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Sexta-feira, 2 de março de 2012 I Série — Número 79
XII LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2011-2012)
REUNIÃOPLENÁRIADE1DEMARÇODE 2012
Presidente: Ex.ma Sr.ª Maria da Assunção Andrade Esteves
Secretários: Ex.mos
Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco Rosa Maria da Silva Bastos de Horta Albernaz Abel Lima Baptista
S U M Á R I O
A Sr.ª Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas
e 6 minutos. Deu-se conta da entrada na Mesa dos projetos de
resolução n.os
238 a 241/XII (1.ª). Em declaração política, o Sr. Deputado Raúl de Almeida
(CDS-PP) aproveitou o facto de, em 2012, se comemorar o Ano Europeu do Envelhecimento Ativo e da Solidariedade entre Gerações para abordar o tema. Depois, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Adão Silva (PSD), Manuel Pizarro (PS) e Jorge Machado (PCP).
Procedeu-se à discussão, conjunta e na generalidade, da proposta de lei n.º 44/XII (1.ª) — Aprova o regime jurídico da reorganização administrativa territorial autárquica, e do projeto de lei n.º 163/XII (1.ª) — Define o regime de audição e participação das autarquias locais e populações no processo legislativo de criação, extinção, fusão e modificação de autarquias locais, procede à primeira alteração à Lei n.º 17/2003, de 4 de junho, e procede à terceira alteração à Lei Orgânica n.º 4/2000, de 24 de agosto (BE). Usaram da palavra, a diverso título, além do Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares (Miguel
Relvas) e do Secretário de Estado da Administração Local e Reforma Administrativa (Paulo Simões Júlio), os Srs. Deputados António Filipe (PCP), Mota Andrade (PS), Luís Fazenda (BE), Hélder Amaral (CDS-PP), José Luís Ferreira (Os Verdes), Luís Montenegro e Bruno Vitorino (PSD), Altino Bessa (CDS-PP), Carlos Abreu Amorim (PSD), José Junqueiro (PS), Paula Santos (PCP) e Pedro Filipe Soares (BE).
Foram ainda discutidos em conjunto, na generalidade, os projetos de lei n.
os 120/XII (1.ª) — Reorganização
administrativa de Lisboa (PSD e PS), 164/XII (1.ª) — Reorganização administrativa de Lisboa (CDS-PP), 183/XII (1.ª) — Cria a freguesia do Parque das Nações, no concelho de Lisboa (BE) e 184/XII (1.ª) — Cria a freguesia de Telheiras, no concelho de Lisboa (BE). Intervieram os Srs. Deputados António Prôa (PSD), Miguel Coelho (PS), João Gonçalves Pereira (CDS-PP), Luís Fazenda (BE), Miguel Tiago (PCP) e José Luís Ferreira (Os Verdes).
A Sr.ª Presidente encerrou a sessão eram 17 horas e 51 minutos.
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A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 15 horas e 6 minutos.
Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta do expediente.
O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): — Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram
admitidos, os projetos de resolução n.os
238/XII (1.ª) — Recomenda ao Governo a abertura dos canais da RTP
Madeira e da RTP Açores na Televisão Digital Terrestre em todo o território nacional, visto já estarem
disponíveis nas respetivas regiões autónomas (PS), que baixou à 12.ª Comissão, 239/XII (1.ª) — Recomenda
ao Governo a integração na carreira de investigador do pessoal que exerce funções de investigador, constante
dos mapas de pessoal dos Laboratórios do Estado e outras instituições públicas que possuam o grau de
Doutor (PCP), que baixou à 8.ª Comissão, 240/XII (1.ª) — Recomenda ao Governo que o início das prestações
de desemprego sejam atribuídas, no máximo, até um mês depois do requerimento do beneficiário (BE), que
baixou à 10.ª Comissão, e 241/XII (1.ª) — Recomenda ao Governo que retifique o erro de enquadramento dos
trabalhadores independentes nos escalões de contribuição (BE), que baixou à 10.ª Comissão.
De expediente, é tudo, Sr.ª Presidente.
A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, vamos iniciar o período de declarações políticas.
Para o efeito, tem a palavra o Sr. Deputado Raúl de Almeida.
O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as
Deputadas e Srs. Deputados: 2012 é o Ano
Europeu do Envelhecimento Ativo e da Solidariedade entre Gerações.
Não substituindo nem prevendo um balanço que poderá e deverá ser feito no seu encerramento, o CDS
entende ser da maior importância sinalizar neste momento, despertando consciências e vontades, este ano
que poderá constituir uma verdadeira revolução no modo como encaramos e vivemos as etapas mais
avançadas das nossas vidas.
Esta é uma oportunidade para todos refletirmos sobre o facto de hoje viveremos mais tempo, com mais
saúde e com mais qualidade de vida do que nunca, e aproveitarmos as oportunidades que a todos se
oferecem.
O Conselho da Europa e o Parlamento Europeu consideram que o envelhecimento ativo pode dar à
geração que está acima dos 60 anos e aos idosos do futuro a oportunidade de permanecerem no mercado do
trabalho e partilharem a sua experiência, continuarem a desempenhar um papel ativo na sociedade e viverem
uma vida o mais saudável e gratificante possível.
Como se vê, é de grande importância a decisão do Parlamento Europeu e do Conselho da Europa de
classificarem 2012 como Ano Europeu do Envelhecimento Ativo e da Solidariedade entre Gerações.
O envelhecimento ativo será este ano o tema central das agendas políticas europeias e, precisamente num
período conturbado da história da Europa, eis que surge também a resposta assente numa aposta clara de
promoção da solidariedade entre gerações.
Resulta muito claro que 2012 terá também de ser encarado como um ano de oportunidades: oportunidades
para refletir sobre a valiosa contribuição das pessoas mais idosas na sociedade; oportunidades para refletir
sobre os desafios da longevidade, designadamente nas áreas do trabalho e do emprego, cuidados de saúde,
serviços sociais, educação e formação ao longo da vida, voluntariado, habitação e transportes.
É também um desafio e uma oportunidade para refletir sobre o diálogo e a solidariedade entre gerações,
que é tão importante.
Mas não nos enganemos: se ficarmos somente no plano da consciencialização, da reflexão e das
intenções, ficaremos muito aquém da grande oportunidade que este ano nos oferece!
2012 é essencialmente um ano para agir, o que implica a definição de objetivos claros e a assunção de
compromissos que permitam aos Estados-membros e às partes interessadas o desenvolvimento de iniciativas
que estimulem o debate, o intercâmbio de boas práticas e a sensibilização da opinião pública para a
importância do envelhecimento ativo enquanto expressão de participação cívica e fator de coesão social.
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Vivemos hoje uma crise económica que tem, obviamente, reflexos do ponto de vista social, resultado de
uma conjuntura económica desfavorável e de um conjunto de fatores internos e externos, que todos bem
conhecemos. Ao facto, não é certamente alheio o quadro de envelhecimento demográfico acentuado, que se
vem verificando desde 2001, com tendências de agravamento em 2012.
Em 2050, prevê-se que se acentue a tendência de involução da pirâmide etária, apontando para uma
esperança média de vida de 81 anos. Paralelamente ao aumento da esperança de vida, cresce o denominado
«envelhecimento dos envelhecidos», com o aumento de pessoas de idade igual ou superior a 80 anos.
Não podemos ignorar os impactos sociais, económicos e financeiros daqui resultantes, parecendo claro
que os modelos económicos e sociais dos últimos 50 anos na Europa não serão capazes de fazer frente a
este fenómeno.
É impossível ignorar os desafios que se nos apresentam e que exigem políticas inovadoras. A estratégia da
União Europeia para o crescimento 2010-2020 assim o requer; a situação portuguesa, Sr.as
e Srs. Deputados,
assim o reclama!
Deste modo, Portugal partilhará com os demais países da União Europeia o desafio de dar resposta à
mudança da pirâmide etária e de criar oportunidades para a participação ativa de todos e de todas, na vida
familiar e na sociedade.
Sabemos que o envelhecimento ativo é a resposta adequada, mas também sabemos que ele exige uma
abordagem multidimensional e que implica a responsabilização e a participação de todos na promoção da
igualdade entre homens e mulheres, no incentivo à solidariedade entre gerações, no combate à exclusão
social e à discriminação.
O Programa do XIX Governo Constitucional assume a dignidade humana como valor máximo e defende
que ninguém poderá ser deixado para trás. Isto significa também uma preocupação séria com aqueles que se
encontram nas etapas mais avançadas da sua vida.
O Programa de Emergência Social foi estruturado na base desse novo modelo de inovação, através de
uma rede nacional de solidariedade dinâmica, inovadora, envolvendo o Estado e os diferentes atores no
terceiro sector.
É importante lembrar neste ponto o que o Governo, através do Ministério da Solidariedade e Segurança
Social, já fez nesta área particular: nos novos centros de noite que criou, permitindo uma vida mais ativa, mas
com a salvaguarda da segurança aos mais idosos;…
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — … nos serviços de apoio domiciliário, que permitem aos idosos uma
independência em relação à institucionalização; e, muito em particular, ao fortalecer a economia social investe-
se em instituições que não têm o preconceito do mercado quanto à idade do quadro a contratar, combatendo o
desemprego de longa duração e a contratação de pessoas com maior idade e experiência.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — Aproveitando a experiência do Programa de Emergência Social, o
Governo tem a noção do quão importante é envolver todos os parceiros possíveis e de aproveitar as mais-
valias pessoais de cada interveniente. Nesse sentido, o Governo deverá conseguir que muitos possam ajudar
a dinamizar nas duas áreas em que se divide este ano europeu.
É da maior importância, por isso, mostrar ao País embaixadores que representem, pelo seu exemplo. Um,
no que ao envelhecimento ativo diz respeito e, outro, no que está compreendido em todo o conceito da
solidariedade intergeracional.
Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: 2010 foi o Ano Europeu da Luta contra a Pobreza e a Exclusão
Social; 2011 foi o Ano Europeu das Atividades Voluntárias que Promovam uma Cidadania Ativa.
As iniciativas que decorrerão este ano de 2012 — Ano Europeu do Envelhecimento Ativo e da
Solidariedade entre Gerações — terão em consideração o legado dos anos europeus anteriores, aproveitando
o que de bom ficou para solidificar a mentalidade social europeia.
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É fundamental que este ano seja uma oportunidade para a compreensão do envelhecimento demográfico
como o resultado do progresso social e económico das nossas sociedades, e que seja um desafio para a
realização de iniciativas que promovam o envelhecimento ativo.
O principal desafio deste ano europeu consiste em mobilizar e envolver todos os parceiros sociais nas
estratégias de intervenção, de modo a gerar uma ação de grande amplitude a nível nacional, regional e local
em toda a União Europeia.
Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Estamos perante mais uma valiosa oportunidade de intensificar a
construção de uma sociedade mais justa, mais fraterna, com maior equidade.
Foi de um salto qualitativo na nossa qualidade de vida, no aprofundamento da nossa cidadania, que aqui
hoje vos falei. Estamos todos convocados, sem exceção, porque é da conjugação de esforços de todos, da
convergência de todos que se constroem os grandes passos do progresso social. Portugal exige-o, os
portugueses merecem-no e nós teremos de cumprir a nossa parte!
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Raúl de Almeida, inscreveram-se os Srs.
Deputados Adão Silva (PSD), Manuel Pizarro (PS) e Jorge Machado (PCP). A Mesa foi informada de que o Sr.
Deputado responderá conjuntamente aos primeiros dois pedidos de esclarecimento e, depois, ao terceiro.
Tem a palavra o Sr. Deputado Adão Silva.
O Sr. Adão Silva (PSD): — A Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Raúl de Almeida, as minhas primeiras palavras
são para cumprimentar V. Ex.ª e sublinhar a pertinência e a oportunidade de ter trazido a debate esta matéria
do envelhecimento ativo e da solidariedade intergeracional no ano europeu de 2012.
Começo por referir uma expressão que considero feliz, que V. Ex.ª usou aqui, hoje, e que é, ao fim e ao
cabo, o grande repto lançado a todos: é preciso construir um salto qualitativo de cidadania no que tem a ver
com a forma como se encara o envelhecimento em Portugal.
Neste momento, em Portugal, estamos com um problema sério no que tem a ver com a inversão da
pirâmide demográfica, não apenas porque somos um dos países europeus com mais baixo índice de
natalidade, mas também aquele em que se verifica o maior crescimento, nos últimos anos, da longevidade
média dos portugueses. Isto é positivo, muito positivo, pois significa que temos um bom Serviço Nacional de
Saúde, que as nossas condições económicas e sociais melhoraram significativamente e que há atenção
generalizada à pessoa idosa.
O Sr. Deputado também fez bem em sublinhar — e eu quero reiterar — quanto este Governo se preocupa
com as questões do envelhecimento, sobretudo com a questão da autonomia da pessoa idosa, criando
condições que combatam a solidão e a vulnerabilidade da pessoa idosa.
Quero realçar algo em que o Governo está muito empenhado — já ouvimos o Sr. Ministro falar sobre esta
matéria —, que tem a ver com a aplicação das novas tecnologias ao acompanhamento da pessoa idosa que
vive em solidão e, potencialmente, numa condição de vulnerabilidade. É o caso, por exemplo, do telealarme,
entre outros aspetos que me parecem muito importantes e que são meios, recursos e respostas para
situações que nos confrangem e a que vale a pena obstar e resolver.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Adão Silva (PSD): — Sr. Deputado, não lhe coloco tanto uma questão, mas deixo-lhe a seguinte
observação: foi pertinente este tema que V. Ex.ª aqui nos trouxe, acompanhamo-lo inteiramente, estamos
muito preocupados com esta matéria e tudo faremos, no Parlamento e no Governo que apoiamos, para que
estas questões sejam encaradas como devem ser e os problemas debelados.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Pizarro.
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O Sr. Manuel Pizarro (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Raúl de Almeida, penso que este tema que
hoje aqui nos trouxe é muito pertinente. De facto, a sociedade portuguesa confronta-se com o problema do
envelhecimento, mas que é um problema que resulta, em larga medida, convém reconhecê-lo, do sucesso do
nosso Estado social.
Com efeito, nas últimas três décadas, a esperança média de vida à nascença em Portugal aumentou cerca
de 10 anos, o maior aumento em todos os países da OCDE, e essa é também uma marca do sucesso do
nosso Serviço Nacional de Saúde.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. Manuel Pizarro (PS): — Sr. Deputado, esse facto exige mais respostas da sociedade, é evidente.
Por isso, queria aproveitar para o interrogar, na esperança de que possa trazer-nos um contributo para essas
respostas, sobre um projeto que é, tanto quanto julgamos, um projeto consensual, que começou a ser
desenvolvido no governo anterior — a Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados.
Trata-se de um projeto de grande importância, que veio dar uma nova resposta qualificada de saúde e de
segurança social a muitos cidadãos idosos e dependentes que dela necessitam. A verdade, Sr. Deputado, é
que, todas as semanas, todos os dias, temos sido confrontados, na comunicação social, com notícias de
misericórdias e de outras instituições de solidariedade social que têm instalações próprias, que têm equipas
preparadas e formadas para entrar em funcionamento, que têm utentes que necessitam dessas unidades, mas
cujas unidades não abrem porque há um atraso burocrático — do nosso ponto de vista, inadmissível,
impiedoso até na forma como discrimina os mais idosos e mais necessitados — para a entrada em
funcionamento das mesmas.
Sr. Deputado, gostava de saber se acompanha a nossa preocupação quanto à necessidade de intensificar
o crescimento da Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados, que nos parece uma resposta
essencial. Neste âmbito, Sr. Deputado Raúl de Almeida, não se trata apenas de proclamações genéricas, com
que todos estaremos sempre de acordo; trata-se de saber em concreto o que se faz para dar resposta aos
problemas das pessoas.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Raúl de Almeida para responder.
O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, quero, em primeiro lugar, agradecer as perguntas
deixadas pelos Srs. Deputados Adão Silva e Manuel Pizarro.
Quero ainda agradecer e registar a coincidência de opiniões que o Sr. Deputado Adão Silva, em nome da
bancada do PSD, aqui sublinhou e que nos parece importante, porque há, de facto, um projeto coerente,
continuado e consequente no terreno posto em prática por este Governo, em particular pelo Ministério da
Solidariedade e Segurança Social. O Sr. Deputado referiu — e muito bem — os telealarmes, a utilização das
novas tecnologias criando condições para o idoso viver com maior independência sem se desenraizar, sem
sair de sua casa, tendo uma cidadania e uma vida mais ativas, uma participação social maior e uma
autonomia maior, que é isso que todos queremos e a que a inversão da pirâmide a todos nos desafia.
Sr. Deputado Manuel Pizarro, quero agradecer-lhe as afirmações feitas e as perguntas colocadas. Há
muitos aspetos em que concordamos. É óbvio que este aumento da esperança média de vida é também fruto
do contributo do sistema nacional de saúde que temos;…
Aplausos do Deputado do PS Acácio Pinto.
… e é óbvio que, nos últimos 30 anos, Portugal se integrou numa Europa e seguiu uma tendência europeia
positiva que melhora a qualidade de vida das pessoas. Não é isso que está em dúvida e é isso que queremos
seguir.
Respondendo de forma concreta à pergunta colocada, Sr. Deputado, quero dizer-lhe que este Governo
está, e continua, empenhado na criação, manutenção e ampliação da Rede Nacional de Cuidados
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Continuados Integrados. O CDS, tal como o Sr. Deputado se lembrará, tem, aliás, na matéria um porta-voz
incansável: a Deputada Isabel Galriça Neto é uma das pessoas mais empenhadas, a nível nacional, nesta
causa.
O Sr. Deputado invoca questões burocráticas. Não tenho certeza quanto às questões burocráticas, mas
quero dizer-lhe que, de facto, há aqui uma mudança de práticas: não há inaugurações de unidades de
cuidados continuados à pressa!…
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
O atual Ministro não irá inaugurar unidades de cuidados continuados com mobiliário emprestado de outras
unidades e com obras acabadas às 7 horas da manhã para a inauguração às 9 horas!… Isso mudou, de facto,
Sr. Deputado, mas o essencial continua e a Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados continuará.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Machado.
