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Quinta-feira, 12 de setembro de 2013 I Série — Número 118

XII LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2012-2013)

COMISSÃO PERMANENTE

REUNIÃODE11DESETEMBRODE 2013

Presidente: Ex.ma Sr.ª Maria da Assunção Andrade Esteves

Secretários: Ex.mos

Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco Rosa Maria da Silva Bastos de Horta Albernaz

S U M Á R I O

A Presidente declarou aberta a reunião às 15 horas e 11

minutos. Deu-se conta da entrada na Mesa das propostas de lei

n.os

168 a 170/XII (2.ª), dos projetos de lei n.os

441 a 443/XII (2.ª), das apreciações parlamentares n.

os 58 a 62/XII (2.ª) e

dos projetos de resolução n.os

809 a 815/XII (2.ª). Foi aprovado um parecer da Comissão para a Ética, a

Cidadania e a Comunicação relativo à renúncia ao mandato de uma Deputada do PS e à respetiva substituição.

A Presidente informou a Câmara de uma mensagem do Presidente da República que deu entrada sobre a devolução, sem promulgação, do Decreto da Assembleia da República n.º 177/XII — Estabelece o regime jurídico da requalificação de trabalhadores em funções públicas visando a melhor afetação dos recursos humanos da Administração Pública, e procede à nona alteração à Lei n.º 12 A/2008, de 27 de fevereiro, à quinta alteração ao Decreto-Lei n.º 74/70, de 2 de março, à décima segunda alteração ao Decreto-Lei n.º 139-A/90, de 28 de abril, à terceira alteração ao Decreto-

Lei n.º 209/2009, de 3 de setembro, e à primeira alteração ao Decreto-Lei n.º 132/2012, de 27 de junho, revogando a Lei n.º 53/2006, de 7 de dezembro.

Usaram da palavra, a diverso título, os Deputados Basílio Horta (PS), João Pinho de Almeida (CDS-PP), João Oliveira (PCP), Pedro Filipe Soares (BE), Heloísa Apolónia (Os Verdes) e Teresa Leal Coelho (PSD).

A Presidente procedeu à leitura do voto n.º 148/XII (2.ª) — De pesar pelo falecimento de bombeiros nos incêndios florestais deste verão (Presidente da AR, PSD, PS, CDS-PP, PCP, BE e Os Verdes). De seguida, usaram da palavra os Deputados Paulo Batista Santos (PSD), Mota Andrade (PS), Hélder Amaral (CDS-PP), António Filipe (PCP), Cecília Honório (BE), Heloísa Apolónia (Os Verdes) e o Ministro da Administração Interna (Miguel Macedo). No final, a Câmara aprovou o voto e guardou 1 minuto de silêncio.

Foi também aprovado o projeto de resolução n.º 812/XII (2.ª) — Deslocação do Presidente da República à Suécia (Presidente da AR).

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Em declaração política, o Deputado Luís Montenegro (PSD) sublinhou os resultados positivos alcançados por Portugal em termos económicos nos últimos meses e enalteceu a capacidade coletiva do País de resistir a tantas adversidades.

Em declaração política, o Deputado Carlos Zorrinho (PS) criticou a política de cortes seguida pelo Governo, que conduz a um empobrecimento geral do País, e esclareceu que o PS votará contra qualquer Orçamento que não altere esta orientação política e não aposte no crescimento e no emprego.

Em declaração política, o Deputado Nuno Magalhães (CDS-PP) congratulou-se pelos sinais económicos positivos registados no 2.º trimestre do ano e apelou a mais diálogo social, sentido de dever e compromisso político.

Em declaração política, o Deputado João Ramos (PCP), a propósito dos incêndios florestais e da perda de vidas humanas, condenou a política florestal do Governo, a falta de planeamento e ordenamento florestal.

Em declaração política, a Deputada Cecília Honório (BE) criticou a política de ensino do Governo, designadamente a proposta de financiamento do ensino privado e o desinvestimento na escola pública.

Em declaração política, a Deputada Heloísa Apolónia (Os Verdes) lembrou as orientações da Assembleia da República para a prevenção dos fogos florestais e condenou a sua não implementação.

A Presidente encerrou a reunião eram 17 horas e 14 minutos.

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A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, Srs. Jornalistas, Srs. Funcionários, está aberta a reunião.

Eram 15 horas e 11 minutos.

Podem ser abertas as galerias.

Desejo a todos um bom trabalho de Comissão Permanente. Como todos sabem, a Comissão Permanente

não é uma reunião do Plenário da Assembleia da República, dos 230 Deputados; é uma reunião de Deputados

que ocorre entre as duas sessões legislativas, tendo, por isso, uma composição reduzida. Deixo aqui esta

informação para o público.

Srs. Deputados, a nossa ordem do dia será preenchida da seguinte forma: ponto 1 — Leitura da

mensagem do Presidente da República sobre a devolução sem promulgação do Decreto da Assembleia da

República n.º 177/XII; ponto 2 — Voto de pesar pelo falecimento de bombeiros nos incêndios deste verão;

ponto 3 — Declarações políticas.

Antes de iniciarmos o primeiro ponto da ordem do dia, passo a palavra ao Sr. Secretário Duarte Pacheco,

que vai proceder à leitura do expediente.

Faça o favor, Sr. Deputado.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): — Sr.as

e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidas,

as seguintes iniciativas legislativas: propostas de lei n.os

168/XII (2.ª) — Estabelece um regime de renovação

extraordinária dos contratos de trabalho a termo certo, bem como o regime e o modo de cálculo da

compensação aplicável aos contratos objeto dessa renovação, que baixa à 10.ª Comissão, 169/XII (2.ª) —

Transpõe a Diretiva 2011/77/EU, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 27 de setembro, relativa ao prazo

de proteção do direito de autor e de certos direitos conexos, e altera o Código do Direito Autor e dos Direitos

Conexos, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 63/85, de 14 de março, e 170/XII (2.ª) — Procede à quinta alteração à

Lei n.º 14/87, de 29 de abril, que aprova a Lei Eleitoral para o Parlamento Europeu, transpondo a Diretiva

2013/1/EU, do Conselho, de 20 de dezembro de 2012, que altera a Diretiva 93/109/CE, do Conselho, de 6 de

dezembro de 1993, no que se refere a alguns aspetos do sistema de elegibilidade nas eleições para o

Parlamento Europeu dos cidadãos da União residentes num Estado-membro de que não tenham a

nacionalidade, que baixam à 1.ª Comissão; projetos de lei n.os

441/XII (2.ª) — Diminuição do IVA na

restauração (PS), 442/XII (2.ª) — Redução do IMI, através da atualização da fórmula de cálculo do valor

patrimonial fiscal (PS), e 443/XII (2.ª) — Redução da taxa do IRC para 12,5% para os primeiros 12 500 euros

de lucros, apoiando as PME (PS), que baixam à 5.ª Comissão.

Deram também entrada na Mesa, e foram admitidas, as apreciações parlamentares n.os

58/XII (2.ª) —

Relativa ao Decreto-Lei n.º 92/2013, de 11 de julho, que estabelece o regime de exploração e gestão dos

sistemas multimunicipais de captação, tratamento e distribuição de água para consumo público, de recolha,

tratamento e rejeição de efluentes e de recolha e tratamento de resíduos sólidos (PCP), 59/XII (2.ª) — Relativa

ao Decreto-Lei n.º 105/2013, de 30 de julho, que altera o Decreto-Lei n.º 118/83, de 25 de fevereiro, o Decreto-

Lei n.º 158/2005, de 20 de setembro, e o Decreto-Lei n.º 167/2005, de 23 de setembro, revendo os descontos

a efetuar para os subsistemas de proteção social no âmbito dos cuidados de saúde, concretamente da ADSE,

da ADM e da SAD (PCP), 60/XII (2.ª) — Relativa ao Decreto-Lei n.º 109/2013, de 1 de agosto, que procede à

extinção da Fundação Alter Real, pessoa coletiva de direito privado e utilidade pública, instituída pelo Decreto-

Lei n.º 48/2007, de 27 de fevereiro, alterado pelo Decreto-Lei n.º 205/2012, de 31 de agosto, devolvendo ao

Estado a prossecução dos fins principais da Fundação (PS), 61/XII (2.ª) — Relativa ao Decreto-Lei n.º

98/2013, de 24 de julho, que procede à afetação à Sociedade Administração do Porto de Viana do Castelo,

SA, de determinadas parcelas de terreno que integram o património do Estado, assim como dos edifícios,

infraestruturas e equipamentos nelas implantados, redefine a área referente à concessão dominial atribuída à

Sociedade Estaleiros Navais de Viana do Castelo, SA, e autoriza a alteração ao contrato de concessão,

incluindo a autorização para a efetivação de uma nova subconcessão (PS), e 62/XII (2.ª) — Relativa ao

Decreto-Lei n.º 98/2013, de 24 de julho, que procede à afetação à Sociedade Administração do Porto de Viana

do Castelo, SA, de determinadas parcelas de terreno que integram o património do Estado, assim como dos

edifícios, infraestruturas e equipamentos nelas implantados, redefine a área referente à concessão dominial

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atribuída à Sociedade Estaleiros Navais de Viana do Castelo, SA, e autoriza a alteração ao contrato de

concessão, incluindo a autorização para a efetivação de uma nova subconcessão (PCP).

Deram ainda entrada na Mesa, e foram admitidos, os projetos de resolução n.os

809/XII (2.ª) — Recomenda

ao Governo que racionalize os contratos de associação na rede escolar garantindo a utilização da capacidade

instalada nas escolas públicas (BE), 810/XII (2.ª) — Pela continuação do Festival Internacional de Teatro de

Expressão Ibérica — FITEI (Os Verdes), que baixam à 8.ª Comissão, 811/XII (2.ª) — Recomenda ao Governo

que concretize as medidas políticas necessárias para o funcionamento pleno do Departamento de Psiquiatria e

Saúde Mental da Unidade Local de Saúde do Baixo Alentejo (PCP), que baixa à 9.ª Comissão, 812/XII (2.ª) —

Deslocação do Presidente da República à Suécia (Presidente da AR), 813/XII (2.ª) — Recomenda ao Governo

para que não atrase mais o apoio social aos idosos sem recursos para suportar o aumento das rendas,

provocados pela nova lei (PS), que baixa à 10.ª Comissão, 814/XII (2.ª) — Reforça os meios humanos nas

escolas e garante o vínculo laboral (PCP) e 815/XII (2.ª) — Recomenda ao Governo a definição do modelo

estatutário da Cinemateca Portuguesa a partir de 2014 e a aprovação, no próximo Orçamento do Estado, de

um plano de médio e longo prazo que garanta a sustentabilidade financeira deste organismo (PS), que baixam

à 8.ª Comissão.

Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, de seguida, vou dar conta de um relatório e parecer da Comissão para a

Ética, a Cidadania e a Comunicação. O relatório é referente à renúncia ao mandato, nos termos do artigo 7.º

do Estatuto dos Deputados, da Sr.ª Deputada Helena André (PS), círculo eleitoral de Aveiro, sendo substituída

por António Alves Cardoso, com efeitos a partir de 1 de setembro de 2011, inclusive.

O parecer é no sentido de a renúncia e a substituição da Deputada em causa serem de admitir, uma vez

que se encontram verificados os requisitos legais.

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, está em apreciação o parecer.

Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, vamos votá-lo.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): — Finalmente, Sr.ª Presidente, em termos de expediente, deu ainda

entrada na Mesa uma mensagem do Sr. Presidente da República, que passo a V. Ex.ª.

A Sr.ª Presidente: — Muito obrigada, Sr. Deputado.

