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Quinta-feira, 3 de julho de 2014 I Série — Número 102

XII LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2013-2014)

REUNIÃOPLENÁRIADE2DEJULHODE 2014

Presidente: Ex.ma Sr.ª Maria da Assunção Andrade Esteves

Secretários: Ex.mos

Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco Rosa Maria da Silva Bastos de Horta Albernaz

S U M Á R I O

A Presidente declarou aberta a sessão às 14 horas e 3

minutos. Deu-se conta da entrada na Mesa doprojeto de revisão

constitucional n.º 1/XII (3.ª), da apreciação parlamentar n.º 89/XII (3.ª) e dos projetos de resolução n.

os 1086 a 1089/XII

(3.ª). Procedeu-se ao debate sobre o estado da Nação, tendo

o Primeiro-Ministro (Pedro Passos Coelho) proferido a intervenção de abertura.

No debate, usaram da palavra, a diverso título, além do Primeiro-Ministro e do Ministro da Economia (António Pires de Lima), os Deputados António José Seguro (PS), Luís Montenegro (PSD), Nuno Magalhães (CDS-PP), Jerónimo

de Sousa (PCP), Catarina Martins (BE), Heloísa Apolónia (Os Verdes), Hugo Lopes Soares (PSD), Hélder Amaral (CDS-PP), Francisco Lopes (PCP), Helena Pinto (BE), José Junqueiro (PS), Carlos Abreu Amorim (PSD), Mariana Mortágua (BE), António Rodrigues (PSD), Alberto Martins (PS), Feliciano Barreiras Duarte (PSD), Pedro Filipe Soares (BE), Rui Paulo Figueiredo (PS), Cecília Meireles (CDS-PP), Luís Menezes (PSD), António Filipe (PCP) e Telmo Correia (CDS-PP).

A encerrar o debate, interveio o Vice-Primeiro-Ministro (Paulo Portas).

O Presidente (Guilherme Silva) encerrou a sessão eram 18 horas e 22 minutos.

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A Sr.ª Presidente: — Sr.as

e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro e Srs. Membros do Governo, Srs.

Jornalistas, Srs. Funcionários, está aberta a sessão.

Eram 14 horas e 3 minutos.

Podem ser abertas as galerias.

Temos hoje, como todos sabem, o debate sobre o estado da Nação mas, antes disso, vou pedir ao Sr.

Secretário, Deputado Duarte Pacheco, o favor de ler o expediente.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa e

foram admitidos pela Sr.ª Presidente, os seguintes diplomas: oprojeto de revisão constitucional n.º 1/XII (3.ª)

— Autonomia Século XXI (Renovar Abril) (PSD), que baixará a uma comissão eventual criada para esse

efeito; a apreciação parlamentar n.º 89/XII (3.ª) — Decreto-Lei n.º 93/2014, de 23 de junho, que procede à

primeira alteração ao Decreto-Lei n.º 248-B/2008, de 31 de dezembro, que estabelece o regime jurídico das

federações desportivas e as condições de atribuição do estatuto de utilidade pública desportiva; os projetos de

resolução n.os

1086/XII (3.ª) — Medidas imediatas que garantam o reforço da capacidade de resposta na área

da toxicodependência e alcoolismo (PCP), que baixa à 9.ª Comissão, 1087/XII (3.ª) — Alunos do ensino

artístico prejudicados no acesso ao ensino superior sem justificação pedagógica ou curricular (BE), que baixa

à 8.ª Comissão, 1088/XII (3.ª) — Recomenda um plano de emergência para o fim dos contentores-escolas e a

conclusão das obras suspensas pelo atual Governo (BE), que baixa à 8.ª Comissão, e 1089/XII (3.ª) —

Recomenda ao Governo um conjunto de orientações em torno da atualização da Estratégia Nacional para as

Florestas (PS), que baixa à 7.ª Comissão.

É tudo, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente: — Vamos dar início ao debate sobre o estado da Nação.

Pedia aos Srs. Deputados o favor de tomarem os vossos lugares e, sendo assim, para abrir o debate, dou

a palavra ao Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro (Pedro Passos Coelho): — Sr.ª Presidente da Assembleia da República, Sr.as

e

Srs. Deputados: Este é o primeiro debate sobre o estado da Nação, na atual Legislatura, em que já não

estamos sob programa de assistência externa. Recuperámos a nossa autonomia nacional depois de três anos

muito difíceis em que tivemos de agir com rapidez e persistência. O povo português mostrou, com a sua

determinação e sabedoria, que Portugal sabe resolver os problemas criados pela política da

irresponsabilidade, ainda que suportando um preço elevado.

Agora é também o momento de todos se comprometerem, perante os portugueses, a nunca mais se forçar

o País a passar por uma situação de pré-bancarrota e pelas respetivas consequências. Este é, sem dúvida, o

momento para o Governo e a maioria que o suporta na Assembleia da República renovarem esse

compromisso público e dizerem «não» — de uma vez por todas, «não» — à política do facilitismo e da

irresponsabilidade…

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

… e também de reforçar esse compromisso com uma estratégia política credível e com escolhas concretas,

assentes em factos e não em retórica, fundadas na realidade e não em ilusões.

Sabemos qual era o ponto de partida há três anos. A situação foi descrita por mim quando aqui apresentei

o Programa do Governo. O desemprego crescia sem freio; o défice orçamental estava descontrolado; o

desequilíbrio externo parecia impossível de conter depois de mais de 10 anos de níveis insustentáveis; a

competitividade da economia tinha sido erodida ao ponto do desespero. Era um período de angústia social e

de consternação e também de incerteza quanto ao futuro de cada um e do nosso País, como não

experimentávamos desde a fundação da democracia.

A nossa participação no euro e no projeto europeu estava ameaçada. A confiança e a economia estavam

em queda livre e a credibilidade do País atingira o seu ponto mais baixo.

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Sabíamos o que tínhamos a fazer para recuperar Portugal. E foi o que fizemos, muitas vezes com escolhas

muito difíceis, mas indispensáveis. Seguimos a nossa estratégia sem poder contar com o apoio responsável

da oposição, que preferiu apostar tudo no fracasso da resposta de emergência à situação do País e na ruína

de todas as gerações.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Os senhores é que apostaram e ganharam!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Hoje, fechado o programa de assistência e, com ele, a emergência financeira,

sabemos o que temos de fazer para consolidar uma nova fase da vida do País, uma fase de desenvolvimento

sustentável, de maior justiça social e de aprofundamento da democracia.

O ponto de partida hoje para essa nova fase é completamente diferente. O crónico desequilíbrio externo

passou a sólido excedente, ainda que com flutuações naturais.

A acumulação de dívida externa, ano após ano, dá agora lugar a uma economia com capacidade de se

financiar e de melhorar a sua posição externa.

O défice orçamental do Estado é menos de metade do que era e está a reduzir-se de forma progressiva.

A pré-bancarrota, a rutura iminente do financiamento do Estado social e a perda de acesso aos mercados

foram substituídos pela estabilidade financeira, pelo regresso pleno a mercado e por reservas suficientes para

as necessidades do Estado durante quase um ano.

Uma economia sem competitividade, fechada e nebulosa, começou a ceder o passo a uma economia mais

aberta, mais flexível, e sem núcleos de privilégio — portanto, mais democrática.

O desemprego sem fim à vista vai diminuindo mês após mês, tal como ainda ontem o Eurostat veio

confirmar. A taxa de 14,3% para o mês de maio corresponde a uma descida face ao ano anterior de 2,6 pontos

percentuais — com a Hungria, a maior descida verificada na União Europeia.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Muito bem!

O Sr. Primeiro-Ministro: — No desemprego jovem, os resultados são também muito importantes. No

mesmo período, o desemprego jovem caiu 4,2 pontos percentuais, com uma aceleração da queda

precisamente no mês passado. Trata-se de sinais importantes da recuperação económica e do acerto das

nossas políticas ativas de emprego.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Mas embora estes dados demonstrem como estamos, felizmente, já muito

distantes dos dias mais sombrios de 2011 e 2012, eles não nos satisfazem e sabemos o que temos de fazer

para ir além deles — muito além deles.

Há três anos, propus aqui, na Assembleia da República, que elegêssemos o crescimento como valor

político e social e também disse que isso implicava políticas novas e uma economia mais aberta e mais

democrática.

As reformas que executámos e o que ainda queremos fazer visam um crescimento não só sustentado no

tempo, mas também que possa ser apropriado por todos os portugueses. Isto quer dizer um crescimento que

impulsione a mobilidade social e eleve os que estão em condições mais difíceis; um crescimento que reduza

as assimetrias sociais; um crescimento económico democrático, que chegue a todos e não se faça por um

período fugaz, à custa da dívida e das gerações mais novas.

O Sr. João Oliveira (PCP): — E dos cortes nos salários!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Para isso, a luta contra o desemprego ocupa a prioridade da nossa agenda.

A sociedade que queremos construir em Portugal é uma sociedade de pleno emprego, de participação

económica e cívica e de multiplicação de oportunidades para todos. O acesso a um bom emprego é uma

medida das oportunidades de que falo e que não podemos ignorar.

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A nossa tarefa é dificultada não apenas porque o desemprego atingiu níveis intoleráveis na decorrência da

emergência financeira de 2011 mas também porque, ao longo de muitos anos, o desemprego estrutural não

parou de aumentar. Portanto, o nosso desafio não se esgota em combater o desemprego conjuntural que a

queda da economia produziu. Queremos derrotar o desemprego que a falta de competitividade e um modelo

económico anacrónico geraram.

Para o alcançarmos, precisamos de fazer deste objetivo para os próximos anos um verdadeiro

compromisso nacional, um projeto de concertação nacional, que envolva os parceiros sociais, a sociedade civil

e os agentes privados. À cabeça desse objetivo está a preocupação com o desemprego jovem. Ora, para as

empresas não há melhor investimento do que apostar nos nossos jovens.

O Sr. António Filipe (PCP): — Isto, se lhes pagarem!

O Sr. Primeiro-Ministro: — De facto, um país e uma economia que não confiem na sua juventude estão

condenados à estagnação e ao empobrecimento. Por tudo isto, quisemos facilitar para todas as empresas a

decisão de abertura ao emprego — no licenciamento e na redução dos custos administrativos, na reforma

laboral, nos incentivos à contratação e na aproximação da investigação e desenvolvimento ao mundo

empresarial. E queremos que essa decisão seja cada vez mais fácil e cada vez mais óbvia.

Um dos pilares dessa sociedade de pleno emprego que queremos construir reside nas qualificações dos

portugueses. E não me refiro apenas à melhoria das qualificações pelo aumento da qualidade de ensino, pela

qual temos vindo consistentemente a trabalhar. Refiro-me também às qualificações que sejam reconhecidas

todos os dias pela sociedade e pela economia. Refiro-me a qualificações que permitam a todos os

portugueses que concluam os seus estudos encontrar uma oportunidade no mercado de trabalho.

A nossa aposta progressiva no ensino dual, profissional e vocacional tem exatamente esse objetivo: dotar

todos os nossos jovens das capacidades de que precisam para iniciar os seus projetos de vida com a

independência e as oportunidades que desejam e merecem. E para isso foi necessário coordenar as ofertas e

metodologias de ensino com o programa de reindustrialização e aposta nos bens transacionáveis da nossa

economia, bem como o da economia verde, que em breve apresentaremos.

Foi por isso que apostámos no ensino técnico e profissionalizante. Foi por isso que reforçámos o ensino

dual e investimos no ensino vocacional. Mas não convertemos este tipo de ensino num parente pobre do

ensino regular.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Que ideia!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Pelo contrário, quisemos desde o início inaugurar um novo foco de excelência

na preparação dos alunos portugueses. A decisão estratégica de envolver as empresas nesta mudança

estrutural dará um novo impulso à empregabilidade dos nossos jovens. No ano escolar que agora termina,

44,5% dos alunos do básico e secundário estavam inscritos no ensino profissionalizante, o que sugere, a

médio prazo, uma importante transformação no nosso mercado de trabalho e, com ela, mais crescimento

económico e mais emprego.

O Sr. António Filipe (PCP): — Mão-de-obra barata!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Mas também no ensino superior introduzimos alterações muito importantes.

Criámos cursos de técnicos superiores profissionais, reservados ao ensino superior politécnico, que terão uma

estreita ligação ao tecido empresarial regional, nomeadamente na definição dos objetivos e programas de

estudo, bem como na disponibilização de estágios de qualidade no final da formação.

Estamos a pôr em marcha um programa de empreendedorismo e incubação de empresas para fazer fluir a

transferência de tecnologia e conhecimento entre as instituições do ensino superior, as unidades de

investigação e desenvolvimento e o mundo empresarial.

Além disso, na política da ciência, quisemos abrir as perspetivas dos nossos investigadores e doutorados

no mercado de trabalho empresarial, com programas específicos e incentivos próprios.

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Quisemos aprofundar todas estas dimensões do nosso ensino público e, além disso, reunir as condições

para que todos possam beneficiar, no período imediatamente posterior à conclusão dos seus estudos — e que

é um período crucial nas suas vidas —, de uma garantia de integração no mercado de trabalho, de aplicação

dos seus conhecimentos e talentos, da participação na economia e na sociedade de corpo inteiro.

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, precisamos de um Estado mais ágil e mais forte, que esteja mais

ao serviço dos cidadãos e da economia e, além disso, que seja um Estado imparcial, acima dos interesses

setoriais e corporativos e que represente o País no seu todo. O Estado imparcial, que não se sujeite a ser

resgatado por este grupo ou aquele interesse,…

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Que ideia, que ideia!…

O Sr. Primeiro-Ministro: — … é o que melhor serve uma economia vibrante, dinâmica e concorrencial, é o

que se ajusta melhor às aspirações democráticas e é o que mais eficazmente exerce as suas próprias

funções.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Muito já foi feito na agenda da reforma do Estado mas precisamos de prosseguir esta agenda reformista,

de resto, já delineada no documento «Um Estado Melhor», apresentado pelo Sr. Vice-Primeiro-Ministro.

A verdade é que muitas vezes perdemos de vista tudo o que já se alcançou, talvez porque muito do que se

fez é hoje considerado óbvio. Mas o facto é que há três anos, muitas destas mudanças eram tudo menos

óbvias ou evidentes — poderia dar numerosos exemplos, desde a regulação à administração central e local.

O papel estratégico que a justiça desempenha na democratização da economia e da sociedade obrigam-

nos a rever o muito que foi feito, precisamente como elementos fundamentais da reforma do Estado. O

combate à pendência processual, em particular no domínio da ação executiva, ou o reforço e reestruturação

do papel dos agentes de execução, são elementos indispensáveis da reforma do Estado, assim como são a

reforma do regime da insolvência e da recuperação de empresas, a reestruturação do mapa judiciário, a

operacionalização dos meios de resolução alternativa de litígios ou a criação de um processo civil mais ágil e

dirigido a resolver a questão material controvertida, que liberte os operadores judiciários de formalismos tantas

vezes inúteis.

O Sr. João Oliveira (PCP): — A aclaração que o diga!

O Sr. Primeiro-Ministro: — O próprio Código do Procedimento Administrativo, que se encontra

presentemente em revisão neste Parlamento, será uma peça relevantíssima de simplificação na relação do

Estado com os particulares e de responsabilização dos serviços públicos. Progressivamente, deixaremos a

pior tradição de esperar que sejam os cidadãos a correr atrás do Estado para que este responda e resolva, em

vez de ser a esfera pública a ir ao encontro das necessidades dos cidadãos.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

E vale a pena recordar que estas reformas têm sido feitas na base mais consensual possível, com o

envolvimento e participação dos profissionais das áreas abrangidas.

Contudo, a política de reforma do Estado e de modernização da administração prossegue, como se tem

observado também ao nível da simplificação e integração dos instrumentos de ordenamento do território. Mas

queremos também aumentar o acesso e descentralizar, queremos desburocratizar procedimentos e digitalizar

serviços.

No passado mês de maio, o Governo aprovou um importante pacote legislativo com medidas variadas de

desburocratização, além de dinamizar os Espaços do Cidadão e as Lojas do Cidadão.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Mais despedimento!

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O Sr. Primeiro-Ministro: — A Assembleia da República aprovou a lei sobre a Chave Móvel Digital. Todas

estas iniciativas serão levadas a cabo devidamente integradas numa estratégia global de reorganização dos

pontos de atendimento de serviços públicos. Assim, manteremos a presença de base municipal em todo o

território e elevaremos a qualidade da prestação dos serviços.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Isso será conseguido através da mobilização e integração efetiva dos

diferentes serviços sectoriais da administração central, da concertação com as entidades locais, em particular

dos municípios, da digitalização dos serviços públicos e da otimização do património imobiliário. É ainda parte

integrante desta estratégia global a melhoria dos transportes e da acessibilidade, em particular nos territórios

de baixa densidade, com o transporte a pedido e as carrinhas de serviço público.

Todas estas medidas vão no mesmo sentido: tornar os serviços do Estado mais modernos, próximos e

ágeis. Eliminam tempo perdido pelos utentes, reduzem custos para as empresas e baixam as despesas

administrativas. Ao mesmo tempo, marcam uma nova era da presença dos serviços do Estado pelo território

nacional, com a reorganização descentralizadora dos serviços de atendimento.

Porém, o esforço de descentralização tem de ir mais longe. Relativamente aos serviços de educação, de

saúde e de segurança social, o Governo tem em curso um ambicioso processo de descentralização de

competências para os municípios e entidades intermunicipais. São competências que pertencem ao Estado

mas que, exercidas a uma distância excessiva dos cidadãos, veem comprometida a sua eficácia e diligência.

Numa palavra, com este conjunto de reformas ganham os cidadãos, ganha a economia e ganha o próprio

Estado.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Muito bem!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Muito já foi feito e muito resta por

fazer. O Governo continuará firme na prossecução da sua agenda reformista. E não abdicará dela porque esta

agenda de reforma está ao serviço da mudança de Portugal e do novo futuro que queremos construir.

Vivemos ainda, bem sei, uma situação difícil, em que muitos portugueses enfrentam grandes dificuldades,

mas estamos a construir as bases da sociedade mais próspera, justa e democrática que ambicionamos. Ela

está ao nosso alcance e eu não aceito que haja patamares de desenvolvimento a que Portugal nunca acederá.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Conheço os portugueses, a sua energia, a sua determinação e a sua

criatividade. Acredito na nossa ética de trabalho, no nosso gosto pelo desafio e na nossa vontade de ir mais

longe. São esses os nossos grandes trunfos nos desafios que temos pela frente. Com mais liberdade,

qualidade nas instituições e nas políticas públicas, os portugueses serão os artífices de uma nova fase da

nossa história em que, daqui por 20 anos, poderemos olhar para trás e dizer: foi aqui que tudo começou.

Aplausos do PSD e do CDS-PP, de pé.

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, numa primeira ronda de perguntas, a ordem é a seguinte: PS, PSD,

CDS-PP, PCP, BE e Os Verdes.

Em primeiro lugar, tem a palavra, pelo PS, o Sr. Deputado António José Seguro.

O Sr. António José Seguro (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, o seu Governo tomou posse há

três anos e, nestes três anos, o senhor destruiu três gerações de portugueses:…

Protestos do PSD.

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… a geração dos avós, a geração dos pais e a geração dos filhos. A geração dos avós, à qual o senhor

cortou nas pensões e nas reformas, à qual o senhor dificultou o acesso aos cuidados de saúde; a geração dos

pais, à qual o senhor provocou o maior aumento de impostos e à qual o senhor, com a sua política de

destruição, destruiu emprego; e a geração dos filhos, à qual a única mensagem que o senhor soube enviar foi:

«emigrem porque neste País os filhos, os jovens não têm qualquer oportunidade».

Foram três anos de destruição de três gerações de portugueses!

Aplausos do PS.

Mais do que isso, o senhor destruiu-lhes a esperança. É que é a esperança que ergue as nações, é a

esperança que é capaz de fazer renascer os povos e colocar o nosso País num trilho de crescimento e não de

empobrecimento, como o senhor optou por fazer.

O senhor cometeu um grave erro — e aí tem razão, foi há três anos, em 21 de junho, que tudo começou.

Tudo começou na destruição do País. O senhor, deliberadamente, empobreceu o País, e o País, hoje, está

mais pobre e os portugueses, infelizmente, vivem pior do que há três anos.

O País está pior porque a nossa dívida pública aumentou, ultrapassou os 133% do PIB, isto é, cada

português deve mais do que devia há três anos.

O País está mais pobre porque temos menos ativos.

O País está mais pobre porque houve privatizações que nunca deveriam ter sido feitas, como foi o caso da

rede elétrica ou como é o caso da EGF, com dificuldades para a sustentabilidade da Águas de Portugal, ou

como é o caso da transportadora aérea portuguesa, a cuja privatização me opus desde o início, porque

considero que há todas as condições para transformá-la numa transportadora aérea da lusofonia,…

Aplausos do PS.

… permitindo a injeção de capitais privados, oriundos de países que têm laços históricos com todos nós.

O País está mais pobre porque a nossa economia está, infelizmente, nos mesmos níveis do início do

século, isto é, recuámos 13 anos, no que diz respeito à economia.

Os portugueses vivem pior porque o desemprego aumentou. E se o Primeiro-Ministro somar ao número de

desempregados registados oficialmente os mais de 300 000 portugueses que estão desencorajados de

procurar emprego, teremos uma taxa de desemprego superior a 20%.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Ah!

O Sr. António José Seguro (PS): — A isso tem de juntar a única vaga de emigração que o nosso País

conheceu a seguir ao 25 de Abril.

O País conheceu duas vagas de emigração, no século passado: no final da primeira década do século XX

e nos anos 60. E conheceu essas vagas de emigração porque não havia, em Portugal, oportunidades de

trabalho, oportunidades para que os portugueses pudessem arranjar aqui o seu sustento, para si e para os

seus.

A seguir ao 25 de Abril, Portugal transformou-se num País de imigração, porque havia oportunidades para

os portugueses e para outros povos que chegaram a Portugal. Fruto da sua política de empobrecimento, Sr.

Primeiro-Ministro, Portugal conheceu a terceira vaga de emigração — e são mais de 200 000 portugueses,

portugueses altamente qualificados, que saíram do nosso País, não por opção, pois isso seria mobilidade, mas

por necessidade, fruto da sua política de empobrecimento.

Aplausos do PS.

Infelizmente, o retrato negro do País não termina aqui. Olhe-se para os números conhecidos da pobreza e

verificar-se-á que houve um aumento do número de portugueses que foram colocados em situação de pobreza

e que esse aumento também se verificou no que diz respeito à pobreza e à exclusão social.

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Temos mais de 2 milhões de portugueses em situação de pobreza — mais de 2 milhões! E esses 2 milhões

são atingidos depois das transferências sociais, pois, sem transferências sociais, o número de portugueses em

situação de pobreza é superior a um quarto da população que temos atualmente em Portugal. Ora, estes são

números inaceitáveis, com os quais não nos podemos resignar.

E não diga o Sr. Primeiro-Ministro que tinha de ser assim, que não havia alternativa, porque nós, desde o

início, dissemos que havia uma alternativa, que há uma alternativa, uma alternativa que consegue conjugar o

equilíbrio sustentável das contas públicas, não apenas através de cortes cegos, como o senhor fez, mas

fundamentalmente através de um limite da despesa e também através das receitas que só a economia e o

emprego conseguem gerar.

A Sr.ª Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. António José Seguro (PS): — O senhor nunca quis aceitar as propostas do Partido Socialista. Pois

bem, compete ao Partido Socialista, como partido responsável na oposição, não dizer apenas o que está mal

no nosso País — essa é uma condição para um debate sério e franco, no dia do debate do estado da Nação.

Assim sendo, apresento aqui cinco propostas concretas, algumas das quais são do seu conhecimento e

contribuem para a recuperação do rendimento dos portugueses e para o crescimento da nossa economia.

A primeira é a do aumento do salário mínimo nacional. Há um consenso na sociedade portuguesa,…

A Sr.ª Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. António José Seguro (PS): — … só o Governo está fora desse consenso. A segunda é a de acabar

com a contribuição extraordinária de solidariedade para repor as reformas aos idosos, corte que os idosos

nunca deveriam ter sentido nas suas reformas e nas suas pensões. A terceira é a de pagar todas as dívidas

do Estado.

Risos do Deputado do PSD Luís Menezes.

Sempre que houve necessidade de acudir aos bancos, não faltou dinheiro; agora que há dinheiro, porque

os bancos não precisaram dele, o senhor tem a responsabilidade de injetar esse dinheiro na economia e pagar

o que deve às empresas.

Protestos do PSD.

A quarta proposta é a de reduzir o IVA da restauração para a taxa intermédia dos 13%, e a quinta e última

proposta é a de dinamizar a economia através de investimento público.

O Primeiro-Ministro sabe que já o confrontei com o facto de o Governo ter à sua disposição 5000 milhões

de euros do quadro comunitário anterior e de se ver na contingência de ter de devolvê-los a Bruxelas porque

não consegue investi-los no nosso País.

A Sr.ª Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. António José Seguro (PS): — Isso é um crime enorme! E, ao mesmo tempo, não percebo que a

União Europeia, tendo já aprovado nove acordos de parceria, não tenha ainda aprovado o acordo de parceria

para Portugal. São 20 000 milhões de euros de que a nossa economia precisa para estimular o crescimento e

também oportunidades de emprego. Ora, isso deve-se à incompetência de um Governo que não consegue

apresentar, em Bruxelas, um acordo de parceria que permita a utilização de fundos comunitários ao nosso

País.

Aplausos do PS.

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A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, está previamente estabelecido que estas intervenções têm o tempo

de 5 minutos. E, se bem que haja um desconto no tempo global dos partidos, pedia o favor de o respeitarem.

Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado António José Seguro, estranho bastante que o

Sr. Deputado venha dizer que tudo começou em 21 de junho de 2011, porque, nas últimas semanas, tenho

ouvido o Sr. Deputado explicar que tudo começou exatamente muito antes, e tenho concordado com as suas

observações. De facto, tudo começou muito antes, Sr. Deputado.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Mas mesmo que o Sr. Deputado tivesse precisado de tanto tempo para o reconhecer, os portugueses

nunca precisaram de tanto tempo para isso. É patente que o que se passou em Portugal nestes três anos é

consequência de políticas deslocadas, anacrónicas e erradas, que foram prosseguidas durante muitos anos,

Sr. Deputado. Mas, evidentemente, o Sr. Deputado tem noção de que os últimos 10 anos foram

particularmente desequilibrantes para Portugal, e se tivéssemos de escolher um ano de referência para o

aumento do desemprego estrutural e o aumento sensível da dívida pública do Estado, teríamos de escolher o

ano de 2007 para 2008, portanto, antes da crise financeira global e da crise económica.

