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Quinta-feira, 26 de janeiro de 2012 I Série — Número 63
XII LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2011-2012)
REUNIÃOPLENÁRIADE25DEJANEIRODE 2012
Presidente: Ex.ma Sr.ª Maria da Assunção Andrade Esteves
Secretários: Ex.mos
Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco Rosa Maria da Silva Bastos de Horta Albernaz
S U M Á R I O
A Sr.ª Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas
e 8 minutos. Deu-se conta da entrada na Mesa dos projetos de
resolução n.os
183 a 192/XII (1.ª) e dos projetos de lei n.os
143 a 146/XII (1.ª).
Em declaração política, a Sr.ª Deputada Catarina Martins (BE) insurgiu-se contra o aumento do preço dos transportes públicos, que entrará em vigor no próximo dia 1 de Fevereiro, e respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Bruno Dias (PCP), Hélder Amaral (CDS-PP), Luís Menezes (PSD) e Rui Paulo Figueiredo (PS).
Também em declaração política, o Sr. Deputado António Filipe (PCP) condenou a alteração das comparticipações do Estado aos bombeiros nos custos de transporte de doentes em ambulância, com o consequente aumento dos preços. No fim, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Teresa Leal Coelho (PSD), Filipe Neto Brandão
(PS), João Semedo (BE) e João Pinho de Almeida (CDS-PP).
Foi apreciado o projeto de resolução n.º 86/XII (1.ª) — Recomenda ao Governo que promova medidas para o desenvolvimento do regadio em Portugal (PSD e CDS-PP), sobre o qual se pronunciaram os Srs. Deputados Pedro do Ó Ramos (PSD), Abel Baptista (CDS-PP), Luís Pita Ameixa (PS), José Luís Ferreira (Os Verdes), Luís Fazenda (BE) e Agostinho Lopes (PCP).
Em seguida, a Câmara discutiu os projetos de resolução n.
os 182/XII (1.ª) — Recomenda ao Governo que promova o
estabelecimento de uma concorrência saudável no setor do leite e produtos lácteos, reabra a discussão do regime de quotas leiteiras nos fóruns próprios da União Europeia e defenda intransigentemente a sua manutenção na regulamentação comum do leite e produtos lácteo (CDS-PP) e 185/XII (1.ª) — Recomenda medidas urgentes a adotar
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pelo governo que visam a sustentabilidade do sector leiteiro (PSD). Intervieram no debate os Srs. Deputados Abel Baptista (CDS-PP), Pedro Alves (PSD), Miguel Freitas (PS), Agostinho Lopes (PCP), Luís Fazenda (BE) e José Luís Ferreira (Os Verdes).
Foi apreciada a petição n.º 87/XI (1.ª) — Apresentada por António Martins Moreira e outros, solicitando à Assembleia da República a redução dos salários dos gestores das empresas públicas e/ou participadas com
capitais públicos, entre 20% e 80%, e a eliminação de bónus e prémios deles emergentes, revertendo as verbas para a constituição de um fundo de reserva para acudir a situações de maior gravidade económico-social. Proferiram intervenções os Srs. Deputados Isabel Santos (PS), Afonso Oliveira (PSD), Pedro Filipe Soares (BE), João Pinho de Almeida (CDS-PP) e Honório Novo (PCP).
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues) encerrou a sessão eram 17 horas e 22 minutos.
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A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que está aberta a sessão.
Eram 15 horas e 8 minutos.
Srs. Deputados presentes à sessão:
Partido Social Democrata (PSD)
Adriano Rafael de Sousa Moreira
Adão José Fonseca Silva
Afonso Gonçalves da Silva Oliveira
Amadeu Albertino Marques Soares Albergaria
Ana Sofia Fernandes Bettencourt
Andreia Carina Machado da Silva Neto
António Costa Rodrigues
António Egrejas Leitão Amaro
António Fernando Couto dos Santos
António Manuel Pimenta Prôa
António Pedro Roque da Visitação Oliveira
Arménio dos Santos
Bruno Jorge Viegas Vitorino
Bruno Manuel Pereira Coimbra
Carina João Reis Oliveira
Carla Maria de Pinho Rodrigues
Carlos Alberto Silva Gonçalves
Carlos António Páscoa Gonçalves
Carlos Eduardo Almeida de Abreu Amorim
Carlos Manuel Faia São Martinho Gomes
Carlos Manuel dos Santos Batista da Silva
Cláudia Sofia Gomes Monteiro de Aguiar
Cristóvão Duarte Nunes Guerreiro Norte
Cristóvão Simão Oliveira de Ribeiro
Cristóvão da Conceição Ventura Crespo
Duarte Filipe Batista de Matos Marques
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Eduardo Alexandre Ribeiro Gonçalves Teixeira
Elsa Maria Simas Cordeiro
Emídio Guerreiro
Emília de Fátima Moreira dos Santos
Fernando Luís de Sousa Machado Soares Vales
Fernando Mimoso Negrão
Fernando Nuno Fernandes Ribeiro dos Reis
Fernando Ribeiro Marques
Fernando Virgílio Cabral da Cruz Macedo
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Hugo Alexandre Lopes Soares
Hugo José Teixeira Velosa
Hélder António Guerra de Sousa Silva
Joana Catarina Barata Reis Lopes
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Jorge Paulo da Silva Oliveira
José Manuel Marques de Matos Rosa
José Manuel de Albuquerque Portocarrero Canavarro
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José Manuel de Matos Correia
João Carlos Figueiredo Antunes
João Manuel Lobo de Araújo
Laura Maria Santos de Sousa Esperança
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Filipe Valenzuela Tavares Menezes Lopes
Luís Manuel Morais Leite Ramos
Luís Pedro Machado Sampaio de Sousa Pimentel
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Lídia Maria Bulcão Rosa da Silveira Dutra
Manuel Filipe Correia de Jesus
Margarida Rosa Silva de Almeida
Maria Clara Gonçalves Marques Mendes
Maria Ester Vargas de Almeida e Silva
Maria Francisca Fernandes Almeida
Maria Isilda Videira Nogueira da Silva Aguincha
Maria José Quintela Ferreira Castelo Branco
Maria José Vieira Teodoro Moreno
Maria João Machado de Ávila
Maria Manuela Pereira Tender
Maria da Assunção Andrade Esteves
Maria da Conceição Alves dos Santos Bessa Ruão Pinto
Maria da Conceição Feliciano Antunes Bretts Jardim Pereira
Maria da Conceição Vaz Barroso Carloto Caldeira
Maria da Graça Gonçalves da Mota
Maria das Mercês Gomes Borges da Silva Soares
Maurício Teixeira Marques
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Mário José Magalhães Ferreira
Mário Nelson da Silva Vaz Simões
Mónica Sofia do Amaral Pinto Ferro
Nilza Marília Mouzinho de Sena
Nuno Filipe Miragaia Matias
Nuno Miguel Pestana Chaves e Castro da Encarnação
Nuno Rafael Marona de Carvalho Serra
Odete Maria Loureiro da Silva
Paulo César Lima Cavaleiro
Paulo César Rios de Oliveira
Paulo Jorge Frazão Batista dos Santos
Paulo Jorge Simões Ribeiro
Paulo Miguel da Silva Santos
Pedro Alexandre Antunes Faustino Pimpão
Pedro Augusto Cunha Pinto
Pedro Augusto Lynce de Faria
Pedro Filipe dos Santos Alves
Pedro Manuel Tavares Lopes de Andrade Saraiva
Pedro do Ó Barradas de Oliveira Ramos
Ricardo Augustus Guerreiro Baptista Leite
Rosa Maria Pereira Araújo Arezes
Sérgio Sousa Lopes Freire de Azevedo
Teresa de Andrade Leal Coelho
Teresa de Jesus Costa Santos
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Ulisses Manuel Brandão Pereira
Valter António Gaspar de Bernardino Ribeiro
Vasco Manuel Henriques Cunha
Ângela Maria Pinheiro Branquinho Guerra
Partido Socialista (PS)
Acácio Santos da Fonseca Pinto
Alberto Bernardes Costa
Alberto de Sousa Martins
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Ana Paula Mendes Vitorino
António José Martins Seguro
António Manuel Soares Serrano
António Ramos Preto
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Basílio Adolfo de Mendonça Horta da Franca
Carlos Filipe de Andrade Neto Brandão
Carlos Manuel Pimentel Enes
Eduardo Arménio do Nascimento Cabrita
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues
Elza Maria Henriques Deus Pais
Eurídice Maria de Sousa Pereira
Fernando Manuel de Jesus
Fernando Medina Maciel Almeida Correia
Fernando Pereira Serrasqueiro
Francisco José Pereira de Assis Miranda
Glória Maria da Silva Araújo
Idália Maria Marques Salvador Serrão
Isabel de Lima Mayer Alves Moreira
Jacinto Serrão de Freitas
Jorge Lacão Costa
Jorge Manuel Capela Gonçalves Fão
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José António Fonseca Vieira da Silva
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Carlos das Dores Zorrinho
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
João Barroso Soares
João Paulo Feteira Pedrosa
João Raul Henriques Sousa Moura Portugal
João Saldanha de Azevedo Galamba
Júlio Francisco Miranda Calha
Laurentino José Monteiro Castro Dias
Luís António Pita Ameixa
Luís Miguel Morgado Laranjeiro
Luísa Maria Neves Salgueiro
Manuel Francisco Pizarro de Sampaio e Castro
Manuel José de Faria Seabra Monteiro
Manuel Pedro Cunha da Silva Pereira
Marcos da Cunha e Lorena Perestrello de Vasconcellos
Maria Antónia Moreno Areias de Almeida Santos
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Maria Gabriela da Silveira Ferreira Canavilhas
Maria Helena dos Santos André
Maria Hortense Nunes Martins
Maria Isabel Coelho Santos
Maria Isabel Solnado Porto Oneto
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Miguel João Pisoeiro de Freitas
Mário Manuel Teixeira Guedes Ruivo
Nuno André Araújo dos Santos Reis e Sá
Nuno André Neves Figueiredo
Paulo Alexandre de Carvalho Pisco
Paulo Jorge Oliveira de Ribeiro Campos
Pedro Filipe Mota Delgado Simões Alves
Pedro Manuel Dias de Jesus Marques
Pedro Manuel Farmhouse Simões Alberto
Pedro Nuno de Oliveira Santos
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel de Amaral Rodrigues
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rui Jorge Cordeiro Gonçalves dos Santos
Rui Paulo da Silva Soeiro Figueiredo
Rui Pedro Gonçalves Duarte
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Partido Popular (CDS-PP)
Abel Lima Baptista
Adolfo Miguel Baptista Mesquita Nunes
Altino Bernardo Lemos Bessa
Artur José Gomes Rêgo
Inês Dória Nóbrega Teotónio Pereira Bourbon Ribeiro
Isabel Maria Mousinho de Almeida Galriça Neto
José Duarte de Almeida Ribeiro e Castro
José Helder do Amaral
José Lino Fonseca Ramos
José Manuel de Sousa Rodrigues
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Manuel de Serpa Oliva
João Paulo Barros Viegas
João Pedro Guimarães Gonçalves Pereira
João Rodrigo Pinho de Almeida
Maria Margarida Avelar Santos Nunes Marques Neto
Michael Lothar Mendes Seufert
Nuno Miguel Miranda de Magalhães
Raúl Mário Carvalho Camelo de Almeida
Teresa Margarida Figueiredo de Vasconcelos Caeiro
Teresa Maria de Moura Anjinho Tomás Ruivo
Vera Lúcia Alves Rodrigues
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Partido Comunista Português (PCP)
Agostinho Nuno de Azevedo Ferreira Lopes
António Filipe Gaião Rodrigues
Artur Jorge da Silva Machado
Bernardino José Torrão Soares
Bruno Ramos Dias
Francisco José de Almeida Lopes
Jerónimo Carvalho de Sousa
José Honório Faria Gonçalves Novo
João Guilherme Ramos Rosa de Oliveira
Miguel Tiago Crispim Rosado
Paula Alexandra Sobral Guerreiro Santos Barbosa
Paulo Miguel de Barros Pacheco Seara de Sá
Rita Rato Araújo Fonseca
Bloco de Esquerda (BE)
Ana Isabel Drago Lobato
Catarina Soares Martins
Francisco Anacleto Louçã
João Pedro Furtado da Cunha Semedo
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda
Maria Cecília Vicente Duarte Honório
Mariana Rosa Aiveca
Pedro Filipe Gomes Soares
Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV)
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
José Luís Teixeira Ferreira
A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai proceder à leitura do expediente.
Tem a palavra, Sr. Secretário.
O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e
foram admitidas pela Sr.ª Presidente, as seguintes iniciativas legislativas: projetos de resolução n.os
183/XII
(1.ª) — Recomenda ao Governo o alargamento da discussão pública da proposta de revisão da estrutura
curricular pelo prazo de um mês (PS), que baixa à 8.ª Comissão, 184/XII (1.ª) — Recomenda ao Governo a
cessação imediata da cobrança de prestações sociais indevidamente pagas pelo Instituto da Segurança Social
(BE), que baixa à 10.ª Comissão, 185/XII (1.ª) — Recomenda medidas urgentes a adotar pelo Governo que
visam a sustentabilidade do sector leiteiro (PSD), que baixa à 7.ª Comissão, 186/XII (1.ª) — Recomenda ao
Governo a inclusão do medicamento Tafamidis no Serviço Nacional de Saúde (PCP), que baixa à 9.ª
Comissão, 187/XII (1.ª) — Recomenda a qualificação da rede consular e a sua adequação às necessidades
das comunidades portuguesa no estrangeiro (PCP), que baixa à 2.ª Comissão, 188/XII (1.ª) — Sobre a
introdução urgente do medicamento Vyndaquel/Tafamidis no Serviço Nacional de Saúde (CDS-PP), que baixa
à 9.ª Comissão, 189/XII (1.ª) — Recomenda ao Governo que, com caráter de urgência, adote as medidas
necessárias para disponibilizar o medicamento Tafamidis a todos os portadores de paramiloidose com
indicação terapêutica para tratamento, sem custos para os doentes (BE), que baixa à 9.ª Comissão, 190/XII
(1.ª) — Recomenda a urgente abertura dos concursos para financiamento às artes através do Instituto do
Cinema e do Audiovisual e da Direção-Geral das Artes, no cumprimento da legislação em vigor (BE), que
baixa à 8.ª Comissão, 191/XII (1.ª) — Recomenda a requalificação da linha ferroviária Tua/Mirandela/Bragança
(BE), que baixa às 6.ª e 8. ª Comissões, 192/XII (1.ª) — Recomenda ao Governo a suspensão imediata de
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todas as deliberações e ações que ameacem a linha ferroviária do Tua e propõe a criação de um grupo de
trabalho que avalie as potencialidades da linha para o desenvolvimento da região (Os Verdes), que baixa às
6.ª e 8.ª Comissões; projetos de lei n.os
143/XII (1.ª) — Estabelece as Bases da Política de Ambiente (Revoga
a Lei n.º 11/87, de 7 de abril, que aprovou a Lei de Bases do Ambiente) (PS), que baixa à 11.ª Comissão,
144/XII (1.ª) — Aprova medidas para incentivar o crescimento económico nas áreas da reabilitação urbana e
do mercado de arrendamento (PS), que baixa às 1.ª, 5.ª, 6.ª e 11.ª Comissões, 145/XII (1.ª) — Reconhece a
liberdade sindical do pessoal da Polícia Marítima (Primeira alteração à Lei n.º 53/98, de 18 de agosto, que
estabelece o regime de exercício de direitos do pessoal da Polícia Marítima) (PCP), que baixa às 1.ª e 3.ª
Comissões, e 146/XII (1.ª) — Segunda alteração à Lei n.º 44/86, de 30 de setembro (Regime do Estado de
Sítio e do Estado de Emergência) (PSD e CDS-PP), que baixa às 1.ª e 3.ª Comissões.
É tudo, Sr.ª Presidente.
A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, vamos entrar na ordem do dia cujo primeiro ponto consiste em
declarações políticas.
Tem a palavra, para proferir a primeira declaração política, a Sr.ª Deputada Catarina Martins.
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Falta uma semana para entrar em
vigor o novo plano de transportes e os novos tarifários dos transportes públicos e o Governo pouco ou nada
diz. Tudo o que sabemos é que os preços vão aumentar. E vão aumentar muito. Não só nunca foi tão caro
andar de transporte público, como nunca pesou tanto nos encargos mensais das famílias.
