O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 1

Quinta-feira, 6 de dezembro de 2012 I Série — Número 26

XII LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2012-2013)

REUNIÃOPLENÁRIADE5DEDEZEMBRODE 2012

Presidente: Ex.ma Sr.ª Maria da Assunção Andrade Esteves

Secretários: Ex.mos

Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco Jorge Manuel Capela Gonçalves Fão

S U M Á R I O

A Sr.ª Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas

e 8 minutos. Deu-se conta da entrada na Mesa das propostas de lei

n.os

111 a 116/XII (2.ª), das propostas de resolução n.os

51 e 52/XII (2.ª), dos projetos de resolução n.

os 514 a 517/XII

(2.ª), das apreciações parlamentares n.os

42 e 43/XII (2.ª) e dos projetos de lei n.

os 318, 319 e 321/XII (2.ª).

Foi aprovado um parecer da Comissão para a Ética, a Cidadania e a Comunicação, autorizando a suspensão do mandato de um Deputado do PS e a respetiva substituição.

Em declaração política, o Sr. Deputado João Oliveira (PCP) deu conta das principais conclusões do XIX Congresso do PCP, realizado no passado fim de semana, e respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Pedro Delgado Alves (PS), Cecília Honório (BE), Heloísa Apolónia (Os Verdes) e Emídio Guerreiro (PSD). Ainda sobre esta matéria, a Sr.ª Presidente cumprimentou o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa (PCP) pela sua reeleição para Secretário-Geral do PCP.

Em declaração política, a Sr.ª Deputada Catarina Martins (BE) acusou o Governo de criar um clima de medo na RTP e insurgiu-se contra a sua política para o cinema.

Respondeu, depois, a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Francisca Almeida (PSD), Bruno Dias (PCP), Michael Seufert (CDS-PP) e Manuel Seabra (PS).

Em declaração política, a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia (Os Verdes) falou da 18.ª Conferência das Partes, da ONU, que está a decorrer em Doha, sobre as alterações climáticas e deu conta do estado das negociações para o período pós-Protocolo de Quioto. No fim, respondeu a pedidos de esclarecimento que lhe foram colocados pelos Srs. Deputados António Leitão Amaro (PSD) e Paulo Sá (PCP).

Em declaração política, o Sr. Deputado Luís Menezes (PSD), a propósito da passagem dos 32 anos sobre o desaparecimento de Francisco Sá Carneiro, sublinhou a vertente reformista deste e estabeleceu um paralelo com a necessidade de hoje se debater a reforma do Estado. Respondeu, depois, a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados José Junqueiro (PS), que também exerceu o direito de defesa da honra, e Hélder Amaral (CDS-PP).

Em declaração política, o Sr. Deputado António Braga (PS) criticou as últimas decisões do Eurogrupo e a resposta do Governo relativamente às mesmas, tendo, depois,

Página 2

I SÉRIE — NÚMERO 26

2

respondido a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Mónica Ferro (PSD), Pedro Filipe Soares (BE), João Pinho de Almeida (CDS-PP) e Honório Novo (PCP).

Em declaração política, o Sr. Deputado Raúl de Almeida (CDS-PP) assinalou a passagem do Dia Internacional das Pessoas com Deficiência e respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Mariana Aiveca (BE), Maria Conceição Pereira (PSD), Jorge Machado (PCP), Heloísa Apolónia (Os Verdes) e Idália Salvador Serrão (PS).

Foi discutida, na generalidade, a proposta de lei n.º 108/XII (2.ª) — Aprova o regime jurídico aplicável ao mergulho recreativo em todo o território nacional, em conformidade com o Decreto-Lei n.º 92/2010, de 26 de junho, que transpôs a Diretiva 2006/123/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2006, relativa aos serviços no mercado interno, com a Lei n.º 9/2009, de 4 de março, que transpôs a Diretiva 2005/36/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 7 de setembro, relativa ao reconhecimento das qualificações profissionais, e com o Decreto-Lei n.º 92/2011, de 27 de julho, que cria o Sistema de Regulação de Acesso a Profissões. Intervieram, além do Sr. Secretário de Estado do Desporto e Juventude (Alexandre Mestre), os Srs. Deputados Pedro Pimpão

(PSD), Laurentino Dias (PS), Miguel Tiago (PCP) e Artur Rêgo (CDS-PP).

Foi também discutido, na generalidade, o projeto de lei n.º 312/XII (2.ª) — Regula a promoção da propriedade e da gestão das entidades que prosseguem atividades de comunicação social (PS), tendo feito intervenções os Srs. Deputados Inês de Medeiros (PS), Carla Rodrigues (PSD), Catarina Martins (BE), Bruno Dias (PCP) e Raúl de Almeida (CDS-PP).

Deu-se conta da entrada na Mesa dos projetos de resolução n.

os 521 a 523/XII (2.ª)

Foi apreciado o Decreto-Lei n.º 232/2012, de 29 de outubro, que aprova o processo de privatização da ANA — Aeroportos de Portugal, SA [apreciação parlamentar n.º 41/XII (2.ª) (PCP)], tendo usado da palavra, a diverso título, os Srs. Deputados Bruno Dias (PCP), Paulo Batista Santos (PSD), Pedro Filipe Soares (BE), José Luís Ferreira (Os Verdes), Rui Paulo Figueiredo (PS) e Hélder Amaral (CDS-PP) e a Sr.ª Secretária de Estado do Tesouro (Maria Luís Albuquerque).

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro) encerrou a sessão eram 19 horas e 25 minutos.

Página 3

6 DE DEZEMBRO DE 2012

3

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 8 minutos.

Os Srs. Agentes da autoridade podem abrir as galerias.

Srs. Deputados, antes de iniciarmos a ordem do dia, dou a palavra ao Sr. Secretário para proceder à leitura

do expediente.

Faça favor, Sr. Secretário.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e

foram admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: propostas de lei n.os

111/XII (2.ª) — Regulamenta a Lei

n.º 45/2003, de 22 de agosto, relativamente ao exercício profissional das atividades de aplicação de

terapêuticas não convencionais, que baixa à 10.ª Comissão, 112/XII (2.ª) — Estabelece o regime jurídico das

áreas regionais de turismo de Portugal continental, a sua delimitação e características, bem como o regime

jurídico da organização e funcionamento das entidades regionais de turismo, que baixa à 6.ª Comissão,

113/XII (2.ª) — Aprova o código de processo civil, que baixa à 1.ª Comissão, 114/XII (2.ª) — Aprova a lei de

organização do sistema judiciário, que baixa à 1.ª Comissão, 115/XII (2.ª) — Procede à primeira alteração à

Lei de Organização, Competência e Funcionamento dos Julgados de Paz, aprovada pela Lei n.º 78/2011, de

13 de julho, aperfeiçoando alguns aspetos de organização e funcionamento dos julgados de paz, que baixa à

1.ª Comissão, e 116/XII (2.ª) — Estabelece os princípios gerais aplicáveis à mediação realizada em Portugal,

bem como os regimes jurídicos da mediação civil e comercial, dos mediadores e da mediação pública, que

baixa à 1.ª Comissão; propostas de resolução n.os

51/XII (2.ª) — Aprova o Acordo entre a República

Portuguesa e os Estados Unidos da América para a Troca de Informação de Rastreio de Terrorismo, assinado

em Washington, em 24 de julho de 2012, que baixa à 2.ª Comissão, e 52/XII (2.ª) — Aprova a Convenção do

Conselho da Europa para a Prevenção e o Combate à Violência contra as Mulheres e a Violência Doméstica,

adotada em Istambul, a 11 de maio de 2011, que baixa à 2.ª Comissão; projetos de resolução n.os

514/XII (2.ª)

— Simplificar procedimentos do SNIRA, atualizar as aplicações que gerem o sistema e fundir as bases de

dados do SNIRA e do PISA (PCP), que baixa à 7.ª Comissão, 515/XII (2.ª) — Reafirma a Resolução da

Assembleia da República n.º 101/2011, de 5 de maio, que recomenda ao Governo que adote as medidas para

a concretização do projeto global de estabilização das encostas de Santarém (PCP), que baixa à 6.ª

Comissão, 516/XII (2.ª) — Recomenda a tomada de medidas com vista à estabilização e consolidação das

encostas de Santarém (CDS-PP), que baixa à 6.ª Comissão, e 517/XII (2.ª) — Recomenda ao Governo que

apoie a recuperação do Mercado do Bolhão respeitando os comerciantes e as características arquitetónicas do

mercado (BE), que baixa à 6.ª Comissão; apreciações parlamentares n.os

42/XII (2.ª) — Relativo ao Decreto-

Lei n.º 234/2012, de 30 de outubro, que procede à segunda alteração do Decreto-lei n.º 165/2006, de 11 de

agosto, que estabelece o regime do ensino do Português no estrangeiro (PS), e 43/XII (2.ª) — Relativa ao

Decreto-Lei n.º 235/2012, de 31 de outubro, que procede à segunda alteração ao Decreto-Lei n.º 248/95, de

21 de setembro, que cria, na estrutura do Sistema da Autoridade Marítima, a Polícia Marítima, e à primeira

alteração ao Decreto-Lei n.º 44/2002, de 2 de março, que estabelece, no âmbito do Sistema da Autoridade

Marítima, a estrutura, organização, funcionamento e competências da Autoridade Marítima Nacional (PCP); e

projetos de lei n.os

318/XII (2.ª) — Altera o regime de renda apoiada para uma maior justiça social (Primeira

alteração ao Decreto-Lei n.º 166/93, de 7 de maio) (BE), que baixa à 11.ª Comissão, 319/XII (2.ª) —

Suspensão da aplicação do regime da renda apoiada (Decreto-Lei n.º 166/93, de 7 de maio) (BE), que baixa à

11.ª Comissão, e 321/XII (2.ª) — Altera a Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro (Aprova a revisão do Código do

Trabalho), de modo a corrigir o pressuposto de assistência a filhos menores com deficiência (Os Verdes), que

baixa à 10.ª Comissão.

Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, dou ainda conta de um relatório da Comissão para a Ética, a Cidadania e

a Comunicação, cujo parecer é o seguinte: «A substituição temporária requerida pelo Sr. Deputado Marcos

Perestrello (PS) deve ser autorizada ao abrigo do disposto no artigo 5.º, n.º 2, alínea b), do Estatuto dos

Deputados;

Página 4

I SÉRIE — NÚMERO 26

4

A vaga resultante da suspensão do mandato, determinada pelo disposto no artigo 4.º, n.º 1, alínea a), do

Estatuto dos Deputados, será preenchida por Inês de Drummond Ludovice Mendes Gomes, com efeitos desde

2 de dezembro de 2012, inclusive.»

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, está em apreciação o parecer.

Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, vamos votá-lo.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados o primeiro ponto da nossa ordem do dia consiste em declarações políticas.

Estão inscritos os seguintes Srs. Deputados: do PCP, o Sr. Deputado João Oliveira; do BE, a Sr.ª Deputada

Catarina Martins; de Os Verdes, a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia; do PSD, o Sr. Deputado Luís Menezes; do

PS, o Sr. Deputado António Braga; e do CDS-PP, o Sr. Deputado Raúl de Almeida.

Pelo PCP, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Ao fim de 10 meses e 1257 reuniões

envolvendo mais de 18 000 militantes, o PCP realizou no passado fim de semana o seu XIX Congresso.

Contrariando o pensamento único imposto pelos ideólogos do capitalismo, as teses do fim da História e

outros mitos, comprovámos neste Congresso a atualidade do ideal comunista.

Frustrando os desejos daqueles que, ao longo dos anos, têm tentado traçar-nos um destino diferente

daquele que continuamos a construir, confirmámos com este Congresso a vitalidade do Partido Comunista

Português e a sua importância neste conturbado momento da história.

Diziam que éramos um partido de gente velha e a definhar, mas cá estamos, com mais 5800 novos

militantes desde 2008, metade dos quais com menos de 40 anos.

Diziam que vivíamos agarrados ao passado e que teríamos que deixar de ser o que somos ou

desapareceríamos, mas hoje, mesmo que não queiram, muitos são obrigados a dar-nos razão quanto às

previsões que fizemos e ao caminho que continuamos a apontar.

Neste XIX Congresso, até um percalço audiovisual que lançou o aviso para inserir a cassete comprovou

que, afinal, não há cassete nenhuma.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Há, sim, um percurso de rigor na análise, coerência nas posições e muita

coragem e persistência na sua afirmação. Um percurso que leva já 91 anos de história que nos enche de

orgulho.

Aplausos do PCP.

Os comunistas fizeram o seu XIX Congresso virados para o povo e partindo da vida do povo, atentos à

situação internacional, com o que ela comporta de perigos e ameaças resultantes da profunda crise do

capitalismo que vivemos, mas também de olhos postos nas imensas potencialidades de transformação e

superação revolucionária do capitalismo que a luta dos povos, hoje, torna mais evidentes.

Caracterizando a grave situação nacional a partir das dificuldades sentidas diariamente pelo povo

português, identificando a política de direita que está na origem dessas dificuldades e não poupando, por tática

ou oportunismo, responsabilidades aos seus executores, identificámos tarefas imediatas e objetivos de fundo.

Afirmámos a necessidade de derrotar a política de direita, que tem a sua mais violenta expressão, desde o

25 de Abril, no pacto de agressão da troica, bem como a necessidade de derrotar o Governo de serviço que a

executa.

Página 5

6 DE DEZEMBRO DE 2012

5

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Clarificámos a política alternativa que propomos e o projeto que

apresentamos ao povo português no Programa «Uma Democracia Avançada — os valores de Abril no futuro

de Portugal», etapa intermédia da construção de uma sociedade socialista em Portugal.

Reafirmámos a possibilidade de construir essa política alternativa na base de uma ampla convergência de

todos aqueles que hoje são duramente atingidos pela política de direita.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — A todos os trabalhadores, às classes e camadas antimonopolistas, a todas

as forças políticas, patrióticas e de esquerda, a todos os democratas lançámos o apelo para que convirjam no

objetivo de derrotar esta política e este Governo e de construir uma alternativa.

A questão da política alternativa foi, aliás, objeto de particular atenção e discussão e merece referência

mais aprofundada.

Em síntese, a proposta de política alternativa que o PCP apresenta assenta em três considerações

fundamentais: primeiro, a necessidade de resgatar Portugal da teia de submissão e dependência; segundo, a

necessidade de recuperar para o País o que é do País, os seus recursos, os seus sectores e empresas

estratégicas, o seu direito ao crescimento económico e ao desenvolvimento e à criação de emprego;…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — … terceiro, devolver aos trabalhadores e ao povo os seus salários,

rendimentos e direitos sociais, tendo com objetivo uma vida digna.

Integrada no programa do PCP «Uma Democracia Avançada — os valores de Abril no futuro de Portugal»,

a política alternativa que propomos integra cinco objetivos em que, a par de um regime de liberdade, com um

Estado democrático, representativo e participado, de uma política de democratização cultural e uma pátria

independente e soberana, se perspetiva um desenvolvimento económico assente numa economia mista,

dinâmica e liberta do domínio dos monopólios e uma política social que garanta a melhoria das condições de

vida aos trabalhadores e ao povo.

Uma política patriótica e de esquerda que tem como eixos centrais a valorização do trabalho e dos

trabalhadores, a defesa dos sectores produtivos e da produção nacional, a afirmação da propriedade social e

do papel do Estado na economia, a democratização e promoção do acesso ao desporto, à cultura e à defesa

do património cultural e ambiental, a defesa do regime democrático de Abril e o cumprimento da Constituição

da República, a efetiva subordinação do poder económico ao poder político, a afirmação de um Portugal livre e

soberano e de uma Europa de paz e cooperação.

Antes de dizermos com e com quem, dizemos um Governo para quê e para quem.

Aplausos do PCP.

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Depois do XIX Congresso, o PCP estará certamente em melhores

condições de dar um decisivo contributo para derrotar esta política que rouba quem trabalha, empobrece a

grande maioria dos portugueses e afunda o País.

Dentro desta Assembleia da República, continuaremos a dar voz aos portugueses e a apresentar as

propostas que dão corpo à política alternativa que propomos.

Fora daqui continuaremos a assumir o nosso papel de partido revolucionário que organiza os trabalhadores

e dinamiza a luta de massas, conscientes de que é a luta dos trabalhadores e do povo que nos há de abrir os

horizontes do futuro.

Aplausos do PCP.

Página 6

I SÉRIE — NÚMERO 26

6

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputado, inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Pedro

Delgado Alves, Cecília Honório, Heloísa Apolónia e Emídio Guerreiro e o Sr. Deputado João Oliveira informou

que pretende responder a cada um dos Srs. Deputados.

Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Delgado Alves.

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado João Oliveira, começo por saudá-lo a si

e, em particular, ao Partido Comunista Português pela realização do seu Congresso, partido fundamental do

sistema político português, e, portanto, com muita atenção o Partido Socialista acompanhou os seus trabalhos.

Partilhamos o diagnóstico que o Partido Comunista fez e também a intervenção que acabou de ser feita

quanto ao estado do País e quanto ao rumo que leva. De facto, atravessamos um período de grande

dificuldade. A população portuguesa sofre os efeitos de uma espiral recessiva em grande medida autoinfligida

pelos erros da política económica do atual Governo. Mas se é certo que concordamos quanto ao diagnóstico,

quanto à urgência de tomarmos medidas que permitam inverter o rumo, é certo que também discordaremos de

muitas das opções e, obviamente, em relação a vários pontos, trilhamos um caminho diferente.

Mas há um aspeto em relação ao qual gostaria de colocar uma questão ao Sr. Deputado, aspeto este que

me parece estruturante para ultrapassarmos as dificuldades que enfrentamos. É precisamente um aspeto que

também referiu na sua intervenção e que diz respeito ao rumo europeu e à opção europeia que Portugal

abraçou. É que me parece que é nesse plano que, em grande medida, teremos de ter capacidade para

construir respostas, ser mais inventivos e ser capazes de dizer que é a recuperação do ideal de solidariedade

que esteve na base da adesão de Portugal à União Europeia, que esteve na base da opção por uma Europa

democrática, solidária, social, que importa, porque, no fundo, no passado, foi essa a opção. E, por pouca

capacidade de realização que esteja a ter no momento, por dificuldades de concretização que possa estar a

sofrer, é esse, verdadeiramente, o debate fundamental no qual, penso, todos temos de participar e ao qual o

Partido Socialista tem procurado dar resposta, mobilizando os agentes europeus que estão disponíveis para

este debate.

Quando o Governo falha em reconhecer que é na Europa que se encontra o caminho, quando o Governo

vira as costas às opções que se vão abrindo, na descoberta de novos caminhos, pela Europa, a pergunta que

deixo vai no sentido de saber se não é esse, verdadeiramente, o caminho que devemos abraçar em primeira

linha. É que sozinhos, voltando a uma lógica de «sozinhos» a resolver os nossos problemas, dificilmente

conseguiremos ultrapassar o fosso que nos afasta cada vez mais da coesão e do rumo de progresso que os

nossos parceiros europeus também esperam de nós.

Portanto, a pergunta que deixo é a de saber que visão tem, efetivamente, dessa Europa e se está,

verdadeiramente, disponível para vir ao encontro desse debate, refundador, em certa medida, do projeto

europeu, mas estruturante para o futuro do projeto europeu e, por isso, também para o futuro do País.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Pedro Delgado Alves, agradeço as questões

que colocou e quero dizer-lhe que, de facto, em relação a matéria de política europeia, temos uma

divergência, que não é uma divergência de pouca monta, é uma divergência de fundo em relação ao Partido

Socialista.

É que, da parte do PCP, fazemos uma opção clara e definimos um objetivo do qual não prescindimos, que

é o de garantir ao nosso País todas as condições de desenvolvimento, quer do ponto de vista económico, quer

do ponto de vista social, mas também do ponto de vista político e cultural. Não abdicamos da nossa

soberania,…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

Página 7

6 DE DEZEMBRO DE 2012

7

O Sr. João Oliveira (PCP): — … não abdicamos das condições que permitam o nosso desenvolvimento. E

a avaliação que fazemos da integração de Portugal na, então, CEE e, hoje, União Europeia é a de que ela foi

profundamente prejudicial para o nosso País, constituiu uma grave lesão dos interesses nacionais,…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — … em particular das possibilidades de desenvolvimento, sobretudo de

desenvolvimento económico. A integração de Portugal na Comunidade Económica Europeia — hoje, União

Europeia — significou a destruição do nosso aparelho produtivo, a criação de défices estruturais e uma

situação gravíssima de dependência externa do nosso País, pela qual estamos, hoje, a pagar uma fatura

muitíssimo significativa.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Aquilo que dizemos é que há um aspeto que se projeta para o futuro com

uma grande urgência, que é a necessidade de termos em Portugal um Governo que faça o confronto do

interesse nacional com as políticas europeias, porque, até hoje, em Portugal, nunca tivemos um Governo que

fosse capaz de confrontar a União Europeia com um caminho próprio de desenvolvimento e defesa do

desenvolvimento do nosso País.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Mas esse caminho precisa de ser feito. É preciso termos, em Portugal, um

Governo que faça esse confronto com a União Europeia e que diga que, se, em matéria de política agrícola

comum, em matéria de política de pescas, em matéria de política económica, há definições de políticas

europeias que colidam com o nosso interesse, que colidam com o desenvolvimento do País, temos de afirmar

a nossa soberania, a capacidade de sermos nós a escolher o caminho de desenvolvimento e de não

aceitarmos, resignadamente, o caminho que outros nos impõem.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — A verdade, Sr. Deputado, é que, hoje, quando olhamos para quem manda

na União Europeia, percebemos que esta União Europeia não é uma construção ao serviço dos povos, não é

uma construção ao serviço do desenvolvimento do nosso País. E por isso dizemos que esta União Europeia

não é reformável, porque esta União Europeia é uma construção política ao serviço dos interesses do capital.

Por isso, temos de afirmar, com muita clareza, o direito inalienável do povo português a decidir o seu

caminho, a decidir um caminho de desenvolvimento que sirva todos os portugueses e não o capital, que sirva

os interesses do desenvolvimento económico e do desenvolvimento social, da melhoria das condições de vida

do nosso País, da capacidade de não dependermos de outros, de não estarmos sucessivamente, como temos

estado nos últimos anos, dependentes das imposições que outros querem fazer ao nosso País.

A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Termino, Sr.ª Presidente.

Dessa opção, Sr. Deputado Pedro Delgado Alves, dessa opção pela defesa da nossa soberania o PCP não

abdica.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Honório.

Página 8

I SÉRIE — NÚMERO 26

8

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado João Oliveira, antes de mais, quero

cumprimentá-lo pela sua declaração política. O Bloco de Esquerda saudou e saúda o importante Congresso

do Partido Comunista Português, saúda os órgãos eleitos e acompanha o diagnóstico que aí foi feito e que o

Sr. Deputado confirmou aqui, na sua intervenção.

Este Governo é um Governo de serviço relativamente às políticas da troica — políticas de uma violência

desconhecida sobre o trabalho e os rendimentos do trabalho — e, por isso, Sr. Deputado, acompanhamo-lo

também na necessidade de construir uma alternativa e na responsabilidade dos partidos políticos à esquerda

pela construção dessa alternativa. Mas, evidentemente, a perspetiva não é a de os partidos políticos serem

donos dessa alternativa, porque a luta social, o movimento popular será capaz de a construir. Há, no entanto,

de facto, uma necessidade de apelar a todos os partidos políticos que se dizem, sentem ou sabem de

esquerda, para que ensaiem a responsabilidade de rasgar com o Memorando de Entendimento e com as

políticas violentas impostas pela troica. É sobre isso que gostaria de o ouvir, sobre essa responsabilidade

acrescida dia-a-dia relativamente a todos os partidos de esquerda, quanto à expectativa da luta social, do

movimento popular, que, como sabe, nos colocou nesta necessidade de trilhar um caminho conjunto para a

criação de um Governo de esquerda, investido no sentido da recuperação da dignidade deste País e deste

povo.

Confirmo, desde já, que o Bloco de Esquerda, com as diferenças que, evidentemente, nos assistem, pela

nossa história, está absolutamente empenhado nessa perspetiva de unidade de luta da esquerda pela criação

de uma alternativa política que responda à voz popular, que responda às exigências de um povo humilhado

pelas políticas deste Governo e pela submissão às políticas da troica.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra, Sr. Deputado João Oliveira.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Cecília Honório, agradeço também as

saudações que nos dirigiu.

De facto, as questões relacionadas com a política alternativa de que o País precisa foram matéria central

da discussão que tivemos oportunidade de realizar no nosso Congresso e o PCP regista, efetivamente, a

importância da discussão das soluções alternativas à política que, hoje, é executada por este Governo, mas

que, nos seus traços essenciais, corresponde à política que temos tido no País, nos últimos 36 anos.

Consideramos que, para definir com exatidão, rigor e correção aquela que é a política alternativa capaz de

arrancar o País da situação em que se encontra e apontar-lhe, de facto, um futuro de progresso e

desenvolvimento, não podemos ser condescendentes nem displicentes, digamos assim, na análise das causas

que estão na origem desta situação, no apontar de responsabilidades àqueles que foram os seus

executores…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — … e na definição da exata importância da discussão da política alternativa.

Foi por isso que, na declaração política, fizemos questão de afirmar uma expressão que temos utilizado,

porque julgamos ser muito adequada: antes de dizermos com quem se constrói o Governo, temos de dizer

para quê e para quem se governa. É na base desta discussão e, sobretudo, na identificação desta prioridade

de definição da política alternativa que temos feito um esforço, sobretudo, de caracterização e clarificação

daquilo que o PCP entende que devem ser as bases da construção de uma política alternativa.

É óbvio que, no quadro que hoje vivemos, sem a rejeição do pacto da troica e sem a derrota deste Governo

e da política de direita, não há possibilidade de construir soluções duradouras e de progresso e, sobretudo, de

construir alternativas políticas a este Governo. Não há possibilidade de construir alternativas políticas a este

Governo que sejam verdadeiras alternativas sem a assunção de um conjunto de objetivos imediatos, entre os

quais se inscreve, obviamente, a necessidade de rejeição do pacto de agressão da troica e da política de

direita.

Página 9

6 DE DEZEMBRO DE 2012

9

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Agora, é preciso ir mais longe e mais fundo na definição da política

alternativa que se propõe para o País e o PCP, de facto, fez esse esforço de clarificação e definição das bases

da política alternativa, que apresentámos, também aqui, nesta declaração política, mas que, certamente, já

hoje são sentidas, de forma muito evidente, por muitos milhares de portugueses que todos os dias nos seus

locais de trabalho, nos seus locais de residência, até já vão assumindo essa política alternativa e por ela vão

lutando.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa

Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado João Oliveira, em nome do Grupo

Parlamentar de «Os Verdes», quero saudar hoje, aqui, o Partido Comunista Português pela realização do seu

XIX Congresso, onde tive o privilégio de representar Os Verdes, numa delegação que lá esteve presente, e de

assistir, portanto, ao vivo, a uma parte daquilo que lá foi expresso.

Quero dizer-lhe, Sr. Deputado, que nos pareceu que nesse Congresso, tal como na declaração política que

agora proferiu, se fez uma análise extraordinariamente realista da situação que hoje se vive no País. E este é

um pressuposto fundamental para a intervenção política, pois significa ter os pés bem assentes na terra e

perceber exatamente o País real em que vivemos.

Há algumas notas que lhe quero deixar. E, porque ouvi, há pouco, atentamente o Sr. Deputado Pedro

Delgado Alves, gostava até, talvez, de prolongar um pouco mais a conversa que o Sr. Deputado aqui

introduziu para lhe perguntar o seguinte: por que carga de água, Sr. Deputado, é que nenhum Governo em

Portugal, fosse do PS ou do PSD, auscultou o povo português relativamente a este modelo de construção

europeia? Por que é que rejeitaram sempre os referendos propostos, sobre este caminho da Europa, para se

auscultarem os portugueses? Que medo terá estado na base dessa recusa, Sr. Deputado? Pergunto-lhe isto,

porque sei, inclusivamente, que o PCP apresentou propostas nesse sentido: que medo teriam estes

Governos?

É que, hoje, o povo português conhece aquilo para que alertámos há uns bons anos atrás. Esta era a

Europa de solidariedade que se estava a construir!… Era esta, a de hoje, perfeitamente visível para todos os

portugueses! Era a Europa que definhou a nossa atividade produtiva, ou seja, aquela Europa que nos manteve

e mantém, agora, na pobreza e diz «Não se conseguem levantar porque não conseguem gerar riqueza,

porque não têm capacidade produtiva»! A Europa ditada pela Alemanha!

Hoje, os portugueses têm consciência daquilo para que alertámos há uns anos atrás.

