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Quarta-feira, 19 de junho de 2013 I Série — Número 103
XII LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2012-2013)
REUNIÃOPLENÁRIADE18DEJUNHODE 2013
Presidente: Ex.ma Sr.ª Maria da Assunção Andrade Esteves
Secretários: Ex.mos
Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco Rosa Maria da Silva Bastos de Horta Albernaz Abel Lima Baptista
S U M Á R I O
A Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 12
minutos. Deu-se conta da entrada na Mesa da proposta de lei n.º
155/XII (2.ª), dos projetos de resolução n.os
766 a 769/XII (2.ª), dos projetos de lei n.
os 424 a 427/XII 82.ª) e da
apreciação parlamentar n.º 53/XII (2.ª). Em declaração política, a Deputada Ana Drago (BE)
falou acerca da atuação da Secretária de Estado do Tesouro Maria Luís Albuquerque na contratação e renegociação de
contratos swap nas empresas públicas. No fim, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Deputados Filipe Neto Brandão (PS), Teresa Leal Coelho (PSD) e Paulo Sá (PCP).
Em declaração política, o Deputado Fernando Virgílio Macedo (PSD) abordou a necessidade de uma reforma do Estado, após o que respondeu a pedidos de esclarecimento do Deputado Miguel Freitas (PS).
Em declaração política, o Deputado António Braga (PS) criticou as políticas de austeridade impostas pelo Governo e
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referiu propostas com vista a minorar as dificuldades. No final, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Deputados Miguel Santos (PSD) e Helena Pinto (BE).
Em declaração política, o Deputado Hélder Amaral (CDS-PP) considerou que o Governo anterior utilizou as parcerias público-privadas em função do calendário eleitoral, não tendo tido em conta a defesa do interesse público, os contribuintes e as gerações futuras, e respondeu a pedidos de esclarecimento dos Deputados Pedro Filipe Soares (BE), Bruno Dias (PCP), Rui Paulo Figueiredo (PS) e Nuno Encarnação (PSD).
Em declaração política, a Deputada Rita Rato (PCP), a propósito da greve realizada pelos professores, que saudou, acusou o Governo de pôr em causa o sistema de escola pública, tendo pedido a sua demissão. Respondeu, depois, a pedidos de esclarecimento dos Deputados Isilda Aguincha (PSD), Rui Jorge Santos (PS), Luís Fazenda (BE), Heloísa Apolónia (Os Verdes) e Michael Seufert (CDS-PP).
Ao abrigo do n.º 2 do artigo 76.º do Regimento, a Deputada Gabriela Canavilhas (PS) insurgiu-se contra a crise que se vive no sistema público de educação em Portugal e que compromete o futuro das próximas gerações e o Deputado Pedro Delgado Alves (PS) repudiou o sucedido na Grécia, no passado dia 11 de junho, em que o Governo grego ditou o fim da estação televisiva e de rádio pública (ERT) e o fim imediato das transmissões, medida que considerou um ataque claro à democracia, ao pluralismo e às liberdades essenciais.
Procedeu-se à discussão do Relatório de Segurança
Interna 2011 e 2012, tendo usado da palavra, a diverso título, além do Ministro da Administração Interna (Miguel Macedo), os Deputados Luís Fazenda (BE), Hugo Lopes Soares (PSD), Filipe Neto Brandão (PS), João Oliveira (PCP) e Telmo Correia (CDS-PP).
Foi discutida, na generalidade, a proposta de lei n.º 150/XII (2.ª) — Regula a obrigatoriedade de publicitação dos benefícios concedidos pela Administração Pública a particulares, procede à primeira alteração ao Decreto-Lei n.º 167/2008, de 26 de agosto, e revoga a Lei n.º 26/94, de 19 de agosto, e a Lei n.º 104/97, de 13 de setembro. Fizeram intervenções, além do Secretário de Estado da Administração Pública (Hélder Rosalino), os Deputados Paulo Sá (PCP), Duarte Pacheco (PSD), Isabel Santos (PS), Cecília Meireles (CDS-PP) e Pedro Filipe Soares (BE).
Foi ainda discutida, na generalidade, a proposta de lei n.º 152/XII (2.ª) — Completa a transposição da Diretiva 2003/49/CE, do Conselho, de 3 de junho, relativa a um regime fiscal comum aplicável aos pagamentos de juros e royalties efetuados entre sociedades associadas de Estados-membros diferentes, e altera o Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442-B/88, de 30 de novembro. Intervieram o Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (Paulo Núncio) e os Deputados Elsa Cordeiro (PSD), João Galamba (PS), Pedro Filipe Soares (BE), Cecília Meireles (CDS-PP) e Honório Novo (PCP).
O Presidente (António Filipe) encerrou a sessão eram 19 horas e 17 minutos.
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A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro e Srs. Membros do Governo, que cumprimento,
Srs. Jornalistas, está aberta a sessão.
Eram 15 horas e 12 minutos.
Podem ser abertas as galerias.
Antes de iniciarmos a ordem de trabalhos de hoje, peço ao Sr. Secretário, Deputado Duarte Pacheco, que
proceda à leitura do expediente.
O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): — Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram
admitidas pela Sr.ª Presidente, as seguintes iniciativas legislativas: proposta de lei n.º 155/XII (2.ª) — Aprova
os requisitos de acesso e de exercício da atividade de perito qualificado para a certificação energética e de
técnico de instalação e manutenção de edifícios e sistemas, conformando-o com a disciplina da Lei n.º 9/2009,
de 4 de março, que transpôs a Diretiva 2005/36/CE, relativa ao reconhecimento das qualificações
profissionais, que baixa à 6.ª Comissão; projetos de resolução n.os
766/XII (2.ª) — Urgente abertura do Centro
de Reabilitação do Norte (PCP), que baixa à 9.ª Comissão, 767/XII (2.ª) — Recomenda ao Governo a abertura
urgente do Centro de Reabilitação do Norte integrado no Serviço Nacional de Saúde (BE), que baixa à 9.ª
Comissão, 768/XII (2.ª) — Recomenda ao Governo a realização de uma inspeção global ao Hospital de Braga
(BE), que baixa à 9.ª Comissão, e 769/XII (2.ª) — Combater o desemprego jovem (Os Verdes); projetos de lei
n.os
424/XII (1.ª) — Garante a internalização dos trabalhadores que se encontrem a desempenhar funções ao
serviço de serviços municipalizados a extinguir ou de empresas municipais a dissolver por força do disposto na
Lei n.º 50/2012, de 31 de agosto, e define o estatuto dos trabalhadores que lhes estão afetos (PCP), que baixa
à 11.ª Comissão, 425/XII (2.ª) — Garante a atribuição do abono para falhas a todos os trabalhadores da
Administração Pública que desempenhem funções de manuseamento de valores, numerário, títulos ou
documentos (Terceira alteração ao Decreto-Lei n.º 4/89, de 6 de janeiro, alterado pelo Decreto-Lei n.º 276/98,
de 11 de setembro, e pela Lei n.º 64-A/2008, de 31 de dezembro) (PCP), que baixa à 5.ª Comissão, 426/XII
(2.ª) — Cria um regime especial de declaração de morte presumida em caso de naufrágio de embarcações de
pesca (PCP), que baixa à 1.ª Comissão, e 427/XII (2.ª) — Altera o Código Penal, a Lei n.º 5/2002, de 11 de
janeiro, e a Lei n.º 101/2001, de 25 de agosto, transpondo para a ordem jurídica interna a Diretiva 2011/36/UE,
do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de abril de 2011, relativa à prevenção e luta contra o tráfico de
seres humanos e à proteção das vítimas e que substitui a Decisão-Quadro n.º 2002/629/JAI, do Conselho
(PSD e CDS-PP), que baixa à 1.ª Comissão; e apreciação parlamentar n.º 53/XII (2.ª) — Decreto-Lei n.º
68/2013, de 17 de maio, que procede à transferência de competências do Instituto Nacional de Saúde Doutor
Ricardo Jorge, IP (INSA, IP), exercidas pelo Centro de Genética Médica Doutor Jacinto Magalhães daquele
instituto, para o Centro Hospitalar do Porto, EPE (PCP).
É tudo, Sr.ª Presidente.
A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, vamos então entrar na ordem do dia, que, como todos sabem,
consiste, no seu ponto 1, em declarações políticas, a que se segue, no ponto dois, o debate do Relatório de
Segurança Interna 2011 e 2012, após o que serão discutidas, nos pontos seguintes, as propostas de lei n.os
150/XII (2.ª) — Regula a obrigatoriedade de publicitação dos benefícios concedidos pela Administração
Pública a particulares e 152/XII (2.ª) — Completa a transposição da Diretiva 2003/49/CE, do Conselho, de 3 de
junho, relativa a um regime fiscal comum aplicável aos pagamentos de juros e royalties efetuados entre
sociedades associadas de Estados-membros diferentes.
Srs. Deputados, antes de entrarmos no período relativo às declarações políticas, tenho o gosto de
comunicar à Câmara que na galeria diplomática se encontram Presidentes e Vice-Presidentes dos
Parlamentos e um alto representante dos países da CPLP, Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau,
Moçambique e Timor-Leste, a quem saudamos.
Aplausos gerais, de pé.
Seguimos, então, para o período de declarações políticas.
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A primeira declaração política de hoje é do Bloco de Esquerda e está já inscrita a Sr.ª Deputada Ana Drago.
Tem a palavra, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Depois de dois anos de um Governo
PSD e CDS a dizer às famílias, que se endividaram para comprar a casa onde vivem, que estas tinham vivido
acima das suas possibilidades, descobrimos que, afinal, tinham sido os gestores que o próprio Governo tinha
escolhido para serem os governantes nestes tempos difíceis que claramente tinham gerido e vivido acima das
nossas possibilidades.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — É verdade!
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Aliás, a propósito dos contratos tóxicos assinados por algumas empresas
públicas, representando perdas potenciais superiores a 3000 milhões de euros, o Governo demitiu com
estrondo dois Secretários de Estado que tinham sido dirigentes destas empresas. Demitiu todos os
governantes envolvidos nesta história? Todos não. Há uma Secretária de Estado que resiste, continuando
sentada ao lado do Ministro Vítor Gaspar, que teve responsabilidades diretas nesta história e que não foi
demitida.
A forma como o Governo geriu todo este processo, do secretismo com os resultados da auditoria até ao
despedimento seletivo dos envolvidos, foi norteada por um único e exclusivo propósito: branquear o
envolvimento da Secretária de Estado Maria Luís Albuquerque, atual braço direito de Vítor Gaspar e anterior
responsável financeira da REFER.
Jogos de palavras sobre a natureza «tóxica» ou «exótica» dos contratos, documentos ocultados, contratos
que misteriosamente foram alterados à última hora, valeu tudo, nos últimos dois meses, para proteger uma
Secretária de Estado.
Comecemos, então, pelo início.
Quando o Governo tomou posse foi avisado, através de um despacho do Tesouro, que os contratos de
seguro de risco assumidos por algumas empresas públicas excediam em muito a proteção dos contratos de
empréstimo e tinham características tóxicas altamente especulativas.
As perdas para os cofres públicos ascendiam na altura, quando o Governo tomou posse, a 1400 milhões
de euros potenciais. Um ano e meio depois, e sem nada ter feito para travar a bola de neve que já estava em
andamento, já as perdas potenciais tinham duplicado, ascendiam a 3000 milhões de euros e os bancos
ameaçaram exigir o retorno. Foi então que o Governo meteu mãos à obra.
Um ano e meio de inação de Vítor Gaspar tornou-se muito rapidamente numa única e deliberada ação:
proteger a face do Governo, separar Maria Luís Albuquerque dos restantes gestores públicos com
responsabilidade nesta matéria, dois dos quais, na altura, ocupavam lugares no Governo.
Na verdade, a primeira diligência do Governo foi entregar a condução deste processo à própria Maria Luís
Albuquerque. Isto nem sequer é fazer da Sr.ª Secretária de Estado juíza em causa própria, é o mesmo que
entregar o julgamento a um dos arguidos.
Aplausos do BE.
E foi assim que a ex-gestora da REFER colocou dois organismos por si tutelados, a Inspeção-Geral das
Finanças e o IGCP, a avaliar a natureza dos contratos assinados, entre outros pela própria Secretária de
Estado.
Como o que começa torto tarde ou nunca se endireita, em fevereiro deste ano, Maria Luís Albuquerque
solicita à Inspeção-Geral das Finanças uma auditoria ao Metro de Lisboa, Metro do Porto, Carris, CP, STCP,
EGREP, mas não pediu nenhuma auditoria à REFER. A mesma REFER exatamente, recorde-se, cuja pasta
financeira tinha sido ocupada por Maria Luís Albuquerque.
O Governo tinha fundamentação jurídica (há um parecer de um escritório de advogados nesse sentido) e
técnica (no relatório do IGCP) para «obter a nulidade das transações via litigação em tribunais portugueses».
Havia espaço para o fazer, havia interesse público para o fazer, mais a mais quando se sabe que esse
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caminho foi seguido, para casos idênticos, pela câmara de Milão, com resultado favorável para os
contribuintes italianos.
O IGCP aconselhou mesmo uma «versão musculada» nas negociações com a JP Morgan. O resultado,
contudo, foi o seguinte. Na semana passada, a Secretária de Estado, Maria Luísa Albuquerque aproveitou o
dia de Santo António para pagar 21 milhões de euros à JP Morgan para cancelar dois swaps «problemáticos»
com a própria REFER, um dos quais foi assinado, adivinhe-se por quem? Exatamente! Por Maria Luís
Albuquerque. Anulou um contrato assinado por si, reconhecendo assim a sua natureza especulativa daquilo
que tinha desempenhado como diretora financeira da REFER, atirando dinheiro para cima do problema que
tinha criado.
A JP Morgan, vale a pena referir, foi o banco que mais perdas potenciais provocou à REFER e o segundo
que mais provocou a todas as empresas. São 445 milhões de euros de perdas potenciais, tendo inclusive sido
classificado no nível 4 (sendo 5 o nível máximo) de complexidade/risco e de perdas provocadas.
O que é que o Governo fez, para lá de resgatar com 304 milhões de euros contratos cujas perdas podiam
chegar a 445 milhões? Deu um prémio à JP Morgan, entregando a privatização dos CTT a um banco de
investimentos que se tem especializado em ganhar dinheiro com o Estado português. É um «toma lá, dá cá»,
ou como o Governo corta nos salários e com os impostos mas vai concedendo generosos prémios à banca.
Vozes do BE: — Muito bem!
A Sr.ª Ana Drago (BE): — São dois contratos assinados por Maria Luís Albuquerque, identificados pela
consultora contratada pelo Governo, a StormHarbour, com um grau de complexidade 4. Numa escala em que
1 é o mínimo e 5 o máximo, 4 é bastante complexo. O IGCP, usando a mesma escala, defende que todos os
contratos com risco superior a 3 sejam anulados judicialmente.
Resumindo: o mesmo tipo de contratos e de ligeireza no acautelamento do dinheiro dos cidadãos levou a
dois comportamentos distintos por parte do Governo. Uns foram demitidos, do Governo ou de empresas
públicas, sem que tenham sido tidos ou achados neste processo. Já o «braço direito» de Vítor Gaspar define
as regras da avaliação destes contratos, que, curiosamente, permitem que continue sentada do lado do
Governo.
Em declarações à imprensa, a Secretária de Estado Maria Luís Albuquerque terá garantido hoje que o
Governo já pagou 1000 milhões de euros aos bancos para anular perdas potenciais de 1500 milhões. Por este
andar, e não aceitando a via judicial que é dada em tantos pareceres e recomendada por tantos financeiros, o
Governo vai dar 2000 milhões à banca, um valor muito superior ao buraco potencial que existia quando tomou
posse.
Anos e anos, Sr.as
e Srs. Deputados, a ouvir PSD e CDS criticar o sorvedouro financeiro das empresas de
transportes, criticando os trabalhadores, aumentando em 25% as tarifas, e não fizeram nada, nada para
estancar a gestão calamitosa que foi efetuada pelos mesmos gestores que levaram para o Governo, e tudo
fizeram para que se chegasse a uma situação absolutamente ruinosa para os contribuintes mas não para a
banca.
Sr.as
e Srs. Deputados, dois anos a atacar as famílias e a economia do País, a cortar rendimentos, serviços
públicos, reformas! Dois anos que permitiram engordar os ganhos da banca com contratos especulativos! É
caso para perguntar se a resposta não está já dada, para quem trabalha no Governo do PSD e do CDS.
Aplausos do BE.
Entretanto, assumiu a presidência o Vice-Presidente António Filipe.
O Sr. Presidente: — A Sr.ª Deputada Ana Drago tem três pedidos de esclarecimento, dos Srs. Deputados
Filipe Neto Brandão, Teresa Leal Coelho e Paulo Sá.
Srs. Deputados, hoje vamos tentar ser rigorosos no tempo, porque temos seis declarações políticas,
havendo duas declarações políticas a título individual, ao abrigo do artigo 71.º Regimento. Portanto, vamos
procurar respeitar os tempos regimentais.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Filipe Neto Brandão.
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O Sr. Filipe Neto Brandão (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Ana Drago, felicito-a pela sua
intervenção.
Gostaria de dizer que também o Partido Socialista entende que o Governo tem estado muito mal neste
processo, e se algo caracteriza a atuação do Governo neste processo é a total opacidade.
O Governo, talvez à semelhança dos critérios dos relatórios que vão sendo conhecidos, que distinguem os
swap entre exóticos, tóxicos e outras categorias, entendeu que tinha dois Secretários de Estado tóxicos e
livrou-se desses Secretários de Estado; não direi que a Sr.ª Secretária de Estado do Tesouro é exótica, mas é
inequívoco que é um exotismo a sua permanência no Governo.
É verdade que algumas perplexidades se suscitam e é bom que tenha sido constituída uma comissão
parlamentar de inquérito para apurar, nomeadamente, por que razão o presidente do Banco Santander veio a
público dizer que há dois anos advertiu este Governo sobre a renegociação dos swaps com vantagem para a
entidade pública, o que não aconteceu. Do mesmo modo, importa explicar — e esta é a pergunta que dirijo à
Sr.ª Deputada — por que razão, em sua opinião (e já o referiu), houve a opção de encerrar contratos, de
fechar posições contratuais no momento em que as taxas de juro se traduzem numa potencial maior perda
para a entidade pública.
São estas questões, todas relacionadas com a falta de transparência, ou, melhor dito, com a opacidade na
condução deste processo, que queria colocar à consideração de V. Ex.ª, Sr.ª Deputada, pedindo a sua opinião
relativamente a esta singular posição do Governo.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago.
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Flipe Neto Brandão, agradeço muito a questão que
colocou.
Creio que esta Assembleia terá muito trabalho pela frente e o Sr. Deputado faz parte da comissão de
inquérito entretanto criada para avaliar exatamente como é que este processo foi possível, como foi possível
assinar um conjunto de contratos que, aparentemente, levam em conta algumas variáveis abstrusas na
proteção do crédito.
Portanto, é necessário perceber como é que foi possível fazer estes contratos, é necessário perceber —
deixe-me dizer-lhe com toda a clareza — como é que, na altura, a tutela governativa permitiu que empresas do
setor empresarial do Estado fizessem este tipo de contratos, mas é necessário perceber também algo
absolutamente extraordinário, que é um Governo dizer que o Estado, em Portugal, gasta demais, que as
famílias gastam demais, que é preciso fazer, o mais rapidamente possível, um encolhimento das obrigações e
dos compromissos do Estado, e descobrirmos que as pessoas que o Governo escolheu para governar e fazer
os cortes fundamentais, em nome do rigor e da consolidação orçamental, tinham sido aquelas que, com toda a
generosidade em relação à banca, tinham assinado um conjunto de contratos especulativos.
Mas há aqui um problema que o Bloco de Esquerda apresenta hoje. Há uma atuação específica do
Governo no que toca a esta matéria que tem a ver com a ocultação e com a tentativa de branquear a
participação da Sr.ª Secretaria de Estado do Tesouro.
Poderia dizer-se que o Ministro Vítor Gaspar conhecia mal a Administração Pública e que não conhecia
estes contratos. Porém, é uma estranheza, porque tinha como Secretária de Estado, desde o primeiro
momento, Maria Luís Albuquerque, que não só conhecia bem o Ministério das Finanças como até tinha sido
diretora financeira da REFER, onde fez um conjunto de contratos que, avaliados exatamente pelo Ministério
das Finanças, continham este aspeto extraordinário: se a Euribor descesse 1 ponto, o Estado perdia; se a
Euribor subisse 1 ponto, o Estado perdia na mesma. Portanto, era preciso que alguém nos explicasse que tipo
de competência técnica ou de interesse na defesa do interesse público podia ter a Sr.ª Secretária de Estado.
Mas mais; quando o processo se torna público no debate político, quem é que esteve dois anos «sentada
em cima do problema»? Maria Luís Albuquerque! Quem é que vai definir as regras de avaliação desses
mesmos contratos? Maria Luís Albuquerque! Quem é que tem nas mãos relatórios de auditoria e não os
divulga? Maria Luís Albuquerque!
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É tempo de dizer: a Sr.ª Secretária de Estado não tem condições de fazer a gestão deste processo, em
particular quando negoceia contratos que ela própria fez, que são considerados especulativos pelos próprios
critérios de avaliação que aparentemente estabeleceu e que vão remunerar bancos que têm extorquido
dinheiro aos contribuintes portugueses! Não se pode manter em funções!
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa
Leal Coelho.
A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Ana Drago, as motivações do Bloco de
Esquerda ficaram claríssimas nesta declaração política que aqui nos traz.
Todos sabemos que quem criou a comissão de inquérito para avaliar os contratos swap foi esta maioria, foi
o PSD e o CDS. A proposta foi nossa, fomos nós que levámos à criação de uma comissão de inquérito para
apurarmos a verdade sobre esta matéria. Mas, como sempre, o Bloco de Esquerda quer é fazer arruaça
política de forma a criar condições de destabilização para alarmar os portugueses, porque é esse o único
intuito que tem.
O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!
A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Se a Sr.ª Deputada estivesse interessada na avaliação dos
resultados da conclusão que tiraremos na comissão de inquérito não viria, precisamente no início dos
trabalhos dessa comissão, trazer para a praça pública esta intervenção intempestiva, pois não faz nenhum
sentido falar desta realidade antes de ter conhecimento de causa sobre ela.
Quero relembrar-lhe também que foi este Governo que remeteu ao Ministério Público todos os contratos —
repito, todos! — que fazem utilização de swap. Não foi o Bloco de Esquerda que deu início à criação desta
comissão de inquérito, mas é o Bloco de Esquerda que quer, aparentemente, destruir os efeitos resultantes do
inquérito que está a ser levado a cabo no âmbito da comissão competente.
Pergunto-lhe, Sr.ª Deputada, por que é que se antecipou à comissão de inquérito, na qual tem assento, e
trouxe hoje a este Plenário esta questão dos swap? Foi apenas para ter o seu tempo de telejornal hoje à
noite?
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago.
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada, sobre os telejornais, longe de mim querer
concorrer com a sua intervenção. Nunca foi esse o meu propósito!
Protestos do PSD e do CDS-PP.
Considerava eu que, sendo o Plenário da Assembleia da República composto por Deputados eleitos e
escolhidos pelo povo, este seria um sítio de clareza de debate político e, portanto, não um sítio de arruaça ou
de confusão de informação.
O Bloco de Esquerda apresentou um conjunto de informações e se a Sr.ª Deputada diz que está
interessada em apurar a verdade, deve permitir não só que as questões sejam colocadas como contribuir para
as respostas.
É que há aqui um problema, Sr.ª Deputada: a verdade é que, muito antes de a maioria ter proposto esta
comissão de inquérito — e, deixe-me dizer-lhe, ainda bem que a propôs, ainda bem que todos aqui votaram a
favor desta comissão —, o Bloco de Esquerda pediu sucessivamente os contratos. Aliás, depois de a
comissão ter sido votada, pedimos os documentos e os dias passavam; aparentemente, a Sr.ª Secretária de
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Estado, que tinha falado disto em fevereiro, tinha alguma dificuldade em utilizar os CTT para fazer chegar a
documentação e os relatórios que já tinha em sua posse e divulgá-los a esta Assembleia.
Mas há um conjunto de desenvolvimentos que estão pela frente. É que, nos relatórios que chegaram à
Assembleia da República e que estranhamente foram divulgados na comunicação social, a JP Morgan
aparece como sendo um dos bancos envolvidos nos contratos mais especulativos, ou seja, de acordo com a
classificação feita pelos critérios da própria IGF e também da StormHarbour, a JP Morgan é um banco que
teve uma relação pouco séria com o Estado português e que vendeu às empesas públicas contratos
especulativos.
O que é que fez a Sr.ª Secretária de Estado? Esperou pelo trabalho da comissão? Esperou que a Sr.ª
Deputada, os Deputados do PSD e do CDS avaliassem os contratos? Esperou que esta Assembleia e o povo
português soubessem exatamente o que é que foi assinado e quanto é que supostamente deveríamos pagar
por contratos especulativos? É que não é dinheiro emprestado, é puramente especulativo, é se sai preto ou se
sai branco! Não! A Sr.ª Secretária de Estado iniciou negociações à revelia dos trabalhos da comissão de
inquérito e começou a fechar contratos antes de sabermos como são esses contratos.
Pior, Sr.ª Deputada: fechou contratos quando a recomendação do IGCP, da StormHarbour e de escritórios
de advogados é a de levar isto a tribunal. Há outras experiências internacionais que levaram a questão a
tribunal e em que se disse: «não paguem nada, é abusivo.»
Tenho uma última questão para referir. É que há qualquer coisa que não bate certo, há contratos que
desaparecem dos relatórios que chegaram até nós.
Termino, Sr. Presidente, dizendo que um relatório da Inspeção-Geral de Finanças de 2008 dizia que, em
2008, a REFER tinha 15 swap contratados por Maria Luís Albuquerque. Oito desses contratos têm prazos de
maturidade para além de 2013, ou seja, estariam hoje em vigor. Nos últimos relatórios que nos chegam só são
avaliados cinco dos oito que estariam em vigor — são cinco que parecem no relatório da StormHarbour.
Queríamos saber o que é que aconteceu a esses três que despareceram.
Se quer saber a verdade, demita a Sr.ª Secretária de Estado e apure onde estão os contratos.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Volto a apelar para que respeitemos os tempos regimentais.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Sá.
O Sr. Paulo Sá (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Ana Drago, antes de mais, quero cumprimentá-la
por ter trazido a Plenário a questão dos swap.
