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Sexta-feira, 15 de junho de 2012 I Série — Número 120
XII LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2011-2012)
REUNIÃOPLENÁRIADE14DEJUNHODE 2012
Presidente: Ex.ma Sr.ª Maria da Assunção Andrade Esteves
Secretários: Ex.mos
Srs. Paulo Jorge Frazão Batista dos Santos Rosa Maria da Silva Bastos de Horta Albernaz
S U M Á R I O
A Sr.ª Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas
e 9 minutos. Deu-se conta da entrada na Mesa das propostas de lei
n.os
71 e 72/XII (1.ª), dos projetos de lei n.os
250, 252 e 253/XII (1.ª), da apreciação parlamentar n.º 19/XII (1.ª) e dos projetos de resolução n.
os 360 a 363 e 365 a 367/XII (1.ª)
Em declaração política, o Sr. Deputado José Junqueiro (PS) insurgiu-se contra a política levada a cabo pelo Governo em várias áreas e respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Luís Menezes (PSD), João Oliveira (PCP), Luís Fazenda (BE) e Hélder Amaral (CDS-PP).
Em declaração política, a Sr.ª Deputada Isabel Galriça Neto (CDS-PP) defendeu a plena integração dos cuidados paliativos no Serviço Nacional de Saúde a nível dos hospitais e do serviço domiciliário, tendo depois respondido a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados João Semedo (BE) e Manuel Pizarro (PS).
Em declaração política, o Sr. Deputado Agostinho Lopes (PCP) acusou o PSD e o CDS-PP de estarem a destruir o sector da agricultura, após o que respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Pedro Lynce (PSD),
Miguel Freitas (PS), Abel Baptista (CDS-PP) e Pedro Filipe Soares (BE).
Em declaração política, a Sr.ª Deputada Catarina Martins (BE) teceu críticas ao Governo pela política de desinvestimento na cultura e respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Miguel Tiago (PCP), Inês de Medeiros (PS) e Maria Conceição Pereira (PSD), tendo este último originado o uso da palavra da Sr.ª Deputada Gabriela Canavilhas (PS) sob a forma de interpelação à Mesa.
Em declaração política, o Sr. Deputado Carlos Abreu Amorim (PSD) congratulou-se com o memorando de acordo que o Governo assinou com a Associação Nacional de Municípios Portugueses, tendo depois respondido a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Mota Andrade (PS), Bernardino Soares (PCP) e Altino Bessa (CDS-PP).
Foram apreciados, conjuntamente, os projetos de resolução n.
os 318/XII (1.ª) — Recomenda ao Governo a
adoção de medidas para baixar a fatura da eletricidade e do gás e aumentar a competitividade da economia (PS), 343/XII (1.ª) — Uma estratégia para a promoção de combustíveis alternativos na mobilidade rodoviária (PCP) e 347/XII (1.ª) —
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Recomenda a adoção de mecanismos de transparência relativos aos custos da energia e às medidas de eliminação das rendas excessivas (BE), sobre os quais intervieram os Srs. Deputados Carlos Zorrinho (PS), Agostinho Lopes (PCP), Catarina Martins (BE), Hélder Amaral (CDS-PP), José Luís Ferreira (Os Verdes) e Pedro Saraiva (PSD).
Procedeu-se à discussão, na generalidade, do projeto de lei n.º 227/XII (1.ª) — Estabelece um novo regime de atribuição de bolsas de estudo a estudantes do ensino superior (BE) em conjunto com os projetos de resolução n.
os
313/XIII (1.ª) — Recomenda ao Governo que regulamente os fundos de emergência dos serviços de ação social das instituições de ensino superior (BE), 314/XIII (1.ª) — Recomenda ao Governo que promova medidas de emergência nos apoios concedidos aos estudantes no ensino superior (BE) e 342/XII (1.ª) — Elaboração de um relatório anual sobre abandono escolar e empréstimos bancários no ensino superior (PCP). Proferiram intervenções os Srs. Deputados Ana Drago (BE), Rita Rato (PCP), Inês Teotónio Pereira (CDS-PP), Pedro Delgado Alves (PS) e Duarte Filipe Marques (PSD).
A Câmara apreciou, na generalidade, o projeto de lei n.º 253/XII (1.ª) — Canal Parlamento através da televisão digital terrestre (PSD, PS, CDS-PP, PCP, BE e Os Verdes) em conjunto com o projeto de resolução n.º 365/XII (1.ª) — Canal Parlamento através da televisão digital terrestre (PSD,
PS, CDS-PP, PCP, BE e Os Verdes). Intervieram os Srs. Deputados Nuno Encarnação (PSD), Inês de Medeiros (PS), Raúl de Almeida (CDS-PP), Bruno Dias (PCP), Catarina Martins (BE), José Luís Ferreira (Os Verdes).
Foram ainda discutidos em conjunto os projetos de resolução n.
os 303/XII (1.ª) — Recomenda ao Governo a
inclusão na televisão digital terrestre de todos os canais de serviço público de rádio e de televisão de âmbito nacional previstos na lei e nos contratos de concessão, assim como a salvaguarda do princípio da orientação para os custos do serviço de transporte e difusão do sinal digital de televisão por via hertziana terrestre (PS), 344/XII (1.ª) — Recomenda a inclusão na TDT de todos os canais de serviço público de televisão e o alargamento da sua rede de emissão terrestre (PCP) e 348/XII (1.ª) — Recomenda a introdução na televisão digital terrestre de todos os serviços de programas que constituem obrigações do serviço público de rádio e televisão (BE). Intervieram os Srs. Deputados Inês de Medeiros (PS), Bruno Dias (PCP), Catarina Martins (BE), Raúl de Almeida (CDS-PP), Lídia Bulcão (PSD) e José Luís Ferreira (Os Verdes).
Deu-se conta da entrada na Mesa do projeto de deliberação n.º 8/XII (1.ª) e do projeto de resolução n.º 368/XII (1.ª).
A Sr.ª Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 22 minutos.
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A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, está aberta a sessão.
Eram 15 horas e 9 minutos.
Podem ser abertas as galerias.
Antes de iniciarmos a ordem do dia, vou dar a palavra ao Sr. Secretário para proceder à leitura do
expediente.
Faça favor.
O Sr. Secretário (Paulo Batista Santos): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados, deram entrada na
Mesa, e foram admitidas por V. Ex.ª, Sr.ª Presidente, as seguintes iniciativas legislativas: as propostas de lei
n.os
71/XII (1.ª) — Autoriza o Governo a regular o acesso à atividade das instituições de moeda eletrónica e da
prestação de serviços de emissão de moeda eletrónica, no âmbito da transposição da Diretiva 2009/110/CE,
do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de setembro, relativa ao acesso à atividade das instituições de
moeda eletrónica, ao seu exercício e à sua supervisão prudencial, que baixa à 5.ª Comissão, e 72/XII (1.ª) —
Define meios de prevenção e combate ao furto e recetação de metais não preciosos, mas com valor comercial,
e prevê mecanismos adicionais e de reforço no âmbito da fiscalização pelas forças e serviços de segurança da
atividade de gestão de resíduos, que baixa à 1.ª Comissão; os projetos de lei n.os
250/XII (1.ª) — Altera o
Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de novembro, que procede à reforma da tributação do património,
simultaneamente precisando o tempo e o modo de fixação pelo Governo da percentagem de receitas do IMI,
decorrentes da realização da avaliação geral dos prédios urbanos (PCP), que baixa à 5.ª Comissão, 252/XII
(1.ª) — Garante o papel fundamental do Estado na conservação da natureza e da biodiversidade e revoga as
taxas cobradas pelo acesso e visita às áreas protegidas e pelos serviços e atos praticados pelo ICNB (PCP),
que baixa à 11.ª Comissão, e 253/XII (1.ª) — Canal Parlamento através da televisão digital terrestre (PSD, PS,
CDS-PP, PCP, BE e Os Verdes), que baixa à 12.ª Comissão; apreciação parlamentar n.º 19/XII (1.ª) —
Relativa ao Decreto-Lei n.º 106/2012, de 17 de maio, procede à primeira alteração ao Decreto-Lei n.º 8/2011,
de 11 de janeiro, que aprova os valores devidos pelo pagamento de atos das autoridades de saúde e de
serviços prestados por outros profissionais de saúde pública (PCP), que baixa à 9.ª Comissão; e projetos de
resolução n.os
360/XII (1.ª) — Recomenda ao Governo um conjunto de orientações visando a sustentabilidade
económica, social, ambiental e financeira dos sistemas públicos de abastecimento de água e saneamento,
bem como dos respetivos níveis de qualidade, eficiência e atendimento, e promove a reestruturação dos
serviços públicos de abastecimento de água e de saneamento atendendo aos princípios da acessibilidade, da
sustentabilidade, da qualidade e da transparência (PS), que baixa à 11.ª Comissão, 361/XII (1.ª) —
Recomenda ao Governo que promova junto das instituições europeias e em articulação com outros Estados-
membros uma estratégia europeia que permita que a União Europeia enfrente o desafio da escassez de água
e da seca de forma concertada, nomeadamente através de uma diretiva relativa à avaliação e gestão dos
riscos associados à escassez de água e às secas (PS), que baixa à 11.ª Comissão, 362/XII (1.ª) — Rejeição
da proposta de reorganização dos cuidados hospitalares na região Oeste (PCP), que baixa à 9.ª Comissão,
363/XII (1.ª) — Recomenda ao Governo a paragem imediata das obras da barragem de Foz Tua (Os Verdes),
que baixa à 6.ª Comissão, 365/XII (1.ª) — Canal Parlamento através da televisão digital terrestre (PSD, PS,
CDS-PP, PCP, BE e Os Verdes), que baixa à 12.ª Comissão, 366/XII (1.ª) — Anula o concurso público para a
contratação de médicos através de empresas de trabalho temporário (PCP), que baixa à 9.ª Comissão, e
367/XII (1.ª) — Recomenda ao Governo a valorização do pequeno produtor/agricultor (CDS-PP), que baixa à
7.ª Comissão.
Em termos de expediente, é tudo, Sr.ª Presidente.
A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, vamos entrar na ordem do dia de hoje, cujo primeiro ponto consiste
em declarações políticas. Estão já inscritos, pelo PS, o Sr. Deputado José Junqueiro e, pelo CDS-PP, a Sr.ª
Deputada Isabel Galriça Neto.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Junqueiro para uma declaração política.
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O Sr. José Junqueiro (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Há uma deriva no Governo e no
País. Vive-se um clima tenso. A insegurança social sente-se em todos os setores. A confiança e a esperança
abandonam os portugueses e são cada vez mais aqueles que partem à procura de uma nova oportunidade,
que lhes é devida e que o Governo lhes nega. Aconselha-os mesmo a emigrar, diz-lhes que o desemprego
não é um drama mas, sim, uma oportunidade, e lá vai lembrando, pela voz do 13.º ministro, o excedentário,
que os portugueses ganham muito e é urgente baixar-lhes os salários.
Aplausos do PS.
O Governo executa um memorando bem distinto do inicial, que só a ele obriga, porque foi o Governo a sós
que o transformou e assinou, na sombra dos gabinetes, tal como fez com o PEC, a que agora chama de
Documento de Estratégia Orçamental e que coloca em causa a coesão social.
No entanto, para quem estivesse a sucumbir à diabolização que o Governo tem vindo a fazer dos últimos
anos, o Sr. Presidente da República em abril, aqui, colocou um ponto final nesse argumentário depressivo ao
referir que Portugal é hoje um País diferente, de portugueses capazes e de uma década de sucessos.
Falou e deu exemplos, como referia a comunicação social, «as razões do orgulho português, tal como o Sr.
Presidente da República as apresentou (…) são em grande medida as bandeiras do Governo anterior: o salto
que o País deu na ciência, na investigação e desenvolvimento, na cultura, nas artes plásticas, nas indústrias
criativas, na inovação em setores tradicionais, no investimento em infraestruturas e em energias alternativas.»
Posto isto, é necessário avaliar se estamos pior ou melhor. O memorando inicial exigia-nos austeridade,
mas garantia valores essenciais.
O Sr. Mota Andrade (PS): — Muito bem!
O Sr. José Junqueiro (PS): — Garantia, por exemplo, que não haveria redução de salários, nem confisco
dos 13.º e 14.º meses, nem para os trabalhadores nem para os reformados; que não haveria despedimentos
livres, sem justa causa; a segurança social e a escola pública seriam preservadas, bem como o Serviço
Nacional de Saúde;…
O Sr. Mota Andrade (PS): — Bem lembrado!
O Sr. José Junqueiro (PS): — … garantia a não privatização da Caixa Geral dos Depósitos ou da Águas
de Portugal.
Aplausos do PS.
E ao que assistimos? Dificulta-se o acesso ao Serviço Nacional de Saúde, faltam medicamentos nas
farmácias, encerra-se um equipamento público e ao lado abre-se um privado, baixam o preço dos
medicamentos, mas baixam também as comparticipações pagando-se mais em vez de pagar menos, como o
ilusionismo do Governo pretendia fazer crer.
Não é, pois, de admirar que o Observatório Português dos Sistemas de Saúde, conhecido, hoje, detete
sinais de degradação nos cuidados médicos prestados aos portugueses e critique a falta de estudos oficiais
sobre os impactos da política de austeridade.
Dificulta-se o acesso à educação e à ciência, corta-se 60% nas bolsas,…
O Sr. Duarte Filipe Marques (PSD): — Eh!…
O Sr. José Junqueiro (PS): — … nos doutoramentos no estrangeiro, os alunos abandonam as
universidades por cortes dos seus recursos e das famílias,…
Aplausos do PS.
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Protestos do Deputado do PSD Duarte Filipe Marques.
… congelam-se as vagas nos cursos, em muitos anos temos um Governo apostado em diminuir o número
de alunos a frequentarem a escola em todos os níveis de ensino, inventam-se exames dos 4.º e 9.º anos, com
provas deliberadamente difíceis, sujeitando os alunos aos piores resultados dos últimos quatro anos, criando
artificialmente uma taxa de insucesso que aumenta de 19% para 43%.
Não é um vexame para os alunos, para os professores, para as famílias mas, sim, para o Sr. Ministro da
Educação que tem por hábito «dar uma no Crato e outra na ferradura».
Aplausos do PS.
Dificulta-se o acesso à justiça com o encerramento injustificado e intolerável dos tribunais, nomeadamente
no interior, tornando a justiça mais cara, ainda mais morosa e obrigando os cidadãos a novas distâncias, a
novas despesas que não podem pagar, apontando-lhes assim o caminho da desistência.
O Sr. Duarte Filipe Marques (PSD): — Devia ter vergonha do que está a dizer!
O Sr. José Junqueiro (PS): — É um ataque grosseiro aos direitos constitucionais de todos os cidadãos!
Aplausos do PS.
Aliás, parece que o Governo encontrou uma nova obsessão: encerrar serviços, desprotegendo o País,
abandonando e condenando o interior, estimulando a sua desertificação e deixando as pessoas à sua sorte.
Este Governo parece ter encontrado também uma nova política, a do encerramento, em vez do investimento.
Aplausos do PS.
Como se isto não bastasse surge agora a ilusão do resgate na administração local. Os efeitos dessa
medida vão ser suportados pelos munícipes e não resolve o problema. Serão «coimados» com taxas
máximas, tal como as micro, pequenas e médias empresas terão de enfrentar uma derrama num vermelho
intenso. É um constrangimento para as economias locais, tal como já o fora a anulação dos incentivos fiscais e
o é, também, um IVA a 23%.
Enquanto isto, o Governo mergulhou num choque entre a justiça e a administração interna, não se
entendendo nas indefinições que introduziram nas polícias, no seu papel, estatuto e coordenação. O
escândalo das secretas aumentou a perplexidade e provou que foi dizimada a privacidade das pessoas no
meio da maior miséria moral que se traduz na promiscuidade entre negócios privados e servidores do Estado.
Aplausos do PS.
Protestos do Deputado do PSD Duarte Filipe Marques.
Ao mesmo tempo o País confronta-se com novas formas de criminalidade, mais intensa, mais violenta, que
o Governo não consegue controlar.
É preciso mudar. Há outro caminho. Mas não é o tal «bom caminho», o «êxito» da avaliação da troica; não
pode ser desemprego máximo e emprego mínimo, liberalização dos despedimentos e iniquidade nos
rendimentos, cortes nos salários e subsídios e aumento nas gorduras do Estado, austeridade sobre
austeridade, recessão e crise económica sem precedentes, empobrecimento de todos para o enriquecimento
de alguns.
Protestos do Deputado do PSD Duarte Filipe Marques.
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Como afirmou João Cravinho, a austeridade é autodestrutiva, alimenta-se a si própria, numa espiral
incontrolável.
Aplausos do PS.
Não somos só nós a pensar assim. Bagão Félix nota que o «Estado está viciado na austeridade» e que ela
se dirige sempre aos mesmos e nada resolve.
O Sr. Mota Andrade (PS): — Muito bem!
Protestos de Deputados do PSD.
O Sr. José Junqueiro (PS): — Manuela Ferreira Leite denuncia que esta austeridade nada resolve,
intensificará a crise e só um modelo social diferente poderá ser a solução, em plena concordância com o
Secretário-Geral do PS, António José Seguro.
Não faltaram avisos. O Governo tem, pois, a obrigação de se concentrar no futuro, nas soluções, e
abandonar a estigmatização do passado, qual porto de abrigo, onde tem vindo a refugiar a incapacidade das
suas políticas. É tempo de aproveitar e não malbaratar a disponibilidade do PS, das oposições e dos parceiros
sociais para construir políticas de compromisso centradas nas pessoas, no crescimento económico e no
emprego.
Finalmente, o Governo não foi escolhido para se desculpar, mas para governar.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. José Junqueiro (PS): — Não nos pode oferecer passado quando nos prometeu futuro!
Aplausos do PS.
O Governo fez-se eleger com a promessa de que havia um limite para os sacrifícios, mas, afinal, a esta
maioria foi sempre mais fácil dizer mal do que fazer bem.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente: — Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Luís Menezes, do
PSD, João Oliveira, do PCP, Luís Fazenda, do BE, e Hélder Amaral, do CDS-PP. O Sr. Deputado José
Junqueiro informou a Mesa de que pretende responder a grupos de dois pedidos de esclarecimento.
Em primeiro lugar, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Menezes.
O Sr. Luís Menezes (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado José Junqueiro, não sei bem como hei de
qualificar tudo aquilo que lhe ouvimos dizer da tribuna… Não sei… Mas optando por uma postura construtiva,
se calhar, começava por fazer uma análise da primeira parte do seu discurso.
Os senhores, durante seis anos, fizeram tudo bem! Os senhores não se enganaram em nada! Os senhores
fizeram tudo bem! Todas as apostas que fizeram correram bem! Todos os investimentos que fizeram correram
bem, menos um, que foi o de terem deixado o País ir à bancarrota!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O País foi à bancarrota, mas essa parte o senhor esqueceu-se de dizer, porque da tribuna só ouvimos que
no tempo do Partido Socialista foi tudo uma maravilha! Vamos ser realistas: os senhores tentaram fazer o
melhor que podiam; falharam e levaram o País a uma situação insustentável, de modo a termos uma
necessidade premente de pedir ajuda externa. Foi o que aconteceu, e foram os senhores que nos levaram a
esse caminho.
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Protestos da Deputada do PS Isabel Alves Moreira.
Sr. Deputado, quando diz que o Governo deve governar tem toda a razão, deve governar, deve tentar
retificar todas as asneiras que o Partido Socialista fez durante anos, mas o Partido Socialista também devia ter
vergonha dessa amnésia que vos dá a todo o tempo de não assumirem o que fizeram neste País durante os
últimos seis anos.
Aplausos do PSD.
Protestos da Deputada do PS Isabel Alves Moreira.
O Governo tem de governar, pois tem, e o Partido Socialista não pode esquecer-se a todo o momento das
coisas que lhe dá jeito esquecer.
Sr. Deputado José Junqueiro, falou de vários aspetos do Memorando. Pergunto-lhe, então: e a matéria das
freguesias, que o Partido Socialista incluiu no Memorando — aliás, que o Sr. Deputado José Junqueiro incluiu
no Memorando — e que agora os senhores enjeitam e dizem não ser uma medida vossa? Ou a questão da lei
do arrendamento, que ninguém percebe bem porquê mas os senhores, apesar de estar prevista no
Memorando, rejeitam como sendo uma necessidade? Ou a reforma da justiça? Ou outras reformas que este
Governo tem feito?
Sr. Deputado José Junqueiro, podíamos começar a enumerar aqui imensas medidas, mas daquelas que
tocam diretamente aos portugueses, daquelas que significam redução da despesa do Estado, podemos referir,
por exemplo, uma poupança de 300 milhões de euros por ano na indústria farmacêutica. Isto é bom ou é mau?
Foi feito ou não foi? Temos 2000 milhões de euros até 2020 de rendas excessivas no setor da energia, como,
aliás, o Sr. Deputado Carlos Zorrinho, ex-Secretário de Estado da Energia e da Inovação, conhece bem.
Dizem que foi pouco, mas, durante o tempo do vosso Governo, as rendas só aumentaram, nunca diminuíram.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Só aumentaram!
O Sr. Carlos Zorrinho (PS): — Não é verdade!
O Sr. Luís Menezes (PSD): — Sr. Deputado, pergunto-lhe quando está o PS disponível para entrar numa
lógica construtiva e ajudar a retirar o País da situação em que os senhores o deixaram.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Para formular o pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado João
Oliveira, do PCP.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado José Junqueiro, é um facto que a política do
atual Governo está a afundar o País, a arruinar a economia nacional, a arruinar as contas do Estado e,
sobretudo e fundamentalmente, a arruinar as condições de vida dos portugueses, a arruinar as famílias
portuguesas, mas nada disto é surpresa. Quem olhasse para o Programa do Governo, quem olhasse para o
programa com que o Governo se comprometeu já sabia que isto ia acontecer. Mas também já sabia que isto ia
acontecer quem olhasse para o pacto de agressão da troica,…
Vozes do PSD: — Ah!…
O Sr. João Oliveira (PCP): — … que, infelizmente, os senhores e os partidos da direita assinaram e
subscreveram.
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O Sr. Carlos Zorrinho (PS): — Não era obrigatório!
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Deputado José Junqueiro, apesar de, obviamente, concordarmos com a
análise que fez da situação em que o País se encontra, e encontra-se cada vez mais afundado, ouvindo a
intervenção que fez da tribuna só lhe faltava uma bacia de água para que pudesse, no fim, lavar as mãos!…
Aquilo que aconteceu da tribuna foi uma desresponsabilização do Partido Socialista!
O Sr. Luís Menezes (PSD): — Muito bem!
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Deputado José Junqueiro, quero, então, perguntar-lhe o seguinte: o
pacto da troica que os senhores assinaram com os dois partidos da direita previa ou não o aumento das taxas
moderadoras? Previa. Previa ou não a intensificação e a aceleração das privatizações? Previa. Previa ou não
cortes nos subsídios de desemprego e nos apoios aos desempregados e aos portugueses que auferem
prestações sociais? Previa. Previa ou não a liberalização dos despedimentos, introduzindo, ao nível das
empresas, despedimentos individuais mais facilitados? Previa. Previa ou não a redução salarial? Previa.
Então, afinal de contas, de que se espanta o Sr. Deputado José Junqueiro? Esta é, portanto, a primeira
pergunta a que importa dar resposta: com que consciência e com que responsabilidade os senhores
assinaram o pacto da troica?
Sr. Deputado José Junqueiro, queria colocar-lhe ainda outras perguntas muito concretas, e que são
perguntas pela positiva, porque, de facto, o nosso País precisa de outra política. Com a política que está a ser
executada, o País está a afundar-se, a economia está a afundar-se e a vida dos portugueses está a ser
arruinada, por isso precisamos como «de pão para a boca» de uma outra política.
Sr. Deputado José Junqueiro, o País precisa de uma política que não seja de cortes na ação social escolar,
que não seja de cortes na saúde, que não seja de cortes na educação, que não seja de aumento do IVA na
restauração, mas tudo isto estava previsto no Orçamento do Estado em relação ao qual os senhores se
abstiveram. Qual é, afinal de contas, a perspetiva que o Partido Socialista tem relativamente a estas
questões? Qual é a perspetiva e quais são as opções do Partido Socialista em matéria de legislação laboral?
A verdade é que a direita aprovou uma alteração à legislação laboral, uma alteração ao Código do Trabalho,
que manda as relações laborais para o século XVIII, e o Partido Socialista absteve-se. Qual é a perspetiva do
Partido Socialista? Quais são as vossas opções em matéria de política laboral? Porque os senhores votaram
favoravelmente o banco de horas! Votaram favoravelmente o corte das horas extraordinárias! Quais são as
vossas opções?
Quais são as vossas opções em matéria de mapa judiciário? Porque aquilo que a Ministra da Justiça e o
Governo estão hoje a fazer em relação ao mapa judiciário é a aprofundar a lei de 2008 que os senhores
aprovaram.
A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Concluo, Sr.ª Presidente.
Quais são hoje as vossas opções? São diferentes das que tinham em 2008 ou são as mesmas?
Em relação aos cortes nos salários, Sr. Deputado José Junqueiro, foi o Governo do Partido Socialista que
cortou os salários da função pública em 2011.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Bem lembrado!
O Sr. Luís Menezes (PSD): — Que falta de memória!
O Sr. João Oliveira (PCP): — Quais são hoje as vossas posições em relação a isto? É que, Sr. Deputado
José Junqueiro, não é possível alinhar nas causas e depois rejeitar as consequências.
Por isso, era importante que o Partido Socialista assumisse hoje outras opções políticas em relação a estas
questões.
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Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Junqueiro.
O Sr. José Junqueiro (PS): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados Luís Menezes e João Oliveira, começo por
agradecer as questões que me colocaram.
Sr. Deputado Luís Menezes, nós, durante esses seis anos, fizemos o nosso melhor, com coragem, pelo
País,…
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Parece o Sócrates!
O Sr. José Junqueiro (PS): — … e durante esses seis anos, os senhores, que deveriam ter cumprido a
vossa parte, que era honrar os compromissos, por exemplo, na justiça ou na administração local, desonraram
os compromissos, durante esses seis anos, os senhores tiveram cinco presidentes diferentes,…
Vozes do PSD e do CDS-PP: — Oh!…
O Sr. José Junqueiro (PS): — … durante esses seis anos, os senhores não apresentaram nenhuma
proposta construtiva para o País.
Aplausos do PS.
Gostaria também de lhe dizer que não temos vergonha do passado, temos orgulho no passado, e quem
nos vem dar razão ao fim de todo este tempo é o Sr. Presidente da República, que, se tivesse de fazer um
discurso relativamente à governação desta maioria, nunca poderia dizer o mesmo que disse sobre a
governação do Partido Socialista.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. José Junqueiro (PS): — Disse o Sr. Presidente da República que as razões do orgulho português
são em grande medida as bandeiras do Governo anterior: o salto que o País deu na ciência, na investigação e
desenvolvimento, na cultura, nas artes plásticas, nas indústrias criativas, na inovação em setores tradicionais,
no investimento em infraestruturas e em energias alternativas.
Aplausos do PS.
O Sr. Deputado quer dizer que esta década de sucesso é uma década perdida,…
O Sr. Luís Menezes (PSD): — De sucesso?! Tenha vergonha!
O Sr. José Junqueiro (PS): — … ou quer dizer que o Sr. Presidente da República analisou mal esta
situação?
Sr. Deputado João Oliveira, ouço sempre o PCP com grande atenção — sempre! —, e ao ouvir o PCP
procuro nas propostas apresentadas aqui, no Hemiciclo, alguma em que o PCP tenha sido parte da solução e
não parte do problema.
O Sr. João Oliveira (PCP): — O enriquecimento ilícito!
O Sr. José Junqueiro (PS): — O PCP, se sabe que hoje em dia temos uma maioria de direita, se sabe que
os trabalhadores estão a ser limitados nos seus direitos, se sabe que há problemas de constrangimento na
saúde, se sabe que há problemas de constrangimento na educação, sabe que deu a mão à direita, que votou
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contra o Governo do Partido Socialista e que aqui, neste Hemiciclo, a votação do PCP foi sempre uma votação
com a direita.
Aplausos do PS.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Não, não! Os senhores é que aprovaram o PEC!
O Sr. José Junqueiro (PS): — Nós sabemos muito bem os compromissos a que chegámos, mas também
lamento que o Sr. Deputado e o seu partido não tenham feito parte desses compromissos, que tenham
claudicado, que não tenham tido coragem para dialogar com a troica.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Ao contrário! Os senhores é que se renderam à troica!
O Sr. José Junqueiro (PS): — Não quiseram defender nem o País nem os portugueses, quiseram apenas
uma política de bota-abaixo, que é algo que não vos ilustra, que não vos ilumina, que não vos prestigia. O
PCP é um partido dos problemas, não é um partido das soluções.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Os senhores são uns troca-tintas!