Os portugueses já são dos que mais pagam pelos transportes públicos na Europa: o passe social pesa o
dobro nos rendimentos médios do que pesa em Bruxelas ou em Atenas e o metro de Lisboa é mais caro, em
valores absolutos, do que o metro de Roma. Mas, para o Governo, o caminho é aumentar.
Uma família com um salário médio em Portugal, 700 € por mês, com os últimos aumentos anunciados,
ficará a gastar agora mais 60% em transportes do que gastava apenas há um ano. Uma família com pai, mãe
e dois filhos que habitem no centro de Lisboa gastam mais 36 € por mês em transportes. Se tiverem de se
deslocar de Sintra para Lisboa ou da Póvoa de Varzim para o Porto o encargo mensal aumenta 100 €. É
incomportável!
O Governo diz que vai criar um novo desconto no passe social para os reformados e para as crianças que
viajem fora das horas de ponta. A novidade é apresentada como uma boa nova pelo Governo. O que o
Governo se esquece de dizer é que, com a redução do apoio nos passes 4_18 e Sub23, ir para a escola de
transportes públicos ficou 80% mais caro desde que o PSD e o CDS estão no poder.
Façamos as contas: uma família de Lisboa com uma criança que frequente a escolaridade obrigatória, que
pagava 14 € pelo passe social no final do último ano letivo, daqui a sete dias vai precisar de despender 26,25
€. Se viver na Amadora e, como acontece com tantas famílias, a criança estudar perto do trabalho dos pais,
deixa de pagar 25 € para passar a gastar 45 €.
O Governo pode inventar os nomes que entender, mas a brutalidade destes aumentos representa um novo
imposto para diminuir ainda mais o rendimento disponível de quem já é fustigado por todo o tipo de medidas
de austeridade.
Mas não é só o aumento de preços que choca. O bom senso parece mesmo uma matéria rara no Ministério
da Economia e do Emprego. Só assim se compreende o peregrino desconto anunciado para crianças que
viajem fora das horas de ponta. Acaso nunca passou pela cabeça do Ministro Álvaro que fora das hora de
ponta os jovens estão na escola? Que a sua deslocação de/e para a escola ocorre nas horas de ponta?
É suposto as crianças saírem em bando da escola e irem a correr para o autocarro aproveitar as horas
mais baratas para se irem encafuar num centro comercial ou, quem sabe, irem à praia?!
Sr.as
e Srs. Deputados, o problema dos transportes não é a sua frequência, nem o preço dos bilhetes, que
é mais caro do que na maioria das cidades europeias com muito maior poder de compra. O problema é a
dívida resultante de anos e anos de subfinanciamento e o facto de o Estado pagar mal e a más horas.
São 19 000 milhões de euros em dívida que custam anualmente a cada empresa cerca de 153% do que
gastam em salários. Os juros da dívida pesam nas empresas uma vez e meia o custo do trabalho.
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Segundo números de 2010, os últimos dados disponíveis mostram um resultado operacional negativo do
conjunto das empresas públicas de transportes de 900 milhões de euros. Destes, 730 milhões de euros são
juros da dívida, isto é, mais de 80%. Mas sobre os juros da dívida o Governo nada diz.
Os juros que as empresas de transportes pagam são como um «elefante no meio da sala» que o Governo
finge não ver enquanto usa a dívida como desculpa para aumentar preços, diminuir serviço, despedir
trabalhadores.
Mesmo nas contas otimistas do Governo, feitas por quem acredita com uma fé que nenhuma razão explica,
segundo as quais os utentes vão manter-se os mesmos mesmo a pagar mais e a ter menos serviço, mesmo
segundo estas contas irreais, o Governo julga alcançar apenas uma poupança de 485 milhões de euros,
pouco mais de metade do que custaram os juros da dívida só em 2010! Uns ridículos 2,5% da dívida das
empresas de transportes. Ou seja, o Governo não tem nenhuma ideia sobre transportes. A dívida é só uma
desculpa. O objetivo é o corte.
O desmazelo com que o Governo aumenta preços e diminui carreiras necessárias para o dia-a-dia de
milhares de pessoas é confrangedor. Dizia esta semana o Secretário de Estado dos Transportes, no fórum de
uma rádio: «Uma vez saí da Secretaria de Estado e vi vários autocarros que não tinham mais de três pessoas.
Bem sei que era tarde, mas temos de combater este desperdício».
É, assim, com base no «olhómetro» de quem saiu à hora errada no dia errado que o Governo avança com
os seus planos sobre tudo e sobre todos. Tivesse o Sr. Secretário de Estado saído a outra hora e, quem sabe,
o Governo ainda aumentava o número de autocarros!
Sr.as
e Srs. Deputados, o Governo encomendou um estudo a vários especialistas para proceder a uma
reorganização dos transportes públicos em Lisboa e no Porto, mas, na verdade, não era preciso tanto, pois o
único objetivo é cortar. Cortar o número de autocarros, metros ou comboios, cortar na qualidade e na
frequência dos transportes, cortar nos horários e na área coberta pelos autocarros, cortar em tudo menos no
preço. Aí o Governo só conhece um caminho: para cima e em força.
Depois de algum recuo nos cortes de ligações previstos no inenarrável estudo, e com medo da contestação
popular que se fez e faz sentir, o Governo prepara-se agora para o maior aumento dos preços de transportes
de sempre. E já avisou: pode bem não ficar por aqui.
Tenha o Governo uma certeza: a contestação popular também não vai ficar por aqui!
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente: — A Mesa foi informada que se inscreveram para pedir esclarecimentos à Sr.ª
Deputada Catarina Martins os Srs. Deputados Bruno Dias, Hélder Amaral, Luís Menezes e Rui Paulo
Figueiredo.
Tem a palavra, em primeiro lugar, o Sr. Deputado Bruno Dias.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Catarina Martins, quero saudá-
la pelo tema que trouxe e que é da maior importância para a vida quotidiana das pessoas, mas também pelo
impacto económico e social que esta ofensiva brutal e esta política de desmantelamento do serviço público
que o atual Governo está a mover em relação aos transportes públicos tem para a vida do País.
Na semana passada, em declaração política, trouxemos este tema para debate no Plenário e nessa altura
tivemos ocasião de dizer que esta política económica está a seguir o modelo da política económica do Chile,
de Pinochet, e é nestes termos que tem de ser denunciada. Trata-se de uma política de verdadeiro terrorismo
social e sabotagem económica.
Ao fim de um ano tivemos três aumentos de transportes: o primeiro de 4,5%, o segundo de 15%, indo até
aos 25%, e a eliminação anunciada dos passes 4_18 e Sub23. Com este imposto sobre as famílias, com este
imposto sobre os trabalhadores e os estudantes, que não têm outra hipótese senão a de ir de transportes
porque, muitas vezes, não podem ir a pé para o local onde vão trabalhar ou estudar ou, então, chegar à
conclusão de que por este andar, com as políticas de encarecimento e de destruição do transporte público,
perdem menos dinheiro se ficarem em casa, alguma coisa está errada e exige uma resposta muito firme e
determinada das populações, dos trabalhadores, dos utentes dos transportes.
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Esta manhã, na Comissão de Economia e Obras Públicas, o PCP apresentou um requerimento no sentido
de serem ouvidos sobre esta matéria a Junta Metropolitana de Lisboa, a Junta Metropolitana do Porto, os
trabalhadores, os utentes do transporte público e o Governo, na pessoa do Sr. Secretário de Estado, e a
maioria PSD/CDS preferiu votar a favor da proposta do PS, que propunha trazer cá o grupo de trabalho.
A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Vou terminar, Sr.ª Presidente.
Pergunto-lhe, Sr.ª Deputada, se, no seu entendimento, faz sentido a Assembleia da República, através da
comissão competente, debater estas matérias ouvindo disciplinadamente o grupo de trabalho que o Governo
nomeou e ignorando olimpicamente a proposta de se ouvir as autarquias, os trabalhadores, os utentes dos
transportes, dizendo que estes, quando quiserem ser recebidos, venham cá bater à porta…!
A Sr.ª Presidente: — Queira terminar.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Esta forma de estar da maioria nesta Assembleia revela bem a atuação que
está a ser levada à prática na política dos transportes.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, peço a todos os que se inscreveram para pedir esclarecimentos que
se contenham dentro do tempo de que dispõem.
Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina Martins.
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Bruno Dias, agradeço a sua questão.
Esta semana sabemos qual é o aumento de preços dos transportes previsto já para o dia 1 de Fevereiro,
mas continuamos sem ter acesso ao plano completo, continuamos sem saber o que o Governo quer fazer.
Sabemos, com os aumentos que conhecemos hoje, que, em 4 meses, andar de metro em Lisboa aumentou
40% e que, nos últimos 12 meses, aumentou 80% para as crianças, para os jovens e para as pessoas com
mais de 65 anos.
Estes são os números da crueldade, da irresponsabilidade e da leviandade deste Governo!
É verdade que este é um Governo que tem muito medo, muito medo de ouvir opiniões. Esconde-se por trás
de grupos de especialistas, tem uma estratégia de contrainformação em que atira para todos os lados a ver o
que resulta e, depois, tenta perceber qual é a pressão da contestação popular.
Mas há uma coisa que este Governo já percebeu: as populações lutaram e lutam pelos transportes
públicos e a verdade é que o Governo recuou em muitos cortes que tinha previsto.
Assim, não temos as estações de metro a fecharem às 21 horas e 30 minutos, e esta é uma conquista das
populações; há garantias sobre a manutenção de ligações de barcos, e esta é também uma conquista das
populações.
Mas o aumento de preços é um ataque e a recusa, o medo, dos partidos da maioria em chamar à
Assembleia da República para ouvir as comissões de utentes, os autarcas, ouvir quem todos os dias tem de
lidar com estas medidas, ouvir quem sabe o que estas medidas custam no quotidiano das populações, só
revela a fragilidade do Governo.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Hélder Amaral.
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Catarina Martins, a matéria que aqui
trouxe hoje é, de facto, recorrente e eu pensei que quantas mais vezes discutíssemos aqui essa matéria faria
com que, pelo decorrer do tempo, fôssemos expurgando a demagogia e até alguma falta de verdade das
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afirmações das bancadas do Bloco de Esquerda e do Partido Comunista Português. Pelos vistos, o tempo aqui
não tem sido bom conselheiro!
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
Protestos do Deputado do PCP Bruno Dias.
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Disse a Sr.ª Deputada que conseguiram que não se fechassem linhas
que estavam previstas fechar, que conseguiram que os transportes do fim da noite não tivessem sido
suprimidos. Pergunto: quem é que disse que iam ser suprimidos esses serviços?
O Sr. Bruno Dias (PCP): — V. Ex.ª, na semana passada!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Onde é que estava essa decisão do Governo?
Protestos do Deputado do PCP Bruno Dias.
VV. Ex.as
criam o problema, criam o fantasma, arregimentam um conjunto de pessoas, normalmente
funcionários dos partidos, para fazer o show off,…
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — … e, depois, partem desse cenário, partem dessa peça de teatro para
uma realidade que não é mais do que isso — uma peça de teatro!
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Mas vamos à realidade: 16 000 milhões de euros de dívida só no setor
das empresas públicas de transportes. Pergunto: qual é a solução do Bloco para este problema?
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — É o Estado não «fugir com o rabo à seringa»!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Um défice acrescido das empresas, os aumentos dos preços dos
transportes congelados pelas piores razões, aliás, razões eleitorais, como aconteceu quando houve o boom do
aumento do preço dos combustíveis em que o Partido Socialista, então no governo, optou por não aumentar o
preço dos transportes. E o que fez?!
Obviamente que não estou a defender que os preços dos bilhetes sejam o sustentáculo e sirvam para o
pagamento de todas as empresas, mas é uma parte importante.
Portanto, eu não considero que seja o preço dos bilhetes que tenha de garantir toda a capacidade
financeira e a sobrevivência das empresas, não é isso, mas é preciso adequar os custos das empresas, e isso
deve ser refletido no custo dos bilhetes.
Queria, ainda, perguntar-lhe, Sr.ª Deputada, se é ou não verdade que todos os dependentes do rendimento
social de inserção, todos os jovens que tenham o escalão A da ação social escolar mantêm os 50% de
desconto no 4_18 e no Sub23? É ou não verdade? Considera ou não isso justo? É ou não verdade que, em
relação ao preço dos bilhetes, pela primeira vez, este Governo criou um verdadeiro passe social? E isto
significa o quê? Significa que aquele cidadão que tem condições financeiras para pagar transportes vai pagar
e quem não tem condições financeiras, quem não consegue pagar para ir trabalhar, para ir estudar, vai ter um
verdadeiro passe social, vai ter uma ajuda.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É, é! Deve ser verdade!…
A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.
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O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — A Sr.ª Deputada considera ou não isto justo?
Para terminar, gostaria de perguntar se não considera razoável, coerente, encontrar uma oferta que seja de
acordo com a procura. Isto é, se há procura nas horas de ponta, então, reforce-se esse serviço, se nos
entretantos não há procura, se há redução,…
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Aumentem a oferta e logo há procura!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — … então, reduza-se esse serviço. Para quê? Para manter o serviço
público e para garantir as empresas saudáveis. Isto faz sentido ou estarei a dizer coisas completamente sem
sentido, Sr.ª Deputada?
Aplausos do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina Martins.
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Hélder Amaral, vamos ver se nos
entendemos: as propostas do Governo não têm nada a ver com a dívida das empresas. As propostas
apresentadas, todas juntas, mesmo com os números do Governo, que são números claramente otimistas, que
não percebem que, quando se diminui a oferta e aumenta o custo, o número de utentes vai diminuir e,
portanto, a receita no tarifário também diminui — os números do Governo não percebem isso! —, mas, repito,
mesmo nas contas otimistas e irrealistas do Governo, o ganho é de 485 milhões de euros, enquanto a dívida é
de 19 000 milhões de euros. Portanto, esta é uma solução que tira serviço a toda a população e que
corresponde a uma poupança de, apenas, 2,5% do valor da dívida.
Sr. Deputado, a solução para a dívida é resolver o problema dos juros, porque são os juros que estão a
destruir as empresas, e para isso há um caminho, que é o da renegociação da dívida. A solução para a dívida
é criar mecanismos para que, a partir de agora, as compensações indemnizatórias às empresas sejam pagas
de forma que se acabe com a necessidade de as empresas se endividarem constantemente.
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Mas quem é que paga essas compensações indemnizatórias?!
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Tenha calma, porque o Bloco de Esquerda ainda nesta semana vai
apresentar um projeto de resolução propondo estas medidas. Não se preocupe, porque existem soluções.
Porém, a do Governo não é solução!
Por falar em demagogia, pergunto: é normal que as crianças e os jovens andem de transportes públicos
fora das horas de ponta?! É normal que uma família em que os pais têm rendimentos médios de 700 €, que é
o rendimento médio em Portugal, tenha de suportar um aumento do preço do passe social de 80%, repito,
80% nos passes das crianças?! E também no passe dos idosos?! O CDS-PP, que tanto defende os idosos,
acha normal que estes cidadãos fiquem de fora da capacidade de ter um passe mais barato e um aumento de
80% no valor do passe?!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Onde é que isso está escrito?!
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — E, Sr. Deputado, não nos venha com o Passe Social+… Sabe porquê?
Porque a portaria que criou o Passe Social+, na hora de contar o rendimento global, conta tudo, até a pensão
de 300 € do avô, mas na hora de dividir só divide pelos sujeitos passivos.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — É verdade!
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Portanto, o avô vai pagar mais 80% de passe social, de acordo com as
contas do CDS-PP. Os senhores deviam ter vergonha!
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Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Menezes.
O Sr. Luís Menezes (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Catarina Martins, o exercício que acaba de
fazer peca por omitir algumas partes da verdade, que são importantes.
Este Governo herdou um setor público dos transportes com 17 000 milhões de euros de dívida e que, nos
últimos cinco anos de governação socialista, viu essa dívida aumentar em 6000 milhões de euros, ou seja,
quase o suficiente para fazer 30 hospitais centrais ou 400 escolas.
Mas vamos diretamente àquilo que a Sr.ª Deputada estava a mencionar.
