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Sexta-feira, 12 de abril de 2013 I Série — Número 77

XII LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2012-2013)

REUNIÃOPLENÁRIADE11DEABRILDE 2013

Presidente: Ex.ma Sr.ª Maria da Assunção Andrade Esteves

Secretários: Ex.mos

Srs. Maria Paula da Graça Cardoso Jorge Manuel Capela Gonçalves Fão

S U M Á R I O

A Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 7

minutos. Deu-se conta da apresentação dos projetos de lei n.

os

390, 391 e 396/XII (2.ª) e do projeto de resolução n.º 678/XII (2.ª).

Ao abrigo do artigo 72.º do Regimento, procedeu-se a um debate de atualidade, requerido pelo PCP, sobre o despacho do Ministro de Estado e das Finanças de congelamento do funcionamento da Administração Pública e as suas consequências, tendo-se pronunciado, a diverso título, além do Secretário de Estado do Orçamento (Luís Morais Sarmento) e da Secretária de Estado dos Assuntos

Parlamentares e da Igualdade (Teresa Morais), os Deputado João Oliveira (PCP), João Galamba (PS), Cecília Meireles (CDS-PP), José Lello (PS), Pedro Filipe Soares (BE), Duarte Pacheco (PSD), Heloísa Apolónia (Os Verdes) e Honório Novo (PCP).

Na generalidade, foi debatida a proposta de lei n.º 135/XII (2.ª) — Procede à segunda alteração ao Decreto-Lei n.º 315/2009, de 29 de outubro, que aprovou o regime jurídico da criação, reprodução e detenção de animais perigosos e potencialmente perigosos, enquanto animais de companhia reforçando os requisitos da detenção e os regimes penal e contraordenacional. Intervieram, além do

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Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna (Juvenal Silva Peneda), os Deputados Paulo Rios de Oliveira (PSD), Cecília Honório (BE), Pedro Delgado Alves (PS), Teresa Anjinho (CDS-PP) e António Filipe (PCP).

A proposta de lei n.º 136/XII (2.ª) — Procede à quinta alteração à Lei n.º 5/2006, de 23 de fevereiro, que aprova o novo regime jurídico das armas e suas munições, foi também discutida na generalidade, tendo intervindo, além do Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna, os Deputados Telmo Correia (CDS-PP), António Filipe (PCP), Cecília Honório (BE), Pedro Delgado Alves (PS) e Paulo Rios de Oliveira (PSD).

Procedeu-se ao debate, na generalidade, da proposta de lei n.º 137/XII (2.ª) — Procede à segunda alteração à Lei n.º 39/2009, de 30 de julho, que estabelece o regime jurídico do combate à violência, ao racismo, à xenofobia e à intolerância nos espetáculos desportivos, de forma a possibilitar a realização dos mesmos com segurança. Produziram intervenções, além do Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna, os Deputados Laurentino Dias (PS), Telmo Correia (CDS-PP), Miguel Tiago (PCP), Cecília Honório (BE) e Paulo Cavaleiro (PSD).

Foram debatidos, conjuntamente, na generalidade, os projetos de lei n.

os 373/XII (2.ª) — Quinta alteração à Lei n.º

37/81, de 3 de outubro (Lei da Nacionalidade) (PS) e 394/XII (2.ª) — Quinta alteração à Lei n.º 37/81, de 3 de outubro (Lei da Nacionalidade), nacionalidade portuguesa de membros de comunidades de judeus sefarditas expulsos de Portugal (CDS-PP). Além dos Deputados Maria de Belém Roseira

(PS) e José Ribeiro e Castro (CDS-PP), que apresentaram os diplomas, proferiram intervenções os Deputados Paulo Simões Ribeiro (PSD), Cecília Honório (BE) e António Filipe (PCP).

Procedeu-se ao debate conjunto, na generalidade, dos projetos de lei n.

os 355/XII (2.ª) — Cria um programa

extraordinário de combate à pobreza infantil e reforça a proteção dos direitos das crianças e jovens (PCP), 356/XII (2.ª) — Estabelece a obrigatoriedade de elaboração e apresentação de um relatório anual sobre os direitos da criança e a situação da infância em Portugal (PCP) e 357/XII (2.ª) — Cria a comissão nacional dos direitos das crianças e jovens (PCP). Além da Deputada Rita Rato (PCP), que apresentou os diplomas, intervieram os Deputados Inês Teotónio Pereira (CDS-PP), Idália Salvador Serrão (PS), Nilza de Sena (PSD) e Mariana Aiveca (BE).

Por fim, a Câmara debateu, em conjunto e na generalidade, os projetos de lei n.

os 378/XII (2.ª) — Introduz

o regime facultativo de contabilidade de caixa do IVA para as micro e pequenas empresas (BE) e 390/XII (2.ª) — Cria um regime de IVA de caixa, alterando o Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 394-B/84, de 26 de setembro (PCP). Usaram da palavra, a diverso título, os Deputados Ana Drago (BE), Honório Novo (PCP), João Pinho de Almeida (CDS-PP), Cristóvão Crespo (PSD) e Hortense Martins (PS).

A Presidente (Teresa Caeiro) encerrou a sessão eram 18 horas e 44 minutos.

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A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, Srs. Jornalistas, está aberta a sessão.

Eram 15 horas e 7 minutos.

Os Srs. Agentes da autoridade podem abrir as galerias, por favor.

Antes de dar início à ordem do dia, vou dar a palavra à Sr.ª Secretária para fazer o favor de ler o

expediente.

A Sr.ª Secretária (Maria Paula Cardoso): — Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e

foram admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: projetos de lei n.os

396/XII (2.ª) — Revoga disposições da

Lei n.º 169/99, de 18 de setembro, alterada pelas Leis n.os

5-A/2002, de 11 de janeiro, e 67/2007, de 31 de

dezembro, e pela Lei Orgânica n.º 1/2011, de 30 de novembro, do Decreto-Lei n.º 310/2002, de 18 de

dezembro, alterado pelos Decretos-Leis n.os

156/2004, de 30 de junho, 9/2007, de 17 de janeiro, 114/2008, de

1 de julho, 48/2011, de 1 de abril, e 204/2012, de 29 de agosto, e do Código Administrativo (PSD e CDS-PP),

390/XII (2.ª) — Cria um regime de IVA de caixa, alterando o Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado,

aprovado pelo Decreto-Lei n.º 394-B/84, de 26 de Setembro (PCP), e 391/XII (2.ª) — Garante que os veículos

em fim de vida não tenham como destino sucatas ilegais, alterando o Código da Estrada, aprovado pelo

Decreto-Lei n.º 114/94, de 3 de maio, republicado pelo Decreto-Lei n.º 44/2005, de 23 de fevereiro (Os

Verdes); e projeto de resolução n.º 678/XII (2.ª) — Recomenda ao Governo um conjunto de orientações

relativas às novas obrigações fiscais para o setor agrícola (PS).

Em termos de expediente, é tudo, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente: — Vamos, de seguida dar início à nossa ordem do dia.

O primeiro ponto é, como sabem, por marcação do PCP, um debate de atualidade, que já identificarei;

depois, vamos debater os requisitos de detenção relativos a animais de companhia e animais perigosos;

segue-se o debate sobre o novo regime jurídico das armas e suas munições; depois, o debate relativo à

questão da intolerância nos espetáculos desportivos relativa à violência, ao racismo e à xenofobia;

procederemos, depois, ao debate relativo à Lei da Nacionalidade; seguindo-se-lhe o debate conjunto de três

projetos de lei sobre o tema Direito das Crianças; depois, haverá um debate de outro projeto de lei, desta vez

sobre as micro e pequenas empresas; e finalmente, faremos o debate de um projeto de lei sobre o IVA de

caixa.

Temos, por isso, uma agenda muito extensa, pelo que peço aos Srs. Deputados que ocupem os vossos

lugares para darmos início ao debate do primeiro ponto da ordem do dia, que passo a identificar: debate de

atualidade, ao abrigo do artigo 72.º do Regimento da Assembleia da República, requerido pelo PCP, sobre o

despacho do Ministro de Estado e das Finanças de congelamento do funcionamento da Administração Pública

e as suas consequências.

O modelo deste debate implica uma primeira intervenção a ser feita pelo Grupo Parlamentar que fixou o

tema, que é o PCP, seguindo-se um período de pedidos de esclarecimentos e de debate, havendo um tempo

global distribuído a cada grupo parlamentar de 5 minutos e ao Governo de 6 minutos.

Sendo assim, pedindo aos Srs. Deputados que criem as condições para a intervenção do primeiro orador,

dou a palavra ao Sr. Deputado João Oliveira, do PCP.

Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Quem se

lembra das palavras do então Deputado do PSD Paulo Rangel sobre a claustrofobia democrática lê o

despacho do Ministro das Finanças e não acredita.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Como é possível numa democracia que um Governo sequestre o Estado,

paralise serviços e tome como reféns as vidas de milhões de portugueses, deixando-as suspensas de uma

decisão do agora todo-poderoso Ministro das Finanças?

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Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Como é possível numa democracia que um Governo que propôs e aprovou

um Orçamento do Estado inconstitucional se vingue de si próprio sobre o seu povo, deixando escolas,

hospitais, serviços da segurança social, centros de saúde, forças de segurança, inspeções e tribunais

paralisados nas respostas que devem dar aos cidadãos que deles necessitam?

A resposta é dura, mas óbvia: obviamente que nada disto é admissível numa democracia e deixou de ser

admitido pela Constituição que entrou em vigor em 1976!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É uma vergonha!

O Sr. João Oliveira (PCP): — O despacho do Ministro das Finanças fala em «sérias dificuldades no

cumprimento dos objetivos a que Portugal está internacionalmente vinculado e das metas orçamentais que

tem de cumprir», procurando responsabilizar o Tribunal Constitucional pelo Orçamento inconstitucional

aprovado por PSD e CDS e justificar o controlo unipessoal de toda a despesa do Estado.

Pergunta-se: onde estiveram essas preocupações quando, em 2012, por inteira e exclusiva

responsabilidade do Governo e da maioria PSD/CDS, não foram cumpridas as metas orçamentais?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

Protestos do PSD.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Onde estão essas preocupações de cada vez que se constata o

incumprimento dos objetivos em relação ao desemprego?

Onde estão essas preocupações de cada vez que se constata o agravamento da recessão económica,

apesar de os recursos nacionais continuarem a esvair-se para o buraco sem fim, criado pela especulação

financeira?

Vozes do PCP: — Exatamente!

Protestos do PSD.

O Sr. João Oliveira (PCP): — O Governo fala do prejuízo para a credibilidade externa do País, na

sequência da decisão do Tribunal Constitucional, e na necessidade de tomar medidas para reconquistar tal

credibilidade.

Pergunta-se: o que prejudica a credibilidade do País são as decisões dos tribunais que fazem cumprir as

leis e a Constituição ou é termos um Governo que em dois anos consecutivos aprova Orçamentos

inconstitucionais?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!

O Sr. João Oliveira (PCP): — O que prejudica a credibilidade externa do País é termos um Governo

vinculado ao cumprimento da Constituição ou é termos um Estado sequestrado pelo Governo?

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Afirma ainda o Governo que é necessário adotar «medidas que reforcem o

controlo da execução orçamental e, consequentemente, de contenção da despesa do sector público».

Pergunta-se: por que não tem o Governo estas preocupações de contenção da despesa cada vez que se

trata de pagar juros usurários aos agiotas e especuladores que sugam os impostos dos portugueses?

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O Sr. Bruno Dias (PCP): — Exatamente!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Por que não tem o Governo estas preocupações de controlo da despesa,

quando se trata de enterrar mais e mais dinheiro no buraco do BPN ou na recapitalização da banca?

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — O Governo afirma, agora, que o despacho é transitório e que não tem os

efeitos que se lhe atribuem. Mas não só o despacho não tem data de validade como os seus efeitos já se vão

fazendo sentir por todo o País e em todos os serviços do Estado.

Vozes do PCP: — Exatamente!

Protestos de Deputados do PSD.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Quando

se constituiu o Governo, vendeu-se a ilusão de que vinha aí um Ministro das Finanças extraordinário, porque

Vítor Gaspar era um técnico e não um político, como se um ministro pudesse tomar decisões técnicas sem

fazer opções políticas.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Exatamente!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Afinal, Vítor Gaspar, «O técnico», já não se contenta sequer em ser

reconhecido pelo Primeiro-Ministro como o político número dois deste Governo. Vítor Gaspar quer agora

concentrar em si todos os poderes, mandar em todos os ministérios e ministros e em todos os serviços do

Estado.

E alguém tem que dizer a este Ministro e a este Governo que a isto já Portugal assistiu, na década de 30

do século passado.

Aplausos do PCP.

Que não haja ilusões.

A política do pacto de agressão e deste Governo ou os despachos do Ministro das Finanças destinam-se a

um único objetivo: fazer pagar aos trabalhadores e ao povo, por inteiro, a crise do capital financeiro e

especulativo.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Se as leis que temos não lhes chegam, fazem outras; se a Constituição lhes

trava o passo, atropelam-na; e se os tribunais os condenam em flagrante delito, transferem para outros o

cumprimento da pena.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Ora bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Aqueles que há mais de 30 anos verdadeiramente mandam no País por

intermédio de sucessivos governos não querem deixar de mandar. E vão fazer de tudo para continuar a

mandar: atropelando a Constituição; arruinando a vida de quem vive do seu trabalho; negando educação ou

refeições nas escolas, tratamentos nos hospitais ou prestações sociais, porque o senhor presidente do

conselho, investido em Ministro das Finanças não deu despacho para realização da despesa.

Vozes do PCP: — Exatamente!

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O Sr. Luís Menezes (PSD): — Tenha vergonha!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Este Governo não se conforma com as regras da democracia nem com a

Constituição, que, apesar de mutilada, continua a consagrar um regime diferente daquele que em Portugal

vigorou até abril de 1974.

Este Governo não aceita a obrigação de cumprir a Constituição e procura agora criar a ideia de que os

custos da recente decisão do Tribunal Constitucional são os que decorrem deste despacho: um Estado

paralisado, direitos fundamentais dos cidadãos dependentes de decisões orçamentais do Ministro das

Finanças, um verdadeiro estado de sítio não declarado.

Por isso, este Governo tem que ser demitido. Que não haja descanso! Que todos aqueles que continuam a

ser alvo destas políticas se levantem contra este Governo, em defesa da Constituição e da democracia,

porque a sua defesa faz-se agora, porque há Constituição e democracia para defender.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento (Luís Morais Sarmento): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs.

Deputados: As metas orçamentais a que o País está obrigado no ano 2013 são muito exigentes. Apesar da

revisão do objetivo orçamental durante o sétimo exame regular, a meta estabelecida constitui ainda um

enorme desafio.

Como sabem, o Governo, em sede de Orçamento do Estado, fez um conjunto de opções que foram

aprovadas por esta Câmara, de natureza orçamental, que lhe permitiam alcançar este objetivo. O Tribunal

Constitucional entendeu que quatro das escolhas realizadas pelo Governo são inconstitucionais.

Dada a absoluta necessidade de dar cumprimento ao decidido no acórdão do Tribunal Constitucional, o

Governo terá, como se compreende, de alterar as suas escolhas e terá de eleger medidas que permitam

atingir os limites estabelecidos.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Agora, já não é verdade!

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Como já referi anteriormente, o cumprimento das metas

acordadas e estabelecidas no Programa tem garantido o financiamento à economia em condições mais

favoráveis do que aquelas que vigoravam aquando da realização inicial do Programa.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — À economia?! Não é isso que a CIP diz!

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — A decisão do Tribunal Constitucional obriga, então, a rever

o Orçamento do Estado. Mas para efetuar esta revisão, deve o Governo manter toda a flexibilidade possível.

É neste contexto que se enquadra o despacho que, hoje, está em discussão: garantir que, durante o

período de definição política, existe toda a margem possível.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Paralisando os serviços!

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Como já referi, este despacho tem também uma vigência

temporária e necessariamente curta: enquanto decorre esta decisão. Esta é a justificação deste despacho.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Onde está referida a vigência?!

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Permito-me dizer que, como já foi referido pelo Sr.

Primeiro-Ministro, o Governo não desiste de cumprir o programa de ajustamento, porque o Governo não

desiste de um Portugal independente e livre de tutelas.

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Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Tarefa difícil!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Se isto é a tarefa do Governo, «vou ali e já venho»!

A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Galamba, do PS.

O Sr. João Galamba (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Hoje, é o dia em que não vai ser um

escândalo que o Governo da República apresente aos nossos parceiros europeus as medidas que pretende

impor a Portugal, na sequência da decisão do Tribunal Constitucional.

Depois de tudo o que a maioria CDS/PSD disseram no passado, falsamente, sobre um Governo que,

alegadamente, não apresentava medidas em Portugal antes de as apresentar aos parceiros europeus, hoje

sabemos que o Ministro Vítor Gaspar decidiu não falar aos portugueses e ir diretamente ao Conselho Europeu

negociar com os credores. Isto é uma vergonha, Sr. Secretário de Estado! O Governo tem a obrigação de,

antes de tudo, negociar e informar os portugueses sobre aquilo que pretende fazer à sua vida.

Aplausos do PS.

Sobre o despacho, Sr. Secretário de Estado, para além de representar uma medida completamente

irracional e irresponsável do ponto de vista da gestão das finanças públicas, o Partido Socialista tem sérias

dúvidas quanto à sua legalidade. É porque o Governo decidiu arbitrariamente violar a autonomia financeira e

administrativa de toda a Administração Pública e por uma birra, por uma resposta irracional à decisão do

Tribunal Constitucional, congelar, parar o País e sequestrar toda a Administração Pública em nome de uma

obsessão do Ministro das Finanças e do Ministério no qual o Sr. Secretário de Estado trabalha.

Aplausos do PS.

Sr. Secretário de Estado, o desnorte deste Governo é total. Sem necessidade e sem que se perceba

porquê, o que não pode deixar de ser considerado um desafio a todos os Ministros presentes no Conselho de

Ministros, o Sr. Ministro das Finanças decidiu fazer algo que já foi feito num passado de má memória:

centralizar em si toda a despesa e todo o funcionamento da Administração Pública, desconsiderando os

portugueses, desconsiderando todos os funcionários públicos e desconsiderando também os Ministros que

estão presentes no Conselho de Ministros, os quais o Sr. Ministro Vítor Gaspar, o Sr. Secretário de Estado e o

seu Ministério decidiram ignorar.

Sr. Secretário de Estado, o que o acórdão do Tribunal Constitucional impõe ao Governo é serenidade e

responsabilidade, não é birra, não são comportamentos incendiários como aqueles que estão plasmados no

despacho que entrou em vigor na segunda-feira.

Sr. Secretário de Estado, não se suspende a Administração Pública e o País por tempo indeterminado até

que o Conselho de Ministros, que não consegue despedir nem exonerar o Ministro Relvas, tome uma decisão

como limite de despesa.

Sempre que houve Orçamentos retificativos ou alterações orçamentais nunca uma decisão desta natureza

foi vista. Isto é absolutamente inaceitável! É um ato de prepotência e de terrorismo administrativo por parte

deste Governo que não pode deixar de merecer a censura deste Parlamento.

Protestos da Deputada do PSD Conceição Bessa Ruão.

Sr. Secretário de Estado, este Governo não perde a oportunidade de perder uma oportunidade. A atuação

perante sérios reveses para este programa de austeridade demonstra a verdadeira face deste Governo e o

modo como encara este programa de ajustamento. Este programa de ajustamento não é, nem nunca foi, uma

oportunidade para reformar o País, é um custo, uma inevitabilidade que exige da parte do Governo a defesa

intransigente dos interesses do País e dos portugueses. Mas este Governo faz exatamente o contrário, ou

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seja, cada revés, em vez de ser encarado como uma oportunidade, é encarado como uma contrariedade e

com embaraço. Foi assim na quinta avaliação, quando o Fundo Monetário Internacional (FMI) reconheceu

publicamente que a austeridade não funcionava e este Governo, em vez de aproveitar a situação para

renegociar o Memorando, decidiu carregar na dose e apresentar um Orçamento do Estado para 2013

absolutamente irracional, que não poderá ser cumprido.

Agora, na sétima avaliação, depois de terem perdido a oportunidade para renegociar uma trajetória credível

de ajustamento, eis que surge o acórdão do Tribunal Constitucional. Aquilo que se exige a um Governo é que

aproveite esse acórdão, juntamente com o descontentamento generalizado da população portuguesa, para

renegociar o acordo. Mas o Governo, mais uma vez, reage com embaraço, como se este acórdão fosse uma

contrariedade para a sua própria estratégia.

Fica aqui definitivamente provado, Sr. Secretário de Estado, que o Governo olha para este Memorando de

Entendimento, olha para a estratégia de ajustamento e para toda a austeridade como a oportunidade para

fazer aquilo que os portugueses nunca dariam ao CDS e ao PSD em eleições. Isso é gravíssimo, Sr.

Secretário de Estado, porque revela de forma muito clara que interesses defende este Governo e quais são as

suas prioridades.

Sr. Secretário de Estado, perante o acórdão do Tribunal Constitucional, chantagear e sequestrar o País,

paralisando o País inteiro como está este Governo paralisado, não é aceitável. Este Governo devia ter feito

aquilo que faria qualquer Governo responsável e que pretenda defender os interesses da população que

supostamente serve e pela qual foi eleito, ou seja, renegociar e apresentar à União Europeia um argumento

muito simples. Para além de todos os argumentos de eficácia e de justiça, este Governo tinha aqui a

oportunidade de apresentar um outro argumento: o da ilegalidade e da inconstitucionalidade da atual trajetória.

A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.

O Sr. João Galamba (PS): — Este Governo escolheu não fazer isso, e agora tem o País em suspenso, em

ameaça, sequestrado por um Governo vingativo, irracional e completamente desnorteado, que não tem a mais

pequena ideia do que quer fazer ao País, a não ser insistir irracionalmente na destruição, primeiro, do País e

dos direitos dos portugueses e, agora, de uma obrigação que qualquer Governo tem, independentemente das

suas opções ideológicas, que é o dever de assumir de forma responsável a gestão corrente do País.

A Sr.ª Presidente: — Queira terminar.

O Sr. João Galamba (PS): — Sr. Secretário de Estado, este despacho faz exatamente o contrário. É uma

vendetta, é uma irresponsabilidade e é a demonstração definitiva de que estamos entregues a um bando de

irresponsáveis, que não têm outro objetivo que não cumprir cega e dogmaticamente orientações da União

Europeia,…

Aplausos do PS.

… que em nenhuma circunstância estão dispostos a contestar e a renegociar, porque o seu verdadeiro

objetivo é desmantelar o País e impor uma agenda cega que não tem maneira de funcionar!

A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.

O Sr. João Galamba (PS): — Sr. Secretário de Estado, os senhores violaram todas as obrigações que

foram delegadas pelo povo português,…

Protestos do PSD e do CDS-PP,batendo com as mãos nos tampos das bancadas.

… e neste momento não representam os interesses dos portugueses, não podem representar o Estado e

não representam ninguém a não ser a vossa própria irresponsabilidade.

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Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Antes de dar a palavra à Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da

Igualdade, que pretende interpelar a Mesa, quero só dizer que não é muito bom interromper o decurso das

intervenções dos Srs. Deputados, mas há limites. Pedia a todos os Srs. Deputados que respeitassem esses

limites.

Tem a palavra, Sr.ª Secretária de Estado.

A Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade (Teresa Morais): — Sr.ª

Presidente, através de uma interpelação à Mesa, e contra a tese do Sr. Deputado João Galamba da birra e da

vendetta, gostaria de pedir a V. Ex.ª que fizesse distribuir às bancadas as declarações proferidas ontem pelo

Sr. Presidente do Tribunal Constitucional, quando disse que o despacho era perfeitamente compreensível.

Vozes do PCP: — É do Tribunal de Contas!

A Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade: — Sr.ª Presidente, eu referia-

me, naturalmente, ao Sr. Presidente do Tribunal de Contas, Guilherme d’Oliveira Martins.

Vozes do PCP: — Ah!…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É a obsessão com o Tribunal Constitucional!

A Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade: — Não é obsessão, é a

circunstância de ter sido aqui invocada, por diversas vezes, a decisão do Tribunal Constitucional!

Corrigindo, portanto, o que disse, Sr.ª Presidente, peço que seja distribuído o texto com as declarações do

Sr. Presidente do Tribunal de Contas, onde ele diz que considera perfeitamente compreensível, nas presentes

circunstâncias, o despacho do Sr. Ministro das Finanças.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. João Oliveira (PCP): — E ouviu a Dr.ª Manuela Ferreira Leite ou, então, o Dr. Pacheco Pereira?

A Sr.ª Presidente: — Sr.ª Secretária de Estado, faremos distribuir o documento. Cabe na base regimental

da interpelação.

Prosseguindo o debate, a Mesa regista inscrições dos Srs. Deputados Cecília Meireles, do CDS-PP, Pedro

Filipe Soares, do Bloco de Esquerda, e Duarte Pacheco, do PSD.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Meireles para uma intervenção.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Secretário de Estado do Orçamento, Sr.ª

Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade, Sr.as

e Srs. Deputados: Confesso que,

ouvindo este debate, às vezes, tenho dúvidas se estaremos todos a falar do mesmo despacho.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Independentemente dessas dúvidas, talvez seja possível — não diria

entendermo-nos, porque creio que será difícil chegarmos a um entendimento comum — chegarmos a uma

discussão serena e razoável.

Já vi que este tema inspira sentimentos muito fortes, mas o facto de os sentimentos serem muito fortes e,

para utilizar um eufemismo, de a situação do País não ser nada fácil (eu diria mesmo que a situação do País é

muito difícil) significa que temos de fazer um esforço para não lançar o pânico e para não lançar atoardas que

depois se tornam difíceis de explicar.

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Sendo assim, penso que seria útil que, de forma serena, discutíssemos o que está em causa neste

despacho. Vejamos, este despacho tem várias características, a primeira das quais é a excecionalidade…

A Sr.ª Presidente: — Sr.ª Deputada, peço desculpa por interromper, mas fui informada de que duas

bancadas não estão a receber som.

Pausa.

Sr.ª Deputada, já pode prosseguir. Peço desculpa pela interrupção, mas temos de ter condições ao nível do

som.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, muito obrigada.

Como eu estava a dizer, este despacho tem uma característica fundamental, de que, aliás, a Sr.ª Secretária

de Estado já falou, que é a excecionalidade.

Como é óbvio, não podemos entender este despacho como se ele fosse para uma situação regular.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É mesmo irregular!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — E se é verdade que o próprio despacho fala na decisão do Tribunal

Constitucional, que é para cumprir e para respeitar, independentemente do que cada um de nós possa achar

da mesma,…

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — … também é verdade que há mais fatores que fazem com que a

nossa situação seja excecional. Por exemplo, é o caso de estarmos sob um plano de assistência financeira; de

se estar a iniciar um processo de renegociação dos reembolsos que, se não for bem-sucedido, pode significar

que a gestão da nossa dívida pública vai ser completamente impossível já no ano que vem;…

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem lembrado!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — … e também de já estarmos a falar da possibilidade da vinda

excecional da troica a Portugal.

O Sr. João Oliveira (PCP): — A Sr.ª Deputada só diz isso porque já não é secretária de Estado!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Mais: ao contrário daquilo que aqui tem sido dito — é bom que isto

fique claro porque há portugueses que estão a ouvir-nos e que podem não perceber o que se está a passar —,

este despacho não suspende a despesa pública, não congela o funcionamento do Estado.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Como é evidente!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Isso é falso! As despesas com pessoal e os salários estão

excecionados. Os contratos em execução, que são a esmagadora maioria dos contratos no Estado, estão

excecionados.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Então, para que serve o despacho?

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — As prestações sociais estão excecionadas, não estão congeladas. A

título de exemplo, já há, aliás, declarações de fonte do Ministério da Saúde explicando que a generalidade das

despesas vão continuar com normalidade, e o Ministério da Administração Interna diz exatamente o mesmo.

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O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Exatamente!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Mais: mesmo para aquelas despesas em que os senhores, à falta de

melhor expressão, falam em congelamento, utilizam uma palavra que não será a mais correta; congelamento é

uma forma de expressão, porque é evidente que as despesas podem ser feitas com autorização do Ministério

das Finanças.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — É óbvio!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Por último, mas não menos importante, não estamos a falar de um

despacho que vá vigorar sem limites no ordenamento jurídico, estamos a falar de um despacho cujo tempo de

vigor se medirá, provavelmente, em dias, estamos a falar de uma situação absolutamente transitória e

excecional.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Deviam ter referido o prazo no despacho!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — E se não sabe, Sr. Deputado, é porque não leu o despacho!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Claro!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — O despacho é claro ao dizer que está em vigor até à tomada de

medidas no Conselho de Ministros que fixem novos tetos de despesa.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Como é óbvio!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Digo-lhe que este Governo, e muito bem, e esta bancada, e muito

bem, não se demitem de fazer escolhas. As escolhas sobre a despesa que vamos fazer são decididas nesta

Casa, não são decididas por, nos serviços, haver umas que se antecipam no tempo e outras que ficam para

depois; são escolhas políticas, que nos cabe a nós fazer. Este despacho assegura que quem escolhe a

despesa é quem aqui está e não os serviços ou os contratos que são executados antes ou depois.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente: — A Mesa regista um pedido de palavra do Sr. Deputado José Lello. Pretende intervir

ao abrigo de que norma do Regimento, Sr. Deputado?

O Sr. José Lello (PS): — Peço a palavra para interpelar a Mesa, na sequência dos trabalhos.

A Sr.ª Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Lello (PS): — Sr.ª Presidente, a minha interpelação está, porventura, desajustada no tempo, na

medida em que pedi a palavra no seguimento da interpelação da Sr.ª Secretária de Estado.

A Sr.ª Presidente: — O Sr. Deputado tem razão, mas a Mesa não se apercebeu do seu pedido.

O Sr. José Lello (PS): — Entendo perfeitamente, Sr.ª Presidente, até porque a minha interpelação não

perdeu oportunidade.

Sr.ª Presidente, queria só informar V. Ex.ª, a maioria e a bancada do Governo que, com os meus parcos

recursos, vou tentar coligir a informação decorrente da intervenção da Dr.ª Manuela Ferreira Leite de ontem

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para dar conhecimento do teor das suas considerações em relação às mesmíssimas questões levantadas pela

Sr.ª Secretária de Estado, que, porventura, serão esclarecedoras da maioria.

A Sr.ª Presidente: — Sr. Deputado, isso não é uma interpelação.

Prosseguindo o debate, tem agora a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares,

do Bloco de Esquerda.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.ª e Sr. Secretários de Estado, Sr.as

e Srs.

Deputados: É extraordinário como o PSD agora vive num mundo em que só ouve o que lhe interessa.

Escutemos, por exemplo, já que o debate se virou num espaço de citações, as palavras de Manuela Ferreira

Leite, que, penso conhecerão,…

Protestos da Deputada do PSD Conceição Bessa Ruão.

… e que há uns tempos estava sentada exatamente nessa bancada e até já fez parte, como Ministra das

Finanças, de Governos do PSD e do CDS. Dizia ela que a decisão do Ministro Vítor Gaspar e deste Governo

não passa de uma dramatização e teatralização e que o congelamento destes gastos no Estado não é nada

mais nem menos do que uma punição do Governo ao País. São estes os termos em que devemos ter este

debate.

Ouvimos o CDS, tentando «tapar o sol com uma peneira», dizer que o despacho é importante, mas

inconsequente; que o despacho é um sinal, mas não serve para nada; que o despacho até pode aqui servir

para congelar despesas, mas não se preocupem, pois já várias pessoas disseram que ele não vai parar

despesa nenhuma.

Este é o espaço da inconsequência de uma maioria completamente desorientada.

É claro que percebemos que pelo segundo ano consecutivo o Ministro Vítor Gaspar vê o seu Orçamento

ser chumbado pelo Tribunal Constitucional.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Muito bem!

Protestos da Deputada do PSD Conceição Bessa Ruão.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Qual é a conclusão que o Governo tira? É a de que o Ministro Vítor

Gaspar deve ter poderes reforçados.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Muito bem!

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Afinal, o crime compensa para este Governo e, particularmente, para o

Ministro Vítor Gaspar, que viu a sua autoridade questionada pelo Tribunal Constitucional, mas também viu o

seu autoritarismo reforçado por este despacho.

Estas são as escolhas que estão em cima da mesa.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Muito bem!

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Diz-nos o Governo, pela voz do Primeiro-Ministro, pela voz do Ministro

Vítor Gaspar e até pela voz do Sr. Secretário de Estado, que isto acontece devido ao Tribunal Constitucional.

É falso! Esta mentira deve ser cabalmente esclarecida. Esta é uma escolha do Governo e é claramente um

castigo que o Governo quer infligir ao País e à Administração Pública pela decisão do Tribunal Constitucional.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Muito bem!

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Nós percebemos o que está em causa. Esta é uma visão punitiva da

democracia e, por isso, quem não vive bem com a Constituição não é a oposição. Quem não vive bem com a

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Constituição é este Governo, e este despacho prova exatamente isso. É a estratégia do terror, é a estratégia

do caos que o Governo quer trazer ao País para ser quanto pior melhor. Está pior? Pois é, a culpa é do

Tribunal Constitucional. Está pior? Pois é, a culpa é da oposição. O Governo é que parece não ter culpa

nenhuma nesta matéria. Até parecia que tudo estava a correr bem!

Ouvimos, na sexta-feira passada — não passaram muitos dias —, aqui, no Plenário, o Sr. Primeiro-Ministro

dizer que tudo estava a correr bem. Agora, que o Tribunal Constitucional disse que o Governo tinha de

encontrar alternativas para 1320 milhões de euros, um terço do que foi o desvio orçamental de Gaspar no ano

passado,…

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Exatamente!

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — … afinal, caiu o «Carmo e a Trindade»! É incompreensível, Sr.as

e Srs.

Deputados! É incompreensível!

Percebemos que não têm nenhuma preocupação com a saúde de quem trabalha no Ministério das

Finanças ou, mesmo, com as tendinites que o Sr. Secretário de Estado e o Sr. Ministro poderão ter por

assinarem tantas autorizações, porque, face à inundação de pedidos de autorização de despesa que vão

chegar, é claro que será esse o desfecho!

O que não podemos aceitar é que se escolha uma via em que o Ministro que perdeu a autoridade passe a

autoritário, em que se escolha uma via em que aquele que era o sucesso — que era um desvio três vezes

superior ao indicado pelo Tribunal Constitucional — em cinco dias passe a ser o descalabro.

Esta é a estratégia da chantagem, é a estratégia do castigo. E nós nessa não entramos, em nome da

seriedade na política.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — A próxima intervenção é do Sr. Deputado Duarte Pacheco, pelo PSD.

Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs. Deputados: Inicio

por uma nota prévia.

Sr.ª Presidente, assistimos já neste debate, em particular pela bancada do Partido Socialista, a uma

agressividade, a ataques pessoais, a ofensas inimagináveis em democracia.

O Sr. Paulo Batista Santos (PSD): — É verdade!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Este tipo de discurso só evidencia uma má e muito pesada consciência

pela bancarrota a que conduziram o País e pela ausência de quererem participar na procura de soluções de

que o País bem necessita.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Não sei se foi ao mirarem-se ao espelho que identificaram o tal «bando de irresponsáveis», expressão que

utilizaram nesta Câmara!?

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Esquecem-se, por vezes, que Portugal, neste momento, é um país

intervencionado; esquecem-se que Portugal é um país com dificuldades de financiamento, não de hoje, mas

de há vários anos e que, por isso mesmo, estamos a viver um momento difícil, um momento de emergência;

esquecem-se que estamos perante uma execução orçamental que, desde o primeiro dia, sabíamos que era

difícil, que tinha de ser muito exigente; esquecem-se que a decisão do Tribunal Constitucional, gostando mais

ou gostando menos dela, provoca dificuldades acrescidas na execução orçamental.

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O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — O Orçamento do Estado é que provoca dificuldades!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Perante este resultado, só havia três hipóteses, e é bom que todos os

portugueses e cada um de vós diga qual a que prefere.

Aumentar mais impostos para tapar o acréscimo de despesa, querem?

O Sr. João Oliveira (PCP): — Renegociação da dívida! Diálogo!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Não, nós não queremos!

Querem mais dívida? O Partido Comunista está a dizer: «Nós optamos por mais dívida».

O Sr. João Oliveira (PCP): — Não, não! Renegociação da dívida!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Nós dizemos que não queremos mais dívida, porque mais dívida significa

mais impostos para as gerações futuras.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Logo, optamos pela terceira solução, que é a de cortar em outras despesas.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Capitalização da banca!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — É esse o caminho que está a ser estudado e é nessa estratégia que se

insere este despacho.

O Conselho de Ministros, muito em breve, com o novo teto de despesa, virá identificar quais os outros

cortes que vão ser apresentados ao País. Mas, pelo meio, não podem ser assumidos novos compromissos,…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Quais compromissos?!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — … compromissos, esses, que venham diminuir os graus de liberdade do

Governo na fixação dessas mesmas metas. É só disso que estamos a falar: de um despacho que é um não-

assunto, porque já aconteceu no passado até em Governos socialistas, porque é excecional, porque é

temporário e porque aquilo que nós sabemos é que, muito em breve, teremos aqui soluções.

O Sr. João Oliveira (PCP): — O Sr. Deputado vive em que planeta?!

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — É tudo um verão azul!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — E se faltava mais alguém com possibilidades de resposta, sabemos as

que foram dadas ontem pelo Dr. Oliveira Martins, Presidente do Tribunal de Contas, e podemos comparar a

diferença entre o bom senso e o populismo demagógico da oposição neste debate.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. João Oliveira (PCP): — E a Dr.ª Ferreira Leite? Ouviu o que ela disse?

A Sr.ª Presidente: — A próxima intervenção é da Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, de Os Verdes.

Faça favor, Sr.ª Deputada.

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A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as

e Srs.

Deputados: Apesar das minhas dificuldades, hoje, talvez devesse dizer ao Sr. Deputado Duarte Pacheco que

os não-assuntos para este Governo e para esta maioria, normalmente, dão em demissão. Vamos ver!…

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Bem lembrado!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr.as

e Srs. Deputados, só quem vê números à frente e nada mais

é que pode considerar este despacho do Ministro das Finanças compreensível ou até aceitável. Quem não

pensa nas pessoas e nas consequências concretas das determinações sobre as pessoas é que pode achar

alguma razoabilidade neste despacho.

Protestos da Deputada do PSD Conceição Bessa Ruão.

O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Dê exemplos concretos!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Vejamos: no dia útil, imediatamente seguinte à decisão do

Tribunal Constitucional, o Sr. Ministro das Finanças faz publicar este despacho que determina que a

Administração Pública não gasta nem mais um novo cêntimo sem a sua prévia autorização.

O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Isso é mentira!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Ora bem, isto é uma resposta claramente imediata e vingativa à

decisão do Tribunal Constitucional, com a qual o Governo já disse e redisse que não concorda. Mas não

concordar é uma coisa; agora, ganhar aqui uma componente de vingança, de resposta vingativa sobre esta

decisão é outra coisa. É como se o Governo estivesse a fazer uma ameaça aos portugueses. É o bloqueio dos

serviços públicos, se se quiser. É o «eu desfaço serviços públicos e depois venham cá queixar-se. Se calhar,

ainda me vêm dizer que era bom ter tirado o subsídio de férias!». Isto não é nada aceitável, Sr.as

e Srs.

Deputados!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Exatamente!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — É como se o Ministro das Finanças tivesse necessidade de, neste

momento, dizer ao País, em função daquela que foi a decisão do Tribunal Constitucional: «Aqui, quem manda

sou eu!». Não, Sr.as

e Srs. Deputados, isto não é minimamente aceitável.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Exatamente!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — E, depois, há algo que me faz uma profunda confusão:…

O Sr. João Galamba (PS): — Só uma?!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — … por que é que o Ministro das Finanças viverá com esta

absoluta desconfiança relativamente aos outros ministérios? Como é, Sr. Secretário de Estado? Os outros

ministros não são competentes para poupar? Não. Não são! São uns gastadores, são uns esbanjadores, não é

verdade?

Risos do Deputado do PCP Bruno Dias.

Não acatariam uma determinação do Governo. É preciso o Sr. Ministro das Finanças pôr lá a sua

autorização. Bem, isto é uma manifestação completa, por parte do Ministro das Finanças, de entender que

todos os outros ministros são absolutamente incompetentes para executar a sua determinação.

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O Sr. Bruno Dias (PCP): — Exatamente!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Bem observado!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Há outra coisa que nos deve fazer grande confusão: quem está

no terreno, Sr.as

e Srs. Deputados, já veio dizer que não aguenta mais do que alguns dias este despacho. As

pessoas andam a sonhar? Vêm pessoas das universidades dizer que há cantinas que podem fechar e deixar

de fornecer alimentação aos alunos, há laboratórios que podem deixar de funcionar e, portanto, os estudantes

não poderão ter essa componente prática de experimentação…

O Sr. Bruno Dias (PCP): — São pormenores!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Pois, são pormenores, de facto, como diz o Sr. Deputado Bruno

Dias.

Protestos do PSD.

… há escolas que se queixam, há unidades de saúde que se queixam… Portanto, as pessoas que estão no

terreno vivem absolutamente assustadas. Isto não significa nada? As pessoas estão todas a sonhar?!

Protestos do PSD.

Na verdade, aquilo que os Srs. Deputados estão a dizer é que ninguém compreendeu o despacho do Sr.

Ministro das Finanças.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Exatamente!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Só mesmo o PSD e o CDS é que compreendem,…

O Sr. Bruno Dias (PCP): — E nem todos!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — … mais ninguém no País consegue compreender!

E nem todos, de facto, porque houve pessoas, designadamente do PSD, que hoje já aqui foram citadas, e

outras que vieram dizer muitíssimo mal deste despacho,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — A Dr.ª Manuela Ferreira Leite!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — … vieram dizer que é de uma absoluta insensatez.

Por último, Sr.ª Presidente, gostava de dizer, para que fique bem claro, que há coisas que são tão óbvias

— já estou como o Sr. Presidente do Tribunal Constitucional —,…

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Isso é que é grave!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — … mas que são muito fortes que é necessário que sejam ditas: a

Constituição da República Portuguesa é para cumprir!

Julgo que, neste momento, há muitos portugueses que se aperceberam da importância da Constituição da

República Portuguesa.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Exatamente!

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A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — A Constituição da República Portuguesa é determinante para o

bem-estar e para a salvaguarda da democracia, é um travão a coisas absolutamente hilariantes, que não

fazem sentido nenhum e que destroem o País.

Sr.as

e Srs. Deputados, dizia há pouco o Sr. Deputado Duarte Pacheco: «Então, agora as pessoas têm de

dizer se são a favor do corte da despesa ou do aumento dos impostos».

O Sr. Paulo Batista Santos (PSD): — Ou da dívida!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Mas os senhores não veem mais nada à frente?! Os senhores

não conseguem encontrar outras soluções?!

Sr. Deputado, quando Os Verdes, e não só, dizem e redizem que é preciso que o Governo ganhe vontade

imediata — e, quando se diz imediata, é «já» — de renegociar a dívida,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Renegociar! Exatamente!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — … o Sr. Deputado não pode virar a cara a esta solução.

Renegociar a dívida é um pressuposto fundamental para tudo aquilo que se quer a seguir,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — … e o que se quer a seguir é levantar o País. Outros países

tiveram essa possibilidade: a Alemanha, que hoje tem os juros quase a 0%, Sr. Deputado! Isto é quase gozar

connosco, não é verdade? Não é a situação deles que é preocupante, é a nossa, porque nós, miseráveis,

estamos a ser joguetes de um jogo de especulação, estamos a ser peças de um jogo de especulação

perfeitamente absurdo. Isto tem de ser denunciado!

Sr. Deputado, renegociar a dívida com os nossos credores e, fundamentalmente, nos montantes, nos

prazos e nos juros absolutamente absurdos que estamos a pagar é determinante.

Portanto, o Sr. Deputado não deixe de ver esta questão como uma solução primeira e imediata que é

preciso ter e implementar.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Fartos de saber estão eles!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — É preciso que o Governo a tome como uma coisa séria para

implementar. Mas não. Cada vez que se fala na renegociação da dívida, os senhores olham para o lado e

continuam a perguntar: «Querem mais impostos ou querem cortes na despesa?». Não, Sr. Deputado. Já

chega de brincadeiras!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Exatamente!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — É verdade! Já chega de brincadeira!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Vamos ter seriedade nesta questão!

A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Termino já, Sr.ª Presidente.

Como eu estava a dizer, vamos ter seriedade e ver todas as hipóteses que estão ao nosso alcance,

fundamentalmente aquelas que não esfrangalham a vida das pessoas.

Pensem nas pessoas e parem de pensar única e exclusivamente nos números.

Aplausos de Os Verdes e do PCP.

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Protestos do PSD.

A Sr.ª Presidente. — A próxima intervenção é do Sr. Deputado Honório Novo, pelo PCP.

Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Secretário de Estado: Vamos ver se conseguimos

esclarecer aqui uma dúvida. Se este despacho não se refere a nada e exceciona todas as despesas, por que

foi ele exarado, Sr. Secretário de Estado?

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exatamente!

O Sr. Honório Novo (PCP): — Que objetivos o despacho persegue? Será apenas para levantar o umbigo

do Sr. Ministro Vítor Gaspar e continuar a ofender o Tribunal Constitucional?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

Protestos da Deputada do PSD Conceição Bessa Ruão.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Secretário de Estado, na sua intervenção inicial, o senhor disse que o

Governo tem de reorganizar as metas orçamentais. Porquê, Sr. Secretário de Estado? É inevitável? É

obrigatório? Faz isso porque o Governo alemão e o Sr. Ministro das Finanças mandou o Governo português

fazer? Por que é que o Governo não encontra uma alternativa? E vou dizer-lhe qual: altere as metas

orçamentais, passe o défice de 5,5% para 6,2% e defenda a honra do País dizendo à troica que, em Portugal,

quem manda mais do que a troica e o Governo alemão é o Tribunal Constitucional.

Era o que devia fazer! Faça isso!

Aplausos do PCP.

Sr.ª Presidente, Sr. Secretário de Estado, é falso que a decisão do Tribunal Constitucional comprometa a

execução orçamental. A execução orçamental, Sr. Secretário de Estado, já está comprometida há muito.

Vozes do PCP: — Exatamente!

O Sr. Honório Novo (PCP): — Por que é que, afinal, em 2012, o défice passou de 4,5% para 6,4%? Por

que é que, em 2012, a execução orçamental derrapou em mais de 3000 milhões de euros?

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Boa pergunta!

O Sr. Honório Novo (PCP): — Também foi por causa do Tribunal Constitucional?