Passando para outra nota, o Sr. Deputado também tem razão numa coisa. É que qualquer política

sustentada no acordo da troica seria uma política falhada para Portugal, fosse ela mais esticada para aqui ou

mais esticada para acolá, sustentada naquelas diretrizes de governação, seria uma política completamente

falhada. E a atual, porque é sustentada nesse acordo da troica, é uma política falhada a todos os níveis: é

extraordinariamente recessiva, gera pobreza, gera desemprego, gera péssimas condições de vida para a

generalidade dos portugueses, para salvar uma pequena minoria, que é aquela que detém o dinheiro, o forte

dinheiro, e que não foi beliscada.

É toda esta injustiça que, na verdade, baliza as políticas governamentais que vão definhando este País, Sr.

Deputado.

O Sr. Primeiro-Ministro e o Sr. Ministro das Finanças, no início do seu mandato, diziam que 2012 era o ano

da viragem e o de 2013 já era o ano da alegria. Aquilo a que os portugueses estão, hoje, a assistir é que o ano

de 2012 foi péssimo e o de 2013 ainda vai ser pior.

Portanto, para onde caminhamos, Sr. Deputado? Este é ou não um Governo totalmente divorciado dos

portugueses?! Este é ou não um Governo que não tem qualquer base de apoio social?!

Página 10

I SÉRIE — NÚMERO 26

10

A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr.ª Deputada, uma vez que já usou quase o dobro do tempo de que

dispunha.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Termino mesmo, Sr.ª Presidente.

Este é ou não um Governo que urge cair, Sr. Deputado?

A Sr.ª Presidente: — Sr. Deputado João Oliveira, para responder, tem a palavra.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, obviamente, quero também

agradecer as referências que fez à realização do XIX Congresso do PCP e responder às suas questões,

começando pela indisponibilidade das várias maiorias, dos três partidos que têm passado pelo Governo, para

auscultar o povo português sobre a integração europeia.

Julgo que a resposta a essa matéria é óbvia. Aliás, da parte do PCP temo-la dado frequentemente. Não

correspondendo este processo de integração europeia aos interesses dos povos, em particular aos interesses

do povo português, é óbvio que os vários Governos evitaram consultá-lo não fosse o povo português traduzir

num referendo…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Ora bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — … essa desconformidade que existe entre o processo de integração

europeia e os interesses dos povos. Aliás, não fosse o povo português fazer aquilo que outros povos fizeram,

nomeadamente o irlandês e o francês, aquando dos referendos, que se pronunciaram contra algumas das

fases deste processo de integração europeia, os Governos portugueses limitaram-se a impor aos portugueses

um determinado caminho, que hoje se revela profundamente negativo e prejudicial, sobretudo na perspetiva

dos interesses dos trabalhadores e do povo português.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Continuamos a dizer que não prescindimos do direito inalienável do povo

português de definir o seu próprio caminho, nem da necessidade de participação na definição do processo de

integração e de manutenção, ou não, de Portugal na União Europeia. Consideramos que esse é um direito

inalienável e que ninguém o pode pôr em causa. E afirmamo-lo, uma vez mais.

Relativamente às questões que colocou a propósito do pacto de agressão da troica e das suas várias

capas ou das suas várias formas, é óbvio que, mesmo sob outra capa e sob outra forma, o pacto de agressão

da troica não deixa de ser aquilo que é. O pacto de agressão da troica é um programa que visa satisfazer os

interesses do capital à custa do povo português, à custa dos trabalhadores,…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — … impondo a exploração dos trabalhadores, impondo o desvio de recursos

do Orçamento do Estado para os cofres da banca e para os buracos criados pela especulação financeira.

Portanto, mesmo sob outra capa ou sob outra forma, o pacto de agressão não deixa de ser aquilo que é,

isto é, não deixa de ser um programa ao serviço do capital, contrário aos interesses do povo e dos

trabalhadores.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — E, para responder à última pergunta que colocou, obviamente que o

Governo que executa este pacto é, como foi dito no Congresso do PCP, um Governo que, embora tenha

legalidade para levar por diante as suas funções, não tem legitimidade. E não tem legitimidade, porque a

política que executa não foi a política com que se comprometeu em eleições. A política que este Governo está

a levar por diante não foi a política com que se comprometeu perante os portugueses, particularmente perante

Página 11

6 DE DEZEMBRO DE 2012

11

os portugueses que, tendo votado no PSD e no CDS, hoje, se manifestam profundamente indignados, porque

foram e estão a ser enganados. Por isso, também já hoje muitos portugueses engrossam as fileiras da luta

contra este Governo, contra o pacto de agressão da troica e contra a política de direita.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Emídio Guerreiro.

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado João Oliveira, gostaria de começar por

cumprimentar o Partido Comunista Português pela realização do seu Congresso e, em particular, felicitar e

cumprimentar o Sr. Deputado João Oliveira pela sua eleição para o Comité Central.

Gostaria de reafirmar que temos — o PSD e o PCP — visões diferentes de Portugal, da sociedade

portuguesa. No PSD, discordamos regularmente do tipo de linguagem que o PCP utiliza nestes debates, mas

sabemos conviver democraticamente e de uma forma saudável no espaço parlamentar, porque assim

contribuímos de forma decisiva para a consolidação da democracia portuguesa.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — O Sr. Deputado falou das grandes dificuldades e dos tempos difíceis

que o nosso País vive. E também já ouvimos aqui, de forma despudorada, o Partido Socialista fazer de conta

que não governou este Pais, ouvimos aqui, de forma despudorada, o Partido Socialista a não querer assumir

que fará amanhã um ano e meio que o povo português o tirou do poder.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Muito bem!

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Mas se o tirou do poder foi porque o Partido Socialista lá estava e os

últimos seis anos — para não falar de 13, dos últimos 17 anos — em que o Partido Socialista esteve a

governar Portugal tiveram implicações diretas no que se passa hoje, porque duplicar a dívida em seis anos

não é tarefa fácil. É tarefa fácil para um Governo irresponsável, como aquele que tivemos!

Sr. Deputado, gostaria de lhe lançar uma questão que, neste momento, me parece decisiva. Todos nós

sabemos que cerca de quatro quintos do dinheiro dos impostos dos portugueses, ou seja, cerca de 80% dos

impostos dos portugueses, são, e bem, aplicados na segurança social, nas pensões, nos apoios sociais, na

educação e na saúde, o que significa que os restantes 20% têm que custear a cultura, a economia, a

agricultura, a segurança, a polícia, as obras públicas e a dívida que nos deixaram.

Ora, o que é necessário saber — e lanço este desafio — é se o Partido Comunista está ou não disponível

para olhar para esta questão e participar no debate nacional que é necessário fazer sobre as funções do

Estado, de forma a podermos preservar um Estado social coerente e sustentável. Esta é a pergunta que

gostaria de lhe lançar, porque receio que o Partido Comunista queira fazer nesta matéria, que é essencial para

o futuro do País, o mesmo que fez com a troica, que foi faltar às reuniões, não aparecer nas mesmas, não

discutir, não debater.

Este desafio que lanço ao Partido Comunista é extensivo a todos os partidos e a toda a sociedade

portuguesa, porque, se não existir uma reflexão sem tabus, séria e transparente, nunca conseguiremos dar o

salto qualitativo de que este País precisa para ser sustentável.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Sr. Deputado João Oliveira, tem a palavra para responder.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Emídio Guerreiro, começo por agradecer as

referências que fez à realização do nosso Congresso.

Sr. Deputado, passo, agora, a responder às suas perguntas.

Página 12

I SÉRIE — NÚMERO 26

12

A intervenção do Grupo Parlamentar do PCP também procura, obviamente, na Assembleia da República,

dar corpo a uma intervenção mais vasta e que, do ponto de vista da intervenção social e política, assume

outros contornos fora da Assembleia da República, mas, sobretudo, na Assembleia da República, procuramos

dar voz àqueles que aqui a não têm: aos trabalhadores; aos desempregados; aos reformados; aos pequenos e

médios empresários; aos pequenos e médios agricultores; enfim, a todos aqueles que hoje são duramente

atingidos pela política de direita…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — … e de quem os senhores falavam em altura de eleições, mas de quem,

depois de ter passado esse período, se esqueceram, de repente.

O Sr. Deputado há de convir que, não ultrapassando limites que nos autoimpomos, obviamente por

questões de decoro, de honestidade e de respeito no debate político, não podemos poupar no que respeita ao

apontar responsabilidades e a caraterizar de forma exata aquilo que vai sendo feito,…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — … e em particular a caraterizar a política que o Governo vai executando.

Portanto, se o Sr. Deputado considera que alguma palavra mais dura é proferida por esta bancada na

caraterização da política, mude a política, porque as palavras não vão mudar!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Deputado Emídio Guerreiro, em relação às responsabilidades do anterior

Governo, nomeadamente do Partido Socialista, queria dizer-lhe o seguinte: os senhores apontam

frequentemente responsabilidades ao Partido Socialista por opções governativas anteriores, nomeadamente

dos Governos do PS de Sócrates. É verdade que o Partido Socialista tem essas responsabilidades, assumiu

essas opções e tem que assumir responsabilidades por aquilo que fez no Governo.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Mas, Sr. Deputado, também não é demais relembrar que, tal qual como o

senhor disse, não era fácil tomar aquelas decisões. E tanto não era fácil que o Partido Socialista até procurou

apoio nas bancadas da direita.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Ora bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Aliás, lamentamos muito que, no momento em que à esquerda houve uma

maior maioria nesta Assembleia da República, entre 2005 e 2009, o Partido Socialista, infelizmente, tenha

procurado todos os entendimentos à direita: no Pacto para a Justiça, na aprovação dos PEC, na aprovação do

Orçamento do Estado; no Código do Trabalho; na aprovação das privatizações; em todas as questões.

Quando havia uma maioria que poderia ser verdadeiramente uma maioria de esquerda, o Partido Socialista

transformou-a numa enorme maioria de direita, procurando as conivências à direita.

Por isso, hoje, Sr. Deputado Emídio Guerreiro, o seu partido e o CDS não podem deixar de ser

responsabilizados, porque, quando foi preciso aprovar Orçamentos do Estado, os senhores cá estiveram a

viabilizar os Orçamentos do Estado do Partidos Socialista.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Ora bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — E quando foi preciso aprovar os PEC?! Sr. Deputado, está lembrado dos

três PEC que o seu partido aprovou, que o atual Primeiro-Ministro aprovou, depois de se ter concertado com o

Primeiro-Ministro José Sócrates?!

Página 13

6 DE DEZEMBRO DE 2012

13

Portanto, Sr. Deputado Emídio Guerreiro, mesmo que não fossemos mais atrás para perceber as

responsabilidades que os partidos da direita (o PSD e o CDS) têm, só pelas conivências e pelos

entendimentos que assumiram com os Governos do Partido Socialista também os senhores são responsáveis

pela situação em que o País se encontra.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Para concluir, Sr. Deputado Emídio Guerreiro, queria dizer-lhe o seguinte:

quando quatro quintos do empréstimo usurário da troica foram, e estão a ir, direitinhos para os cofres da banca

e dos especuladores; quando os senhores mantêm milionários negócios privados à custa de dinheiro público,

como sucede com o financiamento das escolas privadas, e que neste fim-de-semana se tornou ainda mais

evidente; quando os senhores satisfazem esse tipo de interesses, não venham dizer que é cortando nas

funções sociais do Estado, as quais visam garantir os direitos dos cidadãos, que se resolvem os problemas do

Estado. O Sr. Deputado quer encontrar respostas para a crise? Procure-as na Constituição, porque elas estão

lá todas!

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Antes de dar a palavra ao próximo orador, quero cumprimentar o Sr. Deputado

Jerónimo de Sousa pela sua reeleição no Congresso e desejar-lhe, bem como ao PCP, as maiores felicidades

para participar no Parlamento e na democracia.

Tem a palavra, para uma declaração política, a Sr.ª Deputada Catarina Martins.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Soubemos hoje mesmo, no

Parlamento, que a RTP está sujeita a controlo político. Num memorando interno de 6 de novembro, a direção

de informação ficou sem autoridade e sujeita ao Conselho de Administração para decidir que notícias são

colocadas no ar. Ou seja, ficámos a saber que a direção de informação do serviço público de rádio e televisão

deixou de ser independente e que existe um clima persecutório contra quem não favorece a tutela política.

A gravidade extrema desta situação não pode ser ignorada, sob pena de aceitarmos e naturalizarmos toda

e qualquer limitação à democracia e à liberdade de imprensa.

Foi hoje denunciado, mais uma vez, que quem não agradar ao Ministro Relvas leva — e não vale a pena o

Governo esconder-se por detrás de eficientes capatazes. Em apenas um ano e meio, este Governo conseguiu

demitir um Conselho de Administração e nomear outro; conseguiu demitir uma direção de informação e

nomear outra; e conseguiu instalar um clima de medo no interior da RTP.

Quando o Governo se prepara, em moldes que um dia ainda nos há de explicar, para alienar o canal

público de rádio e televisão, caso único e sem igual em toda a Europa, percebemos bem tanta pressa em

alterar e reconfigurar a estrutura diretiva do canal público.

Percebemos bem tanta pressa em afastar todos quantos se opõem aos planos de Borges e de Relvas,

quando lemos as notícias desta semana que dão conta que o Governo se prepara para entregar metade da

RTP a capitais angolanos próximos de um regime que é acusado, em dezenas de relatórios internacionais, de

atacar seriamente a liberdade de imprensa.

Entregar a RTP a capitais privados não é só um disparate económico é também um sério entrave ao

pluralismo informativo e um retrocesso na diversidade de conteúdos.

Em toda a Europa, e até mesmo nos liberais Estados Unidos da América, os serviços públicos de rádio e

televisão são o garante de democracia e o primeiro instrumento das políticas públicas para a cultura.

Mais: num País em que quase metade da população se encontra espalhada pelos quatro cantos do mundo,

a RTP não é apenas um canal de rádio e televisão, é o principal instrumento da diplomacia portuguesa e a voz

de milhões de cidadãos que por uma razão ou por outra emigraram do País.

Sr.as

e Srs. Deputados do PSD e do CDS, nesta matéria não há declaração de voto que valha à maioria.

Onde está o CDS? Vai fazer como fez com o Orçamento do Estado: colocar notas no Facebook a pedir

desculpas a si próprio, enquanto deixa o País e a democracia nas mãos do autoritarismo?

Página 14

I SÉRIE — NÚMERO 26

14

Sr.as

e Srs. Deputados, assim é na RTP, assim é no cinema. O cinema português existe hoje única e

exclusivamente graças à boa vontade dos próprios realizadores, técnicos, produtores e atores.

Hoje mesmo, realizadores, produtores, técnicos e artistas de todos os quadrantes políticos, de todas as

gerações, de João Salaviza a Manoel de Oliveira, publicaram uma carta de censura clara à intrujice do

Governo.

Reconhecia o Governo, há um ano, que o esquema de financiamento do Instituto do Cinema e do

Audiovisual (ICA) não funcionava, mas não se comprometia a tratar do assunto. O setor mobilizou-se e exigiu

uma resposta. Acossado, o Governo decidiu então apresentar uma nova lei para o cinema, uma lei para ser

aplicada ainda em 2012.

Apresentou uma proposta de lei frágil, pouco atualizada, com claríssimos problemas de aplicação prática,

com um esquema de financiamento que não inspirava confiança e, apesar de todos os alertas da oposição,

avançou chantageando com a urgência de uma resposta. Resposta que não veio. Mais uma fraude.

Diz o Governo, para justificar o seu alheamento e desinteresse, que o cinema português é de grande

qualidade e não precisa do Estado para nada. Ao menos digam a verdade: simplesmente não têm nenhuma

política para o setor, não querem gastar um único cêntimo com a cultura.

Foram necessários muitos anos para o cinema português chegar onde chegou, acumulando prémios

internacionais e de excelência reconhecida e foi necessário apenas um ano e meio para este Governo colocar

todo o seu futuro em risco.

A Assembleia da República não pode assistir em silêncio à asfixia da cultura em Portugal.

O recém-empossado Secretário de Estado da Cultura tinha dois assuntos urgentes para tratar: resolver o

investimento através da Direção-Geral das Artes (DGArtes) e concluir o processo de regulamentação da lei do

cinema, já aprovada. Quanto aos concursos no âmbito da DGArtes, atrasou o processo ainda mais um mês

por vaidade política e aproveitou para aplicar novos cortes; quanto à lei do cinema, falhou também

redondamente.

Nestas condições, interessa saber para que é que o Sr. Primeiro-Ministro nomeou um novo Secretário de

Estado. Um Secretário de Estado para funções esvaziadas de sentido não é mais do que um biombo de sala.

O que o Governo fez para a política cultural, e muito especificamente para o cinema, foi uma antecipação

da refundação do Estado, aplicando à socapa, e sem qualquer debate público, o colapso de todas as funções

essenciais dos serviços públicos. Para quem tem dúvidas sobre o que é o Estado mínimo a que a maioria quer

condenar o País, aqui está ele: cortes de 100%.

O último que apague a luz! É esta a posição do Governo para a cultura e, de resto, para tudo o que mexe

no País.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Francisca Almeida,

do PSD, Bruno Dias, do PCP, Michael Seufert, do CDS-PP, e Manuel Seabra, do PS.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Francisca Almeida.

A Sr.ª Francisca Almeida (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Catarina Martins, percebemos que

tentou, à última hora, misturar com o cinema as últimas parangonas dos jornais relativas a um alegado

saneamento na RTP, porventura para dar eco a uma acusação feita na 12.ª Comissão, hoje de manhã, de

forma leviana.

Como sabe, o Grupo Parlamentar do PSD não só participou ativamente nessas audições como as

requereu. Perguntámos de forma absolutamente clara, quer ao Presidente da RTP quer ao jornalista Nuno

Santos, se houve por parte de alguém, dentro ou fora da RTP, da administração ou do Governo, alguma

manifestação de intenção, de vontade, no sentido de afastar algum jornalista ou de condicionar o que quer que

seja dentro da RTP. Do lado do Presidente do Conselho de Administração, foi-nos dito categoricamente que

não. Ao jornalista Nuno Santos perguntámos por factos, factos concretos que legitimem e fundamentem as

acusações que aqui fez. Nenhum facto foi apresentado, como, de resto, foi reconhecido pelo próprio.

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Muito bem!

Página 15

6 DE DEZEMBRO DE 2012

15

A Sr.ª Francisca Almeida (PSD): — Sr.ª Deputada, lamento que o Bloco de Esquerda venha a este

Plenário dar eco a essas acusações levianas.

Assim, pergunto-lhe também: Sr.ª Deputada, tem conhecimento de algum facto concreto dentro deste

processo que indicie, que justifique, que fundamente a acusação que aqui faz?

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — É o «diz que disse»!

A Sr.ª Francisca Almeida (PSD): — Não tem, Sr.ª Deputada! O que aqui veio fazer foi apenas dar eco a

acusações levianas, o que é a todos os títulos lamentável.

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Francisca Almeida (PSD): — Relativamente à matéria da cultura, que também aqui aflorou, até

percebo que venha colocar esta matéria e a questão do cinema em cima da mesa, porque a Sr.ª Deputada

faltou ao debate ocorrido no âmbito da discussão do Orçamento do Estado. Se lá tivesse estado, teria ouvido o

Sr. Secretário de Estado da Cultura relativamente a este assunto e teria participado. Percebemos por que é

que só vem ao debate agora, tarde e a más horas, mas, enfim, no que diz respeito a esta matéria, seja bem-

vinda a este debate, Sr.ª Deputada!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina Martins.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Francisca Almeida, agradeço as perguntas

que colocou.

Sr.ª Deputada, a lei da televisão, conforme saberá, espero, diz claramente que a direção de informação tem

de ter toda a independência do Conselho de Administração. Quando existe, na RTP, um memorando que

obriga a direção de informação a pedir autorização para alocar meios para fazer notícias sobre um tema ou

outro está a violar a lei e a independência da direção de informação. Isto não é um problema de interpretação,

é um problema de lei.

Sendo a Sr.ª Deputada jurista, confesso que hoje nos surpreendeu a todos. Eu não pude estar presente na

audição que teve lugar esta manhã, como sabe, mas estive a ouvi-la com cuidado e verifiquei que a Sr.ª

Deputada citou nessa reunião SMS privados que um jornal já tinha publicado. A publicação pelo jornal, a ser

verdade que se trata de SMS privados, claramente viola várias leis, e a Sr.ª Deputada, ao citá-lo, também

deve ter violado várias leis, que conhecerá melhor do que eu porque é jurista.

Portanto, o que eu pedia é que, nesta matéria, fosse possível entendermo-nos sobre o que falamos e que a

Sr.ª Deputada conhecesse as leis sobre as quais trabalha. Não tem qualquer sentido vir aqui fazer de conta

que a lei da televisão não garante a independência à direção de informação e que esta é uma intromissão na

lei da televisão; não tem qualquer sentido vir violar a privacidade citando SMS privados. Esta é que é uma

conversa que não tem qualquer sentido.

Sr.ª Deputada Francisca Almeida, em relação ao cinema e à cultura, o Bloco de Esquerda apresentou

muitas propostas aquando da apreciação do Orçamento do Estado, estivemos muito presentes. Do PSD é que

vimos zero — vimos zero nas propostas e vimos zero na ação. Ou melhor, não vimos zero, vimos 100% —

100% de corte, 100% de ação para destruir tudo o que é cultura em Portugal.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Catarina Martins, aquilo de que tomámos

conhecimento esta manhã, e como já tive ocasião de dizer, é mau de mais para ser verdade. Sabermos que,

Página 16

I SÉRIE — NÚMERO 26

16

por ordem do Conselho de Administração da RTP, é passível de processo disciplinar o envio de uma equipa

de reportagem num carro de exteriores — segundo a informação que nos foi dada na Comissão Parlamentar

— sem autorização pedida com 72 horas de antecedência é mau demais para ser verdade!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — O Governo, concretamente o Sr. Ministro Miguel Relvas, que tem a tutela e

que, pelo menos nos termos da lei, ainda tem a obrigação de garantir o regular funcionamento do serviço

público de televisão, tem de tomar medidas — mais do que dar respostas, tem de tomar medidas — para que

acabe este regime, que, pelos vistos, está em vigor há um mês na RTP, em que se apresentam sobre

formulários de aquisição de conteúdos ordens que podem ser dadas de procedimento disciplinar relativamente

ao desrespeito ou à desobediência da obrigatoriedade de pedido de autorização superior à administração da

RPT. Não faz sentido nenhum, é quase inacreditável que esteja a acontecer uma situação destas.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — É no quadro de uma perseguição de facto à própria liberdade e às condições

de trabalho dos jornalistas em Portugal que esta matéria se revela de uma ainda maior gravidade.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Não posso deixar de me referir à outra matéria que também abordou,

respeitante à Direção-Geral das Artes e à situação em que está o setor. Tal como já temos dito, vamos tentar

obter uma resposta a todas as questões que, no nosso entendimento, se traduzem numa autêntica censura

financeira à liberdade de criação artística, expressão que, aliás, foi trazida pelo meu camarada Joaquim Benite

na denúncia às políticas culturais deste Governo. O meu camarada encenador e homem do teatro, que não

podemos deixar de homenagear aqui de forma sentida.

Aplausos do PCP.

Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, solicitámos, na Comissão de Educação, Ciência e Cultura, a audição do

Sr. Secretário de Estado, porque exigimos que seja feito o esclarecimento cabal das circunstâncias em que

esta política está a ser desenvolvida pela DGArtes no quadro orçamental.

Quanto à lei do cinema, comprova-se o que tínhamos denunciado desde o início, ou seja, que a lei era uma

manobra para enganar de forma vergonhosa todo o setor, e em boa hora o PCP se demarcou dessa

estratégia.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — É ou não verdade, Sr.ª Deputada Catarina Martins, que a lei serviu para o

Governo não cumprir as suas obrigações em relação à abertura de concursos?

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina Martins para responder.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Bruno Dias, agradecendo a sua pergunta,

devo dizer que concordo em absoluto com o que disse: não podemos não ouvir o que está a acontecer na

RTP e fechar os olhos a isso.

Um conselho de administração ter o poder de autorizar ou não autorizar que haja meios para fazer uma

notícia, ou não a fazer, para colocar no ar uma notícia ou não a colocar, é uma interferência na direção de

Página 17

6 DE DEZEMBRO DE 2012

17

informação que não é aceitável, é uma limitação da liberdade de informação na RTP, é uma

instrumentalização, é uma governamentalização inaceitável do serviço público de rádio e televisão.

É para nós complicado acreditar que Miguel Relvas possa ser o garante do regular funcionamento da RTP,

porque não há coincidências, e a verdade é que sabemos que o plano do Ministro Miguel Relvas sempre foi

privatizar a RTP. Sabemos também que, quando esse plano foi anunciado por António Borges na televisão,

houve, na RTP, quem dissesse que esse plano não tinha sentido — disse-o o Conselho de Administração e

disse-o o Diretor de Informação. O Conselho de Administração foi demitido, o Diretor de Informação foi

demitido. A verdade é que não há coincidências, e as vozes que na RTP foram contra o plano de privatização

já estão fora da RTP. Não há coincidências!

Sobre a cultura e os cortes nesta área, sabemos que o Governo tem feito vários malabarismos para adiar

sucessivamente tudo aquilo que são políticas culturais. Ou seja, o Governo decidiu parar tudo, mas, em vez de

dizer «parar tudo», diz assim: «Vamos aqui arranjar uma coisa, depois outra e depois talvez uma outra. Não

vai acontecer nada, mas estamos sempre a dizer que vamos estar a fazer alguma coisa, a pensar alguma

coisa, a fazer uma regulamentação». Entretanto, está tudo parado e os cortes são a 100%.

Uma última nota. O Sr. Deputado fez aqui uma justa homenagem a Joaquim Benite, que todos perdemos

hoje. É sempre complicado falar, nestes dias, das perdas que são grandes para nós. Jorge Silva Melo dizia

hoje que a maior obra-prima de Joaquim Benite foi o público. Julgo que tantos e tantas de nós somos hoje

público de teatro por causa de Joaquim Benite.

Aplausos do BE e do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Michael Seufert.

O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Catarina Martins, sobre os faits divers

de um caso que os senhores quiseram politizar, quero apenas fazer uma nota muito breve.

A Sr.ª Deputada falou de medo, falou de ingerência. O que perguntamos muito claramente é se houve, ou

não, o exercício de mandato do Diretor de Informação feito com inteira liberdade; se houve alguma afirmação

de Nuno Santos que nos leve a crer que houve algum tipo de pressão política do Governo sobre a RTP; se

houve relato de algum responsável sobre ingerência ou tentativa de ingerência do Governo.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — A Sr.ª Deputada vem aqui com um guião pré-escrito, um guião que

não liga com a realidade. Nós percebemos essa necessidade, mas é pena que nem o Bloco de Esquerda —

porque também é disso que se fala aqui — nem o PCP tenham tido uma palavra para condenar uma hora e

meia de apedrejamentos da polícia nas escadarias deste Parlamento.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. António Filipe (PCP): — Essa agora!

O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Sr.ª Deputada, quanto à questão da cultura — esta, sim, finalmente,

ao fim de 3 ou 4 minutos de intervenção, política —, gostava, em primeiro lugar, de dar-lhe as boas-vindas de

regresso ao debate sobre o orçamento da cultura neste Parlamento.

Quando o Orçamento do Estado foi discutido na especialidade, o Bloco de Esquerda entendeu não se fazer

representar na audição do Sr. Secretário de Estado da Cultura, mas, se tivesse vindo ou se tivesse tido o

cuidado, ainda que não tivesse estado presente, de consultar as atas e de fazer o visionamento das imagens

dessa audição, teria aprendido uma coisa. O Sr. Secretário de Estado da Cultura tomou posse no dia em que

terminou o prazo de auscultação pública sobre a regulamentação da lei do cinema, pelo que entendeu

prolongar esse prazo para lhe dar tempo para se inteirar das necessidades do setor e para que todos, do

setor, pudessem contribuir para essa audição pública.

Página 18

I SÉRIE — NÚMERO 26

18

Disse-nos aqui o Sr. Secretário de Estado que um putativo atraso — que agora se verifica, é verdade —

nesta regulamentação não afetará a data da abertura dos concursos, porque é isso a importância final desta

regulamentação.

Protestos do BE.

Em relação ao passado, tem toda a razão. De facto, o setor do cinema deixou de receber os dinheiros a

que tinha direito pela lei, muito porque os 26 milhões de euros que estavam contratualizados pelo Partido

Socialista até 2017 não estavam cabimentados (mas este é um problema que este Governo tem de resolver).

