para terminar, queria apenas dizer, Sr.ª Presidente, que não deixa de ser irónico que os que se arrogam de
arautos da defesa do serviço público de televisão sejam os mesmos que consentiram que a situação chegasse
onde chegou, originando que alguns portugueses ficassem sem televisão nenhuma.
Aplausos do PSD.
São ironias das agendas partidárias e dos oportunismos políticos!
Vozes do PSD: — Muito bem!
A Sr.ª Carla Rodrigues (PSD): — Srs. Deputados, estamos confiantes de que este Governo não o
permitirá e que até abril serão tomadas medidas na defesa da televisão gratuita em Portugal.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Também para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Inês de Medeiros.
A Sr.ª Inês de Medeiros (PS): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as
e Deputados: Devo dizer
que a intervenção do Sr. Ministro descansou-me no sentido de que íamos ter um debate com alguma
qualidade, deixando de lado as querelas políticas para tratar dos assuntos que interessam aos portugueses.
Mas a intervenção da Sr.ª Deputada Carla Rodrigues veio distorcer um pouco o tom inicial, pelo que, espero,
nesta intervenção, retomar alguma coerência.
Começo por relembrar a importância da passagem do sinal analógico para o sinal digital e o que é que isto
significa em termos de melhoria não só de qualidade de imagem e de som para todos os utilizadores de
televisão, como também para o enriquecimento na oferta e na variedade dos conteúdos televisivos e outros,
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sendo, por isso, essencial para o desenvolvimento da sociedade de informação. Esta passagem permite uma
gestão otimizada do espectro radioelétrico com reais benefícios para os recursos públicos.
Trata-se de uma matéria com uma importância estratégica decisiva para o interesse nacional, enquanto
veículo privilegiado de promoção da igualdade de acesso e de infoinclusão, enquanto oportunidade de
promoção de ofertas de conteúdos e de novos serviços audiovisuais multimédia e enquanto estímulo à
produção nacional e instrumento de criação direta e indireta de postos de trabalho.
Esta realidade não pode ser esquecida nunca! A passagem para o digital é uma mais-valia para o nosso
País.
Aplausos do PS.
E, para evitar confusões, que têm surgido muitas vezes, convém fazer aqui um brevíssimo historial, que
vou tentar que seja o mais sucinto possível.
Importa lembrar que foi, de facto, ao nível europeu que se decidiu o ano de 2012 como o da passagem
definitiva para o sinal digital. Convém também lembrar que foi nesse sentido que o governo tomou todas as
medidas necessárias e que abriu um concurso, em 2007, para a atribuição da plataforma e também dos canais
que iam acompanhar essa plataforma digital. Convém ainda lembrar que esse concurso foi ganho pela PT —
havia um outro concorrente, sueco — e que esse concurso foi feito em função de um caderno de encargos que
o governo da altura tinha criado. E é muito importante que se relembre que nesse caderno de encargos não só
estava garantido o acesso de toda a população — até se falava em 100% da população — ao digital, mas
também se admitia que poderia haver algumas dificuldades em que tudo fosse por via terrestre e a
necessidade de se criarem sistemas alternativos.
Gosto de ouvir o Sr. Ministro dizer que estamos em condições para fazer essa passagem para o digital,
gosto de ouvir o Sr. Ministro dizer que as campanhas estão no ar, pelo que, Sr.ª Deputada Carla Rodrigues,
permita-me que lhe diga que se isso está em condições não é, de certeza, pela ação do governo nos últimos
seis meses, mas sim porque esse esforço começou a ser feito antes.
Portanto, Sr.ª Deputada, as suas palavras são um pouco ambíguas. Se é o próprio Ministro dos Assuntos
Parlamentares que assume que estamos em condições para fazer essa passagem, a isso se deve também,
obviamente, a ação do Governo anterior.
Qual é o problema neste momento?
O problema maior encontra-se justamente nos sistemas alternativos — e vou só falar daquilo que a oferta
de televisão não paga, ou seja, o multiplex A. E, nesse caso, a PT criou, de facto, um sistema alternativo, tal
como lhe era devido, por satélite. E o problema é que há dificuldades na instalação desse sistema alternativo.
Não tenho dúvidas de que, a prazo, esse sistema possa funcionar. O que estava previsto é que esse
sistema alternativo não podia representar, de forma alguma, nem uma diminuição na oferta que era garantida
às populações dessas zonas como também não podia de todo significar um aumento de custos para essas
populações.
Sr. Ministro, a minha questão é simples — foi a única questão que o Sr. Ministro não abordou: o que está
aqui em causa são os custos que a PT está a pedir por este sistema alternativo e que estão muito longe dos
custos que eram estipulados. É isso que está em causa e que nós trazemos aqui a debate, Sr. Ministro.
De facto, até estava previsto haver uma comparticipação para as famílias mais carenciadas, mas essa
comparticipação está limitada aos 22 € e, em média, o tal kit complementar custa 90 € por televisor.
Importa dizer também que a PT estava obrigada a pagar a instalação desses sistemas alternativos. E o que
está a acontecer é que a PT criou um sistema de autoinstalação pelo utilizador, pelo que, caso o utilizador não
seja capaz de o fazer, também tem de pagar a instalação, o que acresce em muito o seu preço.
Para nós, é, pois, absolutamente incompreensível que, perante a apatia total do Governo, a ANACOM
tenha legitimado estas práticas da PT, que vão contra o acordo assinado em 2008.
Vozes do PS: — Muito bem!
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A Sr.ª Inês de Medeiros (PS): — Se o Governo reuniu em setembro com todas as entidades, o que quero
saber, Sr. Ministro é de que forma é que permite que uma entidade reguladora, e não provedora de interesses
dos seus regulados, aceite uma prática comercial abusiva — e eu meço as minhas palavras — sem reação.
Essa é que é a questão essencial.
A terminar, gostaria ainda de abordar uma última questão.
O Sr. Ministro falou do serviço público.
A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Inês de Medeiros (PS): — Termino já, Sr.ª Presidente.
A passagem para a TDT representou, em toda a Europa, um aumento da oferta de serviços públicos —
isso já foi aqui relembrado. Aliás, com a única e verdadeira decisão que vemos nesta área, que é a de anular
um canal de serviço público, nós vamos ficar equiparados, Sr. Ministro — veja lá! —, em termos de oferta
televisiva, também na TDT, apenas a dois países na Europa: a Albânia e a Bulgária. A minha pergunta é, pois,
a seguinte: são estas as realidades que passam a ser a referência do nosso país nesta matéria?
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Raúl de Almeida.
O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as
e Srs. Deputados:
Confesso que, depois de ouvir a intervenção da Sr.ª Deputada Inês de Medeiros, o que fiz com toda a
atenção, fiquei confuso e cheguei a pensar que este era um processo com seis meses que este Governo tinha
herdado muito bem pré-preparado do governo Sócrates. Mas parece-me que não é assim, importando fazer
resumidamente o enquadramento histórico da TDT em Portugal. E como ponto prévio é muito importante
ressalvar que a TDT resulta de uma imposição da Comissão Europeia aos Estados-membros.
Devemos ter em conta que o desligamento começou já em 2006 na Holanda e que a vizinha Espanha já
fez o mesmo desligamento e a migração para o digital há dois anos atrás.
O início do processo em Portugal remonta ao ano 2000 — estava o PS no governo e era o Eng.º Guterres
primeiro-ministro —, quando ocorreu o primeiro concurso, que viria a desmoronar-se em 2003 por desistência
do vencedor. Esta foi a primeira grande machadada neste processo.
Protestos da Deputada do PS Inês de Medeiros.
Em 2006 e 2007, o processo foi visto e o modelo readaptado. Lembramos hoje que já em 2007, quando se
discutia com o Governo socialista de então a lei da televisão neste Hemiciclo, o então Deputado Pedro Mota
Soares alertou em nome do CDS para uma séria de questões sobre o modelo adotado e que se viriam a
revelar verdadeiros obstáculos ao normal desenvolvimento deste processo.
Seguidamente, o governo socialista assistiu ao falhanço do famoso quinto canal, em Novembro de 2008.
Desde essa data que o governo socialista assumiu, perante as consequências como geriu o processo durante
todos estes anos, que a TDT seria apenas uma nova plataforma tecnológica para prestar essencialmente um
serviço de televisão que já dispúnhamos via analógica e não mais do que isto.
O que é que falhou? Até há algum tempo, falhou a informação sobre o modo de proceder à migração do
sistema. Ficámos a saber, pela intervenção da Sr.ª Deputada Inês de Medeiros, que estava tudo pré-
preparado, mas, de facto, informação a sério só se viu depois que este Governo começou em funções.
Falhou o envolvimento dos vários agentes sociais, políticos e económicos, a relação de tensão permanente
com a DECO tem sido um exemplo claro desta falta de envolvimento, deste historial de conflito permanente.
Falhou, claramente, a mobilização dos cidadãos. Este tem sido um processo permanentemente minado por
mal-entendidos, por mitos urbanos da mais diversa espécie, criando mais receios do que esclarecimentos,
junto da população.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
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O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — Resumindo: o Partido Socialista adiou para lá do limite razoável as
medidas facilitadoras de uma migração o mais tranquila possível.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — Coube a este Governo da coligação PSD/CDS a agilização do
processo e, mais difícil, fazer em tempo recorde o que devia e deveria há muito tempo estar feito de modo a
cumprir compromissos e a evitar avultados prejuízos ao País.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — Um processo como este nunca é isento de desconfortos pontuais, de
despesas que, neste momento, sabemos assumirem um particular dramatismo para muitas famílias
carenciadas do nosso país. Mas vemos também com satisfação que há uma preocupação e um compromisso
expressos de ajudar neste particular quem tem menos possibilidades.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Como?
O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — Esperemos que os constrangimentos técnicos se resolvam
prontamente com a salvaguarda dos consumidores de televisão, tornando este processo o mais pacífico
possível, mas, por favor, Sr. Ministro, não adiando mais uma decisão que já deveria ter sido tomada há muito.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as
e Srs. Deputados:
Ainda bem que o PCP trouxe hoje este debate de urgência ao Plenário da Assembleia da República. É que
isso evitou que o silêncio acerca desta matéria tornasse a questão num facto consumado em benefício da PT
e da forma como está a aproveitar este processo.
O Sr. Ministro fez-nos aqui um historial da situação, só que não trouxe resposta para nenhum problema
concreto.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Nada!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — E o que nós queremos aqui são respostas para os problemas
concretos. Durante estes dias, os autarcas dirigiram-se-nos para colocarem os problemas das suas freguesias,
dos seus concelhos, das suas populações, que não conseguirão ter acesso à televisão, bem como houve
pessoas que protestaram individualmente, porque estão a ser oneradas com um custo que não deviam pagar.
Esses problemas não estão a ter resposta neste debate por parte do Governo.
O Sr. Ministro diz que houve uns milhões para a divulgação — em muitos casos, aliás, baseada em
publicidade enganosa. Mas nós não queremos divulgação, queremos é ação, queremos é intervenção para
atalhar os problemas que vão ser criados se o desligamento avançar nos prazos que estão previstos.
Bem sei que é justa a crítica do PSD em relação à súbita preocupação do PS. É mais ou menos simétrica à
súbita despreocupação do PSD.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Exatamente!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É que o governo anterior criou este problema, é o primeiro
responsável por ele, foi quem fez o concurso nestas condições e o Governo atual «deixou correr o marfim»,
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deixou que tudo se consumasse e agora recusa-se a apresentar soluções quando elas ainda são possíveis,
quando elas existem e quando elas são indispensáveis.
Disse o Sr. Ministro que a cobertura do contrato está pronta — 90% do território nacional. Como se fosse
aceitável — e esse é um problema naturalmente do concurso —, quando se aumenta a qualidade da
plataforma tecnológica, diminuir a cobertura do território nacional!
Isto é, excluem-se populações do acesso à melhoria da tecnologia.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Uma vergonha!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — E, mesmo dentro das zonas supostamente cobertas, o Sr. Ministro
sabe bem que os problemas são mais que muitos, designadamente nas zonas piloto, em que a TDT já está
em transmissão, que não estão resolvidos e que não estarão se não houver alguma intervenção.
Depois, temos esta singularidade de não se aumentarem os canais disponibilizados gratuitamente, ao
contrário do que aconteceu em todos os países onde este processo avançou! Só aqui é que não é possível!
Digam-nos lá porquê, porque é que este País tem a singularidade de não poder ter acesso a mais canais
gratuitos como aconteceu em todos os outros países da Europa só para beneficiar os operadores de TV paga,
que é essa a razão de fundo desta questão.
Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, é preciso dizer também que este processo deixa bem claro —
e é preciso que fique claro para processos que venham a ocorrer noutros sectores — o que é a regulação no
nosso país. A regulação é proteger os interesses dos regulados quando eles são monopolistas ou grandes
grupos económicos a intervir no sector. Foi isso exatamente que aconteceu neste caso, porque o que vemos é
a ANACOM a defender a PT e não a defender as populações, que têm direito ao acesso à televisão.
E o que é que vai acontecer a todas aquelas populações que estão isoladas? Aos idosos que estão em
casa e que só têm como companhia a televisão? Às pessoas que toda a vida, desde os últimos 50 anos,
tiveram acesso à televisão e que, de um dia para o outro, vão ter a televisão cortada, vão ter esse direito
negado, a não ser que paguem quantias substanciais para as suas bolsas e para os orçamentos das suas
famílias?
Essas pessoas têm direito à televisão e não podem deixar de ter, porque o governo anterior, ou este,
fizeram um negócio ruinoso com a PT para a televisão digital terrestre.
O adiamento, Sr. Ministro, é possível. Não nos venha dizer que o Governo que corta subsídios aos
funcionários públicos, que impõe restrições brutais nos serviços públicos, que impõe uma série de medidas
contra direitos adquiridos não pode intervir porque há um contrato com a PT! É a mesma lógica de sempre: se
for um grupo económico, o contrato é para valer; se for a população, se forem as autarquias, se forem os
trabalhadores, o contrato é para romper.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — É para rasgar!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Portanto, Sr. Ministro, o desafio que aqui fica é este: tome o Governo
a medida de adiar o desligamento da emissão analógica e de obrigar a PT a cobrir devidamente e sem custos
para as populações aquilo que é todo o território nacional, porque não há portugueses de primeira e
portugueses de segunda. Os portugueses é que contam, não os grupos económicos!
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina Martins.
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as
e Srs. Deputados: A
introdução da televisão digital terrestre em Portugal é, sem dúvida, um absurdo técnico, uma chantagem
económica sobre a população e é um processo que está a promover, ainda mais, a desigualdade e um País a
duas velocidades. A verdade é que a introdução da televisão digital terrestre em Portugal está a ser um
imposto disfarçado. Agora, em Portugal, para ver televisão, a população é obrigada a pagar um imposto
disfarçado à PT e às operadoras da televisão paga.
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Ora, é isto que está em causa e é isto que é inaceitável. Trata-se de um absurdo tecnológico, porque a
televisão digital terrestre era a promessa de melhor e de mais televisão e o que temos é exatamente a mesma
oferta, mas que, ainda, por cima, não chega a todo o território. É um absurdo tecnológico, não há qualquer
explicação técnica para isto, porque o que está a acontecer contraria os próprios pressupostos técnicos do que
deveria ser a TDT e do que foi a sua introdução em toda a Europa. É completamente inaceitável, irresponsável
e inexplicável!
Trata-se também de chantagem económica. Todos conhecemos o anúncio da televisão, que diz: «Em
janeiro, se não tiver TDT, vai ficar sem televisão, vem aí o apagão». E qual é a solução que oferece?
Oferece a seguinte solução, que é a mais fácil e a que está a ser imposta: pague-se uma mensalidade de
televisão! Passamos a ter de pagar uma mensalidade de televisão para termos a certeza de que continuamos
a ver televisão. É esta a publicidade, é isto que se diz ser a informação à população! Isto não é informação, é
desinformação, é publicidade enganosa e está a obrigar tantas e tantas famílias a passarem a ter televisão
paga em casa!
Aqueles que resistem à publicidade enganosa e que, com muito esforço, tentam procurar informação
sabem que terão de comprar um descodificador para cada televisão, se viverem no litoral e nas zonas
cobertas pela digital terrestre, e que talvez tenham de subir ao telhado para reorientar a antena, mas, se não
forem capazes, terão de pagar muito mais do que um descodificador por cada televisão, porque terão de pagar
todo esse serviço.
Quem vive no interior, estes, sim, terão de pagar um sistema caríssimo! As famílias do interior vão pagar 50
milhões de euros para verem televisão! O que o País está a pedir às famílias do interior é um esforço para que
paguem 50 milhões de euros, de modo a continuarem a ver a mesma televisão que viam antes —
desigualdade e irresponsabilidade completamente inaceitáveis!
O Governo do Partido Socialista lançou um concurso inaceitável, feito à medida das distribuidoras de
televisão paga, e entregou-se à empresa que menos interessada estava no sucesso da TDT, na distribuição
da TDT. Isto é completamente inaceitável! Mas o Governo que temos agora, e que, como muito bem
lembraram, foi crítico do sistema da TDT, não pode ficar de «braços cruzados» e dizer que está tudo feito. Não
está tudo feito! É preciso parar agora e é preciso transformar a TDT numa oportunidade para todo o País e
para toda a população, em todo o território. E não pode ser a população a pagar os lucros da PT, os lucros das
distribuidoras de televisão paga. A completa subserviência dos governos às distribuidoras de televisão paga e,
muito especialmente, à PT tornou a TDT um ataque ao País, e este ataque tem de ser parado!
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as
e Srs.
Deputados: Discutimos, hoje, a televisão digital terrestre, que tem a bonita sigla TDT, mas não sei se lhe
devemos chamar TDT ou «TAT», trapalhada atrás de trapalhada,…
Risos do PCP.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — … tantas são as singularidades deste processo.
A primeira trapalhada tem a ver, desde logo, com o início do processo, ou seja, com o concurso e as
questões da concorrência. E esta trapalhada não tem só a ver com o facto de apenas duas empresas terem
concorrido para atribuição da licença. É que a PT/MEO, que ganhou o concurso para operador de distribuição,
tem interesses ou, antes, tem tudo a ganhar com a fragilidade da oferta da TDT. O Sr. Ministro diz-nos que o
processo foi transparente, mas não sei se foi ou não, o que sei é que a Associação Nacional de Municípios
Portugueses já requereu uma investigação ao Ministério Público no sentido de apurar se o interesse público foi
ou não salvaguardado.
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O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — A segunda trapalhada é de clara incompetência política, porque é
mesmo disto que se trata. Quando se exige à operadora que seja assegurada a cobertura de uma
percentagem do território, em vez de se exigir que se assegure uma percentagem da população, é de
incompetência política que estamos a falar e não de outra coisa. E o resultado está à vista! No meio do
«apagão», começa a fazer-se luz: mais de 1,3 milhões de portugueses terão de pagar por uma antena para
terem acesso à televisão. E não são apenas os custos com a aquisição da antena que as famílias terão de
despender! Para além da antena, que não pode ser qualquer uma, terá de ser uma antena amplificada, é
ainda necessário adquirir um kit para a TDT por satélite. Isto já para não falar dos custos com os cabos e a
instalação, que terá de ser feita por um técnico, que também é preciso pagar. Ou seja, estamos a falar de
custos, no mínimo, na ordem dos 150 €.
Mas temos ainda mais trapalhadas: enquanto no resto da Europa a introdução da TDT foi o catalisador de
uma explosão de variedades de oferta televisiva, Portugal ficará com a «medalha digital» pelo facto de ser o
País europeu com menor número de canais nesta plataforma.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Uma vergonha!
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — É que um dos aspetos fundamentais da transição para a TDT é a
oferta de canais de serviço público, já que a cobertura universal, esta, presume-se adquirida e é um dado
adquirido. Mas assim não é, assim não está a ser e assim não será, se o Governo não tomar medidas. O
serviço público que o Estado deveria prestar está a ser negado a mais de 1,3 milhões de cidadãos
portugueses. Isto é inadmissível!
