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Sábado, 19 de abril de 2014 I Série — Número 75

XII LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2013-2014)

REUNIÃOPLENÁRIADE17DEABRILDE 2014

Presidente: Ex.ma Sr.ª Maria da Assunção Andrade Esteves

Secretários: Ex.mos

Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco Rosa Maria da Silva Bastos de Horta Albernaz

S U M Á R I O

A Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 8

minutos. Procedeu-se ao debate conjunto, na generalidade, dos

projetos de lei n.os

437/XII (2.ª) — Alteração à Lei n.º 30/84, de 5 de setembro, alterada pelas Leis n.

os 4/95, de 21 de

fevereiro, 15/96, de 30 de abril, e 75-A/97, de 22 de julho, e pela Lei Orgânica n.º 4/2004, de 6 de novembro (Lei-Quadro do Sistema de Informações da República Portuguesa – SIRP) (PSD e CDS-PP), 438/XII (2.ª) — Primeira alteração à Lei n.º 9/2007, de 19 de fevereiro, que estabelece a orgânica do Secretário-Geral do Sistema de Informações da República Portuguesa, do Serviço de Informações Estratégicas de Defesa (SIED) e do Serviço de Informações de Segurança (SIS) e revoga os Decretos-Leis n.

os 225/85,

de 4 de julho, e 254/95, de 30 de setembro (PSD e CDS-PP), 465/XII (3.ª) — Aprova o regime do segredo de Estado

(PSD e CDS-PP), 466/XII (3.ª) — Cria a entidade fiscalizadora do regime de segredo de Estado (PSD e CDS-PP), 302/XII (2.ª) — Cria a Comissão da Assembleia da República para a Fiscalização do Sistema de Informações da República Portuguesa (PCP), 553/XII (3.ª) — Primeira alteração à Lei n.º 6/94, de 7 de abril, que aprova o regime do segredo de Estado (PCP), 554/XII (3.ª) — Regime das matérias classificadas (PS), 555/XII (3.ª) — Regime do segredo de Estado (PS), e 556/XII (3.ª) — Protege a missão do SIRP e o segredo de Estado, criando inibições ao vínculo imediato e reforçando direitos fundamentais em processo judicial (Primeira alteração à Lei n.º 9/2007, de 19 de fevereiro, e quinta alteração à Lei n.º 30/84, de 5 de setembro) (BE), que foram aprovados. Usaram da palavra os Deputados Teresa Leal Coelho (PSD), António Filipe

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(PCP), Pedro Delgado Alves (PS), Cecília Honório (BE) e Telmo Correia (CDS-PP).

Foram discutidos em conjunto os projetos de resolução n.

os 986/XII (3.ª) — Recomenda ao Governo a criação de um

programa especial para a regeneração das ilhas do Porto (PS), 1008/XII (3.ª) — Recomenda ao Governo a promoção da regeneração de estruturas típicas urbanas em condições de precariedade habitacional (PSD e CDS-PP), que foram aprovados, e 1010/XII (3.ª) — Recomenda a criação de programa especial de reabilitação das ilhas e centro histórico do Porto (BE), que foi rejeitado. Intervieram os Deputados Renato Sampaio (PS), Otília Ferreira Gomes (CDS-PP), Catarina Martins (BE), Paulo Rios de Oliveira (PSD) e Paula Baptista (PCP).

A Câmara debateu, conjuntamente, na generalidade, os projetos de lei n.

os 551/XII (3.ª) — Altera o Estatuto dos

Deputados, tornando obrigatório o regime de exclusividade para Deputados à Assembleia da República (BE), e 552/XII (3.ª) — Altera o Estatuto dos Deputados e o Regime Jurídico de Incompatibilidades e Impedimentos dos Titulares de Cargos Políticos e Altos Cargos Públicos (PCP), que foram rejeitados, tendo usado da palavra, a diverso título, os Deputados Pedro Filipe Soares (BE), João Oliveira (PCP), Fernando Negrão (PSD), José Magalhães (PS) e Teresa Anjinho (CDS-PP).

Foi aprovado o voto n.º 186/XII (3.ª) — Pela participação dos soldados portugueses na batalha de La Lys na I Grande Guerra (PS, PSD e CDS-PP).

Foi rejeitado, na generalidade, o projeto de lei n.º 228/XII (1.ª) — Regime jurídico da partilha de dados informáticos (PCP).

Foi aprovado o projeto de resolução n.º 953/XII (3.ª) — Recomenda ao Governo a concretização de medidas para o setor do aluguer de equipamentos industriais (PCP).

Foi rejeitado o projeto de resolução n.º 941/XII (3.ª) — Cria um plano de emergência social no distrito do Porto (PCP).

Foi aprovado o texto de substituição, apresentado pela Comissão de Economia e Obras Públicas, relativo aos projetos de resolução n.

os 759/XII (2.ª) — Recomenda ao

Governo a criação de um regime específico de navegação nos estuários dos rios (PSD), e 924/XII (3.ª) — Libertação da via da água e transporte não regular em estuários (PCP).

Foi aprovado, em votação final global, o texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo à proposta de lei n.º 204/XII (3.ª) — Aprova o procedimento extrajudicial pré-executivo.

Após ter usado da palavra o Deputado Jorge Machado (PCP), foi rejeitado um requerimento, apresentado pelo PCP, de avocação da votação, na especialidade, das propostas de eliminação dos artigos 2.º, 3.º e 4.º e de aditamento de um artigo 2.º-A do texto final, apresentado pela Comissão de Orçamento, Finanças e Administração Pública, relativo à proposta de lei n.º 211/XII (3.ª) — Modifica o valor dos descontos a efetuar para os subsistemas de proteção social no âmbito dos cuidados de saúde, concretamente da Direção-Geral de Proteção Social aos Trabalhadores em Funções Públicas (ADSE), dos Serviços de Assistência na Doença (SAD) e da Assistência na Doença aos Militares das Forças Armadas (ADM), tendo o texto final sido aprovado em votação final global.

Foram aprovados dois pareceres da Comissão para a Ética, a Cidadania e a Comunicação autorizando um Deputado do PSD e outro de Os Verdes a intervirem em processos que correm em tribunal.

O Presidente (António Filipe) encerrou a sessão eram 12 horas e 51 minutos.

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A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, Srs. Jornalistas, está aberta a sessão.

Eram 10 horas e 8 minutos.

Podem abrir as galerias.

Peço aos Srs. Deputados o favor de tomarem os vossos lugares.

Hoje não há leitura de expediente, pelo que vamos entrar diretamente no debate da ordem dia, que consta

da discussão conjunta, na generalidade, dos projetos de lei n.os

437/XII (2.ª) — Alteração à Lei n.º 30/84, de 5

de setembro, alterada pelas Leis n.os

4/95, de 21 de fevereiro, 15/96, de 30 de abril, e 75-A/97, de 22 de julho,

e pela Lei Orgânica n.º 4/2004, de 6 de novembro (Lei-Quadro do Sistema de Informações da República

Portuguesa – SIRP) (PSD e CDS-PP), 438/XII (2.ª) — Primeira alteração à Lei n.º 9/2007, de 19 de fevereiro,

que estabelece a orgânica do Secretário-Geral do Sistema de Informações da República Portuguesa, do

Serviço de Informações Estratégicas de Defesa (SIED) e do Serviço de Informações de Segurança (SIS) e

revoga os Decretos-Leis n.os

225/85, de 4 de julho, e 254/95, de 30 de setembro (PSD e CDS-PP), 465/XII

(3.ª) — Aprova o regime do segredo de Estado (PSD e CDS-PP), 466/XII (3.ª) — Cria a entidade fiscalizadora

do regime de segredo de Estado (PSD e CDS-PP), 302/XII (2.ª) — Cria a Comissão da Assembleia da

República para a Fiscalização do Sistema de Informações da República Portuguesa (PCP), 553/XII (3.ª) —

Primeira alteração à Lei n.º 6/94, de 7 de abril, que aprova o regime do segredo de Estado (PCP), 554/XII (3.ª)

— Regime das matérias classificadas (PS), 555/XII (3.ª) — Regime do segredo de Estado (PS), e 556/XII (3.ª)

— Protege a missão do SIRP e o segredo de Estado, criando inibições ao vínculo imediato e reforçando

direitos fundamentais em processo judicial (Primeira alteração à Lei n.º 9/2007, de 19 de fevereiro, e quinta

alteração à Lei n.º 30/84, de 5 de setembro) (BE).

Estão já inscritos os Srs. Deputados Teresa Leal Coelho, pelo PSD, António Filipe, pelo PCP, Pedro

Delgado Alves, pelo PS, e Cecília Honório, pelo Bloco de Esquerda, para apresentarem os projetos dos

respetivos grupos parlamentares.

Para apresentar os projetos de lei conjuntos do PSD e do CDS, tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Leal

Coelho.

A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Ex.ma

Sr.ª Presidente, Sr.as

Deputadas e Srs. Deputados: Os Grupos

Parlamentares do PSD e do CDS-PP apresentam quatro projetos de lei, dois em matéria de segredo de

Estado e dois que visam o aprofundamento dos instrumentos de fiscalização e vetting no âmbito do

funcionamento dos Serviços de Informações da República Portuguesa.

Os projetos de lei n.os

465/XII e 466/XII visam, respetivamente, estabelecer um novo regime jurídico do

segredo de Estado e criar uma entidade verdadeiramente fiscalizadora do segredo de Estado.

É nosso entendimento que, decorridos 20 anos sobre a entrada em vigor da atual Lei, e tendo conta as

profundas alterações que se registaram no espaço de segurança e defesa global, devemos introduzir um

sistema mais garantístico do direito de acesso à informação e da preservação dos direitos, liberdades e

garantias, num quadro de aprofundamento democrático, volvidos 40 anos sobre o 25 de Abril.

Por isso mesmo, estabelecemos um conjunto de limites à atuação política em matéria de segredo de

Estado e, simultaneamente, uma exigência de registo do segredo de Estado, de forma a que a Administração

Pública, o Governo e os restantes órgãos de soberania que têm competência em matéria de segredo de

Estado possam ser permanentemente escrutinados no sentido de garantir condições de confiança e

credibilidade do sistema de segredo de Estado, por um lado, e, por outro, do Sistema de Informações da

República Portuguesa.

Sendo o direito à informação um direito, liberdade e garantia essenciais ao Estado de direito democrático,

considerámos determinante estabelecer um sistema de registo do segredo de Estado que nos permita, a par e

passo, conhecer a quantidade de documentos e de matérias em regime de segredo de Estado, bem como o

respetivo período de duração e uma claríssima fundamentação que justifique esta exceção ao princípio da

administração aberta. Repito: urge estabelecer um período de duração e condições de fundamentação efetiva

desta exceção ao princípio da administração aberta.

Para o efeito, e à semelhança do que ocorre noutros Estados do espaço de segurança e defesa em que

nos enquadramos, propomos introduzir um sistema de registo que monitorize, para que, decorrido o prazo de

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duração do segredo de Estado — que é, por via de regra, de acordo com a nossa proposta, de quatro anos —,

possa ser levantado segredo de Estado ou, em alternativa, seja reclassificado com adequada fundamentação,

monitorizada por uma entidade de fiscalização do segredo de Estado.

Para além disso, alinhamos — o que não acontece no diploma atual — com o quadro da União Europeia e

da NATO no que respeita aos prazos da respetiva prorrogação.

No âmbito da regulamentação da União Europeia em matéria de classificação de segredo de Estado,

estabelece-se o limite de prorrogação para 30 anos, limite este que é passível de ser excecionado no que

respeita a determinadas matérias, designadamente proteção da vida privada, proteção de interesses

fundamentais do Estado e documentos sensíveis relativos a estruturas de segurança, estruturas de defesa ou

estruturas de informações.

Nesta matéria entendemos, como sempre o fizemos, estabelecer parâmetros de alinhamento com o quadro

NATO e com o quadro da União Europeia.

A grande maioria, se não a totalidade, dos Estados membros da NATO e da União Europeia, estabelecem

um prazo médio de duração do segredo de Estado de 30 anos, prazo esse que pode ser prorrogado

relativamente às matérias que acabei de enunciar. Portanto, também aqui vamos corresponder ao espaço de

segurança e defesa em que nos enquadramos no âmbito da segurança global.

Para além desta regulamentação NATO e dos nossos parceiros europeus, muitas instituições, organismos

internacionais, incluindo sob a égide da ONU, propõem ou referenciam o prazo de 30 anos como adequado

para ser a regra da prorrogação do segredo de Estado. Fazemo-lo com o orgulho de nos alinharmos com as

orientações que têm vindo a ser estabelecidas no âmbito da comunidade internacional.

Por outro lado, agravamos as penas respeitantes ao crime de violação do segredo de Estado e definimos

um parâmetro de interesses fundamentais do Estado. Nesta delimitação de um parâmetro dos interesses

fundamentais do Estado estamos a alinhar-nos, por um lado, com a doutrina sugerida no espaço de segurança

e defesa em que nos incluímos e, por outro, com o normativo de alguns dos nossos parceiros neste espaço de

segurança e defesa.

Esta baliza, este parâmetro dos interesses fundamentais do Estado que estabelecemos na lei do segredo

de Estado e também no Código Penal, visa precisamente condicionar o nível de arbitrariedade na respetiva

interpretação, para que haja uma maior e mais aprofundada segurança jurídica em matéria de classificação

enquanto segredo de Estado.

Os diplomas regulam ainda os termos do sigilo. Agravamos as consequências em razão da violação do

sigilo para aqueles que estão obrigados ao sigilo em matéria de segredo de Estado e inovamos não inovando,

ao consolidar, por via normativa, a solução jurisprudencial do Tribunal Constitucional relativa ao conflito entre

segredo de Estado e direito de defesa.

Repito: inovamos sem inovar. Consolidamos, por via normativa, a solução que a jurisprudência do Tribunal

Constitucional nos fornece em matéria de conflito entre segredo de Estado e direito de defesa.

No que diz respeito aos serviços de informações, aprofundamos os mecanismos de vetting e de controlo da

atuação dos serviços de informações, com vista a garantir mais segurança e maior credibilidade no sistema e,

nesta matéria, introduzimos, por um lado, o registo de interesse dos funcionários e, por outro, mecanismos de

vetting por via normativa.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Fica assim apresentado o conjunto de diplomas da iniciativa do PSD e do CDS-PP:

Tem a palavra, para apresentar os projetos de lei do PCP, o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, o PCP apresenta dois projetos de lei, cada

um deles sobre uma das matérias que estão em discussão: por um lado, o segredo de Estado, por outro, o

Sistema de Informações da República Portuguesa. São matérias que estão relacionadas pela óbvia razão de

que todas as informações que estejam na posse dos serviços que integram o Sistema de Informações da

República Pública são consideradas diretamente, por força de lei, como sendo segredo de Estado.

Diga-se desde já que essa solução não é inevitável. As matérias reservadas não são apenas as que são

classificadas como segredo de Estado. E até há nesta matéria uma certa contradição. Ou seja, por um lado,

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no diploma relativo ao segredo de Estado, considera-se que as matérias sob segredo de Estado têm de ser

classificadas pelos órgãos de soberania, que essa classificação obedece a critérios de excecionalidade, mas,

depois, todas as informações do Serviço de Informação são consideradas segredo de Estado.

Ora bem, há matérias que são reservadas mas que não são segredo de Estado e que são, obviamente,

protegidas, designadamente o segredo de justiça, matérias relativas às investigação criminal e à intimidade

das pessoas. Não são segredo de Estado, mas são matérias reservadas e, portanto, seria plausível encontrar

uma outra classificação para as matérias na posse do Sistema de Informações. Mas não foi essa a opção do

legislador e, portanto, é com o quadro atual que temos de nos conformar.

Vou expor muito brevemente as propostas que o PCP apresenta neste debate, começando pela questão do

segredo de Estado.

Relativamente ao segredo de Estado, importa revisitar a discussão que houve nesta Assembleia aquando

da aprovação da lei de 1994, com a qual o PCP discordou profundamente, e ainda discorda, e algumas das

razões dessa discordância constam precisamente do projeto de lei que agora apresentamos. Desde logo,

quando à vastidão das entidades que podem classificar matérias como segredo de Estado, não faz nenhum

sentido que se considere que o segredo de Estado é excecionalíssimo e, depois, se permita que todos os

ministros possam classificar matérias como segredo de Estado.

Do nosso ponto de vista, só poderão classificar matérias como segredo de Estado os titulares máximos dos

órgãos de soberania, ou seja, o Presidente da República, o Presidente da Assembleia da República e o

Primeiro-Ministro. Se algum outro membro do Governo entende que deve haver uma matéria a ser classificada

como segredo de Estado o que tem de fazer é propor ao Primeiro-Ministro que proceda a essa classificação,

sob pena de estarmos a banalizar a classificação de matérias como segredo de Estado. Portanto, a nossa

proposta é de que apenas os titulares máximos possam classificar.

Por outro lado, também não percebemos que informações, elementos de prova respeitantes a factos

indiciários da prática de crimes possam ser ocultados às entidades competentes para a investigação criminal.

Não é aceitável! Ou seja, se um titular de um órgão de soberania, no exercício das suas funções, tem

conhecimento de matéria indiciária da prática de crimes, aquilo que tem de fazer é comunicar às autoridades

judiciárias. Não entendemos que outro tipo de atitude é que o responsável do órgão de soberania pode ter

quando estamos perante factos indiciários da prática de crimes. Obviamente que as autoridades judiciárias

saberiam guardar a devida reserva, até para defesa da investigação criminal, relativamente a essas matérias.

Quanto à questão relativa à fiscalização do regime do segredo de Estado, remetemos, precisamente, para

a fiscalização do SIRP (Sistema de Informações da República Portuguesa), na medida em que nos parece que

deve haver um único órgão de fiscalização de matérias em segredo de Estado e Sistema de Informações da

República, até porque o mecanismo de fiscalização, que foi instituído em 1994, nunca funcionou. Foram 16

anos, pelo menos, em que a tal comissão sobre o segredo de Estado, pura e simplesmente, não existiu.

Estamos confrontados, desde há 20 anos, com um primeiro segredo de Estado, que é o de saber como é

que esse regime é fiscalizado. Não é! Essa tal comissão nunca soube rigorosamente nada sobre que matérias

é que estão ou deixam de estar classificadas como segredo de Estado.

Portanto, o primeiro segredo de Estado é, precisamente, a aplicação do próprio regime. Ninguém sabe

como é que ela se fez! É preciso que, também nesta matéria, se institua um mecanismo próprio do Estado de

direito, porque tem de haver fiscalização da aplicação do regime do segredo de Estado e, ao mesmo tempo,

do funcionamento do Sistema de Informações da República, que estão intimamente relacionados. Daí que

consideremos que o atual sistema não é adequado.

Assim, entendemos que deve ser a própria Assembleia da República, não por interpostas comissões mas

ela própria, a criar mecanismos institucionais de fiscalização do Sistema de Informações e do segredo de

Estado, que, do nosso ponto de vista, devem situar-se ao mais alto nível.

A nossa proposta é que seja a Presidente da Assembleia da República, líderes parlamentares e

presidentes de três comissões, ou seja, da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e

Garantias, da Comissão de Negócios Estrangeiros e da Comissão de Defesa Nacional, a chamarem a si a

fiscalização da aplicação do regime, quer do segredo de Estado, quer do Sistema de Informações da

República Portuguesa.

É que há um problema que nunca foi resolvido: o do acesso da Assembleia da República em matérias

classificadas como segredo de Estado. Não é aceitável, do nosso ponto de vista, que a Assembleia da

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República não possa, em circunstância alguma, ter acesso a matérias classificadas. Ou seja, não se trata de

derrogar o regime do segredo de Estado, trata-se de encontrar uma possibilidade, com a devida segurança da

informação, que permita à Assembleia da República uma ponderação sobre os valores que estão em causa e,

em determinadas circunstâncias, encontrar forma de a Assembleia da República ser associada ao

conhecimento de matérias classificadas, cujo conhecimento seja considerado essencial.

Achamos que não é aceitável que este órgão de soberania seja sistematicamente arredado do

conhecimento de determinadas matérias com a invocação, por parte do Governo, por parte do SIRP ou por

parte de seja de quem for, que são matérias reservadas e classificadas e a Assembleia da República não tem,

pura e simplesmente, acesso a elas.

Do nosso ponto de vista, este problema tem de ser resolvido. Aliás, é um problema que não se prende

exclusivamente com o segredo de Estado, porque todos temos conhecimento de situações em que há

Deputados que, no exercício dos seus poderes constitucionais, solicitam ao Governo, ou a qualquer entidade

pública, determinadas informações e a resposta é a de que não podem dar informações porque essa matéria é

reservada. Temos de perguntar por quem é que é reservada e a que título. A Assembleia da República não

pode, pura e simplesmente, ser arredada da informação sobre questões relevantes para o exercício do seu

poder constitucional de fiscalização da atividade do Governo e das demais entidades públicas.

