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Sexta-feira, 31 de janeiro de 2014 I Série — Número 43
XII LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2013-2014)
REUNIÃOPLENÁRIADE30DEJANEIRODE 2014
Presidente: Ex.ma Sr.ª Maria da Assunção Andrade Esteves
Secretários: Ex.mos
Srs. Pedro Filipe dos Santos Alves Rosa Maria da Silva Bastos de Horta Albernaz
S U M Á R I O
A Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 6
minutos. Procedeu-se à apreciação conjunta do projeto de
resolução n.º 759/XII (2.ª) — Recomenda ao Governo a criação de um regime específico de navegação nos estuários dos rios (PSD), do projeto de lei n.º 495/XII (3.ª) — Institui um regime especial de defesa e valorização das embarcações tradicionais portuguesas enquanto património cultural nacional (PCP) — na generalidade — e do projeto de resolução n.º 924/XII (3.ª) — Libertação da via da água e transporte não regular em estuários (PCP), tendo proferido intervenções os Deputados Nuno Filipe Matias (PSD), Bruno Dias (PCP), Jorge Fão (PS), João Paulo Viegas (CDS-PP) e Helena Pinto (BE).
Foram apreciados, conjuntamente, os projetos de resolução n.
os 867/XII (3.ª) — A revitalização do montado e a
importância de uma dinâmica concertada, por parte da sociedade civil, criada pelo Livro Verde para os Montados (PS), 882/XII (3.ª) — Recomenda ao Governo medidas de proteção e valorização do montado (sobreiro e azinheira) (BE), 886/XII (3.ª) — Recomenda ao Governo o cumprimento da Resolução da Assembleia da República n.º
26/2007 (Defender o montado, valorizar a fileira da cortiça) (PCP) e 917/XII (3.ª) — Recomenda ao Governo medidas que protejam o montado (PSD), sobre os quais se pronunciaram os Deputados Miguel Freitas (PS), Helena Pinto (BE), João Ramos (PCP), Mário Simões (PSD), José Luís Ferreira (Os Verdes) e Manuel Isaac (CDS-PP).
Após a Presidente ter posto à discussão o projeto de lei n.º 485/XII (3.ª) — Reposição dos feriados nacionais roubados (PCP), o Deputado Luís Montenegro (PSD), em interpelação à Mesa, manifestou-se contra a designação do título do diploma, tendo-se também pronunciado sobre essa questão os Deputados Nuno Magalhães (CDS-PP) e João Oliveira (PCP). De seguida, após ter sido aceite pelo proponente a alteração do título do projeto de lei, foi o mesmo debatido na generalidade, tendo usado da palavra os Deputados David Costa (PCP), Inês de Medeiros (PS), Clara Marques Mendes (PSD), Mariana Aiveca (BE), José Luís Ferreira (Os Verdes), Artur Rêgo (CDS-PP) e Jorge Machado (PCP).
Procedeu-se à discussão, na generalidade, do projeto de lei n.º 281/XII (2.ª) — Determina a reabertura da possibilidade de requerer a reintegração ao abrigo do
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Decreto-Lei n.º 173/74, de 26 de abril (BE), tendo proferido intervenções os Deputados Pedro Filipe Soares (BE), José Lello (PS), André Pardal (PSD), António Filipe (PCP) e João Rebelo (CDS-PP).
A Câmara debateu ainda, conjuntamente, na generalidade, os projetos de lei n.
os 479/XII (3.ª) —
Revogação das taxas moderadoras e definição de critérios de atribuição do transporte de doentes não urgentes (PCP) e 497/XII (3.ª) — Elimina o pagamento de taxas moderadoras no acesso a cuidados de saúde do Serviço Nacional de
Saúde (SNS) e estabelece a isenção de encargos com transporte não urgente de doentes (segunda alteração ao Decreto-Lei n.º 113/2011, de 29 de novembro) (BE). Usaram da palavra, a diverso título, os Deputados Carla Cruz (PCP), Teresa Caeiro (CDS-PP), Helena Pinto (BE), José Luís Ferreira (Os Verdes), Maria Manuela Tender (PSD) e Luísa Salgueiro (PS).
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues) encerrou a sessão eram 17 horas e 33 minutos.
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A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados e Srs. Jornalistas, está aberta a sessão.
Eram 15 horas e 6 minutos.
Podem ser abertas as galerias.
Hoje não há expediente para anunciar.
Peço aos Srs. Deputados que ainda não tomaram os seus lugares o favor de o fazerem para criarmos
condições de forma a podermos escutar a intervenção do primeiro orador da tarde.
Pausa.
O primeiro ponto da ordem do dia consta da discussão conjunta do projeto de resolução n.º 759/XII (2.ª) —
Recomenda ao Governo a criação de um regime específico de navegação nos estuários dos rios (PSD), do
projeto de lei n.º 495/XII (3.ª) — Institui um regime especial de defesa e valorização das embarcações
tradicionais portuguesas enquanto património cultural nacional (PCP), na generalidade, e do projeto de
resolução n.º 924/XII (3.ª) — Libertação da via da água e transporte não regular em estuários (PCP).
Os partidos autores das iniciativas dispõem de mais 1 minuto, como é habitual.
Encontram-se inscritos, para apresentar estas iniciativas, os Srs. Deputados Nuno Filipe Matias, pelo PSD,
e Bruno Dias, pelo PCP.
Estão ainda inscritos para intervir os Srs. Deputados Jorge Fão, do PS, João Viegas, do CDS-PP, e Helena
Pinto, do BE.
Para uma intervenção, pelo PSD, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Filipe Matias.
O Sr. Nuno Filipe Matias (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Portugal tem a sua força e
genética ligada de forma inseparável à força da natureza que é a água, o mar e os espaços marítimos dos
nossos rios.
O nosso País aproveitou, ao longo de toda a sua História, esta ligação única e privilegiada para fazer dela
janela de oportunidade para potenciar crescimento, conhecimento e desenvolvimento.
Ao longo da nossa vida, enquanto nação, fomos audazes e tivemos sucesso quando aproveitámos estas
potencialidades.
Sabemos que a economia do mar e áreas associadas representa direta ou indiretamente cerca de 11% do
PIB, 12% do nosso emprego e 17% dos impostos indiretos na economia portuguesa. Sabemos que temos
condições naturais únicas e excecionais. Mas sabemos também que existe valor económico, social e
ambiental associado que não pode ser menosprezado.
E é partindo desta noção das potencialidades que temos, da necessidade de preservar o nosso património,
mas também de alavancar atividades e economias locais que levou a que o Grupo Parlamentar do PSD
apresentasse este projeto de resolução, que defende a criação de um regime específico de navegação nos
estuários dos nossos rios.
Trata-se de um trabalho, é bom recordar em nome da honestidade intelectual, que resultou de uma
preocupação conjunta que foi partilhada por um número alargado de associações ligadas a estes sectores,
que aproveito para cumprimentar e agradecer, na pessoa do Prof. Carvalho Rodrigues, um português que
sempre nos habituou a alargar horizontes com ambição.
Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Este projeto procura mostrar que a realidade dos nossos rios e dos
seus estuários se enriquece no exato momento em que reconhecemos que a aposta na revitalização das
nossas frentes ribeirinhas, no apoio à preservação das nossas embarcações típicas, no estímulo à atividade
turística associada, bem como na alavancagem das atividades locais a dinamizar é um passo essencial, de
forma a que, desde o transporte fluvial não regular, de carácter turístico, à construção naval, às pescas, ao
turismo, à energia das marés, à biotecnologia, à alimentação e mesmo à medicina, possamos e devamos ter
nestas riquezas verdadeiras janelas de oportunidade que é fundamental enquadrar, apoiar, regulamentar e
incentivar para devolver uma estratégica e lógica, objetiva e coerente, que potencie a visão de crescimento de
uma verdadeira economia do mar e de proximidade, que seja indutora de desenvolvimento nas áreas
ribeirinhas e que seja de desenvolvimento social e civilizacional das nossas gentes.
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Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Construir o futuro só é possível tendo respeito pelo passado que
tivemos, pelo património que construímos e na sua preservação e aposta, pegando nas suas potencialidades e
lutando para concretizar um futuro diferente, sustentado e melhor.
É com este objetivo e com esta ambição que o PSD apresenta este diploma, mais uma vez dizendo:
presente!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Para apresentar o projeto de resolução e o projeto de lei do PCP, tem a palavra o Sr.
Deputado Bruno Dias.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Aiolas, botes, iates, catraios, canoas,
fragatas, moliceiros, rabelos, galeões — estas são apenas algumas das tipologias de embarcações
tradicionais que continuam a navegar, testemunho histórico da vida e do trabalho de um povo ao longo de
gerações. E esse testemunho prevalece graças à perseverança e dedicação de associações náuticas, de
municípios, de artífices, de entusiastas, que daqui saudamos vivamente — alguns estão hoje aqui presentes.
A valorização das embarcações tradicionais portuguesas deve também ser encarada como uma forma de
proteção de um valor histórico, mas deve igualmente ser encarada como uma forma de partilhar e afirmar a
nossa identidade, aquilo que nos diferencia e de promover valores de uma vida mais sã em todos os aspetos,
desde a saúde até ao associativismo.
Está enganado quem pensar que a continuidade deste trabalho e deste património são um dado adquirido
e garantido para o futuro. Não é assim. É preciso acarinhar esta intervenção, criar condições para que se
desenvolva, considerar e respeitar a sua especificidade.
E isso tem a ver com a exigência de normas e taxas, de vistorias e licenciamentos, de um regime que pode
ser adequado para modernos barcos de recreio a motor, mas que em nada se coaduna com a preservação
das características essenciais de uma embarcação da «Marinha do Tejo». Da mesma forma, as aplicações e
usos de uma aiola de Sesimbra não podem ser comparados com os de uma lancha ou os de um semirrígido.
Com a presente discussão, que saudamos, o PCP retoma e reafirma as propostas apresentadas em
fevereiro de 2009 no projeto de lei que mereceu então o contributo, a opinião e o apoio de tantas comunidades
locais e de tantos profissionais e entusiastas que, diariamente, defendem e promovem este importantíssimo
património cultural do nosso País.
Por outro lado, apresentamos um projeto de resolução sobre libertação da via da água e transporte não
regular em estuários, porque, para o PCP, a via da água deve servir também para que as populações possam
melhor conhecer e viver as zonas ribeirinhas e para que se promova o nosso património cultural e ambiental.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Salvaguardando sempre a segurança da navegação e diferenciando as áreas
de intervenção em presença, consideramos aqui a especificidade deste transporte fluvial não regular,
enquanto componente da defesa e valorização destas embarcações tradicionais e que, por isso mesmo, não
pode ser confundido nem misturado com uma espécie de «oferta marítimo-turística» mais intensiva e
indiferenciada, que aproveitasse a boleia para entrar no negócio.
Deixamos, por isso, o nosso alerta relativamente às opções que venham a ser tomadas no quadro legal e
regulamentar a este propósito.
Dito isto, convergimos, no fundamental, com o teor do projeto de resolução n.º 759/XII (2.ª), também em
discussão, e pretendemos contribuir para o debate, de forma construtiva, com as nossas propostas.
O que destacamos aqui, por um lado, é a possibilidade e o interesse em que esta Assembleia possa
assumir o seu papel e definir esse regime especial de defesa e valorização das embarcações tradicionais
portuguesas enquanto património cultural nacional, legislando nesse sentido e, por outro lado, a necessidade
imperiosa de que as opções legislativas e regulamentares resultem de um processo fundamentado,
participado, que considere de facto o conhecimento e a experiência do movimento associativo náutico, das
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autarquias, do IPTM/IMT e da Autoridade Marítima, designadamente. Aliás, a bem do rigor, importa retificar o
erro de designação do nosso projeto e repor a referência certa, não à Marinha, mas à Autoridade Marítima.
Da parte do PCP, manifestamos, naturalmente, a nossa abertura para trabalhar numa solução consensual
e reiteramos o nosso empenho em contribuir para a definição de um quadro legal que valorize o património
cultural que está presente em cada embarcação típica e em cada comunidade ribeirinha que a preserva.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Não havendo inscrições para pedidos de esclarecimento, dou a palavra, para uma
intervenção, ao Sr. Deputado Jorge Fão, do PS.
O Sr. Jorge Fão (PS) — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Discutimos hoje três iniciativas legislativas
que acabaram de ser apresentadas — dois projetos de resolução e um projeto de lei —, que, embora
identificados de forma relativamente diferente, visam exatamente o mesmo objetivo, objetivo esse que tem a
ver com a necessidade da existência de uma regulamentação específica para a construção, para o
licenciamento da atividade e da navegabilidade das chamadas embarcações tradicionais ou típicas do nosso
País, nos estuários e rios.
Efetivamente, até à data, este regime de licenciamento está enquadrado na regulamentação náutica de
recreio, que claramente não tem sensibilidade nem especificidade para resolver os problemas relacionados
com as características muito próprias deste tipo de embarcações, nem ao nível dos materiais usados na sua
construção, nem ao nível da forma como devem ser licenciados os seus sistemas de propulsão, nem num
conjunto de outros aspetos de natureza específica destas embarcações.
Isto causa claramente dificuldades aos proprietários e aos utilizadores destas embarcações e causa
também muitas dificuldades aos decisores, que são as entidades licenciadoras dessas embarcações, dadas
as especificidades em causa e a sua desarticulação com a regulamentação existente.
Como aqui já foi dito, embarcações como, por exemplo, o carocho, as gamelas, os rabelos, os moliceiros,
as faluas, as bateiras, as varinas, os botes, etc., constituem um património cultural e histórico do nosso País e
sobretudo desempenham um grande papel quer na animação e dinamização social das comunidades
ribeirinhas quer na sua própria sustentabilidade económica.
Na atualidade, este tipo de embarcações encerra um potencial significativo em termos de atividade turística
e mesmo do desenvolvimento da atividade de transporte de natureza não regular.
É evidente que, para tal, compreendemos ser necessária uma regulamentação específica, que
efetivamente diferencie, enquadre e facilite todo o processo de reparação de novas construções, do
licenciamento à atividade, deste tipo de embarcações.
Algumas das normas previstas no projeto de lei apresentado pelo PCP apontam já nesse sentido. O
diploma pretende, sobretudo, consagrar que a regulamentação seja toda ela desenvolvida com base na
audição — e muito bem — dos interessados, nomeadamente da Autoridade Marítima Nacional, das
autarquias, das associações interessadas no setor e de outro tipo de intervenientes no processo.
Não nos parece é que a iniciativa do Partido Comunista esteja já suficientemente sustentada nesta audição
e neste envolvimento dos parceiros. Penso que há espaço para melhorar, como foi dito pelo Deputado Bruno
Dias, pelo que nos parece que o projeto de lei deverá ser mais aprofundado e mais amadurecido.
Relativamente aos projetos de resolução, eles apontam sensivelmente o mesmo caminho ao Governo, no
sentido da necessidade de uma regulamentação específica, caminho com o qual concordamos genericamente.
