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Sexta-feira, 31 de outubro de 2014 I Série — Número 18

XII LEGISLATURA 4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2014-2015)

REUNIÃOPLENÁRIADE30DEOUTUBRODE 2014

Presidente: Ex.ma Sr.ª Maria da Assunção Andrade Esteves

Secretários: Ex.mos

Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco Rosa Maria da Silva Bastos de Horta Albernaz Abel Lima Baptista

S U M Á R I O

A Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 5

minutos. Deu-se conta da apresentação da proposta de lei n.º

258/XII (4.ª), da proposta de resolução n.º 98/XII (4.ª), do projeto de lei n.º 680/XII (4.ª) e dos projetos de resolução n.

os 1148 e 1149/XII (4.ª). Iniciou-se a apreciação conjunta, na generalidade, das

propostas de lei n.os

254/XII (4.ª) — Aprova o Orçamento do Estado para 2015 e 253/XII (4.ª) — Aprova as Grandes Opções do Plano para 2015.

Após o Primeiro-Ministro (Pedro Passos Coelho) ter procedido à apresentação das propostas de lei, respondeu a perguntas dos Deputados Ferro Rodrigues (PS), Luís Montenegro (PSD), Nuno Magalhães (CDS-PP), Jerónimo de Sousa (PCP), Catarina Martins (BE), José Luís Ferreira (Os Verdes), João Galamba (PS), Hugo Lopes Soares (PSD), Teresa Caeiro (CDS-PP), Paulo Sá (PCP), Luís Fazenda (BE), Heloísa Apolónia (Os Verdes), Pedro Delgado Alves (PS), António Rodrigues (PSD), António Filipe (PCP), Cecília Meireles (CDS-PP), Mariana Aiveca (BE), Diana Ferreira (PCP), Mónica Ferro (PSD) e Miguel

Tiago (PCP). No debate que se seguiu, usaram da palavra, a diverso

título, além da Ministra de Estado e das Finanças (Maria Luís Albuquerque) e do Ministro da Economia (António Pires de Lima), os Deputados Vieira da Silva (PS), Adão Silva (PSD) — que solicitaram também a distribuição de documentos —, José Ribeiro e Castro (CDS-PP), Duarte Pacheco (PSD), Paula Santos (PCP), Mota Andrade (PS), Mariana Mortágua (BE), Paulo Sá (PCP), João Semedo (BE), José Luís Ferreira (Os Verdes), Pedro Nuno Santos (PS), Fernando Virgílio Macedo (PSD), Cecília Meireles (CDS-PP), Nuno Reis (PSD), Isabel Santos (PS), Miguel Tiago (PCP), Vera Rodrigues (CDS-PP), Conceição Bessa Ruão (PSD), Jacinto Serrão — que também solicitou à Mesa a distribuição de um documento — e Eduardo Cabrita (PS), Luís Menezes (PSD), Bruno Dias (PCP) — que solicitou ainda a distribuição de um documento —, Hélder Amaral (CDS-PP), Luís Leite Ramos (PSD), Ana Paula Vitorino (PS), Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP) e Nuno Serra (PSD).

A Sr.ª Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 45 minutos.

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A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo — a quem a Mesa cumprimenta —, Srs.

Jornalistas, Srs. Funcionários, está aberta a sessão.

Eram 10 horas e 5 minutos.

Podem ser abertas as galerias.

Como todos sabem, a ordem do dia de hoje consiste no debate conjunto, na generalidade, das propostas

de lei n.os

254/XII (4.ª) — Aprova o Orçamento do Estado para 2015 e 253/XII (4.ª) — Aprova as Grandes

Opções do Plano para 2015.

Na estrutura deste debate, o Sr. Primeiro-Ministro fará uma intervenção inicial para apresentar as duas

propostas de lei, seguindo-se um conjunto de perguntas por parte dos diferentes grupos parlamentares, sendo

que numa primeira ronda cabem 5 minutos a cada grupo parlamentar.

Entretanto, enquanto os Srs. Deputados tomam os vossos lugares para termos condições para iniciar o

debate, dou a palavra ao Sr. Secretário, Deputado Duarte Pacheco, para proceder à leitura do expediente.

Faça favor.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram

admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: proposta de lei n.º 258/XII (4.ª) — Autoriza o Governo a alterar

a Lei n.º 7/2008, de 15 de fevereiro, que estabelece as bases de ordenamento e da gestão sustentável dos

recursos aquícolas das águas interiores e define os princípios reguladores das atividades da pesca e da

aquicultura nessas águas, que baixa à 7.ª Comissão; proposta de resolução n.º 98/XII (4.ª) — Aprova o Acordo

relativo ao Tribunal Unificado de Patentes, assinado em Bruxelas, em 19 de fevereiro de 2013, que baixa à 2.ª

Comissão; projeto de lei n.º 680/XII (4.ª) — Consagra expressamente a identidade de género no âmbito do

direito à igualdade no acesso a emprego e no trabalho, procedendo à 5.ª alteração ao Código do Trabalho,

aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 fevereiro, que baixa à 10.ª Comissão, com conexão com a 1.ª Comissão; e

projetos de resolução n.os

1148/XII (4.ª) — Consagra o dia 17 de maio como Dia Nacional contra a Homofobia

e a Transfobia (PS), que baixa à 1.ª Comissão, e 1149/XII (4.ª) — Recomenda ao Governo medidas para

aumentar a sustentabilidade, a segurança e os rendimentos na arte xávega (BE), que baixa à 7.ª Comissão.

Em termos de expediente, é tudo, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, estando criadas as condições, vamos dar início ao debate, pelo que

dou a palavra ao Sr. Primeiro-Ministro para proceder à apresentação das propostas de lei n.os

254/XII (4.ª) —

Aprova o Orçamento do Estado para 2015 e 253/XII (4.ª) — Aprova as Grandes Opções do Plano para 2015.

Tem a palavra, Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro (Pedro Passos Coelho): — Sr.ª Presidente da Assembleia da República, Srs.

Membros do Governo, Sr.as

e Srs. Deputados, Minhas Senhoras e Meus Senhores: Há quase exatamente um

ano disse nesta Câmara que a proposta de Orçamento do Estado, que tinha acabado de ser entregue na

Assembleia da República, seria o passaporte do País para o nosso futuro pós-troica. E assim foi. Há cinco

meses fechámos o Programa de Assistência na data prevista.

Alcançámos um objetivo nacional crucial. Não foi este Governo que conduziu o País ao beco sem saída

que forçou a vinda da troica, mas foi este Governo que terminou o Programa de Assistência e abriu as portas

para um futuro diferente e melhor para todos os portugueses.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Agora, iniciamos a discussão sobre a proposta de Orçamento de Estado para 2015 sabendo que este é o

primeiro que o País conhecerá sem estar determinado pela emergência financeira.

É um Orçamento determinado pela recuperação do nosso futuro coletivo. E determinado pela

responsabilidade e coerência de não fazer o País andar para trás, de não desperdiçar os sacrifícios e os

resultados obtidos nestes últimos três anos.

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É frequente procurar analisar decisões políticas como o Orçamento do Estado para saber se estão mais à

«esquerda» ou mais à «direita». No caso da proposta de Orçamento do Estado para 2015, a diferença entre

esquerda e direita não é relevante para as escolhas que se abrem diante de nós. E essa escolha é simples:

andar para a frente ou voltar para trás. Nós escolhemos seguir em frente.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Um dos fatores de grande importância da proposta de Orçamento agora em discussão é que permite uma

muito maior clareza quanto a vários temas da vida do País. Clareza quanto às mudanças que foram

introduzidas. Clareza quanto às interpretações contraditórias e mistificações que foram surgindo no debate

público acerca dos nossos problemas e das respostas políticas que foram dadas.

De acordo com todas as grandes organizações internacionais, assim como as previsões do Governo, 2015

será um ano de aceleração do crescimento económico. Será também um ano de continuação de redução do

desemprego. E tudo isso num contexto económico internacional adverso.

Gostaríamos que essa aceleração do crescimento fosse mais intensa, e que a descida do desemprego

fosse mais acentuada, e trabalharemos para isso ao longo de todo o ano de 2015. Mas estes dados trazem

uma clareza muito significativa. Desmentem todas as teses, não só de que vivíamos numa espiral recessiva,

mas também que nunca conseguiríamos crescer se não abrandássemos a consolidação orçamental e se não

aumentássemos a dívida.

Vozes do PSD: — Bem lembrado!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Quantas vezes não ouvimos o argumento cego, inteiramente desligado das

condições reais do País, de que só com mais défice haveria crescimento?

Quantas vezes não nos disseram que havia esta regra mágica, independente das circunstâncias dos

países e das épocas, que só com mais dívida criaríamos emprego?

Quantas vezes não se preferiu enunciar uma vaga teoria em detrimento do bom senso realista que atende

à vida concreta do País e às suas restrições?

Em 2015 faremos o que temos vindo a fazer desde 2011: pensar no que o País efetivamente precisa e

chegar a equilíbrios sensatos e coerentes entre metas para o défice, receita fiscal, despesa e um cenário

macroeconómico realista. Nem mais, nem menos. E sem as falsas dicotomias de austeridade e contra-

austeridade.

Na verdade, crescemos em 2014 e cresceremos em 2015 com o défice mais baixo da nossa história

democrática e com o segundo ano consecutivo de redução da dívida pública. Esse é outro dado decisivo, que

não pode ser ignorado. Sobretudo quando ainda alguns sectores políticos querem fazer vingar a ideia nociva

para o País de que a nossa dívida é insustentável. Como acabei de referir, a nossa dívida pública terá em

2015 o segundo ano consecutivo de diminuição assinalável. Esse é o rumo da sustentabilidade e a rejeição

prática das aventuras propostas que mais não são do que receitas para novos colapsos financeiros e novos

resgates, porventura mais duros do que aquele que sofremos em 2011.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Mais: em 2014 e em 2015, a nossa economia cresce e crescerá com a consolidação de excedentes

externos. Isto é, pela primeira vez desde há muitos anos, e pela primeiríssima vez desde que aderimos à

moeda única, crescemos ao mesmo tempo que reduzimos a dívida externa. É, portanto, de um crescimento

económico e de uma criação de emprego estruturalmente diferentes do que tivemos nos últimos 20 anos: É

sustentável, não se faz à custa de dívida e não tem o curtíssimo prazo de validade que teve no passado. Isso

faz toda a diferença para os portugueses e para o nosso futuro coletivo.

Assim como faz toda a diferença a redução de despesa pública que em quatro anos será realizada. Entre

2010 e 2015, teremos reduzido 11,5 mil milhões de euros de despesa primária do Estado, isto é, se não

tivermos em conta os juros da dívida pública. São 11,5 mil milhões de euros a menos para serem financiados

pelos impostos dos contribuintes. Julgo que é um número categoricamente esclarecedor. Trata-se de redução

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de despesa sem qualquer precedente, nem paralelo na nossa história democrática. De resto, é esse facto que

permite sustentar um excedente primário superior a 2% no próximo ano. Quer dizer, se não fosse o peso dos

juros pela dívida do passado, o País estaria já com um saldo orçamental confortável que permitiria desonerar

fiscalmente os portugueses e reforçar algumas políticas públicas.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Depois dos inúmeros perigos que conseguimos evitar, e das bases reformistas que pudemos lançar, o País

está hoje mais forte para responder aos desafios que temos pela frente. E a proposta de Orçamento para 2015

é mais um instrumento do fortalecimento da nossa economia e da nossa sociedade.

Esta tarefa de robustecimento, porém, não está terminada. É um trabalho contínuo, sobretudo depois da

extrema fragilidade e vulnerabilidade a que o País foi sujeito depois de muitos anos de estagnação económica

e política. É um trabalho contínuo que continuará a mobilizar o Governo, as instituições e toda a sociedade.

Nesse sentido, o ano de 2015, alicerçado no Orçamento do Estado, será um ano de importantes reformas.

A começar pelas reformas no plano da fiscalidade.

Primeiro: como já é público, o Governo irá aceitar incorporar na fase de especialidade, as medidas

incluídas nas propostas de reforma do IRS e da fiscalidade verde com impacto relevante para 2015.

Avançamos com a reforma do IRS que, além de limpar muita burocracia, traz alívio fiscal a muitas famílias:

com a introdução do quociente familiar; com o alargamento das deduções; com o aumento do mínimo de

existência para que mais 120 000 famílias passem a estar isentas de pagamento de IRS; com o apoio ao

empreendedorismo individual e à mobilidade geográfica dos trabalhadores; com mais incentivos à poupança.

Em 2015 haverá alívio fiscal direto a muitas famílias, sobretudo àquelas que têm mais encargos familiares

e que — manda a justiça social — não devem estar tão sobrecarregadas com impostos.

E todos estarão protegidos por uma cláusula de salvaguarda para garantir que ninguém pague mais um

euro em resultado desta reforma. Mas também quisemos firmar um contrato de confiança fiscal com todos os

contribuintes e garantir que cada euro de acréscimo de receita fiscal em 2015 sirva, não para financiar mais

despesa do Estado, mas para reverter a sobretaxa extraordinária.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Segundo: avançamos com a fiscalidade verde, coordenada com a estratégia mais ampla de crescimento

verde, e que aposta na mudança de comportamentos e nos incentivos para uma abordagem de maior

eficiência no uso dos recursos, menos desperdícios nocivos, e de maior sustentabilidade do nosso

crescimento e do nosso modo de vida. E sublinho que a neutralidade fiscal desta reforma traduz-se no alívio

fiscal para os portugueses em sede de IRS.

Terceiro: consolidamos a reforma do IRC, com a descida pelo segundo ano consecutivo da taxa do

imposto, dando segurança e previsibilidade fiscal, ao mesmo tempo que facilitamos a vida às nossas

empresas para que possam investir mais e criar mais e melhor emprego.

Estes três exemplos de reforma fiscal remetem para um horizonte de futuro. De gradual desoneração e

moderação fiscal, no caso do IRS e do IRC a prosseguir nos próximos anos. De alteração de comportamentos

com consistência e benefício económico e ambiental, no caso da fiscalidade verde. Os três exemplos abrem

uma nova era de estabilidade, previsibilidade e coerência no plano da fiscalidade. Uma nova era com

benefícios para todos.

Mas o alcance reformista da ação do Governo para 2015 não se fica pela fiscalidade. Vai muito além disso.

É reformista também na economia.

Vamos executar a Estratégia do Crescimento Verde, para uma economia mais eficiente e com mais

tecnologia e para uma maior sustentabilidade do nosso modo de vida, como referi.

Vamos avançar com a Estratégia Nacional para o Mar, para apostar definitivamente e com coerência nesse

grande recurso que faz parte da nossa história e do nosso futuro.

Vamos concretizar o PETI 3+, para democratizar o investimento público em território com equipamentos e

infraestruturas de necessidade comprovada e valia estratégica demonstrada.

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A proposta de Orçamento do Estado para 2015 é igualmente reformista no Estado e no Estado social. As

reformas no Estado que prosseguirão no próximo ano e são cruciais para cumprirmos as metas que aqui

assumimos. As medidas na Administração Pública que envolvem a requalificação dos trabalhadores, as

poupanças com as Tecnologias de Informação e Comunicação e a racionalização na aquisição de bens e

serviços são, entre muitos outros, aspetos importantes.

Mas esta tarefa nas suas múltiplas dimensões é um trabalho de persistência reformista, que não começa

agora, já começou desde o início deste mandato; que não termina em 2015, mas deve prosseguir nos anos

futuros; que não vincula apenas esta ou aquela tutela, antes responsabiliza todo o Governo no seu conjunto.

Assim, depois de termos introduzido o subsídio de desemprego para trabalhadores independentes, a partir

de janeiro de 2015 será ativado o subsídio de desemprego para empresários em nome individual,

comerciantes e pequenos empresários.

Para promover uma maior conciliação entre o trabalho e a vida familiar e remover os obstáculos aos

projetos de vida das famílias portuguesas, criámos um programa de incentivo à opção de trabalho a tempo

parcial, com apoio do Estado.

Iremos efetuar uma ampla transferência de competências do Estado central para as autarquias, num

ambicioso projeto de descentralização, que só pode beneficiar todos os portugueses.

Daremos, neste domínio, prioridade às áreas da educação, da saúde e da segurança social.

Poderemos, finalmente, deixar um sem-número de irracionalidades centralizadoras e permitir que sejam os

municípios ou as comunidades intermunicipais ou urbanas a decidir o que preferencialmente devem ser elas a

decidir, como os horários de funcionamento das suas unidades locais de saúde ou uma maior

responsabilidade local na gestão dos apoios sociais.

Ao mesmo tempo, estamos a trabalhar para um acordo de concertação com os parceiros do sector social

que, pela primeira vez nos próximos dois anos, inclua os temas da saúde e da educação, desde o pré-escolar

até aos cuidados continuados e paliativos.

Queremos, assim, coordenar a concertação territorial com a concertação solidária.

Além disso, estamos a aprofundar o processo de desburocratização e simplificação com o programa

Aproximar, reorganizando os serviços de atendimento, multiplicando as soluções de mobilidade e de

digitalização dos documentos e dos processos.

E passamos a tutela da ADSE e dos restantes subsistemas de saúde para a área da saúde, permitindo

ganhar escala e normalização, ao mesmo tempo que se garante que os subsistemas permanecerão como

fundos autónomos, com contas próprias e com a sua própria identidade e diferenciação.

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: O ano 2015 é um momento de viragem na recuperação dos

rendimentos dos portugueses e do seu poder de compra. A par do aumento do salário mínimo, com efeitos já

no presente mês de outubro, os funcionários públicos beneficiam já da reversão dos cortes que foram feitos no

contexto da emergência financeira. Essa reversão foi total para todos os trabalhadores do Estado com

rendimentos até 1500 €. E para vencimentos acima desse montante a reversão será de 20% em 2015 e

integral no ano seguinte, se outras propostas não forem feitas, entretanto.

Além disso, com a extinção da contribuição extraordinária de solidariedade, todos os pensionistas

recuperarão integralmente o valor das suas pensões até 4611 €. E cerca de 1,1 milhão de pensionistas, mais

de um terço do universo dos reformados portugueses, verão as pensões mínimas, sociais e rurais,

aumentadas pelo quarto ano consecutivo, depois de o Governo anterior ter determinado um insensível e

precipitado congelamento dessas pensões em 2011.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Mas esta proposta de Orçamento também garante os apoios sociais a quem mais precisa.