Ao longo dos últimos anos, diversas empresas públicas foram celebrando contratos swap que se revelaram
altamente lesivos para o Estado. E não gostava de deixar de assinalar que, ao mesmo tempo que algumas
destas empresas reduziam salários e direitos aos seus trabalhadores, reduziam os serviços prestados às
populações, sempre justificando com a necessidade de racionalizar os gastos destas empresas e de torná-las
sustentáveis, realizavam contratos swap que se traduziram em perdas potenciais, e algumas delas já reais,
muito superiores a essas reduções de salários e de serviços prestados às populações.
Portanto, temos aqui uma dualidade: por um lado, há mãos largas para contratar swap com o sistema
financeiro, em que se gastam milhares de milhões, e, ao mesmo tempo, corta-se nos salários e nos serviços
que estas empresas prestam.
Sr.ª Deputada, há responsabilidades dos gestores das empresas públicas que assinaram esses contratos,
das entidades que tinham o dever de supervisionar e de fiscalizar a realização destes contrato, das empresas
privadas que assessoram as empresas públicas na contratação dos swap e, obviamente, também do Governo
que têm de ser apuradas.
Há, obviamente, responsabilidades muito sérias dos anteriores governos, mas o atual Governo não se
pode pôr de fora porque deixou que a situação se deteriorasse.
Lembro que o Grupo Parlamentar do PCP vem desde há muito tempo a alertar para a questão dos swap e
das perdas que isso poderia representar e este Governo permitiu que a situação se fosse deteriorando.
Além disso, há membros do Governo — alguns já foram demitidos, mas outros continuam em funções —
que, estando nas empresas públicas, tiveram responsabilidades na assinatura de contratos swap. A Sr.ª
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Deputada referiu a Secretária de Estado Maria Luís Albuquerque, mas devo dizer que, no relatório da IGCP,
são identificados seis contratos que tiveram a participação da Sr.ª Secretária de Estado e dois desses são
identificados como contratos de elevado perfil especulativo.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Paulo Sá (PCP): — Concluo, Sr. Presidente.
A questão que quero colocar é se considera ser adequada a linha que tem sido seguida pelo Governo na
negociação para tentar reduzir as perdas potenciais.
Sabemos que, nos últimos meses, através desta renegociação, um conjunto de perdas potenciais já se
transformou em perdas reais; de um conjunto de 900 milhões de euros potenciais, 546 milhões de euros já
foram pagos ao sistema financeiro, ou seja, tornaram-se perdas reais. Isto só representa uma redução de 40%
das perdas potenciais.
A pergunta é se considera que esta linha de negociação é adequada ou se se deviam mesmo pôr em
causa estes contratos swap.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago.
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr. Presidente, vou tentar agora ser mais disciplinada com o tempo, como
sugeriu.
Agradeço muito as questões que o Sr. Deputado Paulo Sá coloca, que creio serem fundamentais.
Quero apenas assinalar aquilo que me parece ser um facto político óbvio. É que, aparentemente, o CDS
não fará a defesa da Sr.ª Secretária de Estado do Estado do Tesouro e, portanto, mantem este silêncio
ensurdecedor quer sobre a questão dos swap quer sobre o desempenho particular da Sr.ª Secretária de
Estado Maria Luís Albuquerque.
Sr. Deputado Paulo Sá, creio que estamos perante uma situação complicada e uma das razões por que o
Bloco de Esquerda traz esta matéria a Plenário, entendendo que é sítio respeitável da democracia portuguesa
e que aqui podemos discutir as questões candentes da vida política, é a de saber como é que é possível a
maior parte dos cidadãos, e até dos Deputados, descobrirem, dois anos depois de ser dado o alerta, a questão
dos contratos swap, as perdas potenciais terem duplicado e o Governo, que atacou todos os setores de
rendimento em Portugal, nomeadamente as famílias, os pensionistas, os serviços públicos, não ter estado
preocupado com esta matéria. Agora, que as perdas potenciais subiram — e, neste momento, conhecemos
esta matéria mas ainda não a conhecemos com detalhe —, subitamente, está a fechar negociações com as
diferentes instituições bancárias, quando sabemos que há várias recomendações que dizem que o Estado
português nada deve pagar por contratos especulativos.
Portanto, um Governo que foi tão forte com os desempregados, reduzindo subsídio de desemprego, com
as famílias, com as crianças, que tinham passe escolar e deixaram de ter — isto no setor dos transportes —,
com os reformados, cortando nos serviços públicos, na saúde, na educação, em todo o lado, agora parece
extraordinariamente generoso em fazer esta negociação de milhões com as várias instituições financeiras,
quando aquilo que tinha de fazer, em nome dos contribuintes e do interesse público, era ir a tribunal e dizer
que nada paga.
Pior: o Governo está a pagar à JP Morgan, que teve contratos com a Sr.ª Secretária de Estado quando ela
era diretora financeira da REFER, ao mesmo tempo que a JP Morgan é classificada como das instituições que
vendeu mais contratos especulativos às empresas públicas, e, a seguir, contrata a JP Morgan para fazer
assessoria financeira na privatização dos CTT.
E quem é que contrata? A mesma Secretária de Estado! Isto é absolutamente extraordinário! Como é que
esta única Secretária de Estado, que teve tanta responsabilidade no passado a assinar contratos, depois a
silenciar esta matéria durante dois anos, agora a finalizar contratos com prejuízo para os contribuintes
portugueses, volta a contratar as mesmas instituições que já nos enganaram no passado?
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Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando
Virgílio Macedo.
O Sr. Fernando Virgílio Macedo (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Nunca em Portugal se
discutiu tanto a reforma do Estado como neste momento, em que, sob intervenção externa, nos tem sido dito
ou induzido onde devemos cortar na nossa despesa pública.
Acontece que esta premissa está errada: não são os outros que devem decidir por nós, somos nós,
internamente, por já termos demonstrado que somos capazes de definir o que vai estar em cima da mesa nos
próximos 10 a 20 anos para reformar o nosso Estado, nomeadamente o Estado providência.
Todos os portugueses já sabem o que é necessário. Todos os portugueses já provaram que conhecem o
caminho. Não são portugueses pessimistas. São portugueses conscientes quanto ao futuro da função Estado,
portugueses que acreditam que a responsabilidade do Estado, devido à crise, é de todos e que não haverá
capacidade para manter os atuais níveis de apoio.
As questões inerentes a essa reforma são simples, as respostas às mesmas é que podem ser complexas e
diversas. Que Estado queremos ter, no futuro? E, sobretudo, que Estado podemos ter no futuro?
Nesta discussão, muitas vezes, passamos demasiado tempo a discutir cortes conjunturais, em vez de
todos, em conjunto, chegarmos a acordo sobre soluções estruturais.
E quando digo todos, digo mesmo todos, sem exceção, dos partidos ideologicamente mais à direita aos
partidos ideologicamente mais de esquerda, porque todos somos portugueses e todos queremos o melhor
para Portugal.
Não podemos resumir a reforma do Estado a uma questão de natureza ideológica. Ninguém tem o direito
de derrogar esta sua responsabilidade de, obrigatoriamente, participar neste debate, e ninguém pode desistir
de o efetuar.
Mais: é imperativo que neste debate não exista nenhum preconceito, mesmo ideológico por parte dos
partidos. Este é o momento de se discutir tudo com todos, no que se refere a esta reforma imperativa.
Para a maioria das pessoas, equacionar a reforma do Estado passa obrigatoriamente por equacionar a
proximidade das próprias funções do Estado.
Reformar significa reformular, reconstruir, refazer… Eu diria: mudar a forma! E mudar a forma passa,
necessariamente, por estar cada vez mais próximos das pessoas, dos seus anseios, das suas dificuldades das
suas prioridades. Só um Estado próximo dos cidadãos pode ser um Estado melhor.
Parece-me inegável que a descentralização é cada vez mais o caminho. Descentralização política por
definição, administrativa por consequência.
Está manifestamente comprovado que a lógica de organização administrativa do nosso País sofre de um
esgotamento anacrónico e de uma ineficiência crónica. Mas, para os arautos do imobilismo e para aqueles que
circunstancialmente beneficiam dessas ineficiências, o sistema organizativo do Estado, como está, está bem.
Não, Srs. e Sr.as
Deputadas, assim não está bem! Temos que parar com a espiral de centralização a que
se tem assistido no nosso País, que, por sua vez, foi uma das origens da espiral de perda da sua
competitividade e que, por sua vez, foi um dos fatores que esteve na base da dívida externa, que obviamente,
hoje, temos de pagar.
Só há um caminho,…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É o caminho de o Governo ir para a rua!
O Sr. Fernando Virgílio Macedo (PSD): — … um caminho que nos leve a uma maior coesão, coesão no
sentido lato da palavra. Se para nós, portugueses, é algo inaceitável poder existir uma Europa a duas
velocidades, por que é que podemos admitir ter um País a duas ou mesmo três velocidades?
Aplausos do PSD.
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Qualquer das reformas que venham a ter lugar deve privilegiar sempre a coesão territorial, económica e
social, como um dos seus vetores principais — não me canso de o defender — e isto só é possível com uma
verdadeira descentralização.
Todas as políticas públicas, a execução de programas nacionais e comunitários, a aplicação de fundos
estruturais europeus, os grandes projetos públicos e todas as políticas de âmbito nacional devem assumir
como objetivo primeiro a correção das assimetrias regionais, para corrigir as enormes disparidades de
desenvolvimento regional de que Portugal padece.
As opções, as decisões tem de ser tomadas por quem está mais próximo das populações. Temos que
aproximar cada vez mais os serviços públicos às populações que deles devem usufruir e também assim
promover o desenvolvimento harmonioso e igualitário de todo o território nacional.
O acesso universal aos serviços do Estado é um direito que todos temos. A liberdade, a democracia e a
cidadania dependem da universalidade deste acesso.
O crescimento económico, a empregabilidade e as oportunidades de os cidadãos melhorarem as suas
condições de vida através do melhor dos seus esforços, deverão ser integradas e simétricas em todo o
território nacional.
Só assim existirá mais eficácia nas decisões, melhor eficiência nos resultados e maior equidade para o
País. Só assim vamos conseguir reafectar e utilizar melhor os nossos recursos e ajustá-los às necessidades
reais. Esta é a prioridade, este deve ser o caminho!
Temos cada vez mais de ir ao encontro do País real, do País mais próximo, do País ouvinte, dos órgãos
que decidem em prol dos ajustamentos locais, da gestão da coisa pública mais eficaz e menos dispendiosa.
É esta reforma que é necessária, mas só é necessária se for mais além. O nosso País exige essa reforma
e nenhum partido tem o direito de bloquear a modernização do nosso sistema de governação.
É fundamental e necessária a importância da coisa pública, que afirme valores democráticos e de
participação numa relação com os cidadãos.
Portugal precisa desta verdadeira reforma para se transformar numa Nação mais justa, territorialmente
mais coesa, em que os cidadãos tenham oportunidades equitativas em qualquer parte do País, e assim se
possam rever e encontrar neste Portugal novo.
É este o momento!
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para pedir esclarecimentos, inscreveu-se o Sr. Deputado Miguel
Freitas, a quem dou a palavra.
O Sr. Miguel Freitas (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Virgílio Macedo, ao ouvir a sua intervenção
ocorreu-me que ela devia ser, essencialmente, dirigida ao Governo.
Aplausos do PS.
Aliás, eu até diria que o Partido Socialista subscreve a intervenção que aqui foi feita, isto é, a necessidade
de ter um Estado mais descentralizado, com maior autonomia e com uma maior coordenação regional.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. Miguel Freitas (PS): — Mas, Sr. Deputado, este Governo fez tudo menos aquilo que o Sr. Deputado
aqui veio defender.
Este é o Governo que ataca a autonomia do poder local; este é o Governo que reduz o número de
freguesias e afasta a administração da decisão e dos cidadãos; este é o Governo do mapa judiciário que
encerra tribunais; este é o Governo que retira autonomia às direções regionais de educação e as transforma
em simples delegações regionais; este é o Governo que faz com que o IPTM (Instituto Portuário e dos
Transportes Marítimos) passe a ser uma estrutura nacional e deixe de ser uma estrutura regional; este é o
Governo que acaba com as ARH (administrações regionais hidrográficas), colocando-as sob tutela da Agência
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Portuguesa do Ambiente; este é o Governo que termina com as delegações regionais da floresta; este é o
Governo que em todas as decisões — em todas! — que tomou em matéria da reforma administrativa do
Estado o que fez foi centralizar e não descentralizar.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. Miguel Freitas (PS): — Sr. Deputado, tenho três questões para lhe colocar. Em primeiro lugar,
considera ou não fundamental que a reforma a fazer da administração do Estado seja feita com bases nas
cinco regiões-plano? Esta é, aliás, uma questão concreta para o PSD, ou seja, pergunto-lhe se a base da
reforma do Estado em matéria de administração deve ou não deve seguir a lógica das cinco regiões.
Segunda questão: considera ou não fundamental o reforço da coordenação por via das comissões de
coordenação e desenvolvimento? Isto é, as CCDR (comissões de coordenação e desenvolvimento regional)
hoje têm um papel absolutamente irrelevante, do ponto de vista regional. Devemos ou não reforçar esse papel
das CCDR?
Finalmente, devem ou não ser reforçadas as verbas para os programas operacionais regionais, no próximo
quadro comunitário de apoio?
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Virgílio
Macedo.
O Sr. Fernando Virgílio Macedo (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Freitas, muito obrigado
pelas suas questões.
Sr. Deputado, a minha intervenção não foi dirigida ao Governo, a minha intervenção foi dirigida a todos os
grupos parlamentares deste Hemiciclo.
Mas, ainda bem que o Sr. Deputado concorda com a minha intervenção, pois isso é sinal que vamos a
caminho do consenso no que respeita à reforma que temos de efetuar relativamente ao nosso Estado, ao
Estado que podemos ter, ao Estado que queremos ter, no futuro.
Efetivamente, Sr. Deputado, todos temos de ter consciência e todos temos de assumir a nossa
responsabilidade enquanto parlamentares no sentido de estarmos disponíveis para essa discussão
fundamental para o futuro do nosso País.
Todos temos de ter consciência — todos somos portugueses! — de que é imperativo efetuar essa reforma
do Estado e todos temos de ter o sentido de responsabilidade para nos sentarmos à mesa sem preconceitos e
sem pré-conceitos para discutir, claramente, o Estado que queremos e que podemos ter no futuro.
Espero, pois, que a sua intervenção seja o entreabrir de portas para essa discussão mais alargada em
torno da reforma do Estado.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado António
Braga.
O Sr. António Braga (PS): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: O atual Governo da República tem
uma capacidade infinita de nos surpreender. Quando julgávamos ser impossível fazer pior, aí vem ao de cima
a criatividade e a inovação em nova trapalhada. Cada uma é ainda mais imprevisível do que a anterior.
Estamos diante de um Governo que, com o passar dos dias, perde mais equilíbrio e reforça o desnorte em
áreas de governação fundamentais.
A crise económica e financeira de Portugal é um mal maior que se agrava de cada vez que se avalia a
execução das políticas do Governo, mas a crise política, a desorientação, a falta de senso, caminham paredes
meias com o desastre social que as políticas de austeridade criaram.
Do experimentalismo financeiro à arrogância política, o Governo gastou menos do que um passo.
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Aplausos do PS.
O País tem sido sujeito a uma das mais graves e absurdas fixações políticas que algum governo jamais
ousou. E tudo em nome de um lunático tecnocratismo europeu, falaciosamente suportado num ignorado rigor
técnico ou até científico.
Mas se por mera hipótese académica, não demonstrada, admitíssemos ser esse o caminho, como explicar,
Sr.as
e Srs. Deputados, à luz dos mesmos invocados critérios, o não pagamento do subsídio de férias no
momento aprazado? Onde entra o rigor e a sustentação técnica se o próprio Primeiro-Ministro nos informou
que havia dinheiro para o fazer?
Por muito que custe admitir ao Sr. Deputado Luís Montenegro, arauto de explicações à medida, e à maioria
parlamentar que suporta o Governo, as únicas explicações são uma insuportável ideia de vingança sobre uma
decisão do Tribunal Constitucional e o preconceito ideológico contra funcionários do Estado e pensionistas.
Aplausos do PS.
O Governo insiste em martirizar o País, agindo contra todas as evidências, contra a economia,
desprotegendo as pessoas quando elas mais precisam de resguardo social.
Mas há mais exemplos de desnorte e arrogância diante de decisões de outros órgãos.
Veja-se o caso dos exames nacionais no nosso sistema de ensino, em que a comissão arbitral não validou
a pretensão do Governo, diante de uma marcação de greve dos professores. Como explicar a teimosia insana
de um Governo que não demonstra a sensatez de mudar a data de exames atempadamente como o devia e
podia ter feito?
Aplausos do PS.
O Sr. Altino Bessa (CDS-PP): — Já estavam marcados desde o início do ano.
O Sr. António Braga (PS): — Nunca a questão da greve podia ou devia ter sido razão para perturbar uma
etapa decisiva no percurso escolar dos alunos que arduamente se prepararam para esses momentos,
simplesmente porque sempre esteve ao alcance do Governo a possibilidade de mudar a data, como ficou,
aliás, sempre bem patente das posições públicas que as partes em conflito enunciaram.
Não foi a greve que causou a principal perturbação, foi a atitude do Governo, ao não acautelar e proteger o
interesse dos alunos e das famílias.
Aplausos do PS.
Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados, o País não pode continuar por este caminho.
Todos sabemos, além do mais, da situação explosiva por que passam as nossas famílias, as empresas, as
pessoas.
Todos lemos e conhecemos os resultados traduzidos nos piores números do desemprego, de falências, de
pobreza extrema de muitos milhares de cidadãos.
Por nós, o País não continuará a caminho do abismo. Denunciaremos sem desfalecimento e não
desistiremos de apresentar propostas, como as que fizemos ao Orçamento retificativo, pese embora
estejamos diante de um Governo esgotado, desprestigiado, sem norte.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. António Braga (PS): — Quatro propostas fundamentadas para minorar efeitos nefastos das políticas
do Governo contidas naquela proposta de lei: alterações ao IVA da restauração; prorrogação no tempo do
subsídio social de desemprego; pagamento devido do subsídio de férias e a adequação da lei dos
compromissos.
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Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Há muito para fazer dentro e fora de Portugal. Na Europa é urgente
maior autonomia das posições políticas do País, face aos que apenas olham o seu umbigo económico e
financeiro.
Quem age por si, em nome dos superiores interesses daqueles que representa, pode concertar melhores
posições na construção de soluções face às dificuldades.
Querer parecer formiga de carreiro atrás de outros interesses traz maus resultados, como se tem visto. A
inexistência de posição autónoma no seio da zona euro, aceitando apenas uma qualquer boleia, é abandonar
o património de um país com quase 900 anos de história.
O Sr. Carlos Zorrinho (PS): — Isso mesmo!
O Sr. António Braga (PS): — Nunca iremos por aí. E hoje já todos sabem que muitas das ideias lançadas
há dois anos pelo PS estão a fazer o seu caminho na Europa, uma descoberta que este Governo procura,
agora, sugerir como o outro caminho, inovador.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado, tem dois pedidos de esclarecimento, dos Srs.
Deputados Miguel Santos e Helena Pinto.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Santos.
O Sr. Miguel Santos (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado António Braga, antes de mais, quero
congratulá-lo pela declaração política que proferiu, na medida em que me permite ter uma oportunidade de o
confrontar com um ou dois aspetos que gostava de lhe colocar.
O primeiro aspeto é uma interpretação que faço de um fado e de uma sina que este País tem.
Vozes do PS: — Muitos fados e muitas sinas!
O Sr. Miguel Santos (PSD): — Muitos fados e muitas sinas, sim, mas queria restringir-me a um que lhe
vou apontar de seguida.
É um fado e uma sina que se vem verificando nas últimas duas décadas e meia, quando o Partido
Socialista assume os destinos e a governança desta Nação, e normalmente isto acaba mal. Temos vários
exemplos, e um mais recente será, talvez, um Governo anterior ao Governo do Sr. Eng.º José Sócrates, que
era um governo de um outro engenheiro, o Eng.º António Guterres, que acabou, nas palavras do próprio, num
«pântano» e com as finanças públicas em situação de desequilíbrio e de descontrolo.
Nessa altura, os portugueses chamaram um governo com a participação forte do PSD para, de facto, pôr
as finanças públicas em ordem e voltar a reequilibrar o Estado e o País.
Esse Governo, como sabemos, não concluiu o seu trabalho, porque a legislatura foi interrompida.
Depois, tivemos um novo fado e uma nova sina com um novo governo do Partido Socialista, desta vez
encabeçado pelo Sr. Eng.º José Sócrates e em que o Sr. Deputado António Braga também teve uma
participação de destaque pelas responsabilidades que assumiu, e mais uma vez esse Governo do Partido
Socialista — triste fado e triste sina! — voltou a devolver o País aos portugueses numa situação de
desequilíbrio tão grave e tão profundo que houve necessidade, depois de muitos meses a tentar protelar e a
arranjar pretexto para evitá-lo, de reconhecer esse desequilíbrio em que o País estava mergulhado e pedir
ajuda internacional em condições absolutamente extraordinárias para conseguir fazer face às despesas, aos
encargos, às responsabilidades que o País tinha de enfrentar.
E, mais uma vez, ao Partido Social Democrata foi confiada a difícil e espinhosa tarefa…
O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado, queira concluir.
O Sr. Miguel Santos (PSD): — Vou concluir, Sr. Presidente.
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Como dizia, ao Partido Social Democrata foi confiada a difícil e espinhosa tarefa de equilibrar as contas
públicas.
O trabalho patriótico que este partido está a fazer no Governo não merece, de facto, a interpretação que o
Sr. Deputado fez, e que não tem qualquer fundamento, de que queremos atacar os portugueses. É
exatamente o contrário.
Para terminar, Sr. Presidente — já percebi que me distraí com o tempo —, só queria responder à questão
da greve dos professores.
Como o Sr. Deputado sabe, o processo de exames não é um dia único e singular. É um encadeamento de
todo um processo de avaliação que tem dias consecutivos marcados e tem atos consequentes por parte dos
professores.
Portanto, quando a greve é marcada para um dia de exames, entendemos, de facto, que foi uma muito má
escolha, independentemente do direito inalienável de greve, entendemos que os sindicatos fizeram uma má
opção e como não havia garantia…
O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem de concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Miguel Santos (PSD): — Vou concluir, Sr. Presidente.
Como dizia, como não havia garantia de que não haveria greve em dia anterior, julgo que o processo teve
este desfecho bastante infeliz.
Mas aquilo que queríamos saber, e não soubemos, foi a opinião do Sr. Secretário-Geral do Partido
Socialista relativamente a este facto. Soubemos que ele afirmou que não tinha opinião, mas há quem tenha e
vou recordar-lhe…
O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado, já ultrapassou largamente o seu tempo.
O Sr. Miguel Santos (PSD): — … que o Sr. Deputado Francisco de Assis tem opinião e diz
nomeadamente o seguinte: «considero ignóbil a convocação de uma greve de professores para o primeiro dia
de exames nacionais. É como se os médicos decidissem fazer greve às urgências hospitalares.
Incompreensível, indigno e inaceitável!».
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Miguel Santos (PSD): — Qual é a sua opinião, Sr. Deputado, uma vez que o seu Secretário-Geral
não a tem?
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Braga.
O Sr. António Braga (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Santos, gostaria de começar por dizer-
lhe que está a ler mal a história, e é uma história recente, nem é muito antiga, pelo que não havia nenhuma
dificuldade em saber que, por exemplo, o Governo do Eng.º António Guterres recuperou o País de uma
situação de um défice de 7% que o Sr. Prof. Cavaco Silva tinha deixado, e que o Governo do Sr. Eng.º José
Sócrates recuperou o défice de cerca de 7% que os Governos do Drs. Durão Barroso e Santana Lopes tinham
deixado.
Vozes do PS: — Bem lembrado!
O Sr. António Braga (PS): — Sr. Deputado, a história é sobretudo importante para tirarmos lições dela,
não é para o Sr. Deputado fugir da presente situação concreta, por que lhe cabe a si responder, que é o apoio
político a este Governo.
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O que aqui elenquei são situações de verdadeiro desnorte, uma espécie de saga contra determinados
aspetos particulares que estão demonstrados. Por exemplo, no caso da greve, o Sr. Deputado acha que,
porque há opiniões, que são aquelas que cada um tem direito a ter, o Partido Socialista não tem opinião? Está
enganado! No dia em que o Partido Socialista for contra alguma greve é contra o seu próprio património
genético, contra a sua própria natureza.
Aplausos do PS.
Não é isso que está em jogo. A greve é um direito absolutamente sagrado, corresponde a um crescimento
civilizacional da nossa organização de sociedade que também o PSD não deveria sequer colocar em crise.
E veja bem que no caso concreto, quem perturbou toda a organização dos exames não foram os
professores, com a marcação da greve, porque desde muito cedo se soube que era possível, viável, desejável
e eu diria até obrigatório, que o Governo tomasse conta da ocorrência, que não tomou, e mudasse a data dos
exames para impedir a perturbação.
Aliás, o Sr. Deputado não ouviu com atenção os próprios, que disseram com clareza que deram
oportunidade ao Governo de o poder fazer, e sempre disseram, e é esse enunciado que eu sigo de boa fé, que
nunca foi anunciada greve contra os exames. Quem tentou fazer com que a greve fosse contra os exames, por
uma posição de obstinação e de arrogância, foi o Governo, que não soube compreender e mudar a data, isso
sim, para que os exames pudessem correr com normalidade, como, aliás, seria desejável em todo o momento.
Sr. Presidente, termino lembrando apenas ao Sr. Deputado que um apoio político tem de ter razões
substanciais para poder ser proporcionado a um governo e o senhor hoje, como se viu, não encontrou
nenhuma razão substantiva para continuar a apoiar este Governo convictamente.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena
Pinto.
A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado António Braga, ouvi a sua intervenção, o
diagnóstico e a análise que fez da situação que vivemos e do percurso deste Governo.
Digo-lhe desde já e com toda a franqueza que acompanhamos muitos dos aspetos que enunciou e parte da
análise que fez sobre a atual situação.
Mas, Sr. Deputado, permita-me que introduza três questões sobre as quais gostaria de ter o seu
comentário e, através de si, a posição do Partido Socialista. A primeira questão prende-se com os adjetivos
que encontrou para caraterizar o comportamento do Governo.
O senhor disse que o Governo perdeu o equilíbrio, que o Governo está num desnorte, que só tem olhos
para a austeridade, mas Sr. Deputado veja se não me acompanha também noutra caraterização do
comportamento deste Governo.
Este Governo, para além de tudo isso, também assume atitudes autoritárias e essas atitudes autoritárias
estão a ser extremamente preocupantes inclusive para o funcionamento da democracia, porque autoritarismo
e democracia não jogam entre si.