As políticas que foram prosseguidas desde então até ao dia em que o Governo (que, na altura, era do

Partido Socialista) teve de recorrer ao apoio externo — e o Sr. Deputado, agora, esclareceu o País que não

teria assinado e negociado naqueles termos — fizeram parte de um caminho que não deu outra alternativa ao

País senão ter mesmo de recorrer a essa situação extrema de pedir um empréstimo vultuoso aos nossos

parceiros e ao Fundo Monetário Internacional para evitar a bancarrota.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Renegociassem a dívida!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Deputado António José Seguro, a destruição que isto representou para o

nosso tecido económico, para as expetativas dos portugueses — já para não falar do seu orgulho — não creio

que possa ser endossada a estes três anos de Governo. É exatamente ao contrário, Sr. Deputado!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Ao longo destes três anos, o Sr. Deputado, que apostou logo desde 2011 no falhanço da execução do

Memorando de Entendimento e por isso falou logo na sua renegociação, sempre conseguiu descartar qualquer

apoio a medidas importantes contidas nesse Memorando.

A propósito das suas novas, ou antigas, propostas, lembro uma em que o senhor disse que se devia

acabar com a contribuição extraordinária de solidariedade e que estas contribuições nunca deviam ter existido.

Porém, foi o Governo do seu partido que incluiu no Memorando de Entendimento, Sr. Deputado uma

contribuição de sustentabilidade a aplicar aos pensionistas com pensões a partir de pensões de 1500 €, Sr.

Deputado.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Mas as outras, as das pensões mais elevadas, essas já constavam do Orçamento do Estado para 2011,

ainda antes do Memorando de Entendimento. Quer dizer que a contribuição extraordinária de solidariedade,

que soma justamente à que vinha do Governo que o senhor apoiou e àquela que constava do Memorando e

que foi negociada pelo Governo que o senhor apoiou, é a que o senhor acha que temos de acabar

rapidamente, porque nunca devia ter existido! Que coisa extraordinária, Sr. Deputado! Que coisa

extraordinária!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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O Sr. Deputado vem tarde, porque o Governo já disse que, em 2015, a contribuição extraordinária de

solidariedade será removida no que respeita às reduções de pensões normais, apenas sobrevindo a das

pensões superiores a 5000 € e a 7500 €, que têm uma sobretaxa que se manterá em 2015, que será reduzida

em 50% em 2016 e que, depois, desparecerá. Portanto, o Sr. Deputado vem tarde.

Quero concluir dizendo o seguinte: ao fim destes três anos, o País que não votou neste Governo, nos dois

partidos que corajosamente têm suportado este Governo, os portugueses que não votaram em nós, hoje,

sabem que foi graças à persistência da estratégia que foi delineada e prosseguida que conseguimos concluir o

período de emergência, fechar o ajustamento enquadrado pelo Programa de Assistência Económica e

Financeira e encarar agora os próximos anos com outra esperança que o resgate de 2011 nos confiscou

durante muito tempo.

Não custava nada, Sr. Deputado, que hoje o Partido Socialista e o Sr. Deputado reconhecessem não os

problemas por que todos tivemos de passar para resolver a situação mas o enorme esforço que os

portugueses fizeram, contra a sua indicação, contra a sua vontade, para superar a emergência nacional. Isso,

hoje, ficava-lhe bem no debate do estado da Nação.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra, para fazer perguntas, o Sr. Deputado Luís Montenegro.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e

Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, como V. Ex.ª evidenciou, no início da sua intervenção, este é o primeiro

debate do estado da Nação, desta Legislatura, em que não temos a troica em Portugal.

Vozes do PSD: — Bem lembrado!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Muitos — desde já, aqueles que falaram — desdenharam da estratégia;

propuseram mais tempo e mais dinheiro, vaticinaram uma espiral recessiva, prognosticaram um segundo

resgate, mas a grande verdade é que todos esses falharam todas essas previsões e menosprezaram a

capacidade dos portugueses.

Vozes do PSD e do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — A verdade é esta, Srs. Deputados: a situação continua a ser difícil, mas

os portugueses venceram o pessimismo, o derrotismo, o fatalismo das palavras da oposição.

Vozes do PSD e do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Neste debate, Sr. Primeiro-Ministro, avaliamos o estado do País,

avaliamos também o estado da maioria e do Governo seguramente, e avaliamos o estado da oposição. O

estado do País e das pessoas é hoje bem melhor do que era em 2011. O País tem uma situação financeira

controlada, uma economia mais dinâmica e que saiu da recessão, tem um bom comportamento nas

exportações, recuperou no investimento privado, como ainda hoje disse o Sr. Ministro da Economia, depois de

12 anos em que o investimento privado não cresceu em Portugal, e o País teve um excedente comercial que

não conhecia há 70 anos.

É um País onde, é verdade, o desemprego se mantém elevado, mas onde a taxa de desemprego desce há

16 meses consecutivos.

Ora, Sr. Primeiro-Ministro, bem sabemos que estes sinais da economia muitas vezes não se refletem de

forma imediata na vida das pessoas e sabemos que há muitos portugueses que ainda fazem, de facto,

grandes sacrifícios. Mas é também verdade que a vida de muitos portugueses começa hoje a ter mais

esperança e começa hoje a ver uma luz que aponta para que se consigam reverter muitas dificuldades.

Há hoje portugueses que têm novas oportunidades de emprego, já está em curso a recuperação de

rendimento dos nossos concidadãos e a sustentabilidade das despesas sociais — porque quando se fala do

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Estado social é preciso que ele seja sustentável —, hoje, é mais sustentável do que era em 2011. Isto são

sinais que trazem um horizonte de esperança e de segurança à vida das pessoas.

Digo isto, Sr. Primeiro-Ministro, consciente de que não vivemos, de facto, num «mar de rosas», mas ciente

de que estamos a renovar Portugal para que a vida das pessoas tenha cada vez menos «espinhos».

O estado desta maioria e deste Governo é também ele significativo neste debate. O Governo e a maioria

apresentam-se neste debate coesos e como referencial de estabilidade.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — No Parlamento e no Governo, temos uma coligação firme, solidária e

convergente no programa político que estamos a desenvolver.

Tivemos as nossas tensões mas soubemos fazer prevalecer o interesse de Portugal e arrancamos para

esta última parte da Legislatura coesos e firmes, na convicção de que, reposta a normalidade financeira,

recuperada a soberania das decisões, podemos lançar o País para um ciclo de crescimento mais sólido, de

criação de emprego, com um Estado mais próximo dos cidadãos e mais eficiente e com um País que é mais

credível na Europa e no mundo.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Mas artificial!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Neste debate, também cumpre falar do estado da oposição. Chegamos

ao dia de hoje com uma oposição muito frágil — frágil nas ideias, frágil das alternativas e frágil também na

estabilidade.

O PCP e o Bloco de Esquerda, desfasados no tempo, propõem-se reestruturar a dívida, sair do euro e,

porventura, sair da União Europeia. Nunca disseram como financiavam o Estado e a economia sem mercados

e sem parceiros europeus.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Não era com cortes nos salários e nas pensões.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Vou repetir: nunca disseram como financiavam o Estado e a economia

sem mercados e sem parceiros europeus!

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — E nunca disseram quanta austeridade era preciso para que fosse

possível reestruturar a dívida.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Muito bem!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Essa é a resposta que o Partido Comunista e o Bloco de Esquerda

nunca deram ao País.

Por isso, podemos concluir que esta solução do PCP e do Bloco de esquerda significaria o terror social,

porque traria, de facto, muito mais austeridade a Portugal.

O Sr. Luís Menezes (PSD):— Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Só conseguem ver isso à frente!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — O principal partido da oposição, Sr. Primeiro-Ministro, o Partido

Socialista, esse vem ziguezagueando quer no discurso quer, agora, até mesmo em termos de liderança

política interna. Mas a sua maior fragilidade é, e foi sempre, política.

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Independentemente de quem foi ou de quem venha a ser o líder do Partido Socialista no futuro, a verdade

é que o Partido Socialista, nestes três anos, não ajudou nada os portugueses a ultrapassarem o estado difícil

em que nos encontrávamos.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Já não tinha ajudado quando era responsável pela governação e quando trouxe a troica — porque foi o

Partido Socialista que trouxe a troica para Portugal —…

O Sr. João Oliveira (PCP): — E vocês levaram o chá e os bolos à troica!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — … mas, sobretudo, não ajudou nem colaborou no cumprimento do

Memorando que subscreveu.

Não ajudou quando andou, permanentemente, a desconfiar da capacidade do País e a assustar as

pessoas com previsões alarmistas e não ajudou, nem ajuda, quando o Partido Socialista nunca teve, nem tem,

coragem de responder ao essencial.

Em primeiro lugar, defende o Partido Socialista a reestruturação da dívida? Sim ou não? Se sim, como?

Nos mesmos termos do PCP e do Bloco de Esquerda? Não creio. Mas o que é que sobra? É negociar juros e

maturidades? Mas isso já está feito! Qual é a reestruturação da dívida que todo o Partido Socialista defende

nesta ocasião?

O Partido Socialista continua indisponível para fazer a reforma do Estado? Para proceder à diminuição da

despesa pública? Sabemos que também não defende o aumento dos impostos. Como faz descer o défice, que

é um objetivo coletivo, essencial para o crescimento e para nos mantermos na nossa linha de sermos

parceiros fiáveis da União Europeia? Como cumprimos o Tratado Orçamental?

Esta é a grande fragilidade da oposição do Partido Socialista, independentemente da sua liderança.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado Luís Montenegro.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Por isso, Sr.ª Presidente, neste primeiro debate do Estado da nação

pós-troica, é caso para concluir dizendo que País está melhor,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Não se nota nada! Está tudo na mesma, para pior!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — … as pessoas começam a sentir mais futuro e mais esperança, a

maioria e o Governo estão firmes e coesos e virados para o futuro. A oposição está frágil e cada um dos

partidos, à sua maneira, cada vez mais virados para o passado.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. João Oliveira (PCP): — É preciso ter descaramento!

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, o Sr. Deputado Luís Montenegro traçou um retrato não só do

estado geral do País mas também do estado geral da oposição. Aproveito essa abordagem que o Sr.

Deputado nos trouxe para manifestar a preocupação que eu e o Governo temos, sobretudo no que respeita ao

Partido Socialista.

O Sr. José Junqueiro (PS): — Preocupação sincera…

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O Sr. Primeiro-Ministro: — Digo-o no quadro das nossas obrigações europeias, evidentemente, porque o

Partido Socialista foi, desde o início do processo de construção europeia, um pilar essencial do nosso projeto

europeu enquanto País.

Portanto, não me preocupam tanto as posições que vêm sendo expressas quer pelo Partido Comunista

Português quer pelo Bloco de Esquerda, que, sabemos, têm desde o início uma visão desconfiada da

participação no projeto do euro e da construção europeia. Porém, já quanto ao Partido Socialista não é assim.

O Partido Socialista é um partido que se insere dentro da experiência governativa portuguesa como um

partido também da zona euro e da União Europeia. Ratificou, na Assembleia da República, o tratado

orçamental, numa altura em que Portugal foi o primeiro País a fazer a ratificação desse tratado, numa altura

essencial para a União Europeia e, em particular, para a zona euro, aquela em que se jogava a credibilidade e

a sobrevivência do euro.

Sempre que há oportunidade, o Partido Socialista fragiliza a sua posição e o seu apoio ao tratado

orçamental e às reformas que foram realizadas na Europa nestes últimos quatro anos e que trouxeram uma

revisão do Pacto de Estabilidade e Crescimento que tornou a vigilância entre os países da zona euro muito

mais apertada, de modo a evitar situações de contágio que ponham em causa a estabilidade financeira dos

parceiros europeus.

Cada vez que se fala na flexibilidade, na renegociação, está a dar-se uma machadada na credibilidade dos

instrumentos de estabilização económica e financeira na Europa.

Convido o Partido Socialista, independentemente de todas as discussões por que possa passar nesta fase

— mas essas têm, com certeza, um contexto diferente e não haverá no interior do PS fortes divergências

quanto ao processo de construção europeia —, a esclarecer, pois é importante e inadiável, se está ou não

está de acordo com a manutenção das regras que permitiram à Europa afastar qualquer pronúncio de falência

do euro e de pré-falência da União Europeia.

O Sr. António José Seguro (PS): — Mas qual é a dúvida?

O Sr. Primeiro-Ministro: — Está ou não está o Partido Socialista convicto, hoje, como estava quando

retificou o tratado orçamental, de que sem disciplina das finanças públicas não é possível partilhar uma

mesma moeda?

O Sr. António José Seguro (PS): — Mas qual é a dúvida?

O Sr. Primeiro-Ministro: — Está ou não está o Partido Socialista comprometido com as regras que estão

nesse tratado e que foram, de certa forma, transpostas para a nossa lei de enquadramento orçamental, que é

como quem diz, há obrigatoriedade de apresentar um objetivo de médio prazo do orçamento equilibrado, em

que o défice que ainda temos deva desaparecer, com predominância do ajustamento estrutural, e em que o

défice estrutural não deva ser superior a 0,5% e, ano após ano, enquanto se está no procedimento por défice

excessivo (tal como são as regras do Pacto de Estabilidade e Crescimento), a despesa pública não deva

aumentar mais do que 0,5% sobre o aumento previsível do produto potencial?

Estas questões são muito práticas e é perante estas questões que temos de responder quanto à estratégia

orçamental que deve ser prosseguida.

Se estivermos de acordo que estabelecemos as regras corretas, então, temos de dizer que, caso

queiramos aumentar uma despesa, outra tem de ser suprimida. Se não queremos aumentar impostos, então,

há medidas que estavam previstas e não podem deixar de ser executadas.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Os benefícios fiscais!

O Sr. Primeiro-Ministro: — E se essas medidas tiverem de ser substituídas por outras, de igual qualidade

e de igual montante, que medidas são essas?

O facto de se estar na oposição não pode ser um refúgio para não esclarecer o País quanto à verdadeira

dimensão do compromisso europeu que se tem e da estratégia que se defende para o País.

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Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Magalhães.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, três anos depois do Programa

de Assistência Económica e Financeira, que não foi esta maioria que pediu, que não foi esta maioria que

negociou,…

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Foi, foi!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — … mas foi esta maioria que teve de ter a coragem de enfrentar e de

executar — e esse Programa destruiu muitas vidas, Sr. Deputado António José Seguro —, gostaria de

assinalar que este é, precisamente, o primeiro debate em que conseguimos recuperar a nossa autonomia

plena, a nossa capacidade plena de decidir e, nesse sentido, a nossa soberania plena.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Já apagaram a fotografia do Catroga?

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Um País que devíamos todos reconhecer, trabalhadores e

empresários, que pagou com esforço, mas que pagou o que devia, que honrou, com certeza com sacrifício, a

palavra dada e recuperou — com sofrimento, é verdade! — a sua soberania plena. Isto devia ter sido

reconhecido.

Mas, Sr. Primeiro-Ministro, não devemos estranhar que a oposição não o reconheça. Durante estes três

anos, a oposição passou todo o tempo a dizer: «nós, Portugal, portugueses, empresários, trabalhadores, não

vamos conseguir».

Primeiro, diziam que não íamos conseguir cumprir com o Programa de Assistência Económica e Financeira

— enganaram-se! Depois, diziam que íamos pedir um segundo resgaste — enganaram-se! Por fim, diziam que

íamos sair com um programa cautelar e Portugal teve uma saída limpa, à irlandesa, como sempre dissemos —

enganaram-se outra vez! Enganaram-se sempre, tiveram sempre do lado errado da história!

Aplausos do CDS-PP.

Também quero dizer ao Sr. Primeiro-Ministro que ouvimos aqui a versão da austeridade inteligente do

maior partido da oposição, que, no fundo, não passa de uma esperança ou, passe a expressão, de uma

fezada.

«Propomos medidas que aumentam a despesa, não quantificamos, sabemos isso, mas temos uma fezada

de que tudo vai melhorar. As empresas vão pagar mais IRC e, com essa fezada, vamos conseguir cumprir

com as metas e consolidar as contas públicas» — é esta a austeridade inteligente!

Não creio, Sr. Primeiro-Ministro, que esta seja a estratégia inteligente de um País que está na União

Europeia, que quer lá estar de cabeça erguida e em igualdade com os outros Estados-membros.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr. Primeiro-Ministro, também lhe digo que, agora que terminámos o

Programa, devemos centrar-nos no futuro e nos desafios que temos para o futuro. Diria mesmo que, até aqui,

o primeiro, segundo e terceiro desafios e até deveres deste Governo foram cumprir com o Programa e

recuperar a soberania, mas, agora que o fizemos, diria que o primeiro, segundo e terceiro deveres e objetivos

deste Governo devem ser a captação de investimento, o crescimento económico, a criação e a manutenção do

emprego e o combate à maior fratura social, que é o desemprego.

Nas últimas semanas, surgiram notícias que deram conta desta confiabilidade que Portugal ganhou para

ser atrativo em relação aos investidores externos e internos. Um investimento de uma multinacional de mais

de 1000 milhões de euros, nos próximos seis anos, pode criar 3000 postos de trabalho.

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O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Bem lembrado!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — O anúncio de um conjunto de sete novos investimentos, no valor de

400 milhões de euros, vai manter 1378 postos de trabalho e criar novos 406, sobretudo no setor produtivo,

industrial e mineiro, e em áreas muito carenciadas do interior, como Viseu, Beja, Castelo Branco, o que é

essencial para um País que queremos coeso.

Também quanto ao desemprego — que se mantém, como disse, e bem, inaceitavelmente alto,

excessivamente alto —, é preciso assinalar que, segundo o Eurostat, pelo 16.º mês consecutivo, desceu ou

estabilizou. Neste caso, desceu 2,6 pontos percentuais em relação ao período homólogo.

Protestos do PCP.

É verdade, é muito elevado, excessivamente elevado! Mas a taxa é de 14,3%, está muito longe dos 25%

da Espanha ou dos 26% da Grécia, que tiveram problemas idênticos. Srs. Deputados, isto quer dizer que

estamos a convergir com a média da União Europeia e a divergir de outras taxas de desemprego de outros

países que tiveram problemas similares aos dos portugueses.

Aplausos do CDS-PP.

Sr. Primeiro-Ministro, também os números do IEFP davam conta de menos 4863 pessoas inscritas nos

centros de emprego, no mês passado, ou seja, são menos 8,9%, mas, sobretudo, há mais 22% de ofertas de

emprego.

O INE, combatendo, muitas vezes, a ideia de precariedade que certa esquerda quer passar, revelou dados

que demonstravam que, no último ano, por cada trabalho a termo, foram celebrados 3,4 contratos sem termo,

ou seja, contratos efetivos.

Já as exportações mantêm o crescimento, o turismo tem os melhores anos sobre os melhores anos e a

produção industrial mantém uma trajetória positiva.

É evidente que tudo isto serve, sobretudo, para nos centrarmos no primeiro, segundo e terceiro objetivos:

crescimento económico, que só é possível se houver investimento, investimento que só é possível se houver

confiança e essa confiança resulta precisamente da capacidade de sermos fiáveis interna e externamente.

Portugal vai ter uma enorme responsabilidade com o novo pacote financeiro dos fundos comunitários

2014/2020. É preciso começar a trabalhar o quanto antes. No passado, outros governos desperdiçaram

demasiados fundos, demasiados euros, que o País, as empresas e os empresários não podem desperdiçar e,

sobretudo, depois do esforço que tiveram, não merecem desperdiçar.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — É em relação a isto que gostava que o Sr. Primeiro-Ministro falasse,

na certeza que, deste lado, há uma maioria estável, que acredita neste Governo, acredita que é possível

invertermos este ciclo e que é possível, sobretudo com responsabilidade, podermos combater o maior flagelo,

que é o desemprego.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Nuno Magalhães, disse que, com muito

sacrifício, honrámos o objetivo de concluir o Programa de Assistência Económica e Financeira e eu quero

sublinhá-lo.

Realmente, foi preciso que todos os portugueses não fossem em «cantos de sereia» e, apesar das políticas

difíceis que foram trilhadas — umas que eram inevitáveis, outras que poderiam ter sido evitadas se, muitos

anos antes, não tivessem feitos tantos projetos e assumidas tantas decisões erradas —, a verdade é que as

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pessoas conseguiram, com o seu esforço e com o seu sacrifício, honrar este ponto importante para a

conclusão do Programa de Assistência Económica e Financeira.

Não podemos, portanto, partir do princípio, agora, que tudo o que se passou já não interessa e podemos,

alegremente, preparar-nos para o próximo. Alguma coisa tem de mudar a sério para que o próximo não

aconteça.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Muito bem!

O Sr. Primeiro-Ministro: — É um pouco neste contexto que pretendo responder às restantes perguntas do

Sr. Deputado Nuno Magalhães.

Verdadeiramente, o que é tradicional responder-se, uma vez que foi superada a emergência, é que o

Estado — e foi aqui proposto —, com políticas públicas ativas, investimento público, agora ajude a crescer.

Portanto, «volte a gastar, se faz favor!»

Perguntei se era preciso cuidar de haver dinheiro, porque convém saber se daqui para a frente esta lição

foi aprendida ou não. Gastamos o que temos ou vamo-nos endividar mais? Esta é a primeira questão. Ora,

não nos podemos endividar mais e, portanto, o primeiro critério importante é haver realismo.

O Sr. António Filipe (PCP): — Mas não se endividaram?

O Sr. João Oliveira (PCP): — Não têm feito outra coisa senão endividarem-se!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Não há ninguém que não queira crescer, aumentar o rendimento e combater,

presume-se, as injustiças sociais; uns agravaram-nas, outros têm procurado combatê-las e responder-lhes. As

respostas não são as mesmas, nem têm o mesmo valor para o efeito.

Respondendo, agora, à questão dos fundos europeus, diria que Portugal recebe, desde o início, fundos de

coesão. A política de coesão da União Europeia tem um objetivo: assegurar a convergência, em termos

económicos, dos países que têm rendimentos per capita mais baixos, de modo a aproximá-los da média da

União Europeia.

O Sr. João Oliveira (PCP): — E está à vista!

O Sr. Primeiro-Ministro: — O que aconteceu em Portugal durante anos foi que a aplicação desses fundos

de coesão não foi devidamente aproveitada, porque Portugal divergiu da média da União Europeia.

O Sr. João Oliveira (PCP): — O Presidente da República está com «as orelhas a arder»!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Quer dizer, teve fundos especiais, teve financiamento, teve dinheiro para

poder apostar na convergência económica, no progresso económico, e o que aconteceu foi o oposto. Ora, se

não mudarmos as regras, evidentemente que o resultado vai ser o mesmo. Por isso é que as regras deste

novo quadro de financiamento são diferentes daquelas que tivemos até hoje.

Em primeiro lugar, uma parte significativa, isto é, mais de metade, vai estar destinada à competitividade da

economia, não ao Estado mas às empresas e, em particular, aos agricultores, que são objeto de fundos

próprios.

Em segundo lugar, dado que é a competitividade que está em causa, uma parte desses fundos tem de ser

reembolsada. Qual é o objetivo? Tudo aquilo que tem de se devolver tem de ser bem aplicado, porque, senão,

não há para devolver. Uma parte significativa destes fundos tem de gerar necessariamente crescimento,

porque, senão, aqueles que têm de os devolver, terão um grande sarilho nas suas mãos.

De uma vez por todas, creio que se começa a perceber que há um Governo, em Portugal, que não anda a

resolver os problemas dos privados, quando eles fazem apostas económicas erradas.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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Portanto, quando aplicam mal os fundos ou governam mal as suas empresas, essas pessoas devem pagar

o preço dos seus erros e não imputá-los socialmente ao conjunto do País. Teremos, portanto, neste novo

quadro comunitário regras diferentes.

Por fim, uma regra também importante é a do mérito dos próprios projetos e, por isso, uma instituição

financeira de desenvolvimento irá gerir uma parte destes fundos, sendo que outros estarão aplicados em

fundos autónomos que devem estar à disposição de quem apresente projetos que tenham viabilidade

económica.

Por fim, Sr. Deputado, respondo à questão da captação de investimento e de confiança. Se tivéssemos

andado estes três anos com a conversa da renegociação, da renegociação da dívida, da renegociação do

Memorando em vez de estarmos fixados nos objetivos que precisávamos de atingir nunca teríamos

regressado em pleno ao financiamento de mercado e nunca teríamos conseguido encerrar o período de

emergência.

Hoje estamos em condições de atrair investimento, e muito tem já aparecido em Portugal, justamente

porque, além da estabilidade na zona euro, hoje há confiança quanto ao que se decide em Portugal.

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Muito bem!

O Sr. Primeiro-Ministro: — E, Sr. Deputado, por isso é que é importante que haja um esclarecimento

cabal quanto às intenções dos principais partidos portugueses.

É muito importante saber, no médio e no longo prazos, se esta confiança se poderá vir a manter. Ora, nós

podemos ter divergências de muita natureza, mas se divergirmos sobre o que pode constituir a nossa própria

ruína, se criarmos as condições para quebrar essa confiança de que todos precisamos para atrair investimento

no futuro, governe quem governe, para aumentar o emprego e combater as injustiças sociais, se nos

pusermos em desacordo sobre isto, então, Sr. Deputado, acontecer-nos-á aquilo que, por vezes, acontece a

muitas organizações: os ressentimentos e as divergências colocam-se acima dos interesses do País. E isso,

Sr. Deputado, temos de dar mostras de não fazer e até de combater.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — A próxima pergunta é do PCP.

Tem a palavra o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, situemo-nos na realidade e

discutamos o verdadeiro estado da Nação, da situação do País, do povo português, com base, como disse,

em factos e consequentes questionamentos.

Pergunto-lhe, Sr. Primeiro-Ministro: é ou não verdade que, com o seu Governo, se acentuou o fosso entre

ricos e pobres na razão direta em que aumentou e concentrou a fortuna nas mãos de alguns poucos e

aumentou a pobreza para muitos?

Vozes do PCP: — Exatamente!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — É ou não verdade que os problemas da dívida e do défice, o alfa e o

ómega das razões invocadas para aceitar a intervenção externa, não foram resolvidos e que, no caso da

dívida, foram mesmo agravados?

É ou não verdade que temos de recuar ao tempo da 2.ª Guerra Mundial para comparar o nível acumulado

de 6% de recessão económica em três anos?

É ou não verdade que o desemprego é hoje estruturante e que só a emigração em massa e os

desencorajados que perderam o subsídio de desemprego ou que não encontram trabalho permitem leituras

distorcidas da estatística?

Sr. Primeiro-Ministro, a redução da taxa de desemprego não é sinal de recuperação, é sinal de emigração

como se tem verificado.

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Aplausos do PCP.

É ou não verdade que os cortes nos salários, nas pensões, nas reformas, a carga brutal de impostos, o

congelamento e a desvalorização do salário mínimo nacional empurraram centenas de milhares de

trabalhadores, reformados e pensionistas para o limiar da pobreza ou mesmo para a pobreza?

Para onde foi o dinheiro que sacaram a quem trabalha ou a quem trabalhou? Quanto foi transferido para o

capital financeiro? Diga, para vermos o estado da Nação!

Vozes do PCP: — Exatamente!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — E admira-se o Sr. Primeiro-Ministro da quebra da taxa de natalidade

que se verifica no nosso País, quando, hoje, as novas gerações veem o seu futuro tão incerto e tão sem

futuro!?

É ou não verdade que, hoje, as populações, particularmente as do interior, ao verem encerrados a unidade

de saúde, o hospital, a escola, os correios, o tribunal sentem que vão piorar as suas condições de vida e que

são discriminadas já não só em relação à sua origem social mas também em relação ao sítio onde nascem,

onde crescem, onde vivem e onde trabalham?

