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Sexta-feira, 6 de julho de 2012 I Série — Número 130

XII LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2011-2012)

REUNIÃOPLENÁRIADE5DEJULHODE 2012

Presidente: Ex.ma Sr.ª Maria da Assunção Andrade Esteves

Secretários: Ex.mos

Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco Rosa Maria da Silva Bastos de Horta Albernaz Abel Lima Baptista

S U M Á R I O

A Sr.ª Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas

e 14 minutos. Deu-se conta da entrada na Mesa do projeto de

resolução n.º 412/XII (1.ª), da apreciação parlamentar n.º 19/XII (1.ª), da proposta de lei n.º 81/XII (1.ª) e da proposta de resolução n.º 41/XII (1.ª).

Foi discutida, na generalidade, a proposta de lei n.º 66/XII (1.ª) — Procede à primeira alteração ao Decreto-Lei n.º 286/2009, de 8 de outubro, que regula a assistência e o patrocínio judiciário aos bombeiros, nos processos judiciais em que sejam demandados ou demandantes, por factos ocorridos no âmbito do exercício de funções, sobre a qual se pronunciaram, além do Sr. Secretário de Estado da Administração Interna (Filipe Lobo d’Ávila), os Srs. Deputados João Lobo (PSD), Filipe Neto Brandão (PS), Teresa Anjinho (CDS-PP), Cecília Honório (BE) e João Oliveira (PCP).

Foi igualmente discutida, na generalidade, a proposta de lei n.º 72/XII (1.ª) — Define meios de prevenção e combate ao furto e recetação de metais não preciosos, mas com valor comercial, e prevê mecanismos adicionais e de reforço no âmbito da fiscalização pelas forças e serviços de segurança

da atividade de gestão de resíduos. Usaram da palavra, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna (Juvenal Silva Peneda), os Srs. Deputados João Oliveira (PCP), Paulo Simões Ribeiro (PSD), Cecília Honório (BE), Isabel Oneto (PS) e Nuno Magalhães (CDS-PP).

A proposta de lei n.º 67/XII (1.ª) — Procede à terceira alteração ao Decreto-Lei n.º 307/2007, de 31 de agosto, que estabelece o regime jurídico das farmácias de oficina, foi também discutida na generalidade, tendo usado da palavra, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado da Saúde (Manuel Ferreira Teixeira) e da Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade (Teresa Morais), os Srs. Deputados Luísa Salgueiro (PS), João Serpa Oliva (CDS-PP), João Semedo (BE), Paula Santos (PCP), Nuno Reis (PSD) e Bernardino Soares (PCP).

A Câmara também se pronunciou sobre o projeto de resolução n.º 406/XII (1.ª) — Plano ferroviário nacional (Os Verdes) e intervieram os Srs. Deputados Heloísa Apolónia (Os Verdes), Adriano Rafael Moreira (PSD), Catarina Martins (BE), Ana Paula Vitorino (PS), Hélder Amaral (CDS-PP) e Bruno Dias (PCP).

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Os projetos de resolução n.os

351/XII (1.ª) — Recomenda ao Governo que estabeleça o leilão crescente na venda de pescado congelado ou proveniente de aquicultura num projeto-piloto a aplicar numa lota de média dimensão (CDS-PP) e 404/XII (1.ª) — Recomenda a proteção ao setor das pescas através da salvaguarda da rentabilidade e da adequação de rede de postos de venda (PCP) foram debatidos conjuntamente, tendo-se pronunciado os Srs. Deputados João Paulo Viegas (CDS-PP), João Ramos (PCP), Ulisses Pereira (PSD), Jorge Fão (PS), Cecília Honório (BE) e José Luís Ferreira (Os Verdes).

Procedeu-se à discussão conjunta dos projetos de resolução n.

os 215/XII (1.ª) — Recomenda ao Governo a

construção do lanço do IC35 Penafiel/Entre-os-Rios (PS) e

410/XII (1.ª) — Recomenda ao Governo a construção do IC35 (BE), sobre os quais intervieram os Srs. Deputados Renato Sampaio (PS), Pedro Filipe Soares (BE), Luís Vales (PSD), Michael Seufert (CDS-PP) e Jorge Machado (PCP).

Foi apreciada a petição n.º 157/XI (2.ª) — Apresentada pela Federação Portuguesa pela Vida, solicitando à Assembleia da República a avaliação da realidade do aborto em Portugal, tendo proferido intervenções as Sr.

as

Deputadas Paula Santos (PCP), Heloísa Apolónia (Os Verdes), Elza Pais (PS), Conceição Bessa Ruão (PSD), Cecília Honório (BE) e Teresa Caeiro (CDS-PP).

O Sr. Presidente (Guilherme Silva) encerrou a sessão eram 18 horas e 20 minutos.

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A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado da Administração Interna, Sr.ª Secretária

de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade, Srs. Jornalistas, está aberta a sessão.

Eram 15 horas e 14 minutos.

Podem abrir as galerias.

Antes de iniciarmos a ordem do dia, vou dar a palavra ao Sr. Secretário para proceder à leitura do

expediente.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): — Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram

admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: projeto de resolução n.º 412/XII (1.ª) — Recomenda ao

Governo que possibilite ao produtor pecuário o preenchimento direto na página do IFAP da declaração de

nascimento/morte de bovinos (CDS-PP), que baixou à 7.ª Comissão; apreciação parlamentar n.º 19/XII (1.ª) —

Requerimento do PCP, solicitando a apreciação pela Assembleia da República do Decreto-Lei n.º 106/2012,

de 17 de maio, que procede à primeira alteração ao Decreto-Lei n.º 8/2011, de 11 de janeiro, que aprova os

valores devidos pelo pagamento de atos das autoridades de saúde e de serviços prestados por outros

profissionais de saúde pública; proposta de lei n.º 81/XII (1.ª) — Altera vários diplomas aplicáveis a

trabalhadores que exercem funções públicas e determina a aplicação a estes dos regimes regra dos feriados e

do Estatuto do Trabalhador-Estudante previstos no Código do Trabalho, que baixa à 5.ª Comissão; e proposta

de resolução n.º 41/XII (1.ª) — Aprova as alterações à lista de compromissos específicos das Comunidades

Europeias e seus Estados-membros em matéria de serviços, anexa ao Acordo Geral sobre o Comércio de

Serviços, resultantes das Cartas Conjuntas das Comunidades Europeias e dos seus Estados-membros, por

um lado, e a Argentina, a Austrália, o Brasil, o Canadá, a China, o território aduaneiro distinto de Taiwan,

Penghu, Kinmen e Matsu, a Colômbia, Cuba, o Equador, Hong-Kong (China), os Estados Unidos da América,

a Índia, o Japão, a Coreia, a Nova Zelândia, as Filipinas, a Suíça e os Estados Unidos da América, por outro

lado, bem como dos relatórios sobre o resultado das negociações conduzidas de acordo com a alínea a) do n.º

2 do Artigo XXI do Acordo Geral sobre o Comércio de Serviços (GATS).

É tudo, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente: — Passamos agora à ordem do dia, cujo primeiro ponto consiste no debate, na

generalidade, da proposta de lei n.º 66/XII (1.ª) — Procede à primeira alteração ao Decreto-Lei n.º 286/2009,

de 8 de outubro, que regula a assistência e o patrocínio judiciário aos bombeiros, nos processos judiciais em

que sejam demandados ou demandantes, por factos ocorridos no âmbito do exercício de funções.

Para dar início ao debate, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Administração Interna. O Governo,

como autor da iniciativa, dispõe de mais 1 minuto.

O Sr. Secretário de Estado da Administração Interna (Filipe Lobo d´Ávila): — Sr.ª Presidente, Sr.ª

Secretária de Estado, Sr.as

e Srs. Deputados: Como é do conhecimento público, o Governo tem vindo a adotar

um conjunto de iniciativas legislativas no sentido de dar cumprimento a um objetivo fundamental do Programa

do Governo — conseguir reunir condições para os corpos de bombeiros que sejam adequadas ao

desempenho da sua atividade.

As alterações aprovadas recentemente em Conselho de Ministros aos Decretos-Leis n.os

241/2007 e

246/2007 são um exemplo desse caminho. Um caminho de incentivo ao voluntariado, um caminho de reforço

do estatuto social dos bombeiros, quer na área da educação quer na área da saúde. Um caminho, Sr.ª

Presidente, que também hoje pretendemos prosseguir com a apresentação da proposta de lei n.º 66/XII (1.ª) e

que, no essencial, apresenta dois objetivos principais.

Em primeiro lugar, tem como objetivo corrigir e suplantar inconstitucionalidades orgânicas identificadas pelo

Tribunal Constitucional e que, inclusivamente, já tinham sido identificadas pela própria Procuradoria-Geral da

República.

A atribuição de novas competências ao Ministério Público tem de resultar da Constituição, do estatuto, ou,

como é o caso, de proposta de lei.

Procura-se por isso, com esta iniciativa, corrigir uma lacuna pela via legislativa competente.

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Sr.as

e Srs. Deputados, mas, para além do que acabo de referir, esta proposta de lei tem também um

objetivo prático: na linha daquelas que têm sido as opções do Governo, a assistência e o patrocínio judiciário

aos bombeiros destina-se a assegurar a defesa dos direitos dos bombeiros, no exercício das suas funções,

independentemente de se encontrarem, ou não, em situação de insuficiência económica.

Enquadram-se no âmbito do exercício das funções dos bombeiros todos os factos que resultem da sua

atividade operacional.

É isso que se pretende com esta iniciativa, em harmonia com a lei de acesso ao direito, atribuindo

especiais competências ao Ministério Público, para conhecer, para instruir, para dirigir o procedimento, bem

como para conceder, denegar, promover e reiterar a proteção jurídica aos bombeiros.

Sr.ª Presidente, Sr. as

e Srs. Deputados, termino, dizendo que não temos dúvidas de que, neste caminho,

somos acompanhados por esta Câmara.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — O debate continua com as intervenções dos Srs. Deputados, estando já inscritos,

para proferirem intervenções, os Srs. Deputados João Lobo, do PSD, Filipe Neto Brandão, do PS, e Teresa

Anjinho, do CDS-PP.

Tem a palavra, em primeiro lugar, o Sr. Deputado João Lobo.

O Sr. João Lobo (PSD): — Sr.ª Presidente da Assembleia da República, Sr. Ministro da Administração

Interna, Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade, Sr. Secretário de Estado da

Administração Interna, Sr.as

e Srs. Deputados: O artigo 7.º do Decreto- Lei n.º 241/2007, de 21 de junho,

consagrou o direito de os bombeiros gozarem de assistência e patrocínio judiciário nos processos judiciais em

que sejam demandantes ou demandados por factos ocorridos no âmbito do exercício de funções.

Por força do disposto no n.º 2 daquele artigo 7.º, esse direito foi objeto de regulação em diploma próprio, o

Decreto-Lei n.º 286/2009, de 8 de outubro.

Porém, o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 560/2011, publicado na 1.ª Série do Diário da República

de 20 de dezembro de 2011, declarou, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade orgânica das

normas constantes dos n.os

1 e 3 do artigo 4.º, do artigo 6.º, do n.º 1 do artigo 7.º e do n.º 2 do artigo 8.º

daquele decreto-lei regulamentar.

Na sua fundamentação, considerou o Tribunal Constitucional que, por forma direta e autónoma, as

referidas normas alargavam o núcleo de competências do Ministério Público, quer as previstas nas

correspondentes normas constitucionais quer as consignadas no respetivo Estatuto, o que apenas,

necessariamente, poderia ter sido feito através de lei da Assembleia da República ou mediante decreto-lei

emitido ao abrigo de autorização legislativa. Daí a inconstitucionalidade orgânica de que aquelas normas

regulamentares enfermavam. Desconsiderou, pois, o Governo de então esta Assembleia da República.

A presente proposta de lei visa suprir a referida inconstitucionalidade, repristinando o mesmo núcleo de

normas, que o Governo submete agora ao órgão da República constitucionalmente competente.

Louvor, então, ao Governo, que, ao invés do anteriormente sucedido, faz cumprir agora a repartição

orgânico-funcional das competências constitucionalmente atribuídas.

Louvor ainda, porquanto, na consideração dos fins humanitários prosseguidos pelos bombeiros, que, sob a

égide «vida por vida», salvam e protegem vidas humanas e bens em perigo, mostrando-se célere no expurgo

das normas julgadas inconstitucionais, solicitou prioridade e urgência quanto à presente proposta de lei e

preveniu a aplicação retroativa das normas desde a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 286/2009, de 8 de

outubro.

Honra ainda a esta Casa que, de forma expedita, trouxe à discussão matéria de relevante interesse público

e que entroniza merecido ato de justiça.

O Grupo Parlamentar do PSD manifesta, pois, a sua concordância com esta proposta de lei.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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A Sr.ª Presidente: — Entretanto, inscreveram-se também, para proferirem intervenções, os Srs. Deputados

Cecília Honório, do BE, e João Oliveira, do PCP.

Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado Filipe Neto Brandão para uma intervenção.

O Sr. Filipe Neto Brandão (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, Sr.ª Secretária de Estado, Sr.as

e Srs.

Deputados: Estamos, hoje, a discutir esta proposta de lei porque o Tribunal Constitucional, e bem — já lá

vamos —, considerou que um determinado decreto-lei não poderia ser regulado por outro decreto-lei, mas,

sim, por uma lei.

Temos de ter presente que, do ponto de vista substantivo, isto é, da substância em sentido literal, o

Decreto-Lei n.º 286/2009, cuja inconstitucionalidade orgânica foi declarada pelo Tribunal Constitucional,

limitara-se a regular o direito à assistência e ao patrocínio judiciário que o artigo 7.º do Decreto-Lei n.º

241/2007 (que, aliás, foi muito bem referenciado pelo orador que me antecedeu) esse, sim, consagrou.

Foi esse Decreto-Lei n.º 241/2007 que definiu o regime jurídico dos bombeiros portugueses,

correspondendo a justos anseios dos bombeiros à data —, e que se mantém plenamente válido no nosso

ordenamento jurídico —, que estatuiu esse direito à assistência e patrocínio judiciário e que determinou que o

mesmo seria regulado em diploma próprio, o que o anterior governo entendeu fazer através de decreto-lei.

Entendeu o Tribunal Constitucional — e bem — que um tal decreto-lei, atento o seu conteúdo, padeceria de

inconstitucionalidade orgânica. Essa decisão do Tribunal Constitucional, que vivamente saudamos pelos

ensinamentos que dela se podem extrair, permite-nos retirar duas conclusões que este Parlamento não pode

deixar de registar.

A primeira — e cito o acórdão em causa — é a de que «no sentido em que se inscrevem no domínio da

regulação do regime especial de assistência e patrocínio judiciário aos bombeiros, todas as normas

impugnadas — principais e acessórias — têm manifesto caráter procedimental».

Quer isto dizer que a presente proposta de lei, ao importar na sua integralidade o que se continha no

decreto-lei julgado inconstitucional, reconhece que, do ponto de vista substantivo, aquela era uma boa

solução. É de inteira justiça reconhecê-lo. Saudamos o Governo por tê-lo feito.

A segunda conclusão, não menos importante, é a de que o julgador constitucional está vigilante quanto à

importância de garantir a intangibilidade do disposto no artigo 165.º, n.º 1, alínea p) da Constituição. O que

significa que para bulir com as competências das magistraturas — ainda que, no caso, para as aumentar —

será sempre necessária uma intervenção da assembleia representativa de todos os cidadãos portugueses. É

assim que a Constituição da República define a Assembleia da República e é isso que a relevância das

magistraturas para a qualidade da democracia reclama.

Nestes tempos instáveis em que vivemos, é bom podermos constatar que o Tribunal Constitucional não se

quer demitir do papel que lhe cabe na defesa do Estado de direito democrático e dos valores em que se funda.

Hoje, talvez mais do que nunca, precisamos de um tal Tribunal Constitucional.

Termino, Sr.ª Presidente, reconduzindo-me, afinal, àquele que é o tema desta discussão: o modo justo de

expressarmos, através da lei, aos bombeiros portugueses, o nosso reconhecimento pelo seu insubstituível

contributo para a segurança de pessoas e bens.

A aprovação desta proposta de lei constituirá, é certo, uma tímida confirmação desse reconhecimento. Mas

é um passo que damos com gosto e, por isso, anunciamos a nossa votação favorável desta proposta de lei.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — De acordo com a ordem das intervenções, segue-se a Sr.ª Deputada Teresa Anjinho,

do CDS-PP.

Tem a palavra, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: A proposta de lei que hoje

discutimos, e que visa a aprovação de uma primeira alteração ao diploma que regula a assistência e o

patrocínio judiciário aos bombeiros, reitera, de facto, e no essencial, por esta via legislativa, uma vontade

anteriormente expressa e que o Tribunal Constitucional, na sequência de um pedido de fiscalização formulado

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pelo Sr. Procurador-Geral da República, considerou ter sido feito de forma imperfeita ao declarar, com força

obrigatória geral, a inconstitucionalidade orgânica destas mesmas normas.

No essencial, abstendo-me de desenvolver o vício de inconstitucionalidade, está em causa a fixação à

magistratura do Ministério Público — tipicamente uma magistratura de ação — de uma competência estrutural

e materialmente nova que a converte numa magistratura de decisão.

O Ministério Público passa, assim, a ter a titularidade do poder de reconhecimento ou negação dos

pressupostos de atribuição ou cancelamento de um direito, ou seja, no concreto, decidir sobre o pedido de

assistência jurídica, bem como proceder ao cancelamento da proteção concedida.

Estamos, portanto, no domínio da regulamentação do regime especial de assistência e patrocínio judiciário

aos bombeiros, a nosso ver perfeitamente justificado, tendo em conta que existe uma diferença relevante em

relação ao regime geral, ou seja, o facto de aos bombeiros o apoio ser concedido independentemente da

situação de insuficiência económica do requerente, como foi referido pelo Sr. Secretário de Estado.

Vem, assim, este Governo, numa conjuntura difícil, no essencial, e com este enquadramento, assegurar

aos corpos de bombeiros condições adequadas ao desempenho da sua atividade.

É, sem dúvida, uma opção legislativa e uma iniciativa para os bombeiros portugueses e para nós, CDS,

muito importante. Não se corrige, a nosso ver, apenas um vício; vai-se muito mais além.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — É uma questão de atitude, uma atitude de compromisso e de

responsabilidade face a obrigações previamente estabelecidas e uma atitude de compromisso e

responsabilidade face a desafios atuais.

A nosso ver, é um sinal importante e em linha com o reconhecimento da nobre missão que os bombeiros

desempenham.

Registamos, pois, como positiva a celeridade do Governo na resolução desta situação, o que não deixa de

contrastar com os quase dois anos que se demorou a adotar o decreto-lei que hoje o Governo pretende

alterar…

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Bem lembrado!

A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — … e que, como já foi referido, dá integral cumprimento ao disposto no

regime jurídico dos bombeiros, diploma datado de 2007.

Para o CDS sempre foi, é e será fundamental contribuir para a dignificação dos bombeiros — instituição e

pessoas — que a sociedade precisa, reconhece e estima.

Por tudo isto, ressalvadas pequenas correções de pormenor em sede de especialidade, naturalmente

acompanharemos a proposta do Governo.

Aplausos do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Honório.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs. Deputados: A

proposta de lei que aqui hoje discutimos fecha finalmente um longo caminho, consagrando aos bombeiros

portugueses o direito à assistência e ao apoio judiciário, tal como já estava previsto no artigo 7.º do Decreto-lei

n.º 24/2007 e que foi retomado pelo Decreto-lei n.º 286/2009, que garantia já que este apoio judiciário se faria

independentemente da condição financeira destes homens e destas mulheres e cuja inconstitucionalidade

orgânica, como sabemos, foi declarada relativamente a algumas das suas normas.

Portanto, foi um caminho longo que se fecha hoje, consagrando para os bombeiros portugueses um direito

fundamental determinante e o que a proposta de lei faz é, no essencial, retomar este Decreto-Lei.

