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Sexta-feira, 13 de Abril de 2012 I Série — Número 95

XII LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2011-2012)

REUNIÃOPLENÁRIADE12DEABRILDE 2012

Presidente: Ex.ma Sr.ª Maria da Assunção Andrade Esteves

Secretários: Ex.mos

Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco Rosa Maria da Silva Bastos de Horta Albernaz

S U M Á R I O

A Sr.ª Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas

e 4 minutos. Deu-se conta da entrada na Mesa da interpelação n.º

5/XII (1.ª). Foram discutidos, em conjunto, as propostas de

resolução n.os

28/XII (1.ª) — Aprova o Tratado que cria o Mecanismo Europeu de Estabilidade entre o Reino da Bélgica, a República Federal da Alemanha, a República da Estónia, a Irlanda, a República Helénica, o Reino de Espanha, a República Francesa, a República Italiana, a República de Chipre, o Grão-Ducado do Luxemburgo, Malta, o Reino dos Países Baixos, a República da Áustria, a República Portuguesa, a República da Eslovénia, a República Eslovaca e a República da Finlândia, assinado em Bruxelas, em 2 de fevereiro de 2012, e 30/XII (1.ª) — Aprova o Tratado sobre Estabilidade, Coordenação e Governação na União Económica e Monetária entre o Reino da Bélgica, a República da Bulgária, o Reino da Dinamarca, a República Federal da Alemanha, a República da Estónia, a

Irlanda, a República Helénica, o Reino de Espanha, a República Francesa, a República Italiana, a República de Chipre, a República da Letónia, a República da Lituânia, o Grão-Ducado do Luxemburgo, a Hungria, Malta, o Reino dos Países Baixos, a República da Áustria, a República da Polónia, a República Portuguesa, a Roménia, a República da Eslovénia, a República Eslovaca, a República da Finlândia e o Reino da Suécia, assinado em Bruxelas a 2 de março de 2012, e os projetos de resolução n.

os 268/XII (1.ª)

— Propõe a realização de um referendo nacional ao Tratado sobre Estabilidade, Coordenação e Governação na União Económica e Monetária (BE), 279/XII (1.ª) — Referendo ao Tratado sobre Estabilidade, Coordenação e Governação na União Económica e Monetária (PCP), 281/XII (1.ª) — Propõe que o Tratado sobre a Estabilidade, Coordenação e Governação na União Económica e Monetária seja sujeito a referendo (Os Verdes) e 283/XII (1.ª) — Recomenda ao Governo que advogue e proponha junto dos signatários do Tratado e no quadro da União Europeia a adoção de

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medidas e a negociação de um protocolo adicional ou de um tratado complementar ao Tratado sobre Estabilidade, Coordenação e Governação na União Económica e Monetária, com vista a promover o crescimento económico e o emprego (PS). Usaram da palavra, a diverso título, além do Sr. Primeiro-Ministro (Pedro Passos Coelho) e do Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros (Paulo Portas), os Srs. Deputados António José Seguro (PS), Luís Montenegro (PSD), Ana Drago (BE), Bernardino Soares (PCP), Nuno Magalhães (CDS-PP), Honório Novo (PCP), José Luís Ferreira (Os Verdes), Vitalino Canas (PS), António Rodrigues e Paulo Mota Pinto (PSD), Telmo Correia (CDS-PP), Francisco de Assis (PS) e Sérgio Azevedo (PSD).

Procedeu-se à discussão conjunta, na generalidade, da proposta de lei n.º 50/XII (1.ª) — Altera a Lei n.º 23/2007, de 4 de julho, que aprovou o regime jurídico de entrada,

permanência, saída e afastamento de estrangeiros do território nacional, e dos projetos de lei n.

os 206/XII (1.ª) —

Aprova o regime de regularização de cidadãos estrangeiros indocumentados (PCP), 25/XII (1.ª) — Consagra o efeito suspensivo dos recursos previstos na Lei de Imigração (BE), e 215/XII (1.ª) — Regularização de trabalhadores imigrantes e menores nascidos em Portugal ou a frequentar o sistema de ensino (BE). Pronunciaram-se, a diverso título, além do Sr. Ministro da Administração Interna (Miguel Macedo), os Srs. Deputados Cecília Honório (BE), Ricardo Rodrigues (PS), Telmo Correia (CDS-PP), António Filipe (PCP), Carlos Peixoto (PSD), Ana Catarina Mendonça (PS) e Nuno Magalhães (CDS-PP).

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro) encerrou a sessão eram 18 horas e 24 minutos.

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A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 4 minutos.

Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Ministros, Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados, antes de dar início à

ordem do dia, o Sr. Secretário vai fazer o favor de ler o expediente.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, deu entrada na Mesa, e foi

admitida, a interpelação n.º 5/XII (1.ª) — Sobre política orçamental e de crescimento (BE). Esta interpelação

está já agendada.

É tudo, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, passamos ao ponto 1 da ordem do dia, que consiste na discussão

conjunta das propostas de resolução n.os

28/XII (1.ª) — Aprova o Tratado que cria o Mecanismo Europeu de

Estabilidade entre o Reino da Bélgica, a República Federal da Alemanha, a República da Estónia, a Irlanda, a

República Helénica, o Reino de Espanha, a República Francesa, a República Italiana, a República de Chipre,

o Grão-Ducado do Luxemburgo, Malta, o Reino dos Países Baixos, a República da Áustria, a República

Portuguesa, a República da Eslovénia, a República Eslovaca e a República da Finlândia, assinado em

Bruxelas, em 2 de fevereiro de 2012, e 30/XII (1.ª) — Aprova o Tratado sobre Estabilidade, Coordenação e

Governação na União Económica e Monetária entre o Reino da Bélgica, a República da Bulgária, o Reino da

Dinamarca, a República Federal da Alemanha, a República da Estónia, a Irlanda, a República Helénica, o

Reino de Espanha, a República Francesa, a República Italiana, a República de Chipre, a República da

Letónia, a República da Lituânia, o Grão-Ducado do Luxemburgo, a Hungria, Malta, o Reino dos Países

Baixos, a República da Áustria, a República da Polónia, a República Portuguesa, a Roménia, a República da

Eslovénia, a República Eslovaca, a República da Finlândia e o Reino da Suécia, assinado em Bruxelas a 2 de

março de 2012, e dos projetos de resolução n.os

268/XII (1.ª) — Propõe a realização de um referendo nacional

ao Tratado sobre Estabilidade, Coordenação e Governação na União Económica e Monetária (BE), 279/XII

(1.ª) — Referendo ao Tratado sobre Estabilidade, Coordenação e Governação na União Económica e

Monetária (PCP), 281/XII (1.ª) — Propõe que o Tratado sobre a Estabilidade, Coordenação e Governação na

União Económica e Monetária seja sujeito a referendo (Os Verdes) e 283/XII (1.ª) — Recomenda ao Governo

que advogue e proponha junto dos signatários do Tratado e no quadro da União Europeia a adoção de

medidas e a negociação de um protocolo adicional ou de um tratado complementar ao Tratado sobre

Estabilidade, Coordenação e Governação na União Económica e Monetária, com vista a promover o

crescimento económico e o emprego (PS).

Para apresentar as propostas de resolução n.os

28 e 30/XII (1.ª), tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro (Pedro Passos Coelho): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: A Assembleia

da República é, hoje, chamada a pronunciar-se sobre o Tratado que cria o Mecanismo Europeu de

Estabilidade e o Tratado sobre Estabilidade, Coordenação e Governação na União Económica e Monetária.

Juntamente com os outros signatários destes Tratados, iniciamos agora o processo de ratificação que deve

ser visto como um momento de confirmação do consenso europeu. De um consenso que se estabeleceu entre

um conjunto muito vasto de democracias europeias, governadas por maiorias políticas de orientações muito

diversas e que resultou de negociações intensas, participadas e leais entre todos os Estados-membros.

Ambos os Tratados têm como propósito completar o que ficou incompleto desde que, com o Tratado de

Maastricht, se escolheu o caminho para uma Europa mais unida, tanto ao nível económico, como ao nível

político. Não se trata, portanto, de escolher um caminho diferente das opções que, na Europa e em Portugal,

temos feito desde essa data. Trata-se, sim, de tornar as escolhas que vimos a fazer, desde há já muito tempo,

mais coerentes e mais sólidas.

Além disso, ambos os Tratados enquadram de modo mais solene um conjunto de iniciativas das

instituições europeias, como o Pacto Euro mais, o Semestre Europeu ou o denominado «Six Pack», que

reflete afirmativamente o princípio da cooperação, da coordenação e da interdependência entre os Estados-

membros.

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Os tempos mais recentes mostraram que os equilíbrios da economia europeia podem ser postos em causa

quando uma das suas partes, por mais pequena que seja, vacila. Mostraram também o quanto temos a perder

por não coordenarmos devidamente as decisões económicas e financeiras que continuam a caber a cada um

dos Estados-membros. Mostraram que não podemos transigir na disciplina, no rigor, na exigência, no respeito

pelas leis e pelas regras que devem ser iguais para todos. Mostraram que temos de redobrar a vigilância e a

prevenção de desequilíbrios económicos e financeiros que, sabemos bem e por experiência própria, tão

nocivos são para o bem-estar das pessoas, para o crescimento e para o emprego.

Mostraram que precisamos de um mecanismo de gestão de crises mais eficaz, com credibilidade e

capacidade de proteger a economia europeia de tempestades que, apesar de temporárias, podem ter efeitos

catastróficos.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Mostraram, ainda, que, no plano europeu, o caminho da solidariedade e da integração só pode ser

prosseguido e aprofundado se feito a par do caminho da responsabilidade.

O Tratado sobre Estabilidade, Coordenação e Governação introduz, por um lado, a consagração de

mecanismos mais eficazes para garantir o cumprimento dos objetivos tantas vezes afirmados por Portugal e

pelos nossos parceiros; e, por outro lado, a transposição para a ordem interna de cada Estado-membro da

obrigação de apresentar uma situação orçamental equilibrada. Seria estranho que uma obrigação com que

estamos comprometidos na ordem europeia não fosse por nós assumida também na nossa ordem interna.

Estes objetivos não são imposições externas a que tenhamos de obedecer, são objetivos que afirmamos

conscientemente porque conhecemos bem os custos da alternativa. A solução adotada neste Tratado é por

isso mais coerente com o nosso entendimento de uma comunidade política autónoma, responsável e capaz de

definir os seus próprios objetivos e de os defender nas suas escolhas. E é também mais coerente com o nosso

entendimento do escrutínio parlamentar de todo o processo orçamental, na medida em que propõe uma

relação muito mais intensa entre os parlamentos nacionais e o Parlamento Europeu neste domínio. Neste

sentido, o Tratado dá um contributo importante para reforçar a democraticidade das nossas sociedades e da

grande sociedade europeia.

Este Tratado, no fundo, representa a nossa recusa em repetir os erros do passado. E aqui não me refiro

apenas aos erros que vários países na Europa cometeram nas últimas duas décadas. Refiro-me, também, aos

erros que na nossa história democrática permitimos que fossem cometidos em Portugal. Não podemos

esquecer que em menos de 35 anos tivemos, por três vezes, de solicitar o socorro financeiro externo. Neste

aspeto, o Tratado dirige-se ainda mais à proteção de países como Portugal do que a outros parceiros

europeus com mecanismos, porventura, mais maduros e reputações mais duradouras de responsabilidade

financeira.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Serve mais os nossos interesses e os da democracia portuguesa. E serve os

nossos interesses não só porque assinala e interioriza no nosso sistema político as duras lições do passado,

mas porque, ao preparar a sustentabilidade das finanças públicas, protege o nosso futuro, isto é, a

salvaguarda do modelo social europeu e do nosso modo de vida.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Que grande proteção! Parece o anjo do Diabo!

O Sr. Primeiro-Ministro: — A regra de ouro que devemos transpor para a ordem interna, de um modo

desejavelmente tão consensual quanto possível, estabelece um limite ao défice estrutural do Estado, ou seja,

à situação orçamental que existiria se as condições económicas e financeiras fossem, por assim dizer, as

normais. É uma regra realista, capaz de distinguir o que é temporário daquilo que é estrutural, corrige os

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desequilíbrios estruturais, mas é inteiramente compatível com uma acomodação razoável às flutuações do

ciclo económico.

Como se pode ver, a chamada «regra de ouro» e as provisões relativas ao endividamento em geral, não

têm apenas consequências financeiras, desempenham um papel igualmente importante na elevação da

qualidade da nossa democracia. No contexto da democracia europeia a regra de ouro reflete a consideração

que é devida aos cidadãos de um Estado que sofrem as consequências das decisões de um outro. Mas na

democracia portuguesa a regra de ouro, que não é uma regra nem de esquerda nem de direita, contribuirá

para elevar o rigor e a transparência do nosso debate público.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos do PCP.

Esta regra não empurra nenhum governo a trair a sua identidade,…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sobretudo, aqueles que não têm dignidade!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … nem o seu programa. Não condiciona as escolhas do eleitorado que é

chamado a escolher de entre projetos políticos alternativos. Apenas exige que os candidatos ao Governo do

País sejam consequentes com as implicações financeiras das suas propostas.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Além disso, garante um princípio de equilíbrio entre gerações, porque, como

sabemos, os desequilíbrios orçamentais persistentes e a acumulação excessiva de dívida são em grande

medida feitas por uma geração que vinculam as gerações seguintes.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Ora, isso desrespeita um princípio democrático fundamental. Porque cada geração deve ter autonomia

para fazer as suas próprias escolhas — sem o fardo insuportável de dívida que não escolheu —, mas

atendendo sempre à autonomia da que virá a seguir.

Como comecei por dizer, há muito que nos comprometemos com o projeto de uma Europa mais unida.

Estou certo de que, neste momento, saberemos fortalecer os alicerces da União e preparar a prosperidade do

futuro.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António José Seguro.

O Sr. António José Seguro (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, é em nome da opção europeia

de Portugal que nós votaremos favoravelmente os tratados que hoje aqui estão em discussão.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. António José Seguro (PS): — O Partido Socialista foi, desde o início, sempre defensor, na primeira

linha e na primeira hora, da adesão de Portugal à União Europeia, da adesão de Portugal ao euro e da

manutenção de Portugal através do aprofundamento político no projeto europeu.

O Sr. Mota Andrade (PS): — Bem lembrado!

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O Sr. António José Seguro (PS): — Segundo: rigor e disciplina orçamentais. O Partido Socialista sublinha

esta regra e este objetivo. Foi por isso que, desde a primeira hora, eu disse que estava disponível a

acolhermos, na legislação nacional, a chamada «regra de ouro».

Só que, Sr. Primeiro-Ministro, isto é o que nos une. Gostava, no entanto, de lhe dizer que não convirjo com

o resto das suas posições políticas e do seu Governo,…

O Sr. Honório Novo (PCP): — Não há nada a divergir para além disso!

O Sr. António José Seguro (PS): — … porque os tratados são, na Europa atual, a pertença resposta para

a crise e nós consideramos que estes Tratados não respondem verdadeiramente à crise.

O Sr. Mota Andrade (PS): — Muito bem!

O Sr. António José Seguro (PS): — Podem responder aos mercados, mas não respondem aos problemas

essenciais dos portugueses, a começar pela necessidade de combater o desemprego.

Aplausos do PS.

É nesse sentido que entendemos que este é um Tratado desequilibrado. Nós queremos mais Europa, não

queremos menos Europa. É por isso que defendemos que o Parlamento português se pronuncie sobre a

necessidade de se adotar na União Europeia um ato adicional a este Tratado.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. António José Seguro (PS): — Um ato adicional que o equilibre e que lhe dê a dimensão económica

e social que este Tratado, manifestamente, não tem,…

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. António José Seguro (PS): — … porque o que os portugueses, os europeus, esperam, hoje, e

exigem, ao Sr. Primeiro-Ministro e aos líderes europeus é que adotem políticas e alterem os tratados de modo

a que a União Europeia tenha mecanismos, instrumentos e políticas, designadamente, para responder ao

problema do desemprego.

É por isso que a Europa necessita de um ato adicional…

A Sr.ª Presidente: — Terminou o tempo de que dispunha, Sr. Deputado.

O Sr. António José Seguro (PS): — com uma dimensão económica e com uma dimensão social para

responder eficazmente à crise. E é isto que não compreendemos, Sr. Primeiro-Ministro! Não compreendemos

como é que o Partido Socialista, tendo dado o seu contributo para o consenso europeu, ao votar, sem

quaisquer condições, estes Tratados, não obtém, da sua parte e da sua maioria, igual procedimento em

relação ao emprego e ao crescimento económico.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado António José Seguro, antes de mais, quero

cumprimentá-lo, e ao Partido Socialista, pela posição que, sobre esta matéria, anunciou ao País. É importante,

quer para os mercados, quer para os países europeus que connosco têm feito esta caminhada de reequilíbrio

do desenho europeu, quer para os portugueses, saber que, no essencial daquilo que tem representado o

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progresso registado pelos países europeus, o Partido Socialista e os partidos que apoiam este Governo têm

uma base de entendimento muito alargada.

Eu próprio, apesar de estar em Moçambique, numa visita que decorreu no princípio da semana, tive

oportunidade de acompanhar o debate interno que foi suscitado sobre esta matéria e a resposta que o

Governo deu, através do Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares, ao Sr. Deputado e ao Partido

Socialista, quanto ao entendimento que o Partido Socialista tinha sobre a base de um projeto de resolução que

poderia ser aprovado no Parlamento, juntamente com o ato de ratificação. Sobre isto, apenas posso dizer que

a posição do Governo foi a de congratulação pela convergência que encontrámos, em muitos aspetos, no

projeto de resolução do Partido Socialista e também a de assinalar, muito pragmaticamente, os aspetos onde

nos pareceu que não podia haver esse consenso — na medida em que, podendo haver consenso entre os

diversos países europeus, quanto a estas soluções, ele pode não coincidir exatamente com o consenso

intrapartidário que cada um dos países apresente — e em que optámos por não acentuar as divergências,

mas, antes, as concordâncias. E, nessa medida, o Governo mostrou-se plenamente aberto a que, no

Parlamento, fosse encontrada, por iniciativa dos partidos, essa base alargada de consenso que, realmente,

existe.

Mas, Sr. Deputado, sobre isto, creio que não posso nem devo acrescentar mais, no dia em que me parece

oportuno realçar, sobretudo, dois pontos que procurei assinalar na minha intervenção inicial.

Primeiro: o caminho que a Europa vem fazendo, ao longo dos anos, mas, em particular, ao longo destes

dois últimos anos de crise mais intensa é um caminho difícil, em que nem sempre foi rápido ou expedito

encontrar uma solução de consenso entre as 27 democracias, mas foi possível que 25 países, mesmo aqueles

que estão para além do euro, conseguissem chegar a ela quanto às matérias da disciplina e do rigor

financeiro.

A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro — Vou terminar, Sr.ª Presidente.

Mas quero dizer ao Sr. Deputado, e este é o segundo ponto que realço, que a Europa se une por muito

mais do que disciplina, exigência e rigor. A Europa é também um projeto político solidário…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Solidário?! Se calhar, é mais solitário!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … e a prova dessa solidariedade está bem na situação que, hoje, se vive em

Portugal, que é, como o Sr. Deputado sabe, uma expressão muito concreta dessa solidariedade.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Falar em solidariedade é verdadeiramente inacreditável!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Quando Portugal precisou, foi, no essencial, a União Europeia que saiu em

nosso socorro.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. António Filipe (PCP): — É uma solidariedade que nos sai do lombo!

A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem, agora, a palavra o Sr. Deputado Luís Montenegro.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, começo por dizer que, de facto, a

discussão que hoje aqui travamos relativamente ao Tratado que Cria o Mecanismo Europeu de Estabilidade e

ao Tratado sobre Estabilidade, Coordenação e Governação na União Económica e Monetária tem uma

importância decisiva para a Europa e tem também uma importância decisiva para Portugal.

Estes Tratados, como disse o Sr. Primeiro-Ministro, reforçam os mecanismos de prevenção e gestão de

crises, respondendo às dificuldades levantadas pela crise financeira que vivemos hoje, na Europa, e

respondendo também à necessidade de aprofundar a coordenação da governação económica europeia. São

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um passo importante, como disse o Sr. Primeiro-Ministro, para a solidariedade europeia e para a solidariedade

intergeracional e, em especial, para garantir a sustentabilidade das finanças públicas e o equilíbrio orçamental

dos Estados-membros.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Muito bem!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — É importante retermos que estes Tratados estão virados para o futuro,

devem ser um suporte, um alicerce de políticas económicas coordenadas que lancem a Europa para um novo

ciclo de crescimento económico e de criação de emprego.

Nessa perspetiva, e saudando a intervenção do Sr. Deputado António José Seguro, devo, de resto,

mostrar, também aqui, a minha concordância com a declaração que o líder parlamentar do Partido Socialista,

Deputado Carlos Zorrinho, fez hoje, quando disse que estes Tratados são um ponto de partida e não um ponto

de chegada. Claro que é este também o nosso entendimento e assim o temos dito ao longo dos últimos dias.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — É fundamental que as políticas e as decisões que a Europa irá tomar

depois da ratificação dos Tratados se devam focar no crescimento económico e na criação de emprego, mas é

também fundamental que à união monetária correspondam finanças públicas sólidas e resultados orçamentais

equilibrados.

Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, gostaria de lhe perguntar e dizer, para que fique claro, que, do nosso ponto

de vista, estes Tratados, sendo, como disse, um ponto de partida e não um ponto de chegada, são, ainda

assim, muito relevantes para prosseguir este objetivo do crescimento económico e da criação de emprego.

Estes Tratados vão ter de ser densificados com decisões que os Estados-membros irão adotar no futuro,

mas já constam neles próprios, em especial no Tratado sobre estabilidade e coordenação económica, no seu

Título IV, nos artigos 9.º, 10.º e 11.º, políticas muito concretas relativamente a este aspeto.

A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — E é preciso notar que, sendo embora muito positivos os contributos que

são dados por outros partidos, em especial pelo Partido Socialista, para que os Estados-membros, no futuro,

possam convergir para a adoção dessas políticas económicas, as quais têm também um grande impacto

social, estes Tratados são, também nesse aspeto, um ponto de partida e não passaram ao lado dessas

preocupações. É este o nosso entendimento e é nesta perspetiva que nos mantemos disponíveis para dialogar

com todos os partidos, e também com o Partido Socialista, sendo certo que, relativamente à forma que foi

preconizada, ainda agora, pelo Sr. Deputado António José Seguro, bem sabemos que colocar hoje como

condição a adoção de um protocolo adicional a este Tratado iria, antes de mais, prejudicar os processos de

ratificação que estão em curso, porque teria, necessariamente,…

A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — … de se abrir um processo de negociação e consensualização e poder-

se-ia estar, efetivamente, a pôr em causa o consenso que se logrou obter para estarmos hoje, aqui, a proceder

a esta ratificação.

Vozes do PSD: — Bem lembrado!

O Sr. António José Seguro (PS): — Não percebeu nada!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — As preocupações são positivas, os objetivos são pertinentes, a forma

que o Partido Socialista escolheu é desajustada, é desadequada e, nessa medida, não merece a nossa

concordância.

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Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Embora não tenha nenhuma pergunta!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, o Sr. Deputado Luís Montenegro fez-me uma pergunta…

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Ah! Fez uma!…

O Sr. Primeiro-Ministro: — … relativamente ao futuro destes Tratados. Tenho de dizer, Sr. Deputado, que

concordo com a observação que fez há pouco, quando citou, justamente, o líder parlamentar do Partido

Socialista.

O caminho que a Europa veio fazendo foi sempre por aproximações graduais, o que se compreende,

atendendo à diversidade de países que contém. Nós, no Governo, não olhamos para estes dois Tratados de

uma forma finalista, eles não são uma panaceia que resolve tudo, mas não vale a pena utilizar uma

relativização tal que se torne indiferente adotar ou não estas regras. Para crescermos, no futuro, temos de ter

regras claras, e cumpri-las, quanto à dívida e ao défice. Porquê? Porque na medida em que uma sociedade se

endivide mais do que aquilo que é sustentável isso significa pôr em risco o Estado social e a própria soberania.

Um país não perde soberania quando consagra regras novas que sejam partilhadas com outros países,

perde efetivamente a sua soberania quando deixa de ter meios suficientes para se bastar, e isto já aconteceu

várias vezes.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Portanto, o que pretendemos prevenir é, justamente, esse mau hábito, essa

má tradição que existe em Portugal e que, infelizmente, existiu em alguns outros países, de forma mais ou

menos sistemática.

Estas soluções não são, portanto, as soluções ideais e não serão as soluções finais, mas, no caminho que

estamos a fazer, representam um consenso extremamente alargado, mais alargado do que o consenso

mínimo que era indispensável para vigorarem na área do euro, na medida em que só dois países, em 27, não

tiveram condições para aderir à subscrição destes Tratados. Isto significa, portanto, que o consenso agora

alcançado é já um consenso extraordinariamente alargado e, na medida em que o possamos outorgar e

caucionar, estamos a ajudar a Europa a encontrar melhores soluções para o futuro. E quem sabe se esta não

é a melhor maneira de criar um caminho de responsabilidade, como disse, que, no futuro, nos dê uma Europa

ainda mais solidária e, politicamente, ainda mais integrada?! É isto que desejamos.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago.

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, com toda a franqueza, uma coisa são

técnicas discutíveis de marketing político, outra coisa é chegar ao Plenário da Assembleia da República e

fazer um discurso que é a pura torção da verdade.

O Sr. Primeiro-Ministro não se pode apresentar neste debate com cara séria e dizer-nos que o Tratado, que

o pacto orçamental que institui a regra cega e, portanto, estúpida, como discutíamos há alguns anos, dos 0,5%

de défice estrutural é um mecanismo de defender o modelo social europeu. Não! É o contrário! É um contrato

para o matar!

Mas também não nos pode vir dizer, depois de este Tratado ser feito à margem de todas as instituições

que têm a participação direta dos cidadãos da Europa, que esta é a forma de aprofundar a democracia no

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espaço europeu. Não! Isto é dizer-nos que, enfim, há procedimentos eleitorais, podemos fazer algumas

eleições, mas, à partida, e para sempre, as regras da política já estão definidas.

E também não vale a pena tentar martelar aquela que é a história recente e dizer que há um extraordinário

consenso no espaço europeu. Não há! Há tudo menos consenso dos cidadãos da Europa, dos seus

movimentos, dos sindicatos europeus, de muitíssimos especialistas, de forças políticas de vários partidos e de

vários países. Aliás, como sabe, hoje mesmo, hoje, que o Governo português aqui se apresenta para ser o

primeirinho a ratificar este Tratado europeu, a Alemanha acaba de adiar a sua decisão, exatamente porque, na

Alemanha, apesar de o Sr. Primeiro-Ministro nos trazer aqui um discurso que poderia ser feito pela Sr.ª

Merkel, este Tratado é contestado. Não há consenso nenhum! Lembra-se, com certeza, das palavras do Sr.

Presidente da República: não tem qualquer lógica tornarmos constitucional um valor que o Estado não controla

diretamente.

Portanto, não há consenso nenhum! Não há! Há um enorme debate!

Mas há uma outra matéria, que é fundamental: esta é a condenação à austeridade permanente de uma

grande parte dos países que integram a moeda única, em particular de Portugal. Factos são factos, Sr.

Primeiro-Ministro!

Desde que a lógica da austeridade permanente entrou em vigor, consigo, em particular consigo, Portugal

tem mais 130 000 desempregados. No final de 2011, havia mais 18 pontos percentuais de dívida pública; no

final do seu pacote de austeridade curativa, vamos ter mais 40 000 milhões de dívida para pagar. Isto não

resolve absolutamente nada, absolutamente nada, Sr. Primeiro-Ministro!

Portanto, devo colocar-lhe a pergunta que é óbvia, até porque tem à sua direita alguém que, no passado,

defendeu que os portugueses deviam ser consultados sobre o modelo de construção da Europa, que propôs

aqui um referendo, que votou ao lado de outros partidos para que houvesse um referendo. De que é que tem

medo? Se este Tratado é tão importante, tão importante, por que é que o Sr. Primeiro-Ministro não o coloca à

discussão e à decisão fundamental do povo português?

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Sr. Primeiro-Ministro, tem a palavra para responder.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Ana Drago, como é patente, temos visões muito

diferentes não só do marketing político mas também das regras democráticas.

Julguei que era perfeitamente transparente e democrático fazer um processo de ratificação de

compromissos internacionais no Parlamento português…

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … e pensei que era perfeitamente legítimo que um Governo eleito pela

população portuguesa pudesse negociar convenções e tratados internacionais. Julgo, Sr.ª Deputada, que são

mecanismos que fazem parte da democracia e, nessa medida, sinto-me muito confortável trazendo ao

Parlamento estas propostas de ratificação.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Deputada, o que mais desejo é que as regras que possamos seguir na

sociedade tenham um consenso o mais alargado possível quando se trate de regras imperativas que estão

para além das escolhas conjunturais. Ora, não há melhor forma de discuti-las do que num Parlamento.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Mas, Sr.ª Deputada, não podemos escolher a via totalitária: a de que temos

que estar todos de acordo.

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A Sr.ª Ana Drago (BE): — Façam um referendo!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Não temos, Sr.ª Deputada.

E só há uma maneira de discutir, em democracia, quem tem a legitimidade de decidir sobre as regras, que

é esperar que seja o povo a decidir.

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Exatamente!

O Sr. Primeiro-Ministro: — E o povo escolheu estes representantes e este projeto europeu,…

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Não escolheu este Tratado!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … não escolheu, em Portugal, o projeto europeu do Bloco de Esquerda nem o

projeto europeu do Partido Comunista, Sr.ª Deputada!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Finalmente, há um aspeto muito relevante que não posso deixar de sublinhar: a Sr.ª Deputada diz que as

regras que, na Europa, os 25 países acertaram condenam os países à austeridade permanente…

A Sr.ª Ana Drago (BE): — É verdade!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … e que, no final desse processo de austeridade, não restará economia.

A Sr.ª Ana Drago (BE): — É o que está a acontecer!

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Nem Europa!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Deputada, se em algum momento — e, infelizmente, vivemo-lo em

Portugal! — um caminho de austeridade é necessário, não foi por vontade expressa ou por deleite político

daqueles que governam, deve-se ao caso de o País ter atingido níveis de dívida e de défice excessivos.

Sr.ª Deputada, se a sua perspetiva, para futuro, é a de que a Europa será mais próspera e unida se tiver

mais défices e mais dívida, então, fico muito confortável com as regras que agora estes países propõem aos

seus países também.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, percebe-se por que razão vem a

este debate: não é pela gestão interna das hierarquias da coligação mas porque o Governo vem aqui defender

um violento ataque à soberania e à independência nacionais.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Ora bem!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — São graves e inaceitáveis as amputações à soberania e à

independência que os senhores aqui querem ver aprovadas. À soberania política, à soberania económica, à

soberania orçamental e, inclusive, à soberania jurisdicional, porque até querem submeter os tribunais

portugueses, incluindo o Tribunal Constitucional, ao Tribunal de Justiça Europeu.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Bem lembrado!

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O Sr. Bernardino Soares (PCP): — O que pretendem é que a nossa política económica esteja sujeita ao

visto prévio da União Europeia e da Alemanha.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Claro!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — O que pretendem é impor, na Constituição ou na lei, de forma

permanente, o pacto de agressão que têm em curso e que hoje já viola direitos constitucionais, direitos

fundamentais. Chamam a isso, numa enorme operação da falsificação política, a regra de ouro. Não é uma

regra de ouro, Sr. Primeiro-Ministro, é mesmo uma regra de chumbo, porque pretende condicionar todos os

direitos, pretende condicionar o desenvolvimento a que o País tem direito, a própria democracia, e pretende

impor inaceitáveis regras orçamentais que são do agrado do grande capital, para que este sugue cada vez

mais riqueza dos portugueses, do País.

Vozes do PCP: — Exatamente!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Se Portugal quiser aumentar o investimento público para criar

emprego, ou melhorar os salários e as pensões para dinamizar o mercado interno, ou melhorar o Serviço

Nacional de Saúde, a educação e a formação, quem é que deve decidir sobre isso? Deve ser o povo

português,…

O Sr. Primeiro-Ministro: — Excelente exemplo, Sr. Deputado!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — … exercendo os seus direitos democráticos e soberanos através dos

seus representantes, ou deve ser a União Europeia, deve ser a Sr.ª Merkel ou qualquer outra pessoa que a

substitua, deve ser o grande capital transnacional que comanda os destinos da União Europeia? Nós

respondemos que deve ser o povo português; o Governo responde que deve ser a União Europeia.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr. Primeiro-Ministro, isto significa que, ao contrário do que o senhor

diz, o povo português não escolheu estas medidas. O povo português não escolheu deixar de poder decidir

sobre o aumento do investimento no seu País, sobre a melhoria dos salários ou sobre a melhoria dos serviços

públicos. Isso não lhe foi proposto, isso não foi decidido pelo povo português!

O Sr. Honório Novo (PCP): — Muito bem!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Digo-lhe também, Sr. Primeiro-Ministro, que querer resolver isto com

um ato adicional é como tentar enxertar uma árvore numa coluna de pedra: não pega, não pega! E não pega,

porque este Tratado não precisa de um ato adicional, precisa de uma rejeição frontal, e é isso que aqui

afirmamos neste debate!

Aplausos do PCP.

Por tudo isto, é um escândalo que o Governo, a maioria e o PS queiram impedir, aprovando

apressadamente estes Tratados, um debate público mais profundo sobre o seu conteúdo e sobre as suas

graves consequências, tal como, de uma forma ou de outra, fizeram com todos os tratados anteriores.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Exatamente!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É por isso que querem, mais uma vez, impedir o povo português de

intervir diretamente neste processo através de um referendo nacional, como o PCP propõe.

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É caso para perguntar de que têm medo os partidos do pacto de agressão, de que têm medo os partidos

que aqui se preparam para dar uma machadada na soberania nacional. Têm, certamente, medo que os

portugueses tomem consciência do que está em causa e lhes estraguem o «arranjinho»!

Mas, Sr. Primeiro-Ministro, o que quer que seja aprovado hoje, aqui, o que quer que seja rejeitado hoje,

aqui, de uma coisa podem estar certos,…

A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — … e vou terminar imediatamente, Sr.ª Presidente: será o povo

português que terá sempre, sempre, o pleno direito de decidir o destino que quer dar ao seu País. Isto nem o

seu Governo, nem nenhum outro vão conseguir impedir!

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Sr. Primeiro-Ministro, tem a palavra para responder.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Bernardino Soares, verdadeiramente, não me

colocou nenhuma questão direta,…

O Sr. António Filipe (PCP): — O Deputado Luís Montenegro também não!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … fez uma intervenção sobre esta matéria, que escutei com muita atenção.

Sr. Deputado, sobre os seus comentários, direi apenas o seguinte: o que representaria para Portugal uma

tragédia seria a Europa não ter tido possibilidade de nos socorrer quando deixámos de ter meios para poder,

de uma forma clara e legítima, assumir as nossas responsabilidades. Felizmente, a regra de ouro que é

proposta com este Tratado permite que os governos utilizem mais dinheiros públicos ou menos dinheiros

públicos, permite aos governos expandir o seu orçamento ou contrair o seu orçamento. A regra de ouro, a

regra de equilíbrio orçamental, não impede os governos de fazerem as suas escolhas, Sr. Deputado!

O Sr. Honório Novo (PCP): — Isso é conversa, Sr. Primeiro-Ministro!

O Sr. Primeiro-Ministro: — De resto, nem sequer impõe uma regra cega relativamente ao défice nominal.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Isso não é muito sério, Sr. Primeiro-Ministro!

O Sr. Primeiro-Ministro: — O que significa isto, sobretudo para os portugueses que possam estar a seguir

este debate? Significa que o défice pode até ser, em termos nominais, num determinado ano, superior quando

há mais contração da economia e o que se exige é que possa existir também excedente orçamental durante

um determinado período que, no longo prazo, aponte para o equilíbrio orçamental.

Sr. Deputado, não vejo como é que o equilíbrio orçamental pode dificultar a ação de um governo, a não ser

a de um governo que queira sempre escolher expandir o défice público…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sabe bem que não é isso!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … à custa da dívida pública e das gerações futuras!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Isso foi o que os governos do seu partido fizeram!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Deputado, essa é uma regra que, infelizmente, vigorou durante muitos

anos, mas que conduziu aos piores resultados.

Finalmente, refiro a questão do referendo, suscitada também pela Sr.ª Deputada Ana Drago.

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Srs. Deputados, se, porventura, qualquer destes novos mecanismos ou tratados interviesse de forma

profunda na arquitetura política e institucional europeia, poderia haver, com certeza, total legitimidade para

defender um referendo.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Em cada tratado há uma desculpa diferente!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Ainda assim, poderia a sociedade portuguesa, em particular, decidir não o

realizar, mas seria perfeitamente natural e compreensível que se apelasse a um referendo. Contudo, não é o

caso, Srs. Deputados.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Nunca é!

O Sr. Honório Novo (PCP): — Isso é descaramento político! Sem vergonha!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Não vemos nenhuma razão para, depois de ter sido a Europa acusada de

demorar tempo demais a responder à crise, acrescentarmos ainda mais atraso, mais incerteza quanto à

resposta que deveríamos encontrar seria, com devem calcular, contraproducente e iria muito além daquilo que

desejaríamos.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos do Deputado do PCP João Oliveira.

A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Magalhães.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, consideramos que a

aprovação destes Tratados é da maior importância para o País, para a coesão interna e para a credibilidade

externa do País,…

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — … reforça a estabilidade da zona euro e a confiança na moeda única

e, como o Sr. Primeiro-Ministro já aqui referiu, e bem, trata de uma matéria por nós sempre considerada

essencial, de caráter intergeracional, e que encerra em si uma questão filosófica, que é a de quanto as

decisões de hoje poderão sacrificar e influenciar as decisões de amanhã.

Sr. Primeiro-Ministro, creio que uma boa regra de gestão de um governo, de uma empresa ou de uma boa

família é percebermos que dívidas de hoje são impostos de amanhã, que dívidas de hoje, por muito que nos

possam satisfazer, são sacrifícios ainda mais sérios e mais duros amanhã.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

Protestos do PCP.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr. Primeiro-Ministro, a solução é conseguida neste Tratado e daí a

importância de haver em torno dele, e da respetiva ratificação, um compromisso forte, firme e alargado.

Por isso, gostaríamos de salientar que, para nós, é importante que Portugal seja o primeiro País a ratificá-lo

e que, nesta Assembleia, haja um amplo consenso em torno dele, cerca de quatro quintos dos partidos aqui

representados.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

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O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — É uma enorme prova de maturidade política e, sobretudo, contribui

para a credibilidade externa do País.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Sr. Primeiro-Ministro, confesso que, nos últimos minutos, fiquei um pouco confuso, porque ouvimos aqui

afirmações que são em si próprias contradições.

Aqueles que, quando esta crise eclodiu, disseram que a Europa não foi expedita, não teve mecanismos

capazes, não foi capaz de reagir a situações de crise num dos seus Estados-membros,…

O Sr. Honório Novo (PCP): — O CDS muda de posição como quem muda de camisa!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — … que não era esta a Europa que queriam, na altura em que a

Europa cria um mecanismo, cria um instrumento, cria um fundo, o que fazem? Ratificam? Sublinham?

Congratulam-se? Não! Não querem aprovar, não querem ratificar!

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Confesso que não compreendo este tipo de posições.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Aqueles que dizem que faltam políticas de emprego, que faltam políticas de estímulo à economia, que

devemos centrar nas pessoas, na economia e no emprego as política europeias, o que fazem quando há um

Tratado que diz exatamente isso? Aprovam-no? Ratificam-no? Não! Querem chumbá-lo!

Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, a minha pergunta é muito simples: na sua perspetiva, qual seria a

alternativa ao chumbo destes Tratados, à sua não ratificação? Haveria maior estabilidade social? Haveria

maior crescimento económico? Haveria maior confiança no euro e na zona euro? Haveria mais emprego? Ou,

pelo contrário, ocorreria o oposto: maior instabilidade social, maior desemprego, maior desconfiança nas

pequenas e médias empresas, maior incapacidade para criarmos riqueza e, com isso, crescimento?!

É porque já todos percebemos, Sr. Primeiro-Ministro, que, infelizmente, bem no centro da Europa, a política

do «não pagamos» dá no que dá!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro para responder.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Nuno Magalhães, assistimos ao debate intenso

que, na sociedade europeia, foi produzido sobre a dificuldade que as instituições europeias tinham em lidar

com a crise financeira. Durante muito tempo, participámos e concordámos que havia incompletude e

imperfeição nos mecanismos existentes. A arquitetura não era defeituosa, era incompleta, o que é diferente.

Foi por essa razão que, logo no início, foi possível constituir o Fundo Europeu de Estabilidade Financeira. De

resto, foi com base nesse mecanismo, que não estava previsto nem nos tratados nem na legislação ordinária,

que alguns países puderam obter auxílio financeiro quando entraram em rutura financeira. Isto é, quando, por

via do peso excessivo das suas dívidas e dos seus défices, viram os mercados financeiros fecharem-se aos

mandatos que as agências representativas recebiam para emissão de dívida.

Ficou claro, desde então, que, se era preciso um mecanismo, que, na conjuntura, pudesse prevenir o

resgate, o auxílio desses países que estavam em rutura, a Europa precisava, no entanto, de um mecanismo

permanente. Esse mecanismo permanente está criado, foi antecipado em um ano e foi aperfeiçoado no âmbito

das negociações mais recentes que tiveram lugar em simultâneo com o «tratado fiscal», chamemos-lhe assim.

Qual foi o pensamento claro — e esclareço para que todos os cidadãos o entendam diretamente? Que as

instituições desempenharão sempre o seu papel, sejam instituições políticas, sejam instituições financeiras,

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desde que exista responsabilidade. E foi isso que aconteceu: sob o compromisso de os países imprimirem

disciplina e rigor nas suas contas públicas, foi possível criar mecanismos de responsabilização e de

solidariedade também.

Por isso mesmo, foi possível criar uma nova forma de ver o BCE atuar por sua própria iniciativa, sem que

tivéssemos de reconfigurar o estatuto ou a natureza dessa entidade independente, que constitui ainda hoje um

pilar fortíssimo da credibilidade do euro e da Europa.