Srs. Deputados, o Sr. Presidente da República devolveu, sem promulgação, o Decreto da Assembleia da

República n.º 177/XII — Estabelece o regime jurídico da requalificação de trabalhadores em funções públicas

visando a melhor afetação dos recursos humanos da Administração Pública, e procede à nona alteração à Lei

n.º 12 A/2008, de 27 de fevereiro, à quinta alteração ao Decreto-Lei n.º 74/70, de 2 de março, à décima

segunda alteração ao Decreto-Lei n.º 139-A/90, de 28 de abril, à terceira alteração ao Decreto-Lei n.º

209/2009, de 3 de setembro, e à primeira alteração ao Decreto-Lei n.º 132/2012, de 27 de junho, revogando a

Lei n.º 53/2006, de 7 de dezembro, enviando uma mensagem com o seguinte teor:

«Sr.ª Presidente da Assembleia da República: Junto devolvo a Vossa Excelência, nos termos do artigo

279.º, n.º 1, da Constituição, o Decreto da Assembleia da República n.º 177/XII, que estabelece o regime

jurídico da requalificação de trabalhadores em funções públicas visando a melhor afetação dos recursos

humanos da Administração Pública, e procede à nona alteração a Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro, à

quinta alteração ao Decreto-Lei n.º 74/70, de 2 de março, à décima segunda alteração ao Decreto-Lei n.º 139-

A/90, de 28 de abril, à terceira alteração ao Decreto-Lei n.º 209/2009, de 3 de setembro, e à primeira alteração

ao Decreto-Lei n.º 132/2012, de 27 de junho, revogando a Lei n.º 53/2006, de 7 de dezembro, uma vez que o

Tribunal Constitucional, através de Acórdão cuja fotocópia se anexa, se pronunciou, em sede de fiscalização

preventiva, pela inconstitucionalidade das seguintes normas do referido Decreto:

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a) Da norma constante do n.º 2 do artigo 18.º, enquanto conjugada com a segunda, terceira e quarta partes

do disposto no n.º 2 do artigo 4.º do mesmo diploma, por violação da garantia da segurança no emprego e do

princípio da proporcionalidade, constantes dos artigos 53.º e 18.º, n.º 2, da Constituição da República

Portuguesa;

b) Da norma constante do n.º 1 do artigo 4.º, bem como da norma prevista na alínea b) do artigo 47.º, na

parte em que revoga o n.º 4 do artigo 88.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro, e na medida em que

impõem, conjugadamente, a aplicação do n.º 2 do artigo 4.º aos trabalhadores em funções públicas com

nomeação definitiva ao tempo da entrada em vigor daquela lei, por violação do princípio da tutela da confiança

ínsito no artigo 2.º da Constituição da República Portuguesa.»

Srs. Deputados, como anunciei no início dos nossos trabalhos, a ordem do dia começa com um período de

debate sobre a mensagem do Sr. Presidente da República, para o que os grupos parlamentares dispõem de 2

minutos.

Em primeiro lugar, tem a palavra o Sr. Deputado Basílio Horta, do PS.

O Sr. Basílio Horta (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: O Partido Socialista congratula-se

com a decisão do Tribunal Constitucional de declarar a inconstitucionalidade do regime jurídico de

requalificação de trabalhadores em funções públicas. E congratula-se por razões de natureza jurídica e

política.

Quanto às razões de natureza jurídica, tal como o Partido Socialista em seu tempo afirmou, esta legislação

estava ferida de inconstitucionalidade e, como tal, não devia ter seguido nem devia ter sido aprovada pela

Assembleia da República. Aliás, aconselho a leitura atenta da declaração de voto da Sr.ª Juíza Conselheira

Lúcia Amaral, pois é bem reveladora da enorme incompetência do Governo quando aprovou e elaborou este

regime jurídico. É uma prova de uma total incompetência! É uma prova de incompetência de quem não

respeita a Constituição, de quem entende que a Constituição é algo abstrato e que pode ser violada ao sabor

das decisões políticas — e este é o segundo aspeto, de natureza política.

Julgo que esta é a sexta vez que o Governo viola a Constituição da República por determinação e por

declaração de inconstitucionalidade de normas pelo Tribunal Constitucional.

É fundamental que o Governo conviva com a Constituição. Uma coisa é a crítica legítima e aberta às

decisões dos tribunais — nada em democracia está isento de crítica —, outra coisa é o funcionamento normal

entre órgãos de soberania, e este deve ser acautelado para a credibilidade da própria soberania.

Resta agora uma única interrogação: como vai o Governo suprir os 400 milhões de euros que deixou de ter

com esta declaração de inconstitucionalidade? Será com mais austeridade sobre os portugueses? Será com a

diminuição dos salários da função pública? Isso preocupa-nos, porque ainda hoje, quando ouvimos, na

comissão que faz o acompanhamento dos trabalhos da troica, o Sr. Vice-Primeiro-Ministro e a Sr.ª Ministra de

Estado e das Finanças, constatámos que tudo está na mesma.

A Sr.ª Ministra das Finanças veio dizer, em relação aos 4700 milhões de euros que o Sr. Primeiro-Ministro

declarou, no dia 3 de maio, que iria cortar, que tudo se mantém na mesma.

A Sr.ª Presidente: — Sr. Deputado, queira terminar.

O Sr. Basílio Horta (PS): — Termino já, Sr.ª Presidente.

Isto foi dito ao lado do Sr. Vice-Primeiro-Ministro, o mesmo que, com base nessa carta, tinha pedido a

demissão porque não queria dissimular uma convivência com uma estratégia com a qual não concordava.

É perante esta situação que os portugueses estão. Vamos, portanto, aguardar para saber qual vai ser a

decisão do Governo para colmatar esta brecha de 400 milhões de euros que muito legitimamente o Tribunal

Constitucional, na defesa dos interesses dos portugueses, determinou que fosse feita.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, a Mesa tem algumas dúvidas quanto à ordem das inscrições, que

não foi registada. Não havendo oposição, seguiremos a seguinte ordem: CDS-PP, Bloco de Esquerda, Os

Verdes, PCP e PSD.

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Então, tem a palavra o Sr. Deputado João Pinho de Almeida.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar

do CDS-PP ouviu, e, naturalmente, respeita, a mensagem enviada pelo Sr. Presidente da República sobre a

devolução do Decreto em causa.

É sabido que esta posição do Sr. Presidente da República e o acórdão proferido pelo Tribunal

Constitucional têm um contexto e um enquadramento objetivos. O contexto é, naturalmente, o de um programa

de assistência em que Portugal está sujeito a uma série de compromissos que tem de cumprir, os quais

decorrem do Memorando de Entendimento e de um pedido de ajuda externa que são da responsabilidade do

Governo anterior.

Portanto, convém ter a noção, quando falamos do enquadramento de toda esta discussão, desta

declaração de inconstitucionalidade e de outras declarações de inconstitucionalidade, que o contexto político

atual das tomadas de decisão sobre estas matérias não é um contexto normal por causa deste Governo mas é

anormal por causa da circunstância em que o Governo do Partido Socialista pôs o País.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sabendo qual é o contexto em que esta matéria surge, é

importante também saber que, objetivamente, o diploma em causa versava sobre matéria de mobilidade

especial, matéria essa que não é da criação deste Governo. O regime da mobilidade especial foi criado, em

Portugal, pelo Governo do Partido Socialista quando ainda não havia programa de assistência e, portanto,

estamos a falar da graduação de um regime que foi criado pelo Partido Socialista. E que fique também claro

que o contexto é da responsabilidade do Partido Socialista e o modelo foi também criado pelo Partido

Socialista.

Entende o Tribunal Constitucional que esta formulação em concreto não é suscetível de ser aprovada

porque está ferida de inconstitucionalidade. É uma matéria de interpretação da Constituição e, portanto,

também não colhe o argumento de que há um programa político de um Governo que é um programa político

de afrontar a Constituição. Há, em sede de interpretação da Constituição, uma opinião divergente entre a

maioria que aprovou este diploma e os Srs. Juízes do Tribunal Constitucional que interpretaram a Constituição

neste contexto.

A Constituição não é um dogma, é uma lei fundamental que num Estado de direito todos devemos

respeitar, mas é discutível. O Sr. Deputado Basílio Horta, que ainda agora interveio, votou contra esta

Constituição, com toda a liberdade, com toda a liberdade.

O Sr. Basílio Horta (PS): — Não esta! Não foi esta!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Portanto, a liberdade de sermos contra ou a favor da

Constituição é uma liberdade total.

A Sr.ª Presidente: — Faça favor de terminar, Sr. Deputado.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Vou terminar, Sr.ª Presidente.

O facto de haver uma decisão do Tribunal Constitucional que é contrária dá a esta maioria a

responsabilidade de encontrar uma solução para este problema.

Essa solução deve ter três preocupações concretas: em primeiro lugar, respeitar as obrigações que

Portugal tem neste momento,…

O Sr. Basílio Horta (PS): — Respeite a história do seu partido!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — … fruto do Memorando de Entendimento que o Partido

Socialista nos deixou; em segundo lugar, fazer algo de fundamental, que é promover a equidade entre

trabalhadores do regime privado e trabalhadores do regime público, porque, tal como tantas vezes diz o

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Tribunal Constitucional, os portugueses têm de ser tratados com equidade, quer trabalhem na função pública,

quer trabalhem no setor privado, e, em último lugar, naturalmente, adaptar à interpretação do Tribunal

Constitucional essa solução. É esse respeito que lhe devemos num Estado de direito, com a convicção de que

estamos a trabalhar para salvar o País e nunca para afrontar a Constituição ou os Srs. Juízes do Tribunal

Constitucional.

Aplausos do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — O PCP indicou à Mesa que pode intervir de imediato. Se a ordem que foi mais ou

menos indicada não for assim perturbada, dou a palavra ao Sr. Deputado João Oliveira.

Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Esta declaração de

inconstitucionalidade confirma alguns dos argumentos e das preocupações que o PCP tinha manifestado ao

longo do debate na Assembleia da República e vem confirmar uma vez mais a natureza da política do

Governo, que, visando o pacto de agressão, confirma também os interesses que estão por detrás desta

política.

Esta é uma política contrária à Constituição e contrária à democracia, mas é também uma política que

impõe aos trabalhadores e ao povo todos os sacrifícios para proteger o grande capital económico e financeiro.

E é uma política que só com chantagem é que pode ser imposta.

Sr.as

e Srs. Deputados, ouvimos ao longo destas semanas, da parte do Primeiro-Ministro e da parte de

outros responsáveis governamentais e dos partidos políticos que suportam a maioria, a recuperação política

da chantagem sobre tudo e todos para continuar a prosseguir a mesma política.

Foi a chantagem sobre o Tribunal Constitucional, ameaçando-o e pressionando-o em relação ao impacto

que podia ter a decisão, e foi, uma vez mais, a chantagem sobre os portugueses, ameaçando-os com a

necessidade de um segundo resgate, porque, afinal de contas, o Governo não vai poder poupar os 900

milhões de euros que queria poupar com o despedimento arbitrário na função pública.

Perguntamos, Sr.as

e Srs. Deputados da maioria, se esses 900 milhões podem justificar um segundo

resgate, o que justifica os 1100 milhões que os senhores entregaram ao Banif em dezembro passado? O que

justifica os mais de 3000 milhões de euros de perdas potenciais dos swaps que os senhores continuam a

proteger em benefício da banca, em benefício dos interesses financeiros? Então, essas perdas, esse dinheiro

público que é gasto em benefício dos grupos económicos, em benefício da banca, em benefício do capital

financeiro, esse prejuízo, esse desperdício de dinheiro público já não significa nada de perdas para o Estado e

de imposições sobre a nossa economia e a nossa situação orçamental?

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, a pergunta que temos hoje de fazer é até quando. Até quando é

que vamos ter um Governo a governar contra a Constituição e a democracia, até quando é que vamos ter um

Governo a governar chantageando e pressionando o Tribunal Constitucional, os órgãos de soberania, mas

chantageando também os portugueses, o próprio povo que o Governo devia governar e que, afinal de contas,

apenas arruína?

E, Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, até quando é que vamos ter um Presidente da República que

sustenta um Governo que governa à margem da Constituição e que, em nome da Constituição, já devia ter

sido demitido há muito tempo?

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

A Sr.ª Presidente: — Segundo a ordem indicada à Mesa, segue-se o Bloco de Esquerda.

Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Poderíamos analisar todo este

processo como algo ocasional que decorre de um erro de governação que pudesse ter acontecido por alguma

falha de alerta ou de aviso que não chegou, mas nada disso justifica o ocorrido: o Governo sabia o que estava

a fazer.

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A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Muito bem!

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Nos debates da Assembleia da República, várias vezes, foi a maioria

avisada de que este diploma era inconstitucional e, depois de todos esses avisos, o que era o anúncio

transformou-se em realidade.

Estamos, portanto, perante a crónica de uma inconstitucionalidade anunciada. Era assim porque assim

tinha de ser. Não é um acaso, não é um erro, é uma vontade, é uma marca de uma governação que pela

quinta vez tem um diploma que é considerado inconstitucional. Não é defeito, sabemos que já é feitio de um

Governo e de uma maioria que olham para a Constituição e não veem valores, que olham para os direitos e

acham que são jogos de palavras.

Só assim compreendemos a falta de sentido de Estado do Governo, do Sr. Primeiro-Ministro, neste verão,

quando dizia, como ouvimos também por parte do CDS, que havia um problema de interpretação, quando, na

prática, não é um problema de interpretação,…

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Também é!

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — … é um problema de governação, de uma governação que não

conhece a Constituição a não ser quando nela tropeça, porque é um Tribunal que lhe diz que é a governação

que está submissa à Constituição e não a Constituição que deve estar submissa a qualquer governo.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Muito bem!

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Entendamo-nos: este Governo governa contra a Constituição, governa

contra os direitos e sabe que tem mais diplomas que são inconstitucionais, estando a trabalhar neles.

Vejamos aquele diploma das 40 horas e vejamos também aquele do corte retroativo de pensões da Caixa

Geral de Aposentações, que, como toda a gente sabe, incluindo os partidos da maioria, incluindo o Governo,

é, mais uma vez, uma inconstitucionalidade.