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exatamente!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — A propósito, Sr. Primeiro-Ministro, permita-me, tendo em conta a

homenagem de hoje a Sophia de Mello Breyner, que lhe pergunte: que sincera homenagem pode este

Governo fazer a esta figura ímpar, na medida em que este Governo trata a cultura como um encargo, como

uma despesa, prejudicando a cultura, os seus criadores, os seus agentes?

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

Dir-me-á, Sr. Primeiro-Ministro, que tivemos de ficar pior para ficar melhor. Apontará, como já o fez, o dedo

à bancada do PS ou até a Governos anteriores do seu partido. Alguma razão terá! Mas estamos melhor?

Ficámos melhor? Como assim, Sr. Primeiro-Ministro?! Como assim?! É capaz de voltar a afirmar que tivemos

uma saída limpa, que nos libertámos da troica e das amarras externas e das políticas de austeridade?

Acha, Sr. Primeiro-Ministro, que o Banco de Portugal está errado quando afirma que até 2019 é preciso

mais austeridade de 7000 milhões de euros? Acha que está certo o exercício do Presidente da República

quando profetiza a austeridade até, pelo menos, 2030?

O Sr. João Oliveira (PCP): — É verdade!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — A traço rude, eis, Sr. Primeiro-Ministro, o estado da Nação.

Sabemos que o Sr. Primeiro-Ministro lida mal com os factos ou procura distorcê-los.

Queria terminar com esta ideia: há quem considere que este Governo é incompetente. Nós consideramos

que não. Não é uma questão de incompetência, é uma questão de opção.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exatamente!

Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Desde o princípio do seu Governo que, mais do que a exploração e o

empobrecimento dos portugueses, que são uma consequência da vossa política, foi sempre, desde a primeira

hora, um objetivo central deste Governo aumentar a exploração e o empobrecimento dos portugueses. Por

isso, os senhores têm menos vida do que pensam e estão derrotados, tendo em conta o vosso isolamento

social, o vosso isolamento político e até o vosso isolamento eleitoral.

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

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A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, acho bom situarmo-nos na

realidade, porque ela ajuda-nos a poder concluir algumas coisas, sendo a primeira a de que, em 2011, o País

não tinha forma de fazer face às suas responsabilidades de curtíssimo prazo, seja no pagamento de pensões

e de salários, seja de amortização de responsabilidades externas.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Não é verdade!

O Sr. Primeiro-Ministro: — O País não tinha forma de fazer face a responsabilidades importantes perante

os portugueses e perante aqueles que eram os seus credores. Nesta altura, o País vive uma situação de

confiança, que lhe permite, apesar de qualquer volatilidade que possa existir nos mercados, viver durante

quase um ano sem pôr em causa essas políticas.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — E o drama das pessoas?!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Ora, o Sr. Deputado há de convir…

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — E o drama das pessoas?!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Eu sei que quando a parte da realidade que eu cito não é do seu agrado o Sr.

Deputado acha que isso não faz parte da realidade. Mas foi o senhor que me convidou a olhar para a

realidade. Olhe também para esta, se fizer favor.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — A realidade não é o drama dos mercados, é o drama das pessoas!

O Sr. Primeiro-Ministro: — O Partido Comunista está habituado a capitalizar o descontentamento das

pessoas sempre que as políticas são impopulares e causam dor social. Nós, em Portugal, nestes três anos,

fomos forçados a prosseguir um caminho de ajustamento que trouxe dor e sacrifício à generalidade dos

portugueses e o Partido Comunista, agora que esse processo está invertido, deve estar a ficar preocupado,…

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Pois está! Pois está!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … porque já só depende de alguma desorientação do Partido Socialista para

poder crescer no futuro mais imediato, uma vez que a economia do País está a recuperar e o desemprego

está a baixar.

O Sr. Deputado vai ter de mudar o seu foco para a realidade e também para aquilo que as pessoas

valorizam, ou seja, as pessoas valorizam ter mais oportunidades de emprego, as pessoas valorizam ver o

desemprego a descer…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Isso é ofensivo para quem está desempregado!

O Sr. Primeiro-Ministro: — E não vale a pena, Sr. Deputado, vir com a velha história de que quando o

desemprego sobe é porque há despedimentos e política antissocial e quando o desemprego baixa é por causa

da emigração.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — E não é?! Saem 3000 por dia!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Faz lembrar, Sr. Deputado, aqueles que não gostam de olhar para a realidade

como ela é e têm sempre de encontrar uma boa desculpa para dizer «não, a realidade não é esta!»

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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Diz também o Sr. Deputado que é preciso recuar aos tempos da 2.ª Grande Guerra para observar uma

contração da nossa riqueza, do Produto Interno Bruto acumulado de 6 pontos percentuais.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Sim, 6%!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Deputado, não fui ver, mas não tenho grandes dúvidas de que o Sr.

Deputado deve ter razão.

Sr. Deputado, a Irlanda perdeu cerca de 10 pontos percentuais, talvez um pouco mais, em termos

acumulados desde que a crise financeira eclodiu e a Grécia, Sr. Deputado, perdeu cerca de 16 pontos

percentuais da sua riqueza…

O Sr. João Oliveira (PCP): — E nós temos de nos dar por satisfeitos?!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Quer dizer, aqueles com quem nos podemos comparar, que tiveram de fazer

programas parecidos com o nosso, perderam muito mais de riqueza e destruíram muito mais Produto do que

nós…

O Sr. João Oliveira (PCP): — E nós temos de nos dar por satisfeitos?!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … e o senhor vê nisso uma oportunidade para castigar o Governo e não para

dizer que o caminho que foi prosseguido foi melhor do que o seguido noutros países. O Sr. Deputado podia

dizer isso também, não é verdade?

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Por fim, Sr. Deputado, deixe-me dizer-lhe que quando cita Sophia de Mello Breyner percebo que queira ter

uma grande preocupação. Há sempre uma certa preocupação em apropriarmo-nos daquilo que é de todos.

Mas não tente essa apropriação, Sr. Deputado. Fica-lhe mal, ainda para mais no dia em que será feita a

transladação de Sophia de Mello Breyner para o Panteão Nacional.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sophia de Mello Breyner não é, Sr. Deputado, contra este Governo nem a

favor do PCP. Deixe lá Sophia de Mello Breyner fora desta conversa!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Não foi isso que eu disse!

O Sr. Mota Andrade (PS): — Isso é de muito mau gosto!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Mas, Sr. Deputado, há uma coisa que quero garantir-lhe: é que os cortes na

cultura aconteceram como aconteceram em todas as áreas da governação. Em todas as áreas da governação!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Na do capital financeiro também?!

O Sr. Primeiro-Ministro: — E tiveram um propósito, Sr. Deputado: garantir que conseguiríamos atingir os

nossos objetivos de défice orçamental.

Quando o Sr. Deputado cita o Governador do Banco de Portugal, cita bem, pois o Governador do Banco de

Portugal lembrou quanto é que ainda há de défice para que o País chegue a um orçamento equilibrado. Mas o

Sr. Deputado, citando o Governador do Banco de Portugal, poderia dizer que não concorda com ele, porque o

Sr. Deputado acha que deve haver défice. O Sr. Deputado acha que o défice é virtuoso, mas, Sr. Deputado, o

défice trouxe o País ao endividamento e à ruína financeira!

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É por isso que a política facilitista e populista que o Governo combate e que o Partido Comunista Português

defende é uma política errada que não será prosseguida por nós e que, julgo, não tem a adesão dos

portugueses.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Tem de ser a mata-cavalos!

A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina Martins.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, não deixemos Sophia de fora deste

debate, não deixemos o melhor que temos, os poetas que temos de fora deste debate, porque o que a direita

quer fazer é, precisamente, essa desistência, essa desistência da aspiração máxima, desse «país liberto»,

dessa «vida limpa», desse «tempo justo» de que Sofia falava e para quem o Governo não tem resposta. É

para esta gente pisada, ignorada, mais do que «humilhada e calcada» que queremos falar hoje.

Depois de três anos de Memorando da troica e a um ano do final da Legislatura, o que é que o Governo

tem para oferecer a este País? Qual é a resposta que dá? Falou-nos hoje de endividamento e de mercados.

Saiba que, quando acabar este debate, a dívida pública portuguesa estará já 4 milhões de euros mais alta do

que quando, há minutos, o Sr. Primeiro-Ministro começou a falar. Portanto, relativamente a endividamento,

estamos conversados sobre as competências deste Governo.

E, sabe, como dizia Pires de Lima, seu Ministro, ainda antes de ser Ministro, as pessoas não comem

mercados ao pequeno-almoço e, portanto, vamos falar sobre a vida concreta das pessoas.

Há um ajustamento no País? Sim! Há reformas estruturais feitas por este Governo no País? Sim! Quais

são? É a reconfiguração do País pela destruição dos direitos sociais e laborais, e é disso que temos de falar

aqui hoje.

Com a maior crise de sempre, o Governo cortou nos apoios a quem mais precisa e os mais frágeis foram

abandonados e ainda hoje não mereceram aqui uma única palavra do Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Bem lembrado!

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Dou-lhe um exemplo: os cortes no complemento solidário para idosos é

talvez uma das mais violentas expressões da política deste Governo. Menos 50 000 idosos com complemento

solidário para idosos não significa menos idosos pobres em Portugal, o que significa é que são os mesmos

idosos pobres, ou mais, sem apoio em Portugal, mais pobres ainda, porque alteraram os montantes, porque

alteraram a idade, porque fizeram alterações administrativas para expulsar pessoas penalizando sempre os

mais pobres. É pela exclusão e pela fragilização que este Governo tem ido quer no complemento solidário

para idosos, quer noutras prestações sociais.

Os números oficiais do Governo que escondem o drama dos desencorajados e que escondem também o

subemprego dizem-nos que há já 412 000 pessoas em situação de desemprego em Portugal sem qualquer

apoio. São os desempregados de longa duração, são os jovens que desesperam por um contrato de trabalho,

são os trabalhadores a recibo verde, a quem prometeram subsídio de desemprego no Memorando da troica.

Lembra-se, Sr. Primeiro-Ministro? Há de perguntar ao Ministro Mota Soares quantos, das centenas de

milhares de trabalhadores que estão a recibo verde em Portugal, é que conseguiram ter acesso ao subsídio de

desemprego.

Sr. Primeiro-Ministro, a política deste Governo tem sido a política do abandono e a economia da

desistência. E a marca são as alterações laborais. A marca é terem dito sempre que o problema era a rigidez

no trabalho. E veja bem a rigidez: ontem mesmo, o Bloco de Esquerda esteve junto dos trabalhadores da

Lunik — de entre 100 trabalhadores aumentaram o trabalho a 80 para despedir 20. Essa é a marca de um país

onde alguns são forçados a tantas horas de trabalho por tão magro salário e para tantos outros ficarem sem

emprego.

Não há nenhuma rigidez, o que existe sim é uma luta da direita contra a dignidade do trabalho. Os

trabalhadores passaram a ser colaboradores, precários, claro, e agora de precários passam a estagiários. E o

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Governo tem o IEFP (Instituto de Emprego e Formação Profissional) como a maior máquina de compressão

salarial e de precarização do trabalho no nosso país.

Temos hoje estagiários a trabalhar nos cafés, nos centros comerciais, nas fábricas, no Estado, e temos o

IEFP a financiar as empresas, a darem um bodo às empresas, para que elas, em vez de postos de trabalho

tenham estagiários, para que humilhem os trabalhadores e para que comprimam salários e direitos. Soubemos

hoje que o IEFP suspendeu os estágios porque as novas normas do Governo permitem estágios ainda em

piores condições, ou seja, não bastava já ter estágios como agora se passa a garantir que os estagiários

nunca terão acesso ao subsídio de desemprego.

Sr. Primeiro-Ministro, quem condena o trabalho condena o País, quem condena quem trabalha condena o

País.

Bem pode o Governo falar da natalidade, mas quem tem 30, 40 anos de idade e uma vida a saltar de bolsa

em bolsa, de estágio em estágio, de subemprego em desemprego, não pode sonhar ter filhos, nem pode

querer viver neste País.

E perguntamo-nos: em nome de quê há esta sangria do País? A austeridade é feita em nome da dívida e é

feita em benefício dos mercados, e essa é a opção e a escolha do Governo.

Quem trabalha e vive em Portugal nunca pagou tanto para ter tão pouco do Estado! A dívida pública nunca

cresceu tanto como com este Governo, 25 milhões de euros por dia, mais de 130% do PIB, muito mais do que

o previsto no Memorando da troica! Os senhores são os recordistas da dívida pública!

Aplausos do BE.

E a pressão da dívida pública que cresce é a pressão das escolas que encerram, é a pressão da saúde

que piora, é a pressão do desemprego que cresce.

Há dívida pública que cresce como nunca se imaginou ser possível, há uma dívida social que se agiganta e

a que é preciso dar resposta.

O Bloco de Esquerda sempre defendeu que era necessária a reestruturação da dívida pública. O FMI vem

agora reconhecer que seria necessário ter pensado, logo em 2011, se a reestruturação era mesmo

necessária.

Sr. Primeiro-Ministro, o que Portugal precisava agora era de um Governo que estivesse a lutar por essa

reestruturação. Infelizmente, quando olhamos para si sabemos que este Governo o que é capaz de fazer é

ficar no camarote de Angela Merkel a bater palmas aos golos marcados na própria baliza.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente. — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Catarina Martins, também li algumas notícias

que faziam referência à defesa, por parte de técnicos do Fundo Monetário Internacional, da opção pela

reestruturação da dívida portuguesa logo no início do Programa de Assistência. No entanto, procurei essas

referências na origem e não encontrei, pelo que pediria à Sr.ª Deputada que tivesse a amabilidade de me

indicar qual é o documento do Fundo Monetário Internacional que faz expressamente essa alusão pois, como

disse, não tive ocasião de vê-la.

A Sr.ª Deputada disse também que o Governo escolheu os mercados. Não, Sr.ª Deputada, o Governo

escolheu os portugueses, não escolheu os mercados. E a política que foi realizada de execução do

Memorando de Entendimento, de criação de confiança suficiente para regresso a financiamento em mercado e

não a financiamento oficial deve-se estritamente à necessidade de o País poder readquirir, como readquiriu, a

sua autonomia e de poder responder às necessidades dos portugueses. Em contrapartida, as políticas que o

Bloco de Esquerda tem vindo a defender, nomeadamente a da reestruturação da dívida, é contrária aos

interesses dos portugueses. E é contrária aos interesses dos portugueses porque no que respeita à dívida

oficial ela representaria a saída de Portugal do euro e da União Europeia e no que respeita à dívida privada ela

significaria rapidamente o isolamento de financiamento para o País e para os portugueses, e isso seria um

desastre.

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Sr.ª Deputada, como, em qualquer caso, a senhora acredita convictamente no desastre que defende, só

tem de convencer todos os portugueses de que esse desastre não é aquilo que a maior parte dos portugueses

têm pensado, mas isso, evidentemente, será um desafio considerável que a Sr.ª Deputada enfrentará.

Finalmente, Sr.ª Deputada, deixe-me dizer-lhe o seguinte: dos muitos debates que travámos no

Parlamento, nunca vi o Governo a enfiar a cabeça na areia e a negar a realidade.

Sabemos que temos um desemprego intoleravelmente elevado, sabemos que a despesa social é

importante num país que tem um nível de riqueza tão baixo como o nosso, mas, Sr.ª Deputada, para que o

Estado desempenhe essas funções é preciso que as possa financiar. A Sr.ª Deputada não consegue

convencer ninguém de que é fácil financiar essas políticas se não tivermos de pagar aquilo que devemos. Isso

pode acontecer uma vez, mas à segunda vez nem sequer essa escolha lhe é dada, porque se não tiver

acesso a financiamento não pode sequer assumir compromissos.

Sr.ª Deputada, é aqui que a nossa divergência é realmente muito grande, porque as políticas que tivemos

de prosseguir destinaram-se a oferecer um futuro de esperança aos portugueses enquanto aquela que a

senhora defende não faz outra coisa do que fazer os portugueses regressarem a um passado de má memória.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Para fazer uma pergunta, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, quando ouvi a sua

intervenção inicial, fiquei com a nítida sensação, e depois o debate acabou por confirmá-lo, que o Sr. Primeiro-

Ministro fala como se se tratasse de um vitorioso, o que me parece até, de certa forma, confrangedor face à

situação que o País atravessa. De facto, o Sr. Primeiro-Ministro fala única e exclusivamente do que e como lhe

interessa — também já percebemos isso.

Pergunto-me porque é que o Sr. Primeiro-Ministro não terá falado dos níveis da dívida pública em Portugal,

que aumentaram substancialmente desde que este Governo tomou posse. Foram qualquer coisa como mais

60 000 milhões de euros, o que não é coisa para brincar.

O Sr. Primeiro-Ministro, entretanto, fala do desemprego, mas não fala do quadro de formação dos números

do desemprego, porque eu nunca ouvi o Sr. Primeiro-Ministro falar dos níveis de emigração e da forma como

isso se pode relacionar com os níveis de desemprego. Dá-me até ideia que o Sr. Primeiro-Ministro tem

tendência para desvalorizar o fenómeno da emigração! Ora, se falamos de qualquer coisa como 350 000

pessoas à procura de emprego lá fora, porque cá dentro não conseguem, isto, na ótica do Sr. Primeiro-

Ministro, terá ou não repercussão nos níveis de desemprego? Eu gostava de saber, porque há determinadas

coisas que não dá para perceber.

O Sr. Primeiro-Ministro, quando fala dos desempregados, não refere que mais de metade desta gente não

recebe subsídio de desemprego. Como é que se subsiste desta forma?!É também com estas coisas que

gostávamos de ver o Primeiro-Ministro de Portugal preocupado, porque acho que é legítimo pedir isso ao

chefe do Executivo português.

Por outro lado, há outra coisa que talvez fosse conveniente o Sr. Primeiro-Ministro explicar neste debate:

como é que é possível compreender que, nestes três anos terríveis, como todos os qualificam, as grandes

fortunas, as grandes riquezas em Portugal tenham aumentado e os portugueses, na sua generalidade, tenham

empobrecido? Alargou-se a bolsa de pobreza. Uma coisa tem tudo a ver com a outra, porque para se

concentrar riqueza numa minoria tem de se alargar a pobreza a uma vasta maioria. Isto é mesmo assim, está

nos livros, mas o problema, Sr. Primeiro-Ministro, é quando está na realidade.

O Sr. Primeiro-Ministro acha que não, pelo que vai, certamente, explicar o fenómeno.

Naturalmente que o Sr. Primeiro-Ministro terá reparado que, durante o seu mandato, voltou a falar-se de

fome em Portugal. Os níveis de pobreza, de facto, foram extraordinariamente relevantes e isso tem, depois,

implicações com muitas outras coisas. Por exemplo, o Relatório de Primavera do Observatório Português dos

Sistemas de Saúde vem dizer que os níveis de pobreza têm a ver com o aumento significativo de problemas

na saúde. E, Sr. Primeiro-Ministro, os serviços de saúde não estão a dar a resposta necessária, porque, o

Governo deliberadamente desinvestiu no setor da saúde, como de resto disse, e em muitos outros setores.

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Também considero que a qualidade dos serviços de saúde é talvez um dos indicadores mais evidentes do

estado de desenvolvimento de um determinado país. E, Sr. Primeiro-Ministro, nesta matéria, estamos a

avançar para um nítido estado de subdesenvolvimento, porque a lógica do Governo em tornar os serviços

públicos mais eficazes não é nada daquilo que o Sr. Primeiro-Ministro acabou de dizer, pois não é isso que os

portugueses sentem. Na verdade, voltámos a ver filas imensas em muitos serviços de saúde e aquilo que o

Governo está a fazer é encerrar abruptamente serviços de saúde, de finanças, tribunais, escolas, etc., etc.,

etc. Está, portanto, a afastar os serviços das pessoas que precisam deles.

Quanto à política de educação, o Governo tem um único objetivo central, que é o de despedir professores.

Diz-se preocupado com as crianças e os jovens, mas não está nada, pois encerra escolas e não manifesta

preocupação rigorosamente nenhuma com as escolas e turmas que estão superlotadas e onde, nitidamente, a

qualidade do ensino reflete essa realidade.

Depois, Sr. Primeiro-Ministro o Governo tem um discurso absolutamente contraditório. Diz que agora

vamos passar para o «rearranque» da economia, mas vai manter — e, quem sabe, agravar até nalguns

aspetos — a austeridade. Isto é contraditório, pois o Sr. Primeiro-Ministro, que assumiu aqui muitas vezes que

a austeridade é recessiva, diz que vai apostar na economia mas não põe de lado um eventual aumento do

IVA. Ou põe? Perguntei-lhe uma vez, mas não respondeu. Talvez consiga hoje uma resposta.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Já lhe respondi tantas vezes!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Primeiro-Ministro, a atitude do Governo é outro grande

problema com o qual o País se confronta. Já não vou falar daquelas coisas que o Sr. Primeiro-Ministro, em

campanha eleitoral, e depois no decurso do mandato, disse que não fazia e depois fez, como a subida dos

impostos, os cortes nos salários, os cortes nas pensões, etc., mas vou falar-lhe talvez daquilo que o Sr.

Primeiro-Ministro, no início do ano, disse ao comprometer-se perante esta Câmara de que, em abril,

apresentaria uma lista dos edifícios públicos com amianto para cumprir a Lei n.º 2/2011.

Deveria ter chegado aqui e ter dito: «Olhem, Sr.as

e Srs. Deputados, não consegui cumprir aquilo a que me

comprometi convosco e, de facto, essa lista não vai ser apresentada em abril, mas, sim, em junho». Bom, não

disse assim, não foi educado dessa forma, disse de outra maneira, fez de conta que não tinha dito que era em

abril e passou para junho, como se ninguém se lembrasse de nada. Acontece, Sr. Primeiro-Ministro, que o

mês de junho acabou e a lista dos edifícios públicos com amianto não apareceu. Ora, queria hoje, por favor,

uma resposta, por parte do Sr. Primeiro-Ministro, mas não para inventar, mas sim para cumprir.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra, Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, diz que falo como se fosse

um vitorioso. Sr.ª Deputada, não sei como observa a minha forma de intervir, mas posso dizer-lhe como me

sinto. E não me sinto um derrotado, Sr.ª Deputada. Não me posso sentir um derrotado, porque, em bom rigor,

cumpri aquilo que era importante para os portugueses, que era fechar o período de assistência económica e

financeira e trazer o País para um nível de confiança capaz de atrair investimento externo, financiar o Estado e

a economia e, a partir daí, poder tratar das feridas que foram abertas durante todo o processo de ajustamento

e recuperar o País. Portanto, Sr.ª Deputada, não posso considerar isso uma derrota. Não posso!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Muito bem!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Se isso se vê na forma como me expresso, creio que me parece ser bastante

compreensível.

Mas, Sr.ª Deputada, não há nenhuma contradição entre o Estado continuar um caminho de consolidação

das finanças públicas e poder ter uma agenda de crescimento para o País. Só as pessoas que pensam que é

o Estado, através do investimento público, que consegue pôr a economia a mexer é que consideram que, se o

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Estado não tiver muitos meios para gastar, isso é um desastre para a economia. Sr.ª Deputada, a economia

tem mais qualquer coisa,…

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Pois tem!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … e nós queremos que esse mais qualquer coisa seja cada vez mais a

iniciativa dos cidadãos e das empresas, e não do Estado.

O Estado, Sr.ª Deputada, se pretende, como pretende, ver diminuir a dívida, quer em stock, quer em rácio

do PIB, tem de diminuir o seu défice, tem de diminuir a sua despesa. E como a Sr.ª Deputada também não

gosta de impostos, se é preciso diminuir o défice, tal só é possível — não aumentando impostos — diminuindo

a despesa. Mas a Sr.ª Deputada não quer diminuir a despesa, quer aumentar a despesa!

Protestos de Os Verdes.

Quer aumentar a despesa de investimento e quer, ao mesmo tempo, por contradição, baixar a dívida,

baixar o défice e trazer a paz e a prosperidade aos portugueses.

Sr.ª Deputada, a contradição não é minha, é sua, e tem de a resolver!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Não é, não!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Diz a Sr.ª Deputada: «Os ricos aumentaram, e aumentaram à custa dos

pobres». Sr.ª Deputada, na distribuição do rendimento, Portugal não agravou a situação com a crise.

Protestos do PCP.

Já foi verificado, nomeadamente ao nível da OCDE, que nós não temos hoje uma distribuição mais

assimétrica do rendimento do que aquela que tínhamos há três ou há quatro anos. Repare bem, Sr.ª

Deputada: temos todos menos rendimento — isso é verdade! — e vamos passar a crescer a partir de um nível

mais baixo do que aquele que atingimos em 2011. Mas como em 2011 esse nível era artificial, a Sr.ª Deputada

deve estar, com certeza, satisfeita, porque agora podemos partir de um nível realista e verdadeiro.

Depois, diz: «Mas não fala do desemprego, não fala da emigração, não fala, não fala, não fala…». Ó Sr.ª

Deputada, não falo de outra coisa! A Sr.ª Deputada é que gostaria que não nos comparássemos com nada,

mas houve outros países que, em circunstâncias idênticas às nossas, tiveram fenómenos de emigração.

A Sr.ª Deputada gostaria que eu dissesse que a emigração é um fenómeno que não tem compreensão em

processos de ajustamento. Mas não é assim, Sr.ª Deputada! Admito isso, já o disse, tendo até sido criticado

por dizê-lo — imagine! E até caracterizaram o facto de eu ter reconhecido isso como um convite à emigração

— imagine a Sr.ª Deputada!

Portanto, falo do desemprego e falo da emigração. Mas, Sr.ª Deputada, as regras que temos para tratar o

desemprego são as mesmas que a Espanha tem, que a França tem, que a Itália tem, que a Alemanha tem,

que a Grécia tem, que todos os outros têm! Por que é que os outros têm taxas realistas e a portuguesa está

errada?! Porquê, Sr.ª Deputada?!

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Estão todas!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Não lhe dá jeito? Preferia que a taxa fosse outra? Mas, Sr.ª Deputada, a taxa

de desemprego é o que é, é de 14,3%. Representa uma taxa muito elevada, Sr.ª Deputada, mas por isso é

que referi que a nossa principal preocupação é, justamente, a de investir numa estratégia nacional de combate

ao desemprego e de promoção do emprego, que passa, evidentemente, também, por conseguir atrair

investimento e por ter um Estado menos gastador e mais equilibrado.

Termino, Sr.ª Deputada, dizendo o seguinte: nós não estamos a caminhar para um estado de

subdesenvolvimento. É preciso conhecer muito pouco do mundo para fazer uma observação dessas, Sr.ª

Deputada. Nós não caminhamos para um estado de subdesenvolvimento. Mas quero dizer-lhe que estávamos

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a caminhar, galopantemente, para um Estado de segunda categoria, que não tinha condições para cumprir e

honrar os seus compromissos e que não tinha acesso a financiamento.