Veja-se o caso do exemplo da greve dos professores. O Ministro Nuno Crato tomou posições irredutíveis
em relação a uma justa luta dos professores. E, Sr. Deputado, tenho de fazer aqui um parênteses, porque teria
sido bom que tivesse sido apoiada por todos com clareza, desde o início, porque era uma luta em defesa dos
postos de trabalho mas também em defesa da escola pública — era, e é, uma luta muito justa.
E o Ministro disse o quê? Há uma decisão do tribunal arbitral que não está conforme as suas necessidades
e ele diz que não a respeita; a seguir, se vem outra decisão, é o próprio Primeiro-Ministro, aqui, que diz que
vai alterar a lei da greve.
Sr. Deputado, em que lado é que vai ficar o Partido Socialista? Vamos estar todos contra a alteração da lei
da greve e esta resposta vingativa do Governo, contra esta prepotência e autoritarismo da maioria?
Sr. Deputado, para terminar, ainda uma outra questão: o Sr. Deputado também falou sobre as questões
económicas, a crise económica profunda que o País atravessa e as medidas previstas no Orçamento
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retificativo, mas não falou de uma questão central em tudo isto, a renegociação da dívida. Sr. Deputado, qual é
a posição do Partido Socialista?
É urgente, é absolutamente necessário renegociar a dívida para ser possível encontrar uma saída para a
crise económica. De que lado estamos, Sr. Deputado?
O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Concluo, Sr. Presidente.
De facto, já todos os partidos apresentaram as suas propostas de alteração ao Orçamento retificativo. O
Bloco de Esquerda apresentou uma e o Sr. Deputado falou das do Partido Socialista, mas o Bloco de
Esquerda apresentou uma que considera muito importante. É que o Bloco de Esquerda vai propor que não se
privatizem serviços públicos, como os CTT e a TAP. Será que o Partido Socialista acompanha o Bloco de
Esquerda nesta proposta, já esta semana, em sede de Orçamento retificativo?!
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Braga.
O Sr. António Braga (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Helena Pinto, agradeço as questões que
colocou, porque nos permitem aprofundar o tema, neste debate parlamentar, já que implicam alguma retórica.
Nessa medida, nem sequer lhe levo a mal que coloque em dúvida a posição do Partido Socialista quanto ao
valor civilizacional que, como há pouco referi, constitui, para nós, o direito à greve. Percebi que, na retórica,
até colocou a questão de uma forma delicada, mas, como compreende, a nossa história, o nosso património
na relação com a democracia e com a luta pelas liberdades e pelos direitos deixa-nos praticamente a salvo de
qualquer dúvida nesse domínio.
Mas se a Sr.ª Deputada insiste e tem dúvidas, aquilo que lhe dizemos, com clareza, é que é possível,
desejável e de todo obrigatório, à luz da Constituição, conciliar todos os direitos, nomeadamente o direito à
greve. E, neste caso, quem falhou rotundamente foi o Governo, com a sua teimosia, porque podia
perfeitamente ter conciliado a realização dos exames com a existência da greve, como, aliás, demonstrámos.
Acompanho-a no diagnóstico que faz, Sr.ª Deputada. E acrescentou uma designação que também posso
assinar por baixo. É que este Governo tem uma posição mais do que autoritária, tem até alguns tiques que nos
fazem lembrar outros tempos e que não poderemos nunca aceitar, num quadro de relacionamento
democrático, onde o diálogo e a concertação têm de ser, acima de tudo, o guião essencial por que deve ser
exercida qualquer governação. E o Governo tem dado mostras não só de desnorte e desorientação nas
políticas, mas também de incapacidade para conviver com outros órgãos, que têm, igualmente, poderes, na
sociedade portuguesa, para definir, à luz da Constituição da República, quais os procedimentos que o
Governo deve adotar. E o facto de este Governo estar, reiteradamente, primeiro, a legislar contra a
Constituição, o que é denunciado e, aliás, travado pelo Tribunal Constitucional, e depois, em função disso, a
tentar «fintar» as decisões do Tribunal Constitucional, em diferentes momentos, é a prova de que convive mal
com os procedimentos associados a um Estado de direito democrático. Portanto, nisto, também
acompanhamos a Sr.ª Deputada. Temo-lo dito e denunciado e temos até chamado a atenção dos Srs.
Deputados da maioria de que este é um caminho errado, que dá maus sinais à sociedade portuguesa e nos
deixa ficar mal. Aliás, nesta matéria, também deviam ter algum pudor no que diz respeito à relação com a
Europa, porque não é esse o perfil europeu de funcionamento das democracias europeias.
Para terminar, Sr. Presidente, quero dar nota de que, relativamente à posição do Partido Socialista quanto
às privatizações, Sr.ª Deputada, enquanto não houver uma lei-quadro de reorientação ou de designação dos
modelos e dos critérios,…
Protestos do PSD.
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Temos, temos! Somos contra! Primeiro, temos de definir quais são as regras! Nós votámos a favor da lei de
meios, mas os senhores não regularizaram, não criaram os regulamentos e, portanto, até lá, os Srs.
Deputados não contam com o nosso voto. Podem ter esta garantia da parte do Partido Socialista!
Temos algumas objeções, nomeadamente quanto à própria privatização da TAP — já o dissemos! —, mas,
noutros setores, estamos disponíveis para enquadrar a sua realização,…
Protestos do PSD e do CDS-PP.
… em função de uma lei que resguarde a transparência e que faça a defesa dos interesses do Estado.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma declaração política tem agora a palavra o Sr. Deputado
Hélder Amaral.
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Portugal atravessou uma
década na qual, fruto da integração europeia e das perspetivas económicas existentes, apostou em
infraestruturas. Devo dizer que o País, nessa matéria, fez algo que importa assinalar. Quem percorre o País,
quem consegue fazer, de forma isenta, uma avaliação do ponto de partida e do que temos hoje, tem de
reconhecer que o País fez um esforço enorme e tem hoje um conjunto de infraestruturas de qualidade
assinalável.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — É verdade!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — A aposta governativa foi, obviamente, no investimento público. Já aqui
dissemos que não somos totalmente contra o investimento público, mas ele tem de ser feito com conta, peso e
medida, tem de ser feito com bom senso, tem de ser feito de forma sustentável, tem de ter em conta a nossa
capacidade não só de o executar mas, fundamentalmente, de o financiar e de não deixar, para as gerações
futuras, pesada herança.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Não esquecemos que o Plano Rodoviário Nacional foi um instrumento
aprovado por maioria nesta Câmara e que vários Governos o quiseram completar. Não tinha data, não era
necessário fazer tudo de uma vez só e, por isso, tinha um prazo longo de execução.
Nesse sentido, o que poderíamos e deveríamos ter feito era encontrar um modelo sustentável, um modelo
rigoroso, era dotar o Estado de capacidade de análise e de controlo dos investimentos, do défice e da dívida
pública, mas o que aconteceu foi a utilização das parcerias público-privadas, que se são em si mesmas um
modelo ágil e benéfico de gestão da coisa pública, se são em si mesmas uma forma de criar know-how e
capacidade no setor privado, são também um modelo que comporta muitos riscos. Por isso é que todos os que
foram passando pela Comissão Parlamentar de Inquérito à Contratualização, Renegociação e Gestão de
todas as Parcerias Público-Privadas do Setor Rodoviário e Ferroviário e todos os que escrevem sobre esta
matéria dizem que o Estado tem de ter condições para se defender, para defender o interesse público, para
defender os contribuintes e as gerações futuras. Pois foi isto que não aconteceu em tantos e tantos anos de
governação.
Portugal, a par do Reino Unido, da Espanha e da Grécia, tem 90% das PPP na União Europeia, mas
Portugal é o País que mais percentagem do PIB tem neste tipo de instrumentos nas parcerias público-
privadas.
Não querendo diabolizar este modelo, devo dizer que o calendário não engana. E quem quiser fazer uma
análise entre a execução de parcerias público-privadas e o calendário eleitoral, encontra uma feliz ou infeliz
coincidência. Ou seja, o Governo anterior utilizou as parcerias público-privadas não para a coesão territorial,
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não para dotar o País do cumprimento do Plano Rodoviário Nacional, mas, sim, por um calendário eleitoral. O
Governo anterior governou para as eleições, não governou para as futuras gerações.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
Permitam-me que deixe aqui alguns exemplos que podem ser conferidos num conjunto de instrumentos.
Em relação à Metro Sul do Tejo, foi previsto um determinado tráfego, com três bandas, a máxima, a média
e a mínima. Segundo o contrato, o Estado suporta todos os custos, se o tráfego não atingir a banda mínima.
Pois, o tráfego situa-se a um terço da banda mínima, o que significa que o Estado português, fruto da falta de
rigor, da falta de cuidado, da falta de análise rigorosa do tráfego, gasta, por ano, em média, 5,7 milhões de
euros dos contribuintes portugueses. É este o resultado!
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — É verdade!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — O que falta das renegociações que foram feitas no novo modelo de
financiamento da Estradas de Portugal? As concessões. Dizia-se, e bem, que a portagem real devia ser
aplicada, essencialmente, nos centros de grande densidade populacional, já que elas se pagam a si próprias.
É verdade! Mas a verdade é que, na concessão da Grande Lisboa e na concessão Norte, que eram,
exatamente, concessões com base nesse modelo de portagem real, os privados perdiam dinheiro. E, na
renegociação, o que fez o Governo do Partido Socialista? Assumiu, para si próprio, essas duas concessões,
assumindo o risco e o prejuízo. Diria que aqui está um exemplo daquilo que nunca deve ser feito no bom uso
da coisa pública.
Sobre a alta velocidade, todos nos lembramos do que dizia o Ministro Mário Lino: «Um cidadão pode ter a
coluna torta, as pernas tortas ou não ter braços que, ainda assim, sobrevive, mas a falta de estudos de
impacte ambiental é mortal». E o que fez esse Governo? Sem estudos de impacte ambiental, assinou um
contrato de alta velocidade. O que disse o CDS, na altura? Alertou para o risco de indemnizações, chamou a
atenção para a degradação das condições financeiras, chamou a atenção para a dívida pública. O que fez o
Governo do Partido Socialista? Assinou um contrato e, agora, resta saber se vamos pagar, de indemnização,
167 milhões, como refere a Ernst & Young, ou os 260 milhões que a empresa pede. E o mais engraçado é que
esse contrato não teve visto prévio e, segundo a lei, não deveria ter sido assinado. Resta saber que interesses
estavam a ser defendidos, porque, seguramente, não era o interesse público.
O que dizer das subconcessões que vamos pagar em 2014, que são sete?! Dizem os parceiros privados
que não conseguiam cumprir o programa, que, de acordo com a degradação das condições financeiras,
tiveram de piorar as condições da 1.ª para a 2.ª fase, o que nunca deveria acontecer. O que fez o Governo?
Disse ser sensível à degradação das condições financeiras e assumiu o risco dessa degradação: são 705
milhões, segundo as melhores expectativas! O Estado trocou uma poupança certa, no momento certo, por
uma possível poupança, num momento incerto e num futuro incerto.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — É verdade!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — E tudo isso sem comparador público, sem saber se ficava mais barato
fazer de uma forma ou de outra, sem estudos de impacte ambiental.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Digamos que estamos perante um exemplo claro daquilo que o Estado
nunca, em momento algum, deve fazer. Coincidência das coincidências: era ano de eleições, o que talvez
explique muita coisa!
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
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O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado Hélder Amaral, inscreveram-se quatro Srs. Deputados
para pedidos de esclarecimento. Como participou, durante vários meses, na Comissão de Inquérito, até será
capaz de adivinhar quem são os Srs. Deputados que se inscreveram, mas indico-os: os Srs. Deputados Pedro
Filipe Soares, Bruno Dias, Rui Paulo Figueiredo e Nuno Encarnação.
Entretanto, a Mesa já foi informada de que o Sr. Deputado Hélder Amaral responderá conjuntamente a
cada dois pedidos de esclarecimento.
Para pedir esclarecimentos, tem, pois, a palavra, em primeiro lugar, o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, de facto, a dúvida poderia ser quanto à ordem, porque
os trabalhos deram conta de quem estava interessado e de quem participou nessa Comissão.
Sr. Deputado Hélder Amaral, fez um conjunto de observações, retirando as conclusões que o CDS retira de
todas as audições — e foram dezenas delas — de um ano de trabalho da Comissão de Inquérito.
Quero fazer-lhe um conjunto de perguntas muito concretas, no sentido de saber se acompanha ou não
aquelas que são também as conclusões do Bloco de Esquerda e que, de facto, poderão ainda ter espaço de
debate na Comissão, de modo a fazerem parte do relatório final.
As parcerias público-privadas provaram ser um espaço de desorçamentação, permitido pelas instâncias
europeias e aproveitado pelos Governos nacionais. E aqui há uma marca governativa que não é só partidária,
é daqueles partidos que se dizem do arco da governação.
Ora, esta matéria demonstra que o arco da governação tem, nas PPP, a demonstração do seu desengano
e daquela ideia de que, afinal, houve um desgoverno por parte do Governo do País.
A escolha das PPP é a escolha da desorçamentação, da opacidade das contas públicas e da oneração dos
contribuintes pela opção dos Governos.
Não ficou claro se havia um comparador que as justificasse, não ficou claro por que é que tinham sido
escolhidas PPP e não a contratação clássica e não ficaram claras as definições dos benefícios para os
privados e dos malefícios para o Estado.
A conclusão, PPP atrás de PPP, é a de que os privados ganharam sempre e as pessoas que eram
representadas pelo Estado pagaram sempre.
Ora, tem de haver uma conclusão de toda esta narrativa e de toda esta análise. Todo este processo
demonstrou que ao Estado sai sempre a «fava» e que aos privados sai sempre o «brinde». Mas se esta é a
conclusão — e pergunto se é ou não a conclusão do CDS —, pergunto também de que lado está a
responsabilidade que o CDS entende que o Estado deve retirar desta conclusão. Da parte do Bloco de
Esquerda, tem uma responsabilidade clara: a de falar com transparência às pessoas e a de defender o
interesse público necessário nesta matéria. Por isso, amanhã mesmo, votaremos um projeto do Bloco de
Esquerda que propõe o resgate público das parcerias público-privadas.
Vozes do BE: — Muito bem!
O Sr. Presidente (António Filipe): — Faça o favor de concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Temos a consciência do que isso significa para as contas públicas,
temos a consciência do que significará para as contas públicas se não for feito. E sabemos que, pesando isso
(e termino, Sr. Presidente), a certeza da construção de uma solução está do lado do resgate público das
parcerias público-privadas. E, não sendo tomada essa decisão, temos também a certeza que o ónus será
continuar com o problema ano após ano, durante décadas, para que as rendas dos privados não sejam
tocadas, garantindo que será o Estado, isto é, que serão as pessoas a pagar sempre.
Por isso, concluo perguntando de que lado fica o CDS: se do lado da manutenção do problema, se do lado
da construção de uma solução.
Aplausos do BE.
O Sr. Altino Bessa (CDS-PP): — Onde é que está o dinheiro para resgatar as concessões?
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O Sr. Presidente (António Filipe): — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado
Bruno Dias.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Hélder Amaral, com efeito, ao fim de mais de um
ano de trabalhos da Comissão Parlamentar de Inquérito à Contratualização, Renegociação e Gestão de todas
as Parcerias Público-Privadas do Sector Rodoviário e Ferroviário, voltam a usar da palavra os Deputados que
nessa Comissão intervieram, por sinal hoje presididos pelo mesmo Sr. Presidente que foi dirigindo os seus
trabalhos.
Nesta matéria, importa registar antes de mais que nesta sessão plenária parece ter havido da parte do
CDS algum entusiamo, algum frémito de antecipação e de expetativa em trazer ao Plenário uma espécie de
versão compacta ou de apresentação em primeira mão da proposta inicial de relatório que foi apresentada ou,
melhor dizendo, enviada pelo Sr. Deputado relator, do Grupo Parlamentar do PSD, na medida em que a
apresentação do relatório ainda vai acontecer daqui por alguns dias.
Portanto, é bom sublinhar que não temos ainda um relatório final, temos uma proposta inicial distribuída e
enviada pelo Sr. Deputado relator, como é bom de ver, e temos muito trabalho para fazer.
Podem existir algumas antecipações, pode haver algum entusiasmo de dar a conhecer urbi et orbi o
trabalho que se fez, pode haver apresentações à imprensa e não à Comissão, mas o que neste momento
importa dizer é que temos muito trabalho para fazer e que estamos disponíveis para prosseguir, desta vez em
sede de relatório e da sua discussão e aprovação final, aquilo que temos vindo a fazer há mais de um ano.
Mas não queremos deixar de responder ao repto da sua declaração política, sublinhando em todo o caso
que há aqui uma abordagem de aprofundamento, de rigor e de alguma contenção na avaliação política que se
faz relativamente aos processos que é pouco compatível com as leituras, diria, unilaterais.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado, tem de concluir.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Vou concluir, Sr. Presidente.
Como terá oportunidade de se recordar, dissemos, logo quando começámos a participar nos debates da
Comissão de Inquérito, que quando o PSD, o CDS e o PS falam uns dos outros acertam quase sempre.
O problema é que temos uma governação que, ao longo de sucessivos governos, de sucessivos ministros
e de sucessivos partidos que se foram seguindo no poder (PS, PSD e CDS), assumiram esta política e esta
opção pelas PPP.
E a questão de fundo que se coloca — e com isto termino, Sr. Presidente — é que ensinamento, que lição,
que aprendizagem retiramos desta experiência concreta e deste trabalho que se fez na Comissão de Inquérito.
É ficar na expetativa de que a próxima PPP é que vai ser a boa? Ou é acabarmos de vez com este modelo de
negócio ruinoso para o Estado, para o interesse público e para as populações? Vamos ou não acabar com
estas opções ruinosas que são os modelos de negócio das parcerias público-privadas?
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra, para responder aos dois pedidos de esclarecimento, o
Sr. Deputado Hélder Amaral.
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr. Presidente, agradeço os pedidos de esclarecimento quer ao Sr.
Deputado Pedro Filipe Soares quer ao Sr. Deputado Bruno Dias.
Gostava de começar por dizer aos Srs. Deputados Pedro Filipe Soares e Bruno Dias que obviamente
estaremos disponíveis para fazer uma discussão séria, ponderada e sensata do relatório e porventura
chegaremos a um consenso sobre o mesmo. Aliás, tive o cuidado de nem sequer citar o relatório na minha
declaração política.
Sr. Deputado Pedro Filipe Soares, queria dizer-lhe que espero que desta Comissão de Inquérito saia a
noção exata dos cuidados que o Estado deve ter para não incorrer nos riscos e nos prejuízos que incorreu
aquando da contratação destes modelos. E há um conjunto de recomendações que podemos fazer.
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Obviamente, não pode ser a desorçamentação e também não podem ser decisões unilaterais que põem em
causa os contratos assinados e os direitos que estão nos privados e na esfera pública.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Não se faz nada!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Nós somos a favor da negociação, da estabilidade dos contratos e do
Estado de direito.
Sr. Depurado Bruno Dias, queria ainda dizer-lhe que não preciso de ler o relatório nem de fazer nenhum
anúncio do relatório.
O relatório de setembro de 2011 do Tribunal de Contas dizia, sobre a Metro Sul do Tejo, o seguinte: «O
Estado concedente deverá alicerçar as suas decisões em estudos de procura mais credíveis e conservadores
e os projetos devem ser fundamentados através do rigoroso estudo da viabilidade económica e social» — era
isso que dizia o Tribunal de Contas.
Também é conhecido o que disse a Ernst & Young sobre as subconcessões, ou seja, que os vistos foram
recusados pelo Tribunal de Contas a cinco subconcessões — Algarve Litoral, Baixo Alentejo, Douro Interior e
Litoral Oeste —, porque faltava a análise do comparador público, análise que o Partido Comunista Português,
e bem, sempre reivindicou para a utilização destes instrumentos. É fundamental saber se é mais económico o
Estado fazer a obra com os seus próprios meios ou em modelo de parceria público-privada. Mas essa análise
não pode ser feita depois de os contratos estarem assinados, tem que ser feita antes de os contratos estarem
assinados — e V. Ex.ª sabe que foi feita depois, o que levanta dúvidas.
Acho que este espaço de debate tem de ser sério e que este modelo é virtuoso,…
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Porquê?!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — … pois pode dotar o Estado de condições para fazer obra, desde que o
Estado tenha em conta se tem ou não sustentabilidade financeira para assinar esses contratos, se tem
capacidade para o fazer durante a sua vida, que é longa, que perpassa vários governos e, porventura, até
várias gerações. Não o modelo das renegociações e dos reequilíbrios financeiros que desvirtuam o modelo,
mas um modelo mais estável, mais «auditável», em que no final se tem a obra mas em que, ao mesmo tempo,
se consegue poupar o esforço financeiro que é preciso para dotar o País com algumas infraestruturas e não se
corre o risco de deixar para as futuras gerações uma conta pesada. Se tivesse havido cuidado, teria sido
possível optar por um por outro modelo, isto é, se tivesse havido essa análise antes da assinatura dos
contratos. Acho que esse é um dos ensinamentos do Partido Comunista Português na Comissão que pode ser
vertido no relatório.
Porém, isso não esconde que nada disso foi feito em muitas e muitas parcerias público-privadas, porque o
calendário não era só o seu custo/benefício, como diz o Tribunal de Contas, o calendário era outro, como eu já
disse. Basta ver quanto custava cada anúncio, cada inauguração de projeto. Se ler bem o relatório do Tribunal
de Contas, ficará a saber que há inaugurações que custaram quase tanto como a obra em si, porque algumas
delas não chegaram a existir.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Srs. Deputados, vamos passar aos dois últimos pedidos de
esclarecimento.
Tem a palavra, em primeiro lugar, o Sr. Deputado Rui Paulo Figueiredo.
O Sr. Rui Paulo Figueiredo (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Hélder Amaral, muito me surpreende
que o CDS se associe a esta manobra de diversão promovida pelo Partido Social Democrata. Mas, se calhar,
não me deveria surpreender assim tanto.
É absolutamente confrangedor e desprestigiante para a Comissão Parlamentar de Inquérito à
Contratualização, Renegociação e Gestão de todas as Parcerias Público-Privadas do Sector Rodoviário e
Ferroviário, para a Assembleia da República e para as instituições aquilo a que temos assistido.
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Um relatório distribuído em primeiro lugar à imprensa, antes de ser distribuído aos Deputados que
participam na Comissão de Inquérito,…
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. Rui Paulo Figueiredo (PS): — … não prestigia o trabalho que fizemos durante um ano, um relatório
que deveria ser apresentado daqui a 15 dias e que foi apresentado e distribuído ontem. Eu, por exemplo,
comecei ontem de manhã a receber telefonemas de jornalistas que tinham o relatório, que só recebi já por
volta das 20 horas. Isto é uma encenação absolutamente confrangedora, lamentável, destinada a disfarçar o
desastre que é a governação protagonizada pelo Partido Social Democrata.
Protestos do Deputado do PSD Luís Menezes.
Aliás, esta Comissão de Inquérito tem sido uma comissão de branqueamento e de acusação. Desde o
início, tinha as conclusões já escritas: procurar acusar membros do Governo do Partido Socialista e branquear
membros dos Governos do PSD.
Por isso é que os senhores chumbaram a audição de Miguel Relvas, de Álvaro Santos Pereira, de Bagão
Félix e de Manuela Ferreira Leite!
Aplausos do PS.
Por isso é que os senhores chumbaram todas as audições de responsáveis de instituições financeiras! 60%
dos lucros das parcerias público-privadas vão para os bancos e os senhores não quiseram ouvir ninguém.
Por isso é que chumbaram todas as audições de responsáveis por análises de custo/benefício.
Por isso é que os senhores tiveram uma fixação em determinada concessionária e chumbaram a audição
de todas as outras empresas.
Por isso é que os senhores branqueiam negócios ruinosos para o Governo, como é o caso do da
Lusoponte.
Por isso é que os senhores dedicam páginas e páginas do relatório a acusar membros do Governo do
Partido Socialista, havendo mais de 20 páginas a branquear a atuação do Secretário de Estado Sérgio
Monteiro, que ora está de um lado, ora está do outro, ora negoceia pelos bancos, ora negoceia pelo Governo!
Ele, sim, é o verdadeiro «bola de ouro» das parcerias público-privadas e os senhores branquearam totalmente
isso!
O Sr. Luís Menezes (PSD): — Tenha vergonha!
O Sr. Rui Paulo Figueiredo (PS): — O Sr. Deputado Hélder Amaral fala, e muito bem, do comparador
público, mas o relatório critica, e bem, a ausência de comparador público em parcerias público-privadas em
Governos do Partido Socialista e omite a ausência de comparador público em parcerias público-privadas de
Governos do Partido Social Democrata. Por isso, nós achamos que este relatório — aliás, proposta de
relatório — é absolutamente confrangedor.
Termino dizendo que há um ponto em relação ao qual estamos de acordo, Sr. Deputado Hélder Amaral: se
alguma coisa de positivo deveria sair, para além desta encenação política confrangedora que o Partido Social
Democrata faz, era um manual de procedimentos e recomendações para o futuro, recomendações robustas
daquilo que deve ser a gestão, a negociação e a contratualização das parcerias público-privadas.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Rui Paulo Figueiredo (PS): — E aquilo que nos é apresentado é absolutamente insipiente,
absolutamente lamentável, é de uma pobreza a todos os títulos assinalável.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado, tem de concluir.
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O Sr. Rui Paulo Figueiredo (PS): — Vou terminar, Sr. Presidente.
Não estamos disponíveis para encenações, mas estamos disponíveis para apresentar recomendações a
sério que sejam discutidas, que é aquilo que este relatório não faz e em que o PSD não está interessado.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra, também para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado
Nuno Encarnação.
O Sr. Nuno Encarnação (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Hélder Amaral, creio que por si só já valeu
a pena trazer aqui este assunto, porque quando vemos o PS nervoso é porque alguma culpa tem no cartório.
Sr. Deputado Rui Paulo Figueiredo, diversão foi o que os senhores andaram a fazer com o dinheiro dos
portugueses ao construírem através de PPP em cada recanto do País! Isso é que foi diversão!
Aplausos do PSD.
Diversão foi o que os senhores andaram a fazer ao criarem uma dívida de 31 000 milhões de euros com as
PPP, dívida que este Governo quer baixar para os 23 000 milhões. É esse o compromisso deste Governo!
E o que mais me preocupa, bem como a todos os portugueses, é a pergunta que vou fazer ao Sr.
Deputado Hélder Amaral.
Sr. Deputado Hélder Amaral, todos nós percebemos que havia estimativas de tráfego empoladas. O que é
que os anteriores governantes queriam quando liam esses papéis e aceitavam fazer mais PPP?