Portanto, o que se exige é um modelo de TDT com cobertura total do território, de forma a garantir um
serviço público de televisão. É completamente inaceitável que a TDT não chegue a todos da mesma forma. É
que, Sr. Ministro, não há portugueses de 1.ª e portugueses de 2.ª, muito menos em matéria de acesso a
direitos!
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Exatamente!
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — De facto, «chovem» mails de todo o lado, de Vouzela a
Mangualde, de Viseu a Vila Real. Mas não é só no interior que isto se verifica, também em muitas localidades
do litoral se passa o mesmo. Dou apenas o exemplo da vila de Caranguejeira, que dista apenas 15 km de
Leiria e tem o mesmo problema.
Portanto, Sr. Ministro, seria sensato que o Governo ponderasse o adiamento do «apagão», de forma a
garantir que, em matéria de acesso a direitos, não há portugueses de 1.ª e portugueses de 2.ª. Seria bom que
o Governo fizesse o seu trabalho, isto é, que garantisse um serviço público de televisão para todos e nas
mesmas circunstâncias.
Aplausos da Deputada de Os Verdes Heloísa Apolónia e do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos
Parlamentares.
O Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares: — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Volto
a dizer e a assumir que esta não é, para mim, uma matéria de combate político nem de olhar para o passado.
Temos de olhar para o próximo dia 12 e vê-lo como o momento de migração da televisão analógica para a
televisão digital, o qual será dividido em três períodos, de uma parte significativa da população portuguesa.
Deixem-me, aliás, dizer-vos que essa referência estava feita nas próprias Grandes Opções do Plano,
discutidas aqui, no Parlamento, em novembro,…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Pois estava! Votámos contra!
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O Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares: — … e não ouvi, nessa altura, da parte dos Srs.
Deputados, dificuldades, outros caminhos ou questões como as que estão agora a suscitar.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Votámos contra!
O Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares: — Fazem-no agora,…
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Há anos!
O Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares: — … porque estamos a uma semana da
migração da televisão analógica para a digital. É uma questão de oportunismo político, que será desmentida
pela realidade.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Vamos ver!
O Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares: — Volto a frisar que a ANACOM é uma entidade
independente, que desempenha, efetivamente, o seu papel de regulador, como tive oportunidade de
comprovar ao longo destes seis meses que tenho tido funções, em todo este processo e noutros.
Quanto à questão da publicidade enganosa, penso que, nesta matéria, também é muito importante que se
diga a verdade. O tríptico que foi distribuído pelo País, aos milhões, é muito claro: a televisão continuará a ser
gratuita em relação aos canais generalistas.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É gratuita! Tem é de se pagar para se ter televisão gratuita!
O Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares: — Em relação ao que foi dito pela Sr.ª Deputada
Inês de Medeiros, deixe-me que lhe diga que a questão de haver mais ou menos canais decorre do concurso e
da realidade com que fomos confrontados no fim. A senhora já era Deputada nessa altura, ao longo do
processo, na anterior Legislatura — eu não era —, e teve, certamente, informação vária e profunda sobre toda
esta matéria. Vejo-a agora muito surpreendida, mas essa surpresa só pode decorrer do discurso político, não
vejo outra razão. Pela nossa parte, sempre soubemos que o que estava em causa, na fase final do concurso
da TDT, eram cinco canais…
O Sr. Paulo Campos (PS): — Sete canais!
O Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares: — Se o Sr. Deputado Paulo Campos quer
intervir, pode usar da palavra. O senhor, nesta matéria, como em muitas outras, também era parte direta, pelo
que, se quiser intervir, tem a palavra.
Protestos do PS.
Sabemos como terminou o concurso, foi um concurso público transparente e devo dizer, agora que noto a
presença do Sr. Deputado Jorge Lacão, que está a decorrer dentro dos prazos e de acordo com os planos que
me foram transferidos pelo Sr. Deputado Jorge Lacão, quando assumi estas funções, de uma forma muito
clara e objetiva. Aliás, o Sr. Deputado Jorge Lacão chamou-me à atenção para todas as dificuldades que
poderíamos encontrar ao longo do processo, o que me foi extraordinariamente útil para poder, desde logo,
iniciar diligências que levassem a ultrapassar as circunstâncias e os obstáculos com que poderíamos ser
confrontados.
A questão central é, pois, a de encontrarmos soluções para os obstáculos e para os problemas.
Devo dizer que a ANACOM contactou cada um dos 308 municípios, que, durante meses, não se
preocuparam com o processo. Fazem-no agora, e bem, volto a frisar, porque mais vale tarde do que nunca.
Estamos cá, até abril, para encontrar soluções que resolvam muitos dos problemas. O que se passou esta
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semana com a Associação Aldeias do Xisto é disso um bom exemplo: foram suscitadas questões e a PT e a
ANACOM estão, cada uma, no quadro das suas competências, a tentar encontrar soluções para os obstáculos
com que fomos confrontados e que temos de ultrapassar, naturalmente, sem dramatizar, mas com muita
seriedade, com profissionalismo e com a consciência de que tudo o que puder ser ultrapassado tecnicamente
tem de o ser.
É também de referir, e ninguém o faz, que, em relação à cobertura por satélite — temos uma cobertura
digital de 90% e os outros 10% são assegurados por satélite —, ainda hoje foi anunciada pela PT a diminuição
do custo dos kits, que vai colocar a custo médio, como se não fossem para televisão por satélite. Portanto,
esta também é uma falsa questão.
Ou seja, o que é fundamental e, para mim, decisivo é o cumprimento rigoroso e na íntegra do contrato
público que foi adjudicado à Portugal Telecom e que cabe à ANACOM e também a mim, no âmbito das minhas
competências, acompanhar, permitindo que se criem todas as condições para que possamos atingir o nosso
objetivo, que é o de fazer a migração para a televisão digital, conforme estava definido no âmbito do concurso.
E devo dizer que o vamos cumprir, como, aliás, terão oportunidade de confirmar, já que íamos convidar para
estarem presentes na primeira sessão os Srs. Deputados da Comissão para a Ética, a Cidadania e a
Comunicação, mas vamos estender esse convite aos líderes parlamentares, de modo a que o Sr. Deputado
Bernardino Soares possa estar presente e possa comprovar, vendo e ouvindo, qual será a realidade, embora
saiba que o Sr. Deputado, no fundo…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Mas vamos fazer isso no Piódão!…
O Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares: — … e no seu íntimo, pretende que tenhamos
êxito e que este é apenas um interlúdio da sua intenção e do seu objetivo.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Por este andar, não é fácil!
O Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares: — Vamos trabalhar nesse sentido, tal como os
autarcas, porque o papel das autarquias, aqui, também é extraordinariamente importante.
Penso que uma situação como esta, da televisão digital, nos deve obrigar a todos a olhar para ela com
muita seriedade e com uma atitude construtiva. É importante para o País e, em particular, para os portugueses
em situação mais desfavorável e mais carenciados. É por isso que para esses estão previstos apoios
específicos, que lhes permitam continuar a ter acesso à televisão generalista, agora em versão digital.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, antes de passarmos à segunda ronda deste debate, quero dar um
esclarecimento sobre a agenda da reunião plenária, que inclui o encerramento do debate, em termos formais,
com a interpretação de que se trata de um agendamento potestativo.
Ora, o requerimento do PCP é para um debate de urgência, que não invoca a norma do artigo 74.º, n.º 5,
do Regimento, que é aquela que faz o debate de urgência consistir, também ele, no exercício de um direito
potestativo.
Sendo assim, Srs. Deputados, não vamos considerar o encerramento formal, visto que não se trata aqui do
exercício de um direito potestativo por parte do PCP, sendo que tenho a informação de que não foi
verdadeiramente esta a interpretação que foi feita na Conferência de Líderes. Da próxima vez, eu própria me
encarregarei de deixar clara esta questão.
Portanto, em razão dos argumentos que acabei de apresentar, não teremos um encerramento formal deste
debate de urgência.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
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A Sr.ª Presidente: — Passamos, então, à segunda ronda, para a qual estão já inscritos os Srs. Deputados
Rosa Arezes, do PSD, Luís Pita Ameixa, do PS, Adolfo Mesquita Nunes, do CDS-PP, Bruno Dias, do PCP,
Catarina Martins, do BE, e José Luís Ferreira, de Os Verdes.
Tem a palavra, em primeiro lugar, a Sr.ª Deputada Rosa Arezes.
A Sr.ª Rosa Arezes (PSD): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as
e Srs. Deputados: Como é
do domínio público, o processo relacionado com a «migração para o sinal digital» já tem um longo histórico
que vai muito para além dos seis meses e meio que este Governo leva de funções e da atual Legislatura.
A questão não é, portanto, nova. Há muito que estava anunciado que, a partir de 2012, o acesso aos
quatro canais generalistas seria efetuado apenas através do sistema TDT, acabando em definitivo a difusão de
sinal analógico.
Nova é, isso, sim, a polémica que, agora, por golpe de mágica, alguns setores descobriram e parecem
querer espalhar no espírito dos cidadãos.
Vozes do PSD: — Muito bem!
A Sr.ª Rosa Arezes (PSD): — No seu desejo de protagonismo, não olham a meios, nem se inibem de fazer
tábua rasa de um aspeto crucial que nunca é demais recordar.
Não foi o Governo PSD/CDS que lançou e acompanhou desde a primeira hora este processo,…
Vozes do PSD: — Bem lembrado!
A Sr.ª Rosa Arezes (PSD): — … herdou-o do governo socialista já em plena velocidade de cruzeiro, mas é
este Governo que tem a responsabilidade de o implementar.
Vozes do PSD: — Muito bem!
A Sr.ª Rosa Arezes (PSD): — Sr.as
e Srs. Deputados, não contem connosco para andar aos ziguezagues,
de acordo com agendas que, aparentemente, nada têm a ver com a defesa do interesse público e a melhoria
da qualidade do serviço.
Vozes do PSD: — Muito bem!
A Sr.ª Rosa Arezes (PSD): — O PSD tem memória e tem coerência. Por isso, está disponível e
interessado em introduzir, neste processo, eventuais mecanismos de aperfeiçoamento que se traduzam numa
mais-valia para as populações. Mas não está disponível para alimentar situações de impasse e de imobilismo,
para «dar o dito por não dito» ou para encontrar, agora, espinhos onde, ainda há meses, só havia rosas.
Vozes do PSD: — Muito bem!
A Sr.ª Rosa Arezes (PSD): — Sabemos que o Governo está a acompanhar este processo e tem
reafirmado o que está escrito no Orçamento do Estado para 2012. E passo a citar: «será dada particular
atenção às mudanças em curso, de forma a garantir que não há cidadãos excluídos relativamente aos
benefícios que se possam colher dessas mudanças».
Sr.as
e Srs. Deputados, este é o caminho que nos propomos prosseguir, apoiando o Governo numa tarefa
de aprofundamento da divulgação da informação, desburocratizando todo o processo e, acima de tudo,
assegurando a todos os cidadãos condições de igualdade no acesso ao sinal digital.
Este é o projeto que o PSD defende, apoiando o Governo no seu trabalho acrescido de supervisão da
atuação da Portugal Telecom e da ANACOM neste processo, tendo em vista, única e exclusivamente, o
cumprimento escrupuloso das suas obrigações.
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Tudo isto, Sr.as
e Srs. Deputados, em nome da melhoria da qualidade do serviço; tudo isto em nome do
interesse público. Tudo isto em nome do desígnio reformista e de recuperação da credibilidade do nosso País,
que é a imagem de marca deste Governo que o PSD tem a honra de apoiar.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Pita Ameixa.
O Sr. Luís Pita Ameixa (PS): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Queria, em
primeiro lugar, pôr em relevo a importância de Portugal, acompanhando, aliás, uma decisão da União
Europeia, ter tomado esta decisão de modernização, de evolução tecnológica no seu espaço radioelétrico. É
igualmente muito importante que os sucessivos governos agarrem nesta decisão e a promovam a bem do
povo português, porque será ele o beneficiário de uma televisão mais capaz, com mais qualidade.
Foi justamente o governo do Partido Socialista — e isso deve sublinhado — que desencadeou este
processo de uma forma efetiva e foi por isso que chegámos hoje a um período concludente, o qual será de
grande importância.
As questões que se colocam são, fundamentalmente, três: em primeiro lugar, a da cobertura do território
nacional e da população em termos de igualdade de acesso; em segundo lugar, a das funcionalidades que a
TDT oferecerá; em terceiro lugar, a dos conteúdos e dos canais a que os cidadãos deverão ter acesso.
Em relação aos conteúdos e ao canais, o problema que se põe é que, tal como foi concursado ainda do
tempo do governo anterior, através da ANACOM, há espaço radioelétrico para, pelo menos, oito canais, ou
talvez mais.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Muito mais!
O Sr. Luís Pita Ameixa (PS): — Esses canais poderiam ser emitidos. Quer os conhecidos quatro canais
generalistas, quer a RTP em alta definição, quer os canais dos Açores e da Madeira, todos eles têm lá espaço.
Se, agora, o Governo pretende acabar com os canais dos Açores e da Madeira e com um dos canais da RTP,
o que vai acontecer é que os cidadãos, para além do esforço acrescido que lhes é pedido para acederem à
TDT, vão ter menos canais de televisão e menos conteúdos. Este é um dos problemas que o Governo tem que
resolver! Esse problema está nas mãos do Governo! O Governo tem competência e possibilidade para
resolvê-lo, sendo que ainda pode e deve fazê-lo!
A outra questão que quero referir tem a ver com a cobertura do território. No caderno de encargos e na
licença atribuída à Portugal Telecom, está escrito, e é muito claro, que a Portugal Telecom fica obrigada a
subsidiar, incluindo a mão de obra, equipamentos recetores terminais, antena e cablagem, os clientes das
zonas não cobertas por radiodifusão digital terrestre para que estes não tenham qualquer acréscimo de
custos, face aos utilizadores daquelas. Quer isto dizer que quem é coberto pelas redes hertzianas terrestres
tem que ter as mesmas condições de quem é coberto pelo DTH, ou seja, de quem recebe as emissões via
satélite.
Mas, Sr. Ministro, isso não está a acontecer, pois as pessoas que não têm sinal terrestre e, por isso, têm
que instalar uma parabólica para receberem emissões via satélite, têm custos altamente acrescidos É a isto
que o Governo tem que responder e é isto que o Governo tem que resolver. Aliás, o Partido Socialista
apresentou um projeto de resolução, que vai ser discutido, justamente nesse sentido.
Temos que dar a todos os cidadãos condições de igualdade. Não podemos ter pessoas que recebem a
TDT mais barata e pessoas que a recebem mais cara. O custo tem que ser igual para todos. A transmissão do
sinal é da responsabilidade do Estado, não é da responsabilidade dos cidadãos que estão em casa!
Portanto, é a estas duas questões — a dos conteúdos e dos canais e a da cobertura em igualdade de
circunstâncias — que o Governo tem que responder e tem que resolver!
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Adolfo Mesquita Nunes.
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O Sr. Adolfo Mesquita Nunes (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados:
Estamos, neste Parlamento, a discutir realidades e não ficções.
Ficção é discutir, como alguns pretendem, a televisão digital terrestre como se este modelo, estas regras,
estes custos, estas consequências, estes problemas estivessem a ser definidos agora e pertencessem à
legitimidade desta Legislatura. Não é verdade! Não podemos discutir a televisão digital terrestre como se
tivéssemos seis anos pela frente para tratar do assunto, com se não tivéssemos herdado as tristes
consequências a que já fizemos referência.
Ficção é discutir a televisão digital terrestre como se não estivéssemos a uma semana da primeira
migração. Não nos peçam para discutir uma televisão digital terrestre como se, afinal, tivéssemos anos à
nossa frente para podermos resolver os problemas que temos para resolver.
Ficção é discutir a televisão digital terrestre como se o processo que nos trouxe até aqui tivesse sido
simples, correto, limpo e transparente. Não o foi, e estamos a receber os problemas do processo que
herdámos, sendo que alguém tem que os resolver, e tem que os resolver no plano da realidade e não no plano
da ficção.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Adolfo Mesquita Nunes (CDS-PP): — Ficção é pretender que é possível uma televisão digital
terrestre sem custos, de borla, gratuita, ou que esta televisão digital terrestre tem custos que não eram
conhecidos desde o início do processo. Não é verdade. Os custos existem, são conhecidos de todos e não
são uma novidade a uma semana da primeira migração.
Ficção é também insistir na ideia de que, se o dinheiro for gasto pelo Estado, não sai do bolso dos
contribuintes, como se fosse possível pretender que o dinheiro que o Estado tem não lhes sai diretamente do
bolso.
Portanto, esta ideia de uma televisão digital terrestre sem custos para as famílias — custos que foram
assumidos no início do processo pelo governo anterior — e de que o dinheiro que sai do Estado não é dos
contribuintes e não os afeta é algo que só pode estar no plano da ficção! Ficção, essa, aliás, que conduziu o
País ao triste estado em que se encontra.
O Sr. Paulo Campos (PS): — Era o que cá faltava!
O Sr. Adolfo Mesquita Nunes (CDS-PP): — A ideia de que é tudo gratuito e de que o Estado tem outro
dinheiro que não o dos contribuintes.
Dito isto, é evidente que o CDS está preocupado com alguns aspetos da primeira migração e das
migrações seguintes da televisão digital terrestre.
É por essa razão — no ponto seguinte da ordem do dia, falaremos disso — que apresentamos um projeto
de resolução sobre esta matéria. Mas, uma vez mais, porque há algo que nos distingue aqui, o nosso projeto
de resolução é sobre a realidade que vivemos a uma semana da primeira migração e não sobre uma qualquer
ficção de uma televisão digital terrestre que está para vir daqui a seis anos e que temos muito tempo para
alterar, condicionar ou modificar.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Verificamos, aqui,
a caricata situação de termos um Governo e uma maioria que estão muito preocupados mas muito tranquilos e
que afirmam que o tempo foi passando, que se fartaram de avisar mas que agora é tarde demais e não há
nada a fazer.
Vozes do PCP: — Exatamente!
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O Sr. Bruno Dias (PCP): — É preciso que se diga o que há de fazer-se perante isto!
Srs. Deputados e Srs. Membros do Governo, o Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares diz que
não quer olhar para o passado. Então, olhe, ao menos, para o presente!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Mesmo que não queira, olhe, ao menos, para o presente e para a próxima
semana, porque o Governo ainda tem uma semana para intervir e tem que tomar medidas agora! E o
adiamento deste «apagão», que está marcado para o dia 12 de janeiro, é possível e necessário! Não há
qualquer obrigatoriedade incontornável que nos obrigue a condenar as pessoas ao facto consumado de
ficarem sem televisão, quando isso pode ser evitado!
O que tem o Sr. Ministro para nos dizer sobre as negociações com a PT, sobre o leilão de frequências 4G,
de que resulta o «apagão analógico», em que, curiosamente, cada uma das três operadoras pagou
exatamente os mesmíssimos 45 milhões de euros por cada lote de frequências,…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Foi cá um leilão…!
O Sr. Bruno Dias (PCP): — … já no tempo do atual Governo?! O que tem para nos dizer sobre as práticas
de tipo mafioso com que as pessoas têm sido confrontadas «à pala» da TDT?!
Há, ainda, uma questão concreta que ainda pode e tem que ser atendida, que é a do número de canais em
sinal aberto. Não é aceitável que vários canais da televisão pública, ou desde logo o Canal Parlamento, em
que está a ser emitida esta sessão plenária, só sejam acessíveis à população através de plataformas de
televisão de acesso pago! Do ponto de vista da cidadania e das políticas públicas de comunicação e
informação, isto é inaceitável,…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. Bruno Dias (PCP): — … particularmente quando há dezenas de canais em sinal aberto e com
acesso gratuito, Srs. Deputados!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Ora bem!
