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Quinta-feira, 1 de março de 2012 I Série — Número 78
XII LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2011-2012)
REUNIÃOPLENÁRIADE29DEFEVEREIRODE 2012
Presidente: Ex.ma Sr.ª Maria da Assunção Andrade Esteves
Secretários: Ex.mos
Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco Rosa Maria da Silva Bastos de Horta Albernaz
S U M Á R I O
A Sr.ª Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas
e 5 minutos. Deu-se conta da entrada na Mesa dos projetos de lei n.
os
181 a 185/XII (1.ª), dos projetos de resolução n.os
234 a 237/XII (1.ª) e da proposta de resolução n.º 26/XII (1.ª).
Em declaração política, o Sr. Deputado João Oliveira (PCP) teceu considerações sobre o relatório de execução da lei sobre política criminal, entre 2009 e 2011, divulgado pelo Procurador-Geral da República, e sobre a impossibilidade de dar cumprimento à lista de prioridades estabelecidas. No fim, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Cecília Honório (BE), Hugo Velosa (PSD), Nuno Magalhães (CDS-PP) e Ricardo Rodrigues (PS).
Também em declaração política, o Sr. Deputado João Semedo (BE) condenou a venda do BPN ao BIC, referindo a necessidade de uma comissão de inquérito parlamentar para análise deste processo, após o que deu resposta a
pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Duarte Pacheco (PSD), Honório Novo (PCP), João Pinho de Almeida (CDS-PP) e Pedro Nuno Santos (PS).
Em declaração política, o Sr. Deputado Luís Menezes (PSD) congratulou-se com a avaliação positiva que foi feita da aplicação pelo Governo do programa de assistência financeira a Portugal e salientou as reformas estruturais que têm estado a ser implementadas. No final, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados José Luís Ferreira (Os Verdes), Catarina Martins (BE), João Galamba (PS), João Pinho de Almeida (CDS-PP) e Miguel Tiago (PCP).
Em declaração política, o Sr. Deputado Miguel Laranjeiro (PS) insurgiu-se contra as mais recentes estimativas sobre a taxa de desemprego, tendo depois respondido a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados
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Adão Silva (PSD), Jorge Machado (PCP), Mariana Aiveca (BE) e Artur Rêgo (CDS-PP).
Foram discutidos os projetos de resolução n.os
196/XII (1.ª) — Recomenda medidas que permitam relançar a cultura beterraba sacarina em Portugal (PSD) e 234/XII (1.ª) — Sobre a retoma da produção da beterraba sacarina em Portugal (PCP). Intervieram os Srs. Deputados Vasco Cunha (PSD), Agostinho Lopes (PCP), Abel Baptista (CDS-PP) e Miguel Freitas (PS).
Procedeu-se à apreciação, na generalidade, do projeto de lei n.º 10/XII (1.ª) — Alarga as condições de acesso e atribuição do abono de família (PCP), sobre o qual se pronunciaram os Srs. Deputados Rita Rato (PCP), Nilza de Sena (PSD), Mariana Aiveca (BE), Artur Rêgo (CDS-PP) e Sónia Fertuzinhos (PS).
Foram apreciados, conjuntamente, os projetos de resolução n.
os 219/XII (1.ª) — Recomenda ao Governo que
suspenda, com efeitos imediatos, o encerramento/desmantelamento dos Centros Novas Oportunidades e reforce o programa Novas Oportunidades (PS), 224/XII (1.ª) — Recomenda ao Governo a suspensão imediata do processo de encerramento dos Centros Novas Oportunidades e a assunção dos encargos relativos ao funcionamento daqueles cujo financiamento foi recusado (BE), 231/XII (1.ª) — Recomenda ao Governo a avaliação, reestruturação e manutenção dos Centros Novas Oportunidades (PCP) e 235/XII (1.ª) — Suspensão imediata do encerramento dos Centros Novas Oportunidades (Os Verdes). Proferiram intervenções os Srs. Deputados Odete João (PS), Ana Drago (BE), Rita Rato (PCP), José Luís Ferreira (Os Verdes), Isilda Aguincha (PSD), Michael Seufert (CDS-PP) e Emídio Guerreiro (PSD).
O Sr. Presidente (António Filipe) encerrou a sessão eram 18 horas e 33 minutos.
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A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que está aberta a sessão.
Eram 15 horas e 5 minutos.
Sr.as
e Srs. Deputados, antes de mais, peço ao Sr. Secretário que dê conta do expediente.
O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e
foram admitidos, os seguintes projetos de lei n.os
181/XII (1.ª) — Procede à primeira alteração à Lei n.º 9/2007,
de 19 de fevereiro, reforçando o controlo e a prevenção das incompatibilidades, impedimentos e conflitos de
interesses dos agentes e dirigentes dos Serviços de Informação da República Portuguesa (PS), que baixou à
1.ª Comissão, 182/XII (1.ª) — Informação sobre cultivo de transgénicos (Alteração ao Decreto-Lei n.º
160/2005, de 21 de setembro) (Os Verdes), que baixou à 7.ª Comissão, 183/XII (1.ª) — Cria a freguesia do
Parque das Nações, no concelho de Lisboa (BE), que baixou à 11.ª Comissão, 184/XII (1.ª) — Cria a freguesia
de Telheiras, no concelho de Lisboa (BE), que baixou à 11.ª Comissão, e 185/XII (1.ª) — Atualização
extraordinária das bolsas de investigação [Altera a Lei n.º 40/2004, de 18 de agosto (Estatuto do Bolseiro de
Investigação)] (PCP), que baixou à 8.ª Comissão.
Deram ainda entrada na Mesa, tendo sido também admitidos, os projetos de resolução n.os
234/XII (1.ª) —
Retomar a produção de beterraba sacarina em Portugal (PCP), que baixou à 7.ª Comissão, 235/XII (1.ª) —
Suspensão imediata do encerramento dos Centros Novas Oportunidades (Os Verdes), que baixou à 8.ª
Comissão, 236/XII (1.ª) — Recomenda ao Governo que proíba a importação e a comercialização de milho
transgénico MON810 (BE), que baixou à 7.ª Comissão, e 237/XII (1.ª) — Recomenda ao Governo regras
justas no diploma que regula os concursos de colocação de docentes e promoção, em 2012, de um concurso
de ingresso e vinculação nos quadros de escola dos docentes contratados (BE), que baixou à 8.ª Comissão.
Finalmente, deu entrada na Mesa a proposta de resolução n.º 26/XII (1.ª) — Aprova o Acordo de Parceria
entre os Estados de África, das Caraíbas e do Pacífico e os seus Estados-membros, assinado em Cotonou, a
23 de junho de 2000, e alterado pela primeira vez no Luxemburgo, em 25 de junho de 2005, e assinado em
Ouagadougou, a 22 de junho de 2010.
Em termos de expediente, é tudo, Sr.ª Presidente.
A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, vamos começar os nossos trabalhos com declarações políticas,
sendo que temos inscritos os Srs. Deputados João Oliveira, do PCP, João Semedo, do BE, Luís Menezes, do
PSD, e Miguel Laranjeiro, do PS.
Assim, dou a palavra, em primeiro lugar, ao Sr. Deputado João Oliveira.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: A noção de que existe em Portugal
uma justiça para ricos e outra para pobres não resulta exclusivamente da circunstância de uns poderem
suportar os custos com o acesso aos tribunais e outros não. Esse cunho de classe manifesta-se em muitas
outras dimensões da justiça, nomeadamente no plano criminal quando se torna cada vez mais flagrante a
dificuldade em investigar, julgar e punir os crimes cometidos pelos ricos e poderosos.
Como a vida tem demonstrado, é possível investigar e julgar o furto de uma embalagem de polvo e de um
champô num supermercado, tanto mais fácil e rapidamente quanto a omnipresente videovigilância facilitar e
simplificar a prova do crime. Mas se se trata de perseguir e punir o tráfico de influências, a corrupção ou o
branqueamento de capitais não há videovigilância que valha e, se porventura forem utilizados na prática do
crime uma conta bancária sedeada num paraíso fiscal ou os privilégios de um qualquer offshore não
cooperante, então, a perseguição do crime será apenas uma miragem.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!
O Sr. João Oliveira (PCP): — Ciclicamente somos confrontados com esta realidade e ciclicamente
ouvimos as mesmas afirmações fingidas de preocupação com a eficácia da investigação criminal que se
repetem como as subidas de Sísifo ao topo da montanha, rolando a pedra que sempre acabava por voltar a
cair.
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A apresentação, na passada semana, do relatório de execução da lei de prioridades da política criminal
pelo Sr. Procurador-Geral da República permitiu mais um desses momentos de encenação da farsa política já
há muito conhecida.
Perante uma lei de prioridades da política criminal que, para não ser inconstitucional, se limita a ser
absurda e inútil, o relatório da Procuradoria-Geral da República confirma o inevitável: foi impossível dar
cumprimento às prioridades legalmente estabelecidas para o biénio 2009-2011.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!
O Sr. João Oliveira (PCP): — O relatório da Procuradoria-Geral da República faz uma avaliação
relativamente extensa e aprofundada dos motivos que conduziram a tal situação e nenhum deles pode ser
considerado inesperado.
As prioridades estabelecidas na lei não foram cumpridas, porque a realidade da vida impôs que elas
fossem outras, porque quando quase tudo é prioritário nada é verdadeira prioridade, porque o Ministério
Público não dispõe dos meios técnicos ou tecnológicos necessários, porque está dependente de outros ou,
ainda, porque as leis penais continuam a ser insuficientes ou desadequadas em múltiplos aspetos.
Neste relatório são particularmente preocupantes as considerações feitas acerca da criminalidade
económica e financeira e da corrupção, particularmente se cruzarmos estes elementos com os que resultam
dos relatórios anuais da Procuradoria-Geral da República relativos aos serviços do Ministério Público.
Quando confrontamos os recursos de que dispõe o Departamento Central de Investigação e Ação Penal,
que é o departamento responsável por este tipo de criminalidade, com as dificuldades encontradas pelo
Ministério Público no combate à corrupção e à criminalidade económica e financeira torna-se facilmente
percetível que é impossível fazer do combate à corrupção uma prioridade garantindo a eficácia da
investigação criminal.
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Sr. João Oliveira (PCP): — É possível garantir o combate a este tipo de criminalidade sem dispor de
peritos e técnicos adequados, sem dispor de veículos que permitam a deslocação dos magistrados às
diligências, trabalhando em instalações degradadas sem os instrumentos informáticos necessários e sem
poder recorrer devidamente aos serviços do Estado para realizar eficazmente a investigação? Obviamente que
não!
Apesar de óbvias as conclusões do relatório da Procuradoria-Geral da República não podem surpreender
ninguém que tenha a mínima noção das condições em que funciona o sistema de justiça e a investigação
criminal, muito menos aqueles que, estando ou tendo estado no Governo, são diretamente responsáveis pela
situação existente.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!
O Sr. João Oliveira (PCP): — Mesmo assim lá acabámos por ouvir as tais afirmações de responsáveis
políticos do PS, do PSD e do CDS que, fingindo preocupação com a eficácia da investigação criminal,
continuam a sugerir como soluções as mesmas receitas que nos trouxeram os problemas.
Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: É certo que as dificuldades no combate ao crime resultam de
inúmeras circunstâncias que vão desde a falta de legislação à rapidez com que os crimes se tornam cada vez
mais sofisticados e complexos, desde a falta de meios da investigação criminal à cobertura que a própria lei
muitas vezes garante às condutas criminosas, não menosprezando alguma falta de preparação das
magistraturas e das polícias para lidar com estes fenómenos criminais.
Mas, Sr.as
e Srs. Deputados, sejamos claros: o problema central da política criminal não é o combate à
pequena criminalidade, porque para esse combate os meios serão sempre mais ajustados. O problema central
da política criminal é o combate à criminalidade grave e complexa, nomeadamente económica e financeira, e à
corrupção, e esse, antes de ser um problema dos tribunais e da justiça, é um problema político.
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É por vontade política que as leis se fazem ou se deixam de fazer! É por vontade política que as leis
permitem combater o crime ou lhe dão cobertura! É por vontade política que se disponibilizam os meios para
punir os criminosos ou se garante a sua impunidade!
Não temos a ilusão de que as opções políticas que têm imposto entraves ao combate à criminalidade
económica e financeira possam ser alteradas em função de um qualquer rebate de consciência. Elas são
opções de classe de quem serve os interesses económicos e financeiros e se preocupa apenas no discurso
com a eficácia da investigação criminal.
Não deixaremos, no entanto, de cumprir a nossa obrigação de denunciar as consequências dessas opções
e de travar a luta para a sua alteração, mobilizando todos aqueles que nela sejam parte interessada.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Inscreveram-se para pedir esclarecimentos os Srs. Deputados Cecília Honório, do
BE, Hugo Velosa, do PSD, Nuno Magalhães, do CDS-PP, e Ricardo Rodrigues, do PS.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Honório.
A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado João Oliveira, em primeiro lugar, quero
cumprimentá-lo pelas preocupantes questões que aqui trouxe hoje a debate.
O Sr. Deputado começou a sua intervenção reconhecendo que este País continua a ter uma justiça para
ricos e uma justiça para pobres — aliás, até a Sr.ª Ministra da Justiça o reconhece —, e a verdade é que esta
realidade permanece, ou seja, um pobre é condenado por um furto num supermercado mas os ricos e os
poderosos continuam a «passar pelas gotas da chuva» e continua a não haver meios adequados para o
combate ao tráfico de influências, por exemplo!…
Portanto, este País continua a viver uma justiça para os ricos e uma justiça para os pobres!
E, como se tudo isto não bastasse, a verdade é que o último debate que aqui tivemos com o Sr.
Procurador-Geral da República relativamente ao relatório do último biénio trouxe-nos preocupações
acrescidas: não há meios e as prioridades da lei não foram cumpridas. Falta quase tudo! Faltam os recursos
humanos, faltam as peritagens à altura das exigências, as peritagens são demasiado morosas, não há
técnicos que respondam a estas necessidades e o sistema informático também não responde às exigências
da lei.
O Sr. Deputado pergunta: mas porquê esta lei? O que é que ela representa objetivamente? Por isso, quero
questioná-lo: afinal, quais são neste contexto as prioridades deste Governo? Ou seja, quando os altos
responsáveis, as pessoas mais acreditadas vêm alertando o País para o facto de que o contexto de crise, de
austeridade, levará a um acréscimo da criminalidade violenta e da corrupção, a pergunta que colocamos é a
seguinte: com que meios, com que respostas este Governo vai encarar a realidade que ele próprio está a
ajudar a construir com as políticas de austeridade? Quais são as respostas? Quais são os meios?
Por isso, Sr. Deputado, a paranoia securitária da direita, que alimentou tantos discursos nesta Casa, afinal,
não tem correspondência com as medidas e com o reforço de meios necessários ao combate destes
problemas.
Assim sendo, quero perguntar-lhe, Sr. Deputado, se me acompanha no reconhecimento da evidência de
que a paranoia securitária passou ao Governo da direita e que falta quase tudo para responder aos problemas
que o País vai viver.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente: — O Sr. Deputado João Oliveira informou a Mesa de que pretende responder
individualmente a cada pedido de esclarecimento, pelo que lhe dou, desde já, a palavra.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Cecília Honório, obrigado pelas questões que
me colocou.
Obviamente que o resultado da avaliação da lei das prioridades da política criminal não podia ser diferente
daquele que nos foi apresentado pelo Procurador-Geral de República. Aliás, desde que foi aprovada nesta
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Assembleia da República a Lei-quadro da Política Criminal, passando pela aprovação das duas leis de
prioridades da política criminal, que foram aprovadas para o biénios 2007-2009 e 2009-2011, o PCP foi a força
política que se manteve coerentemente contra estas leis, denunciando aquele que seria o resultado previsível
e que hoje, afinal de contas, acaba por ser confirmado.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. João Oliveira (PCP): — Relembro este facto, porque, por vezes, pode ser criada a ideia de que
estamos perante um resultado inesperado, de que estamos perante um resultado que não era expectável com
base nas medidas que foram assumidas, com base nas leis que foram aprovadas pela Assembleia da
República e com base nas medidas que os sucessivos Orçamentos do Estado foram veiculando relativamente
à investigação criminal. Mas a verdade é que não é assim, porque este resultado era esperado, quer em
relação à lei das prioridades da política criminal, porque essa lei, para não ser inconstitucional, para não violar
a autonomia do Ministério Público e a independência do poder judicial, para não violar o princípio da legalidade
das leis penais tem, obrigatoriamente, de ser uma lei inútil, mas também porque em sucessivos Orçamentos
do Estado aprovados por estes três partidos, por esta «troica nacional» que tem alternado na governação do
nosso País, a investigação criminal não tem sido dotada dos recursos necessários para cumprir com eficácia a
missão que tem a seu cargo.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. João Oliveira (PCP): — Por isso, chegamos agora a este resultado que é, de facto, um resultado
inevitável, mas é um resultado inevitável que, como eu disse na minha declaração política, tem um cunho de
classe. E tem um cunho de classe, porque são os ricos e os poderosos que escapam às malhas da lei, quando
a lei, quando a justiça os procura punir pelos crimes que praticam.
Isto porque os exemplos que traduzem o julgamento e a condenação daqueles que são responsáveis pela
pequena criminalidade, pelas chamadas «bagatelas penais», multiplicam-se aos milhares, mas em relação a
julgamentos e a condenações pela criminalidade económica e financeira, pela corrupção, pelos chamados
«crimes de colarinho branco», aí, infelizmente, escasseiam os exemplos.
A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Concluo, Sr.ª Presidente, dizendo que escasseiam os exemplos, porque o
sistema de justiça não está dotado dos meios necessários para combater essa criminalidade que tem, de
facto, um cunho de classe; e não está dotado porque as opções políticas que, infelizmente, têm norteado a
governação do nosso país conduzem a que essa situação seja hoje uma realidade e que, infelizmente, num
futuro próximo não se adivinhem alterações substanciais.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Hugo Velosa.
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado João Oliveira, duas notas prévias e muito
breves: ouvi com toda a atenção a sua intervenção e não fiquei naturalmente surpreendido, porque é o
discurso habitual do Partido Comunista Português sobre as questões que se relacionam com a justiça penal,
nomeadamente este argumento que é sempre utilizado da falta de meios e que também foi utilizado aqui, no
Parlamento, pelo Sr. Procurador-Geral da República.
Mas, Sr. Deputado, esse não é o problema fundamental do funcionamento da justiça em Portugal. É
evidente que temos de reconhecer que neste sector, e em todos os sectores, Portugal é um país que tem
alguma falta de meios para melhor fazer, mas não é invocando permanentemente a falta de meios que nós
vamos resolver os problemas da justiça, nomeadamente da justiça penal. E deixe-me que lhe diga o seguinte:
sei que não deve ser fácil, mas o Partido Comunista tem alguma fé de que alguma coisa se vai fazer…!
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A Sr.ª Ministra da Justiça já disse, e já o disse claramente, que no âmbito da justiça penal e da justiça
processual penal vão ser introduzidas modificações substanciais que vão alterar este estado de coisas e é
bom que se diga que o relatório de política criminal que aqui foi discutido e que o Sr. Deputado invocou é um
relatório que tem a ver com leis que foram aprovadas pelo Partido Socialista. O PSD também coerentemente
não esteve com essas leis, portanto as leis sobre as prioridades da política criminal não foram leis aprovadas
pelo PSD.
Portanto, o que este Governo está a fazer, o que vai fazer e aquilo para que V. Ex.ª, e o Partido Comunista
também, estão convocados — mas sem falar nessa questão que aqui referiu de que a justiça é uma justiça de
«opção de classe», porque se formos por aí não vamos a lado algum — é para o desenvolvimento de políticas
concretas, de legislação concreta que agilize o sistema de funcionamento penal, sobretudo, processual penal
e, obviamente, para isso tem de ter mais meios.
Portanto, aquilo que nós queremos dizer — e ao contrário do que disse o Sr. Deputado — é que não foi só
o Partido Comunista que foi coerente em relação a essa matéria das prioridades da lei de política criminal.
O PSD também foi e não esteve a favor dessas leis. Por isso, é que ainda não temos lei, mas vamos ter lei
de política criminal e vamos ter alterações, sobretudo no processo penal, que vão agilizar estas matérias.
A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Termino, Sr.ª Presidente, com a seguinte questão: quero saber se o Partido
Comunista, não ponderando essa questão da «opção de classe», porque não resolve coisa nenhuma nas
questões da justiça —, se está disponível, também, para colaborar num sistema de justiça que seja mais
célere, mais eficaz e mais justo para todos os cidadãos no âmbito do processo penal.
Aplausos do PSD.
A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Hugo Velosa, para não perder tempo, em
relação à questão que coloca, devo dizer-lhe que não temos feito outra coisa senão procurar contribuir para
que estes problemas sejam resolvidos.
Aliás, quero dizer-lhe o seguinte: em relação à questão da falta de meios, obviamente que nunca nos
poderemos dar por satisfeitos em relação aos meios que estão à disposição de qualquer sistema de justiça,
seja ele qual for. Temos é a obrigação de contribuir com a dotação dos meios necessários para que o sistema
de justiça possa cumprir com um mínimo de eficácia a missão que tem a seu cargo!
Relativamente à criminalidade económico-financeira e à corrupção, a conclusão é óbvia, Sr. Deputado
Hugo Velosa: o sistema de justiça não dispõe dos meios necessários para garantir a eficácia dessa missão!
Desafio, aliás, o Sr. Deputado Hugo Velosa a ler o relatório de 2010 dos serviços do Ministério Público,
particularmente a página 99 e seguintes que dizem respeito ao DCIAP (Departamento Central de Investigação
e Ação Penal). O Sr. Deputado Hugo Velosa ficará envergonhado com aquilo que aí vai ler relativamente às
condições de trabalho daqueles magistrados e às condições que o sistema de justiça dispõe para combater a
criminalidade económica e a corrupção!
O Sr. Deputado Hugo Velosa diz que nessa ocasião o seu partido não estava no governo, mas aprovaram
o Orçamento do Estado com o Partido Socialista para esse ano, portanto são corresponsáveis pela exiguidade
dos meios que naquele ano foram postos ao dispor do Ministério Público! Disso não se podem descartar!!
E, Sr. Deputado Hugo Velosa, também não se podem descartar daquilo que são as opções centrais, nesta
matéria, tomadas na Assembleia da República, porque os senhores, com o vosso voto de abstenção,
acompanharam, viabilizaram algumas das leis de política criminal que foram aprovadas na Assembleia da
República!
Ainda um último exemplo, em 2009, abstiveram-se na lei de política criminal cujo relatório de execução
estamos agora a discutir, portanto são corresponsáveis por isso, porque acabaram por viabilizar a aprovação
dessa lei, tal como anteriormente fizeram em relação a outras medidas que hoje contribuem para que a
situação seja o que é!
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Em relação às alterações ao Código do Processo Penal, o Sr. Deputado Hugo Velosa nega que o PSD
acompanhou a revisão de 2007 executada pela maioria absoluta do Partido Socialista? Não pode negar
porque esse é um facto indesmentível em relação a essas e a muitas outras matérias! Os senhores têm
responsabilidade, como tem o PS… Por exemplo, em relação ao combate aos offshore, que são verdadeiras
zonas livres de ocultação do produto do crime e de atuação de práticas criminosas, na Assembleia da
República os senhores têm recusado consecutivamente as propostas que o PCP apresenta para dar combate
a essa realidade e, portanto, não se podem furtar às vossas responsabilidades.