Sobre a decisão do Governo, lembro-me de ouvir Deputados da esquerda dizerem que os relatórios dos
grupos de trabalho eram uma coisa medonha, eram uma coisa tenebrosa, porque ia fechar tudo e mais
alguma coisa, que era o «recolher obrigatório» — até foi a expressão utilizada pelo PCP —, mas, para vossa
chatice, percebo, o que aconteceu foi que, pela primeira vez, nas Áreas Metropolitanas do Porto e de Lisboa
pusemos toda a gente a conversar.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Toda a gente? Toda a gente, quem?!
O Sr. Luís Menezes (PSD): — O Governo soube ouvir e tanto assim é que a Junta Metropolitana de
Lisboa, que deu sempre parecer negativo às várias propostas do grupo de trabalho, deu parecer favorável à
proposta final apresentada pelo Governo. Percebo bem que alguns municípios comunistas da Junta
Metropolitana de Lisboa não gostem de falar dessa parte,…
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Quem o viu e quem o vê?!
O Sr. Luís Menezes (PSD): — … mas, enfim, o Bloco de Esquerda não tem esse problema!
Sr.ª Deputada Catarina Martins, não posso deixar de lhe dizer que o Bloco de Esquerda, perante a
mudança, é sempre muito radical numas coisas e muito pouco radical noutras. É que houve alterações
demográficas, Sr.ª Deputada, há sobreposição de linhas entre a Carris e a Metro de Lisboa, há sobreposição
de linhas entre a STCP e a Metro do Porto… As coisas mudam, sabe?
Eisenhower disse, uma vez, uma frase que podia aplicar-se muito bem ao Bloco de Esquerda. Disse que a
civilização, ao evoluir, é semelhante a uma árvore que possui um tronco principal, mas que tem alguns ramos
mortos cuja madeira vai apodrecendo…
De facto, os senhores olham sempre para toda a árvore e dizem: «não lhe vamos tocar!…»
Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Luís Menezes (PSD): — Mas nós temos de podar esse tronco, temos de cortar os ramos que estão
podres, da mesma maneira que temos de olhar para o serviço público de transportes e fazer com que ele seja
sustentável, evitando assim o processo de destruição que o Partido Socialista quase que conseguiu levar até
ao fim nos últimos seis anos de governação.
Já agora, gostávamos de ver o Bloco de esquerda a adaptar-se à mudança. Junte-se à mudança…
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Mas que mudança?!
A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Luís Menezes (PSD): — … porque esse discurso levou-vos a ficarem todos do lado de lá!!
Mas, olhe, vocês mudaram em algumas coisas: há seis meses os senhores, que acham que o emprego é
para a vida, despediram muitas pessoas no vosso grupo parlamentar e no vosso próprio partido. Podiam
ajudar também nesta matéria!
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Aplausos do PSD.
A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina Martins.
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Luís Menezes, percebi que falou de tudo e
de mais alguma coisa menos do tema que está hoje em discussão e que vou repetir qual é: aumento dos
preços dos transportes públicos.
De facto, sobre este tema, não ouvi da sua parte uma palavra. Não ouvi uma palavra sobre o facto de o
passe 4_18, o passe Sub23 e o passe sénior aumentarem 80% em 12 meses! Não ouvi uma palavra sobre o
facto de ser negada às crianças, aos jovens e aos idosos a possibilidade de utilizarem os transportes públicos!
Não ouvi uma palavra sobre o facto de os preços do metro de Lisboa terem aumentado 40% em 4 meses! Não
ouvi uma palavra sobre o facto de a população portuguesa pagar mais pelos transportes públicos do que o que
se paga no resto da Europa!
Bem pode vir o Sr. Deputado com a desculpa da dívida, mas eu vou repetir-lhe os números: todas as
poupanças do Governo, incluindo aumento de tarifários, redução de oferta e despedimento de trabalhadores,
não chegam sequer para 2,5% da dívida. É uma má desculpa, que esconde mal o objetivo, que é o de mais
um imposto, mais um, encapotado sobre os rendimentos do trabalho, porque os aumentos dos transportes
públicos são de tal ordem que, realmente, se trata de um imposto.
A população já paga, através dos seus impostos, o que deve pagar para financiar o sistema de transportes
púbicos. O que os senhores estão a fazer é um roubo, um roubo descarado. É um roubo descarado a quem
vive do seu trabalho e é um roubo que penaliza todos e mais ainda as crianças, os jovens e os idosos. É uma
vergonha! É inaceitável! E os senhores vão ter contestação. Ai vão ter, com certeza!
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Paulo Figueiredo.
O Sr. Rui Paulo Figueiredo (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Catarina Martins, em primeiro lugar,
quero cumprimentá-la pelo tema revelante que aqui nos trouxe e que está na agenda do dia.
Como sabe, o Partido Socialista, há 15 dias, apresentou requerimentos no sentido de ouvir o Sr. Secretário
de Estado dos Transportes, os grupos de trabalho para a Área Metropolitana de Lisboa e para a Área
Metropolitana do Porto para debater este assunto e, em boa hora, finalmente, hoje, as bancadas da maioria
aprovaram e viabilizaram esse debate e essa audição.
Temos pena que não tenham aprovado a proposta, que acompanhámos, feita para alargar este debate às
organizações dos trabalhadores, às comissões de utentes, às Juntas Metropolitanas de Lisboa e do Porto. O
desafio que aqui deixamos é que todas as entidades que queiram debater esta matéria façam chegar à
Comissão de Economia e Obras Públicas esses pedidos, porque o debate é sempre útil e produtivo.
O Sr. Deputado Luís Meneses dissertou sobre tudo menos sobre o aumento dos transportes e disserta
muito sobre o passado, mas aquilo que é relevante e deve ser dito é que normalmente perde muito tempo a
falar do passado quem tem muito pouco, mesmo muito pouco, para falar sobre o presente e sobre o futuro.
Aplausos do PS.
Aquilo que é relevante é que os senhores estão a governar e, até agora, ainda não apresentaram
propostas para fazer face a um problema sério que queremos debater construtivamente, propostas para fazer
face ao endividamento das empresas.
As únicas soluções que têm apresentado são no sentido de resolver este problema indo ao bolso dos
portugueses, somando aumentos de 5%, a aumentos de 15, 20 e 25%, aumentando os passes em mais de
20%, em mais de 50%, em mais de 80%, e depois suprimindo carreiras e diminuindo horários.
Naturalmente que existiram recuos, recuos pela posição política do Partido Socialista, dos partidos à nossa
esquerda, das organizações dos trabalhadores, das comissões de utentes, mas é exatamente para debater
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isso que é importante confrontar as várias versões dos documentos técnicos que foram feitos e que foram
encomendados e as versões políticas.
A Sr.ª Presidente: — Sr. Deputado, queira terminar.
O Sr. Rui Paulo Figueiredo (PS): — Termino, Sr.ª Presidente, deixando um repto a todos os partidos.
Penso que a Deputada Catarina Martins lhe irá responder positivamente, mas tenho dúvidas sobre as
bancadas do PSD e do CDS e tenho muitas dúvidas sobre o Governo.
Vamos ou não debater soluções para fazer face ao endividamento das empresas? Estamos à espera das
propostas do PSD, do CDS e do Governo, porque os senhores é que estão a governar e é tempo de deixarem
de falar no passado.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina Martins.
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Rui Paulo Figueiredo, agradeço a sua
questão e julgo que, nesta altura, podemos concordar que é necessário ouvir, aqui, na Assembleia da
República, na Comissão de Economia, além do Secretário de Estado dos Transportes, as autarquias, e
esperemos que assim o peçam, porque sabemos que essa é a única forma, uma vez que a maioria
obstaculizou audições mais alargadas.
Sabemos que muitas autarquias têm grandes críticas a fazer aos planos do Governo, sabemos que as
autarquias estão a pensar na forma como se organiza todos os dias a vida das suas populações, a sua
economia local e, portanto, a sua opinião é essencial, havendo até autarquias que têm executivos dos
mesmos partidos que sustentam o Governo que têm críticas fortes a fazer a este plano e que devem ser
ouvidas.
Sabemos também que devemos ouvir os movimentos de utentes, devemos ouvir as organizações dos
trabalhadores, porque o Governo tem tido uma prática constante de anunciar que «vai partir tudo» e esperar
para ver o que acontece. E quando há contestação, quando há organização, depois, aparece a dizer: «afinal
até já não era assim tão mau, só se partiu uma perna».
O problema é que não queremos partir «perna» nenhuma. Os transportes públicos são essenciais e o
acesso das populações aos transportes públicos, ou seja, os transportes públicos terem horários, terem
carreiras e terem preços que servem as populações é essencial para que cumpram o seu papel.
Portanto, é também aqui, na Assembleia da República, que teremos de dar voz a todos aqueles que, fora
da Assembleia da República, têm vindo a dizer não ao Governo, obrigando o Governo a recuar nestas
propostas, e esperamos nós que, com a sua voz, também sejam capazes de fazer o Governo recuar nas suas
propostas obscenas dos preços.
Não à austeridade nos preços dos transportes públicos, a austeridade que há já chega bem.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente: — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.
O Sr. António Filipe (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: A decisão tomada pelo Governo
que assegura a regência do nosso País em nome da troica de alterar as regras de financiamento do
transportes de doentes em ambulâncias está a ter consequências dramáticas e, se não for rapidamente
alterada, ameaça assumir proporções de tragédia.
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Sr. António Filipe (PCP): — Uma recente reportagem da RTP, dando conta da situação de doentes
oncológicos residentes em Alfandega da Fé que não podem deslocar-se ao Porto e a Coimbra para os
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tratamentos de que depende a sua sobrevivência porque as suas pensões não lhes permitem pagar 250 euros
por cada deslocação, dá bem a ideia dos foros de desumanidade que a política deste Governo assume, em
matéria de acesso à saúde.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!
O Sr. António Filipe (PCP): — Mais recentemente, ainda, uma reportagem da TSF refere o caso de uma
cidadã idosa de Odemira que recebe 250 euros de reforma e tem de pagar 200 euros pelo transporte em
ambulância e recolhe testemunhos de bombeiros que deparam com o drama de muitos doentes que, para
pagar a ambulância, não têm dinheiro para pagar os medicamentos de que precisam.
E casos destes repetem-se aos milhares pelo País fora!
As causas desta situação são conhecidas. O memorando da troica a que o PS, o PSD e o CDS aceitaram
amarrar a governação do País, prevê uma redução de um terço dos gastos com transporte de doentes em
ambulância. E se a troica manda, o Governo executa e o PS «assobia para o lado».
O critério para a comparticipação do transporte de doentes em ambulância foi alterado. Só os doentes com
prescrição médica do transporte em ambulância e que não tenham um rendimento superior ao IAS (indexante
de apoio social) terão direito a transporte gratuito, e os centros de saúde receberam ordens para reduzir
drasticamente a requisição de transporte de doentes. Dito e feito: as requisições de transportes de doentes
foram drasticamente reduzidas!
Para além disso, a comparticipação do Estado aos bombeiros pelo custo das deslocações foi também
reduzida e fica hoje muito abaixo do preço de custo, tornando os corpos de bombeiros em financiadores do
Estado.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!
O Sr. António Filipe (PCP): — O Estado paga aos bombeiros 48 cêntimos por quilómetro. Há vários anos
que esta comparticipação permanece inalterada e, entretanto, o preço do gasóleo subiu mais de 20%. Nas
deslocações inferiores a 15 km, o Estado paga uma taxa única de saída de 7,5 € para um único doente; no
caso dos demais, paga 1,5 €.
No caso das deslocações a hospitais em que haja demora no atendimento do doente, o Estado já não paga
o retorno da ambulância, pagando apenas 2,90 € por cada hora de retenção.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Uma vergonha!
O Sr. António Filipe (PCP): — Tudo isto somado, a quebra de 30% nos serviços de transporte
requisitados aos bombeiros e as alterações aos critérios de pagamento decididas unilateralmente pelo
Governo, fizeram com que as receitas dos corpos de bombeiros com o transporte de doentes tivessem uma
quebra da ordem dos 70%. Os bombeiros da Amadora e do concelho de Sintra viram-se mesmo obrigados a
suspender o transporte de doentes não urgentes.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. António Filipe (PCP): — Segundo dados da Liga dos Bombeiros Portugueses, até à data, terão sido
já despedidos 400 trabalhadores adstritos ao transporte de doentes em ambulância. Ou seja, o Governo
instalou o caos a mando da troica.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exatamente!
O Sr. António Filipe (PCP): — As receitas dos bombeiros com o transporte de doentes caíram a pique…
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Uma vergonha!
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O Sr. António Filipe (PCP): — … devido à redução drástica dos pedidos e à escassez das
comparticipações, pondo irremediavelmente em causa a prestação desse serviço e mesmo a própria
viabilidade financeira das corporações.
Os bombeiros aguentam muito, abnegadamente. Aguentam enormes sacrifícios para defender os seus
semelhantes; aguentam os maiores perigos para proteger pessoas e bens; aguentam dificuldades financeiras
resultantes do subfinanciamento crónico a que são sujeitos, mas já não aguentam fazer tudo isso e ao mesmo
tempo financiar o Estado.
Vozes do PCP: — Muito bem! Exatamente!
O Sr. António Filipe (PCP): — O que hoje sucede é que muitos milhares de doentes deixaram de ser
transportados aos hospitais e centros de saúde para consultas e tratamentos indispensáveis à sua saúde,
quando não à sua sobrevivência. As consequências humanas que daí decorrem são terríveis e os danos
causados às populações mais carenciadas são incalculáveis.
Os corpos de bombeiros estão a despedir pessoal adstrito ao transporte de doentes e a ficar com as frotas
imobilizadas por falta de dinheiro, pondo decisivamente em causa a sua capacidade para acorrer a situações
de emergência. Alguns corpos de bombeiros correm mesmo o risco de encerrar.
A questão com que o Governo tem de ser confrontado é esta: quanto custa ao País esta
irresponsabilidade, em vidas humanas, em sofrimentos, em tragédias pessoais e em dramas sociais?
Aplausos do PCP.
Muitos dos bombeiros de Portugal que, através da Liga dos Bombeiros Portugueses, foram agraciados por
esta Assembleia, em 2008, com o prémio dos Direitos Humanos são despedidos da sua nobre função e
lançados no desemprego, porque o Governo não paga o transporte de doentes.
Os bombeiros de Portugal, que prestam um serviço insubstituível e de valor inestimável ao nosso País, nas
funções de socorro e proteção civil, nas situações de emergência e de catástrofe, no socorro a doentes e
sinistrados, no combate a fogos urbanos e florestais, os bombeiros de Portugal, que são das mais benévolas e
reconhecidas instituições do nosso país, veem o seu dispositivo ser desmantelado por falta de apoio do
Estado, pondo em causa a capacidade de resposta do sistema nacional de operações de socorro. Se não
houver bombeiros, quem acorre aos portugueses em situação de emergência?
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!
O Sr. António Filipe (PCP): — Quem acorre no auxílio às vítimas da sinistralidade rodoviária? Quem
acorre às vítimas de inundações ou de incêndios? Não serão seguramente os senhores da troica nem são
certamente os governantes que executam cegamente as suas ordens!
Aplausos do PCP.
A situação a que se está a chegar é insustentável. Os bombeiros, através da respetiva Liga, têm vindo a
alertar insistentemente para a gravidade da situação, perante a impassibilidade do Governo.
Para o Ministério da Saúde, preocupado em poupar dinheiro à custa da saúde dos portugueses, o
problema dos bombeiros é com o Ministério da Administração Interna; para o Ministério da Administração
Interna, preocupado em poupar dinheiro à custa da segurança e da proteção dos portugueses, o Governo
nada deve aos bombeiros e o problema da saúde é com o respetivo ministério. Para o Ministério das Finanças
e para o Primeiro-Ministro, não há vida, não há saúde nem segurança para lá da troica.
O que o Governo hoje está a fazer, com as restrições ao financiamento do transporte de doentes, é a
declarar guerra aos soldados da paz e a encarar os doentes como danos colaterais dessa guerra. O corte no
financiamento do transporte de doentes, com todas as suas consequências, é uma das faces mais desumanas
da política deste Governo. Não é só uma guerra contra os bombeiros, é uma guerra contra o direito mais
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elementar dos portugueses à saúde e à proteção em estado de necessidade. Mas entre o Governo, a troica e
os bombeiros, os portugueses saberão, certamente, quem está do seu lado e ao lado de quem devem estar.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Sr. Deputado, inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Teresa
Leal Coelho, do PSD, Filipe Neto Brandão, do PS, João Semedo, do BE, e João Pinho de Almeida, do CDS-
PP. Não sei como pretende responder…
O Sr. António Filipe (PCP): — Respondo um a um, Sr.ª Presidente.