O Sr. Bruno Dias (PCP): — É que na zona raiana do Alto Minho as pessoas ficam sem televisão
portuguesa e passam não a migrar, Sr. Ministro, mas, sim, a emigrar…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. Bruno Dias (PCP): — … sem sair de casa, porque só têm televisão galega, só têm televisão
espanhola, com cinquenta e tais canais de acesso gratuito, Srs. Deputados!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Ora bem!
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Estão a fazer as pessoas emigrar sem sequer saírem de casa!
Esta política pode ser alterada! Estamos a tempo! Mas é agora, é nesta semana, Sr. Ministro e Srs.
Deputados, porque, se nada for feito, há milhares de pessoas que vão recuar décadas nas suas vidas e voltar
ao tempo em que não havia televisão! Os senhores estão tão preocupados em não olhar para o passado que
estão a condenar milhares e milhares de pessoas a voltarem ao passado,…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
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O Sr. Bruno Dias (PCP): — … com um impacto muito sério nas suas vidas, pois o seu dia a dia é
profundamente afetado!
Não venham aqui dizer que o que está feito pelo PS feito está e continuará nas mãos do PSD e do CDS,
porque, ao menos nesta parte do debate político em torno das políticas de comunicação social, de televisão e
de telecomunicações, não podemos continuar nesta coisa de «vira o disco e toca o mesmo» em que os
partidos da troica nacional, lá porque assinaram com a troica estrangeira um pacto de agressão, continuam a
aplicar estes negócios com o leilão das frequências a servir de Constituição da República para um negócio
milionário que deveria estar em último lugar e não acima do interesse nacional!
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina Martins.
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Neste debate, compreendemos que a
bancada parlamentar do PSD percebe que há problemas com a implantação da TDT e sabemos que também
o percebem os autarcas. Mas, Srs. Deputados, o vosso Governo não percebe, pois diz que está tudo bem. O
Governo diz que está tudo bem. E isto é que é inacreditável, porque sabemos que não está tudo bem! Que
não pode estar tudo bem, sabemos todos!
Portanto, esta é a altura de pensar que se não está tudo bem, tem que se corrigir!
Sr. Ministro, vai correr bem? É que já está a correr mal! Em Portugal, quantas pessoas não estão já a pagar
mensalidades de televisão por causa do desastroso processo de transição do analógico para o digital?!
Quantas pessoas não entram todos os dias nas lojas da PT e saem de lá com uma assinatura?! Quantas
pessoas não veem o anúncio da ZON, ou não recebem um telefonema em casa, e não têm já uma assinatura,
às vezes para ver quatro canais na mesma?! Quantas das nossas famílias não estão, neste momento, a pagar
prestações — mais uma prestação numa altura de crise, numa altura em que é tão difícil chegar ao fim do
mês? Quantas pessoas não estão já a pagar mais uma prestação, e essa prestação é para verem televisão?!
Isto é inaceitável!
Está a correr bem? Há um panfleto nas caixas de correio. Têm visto televisão, Sr. Ministro? Tem visto os
anúncios? Tem visto aquilo que chega à grande maioria da população sobre a televisão digital terrestre?
Estamos a brincar?!
É chantagem económica pura e simples sobre a população portuguesa. E não há nada que justifique isto!
Não há nada que justifique isto, a não ser a completa subserviência para com os interesses da PT e os
interesses das operadoras que vendem a televisão paga. Vamos ter quatro canais de televisão na TDT?! Os
mesmos que temos agora?! E para ter esses quatro canais vamos pagar?!
Paga toda a gente, porque todos vão ter de pagar ou televisores novos ou descodificadores, até alterações
das antenas, em alguns casos. Paga muito, mesmo muito, a população do interior, das zonas que já são mais
excluídas. Temos 500 000 casas em que, no mínimo, vão gastar 100 €, se já tiverem um televisor, para ver
TDT! São 50 milhões de euros que as populações do interior vão ter de pagar para terem acesso aos mesmos
quatro canais a que têm acesso hoje. E, por sinal, até já pagam, na fatura da eletricidade, a taxa do
audiovisual para terem acesso à televisão pública!
Mas, na realidade, ontem, quando a RTP Informação, o canal noticioso da televisão pública, passou um
debate sobre a TDT, quem tem TDT não o pôde ver! Porquê? Porque a TDT tem os mesmos quatro canais!
Isto é inaceitável, é irresponsável! E, se se reconhece que há um problema, o problema corrige-se! Ninguém
cumpriu! A PT não cumpriu! A ANACOM foi tudo menos o regulador e muito menos independente.
Não está o Governo preso a nada que não seja a vontade de continuar a servir os interesses da PT e das
operadoras de televisão paga, para não alterar o curso deste processo já!
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.
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O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Ministro bem pode dizer
que não, mas a verdade é que, com o modelo TDT que está a ser prosseguido, estamos a perder uma
oportunidade histórica para efetuar um salto gigantesco no que diz respeito à qualidade e variedade do serviço
televisivo prestado às populações.
Em todos os restantes países europeus, a instalação da TDT veio trazer um aumento do número de canais
e, afinal, em Portugal, o que vamos ter? O que vem para Portugal? Qual é a oferta? A oferta de canais
gratuitos é exatamente a mesma da oferta analógica, ou seja, estamos a desperdiçar completamente as
vantagens da tecnologia digital. E o pior é que a lógica da mudança para a TDT tinha como objetivo o reforço
da oferta. Mas não é esse o caminho apontado.
O mais grave, porém, é que este sistema vai deixar, como eu disse há pouco, 1,3 milhões de portugueses
às escuras. E, depois, vem a ANACOM — que o Sr. Ministro tem em tão boa conta — sossegar as famílias
que vivem nas zonas sombra e dizer «bem, se não recebem por via terrestre, podem receber por via satélite».
Pois podem! Só que esta solução implica custos adicionais que rondam os 150 € por televisor e estes custos
têm de ser suportados pelas pessoas. Logo, o recurso à via satélite, com os custos a serem suportados pelas
pessoas, viola, de forma grosseira, o princípio da equidade e penaliza, sobretudo, os consumidores nos
pequenos meios habitacionais mais isolados da informação e com menos recursos financeiros.
Assim, na perspetiva de Os Verdes, impor custos adicionais — que é aquilo que o Governo está a fazer —
aos cidadãos para acederem a um direito, que é o de terem acesso à televisão em canal aberto, é
inadmissível. Sr. Ministro, não pode ser! O Governo tem de arranjar soluções! O Governo tem de provar que
todo este processo é motivado pela defesa do bem público e não pela defesa do bem privado, nomeadamente
das operadoras de telecomunicações móveis.
Depois, ainda temos as campanhas de informação. Até essas foram uma verdadeira trapalhada. As
campanhas de informação foram tardias e pouco claras, com resultados desastrosos face àquilo que era
desejável, e a falta de informação está até a levar a abusos por parte da operadora. É a DECO que o diz. A
DECO alerta para o facto de a PT estar a cobrar, ilegalmente, para verificar a cobertura do sinal TDT. Em
causa estão as regiões onde sobram dúvidas sobre como é rececionado o serviço TDT. Isto é, se chega a
casa do consumidor por via terrestre ou se é necessário recorrer à via satélite. O que tem acontecido é que a
PT aconselha os consumidores aí residentes a pagar do seu bolso a técnicos para verificarem a cobertura, o
que, na nossa perspetiva, é inadmissível. Seria bom que o Sr. Ministro também nos dissesse aqui, hoje, se
confirma estas operações, enfim, se tem alguma coisa a dizer sobre este assunto.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Muito bem!
A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos
Parlamentares.
O Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares: — Sr.ª Presidente, concluo este debate como
comecei: com a consciência de que alguns Srs. Deputados «aterraram» com uma significativa ligeireza neste
problema e também com a previsibilidade de saber aquilo que cada um aqui diria, face à circunstância em que
nos encontramos de estar a sete dias do lançamento da televisão digital.
Protestos do PCP e do BE.
Não falei de facilidades; falei, sim, de consciência de que as dificuldades e os obstáculos têm de ser
ultrapassados, que temos trabalhado nesse sentido.
Devo também dizer que haverá uma cobertura dos quatro canais em televisão digital para a Região
Autónoma da Madeira e para a Região Autónoma dos Açores; que vamos ter quatro canais generalistas e não
teremos o quinto canal porque há um processo judicial, que é público; e que, em simultâneo, existia também a
possibilidade de um canal de alta definição, que não vai existir porque os três operadores — era assim que
estava previsto no concurso — teriam que se entender sobre a utilização desse…
Protestos do Deputado do PS Paulo Campos.
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O Sr. Deputado Paulo Campos é um entendido técnico nesta matéria. Posso dar-lhe a palavra para explicar
tecnicamente esta como outras matérias.
Protestos do PS e contraprotestos do PSD.
Eu não sou especialista em concursos, sou especialista em ter que executar as decisões que foram
tomadas.
Em relação a este processo, o que posso dizer é que os três operadores de televisão não se entenderam
sobre a utilização desse canal de alta definição. É uma questão que tem de ser tratada pelos três operadores
de televisão, que não se entenderam.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Não tinha que ser assim!
O Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares: — Digo-o, novamente: avaliámos a intenção de
adiar este processo até 31 de dezembro de 2012, mas, face às circunstâncias dos contratos que estão
assinados, dos compromissos que foram assumidos pela PT e pelos operadores, sendo que o Estado é
também parte interessada — parte significativamente interessada, porque a RTP tem dois canais, mais os
canais das Regiões Autónomas, e, aliás, quero aqui referir que todo este processo da migração do analógico
para o digital terá também custos acrescidos para a RTP, já assumidos no orçamento da RTP para 2012, com
o objetivo de ter um serviço de qualidade em relação aos cidadãos —, estes últimos sete dias são de
acompanhamento de proximidade. Além disso, vai ser intensificada a campanha de divulgação.
Quando, há pouco, referi que a campanha de divulgação foi de 4 milhões de euros assumidos pela PT e de
2,5 milhões de euros assumidos pela ANACOM — era assim que constava do concurso público de 2008 —,
mostra a dimensão e a qualidade dessas mesmas campanhas. Acrescento que, ontem, a ANACOM
concordou, assumiu e vai desenvolver um reforço em relação a essas campanhas, nos próximos meses.
Devo dizer que a primeira fase é, à partida, a mais fácil de implementação e de cobertura, porque estamos
da falar da zona do litoral, e teremos ainda até dia 26 de abril oportunidade de poder atingir o objetivo de servir
todas as famílias portuguesas com a televisão digital e os canais generalistas.
A terminar, quero dizer que é extraordinariamente importante este tipo de debates, este tipo de
sensibilização, e espero que o Parlamento, até ao términus, possa ainda dar um contributo que seja positivo,
que assente na seriedade e na perspetiva de olharmos com realismo para os problemas que existem e não
para os problemas que alguns gostariam que existissem. É esta a mensagem final que aqui quero deixar.
Vamos continuar a fazer essa avaliação. A ANACOM e a PT têm a obrigação de (e vão) fazê-la, em
conjunto também com os municípios. Estão ultrapassadas as dificuldades que foram apresentadas pelas
Aldeias do Xisto, que só esta semana o fizeram, e coube (e cabe) à PT e à ANACOM encontrar a forma de as
ultrapassar.
Foi isso que fizemos, será essa a nossa atitude e será esse o nosso caminho nos próximos meses.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Sr. Ministro, interpretei como uma expressão de retórica ter dito que dava a palavra
ao Sr. Deputado Paulo Campos, uma vez que teria de ser a Mesa, naturalmente, a dar-lhe a palavra. Mas
interpretei muito bem, porque foi nesse sentido que empregou essa expressão.
Terminado o debate do ponto 1 da ordem de trabalhos, segue-se o ponto 2 que é conexo com este tema.
Ao Sr. Ministro e aos Srs. Secretários de Estado, que, verifico, estão prestes a abandonar a Sala, agradeço
a presença nesta reunião.
Vamos agora proceder ao debate conjunto dos projetos de resolução n.os
167/XII (1.ª) — Recomenda ao
Governo que, conforme os termos da cláusula 9 do acordo de 20 de outubro de 2008, celebrado entre a
ANACOM e a PT, seja dada cobertura universal do sinal digital, seja por TDT seja por satélite, sem custos
adicionais para estes utilizadores, e que promova a abertura de mais canais para uma melhor e maior oferta
da TDT tal como está a ser promovida na União Europeia (PS), 169/XII (1.ª) — Pelo adiamento do processo
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de desligamento da rede analógica de televisão, pela garantia de acesso da população à TDT e ao serviço
público de televisão em todo o território nacional (PCP), 170/XII (1.ª) — Recomenda ao Governo que adote as
medidas necessárias a garantir que não existam cidadãos excluídos, particularmente por razões económicas,
no acesso ao sinal digital de televisão, bem como que promova, através das entidades competentes, o
incremento de ações de informação e de fiscalização sobre o processo de implementação da TDT (PSD e
CDS-PP) e 171/XII (1.ª) — Recomenda o adiamento da interrupção do sinal analógico de televisão, uma oferta
televisiva mais alargada e a garantia que a transição para a televisão digital terrestre não será suportada pelos
cidadãos (BE).
A Mesa regista a inscrição, para intervir, dos Srs. Deputados Inês de Medeiros, do PS, Bruno Dias, do
PCP, Francisca Almeida, do PSD, Catarina Martins, do BE, e Raúl de Almeida, do CDS-PP.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Inês de Medeiros para apresentar o projeto de resolução.
A Sr.ª Inês de Medeiros (PS): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Ainda bem que houve o debate
preliminar antes da discussão destes projetos de resolução porque assim se percebeu que é mais do que
justificada a apresentação do nosso projeto de resolução. Sobretudo, pudemos concluir do anterior debate que
a questão fundamental que nos levaram a apresentar esta iniciativa legislativa, ou seja, a problemática dos
custos acrescidos para os utilizadores e para as populações que se encontram na zona sombra, foi o único
tema que o Sr. Ministro, até ao fim, não abordou. Ora, esta é a questão principal que nos leva a estar aqui a
debater.
A questão principal é a de ter havido um acordo, feito entre a ANACOM e a PT, segundo o qual a PT tinha
uma série de obrigações que devia cumprir sem custos adicionais. A PT está a ter uma prática que viola,
claramente, o artigo 9.º desse acordo.
Incompreensivelmente, a ANACOM, em abril de 2011, tomou uma decisão em que legitima este
comportamento da PT ao considerar que os custos e os métodos apresentados pela PT faziam parte de um
acordo celebrado três anos antes.
Esta é a questão fundamental, que continua a não ter qualquer resposta da parte do Governo.
Nós sabemos que a ANACOM, como foi dito aqui, é uma entidade independente, tal como a PT, e
sabemos qual é a margem que o Governo pode ou não ter neste caso, nesta negociação. Mas é obrigação do
Governo garantir a equidade social, é obrigação do Governo lutar contra todo o tipo de discriminação, é
obrigação do Governo garantir o direito à informação e a um serviço público de qualidade, que é um direito
constitucional.
Vozes do PS: — Muito bem!
A Sr.ª Inês de Medeiros (PS): — E o mais extraordinário de tudo é que é o próprio Sr. Ministro Miguel
Relvas que vem dizer-nos que não pode adiar este processo porque a PT pretende cobrar aos operadores,
sejam eles públicos ou privados, a partir de janeiro, haja ou não haja passagem em todo o território nacional!
Ou seja, mesmo que não cumpra aquilo a que está obrigada, a PT pode começar a cobrar aos operadores
públicos e privados. Isto foi dito na intervenção inicial do Sr. Ministro e eu acho extraordinário que ninguém
tenha reagido mais cedo!
Por outro lado, convém lembrar a questão da oferta que é permitida com a passagem para a TDT. Tal
como ficou provado no debate anterior, há espaço para garantir uma maior oferta de canais nesta passagem
para televisão digital terrestre. Infelizmente, sabemos que o 5.º canal ainda aguarda decisão judicial.
Também convinha lembrar que, ao contrário do que tem sido dito, a PT pode concorrer ao concurso,
porque, na altura, não tinha posição predominante na televisão por cabo — isto não é um detalhe, é um ponto
muito importante! Na altura, a ZON foi impedida de concorrer por ter o monopólio da televisão por cabo, além
de que também é de estranhar que, depois de ter ganho o concurso, a PT comece com uma política de
concorrência da televisão por cabo e de concorrência quanto à própria TDT. E, mais uma vez, a ANACOM não
se manifestou!
O que aqui está em causa é, de facto, o comportamento da ANACOM enquanto entidade independente e
reguladora. Quanto a isso, não temos dúvidas.
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Para terminar, gostaria de dizer que está aqui em causa, também, o facto de haver espaço para aumentar
a oferta de canais, e é isso que nós sugerimos. Mas deve garantir-se, pelo menos, os dois serviços públicos
de televisão que estão previstos quer na Lei da Televisão, quer no contrato de concessão de serviço público,
quer, inclusivamente, no caderno de encargos para a televisão digital terrestre e no acordo feito entre a PT e a
ANACOM. Isto não pode ser posto em causa, porque só desta forma passaremos a ter uma oferta de
qualidade e razoável em Portugal, ao nível da TDT.
Em relação à questão do adiamento, devo dizer que não propomos o adiamento especificamente por
considerarmos que essa matéria compete ao Governo. Compete ao Governo ver até que ponto os prazos
estabelecidos permitem a sua concretização sem que haja discriminação das populações e sem que ao
switch-off tecnológico suceda um switch-off social!
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Tratamos agora das soluções para um
problema que foi identificado há bastante tempo e que o Governo tardou e continua a tardar em ouvir.
Já diziam os antigos (a minha avó ensinava-me isto): «Chegou e disse, tirou o chapéu e foi-se»! O Sr.
Ministro nem sequer ficou para ouvir as intervenções sobre as propostas e soluções concretas que tínhamos
para discutir aqui.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. Bruno Dias (PCP): — O PCP apresenta um projeto de resolução que defende a recalendarização e a
definição de um programa de faseamento para garantir que não haja populações excluídas do acesso à
televisão e à emissão terrestre da televisão digital e que, do ponto de vista social e económico, o assumir dos
custos da introdução desta tecnologia não seja mais uma penalização entre muitas outras que estão a ser
aplicadas às populações.
A proximidade no terreno com as populações, com as autarquias é um aspeto fundamental, e nós
colocamos essa questão através das equipas de apoio no terreno para introduzir a tecnologia, bem como a
questão do obrigatório envolvimento neste processo do serviço público de televisão, porque consideramos que
é inaceitável — e, mais uma vez, o Governo nada disse sobre esta matéria — que haja canais da televisão
pública que só são acessíveis mediante o pagamento das plataformas de acesso pago da ZON, da MEO e por
aí fora!
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Inclusivamente, colocamos em consideração, mediante o envolvimento de
operadores não públicos, o alargamento da oferta de canais, para que saiamos desta vergonhosa condição de
sermos o único País da Europa que não aumentou a oferta televisiva de sinal aberto com a TDT.
Como referência breve às outras propostas, nada temos frontalmente contra o projeto do PS, mas não
podemos deixar de registar aqui a extraordinária situação de que um partido que, no governo, foi o primeiro
responsável pela diminuta oferta de canais na TDT venha agora propor uma maior oferta de canais da TDT
com sinal aberto.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É um bocado descaramento!
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Tal como não podemos deixar de referir que, da parte do PSD e do CDS, há
um projeto que, de essencial, nada diz e que não apresenta qualquer proposta para resolver problema algum.
Penso que é caricato (se não fosse insultuoso, numa altura em que as pessoas estão a sentir este
problema) que venham agora defender que se promova a divulgação das áreas incluídas nas chamadas
«zonas de sombra» e a realização efetiva, junto das populações, de ações de esclarecimento nessas «zonas
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de sombra». Ou seja, as pessoas que não têm acesso à televisão digital ficam a saber que não têm acesso à
televisão digital,…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Que maravilha!…
O Sr. Bruno Dias (PCP): — … graças às ações que o PSD e o CDS vêm agora defender!