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Boa pergunta!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Deve ter sido!…

O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Secretário de Estado, a execução orçamental, em 2013, está

comprometida desde que o Orçamento do Estado foi aprovado.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Tal e qual!

O Sr. Honório Novo (PCP): — Os relatórios de execução orçamental, com as despesas de um

desemprego escandaloso (que era para ser de 16,4% e já vai em 16,8%) e com a derrapagem das receitas

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fiscais e contributivas que todos os relatórios de execução orçamental já mostraram, esses relatórios, dizia,

revelam e confirmam que a execução orçamental, em 2013, era e é uma miragem, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. Honório Novo (PCP): — O Tribunal Constitucional, ao rejeitar, pela segunda vez, Orçamentos deste

Governo mostrou que este Governo só consegue uma coisa: governar fora da lei.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exatamente!

O Sr. Honório Novo (PCP): — E o Governo serve-se do pretexto do Tribunal Constitucional para tentar, de

novo, um assalto aos direitos constitucionais, para encontrar um álibi para tentar novos ataques às funções

sociais do Estado, e utiliza-o, desta vez, como álibi para procurar lançar o caos e a confusão nos serviços da

Administração Pública.

Vou dar-lhe dois exemplos, Sr. Secretário de Estado. Um deles surgiu pela voz do Reitor da Universidade

do Minho, que refere: «A Universidade do Minho pode ser obrigada a fechar as portas, a começar pelas

cantinas que só têm uma semana de sustentabilidade».

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Desmintam isto!

O Sr. Honório Novo (PCP): — Outro exemplo, Sr. Secretário de Estado, é uma ordem enviada da direção

da ASAE, na quarta-feira, dia 10 de abril, aos inspetores deste serviço dizendo-lhes que não abasteçam as

viaturas e não utilizem as autoestradas e também que as viaturas devem ser imediatamente aparcadas nas

sedes e que só devem ser usadas em último recurso.

Estes são os exemplos de que o despacho nada vale e nada significa!…

O Sr. Bruno Dias (PCP): — É mentira?!

O Sr. Honório Novo (PCP): — Perante este despacho e face a este Governo, é obrigatório tomar uma

posição clara. Não são admissíveis, Srs. Deputados, mudanças de posição de uma semana para a outra, ao

sabor dos ventos. Não se pode, numa semana, exigir a demissão deste Governo e reclamar eleições

antecipadas e, na semana seguinte, «meter a viola no saco» e deixar de exigir aquilo a que o povo e o País

têm direito e que querem e exigem nas ruas deste País.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Ora bem!

O Sr. Honório Novo (PCP): — Por isso, da nossa parte, não há duas palavras, nem duas posições. A

democracia e o futuro do País exigem novas eleições e uma política alternativa que rompa com a troica e

defenda Portugal.

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Ouvi o «comício»

do Sr. Deputado João Galamba, em que apelou à serenidade, serenidade que o Sr. Deputado não teve.

O Sr. Deputado deveria ter lido o despacho com cuidado, porque o despacho exceciona as despesas que

estão contratadas e que permitem manter toda a Administração Pública a funcionar, como, aliás, acontece.

Vozes do PCP: — Então, para que é que serve?!

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O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — O que o despacho diz é que não é permitido estabelecer

novos compromissos. Ora, novos compromissos não são a execução de contratos que estão estabelecidos.

Protestos do PCP.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — E comprar batatas para uma cantina escolar, por exemplo?

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Repito, novos compromissos não são contratos que estão

em execução.

Como já referi, o Governo deseja manter, até à tomada de decisões, toda a flexibilidade possível e

desejável, neste momento.

O Sr. Deputado João Galamba falou também em ilegalidade, porque, segundo ele, este despacho viola a

autonomia financeira dos serviços. Sr. Deputado, em termos de abrangência, este despacho tem exatamente

a mesma abrangência de despachos anteriores do Governo do PS.

O Sr. João Galamba (PS): — Tem de demonstrar isso, Sr. Secretário de Estado!

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Tem exatamente os mesmos termos, nesse aspeto, Sr.

Deputado. Portanto, não sei em que é que isto viola a legalidade.

Sr. Deputado Honório Novo, pergunta o Sr. Deputado por que razão temos de alterar o Orçamento,…

O Sr. Honório Novo (PCP): — As metas!

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — … por que razão não podemos expandir o défice e

executar este Orçamento com um défice mais alto. Sr. Deputado, qual é a parte da frase «não há dinheiro»

que o Sr. Deputado não entende?

Aplausos do PSD e CDS-PP.

Protestos do PCP.

Sr. Deputado, terei todo o prazer em discutir a execução orçamental de 2012, na Comissão de Orçamento,

Finanças e Administração Pública, com o Sr. Deputado. Mas chamo a sua atenção para o seguinte: aquele

desvio que houve em 2012, e que explicarei em devido tempo, não implicou nem mais um euro de

financiamento relativamente àquilo que estava estabelecido. Já este desvio implica mais financiamento.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Não, não implica!

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Portanto, há que conter este desvio dentro do próprio

Orçamento.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Renegoceie os juros!

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — E, Sr. Deputado, grave seria deixar o País sem

financiamento, como foi deixado em abril de 2011, grave seria deixar o País com compromissos por pagar,

como deixaram em abril de 2011, grave seria, Sr. Deputado, não fazermos nada, chegarmos ao fim e não

termos capacidade de financiamento,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Isso é propaganda!

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — … porque aí não há despacho do Sr. Ministro das

Finanças, é a realidade que se impõe.

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Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Isso é propaganda! Renegoceiem os juros e já têm dinheiro!

A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.ª e Srs. Secretários de Estado, Sr.as

e Srs.

Deputados: Devo dizer ao Sr. Secretário de Estado que a frase «não há dinheiro» não é sua, foi dita

publicamente pelo Ministro Vítor Gaspar, aquele mesmo que gostaríamos que estivesse cá para discutir esta

matéria. Curiosamente, não está, pelos motivos que conhecemos.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Sr.ª Presidente, assim, com tanto ruído, não posso continuar…

A Sr.ª Presidente: — Desconto-lhe o tempo, Sr. Deputado, mas já é pouco.

Faça favor de continuar.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Este é o típico eco das bancadas parlamentares quando não se quer

entrar no debate pelo conteúdo.

E o conteúdo, aqui, é relevantíssimo. É que tanto a bancada do CDS, como o Sr. Secretário de Estado, e

também a bancada do PSD, que referiu quase a mesma coisa, dizem que o despacho é importante mas que

não serve para nada. Ora, nem uma coisa nem a outra são verdadeiras.

Vejamos o que diz, por exemplo, um comunicado da reitoria da Universidade de Lisboa: «Ficamos

impedidos de comprar produtos correntes para os nossos laboratórios, de adquirir bens alimentares para as

nossas cantinas ou de comprar papel para os diplomas dos nossos alunos». Este é o resultado da aplicação

deste despacho — e nem esta maioria consegue «tapar o sol com a peneira».

Agora, o resultado concreto que vemos é um Governo que decide ter uma mão de ferro sobre a despesa

quando ela diz respeito a produtos de limpeza, a produtos de higiene.

O Governo não mexeu nas PPP, não cortou nos lucros abusivos, não cortou nas rendas abusivas da

energia — nada disso! Mas cortou nos produtos de limpeza e de higiene!

A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Percebemos que as escolhas deste Governo estão todas erradas.

Por isso, o que norteia este Governo é o revanchismo contra o País, contra a Constituição, contra a

democracia. E nós, nesses revanchismos, não entramos.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Também se inscreveu para intervir, porque ainda tem tempo, o Sr. Deputado Duarte

Pacheco.

Tem a palavra.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Em primeiro lugar, desejo

agradecer todos os esclarecimentos já aqui transmitidos pelo Sr. Secretário de Estado do Orçamento, para

que fique claro àqueles que não conseguiram ler o que estava escrito no despacho do Sr. Ministro…

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Já lemos!

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O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — … que o Estado não está parado, que a despesa do Estado não ficou

impedida, que o que ficou impedido foram novos compromissos.

O Sr. Pedro Jesus Marques (PS): — Isso é a mesma coisa!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — E isto acontece, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, precisamente a pensar

nas pessoas.

Risos do PS.

É que se queremos chegar a outubro ou novembro e que haja dinheiro nos cofres do Estado para pagar

salários e pensões,…

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

… é preciso estar permanentemente atento, controlar a despesa e garantir que a tesouraria do Estado está

em condições de assumir todos os seus compromissos, impedindo novos compromissos.

Protestos do PCP.

À pergunta que aqui fiz, percebi qual era a resposta dessas bancadas. De facto, a propósito do acréscimo

de despesa que decorre desta decisão, e que os senhores não negaram, perguntei como é que ele pode ser

financiado.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Pergunte à Dr.ª Manuela Ferreira Leite e ao Dr. Bagão Félix!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Perguntei se pode ser financiado através de mais impostos, se deve ser

financiado com outros cortes de despesa ou se deve ser financiado com um aumento da dívida.

Aquilo que os senhores aqui defendem é que deve ser financiado através da dívida, renegociando a dívida.

Ou seja, não pagando aquilo que estamos a dever.

Vozes do PSD: — É verdade!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Não é verdade! Seja sério!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Esquecem-se que não pagar aquilo que hoje devemos significa, para o

futuro, complicar ainda mais todas as condições de acesso ao financiamento.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — A dívida é insustentável!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — E, complicando todas as condições de acesso ao financiamento, são

novamente as pessoas que, no futuro, mais irão sofrer, porque o Estado deixará de ter condições para garantir

o que temos garantido, mesmo nesta fase difícil. É que, mesmo nesta fase difícil, Srs. Deputados, as pensões

mais baixas foram aumentadas, enquanto antes foram congeladas;…

O Sr. Paulo Batista Santos (PSD): — Muito bem!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — … mesmo neste momento difícil, houve cortes nos salários do Estado,

mas os salários mais baixos não foram mexidos;…

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Aplausos do PSD.

… mesmo nestas condições difíceis, as taxas moderadoras foram aumentadas, mas aumentou o número

de isenções para os mais desfavorecidos.

É governando para as pessoas que temos estado a atuar como temos estado a atuar.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Inscreveu-se também para intervir a Sr.ª Deputada Cecília Meireles, que tem tempo,

embora pouco.

Faça favor.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, é só para dar aqui um breve esclarecimento,

sobretudo em relação à intervenção do Sr. Deputado Pedro Filipe Soares.

Sr. Deputado, confesso que acho a sua argumentação assaz inteligente. É que o Sr. Deputado atribui-me

afirmações que eu não faço e, depois, argumenta, e bem, contra elas.

Risos do Deputado do CDS-PP João Pinho de Almeida.

Sr. Deputado, se eu, por acaso, tivesse dito que este despacho não vai parar despesa rigorosamente

nenhuma e não serve para nada, de facto, a minha argumentação seria absurda e o Sr. Deputado teria

absoluta razão.

Como eu não disse nada disso e me limitei a explicar aquilo que o próprio despacho já diz, ou seja, qual é a

despesa que está excecionada, a sua argumentação não colhe. Em todo o caso, é uma argumentação

interessante e ouvi-o com grande prazer.

De qualquer maneira, Srs. Deputados, presumo (e acho que não posso presumir o contrário) que, pelo

menos, a generalidade dos serviços da nossa Administração Pública são bem geridos.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Exatamente!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — E sendo bem geridos, pressuponho que o seu aprovisionamento é

feito através de contratos de execução e de fornecimento contínuo. Portanto, pressuponho que, cada vez que

é preciso adquirir, por exemplo, alimentação ou produtos de higiene, não são feitos microajustes diretos.

Pressuponho, pois, que há um fornecimento contínuo, caso em que estamos perante uma execução e uma

exceção.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Isto não é a Câmara Municipal do Seixal! É gente séria!

Protestos do PCP.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Por último, indo ao fundo da questão, Srs. Deputados, vejo três

hipóteses, uma das quais (à qual já irei) é a que os Srs. Deputados colocam. Perante a situação em que

estamos, temos, repito, três hipóteses. Uma delas é aumentar impostos. O Governo, felizmente, já disse que

não aprova esse caminho, e suponho que não há ninguém nesta Câmara que o aprove, pelo que está

excluído.

Protestos da Deputada do PCP Rita Rato.

Ouça, ouça, Sr.ª Deputada! No fim, poderá falar e ouvi-la-ei com todo o prazer.

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Uma outra hipótese é a de substituir a despesa. Os Srs. Deputados acham mal, mas estas bancadas

acharão bem. Estamos perante uma despesa de 1300 milhões de euros, o que significa que temos de

encontrar uma poupança compensatória de cerca de 5 milhões de euros/dia, nos cerca de 260 dias que faltam

para acabar o ano.

A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Terminarei, Sr.ª Presidente, com a sua tolerância.

Isto implica, como é óbvio fazer escolhas.

A terceira hipótese é aquela que coloca grande parte dos Deputados desta Casa, que é: «Não vamos

cobrar mais impostos, não vamos diminuir despesa. Portanto, o que é que vamos fazer? Vamos aumentar a

dívida e o défice». Não se sabe quem pagará esta dívida, não se sabe como, não se sabe quando. Sabemos

apenas que o vamos fazer.

Protestos do PCP.

Renegociar implica duas partes, portanto, implica que quem está do lado de lá e vai financiar esta dívida e

este défice esteja de acordo.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Mas é preciso que quem está do lado de cá também o exija!

A Sr.ª Cecília Meireles (PCP): — Aquilo que os Srs. Deputados realmente querem não é uma

renegociação, aquilo que os Srs. Deputados querem é um ultimato de Portugal, em que se diga, pura e

simplesmente, «Nós não pagamos. Os senhores façam o favor de não receber e de continuarem a financiar

mais dívida que queremos fazer». Tenham a sinceridade de dizer isto!

Aplausos do CDS-PP.

Em todo o caso — e peço ao Sr. Secretário de Estado que o confirme —, creio que ainda vigora uma regra

segundo a qual quando se aumentam os tetos de despesa é preciso que esta Casa o aprove. Portanto,

mesmo que seja para aumentar os tetos de despesa sem nenhuma compensação, ainda assim será preciso a

aprovação desta Casa, pelo que a Administração Pública não pode fazer despesa que não tenha sido aqui

aprovada. Ora, esta ainda não foi aqui aprovada.

Aplausos do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, peço-vos que não dilatem demasiado o tempo que o Regimento

concede.

Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, o Sr. Deputado

Pedro Filipe Soares fez uma insinuação sobre a ausência do Sr. Ministro das Finanças neste debate, dizendo

que, se calhar, não estaria presente por desrespeito à Câmara ou por qualquer outra razão. Ora, como o Sr.

Deputado sabe, é público que o Sr. Ministro das Finanças se encontra em Dublin a tratar de uma negociação

essencial para o País, relativa à extensão das maturidades, pelo que a insinuação que fez é totalmente

descabida.

Aproveito também para responder ao comentário lateral que foi feito nesta Câmara relativamente à Lei dos

Compromissos. No cumprimento desta lei, o despacho protege a despesa que está contratada e os contratos

realizados, portanto, protegem esses compromissos.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Então, para que é que serve o despacho?

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O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Aquilo que este despacho não permite é que se realizem

novos compromissos para além do que já está estabelecido, mantendo todas as margens para o Governo

poder tomar as suas decisões. É isto que diz o despacho, não é outra coisa e, portanto, os Srs. Deputados

precisam de o reler.

Têm sido colocadas algumas dúvidas à Direção-Geral do Orçamento, as quais foram hoje de manhã

esclarecidas através do site da DGO.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Não foram, não! Os esclarecimentos que lá estão não esclarecem tudo!

A Sr.ª Presidente: — Agradeço ao Sr. Secretário de Estado e aos Srs. Deputados que intervierem no

debate de atualidade que agora termina, pois esgotaram-se os tempos e, por isso, as inscrições.

Passamos ao segundo ponto da ordem do dia, que é o debate em torno da proposta de lei n.º 135/XII (2.ª)

— Procede à segunda alteração ao Decreto-Lei n.º 315/2009, de 29 de outubro, que aprovou o regime jurídico

da criação, reprodução e detenção de animais perigosos e potencialmente perigosos, enquanto animais de

companhia, reforçando os requisitos da detenção e os regimes penal e contraordenacional

Vamos aguardar para que o membro do Governo que intervirá no debate tome o seu lugar no Plenário.

Pausa.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna já se encontra na Sala.

O Governo, como autor da iniciativa, dispõe de mais 1 minuto e, para apresentar a proposta de lei, tem a

palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna (Juvenal Silva Peneda): —

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, não acredito que vá conseguir manter o tom de entusiamo da

discussão anterior.

Devo dizer, em relação às propostas — e sublinho este ponto —, em primeiro lugar, que apresentámos não

um pedido de autorização legislativa mas, sim, uma proposta de lei. O objetivo é muito simples: tratando-se de

matéria tão sensível como a da preservação da segurança e do bem-estar do cidadão, o Governo apela ao

empenho de todos os elementos desta Câmara na melhoria da proposta ora apresentada.

Estas propostas são refletidas e ponderadas, mas acredito que o resultado será mais valioso do que os

textos agora apresentados.

A nossa abordagem é no sentido de fazer ajustes e correções, método que consideramos muito mais

eficiente do que fazer mudanças radicais e não testadas. Assim, e sem qualquer enumeração exaustiva, vou

apresentar as linhas gerais de orientação da presente proposta de lei e dos caminhos que queremos percorrer

neste domínio.

Em primeiro lugar, trata-se de alargar o registo deste tipo de animais perigosos, que, como sabem, era

obrigatório apenas desde julho de 2004.

Em segundo lugar, trata-se de, através de mecanismos de integração de bases de dados, que ainda não

completamente integradas, o que não é objeto da proposta de lei, garantir o acesso efetivo e pleno das forças

de segurança a esses registos.

Em terceiro lugar, prevê-se a exigência de uma formação obrigatória para todos esses animais entre os 6 e

os 12 meses de idade e, quem tem cães em casa sabe, não é cão que é educado, é preciso educar o dono,

pelo que haverá formação obrigatória e normas de conduta para os detentores desses animais.

Ao mesmo tempo, apertámos o regime de inibição de detenção desse tipo de animais, especificando

apenas três aspetos: quem tiver determinado tipo de registo criminal não pode deter este tipo de animais; a

mesma situação se verifica tal como se passa com um condutor de um veículo, ou seja, é proibido conduzir

um animal destes com taxa de alcoolémia ou com perturbações devido a estupefacientes e alargámos para 10

anos a sanção de proibição da detenção destes aninais que estava limitada a 2 anos.

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A linha geral é esta. Os meus amigos têm a proposta de lei em cima da mesa e estarei perfeitamente

disponível para todas as perguntas que queiram fazer a propósito das linhas gerais e de orientação.

Todos sabemos qual é a motivação. Não estamos a legislar a reboque dos acontecimentos publicados nos

jornais, mas o que é facto é que, em relação a acontecimentos recentes quanto a esta matéria, houve alguma

insuficiência legal quanto ao que é necessário fazer, que é por cobro de imediato a alguns tipos de situações,

que, em alguns casos, são dramáticas.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Paulo Rios de Oliveira.

O Sr. Paulo Rios de Oliveira (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.ª e Srs. Secretários de Estado, Sr.as

e Srs.

Deputados: A proposta de lei reforça os requisitos de detenção e os regimes penal e contraordenacional

relativos aos animais perigosos ou potencialmente perigosos.

Nos tempos que correm, de grande constrangimento financeiro, há, no entanto, outros temas que colocam

em causa a segurança e tranquilidade dos cidadãos, sendo o caso deste tema trazido hoje a debate.

Independentemente do número de ocorrências ou da gravidade dos danos — e sabemos que houve casos

de grande gravidade —, a verdade é que o sentimento de insegurança é real e exige medidas mais eficazes e

urgentes.

Também por isso o Governo — e bem! —, depois de ouvir um conjunto alargado de entidades e

organismos, remeteu esta proposta ao Parlamento com um pedido de prioridade e urgência.

O que é que está em causa? Está em causa a salvaguarda da segurança dos cidadãos e dos próprios

animais e a promoção de condutas responsáveis por parte daqueles que têm o dever de vigilância sobre

animais perigosos ou potencialmente perigosos.

É que todos sabemos que muito mais perigoso do que um animal perigoso é um dono perigoso, seja por

negligência seja por falta de idoneidade para assumir tais responsabilidades!

Em linha com as boas práticas internacionais, este diploma pretende exatamente isso: formação sujeita a

aprovação dos detentores deste tipo de animais; maior rigor no treino dos próprios animais, que começará

mais cedo (entre os 6 e os 12 meses de idade); maior exigência para a obtenção da licença para detenção

destes animais e acrescido rigor na apreciação da idoneidade, nomeadamente o conteúdo do registo criminal

— há crimes que automaticamente inibem seja quer for de deter um animal perigoso.

A proposta prevê a obrigação de identificação e registo de todos os cães potencialmente perigosos e o

aumento da fiscalização e do combate a condutas ilícitas ligadas à criação, reprodução e detenção deste tipo

de animais.

Embora este diploma faça uma correta aposta na prevenção (e prevenir tem de ser antes!), a verdade é

que também reforça os mecanismos de repressão, nomeadamente as sanções contra os incumpridores, como

sejam: o aumento das coimas aplicáveis (quer mínimas, quer máximas) e o aumento para 10 anos da sanção

acessória de privação do direito de detenção deste tipo de animais.

Igualmente relevante é a criação um novo tipo legal de crime que vem responder ao clamor público e ao

elementar bom senso e prudência ao configurar penas de prisão ou multa para «quem, ainda que por

negligência, circular na via pública, em lugares públicos ou em partes comuns de prédios urbanos com animais

perigosos ou potencialmente perigosos não estando em condições de assegurar o seu dever de vigilância por

estar sob a influência de substâncias estupefacientes ou psicotrópicas ou outros produtos perturbadores da

aptidão física, mental ou psicológica.»

Francamente, quem não está em condições de se conduzir a si mesmo dificilmente estará em condições de

deter e conduzir um animal, especialmente se for perigoso.

Sr.as

e Srs. Deputados, estas medidas seguem as melhores práticas, são atuais e urgentes e

correspondem à resposta imediata, mas também para o futuro, do que pode ou deve ser a salutar relação

tripartida entre estes animais, os detentores e a sociedade envolvente.

Estamos convictos da bondade e da qualidade desta proposta e alimentamos naturais expetativas de

recolher o apoio dos demais grupos parlamentares, pois o PSD votará esta favoravelmente proposta, que,

aliás, louva.

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Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Inscreveram-se os Srs. Deputados Cecília Honório, Pedro Delgado Alves e Teresa

Anjinho.

Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Honório.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Secretária de Estado, Sr. Secretário de Estado, deve

ser a primeira vez que discutimos um pacote legislativo desta natureza na curiosa ausência do Sr. Ministro da

Administração Interna. Em todo o caso, é um prazer discutir consigo, Sr. Secretário de Estado.

Devo dizer que, globalmente, acompanhamos muitas das propostas apresentadas, nomeadamente quando

se procura sistematizar o regime da detenção, criação e reprodução de animais perigosos, aprofundando o

que consta do Decreto-lei n.º 315/2009.