Quem teima em seguir o mesmo caminho quando é alertado faz essa opção sabendo que está errado, mas

sabendo que essa é a sua escolha ideológica. Ora, um Governo que governa contra aquela que é a matriz de

uma sociedade, os direitos consagrados numa Constituição, instituídos durante décadas, é um Governo que

não só não conhece o seu País como sabe que está a governar contra o próprio País.

Concluímos, desta escolha do Governo em insistir nesta matéria e em insistir em mais

inconstitucionalidades, que este é apenas mais um episódio de um Governo que, não conhecendo a

Constituição, acha que tem ali o seu maior inimigo. Ora, é um Governo que não sabe sobre o que jurou e não

sabe estar à altura daquela que é uma estrutura institucional do País e, por isso, não está à altura da

governação.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Segue-se, agora, Os Verdes.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Em primeiro lugar, queria

cumprimentar-vos a todos e depois, a propósito da intervenção do Sr. Deputado João Pinho de Almeida,

gostava de dizer que é bom que o País e, fundamentalmente, a maioria parlamentar e o Governo ponham na

cabeça de uma vez por todas que o programa da troica não está acima da Constituição da República

Portuguesa e os desejos do Governo também não. Ponto final!

Aquilo que tem sido percetível e que o País já compreendeu é que o Governo não convive bem com a

Constituição da República Portuguesa, primeiro, porque a viola recorrentemente e, depois, porque reage de

uma forma perfeitamente inédita e absurda às decisões do Tribunal Constitucional de acordo com a

Constituição da República Portuguesa.

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Portanto, ter um Governo que não convive bem com a lei mãe, a Lei Fundamental do País é uma coisa que

não direi apenas e só que é esquisita mas que é perigosa. Estas inúmeras tentativas de violação da

Constituição é uma coisa absolutamente perigosa.

E o que vão fazendo o Governo e a maioria parlamentar? Vão disfarçando estas violações da Constituição

antes de elas serem declaradas inconstitucionais. Dissemos aqui vezes sem conta que este diploma, com este

nome pomposo da requalificação dos funcionários públicos, não era nada disso, era um programa de

despedimento de milhares de funcionários públicos — é isto que este diploma visa! — sem justa causa,

arbitrariamente.

A maioria, tal como o Governo, dizia sempre que não, que estávamos a ver mal as coisas, mas o Tribunal

Constitucional veio confirmar isso e hoje não restam dúvidas de que este era um diploma de despedimento

arbitrário de funcionários públicos, o que é algo absolutamente inqualificável, pois significa que para o Governo

e para esta maioria parlamentar vale tudo, tudo! Um Primeiro-Ministro que disse, não nesta sala mas na do

Plenário, que não despediria funcionários públicos está a querer fazê-lo.

Depois, a forma como reagem é até inqualificável. O Sr. Primeiro-Ministro falar do bom senso dos Srs.

Juízes do Tribunal Constitucional?!… O Sr. Primeiro-Ministro perguntar, assim, à boca larga, aos 900 000

desempregados (que, por acaso, são mais e ele sabe-o) de que é que já lhes valeu a Constituição da

República Portuguesa?!… O Primeiro-Ministro não sabe, por exemplo, que é a Constituição da República

Portuguesa que assegura o subsídio de desemprego aos desempregados?

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Exatamente!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — O Sr. Primeiro-Ministro não sabe a quantidade e a qualidade dos

direitos que estão assegurados na Constituição da República Portuguesa? Esta

interrogação/afirmação/provocação que o Sr. Primeiro-Ministro faz aos portugueses é uma absoluta vergonha.

Por último, ameaçar com um segundo resgate ou com medidas ainda mais gravosas devido a este chumbo

do Tribunal Constitucional, como quem diz «Não vão ter disto, mas vão ter ainda pior e eu cá estou para isso».

Sr.as

e Srs. Deputados, cada vez mais não restam dúvidas de que a solução para este País é este Governo ir

para a rua.

A Sr.ª Presidente: — Pelo PSD, tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Leal Coelho.

A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as

Deputadas e Srs. Deputados: O Grupo

Parlamentar do PSD acolhe com respeito esta devolução pelo Presidente da República, na sequência da

pronúncia por inconstitucionalidade do Decreto da Assembleia da República n.º 177/XII (2.ª), mas gostaríamos

aqui de clarificar um conjunto de pontos.

Em primeiro lugar, tal como já disse o Deputado João Pinho de Almeida, estamos condicionados por um

contexto de crise económica e financeira, que é um facto público e notório e que está corporalizado

precisamente enquanto pressuposto do Memorando de Entendimento que estamos a cumprir, documento

esse que foi subscrito pelo PS e por causa da sua governação,…

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Muito bem!

A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — … por causa da dívida que atingimos. Foi por causa do despesismo e

dos défices sucessivos que as opções governativas do PS nos levaram às circunstâncias de 2011, obrigando-

nos a este Memorando de Entendimento.

Por outro lado, não temos a mesma interpretação da Constituição que os partidos da esquerda, e ainda

bem que não temos, porque esses partidos não admitem que há ciclos eleitorais resultantes de eleições por

sufrágio universal que são para cumprir. E estamos exatamente num desses ciclos eleitorais neste período de

governação, que vai chegar ao final da legislatura pacificamente, precisamente porque isso decorre de um

princípio democrático constitucionalmente consagrado.

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Mas não posso deixar de evidenciar uma questão que é óbvia para todo e qualquer português, que é a de

que não há ordem constitucional que possa perdurar sem sustentabilidade, pois sem sustentabilidade não são

assegurados quaisquer direitos que estejam constitucionalmente consagrados.

Por outro lado, achamos curioso que o Partido Socialista, nomeadamente através do Deputado Basílio

Horta — que daqui cumprimento —, tenha optado pela defesa da Constituição, dado que votou contra esta

Constituição, o que significa que o que é a génese ou o âmago inicial da Constituição foi repudiado pelo

Deputado Basílio Horta.

Protestos do PS.

Quero ainda chamar a atenção para os condicionalismos desta governação. O Governo, a Assembleia da

República e esta maioria parlamentar vão arranjar soluções, medidas alternativas que vão substituir, que vão

corrigir o diploma de forma a que ele se enquadre no parâmetro estabelecido pelo acórdão do Tribunal

Constitucional.

A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Mas o acórdão do Tribunal Constitucional e a Constituição da

República Portuguesa não são os únicos constitucionalismos a que estamos sujeitos. Estamos também

sujeitos ao Memorando de Entendimento, a atingir os limites do défice e à contenção da dívida, para que, a

prazo, possamos aliviar a carga fiscal dos portugueses e garantir a sustentabilidade.

A Sr.ª Presidente: — Sr.ª Deputada, queira terminar. Já usou quase o dobro do tempo de que dispunha.

A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Para terminar, Sr.ª Presidente, chamo a atenção para o facto de que

se o Memorando de Entendimento subscrito pelo PS estivesse em vigor na sua versão inicial, para 2014

teríamos de atingir um défice de 1%.

Vozes do PSD e do CDS-PP: — É verdade!

A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — O que significa que o Partido Socialista, para cumprir aquilo com que,

no exercício de soberania, comprometeu Portugal, teria de assegurar estas medidas e muitas mais.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — O Sr. Deputado Basílio Horta pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Basílio Horta (PS): — Sr.ª Presidente, gostaria apenas dizer aos Srs. Deputados Teresa Leal Coelho

e João Pinho de Almeida que efetivamente votei contra a Constituição em 1976, acompanhado por Diogo

Freitas do Amaral, por Adelino Amaro da Costa, por Vítor Sá Machado. Foi contra essa Constituição que votei,

não foi contra esta, que resulta de várias revisões.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Em segundo lugar, Sr.ª Presidente, embora votando contra a Constituição, acontece que fui membro de um

Governo com o Partido Socialista e nunca houve uma decisão minha ou do Governo a que pertenci sujeita a

inconstitucionalidade decretada pelo Tribunal Constitucional. Nunca!

Aplausos do PS.

Eram outros tempos e outra gente! Era outro partido!

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Gostaria ainda de dizer, e com isto termino, que o que é grave é que aqueles que votaram a favor da

Constituição, o PSD, agora a desrespeitem permanentemente. Isso é que é grave!

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Para dar, explicações, querendo, tem a palavra o Sr. Deputado João Pinho de

Almeida.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, com todo o respeito e até amizade pelo Sr.

Deputado Basílio Horta, gostaria de referir que quando há pouco invoquei o facto de o Sr. Deputado ter votado

contra esta Constituição o fiz no contexto da liberdade que todos temos de discordar.

Protestos do Deputado do PS Carlos Zorrinho.

Sr. Deputado Carlos Zorrinho, há uma coisa que o Sr. Deputado Basílio Horta, que é jurista, sabe: a

Constituição é de 1976.

O Sr. Basílio Horta (PS): — Por amor de Deus!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — O Sr. Deputado pode dizer o que quiser, que a Constituição

tem várias revisões. Mas não estamos a falar da Constituição de 1933. Sobre a Constituição de 1933, quem cá

estava há de saber que posição é que teria sobre a mesma.

Protestos do PS.

Mas a Constituição é de 1976 e, portanto, independentemente da revisão em que estamos, a liberdade de

discordar é uma liberdade total.

Disse o Sr. Deputado Basílio Horta, dirigindo-se a esta bancada, que «era outro partido». Não, Sr.

Deputado. Com, muita honra, era o mesmo partido que o senhor ajudou a fundar, o partido que defendia a

liberdade de tal forma que permitia que uns concordassem com a Constituição e outros discordassem dela.

Era esse partido da liberdade, e esse partido aqui está, Sr. Deputado.

O Sr. Deputado pode, hoje em dia, discordar, mas é em nome dessa mesma liberdade que o senhor um dia

exerceu que neste momento também achamos que temos o direito de dizer que a interpretação da

Constituição é uma interpretação legítima, que permite aproximar regimes em Portugal e que permite que não

haja portugueses que possam ser despedidos de uma maneira e que, de um momento para o outro, percam o

seu emprego e que haja outros que possam estar num regime em que têm todas as garantias. Queremos

equilibrar os dois regimes, com um princípio que o senhor também conhece, porque o defendeu nesta

bancada: o princípio personalista, o de que a pessoa humana está em primeiro lugar, merece respeito, mas

que merece igual respeito trabalhe no sector público ou trabalhe no sector privado.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente: — Também para dar explicações, querendo, tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Leal

Coelho.

A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Basílio Horta, é um facto que o Sr.

Deputado votou contra a Constituição de 1976, que é a Constituição que está em vigor. E seguramente votou

contra acompanhado de boa gente.

Na Assembleia Constituinte estava boa gente no CDS-PP, como estava boa gente no PSD,…

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — E no PS!

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A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — … como hoje há boa gente em qualquer destas bancadas, incluindo

na bancada do PS.

Portanto, a boa gente, aquela gente ou outra gente é uma expressão que pode ser interpretada como

discriminatória, numa perspetiva intergeracional, em relação às gerações políticas do passado e às que estão

em funções neste momento.

É verdade que muitos de nós não estávamos neste Parlamento há mais de 30 anos, mas alguns estariam e

foram esses que exerceram o direito de voto. Nós fizemos o nosso percurso e fizemos o percurso de

cumprimento da Constituição.

A Constituição que está em vigor é uma Constituição que o PSD cumpre e respeita, mas é uma

Constituição que o PSD interpreta com a liberdade que a democracia e o Estado de direito lhe garantem.

Essas interpretações da Constituição, volto a repetir, estão extraordinariamente condicionadas pela

irresponsabilidade das medidas adotadas no passado. E nós vamos garantir, por um lado, a sustentabilidade

futura da Constituição, isto é, dos direitos constitucionalmente consagrados, como vamos garantir que não

haja irresponsabilidades intergeracionais. Nós não admitimos condicionar a autonomia das gerações futuras

em nome de irresponsabilidades das gerações presentes.

Por último, Sr. Deputado Basílio Horta, refiro apenas que esta Constituição que o Sr. Deputado não votou,

mas com a qual se encontrou mais tarde, numa qualquer revisão constitucional, é uma Constituição que

respeitamos e fazemos cumprir, apesar de muitos dos intérpretes da mesma terem admitido, no quadro da

Constituição, três resgates que oneram a nossa soberania.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Sr.as

e Srs. Deputados, terminámos este ponto da ordem do dia.

Cumprimento o Sr. Ministro da Presidência e dos Assuntos Parlamentares e o Sr. Ministro da

Administração Interna, que acabam de entrar na Sala, e que vêm participar no debate do ponto seguinte, que

consta da discussão e votação de um voto de pesar pelo falecimento de bombeiros nos incêndios florestais

deste verão, que apresentei, que foi também subscrito por todos os grupos parlamentares e ao qual se associa

o Governo.

