5 DE JULHO DE 2012
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a qual nós não podemos passar, não pode estar a ser colocada em valores tão elevados. E aqui está um dos
pilares fundamentais da proposta que o Bloco de Esquerda traz. É que a ninguém, a nenhuma família,
independentemente da sua situação económica, pode ser negado o direito a um bem essencial, como é a
água. Isto é uma proposta essencial, mas nós percebemos que ela só é garantida de forma correta e essencial
pelo serviço público, porque esse é que é o garante de um bom serviço, racional, eficaz, e de proteção de um
bem essencial, como é a água.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Sá.
O Sr. Paulo Sá (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: A água é um recurso natural indispensável à
vida e de importância fundamental para o desenvolvimento do país. O direito à água e ao saneamento é
essencial para a concretização de todos os direitos humanos. Pela sua importância para cada um de nós e
para o nosso futuro coletivo, a água deve ser gerida unicamente por organismos públicos, na ótica de um
serviço público, no interesse de todos os portugueses e do País.
O projeto de lei apresentado pelo PCP tem como objetivo vedar a empresas privadas o acesso aos setores
de abastecimento público de água, de saneamento de águas residuais urbanas e de gestão de resíduos
urbanos, invertendo a lógica que tem sido seguida por sucessivos governos do PS, do PSD e do CDS desde
1993.
Efetivamente, até essa altura, os serviços de águas e saneamento foram uma responsabilidade exclusiva
da administração local do Estado, sendo a sua gestão pública controlada por órgãos democraticamente eleitos
e orientada para a prestação de um serviço público. É a partir de 1993 que se foram operando as mudanças
legislativas que, gradualmente, abriram este setor ao capital privado. Pela mão dos partidos da política de
direita, a água, de bem social, indispensável à vida, foi-se transformando num bem mercantil, cuja gestão
passou a ser ditada por lógicas economicistas, numa ótica de obtenção de lucro.
É este processo de mercantilização dos serviços de águas e saneamento que o atual Governo PSD/CDS
pretende acelerar. De acordo com as declarações dos responsáveis governamentais pelo setor, está em
preparação a fusão dos sistemas multimunicipais e a integração, nestes sistemas, dos sistemas em baixa,
assim como a revisão do regime de tarifas com o objetivo de recuperar integralmente os custos dos serviços,
ou seja tornar estes serviços lucrativos.
Cinicamente, o Governo e os partidos que o suportam justificam este processo de fusão e verticalização
pela necessidade de «permitir ganhos de eficiência operacional através de economias de escala e de gama
decorrentes das sinergias existentes, fomentar economias de processo e eliminar o atual risco de cobrança, o
que contribuirá para o acesso ao cash-flow, elemento fundamental para financiar novos investimentos no setor
e libertar a pressão na tesouraria».
São frases rebuscadas que apenas pretendem ocultar aos portugueses o verdadeiro objetivo do Governo:
a entrega da gestão e exploração dos serviços de águas e saneamento aos grandes grupos económicos,
nacionais e estrangeiros, que operam no setor.
Ainda mais cinicamente, o projeto de resolução do PSD/CDS recomenda ao Governo que mantenha a
água, assim como as infraestruturas associadas à prestação de serviços de abastecimento de água e de
saneamento na propriedade pública. Sabem muito bem estes partidos que a concessão destes serviços a
empresas privadas representa, na prática, a sua privatização e o controlo pelos privados do acesso à água e
ao saneamento, já que aos portugueses não se coloca a opção de irem às ribeiras, de cântaro à cabeça,
buscar a água que consomem, nem poderão livrar-se dos dejetos domésticos, à boa maneira medieval,
atirando-os pela janela e gritando «água vai!».
Já o PS, no seu projeto de resolução, surge muito preocupado com a possibilidade da entrada de capital
privado nos serviços de água e saneamento por via de concessões, chegando mesmo a invocar «o anúncio
feito pelo Vaticano de recusa da privatização da água, a qual não é um bem meramente mercantil, mas
público». Esquece o PS, ou faz-se esquecido, que também é responsável por alterações legislativas que
abriram a porta dos serviços de águas e saneamento aos privados, assim como pela criação de muitas
empresas municipais, com capitais privados, que atuam no setor.