A Sr.ª Presidente: — Muito bem, Sr. Deputado. Sendo assim, dou palavra à Sr.ª Deputada Teresa Leal
Coelho.
A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado António Filipe, aparentemente vivemos
em países diferentes. O Sr. Deputado acabou de afirmar que os ministros da Administração Interna e da
Saúde estão preocupados em poupar dinheiro à custa da vida das pessoas, à custa da segurança das
pessoas.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É verdade!
A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Pois é uma inverdade, é absolutamente o contrário! Este Ministro da
Administração Interna e este Ministro da Saúde estão a cuidar de recuperar, por um lado, o Serviço Nacional
de Saúde e, por outro, as condições de manutenção da segurança em Portugal.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Isso é conversa!
A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — O Sr. Deputado António Filipe bem sabe que este Governo tem sido
mais «bombeiro» do que outra coisa,…
Protestos do PCP.
… este Governo herdou dívidas que está a resolver dentro de um quadro orçamental de responsabilidade.
Só no âmbito do Serviço Nacional de Saúde herdou uma dívida de 3000 milhões de euros, como todos
sabemos, e já disponibilizou 1500 milhões de euros para dar resposta às condições de financiamento do
Serviço Nacional de Saúde.
Vozes do PSD: — Muito bem!
A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Por outro lado, este Governo tem preservado e dignificado a palavra
das corporações de bombeiros em Portugal, tem demonstrado o respeito que nutre pelas corporações de
bombeiros em Portugal…
O Sr. Bruno Dias (PCP): — É verdade!
A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — … e desencadeou um processo de diálogo. Os senhores bem sabem
que este Governo tem sido bastante eficaz em matéria de diálogo e tivemos um resultado inequívoco, na
semana passada, em sede de concertação social.
Vozes do PSD: — Muito bem!
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A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Ora, é precisamente no momento em que o Governo desencadeia o
diálogo e prova que pode dialogar com bons resultados (repito, na semana passada, este Governo conseguiu
um resultado extraordinário em matéria de concertação social) que os senhores, que normalmente apelam à
necessidade de promoção do diálogo, apontam o dedo.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — E sobre os bombeiros!
A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Este Governo está preocupado com a necessidade de preservar os
cuidados de saúde.
A Sr.ª Presidente: — Sr.ª Deputada, faça favor de terminar.
A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — A pretensão deste Governo é que, dentro de um quadro orçamental
rigoroso e responsável, ninguém fique de fora, nenhum cidadão fique de fora, e é preciso aguardar pelos
resultados desta concertação que o Governo está a estabelecer com os bombeiros.
Aplausos do PSD.
Protestos do Deputado do PCP João Oliveira.
A Sr.ª Presidente: — Sr. Deputado António Filipe, tem a palavra, para responder.
O Sr. António Filipe (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Teresa Leal Coelho, eu é que não sei em
que País é que a Sr.ª Deputada vive,…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Ora bem!
O Sr. António Filipe (PCP): — … porque não se referiu rigorosamente a nada daquilo que disse na minha
intervenção. Os elementos, os dados em que me baseei são objetivos e irrefutáveis.
A Sr.ª Deputada diz que o Governo está em diálogo.
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — É verdade!
O Sr. António Filipe (PCP): — O Governo não teve outro remédio senão retomar o diálogo no momento
em que as corporações de bombeiros deixaram de fazer o transporte de doentes.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!
O Sr. António Filipe (PCP): — Esse é que foi o problema! Se não fosse assim, se não fosse a posição
firme tomada por algumas corporações de bombeiros, o Governo não dialogava rigorosamente com ninguém.
Disse a Sr.ª Deputada que este Governo não deixa os cidadãos ficarem de fora.
Sr.ª Deputada, mas o problema são exatamente os cidadãos que ficam de fora, os cidadãos que precisam
de ser transportados em ambulâncias, precisam de fazer os seus tratamentos, precisam de ir aos hospitais e
não têm meios financeiros para pagar o transporte e ficam de fora com estes critérios que o Governo está a
impor.
O Sr. Adão Silva (PSD): — Não é verdade!
O Sr. António Filipe (PCP): — E são também os bombeiros que ficam de fora, porque são despedidos.
Segundo a Liga dos Bombeiros Portugueses (referi isso na minha intervenção), já são 400 os bombeiros
adstritos ao serviço de ambulâncias que viram os seus contratos de trabalho rescindidos por falta de meios
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financeiros das corporações de bombeiros. São pessoas que ficam de fora, pessoas que têm prestado um
contributo de valor inestimável ao País e que são lançadas no desemprego, enquanto os doentes ficam sem
qualquer proteção,…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!
O Sr. António Filipe (PCP): — … quando não têm meios financeiros para se deslocarem para a realização
de tratamentos médicos dos quais, nalguns casos, depende até a sua própria sobrevivência. Portanto, essas
pessoas ficam de fora com esta política.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Os senhores não querem saber disto!
O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. ª Deputada, quando o Governo tem esta atitude, não vale a pena dizer
que consegue grandes sucessos em concertação social, porque, evidentemente, isso não resolve
minimamente os problemas com que os portugueses se confrontam hoje, no seu dia-a-dia. E é este o País em
que vivemos e do qual não nos podemos alhear.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Filipe Neto Brandão.
O Sr. Filipe Neto Brandão (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado António Filipe, permita-me que o saúde
por trazer a esta Assembleia a problemática que atualmente vivem as associações humanitárias de
bombeiros, as quais são inequivocamente um elemento estruturante e insubstituível da nossa proteção civil e
são credoras do nosso respeito, da nossa admiração e do nosso cuidado.
O Sr. Deputado trouxe precisamente um dos exemplos paradigmáticos daquilo que diferencia o governo
que cessou funções e esta maioria, porque não é mesma coisa cumprir o que está no Memorando de
Entendimento, assinado a 17 de Maio, que, como bem sabe (aliás, referiu-o), se traduz num corte de cerca de
um terço das despesas com o transporte de doentes, e ir além disso com um corte superior a 60%.
Temos de ter consciência, e os bombeiros infelizmente sabem-no muito bem, que os cortes na despesa
implicam sacrifícios não apenas para os utentes mas também para os prestadores de serviços, neste caso
para os bombeiros.
V. Ex.ª citou alguns exemplos. Como sabe, o transporte de alguns doentes, nomeadamente o de doentes
oncológicos, estava excecionado dos cortes, mas temos de ter consciência de que neste momento, aos cortes
que referiu, acresce a diminuição sensível de financiamento dos corpos de bombeiros através da cessação do
financiamento, nomeadamente por intermédio dos governos civis, dos equipamentos de proteção individual e
de outros equipamentos, que passaram a ser custeados pelos corpos de bombeiros, uma vez que não houve
qualquer reforço da Autoridade Nacional de Protecção Civil nessa matéria.
Aliás, o Governo parece manifestar alguma desconsideração relativamente ao voluntariado,
nomeadamente através de pequenos exemplos, como a retirada das isenções das taxas moderadoras aos
bombeiros voluntários, que não tem outro significado que não, precisamente, a expressão de uma
desconsideração que não compreendemos.
Concluo colocando-lhe a seguinte questão, que, aliás, já decorre da sua intervenção mas que gostaria de
salientar: é ou não verdade que neste momento os cortes impostos às associações humanitárias são em muito
superiores aos cortes de 30% que estavam acordados com a troica?
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra, para responder, o Sr. Deputado António Filipe.
O Sr. António Filipe (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Filipe Neto Brandão, começo por agradecer a
pergunta que me colocou.
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O Sr. Deputado perguntou-me se este corte de receitas dos bombeiros com o transporte de doentes vai ou
não para além de uma redução de um terço que consta do documento assinado com a troica.
Fez bem em lembrar o documento da troica, porque os Srs. Deputados pretendem demonstrar uma coisa
que é indemonstrável, quando dizem o seguinte: «nós, Partido Socialista, assinámos o documento da troica,
que refere um corte de um terço nas despesas do Estado com o transporte de doentes, mas, se estivéssemos
no governo, isto não era feito desta maneira, era feito de outra».
Risos do Deputado do CDS-PP João Pinho de Almeida.
Mas os senhores ainda não demonstraram o que é que fariam de diferente se estivessem no governo,…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Ora bem!
O Sr. António Filipe (PCP): — … porque, de facto, assinaram um compromisso com a troica no sentido de
reduzirem em um terço as despesas do Estado com o transporte de doentes. Portanto, não sei como é que os
senhores fariam para aceitar esse princípio da redução de um terço e depois manter tudo a funcionar.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!
O Sr. António Filipe (PCP): — Bom, não sei!…
O Sr. Deputado referiu — realmente, disse-o na minha intervenção — que a quebra de receitas estimada
pelos bombeiros, na atual situação, é de cerca de 70%. Trata-se do corte de receitas dos bombeiros que
resulta não apenas da despesa que o Estado não faz mas também da despesa que os particulares não podem
fazer,…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!
O Sr. António Filipe (PCP): — … porque há muitas situações em que as pessoas se veem privadas de
poder comparticipar por falta de meios financeiros. De facto, há um corte drástico nas requisições feitas pelo
Estado e há uma perda de receitas dos bombeiros em que se conjugam vários aspetos: a quebra das
comparticipações por parte do Estado e a falta de requisições para que os transportes sejam efetuados.
Isto tem duas consequências, Sr. Deputado (e congratulo-me que compartilhe esta preocupação): por um
lado, no estado de saúde das pessoas, que se veem privadas de um transporte que para elas é evidente e
absolutamente necessário, e, por outro, na desestruturação do sistema de proteção civil.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
O Sr. António Filipe (PCP): — Se os bombeiros têm que ser despedidos, se as ambulâncias ficam
imobilizadas, quando houver um acidente rodoviário grave queremos saber quem é que lá vai!
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
O Sr. António Filipe (PCP): — E queremos também saber quem é que responde por opções políticas
destas, que põem em causa decisivamente o sistema nacional de proteção e socorro. Essa é uma grande
preocupação que, pelos vistos, só o Governo não tem.
Aplausos do PCP.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Os bombeiros que fazem o transporte são os mesmos que apagam os
incêndios!
A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado João Semedo.
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O Sr. João Semedo (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado António Filipe, a situação trágica relativamente
ao transporte de doentes, que o Sr. Deputado acabou de descrever com minucia e rigor, é uma das traduções
da política de cortes cegos que o Governo tem seguido na área da saúde.
Já conhecemos o princípio: não há dinheiro para pagar tudo a todos, excluindo deste princípio os amigos
da banca, os amigos da Madeira e até aqueles que andam nas margens do «buraco» do BPN. Assim, não há
dinheiro. E o recurso que o Governo tem é muito simples: é cortar, cortar, cortar.
E o primeiro corte (infelizmente, não é o único, mas é o primeiro e o mais flagrante) é rigorosamente no
transporte de doentes, atropelando um conceito que até há muito pouco tempo era consensual na nossa
sociedade e para aqueles que debatem e promovem uma boa política de saúde: o de que o transporte é,
evidentemente, uma primeira condição, um primeiro fator de acesso aos serviços de saúde. Por essa razão,
deve obedecer a um único critério, no que diz respeito à comparticipação do Estado e ao apoio público no
transporte dos doentes, que é a razão clínica, o motivo clínico, a justificação clínica. O transporte de doentes
deveria apenas ter este critério de decisão no domínio do apoio do Estado.
O Governo, ao mesmo tempo que altera e secundariza este critério, está a asfixiar as corporações de
bombeiros, porque coloca-as numa contradição: se cumprem a sua missão, têm prejuízo; se têm prejuízo,
deixam de existir. E é essa a tragédia que se pode vir a colocar no nosso País. Sem bombeiros, há muitas
missões de caráter humanitário e de relevante interesse para a sociedade que deixam de ser cumpridas.
Por isso, do nosso ponto de vista, há dois passos que são absolutamente inadiáveis, sendo imperativo e
urgentíssimo que o Governo os cumpra: por um lado, rever os critérios da comparticipação pública,
confinando-os à justificação clínica, e, por outro, sem dúvida alguma, rever o contrato e o valor da
remuneração com base no qual o serviço dos bombeiros é atualmente pago. É sobre isto que gostaria de o
questionar.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra, para responder, o Sr. Deputado António Filipe.
O Sr. António Filipe (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado João Semedo, agradeço a sua pergunta, que
me parece muito pertinente.
A questão que podemos colocar, desde logo, é se é aceitável que um Governo, um partido político
responsável, aceite esta imposição da troica de cortar um terço nas despesas com o transporte de doentes,
como se estivéssemos a falar de uma «gordura».
O PSD, quando estava na oposição, fartava-se de falar em cortar nas «gorduras» do Estado. Afinal, uma
«gordura» do Estado é isto? Ou seja, é aceitar, à partida, que um terço da despesa com o transporte de
doentes tem que ser cortada?
Sr. Deputado, não consideramos que isto seja aceitável, porque, obviamente, ninguém se entretém ou
passa o tempo a ser transportado em ambulância para um hospital ou para um centro de saúde. O critério
para o transporte sempre foi clínico — as requisições sempre foram feitas por prescrição médica — e, a partir
de certa altura, passou a dizer-se o seguinte: «fazem o favor de não prescrever o transporte de doentes,
porque a troica diz que temos que cortar em um terço as despesas com o transporte de doentes e nós
aceitámos isso».
Sr. Deputado, isto não é minimamente aceitável, porque tem consequências humanas que podem ser
irreparáveis. A vida das pessoas é posta em causa com uma atitude destas por parte do Estado e isto não é
aceitável a título nenhum. Concordo plenamente com o que diz: o único critério que deve presidir ao
financiamento público do transporte de doentes em ambulância é a necessidade clínica desse transporte.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. António Filipe (PCP): — Não pode haver outro critério, porque qualquer outro critério vai pôr em
causa a saúde e até, por vezes, o direito à vida dos portugueses.
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Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra, para um pedido de esclarecimento, o Sr. Deputado João Pinho de
Almeida.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado António Filipe, trouxe V. Ex.ª a
esta Câmara um tema que é importante e sério. Portanto, a única forma de o abordar é reconhecendo a sua
importância e discutindo-o também com seriedade.
Se assim não fosse, não estava o Governo, neste momento, empenhado num grupo de trabalho no âmbito
do Ministério da Saúde para, juntamente com as corporações de bombeiros, encontrar a melhor solução para
esta situação.
É evidente que se, por um lado, temos um problema financeiro e uma necessidade de gerir de forma justa
os recursos, que são públicos, mas que também são escassos, do outro lado temos a prestação de um serviço
relevante de assistência a doentes. Mas sem misturar, porque aqui estamos a falar de transporte de doentes
não urgentes e convém que tenhamos noção da emergência, que é tratada de outra forma.
Vozes do CDS-PP: — Claro!
Protestos do PCP.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Também sabemos que são as próprias corporações de
bombeiros a dizer que não fecham as portas a uma possibilidade de analisar um mecanismo melhor de
adequação deste sistema, porque são as próprias corporações de bombeiros a reconhecer também que, no
passado, poderá ter havido excessos, desvios ou uma utilização que não fosse a mais correta deste tipo de
transporte. Não é a generalidade dos casos; é, naturalmente, a exceção.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Fiscalizem!
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Portanto, o que cabe, agora, neste momento, ao Governo e
às corporações de bombeiros fazer, no âmbito desse diálogo, é conseguir aquilo que é fundamental, ou seja,
que todos aqueles doentes que têm de ser transportados por esta via, através da prestação de serviços por
parte dos bombeiros, para o Serviço Nacional de Saúde o sejam e que haja a capacidade de os recursos
públicos assegurarem essa comparticipação. É nisso que o Ministério da Saúde está empenhado e não há
razão alguma para desconfiar de que as corporações de bombeiros não estejam também empenhadas nisso.
Protestos do Deputado do PCP João Oliveira.
Agora, há outro problema que o Sr. Deputado aqui levantou, e muito bem: é o facto de as corporações de
bombeiros estarem dependentes da prestação deste tipo de serviços para o seu financiamento.