A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr.ª Presidente, para terminar, quero ainda dizer ao Sr. Deputado Hugo
Velosa que não partilhamos da perspetiva da maioria e do Governo de que estas questões são uma «questão
de fé», tal como a Sr.ª Ministra da Agricultura em relação à seca… Ora, também em relação ao combate ao
crime isto não é uma «questão de fé», nem uma questão de confiarmos na lei do Criador, Sr. Deputado Hugo
Velosa! É, sim, uma questão de termos ou não propostas concretas nos orçamentos do Estado, de termos ou
não alterações ao Código de Processo Penal, de termos ou não leis que possam contribuir para a eficácia da
investigação criminal e do combate ao crime económico-financeiro e à corrupção!
E em relação a isso há uma coisa que é certa: o Sr. Deputado Hugo Velosa nunca participará num debate
em que o PCP «perca por falta de comparência», porque propostas nós temos apresentado e continuaremos a
apresentar e com fartura!
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Magalhães.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado João Oliveira, o senhor fez aqui um
diagnóstico com o qual, tirando a parte ideológica e proclamatória, no fundo não estamos em desacordo. Aliás,
partilhamos até o essencial das preocupações que o Sr. Deputado aqui trouxe em relação a uma lei das
prioridades de investigação criminal que tinha por detrás uma boa intenção e que teve alguns méritos no início
da sua execução, chamando a atenção para alguns problemas que, de resto, nesta Casa o CDS sozinho
levantava. Disso foram exemplos a violência nas escolas, o facto de haver menores com armas nas escolas, o
facto de a violência doméstica estar, infelizmente, a progredir do ponto de vista da criminalidade… Enfim, o
CDS alertou para um conjunto de matérias que o Procurador-Geral da República, de resto — numa audição
em que o Sr. Deputado esteve presente e que eu também acompanhei —, teve ocasião também de sublinhar.
Portanto, foi uma lei das prioridades de investigação criminal que teve os seus méritos, que chamou a
atenção para algumas prioridades e algum tipo de criminalidade que careciam de ser prioridade, mas esses
méritos esbateram-se naquilo que o Sr. Deputado disse e que eu não diria melhor, pois concordo em absoluto
quando diz que a partir do momento em que tudo passou a ser considerado como prioridade nada realmente
foi do ponto de vista da investigação criminal prioritário.
Portanto, estamos de acordo com esse diagnóstico, com essa opinião do Sr. Deputado — aliás, já o
dissemos publicamente, há que alterar esta lei e a maneira como ela foi feita, porque teve efeitos positivos no
seu início ou, pelo menos, em algum tipo de criminalidade, positivos no seu início, mas depois teve
consequências perversas.
Portanto, quero dizer-lhe que nesse aspeto acompanhamos as suas preocupações, como também
acompanhamos — e não é de hoje, de resto, fará certamente essa justiça — as preocupações que aqui nos
trouxe nomeadamente a falta de meios técnicos a nível das perícias da Polícia Judiciária.
É uma tarefa que o Procurador-Geral da República — e bem! — voltou a sublinhar e com a qual estamos
de acordo.
Mas, Sr. Deputado, penso que, tirando a parte meramente ideológica, legítima, mas com a qual
discordamos, o Sr. Deputado se esqueceu do caminho que está a ser feito do ponto de vista legislativo — por
exemplo, a criação de um crime de enriquecimento ilícito, que há muito o Partido Comunista Português
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também reclamava e que finalmente foi possível nesta Legislatura, com esta maioria. Por isso, até não ficaria
mal que o Sr. Deputado sublinhasse esse facto de, apesar de tudo, essa criação ter sido aprovada.
E, Sr. Deputado, estranho que diga que há uma «justiça de classe», dois dias depois de conhecidos os
números do DIAP, nomeadamente depois de a Dr.ª Maria José Morgado — que certamente não será uma
pessoa conotada com esta maioria… — vir dizer que as acusações de corrupção triplicaram o ano passado.
Portanto, Sr. Deputado, quero dizer-lhe que o cenário negro que traçou tem razão de ser nalguns aspetos,
naqueles que lhe falei das prioridades e das questões dos meios e das perícias, mas que, apesar de tudo, há
caminho legislativo feito e há caminho no terreno feito…
A Sr.ª Presidente: — Sr. Deputado, queira terminar.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Termino, Sr.ª Presidente.
Como dizia, há caminho feito no terreno nomeadamente com resultados numéricos, com o fim de terem
triplicado as acusações dos crimes de corrupção.
Agora, Sr. Deputado, antes de terminar, gostaria de fazer-lhe duas perguntas, porque o Sr. Deputado faz
este tipo de declaração política, fala sobre criminalidade, mas nós ficámos sem saber duas coisas.
Primeiro: é ou não o PCP a favor de um plano nacional de videovigilância? Eu, por força das funções que
desempenho na Assembleia Municipal de Setúbal, sei que o Partido Comunista Português em Setúbal é
favorável. É também neste Parlamento? Sim ou não?
É ou não favorável o Partido Comunista Português à generalização do julgamento rápido nos casos de
flagrante delito para qualquer caso? Para o pequeno furto, para as tais «bagatelas penais» de que o Sr.
Deputado falou, mas também para a criminalidade organizada desde que seja em situações de flagrante
delito? Repito: é ou não favorável? São estas as questões que eu gostaria de ver respondidas.
A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Nuno Magalhães, respondo-lhe começando
por utilizar uma expressão popular: «quem o ouvir não o leva preso». Quem ouvir as suas afirmações bem
intencionadas relativamente a esta questão do combate à criminalidade há-de julgar que da parte do CDS tem
havido uma inteira correspondência entre o discursos e as propostas, as posições que tem assumido na
Assembleia da República.
Pois deixe-me lembrar-lhe o seguinte Sr. Deputado: a lei-quadro da política criminal cuja eficácia ou cuja
inutilidade começa agora a ser mais do que evidente foi aprovada nesta Assembleia da República sabe com
os votos a favor de quem? Os do Partido Socialista e os do CDS-PP, e os senhores, na altura, apesar dos
alertas que nós fazíamos, apesar das preocupações que o PCP já na altura deixou bem claras relativamente à
não só possível inutilidade desta lei, mas aos próprios perigos que a lei comporta relativamente àquilo que é o
respeito pela autonomia do Ministério Público e por respeito pelo princípio da legalidade na ação penal, apesar
disso os senhores «embarcaram» no discurso do Partido Socialista, que dizia que este era o instrumento que
ia resolver todos os problemas. Afinal de contas hoje acabam por ter de reconhecer que não era mesmo um
instrumento capaz de resolver os problemas. Portanto, Sr. Deputado Nuno Magalhães, o primeiro apelo que
lhe faço é o de que oiçam com mais atenção as preocupações do PCP, têm de arrepiar caminho menos vezes!
Sr. Deputado Nuno Magalhães, independentemente do discurso que fazem, o que queremos saber é de
propostas concretas que o CDS tem para apresentar relativamente ao combate à criminalidade económico-
financeira. Não consegui fazer a impressão dos documentos, mas se o Sr. Deputado consultar a Intranet da
Assembleia da República conseguirá aceder a eles, as propostas apresentadas pelo PCP em sede de
discussão de vários e sucessivos Orçamentos do Estado, com vista ao reforço dos meios disponíveis para o
combate à criminalidade, particularmente à criminalidade económico-financeira e à corrupção. E sabe como é
que foram as votações do CDS-PP nessa matéria, como em relação em todas as propostas do PCP em
PIDDAC? Votou contra!
Porque os senhores em relação a isso conseguem colocar-se sempre contra as propostas que são
apresentadas na Assembleia da República e já a prever-se a sua contribuição para que o resultado final não
seja positivo. Os senhores conseguem mesmo «embarcar» nas propostas apresentadas com um único critério
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que é o de satisfazerem as necessidades de mediatização das vossas posições políticas, exclusivamente
preocupados com interesses de natureza partidária.
E dou-lhe um exemplo muito concreto, Sr. Deputado Nuno Magalhães: em relação às alterações que foram
introduzidas no Código do Processo Penal, que hoje são identificadas como um dos principais problemas no
combate à criminalidade complexa, particularmente na criminalidade que tem uma dimensão nacional e que
envolve a cooperação com outras autoridades judiciárias, então, os senhores acompanharam as propostas de
alteração ao Código de Processo Penal que foram aprovadas, mas hoje não querem assumir a
responsabilidade por isso!…
A Sr.ª Presidente: — Tem de terminar, Sr. Deputado.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Portanto, concluo, Sr.ª Presidente e Sr. Deputado Nuno Magalhães, dizendo
que, obviamente, estamos dispostos a acompanhar todas as propostas que permitam dar mais eficácia à
investigação criminal, não estamos é dispostos a deixar de parte o combate à criminalidade económico-
financeira e à corrupção.
E dou-lhe um exemplo concreto: se o Sr. Deputado Nuno Magalhães se relembrar do último processo de
discussão do Código de Processo Penal, recordar-se-á de que o PCP apresentou até um projeto de lei
autónomo relativamente aos processos especiais,…
A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.
O Sr. João Oliveira (PCP): — … com vista a garantir que os processos sumário, sumaríssimo e abreviado
tivessem melhores condições, para que existissem julgamentos mais rápidos, dando resposta a uma
necessidade que os magistrados e os operadores judiciários sentem todos os dias nos tribunais! Seria bom
que, em relação a essas propostas, também pudesse haver uma maioria que acompanhasse o PCP!
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Agora, tem a palavra o Sr. Deputado Ricardo Rodrigues.
O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado João Oliveira, tal como o Sr. Deputado
Nuno Magalhães, acompanho muitas das preocupações do Sr. Deputado João Oliveira. A verdade é que,
como o Sr. Deputado bem sabe, o princípio da legalidade obriga a que o Ministério Público investigue todos os
crimes. E o Sr. Deputado também sabe que essa obrigação legal pelo menos deixaria a investigação dos
crimes sujeita ao critério subjetivo de cada um dos senhores magistrados, pois cada um, pessoalmente,
poderia considerá-los prioritários ou não prioritários. Ou seja, o princípio da oportunidade é dado a cada um
dos senhores magistrados.
Aquilo que se fez na lei de política criminal foi, reconhecendo a realidade de um País que, sabemos, não
tem meios para satisfazer todas as necessidades na área da justiça, encontrar prioridades que pudessem ser
consensualizadas na Assembleia da República. Foi isso que fizemos. E essa lei foi consensual…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Consensual?
O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — … no sentido em que obteve uma maioria qualificada e a oposição do
PCP, e penso que também do BE e de Os Verdes.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Isso não é consensual!
O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Sr. Deputado João Oliveira, as perguntas que lhe faço são as seguintes:
o senhor reconhece ou não que o princípio da legalidade, sozinho e sem mais, leva a que cada magistrado
tenha de decidir pessoalmente qual é o crime que vai investigar? Se assim é, qual a legitimidade dessa opção
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pessoal do senhor magistrado? Isso pode ou não implicar um juízo de valor do seu superior hierárquico? Está
em melhores ou em piores condições com uma lei de política criminal? São essas as questões que lhe deixo.
Mas gostaria ainda de dizer que o PCP, habitualmente, não reconhece a realidade do País onde vive e
pensa que há dinheiro para fazer face a todas as necessidades. Reconhecemos que temos dificuldades em
algumas áreas da investigação criminal. Sabemos que isso é verdade, mas, de facto, fica mal à Sr.ª Ministra
da Justiça dizer que há uma justiça para ricos e uma justiça para pobres, isso estar diretamente relacionado
com a investigação criminal e a Sr.ª Ministra da Justiça não ter soluções. Ela é que a Ministra, por isso deveria
ter soluções para o problema que ela própria identifica!
Portanto, espero que a Sr.ª Ministra, a curto prazo, dê respostas (já vamos com algum tempo e a Sr.ª
Ministra não as dá), designadamente sobre a lei de política criminal.
A Sr.ª Ministra bem sabe, e todos nós sabemos, que o período de vigência da lei de política criminal cessou
em 2011. Portanto, agora, a Assembleia da República aguarda a proposta do Governo sobre essa matéria. Ou
seja, o Governo está em falta e deve cumprir, mas, Sr. Deputado, diga lá como é que resolve o problema que
é criar para um magistrado concreto a opção de ser ele a ajuizar o princípio da oportunidade!?…
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente: — Sr. Deputado João Oliveira, tem a palavra para responder.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Ricardo Rodrigues, relativamente ao
acompanhamento do PCP, hoje, neste debate, já percebemos que estamos sempre acompanhados quando
manifestamos preocupações, mas andamos sempre sozinhos quando se trata de propor e de aprovar
soluções para os problemas.
Aplausos do PCP.
Protestos do Deputado do PS Ricardo Rodrigues.
E esse é que é o problema!
Sr. Deputado Ricardo Rodrigues, isto é um problema de acompanhamento, mas é nas soluções, quando
ficamos sozinhos a propor soluções para os problemas, aí é que devíamos andar acompanhados,
particularmente pelo Partido Socialista!!
Relativamente ao princípio da legalidade, tenho a dizer-lhe que, se não se tratasse de questões sérias,
dava para rir.
Queria aqui reconhecer que o Sr. Deputado, com a intervenção que acabou de fazer, quis fazer agora, em
fevereiro de 2012, o debate que se recusaram a fazer em 2007, quando aprovaram a Lei-Quadro da Política
Criminal, quando levantámos os problemas relacionados com o princípio da legalidade, com os perigos que
poderiam resultar desta lei no que respeita à violação do princípio da legalidade, ou tendo como alternativa a
inutilidade da lei! Os senhores recusaram-se a fazer esse debate! Se o tivessem feito nessa ocasião, hoje não
estaríamos no ponto em que estamos, hoje não estaríamos a discutir estas questões!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. João Oliveira (PCP): — Porque o Sr. Deputado Ricardo Rodrigues sabe tão bem como eu que o
Ministério Público é uma magistratura hierarquizada, que há regras de funcionamento no Ministério Público
que resolvem o problema da definição das prioridades sem necessidade de uma lei-quadro — aliás,
sobretudo, não havendo uma Lei-Quadro da Política Criminal!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. João Oliveira (PCP): — E o Sr. Deputado Ricardo Rodrigues sabe tão bem quanto eu que é no
quadro do funcionamento do Ministério Público que essas questões devem ser resolvidas e que são melhor
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resolvidas! Não é por via de uma lei cega às alterações da realidade, não é por via de uma lei que até é cega
em relação aos próprios meios de que o Ministério Público dispõe para cumprir essas prioridades!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. João Oliveira (PCP): — Para terminar, Sr. Deputado Ricardo Rodrigues, devo dizer-lhe o seguinte:
reconhecer a realidade do País é reconhecer que em matéria de corrupção temos muito de andar para
combater o crime, como, aliás, demonstram as estatísticas, que o Sr. Deputado Nuno Magalhães referiu, de
aumento do número de acusações em matéria de corrupção! Isto significa o quê? Significa que em matéria de
corrupção há muito caminho para andar!
Mas reconhecer a realidade do País, Sr. Deputado Ricardo Rodrigues, é reconhecer também a exiguidade
dos meios de que o Ministério Público dispõe para fazer este combate! E, se o Sr. Deputado se disponibilizar a
ler o relatório do Ministério Público e a visitar o Departamento Central de Investigação e Ação Penal, vai
perceber que não é possível definir a corrupção como uma das prioridades da política criminal dando aqueles
meios ao Ministério Público! Com aqueles meios, o Ministério Público não pode fazer do combate a esse crime
uma verdadeira prioridade! «Não bate a bota com a perdigota» e é preciso fazer essa correspondência, Sr.
Deputado!
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Também para proferir uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado João
Semedo.
O Sr. João Semedo (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Julgavam, o PSD e o CDS, que por
uns tempos estariam livres do BPN, que poderiam esquecer o BPN. Puro engano, Sr.as
e Srs. Deputados!…
O BE traz novamente ao Parlamento este processo do BPN, confrontando mais uma vez, e as vezes que
forem necessárias, a direita e o seu Governo com as suas responsabilidades.
Fazemo-lo pela verdade e pela transparência que são devidas aos portugueses que pagam cêntimo a
cêntimo, sugados pela austeridade que lhes é imposta pelo Governo da troica, os muitos milhões que este
mesmo Governo atira para este buraco sem fundo que se chama BPN. São os sacrifícios dos portugueses, os
subsídios que lhes são retirados, os impostos que são aumentados, os apoios sociais cortados, que estão a
pagar o BPN e a sua generosa entrega ao BIC.
O Governo é muito exigente na austeridade, mas também muito relapso na prestação de contas.
Sr.as
e Srs. Deputados, um dia depois, 24 horas depois de a direita ter recusado, neste Parlamento, a
constituição da comissão de inquérito, foi conhecido e confirmado pelo Governo que a venda do BPN ao BIC
implica mais um financiamento de 300 milhões de euros.
O BPN transformou-se num sorvedouro insaciável e a sua venda é cada vez mais um problema, um custo
acrescido para o Estado. Estes novos 300 milhões de euros podem ainda ser muito mais. Basta para isso que
os depósitos atualmente existentes no BPN sejam levantados pelos seus titulares, pois o Governo assumiu o
compromisso de cobrir os depósitos que entretanto deixarem o BPN.
Disse a este respeito o Primeiro-Ministro que não se trata de um empréstimo mas, sim, de uma linha de
crédito. Só mesmo por piada — e não tem piada nenhuma! — é que o Sr. Primeiro-Ministro pode dizer uma
coisa destas. É exatamente a mesma diferença entre ser condenado por roubar ou condenado por furtar.
Sr.as
e Srs. Deputados, o que na semana passada somava 5400 milhões de euros, soma agora 5700
milhões de euros, e ninguém, nenhum de nós, pode hoje dizer que esta fatura vai parar por aqui!
A semana passada, o Estado dava ao BIC 767 milhões de euros para o BIC comprar o BPN por 40
milhões. Agora, o Estado vai receber os mesmos 40 milhões, mas vai pagar 1000 milhões de euros ao BIC.
Em resumo, o BIC recebe 1000 milhões para comprar um banco por 40 milhões. É caso para dizer, Sr.as
e Srs.
Deputados, que a venda do BPN ao BIC «traz mesmo água no bico»!…
Sr.as
e Srs. Deputados, que dirão hoje o PSD e o CDS perante estas novas e péssimas notícias?
Dizia o CDS que a venda se destinava a «pôr fim ao pesadelo do BPN». Mas está à vista que a venda do
BPN acrescenta pesadelo ao pesadelo e que se nada for feito este é um pesadelo sem fim.
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Para o PSD, tudo isto não passava, nem passa, de «chicana política», como dizia o Deputado Hugo
Velosa. Chicana do Bloco de Esquerda, chicana da oposição, e certamente também chicana da Comissão
Europeia, que no fundo faz as mesmas perguntas que nós: estes mais de 5000 milhões foram o mínimo
indispensável?… Onde e como foram gastos estes 5000 milhões? Esta venda ao BIC é ou não um favor ao
comprador?!…
Mas PSD e CDS têm apenas uma preocupação: vender rapidamente o BPN para que o assunto seja
rapidamente esquecido, aquilo a que vulgarmente se chama «atirar o lixo para debaixo do tapete».
Sr.as
e Srs. Deputados, em particular do PSD e do CDS, ouçam o que disse Paulo Rangel: «É preciso
explicar, com todas as letras, o valor, aparentemente diminuto, da privatização; as sucessivas dotações de
capital público; o destino e o valor do património imobiliário; a situação dos trabalhadores»… Continua Paulo
Rangel: «O BPN e a solução para ele encontrada constituem um sorvedouro exponencial de dinheiro. Os
contribuintes portugueses merecem uma explicação: uma explicação simples, completa e definitiva. A
obscuridade e a opacidade em redor do BPN e do seu resgate é, em sede de legitimidade moral e política,
uma bomba-relógio».
A venda é ruinosa? O PSD e o CDS não se interessam!
A venda é a pior opção para o Estado? PSD e CDS não querem saber!
Há outras soluções menos ruinosas? Isso também não lhes interessa!
O que interessa é despachar a venda o mais depressa possível. Por isso, Sr.as
e Srs. Deputados,
recusaram a criação da comissão de inquérito. E recusaram-na porque sabem que ela permite o escrutínio
rápido e claro desta operação, de forma transparente, à vista de todos e em tempo útil!
É preciso, Sr.as
e Srs. Deputados, parar esta espiral em que todas as decisões se transformam em novos
encargos, em mais encargos para o Estado e para os portugueses.
A comissão de inquérito é uma necessidade inevitável e estamos certos de que ela será uma realidade. Os
portugueses não compreenderiam que quem pode constituí-la não o fizesse!
O Bloco de Esquerda, o Partido Socialista, o Partido Comunista Português e o Partido Ecologista «Os
Verdes» votaram a favor da constituição da comissão de inquérito. São 98 votos, votos suficientes para vencer
o muro de silêncio que a direita quer construir em torno do BPN!
Sr.as
e Srs. Deputados, não nos resignemos e utilizemos a democracia para chegar à verdade que os
portugueses nos exigem!
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente: — Inscreveram-se para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado João Semedo os Srs.
Deputados Duarte Pacheco, do PSD, Honório Novo, do PCP, João Pinho de Almeida, do CDS-PP, e Pedro
Nuno Santos, do PS.
Entretanto, o Sr. Deputado João Semedo informou a Mesa de que pretende responder após cada pedido
de esclarecimento.
Tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Pacheco.
O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado João Semedo, não é por uma verdade, ou,
melhor dito, por uma inverdade…
Protestos do Deputado do BE João Semedo.
Sr. Deputado, se me deixar responder…
Protestos do Deputado do BE João Semedo.
Não é por uma inverdade ser repetida n vezes que ela se torna verdade.
O processo BPN — já aqui foi esclarecido num debate recente — é um pesadelo que caiu sobre todos os
portugueses durante os últimos dois anos. Podemos perguntar, indiscutivelmente, porque é que o Governo
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anterior deixou arrastar este processo sem o concluir. E, por isso mesmo, este processo atingiu a dimensão e
os custos que hoje todos conhecemos.
É verdade também que, no Memorando de Entendimento, foi estabelecido um prazo limite para que este
problema fosse resolvido e o Governo, em pouco mais de seis meses, encontrou a solução para o seu fim.
Mas, Srs. Deputados, o processo ainda não está concluído. E nós dizemos aqui, hoje, ontem e amanhã,
aquilo que sempre dissemos: tudo deve ser esclarecido até à última dúvida que os Srs. Deputados tenham,
que os portugueses têm; tudo deve ser esclarecido até ao último cêntimo.
O Governo tem que dar, deve dar aos portugueses todas as explicações, porque não há nada a esconder,
não pode haver nada a esconder neste processo. E, por isso mesmo, Srs. Deputados, não venham dizer que é
um muro de silêncio aquilo que aqui aprovámos, ou seja, uma auditoria feita pelo Tribunal de Contas ao
processo do BPN e ao processo do BPP, também com os vossos votos! A menos que os senhores deem
votos para atos que considerem inúteis e que nós valorizamos, como acontece com o Tribunal de Contas, os
seus profissionais e o seu trabalho.
Aquilo que dissemos — e voltamos hoje a dizê-lo — é que este processo não está concluído.
A Sr.ª Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Vou concluir, Sr.ª Presidente.
O Sr. Ministro das Finanças anunciou que, muito em breve, até ao final de março, se espera que este
processo esteja definitivamente encerrado. Será então o momento — não a meio dele, mas no fim —, para
que todos os esclarecimentos sejam dados aos portugueses. E cá estaremos, decerto, para os dar.
Aquilo que me admira, Sr. Deputado, é que quando registámos um sucesso para o Estado português e
para todos os portugueses, como foi a avaliação positiva, feita pela troica, das obrigações com que estamos
comprometidos, o senhor não tenha tido uma palavra sobre isso. Que falta de solidariedade para com os
portugueses e para com todos os sacrifícios que estamos a fazer!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Vozes do BE: — Oh!…
A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Semedo.
O Sr. João Semedo (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Duarte Pacheco, começo por responder ao fim
da sua intervenção.