Portanto, neste processo legislativo, esperamos que haja abertura por parte de todos os grupos

parlamentares para questões como a do acesso da Assembleia da República a matérias classificadas, seja

pelos Serviços de Informações, seja a título do segredo de Estado, seja a título de outras modalidades de

reserva de documentação, que lhe permita ter um mecanismo institucional para fiscalizar a aplicação deste

regime e, em determinados casos limite, ter uma palavra a dizer relativamente à própria classificação dessas

matérias e à salvaguarda da possibilidade de acesso, com as devidas cautelas, a essas informações, sob

pena de ser posto em causa o núcleo essencial das competências da Assembleia da República.

Aplausos PCP.

A Sr.ª Presidente: — Para apresentar os projetos de lei n.os

554 e 555/XII (3.ª), tem a palavra, pelo PS, o

Sr. Deputado Pedro Delgado Alves.

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Os temas que hoje nos

convocam são, de facto, estruturantes para o Estado de direito a vários títulos.

Hoje, o PS apresenta duas iniciativas legislativas, na sequência, aliás, de um debate mais alargado, que vai

para lá do âmbito da matéria do segredo de Estado e das matérias classificadas, em relação ao qual também

já teve a oportunidade, no passado, de entregar algumas iniciativas relativas ao SIRP e ao funcionamento dos

serviços, que ainda se encontram em apreciação.

Portanto, hoje podemos complementar e ter, finalmente, um conjunto, por parte de todos os grupos

parlamentares, de iniciativas que nos permitem olhar de forma conjugada e harmonizada para a temática do

segredo de Estado e, da nossa perspetiva, das matérias classificadas.

De facto, há um histórico que é preciso ter em conta na construção do regime do segredo de Estado que

nos permite identificar um conjunto de necessidades de correção do regime e de afinamento, nomeadamente

quanto a questões já suscitadas relativas ao acesso pela Assembleia da República, e ao modo como deve

proceder-se à fiscalização do segredo de Estado. Mas parece-nos também que há uma oportunidade, neste

debate, para clarificar e dotar, finalmente, de soluções jurídicas estáveis o tratamento alargado das matérias

classificadas.

Portanto, o PS apresenta duas iniciativas distintas, procedendo à revisão global do sistema e do regime do

segredo de Estado mas aproveitando esta ocasião para colocar também na agenda o regime das matérias

classificadas, que não devendo, pela sua importância, merecer a classificação de segredo de Estado, ainda

assim, lidam com matérias sensíveis, com matérias que, obviamente, por força dos critérios de classificação

devem ser objeto de um tratamento especializado e de um tratamento de proteção e que hoje não têm a

necessária credencial legislativa que se torna indispensável para assegurar a proteção de direitos, liberdades

e garantias e para assegurar que estas restrições ao princípio da administração aberta e da transparência se

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fazem de forma a respeitar o princípio da proporcionalidade e, efetivamente, a relação que a Administração

Pública deve manter com os cidadãos. Por isso, parece-nos que há, de facto, uma oportunidade que se abre.

Quanto ao regime do segredo de Estado, para além de uma atualização e de um acompanhamento da

evolução que ocorreu noutros Estados-membros da União Europeia em relação a esta matéria, tendo em

conta muitos anos de produção jurisprudencial e de pareceres da Comissão de Acesso aos Documentos

Administrativos que têm ajudado a burilar e a interpretar este regime, fundamentalmente, olhamos para

matérias cuja regulamentação nos parece premente, nomeadamente o próprio acesso, pela Assembleia da

República, à matéria classificada.

De facto, neste ponto torna-se imperioso assegurar que, numa lógica de garantia da separação e

interdependência de poderes, o órgão de soberania representativo dos cidadãos portugueses tem os

mecanismos adequados para acompanhar a forma como o regime do segredo de Estado é implementado, o

que significa olharmos para a composição da comissão. Quanto a isto, é fundamental que ela tenha,

efetivamente, um caráter parlamentar, pelo que não podemos acompanhar soluções que desparlamentarizam

e retiram do âmago de competência da própria Assembleia, junto dos seus titulares, o acompanhamento

destas matérias.

Por isso, privilegiamos outro modelo, na linha daquele que já hoje temos mas, obviamente, dotado de uma

solenidade acrescida porque queremos envolver a presidência da Assembleia da República neste processo de

fiscalização, para além, obviamente, de outros Deputados que devam integrar a comissão, envolvendo-os

também no topo desta comissão.

Por outro lado, coloca-se em cima da mesa, e é relevante, a questão do acesso. Os trabalhos

parlamentares necessitam de ter a possibilidade, em muitas circunstâncias e particularmente no que respeita à

atividade que se realiza no quadro de inquéritos parlamentares, de ter mecanismos para aceder de forma

segura e garantística para todos os interesses em presença — aqueles que são os interesses da Assembleia e

aqueles que são os interesses de proteção do segredo de Estado —, ou seja, seria necessário ter, pelo

menos, um mecanismo que permita fazer este acesso.

Portanto, recuperamos uma iniciativa legislativa do PS e integramo-la no quadro desta revisão, permitindo,

efetivamente, um mecanismo para que a Assembleia não fique castrada nos seus poderes de fiscalização e

possa fazê-la mesmo quando a matéria em presença diga respeito ao segredo de Estado.

Quanto às matérias classificadas, o que se torna premente e urgente é, de facto, passarmos a ter uma lei

formal, da Assembleia da República, que seja uma habilitação para a restrição dos direitos, liberdades e

garantias que está subjacente à existência de matérias classificadas, e hoje não a temos.

Hoje, o regime que vigora, os designados SEGNAC (segurança nacional, salvaguarda e defesa das

matérias classificadas), assenta apenas em resoluções do Conselho de Ministros cuja sustentação jurídico-

constitucional não se afigura suficiente para operar uma restrição de direitos fundamentais e também é isso

que está em causa.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Torna-se, portanto, necessário distinguir o que é o segredo de

Estado, que, portanto, deve ter um grau de proteção máximo e um grau de cautela extremo, daquelas outras

matérias em que também o grau de segurança existe, em que as cautelas se encontram presentes e em que

falta, efetivamente, uma credencial constitucional para que o sistema, de facto, assente numa pirâmide bem

organizada, com um zénite claro representado pelo segredo de Estado e depois por graus diferentes, em

escada, quer quanto à classificação, quer quanto ao acesso, que, mais uma vez, permita concluir que há

proporcionalidade e adequação na forma como o acesso tem lugar.

Finalmente, de forma comum a ambas as iniciativas, parece-nos fundamental haver regras claras quanto à

segurança desta informação, credenciando e habilitando, posteriormente, os serviços que tratam esta matéria

e que a manuseiam a adotar medidas de proteção, mas também haver regras quanto à credenciação de

segurança. Ou seja, também aí tem de haver procedimentos que habilitam a Administração Pública a proceder

à inspeção e à fiscalização do perfil de cada uma das pessoas que poderá manusear esta informação —

obviamente, informação sensível —, mas tendo em conta que se colocam questões de acesso a dados

pessoais que também necessitam, por isso mesmo, de uma credencial legislativa.

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O debate em curso é complexo e há disponibilidade do Partido Socialista para acompanhá-lo até noutros

pontos que não estão expressos nestas incitativas apresentadas. Penso que todos temos a ganhar se

conseguirmos construir um regime que dê resposta à urgência da matéria que, já com algum atraso, carece de

uma revisão urgente.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Para apresentar o projeto de lei n.º 556/XII (3.ª), do BE, tem a palavra a Sr.ª

Deputada Cecília Honório.

A Sr.ª Cecília Honório: — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Começo por saudar o facto de este

debate estar hoje muito para além do debate das incitativas sobre o segredo de Estado e de nos dar a

oportunidade, finalmente, de discutirmos com a maioria as propostas concretas de reforma, consideradas

exigíveis por VV. Ex.as

, no âmbito de um apurado trabalho da 1.ª Comissão e num quadro muito preocupante

que o País viveu de grande turbulência dentro dos Serviços de Informação da República. Portanto, é todo este

debate que hoje, finalmente, podemos fazer.

Quero reconhecer esta satisfação dando conta de que a História não deve esquecer que há algum tempo

que a 1.ª Comissão fez um conjunto muito alargado de audições, por iniciativa do Bloco de Esquerda e que

VV. Ex.as

acordaram, e quero, ao mesmo tempo, relembrar-vos que temos aprovados três projetos de lei

desde outubro de 2012: um relativo a uma proposta considerada bastante razoável do período de nojo na

transição dos agentes e funcionários dos serviços de informação para outras realidades fora dos mesmos;

outro sobre o reforço das garantias dos cidadãos e da própria Comissão de Fiscalização de Dados quando há

recolha infundada de informação; e um outro que facilitava esta relação tão densa e tão complexa, que ainda

hoje aqui reconhecemos, da Assembleia da República e dos seus eleitos com matérias classificadas,

nomeadamente com o segredo de Estado.

Estas iniciativas legislativas estão aprovadas há muito, à espera deste pacote que a maioria traz hoje a

debate.

Para além do reconhecimento da importância deste debate e dos seus vários níveis, quero dizer-vos que

aquilo que o Bloco de Esquerda acrescenta às iniciativas que apresentou no passado reporta-se à

possibilidade de acabarmos com as «prateleiras douradas» no Estado, com o fim da automaticidade do

vínculo, que hoje está na lei, e, ao mesmo tempo, com a necessidade de reforçar o direito de defesa em caso

de processo judicial, considerando nós que o Primeiro-Ministro, no que respeita às garantias de um processo

de defesa e no que respeita ao acesso ao segredo de Estado neste âmbito, não pode bloquear aquilo que uma

autoridade judicial considerar determinante para este mesmo processo.

Neste quadro de propostas e no quadro amplo do debate que hoje fazemos, quero relevar que há

propostas positivas nas iniciativas de todos os grupos parlamentares, sendo que saudamos as iniciativas do

PCP como particularmente relevantes e identificamos matérias muito positivas nas propostas do PS, mas

temos dificuldades em entender este acompanhamento de um segredo de Estado que pode durar tantas

décadas, e essa é uma discussão que é preciso fazer com toda a clareza.

Também há aspetos relevantes no pacote de iniciativas que a maioria, finalmente, traz a debate sobre a

reforma que urge fazer de alguns aspetos fundamentais dos Serviços de Informações da República, mas a

este propósito quero deixar-vos também algumas preocupações.

Lemos com atenção os diferentes pareceres, nomeadamente do Conselho Superior da Magistratura, da

Ordem dos Advogados, da Procuradoria-Geral da República, e achamos perigosa esta discricionariedade que

a maioria atribuiu ao segredo de Estado, encaixando-o nos interesses fundamentais do Estado e pondo esta

possibilidade da preservação das instituições políticas, pelo que gostaríamos de saber exatamente o que é

que isto significa.

Há aqui uma discricionariedade que a maioria prevê para o segredo de Estado que nos parece

manifestamente perigosa, sendo que, gostaria já de destacar, interesses do Estado e interesses de

governantes ou de alguns governantes não são, obviamente, a mesma coisa.

Para além deste aspeto, temos a «eternização» potenciada do segredo de Estado e perguntamo-nos onde

é que está a proporcionalidade temporal de um argumento desta natureza, sendo que agora vieram invocar a

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NATO e o enquadramento do espaço em que nos encontramos. Mas eu pergunto-vos onde é que está a

avaliação do tempo e da temporalidade hoje em vigor dos quatro anos.

Finalmente, gostaria de dizer que nos parece que esta «eternização» condiciona objetivamente o direito de

defesa em caso de processo-crime e que é preciso encontrar outras respostas para esta matéria, para as

quais estamos, obviamente, disponíveis.

Aplausos do BE.

Entretanto, assumiu a presidência o Vice-Presidente Ferro Rodrigues.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Em primeiro lugar, tendo já sido

feita a apresentação, e muito bem, pela Sr.ª Deputada Teresa Leal Coelho, quero referir-me aos projetos que

PSD e CDS-PP aqui apresentam, sublinhando aqueles que são, do ponto de vista do CDS-PP, os aspetos

essenciais desses projetos.

Como aqui foi dito, a primeira ideia fundamental é a de que esta matéria está para ser tratada há algum

tempo, carece de ser tratada há algum tempo e, obviamente, tem de ter uma atualização em relação à

realidade dos dias de hoje, que é uma realidade muito diferente daquela em que, pela primeira vez, se

trataram nesta Câmara os assuntos do segredo de Estado.

É por isso que relativamente à questão do segredo de Estado se alargam os registos, independentemente

do seu suporte, porque, obviamente, a realidade hoje é outra. E é também por isso que se procura modernizar

e tornar mais eficaz. Foi aqui dito pelo Sr. Deputado António Filipe, e bem, que a fiscalização desta matéria de

segredo de Estado nem sempre foi eficaz. Pois bem, vamos, então, discutir e procurar garantir que a

fiscalização se faça e que seja mais eficaz.

Passou aqui a questão — e passou não só no debate aqui, na Câmara, mas também na comunicação

social — de sabermos se, com esta matéria, estamos ou não a alargar o conceito de segredo de Estado, a ir

mais longe do que aquilo que seria razoável em matéria de segredo de Estado.

Ora, não tenho — e falo em nome da maioria e como subscritor deste projeto — a ideia de que se trata de

uma intenção de alargamento. A questão é que, obviamente, e pegando até naquilo que aqui foi dito agora

mesmo pela Sr.ª Deputada Cecília Honório, quando diz que há um conjunto de entidades que podem e o que

é que são estes interesses, o segredo de Estado, de alguma forma, logicamente e como qualquer segredo

deste tipo, traduz ou induz uma certa excecionalidade, por assim dizer. Portanto, são só os interesses

fundamentais, os interesses permanentes do Estado português que podem justificar essa mesma realidade.

Obviamente, quando se justifica essa mesma realidade, aquilo que se faz, ao exemplificar uma série de

matérias, matérias que hoje em dia têm até uma preocupação diferente da que tinham no passado — e estou

a pensar, por exemplo, em questões como as ligadas ao ambiente, à proteção da natureza, aos aspetos

fundamentais de ameaças que, hoje, existem e que podem incidir sobre o território e sobre a população

portuguesa —, ao elencar essas matérias, a intenção não é, no meu ponto de vista (e não sou autor único

desta matéria), alargar e alargar indefinidamente o que pode ser segredo de Estado, pelo contrário, a intenção

é, obviamente, tipificar, exemplificar e dizer exatamente aquilo que pode ser segredo de Estado e que, se

virmos bem, está sempre ligado ao conceito anterior, esse, sim, mais amplo e mais vago, de interesse

nacional ou de interesses fundamentais do Estado.

Quando se faz referência à questão política e ao sistema político, o que se está a dizer é que podem ser

matérias classificadas que tenham a ver, por exemplo, com a proteção daquilo que, para nós — e, penso, para

todos nesta Câmara —, é matéria que deve ser sempre objeto de proteção fundamental em relação a todas as

ameaças, que é, obviamente, a democracia, o regime político enquanto democracia.

Portanto, é neste âmbito que entra essa proteção e é neste âmbito que nos devemos concentrar.

O Sr. Deputado António Filipe levantou aqui uma questão que me parece relevante, a de podermos ou não

confrontar-nos, precisamente em matérias de proteção fundamental do território, da população, do regime

democrático, com a existência de crimes.

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É evidente que a leitura que faço é que uma coisa não pode ser exclusiva em relação a outra, ou seja, a

classificação não pode impedir, ao mesmo tempo, se se detetarem crimes, a investigação, a sua prossecução

e o chegarmos a uma boa conclusão.

Portanto, se dúvida existir sobre essa matéria, penso que ela será, obviamente, lidada e terá de ser

resolvida, para que não restem dúvidas, em sede de especialidade. Uma coisa não é exclusiva da outra nem

pode limitar a outra.

Também a questão de sabermos quem pode acionar a classificação e, depois, sabermos qual é a decisão

final, centrando-a ou não designadamente no Primeiro-Ministro, é matéria que pode estar em discussão, que

pode ser aperfeiçoada, pode ser pensada e pode ser refletida.

Agora, é evidente que quem tem a tutela destes mesmos interesses, que agora são mais exemplificados e

mais tipificados, é quem tem de acionar, em primeiro lugar, o mecanismo, e, por isso, não é exclusivo do

Primeiro-Ministro e por isso estamos também a envolver várias formas e vários membros do Governo.

Em relação aos prazos, obviamente que esta matéria foi muito ponderada pela maioria e acho que os

prazos que propomos são razoáveis. Temos, essencialmente, como prazo de referência os quatro anos, sendo

que temos a possibilidade de chegar aos 30 anos e só muito excecionalmente será possível renovar esse

prazo, que é um prazo limite, mas aí, obviamente, de uma forma muito fundamentada, muito explicada e só

em circunstâncias muito excecionais.

Outra questão que está aqui em causa, que foi aqui levantada e que passou por várias intervenções,

nomeadamente do Sr. Deputado António Filipe e do Sr. Deputado Pedro Delgado Alves, é a questão da

fiscalização do segredo de Estado e da fiscalização dos próprios serviços de informações.

Aqui, diria que estamos confrontados, de facto, com duas posições diferentes: a posição da maioria, que

aqui foi apresentada e que subscrevo, e a posição de alguns dos partidos da oposição, designadamente do

Partido Socialista e do PCP.

Estou convicto e confiante na posição que a maioria defende, obviamente respeitando as outras posições,

ou seja, não nos parece ser a melhor solução, seja em matéria de segredo de Estado, seja em matéria de

fiscalização — como foi, no passado, dos serviços de informação, mas designadamente nesta questão do

segredo de Estado —, não nos parece ser o melhor caminho parlamentarizar mais a fiscalização e a proteção

do segredo de Estado.

A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Dirão os Srs. Deputados, com o orgulho e o brio que todos temos em

ser parlamentares: «Bom, a Assembleia devia assumir… A Assembleia estaria em condições de assumir…»

Eu diria que atribuir à presidência da Assembleia da República, aos líderes parlamentares ou a quem quer que

seja dentro da Câmara a responsabilidade de fiscalização e de guarda do segredo de Estado, isso seria, de

alguma forma, um presente envenenado.

A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Isso era colocar no âmbito daquilo que é a disputa política, no âmbito

daquilo que é, por natureza, o confronto político e o confronto de ideias uma matéria que, por natureza, deve

ser protegida e deve ser reservada.

Aplausos do CDS-PP.

Não preciso de invocar os antecedentes que existiram nesta matéria, mas poderíamos ir ao célere caso

Veiga Simão em que, às duas por três, a lista das antenas e dos espiões da República Portuguesa circulava

pela comunicação social, sem ninguém se ter apercebido muito bem como é que esse facto aconteceu,

lembrando-me eu — na altura, não era parlamentar mas tinha contacto com os parlamentares do meu partido

— de um líder parlamentar que tinha um envelope lacrado com essa mesma lista.

Portanto, não há um bom antecedente nessa perspetiva de confiar esta matéria à Assembleia. Por isso, a

solução que a maioria propõe de termos uma comissão, que tem, obviamente, designação da Assembleia, que

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é presidida por um embaixador jubilado e que tem essa competência, parece-nos ser a melhor solução, ou

seja, entregar a essa Comissão especializada, com especiais responsabilidades, a fiscalização parece-nos ser

— e estou convicto disso — a melhor solução.

Por outro lado, sublinharia ainda que as propostas que a maioria aqui apresenta, sem quererem ser muito

específicas quanto ao célebre caso das falhas que existiram nos serviços de informações e numa certa

permeabilidade que estes revelaram no passado num caso muito concreto com interesses privados e

interesses externos ao interesse do Estado, portanto, sem quererem ser muito específicas, é relevante e é

importante que os projetos que aqui apresentamos (e outros projetos também têm propostas nesse sentido)

sejam mais exigentes, logo à partida, no controlo e na escolha dos elementos desses mesmos serviços de

informações, no recrutamento, nas nomeações e até na progressão na carreira que esses mesmos elementos

dos serviços de informações farão, bem como na avaliação e na existência clara de um registo de interesses,

que faz todo o sentido que seja aplicado e que seja rigoroso.

Portanto, estas são matérias que, do nosso ponto de vista, estão em aberto, sendo que estamos

disponíveis para a sua discussão. O desafio que vos deixo, em nome do CDS-PP e enquanto parte desta

maioria — e, obviamente, votaremos favoravelmente os projetos que subscrevemos juntamente com o PSD —

é que estamos disponíveis, numa lógica de reciprocidade, a que todas as matérias que aqui foram

apresentadas hoje possam baixar à Comissão para que, conjuntamente, em sede de 1.ª Comissão, numa

matéria que é uma matéria de Estado, que é uma matéria essencial, que é uma matéria fundamental, em que

o que é importante é proteger os serviços de informações e proteger o segredo de Estado, possamos gerar um

consenso mais amplo.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro

Delgado Alves.

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr. Presidente, de facto, penso que há um clima de consenso e de

abertura que nos permitirá, pelo menos em relação a algumas das questões que são transversais aos grupos

parlamentares e às várias iniciativas, trabalhar em sede de especialidade. No entanto, gostaria de deixar

algumas questões que são relevantes e merecerem ser abordadas ainda nesta fase do debate na

generalidade.

A primeira respeita à questão do âmbito. Se tivermos a oportunidade de fazer uma leitura combinada da

matéria relativa ao segredo de Estado e da matéria relativa às matérias classificadas aí, sim, encontramos um

amplo campo para, de forma criteriosa e harmoniosa, identificarmos o que deve ser objeto de classificação em

cada um destes níveis.