A inconstitucionalidade reportava-se ao alargamento de competências previstas para o Ministério Público e,

nesse sentido, esta iniciativa vem responder às legítimas expetativas dos bombeiros e o Governo quer dar um

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sinal claro, agora que começou a «fase Charlie», de valorização do estatuto destes homens e destas

mulheres.

Assim sendo, o Bloco de Esquerda acompanhará, como é evidente, a iniciativa que o Governo aqui traz.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs. Deputados: A

proposta de lei em discussão já foi suficientemente caraterizada e merece também, começando pelo fim, a

concordância e o voto favorável do PCP.

Trata-se de uma proposta de lei que procura dar resposta ao acórdão do Tribunal Constitucional que

declarou a inconstitucionalidade com força obrigatória geral de normas do Decreto-lei n.º 286/2009, que o

Governo procura suprir, alargando — e reconhecemos esse alargamento, a que, aliás, o Sr. Secretário de

Estado fez referência — ou, pelo menos, clarificando o âmbito das modalidades de proteção jurídica previstas

no diploma com a alteração que é introduzida à alínea c) do n.º 2 do artigo 4.º. Reconhecemos essa

clarificação, julgamos que é de saudar e, por isso, acompanharemos este diploma.

De facto, a situação que motiva a necessidade desta proposta de lei, infelizmente, ocorre em circunstâncias

que julgaríamos preferível que não ocorressem, porque, de facto, trata-se de uma declaração de

inconstitucionalidade por violação da reserva relativa de competência da Assembleia da República. Não traria,

certamente, prejuízo nenhum ao anterior Governo se tivesse apresentado à Assembleia da República um

diploma no sentido de aprovar este regime por uma lei da Assembleia ou por decreto-lei autorizado por esta.

De facto, é lamentável que, de forma incompreensível, se corra o risco de fragilizar, ainda para mais neste

caso, o regime de proteção do apoio judiciário a conceder às associações de bombeiros, cuja necessidade é

manifestamente óbvia e por todos reconhecida.

Portanto, não se compreendendo porquê, o Governo, furtando-se ao procedimento legal e

constitucionalmente imposto, acaba por fragilizar o regime jurídico que é necessário para as associações de

bombeiros.

Terminando a minha intervenção, até porque a discussão a que iremos proceder a seguir levantará, uma

vez mais, estas considerações como sendo necessárias, bom seria que todos os governos tivessem em

devida conta as limitações impostas pela Constituição, quer do ponto de vista formal quer do ponto de vista

material, nas propostas de lei que apresentam à Assembleia da República ou nos decretos-leis que fazem

publicar.

Não vou antecipar a discussão que faremos a seguir a propósito da proposta de lei n.º 72/XII, mas julgo

que será, no mínimo, justiça poética aquilo que teremos hoje à tarde na discussão destas duas propostas de

lei. É que, tendo em conta, particularmente, a intervenção da Sr.ª Deputada Teresa Anjinho, do CDS-PP, e

sobretudo as considerações que teceu à propósito da necessidade de respeito pelos comandos

constitucionais, é ainda com maior expetativa que aguardo a intervenção do CDS relativamente à proposta de

lei que vamos discutir a seguir.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Para uma segunda intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da

Administração Interna.

O Sr. Secretário de Estado da Administração Interna: — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de

começar por agradecer as diversas intervenções dos Srs. Deputados de todas as bancadas e de registar a

adesão unânime que foi manifestada em relação a esta matéria.

Sr. Deputado João Oliveira, quero agradecer-lhe a nota que aqui deixou, porque, no fundo, acabou também

por esclarecer o Sr. Deputado Filipe Neto Brandão, do PS, no sentido de lhe dizer que a proposta de lei que

aqui trazemos não é uma mera republicação ou uma mera reapresentação do decreto-lei posto em causa pelo

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Tribunal Constitucional; vai mais além do que isso em relação ao que são os interesses dos bombeiros de

Portugal, e isso é importante registar.

Por outro lado, quando o Sr. Deputado Filipe Neto Brandão diz que há uma tímida confirmação desse

reconhecimento que é devido a todos os bombeiros, eu queria dizer-lhe que não é uma tímida confirmação, é

mais um passo no caminho que, julgo, devemos todos seguir de apoio à atividade destes homens e destas

mulheres que estão ao serviço de todos.

À Sr.ª Deputada Teresa Anjinho gostaria de dizer que não se trata apenas de uma mera opção legislativa; é

um caminho de incentivo ao voluntariado, é um caminho de reforço do estatuto social dos bombeiros e é um

caminho onde o Governo não tem dúvidas, registando nós com agrado o grande consenso que há nesta

Câmara em torno desta questão.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, terminado este debate, passamos à discussão, na generalidade, da

proposta de lei n.º 72/XII (1.ª) — Define meios de prevenção e combate ao furto e recetação de metais não

preciosos, mas com valor comercial, e prevê mecanismos adicionais e de reforço no âmbito da fiscalização

pelas forças e serviços de segurança da atividade de gestão de resíduos.

Para abrir o debate, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Administração Interna.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna (Juvenal Silva Peneda): —

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Gostava de salientar duas caraterísticas principais em relação ao furto

e à recetação de metais não preciosos. Uma, é a grande dimensão do fenómeno, pois estamos a falar de

cerca de 1000 ocorrências por mês, de alguns milhões de euros envolvidos mensalmente e de mais de 30

detenções. Outra, é o impacto extremamente significativo, dado tratar-se de um crime em que o valor do

prejuízo é cerca de 40 a 50 vezes superior ao resultado líquido do furto.

Mas, mais do que isso, e por causa disso, na proposta de lei que o Governo irá apresentar brevemente a

esta Assembleia de reajuste no Código Penal, prevê-se o agravamento desta moldura penal para que possa

relevar para a respetiva moldura penal não o valor líquido do furto mas o prejuízo causado.

Para além do prejuízo, temos consciência de que atinge áreas e populações com fragilidades específicas,

deixando de funcionar infraestruturas públicas, provocando, por vezes, o isolamento de populações, quebra de

culturas e, sobretudo, provocando um enorme alarme social.

Este tipo de crime não é específico de Portugal, ocorre, neste momento, em toda a Europa, desde a

Polónia, à Alemanha, a Espanha e em vários outros países. E, por exemplo, nos Estados Unidos da América

este é um crime cuja discussão está em cima da mesa e que às vezes precisa de atuações transnacionais

para que possa ser combatido.

Esta proposta de lei que o Governo agora apresenta está quase, curiosamente, sincronizada com uma

proposta de lei muito similar que, neste momento, se encontra para discussão nas Cortes espanholas.

Este diploma trata cinco pontos fundamentais, de que, naturalmente, os Srs. Deputados já se aperceberam,

mas que eu gostava de sublinhar: o registo; o pagamento em dinheiro; o acesso às instalações; a interdição de

atividades; e um estágio mínimo que o material deve ter antes de ser transformado. Trata-se de dar meios às

forças de segurança para terem condições de eficácia relativamente ao debelar desta crise.

Por último, gostaria de dizer que esta proposta de lei resulta do trabalho conjunto do Ministério com as

duas associações representativas do setor, que contribuíram em muito para a redação do que está escrito. É

bom termos consciência de que esses elementos são as primeiras vítimas de um sistema que não tem este

tipo de garantias.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Secretário de Estado, queria colocar-lhe duas perguntas

muito sintéticas.

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Em primeiro lugar, perguntava-lhe como é que o Sr. Secretário de Estado e o Governo entendem que o

regime previsto no artigo 6.º para o acesso às instalações por parte das forças de segurança é compatível com

as disposições do nosso Código de Processo Penal relativamente às revistas e às buscas.

A segunda questão está relacionada com o artigo 7.º e com a aplicação da pena acessória. Gostava que o

Sr. Secretário de Estado nos pudesse esclarecer sobre quem aplica esta pena, em que momento do processo

e em relação a que crimes é que esta pena acessória pode ser aplicada.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Boa pergunta!

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da

Administração Interna.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna: — Sr.ª Presidente, Sr.

Deputado João Oliveira, naturalmente, por causa da sensibilidade destes temas, estaremos disponíveis e

abertos a todas as sugestões.

De qualquer forma, aquilo que aqui propomos é que haja condições para, de acordo com a lei geral e com

o Código Penal, na deteção de flagrantes delitos haja a possibilidade de encerramento imediato das

instalações — é o que aqui está vertido.

Do que estamos a falar é da interdição do exercício da atividade e da possibilidade de se aceder às

instalações, obedecendo à Lei de Segurança Interna, que permite, em determinadas circunstâncias, que

queremos agora aqui tipificar, dando poderes às forças de segurança para poderem aceder às instalações —

é isto que aqui está vertido no diploma.

A questão da interdição do exercício da atividade está, naturalmente, de acordo com a lei geral. Mas o que

gostaríamos que não acontecesse, como hoje acontece, é que, para poderem aceder a este tipo de

instalações, as forças de segurança só o possam fazer através de ameaças de risco ambiental. Isto é, só é

possível, por exemplo, entrar numa empresa de reciclagem se houver risco ambiental e nada mais. E é esse

bloqueio que gostaríamos de poder aqui abrir através desta proposta legislativa.

A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Simões Ribeiro.

O Sr. Paulo Simões Ribeiro (PSD): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs. Deputados:

O furto de metais não preciosos tem vindo a aumentar nos últimos anos, exponencialmente.

Segundo estatísticas da GNR, o cobre representa cerca de 73% dos metais alvo de furto, tendo aumentado

154% face a 2010. Para se ter uma noção da dimensão do problema, o número de furtos de cobre, em 2007,

era de 1188, sendo que, em 2011, registaram-se 9491 furtos deste metal. A seguir ao cobre, e em número de

ocorrências verificadas em 2011, surge o ferro, o alumínio, o inox, o aço e o titânio.

Do furto de metais não preciosos consta a subtração de fios elétricos, material elétrico e de

telecomunicações, pivôs de rega, linhas de caminho-de-ferro, transformadores, grelhas de drenagem, tampas

de saneamento, rails de comunicação e painéis de informação das estradas.

De entre todos estes objetos, são os fios elétricos que ocupam maior destaque, com cerca de 6367

ocorrências, num total de 9491. O impacto deste dano na sociedade corresponde a 50 vezes o valor do furto.

As principais vítimas são a população em geral, os agricultores, as empresas, os municípios e os

operadores de resíduos. Quanto às principais consequências, destacam-se os elevados prejuízos para a

economia nacional, a interrupção de prestação de serviços comunitários, o aumento do risco de acidentes, o

sentimento de insegurança das populações e os danos ambientais.

Consciente dos graves problemas criados por esta situação, o Governo entendeu intervir, e bem, por forma

a criar instrumentos eficazes e céleres de combate a esta criminalidade que, pese embora existirem registos

da mesma desde 2008, carece de uma resposta mais firme.

A prevenção deve ser a matriz primordial da atuação do Estado, mas o combate ao furto de metais não

preciosos, mas com valor comercial, bem como as atividades de recetação dos mesmos, deve ser encarado

como uma das grandes prioridades das forças de segurança.

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Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Paulo Simões Ribeiro (PSD): — Por forma a garantir este propósito, o Governo propõe-se, e muito

bem, a reforçar os mecanismos de fiscalização, de investigação e de punição dos atos ilícitos praticados no

âmbito da atividade de gestão de resíduos.

Assim, esta proposta de lei prevê regras para a implementação de sistemas de segurança, o registo

discriminado, a obrigatoriedade de pagamentos superiores a 50 € através de cheque, regras para sanções

acessórias, etc., etc.

Por isso, o Grupo Parlamentar do PSD saúda esta iniciativa legislativa do Governo que hoje aqui

discutimos, certos que estamos da importância que a mesma reveste na atual conjuntura, bem como do

contributo que dará para a prevenção e punição deste tipo de ilícito.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Cecília Honório.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governos, Sr.as

e Srs. Deputados: Não

está em causa a necessidade de se combaterem estes crimes, que têm, de facto, uma reconhecida relevância

económica, por isso é objeto da proposta de lei n.º 72/XII a criação de novos mecanismos de combate ao furto

e recetação de metais não preciosos, mas com valor comercial.

Há, no entanto, uma questão que podemos colocar como residual: é que, não havendo lei das prioridades,

há crimes prioritários e não sei se será nessa expetativa que o Governo terá outras intervenções casuísticas

desta natureza.

Em todo o caso, sobre a proposta de lei concreta que hoje discutimos, relativamente à obrigatoriedade do

sistema de videovigilância e à obrigatoriedade do registo em papel ou registo eletrónico, por um lado, a

proposta de lei remete para a Lei de Proteção de Dados, por outro, fala de um regulamento. Não percebemos

muito bem qual é a opção efetiva, mas aquilo que nos parece implícito, neste momento, é que o Governo, e

particularmente o Sr. Ministro da Administração Interna, passou a ter uma confiança incondicional nas

competências que a lei reconhece à Comissão Nacional de Proteção de Dados. Portanto, quero apenas ouvi-

lo neste sentido.

Ou seja, é evidente que será a Comissão Nacional de Proteção de Dados a reconhecer da

proporcionalidade e a aferir cada situação caso a caso e é evidente que a ouvirão relativamente à localização

das câmaras de videovigilância, bem como aos prazos de conservação desta mesma informação. E sobre as

pessoas, os responsáveis e o modo como têm acesso a esta informação e em que condições, há aqui uma

mudança, porventura, na orientação do Governo, mas eu gostaria de confirmá-la.

A proposta de lei prevê a utilização dos registos de vídeo, não só para efeitos de processo penal, mas

também para efeitos de processo contraordenacional. Do nosso ponto de vista, e não só, segundo muitos dos

pareceres que fomos colhendo e lendo atentamente, não faz sentido que os dados de vídeo sejam utilizados

como meio de prova numa aplicação de contraordenações e, portanto, isto pode entrar, inclusivamente, em

rota de colisão com a Constituição. Gostaria de ouvir o Governo sobre esta matéria.

Garantindo-se — e o Sr. Secretário de Estado não deu resposta a esta dúvida, que já aqui foi colocada —,

que as forças de segurança ficam autorizadas a entrar nas instalações para fiscalizar atividades e efetuar

diligências de prevenção, mesmo que não haja fortes indícios da prática de crime, está, de facto, a

ultrapassar-se o princípio da necessidade, que é aquele que enforma as medidas de polícia, segundo o que

está consagrado na Lei da Segurança Interna. E a resposta que o Governo aqui deu não resolve a formulação

que se encontra neste articulado, se bem que o próprio PSD já tenha reconhecido, em debate na primeira

Comissão, que esta proposta carece de substanciais alterações.

Finalmente, quanto ao reforço de punição que aqui é previsto, nomeadamente pela pena acessória de

interdição de atividades de gestão de resíduos de metais não preciosos, é igualmente de anotar que há

bastantes incongruências no plano das contraordenações previstas, nomeadamente face ao quadro legal que

já existe para condutas semelhantes no plano ambiental.

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Portanto, estas incongruências carecem, evidentemente, de justificação e alteração, mas aguardemos por

esta disponibilidade que, pelo menos, foi identificada pela maioria quando fizemos o debate na comissão.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Oneto, do PS.

A Sr.ª Isabel Oneto (PS): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs. Deputados: A proposta

de lei do Governo que agora nos é apresentada define meios de prevenção e combate ao furto e recetação de

metais não preciosos com valor comercial.

O Partido Socialista não ignora as consequências socioeconómicas deste tipo de furto, que, aliás, já foram

muito bem descritas pelo Sr. Secretário de Estado, vão muito para além do valor económico do próprio furto.

Mas a proposta de lei surpreende-nos, uma vez mais, pelas más razões, porque o Governo apresenta a este

Parlamento uma iniciativa que contende novamente com elementares princípios do Estado de direito.

Começa a ser uma marca deste Governo ignorar permanentemente aquilo que são os princípios

constitucionais que enformam o Estado de direito.

Não estamos sozinhos nesta crítica, Sr. Ministro; temos connosco o parecer do Conselho Superior do

Ministério Público, cuja leitura recomendamos atentamente, porque vem dizer que os efeitos perniciosos da

confusão entre a atividade preventiva e a atividade repressiva assumem maiores expressão no artigo 6.º,

aquele que prevê as buscas preventivas — não sei onde é que, na Lei de Segurança Interna, tal figura é

admitida —, nomeadamente por não estar a ser observado o princípio da proporcionalidade e da necessidade,

e vem também referir claramente que não faz sentido criar um regime autónomo baseado em atuações

policiais desenquadradas dos processos criminais pendentes.

Sr. Ministro, desta proposta de lei, com cuja finalidade o Partido Socialista concorda — e concorda também

que, em sede da ilicitude material, deve ser revista a danosidade social deste tipo de crimes —, pouco mais se

salva além do título. No entanto, esperemos que, em sede de comissão parlamentar, possamos chegar a bom

porto relativamente às finalidades de prevenção deste tipo de crime.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Magalhães, do CDS-PP.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs. Deputados:

Estamos aqui a falar de um crime altamente lucrativo, como foi aqui dito, altamente organizado, com redes

transnacionais, que merece a preocupação das organizações policiais transeuropeias e que, num aspeto que

não foi focado, mas que me parece importante relembrar, atua normalmente em zonas desertificadas, perante

pessoas particularmente vulneráveis e utilizando como agentes do crime também elas pessoas vulneráveis

que, correndo muitas vezes perigo de vida, e às vezes até pagando com a própria vida, procuram recolher

este tipo de material para os traficantes, que o fazem de forma altamente lucrativa.

Perante isto, há duas atitudes. Em primeiro lugar, uma atitude conservadora, dizendo que se lamenta, que

é algo com que concordamos mas nada fazendo para procurar combater; uma outra é a de procurar combater,

que é a que o Governo tem, e ainda bem.

Portanto, fez bem o Governo quando apresentou o Programa Campo Seguro da GNR, as equipas mistas

das forças e serviços de segurança, o aumento da moldura penal e, agora, uma proposta de lei, feita em

concertação com os parceiros do setor — é bom recordar, para quem fala em velhos hábitos — que não faz

mais do que registar este tipo de crimes, conhecer a tipologia dos meios do crime, reforçar a fiscalização e dar

meios às forças e serviços de segurança para prevenirem e reprimirem, porque é preciso reprimir a prática de

crimes.

Perante tudo isto, não ouvimos da parte da oposição qualquer palavra a dizer se concordam ou não que se

combata este crime que, repito, é grave, é lucrativo, é transnacional e que afeta pessoas fragilizadas em áreas

desertificadas.

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O Sr. Deputado João Oliveira, referindo-se à questão do direito à propriedade privada, prevista no artigo

6.º, está a ponderar sobre direitos fundamentais. Sr. Deputado, eu também poderia falar do direito à

segurança de pessoas e bens, por exemplo. Fala no artigo 7.º, n.º 1, sobre a pena acessória, e pergunta quem

a aplica. Deveria ser quem, Sr. Deputado? Se ler o n.º 2 desse mesmo artigo, fala-se no Código Penal,

dizendo «nos termos da legislação penal», como é evidente.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Não leu a proposta de lei!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Portanto, há duas opções: combater o crime ou conformar-se com o

crime.

Nós preferimos a primeira, e ainda bem que o Governo também.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs. Deputados: Começo

pro dizer que o crime que agora discutimos é, de facto, um crime que deve suscitar preocupação, não só

porque envolve, muitas vezes, a atuação de redes criminosas e porque teve, nos últimos anos,

particularmente, um acréscimo muito significativo que deve preocupar o Estado português, mas também

porque é pela prática deste tipo de crime que, muitas vezes, as populações se veem impedidas de acederem a

bens e serviços essenciais, como a eletricidade, o fornecimento de água, comunicações. E, em todas essas

situações, é pelo furto de metais não preciosos que as populações acabam por ficar impedidas do

fornecimento desses bens essenciais.

Portanto, Srs. Membros do Governo, quero deixar aqui bem claro que, por parte do PCP, acompanhamos a

preocupação e a necessidade de tomar medidas para se combater este tipo de ilícitos criminais e, em sede de

especialidade, apresentaremos propostas concretas de alteração à proposta de lei nesse sentido.

Mas, Sr. Ministro, aquando da discussão em Comissão, houve uma expressão utilizada pelo Sr. Deputado

Hugo Velosa que eu julgo que enquadra bem a discussão que estamos a fazer.