Contudo, em relação ao projeto de resolução n.º 759/XII, para o bom esclarecimento do que é dito, era
importante que o PSD pormenorizasse e ilustrasse duas afirmações. Uma delas consta do preâmbulo e diz o
seguinte: «No domínio dos portos e da atividade portuária, assistiu-se, ao longo dos dois últimos anos, a uma
reorganização do trabalho e da atividade portuária e a uma redução dos custos de contexto (…)».
Sinceramente, não conseguimos vislumbrar nada, pelo que esta é uma boa oportunidade para nos dizerem o
que é que pretendem concretizar com esta afirmação.
Por outro lado, numa das recomendações — e com isto termino, Sr. Presidente —, diz o diploma do PSD
que deve ser conferida coerência e integração destas atividades na estratégia e lógica da economia do mar e
proximidades. Não sabemos muito bem o que é que quer dizer «economia do mar e proximidades».
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Era, pois, importante que esclarecessem estes dois aspetos.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Paulo Viegas.
O Sr. João Paulo Viegas (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: O debate de hoje centra-
se nas tradições e no seu sucesso, debruçando-nos desta vez nas tradições fluviais e do mar.
O que se pretende é discutir o futuro de embarcações que representam apenas uma pequena parte do
espólio flutuante do nosso País, que de forma alguma pode perder estes verdadeiros símbolos de identidade
nacional.
Discutem-se três propostas, todas diferentes, mas acima de tudo todas com a mesma finalidade: defender
o património histórico-marítimo e o seu futuro.
Sendo nós um País com tantas tradições marítimas e fluviais, temos de ser os primeiros a ter vontade de
salvaguardar tudo aquilo que foi construído pelos nossos antepassados e que pode hoje ser uma mais-valia
memorial e turística.
Em Portugal, parte da navegação está subordinada ao regime jurídico da atividade da náutica de recreio e
ao respetivo regulamento, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 124/2004, de 25 de maio.
Esta nova e legítima preocupação leva-nos, assim, a sentir necessidade de criar mecanismos jurídicos que
possam salvaguardar o nosso património histórico flutuante.
Contudo, devemos olhar com cuidado espectável para a regulamentação de matérias fluviais e marítimas.
Qualquer criação legislativa deste domínio deve atender a aspetos como: preservação histórica,
enquadramento tradicional, segurança e aproveitamento turístico.
Posto isto, e para que possamos produzir uma boa lei, teremos de tomar em consideração os
conhecimentos de associações de cidadãos dedicadas à preservação do espólio flutuante ou os
conhecimentos do Museu da Marinha.
Já no que diz respeito ao enquadramento tradicional, e para que possamos encontrar um caminho
inclusivo, teremos que colaborar com as autarquias. Elas terão de ser um importante contribuinte para o
levantamento quantitativo das embarcações existentes, tendo de ser também elas a demonstrar o interesse
municipal das mesmas.
No que respeita à segurança, e no âmbito da construção normativa, temos ainda de contar com os
contributos da Autoridade Marítima Nacional.
Como é facilmente percetível, e sendo nós um País de vocação marítima, esta aposta na preservação pode
originar uma nova dinâmica turística e económica. Assim, faz ainda mais sentido que se possam seguir
conselhos de entidades privadas e públicas que se dediquem ao turismo marítimo ou fluvial.
Para o CDS, os projetos de resolução apresentados têm desde logo o mérito de sensibilizar todos para a
importância do nosso espólio histórico flutuante, bem como permitir que se pense num enquadramento
legislativo próprio.
Contudo, é necessário salvaguardar que qualquer criação jurídica não entre em confronto com legislação já
existente. Provavelmente, vamos ainda ter de mexer na legislação anterior, fazendo-lhe remissões que nos
poupem a confusões entre normas regulamentares.
Assim, o CDS entende que é sensato propor ao Governo a criação de legislação.
Já no que respeita ao projeto de lei, temos mais dúvidas, dado que há uma série de matérias que ficam por
regulamentar que podem ser fulcrais para o sucesso da iniciativa de preservar o nosso espólio histórico
flutuante.
Aplausos do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Para proferir a próxima intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Pinto.
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A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Discutimos hoje três iniciativas que
visam um regime específico para a navegação nos nossos rios e nos seus estuários e que visam também a
defesa e a valorização das embarcações tradicionais.
A justificação para estas iniciativas legislativas tem muito a ver com a nossa História e com as atividades
desenvolvidas em torno dos rios como agentes vivos, que, na prática, comunicam com as populações,
gerando eles próprios iniciativas, e também com a cultura que hoje, felizmente, ainda persiste, embora essa
persistência se deva a um conjunto de pessoas que não desistiu desta importante área não só da nossa
História, mas também como área social e económica.
Nesse aspeto, o Bloco de Esquerda também se quer juntar à saudação que é feita às associações e a
todos aqueles que persistem neste caminho de defesa da nossa cultura nesta área.
Faz todo o sentido, por isso, dinamizar este setor, abrangendo diversas áreas, desde as embarcações
tradicionais, a sua preservação e construção — a esse propósito, o PCP apresenta um projeto de lei que
poderá, com certeza, ser melhorado na especialidade, mas que nos parece bastante atual —, até ao uso do
transporte público fluvial, seja ele ocasional ou não regular, e até também numa certa perspetiva relacionada
com o potencial para o turismo local.
Parece-nos, no entanto, que existem também outras dimensões que estão com certeza comtempladas nos
projetos de resolução e que têm a ver com a dinamização e a capacidade de criar condições para o usufruto
destas áreas por parte das populações, o que também irá contribuir muito, inclusivamente, para a coesão
social destas terras do nosso País. É uma perspetiva integrada que não podemos deixar de valorizar quando
discutimos esta questão.
De facto, constatamos que o regime existente, por um lado, não se coaduna com esta realidade, é
diferente, e, por outro lado, também não resolve os problemas que é preciso resolver e não incentiva a
promoção do usufruto dos nossos rios e estuários. Por isso, apoiamos a intenção — parece-nos urgente fazê-
lo — de se criar um regime específico, porque o que existe hoje está muito virado para os desportos náuticos,
para barcos com outras capacidades e de outro género.
Sr.as
e Srs. Deputados, o Bloco de Esquerda acompanha estes diplomas, embora considere que poderão,
em alguns aspetos, vir a beneficiar de algum aprofundamento em sede de especialidade.
Não podemos deixar de saudar o facto de a Assembleia da República, no seu conjunto, debater e
considerar esta matéria como importante do ponto de vista da nossa cultura, do nosso património, do potencial
económico, mas também do potencial social — gostaria muito de sublinhar este aspeto.
Teremos também de levar em conta as questões ambientais. Consideramos que existe uma falha nestes
projetos, uma vez que deles não consta a componente ambiental e a ligação com estas atividades. A este
propósito, poderá ser reforçado o acesso generalizado das populações e o envolvimento das autarquias, que
poderão ter um papel importante, e das associações que ao longo destes anos se têm dedicado à promoção
dos nossos rios e estuários.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente: — Terminado este debate, passamos ao segundo ponto da ordem do dia, que consta da
discussão conjunta dos projetos de resolução n.os
867/XII (3.ª) — A revitalização do montado e a importância
de uma dinâmica concertada, por parte da sociedade civil, criada pelo Livro Verde para os Montados (PS),
882/XII (3.ª) — Recomenda ao Governo medidas de proteção e valorização do montado (sobreiro e azinheira)
(BE), 886/XII (3.ª) — Recomenda ao Governo o cumprimento da Resolução da Assembleia da República n.º
26/2007 (Defender o montado, valorizar a fileira da cortiça) (PCP) e 917/XII (3.ª) — Recomenda ao Governo
medidas que protejam o montado (PSD).
O projeto de resolução do PS será apresentado pelo Sr. Deputado Miguel Freitas, a quem dou a palavra.
O Sr. Miguel Freitas (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Discutir o montado é, certamente,
discutir a floresta, mas é também discutir as políticas públicas. E no documento apresentado por este Governo
em matéria do acordo de parceria não existe nem uma linha sobre florestas.
Por outro lado, a estratégia nacional das florestas está literalmente na gaveta do Governo: mais de um ano
de atraso para a apresentação e a discussão da estratégia nacional da floresta.
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Os planos regionais de ordenamento florestal também estão em revisão e ainda não estão prontos, no
momento em que estamos a discutir o próximo programa comunitário.
Portanto, a primeira conclusão que podemos tirar é a de que a floresta deixou de estar no quadro das
prioridades deste Governo.
Refiro uma segunda ideia: o discurso que hoje temos é o do regresso a uma ideia produtivista da floresta e
que se submete essencialmente à reindustrialização do País.
Veja-se, aliás, que a única medida concretizada por este Governo é uma medida para estimular uma
espécie industrial — o eucalipto.
Ao discutirmos hoje o montado neste Parlamento, estamos a discutir algo absolutamente invulgar e único
em termos mundiais. Estamos a discutir um sistema que contribui fortemente para a proteção dos solos, que
contribui para a biodiversidade, que contribui para uma paisagem extraordinária e das mais belas que existem
na terra.
Ora, quando discutimos isto temos de dizer que é necessário termos uma nova visão, uma visão diferente,
porque aquilo que temos é uma visão politica compartimentada e que olha essencialmente para os produtos.
Ora, o montado também são produtos, o montante também é cortiça, o montado também é carne
alentejana. Mas o montado é muito mais do que isso: o montado é uma riqueza faunística, florística e é uma
riqueza extraordinária que o País tem.
Portanto, é preciso passar de uma visão de produto para uma visão de sistema. Exemplifico: no próximo
quadro comunitário de apoio, o instrumento que vamos ter para apoiar o montado é uma ajuda direta, mas o
que devíamos ter era uma ajuda agroambiental para apoiar o montado.
A diferença de uma e outra consta da forma como se vê o montado olhando para o produto ou olhando
para o sistema. Dar uma ajuda direta significa, essencialmente, dar uma ajuda ao produtor, enquanto dar uma
ajuda agroambiental significa desenvolver este sistema que é, repito, extraordinário e que devemos olhar de
forma diferente.
Ora bem, hoje o montado é um sistema que está envelhecido, em degradação, é um sistema que está a
ser atacado, sistematicamente, por pragas e por doenças. Há um grito de alerta por parte de cientistas,
autarcas, ambientalistas e produtores que produziram o Livro Verde.
O que o projeto de resolução do Partido Socialista procura fazer é dar voz a todos os que querem ver de
uma forma diferente a política florestal em Portugal.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente: — Para apresentar o projeto de resolução do Bloco de Esquerda, tem a palavra a Sr.ª
Deputada Helena Pinto.
A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: O debate que hoje fazemos sobre o
montado é de extrema importância, sobretudo no atual contexto da política para a floresta seguida pelo
Governo.
Os sinais que nos chegam do Governo são muito preocupantes: há uma ausência de estratégia em relação
à floresta e foram tomadas medidas concretas que levaram, por exemplo, a uma alteração legislativa que abre
a porta à liberalização dos eucaliptos no nosso País.
O montado tem um valor muitíssimo importante, pois é um sistema multifuncional com uso florestal, mas
também com uso agrícola e silvícola; tem um papel fundamental na proteção ambiental, por exemplo na
regulação do ciclo da água, mas podíamos dar mais exemplos; tem uma grande importância a nível social e
económico; e, geralmente, o montado também está associado a zonas que sofrem de maior despovoamento.
No entanto, tem as potencialidades para gerar riqueza, emprego e para ajudar à fixação das populações.
A possibilidade de associar vários tipos de produção é, em si, uma grande mais-valia e, como já foi dito, o
montado, para além de permitir a exploração da cortiça, também permite a produção de carne, leite, mel,
lenha, ervas aromáticas… É graças a este conjunto e a esta capacidade de várias produções que o montado
deve ser encarado como uma mais-valia.
Contudo, também existem riscos que precisam de ser ponderados. A área do montado no nosso País tem
regredido e tem sido votado à desproteção. Veja-se, por exemplo, o caso das obras públicas em que são
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arrancadas milhares de árvores. É outro sinal preocupante e, infelizmente, temos assistido várias vezes a essa
situação e no nosso passado recente.
Em 2013, foi publicado o Livro Verde dos Montados, um documento muito importante para a proteção do
montado, uma vez que congrega o conhecimento científico e o trabalho de investigadores que se têm
dedicado a estudar o montado no sentido da sua promoção.
Por isso, é de toda a importância que a Assembleia da República se pronuncie, novamente, sobre a
proteção e a valorização do montado. Não é a primeira vez que o fazemos, mas, tendo em conta o contexto
atual e os sinais que recebemos do Governo em relação às políticas para a floresta, pensamos que é de todo
importante que a Assembleia da República faça uma recomendação clara sobre o papel do montado, não só
em termos da floresta, mas também ao nível da nossa economia e da possibilidade da fixação de populações.
Ou seja, é necessário pensar o montado numa perspetiva do desenvolvimento económico e social do nosso
País.
É tempo de agarrar esta oportunidade e não virar as costas a uma mais-valia tão grande que, ainda por
cima, é única. Portugal tem a maior extensão de montado do planeta. Seria um crime contra a floresta, um
crime ambiental, se não se desse a importância devida ao montado em Portugal.
Esperemos que a resolução a aprovar pela Assembleia da República vá nesse sentido, comprometa o
Governo e que seja possível inverter algumas das políticas que têm surgido em relação à floresta e que vão
em sentido contrário.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, há muito ruído na Sala. Não interrompi a Sr.ª Deputada Helena Pinto
porque, por vezes, a interrupção ainda é mais perniciosa do que o ruído.
Por isso, peço aos Srs. Deputados o favor de fazerem menos ruído na Sala.
Para apresentar o projeto de resolução do PCP, tem a palavra o Sr. Deputado João Ramos.
O Sr. João Ramos (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Estão, hoje, em discussão quatro projetos
de resolução, embora tivessem dado entrada cinco, sendo o quinto do CDS e, aliás, até mais antigo.
Da nossa parte, não temos dúvida da importância — julgo que nesta Casa ninguém terá — do montado e
do setor da cortiça até como sistema alternativo, como já foi aqui referido, a uma agricultura intensiva de
regadio e que permite a fixação de pessoas em territórios mais pobres. Esta matéria sobre o montado e a
cortiça tem recolhido consenso e unanimidade nesta Assembleia da República.
Em 2007, foi aprovada a Resolução da Assembleia da República n.º 26/2007, intitulada «Defender o
montado, valorizar a fileira da cortiça».
Depois, em 2009, o PCP apresentou um projeto de resolução a recomendar a intervenção da Autoridade
da Concorrência para investigar irregularidades na comercialização da cortiça, nomeadamente na importação
e na exportação, resolução também aprovada por unanimidade.
Em 2011, o Sr. Deputado Miguel Freitas apresentou um projeto de resolução, subscrito por todos os grupos
parlamentares, que consagrou o sobreiro como árvore nacional.
Voltando à Resolução da Assembleia da República n.º 26/2007, consideramos que é uma resolução de
grande importância, desde logo porque foi elaborada por um grupo de trabalho constituído, no âmbito da
agricultura, para discussão destas matérias. Sendo uma resolução aprovada por unanimidade, as suas
recomendações vão ao encontro dos principais problemas do setor. Prova está em que 80% das
recomendações dos projetos de resolução que estão hoje em discussão já se encontravam, em parte, inscritas
na resolução de 2007. Apesar de estes problemas terem sido identificados em 2007 e terem sido
apresentadas recomendações, os problemas não estão resolvidos em definitivo e as recomendações não
estão cumpridas na generalidade.