Quando os mesmos governantes tinham avisos sucessivos de insustentabilidade da Estradas de Portugal,
qual era a resposta que davam? Diziam que queriam mais obra, davam cartas de conforto e diziam que
tínhamos de ter mais PPP.
Quando o País já estava com dificuldades financeiras e económicas e quando já havia uma recessão
profunda não só a nível europeu como mundial, a resposta que dava o Governo do Eng.º José Sócrates era
«continuemos a acrescentar mais alcatrão às estradas; é para isto que o dinheiro vai servir».
Mas, Sr. Deputado Hélder Amaral, acho que todos concordamos com o seguinte: os portugueses
cansaram-se de «levar com alcatrão nos olhos» e perceberam de uma vez por todas que, nesta matéria, a
culpa não pode morrer solteira.
E se esta Comissão de Inquérito teve um dado positivo é que hoje todos sabemos quem é que assinou os
contratos da PPP e por quantos milhões cada um é responsável nesta dívida monstra que foi criada em
Portugal.
Além disso, Sr. Deputado Hélder Amaral, ao perceber a aflição do Partido Socialista, só posso concluir uma
coisa: «aqui há gato».
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Hélder Amaral.
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, começo por agradecer as questões
colocadas.
Sr. Deputado Rui Paulo Figueiredo, os grupos parlamentares são responsáveis por aquilo que fazem com a
documentação que lhes chega e que reproduzem. Eu disse aqui que não cito o relatório mas, obviamente, o
momento escolhido para tal cabe a cada uma das bancadas.
O relatório será alvo de discussão em sede de Comissão e chegaremos todos a conclusões que, espero,
sejam consensuais, não na lógica de perseguição, mas na lógica de dotar o Estado de mecanismos de defesa
para este tipo de instrumentos.
Sr. Deputado, devo lembrar-lhe duas coisas. A primeira é que o CDS teve uma iniciativa no sentido de
alertar para os prejuízos que poderiam existir com a assinatura do contrato relativo ao troço de alta velocidade,
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fruto das condições financeiras que estávamos a viver, para não esgotar a capacidade de financiamento para
as PME.
Dizia na Comissão o ex-Ministro das Finanças sobre porque é que não foi assinado o contrato do troço
Lisboa-Poceirão: «Olhe, se a obra não vai, não vai. Era menos um problema». Mas a verdade é que está
escrito no despacho o seguinte: «Verificou-se uma significativa e progressiva degradação da conjuntura
económica». Aquilo que foi válido para o contrato do troço Lisboa-Poceirão não foi válido para o outro contrato.
E, quanto a isso, não preciso do relatório das PPP para perguntar porquê — o mesmo Governo, o mesmo
ministro, a mesma decisão.
Nós alertámos para o facto de que ia haver indemnizações. Pois vai haver indemnizações, e eu gostava de
saber porquê! Não sei se sairá de lá «gato» ou outro animal qualquer, mas que terá de sair uma conclusão lá
isso terá.
Sr. Deputado Nuno Encarnação, houve um especialista que nos disse: «Se eu tivesse de identificar três
riscos para as parcerias público-privadas, identificava tráfego, tráfego, tráfego». Esse é, de facto, o risco maior.
Mas ou os estudos de tráfego foram feitos para justificar o custo/benefício duvidoso de obras ou, então, houve
incompetência nos estudos de tráfego feitos. Mas que não podemos estar perante discrepâncias tão grandes
de facto não podemos!
O ex-Secretário de Estado Paulo Campos dizia na Comissão: «É evidente que se eu quiser fazer obra no
interior do País — é preciso assumi-lo —, que também tem direito a estas infraestruturas, mas que tem de ser
paga pelo Orçamento do Estado e pelo erário público, não posso ter portagem real». É verdade. E eu
pergunto: mas, então, o que é que aconteceu nas concessões da Grande Lisboa e do Norte? Nessas
concessões, utilizando a mesma conceção ideológica e técnica do secretário de Estado, devia haver portagem
real. E havia, de facto! Estavam em portagem real! O Governo resolveu transformar em pagamento e
disponibilidade. Resultado: 970 milhões de euros de prejuízos para o contribuinte português e para o Estado
português. Teria que ser assim? Talvez não.
Portanto, gostava — considero que esta Assembleia pode fazê-lo — de fazer uma análise sobre como se
tomam este tipo de decisões.
De facto, os privados têm instrumentos que o Estado não tem, mas, então, que se criem esses
instrumentos da parte do Estado. Pois, então, que se tenha mais cuidado e mais atenção na assinatura desses
contratos. Para quê? Para não transformar um bom instrumento num mau instrumento e para não transformar
algo que deve ser benéfico para as populações em algo que é muito prejudicial para o contribuinte português.
Termino, dizendo que cá estaremos para discutir o relatório quando for esse momento, no tempo em que
for oportuno. O CDS terá sugestões e propostas a fazer. Não as fiz agora, porque quis apenas chamar a
atenção para o problema grave que onera, em muito, as contas do Estado e as futuras gerações, para muita
obra que teve não o calendário do Plano Rodoviário Nacional, não o de uma visão sistémica do sistema de
transportes nacionais, mas apenas e só o princípio de que as próximas eleições são mais importantes do que
o futuro do País.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para proferir uma declaração política, tem a palavra a Sr.a Deputada
Rita Rato, do PCP.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Depois de, no passado sábado, a resistência e
a determinação dos professores terem inundado a Avenida da Liberdade, os professores portugueses
realizaram ontem uma jornada de luta histórica em defesa da escola pública de qualidade.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — De Norte a Sul do País, milhares de professores estão a construir, desde o dia 7
de junho, uma poderosa luta em defesa da escola pública democrática.
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Por isso mesmo, daqui saudamos, com uma imensa confiança, a luta de todos e de cada um dos
professores e professoras, que, perdendo um dia de salário, se organizaram e mobilizaram, juntando forças na
defesa da escola pública de qualidade para todos.
Esta greve de 17 de junho, travada com uma imensa coragem pelos professores portugueses, foi ainda
mais importante, porque representou uma sólida expressão da unidade dos professores contra um Governo
chantagista, irredutível e intransigente.
É curioso que nunca tenhamos ouvido o Ministro Paulo Portas em conferências de imprensa no domingo, à
hora do almoço, a anunciar o aumento dos manuais escolares em 2,6%, ou a anunciar o fim do passe escolar
para os estudantes entre os 4 e os 23 anos, ou a anunciar o fim de terapias e apoios a alunos com
necessidades especiais, ou a fazer um balanço do despedimento de 14 500 professores contratados, que
tanta falta fazem à escola pública.
É também curioso que o Primeiro-Ministro, que se diz agora tão preocupado com os jovens e as suas
famílias, não esteja nada preocupado quando força milhares de jovens a abandonarem o seu País e a
emigrarem para fugirem à miséria e ao desemprego.
Não é nada curioso, é inclusivamente revelador, que o Presidente da República, conhecido pelos seus
silêncios ensurdecedores, que nunca teve uma palavra para dizer sobre o drama de milhares de alunos
forçados a abandonar os estudos e sobre a justa luta dos professores, tenha vindo contribuir para o clima de
pressão e chantagem. Hipocrisia política, pura hipocrisia política.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputados: 95% de adesão à greve das avaliações e 90%
registados no dia de ontem são reveladores da determinação dos professores e provam que o Governo
apenas permitiu o funcionamento de muitas salas de exame através da adoção de um conjunto de
ilegalidades, irregularidades e arbitrariedades.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Fora da lei!
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sabe bem o Governo que a luta dos professores não é contra os estudantes, é
contra a política da troica de destruição da escola pública de qualidade, é contra os despedimentos, é pela
dignidade e pelo respeito que merece e exige a profissão docente.
Podemos mesmo dizer que esta luta é também em defesa dos estudantes e dos seus direitos, é pela
defesa do seu futuro, numa escola que assegure a formação da cultura integral do indivíduo, numa escola que
assegure sempre a qualidade do processo de ensino/aprendizagem.
A dita preocupação do Governo sobre as consequências de um dia de luta dos professores é
desmascarada por 365 dias de imposição de medidas de degradação da qualidade do ensino: o aumento do
número de alunos por turma; a criação de mega-agrupamentos, que desumaniza os espaços e aumenta a
descoordenação pedagógica; a reorganização curricular para despedir milhares de professores; a exclusão de
alunos com necessidades especiais, cortando e retirando apoios materiais e humanos essenciais a estes
alunos.
Sr. Presidente, Sr. Deputados: A escola pública de qualidade para todos é uma das mais importantes
conquistas de Abril. A escola pública é um dos pilares estruturantes do regime democrático.
Não há democracia sem escola pública de qualidade e a degradação da escola pública significa a
degradação profunda do próprio regime democrático.
Os professores sabem disto, Srs. Deputados. E, por isso mesmo, a sua longa jornada de luta não
corresponde a nenhum desígnio corporativo. A luta histórica, travada em 2013, no século XXI, pelos
professores portugueses é uma luta em defesa do regime democrático e das suas conquistas.
A luta dos professores em defesa dos seus direitos é inseparável da luta pela qualidade da escola pública,
é inseparável da luta corajosa em defesa da democracia.
A luta dos professores não é contra os alunos, é contra a política deste Governo e da troica, em defesa do
emprego com direitos contra o desemprego; em defesa da dignidade contra o aumento do horário de trabalho,
em defesa da estabilidade e da continuidade pedagógica contra a mobilidade especial.
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Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os responsáveis pela instabilidade que se vive hoje nas escolas não são
os professores, é o Governo e a sua intransigência de despedimento de milhares de professores e de
cumprimento do pacto da troica.
Este Governo é já responsável por ter levado a cabo o maior despedimento coletivo: 14 500 professores
contratados foram empurrados para o desemprego, quando fazem tanta falta nas escolas.
É por isso que daqui queremos apelar aos professores, em especial, mas também a todos os
trabalhadores, aos estudantes, a todos os homens e mulheres deste País a lutar pela demissão do Governo e
pela derrota do pacto da troica, em defesa dos valores de Abril e do regime democrático.
Por um Governo patriótico e de esquerda, demissão deste Governo já!
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Isilda
Aguincha, do PSD, Rui Jorge Santos do PS, Luís Fazenda, do BE, Heloísa Apolónia, de Os Verdes, e Michael
Seufert, do CDS-PP.
Srs. Deputados, tenho de lhes pedir, mais uma vez, tal como costuma fazer a Sr.ª Presidente, que os Srs.
Deputados se inscrevam atempadamente.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isilda Aguincha.
A Sr.ª Isilda Aguincha (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados, este Grupo Parlamentar não
questiona o direito à greve. É um direito legítimo de todos os trabalhadores e, obviamente, dos professores.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Desde que não haja!
A Sr.ª Isilda Aguincha (PSD): — Saudamos os professores, os que fizeram greve, os que foram à luta,
mas também aqueles que não fizeram greve…
O Sr. Pedro Lynce (PSD): — Muito bem!
A Sr.ª Isilda Aguincha (PSD): — … e que permitiram que os exames acontecessem.
O Sr. Pedro Lynce (PSD): — Exatamente!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Obrigados pelo Governo!
A Sr.ª Isilda Aguincha (PSD): — 76% dos exames foram realizados e cerca de 18 000 alunos não
realizaram as provas, sendo estes a nossa preocupação.
Aplausos do PSD.
O Governo já anunciou que as provas se realizarão após cumprido o calendário da primeira fase de
exames, no dia 2 de julho.
Deseja-se que a tranquilidade regresse às escolas.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Só demitindo o Governo!
A Sr.ª Isilda Aguincha (PSD): — O Governo não obteve compromissos das estruturas sindicais que
garantissem que, com a eventual mudança da data deste exame, se cumprissem as provas. Esteve disponível
para o diálogo, tal como continua disponível.
O Sr. Ministro já assumiu que o horário letivo dos professores, um dos fatores de luta, não seria
aumentado.
Também já foi afirmado que não existirão situações de mobilidade.
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Esta luta, Sr.as
e Srs. Deputados, é uma luta dos sindicatos. Não é uma luta dos professores, é uma luta
dos sindicatos.
Aplausos do PSD.
Srs. Deputados, vamos continuar a penalizar os alunos e a escola pública por força da agenda sindical?
Ou, Sr.a Deputada, esta é a agenda do PCP, não dos alunos, não dos professores, não da escola pública?
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — A agenda do PCP?!
O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr.a Deputada Rita Rato, pergunto se pretende responder a cada
pedido de esclarecimento individualmente ou no final.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Responderei um a um, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem, então, a palavra, Sr.a Deputada.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr. Presidente, Sr.a Deputada, agradeço a questão que coloca.
De facto, eu não sou professora, pelo que não fiz greve. Mas fizeram greve milhares e milhares de
professores que, naturalmente, não são do PCP. Alguns serão, mas isso não menoriza as suas condições de
exercício da democracia, muito pelo contrário.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Por isso, estamos solidários com todos os professores que fizeram greve,
inclusivamente os que são do PSD. Houve 90% de adesão no dia de ontem!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É obra!
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — E houve 95% de adesão na greve às avaliações! Naturalmente que muitos
professores militantes do PSD e outros simpatizantes se reveem na necessidade absoluta da defesa do
emprego com direitos e da escola pública de qualidade.
A Sr.a Deputada conhece aquele discurso de quem diz, muitas vezes, que se governa lá longe, nos
gabinetes, não se conhecendo o terreno, e que, portanto, as opções políticas não refletem nem têm em
atenção a realidade do País. Muitas vezes, os que dizem isto são os que não querem reconhecer que aqueles
que estão nos gabinetes, aqueles que sustentam despedimentos na Administração Pública conhecem
efetivamente a realidade do País, mas não é por desconhecimento é por opção política.
Este pacto da troica pretende atirar para o desemprego milhares e milhares de professores, mas não é
porque a troica ou o Ministro da Educação não saibam que eles fazem falta, é porque o compromisso de
destruição das funções sociais do Estado para benefício do poder económico e dos grupos financeiros se
sobrepõe ao da valorização da escola pública de qualidade.
E, se falta de exemplo houvesse, o número de professores que faz parte, e legitimamente, na bancada do
PSD conhece a realidade das escolas. A Sr.a Deputada, que é professora, até conhece melhor do que eu a
aplicação destas medidas e como isto coloca em causa a qualidade pedagógica no processo de
aprendizagem.
Por isso é que a greve de ontem dos professores e a luta que estão a travar desde o dia 7 de junho tem
esta importância significativa: é uma luta em defesa do emprego, contra os despedimentos, contra o aumento
do horário de trabalho; mas é, sobretudo, uma luta pela escola pública e pela qualidade da escola pública,
conforme está consagrada na Constituição. E na História ficam aqueles que não vergam e que não deixam de
lutar pelo regime democrático e pela dignidade da vida dos alunos e dos professores.
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Vozes do PCP: — Muito bem!
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — É isso que estes professores estão a fazer, ou seja, a lutar pela dignidade e pelo
regime democrático. É pena que este Governo não esteja disponível para cumprir a Constituição.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Jorge Santos para pedir
esclarecimentos.
O Sr. Rui Jorge Santos (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Rita Rato, as políticas deste Governo são
ruinosas para a escola pública e um atentado à dignidade do exercício da profissão de professor. Não me
canso de dizer que o que este Governo pretende é, de facto, recriar uma escola pobre para pobres, voltar ao
antigamente, destruir a escola pública.
Aplausos do PS.
A greve não foi, nem é, uma luta corporativa, uma luta para que os professores tenham um regime de
exceção. Antes pelo contrário, é uma luta pela dignidade, uma luta pela defesa da escola pública, pela defesa
das famílias, dos estudantes e do Estado social. A verdade é que este Governo, de forma gratuita, ataca a
classe docente, provoca e humilha os professores.
Vejam e analisem em concreto alguns exemplos.
Primeiro exemplo: imaginem que um professor de uma escola de Vila Real, no próximo ano, não tem
horário para lecionar graças às políticas deste Ministério da Educação. Sabem o que pretende o Governo?
Que esse professor seja obrigado a ocupar um qualquer lugar de uma qualquer escola no Norte, por exemplo
em Viana do Castelo, a mais de 200 km de casa.
Um qualquer trabalhador da Administração Pública cujo posto de trabalho seja eliminado pode, é verdade,
ser colocado num outro serviço mas desde que a distância não ultrapasse 60 km da sua residência. Há aqui
um claro prejuízo para a classe docente.
Segundo exemplo: a conversa do aumento do horário de trabalho para as 40 horas. A maioria dos
professores trabalha mais do que isso, e também aqui não se pretende nenhuma exceção. Em relação ao
aumento das horas de lecionação, o Ministro falta à verdade quando diz que tal não vai acontecer. Veja-se,
por exemplo, o desaparecimento das direções de turma como componente letiva. O que implica esse aumento
não é mais trabalho para os professores individualmente, o que faz é retirar-lhes trabalho, pois pretende-se,
através deste mecanismo, despedir muitos e muitos professores.
Ontem, os professores deram uma resposta ao Governo, uma resposta convincente. E como há imagens
que valem mais do que 1000 palavras, vejam em concreto esta imagem publicada num jornal: vemos um
Ministro pesaroso, triste, curvado e quase, quase, quase a cair.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Rita Rato para responder.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Rui Jorge Santos, fez aqui uma análise sobre esta
situação e a greve dos professores. Mas não foi suficientemente claro sobre qual é a posição oficial do PS
sobre a greve.
Risos do PSD.
Naturalmente, teremos ainda oportunidade de a perceber.
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Da parte do PCP, defendemos intransigentemente o direito à greve. É até interessante perceber que para o
PSD, para o CDS e, designadamente, para o Governo as greves são sempre um direito, mas que nunca
deviam acontecer, porque quando há greves nunca deviam ter os seus efeitos.
Importa aqui dizer que foi o Governo que obrigou ao calendário da greve ao anunciar estas medidas nesta
fase final de ano letivo, criando um conjunto de dificuldades.
Importa também aproveitar esta oportunidade para mostrar como é que este Governo gosta de invocar o
cumprimento da lei, mas apenas das leis que lhe convém. No que trata ao cumprimento da lei,
designadamente da lei da greve, gostava de referir aqui um e-mail que recebemos de um pai. Diz-nos ele que,
no dia 14 de junho, quando chegou à escola do pré-escolar para ir buscar o seu filho, foi informado de que no
próximo dia 17 não haveria atividades letivas porque as educadoras estavam convocadas para fazerem
vigilância aos exames.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Uma vergonha!
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Portanto, o que acontece na prática é que o Governo, perante uma adesão
significativa e, diria, mesmo histórica de determinação dos professores na luta pelos seus direitos e pela
escola pública de qualidade, recorre a todos os expedientes para impedir que a greve possa acontecer da
forma como estava prevista.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Por isso, o que aqui registamos é que o Governo, que anda sempre com a lei na
boca mas nunca cumpre a Constituição, quando não quer cumprir a lei, designadamente naquilo que está
previsto, invoca expedientes que entendemos que não ficam bem ao regime democrático. Mas este Governo,
naturalmente, pagará por eles.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda para pedir
esclarecimentos.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Rita Rato, o Governo diz: «Não há problema
nenhum. Não se aplicará a mobilidade especial, nem a reclassificação profissional, não haverá aumento de
horário, não se vai passar nada na educação» e recebe, em resposta, uma greve fortíssima dos professores,
com altíssimos níveis de adesão, acima de 90%, nos conselhos de avaliação e no exame de segunda-feira
passada.
O que é que se pode entender disso? O que se pode entender disso é que a esmagadora maioria dos
professores não acredita na palavra do Governo. Nem sequer na palavra do Primeiro-Ministro, que veio
garantir: «Não vai acontecer nada aos professores! Não se vai aplicar nada!»
O que ontem foi importante, e não apenas na defesa da dignidade dos professores, como também na
defesa da escola pública, na defesa do mínimo essencial a uma profissão estruturante para o futuro do País e
para o futuro da cidadania em Portugal, é que toda uma classe profissional disse: «Não, não acreditamos na
palavra do Primeiro-Ministro, não acreditamos na palavra do Ministro da Educação».
Portanto, rompeu-se uma legitimidade política, e o PSD hoje, aqui, não consegue sequer refletir sobre a
perda de legitimidade política que sofreu ao longo desta última semana e, em particular, na greve aos exames.
É que, utilizando e manipulando, com uma carga demagógica tremenda, a situação dos alunos e das
famílias, estabeleceu-se uma larga onda de solidariedade no País em relação aos professores, percebendo as
motivações da greve que estavam a fazer. E ao contrário das contas que o PSD e o CDS tinham feito, não
tivemos a hostilização nem o isolamento dos professores. Pelo contrário, tivemos até vozes bastante
autorizadas no campo da direita a reprovar a leviandade e a irresponsabilidade do Ministro, a
irresponsabilidade do Primeiro-Ministro e a forma como o PSD trata a sociedade e determinados corpos
profissionais, como os professores.
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Na verdade, o que temos aqui é uma perda política do PSD e do CDS em relação aos professores.
Passada a greve, nem sequer é estendida uma mão para o diálogo, nem sequer há aqui uma abertura a
quaisquer outras alterações. O Ministro já se devia ter demitido. O Ministro perdeu a máscara nesta greve. Na
verdade, ele queria um confronto, não queria outra coisa. Ele quer aplicar tudo o que é o pacote de
precaridade na área da educação.
Mas não houve aqui nem um gesto de diálogo, nem um aceno para ir ao encontro das reivindicações não
dos sindicatos dos professores — os sindicatos são porta-vozes dessas reivindicações — mas, sim, de todos
os professores.
Há uma agenda extraordinária, e ela vem de professores que votaram à direita, à esquerda e ao centro,
que votaram em todos os partidos. Querem o quê? Querem que o Ministro cumpra a sua palavra e que possa
ter uma abertura. Todas essas pessoas, e muitas outras para além dos professores, queriam que o Primeiro-
Ministro tivesse uma palavra que valesse alguma coisa no País. Não tem sido o caso, e não será o caso.
Acho que é irremediável que vai haver aqui uma rotura política e que os professores vão ter de dar um
contributo essencial, tal qual como toda a função pública, na greve geral do dia 27 de junho, para que se
possam criar condições para recuperar legitimidade política e força no diálogo social, na capacidade de
defender a escola pública e, em geral, os serviços públicos.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Rita Rato para responder.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Fazenda, lembra bem que na mesa das
negociações estiveram oito estruturas sindicais — a Sr.ª Deputada do PSD, há pouco, falava da agenda do
PCP — representativas dos professores, o que, de facto, tem um significado importante. Este Governo
mostrou uma indisponibilidade total para a negociação. Aliás, o Sr. Ministro nem se dignou sentar-se à mesa
das negociações com as entidades representativas e delegou isso para a pasta do CDS, que é, de facto, quem
manda no Ministério da Educação.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Por isso, este Governo, este Ministro, este Ministério do CDS teve a
desonestidade, teve a coragem cínica de não cumprir uma decisão da comissão arbitral.
De facto, há uma etapa deste processo que foge ao Governo, que nunca pensou que uma decisão destas
fosse a favor da proposta que estava em cima da mesa relativamente à comissão arbitral e aos serviços
mínimos.
Protestos do Deputado do PSD Pedro Lynce.
Quando foi chamado a cumprir a lei, este Governo, seguindo tantos outros exemplos em matéria do setor
da educação, mas também em tantas outras áreas, não cumpre a lei e não permite que neste dia de luta este
processo aconteça dentro da normalidade, dentro daquilo que está previsto, criando uma série de incidentes e
contribuindo efetivamente para um sinal de instabilidade e de graves irregularidades na condução deste
processo.
Importa aqui dizer que este Governo não começou a errar agora, nem esta foi a primeira das medidas
gravosas no setor. Aliás, este Governo, desde que tomou posse, não aplicou ainda uma medida de
valorização da escola pública. A única coisa que vê este Governo, a sua cegueira política, é apenas a
destruição da escola pública e o favorecimento da escola privada. Este Governo não vê absolutamente mais
nada que não seja a degradação da escola pública.
É também por isso que entendemos que nenhuma das medidas que estão em cima da mesa, a juntar a
tantas outras — os despedimentos, a mobilidade, o aumento do horário de trabalho, o aumento do número de
alunos por turma, a criação dos mega-agrupamentos, nalguns casos com milhares e milhares de alunos, a
reorganização curricular que permitiu o despedimento de cerca de 14 000 professores —, contribuiu em nada
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para a defesa da escola pública, muito pelo contrário. É também por isto que os professores continuarão em
luta até dia 27, pois têm um papel muito importante na greve geral.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia também para pedir
esclarecimentos.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Rita Rato, se me permite,
começaria por saudar, em nome do Grupo Parlamentar do Partido Ecologista «Os Verdes», todos os
professores que ontem fizeram greve.
De seguida, queria dizer-lhe, Sr.ª Deputada, que o conceito de democracia deste Governo PSD/CDS é
extraordinariamente preocupante. Com o desenrolar deste folhetim de resposta do Governo a este direito à
greve, o Governo demonstrou que entende que as pessoas têm direito à greve desde que essa greve não
tenha impacto rigorosamente nenhum e que ninguém a sinta. É assim que o Governo entende que há direito à
greve.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Uma greve que não chateie!
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Porque quando o direito à greve toca alguém, o Governo entende
que já não há legitimidade para a greve, subvertendo totalmente um dos instrumentos de luta fundamental
para que os trabalhadores portugueses se façam ouvir. Este Governo, de facto, tem-se mostrado de uma
arrogância absoluta, que, atrevo-me a dizer, Sr.ª Deputada, põe em perigo a democracia.
De resto, aquilo que temos andado a discutir nos últimos tempos relativamente ao não pagamento do
subsídio de férias demonstra de forma clara que o Governo, tal como aconteceu na resposta que deu a este
direito à greve, entende que a única coisa que tem a demonstrar é isto: eu faço como quero! É esta a atitude
permanente do Governo, e é absolutamente intolerável.
E é intolerável, Sr.ª Deputada, ainda mais quando o que estes professores procuraram dizer ao Governo é
que não podem aceitar que ele os ameace com mais uma lógica de despedimento e de desqualificação das
suas condições de trabalho, porque quando assim faz põe em causa a vida concreta destas pessoas e das
suas famílias, mas também a qualificação e a valorização da escola pública.
Estas pessoas são também escola pública! Estas pessoas querem também a qualificação da escola
pública, porque é isso que serve aos alunos. Ora, aquilo que temos verificado da parte do Governo é um
desinvestimento financeiro rotundo na escola pública, uma degradação absoluta de investimento mas também
de pessoal. Pergunto-me como é que isso serve aos estudantes portugueses. Portanto, o que estamos a fazer
é a marcar um futuro de desqualificação.