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Raúl de Almeida, referiu o ano de 2010
como o ano europeu antipobreza, com os resultados que se verificaram, que foram uns belíssimos resultados
pela negativa: aumentou a pobreza no nosso País com a política do PS — na altura, de mãos dadas com o
PSD e o CDS-PP —, e a nível europeu também. Agora, em 2012, é o Ano Europeu do Envelhecimento Ativo.
O Sr. Deputado tem palavras muito bonitas, falou na solidariedade para com os mais idosos… Mas
vejamos, então, qual é o comportamento deste Governo PSD/CDS-PP, Passos Coelho/Paulo Portas,
relativamente aos idosos: cortam nas reformas de miséria (a quem recebia 300 € ou 400 € cortaram
recentemente 100 € a milhares de reformados); aumenta o custo de vida, mas a grande maioria dos
reformados não tem aumento de pensão; cortam e aumentam os transportes, condenando milhares de idosos
ao isolamento; «atacam» na saúde, e os idosos não conseguem suportar os custos das taxas moderadoras ou
com o transporte de doentes; fazem aprovar em Plenário, e está em discussão na especialidade, uma lei dos
despejos que vai condenar milhares de reformados e idosos a verem-se impedidos de usufruir da sua própria
habitação.
Portanto, com este Governo Passos Coelho/Paulo Portas não temos envelhecimento ativo; temos
empobrecimento ativo, isso, sim! É esta a política do Governo PSD/CDS-PP relativamente a esta matéria!
Aplausos do PCP.
Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, há, porém, uma outra questão que importa aqui traduzir.
«Envelhecimento ativo», no dicionário destes partidos de política de direita, seja ela levada pelo PS, pelo PSD
ou pelo CDS-PP, quer dizer «obrigar as pessoas a trabalhar para além dos 65 anos». É o caminho de
trabalhar mais para receber menos na reforma. Este é o caminho que está traçado a nível europeu e que tem
fiéis seguidores neste mesmo Parlamento.
Assim, a pergunta que quero fazer-lhe, Sr. Deputado, uma vez que está a terminar o tempo de que
disponho, é esta: não será altura de, uma vez por todas, olharmos para as contribuições para a segurança
social e de, em vez de dependermos apenas do número de trabalhadores, essas contribuições terem em conta
o número de trabalhadores, o salário e os trabalhadores que as empresas têm, mas também a riqueza criada
pelas empresas? Hoje há grandes grupos económicos que têm pouquíssimos trabalhadores, que descontam
pouquíssimo para a segurança social e que deveriam contribuir muito mais, garantindo a sustentabilidade
financeira da mesma. Não acha que é este o caminho alternativo, em vez de castigar ainda mais as pessoas e
de as obrigar a trabalhar para além dos 65 anos para receberem menos de reforma, não permitindo que
tenham um fim de vida com a dignidade que merecem, depois de uma vida inteira de trabalho?
Aplausos do PCP.
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A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Raúl de Almeida.
O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Jorge Machado, muito obrigado pela
pergunta que coloca.
Sr. Deputado, o Ano Europeu do Envelhecimento Ativo e os outros anos europeus que invoquei são anos
que visam progresso social.
Vozes do PCP: — Progresso ao contrário!
O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — É estranho que os senhores, tendo «congelado» no tempo, também
tenham sempre um pé atrás em relação ao progresso social, tenham sempre uma dúvida, uma
descredibilização permanente de todas as iniciativas que querem progresso social.
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Fazem o contrário!
O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — Não percebo porquê. Os senhores terão a resposta, eu não me vou
aventurar por esse caminho!…
Sr. Deputado, ninguém fala em extensão das idades da reforma. A Europa fala, o Conselho Europeu fala, e
Portugal acompanha, que esta não é uma lei obrigatória e que as pessoas não são «arrumadas» em
determinada prateleira em determinada idade.
Protestos da Deputada do PCP Rita Rato.
Têm o direito, se o quiserem, de permanecerem ativas e a sociedade tem a obrigação de lhes proporcionar
o meio para poderem permanecer ativas, aproveitando experiência, aproveitando a vontade de fazer mais, de
participar através de voluntariado. O Sr. Deputado esquece isso tudo!… O Sr. Deputado preocupa-se apenas
com um modelo que já desapareceu há muito tempo!… Por favor, atualizem o discurso, Sr. Deputado!
Para terminar, quero dizer-lhe, Sr. Deputado, para repor a verdade, que uma mentira muitas vezes repetida
poderá começar a parecer verdade, mas cá estamos também para lembrar a verdade e para cortar esse ciclo
de repetição de mentiras. Dizer que este Governo não mexeu nas pensões quando este Governo descongelou
e atualizou ao nível da inflação as pensões mais baixas, que vinham congeladas de governos anteriores,…
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Foram aumentadas 26 cêntimos por dia!
O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — … quando este Governo, apesar daquilo que o Sr. Deputado disse,
isenta das taxas moderadoras os mais sacrificados…
O Sr. João Oliveira (PCP): — Tenha vergonha, Sr. Deputado!
O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — E não estou a dizer-lhe, Sr. Deputado, porque faço questão que o
nosso discurso seja sério, que estas sejam as condições ideais ou suficientes para os nossos idosos; porém,
estou a dizer-lhe que é feito um esforço, que é dado um sinal político e que não fazemos política com
demagogia.
Aplausos do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, vamos entrar no segundo ponto da ordem do dia, sobre
reorganização administrativa.
Aproveito para lembrar que assistem aos nossos trabalhos numerosos autarcas do País, entre os quais o
Sr. Presidente da Câmara Municipal de Lisboa e a Sr.ª Presidente da Assembleia Municipal de Lisboa. Creio
que estarão presentes outros presidentes de câmara, cuja identificação não consta na Mesa. Cumprimento-os
a todos, bem como aos Srs. Membros do Governo, que já se encontram na Sala.
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Vamos, então, dar início ao segundo ponto da ordem do dia, que consiste na discussão, conjunta e na
generalidade, da proposta de lei n.º 44/XII (1.ª) — Aprova o regime jurídico da reorganização administrativa
territorial autárquica, e do projeto de lei n.º 163/XII (1.ª) — Define o regime de audição e participação das
autarquias locais e populações no processo legislativo de criação, extinção, fusão e modificação de autarquias
locais, procede à primeira alteração à Lei n.º 17/2003, de 4 de junho, e procede à terceira alteração à Lei
Orgânica n.º 4/2000, de 24 de agosto (BE).
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares.
O Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares (Miguel Relvas): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs.
Deputados: A Assembleia da República discute hoje a proposta de lei da reorganização administrativa
territorial autárquica. Este eixo da reforma da administração local promove a coesão territorial e o
desenvolvimento local; alarga as atribuições das freguesias e dos correspondentes recursos; aprofunda e
dignifica a capacidade de intervenção das juntas de freguesia; melhora os serviços públicos de proximidade;
racionaliza gastos e promove ganhos de escala. Estes objetivos, bem definidos para o poder local, inscrevem-
se numa mudança mais vasta e ambiciosa.
O Governo está a concretizar em todas as dimensões do Estado, da sociedade e da economia uma
profunda mudança das estruturas, uma mudança como nunca aconteceu na nossa História recente; mas
estamos a fazê-la para reforçar Portugal e melhorar a qualidade dos serviços públicos prestados às
populações.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares: — O nosso compromisso de reorganizar o
Estado tem como objetivo fortalecer o País. Isso significa que o programa de reformas pretende que o Estado
continue a garantir não apenas o acesso aos serviços públicos, mas também as suas qualidade e
sustentabilidade. É isso que nos motiva: governar para uma mudança que tem como objetivo melhorar a vida
concreta dos portugueses.
Não estamos presos aos doces dogmas do passado e não somos reféns do tacticismo político.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Temos uma visão política reformista e inconformista. Acreditamos que o Estado pode, e deve, prestar
serviços de excelência num quadro global de liberdade — liberdade económica, liberdade de propriedade,
liberdade de comércio, liberdade de emprego e liberdade de escolha. A construção desta sociedade de
liberdades implica não apenas a reorganização do Estado, mas, acima de tudo, a sua valorização. É por isso
que o conjunto das reformas estruturais tem como objetivo supremo melhorar a qualidade das políticas
públicas. Como? Desbloqueando procedimentos, revitalizando o tecido produtivo, libertando recursos e
ganhando escala.
A nossa vocação reformista está ao serviço dos portugueses, porque acreditamos no desenvolvimento
económico como um valor político e social que potencia o progresso coletivo. Sem reformas estaríamos a
condenar os portugueses ao ciclo vicioso da austeridade e do empobrecimento.
Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: A reforma da administração local promove a coesão e a
competitividade territoriais através do aprofundamento do municipalismo, dentro de uma lógica genuinamente
descentralizadora e tendo em conta as realidades demográficas, sociais e económicas.
A construção de um Estado eficaz não é confundível com um Estado mínimo.
O nosso compromisso é com o fortalecimento do Estado para servir melhor os Portugueses.
Por isso, a reforma da administração local traduz uma visão transversal a todas as áreas da governação, o
que exige encontrar os níveis adequados da administração que, de forma mais eficiente e mais eficaz, podem
garantir a prestação dos serviços públicos.
É uma reforma que está a ser construída com os autarcas e não contra os autarcas, com as pessoas e não
contra as pessoas e, também por isso, as populações precisam que os eleitos locais se assumam como
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líderes das suas comunidades e que se envolvam neste compromisso de reformar um mapa administrativo
que já leva 150 anos de existência.
Todos os órgãos municipais estão agora convocados para se pronunciarem sobre a reorganização dos
seus territórios para que as soluções encontradas sejam adequadas às realidades locais.
É isto que os Portugueses esperam de nós: que saibamos interpretar o passado e valorizar as
comunidades locais como base na nossa identidade nacional, mas também que sejamos capazes de
encontrar novos caminhos para responder aos desafios do futuro e reforçar esta aliança intergeracional entre
portugueses!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Este momento será também, por isso, clarificador.
A redução significativa do número de autarquias que decorre do Memorando de Entendimento, assinado
pelo anterior Governo com a União Europeia, o BCE (Banco Central Europeu) e o Fundo Monetário
Internacional (FMI).
Protestos da Deputada do PCP Paula Santos.
Hoje, ficaremos a saber qual o grau de convicção de cada um dos partidos parlamentares, seja na rejeição
coerente de todo o programa ou no apoio e, neste caso concreto, dirijo-me ao Partido Socialista, que solicitou
a intervenção financeira externa e defendeu junto dos portugueses o Memorando que estamos agora a
executar.
Se me permitem, termino citando Mário Soares: «A Política implica ideias, ideais, fortes convicções,
vontade de servir, desinteresse pessoal e patriotismo». É disso que hoje precisamos, de menos calculismo e
de mais ousadia, de menos interesses particulares e de mais vontade de servir a pátria.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — O Sr. Ministro tem pedidos de esclarecimento de todas as bancadas do Parlamento.
Antes de indicar os Srs. Deputados inscritos para esse efeito, quero fazer uma pequena explicitação: foi
lembrado à Mesa que não invoquei a presença entre nós dos presidentes de juntas de freguesia, grupo que,
aliás, inclui os autarcas que estão aqui em maioria. Os meus cumprimentos são, naturalmente, dirigidos a
todos.
Aplausos gerais.
Lembro, agora, ao Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares que tem cinco inscrições para
pedidos de esclarecimento dos seguintes Srs. Deputados: António Filipe, Mota Andrade, Luís Fazenda, Hélder
Amaral e José Luís Ferreira.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.
O Sr. António Filipe (PCP): — Sr.ª Presidente, quero, em primeiro lugar, associar a minha bancada às
saudações aos autarcas presentes, particularmente — se me é permitido — aos autarcas de freguesia que
estão a assistir a este debate e, ainda mais particularmente, aos autarcas das freguesias que o Governo
pretende extinguir com esta iniciativa legislativa.
Aplausos do PCP.
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, o Sr. Ministro, supostamente, é o Membro do
Governo com a tutela do poder local, mas, mais concretamente, o Sr. Ministro é o Membro do Governo
destacado para atacar o poder local, e é precisamente para isso que o Sr. Ministro aqui está hoje!
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O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. António Filipe (PCP): — Queria dizer que temos o maior respeito pelos autarcas deste País.
Consideramos que o poder local democrático tem feito muito pelas populações e que os autarcas de freguesia
têm feito muito pelas populações das respetivas freguesias.
Acontece que este Governo trata os autarcas como inimigos e, quanto a autarquias, quanto menos houver,
melhor para este Governo.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!
O Sr. António Filipe (PCP): — Porque não há dia que passe sem que o Governo não queira transmitir a
ideia de que os autarcas são uns despesistas, que são os culpados pela crise em que está o nosso País, que
são perdulários e custam muito ao País e, por isso, têm de ser vergastados em público todos os dias.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!
O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Ministro, queremos dizer-lhe, muito claramente, que o País deve mais
aos autarcas do que aos governos,…
Aplausos do PCP.
… e que, se o País está na situação em que se encontra, não é por ter os autarcas que tem, mas por ter,
infelizmente, os governos que tem tido e que continua a ter.
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Sr. António Filipe (PCP): — O Governo vem hoje aqui propor, ou melhor, impor a extinção de cerca de
1500 freguesias.
Quanto ao resto, é um método. E o método é simples: em primeiro lugar, as freguesias, os autarcas e as
populações não são para aqui chamados, não têm de se pronunciar.
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Sr. António Filipe (PCP): — As assembleias municipais pronunciam-se, mas se não se pronunciarem o
Governo decide. Se o fizerem, mas não da forma como o Governo quer, este decide na mesma. Ou seja, o
que acontece é que o Sr. Ministro tem, lá no seu gabinete, uma régua e um esquadro e, na verdade, já decidiu
que freguesias quer extinguir, digam as populações o que disserem e decidam o que decidirem.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!
O Sr. António Filipe (PCP): — O Sr. Ministro não vem aqui para discutir as atribuições e competências das
freguesias, nem para discutir o respetivo financiamento; vem aqui porque quer acabar com as freguesias!
A Sr.ª Presidente: — Terminou o tempo, Sr. Deputado.
O Sr. António Filipe (PCP): — Vou concluir, Sr.ª Presidente, perguntando ao Sr. Ministro que razões tem o
Governo para extinguir as freguesias, porque, na sua intervenção, não nos deu uma sequer. Se o Governo
não deu uma razão válida, uma única vantagem que decorra para as populações e para o País de se
extinguirem as freguesias… Mas, como ainda tenho tempo, Sr. Ministro, por favor, diga-nos uma única
vantagem da extinção de freguesias que o Governo quer impor…!
Aplausos do PCP.
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A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Mota Andrade.
O Sr. Mota Andrade (PS): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as
e Srs. Deputados, permita-
me, Sr.ª Presidente, que, em nome da bancada do Partido Socialista, saúde todos os autarcas aqui presentes
e todos os autarcas do País, a quem tanto devemos, porque muito do crescimento, do desenvolvimento e do
progresso a que assistimos nos últimos 30 anos, foi fruto do seu trabalho e da possibilidade de as pessoas
poderem escolher, no local, os seus governantes.
Aplausos do PS.
Sr. Ministro, o Governo recuou. Sim, recuou. Fê-lo ao mudar os critérios de agregação de freguesias que
vinham no Livro Verde, critérios esses que, desde o primeiro momento, o PS afirmou que não faziam qualquer
sentido.
O Sr. Jorge Machado (PCP): — E agora fazem?
O Sr. Mota Andrade (PS): — O Governo não acreditou. Foi no terreno, junto das assembleias municipais,
das câmaras municipais, dos executivos autárquicos, das freguesias. Mas foi por ter tido uma má receção a
esses critérios por parte das populações — no périplo que o Governo fez por todo o País e que é do
conhecimento geral —, por bater na parede, que o Governo recuou.
Aqui, a minha primeira pergunta: por que razão o Governo demorou seis meses para compreender que os
critérios iniciais de agregação das freguesias não eram exequíveis.
Protestos do PSD.
O Governo, com a presente proposta de lei, altera os critérios, os quais ainda impõem percentagens na
agregação das freguesias, nomeadamente nas freguesias rurais.
Essas freguesias são, em muitos casos, a última presença do Estado no território; essas freguesias são,
muitas vezes, enormes agentes de coesão social e desenvolvimento local; essas freguesias, Sr.as
e Srs.
Deputados, prestam serviço público, muitas vezes (quase sempre), em regime de voluntariado.
Uma pergunta que se põe, em função do que acabo de dizer: quanto se ganha, Sr. Ministro, com esta
reforma?
Quanto se poupa, se esta reforma, com estes critérios, for avante?
Quais os ganhos de eficácia e eficiência para o poder local?
Em que estudos o Governo se baseou para propor estes critérios?
Vozes do PS: — Muito bem!
A Sr.ª Presidente: — Faça favor de terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Mota Andrade (PS): — Termino já, Sr.ª Presidente.
Sr. Ministro, será que uma reforma desta importância, que tanto mexe com os interesses das populações,
vai ser executada com sucesso, através da nova metodologia do Governo, do custe o que custar?
Aplausos do PS.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Não percebi bem qual é a posição do PS…!
A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.
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O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as
Deputadas, Srs. Deputados,
quero saudar, também, todos os autarcas presentes neste debate que muito importa ao País, porque a
democracia da proximidade, simultaneamente participativa e representativa, é algo que importa muito a todo o
País, à comunidade, ao nosso devir coletivo.
Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares, na verdade, o diploma que hoje nos apresentou é um
diploma de extinção de freguesias, encapotado sob o eufemismo da agregação de freguesias.
Não tem um único critério qualitativo. Tem meramente um critério quantitativo, percentual e tipológico, em
relação a níveis de organização municipal.
Portanto, é um diploma sem «alma», sem nada que tenha a ver com a comunidade local, meramente com
um cálculo populacional e sob a forma de organização populacional.
Como o diploma levantou um grande clamor de contestação em muito lado, tentou-se encontrar uma
circunstância quantitativa, em que deixou de ser quilométrica e passou a ser percentual.