Ai do Estado que não tem acesso a financiamento, Sr.ª Deputada! Não desejaria, nunca, para o meu País,

um estado de autarcia em que, por uma questão de orgulho ou de outra natureza, tivéssemos de impor aos

portugueses sacrifícios que não fossem admissíveis numa sociedade moderna. Mas uma sociedade moderna

tem de ter regras, e essas regras não são apenas aquelas que nos impelem a ganhar votos nas eleições, são

também aquelas que estão disponíveis para conquistar o futuro, mesmo que seja à custa de políticas que

possam não ser populares. Mas serão os eleitores a julgar-nos por isso!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos de Os Verdes.

A Sr.ª Presidente: — A Sr.ª Deputada Catarina Martins pediu para interpelar a Mesa.

Tem a palavra, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr.ª Presidente, queria apenas solicitar a V. Ex.ª a distribuição de um

documento.

Se me permite, o Sr. Primeiro-Ministro pediu-me para distribuir o estudo do FMI que fala dos benefícios da

reestruturação da dívida, quando há critérios iguais àqueles que Portugal tinha em 2011. Tenho comigo esse

estudo, que é de junho de 2014.

Penso que é sempre relevante que, nestes nossos debates, para lá das nossas opiniões e de o Sr.

Primeiro-Ministro falar das obrigações que vêm do FMI, leia também os estudos, para saber que, se calhar, a

reestruturação não é um «papão». Pelo contrário, aqui está o estudo que comprova que é bem mais

abrangente do que pensa.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — O documento vai ser distribuído, Sr.ª Deputada.

Para interpelar a Mesa, nos mesmos termos, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, quero apenas dizer que tenho os dois documentos a que a

Sr.ª Deputada fez alusão. O que queria mesmo — de resto, disse na minha intervenção que estudei as fontes

e não encontrei o que a Sr.ª Deputada diz — era que a Sr.ª Deputada dissesse onde é que isso está escrito.

Por isso, convidei-a a ler, a citar, nos estudos que refere, aquilo que disse, isto é, que o FMI defende que

Portugal devia ter reestruturado a sua dívida em 2011.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Também para interpelar a Mesa, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, gostava apenas de perguntar ao Sr. Primeiro-

Ministro, através da Mesa, se tem alguma lista dos edifícios públicos com amianto para entregar hoje na

Câmara. Basta acenar com a cabeça para dizer se sim ou não, não é preciso perdermos mais tempo.

A Sr.ª Presidente: — Sr.ª Deputada, trata-se de uma interpelação atípica, como, aliás, já é costume aqui,

no Parlamento.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr.ª Presidente, permite-me o uso da palavra?

A Sr.ª Presidente: — Pede a palavra para que efeito, Sr.ª Deputada?

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A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Para uma interpelação à Mesa, Sr.ª Presidente, no seguimento da

interpelação do Sr. Primeiro-Ministro sobre a distribuição do documento.

A Sr.ª Presidente: — Faça favor, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr.ª Presidente, nós somos todos inteligentes. Há um documento do FMI,

que é um estudo longo e que aponta os critérios em que a reestruturação deve ser feita, antes dos programas

de ajustamento, e os critérios são aqueles que se encaixam no caso de Portugal.

Continuo a considerar importante que o Sr. Primeiro-Ministro leia o documento e, por isso, volto a solicitar

que seja distribuído.

Vozes do BE: — Muito bem!

Protestos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, a questão está resolvida enquanto questão processual, tudo o resto

ficará para outras oportunidades de debate.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, permite-me o uso da palavra?

A Sr.ª Presidente: — Faça favor, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, peço desculpa, mas gostava de obter uma

resposta à interpelação que fiz à Mesa.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Sr.ª Deputada, já lhe respondi: a pergunta que fez não cabe na figura processual da

interpelação à Mesa.

Srs. Deputados, vamos prosseguir.

Como sabem, há ainda um conjunto de 11 Srs. Deputados inscritos para formularem as suas perguntas,

depois desta primeira ronda. O Governo já informou a Mesa de que o Sr. Primeiro-Ministro vai responder a um

primeiro conjunto de cinco e, depois, a um conjunto de seis pedidos de esclarecimento.

Assim sendo, para formularem as suas perguntas, no primeiro conjunto, estão inscritos os Srs. Deputados

António José Seguro, Hugo Lopes Soares, Hélder Amaral, Francisco Lopes e Helena Pinto.

Tem, pois, a palavra o Sr. Deputado António José Seguro.

O Sr. António José Seguro (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, como sabe, nunca foi o objetivo

da consolidação das contas públicas que nos dividiu; o que nos dividiu, e continua a dividir, é a estratégia para

o conseguir.

Para o Primeiro-Ministro, a estratégia anunciada há três anos era simples: austeridade em cima de

austeridade, cortes em cima de cortes, na expectativa de que as exportações fossem o motor da economia e,

a partir daí, resolvermos o problema da economia e das contas públicas. Essa receita, tal como tivemos

oportunidade de dizer no início, falhou!

A nossa proposta foi diferente: a consolidação devia ser feita de uma forma sustentável, por via do rigor e

da disciplina orçamental…

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Ainda queria mais?!

O Sr. António José Seguro (PS): — … e, simultaneamente, através do dinamismo da economia, como

forma de gerar receitas para equilibrar as contas públicas e garantir sustentabilidade na escola pública, no

Serviço Nacional de Saúde e na proteção social pública.

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Sempre foi essa a nossa grande divergência.

Chegados aqui, constatamos que as exportações têm vindo a desacelerar. E o que é que tem acontecido?

O que houve de contributo para o desempenho da economia, ainda que com um crescimento anémico, no ano

passado, como o Primeiro-Ministro sabe, foi a procura interna, isto é, o facto de haver um pouco mais de

rendimento no bolso dos portugueses, proveniente, entre outros, das decisões do Tribunal Constitucional.

Aliás, basta haver uma animação da procura interna para haver um aumento das importações. E esse é um

sinal óbvio de que não houve uma alteração do perfil da nossa economia ao longo destes três anos, isto é, o

que era exigido ao Governo e em que, na minha opinião, o Governo falhou, era que tivesse aproveitado estes

três anos para criar condições de sustentabilidade para conseguirmos combater a crise, equilibrar as contas

públicas e ter uma economia com um outro perfil. O Governo falhou, daí que qualquer crescimento por via da

procura interna vá criar um desequilíbrio na nossa balança externa. Este é o problema!

É por isso que os fundos comunitários, quer aqueles que tínhamos, quer aqueles que estão à nossa

disposição até 2020, são fundamentais, não para repetir erros, que também existiram no passado, em

diferentes Governos, mas, sobretudo, para escolher novas prioridades para a nossa economia,

designadamente nos setores dos bens transacionáveis internacionais, porque é aí que devemos apostar, quer

ao nível da qualificação de empresários e trabalhadores, quer ao nível do apoio a projetos que criem emprego.

Só assim diminuímos a nossa dependência externa.

Foi nesse sentido, Sr. Primeiro-Ministro, que, em 5 de outubro de 2012, em nome do Partido Socialista,

propus a criação de um banco de fomento.

O Sr. António Braga (PS): — Muito bem!

O Sr. António José Seguro (PS): — Porquê? Porque um banco de fomento cumpriria esse objetivo,

através de fundos comunitários, que seriam colocados na economia a uma taxa de juro muito baixa e que

deveriam estar sempre a financiar essa economia.

Ora, passados dois anos, não temos esse banco de fomento a funcionar. E pergunto: porquê?! Não temos

os 5000 milhões de euros dos fundos comunitários passados à nossa disposição e da economia. E

perguntamos: porquê?! Não temos ainda o acordo de parceria a funcionar. E perguntamos: porquê?!

O Primeiro-Ministro tem todo o direito de divergir do PS, como o PS tem todo o direito de divergir do

Governo, mas há questões essenciais que têm a ver com a ajuda à nossa economia e a que o Primeiro-

Ministro persiste em não responder. Nós compreendemos porque é que não responde: não tem resposta e

não consegue assumir aqui, no Parlamento, como devia, que falhou na estratégia a que tem vindo a obrigar o

País ao longo destes três anos.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Para formular as suas perguntas, tem, agora, a palavra o Sr. Deputado Hugo Lopes

Soares.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, o debate sobre o estado da

Nação deve servir também, e sobretudo, para olharmos para o futuro.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Curiosamente, aqueles que se quiseram prender ao passado foram

os partidos da oposição. Pergunto-me porquê, tanto mais que o responsável pelo passado negro que vivemos

nos últimos anos é, sobretudo, o Partido Socialista. E parece uma espécie de masoquismo político o Partido

Socialista querer continuar a falar de um passado que é mau para os portugueses, mas do qual é o principal

responsável.

Mas, queria falar-lhe do futuro, Sr. Primeiro-Ministro, e queria falar-lhe de coesão territorial, de

modernização da Administração Pública, dos serviços públicos, de descentralização das políticas públicas.

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O Primeiro-Ministro já teve oportunidade de falar, na sua intervenção inicial, sobre o programa Aproximar-

Programa de Descentralização de Políticas Públicas, sobre o transporte a pedido, o transporte porta a porta,

sobre as lojas do cidadão, essas novas lojas do município, não aquelas megalómanas do Partido Socialista,

mas umas novas lojas do cidadão ao serviço das populações.

Queria também falar-lhe do Espaço do Cidadão, já em uso na Câmara Municipal de Loures e com tanto

sucesso, e do Mediador Digital, e queria perguntar- lhe se estas medidas que o Governo tem implementado na

reorganização dos serviços públicos são ou não fundamentais para a organização de uma melhor

administração, mas sobretudo na luta por uma coesão territorial que todos queremos.

Uma pergunta final, Sr. Primeiro-Ministro, relativamente à natalidade — coesão territorial é também

natalidade. O Primeiro-Ministro teve oportunidade de dizer que queria colocar esse tema na agenda nacional e

tem-no feito; agora, também no passado recente, disse que queria coloca-lo na agenda europeia. Sr. Primeiro-

Ministro, o que é que o Governo tem previsto, para o futuro, que possa dar alento a Portugal, dar alento e

esperança aos portugueses, que não seja o mesmo que o Partido Socialista e a oposição têm dado, que, de

facto, é pessimismo em cima de pessimismo, não sendo esse o caminho que nós queremos seguir.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — A próxima pergunta vai ser formulada pelo Sr. Deputado Hélder Amaral.

Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, falou-nos aqui de um Estado

mais ágil, mais forte, que esteja mais ao serviço do cidadão e da economia e, além disso, que seja um Estado

imparcial, acima dos interesses setoriais e corporativos e que represente o País no seu todo.

A pergunta anterior toca ao de leve nesse assunto e eu queria complementá-la, pois era desse País, no

seu todo, de que eu lhe queria falar, nomeadamente de algo que, creio, partilha comigo, que é o carinho

especial pelo interior. Queria, pois, perguntar-lhe: como é que concretizamos esta política? Como é que

garantimos ao interior igualdade de oportunidades?

Também no que concerne ao investimento, há um conjunto de coisas muito interessantes que acontecem

no interior. Há gente, há autarcas, há empresas, há trabalhadores que estão a fazer um esforço e que estão

disponíveis para ajudar o Governo neste novo País. Há, pois, muita coisa interessante que merece ser

acarinhada e apoiada em termos de investimento, como alguns investimentos que o Governo, e bem, tem

conseguido, nomeadamente aqueles que também já foram aqui referidos, sete investimentos que garantem

basicamente 1784 empregos e que garantem 406 novos empregos em terras como Idanha-a-Nova, Nelas,

Aljustrel ou Vila Velha de Ródão.

A minha pergunta visa, no fundo, saber como é que garantimos um Estado eficaz, rigoroso com o uso do

dinheiro dos contribuintes, rápido no serviço que presta aos cidadãos e, ao mesmo tempo, tanto quanto

possível, próximo. Considero que o interior pode dar um contributo muito positivo nesse sentido. Para além

daquela velha discussão de lamechice ou de chamar a atenção para outros problemas, que existem, de facto,

eu preferia que pudéssemos falar de algo mais positivo, de algo para que o interior está disponível para

contribuir.

Sei que o Governo tem um pacote enorme de propostas para ajudar o interior a ser igualzinho ao litoral ou,

se possível, para também conseguir níveis de desenvolvimento idêntico. Considero que temos condições para

o melhorar e para o conseguir.

A Sr.ª Presidente: — A próxima pergunta vai ser formulada pelo Sr. Deputado Francisco Lopes, do PCP.

O Sr. Francisco Lopes (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, hoje pode ver-se o Estado a que

este Governo e esta política conduziram a Nação. Depois da propaganda sobre a chamada saída da troica, a

realidade aí está a mostrar os dramas sociais, a fragilidade das estruturas produtivas, o aumento da dívida.

Contra a Constituição da República, prossegue o propósito dos cortes nos salários e nas pensões; nos

apoios sociais aos idosos, às crianças, aos jovens, aos desempregados; prossegue o propósito da caducidade

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da contratação coletiva, da tentativa de aumento e de regulamentação dos horários de trabalho, da

generalização da precariedade.

Sucedem-se os ataques à Administração Pública, aos direitos dos trabalhadores e das populações, com

encerramentos e uma degradação geral dos serviços. Ainda na passada segunda-feira, pessoas que

chegaram antes das 9 horas à fila para a segurança social em Lisboa só foram atendidas às 16 horas. Tiveram

que esperar 7 horas, Primeiro-Ministro! E há quem tenha esperado mais! É a isto que chama, como referiu na

sua intervenção, um Estado ágil?!

Por sua vez, o Serviço Nacional de Saúde é golpeado um pouco por todo o País, negando o direito à

saúde, com os doentes autenticamente abandonados nas urgências, esperando horas e horas para serem

atendidos, com carências e falta de meios de toda a ordem, ao ponto de até as famílias terem de levar para os

hospitais as almofadas para as camas dos internados.

Vozes do PCP: — Uma vergonha!

O Sr. Francisco Lopes (PCP): — Sr. Primeiro-Ministro, era a isto que se referia quando falava, na sua

intervenção, de modernização dos serviços?!

E, do outro lado, vemos que o grande capital continua à rédea solta, como se não bastassem as benesses.

Como se não bastassem todos os escândalos da banca, aí temos a situação do BES e aí temos a exigência

de intervenção do Estado para evitar que deixar degradar a situação venha a justificar o injustificável: a

nacionalização dos prejuízos, seja qual for a forma que venham a assumir.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. Francisco Lopes (PCP): — A situação do País é chocante, mas o Governo quer ainda mais. A

realidade do rumo da continuação da política de direita e da dedicação nacional é a da degradação

económica, social e política, que afunda Portugal e compromete o seu futuro por muitas décadas! É uma

opção pela exploração, pelo empobrecimento e pelo definhamento do País, pelo favorecimento da

especulação, pelo domínio dos grandes grupos económicos e financeiros, com os escândalos e a corrupção

que lhes estão associados!

A ferro e fogo, custe o que custar para o povo e o País, a opção deste Governo e desta política é pela

dependência e pela submissão à dívida, ao tratado orçamental, à lógica trituradora do euro e da União

Europeia.

Por tudo isto, Sr. Primeiro-Ministro, o estado da Nação evidencia a urgência da interrupção do caminho de

ruína nacional que está em curso e coloca, com cada vez mais força, a necessidade da alternativa patriótica e

de esquerda que o PCP propõe, que incomoda o Governo, mas que é cada vez mais necessária ao País para

garantir o seu futuro.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Para formular a próxima pergunta, pelo Bloco de Esquerda, tem a palavra, a Sr.a

Deputada Helena Pinto.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, quero convidá-lo a retornar à realidade.

Quero convidá-lo a observar a realidade do nosso País e a pronunciar-se sobre ela.

E a realidade de que lhe quero falar tem alguns números, números oficiais do seu Governo: mais de 400

000 desempregados, ou melhor, 412 000, para ser precisa, sem qualquer tipo de apoio; mais de 49 000

pessoas, neste ano, perderam o rendimento social de inserção; mais de 38 000 idosos, só este ano, não os 50

000 desde que o senhor está no Governo, perderam o complemento solidário para idosos.

Sr. Primeiro-Ministro, antecipo-lhe já a sua resposta: não fale em rigor. Os senhores alteraram as regras e,

sendo assim, com a alteração das regras, prejudicaram milhares de pessoas.

Veja bem o caso dos idosos: o valor de referência para ter acesso à prestação foi alterado; aumentaram a

idade para 66 anos em vez dos 65 anos, e de uma forma praticamente administrativa empurraram milhares de

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idosos para uma situação de pobreza ainda maior do que aquela em que viviam. Sr. Primeiro-Ministro, poderia

dar uma resposta sobre este aspeto?

Mas os números continuam: 181 000 reformas penhoradas, mais de 0,5 milhão de salários penhorados,

6485 contas bancárias penhoradas por mês — sublinho, por mês! —, 150 000 famílias deixaram de conseguir

pagar a casa no ano passado, segundo o Banco de Portugal, o fisco penhora 189 casas, por dia — dados da

Autoridade Tributária.

E se tudo isso não bastasse, Sr. Primeiro-Ministro, ainda temos os cortes no fornecimento de água e luz às

famílias pobres. E aqui falamos de direitos humanos básicos.

A EDP cortou a luz a 300 000 famílias! Só a EPAL cortou a água a 12 000 famílias!

É o este o estado da Nação de que o Sr. Primeiro-Ministro falou?!

Este é o retrato do País do empobrecimento, é o resultado das suas políticas, estes são milhares e

milhares de cidadãos, aos quais o seu Governo voltou as costas.

Mas quero pergunto-lhe, Sr. Primeiro-Ministro: que resposta dá a estes milhares de portugueses e

portuguesas — homens, mulheres, crianças, velhos? Tem resposta para eles? Ou simplesmente fecha a

porta?

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, tentarei ser sintético nas respostas, dado o pouco tempo de

que disponho.

Queria, no essencial, aproveitar esta ronda para dar uma resposta à Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, que

agora não se encontra na Sala. Há pouco não lhe respondi a propósito da questão do amianto, o que foi, de

facto, um lapso meu.

Houve um atraso na forma como procurámos harmonizar todo o inventário que foi feito, e essa é a razão

por que, de acordo com os esforços que agora estão também a ser desenvolvidos pela Autoridade para as

Condições do Trabalho (ACT) e com a Direção-Geral do Tesouro e Finanças, temos condições para que

possam ser carregados todos os dados levantados em todas as áreas setoriais num site adequado, que nos

permitirá, até ao final deste mês, publicar toda a listagem que estava referenciada quanto aos imóveis com

suscetibilidade de conter amianto.

Sr. Deputado António José Seguro, aquilo que, na sua descrição, nos tem dividido é o tipo de consolidação.

O Sr. Deputado acha que é possível fazer uma consolidação que não sacrifique tanto a despesa pública. No

fundo, é disso que estamos a falar, porque o Sr. Deputado disse que o Governo insistiu muito numa linha de

austeridade e falhou — numa linha de austeridade é verdade, que falhou não é verdade, Sr. Deputado!

Protestos do PS.

Tanto não é verdade que nós atingimos as nossas metas e fechámos o Programa de Assistência

Económica e Financeira. Portanto, a verdade, Sr. Deputado, é que a austeridade que estava contida no

Memorando que foi negociado pelo próprio Partido Socialista e que nós, evidentemente, fomos reajustando às

metas que eram necessárias, não falhou, pois permitiu-nos chegar ao fim do Programa e retornar a

financiamento não oficial como era o nosso propósito, como é evidente.

O Sr. Deputado disse que a consolidação era diferente. Claro que é diferente. O Sr. Deputado só não disse

como, porque ao dizer que seria mais complacente do lado da despesa, não diz, então, como é que atingiria

as metas. Mas como, de vez em quando, fala em metas ainda mais ambiciosas, como aquelas que constavam

do PEC 4, e que exigiriam, evidentemente, mais austeridade, não percebo muito bem o que o Sr. Deputado

quis dizer.

A não ser — já o referi uma vez — que esteja como naquela situação em que nós dizemos: «Bem, o

senhor não tem dinheiro para crescer, não é? Olhe, sabe qual é o seu problema? É não ter dinheiro! Mas se o

senhor tivesse dinheiro, tudo isto seria de outra maneira».

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Pois, isso já nós sabemos, Sr. Deputado, mas evidentemente que não tem valor acrescentado para

resolver os problemas das pessoas. E esse é que é o problema! Temos de resolver os problemas das

pessoas, não podemos fazer umas declarações vazias de intenção.

O Sr. Deputado disse também que o modelo está em causa por causa das exportações e que aquilo que

tem acontecido é que, com o aumento do rendimento disponível, consolidado a partir de decisões que

resultaram de acórdãos do Tribunal Constitucional, a nossa procura interna aumentou e que, com isso,

realmente, o crescimento começou a dar de si, que é como quem diz: «Estão a ver? Desde que tenhamos

dinheiro para gastar, a economia cresce.» Ó Sr. Deputado, peço desculpa, mas não é assim!

Pensei que isso já estivesse esclarecido de uma vez por todas!

Protestos do Deputado do PS António José Seguro.

Aquilo que nós tivemos de reduzir, do lado da despesa, porque não estava consentâneo com a

interpretação que se fazia da Constituição, fomos buscar do lado dos impostos, Sr. Deputado! Foi-se na

mesma ao rendimento, não há mais rendimento!

Se vir as contas nacionais, publicadas pelo INE, relativas ao primeiro trimestre, verificará que o rendimento

disponível baixou, Sr. Deputado. Não aumentou, baixou! Mas vai aumentar no futuro, só que não vai aumentar

ficticiamente à custa do crédito e da dívida, tem de aumentar de acordo com os rendimentos que são gerados

na economia.

O Sr. Deputado diz: «Bem, se a economia crescesse mais, recebíamos mais de coleta dos impostos».

Como é que o Prof. Teixeira dos Santos não se lembrou disso?!… Como é que o Prof. Hernâni Lopes não se

lembrou disso em 1983?!… Pois claro, pomos a economia a crescer, recebemos mais impostos, não

precisamos de cortar tanto a despesa e a coisa resolve-se!…

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Milagre!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Por que é que os outros não fizeram esse milagre? Ó Sr. Deputado, parece de

uma ingenuidade extraordinária!…

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Disse o Sr. Deputado Hugo Soares que a modernização da Administração Pública tem de ser feita com

concertação territorial e que a coesão territorial tem de estar também no âmago das políticas de

modernização. Como procurei destacar na minha intervenção, temos todo o interesse em prosseguir políticas

de reorganização dos serviços de atendimento público que prestem um bom serviço, próximo das pessoas,

sem que necessariamente o chamado back office desse serviço tenha a configuração que tem hoje.

É possível, hoje, prestar um serviço próximo das pessoas sem manter as mesmas estruturas que estão

espalhadas pelo território e que estão datadas, fazem parte de uma configuração do Estado e da

Administração que não se adequa aos tempos de hoje.

Claro que todos os que estão agarrados às estruturas existentes e que têm uma visão absolutamente

imobilista daquilo que é a Administração preferem dizer: «Não, não, os senhores só estão a fazer isso porque

precisam de dinheiro». Mas eu digo: «Não, não, nós precisamos de poupanças, mas também precisamos de

fazer um melhor serviço para as populações».

Por isso, a reorganização será feita em conjugação com as câmaras municipais, com os territórios de baixa

densidade na primeira linha da nossa preocupação e com as comunidades intermunicipais. E com elas vamos

fazer mais do que a reorganização de serviços, vamos fazer descentralização de funções do Estado, ao nível

dos cuidados primários de saúde, ao nível dos ensinos básico e secundário ou, mesmo, ao nível da segurança

social e do apoio que é preciso prestar às instituições de solidariedade social. Não há nenhuma razão para

que o Estado central se comporte como se tem vindo a comportar há dezenas de anos.

Como disse, e repito, não há nenhuma razão para que seja o Ministro da Saúde ou o Secretário de Estado

da Saúde a dizer qual é o horário de funcionamento de um centro de saúde.

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O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Não é o Ministro da Solidariedade, Emprego e Segurança Social nem o

Secretário de Estado da Solidariedade e da Segurança Social que têm de determinar as condições de

flexibilidade com que os apoios podem ser dirigidos para as instituições que mais precisam deles e que sabem

quais são as pessoas mais carenciadas.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Ainda vivemos numa visão retrógrada do Estado e temos de a superar.

Portanto, sim, Sr. Deputado, precisamos de ter uma visão moderna da Administração Pública, mais

descentralizada na forma como está organizada e que privilegie a coesão territorial.

O Sr. Deputado abordou também as questões da natalidade.

Enquanto Presidente do PSD, anunciei que um grupo de trabalho iria apresentar publicamente um conjunto

de orientações, de propostas, de sugestões que gostaríamos de sujeitar a debate público, sendo que, na

altura, até convidei as outras forças partidárias a fazerem o mesmo. Evidentemente, o Governo também terá a

sua intervenção nesta matéria e — já o disse publicamente e reafirmo-o aqui — não deixará de suscitar este

debate no contexto europeu, porque esta é uma matéria também de perfil europeu.

Apesar de alguns países, com a França à cabeça, não terem o problema que nós temos, esses casos são

as exceções à regra. A generalidade dos países europeus encara, nesta altura, uma demografia recessiva que

pode vir a pôr em causa a sua sustentabilidade no médio e no longo prazos. Por isso, estes países precisam

de muito imigração e não de restrições à liberdade de circulação — aliás, é isso que tenho defendido também

no espaço europeu. Mas esse é um debate que vamos ter de travar, com tempo e dignidade, no Parlamento e

que deverá ser tratado também do ponto de vista do contexto europeu.

Sr. Deputado Hélder Amaral, não posso ser mais positivo, indo ao encontro da sua preocupação, quanto à

aposta que devemos fazer no interior do País, não apenas em termos de investimento mas também de

políticas públicas.

É verdade que há hoje uma rede de contexto que permite aos investidores verem atratividade em muitos

territórios do interior, e não apenas do litoral, que há respostas que as políticas públicas ainda têm de realizar

para garantir uma maior e efetiva atratividade de alguns territórios, mas algumas das apostas contidas nos

projetos, nomeadamente, nas áreas dos transportes e das infraestruturas, para os próximos sete anos, vão ao

encontro dessas preocupações de trazer o investimento público para próximo das necessidades das empresas

e das famílias, que precisam de atrair ainda mais investimento, de criar postos de trabalho e de ter acesso aos

mercados relevantes mais rapidamente.

O Sr. Deputado Francisco Lopes disse, entre outras coisas, que o Serviço Nacional de Saúde está

abandonado. Sr. Deputado, não tenho tempo para responder a tudo o que me foi perguntado, mas, como já

aqui tinha sido feita uma referência a esta matéria e eu não tinha podido responder, faço-o agora.

Sr. Deputado, o Serviço Nacional de Saúde não ficou de fora da contenção orçamental,…

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Não?!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … mas a verdade é que gastámos efetivamente mais com a área da saúde do

que qualquer Governo antes de nós.

O Sr. José Junqueiro (PS): — Não, não!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sabe porquê, Sr. Deputado? Vou dizer-lhe: porque tivemos de pagar as

dívidas,…

Vozes do CDS-PP: — Ah!…

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Ora aí está!