Se, para o Governo, bom caminho é o de haver mais 100 000 desempregados e uma recessão a
ultrapassar os 3,3% não estou nada admirado que o Sr. Deputado considere que este também seja um bom
caminho para o BPN. Se pensam isso sobre a evolução do País, então é natural que estejam inteiramente
descansados relativamente ao BPN.
Diz o Sr. Deputado que o Governo presta todos os esclarecimentos e informações. Mas desde quando? Só
se for ao Sr. Deputado! É que não tenho nenhum elemento que permita esclarecer aquilo que está em
discussão, isto é, se esta opção de venda do BPN ao BIC é a melhor. E lamento que o Sr. Deputado não se
preocupe em responder a esta questão.
Vozes do BE: — Muito bem!
O Sr. João Semedo (BE): — E todos os dias há uma novidade!… Primeiro, o Governo devia ter pedido
parecer à comissão das reprivatizações, mas não pediu — «é normal», diz o Sr. Deputado! Depois, o Governo
assume um compromisso de cobrir todos os depósitos que forem levantados até 600 milhões de euros (já lá
meteu 300 milhões de euros), e o Sr. Deputado considera isso normal!… O Sr. Deputado deve ser o único
português que considera isso normal! É que os outros portugueses, aqueles que estão a pagar com
austeridade o vosso silêncio e o vosso desperdício ao atirarem dinheiro para cima deste enorme buraco,
seguramente não consideram a sua tranquilidade nada normal, Sr. Deputado!
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Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente: — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado João Semedo, eu disse, há dias, que o BPN
é uma espécie de poço sem fundo. Ainda não estávamos refeitos de, no dia 15 de fevereiro, termos sabido
que o Estado português entrou com mais 750 milhões de euros e, durante este fim de semana, rebentou uma
nova bomba, sob a forma de mais 300 milhões de euros, para que a «carne de lombo» do BPN vá parar,
«ainda mais limpa», às mãos do Dr. Mira Amaral e do BIC.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exatamente!
O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Deputado João Semedo, Passos Coelho costuma dizer que o programa
da troica é para cumprir custe o que custar. Ora, sabemos bem a quem custa.
Custa, por exemplo, ao País, que vai empobrecer — soubemo-lo ontem, pela boca do Ministro das
Finanças — muito mais do que o Dr. Passos Coelho andava por aí a dizer.
Custa também, por exemplo, aos desempregados — soubemos ontem, igualmente pela voz do Ministro de
Estado e das Finanças, que o número de desempregados vai ser muito maior do que aquele que o Dr. Passos
Coelho e o Dr. Paulo Portas andam por aí a anunciar.
Mas também sabemos a quem é que isto tudo não custa, sabemos quem são os felizes contemplados: o
sistema financeiro e, agora, há mais um feliz contemplado, o BIC, do Dr. Mira Amaral, que vai comprar, «por
tuta e meia», o BPN.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exatamente!
O Sr. Honório Novo (PCP): — É mais um feliz contemplado!
Sr. Deputado João Semedo, quero colocar-lhe duas questões sobre esta problemática.
Somados os 750 milhões de euros anunciados a meio de fevereiro e os 300 milhões de euros anunciados
agora dá 1050 milhões de euros. Este valor corresponde aos subsídios de férias e de Natal que confiscaram
aos funcionários públicos este ano. Esta comparação, Sr. Deputado Duarte Pacheco — deixe-me associá-la a
esta pergunta — não pode deixar de ser feita, porque o senhor falou aqui em sacrifícios para os portugueses.
Gostava de perguntar ao Sr. Deputado João Semedo se está ou não de acordo que, se compararmos
aquilo que é roubado aos funcionários públicos — subsídio de férias e subsídio de Natal — com aquilo que é
dado «de mão beijada» ao BPN — o mesmo valor —, há, evidentemente, um enorme descaramento político
do PSD e do CDS ao invocar sacrifícios para todos os portugueses.
Vozes do PCP: — Exatamente!
O Sr. Honório Novo (PCP): — A segunda questão que lhe quero colocar, Sr. Deputado, é muito breve.
A Sr.ª Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Serei muito breve, Sr.ª Presidente.
É preciso, de facto, avaliar os custos da privatização do BPN, os custos de uma eventual alternativa de
liquidação. Mas queria perguntar-lhe, Sr. Deputado, muito claramente, se não entende que também é preciso
avaliar aquilo que não foi avaliado, ou seja, os benefícios e custos de uma outra opção, que defendemos aqui,
que era a da manutenção do BPN na esfera pública, desenvolvendo uma atividade como banco público, numa
área relacionada com as pequenas e médias empresas.
Aplausos do PCP.
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A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Semedo.
O Sr. João Semedo (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Honório Novo, na intervenção que acabei de
fazer, referi explicitamente que este enormíssimo buraco que hoje constitui o BPN — buraco que este
Governo, por via das condições em que vai vender o BPN ao BIC, não parou de aumentar — está a ser pago
com a violentíssima austeridade e com todos os sacrifícios que, hoje, os portugueses sentem na pele.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!
O Sr. João Semedo (BE): — Cada subsídio de desemprego que é cortado, cada apoio social que é
retirado, cada subsídio de férias e de Natal que desapareceu da carteira dos profissionais da Administração
Pública são para enterrar neste buraco do BPN. E é por isso que o Governo devia ter — ou tem! — um dever
acrescido de informação a que é completamente omisso, porque não responde a nenhuma das inquietações,
das dúvidas e dos questionamentos deste processo.
Na semana anterior eram 767 000 milhões e hoje são mais de 1000 milhões. E estes mais de 1000 milhões
podem crescer, porque o compromisso assumido pelo Governo não é apenas de 300 milhões a mais, é de até
600 milhões! Quantos mais depósitos saírem do BPN, mais financiamento o Estado está obrigado a lá
introduzir. A solução poderia ser muito diferente: o banco poderia ficar no perímetro da Caixa Geral de
Depósitos, o banco poderia ser dissolvido, mas esta venda, tal como está a ser organizada, proposta,
desenhada, definida — e, seguramente, assim se irá realizar —, é uma venda que tem contornos de uma
venda de favor, e isso não podemos aceitar de modo algum!
Aplausos do BE.
Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente António Filipe.
O Sr. Presidente: — Igualmente para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Pinho de
Almeida.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sr. Presidente, o Sr. Deputado João Semedo trouxe mais
uma vez a este Plenário a questão do BPN. Para o CDS, todas as vezes que a questão do BPN for discutida
neste Plenário é positivo e contribui para o esclarecimento público.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Todas as vezes que for preciso!
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Portanto, pela nossa bancada, não tem problema nenhum em
trazer o tema do BPN a Plenário, e agradecemo-lo.
O Sr. Deputado, por exemplo, falou aqui sobre o esclarecimento a ser dado, mas podia ter dito que, ainda
hoje, o Bloco de Esquerda apresentou na Comissão de Orçamento, Finanças e Administração Pública um
requerimento para que o presidente aa extinta Comissão de Acompanhamento das Reprivatizações seja
ouvido sobre o parecer que emitiu ou não, que devia ou não ter emitido sobre a privatização do BPN, e que,
fazendo um grande alarido disso — pasme-se! —, todos os partidos votaram por unanimidade. Ou seja,
também esta maioria, porque tem um compromisso com o esclarecimento de todas as matérias do BPN,
naturalmente aprovou a vinda do presidente da extinta comissão para esclarecer qual foi a intervenção que
teve ou não no processo ou que deveria ter tido ou não nesse processo.
Portanto, o nosso compromisso não se materializa em palavras, materializa-se em atos, e o ato foi a
aprovação desse requerimento.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Mas também convém dizer que escusa o Sr. Deputado de
dizer que o CDS inviabilizou uma comissão de inquérito, porque isso não é verdade, como sabe. E sabe
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também que, tal como o CDS aqui esclareceu claramente, entre o compromisso do total esclarecimento sobre
a questão do BPN e a irresponsabilidade de constituir uma comissão de inquérito a meio de um processo de
privatização nós teríamos um voto coerente com isso. Tivemo-lo e não votámos contra a comissão de inquérito
nem votaremos nunca.
A questão é esta, Sr. Deputado: se queremos esclarecer a questão do BPN, não podemos fazer parecer
que todo o buraco foi criado agora por este Governo. O Sr. Deputado apresenta-se aqui ignorando
completamente a gestão irresponsável que o BPN teve, ignorando completamente a ausência de supervisão
que o Banco de Portugal teve, ignorando completamente a opção do Partido Socialista de nacionalizar o
Banco, ignorando completamente a irresponsabilidade da Caixa Geral dos Depósitos numa gestão de dois
anos que agravou profundamente a situação do Banco e de duas tentativas falhadas de reprivatização. O Sr.
Deputado passa uma esponja sobre isso para apagar tudo. Portanto, se alguém aqui está a apagar alguma
coisa que se passou no BPN é o Sr. Deputado! Se alguém aqui está a apagar responsabilidades de quem as
tem, neste buraco que foi criado e nesta obrigação que todos os portugueses têm agora de cumprir, é o Sr.
Deputado.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado, queira concluir, por favor.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Nós não apagaremos essas responsabilidades do passado,
mas não deixaremos de nos bater para que aquelas que foram as decisões durante o período de vigência
deste Governo sejam também todas elas apuradas.
Portanto — e vou terminar, Sr. Presidente —, uma garantia que o Sr. Deputado tem da nossa parte é a de
que não teremos a mesma atitude que há da parte do Bloco de Esquerda, que é a de, a cada momento, querer
apenas ficar na melhor fotografia — dissemo-lo no passado e voltamos a dizê-lo agora — de fazer confusão:
nós não contribuiremos para a confusão, contribuiremos para o esclarecimento, seja sobre o passado, seja
sobre o presente.
A pergunta que lhe deixo, Sr. Deputado, é se está disponível para voltar atrás e querer saber toda a
verdade sobre o BPN e não apenas uma parte dela.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Semedo.
O Sr. João Semedo (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Almeida, há aqui um equívoco: é que
quem propôs a comissão de inquérito para fazer uma avaliação política do processo de reestruturação do
BPN, incluindo a fase final, fomos nós, não foi o CDS!
Mais: o CDS, que tem tanta vontade em que tudo seja conhecido, curiosamente não votou a favor da
constituição da comissão de inquérito! E tem de se dizer, porque é uma questão aritmética, que se quisessem
a comissão de inquérito, se tivessem votado a favor da sua constituição, ela já hoje seria uma realidade. Mas,
não, os senhores articularam o vosso voto com o da bancada do PSD e, enfim, para darem uma alfinetada
discreta quanto possível no parceiro de coligação, abstiveram-se!
Vem o Sr. Deputado dizer que nós é que não queremos saber do passado?! Não, Sr. Deputado, queremos
saber do passado e do presente! E sabe o que nos diz o presente? É que, pelo que o senhor acabou de dizer,
Sr. Deputado João Almeida, nós ficámos todos a perceber que também o CDS quer que a venda se efetive, e
isso é que é extraordinário!
Como é que o CDS, que tantas coisas disse sobre a supervisão do Banco de Portugal, sobre a ausência de
transparência e sobre a gatunagem que existia no BPN, aceita de braços cruzados que o Estado, numa
primeira fase, meta 767 milhões de euros no BPN, ou, como se soube no final da semana passada, 1000
milhões de euros, para o mesmo ser vendido por 40 milhões de euros?! O Sr. Deputado não se inquieta e não
quer saber como é que isto se explica? E não me venha dizer que, lá porque o BIC tem capitais luso-
angolanos, esta é a primeira experiência da diplomacia económica do Sr. Dr. Paulo Portas!
Aplausos do BE.
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O Sr. Presidente (António Filipe): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro
Nuno Santos.
O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Semedo, o PSD e o CDS bem se
esforçam por passar a mensagem de que querem ver tudo esclarecido sobre o BPN, mas essa vontade
expressa nas intervenções choca depois, por exemplo, com aquele que foi o sentido de voto do PSD e do
CDS em relação à última proposta que o Bloco de Esquerda apresentou para a criação de uma comissão de
inquérito.
O CDS bem se esforça por dizer que não inviabilizou a iniciativa do BE, mas todos sabemos que se o CDS
tivesse votado a favor, a comissão de inquérito era já hoje uma realidade. Portanto, a verdade é que o CDS
inviabilizou, de facto, a criação da comissão de inquérito.
Infelizmente, o PSD também não está interessado em esclarecer este negócio, um negócio que é, aos
olhos de todos, danoso para o País, danoso para o Estado, e, infelizmente, votou contra a criação de uma
comissão de inquérito.
É bom que ninguém se esqueça que o Partido Socialista não é responsável pela gestão danosa e ilegal do
BPN. É responsável pela nacionalização do BPN, é verdade, porque na altura era fundamental travar qualquer
possibilidade de contágio ao sistema financeiro, como todos sabíamos.
Hoje, está em cima da mesa um processo de privatização. Já não estamos a discutir a nacionalização,
estamos a discutir a privatização do BPN, e toda a gente já percebeu que estamos a pagar milhões de euros
para alguém aceitar ficar com um banco, para um grupo privado ficar com um banco — e nem sequer há o
compromisso, por parte desse grupo, de assegurar manter um número mínimo de trabalhadores. Nada!
Sabemos, sim, que vamos receber 40 milhões de euros em troca de mais de 1000 milhões de euros para que
um banco privado fique com o BPN. É o que sabemos neste momento.
O PSD comprometeu-se a aprovar a criação de uma comissão de inquérito depois de o negócio estar
concluído, depois do facto consumado. Mas os portugueses têm o direito de ver confrontadas todas as
alternativas, inclusive a possibilidade (já aqui referenciada) de integração no grupo da Caixa Geral de
Depósitos. Todas as possibilidades devem ser, publicamente e de forma transparente, confrontadas, e isso só
se faz antes da privatização, antes do facto consumado!
É por isso que a comissão de inquérito faz sentido já e é por isso que queremos dizer ao Parlamento, em
Plenário, que o Partido Socialista, por sua iniciativa, aproveitará as possibilidades regimentais para que seja
criada uma comissão de inquérito.
A direita chumbou a sua criação, mas é possível, felizmente, ao abrigo do nosso Regimento, criarmos uma
comissão de inquérito. Vamos tomar essa iniciativa para que seja esclarecida toda a verdade sobre este
processo de privatização.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Semedo.
O Sr. João Semedo (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Nuno Santos, tudo o que se sabe sobre a
venda do BPN ao BIC, e não é muito, permite dizer que a venda, nestes termos, é ruinosa para o Estado. Se a
nacionalização foi uma má solução, a venda é uma outra má solução, que agrava o problema em vez de o
resolver. 1000 milhões de euros de financiamento, para diferentes finalidades, por uma venda que é feita por
40 milhões de euros?! Então, isto não tem de ser esclarecido? Então, isto não é o que vulgarmente se chama
«um favor a um amigo»?
Por exemplo, soube-se que não foi pedido parecer à Comissão de Acompanhamento das Reprivatizações,
mas também se sabe, porque a Caixa Geral de Depósitos assim o fez saber no final da semana passada, que
hoje há empresas do grupo BPN que, apesar do contexto em que vivem, têm uma atividade lucrativa, têm as
suas contas equilibradas, e a Caixa Geral de Depósitos anda a retirar tudo o que é bom crédito da carteira
dessas empresas — como é o caso, em concreto, do BPN Crédito — para o transferir para o BPN, que vai
vender ao BIC.
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Esta é uma gestão que se aceite? Alguém acha que isto é normal? Ninguém se interroga? Ninguém se
incomoda?
Nós não vemos outra forma de resolver este problema, de o conhecer, de intervir sobre ele, a tempo e
horas, e aos olhos de toda a gente, que não seja através da criação de uma comissão de inquérito. E, desse
ponto de vista, não queríamos deixar de sublinhar que muito nos agradou ouvir a parte final das suas
declarações, Sr. Deputado Pedro Nuno Santos, porque há, nesta Câmara, número de votos suficiente para
vencer o «muro de silêncio» que a direita quer construir em torno do BPN, e esse direito à verdade, à
transparência, ao conhecimento, à informação é-nos reclamado pelos portugueses, porque vivem hoje uma
situação muito difícil e parte dessa dificuldade serve para pagar um negócio que — tudo leva a crer — se trata
de um negócio de favor.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Também para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado
Luís Menezes.
O Sr. Luís Menezes (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Passaram nove meses desde a
assinatura do Memorando de Entendimento sobre o programa de ajustamento económico para Portugal e
apenas oito meses desde que este Governo entrou em funções.
Neste período, aquele programa já foi sujeito a três avaliações, todas elas bem-sucedidas, que implicarão
que, em menos de um ano, Portugal tenha recebido, por parte dos seus parceiros internacionais, mais de 48,8
mil milhões de euros. Este dinheiro é essencial para mantermos o nosso País a funcionar: para pagar salários,
para manter os hospitais abertos e para, no fim do dia, mantermos o Estado em condições de cumprir com as
suas funções.
Mas, para além da componente económica, o programa de ajustamento contém, em si mesmo, um
conjunto de reformas estruturais vitais para o futuro de Portugal.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Luís Menezes (PSD): — É por isso importante contextualizar historicamente os desafios que hoje
temos pela frente.
A entrada no século XXI trazia consigo um enorme desafio para o nosso País: a adaptação da nossa
economia à moeda única europeia e a um processo de globalização já em curso, que, com os seus defeitos e
virtudes, não conseguimos acompanhar.
Nesta década que passou, Portugal estagnou a nível económico, com um crescimento anémico, mas
também ao nível da sua capacidade reformadora. Foi uma década de responsabilidades governativas
partilhadas, é certo, mas onde o Partido Socialista governou mais de sete anos, incluindo os últimos seis.
Nos recentes anos de governação, palavras como reforma, eficiência ou sustentabilidade não faziam parte
do léxico do governo do Partido Socialista.
Aplausos do PSD.
Foi o tempo da política gerida para os órgãos de comunicação social e para os ciclos eleitorais.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Luís Menezes (PSD): — Esta política centrada em si mesma, esta incúria na gestão da coisa pública,
esta aversão aos problemas reais a que o PS sujeitou o País durante os últimos seis anos saiu caro, muito
caro. Custou ao País a sua soberania financeira!
Aplausos do PSD.
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Mas porque o passado, não devendo nunca ser esquecido, já lá vai, volto ao momento presente, citando
Edmund Burke: «A Sociedade é uma parceria, não apenas entre os vivos, mas entre os que vivem, os que
morreram e os que estão para nascer».
Se anteriores governos ignoraram por completo esta parceria de solidariedade intergeracional, com níveis
de endividamento público estratosféricos,…
O Sr. João Oliveira (PCP): — Os senhores aprovaram os Orçamentos apresentados pelos Governos do
PS!
O Sr. Luís Menezes (PSD): — … o PSD pede a este Governo que tenha esta preocupação como máxima
da sua ação governativa, porque tão importante como cuidar do presente é preparar as bases para um futuro
de prosperidade e de crescimento económico sustentado.
Aplausos do PSD.
Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Com este objetivo em mente, as reformas estruturais contidas no
programa de ajustamento, mais do que um fim em si mesmo, são um meio para atingirmos a solidez
económica, financeira e social, para lidarmos com os desafios de um mundo cada vez mais competitivo e
aberto.
Não se pode, por isso, deixar de relevar o enorme esforço reformista que este Governo tem posto em
prática, fazendo mais em oito meses do que o anterior governo em sete anos.
O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — Com 14,5% de desemprego!
O Sr. Luís Menezes (PSD): — A saber: desde a extinção dos governos civis à reestruturação da
administração central através do PREMAC; na justiça, com um enorme conjunto de medidas legislativas que,
paulatinamente, vai melhorando um sector central da nossa democracia; na área da economia e do emprego,
com a assinatura do acordo de concertação social, com a nova lei da concorrência, com o novo Código da
Insolvência e da Recuperação de Empresas…
O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — E com 14,5% de desemprego!
O Sr. Luís Menezes (PSD): — … ou, ainda, com a reestruturação no sector público dos transportes; na
agricultura e no ordenamento do território, com uma nova lei do arrendamento urbano, com uma nova lei na
área da reabilitação urbana ou, ainda, com a criação da bolsa pública de terras, um debate desencadeado
pelo Grupo Parlamentar do PSD através de um projeto de lei apresentado já nesta Legislatura.
Aplausos do PSD.
Este pequeno enunciado de medidas, já de si extenso, é apenas uma amostra de tudo o que o Governo já
fez.
Não expus nesta intervenção a quantificação destas medidas, e fi-lo propositadamente, porque a sua
importância vai muito para além do seu efeito de curto prazo a nível financeiro.
Protestos do Deputado do PS Pedro Nuno Santos.
Estas reformas estruturais são essenciais para a criação de condições de competitividade a nível
económico e social que permitam ao nosso País entrar num novo ciclo de crescimento sustentado.
Aplausos do PSD.
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Mas, se tudo isto foi feito, o tempo não é para elogios fáceis. É, sim, de ainda maior exigência para com o
Governo, porque se tanto já foi feito ainda há muito mais para fazer pela frente para que todo este esforço não
tenha sido em vão.
Disto mesmo são exemplos o novo mapa judiciário; o combate sem tréguas ao desemprego, em particular
ao desemprego jovem;…
O Sr. João Oliveira (PCP): — Com a emigração? Não têm vergonha nenhuma!
O Sr. Luís Menezes (PSD): — … o turismo enquanto grande desígnio nacional; a reforma da
administração local, que amanhã será debatida por todos neste Plenário; ou, ainda, o regime do
«licenciamento zero».
Essas são apenas algumas das importantes reformas, ou desígnios, pelas quais o País não pode esperar
mais.
Gostaríamos de poder contar com o Partido Socialista neste caminho difícil que temos para percorrer para
reformar Portugal. Se da esquerda mais radical já esperamos pouco, a não ser os habituais apelos à luta
estéril na rua,…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Estéril?
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Estéril é a sua política!
O Sr. Luís Menezes (PSD): — … do PS esperávamos mais, sinceramente: mais firmeza, mais
responsabilidade, mas também mais memória, quer pelo seu passado reformista quer pelo estado lastimável
em que deixaram o País depois de sete anos de governação!
Aplausos do PSD.
Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Se não é tempo para pessimismos exacerbados, também não é
tempo para euforias próprias dos vendedores de ilusões.
A aplicação do programa de ajustamento económico pelo atual Governo tem conduzido a resultados
positivos e encorajadores, resultados que indicam que Portugal está no caminho certo da recuperação da sua
credibilidade e da sua confiança, que nos permitem o reabrir de uma janela de esperança para um futuro
melhor.
Pedimos, por isso, ao Governo que não se desvie do rumo traçado, que se foque em reequilibrar as nossas
contas públicas, que centre os seus esforços em empreender as reformas inadiáveis de que o País tanto
precisa, que promova a coesão e a união entre os portugueses, não deixando ninguém ficar para trás.
Estou certo de que todos, unidos, conseguiremos ultrapassar esta crise e transformá-la numa
oportunidade, abrindo assim um novo ciclo de prosperidade e de crescimento económico sustentado para o
nosso País.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Luís Menezes,
inscreveram-se os Srs. Deputados José Luís Ferreira, Catarina Martins, João Galamba, João Pinho de
Almeida e Miguel Tiago.
Tem a palavra, em primeiro lugar, o Sr. Deputado José Luís Ferreira.
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Menezes, que ouvi com
atenção, congratulou-se com a avaliação que foi feita pela troica e fez, de certa forma, uma apologia à
austeridade. De facto, penso que devíamos aprender com os erros: a austeridade está a matar a nossa
economia. A austeridade não é solução, como, aliás, se está a ver, com as medidas restritivas que estão a ser
aplicadas e que estão a ter preocupantes efeitos recessivos.