No entanto, ficou uma ideia absolutamente punitiva e impositiva, em relação ao desenhar deste processo.
Porque, veja-se: os 15% de majoração, que é acenada, assim como uma cenoura, às assembleias municipais
que se pronunciem favoravelmente que agreguem freguesias; se a assembleia municipal não concordar e,
mais tarde, as mesmas freguesias venham a ser agregadas, já não têm direito aos 15%.
A gratificação é para o passo voluntário; se for forçado, já não têm direito aos 15% de majoração.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Exatamente!
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Tem algum sentido democrático entender que uma pronúncia negativa de
uma assembleia municipal seja considerada equivalente a uma não-pronúncia?
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Tem sentido constitucional!
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Tem algum sentido? Não tem! É o equivalente a dizer a uma assembleia
municipal que, ou vota como o Governo quer, ou então o seu voto não serve absolutamente para nada.
É isto que está no diploma do Governo!
Depois, o Governo sentiu dificuldade nas questões das identidades, porque percebeu que isto é muito mais
do que uma unidade administrativa. Temos aqui problemas profundos de identidade.
Então, criou-se esta manobra estranhíssima acerca das identificações: assim, alguém que tenha nascido
antes de este diploma entrar em vigor pode dizer que nasceu, por exemplo, na Freguesia da Cova da Piedade,
uma unidade administrativa já ultrapassada no tempo.
No entanto, o seu filho terá nascido e terá de dizer, na faculdade prevista no artigo 7.º do diploma, que
nasceu na «Freguesia de Almada, Cacilhas, Cova da Piedade, Pragal e Feijó»… Freguesia, não! Unidade de
freguesias!!
Risos do BE.
A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — É isto a preservação de identidades?!…
Voltando ao exemplo, se esse indivíduo, casualmente, casou no Porto e para aí mudou a sua vida, terá de
pôr, como residência, que mora na «união de freguesias de Massarelos, Cedofeita, Bonfim e Santo
Ildefonso»…!
Risos do BE.
É isto a resolução do problema de identidades?
Sr. Ministro, creio e digo com toda a seriedade, que isto é troçar do problema das identidades do País …
O Sr. António Filipe (PCP): — Muito bem!
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O Sr. Luís Fazenda (BE): — … e não é por se manterem os brasões de não sei quantas freguesias que,
realmente, se resolve um problema de identidades.
Desafio-o, Sr. Ministro, a dar explicações acerca disto.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Hélder Amaral.
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, Sr.as
e Srs.
Deputados, também gostaria de, em nome do CDS, cumprimentar todos os autarcas aqui presentes, aqueles
que, em muitos dos casos, com pouco fazem muito, que são os que estão na primeira linha do combate às
dificuldades e que estão junto das populações. Para eles, o meu obrigado.
Sr. Secretário de Estado, Sr. Ministro, esta é uma medida que consta do Memorando da troica, negociada e
assinada pelo Partido Socialista.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Exatamente!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Mas, ainda que assim não fosse, o então ministro da Administração
Interna, António Costa, defendia, em 2005, que as freguesias com menos de 1000 eleitores poderiam ser
extintas.
Vozes do CDS-PP: — Bem lembrado!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — O programa do governo do Partido Socialista dizia que «O Governo
admite extinguir 1000 freguesias».
Vozes do CDS-PP: — Exatamente!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Vejam lá, quase o mesmo número proposto, hoje, pelo Governo!
Lançaram um conjunto de debates pelo País e o então secretário de Estado José Junqueiro dizia que, no
Minho, em Viseu, na Covilhã, é necessário reduzir freguesias, talvez até municípios — como eu concordo
consigo, Sr. Deputado! Como sabe, nessa matéria da reforma administrativa, sou um pouco mais ambicioso e
vou um pouco mais longe.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Nisso, vocês são muito parecidos!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Portanto, esta é uma ideia que o Partido Socialista tem, há muito.
Mesmo que seja uma ideia para aplicar só em 2050, pensada em 2024…, é uma ideia que já vem de longe,
para aplicar sabe-se lá quando…
O que eu gostaria de perguntar-lhe, Sr. Ministro, de forma muito clara, tem a ver com o seguinte: em
política, não vale tudo, nem a cobardia política tem lugar num debate com esta importância. Portanto, o que
lhe pergunto é se aqueles que, no passado, solicitavam consenso, solicitavam e promoveram debate, e
assinaram, não em nome próprio, mas em nome do País, um compromisso, porque o País se encontrava (na
voz dos próprios) incapacitado para pagar ordenados no mês de julho, pergunto-lhe, Sr. Ministro, se esses,
alguma vez, em algum momento, quiseram debater, apresentaram alguma proposta, disseram do que
discordavam e com o que concordavam no Livro Verde ou na sua revisão, fruto de uma discussão ampla,
pública, em que todos tiveram oportunidade de dizer o que pensavam.
A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.
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O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Em suma, Sr. Ministro, gostaria de saber se, em algum momento, em
nome da verdade e da coerência, houve alguma boa-fé, alguma tentativa por parte do Partido Socialista de
dizer o que queria, mesmo que não fosse de acordo com o prazo que assinou no Memorando, mesmo que
fosse lá para 2025, mas, ao menos, alguma coisa.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, em primeiro lugar, quero aproveitar para, em
nome do Grupo Parlamentar do Partido Ecologista «Os Verdes», saudar todos os autarcas do País, sobretudo
os que se encontram hoje aqui connosco, pelo contributo que têm dado para o desenvolvimento do País e
também para a resolução dos problemas das populações.
Sr. Ministro, tenho de louvar o seu esforço, pois não é tarefa fácil fazer a defesa daquilo que, para os
portugueses, é absolutamente indefensável. É porque os portugueses e os autarcas já perceberam que esta
reforma nada tem a ver com a preocupação do Governo em melhorar a qualidade de vida das pessoas. Esta
reforma foi desenhada a pensar em tudo menos nas pessoas, nos seus problemas e nas suas preocupações.
Os portugueses e os autarcas já perceberam — aliás, perceberam desde o início — que estamos perante
uma reforma feita por encomenda. A troica encomendou, deu ordens e o Governo apressou-se a passar para
o papel a instrução recebida. Nem um moço de recados faria melhor!
É, de facto, um sinal positivo… — bem pode a troica dizer que o Governo está a cumprir religiosamente as
ordens! «É assim que se trabalha», dirá a troica, a mesma troica que nem sequer sabe o que é uma freguesia,
nem a importância de que as mesmas se revestem para as populações no nosso sistema, como, de resto,
ficou visível na reunião tida entre a Associação de Municípios e a troica…
O Sr. Ministro referiu-se ao envolvimento e à participação dos autarcas. De facto, Sr. Ministro, se houvesse
dúvidas sobre a simpatia com que os autarcas olham para esta proposta, bastaria assistir ao que se passou no
Congresso da ANAFRE.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Bem lembrado!
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Eu não estive lá, mas imagino que o Sr. Ministro tenha sido
aplaudido calorosamente e de pé!…
Depois, o Sr. Ministro diz que as autarquias foram ouvidas e que vão pronunciar-se. Sr. Ministro, ouvir não
chega! Ouvir é importante, mas é sobretudo importante, na tomada de decisões, ter em conta aquilo que é
dito, porque, caso contrário, o Governo está apenas a «cumprir calendário». Ora, neste processo, o que nos
parece é que o Governo está a portar-se como o «dono da bola», fazendo-nos lembrar um jogo de miúdos:
enquanto o jogo corre bem, a bola rola; quando o jogo começa a correr mal ao dono da bola, ele mete a bola
debaixo do braço e acabou-se o jogo.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Ora, o Governo está a fazer a mesma coisa. Ou seja, dispõe-se a
ouvir, mas, quando começa a ouvir aquilo que não quer, remata; ou é como o Governo quer, ou acaba o jogo,
mete a bola debaixo do braço e vai-se embora!
Mas isto não é ouvir!! Isto é colocar em prática a tese do «dono da bola»…!
Para terminar, Sr. Ministro, gostaria que explicasse aquilo que me parece ser uma verdadeira contradição,
não só com aquilo que referiu na sua intervenção, mas também com o que consta da exposição de motivos da
proposta de lei.
A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Vou terminar, Sr.ª Presidente.
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Por um lado, diz-se que o Memorando — o tal que, aparentemente, pelo que aqui foi dito, só foi assinado
pelo PS… — compromete o Estado português a reduzir o número de autarquias; depois, refere-se que a
reforma «pretende dar resposta à atual conjuntura económica e financeira»; mas, depois, vem dizer-se que «a
racionalização do número de autarquias locais não visa uma redução da despesa pública a elas afeta».
Sr. Ministro, afinal, em que é que ficamos?
Aplausos de Os Verdes e do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Montenegro.
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, o Partido Socialista começou a sua
participação neste debate enfatizando um facto, qual seja o de que o Governo recuou. Vamos admitir que o
Partido Socialista tem razão. Isso significa, desde logo, que o Governo, em primeiro lugar, avançou, isto é, que
apresentou uma proposta de revisão do mapa territorial das nossas autarquias,…
O Sr. Luís Menezes (PSD): — Muito bem!
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — … que, depois, ouviu contributos e que recuou.
Vamos admitir que o Governo fez isso mesmo: pôs a sua proposta à discussão, avançou e recuou,
tentando convergir com aqueles que foram os contributos que recolheu.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Se tivesse sido isso…
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Há, contudo, uma outra circunstância: é que há outros que estão
exatamente no mesmo sítio onde estavam no início deste debate.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Esses são os que não têm coragem nem de avançar, nem de recuar. Esses são aqueles que, passo a
publicidade, fazem o mesmo que aquele medicamento, o Melhoral, que nem faz bem, nem faz mal.
Aplausos do PSD.
Sr. Ministro, este é um debate sobre a proposta de lei do Governo, mas é também um debate sobre o
sentido de responsabilidade política e o sentido de compromisso político dos vários partidos com assento
nesta Câmara.
Sr. Ministro, esta é uma reforma importante para o País. E é importante, desde logo, porque é preciso
cumprir um compromisso externo do Estado português. Mas é preciso também que todos possamos cumprir
os nossos compromissos políticos, alicerçados nas nossas intervenções ao longo dos tempos, Sr. Ministro.
A título de exemplo, vou ler uma passagem de um programa de governo, que, a propósito da reforma do
poder local, e como objetivo desse governo, dizia o seguinte: «Reorganização territorial das freguesias, com
consenso alargado, designadamente a associação de freguesias, sobretudo nas áreas urbanas e nas regiões
de baixa densidade». Sr. Ministro, isto está escrito na página 96 do Programa do XVIII Governo Constitucional,
que foi liderado pelo Partido Socialista e pelo Eng.º José Sócrates!…
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Sr. Ministro, mesmo antes dos compromissos do Estado português, já havia compromissos políticos dos
partidos políticos, em Portugal.
Vozes do PSD: — Bem lembrado!
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O Sr. Luís Montenegro (PSD): — E, Sr. Ministro, precisamente porque este é também um debate sobre o
sentido de responsabilidade e sobre o sentido de compromisso,…
A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — … quero perguntar-lhe, sem perder aquele que é o compromisso deste
Governo, se está, ou não, disponível para ouvir os contributos de todos, de todos os que têm propostas,
mesmo daqueles que chegam a este debate com uma proposta igual a esta folha: uma folha em branco. É
porque a proposta do Partido Socialista para a reorganização do mapa territorial das freguesias, em Portugal,
é uma folha em branco.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Sr. Ministro, está disponível para ver a folha que o Partido Socialista tem a apresentar ao País?
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares.
O Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares: — Sr.ª Presidente, começo por responder ao Sr.
Deputado António Filipe, dizendo o seguinte: o Sr. Deputado sabe objetivamente que não há extinção de
freguesias; existe, sim, agregação de freguesias.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Leia o seu discurso!
O Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares: — O senhor sabe que o nosso objetivo não é o
de atacar o poder local; pelo contrário, é o de valorizá-lo! E bem sabe o Sr. Deputado, pois tem sido autarca, a
importância que tem, num momento como aquele que estamos a viver, o fortalecimento do poder local, o seu
modelo de organização e o seu modelo de gestão.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Dê lá uma razão para a extinção!
O Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares: — Sr. Deputado Mota Andrade, há uma coisa
que o Sr. Deputado não pode dizer: é que o senhor ou o Partido Socialista tenham sido surpreendidos, em
algum momento, pelas propostas do Governo.
Importa ainda referir que, quando o senhor diz que levámos seis meses para compreender, eu poderia
dizer, seguindo o seu exemplo, que os senhores andam há seis anos a falar, porque este tem sido o vosso
objetivo.
Mas há uma diferença entre aquilo que é o conhecimento da realidade e a coragem para tomar decisões.
No entanto, distingo o Partido Socialista de todos os outros partidos da oposição, pela importância que tem,
pois é o segundo maior partido com peso no poder local. Sabemos, aliás, que um dos primeiros concelhos do
País a aplicar os critérios que, hoje, estamos a aprovar, depois de três anos de profundo trabalho, é uma
autarquia liderada por um autarca socialista, que é a capital do nosso País!…
Quer dizer, para o Partido Socialista, a aplicação dos critérios, em Lisboa, é boa, porque nem o trabalho foi
vosso nem a coragem de tomar as decisões foi vossa… É que é disso que se trata: da coragem para tomar
decisões.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
E saiba, quando me pergunta em que estudos foram baseadas as nossas posições, que esses estudos são
públicos — o Livro Verde foi disso um exemplo.
Agora, pergunto: e as vossas indecisões foram baseadas em quê, Sr. Deputado?
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Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares: — Em que critério científico de conhecimento da
realidade se basearam para tomar a decisão da indecisão? Do Partido Socialista, espera-se mais.
Por outro lado, respeitamos as assembleias municipais. Os órgãos autárquicos — e o Sr. Deputado António
Filipe colocou esta questão — vão ser ouvidos, vão pronunciar-se.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Mas têm de estar de acordo com o Governo!
O Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares: — E, depois, uma unidade técnica, eleita pela
Assembleia da República, tomará a decisão.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Constituída pelo PS e pelo PSD!
O Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares: — Não, não! Como sabe, terá representantes de
partidos da oposição.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Isso é treta!
O Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares: — Sr. Deputado Luís Fazenda, foi visível que o
senhor tem dificuldade em conhecer a realidade do poder local. O senhor fez um comício, uma pequena
intervenção mais partidária…, mas deixe-me dizer-lhe o seguinte: a identidade de cada cidadão não lhe é
dada pelo Estado! O senhor está enganado! Portanto, os argumentos que aqui utilizou são argumentos que
não se identificam com a realidade.
Relativamente ao referido pelo Sr. Deputado Hélder Amaral, quero dizer o seguinte: Sr. Deputado,
tentámos, até ao limite, acertar com todos — e, em particular, com os partidos que assinaram o Memorando
de Entendimento — todas as possibilidades baseadas em critérios técnicos, em critérios de eficácia e em
critérios de organização, de modo a ser possível um entendimento.
Diz, aliás, o Sr. Deputado Mota Andrade, do Partido Socialista, que o Governo recuou depois de ouvir o
País. Não, o Governo ajustou a sua proposta àquelas que foram muitas das propostas e muitas das reflexões
que ouviu pelo País (comunidades locais, universidades…)! E gostaríamos também de a ter ajustado a
propostas do Partido Socialista…
Se não tivéssemos alterado a nossa posição, estaria aqui o Sr. Deputado a dizer… Aliás, foi aqui dito pelo
Sr. Deputado de Os Verdes que nós funcionamos como os «donos da bola», que não ouvimos ninguém. Diz o
Sr. Deputado Mota Andrade que nós recuámos. Como calculará, a verdade está sempre no meio: aí, onde
está a virtude,…
A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Ministro.
O Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares: — … a virtude de saber ouvir para poder saber
decidir!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as
e Srs. Deputados: Sr.
Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares, a pergunta que se coloca quando iniciamos um debate sobre
a reorganização administrativa do País é se ela é, ou não, necessária e como deve ser feita. Esta é a pergunta
séria e metodológica. A resposta do Bloco de Esquerda é clara acerca disso: pensamos que é necessária uma
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reorganização administrativa do País, não temos qualquer posição imobilista sobre a necessidade de uma
reorganização administrativa do País.
Começaremos por onde? Pelas freguesias? Porquê? Por que não começamos por questionar a ausência
da regionalização administrativa? Por que não começamos por questionar esse «limbo de identidade» que são
as áreas metropolitanas, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares? Por que não começamos por questionar
exatamente como se constituem os municípios, qual é a malha dos municípios, qual é a capacidade de
entreajuda e de funcionamento comum dos municípios?
Como é que a freguesia, constituída pelo paroquialismo local, se encaixa nesse conjunto de modelos de
autodeterminação e de participação das populações que até preexistem ao Estado moderno?
Portanto, em relação à questão de ser ou não necessária uma reorganização administrativa, temos uma
posição de abertura absoluta.
Será que o que aqui temos é o início dessa reorganização administrativa? Não, não é. Em relação às
freguesias, é uma extinção forçada, percentual, quantitativa, sem qualificativos, sem qualquer elemento
identificador do número de freguesias existentes no País.
Qual é o pretexto? É o Memorando da troica. Este Memorando veio substituir qualquer ideia de
comunidade local. Aliás, o pingue-pongue político a que estamos hoje, aqui, a assistir entre os partidos da
maioria e o Partido Socialista resume-se a saber quem cola ou quem descola, mais ou menos, do Memorando
feito e assinado com a troica, com as entidades externas. Porquê? Porque, supostamente, o Memorando tem
o objetivo de eliminar um conjunto de despesa pública avultada, mas verificou-se que, no caso das freguesias,
esse facto não releva, porquanto a despesa pública é da ordem dos zero vírgula zero qualquer coisa por
cento. Portanto, foi preciso inventar um argumentário, que é a criação de economias de escala.
Pergunta-se: não seria possível realizar as economias de escala pela associação voluntária de freguesias,
pela criação de quadros de competência comum? É preciso extinguir freguesias?