De facto, aquelas preocupações que o Sr. Deputado Telmo Correia há pouco referia, como, por exemplo, a

matéria ambiental, obviamente, são relevantes. Porém, no caso, temos também um quadro normativo

especifico para acesso à informação ambiental, portanto, temos também uma restrição a direitos fundamentais

nessa medida, e, obviamente, parece-nos que esta matéria seria melhor tratada no quadro do regime de

matérias classificadas, sem necessidade de alargarmos excessivamente o âmbito do segredo a matérias que,

pela sua natureza, não devem ser confundidas com aquele que é o âmago da atividade soberana e de

segurança interna e externa do Estado.

Portanto, é nesse sentido que apresentamos as duas iniciativas, no sentido de dizer que sim, que há outros

interesses a acautelar, mas não necessariamente através do regime do segredo de Estado.

Depois, quanto a uma matéria que foi frisada por várias intervenções e que nos parece pertinente, relativa

ao processo penal e aos direitos de defesa, penso que devemos trabalhar com maior densidade nas várias

propostas e arranjar uma solução satisfatória que tenha em conta a jurisprudência do Tribunal Constitucional e

os equilíbrios precários aqui existentes. Portanto, a nossa disponibilidade, neste ponto, também é total.

Regressando à questão da fiscalização e da comissão, aqui, sim, parece-me que o consenso poderá ser

mais difícil de alcançar, porque o Partido Socialista olhou para esta matéria e selecionou a sua opção

legislativa com base no facto de a Assembleia da República ter uma dupla missão a desempenhar, ou seja,

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por um lado, é responsável pela fiscalização do cumprimento do regime do segredo de Estado, mas, por outro,

também ela própria, carece de acesso para desempenhar a sua missão.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Sr. Deputado, já ultrapassou o tempo de que dispunha.

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Vou já terminar, Sr. Presidente.

Por isso mesmo, concentrar o acesso e a fiscalização numa única entidade e mantê-lo na esfera

parlamentar tem a valia de não externalizar a uma entidade que também não está imune à pressão política,

que também não está imune às circunstâncias difíceis da gestão de matéria sensível,…

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — … mas que, obviamente, se encontra desprovida da legitimidade que

esta Câmara tem para abordar simultaneamente as questões da fiscalização e do acesso.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Muito brevemente, quero dizer que

consideramos positivo que haja uma disposição da parte das várias bancadas de viabilizar todas as iniciativas

que estão aqui em discussão, para que as divergências sejam dirimidas, tanto quanto possível, na

especialidade, porque concordamos e temos também essa disposição, ou seja, achamos que é importante que

as iniciativas hoje aqui em debate possam ser analisadas, detalhadamente, na especialidade. Mas quer isto

dizer que estamos de acordo no essencial? Não quer e, portanto, também não seria bom que saísse deste

debate a ideia de que, em matérias com esta sensibilidade, como o segredo de Estado e o sistema de

informações da República, estamos todos de acordo, porque não estamos.

Nesta fase do debate, quero sublinhar dois aspetos que, para nós, são centrais e relativamente aos quais

divergimos particularmente das iniciativas apresentadas pelos partidos da maioria.

Relativamente ao segredo de Estado, uma delas diz respeito ao âmbito do segredo e à respetiva

fiscalização, ou seja, a tal comissão que foi criada em 1994, que devia ter na sua posse uma relação das

matérias classificadas como segredo de Estado, nunca existiu e, portanto, de duas, uma, ou nunca houve

matérias classificadas como segredo de Estado ou não houve qualquer fiscalização. Como presumimos que

alguma matéria tenha sido, alguma vez, classificada, concluímos que ela não teve qualquer controlo e,

portanto, a situação é inaceitável, mas a proposta que é feita não altera esta realidade.

Uma segunda questão diz respeito à fiscalização do próprio Sistema de Informações da República. O PS e

o PSD…

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Já ultrapassou o tempo de que dispunha, Sr. Deputado.

O Sr. António Filipe (PCP): — Vou terminar de imediato, Sr. Presidente.

Como estava a dizer, o PS e o PSD inventaram também aqui um novo arco, que é o arco da fiscalização,

ou seja, só os Deputados escolhidos pelo PS e pelo PSD podem, através de uma interposta comissão,

fiscalizar o Sistema de Informações, mas nós entendemos que é este órgão de soberania — este! — que tem

de chamar a si essa nobre e essencial função de fiscalizar algo tão importante para um Estado de direito

democrático como são os sistemas de informações.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Também para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada

Teresa Leal Coelho.

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A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as

Deputadas e Srs. Deputados: Registo com

grande satisfação esta disponibilidade para consensualizarmos estes diplomas em sede de especialidade,

mas, tal como o Deputado António Filipe, considero que há matérias em que não estamos de acordo, e não

estamos de acordo em razão da interpretação que é feita do nosso diploma.

O Sr. Deputado António Filipe acabou de referenciar o facto de a atual entidade de fiscalização não ter

promovido um registo do segredo de Estado, o que significa que hoje não sabemos qual é o número de

documentos ou de matérias em regime de segredo de Estado. Pois é! É exatamente isso que queremos

contrariar com o nosso projeto de lei relativo ao segredo de Estado, porque, quando se exige uma notificação

à entidade de fiscalização, no prazo de 30 dias após a classificação de uma matéria ou documento como

segredo de Estado, isso significa que, com a aprovação desse regime, saberemos a par e passo, quantas

matérias e com que fundamento estão classificadas como segredo de Estado.

Parece-me que esta inovação é uma inovação bastante garantística, quanto mais não seja da fiscalização

da quantidade e da natureza dos atos sob classificação como segredo de Estado.

No que diz respeito à matéria indiciária de crime, questão que foi suscitada por vários Deputados, o regime

que propomos é o regime que já está em vigor.

Se há matéria indiciária da prática de crimes, ela deve ser comunicada ao Ministério Público e pode, com

caráter excecional, o Primeiro-Ministro prorrogar a data de comunicação ao Ministério Público. Inovamos aqui,

quando expressamente estabelecemos que jamais poderá ser classificada como segredo de Estado matéria

ou documentos que sejam objeto da competência do Tribunal Penal Internacional, o que significa que damos

aqui um sinal bem claro de que o segredo de Estado não pode esconder ou tutelar abusos cometidos pelo

Estado.

No que diz respeito à conciliação do regime de matérias classificadas, que o Sr. Deputado Pedro Delgado

Alves referiu e que resulta da proposta do PS, a maioria também apresenta uma proposta de conciliação entre

estes dois regimes,…

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Sr.ª Deputada, já esgotou o tempo de que dispunha.

A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Termino já, Sr. Presidente.

Como estava a dizer, no que diz respeito à conciliação do regime de matérias classificadas, a maioria

também apresenta uma proposta de conciliação entre estes dois regimes, ou seja, entre o regime de matérias

classificadas, por um lado, e o regime do segredo de Estado, por outro, de forma a que seja segredo de

Estado exclusivamente aquilo que caiba na classificação de muito secreto, também numa lógica garantística

do direito e do acesso à informação.

Por último, e muito rapidamente, quero só referenciar que não podemos esquecer aquilo que o Deputado

Telmo Correia aqui trouxe e que foi o seguinte: da última vez que, neste Parlamento, foi deixada na 1.ª

Comissão uma lista…

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Peço-lhe que conclua, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — … com a identificação dos funcionários, dos agentes dos serviços de

informações, essa lista, em poucos minutos, estava nas mãos da comunicação social.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Ainda para uma intervenção, certamente muito curta, tem a palavra

a Sr.ª Deputada Cecília Honório.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr. Presidente, é mesmo muito curta.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Relevar o interesse e o empenho de todos os grupos parlamentares não é

relevar nem secundarizar as divergências que existem sobre matérias sensíveis. No nosso caso, apontámos

algumas dessas matérias, nomeadamente no que ao âmbito do segredo de Estado respeita, no que ao

condicionamento do direito de defesa em caso de processo-crime respeita, no que à eternização do segredo

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de Estado respeita, mas, em todo o caso, faremos esse debate como o fizemos desde a primeira vez, com

toda a disponibilidade, até ao fim.

Aguardamos com alguma curiosidade para percecionar o entendimento que é tradicional entre os

chamados partidos do arco da governação sobre matérias tão sensíveis. Vamos ver o que vai acontecer…

Pela nossa parte, como sempre, faremos o nosso trabalho.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Srs. Deputados, concluímos, assim, este ponto da nossa ordem do

dia.

Passamos ao segundo ponto, que é o da apreciação conjunta dos projetos de resolução n.os

986/XII (3.ª) —

Recomenda ao Governo a criação de um programa especial para a regeneração das ilhas do Porto (PS),

1008/XII (3.ª) — Recomenda ao Governo a promoção da regeneração de estruturas típicas urbanas em

condições de precariedade habitacional (PSD e CDS-PP), e 1010/XII (3.ª) — Recomenda a criação de

programa especial de reabilitação das ilhas e Centro Histórico do Porto (BE).

Para apresentar o projeto de resolução do PS, tem a palavra o Sr. Deputado Renato Sampaio.

O Sr. Renato Sampaio (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O combate à desertificação das cidades e

dos seus centros históricos só é possível com a requalificação e a regeneração urbana, no sentido de valorizar

o seu património.

As ilhas do Porto fazem parte importante da sua identidade e do seu património. Nas ilhas do Porto vivem

cerca de 12 000 cidadãos portuenses e as condições de habitabilidade permanecem abaixo dos padrões de

qualidade e conforto, e até de salubridade, dignos de uma cidade e de uma sociedade moderna e

desenvolvida.

As ilhas do Porto marcaram e marcam fortemente o espaço urbano da cidade desde o fim do século XIX…

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Sr. Deputado, desculpe uma pequena interrupção.

Peço aos Srs. Deputados que estão de pé a conversar que se sentem ou que façam favor de ir conversar

lá para fora.

Faça favor de prosseguir, Sr. Deputado Renato Sampaio.

O Sr. Renato Sampaio (PS): — Muito obrigado, Sr. Presidente.

Como estava a dizer, as ilhas do Porto marcaram e marcam fortemente o espaço urbano da cidade desde

o fim do século XIX e foram criadas como forma de alojamento da classe operária no início da industrialização.

Já houve várias tentativas para resolver este problema, desde 1956, nomeadamente com o plano de

melhoramento do próprio regime fascista e até com o programa PER (Programa Especial de Realojamento

nas Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto), de 1993, mas nunca foi criado um verdadeiro programa

específico para as ilhas do Porto, que resolvesse definitivamente este problema.

Por outro lado, não é possível falar de regeneração urbana, no Porto, sem falar da regeneração das

próprias ilhas, que são espaços de vivência, de sociabilidade e até de resistência ao abandono da própria

cidade e do seu centro.

O Sr. Laurentino Dias (PS): — Muito bem!

O Sr. Renato Sampaio (PS): — As ilhas contribuíram decisivamente para que, apesar de tudo, o Centro

Histórico do Porto, que é Património da Humanidade,…

O Sr. Laurentino Dias (PS): — Muito bem!

O Sr. Renato Sampaio (PS): — … não estivesse já completamente desertificado.

O Sr. José Magalhães (PS): — Muito bem!

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O Sr. Renato Sampaio (PS): — Por isso, Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, faz todo o sentido

criarmos um programa específico de regeneração urbana, à semelhança de outros que já foram criados para

outros espaços urbanos, em colaboração, obviamente, com a autarquia, com a Câmara Municipal do Porto,

para podermos alocar fundos comunitários e, no Porto, termos uma verdadeira política de regeneração urbana

e coesão social, tão importante nos dias de hoje.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Otília Ferreira

Gomes.

A Sr.ª Otília Ferreira Gomes (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: As cidades não são

meras concentrações de habitantes e atividades, mas uma convergência de fluxos, comunidades, redes e

intercâmbios, com identidade, valores e cultura próprios, que impulsionam uma evolução acelerada dos

desafios de planeamento, de desenvolvimento social e humano, de responsabilidade da governação nacional

e local.

O projeto de resolução que hoje aqui apresentamos, de âmbito e abrangência nacional, e que recomenda

ao Governo que garanta as medidas necessárias, nomeadamente financeiras, destinadas a incentivar a

regeneração urbana, contribuindo ainda para eliminar as áreas degradadas e reduzir de forma significativa

situações de precariedade habitacional, garantindo assim o correto desenvolvimento urbano, parte de um

diagnóstico comum aos demais projetos que hoje estamos aqui a discutir, mas não pode ser desligado da

recente proposta de lei da política dos solos, ordenamento do território e urbanismo, aprovada por esta

Câmara, e que, ao contrário do que seria de prever, nomeadamente por força das iniciativas e projetos de

resolução que aqui foram apresentados pouco tempo depois pelo Partido Socialista e pelo Bloco de Esquerda,

não obteve os votos favoráveis daquelas bancadas.

Foi com grande preocupação que se assistiu ao alheamento do Partido Socialista neste processo, com a

não entrega, em especialidade, de qualquer proposta de alteração àquele importante diploma. As contradições

são por demais evidentes, quando o que negaram ontem é defendido hoje e o que diziam ontem contradizem

no dia seguinte.

Com aquele diploma, pretendeu-se reduzir a expansão urbana e apostar definitivamente na reabilitação e

regeneração urbanas, em benefício do desenvolvimento social e económico da vida das pessoas e das

comunidades, dando-se aos municípios e aos particulares mecanismos que lhes permitam regular o mercado

do solo e afetar as receitas à reabilitação urbana.

Um problema concretamente identificado, como o das ilhas do Porto, na Área Metropolitana do Porto, os

pátios e as vilas operárias, em Lisboa, urbanizações inacabadas que foram ocupadas, parques de campismo

que se transformaram em primeira habitação e alguns bairros clandestinos, torna necessária uma intervenção

sustentada, específica, em conjunto com as populações visadas.

Assim, com este projeto, procura dar-se continuidade à opção política deste Governo e desta maioria

quando na proposta de lei dos solos foram definidas as bases da reorganização dos instrumentos de gestão

territorial e de política pública dos solos que permita a sua execução e, sobretudo, se priorizou a promoção da

reabilitação urbana, apostando em urbes com sistemas coerentes e bairros vividos.

Como exemplo prático e incontestável da coerência das iniciativas, que decorreu, aliás, do

aperfeiçoamento proposto em sede de especialidade, destaca-se a recuperação da constituição de um fundo

municipal de sustentabilidade ambiental e urbanismo, que, apesar de se encontrar já previsto na legislação

anterior, era facultativo, sendo agora obrigatório, e serão afetas nomeadamente receitas resultantes da

redistribuição de mais-valias, com vista à promoção da reabilitação e do desenvolvimento urbano.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

A Sr.ª Otília Ferreira Gomes (CDS-PP): — É certo que o desafio da reabilitação urbana e do investimento

no desenvolvimento social e urbano sustentável carecem de diversas medidas complementares, medidas

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essas que, embora desenvolvidas pelos diversos agentes locais, mais próximos das populações, devem ser

equacionadas em termos nacionais, como é o caso, por exemplo, do programa Reabilitar para Arrendar, que

teve uma dotação inicial de 50 milhões de euros.

Esta preocupação do Governo ficou demonstrada nas negociações do âmbito da reprogramação dos

fundos comunitários do período 2014-2020, que contemplam investimentos com este fim, sob a apresentação

de propostas em concurso pelos municípios.

Sr.as

e Srs. Deputados, de facto, aumentaram as complexidades urbanas, atribuindo-se atualmente à

administração local um papel central no desenvolvimento urbano e na promoção do crescimento da economia,

da sustentabilidade e da competitividade das cidades.

Com este projeto de resolução, pretende-se que o Governo aprofunde as medidas necessárias

complementares que promovam os investimentos sustentáveis na regeneração urbana, através da partilha de

responsabilidades no desenvolvimento do território entre o Estado, as autarquias locais e os particulares, o

que contribuirá diretamente para a melhoria da qualidade de vida das cidades e das suas populações.

É este o desafio que este Governo e esta maioria têm levado a cabo, é este o objetivo a que este projeto

de resolução visa dar continuidade.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Entretanto, assumiu a presidência o Vice-Presidente António Filipe.

O Sr. Presidente: — Para apresentar o projeto de resolução do Bloco de Esquerda, tem a palavra a Sr.ª

Deputada Catarina Martins.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: O problema da degradação urbana

e das condições de habitação não é novo no nosso País.

Sabemos o que fizeram aos centros das cidades e o que fizeram contra o direito à habitação de quem vive

em Portugal.

Foram anos de política subserviente à especulação imobiliária, empurrando as famílias para um crédito à

habitação, para um sistema financeiro que nunca foi a resposta e que apenas dificulta a vida das famílias.

Sabemos também como estes anos de políticas de austeridade dificultaram ainda mais a situação, com a

perda de salários, com a perda de emprego, com a perda de apoios sociais e com a incapacidade de dar

resposta à crescente degradação dos centros das cidades.

O Porto, infelizmente, é um triste exemplo destas políticas. Ofende-nos a todos pensar que o centro do

Porto, património da humanidade, pelo relevo que tem do ponto de vista cultural, pela sua arquitetura

específica, é, neste momento, uma das zonas mais degradadas do nosso País e aquela onde se vive com

piores condições, tantas vezes indignas.

No Porto, vivem-se, em concentrado, muitos dos problemas do País, porque às políticas de habitação e de

ordenamento do território erradas em todo o País juntam-se uma realidade social e habitacional muito

específicas. Como sabem, no Porto, uma grande percentagem da população vive em bairros sociais, há

bolsas de pobreza muito grandes, que nunca tiveram a resposta de que precisavam, em nome dos direitos

humanos das pessoas que vivem nessas circunstâncias, e no Porto combinou-se a ação desastrosa de

governos e de autarquia.

Na cidade com maior percentagem da população em bairros sociais, um presidente de câmara, Rui Rio, do

anterior Executivo PSD/CDS, decidiu demolir bairros sociais e, com isso, retirar casa a 2000 famílias, sem lhes

dar qualquer opção.

Vozes do CDS-PP: — É falso!

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Simultaneamente, este Governo PSD/CDS decidiu aumentar as rendas

dos bairros, o IRHU (Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana) aumentou as rendas dos bairros,

tornando a vida das famílias ainda mais difícil.

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Temos, ainda, um dos maiores embustes, que é um projeto de reabilitação urbana que não reabilita, que

não resolve o problema do direito à habitação, que é apenas um balcão de negócios, exatamente com a

mesma lógica de especulação imobiliária que trouxe os problemas do País que temos até agora.

A Porto Vivo, SRU — Sociedade de Reabilitação Urbana da Baixa Portuense, SA, dirigida por Rui Moreira,

que é hoje Presidente da Câmara do Porto, é responsável, também, por este modelo «balcão de negócios»

que deixa o Porto e o seu centro a deteriorar-se a cada dia e deixa as pessoas a viver em condições indignas,

sem terem acesso à habitação com condições.

Sabemos que, no Porto, que tem circunstâncias específicas, temos hoje o repovoamento das ilhas, que são

um tipo de habitação tradicional com muita história, mas também com muito poucas condições de vida.

Há, com certeza, nas ilhas, elos, ligações, comunidades que importa preservar e respeitar, mas há nas

ilhas muitas famílias a viverem em condições degradantes, com humidade, sem casa de banho, sem espaço,

doentes, a adoecerem com as condições indignas da habitação e a pagarem preços exorbitantes por essa

habitação indigna, porque não têm outra solução.

O Bloco de Esquerda propõe três medidas.

Em primeiro lugar, propomos a reabilitação das ilhas, em que Governo e a autarquia possam canalizar

fundos próprios e fundos comunitários.

Propomos também que seja dada a possibilidade às famílias que habitam as ilhas de saírem de lá, se

assim desejarem, para habitações condignas.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Termino, Sr. Presidente, com a última proposta: que a Porto Vivo, SRU de

ser um balcão de negócios, possa fazer reabilitação urbana diretamente, com exigências públicas de direito à

habitação, com exigência pública de dar resposta às necessidades das pessoas e não às necessidades da

especulação imobiliária.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Paulo Rios de

Oliveira.

O Sr. Paulo Rios de Oliveira (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: O projeto de resolução do

Partido Socialista tem o mérito de trazer à discussão um tema importante, mas por aí se esgota o mérito da

proposta.

De facto, os socialistas do Porto trazem à discussão um tema do Porto, em que pedem genericamente ao

Governo que atire cheques para cima de um problema.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Muito bem!

O Sr. Paulo Rios de Oliveira (PSD): — Não se esboça aqui o que é que os socialistas da Câmara do

Porto querem ou propõem fazer em relação ao tema. E, de facto, parece-nos, salvo melhor opinião, que esta

abordagem é curta, é parcelar e é mesmo demagógica.

É curta, porque o problema das ilhas não é um problema só do Porto. Basta percorrer a área metropolitana

para encontrar, aqui e ali, e de forma também candente, situações de grave carência habitacional.

Mas nem sequer podemos ficar por aí. Ao longo deste País, nomeadamente em Lisboa, mas não só, esta

situação existe e, portanto, exige uma intervenção que não seja parcelar ou localizada. Mas, mais do que isso:

naquilo que é o aparente único avanço ou esforço do PS em ter uma solução, a solução passa por requalificar

as ilhas.