Muitas destas propostas têm um sentido positivo e vão até ao encontro de algumas reivindicações que

consideramos muito pertinentes: a perspetiva de que os detentores destes animais devem ter uma formação

especializada; o alargamento do leque de crimes que inviabiliza a detenção; a licença a emitir pela junta de

freguesia da área de residência, a constituição da base de dados para o efeito, com as reservas que a própria

lei prevê; a iniciação precoce e ajustada do treino destes animais entre os 6 e os 12 meses, bem como

exigências feitas aos treinadores ou a obrigatoriedade do registo de animais nascidos antes de 1 de julho de

2004.

Consideramos que estes aspetos são pertinentes, bem como o combate às condutas ilícitas ligadas à

criação, detenção e reprodução destes animais e a reformulação do tipo criminal das lutas entre animais e a

sua promoção, se bem que a questão da promoção exija também o reforço do rigor do que é que significa

exatamente esta vertente.

Neste sentido, salvaguardando algumas das propostas feitas, aguardamos também que a maioria tenha

disponibilidade para apreciar as propostas que Bloco de Esquerda apresentará em sede de discussão na

especialidade.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Delgado Alves.

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, Srs. Secretários de Estado: O

Partido Socialista acompanha e vê também como útil o conteúdo desta iniciativa, porque coloca a tónica da

forma correta. Isto é, há um problema que a sociedade identificou e que tem sido objeto de maior atenção

mediática nos últimos tempos — eventualmente, por razões infelizes, mas o que é facto é que colocou na

agenda esta matéria — e a resposta que é dada parece-nos que é, no essencial, adequada, porque parte da

legislação existente, não procurando reinventar a roda mas identificando situações críticas em que a legislação

pode ser melhorada e em que pode ser colocada a tónica em dois aspetos importantes, que respeitam, por um

lado, à prevenção e, por outro, à responsabilização do detentor dos animais perigosos.

De facto, muitas vezes, perante uma circunstância infeliz, olhamos para esta matéria de alguma maneira

impulsionados por uma vontade de procurar responsabilização e não olhamos verdadeiramente para o real

responsável, que é o titular de direitos e deveres, o dono, o detentor do animal, no qual, aí sim, devemos

encontrar a responsabilidade, e desfocamos a nossa atenção, procurando-a noutro local.

Na verdade, o que o diploma propõe é responsabilizar quem assume esta tarefa, e muitas vezes assume-a

de forma ilícita logo de início, uma vez que há a criação de determinadas espécies que não deveriam sequer

ser objeto de criação, pois o seu caráter de perigosidade está identificado, manipulando muitas vezes a própria

criação de animais e criando-lhes sofrimento e problemas de saúde estruturais para efeitos da sua posterior

utilização em eventos desportivos e recreativos, que, de facto, não contribuem nem para a segurança das

populações nem para o próprio bem-estar animal.

De facto, olhar para estas soluções que procuram, por um lado, identificar o perfil de quem não pode

aceder à criação e à detenção de determinados animais é correta, sendo que também nos parece correta a

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distinção no plano da repressão penal e contraordenacional, nomeadamente a distinção entre o promotor do

espetáculo de lutas de animais, que procura lucrar a partir da criação destes animais e que, neste contexto, vai

até criar muito mais riscos risco adicionais, e aquele que é apenas o detentor.

Saúdo a disponibilidade do Sr. Secretário de Estado para introduzir melhorias em sede de especialidade.

Há vários contributos dos conselhos superiores, da Comissão Nacional de Proteção de Dados, que apontam

algumas melhorias de redação que penso que podem ser introduzidas, havendo disponibilidade por parte do

Partido Socialista para o fazer, mas também não deixo de sublinhar que há também alguns riscos nesta

matéria que, por vezes, passam despercebidos e que são os da efetiva aplicação das normas.

De facto, no contexto geral dos normativos relativos aos animais há um descontrolo ao nível da fiscalização

que é importante ter presente. É necessário regulamentar as normas que já temos, mas é também necessário

assegurar que elas são, efetivamente, aplicadas.

Hoje, tivemos oportunidade de receber em audiência os subscritores de uma petição, que, em breve, será

discutida em Plenário, que foca as questões do bem-estar animal, propondo alterações ao quadro legislativo

mas sublinhando, em primeira linha também, a necessidade de haver um reforço da fiscalização e do

acompanhamento por parte das entidades públicas.

Eventualmente seremos céticos, efetivamente, por causa disso, porque olhamos para este diploma e temos

algumas dúvidas quanto à capacidade de, por exemplo, as juntas de freguesia conseguirem alcançar o

acompanhamento necessário à implementação da norma — algo que a própria Associação Nacional de

Municípios Portugueses também sublinha no seu parecer — e também quanto à existência real e efetiva das

possibilidades de proceder ao treino quer dos detentores quer dos próprios animais por ausência de oferta no

mercado.

Assim, é certo que o Governo não pode decretar as soluções quanto a estas duas preocupações, mas pelo

menos podemos tê-las em conta na fase da especialidade.

Termino dizendo que esta matéria deve ser, cada vez mais, objeto de reforço do conhecimento e da

pedagogia, que têm um impacto relevante quanto à abordagem que os seres humanos devem ter na sua

relação com os animais, tendo em conta que não devem instrumentalizá-los em casos equívocos,

precisamente como estes da sua criação para fins perigosos, e por isso esperamos que possa haver

recetividade por parte da Câmara para retomar uma iniciativa do Partido Socialista que está pendente de

análise, reconhecendo a especificidade do estatuto jurídico dos animais e procedendo à alteração do Código

Civil nesse sentido.

Portanto, para terminar, quero dizer que o Partido Socialista já indicou toda a disponibilidade para acolher

as eventuais alterações que sejam suficientes para que a Câmara, finalmente, coloque essa matéria na ordem

do dia.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Anjinho.

A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as

e Srs. Deputados:

Permitam-me que comece por dizer que a proposta de lei que hoje se discute, e que mereceu, de uma forma

geral, o parecer positivo de todas as entidades ouvidas, na opinião do CDS e atendendo a posições

anteriormente assumidas nesta Câmara sobre nesta matéria, promove uma não apenas adequada como

oportuna e importante alteração do regime jurídico em vigor da criação, reprodução e detenção de animais

perigosos e potencialmente perigosos enquanto animais de companhia.

Estamos, assim, perante um reforço de um objetivo claro de prevenção e combate a tais fenómenos

especificamente focado em todos aqueles sobre os quais recai o dever de vigilância destes animais.

Nesta linha, permitam-me destacar com especial acuidade, de forma sumária e, naturalmente, sem

desprimor para todas as restantes medidas que já foram aqui bastante elencadas, as medidas introduzidas em

matéria de monotorização e responsabilização.

Em matéria de monitorização este diploma é, de forma importante, inovador ao introduzir uma norma nos

termos da qual o Governo se obriga a promover uma avaliação dos resultados da aplicação do regime jurídico

que visa aprovar.

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Em matérias como esta, Sr.as

e Srs. Deputados, ainda muito claramente dependentes da sensibilização

social bem como de efetiva atuação do poder público, avaliar é efetivamente promover, responsabilizando o

Estado, a quem compete fiscalizar e punir, mas também — eu diria, até mais importante — responsabilizando

os cidadãos enquanto principais destinatários das normas em apreço.

No que se refere especificamente à responsabilização, merece desde logo o nosso aplauso algo que

também defendemos no passado: a reformulação do tipo criminal de lutas entre animais, sancionando de

forma mais severa o caso dos promotores de tais lutas.

Por outro lado, é igualmente de destacar para salvaguarda da segurança pública bem como da vida e/ou

integridade física dos demais cidadãos, a criação de um novo tipo criminal, que tem em vista impedir a

circulação na via pública, em lugares públicos ou em partes comuns de prédios urbanos do detentor cujo dever

de vigilância possa estar comprometido pelo facto de se encontrar sob o efeito de álcool ou de substâncias

estupefacientes ou psicotrópicas.

Especificamente quanto aos indícios de não idoneidade para detenção deste tipo de animais e nada tendo

a obstar, muito pelo contrário, quanto aos elencados na proposta, por ser exatamente isso que acontece na

maioria dos casos que são do conhecimento público, julgo que seria igualmente de considerar entre os crimes

que determinam esta não idoneidade a prática do crime de ofensa à integridade física por negligência ou

mesmo homicídio por negligência por omissão do dever de vigilância e cuidado na detenção de animais.

Por fim, ainda uma referência particular à previsão da possibilidade de apreensão preventiva dos animais

que serviram ou estavam destinados a servir para a prática de algumas das contraordenações previstas,

possibilidade essa que, no nosso entendimento, deveria ser estendida de forma inequívoca aos casos do

crime.

Em suma, o legislador, com a presente iniciativa, vai ao encontro não apenas da necessidade de

aperfeiçoamento de um regime jurídico como da concretização daquilo que tem vindo a ser identificado como

imperioso nesta matéria, ou seja, a realização de um justo e equilibrado compromisso entre os direitos dos

cidadãos e a já consagrada proteção do animal ínsita nos deveres que esta lei especificamente consagra.

Por tudo quanto foi dito e não obstante eventuais alterações de pormenor em sede de especialidade, este

diploma merecerá naturalmente aprovação por parte do CDS.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as

e Srs. Deputados:

Acolhemos também favoravelmente esta proposta legislativa, tendo em conta o que está em causa.

Temos aqui, basicamente, duas matérias, sendo que uma delas tem a ver com comportamentos com

consequências criminais por factos dolosos. Estamos a falar, designadamente, dos promotores de lutas entre

cães ou da utilização de canídeos para a prática de atos criminais, e aí pensamos que deve haver um combate

muito firme a esse tipo de comportamentos e de atividades.

Mas estamos a falar também de tragédias que ocorrem, por vezes, por negligência, por impreparação ou

falta de informação da parte de detentores de cães, com consequências humanas gravíssimas. Inclusive,

todos temos notícia, infelizmente amiúde, de acidentes envolvendo cães perigosos que vitimam mortalmente

pessoas, acontecendo isso por acidente. Porém, esses acidentes revelam, em muitas situações,

desinformação, negligência e impreparação por parte dos detentores desses cães.

Não estamos a falar dos cães em geral, estamos a falar de um conjunto de raças comprovadamente

perigosas e em relação às quais há que ter, de facto, uma enorme responsabilidade na sua detenção.

Obviamente que o Estado tem também aqui a responsabilidade de exigir que quem seja detentor de cães

perigosos dê provas de idoneidade e dê estar habilitado com as capacidades e as qualificações necessárias

para poder deter esses cães, garantindo a segurança de todas as pessoas que, por qualquer razão, venham a

entrar em contacto com esses cães e que possam sofrer alguma coisa com isso.

Portanto, tudo o que seja aperfeiçoar o ordenamento jurídico relativamente a esta matéria só pode merecer

a nossa concordância, pelo que estamos disponíveis para prosseguir este processo legislativo e colaborar

para encontrarmos as melhores soluções.

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Sabemos que quando ocorre uma desgraça há a tendência natural para ver se é possível aperfeiçoar o

ordenamento jurídico por forma a prevenir que situações dessas venham a ocorrer, e, porventura, nunca será

possível evitar tudo, mas tudo o que possamos fazer e sempre que se verifique que é possível aperfeiçoar o

ordenamento legislativo no sentido de garantir uma melhor prevenção, aí estaremos todos de acordo.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção final, tem ainda a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto

do Ministro da Administração Interna.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna: — Sr.ª Presidente, Srs.

Deputados, ouvi as intervenções dos Srs. Deputados em nome dos diversos grupos parlamentares e tenho um

comentário e um pedido a fazer: o comentário é de agradecimento pela maneira como esta iniciativa foi

acolhida e o pedido é no sentido de que a partir deste momento esta proposta de lei seja vossa, não nossa.

Por isso, peço que a tratem bem e que a tratem depressa, uma vez que é necessária.

Relativamente à Sr.ª Deputada Cecília Honório, e dirijo-me a si em particular, naturalmente o Sr. Ministro

não está aqui, mas espero que me tratem bem, porque se não ele não me deixa tornar a vir cá. Porém, esteve

aqui ontem, como sabe; hoje, está em visita oficial a Maputo e, por impossibilidade absoluta e por obrigações

de agenda da CPLP, não está aqui a apresentar estas propostas, como é evidente.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, termina aqui a discussão deste ponto

da nossa ordem de trabalhos.

Vamos continuar com a apreciação da proposta de lei n.º 136/XII (2.ª) — Procede à quinta alteração a Lei

n.º 5/2006, de 23 de fevereiro, que aprova o novo regime jurídico das armas e suas munições.

Entretanto, peço à Sr.ª Deputada Teresa Caeiro o favor de me substituir.

Neste momento, assumiu a presidência a Vice-Presidente Teresa Caeiro.

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, vamos, então, prosseguir os nossos trabalhos.

Para proceder à apresentação da proposta de lei n.º 136/XII (2.ª), tem a palavra o Sr. Secretário de Estado

Adjunto do Ministro da Administração Interna.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna: — Sr.ª Presidente, Sr.as

e

Srs. Deputados: Não vou referir o que disse anteriormente, mas mais uma vez estamos aqui perante um ajuste

e uma correção relativamente à Lei das Armas.

Se me permitem um pequeno comentário de enquadramento, gostaria de referir que o Governo tem

consciência que há áreas de trabalho no setor das armas que precisam de alguns ajustes. Aquilo em que

acreditamos é que os ajustes a fazer, antes de serem uma questão de ajustes legislativos, muitas vezes são

ajustes administrativos.

Como sabem, a PSP tem a responsabilidade de tutelar esta área em termos administrativos e aquilo que o

Governo está a fazer — posso aqui anunciá-lo — é proceder a um ajuste muito profundo, uma reorganização

muito profunda do departamento de armas e explosivos da PSP, a qual será pública, até com algum apoio

exterior. A Direção Nacional da PSP está muito empenhada em utilizar este departamento como um primeiro

departamento para depois dar origem a uma modernização muito profunda da própria polícia no seu todo.

Por isso, nos próximos tempos, nos próximos seis meses, aquilo que se irá desenvolver é um levantamento

de todo o circuito administrativo. Provavelmente, terão conhecimento de alguém que quer uma licença de uso

e porte de arma, um exame para caçador, enfim, há toda uma panóplia de coisas que precisam de ser

alteradas e a nossa opção é olhar para isso, reorganizar internamente e, depois, aquilo que seja necessário

obter como instrumento legislativo ao serviço do melhor funcionamento será apresentado à Assembleia.

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Portanto, trata-se de duas alterações de pormenor que visam responder a dois tipos de problemas de que

todos tivemos conhecimento público.

O primeiro tem a ver com a utilização perigosa de artigos pirotécnicos, tochas, petardos e potes de fumo, e

estamos a falar da utilização deste tipo de artigos em manifestações, em recintos desportivos e em

estabelecimentos de ensino.

Provavelmente para surpresa de alguns de nós, a utilização de algum tipo de artigos pirotécnicos era

permitida em recintos desportivos, por exemplo. Achamos que o que está em causa é a liberdade de

manifestação, a liberdade de poder assistir a um espetáculo desportivo sem correr riscos e, por isso,

acreditamos que é necessário banir totalmente este tipo de dispositivos neste tipo de situações, ou seja, em

manifestações, recintos desportivos e estabelecimentos de ensino.

O que fizemos foi uma coisa muito simples: foi uma reclassificação da classificação da Lei das Armas para

permitir que este tipo de dispositivos possa recair num quadro legal que já existe, que é o quadro de detenção

de arma proibida. Basicamente, é apenas isto e visa responder às situações que nos preocupam, pois até em

manifestações o rebentamento de petardos pões em causa a segurança dos cidadãos e também dos cidadãos

que são forças policiais.

Por último, e peço desculpa desta junção, aproveita-se também esta iniciativa legislativa para dar conta de

um problema que se colocou e que tem a ver com uma leitura relativamente restritiva da Lei das Armas, a qual

impedia os feirantes, vulgo aquela atividade económica que tem que ver com os «tirinhos» nas feiras, de

exercer a atividade.

Acreditamos que uma mera autorização do Diretor Nacional da Polícia de Segurança Pública pode resolvê-

lo, mas, para conforto de todos, achámos bem juntar a esta alteração legislativa a possibilidade de, para essas

situações bem enquadradas, a Direção Nacional da Polícia Judiciária poder autorizar esse tipo de atividade,

que é uma atividade económica que merece também o nosso respeito, é legítima e, portanto, deve funcionar

sem peias.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as

e Srs. Deputados: De

uma forma breve, gostaria de sublinhar que, não obstante o Sr. Secretário de Estado ter classificado estas

alterações como alterações de pormenor, parecem-nos relevantes, algumas delas parecem-nos mesmo muito

importantes e muito significativas, designadamente aquelas que têm que ver com a detenção de material

pirotécnico, os chamados petardos, as tochas, criminalizando a sua detenção e a sua utilização fora do seu

âmbito habitual. Estamos a falar do artigo 89.º desta mesma lei.

E isto porquê? Essencialmente por razões de ordem pública, que é disso que trata esta proposta, quando

estão em causa reuniões, manifestações, comícios e outro tipo de iniciativas do mesmo género, aproveitando

ainda esta lei para acrescentar uma alteração ao regime da reprodução, ou possibilidade de reprodução, de

armas de fogo e sua utilização para fins recreativos.

Disse o Sr. Secretário de Estado, e muito bem, que o Governo não andará a reboque daquilo que é a

comunicação social, mas não deixamos de estar atentos e ler os sinais que vivemos no País e, apesar de

termos uma generalidade de manifestações tranquilas, serenas e pacíficas, temos tido alguns casos de

manifestações que não têm essas caraterísticas.

Estou a pensar, por exemplo, na manifestação do Chiado, que deu origem a inquéritos policiais e onde

existiram arremesso de objetos contundentes,…

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — … estou a pensar na manifestação aqui à porta da Assembleia da

República, onde a polícia portuguesa aguentou horas a fio debaixo de pedras até ser obrigada a reagir,…

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

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O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — … o que significa que temos uma das polícias mais preparadas, mais

capazes e com maior civismo da Europa, o que merece, obviamente, o nosso elogio.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Sr. Secretário de Estado, temos tido uma utilização generalizada de petardos. Em qualquer um destes

eventos, hoje em dia, são usados petardos. Temos visto também, até no contexto desportivo, as claques, de

que falaremos daqui a pouco, usarem petardos e fazerem-nos rebentar, temos tido acidentes com membros

dessas claques, muitas vezes jovens, que não têm culpa nenhuma mas que estão lá e são atingidos por um

petardo que alguém lançou. Por isso, esta alteração parece-nos da maior importância, da maior relevância, na

defesa do civismo, na defesa do direito livre de manifestação, que respeitamos absolutamente, mas não

respeitamos nem aceitamos a «democracia do petardo», não aceitamos nem respeitamos a democracia feita à

bomba.

Daí que, repito, consideremos esta alteração importante e relevante, merecendo, obviamente, a nossa

saudação e o nosso aplauso.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as

e Srs. Deputados: Vamos

pôr aqui um pouco de «água na fervura». Quem ouviu o Sr. Deputado Telmo Correia é capaz de pensar que o

País está a «ferro e fogo»…

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Exatamente!

O Sr. António Filipe (PCP): — … e que saímos da Assembleia da República e somos «assaltados» por

petardos que rebentam à nossa volta!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Eu já vi!

O Sr. António Filipe (PCP): — Sabemos que o Governo está em estado comatoso e que o País passa por

uma crise gravíssima, mas o civismo dos portugueses ainda não foi, felizmente, afetado por isso.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. António Filipe (PCP): — Portanto, se as razões fossem essas estávamos mal.

A questão que pode colocar-se aqui, Sr. Secretário de Estado, é a seguinte: vimos esta proposta de lei e

vimos os vários pareceres que foram emitidos a propósito dela. Na generalidade, os pareceres — e estou a

referir-me ao Conselho Superior da Magistratura, à Procuradoria-Geral da República, à Ordem dos Advogados

— são de alguma perplexidade, salientando aquilo que consideram ser a desnecessidade desta lei.

No que se refere aos petardos, vemos o Conselho Superior da Magistratura qualificar esta proposta de lei

como um preciosismo, ou até dizer que é inútil legislar sobre o que já está legislado. Portanto, não faz sentido

criminalizar uma situação que já se encontra prevista e punida na lei.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — É um balde de água fria!

O Sr. António Filipe (PCP): — Isto porque a utilização dos petardos nas manifestações a que aludiu o Sr.

Deputado Telmo Correia ou nas manifestações desportivas já está prevista e punida na lei.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Ora bem!

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O Sr. António Filipe (PCP): — Para além de que a Procuradoria-Geral da República também chama a

atenção para alguns factos, como, por exemplo, não haver, nesta proposta de lei, a necessária distinção dos

artigos pirotécnicos em função da sua perigosidade, isto porque se alguns são perigosos, outros são

inofensivos e, portanto, é bom que o legislador distinga aquilo que é diferente e não trate tudo por igual.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. António Filipe (PCP): — Também a Ordem dos Advogados chama a atenção para o facto de

considerar que esta proposta de lei extravasa aquele que é um princípio do Direito Penal, que é o princípio da

intervenção mínima do Direito Penal, que só deve intervir em situações em que isso se justifique plenamente.

Esta proposta de lei, não obstante o mérito de algumas ideias, como seja, por exemplo, relativamente às

manifestações desportivas, a consideração de que não releva apenas o que se passa dentro do recinto

desportivo mas também nas imediações, embora isso coloque dificuldades de saber onde é que começa e

acaba a deslocação para um evento desportivo, e até se não estamos a correr o risco de considerar que

qualquer transeunte está a caminho de uma manifestação desportiva só porque está nas imediações do

estádio, e as entidades consultadas também chamaram a atenção para a dificuldade de delimitar certas

realidades, a verdade é que nos parece que este diploma não é pacífico nos termos em que é apresentado.

Na verdade, esta proposta de lei contém soluções técnicas que podem até conduzir a situações

indesejáveis do ponto de vista da criação de uma certa indefinição quanto àquelas que sejam as melhores

soluções legislativas e, portanto, quer parecer-nos que este tipo de iniciativa carece de uma melhor

ponderação.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília

Honório.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr.ª Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as

e Srs. Deputados: Penso

que a intervenção do Sr. Deputado Telmo Correia veio desvendar a alma e a essência desta iniciativa

legislativa, porque ela é, sobretudo, uma opção ideológica.

Esta alteração à Lei das Armas que hoje aqui discutimos foi interpretada como um preciosismo legislativo.

Na verdade, é uma proposta de lei antipetardos que descamba numa enorme imprecisão legislativa — atrever-

me-ia a dizer que é, do ponto de vista legislativo, um verdadeiro exercício pirotécnico.

Ao abrigo da diretiva que foi transposta, o Governo poderia, e deveria, legislar no que diz respeito a

ameaças à ordem pública, à segurança pública ou à proteção ambiental. Todos nós estamos de acordo que é

preciso salvaguardar os direitos dos manifestantes, o direito de todos os espetadores que assistem a

espetáculos desportivos, não há falsos argumentos sobre a preservação destes direitos fundamentais. Agora,

o que se esperava era que o Governo nos dissesse exatamente quais são os artefactos considerados

efetivamente perigosos, ameaçadores da ordem ou da segurança públicas. Porquê? Quais são exatamente?

Em que condições? Portanto, esta era a necessidade que se impunha para que esta proposta de lei tivesse

algum rigor.

Por outro lado, é preciso não esquecer que a posse de petardos fora das condições legais já é crime,

segundo o artigo 86.º. Ou não é, Sr. Secretário de Estado?

Digamos que há alguma ausência na lei relativamente às tochas, mas já estamos a falar de um crime

previsto, pelo que os senhores legislam sobre o que está legislado.