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As previsões da Comissão Europeia apontam para uma queda do PIB de 3,3% e para um agravamento do
desemprego, que já ultrapassa os 14%, como sabe. Ora, o agravamento das previsões da Comissão Europeia
vêm confirmar, de certa forma, que as medidas de austeridade não funcionam, pelo contrário até têm um efeito
recessivo na nossa economia. Portugal é um dos países com maiores dificuldades na distribuição do
rendimento.
O Sr. Deputado também falou daquilo que o Governo fez. Vou recordar algumas coisas: 638 000
desempregados inscritos; 1,2 milhões de desempregados; em situação de desemprego sem subsídio são mais
de 300 000 pessoas; só em janeiro houve mais 15 500 desempregados (só num mês, Sr. Deputado!); os
abonos de família atingem mínimos históricos; a crise continua a empurrar cada vez mais pessoas para o
desemprego; aumentam os pedidos de rendimento social, sendo que só em janeiro entraram 10 000 pedidos.
É isto que o Governo tem vindo a fazer.
De facto, desde a entrada da troica no destino dos portugueses a economia encolheu 3,3% e o
desemprego disparou para mais de um milhão de desempregados. Ora, face ao que está a acontecer em
Portugal, creio que não é necessário ser prémio nobel da economia para se perceber que o programa da troica
é a receita apenas para o desastre.
A economia a cair 3,3% e o desemprego a alastrar — aliás, a quebra de receitas fiscais que se começa já a
prever para este ano, sobretudo do IVA, e o aumento do desemprego são consequências destas medidas de
austeridade — levam-me a formular este pedido de esclarecimento: Sr. Deputado, a quebra de receitas fiscais
que se adivinha para este ano poderá, ou não, tornar a ajuda externa um problema recorrente?
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Muito bem!
O Sr. Presidente (António Filipe): — O Sr. Deputado Luís Menezes informou a Mesa que responderá
conjuntamente aos três primeiros pedidos de esclarecimento e, depois, aos restantes dois.
Assim sendo, tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina Martins para formular o seu pedido de
esclarecimentos.
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Menezes, pode ter a retórica toda que
quiser sobre as reformas estruturais do Governo, mas uma coisa sabem todos e todas que estão aqui, em
todo o País, aqui mesmo à sua porta. Sabe o quê? Que a única grande reforma estrutural do Governo é
desemprego e trabalho gratuito! Essa foi a única reforma estrutural: desemprego, trabalho gratuito, mais
despedimentos, despedimentos mais fáceis.
Não nos venha falar de futuro! Há 35% de desemprego jovem; há mais de um milhão de desempregados e
de desempregadas neste País. A única reforma estrutural deste Governo é o desemprego.
Sr. Deputado, deixe de olhar para papéis! Pode escrever à vontade uma listinha de tarefas com a troica e
dizer que está a cumpri-la, mas o que o Sr. Deputado e o seu Governo estão a fazer é a destruir o País, é a
dizer a todas as gerações que as soluções que o Governo tem são despedimentos e despejos. Não há mais
nada! Não há mais nenhuma reforma estrutural! Despejos e desemprego — é o que têm para dar. Por isso,
também não estranhamos que a solução que têm para os jovens seja «emigrem!»
Sr. Deputado, reformas estruturais?! Quais? Despedir mais barato? Trabalhar mais horas sem se ser
pago? Um jovem nunca conseguir emprego? Serem todos precários desde que acabam de estudar até,
eventualmente, quem sabe, um dia conseguirem ter uma pensão de miséria? É essa a reforma estrutural
deste Governo? O desemprego? A precariedade? A pensão de miséria? Exatamente, qual é a reforma
estrutural que acha que tem alguma ideia de futuro para alguma geração?
Sr. Deputado, tire os olhos dos papéis! Olhe para o País!
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado
João Galamba.
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O Sr. João Galamba (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Menezes, de facto, já vamos na terceira
avaliação da troica, mas esqueceu-se de falar das outras avaliações que têm ocorrido nos últimos oito meses,
e elas não são positivas, pondo em causa aquilo que aqui disse.
O défice não é um fim em si mesmo, mas as declarações do Governo levam a crer que sim, que para o
Governo o défice é um fim em si mesmo e que, custe o que custar, fará tudo o que for necessário para cumprir
as metas do défice. Mas este sucesso tem custos, e sobre esses custos o Sr. Deputado não falou.
Pode ter havido três revisões da troica, mas houve, pelo menos, cinco revisões do PIB, e todas elas em
baixa; houve outras tantas revisões do desemprego, e todas elas em alta, Sr. Deputado.
O Sr. Sérgio Sousa Pinto (PS): — Muito bem!
O Sr. João Galamba (PS): — Portanto, o que temos aqui é um sucesso, nas suas palavras, sem dúvida,
mas um sucesso que vai conduzir o País ao desastre.
Uma das condições de sucesso deste Memorando, mais importante que o défice, mais importante que os
elogios da troica, é garantir que não se destrói a economia do País, que não se destroem as possibilidades de
emprego dos portugueses e das portuguesas, e — outra coisa muito importante, que é, se calhar, o objetivo
central do sucesso do programa de ajustamento — garantir o acesso aos mercados em 2013. Todos os
resultados macroeconómicos deste Governo — no desemprego, na recessão — tornam inviável qualquer
possibilidade de regresso aos mercados, e isto, Sr. Deputado, não pode ser considerado outra coisa senão um
rotundo fracasso deste Governo.
O Sr. Deputado fala aqui de futuro, mas o futuro não é uma coisa que está ali à frente à nossa espera, o
futuro é uma coisa que se constrói a partir do presente, e não há nada, não há nenhuma medida que este
Governo tenha posto em prática que construa o que quer que seja. Destrói, na vã expectativa de que da
destruição surja o sucesso. Como, ninguém sabe.
Percebo que a Sr.ª Ministra Assunção Cristas, que lida com fenómenos meteorológicos, fale de fé, porque,
de facto, a meteorologia não é um fenómeno humano, mas custa-me ver Vítor Gaspar, em Londres e em
conferências de imprensa, ter um pensamento mágico, de onde, subitamente, o que vai abaixo vem acima!…
Não vem, Sr. Deputado! Infelizmente, todos — todos! — os fatores críticos de sucesso que este Governo
apresenta para o programa de ajustamento baseiam-se apenas e só numa coisa: pensamento mágico, vudu e
crendices! Que isso aconteça na agricultura entende-se, mas na economia e nas finanças é absolutamente
inaceitável!
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Menezes para responder.
O Sr. Luís Menezes (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, muito obrigado pelas questões colocadas,
às quais vou responder de forma enquadrada.
Começando por responder ao Sr. Deputado José Luís Ferreira e à Sr.ª Deputada Catarina Martins, ao
contrário do Partido Socialista, que parece que não esteve em lado nenhum nos últimos sete anos…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É como o PSD!…
O Sr. Luís Menezes (PSD): — Vou até referir duas frases do Deputado António José Seguro, que se
levantou para aprovar o Memorando de Entendimento e que agora é líder do PS. Por um lado, quanto ao PEC
3, dizia que os portugueses estavam fartos de fazer sacrifícios sem ver resultados…
O Sr. João Galamba (PS): — Vocês também diziam isso!
O Sr. Luís Menezes (PSD): — … e que era preciso que os sacrifícios estivessem ligados aos resultados.
Também dizia, relativamente ao PEC 3: «A trajetória das últimas décadas, que vem endividando o País, é
inaceitável.»
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O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Quem aprovou o PEC 3?
O Sr. Luís Menezes (PSD): — Ó Srs. Deputados, não podemos ter «sol na eira e chuva no nabal»! Os
senhores deram cabo do País, os senhores adotaram uma política de endividamento completamente
inaceitável e agora vêm dizer que aquilo que assinaram, que aquilo que este Governo está a cumprir de uma
forma que os senhores nunca conseguiriam cumprir… Os senhores falam que temos uma paixão pela
austeridade, mas nós temos é uma paixão pelo compromisso e, mais, vemos que este PS tem uma paixão por
palavras como ambiguidade, falta de verdade, banalidade, falta de responsabilidade total perante aquilo que
fizeram e que agora fingem que não é vosso!
Aplausos do PSD.
Mas, Srs. Deputados do PS, estamos a falar de reformas, e as reformas estruturais são muito mais
importantes que esta componente de ajustamento financeiro que estamos a fazer, porque para conseguirmos
entrar num novo ciclo de crescimento económico sustentado não basta apenas pôr as contas em ordem, é
preciso preparar as bases para esse crescimento futuro, e isso passa pelas reformas estruturais, das quais os
senhores «lavam as mãos como Pilatos»: quanto à reforma da administração local, dizem «não temos nada a
ver com isso!» Quanto ao mapa da justiça ter de ser reformulado, dizem «isso é impopular, não nos vamos
meter!»
Quero ver o que vai acontecer amanhã neste Plenário. Vamos ter aqui um debate importantíssimo, sobre a
reformulação de uma estrutura com mais de 150 anos relativa ao nosso ordenamento do território, e os
senhores já disseram «não temos nada a ver com isso»! Pois deviam ter vergonha, porque assinaram o
Memorando de Entendimento, foram os senhores que o negociaram e agora «lavam as mãos como Pilatos».
Querem fugir às vossas responsabilidades. É uma opção, mas essa opção fica convosco!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Pinho
de Almeida.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Menezes, trouxe a debate,
e bem, o tema da avaliação a que foi sujeito o Estado português relativamente ao cumprimento do Memorando
de Entendimento e do pograma de assistência económica e financeira.
É um facto indesmentível que esta é a terceira avaliação de um programa e é a terceira avaliação positiva.
É um facto também, por muito que haja quem discorde, que foi este Governo que elegeu como prioridade o
cumprimento desse programa. Assim, a conclusão é evidente: naquilo que este Governo elegeu como
prioridade, a avaliação é claramente positiva,…
O Sr. João Oliveira (PCP): — Como é possível dizer uma coisa dessas?
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — … e foi para isso que os partidos que constituem a coligação
do atual Governo obtiveram mandato, porque claramente foi isso que disseram aos eleitores. A prioridade era
claramente o cumprimento do Memorando de Entendimento, a recuperação da credibilidade…
Protestos do PCP.
Os Srs. Deputados já gritaram durante a campanha eleitoral e não foi por isso que tiveram mais votos!
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
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Portanto, é muito importante que tenhamos noção de que os senhores vão continuar a ter sempre essa
atitude e, provavelmente, vão continuar também a ter o mesmo nível de votos que tiveram!
Protestos do PS e do PCP.
É evidente que quem queira ser sério sabe que para que Portugal recupere a credibilidade e a autonomia o
cumprimento do programa de assistência é premissa essencial, mas também é fundamental que ao Partido
Socialista, que tem sempre essa posição ambígua, sejam ditas determinadas coisas. O desemprego e a
recessão não são produto deste Governo ou desta conjuntura.
Vozes do PS: — Ah!…
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Não, Srs. Deputados, o desemprego e a recessão constavam
do Memorando de Entendimento que os senhores assinaram!
O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — E vai durar quantos anos?
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — O desemprego, a recessão, o crescimento do desemprego e
o aprofundamento da recessão constavam do Memorando de Entendimento que os senhores assinaram!
Os senhores já não têm coragem de falar do PEC 4, mas tenho aqui os dados. O que é que o PEC 4 previa
do ponto de vista do crescimento económico para 2011? Recessão! O que é que o PEC 4 previa quanto ao
desemprego para 2011 e 2012? Crescimento do desemprego!
Protestos do Deputado do PS Pedro Nuno Santos.
Ou seja, já antes do Memorando de Entendimento, mesmo sem os 78 000 milhões de euros, os senhores
previam, com a vossa governação, recessão e desemprego. O mínimo de honestidade intelectual leva a que
façamos este debate sobre premissas minimamente comparáveis, e as premissas minimamente comparáveis
são estas.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado, peço-lhe que conclua.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Concluo já, Sr. Presidente.
Sr. Deputado, pergunto-lhe o seguinte: é ou não verdade que, naquilo que é um caminho de dificuldade —
nunca o negamos —, quem não tenha preocupação com o nível de desemprego que Portugal tem neste
momento, quem não tenha preocupação com o facto de estarmos numa recessão bastante profunda não tem
capacidade para governar um país, nem que seja a fazer planos para daqui a quatro anos, a aplicar daqui a 10
anos? Mesmo assim, o fundamental é sabermos que isto não estava na dependência deste Governo; isto,
infelizmente, já estava definido pelo Partido Socialista. O Partido Socialista definiu-o no Memorando e já o
tinha definido no PEC, porque essa era a consequência de seis anos da sua governação.
Aquilo que está na dependência deste Governo é conseguir inverter o ciclo. Para lhe dar um dado muito
concreto, também no PEC 4, por exemplo, a balança de transações correntes mantinha-se mais ou menos no
mesmo nível, mas o certo é que se reconhece a este Governo ter conseguido, no último ano, inverter
claramente esse ciclo, algo que nem o Partido Socialista atribuía a si próprio.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para pedir esclarecimentos tem a palavra o Sr. Deputado Miguel
Tiago.
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Menezes, tentou deixar-nos aqui dois
exercícios principais de propaganda: um deles é dizer que vamos no bom caminho, de acordo com a avaliação
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da troica; o outro é dizer que toda a situação que estamos a atravessar é da exclusiva responsabilidade do
Partido Socialista.
Sr. Deputado, se vamos no bom caminho é porque o destino não é muito agradável, certamente! Importa
questionar quem pode julgar que tudo corre bem quando o País está confrontado com a situação com que
está e quando os portugueses estão confrontados com a situação com que estão.
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Quanto à outra questão, de a culpa ser exclusiva do PS, o Sr. Deputado
esqueceu-se certamente dos contributos — determinantes, aliás — que o seu partido, tal como o CDS, deu,
não só na governação como na Assembleia da República, e por diversas ocasiões, à política do PS, de resto
sempre amparada por estas duas forças políticas na maior parte dos casos.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Aprovou o Orçamento do Estado!
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Falamos dos Orçamentos do Estado, do PEC 1, do PEC 2, do PEC 3… E
até foram prontinhos, de mão estendida, assinar o pacto de agressão com o povo português, pelo qual agora
responsabilizam exclusivamente o PS, como se o PSD e o CDS não o tivessem assinado.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr. Deputado, uma outra ideia particularmente grave é vir aqui tentar deixar-
nos a ilusão de que tudo se trata de solidariedade intergeracional, esse novo chavão da direita, como se
estivessem a sacrificar os direitos da juventude atual, dos trabalhadores atuais e dos pensionistas atuais a
bem dos trabalhadores jovens e pensionistas do futuro, escondendo que, na verdade, estão a beneficiar os
grandes interesses do presente. Os jovens do futuro, os trabalhadores do futuro, os pensionistas do futuro
viverão ainda pior do que os do presente, se persistirmos neste rumo.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr. Deputado, atente ao aprofundamento da recessão, ao desemprego que,
em sentido lato, já atinge 20% dos portugueses, à facilitação dos despedimentos, à degradação das condições
de vida, ao encarecimento da educação e da saúde, à lei dos despejos que este Governo quer fazer aprovar
na Assembleia da República, aos ataques ao poder local e, ao mesmo tempo, aos milhões e milhões e às
benesses dadas e entregues aos grupos económicos e à banca,…
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Ora, aí é que está!
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — … atente a esta discrepância e diga na cara dos portugueses que este é um
rumo positivo que está a colocar o País no bom caminho.
Sr. Deputado, estéril não é a luta das populações na rua ou nas empresas, estéril não é essa luta que,
inclusivamente, já provou ser capaz de resgatar o carnaval, que nos queriam roubar,…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — … embora, é certo, nem todos tenham tido oportunidade de ir desfrutar
desse carnaval na neve…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Já só foi isso que faltou!
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — … mas muitos conseguiram.
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O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado, queira concluir.
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Estéril, Sr. Deputado, é a política de encerramento, de despedimentos, de
desemprego, de penalização dos jovens, de apelo à emigração; é a política de desertificação do País e a
destruição do nosso aparelho produtivo; é a política de penalização sempre dos mesmos para concentrar as
benesses sempre num punhado muito reduzido de interesses obscuros que muitas vezes nem se mostram.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exatamente!
O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Aquilo que dá frutos é, precisamente, o inverso: são aqueles que defendem,
na rua e nas empresas, com a sua luta, os seus postos de trabalho e o desenvolvimento social e económico
do País.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Menezes.
O Sr. Luís Menezes (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados João Almeida e Miguel Tiago, muito
obrigado pelas questões que colocaram.
Começo por dizer ao Deputado Miguel Tiago que o PCP é um partido coerente, como costumo sempre
dizer. Há mais de 150 anos que continuam agarrados à mesma ideologia do século XIX,…
Protestos do PCP.
… aplicada com enorme sucesso na Rússia, de Estaline, ou na Jugoslávia, de Tito, ou, ainda mais
recentemente, com o vosso querido líder Kim Il-Sung, o atual novo líder da Coreia do Norte!
Protestos do PCP.
Ou seja, percebo perfeitamente que mantenham a coerência de estarem contra o Memorando; aceito e
respeito. O que não aceito é que queiram dizer que uma minoria ruidosa, que mantém um certo ruído na nossa
sociedade, vale mais do que a maioria silenciosa…
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Muito bem!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Maioria silenciosa?!
O Sr. Luís Menezes (PSD): — … que tem de ir trabalhar todos os dias, tem de levar os seus filhos à
escola, mesmo quando há greves atrás de greves, que os senhores, via CGTP, acabam por impor,…
Protestos do Deputado do PCP João Oliveira.
… fazendo com que estas pessoas sofram na pele a dificuldade de ter de escolher entre levar os filhos à
escola ou ir trabalhar para não perderem o emprego.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Luís Menezes (PSD): — Vocês podiam evoluir, mas mantenham-se no vosso caminho!
Protestos do PCP.
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Sr. Deputado João Almeida, ninguém renega a dificuldade da situação atual. O quadro é recessivo e como
tal, num curto prazo, implica um ligeiro aumento do desemprego, o que é admitido por qualquer pessoa de
bom senso e, com seriedade, por parte deste Governo, o que o anterior não fazia.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Falta de cultura democrática!
O Sr. Luís Menezes (PSD): — Sr. Deputado João Almeida, se, por parte da esquerda, aceito esta
coerência em rejeitar o Memorando de Entendimento, o PSD acha intolerável que quem o negociou, quem
trouxe o País ao estado em que se encontra,…
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Então, e o PSD?!
O Sr. Luís Menezes (PSD): — … quem assinou o Memorando, em maio de 2011 — e isso é que me
preocupa! — vir agora costas ao que assinou dizendo que já não é dele.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Luís Menezes (PSD): — Isso é uma falta de respeito para com os portugueses e é uma falta de
lealdade até democrática para com o que foi assinado!
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Só enganam as pessoas!
O Sr. Luís Menezes (PSD): — Volto a fazer aqui um apelo.
Vamos ter, amanhã, um dos primeiros debates essenciais no que diz respeito às reformas estruturais do
nosso País. Muitos já foram feitos, mas amanhã, nesta Câmara, vamos ter a reforma da administração local,
reforma essa que o Partido Socialista, já muito convenientemente, atirou para outro lado e enjeitou culpas para
outra morada. Tenho esperança de que o Partido Socialista, responsável, fiel ao seu passado e espero que
não se esqueça do passado recente, tenha a coragem de, contra as facilidades que querem impor por causa
dos vossos problemas internos,…
O Sr. Miguel Laranjeiro (PS): — Internos?!
O Sr. Luís Menezes (PSD): — … vir para este Plenário debater com seriedade uma reforma que tem de
ser feita,…
Protestos do Deputado do PS Jorge Fão.
… porque há 150 anos que não se mexe no ordenamento do território em Portugal e mais do que discutir a
agregação das freguesias, devemos discutir o que vamos oferecer às freguesias, dignificar o cargo dos
presidentes de junta de freguesia,…
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Luís Menezes (PSD): — … dignificar o papel destes primeiros «soldados» de proximidade do poder
político com as nossas populações.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel
Laranjeiro.
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O Sr. Miguel Laranjeiro (PS): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: O Sr. Ministro de Estado e das
Finanças anunciou ontem ao País que o Governo desistiu de combater o desemprego durante o ano de 2012.
Apresentou uma previsão de 14,5% de taxa de desemprego para um Governo que cada vez que revê os
números do desemprego é sempre para os subir.
Protestos do CDS-PP.
Uma intervenção marcada por uma descrença em Portugal e nas capacidades dos portugueses, um
discurso de desilusão e de desemprego.
O Ministro das Finanças desmentiu o próprio Primeiro-Ministro que se apresentou aqui, no Parlamento,
durante o debate do Orçamento do Estado para 2012, e fez aprovar uma previsão de desemprego que já
ninguém, na altura, acreditava. Onde estão os 13,4% de desemprego para o ano que os Srs. Deputados do
PSD e do CDS-PP inscreveram no Orçamento do Estado?
Ontem, ficámos a saber que a queda do PIB será de 3,3%. Onde está a previsão, já de si negra, de
diminuição do PIB em 2,8%, inscrita no Orçamento do Estado?
Os portugueses perguntam o que fez o Governo nestes últimos meses para que mais de 1 milhão de
portugueses estejam desempregados, subempregados ou inativos em Portugal.
Se temos este valor, se juntarmos aqueles que já emigraram, como é que pode ser dito que o problema é
do mercado do trabalho, do Estado social ou dos subsídios atribuídos? Não é verdade! O problema é da falta
de crescimento económico. Há meses que o Secretário-Geral do Partido Socialista o tem afirmado, os
parceiros sociais, os empresários também. Todos dizem isso. Só o Governo do País é que não quer ouvir.
Austeridade em cima de austeridade está a dar este resultado. Foram avisados. Não quiseram ouvir porque
têm uma agenda diferente.
Mais recessão, mais desemprego e o Primeiro-Ministro diz esta semana que são «alterações sem grande
significado». Mais 100 000 desempregados, nas contas do próprio Governo, e afirma que não tem significado?
Não tem significado para quem? Para o Governo talvez, mas tem muito significado para aqueles que sofrem
com o desemprego.
Aplausos do PS.
O Governo, aliás, foi acometido por uma total insensibilidade e desorientação. No mesmo dia em que o
Ministro de Estado e das Finanças avança com o desemprego record para o ano em curso, o Ministro da
Economia e do Emprego diz que Portugal «está em condições muito melhores». De que estava a falar o
Ministro da Economia e do Emprego?
O principal responsável, contudo, é o Primeiro-Ministro. Lembramo-nos todos muito bem da frase «custe o
que custar». Pois está a custar muito, e cada vez mais, a milhares e milhares de portugueses.
Aplausos do PS.
Temos um Governo parado, num País cada vez mais estagnado.
E, na véspera do último debate quinzenal, o Instituto Nacional de Estatística (INE) apresentava os números
oficiais de desemprego: 14%. O Primeiro-Ministro, na sua intervenção inicial, neste Plenário, não teve uma
palavra para os desempregados, não teve uma medida, uma ação para combater este flagelo. Nada!
Venceu as eleições prometendo não aumentar os impostos, não atacar os funcionários públicos nem a
classe média. Tudo ao contrário do que está a acontecer. Prometeu combater o desemprego e o que tem para
apresentar é mais desemprego. Apenas e só mais desemprego.
Aos problemas dos desempregados jovens, e muitos deles já sem subsídio de desemprego, o Governo não
apresenta medidas, não apresenta ações concretas, mas uma comissão para estudar. Pensaríamos todos,
certamente, que seria uma comissão liderada pelo Ministro da Economia e do Emprego. Mas não. É uma
comissão liderada pelo Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares e da comunicação social. Ora, Portugal
não precisa de propaganda. Os desempregados não precisam de reuniões apenas para ouvir os parceiros,…
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Aplausos do PS.