Ora, nessa medida, é importante reconhecer que, se por qualquer razão não fosse possível, no fim destes

dois anos, ver ratificados estes instrumentos, então, a Europa recuaria não apenas dois anos, mas afundar-se-

ia, na ausência de esperança e de regras quanto ao futuro.

Por isso, respondi, há pouco, que nenhum governo ficará impedido de exercer as suas opções, mas não

pode exercer opções despesistas que pesarão no futuro e, às vezes, até no presente, sem dizer exatamente

com que contrapartida é que deve contar.

A Sr.ª Presidente: — Queira concluir, Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Se quiser mais despesa pública, diga que vai aumentar os impostos e retirar

os recursos da sociedade para o investimento privado. Se, porventura, quiser esse caminho, diga-o

claramente, não precisa de o fazer à custa do défice e da dívida.

O Sr. Paulo Mota Pinto (PSD): — Muito bem!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Esta é a grande virtualidade desta regra, que serve bem a todos os que

querem servir bem os seus países e as suas economias.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Segue-se um conjunto de intervenções, que identifico segundo as inscrições feitas à

Mesa até ao momento, dos Srs. Deputados Ana Drago, pelo BE, Honório Novo, pelo PCP, José Luís Ferreira,

por Os Verdes, Vitalino Canas, pelo PS, e Paulo Mota Pinto, pelo PSD.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago para intervir e também para apresentar o projeto de resolução

n.º 268/XII (1.ª), do Bloco de Esquerda.

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs. Deputados: Creio que

não há outra forma de o dizer senão a de que o Tratado que institui o pacto orçamental e a regra de ouro dos

0,5% do défice estrutural, se for avante, significa uma mudança de vulto, uma rutura com aquilo que foi a

história da construção e do projeto europeu nos últimos 30 anos e, em particular, a pertença de Portugal a

esse mesmo projeto nos últimos 26 anos.

O impacto da regra dos 0,5% significa, na prática, reescrever o contrato social que temos, a forma de

atuação do Estado e das políticas públicas no domínio da economia e das políticas sociais e, portanto, uma

lógica de solidariedade, de criação de emprego, de criação de um espaço de prosperidade e de direitos na

União Europeia que vai, pura e simplesmente, ser rasgada. É, de facto, impor um desemprego estrutural

permanente, o empobrecimento, o esmagar dos direitos sociais e económicos, o estrangulamento da

economia. Portanto, significa — as palavras são para serem usadas — o triunfo de uma lógica ortodoxa no

espaço europeu, que vem negar os fundamentos do próprio projeto europeu.

Por conseguinte, Sr.as

e Srs. Deputados, creio que este é o momento de o povo português, que, em todos

os anos de pertença à União Europeia, não teve jamais uma palavra de participação direta, discutir o futuro do

País e o futuro do projeto europeu. Este é o momento para o fazer, porque é também o futuro da estruturação

democrática do projeto europeu que está em causa.

Este é o Tratado que marcha sobre as instituições de representação democrática do espaço europeu e não

as consulta, este é o Tratado que quer esmagar direitos sociais e económicos na Europa, sem perguntar aos

cidadãos europeus. É isso que o Bloco de Esquerda quer fazer, ou seja, quer chamar os cidadãos

portugueses para discutirem o seu futuro.

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É deles a legitimidade, a eles deve ser dada a palavra.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Para intervir e também para apresentar o projeto de resolução n.º 279/XII (1.ª), do

PCP, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Governo —

e, pelos vistos, o PS também — querem que o Parlamento aprove, hoje, um tratado internacional que

compromete a soberania e coloca em cheque o desenvolvimento do País. Mais: o Governo — e também o PS

— querem que o Parlamento aprove, sem qualquer debate público e nas costas do povo, um pacto orçamental

que é manifestamente contrário aos interesses de Portugal.

Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Neste contexto, importa recordar os aspetos essenciais do que o Governo

— e, pelos vistos, também o PS — querem, hoje, impor aos portugueses com este Tratado.

O tratado orçamental constitui um golpe de natureza constitucional que pretende eternizar as políticas de

retrocesso social e de empobrecimento do País, hoje em vigor com o Memorando da troica. O Governo — e,

pelos visto, o PS também — querem, afinal, com este pacto orçamental legalizar ou, se quiserem,

constitucionalizar, o pacto de agressão da troica.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. Honório Novo (PCP): — O pacto orçamental quer impor regras (ditas de ouro) que transportam para

o direito nacional, ou para a Constituição, limites de dívida e de défice, com carácter permanente e obrigatório,

que só servem para condicionar e impedir o exercício livre e democrático da vontade dos portugueses, para

condicionar e impedir o nosso desenvolvimento no presente e no futuro, e que só servem para eternizar e

reforçar o fosso que, hoje, já existe entre os mais ricos e os mais pobres membros da União Europeia.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!

O Sr. Honório Novo (PCP): — O pacto orçamental faz tábua rasa da nossa soberania, mas não só no

plano orçamental; impõe também a subordinação dos tribunais nacionais, incluindo do Tribunal Constitucional,

à tutela dos tribunais europeus, passando estes a avaliar a forma como a legislação nacional ou a Constituição

da República contempla ou não as regras e condicionalismos orçamentais permanentes, previstos neste

Tratado orçamental.

Pior ainda: o pacto orçamental que o Governo — e, pelos vistos, o PS também — querem hoje aprovar,

nas constas do povo e do País, atribui aos tribunais europeus a capacidade de multar o nosso País, em

valores até 170 milhões de euros. Isto é, o Governo — e, pelos vistos, o PS também — querem que sejam

tribunais europeu a decidir sobre o confisco de centenas de milhões de euros de impostos dos portugueses,

roubados — é o termo — aos subsídios de desemprego ou às prestações sociais.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!

O Sr. Honório Novo (PCP): — E, depois, encerra escolas, serviços de saúde ou maternidades!

O pacto orçamental que o Governo — e o PS também — querem, hoje, aprovar, nas costas do povo e do

País, quer que sejam a Comissão Europeia e Berlim a determinar quando e como deve ser emitida dívida

pública, isto é, quando e como é que Portugal deve permitir, por exemplo, a emissão de certificados de aforro

ou, até, de certificados do tesouro.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!

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O Sr. Honório Novo (PCP): — O pacto orçamental que o Governo — e, pelos vistos, o PS também —

querem hoje aprovar, sem consultar o nosso povo, pretende que não só a política orçamental, mas também as

opções económicas nacionais sejam sujeitas a visto prévio de Bruxelas e ratificadas por Berlim.

O pacto orçamental que o Governo — e, pelos vistos, o PS também — querem hoje aprovar, sem consultar

o País, é quebrar uma outra regra, essa, sim, de ouro, a regra da unanimidade para a entrada em vigor de

tratados europeus.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. Honório Novo (PCP): — Agora, bastam apenas 12 — repito, 12 — países da zona euro para que o

pacto orçamental entre em vigor, mesmo que os restantes não o tenham ainda ratificado ou nunca o venham,

até, a ratificar.

Aqui fica, Srs. Deputados, o exemplo último do desprezo pelas opções nacionais, prevenindo resultados

negativos de consultas populares, onde elas ainda existem e onde esta construção, tão falsamente

democrática, da União Europeia ainda permite ouvir a voz dos povos.

Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Governo — e, pelos vistos, o PS também —

vão aprovar o pacto orçamental. À socapa! Às escondidas! Escondendo, do povo e do País, o significado

profundo das alterações impostas, espezinhando a nossa soberania e os interesses, presentes e futuros, do

nosso País.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!

O Sr. Honório Novo (PCP): — O PCP não aceita nem se resigna com o caminho de declínio e de

definhamento, que o Governo — e, pelos vistos, o PS também — querem impor a Portugal.

O PCP entende que o que está em jogo é muito grave e, por isso, Portugal e os portugueses devem poder

dar uma opinião, devem poder votar.

Por isso, o PCP exige um grande debate nacional sobre o conteúdo e as consequências deste tratado

orçamental e propõe a realização de um referendo sobre o Tratado.

Finalmente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as

e Srs. Deputados, o PCP considera que é um imperativo nacional

pôr fim a este desvario autoritário de opções federalistas, antidemocráticas e violadoras das soberanias

nacionais que a União Europeia continua a percorrer.

Mas não haja dúvidas: o caminho de rutura, com tal desvario, terá que ser, inevitavelmente, feito pelos

povos contra os governos e contra quem está disposto a aprovar e a ratificar este tratado orçamental.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Para intervir e apresentar o projeto de resolução n.º 281/XII (1.ª), de Os Verdes, tem

a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo,

Sr.as

e Srs. Deputados: Os portugueses têm motivos de sobra para estarem preocupados com o caminho que

a União Europeia está a seguir. É um caminho que está a tornar a Europa cada vez menos democrática, com

a Alemanha e a França a decidirem o destino de todos os povos da Europa, sendo os restantes Estados-

membros remetidos para um papel completamente passivo, limitando-se a aceitar as decisões desse diretório.

Mas para além do profundo défice democrático, ainda temos este modelo neoliberal que atualmente está a

dominar a União Europeia e que está a colocar os países em dificuldade, completamente dependentes ou

mesmo reféns dos mercados.

A esta situação não é certamente alheio o facto de o Banco Central Europeu não poder financiar os seus

contribuintes, que são os Estados-membros.

Nesta circunstância, o que o Banco Central Europeu faz é emprestar dinheiro aos grandes bancos privados

a uma taxa de juro baixa para, depois, estes bancos emprestarem esse mesmo dinheiro aos Estados que

precisam, mas a taxas de juro muito mais altas.

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Neste contexto, Os Verdes consideram que aquilo que seria prioritário e deveria ser o centro das atenções

dos responsáveis europeus, era exatamente remover a proibição relativa ao Banco Central Europeu para que

ele pudesse financiar diretamente os Estados-membros e expurgar, assim, do circuito estes bancos

intermediários, que arrecadam milhões e milhões de euros, suportados pelos Estados. Mas não, ao invés

disso, os senhores da Europa pretendem consagrar o pacto orçamental. Ao invés de procurarem soluções

para que os conceitos de coesão e de solidariedade começassem a fazer parte do vocabulário da União

Europeia, os senhores da Europa pretendem controlar totalmente a política económica dos Estados-membros.

Ao exigir-se a inscrição dos limites de défice orçamental significa que, em caso de incumprimento por parte

dos Estados, há lugar à imposição de medidas determinadas pela Comissão Europeia. Esta subordinação

determina a imposição de «programas de reformas estruturais», que podem passar pelas leis laborais, pelos

salários, pelas reformas e pensões, pelos serviços públicos, pela segurança social, e por aí fora, e — pasme-

se! — até há lugar à aplicação de sanções financeiras. Ou seja, os países que estão em dificuldade, em vez

de serem ajudados pela União Europeia, ainda vão sofrer sanções financeiras, o que certamente irá agravar

ainda mais a situação desses países. É o abandono definitivo da solidariedade e da coesão enquanto

premissas da União Europeia.

Mais: a transferência de soberania para a cada vez menos democrática União Europeia vai condicionar o

nosso Parlamento na definição das políticas sociais, económicas e orçamentais, arredando, assim, os

portugueses das decisões que mais importância revestem para as suas vidas. É uma facada na democracia

sem precedentes. As matérias orçamentais constituem a questão-chave de qualquer povo em termos de

soberania.

Este Tratado vai trazer também mais austeridade, quando é mais que sabido que a austeridade não é

solução, como, de resto, se está a ver hoje.

O agravamento das previsões da Comissão Europeia é a confirmação de que as medidas de austeridade

não funcionam, pelo contrário, têm até um efeito recessivo sobre a economia, o que pode tornar a ajuda

externa um problema recorrente.

Neste contexto, Os Verdes consideram que o que está em causa com este Tratado é sério de mais para

não ouvir os portugueses. Os portugueses foram sempre arredados de se pronunciarem diretamente sobre o

futuro da União Europeia, que, ainda por cima, de tratado em tratado, tem esvaziado soberania nacional,

concentrando poderes noutros níveis de decisão, muito, mas muito longe dos portugueses — um verdadeiro

poder sem rosto.

A verdade é que se torna cada vez mais difícil justificar a razão pela qual os portugueses não são

chamados a pronunciarem-se por via de um referendo. Aliás, esta dificuldade já levou, no passado, o PS e o

PSD a formarem algumas farsas de vontade de realização de referendo, logo contribuindo, contudo, para a

sua inviabilização.

Hoje, um referendo nesta matéria apresenta várias virtudes, que certamente enriqueceriam a nossa

democracia, entre as quais destacamos a possibilidade de um amplo debate de esclarecimento sobre o

conteúdo dos Tratados, bem como o reforço da capacidade de decisão concreta sobre a vinculação, ou não,

do Estado a determinadas regras neles impostas.

Os Verdes consideram, assim, que é tempo de materializar essa consulta, e, por isso, propõem que seja

convocado um referendo sobre o Tratado de Estabilidade, Coordenação e Governação na União Económica e

Monetária. Concorda com a aprovação do Tratado sobre Estabilidade, Coordenação e Governação na União

Económica e Monetária? É isto, e apenas isto, que Os Verdes propõem que se pergunte aos portugueses.

Não tenhamos medo do que acham os portugueses, do que sentem, da avaliação que fazem do processo

europeu. Vamos ouvir os portugueses, não vamos transformá-los numa carta fora do baralho. Vamos ouvi-los!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Muito bem!

Vozes do PCP: — Muito bem!

A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Vitalino Canas.

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O Sr. Vitalino Canas (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Ministros, Sr.as

e Srs. Secretários

de Estado, Sr.as

e Srs. Deputados: Discutimos hoje seis diplomas — duas propostas de resolução, que incidem

sobre a aprovação de dois Tratados internacionais; três projetos de resolução que propugnam a realização de

um referendo sobre um desses Tratados; e um projeto de resolução que propõe as bases para um renovado

consenso nacional sobre a União Europeia, na perspetiva de um contributo para um novo consenso europeu.

Tenho de começar por deixar uma nota negativa em relação ao facto de o Governo ter forçado o

agendamento do designado tratado orçamental para este momento, quando nenhum outro Estado signatário

entendeu dever fazê-lo por enquanto.

O Sr. José Junqueiro (PS): — Muito bem!

O Sr. Vitalino Canas (PS): — E digo bem «forçado», porque o Governo nem sequer consultou, por

exemplo, o Partido Socialista em relação a este agendamento, como tem vindo a suceder reiteradamente em

relação a aspetos importantes da vida política nacional.

Aplausos do PS.

Este agendamento prematuro é um sinal de precipitação, que impede uma cuidada ponderação e análise

de um Tratado que, se implementado na íntegra — o que, aliás, é duvidoso —, irá ter um impacto significativo

sobre países como Portugal e sobre a Europa.

Sobre a substância dos dois Tratados, o Partido Socialista tomou posição ainda durante a fase de redação.

Ao Tratado que cria o Mecanismo Europeu de Estabilidade censuramos a avareza, a ausência de vontade

de dar sinais de uma resposta robusta, que teria necessariamente de ir além dos 500 000 milhões de euros de

capacidade de financiamento. Talvez os próximos dias e a evolução do que se passará com Espanha e com

Itália venham a ilustrar o que queremos dizer com isto.

Ao tratado orçamental censuramos mais: censuramos a tentação punitiva e censuramos a vertigem

ideológica de uma maioria conjuntural que governa a Europa e que quer perpetuar para sempre a sua visão.

Mas este Tratado é também um Tratado omisso, um Tratado que ignora as políticas de crescimento e de

criação de emprego, as vertentes sociais, as únicas, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, que

permitirão resolver a prazo e duradouramente os desequilíbrios económicos que nos conduziram à situação

em que nos encontramos.

Aplausos do PS.

Não ignoramos a importância de uma estratégia decidida de rigor, de disciplina e de consolidação

orçamental, que também protagonizámos e também defendemos, mas esta estratégia só produzirá efeitos

duradouros se for acompanhada por uma estratégia de crescimento e de emprego que lance bases sólidas da

economia e permita, no futuro, resistir a ataques especulativos dos mercados.

A abordagem crítica dos dois Tratados não obscurece, porém, o nosso sentido de responsabilidade e de

realismo, que mais uma vez honraremos em nome dos interesses nacionais mais imediatos.

Sabemos que estamos manietados. Em parte, estes Tratados cristalizam alguns compromissos que vêm

do passado. Além disso, não aprovar estes Tratados seria iniciar um caminho para a autoexclusão do euro e

para a autoexclusão, a partir de 1 de março de 2013, do acesso aos instrumentos de concessão de assistência

financeira criados para enfrentar crises como aquela que se abateu sobre nós.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — E para aumentar a dívida!

O Sr. Vitalino Canas (PS): — Não temos, pois, outra alternativa senão aprovar estes dois Tratados. Nesta

inevitabilidade reside, aliás, um dos motivos — porventura, não o principal — para rejeitarmos a realização de

um referendo.

Fazer um referendo sobre duas alternativas quando, verdadeiramente, não há duas alternativas

compatíveis com o interesse nacional mas apenas uma, seria sempre um exercício que falsearia a plena e

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livre manifestação democrática da vontade dos cidadãos. Mais ponderoso é o argumento de que, a propósito

de um tratado que se pronuncia sobre um aspeto parcelar do devir europeu, não se pode referendar a própria

Europa ou a nossa participação na União Europeia e na união económica e monetária, como inevitavelmente

sucederia se promovêssemos agora um referendo, como querem o PCP, o Bloco de Esquerda e Os Verdes.

Porém, verdadeiramente, o que interessa no debate de hoje é aferir se há condições, nesta encruzilhada,

para construirmos, em Portugal, as bases para um novo consenso nacional sobre a Europa, que possa ser um

contributo válido, digno e prestigiante para um novo consenso europeu. Um contributo à altura da nossa

história na construção europeia, que supere a visão reducionista que tem presidido aos destinos da Europa

nos últimos tempos. Esta é a intenção do projeto de resolução apresentado pelo Partido Socialista.

O Sr. José Junqueiro (PS): — Muito bem!

O Sr. Vitalino Canas (PS): — O Partido Socialista identifica quatro eixos em que um consenso favorável

aos interesses nacionais e europeus se pode basear: primeiro, democratização; segundo, reforço da

coordenação económica para o crescimento, o emprego e a coesão social; terceiro, convergência fiscal;

quarto, criação de boas condições para o financiamento das dívidas soberanas.

Recusamos uma visão sectária ou ideológica das soluções. Ninguém poderá dizer de boa-fé que defender

mais democracia, mais coordenação económica no quadro de uma união monetária virada para o crescimento

e o emprego, uma maior convergência fiscal entre os Estados-membros, particularmente os da zona euro, e

uma maior solidariedade no financiamento das dívidas soberanas decorrem deste ou daquele preconceito

ideológico.

Só quem queira fugir a um debate sério pode descartar, com o fundamento de serem partidárias ou

unilaterais, propostas como a consolidação da estratégia Europa 2020, a discussão das perspetivas

financeiras assente no princípio da coesão, a emissão pelo Banco Europeu de Investimento (BEI) de

obrigações para projetos europeus, a adoção de uma progressiva convergência fiscal entre os 17 Estados-

membros da zona euro, a institucionalização de um efetivo e robusto sistema de supervisão bancária a nível

europeu ou o reforço do Banco Central Europeu como credor de último recurso.

O Governo não se atreve, é certo, a ir a esse ponto, mas não encontra melhores fundamentos. O Governo,

de resto, redigiu uma carta em que reconhece que parte assinalável do conteúdo do projeto de resolução que

apresentamos aqui merece a sua concordância. Aliás, o Sr. Primeiro-Ministro já hoje, na sua intervenção,

entendeu reforçar essa mesma indicação.

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Votam a favor!…

O Sr. Vitalino Canas (PS): — Merece concordância do Governo, mas significa isso que o Governo apoia,

aceita e admite o consenso em torno da defesa de um protocolo adicional ao tratado orçamental, que o

complete onde dramaticamente falha? Parece que não.

O Governo invoca dificuldades jurídicas e políticas que tornam, no seu entender, a resolução do PS «pouco

viável a curto ou médio prazo». Além disso, acrescenta que «a forma indicada não pode ser acolhida». Temos,

assim, um Governo que, não obstante a importância decisiva da matéria, está preocupado só com o curto e o

médio prazos — tudo o que for além não interessa! — e está agarrado a argumentos formais ou meramente

circunstanciais.

Aplausos do PS.

Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, os argumentos de circunstância e de forma não são,

certamente, negligenciáveis, mas em política nunca podem ser sobrevalorizados. A política não pode esgotar-

se na circunstância e na forma. A circunstância e a forma, quando monopolizam o discurso político, são

manifestações inequívocas de fraqueza e de incapacidade de enfrentar as questões de fundo.

Vozes do PS: — Muito bem!

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O Sr. Vitalino Canas (PS): — A acusação que deixamos aqui hoje é clara: o Governo e a maioria

preparam-se, porventura, para desistir de alimentar o consenso nacional sobre a Europa e, mais importante

ainda, para desistir de definir com autonomia o interesse nacional no contexto europeu. Temos um Governo

timorato, receoso de tomar qualquer iniciativa, remetido a uma situação defensiva, sem chama e sem

ambição.