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O Sr. Primeiro-Ministro: — … as tais dívidas que o Sr. Deputado António José Seguro quer que o Estado

pague. Andamos a pagar dívidas, Sr. Deputado!

O Sr. Deputado gostaria que, em vez de pagarmos essas dívidas, tratando, depois, de racionalizar os

serviços, continuássemos a aumentar essa dívida. Porque para o Sr. Deputado, no que toca à saúde, no que

toca ao emprego, no que toca à segurança social, no que toca à cultura, no que toca a tudo o que o Estado

deva gastar, não deve ser feita conta, o que é preciso é assegurar que se gaste! E, se se gastar, o País há de

ficar melhor! Sr. Deputado, a verdade é que isso conduziu o País à ruína.

A Sr.ª Presidente: — Queira concluir, Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Finalmente, Sr.ª Presidente, gostaria de dizer à Sr.ª Deputada Helena Pinto

que o facto de as regras relativas ao complemento solidário para idosos terem sido alteradas, como foram

alteradas as regras relativas ao rendimento social de inserção e, em muitas outras circunstâncias, a outras

prestações, não impediu o Estado, através do Governo, de ter uma despesa com prestações sociais mais

elevada do que antes da crise. Isto significa, Sr.ª Deputada, que conseguimos canalizar, através do Programa

de Emergência Social, um volume financeiro maior destinado justamente a impedir que as pessoas pudessem

ficar para trás.

Portanto, Sr.ª Deputada, não, nós não virámos as costas a quem tem dificuldades, não, nós não podemos

colocar o Estado a financiar todos aqueles que têm dificuldades e dívidas, não, Sr.ª Deputada, não o podemos

fazer, mas podemos fazer cumprir regras.

A Sr.ª Presidente: — Queira concluir, Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — E a regra é que as penhoras não podem ir além do salário mínimo nacional,

considerado o mínimo para se poder viver com dignidade.

Sr.ª Deputada, os compromissos assumidos pelos particulares, evidentemente, não podem ser suportados

pelo Estado,…

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Quais compromisso?!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … mas creio que não era essa a sua proposta.

Portanto, ficou registada a sua pergunta sobre as dificuldades que os portugueses estão a passar, mas não

a solução que a Sr.ª Deputada defende para que essas dificuldades possam ser superadas.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Qual é a sua solução?

A Sr.ª Presidente: — Sr. Primeiro-Ministro e Srs. Deputados, como foi anunciado pela Mesa, há ainda mais

seis inscrições para pedir esclarecimentos, mas o Sr. Primeiro-Ministro já não dispõe de tempo para

responder.

A Mesa, por princípio, não tem, nem deve ter, qualquer critério de paternalismo, diria assim, na distribuição

dos tempos, mas ponho à consideração da Câmara o facto de haver seis inscrições para fazer perguntas e de

o Sr. Primeiro-Ministro não ter tempo para responder.

A validade das perguntas é politicamente autónoma, mas não posso dar a palavra sem deixar de referir

previamente a esta situação.

Pausa.

Srs. Deputados, a bancada do CDS-PP informou a Mesa que cede 4 minutos do seu tempo ao Sr.

Primeiro-Ministro.

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Estão inscritos, para fazer perguntas, os Srs. Deputados José Junqueiro, do PS, Carlos Abreu Amorim, do

PSD, Mariana Mortágua, do Bloco de Esquerda, António Rodrigues, do PSD, e Mariana Aiveca, do Bloco de

Esquerda.

Tem, então, a palavra o Sr. Deputado José Junqueiro.

O Sr. José Junqueiro (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, diz o Sr. Primeiro-Ministro que o

Governo atingiu todas as metas. Ter subido a dívida de 94% do PIB para 133% do PIB é uma meta, Sr.

Primeiro-Ministro?

O Sr. António José Seguro (PS): — Muito bem!

O Sr. José Junqueiro (PS): — Emigraram do nosso País mais de 200 000 pessoas. Esta emigração

maciça do País, sobretudo de jovens, é uma meta, Sr. Primeiro-Ministro?

Diz o Sr. Primeiro-Ministro que atingimos o fim do Estado de emergência. Nesse contexto, pergunto: o Sr.

Primeiro-Ministro segue as sugestões do PS para uma política fiscal amiga das famílias e das empresas,

adotando as propostas sobre o IVA, o IRC, o IRS e, por exemplo, a conta-corrente entre o Estado e as

empresas?

O Sr. António José Seguro (PS): — Muito bem!

O Sr. José Junqueiro (PS): — No que respeita aos cortes provisórios e ao fim do Estado de emergência, o

Sr. Primeiro-Ministro recua e deixa de transformar em definitivos os cortes que dizia serem provisórios?

Outra questão: Sr. Primeiro-Ministro, terminado este período de emergência, está em condições de dizer

que não vai cortar mais salários, mais pensões e mais reformas?

Na saúde, Sr. Primeiro-Ministro, está em condições de garantir a normal reposição dos recursos humanos

e materiais para evitar a calamidade que atinge os equipamentos sociais? Hoje mesmo, tivemos conhecimento

dos episódios de Loulé e de São Brás de Alportel.

Está o Sr. Primeiro-Ministro em condições de dizer que vai pagar as dívidas, por exemplo, dos dispositivos

da saúde, que aumentaram exponencialmente de 2011 para 2014, de 800 milhões de euros, que envolvem

1300 pequenas e médias empresas (PME) e cerca de 6000 postos de trabalho? Está em condições de dizer,

Sr. Primeiro-Ministro, que vai assegurar esse pagamento?

Finalmente, na justiça, Sr. Primeiro-Ministro, vai travar uma reforma absurda, que afasta as pessoas do

acesso à justiça? Vai dar por finda a ameaça que fez de extinção de 150 repartições de finanças?

Por fim, Sr. Primeiro-Ministro, relativamente ao QREN, quais são as medidas que propõe para lançar na

economia 5000 milhões de euros que ainda tem do atual Quadro Comunitário de Apoio?

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — A próxima pergunta é do PSD.

Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Abreu Amorim.

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, o sistema de justiça não tem

sido um motivo de especial orgulho nos últimos anos do regime democrático. Infelizmente, a justiça

portuguesa tem tido como imagem de marca a lentidão, a falta de celeridade e a criação de entropias à

economia, atrapalhando a vida de muitos portugueses.

Contudo, este Governo fez mais em três anos pela boa reforma da justiça do que os Governos dos últimos

20 anos juntos.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Muito bem!

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Lembro apenas algumas das reformas: o novo Código de Processo

Civil; a reforma do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas; os novos mecanismos de apoio

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judiciário; o procedimento extrajudicial pré-executivo; o novo Código do Procedimento Administrativo. E

podíamos continuar a elencar, Sr. Primeiro-Ministro, para reafirmar aquilo que disse há pouco.

Este Governo fez mais pela boa reforma da justiça do que os Governos dos últimos 20 anos.

Protestos do PS.

Neste momento, está em curso a reforma do mapa judiciário. É uma mudança que nunca foi ousada antes,

a reforma do sistema organizacional da aplicação concreta da justiça, e a esmagadora maioria dos atores

judiciários está de acordo com esta reforma, apenas se permitindo discordar aqueles que estão sempre do

contra e aqueles que usam o sistema de justiça como mero trampolim para a atividade política pura e dura.

Sendo assim, Sr. Primeiro-Ministro, e tendo em conta que todas as diligências para a implementação desta

reforma estão em pleno curso — por exemplo, a transposição de mais de 3,5 milhões de processos para uma

adequada plataforma digital, os concursos de magistrados, entre outras —, gostaria que dissesse se o

Governo está em condições de assegurar que esta verdadeira reforma das reformas será operacionalizada

finalmente, permitindo que os portugueses tenham direito a uma justiça digna e célere.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente: — A próxima pergunta é do Bloco de Esquerda.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Mortágua.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, vi-o expressar a maior satisfação

pela redução da taxa do desemprego. Não tenha dúvidas, Sr. Primeiro-Ministro, que nós também gostaríamos

que essa diminuição da taxa fosse um reflexo da realidade, mas não é.

A realidade dos jovens que procuram emprego são estágios, estágios que reduzem a taxa de desemprego,

mas não aumentam o emprego. A realidade dos jovens desempregados, estagiários, bolseiros, precários, que

nunca passam dos 500 € por mês, é emigração. Emigração que reduz a taxa de desemprego, mas não

aumenta o emprego. O seu Governo, Sr. Primeiro-Ministro, desistiu de criar emprego para criar estágios. Na

prática, incentiva e financia a precariedade nos privados.

Mas como, ainda assim, estes milhares de jovens tinham demasiados direitos, o seu Governo desistiu de

criar estágios para criar miniestágios; transformou estágios de 12 meses, que davam direito a subsídio de

desemprego, em estágios de 9 meses, para garantir que estes jovens descontem para o subsídio de

desemprego mas esses jovens não têm direito a ele quando ficam no desemprego, porque é isso que eles

são.

Pior: o seu Governo criou bolsas para IPSS (Instituições Particulares de Solidariedade Social), onde jovens

trabalham ao lado de profissionais — o mesmo tempo que os trabalhadores — e recebem bolsas de 200 €

para quem não tem a escolaridade obrigatória e de 400 €, abaixo do salário mínimo, para licenciados. Isto é a

desistência, Sr. Primeiro-Ministro! O seu Governo desistiu do emprego, desistiu dos estágios, desistiu dos

direitos, desistiu dos jovens… e os jovens desistiram do País.

É por isso que temos hoje uma vaga, uma chaga, de exilados económicos em Portugal. E não são precisos

dados, Sr. Primeiro-Ministro: quem vê este debate não conhece ninguém — um irmão, um amigo, um colega

de escola, um sobrinho — que não tenha emigrado. Quem não conhece uma pessoa, um amigo, um familiar

que não tenha emigrado?

O Sr. Primeiro-Ministro fala demagogicamente sobre o direito dos jovens em irem à procura de aventuras,

em irem para fora. O problema é que não reconhece nem garante o direito aos jovens que querem ficar, o

direito à não emigração. É esse o direito que o Sr. Primeiro-Ministro não reconhece e, por isso, o legado do

seu Governo é, de facto, a desagregação de toda uma geração, uma geração que saiu e que terá os seus

filhos fora de Portugal. É a desagregação da geração jovem de Portugal.

Tenho uma pergunta para lhe fazer: num País que perde 120 000 pessoas ao ano, em que grande parte

dessas pessoas são jovens em idade de ter filhos, quem é que fica no País para criar emprego e investir? Um

País que perde 120 000 pessoas ao ano, jovens, quem é que fica no País para pagar a dívida que o seu

Governo criou e vai deixar para as gerações futuras?

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Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — A próxima pergunta é do PSD.

Sr. Deputado António Rodrigues, tem a palavra.

O Sr. António Rodrigues (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, não é possível falar sobre o

estado da Nação sem falarmos da nossa relação com a Europa ou da relação da Europa connosco.

Não é possível encarar o desenvolvimento do País e falar de vitórias ou de derrotas sem fazermos o ponto

da situação do que tivemos nos últimos meses.

E aqui, Sr. Primeiro-Ministro, devo cumprimentá-lo porque, se alguma coisa mudou nos últimos meses, foi

o discurso europeu, que passou a ser um discurso positivo, passou a ser um discurso decisivo, passou a ser

um discurso decisório relativamente a um conjunto de matérias que são importantes para Portugal, mas mais

importante do que serem relevantes para o País são iniciativa do Governo português.

Falo-lhe, por exemplo, do mercado europeu da energia, uma questão que o Governo português levantou,

que hoje está na agenda de decisão concreta e continuada do Conselho Europeu e que só terá benefícios

para Portugal.

Falo-lhe, por exemplo, da união bancária, algo que o Governo português elevou a uma questão de

prioridade, que neste momento encontra o edifício legislativo europeu praticamente consolidado e que

representará uma segurança para o futuro, em termos de moeda única, em termos de sistema financeiro, em

termos de defesa da zona euro.

Falo-lhe, ainda, Sr. Primeiro-Ministro, da capacidade que o Governo conseguiu, também aqui, em ter uma

palavra decisiva no futuro Presidente do Comissão Europeia. A decisão de Juncker, mais do que a pessoa,

representou a salvaguarda de um compromisso político, a salvaguarda de uma capacidade que o Governo

português conseguiu introduzir na agenda. E isto, Sr. Primeiro-Ministro, traduz-se em credibilidade, traduz-se

em confiança, traduz-se em capacidade política que este Governo demonstrou na Europa.

Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, quando a oposição não se cansa de apurar o que é negativo, é importante

relevar o que de positivo tem sido feito em Portugal e no mundo, em Portugal e na Europa e, acima de tudo,

na capacidade de transpor para além das fronteiras a imagem de um Governo capaz de conduzir uma política,

uma estratégia e um resultado em termos do futuro dos portugueses.

Quando discutimos aqui — e queremos discutir aqui — fundos estruturais, quando discutimos aqui a

questão do passado e, acima de tudo, do futuro, estamos a discutir uma questão fundamental: a salvaguarda

do interesse nacional.

Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, cumprimento-o por esse facto e pergunto-lhe, em última instância: é ou não

intenção do Governo continuar a manter o segundo semestre deste ano como o início para o novo Quadro

Comunitário de Apoio, de forma que, nos próximos sete anos, tenhamos meios suficientes para as empresas,

para o emprego e para o conjunto dos portugueses?

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Sr. Primeiro-Ministro, tem a palavra para responder.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado José Junqueiro, os 5000 milhões de euros do

QREN serão utilizados,…

O Sr. António José Seguro (PS): — Quando?!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … não se preocupe com isso.

Sobre esta matéria, quero dizer-lhe o seguinte: em primeiro lugar, Portugal é um dos países em que o nível

de execução do QREN é mais elevado em termos europeus.

Em segundo lugar, quando assumi funções, em relação a vários programas importantes, a taxa de

execução estava consideravelmente abaixo da média. Claro que sabemos que, no início dos programas, eles

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demoram sempre um pouco mais de tempo a arrancar, é verdade. O novo Quadro arranca em 2014 e nós

contamos — pelo menos, do nosso lado — ter tudo em condições para, a partir de setembro/outubro poder

estar a lançar concursos para o novo quadro de fundos europeus. Mas, em relação ao anterior Quadro, que

começou em 2007 — e eu tomei posse a meio de 2011 —, tínhamos um nível de execução consideravelmente

abaixo da média e, então, no PRODER (Programa de Desenvolvimento Rural), imagine só, Sr. Deputado, era

quase 11% abaixo da média.

Mas nós vamos utilizar bem este dinheiro.

Finalmente, relativamente às perguntas que colocou, deixe-me dizer-lhe que o Sr. Deputado e, lamento

dizê-lo, o Partido Socialista estão demasiado presos ao passado e à crise — e o resto da oposição não está

menos, Sr. Deputado.

Ao fim de três anos, uma vez superada a emergência financeira, agora, que nós temos a perspetiva de

começar a ter condições para poder sarar feridas,…

Risos do PS e do PCP.

… tratar do crescimento, do investimento e do emprego, o que é que a oposição quer e se compraz em

fazer? Em insistir nos mesmos temas que acompanharam os três anos de dificuldades.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Queria que falássemos de quê? Da bola?!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Mas é compreensível — não estou contra isso, com certeza. Os Srs.

Deputados querem ficar a olhar para os três anos severos por que passámos e ficam um bocadinho irritados

pelo facto de o Governo estar agora centrado para a frente!

Risos do PS e do PCP.

O que os Srs. Deputados queriam era regressar às políticas destes três anos em que tivemos de fazer um

fortíssimo ajustamento e, portanto, insistem sempre nas mesmas perguntas.

Sr. Deputado José Junqueiro, reafirmei-o nos debates quinzenais e reafirmo-o no fecho desta Sessão

Legislativa: a reforma da justiça é mesmo a sério e é mesmo para ir para a frente, Sr. Deputado! Não é para

balançar, balançar, balançar e voltar atrás. Não! É para fazer.

O Sr. João Oliveira (PCP) — Mas sem julgamentos marcados!

O Sr. Primeiro-Ministro: — E vai ser feita, Sr. Deputado.

De resto, esteve a ser recomendada pela Vice-Presidente da Comissão Europeia, Viviane Reding, à

generalidade dos Estados europeus como um modelo que poderiam seguir no aprofundamento das suas

reformas de justiça. Vale o que vale, mas sempre é a Comissão Europeia a considerar importante a nossa

reforma na justiça!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Há de ser acusado de publicidade enganosa!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Portanto, Sr. Deputado, sim, a reorganização dos serviços vai para a frente,

mas, deixe-me dizer-lhe, também irá para a frente: a descentralização por que estamos a pugnar; uma aposta

reforçada nas qualificações dos portugueses; a necessidade de termos uma economia mais competitiva e um

Estado mais isento. Sim, Sr. Deputado, aquilo que temos à nossa frente já não é cumprir as metas do

ajustamento que os senhores negociaram, mas, sim, cumprir novas metas, que são aquelas que representam

um País mais próspero e mais justo.

Queria, finalmente, dizer à Sr.ª Deputada Mariana Mortágua que a sua colega Deputada, que há pouco

estava tão entusiasmada com o Fundo Monetário Internacional — o que não deixa de ser curioso —, citando o

estudo do FMI, acabou por dizer que Portugal devia ter reestruturado a sua dívida em 2011. Veja como assim

se conseguem fazer títulos nos jornais e nas televisões que não correspondem à verdade!

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Protestos do BE.

Sr.ª Deputada, o FMI não recomendou para Portugal a reestruturação da dívida em 2011 e não o fez agora,

retrospetivamente.

Os senhores têm de ler mais do que títulos de jornais e, portanto, convido-os mesmo a ler com olhos de ver

aquilo que consta dos documentos, que, de resto, o board do FMI não validou, mandou rever e que tem

relação direta com as condições de acesso a financiamento extraordinário do Fundo Monetário Internacional,

tendo em conta a experiência desde os anos 80. Imagine, Sr.ª Deputada, que eu li mesmo os dois

documentos, de fio a pavio,…

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Não parece!

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Leu mal!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … um tem 111 páginas e o outro setenta e poucas e nem por uma vez

encontrei lá o título que as Sr.as

Deputadas gostariam que lá estivesse.

A Sr.ª Presidente: — Queira concluir, Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Concluo, dizendo, finalmente, que o Governo não desistiu do emprego; pelo

contrário, tomou-o como a sua principal prioridade e vamos levá-lo, seja à concertação social, seja à

concertação territorial, seja aos privados, seja à sociedade civil. Temos de estar mobilizados relativamente ao

emprego, porque, como afirmei, ele não resulta apenas da crise financeira e do ajustamento, resulta de muitos

anos de subida do desemprego estrutural, acompanhado de subida de dívida pública, que tem de ser

combatida com muita tenacidade.

O discurso europeu, Sr. Deputado António Costa Rodrigues, dá-nos a possibilidade de reclamar, dentro do

contexto europeu, um mercado interno mais competitivo e uma moeda única que seja um verdadeiro

instrumento de convergência dentro da União Europeia. Mas tem o Sr. Deputado toda a razão: só é possível

reclamar na Europa quando se tem credibilidade e se pode inspirar confiança. E creio que é isso que, hoje, o

nosso País tem junto dos seus parceiros europeus.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Entramos agora na fase das intervenções.

Pelo PS, tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Martins.

O Sr. Alberto Martins (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Para o Partido Socialista, o debate

sobre o estado da Nação é um debate sobre o estado dos portugueses e não sobre o estado de uma nação

virtual, manipulado para efeitos retóricos pelo Governo ao sabor da sua agenda política.

O Sr. António José Seguro (PS): — Muito bem!

O Sr. Alberto Martins (PS): — É um debate sobre o empobrecimento das famílias; sobre o drama das

pessoas que não têm emprego; sobre as empresas que abriram falência; sobre os portugueses que tiveram de

emigrar; sobre as famílias que veem os seus direitos sociais reduzidos; sobre as famílias que não conseguem

pagar a casa, a eletricidade, uma alimentação decente para os seus filhos.

Este é um debate sobre a forma como portugueses vivem no Portugal pós-programa de ajustamento

conduzido por este Governo. Mas é um debate sobre a forma como os portugueses podem olhar o futuro.

Passaram três anos e duas semanas que o atual Governo de direita tomou posse. Três anos e duas

semanas depois, vale a pena revisitar o que aconteceu à vida das famílias portuguesas.

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Olhemos para o desemprego, sempre o desemprego: estava nos 12,1% antes do início do programa; está

hoje próximo dos 15%. Se somarmos os 300 000 portugueses que, desencorajados, estão fora das

estatísticas oficiais do desemprego, ele sobe para os 20% da população portuguesa. E se contarmos os 170

000 desempregados a quem o Governo obrigou a inscrever-se num programa operacional para não perder o

subsídio de desemprego, então o desemprego real — e não maquilhado pelas medidas do Governo — estará

na casa dos 22,5%, ou seja, 1,2 milhões de portugueses desempregados.

O Sr. José Junqueiro (PS): — Bem lembrado!

O Sr. Alberto Martins (PS): — Para estes valores, naturalmente, não entram os portugueses que

abandonaram o País.

Olhemos para o fenómeno esmagador da emigração: só em 2013, saíram de Portugal quase 130 000

pessoas, uma média de 350 pessoas todos os dias. Ao todo, nos últimos três anos, foram 350 000 os

portugueses que se viram forçados a emigrar. Muitos deles, jovens altamente qualificados que o País ajudou a

formar e que este Governo incentiva a irem criar riqueza para outros países.

Olhemos, agora, para as prestações sociais, que chegam a cada vez menos pessoas: entre julho de 2011

e maio de 2014, quase menos 40 000 crianças receberam o abono de família; quase 50 000 idosos pobres

perderam o acesso ao complemento solidário para idosos; e 105 000 pessoas perderam o acesso ao

rendimento social de inserção. Estes são os números cruéis por detrás do discurso de uma chamada «ética

social na austeridade».

Olhemos também para as famílias em incumprimento: vemos que 15,4% das famílias portuguesas não

conseguem cumprir a tempo os seus compromissos com as instituições de crédito — e o número de famílias

nestas condições, ao longo do último ano da dita «retoma», está a aumentar.

Entretanto, num País com uma dívida pública que chegou aos 133% do produto interno bruto no primeiro

trimestre deste ano, alguns dos «sucessos» — como lhe chamou o Governo — do programa de ajustamento

começam a desaparecer, de tão frágeis que eram. Olhe-se para o ajustamento das contas externas, como já

foi referido.

O Partido Socialista sempre disse que o reequilíbrio da balança externa resultava, apenas e só, do

empobrecimento dos portugueses. Disse sempre que o equilíbrio externo, tão elogiado, era filho do aumento

brutal do desemprego que teve lugar, mais intensamente, ao longo do ano de 2012, fruto de uma política

orçamental que escolheu «ir além da troica».

Em 2013, o Tribunal Constitucional obrigou o Governo a repor pensões e salários dos funcionários

públicos. Em consequência, ao longo do ano, o rendimento, a confiança e, por isso, o consumo de muitas

famílias subiu e, com ele, o emprego.

O Sr. José Junqueiro (PS): — Bem lembrado!

O Sr. Alberto Martins (PS): — O que aconteceu entretanto? Só no primeiro trimestre de 2014, a balança

corrente deteriorou-se mais de 600 milhões de euros, mais de 1,5% do produto interno bruto deste período. Ou

seja, bastou o desemprego reduzir-se um pouco e a confiança das famílias recuperar moderadamente para o

pequeno excedente externo passar, de novo, a défice.

Na verdade, ao contrário da ideia que tenta passar, o Governo não transformou nada estruturalmente na

economia portuguesa. Onde Lavoisier afirmava que «na natureza, nada se cria, nada se perde, tudo se

transforma», com este Governo vigora a máxima «muito se perde, quase nada se transforma».

Aplausos do PS.

Mais: o Governo não só não ajudou a transformar estruturalmente nada, como continua, isso sim, a

beneficiar das transformações realizadas no passado. Quando o Governo elogia as exportações de hoje, está

simplesmente a colher os louros do trabalho realizado ao longo de outras governações,…

Risos do PSD.

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… as mesmas governações que acusa de terem reduzido a competitividade da economia portuguesa.

Na verdade, o Governo não sabe como preparar os portugueses para a nova realidade.

O Sr. José Magalhães (PS): — Isso é que é!

O Sr. Alberto Martins (PS): — Quando nos diz que o pior já passou, significa que não sabe lidar com o

ciclo normal da economia portuguesa, marcado agora por uma terrível estagnação.

Não nos esquecemos que, ao longo dos primeiros meses do ano, o Governo, levado pela campanha

eleitoral para as eleições europeias, só falava da «retoma» — que era um milagre (falou-se em milagre, vejam

lá!), que Portugal era um exemplo internacional, que a economia portuguesa, ágil e flexível, tinha entrado

numa novíssima fase.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Não é verdade?!

O Sr. Alberto Martins (PS): — Entretanto, Srs. Deputados, chegaram os números do Instituto Nacional de

Estatística. Resultado: queda do produto interno bruto de 0,7% em cadeia, no primeiro trimestre de 2014.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — E em termos homólogos?!

O Sr. Alberto Martins (PS): — Mesmo se na comparação homóloga com o primeiro trimestre de 2013 se

registou um crescimento de 1,2%, este valor fica muito abaixo do estimado pela Comissão Europeia e que,

como sabemos, era de 2,1%.

O Sr. António José Seguro (PS): — Muito bem!

O Sr. Alberto Martins (PS): — Em face destes resultados, e passadas as eleições europeias, o Governo já

não precisa de iludir os eleitores com a tão propagada «retoma». Concentrou, então, as suas forças na crítica

violenta ao Tribunal Constitucional,…

O Sr. José Junqueiro (PS): — É verdade!

O Sr. Alberto Martins (PS): — … cujo último acórdão tem efeitos orçamentais que, curiosamente, vão

fazer mais pela retoma do que qualquer medida do Governo.

Aplausos do PS.

O Sr. José Magalhães (PS): — Isso é que é!

O Sr. Alberto Martins (PS): — E, Srs. Deputados, tal como aconteceu no ano de 2013, e totalmente à

revelia do Executivo, o Tribunal Constitucional arrisca-se a ser responsável pelo crescimento económico em

2014.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Espetacular!

O Sr. Alberto Martins (PS): — Sr.as

e Srs. Deputados, em qualquer Estado de direito, o respeito pelas

decisões, pelo papel e pelas funções do Tribunal Constitucional é algo absolutamente intocável. Naturalmente,

a crítica e a discussão sobre as decisões do Tribunal Constitucional são intrínsecas ao funcionamento da

democracia.

Vozes do PSD: — Ah!

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O Sr. Alberto Martins (PS): — Porém, aquilo que o Governo e os dirigentes da maioria fazem é pressão

ilegítima, é tentativa de desgaste da imagem pública do Tribunal e dos seus juízes, é desrespeito institucional

e pessoal e é mesmo, pois esse limiar foi atingido, ameaça de aplicação de sanções jurídicas —

administrativas ou penais, supõe-se, pois que são as únicas sanções jurídicas conhecidas — se os juízes

continuarem a praticar o suposto «crime» de decidirem, e pensarem, de acordo com a sua consciência e não

de acordo com aquilo que, pelos vistos, o Governo e a maioria pensavam quando contribuíram para a sua

designação.