Por outro lado, verificamos — e o Sr. Ministro referiu-o aqui — que houve mais um «descontozinho» da PT
para os tais recetores de satélite, que agora ficam a custar a extraordinária «pechincha» de 100 € por cada
instalação, para cada pessoa, para cada casa, por um televisor!
Vejamos o caso da Galiza, para abreviar, em que, em três concelhos — Guarda, Baiona e Tui —, existem
quatro emissores, dois reemissor de rede principal e oito pontos emissores de microcobertura para 260 km2,
ao passo que no distrito de Viana do Castelo, com 2200 km2 de território, há cinco emissores, e acabou-se a
conversa!
Portanto, Srs. Deputados, não venham falar em «zonas de sombra», porque o que é preciso é iluminar este
território com emissores com fartura! Com os emissores necessários para garantir que a cobertura terrestre
não seja uma miragem e as pessoas não fiquem resumidas a uma oferta de televisão por satélite.
Em suma, este projeto que o PSD e o CDS apresentam não vem resolver o problema que está colocado.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Francisca Almeida.
A Sr.ª Francisca Almeida (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Começo por dirigir uma
palavra ao Sr. Deputado Bruno Dias, que se referiu à saída do Sr. Ministro Miguel Relvas, para lhe dizer que,
como sabe, não é da praxe parlamentar a presença dos membros do Governo na discussão de projetos de
resolução. É evidente que, uma vez aprovados, lá chegarão ao Governo.
Foi, por isso, uma referência infeliz que fez neste debate.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Não percebeu!
A Sr.ª Francisca Almeida (PSD): — Sr.as
e Srs. Deputados, no desfecho do debate que agora travamos
sobre a televisão digital terrestre, ficou evidente para todos que o Governo clarificou o processo, mostrou-se
consciente das dificuldades e, sobretudo, demonstrou o seu empenho em mitigar os constrangimentos que
podem advir do apagão do sinal analógico.
A postura é bem diferente — diria mesmo antagónica — em face daquela a que estávamos habituados. E
por isso estamos certos que as recomendações que fazemos não cairão em saco roto, contrariamente ao que
sucedeu quando, há mais de um ano, alertámos o anterior ministro Jorge Lacão para os problemas já nessa
altura manifestámos, no que dizia respeito à implementação da TDT em Portugal.
Nessa altura, eramos — nas palavras do ministro socialista — catastrofistas e intempestivos. Hoje,
estamos certos que, se interviesse neste debate, diria com certeza que, bem ao invés, fomos premonitórios ou
visionários.
Por isso, Sr.as
e Srs. Deputados, chega a ser caricato que o Partido Socialista apresente um projeto de
resolução sobre esta matéria. O Partido Socialista pretende agora dar um sinal de preocupação para encobrir
o desleixo e a ligeireza com que lançou…
Protestos da Deputada do PS Inês de Medeiros.
… e conduziu este processo quando esteve no Governo.
Vozes do PSD: — Muito bem!
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A Sr.ª Francisca Almeida (PSD): — Tem, evidentemente, legitimidade política para apresentar o projeto
que apresenta, mas falta-lhe a legitimidade de quem, desde a primeira hora, tudo fez para que o processo
corresse o melhor possível.
Se este «renovado» Partido Socialista tem memória curta, os portugueses não têm…
Vozes do PSD: — Muito bem!
A Sr.ª Francisca Almeida (PSD): — … e sabem os intentos que perseguem com o projeto de resolução
que hoje traz a Plenário.
Posto isto, Sr.as
e Srs. Deputados, quero sublinhar que o atual Governo herdou o processo de
implementação da TDT já na fase final, mas nem por isso se demitiu da sua responsabilidade de tudo fazer
para que corra o melhor possível e para minimizar os impactos negativos que o mesmo possa ter junto das
populações.
Sabemos, todavia, dos constrangimentos que têm sido apontados: as «zonas de sombra», as alegadas
práticas fraudulentas na verificação de receção do sinal, o desconhecimento do processo, do seu custo e do
acesso às comparticipações. E porque não desconhecemos as notícias vindas a público e a preocupação que
suscitam junto das populações, consideramos que, em primeira linha, deverá ser divulgado o mapa das
alegadas «zonas de sombra», para que se possa dar conhecimento justamente às populações das
dificuldades acrescidas, e incrementadas sessões de esclarecimento e informação, particularmente junto
destas populações.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Já foi dito há muito tempo!
A Sr.ª Francisca Almeida (PSD): — Consideramos, ainda, que é essencial promover um fiscalização
alargada destinada a prevenir e, sobretudo, a punir eventuais práticas fraudulentas, e, finalmente, que tudo
seja feito no sentido de garantir que não existem cidadãos excluídos, particularmente por razões económicas,
no acesso ao sinal digital de televisão.
Vozes do PSD: — Exatamente! Muito bem!
A Sr.ª Francisca Almeida (PSD): — É essencial que se faça cumprir a lei e que aqueles que habitam as
chamadas «zonas de sombra», que já de si estão mais afastados dos centros urbanos, paguem o mesmo —
exatamente o mesmo! — do que os demais cidadãos com acesso aos sistema TDT.
Vozes do PSD: — Muito bem! É isso mesmo!
A Sr.ª Francisca Almeida (PSD): — É isso que está previsto e que, estamos certos, o atual Governo fará
cumprir integralmente.
Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: O processo está em marcha. De nada vale agora pedir o
adiamento para se fazer mais tarde aquilo que não se fez em tempo.
Vozes do PSD: — Muito bem!
A Sr.ª Francisca Almeida (PSD): — Para além de impossível financeiramente, esse adiamento nunca
seria suficientemente lato para minimizar os custos da introdução da TDT para as famílias e para as
instituições.
Por isso, é tempo de arregaçar as mangas e de trabalhar no terreno, sem falsos alarmismos, nem vaticínios
de calamidade. Há que informar, fiscalizar, agilizar comparticipações e encontrar solução para as situações
mais excecionais.
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No fundo, Sr.as
e Srs. Deputados, do que se trata, nesta como em tantas outras áreas da governação, é de
fazer agora o que não fez em tempo o anterior governo socialista.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina Martins.
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Sabemos que a TDT é um
processo em curso — um processo em curso com muitos erros — e sabemos que a introdução da televisão
digital terrestre e a passagem do analógico para o digital é um processo em que as populações teriam a
ganhar muito com a inovação tecnológica, e foi assim um pouco por toda a Europa. As populações tiveram
acesso a melhor televisão, a mais oferta de canais, canais de informação, canais infantis e canais temáticos,
de serviço público e, também, de serviço privado.
Foi essa a transição que foi solicitada às populações na Europa, uma transição entre o analógico e o digital
que trazia benefício às populações e que, sabemos, liberta um imenso dividendo digital que servirá para outras
finalidades e também — é preciso dizê-lo — para outros negócios.
Em Portugal, o que está a suceder é que a transição do analógico para o digital não dá nada às
populações, que vão ter exatamente os mesmos canais, e mesmo a qualidade da receção que se promete não
é verdade em tantas zonas do País.
Também temos a outra parte: a parte do dividendo digital, que pode dar negócio a tantos. Essa mantém-se
e vai a bom ritmo! Tivemos já o leilão da quarta geração e a venda da televisão paga, essa sim, vai a bom
ritmo. Portanto, temos, sim, uma chantagem económica fortíssima sobre a população.
É preciso dizer que é muito estranho que o Partido Socialista venha agora a este debate apresentar
propostas para o que poderia ter implementado, pura e simplesmente, e hoje não estaríamos, a tão pouco
tempo de distância, a apresentar propostas.
Temos vindo a dizer, na Assembleia da República, que este processo está errado, mas é sempre tempo de
mudar um processo que está errado. Ora, temos agora, em cima da mesa, recomendações para alterar um
processo errado e que vai prejudicar muitíssimo as populações.
O Bloco de Esquerda apresenta soluções simples: é preciso adiar a transição, é preciso adiar o switch-off,
é preciso ter mais canais. Comecemos pelos canais públicos, comecemos pela RTP Informação e pela RTP
Memória, que a população já paga com os seus impostos e aos quais deve ter acesso na televisão digital
terrestre, façamos a PT cumprir o seu contrato — é ela que tem de suportar os custos — e acabemos com as
«zonas sombra»! Não há nenhuma explicação tecnológica para isso e nos outros países da Europa não há
«zonas sombra».
As «zonas sombra» não são necessárias, não têm explicação tecnológica! Ou seja, não só as populações
que estão hoje nas «zonas sombra» não devem ser obrigadas a comprar kits caríssimos como as aldeias de
xisto não devem ter de viver com parabólicas nos telhados. É um absurdo tecnológico que estejamos a
retroceder assim! Não é preciso! É preciso, sim, ter cobertura terrestre digital em todo o País, e é isso que
propomos.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Raúl de Almeida.
O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Discutimos aqui hoje, no
seguimento do debate de urgência proposto pelo PCP, quatro projetos de resolução sobre a televisão digital
terrestre. Eu diria que, de uma leitura séria dos diplomas, encontramos virtualidades nos quatro, encontramos
uma intenção de fundo de servir bem o consumidor de televisão, mas, depois, encontramos, em alguns dos
projetos de resolução, uma barreira que nos impede de levar essa intenção à prática.
Importa aqui notar que aquilo que o BE e o PCP propõem é, no essencial, uma recalendarização —
segundo as palavras utilizadas — ou um adiamento do desligamento do sinal analógico. Eu diria que é quase
a teoria, a que nos habituaram ultimamente, da permanente renegociação, do permanente adiamento, do
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permanente «vamos fazer, mas não fazemos, afinal». Esquecem-se que esse aditamento implicaria um
acréscimo, um prejuízo, contabilizado em cerca de 10 milhões de euros,…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — E o prejuízo das pessoas?!
O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — … que refletir-se-á sobre os operadores privados mas também sobre
o operador público, sendo que, neste caso, seria sempre pago pelos contribuintes portugueses.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — E de onde vem esse dinheiro?
O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — Gostaria de saber se o povo concordaria com esse aditamento e com
os custos que ele realmente implica.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Isso está muito mal contado!
O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — Depois, como é costume a quem não tem responsabilidades
governativas, preconizam a cedência gratuita dos equipamentos necessários à receção da TDT. Pergunto:
quanto custaria isto, Srs. Deputados? Para o PCP e para o BE não interessa saber quanto gostaria; alguém
haveria de pagar! Quem? A resposta é simples: será sempre o povo a pagar, serão os contribuintes a pagar
através de mais uma taxa ou de mais um imposto.
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — E quem é que está a pagar agora?
O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — Acham legítimo? Acham bem? Não acreditamos!
Esquecem-se os senhores que quem mais precisa — os pensionistas de baixos rendimentos, os cidadãos
com necessidades especiais, com grau de deficiência igual ou superior a 60%, e as famílias abrangidas pelo
rendimento social de inserção — já dispõe de um apoio significativo na aquisição dos equipamentos.
Já o PS, depois de assistir a uma concessão falhada para um quinto canal na vigência de um governo
Sócrates, vem agora, candidamente, sugerir que a TDT deveria proporcionar muitos mais canais. Quanto a
isto estamos entendidos, não fazemos comentários.
Quer isto dizer que está tudo bem? Quererá isto dizer que não há nada a fazer neste capítulo? Obviamente
que não. Queremos que se evite, em primeiro lugar, a fraude a que temos assistido, e que se tem verificado
por grande parte dos operadores, na venda de serviços e equipamentos não necessários para a TDT.
Aumente-se, por isso, a fiscalização.
Queremos que se desenvolvam todas as ações necessárias para que ninguém fique excluído, seja por
motivos geográficos, económicos ou por mero desconhecimento das ajudas disponíveis.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Vocês deviam era resolver o problema!
O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — Queremos uma especial atenção aos chamados concelhos
particularmente difíceis e às denominadas «zonas sombra»…
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Este debate é que é uma «zona sombra»!
O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — … e façam-se aí os devidos esclarecimentos sobre a implementação
da TDT e da DTH.
Queremos ainda que se promova junto das entidades competentes o cumprimento da cláusula da
deliberação da ANACOM de outubro de 2008, que acho que vale a pena aqui repetir ipsis verbis e que visa
«Garantir que à população cuja cobertura assegurar apenas através do recurso a meios complementares,
concretamente em DTH, (…) sejam disponibilizados pelo menos os mesmos serviços das zonas cobertas por
via terrestre, bem como níveis de serviço e condições de acesso dos utilizadores finais equiparáveis ao
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daquelas.» Ou seja, visa assegurar a igualdade perante toda a população independentemente da sua
localização geográfica.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — Por fim, quero fazer aqui um apelo: salvaguardemos o que é
importante, recredibilizemos a TDT, garantindo a todos a qualidade e as possibilidades futuras que esta
plataforma proporciona.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias, a quem lembro que
tem muito pouco tempo disponível.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados do PSD e do CDS: Isto já não vai lá nem com
mapas das «zonas sombra» nem com sessões de esclarecimento! As pessoas que não recebem televisão já
sabem que não a recebem!
A Sr.ª Francisca Almeida (PSD): — O problema é que não sabem!
O Sr. Bruno Dias (PCP): — O caminho não passa sequer pelo milagre da multiplicação das parabólicas ou
da disseminação dos equipamentos DTH, porque a solução tem de ser garantir a cobertura do território por via
terrestre. Ou os senhores aceitam que em todos aqueles concelhos que já referimos ou no grupo ocidental do
arquipélago dos Açores não haja nenhuma emissão por via terrestre da TDT e só se possa aceder por via
satélite, como se as pessoas estivessem no deserto ou na floresta amazónica? É isto que os senhores
defendem para Portugal?!
Quando perguntamos que medidas estão a ser consideradas e tomadas para o alargamento da oferta dos
canais de sinal aberto, nomeadamente do serviço público, como é que os Srs. Deputados não dizem uma
palavra sobre isso?! Como é que o PSD, o CDS e o Governo nada dizem sobre este problema?! Como é que
estamos a uma semana, ao fim de anos de alertas… E não foi agora que apareceram os alertas! Havia alertas
de especialistas, de trabalhadores, de estruturas dos trabalhadores do setor, de muitas autarquias que
levantaram o problema! Nós colocámos a questão, e o PSD também, com certeza. Mas, e daí, Srs.
Deputados? Que conclusões é que se retiram? Que medidas foram tomadas?
As propostas que o PCP apresenta não são de «adiar para ficar tudo na mesma», não são para
«recalendarizar para seguir como antes», são no sentido de tomar medidas concretas enquanto há tempo. E
haver tempo significa que ainda este ano se tomem estas decisões, nomeadamente com a recalendarização,
para que entre em efeito a tal rede de emissores que falta no nosso território.
Aplausos do PCP.
Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Guilherme Silva.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina Martins.
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: As Sr.as
e os Srs. Deputados do
PSD e do CDS reconhecem que há problemas, só que concluem que há problemas mas vamos manter, as
populações vão pagar e, depois, logo se vê!… Mas depois logo se vê o quê?! Primeiro as pessoas vão pagar
por um serviço que tem problemas, que não lhes oferece o que deve oferecer?! Afinal, quem é que paga esta
transição a prestações? Estão a pôr as populações a pagar e não lhes oferecem nada em troca, não têm nada
para oferecer! Depois logo se vê?!
O PSD e o CDS vão ser responsabilizados por este regresso ao passado, porque todo o processo de
transição da televisão analógica para digital tem sido um desastre. O que temos à nossa frente é, certamente,
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um apagão para centenas de milhares de famílias, e os senhores serão responsabilizados por isso, porque
mantêm um excesso de zelo no que respeita aos interesses da PT e uma completa leviandade no que respeita
aos interesses das populações!
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, terminámos este ponto da nossa ordem de
trabalhos.
Passamos, agora, à discussão conjunta, na generalidade, dos projetos de lei n.os
85/XII (1.ª) — Primeira
alteração à Lei n.º 17/2003, de 4 de junho (Iniciativa Legislativa de Cidadãos) (PCP), 123/XII (1.ª) — Altera a
Lei n.º 17/2003, de 4 de junho, que regula a Iniciativa Legislativa de Cidadãos (Primeira alteração à Lei n.º
17/2003, de 4 de junho) (BE) e 128/XII (1.ª) — Torna acessível a Iniciativa Legislativa de Cidadãos, com uma
primeira alteração à Lei n.º 17/2003, de 4 de junho (Os Verdes).
Para apresentar o projeto de lei do PCP, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.
O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados, o projeto de lei que o PCP
apresenta é muito simples: insistimos em que se deve reduzir o número de assinaturas necessárias para a
apresentação de uma iniciativa legislativa na Assembleia da República das atuais 35 000 para 5000
assinaturas.
Entendemos que é um dever de cidadania da Assembleia da República não digo facilitar mas não
obstaculizar a participação cívica dos cidadãos através da apresentação de iniciativas legislativas no
Parlamento. Isso já acontece através do exercício do direito de petição, que tem sido, aliás, muito valorizado
pela Assembleia da República nos últimos anos, o que é reconhecido até publicamente.
O exercício do direito de iniciativa legislativa junto da Assembleia da República, que está constitucional e
legalmente consagrado, significa um grau de exigência maior no que respeita aos cidadãos quanto à qualidade
da sua iniciativa. Ou seja, os cidadãos não se limitam a manifestar junto da Assembleia da República uma
preocupação ou a fazer uma qualquer solicitação mas, indo mais longe, eles próprios elaboram uma iniciativa
legislativa formal, propondo soluções legislativas concretas para aquilo que pretendem. Ora, este exercício de
cidadania junto do Parlamento, do nosso ponto de vista, deve ser incentivado. Acontece, porém, que ele é
desmotivado.
Não faz nenhum sentido que uma petição possa ser apresentada por um único cidadão e que a iniciativa
legislativa tenha de ser apresentada por 35 000 cidadãos. Não está mal que um cidadão possa apresentar
uma petição, o que está mal é que sejam necessárias 35 000 assinaturas para uma iniciativa legislativa.
Se 4000 cidadãos apresentarem uma petição, ela é obrigatoriamente, e muito bem, debatida no Plenário da
Assembleia da República. Então, que sentido faz exigir 35 000 assinaturas para apresentação de uma
iniciativa legislativa sobre a qual é a Assembleia da República que decide, porque ninguém tem o poder de
impor qualquer decisão à Assembleia da República?
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exatamente!
O Sr. António Filipe (PCP): — O órgão de soberania é a Assembleia da República e é esta que decide se
a iniciativa é pertinente ou não, que decide não apenas sobre a sua tramitação mas também sobre a decisão
final, ou seja, se a proposta feita pelos cidadãos é ou não aprovada. Ora, sucede que a exigência de 35 000
assinaturas é tão desmotivadora que a experiência que temos é que os cidadãos não recorrem a esta iniciativa
legislativa. Mais: não apenas em trabalhos académicos em matéria de Ciência Política e de direitos cívicos,
mas mesmo em iniciativas públicas em que, seguramente, muitos dos Srs. Deputados têm participado, vemos
um reparo unânime da parte dos cidadãos de considerar que a exigência de 35 000 assinaturas é um absurdo.
Portanto, esta não é uma lei que permita de facto o exercício deste direito, é uma lei que parece apostada
em obstaculizar o exercício desse mesmo direito. Nesse sentido, achamos que a Assembleia da República
cumpriria um dever elementar para consigo própria se reduzisse muito significativamente o número de
assinaturas necessárias para a apresentação de uma iniciativa legislativa.
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Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para apresentar o projeto de lei do Bloco de Esquerda, tem a
palavra a Sr.ª Deputada Cecília Honório.
A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: A presente iniciativa do Bloco de
Esquerda, que procede a uma primeira alteração à Lei n.º 17/2003, em conjunto com outras iniciativas que
aqui discutimos, centra-se na urgência em que o processo de recolha de assinaturas para a iniciativa
legislativa de cidadãos seja facilitado, podendo ser efetuado através da Internet, tal como ocorre, aliás,
relativamente à petição. Não faz sentido que assim não seja na sociedade de informação em que vivemos,
que é a sociedade das redes sociais. A nossa aposta, a nossa prioridade é que a iniciativa legislativa de
cidadãos recorra a um meio comum de circulação de informação entre as pessoas.