Se compararmos os resultados de 2014 com os de 2010, verificamos que a despesa com prestações

sociais aumentou mais de 2,7 mil milhões de euros nestes quatro anos. A estratégia de responsabilidade e de

coerência permitiu que houvesse recursos, que na realidade houvesse mais recursos, para garantir que os

mais desfavorecidos e os mais vulneráveis tivessem o apoio de que precisavam. E assim continuará a ser em

2015, refutando todas as considerações sobre um suposto ataque ao Estado social.

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O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!

O Sr. Primeiro-Ministro: — O maior ataque ao Estado social foi desferido com o colapso financeiro de

2011. Agora que estamos recuperados desse duro golpe, podemos olhar para os resultados e para os factos.

Na proposta de Orçamento do Estado para 2015, continuaremos a reforçar o Programa de Emergência

Social, lançado logo no início deste mandato; alargaremos a tarifa social de eletricidade das 60 000 famílias

atualmente abrangidas para um total de 500 000 famílias, que gozarão de um desconto de 34% na sua fatura;

alargaremos a todo o País o Passe Social+, que concede descontos até 60% nas tarifas de transporte às

famílias de menores rendimentos; disponibilizaremos um aumento da verba para a ação social; e

aumentaremos em 50 000 famílias — para um total de 350 000 — o universo das isenções de IMI.

Por sua vez, não só demos força ao Serviço Nacional de Saúde, como iremos em 2015 aumentar as

transferências para o programa orçamental da saúde em mais 287 milhões de euros.

O mesmo podemos dizer da escola e do ensino público, com o alargamento da rede do pré-escolar e a

respetiva tradução no aumento da dotação orçamental para esta que é a base cada vez mais importante na

educação futura das nossas crianças e um importante ponto de apoio da vida das famílias portuguesas.

No ensino básico, introduziremos o Inglês curricular no 1.º ciclo, tornando-o disciplina obrigatória ao longo

de 7 anos consecutivos de escolaridade.

Finalmente, esta proposta de Orçamento de Estado persiste no combate às rendas, em nome da equidade

na repartição do esforço nacional, da justiça e de uma economia mais democrática.

Vamos mais longe na contribuição do sector energético.

Vamos mais longe nas poupanças com parcerias público-privadas na área rodoviária e recordo que alguns

dos contratos feitos no passado foram deliberadamente programados para gerarem despesa a cargo dos

contribuintes apenas a partir de 2014.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Vamos também mais longe na contribuição do sector bancário.

Introduzimos alterações à exploração do jogo online mais equitativas e haverá maior contribuição da

indústria farmacêutica, cuja receita reverterá para o Serviço Nacional de Saúde.

É, assim, inequívoca a força reformista desta proposta de Orçamento. Fica bem demonstrada pelos seus

objetivos e pelas suas linhas de ação.

Infelizmente, já todos nos apercebemos que algumas forças políticas estiveram, e continuarão a estar,

distraídas desta ação política indispensável. Estão absorvidas pelas suas agendas particulares, que culminam

invariavelmente na reivindicação de eleições antecipadas. São opções que apenas vinculam essas forças

políticas, mas que não podem deixar de as responsabilizar perante o povo português.

Da parte do Governo, posso garantir e tirar quaisquer dúvidas que possam restar de que a nossa atenção e

o nosso trabalho estão exclusivamente ao serviço das soluções para o problema dos portugueses e das

respostas para os grandes desafios nacionais.

Colocámos a fasquia alta para 2015, como não poderia deixar de ser. Temos muito trabalho pela frente.

O ano 2015 será um ano de investimento no futuro dos portugueses. Não pode haver maior motivo de

mobilização do que esse.

Pela primeira vez desde há muito tempo, o futuro de Portugal está aberto diante de nós.

Temos a oportunidade de o construir à altura das justas aspirações de todos os portugueses. E nós não a

vamos desperdiçar.

Aplausos do PSD e do CDS-PP, de pé.

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, vamos iniciar a primeira ronda de perguntas dispondo cada grupo

parlamentar de 5 minutos.

O Sr. Primeiro-Ministro informou-nos que, nesta primeira ronda, responderá separadamente a cada grupo

parlamentar, pelo que tem, desde já, a palavra o Sr. Deputado Ferro Rodrigues.

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O Sr. Ferro Rodrigues (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, pelo tipo de intervenção que aqui fez

e o tipo de Orçamento que apresenta verifica-se, mais uma vez, que o senhor vive como sendo um Primeiro-

Ministro de um país imaginário visto que está convencido de que os portugueses ficaram satisfeitos com a

evolução do País em 2014 e estão muito otimistas com aquilo que se prepara para 2015.

Pois posso dizer-lhe que é exatamente o contrário. Ouvimos as confederações patronais, as confederações

sindicais, as associações de municípios e de freguesias, e o ambiente é extremamente negativo, tanto em

relação à evolução do passado como em relação àquilo que vai passar-se no futuro.

O drama é que o Sr. Primeiro-Ministro vive num país imaginário, mas os portugueses têm um Primeiro-

Ministro concreto, que é o senhor e que tem repetido com teimosia um conjunto de políticas que são negativas

e que são incompetentes.

Aplausos do PS.

O Sr. Primeiro-Ministro, na semana passada, queixou-se de comentadores políticos, muitos dos quais do

seu partido, chamando-lhes «orgulhosos», «preguiçosos», «patéticos». Bom, mas o que é este Orçamento

senão até um pouco mais do que isso?

Comecemos pela questão do orgulho. Este Orçamento, ao repetir a mesma lógica dos anteriores, ao

aprofundar a austeridade, é um Orçamento que não é apenas orgulhoso, é um Orçamento extremamente

arrogante.

Protestos do PSD.

Vejo que o Sr. Primeiro-Ministro teve a desfaçatez de dizer que estava a mudar o modelo económico em

Portugal quando, no próximo Orçamento, aquilo que se prevê é que um crescimento de 1,5%, que é, aliás,

posto em causa pelas organizações internacionais, será atingido, por via da procura interna, em 1,3% e das

exportações líquidas em 0,2%. É exatamente o modelo dos tais 10 anos perdidos que o Sr. Primeiro-Ministro

tanto fala, é aquele que, em desespero de causa, quer pôr em 2015!

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — É incrível!

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): — Isto demonstra como, além do orgulho, porque não faz qualquer balanço

sério do que é o erro deste modelo, é arrogante.

A austeridade expansionista falhou, a austeridade expansionista fracassou e insistem no erro, insistem nas

fantasias quanto às perspetivas para o ano que vem e insistem no falhanço do essencial. Repare que, para o

próximo Orçamento, o investimento previsto para 2015 é de 2%. É isto a austeridade expansionista?! Ao fim

de quatro anos de Governo, de 12 Orçamentos, traz-nos aqui uma perspetiva de investimento de 2%! Isto é

um desastre económico e um desastre para o modelo de crescimento português!

Aplausos do PS.

Quanto à preguiça, Sr. Primeiro-Ministro, que maior preguiça pode haver do que, nas circunstâncias em

que o País está, continuar a aumentar a carga fiscal? Sim, porque as receitas de contribuições, de impostos,

de taxas, de taxinhas, aumentam bastante mais do que o Produto, em termos nominais. Isto é que é preguiça,

é ir recolher mais fundos por via do saque fiscal e, por outro lado, atacar os mais pobres com os tetos para as

prestações sociais. O que é isso senão preguiça?!

Sr. Primeiro-Ministro, tenho comigo uma página de um jornal que diz que, no ano passado, um quarto das

crianças que beneficiavam do rendimento social de inserção (RSI) perdeu direito ao apoio. Gosta de ver isto?

Acha que isto é que a política de família? Acha que a boa política de família é a que se dirige aos mais ricos e

não aos mais pobres?!

Aplausos do PS.

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Sr. Primeiro-Ministro, quanto ao patético, aquilo que se verifica é que este Governo não conseguiu

assegurar, neste arranque de época, o funcionamento normal de sistemas e de instituições democráticas

fundamentais, não conseguiram arrancar, com um mínimo de competência e lógica, no sistema de justiça e no

sistema de educação. Isso é que é patético, Sr. Primeiro-Ministro!

Aplausos do PS.

O que é patético é não terem feito a reforma do Estado e agora a meses das eleições, sejam elas

antecipadas ou não, virem pedir, por amor de Deus, o apoio do Partido Socialista para tudo e mais alguma

coisa, desde o IRS, até à fiscalidade verde passando pelas grandes reformas na segurança social. Isso é que

é patético, Sr. Primeiro-Ministro!

Aplausos do PS.

Sr. Primeiro-Ministro, em vez de catalogar os seus antigos colegas, companheiros, Presidentes do PSD e

outros líderes de opinião, aconselho-o a ouvi-los melhor, sobretudo a ouvirem bem aquilo que diz a Dr.ª

Manuela Ferreira Leite,…

Vozes do PSD: — Ah!

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): — … sobretudo a ouvirem bem aquilo que diz o Dr. Bagão Félix. Têm muito a

aprender, Sr. Primeiro-Ministro.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Ferro Rodrigues, vê-lo a citar a Dr.ª Manuela

Ferreira Leite e o Dr. Bagão Félix é, de facto, uma coisa extraordinária,…

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): — Porquê?!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … mas não deixo de a registar também, porque, ao contrário daquilo que o Sr.

Deputado supõe, essa citação não me incomoda nada. Não me incomoda nada! Saiba o Sr. Deputado que, à

frente do Governo, estou muito habituado a lutar com adversidades, venham elas da minha área política,

venham de outras áreas políticas. Encaro-as sempre com total normalidade democrática e nunca deixei de

convidar os meus adversários ou os meus concorrentes para estarem próximos de mim e poderem

acompanhar o ímpeto reformista que o País tem realizado.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos do Deputado do PS Ferro Rodrigues.

Portanto, está muito equivocado se pensa que me causa algum embaraço com tais citações.

Mas deixe-me tentar responder àquilo que afirmou. Diz o Sr. Deputado que vivo num País imaginário.

Realmente essa sua observação tem pouca imaginação.

Sr. Deputado, na verdade, acabaram de ser divulgados pelo INE os indicadores de confiança dos

portugueses, que estão hoje no nível mais elevado desde 2002, que foi o ano em que, como o Sr. Deputado

sabe, Portugal entrou no procedimento por défice excessivo.

Ora, Sr. Deputado, temos hoje possibilidade de observar as condições reais da economia portuguesa, e

elas são indesmentíveis. Não é uma questão de ver melhor ou pior, com estes ou outros óculos. Temos

crescimento na sociedade portuguesa ao longo deste ano e, ao contrário do que o Sr. Deputado sugeriu, todas

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as organizações internacionais têm a mesma perspetiva de crescimento em Portugal para 2015. E até à data

não há qualquer alteração nas previsões que foram feitas, Sr. Deputado, são as mesmas.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): — As mesmas?!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Significa que Portugal, para todas essas organizações, vai crescer mais em

2015 do que cresceu em 2014.

Mas veja o Sr. Deputado o que estamos a discutir: a dimensão do crescimento! Estamos a discutir a

dimensão do crescimento!

O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — Qual crescimento?!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Não sei se o Sr. Deputado já se deu conta dessa pequenina alteração?!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Portanto, quando estamos, pela primeira vez em dezenas de anos, a conseguir crescer sem aumentar o

défice externo, que é como quem diz sem deteriorar as contas externas — e os últimos valores, disponíveis a

agosto, mostram evidentemente, e já aqui o referi, no Parlamento,…

Protestos do Deputado do PS João Galamba.

O Sr. Deputado está inscrito, levará a sua resposta na altura própria. Se não se importa, agora é o chefe da

bancada. Tem de ter paciência.

Risos do PSD.

Ora, a verdade, Sr. Deputado Ferro Rodrigues, é que conseguimos manter um excedente externo até finais

de agosto deste ano e, ao mesmo tempo, ter a nossa economia a crescer. Se isto não é uma mudança de

paradigma, o que é?! Até aqui, Portugal só conseguia crescer com recurso ao endividamento, fosse público,

fosse privado, e isto sugeria sempre, como consequência, um aumento do desequilíbrio externo. O que nós

estamos a fazer é o oposto. Como é que o Sr. Deputado diz que não há uma mudança de paradigma?!

Ao contrário, por exemplo, infelizmente, da Grécia, que conseguiu obter excedentes externos simplesmente

por quedas abruptas das importações, nós temos conseguido manter aumentos de quotas de mercado nas

exportações e o Sr. Deputado diz que não há uma mudança estrutural no paradigma da economia

portuguesa?!

O Sr. João Galamba (PS): — Não há, não! Já lá vamos!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Ó Sr. Deputado, sei que o Partido Socialista passou estes três anos e qualquer

coisa a olhar para as eleições que desejaria ter não no fim do ciclo, mas antes que o ciclo se fechasse…

Vozes do PSD: — Bem lembrado!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … e, com isso, se não me leva a mal, acho que se autoconvenceu dos

resultados que mais lhe interessariam para poder fazer o discurso eleitoral. Mas o Sr. Deputado tem de

conciliar o seu discurso eleitoral com a realidade. Quem está aqui a funcionar à margem da realidade, num

País imaginário, não sou eu, Sr. Deputado, tem sido o Partido Socialista.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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Agora, Sr. Deputado, a reforma do Estado é um processo contínuo que iniciámos neste mandato. Não

estamos agora a fazê-la, iniciámo-la neste mandato e envolveu diversas áreas muito importantes, áreas de

soberania, a da defesa nacional, a da justiça, a da segurança interna. São reformas importantes que têm vindo

a ser executadas.

Mas fizemos também reformas muito importantes do ponto de vista da organização do Estado e, por isso,

conseguimos, logo no início do mandato, não foi no fim, foi no início do mandato, apresentar e eliminar

estruturas que considerávamos que estavam a mais na Administração, designadamente lugares de direção,

assim como encolhemos as despesas do pessoal político ao serviço do Estado, a começar nos gabinetes dos

membros do Governo.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Muito bem lembrado!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Conseguimos, portanto, Sr. Deputado, apresentar uma mudança muito

importante face ao passado, mas conseguimos também introduzir princípios reformistas muito relevantes que

nos ajudam a encarar o futuro de forma mais sólida, e introduzimos vários na área social e da segurança

social.

É verdade que, na área das pensões públicas, não conseguimos introduzir a mais completa reforma que

desejaríamos, mas é conhecido de todo o País que isso não se deve à falta de determinação deste Governo,

Sr. Deputado. Aconteceu, por razão jurídico-constitucional, que, por duas vezes, as propostas que fizemos

para a alteração das pensões públicas, de modo a dar sustentabilidade à segurança social, não passaram,

apesar daquele que foi o nosso empenho, e continuo a aguardar que o Partido Socialista possa dizer se

reconhece ou não que precisamos de ter uma reforma importante nessa matéria.

E agora, sim, termino, Sr. Deputado, dizendo o seguinte: se estamos a fazer todas estas reformas e mais

algumas que enunciei na tribuna, desde o início, apesar de estarmos no final do nosso terceiro ano de

mandato, se temos este ímpeto reformista e nunca deixámos de convocar o Partido Socialista para participar

neste processo de reformas, por que é que o Sr. Deputado considera que estamos a convocar o Partido

Socialista tardiamente para uma tarefa que o Partido Socialista, durante tantos anos que esteve à frente do

País, não conseguiu realizar uma única, e importante, reforma desta dimensão?! Era isto que eu gostava que

o Sr. Deputado me esclarecesse.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — A próxima pergunta cabe ao PSD.

Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Montenegro.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, depois desta pequena viagem ao

País cor de rosa, creio que devemos voltar, de facto, à realidade. E a realidade é esta, Srs. Deputados, não é

imaginação: este Orçamento está a ser discutido sem troica em Portugal. É o primeiro Orçamento desta

Legislatura…

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Ora, lá está!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — … que é discutido sem a troica que os senhores chamaram quando

estavam atrapalhados com as finanças públicas.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Não é imaginação, é realidade! Este é o Orçamento do Estado que perspetiva para Portugal o mais baixo

défice desde o 25 de Abril, desde há 40 anos. Não é imaginação, é mesmo verdade! É um défice de 5000

milhões de euros!

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Srs. Deputados, o que era imaginário era Portugal ter sustentabilidade com um défice de 18 000 milhões de

euros, que era o défice de 2010 que os senhores deixaram a Portugal. Isto é que era imaginário, Srs.

Deputados!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Este Orçamento, Sr. Primeiro-Ministro, é o Orçamento da recuperação do rendimento e do poder de

compra, como o Sr. Primeiro-Ministro disse, e bem, que incorpora um aumento do salário mínimo nacional,

que o Partido Socialista congelou quando ainda era Governo; que incorpora a recuperação do rendimento dos

funcionários públicos, que o Partido Socialista diminuiu quando era Governo; que incorpora a reposição do

rendimento dos pensionistas; que elimina a contribuição extraordinária de solidariedade, que é do tempo do

Partido Socialista.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr. Primeiro-Ministro, de facto, é preciso muita ousadia para, perante

factos — são factos, não são convicções, não são opiniões, não são, sequer, estimativas, são factos! —, dizer

que estamos a viver num País imaginário.

Durante anos, vivemos, de facto, a ilusão de que era possível fazer aquilo para que não tínhamos meios —

isto é verdade! —, mas não foi neste período, foi no período anterior a 2011, que culminou com o pedido de

ajuda externa.

Sr. Primeiro-Ministro, este é também um Orçamento que diminui a despesa pública. É o quarto ano de

diminuição da despesa pública, num acumulado, na despesa primária, de 11 500 milhões de euros. Quando,

também aqui, dizem que só temos capacidade de diminuir a despesa, porque diminuímos o rendimento, esta é

a demonstração de que isso não é verdade.

Este é, ainda, Sr. Primeiro-Ministro, um Orçamento de justiça social. É um Orçamento que, ao contrário do

tal País cor de rosa, atualiza as pensões mínimas, sociais e rurais, que o País cor de rosa congelou, porque

achava que era socialmente justo. Aliás, ainda acha, porque há Deputados no Partido Socialista que falam

muito, até em apartes, nestes debates e entendem que atualizar as pensões mínimas é errado.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

É um Orçamento que não esquece de pedir um contributo maior a quem tem mais capacidade. É um

Orçamento que prevê uma contribuição do setor financeiro, é um Orçamento que prevê uma contribuição do

setor da energia, o que nunca alguém tinha tido a coragem de implementar em Portugal — é bom que se

recorde aqui, Sr. Primeiro-Ministro!