O que gostaríamos de perceber é se o Bloco de Esquerda está interessado, ou não, em que os concursos

abram a tempo e horas, como aqui nos foi garantido. Aliás, na semana que vem o Sr. Secretário de Estado

virá à comissão para garantir isso e para garantir, sobretudo, que o fundo e o Instituto do Cinema e do

Audiovisual (ICA) funcionam de uma forma de transparente, que os concursos são transparentes, que o

dinheiro vai para onde tem de ir, que temos cadeias de valor de verdade e que não temos apenas um setor

que vive encostado ao Estado e a este financiamento.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina Martins.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Michael Seufert, quanto às perguntas que

me fez, vamos ver se nos entendemos: nós nunca deixámos de estar no debate da cultura. O Sr. Deputado

está um pouco irritado, porque estivemos na greve geral com as pessoas da cultura e com as pessoas de

todos os outros setores, tantos trabalhadores e trabalhadoras que mostraram o «cartão vermelho» ao

Governo.

Protestos do Deputado do CDS-PP Michael Seufert.

O incómodo é seu, a convicção é nossa!

O Sr. Deputado falou de várias coisas, mas disse muito pouco. Pergunto-lhe, então: acha normal que um

diretor de informação tenha de pedir ao conselho de administração autorização para fazer uma notícia,

autorização para ter meios para fazer uma notícia? O CDS apoia essa instrumentalização da RTP? Os

Deputados do CDS estão confortáveis com o facto de que quem está contra a privatização da RTP já não

estar lá? Nem o conselho de administração que disse que era contra, nem o diretor de informação que era

contra?

Os Srs. Deputados do CDS querem privatizar a RTP? Rasgaram tudo o que disseram no programa

eleitoral, tudo o que têm defendido e estão agora de acordo com a privatização da RTP?

Os Srs. Deputados têm de ser responsabilizados por aquilo que dizem à população, por aquilo que dizem

aos eleitores. A questão é esta: os Srs. Deputados estão agora a querer privatizar a RTP? Estão de acordo?

Vão apoiar o Ministro Miguel Relvas, vão apoiar António Borges? Onde é que está o CDS? Quer privatizar a

RTP?

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — É boa ou má? Diga lá, responda!

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Quanto à cultura, Sr. Deputado Michael Seufert, está de acordo que

esteja tudo parado? Parece-lhe normal a completa paragem de todos os serviços públicos do setor cultural?

Nós sabemos que, se calhar, a cultura não vos traz votos, mas enfim… É isso o que o CDS defende neste

momento? É que já houve alturas em que o CDS esteve do outro lado, já houve alturas em que o CDS quis o

apoio às artes, em que, para defender a língua, achou muito importante que existisse cinema e audiovisual

português. Mas parece que o CDS, agora, esqueceu tudo o que algum dia tenha dito!

Aplausos do BE.

Página 19

6 DE DEZEMBRO DE 2012

19

Protestos do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Seabra.

O Sr. Manuel Seabra (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Catarina Martins, permita-me que a saúde

pela intervenção que fez e pelo facto de ter feito, mais ou menos, «dois em um»: juntou a RTP e o cinema e

evidenciou dois traços que marcam distintamente a atividade do Governo. Por um lado, o percurso errático do

Governo — na RTP, é mais do que conhecido — e, por outro lado, a absoluta ausência de estratégia, quer na

RTP quer no que diz respeito ao apoio às políticas culturais, designadamente o apoio ao cinema.

Comecemos pelo princípio: comecemos pela ordem de serviço, a tal lei das 72 horas, que, se não fosse só

por si absolutamente ridícula, nos levaria ao ponto de percebermos que os conteúdos informativos da RTP têm

de ser autorizados pelo conselho de administração da mesma televisão 72 horas antes, como se, por exemplo,

uma manifestação ou, até — como esta manhã foi dito —, um tornado tivessem de dar 72 horas de aviso

prévio para que a RTP pudesse dar-lhes cobertura noticiosa. Mas esta é só mais uma das muitas trapalhadas

a que temos vindo a assistir na RTP.

Há uns meses atrás, vimos o jornalista Pedro Rosa Mendes, a quem foi aplicada, por delito de opinião,

após ter delatado uma farra em Angola, uma pena de banimento. Vimos, depois, uma perseguição

ignominiosa a uma jornalista do Público, porque havia quem não se conformasse com o teor de algumas

notícias que sobre si eram publicadas. E, agora, assistimos ao caso do jornalista Nuno Santos, que, segundo o

próprio nos disse hoje de manhã, foi politicamente saneado no decurso de um processo, na conclusão de um

processo em que o próprio nem sequer foi ouvido!

Chegámos a um ponto em que se fazem processos de averiguações, em que se fazem inquéritos que

visam, afinal, a condenação mediática de um determinado indivíduo, ao qual não é, sequer, atribuído o direito

de ser ouvido, de ser auscultado e de se pronunciar sobre os factos que sobre ele impendem.

Esta ausência de estratégia na RTP é transversal e é visível, por exemplo, na injustificada manutenção, até

hoje, de um diretor-geral de conteúdos cuja presença na estrutura da RTP, para além de não ter cabimento

orgânico, é absolutamente inexplicada também do ponto de vista político.

A Sr.ª Deputada Catarina Martins, ao referir-se quer à ausência de política para o cinema e para a cultura

quer ao percurso errático, indefinido, sem estratégia e sem objetivo que está a ser mantido no serviço público

de televisão, identificou dois problemas que carecem de solução imediata. E, embora não estejamos

absolutamente sintonizados na forma de os resolver, acabamos por ter alguma sintonia na forma de os

identificar. Felicito-a por isso.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina Martins.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Manuel Seabra, agradeço as questões que

me colocou.

Julgo que é extraordinariamente importante que haja uma grande força de toda a oposição em relação à

questão da RTP e, mais do que isso, também em relação à questão da liberdade de imprensa em Portugal.

Estamos a viver tempos muito difíceis, em que está em risco a própria democracia, porque sem um serviço

público forte e sem uma liberdade de imprensa assegurada de uma maneira eficaz, transparente, clara,

sabemos que é a democracia que está em causa. É, por isso, muito importante a convergência de todos

aqueles que, no Parlamento e fora dele, defendem que a RTP é essencial como serviço público e é essencial

na defesa da liberdade de imprensa e na defesa do pluralismo.

Portanto, é bom perceber que há pontos em que somos capazes de caminhar juntos, e esse caminho tem

de ser feito: temos de defender a RTP sem qualquer tipo de hesitações! Até porque o discurso da maioria e do

Governo sobre a RTP pode facilmente enganar quem esteja mais distraído. A instrumentalização da RTP pelo

Governo pode levar alguém a dizer «então, mais vale que não seja pública», quando sabemos que é

Página 20

I SÉRIE — NÚMERO 26

20

exatamente o contrário, que é de uma televisão pública forte, com garante de independência de que estamos

a falar.

A estratégia do Governo de debilitar todos os órgãos de comunicação social debilita a democracia, por isso

é preciso tanta força na resposta a esta estratégia do Governo.

Quando falamos da rádio e da televisão portuguesa e de cultura, não esqueço que o Sr. Primeiro-Ministro

disse, mais do que uma vez, que um dos absurdos era a RTP ter mais orçamento do que o Secretário de

Estado da Cultura, esquecendo o Sr. Primeiro-Ministro que, na Europa, todos os serviços públicos de rádio e

de televisão são o primeiro instrumento das políticas públicas para a cultura e, portanto, sim, precisam de um

orçamento que permita a sua atuação enquanto instrumento público para a cultura — não só para a cultura,

mas também para a cultura.

Quando o Governo retira todo o investimento à cultura e quando «mata» a RTP, o que está a fazer é a

«matar» a voz de todo um País, seja a voz política, plural, diversa de que precisamos, seja a voz em todos os

setores, em que nos criamos, em que nos pensamos e em que podemos ser exigentes.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Para uma declaração política, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, de Os

Verdes.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Está a decorrer, em

Doha, a 18.ª Conferência das Partes, outra Conferência da ONU sobre as alterações climáticas.

As negociações iniciaram-se no dia 26 de Novembro, os trabalhos decorrem agora com membros e

representantes de governos, desde ontem, até ao próximo dia 7 de dezembro. Reparem que não dizemos

Chefes de Estado e de Governo, como dizíamos há umas Conferências das Partes atrás, porque certos dos

falhanços das sucessivas tentativas de negociação mundial sobre o clima e na plena convicção de que, em

Doha, as conclusões serão praticamente insignificantes, grande parte dos Chefes de Estado e de Governo

deixaram de se envolver nestas cimeiras.

O Protocolo de Quioto, com todos os defeitos que tem, é o único protocolo vinculativo até hoje conseguido

para combater o fenómeno das alterações climáticas. O período de cumprimento de Quioto decorreu de 2008

até 2012. Termina daqui a uns dias, em 31 de dezembro de 2012.

Estipulava este acordo que, neste período, as emissões de gases com efeito de estufa teriam de ser

reduzidas em 5,2%, ao nível global, com valores de referência de 1990. Estamos a curtos dias de finalização

desse prazo e a meta atingida foi outra: de 1990 a 2011, as emissões aumentaram 30%; desde 2000, as

emissões aumentaram 20%; e o ano de 2011 foi recordista no lançamento de gases com efeito de estufa para

a atmosfera.

Estes dados são bem elucidativos no que respeita à nulidade de qualquer ação global eficaz para travar a

velocidade das mudanças climáticas no planeta.

Nada que não se esperasse, quando os Estados Unidos, o maior poluidor do mundo per capita, nunca

ratificou o Protocolo de Quioto e fez sempre questão, apesar de algumas promessas e expetativas criadas

pelo meio de toda esta história, de não integrar qualquer plano global ou meta de redução de emissões. Os

Estados Unidos têm aqui uma responsabilidade determinante e, na sequência da posição que têm assumido,

uma irresponsabilidade vergonhosa que arrasta depois outros afastamentos desta luta global, designadamente

a entrada da China ou da Índia para acordos de vinculação para redução de emissão de gases com efeito de

estufa.

Desta vez, em Doha, nada foi diferente: a dois dias do final da Cimeira da ONU, os Estados Unidos não

apresentaram qualquer proposta de compromissos sérios para redução de emissões e arrastaram a

desvinculação de outros países como o Canadá, o Japão, a Rússia, a Nova Zelândia, entre outros.

Os falhanços de negociações globais para o período pós-Quioto foram de tal ordem que corremos o risco,

já entrados no mês de dezembro de 2012, de entrar num período de vazio no que respeita a ações concretas

sobre o clima, ou de prolongar o Protocolo de Quioto com uma ínfima parte de países envolvidos e, portanto,

sem resultados eficazes.

Página 21

6 DE DEZEMBRO DE 2012

21

Em cada Conferência das Partes se determinava que a próxima é que resolveria tudo. Estamos na última

Conferência das Partes do período de Quioto e sabe-se que nada ficou nem ficará resolvido, a não ser o que

já se sabia em Durban, ou seja, que tudo foi «chutado» para o futuro, futuro esse onde se tentará um acordo

para estar pronto em 2015 e para entrar em vigor em 2020. E de 2012 até 2020, o que acontece? E depois de

2020, o que vai ser acordado? O certo é que, até 2020, era preciso que, das 50 000 milhões de toneladas de

gases com efeito de estufa lançados anualmente para a atmosfera, se conseguisse, pelo menos, a redução

para 44 000 milhões e que, que uma década depois, se conseguisse reduzir para 35 000 milhões.

A verdade é que se perspetiva hoje que podemos chegar a 2020 com emissões mais intensas, de 52 000

milhões de toneladas anuais.

Esta irresponsabilidade determina que tudo depois será mais difícil de atenuar e que será sempre mais

caro, a cada ano que passa, mitigar e promover adaptações sobre o que está aceleradamente em curso, no

que respeita ao aquecimento global.

Sabendo-se tudo o que hoje se sabe sobre as consequências do aquecimento do planeta, sendo já tantas

populações e Estados deste mundo vítimas diretas do fenómeno das alterações climáticas, é legítimo

perguntar a razão de ser desta declaração de guerra ao mundo. Por que razão para os mercados financeiros

se esbanjam horrores de dinheiro, por que razão se gastam tantos biliões em programas bélicos e por que

razão se poupa tanto no que tem repercussões tão diretas sobre as economias, sobre a sustentabilidade,

sobre as populações ou sobre o ambiente?

Sr.as

e Srs. Deputados, o tempo é cada vez mais escasso para atingir resultados frutuosos. As

consequências da mudança climática são já hoje amplamente sentidas, os extremos climáticos cada vez são

mais regulares, como o mundo assistiu, por exemplo, com o furacão Sandy, que causou dezenas de mortes,

ou com o tufão Bopha, agora, nas Filipinas, que já causou mais de 230 mortes e mais de 120 000 desalojados;

os tornados mais expostos, que até em Portugal experimentámos há pouco tempo no Algarve; as cheias

devastadoras como as que ocorreram em Inglaterra; as secas intensas como as da África subsariana; a

proliferação de doenças como a malária ou a dengue em lugares onde estavam atenuadas ou de há muito

ausentes.

Chegar-se-á a um ponto onde este clima grosseiro e impiedoso quebrará a produção de alimentos,

gerando mais fome no planeta. Não são profecias, Sr.as

e Srs. Deputados! São conquistas de conhecimento

científico, hoje demonstradas já por sinais demasiado claros.

O mundo ameaça ser invadido por um aumento de 4º C de temperatura média, no decurso deste século. A

luta, hoje, é para que essa temperatura média não aumente mais do que 2º C. Mas, por este andar, com estes

Chefes de Estado e de Governo, com esta obsessão pelos ditames do mundo financeiro, com esta

incompetência no que respeita à tomada de medidas que promovam um mundo melhor e mais sustentável,

corremos o risco de o planeta ditar a sua própria resposta. A todos nós, aqueles que acreditamos que a

humanidade não pode desistir, compete-nos continuar a exigir, a propor e a pressionar para o sucesso dessa

humanidade e do nosso planeta. Esse é obviamente um compromisso de Os Verdes.

A Sr.ª Presidente: — Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados António Leitão

Amaro, do PSD, e Paulo Sá, do PCP, aos quais a Sr.ª Deputada responderá em conjunto.

Tem a palavra o Sr. Deputado António Leitão Amaro.

O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, deixe-me

agradecer-lhe ter trazido este tema, importante, fundamental e crucial para o futuro da humanidade, a esta

Assembleia, neste momento.

O PSD acredita, por um lado, que as alterações climáticas são um flagelo global extremamente

preocupante que põe em causa o futuro da humanidade, e, por outro, que o rumo que a humanidade leva tem

causas humanas. Por isso, se tem causas humanas, ações humanas têm de ser tomadas para que essas

causas sejam invertidas.

Assim, juntamo-nos à sua preocupação, porque todo o mundo sofre e Portugal — está identificado — é um

dos países na Europa que mais sofre com as consequências das alterações climáticas. E juntamo-nos

também ao seu apelo: é fundamental que os governos do mundo façam mais, é necessário que os governos

Página 22

I SÉRIE — NÚMERO 26

22

do mundo façam muito mais do que têm feito, que se juntem ao exemplo europeu e, permita-me que lhe diga

também, que se juntem ao exemplo português.

Isto não é um mérito do Governo A ou do Governo B, é um mérito do País. É um mérito também de

Governos do Partido Socialista, do PSD e do CDS, dos últimos anos, que levou a que, ontem, no dia anterior à

Sr.ª Deputada trazer este tema a debate, se tenha ficado a saber que Portugal é o terceiro melhor País no

combate às alterações climáticas. De facto, entre 58 dos maiores contribuidores para as alterações climáticas

e as emissões, Portugal é o terceiro melhor País, fruto de políticas adotadas ao longo de vários anos.

Portanto, Sr.ª Deputada, a minha pergunta é esta: devemos, ou não, continuar neste caminho?

É verdade — e não o escondemos — que a crise tem contribuído para esta situação e para a diminuição

das nossas emissões. É evidente. Mas também o têm as políticas públicas, promovidas pelos vários governos

dos vários partidos. Entre essas políticas estão a aposta nas energias renováveis e um sistema de tratamento

de resíduos que elimina as lixeiras, melhora a reciclagem e a redução de resíduos. Mas também estão outras

medidas que ainda não estão tomadas, mas que este Governo está a concretizar. Por exemplo, com a

aprovação recente, por este Governo, do Roteiro Nacional de Baixo Carbono, somos um dos primeiros países

da Europa a fazê-lo, e com a aprovação do Plano Nacional para o Uso Eficiente da Água, apostamos na

política de eficiência nos recursos.

Estamos ou não no bom caminho? Estamos. Portugal é ou não um exemplo para o mundo nesta matéria?

É.

Por isso, olhando ao nosso exemplo, ao percurso que os portugueses têm feito, querem continuar a fazer e

este Governo está a fazer, a minha pergunta é esta: deve ou não o mundo seguir mais e melhor o exemplo de

Portugal?

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Sá.

O Sr. Paulo Sá (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, antes de mais, quero saudá-la

por trazer aqui a questão das alterações climáticas. Este é um tema de grande importância e relativamente ao

qual não podemos alhear-nos.

Está a decorrer, como referiu, a 18.ª Conferência da ONU sobre alterações climáticas, em Doha, no Qatar,

mas as expectativas de avanços significativos na redução das emissões de gases com efeito de estufa são

extremamente baixas.

Esta Conferência, assim como as que a antecederam, está a falhar na definição dos meios para alcançar

as metas de redução das emissões de gases com efeito de estufa e, mais importante, está a falhar na análise

das razões do insucesso em atingir estas metas.

Conferência após conferência, muitos governos, e também o Governo português, insistem na aplicação de

mecanismos de mercado para solucionar os problemas do aquecimento global. Ou seja, pretendem salvar o

ambiente usando exatamente aqueles mecanismos — os mecanismos de mercado — que têm levado à

degradação do ambiente e ao agravamento dos problemas ambientais.

Com esta abordagem, em vez de reduzirem a emissão de gases com efeito de estufa, apenas criam um

mecanismo multimilionário gerador de ativos financeiros fictícios, algo que se ajusta perfeitamente aos

interesses dos mercados financeiros especulativos, mas que não serve, de modo algum, o interesse dos

povos.

O caminho que deve ser seguido no combate aos problemas ambientais — em particular, ao problema das

alterações climáticas — é, em nosso entender, outro. Passa pela rejeição dos instrumentos de mercado,

defendendo, em alternativa, uma política de limitação da emissão de gases com efeito de estufa, baseada na

justa distribuição dos esforços por setores e por países; passa ainda pela defesa da produção local, reduzindo

a amplitude dos ciclos de produção e de consumo; passa pela inversão da política de liberalização do

comércio mundial, como forma de reduzir o consumo energético e a emissão de gases com efeito de estufa; e

passa pela proteção dos ecossistemas naturais e pela recuperação daqueles que se encontram degradados,

dado o papel que desempenham no ciclo de carbono.

Página 23

6 DE DEZEMBRO DE 2012

23

São estas reflexões que lhe deixo, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, pedindo-lhe o seu comentário sobre as

causas do insucesso de sucessivas conferências da ONU sobre alterações climáticas.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, dirijo-me, em primeiro lugar, ao Sr. Deputado

António Leitão Amaro, agradecendo as considerações que fez e as questões que colocou, mas dizendo-lhe o

seguinte: de facto, existem estudos concretos que incidem sobre as consequências diretas das alterações

climáticas em Portugal, e o futuro não é risonho para nós. É que somos um País muito ligado ao mar (e o

aumento dos níveis do mar tem sobre nós reflexos intensos, ainda por cima um País que tem mais de dois

terços da sua população e da sua atividade concentrada no litoral, pelo que isto tem consequências diretas),

um País que sofrerá cada vez mais de fenómenos climáticos extremos e, por outro lado, também com riscos

de desertificação extraordinariamente elevados, designadamente no sul e no interior do País, o que é algo que

tem reflexos económicos, sociais e ambientais gravíssimos, que têm de nos alertar de uma forma ou de outra.

Sr. Deputado, Portugal não estava exatamente em terceiro lugar, mas em sexto lugar. É que o Sr.

Deputado diz que, se os três primeiros lugares não foram atribuídos, na prática, Portugal é terceiro, pelo que

estamos muitíssimo bem. Mas o Sr. Deputado, depois, não foi capaz de esconder a razão pela qual estamos

com estes níveis: é por causa da crise. E à sua pergunta sobre se Portugal deve ou não ser exemplo para o

mundo, nesta matéria, respondo que não. E não porquê? Porque estes níveis decorrem da desindustrialização

deste País, da falta de atividade produtiva deste País…

O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — Nem a Quercus diz isso!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — … e de muitos outros fenómenos, Sr. Deputado, que estão

associados à crise e não a um comportamento direto do Governo, através da aplicação de medidas internas,

que gerem, de facto, aquela eficiência de que necessitávamos. Aliás, não foi por acaso que o Sr. Deputado

não fez qualquer referência à questão dos transportes públicos. Não podia! É o setor onde as emissões de

gases com efeito de estufa, designadamente o dióxido de carbono, mais galopa. Mas os Governos não

incentivam as pessoas à utilização do transporte público. O Sr. Deputado diz: «Mas pessoas não andam de

transporte público». E porquê, Sr. Deputado? Porque estão desempregadas, em casa, Sr. Deputado. Não

andam de transportes públicos porque não podem, Sr. Deputado!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — É verdade, é!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Portanto, não há uma política direcionada para o combate às

alterações climáticas, designadamente também no setor dos transportes.

Por exemplo, quanto à eficiência e poupança energética, o Plano Nacional de Barragens (e não vou agora

pronunciar-me sobre o seu conteúdo) foi construído no pressuposto de que o consumo energético ia galopar,

em Portugal — é que este é o nosso pressuposto de desenvolvimento.

Nós temos tanto desperdício! No transporte de energia, nos serviços… Em tudo! Nós não combatemos a

ineficiência energética. E é algo que temos de fazer, para que Portugal consiga níveis no combate às

alterações climáticas que não tenham como pressuposto uma crise, um drama. Não, isso não é resposta, nem

exemplo para ninguém no mundo!

Sr. Deputado Paulo Sá, concordo muito com aquilo que o Sr. Deputado disse, designadamente em relação

aos mecanismos de mercado. Ou seja, fingir que se reduz para «rodar» poluição pelo mundo não é solução

para ninguém. E esse é justamente um dos mecanismos que consideramos que deveria ser corrigido ao nível

do Protocolo de Quioto.

Depois, o Sr. Deputado coloca a seguinte questão: por que é que têm tido insucesso as sucessivas

conferências da ONU e as Conferências das Partes a propósito das alterações climáticas? Sr. Deputado,

justamente porque não há vontade política para assumir esta matéria como uma das prioridades a nível

Página 24

I SÉRIE — NÚMERO 26

24

nacional; porque se gosta muito mais de gastar em material bélico, a fazer guerras e a matar gente também de

outra forma; porque se gosta mais de esbanjar dinheiro para os mercados financeiros; e porque as pessoas

contam tão pouco neste mundo, Sr. Deputado. É que a humanidade é tão fragilizada pelo poder político, pelo

poder financeiro e pelo grande poder económico que isto se torna perfeitamente insustentável.

Portanto, como isto não é prioridade política, obviamente que as conferências da ONU nunca tiveram

resultado. E sabe, Sr. Deputado, digo-lhe, com tristeza: duvido que venham a ter a curto prazo.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Para uma declaração política, tem a palavra, pelo PSD, o Sr. Deputado Luís

Menezes.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Celebraram-se, ontem, 4 de

dezembro, 32 anos sobre o desaparecimento de um dos grandes estadistas que Portugal teve. Francisco Sá

Carneiro, foi um homem corajoso, congregador e reformista. E é essa vertente reformista que gostaria de

trazer para este debate.

A Aliança Democrática (AD), liderada por Sá Carneiro, apresentou-se a eleições, em 1979, com um

Programa de Governo que propunha um conjunto de reformas para um País a viver uma enorme crise

económica e social.

Muitas das suas propostas, à data, ousadas e corajosas, só conseguiram ver a luz do dia anos mais tarde.

A título de exemplo: propunha a criação de uma lei de defesa da concorrência, que viria a aparecer, em 1983,

num Governo de Mário Soares; propunha a criação de um imposto sobre as pessoas físicas, que permitisse

atenuar as desigualdades, que desembocaria no Código do IRS, apresentado num Governo de Cavaco Silva,

em 1987; propunha a devolução ao setor privado ou cooperativo da generalidade das empresas editoras,

processo esse que culminaria, em 1993, com a alienação do Diário de Notícias e outras publicações públicas;

propunha também, em 1979, a organização dos transportes públicos de Lisboa e do Porto, fazendo a

integração do seu planeamento e a integração dos transportes em entidades únicas.

Esta última proposta será concretizada durante o ano de 2013, com a fusão da Carris com a Metro de

Lisboa e dos STCP com a Metro do Porto, por este Governo. Mas, associada a esta fusão, este Governo foi

muito mais além.

Aquilo que este Governo herdou, em 2011, foi um setor dos transportes insustentável, com uma dívida de

17 000 milhões de euros, com prejuízos de quase 1000 milhões de euros anuais e com quadros de pessoal

sobredimensionados.

Os dados obtidos até ao 3.º trimestre de 2012 são elucidativos e impressionantes das mudanças obtidas no

setor: uma redução de 133 milhões de euros nos custos operacionais; uma melhoria da margem de 178

milhões de euros; a obtenção, pela primeira vez, nestas empresas de um resultado operacional positivo em

termos agregados; e, ainda, uma redução de efetivos de quase 2200 pessoas, até junho de 2012, ou seja,

quase menos 15% dos trabalhadores, sem ter havido conflitos sociais, em acordo com os trabalhadores.

Podemos dizer que assistimos a uma verdadeira revolução tranquila num dos setores mais vitais da nossa

economia, quer pela sua relevância para o dia-a-dia dos cidadãos quer pela sua dimensão.

Aplausos do PSD.

Muitos diziam que seria impossível, inatingível, que seria o caos. São os mesmos que, em 1979, diziam

que o programa da AD era reacionário e ultraliberal. São os mesmos que não aderiram à proposta deste

Governo de cortar 250 milhões de euros por mútuo acordo com as concessionárias das PPP, preferindo,

antes, enveredar por um caminho ilegal e com o propósito de cortar apenas 120 milhões de euros. São os

mesmos que, tendo assinado um Memorando de Entendimento que previa a agregação de freguesias, agora

se recusam a discutir o tema. São os mesmos que, tendo assinado um Memorando de Entendimento que

previa a redefinição do mapa judiciário, hoje juram nada ter a ver com esse mesmo mapa.

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Hoje, como em 1979, há quem esteja do lado do progresso e das

reformas, há quem, como o PCP e o Bloco de Esquerda, se queira acantonar numa posição ideologicamente

Página 25

6 DE DEZEMBRO DE 2012

25

fechada, agarrada a pressupostos civilizacionais do século XIX, mas que respeitamos, e há quem, como o PS,

se queira acantonar num tacticismo político sem explicação, sem coerência, sem ideologia, mas também sem

convicção.

A nossa posição é clara: estamos do lado do progresso, estamos do lado das reformas.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Vivemos tempos de grandes incertezas e de muitas dificuldades para as famílias e para as empresas.

Aprovámos um Orçamento duríssimo, mas um Orçamento fundamental para reganharmos a nossa

soberania financeira. Mas reganhar a nossa soberania financeira não basta. O Estado tem de mudar! O

Estado não pode continuar a gastar mais do que aquilo que obtém de impostos dos portugueses. Temos a

obrigação moral e histórica de mostrar um caminho diferente para sairmos deste labirinto financeiro em que

muitos países da Europa também estão perdidos.

Muitos hão de dizer que os Estados não devem dar lucro. Concordo. Mas também não devem dar prejuízo.

O Estado tem de ser sustentável, sob pena de se tornar num monstro sorvedor dos recursos dos cidadãos. O

Estado deve oferecer um conjunto de serviços à população de forma eficiente, mas, enquanto agentes

políticos, temos a obrigação de questionar a cada momento esses serviços.

Não pode nem deve haver, por isso, temas tabus nessa discussão, seja sobre o SNS, seja sobre a

educação pública, seja sobre a justiça, ou seja sobre que tema for. Temos todos, mas todos, de ter a

capacidade de, não pondo tudo em causa, discutir a causa de tudo!

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Foi isso que os homens e mulheres de Portugal fizeram no pós-25 de Abril,

com coragem, sem tibiezas, com a convicção de que o progresso nasce da mudança e não da inércia.

Sr. ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Debater a reforma do Estado mais do que debater o Estado em si

é fazer um debate sobre o nosso futuro enquanto sociedade e enquanto Nação.

Com isso em mente, gostaria de terminar como comecei, invocando a memória de um exemplo de um

estadista que não se conformou com o status quo e que teve a coragem de liderar a mudança enquanto lhe

pediram.

Sá Carneiro disse: «Saber estar e romper a tempo, correr os riscos da adesão e da renúncia, pôr a

sinceridade das posições acima dos interesses pessoais — isto é a política que vale a pena». E nunca como

hoje esta frase foi tão atual.