O Sr. José Junqueiro (PS): — Nesta Câmara, aquilo a que estaremos reservados até ao final da
Legislatura será a ver o PCP a atacar sempre o PS e a dar a mão à direita!
Aplausos do PS.
O Sr. António Filipe (PCP): — Os senhores é que votam tudo com a direita!
A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado José Junqueiro, a declaração política que fez
deixa algumas dúvidas, em primeiro lugar sobre a sua intenção. Ou a intenção era fazer uma espécie de
elogio fúnebre do anterior Governo, o que é necessariamente um discurso didático para o interior do Partido
Socialista mas pouco interessante para o País e para o futuro, ou, então, era fazer uma tentativa de
demarcação, ao que parece pouco conseguida, em relação às políticas da maioria, que têm a mesma matriz,
que é a do Memorando assinado com a troica. Portanto, essa demarcação ficou aqui demasiadamente ténue
para que o Partido Socialista possa alcandorar-se a uma determinada posição na oposição, em que tem uma
diferenciação evidente de políticas em relação à direita.
Contudo, não vale a pena insistir sobre um conjunto de circunstâncias e de teses que são todas
passadistas, que estão todas mais do que ultrapassadas. A verdade é que, nos últimos tempos, o Partido
Socialista, com maior ou menor discrepância, teve aquela abstenção violentíssima sobre o Orçamento do
Estado e acabou por viabilizar o Tratado Orçamental com alguns subterfúgios. Assim, a nota dominante, do
ponto de vista da política nacional, é a do consenso com os partidos da maioria e volta e meia uns arrufos
numas negociações à volta de umas leis em que a maioria procura trazer consigo o Partido Socialista para
mais facilmente poder opor-se às contestações várias que muitos segmentos da sociedade portuguesa vêm
fazendo.
Por isso, a minha pergunta, não sei se ao arrepio da intervenção do Sr. Deputado José Junqueiro, é mais
para futuro e menos passadista. Queria saber, Sr. Deputado, se a sua intervenção hoje aqui, uma espécie de
debate do estado da nação antecipado, de balanço geral da política do Governo, antecipa uma posição
diferente do Partido Socialista. Não vai colaborar na lei eleitoral autárquica? Não vai colaborar no próximo
Orçamento do Estado? Ou vai ajudar a maioria a governar nos termos em que tem feito, embora sempre com
uma manifestação de descontentamento, ditando para a ata o violento protesto do Partido Socialista?
Aplausos do BE.
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O Sr.ª Presidente: — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Hélder Amaral.
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado José Junqueiro, eu estava com
sentimentos contraditórios sobre a forma como devia classificar a intervenção de V. Ex.ª. Não sei se é um ato
de coragem, mas para ser simpático, vou ficar por aqui, porque a alternativa à coragem é demasiado dura e a
amizade que tenho por si não me permite sequer classificá-la.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Exatamente!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Porventura, terá sido enganado pelos seus colegas de bancada, eles
ter-lhe-ão dito «vai à luta!», «força, Zé!» e puseram-no a fazer esta intervenção!…
Sr. Deputado, ouvindo a primeira parte da sua intervenção, eu estava levado a dizer: «bom, finalmente, o
Partido Socialista, como um partido responsável, assume as suas responsabilidades e está a fazer um pedido
de desculpa claro ao País». Porque tudo aquilo que identificou tem um culpado: Partido Socialista; Governo do
Eng.º José Sócrates!
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Exatamente!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Tudo aquilo que referiu, os dramas, os problemas da sociedade
portuguesa, tem um rosto, tem um culpado: chama-se Partido Socialista!
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Não vou dizer, como se diz agora, que os senhores assinaram o
Memorando. Fizeram mais do isso, Sr. Deputado: negociaram-no. Quem assinou, quem aceitou, fomos nós;
os senhores negociaram-no item a item, problema a problema, setor a setor. E, portanto, o drama que hoje o
País vive, aquilo que acontece na sociedade portuguesa tem origem no abismo e na bancarrota a que os
senhores levaram o País em seis anos de governação desastrosa,…
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — … onde fugiram dos poderosos, ignoraram a concertação social e
deixaram atrás um conjunto de rendas, de subsídios e de desperdício.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — É verdade! Muito bem!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Foi o que aconteceu, por exemplo, na energia, mas também noutros
setores.
Sr. Deputado, o que deveria ter dito é que o País, na situação em que os senhores o deixaram, não tem
outra alternativa senão fazer uma gestão rigorosa das suas contas públicas, senão olhar com pormenor e com
critério para cada um dos setores e tentar garantir que o Estado funcione, garantir a sua soberania e, ainda
assim, conseguir dar os serviços que a população exige.
Gostava, Sr. Deputado, para não dissertar muito e para não lhe dar alternativa para continuar com o
discurso pouco responsável que teve na tribuna, de fazer perguntas concretas.
Diga-me: no Memorando que VV. Ex.as
assinaram e negociaram, qual é a alteração às leis laborais que a
maioria já fez? Tudo o que está a ser feito estava ou não previsto? E o que não estava previsto foi ou não
aceite por VV. Ex.as
?
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Claro!
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O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — É que é preciso ter responsabilidade, ter o mínimo de vergonha e o
mínimo de seriedade na discussão política, Sr. Deputado!
Vou dizer-lhe outra coisa. O Sr. Deputado conhece, seguramente, o último relatório do Tribunal de Contas
sobre a saúde: 3000 milhões de euros de dívidas.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Exatamente!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Os senhores são os campeões das dívidas, os campeões do calote, os
campeões do esbanjamento dos dinheiros públicos. É o que se descobre nas PPP, é o que se descobre na
educação.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — É uma vergonha!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Aliás, na educação, como a ex-Ministra dizia, foi uma «festa». É
evidente que foi uma festa, mas agora temos de pagar a conta da «festa», temos de limpar o «salão», temos
de arrumar a «mobília». Qual a consequência desta dívida na saúde, Sr. Deputado? Qual é a sua solução?
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sim. Qual é a solução?!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Qual a consequência que isto tem nas empresas, nos funcionários, na
própria qualidade do serviço? Quem paga? Como se resolve o problema?
Dê-nos uma alternativa, dê-nos uma proposta e talvez possamos, um dia, discutir seriamente com o Partido
Socialista, que, de facto, o que deixa aqui é um rasto de pena por vermos o maior partido da oposição não ter
sequer memória. Eu sei que essa é uma tradição do Partido Socialista, que já vem do pântano. Sempre que os
senhores se chegam ao pântano, o que fazem é fugir do pântano. Mas convinha, pelo menos, reconhecer qual
o caminho que fizeram até ao pântano. É a segunda vez que nos deixam no pântano e somos nós que temos
de sair dele.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Junqueiro.
O Sr. José Junqueiro (PS): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, agradeço as perguntas dos Srs.
Deputados Luís Fazenda e Hélder Amaral.
Começaria por dizer ao Sr. Deputado Luís Fazenda o seguinte: nós não temos nenhum equívoco sobre
estas matérias. Dissemos claramente o que queremos sobre a educação, sobre a saúde, sobre a justiça,
dissemos claramente o que queremos sobre a segurança social, dissemos e propusemos medidas para o
crescimento e para o emprego. Temos feito, desde início, uma política construtiva, de modo a que as pessoas,
ao olharem para o Partido Socialista, o vejam não como uma entidade que diz mal de tudo e de todos, mas
como uma entidade que se esforça para apresentar soluções concretas.
Creio que, nessa medida, o Bloco é mais moderado do que o próprio Partido Comunista e, sei, fala-se
melhor nesta matéria com o Bloco do que com o Partido Comunista.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Ah! Há uma coligaçãozinha!
O Sr. José Junqueiro (PS): — Mas o Bloco de Esquerda tem de perceber, de uma forma muito clara, que
nós nos distinguimos por aquilo que propomos, pela exequibilidade destas medidas e pela sua
sustentabilidade. Nunca faremos uma política de terra queimada, nem nunca diremos «quanto pior, melhor».
Por isso, Sr. Deputado, em relação a todas as propostas que foram aqui feitas, em relação a todas as que
aqui referi e em relação a todas as políticas setoriais, o Partido Socialista tem cumprido o seu programa, as
suas convicções, que é colocar as pessoas em primeiro lugar, pôr a economia a funcionar para as pessoas,
proteger os trabalhadores dos seus direitos, liberdades e garantias e fazer com que esta sociedade seja mais
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justa. Espero que o Bloco, com medidas responsáveis, possa acompanhar um clima de responsabilidade
indispensável, de que o País necessita.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Não respondeu às perguntas! É sempre o mesmo!
O Sr. José Junqueiro (PS): — Sr. Deputado Hélder Amaral, gostava de lhe dizer que o Sr. Deputado não
foi elegante com o Partido Socialista, nem comigo. Não lhe responderei da mesma maneira, porque acho que
o debate deve ter elevação e não o que o Sr. Deputado disse — aliás, falou muito e disse quase nada.
Gostava de lhe lembrar o seguinte, a propósito do pântano: o Partido Socialista, que foi Governo, na altura,
com o Eng.º António Guterres, porque o País estava numa crise profunda, a direita deixou 7% de défice,
milhares de desempregados, empresas na falência,…
Aplausos do PS.
… o Partido Socialista, repito, chegou ao poder pelo seu mérito, pela confiança que estabeleceu com as
pessoas.
Quando o Eng.º Sócrates chega a Primeiro-Ministro,…
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Depois, fugiu para Paris!
O Sr. José Junqueiro (PS): — … é porque a coligação do PSD e do CDS tinha deixado o desemprego no
máximo, novamente o défice, falências nas empresas,…
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Seja minimamente sério!
O Sr. José Junqueiro (PS): — … um elevado número de desempregados. E é por isso que os governos
da direita confiaram ao Partido Socialista essa responsabilidade.
Aplausos do PS.
Sr. Deputado, os únicos pântanos que existem foram aqueles que a direita deixou em 1985 e em 2005,
foram as crises profundas que o PS teve que resolver e resolveu pondo o défice abaixo dos 3%, coisa que os
senhores não são capazes de fazer.
Aplausos do PS.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — E depois foram-se embora!
O Sr. José Junqueiro (PS): — Finalmente, Sr. Deputado, quanto às leis laborais, temos uma posição
clara. Nessa matéria, nós não assinámos aquele banco de horas individual que os senhores lá foram pôr. Nós
estivemos a assinar o Fundo de Compensação, nós fizemos as nossas propostas. O que os senhores querem
e fizeram, nas leis laborais, não foi mais do que seguir a cartilha do tal 13.º ministro, o excedentário, António
Borges, que quer despedimentos mais baratos e baixar os salários aos portugueses.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente: — As próximas declarações políticas são pela seguinte ordem dos Srs. Deputados:
Isabel Galriça Neto, do CDS-PP, Agostinho Lopes, do PCP, Catarina Martins, do BE, e Carlos Abreu Amorim,
do PSD.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Galriça Neto.
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A Sr.ª Isabel Galriça Neto: — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Sr.as
Deputadas: A área da saúde, pela
vulnerabilidade que implica, pela situação difícil que caracteriza a doença e as pessoas em situação de
doença, é uma área que, para o CDS, é prioritária e que acompanhamos com grande interesse.
A situação das pessoas com doenças graves e avançadas é um ponto que, para o CDS, é uma prioridade,
a qual nos orgulhamos de acompanhar, tendo-a mesmo colocado na agenda política.
Para nós, e sempre o dissemos, estas pessoas contam e muito, contam até ao fim, pelo que nunca
menorizámos estes cuidados, pelo que não temos falsos pudores de trazer a Plenário uma matéria como esta.
Para além de outras iniciativas que levámos a cabo, convém lembrar que participámos ativamente no
consenso obtido para a Lei do Testamento Vital e que, em devido tempo, saudámos e propusemos a criação
de uma Lei de Bases dos Cuidados Paliativos, já votada em Plenário e atualmente em discussão.
Estamos certos de que, no final destes trabalhos, atingiremos melhores resultados para estes cidadãos
doentes e quero dizer-vos que, nas reuniões que decorreram com os peritos, foram apontados inúmeros
problemas, que, aliás, conhecemos, a nível da formação e da qualificação dos recursos humanos, a nível do
acesso e da articulação e referenciação entre os profissionais. De facto, o que se pretende e que vai ao
encontro das recomendações do CDS é que tenhamos uma rede eminentemente funcional, desburocratizada,
muito longe do modelo que, neste momento, ainda vigora.
No passado, as medidas tomadas para os cuidados paliativos no âmbito da Rede Nacional de Cuidados
Continuados contribuíram para o subdesenvolvimento desta área específica dos cuidados, contribuíram,
inclusivamente, para afastar estes cuidados de saúde do Serviço Nacional de Saúde, houve, claramente, um
mau planeamento, houve, claramente, anúncios que foram feitos, mas que, pura e simplesmente, não
podíamos pagar as camas anunciadas, anúncios irrealistas, que colocaram em perigo a sustentabilidade
financeira dos diferentes projetos. Aqui não houve grandes diferenças em relação ao que se verificou,
lamentavelmente também, em outras áreas da saúde.
Como disse, a forma de trabalhar comprometeu avanços nesta área e convém hoje aqui lembrar — e não
nos demitimos de o fazer — que distritos como Santarém, Viana do Castelo, Aveiro, Leiria e as próprias
regiões autónomas continuam a não ter respostas de cuidados paliativos. Qualquer um de nós, qualquer um
dos nossos familiares, poderá vir a necessitar dessas respostas. Seguramente que isto deve manter a nossa
preocupação para com os nossos concidadãos, bem como a prioridade que queremos dar a esta área.
Gostaria de dizer que também apenas em quatro distritos temos respostas de cuidados paliativos nos
hospitais. Estamos bem certos, estamos, aliás, convictos de que esta Câmara mostrará o seu empenho nesta
matéria, nestes avanços, e que o próprio Ministério está também empenhado em mudar este estado de coisas,
estando a tomar as medidas adequadas neste contexto.
Gostaria de lembrar que nos nossos hospitais, onde se encontram milhares de portugueses doentes, mais
de 25% dos doentes internados têm necessidade do apoio dos cuidados paliativos.
No entanto, como disse — e esta foi uma área subdesenvolvida no anterior Governo —, apenas em quatro
distritos há camas nos hospitais. Estes doentes podem ser tratados de forma mais adequada, mais eficiente. O
que pretendemos é tratar melhor gastando adequadamente; o que pretendemos é evitar erros do passado,
com um planeamento desastroso e com promessas irrealistas;…
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — … o que pretendemos é humanizar, trazer mais qualidade
assistencial a este setor, aumentar a eficiência e também a sustentabilidade do Serviço Nacional de Saúde,
como sempre dissemos.
Para nós, o debate sobre a nova carta hospitalar é uma oportunidade importante, também nesta matéria.
É sabido — e existem há muito recomendações nesta matéria — que cerca de 30% das camas de
cuidados paliativos devem ser concentradas nos hospitais. É sabido que cada hospital português, com mais de
250 camas, deve possuir uma equipa de suporte intra-hospitalar de cuidados paliativos.
É por isso, e porque estamos ainda tão longe de ter melhores cuidados que, neste âmbito, o CDS irá
propor o estudo de medidas que visem a plena integração dos cuidados paliativos no Serviço Nacional de
Saúde, nomeadamente a nível dos hospitais, do apoio domiciliário, com a criação de unidades de cuidados
paliativos e, sobretudo, de equipas de suporte intra-hospitalar.
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Também na área dos cuidados paliativos pediátricos, felizmente uma área de baixa prevalência, mas de
elevado impacto em qualquer família, propusemos já o desenvolvimento de medidas tendentes a viabilizar
respostas nos centros materno-infantis de referência que existem no nosso País, nomeadamente do que está
em construção.
Não deixaremos de falar da relevância desta matéria, às vezes até perante a aparente indiferença que
outras bancadas possam remeter a esta área.
Para o CDS, esta será sempre uma prioridade, a de dar voz a tantos que não a têm e que não podem ser
considerados nem pessoas, nem doentes de segunda.
Não embarcaremos em demagogia. Sabemos as condições do País real, mas queremos aqui convocar
todos para um enorme consenso que tem de ser feito no sentido de mostrarmos a efetiva prioridade que esta
área dos cuidados paliativos tem de ter.
Oxalá o consigamos!
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
A Sr.ª Presidente: — Sr.ª Deputada Isabel Galriça Neto, inscreveram-se, para pedir esclarecimentos os
Srs. Deputados João Semedo, pelo BE, e Manuel Pizarro, pelo PS.
Sr. Deputado João Semedo, tem a palavra.
O Sr. João Semedo (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Galriça Neto, estava a ouvi-la e não
consegui deixar de me perguntar constantemente qual era a finalidade, para que serviu e qual era o
destinatário da sua intervenção.
O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — É o Bloco de Esquerda para ficar esclarecido!
O Sr. João Semedo (BE): — Depois de meditar alguns minutos sobre isso, conclui que a Sr.ª Deputada se
dirigia às bancadas da maioria e, sobretudo, ao Governo da maioria, porque a sua preocupação é o oposto
daquilo que o Governo que a Sr.ª Deputada apoia tem feito.
Vou dizer-lhe.
Prometeram abrir 1326 camas de cuidados continuados até 31 de março; abriram, até 26 de abril, 337!
Diz a Sr.ª Deputada que está muito preocupada com os cuidados paliativos, os cuidados continuados e,
sobretudo, com os doentes que necessitam destes cuidados. Mas a Sr.ª Deputada ainda há muito poucos dias
votou contra o regresso da isenção das taxas moderadoras para os doentes crónicos, que são aqueles que,
por definição das suas próprias patologias, mais necessitam desta isenção.
Diz a Sr.ª Deputada que está muito preocupada com os cuidados paliativos pediátricos. Bom, mas a Sr.ª
Deputada votou contra uma proposta — provavelmente, porque ela era do Bloco de Esquerda — de
transformar o devoluto hospital Maria Pia, na cidade do Porto, numa unidade de cuidados paliativos para
crianças, adolescentes e jovens.
Portanto, tudo aquilo que nos disse — e quanto a isso estou do seu lado — tem de dizer mais alto e mais
forte às bancadas da maioria e ao Governo que a Sr.ª Deputada apoia. Senão, Sr.ª Deputada, as suas
palavras são como quem diz: «Tenham paciência! Não há camas, paciência! Fiquem em casa, não se
tratem!». É este o sentido final das suas palavras, se não tiver politicamente a força, a energia e a coragem de
contestar a política que o seu Governo tem desenvolvido em matéria de cuidados continuados e paliativos.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente: — Sr.ª Deputada Isabel Galriça Neto, tem a palavra para responder.
A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado João Semedo, agradeço a sua
preocupação e a sua pergunta.
De facto, esperaria que, de alguma forma, nos acompanhasse nesta preocupação com o sofrimento das
pessoas que estão numa situação de doença avançada. Nessa medida, o meu discurso foi para todos nós, em
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primeiro lugar, e foi, sobretudo, uma chamada de atenção, tendo nós a convicção de que «Roma e Pavia não
se fizeram num dia» e que, face a erros que aconteceram ao longo de seis anos, com anúncios panfletários,…
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Bem lembrado!
A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — … com promessas que não podiam ser cumpridas, com verbas a
descoberto, seria muito mais fácil e muito mais agradável enveredar por esse tipo de discurso.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — Não é essa a forma de estar deste Governo, o qual suportamos,
com certeza, e não é essa a forma de estar desta bancada. Reconhecendo que existem problemas, não
deixámos de trazer esta matéria.
Nessa medida, deixe-me dizer-lhe que, quando refere a questão dos cuidados paliativos pediátricos e do
Hospital Maria Pia, fizemos questão de relevar a importância que dávamos a essa área, tendo tido o cuidado
de explicar que não era a criação de uma unidade no Hospital Maria Pia que iria resolver esse problema.
Portanto, parece-nos que não podemos dar uma solução menor para cuidados que não podem ser
entendidos como menores. No entanto, como lhe disse, não deixámos de apresentar propostas para que,
numa nova casa, numa unidade que está para ser criada, possa ser encontrada uma solução para as crianças
do Norte.
Para nós, é preciso planear com condições, é preciso ter a noção de que não podemos repetir erros do
passado e, nessa medida, aquilo que vimos propor é que não se olhe para os cuidados paliativos apenas
como uma resposta em unidades na comunidade em IPSS, mas se convoque e envolva os hospitais para esta
matéria.
Portanto, trazemos propostas concretas que consideramos que, estando todas as bancadas preocupadas
com a sustentabilidade do Serviço Nacional de Saúde, com a humanização dos cuidados e com a qualidade
assistencial, poderemos seguramente atingir um consenso.
Estranhamos a sua discordância. Oxalá no âmbito do grupo de trabalho atinjamos resultados mais plenos e
satisfatórios. Estamos convictos de que sim, aliás, é para isso que trabalhamos!
Aplausos do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Pizarro.
O Sr. Manuel Pizarro (PS): — Sr. ª Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Galriça Neto, quero cumprimentá-la
por ter trazido o tema da saúde ao debate parlamentar de hoje. Mas, ao mesmo tempo, Sr.ª Deputada, não
posso deixar de manifestar a minha estranheza. Então, no dia em que o Observatório Português dos Sistemas
de Saúde divulga o seu Relatório Primavera 2012, a Sr.ª Deputada não tem nada para dizer sobre isso?!
O Sr. José Junqueiro (PS): — Ainda não o leu!
O Sr. Manuel Pizarro (PS): — Não lhe ocorre comentar aquilo que o Observatório, um observatório
independente universitário, carateriza como o racionamento dos cuidados de saúde, promovidos pelo atual
Governo?! Não tem nada a dizer sobre a falta de transparência que o Relatório imputa ao Governo, que se
recusou a fornecer dados estatísticos, porque — pasme-se! — aguardam revisão pelo Sr. Ministro. Ficámos a
saber que o Sr. Ministro da Saúde é agora revisor de dados estatísticos sobre as listas de espera…!
Aplausos do PS.
O Sr. José Junqueiro (PS): — É técnico do INE!
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O Sr. Manuel Pizarro (PS): — Não tem nenhum comentário a fazer sobre a queda na dádiva de sangue
que ameaça a sustentabilidade das cirurgias dos hospitais públicos e que não acontecia em Portugal há mais
de duas décadas?!
Não tem nada a comentar sobre a redução do número de transplantes de órgãos, com graves
consequências para a vida das pessoas que precisam de transplante e para a economia do sistema de
saúde?!
Não lhe ocorre nada sobre o aumento da lista de inscritos para cirurgia, que não acontecia desde 2005?!
Nada tem para dizer sobre a não criação de novas unidades de saúde familiares que eram um
compromisso no acordo com a troica?!
Aplausos do PS.
Sr.ª Deputada, acompanhamo-la na preocupação com os cuidados paliativos. Entre 2005 e 2011, foi feito
menos do que o que era necessário, mas o sistema de cuidados paliativos cresceu. No último ano — sim,
porque os senhores não estão no Governo desde ontem, estão há um ano —, sabe o que aconteceu aos
cuidados paliativos? Cresceu zero! Nem mais uma cama! Nem mais uma equipa! Nem mais uma iniciativa de
formação! Zero! Zero!
Aplausos do PS.
Ouvi o que a Sr.ª Deputada disse. Não há resposta em cuidados paliativos em Santarém, em Viana do
Castelo, em Aveiro, em Leiria. Quando é que vai haver, Sr.ª Deputada?! Quer comprometer-se com datas ou
isto é tudo uma conversa fiada para esconder a gravidade da acusação do Relatório Primavera 2012, do
Observatório Português de Sistemas de Saúde?
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. Manuel Pizarro (PS): — Sr.ª Deputada, estamos à vontade porque o Grupo Parlamentar do Partido
Socialista proporá rapidamente um projeto de resolução para a abertura imediata das unidades de cuidados
continuados que estão prontas a abrir, na Gelfa, em Darque, e tantas outras por todo o País. Veremos aí qual
é a seriedade do seu partido em elação a essa posição, porque aí é que se vê, não é na retórica e nas
declarações genéricas!
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Galriça Neto para responder.
A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado, agradecendo a sua pergunta,
deixe-me dizer-lhe que, de facto, não li o Relatório na totalidade, mas li as partes mais significativas. Penso é
que o Sr. Deputado não terá lido as partes onde é elogiada a tomada de posição do Governo relativamente à
opção por medidas duras e complicadas, que não foram evitadas. Essa parte o Sr. Deputado não leu, nem a
sua bancada o acompanhou.
O Sr. Luís Menezes (PSD): — Muito bem!
A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — Não leu a parte onde se diz que foram tomadas medidas na área
da política do medicamento, na área das poupanças, na área da eficiência. Essa parte o senhor não leu.
O Sr. Luís Menezes (PSD): — Esqueceu-se!
A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — Penso que também não leu, ou esqueceu, a parte que diz
respeito ao défice dos 3000 milhões que os senhores deixaram!
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O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Exatamente! Três mil milhões!
A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — Aliás, dessa forma, a gerar sistematicamente endividamento, é
fácil fazer política de saúde.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — Aquilo que os senhores fizeram foi comprometer a
sustentabilidade do Serviço Nacional de Saúde.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Exatamente!
A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — Foi fácil anunciar camas para cuidados paliativos, dizendo que
existiam 170 milhões de euros financiados pelos jogos e, afinal, só existiam 70 milhões de euros.
Sr. Deputado, dessa forma é fácil comprometer as instituições, é fácil fazer promessas, que, depois, não se
podem nem financiar nem cumprir.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — Não é esse o nosso caminho!
Portanto, a «festa» fazemo-la com seriedade e não com anúncios megalómanos e irrealistas.
Porém, o Sr. Deputado contará sempre connosco para, de uma forma séria e transparente, manter o apoio
aos cuidados paliativos, manter o apoio à sustentabilidade do Serviço Nacional de Saúde.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
A Sr.ª Presidente: — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Lopes.
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Na segunda-feira, estive no distrito de
Viseu com dirigentes da Cooperativa Agrícola do Távora, em Moimenta da Beira, e da União das Associações
de Defesa Sanitária/Organizações de Produtores Pecuários (ADS/OPP) da Beira Alta. E estranha é a
sensação, Srs. Deputados, de que os problemas detetados na visita à mesma região há um ano tenham sido
«congelados». São os mesmos. Os mesmos, aliás, de uma visita da Comissão de Agricultura feita há 6 anos!
Os mesmos, com um pequeno grande pormenor: há um ano havia expectativas, que hoje se frustraram, se
esvaziaram completamente. Bastou um ano, Srs. Deputados!
Tantas promessas, Srs. Deputados do PSD e CDS! Tanta e quase sempre justa oposição à política
agrícola do Governo PS/Sócrates! Tanta crítica e propostas alternativas para, depois de um ano de Governo,
certamente com outra encenação, reproduzirem o essencial dessa política, argumentarem como argumentava
o PS, fazerem o que fazia o Ministério da Agricultura do PS, isto é, pouco! Zero!
Houve situações como as do Douro ou da sanidade animal que, não tendo sido sanadas, se agravaram
brutalmente.
PSD e CDS sabiam o que fazer na agricultura! Hoje, não sabem. Desaprenderam rapidamente!
Srs. Deputados, na segunda-feira, na principal organização de produtores de maçã da Beira Alta, fiquei a
saber que a região, que podia dar um forte contributo para colmatar as cerca de 200 000 t de maçã que o País
importa, não o faz porque o Estado português não assegura condições mínimas necessárias para que a
produção se expanda. Precisam de mais 15 000 a 20 000 t de frio e o PRODER ainda não foi capaz de
assegurar a ajuda necessária. Precisam de um seguro de colheitas acessível e eficaz. Mas, se o anterior
sistema não era bom, este Governo alterou tarde, mal e a más horas, agravando os custos dos prémios e
mantendo um sistema desadequado para a região. Os agricultores produzem 40 a 50 t por ha, mas as
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companhias de seguros acham que eles só devem produzir 25 t por hectare, valor máximo que aceitam
segurar. E o Estado, «moita carrasco»; na vinha, na grande maioria dos casos e na região do Douro, pura e
simplesmente, não se fez e nos hortofrutícolas, como o tomate, as companhias recusam-se a fazê-lo. As
verbas disponíveis apenas permitem segurar 10% da produção de uma fileira que vale 250 milhões de euros,
90% para exportar! Mas o Governo acha mesmo que o seguro agropecuário pode ser apenas um instrumento
dependente das partes, nada tendo o Estado a ver com o assunto?!
Os agricultores, para produzir maçã, precisam de água e, como resultado das promessas e disputas de
anos do PS e PSD locais, nem grande barragem nem pequenas charcas!
O Sr. João Oliveira (PCP): — Muito bem!
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Precisam de investigação e desenvolvimento e sucessivos Governos
deixaram desativar a estação fruteira da estação agrária de Viseu. Precisam de uma conceção de fileira, e o
que há é o vazio dos serviços oficiais depauperados de meios e recursos humanos! Pairam no ar e na terra os
riscos de fogo bacteriano que, do Oeste, já atingiram fortemente pomares do distrito mais a sul (felizmente
ainda não chegou à Beira Alta…). Isto sem uma resposta adequada do Governo!