Srs. Deputados, o voto n.º 148/XII (2.ª) — De pesar pelo falecimento de bombeiros nos incêndios florestais

deste verão (Presidente da AR, PSD, PS, CDS-PP, PCP, BE e Os Verdes) é do seguinte teor:

«Hoje, veneramos em dor os heróis deste verão de incêndios. Veneramos a sua coragem e amor aos

outros, a sua entrega inteira, tão inteira que desafiou as possibilidades do humano até ao sacrifício extremo.

Porque nada é maior do que a vida, e foi a vida que, em defesa de todos nós, eles arriscaram e perderam!

Todos lhes devemos tanto!

António Nunes Ferreira, 45 anos, Miranda do Douro; Pedro Rodrigues, 41 anos, Covilhã; Ana Rita Pereira,

23 anos, Alcabideche; Bernardo Figueiredo, 23 anos, Estoril; Cátia Pereira Dias, 21 anos, Carregal do Sal;

Bernardo Cardoso, 19 anos, Carregal do Sal; Fernando Reis, 51 anos, Valença; e Daniel Falcão, 25 anos,

Miranda do Douro.

Eles foram à luta numa dádiva generosa e sem limites. Heróis em cenários de inferno, de uma tragédia de

devastação, de feridas e de morte, no combate desigual entre o fogo e os homens, heróis do corpo e heróis da

alma. O que há de melhor e mais humano tem nestes nomes a sua mais intensa representação!

Não os esqueceremos nunca. Não esqueceremos o seu exemplo — o da mais bela síntese de humanidade

e cidadania. Porque a humanidade é a negação da indiferença e a cidadania é ela, por natureza, ativa!

Foi o sentido sublime desta síntese entre amor aos outros e agir o que eles, em suprema dor e supremo

sacrifício, carregaram. Foi esse sentido de agir e da coragem de agir, primeira condição ética de estar no

mundo, o exemplo que eles nos deram.

Não os esqueceremos na sua paisagem de horror, os bombeiros profissionais e voluntários, as famílias, a

mão amiga dos vizinhos, a mão incansável dos autarcas, todos protagonistas de um sofrimento gigantesco.

Curvamo-nos perante todos, numa gratidão unânime e sem limites.

É como se esta manifestação de pesar não pudesse caber em si mesma, estes heróis chamando por todos

os heróis, os heróis anónimos, os heróis do povo! Eles que tudo deram era supremo desinteresse. Eles que

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foram para lá de tudo o que é possível e exigível. Guardamos o seu exemplo, o mais forte e mais belo entre os

exemplos!

Shakespeare assinalou esta marca de esplendor que não morre, esta espécie de negação de morte dos

heróis, como os que aqui hoje choramos e veneramos. Na sua passagem sobre o pescador de pérolas, ele

dizia que os heróis se transformam em insólitos tesouros que havemos de transportar em exemplo para que

participem do mundo dos vivos.

É assim quando a ação humana desafia todos os limites. Ela torna-se marca indelével com os seus

autores, os seus tempos e lugares. Como uma muralha que se ergue e onde a nossa memória coletiva tem

sempre de bater, agradecer e refletir.

Armamar, em 1985; Caramulo, em 1986; Nisa, em 2003; Sabugal, em 2009; São Pedro do Sul, em 2010;

Tavira e São Brás de Alportel, em 2012; Alfândega da Fé, em 2013. Caramulo de novo! Estes lugares e estes

anos, representando outros lugares e outros anos.

As imagens da tragédia entraram nas nossas casas, deixaram-nos suspensos de apreensão e dor, uma dor

unânime e agradecida que nos atravessou a todos.

Os antigos diziam que a ação corajosa e desinteressada é o lugar predileto da virtude! Foi a virtude o que

eles levaram até às últimas consequências. A virtude como substância ética da alteridade e do sentido dela.

Eles dizem-nos que nada existe sem os outros, que nada tem valor sem a consideração dos outros. Desta vez,

somos nós esses outros e a nossa gratidão não tem limites.

Sentimos a perda destes homens e mulheres, sentimo-la doer dentro de nós. A contagem insuportável da

morte de seres humanos, cada um único e irrepetível. Sentimos a dor dos queimados e feridos. Sentimos a

dor dos que tudo arriscaram em terra desconhecida, fazendo-a sua, e dos seus habitantes o seu próximo.

Sentimos a dor de tantos outros e tantas outras!

E esta dor não pode aqui deixar também de ser também matéria de desafio. Porque é um desafio que nos

é lançado a todos nós que ficamos, a todos nós, sociedade política e sociedade civil: o de empreendermos

agora uma luta de muitas frentes, recusa da banalização da tragédia, de mobilização de todos os meios e

todas as vontades para que um mal assim não volte a acontecer. A luta passou agora para as nossas mãos,

somos nós agora os combatentes!

A dor que se expressa neste lugar de representação e decisão envolve um propósito político firme de agir.

O Parlamento vai constituir um grupo de trabalho, por vontade unânime dos grupos parlamentares, para uma

ação determinada que considere as múltiplas dimensões em que o problema dos incêndios florestais deve ser

enfrentado. E realizará, no próximo mês de outubro, um grande debate que não cabe nesta Comissão

Permanente.

O sinal dos mortos é para nos comprometermos com o renascimento. Só pelo renascimento nos fazemos

os pescadores de pérolas de que falava Shakespeare, só assim os faremos presentes no mundo dos vivos.

Entre a lei, o Governo e as autarquias, as comunidades de vizinhos e a autónoma vontade dos indivíduos

até à partilha da União Europeia.

Aqui, venerar e não esquecer é fazer!

Às famílias, às corporações e aos seus feridos, aos vizinhos e amigos, aos autarcas, o abraço de pesar de

todos os Deputados do Parlamento.»

Como está previsto, vou dar a palavra a todos os grupos parlamentares e ao Governo para intervirem sobre

este voto, lembrando os Srs. Deputados que se encontram nas galerias o Vice-Presidente da Liga de

Bombeiros e alguns familiares dos bombeiros falecidos, a quem dirijo um grande abraço em nome, tenho a

certeza, dos 230 Deputados, alguns dos quais aqui não estão mas que estão connosco de outro modo.

Sendo assim, vou dar a palavra pela ordem prevista, isto é, do maior partido para o mais pequeno e depois

ao Governo.

Em primeiro lugar, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Batista Santos, do PSD.

O Sr. Paulo Batista Santos (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Presidência e dos Assuntos

Parlamentares, Sr. Ministro da Administração Interna, Sr.as

e Srs. Deputados: Este ano, de facto, o flagelo dos

incêndios tem tido contornos particularmente trágicos. Foram oito os bombeiros que perderam a vida no

combate às chamas que assolaram o País este verão. A morte de um bombeiro já seria um número

demasiado trágico a lamentar, mas esta dolorosa contagem crescente de vidas perdidas e de famílias

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devastadas alastra ainda mais o sofrimento, comove-nos e deixa-nos a todos de luto. Não podemos deixar de

prestar a nossa homenagem à coragem e à dedicação destes homens e mulheres que entregam, literalmente,

o seu corpo à luta.

Estamos profundamente gratos aos milhares de bombeiros que continuam a combater o fogo diariamente.

Estamos infinitamente agradecidos pela dedicação e pela solidariedade e por darem o seu melhor para salvar

vidas, mesmo sabendo o risco que correm e que a sua ação lhes pode custar a vida.

É por isso que são verdadeiros heróis: Cátia Pereira Dias, Bernardo Figueiredo, Ana Rita Pereira, André

Nuno Ferreira, Pedro Rodrigues, Bernardo Cardoso, Fernando Manuel Reis, Daniel Falcão. Lamentamos

profundamente que o fogo os tenha vencido. São perdas incomensuráveis e irreparáveis e sabemos que não

há palavras que possam acalmar a dor e a justificada revolta que estas mortes provocam.

Não esqueceremos a forma solidária, responsável e destemida com que levaram a cabo esta missão tão

dura.

Dirijo uma palavra muito especial aos familiares destes corajosos portugueses e portuguesas, assim como

às suas corporações e aos seus companheiros de combate às chamas.

Não quero deixar de expressar sincera e profunda solidariedade para com todos os familiares das

bombeiras e dos bombeiros que faleceram e para com todos os que, apesar desta dor coletiva, continuam a

arriscar a vida todos os dias heroicamente e a entregar-se de corpo e alma a esta ingrata missão. A todos os

eles o nosso muito obrigado!

Sr.ª Presidente, V. Ex.ª lançou aqui um desafio que todos temos, o Parlamento e o País. Todos os anos,

Portugal tem de lidar com o drama dos incêndios florestais. Isto não pode significar, contudo, que possamos

alguma vez resignar-nos a esta realidade, atribuindo-lhe um caráter de fatalidade. Não é, não pode ser! Não

podemos baixar os braços e, sobretudo, não podemos banalizar um assunto tão grave, tão dramático e tão

doloroso para o País e principalmente para as famílias daqueles bravos homens e mulheres que perderam a

vida a lutar pelo bem comum.

Esta é uma área onde nunca está tudo feito e onde, por mais que se faça, há sempre muito mais a fazer,

no trabalho de prevenção, no ordenamento do território, na fiscalização ativa, no planeamento, na gestão e na

maximização dos meios e dos recursos disponíveis, no enquadramento jurídico e penal cada vez mais

dissuasor de atos criminosos.

É importante refletir sobre o que ainda pode ser feito. É isso que iremos fazer empenhadamente no grupo

de trabalho que este Parlamento irá criar.

É necessário promover um trabalho cada vez mais importante de cidadania, de responsabilidade, de

solidariedade e de respeito pelo que é de cada um, pelo que é de todos, e sobretudo de respeito pelo maior

valor seguramente para todos nós, que é a vida humana.

A Sr.ª Presidente: — Tem agora a palavra o Sr. Deputado Mota Andrade, do PS.

O Sr. Mota Andrade (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Presidência e dos Assuntos Parlamentares,

Sr. Ministro da Administração Interna, Sr.as

e Srs. Deputados: Hoje homenageamos, com grande sentido de

pesar, a memória de todos aqueles que tombaram no combate aos incêndios que flagelaram o nosso País.

Homens e mulheres, que, com grande coragem e entrega, deram tudo, que pagaram com a vida numa luta

desigual para defender os haveres da comunidade e a vida das pessoas. Às suas famílias, aos seus colegas,

apresentamos as nossas profundas condolências e a nossa sincera solidariedade. Mas às famílias e aos

colegas destes heróis é igualmente devido, em nome dessa homenagem, que o País possa apurar as

condições em que ocorreram as tragédias.

Nas imagens que nos foram dadas a ver, pudemos observar a luta, o drama, a agonia, o cenário dantesco

vivido em tantos locais do País. E todos sentimos revolta. Sim, uma enorme revolta ao ver a dor, o sofrimento

de tantos e tantas, que, em segundos, perdiam o trabalho de uma vida. E lá estavam no combate os soldados

da paz, horas a fio, muitas vezes em terra estranha, homens e mulheres que davam o seu melhor pelo seu

semelhante, num combate sem tréguas a incêndios e fogos florestais tantas vezes evitáveis.

São cenários que, ao longo de anos, se têm repetido, tragédias provocadas pelo fogo. O País não pode

continuar a passar por esta situação de forma resignada. O momento é de consternação e de pesar, bem o

sabemos. Mas, a seu tempo, o apurar de responsabilidades, o apostar na vigilância e na prevenção para que

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situações como as que vivemos não tornem a acontecer é uma exigência que todos temos de assumir. Será

assim que melhor expressaremos a gratidão e que não esqueceremos aqueles que entregaram as suas vidas

em benefício da comunidade e do nosso País.

A Sr. ª Presidente: — É agora a vez do CDS. Tem a palavra o Sr. Deputado Hélder Amaral.

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Presidência e dos Assuntos

Parlamentares, Sr. Ministro da Administração Interna, Sr.as

e Srs. Deputados: Começo por apresentar as

nossas sentidas condolências às famílias das vítimas, aos amigos e às corporações de bombeiros e por

prestar a nossa homenagem a todos os bombeiros de Portugal, aos heróis do povo: António Nunes Ferreira,

Pedro Rodrigues, Ana Rita Pereira, Bernardo Figueiredo, Cátia Pereira Dias, Bernardo Cardoso, Fernando

Reis e Daniel Falcão. Eles foram à luta, numa dádiva generosa sem limites. Não os esqueceremos nunca, não

esqueceremos o seu exemplo.

Sabemos que o Parlamento vai constituir um grupo de trabalho e, como bem disse a Sr.ª Presidente, não é

hoje o dia, nem o local, nem o momento para debater as várias dimensões da defesa da floresta contra

incêndios. Mas queria garantir, em nome do CDS, hoje, a nossa disponibilidade para avaliar o que pode e

deve ser feito no seguimento do relatório que o Sr. Ministro da Administração Interna acaba de anunciar e que

apresentará em breve.

Gostaria também de referir a nossa convicção de que haverá apoios aos que foram atingidos por esta

tragédia.