Temos de romper com o passado que nos trouxe até aqui. Temos de aderir com determinação aos novos

paradigmas de um mundo em mudança constante e ter a coragem de liderar essa mudança constante. Temos

de renunciar ao politicamente correto e aos caminhos da popularidade fácil. Temos de discutir com

sinceridade, com verdade, pondo de lado a tática politica que, no momento que vivemos, não acrescenta

nada.

É este o desafio para o qual estamos convocados — isto é a política que vale a pena.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados José Junqueiro, do

PS, e Hélder Amaral, do CDS-PP, tendo o Sr. Deputado Luís Menezes informado a Mesa que pretende

responder em conjunto.

Tem a palavra o Sr. Deputado José Junqueiro.

O Sr. José Junqueiro (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Luís Menezes, a questão que apresenta é da

maior importância porque a reforma do Estado é algo que se faz em permanência e que nunca deve deixar de

estar no centro do debate público. E, sim, nós queremos fazer esse debate, o qual, aliás, não começou agora,

porque a reforma do Estado tem vindo a ser realizada ao longo dos últimos anos.

Página 26

I SÉRIE — NÚMERO 26

26

Vozes do PS: — Exatamente!

O Sr. José Junqueiro (PS): — Fazer a reforma do Estado implica, também, sinceridade da parte dos

partidos políticos. Há uns anos, tivemos um encontro para tentar fazer uma nova lei eleitoral para as

autarquias locais, ou fazer um pacto para a justiça, e a verdade é que não conseguimos fazer nem essa nova

lei eleitoral — no passado como agora — nem esse pacto para a justiça, porque a pessoa que liderava o seu

partido à época, como o Sr. Deputado estará lembrado, disse: «Não. Nós não fazemos nenhum pacto nem

para a justiça nem para nenhum outro setor».

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — 90% foi realizado! Está esquecido!

O Sr. José Junqueiro (PS): — Há uma outra questão com a qual nada temos a ver. O Sr. Deputado

lembrar-se-á bem que a reforma do Estado foi reduzida a um anúncio de um corte de 4000 milhões de euros

— foi assim que se falou em «refundação» e, a seguir, em reforma do Estado. E essa é matéria que não diz

respeito ao PS, é matéria a que o Parlamento está alheio,…

O Sr. Carlos Zorrinho (PS): — Exatamente!

O Sr. José Junqueiro (PS): — … porque essa é matéria clandestina, objeto de acordo entre o Governo e a

troica, em setembro. E também as outras são matérias clandestinas, que resultam de seis atualizações do

Memorando e de um documento de estratégia orçamental clandestino, apresentado em Bruxelas mas não

neste Parlamento.

O Sr. Carlos Zorrinho (PS): — Muito bem!

O Sr. José Junqueiro (PS): — Em conclusão, a questão é a seguinte: se o Sr. Deputado quer debater a

reforma do Estado, nós estamos cá para o fazer; se o Sr. Deputado quer arranjar uma fonte de financiamento

para tapar os buracos do Governo, de um prejuízo de 61 milhões de euros por dia, não, Sr. Deputado, nós não

estamos cá! Não há revisão da Constituição, não há cortes no Estado social.

Para isso os senhores não contarão connosco!

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Hélder Amaral.

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Luís Menezes, queria felicitá-lo pela

intervenção que fez e queria não só fazer minhas as suas palavras em relação ao elogio justo que fez à

memória de Sá Carneiro como juntar à memória de Sá Carneiro a memória de um homem que, para nós, é

sempre uma fonte de inspiração, Adelino Amaro da Costa. Os dois serviram de farol e, como o Sr. Deputado

bem disse, indicaram-nos caminhos que, ainda hoje, temos dificuldade em trilhar e alguns têm dificuldade em

perceber.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Sr. Deputado, o que ressalvo da intervenção de V. Ex.ª é algo que tem tendência a passar despercebido.

Recordo-me da discussão do Plano Estratégico de Transportes e de todos os nomes que a oposição

chamou ao Plano. Tivemos a humidade de reconhecer que fazíamos um plano para uma legislatura, não um

plano com seis anos de discussão, com livros brancos e livros de todas as cores, e que nunca viu a luz do dia.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

Página 27

6 DE DEZEMBRO DE 2012

27

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Fizemos uma coisa sensata, porventura menos ambiciosa. Mas qual é

a consequência? A consequência é que está a ser feita, no plano das empresas públicas de transportes, uma

verdadeira restruturação, sem pôr em causa o serviço público e com a verdadeira noção do que é o serviço

público, fazendo-o com justiça e com equilíbrio, sem beliscar quem dele precisa e sem pôr em causa as contas

públicas.

Vozes do CDS-PP e do PSD: — Muito bem!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Houve até um ex-ministro que dizia que era quase impossível

conseguir o equilíbrio operacional, que fazia uma estátua a quem o conseguisse. Hoje, corre o risco de ter de

contribuir para a estátua de quem vai conseguir esse equilíbrio operacional nas empresas públicas de

transportes, repito, sem pôr em causa a essência do serviço público.

Pergunto, também, se é ou não relevante que, num setor em que era fundamental respeitar o direito dos

trabalhadores, ainda assim, tenham sido conseguidos os necessários equilíbrios em termos de quadro de

pessoal. Foi isso que foi feito. Aliás, o Sr. Deputado indicou aqui o número: houve 1200 pessoas que,

livremente, de acordo, em concertação e negociação, aceitaram sair das empresas públicas de transportes.

Não há notícia de qualquer afronta, de falta de respeito pelos direitos dos trabalhadores e de falta de consenso

nesta matéria.

Este é, também, um aspeto que gostava de precisar.

Por outro lado, o Sr. Deputado também falou do que chamo «a avaliação das funções do Estado». Penso

que estamos todos a dizer a mesma coisa, que todas as bancadas concordam que devemos ter um Estado

mais eficiente, mais eficaz, que sirva os contribuintes com a mesma qualidade com que qualquer empresa

serve os seus clientes, isto é, com qualidade, rapidez, eficiência e, obviamente, se possível, sendo

economicamente sustentável.

Esta é uma discussão séria, por isso pergunto ao Sr. Deputado se conseguiu perceber algo que eu não

percebi: não sei se o Partido Socialista quer fazer esse debate,…

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Quer, mas não quer!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — … se depende dos dias, se depende da formulação, ou se, sempre que

nos aproximamos dele, o Partido Socialista foge, o que torna quase impossível discutirmos seriamente este

debate. Portanto, qual é a perceção que tem? É que, da intervenção do Sr. Deputado José Junqueiro, fica a

ideia de que quer discutir, até já começou a fazer o debate, mas quando queremos contribuir para o debate,

eis que o Partido Socialista desaparece no nevoeiro e na penumbra!

Portanto, a minha pergunta é se vamos ter, ou não, oportunidade de fazer uma discussão séria, útil e —

diria até — urgente para o País.

Aplausos do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente. — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Menezes.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados José Junqueiro e Hélder Amaral, muito

obrigado pelas questões que colocaram.

Começava pelo fim, respondendo ao Sr. Deputado Hélder o seguinte: quando me pergunta o que penso da

postura do Partido Socialista relativamente à questão da reforma do Estado, a única coisa que me vem à

mente, assim de repente, é um ditado galego da Rosalía de Castro, que, quando lhe perguntam se concorda

com uma coisa, ela responde «si, pero no»!

Risos do PSD.

Ou seja, uns dias o PS diz que «sim», outros dias que «não»…

Claramente, nestas declarações do Partido Socialista são relevantes dois aspetos.

Página 28

I SÉRIE — NÚMERO 26

28

Por um lado, o renegar completo do passado. O Sr. Deputado José Junqueiro falou de clandestinidade,

mas a postura do Sr. Deputado António José Seguro é que foi de clandestinidade, uma vez que esteve calado

durante os seis anos de governação do Eng.º José Sócrates.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Foi clandestinidade total, da última fila da bancada do PS!

Para além de renegar os últimos seis anos de governação da responsabilidade do PS, a novidade desta

semana foi o facto de o Sr. Deputado António José Seguro, Secretário-Geral do Partido Socialista, renegar o

mea culpa que o ex-Secretário-Geral do Partido Socialista, e então primeiro-ministro, António Guterres fez, ao

assumir também responsabilidade na situação do País. Foi sincero, foi humilde. E considero inacreditável o

renegar do passado do Deputado António José Seguro, enquanto ministro do Eng.º António Guterres!?

Digo-lhe o seguinte: quem renega desta forma o seu passado, nunca há de ter a responsabilidade de

assumir as rédeas do futuro deste País.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Por isso, tenho a dizer é que é com tristeza que vejo Partido Socialista, numa altura difícil, numa altura de

decisões impopulares, ter uma atitude que, do meu ponto de vista, é irresponsável. Mas, mais do que isso,

vejo o Partido Socialista a acobardar-se numa altura tão importante para o País como esta.

Protestos do PS.

Quando perguntamos ao Partido Socialista se está ou não de acordo com a reforma do Estado, a resposta

não é nem sim nem não. E não falo do debate do corte dos 4000 milhões de euros, porque esse cabe ao

Governo fazê-lo e apresentá-lo. Há, contudo, um debate que esta Câmara deve fazer: o debate sobre qual o

papel do Estado, o que devemos, ou não, oferecer aos nossos cidadãos, que eficiência devemos querer

implementar, que Estado queremos — é um Estado mínimo? É um Estado máximo? É um Estado equilibrado?

E a esse debate o Partido Socialista decide responder com a palavra do costume: «nim».

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Nem sim, nem não!

Protestos do PS.

Algum dia hão de ter de se decidir, porque os portugueses já estão cansados dessa tibieza, dessa falta de

coragem. Após seis anos de governação socialista, que o Deputado António José Seguro não gosta de

assumir, após seis anos de governação do Eng.º António Guterres, que ainda esta semana o Deputado

António José Seguro veio renegar, o que se exigia ao Partido Socialista era a responsabilidade de um partido

que, de 1983 a 1995, teve de governar um País intervencionado e teve a coragem de ser reformista.

É desse Partido Socialista que o País precisa!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. José Junqueiro (PS): — Sr.ª Presidente, peço a palavra.

A Sr.ª Presidente: — Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. José Junqueiro (PS): — Sr.ª Presidente, é um pedido de defesa da honra da bancada,…

Vozes do PSD: — Oh!…

Página 29

6 DE DEZEMBRO DE 2012

29

O Sr. José Junqueiro (PS): — … na justa medida em que foi colocada em causa a atitude do Secretário-

Geral do Partido Socialista e, também, a atitude democrática, livre e corajosa do Partido Socialista em toda a

sua história. E isso é algo que não podemos tolerar, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Junqueiro (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Luís Menezes, o Partido Socialista tem um

passado de que se orgulha — orgulha-se de todo o passado. Nós não renegamos o passado e a única coisa

que sei é que os senhores renegam o presente. E são incapazes de perceber, pela cegueira política, que

estão a conduzir o País a um abismo.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Isto é defesa da honra?!

O Sr. António Braga (PS): — Sim, é defesa da honra!

O Sr. José Junqueiro (PS): — Ter a coragem de reconhecer o erro é um ato de grandeza, não é nenhum

ato de contraditório ou que possa colocar mal a sua bancada.

O líder do Partido Socialista nunca renegou a luta política: foi cabeça de lista em Braga durante anos

sucessivos, esteve aqui e fez intervenções nesta Assembleia.

Vozes do PSD: — Lá atrás! Na última fila da bancada!

O Sr. José Junqueiro (PS): — O que os senhores estão a sentir, neste momento, é um grande incómodo

em relação ao Secretário-Geral do Partido Socialista, por um motivo muito simples: porque é, atualmente, o

líder partidário mais popular em Portugal e porque o PS lidera todas as sondagens de opinião!

Protestos do PSD.

Percebo esse vosso nervosismo, mas pergunto, Sr. Deputado Luís Menezes, se é necessário insultar o

líder do Partido Socialista ou insultar a memória do Partido Socialista.

Finalmente, queria dar-lhe duas respostas muito claras: reforma do Estado? Sim! Corte do Estado social?

Não! E quando o senhor diz que o Partido Socialista se acobarda, respondo-lhe: não. O partido Socialista é

claro: reforma do Estado, sim! Traição ao Estado social, não!

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Para dar explicações, querendo, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Menezes.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Sr.ª Presidente, o que o Sr. Deputado José Junqueiro fez não foi uma

defesa da honra, foi um pedido de desculpa do Partido Socialista…

Risos do PS.

… por nos ter trazido ao estado em que nos encontramos.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Gosto de ser claro no que digo: eu disse, e repito, que o Partido Socialista se acobarda perante as

decisões difíceis que temos de tomar. Mas, em momento nenhum, insultei ou fiz algum comentário

depreciativo, fora de contexto ao Secretário-Geral do Partido Socialista.

Página 30

I SÉRIE — NÚMERO 26

30

Protestos do Deputado do PS José Junqueiro.

O que disse, e repito, é que esteve clandestino, durante seis anos, na última fila dessa bancada.

Vozes do PSD: — É verdade!

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Mas posso alterar a palavra: em vez de dizer que esteve clandestino, posso

dizer que foi cúmplice, foi cúmplice do maior ataque ao Estado social que foi feito deste o 25 de Abril,…

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

… com o desvario das PPP, as estradas onde não passam carros, a Parque Escolar e a «festa» da Parque

Escolar sem controlo!

Sr. Deputado José Junqueiro, o passado já lá vai e os senhores já foram castigados — mas, de vez em

quando, convém lembrarmo-nos do que se passou. Hoje, a minha preocupação é com o futuro, e o futuro é

discutir o Estado sem tabus: não é o Estado social, é o Estado.

Por exemplo, na Defesa, gastamos mais 2%, em média, do que é gasto na União Europeia; na

Administração Interna, gastamos, em média, mais 1%, do que é gasto na União Europeia; em Saúde, estamos

iguais, mas há outras áreas onde não estamos.

Discutir o Estado não é discutir o Estado social e o que os senhores querem é assustar os portugueses

com uma conversa mole que não interessa a ninguém. Que alternativas os senhores apresentam? Zero! O

que é que os senhores trazem para este debate? Tacticismo político, revanchismo político. Propostas

concretas? Zero!

O Secretário-Geral do Partido Socialista — tenho-o dito muitas vezes — chegou a líder do Partido

Socialista sem apresentar qualquer proposta, mas não vai chegar a Primeiro-Ministro sem apresentar qualquer

proposta do País!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado António Braga.

O Sr. António Braga (PS): — Sr.ª Presidente, o pequeno debate que acabámos de ter aqui, em que o PSD

se apresenta como uma espécie de arauto das reformas, veio dar-nos mais razão nas questões essenciais

que temos colocado no Parlamento, fundamentalmente as que têm a ver quer com a natureza do Estado, em

geral, quer, sobretudo e principalmente, com a natureza do Parlamento.

Sr. Deputado Luís Menezes, a discussão política parlamentar é feita no Parlamento e, à luz da

Constituição, tem regras que devemos respeitar, porque só com essas regras é que a democracia sai

enriquecida.

Aplausos do PS.

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Os recentes dados do Eurostat reportados a 2011 dão-nos conta

dos indicadores referenciados no apuramento da população que se considera em risco de pobreza e dos que

vivem abaixo desse limiar.

A leitura destes números deve ser realizada com inquietação. Os indicadores são impressivos e dão nota

do grau de sofrimento que atinge milhares de famílias: são mais de 2,6 milhões portugueses em exclusão

social extrema ou em risco de pobreza. E todos sabemos que, ao longo do último ano, o aumento exponencial

de desempregados, nomeadamente casais e jovens qualificados, todos os meses revê em alta estas

estatísticas.

As medidas de austeridade previstas no Orçamento do Estado para 2013 provocarão novo agravamento da

pobreza. E quando a austeridade se reduz a este nível, ao sofrimento, transforma-se em punição, que é,

infelizmente, o que está a acontecer em Portugal.

Página 31

6 DE DEZEMBRO DE 2012

31

Aplausos do PS.

A deterioração das condições económicas nacionais está dramaticamente espelhada nos dados mais

recentes vindos a público das diversas instâncias oficiais. Por exemplo, agravaram-se todos os indicadores

orçamentais — a receita fiscal, depois de o objetivo ter sido revisto em baixa, ficará muito aquém do previsto.

Na melhor das hipóteses, admitindo que, como diz a Direção-Geral do Orçamento, «o crescimento

homólogo mensal da receita fiscal registado em outubro se mantenha nos meses de novembro e dezembro,

no final do ano poder-se-á verificar uma insuficiência de cerca de 0,4% do PIB». E, Srs. Deputados, mesmo se

for considerado o recurso à concessão da ANA, que ainda não foi aprovada pela Europa, recorde-se, tudo

indica que o défice ultrapassará os 5%, bem além dos 4,5% previstos pelo imprevisível Governo.

Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, com o País em ruínas, em pré-colapso económico e social, o Governo

continua sem responder aos problemas que se agravam cada dia.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. António Braga (PS): — A União Europeia é a principal instância onde as decisões relativas à crise

do euro podem contribuir para a defesa da moeda única e dos países em assistência financeira, tal como o PS

tem sublinhado sempre.

Na recente reunião dos países do Eurogrupo, o Governo saiu, como diz o povo, «com uma mão à frente e

outra atrás!»

O Primeiro-Ministro e o Ministro das Finanças passaram a semana anterior a dizer aos portugueses que

esse seria um momento importante para colocar na agenda os problemas que interessam ao País e para

poderem ser consideradas — e cito — «as condições atraentes» oferecidas à Grécia, no âmbito do programa

de assistência financeira. Referiam-se, principalmente, à extensão dos prazos dos empréstimos, às taxas de

juro respetivas, às moratórias na liquidação dos juros e à modificação substantiva, sempre reivindicada pelo

PS e rejeitada pelo Governo.

Percebeu-se, desde o início, que estas posições tão esfuziantes surgiram na sequência das declarações do

Presidente do Eurogrupo, que garantia, antes da reunião, que «as mesmas regras terão de ser aplicadas aos

outros países sob assistência», em clara referência ao que havia sido negociado com a Grécia, como podendo

ser estendido aos restantes países nas mesmas circunstâncias.

Com a oposição da Alemanha e da França, a porta por onde o Governo português julgava poder entrar

fechou-se.

A União Europeia, que procura jogar um papel de relevo na ordem mundial, seja no domínio da paz, da

finança internacional, na ajuda ao terceiro mundo e na defesa do ambiente, não possui ou tarda em criar os

instrumentos internos para atingir esses objetivos e, muito menos, para regular a própria moeda na relação

com outras moedas.

Portugal é vítima dessa ausência e é vorazmente atingido por essa imunodeficiência política na defesa do

euro. Sessenta anos depois da declaração de Robert Schumann para fundar uma Europa unida, sob a égide

de um projeto político comum, é claro, para nós, que o caminho seguido não vai na boa direção.

Vozes do PS: — É verdade!

O Sr. António Braga (PS): — As últimas decisões do Eurogrupo, ao renegarem a realidade que se vive

nos países sob assistência e manterem a pressão financeira sobre Portugal e Irlanda, como que esperando

que cheguem ao estado da Grécia, para então agirem, dá nota de preocupações bem distantes da

solidariedade urgente que salve o euro e toda a economia da União Monetária.

Aplausos do PS.

Página 32

I SÉRIE — NÚMERO 26

32

O Governo português, em vez de se bater pelas suas posições, fugiu ao confronto num momento em que

se exigia coragem e abnegação patriótica, batendo em retirada, desdizendo-se na praça pública, numa atitude

a que Cesário Verde chamaria de «troca-tintas».

Aplausos do PS.

Que o Governo possa perder batalhas no seio da União Europeia, pode compreender-se, dado tudo o que

está em jogo naquela mesa.

Vergonha não é perder, vergonha é recusar ir ao combate em nome de Portugal e dos seus interesses!

O Sr. José Junqueiro (PS): — Muito bem!

O Sr. António Braga (PS): — Assim, não é aceitável que venha de lá a bater com a mão no peito,

arvorando o tal ar de bom aluno para tutor ver e, depois, fazer de conta que tudo o que antes defendeu e disse

aos portugueses não passou de um mal-entendido e que nunca havia dito, aliás, nada de semelhante.

Se havia dúvidas de que este era um Governo de braços caídos, incapaz de defender os interesses do

País, este episódio dissipou-as. É no que dá quando não existe alma na defesa de posições em que se diz

acreditar relativamente aos interesses de Portugal: acabam por ser entradas de leão e saídas de sendeiro.

Afinal de contas, também é verdade, a ideia nunca partiu do Governo, apenas tentou aproveitar a boleia de

declarações públicas de Juncker, ao que parece feitas num canto escuro e por isso inválidas.

Risos do PS.

Só assim se explica que, numa semana, era melhor para o País baixar os juros dos empréstimos, alargar

os prazos e acertar uma moratória e, na semana seguinte, tudo não passou de uma «excessiva simplificação

de assuntos complexos».

Ninguém lhes perguntará, ao Primeiro-Ministro ou ao Ministro das Finanças, qual das palavras que eles

disseram eles não compreenderam, porque, simplesmente, foram eles que as disseram. Mas talvez já estejam

nessa fase, ou seja, a de não saberem bem o que dizem ou de já não se compreenderem — é o tal problema

de comunicação a que o Primeiro-Ministro se refere.

E é nestas ocasiões que, em regra, aparece um outro ministro sombra, António Borges, a dizer à RTP:

«Portugal tem das cargas fiscais mais baixas de Europa! Já temos a economia equilibrada! Já não há

necessidade de sucessivos apertos de cintos como aqueles que tiveram lugar sobretudo no final do ano

passado e no princípio deste ano. Agora, o que é preciso é relançar o crescimento económico!». Ora, aí está

outra vez outro social-democrata a simplificar.

Aplausos do PS.

Sr.ª Presidente, a terminar, quero dizer que não será preciso aos perguntar aos portugueses o que pensam

sobre isto, porque todos perceberam, ao arrepio do Governo, que já não é a primeira vez que o País sai a

perder, e muito. Percebeu-se, mesmo no seio do euro, que este é um Governo sem qualquer estratégia para o

ajustamento, que conduz de forma errática, sem guião, esperando por um qualquer determinismo interno ou

externo para resolver os problemas que cria e acumula. Já não é apenas querer parecer bom aluno, é mesmo,

simplificando, uma questão de subserviência em relação aos familiares políticos europeus.

Lisonjeado por eles, que agem, esses legitimamente, em nome dos interesses de outros países, o Governo

desistiu de conduzir a sua própria política e renega os termos do seu próprio mandato.

Aplausos do PS.

Entretanto, assumiu a presidência a Vice-Presidente Teresa Caeiro.

Página 33

6 DE DEZEMBRO DE 2012

33

A Sr.ª Presidente: — Sr. Deputado, inscreveram-se quatro Srs. Deputados para pedirem esclarecimentos:

a Sr.ª Deputada Mónica Ferro, do PSD, e os Srs. Deputado Pedro Filipe Soares, do BE, João Pinho Almeida,

do CDS-PP, e Honório Novo, do PCP.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Mónica Ferro.

A Sr.ª Mónica Ferro (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado António Braga, acabamos de assistir a um

exercício de citações avulsas, de evocações de memórias, na minha opinião de uma leitura um pouco

enviesada da História.

O Sr. Deputado citou tanta gente que me espanta que não tenha citado o Eng.º António Guterres, do seu

partido, que ainda esta semana fez umas declarações muito interessantes acerca do legado que deixou ao

nosso País. Espanta-me também que, citando tantas estatísticas, não tenha tido uma certa seriedade, até lhe

chamaria académica, de imputar as responsabilidades a quem de direito. Fica bem, fica-nos bem no debate

público.

E já que referiu estas últimas decisões do Eurogrupo e esta eventual falta de coordenação no Governo ou

entre os parceiros e dentro dos partidos políticos sobre de que medidas deveríamos beneficiar, digo-lhe que o

Sr. Deputado fez uma leitura demasiado simplista do que se está a passar.

Na realidade, do que se trata é de uma série de condições que foram negociadas com a Grécia e que

podem, ou não, ser aplicadas a Portugal. A garantia está dada e, como deve lembrar-se, é de julho do ano

passado. Foi reivindicada pelo Primeiro-Ministro português e foi a de que para circunstâncias semelhantes

devem aplicar-se condições semelhantes, e sempre as melhores condições.

Portanto, Sr. Deputado, nós temos a garantia, desde Julho do ano passado e reiterada este ano pelo

Presidente do Eurogrupo, de que as melhores condições que se aplicarem à Grécia serão as melhores

condições aplicadas a Portugal. Mas como nos faz uma leitura sempre muito setorial do que se está a passar,

fica outra questão, que é a seguinte: convém dizer às pessoas que o dinheiro que Portugal recebeu das

entidades financiadoras não vem todo da União Europeia, só uma parte, e a essa parte, sim, poderão aplicar-

se outras condições

Tenho visto cálculos demasiadamente simplistas, esses, sim, invocando ganhos que não consigo

matematicamente explicar, invocando vantagens que não consigo compreender. Sei que é muito simpático

fazer uma leitura na qual nós somos os autores de tudo o que é bom, enjeitando a responsabilidade por tudo o

que é mau. Por parte do PSD, nunca ouvirá nem o renegar de um legado que temos, nem o renegar das

responsabilidades de todas as medidas que estamos a adotar.

Pode também ter a certeza de uma coisa: fazemo-lo por um Portugal melhor, fazemo-lo para que se possa

evitar aquela situação em que os senhores nos obrigaram a estar.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Srs. Deputados, o Sr. Deputado António Braga optou por responder

a grupos de duas questões, pelo que, de seguida, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares, do BE.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado António Braga, sabemos, ouvimos e não

nos enganamos sobre as palavras que nos são ditas nesta Assembleia.

Há oito dias atrás, estava aqui a ter lugar o debate do Orçamento que, se calhar, mais vai destruir quer a

economia, quer o rendimento das famílias, o Orçamento que, nas palavras que o Sr. Ministro das Finanças

utilizou, é «um enorme aumento de impostos». E no final do dia do debate desse Orçamento do «enorme

aumento de impostos» caía a notícia de que podiam mudar as condições daquela que é a maior fatia da nossa

despesa pública, que é a dívida que nós neste momento temos. A notícia era a de que poderíamos ter

melhores condições decorrentes daquelas que foram as condições aplicadas à Grécia.

Instado pela pressão que se criou no País, o próprio Ministro das Finanças disse aqui, para todos nós

ouvirmos, que, seguindo o princípio da igualdade, as mesmas condições que fossem aplicadas à Grécia

seriam aplicadas a Portugal.

Pelos vistos, a palavra do Ministro dura poucos dias, porque, sete dias depois, vai a Bruxelas e dá o dito

por não dito, faz um mortal à retaguarda e revê em baixa, numa versão franco/alemã, aquilo que tinha dito

Página 34

I SÉRIE — NÚMERO 26

34

diante de todos nós. Não há dúvidas em relação às palavras do Ministro: «A melhoria das condições do

empréstimo internacional à Grécia seria a melhoria das condições do empréstimo internacional a Portugal» —

palavras de Vítor Gaspar, Ministro de Estado e das Finanças.

Por isso, é incompreensível como é que esta «cambalhota» do Ministro das Finanças em Bruxelas termina

depois no insulto ao País! Afinal, as palavras do Ministro não eram aquilo que ele queria dizer — o País e os

jornalistas é que perceberam mal as suas palavras.

Não há qualquer dignidade, não há qualquer transparência, não há qualquer apego à verdade de um

Ministro que diz que, afinal, quem se enganou não foi ele, foi o País, que não ouviu aquilo que ele podia dizer

quando escutou aquilo que ele quis dizer na altura.

Sobre isto não há duas palavras e não pode haver, por parte de qualquer uma das bancadas desta

Assembleia, qualquer tibieza na resposta ao Ministro. Num debate essencial, como é o debate do Orçamento

do Estado para 2013, exige-se do Governo a palavra da frontalidade perante os portugueses. O Governo

rompeu essa palavra da frontalidade.

Sr. Deputado, faço-lhe uma pergunta muito direta: considera ou não que o Governo, através do Sr. Ministro

das Finanças, deve vir a este Parlamento prestar esclarecimentos ao País e ao Parlamento? É que quem

faltou à verdade, como faltou o Ministro Vítor Gaspar, não pode passar com o silêncio que seja demolidor

desta maioria e não pode passar pelos «pingos da chuva» das suas escolhas políticas no que é essencial. E o

essencial, neste momento, é cortar nos juros e na dívida pública.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Braga.

O Sr. António Braga (PS): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados Mónica Ferro e Pedro Filipe Soares, muito

obrigado por terem participado neste debate que quisemos aqui trazer, a propósito da participação de Portugal

na construção da União Europeia e da reunião do Eurogrupo.

Sr. Deputado Pedro Filipe Soares, começo por responder às questões que me colocou, dizendo-lhe que

estamos inteiramente de acordo em que o Ministro precisa de dar explicações ao País e ao Parlamento.