Na segunda-feira, na União das OPP da Beira Alta, envolvendo seis cooperativas e quatro associações de
produtores pecuários, ficámos a saber que, apesar de todos os alertas, escritos e orais, do Grupo Parlamentar
do PCP, nomeadamente em todas as audições com a Sr.ª Ministra da Agricultura, a meio do ano de 2012, as
associações não só não receberam o que falta de 2011, e é muito — 60% a 70% —, como ninguém lhes diz
como vai ser em 2012!
Trata-se de estruturas que têm de pagar salários, segurança social, produtos veterinários, transportes e
outros custos da atividade de sanidade animal!
A Sr.ª Ministra criou uma taxa para obter receitas para pagar a sanidade animal. Mas quando vai pagar?
Não se sabe! E quanto vai pagar? Não se sabe! Lembramos que PSD e CDS eram, há pouco mais de um ano,
contra a passagem dos custos de sanidade animal para cima dos produtores, mas é o que está a acontecer.
Estamos a falar de pôr em causa um património de saúde animal que significou o investimento de muitos
milhões de euros de fundos públicos e da falta de resposta a problemas que têm graves implicações na saúde
pública que podem penalizar fortemente a nossa exportação de produtos pecuários.
De que está o Governo à espera para agir? De algum desastre!?… A situação é insustentável, dizem os
responsáveis pela sanidade animal de centenas de explorações pecuárias da Beira Alta!
Srs. Deputados, mas o «rosário» dos problemas é muito maior e não há projetos de resolução que valham
ao PSD e ao CDS-PP e atenuem a gravidade das políticas.
Por exemplo, aprovámos nesta Assembleia da República um projeto de resolução de apoio ao
desenvolvimento do regadio, e até aprovámos um específico sobre a situação do Baixo Vouga Lagunar.
Consequências práticas? Zero! Sobre o regadio de Sabariz/Cabanelas, em Vila Verde, ninguém sabe por que
não se iniciou em setembro; o que se sabe, ao certo, é que a reprogramação do PRODER deu uma «talhada»
de 155 milhões de euros nestas dotações.
Por exemplo, no apoio à floresta, o que aconteceu foi uma reprogramação do PRODER com um corte, um
fogo florestal, equivalente a 150 milhões de euros! Entretanto, pairam notícias de ameaças graves sobre as
terras baldias, cuja lei a Sr.ª Ministra diz que vai ser alterada e incluídas na bolsa de terras, e surgem notícias
de que o Governo pretende concessionar a privados as matas públicas. O que é isto, Srs. Deputados?! Terá
isto alguma coisa a ver com as declarações do duopólio das celuloses de que tem falta de matéria-prima,
quando há mais de 10 milhões de m3 de eucalipto em pé que já deviam ter sido cortados?
Por exemplo, no próprio PRODER, depois de todos os discursos que ouvimos, certo é que continuam os
atrasos no pagamento e que, ao ritmo de execução a que se chegou no fim de abril, não é no presente ano
que se vão gastar as verbas disponíveis no Orçamento do Estado.
Por exemplo, no leite, depois de tudo o que disseram PSD e CDS sobre esta produção, o preço caiu desde
janeiro 2,5 cêntimos, enquanto continuaram a subir os custos de produção — eletricidade, gasóleo, palhas. As
rações tiveram uma subida brutal… E os preços no consumidor não baixaram, subiram! E tudo acontece
apesar da criação da PARCA (Plataforma de Acompanhamento das Relações na Cadeia Agroalimentar). Um
relatório do gabinete de planeamento não deixa dúvidas sobre quem se tem apropriado de margens
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excessivas na cadeia de valor, sobre quem paga os saldos da grande distribuição, sobre quem paga o «circo»
de animais domésticos em Lisboa…
E tudo isto acontece num sector que tem sobre a cabeça o cutelo do anunciado fim das quotas leiteiras, da
responsabilidade do PS, do PSD e do CDS, e a quem o atual Governo cortou 16 milhões de euros que
estavam consignados ao sector leiteiro.
Por exemplo, no Douro, onde o Governo não encontrou uma só resposta para uma região em estado de
cataclismo económico e social, ou, melhor, avançou exatamente com as propostas do anterior governo do PS
para a Casa do Douro.
De facto, este Governo propõe exatamente o que propunha o governo PS para travar a falência em curso
das Adegas Cooperativas do Douro, a falência, diga-se, de algumas das maiores cooperativas — Santa Marta,
Alijó, etc.! Não, minto! Deu uma resposta: avançou com uma alteração do quadro legal do Instituto do Vinho do
Douro e Porto (IVDP), que não só confirma as expropriações feitas por Jaime Silva ao Douro (caso do
cadastro) como reforça a governamentalização e consolida o IVDP como uma extensão do Ministério das
Finanças/Direção-Geral de Contribuições e Impostos na coleta de impostos extraordinários à Região
Demarcada do Douro! E protestaram PSD e CDS, na oposição, pelo roubo de 8 milhões de euros feito em
2011!
Srs. Deputados, tudo isto cai em cima do reforçado e renovado ataque aos serviços públicos e à presença
do Estado no mundo rural e no interior do País.
Ontem fiquei a saber que o Ministério da Saúde se prepara para desativar três estruturas do INEM, em
Vieira do Minho, Cabeceiras e Celorico de Basto. Não bastam os encerramentos e ameaças em curso nas
unidades e serviços de saúde, na rede escolar, nos serviços de finanças, nos transportes ferroviários, não
basta transformar os cidadãos dessas regiões em portugueses fortemente discriminados no acesso à saúde,
também o INEM os vai deixar.
O mesmo se passa com os tribunais; basta olhar para a proposta do Ministério da Justiça para Trás-os-
Montes e Alto Douro ou para a Guarda! E, no fim da linha, a reforma Miguel Relvas (PSD/CDS) para extinguir
as freguesias. De facto, melhor mesmo é apagá-las do mapa, que os cidadãos já lá não estão!
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Sr. Deputado Agostinho Lopes, ultrapassou em mais de 4 minutos o tempo disponível
para a sua intervenção. Eu faço como os árbitros britânicos: normalmente deixo jogar, mas os Srs. Deputados
devem limitar o tempo da intervenção ao tempo regimental.
Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados Pedro Lynce, do PSD, Miguel Freitas, do
PS, Abel Batista, do CDS-PP, e Pedro Filipe Soares, do BE.
Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Lynce.
O Sr. Pedro Lynce (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Agostinho Lopes, começo por cumprimentá-lo
pela oportunidade do tema que aqui traz, mas confesso-lhe, sinceramente, que ficou muito aquém das minhas
expetativas…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Ainda queria mais?!
Risos do PCP.
O Sr. Pedro Lynce (PSD): — … e confesso-lhe que acredito que, depois de lhe fazer as diversas
perguntas, provavelmente, o Sr. Deputado vai encontrar alguma coisa de positivo.
Aliás, o que é que eu esperava? Esperava que o Sr. Deputado Agostinho Lopes, que tanto tem defendido a
produção nacional, viesse aqui, eventualmente, dizer: «sim, senhor, louvo o Governo por dar prioridade à
produção nacional». Esperava que o Sr. Deputado viesse aqui dizer isso claramente!
Assim como esperava que o Sr. Deputado realçasse todas as manifestações do Governo em todos os
eventos agrícolas, designadamente a presença do Sr. Primeiro-Ministro nas feiras mais importantes do País,
nomeadamente a Feira Nacional da Agricultura. E não me refiro aquelas que o governo anterior fazia para ter
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grandes exposições mediáticas, não é a essas que me refiro, refiro-me, claramente, à presença do Sr.
Primeiro-Ministro na Feira Nacional de Agricultura onde, claramente, fez um apelo aos jovens…
O Sr. João Oliveira (PCP): — De apelos está o desemprego cheio!
O Sr. Pedro Lynce (PSD): — … e, inclusive, aos Deputados, pedindo-lhes que conseguissem um
consenso alargado no sentido de aprovarem uma lei que está, neste momento, na Assembleia da República,
como o Sr. Deputado sabe.
Mas, Sr. Deputado, provavelmente, eu teria problemas se, porventura, não tivesse outras coisas que são
positivas, mas tenho. De facto, temos outras coisas que são positivas e eu recordo-lhe, porque, certamente, V.
Ex.ª se esqueceu, por exemplo, a resposta rápida do Governo no combate à seca,…
O Sr. João Oliveira (PCP): — Isso foi depois da fé da Ministra ter falhado!
O Sr. Pedro Lynce (PSD): — … quando comparada com a resposta dada em 2005 — e, provavelmente,
recorda-se disso — com o sacrifício de dinheiro nacional no montante de 20 milhões de euros numa altura de
crise. Na verdade, o Governo avançou imediatamente com 20 milhões de euros.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Foi depois da fé da Ministra ter falhado!
O Sr. Pedro Lynce (PSD): — Por outro lado, recordo-lhe o pedido do Governo para facilidades e
antecipação de verbas comunitárias. V. Ex.ª esqueceu-se disto!
O Sr. Deputado está a falar do PRODER, mas esqueceu-se que houve um reforço do PRODER, esqueceu-
se que o anterior PRODER tinha uma arquitetura que está ultrapassada e, se calhar, o armazenamento da
fruta, de que estava a falar, se o PRODER estivesse devidamente traçado, talvez, neste momento, já existisse,
por exemplo, na área da maçã, e nisso estou de acordo consigo.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Agora, vai também falar dos bancos de terras do Alentejo…!
O Sr. Pedro Lynce (PSD): — Mas também lhe digo, com toda a franqueza, que o Sr. Deputado esqueceu-
se, por exemplo, do problema do parcelário, sendo que sabia perfeitamente que estávamos em risco de,
eventualmente, não termos possibilidade de recebermos a verba a que tínhamos direito e, inclusive, pagar
coimas.
V. Ex.ª não sabe o esforço que foi feito…
A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Pedro Lynce (PSD). — Vou já terminar, Sr.ª Presidente, mas espero a mesma generosidade que
teve para com o Sr. Deputado Agostinho Lopes.
Sr. Deputado, apenas lhe faço a seguinte pergunta: não acha que é motivador o documento de orientação
— repito de orientação, não é imposição — que foi apresentado pelo atual Governo em relação ao período de
2014-2020 do quadro de referência do PRODER quando na ápoca anterior, em 2007, ainda não tínhamos
esse documento? Não será que isto vale a pena? Não será que valia a pena V. Ex.ª refletir e dizer: «estou de
acordo, enganei-me e o Sr. Deputado tem razão!»
Aplausos do PSD.
A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Lopes que, entretanto,
informou a Mesa que pretende responder um a um.
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O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Pedro Lynce, agradeço-lhe as questões
que me colocou e gostaria de começar por dizer que a reflexão relativamente ao período que aí vem fá-la-
emos em devido tempo.
Não é possível é responder aos problemas de hoje com o que há de vir a partir de 2014. Não podemos, Sr.
Deputado! Os agricultores e a agricultura portuguesa precisam de respostas hoje. Por exemplo, para questões
que aqui coloquei, estava à espera que o Sr. Deputado Pedro Lynce me dissesse alguma coisa,
nomeadamente sobre os problemas gravíssimos na sanidade animal.
Sr. Deputado, mesmo na questão da seca, a tomada de decisão não foi tão cedo como isso, como o Sr.
Deputado sabe. O Sr. Deputado, certamente, se lembra do nosso debate aqui, onde a Sr.ª Ministra começou
por ter uma grande fé na Virgem para que viesse chuva, essa chuva demorou algum tempo e depois é que
tomou algumas medidas.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente! Só depois da fé passar…
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Aliás, hoje, até podemos dizer que essas medidas ainda não estão
todas operacionalizadas, passados mais de dois meses sobre a vinda da Sr.ª Ministra aqui, e que
relativamente a uma delas, inclusive, foi-nos dita uma grande mentira nesta Casa, pois deram-nos aqui um
determinado valor para apoiar os produtores pecuários, número de produtores e número de animais efetivos,
que a Sr.ª Ministra conhece há muito, bem como os conhecem os serviços do Ministério, mas, depois, ficámos
a saber que a Sr.ª Ministra fez um rateio de 38% no valor dessa ajuda, valor esse publicado em Diário da
República, e que nem sequer ainda operacionalizou uma coisa tão importante como a eletricidade verde.
Sr. Deputado, sobre a ida do Sr. Primeiro-Ministro e da Ministra da Agricultura — aliás, de muitos ministros
—, à Feira Nacional de Agricultura, em Santarém, essa é, certamente, uma questão importante, mas não
substitui as políticas necessárias para a nossa agricultura, como o Sr. Deputado muito bem sabe.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Por exemplo, em matéria de produção nacional, Sr. Deputado,
precisávamos de ver se começávamos por dar resposta às ajudas, à intervenção, às políticas necessárias
para que haja produção nacional, para que, por exemplo, não seja liquidada a produção de leite, como,
inevitavelmente, está a acontecer, para que a produção de maçã, como referi, possa expandir-se numa região
que tem largas potencialidades de aumentar a sua produção, eliminando esse défice da nossa balança
comercial, mas isso continua a não ser feito passado um ano de Governo do PSD/CDS.
Vou terminar, dizendo apenas isto: o Sr. Deputado tem uma visão muito otimista, mas é porque não tem
lido os jornais ou não tem estado atento à comunicação social, porque se o tivesse feito verificava que nem
organizações com a CAP conseguem, hoje, fazer uma leitura positiva da política agrícola deste Governo.
Aplausos do PCP.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Isso diz muito da política agrícola do Governo!
*
A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Freitas.
O Sr. Miguel Freitas (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Agostinho Lopes, de facto, estamos
preocupados com o rumo deste Governo no domínio da política agrícola, desde logo no domínio do
investimento.
Este ano, o Governo fez aprovar nesta Assembleia da República um Orçamento do Estado em que estão
previstos 150 milhões de euros de PIDDAC, o que significaria um investimento de PRODER de cerca de 900
milhões de euros, mas, curiosamente, a meta do Governo mantem-se nos 650 milhões de euros.
Ora bem, estamos junho e, no dia 1 de junho, o investimento no PRODER tinha sido apenas de 240
milhões de euros. Isto é, no momento em que se exigia uma aceleração no investimento agrícola, o que se
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está a verificar é um abrandamento desse investimento e uma gestão do PIDDAC que mais parece que aquilo
que o Governo está a fazer é a dar atenção àquela que é a sua grande prioridade, a contenção orçamental.
É também por isso que colocamos as questões que o Sr. Deputado aqui nos trouxe, nomeadamente o
pagamento às OPP (Organizações de Produtores Pecuários). Se o Governo tinha uma meta de apenas 650
milhões de euros para gastar em PRODER, o que significaria que havia um excedente de 50 milhões de euros
de PIDDAC no Orçamento do Estado, o Governo tinha a obrigação de já ter pago às OPP, utilizando esse
PIDDAC.
Portanto, temos grande preocupação, do ponto de vista da estratégia de curto prazo do Governo na
utilização do Orçamento do Estado, mas temos também grandes dúvidas e grandes preocupações
relativamente à estratégia do Governo para o futuro da agricultura portuguesa.
O Governo fez uma reprogramação no PRODER e foi buscar o dinheiro exatamente onde ele era mais
necessário, isto é, ao regadio. Foi buscar 221 milhões de euros, 30%, ao Alqueva, pondo em causa a
programação desse investimento. Mas fez mais! Não apenas pôs em causa a programação desse
investimento como também já veio anunciar que o bloco de rega Roxo-Sado vai ser abandonado. Portanto,
não foi apenas o adiamento do investimento, foi também uma parte desse investimento que foi, desde já,
abandonada.
Mais: abandonou o projeto hidroagrícola de Óbidos, abandonou o projeto hidroagrícola da Lezíria Grande
de Vila Franca de Xira, e abandonou pegando nesse dinheiro e metendo-o num investimento que, do nosso
ponto de vista, não é estruturante.
Eram estas preocupações que queria deixar aqui e queria, naturalmente, dizer-lhe o seguinte:…
A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Miguel Freitas (PS): — … sobre seguros agrícolas, Sr. Deputado, como sabe, o governo anterior
preparou um trabalho com as organizações de produtores, estávamos aqui, nesta Assembleia, e
acompanhámos esse trabalho. Este Governo chegou e aquilo que fez foi meter todo esse trabalho na gaveta e
dizer que, a partir de 2014, teremos um sistema de seguros pago totalmente por dinheiros comunitários.
Era um comentário sobre estas questões que gostaríamos de ouvir da sua parte, Sr. Deputado.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Lopes.
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Miguel Freitas, agradeço-lhe as questões
colocadas, particularmente os problemas do investimento relacionados com o PRODER, com as verbas
comunitárias disponíveis para apoiar a agricultura portuguesa.
Todos nos lembramos como os fundos comunitários, ao longo das duas últimas Legislaturas, foram um
«cavalo de batalha», e bem, dos partidos que, hoje, são Governo. Houve seriíssimos problemas, foram
demasiados os atrasos, foi tudo demasiado mau para que a questão não tivesse estado, com grande
vivacidade, no debate parlamentar, em Plenário e nas comissões.
O que se verifica é que, passado um ano de Governo, a situação pouco se alterou. Continuamos a ter
atrasos no pagamento dos projetos, o Ministério da Agricultura ainda não conseguiu libertar um pagamento
atempado dos projetos aos agricultores e às associações de agricultores, continuamos a ter atrasos na
aprovação de projetos e continuamos até a ter esta coisa espantosa contra a qual muito reclamou e clamou
um Deputado que, hoje, é Ministro dos Negócios Estrangeiros: a perda de fundos comunitários disponíveis
para o País, os quais são devolvidos a Bruxelas! É que este Governo também já perdeu fundos comunitários
na rede rural nacional! Inclusive em matéria de apoio aos rendimentos, não se consegue perceber por que
razão, havendo necessidade de recorrer às tesourarias das explorações agrícolas, a braços com grandes
dificuldades, particularmente decorrentes da seca — e regresso ao problema da seca, Sr. Deputado Pedro
Lynce —, o Governo não se mobilizou, não insistiu, em Bruxelas, para que fossem pagos os 20% de RPU de
2011, o que teria constituído, certamente, uma boa ajuda para aguentar e suportar as dificuldades.
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Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Abel Baptista.
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Agostinho Lopes, não sei se existem,
mas, se não existem, acho que é urgente criar duas especialidades políticas, oftalmologista político e
otorrinolaringologista político, porque, realmente, há aqui uma visão completamente distorcida quer da parte
do Sr. Deputado Agostinho Lopes, quer da parte do Sr. Deputado Miguel Freitas.
Vamos falar de algumas questões que são, efetivamente, factos, não são teorias.
O ano de 2011 foi o primeiro ano em que o PRODER foi executado na sua totalidade, por causa do
Governo que está em funções.
É ou não verdade que este Governo, quando assumiu funções, tinha 60 milhões de euros de dívidas às
seguradoras?! O Governo do Partido Socialista orçamentava 8 milhões e gastava 16 milhões.
É ou não verdade que, no dia 9 de março, foi aprovado, no Comité Permanente da Cadeia Alimentar e da
Saúde Animal, em Bruxelas, por unanimidade, o novo plano estratégico para a sanidade animal, que vai ter
custos inferiores para os agricultores?!
É ou não verdade que, pela primeira vez, foi constituída uma plataforma de entendimento entre a produção,
a distribuição e a indústria, a PARCA (Plataforma de Acompanhamento das Relações na Cadeia
Agroalimentar), que produziu, recentemente, o seu primeiro relatório?!
É ou não verdade que foi feito todo o parcelário agrícola, evitando o pagamento de multas e a devolução à
União Europeia de verbas comunitárias de apoio à agricultura portuguesa?!
É ou não verdade que, no âmbito da PARCA, o Governo já tem em fase avançada de conclusão o
compromisso que diz respeito aos contratos das organizações de produtores de leite com a distribuição, o que
vai permitir um aumento significativo do preço à produção?!
É ou não verdade que o Governo tem vindo a acompanhar, sistematicamente, todas as matérias que
surgem em cima da mesa, nomeadamente a questão da seca?! Todos os programas da seca foram
contemplados atempadamente, sendo que foi assinado, na passada semana, um dos que faltava, que era o da
isenção ou redução do pagamento da taxa social única à segurança social, por parte dos agricultores, durante
um período de seis meses. É ou não verdade?!
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Fale da eletricidade verde!
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Sr. Deputado Agostinho Lopes, percebo o conservadorismo do Partido
Comunista, percebo o imobilismo do Partido Comunista, agora, Sr. Deputado, isso não lhe dá o direito de dizer
que está tudo pior do que estava.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Afinal, a cegueira é sua!
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Percebo o argumento do Sr. Deputado, que não quer que as populações
locais possam alterar a gestão do seu bem público, que são os baldios, porque há um conservadorismo de tal
ordem que tudo deve ficar completamente imobilizado, mas não entendo que o Partido Comunista até tenha
sido o único grupo parlamentar deste Parlamento a não tomar qualquer iniciativa na questão da bolsa de
terras.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Está enganado! Olhe que até fomos os primeiros, em 2002!
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Não acha importante a possibilidade de haver entendimento entre os
proprietários e os produtores, no sentido de poderem ter terra para a agricultura?!
A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.
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O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Termino, Sr.ª Presidente, colocando uma questão muito concreta ao Sr.
Deputado Agostinho Lopes: diga-me quais são as propostas do Partido Comunista para resolver algumas
questões que não sejam a nacionalização de todos os bens de produção.
Aplausos do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Lopes.
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Abel Baptista, em matéria de visão
distorcida, estamos conversados, por aquilo que já disse, há pouco, ao Deputado Pedro Lynce. Até poderia
utilizar um bem conhecido ditado popular, muito usado na nossa região, segundo o qual «Quem feio ama,
bonito lhe parece!», porque, de facto, os senhores estão a ver bonito aquilo que continua a ser a política
agrícola de desgraça do anterior governo.
Não tenho tempo de abordar todas as questões que suscitou, mas há duas, centrais, de que quero falar.
Os senhores criaram a PARCA, simplesmente, ao fim destes meses, o que é certo é que a grande
distribuição continua a fazer operações que penalizam brutal e gravemente a produção nacional.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exatamente!
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Isso não é sério, Sr. Deputado!
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Isso é que é isso, Sr. Deputado Abel Baptista!
Esperava que o Sr. Deputado, que tem tido, ao longo destes anos, uma abordagem muito consequente das
questões agrícolas, nos viesse dizer se é possível que possam continuar deste modo.
Quanto ao problema da sanidade animal, o Sr. Deputado lembra-se das perguntas escritas que dirigiu ao
Governo do Partido Socialista sobre esta matéria?!
Torno a perguntar-lhe, Sr. Deputado: acha admissível que, a meio de 2012, as OPP viradas para a
sanidade animal estejam numa total indefinição e escuridão relativamente ao que vai acontecer?! O Sr.
Deputado está de acordo em que estas estruturas mantenham salários em atraso, quatro meses de salários
em atraso, como me referiram em Viseu?! O Sr. Deputado está de acordo com isto? O Sr. Deputado não acha
que o Governo precisa de resolver esta questão? É tanta a verba, é tão grande a fortuna que vai ser gasta na
sanidade animal que o Governo não pode responder?! O Sr. Deputado tem ideia de quanto é que estamos a
falar?
Em matéria de seguros agrícolas, o Sr. Deputado está de acordo com a situação que se está a verificar?
A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — O Sr. Deputado está de acordo que uma produção estratégica como a
do tomate esteja em risco de ficar com 90% sem seguro agrícola?! O Sr. Deputado está de acordo? O que é
que faz o Governo para responder a esta questão, Sr. Deputado?
Era isto que o Sr. Deputado devia ter vindo aqui dizer, em concreto, em vez de fazer elaborações filosóficas
sobre o banco de terras, que não passa, de facto, de uma elaboração filosófica, como, rapidamente, iremos
ver.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem, ainda, a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe
Soares.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Agostinho Lopes, o tema que nos trouxe
hoje a debate demonstra a inação e a ineficiência do Governo em muitas matérias que são essenciais para o
País. E, se ouvirmos as bancadas que apoiam o Governo sobre estas matérias, quase parecem estar
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desgarradas da realidade. É que, ainda recentemente, ouvimos as queixas dos produtores, designadamente
dos produtores de leite, que se dizem «esmagados», porque lhes são imputadas as perdas da grande
distribuição, e nem aquela que era a grande proposta do Governo, a PARCA, veio, afinal, resolver este
problema, pelo contrário, foi uma cortina de fumo, um biombo criado pelo Governo, que tenta esconder a
realidade difícil que os nossos produtores enfrentam.
Mas, também no que toca aos seguros de colheitas, a inação deste Governo é por demais evidente. Num
ano em que as perdas são muitas, num ano em que a seca bateu muito cedo à porta de muitos produtores,
muitas das culturas estratégicas do nosso País não têm acesso aos essenciais seguros de colheitas. E, sobre
isto, o que é que vemos, da parte do Governo? Nada! Inação absoluta e completa! Vemos, afinal, aquela que
era uma das propostas do Governo para o País a «ficar em águas de bacalhau».
Mas, Sr. Deputado, deixo-lhe uma pergunta muito concreta sobre um dos temas que trouxe na sua
declaração política.
Referiu aqui o Baixo Vouga Lagunar, tema que mereceu todo o apoio de todas as bancadas desta
Assembleia e levou até à aprovação de diversos projetos de resolução. O resultado disso devia ter sido a
tomada de medidas urgentes, que são necessárias no terreno, porque é necessário proteger as terras, que
podem ser extremamente produtivas, do avanço da água salgada. Hoje, meses depois desse debate, aqui, na
Assembleia da República, meses depois de esses projetos de resolução terem sido aprovados por
unanimidade, o que vemos no terreno é zero! Absolutamente nada foi feito e, face à urgência da situação, o
Governo teima em nada tirar do papel.
O que pergunto, Sr. Deputado, é se isto é aceitável, se o País se pode dar ao luxo de desperdiçar estes
terrenos, que são essenciais, extremamente produtivos e que podem, até, alavancar a produção regional do
distrito de Aveiro.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Lopes, do PCP.
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Pedro Filipe Soares, o caso do Baixo
Vouga Lagunar é um caso exemplar do que tem sido a política de direita ao longo destes anos, de completo
desprezo pelas potencialidades da terra agrícola portuguesa, de governos do PS e do PSD. Já se investiram
milhões de euros naquele projeto e o certo é que ele continua totalmente abandonado, com enormíssimos
prejuízos para a produção pecuária regional e, naturalmente, para a produção nacional.
O interessante é que aprovámos, já durante esta sessão legislativa, um projeto de resolução (apresentado,
aliás, pela bancada do PSD, que foi apoiado por todas as bancadas) dirigido ao rápido desenvolvimento deste
projeto do Baixo Vouga Lagunar, que é, de facto, um crime contra a produção nacional e contra a economia
nacional.
O certo é que, passados meses, não há um sinal de intervenção no Baixo Vouga Lagunar. E quando
algumas bancadas referem, concretamente, a questão que o Sr. Deputado do PSD me colocou, há pouco,
sobre o banco de terras, respondo se não seria melhor começar por perguntar por que razão é que o poder
político, sucessivos governos, dispondo de meios — e dispõem de tantos meios que, no PRODER até
cortaram 155 milhões de euros, que poderiam ser disponibilizados para esses objetivos —, não pensaram,
antes de pensarem nessa coisa das terras abandonadas, em criar condições para que a terra pudesse ser
agricultável, com capacidade para dar rendimento. Isso não seria necessário? Não seria bom?
Gostaria ainda de fazer uma breve referência, porque nenhum dos Srs. Deputados a fez, ao problema da
situação dramática da Região Demarcada do Douro.
Soubemos, em maio, na audição do Sr. Secretário de Estado das Florestas e Desenvolvimento Rural, que
tutela este problema, que, afinal, as respostas do Governo PSD/CDS ao Douro foram exatamente as mesmas
que o governo anterior, do PS, tinha apresentado. Ou seja, a proposta à Casa do Douro para que entrasse em
falência; a proposta de concentração das cooperativas agrícolas, como se isso resolvesse alguma coisa, pois
aquilo que está falido são, exatamente, as maiores cooperativas da região; e, finalmente, no IVDP (Instituto
dos Vinhos do Douro e Porto), procurando, através de uma alteração legislativa, legalizar, de facto, a
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transformação do IVDP numa delegação da Direção-Geral das Contribuições e Impostos, a cobrar impostos
extraordinários à Região Demarcada do Douro.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exatamente!
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Uma vergonha é o que está a passar-se com o comportamento deste
Governo face à Região Demarcada do Douro!
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Segue, na ordem das inscrições políticas, a declaração política a proferir pela Sr.a
Deputada Catarina Martins. Para esse efeito, tem a palavra, Sr.a Deputada.
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Seis companhias de teatro do
País, de Braga a Faro, declararam que estão à beira da extinção.