O montado de sobro e de azinho continua com graves problemas, as áreas do montado estão a regredir,
enquanto algumas espécies exóticas estão em expansão.
Este novo decreto-lei sobre a florestação e a reflorestação vem tratar de igual modo o sobro e o azinho e,
por exemplo as espécies exóticas como o eucalipto e o pinheiro. O ICNF (Instituto da Conservação da
Natureza e das Florestas) levantou a possibilidade de corte de árvores isoladas a mais de 25 m, esquecendo
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que, por exemplo, em relação ao sobreiro, 25 m é uma distância muito pequena para um sobreiro ser
considerado uma árvore isolada. Existe um grave problema de fitossanidade e os laboratórios de Estado estão
cada vez mais limitados na sua intervenção.
Desde a resolução de 2007, passaram seis anos e meio e três governos e os partidos continuam a sentir
necessidade de recomendar a resolução de um conjunto de problemas.
Note-se que, tendo sido esta uma matéria de consensos, quando tanto se fala em consensos para a
governabilidade e da importância dos mesmos, temos aqui um caso em que há consenso, mas em que não
houve soluções. É porque, para além dos consensos, é preciso haver ação política e, neste caso, não tem
havido. Os consensos, por si só, não resolvem os problemas, é a ação política que os resolve, e não tem
havido ação política em defesa do montado.
Por isso, entendemos que estas recomendações são importantes para o Governo. O PCP revê-se em
quase todas as recomendações que estão em discussão e também entende que seria importante não quebrar
o consenso já encontrado nestas matérias e, se possível, voltar a haver consenso, uma vez que um grande
número de partidos apresentou projetos de resolução.
No entanto, não permitiremos que o consenso seja utilizado para mascarar as responsabilidades do
Governo e dos partidos que o apoiam.
Nesse sentido, o que o projeto de resolução do PCP fez foi transcrever aquilo que eram as recomendações
da resolução de 2007 e exigir o seu cumprimento, porque estas recomendações têm seis anos e meio, mas
grande parte delas ainda estão por cumprir e é isso que é preciso fazer.
Aplausos do PCP e de Os Verdes.
A Sr.ª Presidente: — Mais uma vez, peço aos Srs. Deputados o favor de fazerem menos ruído na Sala.
Para apresentar o projeto de resolução do PSD, tem a palavra o Sr. Deputado Mário Simões.
O Sr. Mário Simões (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Ao debatermos hoje, nesta Câmara,
vários projetos de resolução sobre o montado e depois de aqui termos aprovado o reconhecimento do sobreiro
como árvore nacional, deveríamos encarar com júbilo este momento parlamentar, onde todos convergimos na
importância estratégica de um ecossistema importantíssimo da nossa agricultura. Mas, infelizmente, assim não
o é.
A apresentação dos vários projetos de resolução, com recomendações ao Governo de medidas de
proteção ao montado e de valorização da fileira da cortiça, é a constatação óbvia da incapacidade do Estado,
ao longo das últimas três décadas, em suster o declínio do montado de sobro e de azinho. Como foi possível
chegarmos até aqui? — é a questão que todos temos de colocar.
Por um lado, temos a sobre-exploração do montado de sobro e de azinho, que causa mutilações
irremediáveis nas árvores e que conduz à sua morte em poucos anos, ao que acrescem as práticas culturais
intensivas com a utilização de maquinaria pesada, a mobilização dos solos com impacto nas raízes da árvore,
o uso abusivo de pesticidas e o excesso de encabeçamento, sobretudo com a substituição do gado suíno e
ovino por gado bovino.
Para além destes fatores, subsistem os incêndios florestais e o surgimento de novas pragas e doenças,
que vão dizimando hectares e hectares de floresta de sobro, sem que o coberto vegetal seja reposto.
Cada vez mais frequentes são as más práticas de gestão com a utilização de técnicas agrícolas
agressivas, que afetam o bom estado de conservação dos montados, com destaque para a recolha antecipada
da cortiça que acelera o fim de vida útil do sobreiro.
Os ciclos de seca, cada vez mais curtos entre si, e o abate de sobreiros e azinheiras, em detrimento da
construção de equipamentos e infraestruturas públicas, que muitas vezes ficam ao abandono, constituem
outras das ameaças que pairam sobre o montado, a par da recente legislação que vem enquadrar a plantação
de eucaliptos e que, por embaraço, me eximo de aprofundar.
Sr.as
e Srs. Deputados, tudo isto se deve à ausência de um serviço de fiscalização eficaz que, aliado à falta
de planeamento, nos apresenta um panorama pouco tranquilizador para um ecossistema muito particular, de
delicado equilíbrio e que subsiste, sobretudo, nas regiões a sul da Península Ibérica.
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Urge, pois, ajustar a Estratégia Nacional para as Florestas, que remonta a 2006, às novas ameaças que
pairam sobre o montado e apostar na investigação, como está a fazer, e bem, o Centro de Biotecnologia do
Baixo Alentejo sobre o genoma do sobreiro, para intervir de modo concreto e efetivo na proteção de um bem
único e de um símbolo nacional como é o sobreiro.
Urge, também, estimular as boas práticas, recomendando, por exemplo, as sementeiras de leguminosas,
importantes no combate à erosão dos solos e à melhoria da sustentabilidade do montado.
Permitam-me, ainda, uma referência para a situação de monopólio do setor da cortiça. Não me parece que
seja esta a forma, no tempo presente, de valorizar e promover o mais valioso produto da floresta nacional.
O PSD assume as suas responsabilidades como sempre fez ao longo da sua história e é por dispor desse
capital político e ético que hoje, volvidos apenas dois anos e meio desde que iniciou esta Legislatura, pode
assumir que apresentou ao Governo um conjunto de linhas de orientação programática e efetiva de combate
ao declínio do montado, que aqui reafirma com este projeto de resolução, constatando, no entanto, que já está
em curso a estratégia nacional de investigação, que valorizará os recursos endógenos e a sustentabilidade
dos sistemas florestais de montado de sobro e de azinho, conforme previsto no Livro Verde dos Montados.
Por isso, sugerimos que sejam consideradas verbas financeiras específicas no próximo programa
comunitário de apoio ao desenvolvimento rural e que sejam adotadas as medidas adequadas que travem o
declínio do montado em termos fitossanitários.
Aplausos do PSD e do CDS.
A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Se é verdade que a
defesa e a valorização do montado não é a primeira vez que é discutida nesta Assembleia, também é verdade
que pouco ou nada tem sido feito pelos Governos no sentido de tomar medidas na sua defesa e valorização.
Na X Legislatura, foi criado um Grupo de Trabalho, no âmbito da Comissão Parlamentar de Agricultura,
designado «Defender o montado, valorizar a fileira da cortiça» e, após um extenso trabalho que envolveu
audições, contactos e visitas, esse Grupo de Trabalho apresentou um projeto de resolução, que, aliás, foi
subscrito e aprovado por unanimidade por todos os grupos parlamentares, que deu origem à Resolução n.º
26/2007, de onde constavam 10 recomendações ao Governo, que, aliás, continuam por cumprir.
Em 2009, esta Assembleia aprovou uma nova iniciativa que deu origem à Resolução n.º 64/2009, através
da qual se recomendava a defesa do montado e a valorização da cortiça.
Já nesta Legislatura, e na sequência de uma petição que propunha consagrar o sobreiro como árvore
nacional, esta Assembleia, atento o conteúdo e o objetivo dessa petição, acabou por produzir uma resolução,
subscrita por todos os grupos parlamentares, que esteve na origem da Resolução n.º 15/2012 e que instituiu o
sobreiro como árvore nacional de Portugal.
Este trabalho, que, ao longo do tempo, foi sendo feito pela Assembleia da República, mostra não só a
importância que o montado tem no nosso País mas também a atenção que tem merecido por parte desta
Assembleia. E não é para menos, porque, de facto, o sobreiro estende-se a todo o território continental e
ocupa em Portugal cerca de 737 000 ha, o que corresponde a cerca de 32% da área que esta espécie ocupa
em todo o mediterrâneo ocidental.
Acresce, ainda, que os montados constituem um exemplo claro de como um sistema agrossilvopastoril
tradicional pode ser, de facto, sustentável, preservando os solos, dando vida ao mundo rural e, dessa forma,
contribuindo para combater a desertificação do nosso território.
Mas o sobreiro não representa apenas uma mais-valia para as populações locais, assume também um
papel importante para a economia nacional. Portugal produz cerca de 150 000 t de cortiça por ano, o que
representa mais de metade da produção mundial, ou seja, Portugal produz mais cortiça do que o resto do
mundo.
A cortiça constitui, aliás, o único sector onde o nosso País mantém uma posição de liderança a nível
internacional.
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A somar a tudo isto, ainda temos a enorme biodiversidade associada aos habitats dominados pelo sobreiro,
incluindo espécies que se encontram verdadeiramente ameaçadas de extinção e com elevado estatuto de
conservação, espécies essas consideradas prioritárias tanto a nível nacional como a nível internacional.
Sucede que o montado continua a correr riscos e ameaças que derivam não só do abandono do mundo
rural, que as políticas do Governo têm vindo a potenciar, mas também com o fenómeno das alterações
climáticas.
São estes riscos e estas ameaças que é necessário combater, o que só é possível com uma proteção legal
reforçada que garanta a sua sustentabilidade, que permita a sua expansão e, sobretudo, que preserve a sua
qualidade.
A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Isaac.
O Sr. Manuel Isaac (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Uma primeira palavra de
saudação especial aos Grupos Parlamentares do PS, do Bloco de Esquerda, do PCP e do PSD pela
apresentação dos projetos de resolução que visam a revitalização, valorização e proteção dos ecossistemas
ricos em biodiversidades para os montados de sobro e de azinho.
Já em setembro de 2011, o CDS-PP apresentou, nesta Assembleia da República, o projeto de resolução
n.º 84/XII (1.ª) sobre esta matéria, onde recomendámos ao Governo a implementação de um programa de
revitalização dos montados de sobro e de azinho.
O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Bem lembrado!
O Sr. Manuel Isaac (CDS-PP): — Esta é umas das matérias que este Parlamento tem tratado ao longo dos
últimos anos, com um amplo consenso e que motivou várias decisões, seja a Resolução n.º 26/2007, seja a
declaração do sobreiro como árvore nacional, mas também a realização de conferências ou até o lançamento
de um selo postal, em colaboração com a APCOR e os CTT.
A verdade é que muitas das propostas constantes da Resolução n.º 26/2007 já foram concretizadas,
nomeadamente: criação do pólo das indústrias de base florestal; prémios atribuídos anualmente a
personalidades e instituições que contribuem para a salvaguarda do montado e da cortiça; políticas de
combate à desertificação; revisão da Estratégia Nacional para a Floresta; definição de prioridades no quadro
de financiamento plurianual 2014-2020.
O envolvimento de vários organismos de investigação e da Administração Pública é fundamental para a
definição de uma estratégia nacional de médio e longo prazos para os montados.
A contenção do declínio, a adaptação e a gestão sustentada destes ecossistemas envolve problemas
complexos que precisam de investigação integrada e multidisciplinar. Por isso, há que unir todos os esforços,
entidades e conhecimento para proteger o montado.
Portugal é o País líder no sector da cortiça e por isso deve ser também o País líder no tratamento deste
sector, porque este ecossistema e toda a economia e emprego associado é demasiado importante para o
País.
Definir uma estratégia, implementar medidas e tornar sustentável este ecossistema, seja em termos
ambientais, sociais, mas também económicos, precisa de todos os consensos e, por isso, em nome do CDS-
PP, sugiro que, em sede de especialidade, se consiga uma proposta consensual para que a estratégia e os
planos de ação sejam reconhecidos como verdadeiros documentos nacionais.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Manuel Isaac (CDS-PP): — Consenso político é o que de nós espera os sectores produtivo,
industrial, mas também o ambiente e as populações.
O próximo PDR 2014-2020, que está agora a iniciar, terá de alavancar todos meios nacionais e
comunitários para revitalizar, valorizar e defender o montado.
Com a união de esforços e de vontades, haveremos de ser capazes de atingir os objetivos que todos aqui
nos propusemos atingir.
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Aplausos do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, dou por terminado o debate conjunto
dos projetos de resolução n.os
867/XII (3.ª) (PS), 882/XII (3.ª) (BE), 886/XII (3.ª) (PCP) e 917/XII (3.ª) (PSD).
Segue-se a discussão, na generalidade, do projeto de lei n.º 485/XII (3.ª) — Reposição dos feriados
nacionais roubados, assim o intitulo o autor do projeto de lei.
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr.ª Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa sobre a condução
dos trabalhos.
A Sr.ª Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr.ª Presidente, o projeto de lei que vamos discutir agora tem como
título, como a Sr.ª Presidente acabou de anunciar, «Reposição dos feriados nacionais roubados».
Ora, sobre esta designação cumpre-me dizer e pedir a colaboração da Mesa no seguinte sentido: quando,
na Conferência de Líderes, o Partido Comunista agendou esta iniciativa legislativa e disse que respeitava à
reposição dos feriados nacionais, estavam os outros partidos longe de imaginar que o PCP atribuir-lhe-ia o
título «Reposição dos feriados nacionais», acrescentando-lhe a expressão «roubados».
Sr.ª Presidente, com o devido respeito, calculo que, quando este projeto de lei foi admitido, a Mesa tenha
tido o critério usual, que é o de respeitar a liberdade com que os partidos apresentam as suas iniciativas.
Contudo, quer parecer-nos que a utilização desta expressão ultrapassa os limites do debate político e
parlamentar sério, sereno e respeitador dos mais elementares princípios da convivência democrática entre
quem pensa de maneira diferente.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
De facto, Sr.ª Presidente, para aqueles que valorizam a democracia e o debate de ideias é certo que
podemos discordar das opções políticas, é certo que podemos utilizar os argumentos que entendermos para
expor essas divergências, mas não é legítimo que, do ponto de vista democrático, se possa considerar que
uma decisão política corresponde a um roubo. Isso não prestigia o debate parlamentar, não prestigia a
democracia, envergonha a Câmara, que representa a vontade política do povo português,…
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — … e envergonha ou, pelo menos, devia envergonhar também aqueles
que têm a coragem de propor uma iniciativa legislativa com este título.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Sr.ª Presidente, esta é uma linguagem gratuita, aviltante, acintosa, imprópria para um debate maduro sobre
uma questão que é importante para a vida das pessoas.
Desse ponto de vista, Sr.ª Presidente, esta iniciativa não devia ter sido apresentada com este título e em
bom rigor, enfim, não devia ter sido admitida com esta designação…
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — … e, mais do que isso, Sr.ª Presidente, nós não podemos criar um
precedente que legitime que, no futuro, isto volte a acontecer.
Vozes do PSD: — Muito bem!
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O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Assim, esta interpelação à Mesa e a V. Ex.ª, Sr.ª Presidente, visa uma
coisa muito simples, e estou convencido de que os princípios democráticos que tantas vezes são apregoados
pela bancada proponente não deixarão de ter em consideração: creio que o início desta discussão é o
momento próprio para que os proponentes procedam à retirada desta expressão no título da iniciativa
legislativa. É isso que, através da Mesa, proponho que seja feito.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Também para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Magalhães.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, os factos já aqui foram expostos pelo Sr. Deputado
Luís Montenegro.