Partimos do reconhecimento da seguinte realidade: a Lei n.º 17/2003 foi um passo em frente no
aprofundamento da democracia, consagrou a possibilidade de cidadãos e cidadãs apresentarem iniciativa
legislativa junto da Assembleia da República, foi um passo em frente no sentido de aproximar os cidadãos da
Assembleia da República e foi um passo determinante também no sentido de reforçar a responsabilidade dos
eleitos e das eleitas perante os cidadãos e as cidadãs, no sentido de ouvir a voz popular de uma forma mais
atenta.
No entanto, aquilo que a lei deu com uma mão, acabou por tirar com a outra mão. A verdade é que o
processo implica a recolha de 35 000 assinaturas de eleitores, o registo do bilhete de identidade e do cartão
de eleitor. É um processo que é feito na rua, pessoa a pessoa, extremamente moroso, de meses, penoso e
complicado, e hoje, a Assembleia da República, os Srs. Deputados e as Sr.as
Deputadas, são todos
convidados a fazer o balanço desta lei durante estes anos todos. Ou seja, a verdade é que houve uma
iniciativa legislativa de cidadãos que chegou à Assembleia da República e, por isso, é preciso inverter esta
lógica de obstáculo de uma lei que deu com uma mão aquilo que tirou com a outra.
Nesse sentido, a nossa proposta reconhece que é importante e fundamental a discussão do número de
subscritores exigido atualmente pelo quadro legal em vigor. É uma discussão importante, dado que é um
número desproporcionado e são anotadas diferentes iniciativas com exigências numéricas muitíssimo
diferentes, quer para a constituição de um partido político, quer, inclusivamente, para uma petição, pois 4000
assinaturas dão direito a um debate na Assembleia da República.
É, de facto, um número desproporcionado, mas o nosso empenho é, efetivamente, o de reconhecer que,
numa sociedade de informação, numa sociedade de redes sociais, numa sociedade que viveu grandes
manifestações recentemente, fazendo apelo ao reforço da democracia participativa e à responsabilidade dos
eleitos e das eleitas, é preciso facilitar o acesso a esta iniciativa, sendo a internet um dos meios de facilitação
deste processo e desta iniciativa popular.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para fazer a apresentação do projeto de lei n.º 128/XII (1.ª), do
Partido Ecologista «Os Verdes», tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Os Verdes entenderam,
desta vez, entrar neste processo legislativo com a apresentação de um projeto de lei de alteração à Lei n.º
17/2003 porque já fomos, por diversas vezes, confrontados nesta Assembleia da República por grupos de
cidadãos que nos garantiram que só não apresentaram uma iniciativa legislativa concreta, portanto, um projeto
de lei concreto, da sua autoria, na Assembleia da República, porque a lei não lhes permite que o façam.
Dirão os Srs. Deputados: «Não, não! Essa Lei n.º 17/2003 permite, justamente, que os grupos de cidadãos
apresentem iniciativas legislativas na Assembleia da República». Certo! Mas o problema é que, da mesma
forma que o permite, acaba por impedi-lo, quando exige 35 000 assinaturas para a apresentação dessas
iniciativas legislativas por parte de grupos de cidadãos.
Portanto, de duas, uma: ou «assobiamos para o lado» e fingimos que nada se passa, ou atentamos à
realidade e percebemos que, de facto, esse número exagerado de assinaturas é um obstáculo à concretização
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do direito que a Assembleia da República pretendeu dar aos cidadãos. Tomando consciência desta realidade,
só podemos daqui retirar uma conclusão e termos, nós próprios, uma iniciativa, a de alterar esta lei no sentido
de a tornar exequível. E como a tornamos exequível? Diminuindo, justamente, o número de assinaturas.
Perguntar-se-á, então: «Se isso agora é uma coisa tão relativa, tão relativa, que número é que vamos
permitir para dar dignidade ao direito, não deixando, ao mesmo tempo, banalizar o direito?» Nós, Os Verdes,
também temos essa preocupação. Reparemos que, para entregar uma petição na Assembleia da República,
basta uma assinatura. Entrada a petição, temos de promover um relatório, discuti-lo e votá-lo. Mas seria um
absurdo permitir que uma assinatura desse origem a um processo legislativo na Assembleia da República.
Vamos, então, analisar o caminho das petições. Com 4000 assinaturas, os cidadãos veem a sua petição
chegar mais longe, porque será obrigatoriamente discutida em Plenário e os peticionários serão
obrigatoriamente ouvidos. Há aqui todo um conjunto formal no próprio processo que o enriquece, com a sua
discussão e o envolvimento dos grupos parlamentares, devido à representatividade daquela petição, dando-
lhe uma maior dignidade, e entra, obrigatoriamente, na agenda da Assembleia da República e do seu Plenário.
Por outro lado, na nossa perspetiva, temos outro número importante, que é a apresentação de uma
candidatura para a Presidência da República com 7500 assinaturas. É um órgão de soberania que também
tem uma palavra final no processo legislativo.
Foram estas duas «balizas» que orientaram Os Verdes na proposta que apresentámos. Consideramos que,
entre o número de uma e o número de outra, seria aceitável uma proposta. Assim, propusemos as 5500
assinaturas para que grupos de cidadãos possam apresentar a sua iniciativa legislativa na Assembleia da
República, levando o Parlamento a discutir o conteúdo desse projeto de lei entrado. Julgamos que desta forma
dignificaremos este direito, enriqueceremos a nossa democracia, justamente por esta dignificação, e
valorizaremos aquilo que procurámos, um dia, integrar na lei mas que, ao mesmo tempo, devido ao número de
assinaturas, acabou por se obstaculizar.
Por essa razão, Os Verdes procuram dar este contributo no sentido da diminuição do número de
assinaturas, sem exagero, com o objetivo de que grupos de cidadãos possam de facto exercer este direito na
Assembleia da República.
De resto, há uma coisa que nos deve fazer pensar. Por que razão, desde 2003, só entrou uma iniciativa
legislativa de cidadãos na Assembleia da República? Porquê? Porque outros não tiveram capacidade de
recolher, num curto espaço de tempo, muitas vezes, 35 000 assinaturas.
Os Verdes orgulham-se de contribuir para este processo e seria muito digno que a Assembleia da
República o exercesse.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Hugo Velosa.
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados, Sr. Deputado António Filipe, Sr.as
Deputadas do Bloco de Esquerda e do Partido Ecologista «Os Verdes»: O PSD tem, naturalmente, memória, e
recorda-se que em 2005, houve um debate semelhante de uma proposta do Partido Comunista em que o PSD
votou contra, invocando, no essencial, ser contra a banalização do direito de iniciativa dos cidadãos. Essa
memória mantém-se, pois o PSD continua contra essa banalização deste processo.
Quando se diz, por exemplo, que só houve uma iniciativa, pode não ter sido por causa das 35 000
assinaturas. Aliás, queria dizer que as 35 000 assinaturas correspondem a 0,32% da população e Portugal é
dos países da Europa o que precisa de menos assinaturas da população para apresentar iniciativas
legislativas. Isto para dizer que somos frontalmente contra esta ideia de que devemos reduzir as assinaturas
de 35 000 para 5000.
Para nós, esta não é a questão. O PSD é, obviamente, sensível à necessidade de haver uma maior
aproximação dos cidadãos ao Parlamento. Agora, não pode ser à custa dessa banalização para fazer com que
as iniciativas legislativas, que deve ser normal que partam do Parlamento, passem a partir de um número
reduzido de cidadãos ao serviço não se sabe de que interesses.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Nós, PSD, defendemos essa aproximação, mas não à custa deste método.
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Queria ainda dizer que também entendemos que esta lei — uma lei de 2003, na sequência da revisão
constitucional de 1997 — contém um eventual lapso, quando refere que os cidadãos residentes no estrangeiro
não podem apresentar ou subscrever iniciativas legislativas de cidadãos residentes no território nacional. Esta
discriminação é inaceitável e o PSD é, claramente, contra ela. Assim, numa primeira oportunidade, por
exemplo, através de um projeto próprio, vamos alterar o artigo 2.º da lei de 2003, porque essa discriminação é
inaceitável.
Portanto, aquilo que o PSD quer dizer aos proponentes destes projetos de lei é que continuamos a não
aceitar que se reduza o direito a esta iniciativa de 35 000 para 5000 assinaturas.
A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Mas ainda só houve uma!
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Não aceitamos, Sr.ª Deputada! É uma questão de coerência. Sabemos que
as coisas evoluem e sabemos que aí estão alguns partidos que se mantêm sempre com as mesmas ideias, ao
longo dos anos. Nós, no PSD, achamos que devemos ser coerentes com esta matéria.
Queria lembrar que, para iniciativas europeias, o número de assinaturas necessário já não é, realmente, de
35 000. Refiro iniciativas europeias conjuntas, feitas por um grupo de países, como é possível fazer-se, com a
participação de cidadãos de países europeus em iniciativas europeias. Neste caso, efetivamente, o número de
assinaturas já é menor.
Não percebo por que motivo os partidos não apresentaram uma proposta mais razoável, que não a de
baixar de 35 000 para 5000. Não depende do PSD, obviamente, apresentar essa proposta, mas depende de
nós denunciarmos que o Partido Comunista Português continua igual a si próprio, pois em 2011 propõe a
mesma coisa que tinha proposto em 2005 e, se já não aceitámos nessa altura, também não aceitamos agora.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Os «troca-tintas», na Assembleia, estão desse lado!
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pita Ameixa.
O Sr. Luís Pita Ameixa (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PS, sem aderir aos pontos concretos
dos projetos de lei, não deixa de considerar que a sua discussão, neste Parlamento, pode ter interesse.
Desde logo, o PS é um partido que se revê na doutrina constitucional, na doutrina da nossa Constituição,
democrática, a Constituição do 25 de Abril, que é fundamentalmente tributária da democracia representativa
em que vivemos, que é o nosso regime político e no qual queremos continuar a viver, mas que combina essa
democracia representativa com uma participação popular direta, em muitos aspetos e em muitas
circunstâncias.
Essa participação popular direta pode ser interessante para o aprofundamento da democracia e para a
participação dos cidadãos na vida pública, que constam, aliás, dos princípios fundamentais da participação
política ínsitos na Constituição da República, onde temos, entre outros, o direito de petição à Assembleia da
República, o direito de ação popular, os júris nos tribunais, a participação dos cidadãos na administração
eleitoral, designadamente, nas mesas de voto, a iniciativa referendária por via dos cidadãos, as freguesias de
plenário, onde o órgão representativo é substituído pela participação direta dos cidadãos, a participação dos
moradores ou até a intervenção dos eleitores, dos cidadãos, nas reuniões dos órgãos próprios do poder local.
A iniciativa legislativa dos cidadãos, que está na Constituição desde 1997, não vigora para todas as
matérias da competência da Assembleia da República, mas apenas para algumas. Há, portanto, logo aí, uma
limitação importante em função da matéria.
Além disso, a tendência internacional do Direito Comparado é, justamente, em todos os países e
ordenamentos jurídicos, de abrir a possibilidade de os cidadãos poderem fazer as suas propostas,
naturalmente sem nenhuma obrigação para o órgão de soberania de as aprovar. Essa tendência internacional
vem até no sentido de, com o Tratado de Lisboa, a União Europeia vir a ter também a chamada iniciativa de
cidadania, com regulamento já aprovado e que entrará em vigor no próximo dia 1 de abril, onde são
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necessárias assinaturas de cidadãos de vários países. Em relação a Portugal, são necessárias 16 500
assinaturas.
Julgamos, pois, que vale a pena discutir este assunto, também face à experiência de 8 anos em que vigora
a lei atual e em que houve apenas uma iniciativa legislativa e promovida, até, por uma organização.
Depois existem outros aspetos que têm a ver com o formato, o recurso à internet, a questão dos
emigrantes — muito bem colocada pelo PSD —, que são discriminados na lei atual e que deviam ser
considerados, naturalmente com alguma parcimónia, com bom senso, com cautela, nos termos da nossa
democracia representativa, mas que, no aprofundamento deste debate, nos parece fazerem sentido e seriam
úteis para a nossa democracia.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: A primeira coisa que gostaria de
dizer em nome do Grupo Parlamentar do CDS é que a questão aqui colocada, depois da consensualização,
depois do modelo austríaco, depois da aprovação em 1997, não é, objetivamente, de uma questão dogmática.
Não estamos a falar de um dogma ou de algo de fundamental! Estamos a discutir, no fundo, o que é razoável,
por assim dizer, para a iniciativa legislativa de cidadãos.
Para nós, ainda que esta questão não seja dogmática, é uma questão de princípio, que, se não é
ideológica, pelo menos é política, que é a valorização que fazemos do modelo da democracia que temos. Ou
seja, a questão é saber se queremos ou não queremos um modelo de democracia representativa.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Se queremos ou não queremos que o cerne do nosso sistema político
seja um modelo de democracia representativa centrado no Parlamento, em que a iniciativa legislativa de
cidadãos é a exceção e não a regra.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Nós queremos esse modelo. Consideramos que a valorização deve
continuar a ser feita com base na democracia representativa e não em fórmulas ou em modelos de
democracia direta.
Dizem que, apesar disso, já existe iniciativa legislativa de cidadãos — concordamos! — e que o número de
35 000 assinaturas é demasiado elevado… Podemos até entrar nessa discussão, mas a grande questão que
se coloca é, obviamente, sobre qual é o número razoável.
O que pergunto — sobretudo ao PC…
O Sr. João Oliveira (PCP): — PCP!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — … e a Os Verdes, visto que o Bloco de Esquerda vai um pouco por
outro caminho — é se não consideram que reduzir as assinaturas, de um momento para o outro, de 35 000
para 5000 é passar de 8 para 80 ou, neste caso, de 80 para 8…!? Mesmo se reduzíssemos para metade — e
uma redução para metade é sempre significativa! —, mesmo assim, o número seria superior ao que os
senhores propõem.
Portanto, os senhores dizem que qualquer partido, qualquer grupo de pressão, qualquer sindicato pode, de
um momento para o outro, começar a apresentar aqui iniciativas legislativas — que vêm com o cunho de ser
dos cidadãos, mas que depois condicionam os Deputados… Porque provêm de cidadãos têm de ser
respeitadas pelos Deputados…
Risos do Deputado do PCP António Filipe.
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Sr. Deputado António Filipe, nós conhecemos o discurso, estamos habituados a ele!…
Mas, dizia eu, como essas iniciativas têm o cunho de ser dos cidadãos têm automaticamente de ser
aprovadas…
Risos do Deputado do PCP António Filipe.
Sr. Deputado António Filipe, já foram apresentadas petições relevantes oriundas das várias bancadas, que
iam num determinado sentido ou no sentido contrário e foi muitas vezes fácil terem 200 000 assinaturas ou
mais…
O Sr. João Oliveira (PCP): — Isso assusta o CDS?
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — O quê? A instrumentalização do Parlamento por formas de democracia
direta a mando do PCP? Não assusta, mas não gostamos nem queremos!
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
Protestos do PCP.
Estamos habituados a vê-los fazer isso!
Vozes do PCP: — Tenha vergonha!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Não, isso não nos assusta nada! Nada!
Vou explicar-lhe porquê, Sr. Deputado! Os senhores dizem: vamos ao número para criar um partido. Mas
sabe que criar um partido não chega, porque isso é fácil. Os senhores até criaram o Partido Ecologista «Os
Verdes», que está sentado ao vosso lado!…
Vozes do PCP: — Tenha vergonha!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Criar um partido é a coisa mais fácil do mundo. Arranja-se duas
pessoas, diz-se que é uma coligação e cria-se um partido! É fácil!! E até intervém no Plenário, se for preciso.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
Vozes do PCP: — Seja sério!
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Tem de terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Vou terminar, Sr. Presidente.
Finalmente, percebemos a diferença entre os vossos dois partidos: uns querem 5000 assinaturas e os
outros querem 5500.
Protestos do PCP.
Criar um partido é fácil, mas não basta, Sr. Deputado Bernardino Soares, porque é preciso criar o partido, é
preciso que vá a votos e que eleja Deputados para, depois, ter aqui iniciativa legislativa!! E a média de votos
para eleição de um Deputado não é de 7500 nem de 5000, mas um número muito superior. E é isso que
temos de ter em conta.
Estamos dispostos a rever este número, mas não para 5000, que é, obviamente, do nosso ponto de vista,
uma redução a despropósito e exagerada.
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Aplausos do CDS-PP e do PSD.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma segunda e sintética intervenção, tem a palavra a Sr.ª
Deputada Cecília Honório.
A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Telmo Correia, aproveito o seu apelo a
argumentos razoáveis para o convidar a expressar-se sobre aquela que é, efetivamente, a proposta do Bloco
de Esquerda.
É ou não é razoável que o processo de recolha de assinaturas seja feito pela Internet, seja feito em forma
digital? É ou não é razoável que, numa sociedade de informação, numa sociedade das redes sociais, esta
possa ser uma das formas de recolha de assinaturas para a iniciativa legislativa de cidadãos? É o que se
verifica para a petição.
É ou não é razoável que os partidos da maioria aceitem, no mínimo, esta possibilidade de abrir espaço de
cidadania relativamente à iniciativa legislativa de cidadãos?
Os senhores querem manter tudo como dantes, quando, na verdade, nenhuma das iniciativas em debate
está a ameaçar a democracia representativa.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Sr.ª Deputada, faça o favor de terminar.
A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Termino mesmo, Sr. Presidente.
A iniciativa do Bloco de Esquerda é um convite à razoabilidade, é um convite aos argumentos razoáveis, é
um convite a que os senhores aceitem um mecanismo elementar de reforço deste direito que a lei bloqueia e
que, aparentemente, querem preservar.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma segunda intervenção, também muito sintética, tem a
palavra o Sr. Deputado António Filipe.
O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, vai ser ainda mais sintética.
Verificamos que, quando se fala em cidadãos, o CDS fica irritadíssimo. Foi o que vimos pela intervenção do
Sr. Deputado Telmo Correia.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É verdade!
O Sr. António Filipe (PCP): — O Sr. Deputado Telmo Correia devia explicar-nos em que é que a iniciativa
legislativa de cidadãos afeta a democracia representativa, porque ninguém percebe.
Risos do CDS-PP.
Se os Srs. Deputados entendem que o referendo não põe em causa a democracia representativa — e não
põe! —, como é que a iniciativa legislativa de cidadãos a vai pôr em causa, quando é a Assembleia da
República que decide, a final, sobre qualquer iniciativa que seja apresentada?
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
O Sr. António Filipe (PCP): — O Sr. Deputado Hugo Velosa diz que o PCP não mudou de opinião. Pois
não! Em 2005, 5000 assinaturas eram 5000 assinaturas como hoje 5000 assinaturas são 5000 assinaturas.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Isso é verdade…!
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O Sr. António Filipe (PCP): — Para o PSD é que nem sempre dois e dois são quatro, mas esse é um
problema do PSD…!
A última questão, Sr. Presidente, é a seguinte: tanto o Sr. Deputado Hugo Velosa como o Sr. Deputado
Telmo Correia disseram para arranjarmos um número razoável. Devo interpretar que consideram que 35 000
não é um número razoável… Já é um avanço!
Contudo, se nos dizem que 5000 não é razoável, façam o favor de nos dizer qual é o número que
consideram razoável. E têm muito bom remédio: os Srs. Deputados viabilizam esta iniciativa e, depois, na
especialidade, vão dizer-nos qual é o número que consideram razoável e, provavelmente, entender-nos-emos.
O que acontece é que os senhores não querem que os cidadãos possam apresentar iniciativas legislativas
à Assembleia da República! E tudo o que estão a dizer são «desculpas de mau pagador»!