O Sr. Deputado Hugo Velosa falou da necessidade da salvação da proposta de lei. Sr. Ministro, olhando

para o conteúdo das normas que estão aqui propostas, diria que nem com uma extrema-unção conseguiremos

salvar o conteúdo concreto destas normas! E não é só o Grupo Parlamentar do PCP que o diz, são os

pareceres da Procuradoria-Geral da República, da Ordem dos Advogados, da Comissão Nacional de Proteção

de Dados que apontam não só inconstitucionalidades mas também ilegalidades, nomeadamente o não

cumprimento de disposições legais da Lei da Proteção de Dados.

É que, Sr. Ministro, há necessidade de compatibilizar o combate ao crime com aquilo que são regras

processuais penais e com aquela que é a aplicação do Código Penal e a punição dos crimes.

Dou-lhe um exemplo muito concreto em relação à pergunta que fiz ao Sr. Secretário de Estado, que tem a

ver com o artigo 7.º, com a aplicação da pena acessória de proibição do exercício da profissão. Diz o artigo:

«Todo aquele, pessoa singular ou coletiva, definitivamente condenado a pena de prisão ou equivalente, (…)».

Isto significa o quê? Significa que tem de haver um processo judicial com trânsito em julgado de uma

condenação. Mas, se é assim, quem é que vai aplicar a pena acessória? Já não é o tribunal que fez a

condenação, porque, em relação a esse, o processo extinguiu-se.

Sr. Ministro, há necessidade de corrigir, e de corrigir profundamente, as normas da proposta de lei, porque

tal qual elas estão não se conformam nem com os comandos constitucionais, nem com as normas penais e

processuais penais, nem sequer com a Lei da Proteção de Dados. E o parecer da Comissão Nacional de

Proteção de Dados é muitíssimo extenso não só na identificação de normas que não são compatíveis com a

Lei da Proteção de Dados mas também com a identificação de outras normas que, para serem legalmente

concretizadas, exigem uma intervenção da Comissão Nacional de Proteção de Dados.

Para concluir, Sr.ª Presidente, quero apenas dizer o seguinte: o Sr. Secretário de Estado, em relação à

norma do artigo 6.º e ao acesso às instalações, fala de flagrante delito, mas não é isso que está escrito na

norma. Na norma do artigo 6.º, não há uma referência ao flagrante delito, porque, se houvesse flagrante delito,

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a situação era completamente distinta. E, para essas situações de flagrante delito, o Código de Processo

Penal é suficiente. O problema é que não é de flagrante delito que se trata aqui.

Voltando às alterações ao Código Penal, temos, neste momento, entregue na Assembleia da República,

uma proposta de lei de alteração ao Código Penal que já prevê a agravação das penas, quando o furto

signifique a interrupção do fornecimento de bens e serviços essenciais. E também por uma questão

sistemática, até porque, em matéria penal, é melhor que haja uma codificação das normas e que elas não

sejam dispersas por vários diplomas legislativos, era preferível que estas normas pudessem ser encaixadas

nos seus devidos sítios, quer em termos de processo penal, quer no Código Penal.

Aplausos do PCP.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Temos de ajudar o Governo a fazer as coisas bem feitas!

A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Simões Ribeiro.

O Sr. Paulo Simões Ribeiro (PSD): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Só um pequeno reparo à

intervenção do Sr. Deputado João Oliveira.

A maioria demonstrou disponibilidade para discutir e melhorar a proposta de lei. Todas as propostas de lei

podem ser melhoradas, como é óbvio, e a disponibilidade da maioria vai nesse sentido. Agora, também lhe

digo que o objetivo não é desvirtuar a proposta de lei e que esta proposta de lei, pela sua oportunidade e pela

sua qualidade, já está salva por natureza.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, terminámos o debate, na generalidade, da proposta de lei n.º 72/XII

(1.ª).

Antes de passarmos ao ponto seguinte da ordem de trabalhos, resta-me cumprimentar o Sr. Ministro da

Administração Interna e os Srs. Secretários de Estado.

Vamos, agora, iniciar a apreciação, também na generalidade, da proposta de lei n.º 67/XII (1.ª) — Procede

à terceira alteração ao Decreto-Lei n.º 307/2007, de 31 de agosto, que estabelece o regime jurídico das

farmácias de oficina.

Aguardamos apenas 1 minuto para que os Srs. Membros do Governo ocupem o seu lugar na Sala.

Pausa.

Agora, sim, estamos em condições de iniciar o debate.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Saúde.

O Sr. Secretário de Estado da Saúde (Manuel Ferreira Teixeira): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs.

Deputados: É, de facto, inquestionável que a cadeia de valor dos medicamentos é de essencial importância

para a política de saúde e para a sustentabilidade financeira do Serviço Nacional de Saúde. É, portanto, em

consciência disto que o Governo tem implementado um conjunto profundo de reformas nesta área, a bem da

transparência do setor, a bem dos cidadãos e em benefício do Serviço Nacional de Saúde.

É também, de facto, inquestionável que as farmácias são um elo absolutamente relevante na cadeia de

valor que citei. E também me parece ser, de certa forma, consensual que são necessários alguns

ajustamentos ao regime legal que regula a atividade e o funcionamento das farmácias.

Neste quadro, o Governo apresenta a proposta de lei hoje em discussão, que visa a alteração ao Decreto-

Lei n.º 307/2007, em áreas da reserva de competência da Assembleia da República. Estas alterações têm,

essencialmente, dois fins: por um lado, fazer uma clarificação sobre o regime de propriedade das farmácias,

por forma a permitir que as limitações legais à propriedade sejam verificadas, introduzindo a explicitação sobre

as participações encadeadas; por outro, solicitar autorização à Assembleia da República para proceder à

regulamentação adequada das profissões que o Decreto-Lei n.º 307/2007 apelida de pessoal adequadamente

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treinado — não é bem esta a palavra — e que, com os técnicos de farmácia, ajudam os farmacêuticos. É

exatamente em relação a este pessoal com treino adequado que é necessário promover a regulamentação

adequada.

A proposta de lei que está em discussão visa exatamente estes dois objetivos.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr.ª Presidente, permite-me uma interpelação à Mesa sobre a

condução dos trabalhos?

A Sr.ª Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr.ª Presidente, tanto quanto sabemos, a proposta de lei que está em

debate não abrange os aspetos que o Sr. Secretário de Estado agora referiu. Abrange apenas a questão da

titularidade da propriedade das farmácias e não a dos ajudantes técnicos e outras matérias que foram agora

referidas.

A Sr.ª Presidente: — Sr. Deputado, não se trata bem de uma questão formal, mas, para todos os efeitos,

está colocada.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Tem de fazer outra intervenção, Sr. Secretário de Estado!

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, por agora, estão inscritos, para intervenções, os Srs. Deputados

Luísa Salgueiro, do PS, João Serpa Oliva, do CDS-PP, e João Semedo, do BE.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Salgueiro.

A Sr.ª Luísa Salgueiro (PS): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs. Deputados:

Apreciamos hoje a proposta de lei n.º 67/XII (1.ª), pela qual o Governo nos vem propor um conjunto de

alterações ao Regime Jurídico das Farmácias de Oficina, isto é, das farmácias que servem o público, onde

normalmente adquirimos os medicamentos ou outros produtos necessários para cuidarmos da saúde e do

nosso bem-estar. É apenas desta matéria que se trata e, por isso, secundo as palavras do Sr. Deputado

Bernardino Soares, na interpelação que fez à Mesa, sobre a condução dos trabalhos, dado que esta proposta

de lei, ao contrário do que anunciou aqui o Sr. Secretário de Estado, nada diz relativamente à questão da

atividade dos profissionais que exercem as suas funções nas farmácias.

Sabemos bem que o regime jurídico que o Governo pretende agora alterar, e que está consagrado no

Decreto-Lei n.º 307/2007, foi aprovado no tempo do Governo do Partido Socialista, na sequência do conhecido

Compromisso com a Saúde, assinado entre o Partido Socialista e a Associação Nacional das Farmácias, o

qual veio pôr fim a uma regra que vigorava desde a década de 60, no século passado, e liberalizou a

propriedade das farmácias, permitindo que qualquer pessoa possa ser titular desses estabelecimentos, até ao

limite de quatro farmácias e desde que a sua direção técnica seja assegurada, em permanência e

exclusividade, por um farmacêutico, sujeito às respetivas regras deontológicas.

As alterações que o Governo nos vem apresentar são alterações de pormenor, tornando obrigatória a

nominação dos títulos, clarificando o que se entende por uma pessoa que detém ou exerce a propriedade ou a

exploração ou gestão direta ou indireta de uma farmácia, estabelecendo a verificação do cumprimento do

limite máximo do número de farmácias por pessoa e estabelecendo que, para preenchimento do limite legal de

quatro farmácias detidas, exploradas ou geridas por titular, são também consideradas as concessões de

farmácias que dispensam medicamentos ao público nos hospitais do Serviço Nacional de Saúde. São apenas

estas as regras que se propõem alterar.

Importava aproveitar esta ocasião para resolver a questão suscitada pelo Acórdão n.º 612/2011, do

Tribunal Constitucional, que declarou parcialmente inconstitucional o Decreto-Lei n.º 307/2007 e que nos

recomendou fazer uma clara separação ou distinção entre as farmácias do setor social, do setor privado e do

setor público.

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São estas as principais alterações que o Governo nos vem aqui propor, ou seja, aquilo que

verdadeiramente preocupa, neste momento, as pessoas que são titulares de farmácias, os verdadeiros

problemas, como sejam as questões financeiras, o Governo não toca.

Aquilo que verdadeiramente preocupa as populações, que é a falta de cobertura desta resposta em

determinados territórios, pois, como sabemos, sobretudo em zonas do interior, há populações que já não têm

acesso a uma farmácia, isto não preocupa o Governo.

O Governo vem apenas, basicamente, concordar com a grande medida que foi tomada pelo Partido

Socialista, introduzir-lhe algumas correções de pormenor, não corrigindo, mesmo assim, aquilo que era mais

essencial, no sentido de acolher a decisão do Tribunal Constitucional, e continua à margem dos problemas

das farmácias, das pessoas, dos portugueses em geral.

Sr. Secretário de Estado, o Partido Socialista vai aprovar esta proposta de lei, porque, como disse, é

apenas uma questão de pormenor, mas lamenta que o Governo, mais uma vez, não resolva verdadeiramente

os problemas dos portugueses.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, antes de dar a palavra ao próximo orador, quero apenas lembrar que

se se verifica um lapso na temática do debate talvez o Governo o possa esclarecer. Não é coisa que a Mesa

controle, mas, se houver uma verificação genérica, por evidência, de que há uma extrapolação do tema, talvez

o Governo, durante o debate, o possa esclarecer.

Para uma intervenção, tem, agora, a palavra o Sr. Deputado João Serpa Oliva.

O Sr. João Serpa Oliva (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs. Deputados:

Tendo sido aprovada, no Conselho de Ministros, em 31 de maio, a alteração ao Regime Jurídico das

Farmácias de Oficina, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 307/2007, de 31 de agosto, já aqui citado, houve que

clarificar o regime da propriedade da farmácia, entendendo-se ser matéria da competência da Assembleia da

República. Foram ouvidas, para este efeito, a Ordem dos Farmacêuticos, a Associação Nacional das

Farmácias e a Associação de Farmácias de Portugal.

Assim, com a presente proposta de lei, determinam-se: impedimentos de titularidade; a obrigatoriedade de

serem nominativas as ações representativas do capital das sociedades comerciais proprietárias de farmácias;

a obrigatoriedade de serem nominativas as ações das sociedades que participem direta ou indiretamente no

capital daquelas sociedades, de modo a abranger as participações sociais encadeadas, como, aliás, o Sr.

Secretário de Estado já aqui referiu.

Esta proposta de lei também clarifica o que se entende por pessoa que detém ou exerce a propriedade, a

exploração ou a gestão indireta de uma farmácia, bem como permite a verificação do cumprimento do limite

máximo de farmácias por pessoa, a qualquer nível da participação no capital e a qualquer percentagem deste,

até ao titular de cada ação ou outra participação social permitida.

Ainda no domínio da limitação do direito de propriedade determina-se — e penso que este é um ponto

importante — que passam a estar englobadas no regime legal de quatro farmácias detidas, exploradas ou

geridas por titular as concessões de farmácias de dispensa de medicamentos ao público nos hospitais do

Serviço Nacional de Saúde, ao contrário do que se encontrava em vigor.

Na globalidade, o Governo pretende com esta iniciativa consolidar os mecanismos de fiscalização e de

identificação da titularidade, de modo a tornar efetiva a fiscalização do cumprimento das limitações referidas,

já que com as participações encadeadas se torna difusa a ligação proprietária, o que é indutor de fraude —

como recentes investigações assim o mostraram —, bem como refletir de forma diversa a situação especial

das concessões que não devem ser consideradas fora do perímetro negocial dos agentes económicos.

Sr.ª Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as

e Srs. Deputados: Em outubro de 2010, aquando da

discussão de diversas iniciativas legislativas relativas à transferência de farmácias, eu disse, nesta Câmara,

que «do farmacêutico de profissão que explora uma farmácia se espera que o mesmo se encontre

deontologicamente ligado a questões que não meramente economicistas».

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Muito bem!

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O Sr. João Serpa Oliva (CDS-PP): — E hoje o farmacêutico é peça fundamental na política do

medicamento, tão essencial no atual momento que atravessamos.

Assim, tudo o que possa contribuir para uma melhor fiscalização e para uma maior transparência tem,

certamente, o aval do CDS-PP.

Aplausos do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado João Semedo.

O Sr. João Semedo (BE): — Sr.ª Presidente, Srs. Secretários de Estado: A minha intervenção vai ser

sobre aquilo que, de facto, o Governo propôs à Assembleia e não sobre aquilo que o Sr. Secretário de Estado

disse que o Governo tinha proposto à Assembleia.

O que o Governo propõe à Assembleia é uma alteração na lei muito particular, o que não lhe retira a

importância que ela tem e com a qual concordamos. Até hoje, de facto, o regime de propriedade das farmácias

permitia todas as confusões e todos os malabarismos para ludibriar aquilo que era essencial, que era impedir

a construção e a criação em Portugal de vários grupos que dominavam por inteiro a rede nacional de

farmácias.

Espero que este impulso legislativo do Governo seja acompanhado igualmente pelo indispensável impulso

executivo e fiscalizador para que, efetivamente, aquilo que é hoje um submundo muito pouco recomendável

possa ganhar outra transparência, em nome dos interesses dos proprietários legítimos de farmácias, mas

também daqueles que nelas trabalham.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Muito bem!

O Sr. João Semedo (BE): — Não posso, no entanto, deixar de dizer que considero estranho que o

Governo, ao mexer na lei das farmácias, não aborde outros assuntos, alguns dos quais já referidos pela Sr.ª

Deputada do Partido Socialista que falou anteriormente, mas também dois aspetos muito importantes: por um

lado, o regime jurídico, a regulamentação do processo de abertura de novas farmácias e, por outro lado, a

grande indefinição relativamente à situação profissional e ao reconhecimento profissional dos chamados

«técnicos auxiliares de farmácia», necessidade tão imperativa que o Sr. Secretário de Estado até não se

esqueceu de a referir. Esqueceu-se, no entanto, o Governo de fazer a devida proposta à Assembleia da

República.

Por último, gostava de terminar com um comentário à presença do Sr. Secretário de Estado. Há poucos

minutos, esteve sentado um Ministro do Governo em que o Sr. Secretário de Estado participa. Tenho pena que

o Sr. Ministro da Saúde não tivesse tido oportunidade de vir aqui, à Assembleia, apresentar esta proposta de

lei. Mas compreendo: o Ministério da Saúde está em chamas pelo desrespeito que tem tido pelos profissionais

e pelas pessoas. Desrespeito pelos profissionais, porque quer pagar a preço de saldo um trabalho altamente

qualificado, altamente importante e de grande utilidade social; e desrespeito pelas pessoas, porque, num

truque de ilusionismo, numa noite consegue tirar médico de família a centenas de milhares de utentes para dar

a outros, trocando apenas, ou seja, aqueles que tinham médico de família deixam de ter médico de família e

os que não tinham passam a ter. Isto não é resolver o problema, porque os senhores deviam, de facto,

arranjar médicos de família para os centros de saúde. Isso, sim, era resolver um problema. Tudo o resto é um

truque de ilusionismo onde os senhores se hão de queimar, porque os portugueses não são estúpidos e não

se deixam enganar.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Estão inscritos, ainda para intervir, a Sr.ª Deputada Paula Santos, do PCP, e o Sr.

Deputado Nuno Reis, do PSD.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Paula Santos.

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A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados: Já que

estamos a iniciar um debate em que o tema que foi apresentado pelo Sr. Secretário de Estado não

corresponde ao que está efetivamente na nossa ordem de trabalhos, permito-me também fazer aqui uma

pequena referência, porque se trata de uma matéria sobre a qual o Ministério da Saúde e este Governo

deveriam, de facto, intervir rapidamente, que tem a ver com a contratação destes profissionais de saúde para

os serviços públicos de saúde. Estamos a falar de médicos, de enfermeiros, de nutricionistas, de psicólogos,

de terapeutas, de vários profissionais de saúde com salários que são manifestamente indignos daquilo que é o

seu desempenho profissional, desvalorizando todo o seu desempenho e desvalorizando também o Serviço

Nacional de Saúde

Aplausos do PCP.

Sr.ª Presidente, retomando agora aquilo que é, de facto, a nossa ordem de trabalhos, a proposta de lei que

está em discussão, queríamos referir o seguinte: já em 2007, o PCP alertou e denunciou na Assembleia da

República para as consequências do novo regime jurídico das farmácias de oficina. Dizíamos, e passo a citar:

«O presente diploma abre novas portas aos grandes interesses económicos do setor e propicia uma situação

em que poderosos meios passem a dominar a área da venda dos medicamentos.» O Governo subjugou-se

aos ditames dos grandes interesses económicos e monopolistas na área da saúde em detrimento dos

interesses públicos. Chamámos a atenção do impacto destas medidas na área da saúde.

O Governo dava, assim, passos para a liberalização da propriedade das farmácias, deixando de ser

propriedade exclusiva dos farmacêuticos para concentrar nas mãos de multinacionais, muitas delas da grande

indústria farmacêutica. Estavam, assim, criadas as condições para estas empresas avançarem para a

verticalização do setor do medicamento, como há muito aspiravam.

Os mecanismos para limitar a concentração da propriedade das farmácias previstos no decreto-lei para um

máximo de quatro farmácias por proprietário individual ou por sociedade, como o PCP sempre disse, eram

falíveis e poderiam ser facilmente contornados de diversas formas.

Foram estas razões que levaram à oposição do PCP a este diploma.

Cinco anos mais tarde, vem agora o Governo do PSD/CDS-PP propor uma alteração a este regime jurídico,

exatamente nos artigos referentes à propriedade, aos limites e à exploração ou gestão direta e indireta de

farmácias, no sentido de exercer um maior controlo e fiscalização nestes itens e até de «apertar a malha» em

termos da propriedade e os seus limites.

Estas propostas de alteração do Governo demonstram que as preocupações expressas pelo PCP no

passado não só tinham, como continuam a ter razão de ser…

Vozes do PCP: — Muito bem!

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — … e que os mecanismos previstos no decreto-lei não foram eficazes. Mas,

apesar de positivas, estas propostas não resolvem a questão de fundo, que permanece consagrada no quadro

legal, a saber, a liberalização da propriedade das farmácias.

Embora o Governo faça um esforço de limitar a propriedade das farmácias e a possibilidade da criação de

monopólios no setor, mantém a possibilidade de sociedades serem detentoras de farmácias, não restituindo a

exclusividade da sua propriedade aos farmacêuticos, permanece a possibilidade de venda de medicamentos

fora das farmácias, como continua a permitir que os grandes grupos económicos da área da saúde não sejam

prejudicados nos seus interesses.

Estas seriam as alterações necessárias e desejáveis para defender a acessibilidade ao medicamento e o

direito à saúde.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem ainda a palavra o Sr. Deputado Nuno Reis, do PSD.