A estas perguntas temos uma resposta alternativa. Pensamos que as freguesias que se queiram extinguir e
cuja população entenda claramente da sua desnecessidade devem poder pronunciar-se em relação a esse
facto e, naturalmente, elas extinguem-se. As que se quiserem agregar devem ser chamadas a ter voto nesse
assunto, devem ter a capacidade de determinar a sua associação voluntária em unidades administrativas mais
latas e mais vastas. É esse o princípio que pode ajudar a que as pessoas sejam convocadas para uma vida
coletiva mais intensa e mais profícua em relação à realização daquele serviço público.
Nesse sentido, no projeto de lei que apresentamos privilegiamos a possibilidade da consulta popular, da
decisão local, da associação voluntária, da capacidade de iniciativa legislativa e de referendo local em relação
a este processo.
Talvez não seja o que a troica quer, mas é, visivelmente, o que as populações sentem e querem.
A verdade é que esta sugestão da capacidade de iniciativa das próprias populações, seja por iniciativa de
lei ou de referendo, vai ganhando terreno através de moções e de votos de assembleias municipais por todo o
País, a começar por Lisboa, pela Assembleia Metropolitana do Porto, pela Assembleia Legislativa da Região
Autónoma dos Açores. E quantas mais forem aparecendo, mais vai vencendo o princípio. Curiosamente, o que
vemos por todo o País é que os maiores participantes e apoiantes das propostas no sentido de que haja
consulta às populações são os autarcas do PSD e do CDS-PP.
Portanto, esse princípio da autonomia do poder local, de respeito pela autonomia do poder local e de
respeito pela vontade das populações não é um princípio divorciado da realidade ou qualquer coisa que surgiu
porque o Bloco de Esquerda esotericamente imaginou que isso poderia ser interessante. Não! Resulta da
própria pronúncia popular, dos sentimentos populares, da consistência identitária das populações.
Aplausos do BE.
Sim, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, falemos de identidades!
O Sr. Ministro veio dizer-nos que o nome da terra não constitui algo de identitário para a criação das
personalidades individuais e coletivas e que uma freguesia não se extingue pelo facto de quatro ou cinco se
agregarem, porque mantêm os quatro ou cinco brasões e todas têm a faculdade de manter os nomes. E para
quê? Exatamente para enganar os incautos, dizendo: «Não, não estamos a extinguir. Estamos, sim, a juntar
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quatro nomes.» Verdadeiramente, estão a parodiar a identidade que se formou ao longo do tempo e que é,
aliás, secular na maior parte dos lugares.
Mais de metade das freguesias urbanas desaparecem, assim como, seguramente, mais de 20% das não
urbanas, mas vem dizer: «Não, não, agregam-se, não há extinção de freguesias, há um decreto papal que diz
que não há extinção de freguesias…» Mas o que temos à frente dos nossos olhos é que não há outra coisa
senão a extinção de freguesias. Sobre isso não há a menor dúvida.
Aplausos do BE.
Se os Deputados da maioria quiserem ter um debate sério, assumam as consequências do que estão a
propor. A vossa proposta é legítima. No entanto, não nos tentem enganar fazendo publicidade sobre o que não
estão aqui realmente a concretizar.
Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Entendemos que a capacidade de as populações decidirem não
limita a competência da Assembleia da República.
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Limita, limita!
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Não limita. Assim como o parecer da Associação Nacional de Municípios
Portugueses, que diz que a pronúncia das assembleias municipais deve ser vinculativa, também não limita a
capacidade constitucional do Parlamento. Essa foi uma desculpa inventada à pressa por parte do PSD para
tentar desvalorizar e invalidar os argumentos que lhe têm vindo a ser opostos.
Todos sabemos que há matérias de reserva absoluta de competência da Assembleia que têm várias
limitações à elaboração legislativa por parte da Assembleia. O paralelo mais próximo que podemos fazer é
com a legislação acerca das autonomias regionais não só sobre esta matéria, isto é, a criação, extinção e
modificação de freguesias, como sobre outros diplomas estruturantes das autonomias regionais, em relação
aos quais a Assembleia da República está inibida de legislar, mas não deixa de ter a competência final de
decisão acerca de toda essa legislação. que estrutura e enforma as autonomias regionais, como sejam as leis
eleitorais, o estatuto dos titulares dos órgãos, o estatuto político-administrativo, etc.
Portanto, não me venham dizer que nessas matérias é tudo inconstitucional. Não, não é inconstitucional.
Pode haver limitações ao processo legislativo e, no entanto, a Assembleia da República não perde o seu
poder vinculativo, a sua competência e a sua capacidade de decisão.
Creio que esta matéria, do ponto de vista constitucional, está inteiramente salvaguardada.
Portanto, Srs. Deputados da maioria, se querem discutir o projeto do Bloco de Esquerda com base na sua
inconstitucionalidade, perdem o vosso tempo. Melhor fora que discutissem o parecer da Associação Nacional
de Municípios Portugueses que também foi aqui caracterizado, por ser inconstitucional, pelos porta-vozes do
PSD. Esperemos que o PSD o venha a fazer, já que o Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares nem
sequer se referiu a ele.
Também nos podiam explicar porque é que, numa vastíssima manobra de extinção de freguesias,
deliberaram que as freguesias são uma parte ausente de todo este processo e não têm capacidade para se
pronunciarem, mas apenas para se agregarem por decisão de outrem.
Finalmente, há uma nota que não gostaria de deixar passar em claro.
Do ponto de vista do Bloco de Esquerda, é absolutamente extraordinário que se queira dar à Assembleia
da República uma componente executiva que é tipicamente do Governo. Isso só é percetível pela manobra
política e pelas tentativas de envolvimento do Partido Socialista, ou seja, pelo troiquismo institucional que aqui
nos trouxeram. É absolutamente insólito e verdadeiramente lamentável que uma unidade técnica de matriz
parlamentar — onde, aliás, são desconsideradas as participações das associações legítimas dos autarcas —
vá ser a força de reação rápida que vai moldar as unidades administrativas por todo o País.
Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Fazemos um apelo a que haja uma revisão dos conceitos desta
reorganização administrativa e a possibilidade de ponderar melhores soluções e a participação das freguesias.
Creio que hoje ficará muito claro, a partir do veredicto que esta Assembleia deixar, que o que aqui for
decidido será o que vão ter por todo o País.
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Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente: — Também para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Mota Andrade.
O Sr. Mota Andrade (PS): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as
e Srs. Deputados: O mapa
autárquico nacional assume hoje, sensivelmente, a mesma forma que conheceu há século e meio com a
reforma de Mouzinho da Silveira.
Dizia-se, nesta Casa, no dia 24 de Maio de 1850: «O Governo deve diligenciar fazer reformas, combinando
a economia com as comodidades e com os costumes dos povos. Será esse o único modo de governar e há de
ser sustentado e estimado o Governo que assim o fizer. Não há nenhuma questão mais importante e em que o
Governo deva proceder com maior prudência do que acerca da extinção das freguesias.»
Volvidos mais de 150 anos, as autarquias locais são inequivocamente o pilar da organização democrática e
constitucional do Estado, confundindo-se com a sua história, preexistentes à própria conformação
constitucional da organização do poder político, e não um simples dado orgânico e sociológico.
São formas de administração autónoma, de descentralização territorial do Estado, dotadas de órgãos
próprios e com atribuições específicas correspondentes a interesses específicos.
São a expressão imediata da organização democrática do poder político republicano e não meras
corporações e formas de administração indireta do Estado.
Foi com as autarquias locais que foi possível concretizar a democracia e foi com elas que o País conheceu
o desenvolvimento.
Aplausos do PS.
Foi com elas que foi possível abril e foi com abril que o poder local conheceu nova vida e novos rostos e a
população conquistou o direito de poder escolher os seus governantes mais próximos.
Com a democracia que ajudaram a concretizar, as autarquias locais ganharam autonomia, competências,
atribuições, recursos humanos e financeiros e, assim, maiores possibilidades de satisfazerem as necessidades
das populações.
O dia de hoje ficará para a história da República, da nossa democracia e do poder local como o dia em que
o Governo vem ao Parlamento apresentar uma reforma administrativa territorial autárquica que nada mais é do
que um plano de extinção de freguesias.
Fá-lo não porque esteja investido de um espírito reformista idêntico ao de Mouzinho da Silveira, mas
porque o País se encontra confrontado com a necessidade de cumprir os compromissos assumidos no
Memorando de Entendimento no que à reorganização da estrutura da administração local diz respeito.
O Memorando aponta para a necessidade de reduzir o número de autarquias, é certo,…
Vozes do PSD e do CDS-PP: — Ah!
O Sr. Mota Andrade (PS): — … mas não diz qual o número de municípios ou de freguesias a extinguir
nem tão-pouco a forma de o fazer.
Aplausos do PS.
Ora, como em democracia há sempre alternativas, aqui, como em outras situações, entendemos existirem
outras formas de se cumprir o Memorando de Entendimento…
Vozes do PSD: — Quais?
O Sr. Mota Andrade (PS): — … que não através de uma reforma assente em critérios numéricos e na
ausência de participação dos principais visados: as populações, as freguesias e os eleitos de freguesia.
Aplausos do PS.
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Trata-se de uma pretensa reforma que o Governo quer fazer de forma obstinada, apenas focado nos
números, com uma calculadora, a compasso, a régua e esquadro, esquecendo-se do que consideramos
essencial: uma nova lei eleitoral autárquica, a definição da composição dos órgãos autárquicos e dos seus
meios e competências.
Aplausos do PS.
É, pois, uma meia reforma que vem, apenas e tão-só, forçar a uma redução cega do número de freguesias,
baseada em critérios quantitativos, que conduzirá, somente, ao enfraquecimento da democracia local e ao
afastamento dos cidadãos.
Sr.as
e Srs. Deputados, a garantia constitucional da autonomia local não inclui um direito de cada autarquia
à manutenção da sua própria existência ou dos seus limites territoriais, porque a lei pode modificar as
fronteiras, criar novas autarquias por cisão ou fusão de outras, extingui-las por divisão ou incorporação em
outras, mas o ponto é que não o faça de forma arbitrária ou desnecessária.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. Mota Andrade (PS): — A reforma da administração local é uma reforma necessária, sim. O Partido
Socialista há muito tempo que a defende. Uma reforma que, face às novas realidades e aos novos desafios
que as nossas autarquias enfrentam, reveja os seus meios e competências, permitindo uma melhor resposta
às necessidades dos cidadãos. Uma reforma que, aumentando a eficiência, reforce a prestação do serviço
público, que seja capaz de encontrar um modo de organização administrativa mais eficiente e que seja
consequência de uma profunda reflexão sobre o território e da resposta à questão de saber se a organização
que existe é a que melhor serve as populações.
Trinta anos de poder local democrático permitiram concluir a fase das infraestruturas, impondo-se, neste
momento, a revisão das suas atribuições, das suas competências e o seu modo de funcionamento.
Mas o ponto de partida não é a reorganização territorial, o ponto de partida não é um novo mapa
autárquico. Não! A base, o fio condutor, deve ser uma nova lei eleitoral autárquica, na senda, aliás, do desafio
feito em julho pelo Secretário-Geral do Partido Socialista ao PSD, ao fim de quase uma década de promessas
não cumpridas.
Aplausos do PS.
Sr. Deputado Luís Montenegro, sobre coragem das decisões, lembra-se V. Ex.ª de, há seis anos, quando
acordaram, assinaram e não cumpriram um projeto para a nova lei eleitoral autárquica?
Aplausos do PS.
Sobre coragem, Sr. Deputado, sobre honrar os compromissos estamos falados!
O Sr. Deputado Hélder Amaral disse que o anterior governo estava a estudar uma reorganização territorial.
É verdade! Estava a fazê-lo, sim, e iniciou um processo de discussão pública em conjunto com a ANAFRE, em
conjunto com a Associação Nacional de Municípios Portugueses, em conjunto com várias universidades do
País. De forma a quê, Sr. Deputado? De forma a conseguir um conjunto de critérios que viabilizassem, em
consenso, uma nova lei-quadro.
Aplausos do PS.
A base, o fio condutor, deve, pois, ser uma nova lei eleitoral autárquica que permita a clarificação de
funções, a verdade eleitoral e a transparência na governação pública.
Queremos um modelo mais transparente e coerente e só depois de definida a composição dos diferentes
órgãos autárquicos fará sentido a revisão das novas atribuições, competências e meios financeiros, bem como
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um novo quadro de ordenamento para o território, ou seja, um novo mapa autárquico, o mapa pelo qual o
Governo, de forma errada, quer iniciar a reforma da administração local.
Sobre a reorganização territorial, temos uma posição muito clara: somos contra a extinção de municípios,
por razões culturais e de identidade, porque a sua extinção vai contrariar o sentido de pertença e porque o
municipalismo é a base da construção republicana.
Quanto às freguesias, o Governo esqueceu-se que as nossas 4259 freguesias têm características físicas,
sociais e económicas muito diferentes umas das outras, pelo que não deve haver um único modo de olhar
para realidades tão diversas.
O ordenamento jurídico aplicado a realidades tão distintas terá de ser capaz de respeitar as diferenças que
existem entre as freguesias rurais e as freguesias urbanas, as quais se confrontam com problemas bem
diferentes.
Defendemos, por isso, uma saudável agregação das freguesias existentes no meio urbano.
Lisboa foi pioneira quer no reconhecimento de alguns desequilíbrios, quer na apresentação de uma
proposta de redefinição do mapa do concelho, elaborada com o apoio da sociedade civil e do meio académico.
Lisboa e Covilhã são bons exemplos de como se pode processar a reforma do mapa das freguesias,
porquanto têm presente a opinião dos cidadãos e porque são a prova de que é possível encontrar soluções de
racionalidade, procedendo à eliminação da duplicação de estruturas administrativas.
Aplausos do PS.
No que às freguesias rurais diz respeito, admitimos que estas se possam agregar, caso seja essa a sua
intenção. É importante ter bem presente que, em muitas zonas do território, as freguesias são o último reduto
da presença do Estado e a única ligação das populações com a administração, e isto leva-nos a agir com bom
senso e a não desproteger partes do nosso território, no interior, já tão desertificado; o interior do País, onde
tantas vezes o único interlocutor é o presidente da junta, o seu secretário ou tesoureiro; o interior, com muitos
idosos, pessoas que mais precisam do Estado e da sua presença; o interior, que é caracterizado por uma
sociedade civil muito frágil e com uma densidade demográfica extremamente débil.
E tal poderia levar-nos a pensar que autarquias sem pessoas perdem a razão da sua existência,
consubstanciada na prestação de serviços públicos locais. Pode parecer que uma freguesia num sítio
recôndito não terá razão de existir, mas, ponderadas as circunstâncias, nada justificará a sua extinção.
Não serão as mesmas autarquias locais os principais agentes de fixação das populações? Não serão elas
o principal motor de envolvimento da sociedade? Foi, aliás, com a crítica ao município e ao seu fraco
envolvimento e integração das comunidades locais que emergiu a vontade de valorização e de afirmação
política e administrativa das freguesias.
E nesse espírito nunca se permitiu que fossem consideradas frações dos municípios nem transformadas
em simples órgãos periféricos dos municípios ou da Administração Central.
Sr.as
e Srs. Deputados: É possível fazer esta reforma explicando-a, ao invés de a impor. Uma reforma desta
dimensão, desta importância e com esta relevância não pode ser feita de forma leviana, sem envolver os
agentes locais e os seus legítimos representantes. Defendemo-lo sempre e temo-lo afirmado desde que este
Governo tomou posse. O fator essencial é que as novas freguesias tenham capacidade para intervencionarem
o território e agirem ativamente em favor da sua população e não em questões orçamentais ou financeiras.
Aliás, está para chegar o dia em que o Governo consiga provar que o corte dos custos com as autarquias
equivale a cortes na despesa e que ao corte dos custos corresponde uma melhor qualidade da prestação do
serviço público.
O objetivo desta reforma não deve ser a criação de minicâmaras municipais, mas, sim, de comunidades
com alma, que se responsabilizem pelo destino dos seus e do seu território. Se tal não for feito, estaremos a
fazer uma reforma abstrata, incapaz de regenerar relações de vizinhança, de solidariedade, de proximidade,
de participação — as principais funções das freguesias do futuro.
Sr.as
e Srs. Deputados, o atual Secretário de Estado da Administração Local e Reforma Administrativa, que
saúdo, afirmou há bem pouco tempo o seguinte: «Evidentemente que governar em tempos difíceis se torna
mais complexo, porque é necessário envolver as pessoas, convencê-las para a missão e explicar-lhes os
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objetivos finais. Ou seja, em tempos difíceis, é importante que tenhamos governantes especiais, ou, escrito de
outra forma, governantes que administrem com as pessoas em lugar de administrarem contra as pessoas».
É exatamente o que estão agora a fazer: a governar contra as pessoas; a impor ao invés de envolver; a
diabolizar o poder local e os milhares e milhares de cidadãos e de cidadãs que, de forma abnegada, dão o seu
melhor pelo outro e pela sua comunidade.
Como bem afirmou Alexandre Herculano, um dos maiores defensores da descentralização do Estado, «é o
progresso das ideias que traz as reformas e não o progresso dos males públicos que as torna inevitáveis».
E se a proximidade reforça a participação e a exigência, a manutenção da identidade e a introdução de
maior racionalidade constituirão o equilíbrio desejável. Só com esse equilíbrio uma reforma desta importância
não ficará dependente de maiorias conjunturais e poderá resistir aos ciclos eleitorais e ao teste do tempo.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente: — O Sr. Deputado Bruno Vitorino, do PSD, inscreveu-se para pedir esclarecimentos,
mas o Sr. Deputado Mota Andrade já não dispõe de tempo para responder.
Não sei se o PSD mantém interesse na pergunta. A pergunta tem um valor político autónomo e, se tiver
interesse,…
O Sr. Bruno Vitorino (PSD): — Sim, Sr.ª Presidente.
A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado Bruno Vitorino.