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Este episódio mostra também uma clara diferença de postura entre

o Partido Socialista e o Governo. A nossa atitude é, como já aqui foi salientado, votar favoravelmente estes

dois Tratados, não obstante a distância que nos separa do seu espírito, das suas soluções e da sua ausência

de ambição.

Em contrapartida, a atitude do Governo e da maioria parece ser a de não apoiar um texto com o qual, em

boa medida, concorda, como já nos disse aqui, na base de argumentos formais e circunstancias,

insuficientemente explicados, que, no fundo, dissimulam, pura e simplesmente, que o Governo está satisfeito

com as opções ideológicas do tratado orçamental e não dá qualquer importância a uma estratégia de

crescimento e de emprego. Aliás, isso ficou também cabalmente demonstrado pela intervenção do Sr.

Primeiro-Ministro e pelos encómios que aqui teceu em relação a este tratado orçamental.

Vamos ver se não ficará para a história que o Partido Socialista ofereceu a possibilidade de uma frente

alargada na Europa, em torno de objetivos precisos, a ser seguida depois da aprovação dos Tratados e não

antes, sem condicionar, portanto, Sr. Deputado Luís Montenegro, a respetiva aprovação nem criar qualquer

dificuldade à posição de Portugal, e sem sujeição a qualquer calendário de curto ou médio prazo, e que o

Governo se limitou a alinhar argumentos de circunstância e de forma para rejeitar essa oportunidade.

Aplausos do PS.

Se assim acontecesse, as consequências desse desencontro teriam de ser futuramente assumidas de

acordo com a responsabilidade de cada qual.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados António Rodrigues e

Ana Drago.

O Sr. Deputado Vitalino Canas responderá, em conjunto, aos dois Srs. Deputados.

Tem a palavra o Sr. Deputado António Rodrigues.

O Sr. António Rodrigues (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Vitalino Canas, foi com algum prazer

que ouvimos a sua intervenção, particularmente porque, pela sua voz, o Partido Socialista mais uma vez se

afirmou junto do consenso europeu, que tanto encheu o seu discurso durante as últimas semanas.

O consenso europeu não foi ainda alcançado nesta Câmara mas foi alcançado na Europa: 90% dos

Estados-membros da União Europeia Tratado e 100% dos Estados-membros da zona euro subscreveram este

Tratado. Há melhor exemplo do consenso europeu do que esta esmagadora maioria de Estados, conscientes,

democráticos e legitimados para o fazer, terem chegado a um consenso, num período curto, em três meses,

para realizar um tratado que nos afeta e nos atinge a todos?

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. António Rodrigues (PSD): — Sr. Deputado, registo também a posição do Partido Socialista

relativamente àqueles que negam a Europa, aqueles que, não tendo propostas nem ideias alternativas, a

única coisa que sabem fazer é propor um referendo. Referendo esse que não leva a lado nenhum,…

O Sr. Honório Novo (PCP): — Não é verdade!

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O Sr. António Rodrigues (PSD): — … que não consiste em algo de concreto, limitando-se a renegar

aquilo que existe. Esta é a única proposta que a esquerda tem para nos apresentar, ao contrário daquilo que o

Partido Socialista aqui nos veio dizer.

Mas, também ao contrário daquilo que o Sr. Deputado aqui veio dizer, o Governo e nós próprios

disponibilizámo-nos, em variadíssimas oportunidades e momentos, para nos entendermos com o Partido

Socialista. Disponibilizámo-nos quer através da posição do Governo, que remeteu para a Assembleia da

República o aprofundamento do debate, quer através do próprio Grupo Parlamentar do PSD, que se mostrou

disponível para encontrar plataformas de entendimento com o Partido Socialista relativamente a este Tratado.

A única coisa que dissemos foi que não queríamos pôr em causa este Tratado, que não aceitávamos o

protocolo adicional reclamado mas que estávamos disponíveis para discutir e aprofundar estas matérias.

É por isso que lhe pergunto, em jeito de desafio, o seguinte: está, ou não, o Partido Socialista na

disposição de aprofundar o diálogo que começa hoje com este Tratado que aqui vamos aprovar?

Em segundo lugar, está, ou não, o Partido Socialista disponível para dizer, já hoje, como é que quer

traduzir, na prática, aquilo que consta do Tratado, nomeadamente em relação à regra do equilíbrio orçamental

e ao crescimento económico? Isto sem condições, sem qualquer tipo de barreiras e sem qualquer tipo de

fronteiras, apenas e só para aprofundarmos a verdadeira união económica e a verdadeira União Europeia.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago.

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Vitalino Canas, elencou-nos aqui um conjunto de

denúncias, críticas e censuras àquilo que é o conteúdo deste Tratado, o chamado pacto orçamental.

Sabe que concordamos com muitas delas, porque é preciso olhar para este pacto orçamental e perceber

exatamente o que é que ele significa. Ele significa, na prática, criminalizar para o futuro, no espaço da zona

euro e da União Europeia, qualquer política que promova o crescimento da economia e a criação de emprego,

qualquer política social, enfim, qualquer política que faça parte daquilo que era o elenco das políticas sociais-

democratas, da tradição política da qual o Partido Socialista nasceu.

Tem sido essa, aliás, a alegação de parte importante da esquerda europeia e de vozes fundadoras e

importantes do Partido Socialista. Na prática, isto significa colocar um ponto final naquilo que o Partido

Socialista sempre anunciou ser o seu projeto para a construção europeia.

O Sr. Deputado Vitalino Canas veio aqui dizer-nos o seguinte: há todo este conjunto de críticas mas

estamos num momento de chantagem. Ora, perante a chantagem da Europa e perante as dificuldades do

País, olhamos para o Partido Socialista e o Partido Socialista diz: «nós vamos ceder».

É sobre esta matéria, muito específica, Sr. Deputado, que queria questioná-lo, porque aquilo que temos em

presença é o conflito fundamental da política nacional, da política europeia. Assim, para o futuro, a regra dos

0,5 vai, ou não, aniquilar qualquer instrumento de política pública que permita reconverter, colocar em

contraciclo políticas sociais/políticas económicas, num contexto de recessão e de empobrecimento?

A minha pergunta, Sr. Deputado, é muito simples: neste contexto, como é que um partido que se reivindica

da esquerda socialista democrática se permite votar favoravelmente aquele que é o documento mais

ultraortodoxo alguma vez instituído no projeto europeu? Como é que a esquerda, no momento da verdade,

vota ao lado da ultradireita?

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Vitalino Canas.

O Sr. Vitalino Canas (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado António Rodrigues, o Sr. Deputado reafirmou,

mais uma vez, a ideia do consenso europeu na Europa, mas nós começamos a ter dúvidas sobre a natureza

desse consenso europeu na Europa. É que, na verdade, o consenso a que o Sr. Deputado se referiu é um

consenso pouco alargado e que talvez vincule apenas os partidos que estão no mesmo grupo político que o

Sr. Deputado.

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O Sr. Luís Fazenda (BE): — Ah! Afinal…!

O Sr. Vitalino Canas (PS): — Mas quero tratar daquilo que é o aspeto essencial deste debate e em

relação ao qual ainda não ouvi uma resposta precisa da parte nem do Governo nem do PSD nem do CDS-PP,

que é a questão de saber por que não aceitam o ato adicional a este tratado orçamental. Por que é que não

aceitam?

Aplausos do PS.

Os senhores dizem: «bom, estamos disponíveis para conversar». Talvez estejam, numas tertúlias, nuns

seminários, se calhar, numas conversas… Mas não é isso que está aqui em causa, Sr. Deputado. O que está

aqui em causa é aceitarem um princípio, o princípio de que este Tratado não é suficiente e tem de haver mais

qualquer coisa. Tem de haver, porventura, um tratado adicional. Nós não pedimos ao Governo, nem ao PSD,

nem ao CDS-PP que, amanhã, haja esse tratado adicional. Nós nem sequer colocámos qualquer condição

para aprovarmos os Tratados hoje aqui em discussão.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Nota-se!

O Sr. Honório Novo (PCP): — Isso já se sabe! Aliás, este projeto de resolução é um alibi!

O Sr. Vitalino Canas (PS): — Nós pedimos e sugerimos que iniciássemos imediatamente o nosso trajeto

na Europa em torno daquilo que falta neste tratado orçamental.

Portanto, Sr. Deputado, estou curioso em saber o que vão fazer amanhã. O Sr. Deputado deixou-me uma

pergunta em relação à concretização da chamada regra de ouro. Mas é que, ainda antes da concretização da

regra de ouro, há a necessidade de concretizarem aquilo que pensam sobre o que o Partido Socialista propõe

nesta Casa, sobre uma estratégia de crescimento e do emprego.

Sr.ª Deputada Ana Drago, também admito que haja muitas questões em que estamos de acordo, mas há

muitas em que estamos em desacordo. E também estou curioso em relação àquilo que o Bloco de Esquerda

vai fazer, amanhã, no momento da votação, em relação ao projeto de resolução do Partido Socialista.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Vitalino Canas (PS): — Não sei se o Bloco de Esquerda, nesse momento, não irá associar-se ao

CDS-PP e ao PSD, em relação ao nosso projeto de resolução.

Aplausos do PS.

Risos do BE.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Oh!… Vejam lá!…

O Sr. Vitalino Canas (PS): — Veremos o que o Bloco de Esquerda vai fazer em relação ao projeto de

resolução do Partido Socialista, que concretiza uma lista de políticas, de iniciativas e de projetos que já tenho

visto o Bloco de Esquerda defender mas nunca consequentemente.

Veremos o que fazem amanhã, Sr.ª Deputada.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Mota Pinto.

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O Sr. Paulo Mota Pinto (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro e Srs. Membros do Governo, Srs.

Deputados: O Tratado sobre a Estabilidade, a Coordenação e a Governação na União Económica e

Monetária, objeto dos projetos de resolução que hoje debatemos, foi negociado e objeto de consenso entre

todos os Estados-membros da União Europeia, salvo o Reino Unido e a República Checa, num contexto de

grave crise.

O Tratado foi uma resposta consensualmente encontrada à crise financeira que alastrava na área do euro e

à necessidade comummente sentida de reforma da governação económica europeia, no sentido de uma maior

coordenação e integração.

O Tratado é, além disso, uma contrapartida europeia complementar, e mesmo indispensável, ao programa

de ajustamento económico nacional, que não modifica mas cujo sucesso pleno pode em muito influenciar.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Paulo Mota Pinto (PSD): — Para promover condições favoráveis a um crescimento económico mais

forte na União Europeia é, com efeito, imprescindível uma coordenação mais estreita das políticas económicas

e salvaguardar a estabilidade financeira. Não haverá crescimento económico sem estabilização financeira,

sem finanças públicas sãs.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Tratado arranca, assim, da necessidade de os governos manterem finanças públicas sãs e sustentáveis

e de evitarem défices orçamentais excessivos, para preservar a estabilidade de toda a área do euro.

Consequentemente, na linha da gestão da política orçamental segundo regras normativas (ou, pelo menos,

dentro de certos limites normativos), e não segundo a discricionariedade, a conveniência ou a

irresponsabilidade dos políticos do momento, em prejuízo de quem vem a seguir, exige a introdução de regras

específicas, incluindo uma regra de equilíbrio orçamental e um mecanismo automático para a adoção de

medidas corretivas, em caso de desvio.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Paulo Mota Pinto (PSD): — Esta é uma regra que, como já foi dito, não é de esquerda nem de

direita, só impõe que os governantes assumam as consequências financeiras das suas políticas — por

exemplo, aumentando os impostos ou impedindo a sua descida, se querem gastar mais.

Foi por isso que, por exemplo, na Alemanha, um partido como o SPD, ou, na Espanha, um partido como o

PSOE aprovaram tal regra.

Aplausos do PSD.

No atual contexto de grande reajustamento económico à escala global, a Europa precisa deste Tratado.

Como foi consensualmente visado pelos 25 Estados que o aceitaram, o Tratado quer lançar e deixar bem

amarrada uma âncora de longo prazo, no sentido da estabilidade financeira dos Estado signatários, que tão

necessária é para se poder recuperar credibilidade no futuro da zona euro com a sua atual configuração e

obter alguma flexibilidade no curto prazo.

Só o sucesso de uma tal âncora de longo prazo, com coesão entre os Estados-membros, permitirá àqueles

que mais dificuldade têm em financiar-se hoje recuperar alguma margem de manobra.

Este objetivo do Tratado não deve ser ignorado por quem tanto tem clamado por alguma flexibilização das

políticas de ajustamento financeiro — sem confiança no longo prazo, não conseguiremos ter flexibilidade no

curto prazo e o Tratado é um instrumento para recuperar essa confiança e credibilidade.

Mas não é só a Europa, também Portugal precisa deste Tratado. Independentemente da análise sobre as

causas da situação em que nos encontramos, é certo que basta um olhar frio e objetivo sobre as nossas

finanças públicas, nesta nossa República, desde o 25 de Abril, para verificar a incapacidade crónica de

controlar défices orçamentais ou de gerar finanças públicas equilibradas.

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Os portugueses sabem hoje, por experiência própria, que é preciso pôr cobro a tal incapacidade, que é

preciso limitar a tendência, aparentemente irresistível, para acumular desequilíbrios financeiros, limitar a

irresponsabilidade ou a falta de previsão de agentes políticos frequentemente com horizontes demasiado

limitados no tempo.

O Tratado que hoje debatemos prevê justamente, neste sentido, que se introduzam regras e limites

normativos para o défice e a dívida, com garantias da sua observância.

Pode, por isso, dizer-se que a sua aprovação é imposta também por um imperativo ou necessidade de

defesa de Portugal, do nosso ajustamento financeiro e de recuperação da nossa liberdade de decisão

económica e financeira, um imperativo de coerência com o compromisso internacional de Portugal e com as

opções consagradas no programa de assistência financeira.

As orientações programáticas e a opção pelo processo de integração europeia são, como se sabe, matéria

que tem desde sempre sido objeto de um amplo consenso nacional, desde os primórdios da aposta pela

adesão às Comunidades, passando por grande parte da negociação e pela assinatura da adesão, em 1985,

por um governo constituído pelos dois maiores partidos portugueses — o PSD e o PS —, até às diversas

revisões do tratado, a culminar no Tratado de Lisboa.

Tem sido, felizmente, assim, e assim deverá continuar a ser, pois é o que corresponde, sem dúvida, ao

sentimento da imensa maioria dos portugueses, cuja aprovação da integração europeia e no euro não tem

diminuído mesmo em tempos de políticas de austeridade, como mostram todos os estudos.

De fora da integração europeia têm-se posto — e ainda continuam a pôr-se, é certo — algumas forças

políticas radicais à esquerda, que, da defesa de modelos totalitários de organização da sociedade e do poder

político, passaram com mais insistência a críticos da aposta na União Europeia, com propostas nem sempre

verdadeiramente assumidas mas que, como os portugueses sabem, apenas nos poderiam devolver ao

isolamento do «orgulhosamente sós».

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Ora!… Ora!…

O Sr. Paulo Mota Pinto (PSD): — É assim que se compreendem algumas das propostas que encontramos

aqui hoje de realização de um referendo ao presente Tratado, quando anteriores, bem mais relevantes, não

foram referendados.

Sr.as

e Srs. Deputados: O presente Tratado merece ser aprovado e ser aprovado pela Assembleia da

República, que é a assembleia representativa de todos os portugueses. Uma tal aprovação nunca pode ser

uma aprovação às escondidas, à socapa ou nas costas dos portugueses,…

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Pode! Pode!

O Sr. Paulo Mota Pinto (PSD): — … como parecem esquecer, assim esquecendo o seu papel de

representantes do povo, aqueles que usam esses qualificativos.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Na campanha eleitoral não falou nisto! Não falou, não!

O Sr. Paulo Mota Pinto (PSD): — Saliente-se, porém, que nos partidos que têm integrado o chamado arco

da governabilidade e que são mais de 85% dos representantes dos portugueses nesta Câmara, mantém-se

um amplo consenso nacional sobre a integração europeia.

Tenho de registar, com agrado, que, em particular, o maior partido da oposição, o Partido Socialista, como

já sucedeu no passado, optou por tomar parte nesta reforma e no contributo para Portugal que resulta da sua

aprovação pela Assembleia da República. Esta é, aliás, a única posição coerente com o apoio que deu ao

programa de ajustamento financeiro e com a necessidade de uma resposta europeia à crise financeira e de

governação económica. E é também o que corresponde ao amplo consenso dos países europeus e dos

maiores partidos políticos europeus.

Dito isto — e registada esta manutenção do amplo consenso —, tenho, porém, de salientar dois pontos.

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O primeiro é o de que não é lícito disfarçar objeções políticas envergonhadas, que não se quer assumir,

com argumentos de constitucionalidade, para mais manifestamente infundados, como os que já foram

levantados contra este Tratado, esquecendo normas que na Constituição foram introduzidas justamente para

permitir o exercício, em comum, de certos poderes necessários à construção e aprofundamento da União

Europeia, ou querer disfarçar questões substanciais, como a discussão sobre o timing ou o momento da

ratificação, tal como não será ainda politicamente coerente ou sequer juridicamente conforme com o Tratado

aprovar uma disposição que prevê a introdução de limites para o défice orçamental e depois querer que eles

sejam consagrados numa norma que poderia ser alterada em cada ano pela mesma maioria que aprova o

Orçamento de Estado,…

Aplausos do PSD.

… isto é, pretender que tal pretenso limite pudesse ser rasgado segundo as conveniências da maioria

orçamental do momento. A meu ver, isso não seria sequer conforme com a letra ou o espírito do Tratado em

causa.

O segundo ponto é para sublinhar a evidente impossibilidade e o total irrealismo de uma reabertura do

processo negocial sobre o Tratado para nele incluir atos ou celebrar tratados adicionais, proposta de

reabertura do processo negocial esta que, a ser aprovada pela Assembleia da República, só poderia ter como

efeito deixar Portugal de fora do amplo consenso europeu, faltando ao seu compromisso político e numa

posição incompreensível para os nossos parceiros que têm contribuído para o nosso programa de

ajustamento.

Não é realista ou viável querer à última hora reabrir o processo negocial deste Tratado para aprovar outros

tratados, obstando ao cumprimento do que foi um compromisso político internacional do nosso Estado.

Compreende-se — qualquer cientista político o explica e os portugueses compreendem-no bem — a

necessidade tática de apresentação de tais propostas, numa tentativa de demarcação e distinção que é

sentida pelo maior partido da oposição

No entanto, o que já ninguém compreenderia seria que tal pequena necessidade tática se metesse no

caminho do interesse nacional e do cumprimento dos compromissos de Portugal.

A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Muito bem!

O Sr. Paulo Mota Pinto (PSD): — Aliás, várias das preocupações que o Partido Socialista avança na sua

proposta de resolução estão já contempladas no Tratado.

Por estas razões, e designadamente pelo esse irrealismo e inviabilidade de reabertura do processo de

negociação do Tratado, a resolução apresentada pelo Partido Socialista não pode merecer o acordo do PSD.

Contudo, tal não impede — antes pelo contrário, torna mais premente — a necessidade de um reforço do

consenso político nacional em torno dos grandes temas da integração europeia. É fundamental um amplo

consenso nacional na política europeia, na linha da melhor tradição da democracia portuguesa.

Justamente por isso é público que o Governo propôs a elaboração, pelos partidos com assento parlamentar

na Assembleia da República, de uma resolução comum que, partindo dos pontos que são objeto de consenso,

desse denominador comum, consagrasse orientações programáticas partilhadas, e o PSD, insistentemente,

convidou o Partido Socialista para negociar e discutir os termos de um tal projeto de resolução.

Ainda não foi possível obter o acordo para essa resolução comum, mas não é tarde demais.

Se, depois de meses de negociação e da obtenção de difíceis consensos entre 25 Estados-membros da

União Europeia, o Partido Socialista entendeu que estava ainda a tempo de propor um tratado adicional

complementar ao Tratado acordado, não será também com certeza ainda tarde para, nesta Câmara, se

encontrar a convergência num projeto de resolução em torno dos pontos relativos ao presente Tratado que

são partilhados pelos três maiores partidos portugueses, deixando para já de lado os restantes pontos, como

propostas de novos tratados complementares ou adicionais.

Não será também ainda tarde, portanto, para, com base nessa resolução comum, manter e reafirmar o

amplo consenso em torno das opções nacionais sobre a política europeia.

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Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Ministros, Srs. Secretários

de Estado, Sr.as

e Srs. Deputados: Como aqui foi dito já, o CDS considera os dois Tratados que hoje estamos

a discutir e amanhã aprovaremos como documentos estruturais de uma importância fundamental para os

objetivos de Portugal e, por isso, estes documentos merecerão o nosso inequívoco apoio.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Vão defender o referendo, certo?