Se nada for feito, a Escola da Noite, de Coimbra, a ACTA, do Algarve, o CENDREV, de Évora, a
Companhia de Teatro de Braga, o Teatro das Beiras, da Covilhã, e o Teatro Regional da Serra do Montemuro
deixarão de existir. Entre estas companhias estão estruturas das mais antigas do País, e estruturas que são
responsáveis pelo funcionamento dos teatros das suas cidades.
Quando até estas companhias anunciam o seu desaparecimento iminente, sabemos que a situação de
rutura na cultura em Portugal é total! E, como estas, muitas outras companhias, um pouco por todo o País,
vivem a mesma realidade descrita no comunicado das Companhias da Descentralização: «dezenas de
despedimentos; multiplicam-se as pessoas a trabalhar a meio tempo; há salários em atraso; crescem as
dívidas a fornecedores e os empréstimos, bancários ou pessoais».
As companhias de teatro são serviços públicos de cultura, por excelência, em todo o território. Sem elas, o
acesso à cultura, direito constitucionalmente consagrado, não seria mais do que uma ideia remota. E, como as
companhias de teatro, também as companhias de dança, as orquestras e os agrupamentos musicais são
pilares das políticas públicas para a cultura.
Trabalham com crianças e jovens, estão presentes na escola pública, constroem comunidades de públicos
e a programação cultural de todo o País, habitam os teatros e as praças, reinventam lugares; constroem
festivais e, mesmo quando tudo está tão difícil, são quem dá sentido às celebrações coletivas.
A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Muito bem!
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Dão-nos a conhecer o património das artes e as linguagens
contemporâneas.
Através do seu trabalho, descobrimos a literatura, a música, as artes plásticas, a dança e o teatro de todos
os tempos e do nosso tempo, de todo o mundo e do nosso País.
Tudo tem corrido bem até agora? Não, longe disso!
O desinvestimento na cultura, as políticas erráticas, o desprezo por quem faz da arte a sua vida e profissão
não são de agora e são culpados pelo desperdício imenso, que é o de existir ainda tanto por fazer e tanta
gente sem acesso às artes, no nosso País.
Mas dizer que tudo está na mesma é negar a realidade.
Não é de desinvestimento ou desperdício que falamos já, é, sim, de uma política ativa de destruição da arte
e da cultura, em Portugal.
O orçamento da Secretaria de Estado da Cultura não passa, hoje, de uns ridículos 0,1%, e não nos digam
que as reduções foram em todas as áreas! A cultura pesa, hoje, muito menos no orçamento do Estado.
Não é só de valores absolutos que falamos, é da própria existência de financiamento à cultura como
obrigação do Estado.
O Governo, que afirma que não rasga contratos na hora de pagar as parcerias público-privadas e as
rendas excessivas que minam o nosso País, não só rasgou os contratos que assinou com as estruturas de
criação e produção artística como nem sequer cumpre a lei.
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A Sr.ª Ana Drago (BE): — Muito bem!
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — 2012 é o ano zero no financiamento à cultura, tanto pelas reduções de
100% nos financiamentos — sim, 100%, cortes totais! — como pelo incumprimento de toda a legislação.
A legislação obriga ao lançamento de concursos — concursos, não ajustes diretos, note-se bem! —, mas
nenhum dos concursos a que a lei obriga foi aberto. Zero! Nada!
Protestos do Deputado do PSD Emídio Guerreiro.
E, ontem, o Sr. Secretário de Estado da Cultura veio ao Parlamento falar de cronogramas para eventuais
concursos para 2013! Sem abrir um único concurso este ano, sem nenhum compromisso concreto. Zero!
Nada!
Protestos do PSD.
Este Governo não só cortou os contratos assinados anteriormente como cortou, em 100%, tudo o que
dependia de si.
Durante algum tempo, o Secretário de Estado da Cultura tentou negar as evidências; agora, é já impossível
esconder.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Exatamente!
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Os concursos que não abriram este ano já não vão abrir. Continua o
Governo a repetir que tudo fará para que os prometidos concursos da Direção-Geral das Artes ou mesmo do
Instituto do Cinema e do Audiovisual, eventualmente, abram.
Sejamos francos: não tem orçamento, já não tem tempo e nunca teve vontade. Adiou!
Aplausos do BE.
Adiou, sempre, numa política de facto consumado, para que 2012 fosse um ano zero no financiamento à
cultura.
É certo que muito do que se vai fazendo em cultura, em Portugal, depende das autarquias, mas é certo
também que nas autarquias os problemas se avolumam. Sem nunca ter existido uma relação clara entre as
responsabilidades centrais e locais, não se construiu também nunca a autonomia dos equipamentos culturais
locais ou a transparência e continuidade das políticas locais. E, agora, sobre toda a fragilidade, mais cortes,
cortes cegos!
Há cidades portuguesas em que a programação do teatro municipal teve cortes de mais de 75%. Em
muitos casos, este ano ainda não foi pago, nem sequer assinado, qualquer contrato-programa com as
instituições culturais. E, em alguns casos, a autarquia deixou de financiar completamente os equipamentos
municipais e colocou essa responsabilidade e essa despesa a cargo das estruturas culturais locais.
Dizia o Sr. Secretário de Estado da Cultura, no debate do Orçamento do Estado, que «não há dinheiro» e
iria arranjar soluções. Sabemos, agora, que não foi capaz de arranjar uma única solução, mas sabemos
também que no BPN já foram o equivalente a 40 anos de orçamento da Secretaria de Estado da Cultura —
mais de seis séculos de apoio às artes! Não há dinheiro?! Não há dinheiro?! São seis séculos de apoio às
artes enterrados no BPN.
A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Exatamente!
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Parece ficção, tomara que fosse!
Quem faz arte e cultura, hoje, em Portugal sabe que o Governo é o seu pior inimigo: não financia, muda
regras a meio do jogo, subiu a luz, as taxas e tudo o que pode.
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Estruturas que se reformularam para baixar os custos viram todos os esforços gorados com o aumento da
taxa de IVA da eletricidade de 13% para 23%. Companhias que deixaram de poder pagar salários e segurança
social ficam sem acesso aos apoios anteriormente contratados porque têm dívidas. Profissionais que ficaram
sem trabalho são, hoje, voluntários naquele que era o seu posto de trabalho, e têm de recorrer à caridade.
Trabalho de décadas com escolas foi destruído. Há populações sem acesso ao direito constitucional de
«criação e fruição cultural». Coproduções internacionais abandonadas; residências artísticas canceladas;
saída forçada das redes europeias de programação.
O Governo está a conseguir o pleno: a desprofissionalização do setor e o encerramento das coletividades
amadoras.
Esta é a política da «terra queimada», que deixa à cultura, apenas, o lugar do Festival de Verão, do evento
pontual em Lisboa, no Porto ou em Guimarães, enquanto durar a festa da Capital da Cultura. Mas a cultura,
enquanto cidadania, conhecimento, vivência quotidiana e da comunidade, é mais do que indesejada pelo
Governo.
Já não é já o tão apregoado «livrar o Estado das artes», que PSD e CDS vão repetindo, é, sim, o Governo
a querer ver-se livre das artes.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente: — A Mesa regista três pedidos de esclarecimentos, a formular pelos Srs. Deputados
Miguel Tiago, do PCP, Inês de Medeiros, do PS, e Maria Conceição Pereira, do PSD.
Não sei como a Sr.a Deputada pretende responder…
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Responderei um a um, Sr.ª Presidente.
A Sr.ª Presidente: — Muito bem, Sr.a Deputada.
Tem, então, a palavra o Sr. Deputado Miguel Tiago.
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.a Deputada Catarina Martins, em primeiro lugar, dirijo-lhe
um cumprimento pelo tema que decidiu trazer ao Plenário, na sua declaração política, descrevendo, de facto,
uma situação que ganha contornos cada vez mais calamitosos no País.
O Grupo Parlamentar do PCP esteve presente na reunião de estruturas de criação artística de teatro que
referiu, que, aliás, deu origem a um comunicado público que demonstra bem o Estado a que se está a chegar
nas estruturas de criação artística por força da política de subfinanciamento. Mas pior do que uma política de
subfinanciamento é uma política ativa de censura financeira à livre produção artística. Esta política limita a
criação e, por essa via, limita também a fruição das populações, com todas as pressões culturais que não
sejam as da oferta massificada do mercado, que, entretanto, tudo vai cilindrando, enquanto o Governo esmaga
a produção cultural e artística, alternativa e independente, quando, aliás, deveria não só não esmagar como
promover, de acordo com a Constituição da República Portuguesa,…
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exatamente!
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — … que preconiza, defende e valoriza o direito à cultura em pé de igualdade
com os restantes direitos nela previstos.
Portanto, Sr.a Deputada, esta política não é uma política que nasce da falta de recursos, é uma política que
usa como pretexto a falta de recursos.
A falta de recursos é neste momento o pretexto que o Governo encontrou, como, aliás, faz em diversos
outros setores da sua intervenção política, para justificar o desmantelamento e a desfiguração do papel do
Estado no apoio às artes e à cultura, para garantir que vinguem apenas a cultura de mercado e aquilo a que
chamam as indústrias criativas, para que sejam eliminadas todas as expressões culturais e artísticas livres,
independentes e de cariz popular.
Neste ponto, friso que as coletividades e o movimento associativo popular também contam com cada vez
menos apoio, ao contrário do discurso do apoio ao voluntariado que perpassa o discurso do Governo.
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Vozes do PCP: — Claro!
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr.a Deputada, é verdade que o orçamento da cultura é de 200 milhões de
euros, mas alerto-a para o facto de o executado nunca ultrapassar os 100 ou 115 milhões de euros. Isto
significa que aquilo que se enterrou no BPN não são 40 anos de Orçamento do Estado da cultura, são 80 anos
de executado!
Por conseguinte, aquilo que o Governo, em poucos meses, «enfiou» no BPN, para tapar «buraco» deste
banco, significa cerca de 80 anos de financiamento de um setor inteiro, o que revela bem as prioridades que o
PS, o PSD e do CDS vão prosseguindo.
Sr.ª Deputada, o PCP sempre defendeu — esta posição não é de agora — o crescimento do financiamento
para o setor da cultura, para as políticas culturais e para o apoio às artes e à cultura. Aliás, tem defendido o
crescimento do orçamento deste setor até 1% do Orçamento do Estado, o que não sacrifica em momento
algum que continuemos a almejar e a defender o crescimento desse orçamento até 1% do produto interno
bruto, assim dando um contributo para que nos posicionemos num patamar digno de valorização das artes e
da cultura em Portugal.
A Sr.ª Presidente: — Sr. Deputado, peço-lhe que termine.
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Para o PCP, Sr.ª Deputada — e esta é também uma questão que lhe deixo
—, é muito evidente que a derrota do pacto de agressão das troicas, a derrota das políticas de direita, a defesa
e o resgate da democracia e da soberania nacionais são passos fundamentais para a defesa e a valorização
da liberdade de criação artística e cultural, bem como da sua fruição.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina Martins para responder.
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Miguel Tiago, agradeço-lhe a questão que
me colocou e, devo dizer, subscrevo inteiramente o que referiu: o pretexto é a falta de recursos, mas não é a
falta de recursos que justifica esta política.
Quando vemos as companhias históricas de Coimbra, de Faro, de Évora, de Braga, de Covilhã e da Serra
de Montemuro anunciarem que estão à beira da extinção, vemos uma política de desertificação do País —
desertificação cultural, desertificação de toda a capacidade de ação do País, de tudo o que significa acesso ao
conhecimento. O que nos dizem A Escola da Noite, em Coimbra, a ACTA, em Faro, o CENDREV, em Évora, o
Teatro do Montemuro, a Companhia de Teatro de Braga ou o Teatro das Beiras da história do nosso teatro, do
trabalho com as suas comunidades, da capacidade do País de ter acesso à arte fora de Lisboa e Porto, e a
situação em que se encontram agora!…
Não estava tudo perfeito, não, mas com este Governo, a pretexto da crise, que não é mais do que um
pretexto — porque como disse, e bem, Sr. Deputado, para tantas coisas se encontram orçamentos, e
orçamentos tão elevados —, quando chegamos à cultura a ideia é cortar.
Este é um País colonizado, a quem não é dado o direito a expressar-se, a criar e a conhecer-se. Reféns da
televisão, das grandes corporações do entretenimento, à população portuguesa o que este Governo quer dar é
só aquilo que tenha o mínimo custo por audiência e nunca a expressão, a criação, a capacidade de um povo
ter voz!
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Inês de Medeiros, para pedir esclarecimentos.
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A Sr.ª Inês de Medeiros (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Catarina Martins, também eu agradeço ter
trazido este tema ao Plenário, sobretudo a seguir à audição do Sr. Secretário de Estado da Cultura, em
comissão, há dois dias.
Importa relembrar aqui, brevemente, o Programa do Governo para a área da cultura, em concreto uma
frase: «vamos libertar a cultura do Estado». O que significa libertar a cultura do Estado? Significa pura e
simplesmente o Estado abandonar a cultura em Portugal, em todas as áreas. Abandonar! Abandonar,
obviamente, os apoios previstos.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Deputada fez muito bem em referir o «ano zero», porque quando falamos na abertura de concursos
no segundo semestre deste ano, na abertura de apoios a partir de Setembro, é óbvio que esses apoios são
serão realidade no ano seguinte, no próximo Orçamento do Estado. Ou seja, tudo o que o Governo conseguiu
foi este ano investir zero, zero, zero na cultura!…
Mas a frase não significa só isto, significa também libertar a cultura de qualquer estratégia cultural, de
qualquer ideia de política cultural. Se é verdade, Sr.ª Deputada, que as companhias que referiu estão em risco,
também é verdade que, através de uma série de diplomas que afetam o setor transversalmente, outros teatros
e outras entidades estão também em risco.
Quero aqui relembrar a justificação dada para extinguir o Ministério da Cultura: esta era uma matéria
transversal e, graças ao facto de o Sr. Secretário de Estado da Cultura estar muito próximo do Primeiro-
Ministro, com quem iria reunir-se todas as semanas — imagine-se! —, poder-se-ia discutir transversalmente as
políticas. Resultados: apoios à criação, zero; a lei das fundações, essa bela obra, põe em risco grandes
fundações, como a Casa da Música e o Centro Cultural de Belém (CCB), que não vão poder continuar a
funcionar com essa nova lei; a nova lei das empresas municipais põe em risco teatros, como por exemplo, o
Teatro Municipal da Guarda. Tenho aqui comigo justamente um documento em que é feito um alerta, em que
se diz que se a Culturguarda for extinta é o próprio trabalho do Teatro Municipal da Guarda que está também
em risco. Mas não é o único!…
Depois, vêm falar-nos em rede de cineteatros, o Sr. Secretário de Estado vem apelar à itinerância… Mas
onde? Em que espaços? Como?
Esta situação é de tal maneira dramática que devemos concluir que, no mínimo, é de um extremo mau
gosto ouvir o PSD desmentir que haja um investimento zero na cultura falando de Guimarães 2012 Capital
Europeia da Cultura, como aconteceu há dois dias.
A Sr.ª Francisca Almeida (PSD): — Não é verdade!
A Sr.ª Inês de Medeiros (PS): — Guimarães 2012 Capital Europeia da Cultura, que é um evento
muitíssimo importante, como sabemos, deve zero ao PSD. A iniciativa não foi do PSD e, se bem me recordo, o
PSD bem protestou contra o evento Guimarães 2012 Capital Europeia da Cultura. Lembro-me das audições
pedidas, que achavam um escândalo quanto se investia em Guimarães 2012 Capital Europeia da Cultura,…
Protestos do PSD e do CDS-PP.
… e há dois dias assistimos a este espetáculo extraordinário que foi ver o PSD defender a sua ausência
total de política, de pensamento e de vontade em qualquer matéria cultural com o evento Guimarães 2012
Capital Europeia da Cultura!… Meus senhores, isto é uma vergonha nacional, uma vergonha política, uma
vergonha social, uma vergonha económica!
Aplausos do PS.
Entretanto, assumiu a presidência a Vice-Presidente Teresa Caeiro.
A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina Martins para responder.
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A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Inês de Medeiros, agradeço a sua
pergunta e, devo dizer, subscrevo uma das palavras que utilizou para descrever o que tem sido a política
deste Governo para a cultura — embuste. Embuste naquilo que afirmou, embuste na forma como vai atuando
todos os dias.
A ideia de que algum dia iria abrir concursos que nunca abriu, o facto de ter ido sempre enganando os
agentes culturais, nunca cumprindo a lei e nunca assumindo os seus verdadeiros propósitos, foi também uma
forma de fragilizar todas as estruturas em todo o País, porque estas deixaram de saber com o que contavam e
com isso foram assumindo compromissos, que assumiam, naturalmente, porque era o que vinha na lei, era o
que a lei exigia. Foi o Governo que não cumpriu a lei, foi o Governo que deixou todo o setor ainda mais
fragilizado do que estava.
Mas é embuste também na transversalidade. Nunca será de mais lembrar que o Programa do Governo, o
Orçamento do Estado que aqui se aprovou e as suas Grandes Opções do Plano dizem que a grande aposta
na cultura será a educação. E não será também de mais lembrar que o Governo que tirou a Educação Visual e
Tecnológica da escola é também o Governo que está a cortar os apoios a todas as companhias que trabalham
com a escola pública, e é através destas companhias que as crianças e os jovens da escola pública têm
acesso ao teatro, à dança, à música.
Há cortes em todas as áreas, da educação à cultura nada restou. Acima de tudo, isto é negar o acesso ao
conhecimento das populações, é obscurantismo, é um País isolado, incapaz de agir, incapaz de ter acesso à
sua própria voz.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Conceição Pereira para um
pedido de esclarecimento.
A Sr.ª Maria Conceição Pereira (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Catarina Martins, muito obrigada
por ter trazido este assunto a debate. De resto, foi também bom ouvir a Sr.ª Deputada Inês de Medeiros
mostrar a sua indignação.
Sr.ª Deputada, também acho que «temos que criar condições no nosso País para os artistas e agentes
culturais terem mercado. Isto fará com que um maior número de agentes esteja na atividade como contratado
e não como dependente de subsídios.». Isto foi dito pela Sr.ª Deputada Gabriela Canavilhas.
Vozes do PSD: — Bem lembrado!
A Sr.ª Inês de Medeiros (PS): — E então?
A Sr.ª Maria Conceição Pereira (PSD): — É bom que nos lembremos disto! Esta afirmação foi publicada
no jornal Público —se quiser mostro-lhe uma cópia.
Ainda ontem referi que estamos aqui para encontrar caminhos que nos reorientem para outras estratégias
que não a subsidiodependência nem a constante dependência do Orçamento do Estado — estas foram
palavras do Governo do PS em março de 2011. Esquecem-se!… A memória é curta!…
Sr.ª Deputada Catarina Martins, provavelmente trouxe hoje este tema a debate porque sentiu, há dois dias,
que ficou sem tema, e, então, quis relançá-lo. Não ouviu bem!… Não quis entender!… O Sr. Secretário de
Estado da Cultura esclareceu aqui que os compromissos para 2011 foram cumpridos em 99,7% relativamente
ao que estava orçamentado.
Risos da Deputada do BE Catarina Martins.
Não se ria, Sr.ª Deputada, porque isto é sério para os portugueses!
Disse também que este ano já foram pagos cerca de 6 milhões de euros relativos a compromissos
assumidos em acordos.
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Sr.ª Deputada, devo dizer-lhe que também eu tenho algumas dificuldades em acreditar naquilo que diz,
porque, às vezes, cria aqui um País e pode julgar-se que é o único País que a Sr.ª Deputada, provavelmente,
conhece. A Sr.ª Deputada teve a honra de visitar o meu concelho, de conversar com os agentes culturais, mas
não foi capaz de referir que temos uma companhia profissional, a única que existe entre Lisboa e Coimbra,
que saiu de Évora por não ter apoios e que neste momento continua a existir, recebendo da autarquia mais de
60 000 € de apoio e para a qual vai ser construído um teatro pela autarquia que vai custar 500 000 €. Portanto,
fora das grandes cidades há cultura, fora das grandes cidades os teatros e as companhias profissionais
funcionam. Refiro-me ao Teatro da Rainha, não sei se conhece. Isto é verdade, e foi o PSD que o fez!
No PSD não temos má consciência porque, em tempos em que não eram pedidos sacrifícios aos
portugueses, como acontece hoje, os maiores orçamentos para a área da cultura aconteceram no tempo do
PSD, quando havia essa possibilidade.
Numa altura em que estão a ser pedidas muitas exigências aos portugueses há que racionalizar sem pôr
em causa. Tem havido um grande diálogo da Secretaria de Estado da Cultura com todos os agentes e foi dito
na terça-feira a todos os Srs. Deputados que este setor não iria ser posto em perigo e que no segundo
semestre vão ser abertos os concursos plurianuais.
Protestos da Deputada do BE Ana Drago.
A Sr.ª Deputada não estava na reunião! Não vale a pena gritar porque não me assusto com os seus gritos!
V. Ex.ª pode gritar, mas não sou surda!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Sr.ª Deputada, foi dito pelo Sr. Secretário de Estado que vão ser abertos, até ao final deste mês, os
concursos plurianuais para 2013 e para os anos subsequentes…
O Sr. João Oliveira (PCP): — Quem a ouviu e quem a ouve, Sr.ª Deputada!
A Sr.ª Maria Conceição Pereira (PSD): — … e que está a ser feito um grande esforço para ainda este ano
serem abertos os concursos pontais para 2012.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr.ª Deputada, registo apenas que utilizou o dobro do tempo de que
dispunha.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina Martins, para responder.
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Maria Conceição Pereira, como sabe,
estive presente na audição com o Sr. Secretário de Estado da Cultura e ouvi-o muito atentamente.
O que a Sr.ª Deputada nos diz agora é exatamente o mesmo que nos disse o Sr. Secretário de Estado:…
Vozes do PSD: — É a verdade!
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — … de 2011 só cumpriu parte, não cumpriu tudo; de 2012, zero; para 2013
logo se vê.
Sr.ª Deputada, o que é que vai dizer à companhia de Évora? O que é que tem a dizer a Braga? O que é
que tem a dizer a Faro? O que é que tem a dizer a Montemuro? O que é que tem para dizer a Viseu? O que é
que tem a dizer a Tondela? O que é que tem a dizer a Portalegre, onde o contrato com as escolas não pode
ser cumprido de modo a realizarem-se os espetáculos?
Sr.ª Deputada, reuni com companhias de todo o País e sei bem que por todo o País as companhias foram
obrigadas a despedir, em muitos casos, mais de metade dos seus profissionais, sei bem que os protocolos
com a escola pública estão a ser cancelados por não haver dinheiro para os espetáculos, e a Sr.ª Deputada
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vem aqui falar-nos de 2011 e fazer promessas vagas para 2013, fazendo de conta que 2012, que é o ano em
que estamos, nem sequer existe, sem nenhuma resposta concreta para Braga, Coimbra, Montemuro, Évora,
Faro, Covilhã, cujas companhias vieram dizer-nos que estão à beira da extinção!…
Sr.ª Deputada, deste Governo não precisamos de ouvir mais nada; para a cultura não têm nada a dizer!
Aplausos do BE.
A Sr.ª Gabriela Canavilhas (PS): — Sr.ª Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Faça favor, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Gabriela Canavilhas (PS): — Sr.ª Presidente, é para pedir à Sr.ª Deputada Maria Conceição Pereira
uma cópia das minhas declarações que citou.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Presumo que queira que a Sr.ª Deputada Maria Conceição Pereira o
faça através da Mesa, senão não teria feito uma interpelação.
A Sr.ª Gabriela Canavilhas (PS): — Exatamente, Sr.ª Presidente.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Imagino que a Sr.ª Deputada Maria Conceição Pereira esteja em
condições de fazer chegar o documento à Mesa. Se assim for, será fotocopiado e distribuído por todas as
bancadas.
Srs. Deputados, passamos à última declaração política de hoje, para o que tem a palavra o Sr. Deputado
Carlos Abreu Amorim, do PSD.
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: No passado dia 28 de maio, o
Governo assinou com a Associação Nacional de Municípios Portugueses um memorando de acordo que
constitui um ensejo de consenso no mundo do poder local.
No momento em que algumas forças partidárias, obedecendo a uma agenda política centralizada, tentam
forçar o conflito, a crispação pura e simples junto dos líderes locais, é muito significativo que o Governo e
aquela que é, inequivocamente, a Associação mais representativa do poder autárquico português tenham a
grandeza de encontrar muitos pontos comuns por entre alguns interesses divergentes que, como é natural,
ainda subsistem.
O Sr. Pedro Lynce (PSD): — Muito bem!
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Este memorando de acordo é a comprovação de que o Governo
permanece firme no seu caminho de instituir as profundas transformações de que Portugal carece, através do
método expressamente referenciado no texto do próprio memorando, o diálogo permanente que a democracia
aconselha e a boa política enaltece.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Portugal só conseguirá ultrapassar as presentes dificuldades
através de reformas negociadas e consensualizadas com aqueles que estiverem à altura de as poderem
protagonizar.
Este esforço já tinha sido notado com a conclusão do acordo social celebrado entre o Governo, sindicatos e
confederações patronais em Janeiro último. No momento presente, volta a ser patente a inclinação do
Governo para a obtenção de consensos, que tantos juravam impossíveis, com este memorando de acordo.
Os municípios portugueses têm agora à sua disposição o Programa de Apoio à Economia Local, hoje
mesmo aprovado em Conselho de Ministros, que inclui o pagamento a 90 dias das dívidas vencidas até 31 de
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março, contendo, também, uma linha de crédito no valor de 1000 milhões de euros para as dívidas já vencidas
há mais de 90 dias.
O Sr. Pedro Lynce (PSD): — Muito bem!
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Com este Programa de Apoio à Economia Local, vai adquirir-se
uma importante revitalização das economias locais e, a partir de estas, reanimar o tecido económico nacional.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Mas o memorando de acordo vai ainda mais longe, estabelecendo
uma concordância genérica com a lógica da Lei dos Compromissos e com o rigor orçamental que esta exige,
revelando uma consonância de pontos de vista acerca da aplicação das novas regras do IMI em 2013, 2014 e
2015, em articulação com a futura Lei das Finanças Locais, parte integrante da presente reforma do poder
local, tendo o Governo assumido o compromisso de não reduzir as transferências no Orçamento do Estado de
2013.
O Sr. Pedro Lynce (PSD): — Muito bem!
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — São ainda abarcadas um conjunto de condições sobre a
reprogramação do QREN, instrumento essencial, e nesta reprogramação e na sua avaliação contínua existirá
uma comparticipação de 85% do Estado nas candidaturas dos municípios, com predominância dos programas
Impulso Jovem e Equipamentos Escolares, para os quais são libertados recursos no valor de 250 milhões de
euros.
Por último, o memorando de acordo faz um reconhecimento declarado do papel determinante e inadiável
da reforma da administração local presentemente em curso, salientando, como já disse, o diálogo permanente
que tem existido em todo o seu percurso.
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: É a propósito da reforma do governo local que se têm levantado um
conjunto de dúvidas e imprecisões, tantas vezes, infelizmente, apenas ancoradas no árido intuito de deixar
tudo como dantes, confessando o estado de obstinação permanente contra a mudança que tem singularizado
a esquerda radical.
Lembraram-se agora de lançar uma nebulosa — e não no sentido astronómico da expressão — sobre as
regras de contagem de prazo da Lei n.º 22/2012 e, nomeadamente, quanto ao prazo de pronúncia das
assembleias municipais, previsto no artigo 12.º da referida Lei.
Com a intenção de clarificar as dúvidas eventuais, mesmo quando se desconfia da sua existência real, o
Grupo Parlamentar do PSD afirma que os prazos da Lei devem ser contados de forma corrida, como diz o
jargão jurídico, isto é, incluindo-se sábados, domingos e feriados, e ainda que, de acordo com o artigo 20.º da
referida Lei, essa contagem se suspenda durante as férias judiciais.
A intenção da maioria que aprovou a Lei é não permitir que um prazo tão relevante decorra e termine
durante o mês de Agosto, período em que seria altamente improvável que as assembleias municipais
funcionassem de modo curial. Qualquer outra interpretação acarretaria uma diminuição material de um prazo
de decisão que o Grupo Parlamentar do PSD pretende completo, de modo a permitir uma adequada
ponderação e responsabilização dos órgãos locais na pronúncia exigida por lei.
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Pela terceira vez na última década, coloca-se à democracia portuguesa o
desafio de alterar o nosso sistema eleitoral autárquico. Esta mudança é vista por muitos como essencial, mas
por razões diversas de conjuntura política não foi levada a cabo e o Grupo Parlamentar do PSD não enjeita as
suas responsabilidades no passado quanto a esses adiamentos.
Mas este não é o tempo para recordatórias inconsequentes. Ao contrário, este é o tempo de perfazer as
reformas há muito adiadas.