A Sr.ª Deputada do PSD ainda há pouco dizia que é preciso que a tranquilidade volte às escolas. Pois é,
mas, Sr.ª Deputada, a quem é que compete levar a tranquilidade às escolas?
O Sr. Pedro Lynce (PSD): — A todos!
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — E leva-se a tranquilidade às escolas apontando aos professores e
dizendo-lhes «tu talvez sejas um daqueles que vai para a rua?» Não, não pode ser! Estamos a falar de
pessoas concretas, de famílias concretas e de professores que também tiveram filhos a fazer exames, mas
que tiveram dignidade para dizer aquilo que tinham a dizer ao Governo.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Rita Rato para responder.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, agradeço a questão que
colocou.
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De facto, esta preocupação que de repente assolou o Governo acaba por desmascarar que, ao longo deste
ano letivo, o Governo nunca esteve preocupado nem nunca veio fazer declarações de interesse relativamente
aos impactos, por exemplo, do fim do passe 4_18 e do que significa, numa família, uma criança com quatro
anos pagar de passe exatamente o mesmo que paga um adulto, bem como os impactos que isto tem no
insucesso e no abandono escolar; este Governo também não fez qualquer declaração de interesses sobre o
aumento do preço dos manuais escolares em 2,6%, quando o principal problema das famílias, hoje, é o seu
empobrecimento e a perda de rendimentos.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Portanto, este Governo, à boleia da greve dos professores, que quer utilizar
como bode expiatório, tem objetivos políticos de fundo que, naturalmente, o Primeiro-Ministro, na sexta-feira
passada, nesta Assembleia, anunciou relativamente à necessidade da alteração da lei da greve, se assim se
justificasse, que é como quem diz: se os trabalhadores insistirem nesta luta pelos seus direitos e pela defesa
da democracia, tem de se mudar a lei da greve,…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Ora bem!
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — … têm de se mudar os serviços mínimos, tem de se mudar a Constituição —
esperemos que não! — para ilegalizar um direito à resistência e à luta dos trabalhadores.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
Protestos do Deputado do CDS-PP João Pinho de Almeida.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Deste Governo já vamos esperando muita coisa, pelo que convém estarmos
com atenção e irmos exercendo e defendendo os nossos direitos da melhor forma possível.
De facto, o que está hoje em cima da mesa — e o PSD coloca aqui a questão da necessidade de
tranquilidade nas escolas —, com o próximo Orçamento retificativo, não é, de forma alguma, dar resposta aos
problemas que já hoje assolam a escola pública, por exemplo, no que diz respeito à contratação ilegal de
recursos, à precariedade para a contratação de funcionários, a quem este Governo paga 3,20 € à hora.
Gostava de saber se o Sr. Ministro conseguiria viver com 3,20 € à hora, porque é assim que destrata os
funcionários da escola pública!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — O mesmo se diga em relação aos psicólogos que não foram colocados e que
tanta falta fazem, ou em relação às necessidades permanentes das escolas a que não dadas respostas
relativamente a professores.
Portanto, da parte deste Governo, este não é o primeiro momento em que percebemos que não podemos
contar com ele para valorizar a escola pública. A luta dos professores não começou hoje e também não
acabará, porque só acabará com a derrota deste Governo!
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Michael
Seufert.
O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, já aqui ouvi saudações várias, pelo
que, naturalmente, gostaria de começar por saudar os alunos que ontem fizeram o que iam fazer à escola, que
foi o seu exame nacional!
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Aplausos do CDS-PP e do PSD.
Saúdo também, de uma forma ainda mais especial, aqueles que não o puderam fazer e que vão ter de o
fazer noutra data por causa da greve.
Sr.ª Deputada Rita Rato — e vamos já pôr a questão em pratos limpos —, a greve é, naturalmente, um
direito legítimo. Aliás, tem alguma graça que aqui tenha dito que a direita só quer o direito à greve quando ele
não produz efeitos, quando ele não prejudica ninguém. É que ontem, o dia 17 de junho, é uma data que dá
nome a várias estradas e a uma grande avenida na Alemanha, em Berlim, nomeadamente, porque foi um dia
em que uma grande greve, em 1953, foi oprimida pelo Governo comunista da altura, na Alemanha de Leste,
com tanques vindos da União Soviética, onde, como a Sr.ª Deputada sabe, governava a direita!…
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
Risos do PCP.
A União Soviética, conhecida pelo seu Governo de extrema-direita, enviou tanques, no dia 17 de junho de
1953, para pôr fim a uma greve dos trabalhadores.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Ah, pois é!
O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Sr.ª Deputada, devo dizer que cada um encara a greve como quer.
Felizmente, Portugal não tem os problemas dos países da Europa de Leste, que viveram a longa noite do
comunismo na Europa.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — É verdade!
O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Felizmente, Portugal é uma democracia, Sr.ª Deputada, e, portanto,
temos mecanismos legais e constitucionais para encarar as greves.
A Sr.ª Deputada citou a decisão da comissão arbitral e disse que o Governo não a cumpriu. Mas isso não é,
com todo o respeito, exatamente verdade. A comissão arbitral decidiu que não se podia marcar serviços
mínimos, o que, aliás, vai contra a jurisprudência do Tribunal Constitucional, que só se cita nesta Casa quando
convém…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Essa agora!
O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Isso foi inteiramente cumprido: não se fixaram serviços mínimos.
Depois, o que a comissão arbitral adiantou foi a possibilidade de se marcar o exame para o dia 20 de
junho. Ora, a Sr.ª Deputada sabe tão bem como eu, porque acompanha as questões da Comissão de
Educação, que no dia 20 há exame de Português do 2.º ciclo do ensino básico, às 9 horas e 30 minutos, e há
exame de Português do 3.º ciclo, às 14 horas.
A Sr.ª Deputada achava razoável juntar-se, no mesmo dia, os três exames que têm mais alunos de todo o
sistema educativo português: o exame de Português do segundo ciclo às 9 horas, o exame de Português do
terceiro ciclo às 14 horas e, porventura, o exame de Português do ensino secundário às 21 horas, com
certeza?!
Sr.ª Deputada, como é natural, o interesse público era garantir que os exames se realizassem. Conseguiu-
se isso para três quartos dos alunos de Português e, infelizmente, não se conseguiu para todos. Isto sem
beliscar o direito à greve, porque quem quis fazer greve fez, e quem não quis fazer greve não fez!
A Sr.ª Deputada deu-nos um dado muito curioso sobre o qual gostava de a questionar. Disse que a luta dos
professores só termina com a demissão do Governo e eu pergunto: na sua opinião, isso quer dizer que o
Governo não tem mais que negociar com os sindicatos, porque os sindicatos só vão terminar quando o
Governo se for embora?
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O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Não tem nada a ver com negociar!
O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Ou acha que, como nós achamos, há razão para negociar, há sempre
vontade para negociar, sobretudo se com negociação se conseguir evitar o grande prejuízo que aconteceu no
dia de ontem, que foi, infelizmente, um quarto dos alunos não terem feito o exame na data prevista.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Rita Rato.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Michael Seufert, o CDS falou aqui em nome do
Ministério da Educação, porque é o CDS que, de facto, manda no Ministério da Educação.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Ora bem! Exatamente!
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — O Sr. Ministro executa… Ou melhor, às vezes nem executa, porque até nas
conferências de imprensa passa a palavra ao Sr. Secretário de Estado,…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — … porque se recusa a participar nas negociações com as entidades
representativas.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É um ausente!
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Mas é importante que o Sr. Deputado faça chegar ao CDS, que manda no
Ministério da Educação, que para o PCP é fundamental a retoma das negociações…
Vozes do CDS-PP: — Ah!…
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — … e que o Governo entenda importante sentar-se à mesa, designadamente
para discutir quatro pontos.
Relativamente a outras matérias, entendemos que importa ir mais longe, mas em relação ao que está hoje
colocado em cima da mesa e que motivou objetivamente esta greve é importante assumir a posição — que,
aliás, as oito estruturas sindicais assumiram — de que importava, de facto, que o Governo tivesse
disponibilidade, que não teve até agora, para se sentar.
O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Diga isso à FENPROF!
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr. Deputado, não é só a FENPROF que está à mesa das negociações e que
está disponível para isso. O Sr. Deputado conhece, naturalmente, as oito estruturas sindicais e sabe
exatamente o que está colocado em cima da mesa.
Entendemos que relativamente à mobilidade especial, ao horário de trabalho, aos despedimentos e à
componente letiva de direção de turma… Como é possível?! Diga-me, Sr. Deputado, acha justo que deixe de
estar integrada na componente letiva a direção de turma? Acha pouca coisa que um professor, além de
acumular todas as turmas, ainda tenha direção de turma, não fazendo esta parte da componente letiva? O Sr.
Ministro falou disto como se não fosse bem assim; aliás, ele até é professor do ensino superior, provavelmente
nunca teve uma direção de turma, nunca percebeu do que se trata.
A verdade é esta: os sindicatos mostraram total disponibilidade e exigiram a retoma das negociações
relativamente a estas matérias. Sr. Deputado, não foram os professores que não quiseram continuar a
negociação! Quem mostrou uma irredutibilidade total foi o Governo, não foram os professores.
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Sr. Deputado, quem prejudica os alunos, quem prejudica a escola pública não são os professores. Os
professores são uma dimensão essencial da escola pública, bem como os alunos.
O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Tem toda a razão!
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — O Governo mostrou-se completamente indisponível para negociar a adaptação
das normas previstas no Orçamento do Estado e no pacto com a troica à educação e, naturalmente, os
professores têm de continuar a sua luta.
Da parte do PCP, estaremos sempre solidários com a luta dos professores, em Portugal e no mundo.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Srs. Deputados, concluímos o período das declarações políticas
propriamente ditas.
Seguem-se duas intervenções feitas ao abrigo do n.º 2 do artigo 76.º do Regimento, que prevê que os
Deputados, a título individual, possam «produzir uma intervenção por cada sessão legislativa, pelo período
máximo de 10 minutos, não contabilizável nos tempos do seu grupo parlamentar».
É ao abrigo desta disposição regimental que dou a palavra à Sr.ª Deputada Gabriela Canavilhas.
A Sr.ª Gabriela Canavilhas (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta semana o Governo celebra o
seu 2.º aniversário. O clima não é festivo, é antes de profunda consternação, entre greves e manifestações,
numa onda de desilusão coletiva e de desespero crescente, que se faz sentir transversalmente em toda a
sociedade portuguesa e que se expressa de forma cada vez mais afirmativa, em todas as oportunidades que
se colocam aos portugueses.
Assistimos nestes dois anos à difusão quase hegemónica de um discurso assente na valorização da culpa
e da expiação como instrumentos de legitimação de uma política de destruição do património social construído
em Portugal pela social-democracia — em particular pelo Partido Socialista — que se ajusta, por um lado, a
uma retórica paroquial, sem grandeza nem nobreza, e, por outro lado, a uma estratégia destinada à
implementação de um conceito novo de sociedade, onde o pressuposto matricial da democracia — a
igualdade de oportunidades, deixará de ser, como até agora, a garantia essencial da nossa organização
social.
Aplausos do PS.
Estamos, portanto, no meio de uma crise de graves proporções e de grande significado político. Não me
refiro só à crise económica global que começou em 2008, refiro-me a uma crise que, a manter-se, será
provavelmente, a longo termo, bastante mais destrutiva para o futuro das sociedades democráticas: a crise da
educação.
Tendo a crise económica como pano de fundo, Passos Coelho e Nuno Crato — que nesta matéria,
infelizmente, não estão sozinhos internacionalmente — colocaram o sistema público de educação na linha da
frente daquilo que é uma redução sem precedentes dos instrumentos públicos ao serviço das populações, e
que englobam, a par da educação, a cultura, a informação isenta e livre, a irradicação das discriminações no
que respeita ao bem-estar, às convicções e à dignidade dos cidadãos, e o respeito pelos Direitos Humanos.
Todos têm contribuído, no seu conjunto, para manter vivas as democracias.
Assistimos, no entanto, a alterações progressivas e consistentes dos princípios programáticos
estabelecidos constitucionalmente para a educação, nomeadamente quanto à igualdade de oportunidades
educativas, quer em Portugal quer nas comunidades portuguesas (no que respeita ao ensino do Português), e
assistimos, impotentes, ao empobrecimento sistemático do nosso sistema de ensino: o desaparecimento da
Formação Cívica, o desinvestimento na Educação Visual, o desinvestimento nas Artes e na Música, a
desvalorização da Educação Física, o fim da Área de Projeto, a redução da carga horária, até à irrelevância,
de disciplinas de opção, incluindo a Química e a Física.
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Estes são todos sinais muito preocupantes, entre outros, que revelam um conceito de educação redutor e
minimalista.
Já um sistema de educação baseado na avaliação em exames nacionais a partir dos nove anos de idade,
contrariando os movimentos internacionais, a autonomia e a capacidade das escolas em avaliar os seus
próprios alunos, revela um pensamento simplista e um desconhecimento da complexidade dos processos de
aprendizagem, para não referir o desrespeito pelos professores que os implementam.
Aplausos do PS.
Apesar das recomendações do Conselho Europeu e de todas as instituições internacionais de tratamento
de dados, incluindo a OCDE, a ciência, a cultura, as artes, e aquilo a que podemos chamar os aspetos
humanísticos das ciências sociais, têm vindo a perder terreno nas preocupações governamentais e são, no
entanto, cruciais para a educação dos cidadãos. São-no porque apelam ao pensamento crítico, ao desafío da
imaginação e à compreensão empática da diversidade das experiencias humanas, ajudando deste modo a
uma melhor compreensão do mundo complexo em que vivemos, um mundo global, em que todos dependem
uns dos outros.
Saber pensar bem, a partir de uma vasta gama de culturas e da história das suas interações, é crucial para
permitir às democracias lidar responsavelmente com os problemas que hoje enfrentamos.
Os problemas económicos, ambientais, sociais e políticos que precisamos de resolver e para os quais
precisamos de preparar as gerações futuras, são globais no seu âmbito e exigem uma cidadania reforçada,
informada, exigem competências para avaliar a evidência histórica, competências para pensar criticamente os
princípios económicos, competências para comparar visões diferentes de justiça social. Em suma, exigem
capacidade para avaliar as complexidades das sociedades no seu todo; exigem claramente mais do que uma
escola redutora, simplista, low cost.
Aplausos do PS.
Se esta tendência continua, o mundo passará a produzir gerações de trabalhadores passivos, dóceis,
tecnicamente treinados, em vez de cidadãos completos, a pensar por si só, com preparação para
compreenderem o significado das conquistas de uns e o sofrimento de outros.
A crise não pode, pois, servir de pretexto para diminuir o alcance da cidadania e reduzir os instrumentos
para uma educação humanística abrangente e eficaz. Alguns dos maiores investimentos em educação no
século XX aconteceram em países em crise, o que não acontece atualmente em Portugal: o Ministério da
Educação perdeu 2000 milhões de euros em dois anos, num quadro geral de delapidação do Estado social,
em que apenas o Ministério da Administração Interna aumentou o seu orçamento.
O atual sistema de educação é suportado por 3,5% do Orçamento do Estado (ao nível da Indonésia), face
aos 5% que já tivemos e que os países desenvolvidos ainda mantêm. Mas é suportado, em primeiro lugar, por
uma classe de professores cada vez menos especializada, porque é obrigada a ser polivalente em diferentes
áreas de conteúdos (polivalente até em funções sociais dentro do seu espaço educativo), uma classe de
professores cada vez mais envelhecida e obrigada a lecionar, em horário cada vez mais alargado, até aos 65
ou 66 anos de idade, turmas de 30 alunos, uma classe de professores disponível para se deslocar diariamente
várias dezenas de quilómetros, sem qualquer compensação extraordinária, e distribuir o seu trabalho por
várias escolas dos seus, cada vez maiores, giga-agrupamentos.
Uma classe profissional em que 77% dos professores são mulheres, às quais, para além dessas
obrigações, acrescem responsabilidades familiares ainda desiguais, numa sociedade onde as famílias
monoparentais aumentam e as redes de apoio públicas e familiares diminuem.
E tudo isto para o «sistema funcionar melhor», segundo o Ministro da Educação, para quem «é possível
cortar e o sistema funcionar melhor», para quem «o sucesso da educação não depende de dinheiro, depende
do empenho dos professores e alunos», para quem «pôr dinheiro em cima dos problemas não resolve nada».
Está enganado, Sr. Ministro, investir na educação, na última década, colocou Portugal na média de todos
os indicadores internacionais em educação,…
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Aplausos do PS.
… e até acima da média, em alguns casos, tendo sido um enorme esforço de todos os Governos depois do
25 de Abril — mesmo do PSD, quando era social-democrata —,…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Já nem do PS!
A Sr.ª Gabriela Canavilhas (PS): — … especialmente se tivermos em conta que, no ponto de partida, em
abril de 1974, (quando havia os saudosos e agora recuperados exames da 4.ª classe), os índices de
analfabetismo e iliteracia estavam ao nível da Albânia.
Este autismo, face às evidências e às recomendações dos órgãos consultivos, como o Conselho Nacional
de Educação (CNE) ou instituições internacionais como a OCDE, leva o Ministro da Educação a ignorar as
excelentes classificações de Portugal, nomeadamente no PIRLS (Progress in International Reading Literacy
Study) e no TIMSS (Trends in International Mathematics and Science Study), para não falar do PISA
(Programme for International Student Assessment), indicadores internacionais que aferem a qualidade do
sistema educativo em 2011, e, apesar disso, a alterar o Programa e Metas de Matemática, que estavam em
vigor há apenas um ano, contra a veemente posição da Associação de Professores de Matemática (APM).
Esta semana soubemos — surpresa! — que o extinto Programa de Matemática, afinal, foi o responsável pelos
primeiros resultados positivos, de sempre, em Matemática, nos exames do 4.º ano.
Aplausos do PS.
A demografia está, de facto, a tornar-se um problema muito sério para Portugal, com a diminuição anual
dos nascimentos, mas este problema só chegará ao secundário na próxima década. Até lá, serve de
argumento para justificar o maior despedimento em massa, que se viu até hoje em Portugal.
Dispensam-se milhares de professores do sistema, graças a um elaborado processo que envolve o
aumento do número de alunos por turma, alterações curriculares, a interrupção de processos de formação de
adultos, a extinção de apoios educativos e ainda reduções de carga letiva para ações complementares ao
processo educativo.
Tudo isto, sem que haja avaliação de desempenho dos professores: saem do sistema os professores
excelentes, os bons e os menos bons, saem aos milhares, sem que o Ministério possua, sequer, um
mecanismo eficaz de avaliação da qualidade dos recursos humanos que está a empurrar, literalmente, pela
borda fora.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O sistema de educação de Passos Coelho e Nuno Crato integra-se num
modelo global de desenvolvimento para Portugal, assente num sistema produtivo de baixas e médias
qualificações académicas, com baixos salários, que compete com países com economias ainda mais frágeis
do que a nossa ou com políticas sociais inferiores às nossas. Assenta numa escola pobre, reduzida, na sua
essência, às competências mais básicas, destinada a uma população sem ambição, sem cultura, sem
desígnio, a não ser emigrar ou reforçar as estatísticas de pobreza e desemprego que nos envergonham a
cada dia.
Efetivamente, 40% dos alunos que fazem esta semana exame de 12.º ano afirmam que não vão para o
ensino superior, não acreditam no seu ensino superior, porque não acreditam nas oportunidades de emprego.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Não acreditam porque não têm hipóteses!
A Sr.ª Gabriela Canavilhas (PS): — Por isso é que a crise na educação é a pior das crises, é aquela que
compromete o futuro das próximas gerações, é aquela que, a longo termo, afeta diretamente o coração da
democracia e os seus fundamentos, o primeiro dos quais é a igualdade de oportunidades para todos no
caminho do progresso individual e coletivo.
Por isso é que a luta pela escola pública de qualidade para todos e em nome do progresso deve ser
travada por todos quantos consideram a educação, a cultura, a ciência, o conhecimento e o saber os melhores
instrumentos para enfrentarmos as crises deste mundo em que vivemos.
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Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Também ao abrigo do n.º 2 artigo 76.º do Regimento, tem a palavra o
Sr. Deputado Pedro Delgado Alves.
O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Há cerca de 200 anos, a
Europa vibrava com a luta dos gregos pela independência e pela libertação. O quadro em que se discutia a
aspiração a um renascer das liberdades antigas num Estado moderno é, hoje, oportunidade para voltarmos a
revisitar o tema das liberdades fundamentais.
Hoje, a Europa volta a olhar com ansiedade e a suspirar novamente pela liberdade dos gregos, ciente de
que vê nas suas amarras de austeridade os seus próprios grilhões, atuais ou futuros.
Há quase 200 anos, europeus de vários pontos do Continente colocavam a sua pena e a sua arte ao
serviço da causa dos gregos, juntando a sua sorte à dos libertadores. As palavras de Lord Byron, que também
nos visitou pela mesma altura, ecoam novamente e têm novamente atualidade: «As montanhas olham para
Maratona/E Maratona olha para o mar/E detendo-me por ali durante algum tempo/Sonhei que a Grécia ainda
viria a ser livre».
É certo que hoje o desafio é diferente, é certo que as conquistas que se procuram defender são outras e é
certo que os instrumentos para o alcançar já não são os mesmos e já não têm de ser violentos. Ainda assim, a
importância do momento não é menos relevante.
Senão olhemos para o sucedido, na semana passada, no dia 11 de junho: sem debate público prévio, sem
concertação no seio da coligação governamental, sem qualquer consideração pela vida de 2700 trabalhadores
e dos seus postos de trabalho do serviço público de rádio e televisão, o Governo grego anunciou, a meio da
tarde do dia 11, uma decisão administrativa (entretanto, declarada ilegal), ditando o fim da estação televisiva e
de rádio pública e o fim imediato das transmissões. Pela meia-noite, o sinal seria cortado e o apagão do
serviço público de comunicação social, na Grécia, tinha ocorrido e não havia transmissão.
Sujeitos, há três anos, à mais dura das austeridades, austeridade já publicamente reconhecida, aliás, pelo
FMI como assente em premissas erradas e como tendo um efeito devastador na economia da Grécia, hoje os
gregos enfrentam o flagelo dos seus serviços públicos, sentem diariamente os efeitos dramáticos do
desemprego, da fome e da quebra dos seus índices de desenvolvimento, e são ainda flagelados pelo
crescimento quotidiano e perigosos de extremismos xenófobos, ressuscitando o que de pior a história europeia
foi capaz de legar ao mundo no século XX.
E nesse contexto, uma imprensa livre, um serviço público de qualidade, garantido pela Constituição, pela
lei, é um remédio fundamental e indispensável a uma sociedade democrática e livre.
Aplausos do PS.
Face a este quadro terrível, face a todo o sofrimento a que o povo grego tem sido submetido, algumas
vozes (poucas, é certo, mas algumas) se questionam sobre a razão da indignação e do repúdio universal
desta medida. Ora, a razão da indignação é muito clara: um ataque desta natureza representa um ataque claro
ao coração da democracia, ao pluralismo e às liberdades essenciais e à sua realização plena.
Aplausos do PS.
Não é à toa que a União Europeia de Radiodifusão fala em censura estatal: o corte de um sinal televisivo
representa simbolicamente o que de mais destrutivo podemos conceber na relação do poder político com uma
sociedade livre, democrática e aberta.
Não é à toa que se multiplicaram reações de solidariedade de todos os quadrantes, geográficos, políticos e
institucionais, na Grécia e fora dela, e que, através de disponibilização de sinal da União Europeia de
Radiodifusão os trabalhadores continuaram a poder transmitir o que iam produzindo, mantendo acesa a luz e
mantendo o espírito de esperança na restauração do serviço público de televisão.
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Não é também à toa que múltiplos operadores de rádio e de televisão, na Europa, incluindo a RTP,
sublinharam o carácter inaceitável de uma supressão de um elemento da liberdade de imprensa, a título
meramente preventivo e transitório, como se de uma mera reorganização de uma repartição ou de um balcão
de atendimento ao público se tratasse.
Anatemizando todo o serviço público de uma penada, o Governo grego disparou primeiro, fechando o sinal
de um canal televisivo, calando as vozes da informação, da cultura, da diversidade, e perguntou depois,
anunciando intenções de começar do zero, com uma nova empresa pública de televisão e rádio, com outra
dimensão, assente em premissas que ninguém conhece.
E o que nos interessa a nós, perguntarão, Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados, no Parlamento português,
uma análise do sucedido na Grécia? É que, se queremos integração política à escala europeia, se queremos
partilhar valores, temos de partilhar preocupações e temos de antecipar dificuldades.
Interessa-nos diretamente a necessidade de repudiar uma solução inaceitável em democracia, interessa-
nos dizer com clareza que assim não, que há valores que se sobrepõem, em todos os pontos da União
Europeia, a considerações aparentemente assentes apenas na austeridade e apenas na redução de custos.
O que está em causa, no continente europeu, no berço da democracia, é, sem exagero, um verdadeiro
recuo civilizacional. O que sucedeu em Atenas na passada semana, pelo seu simbolismo de um sinal cortado,
de uma palavra assassinada, de um espaço de liberdade eliminado, de uma penada, pelo lápis burocrático de
um decisor desinspirado, não pode senão merecer uma voz de recusa de todos os democratas em toda a
Europa.
Aplausos do PS.
Não podemos deixar de reagir, não só com a nossa solidariedade, mas fundamentalmente através de uma
reafirmação dos fins do serviço público e das exigências constitucionais que o exigem e que asseguram que a
nossa democracia mantêm a sua qualidade e o seu vigor.
Num quadro em que se repete, vezes sem conta, que não há alternativas à austeridade, que o rumo
europeu em execução é único e que fora dele só pode haver desastre, suprimir um espaço de debate, de
diálogo, de pluralismo e de confronto de ideias é contribuir para fragilizar ainda mais a democracia no seu
momento de maior fragilidade, no momento em que os cidadãos menos nela acreditam e mais dela
dependem.
Precisamente por isto, precisamente porque enfrentamos problemas comuns, precisamente porque somos
pressionados para cortes cegos, precisamente porque também somos impelidos para os mesmos erros, é
importante que reflitamos preventivamente e façamos ouvir as nossas vozes.
Recordemos, então, o que significa o serviço público. Significa rigor, isenção, pluralismo e independência
na informação, num mundo cada vez menos transparente na área da comunicação social e com cada vez
mais fenómenos de concentração de propriedade.
Significa mecanismos adicionais de garantia da independência, através de acompanhamento parlamentar
da execução do serviço público e de respeito pela sua missão.
Significa garantia da livre expressão e confronto de correntes de opinião, a seiva vital de uma democracia
séria.
Significa diversidade e pluralismo na programação, enriquecendo o que as lógicas de mercado nem
sempre permitem florescer, e atendendo às necessidades de todos.