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Dito isto, Srs. Deputados e Sr. Deputado João Oliveira em particular, ao

criarem mecanismos sobre a estabilidade, a coordenação e a governação europeia, por um lado, e um

mecanismo de resposta a crises sistémicas na zona euro, por outro , estes Tratados não só protegem melhor

o nosso País e a Europa de eventuais crises que possam acontecer…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Daqui a seis meses isto vai parecer ridículo!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — … como correspondem ao que chamaríamos, e chamámos sempre,

uma regra realista de bom governo.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — O que está aqui em causa é a aprovação de uma regra de bom

governo.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Não se esqueça do que acaba de dizer para dizer o contrário daqui a seis

meses!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Lembro, de resto, Srs. Deputados, que sempre defendemos e

introduzimos, inclusivamente, no debate constitucional a necessidade desta regra de limite ao endividamento.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Foi sempre essa a posição do CDS. Defendemos e introduzimos no

debate constitucional a possibilidade da existência desta chamada regra de ouro.

Porquê? Porque é uma regra de bom governo e porque, para nós, é fundamental respeitar o não

endividamento. Ao respeitar o não endividamento, ao limitar o endividamento, estamos a proteger o futuro das

novas gerações portuguesas.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Consideramos, por isso, muito positivo que, nesta Câmara, se crie um amplo consenso para aprovar estes

mesmos Tratados. É desejável, é bom e saudamos o Partido Socialista por se juntar a este consenso.

O Sr. Honório Novo (PCP): — É preciso ter descaramento!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Compreendemos as preocupações de conforto partidário e de conforto

de família europeia que tem toda a bancada do Partido Socialista, designadamente os Srs. Deputados António

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Braga, José Junqueiro e Vitalino Canas, mas ainda bem que as vossas preocupações de conforto partidário

não são mais importantes que o vosso respeito pelo interesse nacional.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Pergunta o Sr. Deputado Vitalino Canas por que razão não estamos

aqui, hoje, a discutir e a aprovar a adenda que o Partido Socialista propõe em relação a esta matéria.

É uma boa pergunta, mas a resposta é tão simples quanto isto, Deputado António Braga: porque houve 25

Estados que aprovaram um Tratado no qual não consta essa adenda. Não fomos nós que o decidimos. Este

Tratado é fruto de um amplo consenso europeu. No entanto, não teremos problema algum em discutir esta

matéria para futuro. O problema que temos é, obviamente, com quem.

Tendo dito desde início «onde está a Europa? Por que é que a Europa não responde à crise? Por que é

que a Europa não veio mais cedo criar mecanismos para responder à crise?», agora diz que «a Europa

respondeu, mas não serve. Não queremos esta resposta. A resposta da Europa não é boa». Isso é que não

faz sentido algum, do nosso ponto de vista.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Como também não faz sentido invocar aqui a questão da existência ou

da não existência de mandato. Ao longo deste debate, ouvimos dizer que não há mandato, que este

Parlamento não tem mandato para resolver esta questão.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — E não tem!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Compreendo que quem não quis discutir com a troica, quem não quis

sequer falar com a troica para fazer o Memorando de Entendimento considere que não tem mandato. Respeito

esse facto.

No entanto, nós — CDS e esta maioria —, que nos candidatámos sabendo as dificuldades que íamos

enfrentar, sabendo que era preciso salvar o País de uma crise, sabendo que era preciso recuperar Portugal,

sabendo que era preciso salvar o euro, só temos mandato para fazer isto! Não temos outro mandato que não

seja este!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

E quem diz que não há mandato tem alternativa? Qual é a alternativa?

A Sr.ª Ana Drago (BE): — O referendo!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Chumbar? Chumbar para quê, Sr.ª Deputada? Chumbar para que haja

mais dívida? Chumbar para que haja mais défice? Chumbar para que possa haver mais Estado? Chumbar

para que possa haver mais incumprimento? Chumbar para que possa haver menos credibilidade de Portugal

no exterior? Não é solução, como é evidente!

É verdade que sempre dissemos e defendemos no passado — não temos qualquer dúvida sobre isso —

que, em questões institucionais e de soberania, seria útil a consulta.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — E esta não é?

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Esta é exatamente, Sr. Deputado Luís Fazenda, o contrário. Estes

Tratados são precisos, são fundamentais e são necessários para que Portugal possa recuperar a sua

soberania. É exatamente o contrário.

Aplausos do CDS-PP.

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A Sr.ª Ana Drago (BE): — O outro era a brincar!…

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Votamos aqui, hoje, estes Tratados para que Portugal possa recuperar

a sua soberania! É exatamente o contrário.

Por isso, consideramos que a sua aprovação é fundamental, porque é com a sua aprovação que

poderemos encontrar um caminho de credibilidade externa de Portugal enquanto Nação respeitada no

contexto europeu e, a seguir também, obviamente, o crescimento económico, que é o nosso grande objetivo.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Não têm palavra!

A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Francisco de Assis.

O Sr. Francisco de Assis (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e

Srs. Deputados: Este debate que agora se aproxima do fim permite-nos perceber que se mantêm,

simultaneamente, o consenso e o dissenso no plano europeu.

Não é só o consenso que se mantém mas também o dissenso, já que não há memória de que quer o

Partido Comunista quer o Bloco de Esquerda alguma vez tenham votado favoravelmente algum tratado

europeu, tivesse ele a natureza que tivesse.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Também nunca houve um com referendo!

O Sr. Francisco de Assis (PS): — A circunstância, porém, de haver um consenso não significa a anulação

das diferenças.

Ficou aqui claro que a atual maioria governamental e o Partido Socialista vão votar favoravelmente o

Tratado Europeu, mas também é evidente que têm perspetivas diferentes em relação ao destino da Europa.

Nós aprovamos este Tratado Europeu porquanto percebemos, neste Tratado, um avanço que queremos

saudar.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Diga lá qual é o avanço!

O Sr. Francisco de Assis (PS): — Mas também reconhecemos alguns problemas que ele vem criar e

algumas insuficiências que carecem de ser resolvidas.

O avanço é muito claro.

O Sr. Honório Novo (PCP): — O avanço é ir de frente para o abismo!

O Sr. Francisco de Assis (PS): — Para quem, como nós, defende um aprofundamento da governação

económica europeia, está aqui, claramente, a ser dado um passo nesse sentido.

Sr.as

e Srs. Deputados, não é crível que outros Estados europeus aceitem participar num processo de

maior coordenação da governação económica se não estiverem garantidas algumas regras básicas — que

entendemos excessivas, porém — em matéria de disciplina orçamental. Isso é absolutamente evidente e,

portanto, desse ponto de vista, há um avanço.

No entanto, a seguir, colocam-se problemas. O primeiro problema que não pode ser ignorado é que, se o

consenso não anula as diferenças, o dissenso também não nos impede de compreender os argumentos que

os senhores invocam e não nos impede de compreender a razoabilidade de algumas das reservas que

colocam — essa é que é a essência do debate democrático, Sr. Deputado Honório Novo, não é vir para aqui

repetir slogans, é sabermos ouvir as razões uns dos outros.

Ora, temos consciência de que se há este avanço, a interpretação do que pode significar a governação

económica na Europa para a direita e para a esquerda democrática tem sentidos diferentes. Para grande parte

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da direita europeia significa apenas, através da governação económica, garantir a passagem automática dos

diktats dos mercados financeiros para os orçamentos nacionais. É claramente isso que uma certa direita

europeia pretende.

O Sr. Honório Novo (PCP): — E o PS também…

O Sr. Francisco de Assis (PS): — Ora, com isso não estamos de acordo.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Ai não?! Por isso vota contra!

O Sr. Francisco de Assis (PS): — É justamente porque não estamos de acordo que apresentamos o

projeto de resolução que foi há pouco apresentado pelo Sr. Deputado Vitaliano Canas.

Aplausos do PS.

Há um problema que subsiste e que carece de ser ultrapassado.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Deputado, não brinque com coisas sérias!

O Sr. Francisco de Assis (PS): — O Sr. Deputado Honório Novo deixa-me certamente falar! Sei que o Sr.

Deputado tem tão pouco respeito pela representação nacional que acha que aqui decidimos nas «costas» do

povo, mas a verdade é que representamos aqui o povo e, portanto, agradeço que me deixe falar e concluir a

minha intervenção.

Aplausos do PS e do Deputado do CDS-PP João Pinho de Almeida.

Há também problemas sérios que se colocam porque, sempre que se avança no sentido do reforço dos

mecanismos de uma governação económica, é evidente que se colocam problemas ao nível da legitimação

democrática do processo decisório e da qualidade dos mecanismos de controlo político democrático dessas

mesmas decisões.

Isto significa que, a partir de agora, vão ser colocadas questões sérias ao Parlamento Europeu e aos

diversos parlamentos nacionais no sentido de encontrarmos mecanismos institucionais adequados que

permitam garantir o controlo do processo orçamental por quem tem legitimidade para o fazer, que são os

parlamentos nacionais, na sua origem, e o próprio Parlamento Europeu, o que significa que se trata de um

processo em aberto.

Mas a União Europeia tem a vantagem de não ser um projeto fechado e de não assentar em nenhuma

utopia terminal. A União Europeia é um processo em avanço, é um processo em que às vezes se avança mais

e outras se avança menos, em que às vezes se pensa que se está a avançar e até se está a recuar, mas o

balanço que podemos fazer é positivo, o que nos permite continuar a projetar esperança em relação ao futuro

do projeto europeu, mesmo quando não estamos inteiramente de acordo com os documentos que temos

oportunidade de votar.

Aliás, Srs. Deputados, há uma evidência muito simples e uma regra fundamental na política, a que os

fanáticos das mais diversas ortodoxias são insensíveis: na política nunca se decide entre a luz e as trevas,

entre o bem absoluto e o mal absoluto!

Aplausos do PS.

A política é a capacidade de associar convicções com sentido da responsabilidade, de associar grandes

princípios gerais que norteiam a nossa intervenção pública com a análise no concreto das situações com que

estamos confrontados.

Já aqui foi colocada a questão — e muito bem — pelo Sr. Deputado Vitalino Canas de que não vamos

votar este tratado por estarmos sob qualquer efeito de chantagem de outros países. Vamos votar este tratado,

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também, porque compreendemos a realidade política atual da União Europeia, estamos dispostos a lutar pela

sua alteração, projetamos expectativas nessa mesma alteração e, sobretudo, projetamos expectativas em que,

nos próximos tempos, a Europa possa assistir à vitória de algumas formações políticas da esquerda séria e

eficaz, que, quando ganha eleições e governa, faz avançar a Europa e não coloca problemas ao avanço do

processo europeu.

Aplausos do PS.

Sr.as

e Srs. Deputados, perante todo este quadro com que estamos confrontados, temos uma posição clara

e, uma vez mais, no encerramento deste debate, creio que isso deve ser salientado. O Partido Socialista,

estando no governo ou na oposição, sempre assumiu inteiramente as suas responsabilidades.

Há coisas que têm de estar para além dos cálculos dos benefícios de conjuntura, há coisas que

correspondem a compromissos profundos e, por isso, Sr. Deputado Telmo Correia, tendo ouvido com atenção

a sua intervenção, não posso deixar de lhe dizer que o PS não chegou agora ao consenso europeu, o PS está

na base do consenso europeu em Portugal.

Aplausos do PS.

O PS tem, na sua linha de orientação doutrinária e na sua matriz política, esta opção clara pela Europa.

Não estivemos sempre de acordo com tudo, nunca estaremos. Aliás, num projeto como o europeu é

praticamente impossível alguém estar sempre de acordo com tudo o que se faz. Este projeto europeu é de

uma complexidade tal, envolve países com trajetórias históricas, com fantasmas, com aspirações e com

diferenças de tal ordem, sendo integrado por várias famílias políticas, que tornam muito difícil estar-se de

acordo com tudo.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Não! Estiveram sempre de acordo com tudo!

O Sr. Francisco de Assis (PS): — Sr. Deputado Honório Novo, a União Europeia é bastante mais

complexa do que a extinta União Soviética. Não tenha a mais pequena dúvida sobre isso!

Aplausos do PS.

Protestos do PCP.

Por isso mesmo é que os processos políticos na Europa exigem, em cada momento, um especial sentido

da responsabilidade.

Sr. ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as

e Srs. Deputados, o PS está neste debate como sempre

esteve, colocando a sua interpretação do interesse do País acima de qualquer cálculo de benefício partidário,

colocando as questões estruturais e de longo prazo acima de qualquer raciocínio de conjuntura. Foi assim que

fizemos quando estávamos no governo e não o deixaremos de fazer pela circunstância de estarmos agora na

oposição.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente:— Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Sérgio Azevedo.

O Sr. Sérgio Azevedo (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Ministros, Sr.as

e Srs.

Deputados: O Tratado que cria o Mecanismo Europeu de Estabilidade, assinado em Bruxelas a 2 de fevereiro

de 2012, tem como grande objetivo o reforço da estabilidade financeira da zona do euro através da criação de

uma instituição financeira internacional de carácter permanente para a prestação de assistência financeira a

Estados-membros que tenham ou possam vir a ter dificuldades financeiras graves.

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O presente Tratado contribuirá em grande medida para a estabilidade económica da zona euro e dos seus

membros mediante a prestação de assistência financeira, permitindo e contribuindo, deste modo, para a

preservação da estabilidade económica da própria União Europeia.

Não obstante, será também através da escrupulosa observância do quadro estabelecido pela União, da

vigilância macroeconómica integrada, em especial do Pacto de Estabilidade e Crescimento, do quadro

aplicável aos desequilíbrios macroeconómicos e das regras relativas à governação económica da União que a

defesa contra as crises de confiança que afetam a estabilidade da área do euro melhor se manifestará.

Sr.ª Presidente, este é um momento importante e decisivo na história da União.

A subscrição do presente Tratado por todos os Estados-membros da zona euro representa o esforço da

União na criação de mecanismos que clarifiquem e reforcem a vertente económica da União Económica e

Monetária.

Desde o aparecimento do euro que a união política caminhou de braço dado com uma união monetária,

tendo sido preterida uma união económica que não só valorizasse a moeda única mas também que trouxesse

maior robustez ao desenvolvimento económico dos Estados-membros.

Não é descabido, portanto, afirmar que se até aqui, desde o aparecimento do euro, a união económica

marcou passo, não se tendo verificado o desenvolvimento simultâneo e integrado de uma união monetária

com uma união económica, a partir de hoje, com o contributo de Portugal, o caminho do projeto europeu e da

constante construção europeia poderá ser diferente. Diferente porque será necessariamente mais rigorosa,

mais integrada mas, sobretudo, mais solidária entre os Estados-membros.

O presente Tratado, em conjunto com o Tratado sobre Estabilidade, Coordenação e Governação na União

Económica e Monetária, representa um contributo inestimável para o aprofundamento do pilar económico da

união económica e monetária, promovendo a responsabilidade e a solidariedade orçamentais na zona euro

através de uma capacidade de assistência financeira aos Estados-membros associada a regras orçamentais

que assegurem a sustentabilidade das finanças públicas e uma maior coordenação das políticas económicas.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Sérgio Azevedo (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Ministros, Sr.as

e Srs.

Deputados: Com a aprovação deste Tratado encerramos um ciclo. A criação deste mecanismo era uma

necessidade premente no contexto de uma união económica e monetária claramente deficitária na existência

de instrumentos de coordenação das políticas económicas e de defesa contra as crises sistémicas da moeda

única, como, aliás, a história recente tem vindo a comprovar.

É também por isso que é essencial uma resposta forte e convicta do Parlamento português e de Portugal

no reforço da estabilidade financeira e no projeto de integração europeia e essa resposta, Sr.as

e Srs.

Deputados, começa já com a ratificação dos Tratados em discussão.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios

Estrangeiros.

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros (Paulo Portas): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs.

Deputados, o debate de hoje merece uma primeira conclusão: o Parlamento de Portugal, onde está

representado o povo soberano, vai aprovar, por uma maioria clara, significativa e esclarecedora, os dois

Tratados europeus.

Uma maioria clara que representa a nossa vontade de fazer a nossa parte para vencer a crise na Europa e

da Europa. Uma maioria significativa porque traduz a vontade de as instituições democráticas em Portugal

aprenderem com os erros e transformarem a meditação sobre as causas desses erros em reformas que

evitem a sua repetição.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

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O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sim, hoje, o Parlamento de Portugal, ao

aprovar este dois Tratados, está a dizer aos portugueses, aos outros europeus e ao mundo que Portugal quer

viver com responsabilidade financeira, com prudência orçamental e com contas públicas equilibradas porque

sabemos que só uma Nação assim será livre e independente.

Sim, hoje o Parlamento de Portugal, ao aprovar estes dois Tratados, está a dizer aos portugueses, aos

outros europeus e ao mundo que não queremos mais a espiral de dívidas e de défices que, precisamente há

um ano, obrigaram esta Nação secular e muito respeitada a ter de pedir ajuda externa para evitar a

insolvência.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Sim, hoje, o Parlamento de Portugal, ao aprovar estes dois Tratados, dá um passo importante para que, na

nossa democracia, a boa regra de governar a pensar nas próximas gerações triunfe sobre um mau hábito: o

de governar a pensar nas próximas eleições.

Aplausos do CDS-PP.

É também uma maioria esclarecedora. É que faz uma considerável diferença na perceção interna e externa

que Portugal aprove os dois Tratados não com uma maioria simples, não com uma maioria absoluta, não com

uma maioria qualificada de dois terços, mas com uma maioria esclarecedora que será, com todo o grau de

probabilidade, ainda superior.

Claro que haverá sempre nesta Câmara quem, legitimamente, prefira fazer política com base na utopia,

esquecendo esse humilde detalhe chamado realidade. Mas, no final de tudo, o que conta é o realismo.

O Sr. Honório Novo (PCP): — O senhor muda de opinião como quem muda de camisa!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Deputado Honório Novo, conhecemo-nos

há muitos anos e o Sr. Deputado está convencido que por falar mais alto o povo o ouve mais, mas não tem

acontecido assim!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Como eu dizia, no final de tudo, o que conta é que o realismo prevaleceu, o consenso europeu manteve-se

e, nos momentos essenciais, os partidos de vocação europeísta, cuja maioria é maior do que a maioria

governamental nesta Câmara, sabem pôr o principal à frente do secundário e sabem distinguir o que é de

interesse nacional do que é de conveniência partidária.

Aplausos do CDS-PP.

Ainda bem que Portugal dará hoje, e creio que amanhã, enquanto Estado-nação, esta prova de coesão, um

bem político de rara oportunidade e necessidade que nos distancia, uma vez mais, de qualquer imagem ou

perceção de fragmentação política.

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, vou tecer ainda algumas considerações sobre discussões

importantes do debate de hoje.

Começo, até pela relação especial que existe, nestes temas europeus, entre a maioria e o principal partido

da oposição, pela questão a que o PS tem chamado ato ou protocolo adicional.

Ninguém poderá sustentar que estes Tratados são a versão acabada ou definitiva da construção europeia.

O Governo não o diz e não o pensa. Haverá sempre mais Europa além dos tratados, mas de igual modo

convém clarificar que a ratificação destes Tratados significa a adesão não a um capricho ideológico mas a um

consenso institucional e europeu que junta 25 Estados e 25 governos da mais variada natureza.

Devemos, portanto, tornar mais confortável a adesão do Partido Socialista. Vários governos com orientação

ou participação da esquerda democrática são coautores destes tratados e não será demais recordar a origem

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e o destino da chamada «regra de ouro» pela primeira vez inscrita na constituição alemã pela mão de um

ministro das finanças socialista e inscrita, há bem poucos meses, na constituição espanhola pela mão de um

primeiro-ministro socialista.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Honório Novo (PCP): — E depois?

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Ora, dito isto, há um ponto em que nos

parece que o Partido Socialista poderia meditar mais aprofundadamente, atitude que fica bem a todos nós.

Considerar politicamente que a ratificação por Portugal devia ficar associada a outro documento jurídico,

um ato ou protocolo eventual, havia de equivaler a uma espécie de ratificação condicional. Ora, não há

ratificações condicionais e, se as houvesse, isso seria associar Portugal não a um elemento de certeza, mas a

um elemento de dúvida.

Ora, a Europa, o euro, o crescimento e o emprego precisam de certeza,…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Pois, a Europa é só certezas…!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — … de previsibilidade e de efetividade. Não

precisam de mais incerteza, de mais fragilidade ou, numa palavra, de mais dificuldades.

Dir-se-á, ainda, que essa ideia do ato ou protocolo adicional tem sido mencionada aqui ou ali noutras

paragens da Europa, mas creio que o Partido Socialista rapidamente cairá em si, pois se essas menções

constituíssem razão para Portugal ratificar os dois tratados, dependendo de um ato, protocolo futuro e

eventual, isso tornaria o Estado português parte de uma campanha eleitoral noutro país,…

Vozes do CDS-PP: — Ora bem!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — … submetendo a nossa soberania política a

circunstâncias ou palpites eleitorais noutros países, que devemos cautelosamente evitar, porque as relações

internacionais nesta matéria são Estado a Estado, não são partido a partido.

Se algum dia esse debate suceder na Europa, Portugal participará nele, institucional e construtivamente,

mas sendo esta a hora de ratificar sabemos que estes tratados têm um só texto, que esse texto é igual em 25

Estados e que é sobre esse texto igual em 25 Estados que teremos de nos pronunciar.

Por isso, nós dizemos «ratificamos» e não dizemos «ratificamos se…».

O Sr. Honório Novo (PCP): — Não há nenhum «se»! O «se» é só para enganar a populaça!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Ocorre-nos, aliás, que esse «ratificamos

se…» nem seria bem percebido cá dentro nem seria bem percebido lá fora.