… como se não soubéssemos todos o que pensam, porque os parceiros sociais sabem do que falam há
muitos meses a esta parte. O Governo é que não sabe o que quer. Está desorientado, numa situação para a
qual não estava preparado, mas que ajudou a agravar com as políticas altamente recessivas.
É altura de o Governo assumir que também esta previsão vai ser revista em alta. Basta falar com os
parceiros sociais para perceber que é isto que vai acontecer. Basta sair à rua e ouvir o País para perceber que
o desemprego é superior e tende a crescer.
Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Os empregadores, os empresários, os comerciantes precisam de
financiamento para as suas empresas e não de simulacros de ajudas.
Os empresários estão fartos de ouvir o Governo dizer que não são competitivos e sugerir que muitos têm
de encerrar portas, quando o que acontece é que lhes cortam todas as hipóteses de competir, quando há uma
asfixia do crédito, nomeadamente no financiamento às exportações, quando a diplomacia económica custa a
arrancar e até parecer ter medo da sombra do passado, quando os impostos são elevados, como é o caso do
IVA na restauração e na hotelaria.
Os agricultores precisam dos pagamentos a tempo e horas, precisam de previsibilidade, precisam das
ajudas comunitárias que lhes são devidas, ajudas pagas a 100% pela União Europeia.
Os trabalhadores precisam de formação e qualificação e não que encerrem centenas de Centros Novas
Oportunidades, como está a acontecer, deixando milhares de portugueses sem solução. Se, sobre esta
matéria, não querem ouvir o PS, ouçam a OCDE e percebam que estão a matar uma referência internacional e
o futuro das qualificações em Portugal.
O interior de Portugal precisa que o Governo o olhe com outros olhos. O nordeste do País precisa do túnel
do Marão, o regadio do Alqueva precisa que se termine, como estava previsto.
O País não pode ver tribunais a encerrar, afastando a justiça das pessoas.
Os doentes precisam da acessibilidade ao Serviço Nacional de Saúde.
Portugal não pode assistir a um Governo que quer extinguir freguesias sem critérios de serviço público.
Contra tudo e contra todos.
Os desempregados não precisam de mais palavras e precisam de respostas do Governo que está em
exercício.
Sr. Presidente, para o Governo, se há desemprego, a culpa é dos desempregados; se não há
financiamento da economia, o problema é das empresas; se a agricultura está a morrer, o problema e a culpa
são da natureza.
Para o Governo, se há portugueses a pensar duas vezes em aceder ao Serviço Nacional de Saúde, por
razões financeiras, é um problema que não lhe diz respeito; se os funcionários públicos têm família, logo
ameaça com a mobilidade a qualquer preço, sem respeito pelas pessoas.
Para terminar, Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados, os portugueses precisam de confiança no futuro. Não
precisam do medo que o Governo pretende implantar na sociedade. Precisam de um Governo que apoie as
universidades, os centros de investigação, que desenvolva parcerias com as empresas. Precisamos de
empresas criadoras de riqueza.
Portugal precisa de uma visão moderna, inovadora, empreendedora, apostando nas nossas capacidades e
nas de todos os portugueses.
Portugal precisa de recursos humanos qualificados, com competências para os novos tempos.
O Governo PSD/CDS-PP tem a legitimidade do voto, mas quanto às opções que escolheu, não tem a razão
do seu lado.
O País exige respostas concretas.
Estamos perante um Primeiro-Ministro que governa de costas voltadas para os portugueses, de costas
voltadas para as instituições, para as empresas, para os agricultores. Um Primeiro-Ministro que, custe o que
custar, prefere a destruição do tecido produtivo, o aumento do desemprego, a assumir que errou na estratégia
que está a seguir.
Aplausos do PS.
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O Sr. Presidente (António Filipe): — Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Adão
Silva, Jorge Machado, Mariana Aiveca e Artur Rêgo.
Tem a palavra o Sr. Deputado Adão Silva.
O Sr. Adão Silva (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Miguel Laranjeiro, devo começar
por dar pública nota de que tenho por V. Ex.ª uma grande consideração e, se me permite, mesmo uma grande
amizade. Porém, quero dizer-lhe que V. Ex.ª tem de corrigir, de alguma maneira, o tipo de intervenções que
faz neste Plenário, porque está a degradar-se de cada vez que faz uma intervenção.
Protestos do PS.
É! E já vou explicar porquê.
V. Ex.ª não pode chegar aqui e dizer que o Governo é insensível em relação ao crescimento do
desemprego. O Governo não é insensível, mas realista.
O Sr. Luís Menezes (PSD): — Muito bem!
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Como é evidente!
O Sr. Adão Silva (PSD): — O Governo diz que as condições que estão criadas no País vão ser de molde a
aumentar ainda um pouco mais o desemprego. Sobre esta matéria, acho que não há forma de o dizer de outra
maneira. Haja realismo, acima de tudo!
V. Ex.ª não pode afirmar que o Governo é insensível, que promete coisas que não cumpre, que se
descredibiliza… Quem se descredibilizou foi aquele governo que disse que criava 150 000 postos de trabalho
e, no fim, brindou-nos com 150 000 desempregados!
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Adão Silva (PSD): — Lembra-se, Sr. Deputado? Essa é a questão essencial!
O Sr. Miguel Laranjeiro (PS): — E vocês, em meia-dúzia de meses, resolveram tudo, não é verdade?!
O Sr. Adão Silva (PSD): — Falando de descredibilidade, Sr. Deputado, deixe-me lembrar-lhe o seguinte:
algures no mês de dezembro de 2011, V. Ex.ª chegou a este Plenário e, daquela forma rotunda, perentória,
irrevogável — parecia quase uma espécie de personagem daquele grande romancista colombiano Gabriel
Garcia Márquez —, afirmou o seguinte: «O Governo 'matou' a concertação social!». Passados 15 dias, o
Governo estava a assinar com os parceiros sociais um acordo tripartido, que está a ser elogiado em termos
internacionais.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Isto é muito importante, Sr. Deputado.
Deixe-me ainda dizer-lhe o seguinte: falou V. Ex.ª sobre as exportações e também sobre os 14% da taxa
de desemprego. Quero falar-lhe dos 14% das exportações, que devemos elogiar, e o Sr. Deputado também
devia fazê-lo. A economia portuguesa conseguiu crescer, em 2011, na fileira das exportações, 14% face a
2010! Isto é muito importante para assegurar o futuro, para assegurar o emprego e o desenvolvimento
económico e social do País. Isto é que me parece absolutamente essencial.
Finalmente, quero fazer-lhe uma pergunta. O Sr. Deputado falou da confiança: confiança dos portugueses
no futuro, confiança em Portugal. A minha pergunta é esta: então, quando ouvimos os responsáveis da troica,
que, na terceira avaliação, desbloquearam cerca de 15 000 milhões de euros para Portugal, dizer que estamos
a cumprir o acordo que os senhores assinaram, isto é ou não (e pergunto-lhe porque já não sei bem como é
que hei de falar com V. Ex.ª),…
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O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Adão Silva (PSD): — … uma prova de confiança em que Portugal está a cumprir, em que Portugal
tem futuro, graças ao esforço e ao sacrifício dos portugueses, de todos os portugueses, mas, sobretudo, uma
garantia desta confiança no futuro, sem medo, sem aquele medo que VV. Ex.as
procuram lamentavelmente
instilar?
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Laranjeiro.
O Sr. Miguel Laranjeiro (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Adão Silva, como sabe, estamos de acordo
numa matéria, que é a da consideração mútua que também tenho por V. Ex.ª.
Mas já percebi que a minha intervenção o incomodou, assim como à bancada do PSD. De facto, referi as
questões da confiança e da insensibilidade do Governo — é absolutamente verdade!
Se ouvir o Sr. Ministro da Economia e do Emprego — muitas vezes desaparecido, às vezes aparecido,
mas, quando aparece, o País até prefere que continue desparecido —, verificará o seguinte: em novembro de
2011, isto é, há três meses, referiu que estava convicto de que 2012 seria um ano de viragem para a
economia portuguesa, enquanto o seu colega das Finanças diz que a economia portuguesa vai descer 3,3%;
também em novembro, mas 15 dias depois, manifestou muita preocupação com as previsões da OCDE; e, em
fevereiro, disse que via os números do desemprego com muita preocupação.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — É de uma desonestidade!
O Sr. Miguel Laranjeiro (PS): — Sabe o que disse ontem o Sr. Ministro? Que Portugal está em muito
melhores condições. Mas em muito melhores condições para quê, Sr. Deputado? Em muito melhores
condições para os desempregados?! Em muito melhores condições para o acesso ao Serviço Nacional de
Saúde?! Em muito melhores condições para os trabalhadores que querem aumentar a sua qualificação?!
Sr. Deputado, este é o resultado da ação do seu Governo. E já tenho aqui as previsões do Governo, nas
quais ninguém acredita, porque todas as previsões feitas nestes últimos oito meses pelo Governo do PSD e do
CDS-PP foram sempre revistas em alta, no que diz respeito ao desemprego, e em baixa, no que diz respeito
ao crescimento económico.
Quanto à concertação social, o Sr. Deputado Adão Silva certamente é tão ou mais atento do que eu
relativamente àquilo que os parceiros sociais dizem. Ainda ontem, ouvi na televisão o Presidente da CIP dizer
que as empresas precisavam de três coisas — financiamento, financiamento e financiamento —, mas que não
via ser tomada qualquer medida da parte do Governo para a sua obtenção.
Protestos do Deputado do PSD Luís Menezes.
Ora, o Partido Socialista apresentou aqui, em sede de Orçamento do Estado, uma proposta de linha de
crédito de 5000 milhões de euros.
Protestos do Deputado do PSD Luís Menezes.
Sr. Deputado Luís Menezes, depois, poderá fazer outras perguntas, mas, agora, convinha ouvir isto.
Como dizia, apresentámos aqui uma proposta de uma linha de crédito de 5000 milhões de euros junto de
BEI. O Governo aceitou? Não, não aceitou os 5000 milhões de euros! Mas aceitou o princípio. No entanto, já
passaram quatro meses depois da aprovação do Orçamento do Estado e… zero! Zero!
O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr. Deputado.
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O Sr. Miguel Laranjeiro (PS): — Isso é que está a «matar» as empresas! Isso é que está a «matar» o
emprego! E isso, Sr. Deputado Adão Silva, nós não aceitamos.
Aplausos do PS.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — A única hipótese é não acreditar no que está a dizer. Se
assim não for, é de uma ignorância!
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge
Machado.
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Laranjeiro, efetivamente, o Sr.
Deputado traz aqui uma questão problemática. Já temos dados do agravamento da situação do desemprego
para 2012, o que prova o rotundo falhanço deste Governo e destas opções políticas relativamente ao
desenvolvimento e ao crescimento do nosso País, atirando-o para uma situação de afundamento e de
desgraça no que diz respeito ao desemprego.
Mas importa aqui lembrar o seguinte: no 3.º trimestre de 2011, foram destruídos, em média, 437 empregos
por dia; no 4.º trimestre de 2011, já estávamos a destruir, em média, 1314 empregos por dia; e, hoje, temos
mais de 1,160 milhões de desempregados, graças às opções políticas tomadas.
Entre o 1.º trimestre de 2011 e o 4.º trimestre de 2011, isto é, em, grosso modo, um ano, destruímos 34
900 postos de trabalho, na agricultura, e 31 200 postos de trabalho, na indústria transformadora. Isto é,
estamos a destruir aquilo que é o aparelho produtivo nacional, com consequências gravosas para o
desemprego.
Portanto, as críticas que o Sr. Deputado dirige ao Governo PSD/CDS-PP são justas; «só se perdem as que
caem no chão», como diz o nosso povo.
Mas importa aqui lembrar que o Sr. Deputado referiu que tem uma agenda diferente relativamente ao
Governo PSD/CDS-PP. Então, a pergunta que lhe dirijo é esta: e o pacto de agressão? E o acordo com a
troica? É ou não verdade que este desemprego que registamos, esta destruição do aparelho produtivo resulta
precisamente do pacto de agressão, negociado pelo PS, assinado pelo PSD e pelo CDS-PP?
O Sr. João Oliveira (PCP): — Boa pergunta!
O Sr. Jorge Machado (PCP): — É ou não verdade que é graças a essas políticas, a essa moldura política,
a esse pacto de agressão, que tem um programa político, que se dá a destruição do emprego? É o pacto de
agressão que determina estas políticas, é o pacto de agressão do PS, do PSD e do CDS-PP que conduzem o
País a este desemprego verdadeiramente inaceitável!
Está aqui a dizer-nos que vai rasgar o pacto de agressão e retirar a assinatura do pacto de agressão, ou
não?
O Sr. João Oliveira (PCP): — Bom seria que assim fosse!
O Sr. Jorge Machado (PCP): — É que este pacto de agressão tem a negociação e a assinatura do Partido
Socialista. Se dúvidas existissem de que este caminho da troica não serve os interesses nacionais, estes
dados do desemprego provam exatamente isso.
Depois, pergunto-lhe: quanto ao Orçamento do Estado, com as suas políticas recessivas, como é que se
comportou o Partido Socialista? Votou contra? Não! Teve uma violenta abstenção no Orçamento do Estado,
isto é, deu claramente o aval à política de direita do PSD e do CDS-PP, para destruir o emprego, para criar
mais desemprego, para destruir a economia nacional. Essa é a política do Partido Socialista.
Quanto ao Código do Trabalho, com mais exploração e facilitação do despedimento, o que é que o Partido
Socialista disse, neste passado fim de semana? Que «dá luz verde» a este Código do Trabalho, miserável, de
agravamento da exploração.
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O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Portanto, como é que fica o Partido Socialista, nesta matéria?
O Sr. João Oliveira (PCP): — Deviam ter vergonha!
O Sr. Jorge Machado (PCP): — É a pergunta que lhe deixo.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Laranjeiro.
O Sr. Miguel Laranjeiro (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Machado, agradeço as suas
perguntas.
Permita-me, antes de mais, fazer ainda uma referência à última intervenção relativa às exportações, porque
importa realçar aqui o papel e o esforço dos empresários e de toda a economia. Relevamos sempre a
importância das exportações, mesmo com o Governo a puxar pelas empresas em sentido contrário, como há
pouco referi.
Protestos do Deputado do PSD Adão Silva.
É que nós confiamos nos portugueses, confiamos nos empresários, nos trabalhadores, confiamos nas
empresas que estão a lutar, mesmo com este Governo que não as ajuda.
O Sr. Adão Silva (PSD): — Não parece!
O Sr. Miguel Laranjeiro (PS): — Sr. Deputado Jorge Machado, relativamente ao acordo da troica,
reafirmamos o que dissemos: obviamente, honramos os nossos compromissos.
Protestos do Deputado do CDS-PP João Pinho de Almeida.
Dissemo-lo sempre: honramos os compromissos que assinamos.
Agora, o acordo da troica não determina o encerramento das empresas, nem este aumento do
desemprego.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Como é possível?!
O Sr. Miguel Laranjeiro (PS): — O que determina isso são políticas de austeridade sobre austeridade, de
recessão sobre recessão, que naturalmente vão sempre ao encontro de mais desemprego sobre mais
desemprego.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Ninguém acredita nisso!
O Sr. Miguel Laranjeiro (PS): — E essa é — é, Sr. Deputado João Almeida! — a política deste Governo,
que não tem a ver diretamente com o que está no Memorando da troica mas, sobretudo, com as políticas que
a maioria de direita tem vindo a implementar e que nós, Partido Socialista, temos vindo a denunciar.
Quanto ao Código do Trabalho, parece que o Sr. Deputado se limitou a ler a primeira página. Mas, sabe,
Sr. Deputado, nós não fazemos primeiras páginas…
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Já não fazem! Faziam!
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O Sr. Miguel Laranjeiro (PS): — Se calhar, faz as primeiras páginas do jornal Avante, mas nós não temos
responsabilidade pelo que está nas primeiras páginas.
Risos do PCP.
A propósito do acordo da troica, Sr. Deputado Jorge Machado, tenho de dizer-lhe — e vai ter de me ouvir
sempre dizer isto — o seguinte: vi-o sentado aí nessa bancada, quando, em março do ano passado, se juntou
ao Deputado Paulo Portas, do CDS-PP, ao Deputado Adão Silva, do PSD, e ao Bloco de Esquerda para
derrubar o governo do Partido Socialista,…
Protestos do PCP.
… porque os Srs. Deputados do Partido Comunista Português são sempre iguais, nunca estão do lado da
solução!
Aplausos do PS.
E, quando vos interessou, aliaram-se, com facilidade, à direita, para derrubar o governo do Partido
Socialista.
Aplausos do PS.
Protestos do PCP.
E os senhores sabiam qual era a agenda política que estava daquele lado, naquela bancada: é a agenda
que está agora em vigor.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Vocês aliaram-se a eles e eles «puxaram-vos o tapete»!
O Sr. Miguel Laranjeiro (PS): — E o senhor, com o seu voto, aliado aos votos da direita, também teve
responsabilidade.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Miguel Laranjeiro (PS): — Dir-lhe-ia o seguinte: o senhor também é responsável por esta política
que está em vigor.
Aplausos do PS.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Passaram a vida de mão dada com eles e, depois, zangaram-se! Assim é que
foi!
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana
Aiveca.
A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Laranjeiro, o Sr. Deputado trouxe-nos
uma questão importante, uma questão séria, dramática, aliás, de primeira preocupação para os portugueses e
portuguesas. Por isso, devemos discuti-la com toda a seriedade,…
O Sr. Miguel Freitas (PS): — Claro!
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A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — … mas também com toda a capacidade para encontrar políticas
alternativas que respondam a este flagelo.
Quero dizer-lhe, Sr. Deputado, que o Governo, desta vez, e para responder à questão do desemprego
jovem, que atinge níveis nunca vistos — 35%! —, arranjou um mecanismo, diria mesmo, insólito: criou uma
comissão intitulada «interministerial» para criar emprego jovem, tutelada — veja-se bem! — pelo Ministro
Relvas. Diria, então, que esta é uma comissão bluff. É uma comissão para fazer exatamente o quê?
Publicidade? Se é publicidade, ela é enganosa, porque, efetivamente, o que se precisa, hoje, é de políticas de
criação de emprego, particularmente para os jovens, as quais passam por investimento, público e privado. Os
jovens precisam de respostas e não precisam que haja alguém que os aconselhe a emigrar, porque têm lugar
aqui, num Portugal que se quer maior, num Portugal que tem de acarinhar esta geração, que é a geração mais
qualificada de sempre.
Portanto, creio que esta comissão é, de facto, um bluff e é publicidade enganosa.
Uma outra medida do Governo, face ao desemprego, face aos últimos dados conhecidos — foi de 1000 o
número de pessoas desempregadas por dia, no último trimestre! —, traduziu-se em quê? Em cortar nos apoios
sociais!
Ora, gostaria que o Sr. Deputado nos dissesse se não acha necessário alterar as regras do subsídio de
desemprego, sendo que mais de metade dos desempregados, particularmente os jovens, não tem sequer
acesso a essa proteção social. E se, por um lado, são necessárias políticas de criação de emprego, por outro,
também são necessárias melhores políticas. Numa situação recessiva, numa situação de agravamento da vida
dos portugueses e portuguesas, é necessária uma proteção que os dignifique, ao contrário da proteção
instituída por este Governo, que escorraça os desempregados e desempregadas, particularmente os nossos
jovens.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Laranjeiro.
O Sr. Miguel Laranjeiro (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Mariana Aiveca, estou plenamente de
acordo no sentido de que esta matéria do desemprego deve ser tratada com a seriedade e a serenidade que
este problema comporta.
Temos sempre dito que a política escolhida, de austeridade em cima de austeridade — foi uma opção do
Governo — iria ter esta consequência. E, infelizmente, só mesmo tendo fé é que achamos que vai ficar por
aqui; infelizmente, em muitos setores da atividade empresarial do País, a situação do emprego vai degradar-se
(muito provavelmente, na área da construção civil e na área da restauração). Portanto, nos próximos meses,
deverá registar-se um aumento do desemprego, para além dos 14,5%, previstos pelo Ministro das Finanças. E
isso é grave!
A Sr.ª Deputada referiu, e bem, que, de acordo com o último boletim do Instituto Nacional de Estatística, o
desemprego jovem é de 35,4%. É uma das preocupações centrais das nossas propostas e da nossa
argumentação política.
Como é público, apresentámos algumas medidas, das quais umas já têm alguns meses, no sentido de
aumentar a aplicação do programa no mínimo por um ano, mas também medidas concretas para ir ao
encontro de problemas concretos, como é o caso da redução das taxas de pagamento de impostos por parte
das empresas e instituições que comprovadamente promovam exportações, investimento e desenvolvimento,
contratação de jovens — porque é muito importante que as empresas tenham algum benefício e sejam
estimuladas à contratação de jovens — e também captação de investimento direto estrangeiro. Estas medidas
estão em cima da mesa. O Governo e a troica também as conhecem.
De facto, a solução «emigrar» custa muito, porque, na mesma semana em que o Primeiro-Ministro disse
que a solução para os jovens portugueses era a emigração, sair da sua zona de conforto, o Ministro das
Finanças da Grécia, que estava e está numa situação muito pior, fez um apelo aos jovens gregos para ficarem
no seu país. Todos estamos de acordo de que os jovens são absolutamente centrais no desenvolvimento e na
criação de riqueza e de futuro para os seus países.
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Sr.ª Deputada, relativamente às questões sociais que apontou, tenho de lhe dizer que o Partido Socialista,
ao longo dos anos que teve responsabilidades governativas, deixou uma marca muito profunda de novas
políticas sociais, que ainda hoje serão debatidas neste Plenário, das quais tem orgulho. E é com esse capital
que nos apresentamos e debatemos politicamente as matérias sociais quanto ao que é proposto pelo Bloco de
Esquerda. Não temos qualquer problema em debater tudo, porque fizemos o que devíamos fazer no momento
certo.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Artur
Rêgo.
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Laranjeiro, o Partido Socialista está a
estranhar, porque nunca foi a sua prática, apanhar pela frente um Governo sério, um Governo honesto, um
Governo que não mente.
A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — Que não mente?!
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Este é um Governo que diz que temos um problema, que estamos a
cumprir o Memorando de Entendimento e que, portanto, é natural que, durante esta fase, a taxa de
desemprego cresça. É esta seriedade do Governo que o PS está a estranhar.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — O Sr. Deputado Miguel Laranjeiro disse, na intervenção, que Portugal não
precisa de propaganda. Nesse sentido, pergunto-lhe se se lembra da taxa de desemprego que tínhamos em
2008 e da evolução da taxa de desemprego de 2008 para 2009, de 2009 para 2010 e de 2010 para 2011. Foi
sempre de cerca de 2%, Sr. Deputado!
O Sr. Jorge Machado (PCP): — É tudo «farinha do mesmo saco»!
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — É verdade que agora a taxa de desemprego está nos 14% e que a média
anual é de 12,7%. No entanto, qual é a diferença entre a evolução da taxa de desemprego com este Governo
e a evolução da taxa de desemprego nos últimos três, quatro, cinco anos de governação socialista? Não me
lembro de ver, nesses anos, o Sr. Deputado Miguel Laranjeiro chamar a atenção e fazer uma intervenção todo
empolado como a que fez agora.
Mais: disse o Sr. Deputado que Portugal não precisa de propaganda. Lembra-se, Sr. Deputado, que o seu
primeiro-ministro Sócrates prometeu combater o desemprego, tendo o resultado sido mais desemprego, e
prometeu criar, em 2009, 150 000 novos postos de trabalho?
A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — Não foi em 2009! Foi em 2005!
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Pois é, Sr.ª Deputada. Então, ainda é melhor, porque em 2005 Portugal
tinha cerca de 500 000 desempregados e em 2009 tinha quase 800 000.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Estamos esclarecidos!