Significa um espaço de realização de direitos civis e políticos, nas suas mais variadas formas de
expressão.
Recordemos ainda também que é através do serviço público que se garante a diversidade cultural, que se
conseguem realizar fins de apoio à produção nacional e de proteção da língua e da cultura, desenvolvendo
programas recreativos, culturais e educativos fundamentais para a realização plena desta missão.
Para quem não esteve atento, ouvir aquele que na semana passada se anunciou como o último concerto
da Orquestra da ERT (rádio e televisão da Grécia) e ver as lágrimas de quem fazia ecoar aqueles que
achavam ser os seus acordes finais tem de funcionar como aviso. A matemática perfeita da harmonia musical,
para já, é uma matemática muito superior à matemática da austeridade estéril e estúpida que mata e que
impede o florescimento do pensamento.
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Aplausos do PS.
Hoje, ensaia-se um recuo e o Primeiro-Ministro grego fala numa alternativa transitória e de uma suspensão
provisória. Ainda assim, continua por cumprir a decisão do Supremo Tribunal Administrativo da Grécia, que
declarou ilegal a decisão de encerramento nos termos em que ela teve lugar. Por isso, a atenção continua a
ser necessária, porque hoje, enquanto aqui falamos, enquanto aqui debatemos, o sinal continua a estar
cortado e a televisão da Grécia continua a não transmitir.
Para além da luta já em curso em torno do serviço público, este desfecho demonstra que o que está em
causa é também a luta pelo Estado de direito, que, mais uma vez, reagiu e, através dos seus órgãos
jurisdicionais, travou a loucura que vai tomando conta da nossa Europa e destruindo o modelo social e cultural
europeu.
A luta pelo cumprimento de um modelo de comunicação social em que a função reguladora do serviço
público é tão importante quanto a função de prestação de produtos culturais e de realização de fins culturais
por esse mesmo serviço público.
Regresso onde comecei, desta vez com as palavras de um poeta grego da atualidade, Níkos Kazantzákis,
em que claramente traduzia o sentimento que vai na alma de muitos gregos: «Não espero nada. Não temo
nada. Sou livre.»
Os gregos e os europeus que se manifestam contra a austeridade sem sentido já não esperam, muitas
vezes, nada dos seus decisores políticos, já nada temem porque tudo perderam. São livres. E lutam pela sua
liberdade de expressão, lutam pela sua liberdade de imprensa, lutam pela sua liberdade de opinião. E nós cá
estaremos, lutando com eles!
Aplausos do PS e do CDS-PP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Srs. Deputados, vamos entrar no segundo ponto da ordem de
trabalhos, que consiste na apreciação do Relatório de Segurança Interna 2011 e 2012, cuja apresentação será
feita pelo Sr. Ministro da Administração Interna.
Aproveito para saudar os Srs. Membros do Governo, que entretanto se juntaram a nós, e dou de imediato a
palavra ao Sr. Ministro da Administração Interna para uma intervenção.
O Sr. Ministro da Administração Interna (Miguel Macedo): — Sr. Presidente, também queria apresentar à
Mesa e aos Srs. Deputados os nossos cumprimentos.
A intervenção, necessariamente curta, que aqui vou fazer sublinha duas vertentes essenciais do Relatório
Anual de Segurança Interna relativo ao ano de 2012, destacando os pontos essenciais no que diz respeito à
criminalidade geral e à criminalidade violenta e grave.
Quanto à criminalidade geral, durante o ano de 2012 foram registadas 395 827 participações criminais, o
que representa um decréscimo de 2,3% em relação ao relatório de 2011. Durante o ano de 2012, registaram-
se, nos termos desta estatística, menos 9461 participações do que em 2011.
Confirma-se assim, quanto à criminalidade geral, uma tendência de diminuição, que se verifica, aliás,
desde o ano de 2008, sendo que o valor de 2012 é o segundo mais baixo da década.
O crime de furto continua a assumir particular destaque, a par dos acréscimos verificados nos crimes de
condução com taxa de álcool igual ou superior a 1,2 g/l e do crime de incêndio, fogo posto em floresta.
Neste particular, quero recordar que o Governo apresentou já a esta Assembleia uma proposta de lei de
alteração ao Código da Estrada, visando reforçar a segurança rodoviária, tendo em conta que mais de 10% da
criminalidade está relacionada com crimes rodoviários e infrações estradais.
No crime de incêndio, regista-se um aumento de 46% das participações, mais 2987 participações do que
em 2011, com o consequente aumento do número de suspeitos identificados: 1052 em 2012, contra 430 em
2011, o que significa um aumento de 244%. Houve ainda um aumento de detenções das forças de segurança
em 63%, neste tipo de crimes, e um aumento de 71,3% de detenções com origem na Polícia Judiciária.
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Do ponto de vista do território, o distrito de Lisboa representa um quarto da criminalidade registada. Os
distritos de Lisboa, Porto e Setúbal representam 50% da criminalidade geral e os distritos de Lisboa, Porto,
Setúbal, Faro, Braga e Aveiro representam, no seu conjunto, praticamente 70% dessa mesma criminalidade.
É importante ter presente que nos seis distritos com maior peso relativo, todos eles — todos, sem exceção
— apresentaram decréscimos da criminalidade em 2012: 6,7% a menos em Braga, 4,4% a menos em Faro,
3,9% a menos em Lisboa, 2% a menos no Porto e 1,3% a menos em Setúbal.
Quanto à criminalidade violenta e grave, registaram-se 22 270 casos participados, assinalando-se um
decréscimo de 7,8% da criminalidade grave em relação a 2011, o que significa menos 1884 casos
participados. Ou seja, 2012, também no que diz respeito à criminalidade violenta e grave, é o segundo ano da
última década com menores valores registados (só foi superado no ano de 2007), o que é resultado, sem
dúvida, da diminuição de 12% nos roubos nas vias públicas e de 10,7% de roubos por esticão.
Estes valores são o resultado, sem dúvida, do especial empenhamento, em proximidade e visibilidade, das
forças de segurança.
Quanto ao território, continua a registar-se uma forte concentração da criminalidade violenta e grave nas
áreas metropolitanas, representando distritos como Lisboa, Porto e Setúbal mais de 70% das participações
globais. Ainda assim, e tal como sucedeu quanto à criminalidade geral, estes mesmos distritos registam uma
diminuição das participações. Em Lisboa, por exemplo, menos 12,5% e em Setúbal menos 15,8%.
Sr.as
e Srs. Deputados, estes são, a par de muitos outros, dados e linhas gerais do Relatório Anual de
Segurança Interna que VV. Ex.as
têm à vossa frente. Demonstram uma tendência de diminuição clara da
criminalidade geral e da criminalidade violenta e grave, colocando o ano de 2012 como o segundo melhor ano
da última década. Revelam os bons resultados obtidos, sobretudo, fruto do trabalho, do empenhamento e da
competência das forças de segurança.
Aplausos do PSD.
E confirmam, Sr.as
e Srs. Deputados, que este caminho que temos prosseguido ao longo dos últimos anos,
como País, é um caminho que deve ser mantido.
Tenho afirmado que é uma vantagem estratégica para o País que, no essencial, Portugal seja conhecido e
reconhecido como um destino seguro. E tenho o convencimento de que com o trabalho de mulheres e homens
das forças de segurança assim vamos continuar a ser.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís
Fazenda.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Administração Interna, os relatórios de
segurança interna, de ano a ano, têm vindo a ganhar uma clareza expositiva muito grande e, nessa matéria,
todos temos vindo a ganhar.
Em todo o caso, no estudo que fiz do Relatório de Segurança Interna de 2012, foi com alguma admiração
que li, na página 147, o seguinte: «Em 2012, ao nível da contraespionagem, prosseguiu-se o trabalho de
deteção e acompanhamento das atividades de serviços de informações estrangeiros no nosso país, tendo sido
possível, nalguns casos, evitar o prosseguimento de operações hostis com elevado potencial lesivo para a
segurança e interesses nacionais».
Fiquei atónito, porque, de duas, uma: ou a situação é fortuita e, portanto, seria impublicável, ou a situação é
grave e exige-se mais informação do que esta que é dada a estampa neste documento oficial — que serviços
de informações estrangeiros? Que tipo de operações hostis? Que elevado grau lesivo da segurança nacional?
O que é que isto oculta? Na verdade, precisamos de perceber em que matéria se circunscreve a segurança
interna e qual é a política do Estado acerca disso.
Portanto, de duas, uma: esta frase ou resulta do excesso de zelo de um burocrata ou é politicamente
indefensável.
Gostaria de ouvir uma resposta do Sr. Ministro.
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Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Administração
Interna.
O Sr. Ministro da Administração Interna: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Fazenda, como não sou
burocrata, diria, politicamente, que o Relatório Anual de Segurança Interna de 2012 passava bem sem esta
frase. Não vou explicitar, evidentemente, matérias como aquelas que o Sr. Deputado referiu, nem o Sr.
Deputado o espera, em bom rigor — eu sei disso.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Ficava para a história!
O Sr. Ministro da Administração Interna: — Em todo o caso, queria dizer-lhe que — não é pelo facto de
estar no Relatório, ou não — preocupante, preocupante seria se não tivéssemos algumas cautelas em
matérias como esta. E mais não digo.
Se o Sr. Deputado me pede a opinião — como sabe, o Relatório não tem origem, não é redigido no
Ministério da Administração Interna, muito embora, evidentemente, as forças e os serviços de segurança
tenham colaborado intensamente na elaboração do mesmo —, devo dizer que partilho da opinião do Sr.
Deputado. Era dispensável esta frase, sobretudo porque, como é compreensível, não se pode ir além daquilo
que está no Relatório e o que lá está tanto faz estar como não estar. Mais valia não estar.
Portanto, sobre essa matéria, a única coisa que posso dizer é que, sim, registaram-se situações dessa
natureza; sim, registaram-se situações dessas que foram acompanhadas de situações similares noutros
países. Foram situações sub-reptícias, não feitas de forma direta. E queria sublinhar, ainda, que os serviços de
informação, no âmbito da missão legal que lhes está cometida, estão atentos a essas matérias.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Hugo Lopes
Soares.
O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Apreciar
hoje o Relatório Anual de Segurança Interna é uma das poucas oportunidades que esta Câmara teve, na
presente sessão legislativa, para discutir as questões ligadas à administração interna. E aproveitá-la para
saudar o trabalho das mulheres e dos homens das forças de segurança deste País nunca é uma oportunidade
desperdiçada, pelo que gostaria de, neste momento, em nome do Grupo Parlamentar do Partido Social
Democrata, saudar o esforço, o empenho, a competência e o mérito das forças de segurança deste País.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Numa altura em que atravessamos uma grave crise económica e financeira, a manutenção da paz social
tem sido uma característica deste País. Tal em muito se deve à atuação do Ministério dirigido por V. Ex.ª, mas
deve-se, sobretudo, Sr. Ministro, se me permite, à atuação das forças de segurança, que não podemos deixar
de saudar.
Como V. Ex.ª já teve oportunidade de dizer, um clima de estabilidade e paz social, um clima de um País
seguro — não o clima do «país do Dr. António José Seguro — é absolutamente fundamental para que o
turismo possa prosperar, para que possa haver captação de investimento estrangeiro, para que Portugal
tenha, nos índices na Europa e em todo o mundo, um lugar de reputação no que diz respeito aos índices de
criminalidade.
Referindo-me concretamente ao Relatório Anual de Segurança Interna, Sr. Ministro, gostaria de destacar a
redução dos números da criminalidade geral e, sobretudo, a redução dos números da criminalidade violenta —
a criminalidade violenta desceu quase 8%, de 2011 para 2012, facto que não podíamos deixar de registar.
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Há um conjunto de crimes que vale a pena trazer à colação. Por exemplo, o crime de roubo por esticão e o
crime de roubo na via pública são crimes de alarme social, pela constatação dos cidadãos que, lá fora,
assistem à prática desses crimes. E a diminuição destes crimes tem muito a ver com uma aposta deste
Governo no policiamento de proximidade, no facto de as forças policiais, de forma próxima, patrulharem as
ruas do nosso País.
A este respeito, gostaria de destacar a diminuição do crime em ambiente escolar, que é algo que me apraz
registar aqui.
No entanto, há números que nos devem preocupar. É o caso do aumento da criminalidade no interior do
País, que deve merecer por parte desse Ministério uma atenção redobrada, e de outros crimes que são sinais
dos tempos, mas que são também sinais de preocupação, até porque interferem diretamente com a própria
economia. Por exemplo, o aumento do roubo de cobre é um crime que deve merecer a nossa atenção, porque
tem implicação direta na questão dos transportes, dos serviços de energia e dos serviços de comunicação.
Nesta intervenção, gostaria de destacar sobretudo o facto de a criminalidade ter descido, por força — como
já referi — da atuação de proximidade das forças de segurança. Mas, numa altura em que vamos entrar na
época mais difícil para os fogos florestais, o Sr. Ministro teve oportunidade de, na intervenção inicial que fez,
trazer à colação os números do aumento das participações, da identificação e até da criminalização de
suspeitos, de arguidos e de infratores que, durante o último ano, foram responsáveis por fogos postos. Parece-
me, pois, importante, colocar aqui o foco desta intervenção, uma vez que estamos a iniciar a época mais
perigosa do ponto de vista dos incêndios florestais, embora pareça que o verão ainda vem longe, face ao
tempo que se faz sentir lá fora.
Sr. Ministro, é muito importante a questão da prevenção, mas é sobretudo muito importante que aqueles
que, por uma ou outra razão, continuam a colocar em causa as nossas florestas saibam que, por parte da
administração interna, por parte das nossas forças e segurança, há uma atuação determinada e rigorosa na
investigação, no inquérito e, depois, também no julgamento deste tipo de atuações. Temos de ter,
evidentemente, a montante, todo o trabalho feito (e sabemos que, no âmbito da proteção civil, esse trabalho é
feito), mas, a jusante, não pode deixar de haver a devida investigação e criminalização.
No mais, gostaria de dizer que o Relatório Anual de Segurança Interna (RASI) nunca tem números
positivos, porque trata-se sempre de criminalidade, mas este é um Relatório, como já disse, que nos coloca no
melhor patamar da última década. Portanto, queria repetir a saudação inicial, saudando V. Ex.ª e o Ministério
da Administração Interna, mas sobretudo as forças de segurança deste País, que vão permitindo que este
ainda seja, para bem de todos, um País seguro.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Filipe Neto
Brandão.
O Sr. Filipe Neto Brandão (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, Sr.as
e Srs.
Deputados: Discutimos hoje o RASI — o Relatório Anual de Segurança Interna 2012 e, por contingências de
agendamento, também, a latere, o de 2011. Obviamente, não compete a este Parlamento fazer arqueologia e,
portanto, compreender-se-á que as referências sejam feitas ao Relatório relativo a 2012.
Começo por registar as palavras do Sr. Ministro e dizer que, como muito bem sabem, o PS sempre teve,
nesta matéria, a posição institucional que se impõe de enfatizar que Portugal foi, é, e esperemos que continue
a ser, um País seguro e, portanto, apraz-nos registar que o RASI expresse essa segurança,
Quando discutimos estas matérias, não podemos deixar de ter presente que cada crime, cada acidente
rodoviário, cada incêndio florestal, cada sinistro é, em si, um drama pessoal que afetou alguém e o sofrimento
desse alguém não pode deixar de estar presente nas nossas reflexões. Mas é respeitando esse drama
pessoal que podemos, analisando o agregado, congratular-nos com o resultado final da diminuição da
criminalidade geral e da criminalidade violenta e grave.
Porém, uma análise mais pormenorizada do RASI não deve deixar de suscitar algumas reflexões. A
primeira é a de que temos assistido a um contínuo desinvestimento nas forças de segurança e na segurança
interna.
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Recordo que o RASI de 2011 refere, na página 5, que há um decréscimo de 97% relativamente ao RASI de
2010, no que diz respeito à aquisição de viaturas, por exemplo, sendo certo que, no RASI de 2010, haviam
sido adquiridos 635 novos veículos, dos quais 136 através dos governos civis, e, em 2011, apenas 9.
Uma das perguntas que faço, Sr. Ministro, é esta: qual foi a poupança que se traduziu num reforço de
investimento nas forças de segurança através da extinção dos governos civis? Era expetável que essa
poupança se traduzisse num reforço de investimento, o que manifestamente não está traduzido no RASI. Do
mesmo modo que o RASI de 2012 refere que há um decréscimo de 78% de investimento na aquisição de
equipamentos.
Portanto, é inegável que, a continuar esta via, atingiremos uma situação preocupante, pelo que esperamos
que o Sr. Ministro possa sossegar-nos relativamente a isto.
Uma outra matéria que não pode deixar de ser salientada — e que é, aliás, muito cara ao CDS — é a
notória diminuição do número de efetivos policiais. Ao longo dos anos, assistimos a constantes apelos do CDS
à necessidade de aumentar o número efetivo de policiais e a verdade, Sr. Ministro, é clara e transparente: em
2012, saíram do serviço ativo 1753 elementos, 1303 da GNR e 440 da PSP, o que quer dizer que o saldo é
negativo.
O Sr. Ministro refere, e bem, que não é possível aumentar o número de efetivos todos os anos. Mas há
uma questão: com as críticas do CDS — veementes, diga-se —, a anterior Legislatura saldou-se positiva, ou
seja, a Legislatura acabou com um número de efetivos policiais superior ao número inicial. O que lhe pergunto,
Sr. Ministro, é se está em condições de garantir a este Parlamento que — obviamente, este ano já verificámos
que o saldo é negativo —, no final desta Legislatura, haverá um número de efetivos policiais superior àquele
que V. Ex.ª encontrou.
Relativamente à diminuição da criminalidade violenta e grave, é necessário fazermos a chamada «análise
de malha fina». Ou seja, é verdade que há uma diminuição da criminalidade violenta e grave. Porém, diz-nos o
Relatório de 2011 — V. Ex.ª não o esqueceu, seguramente — que, «apesar do decréscimo da criminalidade
violenta e grave, esta é mais violenta e mais grave.»
Em 2012 — o Relatório que hoje temos em apreço —, se é verdade que, como V. Ex.ª referiu, a redução do
número de roubos por esticão é de molde a baixar significativamente o número de crimes praticados de modo
violento e grave, também é verdade que os crimes mais graves e mais violentos, dentro da criminalidade
violenta e grave, aumentaram. Ou seja, o homicídio aumentou, o roubo a instituições de crédito e ourivesarias
aumentaram e, portanto, obviamente, Sr. Ministro, não podemos deixar de atentar a estes números, que valem
o que valem. Do mesmo modo, embora o crime de violência doméstica tenha diminuído, não pode deixar de
ser cotejado com o aumento muito significativo dos homicídios conjugais.
Portanto, há necessidade de dar continuidade a um trabalho, que foi iniciado na anterior Legislatura, de
sensibilização para a necessidade de combater também esses crimes.
Sr. Ministro, constatando que o meu tempo de intervenção já foi ultrapassado e antecipando o aviso que o
Sr. Presidente me iria fazer, termino como comecei, saudando os números traduzidos no RASI e, portanto, a
mensagem de diminuição da criminalidade que ele encerra, bem como saudando todos os que o fizeram
possível, ou seja, a pró-atividade de todos aqueles que dão o melhor da sua vida para o combate ao crime.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: As
nossas primeiras palavras na apreciação do Relatório Anual de Segurança Interna relativas ao ano transato
são para os profissionais das forças e serviços de segurança e são palavras de apreço.
Num quadro social muito difícil, os profissionais das forças e serviços de segurança, apesar de duramente
agredidos pelo Governo nos seus direitos, com os ataques que têm sido desferidos de forma indiscriminada
contra os funcionários públicos, têm dado o melhor do seu esforço para combater a criminalidade e garantir a
segurança e a tranquilidade dos cidadãos.
Vozes do PCP: — Muito bem!
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O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Ministro, não deixa, aliás, de ser curioso ouvi-lo hoje valorizar o papel
das forças e serviços de segurança, apesar de todos os ataques que contra os profissionais dessas mesmas
forças de segurança o Governo tem levado a cabo.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!
O Sr. João Oliveira (PCP): — No Alentejo, chama-se a isso, Sr. Ministro, «cumprimentar o patrão com o
chapéu dos outros». E, infelizmente, temos pena que o Sr. Ministro tenha assumido esse papel.
O trabalho dos profissionais das forças e dos serviços de segurança é mais um exemplo para desmentir as
falsas teses dos fundamentalistas dos cortes na despesa e dos ataques à função pública.
Ao contrário do que o Governo e os seus arautos procuram fazer crer, os funcionários públicos não
trabalham para si próprios nem são gorduras do Estado; trabalham para servir a comunidade e garantem o
funcionamento das funções vitais de uma sociedade organizada. Não merecem ser tratados como se fossem
delinquentes.
Vem isto a propósito de uma questão que consideramos muito relevante em matéria de segurança interna
e que é completamente omitida no presente Relatório. Refiro-me à despudorada instrumentação dos
processos disciplinares para impedir e reprimir o exercício de direitos associativos e sindicais dos profissionais
das forças e dos serviços de segurança.
Em vez de reconhecer o relevante papel desempenhado pelas associações sindicais e socioprofissionais
das forças e dos serviços de segurança e de respeitar os seus direitos, tal como estão consagrados na lei, o
Governo trata os seus dirigentes como se fossem delinquentes. Quando vemos que impedem largas dezenas
de processos disciplinares sobre os dirigentes associativos e sindicais das forças e dos serviços de segurança,
que não têm como motivações quaisquer infrações cometidas no exercício das suas funções policiais, mas
apenas factos praticados na sua qualidade de dirigentes associativos e sindicais, percebemos que estamos
perante um Governo que convive muito mal com o exercício de direitos democráticos.
O exemplo que as forças e os serviços de segurança devem dar de respeito pela legalidade democrática
deve começar pelo seu interior e o Governo tem aí uma responsabilidade indeclinável.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as
e Srs. Deputados: Os dados constantes do Relatório Anual
de Segurança Interna apontam para uma estabilização em alta da criminalidade participada com o registo de
395 000 ocorrências, em alguns casos, com decréscimo de ocorrências participadas e, noutros casos, com
acréscimos que chamam a atenção para mutações nos fenómenos criminais e para novos tipos de ilícitos de
que são exemplo o roubo de metais não preciosos ou os incêndios florestais com origem criminosa.
No pouco tempo disponível de que disponho, de entre as muitas questões que mereceriam referência, há
dois pontos que não podemos deixar de referir porque justificam a nossa preocupação e não devem ser
minimizados.
Em primeiro lugar, a evolução do número de efetivos das forças e dos serviços de segurança. Para já não
referir a situação calamitosa em matéria de efetivos do SEF, verificamos que, em 2012, entraram 549 novos
elementos da GNR dos 800 que haviam sido prometidos, mas saíram 1313. Houve, pois, um saldo negativo de
764 elementos, maior do que o número de entradas.
Da PSP saíram 440 elementos e não entrou nenhum dos 330 efetivos que haviam sido prometidos.
O Sr. Ministro da Administração Interna: — Não é verdade!
O Sr. João Oliveira (PCP): — Quanto a oficiais, foram incorporados 52 na GNR e 43 na PSP. Ou seja, no
conjunto das maiores forças de segurança — PSP e GNR —, o saldo negativo foi de 1100 elementos e
importa registar que não há uma linha no Relatório sobre o nível etário do efetivo, que, como se sabe, é
elevado, assim como não há uma linha sobre um dos objetivos estratégicos para 2012, que era o de libertar
profissionais de polícia que se encontram em tarefas administrativas, judiciais e burocráticas para as suas
missões próprias, substituindo-os por funcionários não policiais contratados para esse efeito.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
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O Sr. João Oliveira (PCP): — Quanto a isso nem uma palavra, já que a palavra de ordem no Governo é
cortar e despedir, custe o que custar e custe a quem custar!
Em segundo lugar, refiro o problema das instalações e equipamentos. Uma novidade de 2012 foi o
Governo ter abandonando a lei de programação de instalações e equipamentos das forças de segurança,
tendo o cumprimento desta lei ficado sempre muitíssimo aquém das suas previsões.
Tendo sido aprovada com o objetivo de colmatar um défice de investimento nas forças de segurança que
vem de longe, e que se reflete na insuficiência e degradação das instalações e equipamentos, a lei previa um
investimento de 400 milhões de euros entre 2008 e 2012.
Para 2012, a lei previa um investimento de 89 milhões de euros. O Orçamento do Estado já só previa 49,29
milhões e a execução total foi de 56%, no montante de 20,16 milhões de euros. E que desculpas inventou o
Governo para isso? A lei dos compromissos e o próprio despacho do Ministro Vítor Gaspar que determinou
que, a partir de 12 de dezembro, quaisquer despesas teriam de ser autorizadas previamente pelo Ministro de
Estado e das Finanças, o que inviabilizou o lançamento de aquisição de serviços em empreitadas cuja
execução financeira foi planeada para o final do ano. Ou seja, a justificação do Governo para não cumprir a lei
baseia-se nas suas próprias decisões.
Agora a receita mágica são as autarquias. O Governo não tenciona investir em instalações das forças e
serviços de segurança, mas espera que sejam as autarquias a fazê-lo, ou seja, as autarquias, que são
constantemente acusadas de serem despesistas, que o Governo pretende sujeitar a um garrote financeiro por
via das Lei das Finanças Locais e cuja autonomia financeira pretende liquidar de forma autoritária, surgem,
afinal, como entidades financiadoras do Ministério da Administração Interna a fundo perdido, tomando a seu
cargo, através de parcerias, a reabilitação das instalações das forças e dos serviços de segurança.
Nas relações do Governo com as autarquias falta dinheiro mas sobra descaramento!
Em síntese, e para concluir, o RASI de 2012 não nos descansa quanto à evolução da situação nacional em
matéria de segurança interna e muito menos nos descansa a perspetiva de futuro que o Governo aponta para
os serviços e forças de segurança quanto às condições de que irão dispor para cumprir as suas missões.
Da parte do PCP, continuaremos, com firmeza, a defender os direitos dos profissionais dos serviços e
forças de segurança como elementos imprescindíveis de uma política de segurança interna que tenha, ela
própria, os direitos dos cidadãos no centro das suas preocupações.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as
e Srs. Deputados: É curioso
que este Relatório de Segurança Interna lamenta-se, ele próprio, de não ter dados atualizados dos índices de
criminalidade no quadro europeu desde 2009, o que, aliás, vem repetindo de relatório para relatório. Esta é a
primeira constatação e a estranheza desse facto.
Enfim, a pouco e pouco, um conjunto de instrumentos de cooperação no âmbito europeu vão sendo criados
e desenvolvidos, mas vai faltando a informação sobre o que se passa em cada Estado-membro, o que é
insólito.