A definição de artigo pirotécnico na alínea af) do artigo 2.º da proposta de lei, na verdade, é tão abrangente

que cabe lá tudo, inclusivamente artefactos pirotécnicos sem qualquer espécie de risco e com mero caráter

lúdico.

Para concluir, vamos falar sobre as consequências do quadro penal que aqui está previsto, porque há

previsão de uma pena de prisão até cinco anos para quem utilize, transporte, estes artefactos nas deslocações

para os recintos desportivos. Deslocações? O que é isto? Elas começam onde?

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O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — É ir de um sítio para o outro!

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Começam à porta de casa? Quem é que vai atrás deles?

Esta imprecisão dá lugar a uma pena de prisão até 5 anos. E pior do que isto é o agravamento da pena

acessória de interdição, nomeadamente no que diz respeito a estabelecimentos de ensino, de 1 a 8 anos de

agravamento. Isto implica o quê? Implica que um menor de 18 anos com esta pena não frequente um

estabelecimento de ensino no período de 1 a 8 anos? Está impedido de frequentar a escolaridade obrigatória,

segundo o quadro legal em vigor? O que é que vai acontecer aos menores de 18 anos que sofram uma pena

desta natureza? Estão impedidos de concluir a escolaridade obrigatória?

Por isso é que disse, Sr. Secretário de Estado, que isto é um exercício de pirotecnia legislativa e esta

proposta de lei não tem ponta por onde se lhe pegue.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Delgado

Alves.

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs. Deputados:

De facto, olhando para aquele que é, aparentemente, o móbil principal desta alteração, que passa pelo

petardo, e se olharmos para o petardo como um instrumento que não tem sempre um grau de perigosidade

mas faz sempre ruído, de alguma maneira, e não querendo ser excessivamente desagradável, a intervenção

do Sr. Deputado Telmo Correia também teve o potencial de provocar ruído, falando em democracia do

petardo, exagerando, manifestamente, o impacto real da perigosidade deste elemento e a realidade que temos

de analisar.

É que, efetivamente, deparamo-nos com instrumentos pirotécnicos que têm um risco associado —

nenhuma das bancadas questiona esta realidade —,…

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Claro que não!

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — … mas esse risco depende, naturalmente, da sua utilização e da

função e do contexto em que são utilizados. E aquilo que nos merece maiores dificuldades na assunção da

solução legislativa proposta diz respeito ao facto de olharmos para aqui e encontrarmos uma proibição

absoluta, que passa mesmo por a mera detenção ser objeto de proibição, quando, verdadeiramente, o

contexto e o quadro de utilização de determinados instrumentos pirotécnicos são, de facto, relevantes no

ajuizar da adequação da medida que aqui se propõe.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Não sabe do que está a falar!

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Efetivamente, o que encontramos, seja no quadro dos recintos

desportivos, seja no quadro do direito de manifestação, é, obviamente, um interesse de segurança pública

particularmente claro.

O Sr. Hugo Velosa (PSD): — O Deputado Laurentino Dias não está de acordo, com certeza!

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Noto que os Srs. Deputados estão muito exaltados com o facto de,

aparentemente, discordarmos da inclusão na listagem dos elementos proibidos, mas não é isso que está em

causa, o que está em causa é precisamente a necessidade de maior rigor e critério na definição quer do objeto

que se pretende inibir, quer do contexto em que a sua utilização deve ser vedada.

Não se trata, obviamente, de dizer que a iniciativa legislativa não é útil e que se deita fora por completo —

não é isso que está em causa e penso que também não foi isso que esteve em causa nas duas intervenções

que me antecederam e que acompanho —, o que está em causa, no quadro de uma restrição de direitos

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fundamentais e da associação de uma sanção penal, porque também é disto que se trata, por exemplo, no

caso das manifestações e da liberdade de circulação, é que a cautela do legislador deve ser superior à que

entendemos estar plasmada nesta iniciativa.

Obviamente, há disponibilidade para, na especialidade, tendo até em conta os vários elementos fornecidos

pelas entidades que foram ouvidas, e que, não discordando da medida, por vezes, até a consideraram

redundante, uma vez que poderia ser enquadrável no atual regime jurídico das armas e das suas munições,

haver uma clarificação e uma maior exatidão nesta matéria. Portanto, não se trata de deitar fora o bebé com a

água do banho, mas também não se trata de afogar o bebé no banho, confundindo aquela que deve ser a

intervenção exata e precisa a realizar neste domínio com aquilo que aqui encontramos.

Por isso, o Partido Socialista está disponível para, no trabalho de especialidade, poder melhorar a proposta

e, eventualmente, chegar a uma solução equilibrada, mas, obviamente, agora, em sede de apreciação na

generalidade, o nosso juízo global não pode ser inteiramente favorável.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem, agora, a palavra, também para uma intervenção, o Sr.

Deputado Paulo Rios de Oliveira.

O Sr. Paulo Rios de Oliveira (PSD): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs. Deputados:

De volta à tranquilidade, confesso que não entendo. Se estamos a legislar em cima do legislado e, portanto,

nada trazemos de novo, então, por quê tanta indignação e tanto perigo oculto neste documento?!

O PSD acompanha as preocupações aqui manifestadas pelo Deputado Telmo Correia, desde logo, porque

estas duas intervenções, precisamente por serem cirúrgicas, dirigem-se a questões muito específicas, muito

atuais e que preocupam as pessoas.

A verdade é que o direito de reunião e manifestação é um direito constitucional e, tendo tutela

constitucional, deve merecer, de todos, especial respeito e preocupação.

O direito de deslocação e participação em reuniões, comícios, manifestações ou desfiles cívicos têm esse

reconhecimento constitucional, é uma pedra fundamental do Estado de direito e, por maioria de razão, da

nossa democracia. E este direito só é pleno quando é plenamente exercido.

Contudo, este direito fica ameaçado quando, conforme se vem verificando, infelizmente, com invulgar

frequência, por bons e maus motivos, são utilizados artigos de pirotecnia que, pela sua utilização ou

composição, são potencialmente graves e danosos para a saúde de pessoas e para os materiais envolvidos. E

isto tem sido especialmente visível — não precisamos de o explicar, porque, lá fora, todos nos entendem —

nos recintos desportivos.

Ora, se está em causa a saúde e a segurança das pessoas envolvidas, bem como dos agentes de

segurança e do próprio público, impõe-se agir, e impõe-se agir com prontidão.

A lei das armas terá de ser revista, profundamente revista, mas esta situação não pode esperar por essa

revisão.

Mas impõe-se, igualmente, acautelar o direito à vida, à segurança e à integridade física das crianças e

jovens, também com tutela constitucional, em especial no quadro dos estabelecimentos de ensino, seja qual

for a sua natureza, onde temos de ser especialmente exigentes quanto ao impedimento de entrada com

artigos passíveis de criar perigo para pessoas e bens. Onde é que está a dificuldade em perceber isto?!

Deste modo se explica, igualmente, o pedido de prioridade e urgência com que esta proposta chega a

debate.

Pretende-se adaptar a legislação específica à dinâmica social e dar respostas mais firmes a novos riscos e

a novas ameaças.

Não podemos continuar a aceitar as imagens e relatos que nos chegam, com preocupante frequência, de

atos e desacatos envolvendo este tipo de materiais e comportamentos. E as respostas cirúrgicas são estas:

punir criminalmente a detenção, distribuição ou uso em manifestações ou atos públicos, nomeadamente em

recintos religiosos ou em recintos desportivos, e inclusive na deslocação para ou dos mesmos, de

instrumentos de pirotecnia, melhor descritos na lei; eliminar algumas exceções que, em má hora, foram

criadas para alguns tipos de grupos organizados de adeptos, a que chamamos claques, relativamente às

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quais, infelizmente, não sendo todas iguais, temos alguns exemplos bem negativos da sua intervenção;

aumentar, e bem, a pena acessória de interdição de frequência, participação ou entrada em determinados

locais.

Já agora, só para terminar, em 2 segundos, quero manifestar o nosso apreço pela intervenção, esta, sim,

muito cirúrgica, na questão da aquisição de reproduções de armas de fogo para práticas recreativas.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Srs. Deputados, a Mesa não regista mais inscrições, pelo que fica

concluído o debate, na generalidade, da proposta de lei n.º 136/XII (2.ª).

Passamos à apreciação, também na generalidade, da proposta de lei n.º 137/XII (2.ª) — Procede à

segunda alteração à Lei n.º 39/2009, de 30 de julho, que estabelece o regime jurídico do combate à violência,

ao racismo, à xenofobia e à intolerância nos espetáculos desportivos, de forma a possibilitar a realização dos

mesmos com segurança.

Para apresentar a proposta de lei, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da

Administração Interna.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna: — Sr.ª Presidente, Sr.as

e

Srs. Deputados: No pacote legislativo, como lhe chamaram, esta é a terceira e última iniciativa de uma

abordagem de ajuste daquilo que existe, cujo objetivo central são algumas falhas graves que têm sido

detetadas na realização de espetáculos desportivos.

Uma das linhas orientadoras desta iniciativa é uma maior responsabilização dos promotores de

espetáculos desportivos, através, por exemplo, da obrigatoriedade da existência de um ponto de contacto com

as forças de segurança que esteja perfeitamente clarificada.

Aproveita-se, também, para clarificar melhor o conceito de agente desportivo. Não é preciso ser leitor de

jornais desportivos para perceber onde é que isto nos levou noutros tempos, mas, basicamente, aquilo em que

estamos centrados é na responsabilização individual dos adeptos. Ou seja, temos aqui alguns mecanismos

para tornar mais funcional a interdição de acesso, que é rara em Portugal, e, mais do que isso, pretendemos

resolver uma situação sui generis que existe em Portugal, que é a de um adepto de um país qualquer, em

visita ao nosso País, ter liberdade de acesso, mesmo que tenha uma pena de interdição de acesso aos

estádios do seu país natal, porque tal informação não é conhecida. Ora, fica agora garantida a possibilidade

de circulação de informação transfronteiriça sobre esse tipo de indivíduos, para que a polícia portuguesa

possa, de alguma maneira, atuar em conformidade.

Finalmente, o ponto central desta intervenção tem a ver com os grupos organizados de adeptos, as

chamadas claques, a quem, em virtude de alguma atuação menos própria e de que todos temos

conhecimento, o Governo decidiu dar um regime diferente, que passa, nomeadamente, pelo registo obrigatório

de todos os seus membros.

A partir de agora, as claques terão de se organizar à luz, imagem e semelhança de uma associação…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Isso é assim há pelo menos 10 anos!

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna: — … e será necessário o

registo obrigatório dos seus membros. Mais: quando se desloquem para um estádio qualquer, é necessário

que exista uma lista de todos os membros que se vão deslocar, quem são e o que vão fazer àquele estádio.

Basicamente, estamos mais uma vez perante uma iniciativa legislativa que espero que tenha o acolhimento

desta Assembleia.

Como sabem, não tive tempo nem vou reabrir a discussão da iniciativa anterior, a única coisa que quero

transmitir é que, em sede de especialidade, haverá toda a abertura, da parte do Governo, para acolher todas

as sugestões, dúvidas e alterações de todas as bancadas aqui presentes, a propósito das iniciativas anteriores

e também desta.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Ainda para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado

Laurentino Dias.

O Sr. Laurentino Dias (PS): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs. Deputados: Se

houvesse dúvidas sobre o facto de esta proposta de lei não ter, em si, razões para nascer, a apresentação

aqui deixada pelo Sr. Secretário de Estado foi absolutamente clara.

Esta proposta poderá ter, quanto muito, dois objetivos: primeiro, fazer de conta que é a resposta do

Governo a alguns incidentes que aconteceram nos últimos meses nos recintos desportivos;…

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — E é preciso resposta!

O Sr. Laurentino Dias (PS): — … segundo, procurar amenizar a turbulência que as decisões do Governo,

em matéria de financiamento e policiamento, trouxeram também, nos últimos meses, ao mundo desportivo, em

particular ao futebol.

Mas esta proposta não é uma boa resposta para essas questões. Esta proposta, Sr. Secretário de Estado,

não traz nada de novo, muito menos aquilo que V. Ex.ª aqui disse, que já existe há anos na legislação

desportiva.

Aliás, o Sr. Ministro da Administração Interna, quando fez a apresentação desta proposta, na conferência

de imprensa, em Conselho de Ministros, foi claro. Permitam-me que leia o que ele disse: «Temos um quadro

bastante adequado de combate à violência nos espetáculos desportivos». E, depois, disse ainda: «A

operacionalização desses instrumentos é que tem sido muito deficiente». Ou seja, foi o próprio Ministro, na

apresentação pública, em conferência de imprensa, a seguir ao Conselho de Ministros, que disse que não

havia necessidade de uma nova lei, havia, sim, que pegar na lei existente e, efetivamente, encontrar forma de

a operacionalizar.

Então, porquê esta proposta de lei, Sr. Secretário de Estado? Porquê, se ela nada tem que aproveite aos

problemas que existem hoje, que existem desde há anos e que, certamente, todos desejamos combater?! É

para que o Governo durma descansado, porque mudou a lei, apesar de continuar tudo igual?! Ou, então, como

dizia o Sr. Ministro, na conferência de imprensa, esta lei foi preparada em interação com o Secretário de

Estado do Desporto e o desporto que mais pratica o ainda titular dessa Secretaria de Estado é o de acumular

novas leis, mesmo que essas novas leis não tragam nada de novo?! Talvez seja isto!

Sr. Secretário de Estado, o que é que tem corrido mal? A intervenção e o esforço do Estado? A legislação?

Não, o que tem corrido mal, consecutivamente, é a dificuldade do Estado em concertar com o movimento

desportivo, com os responsáveis e dirigentes desportivos de clubes, associações e federações, a forma de

combater os surtos de violência, nomeadamente quando ela vem de grupos organizados de adeptos, os quais

criam, sobretudo esses, situações de enorme instabilidade.

A pedagogia da não violência não vem da existência de mais esta lei, nem sequer da anterior, nem sequer

da próxima, vem da capacidade de todos — os responsáveis pela ordem pública, que é o Estado, e os

responsáveis pelos espetáculos desportivos, que são os promotores desses espetáculos — entenderem que é

imprescindível impor, dentro e fora dos recintos desportivos, um ambiente de calma e de tranquilidade próprio

de um Estado civilizado, de um Estado de direito e de quem vê ou quer no desporto uma escola de virtude.

Esse é que é o problema.

Não vamos votar contra esta proposta de lei, porque isso seria votar contra a lei que está em vigor (a Lei

n.º 39/2009) e que nós, juntamente como este Parlamento, ajudámos a construir. Vamo-nos abster aquando

da sua votação, amanhã, mas procuraremos convencer a maioria a voltar atrás,…

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Voltar atrás é que não!

O Sr. Laurentino Dias (PS): — … porque esta proposta não faz sentido, não é precisa e não tem nenhuma

substância que a dignifique.

Aplausos do PS.

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A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares

e da Igualdade, Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna, Sr.as

e Srs. Deputados:

Espero, nesta matéria, até porque não era de todo minha intenção, não causar nem uma pequena parte da

polémica que parece ter causado a expressão que usei ainda há pouco.

Mas, ainda assim, Sr. Deputado Laurentino Dias, atrevo-me a repetir que não concordo com a democracia

do petardo, mas também não concordo com o desporto à base do petardo. Portanto, mantenho a expressão.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Desta vez não é para a democracia, é para o desporto, mas a ideia é a

mesma.

Além do mais, acho que o Sr. Deputado Pedro Delgado Alves nunca deve ter estado perto de um petardo,

porque, se tivesse estado, perceberia que eles são sempre perigosos. O perigo é sempre potencial, o que não

quer dizer que causem sempre danos, mas isso é outra discussão.

Nesta discussão, tal como na anterior, ouvimos aqui um argumento curioso, que é o de que não é preciso,

embora com duas versões diferentes.

Uma versão é a do Sr. Deputado Laurentino Dias, que é mais ou menos esta: tudo o que o PS fez foi bem

feito,…

O Sr. António Braga (PS): — E foi!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — … o melhor é não fazer mais nada, o melhor é não mexer, o melhor é

seguir a velha doutrina socialista «deixa estar como está, que é para ver como fica». É mais ou menos esta a

orientação.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Isso é uma doutrina de que socialismo?

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Não falei de VV. Ex.as

!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Ah, bom!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Mas vou dizer, Sr. Deputado, se me permitir. É preciso que o Sr.

Deputado me deixe! Se me deixar, eu digo.

O outro argumento que vem da bancada do Partido Socialista é que não muda muito, que já está na lei,

que não traz grande novidade, que não é necessário. Não é necessário, mas mal não fará; pelo contrário,

pode clarificar.

Sr. Deputado, cito-lhe uma velha expressão britânica, que tem que ver com o que estamos a discutir: better

safe than sorry. Diríamos nós, em português: «mais vale prevenir do que remediar». Diriam os juristas, que

gostam de dizer coisas em latim: quod abundat non nocet. Temos várias formas de dizer isto. Contudo, que é

útil, é.

Há pouco, dizia o Sr. Secretário de Estado que não é preciso ler os jornais desportivos. Por acaso leio, e

leio vários, todos os dias. Ainda ontem li, num jornal desportivo, um artigo de uma personalidade da vida

portuguesa, que não é da minha área política, nem sequer em sido lato, e muito menos da minha área

desportiva (estou a falar do Dr. Eduardo Barroso, pelo que percebem porque é que digo isto), no qual fazia, a

propósito dos tempos em que estudou no Reino Unido, um enorme elogio, imaginem a quem: nem mais nem

menos do que à recentemente desaparecida Baronesa Thatcher.

E fazia o Dr. Eduardo Barroso este elogio à Baronesa Thatcher porquê? Porque ele viu, quando esteve em

Inglaterra, o que foi preciso fazer para combater o hooliganismo…

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Vozes do PSD e do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — … naquele país, onde era, de resto, o fenómeno mais grave e mais

preocupante! Fica muito bem este elogio vindo de um socialista!

E diria que esta proposta de lei segue exatamente esse caminho: segue o caminho de combater a

violência; segue o caminho de combater o racismo; cria um fenómeno novo, Sr. Deputado Laurentino Dias,

que é o oficial de segurança, responsável pela coordenação geral de segurança; clarifica a necessidade de

policiamento; responsabiliza os promotores,…

O Sr. Laurentino Dias (PS): — Já está!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — … o que é importante; responsabiliza as claques e, na ausência ou na

impossibilidade de responsabilizar as claques, responsabiliza os clubes; e deixa liberdade ao desporto juvenil,

onde essa liberdade deve existir,…

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — … sendo, por isso, fomento de virtudes, de cultura democrática, de

cultura de tolerância e combatendo aquilo que não pode existir, que são, às vezes — e mais uma vez ligamos

à política —, as infiltrações radicais e agressivas que existem, como sabe, nalgumas claques!

Por isso lhe digo, Sr. Deputado Laurentino Dias, que não é um regime radicalmente novo, mas é um regime

que aprofunda o existente, e nesse sentido é um regime positivo, pelo que merece o nosso apoio e o nosso

aplauso!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para intervir, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Tiago, do PCP.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr.a Presidente, Sr.

as e Srs. Deputados: Depois desta última intervenção, vou

tentar falar a sério.

A Lei n.º 39/2009, já alterada por decreto-lei em 2011, é agora alvo de proposta de alteração por parte do

Governo.

Além de pequenas alterações que o Governo agora pretende introduzir, persistem na legislação questões

para as quais o PCP já vinha chamando a atenção, aliás desde a discussão feita em 2009, nomeadamente

sobre a suspeita lançada de forma indiscriminada sobre todos os adeptos que se organizem em grupo,

comummente designado por claque.

É claro que é necessária uma intervenção política para combater os fenómenos de violência, xenofobia e

racismo nos espetáculos desportivos. E parece-nos óbvio que tal combate será tanto mais eficaz quanto maior

for o investimento na educação e na prevenção. Tal opção não tem sido, infelizmente, a do Governo,…

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exatamente!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — … que para o desporto tem cada vez uma visão próxima da promoção

industrial e para a educação uma visão cada vez mais próxima do ler, escrever e contar, estimulando mesmo

— fruto do processo de ensino cada vez mais amputado — sentimentos de competição e de egoísmo que

estão na base de muitos comportamentos sociais aqui identificados como alvo do combate.

Não pode haver, é certo, nenhuma tolerância para com manifestações de xenofobia, de racismo e de apelo

ao ódio e à violência, nem para com a utilização de grupos de adeptos por estruturas de crime organizado.

A proposta de lei agrava a moldura contraordenacional e sancionatória; propõe também a criação de um

ponto de contacto para a segurança e a obrigação de formação do coordenador de segurança — e pouco

mais.

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Não podemos, todavia, deixar de relevar o impacto negativo que as políticas de privatização de toda a

espécie de segurança, a pretexto dos custos, têm tido na resposta a fenómenos de desacatos de maiores

dimensões junto ou dentro dos recintos desportivos.

Persistem ainda, tal como a Comissão Nacional de Proteção de Dados indica (e já indicou em 2009),

dúvidas várias quanto à utilização de dados sensíveis para a aplicação de sanções, particularmente no que

toca à presença de adeptos nos recintos.

Mais do que isso, o PCP continua a opor-se à suspeita generalizada e indiscriminada lançada sobre todos

os adeptos associados, não nos parecendo ser esse o caminho para a eliminação dos fenómenos e

comportamentos de violência.

Acrescentamos ainda que o PCP manifesta frontal discordância com a solução do alargamento da

finalidade dos sistemas de videovigilância no sentido de poderem passar a abranger a utilização dos registos

para processo contraordenacional.

Em suma, persistindo as questões que geraram mais dúvidas e críticas por parte do PCP em 2009 e

introduzindo apenas matérias acessórias, deixando mesmo algumas remissões identificadas já como

ambíguas ou erradas e outros erros — nomeadamente, conceitos contraditórios com diplomas em preparação

—, o PCP manifesta novas dúvidas e afirma que o Governo não consegue apresentar qualquer espécie de

solução viável para o fenómeno de forma sensível.

O País precisa é de uma política que desencoraje os fenómenos de xenofobia, de racismo e de violência,

que promova o desporto como um direito e não como uma indústria. A solução meramente punitiva e, no

contexto atual, de desinvestimento e de privatização das funções de segurança não irá reduzir sensivelmente

o fenómeno.

E esta operação de cosmética legislativa, como aqui já nos foi inclusivamente descrita, que em diplomas

com ligação ao desporto já vem sendo prática, não muda em nada o facto de a política deste Governo, a sua

política de direita, deixar um campo cada vez mais aberto ao racismo, à xenofobia e à violência dentro e fora

dos recintos desportivos.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília

Honório.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da

Administração Interna, Sr.as

e Srs. Deputados: De facto, não existem alterações de fundo relativamente ao

enquadramento proposto pela Lei n.º 39/2009, já revista.

No entanto, há algumas propostas relativamente novas, como a figura de contacto com a segurança do

dirigente máximo do clube; a alteração no quadro sancionatório, nomeadamente no que aos promotores diz

respeito; e a aposta na responsabilização crescente dos adeptos violentos, ou que se presumem violentos,

bem como na relação com os grupos organizados de adeptos.

Do nosso ponto de vista, no caso desta proposta lei, não se trata de ser tecnicamente mal feita como a que

discutimos anteriormente, trata-se de discutir visões diferentes sobre a forma de encarar a violência, a

xenofobia e o racismo no quadro do desporto e dos espetáculos desportivos.

Temos algumas dúvidas de fundo relativamente à proposta de lei.