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Se somarmos a esse número os 150 000 novos postos de trabalho
prometidos, veja só a taxa de evolução.
A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — Houve uma crise pelo meio!
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O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Tenho comigo esses dados. São dados do Instituto Nacional de Estatística.
O PS, agora que está na oposição, milagrosamente diz que tem e que vai propor medidas para promover o
emprego. Lembro, no entanto, que o PS foi pródigo em medidas, fez pacotes de 50 e de 100 medidas. Qual foi
o resultado prático? Zero.
Protesto do PS.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Vou concluir, Sr. Presidente.
Este Governo, cumprindo o Memorando de Entendimento que foi assinado pelo Partido Socialista e que
subscrevemos e honramos, está a fazer uma coisa, que essa, sim, é essencial para relançar o País: está a
tomar medidas estruturais e a fazer reformas estruturais nos mais diversos sectores. É esse o caminho para
reformar o País. É o que este Governo está a fazer e não o que fez o governo socialista.
Sr. Deputado, devolvo-lhe o que disse: propaganda! Propaganda! Propaganda!
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra, para responder, o Sr. Deputado Miguel Laranjeiro.
O Sr. Miguel Laranjeiro (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Artur Rêgo, agradeço as questões que
colocou.
O Sr. Deputado falou em verdade e lembrei-me do que foi a campanha eleitoral do CDS-PP e do PSD.
Disseram a todos os portugueses que não aumentavam os impostos, mas aumentaram o IVA e o IRS,
disseram «não cortaremos subsídios», mas cortaram metade do subsídio de Natal a todos os funcionários
públicos.
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Isso é falso!
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Completamente falso!
O Sr. Miguel Laranjeiro (PS): — Sim, sim!
Vou usar um dos temas que é muito caro ao CDS-PP, nomeadamente ao seu líder: a lavoura. Disseram
sempre que iam ter um cuidado especial com os agricultores e que iam pagar a tempo e horas. Mentira! Estão
em dívida com os agricultores portugueses há vários meses!
Aplausos do PS.
É importante que os portugueses saibam que estamos a falar de 20% das ajudas comunitárias, de 120
milhões de euros que são integralmente pagos pela União Europeia e que não foram transferidos para os
agricultores. Onde é que ficaram? Isso é falar verdade?
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Oiça os agricultores!
O Sr. Miguel Laranjeiro (PS): — Não. Isso não é falar verdade.
Protestos do Deputado do CDS-PP Abel Baptista.
O Sr. Deputado Artur Rêgo falou do desemprego. Mostrei há pouco um quadro que é absolutamente
verdadeiro, do qual consta a projeção do Ministro. Desenhei, inclusivamente, no quadro uma seta ascendente,
porque muito provavelmente a taxa vai continuar a subir.
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Sabe, no entanto, para quem é que não há desemprego? Para os membros dos gabinetes e dos grupos de
estudo e de trabalho que foram criados.
Aplausos do PS.
Vou citar-lhe o nome de alguns grupos: para a administração central, para o ensino superior público, para a
comunicação social, para a política agrícola comum, para a reforma hospitalar, para as boas práticas clínicas,
para a avaliação das atividades dos árbitros e entidades equiparadas, para o regime jurídico e fiscal das
sociedades desportivas, para a reforma do processo civil, para os cuidados de saúde primários. Enfim, são
páginas e páginas de grupos de trabalho.
Protestos do CDS-PP.
Posso referir mais grupos: para a avaliação dos estabelecimentos de educação pré-escolar, para o
transporte de doentes não urgentes, para a estratégia integrada de apoio às empresas turísticas. Enfim, são
dezenas e dezenas de grupos de trabalho. Os membros destes grupos não têm problema de emprego.
Quem tem esse problema são os milhares e milhares de portugueses, porque esses, sim, estão sem
trabalho.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Srs. Deputados, concluímos as declarações políticas.
Vamos passar ao segundo ponto da ordem de trabalhos, que consta da apreciação conjunta dos projetos
de resolução n.os
196/XII (1.ª) — Recomenda medidas que permitam relançar a cultura beterraba sacarina em
Portugal (PSD) e 234/XII (1.ª) — Sobre a retoma da produção da beterraba sacarina em Portugal (PCP).
Para apresentar o projeto de resolução n.º 196/XII (1.ª), do PSD, tem a palavra o Sr. Deputado Vasco
Cunha.
O Sr. Vasco Cunha (PSD): — Sr. Presidente, o contributo que a agricultura e a agroindústria podem dar
para a economia portuguesa é consensual na sociedade portuguesa e é significativo, quer na geração de
riqueza, quer no combate ao desemprego, quer na redução da nossa dependência externa.
Todavia, na abordagem à agricultura portuguesa, há duas condicionantes que é importante referir. Desde
logo, a que resulta dos nossos recursos naturais, no que diz respeito ao solo e ao clima com as limitações que
lhes são reconhecidas, mas também a concorrência global em que hoje vivemos com os nossos parceiros
europeus e com os outros continentes.
O cultivo da beterraba sacarina, particularmente entre 1995 e 2006, apresentou, para a agricultura e para a
economia portuguesas, níveis de produtividade acima da média europeia e com excelente qualidade. O êxito
da cultura permitiu que as importações de açúcar fossem dramaticamente reduzidas e que Portugal tivesse
capacidade para se autoabastecer também com um nível elevado. Hoje, infelizmente, a realidade é inversa:
dependemos mais do que em 2006 da importação de ramas.
Importa, por isso, sublinhar algumas das vantagens que reconhecemos na introdução desta cultura. Desde
logo, constitui uma boa alternativa para o regadio, configura um interessante produto a explorar pelos
agricultores e é também uma solução com valor acrescentado para a agricultura e para a economia
portuguesas.
Permito-me referir aqui apenas alguns, poucos, indicadores para ilustrar o que acabei de sublinhar. Esta
cultura requer entre 7000 ha a 8000 ha para uma produção de 100 000 t, cria a possibilidade de atividade de
600 empresários agrícolas, gera emprego, estimula o consumo de fatores de produção e também o sector dos
transportes. Esta é, por isso, uma cultura com pouco risco e com uma importância significativa no contexto da
rotação das culturas agrícolas.
Nesse sentido, o PSD propõe este projeto de resolução ao Governo, solicitando que tome as diligências
necessárias em termos nacionais e comunitários para que a fábrica de açúcar em Coruche, a DAI —
Sociedade de Desenvolvimento Agro-Industrial, possa voltar a laborar beterraba sacarina.
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Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para apresentar o projeto de resolução n.º 234/XII (1.), do PCP, tem a
palavra o Sr. Deputado Agostinho Lopes.
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Se alguém quiser saber como foi
possível atingir os atuais níveis de endividamento em Portugal, pode olhar para a história da beterraba
sacarina. É um bom exemplo das políticas de direita.
Aliás, o projeto do PSD é mais um ato de contrição pelos pecados antigos e esperamos que não seja
apenas propaganda, como a que acabou ontem de fazer a Sr.ª Ministra da Agricultura com o anúncio de 29
milhões de euros para projetos de regadio para minimizar a exposição à seca. Trata-se de investimentos do
PRODER já previstos e que só terão efeitos daqui a uns anos. É um anúncio para esconder o corte de mais de
150 milhões de euros no regadio, dos quais 60% nos regadios tradicionais e 40% nos públicos.
A política da beterraba, sem soluções de continuidade, esteve presente durante a ditadura fascista,
atravessou o 25 de abril e chegou aos dias de hoje.
Antes do 25 de abril, não podia existir, porque chocava com os interesses dos grupos monopolistas que
exploravam plantações de cana do açúcar em Angola e Moçambique e as duas refinarias em Portugal.
Com o 25 de abril, criaram-se condições para uma nova política açucareira, mas logo em 1977 o governo
PS/Mário Soares determinou a suspensão do projeto de introdução da cultura de beterraba.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Bem lembrado!
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Depois, a má negociação da adesão à CEE fixou a cota mínima e
insuficiente de 60 000 t e só em 1996 a União Europeia admitiu mais 10 000 t. Foram dez anos de atraso na
indústria, um enorme prejuízo para o País e 200 milhões de euros nos bolsos da Tate & Lyle e da RAR.
No entanto, o mais extraordinário foi o esforço dos governos PSD e PS para «meter as raposas na
capoeira», permitindo a sua presença no projeto e no capital da nova unidade industrial. Esta unidade, que
teve um apoio do Estado de 50 milhões de euros, num investimento total de 80 milhões de euros, está em
funcionamento desde 1997 e é, apesar de a produção corresponder apenas a 20% do consumo, uma
importante vitória da agricultura portuguesa.
Mas a história não podia acabar bem.
Em 2006, a União Europeia reabre o debate sobre a Organização Comum de Mercado (OCM) do açúcar
para reduzir a produção europeia, onde a Alemanha e a França — lembre-se — tinham 61% da produção. E,
num golpe de génio, o Ministro Jaime Silva e o seu governo PS aceitaram, na Comissão Europeia, uma
redução da cota, primeiro, para 34 000 t e, no ano seguinte, ou seja, em 2008, para 15 000 t.
Os 1000 agricultores do vale do Sorraia e até do vale do Mondego, que tinham alcançado e levado as
produtividades bem acima do nível médio da União Europeia, abandonaram a produção. Portugal voltou a
importar ramas, houve o aumento do défice agroalimentar e a perda de subprodutos na alimentação animal.
Foi só prejuízo! Tudo justifica a retoma da cultura, Srs. Deputados: o elevado endividamento externo, onde
pesa o défice agroalimentar; solos disponíveis com regadio, a que o Alqueva acrescenta milhares de hectares;
uma nova reforma da PAC, isto é, a oportunidade para reclamar a correção do erro de 2006/2007; e tem
faltado açúcar, na União Europeia, nos últimos anos. A soberania alimentar e os interesses da agricultura
portuguesa exigem-no!
O PCP, que há décadas se bate pela produção da beterraba sacarina, que foi o único partido que
denunciou e reclamou o crime praticado pelo governo PS, considera que o Governo PSD/CDS-PP deve avaliar
áreas, exigir a quota adequada e medidas para que a fábrica funcione com beterraba sacarina.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Abel Baptista.
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O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Os dois projetos de lei que hoje
discutimos, do Partido Comunista Português e do Partido Social Democrata, têm uma história que acaba por
ser drasticamente interrompida na campanha de 2006/2007, uma vez que as negociações bilaterais entre
Portugal e a Comissão Europeia, que antecederam este acordo, foram mal conduzidas pelo Ministro da
Agricultura Jaime Silva e pelo governo socialista.
Nessa altura, o governo socialista não soube ou não quis aproveitar a oportunidade para defender a
agricultura nacional e acautelar o interesse nacional.
Senão, vejamos: apesar de as novas orientações para a organização comum do mercado do açúcar
comportarem desafios acrescidos, em termos de competitividade (abaixamento dos preços de produção,
redução da produção, etc.), quando se chegou às negociações bilaterais, necessárias ao acordo sobre as
novas regras, o Ministro da Agricultura preteriu os interesses nacionais, negociou a transformação do
complexo agroindustrial, abastecido pela produção nacional (com excelentes resultados, diga-se de
passagem), num mero refinador de açúcar bruto, com base em ramas importadas (semelhante, aliás, aos
outros dois refinadores já existentes no território nacional). Foi esta a opção: dizimar, repito, dizimar a
produção nacional de beterraba sacarina!
Do ponto de vista da agricultura nacional, as medidas de exceção a negociar deveriam ter privilegiado a
continuação do aproveitamento da beterraba nacional, que poderia ser utilizada para a produção de bioetanol
(biocombustível substituto da gasolina) ou para uma produção mista de bioetanol e açúcar. Esta não foi a
opção, porque esta foi mais uma das medidas políticas contra a produção nacional do, então, ministro Jaime
Silva e do governo do Partido Socialista.
Se a negociação tivesse procurado manter o aproveitamento da cultura da beterraba, para além de ser
vantajoso para a agricultura nacional, teria assumido uma importância estratégica, com vantagens económicas
indiscutíveis para o País, pois permitiria contribuir para que as metas de substituição de combustíveis fósseis
rodoviários por biocombustíveis se alcançassem, aproveitando a matéria-prima nacional e o complexo
agroindustrial existente.
Claro está que, com estas medidas, não só foi necessário voltar a investir cerca de mais 13 milhões de
euros na fábrica da DAI (DAI — Sociedade de Desenvolvimento Agro-Industrial, SA), para possibilitar a
refinação de ramas importadas, como se liquidou completamente a produção nacional.
Evidentemente, neste momento, e face à situação atual, é necessário encontrar, eventualmente, algumas
alternativas e, não sendo seguro que o regresso da beterraba a Portugal possa ser uma solução eficaz, não é,
de todo, de não tentar aproveitar.
Sendo certo que os erros passados já foram demasiados, convém, agora, fazermos isto de forma
atempada e segura, permitindo que a competitividade na produção da beterraba em Portugal, que
comprovadamente é superior à da média comunitária, possa voltar a ser instalada.
Para isso, é necessário encontrar alguns mecanismos e, obviamente, entrar em negociações com a
Comissão Europeia. Espero que, agora, o Partido Socialista tenha, pelo menos, o bom senso de, nesta
matéria, emendar a mão em relação ao que fez em 2006 e 2007.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Ainda para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel
Freitas.
O Sr. Miguel Freitas (PS): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Não percebíamos muito bem porque
é que o PSD trazia este assunto a esta Assembleia da República. Pensámos que pretendia, acima de tudo,
«adoçar» o caminho ao Governo. É verdade que o PCP parece ter introduzido aqui um elemento novo e ter
transformado um doce num presente envenenado… Portanto, vamos ver onde levará o debate que estamos
hoje, aqui, a fazer.
Sr.as
e Srs. Deputados: A beterraba sacarina desapareceu de Portugal por uma reforma feita em 2003, com
o desligamento das ajudas. Com o desligamento das ajudas, deixou de ser viável fazer beterraba sacarina,
porque havia uma ajuda específica aos produtores que, ao acabar e ao integrar-se no RPU (Regime de
Pagamento Único), determinou que a cultura deixasse de ser viável.
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Portanto, no cenário em que estamos, já que estamos a conversar com a Europa no sentido da
redistribuição das ajudas, estranhamos que o PSD e o CDS considerem que, num quadro de menor ajuda aos
agricultores de regadio, esta cultura possa vir a ser de novo viável em Portugal.
Mas também é verdade que o discurso do PCP permanece obtuso, isto é, o PCP sistematicamente diz uma
coisa e o seu contrário.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Ai é?!
O Sr. Miguel Freitas (PS): — Defende a cultura da beterraba em Portugal, com fortíssimos estímulos e
apoios aos agricultores (creio que não desconhece que os produtores de beterraba sacarina, em Portugal,
eram dos que mais ajudas recebiam por hectare), mas, simultaneamente, vem defender a redistribuição das
ajudas.
Portanto, é neste quadro que estamos a discutir as duas propostas.
Queremos dizer o seguinte: é verdade! É verdade que a Europa errou sistematicamente em todas as suas
previsões. É verdade que os preços estão elevados. É verdade que, hoje, existem oito ou nove países
europeus que querem a derrogação do prazo das quotas, de 2015 para 2020. É verdade que, na nossa
perspetiva, o Governo português deve estar nessa negociação. Se há abertura dessa negociação, o Governo
português deve lá estar, e deve lá estar, acima de tudo, porque está muita coisa em causa. Mas o Governo
português deve discutir em vários tabuleiros e, se não ganharmos neste, evidentemente, devemos ganhar,
particularmente, na derrogação das quotas leiteiras e na derrogação dos direitos de plantação.
Portanto, é nessa perspetiva tática que estamos aqui para apoiar a iniciativa do PSD, que quer retomar a
cultura da beterraba sacarina em Portugal.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr. Deputado.
O Sr. MiguelFreitas (PS): — Peço-lhe só mais 30 segundos, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado, já ultrapassou largamente o tempo de que dispunha.
O Sr. Miguel Freitas (PS): — É evidente que, ao trazer esta questão, novamente, à Assembleia da
República, se tiver uma vitória, terá um doce, se tiver uma derrota, certamente, ficará com o presente
envenenado.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Vasco Cunha.
O Sr. Vasco Cunha (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Se, porventura, alguém chegasse hoje a
Portugal, e há largos meses não visse as notícias na televisão e na imprensa portuguesa, certamente,
consideraria que a agricultura não tem qualquer tipo de esperança.
Parece que o Ministério da Agricultura, de acordo com as notícias que se podem ver nos jornais e na
televisão, apenas serve para discutir a não devolução de dinheiro a Bruxelas, para evitar que haja brutais
multas por incumprimentos vários ou para encontrar soluções para problemas aos quais é alheio, como é o
caso da seca.
Nesta particular situação que discutimos aqui, hoje, temos de ter alguma esperança. A negociação da
próxima PAC está ainda no seu início e, ao contrário do ceticismo que o Deputado Miguel Freitas apresenta,
gostaria de ter alguma esperança para a agricultura e para a economia portuguesas.
Diz o Sr. Deputado, e também o Partido Socialista, que este pode ser um «presente envenenado». Sr.
Deputado, não quero, por razões óbvias, falar em presentes envenenados e em quem os deixa a quem,…
Vozes do PSD: — Muito bem!
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O Sr. Vasco Cunha (PSD): — … mas digo-lhe, sobretudo, que este debate é importante para assumir e
clarificar posições.
Da exposição que aqui fez percebi que o Partido Socialista tem um «nim»: diz que há um conjunto de
situações que provavelmente não conduzirão a esta solução, mas acredita e quer ter esperança de que ela
possa, finalmente, confirmar-se nas negociações da PAC.
Estamos a fazer o lançamento de um debate, no âmbito do qual os Deputados do PSD, na Comissão de
Agricultura, apresentarão, proximamente, um requerimento, no sentido de que outros atores e intervenientes
nesta fileira venham debater aqui, connosco, esta problemática. É uma oportunidade que tem de estar em
cima da mesa, no momento em que estamos a iniciar as negociações da PAC.
Quero concluir fazendo uma pequena referência ao projeto de resolução do Partido Comunista Português.
É legítimo que o Partido Comunista Português conte a sua história neste processo. Quero apenas fazer-lhe
uma pequena correção, que, aliás, surgiria facilmente se o Deputado António Filipe também tivesse assinado
este projeto de resolução, porque ele, por sua própria elaboração, certamente o corrigiria: a cultura da
beterraba no vale do Sorraia não é, sequer, um dos bons exemplos para a produção ou para o conjunto dos
produtores que aí estão.
Risos do PSD.
No vale do Sorraia, o conjunto dos produtores, com o conjunto de produções que aí conseguia fazer, não
tirava mais do que 2% ou 3% de beterraba sacarina.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Lopes, que, como já não
dispõe de muito tempo, terá de fazer uma brevíssima intervenção.
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: De forma muito rápida, gostaria de
concluir este debate dizendo que o CDS-PP está, claramente, com muitas dúvidas relativamente à
possibilidade de introduzir a beterraba sacarina no nosso País e, portanto, mantém uma posição conhecida.
Gostaria de perguntar ao Deputado Miguel Freitas se considera que os agricultores franceses e alemães de
beterraba recebiam exatamente a mesma ajuda que os produtores portugueses de beterraba. Não recebiam,
Sr. Deputado! E este é o grande problema da redistribuição, que defendemos, do ponto de vista da reforma da
PAC, a qual, infelizmente, mais uma vez, não se vai verificar. Vão-se manter as diferenças substanciais,
perdendo qualquer sentido, inclusive, a palavra competitividade, quando falamos de competição e
concorrência entre a produção agrícola desses países e a de Portugal, no quadro da União Europeia.
Gostaria de apresentar uma conclusão final: é que, de facto, PS, PSD e CDS-PP são corresponsáveis pelo
enorme atraso com que esta cultura chegou a Portugal e, depois, o PS ainda tem a responsabilidade direta
pelo facto de essa cultura ter acabado no nosso País. Mas gostaria de deixar muito claro que o PSD e o CDS
estiveram completamente mudos perante o processo do, então, ex-ministro da Agricultura, Jaime Silva, de
liquidar esta cultura. Não se ouviu uma palavra, nem do PSD nem do CDS, relativamente a este problema.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Esperemos que, de facto, o projeto de resolução do PSD não seja
apenas propaganda.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Srs. Deputados, concluímos este debate, pelo que vamos proceder à
apreciação, na generalidade, do projeto de lei n.º 10/XII — Alarga as condições de acesso e atribuição do
abono de família (PCP).
Para a respetiva apresentação, tem a palavra a Sr.ª Deputada Rita Rato.
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A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Cabe ao Estado garantir, respeitar e promover o
exercício pleno dos direitos das crianças e dos jovens, com vista ao seu desenvolvimento integral e à
efetivação dos seus direitos económicos, sociais e culturais.
Tempos como os que vivemos, de profundas desigualdades sociais, aumento do desemprego e da
precariedade, baixos salários, cortes salariais e aumento brutal do custo de vida, geram situações dramáticas
para milhares de famílias.
O anterior Governo do PS, com o apoio do PSD e do CDS, desencadeou um violento ataque às prestações
sociais, degradando violentamente o dia-a-dia de milhares de pessoas e afastando-as destes apoios.
O Decreto-Lei n.º 70/2010 veio agravar o inaceitável filtro a prestações sociais, que para o PCP são
direitos, com o objetivo de poupar, reduzindo o número de beneficiários destas prestações sociais ou
reduzindo substancialmente o seu montante.
Por outro lado, este diploma eliminou o aumento extraordinário de 25% do abono de família nos primeiro e
segundo escalões e acabou com a atribuição do abono de família nos quatro e quinto escalões.
Os efeitos foram desastrosos: cerca de 800 000 crianças e jovens perderam o abono de família; cerca de
um milhão e 75 000 beneficiários sofreram um corte de 25%; e mais de 13 000 crianças e jovens perderam a
bonificação por deficiência no abono de família.
Os efeitos destas decisões injustas e inaceitáveis levaram a que mais de 80% dos beneficiários tivessem
perdido ou sofrido cortes na sua proteção social.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: Importa recordar que uma criança cuja família sobreviva com o
rendimento mensal de referência de 628 € perde o abono de família. 628 €!!!… Essa criança recebia de abono
22,59 €!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Um escândalo!
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Era insuficiente, mas era determinante para pagar dois pacotes de fraldas,
roupa, calçado, livros, material escolar e alimentação.
Este projeto de lei, apresentado pelo PCP, não exclui, antes exige, o compromisso de uma revisão futura
mais profunda do enquadramento legal do abono de família, no entanto, devido à dramática situação de
muitos milhares de famílias, o PCP apresenta este projeto como um contributo decisivo para a reposição
urgente de mais justiça social.
É uma emergência social a revogação da condição de recursos imposta pelo Decreto-Lei n.º 70/2010 para
a atribuição do abono de família.
Por isso, defendemos a reposição da majoração do abono de família em 25% nos primeiro e segundo
escalões, a reposição do abono de família nos quarto e quinto escalões, a reposição dos valores pagos antes
das medidas que vieram cortar violentamente os apoios sociais e a cessação da decisão de devolução de
verbas do abono de família recebidas indevidamente.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É inaceitável que o pacto de agressão da troica, subscrito pelo PS, pelo
PSD e pelo CDS-PP, que recapitaliza a banca e os grupos económicos e financeiros, ao mesmo tempo atire
todos os dias para a pobreza e o desemprego milhares de pessoas, atacando os direitos fundamentais das
crianças, dos jovens e das suas famílias, pondo em causa necessidades básicas e uma das maiores
conquistas da Revolução de Abril: a proteção da infância e da juventude no superior interesse da criança.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Nilza de Sena.