O Partido Socialista já afirmou ter um projeto de uma nova lei eleitoral autárquica. Os Grupos
Parlamentares do PSD e do CDS-PP também possuem um projeto próprio. De acordo com as declarações
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públicas de dirigentes partidários, não existem diferenças substanciais nas soluções legislativas que ambos os
projetos enunciam.
Assim, não há qualquer razão, material ou ideológica, que impeça um entendimento prévio à apresentação
formal dos dois projetos que carecem de uma maioria de dois terços para a sua aprovação.
Sr.ª Presidente e Srs. Deputados: Não deixemos que o mero taticismo político seja, uma vez mais, um
óbice para o progresso do País. O Grupo Parlamentar do PSD, pela voz do seu líder, Dr. Luís Montenegro,
ainda hoje convidou o Grupo Parlamentar do Partido Socialista e do CDS-PP a encetarem um processo formal
de negociações, tendo em vista um ajustamento de pontos de vista que dê uma boa perspetiva para a
conclusão de esta reforma estrutural. Reiteramos, aqui e agora, esse convite.
Saibamos todos, sobretudo os agentes políticos, estar à altura deste momento histórico e das
responsabilidades que nele nos cabem.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr. Deputado Carlos Abreu Amorim, a Mesa regista três pedidos de
esclarecimento.
Para o efeito, em primeiro lugar, tem a palavra o Sr. Deputado Mota Andrade.
O Sr. Mota Andrade (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Carlos Abreu Amorim, mais uma vez V. Ex.ª
trouxe aqui um tema importante, o do poder local. Mas deixe-me afirmar, em nome do Partido Socialista, que o
desrespeito pelo poder local tem sido uma constante deste Governo.
Aplausos do PS.
O princípio constitucional de autonomia local tem sido, todos os dias, colocado de lado por este Governo. E
há duas provas, claras e inequívocas, disso: desde logo, a forma como decorreu o congresso da Associação
Nacional de Freguesias e também agora, ao sabermos que irá existir um congresso extraordinário da
Associação Nacional dos Municípios Portugueses, que é, lembro, curiosamente, apoiado por muitos autarcas
do seu partido, o Partido Social Democrata.
Aplausos do PS.
Esta é a prova clara da forma, da má forma como VV. Ex.as
têm tratado o poder local.
Sr. Deputado, sobre lei eleitoral autárquica, deixe-me dizer-lhe o seguinte: pelo Partido Socialista, já existia
uma nova lei eleitoral autárquica desde 2007. Portanto, perdemos cinco anos.
Aplausos do PS.
Pela nossa parte, temos toda a disponibilidade para, em acordo com VV. Ex.as
, porque é necessária uma
maioria qualificada, fazermos essa importante reforma. Venha, pois, esse projeto que V. Ex.ª anunciou que, da
nossa parte, de imediato, entregaremos o nosso projeto.
Mas quem rompeu esse acordo e fez perder cinco anos foram VV. Ex.as
. Tomem, pois, a iniciativa que, da
nossa parte, porque há muito tempo pugnamos por essa reforma, terão resposta de imediato.
Aplausos do PS.
Mas, Sr. Deputado, deixe-me dizer-lhe outra coisa que me parece muito importante. V. Ex.ª abordou o
memorando de entendimento entre a Associação Nacional de Municípios Portugueses e o Governo. Quanto a
nós, há aspetos positivos nesse memorando — já o afirmámos. Desde logo, vai facilitar alguns pagamentos de
algumas autarquias, dando-lhes alguma folga de tesouraria. Vai também ter outro aspeto muito importante: o
Governo, finalmente, recua na Lei dos Compromissos. Ao fim de tantos meses, o Governo recua. Estes são
aspetos positivos.
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Mas tem aspetos muito negativos. E o primeiro aspeto muito negativo é o aumento enorme de dificuldades
que vai criar, num momento difícil do País, a todos os cidadãos, ou melhor, a todos os munícipes daquelas
autarquias que recorrerem a essa linha de crédito. Não é aceitável que se obrigue a que todas as taxas
passem para o seu valor máximo! Sendo um programa que se diz de apoio às economias locais — o Sr.
Deputado disse que este programa é para revitalizar as economias locais —, como explicar o aumento dessas
taxas? Vai é tirar aos cidadãos dinheiro que mexa com essas economias locais.
A Sr. Presidente (Teresa Caeiro): — Tem de terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Mota Andrade (PS): — Termino já, Sr.ª Presidente.
Por último, há um aspeto importantíssimo a ter em conta. O Sr. Deputado falou em 250 milhões de euros. É
verdade, mas convém lembrar que esses 250 milhões de euros são retirados às autarquias e eram
fundamentais, porque se trata de projetos já aprovados através do QREN e era fundamental que isso existisse
porque, isso sim, iria revitalizar o tecido económico local.
Portanto, Sr. Deputado Carlos Abreu Amorim, explique-nos lá esta grande incoerência. Como é que podem
chamar a isto medidas de dinamização da economia local quando o que fazem é retirar dinheiro à economia
local?
Aplausos do PS.
A Sr. Presidente (Teresa Caeiro): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino
Soares.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Carlos Abreu Amorim, o memorando
que aqui veio apresentar — parece que, para a semana, vai haver uma iniciativa do Governo sobre esta
matéria, mas o Sr. Deputado quis aqui vir antecipar a sua apresentação (está no seu direito) — é inseparável
do Memorando de Entendimento, aquilo a que temos vindo a chamar, com grande propriedade, o pacto de
agressão sobre o povo e o País, que inclui uma série de medidas de combate ao poder local democrático, de
amesquinhamento e atrofiamento do poder local democrático. Este acordo vai também nesse sentido.
Há vários anos, as autarquias estão sujeitas, até com governos anteriores, a uma sucessiva ofensiva no
plano do financiamento, no plano das regras que lhes são impostas, de que a Lei dos Compromissos é um
bom exemplo, e que visa a sua governamentalização, a retirada e a restrição da sua autonomia de forma a
que elas percam aquela que é a sua maior valia, que é serem representantes legítimos eleitos
democraticamente pelo povo português, pelo povo dos municípios, pelo povo das freguesias e terem
autonomia na prossecução das suas competências, coisa que agora lhes está a ser progressivamente
retirada.
A sua intervenção vem também clarificar uma questão que ainda bem que o PCP levantou, porque, como o
Sr. Deputado bem sabe, ela não estava clarificada. E como o Sr. Deputado bem sabe, até melhor do que eu, a
primeira interpretação do Governo não era essa. E o que estava previsto era que o prazo terminasse no final
do mês de Agosto, impedindo assim um debate mais alargado desta matéria.
Portanto, era mais uma trapalhada como aquelas a que temos vindo a assistir nas últimas semanas, na
Assembleia da República, em matérias autárquicas e administrativas.
Ainda bem que o Sr. Deputado veio confirmar que o prazo é corrido, mas que se interrompe nas férias
judiciais — esse dado é muito importante.
Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Carlos Abreu Amorim, quero ainda dizer que, em matéria de extinção de
freguesias, pode estar certo que não vamos alinhar na farsa política montada a propósito de uma unidade que
pretende ser técnica para disfarçar opções políticas, porque isso é o que os senhores querem para disfarçar a
opção de eliminar mais de 1000 freguesias do nosso país.
Podem até entender-se com o Partido Socialista em matéria de lei eleitoral para impor o presidencialismo
que significará menos transparência, mais opacidade e um campo mais fértil para a corrupção e para a
dificuldade de fiscalizar as autarquias. Mas connosco não contam, nem para reduzir a autonomia das
autarquias nem para diminuir a sua democraticidade.
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Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Ainda para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado
Altino Bessa.
O Sr. Altino Bessa (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Carlos Abreu Amorim, trouxe-nos aqui um
tema muito importante, que se prende com a vida do poder local, das autarquias.
Efetivamente, ao longo destes últimos anos, assistimos a uma desregulação do poder local e da falta de
controlo que o mesmo tinha. Assistimos, ao longo destes últimos anos, a um endividamento excessivo do
poder local — julgo que isto é consensual. Assistimos, ao longo destes últimos anos, a uma falta de
monitorização de todo o setor empresarial local, chegando ao ponto de não saber sequer quantas empresas
municipais existiam no País.
Vozes do CDS-PP: — É verdade!
O Sr. Altino Bessa (CDS-PP): — Agora, feito o retrato e o levantamento do endividamento das empresas e
das próprias autarquias, o Governo chegou a este pré-entendimento, e bem, com a Associação Nacional de
Municípios Portugueses no sentido de disponibilizar uma linha de crédito de mil milhões de euros para que os
municípios que estão numa situação de endividamento excessivo possam, através dessa linha, reequilibrar as
suas finanças, nomeadamente para que as dívidas com menos de 90 dias possam ser pagas.
Sr. Deputado Mota Andrade, trata-se de revitalizar a economia local, porque a asfixia da economia local
ocorreu ao longo destes anos pelo não pagamento por parte das autarquias aos seus fornecedores. Esse é
que foi o grande problema. O Sr. Deputado conhece, como eu, inúmeras empresas que prestam serviços às
autarquias e que têm pagamentos em atraso desde há muitos meses e, nalguns casos, há vários anos.
O CDS, nesse propósito, não cede. O CDS é muito rigoroso no que tem a ver com gestão do dinheiro dos
contribuintes — veja o exemplo de Ponte de Lima, se quiser, Sr. Deputado Mota Andrade — e aquilo que o
CDS sempre defenderá, quer com a Lei dos Compromissos, quer agora com este entendimento, é que haja
um rigor e um critério fundamental e muito apertado quanto aos dinheiros públicos.
Sr. Deputado Carlos Abreu Amorim, relativamente à lei eleitoral autárquica, pelos vistos já temos um ponto
de partida, que é a proposta de 2007. Pergunto, pois, se há disponibilidade por parte do PSD — ela existe por
parte do CDS-PP — para discutir, não só com o Partido Socialista, mas também com as outras bancadas,
para que se faça uma lei que sirva o novo poder autárquico, que tem de ser reformulado porque já demonstrou
que tal como está não serve os interesses das populações.
Aplausos do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Abreu Amorim.
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Mota Andrade, agradeço as questões
que me colocou.
O Sr. Deputado começou por dizer que o que tem pautado a atitude deste Governo em relação ao poder
local é uma posição de desrespeito. Ora, não consigo compreender como é que julga ser desrespeito uma
reforma que está em curso há bastantes meses e que é designada pela própria Associação Nacional de
Municípios Portugueses como estando a ser feita em clima de diálogo permanente.
Não consigo compreender onde é que está o desrespeito pelo poder local quando a sua associação mais
representativa acabou de assinar um acordo de entendimento em matérias extremamente vastas que não
tangem única e exclusivamente a macroquestão, referida pelo Sr. Deputado Altino Bessa, do endividamento
de grande parte dos municípios portugueses, mas que vai mais longe. É que este acordo, este memorando de
entendimento, como acabei de dizer na minha intervenção, refere expressamente uma concordância genérica
com a Lei dos Compromissos, com a necessidade de reprogramação do QREN, com as regras acerca do IMI
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e também com a mesma reforma do governo local que o Governo está a levar a cabo, reconhecendo a sua
necessidade e reconhecendo como válido o método em que ela está a ser realizada.
O Sr. Deputado Mota Andrade fala em congressos, fala em atitudes políticas, mas eu cinjo-me a factos.
Temos um acordo bom para Portugal. Temos um acordo que busca o consenso desta área política, onde
tantos e tantos — e espero que não seja esse o papel do Sr. Deputado e do Grupo Parlamentar do Partido
Socialista — apenas têm tentado criar conflito, crispação e confusão.
O Sr. Luís Menezes (PSD): — Muito bem!
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Este acordo é clarificador e é partir daqui que temos de construir as
bases da restauração do País e, já agora, da autonomia local em Portugal, que tem sido tão mal tratada.
O Sr. Deputado diz: «O Governo recua na lei dos compromissos». Sr. Deputado, vou dizer-lhe, com todo o
respeito que tenho por si, e que é muito: o Sr. Deputado fala muitas vezes numa perspetiva de recuo e avanço
e recuo em posições políticas. Não temos essa perspetiva ferroviária da política. A política não é feita de
avanços e recuos. A política é feita de construção de projetos,…
Aplausos do PSD.
… e este Memorando de Entendimento consubstancia a construção de um projeto político coerente e
idóneo, Sr. Deputado, e o Partido Socialista faria melhor em estar connosco nesta matéria e em não se colocar
para já, como o fez tantas vezes, em atitudes similares à da esquerda radical.
Aplausos do PSD.
Por falar em esquerda radical, Sr. Deputado Bernardino Soares, a lei relativa à reorganização territorial
autárquica é matéria de competência exclusiva da Assembleia da República, a qual não é obstaculizada ou
menorizada pelo facto de uma proposta de lei do Governo ter sido discutida na especialidade e aprovada pela
Assembleia da República. Os grupos parlamentares que a aprovaram, os do PSD e do CDS, são os
responsáveis por esta reforma e foram eles, aliás, que inseriram a parte normativa do artigo 20.º, que se refere
ao Código de Processo Civil.
Portanto, cabe ao legislador material dizer qual é a intenção do legislador e não tanto ao Sr. Deputado
tentar alvitrar qual seria a intenção daquele ou daqueloutro em relação a esta ou a outras matérias.
Há uma matéria sobre a qual o Sr. Deputado está radicalmente enganado — para continuar a usar um
adjetivo que me aprece adequado —, que é a de que uma eventual reforma da lei eleitoral autárquica levaria a
uma presidencialização. Sr. Deputado, desculpe que lhe diga, mas anda distraído, porque presidencialização
em sentido material é o que temos agora, contra legem e contra a Constituição.
As regras únicas, singulares, mas não razoáveis que estão em vigor, e que contrariam o próprio espírito da
Constituição de 1976, levaram a que, na esmagadora maioria dos municípios, existisse uma
presidencialização material quando o presidente de câmara nem sequer é referido como órgão em sentido
formal, nem na Constituição nem na lei.
Portanto, queremos corrigir essa situação. Queremos que Portugal tenha um sistema de democracia local
que seja comparável com aquilo que se faz no resto do mundo.
Sr. Deputado, não há nenhum país no mundo em que o órgão executivo colegial seja eleito por sufrágio
direto e universal. Não há nenhum país do mundo onde exista a figura dos vereadores de oposição.
O Sr. Deputado julga como conveniente a manutenção dessas bizarrias, mas nós julgamos que elas não
têm provado bem e que devem ser alteradas, sendo isso que também nos distingue, Sr. Deputado!
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — O Sr. Deputado Altino Bessa, a quem agradeço a questão, chamou
a atenção para uma matéria: se o País está mal e se temos uma questão financeira e económica
extremamente deficitária, não há dúvida alguma de que as autarquias locais também não estão nada bem.
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Gostaria de concluir dizendo que se a injeção de 1000 milhões de euros mais o apoio a projetos municipais
de 250 milhões de euros é afetar a economia local e é esmagar as finanças dos municípios, desculpem, mas
penso que é o «mundo ao contrário» e não é por aqui, não é desta maneria que devemos avaliar um acordo,
que é bom e que se vai repetir também noutras matérias da governação portuguesa!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Gabriela Canavilhas (PS): — Peço a palavra, Sr.ª Presidente.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para que efeito, Sr.ª Deputada?
A Sr.ª Gabriela Canavilhas (PS): — Para uma interpelação à Mesa, Sr.ª Presidente.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Queira explicar qual é o sentido da interpelação, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Gabriela Canavilhas (PS): — Há pouco, foi citada, pela Sr.ª Deputada Conceição Pereira, de forma
incorreta, uma entrevista minha. Neste momento, tenho comigo o texto da entrevista, que me foi fornecido pela
própria bancada do PSD, pelo que quero retificar a citação que foi feita.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr.ª Deputada, não estou a ver bem qual é o enquadramento da sua
interpelação, mas vou assumir que pretende que a entrevista seja distribuída.
A Sr.ª Gabriela Canavilhas (PS): — Não, não, Sr.ª Presidente. A entrevista já foi distribuída e confirma-se,
pela sua leitura, que a Sr.ª Deputada me citou erradamente, deixando mal o Partido Socialista.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr.ª Deputada, ficam as suas declarações, com muito boa vontade
da mesa.
A Sr.ª Gabriela Canavilhas (PS): — Sr.ª Presidente, o que foi dito e está escrito nessa entrevista é o
contrário do que foi dito pela Sr.ª Deputada Conceição Pereira.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr.ª Deputada, ficou claro o seu ponto.
A Sr.ª Gabriela Canavilhas (PS): — Não é necessário, então, retificar mais do que isto?
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — A Sr.ª Deputada não se revê nas afirmações da Sr.ª Deputada
Conceição Pereira.
A Sr.ª Gabriela Canavilhas (PS): — Espero que fique claro, para toda esta Câmara, que o que foi dito é
falso.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr.as
e Srs. Deputados, depois desta interpretação extensiva por
parte da Mesa de uma interpelação à Mesa, vamos passar ao segundo ponto da nossa ordem de trabalhos de
hoje, que consiste na discussão conjunta dos projetos de resolução n.os
318/XII (1.ª) — Recomenda ao
Governo a adoção de medidas para baixar a fatura da eletricidade e do gás e aumentar a competitividade da
economia (PS), 343/XII (1.ª) — Uma estratégia para a promoção de combustíveis alternativos na mobilidade
rodoviária (PCP) e 347/XII (1.ª) — Recomenda a adoção de mecanismos de transparência relativos aos custos
da energia e às medidas de eliminação das rendas excessivas (BE).
Tem a palavra, para proferir a primeira intervenção, e para apresentar o projeto de resolução do PS, o Sr.
Deputado Carlos Zorrinho.
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O Sr. Carlos Zorrinho (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Ao iniciar funções, o atual Governo
tomou quatro medidas marcantes na área da energia.
A primeira dessas medidas foi a de aumentar a taxa do IVA na energia para 23% e, com isso, desperdiçou
toda a negociação que tinha sido feita com a troica no sentido de ter em conta que Portugal aposta fortemente
nas energias renováveis e, por isso, poderia ter um aumento apenas para a taxa intermédia.
A segunda intervenção foi no sentido de privatizar os principais operadores sem ter em conta as condições
de concorrência nem de salvaguarda dos interesses estratégicos.
Gostava de chamar a atenção para o facto de continuarmos à espera da regulamentação do artigo 27.º,
alínea a), da Lei das Privatizações. O Governo tinha 40 dias para fazer essa regulamentação e o prazo já
derrapou outro tanto tempo.
Em terceiro lugar, o Governo travou a aposta que o País estava a fazer e que o tornava um País
reconhecido como pioneiro naquilo em que hoje toda a Europa fala como alicerce da nova industrialização, ou
seja, a economia verde.
Em quarto lugar, o Governo adiou por quase um ano as medidas desenhadas de racionalização e corte de
rendas, que se tornaram excessivas face ao contexto de sacrifício e contenção que o País vive.
Ao longo deste período, com sentido de Estado, o Partido Socialista nunca deixou de fazer propostas
construtivas ao Governo no setor da energia, as quais foram sendo sucessivamente chumbadas.
Finalmente, com a vinda da troica, o Governo tomou medidas, muitas delas em linha com aquilo que o
Partido Socialista propunha há quase um ano. Saudamos essa abertura e esperamos que a maioria aprove a
nossa resolução de forma a tornar possível a concretização, em Portugal, de uma política energética que
defenda os consumidores, que defenda a economia, que construa uma alavanca para a competitividade à
escala global e uma política energética que tire partido dos nossos recursos endógenos, que reduza as
importações de combustíveis fósseis e que aumente a nossa autonomia estratégica.
Recordo, Sr.as
e Srs. Deputados, que Portugal tem metas ambiciosas a atingir.
Naquele programa nacional de reformas, que, antes, quando era entregue em Bruxelas era, em simultâneo,
colocado num site nacional, enviado ao Sr. Presidente da Assembleia da República e ao Presidente da
Comissão de Assuntos Europeus — era uma boa prática — e que o Governo agora não alterou, constam os
objetivos de ter 31% de consumo energético proveniente de recursos endógenos, 20% de aumento da eficácia
energética e 20% de redução de emissões de CO2.
Ora, há duas formas de atingir estas metas: uma, é apostar nas energias renováveis, criar um pilar da nova
industrialização de crescimento e criar empregos; outra, é a que os senhores estão a usar, ou seja, asfixiar a
economia.
É evidente que se se asfixiar a economia há menos consumo e há uma maior taxa de produção endógena,
há menos consumo e há mais poupança energética, há menos consumo e há menos emissões.
Nós apostamos no primeiro caminho, que conduz a um défice tarifário nulo em 2020. Aliás, os défices
tarifários em Portugal, ao contrário do que tem sido dito, foram sempre originados pelas energias térmicas e
nunca pelo sobrecusto das energias renováveis.
A questão-chave que está aqui em causa, Srs. Deputados, é a seguinte: que caminho quer seguir a
maioria? Quer seguir o caminho de Portugal pioneiro na energia verde, na reindustrialização e numa opção de
criação de emprego e de valor? Então, vote a nossa resolução. Se não a votar significa que quer pôr de lado o
caminho de uma década em que Portugal progrediu, criou emprego e criou valor.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho
Lopes.
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: O Partido Socialista não tem
emenda nesta matéria da energia.
Vozes do PSD e do CDS-PP: — Não é só nessa!
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O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — E noutras!
O PS apresentou-nos, hoje, medidas, segundo o texto do projeto de resolução, para baixar a fatura da
eletricidade e do gás e aumentar a competitividade da economia, o mesmo PS que, no governo, fez o que fez,
e que, nesta Assembleia, disse o que disse sobre energia.
Não foi o Primeiro-Ministro Eng.º Sócrates, Srs. Deputados, que disse isso; foram alguns dos que hoje aqui
se sentam como Deputados e que ontem eram ministros ou secretários de Estado — aliás, um era até ministro
da economia e outro era secretário de estado da energia.
Vozes do PCP: — Bem lembrado!
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Esses Deputados votaram, nesta Câmara, contra todas as propostas do
PCP no sentido de baixar a fatura da energia, do gás e dos combustíveis e de melhorar a competitividade da
economia, sem terem apresentado qualquer alternativa.
Por exemplo, Sr. Deputado José Junqueiro, a propósito de declarações suas de há poucas horas, o que
poderá dizer quanto ao facto de, há pouco mais de um ano, em março 2011, o PS ter votado contra medidas
de um projeto do PCP que agora constam do vosso projeto de resolução em debate?
O que tem a dizer sobre isto o PS, que inventou o défice tarifário, a garantia de potência e uma
extraordinária fórmula de atualizar e pagar as rendas dos terrenos das barragens?
Como é possível que o PS, que subscreveu, com o PSD e o CDS, o pacto de agressão da troica, onde se
avança para a privatização total da EDP, da REN e da GALP — privatizações, aliás, iniciadas e desenvolvidas
por governos do PS —, onde se insere a subida do IVA para a eletricidade e o gás natural, onde se estabelece
a liberalização das suas tarifas, apareça hoje, feito anjinho, passado pela água benta do projeto de resolução,
lavado de responsabilidades políticas, clame contra as privatizações, a liberalização das tarifas e o aumento
do IVA?!
E se o PS não tem emenda, o PSD e o CDS não querem emendar, ou melhor, querem uma emenda na
energia, mas muito devagarinho e muito pequenina, de forma a que a EDP, a Iberdrola e a Endesa não sintam
beliscados os seus fabulosos lucros. Diz a EDP que todas estas medidas a vão afetar — imaginem o valor
extraordinário dos lucros da EDP que vão ser afetados! — em 1%, segundo os seus cálculos.
Em relação à subida do IVA e dos preços tudo foi rápido! Ainda não tinham decorrido dois meses sobre a
tomada de posse deste Governo e já os portugueses pagavam mais 17 pontos percentuais na eletricidade e
no gás natural no quarto trimestre de 2011. Mas o que era para cortar à EDP e a outras empresas vai como
uma tartaruga, tão lentamente que, passado um ano, ainda não aconteceu!
Quanto à dimensão da eliminação das rendas e lucros excessivos, o ex-secretário de estado da energia, o
tal que foi atropelado por esses lucros/rendas excessivos, afirmou no seu último discurso, que não chegou a
proferir, o seguinte: «As rendas excessivas e a atual garantia de potência impactam fortemente na
sustentabilidade do setor elétrico, estando a desviar da concorrência e das famílias recursos num valor global
de cerca de 3500 milhões de euros até 2020. Em termos anuais, as rendas representam cerca de 370 milhões
de euros».
Ora, o Governo PSD/CDS quer cortar apenas 1800 milhões, e muito devagar!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Devagar, mas corta!
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Para os portugueses e pequenas empresas, é à bruta; para o «Sr.
Mexia & C.ª», é com punhos de renda!
Mas, de facto, o Governo ainda não cortou nada. Vai liberalizar as tarifas da eletricidade e do gás natural, o
que vai significar novas subidas de preços. Depois, há um silêncio de chumbo sobre qual é a estratégia do
Governo para a energia. Um plano que estará pronto desde 14 de Fevereiro, segundo o ex-secretário de
estado, nunca mais vê a luz do dia. O que é que o Governo vai fazer em relação à eficiência energética? E em
relação ao gás natural? E aos combustíveis?
Ora, como todos sabemos, PSD e CDS, há pouco mais de um ano, bem berravam forte nesta Casa contra
os preços inaceitáveis de todas as formas de energia!..
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Srs. Deputados, o PCP apresenta também hoje a debate um projeto de resolução, recomendando ao
Governo medidas para o alargamento do comércio e mercado de combustíveis gasosos alternativos na
mobilidade rodoviária — GPL e gás natural nas versões GNC e GPL. É um importante contributo para
contrariar o conhecido monopólio do mercado dos combustíveis líquidos. Quem diz que quer concorrência
nesse mercado, quem diz que quer limitar os prejuízos da subida dos preços da gasolina e do gasóleo, não
pode senão aprovar o projeto de resolução apresentado pelo PCP.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina
Martins.
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: A fatura energética em Portugal é
das mais altas da Europa, tanto pelo peso no orçamento familiar como no peso dos custos da produção
industrial. E este peso da fatura energética não é só justificado pelo aumento do IVA, embora com esse
aumento o Governo tenha dificultado em muito a vida de todas e todos, é também justificado pela liberalização
do mercado e, acima de tudo, pelo famoso défice tarifário.
Este défice tarifário é uma ficção, porque foi criado por uma série de mecanismos que garantem às grandes
empresas produtoras de eletricidade rendas garantidas que são excessivas.
Durante muito tempo, falou-se dos sobrecustos de produção, mas este Governo falou das rendas
excessivas de eletricidade e, mérito lhe seja atribuído, encomendou um estudo sobre essas rendas a
investigadores da Universidade de Cambridge para poder determinar exatamente qual o valor dessas rendas
excessivas. E o resultado desse estudo diz que rendas excessivas, ou seja, inaceitáveis, infundamentadas,
que estão para lá dos custos de produção, que estão para lá da remuneração do investimento e do capital, são
as que os grandes produtores de eletricidade, entre 2007 e 2020, querem receber, ou irão receber pelos
contratos, ou seja, cerca de 4000 milhões de euros.
E o que qualquer um de nós julgaria era que, então, o Governo iria acabar com estas rendas excessivas.
Mas não, o que o Governo fez foi pôr este estudo na gaveta não sem antes, segundo o ex-secretário de
estado da energia, o dar a conhecer a António Mexia para que a EDP pudesse dizer se o estudo podia ou não
ser público, se o estudo podia ou não ter alguma consequência.
O que temos, pois, é que, depois desta circulação do estudo sobre as rendas excessivas na energia entre o
Governo e a EDP, esse mesmo estudo foi para a gaveta, não foi enviado à troica, nunca chegou ao
Parlamento e não é conhecido.
Este estudo é o único que foi feito. E o Governo também não apresentou nenhum outro que o contrarie.
Ninguém apresentou um outro estudo sobre o que são os custos de produção, a remuneração do investimento
do capital, etc. Este é, pois, o único estudo que é conhecido sobre as rendas excessivas e sobre o seu valor.
É, de facto, o único estudo que o determina e é o que está escondido!
Portanto, se queremos ser sérios sobre o que é a fatura elétrica, se queremos ser sérios sobre o que são
as rendas excessivas, então o primeiro passo é que esse estudo possa ser conhecido de todos.
Por isso, o Bloco de Esquerda apresenta um projeto de resolução cuja primeira recomendação é a de que
o Governo divulgue no seu portal o estudo da Universidade de Cambridge sobre as rendas excessivas, e em
português. Bem sabemos que o Governo gosta muito de documentos em inglês, tudo tem circulado em inglês,
mas nós achamos que a população portuguesa tem o direito de saber o que lhe querem cobrar a mais, os
4000 milhões de euros que lhe querem pôr a mais na fatura energética até 2020, e, por isso, tem direito a
conhecer o estudo e tem direito a conhecer esse estudo em português, pelo que essa é a primeira
recomendação que fazemos ao Governo.