Vozes do CDS-PP: — Ora!…
Protestos da Deputada do PCP Rita Rato.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Isto quando sabemos que as corporações de bombeiros
desempenham muitas outras funções para além desta, o que leva a concluir também que todo o financiamento
das corporações de bombeiros, todo o tipo de serviços que os bombeiros prestam, seja no âmbito do
transporte de doentes, seja no âmbito da emergência médica, seja no âmbito do combate a incêndios, tem de
ser analisado em conjunto para também termos todos uma resposta competente e conveniente para a
sustentabilidade das corporações de bombeiros. Todos estamos, com certeza, empenhados nisso.
O que pergunto ao Sr. Deputado é o seguinte: havendo neste momento, um grupo de trabalho que discute
esta matéria, não deveremos, em primeiro lugar, esperar as conclusões desse grupo de trabalho?
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Aplausos do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.
O Sr. António Filipe (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado João Pinho de Almeida, nós esperamos pelo
diálogo, mas «não esperamos sentados»…!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. António Filipe (PCP): — Sabemos as circunstâncias em que o diálogo foi retomado e
acompanhamos atentamente e, até, com preocupação as notícias que dão conta, muito recentemente, de que
não tem havido grandes evoluções. Mas vamos esperar, porque sabemos que a Liga dos Bombeiros
Portugueses é, evidentemente, um interlocutor válido, com uma enorme representatividade, que representa os
milhares de bombeiros voluntários do nosso país que prestam um serviço inestimável. E esperamos que esse
diálogo tenha resultados, que o Governo reconheça o que está em causa e que reconheça a necessidade de
que o nosso país esteja dotado, de facto, de condições para os corpos de bombeiros possam acorrer às
situações das quais são incumbidos.
Vozes do PCP: — Exatamente!
O Sr. António Filipe (PCP): — Mas, Sr. Deputado, deixe-me dizer-lhe o seguinte: os critérios de
financiamento que o Governo alterou depois da troica não foram ditados unilateralmente pelos bombeiros,
foram acordados com o Governo de Portugal!
E esse acordo, que estabelecia critérios e montantes para o financiamento dos transportes de doentes e
que se desvalorizou, porque, evidentemente, não foi atualizado e o gasóleo tem aumentado ao ritmo que
sabemos — coisa com que o CDS se preocupava muito, quando estava na oposição, mas com que, agora,
parece menos preocupado…
Vozes do PCP: — Pois era!…
O Sr. António Filipe (PCP): — Mas isso não foi unilateralmente decidido pelos bombeiros; foi um valor
considerado justo, tendo em conta as necessidades de financiamento dos bombeiros. Para quê? Para que
esse serviço se pudesse manter.
O Sr. Deputado diz que não está aqui em causa o transporte de situações de emergência; simplesmente,
se os bombeiros forem despedidos, se as frotas automóveis ficarem imobilizadas, isso é suscetível de pôr em
causa o sistema de proteção civil e, mesmo, a necessidade de acorrer a situações que são, elas mesmas, de
emergência.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!
O Sr. António Filipe (PCP): — Para além disso, há doentes que não são considerados urgentes, mas que
têm necessidade de cuidados médicos dos quais depende a sua sobrevivência; e estamos a falar,
designadamente, dos doentes oncológicos e de outras doenças crónicas.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Pois é!
O Sr. António Filipe (PCP): — Portanto, Sr. Deputado, o assunto é muito sério. Esperamos que o
processo de diálogo que está em curso entre o Governo e a Liga dos Bombeiros Portugueses dê resultados,
mas estaremos atentos e não deixaremos, em momento algum, de confrontar o Governo com as suas
responsabilidades nessa matéria.
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Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, assim terminamos, por hoje, o período de declarações políticas.
Vamos passar ao segundo ponto da ordem do dia, que consiste no debate do projeto de resolução n.º
86/XII (1.ª) — Recomenda ao Governo que promova medidas para o desenvolvimento do regadio em Portugal,
apresentado pelo PSD e pelo CDS-PP.
O primeiro orador inscrito para intervir é o Sr. Deputado Pedro do Ó Ramos, a quem dou a palavra.
O Sr. Pedro do Ó Ramos (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: O projeto de resolução que,
hoje, discutimos pretende cortar com as políticas passadas e recomeçar a política do regadio e do uso da
água, em Portugal.
O objetivo é o de recomendar ao Governo que, pela primeira vez desde há muitos anos, se pense o
regadio como um todo; que projete os aproveitamentos hidroagrícolas em termos nacionais, baseado nos
muitos pareceres técnicos e científicos que os serviços do Ministério da Agricultura e diversas associações
foram desenvolvendo e sugerindo, tão capazmente, mas que, infelizmente, por diversas razões, não foram
implementados.
Ao invés, o que se verificou, nos últimos anos, foi um desnorte em termos de projetos de regadio, sem que
se conhecesse qualquer plano sobre os investimentos prioritários. Foram inauguradas obras incompletas,
outras, sem estudos prévios, nem estudos económicos que o justifiquem. A falta de uma estratégia fez com
que o Plano Nacional de Regadios, previsto há anos, não tenha saído do papel. No mesmo registo, não
podemos deixar de constatar que o PRODER (Programa de Desenvolvimento Rural), planeado pelos
anteriores governos socialistas, nada contemplou para melhorar a eficiência do uso da água nos regadios
individuais.
Com a iniciativa que hoje discutimos, pretendemos que o Governo assuma (uma vez mais) que a
agricultura é uma atividade crucial e primordial para o desenvolvimento do nosso País e que, para tal, é
indispensável a aposta no regadio.
Na verdade, o regadio, para além de atividade económica de extrema importância, é também polo fixador
de populações e de humanização da paisagem. Trata-se de um fator fundamental para travar a desertificação
do País.
O Sr. Pedro Lynce (PSD): — Muito bem!
O Sr. Pedro do Ó Ramos (PSD): — Neste sentido, é com grande preocupação que vemos as propostas da
Comissão Europeia para a PAC (Política Agrícola Comum) pós 2013 nos apoios ao regadio, esperando que as
negociações comunitárias possam inverter esta situação, tão prejudicial a Portugal.
O Sr. Pedro Lynce (PSD): — Muito bem!
O Sr. Pedro do Ó Ramos (PSD): — Na verdade, no nosso País o regadio é o único sistema que permite
regularizar a ocorrência da precipitação, possibilitando aumentar a produtividade e alargar o leque de opções
produtivas às culturas de primavera/verão.
O PSD entende essencial a criação de condições que promovam a confiança no futuro da agricultura de
regadio em Portugal. Para tal, exige-se uma visão estratégica coerente e realista, um enquadramento político-
institucional adequado a uma colaboração estreita entre a Administração Pública, os agricultores, as suas
organizações e as associações de regantes.
Paradoxalmente, Portugal é o país da União Europeia com menos área regada: apenas 15% da superfície
agrícola utilizada, cerca de metade da área regada da nossa vizinha Espanha.
É imperioso inverter esta situação, pelo que recomendamos desde já: definir uma política de preços da
água de rega nos aproveitamentos hidroagrícolas que promova o desenvolvimento sustentável das zonas
rurais, tendo como objetivo final um preço da água competitivo para os agricultores; adotar uma política de
desenvolvimento rural, capaz de promover culturas de regadio, competitivas e ambientalmente orientadas,
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promovendo a produção de bens transacionáveis e valorizando os recursos solo e água, não desconhecendo
a necessidade de formação dos agricultores;…
O Sr. Pedro Lynce (PSD): — Muito bem!
O Sr. Pedro do Ó Ramos (PSD): — … rever a legislação do regime jurídico das obras de aproveitamentos
hidroagrícolas, envolvendo os agentes públicos e privados; e concessionar as redes secundárias de rega a
Associações de Beneficiários que mostrem competência para tal.
Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados, termino como comecei: há que romper com o passado e adotar-se,
sem qualquer tibieza, uma verdadeira política do regadio e do uso da água.
Aplausos do PSD.
Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Ferro Rodrigues.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Abel Baptista.
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: com a apresentação do projeto
de resolução n.º 86/XII (1.ª), pretende-se que se recomende ao Governo medidas que tenham a ver com a
gestão, a implementação, o apoio e a dinamização do regadio.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Ora, o regadio tem de ser, hoje, feito de uma forma sustentável, em
termos económicos, sociais e ambientais; por isso, também se requer hoje um uso mais eficiente da utilização
da água.
Portugal tem um regadio público que deve merecer da nossa parte a maior das atenções. E é isso que
temos vindo a fazer, relativamente ao Alqueva. Por isso é que este Governo assinou, há dias, em sede de
concertação social, um acordo que deverá permitir a transferência do financiamento das obras do Alqueva, do
PRODER para o QREN (Quadro de Referência Estratégico Nacional). E isto tem relevância em termos
agrícolas, sobretudo pelo seguinte: é que a maior parte do regadio, em Portugal, é privado ou associativo, e é
gerido pelos próprios agricultores ou pelas suas organizações, cuja possibilidade de financiamento está
exclusivamente no âmbito do PRODER e o PRODER; no momento atual, o regadio é uma das principais
fontes de financiamento da Empresa de Desenvolvimento e Infraestruturas do Alqueva (EDIA).
Ora, ao permitir-se o financiamento deste investimento no QREN, está a possibilitar-se a utilização da
verba do PRODER para os regadios privados, que, como disse, cobrem a maior parte dos regadios da área
agrícola em Portugal.
A gestão ou a concessão da rede secundária às organizações de agricultores, através das associações de
regantes, ou outras, faz sentido na medida em que é na gestão de proximidade e de articulação com os
consumidores/utilizadores da água que melhor se define a sua organização, a sua rentabilidade e, até, o seu
preço. Essa é uma das propostas que estão contidas neste projeto de resolução e que, obviamente fará todo o
sentido nesta gestão de proximidade — como, aliás, tem vindo a acontecer já em algumas situações.
Para além de preços competitivos da utilização e da gestão sustentável das águas é, ainda, necessário
haver, da parte de quem faz esse trabalho, uma gestão competente que possa permitir uma gestão
sustentável para a sua utilização em futuras gerações. Desta forma, com este projeto temos de criar condições
de sustentabilidade e de rentabilidade para o investimento agrícola, em regadio; e este Governo tem estado,
nessa medida, no mesmo sentido daquilo que vai…
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Sr. Deputado, permita-me interrompê-lo porque quero pedir aos
Srs. Deputados para conservarem a Sala com os níveis de silêncio adequados.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
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O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Queira prosseguir, Sr. Deputado Abel Baptista.
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Muito obrigado, Sr. Presidente, mas eu estava mesmo a terminar a
minha intervenção.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Para uma intervenção, tem a palavra Sr. Deputado Luís Pita
Ameixa.
O Sr. Luís Pita Ameixa (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PSD e o CDS apresentam este projeto
de resolução como tendo um âmbito nacional, mas, verdadeiramente, é para se focar no caso concreto do
Alqueva. E fazem isso por má consciência, Sr. Presidente e Srs. Deputados.
No nosso país, há a má fama de que quem não quer resolver qualquer problema «faz uma comissão»… O
PSD, como está atrapalhado com esta questão e não quer resolver o problema, «faz um projeto de
resolução», o que, aliás, é um pouco estranho. Sendo partido do Governo, não tem de fazer projetos de
resolução; o PSD tem é de ter ação e tem de resolver as situações!
Mas não fala na questão essencial que é a seguinte: há uma obra muito importante para o País, que está a
decorrer, que tem um calendário, que se baseia em estudos concretos, mas que o Governo do PSD parou.
Este projeto de resolução não fala nessa obra, não fala da conclusão dessa obra, que é o necessário para o
País e para a região. E até inventa coisas novas tais como criar uma nova unidade… — certamente mais
despesa pública para criar mais uma unidade —, quando, neste momento, já existem no terreno as entidades
próprias para a gestão do projeto e que têm um histórico que não pode ser desperdiçado.
Também o PSD se está a preparar para retirar mais verbas ao Alqueva; há setores do PSD que querem
tirar verbas ao Alqueva para outros projetos e para outras regiões. Há a intenção de tirar as verbas do
PRODER do Alqueva, em troca de coisa nenhuma, de uma miragem que poderá vir a ser financiada pelo
QREN, coisa que não será fácil.
Este Governo «entrou a matar» contra o Alqueva e, mais uma vez, vêm aqui o PSD e o CDS com este
projeto de resolução dar cobertura a essa política contra a conclusão do Alqueva, contra a realização desta
obra essencial para a agricultura portuguesa e regional.
Disse que não havia rega. É falso! Disse que os agricultores são incapazes. É falso! O PSD é falso e
humilhou a agricultura alentejana!
Vozes do CDS-PP: — Ohhh…!
O Sr. Luís Pita Ameixa (PS): — A Sr.ª Ministra também já foi acusada, por setores dentro do PSD, de ser
comandada pela CAP, de não ter uma vontade própria em matéria agrícola, designadamente em matéria do
regadio. É a CAP que manda no Ministério — foi o que disseram de dentro do PSD.
Agora, este projeto de resolução não é mais do que uma chamada de atenção à Sr.ª Ministra.
Possivelmente, é um projeto de resolução que, ao mesmo tempo que serve para empatar o que está a ser
empatado, põe em causa a própria Ministra da Agricultura e o próprio Governo.
Para o PS, a questão é simples: o Partido Socialista foi o grande fautor do Alqueva. Com o PS, o Alqueva
teve um novo calendário, que fazia com que a obra fosse concluída em metade do tempo — em 2013.
Conferimos ao País e à agricultura alentejana uma nova ferramenta para o seu desenvolvimento, que o PSD
agora quer matar,…
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Queira fazer o favor de concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Luís Pita Ameixa (PS): — … porque entrou a matar contra o Alqueva. E este projeto de resolução é
mais uma faca para espetar no coração do Alqueva!
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Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís
Ferreira.
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PSD e o CDS-PP apresentam-
nos hoje, para discussão, algumas medidas para o desenvolvimento do regadio em Portugal e o primeiro
registo que Os Verdes querem fazer sobre o assunto tem a ver com o apoio dado por diversas entidade
públicas, nomeadamente o Gabinete de Planeamento e Política Agroalimentar e o próprio Ministério da
Agricultura, aos projetos que uma conhecida multinacional de sementes transgénicas e de agroquímicos tem
para o Alqueva e que mais não são do que projetos que visam tentar dominar o mercado gerado por este
empreendimento público.
Na verdade, o projeto da Syngenta — denominado sudExpand — é, como a própria empresa diz, uma
outra forma de abordar o mercado através do fornecimento de soluções integradas, ou seja, através do
fornecimento do pacote de produtos da Syngenta (sementes transgénicas, fertilizantes e pesticidas, entre
outras coisas). Mas o mais grave é que este projeto tem como parceiros diversas entidades públicas e teve já,
como é, aliás, visível no boletim informativo desta multinacional, o alto patrocínio da própria Ministra da
Agricultura.
Ora, o que está a fazer-se é a favorecer os interesses e o negócio de uma empresa em detrimento de
outras — e isso até nem fica nada bem a quem tanto fala da livre concorrência. O Alqueva não deve estar ao
serviço do negócio de multinacionais das sementes transgénicas e dos agroquímicos, mas, sim, do interesse
nacional e da agricultura nacional.
Toda esta relação entre o Ministério da Agricultura, que também é do Ambiente, e a Syngenta tem muito
que se lhe diga!… E tem muito que se lhe diga mesmo que venha a ser justificada pelos benefícios para os
agricultores, que não estão, de resto, clarificados — falta ainda saber quais são eles.
Como se isto não bastasse, esta semana tivemos a notícia da nomeação, por parte do Ministério da
Agricultura, do diretor ibérico pela área logística da Syngenta para Presidente do Conselho de Administração
da Companhia das Lezírias. De facto, «ele há coincidências»…
São coincidências que reforçam a ideia da adoção de um modelo intensivo de produção para o Alqueva
com tudo o que o mesmo tem de pior: transgénicos, agroquímicos, monocultura e por aí fora!
Para Os Verdes, o que se exige é, antes de mais, que o Governo promova um debate sério sobre o modelo
de produção que se quer para as zonas de regadio, que, afinal, resulta de um investimento público e em
relação ao qual, também por causa disso, os cidadãos têm uma palavra a dizer.
Temos uma palavra a dizer sobre o modelo da agricultura que queremos: se queremos um modelo de
agricultura sustentável e a produção de produtos de alta qualidade ou se, pelo contrário, queremos um modelo
intensivo, como aquele que se está a desenhar. Esta, sim, é que é a questão central nesta matéria!