A Sr.ª Nilza de Sena (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Num momento em que o País
atravessa uma crise económica e financeira grave e em que se debate com uma condição orçamental, que é
sobejamente conhecida, o Governo retomou as propostas que já vinham da herança deixada pelo Orçamento
do Estado de 2011 e prosseguiu o Decreto-Lei n.º 70/2010, de 16 de junho.
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Vozes do PSD: — Bem lembrado!
A Sr.ª Nilza de Sena (PSD): — Esta lei procedeu à definição de regras claras, designadamente quanto à
prova de rendimentos do agregado familiar e a sua respetiva composição, efetuada por via fiscal ou
documentalmente junto da entidade gestora das prestações.
Quando o PCP sugere que quem não preencha os requisitos legais, e até apresente rendimentos
razoáveis,…
Vozes do PCP: — 628 €…!!
A Sr.ª Nilza de Sena (PSD): — … possa receber indevidamente o abono de família, está, obviamente, a
tirá-lo a quem precisa dele com genuína necessidade.
Vozes do PSD: — Exatamente!
A Sr.ª Nilza de Sena (PSD): — É evidente que ninguém gosta de políticas excessivamente restritivas.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Tenha vergonha! Seja séria!
A Sr.ª Nilza de Sena (PSD): — Por isso, o PSD deseja que as condições que agora vigoram sejam
temporalizadas, sejam breves, se possível, e assim que houver folga orçamental…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Mas para os bancos não falta!
A Sr.ª Nilza de Sena (PSD): — … possam ser repostos os níveis de apoio às famílias, designadamente às
mais carenciadas, às monoparentais, bem como desenvolver políticas públicas mais objetivas de incentivo à
natalidade e de renovação geracional.
Em período de aperto financeiro, vir sugerir, como o PCP propõe, a devolução de verbas de prestações
indevidamente pagas, é apenas revelador do desconhecimento dos Srs. Deputados acerca da recomendação
feita pelo Tribunal de Contas, que visa estabelecer, após apuramento de rendimentos e dimensão dos
agregados familiares, uma atribuição mais justa e rigorosa. É disso que se trata: de garantir elementar justiça!
É essa premissa que conduz ao reforço da equidade social. São propostas como esta do PCP que nos
levam a um caminho de fraca coesão. São propostas como esta do PCP que são totalmente desajustadas da
realidade social.
Protestos do PCP.
Ao Governo preocupa-se com os que mais precisam!
Vozes do PCP: — Pois, as famílias dos Salgados, dos Belmiros…!
A Sr.ª Nilza de Sena (PSD): — Por isso, o Governo está a pôr em prática um Plano de Emergência Social
que não esquece as famílias com medidas concretas e proteção específica.
Protestos do PCP.
Sr. Presidente, eu pedia que pudesse falar sem ter de gritar…
O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr.ª Deputada, estamos a ouvi-la perfeitamente.
Os Srs. Deputados vão fazer o necessário silêncio para que a Sr.ª Deputada possa ser convenientemente
ouvida.
Queira continuar, Sr.ª Deputada.
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A Sr.ª Nilza de Sena (PSD): — Ao Governo preocupam os que mais precisam! Por isso, o Governo está a
pôr em prática um Plano de Emergência Social que não esquece as famílias, com medidas concretas e
proteção específica.
Não é só através de prestações familiares que se promovem os apoios! É urgente repensar a família e
repensá-la à luz daquilo que são as novas famílias, à luz dos novos paradigmas de conjugalidade e de
parentalidade.
É importante que as políticas públicas incidam sobre os processos e as formas de vida em família, que hoje
não são só concludentes com o modelo de família tradicional.
A família nuclear coexiste hoje, como é bem sabido, com as famílias recompostas, com as famílias
monoparentais e até com famílias constituídas apenas por uma pessoa.
É, pois, fundamental que os serviços de apoio à família se adaptem o mais possível — e isto é ajustá-la à
realidade — ao modelo de casal de dupla carreira.
Vozes do PCP e do BE: — O que é que isso tem a ver com o projeto de lei?
A Sr.ª Nilza de Sena (PSD): — É nesse enquadramento e com esse espírito presente que as políticas
públicas de família devem ser equacionadas.
Este Governo já começou a fazê-lo com o aumento de 20 000 lugares nas creches, aproveitando
equipamentos que estavam até então subaproveitados. Esse esforço já começou a ser feito!
Não traga aqui o PCP sonhos e vontades; traga propostas refletidas. Não traga aqui o PCP acendalhas
para incendiar estas questões; traga sugestões ajustadas à realidade. É disso que precisamos e é isso que o
Governo vem fazendo!
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Aiveca.
A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Queria começar esta intervenção
por uma afirmação que, creio, é a mais justa e equilibrada: é urgente repensar os direitos das crianças! Por
isso, é urgente redefinir aqueles que foram os cortes indevidamente feitos a esses direitos.
O abono de família quando surgiu, naquele que é o nosso quadro legislativo e na Segurança Social, tinha
um centro e esse centro era exatamente o direito das crianças.
É evidente que, ao longo dos anos, tudo isto se foi pervertendo e culminou com uma legislação em que se
esquecia o direito das crianças para as colocar numa certa amálgama de condição de recursos, o que veio
gerar uma situação em que se considera que uma criança cujos rendimentos da sua família sejam razoáveis,
diz a Sr.ª Deputada do PSD, seja lá o que isso for, mas o que é verdade é que sabemos que os senhores
consideram rendimentos razoáveis 628 €… Veja só, Sr.ª Deputada, o que é a vossa conceção de direitos das
crianças e a vossa conceção de rendimentos razoáveis para dar às crianças a dignidade que merecem!…
Portanto, hoje estamos confrontados com uma situação em que uma em cada três crianças não tem direito
a abono de família. Sabemos hoje que imensas famílias vivem nas maiores dificuldades e as alternativas que
o Governo veio apresentar são tão-só transformar as creches em «armazéns», porque é disso que se trata,
alterando até o número de metros quadrados necessários para abranger mais crianças, fazendo-nos crer que
essa é a alternativa à dignidade das crianças.
Creio que há aqui uma distorção daquele que foi o primado da atribuição o abono de família há dezenas de
anos.
Por isso, acho que temos de retomar essa questão e retomá-la é atribuir a todas as crianças de igual forma
um direito que é o de terem uma vida minimamente digna, protegendo de facto essa sua dignidade.
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Muito bem!
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A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Por isso, hoje, numa situação de crise, numa situação de recessão, numa
situação em que, cada vez mais, as famílias estão em dificuldades, numa situação em que, cada vez mais, os
índices de natalidade estão a recuar como nunca, parece-me que é importante que esta solução seja
colocada.
Os senhores fazem um discurso de incentivos à natalidade, como o faz o Sr. Ministro da Segurança Social,
mas a oferta que têm para dar é pôr mais crianças em creches, em mais «armazéns», não ligando nenhuma
aqueles que são os direitos das crianças.
Por isso, faz sentido esta discussão e o BE associa-se a ela, porque não é possível que, nos últimos
tempos e depois da aplicação desta estranhíssima lei da condição de recursos, mais de 1,5 milhões de
crianças tivessem visto ser-lhes cortados parcialmente ou até retirados o abono de família, o que significa que
uma em cada três são abrangidas.
Concluo, Sr. Presidente, dizendo que é urgente repensar o direito das crianças!
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Artur Rêgo.
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Qual é o sentido que tem, neste
momento em que estamos vinculados por um Memorando de Entendimento a um esforço tremendo que onera
e impõe sacrifícios a todos os portugueses, em que o Governo está obrigado a um extremo rigor e a um
esforço de gestão diário, criterioso, dos recursos que tem e que são escassíssimos, em que cada euro dado
em excesso a alguém…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — O «problema» é que continua a haver crianças!
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — … é um euro que vai faltar a outra pessoa,…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Mas para a banca há!
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — … qual é o sentido que tem, perguntava eu, o Grupo Parlamentar do PCP
vir aqui apresentar esta sua proposta? E fazê-lo sabendo inclusive que, estando em curso a execução de um
orçamento, esta sua proposta acarreta despesa adicional não orçamentada, ilegal portanto, o que a torna
inexequível e um mero exercício de retórica?
Tendo consciência — o Governo e esta maioria — de que estas prestações de abono de família não são
nenhuma fortuna, é verdade!, estando conscientes da debilidade financeira de milhares de famílias
portuguesas qualquer euro extra é bem-vindo, também é verdade!, e mesmo que o que o PCP propõe fosse
viável e legal, o que como já se viu aqui não é, com que cara iria o Governo justificar perante milhões de
portugueses que arranjou verba para aumentar esta prestação social específica, mas não para aumentar
outras prestações sociais também relevantes e também para beneficiar pessoas igualmente carenciadas?
Com que cara? Com que moral e com que autoridade?
A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — O Deputado Pedro Mota Soares tinha a receita, não sei por que não a
aplica!
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Propõe ainda o PCP que, não obstante, todas as pessoas que não tenham
feito prova de condição de recursos e que tivessem direito a essa prestação, e que, no entanto, já a tenham
recebido, não tenham de a devolver.
Com que direito e com que cara pode o Governo defender…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — O Direito da Criança!
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O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Com que direito, com que cara e com que moral pode este Governo
defender uma situação destas e como iria explicar aos restantes portugueses, a todos os restantes milhões de
portugueses, que dava cobertura a esta exceção em clara violação da lei e, acima de tudo, em clara frustração
do esforço a que todos os portugueses estão a ser submetidos e que lhes está a ser exigido?!…
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — E com que justiça, perante todos aqueles portugueses que, tendo recebido
outras prestações sociais indevidas, estão no cumprimento das suas obrigações, a restituí-las, o Governo iria
justificar essa exceção?
Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Justiça social e equidade é distribuir, de forma mais justa e
equitativa, os recursos que se têm, que são escassos, como se disse. E é para acorrer a situações
extraordinárias de carências que o Governo criou o PES (Plano de Emergência Social), com medidas
concretas, dirigidas às famílias que, no terreno, independentemente de outros apoios que já tenham,
continuem a demonstrar situações de carência. É isso que o Governo está a fazer e que vai continuar a fazer.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Sónia Fertuzinhos.
A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Com este projeto de lei, o PCP
apresenta-se no seu melhor. Este projeto de lei é de uma absoluta irresponsabilidade, não apenas tendo em
conta a consolidação orçamental que todos os portugueses e portuguesas já entenderam ser necessária, mas
também, e sobretudo, tendo em conta o esforço e os sacrifícios que os portugueses fazem todos os dias para
contribuir para essa mesma consolidação orçamental.
Mas, com este projeto de lei, o PCP não resiste, mais uma vez, a associar o PS ao PSD e ao CDS, na
responsabilidade partilhada do que diz ser um violento ataque às prestações sociais. E, ao pretender atacar
desta forma o PS, o PCP não percebe que, mais do que atacar o PS, contribui para fragilizar a defesa dos
direitos sociais.
A verdade é só esta: o PCP promete, com este projeto de lei, o que sabe não ser possível cumprir.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Não é? Porquê?
A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — Já vai ouvir, Sr. Deputado!
Mas, se o PCP é igual a si próprio ao apresentar este projeto de lei, o PSD e o PP enfrentam, neste debate,
a enorme vergonha de terem de assumir que tudo o que disseram sobre abono de família, quando estavam na
oposição, é o oposto — e não vale — de agora, que estão no Governo.
Quando o anterior governo do PS reviu os apoios sociais, no quadro da crise internacional, que obrigava a
um esforço de consolidação orçamental sem precedentes, o PSD e o PP negavam a crise internacional,
desvalorizavam a exigência do esforço de consolidação orçamental, esqueciam a dívida pública e clamavam
por mais despesa nos apoios sociais.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Pelos vistos, vocês também!
A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — A ironia suprema, Sr.as
e Srs. Deputados, da irresponsabilidade e da
mentira que marcaram as posições defendidas pelo PSD e pelo PP, quando estavam na oposição, fica
completamente exposta numa intervenção do então Deputado Pedro Mota Soares, em 2010, aquando da
revisão dos apoios sociais e do abono de família.
Dizia o então Sr. Deputado: «O que o Partido Socialista quer fazer é tirar às famílias apoios sociais que, até
no Estado Novo, as famílias tinham direito a receber. O CDS provou que, financeiramente, é comportável
manter o quarto escalão do abono de família». Depois, dizia quanto tirava nas comunicações, quanto tirava
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nas deslocações e estadias, quanto tirava na publicidade obrigatória e dizia que era absolutamente possível
repor o abono de família tal como estava.
Agora, a pergunta ao Sr. Ministro da Solidariedade e da Segurança Social é óbvia: já repôs o abono de
família, cujo dinheiro sabia tão bem onde ia buscar para repor?
A resposta, que todos nós conhecemos, é «não». E é «não» não só porque, afinal, não é tão fácil cortar
nas «gorduras» do Estado,…
Vozes do CDS-PP: — É! É!
A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — … mas também porque o abono de família não tem nada a ver com as
políticas assistencialistas que este Governo, nomeadamente o Ministro Pedro Mota Soares, defende.
E não só não repôs o que criticou, na revisão do abono de família feito pelo PS, como, pelo caminho, o
Governo e o Ministro Pedro Mota Soares tomaram todas as medidas que conhecemos e que têm como
expoente máximo o corte dos subsídios de férias e de Natal.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr.ª Deputada, faça favor de concluir.
A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — Vou terminar, Sr. Presidente.
Mas, Sr.as
e Srs. Deputados, a crise que enfrentamos agora é a mesma que o PS enfrentava quando
estava no Governo.
A necessidade de consolidação orçamental, hoje, é a mesma que levou a que o PS tivesse de assumir a
revisão dos apoios sociais e, por isso, o PS diz hoje, na oposição, o mesmo que dizia quando estava no
governo. Eu digo hoje, aqui, a mesma coisa que a minha colega Deputada Catarina Marcelino disse na altura:
«O caminho é estreito e difícil. Há que fazer as melhores opções possíveis num contexto de grandes
constrangimentos».
A defesa do Estado social e dos apoios sociais é o nosso maior desafio, e a verdade é que hoje, mesmo
com a crise, os pilares essenciais da política de apoio às famílias, definida pelo anterior governo do PS,
mantém-se, estando ao serviço dos portugueses uma segurança social sustentável, uma rede sólida de
estruturas de apoio às famílias jovens com filhos e novos apoios sociais, como o abono pré-natal e uma
licença de parentalidade.
Srs. Deputados do PCP, percebem agora a diferença entre governos do PS e governos do PSD e do PP?
Aplausos do PS.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Tenha vergonha!
O Sr. Presidente (António Filipe): — Apesar de não termos aqui uma troica que corte os tempos, também
temos constrangimentos regimentais.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Rita Rato.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr.ª Deputada do PS, o que percebemos é que
cada vez mais o PS está igual ao PSD e ao CDS.
Aplausos do PCP.
Isso, de facto, é muito grave para o nosso regime democrático, porque todos os dias, com o pacto de
agressão subscrito pelo PS, pelo PSD e pelo CDS, são atiradas para a pobreza milhares de crianças.
Na Assembleia da República e em conferências públicas, choram-se «lágrimas de crocodilo», dizendo-se
que são necessárias políticas de incentivo à natalidade, que é preciso retirar as crianças da pobreza, que é
preciso existirem programas específicos de emergência social, mas quando chega a altura de se tomarem
medidas concretas de aumento dos salários e de retribuição do abono de família, ai que não há recursos
públicos.
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O Sr. Deputado do CDS dizia aqui, há pouco, que os recursos públicos não chegam para tudo. Mas esta
semana o Governo PSD/CDS entregou, numa bandeja, ao BPN cerca de 300 milhões de euros, que foi o que
cortou no abono de família no ano de 2011.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente! Essas são as vossas opções!
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Ora, veja-se bem: está-se a tirar o abono de família às crianças deste País para
ser entregue ao BPN! Está bem dito o que temos aqui falado de visto familiar. Tenho dúvidas — e o CDS pode
confirmá-lo — que esta medida de retirar do abono de família para o BPN tenha ver com visto familiar… Tenho
muitas dúvidas relativamente a esta matéria.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem de terminar, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Vou terminar, Sr. Presidente.
Quero só dar conta de um exemplo concreto de uma economia em crescimento, que garante o abono de
família a todas as crianças: em França, o abono de família é uma prestação social universal e, portanto, são
garantidos apoios sociais às crianças e aos jovens independentemente do rendimento das suas famílias. E
quando se querem sempre copiar os exemplos errados da Alemanha e da França, porque é que não se copia
agora um bom exemplo e se garante, de uma vez por todas, a universalidade do acesso ao abono de família?
É inaceitável que uma família com 628 € de rendimento tenha perdido o abono de família — a Sr.ª
Deputada do PSD não sabe, certamente, o que é viver com 628 € por mês!…
A Sr.ª Joana Barata Lopes (PSD): — Como é que sabe isso?
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — É inaceitável! E o PCP continuará, certamente, a lutar contra isso.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Terminado este ponto da ordem do dia, passamos à discussão
conjunta dos projetos de resolução n.os
219/XII (1.ª) — Recomenda ao Governo que suspenda, com efeitos
imediatos, o encerramento/desmantelamento dos Centros Novas Oportunidades e reforce o programa Novas
Oportunidades (PS), 224/XII (1.ª) — Recomenda ao Governo a suspensão imediata do processo de
encerramento dos Centros Novas Oportunidades e a assunção dos encargos relativos ao funcionamento
daqueles cujo financiamento foi recusado (BE), 231/XII (1.ª) — Recomenda ao Governo a avaliação,
reestruturação e manutenção dos Centros Novas Oportunidades (PCP) e 235/XII (1.ª) — Suspensão imediata
do encerramento dos Centros Novas Oportunidades (Os Verdes).
Para a presentar o projeto de resolução n.º 219/XII (1.ª), tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete João.
A Sr.ª Odete João (PS): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: A promoção das qualificações e do
conhecimento dos portugueses sempre foram áreas centrais na agenda política do Partido Socialista.
É em defesa da aposta na educação e formação de adultos que o projeto de resolução que apresentamos
recomenda ao Governo a suspensão imediata do encerramento dos Centros Novas Oportunidades e o reforço
da Iniciativa Novas Oportunidades.
Num momento em que Portugal enfrenta uma crise económica profunda, em que o desemprego atinge
valores inimagináveis, em que mais de 1,2 milhões de portugueses procuram uma atividade, a aposta nas
qualificações e no reconhecimento e validação de competências dos cidadãos em geral e dos trabalhadores
em particular constitui um dos fatores determinantes para a promoção do crescimento económico, para a
criação do emprego sustentável e para a qualidade e o aumento dos níveis de empregabilidade.
Hoje, mais do que nunca, o investimento em educação e formação de adultos deve ser assumido como
uma prioridade nas políticas públicas para garantir a estabilidade do nosso futuro coletivo.
Mas este não é o rumo da maioria que governa o País. Este não é o rumo do PSD e do CDS.
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Começaram, ainda em campanha eleitoral, por descredibilizar a Iniciativa Novas Oportunidades. Agora,
sem qualquer avaliação, como tinham prometido, e sem qualquer justificação ou fundamentação, como era
devido, sem qualquer critério ou estratégia — como também já nos habituaram —, destroem o património da
educação e formação de adultos.
O Governo, ao encerrar os Centros Novas Oportunidades, revela total insensibilidade social e total
desprezo, Srs. Deputados, não apenas pelos portugueses em processo de certificação de competências, mas
também por todos os trabalhadores que, nestes Centros, deram o seu melhor, por todas as instituições que,
no seu dia-a-dia, cumpriram as metas definidas e os objetivos.
Com estas medidas, Sr.as
e Srs. Deputados, o PSD e o CDS contribuem para aumentar o desemprego,
como diz a ANPEFA (Associação Nacional de Profissionais de Educação e Formação de Adultos) «mais de
2400 técnicos e formadores», e demonstram total desrespeito pelos formandos e pelos técnicos.
A maioria PSD e CDS inicia uma preocupante desistência relativa à aposta fundamental para o futuro de
Portugal e dos portugueses ao não investir nas qualificações e nas competências dos portugueses e coloca o
País de costas voltadas para o progresso e o crescimento.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para apresentar o projeto de resolução do BE, tem a palavra a Sr.ª
Deputada Ana Drago.
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: O debate que temos hoje, neste final de
tarde, sobre as várias iniciativas que estão neste momento em apreciação é uma discussão que creio ser
estratégica em relação ao futuro do País.
O que este Parlamento tem hoje de discutir é qual o desenho das políticas públicas, em matéria de
educação e formação de adultos, qual a estratégia que seguimos em relação ao reconhecimento de
competências adquiridas ao longo da vida e a justiça que fazemos em relação a gerações que não tiveram a
oportunidade de fazer um percurso escolar regular e que agora podem regressar à escola e é um debate
sobre a qualificação da mão-de-obra dos ativos portugueses. É, portanto, determinante para pensarmos como
Portugal pode construir um futuro que seja diferente desta crise.
Se não tivermos esta política de educação e formação de adultos, então percebemos que a maioria apenas
nos propõe, como forma de relançar o processo económico, baixar salários e precarizar a mão-de-obra. Não
há, de facto, qualquer medida de qualificação dos trabalhadores que permita relançar a modernização do
tecido económico.
Discutimos, de facto, uma política que nunca foi assumida por este Governo. À medida que os meses vão
passando, a Iniciativa Novas Oportunidades vai sendo desmantelada, sem que haja um planeamento para o
futuro, sem que haja uma justificação pelas medidas tomadas e sem que haja qualquer alternativa em relação
ao que vai acontecer em matéria de educação e formação de adultos.
Hoje, temos milhares de formandos que não sabem o que é o seu futuro. São formandos que foram
despedidos dos Centros Novas Oportunidades que havia no IEFP, que se dirigiram a um novo Centro Novas
Oportunidades, que foi agora encerrado no novo mês e que vão para um novo processo de formação e de
certificação.
Está, pois, lançada a total confusão. E tudo isso para além de milhares de profissionais e de professores
que tinham tarefas atribuídas e que agora não sabem o que vai acontecer.
É por isso que o BE propõe aqui a discussão de uma política e de uma metodologia. Entendemos que, para
terminarem processos de trabalho, é necessário que o Ministério de Educação e Ciência assegure o
financiamento dos Centros que agora fechou e que se faça um processo de avaliação do que foi a Iniciativa
Novas Oportunidades ao longo dos últimos anos.
Vários projetos, aliás, têm esta ideia de que é necessário fazer uma avaliação do programa — não o do
Partido Socialista, é certo, que mantém a sua coerência. No passado, reivindicámos uma avaliação da
Iniciativa Novas Oportunidades e o Partido Socialista, que estava no governo, não a quis fazer, e agora, que
está na oposição, continua a não querer fazê-la. Mas é determinante sabermos o que foi feito nos últimos
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anos, para que, na base dessa informação, possamos desenhar a educação e a formação de adultos para o
futuro.
O que não é aceitável é entender que se pode «deitar pelo cano abaixo» a experiência de profissionais, a
expetativa de milhares de formandos, um projeto de qualificação do País, sem ter nenhuma alternativa de
modernização económica, a não ser baixar salários! É para este debate que convocamos a maioria!
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para apresentar o projeto de resolução do PCP, tem a palavra a Sr.ª
Deputada Rita Rato.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sobre esta matéria, importa aqui dizer que o
PCP não diz hoje coisas diferentes do que dizia há seis anos atrás, aquando da criação do programa Novas
Oportunidades pelo anterior Governo do Partido Socialista.
Na altura, o PCP afirmou preocupações e críticas relativamente a esta Iniciativa por considerar que se
tratava de um processo de manipulação dos portugueses, com base na desqualificação da escola pública e do
sistema educativo, que satisfazia preocupações e objetivos puramente estatísticos de certificação.