Recorde-se que estas ilhas são, na sua esmagadora maioria, privadas, ilegais e muitas delas insuscetíveis

de criarem verdadeiras condições de habitabilidade.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Muito bem!

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O Sr. Paulo Rios de Oliveira (PSD): — Pergunta-se: o que é que se pretende do Governo? Que entregue

cheques para obras com o fim de recuperar ilhas ilegais de privados?! Esta parece-nos ser, claramente, uma

solução populista, não uma verdadeira solução.

O Bloco de Esquerda, conforme já nos habituou, faz uma proposta em que o maior esforço é para que essa

proposta seja chumbada. A abordagem fala de tudo e de nada, ataca tudo e todos e invoca a memória da

gestão de Rui Rio. Mas quanto à gestão de Rui Rio, assumimo-la por inteiro e temos orgulho naquilo que foi

feito pela Câmara do Porto. Oxalá outros se lhe sigam com igual mérito.

Aplausos do PSD.

Quando o Bloco de Esquerda mistura tudo, fala de «balcão de negócios», ataca o Governo e a cidade,

nada propondo, pede-nos que ajudemos a chumbar a sua proposta, ficando para si com o capital de queixa

desse chumbo. Na parte que nos toca, ajudaremos a concretizar esse objetivo.

Em relação ao diploma do PSD, a nossa proposta é mais abrangente, mas também é mais ambiciosa.

Entendemos que temos de abordar o problema da habitação requalificando o que pode ser requalificado,

regenerando o que pode ser regenerado, mas pensando as cidades de outra forma, para que sejam atraentes

não só para aqueles que as visitam e que as conhecem, mas também para aqueles que nelas habitam, pois só

assim se constrói uma cidade inclusiva.

Terminando, a nossa proposta vai no sentido de que o Governo garanta as medidas necessárias,

nomeadamente financeiras, destinadas a incentivar a regeneração urbana, contribuindo para eliminar os seus

edifícios degradados e reduzir de forma significativa as situações de precariedade habitacional. Esta é uma

abordagem sistémica, global e que faz sentido. Qualquer uma das outras pode ser populista, mas não resolve

o problema.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Paula Baptista.

A Sr.ª Paula Baptista (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O parque habitacional do Porto, em

muitas zonas, ainda continua a ser caracterizado por habitações insalubres. São habitações construídas no

início do século XX e existem em várias freguesias do centro do Porto, como, por exemplo, Vitória, na

freguesia do Bonfim, o Bairro do Mesquita ou, ainda, a Travessa do Arouca, em Francos.

Importa ainda dizer-vos que, nestas freguesias — deixei aqui só alguns exemplos —, habitam milhares de

portuenses e, apesar das sucessivas promessas do poder local, do PS, do PSD e do CDS, também muito

pouco foi feito relativamente à resolução dos problemas das ilhas para garantir princípios e direitos

constitucionais tão simples como o direito à habitação.

É necessário transformar estes espaços de modo a garantir às habitações o mínimo de qualidade para que

as pessoas que nelas habitam ou venham a habitar tenham dignidade. No entanto, existem muitos casos em

que estas construções sem condições de habitabilidade são arrendadas por 200 € mensais.

Em boa verdade, também sucessivos Governos, do PS e do PSD e do CDS não asseguraram nos seus

Orçamentos do Estado as verbas suficientes para promover uma efetiva política de habitação social que

respondesse às necessidades das populações.

Por outro lado, o investimento público, que desempenha um papel vital no combate ao desemprego e na

construção de equipamentos essenciais para promover a justiça social, também tem sofrido cortes ano após

ano. Relembramos aqui que, a partir de 2011, a maioria parlamentar PSD/CDS eliminou o PIDDAC do

Orçamento do Estado, pelo que deixou de ser possível averiguar os montantes de investimento público

realizados e propostos pelo Governo para o distrito do Porto.

O PCP não deixará de acompanhar as propostas de regeneração da cidade e de defesa da dignidade dos

que habitam nestas ilhas.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

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A Sr.ª Paula Baptista (PCP): — Hoje mesmo, estará aqui em votação uma proposta, apresentada pelo

PCP, de um plano de emergência social para o distrito do Porto. Propomos a criação de um programa

integrado para avaliação e superação das necessidades de habitação social no distrito, em articulação com as

autarquias locais, com as seguintes componentes: participação financeira na construção de novos

empreendimentos de habitação social, com equipamentos sociais e adequadas condições de inserção social e

urbanística; participação financeira no apoio direto e indireto à recuperação do parque de habitação social,

incluindo a sua recuperação e qualificação urbanísticas; alteração do quadro legislativo de fixação do valor das

rendas, de modo a que passe a ter em atenção a real situação das famílias.

Esperemos, então, que esta proposta do PCP, que propõe respostas concretas a muitos problemas do

distrito do Porto, incluindo os problemas sentidos nas ilhas, seja aprovada na votação que se fará daqui a

pouco neste Plenário.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma segunda intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Renato

Sampaio.

O Sr. Renato Sampaio (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero chamar a atenção da Câmara e

dos Srs. Deputados para que o nosso objetivo não é o de criar um programa especial para habitação, mas sim

de criar um programa específico para a regeneração das ilhas do Porto, porque esta forma de habitação só

existe no Porto, não existe em mais nenhuma parte do País.

Por outro lado, se temos aqui um problema particular, com características próprias, também temos de ter

uma resposta própria e específica para o mesmo. O que pretendemos, à semelhança do que aconteceu

noutros programas, como, por exemplo, na iniciativa Bairros Críticos, que teve experiências-piloto no Porto e

em Lisboa, é um programa específico para as ilhas do Porto, que envolva a administração central e as

autarquias, para o qual sejam alocados fundos comunitários para que possamos ter a regeneração urbana

deste espaço importante, que é um património da cidade do Porto que queremos preservar de qualquer

maneira.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Srs. Deputados, concluímos, assim, o debate dos projetos de

resolução n.os

986/XII (3.ª), 1008/XII (3.ª) e 1010/XII (3.ª), que serão votados hoje, no período regimental de

votações.

Vamos, então, iniciar o terceiro ponto da ordem de trabalhos, que consiste no debate conjunto, na

generalidade, dos projetos de lei n.os

551/XII (3.ª) — Altera o Estatuto dos Deputados, tornando obrigatório o

regime de exclusividade para Deputados à Assembleia da República (BE), e 552/XII (3.ª) — Altera o Estatuto

dos Deputados e o Regime Jurídico de Incompatibilidades e Impedimentos dos Titulares de Cargos Políticos e

Altos Cargos Públicos (PCP).

Para apresentar o diploma do Bloco de Esquerda, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: O debate que hoje trazemos à

Assembleia da República é da maior importância para a qualidade da democracia que vivenciamos e para a

aproximação entre os eleitos da Assembleia da República e aqueles que os elegeram, entre os eleitos e

aqueles que escolhem.

Todas e todos nós sabemos que tem havido um afastamento entre eleitos e eleitores. Esse afastamento

nasce, muitas vezes, de conflitos de interesses que são claros e inequívocos. Muitas vezes não se sabe se os

interesses que estão a ser defendidos são os interesses públicos ou são quaisquer interesses privados. Por

isso, esse afastamento radica no conflito de interesses entre público e privado e na ausência de regras

capazes de criar um clima de transparência e que, de uma vez por todas, elimine esta suspeição.

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Sabemos que vários são os exemplos mais chamados para dar conta de uma melhoria necessária ao

sistema. Entre administradores, gestores, consultores e advogados, são vários os que hoje podem estar, de

manhã, no seu escritório de advogados a fazer leis defendendo interesses privados, e que, depois, as trazem

à Assembleia da República e as defendem aqui em nome desses interesses privados mas com um mandato

que é público e que foi dado para defender o interesse público.

Ora, essa suspeição decorre de não haver ainda um regime de incompatibilidades e impedimentos que

impeça esta situação. Sobre este tema o Bloco de Esquerda já apresentou um conjunto de iniciativas no

passado, mas acreditamos que é necessário agora dar o passo seguinte, o passo que responda ao clamor de

exigência de transparência que a democracia nos pede neste momento.

O passo seguinte é aumentar a exigência no desempenho do cargo de Deputado exatamente para o

mesmo nível de exigência que se pede a um membro do Governo, a um presidente da República ou a um juiz

— que exerça o cargo em regime de exclusividade. É esta a exigência da democracia.

Aplausos do BE.

Sabemos que são várias as vozes que defendem esta posição. Essas vozes não se esgotam na bancada

do Bloco de Esquerda, cujas Deputadas e Deputados têm, desde o início, exercido os seus mandatos em

regime de exclusividade, são bastante mais alargadas, não só entre Deputados das bancadas da Assembleia

da República mas também, temos a certeza, e os ecos públicos dão conta disso, refletem a opinião maioritária

do País, daqueles que olham para a democracia e que pedem mais — mais compromisso dos eleitos para

com os eleitores e menos promiscuidade entre os interesses públicos e os interesses privados.

Por isso, trazemos aqui uma proposta no sentido da exclusividade, a exemplo daquilo que já foi seguido

noutros espaços de igual importância. Nomeadamente, em Espanha, na comparação que é possível fazer, o

regime de exclusividade está a ser aplicado. No Parlamento Europeu, para o qual realizar-se-ão eleições daqui

a pouco mais de um mês, é exatamente esse o regime que está a ser aplicado.

Portanto, pretendemos nada mais, nada menos do que a mesma responsabilidade para eleitos que têm as

mesmas funções; nada mais, nada menos do que para o órgão de soberania Assembleia da República o

mesmo respeito que existe para outros órgãos de soberania nacionais.

Este é um debate para hoje, não para deixar para amanhã. Sabemos que alguns dirão que isto é

eleitoralismo e que tentarão minorar a proposta não pela qualidade da mesma mas, sim, pelo contexto em que

é apresentada. Contudo, Sr.as

e Srs. Deputados, não nos desviemos do essencial. E o essencial é a exigência

que aqueles que nos elegeram têm para connosco, de saberem que temos de estar cá para os servir a tempo

inteiro e com dedicação exclusiva; não podemos estar aqui a tempo parcial e com interesses dúbios. O

mandato de um Deputado ou de uma Deputada é para com aqueles que o elegeram e deve ser feito com total

exclusividade, disponibilidade e atenção para quem o elegeu.

Outros dirão que este caminho poderá levar à profissionalização do Parlamento. Errado. Não é por existir

um regime de exclusividade dos membros do Governo ou da Presidência da República que existe uma crítica

dos profissionais do Governo ou dos profissionais presidentes da República. Não é por isso, pelo que

rejeitamos que a mesma crítica possa ser utilizada demagogicamente quanto à Assembleia da República.

Sr.as

e Srs. Deputados, a exigência, o desafio e o apelo que deixamos é no sentido da ética republicana, da

total transparência dos eleitos e do compromisso dos eleitos com os seus eleitores.

O desafio que deixamos para todas e todos que se libertem quer dos grilhões partidários quer dos grilhões

das suas bancadas parlamentares é que hoje aqui possamos dizer que damos tolerância zero à

promiscuidade entre interesses públicos e interesses privados, que hoje aqui damos tolerância zero à

promiscuidade que não deveria existir no século XXI na democracia portuguesa.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para apresentar o projeto de lei do PCP, tem a palavra o Sr.

Deputado João Oliveira.

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O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Ao longo dos anos, o PCP tem

trazido à Assembleia da República inúmeras propostas no sentido de enfrentar um problema que, não sendo

novo, tem sofrido significativo agravamento — refiro-me à ideia de existência de situações que configuram

promiscuidade entre o exercício de funções políticas, não só na Assembleia da República mas também no

Governo ou noutros espaços de exercício dessas funções políticas, e outro tipo de interesses que nada têm

que ver com os interesses que deviam nortear as decisões políticas, nomeadamente interesses económicos.

Esta ideia de promiscuidade entre os interesses económicos e o poder político é, de facto, uma ideia que

nem contribui para a melhoria da qualidade da democracia, nem contribui para que a democracia se reforce

aos olhos dos cidadãos.

O PCP, ao longo dos anos, tem apresentado propostas na Assembleia da República no sentido de garantir

que a lei impeça a existência destas situações, que, aos olhos dos cidadãos, são consideradas como

reveladoras de promiscuidade entre os interesses económicos e o poder político.

Temos sucessivamente apresentado propostas de alteração legislativa na Assembleia da República com a

noção de que nenhuma lei, por mais perfeita que seja, poderá evitar por completo a ocorrência dessas

situações. Obviamente, é necessária uma componente de prática pessoal para garantir que tais situações não

ocorram, mas o que sabemos também é que quanto pior for a lei, quanto mais insuficiente for a lei, mais

espaço haverá para que essas situações ocorram e para que, verdadeiramente, a promiscuidade entre

interesses económicos e poder político condicione as decisões políticas e as influencie no sentido de

beneficiar interesses económicos, interesses que não os do destinatário das decisões políticas, que é, afinal

de contas, o povo.

Sr.as

e Srs. Deputados, ao longo de anos, temos vindo a confrontar-nos com situações concretas que dão a

exata dimensão destes problemas. Por exemplo, situações de titulares de cargos políticos que, estando

impedidos de exercer uma determinada atividade ou de praticar determinados atos económicos, por via de

sociedades de advogados acabam por poder praticá-los, ou por via da sua participação em sociedades

gestoras de participações sociais (SGPS) acabam por fazer aquilo que a lei não permite que façam por si só.

Ora, esta é uma dimensão das propostas que hoje aqui trazemos.

As alterações que apresentamos ao Estatuto dos Deputados têm como objetivo impedir que por interposta

pessoa, por uma sociedade advogados ou por uma outra entidade, nomeadamente uma SGPS, os Deputados

possam fazer aquilo que, individualmente, o Estatuto dos Deputados não lhes permite.

Apresentamos propostas no sentido de desconsiderar a natureza jurídica da entidade por intermédio da

qual esses atos são praticados e de relevar, sim, o ato em si, impedindo que ele aconteça.

Apresentamos também uma proposta para alterar o Regime Jurídico de Incompatibilidades e Impedimentos

dos Titulares de Cargos Políticos e Altos Cargos Públicos no sentido de alargar de três para cinco anos o

período de impedimento do exercício de atividades privadas por quem exerceu funções públicas, isto é, o

período em que, depois, não pode exercer funções privadas no âmbito de empresas ou outras entidades com

as quais teve contacto ou com as quais teve de lidar no exercício das funções políticas.

Não é admissível que um ministro ou um secretário de Estado, a partir do momento em que deixa de

exercer essas funções, possa ser contratado por uma empresa com a qual teve de lidar no âmbito dessas

funções políticas. A verdade é que a lei já hoje não o permite por um período de três anos. O que propomos é

o alargamento desse período de três para cinco anos, evitando uma situação de ligação direta entre as

decisões políticas e a atividade económica ou o benefício económico.

Em matéria de impedimentos, estendemos as limitações que já hoje existem para empresas

maioritariamente públicas e institutos públicos a todos os seus órgãos sociais e não apenas a uma parte deles,

como acontece hoje. Clarificamos ainda a intenção de alargar a incompatibilidade que existe hoje no que toca

à presença em conselhos de gestão de empresas públicas, ou maioritariamente públicas, a todas as empresas

em que o Estado tenha parte do capital, mesmo que seja acionista minoritário, e determinamos que,

independentemente daquilo que possa ser a participação relevante, essa participação seja considerada,

mesmo sem a titularidade de 10% do capital social, para efeitos de aplicação do Estatuto dos Deputados,

nomeadamente em matéria de incompatibilidades.

Portanto, Sr.as

e Srs. Deputados, apresentamos um conjunto de propostas concretas que visam resolver o

problema da subversão do princípio constitucional de que o poder económico deve submeter-se ao poder

político. Efetivamente, com as situações de promiscuidade a que temos vindo a assistir são legítimas as

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suspeitas que muitas vezes se lançam de que há uma subversão desse princípio constitucional e de que é o

poder político que está a subordinar-se ao poder económico.

Sr.as

e Srs. Deputados, as desculpas que, ao longo de anos, têm sido utilizadas para impedir a aprovação

destas propostas são as desculpas que dão cobertura a essas situações obscuras, são as desculpas que dão

cobertura a essas situações de promiscuidade entre interesses económicos e o poder político. Esperamos que

hoje não se repitam e que não venham também justificar a oposição ao projeto de lei do PCP com o discurso

da profissionalização da política, porque não é isso que se propõe.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando

Negrão.

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: As iniciativas legislativas agora

em discussão, apresentadas pelo Bloco de Esquerda e pelo PCP, não surgem no melhor momento nem

constituem o melhor pretexto para se começar a discutir de forma séria, sólida e intensa a reforma do nosso

sistema político. Não é o melhor momento porque estamos em período eleitoral; não constituem o melhor

pretexto porque só cuidam de uma árvore, dando como adquirido que a floresta está saudável.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Perto que estamos da celebração de 40 anos sobre o 25 de Abril e

tendo em conta os notáveis progressos levados a cabo, tem de nos ficar, necessariamente, um «amargo de

boca» no que diz respeito ao facto de a relação entre o povo português e o sistema político que o governa ser

cada vez mais distante, havendo mesmo um desfasamento entre o sistema político e os cidadãos. E é esta a

floresta que, antes do tudo o mais, temos a obrigação de cuidar.

Vejamos um caminho — fazê-lo em simultâneo, através da procura de soluções na justiça como o garante

que é do cumprimento da lei, bem como através de alterações ao sistema político como o instrumento que é

do cumprimento da democracia.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Muito bem!

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Sobre a justiça, ao longo das últimas décadas não se cuidou o

suficiente da justiça, nem a justiça cuidou o suficiente de si própria.

A justiça, como prioridade política, foi quase sempre esquecida, e, como consequência, o autogoverno da

justiça teve quase sempre como orientação um conjunto de regras e procedimentos pouco permeáveis às

profundas mudanças que foram ocorrendo ao longo das últimas décadas.

Neste quadro de uma justiça com falta de atenção, meios insuficientes e sem capacidade de afirmação,

cresceram as oportunidades para a corrupção, os favorecimentos e os tráficos de influência, que, obviamente,

foram bastas vezes criminalmente aproveitados e, lamentavelmente, muitas vezes com efetivo ou aparente

sucesso, perante a passividade e até a desorientação dos responsáveis a quem devia cumprir tornar mais

eficaz e mais justa a resposta da lei.

Por isso, hoje a corrupção e, pior ainda, a sua perceção, são uma realidade que mina a relação entre o

cidadão e o seu sistema político.

Sobre o sistema político, é ainda, na dita floresta, que temos de encontrar melhor solução para a

arrogância ou o arbítrio no funcionamento do Estado, nomeadamente através da criação de contrapeso

político por parte de quem tenha como missão agir em nome dos cidadãos.

É urgente encontrar uma relação mais adequada entre votos e assentos parlamentares e, dentro deste, dar

melhor solução à questão da representação e do papel dos representantes eleitos.

E a pergunta que fica é a seguinte: o limite da representação do Deputado é a defesa de uma ideologia? É

a defesa exclusiva de uma ideologia? Ou deverá ir para além disto, devendo funcionar como intermediário ou

mesmo defensor dos cidadãos, constituindo-se como os seus representantes perante o Estado?

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Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — O atual sistema proporcional, de círculos plurinominais e de domínio de

listas partidárias para a eleição dos Deputados nacionais, tem demonstrado fragilidades na relação entre o

Deputado e o eleitor, fazendo com que as preocupações das populações passem para segundo plano,

algumas vezes em nome de interesses sem qualquer legitimidade.

Protestos do Deputado do PCP Jorge Machado.

Os círculos uninominais permitem oportunidades para os verdadeiros candidatos independentes e locais,

reforça a participação ativa dos cidadãos na política, torna mais real a democracia participativa e cria a figura

do cidadão fiscalizador das políticas do Estado e da Administração Pública, sendo que a adoção de círculos

uninominais também não estará isenta de riscos. Por exemplo, o risco de os Deputados passarem a saltar de

partido em partido, durante as legislaturas, consoante as negociações políticas que vão sendo feitas com os

governos.

Sr.as

e Srs. Deputados, quanto ao número de Deputados, a própria Constituição da República Portuguesa

prevê que possam ser entre 180 e 230. Compreendem-se as razões porque se começou pelo número máximo

permitido, mas não se compreende hoje, como uma realidade democrática estabilizada, a não opção pelo

número mínimo, ou outro, de Deputados permitidos pela Constituição da República Portuguesa.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Estas deverão ser, e são, as

prioridades. As prioridades verdadeiramente urgentes num Estado de direito que precisa de consolidar a sua

justiça e de mudar o seu sistema de representatividade, de modo a diminuir o fosso entre eleitos e eleitores. E

é para isso que, antes de tudo o mais, precisamos de trabalhar fora de períodos eleitorais, porque mais

propícios a reflexões consistentes e a consensos alargados.

Protestos da Deputada do PCP Rita Rato.

Definidos caminhos e políticas que melhorem o nosso sistema representativo, teremos ainda pela frente,

por exemplo, as decisivas questões relativas aos partidos políticos e ao seu financiamento.