E não chega, Srs. Deputados, o álibi com que o Governo se cobre quando diz que cumpre as decisões do

Tribunal Constitucional. Pois cumpre, mas só porque não pode fazer outra coisa e, mesmo aí, leva até ao

limite a tentativa de não aplicar integralmente o que o Tribunal decide.

O Sr. José Magalhães (PS): — Exatamente!

O Sr. Alberto Martins (PS): — Aquilo que o Governo e a maioria têm feito neste domínio não encontra,

nem vai encontrar, paralelo em qualquer democracia constitucional. O menosprezo da separação de poderes,

a falta de cultura democrática e de sentido de Estado, que se traduz numa prática e numa vontade deliberada

de degradação das instituições e da sua imagem, ficaram bem evidentes quando o Governo passou pela

vergonha — passou pela vergonha! — de ouvir um dos seus ídolos políticos e financeiros, o Ministro das

Finanças alemão, ensinar-lhe — e disse-o, em entrevista de 27 de junho de 2014, ao Jornal Negócios — que,

e cito, «na Alemanha, também temos um Tribunal Constitucional e é normal respeitar o que o Constitucional

decide».

Aplausos do PS.

Sr.as

e Srs. Deputados, o ataque ao Tribunal Constitucional é, da parte deste Governo, não só a forma de

iludir a sua incompetência mas, acima de tudo, repito, acima de tudo, um ataque à Constituição da República e

ao Estado de direito, isto é, um ataque aos alicerces da democracia.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Alberto Martins (PS): — Sr.as

e Srs. Deputados, o debate sobre o estado da Nação é também um

debate sobre o futuro do País. É um debate sobre a forma como garantir condições essenciais que permitam a

Portugal crescer, criar emprego e pagar a sua dívida pública e privada.

Para isto, Portugal precisa de, por um lado, fazer investimento público inteligente e captar investimento

privado produtivo e, por outro, definir condições de renegociação do pagamento da sua dívida pública.

Sobre o investimento, o Partido Socialista, como já foi dito, seguirá atentamente a operacionalização do

Acordo de Parceria, negociado em Bruxelas. O País necessita de executar, de forma inteligente e eficaz, o

pacote de fundos comunitários e o Governo deve contar com uma atenção muito especial do Partido

Socialista. Este não é um objetivo partidário, mas um objetivo nacional.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Alberto Martins (PS): — Da mesma forma, encontrar condições mais favoráveis para pagar a dívida

pública deve ser um objetivo nacional. O Governo gosta muito de falar de consensos. Pois bem, aqui tem mais

um: renegociar as condições de pagamento da dívida portuguesa, reduzindo juros e ampliando as

maturidades. Se o Governo se colocasse ao lado do Partido Socialista nesta luta, o País ganharia força

negocial ao nível europeu e os portugueses ganhariam outras possibilidades de ver os seus sacrifícios

reduzidos no futuro.

Sr.as

e Srs. Deputados, a saída da crise exige uma Europa mais democrática, de igualdade entre os

Estados, povos e cidadãos, que renuncie à austeridade, ao domínio da especulação financeira sobre os

Estados e à condição redutora de uma União entre credores e devedores. O projeto de solidariedade deve

assentar numa estratégia de finanças públicas orientadas para o crescimento e o emprego, adotar novas

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soluções de renegociação da dívida — e de atenuação da sua carga recessiva e social — e garantir na sua

regulação os direitos fundamentais e sociais inclusivos de um Estado de direito.

Os portugueses não podem, Sr.as

e Srs. Deputados, em circunstância alguma, ser chamados a pagar os

custos das atividades opacas, desreguladas e de especulação financeira da banca portuguesa.

E aqui estamos, num País liderado por um Governo que não honra o contrato social para com os

portugueses, que não tem coragem para enfrentar os lobbies de interesses instalados, que não se afirma nas

instituições europeias na recusa de uma política austeritária e que é incapaz de propor uma visão estratégica e

inovadora para Portugal.

Na sua miopia de austeridade, juntaram à crise financeira, a crise económica, a crise social, a degradação

da democracia. Não perceberam que não há legitimidade democrática sem justiça social.

O Sr. José Magalhães (PS): — Muito bem!

O Sr. Alberto Martins (PS): — Como nos disse, ontem mesmo, a Cáritas Internacional, sobre o custo

humano da austeridade, «as pessoas pobres pagam para uma crise que não causaram e de que não são

responsáveis».

Aplausos do PS.

Sr.as

e Srs. Deputados, o País está mais pobre, o País está mais endividado, o País está mais desigual e

tem vindo a perder a esperança no futuro com este Governo.

É este o estado da nação em que este Governo deixa Portugal. É este o estado que temos necessidade

urgente de mudar.

Aplausos do PS.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Guilherme Silva.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Feliciano Barreiras Duarte.

O Sr. Feliciano Barreiras Duarte (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as

e Srs. Membros do

Governo, Sr.as

e Srs. Deputados: Este é o primeiro debate do estado da Nação desta Legislatura em que

Portugal já não se encontra sob o Programa de Assistência que o anterior Governo, do Partido Socialista,

solicitou à Comissão Europeia, ao Banco Central Europeu e ao Fundo Monetário Internacional, o que deve ser

enaltecido, com o reconhecimento de que tal se deve à determinação com que o Governo conduziu o nosso

País e também às dificuldades que a generalidade dos portugueses tiveram de passar e que têm percebido

nos últimos tempos que valeu a pena.

Minhas Senhoras e Meus Senhores, os últimos três anos foram anos muito difíceis. Foi um caminho feito

de suor e lágrimas, com muitos sacrifícios económicos e sociais, com uma austeridade que atingiu quase

todas as famílias portuguesas.

E, se hoje podemos olhar para trás e, em cada dia que passa, confirmarmos que o pior já passou, nunca

nos deveremos esquecer o quanto este caminho foi difícil e, por isso, tudo deveremos fazer para evitar que tal

se repita no futuro.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Feliciano Barreiras Duarte (PSD): — Ao atual Governo coube a difícil, e tantas vezes

incompreendida, tarefa de pôr em prática, no nosso País, um programa que se destinou a corrigir a trajetória

de colapso para que a irresponsabilidade dos governos do Partido Socialista arrastaram o País.

Há três anos vivíamos e tínhamos uma sucessão de crises: uma crise nas contas públicas, uma crise na

nossa credibilidade externa, uma crise de falta de confiança nas principais instituições e uma crise de alguns

valores de vida.

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Há três anos, em 2011, tínhamos um Estado endividado e sem crédito interno e externo, uma economia

depauperada e pouco competitiva, um investimento público acéfalo e ruinoso, enfim, uma situação de

eminente catástrofe nacional.

Era o País em que os governantes tinham ideias mirabolantes, onde, por exemplo, se projetavam novos

aeroportos e TGV e endividavam gerações inteiras com SCUT e outras parcerias ao género do «faça agora e

pague depois», que é como quem diz «goze o presente e hipoteque o futuro»! Esses Governos encantatórios

exibiam uma certeza que custou, ainda custa e, infelizmente, ainda irá custar muito caro aos portugueses por

muitos e muitos anos.

O sonho e a prática da governação socialista veio a revelar-se funesto.

O triste epílogo dessa governação pode ser bem explicado na célebre declaração do então Ministro das

Finanças, Teixeira dos Santos, quando este, em abril de 2011, reconheceu, vencido, que o Estado português

já só tinha dinheiro para pagar os salários dos funcionários públicos e as pensões dos reformados por mais um

mês.

Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: É também por isso que hoje, passados três anos, causa espanto,

para não dizer estupefação, ouvir os dirigentes do principal partido da oposição (como tivemos oportunidade

de ouvir há minutos), falarem e debitarem aos incautos, outra vez, as suas poções milagrosas, como se não

tivessem a responsabilidade pela situação de bancarrota para a qual os seus Governos atiraram o nosso País!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

É, aliás, verdadeiramente extraordinário ouvir, hoje, os responsáveis pelo descalabro do passado

prometerem, com a melhor das facilidades, a resolução dos problemas que eles próprios geraram e que à

época não conseguiram resolver. Isto, é claro, sem que se lhes conheçam grandes propostas, concretas e

viáveis.

Aliás, neste particular importa referir que mais importante do que fazer propostas é aferir da sua viabilidade

efetiva. Infelizmente, vivemos um tempo de uma espécie de feira das propostas, porquanto quase nenhuma

delas é viável. Prometem crescimento económico, mas não dizem como; prometem tudo alterar na Europa,

mas também não dizem como. Não dizem, nem podem dizer, pois não é assumindo posições laxistas e de um

Estado incumpridor que se garante a solidariedade dos nossos parceiros na União Europeia.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Feliciano Barreiras Duarte (PSD): — Dou alguns exemplos: no setor da saúde — isto para não

falarmos de outras áreas —, o PS, como já foi referido neste debate pelo Sr. Primeiro-Ministro, deixou uma

dívida superior a 3000 milhões de euros, em 2011.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Bem lembrado!

O Sr. Feliciano Barreiras Duarte (PSD): — Sabemos que, às vezes, não gostam que lembremos algumas

destas matérias, mas podíamos falar de outras. Nas parcerias público-privadas, os encargos que deixaram à

atual e às futuras gerações cifram-se em dezenas de milhões de euros.

Na verdade, Sr.as

e Srs. Deputados, ainda um dia se deverá fazer o balanço daquilo a que podemos

chamar, com muita propriedade, sedução socialista, para que os portugueses não esqueçam nunca o terrível

preço que ainda pagam hoje por terem dado crédito a essa sedução no passado.

Minhas Senhoras e Meus Senhores, nestes três anos muito foi feito, mas temos consciência de que ainda

existe muito para fazer. Já recuperámos a nossa credibilidade externa, já recuperámos grande parte da nossa

soberania perdida e já temos sinais que atestam que os sacrifícios valeram a pena.

Sobre muitos dos indicadores que vamos conhecendo no dia a dia a oposição não fala porque,

infelizmente, falar dos bons indicadores não lhe é conveniente por interesses meramente partidários e

eleitorais. Mas a maioria dos portugueses — estamos crentes — já o percebeu também.

Aliás, ao contrário do que os profetas da desgraça gostam de fazer crer, apesar da já referida redução da

despesa pública, o Estado social não foi destruído. Pelo contrário, quando comparamos o que o Estado gastou

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em 2013 relativamente a 2010, as prestações sociais aumentaram nesses três anos 2,3% em termos

absolutos e 1,5% em percentagem do PIB; fizeram-se inúmeras reformas nos setores das finanças públicas,

da defesa, da justiça, da saúde, da educação, da segurança social, da Administração Pública, no mercado

laboral, nas autarquias locais, entre tantas outras; reduziram-se as chamadas «rendas excessivas», seja nas

parcerias público-privadas, seja nos setores da energia e das comunicações, seja no mercado dos

medicamentos.

Minhas Senhoras e Meus Senhores, naturalmente, apesar deste trabalho realizado, não estamos ainda

satisfeitos porque sabemos que ainda existe muito para fazer.

A terminar, direi o seguinte: o Governo tem vindo a trabalhar em várias áreas precisamente pensando no

futuro. Por exemplo, na estratégia de fomento industrial, que está a ser implementada, cuja conclusão tem

como objetivo temporal 2020 e que trará ganhos significativos a Portugal e aos portugueses. Com mais

indústria teremos mais economia, com mais economia teremos mais emprego e com mais emprego teremos

melhor Portugal.

Hoje, depois de décadas de desinvestimento da economia produtiva, assistimos, em Portugal, a uma

mudança do paradigma de modelo económico, assente no aumento das exportações, na captação de

investimento interno e externo e também na qualificação dos trabalhadores portugueses.

Hoje, ao terminarmos esta intervenção, em nome do PSD, no debate do estado da Nação, cumpre

perguntar se os portugueses querem voltar à situação de insustentável calamidade económica e financeira em

que o País estava em 2011 ou se querem, acima de tudo, continuar um caminho de recuperação não só da

sua credibilidade externa mas também da sua autoestima. Querem os portugueses o regresso daqueles que

chamaram a troica ou preferem, antes, quem mandou embora a troica? É uma questão que se deve colocar a

todo o País.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Neste dia em que debatemos o estado da Nação, nunca é demais recordar que foi este Governo que

mandou embora a troica, mas não foi este Governo e esta maioria que chamaram a troica e que negociaram

com ela.

Protestos do PS.

Por muito que não gostem que se diga, é bom que os portugueses o tenham presente: em 2014, o estado

da Nação é muito melhor do que era em 2013, em 2012 e em 2011.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!

O Sr. Feliciano Barreiras Duarte (PSD): — Mas vamos continuar a trabalhar com determinação para que

o estado da Nação, em 2015, seja melhor do que é hoje, em 2014.

É isso que nos mobiliza pelo nosso País e por Portugal!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jerónimo de

Sousa.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs. Deputados: Chegou ao fim, no plano formal, o programa de intervenção das troicasnacional e

estrangeira, mas não o pesadelo de uma nação que vê o seu presente e o seu futuro hipotecados por uma

política que apenas sabe somar medidas de austeridade, de saque e de confisco, semeando dramas no seio

do nosso povo.

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Chegou ao fim um programa imposto ao País, mas o que ficou foi um País economicamente destroçado,

dilacerado no plano social e politicamente fragilizado por uma política que alimentou a descrença, a desilusão

e a resignação.

O estado da Nação é hoje a situação de um País que está mais pobre, em retrocesso, mais distante dos

níveis médios do desenvolvimento de outros países da União Europeia.

Um País mais dependente e sujeito ao arbítrio do estrangeiro, condenado a viver hoje e por longos anos

em regime de liberdade condicional por um Governo, por uma política nacional e europeia e pelas

organizações internacionais dominadas pelos senhores do mundo.

O Sr. António Filipe (PCP): — Exatamente!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — É este o resultado das opções dos partidos da troica nacional e dos

seus compromissos.

O estado de uma Nação exigia mais brio patriótico, mais coragem e outra política de afirmação dos

interesses nacionais a quem tem estado, nos últimos anos, ao comando da governação do País e não

resignação, abdicação e colaboração submissa.

A situação do País é, hoje, por isso, a de um País amarrado num colete-de-forças que o manieta, porque

lhe alienaram os seus instrumentos de gestão política, económica, financeira e orçamental, que urge

recuperar, mas também as suas empresas e sectores estratégicos, hoje maioritariamente em mãos

estrangeiras para servir os interesses do grande capital nacional e internacional, e não o País.

É o estado de uma Nação que viu aprofundar as suas graves e persistentes desigualdades sociais e

territoriais, com uma parte substancial do País a caminhar para a desertificação, à medida que tudo se tira ao

interior do País — escolas, serviços de saúde, tribunais, juntas de freguesia.

Nós levantamos o véu da fantasia propagandística das preocupações sociais e do assistencialismo oficial

— hipócrita e falsamente humano — e o que vemos é um País a sangrar, para lá da frieza de todos os

grandes números e das grandes estatísticas, para lá de 1,4 milhões de desempregados, se incluirmos todos

os desencorajados, de 1,6 milhões trabalhadores precários, a maioria com uma vida também ela precária, de

milhões de portugueses a viver abaixo do limiar da pobreza.

São as vidas sem esperança que se percebem na longa fila da «sopa do mosteiro», outra vez vulgarizada.

São as vidas arruinadas que se enxergam por trás das 150 000 casas devolvidas aos bancos, num

processo que ainda não parou, nem se prevê que pare.

São as vidas das centenas de milhares de portugueses emigrantes — nos últimos dois anos emigraram

250 000 — que levam consigo angústias e dramas e muitos problemas de um desemprego de longa duração,

das dívidas que se acumularam, dos desencantos de quem estudou e não vê no seu País saída para a sua

vida.

Há uma saída massiva de gente de que o País precisa e de que não devia prescindir, em geral, para

países que, sem investimento e a custo zero, nos levam o melhor recurso que temos e nos deixam ainda mais

pobres.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Dizem-nos que o desemprego está a recuperar; nós dizemos que,

assim, com esta política de esvaziamento demográfico, a saírem do País 350 portugueses por dia, como está

a acontecer, até a taxa zero de desemprego é possível.

Sob o enganador manto da propaganda da equidade, temos uma política apostada na concentração da

riqueza e em naturalizar as relações de exploração do trabalho sem limites, como forma suprema de

organização social.

Uma política apostada na construção de um modelo de subdesenvolvimento económico e social assente

em baixos salários e com ausência de direitos, como comprova o facto de, em três anos, ter duplicado o

número de trabalhadores a ganhar o salário mínimo nacional, cada vez mais desvalorizado, tal como o salário

médio, devido à sistemática alteração das leis e condições de trabalho e como o evidencia a proposta do

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Governo que visa golpear a contratação coletiva por via da aceleração da sua caducidade, num processo que

retirou milhões de euros aos salários para entregar uma parte substancial ao capital.

Não me respondeu o Sr. Primeiro-Ministro, mas eu digo-lhe: foi com cerca de 3000 milhões que os

trabalhadores contribuíram para engordar e safar o capital que se tinha metido em alhadas.

Esta é a real situação de um País governado por uma coligação que se rege por uma «Constituição

sombra» e em confronto com a única constituição legítima que devia ser respeitada e não é, a Constituição da

República Portuguesa.

Também no plano económico e financeiro o País segue o caminho oposto ao da tão proclamada

recuperação. É assim com a dívida. O País continua a afundar-se sob o peso de uma dívida insustentável, que

impede o desenvolvimento e o crescimento económico, com um novo máximo histórico acima dos 130% do

PIB. É assim com a economia e com o regresso a níveis negativos neste primeiro trimestre de 2014.

O que o pacto de agressão era suposto resolver e tanto serviu para o justificar, o défice e a dívida,

permanecem para continuar a fundamentar novas investidas contra o povo e o País. Esta política, além de

injusta, no plano social, tem pés de barro.

Afundaram o mercado interno e com ele arruinaram a vida de milhares de pequenos e médios empresários

e agricultores, em nome do porta-aviões das exportações que não levanta ferro porque o País está sem rumo

e atolado nas águas estagnadas de uma economia rastejante, submetido ao domínio dos grandes interesses

económicos e financeiros.

Esta é outra realidade que define a situação do País: a existência de um Estado dito regulador e

independente na aparência mas, efetivamente, capturado pelo polvo dos grandes interesses, cujos tentáculos

se estendem pelos principais centros da decisão política.

O que se passa com o Banco Espírito Santo e o que a sua crise revela, como já o havia mostrado os casos

do BPN, do BPP, do Banif, do BCP, não são apenas práticas obscuras de manipulação de contas e do

mercado ou de fuga e evasão fiscal, com a passividade do Banco de Portugal nas ligações tentaculares de

domínio económico e político, numa inadmissível promiscuidade para obter apoios públicos, perdões fiscais e

toda uma panóplia de benesses e favorecimentos para os seus negócios.

Pelo silêncio de anos e anos e de tão fundas e estreitas relações, os partidos do arco da governação bem

podiam passar a ser chamados do arco da banca, depois de terem sido do arco da troica.

Estes são acontecimentos que dão razão à insistente exigência do PCP de pôr a banca comercial sob

controlo público ao serviço do País e não desta ou daquela família ou de grupos de acionistas.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Isso é que era!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Nacionalização da banca!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — E não repitam os episódios do BPN e do BPP, nacionalizando apenas

os prejuízos, mas fazendo um controlo público efetivo!

Aplausos do PCP.

O Sr. Primeiro-Ministro está a rir-se?

O Sr. Primeiro-Ministro: — Só pode ser uma piada!

O Sr. António Filipe (PCP): — Não se ria, Sr. Primeiro-Ministro!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Ainda há pouco mais de um mês dizia que estava tudo bem no BES,

que não precisava de ajuda, não precisava de qualquer intervenção, estava tudo regulado e agora ri-se

perante uma situação que está cada vez mais complicada?! Sr. Primeiro-Ministro, tenha sentido de

responsabilidade, porque estamos a falar de um caso sério que pode custar muito aos portugueses.

Aplausos do PCP.

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Semearam a ilusão de uma mudança com a saída da troica, mas o que reservam para o futuro está já

desenhado pelo Banco de Portugal para os próximos cinco anos e antes anunciado por Cavaco Silva para os

próximos 20.

É a eternização da política de austeridade e a concentração da riqueza, uma política que fecha as portas à

esperança. Não há futuro com este Governo do PSD/CDS e com um Presidente da República que, abdicando

da defesa da Constituição, fez da política de empobrecimento também o seu projeto para o País.

O estado de degradação económica, social e política a que chegou o País e o futuro sombrio que se

perspetiva para os próximos anos apelam à rutura e à mudança. Há soluções. O País não está condenado a

seguir este rumo de afundamento nacional.

A saída desta situação não se resolve com o consenso entre as forças que conduziram o País ao

precipício. Esta é a falsa saída para mudar alguma coisa para que tudo fique na mesma.

O Sr. António Filipe (PCP): — Muito bem!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — A saída exige rutura com as políticas hoje seguidas, exige uma

política patriótica e de esquerda como a que o PCP defende e de um Governo que a concretize.

Uma política que dê cumprimento ao projeto de progresso e justiça social que a Constituição da República

Portuguesa consagra e tendo presente os valores de Abril.

Para terminar, deixe-me que lhe diga, Sr. Primeiro-Ministro, que, quando o PCP dá voz aos que nunca

conseguem chegar aqui para se fazerem ouvir, fazemo-lo não para capitalizar mas porque queremos estar do

lado certo, do lado dos que menos têm e menos podem, dos que estão a ser agredidos nas suas vidas por

esta política e este Governo.

É, porventura, mais fácil e rentável estar do lado dos poderosos; é esta a vossa opção — eis a contradição

insanável que existe entre nós, a razão das nossas divergências.

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe

Soares.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as

e Srs. Membros do Governo,

Sr.as

e Srs. Deputados: O debate sobre o estado da Nação deveria ser um debate sobre a realidade, a vida, as

pessoas que realmente fazem parte deste País, mas o Governo transformou o estado da Nação num estado

de negação, tentando transportar a realidade para a sua propaganda.

Percebemos claramente como as pessoas reais não entram nas contas deste Governo. Temos um País

mais pobre, mas o Sr. Primeiro-Ministro não falou da pobreza na sua intervenção inicial, nem sequer fez uma

referência.

Temos um País mais desigual, onde os pobres estão mais reféns da pobreza e o Estado menos os apoia,

mas as grandes fortunas aumentaram nestes três anos de Governo.

Sobre a intervenção do Governo, a palavra que mais registamos e que foi repetida à exaustão foi

«passado». É certo que o Governo tentou arranjar uma narrativa, dizendo que o passado era o projeto da

oposição, mas a verdade é que foi «passado», «passado», «passado» a palavra que o Governo mais repetiu.

E nós sabemos bem que passado é, de facto, o projeto que o Governo traz para o País.

Quando olhamos para os hospitais, olhamos para o regresso ao passado das listas de espera, das pessoas

que desesperam nas urgências; quando olhamos para o estado da educação, olhamos para o regresso ao

passado das crianças que perdem horas nos transportes para as escolas, das turmas superlotadas e da perda

de qualidade no ensino; quando olhamos para a pobreza, olhamos para o regresso ao passado, para aqueles

que já perderam o acesso aos apoios sociais e para um Governo que atirou para fora desses apoios, no

momento da maior crise, 160 000 beneficiários; quando olhamos para o estado dos portugueses que

trabalham, olhamos para uma emigração, que é o regresso ao passado, de mais de 300 pessoas por dia que

saem do nosso País; quando olhamos para a vida das pessoas, olhamos para uma perda de riqueza que nos

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atira para o passado, para o início deste século; quando olhamos para os números do emprego, olhamos para

um número de pessoas empregadas que nos remete para 1997, ainda o século passado, portanto é o

regresso ao passado; quando olhamos para a política deste Governo, vemos que destruiu, desde que tomou

posse, 440 000 postos de trabalho, 407 postos de trabalho por dia. É o resultado da política deste Governo.

Por isso, é muito o descaramento do Primeiro-Ministro que nos vem dizer que tem como projeto o pleno

emprego mas que, depois, apresenta à Assembleia da República e ao País o Documento de Estratégia

Orçamental que diz que, se tudo correr bem, em 2018, teremos uma taxa de desemprego de 13%. Este é o

plano do pleno emprego do Governo: uma taxa de desemprego de 13%, uma emigração massiva, uma queda

dos salários, uma falta de perspetiva de futuro para as pessoas!

Não, Sr.as

e Srs. Deputados da maioria, o regresso ao passado não é uma acusação que possam fazer a

qualquer das oposições. O regresso ao passado é, de facto, a política que este Governo tem levado por

diante. Esta é que é a verdadeira natureza desta política.

Aplausos do BE.

Falemos do objetivo da governação. Dizia-nos o Governo, quando tomou posse, que o grande problema do

País era a dívida e, nessa altura, ela estava em 94% do PIB. Olhemos para o que existe hoje: foi pela mão

deste Governo que a dívida passou de 94% do PIB para 133% do PIB.

O Governo não arranjou qualquer solução, não resolveu nenhum problema, acumulou dívida e mais dívida

e quer que agora sejam as próximas gerações a pagar. Esta é a escolha do Governo: destruição da riqueza,

acumulação de dívida, zero de projetos para o futuro do País.

Mas há uma negação mais deste Governo que se prende com a bomba-relógio que hoje existe no nosso

sistema financeiro. Em nenhum momento, o Governo falou sobre o que aflige as pessoas.

Há ou não um novo BPN a configurar-se no nosso sistema financeiro, agora maior, com um buraco

possivelmente três vezes maior, que dá pelo nome de BES? Há ou não essa bomba-relógio? Sobre este

problema, o problema principal no nosso País, o Governo disse zero, nem uma única palavra.

Há empresas que são utilizadas para pagar buracos de outras empresas, bancos que têm políticas de

crédito de favor em função das famílias dos seus acionistas e sobre esta matéria essencial o Governo nada

disse. O Governo, que aplicou o Memorando e que dizia que um dos seus três primeiros pilares era a

estabilidade do sistema financeiro, não disse nada sobre esta matéria. Como é compreensível, Sr.as

e Srs.

Deputados?! Bem, é mais um exemplo do estado de negação deste Governo e de como o Governo, neste

debate, passou ao lado do que era essencial ao País.

As pessoas não comem propaganda, os salários não são pagos em propaganda, o Governo não cria

empregos com propaganda e não resolve os problemas do País com propaganda, mas a única coisa que o

Governo trouxe a este debate foi propaganda. Percebemos, portanto, por que é este o estado do País: porque

só de propaganda é que vive este Governo!

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa

Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Primeiro-Ministro dizia, há

pouco, numa resposta a Os Verdes, que nem era tanto uma questão de se sentir vitorioso face à realidade do

País, era mais uma questão de não se sentir derrotado.

Acho que o Sr. Primeiro-Ministro devia olhar para o resultado das últimas eleições. De facto, não deve viver

só de eleições, mas não deve deixar de interpretar os resultados e a mensagem que claramente os

portugueses lhe deram, que foi a de uma brutal derrota da política que este Governo tem implementado.