A segunda recomendação que fazemos é a de que o Governo deve tirar consequências deste estudo, de
que há 4000 milhões de euros de rendas excessivas, injustificadas, não fundamentadas, a serem pagas aos
grandes produtores de eletricidade até 2020. E tem de retirar consequências, acabando com estas rendas
excessivas.
Não é com números de propaganda que cortam ligeiras percentagens ou que espalham no tempo as
rendas excessivas para tentar disfarçar que elas lá estão. Não é de engenharia financeira que precisamos; do
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que precisamos é de um plano concreto, com metas, com datas, com medidas concretas, apresentado na
Assembleia da República, para acabar com estes 4000 milhões de euros de rendas excessivas.
O Governo conseguiu determinar quais eram as rendas excessivas. Chega, então, de propaganda, vamos
cortar as rendas e queremos aqui um plano concreto para acabar com o regabofe das grandes produtoras de
eletricidade.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Hélder Amaral.
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Gostava de fazer alguns breves
comentários sobre os projetos de resolução que estão em discussão.
Percebe-se agora que aquilo que o Bloco de Esquerda pretende é apenas a divulgação do documento, se
possível em português, não colocando nenhuma objeção de fundo à política nem tão pouco aos cortes que,
pela primeira vez, estão a ser feitos no setor da energia. Mas enfim, veremos se é possível publicar no site do
Governo o tal estudo, e de preferência em português.
Sobre o projeto de resolução apresentado pelo PCP, quero dizer ao Sr. Deputado Agostinho Lopes, que
participa, tal como eu, num grupo de trabalho que está a elaborar um projeto de lei para conseguirmos retirar
alguns dos constrangimentos e incentivar a utilização do GPL e também do gás natural comprimido liquefeito,
que estamos a trabalhar nesse sentido e espero que, dentro de duas semanas, possamos chegar a um texto
final.
Creio, portanto, que parte do que consta do projeto de resolução apresentado pelo PCP já está lá incluído.
Quanto ao projeto de resolução apresentado pelo Partido Socialista, temi, ao lê-lo, vir a encontrar uma
proposta de eletricidade grátis para todos, mas o PS não foi tão longe.
É um facto que o PS vem propor um conjunto de medidas e de matérias, algumas delas já implementadas,
nomeadamente no gás, inclusivamente em recomendações que têm a ver com a última cimeira luso-
espanhola e que o Governo está a incentivar, mas também é verdade que, do ponto de vista do preço da
eletricidade, o PS devia aqui fazer um exercício de alguma responsabilidade.
É evidente que se o Sr. Deputado Carlos Zorrinho ler o Memorando da troica está lá claramente previsto o
aumento do IVA no gás e na eletricidade. Mas dir-me-á o Sr. Deputado que não está lá a taxa com que o
Governo quis aumentar, ou o prazo… Bom, é verdade, mas o Governo de VV. Ex.as
aumentou em 2009 e em
2010 o preço da eletricidade em 4,5% e só não o fez no tempo do Sr. Ministro Manuel Pinho porque criou o tal
défice energético, pela simples e única razão, que não tinha a ver nem com o apoio às energias renováveis
nem com o apoio ao sector, mas, sim, repito, por uma razão eleitoralista. Os senhores não aumentaram o
preço da eletricidade como devia ser, porque estávamos em período eleitoral. Não havia outra razão!
Portanto, o aumento a que este Governo procedeu foi não só no cumprimento do Memorando que VV Ex.as
assinaram e negociaram como teve uma componente que os senhores nunca tiveram em seis anos de
governo, que foi a de dar uma atenção especial aos mais fracos. Sabe porquê? Porque ficaram 700 000
famílias de fora do aumento do preço da eletricidade e 150 000 de fora do aumento do preço do gás.
A opção foi pôr a pagar quem mais pode pagar. E para quê? Para poupar aqueles que menos podem
pagar. Ou seja, isto é uma verdadeira sensibilidade social na austeridade, coisa que o Partido Socialista não
teve, pois sempre aumentou e, quando não pôde ou não quis aumentar, criou défice, que hoje pagamos com
juros. É bom que não esqueça esta matéria!
Mas, por outro lado, deixe-me que lhe diga que não há uma alteração de fundo à política. Veja o resultado
em relação ao CO2 — Portugal, fruto, obviamente, de boas políticas do anterior Governo, está a cumprir todas
as metas em matéria de CO2.
Mas também é verdade que este Governo, pela primeira vez, e o Sr. Deputado Carlos Zorrinho não teve
uma palavra sobre isso, está a fazer cortes no setor da energia, coisa que o seu Governo nunca fez. Aliás,
queixam-se de que existem rendas excessivas, mas foram os senhores que criaram essas rendas excessivas.
Falou do apoio às energias renováveis. Ó Sr. Deputado, sabe de quanto eram os CIEG (custos de
interesse económico geral), os custos políticos na fatura energética em 2005? Eram de 500 milhões. Sabe em
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quanto é que ficaram, em 2011, quando os senhores deixaram o Governo? Ficaram em 2500 milhões, em
cinco vezes mais. Portanto, onde é que está a poupança? Onde é que está a oferta?
Vou deixar de lado a MOBI.E (Rede de Mobilidade Elétrica), porque é matéria que devemos analisar com
mais serenidade e mais cuidado.
Quero apenas dizer-lhe, e com isto termino, que este Governo cumpre toda a boa estratégia que o Partido
Socialista começou, mas cumpre com mais rigor, com mais sensatez, com mais realismo, e isto é visível nos
itens dos cortes nas rendas, que fizemos: cumprir os contratos assinados, salvaguardar o uso de energias
renováveis, salvaguardar tudo aquilo que é estratégia e que está no PNAER (Plano Nacional de Ação para as
Energias Renováveis) e no PNAEE (Plano Nacional de Acão para as Energias Renováveis) e, ainda assim,
conseguir poupar dinheiro aos contribuintes. Sabe quanto é que será? Menos 5% na fatura de eletricidade de
cada um dos consumidores.
A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Muito bem!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — É esta a nossa atuação, era este sentido de responsabilidade que
esperávamos também da parte do Partido Socialista.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís
Ferreira.
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Estamos a discutir três
iniciativas legislativas sobre energia, mas também sobre a necessidade de procurar alternativas ao petróleo na
área dos transportes, porque, de facto, há muito que o País reclama uma política sustentável de transportes.
Uma política sustentável de transportes tem de passar, desde logo, por um investimento sério e efetivo nos
transportes públicos, criando condições para que as pessoas possam, de facto, ver nos transportes públicos
uma verdadeira alternativa à utilização da viatura particular.
Mas uma política sustentável de transportes também exige, por todos os motivos, que, de entre os
transportes coletivos, se atribua preferência à ferrovia. E aquilo a que temos vindo a assistir é exatamente ao
inverso, ou seja, o Governo tem vindo, literalmente, a empurrar os cidadãos para fora dos transportes públicos
e, sobretudo, para fora dos comboios, agravando, em muito, a nossa fatura energética e dificultando a vida
das pessoas.
Não restam dúvidas de que a notória dependência do nosso País relativamente ao petróleo, que, pelos
vistos, vai continuar a manter-se, com todas as consequências que daí decorrem, ambientais mas também
económicas, exige a tomada de decisões, no sentido de procurar alternativas ao petróleo.
Neste contexto, Os Verdes consideram que são absolutamente necessárias políticas de apoio e estímulo
ao desenvolvimento e à renovação de frotas dos transportes públicos, com vista ao incremento de energias
alternativas, porque ficamos todos a ganhar, diminuímos a nossa dependência do petróleo e fazemos menos
estragos em termos ambientais.
Por outro lado, todos nos lembramos que o Governo PSD/CDS fez a promessa de eliminar as rendas
excessivas aos produtores de eletricidade e encomendou até um estudo para fazer o diagnóstico e contabilizar
as rendas excessivas. Porém, os resultados desse estudo ficaram no «segredo dos deuses». Ficamos sem
saber se o Governo aplicou, de facto, os resultados do estudo que encomendou ou se não o fez. Mas, se o
estudo foi suportado por dinheiros públicos, não vemos por que razão o Governo o não disponibiliza a todos os
portugueses e, como já foi aqui dito, em português.
Os portugueses não têm acesso aos estudos, mas são os que mais pagam pela eletricidade em toda a
Europa, ou seja, pagam e não percebem porquê, mas sabem que este modelo de rendas garantidas aos
produtores de eletricidade tem contribuído, e muito, para as subidas constantes do preço da eletricidade.
Aumentos que, aliás, estão a ser suportados pelas famílias e também estão a criar muitas dificuldades às
pequenas e médias empresas deste País. É que, apesar do anúncio do Governo de reduzir as rendas
excessivas aos produtores de eletricidade, a verdade é que se mantém a falta de transparência no que diz
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respeito às rendas pagas e também a falta de objetividade naquilo que foi anunciado pelo Governo, que
considerou histórico o dia em que fez esse anúncio.
Por isso, Os Verdes consideram que o Governo deverá disponibilizar, em português, o estudo que
encomendou relativamente às rendas excessivas, que continuam a ser pagas aos produtores de eletricidade,
assim como consideramos que o Governo deverá tornar público, desde logo entregando-o na Assembleia da
República, o programa detalhado que, supostamente, está a dar corpo àquilo que o Governo anunciou
relativamente ao corte nas rendas excessivas.
Os portugueses têm o direito a conhecer o estudo que o Governo encomendou e têm direito a saber o que
é que o Governo pensa fazer, em concreto, para materializar a promessa feita, de cortar as rendas excessivas
aos produtores de eletricidade.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Ainda para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro
Saraiva.
O Sr. Pedro Saraiva (PSD): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Duas notas iniciais breves, a primeira das
quais apenas para referir que o Sr. Secretário de Estado da Energia esteve na Comissão de Economia e
Obras Públicas na passada quarta-feira, onde deu plena resposta às questões colocadas pelo Bloco de
Esquerda, pelo que bastaria a Sr.ª Deputada estar um bocadinho mais recordada dessa quarta-feira.
Já agora, em matéria de GPL e gás natural, tema que o Sr. Deputado Agostinho Lopes quase acabou por
não tocar, o caminho a seguir é, justamente, o de um grupo de trabalho constituído, que está a trabalhar estas
temáticas.
Mas centremo-nos, agora, no projeto de resolução do Partido Socialista, que motivou este agendamento e
que me suscita, sobretudo, uma palavra, com toda a consideração e respeito que tenho por si, Sr. Deputado
Carlos Zorrinho: perplexidade! E vou explicar porquê. Perplexidade, porque o Grupo Parlamentar do PS, no
fundo, usa um projeto de resolução para, de alguma forma subliminarmente, felicitar o Governo por aquilo que
já fez. E vem recomendar ao Governo que faça aquilo que já fez, nomeadamente ao conseguir o feito histórico
de, pela primeira vez, cortar rendas excessivas no setor elétrico nacional, no valor de 180 milhões de euros
por ano, ou de ter conseguido algo que há muito tempo não se conseguia, como o acordo ibérico em matéria
de gás.
Mas esta iniciativa suscita-me ainda perplexidade, pois o Grupo Parlamentar do Partido Socialista
recomenda ao Governo que faça, justamente, o inverso do que os anteriores Governos do PS fizeram, já que
alimentaram rendas excessivas e, ao mesmo tempo, geraram um galopante défice tarifário que o Prof. Jorge
Vasconcelos qualificou, recentemente, e bem, como sendo «juridicamente, uma ilegalidade, politicamente,
uma demagógica cobardia e, economicamente, um erro».
Aplausos do PSD.
Mas suscita-me também perplexidade, pois foram os Governos do PS os «pais» de uma carteira de dívidas
por pagar que representa já mais de 1800 milhões de euros em défice tarifário e é, agora, o mesmo PS que
sugere que se reduzam, de imediato, os preços da eletricidade.
Sr. Deputado Carlos Zorrinho, ninguém está mais interessado do que o Governo em implementar uma nova
política energética sustentável, direcionada para as famílias e a competitividade das empresas, mas as razões
pelas quais as poupanças anuais de 180 milhões de euros, que, pela primeira vez, alguém conseguiu
implementar, não podem traduzir-se, de imediato, em reduções de preços ao consumidor encontram resposta
nos proponentes deste mesmo projeto de resolução. Bastaria que o Sr. Deputado Carlos Zorrinho perguntasse
ao ex-Secretário de Estado Carlos Zorrinho e teria a resposta…
Primeiro, temos de garantir a viabilidade de um sistema elétrico desgovernado que o PS nos deixou,
tapando o buraco de 1800 milhões de euros de dívidas acumuladas, o qual ia já a caminho de 5000 milhões
de euros. Foi a este caminho suicidário que o Governo colocou, agora, um ponto final, com coragem,
determinação e competência.
Sr. Deputado Carlos Zorrinho, estaremos sempre disponíveis para acolher sugestões, pois queremos
sempre ir mais longe e fazer melhor, mas, desde que estas sejam úteis, responsáveis e fundamentadas, o
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que, infelizmente, não acontece, neste caso, com a generalidade do projeto de resolução do Partido Socialista,
carregado de perplexidades, contradições e equívocos, que são, de resto, incontornáveis, quando, nestas
matérias, alguém que pouco ou nada fez recomenda a outro que faça aquilo que já fez.
Aplausos do PSD.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr.as
e Srs. Deputados, fica, assim, concluída a discussão do
segundo ponto da nossa ordem de trabalhos de hoje.
Segue-se a apreciação, na generalidade, do projeto de lei n.º 227/XII (1.ª) — Estabelece um novo regime
de atribuição de bolsas de estudo a estudantes do ensino superior (BE), em conjunto com os projetos de
resolução n.os
313/XII (1.ª) — Recomenda ao Governo que regulamente os fundos de emergência dos serviços
de ação social das instituições de ensino superior (BE), 314/XII (1.ª) — Recomenda ao Governo que promova
medidas de emergência nos apoios concedidos aos estudantes no ensino superior (BE) e 342/XII (1.ª) —
Elaboração de um relatório anual sobre abandono escolar e empréstimos bancários no ensino superior (PCP).
A Sr.ª Maria Conceição Pereira (PSD): — Sr.ª Presidente, peço desculpa, permite-me uma interpelação à
Mesa, de forma muito breve?
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem a palavra, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Maria Conceição Pereira (PSD): — Sr.ª Presidente, há pouco, não estava no Plenário, estava numa
reunião no grupo parlamentar,…
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr.ª Deputada…
A Sr.ª Maria Conceição Pereira (PSD): — … e, por isso, quero solicitar-lhe que providencie a distribuição
de um documento.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr.ª Deputada, se quiser fazer o favor de invocar o artigo regimental
ao abrigo do qual a Sr.ª Deputada, já no terceiro ponto da nossa ordem de trabalhos, faz uma interpelação à
Mesa sobre uma discussão que teve lugar aquando das declarações políticas, dar-lhe-ei a palavra, caso
contrário, Sr.ª Deputada, é algo que poderá fazer noutra oportunidade.
Peço muita desculpa, mas temos de prosseguir com os nossos trabalhos.
Vamos, então, iniciar o terceiro ponto da nossa ordem de trabalhos, com uma intervenção da Sr.ª Deputada
Ana Drago, para apresentar as iniciativas do Bloco de Esquerda.
Tem a palavra, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Por estes dias, estamos a viver a época
de exames no ensino superior, que finaliza, provavelmente, um dos piores anos vividos, ao nível do ensino
superior, em matéria de ação social escolar.
Este ano, tivemos cerca de 20 000 bolsas a menos em relação a dois anos atrás. Ou seja, desde 2010,
com os cortes que foram feitos nos PEC e nos Orçamentos do Estado — na altura, pelo Governo do Eng.º
Sócrates —, com os cortes que foram feitos nos subsídios de Natal e de férias dos funcionários públicos — já
pelo novo Primeiro-Ministro Passos Coelho —, com o aumento generalizado dos preços da eletricidade no
consumo, com as dificuldades de todas as famílias, este ano, o ano da maior crise social e económica de que
temos memória, houve um número mais reduzido de bolsas de ação social escolar.
Tivemos também uma redução no valor da bolsa de referência para o ensino superior, ao nível da ação
social escolar, com um novo regulamento trazido pelo Ministro Nuno Crato, tivemos atrasos sucessivos na
decisão da atribuição de bolsas de ação social escolar — houve decisões relativas a candidaturas que foram
dadas em Maio, meses e meses depois de iniciado o ano letivo —, e todos nós tivemos conhecimento da
multiplicação de histórias dramáticas de estudantes do ensino superior e das suas famílias confrontados com
uma enorme dificuldade em manter os seus filhos a estudar e em fazer a sua formação avançada.
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Por isso, Sr.as
e Srs. Deputados, creio que esta Assembleia não pode fugir à responsabilidade de ter hoje
um debate sério sobre aquelas que são as medidas essenciais, ao nível da ação social escolar, exatamente
para preparar o próximo ano letivo.
Temos conhecimento de quais são as intenções do Governo: entende que, quanto à ação social escolar,
está tudo bem e, aliás, neste momento, é preciso é fechar as portas, congelar o número de vagas e
estabelecer um nexo entre a empregabilidade dos cursos e o número de vagas. No contexto de um processo
económico de destruição de postos de trabalho, isto significa que as instituições de ensino superior, a prazo,
podem fechar, e bem sabemos qual é o valor do desemprego, ao nível dos licenciados.
Aquilo de que necessitamos para construir o futuro, para construir o crescimento económico, a qualificação
do País, a competitividade, a possibilidade de criar um futuro diferente desta eterna crise é apostar na
formação superior.
É por isso que o Bloco de Esquerda, hoje, assume essa responsabilidade e traz aqui três diplomas que
entende serem fundamentais: uma proposta de um novo regulamento de bolsas de ação social escolar que
permita repensar os erros dos processos anteriores e criar novos mecanismos; medidas de emergência em
relação a estudantes que, neste momento, têm dificuldades em pagar as suas propinas, em fazer as
frequências do ensino superior; e a criação de fundos de emergência, à semelhança dos que já foram criados
noutras instituições, de modo a que se possam regulamentar, a nível nacional, as situações de emergência de
estudantes no ensino superior.
É este o desafio que o Bloco de Esquerda deixa hoje a esta Câmara.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Rita Rato.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: A situação hoje vivida pelos estudantes do
ensino superior é profundamente dramática. Décadas de políticas de direita, com desresponsabilização dos
sucessivos Governos PS, PSD e CDS na garantia do financiamento do ensino superior público, têm resultado
num aumento brutal dos custos com propinas, alimentação, transporte, material escolar, alojamento, em que
os sucessivos governos, designadamente o Governo do Partido Socialista e, na sua continuidade, o atual
Governo PSD/CDS, têm apresentado aos estudantes a substituição da ação social escolar por empréstimos
bancários, agitando a bandeira dos «clientes para os bancos», que pretendem o endividamento das famílias e
agravar o endividamento de milhares de estudantes que, só neste ano, já foram mais de 4000 que se viram
obrigados a requerer empréstimos bancários, empurrados assim para uma despesa, que, depois, numa
situação de desemprego e precariedade não vão conseguir pagar.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — É por isso que entendemos que é muito negativo o facto de, nos últimos dois
anos, repito, nos últimos dois anos, mais de 26 600 estudantes terem perdido a sua bolsa de ação social
escolar no ensino superior. E por isso naturalmente que os custos, a dramática situação de abandono e de
dificuldades para conseguirem pagar o seu passe, as propinas, a alimentação, se tem agravado.
O PCP tem apresentado inúmeras iniciativas no sentido do reforço da ação social escolar, do aumento do
valor das bolsas, do aumento do número de estudantes com bolsa máxima, do financiamento adequado das
instituições de ensino superior público. Sucessivamente, estas iniciativas têm sido rejeitadas por PS, PSD e
CDS.
O Governo PSD/CDS, na linha do que foi o anterior Governo do Partido Socialista, recusa dar a conhecer à
Assembleia da República o retrato real da ação social escolar e da caracterização socioeconómica dos
estudantes no ensino superior.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — É por isso que propomos aqui que não só este Governo mas também os
governos seguintes possam apresentar, anualmente, à Assembleia da República um relatório em que seja
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feita a caracterização do abandono escolar no ensino superior, mas também a caracterização socioeconómica
dos estudantes e dos estudantes que recorrem a empréstimos bancários.
Propomos também a elaboração de um estudo sobre a necessidade de alargamento da rede de
residências universitárias e a definição de um plano, no sentido de dar resposta a um direito, que está
consagrado na Constituição, mas que sucessivos Governos têm transformado num negócio e sobre o qual o
PCP continuará a lutar.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Inês Teotónio
Pereira, do CDS-PP.
A Sr.ª Inês Teotónio Pereira (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Sobre o regulamento de
atribuição de bolsas, comecemos por recordar que o que está em vigor foi proposto e implementado por este
Governo e aplaudido por toda a comunidade estudantil.
O regulamento em vigor, como bem sabem, revogou o anterior, que era alvo de inúmeras críticas por ser
fundamentalmente injusto.
É um facto que ainda existem falhas, e foram detetadas pela comunidade, pelos alunos, pela comunidade
educativa. E é por isso que, no próximo ano letivo, entrará em vigor um novo regulamento, que está a ser
negociado e que deverá corrigir essas falhas.
No entanto, as soluções para tornar o regulamento mais justo são correções, são alterações construtivas,
são melhorias, e não o que está previsto nos projetos do Bloco de Esquerda ou do Partido Comunista
Português.
Sumariamente, o que o Bloco de Esquerda propõe parece simples e milagroso: que se aumente o valor da
bolsa, que se aumente a população elegível à bolsa e que se reduza a exigência do critério do aproveitamento
escolar para a atribuição da bolsa.
A pergunta inevitável que tem de ser feita, e acho que o Bloco de Esquerda tem de esclarecê-la, é a
seguinte: como é que o Bloco de Esquerda sugere que se paguem todas estas bolsas?
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Com o dinheiro do BPN!
A Sr.ª Inês Teotónio Pereira (CDS-PP): — Sugerem, ainda, que, durante o período da troica, os bolseiros
fiquem isentos de pagar as propinas, mas, como sabem, a isenção de propinas pode colocar em risco a
qualidade dos cursos ministrados e, consequentemente, essa mesma frequência.
Protestos do PCP.
Por isso, parece-me importante também que explique como é que se pagariam os cursos.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Aqueles 600 milhões de euros eram capazes de chegar!
A Sr.ª Inês Teotónio Pereira (CDS-PP): — Outra das propostas que pode ser entendida e praticada como
uma espécie de incentivo à fraude é o perdão da dívida das mensalidades das residências universitárias aos
alunos que não tenham obtido deferimento da bolsa e que tenham vivido nas residências, enquanto esperam
pela resposta.
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Claro, senão têm uma dívida!
A Sr.ª Inês Teotónio Pereira (CDS-PP): — Mais uma vez, pergunto quem pagaria essa dívida aos serviços
sociais.
Quanto ao projeto de resolução do PCP, o PCP quer um relatório anual e profundo sobre o abandono
escolar no ensino superior.
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O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Acha mal?!
A Sr.ª Inês Teotónio Pereira (CDS-PP): — No entanto, como já foi afirmado pelo Secretário de Estado do
Ensino Superior, nem todas as instituições recolhem esses dados, como todos ouvimos, como eles
esclareceram.
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Ah! Não sabe?!
A Sr.ª Inês Teotónio Pereira (CDS-PP): — Além disso, foram os próprios serviços de ação social do
ensino superior que disseram aqui, em audição parlamentar — onde estavam os Srs. Deputados que agora
apresentam estas iniciativas?! —, que é impossível, em muitos casos, medir com exatidão as razões que
levam ao abandono escolar.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
A Sr.ª Inês Teotónio Pereira (CDS-PP): — Até porque, na maioria dos casos, confunde-se abandono com
mudança de instituição de ensino superior ou até, mais simplesmente, com mudança de curso.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Tem de clarificar isso!
A Sr.ª Inês Teotónio Pereira (CDS-PP): — Ou seja, o que querem, como sabem, é impossível de se
concretizar.
Vozes do PCP: — Não é, não!
A Sr.ª Inês Teotónio Pereira (CDS-PP): — Além disto, o PCP quer ainda que sejam identificados os
alunos que recorrem a empréstimos bancários. Não se entende a necessidade.
Protestos da Deputada do BE Ana Drago.
Gostava que me explicassem como é que isso seria praticado. Sendo esta uma informação do foro privado,
protegida pelos direitos fundamentais, como é que saberiam quais são os alunos que recorrem a empréstimos
bancários para estudarem.
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Não diga asneiras! Leia a lei! Não sabe do que está a falar! Tanto disparate!
A Sr.ª Inês Teotónio Pereira (CDS-PP): — Outra proposta curiosa é a elaboração de um estudo prospetivo
sobre as necessidades de alojamento de estudantes com base no número de alunos com bolsas de ação
social e que se inicie, com base nesse estudo, um plano de construção de alojamentos universitários para
estudantes, repito, plano de construção de alojamentos universitários para estudantes.
Ora, não se percebe essa proposta, porque as necessidades de alunos que estão a receber a bolsa este
ano podem não em ser as mesmas para o ano posterior e, como sabem, todos estes alunos têm apoios. Se
não tiverem apoios, se não dormirem na residência, têm apoio financeiro para recorrerem a uma residência.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Então, não têm?!
A Sr.ª Inês Teotónio Pereira (CDS-PP): — Se este grande plano de construção não serve os alunos,
gostava que me explicassem para quem vai servir.
Por tudo isto, como é óbvio, não acompanhamos nenhuma destas iniciativas.
Aplausos do CDS-PP.
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Protestos do PCP.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr. Deputado Pedro Delgado Alves, tem a palavra para uma
intervenção.
O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Em primeiro lugar, o Partido
Socialista gostaria de saudar as iniciativas que aqui são hoje apresentadas, na medida em que chegamos, de
facto, a um ponto fulcral para decidir qual vai ser o futuro da ação social escolar no ensino superior. Tem de
ser agora que as medidas têm de ser tomadas e tem de ser agora que tem de ser revisto o regulamento.
É, de facto, positivo, podermos ouvir, por via da Sr.ª Deputada Inês Teotónio Pereira, a intenção do
Governo em rever o regulamento. Pena que o Sr. Ministro e o Sr. Secretário de Estado, nas várias vindas à
Comissão, não tivessem tido oportunidade de reconhecer esta vontade e esta abertura em proceder a esta
revisão do regulamento.
Mas há que dizer uma coisa neste debate, como tem sido dito, aliás, em todos os debates que travámos
sobre esta matéria até este momento: sem os dados necessários e fundamentais para podermos perceber e
diagnosticar o problema, não temos capacidade de dar respostas que estão construídas com alicerces sólidos.
E, quanto a isso, tem de ser absolutamente inequívoco que o Governo se furtou, em todas as ocasiões, desde
a discussão do Orçamento do Estado às várias vindas do Ministro, às várias discussões nesta Câmara, a
fornecer os dados sobre o pagamento de propinas, sobre o número de bolseiros, sobre o número de
candidaturas, sonegando dados que são fundamentais para percebermos qual é o estado atual.
Muito sucintamente, consideramos que as propostas têm alguma valia, especialmente aquelas relativas às
medidas de urgência; temos algumas dúvidas quanto à oportunidade de algumas delas, uma vez que alguns
dos regimes de isenção podem acabar por ser, contraditoriamente, não penalizadores mas, pelo menos,
injustos, em relação aos alunos bolseiros que são cumpridores. É um aspeto que nos preocupa na articulação,
mas, obviamente, temos disponibilidade para discuti-los e trabalhá-los na especialidade, porque, de facto, há
um regime identificado necessitando de alteração.
Há outros aspetos que também nos geram algumas dúvidas e incertezas, nomeadamente no que diz
respeito à isenção da propina, uma vez que é um fator que, acrescentado ao pagamento da bolsa, pode
desequilibrar as prestações que têm de ser pagas no caso em que ele fica definido como sendo também no
sentido de isentar as propinas aos estudantes com as bolsas mais elevadas. Também isso nos preocupa na
forma de construção da fórmula, mas também não é nada que não possa ser resolvido e algo em que o
Partido Socialista também colaborará.
Especialmente, vocacionando o debate para o tempo, pouco, que temos para resolver este problema,
iremos também apresentar uma iniciativa no sentido de fornecer algumas pistas e alguns dados ao Governo
de como deve proceder a esta reavaliação do que são as bolsas de ação social no ensino superior, neste
momento.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr. Deputado Duarte Filipe Marques, tem a palavra para uma
intervenção.
O Sr. Duarte Filipe Marques (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: O sistema de ação social
escolar, em Portugal, baseia-se fundamentalmente em dois princípios: o da boa gestão de recursos e da sua
boa aplicação e também na sua própria sustentabilidade, coisa que, nos últimos anos, tem sido fenómeno
escasso.
Mas num ano com tantas críticas às bolsas da ação social escolar, para um Governo que entrou em
funções em junho do ano passado, pagaram-se exatamente 56 000 bolsas. Precisamente, o número do ano
anterior, se retirarmos a fraude que foi inventada pelo Governo anterior com o regime transitório.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Fraude?!