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O Sr. Nuno Reis (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.ª e Sr. Secretários de Estado, Sr.as

e Srs. Deputados:

Discute-se hoje a proposta de lei n.º 67/XII, que pretende clarificar e aperfeiçoar alguns aspetos do regime de

propriedade das farmácias de oficina.

De forma muito sintética, pretende o Governo reforçar os mecanismos de transparência na identificação da

titularidade das farmácias, esclarecendo o que se deve entender por pessoa que detém ou exerce a

propriedade, a exploração ou a gestão indireta de uma farmácia, mas também garantir que, para o limite

máximo de farmácias por pessoa, se deve considerar qualquer nível de participação no capital e qualquer

percentagem deste.

Daí passarem a contar para o limite legal de quatro farmácias detidas, exploradas ou geridas por titular as

concessões de farmácias de dispensa de medicamentos ao público nos hospitais do SNS, ao contrário do que

sucede no regime atual em vigor.

Daí também a obrigatoriedade de terem de ser nominativas as ações representativas do capital das

sociedades comerciais proprietárias de farmácias, o que permite abranger as participações sociais

encadeadas.

Eis, em traços largos, o diploma que hoje discutimos.

Mas falar de farmácias é oportunidade para falar de medicamentos e, sendo este o último diploma

governamental da saúde a ser discutido nesta sessão legislativa, é hoje um bom momento para se fazer um

balanço da atividade deste Executivo no que respeita à política do medicamento.

Sr.ª Presidente, Sr.ª e Sr. Secretários de Estado, Sr.as

e Srs. Deputados: De largo, diria mesmo, de

larguíssimo alcance e benefício geral tem sido a atuação do Governo neste particular.

O Sr. Paulo Batista Santos (PSD): — Muito bem!

O Sr. Nuno Reis (PSD): — Hoje, graças ao novo regime de prescrição de medicamentos por DCI, à

redução das margens das farmácias e distribuidores ou à limitação do preço máximo dos genéricos, entre

muitas outras medidas já tomadas pelo Governo no sentido de baixar o preço dos medicamentos, quer de

marca quer genéricos, as farmácias estão a vender os medicamentos a um preço substancialmente mais baixo

do que no passado, mesmo o passado mais recente. Reflexo disso é o facto de a despesa do SNS com

medicamentos dispensados nas farmácias ter diminuído 13% em junho passado.

Mais expressiva ainda é a evolução da despesa do Estado e dos doentes com medicamentos genéricos,

que baixou 24% em valor, seguramente a maior queda dos últimos anos.

O Sr. Paulo Batista Santos (PSD): — Muito bem!

O Sr. Nuno Reis (PSD): — Dirão alguns, por desconhecimento ou índole demagógica, que essa

diminuição da despesa do Estado com medicamentos não se deve à redução de preço, mas a uma redução

forçada do consumo de medicamento por parte dos cidadãos. É falso. Os mais recentes dados do INFARMED,

referentes aos primeiros cinco meses deste ano, dão conta de que o mercado total de medicamentos vendidos

em farmácia aumentou 2,1% em volume, o que traduz um acréscimo de 2 milhões de embalagens vendidas.

Ou seja, os portugueses estão a pagar menos pelos medicamentos que consomem, mas consomem mais

medicamentos do que anteriormente.

O Sr. Paulo Batista Santos (PSD): — Muito bem!

O Sr. Nuno Reis (PSD): — Um exemplo bem significativo do que se acaba de dizer é o do segmento dos

medicamentos genéricos, que registou, entre janeiro e maio de 2012, uma redução de 19% em valor, mas ao

mesmo tempo um crescimento de 18% em volume, face ao período entre janeiro e maio de 2011.

O Sr. Paulo Batista Santos (PSD): — Muito bem!

O Sr. Nuno Reis (PSD): — De resto, será sempre bom lembrar que, graças às medidas tomadas para

promover o consumo de medicamentos genéricos, a quota de mercado em volume dos genéricos já atingiu os

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24,4%, estimando-se que possa, até ao final do ano, atingir os 30%, o que seria verdadeiramente histórico e

um sinal muito positivo para os consumidores nacionais.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Saúde.

O Sr. Secretário de Estado da Saúde: — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: De facto, esta alteração

ao Decreto-Lei n.º 307/2007, que o Governo trouxe à Assembleia da República, é apenas parte da profunda

alteração que o Governo aprovou neste Decreto-Lei. Talvez daí o meu lapso.

A profunda alteração que o Governo aprovou, em maio passado, relativamente ao Decreto-Lei n.º 307/2007

inclui a clarificação sobre a metodologia de licenças e de alvarás, a clarificação sobre a exportação de

medicamentos pelas farmácias, a criação de um regime especial de farmácias com volume de vendas

inferiores a 60% da média da faturação do Serviço Nacional de Saúde, o que permite a flexibilização de

requisitos relativos a farmacêuticos, instalações, etc., no sentido de possibilitar a diminuição de custos em

relação às farmácias que têm o menor volume de vendas.

Dado que o Governo procedeu a uma alteração profunda do Decreto-Lei n.º 307/2007 e, em simultâneo, do

Decreto-Lei n.º 53/2007, estamos perante uma profunda alteração do regime das farmácias.

O que o Governo aqui trouxe para debate é apenas aquilo que estava na reserva de competência da

Assembleia da República, aceito que com um lapso relativo à questão da regulamentação de outro pessoal

das farmácias.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Entretanto, assumiu a presidência o Vice-Presidente Guilherme Silva.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — O Sr. Secretário de Estado já esclareceu a questão que há pouco foi

colocada, mas pergunto se o Governo nos pode disponibilizar o conteúdo dessa alteração legislativa, porque

penso que ainda não foi publicada. O Sr. Secretário de Estado veio aqui apresentar todas essas alterações,

sem que nenhum de nós possa ter conhecimento concreto do diploma de que está a falar.

Sei que esse diploma não está aqui em debate, mas, já que fala nele, disponibilize-nos o decreto-lei, que

ainda não foi publicado, para o conhecermos também.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Pedia ao Governo, designadamente à Sr.ª Secretária de Estado dos

Assuntos Parlamentares e da Igualdade ou, mesmo, aos serviços da Assembleia para, se possível,

providenciarem o texto para ser distribuído pelas bancadas.

A Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade sinalizou à Mesa um pedido de

palavra. Pergunto-lhe para que efeito.

A Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade (Teresa Morais): — Sr.

Presidente, é apenas para informar que o Governo diligenciará no sentido de que essa informação seja

disponibilizada ao Parlamento com a maior brevidade.

Ao mesmo tempo, se o Sr. Presidente me autorizar, aproveito esta brevíssima intervenção para dizer ao Sr.

Deputado João Semedo que o Sr. Ministro da Saúde tem vindo a este Parlamento com muita frequência —

ainda na semana passada cá esteve durante todas as horas que os Srs. Deputados entenderam que devia

estar…

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O Sr. João Semedo (BE): — Era só o que faltava!

A Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade: — … para prestar todos os

esclarecimentos que os Srs. Deputados pediram —….

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

… e que o Governo é, nos termos do Regimento, responsável pelas opções que faz quando escolhe quem

é que, em cada debate, o representa no Parlamento.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Está esclarecida a presença do Sr. Secretário de Estado e também

as providências para documentar a Câmara com o documento do Governo.

Srs. Deputados, concluída a discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 67/XII (1.ª), vamos passar à

discussão do projeto de resolução n.º 406/XII (1.ª) — Plano ferroviário nacional (Os Verdes).

Para apresentar o projeto de resolução, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Os Verdes apresentam,

hoje, à Assembleia da República um projeto de resolução que visa a criação de um plano ferroviário nacional.

Se Os Verdes disserem que a mobilidade em Portugal, ao longo das últimas décadas, foi toda centrada na

rodovia, os Srs. Deputados não devem estranhar, pelo contrário, confirmam-no, porque outra coisa não

poderia deixar de ser. Temos um Plano Rodoviário Nacional, não temos um plano ferroviário nacional. Isto

demonstra, desde logo, as opções que foram feitas ao nível da mobilidade, em Portugal.

A partir de uma determinada altura, começou a ouvir-se alguma alteração discursiva por parte dos diversos

Governos a propósito desta matéria, procurando dar maior relevância à matéria ferroviária, porque, de facto,

há necessidade, em Portugal, de alterar o paradigma da mobilidade. Mas o certo é que esses discursos nunca

bateram com a prática e, fundamentalmente, com os investimentos e as opções políticas feitas ao nível da

mobilidade. Esse paradigma também não se alterou com este Governo, pese embora muitos discursos que

não passam disso mesmo, de discursos.

De resto, foi apresentado um Plano Estratégico dos Transportes, talvez melhor dito, um chamado «Plano

Estratégico dos Transportes», que prevê nada mais, nada menos do que o encerramento de cerca de 600 km

de linha ferroviária em Portugal e que — pasmemo-nos! — não tem um único capítulo sobre a ferrovia. Ou

seja, as diferentes modalidades de transporte estão divididas e tratadas em diferentes capítulos, exceto a

ferrovia. Daqui se conclui, desde logo, a pouca importância que o Governo atribui a esta modalidade de

transporte.

Também não era preciso falarmos do Plano Estratégico dos Transportes. Bastava atendermos à prática

deste Governo: um desrespeito profundo pela ferrovia, mas também pela mobilidade concreta dos cidadãos.

Veja-se aquilo que foi feito relativamente ao encerramento da Linha do Tua e veja-se o transporte rodoviário

alternativo que foi encontrado e que, curiosamente, no passado fim de semana, acabou. Neste momento, as

populações não têm nem ferrovia, nem rodovia. Não têm nada!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — É uma vergonha!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Estão absolutamente isoladas, não têm mobilidade!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — É uma vergonha!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — E o que faz o Governo? Não responde e «assobia para o lado»!

Como se não bastasse, temos, em Portugal, três capitais de distrito sem ligações ferroviárias, designadamente

Viseu, Vila Real e Bragança, e o Governo ainda insiste em descaracterizar a ferrovia de algumas cidades onde

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essa ferrovia tem uma importância estratégica, designadamente, em Setúbal, dando uma «machadada» na

ligação ao Algarve, ou em Beja, com a parca ligação que tem à capital do País mas não por via de ligações

diretas, porque o Governo fez essa opção. Isso, de facto, é de uma descaracterização e fragilização absolutas

da mobilidade ferroviária em Portugal!

Estamos completamente ao inverso daquilo que se passa na União Europeia, que, tantas vezes e por

tantas pessoas é vista como um modelo. Para algumas coisas, nunca se encontra modelo absolutamente

nenhum!

Só para as Sr.as

e os Srs. Deputados terem uma ideia, refiro que, em Portugal — são dados de 2006 —, a

média era de 271 m/1000 habitantes de rede ferroviária e de 31 m/km2 e a média da União Europeia era de

398 m/1000 habitantes e de 47 m/km2.

Mas, pior e mais grave, desde 2006 até à data tem diminuído quer o número de transporte ferroviário quer

a própria rede ferroviária. Conclusão: enquanto nós temos diminuído, progressiva e permanentemente, por

exemplo, o número de transporte de passageiros da ferrovia, a União Europeia tem aumentado.

Estamos num caminho profundamente errado ao nível da mobilidade, Sr.as

e Srs. Deputados, e este

paradigma, de facto, tem de ser alterado!

Quando falamos da ferrovia, estamos a falar de um modo de transporte que não só nos dá «pernas» para

nos libertar da dependência externa, que é uma coisa que queremos, designadamente ao nível dos

combustíveis fósseis, que têm enormíssimas desvantagens a nível ambiental e também para os nossos

compromissos de redução de gases com efeito de estufa, mas também tem uma importância estratégica ao

nível da mobilidade e da coesão territorial, designadamente até ao nível da rapidez e da segurança.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Vou terminar, Sr. Presidente.

É por isso que Os Verdes apresentam o projeto de resolução que visa que o Governo apresente à

Assembleia da República, no prazo de um ano, um plano ferroviário nacional que se traduza em princípios de

sustentabilidade ambiental e territorial.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Adriano Rafael

Moreira.

O Sr. Adriano Rafael Moreira (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este é um tema que quem o traz

a esta Câmara merece ser felicitado. Estamos a falar dos transportes e, por maioria de razão, neste caso

particular, do transporte mais amigo do ambiente. Daí que seja sempre com muita satisfação que felicitamos

quem traz o tema a debate.

Porém, temos de fazer referência a duas frases que Os Verdes colocam na Exposição de motivos do

diploma e que merecem ser referidas: trata-se nos últimos anos de uma «aposta monstruosa na rede de

autoestradas» e que «falhou nos critérios de racionalidade económica».

Queria, mais uma vez, felicitar pela caracterização que fazem, essencialmente, do trabalho dos dois

anteriores Governos, que não ponderaram, não tiveram em conta a racionalidade económica, a

sustentabilidade do setor, o que levou a que, mais uma vez, Os Verdes se sentissem na necessidade de trazer

o tema a debate, na Câmara.

Das 14 sugestões que apresentam, como é óbvio, há muitas pertinentes. Mas quanto a este aspeto, é

necessário dizer que todas aquelas que têm pertinência foram já acolhidas no Plano Estratégico dos

Transportes.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — O quê?!

O Sr. Adriano Rafael Moreira (PSD): — O Plano Estratégico dos Transportes, cuja leitura aconselho

vivamente, tem um capítulo específico que se chama «Sistema Ferroviário» — estou a falar da página 4808 do

Diário da República, de 10 de novembro, Resolução do Conselho de Ministros n.º 45/2011.

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Devo dizer-lhe, Sr.ª Deputada, que este plano de transportes é mais amplo, global, articula as várias

modalidades, não pode, como é óbvio, concentrar-se apenas num meio de transporte. Não podemos dizer que

queremos fazer uma autoestrada para uma capital de distrito porque não há ferrovia, iniciar a obra da

autoestrada e, depois, vir ao Parlamento pedir a ferrovia. Temos de ter uma visão integrada, uma visão global

e os transportes têm de ser complementares entre si, de modo a garantir a mobilidade de pessoas e bens em

Portugal e de Portugal para fora do País.

É isso que acontece com o Plano Estratégico dos Transportes que, além de responder a estes três vetores

que garantem a mobilidade, a coesão social e territorial, acima de tudo, não esquece a sustentabilidade do

setor.

Sr.a Deputada, o que, neste momento, se impõe não são mais diagnósticos, não são mais estudos —

alerto-a para as décadas em que se andaram a estudar determinadas infraestruturas —, neste momento, o

que se impõe são alguns projetos de execução, alguns projetos de obra, e isso está também contemplado no

Plano Estratégico dos Transportes.

A concluir, devo chamar a atenção da Sr.ª Deputada, desde logo, para o investimento, que está previsto ser

feito, de ligação dos portos nacionais a Espanha e, através da Espanha, ao resto da Europa, nomeadamente

os portos de Lisboa, Setúbal e Sines, que está expressamente consagrado.

Quero também referir, Sr.ª Deputada, o que está previsto em termos de fecho de rede e de eletrificação.

Meramente a título de exemplo, direi que o PSD, em conjunto com o CDS, apresentou um projeto de resolução

para a eletrificação do troço Caíde/Marco de Canaveses. Porquê? Porque se trata de fazer o fecho de redes.

Ou, então, a ligação do troço Espinho/Oliveira de Azeméis à rede do Norte, de modo a assegurar o transporte

para o Porto.

Sr.ª Deputada, termino felicitando-a pelo tema e sugerindo-lhe vivamente uma leitura do Plano Estratégico

dos Transportes.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina

Martins.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Cumprimentamos Os Verdes por

terem trazido a Plenário o tema da ferrovia.

Ouvi com atenção a intervenção do Sr. Deputado Adriano Rafael Moreira e, sabe, Sr. Deputado, também li

com atenção o Plano Estratégico dos Transportes. Temo-lo debatido várias vezes aqui, na Assembleia da

República.

Sr. Deputado, o que não é sustentável é a aposta na rodovia. A aposta na rodovia não é sustentável do

ponto de vista ambiental, não é sustentável do ponto de vista económico e traz a Portugal inúmeros problemas

do ponto de vista energético, com importações de combustível.

Portanto, a aposta na rodovia é o que não é sustentável.

Como a aposta na rodovia não é sustentável, temos de pensar, então, qual é a aposta estratégica de

Portugal, e tem de ser, do ponto de vista da mobilidade, na ferrovia.

Sabemos, é certo, que o anterior Governo apostou muito na rodovia, e mal! Mas não foi só o anterior

Governo; antes dele também já tinha sido assim. Portanto, PS, PSD e CDS têm tido uma aposta na rodovia

que não tem fundamento pela forma como tem sido feita e que tem sido prejudicial ao País, do ponto de vista

económico, do ponto de vista ambiental e, acima de tudo, do ponto de vista da mobilidade, que é disso que

falamos.

Mas este Governo tem responsabilidades, tem sérias responsabilidades, e, no que respeita à ferrovia, tem

tido uma verdadeira política terrorista.

O documento intitulado Plano Estratégico dos Transportes deste Governo fala de ferrovia para dizer o quê?

Para dizer «vamos ver onde é que há pouca gente a utilizar a ferrovia para ver se cortamos essas linhas», não

a perceber qual é o problema de mobilidade e a viabilizar linhas regionais, que são importantíssimas para as

populações, do ponto de vista da mobilidade, da economia, do ponto de vista ambiental. Não! O que diz o

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Plano Estratégico de Transportes deste Governo é no sentido de encontrar todas as desculpas para cortas

linhas.

Mas o Governo vai além do próprio Plano Estratégico de Transportes na sua política terrorista, quotidiana,

contra a ferrovia. Chegamos ao ponto de, num dia, aprovarmos, aqui, na Assembleia da República, um projeto

com uma recomendação sobre um troço de uma linha, Caíde/Marco, e, no dia seguinte, a CP anunciar que há

menos ligações. Está a acontecer todos os dias.

Chegamos ao ponto de nos dizerem que há linhas regionais que, afinal, não têm procura e, quando vamos

ver, percebemos que alteraram os horários. Fizeram isso com a Linha do Algarve, fazem isso na Beira, estão a

fazer isso um pouco com todas as linhas. Estão a tornar as linhas regionais completamente incapazes de

serem utilizadas pela população. É uma estratégia que se conhece. As pessoas de Beja conhecem-na, e não

só deste Governo mas já do anterior.

Este Governo decidiu expandir o modelo de tornar a ferrovia impossível para a população em todo o País

e, depois, dizem assim: «se as pessoas não apanham os comboios às horas absurdas que nós inventámos,

então, é porque os comboios não são precisos, as linhas deixam de ser sustentáveis e têm de fechar». É esta

a política terrorista do Governo.

Mas faz mais: mesmo nas linhas em que os utentes são, objetivamente, muitos e a todas as horas,

(pensemos, por exemplo, nas linhas urbanas), consegue esta maravilha de reduzir, oficialmente, o número de

utentes, porque, pura e simplesmente, não cobra bilhetes e não tem revisores. Decidiu ignorar parte dos

utentes, fazer de conta que parte dos utentes não existe, para fazer batota com os números e dizer que a

ferrovia não tem os utentes que tem…

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Tem de terminar, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — … não tem a importância que tem.

Entendamo-nos: a ferrovia é, assim, o caminho do futuro e não a rodovia. E com este Governo, no que

respeita à mobilidade, como em tudo o resto, só andamos para trás.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Paula

Vitorino.

A Sr.ª Ana Paula Vitorino (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há um ano que só se fala na ferrovia

pelas piores razões: ou porque aumentaram os preços, ou porque se cancelaram serviços e investimentos, ou

porque há greves.

Mas, em 2006, foram definidas as Orientações Estratégicas para o Setor Ferroviário, que foram publicadas

e envolveram um grande debate público sobre a matéria.

Fixaram-se, como objetivos, ligar todas as capitais de distrito por ferrovia, ligar todos os portos, aeroportos

e principais unidades produtivas.

Foram definidas as vocações das várias linhas e troços.

Todos os investimentos foram reanalisados e reprogramados em função das Orientações Estratégicas.

Nos anos seguintes, a REFER alterou o seu diretório e a CP começou a alterar serviços para corresponder

a objetivos estratégicos, e lançaram-se os novos projetos.