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, terminado este debate, passamos ao quarto ponto
da ordem de trabalhos de hoje, que consta da discussão, na generalidade, do projeto de lei n.º 32/XII (1.ª) —
Altera o Estatuto dos Deputados, aditando novos impedimentos (BE).
Para apresentar o diploma, tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina Martins.
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: A transparência da vida pública é
essencial à democracia, a credibilização da democracia é uma peça fundamental da sua própria existência e é
nesse sentido que o Bloco de Esquerda apresenta um projeto que altera o Estatuto dos Deputados, aditando
novos impedimentos.
A ética não se impõe por lei — pratica-se! Mas sabemos todos que precisamos de regras na nossa vida
política para que a transparência exista e que temos de ir aperfeiçoando essas regras conforme vão
aparecendo novas formas da organização da nossa vida pública, da nossa vida política e também da
organização dos negócios, das empresas, dos vários interesses muitas vezes em confronto.
O Bloco de Esquerda apresenta propostas de três tipos para fortalecer a democracia e a transparência da
vida democrática no que diz respeito à nossa atuação, a nós que estamos aqui, Deputados e Deputadas.
São propostas, por um lado, que fortalecem a independência, a autonomia dos Deputados e das
Deputadas, nomeadamente quanto à nossa ação de fiscalização do Governo e da Administração.
Fortalecemos dizendo que não pode um Deputado ou uma Deputada ser simultaneamente titular de um órgão
coletivo público ou de um órgão de uma empresa que tem capitais públicos, independentemente de esses
capitais serem ou não maioritária ou exclusivamente públicos. Ou seja, quando estamos a falar de entidades
participadas pelo próprio Estado, não pode um Deputado fazer parte de algum dos seus órgãos, mantendo,
assim, a sua independência e a sua autonomia.
Dizemos também que nenhum Deputado pode prestar serviços de assessoria, de consultadoria, de
patrocínio, direta ou indiretamente através de uma sociedade de que faça parte, ao Estado.
Existem já muitos impedimentos no que diz respeito, por exemplo, a atividades de comércio e de indústria.
Um Deputado que seja dono de uma papelaria não pode vender papel à escola pública que fica em frente,
mas um Deputado que seja advogado pode prestar serviços ao Estado, e isso é inadmissível! Mais uma vez,
são a independência e a autonomia dos Deputados e das Deputadas que estão em causa e é isso que
queremos fortalecer.
Queremos também fortalecer as barreiras entre o que é o interesse público e o que é o interesse privado
nas zonas de negócio, de comércio e de indústria com o próprio Estado, e fazendo com que nos impedimentos
que têm a ver com os cônjuges sejam equiparadas as uniões de facto, porque é assim que tem sentido.
Por outro lado, quando falamos em sociedades que são concessionárias ou prestam algum tipo de
assessoria ou consultadoria ao Estado, fazendo com que não haja distinção entre se há 20%, 10% ou 5% do
capital. Não interessa! Não pode um Deputado ter capital de uma empresa que faz negócios com o próprio
Estado!!
Finalmente, a última proposta que faz parte deste projeto de alteração ao Estatuto dos Deputados é uma
norma que impede que um Deputado ou uma Deputada esteja a prosseguir interesses que são opostos ao do
Estado, impedindo que haja patrocínio de ações de entidades que têm interesses contraditórios aos do
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Estado. Não pode um Deputado, que é também advogado, no exercício das suas funções, representar uma
entidade que, por exemplo, em tribunal tem um processo contra o Estado. Esta norma aplica-se também a
uma sociedade que o Deputado detenha. Isso não pode existir!
São regras básicas do reforço da democracia. Reforçar a independência do cargo de Deputado e de
Deputada, reforçar a fronteira entre o interesse público e o interesse privado e não deixar que um Deputado ou
uma Deputada, no exercício das suas funções, possa estar a patrocinar interesses que são contrários ao do
Estado!
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, a proposta que o Bloco de Esquerda nos traz hoje não é
nova nem, sequer, é a primeira vez que se discute. Temos sobre ela uma posição que é conhecida, que não
alteraremos substancialmente e que se baseia em duas ou três ideias fundamentais.
Pensamos que uma cada vez maior transparência na vida política é fundamental. De resto, temos
aprovado várias propostas nesse sentido. Ainda no outro dia, aprovámos um pacote de propostas sobre essa
matéria e recentemente viabilizámos uma proposta do Bloco de Esquerda, sem qualquer preconceito em
relação a isso, também relativamente a este tipo de matérias.
No entanto, apesar de tudo, é preciso alguma cautela na criação de cada vez mais impedimentos, que, no
limite, traduzem a impossibilidade de um Deputado exercer determinadas profissões. Isso, para nós, não é
aceitável. A Sr.ª Deputada dir-me-á que não é isso que está em causa e que apenas acrescentam mais alguns
impedimentos. Está bem… Contudo, se vamos acrescentando cada vez mais impedimentos, chegamos a um
ponto em que certas profissões não são compatíveis com o exercício da atividade de Deputado.
O Bloco de Esquerda, nesta proposta, não faz menção concreta à profissão de advogado, mas
percebemos que é, obviamente, uma das atividades que está ou que é posta em causa. De resto, não foi por
acaso, seguramente, que a Sr.ª Deputada escolheu esse exemplo…
Consideramos que tem de haver regras, tem de haver transparência, tem de haver impedimentos. O
próprio preâmbulo do projeto que o Bloco de Esquerda agora apresenta refere inúmeros impedimentos que já
estão na lei atual e que representam, do nosso ponto de vista, um avanço que foi sendo feito ao longo dos
anos, das legislaturas e dos debates sobre esta mesma matéria. Já existe um rol vastíssimo de impedimentos.
No entanto, esses impedimentos não podem chegar ao ponto em que uma determinada profissão não
possa exercida, porque a consequência disso — e, para nós, seria uma consequência negativa! — era a de
que só poderia ser Deputado quem fosse funcionário público, e tivesse lugar de regresso enquanto tal, ou se
tornasse profissional da política, e depois regressasse ou ao partido ou ao seu lugar de origem na função
pública. Do nosso ponto de vista, isto não é desejável para o Parlamento e não é sequer desejável para o
exercício da política em si!
Consideramos importante, no exercício da política, que haja profissionais, que haja gente competente, que
haja advogados, engenheiros, médicos, etc., que tenham uma profissão, que não vivam da política, que não
dependam da política e que possam ser eleitos e exercer aqui o seu mandato, tal como seguramente estão
muitos dos que aqui estão nesta mesma Câmara. Essa é a nossa visão!
É evidente que, quando se diz que não se pode prestar serviços de consultadoria, nem sequer a empresas
privadas, nem através de si ou através de sociedade de que se seja membro…
O Sr. João Semedo (BE): — Claro!…
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — A Sr.ª Deputada deu o exemplo da papelaria. É verdade, e também eu
acho — tal como a Sr.ª Deputada, por maioria de razão, também acha — que um Deputado não pode
participar num processo em que esteja envolvido o Estado, em que haja um contrato de concessão, em que
haja uma candidatura a um concurso público. Penso que esta inibição existe! Mas não posso proibi-lo é de ser
advogado, de ser sócio de uma sociedade de advogados, de ter clientes e de estar ao mesmo tempo aqui
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como Deputado, conclusão a que conduz, na minha opinião — e, se não for assim, digam! —, este vosso
projeto.
Uma coisa é não poder participar num processo em concreto, mas isso já não pode hoje! Está sujeito ao
crivo do Parlamento e da Comissão de Ética! Outra coisa é não poder ser sócio de uma sociedade, não
participando ele nesse processo! Este impedimento parece-nos claramente excessivo e, no limite, leva à
contradição que alguns defendem — a própria Ordem dos Advogados tem-no defendido algumas vezes —
entre a possibilidade de se ser advogado e de se ser Deputado, matéria com a qual não concordamos, porque
achamos que é importante que as pessoas tenham atividade, tenham profissão e sejam livres no exercício
dessa atividade.
Portanto, basicamente são estas as reservas que mantemos, que consideramos importantes e com as
quais estamos dispostos a discutir esta matéria. Estamos dispostos a discutir mais regras de transparência,
estamos dispostos a avançar em matéria de regras de transparência, mas mantendo a ideia de que não pode
haver uma limitação.
Já agora, Sr.ª Deputada, deixe-me que lhe diga que achamos que não pode haver regras de limitação em
relação a profissões em concreto, como tem acontecido. Pode haver limitações de exercícios de atos em
concreto, como o patrocínio contra o Estado e o patrocínio em concursos onde a decisão do Estado está
envolvida, etc., por aí fora. Mas não creio que possa haver uma limitação para os advogados e não para
outras profissões! Nem considero — mas é uma opinião minha, pessoal — que faça algum sentido retirar os
advogados do local onde precisamente se fazem as leis…! Parece-me ser uma ideia um bocadinho estranha…
Por alguma razão, haverá muitos se não advogados, pelo menos juristas nesta Câmara!… Talvez seja porque
se interessaram por leis e pela feitura das leis, alguns deles, desde muito novos…. Acho que é algo lógico.
Aliás, também não acho que haja uma regra para advogados e outra para as outras profissões!
Porque é que os advogados não podem exercer a sua profissão e se for um engenheiro que trabalhe com
uma construtora já não tem esse mesmo impedimento? Porque é que se for um médico, que esteja ligado a
um grupo privado ou público de medicina, já não tem essa limitação?
Não! As regras têm de ser iguais para todos, têm de ser transparentes e, do nosso ponto de vista, devem
assegurar que haja aqui gente que não depende da política, que não vive exclusivamente da política, que não
é profissional da política, tem profissão e que regressará, com comportamento ético, sério e transparente, à
sua profissão quando terminar seu mandato de Deputado, porque ser Deputado não é uma profissão, é um
cargo e uma responsabilidade, que nós exercemos com dedicação como seguramente nos farão essa justiça e
nós fazemo-la a todos os Srs. Deputados, porque não levantamos suspeições em relação a ninguém, que
estão nesta Câmara e que participam nestes trabalhos.
Entretanto, assumiu a presidência a Sr.ª Vice-Presidente Teresa Caeiro.
A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados, a matéria que agora debatemos tem
importância acrescida por diversos motivos e envolve várias dimensões de preocupações fundamentais que
têm a ver com a organização do poder democrático e do Estado democrático.
É porque por detrás destas alterações ao Estatuto dos Deputados que o Bloco de Esquerda agora
apresenta e por detrás das questões imediatas que se colocam a propósito destas alterações estão
preocupações que têm a ver com a credibilização da atividade política, com o reconhecimento e o crédito aos
olhos dos cidadãos por parte dos eleitos e dos responsáveis políticos, e questões que também têm a ver com
o entendimento que cada partido terá das condições de exercício do mandato parlamentar.
Para o PCP — e temo-lo dito nos diversos debates que têm ocorrido na Assembleia da República a este
respeito —, a atividade parlamentar deve ser a atividade principal do Deputado e não uma atividade em parte
time que um Deputado tem, seja advogado, seja empresário, seja o que for. Entendemos que esta deve ser a
atividade principal do Deputado e que ela não deve estar subordinada a qualquer outro tipo de interesse,
nomeadamente a interesses de natureza económica ou privada, nem à atuação de outros órgãos de
soberania.
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Sabemos, obviamente, que há entendimentos diferentes e por isso muitas das propostas de alteração ao
Estatuto dos Deputados que o PCP tem apresentado não têm sido acolhidas e também por isso temos o
Estatuto dos Deputados que temos…!
Sabemos que há entendimentos diferentes que têm também a ver com conceções políticas e ideológicas
diferentes daquilo que é não só a atuação no âmbito do exercício do mandato parlamentar mas de acordo com
a orientação política de cada partido.
Portanto, é facilmente percetível que os partidos que, no governo, sacrificam o interesse nacional aos
interesses de grupos económicos e financeiros, que defendem políticas de subordinação do poder político ao
poder económico, no que diz respeito à configuração do Estatuto dos Deputados, nomeadamente ao regime
de incompatibilidades e impedimentos, compreende-se que não tenham posição distinta dessa e que,
portanto, também não se importem, a esse nível, com a subordinação do poder político ao poder económico.
O problema da subordinação do poder político ao poder económico é a questão central deste debate e
ultrapassa em muito o Estatuto dos Deputados, porque tem a ver com as orientações concretas, com as
decisões políticas que nesta Assembleia da República são tomadas pelos Deputados no exercício das suas
funções.
Há vários exemplos que podem ilustrar as orientações de privilégio aos interesses económicos e aos
interesses do capital económico e financeiro em relação aos interesses dos cidadãos, dos eleitores e do
próprio País, que é muitas vezes colocado em causa com as decisões que são assumidas.
Há pouco mais de um ano, PS, PSD e CDS-PP chumbaram uma proposta que o PCP havia apresentado
para impedir os grupos económicos de fugirem aos impostos, distribuindo antecipadamente os dividendos.
Ainda recentemente, um episódio mais atual: o Grupo Jerónimo Martins (Pingo Doce) resolve fugir aos
impostos mudando a sua sede social para a Holanda.
Em relação a isto, parece que da parte dos partidos da maioria nada há a exigir, ao contrário do que todos
os dias é entendido em relação aos sacrifícios a impor ao povo e aos trabalhadores, em que parece não haver
limites.
Estas são questões concretas que determinam a subordinação do poder político aos interesses dos grupos
económicos e daqueles que são muitas vezes os contextos que fundamentam, individualmente, as relações
que os Deputados da Assembleia da República podem assumir a coberto da definição do Estatuto dos
Deputados em matéria de incompatibilidades e impedimentos, não limitando as relações de verdadeira
promiscuidade.
Ao contrário do que disse o Sr. Deputado Telmo Correia, os Deputados estão, de facto, impedidos de
estabelecer relações com o Estado nas empresas em que tenham uma participação social relevante. Porém,
há situações em que o Estatuto dos Deputados é insuficiente e não serve para impedir que essas situações
aconteçam, como é o caso das sociedades de advogados.
O Sr. Deputado Telmo Correia sabe bem que, nos termos em que hoje estão definidos os regimes de
incompatibilidades e impedimentos, em particular estes últimos, no Estatuto dos Deputados, as sociedades de
advogados constituem um «cavalo de Troia» para inviabilizar a concretização dos impedimentos que se
colocam a praticamente todas as restantes sociedades. Este é um problema que continua por resolver, e não
por falta de propostas, porque, inclusivamente, o PCP tem trazido à Assembleia da República inúmeras vezes
propostas para ultrapassar este problema. Só por falta de vontade política desta maioria, destes três partidos
que se vão alternando no governo, é que este problema ainda hoje não está resolvido.
Sabemos que não há lei que resolva integralmente todos os problemas que se colocam a este nível — há
uma dimensão inegável que tem a ver com o compromisso pessoal e individual de cada um dos Deputados —,
mas a Assembleia da República não pode deixar de aperfeiçoar a lei, o Estatuto dos Deputados, para impedir
que estas situações de promiscuidade entre funções políticas e negócios privados existam, e o Estatuto dos
Deputados deve contribuir para esse combate.
O projeto de lei do Bloco de Esquerda apresenta soluções que, obviamente, se aproximam muito até de
propostas que o PCP tem apresentado noutros momentos — e, por isso, votá-lo-emos favoravelmente —, mas
receamos que, infelizmente, ele tenha o mesmo destino de anteriores propostas apresentadas pelo PCP.
Receamos que PS, PSD e CDS-PP, «mandando às urtigas» a retórica da ética na austeridade e da
transparência, que ainda há umas semanas o Partido Socialista pretendia vender aos «pacotes» na
Assembleia da República, façam, afinal de contas, uma inversão de 180º e acabem, uma vez mais, como já no
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passado fizeram, por rejeitar uma iniciativa que tem o mérito de contribuir para que haja algum avanço no
combate à promiscuidade entre funções políticas desempenhadas pelos Deputados da Assembleia da
República e os negócios privados, que têm de ser obviamente delimitados até onde puderem ser pelo Estatuto
dos Deputados.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado João Portugal.
O Sr. João Portugal (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados, quero, em primeiro lugar, em nome
do Partido Socialista, saudar o Bloco de Esquerda e os Srs. Deputados subscritores deste projeto de lei por
esta iniciativa, pois o Partido Socialista está sempre disponível para debater estas questões.
Apesar de o Partido Socialista ter algumas discordâncias relativamente a parte deste projeto de lei — e já
lá iremos…! —, abster-nos-emos na votação na generalidade para viabilizar a sua descida à especialidade no
sentido de alterar este projeto de lei de acordo com o maior consenso possível.
Sr.as
e Srs. Deputados, gostaria ainda de responder ao Sr. Deputado João Oliveira dizendo que este não é
um tema do Bloco de Esquerda nem do PCP! É um tema de todos os partidos e só com consenso e com
unanimidade é que conseguiremos alterar a situação e ter maior transparência e melhores impedimentos e
incompatibilidades no Estatuto do Deputado.
Relativamente ao projeto de lei, é importante lembrar que o Partido Socialista, em dezembro, apresentou
nesta mesma Casa um pacote de transparência e prevenção da corrupção, cujo conteúdo previa algumas das
preocupações que o Bloco de Esquerda consagra no seu projeto de lei. Desde logo, quanto à questão
constante da alínea b) do n.º 6 do artigo 21.º, relativa ao impedimento do exercício do mandato judicial a favor
e contra o Estado ou entidade pública, temos a mesma opinião, que, aliás, já manifestámos e colocámos no
nosso pacote de transparência e prevenção da corrupção.
Portanto, não concordando na totalidade com todo o texto desta alínea b), estamos disponíveis para, em
sede de especialidade, podermos consagrar esta pretensão.
Porém, partilhamos uma questão que já aqui foi levantada pelo Sr. Deputado Telmo Correia — e muito
bem, no nosso entender! —, que é a de que não podemos partir do pressuposto de que só podem exercer o
mandato de Deputado pessoas de certas profissões.
Com o conjunto de impedimentos e incompatibilidades que o Bloco de Esquerda traz qualquer dia
corremos o risco de ter aqui apenas funcionários públicos ou funcionários partidários, e esta Casa deve ser de
livre acesso por parte de todas as profissões, porque esta é a Casa a que todos devem ter acesso de forma
igual.
Sr.ª Presidente, Sr.as
Deputadas e Srs. Deputados, relativamente à questão a alínea d) do n.º 5 do artigo
21.º, concordamos com parte do seu conteúdo. No entanto, entendemos que não deve ser colocada em
qualquer caso de impedimento. Situações diferentes devem ser tratadas de formas diferentes nesta Casa e
compete à Comissão para a Ética, a Cidadania e a Comunicação analisar caso a caso e tratar situações
diferentes de formas diferente e analisar, de facto, se há ou não transparência, se há ou não incompatibilidade
ou impedimento de exercer o mandato de Deputado.
Um Deputado não nasce nesta Casa, um Deputado tem uma vida para além desta Casa e não se podem
criar impedimentos e incompatibilidades, esquecendo o passado profissional das pessoas.
Portanto, temos de ter em atenção que esta Casa é de todos e para todos, e que não podemos fechá-la a
funcionários públicos e a funcionários partidários.
Na alínea a) do n.º 6 do artigo 21.º refere o Bloco de Esquerda que deve ser criado impedimento «no
exercício de comércio ou indústria, direta ou indiretamente, com o cônjuge não separado de pessoas e bens
ou com pessoa com quem viva em união de facto, por si ou entidade em que detenha qualquer participação do
capital social, celebrar contratos com o Estado e outras pessoas coletivas de direito público, participar em
concursos de fornecimento de bens ou serviços, ou empreitadas ou concessões abertas e de realizar
contratos com o Estado».
Srs. Deputados, suponham o caso de dois Deputados casados, um em regime de separação de bens e
outro em regime comunhão de bens, que querem abrir uma tinturaria, onde uma das matérias-primas é a
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água. No âmbito do exercício de comércio e indústria estão impedidos de realizar contratos com o Estado.