Depois virá o Estatuto dos Deputados, onde se inserem as iniciativas que o Bloco de Esquerda e o PCP

querem, agora, ver discutidas.

Terminando, deixo duas notas.

Primeira nota: se houver alguém disposto a corromper-se, não é por se proibir que deixará de o fazer.

Aplausos do PSD.

Tão ou mais importante que proibir é fiscalizar, e fiscalizar bem.

Segunda nota: a exclusividade pode tornar o eleito refém do partido político que o fez eleger.

Negligenciando a sua vida profissional, o eleito poderá ficar dependente do seu partido, perdendo liberdade e,

assim, ficar preso à representação exclusiva de uma ideologia, deixando para trás os anseios e os interesses

legítimos dos cidadãos que o elegeram.

Para terminar, deixo um pedido: que seja assumida, de uma vez por todas, a importância e a urgência

destas realidades e que, sem posições fechadas, seja possível, num momento mais adequado, fazer-se uma

profunda mudança da arquitetura do nosso sistema político de forma a serem encontradas as melhores e mais

consensuais soluções.

Será dessa reflexão e das escolhas feitas que resultará melhor ou pior democracia. E essa

responsabilidade, Sr.as

e Srs. Deputados, é nossa!

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Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro

Filipe Soares.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Fernando Negrão, reconheço que nos

mais de 8 minutos que durou a sua intervenção dedicou apenas pouco mais de 40 segundos a falar da

exclusividade. Por isso, a única nota que posso tirar é a de que o PSD quis discutir tudo menos a

exclusividade. Essa é a primeira das conclusões da sua intervenção.

Mas de todas as preocupações que teve, devo também estranhar uma situação concreta: é que anda tão

preocupado, mas não vimos, nenhuma vez, o PSD a apresentar propostas concretas para mudar a situação

atual.

Falou-nos, por exemplo, que a exclusividade não era uma solução. E porque é que não? Porque, para o Sr.

Deputado, poderia colocar os Deputados que estariam em exclusividade reféns dos interesses partidários.

Na sua bancada, há vários Deputados e Deputadas que não estão em exclusividade, porque a lei assim o

permite. Pergunto: algum deles violou a disciplina da bancada parlamentar numa votação ainda recente? Nós

percebemos que não foi por estarem ou deixarem de estar em exclusividade que tiveram mais liberdade para

terem uma opinião própria. É exatamente por isso que essa argumentação é a de quem não quer discutir o

assunto.

Falou-nos sobre a sua preocupação relativa à fiscalização necessária. Ainda hoje, o Sr. Presidente da

Comissão de Ética dizia aos órgãos de comunicação social que não se sabe, sequer, o número de Deputados

que estão em regime de exclusividade. Quer maior suspeição do que a do Presidente da Comissão de Ética

dizer publicamente que não sabe — ele, que deveria ter todo o conhecimento — se os Deputados estão ou

não em regime de exclusividade?

Com suspeições como estas, como é possível dizermos que não se debata a exclusividade agora, mas

depois, que se faça, antes, um guião, um calendário, para se debater essa matéria? Já sabemos que fazer um

calendário significa esta discussão ficar para as calendas!

Não, Sr. Deputado, 40 anos depois do 25 de Abril é na democracia e na sua qualidade que deve estar a

discussão, e este é o debate sobre essa qualidade. Os Deputados devem estar em regime de exclusividade.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Termino, Sr. Presidente.

Essa é que é a garantia da separação entre os interesses públicos e os interesses privados.

Sr. Deputado, pergunto-lhe, muito diretamente, se acompanha ou não a crítica do Presidente da Comissão

de Ética quando diz que acha inaceitável que haja Deputados que estejam disponíveis sete dias por semana

para os seus eleitores e que haja outros que têm a possibilidade de, afinal, estarem a tempo parcial, que pode

ser o tempo maioritário, a defender interesses que não do interesse público. Acha isso aceitável? Considera

que os Deputados são menos do que os membros do Governo,…

O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — … menos do que o Presidente da República no dever e no respeito

pela defesa do interesse público, ou considera que o Parlamento nacional é, afinal, menos do que o

Parlamento Europeu?

Aplausos do BE.

Protestos do PSD.

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O Sr. Presidente (António Filipe): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Negrão.

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado, antes de mais, há coisas que têm de ser

desmentidas, pelo que queria desmentir o facto de no Parlamento Europeu haver exclusividade. Sr. Deputado,

não há exclusividade no Parlamento Europeu! Portanto, não diga coisas que não são verdadeiras, em

Plenário, para os portugueses ouvirem!

Aplausos do PSD.

Protestos do BE.

Sr. Deputado, quero ainda, numa segunda nota, dizer-lhe o seguinte: o Bloco de Esquerda não está bem,

nós sabemos que não está bem. Basta ver o que aconteceu nas eleições autárquicas e o que aconteceu nas

últimas legislativas com o Bloco de Esquerda! Só isso justifica o facto de olharem para a frente e o pavor que

mostram, quando o fazem, pelos próximos resultados eleitorais. Só isso justifica virem com uma iniciativa

isolada para ser discutida aqui, no Plenário, quando o essencial e o importante é discutirmos o nosso sistema

político.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Isso, sim, é importante, Sr. Deputado, e não discutir uma árvore no

meio da floresta, como o senhor quer, por questões meramente eleitoralistas.

Aplausos do PSD.

Protestos da Deputada do BE Mariana Mortágua.

Só por questões eleitoralistas é que o senhor trouxe essa matéria à discussão.

Outra nota, Sr. Deputado: falou em disciplina partidária. É muito curioso o Bloco de Esquerda falar em

disciplina partidária! Que legitimidade é que o Bloco de Esquerda tem para falar em disciplina partidária

quando da vossa bancada nunca houve um voto dissonante?! Nunca houve, nunca!

Aplausos do PSD.

Vozes do PSD: — Nem uma vez!

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Nem haverá, Sr. Deputado! Temos a certeza que nunca tal veremos na

vossa bancada.

O Sr. Deputado deu o melhor exemplo de liberdade partidária, que foi o facto de um Deputado desta

bancada ter dado hoje uma entrevista com uma opinião diferente. Nesta bancada, isso acontece com toda a

frequência. E, Sr. Deputado, nesta bancada há um número significativo de Deputados que exercem as suas

funções em exclusividade, assim como há um número significativo de Deputados que não as exercem em

regime de exclusividade. Ou seja, felizmente, é uma bancada de gente livre, porque defendem, e defendemos,

uma sociedade livre. Nós não queremos uma sociedade de funcionários públicos!

Aplausos do PSD.

Porque numa sociedade só de funcionários do Estado a exclusividade é muito fácil.

Numa sociedade livre, na qual as pessoas tenham a liberdade de escolher o seu caminho profissional, não

é fácil! Não é fácil, porque correm o risco de ficar presas às máquinas partidárias a que pertencem, porque não

regressam ao Estado,…

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O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — … mas para funções de natureza privada, por exemplo. E é isso que faz

toda a diferença entre o vosso pensamento relativamente à sociedade e o nosso. O nosso é de homens e de

mulheres livres; o vosso não sei, tenho dúvidas.

Aplausos do PSD.

Protestos do BE.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Periodicamente, sobe ao Plenário

da Assembleia da República o debate sobre as incompatibilidades de Deputados e de altos cargos públicos e

a cena repete-se, e repete-se com a perda de força que resulta do facto de haver uma discussão sem ilação,

de haver uma discussão sem votação que culmine numa lei aprovada por uma maioria mais ou menos larga.

Aconteceu isso quando o projeto do Partido Socialista, no início da Legislatura — é no início da Legislatura

que estas coisas se resolvem para toda a sua duração ou, então, no fim da anterior —, que visava o reforço

das incompatibilidades, foi aprovado na generalidade, mas depois soçobrou, naufragou, na especialidade, na

1.ª Comissão, enfim de forma mais discreta, mas de forma eficaz.

A reforma proposta era no sentido de reforçar as incompatibilidades. E o debate na generalidade é

comovente — estive a relê-lo: houve, por parte de todas as bancadas, uma espécie de convergência positiva e

virtuosa, que depois se traduziu numa divergência, na hora de detalhar e de decidir, sem explicação bastante.

Ora, não é assim que as coisas se devem fazer.

Mas também não é deste outro modo: verifiquei, por uma rápida sondagem entre os elementos da

comunicação social, que estava muito espalhada a ideia de que o projeto do PCP e do Bloco de Esquerda

visava aplicar já uma série de restrições e impor já uma exclusividade a todos.

Lendo o projeto, tenho de fazer uma interpretação conforme à Constituição e entender que não visa aplicar-

se nesta Legislatura. Mas a dúvida pairou, e as pessoas perguntavam-me: «Diga lá, José Magalhães, se o PS

é a favor ou não de que se acabe já a situação de acumulação e que passe a haver Deputados em full-time e

a todo o vapor, todos e todas, sem exceção, com o mesmo regime». E eu respondia, sendo, em certo sentido,

o porta-voz dos autores do projeto: «Não, não, eles não têm essa ideia, isso é só para a próxima Legislatura».

Mas se é para a próxima Legislatura, para quê fazer esse debate agora?! Se é para a próxima Legislatura,

teremos ocasião de discutir muitos temas, designadamente estes, da reforma do sistema político, que

merecem discussão, mas não em cima de eleições, que são sempre más conselheiras, que fazem perder a

cabeça. Então, se o Governo anda de cabeça perdida, vamos deixar-nos contagiar?! Não, não nos deixemos

contagiar!

Portanto, a nossa ideia quanto a essa matéria é a de que esta é uma discussão absolutamente necessária

(tão necessária que nós próprios a trouxemos a Plenário na altura própria, e lamentamos muito que se tenha

perdido tanto tempo para chegarmos a um veredicto positivo), mas o Parlamento — e que, na sua génese,

está bem descrito na exposição sobre o 25 de Abril ontem inaugurada, e bem — não pode deixar que lhe

colem a imagem de que corta reformas, mas não é capaz de cortar privilégios. Seria injusto, porque temos

conseguido fazer reformas que cortam privilégios, e esse é o primeiro problema destas iniciativas. Não é

verdade que, nos últimos anos, não se tenham aprovado restrições importantes. Houve uma mudança positiva

e ela pode, dizemo-lo nós, ser ainda aperfeiçoada. E não nos limitamos a dizê-lo; propusemos iniciativas

nesse sentido e achamos que sabemos o que devemos propor para que isso melhore. Isso é muito importante,

mas é necessário ir mais longe.

Um segundo problema que se coloca é que o debate é feito com alguns cavando um fosso, que é um fosso

francamente desagradável e artificial, entre bancadas. É uma coisa do tipo: de um lado está toda a virtude e

do outro lado está todo o pecado — isto que estou a dizer é casual. É que, na realidade, não há fosso, aqui

não há fosso nessa matéria; Há divisões, há pontos de vista diferentes, mas não há fosso.

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Por exemplo, o Sr. Deputado Luís Montenegro está a olhar para mim com um olhar crítico e atento. É

insuportável, mas, por favor, não vamos confundir isso com a ideia de que é incapaz de votar uma reforma que

melhore as incompatibilidades. É capaz de votar, e esperemos que vote uma reforma desse tipo.

Protestos do Deputado do PCP João Oliveira.

Sr. Deputado João Oliveira, também há aqui matéria para si. O Sr. Deputado escreve no projeto de lei que

apresentou uma frase muito interessante e surpreendente, porque é uma frase genérica, que diz o seguinte:

«(…) o PS impôs inaceitáveis interpretações de certas normas do Estatuto para dar cobertura a situações

concretas existentes nas suas fileiras, interpretações essas que a atual maioria PSD/CDS aproveita e procura

perpetuar.»

O Sr. Deputado vai ter a gentileza de dizer, uma a uma, quais são essas exceções para nós percebermos.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Com nomes e tudo!

O Sr. José Magalhães (PS): — Com nomes e tudo!

É que, nesta matéria, não deve haver meias palavras, nem pagar o justo pelo pecador.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. José Magalhães (PS): — Então, se o Sr. Deputado entende que há alguma situação estranha,

aberrante, desagradável, etc., deve dizê-lo abertamente e nós consideraremos e o Presidente da Comissão de

Ética deve agir. O Presidente da Comissão de Ética não pode nem deve dizer que não sabe quantos

Deputados estão em exclusividade, porque basta ir aos canhenhos e consultar. Eu li hoje num jornal essa

informação.

Aplausos do PS.

Portanto, os nossos registos de interesses são consultáveis. E, um dia destes, as declarações, além de

estarem no Tribunal Constitucional, estarão na Internet. E não há nada a recear disso, é a transparência.

Assim sendo, Srs. Deputados, nesta matéria, temos de criar sobretudo um clima de reforma e uma

estrutura que impulsione essa matéria.

E, sobre isso, gostaria de dizer duas coisas, para acabar a intervenção neste ponto.

Em primeiro lugar, que não se trata uma doença complexa com uma mezinha mágica. A exclusividade não

é uma mezinha mágica. O Primeiro-Ministro está em exclusividade! O inexistente Secretário de Estado da

Cultura, Barreto, está em exclusividade — é uma inexistência política em exclusividade!

Risos do PS.

Não há aqui poção mágica nenhuma!

Aplausos do PS.

Eu até pagaria alguma coisa para o Primeiro-Ministro não estar em exclusividade e estar fora em part-time,

não empobrecendo o País!

Risos do PS.

Portanto, Srs. Deputados, a questão é esta: temos de ser certos e não dizer demagogicamente que há uma

mezinha e uma poção mágica.

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Por último, é necessário que apliquemos as nossas próprias leis. Os Deputados não são levados a sério se

deixam que os seus direitos estatutários sejam ofendidos e violados. Os Deputados têm de ter direitos e a

oposição tem de ver esses direitos respeitados, garantidos e, sobretudo, não gozados.

Devo dizer-vos que, hoje, ao ler um jornal, percebi que essa dimensão está um pouco perdida, e temos de

recuperá-la. Esse jornal publica um boletim alfandegário, o qual revela que um membro do Governo nos

mentiu — pelo menos um. Foi o membro do Governo que nos disse que um conjunto de obras de arte não

tinha entrado em Portugal há mais de 10 anos e que, portanto, não podia ser objeto de classificação. E nós,

enquanto Deputados, pedimos: «Deem-nos o documento»! Não deram. Insistimos: «Deem-nos o documento»!

Não deram. E, quando vi o documento, percebi porque é que não deram. É que esse documento prova, por a

mais b, que as obras entraram em Portugal há mais de 10 anos. Era por isso que não nos davam o

documento. Tenho aqui o documento.

Aplausos do PS.

E, então, Srs. Deputados, diz-se: «Isso é uma chalaça, é uma questão política, os políticos são assim; os

atos não têm consequências — não se dá um documento e não acontece nada; engana-se o Parlamento e

não acontece nada!»

Acontece, Srs. Deputados! A lei dos crimes de responsabilidade foi feita para isso. Eu ajudei a fazê-la. É

uma lei de aplicação em último caso, mas é de aplicação. Quando um elemento governamental esconde um

documento para que o Parlamento não exerça as suas competências, o que é isso? Eu digo: é obstrução à

justiça, é um ato grave; não é uma chalaça, não é uma piada. E nós tiraremos as ilações disto.

Portanto, Sr. Presidente, apelamos a que, nesta matéria, haja uma convergência, não haja qualquer fosso,

haja a verdade toda e haja um esforço conjunto para garantirmos aos Deputados e aos outros um Estatuto

digno, assente na verdade e na competência.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Anjinho.

A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: As iniciativas hoje em

discussão, como bem se vê, não são novas.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — A do Bloco de Esquerda é nova!

A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — Já lá chegarei, Sr. Deputado!

Estas iniciativas retomam essencialmente propostas apresentadas por duas vezes, uma em cada sessão

legislativa, propõem, no essencial (mesmo com algumas alterações da parte do Bloco de Esquerda, que

amadureceu ideias), exatamente o mesmo, e têm por base as mesmas preocupações, pelo que, logicamente,

em nome da mesma coerência, não terão, da parte do CDS, um desfecho formal e substancialmente diferente.

A este respeito, permitam-me, a título introdutório e com frontalidade, dizer seguinte: no caso dos partidos

proponentes, coerência não significa necessariamente correção. Fazer sempre o mesmo, nada alterar — e,

muito pelo contrário, até agudizar o discurso, como acontece com a iniciativa do BE — e esperar resultados

diferentes não nos parece a forma mais séria e construtiva de debater estas questões, o que nos faz

inclusivamente questionar sobre as suas verdadeiras motivações.

De qualquer forma, da nossa parte — e acho que devem reconhecê-lo —, nunca nos furtámos, nem nunca

nos furtaremos, a debater seriamente estas matérias, tanto que, no passado, já assumimos importantes

lideranças neste debates.

Mas que fique bem claro que hoje, tal como no passado, aquilo que nos move não é, de forma alguma,

qualquer demagogia populista, mas a defesa do Estado de direito, ancorado na democracia e em instituições

sólidas, inevitavelmente dependentes de um exercício responsável do poder legislativo.

Mas passemos da forma à substância. Como já dissemos, o exercício de funções públicas, seja por parte

de titulares de cargos políticos, seja por parte de titulares de cargos públicos, deve pautar-se, em toda e

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qualquer circunstância, pelo rigor, pelos princípios da transparência e da fiscalização da sua atividade por

parte dos cidadãos, pelo que, isso sim, comungamos inteiramente das preocupações, de alguma forma

vertidas nestas propostas, em reforçar o escrutínio e a transparência relativamente à atividade dos respetivos

titulares.

Todavia, como também já o dissemos no passado, mesmo que hoje, face ao proposto, em particular pelo

Bloco de Esquerda, o digamos proporcionalmente com mais intensidade, não comungamos das soluções

propostas, soluções que, numa postura restritiva, contrariam em absoluto a nossa visão de democracia e de

sistema representativo.

A este respeito, Sr.as

e Srs. Deputados, não deixa de ser curioso que os partidos que mais invocam os

valores de Abril e, em particular, o valor da liberdade, sejam exatamente os que hoje, nesta Casa, mais

apelam à sua restrição — supostamente em nome dessa mesma liberdade…

Então, para avaliar da justiça e da equidade destas propostas, façamos duas perguntas essenciais: porquê

e em nomedo quê?

Isto, porque — e julgo que, a este respeito, todos estamos transversalmente de acordo —, para restringir

direitos e liberdades conquistados e constitucionalmente consagrados, há que respeitar certos princípios

fundamentais, como seja o princípio da proporcionalidade, pelo que, estando em causa restrições, há que

olhar para a respetiva fundamentação e ponderar, ou seja, decidir se o que nos propõem é, de facto,

adequado e a melhor solução — menos restritiva —, face ao fim visado.

Protestos do Deputado do PCP Jorge Machado.

E porquê? Numa palavra: suspeitas.

Reporto-me, para este efeito, a uma frase da Sr.ª Deputada Cecília Honório, no debate do ano passado (e

isto com a consciência de que, de lá para cá, amadureceram ideias e passaram de uma mera ideia

interessante de exclusividade, no ano passado, a uma proposta concreta e supostamente solucionadora de

todos os problemas). Disse a Sr.ª Deputada o seguinte: «Um quadro de suspeitas que se vai agravando

crescentemente, muito cavalgado pelo discurso populista…» — ainda bem que o reconhece — «… e,

infelizmente, fundamentado em situações concretas».

Ora, vamos, então, partir deste quadro e perceber o que temos, o que não temos, a justiça do que hoje

debatemos e o que podemos ou devemos fazer.

Primeiro cenário: suspeitas infundadas, o que me parece ser claramente a regra e, aliás, assumida pelo

próprio Bloco.

Resposta: esclareça-se, atue-se e responsabilize-se, nomeadamente, e em particular, no quadro da atual

estrutura e das competências da Assembleia da República — como dizia, e muito bem, o Sr. Deputado do

Partido Socialista.

Aliás, Sr. Deputado, concordo inteiramente quando afirma, e sempre afirmaram, que um problema desta

natureza não afeta apenas o Deputado a, b ou c, mas toda uma instituição, pelo que, se há regras e há

procedimentos, havendo pessoas responsáveis pela respetiva aplicação e fiscalização, então também

devemos exigir responsabilidade, diligência e transparência no exercício e na defesa destas funções,

nomeadamente, e em particular, no quadro desta Assembleia.

Mas admito que, neste campo, pode ser feito mais e melhor, só não me parece que seja por via restritiva.

As declarações do Sr. Presidente da Comissão de Ética assim o denunciam.

Passemos, então, ao segundo cenário: suspeitas fundadas.

Ora, relativamente a este caso, não tenho dúvidas na resposta: denuncie-se, investigue-se, acuse-se,

julgue-se e condene-se,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Já lhe mostro!

A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — … para então — e só então — refletirmos sobre a expressividade

deste problema e, naturalmente, sobre a pertinência legislativa, seja quanto ao meio, seja quanto à adequação

do meio para o fim em si.

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A exclusividade, Sr.as

e Srs. Deputados, não significa necessariamente mais trabalho ou melhor qualidade

nesse seu trabalho.

A exigência de democracia reside na avaliação que é feita em particular pelo povo da qualidade do trabalho

individual de cada Deputado.