Mas é um Orçamento que também pede às empresas com mais lucros que tenham um acréscimo de

contribuição face às demais, como acontece, de resto, com os cidadãos.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Por isso é que baixou o IRC!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — É um Orçamento que incorpora que as pessoas singulares, que já

pagam impostos muito elevados, mas que têm rendimentos acima de 80 000 €, tenham uma taxa adicional de

imposto de 2,5% e que as pessoas singulares que tenham um rendimento superior a 250 000 € tenham uma

taxa adicional de 5%, pedindo um esforço maior a quem, de facto, tem mais capacidade. Isto é justiça social,

Sr. Primeiro-Ministro e Srs. Deputados!

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Muito bem!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — É também, Sr. Primeiro-Ministro, e o Sr. Primeiro-Ministro disse-o, um

Orçamento de crescimento, de recuperação. A nossa economia vai crescer pelo segundo ano consecutivo e

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vai crescer mais do que na zona euro. Vamos recuperar capacidade de investimento, vamos dar continuidade

a uma política de reforço da nossa competitividade.

Sr. Primeiro-Ministro, este Orçamento, de facto, concretiza a mudança em Portugal e renova a esperança

perante os portugueses.

Agora, Sr. Primeiro-Ministro, face até à intervenção que ouvimos da bancada do Partido Socialista, importa

fazer esta pergunta simples ao País: que Orçamento do Estado estaríamos a propor a Portugal, se, acaso,

tivesse sido o Partido Socialista a ganhar as eleições em 2011, se, acaso, o Governo tivesse seguido a

receita, a tal receita do Partido Socialista?! Onde é que estaríamos, se não tivéssemos tido a coragem de

cumprir o Memorando de Entendimento que até foi negociado e subscrito por parte do Partido Socialista?!

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Muito bem!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Onde é que estaríamos hoje?! Que propostas poderíamos apresentar e

que credibilidade tínhamos para propor ao País um caminho de recuperação?!

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Onde é que estaríamos hoje, se, com excessiva demagogia, tivéssemos

seguido aquela que era a proposta do Partido Socialista, de decretar o fim da austeridade?! Foi há um ano, na

discussão do Orçamento do Estado para 2014, quando o Partido Socialista dizia: «Tem de se decretar o fim da

austeridade»! Que Orçamento teríamos hoje, se tivéssemos seguido essa receita?! Não sei o que os Srs.

Deputados estavam a dizer, não sei se estavam a referir-se, talvez, àquelas que foram as propostas, por

exemplo, do Presidente Hollande, que tanto idolatraram.

Risos do PSD.

Onde é que estava Portugal, se tivesse seguido aquela que era a inspiração do Partido Socialista

português?!

A Sr.ª Presidente: — Tem de concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, termino dizendo o seguinte: é difícil

governar com tanta exigência, é difícil impor este ímpeto reformista àqueles que, no fundo, querem que tudo

continue na mesma. É difícil, mas é também ambicioso e é, sobretudo, necessário. E a verdade é esta, Sr.

Primeiro-Ministro: durante este período, todos os agentes da oposição, em particular do Partido Socialista,…

A Sr.ª Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Vou concluir, Sr.ª Presidente.

Como estava a dizer, durante este período, todos os agentes da oposição, em particular do Partido

Socialista, achavam que Portugal não cumpria, que não tinha capacidade de cumprir os seus objetivos,

achavam que Portugal não ia sair da recessão, que estávamos num processo de espiral recessiva.

Esse País imaginário, os portugueses, no seu dia a dia, com o seu trabalho, rejeitaram-no e estão a

construir, de facto, um Portugal de futuro.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Sr. Primeiro-Ministro, tem a palavra para responder.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Luís Montenegro, o Orçamento do Estado, como

o Sr. Deputado referiu, é um Orçamento que prossegue corajosamente a determinação inabalável do Governo

de retirar Portugal de qualquer zona de perigo financeiro como aquele que vivemos, quando chegámos à beira

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do abismo, da insolvência e da bancarrota, em 2011, e com o avolumar de responsabilidades, que se atiraram

para a frente dos portugueses no futuro, em resultado de processos de endividamento, que nunca tiveram na

sua base processos transparentes e consolidados de informação que permitissem decisões responsáveis.

Disso é caso inequívoco as parcerias público-privadas que proliferaram durante anos, sem uma noção correta,

adequada, dos efeitos que poderiam vir a ter para os Orçamentos futuros.

Disse-o, há pouco, da tribuna, que a renegociação que foi feita em 2009 conduzia a um agravamento

substancial das obrigações dos contribuintes, por via da transferência do Orçamento do Estado, para os

concessionários no âmbito das parcerias público-privadas rodoviária, que obrigariam, por exemplo, a que este

ano tivéssemos encargos muito próximos de mais de 1000 milhões de euros relativamente àqueles que

estavam inicialmente previstos.

Significa isto, Sr. Deputado, que é importante, mais agora do que estar a julgar o passado, perceber bem

aquilo que fizemos nestes três anos. Interrompemos esse ciclo de irresponsabilidade. Arcámos,

evidentemente, com as consequências políticas de reverter algumas dessas decisões, congelar outras e,

simplesmente, mudar de paradigma, como dizia o Sr. Deputado Ferro Rodrigues, relativamente a muitas

outras…

Protestos do Deputado do PS Ferro Rodrigues.

… e por essa razão, hoje, como é reconhecido quer pela UTAO (Unidade Técnica de Apoio Orçamental),

no Parlamento, quer pelas instituições internacionais temos Orçamentos mais transparentes do que tínhamos

no passado. Temos a possibilidade de decidir, relativamente ao futuro, com base numa informação que é mais

fidedigna, respeitando a situação em que estamos a viver.

Por isso, como a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças disse, não haverá, no futuro próximo, ninguém que

possa aparecer dizendo que foi surpreendido ou que não sabia o que havia nas nossas finanças públicas,

porque o grau de escrutínio e de transparência das nossas contas é em Portugal, como nunca foi, de um nível

elevado que permite que todos os portugueses possam pronunciar de forma informada sobre a nossa

situação.

A nossa determinação permitiu-nos que reduzíssemos o desemprego, aumentássemos o nível de

crescimento económico, portanto, de retoma, incluindo o do investimento, e pudéssemos ainda obter, como foi

hoje divulgado pelo INE, ainda há pouco o referi, um índice de confiança ao nível dos melhores últimos 12

anos.

Portanto, este Orçamento — o Sr. Deputado tem razão — é determinado, é responsável e continua a tratar

os portugueses com inteligência e a maturidade que eles merecem.

Mas é também um Orçamento de justiça social.

Quando, há pouco, o Sr. Deputado Ferro Rodrigues dizia que tínhamos colocado as crianças sem apoios

sociais, não deve recordar-se, com certeza, quando o País viu um Governo do Partido Socialista descontinuar

o quarto e quinto escalões do abono de família para aqueles que tinham rendimentos mais baixos.

Protestos do PS.

O Sr. João Galamba (PS): — Mais baixos, não!

O Sr. Primeiro-Ministro: — O Partido Socialista esqueceu-se disso! Isso não interessa!

Também se esqueceu quando congelou o salário mínimo nacional. «Foi porque as circunstâncias eram

más. Isso agora já não conta», dizem. Ficou congelado o salário mínimo nacional!

Ou quando propuseram o corte dos salários no setor público como o que agora vigora. Mas isso também

pertence ao passado, não tem nenhuma consequência para futuro, revela uma elevada sensibilidade social do

Partido Socialista e um grande apreço pela Administração Pública!

Sr. Deputado, se tivéssemos seguido a linha que estava indicada, a linha de inércia, que, no essencial,

vem, grosso modo, de 1995 até hoje, se a tivéssemos mantido sob a mesma inércia que os socialistas a

tiveram no passado, no ano de 2015 atingiríamos mais 40 000 milhões de despesa pública, o que não seria

sustentável aos bolsos dos portugueses.

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Portanto, Sr. Deputado, concordo quando diz que temos necessidade de manter este impulso reformista,

de manter esta determinação, de ter um Orçamento que é responsável, que mantém políticas restritivas, na

medida em que ainda temos défice e dívida para abater. Mas falamos com autoridade, a autoridade de quem

diminuiu a dívida e o défice e isso, creio, Sr. Deputado, faz muita diferença quando discutimos as decisões que

tomamos para futuro.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — A próxima pergunta cabe ao CDS-PP.

Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Magalhães.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, como disse, acabaram de sair

os números do INE sobre a confiança dos consumidores, os melhores desde 2002, ou seja, desde há 12 anos.

E, Sr. Primeiro-Ministro, é caso para dizer que, quando o INE ouve os consumidores, eles confiam no futuro;

quando ouvimos a oposição, como acabámos de fazer, continuam a desconfiar não só do futuro, mas,

sobretudo, daquilo que o País, os portugueses e as empresas foram e são capazes de fazer.

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — É isto que nos distingue, Srs. Deputados!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, temos um Orçamento que, a nosso ver, tem uma história, tem um contexto e

tem uma opção.

Tem, desde logo, uma história e uma data: 17 de maio de 2011, um País com falta de liquidez para pagar

funções essenciais do Estado, a negociar um resgate em cima da hora, com um Memorando em estado de

necessidade, em total dependência do exterior.

Temos, por isso, e com base nessa história, Sr. Primeiro-Ministro, um contexto com dois ciclos: o primeiro é

aquele que fizemos, ou seja, cumprir com o que nos comprometemos, pagar o que devíamos e seguir o plano

A, isto é, um só resgate, um só memorando, um só prazo, um só programa.

Lembra-se bem daqueles que diziam: «Portugal não vai pagar! Não vamos conseguir! O segundo resgate

está por dias, está por horas»?! Enganaram-se, Sr. Primeiro-Ministro!

Lembrar-se-á também, certamente, daqueles que diziam: «Bom, se calhar, vamos cumprir, mas com mais

tempo, mais dinheiro, mais juros, é uma espiral recessiva»?! Sr. Primeiro-Ministro, enganaram-se novamente!

Lembrar-se-á, ainda, Sr. Primeiro-Ministro, daqueles que, depois destas evidências, diziam: «Afinal, vamos

cumprir e dentro do prazo, mas vamos ter um programa cautelar que, no fundo, é um segundo programa»?!

Enganaram-se não uma, não duas ou três vezes, Sr. Primeiro-Ministro, enganaram-se sempre, uma vez atrás

de outra!

Risos do PS e do BE.

E, Sr. Primeiro-Ministro, agora, riem-se, desconversam, olham para o lado!

O Sr. João Galamba (PS): — Até o Ministro Paulo Portas se ri!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Mas é bom recordar, porque isto dói, a verdade dói, Srs. Deputados:

os senhores enganaram-se sempre, enganaram-se face à realidade e até admito dizer que se enganaram face

aos vossos desejos, conforme aqueles que eram os vossos objetivos eleitoralistas.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

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Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, estamos num segundo ciclo do nosso contexto, que é de crescimento, de

criar condições para o crescimento.

Este Orçamento é o primeiro da nossa democracia que cumpre as regras da União Económica e

Monetária, que se baseia num cenário macroeconómico positivo e, mais importante, que inicia a necessária e

devida moderação fiscal.

É um Orçamento que, de um défice socialista de 11,2%, prevê um défice de 2,7%, bem abaixo dos 3%,

bem abaixo de qualquer tipo de sanção.

É um Orçamento de recessão socialista, que prevê um crescimento de 1,5% e, relativamente ao qual,

aqueles que apoiaram um Governo em que havia recessão atrás de recessão e crescimentos anémicos, já

discutem apenas a intensidade do crescimento. Veja bem como eles mudaram, Sr. Primeiro-Ministro!…

É um Orçamento que prevê, apesar de ainda em valores altos, um decréscimo significativo do desemprego,

aproximando-se até de valores bem anteriores ao Memorando de Entendimento, de 2010.

Sr. Primeiro-Ministro, é também um Orçamento que permite a recuperação total de cortes a cerca de 400

000 pensionistas abrangidos pela CES (contribuição extraordinária de solidariedade), que premeia famílias

com filhos ou avós a cargo, sem prejudicar quem não quer ou quem não pode ter filhos, o que é uma medida

justa. É uma verdadeira reforma estrutural adiada há muito e que muitos, hoje, procuram apoucar.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Promove a competitividade e o emprego, quando baixa o IRC em 2

pontos percentuais, abrangendo 280 000 empresas.

Cria um regime do IVA mais favorável a pequenos agricultores, a 130 000 pequenos agricultores, e obriga

a que o Estado, por uma questão de princípio e ética, diria eu, quando cobra mais receita do que a prevista,

não a engula, não gaste em si mesmo, retribua-a, devolva-a aos contribuintes. Isto, para nós, é essencial e

revela uma ética e uma diferença.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Mas, como foi aqui dito, Sr. Primeiro-Ministro, é também um

Orçamento que descongela pensões mínimas, sociais e rurais — congeladas pelos socialistas —, pela quarta

vez consecutiva, em 221 € por ano e que mantém a majoração do subsídio de desemprego para casais

desempregados, que o PS tinha sido obrigado por esta Assembleia a concretizar e que, passado um mês,

rasgou, naquela que foi uma atitude muito pouco democrática, Sr. Primeiro-Ministro.

Consagra, finalmente, proteção social para 250 000 empresários em nome individual que careçam disso

mesmo e, sobretudo, Sr. Primeiro-Ministro, cria condições, com a credibilização e a confiança, para

descongelar já o salário mínimo nacional, o que, em 2010, apesar de um acordo tripartido entre sindicatos e

confederações patronais, o Partido Socialista tinha rasgado.

É por isso o Orçamento de uma opção, uma opção pela credibilização internacional, pela transparência

orçamental, pela moderação fiscal, pelo emprego, pela competitividade, pelos setores produtivos, como a

agricultura, mas também pela família e pela natalidade, num desafio estrutural de um País como o nosso.

Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, quero dizer-lhe, para concluir, que este Orçamento revela, de facto, como

eu disse, a história, o contexto e as nossas opções.

Fica o País a conhecer as nossas opções e, Sr. Primeiro-Ministro, é tempo de conhecer as opções dos

outros partidos. É tempo, nomeadamente, de o maior partido da oposição, o Partido Socialista, dizer ao que

vem, ao que quer vir e quais são as suas opções.

É caso, Sr. Primeiro-Ministro, para dizer: Srs. Deputados, têm aqui uma boa nova oportunidade de o fazer,

esperamos por isso, estamos convencidos de que, neste dia e meio de Orçamento do Estado, vamos

conseguir perceber, finalmente, quais são as opções do Partido Socialista. É uma nova oportunidade, é um

desafio, vamos aguardar por eles.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

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A Sr.ª Presidente: — Sr. Primeiro-Ministro, tem a palavra.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Nuno Magalhães, tem toda a razão.

Nestes três anos, aqueles que disseram que o caminho que estávamos a trilhar conduziria a um beco sem

saída, à tal espiral recessiva, a uma situação de que não conseguiríamos sair, que não conseguiríamos

ultrapassar sem nova ajuda externa — e, repare bem, uma ajuda externa que seria, portanto, a segunda, em

resultado do falhanço da primeira —, com mais tolerância para com a dívida e o défice do que a primeira,

disseram uma coisa difícil de entender,…

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Exatamente!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … mas que povoou as ideias e as mentes de todos aqueles que se fixaram na

ideia de que a realidade não podia ser o que era e que nós não podíamos passar a viver de acordo com essa

realidade.

O irrealismo destes anos não é novo, na verdade, é um padrão que foi seguido no passado e por isso é

que é importante trazê-lo hoje à colação. Mas esse exercício de memória não é um exercício de

responsabilização, é um exercício para que possamos estar seguros de que não estamos a repetir nem

condenados a repetir os mesmos erros. Isto é indispensável para futuro, porque todos os portugueses, que

passaram pelos enormes sacrifícios que passaram, têm o direito de exigir dos políticos, estejam eles no

Governo ou na oposição, da classe política que aprenda com os erros do passado, que seja responsável e que

não os faça passar novamente pelas mesmas circunstâncias.

Ora, se tivéssemos seguido o mesmo caminho de irrealismo do passado e aquele que queriam que nós

seguíssemos nestes três anos, na verdade, nunca teríamos suscitado a confiança e, evidentemente, a

credibilidade para poder concluir o Programa de Assistência como fizemos, criando hoje melhores condições

— inegavelmente melhores de condições — de financiamento da economia portuguesa, de atração do

investimento externo e de financiamento do próprio défice público, porque ainda o temos.

As condições que estamos hoje a enfrentar em mercado financeiro para pagamento de juros são

incomparavelmente mais favoráveis do que aquelas que os governos anteriores conheceram. Isso deve-se,

evidentemente, às lições que a Europa, no seu conjunto, tirou da crise e à ação do Banco Central Europeu,

como sempre tenho referido, mas também, não tenham dúvidas, às decisões determinadas que mantivemos.

Bastou que, há duas semanas, se questionasse se a Grécia haveria de sair, ou não, intempestivamente,

um ano antes, do programa para que as taxas de juro a 10 anos da dívida pública portuguesa, espanhola e

italiana tivessem alterações sensíveis nos mercados. E, durante essa altura, os nossos juros, só por via disso,

acabaram por se agravar em mais de 50 pontos base. Isto significa, Sr. Deputado, que se uma perturbação

dessas tivesse acontecido há um ou dois anos teria acontecido, em Portugal, um segundo resgate.

Se não queremos que situações adversas como estas, que podem ocorrer, no futuro, na Europa, nos

afetem dessa maneira, como afetaram no passado, temos de prosseguir com determinação o

desendividamento do Estado, só podendo ser alcançada essa via com excedentes orçamentais, que é como

quem diz com disciplina orçamental, dentro da linha que temos defendido, sobretudo pelo lado da despesa e,

quando isso não nos é autorizado, apesar de tudo, pelo lado da receita.

Esse caminho, que pode ser incómodo hoje, é aquele que garantirá confiança e segurança aos

portugueses para um futuro sustentável.

Finalmente, diz o Sr. Deputado que está na altura de conhecermos as opções dos outros. Também acho,

Sr. Deputado. A sua intervenção e a sua questão ao Governo teve também esse mérito indireto de permitir

que aqueles que contestam as nossas opções e decisões — e que estão, evidentemente, no seu pleno direito

de o fazerem — possam também dizer como fariam.

Se dizem que estão interessados em manter disciplina financeira, como o fariam? Onde o fariam? Se a

despesa corrente primária, como aqui recordei, caiu 11,5 mil milhões de euros desde 2010 e precisa de

continuar a cair, sendo que, nestes três anos, o que queriam era que a despesa fosse maior e que não

tivéssemos seguido esse caminho de restrição, então, que alternativas é que apresentavam? Não querem

receita a mais, não querem despesa a menos, então, como se faria?