Permitam-me, ainda, um apelo. Respeitando as nossas diferenças, Governo e Partido Socialista estão, no

entanto, convocados para o entendimento, pela simples razão de que o tratado de governação terá de ser

adequadamente transposto para a legislação nacional, e essa transposição terá de ser verificada pelo Tribunal

de Justiça.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Onde é que fica esse tribunal?!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — É, portanto, uma medida do sentido de

Estado e do sentido de responsabilidade de todos nós assegurar que Portugal passa bem, passa

corretamente, passa sem sobressalto esse crivo jurídico comum a todos os Estados contratantes.

Os partidos de governo e não apenas os partidos do Governo sabem bem que esse desiderato — passar

largamente a etapa da ratificação e passar com distinção a etapa da transposição — é um dever. Por isso, a

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disponibilidade dos partidos do consenso europeu é um imperativo, e essa disponibilidade implica abertura da

maioria ao Partido Socialista, mas também do Partido Socialista face à maioria.

Temos a certeza de que nenhuma diferença legítima impedirá aquela que é uma comunhão no essencial.

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Quando, em abril do ano passado, Portugal foi obrigado a pedir

ajuda externa, alguns optaram por fazer uma campanha eleitoral dizendo aos cidadãos que não…

O Sr. António Filipe (PCP): — Que não iam aumentar os impostos!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — … era preciso falar com as instituições que

iam emprestar dinheiro a Portugal. Outros fizeram uma campanha eleitoral dizendo aos portugueses…

O Sr. António Filipe (PCP): — Que não iam cortar nos subsídios!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — … as causas e as consequências daquela

situação. Eu, em particular — permitam-me uma nota pessoal —, tive bem a consciência de que, tendo visto

três vezes nas últimas décadas o FMI em Portugal, faria tudo o que estivesse ao meu alcance para que esta

fosse a última vez e que nós recuperássemos a nossa autonomia e a nossa liberdade com responsabilidade

financeira.

É exatamente isso que estamos a fazer! É proteger o futuro de Portugal dos erros que cometemos no

passado!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, a Mesa não regista mais inscrições, pelo que dou por terminado este

debate.

O ponto seguinte da nossa ordem do dia consta do debate conjunto, na generalidade, da proposta de lei n.º

50/XII (1.ª) — Altera a Lei n.º 23/2007, de 4 de julho, que aprovou o regime jurídico de entrada, permanência,

saída e afastamento de estrangeiros do território nacional, e dos projetos de lei n.os

206/XII (1.ª) — Aprova o

regime de regularização de cidadãos estrangeiros indocumentados (PCP), 25/XII (1.ª) — Consagra o efeito

suspensivo dos recursos previstos na Lei de Imigração (BE), e 215/XII (1.ª) — Regularização de trabalhadores

imigrantes e menores nascidos em Portugal ou a frequentar o sistema de ensino (BE).

Para introduzir o debate, tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna.

O Sr. Ministro da Administração Interna (Miguel Macedo): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados:

Com a presente proposta de lei, o Governo pretende alterar o regime jurídico da denominada lei dos

estrangeiros. E fazemo-lo por dois motivos essenciais: em primeiro lugar, para transpor para o direito interno

cinco diretivas europeias e, em segundo lugar, para tornar a lei mais eficaz contra os crimes associados à

imigração ilegal, bem como para melhorar e consagrar direitos dos cidadãos estrangeiros.

O prazo limite da transposição de três das diretivas está já largamente ultrapassado e a Comissão

Europeia tinha já desencadeado a respetiva ação por incumprimento, estando iminente a aplicação a Portugal

de uma sanção pecuniária no montante de 5 milhões de euros.

Neste contexto, transpõe-se a «diretiva retorno», relativa ao repatriamento de nacionais de Estados

terceiros.

Estamos conscientes que o repatriamento deve ocorrer em condições humanamente dignas e com pleno

respeito pelos direitos fundamentais e dignidade das pessoas.

Neste sentido, reforça-se o princípio da não repulsão, isto é, a proibição de proceder ao repatriamento

quando estejam em causa violações de direitos humanos; em segundo lugar, promove-se a regra do regresso

voluntário de imigrantes ilegais, reforçando e alargando o papel do instituto do abandono voluntário; depois,

atribui-se ao cidadão estrangeiro o benefício de proteção jurídica e serviços de tradução e interpretação nos

casos de impugnação judicial da decisão de expulsão.

Finalmente, consagram-se direitos legais do cidadão estrangeiro detido em centro de instalação,

nomeadamente o direito ao contato com familiares, o direito ao contato com o representante legal e o direito à

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prestação de cuidados de saúde, dando especial atenção às pessoas mais vulneráveis, designadamente

menores, idosos e pessoas com deficiência.

Ainda em sede de transposição da «diretiva retorno», reforça-se a cooperação entre Estados membros de

forma a reforçar a segurança da União Europeia e garantir a segurança de pessoas e bens; limitam-se as

situações em que os cidadãos estrangeiros ficam entregues à custódia do SEF (Serviço de Estrangeiros e

Fronteiras); estabelece-se um prazo máximo, onde a lei atual não coloca qualquer limite, à colocação em

centro de instalação temporário, nos casos em que haja sido proferida decisão de expulsão, até dois meses,

para a generalidade dos casos, e até quatro meses para os casos de gravidade excecional, prazos estes que

são, lembro aqui, bastante mais favoráveis do que o disposto na «diretiva retorno», a qual prevê um limite

máximo de seis meses.

Alargam-se, ainda, os fundamentos da expulsão para incluir casos que constituem uma ameaça para a

ordem pública e para a segurança nacional, reforçando-se assim a componente de prevenção.

Transpõe-se ainda, neste quadro, a «diretiva emprego altamente qualificado», a qual pretende implementar

medidas destinadas a atrair para a União Europeia mão-de-obra altamente qualificada com o objetivo de

reforçar a competitividade da economia e o crescimento económico.

Cria-se assim o «cartão azul/União Europeia», o qual simplifica os processos de admissão destes

trabalhadores e das suas famílias e melhora o estatuto legal dos mesmos, equiparando-os aos cidadãos da

União Europeia em diversos aspetos. O «cartão azul/União Europeia» funciona ainda como uma verdadeira

autorização de residência europeia.

É ainda transposta a «diretiva sanções», a qual se insere num esforço comunitário contra o emprego ilegal

de cidadãos estrangeiros, o qual se realiza, muitas vezes, em condições claramente violadoras dos direitos

humanos e de outros direitos básicos.

São, assim, agravadas as sanções nos casos de exploração de imigrantes ilegais, criminalizando-se a

exploração reiterada de imigrantes ilegais, num combate que se pretende sem tréguas a estes fenómenos,

incentivando-se, assim, um esforço de regularização dos trabalhadores por parte dos empregadores.

Por outro lado, criam-se mecanismos de apoio aos imigrantes ilegais, de forma a assegurar o efetivo direito

de apresentação de queixa contra os respetivos empregadores, bem como se reforça a competência do

Serviço de Estrangeiros e Fronteiras para realizar inspeções regulares neste âmbito.

Tirando o melhor partido do presente impulso legislativo, o Governo aproveita ainda para alterar

pontualmente a lei dos estrangeiros.

Não importa aqui, nem tal seria possível em razão do tempo disponível, enumerar todas as alterações,

mas, em benefício de uma discussão proveitosa e transparente, julgamos importante sublinhar algumas das

nossas propostas.

São propostas que se norteiam por dois princípios-chave: por um lado, uma preocupação natural com a

ordem pública e a segurança nacional e, por outro lado, a agilização de procedimentos, a afirmação de direitos

e o reforço de outros já existentes.

É manifesto que a ordem pública e a segurança nacional passam também por uma política eficaz no

combate à imigração ilegal e aos crimes a ela associados, sendo necessário dotar a lei dos estrangeiros e o

Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, em particular, dos mecanismos necessários à prevenção e combate a

estes fenómenos.

Assim, com a presente proposta de lei, o Governo pretende restringir os limites à recusa de entrada e à

decisão de expulsão, passando a não beneficiar daquele limite os cidadãos estrangeiros que tenham praticado

factos e crimes graves ou que constituam uma ameaça para a ordem pública e para a segurança nacional.

Em segundo lugar, pretende não renovar a autorização de residência a quem tenha sido condenado a pena

de prisão de um ano, ainda que a pena tenha sido suspensa em determinados casos especialmente graves,

tais como por criminalidade violenta ou especialmente violenta e grave, aumentar a moldura penal dos crimes

de auxílio à imigração ilegal, angariação de mão-de-obra ilegal, de casamento ou união de conveniência, bem

como aumentar a moldura penal aplicada ao crime organizado ou à prática reiterada destes crimes.

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: De forma clara, procura-se combater quem lucra com a imigração

ilegal, o que, não raras vezes, é feito em clara violação dos direitos humanos do imigrante, mas

compreendemos também que estamos perante uma matéria sensível, de particular desproteção do cidadão

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estrangeiro, tornando-se por isso necessário, como já dissemos, agilizar processos, por um lado, e, por outro,

consagrar novos direitos e reforçar outros direitos já existentes.

Neste capítulo, sumariamente, propomos: o alargamento, sem precedentes, do direito à assistência jurídica

ao cidadão estrangeiro não admitido em Portugal, à vítima de tráfico de pessoas ou de auxílio à imigração

legal e ainda ao detido em centro de instalação temporária.

Queremos agilizar as formalidades prévias à concessão de vistos, reduzindo o prazo para emissão do

parecer do SEF de 20 para sete dias e propomos ainda um regime específico para investidores, isto é, para

quem faça investimentos financeiros em montante igual ou superior a 1 milhão de euros ou investimentos

imobiliários de valor igual ou superior a 750 000 € ou crie 30 ou mais postos de trabalho.

A intenção com esta proposta é clara: tornar o País mais atrativo e mais competitivo na captação de

investimento estrangeiro, apostando na dinamização e crescimento da nossa economia; um regime mais

célere, mais simples, menos burocrático, fazendo com que esta lei seja mais amiga do investimento

estrangeiro.

Por outro lado, aumentamos a validade do visto de estada temporária dos atuais três para quatro meses e

prevemos a possibilidade que quem tenha autorização de residência para exercício de atividade subordinada

possa também exercer uma atividade profissional independente, quando, até agora, só o inverso estava

previsto na lei.

Propomos ainda — e isto é importante, porque permite corrigir uma situação de injustiça da atual lei— que

os membros da família de quem tenha sido acusado pelo Ministério Público pela prática de violência

doméstica possam, de forma autónoma, obter uma autorização de residência.

Por último, propomos também que a pena acessória de expulsão de cidadão estrangeiro possa ser

executada logo que metade da pena esteja cumprida.

Este é um regime proposto para as situações de penas até cinco anos — sublinho este ponto. E este

sublinhado tem a ver com o facto de, nestes casos, uma vez que ao cumprimento da pena de prisão se segue

a sanção acessória de expulsão do território nacional, ficarem assegurados objetivos de prevenção geral e

especial sempre associados a qualquer tipo de sanção criminal.

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, de forma transparente, clara e concisa, são estes os nossos

propósitos e opções: cumprir as obrigações do Estado Português, combater a imigração ilegal e reforçar os

direitos dos cidadãos estrangeiros.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Entretanto, assumiu a Presidência a Sr.ª Vice-Presidente Teresa Caeiro.

A Sr.ª Presidente: — Sr. Ministro, inscreveram-se três Deputados para pedirem esclarecimentos.

Entretanto, o Grupo Parlamentar do PSD vai transferir 2 minutos para o Governo de modo a que o Sr. Ministro

possa responder.

Sr. Ministro, responderá individualmente ou em conjunto?

O Sr. Ministro da Administração Interna: — Em conjunto, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Assim sendo, tem, desde já, a palavra a Sr.ª Deputada Cecília

Honório.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, em 26 de Julho de 2011, reconheceu em

audição nesta Casa que a atual Lei da Imigração não carecia de alterações, que respondia às situações e aos

problemas e que era, aliás, internacionalmente reconhecida.

O que é que mudou, Sr. Ministro? A verdade é que temos um País de imigrantes que fogem quando podem

porque este País que não lhes dá dignidade nem condições de vida.

Um dos aspetos mais gravosos tem exatamente que ver com a transposição da «diretiva retorno». É uma

diretiva que consagra esta orientação securitária, que facilita a expulsão, que facilita o afastamento de

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imigrantes e que permite, inclusivamente, a detenção de crianças e jovens. É disto, Sr. Ministro, que estamos

a falar, nem menos, nem mais.

Gostaria de lhe dizer que as opções seriam outras. Em primeiro lugar, porque o Sr. Ministro reconheceu, no

passado, que não era preciso mudar a atual Lei da Imigração. Em segundo lugar, porque a própria diretiva

reconhece, no n.º 3 do artigo 4.º, que os países podem permanecer com as medidas que sejam mais

favoráveis e, portanto, não faz qualquer sentido a adoção desta diretiva, a não ser, mais uma vez, Sr. Ministro,

a cedência ao diretório da Sr.ª Merkel e do Sr. Sarkozy e a esta ideia de que um imigrante é um potencial

inimigo.

Sr. Ministro, a segunda questão, que, aliás, se articula com a primeira, tem que ver com o facto de,

doravante, haver imigrantes de primeira e imigrantes de segunda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — E de terceira!

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — E também imigrantes de terceira.

Esta visto de ouro para quem tem 1 milhão de euros para investir, e que garante a legalização imediata, é

verdadeiramente inaceitável, porque há milhares de vidas, Sr. Ministro, que continuam suspensas à espera de

uma resposta, à espera de poderem viver e trabalhar neste País, no entanto, a resposta que os senhores dão

é para quem tem 1 milhão de euros para investir. Imigrantes de primeira, de segunda, de terceira — é a

resposta do Governo de direita.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Ricardo

Rodrigues.

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, como sabe, este regime jurídico é recente

em Portugal. Aliás, já fomos elogiados pelas Nações Unidas pela forma como tratávamos e recebíamos os

nossos imigrantes, o que deve ser um motivo de orgulho para o País, porque demos passos significativos

nesse regime jurídico e nos direitos que os nossos corresidentes podem ter no nosso País.

Pretende agora o Governo alterar algumas questões que para nós são significativas. Devo dizer-lhe, Sr.

Ministro, que gostava de ouvir a sua opinião sobre a capacidade ou a impossibilidade de, na especialidade,

podermos alterar alguns aspetos dessa vossa proposta de lei.

Nem sempre uma diretiva comunitária constituiu um avanço para o País, nem sempre estamos obrigados a

transpor todas as diretivas comunitárias e, neste caso, como já foi realçado, podíamos ter essa exceção.

De resto, consideramos que a «diretiva retorno» traz alguns problemas em concreto e propícia menos

direitos aos próprios imigrantes.

No caso concreto, o Sr. Ministro já anunciou que nas medidas de expulsão, por exemplo, deixámos de ter

uma norma que dizia «o imigrante que atente contra a segurança nacional pode ser expulso» para termos uma

outra norma que diz «o imigrante que constitua uma ameaça para a ordem pública…». Isto é, deixámos de ter

uma ação concreta para termos um conceito jurídico mais alargado e abstrato.

Ou seja, vemos aqui uma abertura discricionária que nos parece perigosa no âmbito daquilo que deve ser

um tratamento digno para com os nossos concidadãos, neste caso.

Mas devo dizer que também concordamos com muitas das propostas que o diploma apresenta. Na

verdade, aquilo que tem que ver com o empreendedorismo dos imigrantes obtém o nosso acordo, bem como o

alargamento da assistência jurídica. Portanto, Sr. Ministro, como vê, temos capacidade de podermos entrar em

diálogo na especialidade, o que poderá propiciar um melhor entendimento e um maior consenso.

Se for essa a opinião do Governo, pode contar com a disponibilidade do Partido Socialista para

encontrarmos maiores consensos.

Aplausos do PS.

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A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Ainda para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado

Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, lançada a dúvida no debate porque

discutimos esta lei agora, obviamente que tem que ver, essencialmente, com a transposição de diretivas,

como o Sr. Ministro já respondeu. Portanto, essa é a origem essencial ou fundamental desta lei.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Em segundo lugar, Sr. Ministro, quero também sublinhar que, do nosso

ponto de vista, esta lei corresponde àquilo que foi sempre o pensamento estrutural do CDS nesta matéria.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Bem dito!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Muito obrigado, Sr.ª Deputada!

Como dizia, foi sempre o pensamento de um partido que defende rigor na admissão e humanidade na

integração dos imigrantes.

Foi sempre esse o nosso pensamento. É esse o nosso pensamento hoje, como foi no passado.

Registamos, pois, com agrado que esta lei consagre matérias que nós sempre defendemos.

A ideia do cartão azul europeu, a ideia do trabalho qualificado, a ideia da admissão de trabalhadores

qualificados neste plano foram ideias tidas em conta por nós desde o início. Lembro-me de o CDS discutir esta

matéria em 2003 e em 2004 e de isso ter sido sempre considerado por nós um valor fundamental. Como,

obviamente, é um valor fundamental a atração de investimento, a lógica da diplomacia económica, que pode

ajudar o País a recuperar — vem do debate anterior, mas é evidente que é uma ideia fundamental.

Dito isto, Sr. Ministro, a pergunta que lhe deixaria, até um pouco na sequência do que foi dito pelo Sr.

Deputado Ricardo Rodrigues, tem a ver com a forma de concretizar esta realidade. Nós defendemos rigor,

mas defendemos que a proteção do Estado, atendendo até que existem fenómenos detetados de imigração

ligada a práticas criminosas, tem de ser feita e que esta ameaça, Sr. Ministro, só pode ser — digo eu — ligada

ou à prática de crimes ou à pertença a organizações criminosas, como é evidente. Portanto, esse

esclarecimento parece-nos fundamental, porque esta lei traz, desse ponto de vista, novas responsabilidades e

novas obrigações.

Uma última questão tem que ver com a preparação dos nossos Serviços de Estrangeiros e Fronteiras para

darem execução a esta lei, para lhe darem cumprimento e para poderem garantir os mecanismos e a maior

exigência que esta lei comporta.

Aplausos do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Administração

Interna.

O Sr. Ministro da Administração Interna: — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Cecília Honório, é verdade

que fiz essa afirmação, mas não deixa de ser verdade que Portugal está vinculado à transposição destas cinco

diretivas comunitárias. Algumas delas, de resto, estão em período de largo atraso.

O caso da «diretiva retorno» é um desses casos, cujo primeiro prazo terminou em Dezembro de 2010 e o

segundo em dezembro de 2011, arriscando-se hoje Portugal, como disse na minha intervenção, a uma

fortíssima sanção que pode ascender, por causa da não transposição de outra diretiva, a 5 milhões de euros.

Ora, justamente nós, que estamos envolvidos neste processo de construção europeu e que estamos

envolvidos, no âmbito do terceiro pilar, na criação de um espaço comum de justiça e segurança, temos,

enquanto parte inteira deste projeto europeu, que cumprir com as obrigações nacionais. E é isso que estamos

a fazer.

Quero sublinhar, Sr.ª Deputada, que há várias formas — admito — de ler esta proposta de lei, mas não a

ler com o essencial de reforço dos direitos dos imigrantes julgo que resulta em tresler a proposta de lei.

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A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Julga mal!

O Sr. Ministro da Administração Interna: — Não quer isso dizer — e respondo agora a uma das

questões colocadas pelo Sr. Deputado Ricardo Rodrigues — que cheguemos a este debate com propostas

absolutamente fechadas sobre estas matérias. Não! Há algumas questões que eu reconheço que têm especial

sensibilidade e especial melindre, pelo que o contributo positivo, racional, interessado dos Srs. Deputados, em

sede de especialidade, há de concorrer para termos, no final, uma lei melhor do que aquela — não tenho

dúvida — que chegou à Assembleia da República, muito embora o empenhamento que tenhamos posto na

avaliação de cada uma destas propostas tenha sido sério e o mais rigoroso possível.

Portanto, essa abertura, Srs. Deputados — digo-o a todos os Srs. Deputados —, fica aqui manifestada.

A esse propósito, Sr.ª Deputada Cecília Honório, quando falo em tresler esta proposta de lei é acentuar

uma ou outra proposta com que, eventualmente, a Sr.ª Deputada não concorda. Mas não concorda

naturalmente, porque a Sr.ª Deputada e o seu partido sempre foram contra a «diretiva retorno».

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Pois com certeza! Não tenha dúvida!

O Sr. Ministro da Administração Interna: — Olhar para esta proposta de lei sem, por exemplo, na sua

intervenção, sublinhar a importância do reforço do princípio da não expulsão — VV. Ex.as

, muitas vezes, em

debates aqui, na Assembleia, sublinharam como importante, mas a senhora nada disse sobre isso; não

sublinhar, por exemplo, a afirmação da regra do regresso voluntário de imigrantes ilegais e do instituto do

abandono voluntário, que sai reforçado, significa, evidentemente, Sr.ª Deputada, olhar para a proposta de lei

com determinados olhos que não são os nossos.

Finalmente, não sublinhar, na sua intervenção, a consagração, sem precedentes, em toda a sua extensão,

da proteção jurídica para imigrantes que estejam numa situação de especial vulnerabilidade pela situação em

que estão em Portugal, Sr.ª Deputada isso não é tresler a nossa proposta de lei, é pura e simplesmente

esquecer propostas anteriores que o seu partido fez aqui na Assembleia da República.

