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10 DE DEZEMBRO DE 2012

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A ideia subjacente ao projeto-lei n.º 312/XII (2.ª), a de aumentar o nível de transparência relativamente à

propriedade e gestão das entidades com atividades de comunicação social, merece o meu firme apoio.

A comunicação social é uma atividade cujo funcionamento é absolutamente crucial para a (qualidade da)

vida pública em sociedades democráticas e pluralistas. A comunicação social tem um papel essencial no

debate público, no escrutínio da governação e do comportamento dos vários poderes relevantes (políticos,

económicos, sociais, etc.). Na perspetiva da realização dos indivíduos, a liberdade de imprensa é uma

condição essencial da sua dignidade e, por isso, é consagrada como direito fundamental na Constituição

Portuguesa.

Embora seja academicamente controvertido o efetivo impacto da propriedade das empresas de

comunicação social no desempenho dos respetivos media, certo é que o aumento da transparência gera, pelo

menos, dois tipos de efeitos benéficos: (i) impacto preventivo-pedagógico na relação entre os proprietários e

os conteúdos emitidos pelos respetivos órgãos de comunicação social; e (ii) aumento da legitimidade

(credibilidade e confiança) dos órgãos de comunicação perante a audiência. Daí a Constituição da República

Portuguesa estabelecer uma obrigação de transparência da comunicação social no seu artigo 38.º, n.º 3.

O princípio da transparência é, aliás, transversalmente valorizado nas várias áreas da vida comunitária em

que está em causa o exercício de poder, por exemplo as obrigações de transparência dos titulares de cargos

públicos. Como escreveu o juiz Louis Brandeis, do Supremo Tribunal Federal dos EUA: «Se a ampla luz do dia

puder incidir sobre as ações dos homens, ela purificá-las-á tal como o sol desinfeta». Ora, a comunicação

social é, indiscutivelmente, um poder muito relevante na esfera pública e, como tal, sobre ela se justificam,

portanto, as mesmas exigências de transparência.

Reconheço vários argumentos que são esgrimidos contra o projeto-lei n.º 312/XII (2.ª) e em particular

contra a norma proposta que prevê a extensão das obrigações de transparência aos titulares individuais que

detenham participações societárias superiores a 5% das empresas de comunicação. Merecem destaque os

seguintes argumentos: violação inconstitucional do direito de privacidade dos proprietários individuais; a

proteção do mercado interno europeu; e a diferenciação relativamente ao regime de outras atividades

económicas.

Com todo o respeito, tais argumentos não merecem o meu acolhimento. Quanto ao argumento do direito de

privacidade contraponho que a sua proteção constitucional não é absoluta. Pelo contrário, sendo um direito de

proteção relativa no conflito com outros direitos e interesses constitucionalmente protegidos. Ora, a

transparência da titularidade dos órgãos de comunicação social é um valor constitucional relevante e expresso

no artigo 38.º, n.º 3, da Constituição. E a norma que circunscreve a obrigação de transparência às pessoas

individuais que detenham participações sociais superiores a 5% garante que a restrição do direito fundamental

da privacidade é proporcional nas várias vertentes deste princípio: necessária, adequada e proporcional stricto

sensu. Não são todos os indivíduos com participações em empresas de comunicação social que ficam

obrigados à revelação dessa participação. Só estão obrigados aqueles que detêm uma participação relevante

(5%) que lhes pode conceder algum controlo societário.

Por outro lado, não há violação do mercado interno europeu porque se trata de normas aplicáveis a

entidades que operem em Portugal e na medida que aqui operem. Por outro lado, as normas são aplicáveis a

todas as pessoas individuais e coletivas sem discriminar em função da respetiva nacionalidade e proveniência.

Não há discriminação entre nacionais, nem restrição injustificada ao investimento. Trata-se de uma fundada

exigência legal do poder público português a quem pretenda operar na atividade da comunicação social em

Portugal.

Finalmente, não faz sentido repudiar a norma por esta criar uma obrigação mais exigente do que as

aplicáveis à generalidade das atividades, designadamente às sociedades abertas admitidas à cotação em

mercado de capitais. É que o sector da comunicação social é muito particular no seu conteúdo, características

e sobretudo importância na sociedade e condições de funcionamento da democracia e da esfera pública.

Adicionalmente considero que o sentido da expressão «divulgação genérica» do artigo 38.º, n.º 3, não

inviabiliza a norma do projeto de lei que prevê a obrigação de transparência sobre as pessoas individuais. O

dever de divulgação genérica deve ser material, ou seja, independentemente da natureza coletiva ou individual

do titular e independentemente de os titulares individuais interporem sociedades comerciais ou outros veículos

de investimento. O caráter genérico da divulgação deve prender-se com a quantidade de informação

disponibilizada e o modo de divulgação utilizado, mas não pode deixar de identificar o titular pois assim a

norma constitucional não seria materialmente cumprida.

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