Ora, como é que essa mesma empresa faz um contrato com a EPAL, empresa de águas de Lisboa, para se
abastecer da água que é necessária para o seu negócio?
Com esta alínea, o que o BE pretende… Aliás, esta é a discussão que tivemos ontem e concordámos em
que, de facto, temos de criar impedimentos e incompatibilidades, mas não podemos ir tão longe…
Vozes do BE: — Isso é um disparate!
O Sr. João Portugal (PS): — Não é um disparate, porque, quando apresentamos um diploma, temos de o
levar até ao seu extremo.
Portanto, devemos criar impedimentos, mas devemos ter atenção ao que estamos a fazer, pois temos de
dignificar o Estatuto dos Deputados e temos de ter em atenção, como disse, que os Deputados não nascem
nesta Casa, têm uma vida e não podemos tratar de forma diferente Deputados em razão do seu regime de
casamento.
Sr.as
e Srs. Deputados, queria ainda dizer que relativamente à questão, que é a pretensão do BE, de
equiparar o casamento às uniões de facto no que respeita à incompatibilidade e ao impedimento dos
Deputados, estamos totalmente de acordo e também aí daremos luz verde com o nosso voto favorável em
sede de especialidade.
Estaremos, como estamos e estivemos sempre, disponíveis para, junto com os outros partidos, credibilizar
esta Casa, criar pacotes de transparência, de prevenção da corrupção, de alteração ao Estatuto dos
Deputados, mas isto deve ser feito com consenso, não com medidas avulso, e com toda a credibilidade para
que todos tenham livre acesso a esta Casa.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem a palavra o Sr. Deputado Sérgio Azevedo.
O Sr. Sérgio Azevedo (PSD): — Sr.a Presidente, Sr.
as e Srs. Deputados: O projeto de lei apresentado hoje
pelo Bloco de Esquerda pretende a alteração do Estatuto dos Deputados, aditando novos impedimentos.
Este diploma não é novo nesta Câmara sendo esta a quarta vez que é discutido. Também na X Legislatura
o Bloco de Esquerda apresentou por três vezes o mesmo diploma, não tendo obtido, em todas elas, aprovação
do Parlamento.
O PSD reitera, como já o fez por diversas vezes no passado, a importância da transparência para quem
exerce cargos públicos. Acreditamos que a cultura de transparência para ser efetiva necessita não só de uma
mudança de atitudes mas, sobretudo, de uma mudança de práticas.
Aliás, a este respeito, Sr.as
e Srs. Deputados, se há partido que promoveu alterações aos regimes de
incompatibilidades dos titulares de cargos políticos, ao Estatuto dos Deputados e até mesmo ao combate à
corrupção, foi o PSD.
Desde o primeiro diploma, a Lei n.º 7/93, com todas as suas alterações, até aos diplomas do combate à
corrupção e ao enriquecimento ilícito, o PSD esteve na linha da frente a favor da transparência daqueles que
abraçam a causa pública.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É só transparência!…
O Sr. Sérgio Azevedo (PSD): — Nós, no PSD, não apregoamos; fazemos! E nesta matéria fizemos muito.
Protestos do BE.
Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Acreditamos que a sociedade não é um sistema fechado e que a
exigência posta àqueles que abraçam a causa pública é cada vez maior. Por isso, consideramos que esta é
uma matéria nuclear da ética política que diz diretamente respeito ao cerne da credibilidade e do prestígio da
atividade política.
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Mas também acreditamos que a ética na política não reside apenas na lei; está em quem exerce o seu
mandato e na responsabilidade que essa pessoa atribui à confiança que lhe foi conferida pelo voto.
A transparência é também, no nosso entender e na sua essência, um comportamento, uma postura, uma
coerência. É nisso que também acreditamos!
Sr.a Presidente, Sr.
as e Srs. Deputados: Há uma certa tendência de os partidos mais à esquerda, em
matérias como esta, porem constantemente em causa o funcionamento da democracia.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Sérgio Azevedo (PSD): — Para aqueles que estão mais à esquerda neste tipo de matérias o mote é
sempre: restringir!, restringir!, restringir!!
Restringem porque não confiam no julgamento do povo, porque põem sempre em causa quem exerce a
atividade política, ou porque tomam a parte pelo todo, ou porque, utilizando o velho e cansado argumento, o
poder político está sempre subjugado à vontade do poder económico.
Aplausos do PSD.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Isso é uma autocrítica!
O Sr. Sérgio Azevedo (PSD): — Nós, no PSD, não tememos a democracia. Não temos medo do
julgamento popular e acreditamos na liberdade de ação de todos os cidadãos, porque, para nós, é, de facto, o
povo quem mais ordena.
Vozes do PSD: — Muito bem!
Vozes do PCP: — É, é…! Vê-se!!…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Não é o povo; é o polvo!…
O Sr. Sérgio Azevedo (PSD): — O projeto de lei que hoje discutimos é, no nosso entender, mais uma
castração do que uma solução.
Aliás, a este respeito, não podemos deixar de referir que este agendamento, neste momento em particular,
é travestido de toda uma envolvente mediática e comunicacional em torno desta questão.
Aplausos do PSD.
Protestos do BE.
Nós, no PSD, não disputamos linhas em páginas de jornais…! Não nos revemos num jornalismo
sensacionalista que, em vez de estudar, inventa e, em vez de informar, o que pretende é excitar e atordoar.
O Sr. João Semedo (BE): — Deve estar a falar para o PSD…!
O Sr. Sérgio Azevedo (PSD): — Por isso, não agendamos nem discutimos ao sabor de um espetro
mediático falso.
Queremos, de facto, discutir e reforçar a transparência daqueles que exercem cargos políticos, mas
recusamo-nos a tomar a parte pelo todo ou a ter mais audiências à custa de matérias que abalam ainda mais
a credibilidade da política junto dos cidadãos.
Sr.a Presidente, Sr.
as e Srs. Deputados: A importância deste tema obriga-nos a uma reflexão primacial que
deve ter lugar antes de qualquer decisão ou tomada de posição. Afinal, que tipo de Deputados queremos?
Queremos Deputados capazes de estarem à altura das exigentes responsabilidades do exercício de um cargo
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público? Ou só queremos Deputados que exerçam o seu mandato como se de uma carreira profissional se
tratasse?
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Deve estar a falar do PSD!
O Sr. Sérgio Azevedo (PSD): — Queremos nesta Assembleia Deputados despertos e conhecedores da
sociedade que nos rodeia, ou queremos só Deputados funcionários partidários e de gabinete?
Aplausos do PSD.
Esta é, no nosso entender, a grande reflexão que deve ser feita e, pela nossa parte, digo-vos o seguinte:
da mesma maneira que valorizamos aqueles que fazem da política a sua vida e lutam acerrimamente pelas
suas ações e convicções, valorizamos igualmente aqueles que nos trazem outra perspetiva, outro
conhecimento e cujo contributo é essencial para que esta Câmara seja verdadeiramente representativa da
nossa sociedade.
O Sr. João Oliveira (PCP): — E vêm fazer disto um part time!
O Sr. Sérgio Azevedo (PSD): — Rejeitamos embarcar numa demagogia circunstancial e remar contra a
maré da impopularidade, defendendo uma ideia essencial: só há um Parlamento forte com Deputados fortes
nas suas convicções e nas suas ações.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Sérgio Azevedo (PSD): — Esta é uma verdade inegável!
Aliás, a este respeito, Sr.as
e Srs. Deputados, permitam-me citar Manuel Alegre numa declaração política
feita nesta Assembleia, na qual disse o seguinte: «(…) A função de Deputado, a que o Deputado francês
Robert Buron, grande resistente antinazi, chamou ‘a mais nobre função do mundo’, não é a de passar a vida
sentado no Plenário.
Creio, aliás, que é necessária uma revisão mais profunda do Estatuto do Deputado. Ser Deputado é uma
responsabilidade que implica obrigações e rigor. Mas não é um castigo nem uma penitência.
Os Deputados são julgados politicamente pelo seu trabalho e pelo seu comportamento.»…
O Sr. João Semedo (BE): — O que é que isso tem a ver com o projeto de lei?
O Sr. Sérgio Azevedo (PSD): — «Esse juízo político não pode ser substituído por métodos restritivos nem
por processos administrativos.
É a ação política do Deputado que tem de ser valorizada, de acordo com o espírito da Constituição, em que
o eleito responde perante o País e a sua consciência.
É também por uma ação pedagógica contra a herança antiparlamentar de quase meio século de ditadura
que passa o prestígio do Parlamento. Não pela menorização do papel do Deputado.»
Sr.as
e Srs. Deputados, algum tempo depois desta declaração sabemos bem qual foi a união entre o
Deputado Manuel Alegre e o Bloco de Esquerda…!
Vozes do PSD: — Bem lembrado!
O Sr. Sérgio Azevedo (PSD): — Temos, por isso, um profundo desacordo com o projeto de lei hoje em
discussão, quer pelos termos que utiliza quer pelos fundamentos em que assenta.
Rejeitamos liminarmente a ideia de que os Deputados vivem numa situação de promiscuidade com o setor
privado e com o poder económico ou, então, que atuam em nome dos seus interesses pessoais à frente dos
interesses da República,…
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Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. João Semedo (BE): — Olhe que a Deputada Teresa Coelho não diz isso…!
O Sr. Sérgio Azevedo (PSD): — … quanto mais não seja porque qualquer tipo de generalização é falsa e
injusta, e em nada contribui para a confiança dos cidadãos na política, nem tão pouco para o bom nome do
Parlamento. Isto não significa que não tenhamos a consciência de que nenhuma lei é perfeita, nem que
estamos indisponíveis para debater com rigor e seriedade questões relacionadas com esta matéria.
Bem sabemos que, muitas vezes, as questões de natureza política assentam em questões de ética, mas
nem sempre as questões de ética assentam em questões de natureza política.
Por isso, registámos com algum agrado o contributo que o Bloco de Esquerda deu em matérias tão
importantes como o combate à corrupção e ao enriquecimento ilícito, essas, sim, medidas urgentes e
verdadeiramente atuantes na credibilização de quem exerce funções públicas.
Vozes do PSD: — Bem lembrado!
O Sr. Sérgio Azevedo (PSD): — Em tudo o resto estamos serenos e tranquilos, pois temos a consciência
de que estamos no caminho certo.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina
Martins.
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Sérgio Azevedo, ouvi-o com muita atenção
e espero que a bancada do PSD o tenha ouvido também com muita atenção, porque, estou certa, muitas das
coisas que disse se dirigiam à sua própria bancada. Felicito-o por isso!
Aplausos do BE.
Nós não estamos hoje aqui a discutir teoria geral sobre o Estatuto dos Deputados ou de cargos políticos;
estamos a discutir propostas concretas que o BE vem trazendo a esta Assembleia há muito tempo.
É verdade que as nossas propostas não são novas, é verdade que esta é uma batalha nossa de há muito
tempo e é verdade que persistimos, porque achamos que é muito importante fortalecer a democracia e que a
democracia se fortalece quando é mais clara, mais transparente…
O Sr. João Semedo (BE): — Muito bem!
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — … e quando os Deputados e as Deputadas são mais autónomos,
independentes e responsáveis no exercício do seu mandato e mais responsabilizados!
Portanto, entendamo-nos: se o projeto não é novo, também não é, com certeza, por mediatismos de
momento ou por demagogia que ele é apresentado!
Os Srs. Deputados saberão que insistimos, que temos vindo a insistir! E se umas vezes falamos sozinhos,
noutras mais vozes lá fora chamam a atenção para os problemas que se discutem na Assembleia da
República — e, neste momento, há muitas vozes lá fora que veem os problemas da Assembleia da República
e que pedem para atuarmos, pelo que nós temos vindo a denunciar esses problemas!
Por outro lado, há cada vez mais gente dos vossos próprios partidos a saber que estas alterações são
necessárias. Por isso, também na comunicação social tem existido mais eco destas propostas, que até vêm de
pessoas dos vossos partidos!
Portanto, sabemos que não e só o BE que percebe que estas alterações são necessárias; sabemos
também que no PSD e no CDS há muito quem pense que estas propostas são necessárias, e também no PS
— aliás, o PS acompanha-nos.
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Todavia, muitas vezes, também andamos para trás. Sabemos que o Estatuto dos Deputados tem avançado
com impedimentos e com incompatibilidades, mas também sabemos que houve revisões em que se andou
para trás e agora é permitido algo que não era permitido antes, que é a participação de Deputados em muitos
órgãos consultivos, que agora são exceções, ou o patrocínio de ações contra o Estado, coisas que não eram
possíveis… Portanto, andámos para trás e não devia ter sido possível andar para trás, porque precisamos,
sim, de aprofundar este diploma.
No nosso projeto de lei falamos de propostas concretas. Não há perseguição a nenhuma profissão! É
verdade que quando se lê o projeto do BE se percebe que o exercício da profissão de advogado tem aqui
limitações impostas, mas é porque, como os senhores sabem, o Estatuto dos Deputados tem tido uma espécie
de isenção no que respeita aos impedimentos e incompatibilidades quando falamos de advocacia, ou seja,
impedimentos e incompatibilidades que há para tantas profissões, quando os advogados têm estado um pouco
à margem, a navegar por cima…
Portanto, os advogados têm ficado ausentes desta limitação, desta capacidade de fortalecer o interesse
público, e se, em alguns momentos, o projeto parece ser muito sobre a advocacia é porque esta profissão tem
estado, como já disse, ausente dos impedimentos e incompatibilidades.
O que queremos não é perseguir uma profissão; é, sim, que todas as profissões tenham as mesmas regras
quando falamos de clareza e quando falamos de responsabilidade!
Não está vedada a participação na Assembleia da República a nenhuma profissão — esse é um falso
problema —, mas é verdade que ninguém é Deputado por obrigação; é-o porque se propôs a isso e quem se
propõe a um cargo público de mandato parlamentar sabe que tem responsabilidades acrescidas, sabe que
terá mais limitações. É natural que assim seja, faz parte da vida democrática, faz parte da transparência, da
credibilização da política da nossa democracia. Ser Deputado é um cargo com especiais responsabilidades,
que vêm com especiais limitações para que o interesse privado e o interesse público sejam defendidos.
Se o propósito das bancadas da maioria for o de discutir o projeto, porque estamos abertos a discutir na
especialidade ponto a ponto, a melhorar o que houver para melhorar — estivemos sempre abertos a isso —,
então o diploma será aprovado. Mas se querem deixar tudo na mesma, então chumbam o diploma. É tão
simples quanto isso.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, está concluída a
discussão deste ponto da nossa ordem de trabalhos.
Vamos agora passar ao último ponto da ordem do dia de hoje, que consta da apreciação conjunta dos
projetos de resolução n.os
151/XII (1.ª) — Em defesa do transporte ferroviário na capital de distrito de Setúbal
(Os Verdes) e 164/XII (1.ª) — Recomenda ao Governo a reposição dos locais de paragem do Intercidades em
Setúbal e Alcácer do Sal e a restituição do serviço regional da linha do sul entre Barreiro e Tunes (BE).
Cada grupo parlamentar dispõe de 3 minutos. O Bloco de Esquerda e Os Verdes, como autores das
iniciativas, dispõem de mais 1 minuto.
Para apresentar a sua iniciativa, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, permita-me que comece por dizer que gostaria de
ouvir um determinado Deputado desta Casa continuar hoje aqui a delirar sobre este projeto de resolução que
Os Verdes apresentam.
Sr. Deputado Telmo Correia, deve custar-lhe tanto, mas tanto, assistir à apresentação de tantos projetos de
lei ou de resolução por parte de Os Verdes para beneficiar o País!
Oiça, então, Sr. Deputado: este projeto de lei de Os Verdes — e eu quero ver como é que o CDS se vai
pronunciar sobre ele e posicionar-se…
Protestos do Deputado do CDS-PP Telmo Correia.
Não sabe qual é? Não sabe o que se está a discutir? Muito bem, mas era bom que soubesse.
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Sr.as
e Srs. Deputados, este projeto de resolução, para informação de todos, visa que se reponha a
paragem do Intercidades que faz ligação ao Algarve, na linha do sul, na cidade de Setúbal, coisa que a CP
decidiu eliminar e a que o Governo anuiu. A paragem do Intercidades deixa de ser feita também em Alcácer do
Sal — errado! E mais: a CP também determinou que vai acabar com o serviço regional. Reparem na manobra
refinada, Sr.as
e Srs. Deputados: ia do Barreio a Tunes, passou a ir do Pinhal Novo a Tunes e depois de
Setúbal a Tunes. Ou seja, foi reduzindo o percurso até acabar. Tudo para enganar as populações, tudo para
deitar abaixo o direito à mobilidade das populações.
Setúbal é um concelho com mais de 120 000 habitantes. É uma capital de distrito que viveu sempre
sustentada na mobilidade ferroviária, extraordinariamente importante nesta cidade, e a CP não tem modas (é
mesmo assim), nem modos e dá uma machadada no transporte ferroviário em Setúbal, através de uma
decisão unilateral que não envolveu nem utentes, nem trabalhadores, nem autarquias.
Pasmemos! Todos estes autores souberem da questão via comunicação social, o que eu julgo demonstrar
um profundo desrespeito por parte da CP e, designadamente, também, por parte do Governo.
Pasmemos! Esta decisão não consta do dito plano estratégico de transportes. Ou seja, a somar aos 600
km de via ferroviária a encerrar que prevê o PET (Plano Estratégico de Transportes), ainda há um inúmero
conjunto de serviços que a CP visa encerrar e que o Governo aceita encerrar, destruindo a mobilidade
ferroviária em Portugal.
Alega a CP que a eliminação desta paragem do Intercidades em Setúbal poupará meia hora de viagem na
deslocação Lisboa/Algarve.
Protestos do CDS-PP.
Não, não é verdade, Srs. Deputados! Digam isso aos cidadãos de Setúbal!
Pelo contrário, aumenta-lhes o tempo de viagem porque, agora, em vez de apanharam o comboio em
Setúbal, têm de se deslocar para o Pinhal Novo, com custos acrescidos, pelo que, provavelmente, ainda lhes
agravará em meia hora esta viagem.
Portanto, os pressupostos estão todos errados, Sr.as
e Srs. Deputados. E não deixa de ser caricato que
esta decisão tenha sido tomada, justamente, quando estava a decorrer — pasmemos! — a Cimeira de Durban
para o combate às alterações climáticas.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para apresentar o projeto de resolução do BE, tem a palavra a Sr.ª
Deputada Mariana Aiveca.
A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: O Bloco de Esquerda traz também
a debate um projeto de resolução que visa exatamente a reposição dos locais de paragem do Intercidades em
Setúbal e Alcácer do Sal, garantindo a estas populações transporte ferroviário com duração e horários a
preços de conforto.
Pretendemos também, com este projeto de resolução, a restituição do serviço regional da linha do sul, no
seu percurso original, com partida na cidade do Barreiro e com destino a Tunes, no sentido de acautelar a
mobilidade em condições dignas das populações, nomeadamente nas regiões mais interiores e privadas de
alternativas de transporte público.
Sabemos que o distrito de Setúbal tem vindo a sofrer sucessivas supressões do serviço de transporte
ferroviário, deixando uma série de localidades a sul do distrito de Setúbal e no litoral alentejano sem qualquer
alternativa de mobilidade.
Recorde-se que, após a modernização da linha do Sado, o serviço regional de ligação a Tunes tem sido
consecutivamente alterado, com o encurtamento do seu percurso e culminando agora com a sua erradicação
total. E, não contentes com isto, a CP, de uma forma unilateral, sem ouvir populações, sem querer saber dos
seus problemas, o que veio fazer foi, mais uma vez, provocar problemas à mobilidade dos cidadãos e cidadãs
do distrito de Setúbal.