Em Junho de 2011, chegou o Governo PSD/CDS, em resultado da crise política aberta com a ajuda do

Partido Ecologista «Os Verdes».

E o que fez o Governo, desde que tomou posse? Parou tudo. Arquivaram-se orientações estratégicas.

Encerraram-se serviços e esqueceram-se projetos. Iam estudar tudo de novo, o que é legítimo.

E, passado uns meses, em outubro, o que diziam? Que parava tudo, que iam sanear financeiramente as

empresas, que iam apresentar novos modelos de privatizações e de concessão, etc., etc.

Mas, ao fim de um ano, o que temos? Aumentos brutais dos preços dos transportes públicos e eliminação

do passe social; cancelamento de serviços regionais e locais nas linhas de via estreita, e, entenda-se, por

razões estritamente ideológicas, mascaradas de financeiras.

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Cancelaram-se os projetos de alta velocidade, por razões eleitorais também mascaradas de financeiras.

Cancelaram-se as novas ligações a Vigo e a Madrid para mercadorias, com a desculpa que iriam substitui-

las por umas muito melhores e mais baratas, só que nunca mais chegam e, entretanto, perdem-se fundos

comunitários e o desenvolvimento do País.

Parou-se a eletrificação da Linha do Douro, porque iam cortar as gorduras — não se entende é se é meia

catenária, se é eliminar o controlo de tráfego.

Reduziram-se os investimentos em manutenção, o que esperamos não venha a ter consequências.

As tais novas concessões nunca mais chegam e não se sabe como são.

Anunciam-se mais cortes de serviços, porque é preciso poupar.

Em suma, para além de tristes episódios, como a ausência, não anunciada, na Assembleia Geral da Metro

do Porto para nomeação, com um ano de atraso, da nova administração, o que é que, na realidade, temos?

Os tais aumentos brutais nos preços e os cortes e mais cortes nos serviços e nos investimentos.

E quais são as implicações para as populações? Quais as implicações para a competitividade da economia

nacional? Mas isso não interessa ao Governo!

Mas há uma coisa que sabemos: o número de passageiros transportados pela CP, entre janeiro e maio

deste ano, relativamente a igual período de 2011, desceu quase 10%. Repito, quase 10%, menos 6000

pessoas a utilizar a ferrovia, durante estes meses.

Sr.as

Deputadas e Srs. Deputados: Está a tocar a finados pelo caminho-de-ferro em Portugal. Por isso, é

necessário tocar a rebate na defesa da ferrovia! Por isso, votamos favoravelmente o projeto de resolução.

Devem ser retomadas as orientações estratégicas para o setor, devem ser feitos investimentos em mais e

melhores serviços ferroviários, ao serviço das pessoas e ao serviço da economia.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, pelo CDS, tem a palavra o Sr. Deputado

Hélder Amaral.

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Sem nenhuma ironia, queria

cumprimentar o Partido Ecologista «Os Verdes» por apresentar esta matéria.

No entanto, gostava de dizer — e vou tentar ser simpático, ao classificar — que sempre que trazemos uma

medida que gera algum consenso, que fala de um problema real mas que não tem em conta as causas e a

impossibilidade financeira de resolvermos o problema, que é a que vivemos hoje, isso tem um nome, que aqui

não quero dizer.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Pode dizer!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — O que o Partido Ecologista «Os Verdes» vem aqui dizer é consensual,

é razoável: temos de olhar para o sistema ferroviário nacional; devemos estudar um plano ferroviário nacional;

devemos melhorar o serviço e a ligação da ferrovia aos outros modelos de transporte, para termos um

verdadeiro sistema de transportes, tudo isso parece razoável.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Está em desacordo?!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Estou a acabar de dizer que estou de acordo! Não há é condições

financeiras, o que é sobejamente conhecido por todos, para o fazer.

Mais uma vez, gostava de o relembrar, mas sei que o Partido Comunista Português e o Partido Ecologista

«Os Verdes», nessa matéria, não só não querem saber como são coerentes, pois falam no «pacto de

agressão».

O que diz o Memorando de Entendimento, assinado e negociado pelo Partido Socialista, e que nós

aceitamos?

Protestos do PCP.

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Diz que é preciso equilibrar as receitas e as despesas dos gestores das infraestruturas; diz que é preciso

realizar uma racionalização da rede; diz que é preciso rever as atuais obrigações de serviço público, etc., etc.

O que dizia um despacho de dezembro de 2010, do anterior governo? Que queria fechar 800 quilómetros

de ferrovia, nomeadamente,…

A Sr.ª Ana Paula Vitorino (PS): — Não é verdade!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — … a Linha do Algarve, toda a Linha do Oeste, a Linha de Beja, a Linha

da Beira Baixa.

O que foi que este Governo disse, e bem, contrário ao que tinha o governo anterior, que tinha um Plano

Estratégico de Transportes que já levava cerca de 6 anos e não sabia quando é que estaria concluído nem

para quando apontava? O que foi que este Governo assumiu? Um Plano Estratégico de Transportes com

duração e com validade de uma Legislatura. Para quê? Para fazer uma ação concertada, cirúrgica, ao

momento, para resolver pequenos problemas.

O que fez o Governo? Olhou para as condições que existem e, por exemplo, consta do Plano Estratégico

de Transportes aquilo com que o Partido Ecologista «Os Verdes» concorda, penso eu, ou seja, a ligação dos

portos à ferrovia. Parece algo do mais elementar bom senso, algo que já devia estar feito mas não estava e é

uma aposta.

Mais: melhorar um conjunto de ligações à Europa para mercadorias parece-me algo que merece consenso.

Há até uma matéria que julgo que é cara ao Partido Ecologista «Os Verdes»: não ignoram que as linhas de

baixa procura, do ponto de vista da sustentabilidade ambiental, não são rentáveis…

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Que grande confusão!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — … ou seja, por exemplo, uma linha com uma automotora diesel que

gasta 140 l de diesel/100 km, dizem os técnicos e dizem os estudos que o preço do passageiro/km é muito

elevado. É preferível pagar viagens de autocarro.

Pensei que a sustentabilidade ambiental fosse algo a que o Partido Ecologista «Os Verdes» fosse, de

facto, sensível.

Protestos da Deputada de Os Verdes Heloísa Apolónia.

Pelos vistos, não é, mas, enfim, não posso fazer mais.

O que peço é que, nestas matérias, quem causou tanto dano às contas públicas, quem pôs o País na

situação em que pôs, quem torna praticamente impossível fazer mais e melhor em matéria de ferrovia, sendo

que, na parte dos princípios, estamos de acordo, não venha aqui… enfim, é lamentável ouvir o discurso que

ouvimos de alguém que até é especialista neste segmento dos transportes, como é o caminho-de-ferro.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr. Deputado.

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Da parte do Partido Ecologista «Os Verdes», isto é razoável, é

coerente, mas não «casa» com a realidade. É uma ignorância completa, porque o País, hoje, não pode viver

de discursos meramente demagógicos e oportunistas como o que aqui trouxe.

Aplausos do CDS-PP.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Então, não os façam!

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias.

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O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: O primeiro facto a registar é que o País

não tem um plano ferroviário nacional.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Muito bem!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Não há! O CDS anuncia que, se calhar, não é preciso, porque temos um pacto

assinado com a troica. Está resolvido o assunto. Para nós, não está!

Acrescentam, o CDS e o PSD também, que há um Plano Estratégico de Transportes que fala do sistema

ferroviário. É o ponto 4.5.4.4. Esta parte tem 10 itens, que são: desativação da Linha de Vendas Novas;

desativação da Linha de Beja-Funcheira; desativação da Linha do Leste; desativação da Linha do Vouga;

desativação da Linha do Oeste; reestruturação do Sud Expresso, em resultado da medida anterior,

desativação da Linha de Cáceres; descontinuação dos rodoviários, atualmente realizados; desativação das

Linhas do Tâmega, do Tua, do Corgo e da Figueira da Foz, e o último item, em função dos impactos das

medidas, reanalisar a necessidade de implementar outras medidas, que é como quem diz «se isto não chegar,

fechamos mais».

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Que vergonha!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — É isto que é errada e falsamente designado por Plano Estratégico de

Transportes, e é esta coisa — que não é plano estratégico nenhum, quanto muito será de encerramentos e

privatizações — que os senhores querem oferecer para a troca de um plano ferroviário que não aceitam.

Pergunto aos Srs. Deputados se, perante este somatório de encerramento de 224 km de linhas, de

eliminação de serviço para o estrangeiro em mais de 234 km, de fecho definitivo de mais 144 km de linhas

provisoriamente encerradas pelo governo anterior, não estamos perante uma matéria em que a única

estratégia que existe é de encerrar, é de desmantelar.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — E ainda nos lembramos — não foi assim há tanto tempo! — que o então

Ministro Teixeira dos Santos, confrontado por nós, PCP, com orçamentos do Estado que, para a REFER e

para o investimento na ferrovia, previam zero euros, respondeu que o investimento será feito através de

fundos comunitários e, enfim, algum endividamento — palavras ditas nessa altura.

Aquilo que está em cima da mesa é que estamos perante uma política que vem de longe, que já foi longe

demais, que assenta, essencialmente, naquilo que nos mandarem fazer a partir de Bruxelas,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — … a partir do FMI, a partir dos grupos económicos que cuidam dos seus

interesses, enquanto aqui não há quem cuide do interesse nacional, ao nível do poder, das maiorias e dos

governos — se um diz mata, outro diz esfola, Srs. Deputados!

O que está na base desta estratégia dos governos é uma orientação demasiado grave para passar assim

em claro. Diz o Plano de Ação da EMEF, da empresa de manutenção ferroviária, que «nos pressupostos do

macro contexto, o cancelamento da operação comercial pela CP, a par da mudança dos sistemas de

manutenção do material circulante, não deixa margem para a continuação dos atuais processos e

procedimentos». Isto é uma declaração de insolvência da ferrovia em Portugal,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — … é uma declaração de morte, é uma sentença de morte para a ferrovia e,

portanto, não há Plano Estratégico de Transportes que valha quando o que está em cima da mesa é a

desativação e o encerramento.

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O que se está a fazer por cá é o que se fez na Grécia, com os resultados conhecidos, não é o aumento,

como o projeto de resolução de Os Verdes bem refere,…

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr. Deputado.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Termino, Sr. Presidente.

… do trânsito e transporte de passageiros na ferrovia, como na generalidade dos países europeus, ao

contrário do que se está a fazer aqui.

Daí que o se pretende com esta proposta — e termino com esta referência, Sr. Presidente —, que os

senhores querem rejeitar, é que passe a existir um plano ferroviário nacional,…

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr. Deputado.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — … que tenha um modelo em rede, que aponte para princípios de

sustentabilidade, e essa sustentabilidade não é, seguramente, aquela que pretendem afirmar, como se fosse

possível, no atual sistema e no atual modelo económico.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Muito bem!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Este modelo é que é insustentável, Srs. Deputados.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, acabámos a discussão deste ponto da ordem do

dia. Vamos passar ao ponto 5, que consiste na discussão conjunta dos projetos de resolução n.os

351/XII (1.ª)

— Recomenda ao Governo que estabeleça o leilão crescente na venda de pescado congelado ou proveniente

de aquicultura num projeto-piloto a aplicar numa lota de média dimensão (CDS-PP) e 404/XII (1.ª) —

Recomenda a proteção ao setor das pescas através da salvaguarda da rentabilidade e da adequação de rede

de postos de venda (PCP).

Para apresentar o projeto de resolução do CDS-PP, tem a palavra o Sr. Deputado João Paulo Viegas.

O Sr. João Paulo Viegas (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: O projeto que hoje aqui

trazemos não pretende ser uma solução definitiva mas, sim, um contributo para a venda de pescado.

Em Portugal, a primeira venda de pescado fresco e refrigerado é feita por leilão ou por contrato. No recinto

da lota, procede-se à venda do pescado por leilão decrescente, onde um comprador devidamente habilitado

para o efeito termina esse leilão dando ordem de compra quando entende que o valor do pescado atingiu o

melhor preço.

Este modelo de leilão é justificado com a perecibilidade dos produtos e com a necessidade que o mesmo

se realize de uma forma mais rápida, mantendo a frescura dos mesmos. Este sistema está interiorizado e é

aceite pelos diversos operadores.

Esta iniciativa do CDS-PP pretende introduzir o leilão crescente no caso do pescado congelado e do

proveniente de aquicultura, porque entendemos que nestes casos o problema de perecibilidade dos mesmos

não se verifica: no primeiro caso, visto que está conservado em câmara frigorífica; no segundo, se a sua

transação se realizar antes da sua recolha.

Por entendermos que estes mecanismos devem ser introduzidos de uma forma fiável e que efetivamente

contribua para uma maior transparência na formação de preços, recomendamos que se estabeleça um

projeto-piloto numa lota de média dimensão e de forma a não interferir com o modelo atualmente existente.

Estamos convictos que este projeto permitirá aferir dados concretos, nomeadamente o preço médio

conseguido pelo produtor e a sua comparação com os preços conseguidos no modelo atual, permitindo ainda

que o pescado produzido em viveiro seja efetivamente vendido antes de ser retirado, o que no nosso entender

também transmite mais confiança a quem se dedica ou pretende dedicar a esta atividade que tem enormes

potencialidades e terá de ser uma aposta de futuro.

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Quanto ao projeto de resolução do PCP, estamos de acordo com alguns dos pontos referidos. Não temos

dúvidas da importância que a estrutura da Docapesca tem, nomeadamente como garante da proteção social

aos pescadores, através dos descontos em lota, e na regulação entre o setor da pesca e o da

comercialização, que permite, inclusive, que os prazos médios de pagamento neste sector sejam dos mais

baixos.

A Docapesca possui ainda uma rede de informação e estatística bem elaborada, que permite uma

informação das espécies capturadas, quantidades e valores de venda nas diversas lotas e postos de

vendagem.

Estamos igualmente de acordo na readaptação da rede de lotas e postos de vendagem, mas neste ponto

divergimos quanto à necessidade de criar mais postos.

O que nos parece fundamental é criar as condições para que o pescado proveniente dos postos de menor

dimensão possa chegar o mais rapidamente possível à lota geograficamente mais próxima, garantindo a sua

frescura e o acesso a um leilão mais participado, o que permitirá a obtenção de um valor mais elevado.

Na apreciação que é feita quanto ao processo de formação do preço em primeira venda, o PCP optou por

uma análise pouco cuidada dos factos, omitindo até alguns, como é o caso dos contratos que estão

estabelecidos entre os compradores e as organizações de produtores de peixe e que, apesar de passarem

pela lota, não estão sujeitos ao leilão.

Estes contratos apresentam valores muito abaixo dos praticados em leilão e, visto que são estabelecidos

pelas próprias organizações, não se percebe os valores estabelecidos.

Na semana de 25 a 29 de Junho, o linguado atingiu valores máximos de 20,74 €/kg em leilão, estando os

valores em contratos celebrados com as organizações de produtores entre os 2 e os 6 euros/kg, o que não

contribui em nada para a total transparência na elaboração dos preços, o que é desejável.

Estamos por isso inteiramente disponíveis para discutir e apresentar mais projetos, com vista à melhoria

sistemática que este sector de importância fundamental para o desenvolvimento do nosso País merece.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção de apresentação do projeto de resolução do

PCP, tem a palavra o Sr. Deputado João Ramos.

O Sr. João Ramos (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: A discussão que fazemos agora foi

despoletada pelo projeto de resolução da autoria do CDS, ao qual se juntou um outro da autoria do PCP.

Começando pelo projeto do CDS, diria que ele propõe o estabelecimento de um projeto-piloto, numa lota

de média dimensão, onde possa ser experimentado o processo de venda em lota de peixe proveniente de

aquacultura e de peixe congelado, implementado o sistema de leilão crescente.

O que o CDS pretende é claro, mas entendemos que é inoportuno. E é inoportuno não por não haver

condições para implementação destas medidas, é inoportuno porque tudo aquilo que o CDS propõe já existe.

A Docapesca já permite nas suas lotas um sistema de venda de peixe de aquacultura e congelado com

leilão ascendente, um serviço mais avançado do que aquilo que o CDS agora propõe, uma vez que é

disponibilizada a possibilidade do leilão on-line, que permite ao vendedor vender o peixe sem o expor à

degradação, uma vez que não é necessário retirá-lo dos congeladores ou dos tanques.

Mais ainda: esta proposta nem vai ao encontro daquilo que são as principais preocupações do setor da

aquacultura. O sistema de venda direta é largamente utilizado nas transações do setor, sendo o leilão um

procedimento residual.

Em texto publicado no mês passado, o secretário-geral da Associação Portuguesa de Aquacultores elenca

os oito principais problemas que o setor atravessa. Entre eles estão preocupações com a regulamentação do

seguro aquícola bonificado, preocupações com a carga fiscal e com o preço de combustíveis e eletricidade,

com o prazo de pagamento dos compradores ou a necessidade de execução de um plano setorial com

localização das áreas existentes e definição das áreas de expansão. Mas sobre dificuldades na venda do

pescado não há qualquer referência.

Para além de ser um projeto a sugerir a experimentação de um sistema já criado, ainda propõe a resolução

de um problema que, segundo o setor, não existe ou, pelo menos, não é digno de registo.

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Resta a hipótese de ser esta uma tentativa de introduzir a modalidade de leilão crescente para a expandir

posteriormente para o peixe selvagem.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Ora aí está!…

O Sr. João Ramos (PCP): — Até essa experiência dificilmente daria resultados viáveis, uma vez que

nunca se poderá comparar a necessidade de venda rápida do pescado selvagem, altamente perecível, com a

garantia de conservação dada pela congelação ou por estarmos perante a venda de animal ainda vivos.

Mas se era uma oportunidade de refletir sobre alterações a introduzir no sistema de lotas, o projeto de

resolução do PCP promove essa oportunidade e sobre aspetos que, efetivamente, são problemas para o setor

das pescas.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP). — Vieram a reboque, foi o que foi! Vieram a reboque…

O Sr. João Ramos (PCP): — O primeiro é a necessidade de avaliação da rede de lotas e da necessidade

do seu alargamento.

Existe em Portugal uma rede de 20 lotas e 33 postos de vendagem, mas existem cerca de 90 portos de

pesca. Isto dá-nos a noção de que a rede de receção e venda de peixe pode ficar aquém daquilo que são as

necessidades das comunidades piscatórias. E o que se conhece é que em algumas dessas comunidades são

necessárias deslocações mais ou menos longas para descarregar o peixe, logicamente com custos

acrescidos.

Mais importante ainda: o PCP propõe que seja feito um estudo da cadeia de valor para estabelecimento de

margens máximas de lucro, à semelhança da intensão manifestada para as produções agroalimentares,

através da PARCA. Com esta medida, pretende pôr-se termo à acumulação de margens de lucros várias

vezes superiores ao preço de primeira venda, com benefício de intermediários e comércio e prejuízo para os

pescadores.

No ano passado, o preço médio de venda do peixe em lota foi de 1,67 €/kg e o preço médio da sardinha,

espécie que representa 40% das capturas em Portugal, foi de 0,86 €/kg. Todos aqueles que compram peixe

para consumo ou que conhecem os seus preços veem imediatamente nestes valores grandes lucros a que

não têm acesso aqueles que arduamente, muitas vezes arriscando a vida, tiram o peixe do mar.

Recapitulando: avaliação e adequação da rede de lotas e postos de vendagem e estabelecimento de

margens máximas de lucro ao longo da cadeia de valor do pescado são, estes sim, problemas que afetam o

setor das pescas, problemas sentidos por pescadores e armadores e que importa solucionar. Eis que o PCP

proporciona à Assembleia da República a possibilidade de propor a sua solução e é com satisfação que

ouvimos que o CDS concorda com parte destas propostas, esperando, assim, que elas venham a ser

aprovadas, para bem de todo o setor, que bastantes dificuldades atravessa.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Ulisses

Pereira.

O Sr. Ulisses Pereira (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Discutimos hoje dois projetos de

resolução sobre realidades completamente diferentes, e essa é a primeira nota que gostaríamos de deixar,

expressando a dificuldade em abordá-las coerentemente numa única intervenção.