O Sr. Bruno Vitorino (PSD): — Sr.ª Presidente, em primeiro lugar, saúdo as Sr.as
e os Srs. e Sr.as
Deputados, os Srs. Membros do Governo e todos os autarcas que se encontram presentes a assistir à sessão,
agradecendo o trabalho que têm feito pelas vossas terras, pelas nossas gentes e pelo nosso País.
Sr. Deputado Mota Andrade, relativamente a esta matéria — deixe-me dizer-lhe olhos nos olhos —, o PS
tem demonstrado incapacidade, irresponsabilidade e incoerência.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Bruno Vitorino (PSD): — Tem demonstrado incapacidade para apresentar nesta Casa uma iniciativa
legislativa sobre a reforma administrativa do poder local, ao contrário do que aqui já tinham prometido. De
facto, a existirem, as ideias do maior partido da oposição, seriam importantes e enriqueceriam o debate.
O PS tem também demonstrado irresponsabilidade, pois prefere juntar-se à extrema-esquerda, fazendo
crítica pela crítica, recorrendo, muitas vezes, à demagogia e ao medo, recusando um debate sério e
demonstrando, assim, falta de sentido de Estado.
O PS tem ainda demonstrado incoerência, total incoerência! Senão vejamos: os senhores acusam o
Governo por causa do prazo de discussão, que é apertado; acusam o Governo pela redução do número de
freguesias, que é significativa; acusam o Governo pela questão economicista, que não devia nunca ter sido
levantada, porque é quase irrelevante.
Mas o Memorando de Entendimento, assinado com a troica, negociado e assinado por VV. Ex.as
, diz: «Até
julho de 2012, o Governo desenvolverá um plano de consolidação para reorganizar e reduzir
significativamente o número de autarquias. Estas alterações reforçarão a prestação do serviço público,
aumentarão a eficiência e reduzirão custos», ou seja, prazos, redução significativa do número de autarquias e
redução de custos.
O que tanto criticam agora foram assuntos metidos nesta discussão por VV. Ex.as
! Que grande coerência
demonstram! O Partido Socialista assinou o acordo, mas opõe-se-lhe!… O PS coloca o tema no seu programa
eleitoral, mas é frontalmente contra esta matéria!… O PS diz uma coisa e o seu contrário numa velocidade
estonteante!
Vozes do PSD: — Muito bem!
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O Sr. Bruno Vitorino (PSD): — O PS dá o dito por não dito com uma facilidade e um à-vontade que
incomoda qualquer português.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Bruno Vitorino (PSD): — Sobre a redução do número de freguesias, deixo uma reflexão e algumas
situações.
A Sr.ª Presidente: — Terminou o seu tempo, Sr. Deputado.
O Sr. Bruno Vitorino (PSD): — Terminarei de imediato.
Sabe o Sr. Deputado que dos 634 contributos que o Governo recebeu sobre esta matéria nem um é do
PS? Qual é, afinal, o modelo que os senhores defendem?
Sr. Deputado, já agora, deixe-me dizer-lhe isto: não deixei de lhe colocar a questão, porque achei que foi
estratégia do Partido Socialista esgotar o seu tempo para fugir ao debate, como tem feito até aqui.
Aplausos do PSD.
A Sr.ª Presidente: — Para uma interpelação à Mesa tem a palavra o Sr. Deputado Luís Montenegro.
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr.ª Presidente, queria solicitar à Mesa que o PS possa usufruir de um
minuto do tempo do PSD para promovermos aqui um bom debate democrático e para, dessa forma, o Sr.
Deputado Mota Andrade poder responder à pergunta do PSD.
Vozes do PSD: — Muito bem!
A Sr.ª Presidente: — Se não houver objeções, dou a palavra ao Sr. Deputado Mota Andrade…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr.ª Presidente, peço a palavra também para interpelar a Mesa.
A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr.ª Presidente, 1 minuto não chega, ou, então, vamos alterar as
regras dos tempos de hoje.
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr.ª Presidente, peço de novo a palavra.
A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr.ª Presidente, não querendo protelar esta interpelação, quero dizer
que, com a cedência de tempo, o nosso objetivo não é o da recuperação do tempo perdido do PS mas, sim,
dar a possibilidade de o Sr. Deputado poder responder.
O objetivo da nossa proposta é que seja retirado 1 minuto ao tempo do PSD. Portanto, o tempo do debate
não vai sofrer alteração, apenas o protagonista da intervenção não será um Deputado do PSD mas, sim, do
PS.
A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, parece-me lógico o entendimento que se estabeleceu, porque não
estamos dentro das regras da normalidade, estamos dentro de uma excecionalidade que não interfere no
cômputo geral dos tempos do debate.
Tem, então, a palavra o Sr. Deputado Mota Andrade para responder, dispondo de um minuto cedido pelo
PSD.
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O Sr. Mota Andrade (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado, deixe-me que lhe diga, como acabei de dizer
da tribuna, que o PS cumpre religiosamente os seus compromissos.
Protestos do PSD.
E também em relação ao Memorando da troica o PS cumpre os seus compromissos.
Aplausos do PS.
Protestos do PSD.
Sr. Deputado, ainda hoje mesmo o novo representante do FMI em Portugal reconheceu que o Partido
Socialista tem cumprido aquilo a que está vinculado. Quem não cumpriu, e num passado não tão longínquo,
foram VV. Ex.as
, como eu tive oportunidade de dizer da tribuna ao Sr. Deputado Luís Montenegro.
Portanto, sobre matéria de cumprir compromissos, não recebemos lições de ninguém, muito menos do
PSD!
Mas deixe-me dizer-lhe que temos uma estratégia clara. VV. Ex.as
nunca ouviram o Partido Socialista…
Aliás, nem o Partido socialista, nem a Associação Nacional de Municípios Portugueses, nem a ANAFRE! Não
ouviram ninguém!
O Governo, com pompa e circunstância, num grande show off, anunciou, em setembro passado, um Livro
Verde para o poder local. O PS não foi ouvido e disse, desde a primeira hora, que os critérios que estavam
plasmados nesse Livro Verde não serviam.
O PS, desde a primeira hora, disse que a reforma do poder local que é necessária deve começar por uma
revisão da lei eleitoral autárquica. VV. Ex.as
nunca ouviram o Partido Socialista, VV. Ex.as
estão hoje com
dificuldades, porque contrariamente ao anterior governo, que iniciou um processo de reestruturação do
território, VV. Ex.as
não ouviram as partes interessadas.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, continuo a pedir-vos que façam as intervenções dentro dos tempos
regimentais para não termos de passar o tempo a gerir consequências anómalas do mau uso do tempo.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Altino Bessa.
O Sr. Altino Bessa (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as
e Srs. Deputados, Srs.
Autarcas aqui presentes: Este debate que hoje aqui fazemos começa com algo de estranho. Desde logo,
começa com a orientação que o Partido Socialista tem relativamente à sua postura, aos seus tempos,
furtando-se, claramente, a participar neste debate com o objetivo claro de protelar essa mesma intervenção,
não sendo objetivo.
Também me parece um pouco estranho que, num debate com esta importância — eventualmente haverá
razões atendíveis —, o Secretário-Geral do Partido Socialista e o líder da sua bancada parlamentar não se
encontrem presentes. Mas, enfim…
Depois de um amplo debate de quase seis meses sobre os vários eixos do Livro Verde, eis que nos
encontramos aqui hoje a discutir a proposta de lei do Governo sobre a reorganização administrativa do
território.
Efetivamente, esta lei é melhor do que a proposta inicial do Livro Verde. Os seis meses de debate serviram
para hoje estarmos aqui confrontados com uma lei mais clara, com uma lei que tem objetivos claramente
definidos, com uma lei que promove a coesão territorial e o desenvolvimento local, o alargamento das
atribuições das freguesias e dos correspondentes recursos, o aprofundamento da capacidade de intervenção
da junta de freguesia, a melhoria e o desenvolvimento dos serviços públicos de proximidade prestados pelas
freguesias às populações, a promoção de ganhos de escala, de eficiência e de massa crítica nas autarquias
locais.
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Esta lei tem princípios muito claros e muitos definidos: a preservação da entidade histórica, cultural e social
das comunidades locais; a participação das autarquias locais na concretização da reorganização
administrativa dos respetivos territórios; flexibilidade no desenho de soluções concretas de reorganização
administrativa territorial autárquica; e estímulo à reorganização administrativa do território dos municípios.
Esta é, efetivamente, uma lei que serve melhor as populações!
O CDS participou amplamente neste debate, promoveu inúmeros debates nacionais, distritais, concelhios e
até de freguesia. Esta foi sempre a nossa posição, de grande responsabilidade. Não nos furtamos à
discussão, ao contrário de muitos outros, que nem aos debates compareceram, e esse começou desde logo a
ser um sinal negativo que alguns partidos começaram a dar, não se querendo envolver na discussão.
Prova disso é que, chegados aqui, pudemos confirmar que a postura do Partido Socialista foi a de não se
envolver de nenhuma forma nesta discussão. Hoje podemos afirmar que o Partido Socialista é um partido
refém do seu tacticismo político, que abandona claramente os compromissos que negociou e assumiu no
âmbito do programa de assistência económica e financeira. Com efeito, o Memorando de Entendimento
compromete o Estado português a «reduzir significativamente o número de autarquias com efeitos para o
próximo ciclo eleitoral local», e aquilo com que o Partido Socialista se comprometeu não está a cumprir.
Felizmente nem todos pensam da mesma forma no Partido Socialista. Gostaria, pois, de recordar palavras
do anterior Presidente do Partido Socialista Almeida Santos: «Nos tempos atuais, não se justifica a existência
de 308 municípios» e propôs a sua redução, o que permitiria uma poupança brutal que seria usada em favor
dos cidadãos. Propôs ainda «a redução do número de municípios, porque há freguesias com meia dúzia de
eleitores, e isso não se justifica no mundo em que as comunicações são rapidíssimas».
Também António Costa, enquanto Ministro da Administração Interna, disse: «Tem de se acabar o tabu das
fusões das freguesias e municípios». Mas, pelos vistos, o tabu ainda não acabou no Partido Socialista.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Altino Bessa (CDS-PP): — O Programa do Partido Socialista nas últimas eleições legislativas
também dizia o seguinte: «O governo do PS já tomou a iniciativa de lançar um amplo debate público sobre a
reorganização do poder local, em particular ao nível das freguesias.». Andam a debater isto há tantos anos e
não têm uma única ideia, não têm uma única opinião, não têm uma única alternativa a esta promessa!
Aplausos do CDS-PP.
Ainda hoje fomos confrontados na comunicação social com o seguinte: «PS vota contra reforma autárquica
e descola mais do Memorando da troica.» Eu diria que esta é a primeira grande traição desta liderança do PS
à liderança anterior de José Sócrates.
Perante isto, o PS de José Seguro argumenta que a discussão começou pelo sítio errado, que o «fio
condutor» devia ter sido a lei eleitoral. Mas como é que o «fio condutor» poderia ser a lei eleitoral quando nós
queremos — e, pelos vistos, os senhores também — que as assembleias municipais tenham mais autonomia
e maior poder de fiscalização? Se nós não fizermos a reorganização administrativa do território como é que
vamos saber, como vão ficar essas assembleias municipais?
Esse é um argumento falacioso e apenas tático de alguém que aposta a sua liderança nestas próximas
eleições e não se quer comprometer porque pensa que isto lhe pode trazer consequências. Mas nós não
fugimos ao debate, Sr. Deputado Mota Andrade, e vamos assumir as nossas responsabilidades, quer os
senhores queiram, quer não.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
O Sr. Mota Andrade (PS): — Não sabe do que está a falar!
A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Abreu Amorim.
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O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos
Parlamentares, Srs. Secretários de Estado, Sr.as
e Srs. Deputados, Srs. Autarcas: Há três semanas, o líder do
Partido Socialista — hoje sintomaticamente ausente — informou o País de que «não tinha assinado o
Memorando com a troica».
Alguns julgaram que tinha sido um desacerto, uma má escolha de palavras, enfim, uma gaffe — mais uma!
— de uma liderança que tarda em se encontrar e que parece incapaz de superar os seus pavores intestinos.
Mas as semanas seguintes revelaram os piores receios de quem julgava que a atual liderança do Partido
Socialista não se reduzia a uma triste e deslavada cópia do partido de Sócrates, que era timbrado pela falácia,
pela falta de seriedade e pelo abandono constante e aligeirado da palavra dada, como os portugueses bem
sabem e não se esquecem.
Aplausos do PSD.
Infelizmente, nos últimos dias, confirma-se um padrão de conduta política neste PS que difere, para muito
pior, dos primeiros meses da sua atual liderança!
Desde o aviso de António José Seguro, aquele que até já tinha sido prematuramente anunciado como o
«novo» Partido Socialista, parece apostado em regressar ao seu passado recente e mais lamentável: volta-se
a pressentir o ar bafiento do socratismo, acompanhado pelo desprendimento ético perante os compromissos,
mesmo aqueles de maior peso e gravidade para Portugal e os portugueses!
Aplausos do PSD.
Infelizmente, nos últimos dias, confirma-se um padrão de conduta política neste PS que difere para muito
pior dos primeiros meses da sua atual liderança.
Desde o aviso de António José Seguro, aquele que até já tinha sido prematuramente anunciado como o
novo Partido Socialista parece apostado em regressar ao seu passado recente e mais lamentável.
Volta-se a pressentir o ar bafiento do socratismo, acompanhado pelo despreendimento ético perante os
compromissos, mesmo aqueles de maior peso e gravidade para Portugal e os portugueses.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Protestos do PS, tendo alguns Deputados batido com os pés no chão.
Afinal, este PS não negociou nem deve ter assinado este Memorando ou coisa semelhante!
Agora já não se sentem obrigados perante as entidades internacionais que nos vieram salvar da bancarrota
anunciada, desgraça financeira essa em que o seu Governo socialista nos enfiou e, ainda por cima, tardou
criminosamente em reconhecer e a pedir a imprescindível ajuda!
Aplausos do PSD.
Não, nada disso! Para este PS, recalcado no pior que a política portuguesa concebeu nos últimos anos,
para esta liderança que apenas parece ansiar pelos afagos discursivos dos ex-ministros de Sócrates afinal o
desemprego só começou a crescer há oito meses atrás e agora o País já não precisa de um novo mapa
judiciário e — pasme-se! — até a terceira avaliação positiva da troica afinal não é boa para os portugueses. E
o que não se diria se esta avaliação fosse negativa!
Aplausos do PSD.
Hoje debate-se a reforma da administração local, que, na parte respeitante às freguesias, foi iniciada pelo
PS, e que até já foi apelidada de «reforma Junqueiro», o então Secretário de Estado que jurava querer acabar
com as freguesias mais pequenas — nessa altura não deviam existir nem réguas, nem esquadros naquela
secretaria de Estado socialista —,…
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Aplausos do PSD e do CDS-PP.
… e que é hoje, graças ao Partido Socialista e ao seu governo, condição imperativa que foi impingida no
Memorando da troica.
E o PSD desafia o PS a esclarecer o País sobre o seguinte: quem inseriu no Memorando da troica o ponto
que diz «redução significativa das autarquias locais»? Foi o então Secretário de Estado José Junqueiro, que
tinha competências delegadas? Ou o ministro Silva Pereira, que era o titular desses poderes?
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — E quem terá, misteriosamente, inscrito o mesmo preceito no
programa eleitoral com que o PS se apresentou às últimas legislativas?
Aplausos do PSD.
Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados e Srs. Autarcas: Os critérios do documento
verde para a reorganização territorial evoluíram abundantemente na proposta que hoje debatemos graças aos
contributos adquiridos nos debates que se travaram em todo o País e também aqui, no Parlamento.
Quando o documento verde foi apresentado, há cinco meses, o PS disse discordar dos critérios de
agregação das freguesias, criticou muito, mas não fez uma única proposta digna desse nome!
Aplausos do PSD.
O PSD afirmou, a todo o tempo, a sua total e completa disponibilidade para dialogar e apreciar as
sugestões da oposição, em especial do Partido Socialista. Em vão!
Conversas existiram, e foram várias, mas contributos mais ou menos válidos, esses, infelizmente, não
conseguimos avistar nenhum.
Agora, com a nova proposta do Governo, o PS, abusando de um atrevimento excessivamente fértil, repete
ipsis verbis os mesmos argumentos que aduziu contra o documento verde.
Não é responsável, não é politicamente sério, primeiro, jurar que o Governo recuou e, depois, repisar
tautologicamente os mesmos pretextos que parecem servir para tudo no que tange à reorganização territorial.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Sob o ponto de vista ético e político, e atendendo ao superior interesse nacional, o Partido Socialista não
tem o direito de permanecer à margem desta reforma, de que é o progenitor principal e de que, agora, se
pretende desnaturado!
Se permanecer teimosamente neste erro, a presente proposta será a primeira ocasião em que o PS rejeita,
expressa e inequivocamente, um ponto essencial do Memorando que pediu, negociou, assinou e jurou
cumprir!
Aplausos do PSD.
Se assim for, o País saberá com que Partido Socialista poderá contar para o futuro. E esta liderança do PS,
temo bem, cedo aprenderá à sua própria custa que esta deplorável imitação do estilo antecedente não é a
conduta mais aconselhável a médio ou a longo prazo. Porque, na política como na vida, o original leva sempre
vantagem sobre a triste cópia.
Aplausos do PSD, com alguns Deputados de pé, e do CDS-PP.
Protestos do PS, tendo alguns Deputados batido com os pés no chão.
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O Sr. José Junqueiro (PS): — Sr.ª Presidente, peço a palavra.
A Sr.ª Presidente: — Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. José Junqueiro (PS): — Sr.ª Presidente, é para defesa da honra da bancada, nos termos do artigo
84.º do Regimento.
Vozes do PSD: — Oh!
A Sr.ª Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. José Junqueiro (PS): — Sr.ª Presidente, estávamos à espera de que, neste debate, perante tantos
autarcas aqui presentes e perante o País, o PSD pudesse apresentar as razões desta reforma.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. José Junqueiro (PS): — À falta de melhor argumento, escolheu o caminho mais fácil,…
Vozes do PSD: — Defenda a honra!