Refiro ainda a nossa disponibilidade, no respeito da Constituição da República Portuguesa e do poder

judicial, para reduzir a divergência que há entre o número de criminosos que já foram julgados e condenados e

aqueles que se encontram efetivamente a cumprir pena de prisão.

Temos esperança de que, com a entrada em vigor do banco de terras, possamos ter mais terra cuidada,

menos terra abandonada, logo, melhor prevenção. É na prevenção que devemos concentrar o nosso esforço.

Porventura não precisaremos de mais leis, precisamos é de uma mudança de atitude.

Os incêndios, como sempre ouvimos dizer, não se combatem, evitam-se, principalmente através da

prevenção feita por aqueles que não podem nem devem ignorar a geografia e as características da floresta do

seu território. Novos aceiros, mais e melhores pontos de vigia, novos pontos de águas, mais e melhor limpeza

de matas, mais e melhores faixas de contenção, mais e melhor fiscalização são coisas que estão a nosso

alcance para evitarmos, ano após ano, tragédias como estas a que acabámos de assistir.

Sr.ª Presidente, direi, para terminar, que a homenagem a estes homens e mulheres que dão tudo e fazem

jus ao seu lema «vida por vida» merecem deste Parlamento, de todas as bancadas, uma maior atenção e um

reforço da vigilância e do que deve ser feito para prevenir e não tanto combater o flagelo dos incêndios em

Portugal.

A Sr.ª Presidente: — Pelo PCP, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Ministros, Sr.as

e Srs. Deputados: As nossas primeiras

palavras são para exprimir as nossas sinceras condolências aos familiares e às corporações dos bombeiros

falecidos este ano no combate aos fogos florestais.

O ano de 2013 tem sido trágico pelas consequências humanas dos incêndios florestais. É difícil encontrar

palavras para exprimir o nosso pesar pela morte de bombeiros no cumprimento da sua nobre, difícil e

benévola missão. Todas as homenagens são devidas a estes homens e a estas mulheres que diariamente

arriscam a vida em defesa da comunidade sem nada receberem em troca. Esse pesar é comum a todos nós e

a essas homenagens todos nos associamos.

Mas neste momento é preciso dizer algo mais. É preciso dizer que a dimensão e a gravidade dos fogos

florestais deriva de uma chaga que tem o nome de desordenamento florestal.

É claro que as condições climatéricas são propícias à propagação dos incêndios; é claro que há mão

criminosa em muitos incêndios, que é preciso combater com meios e com firmeza; mas é também claro que o

mau estado da floresta e a falta de investimento na prevenção contribuem decisivamente para agravar o

pesadelo que todos os anos nos assalta.

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O reordenamento florestal é a mais importante medida preventiva dos fogos e não basta legislar, é preciso

clarificar quem fiscaliza, quem notifica e quem faz cumprir a legislação.

As circunstâncias em que vivemos obrigam a que haja mais orçamento para o combate aos fogos do que

para a prevenção, quando a lógica deveria ser exatamente a inversa. Se houvesse mais investimento na

prevenção poupar-se-ia muito no combate, em dinheiro, em meios, em bens materiais e, principalmente, em

vidas humanas.

No que se refere aos meios de combate, não podemos deixar de nos questionar sobre a adequação entre

os meios disponíveis no terreno e a dimensão e gravidade das situações a que os bombeiros têm de acorrer.

Não podemos ignorar as críticas que são dirigidas à insuficiência dos meios aéreos nacionais para o combate

aos incêndios, que nos obriga todos os anos a recorrer ao auxílio de outros países, ou à insuficiência de meios

e de equipamentos de proteção de muitas das nossas corporações de bombeiros.

Comprometemo-nos hoje, aqui, a criar um grupo de trabalho para estudar e debater com profundidade a

problemática dos fogos florestais. Devemos fazê-lo. Mas convém lembrar que não é a primeira nem a segunda

vez que o fazemos. Em 2006, uma comissão parlamentar eventual para os fogos florestais produziu um

primeiro relatório contendo um conjunto de importantes recomendações; em 2007, foi produzido um segundo

relatório com novas recomendações; seis anos depois, perante a tragédia que se abateu sobre o País, é

preciso saber o que foi feito desses relatórios e que cumprimento foi dado pelos governos às suas

recomendações.

O grupo de trabalho que vai ser criado, na sequência do voto que hoje aprovamos, não precisa de inventar

o que já foi inventado, mas tem o dever de apurar responsabilidades pelas recomendações que nunca

passaram do papel.

A crise e as dificuldades económicas do País não servem de desculpa para a falta de investimento na

prevenção e nos meios de combate aos fogos florestais pela simples razão de que essa falta de investimento

conduz a prejuízos que são incomparavelmente superiores. A lógica prevalecente nas políticas de combate

aos fogos em Portugal continua a ser a de que como não se preveniu tem de se remediar. Só que para as

vidas humanas que se perderam no combate aos fogos infelizmente já não há remédio.

A Sr.ª Presidente: — Tem a agora a palavra, pelo BE, a Sr.ª Deputada Cecília Honório.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr.ª Presidente, Srs. Ministros, Sr.as

Deputadas e Srs. Deputados:

Acompanhamos esta homenagem com toda a solidariedade e respeito e gostaria também de deixar uma

palavra aos homens e às mulheres que ficaram feridos nos incêndios deste verão e pelos quais podemos

ainda fazer muito.

Para as famílias, para os amigos e para os filhos que estes homens e estas mulheres deixaram as nossas

palavras nunca estarão à altura do sofrimento e da perda que estão a sofrer.

Por isso, hoje, é o momento que todos os representantes eleitos acham ser a hora de valorizar a coragem

abnegada dos homens e das mulheres que combatem este flagelo com uma entrega total, arriscando quase

tudo.

Mas nesta hora, que é de profunda comoção, como só pode ser, e neste momento do nosso testemunho,

do nosso respeito absoluto pelo vosso trabalho, é também a hora de assumirmos a responsabilidade de toda a

discussão e de toda a avaliação que falta fazer sobre este flagelo que o País continua a viver ano após ano.

Por isso, quando a Sr.ª Presidente aqui deixou o repto de que não podemos, de forma alguma, aceitar a

banalização da tragédia, nós só podemos responder: Sr.ª Presidente, estamos cá para fazer esse trabalho!

Aceitamos os compromissos definidos coletivamente, mas também chamamos a atenção para o muito

trabalho que tem sido feito e para a dificuldade que há em tocar na responsabilidade do muito que falta fazer.

Chegará, pois, a hora — e nós comprometemo-nos com esse trabalho — em que é necessário

compreender as razões destas perdas, que não há palavras que possam acompanhar, apurar as

responsabilidades e identificar o que devia ter sido feito melhor do que o foi. Nós preocupamo-nos!

É evidente que há falta de investimento na floresta, é evidente que há falta de prevenção, mas também é

preciso equacionar se os meios e a forma como estes foram postos ao dispor o foram na qualidade e na

quantidade desejável face ao flagelo sofrido.

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Estaremos cá, Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, para tudo o que for necessário, porque estas vidas

não podem ser perdidas em vão.

Por isso, comprometemo-nos. Vamos avaliar este processo e vamos apurar as responsabilidades, porque

esta história, estas perdas não se podem repetir.

A Sr.ª Presidente: — Tem agora a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, de Os Verdes.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Srs. Ministros, Sr.as

e Srs. Deputados: Queria, em

nome do Grupo Parlamentar Os Verdes, dizer que nos associamos completamente a este voto de pesar, que

subscrevemos, manifestando o nosso mais sentido pesar às famílias dos oitos bombeiros que perderam a vida

este ano e às respetivas corporações de bombeiros.

Morreram novos de idade, alguns muito novos de idade, a salvar o País das chamas absolutamente

descontroladas. Estes bombeiros morreram para salvar outras vidas e o património do País, num trabalho de

solidariedade e de abnegação que tem de ser absolutamente reconhecido. São pessoas, naturalmente, com

características muito especiais.

Sr.as

e Srs. Deputados, Os Verdes também julgam que a melhor forma de homenagear estes homens e

estas mulheres que perderam a vida e também de homenagear outros homens e mulheres que perderam a

vida no combate aos fogos noutros anos — e para que não voltemos muitas vezes, aqui, a homenagear outros

homens e outras mulheres que, eventualmente, perderam a sua vida no combate às chamas —, para

tentarmos poupar essas vidas é preciso que a Assembleia da República volte a fazer uma nova reflexão.

Sr.as

e Srs. Deputados, Os Verdes vão hoje fazer uma declaração política justamente sobre a matéria dos

incêndios florestais, porque consideramos que hoje, primeiro dia após o período de férias em que se reúne a

Comissão Permanente, é o dia em que a Assembleia da República tem de começar a discutir o flagelo dos

fogos florestais. E a discussão deste voto, como primeira marca, é extraordinariamente importante.

Estes são os homens e as mulheres que, primeiro, temos de homenagear, mas homenageá-los significa

também fazer uma grande reflexão.

Aquando da preparação da declaração política que vou proferir, estive a reler um relatório da Assembleia

da República de 1990. Desde então, morreram muitos bombeiros e muitas bombeiras. Sr.as

e Srs. Deputados,

aconselho-os a todos que leiam o que aquele relatório refere sobre prevenção dos fogos florestais.

Sr.as

e Srs. Deputados, se hoje fizermos um relatório no Parlamento sobre a prevenção dos fogos florestais,

vamos buscar quase todas aquelas ideias.

O que é que falhou? Os bombeiros diziam, na televisão, este ano: «Falhou a prevenção, o que dificulta

muito mais o combate! A prevenção não aconteceu como deveria ter acontecido!» E nós temos de ouvir isto!

Isto tem de resultar em ação, em pró-atividade!

Sr.as

e Srs. Deputados, não vou dizer muito mais neste momento, que é de sentido pesar e de homenagem

às famílias e às corporações, mas quero dizer mais qualquer coisa daqui a alguns minutos, quando proferir a

minha declaração política.

A Sr.ª Presidente: — Para intervir, em nome do Governo, tem a palavra o Sr. Ministro da Administração

Interna.

O Sr. Ministro da Administração Interna (Miguel Macedo): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados:

Queria, em nome do Governo, associar-me ao voto de pesar que o Parlamento hoje expressa pela morte dos

bombeiros vítimas do combate às chamas em defesa de pessoas, de bens e do património florestal do País.

Um voto de pesar pelo António, pelo Pedro, pela Ana Rita, pelo Bernardo Figueiredo, pelo Bernardo Cardoso,

pela Cátia, pelo Fernando e pelo Daniel.

Este voto de pesar é também um voto de reconhecimento e de gratidão pelo trabalho, pelo empenhamento,

pelo exemplo e pela dedicação de todos aqueles que abraçam a missão nobre de socorrer e de assistir os

outros.

É um voto que evoca a memória e os exemplos destes bombeiros e que não esquece, neste momento,

todos aqueles que, ainda nos hospitais, lutam pela vida, sendo acompanhados com enorme carinho e enorme

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dedicação — sou testemunha disso — pelos médicos e por todo o pessoal hospitalar no sentido de salvar as

suas vidas e de minorar o seu sofrimento.

Queria, pois, aqui, expressar também esta palavra sentida.

Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, não sei se esta é a hora, mas permitam-me uma nota pessoal: qualquer

um de nós que viva de forma direta os momentos que eu vivi neste verão não sai daqui a mesma pessoa.

Eu vivi e senti as ondas de dor que percorreram este País, que atingiram tantas famílias, algumas delas

aqui presentes, que magoaram profundamente tantas corporações de bombeiros, que alastraram aos amigos

mais próximos daqueles que morreram neste combate desigual. Quero aqui dizer-vos que para quem viveu,

como eu vivi — como homem e pessoa que sou também com emoções —, estes momentos trágicos, sinto,

com uma determinação redobrada, que o País não pode continuar na situação em que está em relação à

questão dos fogos florestais.

E julgo que, sem prejuízo de fazermos os apuramentos que quisermos em torno desta matéria, o sinal

maior, o reconhecimento maior que todos, como País — mas também nós, que temos responsabilidades

políticas —, podemos dar é o de, com enorme determinação, fazermos aquilo que ainda não foi feito. Sabendo

que esta é uma atividade de muito risco, sabendo que temos um País que tem condições climatéricas muito

difíceis — em particular na segunda quinzena do mês de agosto e até ao dia 3 de setembro tivemos situações

climatéricas muitíssimo difíceis no terreno —, sabendo que muitos destes combates foram feitos em condições

muito difíceis e em terrenos cuja orografia era terrível, sabendo tudo isso temos todos a consciência de que

temos de redobrar de determinação para, como dizia, fazer aquilo que ainda não foi feito.

Queria, neste momento, Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, não me estendendo mais sobre estas matérias,

pois haverá um momento próprio para falarmos sobre tudo isto, apresentar as condolências, em nome do

Governo português, às famílias dos bombeiros que faleceram e às corporações de Alcabideche, do Estoril, da

Covilhã, de Miranda do Douro, de Carregal do Sal e de Valença.