Algumas das críticas e preocupações manifestadas pelo PCP diziam respeito à orientação de metade dos
jovens do ensino secundário para cursos tecnológicos e profissionais de dupla certificação; à ausência de
avaliação dos processos de qualificação e formação; à ausência de validação pedagógica e científica dos
processos de reconhecimento, validação e certificação de competências (RVCC) por inexistência de estrutura
intermédia que a assegurasse; à exiguidade das equipas de técnicos de diagnóstico, profissionais de RVCC e
formadores, bem como à precariedade dos seus vínculos laborais; à instabilidade, que já então se adivinhava,
quanto ao futuro da rede nacional de Centros Novas Oportunidades (CNO).
Apesar destas críticas que formulou e assume, o PCP não considera que a solução para os problemas
identificados passe pelo encerramento dos CNO pelo atual Governo do PSD/CDS sem qualquer avaliação
prévia, sem alternativas e sem fundamento.
O PCP sempre considerou e afirmou como inaceitável o desrespeito revelado pelo governo do PS em
relação aos direitos destes trabalhadores, bem como a sua instrumentalização e a propaganda feita à custa do
seu trabalho e da sua dedicação!
Já em relação ao atual Governo do PSD e do CDS, o PCP denuncia uma prática deliberadamente
orientada para provocar desemprego (designadamente de professores que ficarão com horários zero nas
escolas públicas) e poupar dinheiro, desrespeitando a lei, não pagando indemnizações por despedimento e
não garantindo a proteção social dos formadores, cuja maioria se encontrava sujeita ao regime de falso recibo
verde.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — As medidas já anunciadas relativamente ao programa Novas Oportunidades
confirmam que não há, da parte do atual Governo, qualquer intenção de melhorar níveis de escolaridade ou de
qualificação dos portugueses, mas apenas uma sanha destruidora da escola pública e das estruturas públicas
de qualificação e formação…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — … de matriz economicista e com consequências profundamente prejudiciais
para o futuro do País e dos trabalhadores.
Os fundamentos ideológicos e os argumentos economicistas que sustentam estes encerramentos são, uma
vez mais, tomados contra os direitos dos jovens e dos trabalhadores, nomeadamente no que diz respeito ao
cumprimento da Constituição e da Lei de Bases do Sistema Educativo.
Por isso tudo isto, o PCP defende a manutenção em funcionamento, no presente ano letivo, dos CNO
tutelados pelo Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP) e pelo Ministério da Educação e Ciência
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no sentido de salvaguardar a resposta adequada a todas as solicitações existentes, bem como a realização de
um processo de avaliação profundo e rigoroso da organização e funcionamento dos Centros Novas
Oportunidades e uma reorganização e reestruturação com efeitos a partir do próximo ano letivo.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para apresentar o projeto de resolução do Partido Ecologista «Os
Verdes», tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Investir na qualificação da
força ativa portuguesa representa, hoje mais do que nunca, um imperativo nacional. Um imperativo, sobretudo
se tivermos em conta a estrutura de oportunidades caracterizada por níveis de desemprego sem precedentes
na nossa história, pela especialização dos setores de mercado e pelo défice de certificação e de qualificação
dos portugueses ativos.
Segundo dados do Instituto Nacional de Estatística (INE), 65% da população ativa portuguesa tem, no
máximo, o 3.º ciclo do ensino básico e no grupo de desempregados, em particular, verifica-se uma distribuição
idêntica.
Na verdade, Portugal tem atribuído pouca relevância à educação e à formação de adultos. E, neste quadro,
a criação da Agência Nacional de Educação e Formação de Adultos, que ocorreu no ano 2000, teve uma
expressão muito significativa. Essa Agência foi responsável, entre outras estruturas, pelos primeiros cursos de
educação e formação de adultos e, em 2006, pela Agência Nacional para a Qualificação, a quem foi atribuída
a implementação da Iniciativa Novas Oportunidades.
Na sequência destas iniciativas, existiam, no final de julho do ano passado, 448 Centros Novas
Oportunidades, com mais de um milhão de pessoas inscritas, das quais quase metade completou uma
certificação total e cerca de 15 000 obtiveram uma certificação parcial. Ora, estes números evidenciam, de
forma muito clara, a ação positiva de uma estratégia de qualificação de adultos no âmbito de um paradigma de
aprendizagem ao longo da vida.
Porém, com a chegada ao Governo do PSD e do CDS-PP, chegou também a destruição do património em
matéria de educação e formação de adultos, através da extinção de um grande número de Centros Novas
Oportunidades.
Sem qualquer oportunidade, o Governo acaba assim com a oportunidade de se formarem que estava a ser
dada às pessoas que não tiveram oportunidades de o fazer a seu tempo.
Mas o Governo está a fazer mais: está a proceder à aniquilação de postos de trabalho correspondentes às
equipas pedagógicas.
O Governo tomou posse e de seguida, através de um processo de avaliação cujos critérios são, aliás,
pouco claros e nada transparentes, mais de 150 Centros Novas Oportunidades viram indeferidas as suas
candidaturas. E, apesar de essas decisões terem sido objeto de contestação por parte dos respetivos Centros,
o Governo foi sucessivamente adiando a sua resposta, que até hoje ainda não chegou. O Governo tarda em
responder e apressa-se a encerrar Centros, caminhando a passos largos no sentido do desmantelamento
silencioso da rede de Centros Novas Oportunidade.
Entretanto, milhares de profissionais não sabem qual será a sua situação, tendo alguns deles,
inclusivamente, contratos assinados até ao final de 2013, na sequência do período de financiamento do
QREN. E, com eles, os Centros e todas as pessoas inscritas estão em suspenso.
O pouco que se conhece das intenções do Governo para depois do período transitório que termina a 31 de
agosto é que se prepara para deixar à margem os portugueses adultos, cujas oportunidades se diluirão no
cruzamento da falta de oportunidades de qualificação face à exiguidade das ofertas de trabalho.
O Governo, de forma muito pouco transparente, prepara-se assim para aniquilar todo o património
adquirido em termos nacionais no domínio da educação e formação de adultos, colocando em causa muitos
profissionais e milhares de pessoas que encontravam nesses cursos uma oportunidade de formação.
Por isso, Os Verdes apresentam esta iniciativa legislativa no sentido de suspender o encerramento
imediato dos Centros Novas Oportunidades, recomendando ao Governo que proceda à publicação, divulgação
e discussão pública dos resultados que presidiram aos critérios de encerramento dos Centros e da avaliação
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da Iniciativa Novas Oportunidades; que realize uma auditoria à Iniciativa Novas Oportunidades por uma
entidade independente; e que proceda à audição de especialistas sobre educação e formação de adultos,
sobre o futuro da Iniciativa Novas Oportunidades, sobre o futuro dos Centros Novas Oportunidades e da
educação e formação de adultos, o que pressupõe, naturalmente, a suspensão imediata do encerramento dos
Centros Novas Oportunidades. E fazemo-lo porque os Verdes também consideram que é necessário continuar
a dar oportunidade de formação àquelas pessoas que não tiveram oportunidades de o fazer a seu tempo.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Muito bem!
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isilda Aguincha.
A Sr.ª Isilda Aguincha (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Investir na qualificação e nas
competências dos nossos concidadãos é, de facto, imperioso; é um fator determinante para a promoção do
crescimento económico, para a criação de emprego sustentável e de qualidade e para o aumento dos níveis
de empregabilidade.
Mas há que investir em efetivas qualificações, investir num caminho que confira real empregabilidade, que
dê a cada um perspetivas de trabalho, de realização pessoal e profissional.
O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Muito bem!
A Sr.ª Isilda Aguincha (PSD): — Portugal e os portugueses precisam disso.
O PSD assumiu, durante a campanha, a necessidade de rever a Iniciativa Novas Oportunidades. O
Programa do Governo assume esta revisão.
Como é já claro para todos, o Governo não fechou Centros Novas Oportunidades. O Governo apoia o
funcionamento dos CNO, mas não pode atuar como se não existisse amanhã, como se o País não estivesse
numa situação de emergência económica, financeira e social…
Vozes do PSD: — Bem lembrado!
A Sr.ª Isilda Aguincha (PSD): — … resultante de uma governação socialista que se revelou um verdadeiro
programa de destruição de oportunidades.
Aplausos do PSD.
E, naturalmente, em tempo de restrições, há que apoiar com critério os poucos recursos que temos.
Em última instância, o que nos fica destes projetos de recomendação é o seguinte: haja dinheiro para
continuarmos, sem mais, a suportar uma «bandeira» de um governo que nos deixou sem verbas sequer para o
funcionamento e com encargos, muitos, mesmo muitos encargos, para as gerações vindouras, Srs.
Deputados.
Protestos do PS.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Está a falar dos 12000 milhões da banca?
O Sr.ª Isilda Aguincha (PSD): — Adiar decisões, Srs. Deputados, como é proposto, é manter os
portugueses na ilusão, e esse não é o nosso caminho!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Michael Seufert.
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O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nesta matéria, há uma questão
ideológica que separa o CDS do entusiasmo que o Partido Socialista e o Bloco de Esquerda — neste caso, o
PCP é bem mais cuidadoso, devo dizer — mostram com a Iniciativa Novas Oportunidades.
O CDS, já no passado, no que respeita a vários programas, como a Novas Oportunidades e o Magalhães,
todos do rol de uma série de «panaceias» que o Partido Socialista propunha para a educação, sempre
demonstrou a maior das dúvidas.
Em relação a este programa em concreto, cedo se mostrou que pretendia apenas atribuir certificados em
massa a jovens, a menos jovens, para embelezar as estatísticas,…
O Sr. Carlos Zorrinho (PS): — Está a insultar as pessoas!
O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — … e cedo começámos a denunciá-lo.
Infelizmente, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o que vimos foi o seguinte: em demasiados casos, pouco ou
nada era feito para qualificar e o processo passava demasiadas vezes apenas por certificar. E isso, para nós,
faz toda a diferença.
Srs. Deputados, para nós, estudar e obter uma qualificação pede esforço, dá trabalho.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Não há sucesso sem exigência! E isso é muito, muito claro! É uma
diferença ideológica, porventura ultrapassável. Admito que sim, mas é algo que todos sabem que o CDS
sempre defendeu. O CDS nunca deixou de estar do lado do esforço, do mérito, da motivação e do trabalho.
E não ignoramos a conclusão do único estudo independente que houve sobre a Iniciativa Novas
Oportunidades, que nos dizia que tinha um impacto direto sobre a autoestima dos participantes. É um impacto
que reconhecemos. Infelizmente, no entanto, é um impacto falso, porque é baseado na mentira de que a
certificação administrativa implica necessariamente uma qualificação mais elevada, aliás ao contrário do que o
PS diz no seu projeto de resolução — o PS diz que este programa teve um forte contributo para o aumento
dos níveis de empregabilidade dos portugueses.
Já há pouco ouvimos o Deputado Artur Rêgo falar nisso e volto à mesma questão: é que se fosse verdade
que a Iniciativa Novas Oportunidades tinha criado emprego, significaria que as políticas económicas do Partido
Socialista tinham sido ainda mais desastrosas do que aquilo que já sabemos. Repare-se que no início do
governo do PS a taxa de desemprego passou de 8,3% para 12,5%. E resta perguntar de quanto teria sido
essa taxa se não houvesse a Iniciativa Novas Oportunidades, que aqui são vendidas como criadoras de
emprego, como se isso batesse com a realidade!
Aplausos do CDS-PP.
Já para não subtrair os 150 000 postos de trabalho que eram anunciados nos cartazes da campanha
eleitoral. Mas, enfim…
Protestos do PS.
Quanto à substância dos projetos de resolução, há que clarificar uma coisa: o Governo não fechou, nem
sequer poderia fechar, nenhum Centro Novas Oportunidades. O que o Governo fez, muito claramente, foi abrir
concursos para o financiamento.
O financiamento, Sr. Presidente e Srs. Deputados, acabava a 31 de dezembro do 2012. De 15 de
novembro a 12 de dezembro, abriram as candidaturas para novos financiamentos até agosto deste ano.
Dessas candidaturas, as que não foram aceites por não haver fundos poderão procurar outras formas de se
financiarem.
Mas é preciso dizer que os critérios que ordenaram as candidaturas foram os que haviam sido definidos
pelo Partido Socialista em 2008!
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E não deixa de ser extraordinário — e com isto termino — que, no caso das escolas com contratos de
associação, que produzem resultados conhecidos, reconhecidos e que oferecem um ensino de qualidade
escrutinado, o PS tenha sido muito rápido a tirar o financiamento a meio dos contratos em vigor,…
O Sr. Carlos Zorrinho (PS): — Não sabe o que está a dizer!
O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — … a meio do ano letivo, e quando dizia que Portugal já tinha saído da
crise. E também não deixa de ser extraordinário que, no caso dos CNO, quando termina um período de
financiamento, o Governo tenha fixado critérios para um novo financiamento, e tendo esse financiamento sido
dado até um limite orçamental, venha dizer «ao tio, ao tio, ao tio,… que não pode ser»!
O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem mesmo que terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — A avaliação da rede e do sistema está a ser feita e será comunicada
publicamente, como disse o Governo, e será comunicado o estudo que sustenta essa avaliação. Até lá, este
sistema viverá com o dinheiro que existe. O dinheiro não estica, nem nós defendemos estas políticas, embora
alguns as defendam, mas elas tiveram os resultados conhecidos.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Rita Rato.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Depois de ouvir o PS, o PSD e o CDS, ficamos
a perceber que, reconhecendo os erros e as necessidades de aperfeiçoamento e de valorização científica e
pedagógica do programa Novas Oportunidades, da parte do PSD e do CDS, o objetivo não é o de melhorar a
qualificação dos portugueses. O objetivo é o de, também à custa deste programa, poupar e cortar naquilo que
é também o objetivo de destruição da escola pública de qualidade, da formação integral do indivíduo e, ainda,
de destruição das estruturas públicas de qualificação e de formação. Aliás, o número do desemprego docente
e dos professores que o Ministro da Educação anunciou, em outubro, já inclui, certamente, as contas feitas
com o encerramento dos Centros Novas Oportunidades.
Portanto, fica aqui muito claro que se tínhamos um governo do Partido Socialista que desqualificava e
desvalorizava a escola pública de qualidade e a sua formação, teremos, da parte do PSD e do CDS, não a
melhoria deste programa, não o cumprimento da Lei de Bases do Sistema Educativo, mas, de uma vez por
todas, o encerramento da qualificação dos portugueses e das estruturas que o garantem.
Da parte do PCP, não poderemos acompanhar em nada este objetivo e também poderão contar não só da
parte do PCP mas também, creio, da parte das populações em geral, que lutam todos os dias pelo seu direito
à formação, pelo direito à escola pública de qualidade, uma resposta firme, porque este não é, certamente, o
caminho. Este é o caminho da desqualificação e do retrocesso social.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago.
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Talvez hoje, como nunca, em nenhum dos
vários debates que já tivemos sobre este encerramento dos Centros Novas Oportunidades, PSD e CDS
acabam de assumir que o programa Novas Oportunidades é para encerrar. Portanto, isto tem ido por etapas:
primeira, em dezembro,…
Risos do CDS-PP.
O Sr. Deputado ri-se. Não se ria, não se ria!… Ouça as palavras da Sr.ª Deputada Isilda Aguincha ou do
Deputado Michael Seufert. Foi o que aqui nos disseram!
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Protestos do PSD e do CDS-PP.
Um «programa de destruição de oportunidades» — palavras ditas pela Sr.ª Deputada Isilda Aguincha. A
Iniciativa Novas Oportunidades foi um «programa de destruição de oportunidades». Foi isto que foi dito.
O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Não! Não!
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Portanto, assumiram aqui, muito claramente, que os Centros que agora estão a
funcionar, provavelmente, a partir de agosto, também vão terminar.
Mas o Sr. Deputado do CDS foi mais honesto, digamos assim. Disse que o problema era ideológico.
Protestos do CDS-PP.
Não é sobre os resultados do sistema, porque quanto a esses, o Sr. Deputado não conhece. Ou conhece-
os? Não conhece!
Risos do Deputado do CDS-PP Michael Seufert.
Está a rir-se!
E quanto à avaliação externa, o Sr. Deputado conhece os resultados?
O Sr. Deputado veio aqui dizer que aquilo que foi feito em relação à certificação de competências que os
portugueses adquiriram nos ensinos básico ou secundário foi dar certificações. Foi o que aqui nos veio dizer.
Pergunto: o Sr. Deputado conhece o trabalho de todos os Centros?!
O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Vá ao terreno!
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Conhece todas as certificações que foram dadas?!
O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Não conheço todas!
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Essa é uma acusação muitíssimo grave!
O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr.ª Deputada, queira concluir, por favor.
A Sr.ª Ana Drago (BE): — O senhor disse que os Centros Novas Oportunidades cometeram fraudes!
Protestos do CDS-PP.
Disse que cometeram fraudes. Atribuíram certificação que as pessoas não mereciam.
Protestos do CDS-PP.
Bom, isto tem de ter alguma consequência. O Sr. Deputado, agora, vai ter de investigar o que foi feito.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Disso não há dúvida nenhuma!
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Mais do que isso…
O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr.ª Deputada, conclua, por favor.
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Vou terminar, Sr. Presidente, mas o que vou dizer é relativamente importante.
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O Sr. Deputado disse algo absolutamente extraordinário: que era necessário que a Iniciativa Novas
Oportunidades gerasse emprego. Bom, eu nunca tinha visto, mas, com os níveis de desemprego que os
senhores atingiram na população jovem, percebe-se, então, isto: vai acabar a escolaridade obrigatória de 12
anos, vão fechar universidades. É porque a qualificação não tem a ver com a criação de emprego.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Essa é a opinião do PS!
A Sr.ª Ana Drago (BE): — E a partir do momento em que os senhores baralham os conceitos, por
preconceito ideológico, percebe-se uma coisa: os senhores não estão dispostos a qualificar o País,…
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — A certificar é que não! A qualificar, sim!
A Sr.ª Ana Drago (BE): — … os senhores não querem investir na qualificação dos portugueses.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr.ª Deputada, tem de concluir.
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Os senhores não apresentaram aqui nenhum programa, uma única ideia, repito,
uma única ideia, para qualificar o programa. O que os senhores querem é fechar, e acabou por aqui. E isso é
um desastre para o futuro do País!
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (António Filipe): — A Mesa não regista mais inscrições, pelo que declaro encerrado este
debate…
A Sr.ª Odete João (PS): — Sr. Presidente, peço a palavra para intervir.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem, então, a palavra, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Odete João (PS): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Neste debate, o que distingue o Partido
Socialista da maioria de direita é simples: o PS promove a qualificação dos portugueses; a maioria de direita
destrói.
Aplausos do PS.
O Partido Socialista procurou, com a Iniciativa Novas Oportunidades, elevar os níveis de escolaridade dos
portugueses e, com isso, aumentar a coesão social. O Partido Socialista elogia o esforço de todos aqueles que
procuraram aumentar os seus níveis de qualificação. Não faz, como as bancadas do PSD e do CDS que
sistematicamente desvalorizam este esforço, sistematicamente insultam todos aqueles que procuraram a sua
valorização!
Aplausos do PS.
Quanto à avaliação, Sr.as
e Srs. Deputados, se não bastarem as auditorias regulares da Agência Nacional
para a Qualificação, se não bastar o relatório da Comissão Europeia, se não bastar o estudo da Universidade
Católica Portuguesa, se não bastarem as orientações do Conselho Nacional da Educação, se não bastar o
relatório Going for Growth 2012, da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económicos (OCDE),
que pede ao Governo a expansão da educação e formação vocacional, se não quiserem ouvir o PS, vejam
estes relatórios, vejam estas avaliações, invistam naquilo que é prioritário para o País. É porque o
investimento na formação e educação de adultos é fundamental para os portugueses.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Mas não é com a Iniciativa Novas Oportunidades!
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A Sr.ª Odete João (PS): — Ao desistirem da Iniciativa Novas Oportunidades estão a desistir dos
portugueses, estão a desistir de Portugal,…
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Odete João (PS): — … estão a considerar que a educação e a formação de adultos não são
prioritárias.
Não desistam dos portugueses. Não ouçam o Partido Socialista, mas não desistam dos portugueses.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Emídio
Guerreiro.
O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Ao longo deste debate tem-se
ouvido um conjunto de afirmações que eu gostaria de recordar para poder rebater.
Este Governo não fechou Centros Novas Oportunidades.
A Sr.ª Francisca Almeida (PSD): — Bem lembrado!
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Fechou, fechou! Haja alguma seriedade!
O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Este Governo…
Protestos do PS, do PCP e do BE.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Tenham calma!
O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Este Governo está a fazer aquilo que prometeu aos portugueses. Está
fazer aquilo que pôs no seu Programa de Governo, que foi aqui debatido.
Srs. Deputados do Partido Socialista, temos um modelo diferente? Temos! Foi assumido na campanha
eleitoral!
A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — Onde é que está a avaliação?!
O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Tenho de recordar aqui os ataques que o então Partido Socialista, em
campanha eleitoral, fez ao atual Primeiro-Ministro e então candidato a Primeiro-Ministro por aquilo que ele
defendeu relativamente às Novas Oportunidades.
Vozes do PSD: — Bem lembrado!
O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — E o que disseram os portugueses? Desse lado, 29% e deste lado, 38%!
Vozes do PS: — Não é verdade!
O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — É verdade! Esta é a verdade!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
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Quero recordar mais: ao contrário do que se tem dito aqui e até insinuado, não se destruiu, não se fechou,
nem se desvalorizou. Pelo contrário, o que vamos ter no próximo ano letivo, a partir do verão, é aquilo que
prometemos. É, de facto, um novo modelo de intervenção, de qualificação dos adultos portugueses. Repito, de
qualificação. Percebo que haja muitos Deputados na bancada do PS que está com saudades em entregar
diplomas a granel que certificavam as pessoas.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Mas nós…
O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado, queira concluir, por favor.
O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Vou terminar, Sr. Presidente.
Nós vamos, de facto, promover a verdadeira qualificação das pessoas. Porquê? Porque o que é importante
é que, depois deste processo, os portugueses que passam por este processo vejam a sua vida profissional
melhorada.
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Para isso, é preciso haver oportunidades na economia!
O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Isso é que é fundamental.
Quero recordar — e vou terminar, Sr. Presidente — que o que se passou foi que o governo socialista
destruiu as novas e as velhas oportunidades dos portugueses…
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — … ao deixar este País de mão estendida à caridade internacional.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Srs. Deputados, concluído o debate conjunto dos projetos de
resolução n.os
219, 224, 231 e 235/XII (1.ª), informo que os mesmos serão votados oportunamente.
Lembro que, amanhã, na reunião plenária, com início às 15 horas, haverá declarações políticas, seguido da
discussão conjunta, na generalidade, da proposta de lei n.º 44/XII (1.ª) — Aprova o regime jurídico da
reorganização administrativa territorial autárquica, e do projeto de lei n.º 163/XII (1.ª) — Define o regime de
audição e participação das autarquias locais e populações no processo legislativo de criação, extinção, fusão e
modificação de autarquias locais, procede à primeira alteração à Lei n.º 17/2003, de 4 de junho, e procede à
terceira alteração à Lei Orgânica n.º 4/2000, de 24 de agosto (BE), e, por fim, da discussão conjunta, também
na generalidade, dos projetos de lei n.os
120/XII (1.ª) — Reorganização Administrativa de Lisboa (PSD e PS),
164/XII (1.ª) — Reorganização Administrativa de Lisboa (CDS-PP), 183/XII (1.ª) — Cria a freguesia do Parque
das Nações, no concelho de Lisboa (BE) e 184/XII (1.ª) — Cria a freguesia de Telheiras, no concelho de
Lisboa (BE).
Por hoje, é tudo. Muito boa tarde a todos.
Está encerrada a sessão.
Eram 18 horas e 33 minutos.
Presenças e faltas dos Deputados à reunião.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.