I SÉRIE — NÚMERO 100
6
a escola pública, o Serviço Nacional de Saúde — eis a herança de Abril que hoje corre o risco de ser
desmontada peça por peça.
É por isso que o nome das coisas é tão importante. A direita bem o sabe, que alimenta este sentimento
sanguinário de vingança contra o Estado social.
Protestos do PSD.
É por ele que hoje somos chamados a resistir e a reivindicar as cores da primeira revolução moderna da
Europa, a francesa. Recordemos: o azul da igualdade, contra a chantagem do desmantelamento dos serviços
públicos; o branco da liberdade, que enfrenta o autoritarismo social e violento do castelo contra as choupanas,
dos privilégios contra o trabalho; o vermelho da fraternidade e da solidariedade, em nome de um contrato
social entre gerações.
Senhoras e Senhores, 38 anos depois de Abril ter libertado o povo da ditadura, impõe-se refazer o contrato
social que dá corpo à Constituição, agora espezinhada, e defender o País do protetorado que nos oprime.
Os sucessivos governos têm-se rebaixado à direção autocrática do diretório franco-alemão e, à revelia
daquilo que é o verdadeiro espírito europeu, Portugal torna-se um «colonato» do governo alemão.
Testemunha-o o Tratado Orçamental Europeu, aprovado à pressa por subservientes discípulos da
austeridade, para se anteciparem, aliás, às eleições francesas, e que condena o País à impossibilidade de
responder à recessão profundíssima em que estamos a morrer. Recusaram o referendo, não querem ouvir a
voz popular.
E essa desistência é uma ofensa. O regime que abdica da responsabilidade é, em si mesmo, uma crise. A
herança europeia da Revolução Francesa, do sufrágio universal, dos movimentos de trabalhadores, das
modernas constituições ou da última revolução europeia do século XX, que foi a nossa, está a saque, nas
mãos da especulação financeira e da batuta autocrática da Sr.ª Merkel.
Não podemos ignorar, não pactuamos com a fatalidade, só a voz do povo português pode falar mais alto e
acabar com esta rota de destruição.
Nessa manhã fundadora, a palavra era a esperança. 38 anos depois, este é um país que querem condenar
à fatalidade de um passado que se repetirá, até à eternidade, num presente sem futuro. Resistamos, pois, pela
esperança, por todos, em nome da herança tricolor de todas as solidariedades que ajudaram a fazer a
democracia e mais Europa para a Europa.
Se precisamos de um novo 25 de Abril? A nossa resposta é sim, precisamos. É certo que não vivemos
numa ditadura nem carecemos que os militares se façam à rua. Mas a democracia está doente. É hoje uma
democracia oligárquica, que garante poderes e privilégios a uma minoria, que é fraca com os fortes e cruel
com os fracos, de costas voltadas para a sociedade, indiferente à indiferença, castigadora do sofrimento. É um
regime que vive do canto de sereia da fatalidade e do conformismo, onde não há nada a fazer, mas onde se
instala o discurso populista antipolítico tão amigo, afinal, das mais perigosas tentações autoritárias.
Resistamos, pois, pela esperança, pelo futuro, pelo 25 de Abril e porque o povo é «quem mais ordena!».
Aplausos do BE, de Os Verdes e de Deputados do PS.
A Sr.ª Presidente da Assembleia da República: — Pelo Grupo Parlamentar do Partido Comunista
Português, tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Lopes.
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr. Presidente da República, Sr.ª Presidente da Assembleia da
República, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Presidentes do Supremo Tribunal de Justiça e do Tribunal
Constitucional, Sr.as
e Srs. Convidados, Sr.as
e Srs. Deputados:
Uma crise profunda brutaliza a pátria portuguesa, uma crise encaixada, embebida na crise do capitalismo,
uma crise que revelou todas as fragilidades, todos os défices estruturais, todos os estrangulamentos do País.
Um processo cumulativo, que agora implodiu e explodiu, detonado pela crise do capitalismo.
Bateu-nos à porta e não pediu licença para entrar. Estava cá dentro, em gestação. Não aconteceu por
acaso. É o resultado de opções políticas. Tem responsáveis: o PS, o PSD e o CDS.