Queria também, a todos aqueles que, neste momento, estão no combate aos fogos em Arouca, em Vale de

Cambra, fogos com algum significado e dimensão, deixar uma palavra de solidariedade e de confiança na

certeza de que aquilo que se passou é motivo para as homenagens do País e dos portugueses, para a

gratidão do País, mas também tenho a certeza absoluta para a reforçada determinação de tudo fazermos para

que este inferno das chamas, que se repete anos após ano no nosso País, tenha um dia o seu fim.

Se assim for, julgo que estamos a homenagear da melhor forma a memória destes bombeiros, que tudo

deram ao serviço do seu País, das suas gentes e do seu património.

Queria, por isso, de forma muito sentida, terminar esta intervenção, evocando o seu exemplo, um exemplo

maior de portugueses de primeira, que nos enche de dor, mas, ao mesmo tempo, de profundo

reconhecimento.

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, feitas estas intervenções, vamos passar à votação do voto n.º

148/XII (2.ª) — De pesar pelo falecimento de bombeiros nos incêndios florestais deste verão (Presidente da

AR, PSD, PS, CDS-PP, PCP, BE e Os Verdes).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, vamos guardar 1 minuto de silêncio.

A Câmara guardou, de pé, 1 minuto de silêncio.

Srs. Deputados, vamos votar, agora, o projeto de resolução n.º 812/XII (2.ª) — Deslocação do Presidente

da República à Suécia (Presidente da AR).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, o último ponto da ordem de trabalhos de hoje consiste na apresentação de declarações

políticas.

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A ordem das declarações políticas, combinada na Conferência de Líderes, parte do maior partido para o

mais pequeno, pelo que, pelo PSD, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Montenegro.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Portugal vive hoje uma situação

política e social relativamente estranha.

Todos sabemos e reconhecemos a situação de grave crise em que o País mergulhou nos últimos anos.

Todos sabemos qual o foi o ponto de situação que conduziu à realização das últimas eleições legislativas e à

abertura desta Legislatura. Todos sabemos que Portugal teve necessidade de pedir ajuda externa, que o

Estado não tinha dinheiro para pagar salários, para pagar pensões e para manter serviços públicos operantes,

que Portugal tinha uma linha de crescimento da sua dívida e do seu défice que eram incomportáveis.

Todos sabemos, também, o esforço que os portugueses fizeram — e ainda estão a fazer — ao longo deste

período.

Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, todas estas razões conduzem-nos à constatação de que não é, de facto,

o momento para grandes euforias nem para lançarmos muitos foguetes. Mas, Sr.ª Presidente e Srs.

Deputados, há sinais que são encorajadores e há sinais que nos dão uma orientação de confiança

relativamente ao que o País e os portugueses são capazes de fazer.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Portugal foi o País da Europa que mais cresceu no segundo trimestre de

2013. Portugal foi — e é — o País da Europa que regista o maior crescimento da sua produção industrial neste

ano.

Hoje, temos os principais índices de confiança a melhorar os seus resultados.

As nossas exportações têm vindo a registar um crescimento sólido e significativo mormente quando

conjugadas com os problemas decorrentes dos nossos principais parceiros comerciais, em particular os

europeus, estarem também a atravessar momentos difíceis.

Nos últimos meses, embora o nosso desemprego seja elevadíssimo (e a nossa grande preocupação

social), temos conseguido estancar o seu crescimento e tem sido mesmo possível assistir a alguma diminuição

ainda que ligeira.

As nossas contas externas estão hoje equilibradas, ao contrário do que sucedeu nos últimos anos.

O País foi também capaz, nestes dois anos, de empreender várias reformas estruturais, quer ao nível de

sistemas públicos, como o sistema de justiça e o sistema de saúde, quer ao nível do próprio Estado. É certo

que ainda falta fazer muito no que tange à reforma do Estado, mas não podemos esconder e escamotear o

facto de já termos sido capazes de extinguir serviços e entidades que estavam duplicadas, de termos tido a

capacidade de diminuir os cargos dirigentes na Administração Pública e de reduzir muitas das despesas

injustificadas dos serviços da Administração.

Tudo isto, Sr.ª Presidente, foi feito reestruturando muitos serviços públicos sem que daí decorresse prejuízo

para o cumprimento das principais funções do Estado.

Ora, Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, todos estes resultados são inegavelmente resultados positivos que

têm sido reconhecidos cá dentro e também internacionalmente. Aliás, ainda hoje, no debate sobre o estado da

União Europeia que decorre no Parlamento Europeu, o Presidente da Comissão enfatizava e realçava

precisamente este aspeto da nossa capacidade de resistir a tantas adversidades e de conseguir mostrar e

exibir aos nossos parceiros toda a nossa capacidade coletiva. E é, de facto, este reconhecimento e esta

capacidade que nos mobilizam para aquilo que temos de fazer.

Todavia, Sr.ª Presidente, se é verdade que somos daqueles que assumem com prudência, mas também

com confiança, este ponto de viragem, a nossa situação política é, de facto, algo estranha porque por parte da

oposição, em particular do Partido Socialista, há uma reação extraordinária.

Por um lado, a oposição — em particular o Partido Socialista — fica zangada pelo facto de nós termos tido

esta capacidade e de começarmos a oferecer ao País a confiança que decorre do facto de estarmos a atingir

resultados tão importantes.

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A oposição tem todo o direito (e até o dever democrático) de confrontar o Governo com as suas

alternativas, mas também tem o direito e o dever democrático de reconhecer o que o País é capaz de fazer, o

que as famílias e as empresas portuguesas são capazes de acertar e de conseguir alcançar.

Infelizmente, Sr.ª Presidente, o Partido Socialista, para além de se apresentar zangado com estes

resultados positivos que Portugal é capaz de alcançar, alinha não só com aquilo que tem sido típico desta

Legislatura, que é um certo pessimismo, um certo derrotismo, uma certa falta de confiança na capacidade do

País, como está muito motivado e muito mobilizado para uma técnica, diria, de megafone eleitoralista, que é

uma técnica que vem trazer à vida política e à vida pública o que de mais radical temos no nosso sistema

político, que é a demagogia exagerada.

Refiro-me ao facto — veja-se só — de se vir apresentar, com todas as suas responsabilidades, com todo o

seu passado também de cumprimento da tarefa de reformar o País, contra um Orçamento do Estado que não

é ainda sequer conhecido — nem as suas orientações são, ainda, sequer conhecidas!

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — O Partido Socialista faz, ao mesmo tempo, duas coisas: propõe no

Parlamento uma baixa generalizada de todos os impostos, quiçá recordando o que fez em 2009, por exemplo,

em vésperas de eleições legislativas,…

Vozes do PSD: — Bem lembrado!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — … e que nos conduziu à situação da ajuda externa de 2011 e, a par de

todo o facilitismo que envolvem estas propostas, vem dizer que é contra o próximo Orçamento do Estado.

Porque é que é contra? É contra porque é contra! Porque não tem razão, porque é um Orçamento que vai

ser apresentado pelo Governo. Mas que diabo! Outros governos, quer do PS quer do PSD, no passado,

tiveram o condão de ter um debate orçamental preenchido que conduziu, muitas vezes, a que o resultado do

posicionamento político dos partidos não fosse, apesar de estarem na oposição, o de estar contra o que é feito

pelo Governo.

A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Termino já, Sr.ª Presidente.

Por isso, Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, é importante que hoje, nesta Comissão Permanente, possamos

perguntar, no momento em que devemos registar estes sinais positivos, o encorajamento que resulta da nossa

capacidade de obtermos estes resultados: afinal, o que quer o principal partido da oposição, o que quer o

Partido Socialista? Quer que o País mude ou quer que o País permaneça na mesma? Quer que o País volte a

ter no futuro os mesmos problemas que não foi capaz de resolver nos anos que passaram? Que quer o

Partido Socialista das 8.ª e 9.ª avaliações do nosso Programa? Quer que corra mal, ou quer que corra bem,

como correram os sete exames anteriores?

Sr.ª Presidente, quero terminar fazendo um apelo muito claro a toda a oposição, em especial ao Partido

Socialista: na maioria, não temos dúvidas, vamos continuar o nosso caminho de transformação do País e

vamos continuar a nossa disponibilidade para o diálogo político e para o diálogo social. Mas é tempo de

termos uma oposição — em especial, o principal partido da oposição — com uma visão mais positiva sobre o

nosso País e com uma predisposição para ser, efetivamente, nos atos, nos contributos, uma oposição

construtiva e não uma oposição que, infelizmente, é radical, demagógica e que não contribui para o sucesso

do trajeto do País.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Zorrinho, do PS.

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O Sr. Carlos Zorrinho (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Estamos a viver um verão trágico

nos incêndios florestais.

Com uma postura institucional, que nunca é demais sublinhar, acabámos de aprovar, nesta Câmara, um

voto que, além de homenagear os bombeiros, compromete a Assembleia da República com um debate

aprofundado.

Os meus parabéns, Sr.ª Presidente, pela sensibilidade com que elaborou esse voto.

É assim a democracia. O que corre menos bem tem que ser melhorado para o benefício de todos. Deveria

ser assim em todos os domínios da sociedade. Deveria ser, também, assim com a tragédia do

empobrecimento que nos assola desde há mais de dois anos. Verdadeiramente, desde que esta coligação

PSD/PP iniciou funções.

É um empobrecimento estranhamente desejado pela maioria que nos governa, porque é um

empobrecimento programático. É um empobrecimento para baixar salários, para tornar mais apetecível a

privatização do património público, para destruir a classe média em Portugal e para escancarar o fosso entre

ricos e pobres.

No que diz respeito ao combate ao empobrecimento, o Governo e os seus Deputados, como ainda agora

ouvimos o líder Luís Montenegro, apregoam o consenso mas praticam a rotura. Estão em estado de absoluta

negação.

No plano conjuntural, e beneficiando de alguma melhoria do clima económico europeu, tivemos — é

verdade — indicadores que melhoraram, e isso é para todos nós uma razão de contentamento.

Vozes do PSD: — Ah!…

O Sr. Carlos Zorrinho (PS): — Mas, Srs. Deputados, os indicadores estruturais, as vossas políticas cortam

raso toda a esperança.

O Governo não dá sinais de querer arrepiar caminho. Antes insiste nos cortes. É um alfaiate que só sabe

cortar a direito mesmo depois de Vítor Gaspar mostrar com clareza o erro do molde que o próprio desenhou.

Com esses cortes cegos, Srs. Deputados, já destruímos meio milhão de empregos.

Apostamos menos no conhecimento, temos menos alunos, menos professores, menos condições de

aprendizagem, somos menos competitivos e até menos felizes, porque sendo a felicidade a ausência de

medo, na definição de Eduard Punset, Portugal é cada vez mais um País amedrontado. Amedrontado pelo

desemprego, amedrontado pelas quebras no acesso à educação e à saúde, amedrontado pela redução brutal

das prestações sociais.

Sejamos claros: em maio de 2013, o Primeiro-Ministro, Pedro Passos Coelho, enviou uma carta à troica.

Essa carta compromete o nosso futuro coletivo.

Bem pode agora o Primeiro-Ministro anunciar amanhãs que cantam. Os compromissos não enganam!

Nessa carta, o Primeiro-Ministro compromete-se a cortar, em 2014, quase 500 milhões de euros com

despedimentos na função pública; 325 milhões de euros na educação; 300 milhões de euros na proteção

social; 127 milhões de euros na saúde; quase 1500 milhões no sistema de pensões, sendo 50% disso nas

pensões atuais dos funcionários públicos aposentados; «ratar» em 10% ou mais todas as pensões acima dos

419 €.

Sr.as

e Srs. Deputados: Estes cortes assumidos unilateralmente pelo Primeiro-Ministro, sem consultar o

Parlamento, os partidos da oposição ou os parceiros sociais, não têm apenas impacto na qualidade dos

serviços e no emprego. Matam, asfixiam a nossa economia. A concretizarem-se levarão o País para o quarto

ano consecutivo de recessão.

Isso, para nós, é inaceitável. E bem pode a Sr.ª Ministra das Finanças, como procurou fazer hoje, encontrar

uma maquilhagem para esconder a espiral recessiva, colocar toda a sua criatividade na invenção de novos

indicadores, porque a realidade, infelizmente, é clara: a dívida pública subiu 15 pontos no ano de 2012, 8

pontos no 1.º semestre de 2013 e, com estas políticas, o que nada nos satisfaz, continuará a subir em 2014.

Por isso, o Partido Socialista é muito claro, e não precisa de ver o Orçamento, Sr. Deputado: com esta

cartilha de cortes, não há Orçamento que possa ser viável. Votaremos contra qualquer Orçamento que não

mude a orientação política e não aposte no crescimento e no emprego, que, afinal, não aposte no chamado

«novo ciclo» do Governo, que tão depressa foi abandonado.