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O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Exatamente!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Um debate maduro, entre pessoas responsáveis, tem, com clareza, de

responder a essas questões. Elas não estão ainda respondidas, Sr. Deputado, e não é o Governo que tem a

responsabilidade de dar essa resposta.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Termino, referindo-me a uma observação que o Sr. Deputado fez e que já o Sr. Deputado Ferro Rodrigues

tinha feito também, a propósito dos tetos para as transferências sociais.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Cai em cima da cabeça dos pobres e dos desempregados!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Disse o Sr. Ministro Pedro Mota Soares, e não posso estar mais de acordo

com ele, que se trata de dar consequência a um princípio moral: uma família, com todos os subsídios ou

transferências que recebe, não pode ter um benefício que seja superior àquilo que resultaria de um rendimento

médio normal para qualquer família que pague os impostos que suportam essas transferências para outras

famílias.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Portanto, Sr. Deputado, sim, é verdade, trata-se de responsabilidade social e é um princípio moral social

muito importante. Quando os recursos são limitados e as necessidades são muitas…

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Cortam aos pobres para darem ao IRC!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … temos de ter a certeza de que aqueles que fazem um esforço solidário

dirigido aos que precisam desse apoio não ficam em piores circunstâncias do que aqueles que beneficiam da

sua solidariedade.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Para formular a próxima pergunta, tem a palavra o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa,

do PCP.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, começou a sua intervenção

com uma frase que tem um grande significado: «há cinco meses, fechámos o Programa de Assistência na

data prevista». E as bancadas aplaudiram!…

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — E o País também!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Contudo, no artigo 239.º da proposta de lei de Orçamento afirma-se

que se mantêm em vigor todas as medidas e efeitos de natureza temporária previstos em lei ou

regulamentação que se encontrem dependentes do Programa Assistência Económica e Financeira.

O Sr. António Filipe (PCP): — Ora bem!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Explique esta contradição, Sr. Primeiro-Ministro, porque acho que é

importante, numa demonstração de que não houve saída limpa nenhuma, antes pelo contrário.

Aplausos do PCP.

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O que disse na sua intervenção inicial, e achei interessante a expressão, foi que «faremos em 2015 o que

temos vindo a fazer desde 2011». Ora, isso demonstra que este é um Orçamento que segue o mesmo rumo

dos anteriores Orçamentos do seu Governo, o mesmo rumo de imposição de medidas de empobrecimento dos

portugueses, de corte e de congelamento dos salários e das reformas, de despedimentos na Administração

Pública, de confisco dos rendimentos do trabalho, de ataques aos direitos sociais de todo um povo, à

educação, à saúde e à Segurança Social.

Um Orçamento para prosseguir a política dos PEC e da troica e os acordos de política fiscal dos partidos

ditos do «arco da dívida» a favor dos rendimentos de capital.

Um Orçamento de aumento generalizado dos impostos sobre os trabalhadores e o povo.

Um Orçamento que, em cima de uma brutal injustiça fiscal do maior aumento de impostos diretos sobre o

trabalho de que há memória, vem carregar, agora, nos impostos indiretos sobre os mesmos com a chamada

fiscalidade verde. Um aumento de cerca de 8% que se traduzirá em novos aumentos nos combustíveis, no

gás, no imposto de circulação, nos transportes públicos, no IMI, com o fim da cláusula de salvaguarda, entre

outros.

Um Orçamento que para quem trabalha ou trabalhou deixa a promessa de uma improvável devolução da

injusta sobretaxa do IRS — se… se… —, mas que para o grande capital cumpre de imediato a baixa dos seus

impostos com a diminuição da taxa do IRC, depois da redução aprovada há um ano — com o apoio do PS,

diga-se —, mais as rendas das parcerias público-privadas (PPP), as privatizações, os benefícios fiscais, o

aumento dos juros pagos pela dívida, que, no próximo ano, serão de mais 400 milhões de euros, um serviço

da dívida brutal de 8200 milhões de euros!

Um Orçamento de aprofundamento das desigualdades e de agravamento da crise social que apresenta um

novo corte de 100 milhões de euros nas prestações sociais. Toda contente, a bancada do PSD dizia: «ah, mas

a banca participa com 30 milhões!…» Nem sequer é para o Orçamento do Estado, como se sabe, mas apenas

para o fundo que existe para acudir à banca.

Vozes do PCP: — Exatamente! Bem lembrado!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Um Orçamento do Estado que continua o ataque às funções sociais

do Estado e o seu desmantelamento — mais uma vez, e à cabeça, os cortes na educação de mais de 700

milhões de euros e o agravamento da política de subfinanciamento nos serviços públicos essenciais à vida das

populações.

Este é o último Orçamento do seu Governo. Um Orçamento que fecha um ciclo de uma governação de que

o País deseja ver-se livre e em relação à qual tudo faremos para antecipar o seu fim.

Protestos da Deputada do PSD Conceição Bessa Ruão.

Um Orçamento para concluir uma governação que bateu todos os mais indesejáveis recordes a que um

País pode aspirar.

Um Orçamento de um Governo que deixa um rasto de destruição incomportável.

Protestos do PSD.

Sim, sim!… Os senhores escondem a realidade, mas eu demonstro que afundou a economia, com o PIB a

cair cerca de 6%, com milhares de empresas levadas à falência e que aponta para um crescimento em 2015

que é uma fantasia, à revelia dos impactos do BES e do quadro europeu e internacional.

Um Governo que mais que duplicou o desemprego, batendo todos os recordes de destruição de emprego,

e o mesmo se diga em relação à precariedade; que afundou o investimento para níveis nunca vistos, com

impactos desastrosos na recuperação da economia do País e no acentuar das assimetrias regionais, que fez

crescer a dívida, nestes três anos, em mais de 51 000 milhões de euros.

Até quando vão fugir à nossa proposta de renegociação da dívida para relançar a economia do País e pôr

fim a esta política de austeridade, de regressão social e civilizacional?

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Um Governo que afundou a educação e o ensino — do básico ao superior — com os cortes que promoveu

de mais de 2200 milhões de euros, entre 2011 e o que está previsto para 2015.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exatamente!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — O Governo que mais dificuldades criou ao Serviço Nacional de Saúde

e aos portugueses no acesso aos serviços de saúde com a política de encerramentos e de cortes.

Até quando vão recusar a nossa proposta de defesa da escola pública e do Serviço Nacional de Saúde e

vão perpetuar este ataque brutal aos direitos do nosso povo à saúde e à educação?

Um Governo que subiu ao pódio da injustiça social e que, com o contributo do anterior Governo, conseguiu

a proeza de dar o maior e mais profundo golpe no sistema de proteção social: menos 665 000 crianças a

receberem abono de família; menos 312 000 pessoas a receberem o rendimento social de inserção; e menos

73 000 pessoas a receberem o complemento social para idosos. Num País onde mais de metade dos

desempregados não recebe o subsídio de desemprego e os que recebem viram o seu valor cair.

O Governo que mais pobres produziu no mais curto espaço de tempo, com a sua política de retrocesso

social — mais 600 000 em três anos —, que mais cortou nos rendimentos das famílias, com o agravamento da

injustiça fiscal, o aumento histórico dos impostos diretos e indiretos, em cima de brutais cortes e

congelamentos de salários e pensões.

Também aqui, Sr. Primeiro-Ministro, até quando vão recusar a nossa proposta de uma política fiscal para

romper com o favorecimento dos bancos e dos grandes grupos económicos, com a especulação e aliviar os

impostos dos trabalhadores e do povo?

Esta semana, o Governo exultou com o facto de o Banco Mundial achar que Portugal é um País amigo dos

mercados. E porquê? Porque cá há salários mais baixos; porque cá se pode despedir com facilidade; porque

cá há um exército de desempregados disponíveis para trabalharem sem direitos; porque cá o capital paga

menos impostos.

Sr. Primeiro-Ministro, é este o País que pretende construir? Com certeza que o povo português não o

permitirá!

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Sr. Primeiro-Ministro, tem a palavra para responder.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, pediu-me, logo à abrir a sua

intervenção, que explicasse a referência à manutenção de medidas que vigoraram temporariamente durante o

Programa Assistência Económica e Financeira (PAEF).

O Orçamento do Estado faz uma referência explícita a isso, pelo que o Sr. Deputado poderia ter

acrescentado o resto: na medida em que elas possam ser importantes no conjunto das obrigações europeias

que Portugal tem…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Uma nova desculpa, portanto!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … no conjunto dos compromissos que resultam quer de ser parte da moeda

única, da zona euro, quer de ter subscrito o chamado tratado orçamental.

Sr. Deputado, isso é muito relevante, porque me permite, nesta Câmara, mais uma vez, explicitar bem o

que é estar sob resgate financeiro e ajuda externa ou ter a responsabilidade de integrar o espaço monetário

comum e de fazer parte da União Europeia.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Outra desculpa para fazer o mesmo!

O Sr. Primeiro-Ministro: — É verdade, Sr. Deputado, são coisas distintas, mas têm entre si uma ligação

evidente.

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De facto, quem precisa de pedir um resgate porque chegou à circunstância de não ter os meios para se

bastar, mas pretende estar e prosseguir políticas numa área monetária comum a outros países, tem de exibir

responsabilidade — responsabilidade das suas contas públicas, responsabilidade na sua dívida, que pode,

evidentemente, ter impactos relevantes sobre os seus vizinhos que, conjuntamente, prosseguem um projeto

comum.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Ficamos com a «pulseira eletrónica»!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Mas, claro, percebo muito bem que o Sr. Deputado não queira misturar este

elo de responsabilidade nas duas coisas, porque o Sr. Deputado acha que nada tem a ver com resgate e acha

que nada tem a ver com o facto de pertencermos ao euro e à União Europeia. E tem o Sr. Deputado toda a

razão. Toda a razão!… Mas estamos na União Europeia e no euro apesar da posição do Partido Comunista

Português, que não quer lá estejamos.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Com faturas destas, devia discutir a conta!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Na verdade, o Sr. Deputado não teve responsabilidade no resgate a que

Portugal teve de se submeter em 2011 porque não exerceu funções de governo nesses anos, embora,

evidentemente, faltasse fazer um exercício teórico — porque só pode ser teórico — de saber onde estaria

Portugal se aqueles que defendiam as tentativas coletivizantes, como o Sr. Deputado e o seu partido

defendiam, porventura, tivessem sido bem sucedidos em 1975 e estivessem no governo ao longo destes anos.

O Sr. António Filipe (PCP): — Pior do que isto não estava!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Estava, estava!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Mas não nos faltam elementos de inspiração na Europa e no mundo para

podermos adivinhar qual seria o resultado.

O Sr. Deputado fez um conjunto de afirmações muito diversificadas. Não posso, evidentemente, responder

a todas, a não ser que enumerasse pela negativa tudo o que disse, mas posso dizer o seguinte: temos

procurado, ao longo destes anos, atingir uma proporcionalidade que traga mais justiça à forma como os

sacrifícios são distribuídos.

O Sr. António Filipe (PCP): — Vê-se!…

O Sr. Primeiro-Ministro: — Por essa razão — e repare bem, Sr. Deputado, que esta proposta mantém

essas exigências —, os contribuintes, para efeito de IRS, que estão nos escalões mais elevados, têm, além da

sobretaxa, uma taxa de solidariedade que não se aplica a nenhum outro contribuinte. Quer dizer, aqueles que

têm rendimentos mais elevados não só pagam proporcionalmente mais como a taxa de esforço que lhes é

exigida é mesmo maior.

E, Sr. Deputado, mantivemos o mesmo no IRC: descemos a taxa normal em dois pontos percentuais para

2014, prevendo o mesmo para 2015, para com isso beneficiar as pequenas e médias empresas…

Vozes do PCP:— Ah!

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Não é verdade!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … e conseguirmos mais emprego e maior crescimento, nomeadamente do

investimento.

Mas, Sr. Deputado, não foi só isso. Também fizemos alterações importantes no Código Fiscal, que

permitem, por exemplo, que para efeitos fiscais, tudo aquilo que são proveitos ou dividendos reintroduzidos,

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recapitalizados nas próprias empresas, possam constituir despesa fiscal aceite, isto é, para promover o

investimento e a criação de emprego. Fizemos, de facto, muitas outras coisas.

Na verdade, mantivemos uma discriminação negativa sobre aqueles que têm rendimentos, neste caso

corporativos, muito acima do normal. Porque será, Sr. Deputado? Porque entendemos que, em momentos

especiais em que todos fazem sacrifícios, aqueles que têm mais rendimentos, sejam singulares, sejam

coletivos, possam ser chamados a participar mais no esforço de solidariedade. Isso tem sido feito por este

Governo, não vejo por que é que o Sr. Deputado não o consegue reconhecer.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Porque é que o número de milionários aumentou?

O Sr. Primeiro-Ministro: — Diz também o Sr. Deputado que desmantelamos o Estado social e, enfim,

depois, fez aquele conjunto de ilustrações habitual que está já profusamente negado.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Onde?

O Sr. Primeiro-Ministro: — Na verdade, Sr. Deputado, hoje temos uma despesa agregada, em termos

nacionais, maior na área social do que tínhamos em 2010 — maior!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Isso é falso!

O Sr. Primeiro-Ministro: — A despesa total social é hoje maior do que em 2010 e o Sr. Deputado ainda diz

que desmantelámos o Estado social?!

O facto de termos levado mais longe a condição de recursos, que foi trazida pelo Partido Socialista,

também para as prestações sociais, não significa gastar menos, significa redistribuir de outra maneira e ter a

certeza de que aquilo que temos é bem empregue naqueles que mais precisam. É muito diferente!

Sr. Deputado, saiba que se chama a isso não fazer prestações sociais de forma cega, dando

indiscriminadamente. É verdade, Sr. Deputado, nós não podemos dar indiscriminadamente,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Isso é propaganda!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … temos de olhar muito bem para as condições em que devemos transferir os

apoios sociais.

Para concluir, Sr. Deputado, porque já não tenho mais tempo, quero dizer apenas o seguinte: na área da

educação — creio que já ficou muito claro, mas o debate na especialidade ajudará a clarificar ainda mais —

não há uma diminuição de 700 milhões.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Há, há! Se não for maior!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Se o Sr. Deputado quiser ser correto na forma como analisa os orçamentos

tem de comparar o que é comparável.

O Sr. Amadeu Soares Albergaria (PSD): — Exatamente!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Muita da despesa realizada em 2014 na área da educação, e que teve a ver,

nomeadamente, com programas de rescisões, não terá lugar no próximo ano. Pelo contrário, terá pela primeira

vez um benefício, um retorno de poupança resultante desse investimento.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Mas as falências são reais!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Deputado, é preciso ser sério quando fazemos estas comparações. E não,

Sr. Deputado, não estamos a destruir a saúde,…

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O Sr. João Oliveira (PCP): — Veja o IPO do Porto!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … não estamos a destruir a educação, não estamos a destruir o Estado social,

antes pelo contrário, estamos a dar-lhe sustentabilidade, e é isso que fará com que o nosso Estado social seja

mais resiliente no futuro.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. João Oliveira (PCP): — E o IPO do Porto?

A Sr.ª Presidente: — A próxima pergunta cabe à Sr.ª Deputada Catarina Martins, do Bloco de Esquerda.

Tem a palavra, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, ouvi atentamente a apresentação

que fez do Orçamento e queria dizer-lhe, com toda a sinceridade, que a engenharia criativa dos números do

Orçamento não esconde, de forma nenhuma, a realidade de um País que é hoje mais pobre, mais desigual,

com menos emprego e com mais dívida.

De facto, o Sr. Primeiro-Ministro sabe tão bem como eu que este Orçamento não é para levar a sério. Aliás,

o Governo recordista dos orçamentos retificativos vem, do primeiro ao último, com esta coerência de nunca

podermos discutir números que sejam para valer.

Este Orçamento do Estado ignora olimpicamente o impacto da falência do BES nas contas públicas, ignora

a estagnação económica na zona euro e, principalmente, na Alemanha, e tem previsões tão irrealistas que o

próprio Governo não acredita nelas e, depois, as previsões de um lado não batem certo com as previsões

apresentadas noutro sítio.

Protestos da Deputada do PSD Conceição Bessa Ruão.

Os números deste Orçamento do Estado são definidos por uma expressão que o Sr. Primeiro-Ministro

criou, aqui mesmo, em Plenário: «malabarice». «Malabarice» é esta distância que vai entre o que o Governo

diz que faz e o que efetivamente consta deste Orçamento do Estado.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Pelo contrário!

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Levou meses a falar de desagravamento fiscal e vamos ter a maior carga

fiscal da história da democracia.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Fala em ética na austeridade e na preocupação com a pobreza, mas corta

nas prestações sociais dos mais pobres e cria o famigerado teto nas prestações sociais.

Fala nas famílias, mas não só cortou o apoio às crianças mais pobres como aumentou os impostos sobre a

habitação.

Diz, ainda, que põe fim à promiscuidade com os grandes interesses económicos quando sabemos que as

rendas da EDP continuam intocadas e o único imposto que vai descer é o imposto sobre o lucro das grandes

empresas, enquanto todos os outros sobem. Numa palavra: «malabarice»!

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Nada revela de forma mais profunda as prioridades deste Governo como

o aumento brutal de IRS ser acompanhado pela segunda descida de IRC.

Foram quatro anos de Governo PSD/CDS e quem vive do trabalho paga hoje mais 30% de IRS, enquanto

as empresas têm uma borla de 20% nos seus impostos.

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A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Talvez o Sr. Primeiro-Ministro não saiba, mas eu digo-lhe: o corte no IRC

não abrange as pequenas e médias empresas,…

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Bem lembrado!

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — … esta borla é mesmo uma borla sobre os lucros dos grandes lucros

económicos. É mesmo essa a promiscuidade do Governo.

Sr. Primeiro-Ministro, diga-me que impostos aumenta e quais os que desce e dizemos-lhe para quem

governa.

Vamos por partes. Sobre o Orçamento do Estado, o prometido desagravamento fiscal, propaganda dos

primeiros dias do Orçamento do Estado, resultou na maior carga fiscal da história da democracia, não só

porque a sobretaxa do IRS não desce nem uma décima mas também porque há um aumento brutal do IMI,

aumentam impostos sobre combustíveis, há taxas e taxinhas — verdes, cor-de-rosa, cor-de-laranja — para

todos os gostos. A moderação fiscal, prometida pela mão de Paulo Portas, é, afinal, uma mão dormente e a

carga fiscal continua a aumentar.

Já nos disse que vai devolver às famílias, por via do quociente familiar, 150 milhões de euros, mas o que

não diz é que esta quantia não é sequer metade do que foi cortado em abono de família, 330 milhões de

euros.