Depois, é extremamente preocupante a forma como o Sr. Primeiro-Ministro — e desculpe-me a expressão

que vou utilizar — brinca com a realidade. Fazendo o quê? Desvirtuando essa mesma realidade.

Repare que o Sr. Primeiro-Ministro teve o desplante de responder a Os Verdes dizendo que o fosso entre

os mais ricos e os mais pobres não aumentou em Portugal, quando o INE, este ano, nos disse que era

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exatamente isso que tinha acontecido, que o fosso entre os 10% mais ricos e os 10% mais pobres aumentou

devido às políticas implementadas por este Governo.

Portanto, esta negação da realidade não fica bem ao Sr. Primeiro-Ministro, porque ela não se encaixa na

vida concreta que as pessoas vivem no seu dia-a-dia.

Depois, esta negação da realidade, como eu estava a dizer, acontece permanentemente.

Quando viemos aqui, pela primeira vez, denunciar que havia muitas crianças — e eram denúncias que as

escolas nos apresentavam — a chegar à escola sem terem o pequeno-almoço tomado, a primeira reação foi a

de dizer: «não há provas de que isso aconteça».

Quando viemos aqui, pela primeira vez, denunciar que havia estudantes a abandonar o ensino superior,

porque não tinham condições de o pagar, a primeira reação do Governo foi a de dizer: «não há provas de que

isso aconteça».

Quando viemos aqui dizer que as pessoas têm dificuldade, cada vez mais dificuldade, de acesso à saúde,

fundamentalmente os idosos, a primeira reação do Governo foi a de dizer: «isso não é verdade».

E depois ouvimos coisas absolutamente extraordinárias como o Sr. Vice-Primeiro-Ministro dizer, aqui, na

Assembleia da República, neste Plenário, que quem perdeu rendimento social de inserção foi porque tinha

mais de 100 000 euros na conta… Gostava de saber se os portugueses que nos estão a ouvir,

designadamente os que perderam o rendimento social de inserção, se enquadram nesta realidade. Isto é uma

rotunda mentira! O Governo suporta as suas políticas em rotundas mentiras e isso, obviamente, não dá

resultado.

Quando debatemos aqui a questão do aumento do IVA houve Deputados da maioria a dizer,

inclusivamente, que havia estabelecimentos de restauração a mais e que o aumento do IVA era uma forma de

regular o número de estabelecimentos de restauração.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — É verdade!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Isto é um absurdo! Aliás, a política deste Governo é um absurdo,

a argumentação é, obviamente, absurda, porque não se consegue sustentar em mínimos padrões de justiça.

Depois, falemos em natalidade. Os senhores podem proferir muitos discursos sobre a vossa vontade de

inverter esta realidade mas o facto é que a baixa da taxa de natalidade é uma questão extraordinariamente

preocupante e não se inverte enquanto as pessoas não conseguirem reganhar esperança no futuro e

condições de vida.

As pessoas que sabem que não conseguem suportar a educação de um filho ou não conseguem criar um

filho optam, com responsabilidade, por não o ter, Sr. Primeiro-Ministro, e isto, de facto, é delapidador, porque o

que o Governo se propõe fazer para os próximos tempos é aplicar mais austeridade, mais aumento de

impostos, corte de salários ou corte de pensões.

Repare, Sr. Primeiro-Ministro, que para as pessoas tanto se lhes dá que o senhor retire por via do aumento

dos impostos ou por via do corte dos salários e das pensões, pois o certo é que as pessoas ficam sempre com

menos. Os senhores fazem sempre esse jogo de que se não é por via da despesa é por via da receita, mas

para as pessoas vem a dar no mesmo.

O que os senhores têm a fazer é repor o que retiraram para que as pessoas consigam reganhar condições

de vida, para, por exemplo, Sr. Primeiro-Ministro, pensarem em ter filhos,…

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Queira terminar, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Termino já, Sr. Presidente.

… ou para serem também agentes redinamizadores da economia, que é uma coisa de que estamos

efetivamente a precisar.

É que o Sr. Primeiro-Ministro, quando faz as suas contas, nunca conta com a riqueza que o País podia

ganhar com a redinamização da economia. E não conta porquê? O senhor não vai ter força nem folego, com

as políticas que está a praticar, para redinamizar a economia e por essa via gerar a riqueza que o País

precisa.

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Por fim, Sr. Presidente, termino dizendo o seguinte: este Governo não respeita os portugueses, que não

são, de facto, os verdadeiros beneficiários da ideologia do Governo, da ideologia macabra este Governo.

Aplausos de Os Verdes e do PCP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro da Economia.

O Sr. Ministro da Economia (António Pires de Lima): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados,

debatemos hoje o estado da Nação num ambiente de recuperação económica: o produto cresce, em termos

homólogos, 1,3% no primeiro trimestre de 2014 e o desemprego, apesar de ainda estar a níveis muito altos,

desceu de um máximo superior a 17%, quase 18%, em janeiro de 2013, para 14,3% em maio deste ano.

Sim, nós sabemos e, mais do que saber, nós sentimos. Foram três anos repletos de sacrifícios para as

famílias e de desafios muito exigentes para as empresas. Foi um percurso muito difícil e, para muitas pessoas

e empresas, um percurso mesmo heroico.

Não queremos voltar a passar por tão dura prova e humilhação como aquela que nos foi deixada como

legado.

Na hora do balanço de um Governo que assumiu responsabilidades no momento mais difícil podemos

dizer: honrámos os nossos compromissos financeiros, recuperámos a reputação da Nação e sem reputação —

é bom deixar este ponto claro — a recuperação da economia e a descida do desemprego não seria possível e

não estaria a acontecer.

A economia portuguesa cresce, hoje, de uma forma saudável e, por isso, está bem mais forte do que antes

da crise da dívida. Temos boas razões para acreditar, com esperança fundada e não com base em

pensamentos etéreos ou mágicos, num futuro melhor.

Nos últimos anos, a economia portuguesa começou por ser puxada pelo motor das exportações, isto é,

pela capacidade das nossas empresas competirem e ganharem quota de mercado a nível global. O peso das

exportações no produto passou de 28% para 41% do PIB.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Cumprimenta com o chapéu dos outros!

O Sr. Ministro da Economia: — Em apenas três anos, corrigimos um défice crónico da nossa balança

comercial externa, impulsionada pela exportação dinâmica de bens transacionáveis, com crescimentos

impressivos em praticamente todas as categorias de produtos, mas também pela pujança do setor dos

serviços, com assinalável expressão no turismo e na expansão notável dos centros de serviços qualificados.

Há alguém neste Hemiciclo que não reconheça e não sinta orgulho neste notável comportamento das

nossas empresas, mobilizado pelos nossos empresários, pelos nossos gestores, pelos nossos trabalhadores?

Pois se há, faz mal, do meu ponto de vista. Faz mal! O Governo, como sempre, manifesta aqui o orgulho nas

empresas portuguesas.

Sr. Presidente e Srs. Deputados: Ao motor das exportações, que, em 2016, de acordo com o Banco de

Portugal, valerão mais de 45% do produto, juntou-se, entretanto, o motor da procura interna.

Após uma queda substancial entre 2010 e 2013, os indicadores apontam para uma retoma do consumo

privado: crescimento de 1,5% no primeiro trimestre de 2014.

Esta recuperação assenta na melhoria dos níveis de confiança que atingiram em maio o melhor patamar

dos últimos cinco anos. E esta recuperação do consumo, ao contrário daquilo que aqui já se disse hoje, é feita

com uma balança comercial equilibrada, com uma taxa de cobertura de 100% nos primeiros quatro meses do

ano e sem défice externo.

Os tempos não estão para nenhuma espécie de euforia. A euforia, aliás, é muito má conselheira, mas a

confiança, este sentimento que está a ganhar espaço na sociedade portuguesa e que faz acreditar que os

momentos mais difíceis estão para trás e que Portugal e a sua economia estão no caminho certo, faz toda a

diferença no momento em que vivemos.

E é também este ambiente de confiança, assente num conjunto de reformas estruturais que foram fazendo

o seu caminho e num posicionamento geoestratégico único em Portugal, que explica o surgimento do terceiro

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motor da economia: depois de 12 anos de queda consecutiva, o investimento privado dá sinais de

recuperação.

Se já no último trimestre de 2013 se tinha verificado alguma estabilização e, até, uma recuperação no

investimento de caráter produtivo, no primeiro trimestre de 2014, o investimento cresceu 12% face ao período

homólogo do ano passado, dando um contributo para a subida do PIB superior ao que foi o do consumo

privado, e é bom que assim seja e se mantenha.

O investimento, mais do que dissertações ideológicas, é a melhor forma de combater o desemprego. Só

investe quem confia. Felizmente, são muitos e bons os exemplos recentes de importantes investimentos

realizados ou a realizar no nosso País e que alimentam esta convicção.

Ao recente investimento de 700 milhões anunciado na Autoeuropa, em Palmela, somam-se os mais de

1600 milhões de euros de investimento contratualizados com o Estado português, através da AICEP, que

preveem a criação de mais de 2300 novos postos de trabalho, a maior parte no interior do País.

Vão-se sucedendo as boas notícias: a IKEA, multinacional sueca, anunciou na semana passada, na sua

sede internacional, que planeia contratar 7000 pessoas em todo o mundo, imaginem lá!, 3000 das quais em

Portugal, concretamente através do investimento que vão fazer em Loulé.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Hoje mesmo a IBM, outra multinacional reputada, e que não deve ser desdenhada nem pela esquerda mais

radical, acaba de informar que um dos 15 centros tecnológicos de computação em nuvem, centros iCloud, vai

localizar-se, imaginem lá!, em Lisboa. Depois de já se saber que Londres, Washington e a Cidade do México

eram alguns dos centros escolhidos, foi hoje confirmado que Lisboa é também um dos centros mundiais

escolhidos pela IBM.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A criação de emprego é, de resto, aliás, um dos grandes desafios que enfrentamos como País e é uma

pena e é lamentável que os partidos da oposição não contribuam para o ambiente de confiança que os

portugueses sentem e que todos os investidores hoje reconhecem no País.

Vozes do PSD e do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Ministro da Economia: — O desemprego cresceu, é bom notar, de 7% para quase 13% no período

de 2007 a 2011. É certo que continuou a crescer, e de forma substancial, no primeiro período de ajustamento,

atingindo o seu pico em janeiro de 2013, mas, pela primeira vez de uma forma consistente, tem vindo a recuar

mês após mês, trimestre após trimestre e situa-se agora nos 14,3%. Estamos ainda longe de ter um nível

socialmente aceitável e sustentável de desemprego, mas estamos no caminho certo.

A recuperação da nossa economia, alicerçada em três motores — exportações, consumo privado e,

sobretudo, retoma do investimento — alimenta a convicção de que o desemprego, que é a maior chaga da

nossa sociedade, vai continuar, gradualmente, a diminuir.

Sr. Presidente, Sr.

as e Srs. Deputados: Fomos capazes, no último ano, de gerar compromissos importantes

que tiveram e têm um efeito positivo na nossa economia e na confiança dos consumidores e dos agentes

económicos.

É fundamental que os agentes políticos e institucionais saibam, com maturidade, com responsabilidade

financeira e com responsabilidade democrática, criar pontes de compromisso e de entendimento que garantam

aos cidadãos, aos trabalhadores e às empresas condições para uma moderação fiscal e para um

desenvolvimento mais pleno da nossa sociedade.

Assim sendo, estarão criadas as condições de estabilidade para que os mercados e investidores, nacionais

e estrangeiros, continuem a olhar para o País com confiança e para que os portugueses, todos os

portugueses, sintam de forma mais sensível nas suas vidas os efeitos da recuperação económica.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — O Sr. Ministro tem três pedidos de esclarecimentos e peço-lhe que

informe a Mesa como pretende responder.

Entretanto, tem a palavra, para pedir esclarecimentos, a Sr.ª Deputada Mariana Mortágua.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr. Ministro, apesar das

aparições, dos vários milagres, os dados mostram uma economia bem mais frágil do que aquela que aqui

apresenta. Aliás, quem não conhecer os dados pensa que Portugal é uma economia em expansão, a par do

Brasil, da Índia e de outros grandes gigantes económicos.

Os dados do primeiro trimestre mostram que, ao contrário do que o Sr. Ministro diz, o PIB caiu em cadeia

face ao trimestre anterior.

O Sr. Ministro vai responder-me dizendo que é uma questão de sazonalidade, é o turismo e é o setor

agrícola, mas eu vou digo-lhe que o INE diz que o que caiu foram as exportações. E a parte das exportações

que caiu foram os combustíveis, combustíveis vêm da refinaria da Galp que parou dois meses, e é esta a

razão pela qual as exportações caíram. Isto quer dizer que todo o milagre exportador da economia portuguesa

vinha de uma única empresa, como, aliás, a oposição muitas vezes disse.

O Sr. Ministro vem dizer também que a procura interna, por outro lado, aumentou e dá, até, um contributo

positivo ao PIB. O que acontece é que como o aumento da procura interna não tem uma correspondência a

mais produção, as importações aumentam, e como as importações aumentam o défice da balança comercial,

que era o grande motivo de sucesso e de foguetes deste Governo, veio por aí abaixo.

No fundo, temos uma falência do modelo de crescimento deste Governo. E há uma conclusão a tirar: tal

como já foi dito muitas vezes, e por vários economistas, para além do bom senso político, a austeridade não é

uma forma de tirar países da crise, a austeridade é um mecanismo para transferir recursos do trabalho do

setor público para as empresas do setor financeiro que criaram a crise e perderam capital com ela. É este o

verdadeiro motivo da austeridade: transferir recursos, dando ao mercado, através da privatização, setores que

eram públicos, cortando nos salários para pagar juros aos bancos internacionais que especularam contra a

dívida pública, oferecendo às grandes empresas leis do trabalho mais precárias e com menos salários. É disto

que se trata.

A ideia que há pouco o Sr. Primeiro-Ministro referia de que empobrecendo se cresce e de que temos todos

de sofrer muito para viver melhor no futuro é uma ideia moralista e medieval que não tem nada de

racionalidade económica. É, aliás, uma ideia, do ponto de vista económico, bastante duvidosa para não dizer

pior.

O Sr. Presidente Guilherme Silva): — Queira terminar, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Termino já, Sr. Presidente.

A melhor forma de consolidar contas públicas no longo prazo é pagar salários e descer impostos — a longo

prazo, o crescimento consolida as contas públicas —, não é cumprir ao milímetro aquilo que o tratado diz,

porque a obediência cega nunca fez o melhor por um país, Sr. Primeiro-Ministro. O Sr. Primeiro-Ministro tem

de olhar para a sua economia e ver o que é que faz sentido ajustar nas contas públicas sem destruir a

economia.

Sr. Presidente, termino, perguntando ao Sr. Ministro da Economia o seguinte: o Governo insiste na

dicotomia entre cortes inconstitucionais dos salários ou o aumento dos impostos. O Sr. Ministro já disse que o

aumento de impostos é mau para a economia, pelo que pergunto até onde é que vai a disciplina do Ministro da

Economia que trabalha sempre para as finanças.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Rui

Paulo Figueiredo.

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O Sr. Rui Paulo Figueiredo (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Economia, neste último ano, em que

está no Governo, tem hesitado, nas suas intervenções, entre ser o gestor rigoroso, o político sério que não

abdica das suas ideias e da sua defesa e aquela versão de soldado leal e disciplinado no Governo conjugada

com o comissário político que faz a propaganda e a apologia do milagre económico.

Hoje, estava à espera de um diagnóstico mais rigoroso, de uma análise mais factual da economia, que

salientasse os aspetos negativos e que até dissesse que, em algumas áreas, a coisa já esteve pior e houve

algumas melhorias. Mas, o que tivemos foi uma nova versão do milagre económico, da recuperação da

economia e da economia mais forte e mais saudável.

Sr. Ministro, não percebemos como é que pode dizer isto. Como é que pode dizer que tivemos uma grande

recuperação da economia quando, ao nível do produto interno bruto, nós, em termos de criação de riqueza,

recuámos 13 anos?

Portanto, Sr. Ministro, se quiser fazer uma análise séria e factual, não pode dizer que nos últimos três anos

tivemos uma grande recuperação dos índices da economia.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Rui Paulo Figueiredo (PS): — Não sei como é que o Sr. Ministro pode dizer que temos uma

economia mais saudável, pois quando se debater este assunto seriamente terá de reconhecer que nos últimos

três anos não mudámos o perfil da nossa economia, pelo que continuamos com os mesmos problemas e com

os mesmos desequilíbrios. Portanto, Sr. Ministro, mais uma vez, esta versão do milagre da recuperação da

economia forte e saudável não condiz com a realidade.

Quanto ao desemprego, é verdade e é positivo que a taxa de desemprego tem descido,…

Vozes do PSD e do CDS-PP: — Ah!

O Sr. Rui Paulo Figueiredo (PS): — … mas, Sr. Ministro, também tem que debater este assunto com

seriedade, como aqui temos feito, e tem de somar a estes valores os valores dos inativos, dos

desencorajados, daqueles que estão em emprego precário, dos emigrantes, pelo que estamos muito longe

daquilo que o País precisa e muito longe de estar satisfeitos, como o seu discurso parece indiciar.

Sr. Ministro, a dívida pública está cada vez pior, os impostos aumentaram, e muito, há cortes nos salários e

nas pensões, as pessoas estão muito pior,…

Vozes do CDS-PP: — Trouxe o discurso escrito de casa!

O Sr. Rui Paulo Figueiredo (PS): — … portanto, aquilo que cada portuguesa e cada português sente no

bolso não condiz com o milagre económico que o Sr. Ministro anuncia.

Ainda bem que tivemos dados positivos nos últimos quatro meses no investimento privado. Saudamos isso

e saudamos o trabalho das empresas, dos gestores, dos trabalhadores que trabalham nessas empresas.

Mas, Sr. Ministro, não referiu os dados dos últimos dois anos, porque eles são bem negativos. Tanta

diplomacia económica, tantas viagens, tanta propaganda e tão poucos resultados para apresentar!

O tema das exportações já foi aqui muito debatido. Várias vezes avisámos sobre a dependência excessiva

da refinaria de Sines, várias vezes dissemos que o crescimento das exportações era positivo, mas que

estávamos preocupados com a desaceleração das exportações e que era preciso fazer mais. Também aqui

está muito longe do milagre económico que o Sr. Ministro tem anunciado.

Para terminar, gostaria de lhe colocar duas ou três perguntas muito objetivas e muito sintéticas

relativamente a temas que lhe são caros.

Sobre as parcerias público-privadas, falhou mais um prazo. Há dois anos que anda a anunciar os 300

milhões de euros de cortes e até agora zero contratos assinados, zero contratos visados pelo Tribunal de

Contas, zero contratos de renegociações levados a Conselho de Ministros. O último prazo anunciado pelo Sr.

Secretário de Estado e pelo Presidente da Estradas de Portugal era o mês de junho, mas já estamos em julho,

Sr. Ministro, e continua sem nenhum corte.

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O Sr. José Junqueiro (PS): — Bem lembrado!

O Sr. Rui Paulo Figueiredo (PS): — Sobre o IVA da restauração, o que nós temos é a descida de

impostos. Como já lhe disse aqui uma vez, o Sr. Ministro dizia que o anterior Ministro da Economia era

simpático, tinha boas ideias, mas não tinha força política porque não conseguia fazer vingar nenhuma das

suas ideias em Conselho de Ministros. O Sr. Ministro é a mesma coisa, pois tem boas ideias, mas o que nós

temos é aumento de impostos em vez de descida de impostos. E eu faço-lhe a justiça de referir que o senhor

também é simpático e até tem boas ideias, mas, de facto, não as consegue implementar.

Termino, referindo que há um grande consenso político e social sobre o aumento do salário mínimo para

ajudar a melhorar a procura interna. Pergunto-lhe, pois, Sr. Ministro: para quando o amento do salário mínimo?

É que só o Governo é que está fora desse consenso e penso que podemos tratar desse assunto muito

rapidamente.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília

Meireles.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Economia, nos últimos momentos

desta sessão legislativa, creio que vale a pena fazer um balanço do que foi este ano.

Não lhe diria, Sr. Ministro, que há um ano atrás não estaríamos aqui a falar do Programa de Ajustamento,

ou mesmo do segundo resgate, porque isso, creio eu, já é uma questão ultrapassada…

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Portugal cumpriu, nós cumprimos e, portanto, disso não falaremos

mais. Aliás, a oposição, sobre essa matéria, muito convenientemente, nunca mais disse nada.

Mas não foi apenas nisso que Portugal mudou. É verdade que a taxa de desemprego é ainda alta, mas,

apesar de tudo, conseguimos, num ano, diminui-la em mais de dois pontos percentuais.

Lembro-me bem que, ainda há alguns meses, quem se atrevesse nestas bancadas — e muitos de nós

atreveram-se — a falar em sinais tímidos de recuperação económica, dizendo que era preciso ter cautelas

mas que havia boas notícias, era logo ferozmente criticado. E diziam-nos: «Os senhores negam-se a ver a

espiral recessiva». Pois bem, agora é a oposição que meteu a espiral recessiva na gaveta, pois percebeu que

não houve nenhuma espiral recessiva e consegue finalmente reconhecer os sinais que são crescentemente

fortes e existentes.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Destes sinais, salientaria não só as exportações, mas, sobretudo, o turismo, que teve, no ano passado, o

seu melhor ano de sempre e que continua, nestes primeiros meses, e até abril, a crescer a taxas superiores a

10%, nesse setor que a oposição também costumava dizer que não estava a arrancar nem a recuperar.

Como nunca achámos que o Estado fosse o alfa e ómega da economia e que atirar dinheiro e investimento

público para cima de tudo fosse a solução para o crescimento, o que lhe pergunto é o seguinte: do ponto de

vista daquilo que o Estado pode fazer para fomentar a desburocratização, o investimento privado e a

competitividade, o que é que mais podemos fazer para continuar neste caminho que, e muito bem, o Sr.

Ministro chamou de recuperação económica, de confiança e de esperança?

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Economia.

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O Sr. Ministro da Economia: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, é óbvio que a

austeridade nunca foi um objetivo económico em si mesmo, foi sempre uma necessidade para repor o

equilíbrio das nossas contas públicas, para corrigir défices acumulados durante anos, para reganharmos a

nossa credibilidade, o acesso aos mercados, ao financiamento, e, assim, podermos fomentar, como está

agora a acontecer, uma estratégia de investimento.

Não vale a pena, também, diabolizar as importações, porque nós nunca o fizemos. Uma boa parte do

crescimento das importações, nestes primeiros quatro meses — as importações cresceram 3,4% — deve-se à

importação de automóveis e ao crescimento da importação de máquinas e equipamentos — cresceram mais

de 10% —, o que está ligado diretamente à agenda para o investimento.

Sr.ª Deputada, também não é verdade que as nossas exportações tenham caído nos primeiros quatro

meses do ano; bem pelo contrário, elas cresceram 2% apesar do setor dos combustíveis, pontualmente, ter

tido uma queda, que não foi uma queda módica, de 38%.

Porque acho profundamente injusta essa qualificação que faz das nossas exportações e porque está a

desqualificar muitos empresários e muitos setores da nossa economia, gostaria de lhe dar alguns exemplos:

as viagens e o turismo cresceram, no primeiro quadrimestre, 9%; os transportes, 4%; os veículos, 8%; o

plástico e as borrachas, 11%; o vestuário, 13%; os produtos agrícolas, 9%; os minerais e metálicos, 4%; os

materiais têxteis, 8%; o calçado, 11%; a cortiça e a madeira, 5%; os produtos de ótica e precisão, 16%; os

serviços de informação, 11%; os serviços financeiros, 25%; e os seguros, 16%. Que orgulho eu tenho na

economia portuguesa!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Tenho pena que esse orgulho não seja partilhado pelos partidos da oposição.

Vozes do CDS-PP: — Ah!

O Sr. Ministro da Economia: — Sr. Deputado Rui Paulo Figueiredo, é preciso não ter consciência da

realidade para não verificar com objetividade a mudança substancial de paradigma de uma economia que

estava assente no endividamento sem crescimento. A economia portuguesa vai crescer este ano entre 1% e

1,5%. É pouco para as nossas ambições, mas ainda assim é o triplo do que cresceu na década passada, uma

década que foi dominada por governos do Partido Socialista e onde esteve muitas vezes sentado, ou

apoiando, o atual líder da oposição.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Vozes do PS: — Calma! Não se irrite!

O Sr. Ministro da Economia: — É pouco para a nossa ambição, mas, ainda assim, é o triplo daquilo que a

economia portuguesa cresceu quando o Partido Socialista estava no poder e com uma situação de equilíbrio.

Também há uma mudança de paradigma importante quando verificamos que as nossas exportações

passaram de 28% da riqueza para mais de 41%. E o objetivo do Governo não é ficar nestes 41%, é criar

condições para que a agenda exportadora possa valer mais de metade da riqueza que criamos em Portugal

ainda durante esta década. Aliás, o Banco de Portugal prevê que as exportações portuguesas possam valer

mais de 46%, já em 2015.

Sr. Deputado, perdoe-me, mas é preciso não estar muito atento à realidade para não ter percebido que

houve uma mudança de paradigma substancial quando um défice crónico, o défice externo, que durante os

últimos anos da década passada sempre esteve situado em níveis superiores a 10% do PIB, se corrigiu,

devido, fundamentalmente, ao aumento das nossas exportações, que cresceram 30% em apenas dois anos.

Portugal é um caso de sucesso, de correção do seu défice externo, que passou de menos de 10% do PIB

para um superavit de 3%, durante o ano de 2013, e manteve essa tendência de equilíbrio durante o primeiro

quadrimestre de 2014.

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Portanto, isto é uma mudança estrutural do paradigma da nossa economia, cujo mérito principal é dos

empresários, das empresas, dos gestores e dos trabalhadores, mas de que o Estado tem sido um parceiro

reformista, um parceiro que tem procurado ajudar a esta mudança.

Sr.ª Deputada Cecília Meireles, ex-Secretária de Estado do Turismo deste Governo, deixe-me dizer-lhe que

este Governo, desde há três anos, tem feito uma profunda obra reformista e, nesse sentido, tem-se

posicionado como um parceiro fundamental desta agenda da retoma económica. De facto, isso tem-se visto ao

longo das muitas reformas, como aquelas que foram feitas nas leis laborais, no funcionamento dos portos, na

justiça e em muitas outras áreas, que fizeram com que Portugal fosse reconhecido pela OCDE como o

segundo país, entre 27, que mais cresceu na sua agenda reformista e que mais amigo se tornou, do ponto de

vista do investimento, nos últimos cinco anos. Estamos agora colocados na 8.ª posição, quando, em 2009,

estávamos na 25.ª posição, em termos de países da OCDE amigos do investimento.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro da Economia: — E uma das áreas que mais tem colaborado nesta agenda do crescimento

tem sido precisamente a do turismo, onde, como a Sr.ª Deputada sabe, e bem, foram feitas reformas

importantes não só ao nível da simplificação turística, não só ao nível da promoção, mas também ao nível de

parcerias com distribuidores, nomeadamente alemães e ingleses, que têm ajudado decisivamente para que os

fluxos turísticos, em Portugal, estejam a crescer 11% e para que estejamos a ganhar quota de mercado a

todos os nossos competidores mediterrânicos.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Menezes.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs.