O utente que queira apanhar o Intercidades Lisboa/Faro e que resida em Setúbal tem de andar para trás
até ao Pinhal Novo para apanhar o comboio. O utente que resida em Alcácer do Sal tem de ir para Grândola
para apanhar o mesmo comboio. Diz a CP que é para encurtar o tempo. Perguntamos nós: qual tempo? O
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tempo dos utentes não é, certamente. Diz a CP que é para também rentabilizar recursos. Mas quais recursos,
perguntamos nós, uma vez que os utentes, quer de Setúbal, quer de Alcácer do Sal, vão gastar mais dinheiro?
Acresce, Sr.as
e Srs. Deputados — e quem conhece a região sabe que assim é —, que o utente para ir de
Setúbal ao Pinhal Novo apanhar o Intercidades nem sempre tem um comboio com ligação horária adequada, o
que significa que, em muitos casos, terá de sair em Setúbal 45 minutos antes da passagem do Intercidades no
Pinhal Novo. Gostava, pois, de saber onde é que está esse tal encurtamento de tempo de que falam.
O que podemos concluir é que, para a atual maioria governativa, a noção de serviço público se tem
pautado por diversas medidas no sector de transportes, sendo este o exemplo mais paradigmático: os
senhores não querem servir as populações, os senhores deixam ao livre arbítrio de uma empresa pública, que
deveria prestar um serviço público, todas as agressões a um distrito tão mal tratado, tão agredido, tão
espatifado na sua economia, com problemas sociais tão graves. Neste caso, deixam também agravar mais
este problema social, que é o da mobilidade.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Adriano Rafael
Moreira.
O Sr. Adriano Rafael Moreira (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Começo por felicitar, mais
uma vez, os proponentes destes projetos, porque penso que nunca é demais felicitar o debate sobre a
mobilidade e sobre os transportes. No entanto, devo realçar que é necessário não esquecer nessas propostas
a componente da verdade. Temos de ser rigorosos.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Adriano Rafael Moreira (PSD): — Há nestes diplomas algumas omissões que desvirtuam o debate.
Protestos do PCP, do BE e de Os Verdes.
Começo, desde logo, por referir as afirmações da falta de valorização da ferrovia, que o Governo não está
a valorizar a ferrovia ou que os governos não o têm feito. Tal não corresponde à verdade. Os portugueses
sabem que tem havido uma aposta na ferrovia. E no que diz respeito a Setúbal, Srs. Deputados, temos de ser
verdadeiros: Setúbal tem, por dia, a partir ou a chegar à sua estação, 116 comboios.
Protestos do PCP, do BE e de Os Verdes.
Srs. Deputados, não vou comparar com Viseu ou com Bragança, porque não têm comboio, mas se
comparar com Santarém, esta cidade nem metade dos comboios tem em relação a Setúbal.
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Mas alguma vez foi a Setúbal?
O Sr. Adriano Rafael Moreira (PSD): — É óbvio que questões de gestão, acertos de horários, escalas,
tudo isso faz parte de uma gestão que tem de ser ajustada, tem de ser dialogada com os passageiros e há
uma dinâmica que vai mudando semestre a semestre. Não é o que está em causa.
Relativamente ao comboio Intercidades Lisboa/Faro, que é um dos aspetos que VV. Ex.as
referem, digo-vos
que a CP fez um esforço, colocou a oferta, mas não há procura para o Setúbal/Faro. E, não havendo procura
para o Setúbal/Faro, há uma decisão que vem beneficiar quem procura o comboio Lisboa/Faro, reduzindo o
tempo, mas não prejudica quem quer recorrer ao comboio em Setúbal.
O tempo que leva o meio ferroviário de Setúbal a Pinhal Novo não chega a 15 minutos.
A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Não está a ver bem! Não sabe onde é o Pinhal Novo!
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O Sr. Adriano Rafael Moreira (PSD): — E de Setúbal para o Pinhal Novo há 116 comboios por dia, Srs.
Deputados. A oferta, portanto, é quase ao ritmo do metropolitano.
A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Para o Pinhal Novo?!
O Sr. Adriano Rafael Moreira (PSD): — Para o Pinhal Novo, Sr.ª Deputada. Pode consultar na Internet.
O que está em causa é a mudança em Pinhal Novo.
Em Pinhal Novo fez-se um investimento caríssimo, que superou os 25 milhões de euros, e tem todas as
condições para ser uma estação intermodal, que faz o interface da linha do Sado com a linha do sul e também
com os passageiros de Setúbal.
Este interface permite que se possa recorrer ao Alfa Pendular ou ao Intercidades sem custos acrescidos e
sem demoras de tempo; antes pelo contrário, com ganhos de tempo. Portanto, estas questões são objetivas e
estão em cima da mesa. E quando, no início, eu disse que estes diplomas faltavam à verdade referia-me a
estes aspetos.
VV. Ex.as
omitiram estas questões, tentando fazer de Setúbal a vítima do sistema, quando não é o caso. As
pessoas de Setúbal que queiram recorrer à ferrovia dispõem desses meios. E, mais importante do que isso,
têm acesso privilegiado à capital em horários muito regulares para as suas necessidades.
A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Chame um Deputado de Setúbal para dizer isso sem se rir!
O Sr. Adriano Rafael Moreira (PSD): — Para concluir, no que diz respeito ao comboio regional, VV. Ex.as
sabem perfeitamente que o Alfa Pendular entre Tunes e Pinhal Novo leva mais de duas horas (essa oferta
existe ao dispor de qualquer habitante de Setúbal). Então, agora, querem obrigar as pessoas a fazer o
percurso em regional quando podem fazer em Alfa Pendular? Não tem qualquer razoabilidade. Portanto, se
falarmos verdade, VV. Ex.as
concluem que há uma aposta séria na ferrovia e que a população continua a ser
bem servida.
Aplausos do PSD.
A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Não sabe nada do que está a dizer!
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Eduardo
Cabrita.
O Sr. Eduardo Cabrita (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: O tema que hoje é aqui trazido, e
que tem a ver com a degradação do serviço ferroviário na cidade de Setúbal e no litoral alentejano,
designadamente na cidade de Alcácer do Sal, é um exemplo na manifestação de desconhecimento gritante do
Deputado do PSD que usou da palavra, do abandono do distrito de Setúbal e da ausência de uma completa
estratégia para a ferrovia.
Aquilo que marcou os últimos anos nesta área foi a eletrificação da linha do Sado, a construção da variante
de Alcácer, a definição de uma ligação quer a Sines, quer à Europa, e a programação do anel ferroviário para
Lisboa e, finalmente, o investimento na renovação da estação de Setúbal, da velha estação que tem hoje
condições exemplares.
Face a estes investimentos, aquilo que este Governo nos traz, fora de qualquer dimensão estratégica, fora
do plano estratégico dos transportes, essa fábula que, felizmente, ainda não está em vigor, é acabar com a
ligação em Alfa Pendular e em Intercidades naquela que é a maior capital de distrito a sul do Tejo. É essa a
diferença!
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. Eduardo Cabrita (PS): — A cidade de Setúbal deixou de ter qualquer ligação ferroviária de elevada
qualidade!
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E julgava eu que era o meu amigo Deputado Pedro Lynce que iria usar da palavra em nome do PSD neste
debate, porque conhece bem Alcácer do Sal!
A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Exatamente!
O Sr. Eduardo Cabrita (PS): — A cidade de Alcácer do Sal deixou de ter qualquer ligação ferroviária, seja
ela regional ou qualquer outra. A variante de Alcácer foi construída para servir a ligação de mercadorias ao
porto de Sines e para melhorar a ligação da circulação rápida entre Setúbal e o Algarve, não foi construída
para colocar Alcácer do Sal à margem de qualquer ligação ferroviária. Isto é, temos hoje um Alfa Pendular e
um Intercidades que excluem a maior cidade que estava no caminho entre Lisboa e o Algarve e uma ligação
regional entre Setúbal e o Algarve que deixou de existir. É este o sinal destes tempos, que, ao lado de tantos
outros sinais, designadamente o abandono do litoral alentejano e o abandono de projetos estruturantes na
península de Setúbal, têm em comum a conjugação de sinais negros de seis meses desta governação.
Isto representa o abandono do distrito de Setúbal como espaço de desenvolvimento, como plataforma
atlântica, motor de uma estratégia de desenvolvimento, competitividade e criação de emprego quer na
península, quer no litoral alentejano, de que tanto precisamos hoje, cada vez mais, como dizem todos os que
não estão cegos, incluindo o Sr. Presidente da República, porque aquilo que falta, neste tempo de recessão, é
uma estratégia de crescimento e de criação de emprego, e demonstra que, em matéria de ambiente, em
matéria de mobilidade, a ferrovia é o parente esquecido, o parente abandonado. Desequilibram-se as contas
externas, pioram-se as condições de mobilidade das populações e privilegiam-se soluções de má qualidade,
mais caras, rodoviárias, esquecendo as cidades de Setúbal e Alcácer do Sal, esquecendo a ligação a Sul.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: O brilhantismo desta decisão do Governo,
que não está escrita em plano estratégico nenhum — e bem se podem gabar dos debates que não fazem
sobre o plano estratégico de transportes, para depois aparecer uma coisa no plano estratégico, à revelia de
tudo o que dizem, como facto consumado, que é a supressão do comboio e a eliminação do transporte
ferroviário —, é de tal ordem que a Refer, em junho do ano passado, concluiu a remodelação da estação de
Setúbal por 14,3 milhões de euros. E para quê? Para incluir linhas de passagem de serviços de longo curso.
Agora, com esta decisão, sai a linha de longo curso! Alegam o aumento da velocidade dos comboios. Ora, a
velocidade passa de 83,6 km por hora para 86,9 km por hora, em velocidade média!
Srs. Deputados, na verdade, com este quadro, fica a ideia de uma tentativa de acelerar o Intercidades para
acabar com o Alfa Pendular. Por isso, tenham cuidado com o que estão a dizer, porque, segundo informações
publicadas recentemente, a CP também tinha intenções de acabar já com o Alfa Pendular na linha do Sul, mas
não o vai fazer por agora. A opção que estava em cima da mesa devia-se ao desgaste que os comboios
pendulares estavam a ter na serra algarvia. Por isso, aumenta-se esta maravilha de 3 km por hora, em
velocidade média, para que, mais tarde ou mais cedo, seja mais fácil eliminar o comboio Alfa para o sul do
País.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Por isso, tenham cuidado com o triunfalismo, Srs. Deputados!
Consideramos que este debate é da maior importância, Saudamos, pois, o Partido Ecologista «Os Verdes»
pelo projeto apresentado, pela iniciativa do agendamento deste debate sobre um assunto da maior gravidade
para as populações, para o transporte ferroviário no distrito de Setúbal, no Alentejo Litoral e, de uma forma
geral, no sul do País, porque este não é um problema apenas da cidade de Setúbal ou do Algarve. Sabemos
que há pessoas que vivem e trabalham e precisam de ter transporte ferroviário entre Setúbal e Tunes.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!
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O Sr. Bruno Dias (PCP): — Tal como sabemos que isto significa um retrocesso — já aqui o referimos a
propósito da televisão digital terrestre — de 60 anos, para o tempo em que não havia televisão, que é o que
muita gente vai sentir na próxima semana. Assim como também já referimos o retrocesso de mais de 100
anos, para o tempo anterior à jornada de 8 horas de trabalho, com a lei da I República para o sector do
comércio. Agora, com esta decisão, recuamos 122 anos, para o tempo em que não havia comboios para o sul
do País a partir de Setúbal e do Alentejo Litoral.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Uma vergonha!
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Não pode ficar sem registo a argumentação provocadora e hipócrita do PSD,
um partido que matou a ferrovia em Bragança e em Viseu, que, a propósito da supressão de comboios em
Setúbal, vem dizer que podiam estar pior, porque podiam estar como em Bragança ou em Viseu. Haja
vergonha na cara, Sr. Deputado Adriano Rafael Moreira! Se os senhores não soubessem, ainda podiam alegar
desconhecimento, mas sabem do que estão a falar e, como tal, é ainda mais grave e inadmissível o que estão
a fazer!
Por isso, saudamos e valorizamos as ações e jornadas de luta que já aconteceram em Alvalade, em
Alcácer, na Baixa da Banheira, que reuniram as populações, os utentes dos transportes, a população local,
que se ergueu e levantou a sua voz contra este assalto que está a ser feito à sua mobilidade, ao transporte
ferroviário, ao serviço público, porque o transporte ferroviário, como os Srs. Deputados muito bem têm a
obrigação de saber, é como um rio caudaloso, que não vive sem afluentes. Sabemos que a luta das
populações e a luta dos trabalhadores ferroviários vai ser essencial, insubstituível e decisiva para combater
esta política de desmantelamento, de desastre nacional que os senhores estão a desenvolver, seguindo
entusiasticamente o pacto de agressão que a troica portuguesa assinou com a troica estrangeira.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem, agora, a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Nuno
Magalhães.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Este é um debate sobre um
tema relevante, merecendo, por isso, uma discussão serena, em que, como aliás em quase todas as
discussões, convém começar por enunciar os factos.
Vamos, por isso, aos factos.
Esta decisão tem, necessariamente, um impacto direto na vida das pessoas, nomeadamente das pessoas
de Setúbal e de Alcácer do Sal, limita a mobilidade ferroviária das populações, mas a CP também tem hoje um
passivo superior a 3000 milhões de euros e tem necessidade de pagar, por ano, juros superiores a 150
milhões de euros.
A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — E pagam os utentes! Os utentes é que pagam! São sempre os mesmos!
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Cada português, por este descontrolo das e para pagar a dívida da
CP, tem, neste momento, um encargo de 85 000 €.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Culpa de quem?!
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Pergunta o Sr. Deputado Bruno Dias: «Culpa de quem?».
Naturalmente, a culpa é de quem governou nos 13 dos últimos 15 anos.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Só?! E os outros?!
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O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Perante isto, há um dilema — de facto, compreendo a preocupação
do Sr. Deputado Bruno Dias e da Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia: diminuir a capacidade de mobilidade e de
transporte das populações de Setúbal e de Alcácer ou nada fazer e, provavelmente, dentro de alguns anos,
não haver transporte algum, seja para quem for. É este o dilema!
Identificado o dilema, permitam-me, Sr.as
e Srs. Deputados, poder também alvitrar algumas possíveis
soluções para minorar o problema.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — É verdade que os investimentos feitos na linha do Sado permitiram a
existência de duas linhas de circulação ferroviária a partir de Pinhal Novo, nomeadamente em direção ao Sul,
ao contrário do que durante muitos anos existiu e que, apesar de tudo, na altura, constituiu um avanço.
Por isso mesmo, julgo que, perante este esforço nacional, todas as pessoas do distrito de Setúbal, de
Alcácer, estarão, certamente, disponíveis para dar o seu contributo, o que não quer dizer que não se possa
pensar em medidas que, de alguma forma, possam minorar os prejuízos para a sua vida diária.
Desde logo, podemos estudar a possibilidade de alterar o tarifário de forma a não penalizar duplamente os
utentes dos serviços que têm de ir ao Pinhal Novo.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — E o horário!
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Podemos também estudar a possibilidade de adequar os horários e
as alternativas existentes, nomeadamente salvaguardando a questão que é mais séria e que tem a ver com
Alcácer do Sal. Mas também podemos, por exemplo, analisar a possibilidade de manter algumas das
circulações nos moldes anteriores, nomeadamente de forma sazonal e nos períodos de maior afluxo.
Sr.as
e Srs. Deputados, estas são sempre matérias relativamente às quais todos sabemos, nomeadamente
aqueles que conhecemos o distrito de Setúbal, Alcácer e as populações, como, no concreto, vão afetar a vida
diária daquelas pessoas. Mas também não podemos cair na tentação de, em nome disso, esquecer, por um
lado, o interesse nacional e, por outro, ter uma visão micro de uma realidade que é macro. E reparem que,
mesmo no próprio distrito, alguns autarcas, nomeadamente um autarca do Partido Comunista Português, o
autarca de Santiago do Cacém, veio saudar publicamente esta decisão, ficou satisfeitíssimo. Sabem porquê,
Srs. Deputados? Porque Santiago do Cacém passa a ter uma paragem!
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Já cá faltava a falta de seriedade!
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Portanto, Srs. Deputados, aquilo que se exige é responsabilidade,
serenidade, reconhecer que esta é uma medida difícil, que tem um impacto que, necessariamente, não é
positivo para as populações, mas que, infelizmente, pelo desvario dos últimos anos, tornou-se, mais do que
necessário, diria absolutamente inevitável.
Aplausos do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma breve conclusão, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa
Apolónia.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Penso que foi muito importante
que o CDS dissesse aqui, claramente, que reconhece que esta decisão é mesmo má e prejudica mesmo as
populações.
O PSD tentou «pintar» a coisa de outra forma. Para o PSD, às tantas, as populações até deviam estar a
saltar de alegria por perderem o comboio ou qualquer coisa deste género.
Mas o CDS também deixou claro o que é que coloca à frente das populações: a troica!
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O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Não foi a troica que faliu a CP! Já estava falida antes!
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — A troica sempre à frente das populações: há prejuízo para as
populações? Não importa, a troica é que conta!
Quanto ao passivo da CP, é verdade, Sr. Deputado, mas andámos aqui a denunciar, durante tantos anos, e
continuamos a denunciar, as indemnizações compensatórias que não eram pagas,…
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — De onde é que vem o dinheiro para as indemnizações
compensatórias?!
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — … o facto de estas empresas estarem a pagar mais em juros do
que em ordenados. E os senhores, que sempre embarcaram nesta conversa, agora vêm dizer: «Ai, Jesus, os
passivos das empresas!». Pois claro! Não ouviram quem deviam!
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Que culpa tem o povo?!
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — E as populações? Em que é que contribuíram para isso? Em
nada, Sr. Deputado Nuno Magalhães! Mas, entretanto, o que é que acontece? São as populações que levam,
são as populações que são prejudicadas! Mais custos, menos mobilidade! Sempre! Tudo, tudo, tudo em cima
da generalidade das populações, que não são ouvidas, não são tidas nem achadas! Pois claro! Era o que mais
faltava! Isso era democracia a mais, não era, Sr. Deputado?! Evidentemente, era mau demais para quem
defende certas e determinadas coisas que não se conseguem compreender!
Sr. Deputado Adriano Rafael Moreira, veja lá bem: acabamos com outros comboios regionais, não?!…
Então, os regionais não servem absolutamente para nada!… Ora bolas, param em todo o lado, é uma chatice,
não é, Sr. Deputado?!… É uma chatice!…
Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Guilherme Silva.
O Sr. Presidente: — Faça favor de terminar, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Vou mesmo terminar, Sr. Presidente.
Os comboios regionais servem pequenas localidades, o que é uma chatice, pois claro!… Qualquer comboio
que vá de Lisboa ao Porto vai muito mais rápido se não parar em lado nenhum! Mas pensemos: é assim que
se servem as populações, em Santarém, em Coimbra e por aí fora? Não é!
Sr.as
e Srs. Deputados, vou mesmo terminar, dizendo que não houve aqui argumentação, porque não era
possível haver argumentação a favor desta decisão da CP. Ninguém conseguiria argumentar, evidentemente,
porque é uma decisão totalmente errada, macabra para o desenvolvimento de Setúbal.
Por isso, penso que seria extraordinariamente relevante que o Parlamento desse um sinal à CP e ao
Governo de que quer manter Setúbal com comboios de qualidade, a servir um direito das populações, que é o
seu direito à mobilidade.
Aplausos de Os Verdes e do PCP.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, terminámos o debate dos projetos de resolução
n.os
151/XII (1.ª) e 164/XII (1.ª) e a nossa ordem de trabalhos de hoje.
A próxima sessão plenária realizar-se-á amanhã, às 10 horas, e será destinada à realização do debate
quinzenal com o Sr. Primeiro-Ministro, ao abrigo da alínea b) do n.º 2 do artigo 224.º do Regimento.
No final do debate, procederemos às votações regimentais.
Está encerrada a sessão.
Eram 18 horas e 37 minutos.
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Deputados que faltaram à sessão:
Partido Social Democrata (PSD)
Manuel Augusto Meirinho Martins
Paulo César Lima Cavaleiro
A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.