Sim, o Partido Socialista cortou, e mal, o apoio a meio milhão de crianças no abono de família, mas os

senhores não só não repuseram o abono de família como ainda cortaram nos apoios às crianças mais pobres.

Aplausos do BE.

Sr. Primeiro-Ministro, o IRS é todo ele uma trapalhice, ou seja, uma aldrabice da trapalhada em que ficou a

reforma fiscal.

Vozes do PSD: — Eh!…

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — A suposta diminuição da sobretaxa transformou-se num crédito fiscal, a

ser pago em condições que todos sabemos que não vão existir, e só em 2016, ou seja, depois de a coligação

ir a votos.

Inventou uma cláusula de salvaguarda que permite aos contribuintes escolherem entre o IRS de 2014 e o

de 2015, com taxas e cálculos diferentes, que, supostamente, uma plataforma informática vai resolver (espera-

se que não seja igual nem à da justiça nem à das escolas!) e que constitui a maior novidade deste Governo. É

um País e dois sistemas fiscais. Em todo o caso, são dois sistemas fiscais em que a carga sobre quem vive do

seu trabalho está sempre a aumentar.

Ao aumento da carga fiscal sobre quem trabalha corresponde o Orçamento que menos oferece a quem

vive do seu trabalho: nunca pagámos tanto para ter tão pouco. São os cortes nos serviços públicos. Sr.

Primeiro-Ministro, olhe para os números, só na escola corta 700 milhões de euros. Como é que pode o

Governo, que a meio do primeiro período letivo ainda não conseguiu o mínimo dos mínimos, que é ter as

crianças com aulas, vir cortar neste Orçamento 740 milhões de euros na escolaridade obrigatória?!

E, depois, vem com esta conversa do princípio moral. O princípio moral de um Governo que põe

trabalhadores pobres contra desempregados pobres, que corta 100 milhões de euros, com tetos, nas

prestações sociais, ao mesmo tempo que aumenta a borla fiscal para as grandes empresas. Diz-me que

benefícios fiscais concedes às grandes empresas e que cortes sociais fazes nos apoios e dir-te-ei contra quem

governas!

Protestos do Deputado do PSD Hugo Lopes Soares.

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Sr. Primeiro-Ministro, para terminar, há duas perguntas que devem ser feitas sobre este Orçamento

indefensável.

Primeira pergunta: em nome de quem é que aumenta a carga fiscal sobre quem trabalha, quando corta nos

serviços públicos, quando corta nos apoios sociais, quando nem há investimento nas infraestruturas nem na

criação de emprego, quando privatiza o pouco que resta ao País, quando as pensões mínimas continuam

abaixo do limiar de pobreza? Em nome de quem é que quem trabalha tem a maior carga fiscal da história da

democracia?

Segunda pergunta: como é que pode esbulhar desta forma os contribuintes que vivem do seu trabalho ao

mesmo tempo que concede mais borla fiscal sobre os lucros dos grandes grupos económicos? Como pode

explicar ao País que nunca há folga sobre quem trabalha mas sobre o capital a folga é sempre e cada vez

maior?

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Catarina Martins, este Orçamento do Estado

tem, a seu favor, resultados orçamentais que apresentámos durante três anos e julgo que eles são claros.

O País tinha uma situação, em 2009 e 2010, de défice orçamental que rondou ou superou os 10% e tem

tido, ao longo destes três anos, um défice orçamental claramente inferior, à custa de sacrifícios, os quais foram

combatidos, nomeadamente, pelo seu partido, pela sua formação política, ao longo destes três anos.

Sr.ª Deputada, dizer que este Orçamento não é para levar a sério porque os resultados para que aponta

não são de fiar, é a mesma coisa do que esvaziar de sentido as denúncias que a Sr.ª Deputada aqui tem feito

ao longo destes três anos. Na verdade, a Sr.ª Deputada, ao longo destes três anos, não quis nós

corrigíssemos esse défice orçamental que implicava necessariamente que houvesse uma diminuição da

despesa pública.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Implicava? A dívida está sempre a aumentar!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Não há milagres, Sr.ª Deputada, não há milagres! Se um défice é muito

elevado, só pode descer ou à custa do aumento da receita ou à custa da diminuição da despesa e,

normalmente, à custa das duas coisas. A Sr.ª Deputada não quer uma nem outra. Não é original, lamento

dizer-lhe, mas essa é a razão pela qual os portugueses não tencionam, ao longo de todo este tempo, que o

Bloco de Esquerda possa contrair responsabilidades de Governo,…

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Mas pode!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … porque não tem responsabilidade política suficiente, aos olhos dos

portugueses, para poder tomar as medidas necessárias para salvaguardar os seus interesses.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Mas também temos o dever de responder ao País!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Diz a Sr.ª Deputada: «Não, o Orçamento não pode ser levado a sério. Por

exemplo, não prevê nenhum impacto da resolução do Banco Espírito Santo nas contas públicas». Mas não há,

Sr.ª Deputada! É assim: não há!

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Não há?! Essa agora!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Nas contas públicas, para os contribuintes, não há! Não há, em 2015,

nenhuma previsão de impacto para as contas públicas. Já disse várias vezes que é muito natural, infelizmente,

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que o processo de insolvência do Grupo Espírito Santo que está a correr tenha impacto na economia

portuguesa. Não é fácil fazer previsões sobre isso e não conheço ninguém que tenha apresentado,

ousadamente, qualquer previsão sobre essa matéria. Não conheço! Não conheço!

No entanto, já disse publicamente que esse impacto só pode ser negativo, o que significa que poderíamos,

eventualmente, crescer mais e ter mais emprego se não fosse essa matéria.

Mas, Sr.ª Deputada, os exercícios que foram feitos, com muita transparência, de resto, de teste de vários

cenários adversos para a projeção das contas públicas — e que, imagine, Sr.ª Deputada, também foram

elogiados pela UTAO, bem como pela Comissão Europeia, que percebem que é mais transparente o exercício

que nós fazemos, de sensibilidade a diversas hipóteses, umas mais favoráveis, outras mais adversas),

colocam-nos dentro do que é uma previsão central, que o Governo não vê razões para alterar nesta altura e

que as instituições internacionais também não veem.

A Sr.ª Deputada diz: «bem, mas como é que este Orçamento do Estado comporta a maior carga fiscal de

sempre?» Sr.ª Deputada, creio que a senhora faz confusão entre carga fiscal e receita fiscal.

Protestos de BE.

A receita fiscal que vamos recolher em 2015 beneficia de um nível de eficiência no combate à evasão e à

fraude fiscais de que já demos provas ao longo destes anos. Isto é, não é um exercício meramente teórico, já

demos provas de que se há coisas em que não fomos irrealistas, no sentido de otimistas, nas previsões, foi

em matéria de receita fiscal. Isto quer dizer que superámos largamente as previsões que tínhamos de receita

fiscal dos anos anteriores. E não foi por termos aumentado as taxas de imposto.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Ah, pois não!…

O Sr. Primeiro-Ministro: — Portanto, Sr.ª Deputada, temos hoje um resultado positivo que advém do facto

de termos um alargamento da base tributária e, evidentemente, um maior sucesso no combate à evasão e

fraude fiscais, que justificam, a par da melhoria do ciclo económico, o nível superior de receita fiscal que

vamos alcançar.

Portanto, Sr.ª Deputada, este Orçamento faz, desse ponto de vista, um equilíbrio que julgo que é razoável.

Diz a Sr.ª Deputada: «mas não gostaria de ter uma carga fiscal menor?». Não tenha dúvidas, Sr.ª

Deputada! Mas digo-o com coerência, porque apresentámos várias medidas que permitiriam ter baixado no

Orçamento do Estado a despesa pública que não tiveram a conformação jurídico-constitucional e que nos

obrigaram a que tivéssemos aumentado a receita por via do aumento dos impostos. Isso sim, Sr.ª Deputada,

isso é verdade.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — E do IMI!

O Sr. Primeiro-Ministro: — E é verdade que, de cada vez que uma medida importante do lado da

poupança na despesa não é viabilizada do ponto de vista jurídico-constitucional, se queremos manter o

objetivo de redução do défice, a isso terá de corresponder, necessariamente, um aumento dos impostos.

O Sr. Eduardo Cabrita (PS): — Graças ao Estado de direito e à recessão económica!

O Sr. Primeiro-Ministro: — É isso, Sr.ª Deputada, que não entendo na sua afirmação, porque a senhora

exulta quando o Tribunal Constitucional conclui que determinada poupança na despesa não é constitucional,

na interpretação do Tribunal, e, portanto, não pode ser tomada.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Isso é uma chatice da democracia, não é?

O Sr. Primeiro-Ministro: — Mas depois, a Sr.ª Deputada contesta também a necessidade de aumentar os

impostos para prover ao mesmo objetivo, o que conclui, em coerência, que eu não fiz uma afirmação errada

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quando disse que a Sr.ª Deputada gosta de viver no melhor dos mundos: no mundo em que o défice baixa, a

dívida baixa, mas em que não temos de diminuir a despesa nem aumentar a receita.

Mas esse seu mundo, Sr.ª Deputada, está-me, obviamente, vedado.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — A próxima pergunta cabe ao Partido Ecologista «Os Verdes».

Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs.

Deputados: Sr. Primeiro-Ministro, ouvi-o com toda a atenção mas tenho a dizer-lhe que o otimismo do seu

discurso inicial está ao nível do otimismo deste Orçamento do Estado e dos anteriores e, até, do otimismo das

previsões do antigo Ministro Vítor Gaspar.

A verdade é que, ao longo destes últimos três anos e meio, o Governo não se cansou de impor sacrifícios e

austeridade à generalidade das famílias. Durante esse período — portanto, desde a tomada de posse do

Governo até hoje —, entre redução dos salários da Administração Pública, congelamento das progressões e

das promoções e redução de outros prémios, os trabalhadores da Administração Pública ficaram sem 8,8 mil

milhões de euros. Isto já para não falar da pesadíssima carga fiscal ou dos cortes nas reformas e nas pensões

ou, até, dos cortes ou do emagrecimento dos apoios sociais.

Só no que se refere aos salários dos trabalhadores da Administração Pública, voaram quase 9000 milhões

de euros.

Entretanto, o desemprego disparou para números nunca vistos, a dívida pública não parou de aumentar e a

nossa economia continua sem dar sinais de vida.

Mas, Sr. Primeiro-Ministro, durante esse período, quando o Governo apresentava os cortes e os sacrifícios

foi sempre dizendo que esses cortes e sacrifícios decorriam da presença da troica em Portugal, mas que

assumiam natureza provisória, excecional e, portanto, eram limitados no tempo.

O Governo falava então da recuperação da soberania, da situação de protetorado; depois, veio a luz ao

fundo do túnel, os sinais positivos e, até, os milagres económicos.

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro até pôs o relógio a andar para trás: quando a troica se fosse embora, tudo

voltaria ao sítio. Sairia a troica, voltariam os salários, o nível dos impostos, os apoios sociais e tudo o resto que

voou nestes últimos três anos e meio. Mas, afinal, a troica foi embora e as políticas ficaram, como, aliás, se vê

neste Orçamento do Estado.

Este Orçamento do Estado, ainda que não pareça, foi construído sem a sombra da troica e, mesmo assim,

sem troica, o Governo insiste na continuação da imposição dos sacrifícios aos portugueses e nas políticas de

austeridade. Ora, os portugueses, que viram a troica sair do País, que ouviram o Governo dizer que quando a

troica se fosse embora entraríamos num novo ciclo de crescimento económico, sentem-se agora, e de novo,

completamente enganados pelo Governo.

Neste Orçamento, o Governo não só mantém a brutal carga fiscal sobre quem trabalha como ainda fica a

dever aos trabalhadores da Administração Pública 80% do que lhes retirou, para quem vier a seguir pagar, se

chegar a pagar.

Como diz a antiga Ministra e também ex-Presidente do PSD, Manuela Ferreira Leite: «declarar meras

intenções para anos futuros, prometer sob condição, é confundir discurso político com compromisso legal de

executar uma decisão».

Risos de membros do Governo.

Está muito bem dito, Sr. Primeiro-Ministro! O Sr. Primeiro-Ministro está a rir-se, não sei porquê, mas

também não vou perguntar-lhe, não interessa para o caso.

Protestos do PSD.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Rir não é ideológico!

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O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Não podemos ser todos mal-encarados!

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Aliás, Sr. Primeiro-Ministro, esta fórmula encontrada pelo

Governo para proceder à reposição dos cortes salariais é, no parecer da Associação Sindical de Juízes, de

constitucionalidade duvidosa. Portanto, muito provavelmente, ainda não é desta que o Governo nos apresenta

um Orçamento dentro do quadro constitucional.

Vou repetir, Sr. Primeiro-Ministro: a Associação Sindical de Juízes considera que esta fórmula que o

Governo encontrou de proceder à devolução dos cortes é de duvidosa constitucionalidade.

E o Governo que faz depender a descida da sobretaxa do aumento da receita do IRS e do IVA é o mesmo

Governo que, sem qualquer condição, volta a descer a taxa do IRC para as grandes empresas, agora de 23%

para 21%, depois de este ano já ter procedido à redução de 25% para 23%.

Esta é a grande diferença, Sr. Primeiro-Ministro: quando se trata de devolver às pessoas o que o Governo

retirou, o Governo estabelece condições, impõe um «se» e remete para o futuro, para quem vier a seguir;

quando se trata de baixar os impostos das grandes empresas e dos grupos económicos, o Governo não impõe

qualquer condição, não há qualquer «se», é só baixar os impostos e não há, sequer, qualquer remissão para o

futuro.

Mas há ainda outra diferença. Quando se trata das famílias, as devoluções são praticamente virtuais;

quando se trata das grandes empresas, as descidas de impostos são reais.

São estas as prioridades deste Governo e são estas as suas opções. O Governo vai ter, de facto, o

resultado pretendido com este Orçamento. Em 2015, as famílias portuguesas, só em IRS e IVA, vão pagar

mais 1000 milhões de euros do que neste ano e as grandes empresas, com a diminuição da taxa do IRC, vão

pagar umas boas centenas de milhões de euros a menos ao Estado.

São estas as prioridades e as opções deste Governo: as grandes empresas e os bancos.

Sr. Primeiro-Ministro, o Conselho Económico e Social, a propósito do parecer sobre as GOP 2015,

manifesta grande preocupação sobre as consequências do processo relativo ao BES, consequências que

podem surgir para o sistema produtivo, para o sistema financeiro mas, também, para o emprego e para os

contribuintes em geral.

Parece claro que o caso do BES nos leva a dizer que estamos diante de perdas potenciais que se podem,

muito provavelmente, transformar em perdas reais. Portanto, não estanharia que viéssemos a ter mais um ou

dois orçamentos retificativos ainda antes das eleições.

Mas gostaria, Sr. Primeiro-Ministro, que se pronunciasse sobre os impactos do processo do BES na

economia e as suas consequências neste Orçamento, porque acho que seria importante saber, por exemplo,

se o Sr. Primeiro-Ministro acompanha a Sr.ª Ministra das Finanças, que, na Comissão de Orçamento e

Finanças, afirmou que o caso do BES não iria ter qualquer impacto no Orçamento do Estado para 2015.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado José Luís Ferreira, começo por esta última

questão, a que tenho ideia de já ter respondido, ainda agora, através de uma pergunta que me foi dirigida pela

Sr.ª Deputada Catarina Martins.

Julgo que não há, de resto, nenhuma inconsistência entre o que acabei de dizer em resposta à Sr.ª

Deputada e as afirmações que a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças terá feito na COFAP, e que o Sr.

Deputado trouxe agora à colação aqui, no debate. Por acaso, julgo que não conhecia essas afirmações da Sr.ª

Ministra na Comissão, mas se a sua citação é fiel, creio que, pelos vistos, combinados não estaríamos melhor,

porque acabei justamente de responder à Sr.ª Deputada Catarina Martins aquilo que, pelos vistos, a Sr.ª

Ministra de Estado e das Finanças terá dito na Comissão. Não temos impacto previsto nas contas públicas e,

portanto, no Orçamento do Estado para esta matéria.

Admito, e também já o disse, que haja um impacto sobre a economia, que não deriva, no essencial, da

solução de resolução do Banco Espírito Santo. Resulta, no essencial, da situação de insolvência do Grupo

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Espírito Santo, o que é uma coisa diferente. E eu gostaria que o Sr. Deputado contribuísse também para que,

aos olhos dos portugueses, se percebesse melhor essa diferença, embora, evidentemente, todos tivéssemos

preferido que, na cabeça dos gestores de um e de outro, essa clareza tivesse existido para que o Banco

Espírito Santo não tivesse chegado à situação em que chegou.

Na verdade, Sr. Deputado, qualquer que seja o impacto do lado do Grupo Espírito Santo na economia — e

será negativo, naturalmente —, ele não tem relevância macroeconómica que altere significativamente as

projeções de cenário macro que fazemos, tal como estão previstas no Orçamento do Estado. Portanto, não

prevemos que haja um impacto significativo que venha a afetar as variáveis macro que constam do nosso

cenário macroeconómico.

O Sr. João Galamba (PS): — Que grande confusão que vai aí nessa cabeça!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Pergunta o Sr. Deputado, insistindo numa matéria que já tem sido repetida por

outros Srs. Deputados, porque é que o Governo decide descer o IRC para as grandes empresas. Sr.

Deputado, a descida do IRC é para todas as empresas, não é para as grandes, é para todas. Porque é que o

Sr. Deputado insiste que é para as grandes empresas se é para todas?

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — É para as que têm lucros!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Mas como eu referi há bocadinho, no caso daquelas que têm lucros muito

elevados até há uma taxa de solidariedade, que vigorou no passado e se mantém para 2015. Portanto, é ao

contrário do que o Sr. Deputado diz!

Essa sobretaxa, que afeta as grandes empresas, assegura, justamente, que essas continuarão a pagar

mais do que as outras, a fazerem um esforço maior do que as outras. Portanto, Sr. Deputado, peço-lhe um

favor: não retorça a realidade das coisas apenas por que lhe parece mais fácil ou mais vantajoso dizer que as

grandes empresas vão pagar menos, simplesmente, e as pequenas empresas vão pagar mais. É ao contrário,

Sr. Deputado, é exatamente ao contrário.

Depois, o Sr. Deputado diz que se criou a expectativa que a saída da troica reverteria tudo. Não sei se o Sr.

Deputado teria essa convicção, mas eu não, nem nunca induzi ninguém a pensar tal coisa. O que eu disse foi

muito diferente e disse-o de muitas maneiras. Disse que é muito diferente viver sob resgate financeiro ou viver

com autonomia financeira. É muito diferente estar com 10% ou 11% de défice ou estar com 4%, como

estaremos este ano. É muito diferente não ter acesso aos mercados para financiar seja as empresas, seja o

Estado, ou ter acesso a mercado. Isso é muito diferente, Sr. Deputado.