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O Sr. Duarte Filipe Marques (PSD): — O que é curioso é que um Governo que «trata mal os estudantes»
aumentou em 100 € a bolsa média paga a esses estudantes. Ou seja, pagou-se mais a quem mais precisa.
Mas, Srs. Deputados e Sr.as
Deputadas, a situação de dificuldade que o País atravessa não é compatível
com algumas demagogias irresponsáveis que têm sido levadas a cabo por alguns partidos políticos.
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — É incompatível com a crise e com pagamentos para a banca!
O Sr. Duarte Filipe Marques (PSD): — É por isso que eu diria que, em boa hora, esta Assembleia trouxe a
esta Casa os dirigentes estudantis e os serviços de ação social escolar de todo o País. Aliás, nesse dia, como
eu já aqui disse, caíram vários mitos: sobre o abandono escolar, que afinal não era o que diziam; sobre os
estudantes que não pagaram as propinas, porque não podiam; e sobre a gestão do Fundo de Emergência.
Aliás, até pedia, se fosse possível, que distribuíssem às bancadas da oposição a ata dessa reunião…
Protestos da Deputada do BE Ana Drago.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Também lá estivemos!
O Sr. Duarte Filipe Marques (PSD): — … porque, ao que parece, estiveram lá, mas não ouviram aquilo
que as escolas disseram.
Acho importante e, sobretudo, muito justo reconhecer o trabalho de proximidade, insubstituível, que os
serviços da ação social escolar e as escolas têm levado a cabo, junto dos seus estudantes, para darem
respostas às situações muito complicadas, que, na verdade, alguns deles atravessam.
Digo-vos mais: é também de regozijo, num dia como o de hoje, saber que o Governo está a preparar um
novo regulamento de bolsas, com algumas alterações, e também está a ouvir os professores, os estudantes e
os serviços para corrigir algumas gralhas que admito que tenham.
O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — «Gralhas»?!
O Sr. Duarte Filipe Marques (PSD): — Mas é um dia importante também, porque é um dia após uma
decisão de um Governo, que, pela primeira vez, vai condicionar a abertura de novas vagas à empregabilidade
desses mesmos cursos.
É a transparência com os pais mas, sobretudo, com os seus filhos e com os seus estudantes.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Por este caminho fecham todos os cursos!
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr.ª Deputada Ana Drago, tem a palavra para uma intervenção.
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr.ª Presidente Srs. Deputados: Devo dizer que fico surpreendida. Tantos
debates que temos tido sobre a situação social que se vive no ensino superior, mas até hoje, de facto, as
bancadas da direita não tinham assumido, com a candura que aqui assumiu a Sr.ª Deputada Inês Teotónio
Pereira, que a propina paga um serviço. Ou seja, que, em Portugal, aquilo que sustenta as instituições de
ensino superior são as propinas, pagas pelos alunos.
Aquilo que a Sr.ª Deputada aqui nos disse foi isto: «se eles não pagarem propinas, como é que isto vai
funcionar?» Portanto, a partir de agora, percebemos bem do que estamos a falar!
Protestos da Deputada do CDS-PP Inês Teotónio Pereira.
Ou seja, a Sr.ª Deputada acaba de dizer aqui que o acesso à formação superior não é um direito para
quem tenha o mérito para aceder a esse mesmo direito para fazer a sua formação. Não é uma aposta do País.
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É um serviço que é pago. E, portanto, se não entrar o dinheiro das propinas, não há serviço! Foi aquilo que a
senhora nos disse de uma forma absolutamente taxativa e, devo dizê-lo, de uma forma absolutamente
cândida. Ninguém, nesta Câmara, até hoje, mesmo à direita, tinha tido a coragem de assumir e dizer «ensino
superior é para quem pode e para quem paga! Os outros não têm… azar!» Não é Sr.ª Deputada?
Sr.ª Deputada, não sei bem que famílias conhece, mas imagine uma família com três elementos, dois —
não fique chocada — a ganhar, cada um, 500 €, e um filho no ensino superior com bolsa mínima. Ou seja, têm
1000 € de rendimento para toda a família —…
O Sr. Duarte Filipe Marques (PSD): — Não tem nada! Que disparate!
A Sr.ª Ana Drago (BE): — … é verdade! — e a única coisa que têm é o dinheiro que é dado para pagar a
propina. Se for um estudante deslocado, não tem alojamento, transportes, alimentação. Não tem! E este é o
vosso regulamento, esta é a situação do País!
Os senhores anunciam-nos aqui propostas do Governo. Bom, os senhores têm um Ministério, um Sr.
Secretário de Estado do Ensino Superior, assessores, juristas, gente que trabalha nos departamentos do
Ministério e, até hoje, proposta, nada! Se o Sr. Deputado tivesse ouvido bem, teria retido, naquela audição,
que aquilo que os estudantes nos pediram foi «medidas, já»!
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr.ª Deputada, vai ter de concluir!
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Nomeadamente, uma coisa que os senhores já chumbaram: que os estudantes
não possam ser castigados por dívidas ao fisco e à segurança social, que não são deles!
Hoje, Srs. Deputados, nos dias de hoje…
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr.ª Deputada, tem de terminar!
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Termino, Sr.ª Presidente, dizendo que nos dias de hoje há faculdades que têm
projetos de regimento que impedem estudantes de fazerem exames e terminarem os seus anos, porque não
tiveram dinheiro para pagar as propinas.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr.ª Deputada, terminou o seu tempo.
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr.ª Presidente, termino muito rapidamente.
A situação que se vive hoje no ensino superior tem de ser resolvida. E tem de ser resolvida já, antes que se
inicie um novo ano letivo, porque os senhores dizem aqui que não há apoio ao alojamento, que não há apoio
aos bolseiros, que tudo vai continuar no próximo ano exatamente como esteve este ano, ou seja, com risco de
abandono escolar.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr.ª Deputada Rita Rato, tem a palavra para uma intervenção.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Sr.ª Deputada do CDS: Gostava de responder
a uma pergunta concreta que colocou. Então, como é que se pagam as propinas? Quando o PCP, em sede de
discussão do Orçamento do Estado, aqui apresentou a proposta de gratuitidade do acesso ao ensino superior
teve de dizer onde ia buscar dinheiro. E adivinhe onde é que o íamos buscar… O dinheiro que o Governo vai
cobrar de propinas a todos os estudantes do ensino superior representa 300 milhões de euros. Sabe quanto é
que este Governo ofereceu «de bandeja» ao offshore da Madeira em perdão de benefícios fiscais? 1200
milhões de euros! Tem aqui um exemplo de onde pode ir buscar dinheiro para garantir o pagamento: é tirar ao
Alberto João Jardim e garantir o pagamento aos estudantes do ensino superior!
O Sr. João Oliveira (PCP): — São opções de desenvolvimento!
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A Sr.ª Rita Rato (PCP): — A outra questão que colocou tem a ver com as residências universitárias. A Sr.ª
Deputada Inês Teotónio Pereira não percebeu, mas estamos aqui para explicar.
A Sr.ª Deputada deve saber que hoje, no nosso País, as residências universitárias e as instituições públicas
não garantem resposta, não chegam sequer para os estudantes bolseiros da ação social,…
O Sr. Duarte Filipe Marques (PSD): — Isso é mentira!
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — … portanto, é óbvio que para os estudantes deslocados que têm de recorrer a
alojamento este custo representa uma despesa exorbitante e insuportável para a esmagadora maioria das
famílias.
O que aqui propomos é tão-só — a Sr.ª Deputada não vê interesse nisso, o PSD também não, mas nós
vemos todo o interesse— que o Governo apresente um relatório anual à Assembleia da República que tenha
em conta a realidade e a caraterização socioeconómica dos estudantes e que defina as necessidades de
reorganização e de alargamento da rede de residências.
Não sei se a Sr.ª Deputada já foi a Coimbra, mas vou dar-lhe aqui um exemplo. O PCP, na segunda-feira
passada, visitou a residência universitária Alegria em Coimbra, e é uma vergonha perceber a degradação das
condições materiais e humanas em que aquela residência se encontra. Sr.ª Deputada, vá conhecer esta
residência e perceba que o investimento na educação não é uma despesa, é um investimento no
desenvolvimento económico e social do País; não é um favor que o Governo, o PSD e o CDS estão a fazer
aos estudantes, é a garantia de um direito constitucional.
O Sr. Deputado do PSD disse aqui que houve uma gralha nos regulamentos de atribuição de bolsas. Mas o
Sr. Deputado considera que o não cumprimento da Constituição é uma gralha?! Que o Governo incumpre e
viola a Constituição todos os dias quando não garante a todos os estudantes o acesso ao ensino superior e
que isso é uma gralha? Ó Sr. Deputado, por muito menos o vimos, no ano passado, com uma corda ao
pescoço em frente à Assembleia da República!
Aplausos do PCP.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Bem lembrado!
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr. Deputado Duarte Filipe Marques, tem a palavra para uma
intervenção.
O Sr. Duarte Filipe Marques (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: É curioso ver a demagogia
com que o Partido Comunista e o Bloco de Esquerda se dirigem a esta Câmara sobre os valores em causa. É
que, não por acaso, este é o ano em que mais se investiu e em que mais dinheiro foi pago em complementos
para estudantes, para residências e para transportes.
Protestos do PCP.
Sei que os valores lhe «entram pelos olhos» e que isso custa imenso, Sr.ª Deputada! A verdade é que
parece que, por vezes, o BE e o PCP até rezam para que isto corra mal aos estudantes, e logo no ano em que
o valor da bolsa média aumentou!…
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Se as aldrabices pagassem imposto, havia dinheiro para pagar propinas!
O Sr. Duarte Filipe Marques (PSD): — Digo-vos uma coisa: o que é muito verdade e me choca é a
demagogia sobre números, quando Deputados ouviram aqui, nesta Assembleia, os estudantes, os professores
e os funcionários desmentirem aquilo que os senhores afirmam aqui — e sabem que isto é verdade — sobre
abandono escolar.
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O Sr. João Oliveira (PCP): — Meta lá a corda ao pescoço!
O Sr. Duarte Filipe Marques (PSD): — Deviam ter estado todos nessa audiência para saberem a verdade.
Não me canso de repetir: demagogia, demagogia, é o líder do Bloco de Esquerda ir à Universidade de Aveiro,
fugir das associações de estudantes democraticamente eleitas e reunir com os estudantes à parte,…
A Sr.ª Ana Drago (BE): — O quê?!
O Sr. Duarte Filipe Marques (PSD): — … à boa maneira do Eng.º Sócrates, que contratava criancinhas
para compor o cenário. Isso é que é demagogia e, sobretudo, muita irresponsabilidade!
Aplausos do PSD.
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Está a falar de quê?!
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr. Deputado Pedro Delgado Alves, tem a palavra para uma
intervenção.
O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: De facto, nada como um mestre de
demagogia para a explicar!…
Aplausos do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.
Sr. Deputado Duarte Marques, falemos de factos: audição das associações de estudantes na Assembleia
da República. Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa (ISCTE): medidas de urgência não
servem as que estão previstas porque não estão previstas; atraso no pagamento. Universidade de Trás-os-
Montes e Alto Douro (UTAD): atraso; fundo de emergência é, neste momento, uma miragem. Instituto
Politécnico do Porto: degradação da situação e diminuição de bolseiros devido à falta de critérios num
momento de crise. Universidade do Algarve: tendência para a substituição da ação social escolar por
caridade;…
O Sr. João Oliveira (PCP): — É melhor arranjar uma corda de amarrar navios para pôr ao pescoço!
O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — … contratualização, diminui os prazos de resposta, uma medida que
constava do regulamento anterior. Associação Académica de Lisboa: o que é sucede aos passes sub-23, que
ajudavam a compensar o preço dos transportes?; os refeitórios deviam estar abertos o resto da semana
devido à diminuição significativa do rendimento disponível dos alunos. O próprio Conselho Coordenador dos
Institutos Superiores Politécnicos (CCISP) confirmou-nos que o Governo tem todos os dados e não forneceu
nenhum deles à Assembleia da República quando foram pedidos em Comissão, no Plenário e nas audições.
Aplausos do PS.
Finalmente, a Associação Académica da Universidade de Lisboa refere que o aproveitamento frusta as
expetativas de quem tinha e de quem aguardava por outros critérios e também vai voltar a trazer à colação a
abordagem que os senhores normalmente fazem, que é a de se exigir mais aos bolseiros do que aos
restantes. Temos critérios sobre prescrição, e estes critérios têm de ser utilizados por todos. Quem tem
dificuldades económicas não deve ser penalizado pelas exigências do seu aproveitamento escolar.
Fraude, Sr. Deputado Duarte Marques, fraude não é o regime transitório, que manteve dentro do sistema
alunos que dele beneficiaram; fraude é vir dizer que aumentou o valor das bolsas quando todos sabemos que
esse valor aumentou artificialmente porque os alunos que beneficiavam do regime transitório saíram do
sistema e deixaram de receber a bolsa mínima.
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A Sr.ª Ana Drago (BE): — Exatamente!
O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — É por isto que aumentou o valor! E, na realidade, a ideia de que o
valor da bolsa máxima aumentou é uma miragem que abrange menos de 1% dos estudantes beneficiários.
Portanto, aquilo que os dirigentes estudantis e os serviços de ação social nos vieram dizer foi o seguinte:
tomem medidas com urgência, não deixem que, mais um ano, alunos fiquem fora do ensino superior porque
não têm meios, porque não têm suficiência de recursos. Essa é a causa, não é arranjar subterfúgios para
resolver e vencer um debate!
Aplausos do PS.
O Sr. Duarte Filipe Marques (PSD): — Sr.ª Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Em que termos?
O Sr. Duarte Filipe Marques (PSD): — Sr.ª Presidente, queria apenas pedir à Mesa que fizesse distribuir
aos partidos da oposição a ata da reunião que teve lugar aqui, na Assembleia da República, com os serviços
da ação social escolar, com os estudantes, com o Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas
(CRUP) e com o CCISP…
Protestos da Deputada do PCP Rita Rato.
… para o Sr. Deputado Pedro Alves poder ler a ata e não apenas os apontamentos que, afinal, lhe deu jeito
tirar. Nessa ata estão todos os dados, do abandono escolar, do pagamento não atrasado de propinas,…
O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Onde?!
O Sr. Duarte Filipe Marques (PSD): — … da bolsa média. Agradecia, portanto, que essa ata fosse
distribuída.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr. Deputado, como imaginará, nenhum Sr. Deputado nem a Mesa
poderão obrigar o Sr. Deputado Pedro Delgado Alves, ou qualquer outro, a falar.
O Sr. Duarte Filipe Marques (PSD): — Mas pode ler as atas!
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Fica, assim, feito o requerimento verbal para que essa ata, estando
disponível, seja distribuída através da Mesa. Penso que é isto que posso interpretar das suas palavras, Sr.
Deputado, não é assim?
O Sr. Duarte Filipe Marques (PSD): — Sim, Sr.ª Presidente.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, vamos passar ao
ponto 4 da nossa ordem de trabalhos de hoje, que consiste na discussão, na generalidade, do projeto de lei n.º
253/XII (1.ª) — Canal Parlamento através da televisão digital terrestre (PSD, PS, CDS-PP, PCP, BE e Os
Verdes) em conjunto com o projeto de resolução n.º 365/XII (1.ª) — Canal Parlamento através da televisão
digital terrestre (PSD, PS, CDS-PP, PCP, BE e Os Verdes).
Sr. Deputado Nuno Encarnação, tem a palavra para uma intervenção.
O Sr. Nuno Encarnação (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: O projeto de lei e o projeto de
resolução em apreciação contêm uma ligeira alteração à atual lei em vigor. Fazemos, assim, uma adaptação à
realidade hoje existente, dando o salto tecnológico permitido através da TDT, onde o espectro hertziano
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terrestre deixa de ser limitado a quatro canais, como acontecia no tempo analógico, possibilitando-se a sua
transmissão em canal aberto.
O Canal Parlamento em nada alterará a sua natureza especial, nem tão-pouco o seu modelo de gestão. A
Assembleia da República disponibilizará, assim, o sinal da sua rede interna de vídeo para efeitos da
distribuição de emissões parlamentares nas redes de televisão por cabo e nos serviços de radiodifusão
televisiva digital terrestre. Terão acesso ao sinal de vídeo da Assembleia da República todos os operadores de
distribuição de serviços de programa televisivos devidamente licenciados.
Não podemos deixar de recordar a extrema dedicação por parte da Sr.ª Presidente da Assembleia da
Republica nesta matéria em concreto, bem como de enaltecer o entendimento entre todos os partidos políticos
que têm representação parlamentar. No Parlamento, encontramos a pluralidade de opiniões e a defesa de
cada um dos cidadãos.
O Canal Parlamento tem aproximado e tem dado a conhecer a todos os portugueses todo o trabalho que
nesta Casa, em prol deles, fazemos. A entrada do Canal Parlamento na TDT será, sem dúvida, um veículo de
maior proximidade entre nós e todos aqueles que representamos a nível nacional.
Este é um canal feito por todos nós, com uma pequeníssima equipa fantástica, que todos os dias assume
novos desafios. Quase 10 anos depois, queremos dar mais este passo, apenas mais um grande passo que
permitirá a muitos portugueses um acompanhamento cada vez mais próximo do nosso dia a dia. Assim
poderão acompanhar as nossas divergências, as nossas convicções, as nossas próprias discussões, sejam
feitas neste Plenário ou nas diversas comissões que nesta Casa reúnem diariamente.
A imagem desta Casa, desta nossa Casa da democracia, é feita por todos nós e por cada um de nós. O
Canal Parlamento muito tem ajudado neste desígnio.
Aplausos do PSD, do PS e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr.ª Deputada Inês de Medeiros, tem a palavra para uma
intervenção.
A Sr.ª Inês de Medeiros (PS): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: De facto, hoje apresentamos aqui um
projeto de lei e um projeto de resolução assinados por todas as bancadas, o que denota bem o apreço e o
carinho que todas as bancadas com assento parlamentar têm em relação ao Canal Parlamento.
Importa aqui salientar que o Canal Parlamento não é uma televisão como as outras, é um serviço que a
Assembleia presta à democracia portuguesa. Nesse sentido, deve ser protegido, deve ser acarinhado e deve
poder continuar a chegar aos cidadãos sem interferência e com base em decisões consensuais, como têm
sido até agora.
Ao efetivar-se a transmissão do Canal Parlamento em sinal aberto estaremos perante um importante
contributo para a intenção de estabelecer uma maior proximidade entre os cidadãos e a atividade parlamentar
e subsequente compreensão dos mecanismos democráticos. Como tal, estamos também a dar corpo a uma
recomendação do Comité de Ministros do Conselho da Europa relativa à adoção de medidas para promover a
contribuição democrática e social da televisão digital terrestre.
Em relação àquilo que o Sr. Deputado Nuno Encarnação disse na sua intervenção, importa também
realçar, para que não haja mal entendidos, que o conceito de operador de distribuição de serviços de
programas televisivos, nos termos da Lei da Televisão, abrange tanto a distribuição por cabo como o titular de
licença de distribuição da TDT, e foi também usado recentemente para abranger ambas as realidades no
Decreto-Lei n.º 70/2009, de 31 de março, que alterou o artigo 5.º do referido Regime de Taxas da Entidade
Reguladora para a Comunicação Social (ERC) da ERC.
Ou seja, neste momento, tendo nós passado exclusivamente para o sinal digital, depois do chamado
«apagão», não há razões para que o Canal Parlamento, que presta este serviço ímpar aos portugueses, não
possa estar disponível para todos sem custos adicionais, permitindo assim que a Assembleia chegue a casa
dos cidadãos ou que os cidadãos entrem na Assembleia.
Aplausos do PS.
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A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr. Deputado Raúl de Almeida, tem a palavra para uma intervenção.
O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as
Deputadas e Srs. Deputados: Esta é uma
excelente notícia e vivemos neste debate, aqui hoje, neste momento, um passo importantíssimo na
aproximação entre os cidadãos e a política, no aprofundamento da qualidade da nossa vida democrática —
falamos do serviço que conhecemos como Canal Parlamento.
Tem feito este Canal um percurso de consolidação, de evolução significativa de meios técnicos, de
aumento consistente de horas de emissão, de cada vez melhor organização da sua grelha e programação.
Graças aos excelentes profissionais desta Casa, graças aos Deputados de todos os grupos parlamentares,
sem exceção, que compõem o Conselho de Administração deste serviço, hoje o Canal Parlamento é não só
informativo, como também formativo e convidativo. Graças também — é justo aqui referenciá-lo — ao
empenho da Sr.ª Presidente da Assembleia da República, é possível esta boa notícia para a vida democrática:
a disponibilização deste serviço em canal aberto.
Como bem se diz na Exposição de motivos do presente projeto de lei, pretende-se levar o Parlamento a
casa de todos os portugueses, trazendo assim os cidadãos portugueses para este importante centro da vida
política democrática.
Por outro lado — e muito importante —, estão asseguradas as características que fazem deste um serviço
de referência, um serviço único.
Assegura-se, pela continuação de todos os partidos com assento parlamentar no Conselho de
Administração, a maior transparência, isenção e inequívoca neutralidade.
Assegura-se a disponibilização do Canal a eventuais futuros operadores, garantindo a sua universalidade
de transmissão.
Assegura-se, acima de tudo, o aprofundamento da participação cívica, a melhoria da qualidade de vida
democrática, a transparência da vida das instituições, que todos representam e são de todos.
É um passo decisivo, Sr.as
e Srs. Deputados, na caminhada de uma cidadania cada dia mais forte e
também mais responsável.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Esta é uma boa decisão. É uma boa
decisão que só peca por tardia.
A emissão do Canal Parlamento em sinal aberto, através da TDT, representa um avanço positivo e um
contributo para a cidadania, com mais e melhor participação, assente em mais e melhor informação e no
conhecimento mais concreto e mais direto do que acontece nas sessões da Assembleia da República, nas
reuniões plenárias, nas comissões parlamentares.
Esta decisão de se abrir a emissão do Canal Parlamento já devia ter sido tomada há anos, logo desde a
origem do processo de implementação da TDT em Portugal. Mas mais vale tarde do que nunca e, assim, a
Assembleia da República leva por diante uma medida que vínhamos defendendo há muito e que muitíssimos
cidadãos, estruturas, organizações, investigadores, solicitavam à Assembleia da República e aos grupos
parlamentares, manifestando esse desejo e essa reivindicação justa de que a Assembleia, nos seus trabalhos
diários, estivesse disponível não apenas a quem paga pelo acesso à televisão por cabo, às plataformas pagas
de televisão, mas, sim, a todos os cidadãos, de um forma generalizada, como agora passa a acontecer, com
esta decisão. Assim se coloca um ponto final a essa injustiça que vínhamos apontando, que reconhecíamos e
que agora vai ser finalmente corrigida.
Por fim, uma palavra sobre esta opção de legislar mantendo o caráter específico e especial do Canal
Parlamento, não como uma televisão como as outras, como já aqui foi dito, mas, sim, como um serviço de
transmissão integral, sem mediação, dos trabalhos parlamentares,…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
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O Sr. Bruno Dias (PCP): — … ou seja, não mexemos na lei da televisão e fizemos bem em não o fazer;
mexemos na legislação enquadradora do Canal Parlamento, pelo serviço especial da Assembleia que é
prestado à população portuguesa, como bem se refere no preâmbulo deste projeto de lei, com este acesso
sem edição, sem montagem, sem cortes. Esta característica deve manter-se como o traço essencial do Canal
Parlamento porque muitos cidadãos têm esse interesse, que marca a diferença não por mais um programa de
reportagem, pois não temos direito a fazer esse trabalho, que compete aos profissionais da comunicação
social, aos canais de televisão.
Nós, aqui, na Assembleia, devemos ter uma janela aberta para a população, de uma forma não editada,
sem montagens, para que se veja, exatamente, o que acontece nos trabalhos da Assembleia da República.
Consideramos que é importante que este caminho tenha sido a opção seguida e consideramos que esta
linha de trabalho, de manter a emissão integral, em direto, e sempre depois, ao fim do dia, com a repetição,
para quem está a trabalhar ou a estudar ter acesso a esta informação, é algo que deve ser mantido e é um
trabalho só possível graças ao profissionalismo e ao empenhamento dos trabalhadores, dos profissionais do
Canal Parlamento, que garantem, todos os dias, esta emissão, este acompanhamento, com o sentido de
melhorar, de diversificar esse acompanhamento e essa transmissão dos trabalhos parlamentares, que devem
cada vez mais ter o escrutínio, o acompanhamento e, naturalmente, a crítica da população deste País.
Aplausos do PCP.
Entretanto, reassumiu a presidência a Presidente Maria da Assunção Esteves.
A Sr.ª Presidente: — Tem, agora, a palavra, a Sr.ª Deputada Catarina Martins, do Bloco de Esquerda.
Faça favor, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: A decisão de todas as bancadas
parlamentares de proceder a uma alteração legislativa que permite ao Canal Parlamento estar presente na
televisão digital terrestre, é uma decisão importante e que vai no seguimento de uma série de decisões que a
Assembleia da República tomou sobre a transparência e a acessibilidade de todos os cidadãos e cidadãs à
sua atividade.
O Canal Parlamento não é um serviço de programas televisivo, não se confunde com os outros canais de
televisão. É um órgão institucional, que transmite, de forma integral, as reuniões do Plenário da Assembleia da
República, as comissões com audições de membros do Governo e outras comissões consideradas relevantes,
pelas audições de entidades externas, que também são feitas.
Não se confunde, por isso, com um canal de televisão, nem entra naquilo que é o enquadramento e a
oferta da comunicação social em Portugal. É um órgão institucional, importante para a prestação de contas a
todos e a todas da atividade na Assembleia da República e que fica agora disponível, não apenas para quem
paga uma mensalidade a uma operadora de televisão por cabo, não apenas para quem paga uma
mensalidade para acesso à internet, mas a todos os que tenham televisão em casa. Todos passam a ter
acesso a este órgão de comunicação institucional da Assembleia da República.
Julgo que é importante dizer-se isto, porque é isto que consegue este projeto de lei, que tem o consenso de
todas as bancadas, mantendo esta ideia de que o Canal Parlamento não é um canal de televisão mas um
órgão institucional de comunicação, de transparência, uma janela sobre o que se passa na Assembleia da
República.
Faz bem a Assembleia da República em utilizar as inovações tecnológicas para aumentar a transparência
sobre a sua atividade, para aumentar o contacto com os cidadãos e cidadãs. Estamos bem, neste momento e
nesta decisão.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente: — Tem, agora, a palavra, o Sr. Deputado José Luís Ferreira, por Os Verdes.
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O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: No próximo ponto da ordem de
trabalhos vamos discutir o processo de instalação da televisão digital terrestre em Portugal e, nessa altura,
teremos oportunidade de reafirmar a nossa posição relativamente a este processo que, na nossa perspetiva,
ficará marcado pela completa ausência do interesse público.
Ausência de interesse público nas decisões do Governo, que levaram a que milhares e milhares de
portugueses ficassem sem acesso à televisão e, também por isso, vão ficar sem acesso ao Canal Parlamento.
Isto já para não falar do facto da introdução da televisão digital terrestre não ter representado um salto em
termos de oferta televisiva, ao contrário do que aconteceu por toda a Europa.
Relativamente às duas iniciativas legislativas que agora discutimos, um projeto de lei e um projeto de
resolução, que é, aliás, subscrito por todos os grupos parlamentares, queria começar por registar o consenso
conseguido nesta matéria para que a Assembleia da República disponibilize o sinal da sua rede interna de
vídeo para efeitos da distribuição de emissões parlamentares nos serviços da televisão digital terreste.
Com estas iniciativas legislativas, pretende a Assembleia da República levar o serviço televisivo do Canal
Parlamento a todos os portugueses, e só não será em iguais condições para todos porque o processo de
instalação da televisão digital terrestre, infelizmente, está a levar, como disse há pouco, a que milhares e
milhares de portugueses tenham de pagar para ter acesso à televisão e, nesta perspetiva, fica fragilizada a
vocação universal deste serviço.
De qualquer forma, ao levar o serviço televisivo do Canal Parlamento aos portugueses, esta Assembleia
está a fazer a sua parte. Falta agora que o Governo faça a parte que lhe compete, isto é, que trate de
assegurar que a televisão digital terrestre chegue a todos e em iguais condições, para que todos, e em iguais
condições, tenham acesso aos trabalhos da Assembleia da República, para que todos, e em iguais condições,
tenham acesso ao Canal Parlamento.
Quando assim for, quando o Governo garantir o acesso a todos e em iguais condições ao Canal
Parlamento, então, concluiremos o passo que esta Assembleia está hoje a dar, um passo que, para Os
Verdes, representa um verdadeiro aprofundamento da democracia, que vai certamente reforçar a
transparência da atividade politica e também aproximar os eleitores dos eleitos, permitindo que os portugueses
acompanhem os trabalhos da Assembleia da República.