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Deixem-me dizer-vos aqui que, se tivesse vergonha na cara, também o PP não votaria este Orçamento,

porque o novo ciclo em que reentraram no Governo foi rapidamente abandonado e já não existe nas políticas.

Aplausos do PS.

Nós damos um sinal construtivo. Já no dia 3 de outubro, a maioria terá uma nova oportunidade de arrepiar

caminho. As propostas do PS, de redução do IVA na restauração, de incentivos às pequenas e médias

empresas, de apoio aos inquilinos com mais dificuldades de adaptação à lei das rendas e de aplicação de

regras de justiça no cálculo do imposto municipal sobre imóveis, não são uma panaceia para o País mas são

um sinal de um outro caminho e de uma outra política.

Não é nas palavras mas nos atos, Srs. Deputados, que o consenso pode ter consequências.

Não podemos esperar outra coisa da maioria que não a aprovação das propostas que aqui serão votadas

no dia 3 de outubro, porque são propostas boas para Portugal e para os portugueses.

E, Srs. Deputados, tal como nos incêndios, tal como na cidadania, tal como em tudo na vida, é o bem

comum e o interesse nacional que nos deve inspirar.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Para uma declaração política, tem, agora, a palavra o Sr. Deputado Nuno Magalhães.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Neste reinício dos trabalhos,

gostaria de, em nome do CDS, destacar quatro temas que nos parecem relevantes.

O primeiro é o dos sinais na economia que o País conheceu, no último trimestre, e que, a nosso ver, sendo

positivos, não podem ser dados por garantidos, porque ainda não têm consistência suficiente, mas, sendo tão

variados, revelam uma coerência que nos deve servir de alento para o que ainda temos para fazer. Do que

Portugal realmente precisa é de que esta coerência seja uma verdadeira e duradoura tendência.

Na verdade, ocorreram, no último trimestre, oito factos que nos parecem relevantes.

Primeiro facto: Portugal registou, no 2.º trimestre de 2013, um crescimento de 1,1%, ou seja, tivemos um

trimestre a crescer, não em termos homólogos, é certo, mas interromperam-se 11 trimestres (1000 dias!)

consecutivos de recessão económica.

Segundo facto: deu-se o caso de esses valores serem os melhores da zona euro e até superiores à média

dos países da União Europeia.

Terceiro facto: no desemprego, a maior fratura social do nosso País, registou-se, em cinco meses

consecutivos, uma diminuição global de 1%, mas, mesmo mantendo valores muito altos (inaceitáveis mesmo),

não deixa de ser importante registar que temos os primeiros sinais de criação de emprego.

Quarto facto: há melhorias, ainda que não sustentadas mas melhorias, na produção industrial.

Quinto facto: começa a haver uma recuperação no consumo alimentar, ascendendo a valores positivos,

facto que não ocorria desde 2011, há 2 anos.

Sexto facto: invertendo uma tendência preocupante, o número de empresas que foram criadas foi, pela

primeira vez, em muitos meses, superior ao número de empresas que encerraram. No 1.º semestre de 2013

foram criadas 20 051 empresas e encerradas 6848, num saldo favorável de 13 203 empresas, que também

são postos de trabalho criados.

Sétimo facto: as exportações, no último mês, atingiram uma subida record de 5,5%, em termos homólogos,

e de 9,6%, face ao mês passado, mérito das empresas, dos empresários e dos trabalhadores do setor privado.

Oitavo facto: o turismo, um setor que foi, é e deve continuar a ser uma aposta do nosso País, tem dado

sinais que nos aumentam a esperança de este ser o melhor ano de sempre do turismo português. Houve

fatores externos que contribuíram para isso? Houve! A instabilidade no Norte de África, resultante das

denominadas «primaveras árabes», afastou muitos turistas dessa região? Afastou! Mas é um desrespeito pelo

esforço das empresas, dos empresários e trabalhadores do setor não reconhecer que o mercado turístico é

muito competitivo, que competimos com outros destinos e que Portugal soube adaptar-se melhor do que

outros países, como a Espanha, a Grécia, a Croácia ou Malta, na captação desses novos mercados.

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Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: É neste contexto, com estes factos e com esta prudência, que

devemos enfrentar os exigentes desafios que estão à nossa frente. A todos, porque é o País que está em

causa, pedimos que estejam à altura das suas responsabilidades.

Diálogo social entre e com os parceiros sociais, sentido de dever de todos os órgãos de soberania e

sentido de compromisso político entre os partidos são pressupostos essenciais para que possamos recuperar

a nossa soberania plena e sair deste período negro, que atravessamos, pela terceira vez, em 39 anos de

democracia.

Precisamos de estar à altura do momento, de perceber que não seria bom para ninguém que se criasse a

ideia (interna ou externamente) de que, em Portugal, há um País e dois sistemas, de que, no Estado, há mais

salário, mais aposentação, mais garantia de emprego, e até havia menos horas de trabalho; já no setor

privado, onde trabalham cerca de 80% dos portugueses, há menos salário, menos reforma, menos garantia de

emprego e, apesar de tudo isto, até havia mais horas de trabalho. Temos e devemos preservar a união de

todos e garantir que há maior igualdade de tratamento de todos, para todos e entre todos.

Bem sabemos, e este é o terceiro tema que gostaria de abordar, que vivemos em ambiente de pré-

campanha e que as declarações da oposição devem ser interpretadas neste contexto, mas não deixa de ser

surpreendente que o maior partido da oposição diga, à segunda-feira, que não aceita a mobilidade especial

que criou, à terça-feira, que é contra a convergência de pensões da Caixa Geral de Aposentações, à quarta-

feira, que discorda da alteração do horário de trabalho na função pública, à quinta-feira, que votará contra um

Orçamento que desconhece, para, à sexta-feira, vir propor uma redução substancial na receita do Estado. Não

é bom para a democracia que assim aconteça e creio mesmo que não será bom para o PS, pois os

portugueses sabem bem o que custou (e custa) prometer ilusões em troca de votações.

Um bom exemplo disto, Sr.as

e Srs. Deputados, são as recentes declarações do Secretário-Geral do Partido

Socialista, relativas ao abono de família.

Aquando da aprovação deste regime, pelo então Ministro Bagão Félix, foi instituída a atribuição de um

montante adicional, com vista à compensação de encargos escolares, no 1.º escalão de rendimentos.

Durante o primeiro Governo de Sócrates foi instituída uma majoração de 25% para o valor dos 1.º e 2.º

escalões do abono de família para crianças e jovens.

Ainda durante o primeiro Governo de Sócrates, foi alargado o pagamento do montante adicional do abono

de família (anteriormente apenas aplicável aos beneficiários do 1.º escalão de rendimentos) a todos os

beneficiários do abono de família.

Já no segundo Governo de Sócrates, o pagamento do montante adicional do abono de família voltou a ser

apenas para o 1.º escalão, retomando a versão original, para, também no segundo Governo de Sócrates, ser

eliminada a atribuição do abono de família em relação aos 4.º e 5.º escalões e a majoração de 25% para o 1.º

e 2.º escalões, que havia sido fixada em 2008, precisamente pelo Governo de Sócrates.

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Assim vemos como vai o Partido Socialista. O Secretário-Geral do

Partido Socialista vem, agora, propor o alargamento deste abono, que um Governo de centro direita criou, que

um Governo do Partido Socialista, em véspera de eleições, alargou, que o mesmo Governo do Partido

Socialista, depois de eleições, retirou.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Agora, em véspera de eleições, o PS quer que este Governo,

debaixo de um resgate, reponha aquilo que o PS retirou há três anos, e sem estar sob qualquer tipo de

assistência financeira. Para isto, Sr. Deputado Carlos Zorrinho, é que é preciso ter vergonha na cara!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Não obstante, o CDS está, como sempre esteve e estará,

disponível para o diálogo social e para o compromisso político, que, mais do que desejável, é inevitável, face à

situação do País.

Aguardemos, pois, que este período passe, que a «normalidade» e a tranquilidade regressem e que seja

possível, num quadro de profundo diálogo partidário, encontrarmos as melhores soluções para Portugal e para

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os portugueses, honrando os sacrifícios que fizeram e preparando o futuro, que é já ali, em junho de 2014,

quando, finalmente, a troica deixar o nosso País. É este o dever de todos, é para isto que todos devemos estar

à altura.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente: — Também para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado João Ramos.

O Sr. João Ramos (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: O PCP entendeu trazer à discussão a

problemática dos incêndios florestais e das responsabilidades políticas. Aqui, como na Comissão de

Agricultura, o PCP estimula esta discussão quando se prepara o início de uma nova sessão legislativa e no

decorrer de um verão dramático em área ardida mas especialmente dramático em perda de vidas humanas, às

quais prestamos a nossa homenagem.

Foi ontem aprovada a proposta do PCP de constituição de um grupo de trabalho para acompanhamento

desta problemática e das suas consequências, na época que ainda decorre.

Foi a iniciativa política do PCP, que incluiu uma deslocação à serra do Caramulo, que forçou o Ministério da

Agricultura (afastado, durante o mês de agosto, da temática dos incêndios) a vir para o terreno. O Secretário

de Estado das Florestas, acompanhado do Secretário de Estado da Administração Local, apareceu na serra

do Caramulo precisamente no dia e hora a que o PCP havia anunciado uma reunião e uma visita.

O Ministério da Agricultura manteve não só o silêncio como foi cirurgicamente afastado dos momentos

políticos. Em 23 de agosto, não esteve representado numa reunião onde estiveram, com outras entidades, o

Ministro da Administração Interna e a Ministra da Justiça. Tal como, em 28 de agosto, não esteve presente no

briefing a que o Primeiro-Ministro assistiu. Este afastamento não é esquecimento nem é, sequer, inocente.

Enquanto se anunciam grandiosas ações de detenção de incendiários, o Ministério com competências na

definição e implementação de uma política florestal e responsável político pelas ocorrências vai fugindo a

responsabilidades.

A responsabilidade está na falta de planeamento e ordenamento florestal, e esta verdade é assumida aqui,

unanimemente, na Assembleia da República. As matérias florestais têm sido, até agora, das mais

consensuais. Este consenso, agora quebrado com a legislação da florestação e reflorestação (e o Governo

prepara-se para o quebrar novamente com a proposta de alteração da lei dos baldios), permitiu a criação de

instrumentos legislativos que, por si só, sem ação no terreno, pouco podem fazer pela floresta, pelas

populações e pela economia nacional.

Responsabilidades que se repartem entre PS, PSD e CDS, uma vez que, no seguimento dos anos trágicos

de 2003 e 2005, se procedeu a um profundo debate e se decidiram e anunciaram medidas, entretanto, nunca

concretizadas.

Este Governo PSD/CDS tornou mais difícil a implementação de uma verdadeira política florestal. A

reformulação do PRODER retirou cerca de 150 milhões de euros às políticas florestais e as alterações

aplicadas ao Fundo Florestal Permanente permitiram camuflar uma redução deste Fundo, de 20%, entre 2011

e 2013. Estes são instrumentos fundamentais em matéria de ordenamento e prevenção. Mas fundam-se nas

políticas liberais de submissão ao poder económico e de destruição do Estado, promovidas por este e

anteriores Governos, o interesse na inexistência de ordenamento e as maiores dificuldades no combate aos

incêndios.

O desmantelamento dos serviços do Ministério da Agricultura levou a abdicar de um conjunto de técnicos,

que, ao andarem no terreno, que conheciam como a palma das mãos, faziam prevenção e vigilância.

O encerramento de serviços públicos acentuou as razões para o êxodo do interior, provocado pela

ausência de perspetivas de emprego e de futuro. A ocupação do território é fundamental na proteção da

floresta. São os moradores que protegem as aldeias através dos campos de cultivo. É a floresta autóctone,

nomeadamente de carvalhos, que melhor resiste aos incêndios, se comparada com a monocultura do pinheiro

ou do eucalipto.

Ao longo de décadas de incêndios, as estatísticas são claras quanto à redução das áreas de pinheiro ou

azinheira e ao aumento da área de eucalipto. Isto num País em que o negócio da madeira é praticamente um

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monopólio e em que, por exemplo, as celuloses, na ânsia de maiores lucros, esmagam o preço da madeira

tirando rentabilidade às explorações florestais.

As dificuldades no terreno são agravadas por políticas que põem interesses privados à frente dos

interesses das populações. No Caramulo passaram-se linhas elétricas por cima de reservatórios de água

inviabilizando a sua utilização por meios aéreos. Os novos modelos de gestão da água, como forma de

garantir clientes, foram eliminando fontes que eram fundamentais para o abastecimento dos reservatórios,

agora abastecidos por camiões cisterna durante a noite para que de dia os meios aéreos possam atuar. Isto

numa serra conhecida também pelas suas nascentes.