Globalmente, não estamos em desacordo com o projeto de resolução que o PSD e o CDS apresentam,
mas não acompanhamos os proponentes relativamente ao n.º 4 do projeto de resolução. Portanto, se houver
abertura para que a votação seja feita ponto a ponto, certamente votaremos a favor dos restantes três pontos
do projeto.
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr. Presidente, Sr.as
Deputadas e Srs. Deputados: Creio que o projeto de
resolução apresentado pelo PSD e pelo CDS se deve a uma má consciência acerca do parêntesis em que foi
posto o projeto de Alqueva. Essa é a sua verdadeira motivação, é tentar dizer que a «bandeira» não caiu,
quando, de facto, ela foi arreada!
Tentar vir aqui mascarar essa realidade, com eventuais transferências de verbas do PRODER para o
QREN, com apoios a associações de regadio privadas, etc., é uma conversa para embalar a opinião pública.
Na verdade, o ponto substancial, o que é cardeal no projeto de resolução é dizer: «O Alqueva parou, está
interrompido, está entre parêntesis. Mas, afinal de contas, lá mais ao fundo do túnel, haverá uma luz… Por
agora, nada.»!
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O PSD e o CDS, sobretudo na Assembleia da República e para os jornais, quer falar ao sul do País e dizer:
«Qualquer dia, Alqueva virá!»… Portanto, é esta a finalidade do projeto de resolução aqui apresentado
conjuntamente, e nós não podemos acompanhar esse objetivo.
Na verdade, a assunção de responsabilidades por parte da direita levaria, embora com ajustamentos, a que
fosse cumprido aquele que era o compromisso dos poderes públicos em relação à conclusão desta obra
nacional, deste projeto tanto tempo adiado e que, finalmente, estava perto de ser concluso. Mas não é deste
modo que o será e, portanto, só podemos contestar esta posição da parte da Ministra Assunção Cristas e dos
partidos que aqui a apoiam, na Assembleia da República.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho
Lopes.
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os partidos da política de direita —
PSD, CDS-PP e PS — deviam ter pudor na abordagem de alguns temas.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Um deles é, seguramente, o do regadio, porque é da responsabilidade
da política de direita a situação desastrosa do regadio em Portugal,…
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exatamente!
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — … porque são da responsabilidade da política de direita — destes três
partidos! — as obras que se arrastam há anos a fio, década após década, de que são casos paradigmáticos
as do Vale da Vilariça, do Baixo Vouga Lagunar, do Baixo Mondego e até do próprio Alqueva.
São da responsabilidade da política de direita o abandono e a degradação de inúmeros perímetros de rega,
que custaram vultosas verbas ao erário público. Um balanço da Direcção-Geral de Agricultura e
Desenvolvimento Rural (DGADR), em 2009, considerou que dois terços da área equipada pública ultrapassou
o limite útil de vida e determinava que, em 50 casos, 20 tinham muita urgência de intervenção e 15 muita e
média urgência.
São da responsabilidade da política de direita — e destes três partidos! — o atraso e o insuficiente
desenvolvimento do regadio face à superfície agrícola utilizável, suscetível de aproveitamento.
O Sr. João Oliveira (PCP): — É um facto!
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Dos 2,8 milhões de hectares disponíveis, de acordo com o
recenseamento agrícola de 2009, apenas são irrigáveis cerca de 540 000 ha. Mas, a todo este rol, soma-se o
escandaloso desaproveitamento pleno das áreas equipadas e suscetíveis de rega: em 20 anos, de 1989 a
2009, a superfície irrigável reduziu-se em 38%, ou seja, menos 237 000 ha, e a superfície regada reduziu-se
em 26%, ou seja, menos 162 000 ha.
Segundo o recenseamento agrícola de 2009, nos últimos 10 anos verificou-se no País um decréscimo da
superfície regada de 23%, o que equivale a menos 140 000 ha e a menos 105 000 explorações.
O Sr. João Oliveira (PCP): — E preocupam-se com o regadio… O que seria se não se preocupassem!…
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — A superfície irrigável na superfície agrícola utilizada decresceu de 21%
para 15% em 10 anos — um desastre que envergonha o País!
Mais grave é o facto de o projeto de resolução aparecer como uma tosca tentativa de ocultar, de lançar
uma «cortina de fumo» sobre a decisão do Ministério da Agricultura, do Governo de cortar em mais de 150
milhões de euros as dotações do PRODER para o regadio. Depois de o Orçamento do Estado ter tido duas
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linhas dedicadas a este assunto, sem qualquer orçamentação específica e clara para o regadio, avança-se
agora com um brutal corte de reprogramação do PRODER — e os Deputados do PSD e do CDS nada dizem.
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Queira fazer o favor de concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Termino já, Sr. Presidente.
Tínhamos já baixas execuções do PRODER, agora temos um corte de 100 milhões de euros no Alqueva —
não se sabe quanto é que o QREN vai transferir —, além de um corte de cerca de 30 milhões de euros nos
sistemas de regadio públicos e um corte de 15 milhões de euros nos sistemas de regadio tradicionais.
Não percebo porque é que os Srs. Deputados do PSD e do CDS nada disseram sobre este assunto!…
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Tem mesmo de concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Concluo já, Sr. Presidente.
O projeto não é apenas uma «cortina de fumo» a esconder a continuidade desta política; é um projeto
completamente vazio de conteúdo, com uma ou outra habilidade política, porque de concreto, relativamente ao
problema central do avanço do desenvolvimento do regadio, o projeto vale zero, Srs. Deputados!! Apenas
serve para esconder os cortes que o Governo e o Ministério da Agricultura fizeram no PRODER para o
regadio. Esta, sim, é que é a verdade!
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Abel Baptista.
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: No final do debate sobre estes
projetos de resolução, não deixa de ser curioso o facto de o Partido Socialista vir dizer aqui, hoje, que nós
queremos acabar com o Alqueva.
Não, Sr. Deputado Luís Pita Ameixa! Nós não queremos acabar com o Alqueva! Nós queremos executar o
Alqueva em condições que permitam a viabilidade dessa execução,…
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — … em que seja possível ter o dinheiro e não estabelecer apenas um
calendário, faltando depois «aquilo com que se compra os melões»… Já que falamos de agricultura, falta o
dinheirinho, Sr. Deputado! É preciso colocar lá o dinheiro para se poder executar, que é o que queremos e o
que estamos a fazer.
Ouvimos agora o Sr. Deputado Agostinho Lopes acusar este Governo, mas o Sr. Deputado enganou-se,
porque não era este Governo que tinha de acusar, mas, sim, os anteriores!
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Foram 20 anos de política de direita, vossa e do PS! Foram 20 anos!
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — A execução está abaixo da média, não por culpa deste Governo, mas
por culpa dos governos anteriores!
O Sr. Pedro Lynce (PSD): — É verdade!
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Relativamente ao que está previsto para os próximos anos, todas as
soluções que estão em cima da mesa permitirão executar a obra do PRODER, eventualmente não em 2015,
conforme o Partido Socialista antecipou na recalendarização que fez da obra, sem lhe atribuir os meios
financeiros necessários…
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O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Queira fazer o favor de concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Termino já, Sr. Presidente.
Sobretudo, há que executar esta obra bem fundamental para a região, sem esquecer, no entanto, todo o
regadio a nível nacional. É por isso que propomos — e foi assinado em sede de concertação social — a
possibilidade de alterar o financiamento do Alqueva no QREN e não no PRODER.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro do Ó
Ramos.
O Sr. Pedro do Ó Ramos (PSD): — Sr. Presidente, o Sr. Deputado Luís Pita Ameixa não esqueceu,
certamente, que foi um governo do PSD que decidiu avançar com este investimento.
O Sr. Pedro Lynce (PSD): — Bem recordado! Bem recordado!
O Sr. Pedro do Ó Ramos (PSD): — Sr. Deputado, tenho de dizer-lhe o seguinte: não leu, com certeza, o
projeto de resolução e não ouviu a minha intervenção, o que tenho de lamentar!
De facto, como se recorda, o Alqueva era um projeto multifuncional: previa obra, formação e
comercialização. Os senhores executaram a obra, mal! — recordo a infraestrutura de Odivelas —, mas
deixaram cair a comercialização e a formação…, abandonaram-nas, pura e simplesmente!
O Sr. Pedro Lynce (PSD): — Exato! Bem lembrado!
O Sr. Pedro do Ó Ramos (PSD): — Portanto, neste momento, dos 50 000 ha que deviam ser regados,
provavelmente só serão 30 000 ha. Seria o mesmo que dizer: vamos avançar com a obra e, depois, não há
dinheiro! Na altura em que foi feita a negociação, deviam ter incluído o Alqueva no QREN, e não no PRODER!
Aplausos do PSD.
Sabe porquê, Sr. Deputado?
O Sr. Pedro Lynce (PSD): — Porque não quiseram!
O Sr. Pedro do Ó Ramos (PSD): — Os senhores, no âmbito do PRODER, excluíram o regadio individual.
Mas os 200 milhões de euros que foram assegurados na semana passada vão permitir que esses agricultores,
em termos de regadio individual, possam ter acesso a ele, de facto.
Sr. Deputado, não venha falar de má consciência, porque má consciência têm os senhores, que agora
dizem que a obra tem de ser concluída, mas não deixaram lá o dinheiro para a concluir. Isto, sim, é que é
lamentável!
Vozes do PSD: — Muito bem!
Protestos do Deputado do PCP João Oliveira.
O Sr. Pedro do Ó Ramos (PSD): — Queria terminar, dizendo que o Governo está muito empenhado em
concluir o Alqueva, mas em concluí-lo eficazmente e da forma possível, isto é, com dinheiros que vamos
conseguir trazer de Bruxelas.
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Sr. Deputado Luís Pita Ameixa, o Partido Socialista nunca quis ir por este caminho, um caminho muito mais
fácil, realista e possível de concretizar. Os Srs. Deputados não quiseram ver esta situação e isso prejudicou,
de facto, a agricultura portuguesa.
Sr. Deputado, a decisão da semana passada defende os agricultores portugueses, defende o sul do País e
defende Portugal!
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Sr.as
e Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, dou por
concluído o debate do projeto de resolução n.º 86/XII (1.ª).
Vamos iniciar a discussão conjunta dos projetos de resolução n.os
182/XII (1.ª) — Recomenda ao Governo
que promova o estabelecimento de uma concorrência saudável no setor do leite e produtos lácteos, reabra a
discussão do regime de quotas leiteiras nos fóruns próprios da União Europeia e defenda intransigentemente a
sua manutenção na regulamentação comum do leite e produtos lácteo (CDS-PP) e 185/XII (1.ª) —
Recomenda medidas urgentes a adotar pelo Governo que visam a sustentabilidade do setor leiteiro (PSD).
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Abel Baptista.
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: O CDS, na oposição ou com
responsabilidades de Governo, não deixa de manter uma das suas mais prestigiadas ações junto dos
agricultores — a defesa da qualidade de vida dos agricultores e a defesa da produção nacional. Aliás, esta é
uma questão que tem vindo a ser muitas vezes apregoada e muito pouco praticada.
É de referir que foi por ação do CDS que o relatório final da Autoridade da Concorrência, elaborado em
2010, já apontava para relações comerciais entre a distribuição e os fornecedores com alguma volatilidade de
preços (este era o termo usado na altura). O certo é que a Autoridade de Segurança Alimentar e Económica
(ASAE), no início do mês, fez uma apreensão de leite importado na ordem dos 323 000 litros, pelos dados
mais recentes, o que teve a ver, eventualmente, com prática ilegal de dumping, que desfavorece a produção
nacional. Aliás, no âmbito do Governo, foi criada a Plataforma de Acompanhamento das Relações na Cadeia
Agroalimentar (PARCA), por despacho de 15 de novembro do ano passado, grupo que tem estado a trabalhar
também no âmbito do incentivo e apoio à fileira do leite.
Obviamente, não poderíamos deixar de apresentar aqui uma recomendação muito concreta ao Governo,
primeiro no que diz respeito à questão interna no âmbito da concorrência, para que se promova o
estabelecimento de uma concorrência saudável no sector do leite e dos produtos lácteos. Mas, dada a
situação em que nos encontramos em termos de calendário, a nossa recomendação é também no sentido de
se fazer uma discussão do regime das quotas leiteiras e de, na discussão da política agrícola comum, haver
uma defesa destas quotas da parte de Portugal, não aceitando de forma fácil a sua supressão, tal qual
aconteceu no governo do Partido Socialista, nomeadamente com o ex-Ministro Jaime Silva, que se rendeu ao
fim das quotas sem qualquer tipo de oposição, o que aqui queremos retomar para defesa da agricultura
portuguesa.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Alves.
O Sr. Pedro Alves (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: O setor agrícola tem caraterísticas tão
próprias que o tornam detentor de uma especificidade única. Muitos criticam, sem conhecer nem perceber, a
dimensão do apoio público que o sector agrícola tem e deve continuar a ter.
Os efeitos da política agrícola comum na agricultura portuguesa são profundos e mudaram radicalmente a
sua face ao longo dos últimos anos. O sector inovou, modernizou-se e, com muito esforço, tem conseguido ser
competitivo em algumas fileiras. No entanto, é certo que continuam por resolver questões de produtividade,
como sejam a organização económica dos produtores e das cooperativas.
Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Portugal precisa de um setor agrícola forte e sustentável, em que a
cooperação entre todos os agentes do setor agroalimentar seja o complemento de políticas públicas estáveis.
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Porém, residem vários fatores que provocam desequilíbrios no sistema de produção, desde logo a relação
complexa e distorcida entre a produção e a grande distribuição, cujos problemas têm vindo a agravar-se nos
últimos anos.
No caso do leite, o desequilíbrio é cada vez mais acentuado. O setor do leite enfrenta não só uma
concorrência dos produtos de marca branca, que são objeto de agressivas campanhas publicitárias por parte
da grande distribuição, recentemente noticiadas, como está também impedido de refletir no produto o custo de
produção, em que as matérias-primas parecem estar numa espiral inflacionista, obrigando a vender o produto
abaixo do custo para escoar a produção.
Perante este desequilíbrio negocial desfavorável aos produtores e fornecedores, reconhecido pelo
Presidente da Autoridade da Concorrência em Outubro de 2010, o PSD entende que é urgente que o Governo,
em colaboração com a Autoridade da Concorrência, aprofunde a transparência das relações comerciais juntos
dos consumidores. Para tal, consideramos que deve ser obrigatória a indicação da origem na rotulagem de
todos os produtos de marca branca em local bem visível e que a Autoridade da Concorrência procure justificar
o diferencial de preços entre os produtos de marca branca e os produtos de marca própria em relatórios
trimestrais e os divulgue em sítio na web.
Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: No sector leiteiro, que representa 2000 milhões de euros para a
economia portuguesa e garante cerca de 100 000 postos de trabalho, residem outros fatores preocupantes
para a sua viabilidade económica e social, desde logo o facto de o sector ser composto predominantemente
por explorações de difícil reconversão, sobretudo após os elevados investimentos tecnológicos que foram
sendo efetuados pelos produtores, com amortizações a médio prazo.
Acresce ainda que o fim das quotas de produção previsto para 2015, que o PSD vem denunciando desde
2002 como um erro grave para a economia nacional, irá agravar ainda mais a competitividade destas
explorações face aos parceiros comunitários. Assim, o PSD defende que no próximo quadro comunitário de
apoio, a vigorar entre 2014 e 2020, exista um apoio específico para o sector do leite, que garanta um
mecanismo de transição complementar ao fim do regime das quotas leiteiras, caso não seja mesmo possível
adiar o fim deste mecanismo, decisão que deve ser defendida pelo Governo português.
Entendemos também que deve ser incentivado o reforço do associativismo entre os produtores de leite a
jusante da cadeia produtiva, com vista à redução dos custos da aquisição dos fatores de produção, à
semelhança do que acontece a montante.
Por último, o PSD congratula-se com a decisão do Governo de criar uma Plataforma de Acompanhamento
das Relações na Cadeia Agroalimentar, cujo objeto reside na resolução de conflitos e na promoção de
diálogos de entendimento, e espera que as soluções apresentadas, também com este nosso contributo,
possam melhorar as relações entre toda a cadeia agroalimentar.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Freitas para uma
intervenção.