O primeiro, apresentado pelo Grupo Parlamentar do CDS-PP, recomenda ao Governo que estabeleça o

leilão crescente na venda de pescado congelado ou proveniente de aquicultura. Respeitando a bondade das

intenções que estão subjacentes a esta iniciativa legislativa, e por isso mesmo vamos votá-la favoravelmente,

temos, no entanto, dúvidas sobre a eficácia das recomendações propostas.

Em primeiro lugar, não se procede hoje à venda de nenhum pescado congelado nas lotas, embora,

naturalmente, tal possa vir a suceder de uma forma virtual.

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Por outro lado e também de uma forma virtual, as vendas em lota do pescado proveniente de aquicultura é

inferior a 0,5% do total produzido, já que a esmagadora maioria deste tipo de pescado é transacionada através

de contratos de abastecimento. Ou seja, estamos a falar de uma realidade também ela quase que virtual.

Uma nota que deve ser partilhada, e que seguramente é do conhecimento de todos os Senhores

Deputados, é que existe hoje um sistema informático de suporte à venda de pescado fresco nas lotas de

Matosinhos, Figueira da Foz, Peniche, Sesimbra e Portimão. Pelo que sabemos, este sistema está em fase

final de adaptação para permitir a realização de leilões na internet, num regime de leilão crescente, destinado

à venda de produtos da aquicultura.

E aqui existe uma diferença grande entre as condições que suportam um modelo ou outro. No pescado

proveniente de aquicultura, a venda realiza-se antes do pescado atingir a dimensão desejada para a sua

transação, ou seja, é fácil estimar as quantidades que vão estar disponíveis num determinado momento.

Já quanto ao pescado fresco, as quantidades e espécies apresentadas são conhecidas apenas no

momento anterior à venda e esta deve ser realizada no menor espaço de tempo possível, para garantir o seu

escoamento nas melhores condições.

O que mais nos preocupa é o que se passa na primeira venda do pescado fresco, com reflexos muito

diretos nos rendimentos dos pescadores e armadores.

Mais do que soluções fáceis e populistas de se pedir uma lota para cada praia, como induz o projeto de

resolução do Partido Comunista,…

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Ulisses Pereira (PSD): — …o que favoreceria apenas a cartelização, nomeadamente nos portos

mais pequenos, é necessário introduzir mecanismos que conduzam à melhoria dos rendimentos dos

pescadores obtidos na primeira venda do pescado fresco, que são baixos, muito baixos.

Esta é uma matéria que está na primeira linha das preocupações do Grupo Parlamentar do PSD, matéria

para cuja reflexão pensamos ser importante a participação de todos os partidos com representação nesta

Assembleia, e por isso mesmo iremos apresentar, em sede de Comissão, uma proposta de constituição de um

grupo de trabalho para tratar das questões relacionadas com a primeira venda de pescado fresco e com o

modelo de funcionamento das lotas em Portugal.

Contamos com todos para este trabalho, pois esta é uma matéria que seguramente a todos deve unir.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Fão.

O Sr. Jorge Fão (PS): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Debatem-se hoje nesta Câmara dois

projetos de resolução, respetivamente, da iniciativa do CDS-PP e do PCP, relacionados com o sistema da

primeira venda de peixe, aquilo que em Portugal, concretamente, designamos por venda de peixe em lota.

Gostava de deixar três notas sobre este assunto nos 3 minutos que temos para esta intervenção.

A primeira nota é relativa àquilo que entendemos, e já não é a primeira vez que o dizemos, ser o uso

demasiado recorrente e frequente da figura do projeto de resolução no processo de debate na Assembleia, o

que pode provocar, no nosso entendimento, uma vulgarização deste instrumento de intervenção política,

tornando-o até, de alguma maneira, inconsequente no que diz respeito a efetivas alterações nas políticas

setoriais, e esse, sinceramente, penso que deverá ser o grande objetivo de um instrumento de intervenção

parlamentar como é o projeto de resolução.

E se, por um lado, se compreende o uso pelos partidos da oposição deste instrumento, no sentido de que,

efetivamente, às vezes, não há outras hipóteses e outros canais para pôr na agenda política o debate de

temas importantes, já no que respeita aos partidos do poder, sinceramente, não me parece muito razoável

este recurso sistemático. Parece mais uma corrida entre o PSD e o CDS-PP para ver quem apresenta mais

projetos de resolução, ou seja, recomendações de fora para um Governo que, efetivamente, é vosso. Portanto,

às vezes, não se compreende muito bem o seu uso, sobretudo em matérias de pequena importância.

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Uma segunda nota que queremos deixar é relativa à questão do tema enquadrador daquilo que são os dois

projetos de resolução em apreço, ou seja, o sistema de primeira venda de peixe, em Portugal, ou de venda em

lota.

Sobre esta matéria, queria referir que este processo de primeira venda tem, em Portugal, uma história de

50 anos, de avanços e recuos na melhoria e no aumento da eficácia deste processo, que é da

responsabilidade da Docapesca.

Como aqui foi dito, a Docapesca é uma empresa do setor empresarial público, com 100% de capitais

públicos, que, a título de exemplo, teve um volume de negócios de mais de 200 milhões de euros no ano de

2011, transacionando 130 000 t de pescado. Sinceramente, esta empresa desempenha um papel de grande

importância neste processo de controlo da venda de peixe, desde logo porque contribui para o controlo

higieno-sanitário deste produto alimentar, porque tem um contributo significativo na rastreabilidade e controlo

estatístico na gestão dos stocks e, sobretudo, porque tem uma grande responsabilidade social, contribuindo

para o controlo da receita fiscal, para o aumento da contribuição para a segurança social e, ainda, para a

garantia de rendimento e pagamento aos pescadores do produto da pesca.

Contudo, não controla a totalidade do negócio, havendo cerca de 40 a 50% que é considerado fuga à lota,

o que prova que, de facto, é necessário um debate profundo para a melhoria do seu sistema de

funcionamento, e estes dois projetos de resolução pouco trazem para este debate, em nossa opinião.

A última nota que queria deixar é acerca dos projetos e será muito rápida.

O projeto do CDS-PP é um projeto muito superficial e versa uma matéria que, inclusive, já está, por parte

da Docapesca, em ensaio, dado que já está a ser ensaiado um sistema de leilão on-line para a venda do

pescado de aquacultura e do pescado congelado. Portanto, sinceramente, de um partido que tem

responsabilidades no poder — aliás, o Ministério da Agricultura é da responsabilidade de um protagonista do

CDS-PP —, abordar esta matéria num projeto de resolução parece-nos pouco.

Relativamente ao projeto de resolução do PCP, tem outra amplitude, outra profundidade e outro

pensamento ideológico, mas no primeiro ponto, que recomenda o alargamento dos postos de venda, isto é em

contraciclo e não é, claramente, o sentido que se deve seguir na modernização desse sistema, pelo que não

estamos de acordo com ele.

Em relação aos outros dois pontos, em princípio, parecem-nos bem-intencionados, mas lançam a

necessidade de um profundo debate, um debate estruturado sobre a revisão e a reestruturação do sistema de

primeira venda de peixe. Essa, sim, é a orientação que devemos dar ao nosso trabalho. Aliás, recordo que há

um estudo desenvolvido pelo anterior governo sobre esta matéria que nos deve servir de base ao trabalho.

Acho, portanto, que é por aí que devemos ir e recomendo aos partidos que suportam o Governo que se virem

para essa matéria porque é aí que reside a importância do debate sobre a primeira venda de peixe, em

Portugal.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Honório.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: O BE reconhece que a profunda

crise que se vive no setor das pescas justifica a máxima atenção da Assembleia da República.

Foi por isso que, no passado, apresentámos aqui duas importantes alternativas, que os senhores não

quiseram aceitar. A primeira tinha a ver com a possibilidade de venda direta de pescado em determinado

contexto, com determinadas condições, e a outra tinha a venda com o cabaz de peixe, que os Srs. Deputados

da maioria não quiseram mas que, afinal, o Governo vai implementar. Portanto, é com a máxima seriedade

que este setor e estes profissionais deveriam ser olhados por esta Câmara.

Ora, aquilo a que assistimos e verificamos, da análise destes projetos de resolução, é que se vale a pena

acompanhar as propostas que o PCP aqui apresenta, quer pela necessidade de proceder à avaliação do

alargamento dos postos de vendagem, quer pela necessidade de regulamentação da margem máxima, para

evitar mais prejuízos e mais desregulação neste setor, relativamente à proposta do CDS, parece-nos que não

só não traz qualquer novidade relativamente a algumas práticas que já aqui foram apontadas como ainda

favorece alguns setores instalados e cria uma dupla concorrência desleal.

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Na verdade, o pescado congelado ou fruto da aquicultura, indo à lota, o que, aliás, do nosso ponto de vista,

não deveria acontecer, cria uma pressão inaceitável sobre o pescado selvagem, obrigando a que os preços

desçam. Portanto, é uma pressão sobre o pescado selvagem.

No que respeita à proposta de leilão crescente, diria que ela seria altamente favorável para este tipo de

pescado mas não é prática relativamente ao pescado selvagem, que sairia fortemente lesado e, assim, o

prejuízo seria muito maior para este setor, que já tem uma crise que nós bem deveríamos identificar e

enfrentar com propostas consistentes e corajosas.

Para o Bloco de Esquerda, o que deveria acontecer era que o pescado fruto da aquicultura e o pescado

congelado nem sequer deveriam ir à lota e que o leilão crescente fosse aplicado ao pescado selvagem. Essa,

sim, seria uma medida para proteger fundamentalmente os pescadores que enfrentam mais dificuldades no

atual contexto e não precisamos de favorecer os interesses instalados no setor.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís

Ferreira.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: O setor das pescas vive

tempos difíceis e os nossos pescadores deparam-se com inúmeros problemas. E se é verdade que não

estamos a falar de problemas de hoje, também é verdade que, atualmente, esses problemas têm vindo a

agravar-se e a ganhar proporções muito preocupantes.

Como se sabe, um dos problemas mais graves que o sector das pescas e os pescadores enfrentam

prende-se exatamente com os custos de produção e com os preços de venda.

De facto, tanto os custos de produção como os preços de venda estão a comprometer ou a colocar em

causa a própria rentabilidade económica do setor da pesca, sobretudo no que se refere à pesca artesanal e

costeira. E não sendo problemas novos, já há muito que se exigem medidas vocacionadas para a proteção

deste sector, assegurando ou garantindo a sua rentabilidade económica.

Estamos a falar de medidas que, a nosso ver, deveriam passar, nomeadamente, pela implementação de

uma verdadeira rede de proximidade de pontos de descarga e vendagem, que reduziria, naturalmente, os

custos com deslocações, mas também poderia representar um instrumento importante no que se refere ao

combate à fuga à lota.

De facto, face à dimensão da nossa costa, é manifestamente insuficiente uma rede de desembarque e

venda de pescado que dispõe apenas de 20 lotas e pouco mais de 30 postos de vendagem. Como se

percebe, um grande número de comunidades piscatórias não fica coberta por esta magríssima rede de

desembarque e venda de pescado.

Portanto, basta ter presente a dimensão da nossa costa e os cerca de 100 portos de pesca que temos no

continente para ficarmos com uma noção das comunidades que ficam foram da rede existente, já para não

falar das comunidades que operam a partir da praia e não possuem quaisquer estruturas para descarregar e

vender o seu pescado.

Mas são também necessárias medidas viradas também para o processo de formação do preço em primeira

venda. A situação a este nível é perfeitamente alarmante e profundamente injusta para os pescadores.

Quando comparamos o preço do peixe na primeira venda em lota com o preço que é pago pelo consumidor

final ficamos com a noção clara de quem fica com a grande fatia do bolo e da dimensão da injustiça que é

imposta aos pescadores.

É, pois, necessário colocar um travão às elevadas margens comerciais dos intermediários e da grande

distribuição, como forma de proteger os pescadores mas também os consumidores.

Portanto, acompanhamos as preocupações do Partido Comunista Português e os objetivos que dão corpo

ao projeto de resolução que agora apresenta, tanto no que diz respeito ao alargamento da rede de postos de

vendagem como no que se refere à regulamentação de margens máximas.

Relativamente ao projeto de resolução do CDS-PP, que pretende recomendar ao Governo a criação de um

projeto-piloto numa lota de média dimensão em que o leilão decrescente seja substituído pelo leilão crescente,

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parece-nos que trás pouco de novo, muito pouco, até porque, aparentemente, o leilão crescente é já uma

prática que se verifica nalgumas lotas do País.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Muito bem!

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, vamos passar ao ponto seguinte da nossa ordem

de trabalhos, de que consta a discussão conjunta dos projetos de resolução n.os

215/XII (1.ª) — Recomenda

ao Governo a construção do lanço do IC35 Penafiel/Entre-os-Rios (PS) e 410/XII (1.ª) — Recomenda ao

Governo a construção do IC35 (BE).

Para apresentar o projeto de resolução do PS, tem a palavra o Sr. Deputado Renato Sampaio.

O Sr. Renato Sampaio (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PS apresenta este projeto de resolução

pela necessidade de uma verdadeira alternativa à EN106. É uma aspiração legítima das populações daquela

região, nomeadamente de Penafiel, Marco, Castelo de Paiva e Cinfães, e é uma preocupação dos Deputados

do PS do Porto e do distrito de Aveiro.

A EN106 não é uma solução para a mobilidade, o tráfego de pesados é muito elevado, não tem capacidade

de escoamento do tráfego que aí circula, atravessando áreas com grande densidade populacional e, por isso,

é a via de maior sinistralidade da região. Por outro lado, neste espaço territorial existe o mais dinâmico tecido

empresarial da região.

Assim, a construção do IC35 é fulcral para a economia local e regional, é determinante para a atração de

investimento, para a fixação de empresas e, por isso, para a criação e promoção de emprego. É ainda um

contributo decisivo para a coesão territorial, económica e social. Por outro lado, integra também o Plano

Nacional Rodoviário.

Compreendemos as atuais restrições e constrangimentos económicos e financeiros do País e temos

consciência do elevado investimento deste projeto, mas também temos presentes os benefícios associados ao

desenvolvimento económico da região com a sua construção.

Dentro destes parâmetros, o Governo deve desenvolver todos os esforços para evitar a paralisação total e

absoluta deste importante investimento. Nas atuais circunstâncias de constrangimento financeiro do País, em

vez de projetos serem abandonados em absoluto, podem e devem ser implementados de uma forma faseada.

É neste sentido que os Deputados do PS-Porto apresentam este projeto de resolução, ou seja, com o

objetivo de o IC35 ser construído e implementado em fases diferenciadas, tendo o primeiro troço

Penafiel/Entre-os-Rios carácter de urgência, sendo dada desde já continuidade à sua implementação e

construção por ser aquele que tem todos os procedimentos administrativos já avançados. As populações

assim o exigem e a região agradece.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe

Soares.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: A construção do IC35 é uma

reivindicação das populações de há várias décadas e nas últimas duas décadas, pelo menos, tem também

sido um dos pontos dos programas eleitorais de todos os partidos, particularmente daqueles que já passaram

pelo governo.

Ainda hoje, se formos, por exemplo, ao concelho de Marco de Canavezes, vemos lá cartazes do PSD em

que pergunta ao governo PS onde é que está a construção do IC35. Por isso, percebemos que, quando o PSD

passou da oposição para o Governo, se esqueceu destas que eram as suas reivindicações na oposição.

Mas esqueceu-se também o PS, que teve 6 anos para poder construir o IC35 e assim o prometia às

populações que ainda se lembram dos governantes que, em período eleitoral, diziam: «votem em nós, votem

em nós porque, se o fizerem, logo ao virar da esquina terão a construção do IC35».

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Isso é o que vocês dizem!

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O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Não aceitamos que hoje se reduza este debate ao que são as

promessas eleitorais do PSD, do CDS ou do PS e aos incumprimentos dessas promessas eleitorais, uma vez

que estes partidos chegam ao governo.

Há uma realidade concreta que tem de ser respondida e no caso da EN106 é uma realidade que

demonstra números muito nefastos para as populações. Quem conhece o lanço entre Penafiel e Entre-os-Rios

sabe das dificuldades do troço, muito sinuoso, com muito tráfego, particularmente de pesados, e sabe que tem

graves problemas de segurança para as populações. Em muitos destes lanços não há sequer passeios,

mesmo dentro de centros populacionais.

Sendo assim, é necessário responder com a urgência que a segurança das populações impõe. E porque

nós colocamos a urgência da resposta à segurança das populações acima de todos os outros critérios,

dizemos que é necessária a construção de todo o IC35, mas é ainda mais necessária a construção do lanço

Penafiel/Entre-os-Rios.

Sabemos que há benefícios económicos necessariamente decorrentes desta construção, há benefícios de

respeito pelo ambiente e melhoria das condições ambientais, particularmente no centro das povoações, mas

há enormes benefícios na segurança das populações que têm de ser colocados em cima da mesa e a que tem

de ser dada resposta.

O IC35 tinha sido pensado entre Penafiel, na ligação à A4, e Sever do Vouga, na ligação à A25, mas é

necessário responder também às necessidades de mobilidade do norte do distrito de Aveiro, de Arouca,

Castelo de Paiva e Sever do Vouga, do interior do distrito de Aveiro, e o IC35 respondia também a esta

realidade.

Colocamos a segurança das populações acima de todos os outros valores e por isso dizemos que, para

além da necessidade de construção do IC35, há a prioridade da urgência de responder à segurança das

pessoas e, por isso, a prioridade para a construção do lanço entre Penafiel e Entre-os-Rios. Mesmo na

situação difícil que o País enfrenta, há possibilidade de direcionar fundos comunitários para a construção

desse lanço. Haja a coragem e o respeito pela palavra dada às populações para o podermos fazer com a

urgência possível.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Vales.

O Sr. Luís Vales (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Esta situação que hoje discutimos tem

já mais de 11 anos. O que era urgente há mais de uma década continua, em parte, por cumprir.

O Partido Socialista que, em 2001, estava no Governo e que, entre 1995 e 2011, esteve 12 anos no poder,

vangloriava-se de fazer autoestradas, prometendo uma terceira via rápida entre Lisboa e Porto, um TGV, um

novo aeroporto para Lisboa, primeiro na Ota, depois em Alcochete, vem, agora, pasme-se!, apresentar um

projeto de resolução recomendando ao Governo que avance com a construção do IC35.

O PS, quando sabe que a obra vai finalmente avançar, faz uma jogada de antecipação verdadeiramente

oportunista.

Vozes do PSD: — Muito bem lembrado!

O Sr. Luís Vales (PSD): — Mário Soares meteu o socialismo na gaveta! O Governo PS meteu o IC35

dentro de um cofre e perdeu as chaves!

Aplausos do PSD.

Se dúvidas existem sobre o comportamento do PS, basta que os membros da sua bancada e que

integraram o anterior Governo, possam interromper este silêncio comprometedor.

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Temos que ser isentos no julgamento: o Partido Socialista e, em particular, os Srs. Deputados do PS

eleitos pelo círculo do Porto que passaram por esta Assembleia são especialmente coniventes com esta

situação.

Primeiro, nada fizeram e não denunciaram. Erraram por omissão! Segundo, não estiveram ao lado das

populações, nem ao lado dos autarcas. Falharam, porque primaram pela ausência de solidariedade!

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Luís Vales (PSD): — Sr.as

e Srs. Deputados: O atraso na obra tem um custo intolerável para as

populações. Tem custos na competitividade da região, no emprego e na economia, na circulação e na

segurança das populações. Por isso, este Governo já avançou com o projeto! O Governo, que tomou posse há

um ano, está a corrigir os erros e as omissões do PS.

Encontra-se em fase de realização o projeto de execução do troço entre Penafiel e Rans e está em

preparação o projeto de Rans/Entre-os-Rios.

Mesmo perante um momento delicado, de escassez de recursos financeiros, que Portugal atravessa, este

Governo está a agir.

Entendemos que este é apenas um número político e uma manobra descabida de uma bancada que,

quando vê os outros trabalharem, apressa-se a tentar retirar dividendos mediáticos. É a fábula de La Fontaine

revisitada: a cigarra a aproveitar-se do trabalho da formiga!

