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17 DE MARÇO DE 2012

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O Bloco de Esquerda, de facto, aponta alguns caminhos corretos, na estrada que traça, mas, muitas vezes,

o percurso, a velocidade e a capacidade de os realizar não são os mais corretos e os mais equilibrados.

Neste sentido, os dois ou três aspetos fundamentais deste debate, que giram, por um lado, em torno da

moratória e, por outro, da alteração ao regime da dação em cumprimento, merecem ser vistos de forma mais

cautelosa. Há, penso eu, disponibilidade para os discutirmos e continuarmos a discutir, em sede de

especialidade, mas é importante que, neste debate, apontemos os problemas que encontramos.

Em primeiro lugar, os pressupostos para acesso à moratória são aqueles que mais preocupam,

concretamente os casos de desemprego ou de redução muito significativa do rendimento. No entanto, temos

de construir um mecanismo que, de alguma forma, não leve a que a abertura deste caminho penalize

excessivamente o setor financeiro. Uma possibilidade que se pode ponderar — e o Partido Socialista está

também a estudar várias possibilidades e contribuirá para este debate, com as suas propostas, nos próximos

tempos — é a de criar um fundo de garantia, financiado, eventualmente, de forma solidária, pelos vários

intervenientes, através do recurso aos próprios contratos, em que se procure identificar um valor que permita

acompanhar a fase em que a moratória possa vir a ser implementada. É que impô-la, pura e simplesmente, de

forma unilateral pode também desequilibrar uma situação a que, mal ou bem, as instituições financeiras não

teriam capacidade para responder.

Quanto à dação em cumprimento, trata-se de uma matéria igualmente preocupante, na medida em que o

projeto do Bloco de Esquerda pressupõe uma unilateralidade que desequilibra a proteção da confiança das

duas partes que acordaram no contrato. Reconhecemos que, de facto, há experiências de direito comparado

que vão num sentido diferente, mas, mesmo essas — e aqui permito-me discordar um pouco da exposição —,

não têm o grau de generalização que lhe pretende ser dado.

No caso espanhol, o que temos hoje são alguns exemplos de alguma jurisprudência de tribunais de 2.ª

instância que aponta num determinado caminho, mas isso ainda não foi generalizado, ainda não tem tradução

de forma generalizada. Aliás, o próprio Governo espanhol está a tentar encontrar uma solução equilibrada.

Portanto, o caminho passa por aí, mas a resposta exata não é necessariamente essa.

Mesmo o caso norte-americano — é preciso precisá-lo — assenta num sistema dual de empréstimos, que

distingue os recourse loans dos non-recourse loans, os quais assentam, eles próprios, à partida, em regimes

diferentes, um dos quais admite, de facto, a entrega do imóvel como fator de exoneração da dívida, como fator

liberatório, mas os outros não o fazem e, precisamente por isso, existe uma tutela da confiança construída

com base nesse ponto de partida.

Nessa perspetiva, uma alteração agora, a qual, como resulta da proposta do Bloco de Esquerda, teria

efeito imediato nos contratos vigentes, poderia, obviamente, desequilibrar de forma excessiva o modo de

resolver o problema. Portanto, importa fazer uma leitura mais cuidada do direito comparado e da aplicação no

tempo das medidas propostas, para saber até que ponto é que podemos entrar em algumas áreas.

Para além destes aspetos, podemos apontar alguns caminhos adicionais para engrossar as medidas que

auxiliariam as famílias a sair da situação de dificuldade em que se encontram. Desde logo, a revisão do regime

da venda forçada, em caso de execução, procurando assegurar que o valor-base pelo qual os imóveis são

licitados não se fique apenas pelos 70% e possa ser aumentado; a proteção dos fiadores, que é uma realidade

que deve merecer muita atenção, porque, em muitos casos, estamos a transformar os fiadores em

codevedores e, muitas vezes, através da renúncia ao benefício da execução prévia, que é algo que também

deve ser colocado em cima da mesa, no quadro de uma reequilibrada análise do problema; a ponderação da

existência de um fundo de garantia, como disse há pouco, à semelhança de outros mecanismos existentes,

como o fundo de garantia salarial ou o fundo de garantia automóvel, o qual possa, em termos similares, dar

uma resposta nesta área; a adoção de critérios que, em alguns casos, ainda admitam que, apesar de ter

havido incumprimento, possa haver uma retoma dos contratos, se as condições do agregado familiar

melhorarem, isto é, se, no decurso do processo de execução, for ainda possível voltar atrás e retomar o

contrato, porque há nova estabilidade financeira naquele agregado familiar, tal deve ser possibilitado;

finalmente, pequenos paliativos, como, por exemplo, assegurar que, quando uma mesma instituição de crédito

tem várias relações com um particular, sejam, pelo menos, imputados ao crédito à habitação quaisquer

pagamentos realizados e que outras despesas, por exemplo, com cartões de crédito ou outros créditos

contratados, não funcionem como um desvio, quando o particular ainda tem alguma possibilidade de fazer

pagamentos.

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