O Sr. José Junqueiro (PS): — … que foi o caminho do insulto baixo, desconsiderando toda a gente.
Aplausos do PS.
Quero dizer que fui membro do Governo do Eng.º Sócrates,…
O Sr. Luís Menezes (PSD): — Azar o seu!
O Sr. José Junqueiro (PS): — … orgulho-me muito de ter pertencido a esse Governo…
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. José Junqueiro (PS): — … e não reconheço categoria nem competência ao Sr. Deputado para vir
aqui ofender quem quer que seja.
Aplausos do PS.
Mais: este Sr. Deputado tem um percurso errático, desde o PND até ao CDS, passando pelo PSD, tudo lhe
serviu! Gente sem coluna vertebral!
Aplausos do PS.
Protestos do PSD, tendo alguns Deputados batido com os pés no chão.
Mas, Sr.ª Presidente, quero dizer que, no Memorando da troica, que honramos, não há desemprego em
14,8%; no Memorando da troica não há captura dos subsídios de Natal e de férias; no Memorando da troica
não há alteração das leis do trabalho; no Memorando da troica não está nenhum compromisso para a
recessão. Nós cumprimos, mas não aceitamos lições de moral vindas do PSD e, sobretudo, vindas deste Sr.
Deputado, que fez um discurso com a boca rente ao chão.
Aplausos do PS.
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A Sr.ª Presidente: — Para dar explicações, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos
Abreu Amorim.
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado José Junqueiro, pediu a palavra para
defender a honra da bancada, mas não vi qualquer exercício relativo a esse objeto. Não vou dizer que foi por
défice do mesmo objeto, mas, sem dúvida alguma, a honra da sua bancada não ficou muito bem defendida
com a intervenção de V. Ex.ª.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Disse o Sr. Deputado que foi membro do anterior Governo, liderado
pelo Eng.º José Sócrates. Sr. Deputado, nós bem o sabemos, e não o esquecemos, tal como o País também
não se esquece. E os autarcas que nos veem e que nos ouvem sabem perfeitamente quem é que começou a
falar da extinção das freguesias, sobretudo das mais pequenas. Era essa honra que o Sr. Deputado deveria
defender, mas não o fez!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, a Sr.ª Deputada Paula Santos inscreveu-se para formular um pedido
de esclarecimento ao Sr. Deputado Carlos Abreu Amorim, pelo que tem a palavra.
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Carlos Abreu Amorim, ouvimos atentamente
a sua intervenção e registámos que o Sr. Deputado não disse uma única palavra em defesa da proposta que o
Governo, hoje, veio aqui apresentar, para extinguir freguesias. Nem uma palavra!
Aplausos do PCP.
O Governo continua a não dizer ao PCP quais as vantagens em extinguir freguesias, qual é o ganho das
populações e do País com esta proposta. Registo que o Sr. Deputado do PSD também não enunciou uma
única vantagem.
Por isso, Sr. Deputado, a primeira questão que lhe quero colocar, e reitero a questão já colocada por nós, é
esta: qual é, afinal de contas, a vantagem ou quais são as vantagens para as populações e para o País com a
extinção de freguesias?
Aplausos do PCP.
Uma segunda questão, de forma muito rápida, tem a ver com o seguinte: o Governo insiste em avançar
com uma reforma contra as populações, contra o País, contra a opinião dos autarcas. Muitos autarcas — e
estão hoje aqui presentes muitos deles — manifestaram a sua opinião contra o documento verde e contra a
extinção de freguesias. Muitos desses autarcas são do PSD, eleitos pelo PSD! Sr. Deputado, diga-nos como é
que incorporou os seus contributos e como é que o Governo incorporou as propostas e as opiniões dos
autarcas do PSD na proposta que hoje aqui nos traz?
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Abreu Amorim.
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Paula Santos, agradeço as
questões que me colocou.
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Deixe-me dizer-lhe o seguinte: não concordo com muitas das coisas que têm sido ditas sobre o panorama
das freguesias portuguesas. Dizem que as 4259 freguesias portuguesas estão bem como estão e que não se
lhes deve mexer. Não é essa a minha opinião.
A esmagadora maioria das freguesias portuguesas, designadamente aquelas que são mais pequenas e
que, portanto, devem ser mais protegidas, não têm sido devidamente acarinhadas, em tempos de
democracia,…
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Pois não!
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — … pelo que estão indigentes. Já referi aqui, em Plenário, que
grande parte delas vive em estado de mendicidade em relação aos municípios.
Ora, queremos dar escala, massa crítica e, sobretudo, dignidade às freguesias, Sr.ª Deputada.
Esta reforma é feita para defender as freguesias, esta reforma é feita para preservar aquilo que as
freguesias têm de melhor…
Protestos do PCP.
… e aquilo que o princípio da autonomia local, consagrado na nossa Constituição, nos oferece a este
respeito.
Aplausos do PSD.
Vozes do PCP: — Respondeu zero!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Estamos aqui há duas horas e ainda não apresentaram um
argumento!
A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Paula Santos.
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Permitam-me que, em primeiro lugar,
saúde os autarcas aqui presentes, especialmente os autarcas de freguesia e os trabalhadores da
administração local.
Aplausos do PCP.
Depois do «pacto de agressão», subscrito por PS, PSD e CDS, e da apresentação do famigerado
documento verde, o Governo traz hoje à discussão uma proposta com um único propósito: extinguir um terço
das freguesias.
Registamos até que o Sr. Ministro, na intervenção inicial, tenha referido que o Memorando foi assinado pelo
anterior Governo, pela União Europeia, pelo BCE e pelo FMI.
Sr. Ministro, porventura, esqueceu-se de que o PSD e o CDS também puseram lá a sua assinatura?!
Aplausos do PCP.
Não vale a pena transferir responsabilidades! PS, PSD e CDS são, igualmente, responsáveis nesta
proposta para extinguir freguesias.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Para o Governo, a preocupação não é melhorar as condições de vida das
populações nem promover a participação democrática ou, menos ainda, capacitar as freguesias para reforçar
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a sua intervenção. Importa apenas extinguir freguesias, «a bem ou a mal», como assumiu o Sr. Ministro Miguel
Relvas.
Mas o Sr. Ministro sabe que não apaga a esmagadora votação dos autarcas no congresso da ANAFRE, a
rejeitar o documento verde, as centenas de tomadas de posição e moções contra a extinção de freguesias,
aprovadas pelos órgãos autárquicos, nem as ações de luta já dinamizadas pelas populações.
O Governo prepara-se para impor uma reforma administrativa ou, de uma forma mais rigorosa, a extinção
de freguesias, contra a vontade das populações, numa atitude de autoritarismo.
A extinção de freguesias é uma peça de uma vasta proposta de desmantelamento do poder local
democrático, num autêntico ajuste de contas com as conquistas da Revolução de Abril.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Ora bem!
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Atacam a autonomia administrativa e financeira, a justa repartição dos
recursos públicos entre a administração central e local, degradam os serviços públicos para os entregar aos
grandes grupos económicos, destroem o emprego público e põem fim à pluralidade, representatividade e
colegialidade dos executivos municipais.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — A eventual concretização destas propostas significará um profundo
retrocesso.
A questão que se coloca, e à qual o Governo e os partidos que o suportam, ainda hoje, na Assembleia da
República, não deram resposta, é a de saber, afinal, o que ganham as populações e o País com a extinção de
freguesias. A resposta é fácil: não ganham nada, perdem muito!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — O Governo utiliza falsos argumentos para justificar a extinção de freguesias.
Senão, vejamos: evoca a proximidade, quando, na realidade, vai afastar as autarquias das populações; afirma
ganhos de eficiência e de escala, quando reduz a capacidade de resolução dos problemas das populações; e
afirma o reforço da coesão, quando acentua as assimetrias, onde os territórios mais ricos e mais populosos se
tornarão mais atrativos, em detrimento dos territórios mais pobres, dando mais um passo para a desertificação
e o abandono de muitas localidades.
Até um dos argumentos muito utilizado, relativo aos meios e às competências, o Governo não o concretiza,
remetendo para futura legislação.
A proposta de lei limita-se a indicar critérios de régua e esquadro para extinguir freguesias. E, como se não
bastasse, desvaloriza a posição das assembleias de freguesia, dizendo que, simplesmente, podem apresentar
pareceres, mas que só serão considerados se forem ao encontro dos critérios estabelecidos pelo Governo.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Uma vergonha!
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Tal como fazem com a posição das assembleias municipais, que,
designada por «pronúncia», só tem validade se for ao encontro dos critérios propostos, caso contrário será
ignorada, como se não tivessem tomado posição. É neste momento que intervém a dita «unidade técnica»,
sem legitimidade democrática, para dizer quais as «pronúncias» que estão ou não de acordo com os critérios
pré-estabelecidos pelo Governo e, caso não estejam, é essa «unidade» que elabora a proposta.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Querem transformar as assembleias municipais nas coveiras das
freguesias, mas, no caso das que não aceitarem este papel, será a unidade técnica, em desrespeito pela
autonomia do poder local democrático, a determinar qual será a reorganização administrativa.
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A metodologia que o Governo propõe deixa claro que só contam as posições coincidentes com as suas
pretensões, caso contrário são deitadas para o «caixote do lixo».
Mas introduzem mais um elemento de chantagem: a majoração de 15% do orçamento da futura freguesia,
para aquelas que se juntarem voluntariamente.
A proposta apresentada não salvaguarda as especificidades e a identidade das freguesias, não tem em
conta a realidade de cada uma e reduz significativamente a participação popular.
Não são os aspetos de natureza económica que motivam a extinção de freguesias, dado o seu diminuto
peso no Orçamento do Estado, mas, sim, o empobrecimento do regime democrático. Os autarcas dão voz aos
anseios e às reivindicações das populações, tornando-se incómodos para os governantes. É exatamente esta
realidade que o Governo quer liquidar.
Apesar de o Governo fazer crer que este processo vai continuar, podem contar com a luta das populações,
dos trabalhadores e dos autarcas para dar combate a estas medidas e defender as freguesias, a dignificação e
a valorização do poder local democrático.
A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Estou a terminar, Sr.ª Presidente.
O descontentamento cresce de norte a sul do País.
O PCP assume a sua posição ao lado das populações, dos trabalhadores e dos autarcas, que lutam e dão
combate à destruição do poder local democrático. Defendemos o aprofundamento dos princípios
constitucionais conquistados pelo povo, o reforço do poder local democrático e a melhoria da qualidade de
vida das populações.
Não legitimaremos a extinção de freguesias!
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Estamos no fim do debate, mas
há um dado curioso nesta discussão que Os Verdes não podem deixar passar em branco. É que a proposta do
Governo é tão boa, tão boa, que o Governo, o PSD e o CDS não querem ficar com a paternidade da reforma e
hoje mais não fizeram do que dizer assim: «A reforma é boa, mas a culpa é do Partido Socialista, que assinou
o Memorando». E a proposta é tão boa, tão boa, que o PSD e o CDS, hoje, até agiram como se nada tivessem
a ver com o Memorando de Entendimento que foi assinado com a troica.
Ora, se a proposta fosse boa, não era necessário atribuir culpas a ninguém e até se reivindicava a
paternidade da «obra»!
Quando falamos de reformas, creio que a primeira questão que deve ser colocada é a sua motivação, ou
seja, o que é que dá origem a essa reforma. E a origem ou a motivação de qualquer reforma, se for séria, terá
de ser o interesse das populações, não pode ser outra. O interesse dos cidadãos tem de ser o «farol»
orientador de qualquer reforma, porque, se assim não for, meus senhores, o melhor é ficarmos quietos, uma
vez que, para pior, já basta assim. Se não se pretende melhorar a qualidade de vida das pessoas, pelo menos
que não se complique, que não se piore.
O que se percebe desta proposta é que o interesse das pessoas não foi, sequer, considerado. E não foi
considerado, porque a motivação desta proposta é, exclusivamente, a redução do número de autarquias e, por
essa via, poupar dinheiro, mesmo que isso implique sacrifícios e dificulte, ainda mais, a vida das populações.
Mas isto, agora, para o Governo, não interessa nada, o que interessa é a troica.
O mais grave e que, porventura, até poderá chocar mais os portugueses é o facto de serem as freguesias e
as câmaras municipais os órgãos de poder que melhor investem o dinheiro dos contribuintes e os únicos que
conhecem uma parte substancial da realidade social e que, além disso, têm capacidade para chegar de forma
direta àqueles que, efetivamente, contribuem para os cofres do Estado.
Lembramos que, com 10% das receitas totais do Estado, são as autarquias que asseguram quase 50% do
investimento público. Portanto, dizer-se, como se diz, que o objetivo desta reforma não é o de menorizar o
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papel de intervenção das autarquias locais é enganar as pessoas, é faltar à verdade. E avançar com esta
reforma, nestes moldes, e com o espírito que encerra, é apenas impedir cada vez mais os contribuintes de
terem acesso direto aos órgãos do poder e caminhar no sentido de uma gestão pública mais opaca, menos
eficiente e muito, mas muito distante dos cidadãos.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Muito bem!
A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.a e Srs. Membros do Governo, Sr.
as e Srs.
Deputados: Neste debate sobre a reorganização administrativa, podemos já tirar algumas conclusões sobre as
diversas intervenções que tivemos nesta Assembleia.
A primeira conclusão, aquela que é mais importante, é que o Governo não acredita na sua proposta e por
isso não a defende, não respondeu a nenhuma das perguntas que foram colocadas sobre a proposta que
trouxe a debate e por isso não a defende, porque ela não é argumentativamente defensável.
Por parte das bancadas que apoiam o Governo, o PSD falou mais de 10 minutos sem dizer uma palavra,
uma única que fosse, sobre a proposta que apoia. Falou sobre tudo e mais alguma coisa, menos sobre a
política concreta.
Em abono da verdade, digamos que o CDS foi o único partido que tentou trazer algum debate sério a esta
matéria, sem sucesso, porque não há argumentação que explique esta prepotência do Governo. Tentou, mas
não conseguiu.
O que percebemos deste debate é que quem não tem argumentos utiliza a força. Por isso, se falta a
racionalidade, se falta a razão, impõe-se pela força, pela prepotência, a vontade do Governo. Prepotência
sobre as freguesias, num claro desprezo sobre o poder local, mas também prepotência sobre as populações,
num desprezo sobre aquilo que é fundamental às pessoas, que é a sua identidade.
O Governo não valoriza isso, até faz algum jogo de insulto às populações sobre as propostas que põe em
cima da mesa.
Extinguem-se freguesias, mas afinal o Governo diz que não desaparecem os nomes! Criam-se uniões,
uniões de várias freguesias, mas perde-se a identidade que une as pessoas às suas terras, e essa está muito
acima da vontade do Governo!
Diz-nos ainda que as freguesias até poderão falar, desde que, claro, não contrariem a vontade do Governo.
Extinguem-se a bem, fundindo-se com outras freguesias, ou extinguem-se a mal, porque o Governo impõe que
assim seja!
E pergunta-se alguma coisa às assembleias municipais? Pergunta-se apenas o seguinte: as assembleias
municipais dizem «sim, Sr. Ministro» ou é preciso que o Ministro imponha que elas digam que sim à vontade
do Governo?!
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Muito bem!
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Esta é a visão democrática do Governo, que diz às freguesias e às
assembleias municipais «ou estão connosco ou nós, pela força, vamos fazer com que vocês cumpram a nossa
vontade»!
Não há democracia nesta escolha, não há política nem argumentação que não seja a do ataque às
populações, às suas identidades, através deste ataque ao poder local!
O Governo tentou trazer aqui um quadro a preto e branco. Por um lado, diz que estamos do lado da
modernidade e quem está contra nós está do lado do imobilismo, mas, por outro lado, o que percebemos é
que para este Governo modernidade é sinónimo de prepotência. Por isso, o que se debate hoje é se estamos
do lado da democracia ou se estamos do lado da prepotência do Governo.
O que o Bloco de Esquerda trouxe a este debate foi estar do lado da democracia, da vontade das pessoas,
porque não há imobilismo em quem ouve a vontade das populações. Elas sabem bem o que querem, e o
poder local foi feito para elas, foi feito para as servir à medida das suas necessidades. Se elas disserem que
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querem a fusão, deverão fazê-lo, mas com referendos, porque de outra forma é impor a vontade do Governo
acima de todos — das freguesias, das assembleias municipais e, principalmente, das populações.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Administração
Local e Reforma Administrativa.
O Sr. Secretário de Estado da Administração Local e Reforma Administrativa (Paulo Simões Júlio): —
Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados, Srs. Autarcas aqui presentes: Depois de ouvir atentamente todas as
intervenções, neste final de debate, dou por mim a pensar se o que alguns aqui disseram traduz falta de
conhecimento e de trabalho para entender a proposta de lei que hoje aqui discutimos ou, pior ainda, traduz
simplesmente contorcionismo político.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Secretário de Estado da Administração Local e Reforma Administrativa: — Neste tempo, quem
aceitou cargos políticos assumiu que teria que se incomodar. Infelizmente, ainda temos alguns políticos em
Portugal que não se querem incomodar, políticos que sacrificam a coerência a favor da tática, que falam em
ciclo fechado, limitando-se a criar diálogos entre políticos, deixando os portugueses de fora.
O pior que pode acontecer aos políticos que têm responsabilidades nacionais é não saberem escrutinar
problemas e não terem deles uma leitura correta.
Sobre o território, quando alguns olham para o interior, imaginam provavelmente um território condenado
ao fracasso, fazem demagogia com as populações que lá vivem e dizem basicamente que o problema se
resolve fazendo tudo como tem sido feito.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Secretário de Estado da Administração Local e Reforma Administrativa: — Esta insanidade de
querer resultados diferentes pensando que basta formular um simples desejo e insistindo em continuar a fazer
tudo na mesma deveria terminar em Portugal.
Protestos do Deputado do PCP Bernardino Soares.