Em primeiro lugar, era esperável que esta iniciativa trouxesse à luz do dia a avaliação dos resultados da lei

de 2009 — o que é que foi feito, quais foram os problemas que se resolveram, quais são os limites efetivos da

lei — para se poder legislar num sentido diferenciado. Falta-nos essa informação.

Em segundo lugar, esta iniciativa «mete-se» em matérias muito sensíveis, nomeadamente proibindo

qualquer manifestação de convicção política e ideológica. Como se sabe, são direitos de grande sensibilidade,

tal como o que proíbe, por exemplo, que alguém da Juventude Social Democrata (JSD) vá a um jogo de

futebol com uma t-shirt cor-de-laranja…

Protestos do PSD e do CDS-PP.

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As proibições aqui previstas têm, de facto, em termos de condicionamento de direitos, uma extensão que

nos preocupa.

Mas a questão de fundo é mesmo a dos grupos organizados e a forma como a proposta de lei reage ao

problema das claques. E reage mantendo a ambiguidade que já vem do passado — é verdade, mantém a

mesma ambiguidade. Ou seja, todos os grupos organizados e todas as claques são à partida considerados

suspeitos. E, como suspeitos, são olhados como uma espécie de ilhéus de suspensão de direitos, sendo

hipervigiados e hipercontrolados. Mas, ao mesmo tempo, fruto de protocolos, são apoiados. Portanto, esta é a

ambiguidade que a proposta de lei mantém: suspeitos, desde o início, mas apoiados pelas direções dos

clubes.

Achamos que nem no passado, nem no presente, tem havido resposta à altura para estes fenómenos de

violência organizada.

Esperar, hoje, que sejam as direções dos clubes e os responsáveis máximos os fiscais da atividade das

claques, que sejam eles a controlar a eficácia e a extensão dos apoios, quando são tantas vezes fruto de uma

constelação de interesses à volta dessas mesmas claques, quando são muitas vezes estes poderes dentro

dos clubes que estimulam essas claques, é, do nosso ponto de vista, uma contradição sem resolução na

proposta de lei e não é a forma mais credível de aceitar que a violência no desporto exige prevenção, exige

um trabalho muito mais amplo antes de lá chegarmos. Reconhecemos aquelas que são evidências para nós,

há muito tempo.

Relativamente às questões das claques, temos uma posição clara desde sempre e não podemos nem

devemos, do nosso ponto de vista, sustentar grupos organizados que vivem muito menos da aclamação das

vitórias do seu clube do que propriamente daquela que é a sua realidade, que é o confronto entre claques de

clubes diferentes. E para esta realidade esta proposta de lei não tem uma resposta consistente.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem a palavra, para intervir, o Sr. Deputado Paulo Cavaleiro.

O Sr. Paulo Cavaleiro (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado Adjunto

do Ministro da Administração Interna: O Governo traz ao Parlamento, para apreciação, uma proposta de lei

que estabelece o regime jurídico do combate à violência, ao racismo, à xenofobia e à intolerância nos

espetáculos desportivos de forma a possibilitar a realização dos mesmos com segurança, facto que revela a

sua preocupação na aplicação prática dos princípios da ética e da segurança no desporto, apostando de uma

forma clara e inequívoca não só na punição mas também numa legislação que contempla uma perspetiva em

alguns pontos preventiva.

Na realidade, as questões de violência associada ao desporto exigem uma reflexão permanente, bem

como a atualização dos meios e da legislação que serve de enquadramento para esta matéria.

Permitam-me que, no âmbito do combate a fenómenos como estes, destaque e faça uma referência ao

Plano Nacional de Ética no Desporto, uma iniciativa deste Governo, apresentada em fevereiro do ano

passado, que visa um conjunto de ações estruturadas e planificadas, que promovam os valores inerentes ao

desporto.

Mas, Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, a ética no desporto é sinónimo de mais cidadania e de mais

respeito. Daí, a importância desta proposta de lei para a defesa de princípios básicos, do espírito desportivo,

do bom convívio, da dignidade e do civismo nas competições desportivas.

Empenhado em avaliar a aplicação do ordenamento jurídico existente, e com o contributo do Grupo de

Trabalho, criado no MAI (Ministério da Administração Interna), sobre o policiamento de espetáculos

desportivos, entre outros, foi possível ao Governo identificar alguns aspetos que carecem de uma melhor

concretização, como são os respeitantes às garantias de segurança nos recintos desportivos.

Se atendermos à proposta de lei, merecem uma referência especial algumas questões em concreto, como

já foi aqui referenciado pelo Sr. Secretário de Estado e por muitos outros Deputados que intervieram sobre

esta matéria: a questão da atualização do regime sancionatório através do alargamento e do agravamento das

sanções aplicáveis, bem como da forma como é calculado o valor dessas sanções; a questão da criação do

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ponto de contacto para a segurança, do responsável pela matéria de segurança nos clubes; e também a

alteração no regime jurídico dos denominados grupos organizados de adeptos.

Como aspetos positivos, devem também referenciar-se a simplificação de processos conseguida com a

centralização das competências para a instrução e decisão dos processos contraordenacionais; um papel

também de maior responsabilidade aos pais e encarregados de educação; e a introdução de uma nova

qualificação de espetáculo desportivo de risco reduzido para competições de crianças e jovens até ao escalão

juvenil.

São vários os pontos — pela nota técnica que nos chegou hoje conhecemos pelo menos nove — que se

destacam em termos de alteração à atual lei.

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: A ética desportiva tem de prevalecer. Em nenhuma circunstância,

podemos pactuar com qualquer tipo de violência.

Creio que esta proposta versa matérias importantes que irão assegurar as condições propícias a que os

espetáculos desportivos sejam uma festa à qual todos possamos assistir com as nossas famílias, em

segurança.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Paulo Cavaleiro (PSD): — O Grupo Parlamentar do PSD está disponível para participar na sua

discussão em sede de especialidade e para a melhorar naquilo que todos entendamos que seja possível, até

com as sugestões que o Partido Socialista queira fazer sobre esta matéria. É que neste caso, em concreto,

esta proposta não vem de nenhum acordo com a troica, pelo que pode propor à vontade aquilo que entenda

ser melhor e ser necessário para que a violência nos espetáculos desportivos seja verdadeiramente reduzida e

para que todos possamos assistir a um espetáculo desportivo na maior das tranquilidades e com o ânimo e o

espirito que o espetáculo desportivo deve ter.

Devemos, pois, todos trabalhar em conjunto para que possamos encontrar as melhores soluções. E cabe-

nos agora a nós, ao Parlamento, dar esse contributo. É para isso que cá estamos e espero que todos

possamos contribuir para isso.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para concluir este debate, tem de novo a palavra o Sr. Secretário de

Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna: — Sr.ª Presidente, Sr.as

e

Srs. Deputados: Quero, com esta intervenção, deixar apenas duas pequeninas notas.

A primeira nota é sobre a necessidade ou a desnecessidade desta lei. Quem sou eu para opinar quando

estou na Casa da feitura das leis? Os Srs. Deputados assim o decidirão!

Uma segunda nota refere-se à intervenção do Sr. Deputado Miguel Tiago, a quem peço imensa desculpa,

porque não gosto de responder diretamente. Mas tenho de o fazer, dizendo o seguinte: não há indício algum

de que este Governo alguma vez tenha recuado na garantia de que as funções de segurança são funções

sérias e perfeitamente indelegáveis por nós.

Não sei onde é que leu qualquer alusão à privatização de funções de segurança. Seguramente que não é a

prática deste Governo — nem preciso de falar das suas intenções.

Naturalmente que, em sede comissão, no debate de especialidade, estaremos perfeitamente disponíveis,

antes ou depois, para explicar melhor algumas das razões de ser desta lei.

Naturalmente, algumas coisas aparecem, como todos sabemos, a propósito das claques, algumas ligações

não propriamente muito claras entre claques e outro tipo de organizações…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Às vezes, até claras demais!

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna: — Julgo que essa

preocupação deveria ser partilhada por todos e, desde já, o Governo está perfeitamente disponível para

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fornecer as informações que tem de algum tipo de delinquência que utilizam algumas destas organizações

para a troca de opiniões sobre a melhor maneira de a combater.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — A Mesa não regista mais inscrições, pelo que assim fica concluído o

debate deste ponto da nossa ordem do dia.

O ponto seguinte consiste no debate conjunto, na generalidade, dos projetos de lei n.os

373/XII (2.ª) —

Quinta alteração à Lei n.º 37/81, de 3 de outubro (Lei da Nacionalidade) (PS) e 394/XII (2.ª) — Quinta

alteração à Lei n.º 37/81, de 3 de outubro (Lei da Nacionalidade), nacionalidade portuguesa de membros de

comunidades de judeus sefarditas expulsos de Portugal (CDS-PP).

Para proceder à apresentação da iniciativa legislativa do PS, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria de

Belém Roseira.

A Sr.ª Maria de Belém Roseira (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: O projeto de lei que o

Grupo Parlamentar do Partido Socialista hoje aqui apresenta tem como objetivo permitir a aquisição da

nacionalidade portuguesa, por naturalização, aos descendentes de judeus sefarditas portugueses, através da

demonstração da tradição de pertença a uma comunidade sefardita de origem portuguesa, com base na

comprovação de requisitos objetivos de ligação a Portugal.

O Sr. Carlos Zorrinho (PS): — Muito bem!

A Sr.ª Maria de Belém Roseira (PS): — Esta solução acompanha aquela que, já em ambiente

democrático, foi adotada pela vizinha Espanha.

Aproveito para saudar o Sr. Embaixador de Espanha e as comunidades judaicas aqui presentes, que se

encontram a assistir à sessão.

Aplausos do PS, do PSD e do CDS-PP.

No dia em que se comemoram os 50 anos da encíclica Pacem in Terris, penso que é simbolicamente

importante apostarmos na paz e na tolerância entre os povos.

Mas este projeto de lei é bem mais do que a definição do seu objeto. Ele é, verdadeiramente, um

reencontro com a História de Portugal. A sua exposição de motivos, para a qual vos remeto, é

abundantemente justificativa da sua justeza e da sua justiça.

Apesar de a diáspora judaica por terras ibéricas, segundo Inácio Steinhardt, ser difícil de datar em termos

exatos, as fontes históricas existentes permitirão situá-la bem antes do nascimento de Jesus, tendo-se visto

reforçada e alargada com a facilidade de comunicações que a vastidão do império romano possibilitou.

Mas o que é verdadeiramente importante sublinhar é a relevância do papel que os judeus desempenharam

na formação do reino português, logo com D. Afonso Henriques e a conquista de Santarém —

estrategicamente indispensável para a conquista de Lisboa — bem como na Revolução de 1383, que permitiu

a consolidação da nacionalidade e, mais tarde, na Restauração.

A centralidade do papel dos judeus em Portugal enquanto detentores de poder político e económico, das

relações com a Europa e também do saber quer no domínio das humanidades quer no das ciências exatas foi

determinante para a construção da nossa história e da nossa expansão.

Vozes do PS: — Muito bem!

A Sr.ª Maria de Belém Roseira (PS): — A Rede de Judiarias de Portugal, recentemente constituída,

apresenta-se como tendo por especial objetivo permitir a descoberta da história dos judeus na história de

Portugal. E esse trabalho é fundamental, pois só conhecendo bem a nossa história poderemos conhecer-nos

bem a nós próprios e projetar o nosso futuro coletivo.

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A instauração da Inquisição em Portugal, imposta pelos reis católicos como moeda de troca para a

realização do casamento de D. Manuel I com a infanta D. Isabel, em época em que os judeus representariam

cerca de um quinto da população portuguesa, bem como o «decreto de expulsão dos hereges», em 1496,

foram sentidos como uma «segunda expulsão de Jerusalém», de acordo com a poesia da época.

Muitos autores referem a diferença de grau da atuação da Inquisição portuguesa relativamente à

espanhola. Mas tais considerações, a serem verdadeiras, não poderão nunca apagar a ignomínia dos crimes

abomináveis cometidos por esta instituição, nem poderão apagar que a expulsão ou a condenação de

eminentes figuras da sociedade portuguesa, vultos enormes que marcavam a Europa e o mundo do seu

tempo, representaram a decapitação dos recursos do País em variadíssimas expressões imateriais e

materiais.

Para o comprovar há a forte marca que imprimiram muitos dos que foram expulsos ou conseguiram fugir,

nos países onde foram parar, nos domínios do pensamento, do saber e do empreendedorismo.

As ignomínias praticadas dão bem expressão ao empobrecimento ético, intelectual, económico e social que

o fanatismo, a intolerância e o obscurantismo, casados entre si, sempre geram, através da produção de

monstruosidades que nos envergonham e que comprometem não só a época em que são cometidos como as

que se lhes seguem.

Tratou-se, por antecipação, da tradução, na prática, do conceito de «banalidade do mal», desenvolvido já

na nossa contemporaneidade, a propósito do Holocausto.

De todos os que lutaram contra a Inquisição, destaca-se, em posição ímpar, o padre António Vieira. Por

isso, foi insistentemente perseguido e até preso. Muitos e denunciadores foram os discursos que elaborou e

proferiu. A pressão que exerceu sobre D. João IV, «não pedindo favor, mas justiça», ou afirmando «se no juiz

há ódio, por mais justificada que seja a inocência do réu, nunca a sentença do juiz há de ser justa».

Abundantemente citado por Anita Novinsky, Vieira argumenta, considerando «os cristãos-novos mártires do

próprio catolicismo e sujeitos a um tribunal criminoso». Este um lugar onde «os inocentes perecem e os

culpados triunfam, porque esses na boca têm o remédio e no coração o veneno».

Muitos autores descreveram magistralmente o que representou a Inquisição, bem como as perseguições

de que os judeus foram alvo em Portugal, dando expressão ao sentimento profundo do sentir do povo

português. Cito, só como exemplos, Oliveira Martins, na sua História de Portugal, ou Camilo Castelo Branco

em O Judeu. Antero de Quental considerava mesmo a expulsão dos judeus uma das causas da decadência

dos povos peninsulares. Feita em nome de Deus ou da pureza do sangue, tinha, na verdade, como grande

objetivo o seu afastamento de posições de poder e a apropriação das riquezas que detinham!

O fanatismo, a intolerância e a cegueira que a Inquisição representou só se aproximou do fim com o

poderoso Marquês de Pombal.

Recordo o facto descrito por Cecil Roth, que, na sequência de ordem ditada pelo rei D. José, de que todo o

português que tivesse sangue judeu deveria usar um chapéu amarelo, o Marquês se apresentou na corte com

três chapéus debaixo do braço. Inquirido pelo rei sobre o que pretendia fazer com eles, o Marquês respondeu,

dizendo que, obedecendo às ordens do rei, um dos chapéus era para si próprio, outro para o grande inquisidor

e um outro para sua majestade.

Este diploma, a ser aprovado, é uma demonstração prática de Uma Teoria de Justiça, de Amartya Sen: não

bastam instituições justas e pessoas justas; necessitamos de realizações justas.

O que, verdadeiramente, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista pretende, na sequência do pedido de

desculpas apresentado ao povo judeu, em nome do Estado Português, pelo então Presidente da República

Mário Soares, em 1989, e prestando tributo ao nosso património de tolerância, universalismo e miscigenação,

é que, naquilo que está ao nosso alcance, «a planta do pé dos judeus» que têm raízes em Portugal «aqui ache

descanso», se for esse o seu desejo.

Aplausos do PS, do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Ribeiro e Castro para apresentar o projeto de lei

n.º 394/XII (2.ª), da autoria do CDS-PP.

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O Sr. José Ribeiro e Castro (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Antes de mais,

cumprimento a comunidade judaica, que segue o debate na galeria, pedindo-lhe que transmita também as

saudações do CDS ao rabino da sinagoga, que sabemos ter começado a assistir ao debate, mas que teve de

se ausentar.

Cumprimento igualmente o Sr. Embaixador de Espanha, já aqui saudado.

Hoje é um dia histórico para muitos compatriotas da comunidade judaica, sendo também um dia histórico

para nós, Assembleia da República, e para Portugal.

É um dia de reparação histórica, um dia de restabelecimento da memória, o dia em que repomos a ligação

por cima de 520 anos de separação forçada, que pomos termo a um hiato que nunca devia ter existido. É

como que repor o trato sucessivo da nacionalidade portuguesa, o trato sucessivo da pertença comum, que, no

coração de quem partiu, nunca se interrompeu.

O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. José Ribeiro e Castro (CDS-PP): — É o dia em que damos de novo as boas-vindas a quem nunca

devia ter tido de partir de Portugal. É, portanto, um dia feliz.

Cito um texto de um autor judaico que fez as crónicas da diáspora sefardita, para termos um pouco a ideia

da importância que isso teve para o Novo Mundo: «A dispersão do povo de Israel, sobretudo após a instituição

da Inquisição na Península Ibérica, neste caso em Portugal, viu uma fuga de cérebros para o resto do mundo

de então, inclusive as ilhas e as colónias portuguesas de além-mar. No Novo Mundo, um dos lugares favoritos

foi o Brasil, para onde, sobretudo depois da segunda metade do século XVI, muitos cristãos-novos decidiram

deslocar-se, especialmente graças à sua educação — a abranger todos os ramos do saber humano — e aos

seus meios económicos, ambos muito vastos.

A história da diáspora judaica nas Américas começa com o êxodo de 1492…» — de Espanha — «… e

continua com a expulsão de Portugal, em 1496-98. Durante mais de um século, cartógrafos, cosmógrafos e

cientistas judeus foram indispensáveis para fundar as bases dos dois impérios ibéricos nas Américas. Eles

serão os alicerces dos descobrimentos europeus, da África às Américas. Com a expulsão dos judeus do solo

ibérico e com as atrocidades da Inquisição, as futuras potências coloniais ibéricas não só perderam uma

importantíssima parcela intelectual, indispensável ao crescimento económico nacional, mas também, e

mormente, limitaram ou até atrofiaram os seus contactos com o resto da Europa, financeiramente em mãos

dos Judeus. Isto aplica-se sobretudo a Portugal, com um império a cobrir todos os continentes.» (a)

E o estudo termina dizendo o seguinte: «Mesmo se não numerosos, a presença dos sefarditas, sobretudo

de origem portuguesa, foi muito importante no desenvolvimento económico das Américas, do Canadá ao

Brasil, passando pelas colónias anglo-americanas e Caraíbas.» (a)

Não é de surpreender, por isso, que numa série documental produzida há poucos anos na RTP, intitulada

Portugal Sem Fim, que viajava pelas presenças lusas espalhadas por todo o mundo, quatro dos 33 episódios,

assinados por grandes jornalistas portugueses, fossem especificamente sobre a diáspora sefardita. Foram

trabalhos assinados por Seruca Salgado, que, aliás, seria importante que a RTP pudesse reexibir nos

próximos dias (pude, na altura, ver alguns), em que se conta a história da presença de descendentes

sefarditas em Israel, na Turquia, em Belmonte, em Faro, em Jerusalém, em Curaçau, na Holanda e nos

Estados-Unidos. Sabemos também que há uma forte presença de descendentes sefarditas no Brasil, e é daí,

aliás, que veio a relação do CDS com este processo.

Este é, para nós também, na bancada do CDS, um dia de grande satisfação e de alegria, de honra e de

orgulho.

Gostava de dizer aqui, para ilustrar a importância que as redes sociais têm hoje em dia na política, que foi

através do Facebook que fomos alertados para a existência deste rasto que não se pode apagar na nossa

memória e que nos interessámos pelo assunto. Foram sefarditas do Brasil que nos contactaram.

Em 2010, seguimos uma petição eletrónica, que recolheu mais de 1000 assinaturas em pouco tempo, e

que está ainda pendente, e apresentámos duas perguntas aos Ministros da Justiça e da Administração Interna

de então para auscultar da sua sensibilidade para o acolhimento desta pretensão. Recebemos uma resposta

desses ministros que assinalava que a mera tradição histórica não era suficiente e que era necessário um

estudo mais profundo.

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Nessa altura, tínhamos o entendimento de que a lei vigente já podia ser acolhimento suficiente para o

tratamento administrativo favorável, uma vez que o n.º 6 do artigo 6.º da lei vigente (que, aliás, serve de base

e de inspiração ao projeto de lei do PS, como também ao nosso) já permitia discricionariamente reconhecer a

nacionalidade portuguesa ou atribuí-la a quem provasse descender de comunidades de ascendência

portuguesa, como é o caso.

Continuámos a trabalhar nesse sentido e ainda recentemente abordámos quer a Conservatória dos

Registos Centrais, quer a Sr.ª Ministra da Justiça, sensibilizando para esta questão e para que orientações

administrativas claras fossem definidas.

Apareceu, então, a iniciativa do Partido Socialista, que é um passo muito importante e que saudamos.

Aderimos a essa iniciativa e apresentámos também um projeto de lei muito semelhante. Em nosso

entendimento, isto tem vantagens, porque supera a discricionariedade administrativa e a incerteza que poderia

sempre existir, construindo um quadro que será agora legislado e depois regulamento, o qual será dotado de

certeza normativa e de certeza regulamentar, portanto da segurança jurídica indispensável. Este é, assim, um

grande passo.

Devo dizer que, deste diálogo que estabeleci pelo CDS, retenho a memória de um diálogo muito tocante e

muito comovente. É, de facto, muito tocante ver que há pessoas, que não têm a nossa nacionalidade, mas que

a querem ter, e que, apesar de 500 anos de errâncias — e sabemos que são 500 anos atravessados de muito

sofrimento —, mantêm os nomes, mantêm os apelidos, mantêm o idioma, mantêm as tradições, mantêm e

cultivam os símbolos e os ritos particulares e mantêm o gosto de voltarem a contar-se entre nós.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. José Ribeiro e Castro (CDS-PP): — Isso é, para nós, o maior sinal de portugalidade que pode

existir, o maior sinal de que aqui pertencem. Por isso, é muito bom podermos tê-los de volta, com a mesma

bandeira e na mesma comunidade nacional.

Será, pois, muito importante que esta Assembleia vote por unanimidade os projetos de lei que hoje aqui

são apresentados.

Aplausos do CDS-PP, do PSD e do PS.

(a) (inDo Êxodo ao Êxito: Crónicas do Sucesso Sefardita no Novo Mundo (1492-1820), de Joseph

Abraham Levi, Rhode Island College, 2003).

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Simões Ribeiro para uma

intervenção.

O Sr. Paulo Simões Ribeiro (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Em primeiro lugar, gostaria

de, em meu nome e em nome do Grupo Parlamentar do PSD, saudar a comunidade judaica, que aqui

acompanha este debate, o que é, para nós, importante.

Fundando-se em razões históricas, discutimos hoje, neste Plenário, alterações ao artigo 6.º da Lei da

Nacionalidade, no sentido de passar a ser concedida a nacionalidade por naturalização aos descendentes de

judeus sefarditas portugueses.

Resumidamente, podemos afirmar que os primeiros passos da presença de judeus no território da

Península Ibérica remontam à época das navegações fenícias. Tiveram sempre uma importante intervenção

na fundação da nacionalidade, como já aqui foi dito, e desempenharam um muito relevante papel também no

plano cultural peninsular na Idade Média e na Idade Moderna, até à sua expulsão no final do século XV.

Da sua história também conhecemos a sua permanência entre nós enquanto cristãos-novos, bem como a

perseguição sofrida às mãos da Inquisição.