Por isso, quando dizemos que o período de emergência financeira ficou concluído e que fechámos o

programa de assistência e, portanto, saímos da emergência financeira, isso é assim, Sr. Deputado, e deveria

ser um motivo de satisfação apesar de se estar na oposição.

Agora, Sr. Deputado, não é a saída da troica que resolve todos os problemas do País, nem eu nunca terei

feito tal afirmação.

Portanto, Sr. Deputado, julgo que há aí — e não leve a mal — um excesso de linguagem da sua parte, ao

atribuir-me aquilo que eu nunca disse.

Mas, agora, Sr. Deputado, permita-me que, a propósito das restrições na Administração Pública, diga o

seguinte: é sabido o que é que o Governo apresentou como solução para poupanças salariais e do lado das

pensões. Enfrentámos, como não podia deixar de ser, a impopularidade devida a apresentar com

transparência — e, deixe-me dizer, acho que com alguma coragem — níveis de redução desses rendimentos,

que nenhum governo gosta de fazer mas que nós fizemos, convictos de que era indispensável diminuir, e

rapidamente, a despesa pública para podermos reganhar confiança no financiamento.

E fizemo-lo ao longo de três anos, ao contrário do que aconteceu em países que passaram pelas nossas

circunstâncias, como a Irlanda ou a Grécia, de forma a que todos os anos fomos forçados a adotar soluções

diferentes — todos os anos, Sr. Deputado. Nenhum destes outros países que viveram sob resgate financeiro

precisaram de o fazer. Ainda no último Conselho Europeu, confirmei com o Primeiro-Ministro irlandês os cortes

salariais que foram adotados na Irlanda e que foram superiores aos nossos — eles roçam cerca de 20%, em

média, vigorarão até 2016 e só a partir de então começarão a reverter durante um período de três anos.

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Protestos do Deputado do PS João Galamba.

Sr. Deputado, isso aconteceu na Irlanda, aconteceu na Grécia e nós, cá, todos os anos, tivemos de alterar

essas medidas. E cada vez que éramos forçados a fazer menos poupança dessas despesas salariais, tivemos

de aumentar os impostos para podermos chegar ao mesmo resultado. Nunca percebi por que é que a

oposição via nisso um processo virtuoso. Mas digo-lhe uma coisa, Sr. Deputado: como afirmei da tribuna, nos

termos do Tribunal Constitucional, a reversão salarial, em Portugal, em 2016, deverá ser total porque, como

sabe, o Tribunal Constitucional não permitiu que a proposta que o Governo anunciou pudesse, em 2016,

prosseguir com mais uma devolução de 20% do corte salarial.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Porque era inconstitucional!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Devo dizer, Sr. Deputado, que se eu for Primeiro-Ministro, nessa altura, não

deixarei de apresentar novamente essa proposta. E, portanto, proporei que a reversão salarial seja de 20%,

em 2016, como consta, de resto, daquilo que tem sido a posição pública do Governo.

Evidentemente, no Orçamento do Estado, não posso ignorar qual foi a decisão do Tribunal Constitucional,

que diz que só para 2015 é que esta reversão salarial que propusemos pode vigorar. Mas não deixarei, como

sugeri na minha intervenção inicial, de apresentar propostas que estejam de acordo com aquilo que achamos

que é razoável e que é possível.

A Sr.ª Presidente: — Queira concluir, Sr. Primeiro-Ministro

O Sr. Primeiro-Ministro: — Concluo, Sr.ª Presidente, apenas justificando ao Sr. Deputado, e a Sr.ª

Presidente não me vai levar a mal, uma nota de boa disposição de há pouco — e julgo que isso não deve

impedir o nosso debate —, quando ouvi também o Sr. Deputado citar a Dr.ª Manuela Ferreira Leite. Confesso

que foi quase irresistível, realmente não foi controlado, mas não pude deixar de ver com muito interesse que

não só o Sr. Deputado Ferro Rodrigues, do lado do Partido Socialista, mas também Os Verdes tenham citado

a Dr.ª Manuela Ferreira Leite neste debate. Tenho a certeza, dentro das certezas que podemos ter, de que ela

deve estar bastante interessada neste debate.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Concluímos aqui a primeira ronda de perguntas. Vamos passar ao conjunto de

perguntas que se segue. O Governo informou que o Sr. Primeiro-Ministro responderá a grupos de perguntas

do seguinte modo: de 13 perguntas, responderá, primeiro, a um conjunto de quatro, depois, a mais quatro e, a

seguir, a cinco.

Assim sendo, tem a palavra, pelo PS, o Sr. Deputado João Galamba.

O Sr. João Galamba (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, não deixa de ser estranho ver o

Governo e a maioria celebrarem uma previsão orçamental para 2015, que será apurada em 2016, e ver toda

esta bancada e este Governo chamarem-lhe um facto. Penso que assim ficamos conversados em relação ao

vosso conceito de realidade, Sr. Primeiro-Ministro.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. João Galamba (PS): — O Sr. Primeiro-Ministro tem uma estranha dissonância cognitiva na grande

maioria das afirmações que fez aqui. É que falaram aqui muito da espiral recessiva. A frase do Sr. Presidente

da República, que foi quem primeiro falou da espiral recessiva, foi esta: «Temos de pôr cobro a esta espiral

recessiva». Isto foi dito em 1 de janeiro de 2013. E isto aconteceu, Sr. Primeiro-Ministro, puseram cobro à

espiral recessiva. Mas não foi o senhor, nem o seu Governo que o fez, foi o Tribunal Constitucional, ao

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invalidar uma austeridade de 3000 milhões de euros, obrigando este Governo a devolver 3000 milhões de

euros, Sr. Primeiro-Ministro.

Aplausos do PS.

E olhemos para a evolução da economia e relacionemo-la com esta decisão do Tribunal Constitucional. É

que é muito fácil ver o que aconteceu em 2013 e 2014, é muito fácil ver aquilo que o Sr. Primeiro-Ministro

insiste em não perceber. E o que é que aconteceu, Sr. Primeiro-Ministro? Este Governo foi travado nos seus

objetivos de austeridade no valor de 3000 milhões de euros, em 2013, e de um pouco mais 1000 milhões de

euros, em 2014. E o que é que aconteceu quando o Governo foi travado nos seus intentos? Aquilo que a

oposição e o Partido Socialista sempre disseram que iria acontecer: amentou o rendimento dos pensionistas e

aumentou o rendimento dos funcionários públicos. E aconteceu aquilo que a teoria económica mais elementar

diz que inevitavelmente acontece: cresce o consumo. Foi isso que aconteceu, Sr. Primeiro-Ministro!

A única variável macroeconómica que melhorou face ao esperado pelo seu Governo — e já vou ao

investimento —, em 2013 e 2014, foi o consumo privado, Sr. Primeiro-Ministro, e, já agora, o consumo público.

Portanto, o Sr. Primeiro-Ministro, porque disse no passado que a atividade económica assente no consumo

público e no consumo privado é insustentável, tem de explicar como é que, súbita e misteriosamente, isso

passou a ser um grande feito deste Governo e algo de que o País se deve orgulhar. É o senhor que deve essa

explicação, porque isso é a negação de tudo o que sempre defendeu.

E vamos ao investimento, Sr. Primeiro-Ministro. O seu Governo, o ex-Ministro Vítor Gaspar disse que teria

chegado o tempo do investimento. Olhemos para o que aconteceu ao investimento. O investimento cai mais

de 30%, desde que este Governo entrou em funções. Em 2014, aumenta, na melhor das hipóteses, 1,5% —

1,5%, Sr. Primeiro-Ministro, que é menos de um terço do que caiu no ano anterior, e muito, muito, muito

menos do que caiu nos últimos três anos!

E o que é que o Governo diz agora? Diz que, na melhor das hipóteses, vai aumentar 2% para 2015. Ora,

2% para 2015, que é uma estimativa, mais 1,5% para 2014, que também é uma estimativa, Sr. Primeiro-

Ministro, é metade do que caiu em 2013.

E quais são as consequências disto? São duas, Sr. Primeiro-Ministro. É que, Sr. Primeiro-Ministro, as

coisas só começaram a correr melhor nas contas públicas quando a sua estratégia foi derrotada e teve de a

inverter, ou seja, quando aumentou a despesa pública e quando devolveu rendimento a pensionistas, a

funcionários públicos, a quem recebe subsídio de desemprego e a quem recebe subsídio de doença — e isto

são medidas que lhe foram impostas, não são suas. Foi aí que a receita fiscal aumentou, que o consumo

privado aumentou e que, finalmente, a economia portuguesa pôde respirar um pouco, como sempre disse o

Partido Socialista.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Está bem!… Está bem!…

O Sr. João Galamba (PS): — Portanto, não é um sucesso, Sr. Primeiro-Ministro. É o fracasso da sua

estratégia. E é tanto o fracasso da sua estratégia que, neste Orçamento do Estado, o senhor consegue a

proeza de, simultaneamente, lamentar o que o Tribunal Constitucional lhe fez e elogiar os efeitos dessa

medida. Não há melhor exemplo de dissonância cognitiva do que este facto, Sr. Primeiro-Ministro.

A Sr.ª Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. João Galamba (PS): — Vou terminar, Sr.ª Presidente.

Quanto à transformação estrutural, aqui referida, o perfil de crescimento é exatamente o mesmo a que se

assistiu na alegada década perdida, obviamente com o desemprego no dobro do que era.

Sr. Primeiro-Ministro, o ajustamento externo português tem uma única explicação: experimente aumentar o

emprego em 350 000 postos de trabalho, que foi o que este Governo destruiu, e verá o que acontece ao

consumo e verá o que acontece ao ajustamento externo — desapareceria num ápice! Aliás, é isso que está a

acontecer. É que, se olharmos para o que aconteceu desde o princípio deste ano, veremos que a balança de

bens e serviços se degradou todos os meses, todos os meses!

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A Sr.ª Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. João Galamba (PS): — Com um pequenino crescimento do consumo, um pequenino alívio da

austeridade e um pequeno aumento do emprego, regressam todos os desequilíbrios do passado.

Portanto, Sr. Primeiro-Ministro, este Governo, o seu Governo, pode ter feito muita coisa, mas transformar

estruturalmente, no sentido positivo e sustentável, a economia portuguesa, não foi seguramente uma delas. E

a única coisa que, neste momento, está a acontecer é que os portugueses podem ter a certeza que há

instituições e partidos que combatem as medidas que os senhores tomaram, parte das quais foi revertida.

Essa é, de facto, a única notícia que pensionistas e funcionários públicos e o País terão para 2015.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, os tempos são imputados no tempo geral de cada grupo parlamentar

e, por isso, há mais tolerância. Mas, por uma questão de equilíbrio, peço sempre aos grupos parlamentares

que façam o possível por respeitar o tempo.

Tem, agora, a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Hugo Lopes Soares.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, o Sr. Deputado do Partido

Socialista que acabou de intervir representa o Partido Socialista que é contra o aumento das pensões mínimas

e das pensões rurais. E como nunca é demais lembrar, queria aqui dizer que nós não somos contra esse

aumento. Nós, nesta maioria, nós, no Governo, temos a vontade política firme de continuar sempre a proteger

aqueles que mais precisam e, Sr. Deputado João Galamba, a aumentar as pensões mínimas e as pensões

rurais.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Sr. Primeiro-Ministro, pensei que era hoje que um dos segredos mais bem guardados da política

portuguesa iria ser desvendado. Depois de duas intervenções do Partido Socialista, pensei que iria ser hoje

que iríamos perceber por que é que o Partido Socialista anunciou o seu voto contra este Orçamento do

Estado.

É que uma das poucas coisas que este Partido Socialista já anunciou foi que, caso fosse governo, não

poderia repor os níveis salariais. Ora, este Orçamento do Estado repõe parte das remunerações que os

funcionários públicos haviam perdido.

O Sr. Primeiro-Ministro: — É verdade!

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Será o Partido Socialista contra essa reposição das remunerações à

função pública e será por isso que vota contra este Orçamento do Estado? Uma das poucas coisas que este

Partido Socialista já anunciou é que não podia baixar os impostos, a não ser, verdade seja dita, o IVA da

restauração. Ora, este Orçamento do Estado baixa a carga fiscal.

O Sr. João Galamba (PS): — Baixa a carga fiscal?! Onde?!

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Será que é por isso que o Partido Socialista é contra este Orçamento

do Estado? Será porque é contra a redução dos impostos, designadamente do IRC? É que eu já o ouvi, Sr.

Primeiro-Ministro! Já ouvimos este Partido Socialista dizer que o acordo dado à reforma do IRC e à baixa dos

impostos das empresas, que é amiga do emprego, não foi dado por este Partido Socialista, foi pelo outro

Partido Socialista. Ora, assim, não sei em que é que ficamos…

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Há dois Partidos Socialistas! Há um PS bom e um PS mau!

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O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Mas há ainda uma última hipótese, Sr. Primeiro-Ministro, e era sobre

essa que queria questioná-lo. Será que este Partido Socialista, o tal Partido Socialista do País cor-de-rosa e

imaginário, é contra este Orçamento do Estado porque ele não prevê os TGV, as Parque Escolar, os

aeroportos, a dívida sem fim, uma terceira ponte sobre o Tejo? Sr. Primeiro-Ministro, será que este Partido

Socialista é contra este Orçamento do Estado porque ele, de facto, protege as novas gerações, porque ele, de

facto, não deixa dívida para os outros e prevê o défice mais baixo da nossa história democrática?

Sr. Primeiro-Ministro, será que é por causa deste País, que é o País real, que o Partido Socialista vota

contra este Orçamento do Estado?

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, a Sr.ª Deputada Teresa Caeiro.

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, o Sr. Primeiro-Ministro tem falado

várias vezes — e ainda hoje o fez — na agenda reformista deste Governo. Este espírito reformador, é bom

recordá-lo, foi prosseguido mediante medidas muito duras impostas pelo programa de ajustamento e mediante

os espartilhos impostos pela troica.

Mas se há um aspeto extremamente importante a realçar é que o Governo, ao mesmo tempo que

prosseguia este espírito reformista, sempre fez questão de salvaguardar as áreas sociais. Estou a referir-me,

em particular, à segurança social e à saúde, áreas das quais dependem, tantas vezes, a vida das pessoas e

das famílias.

Sr. Primeiro-Ministro, começaria por me referir à área da saúde.

Em suma, este Governo conseguiu fazer em atos aquilo que os outros só conseguem através de palavras,

palavras, proclamações e exigências, mas através de atos não conseguem resolver qualquer problema.

Nunca será demais realçar o que foi conseguido na área da saúde nestes últimos três anos do ponto de

vista das reformas estruturais, do ponto de vista da qualidade, de um maior acesso, de uma maior

transparência, do pagamento de 3000 milhões de euros de dívidas a fornecedores, herdadas do passado;

houve mais transparência, mais combate à fraude, mais eficiência no sistema.

Agora, com o Orçamento para 2015, vamos prosseguir com este verdadeiro compromisso que o Governo

tem para com a saúde, para com o SNS e para com os utentes.

Vou dar apenas alguns exemplos. O primeiro, Sr. Primeiro-Ministro, é a transferência direta de 150 milhões

de euros do Orçamento do Estado para o programa orçamental da saúde. Não se trata de um orçamento

retificativo, para colmatar uma ou outra falha. Não, é uma transferência direta do Orçamento no valor de 150

milhões de euros. Este é um acréscimo verdadeiramente importante para a saúde.

Mais: para além de ter havido um claríssimo acréscimo de pessoas isentas do pagamento de taxas

moderadoras nos últimos três anos, com este Orçamento vai haver um decréscimo do valor das taxas

moderadoras em 0,9%.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Bem lembrado!

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Isto vem revelar não só uma vontade constante de aliviar os encargos

das famílias com a saúde, mas também vem provar aos que diziam que o Governo se queria financiar através

das taxas moderadoras que isso não é verdade.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Bem lembrado!

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Portanto, sempre que possível, o Governo, através do Ministério da

Saúde, vai ajustando os encargos que impõe aos utentes na medida em que isto possa ser mais benéfico.

Um terceiro exemplo da área da saúde é a redução evidente, irrefutável e inegável do preço dos

medicamentos. Esta redução do preço dos medicamentos vai prosseguir também através de uma

renegociação anual dos medicamentos dispensados em meio hospitalar. É inegável que, para os cidadãos,

trata-se da possibilidade de um maior acesso a cuidados de saúde.

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Refiro ainda o acordo que foi alcançado com a indústria farmacêutica. Se até ao fim do ano não for possível

alcançar um novo acordo que estabeleça um teto a partir do qual o Estado não é onerado, então, haverá uma

tributação específica para a indústria farmacêutica.

São medidas, não são palavras, são atos. É assim que se governa. É assim que se melhora a qualidade de

vida dos portugueses.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente: — Queira concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Peço a sua tolerância, Sr.ª Presidente, tal como já aconteceu com

intervenções anteriores. De qualquer forma, vou apressar-me.

Refiro ainda a possibilidade, que já foi anunciada, de serem encontradas formas de incentivo para

compensar médicos que vão trabalhar para zonas mais carenciadas.

Portanto, Sr. Primeiro-Ministro, em 2015 teremos um maior equilíbrio nas contas onde subsistiam

desequilíbrios e os hospitais vão obter mais receitas num tempo mais previsível e com maior estabilidade.

Sr. Primeiro-Ministro, coloco-lhe ainda uma pergunta concreta em relação à saúde. Tal como foi anunciado,

vai haver uma recapitalização dos hospitais públicos que estão em situação de falência e de grande carência.

Sr. Primeiro-Ministro, pode confirmar-nos esta recapitalização? Pode elaborar um pouco mais sobre como é

que esta recapitalização se vai concretizar?

Sr.ª Presidente, pedindo-lhe mais um pouco de tolerância — mas não posso deixar de falar de outro

aspeto, que o Sr. Deputado Hugo Soares também referiu —, refiro a enorme resistência do Partido Socialista

em atender aos que mais precisam, aos mais vulneráveis, que são os pensionistas com reformas mínimas

sociais e rurais.

Em 2011, numa altura incomparavelmente menos complicada do que a de hoje, os senhores não tiveram

pejo em congelar pensões a estas pessoas, que são os mais vulneráveis, os mais pobres entre os mais

pobres. Este Governo tem-se dedicado a descongelar estas pensões.