Ouvindo alguns Srs. Deputados, apetecia-me dizer-lhes que «desliguem o zoom». Quando olharem para o
interior, vejam também jovens que lá estudam, pessoas que lá vivem, famílias que lá estão, e percebam que o
ciclo vicioso somente se resolverá mudando a prioridade das políticas e a organização política e administrativa
das estruturas que as suportam.
Aplausos do PSD.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Limpe as mãos à parede!
O Sr. Secretário de Estado da Administração Local e Reforma Administrativa: — Esta organização
administrativa que discutimos aqui, hoje, tem mais de 150 anos e é essencial que seja adequada às novas
necessidades do território e das pessoas que lá estão.
Esta iniciativa é complementada com outras, nomeadamente com a cooperação intermunicipal e com mais
simplificação de processos no sentido de libertar recursos, porque é disso que estamos a falar, para termos
melhor coesão territorial e cidades mais sustentáveis.
Gostaria de insistir que, com esta reorganização política e administrativa, não se perde nem se reduz
nenhum serviço público.
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O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Não?!
O Sr. Secretário de Estado da Administração Local e Reforma Administrativa: — É essencial que
todos, sobre este assunto, falem a verdade.
Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Não precisamos, nem devemos, fazer tudo como fazíamos há 20
ou 30 anos, porque o mundo mudou, Portugal mudou e o local também mudou.
Parece que nesta mudança toda há alguém que mudou pouco,…
O Sr. António Filipe (PCP): — A troica!
O Sr. Secretário de Estado da Administração Local e Reforma Administrativa: — … que continua na
política do «mais ou menos» e do «assim, assim».
Pensávamos, sinceramente, que este momento difícil que atravessamos — aliás, consequência dessa falta
de coragem de fazer o que deveria ter sido feito no momento certo — seria suficiente para trazer mais
coerência à política portuguesa.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — «Blá-blá-blá»!
O Sr. Secretário de Estado da Administração Local e Reforma Administrativa: — Hoje, percebemos,
aqui, que nos enganámos. Para mal de Portugal e dos portugueses, a mudança que se vislumbra a alguns é
que se pode negociar, se pode assinar e depois também se pode incumprir. Mas, como diz o povo, «a
esperança é a última coisa a morrer».
Gostaríamos de dizer que o Governo continua a querer alternativas credíveis, que esta proposta de lei não
é fechada e que temos a expetativa de que quem tem responsabilidades as assuma. Este Governo ouve,
incorpora contributos, mas há uma coisa que jamais deixará de fazer: decidir.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — «Blá-blá-blá»!
A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Montenegro.
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: No
final deste debate, gostava de deixar três ou quatro notas.
A primeira é a seguinte: na bancada do PSD, e nesta maioria, não temos a arrogância de pensar que
somos os donos da razão.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. João Paulo Pedrosa (PS): — Têm, têm!
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Este processo evidencia bem aquela que é a nossa postura de
disponibilidade para podermos colher dos outros partidos e de outras forças da nossa sociedade os
contributos para tomar boas decisões.
O Sr. Luís Menezes (PSD): — Bem recordado!
O Sr. Luís Fazenda (BE): — O Secretário de Estado acabou de falar de insanidade!
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Contudo, Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, estar contra tudo e contra
todos não é contributo para fazer reforma nenhuma.
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Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Nós somos até — dá-se esta
circunstância — o partido com mais autarcas de freguesia em Portugal. Temos um grande respeito por todos
os autarcas de todos os partidos, mas temos, em primeira linha, uma grande gratidão para todos quantos
servem nas freguesias as suas populações em nome de candidaturas apoiadas pelo PSD.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Protestos do Deputado do PCP Bernardino Soares.
O que pretendemos é que esses autarcas possam continuar a levar a cabo o seu trabalho em benefício das
populações, que as nossas freguesias sejam mais dinâmicas, que as nossas freguesias sejam mais dignas e
tenham mais capacidade para prestarem o seu serviço.
E não esquecemos, Srs. Deputados, que esta proposta é um campo fácil para a demagogia, é um campo
fácil para todos exibirem o seu bairrismo.
Nós também somos bairristas, nós também gostamos da identidade que está adjacente à terra que nos viu
nascer, à terra onde crescemos, onde estudámos, onde trabalhamos e onde vivemos. Também temos a noção
da importância desse sentimento de identidade. Mas, neste momento, o que se nos exige é que não olhemos
só para isso, que olhemos para o todo nacional e possamos reconstruir Portugal, para o pôr a crescer
económica e socialmente.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — 0,1% do Orçamento do Estado!
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Reformar, Srs. Deputados, não é deixar tudo na mesma, reformar exige
também alguma coragem. E hoje, neste debate, verificou-se uma grande diferença entre aqueles que estão do
lado da coragem e aqueles que estão do lado do medo.
Srs. Deputados, tem medo quem não cumpre a sua palavra!
O Sr. Luís Menezes (PSD): — Muito bem!
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Tem medo quem coloca o interesse partidário acima do interesse
nacional.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Tem medo quem esmorece à primeira crítica que encontra no seu
discurso político. Tem medo quem não é capaz de ter vontade de reunir e de convergir a bem das nossas
populações.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — E, Srs. Deputados, tem medo quem não tem convicção.
O Sr. Luís Menezes (PSD): — Muito bem!
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Srs. Deputados, a seguir vai falar-se de Lisboa. Em Lisboa, não houve
medo quer de quem tem o poder municipal quer de quem é oposição municipal.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
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A Sr.ª Presidente: — Terminou o tempo de que dispunha, Sr. Deputado.
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Vou terminar, Sr.ª Presidente.
O PSD, em Lisboa, fez e faz o mesmo que faz na Assembleia da República!
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Não faz, não!
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Outros, não se podem gabar do mesmo, Sr.as
e Srs. Deputados!
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Vou terminar, Sr.ª Presidente, dizendo que julgo que o desafio que
temos pela frente é muito grande. Temos que decidir se queremos ser taticistas, se queremos ser calculistas,
se queremos pensar apenas e só nas eleições seguintes ou se queremos, efetivamente, mudar Portugal. É
esta a opção que temos que tomar!
Estamos disponíveis para acolher o contributo positivo de todos, se todos quiserem contribuir para esta
transformação. Quem não quiser contribuir, vai ter que ficar a falar sozinho.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, vamos entrar no ponto seguinte da ordem do dia, qual seja o debate
conjunto, na generalidade, dos projetos de lei n.os
120/XII (1.ª) — Reorganização administrativa de Lisboa
(PSD e PS), 164/XII (1.ª) — Reorganização administrativa de Lisboa (CDS-PP), 183/XII (1.ª) — Cria a
freguesia do Parque das Nações, no concelho de Lisboa (BE) e 184/XII (1.ª) — Cria a freguesia de Telheiras,
no concelho de Lisboa (BE).
Para apresentar o projeto de lei n.º 120/XII (1.ª), tem a palavra, pelo PSD, o Sr. Deputado António Prôa.
O Sr. António Prôa (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Discute hoje a Assembleia da
República a proposta de reorganização administrativa de Lisboa que resulta da vontade dos órgãos
autárquicos do município de Lisboa e é apresentada pelos Grupos Parlamentares do PSD e do PS.
Permitam-me, por isso, uma referência e uma saudação aos autarcas de Lisboa aqui presentes, e são
muitos: Srs. Presidentes de junta de freguesia, Sr. Presidente da Câmara, Sr.ª Presidente da Assembleia
Municipal e Srs. Deputados municipais. Esta proposta resulta do vosso, permitam-me, do nosso trabalho e da
nossa vontade. A reforma administrativa de Lisboa é a consequência de uma análise sobre a evolução, a
realidade e as aspirações da capital do País.
Lisboa, como todo o território povoado, é uma realidade dinâmica, função do desenvolvimento urbano,
demografia e exigências das suas populações, mas também de maiores ambições dos seus autarcas. Por isso
mesmo, tornava-se urgente adaptar a organização da cidade a uma nova realidade e a maiores exigências de
desempenho.
Sr.ª Presidente e Srs. Deputados: Esta é uma reforma que é feita porque, no PSD, defendemos que as
organizações públicas devem estar ao serviço das pessoas e só devem existir em função dessa utilidade, e
por isso não são imutáveis.
Esta é uma reorganização que sublinha o papel fundamental das freguesias na promoção de políticas de
proximidade com as populações e por isso a opção de diminuição de 53 para 24 e não para um número ainda
inferior. É, ainda assim, uma redução de 55%.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Mas as freguesias não foram consultadas!
O Sr. António Prôa (PSD): — Esta é uma reforma que se traduz em freguesias com dimensão adequada,
aptas a assumirem um significativo aumento de competências, mas também de recursos humanos e
financeiros.
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Esta é uma reorganização que dignifica os autarcas das freguesias, dotando-os de melhor capacidade para
que façam aquilo com que um verdadeiro autarca mais se preocupa: contribuir para o bem-estar dos seus
fregueses.
Esta é uma reforma que coloca as freguesias em condições de contribuírem decisivamente para o
desenvolvimento da cidade, para que Lisboa possa dar um contributo mais ativo para ajudar o País.
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Esta proposta resulta de um processo de discussão pública alargada, com
uma proposta inicial que foi melhorada com os contributos de todos quantos quiseram participar. Envolveu
debates no município e nas freguesias,…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — E as freguesias o que é que disseram?!
O Sr. António Prôa (PSD): — … contributos de académicos e de estudiosos de Lisboa e a participação de
milhares de lisboetas.
Depois, a Câmara e a Assembleia Municipais deliberaram, por larga maioria, propor um novo modelo de
que resulta a presente proposta. O consenso a que se chegou é, aliás, exemplar.
Cabe agora à Assembleia da República decidir. Decidir se apoia a vontade manifestada pelos órgãos
autárquicos de Lisboa.
Para o PSD, que acredita no papel das freguesias e dos seus autarcas e que, desde a primeira hora, se
empenhou neste processo de forma responsável, é evidente que sim, pela proposta, mas também pelo seu
significado.
Por isso, apoiamos esta proposta, que é, aliás, em tudo semelhante à proposta que o Governo apresenta
no plano nacional.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Pois é!
O Sr. António Prôa (PSD): — Há, no entanto, uma única diferença: enquanto em Lisboa o PS e o PSD se
empenharam, na reforma nacional falta a mesma atitude responsável do Partido Socialista.
Aplausos do PSD.
A Sr.ª Presidente: — Ainda para apresentar o projeto de lei n.º 120/XII (1.ª), tem a palavra, pelo PS, o Sr.
Deputado Miguel Coelho.
O Sr. Miguel Coelho (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: O primeiro aspeto a referir, em
relação a esta proposta de reforma administrativa de Lisboa que agora estamos a discutir, é que ela nada tem
a ver com a troica.
Esta reforma é um velho anseio dos autarcas da cidade de Lisboa já desde os tempos do Presidente
Abecasis (na altura, na Assembleia Municipal, foi criada uma comissão para analisar e discutir a reforma
administrativa da cidade), atravessou gerações de autarcas e, finalmente, em 2008, o Presidente da Câmara
Municipal de Lisboa, Dr. António Costa — que quero aqui saudar, assim como a Sr.ª Presidente da
Assembleia Municipal e todos os autarcas das freguesias de Lisboa aqui presentes —, colocou a questão no
dia 5 de outubro de 2008, perante o Sr. Presidente da República.
Reclamou então o Dr. António Costa uma dupla descentralização: do Estado para os municípios e dos
municípios para as freguesias. Como a descentralização dos municípios para as freguesias tinha a ver
connosco, em Lisboa meteu-se mão à obra!
Em segundo lugar, queria dizer que esta reforma só foi possível porque o Partido Socialista e o Partido
Social Democrata em Lisboa, partidos que também aqui, na capital, disputam duramente a luta pelo poder
autárquico, souberam colocar de lado os seus interesses imediatos, do ponto vista eleitoral, e assumir uma
visão estratégica para a cidade de Lisboa, fundamental para o futuro dos lisboetas e da cidade.
Protestos do Deputado do PCP Bernardino Soares.
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Esta é uma reforma que partiu de baixo e, como disse, de um impulso reformador, afirmado no dia 5 de
outubro de 2008.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — E as freguesias? O que é que as freguesias disseram? Qual foi o
parecer?
O Sr. Miguel Coelho (PS): — Foi encomendado a duas instituições técnicas universitárias um estudo que
serviu de base para uma proposta que surgiu, finalmente. Esse estudo foi debatido em sessão pública na
Assembleia Municipal e originou, depois, um acordo político, que, por sua vez, deu lugar a um debate intenso
na sociedade portuguesa. Foram travados debates públicos na Assembleia Municipal e dezenas de debates
nas assembleias de freguesia e foram colocados meios eletrónicos à disposição dos cidadãos para
comunicarem e darem a sua opinião — um «infomail» direto a todos os cidadãos da cidade de Lisboa para
participarem em relação não só ao mapa e às competências como, também, à nomenclatura das próprias
freguesias.
Não houve reforma tão participada como esta na cidade de Lisboa!
Aplausos do PS.
É uma reforma, Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, que assenta em três pilares decisivos.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É uma reforma só de fronteiras!
O Sr. Miguel Coelho (PS): — O primeiro pilar, como não podia deixar de ser, é o da descentralização de
competências. Nunca foram conferidas tantas competências às juntas de freguesia como as previstas nesta
reforma, que agora se submete à apreciação da Assembleia da República. As freguesias da cidade de Lisboa
passam a ter competências em domínios que não tinham até aqui, e por direito próprio, e noutros que já
tinham por delegação de competência, mas que agora passam a ter também por direito próprio.
O segundo pilar assenta na transferência dos respetivos recursos humanos e financeiros. Também aqui,
temos orgulho de defender uma proposta que não vai custar mais um cêntimo ao Orçamento do Estado, o que
nos dá uma particular satisfação.
Naturalmente, o terceiro pilar desta reforma é o da reconfiguração do mapa, o da reconfiguração da
dimensão de escala. Lisboa já não é hoje a mesma cidade de há 50 anos, altura em que foi feita a última
reforma. Lisboa cresceu e mudou a sua estrutura tipológica do ponto de vista demográfico: tem menos
residentes, mas mais cidadãos trabalhadores durante a semana inteira.
O nível de exigência na cidade de Lisboa é muito maior em relação a todos os autarcas. Lisboa tinha
disparidades que agora não pode ter: existiam freguesias com menos de 200 eleitores, a par de outras com
mais de 40 000 eleitores. Portanto, face às novas exigências, era preciso reconfigurar o mapa da cidade para
que pudesse corresponder também à descentralização de competências que agora lhes é dada. É por isso
que se reduzem as freguesias de 53 para 24.
Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, termino dizendo o seguinte: esta é uma reforma de toda a cidade, é uma
reforma do povo de Lisboa e é uma reforma dos seus autarcas. Por isso, ela merece vir a ser aprovada nesta
Assembleia da República!
Aplausos do PS.
Em sede de discussão na especialidade, seguramente estaremos disponíveis para todos os acertos de
pormenor que configurem com questões de fronteira dos territórios do concelho de Lisboa, mas não estamos
disponíveis, como é natural, para violar o acordo político que fizemos com o PSD e, sobretudo, com a cidade
de Lisboa, através da Câmara e da Assembleia Municipais.
Aplausos do PS.
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A Sr.ª Presidente: — Para apresentar o projeto de lei n.º 164/XII (1.ª), tem a palavra o Sr. Deputado João
Gonçalves Pereira.
O Sr. João Gonçalves Pereira (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Queria começar por
cumprimentar o Sr. Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, a Sr.ª Presidente da Assembleia Municipal e
respetivos vereadores e autarcas de Lisboa aqui presentes.
Queria iniciar esta intervenção com um elogio e duas críticas ao Dr. António Costa.
O Dr. António Costa teve o mérito de ter colocado na agenda política a reforma administrativa de Lisboa.
Mas teve dois deméritos: o primeiro foi o de não ter permitido um debate amplo em que se pudessem discutir
todas as propostas e o segundo foi o de ter excluído o CDS do entendimento alargado que poderia ter existido.
Por outro lado, se estamos a discutir há mais de dois anos uma reforma administrativa para Lisboa é
porque o modelo vigente das 53 juntas de freguesia está obsoleto e falido. E, se está obsoleto e falido, é
porque as freguesias não têm dimensão nem têm escala.
As juntas de freguesias têm poucos recursos humanos e financeiros, bem como reduzidas competências,
traduzindo-se numa incapacidade de resposta aos cidadãos.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. João Gonçalves Pereira (CDS-PP): — Chegados aqui, qual é o panorama? Temos quatro cenários:
o Bloco de Esquerda quer aumentar o número de freguesias; o Partido Comunista quer manter tudo como
está; o PSD e o PS querem reduzir para metade o número de freguesias; e nós, CDS, queremos uma Lisboa
que vá ao encontro da realidade das capitais europeias. Este é o compromisso que o CDS tem com Lisboa,
este é o compromisso que o CDS tem com os lisboetas, este é o compromisso que assumimos com o nosso
eleitorado.
Comecemos pelo projeto de lei do CDS.
Propomos 11 freguesias. Esta é a proposta que dá mais escala e dimensão às juntas de freguesia, é
aquela que reduz substancialmente o número de autarcas eleitos e, com isso, ao reduzir o número de autarcas
eleitos, vai permitir que os partidos políticos possam escolher os melhores autarcas e que haja uma melhor
gestão municipal.
É o único projeto de lei que prevê uma dupla descentralização: a descentralização de competências não só
do município para as juntas de freguesia como, também, da administração central para os municípios.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — E o Governo deixa?!
O Sr. João Gonçalves Pereira (CDS-PP): — É também aquela que vai dotar as juntas de freguesia de
mais competências e de mais poderes, dignificando desta forma o seu papel. Mais competências significam
melhor serviço aos cidadãos. E, nesta matéria de competências, o projeto de lei CDS vai mais longe do que o
projeto de lei do PS e PSD.
Dou-vos apenas dois ou três exemplos: a gestão cemiterial, a gestão dos postos de limpeza e o urbanismo
de proximidade, todas elas matérias que podem ser da competência das juntas de freguesia.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. João Gonçalves Pereira (CDS-PP): — Ainda sobre o nosso projeto de lei, o CDS foi o primeiro
partido a propor as freguesias de Telheiras e do Parque das Nações.