No entanto, todos reconhecemos que existe uma grande dificuldade na identificação dos descendentes dos

cripto-judeus portugueses anteriores à época do Marquês de Pombal, atenta a destruição de todos os registos

dos cristãos-novos decretada pelo alvará de 1768 que determinou o fim da atividade inquisitorial em Portugal.

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Após aquela data, alguns descendentes de judeus portugueses fugidos das perseguições regressaram a

Portugal, instalando-se, criando novos laços familiares, culturais e profissionais e vendo reconhecida a sua

história e singularidade, designadamente através do pedido de desculpas do Estado português em 1989, que

reabilitou a sua imagem e identidade, para além da sessão evocativa dos 500 anos do decreto de expulsão

dos judeus de Portugal, promovida por esta Casa em dezembro de 1996.

Apesar das perseguições e do longo afastamento do seu território ancestral, muitos judeus sefarditas

transmitiram sempre o sentimento português de geração em geração. Ora, o corolário de tal processo de

reabilitação e reconhecimento desta identidade e cultura será a promoção do retorno a Portugal dos

descendentes dos judeus expulsos ou perseguidos, designadamente através da possibilidade de aquisição da

nacionalidade portuguesa por naturalização aos que demonstrem objetivamente a tradição de pertença a uma

comunidade sefardita de origem portuguesa.

Por isso, para além de hoje fazermos aqui história, é opinião do Grupo Parlamentar do PSD que estamos a

fazer um ato de elementar justiça. Para nós, um país sem memória é um país sem história, e um país sem

história será sempre um país sem glória.

Aplausos do PSD, do PS e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Honório para uma

intervenção.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: O Bloco de Esquerda acompanha

as iniciativas legislativas aqui apresentadas pelo PS e pelo CDS no sentido de ser atribuída a nacionalidade

aos descendentes de judeus sefarditas, reconhecendo que não há História com «se», que não há correção do

passado e que a perseguição de que este povo e esta comunidade foram alvo refez o rumo da História deste

País.

A importância que atribuímos a estas iniciativas não é de reescrever a História, não é de apagar o passado,

é, sim, de o enfrentar e de repor justiça perante o que sabemos ter sido um dos massacres com maior

dimensão e com maior impacto nacional. Por isso, subscreveremos estas duas iniciativas legislativas,

desconhecendo qual é o universo de incidência das mesmas — não temos esse conhecimento efetivo.

Saudamos a generosidade do CDS no que respeita à dispensa do critério do conhecimento e domínio da

língua portuguesa para o reconhecimento deste direito e saudamos os dois partidos políticos por trazerem aqui

esta tentativa de enfrentar o passado, acompanhando, aliás, uma iniciativa levada a cabo no país vizinho.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe, do PCP, para uma

intervenção.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, nada temos a acrescentar ao que já

aqui foi dito. Queremos apenas dizer que votaremos favoravelmente estas iniciativas.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Não se registando mais inscrições, fica, assim, concluído este ponto

da nossa ordem de trabalhos.

A Mesa despede-se dos nossos convidados que estiveram a assistir a este debate, bem como do Sr.

Embaixador de Espanha, que nos deu a honra de também ter assistido à nossa sessão.

Passamos ao ponto seguinte da ordem do dia, que consiste no debate conjunto, na generalidade, dos

projetos de lei n.os

355/XII (2.ª) — Cria um programa extraordinário de combate à pobreza infantil e reforça a

proteção dos direitos das crianças e jovens (PCP), 356/XII (2.ª) — Estabelece a obrigatoriedade de elaboração

e apresentação de um relatório anual sobre os direitos da criança e a situação da infância em Portugal (PCP)

e 357/XII (2.ª) — Cria a comissão nacional dos direitos das crianças e jovens (PCP).

Para apresentar as iniciativas legislativas, tem a palavra a Sr.ª Deputada Rita Rato.

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A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputados: Vivemos tempos de retrocesso. A violência da

crise económica e social que destrói o País tem tido impactos brutais sobre as crianças e jovens.

Nas escolas portuguesas existirão certamente mais de 13 000 crianças com fome e carências alimentares

e cerca de 350 000 são abrangidas pela ação social escolar, ou seja, vivem em famílias com rendimentos

mensais de referência de 419 €.

A Sociedade Portuguesa de Pediatria denunciou recentemente que têm surgido nos hospitais casos que

não se registavam há 20 anos: mães que acrescentam água ao leite artificial; pais que não têm condições para

acompanhar os filhos no internamento hospitalar.

Passados quase 39 anos da Revolução de Abril e 23 anos da ratificação da Convenção dos Direitos da

Criança, hoje, no nosso País, muitas são as crianças vítimas da subnutrição e da fome, da degradação dos

serviços de saúde materno-infantil, do abandono e insucesso escolares, do trabalho infantil, da promiscuidade

habitacional, de violência, de maus tratos, de mendicidade, de abandono.

Os direitos fundamentais existem em forma de lei, mas não existem na vida de milhares de crianças.

Apesar de não existirem dados estatísticos atualizados, os sinais que nos chegam da sociedade são muito

preocupantes.

Cada vez mais famílias têm dificuldades em cumprir as necessidades básicas das crianças com

alimentação, vestuário, habitação, material escolar e cuidados de saúde. Há fome na escola, porque há fome

em casa.

Há fome em casa porque o encerramento de empresas, salários em atraso, desemprego, cortes nos apoios

sociais, no subsídio de desemprego, no abono de família, no rendimento social de inserção marcam o dia-a-

dia de muitos milhares de famílias.

Em Portugal, as causas estruturais da pobreza têm sido agravadas por mais de 36 anos de políticas de

direita, o processo de integração capitalista da União Europeia, a natureza do capitalismo e da crise e a

aplicação das medidas do pacto de agressão da troica.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: O Relatório da UNICEF de 2012 «Medir a

Pobreza Infantil», baseado em indicadores de 2009, confirma que 27% das crianças portuguesas vive em

situação de carência económica, 46,5% no caso das crianças que vivem em agregados monoparentais, 73,6%

das crianças vive em situação de carência económica no caso de famílias cujos pais estão desempregados.

Estes dados são anteriores ao agravamento da crise económica e social e à aplicação do pacto da troica, o

que significa que estes dados pecam por defeito.

Alertam vários especialistas que «A situação da infância em Portugal (…) carece de meios de diagnóstico

que sejam adequados e eficazes. Não há nenhum espaço institucional de análise permanente e continuada

sobre as crianças. Desde a extinção da Comissão Nacional para os Direitos da Criança que em Portugal não

se realizam estudos sobre a aplicação da Convenção sobre os Direitos da Criança».

É necessário romper com este caminho de austeridade e exigir que os direitos e a dignidade da vida das

crianças não existam apenas no papel da lei e constituam, de facto, a vida real de todas as crianças

portuguesas.

Por isso, as propostas do PCP vão em três dimensões complementares: diagnóstico, acompanhamento e

intervenção; a elaboração anual de um relatório sobre a situação da infância; a criação da comissão nacional

dos direitos das crianças e jovens; a criação de um programa extraordinário de combate à pobreza infantil.

Sabemos que estes são passos integrantes de um caminho maior de erradicação da pobreza, de progresso

e de justiça social. Mas, da parte do PCP, daremos todos os passos necessários para a defesa da dignidade

da vida destas crianças e da defesa do regime democrático.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Inês Teotónio

Pereira.

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A Sr.ª Inês Teotónio Pereira (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Antes de mais, queria

começar por felicitar o PCP por demonstrar, através destes três projetos de lei, uma grande preocupação com

o tema da pobreza infantil.

É um facto que Portugal atravessa um período difícil desde há alguns anos em termos de percentagem de

crianças em risco de pobreza, sendo apesar de tudo, segundo os dados estatísticos — e ainda bem — mais

baixo do que em vários países da União Europeia, como é o exemplo da Polónia, da Espanha, da Itália, ou

mesmo do Reino Unido.

O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — É verdade!

A Sr.ª Inês Teotónio Pereira (CDS-PP): — A situação é obviamente bastante grave, por isso acreditamos

que a intenção e a preocupação do PCP é genuína e que o seu objetivo é de facto ajudar a ultrapassar esta

situação.

Nem podia ser de outra forma, porque este tema não pode nem deve ser, em circunstância alguma,

utilizado como fundamento de luta partidária ou de tentativa de mediatização inócua.

A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — Muito bem!

A Sr.ª Inês Teotónio Pereira (CDS-PP): — No entanto, e apesar de reconhecermos as suas boas

intenções, a verdade é que infelizmente estes três projetos nada acrescentam em soluções concretas que

ajudem a resolver o problema da pobreza infantil. E é pena.

Protestos da Deputada do PCP Rita Rato.

Se não, vejamos: no que toca ao projeto de lei n.º 355/XII (2.ª), que cria o programa extraordinário de

combate à pobreza infantil, é importante dizer que, na prática, este programa teria um impacto nulo ou quase

nulo se fosse criado.

É que, além de chavões como «promover à criança melhores condições», «intervir em diversos planos»,

«definir metas», «perspetivar políticas» ou «orientar para a mudança», pouco ou nada se consegue tirar daqui.

No nosso entender, mais importante do que intenções programáticas é implementar medidas concretas,

como aquelas que estão em curso, tais como o aumento de vagas nas creches; o aumento em 10% do

subsídio de desemprego de casais com filhos, em que ambos os elementos estejam desempregados; o

programa de emergência alimentar; o programa escolar de reforço alimentar, como o dos pequenos-almoços

nas escolas, que já abrangem mais de 11 000 crianças; o programa de acolhimento institucional e intervenção

precoce na infância, e por aí fora.

Quanto ao projeto de lei n.º 356/XII (2.ª), que estabelece a obrigatoriedade do Governo de elaborar e

apresentar um relatório sobre os direitos da criança e a situação da infância em Portugal, a ideia é boa, mas

convém lembrar que o Ministério da Solidariedade e da Segurança Social elabora periodicamente um conjunto

de relatórios de avaliação, como o relatório CASA (Caraterização Anual da Situação de Acolhimento das

Crianças e Jovens),…

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Não tem nada a ver!

A Sr.ª Inês Teotónio Pereira (CDS-PP): — … o relatório de avaliação da atividade das CPCJ (Comissões

de Proteção de Crianças e Jovens), o relatório da assessoria técnica aos tribunais ou o relatório da adoção.

Todos eles já cumprem os objetivos propostos por estes projetos de lei.

Também o Ministério dos Negócios Estrangeiros elabora regularmente um relatório sobre a aplicação da

convenção dos direitos da criança em Portugal.

Mais uma vez, esta iniciativa do PCP iria traduzir-se em mais uma duplicação de um trabalho que já é

realizado, para além dos acrescidos custos que implicaria.

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Por último, sobre o projeto de lei n.º 357/XII (2.ª), que cria a comissão nacional dos direitos das crianças e

jovens, consideramos que nesta altura é mais útil, mais prático e mais eficaz agilizar as comissões e os

programas já existentes e a sua execução do que estar a criar novas comissões e novos programas.

O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Muito bem!

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Não percebeu nada!

A Sr.ª Inês Teotónio Pereira (CDS-PP): — Atualmente, está em curso a criação do conselho nacional para

as políticas de solidariedade e segurança social, família, reabilitação e voluntariado, que irá tratar de matérias

que o PCP quer atribuir às comissões que quer criar, além da agenda da criança, que pretende reforçar a

proteção dos direitos da criança, através da criação do sistema de interação das várias entidades com

responsabilidades neste tema.

Por tudo isto, agradecemos e reconhecemos o empenho do PCP nesta questão, mas entendemos que

nenhum dos projetos vai ao encontro das necessidades das crianças que vivem em situação de pobreza e que

exigem respostas urgentes.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Idália Serrão.

A Sr.ª Idália Salvador Serrão (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Gostaria de saudar a

oportunidade que o PCP nos traz para que possamos, uma vez mais, discutir este tema tão fundamental, que

é o tema dos direitos da criança.

O Partido Socialista está disponível, como sempre esteve, para viabilizar toda e qualquer iniciativa que

melhore a aplicação e o acompanhamento da convenção dos direitos da criança.

Relativamente ao projeto de lei que cria a comissão nacional dos direitos das crianças e jovens,

consideramos que é uma redundância e não comporta grande efeito útil face ao que existe hoje e que já está

regulamentado.

Relembro os diferentes domínios que a Comissão Nacional de Proteção de Crianças e Jovens em Risco

abrange: a prevenção, a reparação e o acompanhamento dos direitos da criança.

Quanto ao projeto de lei que institui o relatório anual de direitos das crianças e situação da infância em

Portugal, nada temos a opor. A criação de um relatório que congregue todos os dados relativos à infância e à

juventude é, na nossa opinião, uma iniciativa que pode ser desenvolvida. Nada temos, pois, a opor, desde que

fique a cargo da Comissão Nacional de Proteção de Crianças e Jovens em Risco.

Em relação ao projeto de lei que cria o programa extraordinário de combate à pobreza infantil e reforça a

proteção dos direitos da criança, gostaria de fazer algumas considerações.

Entre 2005 e 2011, segundo dados do Eurostat, Portugal apresentou das maiores reduções da taxa de

pobreza infantil entre os países da União Europeia. No mesmo período, na União Europeia a 27, ou na zona

euro, a taxa de risco de pobreza infantil subia, contrariando a tendência verificada em Portugal.

Mas hoje a realidade em Portugal também não nos pode deixar indiferentes no que diz respeito a crianças

e à pobreza infantil. A realidade diz-nos que há uma total ausência de instrumentos de combate à pobreza e à

exclusão social, contrariamente ao que aqui já foi referido pela Sr.ª Deputada do CDS.

Na nossa opinião, há uma grande incapacidade do Governo para entender que famílias em maiores

dificuldades são famílias mais expostas a situações de pobreza e de exclusão social. O desemprego, os

baixos rendimentos das famílias e a degradação dos apoios sociais a que vimos assistindo são realidades que

este Governo vem acentuando nas famílias portuguesas. E é pena, Sr.as

e Srs. Deputados, que o Governo não

entenda que só invertendo esta tendência se combate a pobreza e a exclusão social.

Vejamos, por exemplo, como o Governo alterou a equivalência das crianças para efeitos de cálculo de

prestações sociais, como o rendimento social de inserção. A realidade hoje, com este Governo de maioria

PSD/CDS, é que as crianças passaram a valer muito menos.

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É num compromisso de combate efetivo à pobreza e à exclusão social que estaremos, Sr.as

e Srs.

Deputados, disponíveis para trabalhar esta proposta na especialidade.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem agora a palavra a Sr.ª Deputada Nilza de

Sena.

A Sr.ª Nilza de Sena (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputados: Começo por saudar a bancada do PCP por

este conjunto de iniciativas legislativas que aqui nos traz hoje.

A questão da pobreza, da exclusão social, em particular da pobreza infantil, tem sido um tema constante

nas preocupações do PCP, mas quero dizer também à Sr.ª Deputada Rita Rato que essa preocupação no

PSD não é menor.

Tal como nos mostraram os vários trabalhos de Josué de Castro, que tratou de perto, nos seus livros, em

particular em Geografia da Fome e Geopolítica da Fome, esta matéria, tão ameaçadora quanto a bomba

atómica, trata da pobreza dos povos, destacando-se a pobreza infantil.

As propostas que o PCP apresenta, que são pertinentes no sentido de serem consideradas muito

oportunas no momento que atravessamos, não nos devem fazer desmerecer o esforço que o Governo

também tem feito nesta matéria.

O sentido de oportunidade das medidas aqui apresentadas manifesta também uma duplicação face ao que

já é feito. O PCP propõe a criação de um programa extraordinário de combate à pobreza infantil, mas é

preciso dizer que o Governo tem um conjunto de medidas legislativas direcionadas precisamente para grupos

mais vulneráveis, onde se integram as crianças, o que significa que a aprovação desta medida seria, além da

burocratização excessiva desta matéria, uma duplicação.

Por outro lado, devo dizer que, quando propõe a obrigatoriedade de o Governo elaborar um relatório sobre

os direitos da criança e a situação da infância em Portugal, também aqui há uma duplicação, pois já existe um

relatório para a aplicação da convenção dos direitos da criança em Portugal, inclusivamente com a

participação de vários ministérios, pelo que, desse modo, seria também acrescentar uma burocratização.

O que é proposto pelo PCP já é, pois, feito por outros organismos, embora não exatamente com o mesmo

tipo de nomenclatura.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Não é a mesma coisa!

A Sr.ª Nilza de Sena (PSD): — Queria ainda dizer que a proposta de criação da comissão nacional dos

direitos das crianças e jovens é um passo importante, é um princípio relevante, mas também já está

contemplado com o Conselho Nacional para as Políticas de Solidariedade, Voluntariado, Família, Reabilitação

e Segurança Social.

Por todas estas razões, saudando a iniciativa, porque a reconheço como genuína, considero que estas

propostas já estão implementadas.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana

Aiveca.

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Queria saudar estas três iniciativas

pela discussão que elas próprias provocam. Ouvimos, agora mesmo, as bancadas que suportam o Governo

saudarem as iniciativas, mas colocam sempre a questão de não serem muito oportunas no momento que

atravessamos.

Creio que, na geografia da pobreza, não podemos ter este garrote da oportunidade ou da inoportunidade

quando tratamos da pobreza com rosto de criança. É verdade que há, no terreno, alguns programas, mas

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quando vemos a sua execução — falo, por exemplo, do Programa de Emergência Social — constatamos que

não passam de nomenclaturas.

Portanto, o que hoje aqui discutimos são três projetos que provocam esta discussão da pobreza infantil e

que visam melhorar as situações existentes, inclusive através da criação de uma comissão nacional dos

direitos das crianças e jovens. É que o conteúdo proposto no projeto de lei n.º 357/XII (2.ª) é diferente da tal

comissão que, por ser muito abrangente, abarcando desde a proteção às crianças ao voluntariado, não tem,

de facto, qualquer eficácia no que se refere à monitorização dos direitos das crianças e jovens.

Por isso mesmo, independentemente de poderem fazer-se, em sede de especialidade, alguns acertos,

nomeadamente neste último projeto que referi, creio que projeto de lei n.º 355/XII (2.ª), que cria um programa

extraordinário de combate à pobreza infantil, é de grande importância e todos deviam adotá-lo.

Estamos numa situação extraordinária de pobreza, que tem rosto de criança e que, segundo o Eurostat,

nos dados de 2011, nos coloca acima da média europeia (27%, para a média europeia, e 28,6%, para

Portugal). E não estão aqui contabilizados os impactos das medidas que este Governo está a implementar.

Por exemplo, não está contabilizado o efeito que o despacho do Ministro Vítor Gaspar vai ter, por exemplo,

nas cantinas, nas escolas, nas creches. É que as IPSS não têm centros de custos, Sr.as

e Srs. Deputados,

vivem com o dinheiro diariamente. E se hoje não for possível comprar os materiais que são necessários para

melhorar a qualidade de vida das crianças e jovens, este nível de 28,6% de pobreza vai aumentar.

Ora, as Sr.as

e os Srs. Deputados assumem aqui, também, a responsabilidade de não querer fazer esta

discussão.

O Bloco de Esquerda manifesta toda a disponibilidade para a aprovação destes projetos, sendo certo que

alguns deles precisam naturalmente de melhorias e contributos, circunstância que os proponentes também

aqui tiveram em consideração, estando com certeza disponíveis para tal.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — A Mesa não regista mais inscrições. Fica, assim, concluído o debate

conjunto, na generalidade, dos projetos de lei n.os

355/XII (2.ª), 356/XII (2.ª) e 357/XII (2.ª).

Passamos à discussão, em conjunto e na generalidade, dos projetos de lei n.os

378/XII (2.ª) — Introduz o

regime facultativo de contabilidade de caixa do IVA para as micro e pequenas empresas (BE) e 390/XII (2.ª) —

Cria um regime de IVA de caixa, alterando o Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado, aprovado pelo

Decreto-Lei n.º 394-B/84, de 26 de setembro (PCP).

Para apresentar o projeto de lei da autoria do Bloco de Esquerda, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana

Drago.

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: O Bloco de Esquerda agendou para

hoje um projeto de lei que creio ser da maior importância para a discussão da situação económica que o País

atravessa.

O Bloco de Esquerda vem propor algo que, no passado, vozes da maioria de direita, quer do PSD quer do

CDS, defenderam, propondo a criação de um regime chamado «IVA de caixa», ou seja, que empresas até um

determinado valor de faturação (a proposta do Bloco de Esquerda é para 10 milhões de euros, isto é, para as

micro e pequenas empresas) possam fazer o pagamento do IVA devido ao Estado não no momento em que

emitem a fatura relativa a uma determinada venda mas, sim, no exato momento em que, de facto, recebem o

pagamento.

Creio que talvez seja o momento de utilizar as palavras do CDS neste debate político. Há alguns anos, o

Grupo Parlamentar do CDS — na altura, na oposição — apresentava, sobre a questão do regime de IVA de

caixa, os seguintes argumentos: «Segundo estudos do Intrum Justitia (2009), Portugal encontra-se em 4.º

lugar, entre os países europeus, no atraso no pagamento das faturas. O mesmo estudo refere que pequenas e

médias empresas (PME) portuguesas enfrentam maiores riscos por os atrasos nos pagamentos rondarem, em

média, 92 dias para além do prazo acordado (…)». E dizia mais: dizia que estes pagamentos em atraso

podem ter consequências dramáticas para as empresas, que enfrentam problemas de liquidez, especialmente

as PME, levando empresas à falência.

É, portanto, sobre falência de empresas que estamos hoje a discutir.

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No último Orçamento do Estado, o Governo apresentou uma proposta, ainda não em vigor, para a criação

de um regime de IVA de caixa para empresas com faturação até 500 000 €. Tenhamos consciência do que

são estas empresas: são empresas de pequeno comércio ou de restauração, que trabalham com dinheiro vivo

e que, portanto, não têm um problema relativamente ao prazo de pagamento dos seus clientes, e às quais, por

isso, o IVA de caixa não resolve qualquer problema.

Já as pequenas e médias empresas, essas sim, têm hoje problemas gravíssimos no que toca à cobrança

da sua faturação, pelo que têm de adiantar ao Estado um dinheiro que, na prática, ainda não receberam.

É, portanto, urgente criar este regime de IVA de caixa que dê resposta aos problemas de tesouraria da

maior parte das nossas pequenas e médias empresas, que, como diz o CDS, representam cerca de 75% do

emprego em Portugal, pelo que é para estas que temos de trabalhar.

Assim sendo, Sr.as

e Srs. Deputados, a proposta que aqui trazemos é muito simples e visa salvar

empresas, impedir falências e manter a continuidade da nossa economia nacional.

É agora tempo de ouvir a maioria, PSD e CDS, que tanto falou na campanha eleitoral de pequenas e

médias empresas. Este é o momento de lhes fazer justiça.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para apresentar o projeto de lei n.º 390/XII (2.ª), do PCP, tem a

palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: A introdução do chamado «regime

de IVA de caixa» é, provavelmente, uma das promessas eleitorais e um dos compromissos eleitorais mais

vezes usado pelo PSD e pelo CDS para enganar as pequenas empresas deste País.

Diria que, ao longo de anos e anos, há milhares de microempresas e pequenas empresas que têm sido

objeto deste embuste por parte do PSD e do CDS.

Desde 2005, todos «enchem a boca» com a introdução do chamado «regime de IVA de caixa». Porém,

como é habitual, encerrado o ciclo eleitoral, logo as promessas e os compromissos vão parar direitinhos ao

caixote do lixo.