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Luís Vales (PSD): — Mas as populações saberão julgar o aproveitamento demagógico do PS.

Sr.as

e Srs. Deputados: Não compreendemos, de igual modo, o projeto de resolução do Bloco, que só pode

ser interpretado como um golpe clássico de uma certa esquerda. É o BE a andar à boleia do PS. É caso para

dizer: as esquerdas estão unidas, mas não sabemos para onde vão.

Afinal, por que razão o PS e o Bloco de Esquerda decidem agora apresentar propostas de resolução para

se construir este troço do IC35? Porque querem agora recomendar ao governo aquilo que o Executivo já está

a fazer?

As populações não querem projetos de resolução atrasados, nem demagogia barata: querem a obra, e esta

já está em marcha!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Michael

Seufert.

O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: A oportunidade da

apresentação deste projeto de resolução do Partido Socialista, que aqui discutimos, é, no mínimo, duvidosa.

Se se percebe que o Bloco de Esquerda, que não aspira, propriamente, a responsabilidade governativa, se

pode permitir a apresentar projetos sem procurar a sua viabilidade, o mesmo, achamos nós, já não se poderia

dizer do Partido Socialista, porque este projeto só pode ter uma leitura, que é a do extremo populismo.

Não é que a construção do IC35 entre Penafiel e Entre-os-Rios não seja uma grande necessidade. Ela é

uma grande necessidade e foram aqui levantadas pelo Partido Socialista enormes razões pelas quais esse

projeto deve andar para a frente. Aliás, quem conhece a região, nomeadamente os Deputados do CDS do

Porto e de Aveiro, compreende bem os constrangimentos que existem pela não construção deste troço.

Também não é de estranhar — é verdade— que o Partido Socialista volte a esta questão agora. Aliás, o

Partido Socialista volta sempre a esta questão, normalmente antes das eleições. E não só em relação ao IC

35! Em 2009, foi à Trofa anunciar o metro da Trofa, foi anunciar, no plano estratégico de transportes, a

construção do IC35 e se formos falar com as populações da Trofa, de Penafiel, de Sever do Vouga, de Entre-

os-Rios vamos ouvir exatamente isso, ou seja, que o Partido Socialista vai lá, faz a festa, diz que já está tudo

pronto antes das eleições, mas, depois, ganha as eleições e as coisas voltam à estaca zero.

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Nesse sentido, Sr. Presidente, e apesar de sucessivas promessas do Partido Socialista, apesar de não ser

conhecido o projeto de execução para esta obra nos tempos do Partido Socialista, há uma pergunta que se

impõe fazer: o Partido Socialista esteve no poder e não fez esta obra e agora vem recomendar ao Governo

que a faça — 300 milhões de euros, como o Partido Socialista aqui anuncia? Sr. Deputado Renato Sampaio,

esta obra era feita como mais uma PPP? Era com endividamento da Estradas de Portugal?

O PS esteve seis anos no Governo e não fez o IC35. O CDS, durante a campanha eleitoral, foi aos locais e

disse, olhos nos olhos, à população «não sabemos se vamos poder concretizar esta obra.» Mas se fosse o PS

que estivesse no Governo esta era mais uma PPP, Sr. Deputado? Era feita com endividamento da Estradas

de Portugal, que não tem dinheiro para mandar cantar um cego por aquilo que os senhores fizeram?

Era uma resposta a estas questões que gostaríamos de ouvir.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge

Machado.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O projeto de resolução que recomenda a

reconstrução do lanço do IC35 entre Penafiel e Entre-os-Rios é uma realidade e é uma aspiração legítima por

parte das populações.

O PCP apresentou, em 7 de julho de 2011 — está a fazer praticamente um ano —, um projeto de resolução

que visava recomendar ao Governo a urgente construção do IC35. Na altura, como é que votou o PSD e o

CDS-PP? Votaram contra o projeto de resolução.

Anuncia, agora, o PSD que a obra avança relativamente à urgente necessidade das populações, mas, no

terreno, nada, zero! E mais: este projeto de resolução que o PCP apresentou há um ano e que recomendava a

urgente construção do IC35 foi rejeitado com os votos do PSD.

PS e BE apresentam agora um projeto de resolução com argumentos muito idênticos aos do PCP de 2011,

e muito bem. Diz o Bloco de Esquerda que a construção do IC35 é uma necessidade desde a década de 80, e

é verdade; que é uma aspiração das populações dos concelhos de Penafiel, de Marco de Canaveses, Castelo

de Paiva e Cinfães, e é verdade. Mas temos de denunciar aqui que o facto de o IC35 não ser hoje uma

realidade é por culpa do PS, do PSD e do CDS-PP.

Na verdade, estes partidos são os responsáveis pela ausência desta infraestrutura básica e, portanto, não

adianta virem com discursos de grandes preocupações ou dizer que o projeto está em avanço, no que respeita

a projetos e a enunciados de boas intenções, porque o que interessa é, efetivamente, a sua construção.

Hoje, o IC35 não é uma realidade por culpa destes partidos, porque dizem uma coisa na oposição e fazem

o seu contrário quando assumem o poder. O PS diz agora que é urgente a construção do IC35, mas passou

vários anos no Governo e não fez nada relativamente a esta matéria.

O mesmo se diga relativamente ao PSD e ao CDS-PP, que têm discursos contraditórios. Lá, no terreno,

junto das populações, toda a gente é favor da construção do IC35, mas não irei perder muito mais tempo com

estas contradições.

A verdade é que, em sucessivos orçamentos do Estado, o PCP apresentou propostas de reforço de verbas

para a construção da obra do IC35, mas a realidade é que o PS, o PSD e o CDS-PP andaram de mãos juntas

a dançar o tango da política de direita que impediu a construção do IC35.

Apresentámos sucessivas propostas em sede de orçamento do Estado. E como é que votaram PS, PSD e

CDS-PP? Sempre contra a construção do IC35! Esta denúncia tem de ficar registada para que a população

saiba.

Importa destacar a importância do IC35. A verdade é que quem percorre aquela estrada percebe o inferno

que a estrada nacional n.º 106 representa. É urgente ligar a A4 à A25. A não construção tem impactos

gravíssimos, quer do ponto de vista económico, quer social na mobilidade e, principalmente, na segurança

rodoviária. Os dados — e para quem pesquisa encontra-os — são absolutamente assustadores no que

respeita à sinistralidade rodoviária.

Importa também lembrar que esta obra do IC35, que tem vindo, sucessivamente, a ser adiado, é um

compromisso assumido por todos os partidos políticos, desde a queda da Ponte Hintze Ribeiro, em março de

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2001, que, solenemente, assumiram o compromisso de construir esta estrada, mas até hoje PSD, PS e CDS-

PP são responsáveis pela sua não construção.

Assim, o PCP irá continuar a lutar para que ela seja uma realidade, porque ela faz, efetivamente, falta a

estas populações.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Renato

Sampaio.

O Sr. Renato Sampaio (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de dizer ao CDS que o metro da

Trofa, como se sabe, estava na primeira fase do metro do Porto e foi uma administração da Metro do Porto, do

PSD, com Governo do PSD/CDS, que o retirou da primeira fase para o passar para as calendas.

Aplausos do PS.

Vozes do CDS-PP: — Não é verdade!

O Sr. Renato Sampaio (PS): — E foi exatamente o Governo do PS…

Vozes do CDS-PP: — Não é verdade!

O Sr. Renato Sampaio (PS): — Pois, eu sei que custa ouvir isto!

E foi exatamente o Governo do PS que o repôs na segunda fase.

Mas eu queria falar do IC35.

Srs. Deputados, se nós, no Governo, tudo tivéssemos feito, o atual Governo não teria nada para fazer.

Risos.

Eu sei que o Governo está embaraçado para saber o que fazer…

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — O Sr. Deputado é que está embaraçado!

O Sr. Renato Sampaio (PS): — … e pelo muito que o PS fez quando governou. Mas esse é exatamente o

vosso problema: estabelecerem prioridades e fazerem o que têm de fazer!

Fala-se em obra feita. Eu não vi obra nenhuma no terreno. Nenhuma! Nós tínhamos uma solução: o

financiamento era feito através dos fundos comunitários, com um acordo que havia com a Associação

Nacional de Municípios Portugueses. Por isso, tínhamos a solução!

Agora, o que exigimos ao Governo é que estabeleça prioridades, que governe, porque eu julgo que as

populações estão a pedir. Esse é que é o grande problema que o atual Governo tem: passado um ano, ainda

nada ter feito!

Quanto à questão de termos metido o IC35 na gaveta, Srs. Deputados, o PS apresentou este projeto de

resolução há muito tempo. O PSD local é que, antes das eleições, andou a fazer uma petição que enterrou

rapidamente e só a desenterrou quando o PS apresentou este projeto aqui, na Assembleia da República.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma nova intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Michael

Seufert.

O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sr. Deputado Renato Sampaio,

andará mal de memória se não se recordar que quando a Junta Metropolitana do Porto foi obrigada, pelo

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Governo do Partido Socialista, a retirar o metro da Trofa da primeira fase, isso aconteceu porque a Metro do

Porto, depois de arcar com todo o investimento,…

O Sr. Renato Sampaio (PS): — Não é verdade!

O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — … com todo o custo de investimento, com o serviço da dívida, com o

crédito da obra do metro do Porto, estava falida.

O Governo do Partido Socialista disse que continuava a financiar o metro do Porto se a Junta Metropolitana

deixasse de ter o poder de nomear a administração da Metro do Porto…

O Sr. Renato Sampaio (PS): — Não é verdade!

O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — … com o compromisso de que era construído na segunda fase…

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — É verdade!

O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Sr. Deputado, isso até podia não ser verdade, mas, em 2009, a

Secretária de Estado dos Transportes foi à Trofa, a dias das eleições, dizer que já estava lançado o concurso

para o metro da Trofa e era mentira, Sr. Deputado! Era mentira, como o Sr. Deputado bem sabe!

Aliás, há de recordar-se que o candidato que o Sr. Deputado apoiou agora internamente no seu partido

para a federação do Partido Socialista do Porto era o vice-presidente da Junta Metropolitana na altura.

O Sr. Renato Sampaio (PS): — Não é da altura!

O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — A Junta Metropolitana não é do PSD, nem é do CDS, Sr. Deputado; é

das cidades e das autarquias da região do Porto.

Mas, muito mais do que isso, Sr. Deputado, sabe uma coisa? Se e quando o IC35 for construído, não o vai

ser graças ao Partido Socialista, mas sim apesar do Partido Socialista!

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Porque o Partido Socialista deixou o País, a Estradas de Portugal e

todo o investimento rodoviário numa situação que o País não podia suportar.

O IC35 vai acontecer, nós vamos vê-lo acontecer nesta Legislatura, é uma prioridade do Governo e dos

Deputados do Porto e de Aveiro e devia ser também uma prioridade do Partido Socialista.

O Sr. Renato Sampaio (PS): — E é!

O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — O Partido Socialista perdeu essa oportunidade quando estava no

Governo, mas vai estar aqui para vê-la acontecer.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe

Soares.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Devo dizer que, apesar do

debate sobre a política, há um problema que as populações sentem, que é a falta de segurança da estrada

nacional n.º 106.

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Muito bem!

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O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — E ou se resolve esse problema com a construção do IC35, dando

prioridade à ligação de Penafiel a Entre-os Rios, ou nós vamos continuar a assistir aos partidos que andam no

Governo e que depois passam para a oposição ou que estão na oposição e depois passam para o Governo a

discutir política, mas a não resolver problemas.

E porque é necessário resolver os problemas, se há tanto empenho assim dos Deputados do CDS e do

PSD do Porto e de Aveiro, que conhecem este problema no terreno, como aqui o disseram, desafio-os a

votarem a favor do projeto de resolução do Bloco de Esquerda, que diz apenas e só isto: «É urgente construir

o IC35. Vamos dar prioridade à construção da ligação de Penafiel a Entre-os-Rios.». Tão simples e tão eficaz

e uma resposta tão certa para as populações que dela precisam. Haja a coragem de ter essa afirmação aqui,

apesar da vontade dos diversos governos.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma nova intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís

Vales.

O Sr. Luís Vales (PSD): — Sr. Presidente, utilizarei os segundos que me restam de uma forma muito

telegráfica.

Só queria dizer ao Sr. Deputado Renato Sampaio que deveria ter vergonha pela intervenção que proferiu.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Luís Vales (PSD): — O PS meteu o IC35 na gaveta e o senhor, durante todos estes anos, em que o

seu partido foi Governo, nada fez.

Vozes do PSD: — Esteve calado!

O Sr. Luís Vales (PSD): — O PSD foi agora buscá-lo à gaveta e o senhor, com um discurso demagógico,

vem dizer as banalidades que disse.

Quero dizer-lhe que espero que o senhor esteja cá para ver esta obra acontecer nesta Legislatura.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, vamos passar ao último ponto da nossa ordem e

trabalhos, que consta da apreciação da petição n.º 157/XI (2.ª) — Apresentada pela Federação Portuguesa

pela Vida, solicitando à Assembleia da República a avaliação da realidade do aborto em Portugal.

Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Paula Santos.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: A consagração, no quadro legal português,

da despenalização da interrupção voluntária da gravidez (IVG) constituiu uma conquista de décadas de luta

em defesa dos direitos das mulheres e representou um grande avanço civilizacional na garantia e no

reconhecimento dos direitos sexuais e reprodutivos.

Vozes do PCP: — Muito bem!

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Não obstante a ofensiva ao Serviço Nacional de Saúde, a fragilidade dos

cuidados de saúde primários, o encerramento de serviços de proximidade e de maternidades, o

encaminhamento para entidades privadas, quando há capacidade no SNS, ou a não adequada implementação

da educação sexual, fazemos um balanço muito positivo nestes cinco anos de aplicação da lei.

Vozes do PCP: — Muito bem!

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A Sr.ª Paula Santos (PCP): — A luta de muitas gerações de mulheres pôs fim à inaceitável criminalização,

a um flagelo social e a um problema de saúde pública, que, para além de problemas de saúde gravíssimos,

custou a vida a demasiadas mulheres.

No entanto, as forças conservadoras e reacionárias nunca aceitaram o resultado do referendo e claramente

tentam reverter a lei. Durante cinco anos, foram inúmeras as mistificações e as demagogias para tentarem

criar entraves à aplicação da lei, ignorando as consequências do aborto clandestino que até 2007 vigorava em

Portugal e deturpando os dados dos relatórios anuais da Direção-Geral de Saúde.

Dos dados oficiais relativos ao ano de 2011 destaca-se que o maior grupo de mulheres que recorreram à

IVG estão em situação de desemprego, seguido das trabalhadoras operárias e das que trabalham na

agricultura, das estudantes e das trabalhadoras não qualificadas, o que revela as dificuldades económicas e

os baixos salários com que as famílias sobrevivem.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — 51,8% das mulheres que fizeram interrupção da gravidez tinham já cerca de

um a dois filhos, cerca de 75% das mulheres fizeram a interrupção da gravidez pela primeira vez, contrariando

a tese de que há uma grande reincidência na realização de IVG.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Bem lembrado!

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Portugal é o quinto país da União Europeia com menor taxa de interrupções

da gravidez por 1000 mulheres em idade fértil e está abaixo da média da União Europeia no que respeita à

realização de interrupções da gravidez por 1000 nados vivos.

Sem qualquer vergonha e pudor, estas forças reacionárias tentam associar o número de interrupções

voluntárias da gravidez por opção da mulher à redução da natalidade no País, aliás um dos aspetos que

motivou o voto contra do PCP em relação ao relatório final desta petição.

É evidente que, a não vigorar esta lei, estas mulheres seriam forçadas a recorrer ao aborto ilegal e

clandestino sem quaisquer condições.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — É uma hipocrisia considerar que a IVG é responsável pela baixa natalidade,

ignorando todas as condições económicas e sociais que levam os casais a adiar a decisão de ter filhos ou a

optarem por terem um só filho. O desemprego, a precariedade, os baixos salários, as dificuldades no acesso à

habitação, o desrespeito pelos direitos da maternidade e paternidade, os cortes no abono de família e noutros

apoios sociais e bem recentemente a redução do valor do subsídio de maternidade são, de facto, os fatores

que contribuem para a baixa taxa de natalidade em Portugal.

A proposta já anunciada de cobrar taxas moderadoras na realização da IVG é inaceitável. Tudo faremos

para impedir que avance, pois representará um retrocesso, dificultando o acesso das mulheres aos cuidados

de saúde, com um sério prejuízo para a sua vida sexual e reprodutiva. A IVG é um ato médico e, como tal,

deve ser assegurado pelo SNS, garantido a todas as mulheres independentemente da sua condição

económica.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Sr.ª Deputada, faça favor de terminar.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Termino já, Sr. Presidente.

Para o PCP, o cumprimento desta lei é indissociável do papel insubstituível do SNS na promoção do

conjunto dos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres, designadamente a garantia de cuidados médicos

qualificados na gravidez; o acesso à educação para a saúde e sexualidade; acessibilidade às consultas de

planeamento familiar e gratuitidade dos métodos contracetivos; a garantia de apoio nas situações de

infertilidade e o reforço dos direitos da maternidade e paternidade.

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O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Sr.ª Deputada, faça favor de terminar.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Mesmo para terminar, Sr. Presidente, dizemos que, deste modo, não

podemos acompanhar, de todo, os pressupostos desta petição, porque pretendem andar para trás e voltar aos

tempos do aborto ilegal, afrontando os direitos das mulheres e a sua dignidade enquanto seres humanos.

Aplausos do PCP e do BE.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa

Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, começo por dizer que Os

Verdes discordam em absoluto do texto da petição. Não nos identificamos absolutamente nada com o que

nela está aqui descrito e com o que nela é solicitado.

Os Verdes envolveram-se muito na alteração da legislação que permitisse a legalização da interrupção

voluntária da gravidez, portanto da interrupção da gravidez a pedido da mulher, e, passado este tempo,

consideramos que o País ganhou muito com isso, porque a realidade do aborto clandestino diminuiu

substancialmente. Ganharam, portanto, muitas mulheres, ganhou muito a população portuguesa e ganhámos

até nos cuidados hospitalares quando se reduziram as complicações pós-aborto.

Isto deve remeter-nos para uma profunda felicidade, Sr.as

e Srs. Deputados! A realidade do aborto

clandestino é um flagelo e nós contribuímos para combater esse flagelo, ganhámos com isso!

Mas vamos ver outra coisa completamente diferente: ninguém faz um aborto porque quer — «ai eu desejo

tanto fazer um aborto, ora vou fazer um aborto». Não é assim! As pessoas não fazem abortos porque é um

gosto, pelo que todos queremos que cada vez menos pessoas façam essa opção do aborto. Todos temos de

lutar para isso. É evidente!

E como é que Os Verdes entendem que se deve lutar para isso? Desde logo, fazendo exatamente o

contrário daquilo que os sucessivos governos têm feito e que este, em particular, está a fazer, que é delapidar

a vida das pessoas, é fazer com que as pessoas não tenham condições económicas para poderem ter talvez

uma das maiores felicidades da sua vida, que é terem um filho ou os filhos que entenderem.

Hoje, as pessoas, os jovens casais, fazem a opção de não ter filhos não porque não queiram, mas porque

não podem, porque não os conseguem sustentar — têm essa visão. Muitas vezes só conseguem ter um

emprego aos 30, aos 40 anos, e isto é absolutamente insuportável. Aquilo que vêm no seu futuro mais

imediato é o desemprego à porta. Ora, como é que é possível alguém sustentar-se no futuro e sustentar o

sonho de uma vida familiar plena com filhos nesta realidade?

É por isso que não nos identificamos em nada nesta petição. Quando lemos, na petição, que «o aborto

gera desemprego»… Ó Sr.as

e Srs. Deputados, penso que há limites para a demagogia! Só espero que as

pessoas que subscreveram esta petição combatam veementemente a política de desemprego que o Governo

anda a criar.

Por exemplo, quando encaixa meninos na mesma turma, 30 ou mais, com um professor e faz um

despedimento desgraçado de professores, isso, sim, é contribuir para o desemprego! Ou quando esta petição

nos diz que o País está confrontado com o dramático pedido das famílias de redução de salários. Pedido?!