Evidentemente, demos o assentimento, por consenso entre todos os grupos parlamentares, do
agendamento para o dia de hoje de um projeto de lei que versava, antecipámos todos nós, naturalmente
sendo contra, uma matéria relacionada com os feriados.
Portanto, quanto a isso nada a opor, é a democracia, são opiniões divergentes, opções divergentes e
visões divergentes.
Mas, Sr.ª Presidente, como deve imaginar, quando demos o assentimento, creio que nenhum grupo
parlamentar — enfim, falo do CDS mas creio que nenhum grupo parlamentar — estava minimamente a pensar
que estávamos a falar de um projeto de lei que se refere à «reposição dos feriados nacionais roubados».
Fomos surpreendidos pela súmula.
Sr.ª Presidente, quero aqui dizer com uma clareza cristalina que este tipo de linguagem é injuriosa e não
pode ser aplicada a uma lei que foi aprovada por uma maioria da Assembleia da República, órgão de
soberania legítima e democraticamente eleito.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
E digo mais, Sr.ª Presidente, numa linguagem, se quiser, popular mas respeitosa: quem não se dá ao
respeito não pode ser respeitado.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
E se o Parlamento hoje discutir esta matéria nestes termos não se dá ao respeito e é natural que seja
desrespeitado, lá fora, pelos cidadãos.
Por isso, Sr.ª Presidente, poderia invocar o artigo 89.º, n.º 3, do Regimento da Assembleia da República
que, em relação ao modo de usar a palavra, dá o poder a V. Ex.ª de advertir ou até de interromper quando o
discurso se torne injurioso e ofensivo, podendo retirar-lhe a palavra. «Roubo» é evidentemente injurioso e
ofensivo, e porque ainda estamos numa Casa que respeita o Estado de direito democrático, as regras
democraticamente aprovadas por uma maioria democrática, legitimamente eleita, estou convencido que a Sr.ª
Presidente não deixará de se juntar a este apelo feito pelo Sr. Deputado Luís Montenegro para que o Grupo
Parlamentar do PCP reconsidere e possa apresentar um projeto que, ainda que discordando com a maioria,
discordando com o Governo, discordando com as opções do PSD e do CDS, com certeza, respeite os valores
de Abril.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr.ª Presidente, para que rapidamente possamos discutir a substância,
porque é isso que interessa, gostaria de dizer o seguinte: já na Conferência de Líderes abordámos esta
questão e tivemos oportunidade de registar e compreender o incómodo e as objeções dos Srs. Deputados da
maioria relativamente à designação deste projeto de lei. Tivemos também oportunidade de clarificar que a
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utilização da expressão «roubados» neste título não tem qualquer objetivo de fazer associar a discussão desta
questão ao conceito jurídico-penal do roubo.
Protestos do PSD e do CDS-PP.
Obviamente que se trata de uma questão e de um argumento político e, Sr.ª Presidente, não estávamos à
espera que isto acontecesse, estávamos à espera de discutir a substância do projeto e não a designação, até
porque tivemos oportunidade de dizer também na Conferência de Líderes que, no nosso entendimento, o que
envergonha a Assembleia da República é obrigar os trabalhadores a trabalho não pago, obrigar os
trabalhadores a trabalhar sem remuneração.
Aplausos do PCP.
Mas, Sr.ª Presidente, a intenção do Grupo Parlamentar do PCP é garantir que os feriados que já este ano
há perspetiva de não serem gozados possam sê-lo rapidamente. Portanto, se é o título da iniciativa que
impede a aprovação do projeto de lei, obviamente alteramos o título para que ele possa ser aprovado e os
feriados possam ser repostos.
Aplausos do PCP.
Protestos do Deputado do CDS-PP Artur Rêgo.
A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, se o partido autor deste título se dispõe a modificá-lo, creio que
temos a questão ultrapassada.
Srs. Deputados, penso que não devemos transformar esta questão num caso…
Protestos do PSD e do CDS-PP.
Srs. Deputados, há coisas que são difíceis e o seu contrário é igualmente ou ainda mais difícil. O confrontar
o autor com este título seria provavelmente uma regra de prudência, que não chegou a ser observada; mas
também conseguir a transformação do título contra a vontade do seu autor é, do ponto de vista democrático,
não menos difícil do que aceitar uma palavra menos adequada.
Por isso, creio que há um entendimento. Não sei se na Conferência de Líderes, onde não pude estar, foi
solicitada a retirada do título mas, repito, penso que chegámos aqui a uma solução de consenso.
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr.ª Presidente, peço a palavra.
A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr.ª Presidente, se bem percebi, gostaria de registar com muito agrado a
decisão do Grupo Parlamentar do Partido Comunista de retirar a expressão «roubados» da epígrafe deste
projeto de lei.
Portanto, quero humildemente cumprimentar o Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português pelo
gesto que acabou de ter perante o respeito que é devido a esta Câmara. Aproveito também para lançar o
desafio para que todos sejamos capazes de nunca mais cairmos numa situação igual a esta.
Aplausos do PSD.
A Sr.ª Presidente: — Tem também a palavra o Sr. Deputado Nuno Magalhães, não deixando de antes
advertir para o facto de estas questões deverem ser definitivamente resolvidas em Conferência de Líderes.
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O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, quero também congratular-me com o facto de o
Partido Comunista Português e o seu grupo parlamentar terem retirado a expressão «roubados» do título da
iniciativa.
Nesses termos, e sendo assim, passando o projeto de lei a denominar-se «reposição dos feriados
nacionais», com certeza que o CDS participará em ampla liberdade e votará conforme essa mesma liberdade.
Se foi isso que percebemos, ainda bem, pois fica a democracia a ganhar; se não foi isso, lamentamos imenso
mas não podemos participar naquilo que ofende os princípios básicos da democracia e desta Casa.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr.ª Presidente, peço a palavra.
A Sr.ª Presidente: — Eu tinha feito já uma interpretação não contestada pelo PCP, mas se há
desenvolvimentos há que aceitá-los.
Tem a palavra, Sr. Deputado João Oliveira.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr.ª Presidente, se me permite a interpretação autêntica que, neste caso,
posso fazer em nome do Grupo Parlamentar do PCP, gostaria de dizer o seguinte: faremos chegar
formalmente à Mesa o pedido de alteração do título do projeto de lei, que passa a ser «reposição dos feriados
nacionais abolidos». Isto para que fique a nota da supressão dos feriados nacionais, porque esse é um facto
objetivo, e com vista a que não haja desculpa alguma para que a reposição dos feriados não possa resultar da
votação na próxima sexta-feira.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente — Srs. Deputados, insistindo para que estas questões sejam dirimidas em sede de
Conferência de Líderes, vamos passar ao conteúdo do debate.
Sendo assim, para apresentar o projeto de lei do PCP, tem a palavra o Sr. Deputado David Costa.
O Sr. David Costa (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: O País está confrontado com um
evidente retrocesso civilizacional.
A Sr.ª Presidente: — Sr. Deputado, peço desculpa pela interrupção, mas, em nome do direito que tem a
ser escutado, serve a mesma para repor maior tranquilidade no Plenário. Assim, peço aos Srs. Deputados, o
favor de tomarem os vossos lugares e que não façam ruído para que o Sr. Deputado David Costa se possa
fazer ouvir.
Faça o favor de continuar, Sr. Deputado.
O Sr. David Costa (PCP): — Os sucessivos ataques deste Governo PSD/CDS-PP aos trabalhadores e as
suas famílias estão a empobrecer cada vez mais os portugueses.
O ataque a muitos dos direitos conquistados pela luta de massas visa a desvalorização do trabalho e o
agravamento acentuado da exploração.
Este Governo de direita impõe uma política de exploração que assenta no corte de salários e no aumento
dos horários de trabalho mas também em medidas como os cortes nas reformas e pensões, a desregulação
de leis laborais, o ataque à contratação coletiva e aos sindicatos e uma ofensiva sem precedentes a todas as
funções sociais do Estado.
Tudo isto mascarado com muita propaganda. Onde o PSD e o CDS-PP veem sinais positivos, os
trabalhadores sentem na pele a dificuldade dramática em pôr comida na mesa. Onde PSD e CDS-PP veem
sinais positivos, os jovens só têm como alternativa emigrar para trabalhar. Onde o PSD e CDS-PP veem sinais
positivos, no aumento das fortunas, os portugueses são obrigados a trabalhar até à exaustão, com mais horas
semanais, com menos dias de férias e feriados retirados.
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Mas quem é que consegue compreender, com o avanço cientifico-tecnológico existente, esta opção de
exploração do fator trabalho?!
Alguém pode encontrar nesta medida uma perspetiva de futuro, de desenvolvimento, de melhoria das
condições de vida e de trabalho?!
Esta opção só é compreensível para quem quer fazer da exploração do trabalho lei de vida e, para isso,
impõe aos trabalhadores que trabalhem sem receber.
O trabalho não pago imposto pelo Governo revela as suas opções de classe, contra os trabalhadores,
contra o progresso e a justiça social, contra as conquistas de Abril.
A eliminação de quatro feriados nacionais pelo Governo PSD/CDS constitui a imposição de quatro dias de
trabalho grátis, trabalho não pago, Srs. Deputados, entregue de mão beijada ao patronato e um verdadeiro
roubo aos trabalhadores.
Foi esta medida que relançou a economia? Não, é obvio que não! Foi esta medida que fez diminuir o
desemprego? Pelo contrário, é em si mesma promotora de mais desemprego. Então, para que serve? Apenas
para agravar a exploração e facilitar a acumulação de capital.
Além de tudo isto, esta medida, acordada entre o Governo, a UGT e as entidades patronais, afeta o direito
e a capacidade de articulação da vida profissional e pessoal, nomeadamente a vida familiar, atingindo direitos
e valores fundamentais para a vida dos trabalhadores e do povo.
O projeto de lei que o PCP apresenta repõe os quatro feriados nacionais, reconhecendo a sua importância
histórica e cultural, com particular realce para o dia da implantação da República e da restauração da
independência, cuja eliminação colide com a cultura e a história do povo português.
O PCP propõe ainda a consagração da terça-feira de Carnaval como feriado obrigatório, apoiado numa
prática secular da sua comemoração por todo o território nacional, garantindo que a sua comemoração não
fica dependente de decisão do Governo.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente. — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Inês de Medeiros.
A Sr.ª Inês de Medeiros (PS): — Sr.ª Presidente, começo por saudá-la e dar-lhe as boas vindas.
Srs. Deputados, sem querer reabrir o debate, quero deixar claro, em relação à anterior epígrafe deste
projeto de lei, que acompanhamos as dúvidas aqui expressas pela maioria e, por isso, congratulamo-nos com
a sua alteração.
Vozes do PSD: — Muito bem!
A Sr.ª Inês de Medeiros (PS): — Quanto à substância do projeto de lei, gostaria de fazer uma abordagem
mais histórica e começava pela história recente.
O atual Governo acabado de chegar ao poder, ainda em período de afirmação e na ânsia de se mostrar
reformador, achou que a forma mais eficaz de demonstrar o seu apreço pelas noções de eficácia,
rentabilidade e, sobretudo, para acentuar o processo de culpabilização coletiva com o qual esperava justificar
a sua política, considerou que o gesto mais significativo seria eliminar feriados.
Prosaicamente, a ideia a fazer passar era que o regabofe tinha acabado. A causa parecia fácil de fazer
passar na opinião pública, já estava a ser banalizada pelos especialistas oficiais que vinham declarar que as
nossas fragilidades em termos de produtividade estavam no excesso de celebração coletiva.
Claro que nada foi devidamente estudado, ninguém até agora conseguiu provar que a eliminação de alguns
feriados tenha tido resultados concretos em termo de competitividade e, mais uma vez, ficou claro que a
dimensão histórica, social e cultural não é propriamente o forte deste Governo.
A noção de feriado nacional, introduzida em Portugal após a revolução liberal, foi introduzida porque o
Estado moderno contemporâneo considera que importa promover a unidade e a identidade de uma sociedade
em torno de valores que a caracterizam. Esta noção parece ser demasiado abstrata para os nossos atuais
governantes. Tudo o que tenha uma dimensão temporal e uma complexidade um pouco mais elaborada do
que o imediato perturba — e, diria até, incomoda — quem atualmente nos dirige.
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Aplausos do PS.
Mas, afinal, a questão não correu assim tão bem como se esperava, porque a verdade é que ao eliminar
certos feriados se estava a pôr em causa a celebração da nossa própria história, desses tais valores que
fazem de nós um coletivo, um País, uma Nação. E foram até mais as vozes que condenaram do que as que
aplaudiram.
Não deixa, no entanto, de ser curiosa a escolha para a eliminação dos feriados civis, e é desses que vou
falar: o 1.º de Dezembro celebrava a nossa recuperação da autonomia e independência face aos castelhanos
em — lembrem-se! — 1640.
Esse mesmo 1640 que o Vice-Primeiro-Ministro diz que se vai repetir com a saída da troica, comparando,
aliás, de forma algo duvidosa a intervenção dos nossos parceiros europeus a uma anexação.
Não sei se se pretende, findo o programa de resgate, a introdução de um novo feriado para celebrar este
novo Portugal, banhado numa mesma nova normalidade como anuncia o Primeiro-Ministro.
O segundo feriado foi o de 5 de Outubro, que celebrava a República, ou seja, o regime no qual vivemos
atualmente. Também aqui somos confrontados com uma dúvida substancial: esta escolha foi deliberada, com
intenções inconfessáveis de alteração de regime ou foi por mera ignorância?! Não sabem, sequer, que a
excessiva exaltação do qualificativo «novo» tem conotações menos generosas?!
É muito desestabilizador não conseguir responder a esta dúvida. Mas o Partido Socialista, em
contrapartida, não tem dúvidas de que, se a nossa independência merece ser celebrada, é imprescindível,
sobretudo nos tempos que vivemos,…
A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Inês de Medeiros (PS): — Estou a terminar, Sr.ª Presidente.
Como estava a dizer, é imprescindível, sobretudo nos tempos que vivemos, relembrar, celebrar e promover
com dignidade os valores e ideais da República: a liberdade, a igualdade, a educação, a cidadania.
Estes feriados são a partilha de uma mesma história e de uma cultura, para não sermos, como dizia
Malraux, apenas um acidente do universo.
Por isso, e apesar de algumas reservas sobre a oportunidade da introdução de novos feriados,
acompanharemos favoravelmente o projeto de lei do PCP.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem, agora, a palavra a Sr.ª Deputada Clara Marques
Mendes.
A Sr.ª Clara Marques Mendes (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Relativamente à matéria
que hoje aqui se discute, importa deixar três notas fundamentais.
Em primeiro lugar, a lei que aprovou a terceira revisão ao Código do Trabalho e na qual se integra
especificamente esta matéria dos feriados resultou de um amplo consenso social, de um acordo de
concertação social…
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Conversa da treta!