Não pode haver maior erro, por mais justificável que seja, do que confundir a parte com o todo e querer

alterar o sistema representativo por causa de quem não o representa.

Não podemos, não devemos, particularmente nesta matéria, propor restrições desta natureza sem ter uma

justificação objetiva, razoável, proporcional e adequada. E aqui entra a ponderação não só do porquê mas do

para quê.

Sr.as

e Srs. Deputados, pela nossa parte, feita esta reflexão, percebendo que em causa está muito mais do

que o exercício do mandato de Deputado, está toda uma visão de democracia e de sistema representativo,

não temos qualquer melindre em afirmar que, a nosso ver, as soluções propostas — em particular a da

exclusividade — não parecem ser objetivas, razoáveis, proporcionais e, nessa medida, adequadas aos fins.

Partem de uma realidade que, se preocupante, baseia-se mais em perceções do que em factos, pelo que deve

ser lida sempre com algum cuidado.

Assumem um ponto de partida e de chegada persecutórios, uma presunção de culpa, com clara inversão

do ónus da prova em relação ao exercício do mandato de Deputado e à sua subjugação aos interesses

privados e ao poder económico.

Entendem, a meu ver de forma profundamente utópica e demagógica, que a transparência e independência

serão — e apenas podem ser — garantidas estando o Deputado a tempo inteiro e em dedicação exclusiva.

A este respeito o Bloco de Esquerda fala inclusivamente em «tolerância zero». Srs. Deputados e Sr.as

Deputadas, esta para mim, confesso, é uma novidade, pois falar em «tolerância zero» é admitir que o Bloco de

Esquerda reconhece e pratica essa tolerância e, a esse respeito, permitam-me clarificar que, da parte do CDS,

não há, nunca houve, nem nunca haverá, qualquer tolerância nesta matéria.

Resumindo: não nos parece que esta seja a melhor forma de qualificar a democracia. Estas propostas

afiguram-se inadequadas e ineficazes em função dos fins visados.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — Estas iniciativas procuram legislar sobre algo que se situa no domínio

da ética e, nessa matéria, devemos ter em conta que o direito é e será sempre limitado.

E mais: nesta matéria devemos olhar para os instrumentos que temos e podemos e devemos fazer melhor,

nomeadamente no que se refere a clarificar os registos de interesses, de modo garantir maior acuidade e

transparência na atividade do Deputado e, obviamente, clarificar o exercício dos direitos e deveres dos

Deputados no quadro da fiscalização que decorre do Regimento e do mandato.

Termino, como, aliás, sempre terminei, dizendo que estamos disponíveis para discutir mais regras, mais

transparência, mas não estamos disponíveis, nem nunca estaremos, para restringir indevidamente, de forma

avulsa e incoerente, liberdades fundamentais.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma segunda intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João

Oliveira.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, relativamente à matéria da

exclusividade, quero dizer que o Grupo Parlamentar do PCP já apresentou, noutra ocasião, uma proposta

nesse sentido e mantemos a nossa convicção de que o mandato parlamentar deve ser a atividade principal, e

não secundária, de quem é eleito para essas funções e não deve ser instrumental de outras prioridades ou

interesses. Portanto, não discordamos do princípio que é afirmado pelo projeto do Bloco de Esquerda. De

resto, é prática dos Deputados do Grupo Parlamentar do PCP manterem a função de Deputado como a

principal função, e não como a secundária ou subordinada a outros interesses.

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Sr.as

e Srs. Deputados, sobre a matéria de incompatibilidades e impedimentos, o PCP apresenta soluções

concretas de alteração à lei para resolver problemas que configuram, de facto, situações obscuras, de

promiscuidade entre interesses económicos e o poder político.

O Sr. Deputado José Magalhães pede exemplos com nomes e eu dou-lhe. O Deputado António Vitorino

integrava uma sociedade de advogados contratada pela Galp para fazer negociações com a ENI. Não está em

causa uma situação de impedimento?! Trata-se de um Deputado que é contratado, por via da sociedade de

advogados, para representar uma empresa com capitais públicos na negociação com uma empresa privada,

destinada à privatização! Suscitámos esta questão na Comissão de Ética e os senhores deram cobertura a um

entendimento diferente do Estatuto dos Deputados.

Dou-lhe mais exemplos: o Deputado Vitalino Canas, quando há uns anos foi contratado como Provedor

para o Trabalhador temporário, pela Associação Portuguesa das Empresas de Trabalho Temporário, veio

anunciar a necessidade de um conjunto de alterações à legislação laboral. Anunciou que estava, enquanto

Provedor, em representação da associação de empresas de trabalho temporário, a estabelecer protocolos

com a Secretaria de Estado das Comunidades Portuguesas, com a Inspeção-Geral do Trabalho, ou seja, com

entidades que ele, enquanto Deputado, tinha obrigação de fiscalizar. Nós suscitámos a questão na Comissão

de Ética e o Partido Socialista deu cobertura a estas situações.

Queria exemplos com nomes? Aqui os tem, Sr. Deputado José Magalhães!

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem de concluir, Sr. Deputado.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Vou concluir, Sr. Presidente.

Vou dar ainda outro exemplo, mas não vou referir o nome do Sr. Deputado em causa porque esta questão

nunca foi levada à Comissão de Ética e, portanto, vou poupar-me a fazê-lo: uma sociedade de advogados fez

uma contratação e anunciava que fulano tal é «o novo consultor jurídico da sociedade. A sociedade pretende

com esta contratação prestar o melhor serviço aos clientes, conjugando uma perspetiva técnico-jurídico do

direito com uma abordagem prática a esta área. O advogado encontra-se atualmente a coordenar um grupo de

trabalho com a missão de discutir de discutir na Assembleia da República um novo Código de Processo Civil».

Sr.as

e Srs. Deputados, pergunto se, no vosso entendimento, isto levanta ou não suspeitas em relação à

forma como os Deputados exercem estas funções. Estas situações, objetivamente, levantam suspeitas.

Temos necessariamente de clarificar que, quando tomamos decisões na Assembleia da República, tomamo-

las por convicções políticas.

Sr. Deputado José Magalhães, combatemos esta situação politicamente, não levantámos qualquer suspeita

do que quer que seja, combatemos politicamente as opções de discussão do Código do Processo Civil com

base nessa circunstância concreta.

Porém, estas situações não podem acontecer e elas só não acontecerão se o Estatuto dos Deputados for

alterado, em vez de se manter como está atualmente.

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, houve dois argumentos que

foram repetidos à exaustão e creio que vale a pena retribuir as acusações porque ver-se-á que eles não têm

motivação nenhuma para existir.

O primeiro é o de que esta iniciativa tem um cariz eleitoralista. É falso!

Vozes do CDS-PP: — Não, não tem! Nem o BE alguma vez faria isso! Não vai haver eleições!

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — É clara e manifestamente falso e é a tentativa de não se discutir o

essencial! Creio que essa tentativa de não se discutir o essencial ficou bem clara em algumas das

intervenções que ouvirmos.

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É necessário requalificar a democracia. É uma exigência. E o timing mais oportuno para o fazer é o dos 40

anos do 25 de Abril e o da exigência democrática que esse legado da democracia nos traz.

Há uma segunda acusação, no mínimo esotérica, que é a ideia das liberdades. Agora, pelos vistos, há uma

tentativa do Bloco de Esquerda de retirar as liberdades aos Deputados!

Sr.as

e Srs. Deputados, atualmente já existem restrições à função de Deputado, que é incompatível com

outros cargos e funções, e há necessidade de cumprir as regras que estão previstas no Estatuto dos

Deputados. Não venham dizer que há uma alteração na perspetiva que existe sobre esta matéria. Não! É o

caso clássico em que a liberdade de uns choca com a liberdade dos outros. Enquanto cidadão, tenho direito a

que não haja nenhum eleito que coloque a liberdade dele acima da minha e acima do vínculo que ele tem para

com a causa pública. É exatamente disto que estamos a falar e é essa obrigação que tem. Não se trata de

restringir a liberdade, trata-se de garantir que a liberdade dos Deputados não viola nem torna promiscua a

relação que existe com o interesse público, nem torna, noutro contexto, mais válido o interesse privado do que

o interesse público.

Srs. Deputados, há um último ponto que quero deixar bem claro, que foi notório na intervenção de hoje do

Partido Social Democrata e também nas declarações quer do CDS quer do Partido Socialista, mais deste

partido, que tem a ver com o número de Deputados.

Pelos vistos, o PSD não está preocupado com o facto de haver Deputados que de manhã podem estar no

escritório de advogados, reunidos com privados, e à tarde vêm fazer as leis de acordo com os interesses

privados. Isto é normal, pode aceitar-se e deixa-se andar.

Protestos do PSD.

O que é inaceitável para o PSD e merece uma reflexão, é haver um número excessivo de Deputados,

quando, comparando Portugal com todos os países com uma câmara legislativa, temos o menor número de

Deputados por habitante em toda a União Europeia.

Ora, o que não é um problema é o que o PS diz que é o problema e aquele que é o problema é a situação

que o PS, o PSD e o CDS não querem resolver.

Da nossa parte, o vínculo ao interesse público é que deve nortear todas e todos os eleitos, e esse vínculo

ficará mais protegido com a obrigação já existente para outros órgãos de soberania e, creio, com aquela que é

a exigência de toda a democracia em Portugal, a de que os Deputados exerçam o seu cargo em regime de

exclusividade.

Aplausos do BE.

O Sr. José Magalhães (PS): — Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. José Magalhães (PS): — Sr. Presidente, é para defender a honra da bancada em relação às

declarações do Sr. Deputado João Oliveira.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Oliveira, o Sr. Deputado não devia dar

lições de transparência ao Grupo Parlamentar do PS, desde logo porque o Grupo Parlamentar do PS foi

aquele que, tendo uma maioria largamente absoluta e sem empurrões, garantiu, por exemplo, o acesso via

Internet aos registos de interesse dos Deputados. Fizemo-lo em homenagem a um princípio que é nosso.

Aplausos do PS.

Nessa matéria, Sr. Deputado, poupe-nos essa pequena lição a esta hora.

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Mas, Sr. Deputado, progredimos, porque, no vosso projeto de lei, o Sr. Deputado referia, de maneira

redonda, que o PS tinha imposto inaceitáveis interpretações de certas normas do Estatuto para dar cobertura

a situações concretas nas suas fileiras, e que o PSD tinha ido pelo mesmo caminho.

Quanto ao PSD e ao CDS-PP, pelos vistos estão ilibados, porque o Sr. Deputado não citou caso algum e,

portanto, esse caminho não existe em sítio nenhum ou, pelo menos, o Sr. Deputado não o referiu — já é meio

caminho!…

Mas o Sr. Deputado não resistiu a fazer o contrário do que o decoro parlamentar e a boa ética aconselham.

Quando, no Reino Unido, no caso Miller, aconteceu o que aconteceu, o Deputado que tinha dados levou-os à

comissão de ética, a comissão de ética investigou, a comissão de ética ouviu, a comissão de ética apurou e o

resultado é o que se vê. O Sr. Deputado opta por infamar dois camaradas meus com toda a calma.

Uma voz do PCP: — Não é verdade!

O Sr. José Magalhães (PS): — Infelizmente, é verdade. Infamou-os de maneira completamente sumária —

é uma espécie de splash nesta matéria —, com coisa nenhuma, a não ser uma afirmação sua.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Já o vou desmentir!

O Sr. José Magalhães (PS): — É que esses casos que o Sr. Deputado agora afirma que existem são

expressões e situações concretas em que a Assembleia da República nada apurou,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Falso!

O Sr. José Magalhães (PS): — …nada concluiu, apenas acontece que o Sr. Deputado não está de acordo.

O Sr. João Oliveira (PCP): — É falso!

O Sr. José Magalhães (PS): — E o acordo do Sr. Deputado ainda não é lei.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado, já concluiu o seu tempo, pelo que tem de terminar.

O Sr. José Magalhães (PS): — Portanto, nesta matéria, Sr. Presidente e Srs. Deputados, devemos ter

cuidado, prudência e não atirar pedras à toa, porque isso ofende pessoas em concreto e é a pior forma de

discutir a reforma do Estatuto dos Deputados ou, de resto, de discutir política em geral.

O Sr. Deputado não pode emitir juízos desse tipo como antigamente os papas emitiam bulas e anátemas.

O anátema não leva a sítio nenhum e a pedrada à toa não leva a sítio nenhum.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Magalhães, não sei se o Sr. Deputado

estava predisposto a receber alguma lição mas a minha intenção não era dar lições a ninguém, era firmar uma

posição política relativamente a esta matéria. Alias, foi o Sr. Deputado que me pediu, dizendo: «concretize o

que querem dizer». Ora, concretizei.

Mais: não sei se a memória parlamentar do Sr. Deputado José Magalhães já começa a fraquejar assim

tanto,…

O Sr. José Magalhães (PS): — Agora estamos no alzheimer?!

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O Sr. João Oliveira (PCP): — … mas quero dizer-lhe que a Assembleia da República tratou destas duas

questões, porque, quer em relação ao Sr. Deputado António Vitorino, quer em relação ao Sr. Deputado Vitalino

Canas, o PCP levou essa matéria à Comissão de Ética, onde foram discutidas estas questões,…

O Sr. José Magalhães (PS): — E o que é que aconteceu?!

O Sr. João Oliveira (PCP): — … e a Comissão tomou posição, apurou. Ao contrário do que disse o Sr.

Deputado José Magalhães, a Comissão de Ética apurou.

O Sr. José Magalhães (PS): — E?!…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Em ambas as situações, apurou com a opinião exclusiva do Partido

Socialista no sentido da admissibilidade dessas situações. Todos os outros grupos parlamentares se

recusaram a votar a favor da opinião que os Srs. Deputados impuseram naqueles relatórios da Comissão de

Ética.

Por isso, não retiro uma vírgula ao que está escrito no nosso projeto de lei.

O PS deu cobertura a situações que são incompatíveis, ou que são impedimentos, e deu cobertura a uma

interpretação do Estatuto dos Deputados que também dá cobertura a situações que, obviamente, o PSD e o

CDS, nesta legislatura, já aproveitaram também noutras circunstâncias, nomeadamente em situações em que

foi colocada a possibilidade de haver autorizações aos Srs. Deputados, ou pareceres favoráveis, para que

exercessem determinadas atividades.

Portanto, Sr. Deputado José Magalhães, lamento que a sua memória parlamentar não tenha tido em

consideração estas duas circunstâncias, mas o PCP tratou destas questões com todo o rigor, levando as

questões à Comissão de Ética. Os senhores é que impuseram uma interpretação que subverte por completo

as regras das incompatibilidades e dos impedimentos.

É uma opção vossa, podem fazê-la, mas têm de assumir a responsabilidade.

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Srs. Deputados, está concluído o debate. Vamos, então, entrar no

período regimental de votações.

Antes de mais, vamos proceder à verificação do quórum, utilizando o sistema eletrónico.

Os Srs. Deputados que, por qualquer razão, não o puderam fazer, terão de o sinalizar à Mesa e depois

fazer o registo presencial, para que seja considerada a respetiva presença na reunião.

Pausa.

O quadro eletrónico regista 208 presenças, às quais se acrescentam os Srs. Deputados Abel Baptista, do

CDS-PP, Jorge Fão, do PS, e Jorge Paulo Oliveira, do PSD, perfazendo 211 Deputados presentes, pelo que

temos quórum para proceder às votações.

Srs. Deputados, vamos proceder à votação do voto n.º 186/XII (3.ª) — Pela participação dos soldados

portugueses na batalha de La Lys na I Grande Guerra (PS, PSD e CDS-PP), que vai ser lido pela Sr.ª

Secretária Rosa Maria Albernaz.

A Sr.ª Secretária (Rosa Maria Albernaz): — Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, o voto é do seguinte teor:

«Celebrou-se no passado dia 12 de abril mais uma homenagem à participação dos soldados portugueses

na batalha de La Lys, 9 de abril de 1918, com cerimónias no cemitério militar português de Richebourg e no

município de La Couture, onde foi erguido um monumento aos soldados portugueses.

Foram cerimónias a que acorreram muitos franceses e portugueses residentes em França, que assim

também se quiseram associar a esta importante homenagem. As autoridades oficiais francesas e portuguesas

prestaram mais uma vez uma sentida e comovente homenagem aos militares portugueses que combateram

ao lado dos Aliados em defesa da liberdade da França e da Europa.

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A participação do Corpo Expedicionário Português na I Grande Guerra insere-se num dos mais marcantes

contextos e acontecimentos na História da Europa e de Portugal. Perante uma ofensiva avassaladora dos

exércitos alemães, mais de 7000 portugueses perderam a vida só nos campos de La Lys.

A evocação, em França, deste acontecimento na I Grande Guerra é uma forma de manifestar um sentido

reconhecimento pelo apoio dado pelos soldados portugueses e pela sua coragem e heroicidade que

demonstraram.

É, por isso, importante que também em Portugal haja um reconhecimento adequado do valor daqueles

portugueses que, num contexto nacional e internacional complexo e instável, combateram em condições muito

difíceis e precárias mas que defenderam até aos limites da resistência humana a missão que lhes foi

destinada. É uma forma de os resgatar ao esquecimento e de honrar os que estiveram nos campos de batalha

e foram vítimas dessa guerra. É também uma forma de honrar as suas famílias e descendentes.

Assim, num gesto pela participação valerosa dos militares portugueses na batalha de La Lys e na I Grande

Guerra, a Assembleia da República exprime um profundo reconhecimento a todos os portugueses que

defenderam a liberdade da França e da Europa e por ela deram a sua vida. O recurso à guerra nunca é uma

solução. O exemplo desses valerosos soldados deve servir sempre para isso nos recordar.»

O Sr. Presidente (António Filipe): — Srs. Deputados, vamos proceder à votação do voto que acabou de

ser lido.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PS e do CDS-PP, votos contra do BE e

abstenções do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, dá-me licença que use da palavra?

O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado, para que efeito?

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, é para indicar que a bancada do Bloco de Esquerda irá

apresentar, por escrito, uma declaração sobre a votação anterior.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, dá-me licença que use da palavra?

O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado, para que efeito?

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, é para o mesmo efeito. Apresentaremos uma declaração de

voto.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Srs. Deputados, vamos passar agora à votação, na generalidade, do

projeto de lei n.º 437/XII (2.ª) — Alteração à Lei n.º 30/84, de 5 de setembro, alterada pelas Leis n.os

4/95, de

21 de fevereiro, 15/96, de 30 de abril, e 75-A/97, de 22 de julho, e pela Lei Orgânica n.º 4/2004, de 6 de

novembro (Lei-Quadro do Sistema de Informações da República Portuguesa — SIRP) (PSD e CDS-PP).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD e do CDS-PP, votos contra de Os Verdes e

da Deputada do PS Isabel Santos e abstenções do PS, do PCP e do BE.

O projeto de lei baixa à 1.ª Comissão.

Vamos proceder à votação, na generalidade, do projeto de lei n.º 438/XII (2.ª) — Primeira alteração à Lei

n.º 9/2007, de 19 de fevereiro, que estabelece a orgânica do Secretário-Geral do Sistema de Informações da

República Portuguesa, do Serviço de Informações Estratégicas de Defesa (SIED) e do Serviço de Informações

de Segurança (SIS) e revoga os Decretos-Leis n.os

225/85, de 4 de julho, e 254/95, de 30 de setembro (PSD e

CDS-PP).

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Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD e do CDS-PP, votos contra de Os Verdes e

da Deputada do PS Isabel Santos e abstenções do PS, do PCP e do BE.

O projeto de lei baixa à 1.ª Comissão.

Votamos agora, na generalidade, o projeto de lei n.º 465/XII (3.ª) — Aprova o regime do segredo de Estado

(PSD e CDS-PP).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD e do CDS-PP, votos contra do BE e de Os

Verdes e abstenções do PS e do PCP.

O projeto de lei baixa à 1.ª Comissão.

Passamos à votação, na generalidade, do projeto de lei n.º 466/XII (3.ª) — Cria a entidade fiscalizadora do

regime de segredo de Estado (PSD e CDS-PP).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD e do CDS-PP, votos contra de Os Verdes e

abstenções do PS, do PCP e do BE.

O projeto de lei baixa à 1.ª Comissão.

Votamos agora, na generalidade, o projeto de lei n.º 302/XII (2.ª) — Cria a Comissão da Assembleia da

República para a Fiscalização do Sistema de Informações da República Portuguesa (PCP).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PCP, do BE e de Os Verdes e abstenções do

PSD, do PS e do CDS-PP.

O projeto de lei baixa à 1.ª Comissão.

Vamos votar, na generalidade, o projeto de lei n.º 553/XII (3.ª) — Primeira alteração à Lei n.º 6/94, de 7 de

abril, que aprova o regime do segredo de Estado (PCP).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PCP, do BE e de Os Verdes e abstenções do

PSD, do PS e do CDS-PP.

O projeto de lei baixa à 1.ª Comissão.

Votamos agora, na generalidade, o projeto de lei n.º 554/XII (3.ª) — Regime das matérias classificadas

(PS).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS e abstenções do PSD, do CDS-PP, do PCP,

do BE e de Os Verdes.

O projeto de lei baixa à 1.ª Comissão.