A Sr.ª Presidente: — Peço que termine, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Pergunto ao Sr. Primeiro-Ministro se, como já foi anunciado, vai haver

um novo aumento de pensões. Já foi dito pela comunicação social que o aumento destas pensões é de 1%.

Isto significa que pensões que, em 2011, eram de 246 €, passarão a ser de 262 €. Isto significa um aumento

de 6,3%. Isto significa que, por pessoa, por ano, houve um acréscimo de rendimento de 222 €.

Agradecia ao Sr. Primeiro-Ministro que respondesse e agradeço à Sr.ª Presidente a tolerância.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Sá, do PCP.

O Sr. Paulo Sá (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, em 2013, o Governo aumentou

brutalmente a carga fiscal que incide sobre os rendimentos dos trabalhadores por via da redução do número

de escalões de IRS, do aumento da taxa de imposto em cada um desses escalões, da limitação das deduções

à coleta e da introdução de uma sobretaxa extraordinária.

Em consequência destas alterações, a receita de IRS aumentou, nesse ano, 3200 milhões de euros, ou

seja, 36%. Este aumento não foi — como o Sr. Primeiro-Ministro já tentou dizer hoje — resultado do

crescimento económico, que, como se lembra, nesse ano nem existiu, nem foi resultado do combate à fraude

e evasões fiscais; foi mesmo um esbulho do rendimento dos trabalhadores e do povo.

Em 2014, o Governo manteve este esbulho dos rendimentos dos trabalhadores, prevendo uma receita de

IRS de 3800 milhões de euros, ou seja, Sr. Primeiro-Ministro, mais 42% do que a de 2012.

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No Orçamento do Estado para 2015, o Governo pretende continuar a impor esta insuportável carga fiscal

sobre os rendimentos dos trabalhadores e do povo, prevendo uma receita de cerca de 4100 milhões de euros,

ou seja, mais 45% do que em 2012.

Só nestes três anos, Primeiro-Ministro — 2013, 2014 e 2015 —, a receita adicional em sede de IRS será de

11 000 milhões de euros.

Na realidade, Sr. Primeiro-Ministro, em três anos, o Governo foi buscar aos bolsos dos trabalhadores o IRS

de quatro anos.

O Sr. Primeiro-Ministro lembra-se, com certeza, de que este brutal aumento de IRS — aliás, como outras

medidas dirigidas contra os direitos e os rendimentos dos trabalhadores — foi apresentado como sendo

provisório, mas, na realidade, este brutal aumento de imposto já vai no terceiro ano consecutivo. Também

aqui, Primeiro-Ministro, o Governo quer transformar em definitivo aquilo que, repetidamente, anunciou como

sendo provisório.

Em 2015, os trabalhadores irão pagar mais impostos, seja através do IRS, seja pelo aumento dos impostos

sobre o consumo, seja ainda pela introdução de novos impostos no âmbito da fiscalidade verde.

Sr. Primeiro-Ministro, esta opção do Governo de espremer os trabalhadores contrasta com a opção de,

pelo segundo ano consecutivo, descer a taxa de imposto sobre os lucros das empresas, o IRC.

O Governo, depois de, em 2014, ter descido a taxa de IRC de 25% para 23%, quer agora reduzi-la de 23%

para 21%.

Sr. Primeiro-Ministro, esta descida da taxa, associada ao aumento do número de anos em que é possível

fazer reporte de prejuízos e à introdução de instrumentos de planeamento fiscal agressivo, colocados à

disposição das grandes empresas, dos grandes grupos económicos, irá permitir que essas grandes empresas

e esses grandes grupos económicos reduzam substancialmente os impostos a pagar.

A redução do peso do IRC na receita fiscal é uma evidência que ninguém pode negar, que o Sr. Primeiro-

Ministro não pode negar. O IRC representava, em 2000, no conjunto dos impostos diretos, 37%; em 2013, já

representava apenas 27% (menos 10 pontos percentuais!). No reverso da medalha, o IRS passou de 56% nos

impostos diretos, em 2000, para 67%, em 2013 (mais 12 pontos percentuais!). Ou seja, os trabalhadores estão

a contribuir cada vez mais para a receita fiscal, enquanto as grandes empresas e os grupos económicos estão

a contribuir cada vez menos.

O Sr. Primeiro-Ministro tem de explicar aos portugueses estas opções do Governo em matéria de política

fiscal. Porque é que desce a taxa de IRC pelo segundo ano consecutivo, favorecendo as grandes empresas e

os grandes grupos económicos, ao mesmo tempo que agrava ainda mais a carga fiscal que recai sobre os

trabalhadores e o povo?

Sr. Primeiro-Ministro, reconheça que a natureza da política do Governo é esta: favorecer o grande capital à

custa dos trabalhadores e do povo!

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado João Galamba, diz que eu confundo previsões

com factos. Não, Sr. Deputado, não creio que seja assim. O que eu disse é que é um facto que as previsões

que foram apresentadas pelos organismos internacionais estão de acordo com as que o Governo apresentou.

Risos de Deputados do PS.

É um facto. Não é verdade, Sr. Deputado? É um facto sobre previsões.

É também verdade que os factos da execução orçamental destes anos não deixam margem para dúvidas.

A nossa despesa diminuiu em termos totais, quando falamos apenas da despesa primária e também diminuiu

quando temos em conta só a despesa corrente primária, isto é, tirando o investimento, porque sabemos que o

investimento público teve de contrair bastante…

Protestos do Deputado do PS João Galamba.

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O Sr. Deputado agora vai ter de escolher se me quer continuar a questionar ou se quer ouvir as respostas

às perguntas. É que estou a responder ao Sr. Deputado.

Ora, o Sr. Deputado procurou explorar um ponto que é mais ou menos este: há assim uma espécie de

efeito involuntário; as nossas políticas deram certo por caminhos ínvios que não estão de acordo com aquelas

que eram as nossas intenções.

O Sr. João Galamba (PS): — Não é bem isso!

O Sr. Primeiro-Ministro: — O que o Sr. Deputado quer dizer é mais ou menos isto: «Os resultados até não

foram maus, mas só aconteceram assim porque o Tribunal Constitucional não deixou os senhores fazerem as

maldades que queriam fazer, porque, se os senhores tivessem feito a política que queriam, os resultados

teriam sido péssimos».

Devo dizer que já tinha assinalado uma total incoerência do Partido Socialista nesta matéria. Em primeiro

lugar, porque o Partido Socialista, em diversos programas de estabilidade que apresentou a este Parlamento,

previu exatamente medidas como aquelas que depois veio a reclamar como sendo inconstitucionais.

A última que ainda não reclamou como sendo inconstitucional foi o teto para as prestações sociais, que

consta do PEC 2 — está presente o Deputado que era na altura era Ministro da respetiva pasta. É mesmo

assim, Sr. Deputado: teto para as prestações sociais.

O Sr. Nuno Sá (PS): — Isso é falso! É manipulação!

O Sr. Primeiro-Ministro: — A definição de tetos máximos de despesa com as prestações sociais do

regime não contributivo da segurança social consta do PEC do Partido Socialista.

O Partido Socialista previu também cortes nos salários da Administração Pública, cortes nas pensões

equivalentes a estes, isto é, cortes que deveriam ser feitos nas pensões a partir de 1500 € e, depois — pasme-

se! — veio dizer que «se formos Governo, por ganharmos as eleições em 2015, não podemos repor estes

cortes, mas queremos que eles sejam inconstitucionais para este Governo. Nós, quando estávamos no

Governo, defendíamos estes cortes, mas agora, como estamos na oposição, achamos que não podem ser

constitucionais». Quer dizer, se eles não fossem inconstitucionais quando o PS governava, os resultados eram

aceitáveis e bons, como seria boa a linha política que o Governo segue a executá-los, mas, como é este

Governo que prossegue esta linha e o Partido Socialista está na oposição, os caminhos são ínvios e os

resultados são paradoxais com aquilo que o Governo quer!

Sr. Deputado, um pouco de consistência nesse raciocínio, se faz favor!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Deixe-me dizer ao Sr. Deputado que discordo da suposta evidência empírica que traz.

Na verdade, a retoma do consumo que está a ter lugar este ano e que contraiu extraordinariamente em

2012, tem exatamente a mesma origem: a confiança e as expectativas dos agentes económicos.

O Sr. João Galamba (PS): — A falta de confiança!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sabe o Sr. Deputado que, na verdade, o que aconteceu, maioritariamente, foi

que, em 2012, as pessoas assustaram-se quanto àquilo que era o limite das suas possibilidades, aqueles que

podiam não gastaram e, agora, aqueles que podem estão a gastar mais porque têm confiança na retoma da

economia. E isso é ilustrado, Sr. Deputado, através de duas evidências.

A primeira é que o endividamento das famílias face à banca não está a aumentar, está a diminuir. Portanto,

se o endividamento face à banca está a diminuir, o consumo não está a ser insuflado à custa de dívida, como

no modelo que o Partido Socialista prosseguiu durante anos, Sr. Deputado! É ao contrário.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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Hoje, temos uma retoma do consumo que tem uma contrapartida do lado da taxa de poupança — temos

visto essa taxa recuar ligeiramente ao longo deste ano —, mas que só demonstra que a confiança dos

consumidores não se compara àquela que existia em 2012, e deixe-me dizer, Sr. Deputado, que também não

se compara àquela que existia em 2011, quando tivemos de pedir um resgate.

Em segundo lugar, continuamos a ter empresas que — e isso é uma mudança de paradigma, fica-lhe mal

não o reconhecer —, apesar das circunstâncias adversas, nomeadamente ao nível da procura externa, têm

continuado a aumentar as exportações.

Sr. Deputado, a procura interna decorre da animação do consumo sem endividamento, e sem

endividamento bancário, e do investimento, que também foi retomado, como o Sr. Deputado aqui assinalou. O

Sr. Deputado gostaria que houvesse mais, eu sei! Nós também gostaríamos que houvesse mais, mas a

verdade é que o investimento tem vindo a cair de há muitos anos a esta parte. Evidentemente, estamos a falar

de investimento privado, porque sobre investimento público o Sr. Deputado Hugo Lopes Soares explicou: o

Partido Socialista continuaria a insuflar grandemente na nossa economia até que batêssemos, como batemos,

com a cabeça na parede, como é evidente.

Continuamos, portanto, a melhorar as expetativas na procura interna, quer pelo investimento, quer pelo

consumo, mas estamos também a melhorar as nossas exportações, e isso o Sr. Deputado deveria reconhecer,

porque elas têm vindo a aumentar continuamente. Continuamente, Sr. Deputado! Têm aumentado em volume

e em quotas de mercado, o que significa uma mudança de paradigma que está bem expressa no facto de

crescermos, enquanto País, com equilíbrio externo e não com desequilíbrio externo.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. João Galamba (PS): — Não conhece os números do investimento público!

O Sr. Primeiro-Ministro: — O Sr. Deputado João Galamba também perguntou o que é que aconteceria se

as nossas políticas, tal como foram desenhadas inicialmente, tivessem prosseguido sem qualquer entorse. Eu

digo-lhe, Sr. Deputado: tinha havido, seguramente, mais estabilidade, porque as pessoas saberiam

exatamente, como souberam na Irlanda e na Grécia, com o que poderiam contar e não estavam todos os anos

à espera de saber se no próximo ano o corte era assim ou assado e se o imposto era assim ou assado. Isso,

Sr. Deputado, paga-se muito, não só em política, mas também em economia, nas expetativas dos

consumidores, dos investidores, dos agentes económicos.

Teríamos, com certeza, em resultado, um equilíbrio muito maior entre receita e despesa no contributo para

o esforço de consolidação orçamental, teríamos maior estabilidade e previsibilidade por parte dos agentes

económicos e teríamos talvez — digo «talvez» porque, evidentemente, não o posso provar — uma

recuperação mais rápida.

Respondo agora ao Sr. Deputado Hugo Lopes Soares, dizendo-lhe que, na pergunta que fez, deu uma

parte da resposta e que eu dei a outra parte agora mesmo. Onde é que nós estaríamos? Sr. Deputado, não sei

em que resgate estaríamos, mas, provavelmente, estaríamos a competir com o número de PEC que tinham

sido apresentados para resolver um problema que o Partido Socialista não quis resolver, atuando

estruturalmente sobre a despesa, como continua a dizer que não quer atuar estruturalmente sobre a despesa

no futuro.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Deputado também disse, e com muita razão, que as terceiras travessias, os novos aeroportos, todos

os projetos megalómanos que continuavam a prosseguir, mesmo quando estava claro que não tínhamos

dinheiro para os suportar, ainda não foram — repare bem — ressuscitados pelo Partido Socialista. Mas virá a

campanha eleitoral, e quando chegarmos ao período da campanha talvez alguns desses projetos possam

finalmente ser reassumidos,…

O Sr. Vieira da Silva (PS): — O Sr. Primeiro-Ministro é a última pessoa que pode falar de campanhas!

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O Sr. Primeiro-Ministro: — … dado que o País agora já está em condições de ter financiamento, de

crescer e, se calhar, até pode crescer mais endividando-se mais para futuro! Espero, sinceramente, que não

seja esse o caminho a prosseguir.

A Sr.ª Deputada Teresa Caeiro perguntou-me, relativamente à área da saúde, se a recapitalização que foi

anunciada se vai efetivar ou não. Sr.ª Deputada, é já este ano. Este ano, iremos realizar capital social de

hospitais EPE no valor de, aproximadamente, 157 milhões e, durante o próximo ano, com um orçamento de

cerca de 300 milhões, o que é muito importante.

Como a Sr.ª Deputada aqui recordou, e bem, assumimos uma herança pesada de dívidas que estavam por

pagar, no setor da saúde, superiores a 3000 milhões de euros. Temos, nesta altura, apenas perto de 800 000

euros para resolver e espero que até ao final do nosso mandato consigamos acabar com essa chaga de

termos de pagar sempre mais caro por não pagarmos a horas o que devíamos pelos serviços de saúde que

prestámos.

Não só temos vindo a fazer o saneamento financeiro, como estamos a apontar para o equilíbrio financeiro

dos hospitais EPE, o que é o contrário do que muita da oposição diz. Não estamos a atacar o Serviço Nacional

de Saúde, temos vindo a torná-lo mais robusto, menos endividado e em condições de prestar melhores

cuidados aos portugueses.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Deputada, tem toda a razão: no próximo ano prevemos, pelo quarto ano

consecutivo, aumentar as pensões mínimas sociais e rurais.

Aquela medida de sensibilidade social que levou o Partido Socialista a congelar as pensões para 2010 tem

sido atualizada por nós todos os anos, e acima da inflação. Julgo que, no próximo ano, teremos condições de

nos aproximarmos de uma atualização de cerca de 1%, o que é significativo quando temos em conta a

situação de deflação que se tem verificado. Continuaremos, portanto, em termos reais, a fazer a atualização

dessas pensões mínimas sociais e rurais. Creio que isso é muito importante.

O Sr. Deputado Paulo Sá falou, mais uma vez, do aumento da carga fiscal e das medidas provisórias que

vão ficando. Mas, Sr. Deputado, julgo ter sido muito claro quando disse, em primeiro lugar, que tinha

alternativas para que alguns impostos não fossem tão elevados. Não podemos ser, ao mesmo tempo,

culpados de não podermos fazer descer mais a despesa, de forma virtuosa, no entender do Partido

Comunista, mas também de não podermos ter, do lado da receita, o necessário para podermos diminuir o

défice. Os senhores têm de escolher uma das críticas, não podem fazer as duas, a menos que digam que

também acham que é importante viver em défice excessivo e sem garantias de financiamento desse défice.

Protestos do Deputado do PCP Paulo Sá.

Diz o Sr. Deputado, como já outros repetiram, que vamos colocar sobretudo as grandes empresas a pagar

menos. Sr. Deputado, mantemos uma derrama de 3% para todas as empresas que tenham um resultado

superior a 1,5 milhões de euros; mantemos uma derrama de 5% acima do que é pago com o IRC para as

empresas que têm resultados de 7,5 milhões ou mais; e mantemos uma derrama de 7% para as empresas

que tenham 35 milhões de resultado ou mais.

Sr. Deputado, se aquelas que têm resultados maiores e mais gordos, que são evidentemente as grandes

empresas — e são poucas, infelizmente; bem precisávamos de ter muitas mais grandes empresas a pagar

impostos! —, vão pagar 3%, 5% e 7% mais, como é que vem aqui dizer que as grandes empresas vão pagar

menos do que as pequenas, quando é exatamente ao contrário?

Protestos do PCP.

Espero que esta questão fique respondida de uma vez e que o Sr. Deputado não venha, uma outra vez

ainda, com a mesma asserção, que não é verdadeira.

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A Sr.ª Presidente: — Queira concluir, Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Concluirei, Sr.ª Presidente.

Sr. Deputado, não é pelo facto de as medidas provisórias vigorarem durante dois, três ou quatro anos que

não são provisórias. São provisórias, e o Tribunal Constitucional reconheceu-as enquanto tal. E sabe do que é

que dependem? Do nosso equilíbrio orçamental! E sabe para o que é que estamos a trabalhar?

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Para os bancos!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Para o equilíbrio orçamental!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, vamos prosseguir com uma nova ronda de perguntas ao Sr.

Primeiro-Ministro.

Lembro que o CDS-PP se inscreveu para esta ronda e que a Mesa, há pouco, não contabilizou essa

inscrição, por isso, em vez de quatro, há cinco Srs. Deputados inscritos para pedir esclarecimentos.

Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, na sua intervenção inicial disse uma

frase enigmática. Referiu que se caminhava para a reposição integral do salário da função pública em 2016,

acrescentando «se, entretanto, não surgirem outras propostas».

Há pouco, referindo-se até ao exemplo da Irlanda, que demorará mais tempo a fazer a reposição integral

dos salários da função pública, pareceu invejar essa situação.

Desafio-o, pois, a fazer um esclarecimento cabal, caso tenhamos a desdita de ser, de novo, Primeiro-

Ministro em 2016: vai ou não conformar-se com a decisão do Tribunal Constitucional sobre a reposição

integral do salário da função pública? Vai ou não conformar-se com essa decisão ou, entretanto, vai entrar em

conflito com a decisão do Tribunal Constitucional?

O Sr. Primeiro-Ministro disse também que não havia ataques ao Estado social, tendo minimizado

completamente o facto de haver um corte de 700 milhões de euros neste Orçamento, já depois de tantos

outros cortes na área da educação básica, o que não se percebe, uma vez que imediatamente desvalorizou a

folha salarial — «ah, o programa de rescisões…» Mas esse corte de 700 milhões não é apenas do programa

de rescisões. Até o Ministro admite, com uma certa leviandade, que serão 200 milhões de cortes, ou se calhar

nem isso. Basta ver as declarações públicas do Ministro pelo qual colocou as mãos no fogo.