A Sr.ª Clara Marques Mendes (PSD): — … e, portanto, de um compromisso social que deve ser
respeitado e foi respeitado nesta Assembleia da República.
Vozes do PSD: — Muito bem!
A Sr.ª Clara Marques Mendes (PSD): — Respeitar esse acordo, essa vontade da maioria é respeitar os
valores da democracia, quando numa mesma mesa se sentaram patrões, trabalhadores e o Governo para
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encontrarem uma melhor solução. Tentaram esse acordo para que, assim, pudesse haver alterações e se
pudesse inverter a situação da nossa economia e do mercado laboral.
Uma segunda nota que importa deixar aqui é a de que está previsto na lei, concretamente no artigo 4.º da
lei que procede à quinta alteração ao Código do Trabalho, que a eliminação dos feriados será
obrigatoriamente objeto de reavaliação num período nunca inferior a cinco anos.
Por fim, em terceiro lugar, importa lembrar os objetivos que estiveram na base das alterações ao Código do
Trabalho, os quais se prendem com o aumento da produtividade e a inversão da situação que viviam a nossa
economia e o nosso mercado laboral. E, apesar de ainda ténues, a verdade é que os sinais têm vindo a
manifestar-se.
Admitam, Srs. Deputados, que aqueles sinais que tanto apregoavam que não iriam existir, de facto,
existem. E quais são esses sinais? Esses sinais têm vindo a público e os Srs. Deputados têm de os
reconhecer: aumento da criação de empresas, diminuição do desemprego, aumento da criação líquida de
emprego e crescimento da nossa economia.
Vozes do PSD: — Muito bem!
A Sr.ª Clara Marques Mendes (PSD): — Srs. Deputados, isto são factos e são factos do conhecimento dos
Srs. Deputados, mas de que os Srs. Deputados teimam em não falar. São sinais de que há uma viragem na
nossa economia e que as alterações, as reformas estruturais, estão a dar resultados, mas de que os Srs.
Deputados teimam em não falar. Reconhecem, mas não falam!
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Exatamente!
A Sr.ª Clara Marques Mendes (PSD): — Srs. Deputados, são aspetos como estes que devem ser
valorizados e devemos deixar o discurso de terra queimada, que apenas inflama a sociedade e não apresenta
qualquer solução.
A economia está a dar sinais, todos os dias temos recebido notícias disso e os Srs. Deputados não o
podem negar.
Eis chegado o momento de reconhecer a coragem do Governo e dos portugueses, com os sacrifícios que
fazem. São muitos sacrifícios e, por isso mesmo, devem ser respeitados por todos. E respeitar esses
sacrifícios dos portugueses não é vender ilusões, é falar com verdade, é dizer que as reformas são
necessárias e fundamentais para que se mude e se entre numa senda de crescimento.
Temos obrigação de ser honestos e verdadeiros, de deixar a demagogia de lado, para que os portugueses
saibam que o caminho, apesar de difícil, está a dar resultados. Há, de facto, ainda muito pela frente, mas há,
finalmente, um caminho e não o abismo para que outros nos enviaram.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Também para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Aiveca.
A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Na reunião plenária de 11 de maio
de 2012 foram aprovadas as alterações ao Código do Trabalho. Votaram a favor a direita, PSD e CDS,
absteve-se o Partido Socialista, votaram contra os Grupos Parlamentares do Bloco de Esquerda, do PCP, do
Partido Ecologista «Os Verdes» e 10 Sr.as
e Srs. Deputados do Partido Socialista.
Nesta alteração, estava consubstanciada nova legislação sobre os feriados. No artigo 234.º, nesta
alteração ao Código do Trabalho, praticava-se um esbulho dos feriados nacionais. Tal artigo não teve nenhum
consenso, como agora foi afirmado, pelo contrário, provocou manifestações de muitas associações, não
sindicais nem patronais mas da sociedade civil, e relembro até a declaração de voto produzida a este
propósito pelo Sr. Deputado do CDS-PP.
Por isso, não há qualquer consenso na sociedade perante um Governo que faz alterações à legislação do
trabalho, sempre em nome da competitividade e da produtividade, mas cujo resultado está à vista de todos e
de todas.
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Aumentou a precariedade, aumentou o trabalho sem direitos, aumentou o trabalho a tempo parcial,
aumentou o desemprego, aumentou o trabalho não pago, aumentou a pobreza.
Por isso mesmo, a vossa legislação significa o fracasso de uma economia que não cresce, bem pelo
contrário, significa o fracasso da vida das pessoas que vivem cada vez pior.
Mas, não contentes com estas alterações, decidiram ainda reescrever a história, reescrever as tradições,
reescrever a memória. E é exatamente a Assembleia da República que aprova a retirada do feriado que
celebra a implantação da República.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — É verdade!
A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Os Srs. Deputados não gostam de certas palavras, mas, exatamente por
isso, utilizo terminologia já aqui usada relativamente ao esbulho fiscal: houve, sim, um esbulho aos
trabalhadores e trabalhadoras, que passaram a trabalhar mais quatro dias por ano de borla, houve um esbulho
ao País, às suas tradições, à sua história e à sua memória.
Tudo isto, Sr.as
e Srs. Deputados, não tem qualquer tipo de reflexo na nossa economia, nem na
produtividade, nem na competitividade, tem reflexo, sim, nos direitos do trabalho, tem reflexo, sim, numa
sociedade que se quer mais democrática, tem reflexo, sim, na retirada das conquistas da democracia e do 25
de Abril.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente: — Ainda para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: As pessoas que trabalham, de
facto, têm vindo a ser muito maltratadas por este Governo, e os exemplos não faltam.
Vejamos: alterações ao Código do Trabalho que vieram facilitar o despedimento e tornar as indemnizações
mais baratas, em caso de despedimento; reduções salariais; generalização da precariedade; aumento de
impostos; aumento do horário de trabalho; eliminação de dias de férias e de descanso compensatório. E,
enfim, não sendo por roubo ou furto — não sei muito bem como hei de dizer, se calhar, posso chamar-lhe
desvio, mas pouco interessa —, o que é verdade é que as pessoas que trabalham ficaram sem cinco feriados,
quatro feriados obrigatórios e um facultativo. São cinco dias por ano em que as pessoas acabam por trabalhar
apenas para a entidade patronal, ou seja, trabalham de graça.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Bem lembrado!
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Isto é, de facto, de uma injustiça gritante.
Mas, sobre o Carnaval, e porque nos parece muito pouco razoável deixar nas mãos do Governo a
faculdade de, uma ou duas semanas antes, decidir não considerar o dia de Carnaval como um feriado,
frustrando, aliás, as expectativas dos portugueses, das autarquias e até dos operadores turísticos, e sem dar
tempo aos serviços de se reorganizarem, apresentámos, há cerca de dois anos, uma iniciativa legislativa com
vista a alterar o Código do Trabalho para tornar a terça-feira de Carnaval como um feriado obrigatório. Porém,
a maioria não foi na conversa,…
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Ainda bem que reconhece que era conversa!
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — … a maioria fez o Carnaval do costume e chumbou a proposta. É
pena porque, culturalmente, a terça-feira de Carnaval é um dia assimilado pelas pessoas como um feriado
verdadeiro.
Aliás, esse facto tem levado os portugueses a programarem, com tempo, uma saída, para passarem esse
dia com a família, muitas vezes até com reservas de estadia.
Também o calendário escolar está feito de maneira a contemplar a terça-feira de Carnaval como um
feriado. Aliás, até por isso há uma interrupção letiva nesse período. Para além disso, muitos serviços da
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Administração Pública, como é o caso dos centros de saúde e hospitais, não marcam consultas para esse dia
porque estão a contar com o feriado, ou, no caso dos tribunais judiciais, não agendam diligências para esse
dia porque estão a contar com o feriado.
Contudo, o Governo não considera o dia de Carnaval como um feriado, e já o fez por duas vezes. Aliás, a
decisão do Governo levou à situação caricata e singular de termos uma terça-feira de Carnaval em que meio
País esteve parado e meio País esteve a trabalhar, como, de resto, mostra o facto de mais de 70% dos
municípios terem dado tolerância de ponto nesse dia. Portanto, 70% dos municípios não foram na conversa do
Governo e a parte do País que trabalhou apenas o fez a meio gás, porque não havia serviços de correio, os
CTT estavam encerrados, e os bancos também estavam encerrados.
Srs. Deputados, vamos respeitar o Governo e não vamos dizer que o Governo roubou ou furtou, mas
vamos também respeitar as pessoas e devolver-lhes os feriados, porque, não sendo por roubo ou furto, na
verdade, as pessoas acabaram por perdê-los.
Entretanto, assumiu a presidência o Vice-Presidente Ferro Rodrigues.
O Sr. Presidente: — Ainda para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Artur Rêgo.
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Ao longo da história e desde que foi
instituída como oficial a celebração de determinados dias considerados de relevo para o País como feriados,
foram criados feriados, foram abolidos feriados, enfim, não é um processo novo.
O que se passou em 2012 foi um episódio num processo com mais de 100 anos, aliás, com perto de 200
anos. E o que é que aconteceu em 2012? Pura e simplesmente, foi decidido suspender a celebração de quatro
feriados. Mas não foi este Governo e esta maioria, por sua livre iniciativa, por sua autoria e sem consultarem
ninguém, que decidiram fazê-lo. Não! Fizeram-no em concertação social, no âmbito de um acordo tripartido, e
os próprios feriados, não apenas o número, mas também as datas dos feriados que seriam abolidos, foram
acordados e concertados com todos os parceiros sociais.
Portanto, foi um processo perfeitamente transparente, ao contrário do que aqui foi dito, foi um processo que
teve todo o apoio e suporte dos representantes das diversas forças sociais,…
Vozes do PCP e de Os Verdes: — Algumas!
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — … seja do lado empresarial, seja do lado dos trabalhadores — as centrais
sindicais estavam lá —,…
Risos do Deputado do PCP Jorge Machado.
… foi um processo que culminou numa lei da Assembleia da República, que foi aqui aprovada e está em
pleno vigor. Foi, pois, um processo transparente, legítimo…
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — E injusto!
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — … e perfeitamente claro.
Para terminar, é evidente que tem de se desvalorizar a questão do esbulho, aliás, com todo o respeito, nem
faz grande sentido falar na questão do esbulho, do roubo dos dias de trabalho, por eliminar feriados,…
O Sr. David Costa (PCP): — Trabalho de borla!
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — … porque os feriados nada têm a ver com isso.
Protestos do PCP e de Os Verdes.
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Quando se cria um feriado, não se está a fazer um ajuste salarial por se trabalhar um dia a menos, assim
como quando se elimina também não se faz o mesmo. Os feriados são celebrações de momentos importantes
que se entende que devem ser instituídos e são suspensões dessas celebrações que devem ser suspensas
no momento em que o feriado é suspenso.
Mesmo para terminar, Sr.ª Deputada Inês de Medeiros, também me desgostou que o feriado do 5 de
Outubro fosse suspenso. Mas essa data não se refere à celebração do dia da República, da implantação da
República. Não, Sr.ª Deputada! A implantação da República tal como a restauração da independência são
episódios da História de Portugal. A data de 5 de Outubro refere-se a 1143, data da assinatura do Tratado de
Zamora, da criação do País. Essa, sim, é que seria a grande data, Sr.ª Deputada. Como vê, não houve
nenhuma intenção persecutória em relação à República.
Protestos do PS e do PCP.
E, Sr.ª Deputada, nunca se poderia justificar esse tipo de argumento, dado que o feriado de 5 de Outubro
foi sugerido, apoiado e sustentado por todos os parceiros sociais.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Jorge
Machado, do PCP.
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Agora percebemos bem o
incómodo do PSD e do CDS-PP face a este projeto de lei.
O PSD e o CDS-PP perderam mais tempo a falar do título do diploma do que da questão de fundo, que é a
reposição dos feriados, a sua justa reposição para os trabalhadores. O título era apenas a desculpa para o
PSD e o CDS-PP não discutirem o problema.
E, do pouco que disseram, o que é que referiram?
O PSD falou de sinais da economia, falou de um mundo cor-de-rosa que, pura e simplesmente, não existe.
O CDS falou da concertação social, sabendo muito bem que a CGTP esteve, desde a primeira altura, contra a
abolição destes feriados. Portanto, a desculpa da concertação social não é, efetivamente, verdadeira nem
legítima. E diz ainda o CDS-PP que trabalhar mais dias sem receber não é uma questão salarial.
Portanto, fica claro que o PSD e o CDS-PP queriam fugir à questão. A verdade é que o Governo
manifestou a intenção de devolver alguns feriados em 2015. E colocam-se três questões imediatamente.
Primeira questão: de boas intenções está o inferno cheio.
Segunda questão: a devolução dos feriados não é uma benesse que dependa da disponibilidade do PSD
ou do CDS-PP; os trabalhadores vão recuperar aquilo que o PSD e o CDS-PP lhes retiraram!
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Terceira questão: se a intenção é devolver os feriados, então que se
aprove imediatamente a iniciativa do PCP!
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
O Sr. Jorge Machado (PCP): — O que o CDS-PP e o PSD fizeram com a eliminação dos feriados é
inaceitável e inconcebível, pois significa mais cinco dias de trabalho sem salário. É um autêntico roubo, é um
agravamento da exploração, é trabalho gratuito! E o PSD e o CDS-PP desrespeitam as datas históricas que
estes feriados efetivamente representam!
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Sr. Deputado, agradeço que conclua.
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O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr. Presidente, a terminar, queria dizer que o PSD e o CDS-PP colocam o
progresso tecnológico e científico ao serviço da acumulação da riqueza e não ao serviço das populações e dos
trabalhadores.
Hoje, produz-se cada vez mais por cada hora de trabalho e, em vez de reduzirem o horário de trabalho, em
vez de melhorarem as condições de vida dos trabalhadores, o que o PSD e o CDS-PP fazem é colocar o
progresso tecnológico e científico ao serviço da exploração.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Clara Marques Mendes (PSD): — Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Para que efeito, Sr.ª Deputada?
A Sr.ª Clara Marques Mendes (PSD): — Sr. Presidente, é para uma interpelação à Mesa sobre a
condução dos trabalhos.
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Tem a palavra, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Clara Marques Mendes (PSD): — Sr. Presidente, pretendo apenas, a bem do esclarecimento do
debate, informar que houve um lapso na minha intervenção quando falei no aspeto da reavaliação dos
feriados.
Houve um lapso na leitura da lei. O que queria dizer quanto à reavaliação dos feriados é exatamente o que
vem na lei, ou seja, que tal é obrigatoriamente objeto de reavaliação num período não superior a 5 anos.
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Muito obrigado, Sr.ª Deputada. Ficou esclarecido.
Passamos ao quarto ponto da ordem do dia, que consiste na discussão, na generalidade, do projeto de lei
n.º 281/XII (2.ª) — Determina a reabertura da possibilidade de requerer a reintegração ao abrigo do Decreto-
Lei n.º 173/74, de 26 de abril (BE).