O Sr. Miguel Freitas (PS): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Queria começar por dizer que é muito
importante podermos discutir em Plenário a questão do leite, mas esperava, sinceramente, por parte do CDS e
do PSD, uma nova abordagem a esta questão. Devo dizer que a lógica de mostrar serviço que está por detrás
da apresentação destes dois diplomas, de facto, pode ser eloquente, mas leva a afirmações muito graves.
O CDS, no seu projeto de resolução, diz que a ASAE só atuou porque o Governo mandou. Ora, esta é uma
afirmação muito, muito grave. Dizer que a ASAE atua hoje em função de instruções políticas por parte do
Governo é uma afirmação que, naturalmente, o PS reputa da maior gravidade.
Aplausos do PS.
O CDS vem dizer uma coisa que toda a gente — e o próprio Governo — já disse, isto é, que o Governo tem
de defender em Bruxelas as quotas leiteiras, mas aqui não trouxe nada de novo. O que o CDS deveria estar a
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dizer, neste momento, é que é necessário que o Governo comece a preparar cenários alternativos
relativamente a esta matéria.
Por questões de princípio, também consideramos que a matéria das quotas leiteiras é muito importante
para Portugal,…
O Sr. Pedro Lynce (PSD): — Capoulas Santos não pensou isso!
O Sr. Miguel Freitas (PS): — … mas aquilo que o Governo devia estar a fazer era a estudar os cenários
alternativos.
Referindo-me agora ao projeto de resolução do PSD, direi que esse diploma traz elementos mais concretos
do que o projeto de resolução do CDS, mas é muito curioso o PSD vir apresentar propostas com medidas
urgentes — repito: medidas urgentes — para o sector leiteiro quando se trata de uma proposta no sentido de
que haja uma ajuda a partir de 2014. Ora bem, não nos revemos na urgência do PSD relativamente a este
sector. O sector precisa de medidas hoje e não em 2014, e, portanto, propor como uma medida urgente para o
sector do leite uma ajuda em 2014 parece-nos, no mínimo, desfasado da urgência e da necessidade de
medidas para este sector.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Lopes para uma
intervenção.
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Percebemos bem a causa da
«agitação agrícola» do CDS e do PSD. Depois de tudo o que disseram nesta Casa, e fora dela, sobre a
grande prioridade nacional que era a agricultura, estamos a assistir à continuidade da política agrícola de
sempre, de desastre para a agricultura portuguesa.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É verdade!
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Não é verdade!
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — E quem desencadeou a intervenção da ASAE, Sr. Deputado Abel
Baptista, não foi nem a Sr.ª Ministra nem a PARCA — como, aliás, a Sr.ª Ministra me disse —, foi a luta dos
agricultores no dia 7 de janeiro, foi a denúncia dos produtores e das organizações agrícolas logo nos primeiros
dias de janeiro!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Estes projetos de resolução são um extraordinário exercício de ruído
político, mas diga-se que não é por incompetência dos Deputados do PSD ou do CDS.
Em relação à liquidação das quotas leiteiras, o CDS e o PSD estão sem nenhuma confiança na sua
Ministra da Agricultura. Então, a Sr.ª Ministra já disse nesta Casa, três vezes, que assumia o compromisso
solene de combater a liquidação das quotas leiteiras e apresenta-se um projeto de resolução em que duas das
três recomendações são no sentido de a Sr.ª Ministra combater o fim das quotas leiteiras?! Que desconfiança,
Srs. Deputados do CDS!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Estão desconfiados!
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Mas mais grave e significativo é o facto de o CDS-PP e o PSD
passarem ao lado do que está a acontecer: as quotas não vão ser liquidadas em 2015! Como já dissemos,
inclusive à Sr.ª Ministra, as quotas estão a ser liquidadas paulatinamente, todos os anos, pelo aumento anual
da quota de cada de país em 1%.
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O Sr. Pedro Lynce (PSD): — Com a ajuda de Capoulas Santos!
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — São cerca de 2,8 milhões de litros de leite anuais ao nível da União
Europeia! É a tal «aterragem suave» das quotas leiteiras inventada por Bruxelas!… Estes aumentos estão a
produzir excedentes, inclusive com alguns países a ultrapassarem as quotas atualizadas sem pagarem multas,
como a Dinamarca, a Holanda e a Áustria. E são esses excedentes que vão sendo «despejados» em Portugal
a preços de saldo, como o CDS diz no seu projeto de resolução.
Este processo já devia ter sido (e tem de ser) interrompido, senão, quando chegarmos a 2015, as quotas já
não valem nada, vamos «assobiar às botas» as quotas que então ficarem, se ficarem, Srs. Deputados!
Percebemos, porém, por que é que o CDS, o PSD e até o PS não dizem nada sobre este assunto: porque
estiveram de acordo com as duas resoluções do Conselho de Ministros da Agricultura, de março e de
dezembro de 2008, que decidiram este processo de liquidação das quotas leiteiras.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Bem lembrado!
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — O CDS-PP acha também que as conclusões do grupo de peritos de alto
nível da União Europeia são uma «boa ajuda», não obstante prosseguirem a estratégia e a meta de liquidarem
as quotas leiteiras e de entregarem os preços do leite no futuro aos inarráveis mercados de futuros, isto é, à
«roleta» das bolsas de futuros, Srs. Deputados.
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Sr. Deputado, peço-lhe que conclua.
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Concluo já, Sr. Deputado.
E o PSD e o CDS-PP não acham estranho, nem contraditório com as suas preocupações relativamente ao
setor leiteiro, que a Ministra, na reprogramação do Programa de Desenvolvimento Rural (PRODER) que tem
em curso, faça um corte de cerca de 20 milhões de euros no pacote específico de 50 milhões de euros que
existia para apoiar exatamente o fim das quotas leiteiras.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — O PSD até quer mais dinheiro! Então, porque é que a Sr.ª Ministra está
cortar nos 50 milhões de euros que estão destinados ao setor do leite neste momento?
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Sr. Deputado, tem mesmo de terminar.
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr. Presidente, termino já.
Tenho pena de não poder falar da concorrência e das preocupações que o CDS devia explicitar quanto ao
monopólio da Lactogal, ou seja, contra a organização dos produtores. Porque é que estes partidos não dizem
uma palavra,…
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Sr. Deputado, tem mesmo de concluir! Os tempos são acordados
em Conferência de Líderes.
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — … falando dos rendimentos dos produtores de leite, dos custos dos
fatores de produção?
Muito obrigado, Sr. Presidente.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.
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O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr. Presidente, Sr.as
Deputadas, Srs. Deputados: A primeira interrogação que
se coloca é qual a razão de existirem dois projetos de resolução, um do CDS e outro do PSD. Normalmente
vêm sempre em conjunto, mas desta vez veio cada um pelo seu pé. E percebe-se a razão: o CDS ainda quer
tentar disputar a ressurreição das quotas leiteiras e o PSD já acha que isso é tempo perdido e prefere antes
um subsídio para um período de transição.
Já percebemos, pois, que há aqui uma diferença de política, o que motiva a existência de dois projetos de
resolução sobre a mesma matéria, cada um com a sua autonomia.
Gostaria de dizer que lutar pela continuação das quotas e por todos os mecanismos de apoio à produção é
favorável e necessário para o nosso País. Essa questão não será, neste momento, significativa, porque o
problema é o encurtamento das margens de comercialização que a produção tem. E se há nos projetos de
resolução qualquer coisa que indica a necessidade de combater o dumping nos preços e de agir ao nível da
concorrência, o que poderemos acompanhar facilmente, o problema não é esse. O problema é que, com
quotas fixadas ou não, com ou sem subsídios de transição, se a partir de 2015 não houver alterações do ponto
de vista da política da União Europeia que garantam obrigatoriedade de escoamento da produção nacional —
o que terá de ser desafiado ao ordenamento comunitário —, é evidente que será uma produção a caminho da
decadência, da completa vacuidade, porque a grande distribuição socorre-se do leite a mais baixo custo, que
pode comprar em quaisquer outros mercados.
Há aqui, objetivamente, um antagonismo completo. Se não há qualquer mecanismo de proteção da
produção nacional, independentemente da perequação dos fatores que concorrem para o nivelamento dos
preços (e hoje há essa plataforma de acompanhamento sobre a qual mantemos um grande ceticismo), a
verdade é que se não houver essa imposição não há mecanismo de quota nem de subsídio que resolva o
problema do definhamento da capacidade de produção nacional. Creio ser este o ponto em que os projetos de
resolução do CDS e do PSD, embora diferentes, não chegam a atingir nenhuma solução alternativa.
Era bom que aprofundássemos este problema. Era bom que tivéssemos propostas mais amplas em
Bruxelas do que as que têm sido consentidas até agora.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís
Ferreira.
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: De facto o escoamento da
produção e dos preços à produção é um dos graves problemas da agricultura nacional, mas não é o único.
Seria bom não esquecer a questão do preço dos fatores de produção, a questão do crédito bancário, a
questão do encerramento definitivo de grande parte das medidas do PRODER, nomeadamente a medida da
modernização, a questão do licenciamento e da sanidade animal, e por aí fora.
Mas também seria bom não esquecer que este estrangulamento dos preços à produção, este domínio
impensável e suicida de três ou quatro grupos económicos de todo o comércio a retalho acaba por ser o
resultado das políticas dos vários governos ao nível do licenciamento, ao nível dos horários de abertura das
grandes superfícies, ao nível de uma política que coloca no mesmo patamar o pequeno e o grande comércio e
que continua a permitir campanhas falsas e enganadoras ao consumidor, que violam a lei da concorrência e
que são altamente lesivas do interesse nacional.
Foram estas políticas, em relação às quais, aliás, os partidos proponentes, como se sabe, também têm
responsabilidades, que permitiram a instalação de verdadeiras plataformas logísticas, que são as grandes
superfícies, que funcionam como autênticas embaixadas na promoção do produto estrangeiro e que levaram a
que estes agentes económicos estejam hoje no «top 10» dos principais importadores, ultrapassando já —
pasme-se! —, algumas empresas ligadas ao ramo da energia e do setor automóvel.
Apesar de não estarmos em desacordo com estes projetos de resolução, apresentados pelo PSD e pelo
CDS-PP, teremos de dizer que estamos a falar de medidas meramente paliativas que não resolvem o fundo da
questão.
Entendemos que tem de haver uma regulamentação forte das marcas brancas, uma política restritiva
relativamente à abertura de novas grandes superfícies comerciais, que é necessário revogar o Decreto-Lei n.º
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111/2010, de 15 de Outubro, que veio permitir a abertura das grandes superfícies aos domingos e feriados,
mas também que é necessário restringir os horários de abertura nos restantes dias e obrigar estes agentes
económicos a possuírem a opção pelo produto nacional. Trata-se, aliás, de matérias que Os Verdes já
trouxeram para discussão nesta Assembleia, mas que, infelizmente, como se sabe, não foram aprovadas.
Vamos esperar para ver como o PSD e o CDS-PP se vão posicionar, quando, em fevereiro, for novamente
discutido em Plenário o projeto de lei de Os Verdes que visa impor limites ao horário de funcionamento das
grades superfícies comerciais. E digo que vamos esperar para ver, porque o PSD e o CDS estão agora
preocupados com a questão.
A nosso ver, para que a sustentabilidade do setor leiteiro seja uma realidade, é ainda necessário que o
Governo recue em relação ao corte do financiamento público à sanidade animal e na decisão de cortar 290
milhões de euros no financiamento nacional do PRODER. É necessário também que o Governo intervenha no
preço dos fatores de produção, principalmente no custo da energia, repondo a eletricidade verde aos níveis de
2006. Aliás, esta seria a oportunidade de o PSD e de o CDS-PP corrigirem aquilo que tanto criticaram e que
consideraram, na altura, um monumental erro: o facto de o ex-Ministro Jaime Silva ter extinguido essa ajuda.
Mas, sobre esta matéria, ambos os projetos de resolução, tanto o do PSD como o do CDS, são
completamente omissos, o que é pena. Pode ser que fique para a próxima!
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Abel
Baptista.
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Não estamos na mesma, …
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Pois não, estamos pior!
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — … e só pode afirmar o contrário quem não está a acompanhar esta
questão.
Nesta matéria estamos diferentes, e para melhor. Aliás, foi a primeira vez que se verificou que a ASAE
procedeu à apreensão de produtos agrícolas importados por suspeita da prática ilegal de dumping. Não
estamos, pois, na mesma, e estamos melhor, porque foi criada a plataforma de acompanhamento de relações
na cadeia agroalimentar criada em novembro, que tem estado a trabalhar e tem dado bons resultados para o
setor produtivo da área da agricultura. No ano passado, foi a primeira vez que o Ministério da Agricultura
terminou o ano com a execução total da verba disponibilizada, em termos do PRODER.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Não estamos, pois, na mesma; estamos melhor!
Protestos do Deputado do PCP Agostinho Lopes.
Srs. Deputados, para além de não estarmos na mesma, estamos a mostrar serviço, usando as palavras do
Sr. Deputado Miguel Freitas, do PS. E é nosso dever mostrar serviço a favor dos agricultores e da agricultura
portuguesa.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — O Partido Socialista não mostrou serviço durante os seis anos em que
governou, mas nós, PSD e CDS-PP, já o fizemos em seis meses, e temos muito orgulho nisso, Sr. Deputado.
E mesmo quando o Governo já o está a fazer e diz que quer continuar a fazer, temos orgulho em mostrar
serviço, porque há uma posição política que queremos assumir e que compete a esta Assembleia da
República, que é assumir politicamente o seu dever e valorizar o produto nacional, valorizar o que é nosso,
não só no que dizemos mas também no que fazemos.
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Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Tem a palavra, dispondo de 18 segundos, o Sr. Deputado Miguel
Freitas.
O Sr. Miguel Freitas (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ouvi a segunda intervenção do Deputado do
CDS e não ouvi uma explicação clara relativamente a esta questão.
Reafirmo que o CDS, no seu projeto de resolução, diz que a ASAE atuou porque o Governo mandou. É
isso que está expresso, dizendo que o Ministério reuniu com a APED (Associação Portuguesa das Empresas
de Distribuição), a qual reconheceu a existência de situações menos transparentes, tendo sido o Governo que
encaminhou as denúncias para as entidades fiscalizadoras, levando-as a atuar.
Volto, pois, a repetir: o CDS diz que a ASAE atuou porque o Governo mandou e não esclareceu esta
questão aqui em Plenário.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Srs. Deputados, concluído este ponto da nossa ordem do dia,
passamos à apreciação da petição n.º 87/XI (1.ª) — Apresentada por António Martins Moreira e outros,
solicitando à Assembleia da República a redução dos salários dos gestores das empresas públicas e/ou
participadas com capitais públicos, entre 20% e 80%, e a eliminação de bónus e prémios deles emergentes,
revertendo as verbas para a constituição de um fundo de reserva para acudir a situações de maior gravidade
económico-social.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Santos.
A Sr.ª Isabel Santos (PS): — Sr. Presidente, Sr.as
Deputadas e Srs. Deputados: Permitam-me que, antes
de mais, dirija uma saudação aos 4909 subscritores desta petição, que hoje trazem aqui um tema recorrente
no debate produzido nesta Câmara e na reflexão produzida por todos nós e que ganha, numa fase em que
está a ser exigido um esforço suplementar a todos os portugueses e, em particular, aos muitos trabalhadores
da Administração Pública portuguesa, uma particular relevância e um particular interesse.
Mas boa parte da temática desta petição, ou seja, a redução das remunerações dos gestores das
empresas públicas e das empresas participadas do Estado, já está ultrapassada em função de diversas
alterações ocorridas ao longo dos últimos tempos. Primeiro, pela suspensão das remunerações variáveis a
partir de 2010, uma medida que se estende até 2013 devido a uma proposta inscrita no Orçamento do Estado
de 2011. E desde 2011 que se verificou também um corte nestas remunerações semelhante ao corte
produzido nas remunerações de todos os funcionários da Administração Pública.
Mais recentemente, o Governo legislou nesta matéria, tendo produzido a revisão do estatuto dos gestores
públicos. O próprio Partido Socialista tinha anunciado a intenção de apresentar uma iniciativa legislativa nesse
sentido, em Outubro do ano passado, propondo nessa altura que essas remunerações ficariam indexadas ao
vencimento do Presidente da Assembleia da República, mas que não poderiam ultrapassar o valor da
remuneração do Primeiro-Ministro.