Não é aceitável que um Ministro, de um qualquer Governo, se comprometa com uma ação concreta na

defesa dos interesses de Portugal num dia e que, no dia seguinte, ao contrário, venha dizer que fomos nós

que percebemos mal, que o que ele quis dizer não era isso e que houve um mal-entendido, pelo que

acompanhamos o Bloco de Esquerda nessa preocupação de podermos ouvir as explicações do Sr. Ministro,

confrontando-o com as suas próprias declarações.

Mas deixe-me dizer-lhe, Sr. Deputado, que neste Governo, e sobretudo através do Sr. Ministro das

Finanças, temos a garantia constante da previsibilidade de duas coisas que ocorreram sempre: é o aumento

de impostos e o erro sistemático na previsão dos diferentes cenários macroeconómicos. E é nessa medida

que, infelizmente, o Governo se tornou muito previsível, quando deveria ser, ao contrário, previsível nos

compromissos que têm assumido quer com os portugueses, em geral, quer, sobretudo, na dinâmica da sua

ação governativa e, nomeadamente, na defesa dos interesses de Portugal na Europa.

A Sr.ª Deputada Mónica Ferro ficou muito admirada por eu ter feito algumas citações, e chamou-lhes

«citações avulsas». Sr.ª Deputada Mónica Ferro, eu teria mais cuidado a dizer isso. É que eu citei dirigentes

do seu partido e altos membros do Governo de Portugal; não se trata, pois, de citações avulsas, e as citações

são rigorosas. Naturalmente que o PSD, neste domínio, tem sempre uma dificuldade muito grande em

ultrapassar aquilo que se transformou numa fronteira muito ténue entre o que é hoje verdade e o que amanhã

é mentira e o seu contrário.

E o que queremos dizer à maioria, nomeadamente ao PSD e ao Governo, é que é incompreensível como é

que um Governo que tem um assento e um voto, como têm os governos dos outros países, na concertação do

grupo da moeda única é incapaz de colocar com frontalidade as questões que têm a ver com as necessidades

e os interesses de Portugal. Vejam bem, os outros países não têm qualquer dificuldade em fazê-lo! E

compreendemos muito mal que os ministros e o Primeiro-Ministro, que partem de Portugal anunciando um

conjunto de ações que vão levar a efeito no seio da discussão dessa agenda, acabem por vir convencidos do

contrário do que iam defender quando partiram.

Página 35

6 DE DEZEMBRO DE 2012

35

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João

Pinho de Almeida.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado António Braga, o senhor falou

sobre o que se passou no Eurogrupo e, embora menos, sobre aquilo que se vai passando na Europa.

De facto, o Partido Socialista tem apelado muitas vezes para que se debatam as questões europeias, num

apelo que é um apelo relevante, porque, indiscutivelmente, a situação em que estamos depende muito das

soluções que se consigam gerar ao nível europeu e muito dificilmente aquelas que gerarmos, a título

estritamente nacional, podem ser suficientes para resolver os problemas. Mas convém que tenhamos noção

de todos os problemas por que passa a Europa neste momento. A Europa não tem apenas um problema com

países que estão sob programas de assistência. É verdade que Portugal está sob um programa de

assistência, mas devemos ser nós os primeiros a dizer que esse não é o único problema da Europa e que a

Europa não tem três problemas chamados Grécia, Irlanda e Portugal, a Europa tem vários problemas, e a

esmagadora maioria deles está no centro da Europa, onde a Europa não os consegue resolver.

Esta é a Europa que não consegue aprovar o seu próprio orçamento; esta é a Europa que não consegue

dar passos decisivos para resolver um problema de ter criado uma moeda única que não tem mecanismos

próprios de uma moeda e que, portanto, não consegue ser suficientemente estável.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Esta é a Europa que não consegue criar uma união financeira

e bancária que permita, de uma vez por todas, separar o risco soberano do risco das instituições financeiras. É

nesta Europa que nós estamos envolvidos e é sobre esta Europa que nós temos de fazer os debates.

E é especialmente preocupante que, nesta Europa, haja um ministro das Finanças de um Estado soberano

que diga que Portugal não deve pedir aquilo que não é suscetível de ser pedido, aquilo que é nosso por

direito, e que haja, logo ao lado, outro ministro das finanças de outro Estado soberano que diga exatamente a

mesma coisa. Estamos a falar do ministro das finanças da Sr.ª Merkel, é verdade, mas estamos também a

falar do ministro das finanças do Sr. Hollande, que disse exatamente o mesmo que disse o ministro das

finanças da Sr.ª Merkel.

Portanto, para o Partido Socialista convém agora ter a noção disso, porque durante cerca de um ano

disseram que todo o problema europeu passava pela alteração de liderança em França, porque isso permitiria

equilibrar a Europa entre dois tipos de visões.

Sr. Deputado António Braga, o que lhe pergunto agora é onde está essa outra visão, porque o que eu ouvi

ao ministro das finanças do Sr. Hollande foi exatamente o mesmo que ouvi ao ministro das finanças da Sr.ª

Merkel. Então, onde é que estava essa esperança de que, afinal, Portugal não tinha soluções internas, mas

tinha uma grande solução externa que era a eleição do Sr. Hollande? Os senhores até foram para França

fazer campanha, porque diziam que era lá que estava a nossa solução!

Portanto, Sr. Deputado António Braga sobre a nossa bancada e sobre a maioria, não tenha qualquer

dúvida de que nunca deixaremos de reivindicar aquilo que é nosso por direito. E nosso por direito é a

aplicação de regras idênticas àquelas que forem aplicadas a qualquer outro Estado que esteja sob programa

de assistência, naquilo que é próprio do programa de assistência.

Isso pode ser muito importante para Portugal, não temos vergonha de o dizer. Não temos vergonha de

afirmar que se pudermos discutir maturidades e que se pudermos beneficiar de períodos de carência

alargados isso é muito importante para a situação em que estamos. Isso pode permitir, designadamente,

aliviar aquele que é o esmagamento fiscal em que vivemos neste momento. Claro que isso é relevante e

importante, nunca abdicaremos de o defender, mas também nunca admitiremos que seja por via da Alemanha

ou que seja por via da França e do Sr. Hollande que nos venham dizer que aquilo que é nosso por direito não

deve ser pedido.

Página 36

I SÉRIE — NÚMERO 26

36

Aplausos do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado

Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado António Braga, registo a sua declaração

política sobre as conclusões do Eurogrupo e aquilo que foi considerado, em determinada altura, como

condições benéficas para a Grécia.

O Sr. Deputado disse que o Sr. Primeiro-Ministro e o Ministro das Finanças exultaram com essas

conclusões, mas esqueceu-se de fazer referência a uma terceira pessoa, que também exultou com essas

conclusões iniciais, que foi o Secretário-Geral do Partido Socialista, que está sentado ao seu lado.

É verdade que, afinal, «a montanha pariu um rato», mas esta euforia com que o Partido Socialista,

normalmente, trata as decisões comunitárias lembra-nos o que os senhores andaram, durante vários meses, a

defender, afirmando que, por exemplo, o pacto orçamental iria ser beneficiado com a nova presidência

francesa,…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Ora, ora!

O Sr. Honório Novo (PCP): — … porque iria ser objeto de uma alteração e da inclusão de uma adenda

sobre o crescimento. Não sei se o Sr. Deputado António Braga quer aproveitar esta oportunidade para nos

dizer onde é que, afinal, está a tal adenda para o crescimento no tratado orçamental, que, como sabe, também

já foi aprovado em França.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Ora bem!

O Sr. Honório Novo (PCP): — Sobre a reunião do Eurogrupo, gostava de avançar com duas confirmações

e uma pergunta.

Primeira confirmação: os portugueses não ouvem nem entendem mal.

Segunda confirmação: quem ouve mal e entende mal é o Sr. Ministro de Estado e das Finanças.

Quanto a ouvir mal, o Sr. Ministro de Estado e das Finanças que se trate. É uma questão médica, trate-se.

Risos da Deputada do PS Inês de Medeiros.

Quanto a entender mal, o problema, pelos vistos, já está resolvido, porque ouviu, primeiro, o Sr. Ministro

das Finanças do Governo alemão, ouviu, depois, o Sr. Ministro das Finanças do Governo francês e, no final,

concluiu que aquilo que tinha dito era resultado de uma má perceção e que o caminho certo para o Governo

português era o da submissão, o da continuada submissão, agora retomada, em relação ao Governo da Sr.ª

Merkel e ao Governo do Sr. Hollande, que, sobre esta matéria, dizem rigorosamente a mesma coisa.

Naturalmente, depois destas confirmações, quero colocar-lhe uma questão importante. Admitamos que há

melhores condições de financiamento para a Grécia, relativamente à sua dívida. Gostava de perceber o que o

senhor pensa sobre a aplicação dessas melhores condições putativas a Portugal, se, com o oferecimento

dessas melhores condições de financiamento, impuserem, simultaneamente, a Portugal, por exemplo, o corte

dos salários na Administração Pública em 20%,…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Ora bem!

O Sr. Honório Novo (PCP): — … o corte das reformas e das pensões em 20%. O senhor e o Partido

Socialista entendem que essas condições de financiamento serão favoráveis para Portugal, se, do outro lado,

nos quiserem impor condições de corte nos salários e nas reformas?

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

Página 37

6 DE DEZEMBRO DE 2012

37

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Braga.

O Sr. António Braga (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado João Pinho de Almeida, que diferença entre a

abordagem que o senhor faz desta questão e aquela que ouvimos do lado do PSD! Mas que diferença!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Está enganado!

O Sr. António Braga (PS): — Deixe-me dizer-lhe, Sr. Deputado, que já todos sabíamos que o CDS tinha

divergências com o Ministro das Finanças.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Até o PSD tem!

O Sr. António Braga (PS): — Divergências que são salutares, não há que ter qualquer vergonha disso.

Aliás, foi o Sr. Deputado que usou a expressão «vergonha».

Mas agora ficámos a saber que também tem divergências com o Primeiro-Ministro. Este é um dado

relativamente interessante para o debate, porque se essas divergências são reais, do ponto de vista

substantivo, acreditamos que o CDS-PP, oportunamente, saberá defender e apresentar as suas ideias e

propostas em diferentes sedes, nomeadamente ao nível das famílias políticas, na Europa, onde é importante

que o CDS saia da sua cadeira e dê passos para intervir e organizar o debate, no sentido de beneficiar

Portugal no seu conjunto.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Quem é que fez a pergunta? Não foi um Deputado do CDS?!

O Sr. António Braga (PS): — Naturalmente, Sr. Deputado João Almeida, acompanhamo-lo nas suas

preocupações quanto às decisões do Eurogrupo, mas deixe-me dizer-lhe que é espantoso que alguém vá para

a reunião com um conjunto de ideias e propostas, com as quais se compromete, inclusive, no Parlamento, e

de repente, quando lá chega, em vez de convencer, ser convencido.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Vamos ver!

O Sr. António Braga (PS): — Esse é que é o espanto em relação a esta «entrada de leão e saída de

sendeiro» dos nossos governantes que estiveram nessa reunião.

Quanto ao resto, Sr. Deputado, cada um tem a liberdade de expressão de pensamento que entender,

nomeadamente o próprio Governo francês, que tem a sua autonomia e determinação. Mas lembro-lhe que no

Conselho Europeu de junho foi aprovado um pacto para o crescimento e para o emprego justamente por

iniciativa do Governo francês,…

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — De que é que vale?!

O Sr. António Braga (PS): — … que alterou, Sr. Deputado Honório Novo, o quadro em que se vinha a

trabalhar,…

O Sr. Honório Novo (PCP): — Completamente falso!

O Sr. António Braga (PS): — … dando um impulso à ideia que o Secretário-Geral do PS, o Deputado

António José Seguro — Sr.ª Deputada Mónica Ferro, espero que fique satisfeita —, sempre tem defendido,

com vigor, nos contextos interno e externo, dando, aliás, interessantes contributos ao Governo para poder

participar melhor nessa discussão.

Sr. Deputado Honório Novo, acompanho-o em absoluto. Se o Sr. Ministro ouve mal e se é um problema

físico, há soluções para isso.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Cuidado!

Página 38

I SÉRIE — NÚMERO 26

38

O Sr. António Braga (PS): — Talvez entenda melhor a língua alemã do que a portuguesa, porque quando

vemos imagens dos encontros — que são mais encontros fortuitos do que propriamente encontros —

compreendemos, pelo assentimento, pelo gesto e pela inclinação de proximidade em relação ao governante

alemão que o Sr. Ministro de Estado e das Finanças percebe muito bem a língua alemã. Entendemos que isso

é bom, é útil — ao que parece, Portugal terá investido muito para que o Sr. Ministro perceba alemão —, mas o

que é importante é que este Governo e o Sr. Ministro têm um mandato dos portugueses, e não dos alemães,

para defender a situação de Portugal no seio da própria União Europeia.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. António Braga (PS): — Sr. Deputado Honório Novo, também o acompanho na sua preocupação,

mas há que dar razão ao Partido Socialista ou, pelo menos, fazer a justiça de nos considerar consistentes nas

propostas que fazemos, quer no Parlamento, quer fora dele, relativamente à intervenção de Portugal na União

Europeia. E o que dizemos é justamente o contrário do que o Sr. Deputado enunciou. Quando pretendemos

alargar o prazo, pretendemos uma negociação, quando pretendemos reduzir o juro da dívida, também

pretendemos uma negociação. O que dizemos, ao contrário de outros, embora respeitemos a sua opinião

legítima, é que não é de renegociação da dívida que se trata, porque queremos e temos condições para

liquidar a dívida. Trata-se de encontrar as melhores condições para relançar o crescimento da economia

portuguesa e podermos honrar os compromissos que temos com os credores internacionais e também no seio

da própria União Europeia.

Por isso, agitar qualquer fantasia sobre o aumento da austeridade a propósito da renegociação de prazo e

de juros, está, a nosso ver, em desconformidade com aquilo que temos vindo a propor.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Raúl de

Almeida.

O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as

Deputadas, Srs. Deputados: Celebrou-se, no

início desta semana, o Dia Internacional das Pessoas com Deficiência.

Como na semana passada foi dito, neste mesmo púlpito, por vários colegas, a propósito do dia dedicado ao

combate da violência contra as mulheres, a utilidade deste Dia Internacional deve ser apenas o sublinhado

formal de que, todos os dias, sem exceção, são dias das pessoas com deficiência.

O Dia Internacional das Pessoas com Deficiência, o dia 3 de dezembro, é uma data internacional

comemorativa, promovida pelas Nações Unidas desde 1998, com o objetivo de fomentar uma maior

compreensão dos assuntos relacionados com a deficiência, mobilizar a defesa da dignidade, dos direitos e do

bem-estar das pessoas e aumentar a consciência dos benefícios trazidos pela integração das pessoas com

deficiência em cada aspeto da vida política, social, económica e cultural.

Em cada ano, o tema deste Dia é baseado no objetivo do exercício pleno dos direitos humanos e da

participação na sociedade, estabelecido pelo Programa Mundial de Ação relativo a Pessoas com Deficiência,

adotado pela Assembleia Geral da ONU, em 1982.

Em Portugal, o caminho de integração destes nossos semelhantes tem sido, a bem da verdade, um

caminho progressivo e sólido e podemos afirmar que, apesar de todos ambicionarmos sempre, e bem, mais

rapidez e eficácia, a matéria tem sido tratada com seriedade e empenho pelos diversos Governos da nossa

democracia. Esta é uma matéria humana, não política, e, como tal, deverá sempre, a cada momento, ser

assumida pelo Estado e pelos seus diferentes protagonistas.

Quererá isto dizer que tudo está feito?

Quererá isto dizer que podemos estar satisfeitos?

Quererá isto dizer que não há, ainda, muito caminho a percorrer?

Página 39

6 DE DEZEMBRO DE 2012

39

Claro que há ainda muito, mesmo muito, por fazer. Claro que o nosso grau de exigência deve estar sempre

em alerta. Claro que todos temos obrigação de pensar, propor e agir, quanto ao próximo passo desta longa

caminhada.

Em primeiro lugar, importa deixar bem claro que integrar as pessoas com deficiência não é um dever

decorrente dos seus direitos específicos, é cumprir a Constituição, é agir em conformidade com os Direitos do

Homem.

Este passo leva-nos ao ponto fundamental da compreensão do que deve ser esta integração.

Há palavras difíceis, mas lembro-me — e muitos dos Srs. Deputados também se lembrarão — de ouvir

falar nos «inutilizados», nos «aleijados», nos «ceguinhos», nos «maluquinhos». Lembro-me de, tristemente, se

falar e tratar da deficiência como um problema, uma não conformidade social, a que se respondia com a

exclusão, o afastamento e, pior do que tudo, o estigma e a vergonha.

Sr.as

e Srs. Deputados, não foi há tanto tempo assim, como não foi há tanto tempo assim que seres

humanos foram oficialmente discriminados em razão da cor da sua pele ou da sua etnia.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — É verdade!

O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — Felizmente, nesta matéria, como noutras, de perceção e

relacionamento com o nosso semelhante, na sua diferença, o progresso tem sido notório.

Em poucos anos, chegamos à conclusão clara de que o primeiro combate a ser feito é o combate à

ignorância, a mãe de todos os preconceitos.

Em poucos anos, começamos a pensar, primeiro, que temos de cuidar destes nossos semelhantes e,

depois, que, aqui, a condescendência não tem lugar, porque o que realmente se passa é que temos de

garantir a todos o regular exercício dos seus direitos. Sr.as

e Srs. Deputados, não há, rigorosamente, nenhum

favor nisto!

Em poucos anos, o Estado foi interiorizando a necessidade de proporcionar a todos, sem exceção, o

regular exercício dos seus direitos. Urge, contudo, ainda, evoluir muito, e muito, na prática: na eliminação das

barreiras físicas e arquitetónicas, devendo o exemplo começar pelo Estado, nas áreas que gere, espaços e

edifícios públicos; no dever, que salientamos estar a ser reforçado e bem gerido, da atribuição das ajudas

técnicas aos que delas precisam, temporária ou definitivamente; na integração na escola, com meios humanos

e materiais, e sempre que este seja o melhor caminho, bem como no apoio às escolas de ensino especial, nos

casos em que melhor se adequa; na promoção de mais centros de atividades ocupacionais, estruturas

altamente deficitárias em Portugal e única resposta possível para tantos jovens e adultos; na promoção, como

vem acontecendo, e bem, de uma perspetiva de rede, de articulação de políticas para a sua maior eficácia; no

apoio, que acontece, deve ser continuado e, se possível, reforçado, aos centros de emprego protegido, como

meio de integração destas pessoas no mercado de trabalho, conduzindo à sua maior realização profissional e

pessoal; no apoio às empresas que contratam e integram estas pessoas, o que está a ser feito, e bem feito; no

reconhecimento público das empresas com melhor e mais responsabilidade social.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — Falámos, até agora, do papel do Estado, mas não seria justo,

deixem-me que vos diga, se nos esquecêssemos de que esta é uma caminhada que tem sido liderada por um

enorme grupo de pioneiros. Em primeiro lugar, as próprias pessoas com deficiência, os seus familiares e os

seus amigos; os profissionais da intervenção social, da saúde, da educação, que dedicaram os seus talentos e

as suas competências a esta causa; as organizações, de que cito algumas, como a CNOD, as CERCI, as

APPACDM, a AAPD, a ACAPO, os Deficientes das Forças Armadas, a AAPDA, e tantos, tantos outros.

Por fim, uma menção destacada ao que deve ser o ponto de referência, no presente e no futuro, desta

caminhada conjunta.

Já todos percebemos que as pessoas com deficiência não são um encargo do Estado e das famílias. Estas

pessoas, aos mais diversos níveis e nas mais variadas circunstâncias, afirmam-se, por direito próprio, como

um sério e fortíssimo ativo social. Têm, como todos, muito a aprender e têm, como todos, muito a ensinar.

Têm o poder único de, muitas vezes, nos recentrarem no essencial e têm o poder de trazer a solidariedade

Página 40

I SÉRIE — NÚMERO 26

40

para o centro da vida social. Assumiram um protagonismo ímpar na humanização de um mundo que insiste

em fugir da sua mais profunda essência, e fazem-no, apesar de tudo e de tanto, na luta permanente por

pertencerem a um lugar que é seu por direito, mas a que outros acedem com menos restrições.

Lembramo-nos tantas vezes deles e orgulhamo-nos, por exemplo, dos atletas paralímpicos, mas os

Paralímpicos dessas pessoas são todos os dias. Eles são heróis sempre e todos os dias. A todos estes atletas

da vida agradeço o exemplo e espero que todos estejamos à sua altura.

Aplausos do CDS-PP, do PSD e do PS.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr. Deputado Raúl de Almeida, inscreveram-se os seguintes Srs.

Deputados para lhe pedirem esclarecimentos: Mariana Aiveca, do BE; Maria Conceição Pereira, do PSD;

Jorge Machado, do PCP; Heloísa Apolónia, de Os Verdes; e Idália Salvador Serrão, do PS.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Aiveca.

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Raúl de Almeida, queria, em primeiro lugar,

cumprimentá-lo pela sua intervenção e pelo conteúdo da mesma, porque, de facto, temos todos e todas a

obrigação de mobilizar a defesa da dignidade das pessoas com deficiência.

Disse o Sr. Deputado, e bem, que o caminho destes últimos anos tem sido muito eficaz — se assim se

quiser — no que respeita à compreensão da sociedade para a discussão destas matérias e para não

estigmatizar aquelas pessoas que, como bem disse, eram tratadas com estatuto menor, como pessoas

menores, muitas vezes começando esse próprio estigma no seio da família, como todos bem conhecemos.

Por isso — o Sr. Deputado também o disse —, temos obrigação de pensar, de propor e de agir para

continuar um caminho que queremos cada vez mais igualitário para essas pessoas com deficiência

relativamente a toda a sociedade.

Sr. Deputado, o Bloco de Esquerda nunca enjeitou a sua responsabilidade e sua obrigação de pensar, de

propor e de agir. Fizemo-lo relativamente aos centros de emprego protegido, temo-lo feito em orçamentos do

Estado, temo-lo feito em todas as áreas da nossa intervenção.

O que lhe queria perguntar tem a ver com as medidas propostas pelo último Orçamento do Estado e em

relação ao qual o Bloco de Esquerda propôs que houvesse benefícios — se assim se podem chamar, pois não

se podem considerar benefícios, trata-se tão simplesmente de repor a dignidade destas pessoas — no sentido

de as deduções à coleta sofrerem alterações, situação retirada, se bem se lembram (e contestada pela sua

bancada — e muito bem, Sr. Deputado!), no Orçamento do Estado para 2007.

O Bloco de Esquerda fez, essencialmente, duas propostas: desde logo, tornar elegíveis para estas

deduções à coleta as pessoas com uma deficiência a partir de 80%, dado que, neste momento, apenas são

elegíveis pessoas com deficiência a partir de 90%; e também considerámos que deveria ser aumentada —

aliás, é uma reivindicação das organizações — essa mesma dedução à coleta.

O que é que aconteceu? Curiosamente, Sr. Deputado, as bancadas da maioria rejeitaram esta proposta do

Bloco de Esquerda.

Por isso, entendemos que temos a obrigação de propor e de agir, mas na hora de agir nem todos

pensamos de igual forma, lamentavelmente. Não bastam apenas as palavras ou os processos de intenções,

temos que continuar neste caminho.

O que se quer que a maioria faça é que intervenha de uma forma eficaz. E intervir de uma forma eficaz

seria, nesta circunstância, aprovar as propostas que o Bloco de Esquerda apresentou e que, lamentavelmente,

os senhores chumbaram.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr.ª Deputada, tem de concluir, pois já ultrapassou largamente o seu

tempo.

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Queria apenas fazer uma pergunta muito direta. Considera o Sr. Deputado

justo que a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa utilize a condição de recursos como critério para atribuir as

ajudas técnicas, sabendo nós que este é um direito de todos os deficientes? Não consideramos que esta seja

a melhor forma de o fazer.

Página 41

6 DE DEZEMBRO DE 2012

41

Colocámos esta pergunta ao Sr. Secretário de Estado, mas gostaria muito de ouvir a sua opinião.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, a Sr.ª Deputada Maria

Conceição Pereira.

A Sr.ª Maria Conceição Pereira (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Raúl de Almeida, quero também

felicitá-lo e agradecer-lhe por ter trazido este assunto à Assembleia, que tantas vezes é esquecido. Mas,

felizmente, o dia 3 de dezembro não passou em branco.

Já tivemos oportunidade de trabalhar em conjunto em relação ao diploma referente aos centros de

emprego protegido. Certamente, já prevíamos que se perspetivavam momentos difíceis e que os mais

fragilizados iriam sofrer. Em bom tempo tomámos as medidas necessárias.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr.ª Deputada, não brinque com isto!

A Sr.ª Maria Conceição Pereira (PSD): — Não fomos acompanhados por todos os grupos parlamentares,

mas fomos acompanhados pela sua maioria. E como V. Ex.ª referiu, estes assuntos não devem ser motivo de

debate político mas, sim, de união entre todos, porque têm a ver com a nossa população mais frágil, com

aqueles que mais necessitam que a voz dos Deputados esteja ao seu serviço nesta Casa.

Protestos do Deputado do PCP Jorge Machado.

Sr. Deputado, não necessita de gritar quando outros estão a intervir,…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Ninguém está a gritar!

A Sr.ª Maria Conceição Pereira (PSD): — … porque as pessoas sabem quem são aqueles que estão a

acompanhá-los.

O Sr. Deputado Raúl Almeida referiu os nossos atletas paralímpicos e eu lembrava aqui as palavras-chave

que os acompanharam: igualdade, inclusão e excelência.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — E os apoios?!

A Sr.ª Maria Conceição Pereira (PSD): — São três pontos que nos devem acompanhar sempre quando

falamos da situação das pessoas com deficiência e que tanta coragem deram aos nossos 30 atletas, os quais

quero homenagear aqui mais uma vez em nome do Grupo Parlamentar do PSD.

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Maria Conceição Pereira (PSD): — Queria também referir que este Governo, independentemente

de muitas vezes ser apelidado de insensível, tem estado pronto para nos vários momentos, e nos momentos

mais difíceis, dar uma resposta a estas situações.

Recordamo-nos do que sucedeu há bem pouco tempo, isto é, do clamor, com alguma razão, de algumas

pessoas portadoras de deficiência, as quais se queixavam de as ajudas técnicas não lhes chegarem, tendo de

imediato a resposta sido dada com um reforço de verba que poderá chegar, este ano, a 4,5 milhões de euros,

caso se mostre necessário, e com a criação de uma comissão de acompanhamento e de uma linha direta.

Quero ainda dizer que, nesse mesmo dia, o Sr. Secretário de Estado da Solidariedade e da Segurança

Social e os vários ministérios tiveram oportunidade de se reunir de imediato com todas essas pessoas. Essas

pessoas precisam de uma resposta imediata, e ela foi dada, de tal forma que essas pessoas estão a ser

acompanhadas.

Página 42

I SÉRIE — NÚMERO 26

42

Quero partilhar com V. Ex.ª a homenagem a todas as instituições que estão no terreno e que fazem um

trabalho silencioso, mas de grande valia, e às famílias que com elas trabalham nesta dignificação da pessoa

humana.

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Maria Conceição Pereira (PSD): — Por isso, gostaria que o Sr. Deputado referisse muito do

trabalho que este Governo tem feito, nomeadamente no âmbito do novo programa de financiamento às

instituições ou nas reuniões regulares que tem havido com as organizações não-governamentais, pois penso

que isso deve ser aqui lembrado. Todos os dias devemos trabalhar para a igualdade, para a inclusão e para a

excelência.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Raúl de Almeida.

O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, começo por agradecer às Sr.as

Deputadas Mariana

Aiveca e Maria Conceição Pereira as perguntas que me colocaram.

Queria testemunhar o trabalho que, juntos, temos desenvolvido nesta Assembleia. Entendo que todos o

temos feito com seriedade e que temos tido a capacidade de pôr sempre o essencial acima do acessório e de

pôr o interesse da preservação dos direitos humanos acima das divisões políticas.

Compreendo as questões que a Sr.ª Deputada Mariana Aiveca me colocou, porque, muito francamente, e

conforme disse na intervenção que fiz, estamos sempre aquém nesta caminhada e sempre com vontade de

fazer mais e melhor, de evoluir nesse sentido.

Mas a política também é, Sr.ª Deputada, a arte do possível. Houve pontos onde não fomos tão longe como

gostaríamos, como sucede nas deduções à coleta. Trata-se de uma questão que colocou, e bem, e que

podemos compreender com abertura, sem qualquer tipo de preconceito.