Foi por isso, aliás, que Os Verdes também subscreveram estas iniciativas legislativas, esperando agora
que o Governo faça o que tem de fazer, isto é, que garanta o acesso a todos e em iguais condições à televisão
e, por maioria de razão, também ao Canal Parlamento.
A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, entramos agora no ponto n.º 5 da ordem do dia, que consiste na
discussão conjunta dos projetos de resolução n.os
303/XII (1.ª) — Recomenda ao Governo a inclusão na
televisão digital terrestre de todos os canais de serviço público de rádio e de televisão de âmbito nacional
previstos na lei e nos contratos de concessão, assim como a salvaguarda do princípio da orientação para os
custos do serviço de transporte e difusão do sinal digital de televisão por via hertziana terrestre (PS) e 344/XII
(1.ª) — Recomenda a inclusão na TDT de todos os canais de serviço público de televisão e o alargamento da
sua rede de emissão terrestre (PCP).
Para este debate, estão inscritos, desde já, os Srs. Deputados Inês de Medeiros, pelo PS, Bruno Dias, pelo
PCP, Raúl de Almeida, pelo CDS-PP, Catarina Martins, pelo BE, Lídia Bulcão, pelo PSD, e José Luís Ferreira,
por Os Verdes.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Inês de Medeiros.
A Sr.ª Inês de Medeiros (PS): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Já foi amplamente falada nesta Câmara
a importância que constitui a passagem do sinal analógico para o sinal digital na rede de distribuição de
televisão. Importância em termos de melhoria da qualidade de som e imagem, melhorias em termos de
aumento da oferta, importância para a melhor equidade e em termos da defesa do direito constitucional de
informar e de ser informado.
Também, infelizmente, já foram aqui amplamente abordadas as dificuldades encontradas por numerosas
zonas do País na transferência para a TDT, criando inaceitáveis discriminações e favorecendo
aproveitamentos mais que condenáveis, por parte de agentes privados, situação para a qual urge encontrar
uma resposta.
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Por isso mesmo, o Partido Socialista já apresentou aqui um projeto de resolução, que foi aprovado nesta
Câmara. Face às notícias alarmantes que continuam a surgir, voltou a formular uma série de perguntas
concretas ao Governo, que, lamentavelmente, ainda não obtiveram resposta.
Hoje, a proposta de resolução que aqui trazemos tem por objetivo não apenas denunciar as deficiências do
processo mas introduzir os temas de reflexão que deviam estar na base de qualquer política setorial. Ou seja,
o pensamento estratégico que tem estado tão escandalosamente ausente, condenando Portugal a ser o único
país da União em que a passagem para o sinal digital não representa qualquer aumento ou melhoria de oferta,
tanto em termos de serviço público como em termos de oferta privada.
Aliás, foi no sentido de melhorar a oferta pública que foi assinado um protocolo entre o anterior governo e a
administração da RTP para a criação de um canal de música portuguesa, sem custos adicionais para o
contribuinte, assim como a criação de um portal dos mundos de língua portuguesa. Estes dois projetos foram,
entretanto, abandonados, devido, segundo a própria administração da RTP, aos planos do Governo — planos
pouco claros ainda, dizemos nós.
Mas o PS não desiste de lutar por um melhor serviço público e uma melhor oferta de serviços de
radiodifusão. Por isso, o nosso projeto de resolução baseia-se em duas ideias-chave, que é essencial articular:
aumentar a oferta de serviço público de radiodifusão, não fazendo uma simples transferência de todos os
canais da RTP para sinal aberto mas propondo a passagem dos canais de âmbito nacional, pois só para esses
se justificaria essa abertura, assim como a passagem das rádios de serviço público. A televisão é hoje um
suporte pluridimensional.
Esta passagem dos canais já existentes deverá, obviamente, salvaguardar o equilíbrio financeiro do
mercado, enriquecer a oferta. Por isso, deverão ser concretizados os serviços de programas que procurem
satisfazer as necessidades educativas e formativas do público e/ou um serviço de programas destinado a
promover o acesso às diferentes áreas do conhecimento, tal como estava previsto no contrato de concessão
de serviço público. Aliás, durante os últimos dois anos, é suposto a RTP ter feito um estudo de viabilidade
destes dois projetos.
A melhoria da oferta faz-se não só através do canais públicos mas também criando condições para que os
operadores privados possam, também eles, aumentar a sua oferta. Ora, temos assistido a um diferendo entre
os atuais operadores de televisão e os prestadores do serviço de transporte e difusão do sinal de televisão por
via terrestre, devido ao elevado custo que vem sendo requerido pela PT Comunicações para a prestação
desse serviço de interesse geral. Esta matéria é da competência da ANACOM, mas compete ao Estado
garantir a aplicação do direito e a salvaguarda do interesse público.
Por isso, por neste momento estarmos perante uma situação de monopólio da PT, empresa agora
totalmente privada, onde o Estado não tem qualquer participação para garantir o interesse público, importa
retomar os termos previstos no Decreto-Lei n.º 31/2003, de 17 de fevereiro, assinado pela Dr.ª Manuela
Ferreira Leite, então Ministra de Estado e das Finanças, em que se define que o regime de preços de acesso à
rede de transporte e difusão do sinal de televisão deve respeitar os princípios da transparência, não
discriminação e orientação para os custos.
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Tal como iniciei, reafirmo aqui que este é um tema maior para a
construção de uma economia mais dinâmica e saudável, para a criação de uma sociedade mais justa e
informada e para o exercício quotidiano da democracia. Ainda não perdi a esperança que, nesta Casa, se dê a
devida importância e dignidade que estas matérias exigem, recusando o triste espetáculo a que temos
assistido, onde amadorismo, falta de projeto ou visão estratégica para o interesse nacional e, mais grave
ainda, falta de sentido de Estado, têm dominam o discurso do Governo em relação aos serviços de televisão,
sejam eles públicos ou privados.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente: — Sr.ª Deputada, quando entrámos no ponto 5, não tinha sido entregue à Mesa o guião
atualizado, que inclui o projeto de resolução n.º 348/XII — Recomenda a introdução na televisão digital
terrestre de todos os serviços de programas que constituem obrigações do serviço público de rádio e televisão
(BE), que vai ser discutido conjuntamente com os que já identifiquei.
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Com este guião atualizado, fica identificado o debate, que os Srs. Deputados apresentarão, como, aliás, a
Deputada Inês de Medeiros já fez em relação ao projeto de resolução do PS.
Para apresentar o projeto de resolução do PCP, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Já foi dito várias vezes e ninguém consegue
desmentir que, ao cabo de um processo de implementação da TDT em Portugal, continuamos a ter uma das
ofertas televisivas mais pobres da Europa. O apagão analógico e a libertação das frequências do espectro,
que permitia a entrada em funções de toda uma gama de canais televisivos e de rádio ao dispor da população,
em sinal aberto, de forma não condicionada, afinal, ficou no tinteiro.
Portanto, hoje, temos quatro canais de televisão, agora cinco, pois passamos a ter um serviço diferente,
que é o Canal Parlamento, mas temos uma oferta das mais pobres da Europa e isto pode ser resolvido
colocando o serviço público de televisão — e o de rádio também, concordamos com isso — disponível para
todos os cidadãos e não apenas para aqueles que pagam as operadoras de cabo e de acesso pago por
satélite.
As plataformas de acesso pago não podem ser a condição única para a cidadania portuguesa ter acesso
ao serviço público de televisão e de rádio, e é isso que propomos.
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Há frequências com fartura disponíveis para isto. A questão é para que é que
vão ser usadas. Nós dizemos que devem ser usadas também para o serviço público de televisão e de rádio
ser disponibilizado ao povo português. No nosso projeto de resolução, falamos do serviço público de televisão.
Há outros projetos que falam também no de rádio, e nós concordamos com isso. Por isso, estamos de acordo
com essa dupla vertente, rádio e televisão, serviço esse que pode ser disponibilizado para todo o País pelo
sistema digital de transmissão.
O que também propomos, para além desta questão importante, é que haja um alargamento da cobertura
territorial da TDT para acabar com esta absurda iniquidade de termos uma larga fatia do território nacional
onde só se consegue aceder à televisão como se estivéssemos no deserto ou na Amazónia, por parabólica,
por satélite, o que não faz sentido algum!
Recebemos — não sei se os demais Srs. Deputados também — um email, entre muitos, de um cidadão a
dizer: «Não tenho 91 € que possa tirar do meu orçamento familiar para empregar num serviço que me foi
erradamente retirado. Estou, como muita população, sem televisão desde o dia 26 de abril. Acontece que, em
78, nesta aldeia, não havia eletricidade e via-se televisão com uma bateria de automóvel. Agora, não é
possível, nem com outros aparelhos mais sofisticados. Só com parabólica».
Srs. Deputados, isto é um absurdo! É por isso que dizemos que deve ser seguido este critério de se alargar
a cobertura territorial da TDT para um nível que não seja inferior ao da emissão analógica da RTP1, que se
verificava antes do início deste apagão analógico.
Portanto, se repusermos essa cobertura territorial que existia no início do ano com a RTP1,
designadamente, estamos a responder a estes cidadãos que se indignam, que se insurgem contra esta
situação incompreensível que se verifica no nosso País.
O pior não sei aqueles que nos mandam mails, são aqueles que nem sequer mail têm para se dirigir a
quem quer que se seja, Srs. Deputados!
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
O Sr. Bruno Dias (PCP): — É essa a questão que queremos colocar, porque a voz destes cidadãos
também tem de ser ouvida, mesmo que não chegue às altas instâncias do poder político.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Para apresentar o projeto de resolução do Bloco de Esquerda, tem a palavra a Sr.ª
Deputada Catarina Martins.
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A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: No ponto anterior, disse que a
Assembleia da República tem utilizado as inovações tecnológicas que existem, que estão à sua mão, para
aumentar a sua capacidade de chegar aos cidadãos e às cidadãs, fazendo o que é lógico, querendo pôr o
Canal Parlamento na televisão digital terrestre.
Vamos agora falar do que está mal, vamos agora falar do absurdo e do ilógico que tem sido a marca da
televisão digital terrestre em Portugal. O Bloco de Esquerda já apresentou diversos projetos sobre esta
matéria, porque é ilógico termos a TDT mais pobre da Europa quando a inovação tecnológica nos permite
mais pluralidade, mais diversidade, sem ser preciso pagar as mensalidades às operadoras de televisão por
cabo ou de fibra.
É isso que a televisão digital terrestre dá a todos os cidadãos e cidadãs, a capacidade de terem pluralidade
e diversidade de conteúdos. Em Portugal, não dá! Em Portugal, pediu-se às famílias para pagarem 100, 150 €,
dependendo do sítio onde estão, gastando esse dinheiro para continuarem a ver exatamente a mesma
televisão que tinham, e em muitos locais para ver televisão nenhuma, porque ver com parabólica é muito
complicado, é muito difícil, é muito caro e tanta gente ficou excluída. Lembramos que foi aprovado um dos
pontos de uma recomendação do Bloco de Esquerda sobre essa matéria, mas a verdade é que não chegou a
todo o território, a verdade é que a maioria continuou a «chumbar» um ponto que consideramos essencial,
pelo que apoiamos os projetos no sentido de a televisão digital terrestre ter de chegar a todo o País sem
parabólicas.
É completamente ilógico que seja preciso pôr uma parabólica, em Portugal, para se ver televisão, desde o
dia 26 de abril! Isso não tem qualquer sentido!
O projeto de resolução que o Bloco de Esquerda apresenta hoje é muito específico, é sobre os serviços de
programas do serviço público de rádio e televisão. São serviços de programas que todos pagamos, nos
impostos, na taxa do audiovisual, mas, por que não era possível, antes da televisão digital terrestre, que toda a
oferta de programas aí estivesse livremente, utilizou-se o cabo. Tratava-se de uma condicionante tecnológica
que não existe agora.
Portanto, nada justifica que, hoje em dia, a população pague os canais de televisão e de rádio da RTP nos
seus impostos, através da taxa de audiovisual, e, ainda por cima, depois, vá ter de pagar uma mensalidade a
uma operadora de televisão por cabo para ver alguns desses canais. Não se compreende!
Não se compreende que, para ter acesso ao arquivo, à RTP Memória, ou à informação tenha de se pagar
uma mensalidade. É inaceitável! Já está pago! A população tem de direito de acesso em canal aberto,
livremente, a esses canais.
Mas mais: o contrato de concessão do serviço público de televisão diz que a televisão pública tem de
responder às necessidades de hoje. Ora, há uma necessidade de hoje muito específica de que fala o contrato
de concessão, que é um serviço de programas dedicado ao público infanto-juvenil. É essencial ter uma
programação de qualidade para o público infanto-juvenil, o serviço público de televisão tem de garantir essa
oferta e é o que está no contrato de concessão do serviço púbico.
Portanto, o que Bloco de Esquerda propõe é não só que os canais que estão hoje em cabo passem a estar
também na televisão digital terrestre mas também que a RTP cumpra as suas obrigações, dando essa oferta
essencial que está no contrato de serviço de concessão, a programação infanto-juvenil, e que não foi ainda
cumprida.
É hoje uma necessidade essencial de inclusão o acesso a canais de informação e a canais infanto-juvenis.
A quem está vedado este acesso está excluído, numa sociedade que é de informação e de entretenimento e
em que estes serviços de programas são tão essenciais à forma como nos organizamos como sociedade. Por
isso, a RPT tem obrigação de o fazer.
Uma última palavra: o Governo tem dito que isto é caro, mas façamos, então, as contas de uma forma
clara. O Governo quer retirar a publicidade do Canal 1 da RTP. Retirar a publicidade ao Canal 1 da RTP custa
30 milhões de euros por ano, mas passar todos os canais que estão no cabo para a TDT custa menos de 15
milhões, custa menos de metade.
O que o Bloco de Esquerda propõe ao Governo é que tenha metade dos custos a que se propõe e, com
isso, ofereça um serviço de qualidade à população, com todas as exigências de um serviço moderno de rádio
e televisão.
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Quando a maioria nega estas propostas, quando faz malabarismos com os números, sabemos que está a
destruir o serviço público de rádio e de televisão, mas, mais do que isso, está a negar o acesso da população
à informação, ao conhecimento, à cultura, a todas aquelas que são as obrigações do serviço público e rádio e
de televisão e, ainda, a razão pela qual existe serviço público de rádio e de televisão, que é essencial à
democracia.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Raúl de Almeida.
O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as
Deputadas, Srs. Deputados: Tudo na vida
evolui e a migração da televisão analógica para a TDT não foi — dizemos nós, felizmente — a desgraça que
anunciou o Partido Socialista, que esteve na sua génese e que, de facto, conduziu desgraçadamente este
processo, não foi a desgraça que o Partido Comunista anunciou nem a desgraça que o Bloco de Esquerda
anunciou. Foi diferente.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Isso é porque não mora em Portel!
O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — É verdade que trouxe incómodo a algumas franjas da população. É
verdade, não o podemos ignorar nem ignoramos, Srs. Deputados!
Apresentámos, em tempo próprio e útil, nesta Casa, com seriedade, um projeto de resolução que visava a
salvaguarda dos direitos destes cidadãos, dos telespetadores, e estamos satisfeitos com a forma como tem
seguido o subsequente processo e com a clara evolução que houve.
Protestos do PCP.
Uma evolução em relação a um processo mal conduzido por sucessivos governos socialistas, uma
condução que chegou a uma conclusão razoável, conseguida por este Governo, para um problema que há um
ano se previa catastrófico, e é preciso dizê-lo claramente.
Risos da Deputada do PS Inês de Medeiros.
A Sr.ª Deputada ri!… Nós poderíamos rir da inversão de objetivos do Partido Socialista nesta matéria. O PS
fez tábua rasa, deu uma verdadeira cambalhota política e de objetivos nesta matéria e, perante este problema
em que se enredou, em que enredou os telespetadores portugueses, vem, num curtíssimo espaço de tempo,
fazer um remake, um déjà vu, uma reprise, como quiserem, ao pedir novamente os programas todos da RTP
em canal e em sinal aberto.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Não é o mesmo tema!
O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — O Partido Comunista e o Bloco de Esquerda seguem-lhe as pisadas.
A ideia não é realista, mas, convenhamos, é simpática.
O vosso azar, Srs. Deputados, é que os portugueses começaram a ver a cara diferença entre simpatia e
realidade, começaram a preferir a realidade à simpatia irresponsável, começaram a perceber que tudo tem um
custo e que o custo daquilo que senhores prometem como gratuito, daquilo que é não mais do que uma
promessa agradável, custa dinheiro a todos os cidadãos, a todos os contribuintes portugueses.
E se é sério — e é sério — trabalharmos todos juntos por melhores conteúdos em sinal aberto, se
devemos, como bem diz a Sr.ª Deputada Catarina Martins, olhar para temas como a programação infanto-
juvenil e sermos a salvaguarda de que seja respeitada no operador público de televisão em sinal aberto, se
devemos ter em atenção todos os conteúdos, não é sério e não nos sentirmos com mandato para gastar mais
dinheiro em nome dos contribuintes portugueses.
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Não se trata só da transmissão, não é só a transferência dos canais para o sinal aberto, é cortarmos à RTP
receitas que vêm da transmissão por cabo E já não é sério, Srs. Deputados, prometer esta transferência
fazendo o «deve» e o «haver» — porque há «haver» neste caso e os senhores veem só o «deve» —, façamos
as contas com realidade.
Ainda que a transmissão fosse gratuita, e não o seria, não podemos negar ao operador público esta
dualidade, com canais cuja inclusão em sinal aberto, desde o início, os senhores, Partido Socialista, nunca
negociaram, nunca pensaram, nunca defenderam, canais que foram arquitetados, desenhados e criados de
raiz para serem transmitidos por cabo.
Dizer o contrário disto é tentar enganar simpaticamente os portugueses. Portanto, não nos sentimos com
esse mandato para gastar mais dinheiro em nome dos portugueses.
Quanto aos falsos anúncios de gratuitidade, há, contudo, um ponto que nos preocupa, e aí voltamos a
referir a diversidade, a abrangência e a qualidade da programação do operador púbico. Os portugueses
contarão connosco com seriedade, com clareza, com transparência, como sempre contaram, mas não foi essa
a discussão que os senhores aqui hoje trouxeram, não é esta a preocupação dos partidos da oposição; os
senhores preferem vender ilusões, ilusões que o povo há muito trocou pela realidade.
Aplausos do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Lídia Bulcão.
A Sr.ª Lídia Bulcão (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Ao ouvir os argumentos esgrimidos
nesta Câmara pela bancada socialista, pensei, por momentos, que era outro partido a falar.
O PS, que está hoje na oposição, vem agora pedir o que não foi capaz de fazer no devido tempo quando
foi responsável pela definição do sistema de TDT que Portugal devia ter.
O PS, que está hoje na oposição, vem agora pedir a solução para um problema que ele próprio criou
enquanto Governo, querendo agora atirar para cima da maioria uma responsabilidade que é inteiramente sua.
A Sr.ª Carina Oliveira (PSD): — Bem lembrado!
A Sr.ª Lídia Bulcão (PSD): — Não tenho dúvidas de que a maioria de hoje gostaria de ter mais canais
disponíveis na TDT. Aliás, não tenho dúvidas de que o País inteiro gostaria. E há muito que o dissemos!
Mas se hoje isso não é possível, deve-se, única e exclusivamente, ao Partido Socialista. Em primeiro lugar,
pelo contrato que negociou. E, em segundo lugar, pela difícil situação financeira em que deixou o País, que
não permite que se desperdicem ainda mais milhões de euros para alterar a atual oferta de TDT.
Aliás, a propósito do argumento usado agora pelo PS na proposta que aqui nos traz, de que se pode
aplicar «o princípio da orientação para os custos do serviço de transporte e difusão do sinal digital»,
alegadamente porque existe um monopólio no serviço prestado pelo operador, relembro o que aqui foi dito na
sessão plenária de 31 de março de 2007.
Debatia-se, então, a concorrência no mercado audiovisual da televisão paga e ouve quem afirmasse bem
alto o seguinte: «É esse o regime que vigora na rede cabo e, evidentemente, o futuro operador da parte paga
da televisão digital terrestre não pode ter desvantagens competitivas com o operador da rede cabo, sob pena
de não haver concorrência.»
Sr.as
e Srs. Deputados, estas palavras não são do PSD, nem do Governo da maioria mas, sim, do ex-
ministro do PS para os assuntos parlamentares, Augusto Santos Silva, que foi também Deputado da bancada
socialista, a mesma que aqui vem agora apresentar uma proposta baseada no argumento oposto.
A Sr.ª Carina Oliveira (PSD): — Bem lembrado!
A Sr.ª Lídia Bulcão (PSD): — Já o PSD, pelo contrário, alertou, diversas vezes, para os erros desenhados
pelo Governo socialista neste processo, tal como alertou para a situação embrionária em que o deixou a
escassos meses do primeiro desligamento.
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Felizmente, foi possível minorar algumas contingências, graças ao esforço deste Governo, do Parlamento e
do Grupo Parlamentar do PSD, que, inclusive, foi o primeiro a fazer aprovar um projeto de resolução sobre
esta matéria.
Conseguiu-se mesmo criar condições para que consigamos ter ainda o Canal Parlamento incluído nesta
TDT, como, aliás, acabámos de debater.
Já a propósito da recomendação para o alargamento da cobertura territorial, gostaria de relembrar os Srs.
Deputados de que o contrato negociado por esse mesmo Governo socialista diz que «no final da
implementação da rede de TDT, a cobertura deve ser no mínimo de 90,12% no território continental, de 87,36
% nos Açores e de 85,97% na Madeira».
Ora, estes valores já foram largamente ultrapassados, tendo mesmo atingido uma cobertura de 92% nos
Açores e superior a 94% no território continental.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Mas as Flores e o Corvo não têm!
A Sr.ª Lídia Bulcão (PSD): — E isto, meus senhores, só foi possível graças à colocação de inúmeros
retransmissores extra nos últimos meses, para corrigir, mais uma vez, erros que vinham de trás.
Sr.as
e Srs. Deputados, o PS diz-se agora preocupado em «garantir a universalidade do acesso a uma
oferta alargada e diversificada de conteúdos audiovisuais à generalidade dos cidadãos».
Pena que só agora, que já não está no Governo, se tenha lembrado disso.
A Sr.ª Carina Oliveira (PSD): — Bem lembrado!
A Sr.ª Lídia Bulcão (PSD): — Hoje, a TDT que temos, infelizmente, é a TDT que o PS quis.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr.ª Presidente e Srs. Deputados: Já dissemos e voltamos a
afirmar que o processo de instalação da televisão digital terrestre, em Portugal, está repleto de singularidades
e de exemplos daquilo que não deve ser feito, quando se pretende, de facto, salvaguardar o interesse público.
Foi um processo que correu mal e cheio de deficiências! E correu mal desde o seu início, desde o concurso
e das questões de concorrência, passando pelo facto de se exigir à operadora que fosse assegurada a
cobertura de uma percentagem de território em vez de se assegurar uma percentagem de população. E o
resultado está à vista.
É o resultado de decisões do anterior Governo socialista, é verdade, mas também é o resultado de
decisões do atual Governo, porque o Governo do PSD/CDS não pode agora chegar aqui e dizer «não temos
nada a ver com isto!». Tem e muito! Foi o atual Governo que desencadeou o apagão e o resultado é que
milhares e milhares de portugueses têm de pagar por uma antena para terem acesso à televisão.
Mas, para além destes factos, que não são poucos, ainda estamos a perder uma oportunidade histórica
para efetuar um salto gigantesco, não só na qualidade, mas também na variedade do serviço televisivo
prestado às populações.
De facto, em todos os restantes países europeus, como há pouco já disse, a instalação da TDT
representou um aumento do número de canais disponíveis. Por cá, temos uma oferta de canais gratuitos
exatamente igual à oferta analógica, o que não deixa de ser curioso, porque esta mudança para a TDT tinha
como grande objetivo o reforço da oferta de canais. Ou seja, enquanto no resto da Europa a introdução da
TDT representou uma explosão de variedades de oferta televisiva, em Portugal vamos ter uma oferta de
canais gratuitos exatamente igual à oferta analógica e, portanto, nem sequer aproveitamos as vantagens da
tecnologia digital.
Mas o mais grave é que este sistema está a deixar muitos portugueses às escuras. Por todo o País, mas
sobretudo no interior, há imensos casos de retransmissores que serviam as populações com qualidade e que,
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ao serem desligados por este Governo, deixaram as populações sem qualquer alternativa que não seja o
recurso à televisão por satélite.
E o recurso à via satélite, com os custos a serem suportados pelas pessoas, viola claramente o princípio da
equidade e penaliza, sobretudo, os consumidores nos pequenos meios habitacionais, mais isolados da
informação e até com menores recursos financeiros.
Impor custos adicionais aos cidadãos para acederem a um direito, que é o de terem acesso à televisão em
canal aberto, é completamente inadmissível e só se compreende porque o Governo — o anterior e este —
continuou, neste processo, a recusar-se a salvaguardar o interesse público e continua a agir em função de
interesses privados, nomeadamente das operadoras de telecomunicações móveis.
Nesta matéria Os Verdes consideram que a introdução da televisão digital terrestre tem de estar
forçosamente associada a mais serviço público, a mais variedade, a mais oferta e a mais qualidade no serviço
de televisão prestado aos cidadãos, pois só assim se defenderá e se afirmará a presença do interesse público
neste processo.
É por isso que consideramos fundamental que os diversos canais da RTP sejam integrados na plataforma
da TDT de maneira a estarem disponíveis para todos os portugueses em sinal aberto e sem quaisquer
limitações ou constrangimentos.
Mas é também necessário garantir que a cobertura territorial da TDT por emissão terrestre seja, no mínimo,
igual à cobertura que era feita pela emissão analógica da RTP 1 no início do processo, porque é preciso
assegurar o interesse público e porque é necessário garantir o acesso de todos os portugueses à televisão.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Muito bem!
A Sr.ª Presidente: — Tem ainda a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Bruno Dias.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Não há dinheiro para alargar a oferta
televisiva, mas as pessoas a quem o Governo tirou os subsídios de férias e de Natal têm de ter dinheiro para
pagar 91 € por um kit de parabólica e têm de ir para as plataformas de cabo de acesso pago, que é o que os
senhores obrigam as pessoas a fazer atualmente!
Sabem quando é que aparecem com mais insistência as campanhas agressivas da Meo e dessas
plataformas pagas? É quando falha a emissão da TDT! Coincidências? Não acham estranho que, num leilão
de frequências, cada lote de frequências tivesse sido pago exatamente por 45 milhões de euros pelas três
operadoras?! Não se perguntam onde é que está o dinheiro que está a ser ganho pelas operadoras no tal
apagão analógico e nas frequências que passam a ser usadas?
Srs. Deputados, não digam que não há dinheiro, porque o dinheiro está é a ficar todo muito bem guardado
nos mesmos cofres, nos mesmos grupos económicos, naqueles que estão a ganhar com este espantoso
negócio, que, sim senhor, teve na origem a responsabilidade política do Governo PS mas que, atualmente, é
da responsabilidade política do Governo PSD/CDS. E de uns para os outros as pessoas vão passando de mal
a pior e atravessando problemas cada vez mais graves relativamente aos quais não vale dizer que não há
alternativa; há alternativa, sim, mas os senhores vão chumbá-las amanhã nas votações.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Inês de Medeiros (PS). — Sr.ª Presidente, peço a palavra.
A Sr.ª Presidente: — Para que efeito, S.ª Deputada?
A Sr.ª Inês de Medeiros (PS). — Sr.ª Presidente, gostaria que a Mesa solicitasse à Sr.ª Deputada Lídia
Bulcão que contextualizasse o que disse ou, então, que fornecesse a ata de onde tirou a citação do então
ministro Augusto Santos Silva, porque eu temo que a Sr.ª Deputada esteja a confundir a TDT paga com a TDT
gratuita.
A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Lídia Bulcão.
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I SÉRIE — NÚMERO 120
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A Sr.ª Lídia Bulcão (PSD): — Sr.ª Presidente, é apenas para dizer que vou fazer chegar à Sr.ª Deputada
Inês de Medeiros a ata da reunião em questão.
A Sr.ª Presidente: — Com certeza, Sr.ª Deputada.
Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta de duas iniciativas legislativas que deram entrada na Mesa.
O Sr. Secretário (Paulo Batista Santos): — Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa as
seguintes iniciativas: projeto de deliberação n.º 8/XII (1.ª) — Prorrogação do período normal de funcionamento
da Assembleia da República (Presidente da AR) e projeto de resolução n.º 368/XII (1.ª) — Constituição da
Comissão Permanente (Presidente da AR).
É tudo, Sr.ª Presidente.
A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, amanhã terá lugar o debate quinzenal com o Sr. Primeiro-Ministro.
Está encerrada a sessão.
Eram 19 horas e 22 minutos.
Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.