Tem a palavra, para uma intervenção, e para apresentar o projeto de lei, o Sr. Deputado Pedro Filipe
Soares.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Foram muitos e muitas os
servidores e as servidoras do Estado — militares, não militares, civis — que contribuíram para a queda da
ditadura. Devemos-lhes mais do que apenas reforçar a democracia, devemos-lhes mais do que as palavras
conseguem dizer. De facto, com a sua coragem individual, muitas e muitos, confrontados com ordens diretas,
escolheram confrontar essas ordens e desobedecer e, por defenderem a democracia, por atacarem um
regime, foram depois perseguidos, muitos deles foram tirados para fora do Estado e muitos outros tiveram de
sair do País devido à perseguição.
Todas estas pessoas, sem exceção, merecem o nosso reconhecimento e o do Estado português, por isso
devem merecer também a sua proteção.
Era exatamente isso que o Decreto-Lei de 26 de abril de 1974 — o Decreto-Lei n.º 173/74 — visava:
pretendia uma amnistia para os crimes políticos e para as infrações que foram cometidas nos mesmos termos,
permitia a reintegração destes servidores e era também contemplada a sua expetativa legítima de promoção
na carreira.
Posteriormente, este Decreto-Lei foi regulado e, em diversos momentos, foi reaberto o prazo para os
cidadãos terem acesso aos direitos que nele estavam consagrados.
O que se pretende com este projeto de lei do Bloco de Esquerda é que aqueles que não tiveram ainda
acesso aos benefícios previstos neste Decreto-Lei (à reintegração nele prevista), mas que estavam em
condições de aceder aos mesmos, possam, agora, ter um novo prazo para serem reintegrados.
Especificamente, pretende-se que todos aqueles militares e ex-militares que tinham direito a pedir a sua
reintegração e que, pelos mais diversos motivos, não o fizeram tenham agora uma nova oportunidade. Esses
militares poderão ter ainda direito à promoção na carreira que a reintegração lhes permitirá.
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Com isso, estamos a virar a página: a virar a página do reconhecimento do direito histórico que deveria ser
consagrado a estes militares e ex-militares e também a virar a página do reconhecimento, por parte de todo o
Estado português, daquilo que fizeram pela promoção da democracia, pela instauração da democracia. E, de
uma vez por todas, há que perceber que a sua ação foi determinante, dentro e fora do País, para que hoje
tantos e tantas vivam em liberdade em todo o espaço democrático. E porque eles foram o agente histórico que
permitiu essa alteração, há que reconhecer o direito à sua reintegração.
Sr. Presidente, termino a minha intervenção dizendo que esta escolha é de direito, é de reconhecimento,
mas não terá qualquer relevância orçamental. Não se devem, pois, colocar os cifrões em cima da mesa
quando é de reconhecimento e de direitos que estamos a falar; devem, sim, colocar-se de lado, porque não
têm sequer importância.
O que é importante é reconhecer que estes cidadãos tiveram um papel determinante para a instauração da
democracia, para o derrube da ditadura. E é exatamente isso que recolocamos em cima da mesa, propondo a
abertura de um novo prazo para poderem aceder àquilo que, no passado, já lhes foi permitido.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado José Lello.
O Sr. José Lello (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Apreciamos o projeto de lei do Bloco de
Esquerda que visa a possibilidade de abertura do processo de reintegração inicialmente abordado no Decreto-
Lei n.º 173/74, de 26 de abril, da Junta de Salvação Nacional, um diploma visava a amnistia dos ditos crimes
políticos e das infrações disciplinares dessa natureza.
O objetivo desta iniciativa parlamentar do BE prende-se com a correção de situações de militares e ex-
militares que, pelas mais variadas razões, não conseguiram beneficiar da reintegração prevista no Decreto-Lei
de 1974.
Para tal, prevê a abertura, por seis meses, da possibilidade de os cidadãos, à época militares e ex-militares
e que se julguem estarem abrangidos pelas condições e termos previstos no Decreto-Lei n.º 173/74,
apresentarem as suas candidaturas.
Enfim, o intuito é que se faça justiça àqueles que, 40 anos após o 25 de Abril, ainda dela não beneficiaram,
isto é, aos militares e ex-militares que não tergiversaram na defesa da liberdade e dos valores democráticos,
colocando as suas vidas e carreiras em risco num País sujeito a uma ditadura que se eternizou no poder por
décadas de má memória. Muitos tiveram que abandonar Portugal e perderam tudo, nomeadamente direitos,
carreiras e a ligação à informação sobre a realidade específica que aqui se vivia, o que, porventura, não lhes
permitiu fruir do conhecimento da iniciativa que o novo Portugal de Abril lhes abria de forma a permitir a sua
reintegração plena no País que os escorraçara. Esta é, pois, uma iniciativa que visa repor-lhes a vida e a
dignidade que o regime fascista lhes havia sonegado.
Curiosamente, o Decreto original de 1974 não mencionava qualquer prazo de validade para que uma
candidatura pudesse vir a ser validada. Essa condicionante apenas viria a ser definida no âmbito da
regulamentação do diploma, a qual nem sei sequer se será ajustada ao espírito do legislador.
Passados 40 anos, e depois de quatro períodos de receção de candidaturas, haverá quem se questione
sobre se ainda fará sentido persistir neste tipo de iniciativas legislativas ou se ainda existirão cidadãos nas
situações que haviam motivado as preocupações de equidade dos militares de Abril. Se houver casos ainda
remanescentes, será justo que nos 40 anos do 25 de Abril o País se reconcilie com os injustiçados pelo regime
fascista e os trate com a devida retidão democrática.
O Bloco de Esquerda, na senda do histórico legislativo, prevê no seu diploma seis meses de prazo para
que as candidaturas possam vir a ser apreciadas. Ora, num País democrático e livre, como é o nosso, quando
um tal Dr. Charrua, sem constrangimentos de prazos ou peias burocráticas, foi principescamente remunerado
em razão de alegados prejuízos de caráter político, como poderemos estar nós a limitar um direito que
legitimamente assiste a quem foi objeto de perseguições, de expulsões das suas carreiras, de perda de
liberdade e da ruína da sua própria cidadania, a limites de ordem burocrática que não têm sentido?
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Peço-lhe o favor de concluir, Sr. Deputado.
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O Sr. José Lello (PS): — Vou já concluir, Sr. Presidente.
Considero, assim que, a todo o tempo, se alguém comprovar que foi prejudicado e viu os seus direitos
aniquilados dentro do âmbito temporal e restrito do diploma original, como aconteceu a esses militares e ex-
militares que o Decreto-Lei de abril pretendeu ressarcir, deverá poder apresentar o seu caso específico ao
escrutínio rigoroso das autoridades democráticas deste País, independentemente de peias e bizantinices
burocráticas.
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Faça favor de concluir, Sr. Deputado.
O Sr. José Lello (PS): — Vou terminar, Sr. Presidente.
Às autoridades caberá fazerem um exame rigoroso das candidaturas que permita expurgar
comportamentos oportunísticos e compensar apenas aqueles que, na defesa dos seus ideais, foram oprimidos
e violentados pela máquina fascista do regime derrubado em 25 de Abril.
Muito obrigado pela sua tolerância, Sr. Presidente.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado André
Pardal.
O Sr. André Pardal (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: O projeto de lei apresentado pelo
Bloco de Esquerda tem como objetivo reabrir a possibilidade de reintegração de militares e ex-militares ao
abrigo do Decreto-Lei n.º 173/74. Esta iniciativa prevê ainda que, nos casos em que no passado tenha havido
indeferimento do requerimento de reintegração, seja permitida a apresentação de novo requerimento.
Ora, fazendo aqui uma perspetiva histórica, logo em 1974 o próprio Decreto-Lei n.º 173/74 visou amnistiar
crimes políticos e infrações disciplinares da mesma natureza e proceder à reintegração de civis, de servidores
do Estado e de militares que tivessem sido demitidos ou reformados compulsivamente. Este Decreto-Lei foi
regulamentado em 1975.
Em segundo lugar, em 1978, o Decreto-Lei n.º 349/78 veio abrir um novo prazo de 90 dias para o mesmo
efeito.
Em terceiro lugar, em 1982, o Decreto-Lei n.º 281/82 reabriu o processo, por mais de 90 dias, para quem
não tivesse a situação resolvida.
Por fim, em 1999, muito recentemente, a Lei n.º 43/99 aprovou ainda medidas extraordinárias tendentes à
mesma revisão e à mesma reintegração de militares e ex-militares. Este processo, que foi reaberto em 1999 e
terminou em 2008, teve uma comissão de apreciação que apreciou cerca 30 processos e um encargo superior
a 1,5 milhões de euros.
Verificamos, portanto, considerando o histórico, que houve três reaberturas do processo, desde o Decreto-
Lei n.º 173/74, para o mesmo efeito. Portanto, este é um processo que, num histórico de 40 anos, teve várias
reaberturas e análises legislativas.
Ao longo desses anos, como referi, foram sendo criadas várias condições para a reintegração dos militares,
nomeadamente através da abertura de períodos extraordinários para os interessados. Como consequência da
aprovação destes alargamentos, surgiram encargos que terão repercussões orçamentais.
Os encargos que o projeto de lei do Bloco de Esquerda refere são muito dificilmente quantificáveis. Acresce
também que há uma indeterminação do universo de beneficiários a que será aplicável: não sabemos de
quantos beneficiários estamos a falar e na exposição de motivos do diploma não é referida nenhuma situação
objetiva e concreta que justifique a reabertura da possibilidade de requerer a reintegração destes militares e
ex-militares. Portanto, o projeto de lei e a sua exposição de motivos são vagos.
Desta forma, e para concluir, Sr. Presidente, dado que este mesmo dossier foi reaberto há muito pouco
tempo, há sensivelmente cinco anos, o PSD não vê neste momento oportunidade nem justificação plausível
para este diploma.
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Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.
O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Damos a nossa concordância a esta
iniciativa legislativa apresentada pelo Bloco de Esquerda. É evidente que o Decreto-Lei de 1974 correspondeu
à mais elementar justiça relativamente àqueles que tinham sido perseguidos e preteridos nas suas carreiras
por serem opositores ao regime fascista. Portanto, o que se fez em 1974, na sequência do 25 de Abril, foi um
ato da mais elementar justiça.
A única coisa que se pode questionar é se alguma vez fez sentido limitar no tempo a possibilidade de as
pessoas que foram prejudicadas requererem a reposição das suas carreiras e serem, de alguma forma,
ressarcidas dos prejuízos que injustamente lhes foram criados.
A opção, no entanto, foi a de fazer depender a apresentação dos requerimentos de um determinado
horizonte temporal. Ora, isso levou a que, em momentos posteriores, designadamente em 1982, e mais
recentemente, como já aqui foi referido, o legislador se visse na contingência de abrir um novo período durante
o qual as pessoas que estivessem em condições de poderem ser abrangidas por essa reposição, que tinha
sido decidida originariamente em 1974, pudessem, efetivamente, requerê-la.
Acontece que vicissitudes diversas podem ter levado a que alguns cidadãos o não tivessem feito,
designadamente o facto de não viverem em Portugal nessa altura ou de, por qualquer razão relativa à sua
própria vida, não terem feito o requerimento atempadamente. Mas o que interessa é ponderar se o princípio de
justiça que esteve na base do Decreto-Lei originário não deve ser aplicado em qualquer momento, sempre que
haja um cidadão que demonstre que estava em condições de poder beneficiar dele. E essa é que é a questão!
Não nos parece que seja muito justo que alguém, num determinado período, de seis ou de x meses, não
tenha apresentado aquele requerimento, quando o podia ter feito e quando reunia todas as condições para
poder beneficiar dele, perca indefinidamente esse direito. Daí que concordemos com esta iniciativa, que nos
parece pertinente.
É mais que evidente que não haverá um número muito significativo de cidadãos que venham a ser
abrangidos, mas se houver um que seja deve ser merecedor da nossa consideração.
Também estamos disponíveis para que, se esta iniciativa for aprovada — pareceu-nos ser essa a ideia que
foi aqui expressa há pouco pelo Sr. Deputado José Lello —, se possa ponderar a possibilidade de não fazer
depender o requerimento de um período temporal, o que nos poderia levar, inclusivamente a, no futuro, termos
de apresentar alguma iniciativa semelhante, embora isso não seja provável.
Do nosso ponto de vista, também há abertura, obviamente, para repensar essa questão. Como acabei de
dizer, a possibilidade de beneficiar desta reposição de carreira não deveria depender de um prazo específico.
Estamos, pois, disponíveis para, se for essa a vontade dos proponentes e do conjunto dos Deputados
desta Assembleia e dos grupos parlamentares, revermos essa questão e consagrarmos que alguém que
esteja em condições de beneficiar da justa reposição de carreiras, que foi decidida em 1974, a possa requerer,
independentemente do momento em que o faça.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Rebelo.
O Sr. João Rebelo (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Esta proposta do Bloco de
Esquerda já teve uma outra versão na anterior Legislatura. Para perceberem bem o seu alcance, essa anterior
versão era objetivamente inconstitucional, por se destinar exclusivamente a resolver um caso, e não era geral
e abstrata.
De facto, o projeto de lei em debate corrige essa questão. O problema está em que, ao corrigir essa
questão, acaba por abrir — e poderá abrir — uma espécie de «caixa de Pandora» para resolver outros casos,
podendo outras pessoas utilizar esta proposta do Bloco de Esquerda para esse efeito.
O Bloco de Esquerda pode dizer que não é isso que acontece, que os casos visados são muito reduzidos
ou poderão ser muito reduzidos. Mas as informações que obtivemos, porque andámos a estudar este assunto
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— que não é fácil, é melindroso, mas que visa resolver algo que é objetivamente injusto —, são as de que,
dada a forma como esta proposta está redigida e a forma como é defendida, poderá, de facto, trazer
problemas em relação a outro tipo de questões.
Foi aqui bem lembrado que não houve só um período para a inscrição de parte destes militares que foram
— convém realçá-lo — vítimas de perseguições no tempo do Estado Novo. Tiveram essa legislação aprovada
em 1974 para, exatamente, reparar a injustiça de que tinham sido alvo por parte do regime salazarista.
Portanto, foi uma legislação positiva e boa e que mereceu a concordância de toda a gente e dos democratas.
Mas a verdade é que não foi só em 1974 que existiu esse período de inscrição, existiram outros períodos, que
foram aqui referidos: em 1978 e em 1982. Portanto, existiram vários períodos, durante Governos diferentes —
no caso do período de 1978, havia um Governo do Partido Socialista e, no caso de 1982, o Governo era da
AD —, em que se alargou a possibilidade de inscrição por parte desses ex-militares. E quando falamos de
1982, estamos a falar de oito anos depois do 25 de Abril, por conseguinte houve um período bastante longo
para esse efeito.
Finalmente, a Lei n.º 43/99, já com uma abrangência bem superior, ainda veio também corrigir muitas
injustiças que tinham sido criadas.
O último militar a ver a sua carreira corrigida — abrangido pela Lei n.º 43/99, inspirada, aliás, no Decreto-
Lei de 1974 — e a ver os seus direitos tidos em conta ocorreu em 2008.
Portanto, estes vários processos nasceram em 1974 e terminaram em 2008. Estamos, portanto, a falar de
um longo período de tempo para se resolverem estas questões.
O Bloco de Esquerda, com esta proposta, corrigiu, e bem, o âmbito muito restrito da outra, que
eventualmente podia tornar inconstitucional uma leitura da própria proposta, o que não é o caso atualmente.
