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I SÉRIE — NÚMERO 55

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atropelos à língua portuguesa causados pelo dito Acordo Ortográfico, nomeadamente rupturas na evolução

semântica e nas famílias de palavras, submissão da grafia à pronúncia dos diversos países, para já não falar

das denominadas «facultatividades» geradoras de situações no mínimo ridículas, num claro desrespeito pela

evolução natural da língua e sendo o motivo da grande confusão em que se tornou a grafia da língua

portuguesa. Também não podemos ignorar a maioria dos contributos recolhidos pelo Grupo de Trabalho que

foi constituído nesta Assembleia da República, em que escritores, professores, linguistas e livreiros, entre

outros, manifestaram a sua posição contra aquilo que maioritariamente foi considerado como sendo um grave

atentado ao património comum de tantos povos.

A aplicação deste Acordo Ortográfico tem consequências gravíssimas na educação dos jovens e é, em

meu entender, um perfeito atentado à inteligência e à qualidade do ensino. Pior do que isso, assistimos à

destruição do código genético da língua portuguesa, numa tentativa desesperada de unificar o que é

impossível ser unificado. As reservas na adoção do Acordo pelos países da CPLP são um sinal de que nem

tudo está bem. Por isso também, urge repensar toda esta situação, antes que seja tarde de mais. Daí o meu

desalento, pois mais uma vez se adiou uma tomada de posição que, apesar de eventuais constrangimentos,

iria contribuir para que fosse possível pôr termo ao caos linguístico em que vivemos e do qual ninguém, em

boa fé, se pode orgulhar.

A Deputada do PSD, Maria Ester Vargas.

——

Tenho 24 anos de atividade parlamentar — e hoje, é provavelmente o dia mais triste desse percurso, em

que senti à evidência a impotência do Deputado individualmente considerado.

Esta foi uma oportunidade perdida para colocar um travão, uma suspensão para pensar, num processo que

está a conduzir à destruição da língua portuguesa e a semear o caos ortográfico junto do povo português.

Este é um processo eivado de inconstitucionalidades orgânicas e formais.

Houve um pressuposto que não se verificou: ao contrário do que se julgava, este acordo não unifica

ortograficamente a língua portuguesa, antes pelo contrário. A questão das consoantes mudas, a questão dos

hífens, o critério das facultatividades, o critério da pronúncia e a forma como funcionam os instrumentos do

VOP (Vocabulário Ortográfico do Português) e do Lince destroem pela base o pressuposto inicial. Desunifica-

se em vez de unir.

Politicamente, Portugal corre o risco absurdo de chegar ao início de 2016 e ser o único país a aplicar

obrigatoriamente uma ortografia que nem sequer era a sua.

Este é um acordo feito à margem dos povos a que se destina, que não foi pedido, nem é desejado, seja em

Díli, em Luanda, em Lisboa ou em S. Paulo.

Nem é necessário. A língua inglesa tem 20 variantes, e nunca precisou de um tratado. Tampouco o

francês, que tem 15 variantes. Como disse Adriano Moreira: «A Língua não obedece aos tratados. Não se dão

ordens à língua».

Fiz tudo o que estava ao meu alcance para que o meu grupo parlamentar tivesse uma posição diferente,

propus um projeto de resolução claramente no sentido da suspensão da aplicação do acordo ortográfico, mas

a decisão foi outra — tenho que respeitar esta decisão, mas esse respeito não me obriga ao silêncio, estou

num partido democrático.

Seguiu-se em Portugal a estratégia do facto consumado — perdão! eu disse «facto»? Errado! É a

estratégia do «fato» consumado, pois tenho um «Lince» às costas, qual patrulheiro das palavras, que não me

deixa falar em bom português.

A solução hoje aqui aprovada é o mínimo dos mínimos dos mínimos, é uma solução fraca, não vinculativa,

e que nada fará para inverter o rumo traçado por este estranho consenso político rendido às conveniências

económicas, diplomáticas e operacionais.

Um Deputado do Partido Socialista fez há dias circular um email acusando-me de estar equivocado. Sou

um ser humano, e admito que também erro, e também me equivoco.

Mas, quando olho à minha volta, e vejo tantas personalidades da vida literária, cultural, política, com as

quais partilho a mesma opinião, de rejeição da aplicação deste acordo ortográfico: Lobo Antunes e Agustina;

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