Contudo, houve muita coisa bem-feita, nos últimos tempos, na política portuguesa. E não falo só deste

Governo. Aliás, está presente a Sr.ª Deputada Idália Serrão que teve responsabilidades governativas nesta

matéria e que também teve um papel ativo, importante e construtivo nestas políticas. Trata-se, pois, de uma

caminhada que vem sendo feito e em relação à qual têm sido dados passos muito importante.

A Sr.ª Deputada Mariana Aiveca fez-me uma pergunta sobre a atribuição das ajudas técnicas pela Santa

Casa da Misericórdia de Lisboa. Muito francamente, e sem dramatismo nenhum — não estamos aqui

entrincheirados a discutir esta questão —, entendo que todas as instituições a nível nacional se devem reger

por um único catálogo de atribuição das ajudas técnicas. Não tenho mais nada para lhe dizer sobre isto.

Sr.ª Deputada Maria Conceição Pereira, muito obrigado pelas questões que colocou. Queria dizer-lhe que

há, de facto, felizmente, essa continuidade de trabalho em prol da humanização da sociedade. Nem diria tanto

da integração da pessoa com deficiência mas, sim, da humanização da sociedade, porque toda a sociedade

cresce com este fator.

Este Governo tem sido atento, diligente e vigilante e tem estado onde entende que deve estar — e aqui já

se trata, talvez, de uma opção política —, que é ao lado daqueles que nomeei e de outros tantos que existem,

isto é, das instituições, num trabalho de muita proximidade, de acompanhamento, de apoio e de ajuda a essas

instituições, pois são elas que estão mais perto das pessoas que necessitam, a trabalharem com mais

qualidade, com mais eficiência e, sempre que possível, dentro da conjuntura em que nos encontramos, com

mais recursos.

Queria ainda dizer que é essencial — são coisas que não precisam de dinheiro e que vão sendo feitas,

felizmente — a proatividade que o Governo tem tido no estímulo da boa consciência empresarial, no estímulo

da empregabilidade das pessoas com deficiência. Não só no estímulo às empresas, às entidades

empregadoras, mas também no desenvolvimento de uma via profissional que realize estes cidadãos.

Também a nível dos centros de emprego protegido — olhando para este Hemiciclo, vejo várias pessoas

que estiveram envolvidas nessa discussão e que deram o seu contributo positivo, profícuo e produtivo — se

vai fazendo caminho.

Página 43

6 DE DEZEMBRO DE 2012

43

Dentro de todos os constrangimentos, reafirmo que deveríamos fazer mais, que queremos sempre fazer

mais. Acho que a ambição de cada um de nós neste capítulo é imensa e justifica-se que seja imensa, mas vai-

se fazendo muito com vontade política, com decisão e com vontade de evoluir; uma vontade que vem de trás,

mas que está presente e que continuará para o futuro. Todos assim esperamos.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge

Machado.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Raúl de Almeida, saúdo-o pela sua

declaração política. Falou de direitos humanos, e muito bem, falou da obrigação de integração das pessoas

com deficiência, tendo até referido a Constituição. Até aqui muito bem, não temos nada contra, concordamos

com a sua intervenção.

Mas, depois, utilizou um conjunto de exemplos desligados da realidade para elogiar o Governo. O exemplo

dos apoios aos atletas paralímpicos é o mais elucidativo, pois esses apoios não existem, têm vindo a ser

drasticamente reduzidos.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Pois é!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Palavras bonitas não chegam, Sr. Deputado. Os cidadãos com deficiência

são dos mais discriminados entre os discriminados e sofrem de uma forma acentuada as medidas do Governo.

Nessa medida, queria colocar-lhe várias perguntas.

Quando o Governo, o PSD e o CDS-PP cortam, roubam os subsídios de férias e de Natal, estão ou não a

piorar a vida das pessoas com deficiência?

Quando aumentam os impostos sobre quem trabalha ou sobre quem está reformado, quando não repõem,

por exemplo, o estatuto de benefícios fiscais (tivemos oportunidade de discutir isso em sede de apreciação do

Orçamento do Estado), estão ou não a piorar a vida das pessoas com deficiência?

Vozes do PCP: — Exatamente!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Quando cortam na saúde, na educação e na segurança social, prejudicam

ou não as pessoas com deficiência? Onde é que está a integração das pessoas com deficiência quando

cortam nestas vertentes, que são verdadeiramente fundamentais? Quando atacam os salários, os direitos e os

sindicatos, estão ou não a prejudicar também as pessoas com deficiência? Quando aplicam uma taxa de 5%

sobre o subsídio de doença e uma taxa de 6% sobre o subsídio de desemprego, estão ou não a comprometer

a qualidade de vida das pessoas com deficiência? É aqui, no plano concreto, que devemos discutir as

questões das pessoas com deficiência. Quando promovem, com as vossas opções políticas, o desemprego

estão, ou não, a condenar à miséria milhares e milhares de pessoas com deficiência?

Sr. Deputado, na passada segunda-feira, no âmbito do contacto com o eleitorado, eu e o Deputado Honório

Novo visitámos o Centro de Reabilitação do Norte. O Sr. Deputado, salvo erro, foi eleito pelo círculo eleitoral

de Aveiro, pelo que saberá, como eu, que uma pessoa com deficiência que precise de reabilitação tem de se

deslocar 300 km ou 400 km para ir ao Centro de Medicina de Reabilitação de Alcoitão. Ora, constatámos que

o Centro de Reabilitação está totalmente pronto a funcionar, e apenas não abre — sabe porquê? — porque,

de acordo com as palavras do Sr. Ministro da Saúde, o Centro de Reabilitação abre quando estiver

assegurada a sua viabilidade económica e financeira.

Diz o Presidente da Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia, agora candidato a candidato à Câmara

Municipal do Porto, que privilegia a vinda de deficientes europeus de «classe A». Perguntámos o que são

deficientes de «classe A» e ele esclareceu, mais à frente, noutras declarações, que são os VIP, isto é, os

ricos. Ou seja, aquele Centro de Reabilitação irá financiar-se para servir os ricos da Europa e não os

deficientes portugueses.

Página 44

I SÉRIE — NÚMERO 26

44

Sr. Deputado, pergunto-lhe o que é que entende sobre esta matéria. Trata-se de uma medida concreta: há

um centro de reabilitação pronto a funcionar, que é fundamental para as pessoas com deficiência, e que não

abre por causa de uma opção política do Governo.

Sr. Deputado Raúl de Almeida, também as pessoas com deficiência têm muitas e boas razões para

derrotar esta política e este Governo e, infelizmente, não têm razões para estarem satisfeitas com as opções

políticas que têm governado, ou melhor, desgovernado, o nosso País.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia também para pedir

esclarecimentos.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Raúl de Almeida, quero também

saudar a temática que trouxe a debate na sua declaração política, sobre a qual gostaria de lhe colocar três

perguntas muito concretas.

A primeira pergunta prende-se com um projeto de lei que Os Verdes entregaram ontem na Assembleia da

República, que visa alterar o regime relativo à assistência a filhos, formando uma justiça que hoje

incompreensivelmente não existe na lei. Porquê? Porque a lei que estabelece a assistência a filhos, no caso

concreto com deficiência, determina a redução do horário semanal de trabalho em cinco horas, mas só até os

filhos perfazerem um ano de idade. Ora, isto não faz sentido absolutamente nenhum, Sr. Deputado, porque os

filhos não deixam de ter essa deficiência a partir de um ano de idade, continuam dependentes e a necessitar

dessa assistência. De resto, há até deficiências que se vêm a diagnosticar e a serem detetadas depois de um

ano de idade e, portanto, os pais não podem beneficiar desse regime. Ou seja, qual é o sentido de a lei

determinar hoje este limite de idade, remetendo depois essa assistência para aquela que é concedida a todos

os pais de filhos menores até aos 12 anos? Não tem nenhum sentido!

Sr. Deputado, aproveito a sua intervenção para apelar à maioria no sentido de aprovar este projeto de lei

de Os Verdes, que será a breve prazo agendado, de modo a que possamos reparar um aspeto da lei que não

faz sentido absolutamente nenhum.

A segunda questão tem a ver com as barreiras arquitetónicas, matéria que o Sr. Deputado aflorou na sua

intervenção e que, de facto, para as pessoas com mobilidade reduzida é extraordinariamente importante.

Há inúmeros serviços públicos em Portugal que não permitem o acesso fácil a estas pessoas,

designadamente em centros de saúde há coisas perfeitamente caóticas e incompreensíveis.

Todos os prazos previstos na lei sobre a eliminação das barreiras arquitetónicas estão já falhados. Todos!

E a culpa não é só deste Governo, é culpa de todos os Governos que, desde a introdução da lei, nada fizeram,

ou fizeram muito pouco, relativamente a essa matéria.

Gostava que o Sr. Deputado, uma vez que pertence à maioria parlamentar, me dissesse o seguinte: desde

o início até ao final da Legislatura, se o Governo lá chegar — cá por mim, espero que não, mas façamos de

conta que é assim! —, o que é que o Sr. Deputado vislumbra que se possa alterar ao nível prático em termos

da eliminação das barreiras arquitetónicas? Que passo é que será dado em quatro anos de Legislatura, por

aquilo que conhece da intervenção deste Governo na matéria?

Por último, relativamente aos atletas paralímpicos e à sua magnífica prestação, nós ficamos muito

satisfeitos com a sua prestação e fazemos muitas homenagens, mas gostava de perguntar muito

concretamente o seguinte: dessa nossa satisfação, e fundamentalmente da satisfação da maioria, o que é que

decorre em termos práticos e de apoio a estes atletas para um reforço da sua prática no desporto e para que

continuem sempre a dar mais pelo seu País, alegrando-nos a todos?

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Ainda para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada

Idália Salvador Serrão.

Página 45

6 DE DEZEMBRO DE 2012

45

A Sr.ª Idália Salvador Serrão (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Raúl de Almeida, gostaria de saudar

o tema que trouxe a debate e também as suas palavras francas, sinceras e sentidas.

Devemos reconhecer que há ainda na sociedade, e não apenas na sociedade portuguesa, um profundo

alheamento quanto à realidade das pessoas com deficiência e das suas famílias, quanto à dureza do seu dia a

dia, dureza que, diria, encaram e enfrentam sempre com perseverança, sempre com otimismo. Essa é uma

lição de vida que devemos estar aptos a receber.

Independentemente de a deficiência poder vir, ou não, a ser uma questão de moda, é bom que ela seja

moda, porque se vai entranhando. Por isso, Sr. Deputado, não sendo este meu último comentário relativo à

sua intervenção, gostaria de dizer-lhe que, de moda em moda, vamos interiorizando as dificuldades mas

também as bem-aventuranças das pessoas com deficiência.

Sr. Deputado Raúl de Almeida, referiu na sua intervenção a questão das atribuições dos produtos de apoio.

Todos conhecemos a realidade, e ainda ontem, numa sessão pública de avaliação do Programa Rede Social

que se realizou em Coimbra, o Sr. Secretário de Estado da Solidariedade e da Segurança Social teve

oportunidade de garantir que a segurança social tem verbas ilimitadas para atribuição de produtos de apoio às

pessoas com deficiência.

Sr. Deputado, penso que a reação da plateia que ontem ouviu o Sr. Secretário de Estado, e que foi

bastante violenta, demonstra o conhecimento que as pessoas com deficiência, as famílias e as organizações

têm da realidade, das necessidades e também das capacidades do Estado.

Há que ter um discurso muito realista, e nós cá estaremos para ver qual vai ser a execução mas também

para fazermos um acompanhamento das famílias. Afirmar que a segurança social tem verbas ilimitadas é, na

nossa perspetiva, demagógico, é brincar com as famílias, é ir longe demais.

Sr. Deputado, a deficiência não são só produtos de apoio. De repente, os produtos de apoio caíram no

discurso do Governo como se fossem a descoberta dos males e de todos os bens da deficiência.

Sr. Deputado, qual é a estratégia do Governo para a deficiência — para a deficiência motora, para a

deficiência sensorial? Qual é a estratégia do Governo para a multideficiência? Para a comunidade surda? Para

a cegueira? Para a baixa visão? Se a deficiência é uma prioridade tão grande para o Governo, então, qual é a

resposta do Governo para os alunos com necessidades especiais na sequência do aumento da escolaridade

obrigatória até aos 18 anos? Qual é o trabalho que está a ser desenvolvido sobre esta matéria,

nomeadamente nos centros de recursos, com o Instituto do Emprego e Formação Profissional e com a

Direção-Geral da Educação? Não nos venham dizer que é simples e que os recursos que existem chegam.

Sr. Deputado, este é um discurso completamente irrealista! Não podemos ir nas modas, temos de ser

realistas e honestos para com as famílias, pois é demasiado grave aquilo que está em causa.

O Sr. Laurentino Dias (PS): — Muito bem!

A Sr.ª Idália Salvador Serrão (PS): — Sr. Deputado, é nas instituições que reside o conhecimento sobre

as diferentes áreas da deficiência na sua multidisciplinariedade e na sua diversidade. Nesse sentido, o que é

que se passa com os Centros Novas Oportunidades para a deficiência? Como pensa o Governo dar resposta

ao significativo atraso que as pessoas com deficiência adultas têm em termos de escolaridade? Porque têm!

Há todo um processo de exclusão que tem de ser ganho para as pessoas com deficiência. Tem de ser ganho

para o Estado, mas para as pessoas com deficiência e para as famílias é inequívoco.

Não acha estranho, Sr. Deputado, que haja escolas do ensino particular e cooperativo sem alunos com

necessidades educativas especiais, segundo um relatório muito recente? Porque é que estas crianças não

estão também no ensino particular e cooperativo? Há aqui algum tipo de exclusão? O Estado é conivente com

este tipo de exclusão?

O Sr. Deputado referiu-se há pouco, parece-me, a prémios de mérito às empresas para premiar aquelas

que têm práticas inclusivas e práticas amigas das pessoas com deficiência. Isso é algo que já se desenrola há

muitos anos, que passou por vários Governo de diferentes forças políticas, portanto, não é nenhuma inovação.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr.ª Deputada, queria concluir. Já ultrapassou largamente o tempo

de que dispunha.

Página 46

I SÉRIE — NÚMERO 26

46

A Sr.ª Idália Salvador Serrão (PS): — Concluo já, Sr.ª Presidente.

Como estão os senhores e o Governo a trabalhar a empregabilidade?

Estas questões, Sr. Deputado, não são mais do que uma estratégia: o que é que o Governo quer; para

onde quer ir; quais são os recursos e quais são os compromissos.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr.ª Deputada, está a falar há 5 minutos!

O Sr. Laurentino Dias (PS): — E está a falar bem!

A Sr.ª Idália Salvador Serrão (PS): — Bem-haja, Sr.ª Presidente, e muito obrigada.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem a palavra o Sr. Deputado Raúl de Almeida para responder.

O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, antes de mais, queria agradecer as perguntas das

Sr.as

Deputadas Idália Salvador Serrão e Heloísa Apolónia e do Sr. Deputado Jorge Machado.

Tentando responder pela ordem das intervenções, começo por lhe dizer, Sr. Deputado Jorge Machado, que

não o sigo na politização desta questão. Muito francamente, não foi para isso que fiz esta intervenção, não foi

para isso que trouxe, em nome do CDS, este tema; não foi para dividir, foi para uma convergência de esforços,

para uma troca de ideias e para se produzir positivamente sobre o tema.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem! Não sabe fazer outra coisa!

O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — Pode haver dúvidas, pode não estar tudo feito, Sr. Deputado, mas,

muito francamente, ir buscar a tal «cassete» para uma discussão destas não me parece que mereça resposta.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — Mas, Sr. Deputado, focou, e bem, um ponto que merece ser

esclarecido.

Em relação ao Centro de Reabilitação do Norte, quero assegurar-lhe que temos a garantia de que estará

disponível e aberto a todos os que dele precisarem, sem qualquer tipo de exceção. Isso sossega-nos e basta-

nos.

Vozes do PCP: — Quando?

O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, tenho de dizer-lhe, muito

francamente, que não conheço o projeto de lei que Os Verdes apresentaram. A Sr.ª Deputada fez aqui um

enunciado da questão da alteração da lei relativa ao acompanhamento familiar dos filhos com deficiência. Em

tese, e conforme eu disse com toda a seriedade e com toda a sinceridade, dentro do possível — volto a dizer

que a política é a arte do possível —, devemos estar atentos e fazer tudo o que pudermos no sentido da

melhoria da integração, sendo os pais essenciais para essa integração.

Em relação às barreiras arquitetónicas, Sr.ª Deputada, tenho conhecimento prático da matéria e, como se

percebe e se adivinha facilmente, é uma das coisas que também me preocupa. Aliás, acho que preocupa cada

um de nós.

Tenho acompanhado o Governo nesta matéria e posso dizer que há aqui um trabalho, um índice de

realização muito elevado, como de resto havia — Sr.ª Deputada Idália Serrão, não tenho problema nenhum

em dizê-lo — no Governo anterior, bem como no Governo que o antecedeu, e por aí fora. Porém, temos de ter

noção de que, infelizmente, muitos dos nossos edifícios públicos estão desenhados e projetados de costas

viradas para estas necessidades e que as alterações muitas vezes são profundas, outras vezes não são

práticas, outras vezes não são praticáveis.

Página 47

6 DE DEZEMBRO DE 2012

47

Temos este impedimento, mas é um caminho que está a ser feito e, devo dizer, a taxa de realização do

Governo nesta matéria — o Sr. Ministro e o Sr. Secretário de Estado da área poderão concretizar melhor este

aspeto — é muito positiva e muito favorável.

Por fim, em relação aos atletas paralímpicos, queria dizer-lhe que este Governo manteve o acordo, que

ameaçava não se realizar. É verdade que todo o apoio deveria ser dado, que deveríamos aumentar o apoio,

que os deveríamos apoiar por todos os meios possíveis e impossíveis, mas, mais uma vez, a política é a arte

do possível e, pelo menos, cumpriram-se os compromissos que o Estado tinha para com esses atletas.

Por fim, Sr.ª Deputada Idália Serrão, reconhecendo, como é óbvio, que tem um percurso público nesta

matéria que fala por si, quero dizer-lhe que as ajudas técnicas não são tudo na deficiência, mas são uma parte

essencial, crítica, imediata e material para suprir dificuldades da vida destas pessoas.

Sr.ª Deputada, quanto ao reforço de orçamento nesta área, para mim mais importante do que o reforço é

uma rede de gestão — que sabemos ainda não estar 100% articulada entre o Ministério da Saúde e o

Ministério da Solidariedade e da Segurança Social, mas estar num caminho de articulação positivo — para

melhor rentabilidade destes meios, e por isso falei há pouco das pessoas que precisam provisoriamente ou

definitivamente destes meios (há qui uma grande diferença).

Portanto, se conseguirmos reutilizar, se conseguirmos fazer um melhor aproveitamento, se conseguir que o

dinheiro que é dedicado a estas pessoas seja gerido de forma mais eficaz e melhor aproveitado, melhor.

Depois, falou nos centros de recursos, nas necessidades educativas especiais… As necessidades

educativas especiais, felizmente, são, hoje, detetadas através da intervenção precoce, são sinalizadas e

seguem pela escola fora; fazem todo o percurso escolar do aluno.

O que dizemos e que mantemos é que acreditamos que o Governo está a ter uma visão consciente, que

não deve ser uma visão radical de passarmos o tempo — que é compreensível em todas essas evoluções do

radicalismo, da integração a todo o custo ou da não integração — mas de tratamento de cada caso como um

caso, merecedor de atenção e de um enquadramento devido.

Para terminar, Sr.ª Deputada, queria dizer-lhe que se há exclusão de alunos com deficiência ou com

necessidades educativas especiais dos estabelecimentos de ensino particular e cooperativo é porque esses

estabelecimentos estão a negar os direitos fundamentais, estão a violar a lei, devem ser denunciados, devem

ser averiguados após a denúncia e devem ser condenados em conformidade. Só isso. Cumpra-se a lei!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Srs. Deputados, concluído o primeiro ponto da ordem de trabalhos

de hoje, relativo a declarações políticas, vamos passar ao segundo ponto, que consiste na discussão, na

generalidade, da proposta de lei n.º 108/XII (2.ª) — Aprova o regime jurídico aplicável ao mergulho recreativo

em todo o território nacional, em conformidade com o Decreto-Lei n.º 92/2010, de 26 de julho, que transpôs a

Diretiva 2006/123/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2006, relativa aos

serviços no mercado interno, com a Lei n.º 9/2009, de 4 de março, que transpôs a Diretiva 2005/36/CE, do

Parlamento Europeu e do Conselho, de 7 de setembro, relativa ao reconhecimento das qualificações

profissionais, e com o Decreto-Lei n.º 92/2011, de 27 de julho, que cria o Sistema de Regulação de Acesso a

Profissões.

Para fazer a apresentação desta proposta de lei, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Desporto e

Juventude, que aproveito para saudar, bem como à Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e

da Igualdade.

Tem a palavra, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado do Desporto e Juventude (Alexandre Mestre): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs.

Deputados: Esta proposta resulta de uma coordenação permanente feita com a Federação Portuguesa de

Atividades Subaquáticas, mereceu, igualmente, o parecer positivo da Comissão de Regulação de Acesso a

Profissões, é o terceiro diploma que trazemos a esta Casa em vista a dar total cumprimento à transposição

integral das Diretivas Serviços e Qualificações. No fundo, o que se pretende é, o mais possível, eliminar

formalidades consideradas necessárias no âmbito de procedimentos administrativos, evitar processos

Página 48

I SÉRIE — NÚMERO 26

48

complexos e demorados, reservando-os apenas para situações de caráter excecional, nomeadamente

implementando como regime-regra a questão do deferimento tácito.

Em harmonia com o disposto no artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 92/2010, de 26 de julho, e conforme consta do

anexo a que se refere o n.º 1 desse artigo 3.º, há que aplicar o regime da legislação já existente que transpôs,

parcialmente, a Diretiva Serviços e a Diretiva Qualificações ao mergulho amador e, fundamentalmente, a

alteração principal prende-se com a eliminação da necessidade de obter o título nacional de mergulho.

Presentemente, temos uma espécie de dupla certificação, em que temos um certificado emitido pela escola de

mergulho e, depois, também a intervenção do IPDJ (Instituto Português do Desporto e da Juventude), que

deixa de ser necessária.

Para além desta alteração, temos ainda a salientar: a referência ao mergulho recreativo adaptado, portanto,

o mergulho praticado por pessoas portadoras de deficiência, que têm aqui as suas especificidades acolhidas;

a licença prévia que as entidades que pretendam constituir-se como escolas de mergulho ou centros de

mergulho estabelecidos em território nacional devem obter tem agora uma duração ilimitada, não carecendo

de renovação; também se atribui competência de fiscalização do cumprimento das normas previstas neste

diploma à federação desportiva com utilidade pública desportiva na área do mergulho, o que também é

novidade; o sancionamento da entidade prestadora de serviços pela abertura e funcionamento sem o

planeamento, programação, gestão, implementação e supervisão das atividades por parte de um diretor

técnico com a certificação necessária; a previsão expressa das regras relativas a reconhecimento mútuo,

desmaterialização de procedimentos e cooperação administrativa. De notar, ainda, que o licenciamento das

escolas de mergulho tem de ser publicitado em sede do site do Instituto Português do Desporto e da

Juventude.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Pimpão.

O Sr. Pedro Pimpão (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, Sr.ª Secretária de Estado dos

Assuntos Parlamentares e da Igualdade, Sr. Secretário de Estado do Desporto e Juventude: Tal como frisou o

Sr. Secretário de Estado, o Conselho de Ministros aprovou, no passado dia 31 de outubro de 2012, o diploma

sobre o regime jurídico aplicável ao mergulho recreativo em todo o território nacional, em conformidade com a

transposição de diretivas comunitárias relativas aos serviços no mercado interno e ao reconhecimento das

qualificações profissionais, bem como com o Sistema de Regulação de Acesso a Profissões.

Impõe-se assim, com esta proposta de lei, adequar a disciplina das atividades económicas relacionadas

com o mergulho, incluindo o regime das entidades que criam sistemas de ensino e que prestam serviços de

mergulho, ao regime constante do Decreto-Lei n.º 92/2010, de 26 de julho, nomeadamente no que se refere às

regras para simplificar o livre acesso e exercício das atividades de serviços realizadas em território nacional e

transpõe, assim, para a ordem jurídica interna a Diretiva 2006/123/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho,

relativa aos serviços no mercado interno, a Diretiva Serviços.

Do mesmo modo, aproveita para conformar a parte do regime relativa aos profissionais envolvidos nestas

atividades com a Lei n.º 9/2009, de 4 de março, que transpôs para o ordenamento jurídico interno a Diretiva

relativa ao reconhecimento das qualificações profissionais, e com o Sistema de Regulação de Acesso a

Profissões, assim como pela eliminação da necessidade de obter o título nacional de mergulho, tal como foi

aqui referido pelo Sr. Secretário de Estado do Desporto e Juventude.

Para além de estabelecer o regime mencionado, esta proposta de lei visa dar cumprimento à medida 5.22

do Memorando de Entendimento, tendo sido validada pela Direcção-Geral das Atividades Económicas e pela

ESAME, no âmbito da referida Diretiva Serviços.

Esta proposta de lei, antes de ser submetida à aprovação do Conselho de Ministros e de vir aqui, a

Plenário, foi ainda sujeita ao competente parecer da Comissão de Regulação do Acesso a Profissões.

Com esta proposta de lei, pretende-se que as respetivas atividades sejam prestadas com qualidade e

respeito pela saúde pública, direito constitucional a salvaguardar, pelo que o acesso às referidas profissões

dependerá da titularidade de certificação válida.

Este diploma institui, ainda, o registo nacional de mergulhadores certificados, implementa a forma de

determinação de sistemas de formação, enquadra e regula a prestação de serviços nesta área.

Página 49

6 DE DEZEMBRO DE 2012

49

Ao nível da formação, esta proposta define regras para o licenciamento, para o reconhecimento e

funcionamento de escolas e centros de mergulho. Para além de que define os requisitos para a figura do

diretor técnico, do coordenador e das regras da atividade.

A proposta ora apresentada dispõe, igualmente, sobre os requisitos de aptidão funcional e de saúde dos

próprios praticantes, bem como sobre a fiscalização que será assegurada por diversas autoridades, de acordo

com a competência e atribuições de cada uma delas.

Assim, este diploma tem como objetivo a eliminação de formalidades consideradas desnecessárias no

âmbito dos procedimentos administrativos, garantindo-se a competitividade do mercado dos serviços e uma

maior transparência e informação aos consumidores.

Face ao exposto, dá-se assim, por intermédio desta proposta de lei, mais um passo na regularização e

harmonia legislativa de mais uma atividade desportiva que vai ganhando cada vez mais expressão no contexto

nacional.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Laurentino

Dias.

O Sr. Laurentino Dias (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.ª e Sr. Secretário de Estado, Sr.as

e Srs. Deputados: O

Sr. Secretário de Estado sorri, antevendo o que vou dizer, que é dar-lhe os parabéns por ter trazido ao

Parlamento este diploma. É sempre bom que o Governo faça a atualização da legislação em vigor para nele

enquadrar as diretivas comunitárias, como V. Ex.ª faz com este diploma, a saber, a Diretiva Serviços e a

Diretiva Qualificações Profissionais.

Quando assim é, contará com a nossa disponibilidade para, olhando para este diploma — e naquilo que é a

transposição das diretivas, e já o apreciámos, está corretamente transferido para a proposta que nos

apresenta —, em relação a algumas outras novidades que ele traz (e são poucas porque, felizmente, repõe

quase integralmente uma legislação de 2007), certamente, na especialidade, termos a atenção de as acolher,

se elas forem boas, ou de as retificar, se elas não estiverem em correspondência com o global do diploma.

Em todo o caso, acolhemos como bom este diploma e trabalharemos com os demais grupos parlamentares

na especialidade para procurar que o diploma final seja ainda melhor.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Tiago.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: Da parte do

Grupo Parlamentar do PCP, identificamos quase um desafio do Governo aos Deputados — «encontre as

diferenças». É um «encontre as diferenças» entre esta proposta de lei e o regime em vigor, o estabelecido

pelo Decreto-Lei n.º 16/2007.

Esta proposta de lei, à semelhança do que já fez o Sr. Secretário de Estado com o regime do treinador de

desporto, é, na prática, uma tradução daquilo que já está na lei — aliás, trazido por decreto-lei para a

legislação portuguesa —, desta feita com a apresentação de uma proposta de lei onde se diz que há um

conjunto de soluções inovadoras.

Diz-nos o Sr. Secretário de Estado que tem parecer positivo da Comissão de Regulação de Acesso a

Profissões. Esse parecer positivo — em lado nenhum é referido «positivo» — tem até um conjunto de críticas

que a sua proposta de lei não acolhe, Sr. Secretário de Estado.