Deputados: Estamos quase a terminar mais um debate sobre o estado da Nação.

Como já foi dito, várias vezes, nesta Câmara, é o primeiro debate do estado da Nação desta Legislatura

que é feito fora do Memorando de Entendimento, sem a troica estar presente e sendo o País e os seus órgãos

de soberania completamente detentores das rédeas do futuro do nosso País.

O Sr. João Oliveira (PCP): — E, vai daí, mais uns cortes nos salários!

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Como disse o Presidente do Grupo Parlamentar do PSD neste debate, para

além de debatermos o estado da Nação, devemos debater também o estado do Governo, o estado da maioria

e o estado da oposição.

Sobre o estado do País, é muito simples a situação que podemos apontar. E vamos ser apenas factuais.

Apanhámos, em 2011, um País na ressaca do Memorando de Entendimento, depois de seis anos de

desvario governativo; apanhámos um País que teve de se sujeitar a medidas altamente restritivas; um País

que vinha com uma trajetória crescente de desemprego desde 2007,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — E ainda não mudou!

O Sr. Luís Menezes (PSD): — … o qual estava em 7% e, em 2011, quando o Governo do Partido

Socialista saiu estava em 12%.

Para além do mais, depois de três anos de enormes dificuldades, temos um País que passou de 17,8% de

desemprego, em março do ano passado, para 14,3% de desemprego, em maio deste ano — uma descida

apenas a par da Hungria, na zona euro, aliás, em toda a União Europeia.

O Sr. Paulo Cavaleiro (PSD): — É verdade!

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O Sr. Luís Menezes (PSD): — Outro facto relevante: o País cresceu, nos últimos 15 meses. Em termos

homólogos, houve um crescimento de mais de 1%, repito — em termos homólogos, houve um crescimento de

mais de 1%. Gosto de o repetir, porque, apesar de haver arautos da desgraça que querem considerar que o

último trimestre teve um comportamento menos positivo — e não vale a pena escondê-lo, porque há razões

objetivas para que esse crescimento tenha sido menos positivo —, o facto é que o País está a crescer. O

desemprego está a diminuir e o País está a crescer.

Se tivéssemos ido atrás daquilo que o Presidente do Grupo Parlamentar do Partido Socialista ainda há

pouco disse, que era a sedução de mais tempo e mais dinheiro, Sr. Deputado Alberto Martins, ainda hoje

estávamos com o Memorando de Entendimento em cima das nossas costas.

O Sr. José Junqueiro (PS): — Das vossas, não; das nossas!

O Sr. Luís Menezes (PSD): — O facto foi só um: o Governo, coeso, e esta maioria, coesa, conseguiram

tirar o País do Memorando de Entendimento, o que muitos acreditavam que era impossível.

Mas, no debate do estado da Nação, Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, vale a pena fazer também um

balanço sobre o estado da oposição e do Governo.

O Governo e esta maioria, como já tive oportunidade de dizer no debate da moção de censura que o PCP

apresentou, estão coesos.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Isso vê-se, todos os dias!…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Basta olhar para o semblante dos Deputados do CDS!

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Mas como é que está a oposição? A oposição não apresenta alternativas,

pelo menos credíveis.

Foi com tristeza que ouvimos o líder da bancada do Partido Socialista dizer, neste Parlamento, que a única

solução que tem para apresentar ao País é a renegociação da dívida. É lamentável que, um mês após termos

saído do Memorando de Entendimento, a única proposta que o Partido Socialista tem para apresentar ao País

seja a renegociação da dívida, que durante três anos conseguimos evitar. Aliás, foi isso que fez com que

tivéssemos saído do Memorando de Entendimento sem qualquer outro tipo de resgate, sem segundo resgate

e sem qualquer tipo de cartas de conforto.

Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, no balanço deste debate do estado da Nação,

há uma conclusão a retirar: temos um País que passou por enormes provações, podemos dizer, com

propriedade, que o País está melhor, podemos dizer, com propriedade, que começa a haver mais esperança e

mais confiança nas pessoas e que as pessoas começam também a ver melhorias nas suas vidas e no seu dia

a dia. E não vale a pena escamotear: nesta Câmara, em toda esta Câmara, só o Governo e esta maioria

apresentam soluções de futuro e estabilidade para o País; do lado da oposição, infelizmente para o País,

acima de tudo para o País, não vemos nem uma ideia, nem estabilidade, mas, sobretudo, não vemos vontade

de querer apresentar uma alternativa para o País que não seja aquela que temos para oferecer enquanto

Governo e enquanto maioria.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Também para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado

António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados e Srs. Membros do Governo: Uma imagem

muito impressiva que nos vai ficar deste debate é a imagem do Sr. Primeiro-Ministro a rir à gargalhada,

quando o Secretário-Geral do PCP, na tribuna, falava dos desmandos da banca, que tão caro têm custado aos

portugueses.

Aconselhava o Sr. Primeiro-Ministro a não se rir na cara dos portugueses, porque os portugueses, que,

com os cortes nos salários, com os cortes nas reformas, com os cortes nas funções sociais do Estado, têm

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pago do seu bolso os desmandos da banca, não acham certamente piada a que tenham de pagar essa fatura

para que os banqueiros se possam rir com o Sr. Primeiro-Ministro.

Aplausos do PCP.

Portanto, já que tanto se fala dos sacrifícios dos portugueses, é bom que se tenha respeito pelos

portugueses e pelos sacrifícios que eles têm sido obrigados a fazer.

O Governo e a maioria vêm aqui hoje proclamar o fim da crise. O País, lá fora, sofre, o Governo, aqui

dentro, deita foguetes. Mas os portugueses, com tantas proclamações do fim da crise, de que a crise já

passou, de que foram três anos de sacrifícios mas que agora vem o Eldorado, perguntar-se-ão: «Bom, então,

que medidas é que estão ensejadas para que possa ser aliviada a carga de sacrifícios que foi imposta aos

portugueses? Será que o Governo desistiu dos cortes salariais e vai repor os salários de que os trabalhadores

se viram privados nos últimos anos?» Não, pelo contrário, o que está em cima da mesa é o Governo fazer

tudo quanto pode para manter intocados os cortes salariais que quis impor aos portugueses.

E os reformados, uma vez que terminou a crise, poderão aspirar a que os cortes que lhes foram impostos

nas reformas terminem? Não, pelo contrário, o Governo não tem qualquer intenção de recuar naquela medida

iníqua que foi a imposição da contribuição extraordinária de solidariedade aos reformados.

E os portugueses podem aspirar a que haja melhores condições de financiamento da educação, do Serviço

Nacional de Saúde? Não, pelo contrário, o que se anuncia é a continuação de cortes na saúde, nas

prestações sociais, na educação, em tudo o que é responsabilidade social do Estado.

É tempo de acabar essa ofensiva contra os direitos dos trabalhadores? Não! Aquilo que está em cima da

mesa é o enfraquecimento da contratação coletiva e a fragilização ainda maior da situação dos trabalhadores

perante o patronato.

Vai, finalmente, aumentar o salário mínimo nacional? Nem uma palavra da parte do Governo sobre essa

matéria. Provavelmente, à medida que as eleições se aproximam, continuarão a dizer que, sim, senhor, é

necessário aumentar o salário mínimo nacional, mas um dia mais tarde veremos se há condições para isso.

Foi anunciada, finalmente, a baixa do IVA da restauração? Não, nem uma palavra sobre isso!

O que aqui foi dito pelo Sr. Primeiro-Ministro foi que os portugueses têm de escolher entre a pobreza ou a

crise. É com o empobrecimento que o País pode sair da crise para que se cumpram as palavras de há uns

dias do Sr. Deputado Luís Montenegro, de que o País está melhor e os portugueses estão pior.

Srs. Deputados e Srs. Membros do Governo, o País não pode estar melhor se os portugueses estiverem

pior.

Mas também fica claro neste debate, apesar dos esforços que o Governo faz para ocultar a realidade, que

não houve nenhuma saída limpa do programa da troica. Seja com a troica a mandar cá dentro, seja com a

troica a mandar lá de fora, o que é evidente é que, a manter-se este Governo, a manter-se esta política, o País

estará amarrado à pulseira eletrónica das medidas que tanto têm lesado o nosso País e os portugueses.

O garrote da dívida, que aumentou galopantemente nos últimos três anos, ao contrário daquilo que o

Governo pretende insinuar, o garrote do empobrecimento, o garrote do retrocesso, do profundo retrocesso

social que o nosso País tem sofrido — a troica poderá já não estar aqui, fisicamente, mas a verdade é que o

País continua sequestrado às políticas da troica que este Governo pretende continuar a impor, enquanto se

mantiver no poder —,…

Aplausos do PCP.

… são um imperativo nacional para que este Governo seja afastado da governação, para que esta política

seja mudada o mais rapidamente possível, a bem de Portugal e a bem da qualidade de vida dos portugueses.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Ainda para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo

Correia.

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O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e

Srs. Deputados: Estamos perto do final de um debate sobre o estado da Nação, que eu, em nome do CDS,

classificaria como um debate esclarecedor, um bom debate do estado da Nação. E importa fazer, logo, à

partida, a comparação entre o debate que realizamos hoje e o debate que realizámos aqui, há um ano,

porque, no fundo, é também isso o debate do estado da Nação.

Protestos do PCP e do BE.

Srs. Deputados, os senhores são ouvidos com todo o silêncio, mas não conseguem ouvir ninguém. É

impressionante!

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, por favor, façam o silêncio necessário para

ouvirmos o Sr. Deputado Telmo Correia.

Os Srs. Deputados que estão de pé façam o favor de se sentar e aqueles que não pretendem continuar no

Plenário e estão a sair, façam-no com o silêncio necessário.

Queira prosseguir, Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Muito obrigado, Sr. Presidente.

Importa, ainda, fazer uma avaliação das responsabilidades do Governo e da maioria, obviamente, mas

também, Srs. Deputados — e não queiram fugir a isso — das responsabilidades da oposição, porque não há

processo político em que não haja responsabilidades de uns e de outros.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Em relação ao Governo e à maioria, quero dizer o seguinte: tínhamos

um primeiro objetivo fundamental, que era o de concluir o Programa a que outros nos obrigaram, recuperar

soberania e tirar a troica de Portugal. O primeiro objetivo foi cumprido, por mérito dos portugueses, mas

também por mérito de quem teve a coragem política de o assumir e de quem liderou este processo.

Obviamente, nesta matéria, a maioria está de consciência absolutamente tranquila.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Fomos e somos responsáveis por medidas difíceis, por medidas exigentes, por medidas de rigor e por

sacrifícios que pedimos aos portugueses, mas somos também responsáveis, como ainda agora aqui foi

demonstrado, por uma economia a crescer, por exportações a crescerem, por crescimento industrial, por

resultados no turismo, pela saída da troica, pela recuperação da soberania e por tudo aquilo que já foi dito hoje

neste debate. Esta, para o bem e para o mal, é a nossa responsabilidade e não fugimos dela!

Mas a oposição que assuma também as suas responsabilidades, porque há responsabilidades da

oposição! E há duas responsabilidades fundamentais: em primeiro lugar, a oposição que admita aqui que não

acertou nunca!

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Não, o Governo é que acertou!? Vê-se na dívida!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Não acertou quando disse que era preciso mais tempo e mais dinheiro;

não acertou quando prognosticou a espiral recessiva; não acertou quando garantiu o segundo resgate; não

acertou quando garantiu que tinha de haver programa cautelar; não acertou uma única vez!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

E não só não acertaram nunca, como tiveram sempre, Sr.as

e Srs. Deputados, o mesmo comportamento.

Perante as dificuldades, perante as exigências, perante os sacrifícios, como é que se comportou a oposição?

Comportou-se fazendo sempre a mesma coisa, isto é, procurando criar mais dificuldades, procurando pôr paus

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na engrenagem, apelando à rua, apelando à contestação, apelando ao não cumprimento dos objetivos e das

metas. Isso também é uma responsabilidade vossa, mas foi mesmo com todas essas dificuldades que a

maioria conseguiu, e isso é um facto absolutamente relevante.

É extraordinário que quem deixou o País à beira de um naufrágio, não tenha depois, durante todo este

processo, ajudado em nada. Nem um balde, nem uma boia, nada! Deixaram o País à beira do naufrágio, não

ajudaram em nada!

Protestos do PS.

Agora, que estamos capazes de navegar novamente, o que é que dizem? «Agora, estamos aqui. Agora,

estamos felizes. Não aconteceu nada, o Partido Socialista não tem nenhuma responsabilidade nesta matéria».

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Protestos do Deputado do PS José Magalhães.

Curiosamente, propõem mais do mesmo. O que é que veio hoje aqui o Sr. Deputado António José Seguro,

com a sua felicidade atual e momentânea, dizer? Apenas mais despesa, mais investimento público, mais

gastos do Estado e menos cortes, ao mesmo tempo que apelam às instâncias, designadamente ao Tribunal

Constitucional, para que não permita nenhum tipo de cortes.

Ora, se os senhores querem mais despesa, se não permitem e apelam a que não haja cortes, como é que

vão resolver o problema? Como é que vão resolver o problema? É que não apresentam nenhuma solução.

Protestos do PS.

Srs. Deputados, se me permitem…

Sr. Deputado António Braga, já ouvi várias vezes o Partido Socialista dizer ao Governo e à maioria que

este Governo é mais troiquista do que a troica — é uma expressão vossa.

O Sr. António Braga (PS): — E é verdade!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sabe o que é que acontece? É que de cada vez que há uma

turbulência no Partido Socialista os senhores não ficam mais troiquista do que a troica mas, isso sim, mais

trotskistas do que o Trotsky! Os senhores ficam mais trotskistas que o Bloco de Esquerda! E só o facto de os

senhores ficarem mais trotskistas que o Trotsky é que pode explicar que o Secretário-Geral do Partido

Socialista diga agora que, se fosse ele, não assinava o Memorando. Como é que é possível?! Os senhores,

que deixaram o País à beira da bancarrota, dizem, agora, que não teriam assinado o Memorando?!

Protestos do PS.

Os senhores não assumem minimamente as vossas responsabilidades, os senhores continuam a fazer

promessas, e é por isso que o principal problema da oposição é de credibilidade.

Protestos do PS.

O que é que mudou neste ano? Hoje, o Governo é um referencial de estabilidade, hoje o Governo é cada

mais um referencial de credibilidade.

Protestos do PS.

Se me deixarem terminar, Srs. Deputados, direi que o Governo termina este mandato de cabeça erguida, a

oposição não tem uma alternativa.

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Protestos do PS, do PCP e do BE.

O Sr. Deputado António Filipe fala numa imagem. Sabe o que é que lhe digo sobre essa imagem? O que é

extraordinário é que a oposição não representa uma alternativa. A «alternativa» é entre aqueles que querem a

reestruturação, que levaria à saída do euro, aqueles que, como o PC, assumidamente querem a saída do

euro…

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — PCP!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — … e aqueles que, como o PS, não sabem muito bem o que querem. Os

senhores não têm uma alternativa!

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr. Deputado.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Mesmo para terminar, Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, sobre a

banca, digo-lhe o seguinte: o senhor faz bem, e nós somos insuspeitos, pois sempre apelámos à supervisão

sobre a banca.

Agora, Sr. Deputado, não basta uma crise numa instituição bancária para o senhor pensar que está em

1975 e no 11 de março.

Vozes do PSD e do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — BCP, Banif… Isso não existe!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Os senhores não vão entrar pela banca adentro, os senhores não vão

nacionalizar,…

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr. Deputado.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — … os senhores não vão ocupar herdades, os senhores não vão sanear

gestores de empresas.

Protestos do PCP e do BE.

Nós não estamos em 1975, nem no PREC. Nós estamos em Portugal em 2014, na Europa, no euro, onde

queremos continuar.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr. Deputado.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — É nesta perspetiva que este Governo e esta maioria vão terminar o seu

mandato de cabeça erguida, porque são a melhor solução para Portugal.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Francisco Lopes (PCP): — Viva a fraude e a especulação!

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, vamos entrar na fase

de encerramento do debate.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Vice-Primeiro-Ministro.

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O Sr. Vice-Primeiro-Ministro (Paulo Portas): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Se há um debate

em que tem sentido fazer a pergunta clássica de uma democracia — estamos melhor, igual ou pior do que há

um ano — é o debate sobre o estado da Nação.

A resposta parece meridianamente clara: Portugal é, hoje, um País mais livre do que há um ano.

Economicamente, Portugal melhorou face ao ano passado; socialmente, os portugueses podem ter mais

esperança agora do que há um ano.

Protestos do Deputado do PS Alberto Martins.

Porém, convém não esquecer, diria mesmo que convém não esquecer nunca, que esta mudança de

sentido positivo não foi um acontecimento trivial, não se conseguiu, sequer, em circunstâncias normais, teve

um lastro de sofrimento e de restrição que não se apagou das memórias. Tocou a vida de quase todos: as

oportunidades dos mais novos, as certezas dos mais velhos, a estabilidade da classe média.

O Sr. José Junqueiro (PS): — Muito bem!

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — Foi tão excecional o tempo que vivemos no nosso País que só pode

caraterizar-se como extraordinário o esforço dos nossos concidadãos para o superar.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — Politicamente, somos certamente um Estado mais livre pela simples

razão de que o período de co-Governo com o sindicato dos credores, vulgarmente conhecido por troica,

terminou no dia 17 de maio.

Essa recuperação de liberdade de decisão nacional e a consequente transição para o desempenho do

papel que queremos ter na Europa — o papel de parceiros e não o de devedores — fazem politicamente muita

diferença.

Só não o percebe quem ainda acredita no internacionalismo revolucionário e por isso não preza o Estado-

Nação ou aquela tecnocracia que confunde a globalização dos problemas, que é um facto, com uma alegada

irrelevância dos poderes democráticos de cada Estado e de cada povo, uma alegação que é falsa e que é

perigosa.

Protestos do PS e do PCP.

Este é, portanto, o primeiro debate do estado da Nação, nesta Legislatura, sem a troica.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — Já não estávamos habituados a essa ausência. Devemos, por isso, não

apenas constatá-la como valorizá-la e prolongá-la.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Até para dizer isto: no caminho das pedras, que foi o protetorado, estavam certos os que defendiam que

Portugal cumprisse um resgate e mais nenhum e estavam errados os que prognosticavam que Portugal

pedisse ou viesse a ter um segundo resgate.

De igual modo, estão na direção correta os que sabem que só os países confiáveis são respeitáveis e

ajudáveis e, por isso, Portugal não está dispensado de garantir as condições para ir reduzindo a sua dívida.

Já os que usam indistinta e pouco criteriosamente conceitos como reestruturação ou renegociação da

dívida nunca explicam onde nos conduziria essa política unilateral.

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Ora, é razoável suspeitar que essa política unilateral nos conduziria a um isolamento doloroso e a uma

crise de reputação e confiança em relação a Portugal com um efeito devastador sobre os rendimentos dos

portugueses.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — Ninguém tem o monopólio da razão e mal de quem o pretenda ter. Mas

bem pode dizer-se que, se Portugal tivesse seguido por esses caminhos aventureiros, uma de duas: ou a

troica ainda cá estava ou Portugal já não estava no euro.

A economia portuguesa melhorou significativamente face ao ano passado. Os números são o que são e a

circunstância de haver um tempo de adaptação entre o que é macro e o que é micro não evita uma

comparação que, mais do que favorecer o Governo, favorece o País.

O Sr. Francisco Lopes (PCP): — Viva a fraude e a especulação! É a divisa do CDS!

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — Vejamos as coisas como elas são.

Primeiro, há um ano Portugal estava em recessão técnica e, felizmente, já não está.

Segundo, há um ano o desemprego estava em 17% e, hoje, está em 14,3%. Ainda não chega, mas a

tendência é descendente, constante e, por isso, positiva.

Terceiro, os indicadores de confiança recuperaram: o dos consumidores subiu para o melhor nível desde

2009; o dos empresários cresceu para o melhor nível desde 2010. A confiança é a base do crescimento e o

crescimento é a condição do emprego.

Quarto, o investimento produtivo deu os primeiros sinais de vida no último trimestre de 2013, mais 9%,

reforçando a tendência no primeiro trimestre de 2014, mais 12%. É a maior reserva de esperança nos

indicadores económicos, dada a letargia do investimento em Portugal na última década.

Quinto, as exportações, apesar da contração conhecida por razões previsíveis, continuam a crescer 2%

sobre o melhor ano de sempre — o ano passado — e crescem 2%, sendo que um dos setores, o dos

combustíveis, por razões conhecidas, decresceu mais de 30%.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — Sexto, o turismo poderá voltar a ter, em 2014, o melhor ano de sempre,

uma proeza nada negligenciável se repararmos que até abril deste ano as dormidas aumentaram mais 11% e

os proveitos do setor cresceram mais 10% — um crescimento sobre o recorde de 2013.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — Sétimo, a agricultura voltou a ser, como merece, pilar de investimento,

crescimento, exportação e emprego.

Há um ano, a taxa de execução do PRODER era de 66%; hoje, essa taxa de aplicação dos fundos para a

agricultura está em 84%, quatro pontos acima da média comunitária.

Escuso de mencionar qual era a execução do PRODER quando este Governo entrou, a menos que

queiram medi-la em devoluções a Bruxelas ou cativações nas finanças.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Oitavo, a produção industrial, apesar de todas as limitações conhecidas, estabilizou numa tendência de

crescimento para o período homólogo de 2013, que se cifra em mais 1,4%.

Nono, o consumo interno também registou uma melhoria face a 2013, com um alcance que até é maior,

dado o histórico de dificuldades: estamos 1,6% acima de 2013.

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Décimo, simbolicamente, ou talvez não, porque se traduz imediatamente na vida prática das pessoas e das

suas expetativas, há um tempo, por cada empresa que nascia em Portugal duas desapareciam e, hoje, por

cada empresa que desaparece nascem mais de duas novas empresas no nosso País.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — Quer isto dizer que a situação económica é ideal ou sequer boa? Não!

Quero apenas dizer, e já não é pouco reconhecer, que a economia portuguesa beneficiou das reformas feitas,

recuperou a confiança e caminhou para melhor.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

E na leitura dos números, também há uma diferença que causa perplexidade: quando Portugal vivia os

anos de chumbo do resgate, nunca negámos os factos dolorosos da recessão; agora, que a economia

portuguesa sensivelmente melhora, espanta que em alguns partidos da oposição o que esteja a dar é negar os

factos do crescimento.

Tão bizarro seria ter um Executivo que imitasse a avestruz — e não o fizemos, mesmo quando tudo parecia

impossível —, como ter, e infelizmente temos, uma oposição que recorre apressadamente a uma teoria

conspirativa para cada facto que a surpreende ou que a questione.

Se o desemprego sobe, é o patrão que despede, mas, se o desemprego desce, é a emigração que

floresce; se os juros descem, a virtude é da Europa, mas, se os juros sobem, a culpa é do Governo; se a

economia retrocede são as reformas que não resultam, mas, se a economia anima, a proeza é da

Constituição; se as exportações pulam, são os combustíveis, mas se contraem é porque atingiram o seu limite.

Nesta parafernália argumentativa, algo deslocada da mais sucinta consistência, só falta dizer que os

turistas que maciçamente escolhem Portugal como destino vêm para cá porque vêm manifestar-se contra o

Governo.

Risos e aplausos do PSD e do CDS-PP.

Reconheçamos o óbvio: melhorámos enquanto economia, mas precisamos de melhorar mais se sonhamos

com um Portugal que seja visto, vivido e sentido como uma sociedade de oportunidades.

Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Creio também ser razoável afirmar que, do ponto de vista social, há

mais razões para ter um módico de esperança agora. Uma esperança baseada no que é possível fazer e não

no que é fácil prometer; uma esperança fundada no que é equilibrado e não no que é utópico; uma esperança

que a um tempo prova que os cortes não eram permanentes e a outro tempo preservam a estabilidade

orçamental, não pondo em risco a súbita vertigem de que seria possível voltar a 2010 e, logo de uma

assentada só, aquilo que Portugal já conseguiu.

Vozes do PSD e do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — Vejam o primeiro exemplo: sim, é possível melhorar o salário mínimo

nacional numa negociação equilibrada que não deixe de atender também às questões da produtividade. Há

um ano não era possível, desde logo porque o Memorando da troica o impedia.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Agora o Governo não deixa!

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — Alguém pode dizer que nada mudará?

Concentremo-nos no segundo exemplo: sim, é possível recuperar substancialmente o rendimento dos

pensionistas que pagam CES (contribuição extraordinária de solidariedade). Este Governo descongelou as

pensões mínimas, garante uma isenção até 1000 €, o que beneficia 86% dos pensionistas, e propõe uma

redução das contribuições que significa realmente uma devolução de poder de compra especialmente

favorável à classe média dos aposentados.

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O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Bem lembrado!

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — Alguém pode honestamente dizer que tudo fica na mesma?

Por fim, o terceiro exemplo: pretende o Governo fazer uma recuperação de, pelo menos, 20% ao ano dos

salários da Administração Pública, face ao valor dos cortes sofridos desde 2010.

Pretende, ainda, evitar a perpetuação dos congelamentos de carreiras que, no limite, exasperaria o mérito

e empobreceria a Administração.

É um caminho gradual mas seguro, num domínio em que nem o líder socialista, em dia mais criativo, se

propusera repor tudo de uma vez só. Alguém pode, então, afirmar que tudo ficará igual?

O Sr. Filipe Lobo d'Ávila (CDS-PP): — Bem lembrado!

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — Diz o nosso povo que «mais vale um pássaro na mão do que dois a

voar». Esse é exatamente o princípio que se aplica à negociação do salário mínimo nacional, à proposta de

recuperação substancial do valor das pensões e ao diploma de recuperação progressiva dos salários da

Administração Pública.

Corrigem-se injustiças, desde logo, nos que têm menos; melhoram-se claramente os rendimentos dos

pensionistas, dando-lhes um quadro de referência previsível, estável e certo; progride-se numa Administração

Pública que tem menos dimensão mas que pode, e deve, ser mais bem paga. É razoável,…

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Vai cortar novamente!

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — … e o razoável, depois de tanta exceção, é verdadeiramente um ganho.

Temos esperança de que estas medidas não gerem controvérsia, porque fazem bem a muita gente.

Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: «Quando a pátria que temos não a temos» — assim, desta forma

ampla, exata e, sobretudo, bonita, se referiu Sophia, noutras circunstâncias, ao valor que no fim do dia nos

unirá a todos.

Portugal, essa história inesperada e esse projeto inacabado só pode ser cumprido em liberdade se nenhum

de nós renunciar à ideia de justiça. Creio, sinceramente, que não há tempo a perder.

Aplausos do PSD e do CDS-PP, de pé.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, terminámos os nossos trabalhos de hoje.

Voltaremos a reunir-nos na próxima terça-feira, dia 8, pelas 10 horas. A agenda do dia não está ainda

definitivamente fixada, aguardando-se a entrada de uma proposta de lei urgente do Governo, pelo que será

divulgada pelos canais parlamentares de informação adequados.

Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 22 minutos.

Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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