Quero tomar por boas as indicações de 2009, ou seja, um pouco à contracorrente dos mitos que foram
criados em toda a Europa os países do sul, nomeadamente Portugal, a Grécia, em geral todos os países do
sul da Europa, têm índices de criminalidade muitíssimo mais baixos do que os dos países do norte da Europa,
e alguns países tidos como uns certos santuários são, na verdade, aqueles que têm índices de criminalidade
mais violentos.
Portanto, não sei nem quero daqui inferir nenhuma relação entre os países que estão intervencionados e o
seu grau de criminalidade, mas a verdade é que temos pela nossa frente uma situação em que os países onde
há menor criminalidade, onde há maior segurança, onde há condições de sociabilidade e de civilidade maiores
são exatamente estes países, pelo que se demonstra dos indicadores. A não ser que de 2009 para cá as
coisas se tenham alterado sensivelmente, o que não creio, dado que a crise, ela própria, é global,
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independentemente dos seus níveis de incidência nas várias economias e nas várias situações sociais dos
Estados-membros.
Portanto, gostaria que neste debate se chamasse isso à colação, que se trouxesse isso como ponto
essencial de algum holofote político, pois os países que, aparentemente, têm problemas financeiros, que não
discuto aqui, afinal de contas são os que apresentam melhores índices sobre o combate à criminalidade e
segurança das populações.
Um segundo ponto relativamente ao qual gostaria de obter uma resposta por parte do Governo é o
seguinte: das ilações estratégicas, das coordenadas estratégicas que se retiram do Relatório de Segurança
Interna de 2012, vê-se que se vai manter o sistema dual nas forças de segurança, mas vai insistir-se na ideia
de que são sistemas complementares, com valências diferentes, quer a GNR de um lado, quer a PSP do
outro, essencialmente neste sistema. Mas, do relatório, não se retira em lado algum essa conclusão.
Portanto, essa é uma conclusão que não se apoia em factos que venham descritos no Relatório, pelo que
eu gostaria de saber como é que as conclusões aparecem isoladas em relação à análise do próprio Relatório.
Quais são, pois, os factos e as condições, o desenho estratégico, a experiência, aquilo que levou o
Ministério da Administração Interna a entender que haverá uma situação de distinção de valências em relação
às forças de segurança, mantendo o sistema dual.
Aliás, todo o relatório vem percorrendo um conjunto de instrumentos de cooperação entre as várias forças
de segurança, entre os vários órgãos de polícia criminal, etc., mas isso não nos indica nem nos antecipa qual
é o modelo deste Governo sobre as forças de segurança, e não será deste Relatório que extraímos as
conclusões necessárias.
Por último, gostava de dizer que, no Relatório de 2011, havia um conjunto de considerações mais vastas
acerca de zonas urbanas sensíveis que, parece, se apagaram neste Relatório de 2012.
Não creio que isso derive da realidade dos factos. Provavelmente, derivará de algumas experiências que,
entretanto, as forças de segurança retiraram acerca da sua atividade local e de proximidade, mas que não
estão transportadas para este Relatório e não fazem parte das coordenadas estratégicas que aqui se
apontam, culminando o trabalho do Relatório de Segurança Interna.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Estes são os apontamentos que deixo ao Sr. Ministro, às Sr.as
e aos Srs.
Deputados, porque entendo que há aqui algumas circunstâncias que mereceriam um maior aprofundamento e
algumas conclusões tomadas com maior fidedignidade dos factos, mas também maior consistência acerca das
conclusões estratégicas.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr.ª e Srs. Secretários de Estado, Srs.
Deputados: Procurando ser breve, quero sublinhar, em primeiro lugar, que estes relatórios que hoje aqui
referimos representam uma tendência positiva.
Portanto, é positivo, é bom, é um dado relevante para registar que a criminalidade em Portugal tem vindo a
decrescer e que nós estamos a falar para 2012 de um decréscimo de 7,8%, como foi aqui foi dito, o que
significa — e este é um número relevante — menos 1800 ocorrências em termos de criminalidade violenta e
grave, sendo que, por exemplo, na região normalmente mais afetada do ponto de vista da criminalidade, que é
a região de Lisboa, representa qualquer coisa como -14,8%.
São dados relevantes, são dados importantes, são dados significativos, são dados certamente mais
agradáveis do que outros para a equipa da Administração Interna vir trazer e discutir neste Parlamento e,
sobretudo, são dados, como já aqui foi dito de alguma forma, que contrariam a tese dos que estão sempre a
anunciar a catástrofe, ou seja, daqueles que estão sempre a dizer: «Agora, que o País vai entrar em
dificuldades económicas, vamos ter mais criminalidade do que nunca, vamos ter os números a disparar,
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vamos ter mais ocorrências violentas comparadas com as que alguma vez tivemos!». A verdade é que não
tivemos, e ainda bem que assim é. Esse é um dado relevante e positivo para registar.
É um dado que é mérito de quem? Na minha opinião, é mérito, em primeiro lugar, dos portugueses pelo
civismo que vão mantendo e, em segundo lugar, das nossas várias forças de segurança pela elevada
competência, dedicação e empenhamento.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Do Governo é que não é!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — O mérito é, obviamente, em larguíssima medida, das forças de
segurança pela capacidade e competência.
Mas, se reconhecemos este dado positivo, há, no entanto, que aproveitar para fazer algumas reflexões.
A primeira é a seguinte: este é um modelo que funciona e por isso, do ponto de vista da reestruturação, na
nossa opinião, no essencial deve ser mantido. Ou seja, aproveitando a experiência das várias forças de
segurança, a partir dessa experiência e de uma realidade centrada em várias forças de segurança, o modelo
deve ser continuado.
Por outro lado, também compreendemos que pode ter de haver reestruturações, pode ter de haver
alterações pontuais, porque há aqui tendências… E nós sabemos, Sr. Ministro, que a estatística vale o que
vale. Numa localidade onde existiram dois crimes, se existirem no ano seguinte quatro, a criminalidade
aumentou 100%. No entanto, não deixam de ser dois crimes ou quatro crimes. Por isso, a estatística vale o
que vale.
Mas há indicadores de preocupação em relação ao que tem sido referido como uma certa interiorização ou
ruralização da criminalidade e que, acho, devem merecer alguma atenção, tal como deve merecer atenção o
dispositivo exato no terreno, sendo que já aqui temos falado várias vezes na utilização dos homens,
designadamente da GNR, na capacidade de a GNR estar ainda mais no terreno e na necessidade de manter
esta lógica de proximidade que tem vindo a ser referida.
Em relação ao número de efetivos, vou poupar tempo, não vou alongar-me, até porque o Sr. Deputado
Filipe Neto Brandão já levantou essa questão. De resto, o Sr. Deputado nunca está tão bem como quando
levanta as preocupações do CDS e permita-me que lhe diga que são alguns dos seus melhores momentos, do
meu ponto de vista!
O Sr. Filipe Neto Brandão (PS): — Não é só o CDS que critica o Governo!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Quando o Sr. Deputado falou quase que em nome do CDS, dizendo
quais são as preocupações do CDS, por um lado, o Sr. Deputado está melhor do que nunca e, por outro,
dispenso-me de fazer muitos mais comentários. Limito-me a cumprimentá-lo e a agradecer a ajuda que me dá
e que me permite poupar bastante tempo!
Risos do CDS-PP.
É evidente que estes resultados não são estritamente resultado…
O Sr. Filipe Neto Brandão (PS): — É que o CDS tem criticado o Governo!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Quando o Sr. Deputado alerta as boas preocupações, está sempre
bem! Nunca esteve tão bem!
Portanto, permita-me que o elogie. Não me leve a mal.
O Sr. João Oliveira (PCP): — É o profundo Bilderberg!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Eu não o elogiei a si, Sr. Deputado João Oliveira, nem o elogiaria
nunca. Eu consigo não tenho elogios para fazer, peço desculpa.
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Protestos do PCP.
Sr. Presidente, estou a tentar não gastar o tempo todo, mas está a ser difícil porque estou a ser muito
interrompido.
Srs. Deputados, o que eu queria dizer é que este mérito é essencialmente das forças de segurança, mas
há que reconhecer que o Ministério da Administração Interna — esta equipa e este Ministro — tem de
assegurar um aspeto que, do nosso ponto de vista, é fundamental, e quero deixar aqui este elogio: a confiança
necessária para que as forças de segurança possam atuar, ou seja, não pôr em causa a sua atuação, não pôr
em causa as cadeias hierárquicas de comando e dar confiança. Dar confiança e, ao mesmo tempo, poupar
dinheiro.
Por isso, é bom e positivo, numa área que não deve ser uma área prioritária de poupança, que é a da
segurança dos portugueses — nós, CDS, sempre o achámos e não mudámos de opinião —, que exista uma
experiência-piloto de execução orçamental que seja atribuída ao Ministério da Administração Interna, o que é
um bom sinal quanto à forma como este Ministério tem sido gerido.
Sublinhamos, ainda, a existência e a importância para nós da atenção a crimes específicos. Já aqui foram
referidos alguns problemas de delinquência juvenil, ainda que tenha baixado o número global de criminalidade,
os roubos a bancos, o estabelecimento de venda de ouro relativamente à qual é necessária legislação
específica, que ainda não temos, bem como a necessidade de existência de legislação específica sobre uma
matéria que é muito sensível ao CDS, que é a do crime de vandalismo, sendo que há um pré-trabalho que
estará a ser feito sobre esta matéria.
Termino dizendo que, para nós, é muito importante o que o Sr. Ministro anunciou, que é uma atenção
específica a realidades e a momentos específicos. É muito importante que haja um dispositivo especial para o
verão, um reforço de efetivos no Algarve, saber até que ponto é que esse dispositivo é suficiente e se existem
ou não outras realidades que exijam também atenções específicas, porque essa é a melhor forma de
continuarmos a assegurar estes números que o Sr. Ministro aqui traz hoje e que, felizmente, são números
positivos para a tranquilidade e para a segurança dos portugueses.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
O Sr. Presidente (António Filipe): — O Sr. Ministro da Administração Interna beneficia de uma
transferência de 1 minuto por parte de Os Verdes, o que lhe permite beneficiar de alguns segundos. Tem, por
isso, oportunidade de fazer uma segunda intervenção.
O Sr. João Oliveira (PCP): — É o «minuto verde»!
Risos.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra, Sr. Ministro da Administração Interna.
O Sr. Ministro da Administração Interna: — Sr. Presidente, queria agradecer à Sr.ª Deputada de Os
Verdes a gentileza, porque vai permitir-me dar alguns esclarecimentos em matérias que são factualmente não
corretas, a começar por algumas afirmações do Sr. Deputado João Oliveira.
Sr. Deputado João Oliveira, queria dizer-lhe aqui, nesta Câmara, como já disse publicamente, que
enquanto eu for Ministro da Administração Interna todos os anos entrarão novos elementos para a Polícia e
para a Guarda Nacional Republicana.
Aconteceu assim em 2011 — não por meu mérito, evidentemente, porque o procedimento tinha corrido no
Governo anterior — e a regra era a de que ano sim, ano não entravam elementos para as forças de
segurança.
Ora, desde que sou ministro todos os anos têm entrado elementos para as forças de segurança. Ainda na
semana passada, entraram 298 novos agentes para a Polícia de Segurança Pública e, na próxima semana,
vão entrar mais umas centenas de elementos para a Guarda Nacional Republicana. Em setembro,
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começaremos a formação de novos elementos para a Guarda Nacional Republicana e também de novos
elementos para a Polícia de Segurança Pública. Todos os anos tem acontecido isto! Todos os anos!
Acresce, aliás, Sr. Deputado — e o senhor não registou isto —, que este ano introduzimos alterações na
colocação dos elementos policiais justamente para fazer face àquilo que o Sr. Deputado Telmo Correia
evidenciou na intervenção e que está no Relatório de Segurança Interna, que é uma certa interiorização do
crime.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Ministro, tem de concluir.
O Sr. Ministro da Administração Interna: — Mudámos a forma de colocação dos elementos policiais. Há
elementos policiais, dos novos que entraram, que geralmente ficavam em Lisboa e no Porto, que vão passar
— aliás, já foram colocados — para comandos no interior em muito maior quantidade do que acontecia no
passado. E isto foi feito, Sr. Deputado, ao contrário do que disse, em concertação e em diálogo com as
estruturas sindicais.
Sr. Deputado, que fique muito claro uma coisa, que eu não escondo nunca: nós temos um diálogo
democrático com as estruturas sindicais, mas não confundimos diálogo democrático com indisciplina nas
forças de segurança.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Não é nada disso!
O Sr. Ministro da Administração Interna: — Isso é uma coisa que tem de ficar muito clara.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Ministro, vai ter de concluir.
O Sr. Ministro da Administração Interna: — Sr. Presidente, antes de terminar gostaria de dizer, se me
permite, que nós não passamos nenhuma competência para as autarquias locais. Aquilo que é da
responsabilidade do Estado nós pagamos.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Então, têm de pagar a renda do quartel de Bucelas!
O Sr. Ministro da Administração Interna: — Fazemos é, de forma descentralizada, um conjunto de obras
importantes que estão a realizar-se neste momento por todo o País.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Srs. Deputados, vamos passar ao ponto 3 da ordem de trabalhos, que
consiste na apreciação, na generalidade, da proposta de lei n. º 150/XII (2.ª) — Regula a obrigatoriedade de
publicitação dos benefícios concedidos pela Administração Pública a particulares, procede à primeira alteração
ao Decreto-Lei n.º 167/2008, de 26 de agosto, e revoga a Lei n.º 26/94, de 19 de agosto, e a Lei n.º 104/97, de
13 de setembro.
Para apresentar o diploma, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Administração Pública.
O Sr. Secretário de Estado da Administração Pública (Hélder Rosalino): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs.
Deputados: Na sequência do Censo e da avaliação realizada às fundações, processo que demonstrou a
importância de conhecer os apoios públicos que são concedidos a estas e outras entidades públicas e
privadas e tendo por base o conhecimento acumulado com a aplicação da Lei n.º 26/94, de 19 de agosto, que
regulamenta a obrigatoriedade de publicitação dos benefícios concedidos por organismos públicos, o Governo
procede à apresentação da proposta de lei que regula a obrigatoriedade de publicitação dos benefícios
concedidos por entidades públicas a entes privados.
Esta lei vem exigir um reforço da transparência e aperfeiçoamento do acompanhamento sobre a atribuição
de apoios financeiros e patrimoniais por parte de entidades públicas, assegurando, simultaneamente, um
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reforço do controlo sobre a evolução da despesa pública no âmbito da cooperação de natureza financeira e
patrimonial que existe entre o Estado e o setor privado.
Com este objetivo, a presente proposta de lei procede: ao alargamento do âmbito de entidades públicas
obrigadas à publicitação de apoios, passando a abranger todo o tipo de entidades; ao alargamento do tipo de
apoios abrangidos e da sua origem, passando a contemplar-se os apoios decorrentes de receitas próprias de
entidades públicas; à inclusão, no grupo de beneficiários de apoios, de todas as entidades públicas que se
encontram fora do perímetro do setor das administrações públicas no âmbito do Sistema Europeu de Contas;
ao estabelecimento de um dever de reporte pelas entidades públicas à Inspeção-Geral de Finanças, ficando
esta responsável por garantir o acompanhamento do cumprimento das obrigações que, em parte, já se
encontram estabelecidas pela Lei n.º 26/94; ao estabelecimento de consequências para eventuais situações
de incumprimento dessas obrigações de reporte, por forma a conferir verdadeira eficácia às obrigações
estabelecidas, sendo que esta é uma das reconhecidas faltas do sistema de reporte atualmente em vigor.
O Governo procede, ainda, à racionalização dos custos associados ao cumprimento das obrigações de
publicitação e de reporte, reduzindo as obrigações de publicitação em meios de difusão escrito e impondo, em
sua substituição, a desmaterialização desta publicitação nos respetivos sítios na Internet, bem como no sítio
da Inspeção-Geral de Finanças.
Em síntese, a presente proposta representa um reforço inquestionável da cooperação com entidades do
setor público e privado, bem como da transparência, da prestação de contas e de responsabilização de todos
os intervenientes, designadamente os dirigentes responsáveis pela autorização dos apoios em causa, pelo
que se considera, na sequência da sua entrada em vigor, que é expetável uma racionalização e contenção na
despesa pública neste âmbito.
Por fim, o Governo manifesta a sua disponibilidade para colaborar no processo de aperfeiçoamento da
presente proposta de lei, em sede de apreciação na especialidade, designadamente na introdução de
alterações que, não pondo em risco os princípios e os fins que se prosseguem, possa introduzir ganhos de
eficácia e eficiência na concretização do reforço de transparência na utilização dos dinheiros públicos.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente (António Filipe). — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Sá.
O Sr. Paulo Sá (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado da Administração
Pública: O Estado concede um amplo conjunto de apoios financeiros e patrimoniais a pessoas singulares ou
coletivas dos setores privado, cooperativo e social, constituindo estes apoios uma forma de alcançar a
realização de direitos económicos, culturais e sociais.
Afirma o Governo ser seu objetivo reforçar a transparência na atribuição destes apoios. Este objetivo, em
abstrato, é louvável. Contudo, a forma encontrada pelo Governo para o concretizar suscita-nos sérias
objeções.
Entendemos que o objetivo de reforçar a transparência na atribuição de apoios públicos não se pode
sobrepor, e muito menos anular, aos direitos fundamentais à privacidade e à proteção dos dados pessoais. E é
exatamente por esse caminho que o Governo envereda. Veja-se, por exemplo, a intenção de publicitar na
Internet a lista de cidadãos beneficiários de habitação social, que se traduz numa inaceitável intrusão na
esfera da vida privada. A natureza deste apoio é claramente de caráter social, pelo que, à semelhança de
outros apoios desta natureza, não deve ser objeto de publicitação.
O parecer da Comissão Nacional de Proteção de Dados é claro: a proposta do Governo prevê o tratamento
de dados com alto potencial discriminatório, pelo que a sua disponibilização na Internet presta-se a utilizações
indevidas que coloca em risco a privacidade dos cidadãos.
A intenção do Governo de publicitar na Internet os nomes dos beneficiários de habitações sociais
representa uma desprezível tentativa — mais uma — de estigmatizar os cidadãos mais carenciados. O
Governo comporta-se como polícia dos pobres e guarda-costas dos ricos.
Vozes do PCP: — Muito bem!
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O Sr. Paulo Sá (PCP): — Para este Governo e para os partidos que o sustentam, os pobres são uns
manhosos que tentam por todos os meios enganar o Estado, obtendo indevidamente apoios sociais, e que,
por isso, devem ser expostos publicamente. Esta é uma visão repugnante que deve ser liminarmente rejeitada
e denunciada.
O Sr. João Galamba (PS): — Muito bem!
O Sr. Paulo Sá (PCP): — Pretende, ainda, o Governo, com a sua proposta, sancionar o incumprimento do
dever de reporte de uma forma completamente desproporcionada e excessiva, ao estabelecer como
penalização a retenção de 15% da dotação orçamental das entidades que concedem apoios, além de —
pasme-se — congelar a tramitação de quaisquer processos dirigidos ao Ministério das Finanças. Desta forma,
bloqueia-se o funcionamento das entidades públicas concedentes de apoios, comprometendo a sua
capacidade para prestar os serviços a que se encontram obrigadas por lei. Em última análise, são os
cidadãos, isentos de qualquer responsabilidade pelo incumprimento do dever de reporte destas entidades, que
são penalizados.
Chegados a este ponto, reconhecemos a marca distinta da opção de classe deste Governo. A opção de
atacar, não o Estado, porque esse é necessário para garantir os benefícios, privilégios e rendas do grande
capital, mas, sim, os serviços prestados pelo Estado, direta ou indiretamente, aos cidadãos. Os serviços
públicos e as prestações sociais, assim como as instituições privadas de serviço social, acompanhados de
uma justa política fiscal, desempenham uma importante função de redistribuição de riqueza que este Governo
se empenha em fragilizar.
O Sr. Presidente (António Filipe). — Queira concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Paulo Sá (PCP): — Vou concluir, Sr. Presidente.
Rejeitamos a proposta do Governo. Esta posição não significa, obviamente, a rejeição do princípio da
transparência da Administração Pública e, em particular, da concessão de apoios públicos a entidades dos
setores privado, cooperativo e social. Significa tão-somente a constatação de que essa transparência não
pode ser alcançada no quadro da política de direita e antipatriótica levada a cabo pelo Governo, servindo
apenas como pretexto para um ataque aos serviços públicos e às importantes funções sociais que estes
desempenham.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Pacheco.
O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as
e Srs. Deputados: O
presente diploma visa dar transparência a todos os subsídios, ajudas, tudo aquilo que possa ser considerado
algo que seja concedido pelo Estado aos cidadãos, às empresas, às instituições.
Não consigo admitir que alguém tenha objeções ao princípio da transparência. No momento em que todos
nós estamos tão exigentes com a despesa pública, tudo o que seja despesa pública, nomeadamente
donativos em espécie, donativos em dinheiro ou aquilo que possa ser considerado despesa pública por ser
despesa fiscal, por ser um benefício fiscal concedido, deve ser transparentemente transmitido à sociedade.
Este princípio deve estar consagrado na lei e deveria unir-nos a todos, porque todos nós sabemos o quanto
exigentes estamos a ser perante os cidadãos e quanto exigentes devemos ser por cada cêntimo que o Estado
gasta.
Segunda questão: o princípio da responsabilização também deveria ser um princípio unânime nesta Casa.
Todos nós devemos exigir que quem concede esses subsídios seja responsabilizado pelos subsídios que
concede, e essa responsabilização só é eficaz se forem transparentes os subsídios que qualquer entidade
pública tenha concedido.
Compreendemos que é preciso compatibilizar este princípio da transparência e da responsabilização com o
princípio da privacidade — esse equilíbrio tem de ser encontrado — e, simultaneamente, assumimos sempre
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que não há aqui ninguém que seja detentor da verdade absoluta. Não há obras perfeitas, não há iniciativas
legislativas perfeitas, nem dos partidos da oposição, nem dos partidos da maioria, nem do Governo.
Logo, temos de estar sempre disponíveis para que, depois do debate que vamos iniciar, depois de aprovar
esta legislação, seja encontrada legislação que possa compatibilizar estes princípios.
É esta a postura que eu acreditava que todos os partidos, hoje, iriam aqui ter: aceitar o princípio da
transparência, aceitar o princípio da responsabilização, aceitar o princípio da privacidade e procurar, na letra
da lei, aquilo que possa compatibilizar estes princípios.
Sabemos que o equilíbrio não é fácil, que a solução perfeita não existe, mas, pura e simplesmente,
agarrarem-se aos pormenores para deitarem forma o essencial é que não é aceitável, Srs. Deputados.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Santos.
A Sr.ª Isabel Santos (PS): — Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as
e Srs. Deputados: Ouvi com
atenção a intervenção do Sr. Deputado Duarte Pacheco e percebo bem o tom um tanto ou quanto
comprometido e até constrangido da sua intervenção face a algumas soluções aqui em discussão.
É evidente que o Partido Socialista tem tido sempre uma atitude de forte comprometimento com tudo o que
tem a ver com transparência, com rigor, com melhor gestão e, até, com a desmaterialização de procedimentos
que este diploma nos vem propor. Quanto a esta matéria, penso que estamos todos, nesta Câmara,
perfeitamente de acordo.
No que não estamos de acordo é naquilo que tem a ver com a violação de um direito fundamental, que é o
direito à privacidade e à proteção dos dados pessoais,…
Vozes do PS: — Muito bem!
A Sr.ª Isabel Santos (PS): — … pondo em causa de uma forma absolutamente estigmatizante pessoas
que vivem em condições sociais de grande precariedade.
Percebemos bem que, na direita, há uma conceção que tende a transformar e a confundir aquilo que são
direitos sociais e fundamentais e a prossecução desses direitos sociais com o exercício de uma certa espécie
de caridadezinha do Estado, que retira direitos aos cidadãos. Isto é algo que, para nós, é verdadeiramente
inadmissível e é isto que está aqui em causa.
É exatamente por isto e pela defesa da Constituição portuguesa naquilo que tem a ver com a garantia a
todos os cidadãos do direito à privacidade, com aquilo que tem a ver com a garantia, no artigo 65.º, do direito
à habitação em condições de privacidade e com aquilo que tem a ver com a definição do papel do Estado na
prossecução desses direitos que nós não podemos acompanhar esta iniciativa.
Em muitas outras iniciativas do género, tivemos uma atitude de abertura à mudança das soluções
encontradas e à melhoria do diploma e mantemos aqui essa atitude. Agora, não podemos tolerar, repito, não
podemos tolerar que se consagrem normas altamente discriminatórias como aquela que aqui se pretende
consagrar, atingindo um nicho da população que vive em condições de precariedade e com grandes
dificuldades sociais.
Percebo esta conceção de que aqueles que têm dificuldades sociais, os párias da sociedade, são
altamente culpabilizados pelas condições sociais em que vivem,…
O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Isabel Santos (PS): — … sendo expostos ao julgamento público da sociedade; percebo esta
tentação de fomentar a delação e a inveja social, mas, por favor, puxem por aquilo que a nossa sociedade tem
de melhor e não por aquilo que tem de mais retrógrado e de mais condenável.
Aplausos do PS.
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O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília
Meireles.
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.ª e Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados: A
proposta de lei que hoje discutimos tem a característica, para além de outras questões a que naturalmente me
referirei, de ter, do prisma do CDS, um antecedente.
A nossa preocupação com a transparência na atribuição de subsídios públicos não vem de agora, vem de
trás. Aliás, tivemos oportunidade…
Protestos da Deputada do PS Isabel Santos.
Ó Sr.ª Deputada, esclarecerei, sem meias-palavras, a questão concreta que coloca e que acho central.
Na Legislatura passada discutimos uma iniciativa do CDS, aliás, juntamente com uma do PS — ambas
baixaram à especialidade e caducaram —, que previa, exatamente, que tudo o que fossem apoios, subsídios e
subvenções atribuídos pelo setor empresarial do Estado, quer fosse do Estado central, quer fosse
intermunicipal, quer fosse municipal, fossem alvo de publicações obrigatórias. Mais: dizia também que estas
publicações, porque já, na altura, sentíamos que essa era uma preocupação essencial, deviam ser feitas
online, até porque as outras publicações representavam um grande custo.
Ora, o espírito da lei que aqui temos e grande parte da sua letra respondem, muito claramente, e
aperfeiçoam aquele anseio, na medida em que alargam o âmbito das entidades abrangidas, incluindo,
precisamente, o setor empresarial do Estado. É que aquilo que acontecia é que muitos apoios e muitas
subvenções que, na realidade, tinham um alcance político eram feitos através das empresas,…
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Ora bem!