O mesmo, deve dizer-se, tem feito nesta matéria o Partido Socialista, que, entre 2005 e 2011, não foi

minimamente sensível e rejeitou todas as iniciativas para introduzir um regime especial de IVA de caixa,

mesmo que este regime se limitasse às relações económicas com a Administração Pública.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exatamente!

O Sr. Honório Novo (PCP): — Neste grupo parlamentar, não mudámos de posição, nem alterámos os

nossos compromissos. Apresentámos, como todos sabem, no passado, um conjunto de iniciativas legislativas,

de propostas em sede orçamental, que, como referi, foi rejeitado pelo Partido Socialista.

Naturalmente, apresentámos, já nesta Legislatura, por diversas vezes, várias iniciativas no mesmo sentido.

Por exemplo, estou a recordar-me (e certamente se recordam), nos debates orçamentais, de propostas de

alteração para que este regime fosse criado.

De facto, julgo que é absolutamente inaceitável que empresas que prestam serviços à Administração

Pública, que fornecem serviços e bens sejam obrigadas a entregar o IVA correspondente a estas faturas,

entreguem os valores correspondentes ao Estado, mas o Estado não lhes pague aquilo que elas têm direito a

receber. Isto é, o Estado não pagou o IVA àquelas empresas para elas poderem honrar os seus

compromissos.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. Honório Novo (PCP): — É esta a realidade que o País vive.

Portanto, julgo que a introdução do regime de IVA de caixa, pelo menos nas relações económicas com a

Administração Pública, é possível, é uma coisa extremamente fácil. Os senhores bem sabem que já existe

para algumas matérias e, portanto, a sua regulamentação é praticamente imediata.

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Assim sendo, deixem-me dizer o seguinte: chega de promessas, meus senhores. Chega de promessas! Se

não aprovarem o projeto de lei do PCP, o PSD e o CDS vão continuar o embuste e vão continuar a enganar

milhares e milhares de pequenos empresários, em Portugal.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Pinho de

Almeida.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: A forma como o Bloco

de Esquerda e o PCP apresentaram estas iniciativas indica que a principal preocupação destes grupos

parlamentares ao fazê-lo não são as pequenas e médias empresas mas é um ajuste de contas com as

bancadas do PSD e do CDS.

Protestos do PCP.

É justo dizer que, de facto, foram estas bancadas que, desde sempre, mais se bateram para que as micro e

pequenas empresas, em Portugal, tivessem condições para resistir a um dos principais problemas que tinham

no passado e que, é verdade, Srs. Deputados, têm de forma muito mais agravada neste momento.

O facto de muitas destas empresas terem de entregar IVA ao Estado antes de terem recebido as faturas

que passaram e que geram a responsabilidade de entregar esse IVA é um dos maiores problemas, senão o

maior, que estas empresas têm na sua tesouraria, neste momento.

Não ignoramos esse facto, nem mudámos de posição, pela simples razão de termos passado da oposição

para uma maioria que apoia um Governo. Agora, é preciso termos perfeita consciência do que é que, em

concreto, diz cada uma destas iniciativas.

O projeto de lei do Bloco de Esquerda propõe um IVA de caixa até 10 milhões de euros. Acontece, como

sabemos, que o IVA é um imposto regulado por uma diretiva europeia — a Diretiva do IVA —, segundo a qual

o limite máximo para o IVA de caixa é de 500 000 €. Não é por acaso que a autorização legislativa aqui

aprovada, em sede de Orçamento do Estado, tem como limite 500 000 €. Não é porque o Governo se lembrou

disso, é porque é esse o limite que está inscrito na Diretiva do IVA, Diretiva esta que foi revista em dezembro

do ano passado, pois, até dezembro do ano passado, nenhum país podia aprovar unilateralmente IVA de caixa

sem que tivesse, primeiro, negociações com a Comissão Europeia, com o Comité do IVA, para que esse IVA

de caixa fosse autorizado.

É exatamente isto que acontece relativamente à possibilidade de estender este IVA de caixa dos 500 000 €

até aos 2 milhões de euros.

Se querem a nossa opinião, é evidente que o Estado português, depois de aplicar o IVA de caixa de 500

000 €, deve encetar negociações com a Comissão Europeia para poder ir até ao limite máximo dos 2 milhões

de euros. Não podemos é iludir a realidade e dizer às pessoas que vamos ter um limite que é um limite que

contraria uma diretiva e que, portanto, é totalmente inexequível.

O mesmo se passa com o projeto de lei do PCP. O PCP diz uma coisa que, do ponto de vista da

«discussão de café», também é perfeitamente consensual. Todos acham, pelo menos relativamente ao

Estado, que se devia poder compensar o IVA que as empresas têm de entregar quando o Estado ainda não

lhes pagou.

Acontece que a Diretiva do IVA diz exatamente o contrário, isto é, que não pode haver regimes de IVA de

caixa exclusivamente para o Estado e que esses regimes, a existirem, têm de ser universais. Portanto, não é

possível aplicar o que o PCP aqui nos propõe.

A conclusão que temos de retirar deste debate é a seguinte: o Grupo Parlamentar do CDS continua a achar

que o IVA de caixa é essencial para que as pequenas e micro empresas, em Portugal, resolvam um dos seus

principais problemas de tesouraria. Fá-lo-á nos termos em que a Diretiva do IVA permite e no âmbito da

autorização legislativa que aqui foi aprovada, em sede de Orçamento do Estado, por esta maioria.

Fiquem os Srs. Deputados a saber que vai haver IVA de caixa, em Portugal, e que esse IVA de caixa vai

existir porque este Governo, apoiado pela maioria PSD/CDS, o vai aprovar.

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Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. António Braga (PS): — Está demorado!

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Cristóvão

Crespo.

O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: A introdução de um regime de

caixa de exigibilidade do IVA tem sido objeto de várias iniciativas dos vários partidos, nas últimas legislaturas.

O PSD tem acompanhado a preocupação inerente ao problema que resulta para os operadores económicos

do não recebimento atempado dos montantes que são devidos pelo exercício da respetiva atividade, tanto dos

valores respeitantes a proveitos como dos impostos que são devidos ao Estado.

Por isso, tem sido preocupação acrescida do Governo regularizar, tão rápido quanto possível, as dívidas

dos entes públicos aos respetivos fornecedores e prestadores de serviços.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — Mais importante que a forma de liquidação e arrecadação dos impostos,

que devem ser neutrais no seu impacto nos agentes económicos, mais saudável para a economia do País, é o

regular funcionamento do mercado, existindo regras claras e cumpridas quanto a pagamentos e a

recebimentos.

Esta tem sido uma orientação e preocupação fundamental do Governo, no sentido de recuperar e evitar os

atrasos nos pagamentos, que se acentuaram dramaticamente na vigência do Governo anterior.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — Sr.as

e Srs. Deputados, um eventual regime de caixa do IVA, por se

tratar de um regime excecional, obriga à existência de prudência acrescida na sua aplicação, porque, para

além de suscitar a intervenção comunitária (quando generalizado, como o BE propõe), pode suscitar riscos de

distorção da concorrência e dificuldades técnicas do controlo por parte da administração tributária.

Por isso, a autorização legislativa concedida ao Governo no artigo 241.º da Lei do Orçamento do Estado

para 2013 parametriza, na medida adequada, a forma de adequar um tal regime simplificado e facultativo de

contabilidade de caixa.

Em primeiro lugar, temos de considerar que o IVA é um imposto que se encontra harmonizado com a

legislação comunitária, e com ela tem de se conformar e compatibilizar nas suas exceções. Depois, é

necessário definir um quadro de obrigações que permitam monitorizar os impactos e os efeitos, tanto ao nível

contabilístico, sancionatório, de criação de redundâncias e, por fim, não menos importante, de combate à fuga

e evasão fiscal.

A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Agora é que se lembram!

O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — Face ao que já afirmámos, não pode o PSD acompanhar o sentido

proposto tanto pelo projeto de lei do Bloco de Esquerda como pelo projeto de lei do PCP.

O projeto de lei do Bloco de Esquerda viola o Direito Comunitário, potencia esquemas de fraude e evasão

fiscal, não está compatibilizado com o artigo 19.º do Código do IVA, está desatualizado e não toma em

consideração as melhorias introduzidas pela Lei do Orçamento do Estado para 2013.

O projeto de lei do PCP é vazio de conteúdo útil, esquecendo que da atual redação do artigo 2.º já resulta

que o Estado e demais pessoas coletivas de direito público são, por regra, sujeitos passivos de IVA, viola o

Direito Comunitário e limita-se a reciclar uma proposta antiga, não tendo em conta o n.º 5 do artigo 2.º,

introduzido pelo Decreto-Lei n.º 134/2010.

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Em conclusão, Sr.as

e Srs. Deputados, em virtude de os projetos do BE e do PCP não resolverem os

problemas, nem se conformarem com a legislação comunitária, temos a certeza de que o Governo, dentro da

previsão aprovada pela Lei do Orçamento do Estado para 2013, terá a iniciativa legislativa adequada.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Hortense

Martins, do PS.

A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: A matéria de que hoje estamos a

falar, na verdade, tem um histórico.

O histórico que começou em 2009, aliás, com base numa iniciativa que reuniu, nesta Câmara, 12 propostas

— em que uma delas, a do PCP, tinha a ver com esta matéria. Mas houve ainda outra iniciativa: em 2009,

ocorreu a tal «sexta-feira negra», que reuniu toda a oposição num envelope de despesismo e populismo

relativamente ao Governo que exercia funções.

Aplausos do PS.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Não tem nada a ver com despesa!

A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Em 2010, Assunção Cristas, do CDS, na Comissão de Orçamento e

Finanças, apresentou um projeto de resolução exatamente com esta medida. Mas, Sr. Deputado João

Almeida, ela ia para além dos 500 000 €! Ou seja, era muito mais exigente e, agora, o Sr. Deputado diz que

não é possível…

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Ninguém falou de despesa! Isto é receita!

A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Mas o projeto de resolução então apresentado na Comissão seria

possível!

Aplausos do PS.

Sr. Deputado João Pinho de Almeida, concordo que há um limite e que esse limite requer — é o caso do

projeto apresentado pelo Bloco de Esquerda — consulta ao Comité do IVA.

Disse o Sr. Ministro da Economia, no dia 20 de janeiro de 2013 (já foi há algum tempo, mas não foi assim

há tanto tempo), no que diz respeito ao reiterar da intenção do Governo de levar a cabo esta medida:

comprometemo-nos a realizar esta medida e estamos só à espera que a Comissão Europeia nos autorize. E

eu pergunto: autorizar para os 500 000 € ou para os 2 milhões, que era a proposta do projeto de resolução do

CDS? Não percebemos.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Houve uma alteração em dezembro, depois disso! Devia

saber!

A Sr.ª Hortense Martins (PS): — O que sabemos é que o que apresentaram no Orçamento do Estado para

2013 foi um embuste — aliás, não somos nós que o dizemos —, foi um engano aos pequenos empresários,

Srs. Deputados da maioria.

Os pequenos empresários dizem que o novo regime de caixa do IVA é um embuste. E porquê? Porque a

própria autorização legislativa previa que, até 31 de dezembro, tinham de pagar o IVA na mesma! Portanto, se

era um regime que, eventualmente, iria vigorar por dois ou tês meses, chegavam a 31 de dezembro e tinham

de pagar tudo na mesma.

Então, mesmo que o aplicasse, seria um regime que nunca existiria, na verdade.

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Aplausos do PS.

Queria ainda relembrar algo que para o Partido Socialista é muito importante. Do que se trata não é apenas

de (pretensamente) resolver um problema que os próprios… Por exemplo, um grupo de contabilistas diz que

os pequenos empresários não veem os seus problemas resolvidos através desta medida, porque esta medida

requer mais obrigações, mais custos administrativos e, portanto, é uma medida que tem de ser mais

ponderada.

Na verdade, há outros regimes que seriam passíveis de ser utilizados. É o caso, por exemplo, do regime de

IVA devido pelo adquirente ou da autoliquidação entre todos os sujeitos passivos de IVA, que é, aliás, uma

solução usada e que, eventualmente, poderia ser utilizada para fazer face a esta situação.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Queira concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Concluo, Sr.ª Presidente, dizendo algo que tem mais relevância. Temos

sido contactados por inúmeros empresários, por exemplo, do setor têxtil, um setor exportador a quem o

Governo está a dever a devolução do IVA. Ora, isto não se resolve através das iniciativas que estão sobre a

mesa, mas através do cumprimento das obrigações por parte do Governo!

Aplausos do PS.

Paguem o que não é vosso!

O Sr. Pedro Jesus Marques (PS): — Paguem o IVA!

A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Paguem o IVA, reembolsem os empresários e tudo funcionará

certamente da melhor maneira. E façam-nos com a redução desses mesmos prazos, que foi o que fez o

anterior Governo.

Aplausos do PS.

O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — Sr.ª Presidente, peço a palavra para fazer uma interpelação à Mesa.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — Sr.ª Presidente, não ficou clara a posição do Partido Socialista em

relação a esta matéria, pelo que gostaria que a Sr.ª Presidente fizesse distribuir pelos grupos parlamentares o

sentido de voto do Partido Socialista no anterior Orçamento do Estado: votou contra a autorização legislativa,

em toda a sua extensão. É que, repito, depois de ouvir a intervenção da Sr.ª Deputada Hortense Martins,

ficámos sem perceber qual foi o sentido de voto do PS.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr. Deputado, farei distribuir essa informação assim que a fizer

chegar à Mesa.

Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago.

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, são absolutamente lamentáveis as

intervenções que os Srs. Deputados Cristóvão Crespo e João Pinho de Almeida proferiram neste debate,

porque acabaram de dizer que cometeram uma fraude nas eleições de 2011.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Para si é sempre tudo lamentável!

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I SÉRIE — NÚMERO 77

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A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr. Deputado Cristóvão Crespo, não sei se tenho a sua atenção, mas tenho em

mãos o programa que o senhor apresentou aos portugueses, aos empresários, durante as eleições de 2011.

Diz este programa: «Mudar Portugal, ponderar a consagração de um regime de caixa em matéria de IVA

aplicável às pequenas e médias empresas». Ou seja, Sr. Deputado, não se trata de um regime para um

volume de negócios até 10 milhões, mas, porque refere as médias empresas, atinge os 50 milhões.

Foi esta a proposta que os senhores apresentaram,…

O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — Não, não foi!

A Sr.ª Ana Drago (BE): — … mas agora há dúvidas, negociações e diretivas europeias…

E o que é que dizia o CDS-PP? «Este é o momento»! Apresentava-se o CDS aos empresários

portugueses, orgulhoso, dizendo que tinha apresentado na Assembleia da República uma resolução para a

criação de um regime simplificado de IVA de caixa, começando pelas pequenas empresas — que são

empresas com regime de faturação até 2 milhões.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — E então? O que é que eu disse aqui?!

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Mas o Sr. Deputado João Pinho de Almeida acaba de dizer-nos que isso era

totalmente impossível, porque até dezembro o regime tinha como limite os 500 000 €.

Portanto, o que os senhores propuseram foi uma resolução da Assembleia da República, proposta pelo

CDS, votada favoravelmente pelo PSD, para que este regime fosse criado até 2 milhões do volume de

negócios.

Em suma, os senhores pegaram no programa, no slogan «Este é o momento» e enganaram os

empresários! Os senhores têm três Ministros no Governo, têm o Secretário de Estado das Finanças Paulo

Núncio, têm uma maioria, e o que é que fazem em relação à manutenção de empregos e ao combate à

falência de empresas? Os senhores pegam neste programa e rasgam-no!

Neste momento, a oradora rasgou uma cópia do Programa Eleitoral do CDS-PP.

Não têm palavra porque não têm política! Tudo o que os senhores prometeram, todo o vosso compromisso

político durante as eleições de 2011 vale zero! Os senhores, pura e simplesmente, enganaram os empresários

que se lhes dirigiram e que confiaram nos senhores. Enganaram-nos! Não têm palavra!

Aplausos do BE.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Peço a palavra, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Para uma interpelação à Mesa sobre a condução dos

trabalhos, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, esta interpelação não é, naturalmente, sobre

educação ou capacidades dramáticas, porque isso não diz respeito a este Parlamento, mas para questionar se

houve algum problema no som da Sala — tem havido vários, Sr.ª Presidente — no momento em que eu disse

que o CDS defendia a autorização legislativa para que houvesse um regime de IVA de caixa de 500 000 € e

que o Estado português, através deste Governo de que o CDS faz parte, devia negociar essa extensão até 2

milhões de euros, como prevê a Diretiva do IVA, que é exatamente o que está no Programa Eleitoral que a

Sr.ª Deputada Ana Drago acabou de rasgar. E volto a dizer que a parte da edução, obviamente, que se

perdoa.

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Aplausos do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr. Deputado João Pinho de Almeida, a Mesa não teve

conhecimento nem registou quaisquer problemas de som.

A Sr.ª Deputada Ana Drago pede a palavra para que efeito?

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr.ª Presidente, para que, por intermédio de V. Ex.ª, possa ser distribuída à

Assembleia da República a resolução que foi proposta pelo CDS quando estava na oposição, votada

favoravelmente pelo PSD, que nada diz relativamente a diretivas europeias.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Pois não! Porque não existia! Foi revista a diretiva!

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Pelo contrário, nesta resolução, o que a Assembleia a República recomenda ao

Governo é que crie um regime simplificado de IVA de caixa para volume de negócios até 2 milhões.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr.ª Deputada, imagino que a resolução seja autoexplicativa,

portanto, se tiver a bondade de a fazer chegar à Mesa, será distribuída pelas diferentes bancadas.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, há 10 anos — pelo menos há 10 anos! —

que os senhores, sobre esta matéria do regime de caixa de IVA, andam a fazer jogo duplo. E podem ter a

certeza que nós denunciaremos sempre esse jogo!

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exatamente!

O Sr. Honório Novo (PCP): — Dizem uma coisa aos pequenos empresários e, depois, chegam a esta

Casa e fazem rigorosamente o contrário. É este o vosso jogo duplo.

Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, não vamos deixar que continue o embuste nem vamos deixar que esta

Legislatura chegue ao fim antes de os senhores poderem comprometer-se e fazer o que, agora, voltaram a

encenar, isto é, que o regime de caixa vai aparecer «caído do céu aos trambolhões».

Nós, desta bancada, não permitiremos que o Deputado João Pinho de Almeida se transforme no ex-

Secretário de Estado Emanuel Santos.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Isso eu agradeço! Agradeço-lhe a consideração!

O Sr. Honório Novo (PCP): — As afirmações do ex-Secretário de Estado Emanuel dos Santos, nós já as

conhecíamos e elas eram…

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Não posso permitir que o Sr. Deputado fale muito mais tempo, pois

já esgotou o tempo de que dispunha.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr.ª Presidente, com a sua condescendência, gostaria de dizer que,

certamente, não é possível introduzir o IVA de caixa por causa da diretiva europeia. Mas esse é um argumento

já conhecido, é um argumento antigo, usado no passado. Agora, os senhores usam-no outra vez, usam

exatamente os argumentos que denotam falta de vontade política para resolver este problema.

Nós — podem ter a certeza — não nos cansaremos de denunciar o que os senhores fazem nos

orçamentos do Estado, que é anunciar autorizações legislativas para enganar os empresários, mantendo um

embuste que não resolve o problema. Querem resolver o problema, aprovem o nosso projeto de lei!

Aplausos do PCP.

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A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, fica concluído este

ponto, bem como a ordem de trabalhos de hoje.

A próxima sessão plenária realizar-se-á amanhã, sexta-feira, pelas 10 horas, com a ordem do dia que

passo a anunciar.

Em primeiro lugar, a discussão conjunta dos projetos de resolução n.os

573/XII (2.ª) — Resolve recomendar

ao Governo a adoção de medidas e financiamento para a estabilização das encostas de Santarém (Os

Verdes), 509/XII (2.ª) — Recomenda ao Governo que assegure o financiamento para concretização do Projeto

Global de Estabilização das Encostas de Santarém (PSD), 512/XII (2.ª) — Recomenda ao Governo a

concretização urgente do Projeto Global de Estabilização das Encostas de Santarém (PS), 515/XII (2.ª) —

Reafirma a Resolução da Assembleia da República n.º 101/2011, de 5 de maio, que recomenda ao Governo

que adote as medidas para a concretização do Projeto Global de Estabilização das Encostas de Santarém

(PCP), 516/XII (2.ª) — Recomenda a tomada de medidas com vista à estabilização e consolidação das

encostas de Santarém (CDS-PP) e 571/XII (2.ª) — Reafirma a recomendação ao Governo para a

concretização do Projeto Global de Estabilização das Encostas de Santarém (BE).

Em segundo lugar, a discussão conjunta dos projetos de resolução n.os

531/XII (2.ª) — Recomenda ao

Governo que considere prioritária a obra de construção do novo acesso rodoviário ao porto comercial de Viana

do Castelo e garanta o financiamento público necessário para a concretização deste projeto (PS), 673/XII (2.ª)

— Recomenda ao Governo que garanta o financiamento público necessário à construção dos acessos

rodoviários ao porto comercial de Viana do Castelo (PCP) e 675/XII (2.ª) — Recomenda ao Governo a

concretização das ligações rodoviária e ferroviária ao porto de Viana do Castelo (BE).

Em terceiro lugar, a discussão conjunta dos projetos de resolução n.os

476/XII (2.ª) — Recomenda ao

Governo que estude uma alternativa ao pórtico do estádio defendendo os melhores interesses de Aveiro e

acabando com uma grave injustiça para com os aveirenses (PSD e CDS-PP) e 676/XII (2.ª) — Recomenda ao

Governo o fim das portagens nas ex-SCUT na região de Aveiro, nomeadamente o pórtico do estádio, assim

como a não introdução de novas portagens (BE).

Em quarto lugar, a apreciação da petição n.º 166/XII (1ª) — Apresentada por Gonçalo Filipe Sabino

Pinheiro e outros, solicitando à Assembleia da República a continuação do funcionamento da Maternidade Dr.

Alfredo da Costa, conjuntamente com os projetos de resolução n.os

672/XII (2.ª) — Recomenda a suspensão

imediata do processo de desmantelamento e encerramento da Maternidade Alfredo da Costa (PCP), 674/XII

(2.ª) — Pela continuidade do funcionamento da Maternidade Alfredo da Costa (Os Verdes) e 677/XII (2.ª) —

Recomenda ao Governo a manutenção em funcionamento da Maternidade Alfredo da Costa até à sua

transferência para o futuro Hospital Oriental de Lisboa (BE).

Em quinto lugar, a apreciação da petição n.º 200/XII (2.ª) — Apresentada pela ST & Sociedade de

Publicações L.da

— Diário Económico, protestando contra um novo aumento de impostos por considerar que o

País atingiu o nível máximo de carga fiscal.

Em sexto lugar, teremos o projeto de lei n.º 396/XII (2.ª) — Revoga disposições da Lei n.º 169/99, de 18 de

setembro, alterada pelas Leis n.os

5-A/2002, de 11 de janeiro, e 67/2007, de 31 de dezembro, e pela Lei

Orgânica n.º 1/2011, de 30 de novembro, do Decreto-Lei n.º 310/2002, de 18 de dezembro, alterado pelos

Decretos-Leis n.os

156/2004, de 30 de junho, 9/2007, de 17 de janeiro, 114/2008, de 1 de julho, 48/2011, de 1

de abril, e 204/2012, de 29 de agosto, e do Código Administrativo (PSD e CDS-PP), que será apenas votado.

Por último, haverá votações regimentais no final do debate.

Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 44 minutos.

Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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