Vamos proceder agora à votação, na generalidade, do projeto de lei n.º 555/XII (3.ª) — Regime do segredo

de Estado (PS).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS e abstenções do PSD, do CDS-PP, do PCP,

do BE e de Os Verdes.

O projeto de lei baixa à 1.ª Comissão.

Vamos votar, na generalidade, o projeto de lei n.º 556/XII (3.ª) — Protege a missão do SIRP e o segredo de

Estado, criando inibições ao vínculo imediato e reforçando direitos fundamentais em processo judicial

(Primeira alteração à Lei n.º 9/2007, de 19 de fevereiro, e quinta alteração à Lei n.º 30/84, de 5 de setembro)

(BE).

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Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PCP, do BE e de Os Verdes e abstenções do

PSD, do PS e do CDS-PP.

O projeto de lei baixa à 1.ª Comissão.

Procedemos agora à votação do projeto de resolução n.º 986/XII (3.ª) — Recomenda ao Governo a criação

de um programa especial para a regeneração das ilhas do Porto (PS).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes e abstenções

do PSD e do CDS-PP.

Vamos votar o projeto de resolução n.º 1008/XII (3.ª) — Recomenda ao Governo a promoção da

regeneração de estruturas típicas urbanas em condições de precariedade habitacional (PSD e CDS-PP).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do CDS-PP, do PCP, do BE e de Os Verdes

e a abstenção do PS.

Passamos a votar o projeto de resolução n.º 1010/XII (3.ª) — Recomenda a criação de programa especial

de reabilitação das ilhas e centro histórico do Porto (BE).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP, votos a favor do PCP, do BE e

de Os Verdes e a abstenção do PS.

Srs. Deputados, vamos votar, na generalidade, o projeto de lei n.º 551/XII (3.ª) — Altera o Estatuto dos

Deputados, tornando obrigatório o regime de exclusividade para Deputados à Assembleia da República (BE).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD, do PS e do CDS-PP e votos a favor do PCP,

do BE e de Os Verdes.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Conceição Bessa Ruão.

A Sr.ª Conceição Bessa Ruão (PSD): — Sr. Presidente, anuncio que, em meu nome e em nome dos

Deputados Eduardo Teixeira, Maria Manuela Tender e Graça Mota, apresentaremos uma declaração de voto

por escrito sobre esta votação.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Fica registado, Sr.ª Deputada.

Vamos votar, na generalidade, o projeto de lei n.º 552/XII (3.ª) — Altera o Estatuto dos Deputados e o

Regime Jurídico de Incompatibilidades e Impedimentos dos Titulares de Cargos Políticos e Altos Cargos

Públicos (PCP).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD, do PS e do CDS-PP e votos a favor do PCP,

do BE e de Os Verdes.

Tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Filipe Marques.

O Sr. Duarte Filipe Marques (PSD): — Sr. Presidente, é para anunciar que, em meu nome e em nome do

Sr. Deputado Cristóvão Norte, apresentaremos uma declaração de voto por escrito sobre as duas últimas

votações.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Fica registado, Sr. Deputado.

Tem a palavra o Sr. Deputado Mendes Bota.

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O Sr. Mendes Bota (PSD): — Sr. Presidente, é também para anunciar que, em relação aos projetos de lei

n.os

551/XII (3.ª) e 552/XII (3.ª), irei apresentar uma declaração de voto por escrito.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Fica registado, Sr. Deputado.

Tem a palavra o Sr. Deputado Sérgio Azevedo.

O Sr. Sérgio Azevedo (PSD): — Sr. Presidente, é para o mesmo efeito.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Fica registado, Sr. Deputado.

Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Paulo Figueiredo.

O Sr. Rui Paulo Figueiredo (PSD): — Sr. Presidente, é para anunciar que, em meu nome e em nome do

Sr. Deputado António Cardoso, apresentaremos uma declaração de voto por escrito sobre as duas últimas

votações.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Fica registado, Sr. Deputado.

Srs. Deputados, vamos passar à votação, na generalidade, do projeto de lei n.º 228/XII (1.ª) — Regime

jurídico da partilha de dados informáticos (PCP).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD, do PS e do CDS-PP e votos a favor do PCP,

do BE e de Os Verdes.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Inês de Medeiros.

A Sr.ª Inês de Medeiros (PS): — Sr. Presidente, quero anunciar que o Partido Socialista apresentará uma

declaração de voto por escrito sobre a votação que teve agora lugar.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Fica registado, Sr.ª Deputada.

Tem a palavra o Sr. Deputado Michael Seufert.

O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Sr. Presidente, é também para informar que apresentarei, em nome

pessoal, uma declaração de voto sobre a votação que acabou de ser efetuada.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Fica registado, Sr. Deputado.

Srs. Deputados, vamos votar o projeto de resolução n.º 953/XII (3.ª) — Recomenda ao Governo a

concretização de medidas para o setor do aluguer de equipamentos industriais (PCP).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, vamos votar o projeto de resolução n.º 941/XII (3.ª) — Cria um plano de emergência social

no distrito do Porto (PCP).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PS, do PCP,

do BE e de Os Verdes.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Sr. Presidente, relativamente à votação que iremos fazer de seguida,

pretendo fazer uma retificação ao que consta do guião: o projeto de resolução n.º 759/XII (2.ª) é da autoria do

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PSD e não do PCP, como consta do guião, sendo, sim, o projeto de resolução n.º 924/XII (3.ª) da autoria do

PCP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Srs. Deputados, vamos, então, proceder à necessária correção.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Emília Santos.

A Sr.ª Emília Santos (PSD): — Sr. Presidente, quero anunciar que, em meu nome e em nome de um grupo

de Deputados do PSD eleitos pelo círculo eleitoral do Porto, iremos apresentar uma declaração de voto por

escrito relativa à votação do projeto de resolução n.º 941/XII (3.ª).

O Sr. Presidente (António Filipe): — Com certeza, Sr.ª Deputada.

Srs. Deputados, vamos agora proceder à votação do texto de substituição, apresentado pela Comissão de

Economia e Obras Públicas, relativo aos projetos de resolução n.os

759/XII (2.ª) — Recomenda ao Governo a

criação de um regime específico de navegação nos estuários dos rios (PSD), e 924/XII (3.ª) — Libertação da

via da água e transporte não regular em estuários (PCP).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, quero anunciar que o PCP apresentará uma declaração de

voto por escrito sobre a votação que acaba de ter lugar.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Com certeza, Sr. Deputado.

Srs. Deputados, vamos agora proceder à votação final global do texto final, apresentado pela Comissão de

Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo à proposta de lei n.º 204/XII (3.ª) — Aprova

o procedimento extrajudicial pré-executivo.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD e do CDS-PP, votos contra do PCP e de Os

Verdes e abstenções do PS e do BE.

Srs. Deputados, segue-se um requerimento, apresentado pelo PCP, de avocação da votação, na

especialidade, das propostas de eliminação dos artigos 2.º, 3.º e 4.º e de aditamento de um artigo 2.º-A do

texto final, apresentado pela Comissão de Orçamento, Finanças e Administração Pública, relativo à proposta

de lei n.º 211/XII (3.ª) — Modifica o valor dos descontos a efetuar para os subsistemas de proteção social no

âmbito dos cuidados de saúde, concretamente da Direção-Geral de Proteção Social aos Trabalhadores em

Funções Públicas (ADSE), dos Serviços de Assistência na Doença (SAD) e da Assistência na Doença aos

Militares das Forças Armadas (ADM).

Para apresentar o requerimento, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Machado.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, o PCP chama a Plenário as propostas

apresentadas em sede de discussão na especialidade em que o PCP propõe a eliminação dos aumentos dos

descontos para a ADSE, para a SAD e para a ADM.

Estes aumentos dos descontos são um novo assalto aos rendimentos dos trabalhadores e reformados da

Administração Pública num quadro em que estes já perderam mais de 30% dos seus rendimentos.

O Governo PSD/CDS, desde o início das suas funções, aumentou estes descontos para a ADSE, a SAD e

a ADM em 133%, provocando um grande rombo no orçamento familiar dos trabalhadores.

Assim, PSD e CDS-PP utilizam a ADSE, a SAD e a ADM como um instrumento para cortar salários e

reformas. Mas, mais: o Governo transforma uma contribuição num imposto, uma vez que se, por um lado,

aumentam as contribuições, por outro, desviam 50% das contribuições das entidades públicas para os cofres

do Estado.

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E nem aquele que é o reconhecimento, por parte da maioria PSD/CDS-PP, da existência do problema e da

tentativa manca de o resolver em sede de discussão na especialidade com a proposta que apresentaram

resolve o problema da inconstitucionalidade que o PCP aqui denuncia.

O PCP propõe a eliminação destas transferências para os cofres do Estado de contribuições que são da

ADSE, da SAD e da ADM.

Por fim, com esta proposta de lei, fica provado que o que o Governo quer fazer e aquilo que o Governo diz

sobre o facto de a troica ir sair, de as coisas estarem melhores, de que não haverá novos cortes, tudo não

passa de uma gigantesca mentira e não corresponde à verdade.

Aqui está um novo corte, um novo assalto aos salários e às reformas. Prova-se, assim, que a troica não

saiu nem vai sair do País enquanto este Governo de desgraça nacional não for derrotado.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Srs. Deputados, vamos, então, votar o requerimento de avocação

apresentado pelo PCP.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PS, do PCP,

do BE e de Os Verdes.

Srs. Deputados, vamos, pois, passar à votação final global do texto final, apresentado pela Comissão de

Orçamento, Finanças e Administração Pública, relativo à proposta de lei n.º 211/XII (3.ª) — Modifica o valor

dos descontos a efetuar para os subsistemas de proteção social no âmbito dos cuidados de saúde,

concretamente da Direção-Geral de Proteção Social aos Trabalhadores em Funções Públicas (ADSE), dos

Serviços de Assistência na Doença (SAD) e da Assistência na Doença aos Militares das Forças Armadas

(ADM).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD e do CDS-PP e votos contra do PS, do PCP,

do BE e de Os Verdes.

Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai ainda dar conta de dois pareceres da Comissão para a Ética, a

Cidadania e a Comunicação.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, a solicitação do Tribunal

Administrativo e Fiscal de Penafiel, Processo 609/20007.1 BEPNF, a Comissão para a Ética, a Cidadania e a

Comunicação decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Mário Magalhães (PSD) a prestar

depoimento por escrito, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Srs. Deputados, está em apreciação o parecer.

Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, vamos votá-lo.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, a solicitação da 5.ª Vara Criminal

de Lisboa, Processo 1517/05.6JFLSB, a Comissão para a Ética, a Cidadania e a Comunicação decidiu emitir

parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado José Luís Ferreira (Os Verdes) a prestar depoimento por

escrito, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Srs. Deputados, está em apreciação o parecer.

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Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, vamos votá-lo.

Submetido à votação, foi aprovado, por unanimidade.

Srs. Deputados, lembro que a nossa próxima sessão plenária terá lugar no dia 23 de abril, pelas 15 horas,

e a ordem do dia será inteiramente dedicada ao debate quinzenal com o Primeiro-Ministro.

Antes de dar por encerrada a nossa reunião de hoje, quero desejar a todos os Srs. Deputados, a todos os

funcionários, a todos os jornalistas e aos cidadãos que nos acompanham uma Páscoa Feliz.

Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 12 horas e 51 minutos.

———

Declarações de voto enviadas à Mesa, para publicação

Relativas ao voto n.º 186/XII (3.ª):

No passado dia 17 de abril, os Grupos Parlamentares do PS, do PSD e do CDS-PP apresentaram à

Assembleia da República um voto pela participação dos soldados portugueses na Batalha de La Lys, na

Primeira Grande Guerra, tendo o Grupo Parlamentar do PCP optado pela abstenção.

O PCP associa-se à manifestação de pesar pela morte de milhares de soldados portugueses vítimas da

Primeira Guerra Mundial. Porém, não podemos deixar de fazer algumas observações, tendo em conta o

conteúdo do voto apresentado.

Um primeiro aspeto que consideramos não poder ser escamoteado é que a Primeira Grande Guerra

constituiu uma guerra que, no essencial, foi caracterizada pela disputa entre potências coloniais com ambições

hegemónicas, que colocavam como objetivo central a repartilha colonialista do mundo, nomeadamente, entre

as grandes potências capitalistas envolvidas no conflito. Pelo que atrás foi aduzido, a Primeira Grande Guerra

foi uma guerra imperialista, o que deve ser claramente denunciado e condenado.

Um outro aspeto que tem de ser recordado e valorizado quando se fala da participação portuguesa na

Primeira Grande Guerra, mas que foi negligenciado neste voto, prende-se com a forte oposição do movimento

operário e do povo português ao envolvimento e à participação do País no conflito.

O PCP considera importante sublinhar ainda que a participação portuguesa na Primeira Grande Guerra,

para além de ter vitimado milhares de soldados portugueses, teve um impacto extraordinariamente gravoso

nas condições de vida do povo português, espalhando a fome e as dificuldades entre as camadas mais

desfavorecidas da população e atrasando o País, agravamento que decorre de terem sido canalizados

elevados e significativos recursos para a participação na Primeira Guerra Mundial em vez de serem utilizados

para garantir a melhoria das condições de vida e o investimento em áreas fundamentais para o

desenvolvimento do País.

Eis as razões pelas quais o Grupo Parlamentar do PCP apresenta esta declaração de voto.

O Deputado do PCP, João Oliveira.

——

Foram mais de 7000 os portugueses que foram mortos, feridos ou presos durante a batalha de La Lys.

Impreparados, mal equipados, em clara inferioridade numérica e abandonados pelo Governo português, os

militares portugueses foram massacrados pelo exército imperial alemão.

Os soldados portugueses que perderam a vida em La Lys ou que nessa batalha ficaram feridos foram

duplamente vítimas: vítimas pelo abandono a que foram votados pelo Governo português que resultou no

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massacre da batalha de La Lys e vítimas porque foram utilizados para proteger a pretensão colonialista do

Estado português.

A entrada de Portugal no conflito armado, declarando guerra à Alemanha, não se deveu à defesa das

ideias de liberdade ou de democracia.

Foi motivada para reforçar uma aliança com países que garantiam a proteção das colónias portuguesas em

África, contra os intuitos açambarcadores da Alemanha que procurava novas colónias.

Perante as motivações latentes na participação portuguesa na batalha de La Lys, o Bloco de Esquerda não

podia ter acompanhado o voto proposto.

As Deputadas e os Deputados do Bloco de Esquerda, Pedro Filipe Soares — Cecília Honório — Mariana

Aiveca — Catarina Martins — Helena Pinto — João Semedo — Luís Fazenda — Mariana Mortágua.

——

Relativas aos projetos de lei n.os

551/XII (3.ª) (BE) e 552/XII (3.ª) (PCP):

O projeto de lei sobre o regime de exclusividade obrigatório apresentado pelo Bloco de Esquerda assenta

na necessidade de credibilização da vida democrática bem como na necessidade de novas regras que a

transparência e a representatividade das funções exercidas exigem.

Ora, não podemos estar mais de acordo com estes princípios, sendo que pensamos que o exercício de

representação que cabe a cada Deputado exige mais do que isso. Desde logo, disponibilidade pessoal para

que possamos estar numa relação de proximidade tanto quanto possível, com os eleitores; disponibilidade

mental e liberdade de pensamento, consubstanciadas na inexistência de conflitos entre os interesses privados

e públicos, para que a defesa do interesse público possa ser real; independência e transparência para que

toda a atuação seja conduzida à luz do bem comum, que afinal todos os Deputados afirmam defender.

Ora, todas estas exigências não são compatíveis com dispersão de atividades, atenção e pensamento

daqueles que aceitam ser eleitos para a Assembleia da República.

Acresce que a dignificação das funções de Deputado e o seu reconhecimento por parte de cada cidadão,

assente na confiança do mandato conferido que cada um de nós reclama, só será uma realidade se preencher

os requisitos acima enunciados.

Por esta ordem de razões, somos favoráveis ao exercício de funções de Deputado em exclusividade, em

termos que não se afastam substancialmente do projeto de lei apresentado pelo Bloco de Esquerda, quanto

aos princípios enformadores.

Porém, entendemos que é possível ir mais longe e que esta exclusividade também é suscetível de ser

enquadrada num quadro legislativo mais amplo que deverá, em nosso entender, passar pelas seguintes

dimensões: redução do número de Deputados com assento na Assembleia da República; criação de um

período de transição de atividade, pois sem a certeza de uma eleição, nenhum Deputado faz cessar a vida

profissional anterior, de um dia para o outro; revisão do estatuto remuneratório desta função; introdução à

limitação do número de mandatos; e, por fim, a criação de um subsídio de reintegração na vida ativa, que

permita uma reintegração no mercado de trabalho, então abandonado, quando tal se verifique em concreto.

Um quadro legislativo desta natureza permitirá a salvaguarda do exercício de uma atividade política mais

transparente, mais confiável e de maior relevância democrática em favor dos cidadãos e simultaneamente é

suscetível de garantir as condições mínimas para o exercício da mesma, por parte daqueles que para tal

estiverem disponíveis.

Observando a disciplina de voto, mas genericamente concordando com a exposição de motivos

apresentada pelo Bloco de Esquerda no seu projeto de lei, mas ainda assim entendendo que é possível rever

o enquadramento do exercício desta função parlamentar, subscrevemos a presente declaração de voto.

Os Deputados do PSD, Conceição Bessa Ruão — Eduardo Teixeira — Graça Mota — Maria Manuela

Tender.

——

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43

Os deputados abaixo assinados, a propósito das iniciativas legislativas do BE e do PCP — projetos de lei

n.os

551/XII (3.ª) e 552/XII (3.ª) —, os quais versam sobre a alteração do Estatuto dos Deputados, e, em

particular, sobre a questão do exercício das funções parlamentares em regime de exclusividade, entendem

sobre esta matéria tecer as seguintes considerações:

1 — Os Deputados abaixo assinados votaram contra esta proposta por considerarem que, apesar de

concordarem com o espirito e objetivo da iniciativa, em particular com a obrigatoriedade da exclusividade, os

projetos de lei apresentados pelo Bloco de Esquerda e pelo PCP carecem de alcance e profundidade no

articulado proposto face aos desafios que se colocam. A reforma do sistema político é urgente e a reconquista

da confiança dos cidadãos nas instituições deve ser uma prioridade do nosso sistema democrático e em

particular da Assembleia da República.

2 — Esta matéria deve ser fruto de uma reflexão séria, desprovida de oportunismos e englobada numa

reforma estrutural do sistema político, a qual deve compreender o voto preferencial, a redução do número de

Deputados para 180 no limiar inferior que tem tradução constitucional, bem como o debate sobre a obrigação

do regime de exclusividade, entre outras alterações que promovam e reforcem as relações de confiança e

credibilidade do sistema político. Ora, esta visão integrada não tem cabimento nas iniciativas desgarradas que

foram submetidas a apreciação do Plenário da Assembleia da República.

3 — Consideram também que esta matéria deve ser objeto de um alargado debate sobre o regime de

incompatibilidades, em particular o exercício de funções em exclusividade. Acreditam os Deputados que neste

debate devem ser discutidas todas as possibilidades, designadamente a obrigatoriedade de exclusividade para

Deputados que desempenham funções institucionais quer nos órgãos da Assembleia da República, quer dos

grupos parlamentares, devendo ainda ser considerada a possibilidade de reformar o estatuto remuneratório

dos Deputados, aprofundando o fosso remuneratório entre Deputados que exerçam funções em exclusividade

ou não.

4 — Outra das possibilidades muito plausível versa sobre a revisão do regime de remuneração dos

Deputados no caso de se optar pela obrigação de exercício do mandato em regime de exclusividade. Tal

poderia ser concretizado redistribuindo a poupança da redução de 50 Deputados pela remuneração dos

restantes 180, assegurando, deste modo, uma política de rendimentos mais consentânea com o estatuto de

titular de órgão de soberania e que convoque os melhores para o desempenho das funções, por um lado, e,

por outro, assegurando que tal reforma é neutral do ponto de vista orçamental.

5 — Por outro lado, importa concretizar o voto preferencial, já que o mesmo não bule com um sistema

pluripartidário que enriquece a democracia e assegura que os eleitores tenham uma relação de maior

proximidade e escrutínio perante aqueles que mandataram para os representar.

6 — No âmbito deste debate sobre a reforma do sistema político, os Deputados abaixo assinados

consideram ainda que a limitação de mandatos já aplicada aos presidentes de câmara deveria ser alargada

aos outros titulares de cargos políticos, como Deputados, Eurodeputados e vereadores de autarquias locais.

7 — No que diz respeito ao financiamento dos partidos políticos, os Deputados consideram que deverá ser

também discutida a possibilidade de uma percentagem da subvenção pública dos partidos dever ser

obrigatoriamente investida por estes em formação política dos seus quadros.

Os Deputados do PSD, Duarte Filipe Marques — Cristóvão Norte.

——

Porque se trata de matéria que foi discutida em tempo no seio do meu grupo parlamentar, e onde a minha

proposta de aprofundar a reflexão e conduzir a iniciativa legislativa não mereceu acolhimento, devo respeitar

essa posição, e por isso votei contra estes diplomas seguindo a orientação partidária, mas nada me inibe de

afirmar que penso de forma muito diferente da maioria dos meus colegas de partido. O PSD é um partido

democrático e, felizmente, ninguém está impedido de manifestar a sua opinião divergente. É o caso.