Mas, com a correção que o Bloco de Esquerda introduz na proposta inicial, a verdade é que caímos na
possibilidade de se alargar significativamente o universo de potenciais beneficiários.
Ora, neste momento, não existe nem a possibilidade política e económica nem a justeza de o fazermos,
pelo que expressamos as nossas reservas claras em relação a esta proposta.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Para uma segunda intervenção, certamente breve, tem a palavra o
Sr. Deputado Pedro Filipe Soares.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Sr. Deputado José Lello, de
forma muito simples, quero dizer que a nossa tentativa de introduzir o prazo de 180 dias era uma proposta de
consenso, mas estamos abertos para, na especialidade, caso o projeto de lei seja aprovado na generalidade,
podermos até retirar o prazo de tempo limite e dar esse direito sem qualquer limite temporal. Sobre essa
matéria estamos de acordo.
Como se percebe, do lado da maioria, há reservas a este projeto de lei. Não sei que diga mais do que
aquilo que já dissemos no passado em relação a este processo. Por um lado, há um reconhecimento; por
outro lado, a crítica de que este projeto de lei é geral e abstrato, quando, no passado, era objetivo e concreto;
depois, há também a crítica de que é geral e abstrato, quando deveria ser objetivo e concreto.
Não é possível agradar de tal forma aos objetivos da maioria sobre esta matéria. Entendamo-nos!
Todos sabemos que estamos a falar de um número reduzidíssimo de cidadãos abrangidos por esta
matéria. E eu coloco a pergunta ao contrário: um que fosse não merecia que a lei fosse tal alterada, para lhe
dar direito a obter o reconhecimento do Estado que ele serviu? É que, de facto, ele serviu o Estado
democrático e atacou a ditadura!
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Termino, Sr. Presidente, dizendo que foram estes exemplos
individuais, que, todos somados, derrubaram a ditadura. Não deveríamos, pois, ter esse reconhecimento para
com eles e consagrar essa possibilidade?
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De facto, todos sabemos que se trata de um universo extremamente reduzido, cujos elementos contar-se-
ão, pelos vistos, pelo número de dedos de uma mão.
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Tem mesmo de concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Mas, caso a maioria entenda que possa existir uma formulação
diferente da lei que retire esse prazo, temos abertura para, na especialidade, chegarmos a um consenso sobre
essa matéria.
Muito obrigado pela tolerância, Sr. Presidente.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Srs. Deputados, concluído o debate do projeto de lei n.º 281/XII
(2.ª), passamos ao quinto e último ponto da nossa ordem de trabalhos, que consiste na discussão conjunta, na
generalidade, dos projetos de lei n.os
479/XII (3.ª) — Revogação das taxas moderadoras e definição de
critérios de atribuição do transporte de doentes não urgentes (PCP) e 497/XII (3.ª) — Elimina o pagamento de
taxas moderadoras no acesso a cuidados de saúde do Serviço Nacional de Saúde (SNS) e estabelece a
isenção de encargos com transporte não urgente de doentes (segunda alteração ao Decreto-Lei n.º 113/2011,
de 29 de novembro) (BE).
Para apresentar o projeto de lei do PCP, tem a palavra a Sr.a Deputada Carla Cruz.
A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Com esta iniciativa, que propõe a revogação
das injustamente denominadas taxas moderadoras e a atribuição de transporte não urgente a todos os utentes
que dele necessitem, o PCP pretende dar uma resposta urgente para assegurar a universalidade do cesso à
saúde.
Vozes do PCP: — Muito bem!
A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — A saúde é um direito! O aumento brutal das taxas moderadoras, a par do corte
nos salários e pensões, constitui um obstáculo à saúde.
A introdução de taxas moderadoras em 1992 foi apresentada pelo PSD como a medida que visava moderar
os consumos excessivos de cuidados de saúde. Mas como o PCP na altura alertou e a realidade mostra, as
taxas moderadoras, para além de não moderarem consumos, têm-se constituído como um mecanismo de
copagamento em matéria de acesso aos cuidados de saúde, sendo um instrumento que tem sido utilizado
para transferir custos para os utentes.
A utilização mais eficiente dos serviços de saúde consegue-se com a melhoria do acesso e dos meios
disponíveis nos centros de saúde, com a garantia da existência de médico de família para todos os utentes e
com o funcionamento adequado e suficiente dessas unidades — coisa, aliás, que tem sido fortemente atacada
por este Governo.
No tocante aos critérios de atribuição de transporte não urgente a doentes — processo iniciado em 2010,
pelo Governo PS —, a obrigatoriedade de serem preenchidos requisitos clínicos e de insuficiência económica
impediu que beneficiassem desse recurso milhares de portugueses a necessitarem de transporte para
consultas e tratamentos.
A forte contestação levada a cabo pelos utentes impeliu a Assembleia da República a pronunciar-se sobre
esse assunto, tendo sido aprovada, em abril de 2011, por todos os partidos — exceto pelo PS —, uma
resolução que recomendava a revogação do Despacho n.º 19264 /2010 e a revisão do quadro legal referente
ao transporte de doentes não urgentes, garantindo a universalidade e a igualdade de acesso.
O atual Governo, contrariando a posição assumida então pelo PSD e pelo CDS-PP, em 2011, manteve o
mesmo critério de atribuição de transporte não urgente. O Governo, reagindo à contestação, publicou uma
portaria. Porém, continua a não resolver a questão central dos critérios da justificação clínica e da insuficiência
económica.
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O Sr. João Oliveira (PCP): — Muito bem!
A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — O que o PCP hoje aqui apresenta é que se retire o caráter cumulativo e que
seja atribuído o transporte não urgente de utentes sempre que a situação clínica o justifique ou por carência
económica.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Para formular pedidos de esclarecimentos, tem a palavra a Sr.a
Deputada Teresa Caeiro.
A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.a Deputada Carla Cruz, tenho três questões muito
breves a colocar-lhe.
Em primeiro lugar, pergunto como é que o PCP, através do artigo 1.º do projeto de lei que apresenta, diz
que revoga o Decreto-Lei n.º 113/2011, de 29 de novembro, que estabelece o acesso às prestações do
Serviço Nacional de Saúde, substituindo-o por três artigos, dizendo o quarto artigo que a lei entrará em vigor
cinco dias após a sua publicação.
Como é que se substitui — esta é a minha segunda questão — um diploma tão extenso, tão denso e tão
complexo como é o Decreto-Lei n.º 113/2011 e depois não se tem em atenção a chamada «lei-travão», que
diz que não pode haver aumentos de despesa dentro do mesmo ano de execução orçamental?
Terceira questão, no artigo 3.º do projeto de lei do PCP, diz-se: «O SNS assegura na totalidade os
encargos com o transporte não urgente prescrito aos utentes sempre que a situação clínica o justifique ou por
carência económica.» Ora, isto levar-nos-ia a uma situação, no mínimo, insólita: poder-se-ia impor ao Serviço
Nacional de Saúde que assumisse os encargos apenas por carência económica e não por situação clínica que
o justifique.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Carla Cruz.
A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Teresa Caeiro, já apresentámos várias vezes
este projeto de lei. Portanto, se a questão é aquela que coloca, aproveitemos, então, o Orçamento retificativo
para a colocarmos. Porque está aí! E está resolvida à questão!
Relativamente às taxas, Sr.ª Deputada, a realidade mostra que há muitos milhares de doentes que não
conseguem ter acesso à saúde. É isto que está em causa e por isso o nosso diploma refere quer a
insuficiência económica quer a razão clínica.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Não há justificação!
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Para apresentar o projeto de lei n.º 497/XII (3.ª), tem a palavra a
Sr.ª Deputada Helena Pinto, do Bloco de Esquerda.
A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: A Assembleia da República discute,
novamente, a questão das taxas moderadoras.
Antecipamos a resposta das bancadas da maioria, do PSD e do CDS: Está tudo bem! — dirão, com
certeza, nas próximas intervenções. Aliás, a narrativa da maioria, da direita, sobre o Serviço Nacional de
Saúde é esta: está tudo bem!… Está tudo bem!… Mas, Sr.as
e Srs. Deputados, como sabemos, não está tudo
bem.
Como sabemos, a realidade desmente a análise que o Governo e os partidos que o suportam fazem sobre
o Serviço Nacional de Saúde. É ver os serviços de urgência a «explodirem» — a «explodirem»! —, é ver os
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utentes, horas e horas, à espera de serem atendidos para verificarmos, com a toda a facilidade, que,
infelizmente, as coisas não estão bem no Serviço Nacional de Saúde e na prestação de cuidados de saúde à
população portuguesa.
Mas hoje estamos aqui a discutir novamente — e sublinho novamente — o caso concreto das taxas
moderadoras. A alegada função moderadora da taxa revela-se, afinal, um copagamento dos serviços e
cuidados de saúde. É isto, nada mais, nada menos! Revela-se um obstáculo ao acesso aos cuidados de
saúde. E o enorme aumento das taxas levado a cabo por este Governo penaliza ainda mais as pessoas e as
famílias, agrava o seu empobrecimento.
Quanto ao transporte de doentes, também hoje aqui em debate, a situação passa pela mesma injustiça. A
injustiça é a mesma: as pessoas que precisam de tratamento, a quem foi prescrito um tratamento dentro do
Serviço Nacional de Saúde, não devem pagar o transporte, porque não podem ser penalizadas por habitarem
longe dos centros onde é possível fazerem esses tratamentos. Isto é básico, Sr.as
e Srs. Deputados! É básico!
Por isso, o Bloco de Esquerda retoma as suas propostas e, mais uma vez, traz a votação a eliminação do
pagamento das taxas moderadoras e a isenção do encargo com transportes no caso dos doentes não
urgentes. Mais uma vez, é este o desafio que está do vosso lado, Srs. Deputados.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado José Luís
Ferreira, de Os Verdes.
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: As taxas moderadoras e o
transporte de doentes constituem, a nosso ver, não só um exemplo da forma como este Governo encara uma
área tão sensível como a saúde, como também representam hoje dois grandes obstáculos, que têm vindo a
dificultar de forma acentuada o acesso dos portugueses aos cuidados de saúde.
Como é público, as taxas moderadoras foram uma invenção dos Governos do PSD de Cavaco Silva, como
forma, diria eu, de dar a volta ao princípio constitucional que consagra a natureza gratuita e universal do
acesso à saúde e ao Serviço Nacional de Saúde. Depois de descoberta a fórmula, foi o que se viu: os
Governos usaram e abusaram desse mecanismo, ao ponto de transformar os doentes em verdadeiros clientes
do serviço de saúde.
Já não bastava aquilo que o Governo do Partido Socialista fez nesta matéria, quando aumentou
significativamente o valor das taxas moderadoras e quando obrigou os pensionistas e os desempregados com
rendimentos abaixo do salário mínimo nacional a pagarem as taxas moderadoras do Serviço Nacional de
Saúde, ainda vem, depois, este exagero do Governo PSD/CDS, que impôs novos e brutais aumentos nas
taxas moderadoras. E fê-lo indiferente aos apelos da Organização Mundial da Saúde, que chama a atenção
para a necessidade de remover os obstáculos financeiros no acesso aos cuidados de saúde.
O Governo PSD/CDS voltou a atacar nos valores das taxas moderadoras. E o mais grave é que o Governo
tomou estas medidas sabendo perfeitamente que, apesar dos encargos duríssimos que as mesmas
representam para os orçamentos de muitas famílias, não assumem qualquer relevância para o financiamento
do Serviço Nacional de Saúde.
Acresce ainda que, com os valores atuais, as ditas taxas moderadoras perdem completamente a sua
natureza moderadora para passarem a ser verdadeiras taxas de utilização. Ou seja, o utente, que já financia
com os seus impostos o Serviço Nacional de Saúde, quando necessita de recorrer aos serviços de saúde, que
o Estado deveria assegurar, tem, afinal, de voltar a pagar esse serviço. Não faz sentido! É, por isso,
necessário revogar as taxas moderadoras.
Quanto aos critérios de atribuição do transporte de doentes não urgentes, este regime, pese embora as
várias alterações que já conheceu, continua sem dar a resposta necessária e constitui mais um obstáculo no
acesso dos portugueses aos cuidados de saúde.
Por isso, Os Verdes consideram imperioso atribuir o transporte a título gratuito a todos os utentes do
Serviço Nacional de Saúde que dele necessitem, seja por motivos clínicos seja por motivos económicos, para
consultas, exames ou tratamentos.
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Na nossa perspetiva, é indispensável procurar proceder a uma aproximação aos preceitos da nossa
Constituição, que elevou o direito à proteção da saúde como um direito fundamental. Ora, isso passa, por um
lado, pela revogação das taxas moderadoras e, por outro lado, por garantir o transporte de doentes não
urgentes de forma gratuita a quem dele careça, seja por motivos clínicos, seja por motivos económicos.
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa
Caeiro.
A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Gostaria de colocar algumas
questões prévias.
Os Srs. Deputados dos PCP e do Bloco de Esquerda podem repetir as vezes que quiserem os termos que
tanto apreciam, como «medidas economicistas» ou «o desmantelamento do SNS», que não é por isso que
eles se tornam uma realidade. Dizendo-o de outra forma, por analogia, uma mentira muitas vezes repetida não
se torna numa verdade.
Protestos do PCP.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Veja lá os termos, Sr.ª Deputada!
A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Aliás, os Srs. Deputados do PCP, desde 1990 — e, mais
recentemente, os Srs. Deputados do Bloco de Esquerda —, desde a Lei de Bases da Saúde, querem eliminar
as taxas moderadoras.
O Sr. João Oliveira (PCP): — As taxas só vierem em 1992!
A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Não será demais repetir aos Srs. Deputados do Partido Comunista,
como também, agora, aos Srs. Deputados do Bloco de Esquerda, que as taxas moderadoras têm o efeito de
moderação, não são copagamento.
Aliás, deixem-me fazer um parêntesis para dizer que os senhores perdem alguma credibilidade. Sabem
porquê?
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — O CDS tem muita «credibilidade»!
A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Porque qualquer que seja o Governo, seja socialista, seja do centro ou
da direita, os senhores dizem sempre as mesmas palavras:…
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Já ultrapassou o seu tempo, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — … que está em curso o desmantelamento do Serviço Nacional de
Saúde! Ora, isto retira alguma credibilidade ao vosso discurso.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Não se preocupe com a nossa credibilidade, preocupe-se com os doentes!
A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — O atual Ministro da Saúde propôs-se ter como prioridade salvaguardar
o Serviço Nacional de Saúde, torná-lo mais acessível e mais eficiente, para que ninguém seja privado do
acesso aos cuidados de saúde.
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Tem de concluir, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Vou concluir em 30 segundos, Sr. Presidente, se me der autorização.
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O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Tem de ser em menos tempo!
A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Relativamente às taxas moderadoras, os Srs. Deputados não acharão,
com certeza, que as taxas moderadoras, que representam menos de 2% do orçamento da saúde, são
copagamento! Com certeza não acharão que é disso que se trata!
No que respeita ao transporte não urgente de doentes, há dois regimes em curso. Há o regime de isenção
total quando haja motivos clínicos,…
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Já passaram 30 segundos, Sr.ª Deputada!