Alguém foi pedir alguma coisa às famílias e as famílias disseram que sim?! Não, Sr.as

e Srs. Deputados, este

pedido tem outra palavra: é o roubo dos salários às famílias portuguesas, e é por via disso, justamente, que as

famílias não podem sonhar ter a família plena que querem e é isso que está errado.

Esta petição orienta-se para o lado errado. O País ganhou quando alterou a lei que permitiu a interrupção

voluntária da gravidez até às 10 semanas. O País perde quando tem um Governo que só gere uma coisa

segura em Portugal: desemprego e desgraça para as famílias.

Aplausos de Os Verdes e do PCP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Elza Pais.

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A Sr.ª Elza Pais (PS): — Sr. Presidente, Sr.as

. e Srs. Deputados: A despenalização da IVG, em 2007,

representou uma conquista civilizacional que permitiu, de então para cá, que mais nenhuma mulher morresse

devido a complicações de aborto clandestino e que todas as mulheres passassem a ter acesso aos cuidados

sexuais e reprodutivos, como acontece na maior parte dos países civilizados do mundo.

As mulheres, antes excluídas do Serviço Nacional de Saúde (SNS), podem hoje efetuar uma interrupção

segura e legal e serem acompanhadas por profissionais de saúde e seguidas em consultas de planeamento

familiar.

Trata-se de uma lei que tem vindo a ser aplicada e avaliada — portanto, é falso quando se diz que não está

a ser avaliada pela Direção-Geral de Saúde — e que, se algum problema apresenta, é ainda o de alguma

dificuldade de aplicação pelo SNS, sobretudo nalgumas zonas do País, como no Alentejo.

O SNS não sai, portanto, prejudicado com esta lei; o SNS sai, por isso, beneficiado com este investimento

na saúde da mulher.

É, por isso, absolutamente falso e demagógico dizer que os custos com IVG aumentaram. Já chega de

atribuir culpas a quem as não tem, às mulheres.

É igualmente falso dizer que as mulheres portuguesas estão a usar a IVG como método contracetivo: em

2011, 74% das mulheres que recorreram à IVG nunca tinham realizado anteriormente uma interrupção e mais

de 20% realizaram uma.

A quase totalidade das mulheres, quase 97%, que recorreram à IVG escolheram, depois disso, um método

de contraceção.

É também igualmente falso dizer que o número de IVG tem aumentado de forma significativa, pois os

dados demonstram — basta ler os relatórios — que a taxa de IVG em Portugal é significativamente mais baixa

que a média europeia e mais baixa que noutros países da Europa, como em França, Itália, Espanha e Reino

Unido.

O aumento da IVG em 2011, apesar da situação de crise temos vivido, foi de 1,2%, menor que o aumento

da IGV em 2010, que foi de 1,8%, e menor que o aumento da IGV em 2009, que foi de 6,7%.

Não é verdade — já aqui foi dito — que esta lei tenha contribuído para o desemprego de educadoras de

infância. Aqui os limites da demagogia e do populismo chegam ao rubro. Chega mesmo a constituir um insulto

para a dignidade humana das mulheres e dos casais que querem assumir a maternidade e a paternidade

como um direito fruto de uma escolha livre e consciente.

A verdade é que as atuais políticas sociais, altamente restritivas, em nada facilitam as escolhas

conscientes.

Os abonos de família, os subsídios de maternidade, paternidade e adoção estão cada vez mais reduzidos.

A precariedade e a insegurança laboral é cada vez maior. E isso condiciona as opções dos casais e das

famílias.

Dito isto, temos consciência de que nem tudo está feito!

É preciso melhorar o serviço de saúde sexual e reprodutiva no SNS e alargá-lo a zonas territoriais onde

ainda não foi devidamente implementado. É preciso melhorar as consultas de planeamento familiar e

aconselhamento. É preciso que a educação sexual nas escolas, contrariamente ao que está a acontecer,

chegue e faça com que os jovens tomem atitudes livres e conscientes para terem uma vida com opções

dignas.

É, por isso, preciso garantir que nenhuma mulher seja afastada de uma unidade de saúde pública quando

dela necessita.

Aplausos do PS e do BE.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Conceição

Bessa Ruão.

A Sr.ª Conceição Bessa Ruão (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Concordemos ou

discordemos, queremos manter a boa tradição desta Casa e cumprimentar os peticionários.

Aplausos do PSD.

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Na petição que apresentaram à Assembleia da República, pediam a avaliação da realidade do aborto, a

proteção da maternidade, a avaliação da forma do consentimento e a gestão dos recursos financeiros do País,

tendo em conta que deverá ser dado mais apoio às mulheres que decidem abortar, no sentido de lhes facultar

condições para o exercício da maternidade.

Não foi objetivo dos peticionários, nunca, criminalizar a mulher que aborta.

Protestos do BE.

Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Os dados trabalhados e recolhidos sobre 4 anos de avaliação da

realidade do aborto foram seriamente tratados e impõe-se que, sem qualquer reserva mental, sejamos

capazes, todos, de fazer uma reflexão e encontrar soluções para os seguintes pontos: o aborto repetido, como

método contracetivo, quando todos os contracetivos estão disponíveis no Serviço Nacional de Saúde, bem

como as consultas de planeamento familiar, que são absolutamente gratuitas e às quais as mulheres,

generalizadamente, faltam;…

Aplausos do PSD.

Protestos do BE.

… a obrigatoriedade da assinatura da ecografia da idade do feto pela grávida, para assegurar que o tempo

e a explicação sobre as consequências do aborto são reconhecidos pela mulher; manter sob controlo o

aumento do aborto cirúrgico no Serviço Nacional de Saúde, apesar de este ainda ser, maioritariamente,

medicamentoso; o tratamento estatístico dos dados relativos às mulheres que se arrependem e desistem de

abortar, para que se possa deles tirar ilações; é necessário, igualmente, apreciar e tirar consequências sobre o

regime de atribuição dos mesmos direitos de natureza pecuniária e estatuto à mulher que aborta, em

equiparação à mulher que opta pela maternidade;…

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Que vergonha!

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Tenha vergonha!

A Sr.ª Conceição Bessa Ruão (PSD): — … a escassez dos meios financeiros e humanos quer para o

apoio à procriação medicamente assistida, quer para a maternidade versus os disponibilizados para o aborto;

assumir a natalidade e o crescimento demográfico como uma questão estratégica; equacionar a aplicação de

taxa moderadora, eventualmente, nos casos de reincidência, resolvidas que sejam as limitações que hoje se

verificam.

Por tudo isto, não podemos deixar de manter sob escrutínio esta lei e as leis conexas.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Maria Antónia Almeida Santos (PS): — Que vergonha!

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, a Mesa não regista mais inscrições…

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr. Presidente, peço desculpa, permite-me o uso da palavra?

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Quer inscrever-se, Sr.ª Deputada?

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr. Presidente, supunha, inclusivamente, que a Sr.ª Deputada Teresa

Caeiro se tinha inscrito antes de mim…

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A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Ora essa, Sr.ª Deputada, faça favor.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Tem a palavra, Sr.ª Deputada Cecília Honório.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr. Presidente, Sr.as

Deputadas e Srs. Deputados: Aceitando a

generosidade da Sr.ª Deputada Teresa Caeiro, quero, antes de mais, cumprimentar os peticionários.

Cinco anos depois de a maioria das portuguesas e dos portugueses terem dito «sim» à despenalização do

aborto;…

O Sr. Manuel Pizarro (PS): — Bem lembrado!

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — … cinco anos depois da conquista de um cuidado de saúde que não existia

e que o Serviço Nacional de Saúde passou a garantir; cinco anos depois de as mulheres, em Portugal,

deixarem de ser julgadas em tribunal e humilhadas, humilhadas; cinco anos depois, vem a Federação

Portuguesa pela Vida peticionar à Assembleia da República — e acho que vale a pena olhar para este texto —

, peticionar-nos a nós, Deputados e Deputadas, que reconheçamos o flagelo do aborto, que varre o País de

norte a sul, destruindo crianças, mulheres e famílias e criando desemprego, e ainda que se deixe, e estou a

citar, de cobrir de dinheiro o aborto.

O Sr. Manuel Pizarro (PS): — Muito bem!

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Ora, empurrar as mulheres para o setor privado não constituiria, com

certeza, problema para vós. Mas o que é importante, depois deste discurso, é que possamos fazer esta

discussão com o bom senso e a decência que ela merece.

Por isso, quero deixar duas notas breves quer sobre números, quer sobre avaliação de custos. E aquilo

que os números nos dizem é que Portugal tem das mais baixas taxas de interrupção voluntária de gravidez da

Europa.

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Exatamente!

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Ao contrário do que muitos disseram, os números conhecidos não nos

dizem que a crise, a crise provocada pelas políticas deste Governo, está a mandar as mulheres para

interrupções voluntárias de gravidez, aumentando esses números. O que os números nos dizem é que há um

decréscimo muito significativo de IVG na faixa etária das mulheres mais jovens.

Mas, se queremos falar de custos com seriedade, não há nenhuma conversa que esta Assembleia possa

ter, sem ter em conta o que se ganhou e que o Estado poupou, com as muitas mulheres que não morreram

em consequência do aborto clandestino,…

Aplausos do BE, do PS, do PCP e de Os Verdes.

… com as muitas mulheres que não foram parar às urgências dos hospitais em consequência do aborto

clandestino.

Vamos falar a sério de custos, vamos introduzir bom senso neste debate!

Não sabemos exatamente o que o CDS pensa sobre esta petição, mas reconheço, no entanto, que o PSD

não deu uma bênção, em absoluto, ao seu conteúdo, aquilo que fez foi reinterpretar esse conteúdo.

Por isso, aguarda-se que os partidos da maioria utilizem também o bom senso no debate que está sobre a

mesa.

Há quem fale, enfim, de taxas castigadoras para todas as mulheres — fala-se! — e há quem fale de taxas

castigadoras para as reincidentes, para penalizar, para castigar a reincidência — e, aqui, tenho mais

fundamento, porque ouvi a Sr.ª Deputada Conceição Bessa Ruão, com toda a atenção.

Sr.ª Deputada, vai dar-vos muitos problemas uma solução dessa natureza, porque têm muitas questões

para resolver até lá chegar, desde logo, o que diz respeito ao próprio segredo médico e, em segundo lugar, o

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que tem a ver com a privacidade das mulheres. Não vão, com certeza, propor que existam listas de mulheres

abortadeiras na Internet e que o Ministério da Saúde constitua uma base de dados com as mulheres que são

reincidentes?! Portanto, isto vai dar-vos muitos, muitos problemas, mas espero que o bom senso acompanhe

este debate, que é, certamente, um debate futuro.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Concluo, Sr. Presidente.

Dentro deste bom senso, é hora de acabar com toda a hipocrisia para com tantas mulheres e tantos

homens que queriam ter filhos e não podem. Não é hora de fazer hipocrisia com números falsos, com

estatísticas viciadas, com palavras gongóricas, quando há mulheres e homens que queriam ter filhos, mas,

simplesmente, não podem fazer esta escolha com toda a liberdade.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Portanto, que o bom senso nos acompanhe para o futuro.

O que alguns e algumas de vós bem querem bem sabemos nós: querem que as mulheres sejam

empurradas para as clínicas privadas, para o vão da escada,…

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Sr.ª Deputada, faça favor de terminar.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — … mas é tempo perdido.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Tenha vergonha!

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Essa batalha foi ganha pela democracia,…

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Sr.ª Deputada, faça favor de terminar, porque já excedeu

largamente o tempo de que dispunha.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — … essa batalha foi ganha pela modernidade.

Aplausos do BE e do PS.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa

Caeiro.

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Gostaria de começar por saudar

os mais de 5000 subscritores desta petição, neste valioso sinal de cidadania, que é o exercício do direito de

petição.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Mesmo quando se discorda!

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Pedem os subscritores à Assembleia da República que reconheça o

flagelo do aborto, imagino que do aborto por opção da mulher, desde há 4 anos.

Bom, permito-me fazer algumas correções.

Em primeiro lugar, de facto, o aborto é um flagelo, mas é um flagelo de toda a humanidade e não apenas

de Portugal. E é um flagelo que não existe desde há 4 anos, mas, que eu saiba, desde a antiguidade, mais

concretamente, desde o século 28 a.C. Aliás, era discutido abertamente por Aristóteles, era incentivado até

por outros filósofos e era abordado com toda a naturalidade — imagine-se! — por Hipócrates.

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Portanto, a verdade é que este flagelo tem muito mais tempo do que os 4 anos da lei de despenalização do

aborto. A diferença é que até há 4 anos não existiam números fiáveis. Porquê? Porque o aborto era uma

prática clandestina.

A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — Era crime!

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Dito isto, e não pretendendo, o CDS, reabrir o debate sobre a

descriminalização do aborto, consideramos que a aplicação desta lei, com certeza, tem de ser acompanhada,

monitorizada, fiscalizada, adaptada e corrigida.

Aplausos do CDS-PP, do PSD e do PS.

Mal fora um Parlamento que não avalia e mal fora uma democracia que não se questiona! Era só o que

faltava! Não há assuntos tabu!

Aplausos do CDS-PP, do PSD e do PS.

A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — Faça isso!

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — É evidente que, se for caso disso, cabe-nos a nós, legisladores, fazer

as correções e as adaptações necessárias, assim como nos compete retirar as ilações e as lições dos

relatórios anuais que são produzidos sobre a aplicação da lei, bem como do relatório da Inspeção-Geral das

Atividades em Saúde, que todos conhecemos.

Também consideramos, Sr.as

e Srs. Deputados, que é fundamental combater este flagelo e não nos

revemos, de modo algum, nas declarações que consideram que tudo está bem e que tudo está resolvido.

A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — Ninguém disse isso!

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Entendemos que este flagelo — e o flagelo não é só o aborto

clandestino, a decisão de uma mulher interromper uma gravidez é, em si, um flagelo e entendemos que deve

ser combatido, independentemente das posições ideológicas, filosóficas, éticas e jurídicas com que se

pretenda encarar este problema — deve ser atacado, sobretudo, com base na prevenção e na informação,

para evitar as gravidezes não desejadas e as interrupções voluntárias.

Aparentemente ao contrário de outras bancadas, não nos conformamos. Entendemos que, enquanto

houver uma única gravidez indesejada, uma interrupção voluntária da gravidez por opção, não há nenhum

avanço civilizacional, como os senhores dizem, não há qualquer progresso civilizacional. Progresso

civilizacional, Sr.as

e Srs. Deputados, são os progressos da ciência, os progressos da medicina, os métodos

contracetivos, os bons indicadores materno-infantis que temos e que devemos preservar. Isto é que são

avanços civilizacionais! Que não haja aqui equívocos, Sr.as

e Srs. Deputados! A interrupção voluntária da

gravidez, independentemente da solução legal que se encontre para este problema, é e será sempre a

interrupção voluntária do desenvolvimento de um ser humano.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — E não nos conformamos, ao contrário de outras Sr.as

Deputadas e de

outros Srs. Deputados, dizendo que está tudo ótimo porque estagnámos nos 20 000 abortos por ano.

A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — Ninguém disse isso!

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Para nós, enquanto houver uma interrupção voluntária da gravidez por

mera opção da mulher, o problema não está resolvido e não nos conformamos.

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Aliás, Sr. Presidente, para terminar, não consideramos, de todo, que isto seja uma conquista

civilizacional…

A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — O clandestino era melhor!

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — … e é até chocante chamar a uma solução que é um mal menor para

um problema maior, porque, Sr.ª Deputada, a descriminalização é um mal menor, uma conquista e um avanço

civilizacional. Não é! Não é!

Vozes do PS: — É, é!

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — É um mal menor para um problema enorme!

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — É chocante que associações, grupos e individualidades, que tanto

militam para que esta lei seja mantida intocada, não se preocupem nem um segundo com as mães que,

apesar das adversidades, decidem manter a gravidez até ao fim.

Aplausos do CDS-PP e de Deputados do PSD.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Conceição

Bessa Ruão.

A Sr.ª Conceição Bessa Ruão (PSD): — Sr. Presidente, é uma pena a radicalização do debate, porque é

consensual que a legislação aprovada foi ao encontro do apelo da sociedade que a referendou.

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Conceição Bessa Ruão (PSD): — O Estado tem obrigação, para qualquer lei que elabora, de a

avaliar, independentemente de concordar ou não com ela, e não nos podemos abster de um dever que é

nosso, enquanto Deputados.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª Conceição Bessa Ruão (PSD): — Sr.ª Deputada do Bloco de Esquerda, não faço juízos de intenção

sobre ninguém.

Queremos melhorar o papel do Estado na sua obrigatoriedade relativamente ao planeamento familiar e à

proteção das mulheres. E, sobre isto, todos ainda temos muito a fazer!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Cecília Honório (BE):- Muito bem!

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, estão terminados os nossos trabalhos.

Reuniremos amanhã, pelas 10 horas, com a seguinte ordem de trabalhos: ponto 1, debate conjunto, na

generalidade, da proposta de lei n.º 70/XII (1.ª) — Aprova o estatuto do aluno e ética escolar, que estabelece

os direitos e os deveres do aluno dos ensinos básico e secundário e o compromisso dos pais ou encarregados

de educação e dos restantes membros da comunidade educativa na sua educação e formação, e dos projetos

de lei n.os

209/XII (1.ª) — Cria os gabinetes pedagógicos de integração escolar (GPIE) (PCP), 218/XII (1.ª) —

Estabelece medidas de redução do número de alunos por turma visando a melhoria do processo de ensino-

aprendizagem (PCP), 257/XII (1.ª) — Estabelece o número mínimo e máximo de alunos por turma (PS),

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261/XII (1.ª) — Estabelece um número máximo de alunos por turma e por docente nos estabelecimentos de

educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário (BE) e 262/XII (1.ª) — Cria as equipas escolares

multidisciplinares (BE); ponto 2, debate, na generalidade, da proposta de lei n.º 69/XII (1.ª) — Estabelece os

princípios de ação do Estado no quadro de fomento, desenvolvimento e proteção da arte do cinema e das

atividades cinematográficas e audiovisuais; ponto 3, discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 71/XII

(1.ª) — Autoriza o Governo a regular o acesso à atividade das instituições de moeda eletrónica e da prestação

de serviços de emissão de moeda eletrónica, no âmbito da transposição da Diretiva 2009/110/CE, do

Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de setembro, relativa ao acesso à atividade das instituições de

moeda eletrónica, ao seu exercício e à sua supervisão prudencial; ponto 4, apreciação, em conjunto, da

petição n.º 42/XII (1.ª) — Apresentada por Paulo Alexandre Pereira, Presidente da Direção da TEM, e outros,

solicitando à Assembleia da República a criação e aprovação do estatuto do doente crónico, bem como da

tabela nacional de incapacidade e funcionalidades da saúde, do projeto de resolução n.º 403/XII (1.ª) —

Recomenda a criação do estatuto de doente crónico (PCP), do projeto de lei n.º 234/XII (1.ª) — Regime

especial de comparticipação de medicamentos destinados a portadores de doenças raras (BE) e do projeto de

resolução n.º 407/XII (1.ª) — Recomenda ao Governo a criação do estatuto do doente crónico e da tabela

nacional de incapacidade e funcionalidade da saúde (BE); e, ponto 5, apreciação das propostas de resolução

n.os

31/XII (1.ª) — Aprova anexos à Convenção sobre os Privilégios e Imunidades das Organizações

Especializadas das Nações Unidas, adotada pela Assembleia Geral das Nações Unidas, em 21 de novembro

de 1947, 32/XII (1.ª) — Aprova o Acordo entre os Estados-membros da União Europeia, reunidos no

Conselho, sobre a Proteção das Informações Classificadas Trocadas no Interesse da União Europeia,

assinado em Bruxelas, a 25 de maio de 2011, e 33/XII (1.ª) — Aprova o recesso por parte da República

Portuguesa do Tratado sobre o Estatuto Jurídico da EUROFOR, assinado em Roma, a 5 de julho de 2000. Às

12 horas, teremos, como habitualmente, votações regimentais.

Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 20 minutos.

Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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