As responsabilidades políticas deste e de anteriores Governos são enormes, não implementando as

políticas necessárias, cortando no investimento público e permitindo o despovoamento, responsabilidades que

se estendem à fiscalização.

No Caramulo vimos, enquanto a serra ainda ardia, a realização de ações de limpeza de bermas em pleno

período crítico, atividade que terá sido a ignição de um dos incêndios, como também vimos novas plantações

de eucalipto contiguas a uma área industrial sem respeito por qualquer faixa de proteção. Alguém as

autorizou.

Esperamos, e tudo faremos para que assim seja, que as visitas dos secretários de Estado resultem em

apoios concretos para as populações afetadas, como são exemplo aquelas que ficaram sem alimento para os

seus animais ou os jovens apicultores que ficaram sem flora para iniciar os seus projetos.

É já hora de parar com os lamentos que, ano após ano, vão permitindo que o País arda de fio a pavio e de

implementar as medidas que sirvam o interesse nacional e promovam o desenvolvimento. O PCP não deixará

de lembrar que essas medidas são a única forma de superar esse flagelo recorrente.

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

A Sr.ª Presidente: — Pelo Bloco de Esquerda, tem a palavra, para uma declaração política, a Sr.ª

Deputada Cecília Honório.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as

Deputadas, Srs. Deputados: O Primeiro-Ministro

aproveitou o mês de agosto para pressionar o Tribunal Constitucional e declarar guerra à Constituição. Bem o

vimos. Depois da quinta declaração de inconstitucionalidade, desta feita sobre o programa de despedimentos

na função pública, chega setembro e eis que os pensionistas e o abate da escola pública estão na mira do

Governo.

O último «murro» — porventura, o sexto «murro» — na Constituição chega, agora, pela mão do Ministro

Nuno Crato. A proposta de financiamento do ensino privado é a prova do revanchismo desta direita que não

conseguiu rever a Constituição à sua medida.

E se porventura as bancadas da maioria — e nós reconhecemo-lo — são capazes de desprezar friamente

os milhares de professores no desemprego ou a escola pública reduzida ao «osso» nos recursos (são os

casos de crianças com aulas em contentores e de turmas sobrelotadas com mais de 30 alunos e mais do que

um nível de ensino), ao menos aceitem o repto de pensar, pelo menos uma vez, no que se propõem fazer às

crianças e aos jovens deste país.

Como se não chegasse a obsessão com os exames do Ministro Crato, que faz de Portugal, aliás, uma

raridade no plano europeu ao impor aos alunos três momentos de exame em nove anos de escolaridade

obrigatória; como se não chegassem os maus resultados e a violência sobre crianças de nove anos a terem de

dar provas sobre a expedição marítima das Berlengas; como se não bastasse dividir no 2.º ciclo os alunos

entre os que podem continuar e os que, por via de um ensino vocacional, ficarão para trás, vem agora Nuno

Crato falar desse «contrato simples com as famílias», garantir que haverá escolas privadas para os ricos e,

porventura, para os remediados e escola pública para os pobres.

É uma escola duplamente dualizada: estudar não será para todos, nem no currículo, nem na escola que

poderão frequentar. Os filhos de famílias com recursos sobreviverão, os outros que se aguentem.

Isto, Sr.as

e Srs. Deputados, é apartheid escolar e é o espezinhamento da Constituição. E vamos ao seu

artigo 74.º: esta proposta de Nuno Crato é um ataque à igualdade de oportunidades no acesso e no sucesso,

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consagrada neste artigo, e é um ataque à natureza do sistema público de ensino, também é consagrado na

nossa Constituição.

Usarão os impostos dos portugueses a seu bel-prazer para tirar dinheiro à escola pública e para o colocar

nas mãos dos privados. Fá-lo-ão indiferentes aos péssimos resultados da experiência sueca e aos bons

resultados que a escola portuguesa vem conseguindo e que estão, aliás, consagrados e reconhecidos nos

indicadores internacionais mais conceituados.

Mas não pensem que a coisa ficará só por aqui: é que falta a municipalização. Ela está no Programa do

Governo, é apetite de muitos autarcas de direita. E, como se não chegasse esta «sangria desatada» dos

recursos públicos, imaginem agora aquilo que também se joga nas próximas eleições autárquicas: não é coisa

pouca; é a possibilidade de entregar aos autarcas a gestão das escolas e dos professores — isto está no

Programa do Governo.

Conhecemos a hipocrisia dos argumentos: a liberdade, a dita liberdade de escolha de que tanto gostam,

sobrepõe-se — é mais forte, à revelia do que diz a Constituição — à igualdade de oportunidades no acesso e

no sucesso.

Os interesses da família, do vosso ponto de vista, estão contra o Estado e o mercado, ainda do vosso

ponto de vista, naturalmente, como uma entidade divina, de tudo tratará.

Estado para quê? — perguntam VV. Ex.as

e, por maioria de razão, o vosso Ministro da Educação. Estado

para quê se o Ministro até se quer livrar de um «sistema soviético de contratação de professores» — fala ele

como se estivesse em plena ação na Guerra Fria.

O «sistema soviético», de que se queixa o Sr. Ministro, é responsável pelos milhares de professores no

desemprego, professores e professoras com 15 e 20 anos de serviço. E não foi o mercado que os pôs na rua,

foi o Governo, foi o vosso Ministro. É a humilhação de filas intermináveis de professores contratados nos

centros de emprego, gente altamente qualificada, gente que deu o melhor que tinha e que foi posta na rua — e

não foi pelo mercado, foi pelo vosso Governo!

E dos 45 000 professores que concorreram, sabemos bem — o Ministro não se decide, mas sabemo-lo

bem — que muito poucos terão alguma oportunidade de trabalho, enquanto o vosso Ministro da Educação

continua a desdobrar-se inaugurando escolas já inauguradas e mantendo a hipocrisia das «falinhas mansas».

Dou-vos o exemplo desta decisão de indemnizar os docentes contratados em 2012, contemplando apenas

aqueles que foram contratados a partir de 1 de setembro desse mesmo ano e deixando todos os outros para

trás. Hipocrisia, falinhas mansas. «Ficaram para trás, temos pena», dirá o Ministro, «porventura, foi o

mercado». Não foi, foi ele e foi o vosso Governo.

Isto não é o mesmo mas é algo com mais força do que o que já conhecemos no passado em relação às

orientações liberais para a educação de outros governo.

Isto é um programa conservador, radical e bafiento que retira Portugal das referências europeias, que

despreza o esforço de instituições e de profissionais feito nos últimos anos, que fecha a porta das

universidades a milhares de jovens, desprezando inclusivamente aquilo que está consagrado e comprometido

na Estratégia Europa 2020 quanto à percentagem de licenciados a que somos obrigados, e ameaçando agora,

para além de deixar tantos jovens à porta, o Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior que os cortes não

são só aqueles que dizem, ainda há outros que não estão necessariamente previstos.

Sr.as

e Srs. Deputados, esta é uma política radical de destruição do ensino público e não pode continuar.

Sobra para muitos e para muitas o recurso aos tribunais, garantidamente, e certamente a luta, toda a luta, na

defesa da escola pública, na defesa da qualidade da qualificação dos portugueses, na defesa de um projeto de

futuro para as nossas crianças e para os nossos jovens, na esperança de que o País responda corajosamente

a este recuo em todos os níveis do nosso ensino, que não é um recuo de 10 ou de 20 anos, é um recuo de 50

anos. Há, de facto, radicais por aí; o problema é que eles estão sentados no Governo.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Para proferir a próxima declaração política, que é a última esta tarde, tem a palavra a

Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, de Os Verdes.

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A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Os Verdes entendem que

hoje se impõe que a Assembleia da República aborde a questão dos fogos florestais, que ficam novamente

marcados como o flagelo do País no verão de 2013.

O Parlamento fará um debate a curto prazo sobre a matéria, mas hoje impõe-se que se façam já algumas

referências que levem quem tem responsabilidade política a ter consciência de questões que não podem

deixar de ser abordadas, porque elas são também resultantes de políticas descuidadas e da atribuição de uma

importância reduzida a algo que tem importância vital.

Nos anos de 2003 e de 2005, anos de grande flagelo de fogos florestais, a tendência dos governantes foi

remeter a responsabilização para o fator metereológico. Em 2013, a tendência de alguns foi remeter a

responsabilização para os incendiários criminosos. Num ou noutro caso, é preciso ter consciência que existem

outros fatores que determinam a dimensão de um fogo florestal e a dimensão que ele pode atingir. E é aqui

que é preciso que os olhos se abram e que, de uma vez por todas, neste país se aja em conformidade.

Em 1990, a Assembleia da República produziu um relatório que determinava um conjunto de orientações

necessárias para a prevenção — repito, prevenção — dos incêndios florestais. Entre elas, encontravam-se a

proibição de substituição de espécies florestais por outras técnica e ecologicamente desadequadas, a abertura

de caminhos e aceiros que facilitem o acesso ou sirvam de estanque aos incêndios e a limpeza das matas.

É preciso perguntar por que razão, passadas mais de duas décadas, se o Parlamento fosse produzir novo

relatório, estas mesmas conclusões de 1990 teriam que ser reproduzidas. Como foram reproduzidas em

relatórios após os incêndios de 2003 e de 2005, sê-lo-iam em 2013. Ora, há então aqui qualquer coisa que

tem falhado, e onde se tem falhado muito é nas políticas de prevenção dos fogos.

Refiro o abandono do mundo rural e todas as políticas que têm contribuído para a desativação do mundo

rural prejudicaram a floresta. E quando se encerraram escolas e unidades de saúde, por exemplo, em zonas

mais rurais também se contribuiu para retirar potencial à redinamização do mundo rural. As pessoas saem de

lá e a floresta fica entregue a si própria!

Diminuiu-se, e muito, o número de guardas florestais. E quando se despedem funcionários públicos é

também a vigilância do nosso património que estamos a descuidar. A vigilância da floresta é tão necessária

como a vigilância costeira, porque é cuidar dos nossos espaços e da nossa segurança, mas, se não houver

funcionários para a fazer, ela não se faz. E os guardas florestais sempre tiveram um papel fulcral na primeira

intervenção sobre os fogos florestais.

O eucalipto é uma das espécies que arde mais facilmente e é, hoje, a espécie predominante da nossa

floresta. Em 1990 não era, mas hoje é, representando mais de 800 000 hectares de floresta. De 1995 até 2010

teve um aumento de 13%, em área. Aqui «rolou-se o filme» ao contrário no que respeita ao que era preciso

para se atingirem bons resultados e, a agravar a situação, este Governo aprovou um novo regime de

arborização e de rearborização que facilita ainda mais o crescimento do eucaliptal no País.

Das coisas que os bombeiros mais se queixaram foi das dificuldades de acesso. Abertura de caminhos

onde é possível ou abertura de faixas de contenção é algo que continua por existir na generalidade da nossa

floresta. E não podem ser as populações a abrir esses acessos, como é óbvio! Há bombeiros que tiveram de

caminhar uma ou duas horas para conseguirem chegar ao incêndio, chegando lá já mais que exaustos!

Queixaram-se os bombeiros muito, muito, da falta de limpeza das matas. E ainda está por desvendar o que

pode ter acontecido a muitas linhas de água, ao nível da contaminação, decorrente dos fogos florestais

ocorridos e também ao nível da erosão.

É preciso olhar atentamente para a execução do PRODER no que respeita à defesa da floresta, que ronda

uma taxa muito reduzida.

São estes exemplos, Sr.as

e Srs. Deputados, que demonstram que não se está a agir em conformidade

com as aprendizagens que se deviam ter do passado. A prevenção tem sido nitidamente descurada. Aposta-

se muito mais no combate do que na prevenção. É preciso inverter esta lógica. O Sr. Ministro da

Administração Interna, principal responsável pelo combate aos fogos, deve perceber que o combate é tanto

mais difícil quanto menor for a prevenção. Deve ser o primeiro a exigir, dentro do seu Governo, uma política

séria de prevenção de fogos florestais e de defesa da floresta. Mas é para começar já!

Esta é, Sr.as

e Srs. Deputados, inclusivamente, a melhor forma de ajudar os nossos bombeiros que hoje

aqui homenageámos, que, numa demonstração de heroísmo absoluto, de uma solidariedade infindável, de

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uma abnegação total, salvam o País, pondo em risco a sua própria vida. O País está em dívida para com os

bombeiros e parte dessa dívida só será paga com resultados concretos na prevenção dos fogos florestais.

A Sr.ª Presidente: — Muito obrigada, Sr.a Deputada Heloísa Apolónia.

Srs. Deputados, termina aqui esta reunião.

Como sabem, tem lugar uma sessão plenária na próxima segunda-feira, dia 16, cuja ordem do dia inclui

declarações políticas e a eleição de um membro para a Comissão Nacional de Eleições.

Desejo a todos muito boa tarde.

Srs. Deputados, está encerrada a reunião.

Eram 17 horas e 14 minutos.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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