O Governo legislou no sentido de que estas remunerações tenham exatamente como teto a remuneração
do Primeiro-Ministro.
Está assim ultrapassado desta forma, e de uma forma que nos parece responsável, este desiderato,
porque se estabelece aqui um teto máximo que não só moraliza, face à décalage que existe entre os
vencimentos destes gestores públicos e dos próprios funcionários da Administração Pública e até dos próprios
interventores políticos que os nomeiam, mas também estabelece um limite que é importante ter em conta face
às restrições orçamentais com que todos nos deparamos.
Assim, estando ultrapassado este objetivo, o compromisso do Partido Socialista com estes subscritores é o
de que acompanharemos a aplicação do diploma que entrou recentemente em vigor — foi publicado a 18 de
janeiro deste ano — e que estaremos abertos a qualquer possível alteração que, no decurso de um período
razoável da sua aplicação, se venha a verificar ser necessária.
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O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Tem de concluir, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Isabel Santos (PS): — Concluo em segundos, Sr. Presidente.
Mas também quero aqui dizer que estaremos atentos em relação a uma outra matéria alvo desta iniciativa
legislativa do Governo, que tem a ver com o recrutamento e a seleção destes gestores públicos. Mesmo antes
da nomeação da comissão de recrutamento e seleção — pasme-se! —, todos estes gestores públicos estão a
ser nomeados a uma velocidade assustadora. Estaremos, pois, atentos.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Afonso
Oliveira.
O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Um dos indicadores da qualidade
da democracia é revelado pela capacidade que os cidadãos têm para intervir e participar de forma ativa na
vida do País.
O direito de petição é um inequívoco instrumento de participação política, democrática e pertence por
inteiro aos cidadãos.
Em nome do Grupo Parlamentar do PSD, quero saudar os 4909 cidadãos que subscreveram esta petição,
porque exerceram um dos gestos coletivos mais significativos da participação cívica e da necessária ligação
entre eleitos e eleitores. Saúdo-os por isso.
Esta petição, que deu entrada na Assembleia da República na anterior Legislatura, tem como objeto, como
já foi aqui referenciado, a redução dos salários dos gestores das empresas públicas e/ou participadas com
capitais públicos.
Importa, a este propósito, referir que a matéria da remuneração dos gestores públicos tem merecido uma
grande discussão na sociedade portuguesa nos últimos anos e particularmente num tempo em que a realidade
tem vindo a exigir um enorme esforço a todos os portugueses.
É, por isso, o momento de sublinhar que o atual Governo assumiu, de forma inequívoca, e tem vindo a
afirmar a necessidade de racionalização do sector empresarial do Estado e de tratar, de forma clara e
adequada, a matéria das remunerações dos gestores públicos.
Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: A boa notícia, nesta matéria como em muitas outras, como já foi
referenciado pela Sr.ª Deputada Isabel Santos, do Partido Socialista, é que o Governo, nesta matéria de
grande importância, agiu e aprovou (há aqui uma grande diferença) o Decreto-Lei n.º 8/2012, publicado no
Diário da República, em 18 de janeiro.
O Sr. Pedro Lynce (PSD): — Muito bem!
O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Pretende-se, com este diploma, assegurar a observância de critérios de
transparência, isenção e mérito. Alteram-se as remunerações, prémios de gestão e outros benefícios dos
gestores públicos, promovendo-se a transparência, a eficiência e a ética, com a fixação de valores máximos
de remuneração.
Altera-se, ainda, o regime de indemnizações dos gestores públicos e as situações de acumulação de
remunerações. Destaco o artigo 28.º, que, no seu n.º 1, refere que «A remuneração dos gestores públicos
integra um vencimento mensal que não pode ultrapassar o vencimento mensal do Primeiro-Ministro».
Fica para todos muito claro que o atual Governo não «assobiou para o lado» e teve a coragem de alterar as
regras do jogo e legislar numa matéria da maior importância.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — É esta, e bem, a atitude do Governo: atuar, com determinação, sobre
matérias estruturantes e que revelam o caminho que temos de percorrer.
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Foi também com uma atitude de cidadania que os subscritores desta petição a fizeram chegar a esta
Assembleia e ajudaram ao debate.
Concluo, cumprimentando, mais uma vez, os subscritores pela sua ação e pela preocupação que nos
manifestaram.
Quero também referenciar aqui a atitude, que me pareceu muito correta, da parte do Partido Socialista, na
anterior intervenção. Acho muito bem que acompanhe a aplicação deste diploma. Parece-me uma atitude
correta.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe
Soares.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Em primeiro lugar, quero deixar
um gesto de saudação aos peticionários que tiveram na sua cidadania ativa o trabalho, mas também a
disponibilidade suficiente para trazer a esta Assembleia um debate que assume toda a importância.
Eles deram voz à indignação perante a injustiça que estava aos olhos de todos e que demonstrava que,
não existindo limites para os salários dos gestores públicos, também não existia, na prática, dignificação para
essa atividade, pois era o abuso que imperava e que estava aos olhos de todos.
O Bloco de Esquerda já defendeu no passado — e fê-lo de forma veemente — que tinha de existir um
limite para os salários dos gestores públicos. Nesse sentido, criámos a seguinte regra, que nos parecia
essencial: quem era nomeado não podia ganhar mais do que quem nomeava. Isto demonstrava a dignificação
que queríamos trazer a este debate. É que, para nós, a realidade «entrava pelos olhos dentro»: vencimentos
absolutamente absurdos, elevadíssimos e que passavam completamente à margem do que era todo o sistema
remuneratório dos titulares de cargos públicos.
Quando se pediam sacrifícios às portuguesas e aos portugueses, percebíamos que muitos dos sacrifícios
eram pedidos para depois se dar nestes vencimentos completamente milionários parte do abuso, pelo que não
era aceitável ter este discurso perante os portugueses.
O Governo agiu, depois de o PSD e o PS terem chumbado esta proposta do Bloco de Esquerda, assim
como as de outros partidos, nesta Assembleia.
De facto, o Governo agiu, recentemente, estabelecendo na lei a regra de que o limite para o salário dos
gestores públicos é o vencimento do Primeiro-Ministro, havendo a possibilidade de uma majoração de 40% no
que diz respeito a ajudas de custo.
Mas, ao criar a regra, o Governo criou também a exceção à regra, colocando as duas em lei. Por isso,
percebemos que há aqui uma lei «de fachada», ao dizer-se que é o mercado que dita quem pode, ou não,
recorrer ao abuso. E esta é uma política recorrente neste Governo: o mercado manda, o Governo cede e a
injustiça pode continuar a ser cometida.
Esta lei também diz que caberá a uma comissão de recrutamento escolher os melhores pelas suas mais-
valências técnicas, pela sua capacidade. Porém, na prática, verificamos que são as nomeações em catadupa
a regra que o Governo criou, passando, no fundo, à margem da aplicação desta lei.
Por isso, neste contexto e perante esta realidade, o Bloco de Esquerda insistirá em que o caminho se faça
até ao fim: não basta uma lei que permita a exceção; é preciso acabar com a exceção que dá azo à injustiça.
Assim sendo, o Bloco de Esquerda, porque considera que nesta proposta de colocação de limites aos
salários dos gestores públicos há um princípio fundamental da democracia, bater-se-á pela justiça que não se
verga, nem aos mercados.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Pinho de
Almeida.
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O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sr. Presidente, em nome da bancada do CDS-PP, quero
igualmente cumprimentar os cidadãos subscritores desta petição, que trata de remunerações dos gestores
públicos.
E sobre remunerações dos gestores públicos, há dois limites que não devem ser ultrapassados: um é o da
demagogia…
Protestos do Deputado do PCP João Oliveira.
… e outro o do despesismo. Devemos ser razoáveis na discussão desta matéria. Se, por um lado, não
podemos entrar num discurso irresponsável, não percebendo que os gestores públicos têm a dignidade dos
cargos que exercem, por outro, não podemos também ser indiferentes ao que aconteceu durante muitos anos,
que foi o facto de as remunerações destes gestores, quer as remunerações fixas quer as remunerações
variáveis, terem entrado num total descontrolo, muito acima daquilo que era a realidade do mercado.
Vozes do CDS-PP e do PSD: — Muito bem!
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — É muito interessante fazermos esta discussão neste momento
e registarmos o consenso existente na Câmara. É que, curiosamente, há precisamente um ano, quando
estávamos a fazer esta mesma discussão nesta Câmara, iniciativas do CDS e de outras bancadas
parlamentares foram, à época, rejeitadas, defendendo essas iniciativas exatamente aquilo que hoje está
consagrado na lei.
O Sr. Honório Novo (PCP): — É melhor virar-se para o seu parceiro de coligação!
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Mas ainda bem que, hoje, está consagrado na lei.
É que há uma realidade essencial que mudou: o partido que está no governo. Pode o Partido Socialista
dizer, nesta matéria como noutras, que tinha pensado fazer o que agora foi feito. Pensou, mas não fez — e
não foi por falta de tempo.
É importante dizer que não são só as remunerações dos gestores públicos que, agora, estão limitadas, por
decisão deste Governo, ao vencimento do Primeiro-Ministro; são também, como já foi dito, os prémios que
estão suspensos, enquanto durar o plano de assistência financeira. É que, como também foi dito, os esforços
são para todos. E, se são para todos, têm de ser também para esses gestores, que veem os seus prémios e
os seus bónus suspensos durante este período.
Mas também não foi só isso que mudou. Mudou, por exemplo, a dimensão dos conselhos de
administração. É que, durante muito tempo, na bancada do CDS, dissemos — e o Governo, agora, é
consequente com isso — que, em muitos casos, a dimensão dos conselhos de administração também era
exagerada. Dissemos, muitas vezes, que, onde havia sete membros no conselho de administração, poderia
haver cinco e que, onde havia cinco, poderia haver três. Pois é exatamente esse o caminho seguido por este
Governo.
Dissemos também que a seleção dos gestores deveria ser regulada. E é por isso que, neste momento,
também há mecanismos para a seleção desses mesmos gestores — e esses mecanismos são transparentes.
E já lá vou à parte da contestação…
Há também uma coisa muito importante pela qual sempre nos batemos: contratos de gestão. Estes
gestores, mesmo sendo nomeados por critérios mais transparentes e mesmo tendo remunerações mais
razoáveis, têm de ser fiscalizados pela gestão que fazem da coisa pública: têm de ter objetivos e têm de
responder por esses objetivos.
A Sr.ª Isabel Soares (PS): — Já tinham!
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — É por isso que a fiscalização dos contratos de gestão é
essencial.
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Dizem alguns Srs. Deputados que a atual regra tem exceções. Pois… Mas é que a novidade é a regra; a
exceção era a prática que já existia.
Portanto, aquilo em que este Governo inovou foi exatamente na introdução de uma regra, que é clara e
praticamente absoluta.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — O CDS dantes não falava em exceções! Agora, já fala!
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Por outro lado, dizem os Srs. Deputados que já houve
nomeações. É verdade! Na maior parte dos casos, tratou-se de reconduções daqueles que o Partido Socialista
tinha nomeado.
Protestos da Deputada do PS Isabel Soares.
Mas a novidade também não são as nomeações; a novidade é que todas estas pessoas que, agora, foram
nomeadas, ao contrário do que acontecia no passado, vão ter de se sujeitar a concurso, até ao final de 2013.
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Sr. Deputado, peço-lhe que conclua.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Concluo de imediato, Sr. Presidente.
E isso não acontece por uma regra que já existisse mas, sim, por uma regra aprovada por este Governo.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, começo também por saudar os subscritores desta petição,
que, recorde-se, deu entrada na Assembleia da República em julho de 2010.
Quero ainda expressar o acordo do PCP com os objetivos centrais desta petição, isto é, promover uma
redução dos salários dos gestores públicos em empresas públicas ou com participação do Estado, eliminando
prémios que existem em muitas delas — e que, Srs. Deputados do PS, do PSD e do CDS, continuam a existir
em algumas delas!
Devo também recordar que esta questão mereceu várias e insistentes iniciativas do PCP — e isso sucedeu
não só agora, recentemente, com o eclodir da chamada «crise», mas tem norteado a postura deste partido ao
longo dos anos. Para não ir mais longe, recordo um projeto de lei apresentado em 2005, as recorrentes
propostas apresentadas em sede orçamental (lembro-lho, Sr. Deputado João Almeida!) e, finalmente, o projeto
de lei n.º 521/XI (2.ª), apresentado na anterior Legislatura e aqui discutido há cerca de um ano, que limitava
não só as remunerações dos gestores do sector empresarial do Estado, mas também as dos órgãos diretivos
dos institutos públicos, das autoridades reguladoras (não se esqueça, Sr. Deputado!), das empresas públicas
regionais, metropolitanas, intermunicipais e municipais.
Convém recordar aqui — e o Sr. Deputado João Almeida não o disse, mas eu vou expressá-lo — que esta
limitação generalizada de salários dos gestores públicos não foi, na altura, aprovada por causa da oposição do
PS e do PSD, isto é, do bloco central, que nomeava e nomeia (agora, com a participação do CDS) esses
gestores de entre amigos e correligionários.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Bem lembrado!
O Sr. Honório Novo (PCP): — E pode dizer-se que a recente legislação aprovada pelo Governo nesta
matéria, não obstante algum progresso que se reconhece e se sublinha, cria também — e isso é indesmentível
— uma vasta série de exceções, mais parecendo uma «peneira rota» que vai poder continuar a deixar passar
os vencimentos muito acima dos do Primeiro-Ministro ou do Presidente da República, isto é, os vencimentos
dos amigos e gestores do PS e do PSD, a nomear para o setor empresarial do Estado.
Mudou-se o Governo; vai-se, ao que parece, a ética e o falso moralismo.
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Mas não é só os salários dos gestores públicos o que devemos debater a propósito desta matéria. É que,
quando o Dr. Catroga se prepara para dar o exemplo de falta de ética e de descaramento, preparando-se para
ganhar mais de 700 000 €/ano num part-time na EDP, acumulando este salário com uma milionária reforma, é
preciso dizer, Srs. Deputados, que esta não é uma decisão que possa ser remetida exclusivamente para o foro
privado — não! Os portugueses e as portuguesas, os trabalhadores, as pequenas empresas, os
desempregados vão pagar na sua fatura mensal de energia elétrica estes vencimentos obscenos praticados
nas antigas empresas nacionalizadas, que o Governo decidiu dar «de bandeja» a mãos privadas.
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Vou concluir, Sr. Presidente.
Quando somos todos nós a pagar estes salários — na Caixa Geral de Depósitos, na TAP, na CMVM, no
Banco de Portugal, na EDP ou na REN —, há que recolocar esta questão em sede política, onde ela deve ser
resolvida.
É tempo de dizer «basta!» a esta permanente atitude de Pilatos por parte deste Governo, como dos
anteriores. É tempo de dizer que não é mais suportável, Srs. Deputados, aceitar passivamente esta
austeridade mal distribuída,…
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.
O Sr. Honório Novo (PCP): — … tantos sacrifícios desiguais que nos são impostos pela troica e o seu
Memorando de agressão, tão diligentemente executado pelo PSD e pelo CDS.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Srs. Deputados, concluída a apreciação da petição n.º 87/XI (1.ª),
chegámos ao fim da ordem do dia de hoje.
A próxima sessão plenária realizar-se-á amanhã, quinta-feira, dia 26, às 15 horas, e a agenda será
oportunamente distribuída.
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.
Eram 17 horas e 22 minutos.
Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:
Partido Social Democrata (PSD)
Carlos Henrique da Costa Neves
João Bosco Soares Mota Amaral
José Mendes Bota
Maria Paula da Graça Cardoso
Partido Socialista (PS)
António Fernandes da Silva Braga
Partido Popular (CDS-PP)
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia
Partido Comunista Português (PCP)
João Augusto Espadeiro Ramos
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Deputados que faltaram à sessão:
Partido Social Democrata (PSD)
António Carlos Sousa Gomes da Silva Peixoto
Manuel Augusto Meirinho Martins
Paulo Cardoso Correia da Mota Pinto
Partido Socialista (PS)
Inês de Saint-Maurice de Esteves de Medeiros Vitorino de Almeida
José Duarte Piteira Rica Silvestre Cordeiro
Maria Odete da Conceição João
Partido Popular (CDS-PP)
Manuel Fialho Isaac
A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.