Gostaria de sintetizar o que penso sobre a matéria da transparência na política e sobre as

incompatibilidades, impedimentos e conflitos de interesses que se atravessam no exercício do mandato de

Deputado.

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1 — Estou convicto de que uma das razões que mais contribuem para o descrédito da classe política em

geral e o desprestígio da instituição parlamentar em particular tem a ver com a perceção pública de que a

acumulação do mandato de Deputado com atividades profissionais gera situações de suspeição de existência

de conflitos de interesses não declarados e de tráfico de influências, subalternizando o interesse público em

favor de interesses particulares;

2 — A questão dos Deputados que acumulam a sua função com a profissão de advogado gera uma

situação de difícil apreciação porquanto, estando deontologicamente impedidos de revelar a sua carteira de

clientes, muito difícil se torna apurar da existência de conflitos de interesses não declarados nos termos legais.

Em geral, é muito estranho que a declaração de existência de interesse particular em determinadas matérias

em discussão só muito e rarissimamente se verifica;

3 — Por outro lado, discordo totalmente da posição, que já vi publicada, de que a classe dos advogados

deveria estar impedida de se candidatar à Assembleia da República, pois isso constituiria um atropelo

inconstitucional a um direito fundamental, o de ser eleito;

4 — Esta situação da acumulação de atividades privadas e públicas revela-se geradora de várias injustiças

relativas. Desde logo, a existência de dois tipos de Deputados, uns que, com sacrifícios pessoais, familiares e

profissionais, optam por se dedicar a tempo inteiro à missão confiada pelo povo, e outros que exercem o

mandato em tempo parcial, desconhecendo-se até que medida vai a consagração do seu tempo disponível às

questões particulares, pois não existe modo de distinguir um das outras;

5 — Injustiça relativa, até em termos remuneratórios, que a diferença entre a compensação pecuniária do

tempo inteiro e a do tempo parcial é mínima;

6 — Existe uma terceira injustiça, interna aos que optam pelo regime de acumulação, sendo difícil de

distinguir quem exerce a sua profissão sem interseção de proveito próprio adveniente do estatuto político do

cargo e quem usa este último para daí retirar vantagens diretas ou indiretas;

7 — Por outro lado, se a dedicação exclusiva é exigida para os cargos de Presidente da República, do

Governo e dos magistrados, por que razão ficam os membros deste outro órgão de soberania, que é a

Assembleia da República, dela isentos, que não seja o privilégio?;

8 — Finalmente, existe uma injustiça global. A suspeição e o desprestígio que a atividade de alguns

desperta na opinião pública e na comunicação social abate-se sobre todo o corpo parlamentar, pagando o

justo pelo pecador, não se distinguindo o trigo do joio, generalizando-se a apreciação de que «são todos

iguais»;

9 — Dito tudo isto, e já tendo evoluído para esta conclusão há alguns anos, sou favorável à obrigatoriedade

do regime de dedicação exclusiva na função parlamentar, à semelhança do regime adotado pela vizinha

Espanha;

10 — Admito que, no caso de Deputados recém-eleitos pela primeira vez, seja concedido um período

transitório de acumulação do exercício do mandato com atividades profissionais, por seis meses, tempo

necessário para consolidar a adesão a este regime de exclusividade, que implica o abandono ou a suspensão

de outras atividades e das consequências pessoais que daí poderão ocorrer;

11 — Sendo favorável ao regime de exclusividade, todo o conjunto de propostas para alargar as

incompatibilidades e os impedimentos, embora preferível à situação atual, acaba por tornar ainda mais

complexo o regime já existente, numa rede de proibições dificilmente explicável à opinião pública e por esta

compreendida;

12 — Quer na Assembleia da República, quer no Tribunal Constitucional, os meios de investigação para lá

da mera apresentação de declarações de inexistência de incompatibilidades e impedimentos, de registo de

interesses e de património, são praticamente nulos ou inexistentes. Não há vontade política de averiguar em

profundidade o que está para lá da obrigação declaratória ou se esta corresponde a toda a realidade;

13 — Não concordo com a acusação de que o regime de exclusividade significaria a «funcionalização dos

Deputados». Não me sinto funcionário de ninguém, mas sim representante de quem me elegeu. Ainda assim,

prefiro um Deputado-«funcionário» que um Deputado-«facilitador», no sentido pejorativo da expressão, muito

em voga ultimamente. Ser Deputado, não deve ser encarado como uma profissão, mas como um serviço que

se presta ao País. Encaro a limitação dos mandatos parlamentares como uma solução adequada, em termos a

estudar. Não ser Deputado toda a vida, como já não se é Presidente da República toda a vida, ou Presidente

de Câmara Municipal para sempre;

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14 — Tampouco posso concordar com o argumento de que a exclusividade seria um filtro redutor da

qualidade dos Deputados. Abundam exemplos de excelentes Deputados, que exercem o mandato em

exclusividade de funções, e, a contrario, exemplos há de Deputados em regime de acumulação que ainda não

conseguiram acrescentar qualidade ao trabalho parlamentar;

15 — Sou favorável à criação de um sistema eleitoral que reduza o número de Deputados para 180 ou, se

uma revisão constitucional o permitisse, para 150. Seria mais do que suficiente. Não para melhorar a

remuneração dos que ficassem, com a poupança que tal diminuição acarretaria — essa é a pior das

justificações —, mas para dotar os Deputados que ficassem das condições de apoio que melhorassem a

qualidade do seu trabalho parlamentar. É impensável que, contrariamente ao que se passa na generalidade

dos parlamentos europeus, os Deputados portugueses não tenham até agora mexido um dedo para

concretizar direitos que lhes estão consagrados nas alíneas a) e b) do n.º 2 do artigo 12.º do Estatuto dos

Deputados. A saber: gabinete próprio e individualizado (na melhor das hipóteses, os gabinetes são partilhados

por dois Deputados), e assistente individual (para dar o meu próprio exemplo, os serviços da «minha»

secretária são partilhados por mais 14 colegas). Ou seja, nem dispomos de assistentes individuais, nem há

espaço para os colocar, nem orçamento para lhes pagar. E tudo isto não depende de mais ninguém que de

nós próprios, os Deputados!;

16 — Defendo que os Deputados deveriam ser eleitos em três tipos de círculo eleitoral: um terço, num

círculo nacional (com voto preferencial), um terço em círculos regionais ou sub-regionais (também com voto

preferencial), e um terço em círculos uninominais (neste caso, abertos também a candidaturas

extrapartidárias);

Finalmente, gostaria de deixar aqui expresso que considero que o ritmo atualmente imprimido pelos grupos

parlamentares à Assembleia da República é excessivo e está a comprometer a qualidade do trabalho

parlamentar. Existem reuniões a mais, audições a mais, uma multiplicação excessiva de iniciativas legislativas,

muitas vezes agendadas em cima da hora. Os Deputados, em geral, e os deputados dos grupos

parlamentares mais pequenos, em particular, correm de reunião em reunião, convocadas para a mesma hora,

são frequentes as dificuldades de arranjar quórum de funcionamento, e tudo isto implica um grande

acompanhamento de uma máquina técnico-administrativa da Assembleia da República, onde há vários anos

se sucedem as saídas para a reforma e estão proibidas as admissões. Existe tempo de Plenário a mais e

tempo de acompanhamento dos círculos eleitorais a menos. Não há paralelo na Europa. Tudo isto são

realidades, mas a vertigem é grande, privilegia-se o combate político de superficialidade, não há tempo de

respiração reflexiva sobre o que se anda a fazer. Ao contrário do que certa comunicação social se esforça por

propalar, e do que muita gente pensa, trabalha-se muito na Assembleia da República. Há quem trabalhe

demasiado, mas também há quem se esforce muito pouco. É mais uma desigualdade. No Plenário, muitas

vezes impera a retórica vazia de conteúdo ao sabor dos títulos dos órgãos de comunicação social, por entre

uma algazarra de apartes, e a política parece reduzida a uma fábrica de sound bites. O respeito interpares

nunca esteve tão baixo. Nada disto é bom para a democracia, nem para a instituição parlamentar.

O Deputado do PSD, Mendes Bota.

——

O projeto de lei n.º 551/XII (3.ª), apresentado pelo BE, versa apenas sobre um único aspeto do nosso

sistema político que se prende com a exclusividade dos Deputados à Assembleia da República.

No debate na generalidade que ocorreu no Plenário da Assembleia da República no dia 19 de abril de

2014, ficou clara a posição do PSD relativamente a esta matéria em particular, considerando que o sistema

político deve ser alvo de uma reforma integrada que contribua para a dignificação do exercício de funções

públicas e para uma maior aproximação entre eleito e eleitor, no sentido de combater os alarmantes números

relativos à abstenção existentes em Portugal.

Nesse sentido, apesar de exercer as minhas funções em regime de exclusividade, considero que esta é

uma medida que não pode ser analisada de forma isolada e merece um debate sério e profundo, porque tem

por base uma opção de fundo que deve ser equacionada, isto é, se queremos os nossos agentes políticos –

legitimamente eleitos pela população — exclusivamente dedicados à atividade política e o mais afastados

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possível do mundo do trabalho de modo a não serem suscetíveis de se deixarem influenciar por interesses

convergentes, ou se, por outro lado, queremos que os nossos eleitos mantenham uma carreira profissional a

par da atividade política e, assim, estejam mais próximos do «mundo real». Esta é uma discussão que

considero que deve ser levada a cabo de uma forma aprofundada.

No entanto, considerando o desiderato nacional de reformar o sistema político, a Comissão Política Distrital

de Leiria do PSD, da qual faço parte integrante enquanto vogal, já deu o seu contributo para esta ampla

discussão, apresentando no último Congresso Nacional do PSD, realizado em Lisboa nos dias 21 a 23 de

fevereiro do corrente ano, uma moção intitulada «Fortalecer Leiria, Fortalecer Portugal».

Esta moção versava sobre diversos assuntos relacionados com a realidade da região de Leiria, mas não se

ficou pelo seu natural cariz regional, apresentando algumas linhas orientadoras das necessárias reformas a

serem encetadas em Portugal, nomeadamente no que ao caso concreto diz respeito, a reforma do sistema

político.

Nestes termos, é propugnada nesta moção a defesa dos círculos eleitorais uninominais para as eleições

legislativas e a extensão da limitação de mandatos para o exercício da função parlamentar, tal como já se

verifica para os presidentes dos órgãos executivos autárquicos.

No panorama autárquico é ainda defendido o aprofundamento da reforma da lei eleitoral autárquica,

através da implementação de executivos maioritários, mantendo, contudo, no órgão executivo, a

representação das oposições.

Quanto às presidenciais, é preconizado um único mandato presidencial de sete anos.

Este capítulo referente à reforma do sistema político termina com um apelo ao reforço dos meios para

melhorar o andamento dos processos nos tribunais e para o combate à corrupção, bem como a aprovação da

lei sobre o enriquecimento ilícito.

Saliente-se, a este propósito, que a moção apresentada pela Comissão Política Distrital de Leiria do PSD

foi aprovada pelo Congresso Nacional do PSD.

A título pessoal, concordo inteiramente com estas disposições e com a necessidade de encetar reformas

no atual sistema político que visem melhorar a imagem que as pessoas têm da classe política que os

representa, nomeadamente por intermédio da limitação do número de mandatos na Assembleia da República,

tal como acontece com os nossos autarcas, a introdução de círculos uninominais e a eventual modificação do

número de Deputados que a Constituição da República Portuguesa estabelece entre os 180 e os 230

deputados, desde que estas modificações tenham em consideração a representatividade territorial de todas as

regiões e as diversas realidades socioculturais e demográficas do nosso País.

Estas alterações, contudo, a verificarem-se, terão de ser acompanhadas de mecanismos que permitam

aprofundar a proximidade e a relação de confiança entre eleito e eleitor, nomeadamente por intermédio de um

inequívoco reforço dos meios de ação e valorização do papel dos Deputados enquanto representantes da

população, assim como do aumento efetivo das competências de fiscalização que, para além da primacial

competência legislativa, estão associadas ao desempenho dos mandatos parlamentares.

Creio, por último, que é na reforma do sistema político e na modernização das instituições democráticas, no

sentido de lhes conferir maior credibilidade perante a população portuguesa, que reside o maior tributo e

homenagem à nossa democracia e aos 40 anos que agora comemoramos sobre o emblemático 25 de Abril de

1974.

Este é um esforço e um desafio sério e ambicioso que deve ser desencadeado com um amplo consenso e

envolvimento das várias forças políticas com assento na Assembleia da República.

O Deputado do PSD, Pedro Pimpão.

——

O Grupo Parlamentar do Partido Socialista votou contra o projeto de lei n.º 551/XII (3.ª) — Altera o Estatuto

dos Deputados, tornando obrigatório o regime de exclusividade para Deputados à Assembleia da República

(BE) e o projeto de lei n.º 552/XII (3.ª) — Altera o Estatuto dos Deputados e o Regime Jurídico de

Incompatibilidades e Impedimentos dos Titulares de Cargos Políticos e Altos Cargos Públicos (PCP).

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Os Deputados signatários, Rui Paulo Figueiredo, António Cardoso e Jorge Fão, do Grupo Parlamentar do

Partido Socialista, concordam com o sentido de voto expresso pelo seu Grupo Parlamentar na medida em que

o ato de legislar sobre estas matérias ganhará em ter uma adequada ponderação e maturação no seio da

Assembleia da República, em especial na Comissão competente, e dos próprios grupos parlamentares. O que

aqui não aconteceu.

Do mesmo modo, ganha em não estar inserido em períodos eleitorais ou pré eleitorais. Como aqueles que

estamos a viver.

Não obstante, querem deixar expresso, de modo sucinto, o seu entendimento sobre algumas das matérias

em causa.

Defendemos a revisão do Estatuto dos Deputados e do Regime Jurídico de Incompatibilidades e

Impedimentos dos Titulares de Cargos Políticos e Altos Cargos Públicos no sentido de aprofundar as

incompatibilidades e impedimentos atualmente existentes.

Defendemos a alteração do Estatuto dos Deputados no sentido de aprofundar a distinção, atualmente

existente, entre quem exerce o mandato em regime de exclusividade e quem não o exerce em regime de

exclusividade. Analogamente, tendo em atenção que o exercício do mandato de Deputado deve ser sempre,

qualquer que seja o regime do seu exercício, a função primeira que é exercida.

Entendemos que a possibilidade de exercício do mandato em exclusividade deve ser uma matéria a

ponderar no quadro de uma reforma mais global do exercício das funções de Deputado. E concordamos com

essa necessária ponderação.

Entendemos que as matérias sobre que versam estes dois projetos de lei devem continuar, desde já, a ser

debatidas na Assembleia da República, na comissão competente, e por todos os grupos parlamentares, de

modo a que o ato de legislar possa ser, no futuro, que se quer relativamente breve, bem ponderado e

maturado. E que possa ser objeto dos adequados consensos de modo a que a alteração legislativa a efetuar

não seja meramente conjuntural e sim estrutural e duradoura.

Por fim, entendemos que a revisão destes regimes jurídicos não exige ser integrada em nenhuma reforma

global mais profunda do regime democrático, da reforma do Estado ou da legislação eleitoral. Para citar os

exemplos mais referidos. E muitos outros poderiam ser dados.

Poderá vir a sê-lo. Mas também poderá avançar autonomamente e quanto antes.

A desculpa para não legislar sobre esta questão não poderá ser o estar à espera para legislar sobre todas

as matérias que com ela podem estar em conexão.

Os Deputados do PS, Rui Paulo Figueiredo — António Cardoso — Jorge Fão.

———

Relativa ao projeto de resolução n.º 941/XII (3.ª) (PCP):

O Grupo Parlamentar do PSD não ignora nem se conforma com situações de pobreza e exclusão social.

E é por esse inconformismo que o Governo suportado pelos Deputados do PSD e do CDS-PP passou à

ação e tudo têm feito para minimizar as dificuldades sociais, nomeadamente as que foram acrescidas pela

crise económica e financeira a que a governação socialista levou o nosso País.

Com efeito, à crise internacional, o Governo socialista conseguiu acrescentar uma crise económica,

financeira e social sem precedentes.

Não é por isso de estranhar que todos sejamos chamados a resolver tantos e tão graves problemas e que

tantos se vejam confrontados com penosas e inaceitáveis situações de clara dificuldade.

Mas nesta chamada nacional, a que todos devemos dizer presente, importa preservar e apoiar os mais

frágeis.

Por isso, o Primeiro-Ministro afirmou que «connosco ninguém fica para trás».

Assim nasceu o Programa de Emergência Social e se criaram medidas objetivas de defesa de uma vida

digna e possível aos menos afortunados, apesar de todas as difíceis limitações orçamentais.

E o Parlamento, recorde-se, com a iniciativa dos Deputados do PSD e do CDS-PP, fez aprovar a Lei de

Bases da Economia Social, instrumento fundamental para juntar as forças do Governo e das instituições da

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economia social, que, de forma agregada, conjugada, reforçada e certeira, até pela proximidade, possa apoiar

aqueles que mais precisam.

Vem da sabedoria popular que a união faz a força. É verdade. E faz também, dizemos nós, um combate à

duplicação e ao malbaratar de recursos, seja por fraude ou incompetência, uma melhor aplicação de recursos

e um melhor enfoque na resolução dos problemas dos mais frágeis de nós.

Também no social todos somos chamados e todos devemos honrar os valores de uma democracia

solidária e recusar, frontal e enfaticamente, a utilização das dificuldades de alguns de nós como bandeira

partidária. É por estes considerandos e porque a iniciativa apresentada pelo PCP — projeto de resolução n.º

941/XII (3.ª) - Cria um plano de emergência social no distrito do Porto — se baseia numa visão

inaceitavelmente propagandística e em dados factualmente errados, como os do desemprego; porque

esquece que foi este Governo que descongelou as pensões mínimas e ignora o que tem sido feito,

nomeadamente ao nível do realojamento; e, ainda, porque recorre à mentira quanto à entrega de

infraestruturas, como o Lar Residencial das Fontainhas, que os Deputados do PSD não acompanham esta

iniciativa demagógica, que não tem pejo em utilizar as dificuldades de terceiros, as inverdades e as

manipulações da verdade para obter visibilidade e dar prova de vida, de triste vida.

Os Deputados do PSD abaixo identificados não acompanham esta iniciativa do PCP, porque ela vem

contrariar a lógica defendida nos últimos anos e que passa por criar um sistema social menos esbanjador,

menos permeável à fraude e ao abuso, para que o Estado, enquanto agente de recursos limitados, possa

chegar a quem mais precisa.

E não a acompanham também porque grande parte das propostas de recomendação aqui enunciadas

neste projeto de resolução estão já em curso — muitas delas sob a gestão dos parceiros sociais da rede local.

Os Deputados do PSD, Fernando Virgílio Macedo — Emília Santos — Andreia Neto — Paulo Rios de

Oliveira — Afonso Oliveira — Mário Magalhães — Maria José Castelo Branco — Margarida Almeida — Miguel

Santos — Conceição Bessa Ruão — Nuno Sá Costa.

———

Relativa aos projetos de resolução n.os

759/XII (PSD) e 924/XII (3.ª):

O PCP valoriza e congratula-se com o debate e o processo que resultaram na publicação da Resolução da

Assembleia da República n.º 37/2014, sobre a libertação da via da água e criação de um regime específico de

navegação nos estuários dos rios, que resulta também da apresentação da iniciativa resolutiva deste grupo

parlamentar.

Desde o primeiro momento, o PCP manifestou total abertura para trabalhar numa solução consensual e

contribuir de forma construtiva para a definição de um quadro legal que valorize o património cultural presente

em cada embarcação típica e em cada comunidade ribeirinha que a preserva.

Entretanto, não podemos deixar de relembrar que, salvaguardando sempre a segurança da navegação, e

diferenciando as áreas de intervenção em presença, considerámos aqui a especificidade deste transporte

fluvial não regular, enquanto componente da defesa e valorização destas embarcações tradicionais. Nesse

sentido, tal realidade não devia ser confundida nem misturada com uma espécie de «oferta marítimo-turística»,

mais intensiva e indiferenciada, que aproveitasse a situação para se integrar no mesmo regime.

Assim, reiteramos o nosso alerta relativamente às opções a tomar no quadro legal e regulamentar a este

propósito e registamos as nossas reservas quanto à expressão inserida no n.º 2 da Resolução: «Defina um

regime de prestação de serviços no âmbito do transporte fluvial público não regular, abrangendo as

embarcações típicas e outras vocacionadas para o mesmo».

Valorizando o essencial do resultado alcançado pelo avanço que significa, importa que as soluções a

seguir não passem por tratar de forma igual aquilo que é muito diferente.

O Deputado do PCP, Bruno Dias.

———

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Nota: As declarações de voto anunciadas pelo Deputado do PSD Sérgio Azevedo, pela Deputada do PS

Inês de Medeiros e pelo Deputado do CDS-PP Michael Seufert não foram entregues no prazo previsto no n.º 3

do artigo 87.º do Regimento da Assembleia da República.

———

Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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