A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — … insuficiência económica e o transporte para a realização das
prestações de saúde se justifique; e há um segundo regime, ao contrário do que acontecia no Governo
socialista,…
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Tem de concluir, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — … um regime de pagamento parcial dos encargos do SNS, que cabe
ao doente de acordo com as suas capacidades, quando não se encontre em situação de insuficiência
económica e esteja em causa um tratamento prolongado.
Muito obrigada pela tolerância, que, aliás, Sr. Presidente, é bastante curta, devo dizer-lhe.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Não foi muita a tolerância, mas foi superior a 30 segundos.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Manuela Tender, do PSD.
A Sr.ª Maria Manuela Tender (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Discutimos hoje dois
projetos de lei, um do Partido Comunista e outro do Bloco de Esquerda, que pretendem eliminar as taxas
moderadoras e instituir o transporte gratuito de doentes não urgentes no Serviço Nacional de Saúde.
São temas recorrentes na agenda demagógica destes partidos,…
O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!
A Sr.ª Maria Manuela Tender (PSD): — … que tudo prometem a todos sem qualquer custo, na vã
esperança de apresentar como alternativa política um mundo ideal, onde cada cidadão tivesse apenas direitos
e nenhum dever. Não explicam, porém, os proponentes destas iniciativas de que forma assegurariam o
pagamento da despesa pública resultante da implementação destas políticas.
Protestos do PCP.
A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Então, é copagamento!
A Sr.ª Maria Manuela Tender (PSD): — Os encargos, ou as consequências das suas propostas, nunca
serão preocupação destes partidos, para os quais parece que quanto pior melhor e que se o País entrasse
outra vez em bancarrota… lá se veria!…
A Sr.ª Carla Rodrigues (PSD): — Muito bem!
A Sr.ª Maria Manuela Tender (PSD): — Dito isto, Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados, algumas palavras
mais concretas sobre as iniciativas em discussão.
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Em primeiro lugar, omitem o PCP e o Bloco de Esquerda, na Exposição de motivos das respetivas
iniciativas, que há hoje, em Portugal, mais de 5,7 milhões de utentes do Serviço Nacional de Saúde isentos do
pagamento de taxas moderadoras.
A Sr.ª Carla Rodrigues (PSD): — Bem lembrado!
A Sr.ª Maria Manuela Tender (PSD): — Mais 1 milhão de isentos do que nos tempos do Governo anterior,
Srs. Deputados!
Vozes do PSD: — Muito bem!
A Sr.ª Maria Manuela Tender (PSD): — Em segundo lugar, esquecem o PCP e o Bloco de Esquerda que
as taxas moderadoras têm, como o próprio nome indica, uma finalidade de moderar a procura excessiva ou
exagerada de serviços de saúde, garantindo que quem deles precisa os receberá efetiva e atempadamente.
O Sr. António Filipe (PCP): — Por isso é que as urgências estão às moscas!
A Sr.ª Maria Manuela Tender (PSD): — Em terceiro lugar, esquece o PCP — mas não o Bloco, justiça seja
feita — que este Governo estendeu a situação de insuficiência económica a todas as pessoas com um
rendimento mensal até 630 €, quando antes, é bom lembrar, esse valor não ultrapassava os 485 € mensais.
Portanto, abrange mais 145 € do que nos tempos do Governo do Partido Socialista.
A Sr.ª Carla Rodrigues (PSD): — Muito bem!
A Sr.ª Maria Manuela Tender (PSD): — Se está tudo feito, Srs. Deputados? Certamente que não, mas
lembramos, a título de exemplo, que este Governo consagrou também a isenção do pagamento das taxas
moderadoras nas situações de desemprego involuntário para facilitar o acesso àqueles que ainda não
conseguissem reunir, formalmente, os critérios de verificação de condições de insuficiência económica. E
mesmo quando não estejam em condições de insuficiência económica, o SNS assume parcialmente os
encargos com o transporte de doentes quando a situação clínica exija a prestação de cuidados de saúde de
forma prolongada e continuada.
O Sr. João Oliveira (PCP): — E em carência económica, quem é que assume essa responsabilidade?
A Sr.ª Maria Manuela Tender (PSD): — Srs. Deputados, façam o favor de ler a Portaria n.º 142-B/2012.
Voltando ao projeto do PCP, não deixa de ser curioso que ali se escreva que as opções do Governo
«contrariam de modo inequívoco o disposto na Lei Fundamental» quando, depois, o seu artigo 3.º viola
flagrantemente a lei-travão, princípio geral da Constituição em matéria orçamental.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Isso resolve-se com o retificativo!
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Sr.ª Deputada, peço-lhe que conclua.
A Sr.ª Maria Manuela Tender (PSD): — Sr. Presidente, concluo já, com a condescendência de V. Ex.ª.
Temos de ser coerentes, Sr.as
e Srs. Deputados!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A finalizar, independentemente do que se afirmou, a verdade é que o Memorando de Entendimento já
previa o aumento do valor das taxas moderadoras e também a redução dos custos do Estado com o
transporte de doentes não urgentes.
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O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Tem de concluir, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Maria Manuela Tender (PSD): — Termino, Sr. Presidente, dizendo que quem propõe o contrário
mais não faz do que tentar enganar os portugueses com promessas que sabem que não podem cumprir.
A Sr.ª Carla Rodrigues (PSD): — Muito bem!
A Sr.ª Maria Manuela Tender (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Se não podemos oferecer
tudo a todos sem qualquer custo, podemos e devemos garantir o acesso sem custos aos mais desfavorecidos.
Foi isso que este Governo fez e orgulhamo-nos disso.
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Peço-lhe que conclua, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Maria Manuela Tender (PSD): — Sr. Presidente, o PSD não embarca na demagogia fácil nem
vende ilusões, ao contrário daquilo que tristemente a esquerda parlamentar tem habituado o País.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa
Salgueiro, do PS.
A Sr.ª Luísa Salgueiro (PS): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Os dois assuntos que hoje temos
para analisar com base nos dois projetos de lei são muito prementes e importantes no Serviço Nacional de
Saúde português e têm a ver com as taxas moderadoras e com o transporte de doentes não urgentes.
Temos discutido estes assuntos em todas as sessões legislativas, porque têm sido apresentados projetos
de teor semelhante a estes, e são conhecidas as posições de base relativamente a estes assuntos.
Quanto às taxas moderadoras, elas foram introduzidas por um Governo do PSD, mas o Governo do Partido
Socialista manteve-as porque entendemos que deve haver um efeito verdadeiramente moderador no acesso
aos cuidados de saúde. O que nós não podemos compreender é que, de acordo com o gráfico da Entidade
Reguladora de Saúde, uma entidade independente, reconhecida, aliás, pela maioria e repetidamente invocada
— isto que fique bem claro aqui —, tenha havido em 2011 aumentos de taxas, nalguns casos de 200%!
A Sr.ª Maria Antónia Almeida Santos (PS): — Esse é que é o problema!
A Sr.ª Luísa Salgueiro (PS): — Convém fazer a diferença: é que, neste caso, deixamos de falar de um
instrumento de moderação para falarmos de um instrumento que tem subjacente um intuito de
cofinanciamento. E isto tem resultados absolutamente perversos: é que, se tivermos em consideração
situações como, por exemplo, a das urgências, em que um utente entra numa urgência, paga a respetiva taxa,
mas depois é sujeito a meios complementares de diagnóstico e tratamento — como um raio X, uma ecografia,
uma TAC — e paga 50 € na urgência, o que está a acontecer é em muitos casos os doentes dirigirem-se ao
privado, já nem vão ao público. É uma política que é subjacente a uma questão ideológica que está nas bases
programáticas deste Governo. E relativamente a isto não podemos estar de acordo.
Portanto, é uma diferença que fica bem clara entre nós. Nós não podemos aceitar os valores das taxas
moderadoras atuais e por isso é que, em sede de Orçamento do Estado, propusemos, e voltaremos a este
ponto, uma redução das taxas moderadoras, sobretudo no acesso aos cuidados de saúde primários, porque é
daí que resultam situações que vivemos atualmente, como a das urgências, e que tem a ver com a dificuldade
que os portugueses têm no acesso aos cuidados de saúde primários.
No que respeita ao transporte não urgente de doentes, foram apresentados dois diplomas em que as
regras são distintas. Num caso, o único requisito que se exige é o da necessidade clínica; noutro caso, pode
ser alternativa à necessidade clínica a insuficiência económica. Nós também já comunicámos a nossa posição:
entendemos que os requisitos devem ser cumulativos.
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No entanto, e respondendo ao que a Sr.ª Deputada Maria Manuela Tender disse, de que neste momento
há mais cidadãos isentos de taxas,…
A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — E há!
A Sr.ª Luísa Salgueiro (PS): — … queria recordar o seguinte, Sr.ª Deputada: relativamente ao montante
de apuramento da isenção, há mais portugueses na categoria da insuficiência económica, sobretudo. Sabe
porquê, Sr.ª Deputada? Tem a ver com o empobrecimento dos portugueses. Decorrente de quê? Decorrente
das medidas do Governo que V. Ex.ª apoia. É por isso que há mais utentes isentos no Serviço Nacional de
Saúde.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Peço-lhe que conclua, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Luísa Salgueiro (PS): — Pedindo igual tolerância dos oradores anteriores, termino já, Sr.
Presidente.
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Não houve muita tolerância, mas mantenho a mesma lógica.
A Sr.ª Luísa Salgueiro (PS): — Queria recordar outra coisa, Sr.ª Deputada: a forma de cálculo do
montante mensal é independente do número de membros do agregado familiar. É indiferente, para este
Governo, que uma família tenha dependentes ou não, tenha um ou mais filhos, é indiferente e, para nós, isso
também não é aceitável. E o Sr. Provedor de Justiça também já se manifestou quanto a isso e impôs que o
Governo alterasse essas regras, porque não podem ficar indiferentes à composição do agregado familiar. Por
isso, impunha-se essa alteração.
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Tem de concluir, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Luísa Salgueiro (PS): — Nós não podemos, como princípio geral, acompanhar as iniciativas
legislativas que aqui são propostas, mas também não podemos concordar com o sistema quer das taxas
moderadoras quer do transporte de doentes não urgentes atualmente em vigor.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Tem a palavra, para uma segunda intervenção, a Sr.ª Deputada
Helena Pinto, do Bloco de Esquerda.
A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Compreendo a posição agora
assumida pela Sr.ª Deputada Luísa Salgueiro, mas, já agora, o PS podia ter apresentado uma proposta,
porque isso de ficar na terra de ninguém, não acompanham uns, nem acompanham outros, também não pode
ser, Sr.ª Deputada! Convenhamos, isto é um assunto importante, penso eu!
A Sr.ª Luísa Salgueiro (PS): — Mas nós vamos apresentar!
A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Mas continuando…
Já agora, Sr.ª Deputada Manuela Tender, falou da agenda demagógica e eu queria aproveitar estes
segundos de que ainda disponho para falar da agenda demagógica.
Não foi há muito tempo — foi ontem — que o seu partido, o PSD, da tribuna, fez uma declaração política
sobre questões da demografia e dos incentivos à natalidade e da proteção da família. Foi ontem que ouvimos
a bancada do CDS falar que havia menos natalidade porque o conceito de família, no ocidente, estava a ser
posto em causa e, por isso, é que havia menos natalidade. Então, falemos de demagogia! Como é que a Sr.ª
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Deputada pode justificar as condições de acesso ao regime de isenção das taxas moderadoras, quando o
número de pessoas do agregado familiar não é considerado? Diga-me, Sr.ª Deputada. Eu gostava que tivesse
tempo para responder a esta questão. E já não vou falar do visto familiar, que já se foi. O visto familiar foi-se!
Pergunto-lhe como é que o PSD e o CDS conseguem falar de natalidade, conseguem falar de família, e
mantêm na legislação, em vários aspetos, uma injustiça grosseira que diz, nada mais, nada menos, o
seguinte: o número de pessoas do agregado familiar não conta para nada; não conta para nada!
Portanto, uma pessoa, uma mulher sozinha, ou um homem sozinho, que ganhe pouco mais do que 630 €,
mas que tenha dois filhos maiores de 12 anos não está isento das taxas moderadoras.
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Peço-lhe que conclua, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Eu vou concluir, Sr. Presidente, mas deixe-me levar a injustiça até ao fim aqui
bem explicada.
Os Srs. Deputados têm de me dizer como é que uma pessoa que ganhe 635 € por mês e que tenha dois
filhos maiores de 12 anos pode pagar o valor das taxas moderadoras na urgência, que a Sr.ª Deputada Luísa
Salgueiro, agora mesmo, disse que podem ir a 50 €, ou mais.
Ó Srs. Deputados, com franqueza, invocar a demagogia para a esquerda neste assunto? Invocar a
demagogia? Srs. Deputados, vejam-se ao espelho, por favor!
Aplausos do BE.
A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Não são nada demagógicos. Nada!…
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Tem a palavra, para uma segunda intervenção, a Sr.ª Deputada
Carla Cruz, do PCP.
A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Dizer que o problema dos doentes é uma
questão demagógica é ofender os doentes.
O Sr. David Costa (PCP): — Muito bem!
A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Quando o CDS diz que está preocupado com a credibilidade do PCP, Sr.ª
Deputada e Srs. Deputados do CDS, nós estamos é preocupados com a saúde dos doentes e com as
dificuldades que este Governo tem prestado no acesso à saúde.
Referir as comparticipações do Governo, que tão piedosamente são concedidas, Sr.ª Deputada do PSD, as
comparticipações não resolvem os problemas. Há muitos doentes, muitos. Basta falar com eles, que lhes
dizem que não conseguem pagar aquilo que têm de pagar.
Dizer que o País não aguenta com as taxas moderadoras e com a isenção dos transportes, Srs.
Deputados, o País não aguenta é ter de pagar PPP, o País não aguenta é com os benefícios fiscais aos
grandes grupos económicos. E sabe, Sr.ª Deputada do PSD e Srs. Deputados do CDS, é isso que vocês não
fazem. A bancarrota vem aí e não é por isentar os doentes.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Peço-lhe que conclua, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Concluo, Sr. Presidente.
Dizem que estão muito preocupados com os doentes. Mas sabe, Sr.ª Deputada do PSD, Srs. Deputados do
CDS-PP e também do PS, quando os doentes vão ao SNS e dizem: «Não temos dinheiro para pagar»,
respondem-lhes assim: «Falem com a segurança social»; eles vão à segurança social e aí dizem-lhes: «Isso
não é um problema nosso, isso é um problema do SNS».
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O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Peço-lhe que conclua, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Portanto, vocês estão a impedir que os doentes tenham direito à saúde.
Hoje, ficou aqui claro, mais uma vez, que aquilo que vocês querem, efetivamente, é vedar o acesso a um
direito que está constitucionalmente consagrado.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Chegámos ao fim da ordem do dia.
Amanhã, a reunião plenária terá início às 10 horas, com dois pontos em agenda: no primeiro, o debate
quinzenal com o Primeiro-Ministro, sobre questões políticas, económicas e sociais; e, no segundo, votações
regimentais, no final do debate.
Está encerrada a sessão.
Eram 17 horas e 33 minutos.
Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.