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — … precisamente porque os outros tinham de ser publicitados. Isto
torna o processo de publicitação mais transparente.
Por outro lado, e indo diretamente à questão que está a ser discutida, e bem, porque também me
preocupa, esta proposta exclui, e muito bem, da obrigação de publicitação as subvenções de caráter social.
Assim sendo, faz todo o sentido, do nosso ponto de vista, que a atribuição de casas seja alterada, de modo a
ficar também incluída nestas alíneas de exclusão, ou seja, a letra da lei deve ser alterada para que,
obviamente, aquilo que são prestações sociais, aquilo que tem a ver com a privacidade das pessoas, aquilo
que são obrigações sociais fiquem excluídas do âmbito e do alcance desta lei. Não pode ser este o objeto da
lei.
Aplausos do CDS-PP.
A Sr.ª Isabel Santos (PS): — Muito bem!
O Sr. João Galamba (PS): — Assim já não é ignóbil!
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe
Soares.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª e Srs. Membros do Governo, Sr.as
e Srs.
Deputados: Esta intervenção da Deputada Cecília Meireles avança uma outra forma de olhar para esta
proposta de lei, porque, de facto, aquilo que deu entrada na Assembleia da República, como disseram a
Associação Nacional de Municípios Portugueses, as regiões autónomas, a Comissão Nacional de Proteção de
Dados, era uma violação do direito à privacidade. Por exemplo, quem tem direito a habitação social, e deve ter
esse direito, porque a sua condição económica assim obriga e, obviamente, não é algo que o Estado lhe
queira retirar — presume-se —, não pode ter como consequência desse direito a habitação social a devassa
da sua vida privada, com exposição pública dos seus dados. E era a isto que a lei obrigava! A letra da lei, tal
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como deu entrada na Assembleia da República, levava à publicitação dos dados de quem tinha acesso a
habitação social, o que era um erro crasso que não podíamos aceitar e que tínhamos como indicação para
trazer a este debate.
É certo que a intervenção do CDS, e presume-se que seja a vontade da maioria, introduz uma alteração
nos termos do debate, mas, em todo o caso, apenas para clarificação em sede de especialidade. Quanto ao
nosso voto na generalidade, fica, desde já, anunciado que incide sobre a letra da lei apresentada e anunciada
à Assembleia da República e, por isso, votaremos com base na letra da lei.
Na especialidade, iremos apresentar propostas de alteração, mas não apenas sobre esta matéria, porque,
de facto, como dizia há pouco a Deputada Isabel Santos, há um espaço de unanimidade no País, creio, no
sentido da dotação do Estado dos benefícios da utilização das novas tecnologias. Este é um processo no qual
todos devemos dar passos em conjunto para que seja mais profícuo, mas há necessidade de uma clara
defesa, em termos constitucionais, do direito à privacidade de cada uma das pessoas. É disto que estamos a
falar e esta letra da lei suscita algumas reservas nessa matéria, pelo que, em sede de especialidade, também
teremos ocasião de clarificar aquilo que, para nós, são limites aceitáveis e aquilo que consideramos que o
Governo não está a respeitar.
Chamo a atenção para uma outra forma de olhar o Estado, e nisto, pelo conteúdo da lei, também nos
distanciamos da forma como o Governo olha para o funcionamento do Estado. É recorrente esta forma de
pensar, mediante a qual o Estado impõe à administração central, à administração regional, à administração
local e, depois, diz que, se não cumprirem, terão um corte. Ora, esta forma de estar, altamente punitiva e com
uma visão centralista do Estado, até vai contra aquela que foi a intervenção política de hoje do PSD. Isto é o
centralismo no seu pior: a ideia de que, ou cumprem o que eu quero — eu, detentor do dinheiro para o Estado
—, ou, então, vão levar cortes nas dotações previstas. Nós não consideramos que esta seja uma forma correta
de estar. Deve haver um princípio de respeito entre todas as instâncias do Estado, desde o Estado central à
administração local e à administração regional, mas esta não é a forma de o Governo pensar e, por isso,
temos esta divergência de opinião e de posição sobre o pensar de uma Administração Pública célere, que
responda às pessoas, que tenha uma responsabilidade e que não tenha uma visão punitiva sobre si própria.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Srs. Deputados, o PSD ainda dispõe de 13 segundos e o Sr.
Deputado Duarte Pacheco pretende utilizá-los, pelo que tem a palavra para uma intervenção.
O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as
e Srs. Deputados: Ficou
claro, neste debate, desde já, o espírito que preside à presente iniciativa legislativa.
Ficou clara, desde já, a abertura dos partidos da maioria para encontrar soluções que possam
compatibilizar o princípio da transparência e da responsabilização com o princípio da privacidade, que todos
queremos defender.
Por isso, Srs. Deputados, neste momento, fazemos somente um apelo aos partidos da oposição: não se
deixem envolver pela demagogia e pelo populismo fácil e sejam parceiros na solução. Mas, para serem
parceiros na solução, têm de mostrar que estão com os princípios orientadores desta iniciativa legislativa e
não, pura e simplesmente, criticar o princípio-base da transparência e, depois, querer participar na solução.
Era este apelo à vossa responsabilidade que queria aqui deixar.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da
Administração Pública.
O Sr. Secretário de Estado da Administração Pública: — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostava de
reiterar que não há qualquer intenção por parte do Governo de ter atitudes persecutórias ou estigmatizantes
relativamente a qualquer grupo da população. E houve uma preocupação muito clara nesta lei: a de excluir
tudo o que eram prestações de caráter social.
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Relativamente à matéria da atribuição de casas no âmbito dos programas de habitação social, gostava de
recordar — e penso que os Srs. Deputados, porventura, não fizeram essa análise prévia — que existe uma lei,
desde 1997, a Lei n.º 104/97,…
A Sr.ª Isabel Santos (PS): — Não tem nada a ver!
O Sr. Secretário de Estado da Administração Pública: — … aprovada por unanimidade neste
Parlamento, a qual cria o Sistema de Informação para a Transparência dos Atos da Administração Pública, o
SITAAP, e reforça os mecanismos de transparência previstos na Lei n.º 26/94, que diz que é criado o sistema
de informação para a transparência dos atos da Administração Pública. E diz ainda o seguinte: «O SITAAP
tem por objetivo a recolha, tratamento e divulgação de dados nominativos e estatísticos sobre os seguintes
atos da Administração Pública central, regional e local: (…)». E depois, mais adiante, numa das alíneas, entre
esses atos, consta a atribuição de casas no âmbito de programas de habitação social. Esta Lei foi aprovada
em 1997, neste Parlamento, por unanimidade e, portanto, revogámos e transportámos aquilo que essa lei
continha para este diploma.
Não obstante, o Governo manifestou a sua disponibilidade, obviamente, para colaborar no aperfeiçoamento
da lei e, portanto, respeitará aquilo que for considerado como mais adequado nesta matéria.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Srs. Deputados, a proposta de lei que acabámos de apreciar na
generalidade será votada no período regimental de votações, que ocorrerá amanhã.
Passamos, agora, ao quarto e último ponto da ordem de trabalhos, que é o da apreciação, na generalidade,
da proposta de lei n.º 152/XII (2.ª) — Completa a transposição da Diretiva 2003/49/CE, do Conselho, de 3 de
junho, relativa a um regime fiscal comum aplicável aos pagamentos de juros e royalties efetuados entre
sociedades associadas de Estados-membros diferentes, e altera o Código do Imposto sobre o Rendimento
das Pessoas Coletivas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442-B/88, de 30 de novembro.
Para apresentar esta proposta de lei, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (Paulo Núncio): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs.
Deputados: A proposta de lei que hoje se encontra em discussão nesta Câmara visa concluir a transposição
para o ordenamento jurídico português da Diretiva 2003/49/CE, do Conselho, de 3 de junho, que harmoniza o
regime fiscal aplicável aos juros e royalties pagos entre sociedades associadas de diferentes Estados-
membros da União Europeia.
Esta Diretiva europeia estabeleceu como regra a isenção de tributação nos pagamentos de juros e royalties
entre uma filial localizada num Estado-membro e a sua casa-mãe, situada noutro Estado-membro, no âmbito
da União Europeia. Aquando da sua aprovação, Portugal negociou com os restantes países europeus um
regime transitório de oito anos, iniciado em 1 de julho de 2005, o qual permitiu manter a tributação sobre estes
fluxos financeiros, embora com o compromisso de a eliminar no termo do período de transição. A aprovação
desta proposta de lei visa, exatamente, cumprir o compromisso assumido a nível europeu.
Com efeito, com a aprovação deste diploma, o regime-regra previsto na referida Diretiva passa a estar
plenamente em vigor no ordenamento jurídico português, o que é uma boa notícia para a economia
portuguesa e para a competitividade fiscal de Portugal.
Por um lado, de um ponto de vista concorrencial, as milhares de filiais e sucursais portuguesas de grupos
económicos europeus passarão a beneficiar, a partir de 1 de julho de 2013, do mesmo regime que vigora nos
restantes Estados-membros da União Europeia. Desta forma, e desde logo, os custos de financiamento destas
entidades portuguesas serão reduzidos, tornando mais fácil e menos oneroso o acesso ao financiamento
intragrupo destas empresas a operar em Portugal. Mas não só! Esta medida permitirá também reforçar a
posição de Portugal no contexto das decisões de investimento das empresas multinacionais, como destino de
investimento direto estrangeiro destes grupos económicos.
Num momento em que o Governo está fortemente empenhado no investimento e no financiamento da
economia, a presente medida é mais um elemento para promover a competitividade fiscal de Portugal. Trata-
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se, de facto, de mais um contributo para estimular o crescimento económico e o emprego, a par de outras
recentes medidas em matéria fiscal, como o IVA de caixa, o crédito fiscal extraordinário ao investimento e o
alargamento do regime dos incentivos fiscais de natureza contratual.
Numa altura em que Portugal precisa de concentrar esforços para voltar a crescer e criar novos postos de
trabalho, é fundamental que as medidas de reforço da competitividade e de estímulo ao investimento
obtenham o maior consenso social e político possível, nomeadamente dos partidos do arco da
governabilidade.
Estou certo de que, uma vez mais, todos os intervenientes políticos estarão à altura das suas
responsabilidades e aprovarão mais esta medida de reforço da atratividade do sistema fiscal português.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Elsa Cordeiro.
A Sr.ª Elsa Cordeiro (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as
e Srs. Deputados: Através
desta iniciativa, pretende o Governo completar a transposição para a ordem jurídica interna da Diretiva do
Conselho Europeu relativa a um regime fiscal comum aplicável aos pagamentos de juros e royalties efetuados
entre sociedades associadas de Estados-membros diferentes.
Assegura-se, com esta transposição, que os pagamentos de juros e royalties fiquem sujeitos a uma única
tributação.
Eliminam-se desigualdades de tratamento fiscal entre transações nacionais e transações transfronteiriças.
Pretende-se, assim, alterar vários artigos do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas
Coletivas, bem como alterar o Decreto-Lei n.º 165/86, que concede benefícios fiscais e financeiros, de âmbito
regional, de promoção e captação de investimentos na zona franca da Madeira.
Sr.as
e Srs. Deputados, beneficiámos, por razões orçamentais, à época, de um período transitório de oito
anos, a fim de permitir diminuir gradualmente os impostos, cobrados mediante retenção ou liquidação, sobre
pagamento de juros e royalties.
Durante os primeiros 4 anos, as taxas de retenção na fonte não poderiam ultrapassar 10% sobre os juros e
royalties pagos a uma sociedade associada a outro Estado-membro ou a um estabelecimento estável situado
noutro Estado-membro e 5% nos últimos 4 anos.
Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Em resumo, com esta iniciativa legislativa, damos mais um
importante passo no combate à fraude fiscal e à economia paralela. Simultaneamente, criamos mais uma
ferramenta que, somada às existentes, contribuirá para a redução dos custos de contexto, assumindo-se por
isso como um estímulo à competitividade da economia nacional e à promoção do emprego.
Vozes do PSD: — Muito bem!
A Sr.ª Elsa Cordeiro (PSD): — Realça-se que, ao reduzirmos por esta via os custos de financiamento de
entidades inseridas em grupos económicos transnacionais, tornamos o nosso País mais atrativo ao
investimento.
Finalizando, esta medida, somada às que recentemente foram apresentadas pelo Governo de estímulo à
oferta, torna o longo caminho que ainda teremos de percorrer muito mais acessível, sem sobrecarregar as
famílias e a economia com mais impostos.
Esta é, seguramente, uma iniciativa que, atenta a sua importância, a sua necessidade, ninguém de boa-fé
ousará negar, razão pela qual esperamos, justificadamente, que venha a merecer um consenso alargado
desta Câmara.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Galamba.
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O Sr. João Galamba (PS): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: A minha intervenção será breve, pois
vou colocar um conjunto de perguntas.
Gostaria de saber, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, se considera ou não que as razões que
existiram para a presença de um período de transição que foi aplicado a Portugal e à Grécia em 2003 ainda
existem hoje. Se as razões iniciais foram orçamentais, parece-me, por maioria de razão, que Portugal e a
Grécia estão hoje numa situação orçamental pior do que estavam em 2003. Gostaria de saber se Governo
tentou por algum meio alargar o prazo transitório, atendendo à atual situação do País.
Gostaria também de saber por que é que uma proposta de lei que tem, obviamente, uma implicação
orçamental não contém qualquer estimativa quer da receita hoje cobrada pelo Estado, ao abrigo da lei anterior,
quer das perdas de receita resultantes da aprovação desta proposta de lei.
O Sr. Secretário de Estado falou do aumento da competitividade fiscal. Penso que, no quadro atual, de
forte desinvestimento em toda a Europa, não é apenas um problema português, é um problema de toda a
Europa — aliás, neste momento, há uma crise de investimento mundial, há uma retração muito significativa —,
não é com medidas desta natureza que se vai inverter o ciclo, por muito que o Sr. Secretário de Estado
continue a afirmar que é assim.
Portanto, Sr. Secretário de Estado, ponto um, a situação que obrigou à derrogação em 2003 verifica-se
hoje ou não e até, porventura, é mais justificada e, ponto dois, qual é a receita até agora cobrada ao abrigo
desta norma e, portanto, qual é a receita que se prevê perder com a aplicação desta proposta de lei?
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe
Soares.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª e Sr. Secretários de Estado, Sr.as
e Srs.
Deputados: De facto, a proposta de lei que o Governo traz a debate (que bem poderia ter sido entregue no
âmbito do Orçamento retificativo, poderia ter sido seguido esse trâmite) tem uma alteração que vai ao encontro
de uma perspetiva seguida pela Europa há muitos anos e por isso é que está englobada enquanto
transposição de uma diretiva — é essa a justificação do Governo — e, ao contrário do que o Sr. Secretário de
Estado tentou aqui dizer, tem muito pouco a ver com uma nova perspetiva para o investimento. Não é disso
que se trata mas, sim, de uma transposição de uma diretiva.
A proposta de lei acaba com um período extraordinário, que tinha sido cedido a Portugal, que evitava uma
perda de receita fiscal nesta transposição da Diretiva. Essa é que, de facto, a consequência direta da
aplicação desta legislação.
Para nós, é incompreensível que, na situação atual, o Governo não tome como boas aquelas que foram as
justificações para a existência de um período extraordinário, que protegia a receita fiscal nacional.
Há uma perda clara de receita fiscal. Já sabemos qual será a resposta do Governo: a de que ela será
compensada pelo investimento e com isso, com essa recuperação da economia pelo investimento, poderemos
ter aqui uma balança nula de impactos ou até uma balança positiva de impactos. Curiosamente, se o Governo
utilizar esta argumentação, utiliza a argumentação que nega aos partidos da oposição quando eles dizem que
há medidas fiscais necessárias para a retoma da economia, como, por exemplo, a redução do IVA da
restauração, em que o Governo diz que não, diz que isso é uma perda de receita fiscal insanável e que nunca
será ultrapassável pela retoma da economia.
Mas, à parte dessa retórica, que ora é utilizada ora não é utilizada consoante a necessidade argumentativa
do Governo, o que temos objetivamente é, mais uma vez, uma perda de receita fiscal relativamente àqueles
que são os grupos que podem facilmente utilizar offshore, ou zonas de tributação bastante menor, para terem
uma facilidade de diminuição de pagamentos fiscais.
Ora, esta escolha do Governo é clara, é feita de acordo com as perspetivas comunitárias, mas rompe com
o período de exceção e não se percebe por que razão o faz quando, de facto, não existe uma alteração nas
condições que existiam quando Portugal pediu esse regime de exceção.
A pergunta que se coloca, penso, é a de saber se o Governo tentou ou não manter este regime de exceção
ou se sucumbiu à vontade europeia.
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Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília
Meireles.
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.a Secretária de Estado dos Assuntos
Parlamentares e da Igualdade, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Srs. Deputados: Já sabemos
que o que estamos aqui a discutir é a transposição de uma diretiva, a qual, aliás, já é antiga, data de 2003,
que previa um regime, como já foi referido, de dilação da transposição de cerca de oito anos.
Já foram feitas muitas perguntas ao Sr. Secretário de Estado e o que gostaria de lhe perguntar é se sabe
qual é o panorama nos outros países que beneficiaram dessa dilação, a Espanha e a Grécia, tanto mais que a
informação que temos na nossa nota técnica é a de que em Espanha esta Diretiva já está em cabal aplicação
e que já não há lugar a esta tributação.
Em segundo lugar, e não menos importante, porque importa não só discutirmos a transposição da Diretiva
mas aquilo que ela significa, gostava de colocar-lhe uma pergunta sobre a competitividade fiscal. Isto porque o
que estamos aqui a dizer basicamente é que, havendo empresas transnacionais, quando haja lugar a fluxos
de pagamentos entre elas de juros ou de royalties, estes serão tributados apenas num sítio, o que é do mais
meridiano bom senso, como é óbvio.
Pergunto: se, em Portugal, este regime não existir, o que significará isso do ponto de vista da
competitividade fiscal? Ou seja, se para uma empresa transnacional estar em Portugal significar um encargo
bastante maior do que estar, por exemplo, em Espanha, que já fez a transposição da Diretiva, o que significará
isso em termos de perda de investimento e de perda consequente de receita fiscal, porque, naturalmente, o
afastamento do investimento leva à perda da receita fiscal?
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Governo apresenta-nos hoje uma
proposta de lei que visa transpor para o direito interno uma diretiva de 2003, que já aqui foi referido, relativa ao
pagamento de juros e royalties entre sociedades associadas. Colocam-se sobre esta transposição diversas
questões, sendo a primeira relativa ao ponto de vista do Governo.
O Governo pretende, diz, com esta legislação, dar por concluído um período transitório que tinha e,
simultaneamente, eliminar aquilo que diz serem condições de dupla tributação entre entidades com atividades
em diversos países. Portanto, como disse a Sr.ª Deputada Cecília Meireles há pouco trata-se apenas de
eliminar esta dupla tributação.
O que é espantoso é que houve 9 anos, digamos quase 10 anos, para alterar e transpor esta Diretiva só
para eliminar a dupla tributação. Se fosse tão simples assim, se fosse apenas para eliminar a dupla tributação,
todos nos perguntaríamos por que raio é que demorou tanto tempo só para evitar esta dupla tributação!? Faz-
me lembrar um pouco, a propósito desta transposição, aquele velho ditado português «parece que há gato
escondido com o rabo de fora». Oxalá não haja! Mas, às vezes, parece que há.
A outra intenção do Governo é aparentemente benévola para a economia nacional: promover a dita
competitividade da economia, uma máxima que está hoje na moda e que é recorrente, particularmente na
boca do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.
Contudo, é uma proposta que tem uma implicação orçamental evidente: há perdas de receitas, há uma
despesa fiscal e ninguém ficará tranquilo, Sr. Secretário de Estado. Convenhamos que estas questões,
embora recorrentes já hoje, aqui, à tarde, nas intervenções de vários Deputados, são absolutamente justas.
Pergunto: primeiro, por que razão o senhor, ou o Governo ou os sucessivos Governo demoraram tanto
tempo, se se tratava só de eliminar uma dupla tributação; segundo, e mais importante, qual é a estimativa
orçamental de despesa fiscal que a introdução desta nova legislação vai implicar?
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Sr. Secretário de Estado, só lhe peço que não nos faça hoje, aqui, o que nos fez no outro dia quando do
debate sobre o chamado «supercrédito fiscal», em que não nos conseguiu dar estimativas nem responder a
nenhuma das perguntas concretas que foram colocadas.
Sugeria-lhe que desta vez, pelo menos, nos dissesse quanto é que isto vai custar ao erário público.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Srs. Deputados, pergunto se mais alguém pretende intervir no tempo
disponível.
Se mais ninguém se inscrever, damos este ponto por encerrado.
Pausa.
A Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade (Teresa Morais): — Sr.
Presidente, peço desculpa mas informo que pedi a inscrição do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.
Deve ter havido confusão na Mesa.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Houve, com certeza. Não me chegou essa indicação.
Tem, então, a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começaria por
dizer que este é um compromisso que foi assumido em 2003 pelo Estado português, não é um compromisso
assumido por este Governo, e os compromissos são para serem cumpridos.
O Partido Socialista tem uma vocação europeia e deveria ser o primeiro nesta Câmara, juntamente com os
partidos da maioria, a apoiar o compromisso assumido pelo Estado português a nível europeu.
Já agora, deixem-me que vos diga que esta é uma boa notícia para a economia portuguesa, porque visa
reforçar o funcionamento do mercado interno, e o reforço do funcionamento do mercado interno traz por si
uma redução de custos de contexto e a promoção do crescimento económico dentro de espaço económico
europeu. Espero que o PS também continue a acreditar no mercado único europeu.
Além disso, é uma medida fundamental para reforçar a competitividade fiscal portuguesa, é uma medida
que visa reforçar as empresas portuguesas, que passam a ter um custo de financiamento mais baixo do que o
que acontecia até agora, e que visa reforçar Portugal como um local de destino do investimento direto
estrangeiro.
Relativamente às questões colocadas pelo Bloco de Esquerda, Sr. Deputado Pedro Filipe Soares, há que
ler com atenção as propostas de lei e as diretivas que estão sujeitas a discussão nesta Câmara. Este diploma
visa exclusivamente regular o pagamento de juros e de royalties entre sociedade dentro da União Europeia.
Não se aplica a nenhum pagamento para fora da União Europeia e muito menos a pagamentos a sociedades
offshore.
Ao contrário, e por este Governo, foram introduzidas tributações reforçadas quando se tratar de pagamento
de juros a sociedades fora da União Europeia e, em especial, para sociedades offshore.
Quanto às questões colocadas pela Sr.ª Deputada Cecília Meireles, do CDS, obviamente, o facto de
Espanha ter concluído a transposição desta Diretiva antes de Portugal coloca a Espanha numa situação de
competitividade fiscal maior do que a portuguesa, e evidentemente que, num momento em que Portugal
transpõe a diretiva…
O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Secretário de Estado, tem de concluir.
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — Estou a terminar, Sr. Presidente, dizendo que,
nesse momento em que Portugal transpõe a diretiva, repõe a igualdade, em termos de capacidade de atração
de investimento e capacidade de financiamento das empresas a operar em Portugal.
Finalmente, em relação à questão da receita fiscal, quero dizer que a despesa associada a esta
transposição é residual. Estamos a falar de uma taxa de tributação de cerca de 5%, nos últimos quatro anos, a
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despesa fiscal associada andará entre os 5 e os 10 milhões de euros e o Governo está absolutamente
convencido de que esta medida de reforço da competitividade fiscal portuguesa será suficiente para
compensar em larga escala a perda de receita associada.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Srs. Deputados, esta proposta de lei será…
O Sr. João Galamba (PS): — Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado João Galamba quer intervir?
O Sr. João Galamba (PS): — Sim, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Srs. Deputados, acho que teremos de discutir, em breve, na
Conferência de Líderes, a metodologia das inscrições, porque estamos a chegar aos momentos finais dos
debates com alguma confusão de comunicação entre os grupos parlamentares, o Governo e a Mesa,
relativamente aos oradores inscritos.
Sr. Deputado João Galamba, tem a palavra.
O Sr. João Galamba (PS): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, ninguém pôs aqui em causa
compromissos. O que houve foi uma decisão, em 2003, e perguntei-lhe se as razões que tinham levado ao
pedido de derrogação, em 2003, se verificavam agora, ou não, e, verificando-se, se o Governo tinha tentado
prolongar. Não houve aqui nenhum rasgar de compromissos nem nenhuma violação de compromissos pelo
Estado português.
Perguntei apenas se o Governo, o seu Ministério, entendeu que as circunstâncias se mantinham ou não e
se tentou fazer alguma coisa para prolongar o que tinha sido decidido em 2003. Não há nenhuma violação de
qualquer compromisso europeu.
Em segundo lugar, 5 ou 10 milhões de euros… Bem, é certamente menor que muitos outros valores de que
se fala agora, mas não é insignificante.
Sr. Secretário de Estado, neste momento, a principal ameaça ao mercado interno é o corte nos salários
que está em curso em Portugal e em toda a Europa. Essa é que é a principal ameaça ao mercado interno!
O funcionamento do mercado interno estará posto em causa se as políticas que este Governo defende na
Europa e pratica com especial zelo em Portugal insistirem no ataque à procura, que é, como já dissemos
noutros debates e dizem os empresários, a principal determinante do investimento, Sr. Secretário de Estado.
O Sr. Secretário de Estado continua a trabalhar numa fantasia, que é a ideia de que, se eliminarmos os
impostos sobre o capital, mesmo que não haja clientes, mesmo que não haja vendas, de repente, o
investimento irá florescer.
Sr. Secretário de Estado, sem procura não há investimento e todas estas medidas de desagravamento
fiscal sobre rendimentos de capital têm apenas uma consequência, que é a de agravar a distribuição de
rendimentos entre trabalho e capital e proceder a uma política de redistribuição de riqueza. Não há aqui
criação de riqueza nenhuma, Sr. Secretário de Estado!
Com esta política, em Portugal e na Europa, garanto-lhe que pode tomar as medidas ficais que quiser que
não haverá um cêntimo de investimento em Portugal por causa destas medidas.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Creio que, agora, sim, terminámos o debate da proposta de lei n.º
152/XII (2.ª), que será votada na sessão regimental de votações que terá lugar amanhã.
Amanhã, reuniremos às 15 horas e a ordem do dia será preenchida com o debate do projeto de resolução
n.º 769/XII (2.ª) — Combater o desemprego jovem (Os Verdes), um agendamento potestativo do Partido
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Ecologista «Os Verdes», findo o qual haverá lugar à sua votação, caso tal seja solicitado, e haverá ainda lugar
a outras votações regimentais.
Por hoje, concluímos os nossos trabalhos.
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.
Eram 19 horas e 17 minutos.
Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.