E não ficaria mal, por uma vez, que o Bloco de Esquerda reconhecesse que, nesta matéria, há uma

componente de evidente humanismo e preocupação com a situação vulnerável destes imigrantes,…

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Ministro da Administração Interna: — … quando o Governo apresenta a proposta de lei relativa a

estas matérias nos termos em que a apresenta.

Mas, Sr.ª Deputada, para termos a noção do que estamos a falar e não falarmos sempre no ar sobre tudo,

refiro números do ano passado, Sr.ª Deputada, de 2011. Houve 436 822 imigrantes registados em Portugal.

Queira V. Ex.ª saber que afastamentos executados, para este universo de pessoas, no ano passado, foram

659 e que, ao abrigo da legislação que está em vigor, que não mudamos e até reforçamos, em diversas

dimensões, como acabei de provar, por exemplo no que se refere ao artigo 88.º, n.º 2, da nossa lei, que

permite a regularização extraordinária, regularizaram a sua situação 6901 imigrantes em Portugal.

Vozes do CDS-PP: — Ora bem!

O Sr. Ministro da Administração Interna: — Portanto, Sr.ª Deputada, quando os resultados são estes e a

realidade é esta, fica um bocadinho desfasado da realidade falar em preocupações securitárias ou num pendor

securitário desta lei de imigrantes. E digo-lhe, Sr.ª Deputada, que, nesta matéria, queremos prosseguir o bom

caminho que o País tem seguido ao longo dos últimos anos e que tem granjeado, justamente, o

reconhecimento internacional.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para apresentar o projeto de lei n.º 206/XII (1.ª), tem a palavra o Sr.

Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Quem olhasse

para este debate pensaria que, estando cá a equipa governamental do Ministério da Administração Interna,

estaríamos a discutir, porventura, o Relatório Anual de Segurança Interna ou um qualquer diploma legislativo

sobre combate à criminalidade. Mas não estamos, estamos, sim, a discutir imigração.

Portanto, verificamos que, em vez de estar aqui o Secretário de Estado Feliciano Barreiras Duarte, a quem,

ainda há poucos dias, numa iniciativa pública, ouvi dizer que, com este Governo, os imigrantes não eram um

problema de segurança pública, não eram um problema de polícia — e estamos a ver que, afinal, sempre são

—,…

O Sr. Ministro da Administração Interna: — Não!

O Sr. António Filipe (PCP): — … quem cá vem, em nome do Governo, para discutir a lei de imigração, é o

Ministério da Administração Interna, o que não deixa de ser um manifesto retrocesso, não porque tenhamos

menos consideração pela equipa do Ministério da Administração Interna, mas porque o problema da imigração

não é, manifestamente, de segurança pública, é de integração de cidadãos na sociedade portuguesa.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Exatamente!

O Sr. António Filipe (PCP): — Portanto, estamos perante um retrocesso, não só pela forma mas também

pelo conteúdo.

Diria que, depois da legislação de 2007, que foi um passo positivo e que inverteu uma tendência que vinha

de 1993, de uma política legislativa errada, de portas fechadas, que não respondia minimamente aos

problemas e à realidade da imigração, estamos hoje, de facto, perante um retrocesso. Diria que o Dr. Manuel

Dias Loureiro, lá, onde estiver, se assistir a este debate, há de sentir que não está aqui presente fisicamente,

mas está aqui em espírito, na proposta de lei do Governo.

Vozes do PCP: — Exatamente!

O Sr. António Filipe (PCP): — Da legislação de 2007, que foi um passo positivo, em nosso entender,…

O Sr. Ministro da Administração Interna: — Vocês abstiveram-se!

O Sr. António Filipe (PCP): — … ficaram duas questões fundamentais por resolver, uma das quais a do

absurdo sistema de quotas para a imigração, que representa, na situação em que estamos hoje, no nosso

País, de profundo desemprego, uma política manifestamente de portas fechadas, completamente irrealista.

A segunda questão foi a da não resolução, por via legislativa, do problema dos cidadãos indocumentados,

dos trabalhadores, dos cidadãos que vivem em Portugal, que trabalham em Portugal e que, por não terem

entrado legalmente, regularmente em Portugal, se veem impossibilitados de resolver a sua situação, a não ser

pelo recurso aos mecanismos excecionais e discricionários do artigo 88.º, que o Sr. Ministro aqui referiu.

Portanto, aquilo que propomos é que os cidadãos que chegaram a Portugal, que vivem em Portugal desde

data anterior à da aprovação da legislação de 2007 e que estão a trabalhar em Portugal não sejam tratados

como delinquentes, não sejam expulsos administrativamente do nosso País e possam ver a sua situação

regularizada.

É isso que propomos, porque entendemos que a imigração não é um problema. Assim como os

portugueses que procuram trabalho noutros países não são um problema para esses países, também

entendemos que os imigrantes que trabalham ou pretendam trabalhar em Portugal não são um problema para

nós, o problema é a ilegalidade da imigração.

Aplausos do PCP.

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Não é a imigração que é um problema, é a ilegalidade em que estão muitos desses trabalhadores que

constitui, de facto, um grave problema social.

A proposta de lei que o Governo aqui apresenta é a transposição da «diretiva retorno», também chamada,

e justamente, a «diretiva da vergonha». O Governo, ao vir aqui propor a transposição desta diretiva, nos

termos em que a propõe, revela que, efetivamente, não tem vergonha de transpor para a legislação

portuguesa um regime de detenções administrativas ilegais de cidadãos que não cometeram qualquer crime.

Esta proposta de lei, tal como a «diretiva retorno», trata as vítimas como criminosos, não distingue,

efetivamente, como deveria distinguir, aqueles que são responsáveis pela exploração da imigração ilegal, e

que pretendem beneficiar com ela, daqueles que recorrem à imigração ilegal, sendo vítimas dela, porque não

têm condições de sobrevivência nos seus países.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Exatamente!

O Sr. António Filipe (PCP): — Ao tratar as vítimas da imigração ilegal como se elas fossem os criminosos,

o Governo revela que, de facto, alinha pela «diretiva da vergonha», alinha por perspetivas xenófobas, que

existem, infelizmente, noutros países europeus. Isto é tão absurdo, porquanto o Governo quer adotar para

Portugal uma política de portas fechadas, ao mesmo tempo que há membros do Governo, a começar pelo

Primeiro-Ministro, que aconselham os portugueses a emigrar, porque não têm condições de sobrevivência

neste País, devido às condições que a política deste Governo está a criar a toda uma geração de portugueses.

Aplausos do PCP.

O Governo comporta-se, com esta proposta de lei, como se Portugal estivesse a ser invadido por vagas de

imigrantes, quando aquilo que está a acontecer, infelizmente, são vagas de emigrantes, de muitos jovens, de

muitos trabalhadores portugueses, que, por não terem condições para encontrar meios de sobrevivência em

Portugal, não têm outro caminho que não seja o de procurar a emigração.

Que sinal é que damos a esses portugueses, quando queremos fechar a porta de Portugal a cidadãos de

outros países? Que exemplo, que sinal é que damos aos países que vão ter de acolher os portugueses que

neles procuram melhores condições de vida e de trabalho?

Para concluir, Sr.ª Presidente, queria dizer que esta proposta de lei considera os cidadãos estrangeiros em

várias categorias e, por isso, temos imigrantes de primeira, de segunda e de terceira. Temos os empresários,

os cidadãos estrangeiros que queiram ter empresas em Portugal, a quem o Governo estende a passadeira —

o Governo estende a passadeira aos empresários, mas fecha a porta aos trabalhadores; depois, temos os

imigrantes altamente qualificados, para quem o Governo cria o «cartão azul» e que, em determinadas

condições, podem aceder a Portugal, ou seja, doutores e engenheiros, sim,…

Risos do CDS-PP.

… trabalhadores da construção civil, trabalhadores da hotelaria, eletricistas, não. Em suma, empresários,

sim, doutores e engenheiros, talvez, trabalhadores, não!

Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Estamos perante um retrocesso em matéria de

políticas de imigração, a que os Srs. Deputados do CDS, pelos vistos, acham muita piada, pois estão fartos de

se rir, mas nós não achamos piada absolutamente nenhuma e entendemos, há muito, que ninguém beneficia,

ninguém, com uma legislação que mantém milhares de trabalhadores, em Portugal, em situação ilegal, porque

isto constitui um flagelo social não apenas para os próprios mas para o conjunto da sociedade portuguesa.

Esta política, dita de portas fechadas, é uma política que acaba por incentivar a ilegalidade da imigração e

fazer com que, para muitos imigrantes e para muitos portugueses, isto seja, de facto, um flagelo social,

quando podia não ser.

Entendemos que Portugal, como todos os países do mundo, só tem a ganhar com práticas e políticas

legislativas migratórias que sejam realistas, que tratem as pessoas com a dignidade que merecem,

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independentemente da nacionalidade, e que não criem barreiras xenófobas, que se traduzem num flagelo

social para todos.

Nesse sentido, a alteração da legislação de 2007 por esta que o Governo aqui propõe, a realizar-se, será

um retrocesso com o qual a sociedade portuguesa nada tem a ganhar.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para apresentar os projetos de lei n.os

25/XII (1.ª) e 215/XII (1.ª), tem

a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Honório.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Portugal é

hoje um País de onde os portugueses saem, aliás, sob recomendação do Governo, mas a resposta que o

Governo tem para os imigrantes que aqui vivem e trabalham há muito tempo, que aqui pagam os seus

impostos, que aqui têm os seus filhos, é a de os escorraçar e restringir os seus direitos. Isto é

incompreensível, quando é o próprio Relatório Anual de Segurança Interna que reconhece que as migrações

diminuem, mas aumenta, muito significativamente, o recurso ao programa de retorno. Quem pode, os

imigrantes que podem saem de um País que não os respeita, não os valoriza, não os reconhece!

A resposta que aqui temos hoje, Sr. Ministro da Administração Interna, por mais rosas que tenha aqui

trazido — e já lhe falarei da maioria dos espinhos —, é a transposição de uma diretiva que foi condenada por

Governos, pela igreja católica, por associações e que é uma violência e um atraso brutal no respeito e na

relação com os imigrantes. De facto, isto é olhar para estas pessoas como inimigos em potência. É verdade! É

esta a perspetiva que está consagrada nesta proposta de lei e é por isso que se compreende que o Governo a

tenha elaborado à socapa. Não consultaram associações de imigrantes, não consultaram os representantes

destas comunidades, não consultaram organizações sindicais, nem sequer se lembraram do COCAI

(Conselho Consultivo para os Assuntos da Imigração), mas a proposta aí está e é esta a sua razão

fundamental: ela é, efetivamente, um recuo determinante, com algumas das propostas que a estruturam,

nomeadamente com a adoção da «diretiva retorno» e da «diretiva sanções».

Mas, Sr. Ministro, há aqui um equívoco que não pode continuar, porque o Sr. Ministro vem falar da

perspetiva humanitária, é muito humanista, mas a verdade é que o CDS revelou aqui o seu contentamento

pleno, por reconhecer nesta proposta de lei muitas das velhas paranoias em relação aos imigrantes.

Vozes do CDS-PP: — Paranoias?!

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Portanto, não há aqui acerto! Não podemos falar de uma perspetiva

humanista, de integração, que, aliás, a proposta de lei não reconhece, quando verificamos esta prova evidente

do contentamento do CDS, sempre disponível para ver no imigrante um inimigo em potência, um potencial

criminoso.

Falou de rosas e deixo-lhe alguns espinhos e algumas demonstrações de recuo nos direitos fundamentais,

desde logo no artigo 122.º, o dos ditos «vistos de ouro». Por exemplo, legalização imediata de quem tem 1

milhão para investir no País — aqui, curiosamente, Srs. Deputados, já não vos preocupa que este dinheiro

possa vir, por exemplo, do tráfico de droga, já não vos preocupa, por exemplo, que este dinheiro possa ter um

efeito chamada sobre negócios menos claros. Não vos preocupa! Desde que exista um «visto de ouro» para

quem tem 1 milhão e um «visto de prata» para o «cartão azul», está tudo bem para o CDS! Quem trabalha,

quem aqui vive, quem aguarda a oportunidade de legalização, estes, verdadeiramente, não contam!

Voltemos ao recuo nos direitos fundamentais, com o artigo 64.º — dificuldades acrescidas no

reagrupamento familiar é o que consagra este artigo, Sr. Ministro.

O artigo 36.º reforça, e muito, a discricionariedade na recusa de entrada.

O artigo 160.º, relativo às expulsões, assume que menores, deficientes, grávidas, idosos, famílias

monoparentais, com crianças a cargo, podem ser expulsos.

Em relação ao artigo 180.º-A, Sr. Ministro, Portugal pode participar em voos comuns e «despachar» os

imigrantes que tenham de ser «despachados», segundo as políticas do Sr. Sarkozy e da Sr.ª Merkel, ou seja,

o Sr. Sarkozy resolve mandar embora os imigrantes e Portugal vai participar em voos comuns.

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O que é isto, Sr. Ministro? O que é que significa exatamente isto senão uma submissão a uma política de

regressão na integração dos imigrantes?

E é por isso que o nosso entendimento é exatamente o oposto: é o humanismo, é o respeito, é a dignidade

dos homens e das mulheres que aqui vivem, aqui trabalham, aqui pagam os seus impostos, aqui descontam

para a segurança social, aqui têm e criam os seus filhos! Estes homens e estas mulheres merecem respeito,

por isso a nossa resposta vai exatamente em dois sentidos.

Em primeiro lugar, vai no sentido de «desfazer» a regra geral do efeito devolutivo das decisões. E é por

isso que propomos que se consagre o efeito suspensivo, nomeadamente em situações de expulsão! Não pode

uma situação desta natureza implicar que não tem retorno quando o imigrante dela recorre! Portanto, o efeito

suspensivo destas decisões, nomeadamente em caso de expulsão, é a melhor oportunidade de assumir que

reforçamos os direitos destas pessoas!

E, fundamentalmente (para nós, esta é a questão principal), não há nenhuma razão para os milhares de

vidas suspensas, sujeitas ainda hoje à irregularidade, à clandestinidade. Não há nenhuma razão para que

estes homens e estas mulheres que trabalham, que fazem os seus descontos, que pagam os seus impostos,

que não têm problemas com a justiça, que não são perseguidos por qualquer crime, que são homens e

mulheres como nós, não possam ver a sua situação regularizada, não possam ver reconhecido o seu direito

pleno a fazer parte deste País.

E menor razão haverá, Sr.as

Deputadas e Srs. Deputados, para que a situação das crianças e dos jovens

aqui nascidos ou que frequentam o nosso sistema de ensino não seja regularizada. Essa é, para nós, uma

prioridade absoluta: enquanto houver uma criança, um jovem sujeito à irregularidade, sujeito à

clandestinidade, este Parlamento deverá ter vergonha, porque a democracia não é completa. Para nós, esta

situação relativamente às crianças e aos jovens é verdadeiramente inaceitável.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Peixoto.

O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs. Deputados: Em

pouco tempo, o Governo pôs em marcha várias medidas legislativas destinadas a modernizar o País e a torná-

lo mais atrativo aos olhos do mundo. Com a Lei da Arbitragem Voluntária, a lei da concorrência, a lei das

insolvências e este novo regime da chamada Lei da Imigração, o País está a acompanhar as novas dinâmicas

e realidades da vida, tornando-se mais competitivo, mais atrativo, mais aberto, mais atuante e mais rápido a

pensar e a agir.

O que até há pouco tempo era visto como uma ameaça à nossa soberania — e falo exatamente do

fenómeno da imigração — e à nossa segurança coletiva, ao nosso mercado de trabalho e à nossa economia,

passa agora a ser visto como uma oportunidade para o desenvolvimento económico do País e para a

captação de capital humano, e já agora financeiro, de valor acrescentado para Portugal.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Mas essa oportunidade, Sr.as

e Srs. Deputados, também é um enorme

desafio ao qual temos que ser — e estou certo que estamos a ser — capazes de responder.

É bom lembrar que, presentemente, há cerca de 440 000 estrangeiros a residir em Portugal, menos 15 000

do que em 2009, ano em que a crise se agravou ou se manifestou com a atual severidade.

Ninguém tem dúvidas de que sem o contributo dos emigrantes a população portuguesa teria decrescido

com algum significado nestes últimos anos. E, caso se mantenham os níveis tradicionais de imigração, prevê-

se que em 2060 haja 50 a 100 milhões de trabalhadores a menos, o que não deixa de ser alarmante. A Europa

está a envelhecer e Portugal não está a rejuvenescer ao ritmo necessário.

O Sr. António Filipe (PCP): — Assim também não rejuvenesce!

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O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Numa palavra, os imigrantes precisam de Portugal e Portugal precisa dos

imigrantes.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Isso «espremido» não dá nada!

O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — O apoio e a facilitação da imigração são, pois, desígnios do presente e

necessidades do futuro. Mas este incentivo à mobilidade de estrangeiros não oriundos da união económica e à

sua fixação no País não é nem pode ser feito a qualquer preço. Ou há regras de conduta, ou há legislação

adequada, ou Portugal pode transformar-se num offshore de imigrantes ilegais ou num paraíso de

branqueamento de capitais, o que naturalmente provoca os malefícios que todos sabem.

E é por isso que se deve saudar, Sr. Ministro da Administração Interna, esta iniciativa do Governo, que

transpõe para a nossa ordem jurídica diretivas comunitárias já há muito produzidas pelo Parlamento Europeu e

pelo Conselho que ainda repousavam na inércia governativa do passado.

Os pontos desta iniciativa que se podem destacar — e depois daquilo que já foi dito pelo Sr. Ministro —

são, em nosso entender, cinco.

Em primeiro lugar, a introdução de regras, ou de novas regras, para o repatriamento de cidadãos de países

terceiros em situação irregular.

O que se pretende, ao contrário daquilo que já aqui foi dito, é que sejam implementadas medidas comuns e

transversais a todos os Estados-membros de afastamento de imigrantes irregulares em condições humanas

dignas e respeitando os seus direitos fundamentais.

Em segundo lugar, é importante salientar a criação de um novo tipo de autorização de residência.

Também é bom lembrar que o atraso na transposição desta diretiva, já pronta desde dezembro de 2008,

causou ao País, até agora, cerca de 5 milhões de euros de prejuízo em multas.

O que se pretende com o «cartão azul» da União Europeia é atrair ou chamar a Portugal mão-de-obra

altamente qualificada nas mais diversas áreas. Benefício este que é extensível, naturalmente, às famílias

desses imigrantes, reagrupando o núcleo familiar, dando-se com esta medida um sinal de que se apoia a

família e a estabilidade de todos os imigrantes.

Em terceiro lugar, deve evidenciar-se a criminalização da contratação de imigrantes ilegais por entidades

empregadoras. Visa-se, com esta medida, proteger os mais necessitados e os mais pobres e penalizar as

entidades empregadoras que exploram e contratam abusivamente imigrantes.

Em quarto lugar, estabelece-se a prisão para falsas uniões ou casamentos de conveniência e o

cancelamento das autorizações de residência para quem adotar este tipo de uniões, de noivados de ocasião.

O Sr. António Filipe (PCP): — Isso é criminalizar a coligação PSD/CDS!

O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — O que para nós é vital, dada a filosofia que encerram as alterações ao

diploma, é a criação do estatuto do imigrante empreendedor e investidor.

Protestos da Deputada do PCP Rita Rato.

Srs. Deputados, o Estado português não tem sido capaz de travar a saída de altos quadros e de altos

talentos do País,…

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Estão a «correr» com eles!

O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — … mas tem de ser capaz de seduzir os imigrantes e os cidadãos de outros

países externos à União Europeia. O que se procura com esta medida é a atração da imigração de qualidade!

O que o Governo procura é facilitar o arranque de projetos de investimento no País.

O que o Governo procura é dar corpo à sua política, assumida, de dinamização da diplomacia económica.

O que se pretende não é criar imigrantes de primeira e imigrantes de segunda.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — É o que está previsto!

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O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Até porque, Srs. Deputados do BE e do PCP, os projetos de lei que os

senhores aqui propõem é que fazem exatamente isso, pois tratam de forma diferente os mesmos imigrantes:

alguns que já cá estão, que entraram no País de forma irregular e que aqui permanecem de forma irregular, só

porque têm emprego…

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Só porque têm emprego?! Que vergonha!

O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — … e se portaram bem já têm direito a ser legalizados, ou seja, passam de

uma situação ilegal para uma situação legal. Mas aqueles que lutam por serem exigentes, por cumprirem

todas as regras estatuídas pelo País, esses já não têm essa deferência quer do Bloco quer do Partido

Comunista.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Partido Comunista Português!

O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Partido Comunista Português.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, o que importa

verdadeiramente, porque nem sempre se acerta, é fazer algo para melhorar a situação atual. O que é grave

não é não acertar, o que é grave é não tentar, e o Governo não pode ser acusado disso.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Faça favor de concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Vou já terminar, Sr.ª Presidente.