Mas, mais, diz que o regime é igual ao do atual decreto-lei para o instrutor de mergulho recreativo que se

propõe regular, que o regime é igual ao do atual decreto-lei para o regime de coordenador de mergulho que se

propõe regular, que o regime proposto é igual ao do atual decreto-lei para o diretor técnico, que o Sr.

Secretário de Estado diz que pretende regular.

Portanto, na prática, é uma repescagem da lei em vigor que o Sr. Secretário de Estado nos traz. Para

mostrar serviço à troica — porque tem lá um pontinho que diz que tem de rever todos os acessos às

Página 50

I SÉRIE — NÚMERO 26

50

profissões, através de proposta de lei a propor ao Parlamento português — e para mostrar serviço no seu

Gabinete, porque certamente não faz grande coisa para o desporto em Portugal, o Sr. Secretário de Estado

traz-nos aqui estas propostas de lei que, na verdade, acabam por desvalorizar o trabalho da Secretaria de

Estado do Desporto e da Juventude.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Vão obrigar a fazer a prova de vida?!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr. Secretário de Estado, da nossa parte, Grupo Parlamentar do PCP,

evidentemente que estas críticas não nos demitirão da nossa responsabilidade para contribuir, em sede de

especialidade, para a melhoria deste documento, como, aliás, fizemos, dando os nossos contributos em

relação ao documento que acabei de referir sobre o treinador de desporto.

Mas isso não pode apagar o facto de este documento ter sido agendado à pressa, não permitiu que a

Comissão produzisse um relatório, não permitiu que a Comissão fizesse a auscultação das federações

desportivas envolvidas, nomeadamente aquela que referiu como tendo mantido grande articulação.

Gostava apenas de relembrar não só que vamos pelo mau caminho quando a prática governamental se

mantém mas também que o PCP trouxe, pela primeira vez, à Assembleia da República o regime de mergulho

que, na altura, o Partido Socialista pediu para que não fosse aprovado porque o Governo estava a aprofundá-

lo e a regulamentá-lo e, na altura, verificámos que era até muito semelhante àquele que o PCP propôs. Agora,

vem este Governo, provavelmente no mesmo caminho, para tentar apagar essa história, apresentar um

diploma que, afinal de contas, é igual ao que já existe.

Aplausos do PCP.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É que o Sr. Secretário de Estado tem de justificar o lugar!

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem a palavra o Sr. Deputado Artur Rêgo para uma intervenção.

O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as

Deputadas, Srs. Deputados, Srs. Secretários de

Estado: Tenho de agradecer ao Sr. Deputado Miguel Tiago, porque estava com alguma dificuldade sobre o

que ia dizer em relação a este tema árido, que é uma mera transposição de diretivas, e o Sr. Deputado

resolveu-me o problema.

Como gosto sempre de resolver a ignorância que resulta da má leitura ou da apoucada leitura dos diplomas

que aqui são propostos, gostaria de dizer ao Sr. Deputado Miguel Tiago o seguinte: quanto a alterações, esta

proposta vem aplicar a legislação ao mergulho enquanto prática desportiva, mas também ao mergulho

amador;…

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Isso já existia!

O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — … a licença passa a ter duração ilimitada, deixando de ser necessário

proceder à renovação — não existia, Sr. Deputado! —; a licença para entidades que estabeleçam escolas ou

centros de mergulho é ilimitada; os pedidos de licenciamento são decididos no prazo máximo de 30 dias,

considerando-se o pedido diferido se o IPDJ não produzir autorização nesse prazo;…

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Que grande alteração!

O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — … a fiscalização de cumprimento das normas de atividade de mergulho é

alargada à federação desportiva na área do mergulho; o exame médico para acesso ao mergulho pode ter

lugar em qualquer outro país da União Europeia, seguindo as normas europeias, não tem de ser cá, em

Portugal; finalmente, e mais importante do que tudo, é referida a eliminação do requisito de obtenção do título

nacional de mergulho para a prática de mergulho.

Sr. Deputado, estas são algumas das diferenças que este diploma vem introduzir.

Página 51

6 DE DEZEMBRO DE 2012

51

Terei a atenção de dar ao Sr. Deputado, se assim o entender, uma cópia da proposta de lei e sublinharei

estas partes na mesma para o Sr. Deputado mais facilmente poder localizar as alterações.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Não vai gastar muita tinta!

O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Portanto, o que está verdadeiramente em causa nesta proposta de lei…

O Sr. MiguelTiago (PCP): — É mostrar serviço à troica!

O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — … é concretizar a aplicação das diretivas referidas, dar sequência àquelas

duas anteriores propostas de lei, como o Sr. Secretário de Estado referiu, sobre o fitness e a atividade de

treinador desportivo, transpondo integralmente para a legislação portuguesa as diretivas comunitárias.

Em conclusão, o que está verdadeiramente em causa, tal como nos diplomas anteriores, é simplificar

procedimentos: eliminar formalidades desnecessárias, reforçar a competitividade e a transparência,…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É patético!

O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — … adequar a disciplina das atividades económicas relacionadas com a

prática do mergulho, ou seja, adequar a prática do mergulho e as atividades económicas àquilo que são as

necessidades do mercado. Por isso é que são atividades económicas que têm de ser rápidas e eficientes e

não estar dependentes da velha e tradicional burocracia administrativa.

Propõe-se também um reconhecimento de qualificações profissionais, num processo mais simplificado e

menos burocrático.

E a única questão que deixaria ao Sr. Secretário de Estado é esta: sendo esta a terceira proposta de lei

que o Governo apresenta com este desiderato, de dar aplicação a estas diretivas, antevê o Governo mais

alguma área em que seja preciso tomar iniciativas futuras dentro deste âmbito para concretizar ou acabar de

concretizar a aplicação das diretivas no território nacional?

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Acabou de se inscrever o Sr. Secretário de Estado do Desporto e

Juventude para uma intervenção.

Tem a palavra.

O Sr. Secretário de Estado do Desporto e Juventude: — Sr.ª Presidente, quero agradecer ao PS a sua

total disponibilidade para cooperar nesta matéria.

Relativamente ao Partido Comunista Português, quero dizer tão-só o seguinte: podemos não gostar, mas o

direito da União Europeia existe, é aplicável no nosso ordenamento jurídico (artigo 8.º da Constituição da

República Portuguesa) e, quando há diretivas que são transpostas incorretamente ou apenas parcialmente, é

assim obrigatório — e não é a mando da troica, mas a mando do direito da União Europeia — que os Estados-

membros procedam à transposição total e integral dessas mesmas diretivas, sob pena de incumprimento.

E o que é que acontece, Sr. Deputado, quando há um incumprimento na transposição da diretiva? Pode

haver uma ação de incumprimento da Comissão Europeia contra o Estado português, o que implica sanções

— e duvido que o Sr. Deputado queira que o Estado português seja sancionado por incumprimento. Ora, nós

estamos a obstar a esse incumprimento, não queremos fazer alterações legislativas profundas quando elas

não são necessárias, mas queremos desburocratizar…

O Sr. MiguelTiago (PCP): — Por que é que não revoga a lei?

O Sr. Secretário de Estado do Desporto e Juventude: — Sr. Deputado, convido-o a ler a proposta de lei.

Sabe, às vezes, custa ler. O Sr. Deputado, uma vez, apontou uma omissão num relatório e estava lá o

documento. É que, às vezes, não lê os documentos.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Na altura, só leu o que era preciso!

Página 52

I SÉRIE — NÚMERO 26

52

O Sr. Secretário de Estado do Desporto e Juventude: — Leia também, por favor, esta proposta de lei e

vai ver que houve alterações substanciais.

Quanto à questão do Sr. Deputado do CDS-PP, quero dizer que este é o terceiro diploma que trazemos

aqui, em cinco que foram identificados pela troica como estando em incumprimento. Portanto, estão fechados

os cinco diplomas: dois por decreto-lei, dois por proposta de lei… Assim, esta matéria de dar cumprimento ao

direito da União Europeia está concluída da nossa parte.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Muito obrigado, Sr. Secretário de Estado.

Partindo do princípio de que os Srs. Membros do Governo não vão permanecer na Sala durante a próxima

discussão, a Mesa aproveita para se despedir.

Srs. Deputados, prosseguimos com o debate, na generalidade, sobre o projeto de lei n.º 312/XII (2.ª) —

Regula a promoção da propriedade e da gestão das entidades que prosseguem atividades de comunicação

social (PS).

Para fazer a apresentação deste projeto de lei, tem a palavra a Sr.ª Deputada Inês de Medeiros.

A Sr.ª Inês de Medeiros (PS): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: A proteção da liberdade de imprensa é

um dos imperativos de um Estado democrático. Para que essa liberdade seja efetiva, há que impor limites à

concentração da propriedade dos órgãos de comunicação social.

Assim o entende a União Europeia; assim o entendem, com legislação própria, a França, a Itália, a

Espanha, os Estados Unidos da América, em suma, basicamente todos os países democráticos.

Para poder fiscalizar a concentração, importa ter regras eficazes que garantam a transparência da

propriedade. Ora, sobre essa matéria, tanto o Dr. Jorge Miranda como o Dr. Rui Medeiros são muito claros: à

regra de impedimento de concentração dos meios de comunicação social ainda não foi dada exequibilidade,

verificando-se, por conseguinte, uma inconstitucionalidade por omissão. E vão mais longe, quando dizem

também claramente que são insuficientes as atuais competências da entidade reguladora. Alertaram para este

facto em 2006.

Já em 2009, o PS, então no Governo, apresentou um projeto para colmatar esta inconstitucionalidade por

omissão, que mereceu o voto contra da atual maioria e o veto presidencial.

Em 2011, o PS conseguiu dar um passo decisivo em termos de transparência na lei da televisão e da rádio.

Na anterior sessão legislativa, o PS apresentou este projeto para alargar essas regras de transparência a todo

o setor da comunicação social.

O PS tem sido constante na sua vontade de total transparência, garante primeiro da liberdade de

expressão. E não desiste de o exigir.

Mas também tem havido outra constante: a recusa dos partidos da maioria dessa mesma transparência.

Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Diz o ditado que «pior do que o que não sabe é aquele que não quer

saber». O PS sabe o que quer ver clarificado, sabe o que considera ser um direito de todos os portugueses, só

não sabe por que é que a maioria insiste em esconder a propriedade dos órgãos de comunicação social.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Carla

Rodrigues.

A Sr.ª Carla Rodrigues (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: O PS apresenta-nos um projeto

de lei que visa promover a transparência da propriedade e da gestão das entidades que prosseguem a

atividade de comunicação social.

Este projeto já foi apresentado e reapresentado, diversas vezes, nesta Casa. Está na carteira das

iniciativas legislativas do PS e, volta e meia, à falta de outras iniciativas, reaparece para discussão. Ainda nem

há quatro meses, discutimos, votámos e rejeitámos este mesmíssimo projeto, nesta mesma Casa.

Página 53

6 DE DEZEMBRO DE 2012

53

Então, que alterações de circunstâncias justificam, agora, este encore, em tão curto espaço de tempo?

Bom, o PS justifica com «tentativas de controle de órgãos de comunicação social». Que tentativas? —

perguntamos. Que controle? Por quem? Para quê?

Esta justificação não colhe. Baseia-se em suspeições, em desconfianças, em palpites. O PS insiste nesta

cruzada, como se a liberdade de imprensa e o respeito pelos direitos fundamentais estivessem em perigo e o

Partido Socialista fosse o seu último guardião.

Sr.as

e Srs. Deputados, a liberdade de imprensa representa um valor fundamental do Estado de direito

democrático. A liberdade de expressão e de informação estão consagradas constitucionalmente.

O PSD defende, e sempre defendeu, a liberdade de imprensa, de expressão e de informação.

É, aliás, incumbência do Estado assegurar a liberdade e a independência dos órgãos de comunicação

social e impedir que a sua concentração possa, no limite, representar uma ameaça para as liberdades de

imprensa e de informação.

E o Estado já cumpre essa incumbência: temos uma lei da rádio e da televisão revista recentemente (em

2011), a que a Sr.ª Deputada fez referência e que contém normas muito explícitas na promoção da

transparência da propriedade; temos a Entidade Reguladora para a Comunicação Social, a quem compete a

promoção da transparência e assegurar a não concentração da titularidade dos meios de comunicação social;

temos o Portal da Transparência; temos um decreto regulamentar, republicado em 2009, mas cuja versão

original remonta a 1999, que já prevê que são elementos do registo de publicações periódicas e das empresas

jornalísticas, entre outros, o capital social e a relação discriminada dos seus titulares e a identificação dos

titulares dos órgãos sociais

Enfim, o PS quer ir mais longe, no seu afã dirigista, e implantar, em Portugal, um regime que não tem

paralelo na Europa.

Querem enxertar, na comunicação social, normas que existem para o setor das sociedades financeiras no

âmbito do Código de Valores Mobiliários, sem qualquer correspondência ou similitude com o setor específico

da comunicação social.

A própria resolução do Parlamento Europeu sobre a concentração dos meios de comunicação social é

clara ao afirmar que «a introdução de regras excessivamente restritivas em relação à propriedade dos meios

de comunicação social pode reduzir a competitividade das empresas europeias no mercado mundial e

aumentar a influência de grupos de comunicação não europeus».

O PSD reconhece a importância da transparência no domínio da propriedade dos media e está atento ao

que se passa, em Portugal e na Europa, neste domínio. Não descartamos, por isso, a possibilidade de este

Parlamento aprofundar a legislação sobre este tema, mas não com este modelo que nos é apresentado pelo

Partido Socialista e não sem antes deixarmos amadurecer legislação recente sobre a matéria.

Por estas e outras razões, que, por escassez de tempo, Sr.ª Presidente, não vou aqui elencar, este projeto

do PS é precipitado, é desnecessário, é desenquadrado das normas comunitárias e carece de maior

maturação, ponderação e moderação.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina

Martins.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Quando falamos de comunicação social

e das regras sobre a transparência e a propriedade da comunicação social, é verdade — e, Sr.ª Deputada

Carla Rodrigues, tendo em conta a intervenção que acabou de fazer — que há regras especiais. Há regras

especiais e regras muito mais estreitas do que em qualquer outro setor. É assim mesmo e tem de ser.

É por isso também que, em toda a legislação sobre a comunicação social (e não especificamente na

legislação sobre concentração, que também existe), há normas que dizem, por exemplo, que os grupos que

têm comunicação social têm de ter autonomia, ou seja, têm de ser grupos económicos que detêm órgãos de

comunicação social porque o que querem fazer é comunicação social. É exatamente isso o centro da sua

atividade.

Página 54

I SÉRIE — NÚMERO 26

54

O que acontece, e é extraordinariamente perigoso para a democracia — e vejam que isto devia ser um

adquirido e que não devíamos estar a falar disto neste termos agora, mas, enfim, vamos então explicar

exatamente o que acontece e por que é que isto é importante —, é que, quando uma qualquer sociedade é

dona de órgãos de comunicação social e a sua participação nessa sociedade não tem a ver com o modelo de

negócio ser comunicação social mas outro qualquer, isso significa que o órgão de comunicação social não tem

independência do poder económico. Ou seja, significa que há alguém que compra um órgão de comunicação

social e que não lhe interessa saber muito bem como é que funciona, não lhe interessa até se o negócio

enquanto comunicação social é viável ou não. Porquê? Porque não serve para fazer comunicação social da

forma independente que se quer na democracia; é, sim, um veículo para um qualquer negócio, para um poder

económico ou um poder político oculto. É disso que estamos a falar.

É por isso que, na comunicação social, as regras são, e devem ser, muito apertadas. E é por isso que, em

Portugal, faltam regras.

Quando nós não sabemos quem são os donos dos órgãos da comunicação social portuguesa, isso significa

que não sabemos se há independência do poder económico desses órgãos de comunicação social — e isso é

gravíssimo.

Mais: não sabemos se há concentração. É que, quando uma qualquer sociedade de capitais participada,

que tem sede sabe-se lá onde, cujos donos podem ser vários, e multiplicar-se por várias sociedades, podem

ser a mesma pessoa ou as mesmas pessoas, podem ter os mesmos interesses económicos e políticos

disfarçados em várias sociedades, porque não são obrigados a dizer quem são, porque não há uma lei da

transparência que os obrigue a dizer quem são, mas, entretanto, vão comprando órgãos de comunicação

social uns atrás dos outros, já viu como isto é assustador, Sr.ª Deputada? Já pensou?

A Sr.ª Carla Rodrigues (PSD): — Está a fazer um «filme»!

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Quem é que está a tentar comprar… De quem é a Cofina, daqui a pouco

tempo? Quem é que tem uma percentagem do Correio da Manhã, o jornal mais lido em Portugal? Não lhe

preocupa o que acontece se a Controlinveste for vendida e a Sr.ª Deputada não souber a quem?

Controlinveste que detém, entre outros, o Diário de Notícias, o Jornal de Notícias e a TSF. Isso não a

preocupa? Não a preocupa que o Governo que apoia queira vender metade da RTP e não se saiba a quem?

Já pensou? Já pensou o que é um País que corre o risco de ter mais de metade da sua comunicação social

controlada por interesses económicos e políticos que não se assumem?

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Bruno Dias.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Como já foi aqui dito, este projeto é, e

com toda a legitimidade, a reapresentação de uma iniciativa que o PS trouxe a este Plenário no passado dia 3

de julho.

Entendemos que os problemas que se colocavam, à data, não se resolveram, antes pelo contrário, no que

diz respeito à concentração da propriedade e à falta de transparência e no que diz respeito à dominação

crescente que o poder económico exerce na comunicação social.

Reafirmamos o que defendemos na altura: a transparência plena e o conhecimento público da propriedade

dos meios de comunicação social é algo que faz falta, que é necessário, e parece-nos muito bem que haja

propostas e iniciativas no sentido de aprofundar esse conhecimento e essa transparência. Importa dizer que

sem transparência nada feito, mas só a transparência não chega! Ou seja, quando a comunicação social se

vai aprisionando e transformando em coutada do poder económico e das grandes empresas, quando vai

desaparecendo gradualmente o pluralismo no sistema mediático, é preciso dizer que não ficamos sossegados

com o facto de sabermos quem são os donos dessa coutada. É, pois, preciso evitar que essa situação se

aprofunde e se agrave; é preciso evitar que vá piorando a gravidade do problema.

De resto, como dissemos — e reafirmamos —, estamos de acordo com a transparência da propriedade e

com a sua defesa. No entanto, parece-nos que isso não é suficiente, tanto mais que a inconstitucionalidade

Página 55

6 DE DEZEMBRO DE 2012

55

por omissão, a que se referiu — e bem — a Sr.ª Deputada Inês de Medeiros, salvo melhor opinião, continuará

a acontecer enquanto não se cumprir o artigo 38.º da Constituição, porque nele não se prevê que o Estado

deve divulgar a concentração da propriedade dos media, mas, sim, que deve impedir a concentração da

propriedade dos media.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Isso mesmo!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Portanto, esta matéria coloca-nos perante a necessidade de tomar outras

medidas e de continuar essa análise, essa perspetiva de intervenção. Ou seja, o que estamos a discutir, em si

mesmo, não é negativo, mas será insuficiente.

Esta discussão levanta um outro problema, que, aliás, já temos abordado, o da responsabilidade e

importância ainda maiores, neste panorama preocupante de dominação pelo poder económico do sistema

mediático do nosso País, do serviço público na informação e na comunicação social.

Queremos reafirmar que é altamente preocupante a situação de que tivemos conhecimento esta manhã, na

Assembleia da República, a de que está em vigor um regime na RTP, há cerca de um mês, que transforma

opções editoriais das direções de informação em pedidos de autorização ao conselho de administração, que

passa assim a ter uma espécie de direito de veto sobre trabalhos de reportagem e cobertura noticiosa.

Isto significa que estamos perante um problema muito grave que exige uma resposta do Estado português

sobre o sistema mediático e o impedimento concreto dessa concentração de propriedade, mas que

responsabiliza ainda mais o serviço público. Exige-se uma resposta cabal de cidadania, de democracia, que o

serviço público também deve garantir, uma vez que, nos dias de hoje, estamos a assistir a sintomas e mostras

de uma ameaça cada vez maior a esse pluralismo.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Raúl de

Almeida.

O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as

Deputadas e Srs. Deputados: Li com atenção o

projeto de lei objeto de discussão e fiquei confuso sobre se se trataria do projeto de lei n.º 312/XII ou do

projeto de lei n.º 263/XII, que deu entrada nesta Câmara há seis meses e foi rejeitado há cinco meses. Depois,

notei que há um ponto de honestidade: no preâmbulo do projeto de lei é admitido que, de facto, este é um

remake do anterior projeto.

Temos legislação recente em vigor nesta matéria.

A Sr.ª Inês de Medeiros (PS): — Ai temos?!

O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — Temos a lei da televisão e da rádio.

A lateralidade deste diploma face aos regimes a que temos acesso neste momento, em nosso entender,

apenas vem criar confusão nesta matéria.

Tudo o que dissemos e defendemos — e a Sr.ª Deputada Inês de Medeiros, que foi buscar os ditados

populares, sabe o que dissemos no verão passado — mantemos por uma questão de coerência e por

continuarmos a considerar que não existe qualquer mudança, nem do projeto nem das circunstâncias, que

justifique o contrário.

Devo dizer que é sempre importante abordar o tema da transparência, e para isso estamos sempre

disponíveis. Não só o CDS-PP como todos os partidos desta Câmara devem obrigar-se, permanentemente, a

fazer esta reflexão. E, nesta matéria incluímos, obviamente, a transparência da propriedade dos meios de

comunicação social.

Estamos, e sempre estivemos — devo frisar —, ao lado da transparência, para termos um Estado

escorreito, percetível, claro e que todos possam interpretar de forma fácil, que todos possam compreender. É

essa a obrigação do Estado.

Página 56

I SÉRIE — NÚMERO 26

56

Fará sentido criar todo um corpo legislativo novo (novo se fosse aprovado, porque é uma repetição do que

foi apresentado), ao lado da legislação vigente, ao lado da Entidade Reguladora para a Comunicação Social

(ERC) e do seu estatuto de atuação, da lei da televisão, da lei da imprensa e da lei da rádio? Pura e

simplesmente, não nos parece.

A grande vontade de produção legislativa do Partido Socialista, neste capítulo, atinge um extremo que não

nos parece aceitável. E, como já referi, o nosso objetivo é o da clareza, o da adequação legislativa que

proporcione a transparência que todos, sem exceção, desejamos. Ora, esta iniciativa legislativa, de forma

muito clara, em resultado do debate que aqui travámos, em particular das intervenções dos Srs. Deputados

Catarina Martins e Bruno Dias, gera nada mais do que confusão, porque estivemos a falar de questões que

em nada estão conexas com o que depreendi da leitura do projeto de VV. Ex.as

.

É muito claro: este projeto de lei vem acrescentar a confusão que não se deseja, vem cercear um caminho

de legislação existente e que deve ser percorrido e em nada contribui para a transparência da propriedade e

dos próprios órgãos de comunicação social em Portugal.

Termino dizendo algo que não é bem um ditado, mas é uma frase que todos conhecemos bem: «Não volte

ao sítio onde já foi feliz». Neste caso, o facto de a Sr.ª Deputada Inês de Medeiros, nesse sítio, não ter sido

feliz não quer dizer que lá volte recorrentemente.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Inês de

Medeiros.

A Sr.ª Inês de Medeiros (PS): — Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, já que estamos numa de recorrer a

ditados, permitam-me que lhes diga, Srs. Deputados do PSD e do CDS: «De boas intenções está o inferno

cheio»!

A questão é muito simples: se os Srs. Deputados querem transparência, aprovam este projeto;…

Aplausos do PS.

… se não querem e mantêm essa vontade de opacidade, chumbam este projeto de lei que

reapresentámos.

Hoje em dia, há um consenso na sociedade sobre a absoluta necessidade deste projeto — foi o que

constatámos, aliás, em vários congressos que se têm realizado ultimamente, sobre o serviço público de

televisão e sobre a liberdade de imprensa, posição reforçada por vários comentadores e agentes políticos e

sociais. Portanto, os únicos que ainda não perceberam que estão contra a corrente e que estão a defender o

indefensável são os Srs. Deputados da maioria!

Sr. Deputado Raúl de Almeida, quero deixar muito claro que eu e o PS voltaremos sempre ao «sítio»

porque sabemos que temos razão! Portanto, os senhores poderão continuar a chumbar estas iniciativas e nós

continuaremos a apresentar, em cada sessão legislativa, um projeto de lei até aos Srs. Deputados admitirem

que esta situação não pode continuar. E não vale a pena esgrimir falsos argumentos!

Os Srs. Deputados falam da lei da rádio e da televisão, mas este projeto é a extensão do que está na lei da

rádio e da televisão para todo o setor, não é uma alteração da lei da rádio e da televisão. Portanto, esse

argumento é falso.

Os Srs. Deputados estão a atirar poeira para os olhos dos portugueses, o que vos fica mal nesta altura. A

questão é simples: o que é os Srs. Deputados querem, transparência ou opacidade? Decidam!

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Não havendo mais inscrições, dou por concluída a discussão, na

generalidade, do projeto de lei n.º 312/XII (2.ª).

Vamos prosseguir com a apreciação do Decreto-Lei n.º 232/2012, de 29 de outubro, que aprova o processo

de privatização da ANA — Aeroportos de Portugal, SA [apreciação parlamentar n.º 41/XII (2.ª) (PCP)].

Página 57

6 DE DEZEMBRO DE 2012

57

Antes de dar a palavra ao Sr. Deputado Bruno Dias, vou pedir ao Sr. Secretário o favor de anunciar três

projetos de resolução que entretanto deram entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (Abel Baptista): — Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, sobre a matéria objeto da presente

apreciação parlamentar, deram entrada na Mesa os projetos de resolução n.os

521/XII (2.ª) — Revoga o

Decreto-Lei n.º 232/2012, de 29 de outubro, que aprova o processo de privatização da ANA — Aeroportos de

Portugal, SA (PCP), 522/XII (2.ª) — Cessação de vigência do Decreto-Lei n.º 232/2012, de 29 de outubro, que

aprova o processo de privatização da ANA — Aeroportos de Portugal, SA (BE) e 523/XII (2.ª) — Cessação de

vigência do Decreto-Lei n.º 232/2012, de 29 de outubro, que aprova o processo de privatização da ANA —

Aeroportos de Portugal, SA (Os Verdes).

É tudo, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Agora, sim, para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado

Bruno Dias.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.as

Secretárias de Estado, Sr.as

e Srs. Deputados: No

Plenário da Assembleia da República, o PCP dá-vos a oportunidade de travarem um negócio ruinoso para a

própria soberania nacional.

Há poucos dias, no Funchal, numa audição parlamentar que o PCP promoveu sobre esta matéria, dizia um

cidadão que os aeroportos são a porta de entrada mais nobre do nosso País no presente. Ora, o Governo

prepara-se para entregar as chaves da porta da frente a um grupo económico, para este ficar com a gestão de

um negócio absolutamente milionário, pelas vantagens que vai obter, mas que é absolutamente ruinoso para o

Estado português, pelo que isto significa num setor absolutamente estratégico.

Sabemos que o encaixe financeiro desta operação, que tem sido mencionado para disfarçar o défice deste

ano, que é de cerca de 2000 milhões de euros, representa menos do que o encaixe que a ANA garantiu só

nos últimos 10 anos — 1270 milhões de euros em investimento, 366 milhões em resultados líquidos, 200

milhões em IRC, cerca de 500 milhões em IRS e na segurança social. E a concessão aeroportuária será por

50 anos!

Fica a pergunta: o que é que se prevê relativamente a obrigações que foram suscitadas quanto a

investimentos necessários para o futuro, como a repavimentação da pista do aeroporto de Porto Santo, ou as

questões do aeroporto da Horta, do novo aeroporto de Lisboa e das condições necessárias para a expansão

da manutenção aeronáutica na TAP, setor estratégico para o nosso País?

Srs. Deputados, esta privatização coloca mais um monopólio privado a sufocar a economia nacional, com a

destruição de postos de trabalho, e representa, a par da privatização da TAP, a alienação de toda a soberania

nacional no setor do transporte aéreo.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Ainda não se concretizou esta privatização e já está anunciada a

consequência-primeira desta medida: o aumento das taxas aeroportuárias no aeroporto de Lisboa, uma

medida injusta e inaceitável, com evidentes prejuízos para a atividade turística, não só de Lisboa mas também

do centro e sul do País, originada no tráfego aéreo do aeroporto da cidade de Lisboa.

Já estão à vista, nesta região, neste País, as consequências — que ainda vão ser mais graves — desta

privatização que transforma uma operação de caráter estratégico para o País num negócio que é uma

autêntica liquidação de outlet.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Batista Santos.

O Sr. Paulo Batista Santos (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: O PCP convoca esta

Câmara…

Página 58

I SÉRIE — NÚMERO 26

58

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Agora já não importa a competitividade!