Vozes do CDS-PP: — É verdade!
O Sr. João Gonçalves Pereira (CDS-PP): — Durante meses, andámos sozinhos nesta luta. Depois disso,
foi com agrado que vimos o PS e o PSD anunciarem uma alteração ao seu projeto de lei e o Bloco de
Esquerda aparecer com um projeto de lei que também vai ao encontro da proposta do CDS, designadamente
em relação a Telheiras.
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Quanto ao Parque das Nações, permitam que diga o seguinte: vamos ter uma freguesia do Parque das
Nações que abrange toda a zona de intervenção da Expo 98, e é graças ao CDS que vamos acabar com um
Parque das Nações que está dividido em dois concelhos e em três freguesias.
O facto de o PCP e de o Bloco de Esquerda proporem manter ou aumentar o número de freguesias é sinal
que ainda não perceberam que as necessidades dos cidadãos de ontem já não são as mesmas de hoje e não
serão as mesmas de amanhã. Manter ou aumentar o número de freguesias é alimentar um modelo que está
obsoleto, é alimentar um modelo que está falido.
Se seguirmos o modelo proposto pelo PCP e pelo Bloco de Esquerda, o Sr. Presidente da Câmara
Municipal de Lisboa vai poder propor como um dos recordes no Guinness o facto de Lisboa ser a capital da
Europa com maior número de freguesias e com as freguesias mais ineficientes.
Pausa.
Não se riam, Sr. Deputados do PSD e do PS.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Ninguém se riu!
O Sr. João Gonçalves Pereira (CDS-PP): — Não se riam, porque se ficarmos com 24 freguesias
poderemos candidatar-nos na mesma aos recordesdo Guinness!
Protestos do Deputado do PCP Honório Novo.
Quanto ao projeto de lei do PS e PSD, que propõe uma redução para 24 freguesias, nós entendemos que é
melhor ter 24 do que ter 53 freguesias. Mas esta é uma reforma que fica a meio caminho, e estas reformas só
se fazem de 50 em 50 anos.
A terminar, queria deixar duas questões.
A primeira é para o PSD: por que é que reduzir as freguesias de 53 para 24 é muito bom, faz reduzir a
burocracia, dá escala e dimensão às novas freguesias, dá mais capacidade de resposta ao cidadão, etc., e por
que é que passar de 53 para 11 freguesias é mau?
A segunda questão é para o PCP, o BE, o PS e o PSD: por que é que Lisboa tem de ter mais freguesias do
que Madrid, Paris ou Roma?
Protestos do PCP e do BE.
A terminar, Sr.ª Presidente, direi que o CDS tem esperança de que, em sede de especialidade, possa
existir um debate alargado sobre a reforma administrativa de Lisboa, o tal debate que não existiu em Lisboa,
mas que pode ter lugar aqui, no Parlamento.
Temos a esperança de que esta reforma administrativa de Lisboa transforme Lisboa numa cidade
competitiva, atrativa e moderna!
Aplausos do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Para apresentar os projetos de lei n.os
183 e 184/XII (1.ª), tem a palavra o Sr.
Deputado Luís Fazenda.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados e Sr.as
Deputadas: Quero também saudar o
Sr. Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, a Sr.ª Presidente da Assembleia Municipal e todos os autarcas
municipais e de freguesia da cidade de Lisboa.
São-nos atribuídas intenções que carecem de prova. O Bloco de Esquerda não defende 55 freguesias para
a cidade de Lisboa.
O Sr. Altino Bessa (CDS-PP): — Pois não! Defende 12 no Programa Eleitoral!
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O Sr. Luís Fazenda (BE): — Se o Sr. Deputado me permitir…
Entendemos que deve haver um outro método, um outro processo. Há muitos anos que vimos defendendo,
inclusivamente, minicâmaras, uma divisão administrativa diferente na cidade de Lisboa. Isso tem a ver com
uma discussão de competências, tenha, ou não, a Câmara de Municipal de Lisboa a habilitação legal para o
efeito, e tem a ver com uma outra vontade política e com a associação da vontade das freguesias, que não
foram tidas nem achadas neste processo.
Portanto, temos aqui uma discordância de princípio e de método, não exatamente as intenções que nos
atribui aqui o CDS de forma completamente oblíqua e que nada têm a ver com aquilo que propomos.
Distanciamo-nos da proposta porque, à partida, ela não teve a participação de quem deveria ter tido e
entendemos que, mais cedo ou mais tarde, teremos de encontrar um modo que realmente seja conveniente e
participado.
Lateralmente, apresentamos duas propostas, uma cria a freguesia do Parque das Nações — a qual, aliás,
abrange parte de território que está no concelho de Loures e, por isso, entendemos que, a partir do momento
em que possa ser aprovada, tem de ser discutida em concertação com o município vizinho — e, outra, cria a
freguesia de Telheiras. Porquê? Porque são movimentos de cidadania, que têm massa crítica, que têm
proposta estruturada e que nos parecem dever ser atendidos. Neste momento, há uma espécie de uma paixão
de extinção de freguesias, como se a vida não fosse evolutiva, mutável e não houvesse aqui ou além
necessidade de criar novas freguesias. Como é evidente, há.
Que há um problema em Lisboa, que se tem de harmonizar escalas, que se tem de harmonizar incidências
administrativas entre freguesias muito pequenas e freguesias muito grandes, parece-me uma coisa
absolutamente óbvia, o modo como se o faz é que não, o modo administrativo, de cima para baixo, sem
consulta e sem participação daqueles que são os verdadeiramente interessados parece-nos um método
inteiramente errado.
O Sr. João Gonçalves Pereira (CDS-PP): — Onde está a proposta do Bloco?!
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Portanto, a nossa posição acerca desse processo é claríssima e igual, seja na
Assembleia da República seja na Assembleia Municipal de Lisboa.
Devo aqui sublinhar a felicidade com que vi a Assembleia Municipal de Lisboa aprovar uma moção,
apresentada, aliás, pelo Bloco de Esquerda, defendendo o referendo das freguesias da cidade e, em geral,
deste processo, que dizem que é o mesmo. Não sei se é, se não, e acho que o Partido Socialista deve alguma
explicação acerca disso.
O Sr. João Gonçalves Pereira (CDS-PP): — O senhor foi candidato por Lisboa com uma proposta de 12
freguesias!
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Eu tendo a achar que há aqui algumas nuances de diferenciação em relação
ao processo que o Governo lançou de reorganização administrativa e o da cidade de Lisboa, mas se o Partido
Socialista não se acusa, quem serei eu?
Na verdade, presumo que nestas circunstâncias seria bom também ouvir a palavra dos cidadãos. Se, em
geral, a Assembleia Municipal de Lisboa, aliás, como muitas outras do País, e até uma assembleia legislativa e
uma assembleia metropolitana têm vindo a apoiar esta ideia de que as populações devem ser consultadas,
talvez não fosse uma má ferramenta, e seguramente enobreceria a capital do País e esta cidade de tão
desvairadas gentes, que foi evoluindo ao longo dos anos e que, seguramente, também vai evoluir através
destes processos, os quais podem, porém, vir a ser corrigidos, calibrados e, sobretudo, certificados
democraticamente.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Tiago.
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O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: O PCP denunciou, desde o primeiro
momento, a forma como o PSD e o PS negociaram nos seus gabinetes um autêntico Tratado de Tordesilhas a
que vieram a chamar reorganização administrativa da cidade de Lisboa.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Também desde o primeiro momento, o PCP denunciou o conteúdo dessa
putativa reorganização, deixando claro que se trata de um ajuste da organização territorial aos interesses
destas forças políticas e à conceção que tanto uma como outra têm de poder local. Para estes partidos, em
momento algum esteve em causa a avaliação das insuficiências ou debilidades da atual resposta do poder
local às necessidades das populações de Lisboa. Aliás, fizeram mesmo esta negociata nas costas desta
população.
Iludindo a questão central, que é a política autárquica levada a cabo tanto por PSD como por PS, tentam
responsabilizar o modelo administrativo. Para iludir que é a política de distanciamento entre eleitos e eleitores,
de submissão ao poder central, de alinhamento com as políticas de privatização e concessão de serviços, de
depauperação das capacidades executivas do poder local e de cedência constante aos grandes interesses
económicos, nomeadamente aos que se relacionam com a especulação imobiliária, a principal causa do
descontentamento e da deterioração da qualidade de vida na cidade, o PS e o PSD desviam as atenções para
o mapa administrativo.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exatamente!
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — O problema não está no número de freguesias, que, eventualmente, poderia
ser até superior ao existente, tendo em conta o número de habitantes de algumas das atuais freguesias —
devíamos trabalhar para ter uma resposta mais próxima dos cidadãos e não mais distante —, mas, sim, no
serviço que prestam as autarquias (essa devia ser a preocupação), ou seja, a câmara municipal e as
freguesias. Não é aglutinando estruturas, afastando o poder dos moradores e retirando a presença territorial
dos órgãos autárquicos que será possível resolver os problemas da cidade.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — A cidade não pode continuar a ser entendida como um espaço de
especulação imobiliária e um tabuleiro de disputa partidária em que se divide o terreno entre o PS e o PSD.
O PS e o PSD lançam, assim, um processo construído de cima para baixo (se é que alguma vez foi lá
abaixo…), dos bastidores para as populações (se é que alguma vez chegou às populações…), sem qualquer
apoio destas, que não compreendem como se pode dizer a um morador de Santo Estevão que vá tratar dos
seus assuntos ao Socorro. É uma proposta que ofende a identidade cultural dos bairros, com destaque para a
zona central da cidade, e que não apresenta nenhuma solução para os principais problemas que a cidade
atravessa.
Vozes do PCP: — Exatamente!
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Além disso, é uma proposta que não cumpre sequer o enquadramento legal
em vigor, na medida em que concebe as autarquias à margem da legislação, com atribuições e competências
que atualmente não lhes são atribuídas.
Com este processo, o PS e o PSD quiseram, simultaneamente, diminuir a representatividade democrática,
o número de eleitos, o número de assembleias, a proximidade do poder ao eleitor, a eficácia da resposta do
poder local, mas também iniciar a marcha de destruição do poder local democrático que o atual Governo quer
impor.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exatamente!
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O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Bem pode o PS agora fingir não apoiar, como fez ainda há pouco, a
imposição do Governo para a reforma administrativa do território, mas terá de assumir a responsabilidade de
ter sido ele próprio a iniciar e a conduzir esse processo em Lisboa. São ilustrativas as palavras que acabámos
de ouvir do Partido Socialista, que acaba de nos dizer que a reorganização que preconiza para a cidade de
Lisboa só terá enquadramento se aquela que o PSD quer impor ao País for avante.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Os habitantes de Lisboa contam com o PCP na Assembleia da República,
nas freguesias, na Assembleia Municipal e na Câmara Municipal para dar combate a mais este projeto de
desfiguração do poder local democrático.
O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — Eles concordam! Eles querem!
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Queremos uma adaptação administrativa que dê resposta aos problemas
das pessoas, e não aos caprichos do PS e do PSD.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Quero aproveitar para, em
nome da direção de Os Verdes, saudar o Sr. Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, a Sr.ª Presidente da
Assembleia Municipal de Lisboa e os autarcas de Lisboa presentes nas galerias, como o Presidente da Junta
de Freguesia de Santo Estevão, o Presidente da Junta de Freguesia de Carnide, bem como os restantes.
Estamos a discutir a divisão administrativa de Lisboa e deparamo-nos, para além das iniciativas do Bloco
de Esquerda, com duas iniciativas legislativas, uma do bloco central, do PS e do PSD, e outra do CDS, ambas
a proporem um novo mapa para Lisboa. Ambas têm também em comum o propósito de reduzir o número de
freguesias da cidade de Lisboa. No caso do projeto de lei do CDS-PP, passaríamos de 53 para 11 freguesias
e, no caso do projeto de lei do bloco central, passaríamos de 53 para 24 freguesias.
Sobre a proposta do PS/PSD, Os Verdes registam, de facto, a preocupação dos autores com a
necessidade de mais competências próprias para as juntas de freguesia e de mais meios para que prestem
mais serviços de proximidade, mas não deixamos de estranhar a coincidência de os autores da iniciativa
serem exatamente os mesmos que — um ou outro, ou ambos — têm estado no governo há 35 anos, mas só
agora se lembram dessa necessidade. Queríamos registar aqui este facto.
Depois, falam de mais serviços de proximidade, mas propõem reduzir de forma drástica o número de
freguesias. Ou somos nós que estamos a ver mal o «filme» ou, então, «não bate a bota com a perdigota»!
Impõe-se uma pergunta: desde quando é que a redução do número de freguesias é condição indispensável
para reforçar as competências próprias ou a atribuição de mais meios para as freguesias? Então, não é
possível fazer isso sem reduzir as freguesias? Claro que é! Claro que foi possível ao longo destes 35 anos!
E por que é que um novo mapa da cidade de Lisboa tem de implicar a redução de freguesias? Porque a
redução de freguesias foi o objetivo da reforma…
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Exatamente!
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — … e não a consequência da discussão. A redução de freguesias
foi o motivo da reforma! Uma reforma séria deveria ter como objetivo o interesse dos lisboetas, e não a
redução de freguesias.
Faltou neste processo uma verdadeira discussão pública. O Sr. Deputado António Prôa falava da discussão
pública. A verdade — e agora vai também dizer que sim, porque é a verdade — é que, na Assembleia
Municipal, o PSD e o PS inviabilizaram uma proposta no sentido de prolongar a pobre discussão que se diz
pública. Foi feito um inquérito, ao qual responderam 7000 pessoas num universo de 500 000 lisboetas, e os
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poucos que se pronunciaram pouco mais podiam fazer do que dizer que nome preferiam para a sua freguesia.
Isto é uma discussão pública séria!…
Para terminar, quero dizer que ao reduzir as freguesias para metade vamos ter freguesias com uma
dimensão tal que dificultará o contacto com as populações. Se pretendemos uma democracia participada e
uma aproximação entre eleitores e eleitos este não é, seguramente, o caminho.
A reorganização da cidade pode até ser considerada, mas não assim e nem com os objetivos que presidem
a esta proposta. Não é assim porque é necessário ouvir as pessoas e os autarcas, respeitar as identidades, as
proximidades, a cultura e a história das freguesias.
Uma reorganização administrativa séria tem de ter como preocupação central a resposta às necessidades
dos lisboetas e não a redução de freguesias. As propostas aqui em causa — e não estou a incluir aqui as do
Bloco de Esquerda, relativamente às quais votaremos a favor de uma e contra a outra, porque envolve outro
município —, do bloco central e do CDS-PP, na nossa perspetiva, vêm apenas reduzir o número de freguesias
mas também reduzir a democracia, para além de complicarem a vida aos lisboetas.
A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado António Prôa para uma intervenção, dispondo de 5
segundos.
O Sr. António Prôa (PSD): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Muito brevemente, na conclusão deste
debate, quero apenas sublinhar a coerência da proposta que o PSD, em conjunto com o PS, apresenta aqui
hoje com a da reforma nacional,…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Isso é verdade!
O Sr. António Prôa (PSD): — … na medida em que ambas as propostas visam o mesmo objetivo, ou seja,
tornar as freguesias mais capazes para servirem as suas comunidades. Ambas pretendem aumentar as
competências próprias das freguesias, ambas foram alvo de um processo de discussão pública com a
sociedade civil e com os autarcas, ambas colocam nas mãos dos respetivos órgãos autárquicos a decisão em
concreto sobre a reorganização territorial e, mais importante, ambas pretendem apoiar-se num alargado
suporte partidário e parlamentar. Há, infelizmente, uma única diferença: se em Lisboa o PSD tivesse a mesma
atitude que o PS parece ter na reforma nacional, o PSD teria dito: «esta reforma é promovida pelo Dr. António
Costa, então, o PSD não vai colaborar».
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. António Prôa (PSD): — Mas não!
A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.
O Sr. António Prôa (PSD): — Vou terminar, Sr.ª Presidente.
O PSD entende as reformas pela sua importância para a vida dos portugueses, e é nessa medida que
nelas se empenha. Assim o Partido Socialista tivesse a mesma responsabilidade no plano nacional.
Aplausos do PSD.
A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, dou por terminado este debate, renovando os meus cumprimentos a
todos os autarcas presentes.
A próxima sessão plenária realizar-se-á amanhã, às 10 horas, tendo como primeiro ponto da ordem do dia
a aprovação de Diários, após o que será apreciada, na generalidade, a proposta de lei n.º 42/XII (1.ª) —
Aprova a lei-quadro das fundações e altera o Código Civil, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 47 344, de 25 de
novembro de 1966.
Seguir-se-á a apreciação conjunta do projeto de resolução n.º 208/XII (1.ª) — Recomenda ao Governo que
pondere, tendo em conta a segurança dos cidadãos, a possibilidade da permissão do estacionamento de
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veículos GPL em parques cobertos, assim como a possibilidade de eliminação da obrigatoriedade do dístico
identificador nesses mesmos veículos (CDS-PP) e também, na generalidade, do projeto de lei n.º 169/XII (1.ª)
— Procede à primeira alteração ao Decreto-Lei n.º 136/2006, de 26 de julho, que estabelece os princípios de
utilização nos veículos automóveis ligeiros e pesados de gases de petróleo liquefeito, designados por GPL
(PS).
O ponto 4 da agenda consiste na discussão, na generalidade, do projeto de lei n.º 182/XII (1.ª) —
Informação sobre cultivo de transgénicos (Alteração ao Decreto-Lei n.º 160/2005, de 21 de setembro) (Os
Verdes), em conjunto com o projeto de resolução n.º 236/XII (1.ª) — Recomenda ao Governo que proíba a
importação e comercialização de milho transgénico MON810 (BE).
De seguida, será apreciado o projeto de resolução n.º 202/XII (1.ª) — Recomenda ao Governo um novo
modelo de contratualização com as empresas de transportes públicos (BE).
Haverá ainda lugar a votações regimentais.
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.
Eram 17 horas e 51 minutos.
Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.