Com este conjunto de regras que quer introduzir, o Governo tenta três coisas muito focadas: em primeiro

lugar, contribuir para o equilíbrio da demografia no País; em segundo lugar, estimular o desenvolvimento

económico do País; e, em terceiro lugar, apoiar e incentivar a imigração.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Catarina

Mendonça.

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, Srs. Membros do

Governo: Sr. Ministro da Administração Interna, creio que, antes de começarmos a analisar a proposta de lei,

vale a pena corrigir o que já foi dito nesta Câmara.

A «diretiva retorno», no seu artigo 4.º, n.º 3, é muito explícita: «A presente diretiva não prejudica o direito

dos Estados-membros de adotarem ou manterem disposições mais favoráveis relativamente às pessoas

abrangidas pelo seu âmbito de aplicação, (…)».

Sr. Ministro, começo por aqui, pois parece-me um ponto essencial da mudança de filosofia desta lei, se

assim quiser.

O meu colega Deputado Ricardo Rodrigues já aqui evidenciou o que nos parece ser uma má transposição

da diretiva, desde logo o que consta no artigo 134.º da proposta de lei e os fundamentos para o afastamento

coercivo, que nos parece mais discricionário e menos favorável ao imigrante irregular — e já lá iremos.

Mas queria confrontá-lo com o preceito que citei e com as suas declarações, proferidas há meia dúzia de

meses, no sentido de que não havia necessidade de alterar a Lei da Imigração por considerar que era uma

boa lei.

De resto, no passado, o PSD assim o disse no Plenário, aquando da discussão que ocorreu em 2007, a

qual envolveu imensas associações de imigrantes, todos os partidos e esta Assembleia da República. Por

isso, causa-me espanto e surpresa que a proposta de lei que o Sr. Ministro aqui apresenta hoje não tenha tido

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os mesmos procedimentos e não tenha sido debatida previamente com as associações. Contudo, creio que,

em sede de especialidade, ainda estaremos em altura própria para ouvir um conjunto de associações e de

entidades que merecem ser ouvidas.

Sr. Ministro, Sr.as

e Srs. Deputados, para o Partido Socialista a imigração foi sempre encarada como um

fator de coesão social, tendo optado por construir políticas de integração, de inclusão e de humanidade para

os cidadãos que aqui procuram novas oportunidades; de respeito pelos direitos dos imigrantes; de igualdade

de oportunidades; de promoção da integração dos imigrantes e do diálogo intercultural.

Foi assim com o programa Escolhas, que já vai na quarta geração; foi assim com a humanista e

responsável Lei da Imigração; foi assim com a mais inclusiva Lei da Nacionalidade; foi assim com os planos

para a integração de imigrantes, que nesta lei (quero também sublinhar isso) são continuados; foi assim com a

criação dos centros locais de apoio aos imigrantes; foi assim com o apoio às associações de imigrantes e com

o reagrupamento familiar.

Por isso, Sr.ª Deputada Cecília Honório, não podemos acompanhar, como no passado não

acompanhámos, o diploma que VV. Ex.as

aqui apresentam, porque fica aquém da filosofia da Lei n.º 23/2007 e

é um diploma avulso que não resolve o problema do reagrupamento familiar, que, desse ponto de vista, em

alguns dos artigos — são precisos alguns retoques —, esta Lei também melhora.

Mas a visão tem sido, pelo que acabei de referir, consistente, humanista, integradora e responsável.

Sr.as

e Srs. Deputados, por tudo isto, não é demais relembrar aqui que Portugal tem sido encarado não só

pelas Nações Unidas mas também pelo MIPEX o melhor País nas práticas de integração de imigrantes —

integração na educação, integração no acesso aos cuidados de saúde, integração na sociedade portuguesa,

integração em todos os espaços e na sua participação cívica.

Vozes do PS: — Muito bem!

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — Mas, para este sucesso, Srs. Deputados, não concorreu a nossa

origem de País emigrante, a concorrer agora para País acolhedor e imigrante; concorreu, sim, a prioridade

política e as opções políticas que fizemos.

Aplausos do PS.

Foi, claramente, essa a diferença que fez com que os governos do Partido Socialista tivessem sempre

primado por essa mesma opção de inclusão e de integração.

Por isso, Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, Sr.as

e Srs. Deputados, pedindo a vossa total disponibilidade para,

em sede de especialidade, podermos melhorar esta lei, queria aqui deixar uma preocupação, que já foi

também evidenciada pelo Deputado Ricardo Rodrigues. É que há uma coisa que não é possível, Sr. Ministro:

reconhecendo a necessidade de transpor as diretivas comunitárias, não vale a pena pulverizar esta lei com o

que há de mau nessas diretivas. Por isso mesmo, aumentar o tempo de detenção dos imigrantes irregulares

de três para quatro meses, mesmo que fosse mais um dia, Sr. Ministro, é um erro.

Queria aqui dizer-lhe que o Conselho da Europa aprovou um relatório, em janeiro de 2010, da minha

autoria, em que propunha medidas alternativas aos centros de detenção.

Creio que esta é a oportunidade que o Governo e o Parlamento têm para, em vez de considerar um

imigrante ilegal como um criminoso — o que, felizmente, Portugal não tem feito, porque os seus centros de

detenção temporária são centros totalmente diferentes do resto da Europa —, encarar a possibilidade de

novas formas de manter esses imigrantes ilegais sem ter que ser a detenção.

Não estamos a falar de pessoas criminosas, estamos a falar de pessoas que procuram uma nova

oportunidade aqui, no nosso País.

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Muito bem!

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — Por tudo isto, Sr.as

e Srs. Deputados, as diretivas que este

diploma visa transpor são diretivas eivadas de uma deriva securitária que se vive hoje na Europa.

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Vozes do PS: — Muito bem!

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — Do discurso do Sr. Ministro não ficou este registo, mas em alguns

dos artigos desta lei pode ficar, se não forem aceites as propostas que o Partido Socialista se empenhará para

apresentar em sede de especialidade e contribuir para que continuemos a manter o ranking internacional que

sempre mantivemos em política de imigração.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Magalhães para uma

intervenção.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado: Ainda bem

que intervenho depois da intervenção da Sr.ª Deputada Ana Catarina Mendes, que, na verdade, vem colocar

algum equilíbrio em relação às intervenções que a antecederam, as quais, em algumas partes, roçaram o

surrealismo, para não dizer mesmo algo pior.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Surrealismo?!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Na verdade, Sr.ª Deputada Ana Catarina Mendonça — e começo por

me referir à sua intervenção —, tem toda a razão quando diz que (e espero estar a citá-la de forma correta) um

imigrante ilegal não é um criminoso. Não poderíamos estar mais de acordo com isso, nem esta lei vai nesse

sentido.

Porém, a Sr.a Deputada concordará que há muitos criminosos que ganham com a imigração ilegal e é

justamente para isso que esta lei serve, ou seja, para punir, de forma severa, aqueles criminosos que ganham

com os imigrantes ilegais, com a imigração ilegal e com a sua exploração, que atinge as formas mais

bárbaras, mais violentas do século XXI. Nisso esta lei é equilibrada, moderada, europeia, transpõe diretivas.

Esta lei não merece da parte do CDS qualquer regozijo especial, se bem que, não podemos deixar de notar

— e isso foi muito bem salientado pelo Deputado Telmo Correia —, em 2002, uma vasta maioria de grupos

parlamentares aqui presentes considerou as nossas propostas quase para além daquilo que seria admissível

e, hoje, vota favoravelmente. É uma evolução! É natural! Ainda bem que assim acontece! E não queria

especial louros em relação a esta matéria.

Por isso, Sr.a Deputada Ana Catarina Mendes, queria dizer-lhe que, obviamente, estamos disponíveis para,

em sede de especialidade, fazer as alterações necessárias no sentido daquilo que tem sido possível ser feito e

queremos que se mantenha, que é um consenso com o Partido Socialista em torno destas matérias. Creio

mesmo que algumas das dúvidas que aqui nos pôs não correspondem quer à intenção do Governo quer até —

bem sei que é uma boa jurista, mas permita-me dizê-lo — à letra e ao espírito da lei. Por conseguinte, teremos

espaço para, na especialidade, podermos tirar estas dúvidas.

No entanto, Sr. Ministro, Sr.as

e Srs. Deputados, também não posso deixar de comentar algumas

intervenções que foram feitas, uma mais surpreendente do que a outra.

Ora, a mais surpreendente foi a do Sr. Deputado António Filipe, alguém a quem me habituei a respeitar e

que, reconheço, percebe destas matérias.

O Sr. Deputado António Filipe disse «Bom, aqui d’el-rei! Está aqui a equipa do Ministério da Administração

Interna para discutir uma matéria destas…». O Sr. Deputado bem sabe que não se trata da lei de imigração;

trata-se, sim — e vou citar —, do «regime jurídico de entrada, permanência, saída e afastamento de

estrangeiros do território nacional».

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — E o que é isso?!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Como é evidente, nem o mais reacionário defenderia que se esgota

nesta lei toda a política de imigração de um governo!

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Vozes do CDS-PP: — Exatamente!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Esta é apenas uma lei que gere os fluxos migratórios, Sr. Deputado.

Com essa sua afirmação, vinda de si, que, para mais, é justamente um Deputado da 1.ª Comissão,…

Vozes do CDS-PP: — Exatamente! Pois é!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — … de alguma forma, eu poderia ser tentado a dizer que o Partido

Comunista Português revelou aqui uma política securitária, ao escolher o Sr. Deputado António Filipe para

intervir neste debate.

Vozes do CDS-PP: — Exatamente!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Não o faço, com certeza, porque, como é evidente, sei que o Sr.

Deputado sabe que esta é uma lei específica, da competência do Ministério da Administração Interna há mais

de uma década e que, naturalmente, tem um responsável, que é o Ministro da Administração Interna, a pessoa

que aqui está presente.

A outra intervenção, menos surpreendente, da Sr.a Deputada Cecília Honório, fala de uma paranoia.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Do CDS!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr.a Deputada, não sei muito bem o que lhe diga, porque considero

que a Sr.a Deputada é que revela uma enorme paranoia para com a Sr.ª Merkel e o Sr. Sarkozy. Mas isso é

consigo, devo dizê-lo.

Mas, Sr.ª Deputada, a paranoia não justifica a ignorância. Provavelmente, vou surpreendê-la,…

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Isso é difícil!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — … mas, sem querer ser ofensivo, direi que muitas destas diretivas e

destas leis, quer a do Partido Socialista, em 2007, quer a de agora, foram aprovadas no Bundestag,

nomeadamente, pelo Sr. Deputado do Bundestag Cohn-Bendit. Portanto, está a ver!

Protestos da Deputada do BE Cecília Honório.

Esteja descansada, não é uma coisa assim tão radical, à direita, como possa imaginar!

A Sr.a Deputada também disse coisas extraordinárias como esta: a ideia de um cartão que facilita o

investimento e a captação desse investimento é uma ideia que vai facilitar a lavagem de dinheiro. Sr.a

Deputada, há a Europol, como sabe, há o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, como sabe, há troca de

informações, como sabe — estamos na parte criminosa e na parte securitária, que a Sr.a Deputada não gosta!

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — A Sr.a Deputada, no fundo, veio aqui fazer uma crítica contraditória:

por um lado, diz que esta é uma lei que fecha as fronteiras e, por outro, diz que, afinal, abre certas fronteiras

para certos criminosos. Sr.a Deputada, entenda-se: esta lei é securitária ou é laxista. Pelos vistos, por um lado,

é uma lei laxista, para aquilo que interessa, e, por outro, é uma lei de portas abertas.

Protestos da Deputada do BE Cecília Honório.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Queira concluir, Sr. Deputado.

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O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Termino, Sr.ª Presidente, dizendo que esta é uma lei equilibrada, é

uma lei que toca em pontos essenciais, como a restrição do reagrupamento familiar nos casos de violência

doméstica — que podia ter sido aqui falado, mas não foi, o que estranho, nomeadamente, por parte do Bloco

de Esquerda! —, ou a clarificação no âmbito do apoio judiciário às vítimas de tráfico de pessoas ou de ação de

auxílio à imigração ilegal, que, pelos visto, também não interessa. No fundo, o que interessa é colocar rótulos.

Por isso, hoje percebemos que há grupos parlamentares com algumas divergências mas que pretendem

uma política de imigração realista, europeia, e há outros que, pelos vistos, só se preocupam em ter um

discurso político com as entradas dos imigrantes, porque uma vez cá não cuidam de perceber se temos ou

não capacidade de acolhimento, isso não lhes interessa, porque o discurso está feito, o «número» está feito,

as boas vontades estão ditas.

Isso vai enganando alguns, não enganará, certamente, nem a União Europeia nem este Parlamento.

Aplausos do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Ainda para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António

Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr.ª Presidente, intervimos tendo em conta algumas afirmações que foram

aqui feitas.

Relativamente à presença da equipa do Ministério da Administração Interna, temos muito gosto em discutir

seja o que for com essa equipa, mas acontece que esta proposta de lei é subscrita, em primeiro lugar, pelo Sr.

Ministro Adjunto e a área da imigração está sob a sua tutela, existindo um Sr. Secretário de Estado para a

imigração.

Portanto, não é por acaso, seguramente, que é o Ministério da Administração Interna que vem aqui fazer

esta discussão. Seguramente, não tiraram à sorte e, portanto, o Governo é que sabe do que vem cá falar. E,

obviamente, vem cá falar, do seu ponto de vista, de um problema de segurança interna. Nós achamos que não

é fundamentalmente esse o problema.

Protestos dos Deputados do PSD Hugo Velosa e do CDS-PP Nuno Magalhães.

Disse o Sr. Deputado Carlos Peixoto que nós defendemos que deve ser regularizada a situação de

pessoas que entraram em Portugal não respeitando as regras. É verdade, Sr. Deputado. Nós entendemos que

é infame que cidadãos — e é um facto que não entraram em Portugal regularmente — que entraram, em

Portugal, antes da legislação aprovada em 2007, ou seja, cidadãos que estão cá há mais de 5 anos, que estão

cá a trabalhar, não criaram problema algum, não praticaram crimes, têm cá, em alguns casos, as suas

próprias famílias, sejam expulsos administrativamente…

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. António Filipe (PCP): — … e que, ainda por cima, os recursos que eles possam apresentar dessa

decisão não tenham efeito suspensivo.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. António Filipe (PCP): — Achamos que isso é infame! Essa não é uma forma de Portugal, enquanto

País de emigração, se dignificar, nem se dignificar aos olhos do mundo.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. António Filipe (PCP): — Diz o Sr. Deputado que esta proposta de lei é um incentivo à mobilidade

dos trabalhadores, que temos um problema demográfico e que a imigração ajudará a resolver esse problema

demográfico? Sr. Deputado, isso é verdade, mas não é com esta lei, nem sequer com a lei que está em vigor,

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muito menos com a proposta de lei! Porque, então, nesse caso, seria só a possibilidade de entrada de

empresários que iria resolver o nosso problema demográfico, quando se fecha a porta aos trabalhadores?

Quando o que se diz é que há umas quotas, que são aprovadas anualmente por resolução do Conselho de

Ministros, que fixam o montante global de trabalhadores que podem entrar e que isso depende da existência

de oportunidades de emprego não preenchidas por nacionais portugueses, por nacionais de Estados-membros

da União Europeia ou do espaço económico europeu?!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Está mesmo a ver-se!

O Sr. António Filipe (PCP): — Bom, quais são? Gostava de saber se o Governo definiu contingentes

destes, numa situação como aquela em que o País está, em que ninguém encontra emprego em Portugal,

nem nacionais nem estrangeiros, Sr. Deputado!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. António Filipe (PCP): — Com esta política de quotas de portas fechadas, gostaria de saber como se

resolve o problema demográfico e como se pode considerar que estamos perante uma iniciativa de incentivo à

mobilidade.

Sr. Deputado, falemos de coisas sérias!

Esta proposta de lei aponta irrealisticamente para uma política de portas fechadas, que, de facto, não nos

dignifica, não resolve problema nenhum! Portugal, neste momento, por razões que todos sabemos, não é um

País atrativo para a imigração, como é evidente. Neste momento, o nosso problema é que voltámos aos níveis

de emigração dos anos 60, porque, infelizmente, os jovens não encontram trabalho em Portugal, nem os mais

qualificados! É, aliás, extraordinário como é que esta proposta de lei vem aqui falar em incentivos para a vinda

de trabalhadores qualificados para Portugal, quando os jovens qualificados em Portugal têm de emigrar para o

estrangeiro!!

Vozes do PCP: — Exatamente!

O Sr. António Filipe (PCP): — Estamos a falar de quê, Srs. Deputados?!

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. António Filipe (PCP): — Vou terminar, Sr.ª Presidente.

Não estamos a falar de coisas sérias. O problema é que há, em Portugal, pessoas que trabalham, que têm

cá as suas famílias, que não se conseguem legalizar e que estão sujeitas à expulsão, estão sujeitas à sobre-

exploração da fragilidade da sua situação de ilegalidade. Esse problema, que é real, os senhores não o

querem resolver com esta proposta de lei!

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna para uma

intervenção.

O Sr. Ministro da Administração Interna: — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Uso da palavra para deixar

duas ou três notas no final deste debate, no sentido de repor alguma verdade em relação a algumas

acusações e afirmações que aqui foram produzidas.

Vou começar por me referir ao Sr. Deputado António Filipe. É que, Sr. Deputado, todas as proposta de lei

que dão entrada na Assembleia da República são assinadas pelo Ministro Adjunto e dos Assuntos

Parlamentares. Portanto, esse não pode ser o critério de distribuição das competências dentro do Governo.

Mas, para sossegar o Sr. Deputado António Filipe, sempre lhe direi que, evidentemente, o Sr. Secretário de

Estado Adjunto do Ministro Adjunto colaborou na elaboração desta lei. Este é um primeiro ponto.

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Segundo ponto, Sr. Deputado António Filipe: V. Ex.ª, que fez aqui grandes afirmações contra a imigração

ilegal, que acompanho, não teve, no entanto, uma palavra para o facto de, nesta proposta de lei, ao contrário

daquilo que acontece na lei atual, criminalizarmos a prática reiterada de contratação de imigrantes ilegais.

Portanto, o Sr. Deputado não pode retirar de uma proposta como esta o sentido exatamente contrário daquilo

que nos está acusar!

Protestos do Deputado do PCP António Filipe.

Já agora, Sr. Deputado António Filipe, também não quero deixar ficar sem resposta algumas das

acusações que a Sr.ª Deputada Cecília Honório aqui nos fez.

A Sr.ª Deputada falou de vários artigos — do artigo 64.º, do artigo 180.º, do artigo 122.º… Sr.ª Deputada,

aconselho que, em sede de especialidade, leia com cuidado a nossa proposta!

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Li!

O Sr. Ministro da Administração Interna: — Vou só dar-lhe um exemplo. Um só exemplo basta: artigo

64.º, relativo ao reagrupamento familiar. Disse aqui a Sr.ª Deputada «ó demónios da direita, os senhores estão

a dificultar o reagrupamento familiar!» Sabe o que diz o nosso artigo 64.º, Sr.ª Deputada? Hoje, para haver

reagrupamento familiar há um processo e tem de haver um deferimento do mesmo para que o reagrupamento

familiar se efetive. O que dizemos na nossa proposta, Sr.ª Deputada, é que não é preciso deferimento, basta o

parecer favorável do SEF.

A proposta diz rigorosamente isto (só para vermos do que estamos a falar e a demagogia total que há

sobre isto): sempre que for emitido pelo SEF um parecer favorável de reagrupamento familiar «(…) nos termos

da presente lei, deve ser facilitado aos requerentes (…)». Veja bem, Sr.ª Deputada! Como é que a senhora

retira disto um sentido completamente oposto, contrário àquilo que estamos a propor nesta Assembleia da

República?

Portanto, Sr.ª Deputada, menos demagogia, mais racionalidade, menos paixão, mais controlo para discutir

este tipo de matérias!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Queira concluir, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro da Administração Interna: — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, termino referindo um

número que, de resto, nem sequer é da responsabilidade deste Governo. É bom não esquecer que, ao abrigo

dos processos de regularização, designadamente do último, foram regularizadas as situações de 64 000

cidadãos que estavam ilegalmente em Portugal.

Eu tive oportunidade de dizer nesta Câmara que, só no último ano, foram regularizadas as situações de

mais de 6000 cidadãos que estavam ilegalmente em Portugal, ao abrigo do artigo 88.º, n.º 2.

Portanto, não se veja nenhuma tendência securitária numa lei que continua a ser uma lei humanista, que

honra o País e que dignifica a condição de imigrante. E é assim que queremos continuar!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Luís Fazenda (BE): -—Na especialidade, vamos desmentir isso tudo!

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr.as

Deputadas e Srs. Deputados, não havendo mais inscrições,

fica, assim, concluído o último ponto da nossa ordem de trabalhos de hoje.

A Mesa aproveita para se despedir do Sr. Ministro da Administração Interna, dos Srs. Secretários de

Estado e da Sr.ª Secretária de Estado.

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I SÉRIE — NÚMERO 95

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A próxima sessão plenária realizar-se-á amanhã, pelas 10 horas, e terá como ordem do dia o debate

quinzenal com o Primeiro-Ministro, ao abrigo da alínea b) do n.º 2 do artigo 224.º do Regimento, após o qual

haverá votações regimentais.

Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 24 minutos.

Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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