O Sr. Paulo Batista Santos (PSD): — Ainda não disse nada, Sr. Deputado Bernardino Soares. Peço-lhe

que aguarde um pouco.

Como dizia, o PCP convoca esta Câmara, e bem, para discutirmos o processo de privatização da ANA, e

fá-lo na perspetiva ideológica que acredita, que está convencido que é a melhor para as empresas públicas,

em Portugal. Provavelmente, noutro cenário, na visão do PCP, estaríamos aqui não a discutir processos de

privatização, mas, eventualmente, processos de nacionalização. Não é essa a visão do Governo, não é essa a

visão com que nos comprometemos no quadro do Programa de Assistência Económica e Financeira.

De facto, o processo de privatização da ANA não é uma novidade — Sr.as

e Srs. Deputados, lamento

surpreendê-los —, consta do Programa de Assistência, foi decidido e anunciado ao País no âmbito do Plano

Estratégico dos Transportes, no qual está expressa a visão do Governo sobre este processo de privatização,

consta da decisão do Conselho de Ministros de agosto deste ano e, agora, por via da publicação do Decreto-

Lei n.º 232/2012, de 29 de outubro.

O Sr. Deputado disse, e bem, que se pretende a maximização do encaixe financeiro com vista ao

ajustamento que também temos de fazer do ponto de vista orçamental — se o vamos fazer, convém que o

façamos com efetivo resultado. Mas pretende-se, também, respeitar a importância estratégica do designado

«hub» de Lisboa, pretende-se definir, igualmente, um quadro legal e regulatório adequado que permita à ANA

ter um potencial de crescimento e continuar a ser uma empresa competitiva, e pretende-se, ainda, assegurar

condições para a afirmação de uma gestão prudente e capaz numa empresa que também consideramos

estratégica para o nosso País.

O que o Governo aprova, por via deste Decreto-Lei, é o processo de privatização da ANA até 100%. Fá-lo

através de um modelo transparente e de uma forma clara, suscetível do escrutínio não só deste Parlamento

como de qualquer cidadão (todos podem acompanhar o processo de privatização daquele ativo estratégico);

fá-lo através de uma modalidade de venda em que reconhece a situação de instabilidade económica e

financeira que vivem os mercados de capitais; e fá-lo através de uma negociação particular a um ou mais

investidores, permitindo, assim, fazer um maior encaixe.

O mais importante a dizer a esta Câmara, de uma forma clara e inequívoca, é que o Estado português

mantém ao seu dispor um conjunto de instrumentos jurídicos eficazes para poder cumprir não só a sua função

reguladora e de supervisão como, sobretudo, a todo o momento, conforme decorre do artigo 7.º do Decreto-

Lei, poder, se entender que o interesse do Estado não está defendido, suspender e anular o processo de

privatização.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe

Soares.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as

Secretárias de Estado, Sr.as

e Srs. Deputados: O

tema da privatização da TAP não é, ao contrário do que, muitas vezes, se tenta passar, um tema menor,

sequer, no âmbito de todo o programa de privatizações. Não é um tema ideológico, a não ser na forma como o

Governo o ataca, porque o que o Governo diz é que apenas os privados sabem gerir aquilo que é público,

independentemente da forma como está a ser gerido.

Ao olharmos para a ANA, percebemos que a sua gestão foi bem feita, em correlação com o que era a

gestão da TAP. A gestão do setor aeroportuário tinha a ligação da transportadora com o setor dos aeroportos

e essa ligação permitiu quer a afirmação de Portugal como a porta de entrada para a Europa, quer a afirmação

e o reconhecimento internacional dos aeroportos portugueses — as Sr.as

e Srs. Deputados saberão que, por

exemplo, o Aeroporto do Porto foi considerado como um dos melhores da Europa, fruto de investimento

público de qualidade.

O que está em cima da mesa com esta privatização, afinal, é uma visão de tão ideológica tão antiga

também. E nós percebemos bem que é mais um negócio para ajudar alguns privados; percebemos que, antes

Página 59

6 DE DEZEMBRO DE 2012

59

de o ser, já o era neste negócio. A própria Associação de Turismo de Lisboa revoltou-se contra o aumento das

taxas aeroportuárias no Aeroporto da Portela, porque este aumento visa tornar mais benéfico para os privados

a exploração do Aeroporto da Portela.

A própria gestão deste processo de privatização feita pelo Governo e pelos privados é questionável e, a par

do esclarecimento da Sr.ª Secretária de Estado sobre este aumento anunciado das taxas aeroportuárias na

Portela (por ser mais benéfico para os privados), também é necessário que, em nome da transparência, o

Governo clarifique por que motivo pede assessoria a uma empresa no âmbito da privatização da ANA e a

mesma empresa está a dar assessoria aos privados no âmbito da privatização da TAP — perdão, é o

contrário!… Como, com certeza, a Sr.ª Secretaria de Estado saberá bem, a Da Vinci (que tem ilustres

membros do PSD como seus assessores) está a prestar assessoria ao Estado na privatização da TAP, tal

como está a prestar assessoria aos privados no processo de privatização da ANA.

Esta realidade demonstra, por um lado, como os interesses públicos e privados ficam numa nebulosa, em

que ganham sempre os interesses privados e, por outro lado, a forma como se protege que a privatização seja

feita em condições que os privados possam, depois, ter o negócio garantido, uma renda garantida.

Pelo caminho fica o interesse nacional num setor estratégico, fica comprometida a garantia da coesão

territorial num cenário da nossa geografia — em que todos percebemos que as regiões autónomas são

protegidas com uma TAP pública e com uma ANA pública —, tal como ficam comprometidos os cofres do

Estado, porque ficam reféns dos interesses privados e «descalços» em relação aos lucros que a ANA tem

dado, ano após ano. É, por isso, um mau negócio para todos. Para todos, menos para os privados.

Conclusão do Governo: privatize-se! A interesse de quem? Dos privados, obviamente.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís

Ferreira.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Para além do mal que

representa para o interesse nacional a privatização da ANA, este processo conhece contornos ainda mais

estranhos do que qualquer outro processo de privatização, desde logo, porque, no caso da privatização da

ANA, a falta de transparência foi ainda mais evidente, foi ainda mais notória do que em qualquer outro

processo de privatização. Ou seja, a transparência esteve e está completamente ausente neste processo.

O pouco que se conhece sobre o contrato de concessão entre o Estado e a ANA é que está a ser

trabalhado tendo como pressuposto de que se trata de um contrato entre duas entidades públicas — de facto,

são públicas, por enquanto —, mas o seu conteúdo pretende definir as bases da concessão por 40 ou 50 anos

a um grupo privado.

De facto, é estranho que a preocupação do Governo nesta concessão não seja a de assegurar o interesse

público ou a de saber se ela é ou não vantajosa para o País. Nada disso! A única preocupação do Governo,

neste processo, é a de saber se a União Europeia e o Eurostat aceitam integrar a receita da concessão para

efeitos da contabilização do défice das contas públicas. Esta é a única preocupação do Governo neste

processo!

Também tem contornos estranhos o facto de esta privatização ser antecedida de uma concessão, e aqui

impõe-se uma pergunta: afinal, o que é que o Governo quer concessionar à ANA? Um serviço público que a

ANA já está a fazer?! É que, por incrível que pareça, é exatamente isto que está a passar-se, ou seja, o

Governo pretende concessionar à ANA um serviço público que a própria ANA já faz! E, agora, abanamos

todos a cabeça duas vezes e dizemos: não pode ser! Mas eu digo: é! É isto que se está a passar.

Parece complicado, mas, afinal, foi este o expediente que o Governo encontrou para se autofinanciar.

O Sr. António Filipe (PCP): — Exatamente!

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Ou seja, o Governo utiliza a ANA para obter empréstimo, obriga

a ANA a endividar-se junto da banca, para termos uma empresa pública com um passivo, a que vão acrescer

Página 60

I SÉRIE — NÚMERO 26

60

os juros desta delirante operação, isto, naturalmente, com reflexos negativos na venda e no valor da sua

privatização.

Também importa referir que, quando falamos da privatização da ANA, estamos a falar de uma empresa

que representa um motor de fomento da nossa economia que agrega tanto a aviação como o turismo, uma

empresa que dá lucro, aos milhões! Só nos últimos 10 anos, a ANA entregou aos cofres do Estado mais de

525 milhões de euros, e só no ano passado a ANA fez entrar nos cofres do Estado cerca de 70 milhões de

euros.

Não deixa de ser curioso que o Governo venha dizer que um dos motivos para a sua privatização é que a

ANA passará a fazer investimentos. Agora, tornamos a abanar a cabeça duas vezes, porque o que acontece é

que a ANA já faz muitos investimentos e a ela se deve a modernização da rede aeroportuária nacional.

O Sr. António Filipe (PCP): — Exatamente!

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Portanto, o argumento do Governo, a propósito do investimento,

é completamente descabido, não tem qualquer sentido, é falso, porque a ANA tem vindo a fazer investimentos,

e investimentos de qualidade!

O Sr. António Filipe (PCP): — Exatamente!

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — A única diferença — que é uma grande diferença para quem tem

a preocupação do interesse público — é que, até aqui, esse investimento tem vindo a ser norteado pelo

interesse público, pelo interesse nacional e, depois de privatizada, esse investimento será norteado pelo

interesse dos respetivos acionistas. Esta é a única diferença. Mas, pelos vistos, é isto que interessa ao

Governo: o interesse de uns poucos; o interesse coletivo, o interesse público não interessa para nada.

Portanto, em defesa do interesse público, do interesse nacional, Os Verdes também exigem que se trave o

processo de privatização da ANA.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Paulo

Figueiredo.

O Sr. Rui Paulo Figueiredo (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as

Secretárias de Estado, Srs. Deputados,…

Protestos do Deputado do PCP Bernardino Soares.

O Sr. Deputado Bernardino Soares já que quer antecipar a intervenção…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Não é difícil!

O Sr. Rui Paulo Figueiredo (PS): — Cumprimento-o a si e ao Partido Comunista pelo tema que aqui nos

trazem.

O Partido Socialista tem colocado o tema das privatizações no centro da sua agenda política. Foi por

iniciativa do Partido Socialista que ficou consagrado na legislação a necessidade de salvaguarda dos

interesses estratégicos nacionais.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Olha que sorte!…

O Sr. Rui Paulo Figueiredo (PS): — E, a propósito deste tema, continuamos — há um ano — à espera

desta regulamentação. A Sr.ª Secretária de Estado já nos disse que anda em aturadas negociações, mas o

que é facto é que nós continuamos à espera, o País continua à espera.

Página 61

6 DE DEZEMBRO DE 2012

61

Por isso, o Partido Socialista tem sido muito claro nesta matéria: entendemos — e já apresentámos esta

proposta várias vezes, a última das quais em sede de discussão do Orçamento do Estado — que o processo

de privatizações deveria ser suspenso até que seja regulamentada a salvaguarda dos interesses estratégicos

nacionais.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Rui Paulo Figueiredo (PS): — É por essa razão que defendemos, de um modo muito claro, que o

processo de privatização da ANA deve ser suspenso, daí termos apresentado (em breve, estará agendado

para Plenário)…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Em breve? Só se for para janeiro!

O Sr. Rui Paulo Figueiredo (PS): — … um projeto de resolução que o defende. Mas, Sr.ª secretária de

Estado, também consideramos que este processo tem sido marcado por falta de transparência, por falta de

rigor e por uma grande opacidade.

Há pouco, tivemos um debate sobre a propriedade dos meios de comunicação social, em que, também

aqui, a maioria defendeu a falta de transparência e a opacidade. Começa a ser uma imagem de marca deste

Governo e desta maioria a falta de transparência e a opacidade!

Também defendemos diálogo institucional e diálogo social, que é o que não temos tido. Ainda ontem

tivemos oportunidade de receber, na Comissão de Economia e Obras Públicas, uma dezena de sindicalistas a

propósito da TAP que se queixavam da falta de diálogo do Governo. Nós queremos que haja, nesta matéria

das privatizações, diálogo social e diálogo institucional e queremos, também, que este processo seja mais

rigoroso e mais transparente.

Negociações particulares e ajuste direto não são métodos que defendam os interesses nacionais.

Cadernos de encargos e possíveis vencedores escolhidos no mesmo dia, no mesmo Conselho de Ministros,

não é um processo transparente. O mesmo se diga de separar o caderno de encargos e os possíveis

vencedores com três ou quatro dias, ou com uma semana de intervalo e, depois, ir mudando as regras a meio

do caminho. Estes não são processos transparentes, Sr.ª Secretária de Estado.

No caso da ANA, importa salvaguardar as infraestruturas. Temos queixas no Porto (de Rui Rio), nos

Açores, na Madeira e em Beja, temos o problema, já aqui focado, das taxas aeroportuárias e precisamos que

este debate seja aprofundado e queremos mais escrutínios.

Por isso, Sr.ª Secretária de Estado e Caros Colegas da maioria, nós vamos apresentar, em sede de

Comissão de Economia e Obras Públicas, requerimentos para que seja feito um conjunto de audições sobre a

TAP e sobre a ANA, porque precisamos de mais escrutínio, de mais debate e de mais defesa dos interesses

estratégicos nacionais.

Contamos com a disponibilidade do CDS e do PSD para viabilizar essas intervenções. Já temos o caso da

Cimpor e vale a pena pensarmos que não queremos que aconteça o mesmo nem à TAP nem à ANA.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Hélder

Amaral.

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as

Secretárias de Estado, Sr.as

e Srs. Deputados:

Sobre esta matéria, gostava de situar na discussão presente este processo de apreciação parlamentar 41/XII

(2.ª), do PCP, que é, a exemplo de outros, tecnicamente, e não só, ideológico. Portanto, nessa matéria, trata-

se de um processo coerente com aquilo que o Partido Comunista Português costuma defender.

Estando longe daquilo que o Partido Comunista aqui defende, gostaria de dizer que, ainda assim, pondo de

lado as suspeitas nunca provadas e apenas e só anunciadas, parece-me que quer o PS, quer o PSD, quer o

CDS têm uma visão das privatizações diferente. O Partido Socialista, desde logo, porque inscreveu estas de

Página 62

I SÉRIE — NÚMERO 26

62

que estamos a falar no Memorando, pondo-as agora em causa, não porque discorde delas mas porque são

outros a fazê-las. Mas, no essencial, estará de acordo.

Da nossa parte, não temos nada que se oponha à privatização da ANA desde que esteja garantido, como

se deve calcular, aquilo que é uma definição clara de serviço público, aquilo que são os necessários

instrumentos de transparência e aquilo que foi dito ainda agora sobre o que deve ser uma audição, uma

explicação, um envolvimento dos trabalhadores nestes processos. Não nos moldes em que os trabalhadores o

possam querer fazer, mas quando e onde pode ser e não, propriamente, sempre e quando qualquer sindicato

ou qualquer comissão de trabalhadores entende pedir explicações, alegando que há falta de diálogo.

O CDS não quer que estes processos sejam feitos nas costas dos trabalhadores, e tivemos a confirmação

de que muitos sindicatos foram recebidos, foram ouvidos, tiveram oportunidade de manifestar a sua opinião,

tiveram oportunidade de dizer aquilo que pretendiam. Não cabe é aos sindicatos fazerem cadernos de

encargos. Essa é uma tarefa de quem tem a legitimidade de governar e de quem tem a competência de fazer

esses mesmos cadernos de encargos.

Portanto, olhando para os cadernos de encargos, está lá explícito que há aqui proteções que me perecem

benéficas. O facto de se prever que as taxas nas ilhas e no Porto sejam mantidas implica tão-só uma defesa

desses aeroportos. O facto de estarmos, com esta privatização, a dar capacidade a um setor que é estratégico

e que tem um potencial de crescimento enorme, que pode gerar imensos retornos para a economia, que pode

até gerar mais emprego é estar a defender os trabalhadores. Acredito que os trabalhadores queiram estar na

situação atual, mas qual é o problema de dinamizarmos todas as nossas instalações portuárias e com isso

gerarmos mais empregabilidade? Qual é o problema de, com isso, gerarmos até, porventura, melhores

remunerações?

Estamos a falar de interessados — e a Sr.ª Secretária de Estado poderá confirmar — que não são

inexperientes na matéria. Estamos a falar de possíveis interessados (e não sei qual deles irá ganhar) que

estão no terreno, que têm experiência, que, no fundo, estão com a mão na massa, que percebem o que deve

ser uma gestão aeroportuária eficiente.

A gestão aeroportuária compreende as instalações e as infraestruturas, não abrange só a gestão da venda

de slots ou de taxas aeroportuárias, mas a gestão de todo o mundo do aeroporto, todo o mundo de serviços

que podem ser prestados. Portanto, há sérias vantagens para a economia portuguesa, para a posição

estratégica do País, para esse setor, que é importante, ter um parceiro, ter alguém que tenha capacidade

financeira para fazer as evoluções, para melhorar os serviços, para tirar todo o potencial que puder tirar de

uma gare ou de um aeroporto para que o País possa, por outra via, receber dividendos.

Não nos assusta uma privatização, não nos assusta que haja privados nesse setor. Acreditamos que os

privados podem gerir melhor, com mais eficiência, acreditamos que o Estado pode tirar daí dividendos,

acreditamos que os trabalhadores podem ser protegidos nos seus direitos e acreditamos que o Estado tem

todas as capacidades — e se não tiver cá estará esta Assembleia — para, a todo o momento, fiscalizar,

controlar, perguntar, acompanhar aquilo que deve ser a transparência, a eficácia e o rigor que esse processo

deve ter.

Como estamos descansados quanto a essas matérias, não queremos obstar a que haja debate sobre a

matéria, não queremos que algo fique escondido, e com bom senso e com a necessária razoabilidade faremos

com que estas matérias sejam discutidas.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Em representação do Governo, para uma intervenção, tem a palavra

a Sr.ª Secretária de Estado do Tesouro.

A Sr.ª Secretária de Estado do Tesouro (Maria Luís Albuquerque): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados:

Começo por agradecer aos Srs. Deputados do PCP a oportunidade que me deram de vir prestar

esclarecimentos sobre a questão da privatização da ANA e, naturalmente, como é minha obrigação,

disponibilizar-me para voltar a esta Assembleia para, em Plenário ou em comissão, prestar todos os

esclarecimentos que sejam relevantes, porque é, de facto, importante para o Governo explicar quais são as

Página 63

6 DE DEZEMBRO DE 2012

63

preocupações, que cautelas tomou e combater essa perceção que alguns Srs. Deputados possam ter de que

o processo não é suficientemente transparente.

Começando por responder ao Sr. Deputado Bruno Dias, algumas das questões que referiu, nomeadamente

dos benefícios de pagamento de impostos, de contribuições para a segurança social, mantendo-se a empresa

com sede em Portugal e a trabalhar em Portugal, devo dizer que, naturalmente, não se perdem por passarem

de uma gestão pública para uma gestão privada.

No que diz respeito ao aumento das tarifas, considero importante, muito embora isso não decorra do

decreto-lei de privatização, mas sim do contrato de concessão, explicar o seguinte: o objetivo que se pretende

com o aumento das tarifas no aeroporto de Lisboa é o de fazer uma subsidiação cruzada para permitir tornar

mais competitivos os aeroportos de outras partes do País, nomeadamente o aeroporto do Funchal, que tem as

tarifas mais altas da Europa ocidental. Também estamos preocupados em preservar a competitividade do

turismo numa região que tem sentido tantas dificuldades.

A questão que se coloca é, de facto, a de se fazer uma gestão integrada e eficaz de uma rede de

aeroportos, fazendo com que aqueles que têm maior possibilidade de ter tarifas mais altas possam compensar

os outros, onde as tarifas não devem aumentar.

A forma como as tarifas, em Lisboa, serão determinadas está limitada por uma comparação com um

conjunto de aeroportos, cujas tarifas são revistas de dois em dois anos, garantindo que nunca perdem

competitividade por comparação com os aeroportos comparáveis.

Uma outra questão que também me parece muito importante esclarecer neste debate prende-se com

aquilo que o Sr. Deputado José Luís Ferreira referiu, dizendo que aquilo que o Estado pretende fazer ao

celebrar o contrato de concessão é apenas registar uma receita no défice.

Sr. Deputado, a intenção não é de todo essa; o objetivo de fazer este contrato é completamente

independente do tratamento dado em contas públicas. Uma coisa é uma concessão estar a ser gerida por uma

entidade que é pública, outra é ser gerida por uma entidade que é privada, e o Estado não pode deixar de

contratualizar, assegurar a certeza jurídica, a propriedade e a transferibilidade dos bens de concessão antes

de vender as ações da ANA.

Recordo que o que é vendido são as ações da ANA; os ativos aeroportuários são domínio público,

continuam na posse do Estado.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma nova intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno

Dias.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Quero que fique bem claro que, para o

PCP o mais grave, o mais escandaloso e o mais criminoso em todo este processo não é a falta de

transparência, que, só por si, é mais grave.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Exatamente!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — É que estamos a falar de delapidar o património público, que é fundamental

para a própria soberania nacional.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Com a rede aeroportuária e com o transporte aéreo não se brinca, Srs.

Deputados!

Estamos a falar de matéria fundamental para a própria segurança do País e das populações!

Estamos a falar de uma rede aeroportuária que tem necessidades de investimento e que já provou ter, na

gestão pública, uma capacidade de resposta que não é menor da de qualquer grupo privado que venha para

Portugal. Não vêm cá ensinar nada, Srs. Deputados!

Página 64

I SÉRIE — NÚMERO 26

64

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Vêm cá aprender, porque a capacidade técnica que existe hoje na ANA —

Aeroportos pede meças a nível mundial!

O desempenho económico e financeiro da ANA — Aeroportos, como os senhores sabem muito bem, pede

meças, dá lucros e dá dividendos para o Estado.

Não venham cá falar de contas públicas, Srs. Deputados! Estão a comprometer receita pública nos

próximos 50 anos.

Vozes do PCP: — Exatamente!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Dessa forma, os lucros de dividendos deixam de entrar para o público e

passam a ir para o privado!

Vozes do PCP: — Exatamente!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — O que é que pensam que estão a fazer quando entregam um negócio que

transformam em monopólio privado, a nível nacional, a um grupo que pode comprar este setor e a sua

gestão?! Sendo certo que, há poucos anos, no parlamento britânico, foi criada uma comissão de inquérito à

privatização dos aeroportos de Londres — só de Londres! — pela companhia espanhola Ferrovial, que

mandou a British Airways ao charco em poucos anos e que foi comprada por capitais espanhóis pouco tempo

depois?!

Quem é que os Srs. Deputados pensam que enganam?

Não venham falar de ideologias! Ideologia é o enquadramento das ideias para as opções de classe que

tomamos. Nós, PCP, tomamos a opção de defender o povo e o País, defendendo o caráter público desta

empresa estratégica para a economia nacional!

Os senhores de certeza que não estão com falta de ideologia, nem estão a fazer uma abordagem técnica.

Estão com uma ideologia que é a de obedecerem aos interesses de classe dos grupos económicos.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Não é a ANA e o País que precisam de grupos económicos, são os grupos

económicos que precisam da ANA e do País, e é isso que os senhores estão a oferecer! Estão a oferecer, de

bandeja, fatias do País aos grupos económicos que o querem comprar!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Podem contar com a nossa oposição e com o nosso firme combate aqui e lá

fora!

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Batista

Santos.

O Sr. Paulo Batista Santos (PSD): — Sr.ª Presidente, apenas umas breves palavras para dizer ao Sr.

Deputado Bruno Dias, com toda a clareza e com a mesma firmeza, que não tem o monopólio da defesa do

povo.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Muito bem!

Página 65

6 DE DEZEMBRO DE 2012

65

O Sr. Paulo Batista Santos (PSD): — As bancadas do PSD e do CDS, como há pouco aqui significaram,

têm feito muito pelo povo,…

Vozes do PCP: — Nota-se!

O Sr. Paulo Batista Santos (PSD): — … desde logo, a salvar o País.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Salvar de quem?!

O Sr. Paulo Batista Santos (PSD): — Aquilo que V. Ex.ª aqui veio defender, como, aliás, há pouco,

ensaiou o Sr. Deputado Rui Paulo Figueiredo…

Protestos do PCP.

Sr. Deputado Bruno Dias, não é possível dizer aos portugueses que defende a redução de impostos, que é

contra a extinção de fundações, que é contra as privatizações, e, em contrapartida, dizer que o Orçamento do

Estado para este ano é violento.

Protestos do PCP.

Sr. Deputado, infelizmente, aqueles senhores que ali estão sentados na bancada do PS colocaram o País

perante a obrigação e o dever de se equilibrarem as contas públicas.

Protestos do Deputado do PS Paulo Campos.

Vozes do PCP: — Com o vosso voto!

O Sr. Paulo Batista Santos (PSD): — E, para esse efeito, empresas como a ANA, que precisam de ser

competitivas, de crescer, de aumentar a sua capacidade de trabalho, entram no mercado do trabalho, na visão

que temos para o País. E a visão que temos para o País é a de que pode crescer com as pessoas, com

empresas competitivas, com empresas como a ANA e a TAP que sejam reais.

Sr. Deputado Rui Paulo Figueiredo, o que é enganar o povo, o que é opacidade, o que é falta de

transparência é dizer aos portugueses que poderíamos construir autoestradas pelo País todo e que depois não

vinha a fatura!

Vozes do PSD: — Muito bem!

Protestos do PS.

O Sr. Paulo Batista Santos (PSD): — Veio a fatura, e estamos agora a pagá-la!

Falta de transparência é espalhar escolas com luxo asiático pelo País todo, no âmbito da Parque Escolar, e

esperar que ninguém as pague. Temos de as pagar, Sr. Deputado!

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Muito bem!

O Sr. Paulo Batista Santos (PSD): — Esse é o problema dos contratos que VV. Ex.as

fizeram! E o dia da

fatura, o dia de pagamento chegou.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Secretária de Estado do

Tesouro, no pouco tempo de que ainda dispõe.

Página 66

I SÉRIE — NÚMERO 26

66

A Sr.ª Secretária de Estado do Tesouro: — Sr.ª Presidente, vou tentar não exceder ou, pelo menos, não

exceder em muito o tempo de que ainda disponho.

Queria novamente esclarecer a questão colocada pelo Sr. Deputado Bruno Dias, falando em delapidar o

património da rede aeroportuária, dizendo o seguinte: a rede aeroportuária não é vendida, Sr. Deputado, é

concessionada.

Vozes do PCP: — Oh!…

A Sr.ª Secretária de Estado do Tesouro: — Significa que se mantém no património do Estado, significa

que, se o concessionário não cumprir as suas obrigações, o Estado retoma a concessão; e, se cumprir as

suas obrigações, findo o prazo da concessão, volta à sua posse. Não estamos, pois, a delapidar o património.

Concordo com o Sr. Deputado quando diz que a capacidade técnica da ANA pede meças a qualquer

empresa no mundo. É verdade. E seguramente que o investidor que vier a adquirir a ANA valorizará e utilizará

essa sua capacidade técnica e utilizará mesmo essa capacidade portuguesa para poder exportar esse

conhecimento além-fronteiras, como aconteceu com outras empresas.

No que diz respeito às necessidades de investimento, mais uma vez isso não está no diploma de

privatização mas, sim, na regulação, cujo diploma, aliás, também já foi publicado, e no contrato de concessão,

e o investidor assegurará as necessidades de investimento dos aeroportos, inclusivamente a eventual

necessidade de construção de um novo aeroporto para a cidade de Lisboa, se tal se vier a verificar necessário

no futuro.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Terminado este debate, a Mesa aproveita para se despedir das Sr.as

Secretárias de Estado e para anunciar que os projetos de resolução que há pouco foram anunciados, os

projetos de resolução n.os

521/XII (2.ª), 522/XII (2.ª) e 523/XII (2.ª), relacionados com esta matéria, serão

integrados no guião de votações da próxima sexta-feira.

Assim concluímos os nossos trabalhos de hoje. A próxima sessão plenária realizar-se-á amanhã e da sua

ordem do dia constará uma marcação do PSD e do CDS-PP para a discussão, na generalidade, do projeto de

lei n.º 320/XII (2.ª) — Reorganização administrativa do território das freguesias (PSD e CDS-PP).

Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 25 minutos.

Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

Páginas Relacionadas
Página 0052:
I SÉRIE — NÚMERO 26 52 O Sr. Secretário de Estado do Desporto
Página 0053:
6 DE DEZEMBRO DE 2012 53 Então, que alterações de circunstâncias justificam, agora,
Página 0054:
I SÉRIE — NÚMERO 26 54 O que acontece, e é extraordinariamente perigo
Página 0055:
6 DE DEZEMBRO DE 2012 55 por omissão, a que se referiu — e bem — a Sr.ª Deputada In
Página 0056:
I SÉRIE — NÚMERO 26 56 Fará sentido criar todo um corpo legislativo n

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×