Na verdade, há um enorme desprezo pelos professores e outros agentes educativos, que são as vítimas

dessa diminuição brutal do orçamento, porque está a substituir salários mais elevados por salários bastante

mais baixos. Isso concorre para a qualidade do ensino público, para a defesa da escola pública? Não, não

concorre!

Tendo em conta uma política social de provisão pública ao longo do seu mandato, tem havido uma

diminuição do número de alunos no ensino superior. Esse é que é o estado da educação e o símbolo da

provisão pública que temos tido.

Também é um facto que, para além de termos um contencioso crónico entre os reitores das universidades,

presidentes de politécnicos e a equipa do Ministério da Educação, temos agora um documento público do

Conselho de Reitores, condenando a política da 5 de Outubro, do Ministro Nuno Crato, sobre a ciência e a

investigação, porque há um corte e a anulação do financiamento público a 50% dos centros de investigação,

através de um contrato fraudulento — assumo a palavra «fraudulento» — com uma instituição de avaliação

estrangeira. Esta é que é a simbologia do Estado social que diz aqui defender.

Sr. Primeiro-Ministro, deixo-lhe dois desafios.

Em primeiro lugar, que faça a restituição integral dos salários da função pública em 2016, caso tenhamos a

desdita de o termos, de novo, como Primeiro-Ministro. Diga coisas claras, não diga enigmas!

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Em segundo lugar, diga claramente que está a desinvestir na escola pública e, em particular, nos anos em

que ela é mais importante, que são aqueles que significam o início da qualificação e a criação da autonomia

das competências cognitivas da nossa juventude e de toda a adolescência.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, o Sr. Deputado Luís

Montenegro, há pouco, quando fez a sua intervenção, disse que o Governo tinha criado uma coisa que nunca

ninguém tinha tido a coragem de criar — pedir a contribuição do setor energético e do setor bancário —, como

se, pelas palavras do Sr. Deputado, este Governo e a maioria fossem uns valentões. Mas o Sr. Deputado

esqueceu-se de dizer que a contribuição que estão a pedir ao setor energético e ao setor bancário é uma

ninharia — uma ninharia! — comparada com o que tiram às famílias.

Por exemplo, olhando para o Orçamento do Estado de 2015, vejo que vão buscar à contribuição do setor

bancário 30 milhões de euros. São para o Estado? Não, não! São para um fundo de resolução à disposição da

banca. Ou seja, põem a banca a fazer um mealheiro para a banca — calma, ninguém toca aí!

Protestos do PSD.

Dou um exemplo para percebermos bem a diferença de valores. Só nas prestações sociais o Estado vai

sacar aos mais pobres, em Portugal, mais de 300 milhões de euros, ou seja, 10 vezes mais aos mais pobres

do que aquilo que está a banca a amealhar para a banca. Sr. Primeiro-Ministro, falar de justiças sociais desta

forma é uma coisa muito esquisita, não é?

Depois, repare-se bem: o Governo, tendo margem para descer impostos, escolhe, obviamente, aqueles a

quem está a servir, que são os grandes grupos económicos e o grande setor financeiro, naturalmente. Então,

opta por baixar o IRC. E o Sr. Primeiro-Ministro está a fazer crer aos portugueses que as grandes empresas

nem vão ser tocadas com essa descida do IRC.

Sr. Primeiro-Ministro, dou só o exemplo de uma empresa: a EDP, face aos resultados e aos lucros que

teve, com esta baixa do IRC pelo segundo ano consecutivo, vai poupar nada mais nada menos do que mais

de 40 milhões de euros. São 40 milhões de euros que não entram nos cofres do Estado! Está a ver agora

como é que é «compensada», por exemplo, a contribuição para o setor energético? Vai poupar mais com a

descida do IRC do que com aquilo que paga para a contribuição do setor energético, ou seja, ainda fica a

ganhar.

Portanto, Sr. Primeiro-Ministro, não tente iludir as pessoas! Os senhores, de facto, estão ao serviço destes

grandes grupos económicos e deste setor financeiro!

Já quanto ao IRS, baixar o brutal aumento de impostos que se verificou no ano de 2013!? Nem pensar! O

Estado arrecadou mais de 4000 milhões de euros das famílias portuguesas. Ó Sr. Primeiro-Ministro, os

senhores, de facto, andam aqui ao serviço de alguém!

O Sr. Primeiro-Ministro falou da fiscalidade verde e eu vou ter muito gosto em discutir com o Sr. Ministro do

Ambiente — aliás, estou desejosa que isso aconteça, se o Sr. Ministro não se importar de marcar na sua

agenda uma reunião, já aprovada, com a Assembleia da República —, para podermos falar seriamente sobre

a questão da fiscalidade verde.

Mas, Sr. Primeiro-Ministro, infelizmente, veio a verificar-se aquilo que Os Verdes denunciavam: a

fiscalidade verde vai comportar um aumento de impostos para os portugueses na ordem dos 150 milhões de

euros.

O que acontece em termos de fiscalidade ambiental — e, já agora, o senhor não é o inventor da fiscalidade

ambiental em Portugal, lamento dizer-lhe… É que, em conferência de imprensa, deu a entender que em

Portugal nunca ninguém se tinha lembrado da fiscalidade ambiental. Olhe, se eu fosse contabilizar as

propostas que Os Verdes aqui já apresentaram sobre fiscalidade ambiental em anteriores Orçamentos do

Estado — que a maioria chumbou e que este ano, por acaso, vamos reapresentar, e vamos lá ver como é que

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a maioria se comporta —, tínhamos muito que conversar… Mas quero dizer-lhe que já existem impostos de

carácter ambiental em Portugal. Não é mentira nenhuma!

Sr. Primeiro-Ministro, não se pode fazer ou pseudo-fazer uma fiscalidade ambiental sem criar alternativas

para as pessoas. Por exemplo, os senhores podem, através da taxa de carbono, aumentar enormemente os

combustíveis em Portugal e, a partir daí, as pessoas têm mais dificuldade em usar o carro, mas também têm

mais dificuldade em andar de transportes públicos, porque, eventualmente, os preços dos mesmos também

aumentam à conta disso, mas se os senhores não criarem alternativas de transporte, designadamente

alterando o paradigma da mobilidade do carro individual para os transportes públicos, os senhores não alteram

comportamento absolutamente nenhum, apenas carregam na carteira das pessoas. E, lamento, mas a

fiscalidade verde que os senhores apresentam não muda o paradigma da mobilidade em Portugal e não alicia

as pessoas a direcionarem-se para o uso do transporte coletivo.

Sr. Primeiro-Ministro, quero dizer-lhe uma coisa: há bem pouco tempo, na Assembleia da República, a

maioria chumbou uma proposta que Os Verdes apresentaram para reduzir os resíduos de embalagens.

Sabe porque é que a chumbaram, Sr. Primeiro-Ministro? Porque esse projeto de lei de Os Verdes

reportava-se àquelas embalagens que os consumidores trazem consigo quando adquirem produtos mas não

querem trazer, ou seja, trazem porque elas são agregadas. Ora, nós queríamos regular esse mercado das

embalagens e a maioria chumbou o nosso projeto, porque aí já não era pôr o consumidor a pagar a

embalagem, já era retirar o pagamento que o consumidor faz obrigatoriamente, porque o mercado lhe impõe

que pague o produto mais uma embalagem que o consumidor não quer para nada…

A Sr.ª Presidente: — Queira concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Concluo, dizendo o seguinte: os senhores não estão

minimamente preocupados com a alteração de comportamentos ambientais nem com aquilo que o mercado

pode ou não oferecer em termos de melhores opções ambientais aos consumidores e também aos

contribuintes portugueses.

Os senhores só estão interessados em sacar dinheiro! Lembraram-se da fiscalidade verde e pensaram

assim: «Onde é que, por aqui, nós podemos ir sacar 150 milhões de euros?»

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, gostaria de dizer que os tempos negativos, quer dos grupos

parlamentares quer do Governo, que estão indicados no quadro eletrónico, serão descontados nos tempos

atribuídos para o debate de amanhã, tal como está acordado.

Tem, agora, a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Pedro Delgado Alves.

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, a

intervenção que nos deixou relativa ao Orçamento do Estado passou ao lado da matéria relativa à ciência e ao

ensino superior.

De facto, o senhor fez algumas alusões à educação, tentando justificar o que é, aos olhos de todos,

injustificável, mas falhou uma área estratégica para o desenvolvimento do País em que, se tivermos em conta

aquilo que o Orçamento do Estado para 2015 vai acrescer aos últimos três anos, de facto, deparamo-nos com

um cenário de devastação de um setor estratégico.

Olhemos apenas para três exemplos do que tivemos até hoje: em 2012, um corte de 147 milhões de euros

no global do investimento para ensino superior e ciência; em 2013, um corte de 40% nas bolsas de

doutoramento e de 65% nas bolsas de pós-doutoramento; em 2014, das 322 unidades de investigação cerca

de metade perdem o investimento.

São três exemplos daquilo que, ao longo dos anos, fomos acumulando pacientemente, mas

desgraçadamente, no setor do ensino superior e da ciência.

E, em 2015, o Orçamento do Estado oferece-nos mais novidades: primeiro, não se garantem às instituições

as dotações necessárias para se dar cumprimento às decisões em matéria salarial; segundo, acrescenta-se

novo corte na ordem dos 91 milhões de euros ao setor do ensino superior ao contrário de todos os pedidos, de

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todas as desesperadas afirmações dos reitores das universidades portuguesas pedindo para não haver novo

corte; terceiro, introduzem-se, pela primeira vez, cativações aos orçamentos relativos à aquisição de bens e

serviços, acabando com uma área em que, apesar de tudo, nos últimos três anos, tinham vindo a ser

poupadas as instituições do ensino superior; e, finalmente, mantém-se a impossibilidade de, para lá da massa

salarial do ano anterior, as instituições poderem fazer recrutamento, o que é especialmente penalizador no ano

em que, precisamente, termina o regime transitório dos estatutos das carreiras docentes e em que,

obviamente, é necessário ter em conta as progressões automáticas que teriam que ter lugar no ano de 2015.

Para além disto, todos os anos desde que o atual Governo está em funções há uma quebra de inscritos no

ensino superior, há uma quebra de bolseiros de investigação científica, há uma quebra de verbas

disponibilizadas para as unidades de investigação e, claramente, há também uma quebra evidente no

financiamento público para o setor da investigação científica e do ensino superior em que, pela primeira vez,

estamos abaixo dos valores de 2008.

E não sou eu, Deputado da oposição que apenas quer fazer maldades ao Governo e trazer inverdades a

este debate, que o digo; são todos aqueles que, com credibilidade, têm trazido este tema à colação.

O reitor da Universidade de Lisboa, em janeiro deste ano, disse: «Os valores de financiamento do ensino

superior regressam a valores dos anos 90». Em junho de 2014, o Prof. Carlos Fiolhais disse: «O Governo está

a matar a investigação científica e a área do desenvolvimento». Em outubro de 2014, o novo presidente do

CRUP e reitor da Universidade do Minho, sublinhou: «Houve esforços do Governo para acabar com a

ciência». E, como já foi referido, ainda na semana passada o CRUP disse claramente: «Já não há espaço para

benefício da dúvida. O atual Governo sentenciou de morte 50% do tecido científico nacional».

Tendo isto em conta, Sr. Primeiro-Ministro, o que é que disse o ministério? Disse, apenas: «Estes

resultados mostram que o sistema científico e tecnológico tem respondido muito positivamente e mostrado

robustez e competitividade perante a inegável situação de adversidade financeira».

Ora, traduzindo isto para português que as pessoas compreendam, é um pouco como dizer que temos aqui

um guitarrista que ficou a bolachas e sal há dois anos, que tem um saco de plástico à volta do pescoço que

não o deixa respirar, arrancámos-lhe as unhas com um alicate mas está a tocar o Concerto de Aranjuez

perante esta inegável situação de adversidade anatómica.

Portanto, Sr. Primeiro-Ministro, face a todos estes elementos, face à clareza dos ataques de todas as

instituições, que olham para este Orçamento do Estado com a descrença habitual, a pergunta é: vamos fazer

de conta que a música é melodiosa ou, efetivamente, todas estas afirmações, todos estes pedidos de correção

do Orçamento do Estado para 2015 vão ser atendidos agora que, finalmente, poderemos, na sua perspetiva,

ter a tão famigerada abertura e espaço de respiração que, claramente, na área da ciência ainda não

apareceu?

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Para uma pergunta, tem a palavra o Sr. Deputado António Rodrigues.

O Sr. António Rodrigues (PSD): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs. Deputados:

Confesso, Sr. Primeiro-Ministro, que momentos em que discutimos o Orçamento do Estado são momentos em

que ponderamos as expectativas, as decisões, as definições e, por isso, esperamos ouvir, muitas vezes,

contributos positivos por parte da oposição, contributos esses que tardam em chegar.

Aliás, ouvindo a última intervenção da bancada do Partido Socialista, pareceu-me que foi o retrato perfeito

daquilo que tem sido o Partido Socialista nos últimos três anos: fechamo-nos todos dentro de um quarto

escuro e esperamos que, um dia, a crise passe para podermos vir para um novo mundo.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. António Rodrigues (PSD): — É essa a atitude que o Partido Socialista tem tido: estar longe de tudo

aquilo que é a realidade e estar longe do exercício que este Governo tem feito de repor o País onde deve

estar, que é nos trilhos do futuro.

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Por isso, interessa-nos falar de futuro e deste Orçamento, voltando a dizer, Sr. Primeiro-Ministro, que

falamos de expetativas e de definições, e é sobre isso que busco o seu comentário.

Estamos hoje, e cada vez mais, seguros, vendo aquilo que se passa na Europa. Seguros, porque temos

regras claras, temos regras que temos de normalmente prosseguir, ao contrário de outros Estados que, por

vezes, acham que, também aí, o mundo é o mundo do irrealismo.

Recordo — isso já hoje aqui foi falado —, por exemplo, a atitude do Partido Socialista em relação ao

Estado francês e à postura que a França tem relativamente à política europeia, que teve entradas de leão e,

pelos vistos, saídas de sendeiro. Ou seja, começou por dizer que ia mudar o mundo, depois ia só mudar a

Europa, depois ia mudar a França, e acabou por mudar só o orçamento. E é essa a realidade que analisamos.

Aplausos do PSD e do PSD-PP.

Não é que não se possa dizer o mesmo dos italianos — a grande expectativa que os socialistas europeus

têm —, mas também ontem soubemos que os italianos tinham mudado as suas expetativas e, mais do que

isso, fizeram cortes relativamente ao seu orçamento.

Foi disso que se tratou em Espanha, foi disso que se tratou em França e foi disso que se tratou em Itália.

Aliás, ainda ontem soubemos que os franceses tiveram de cortar mais 3000 milhões no seu orçamento, isto

tudo dentro de uma política de expansão, de uma política social, de uma política de preocupação

relativamente ao que acontece, ou seja, uma política de atirar areia para os olhos dos eleitores, como este

Partido Socialista costuma e gosta de fazer.

Sr. Primeiro-Ministro, as questões que quero colocara são simples. Há profundos desafios na Europa, para

a qual contribuímos, e para os quais esperamos algum tipo de resposta.

Esperamos respostas, por exemplo, da nova Comissão Europeia, que tem algumas novas perspetivas que

podem ser úteis não só para o País mas para a Europa, nomeadamente em matéria de crescimento, de

emprego e do pacote de investimento que o novo presidente da Comissão Europeia já anunciou que quer

apresentar até ao final do ano e que hão de contribuir para o aumento da criação de novos empregos na

Europa.

Há desafios na Europa em relação aos quais nós também não podemos estar alheios, nomeadamente no

que se passa com a política de imigração. Não podemos continuar alheios ao que se passa, ou seja, à

chegada de 150 000 pessoas à procura de novas soluções e a Europa fechar-lhes a porta. Os Governos

europeus têm de olhar para esta matéria e, também aqui, temos de ter uma palavra a dizer.

Mas, mais do que isso, temos de aproveitar a janela de oportunidade que se abriu com o último Conselho

Europeu. Julgo que essa é uma matéria fundamental para o País, que este Orçamento do Estado tem de

consagrar em termos de desenvolvimento próximo e futuro, e que respeita à energia.

A energia foi elevada à prioridade razoável dentro do próximo quadro de decisão política europeia. Julgo

que isso é uma oportunidade para o País que, durante muitos anos, teve uma barreira nos Pirenéus que

impedia que Portugal pudesse também contribuir para a Europa e ganhar com esse esforço.

Por isso, é importante que possamos hoje refletir sobre essa matéria e saber, Sr. Primeiro-Ministro, se é

possível contarmos com este apoio, com este desenvolvimento para uma política mais relevante em termos

não só da participação portuguesa, não só da definição portuguesa, mas, acima de tudo, de um ganho

europeu relativamente a esta matéria.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, o senhor veio aqui apresentar um

Orçamento que prossegue a crise, que em aspetos fundamentais a agrava, mas, com um discurso pré-

eleitoral, vem proclamar o fim da crise.

O que sucede é que o seu discurso não tem qualquer relação com o que se passa no País, não tem

qualquer relação com a situação que os portugueses vivem, com a realidade vivida no nosso País, nem tem

qualquer relação com o Orçamento que os senhores aqui propõem.

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E, Sr. Primeiro-Ministro, toda a gente sabe isso! Os portugueses sabem-no, os senhores também o sabem,

os Srs. Deputados da maioria também o sabem, porque aplaudem vibrantemente mas têm o pânico

estampado no rosto.

Sr. Primeiro-Ministro, o que acontece é que só proclama o fim da crise quem nunca sofreu com ela, porque

não há um trabalhador da função pública ou do setor privado, um reformado ou um pensionista, um jovem

licenciado a ganhar 500 € a trabalhar num call center ou à procura de emprego ou a ter de emigrar porque não

encontra emprego em Portugal, não há ninguém neste País que acredite no fim da crise e no discurso que o

Sr. Primeiro-Ministro aqui trouxe.

Aliás, o Sr. Primeiro-Ministro fala em índices de confiança, mas significativamente não fala nos dados

oficiais do INE sobre o aumento da pobreza e sobre o risco de pobreza, que afeta hoje um quarto da

população portuguesa. Cerca de 25% da população portuguesa está em risco de pobreza segundo dados

oficiais. Mas para isso o Sr. Primeiro-Ministro não tem uma palavra.

O Sr. Primeiro-Ministro vem discutir o Orçamento do Estado com o caos instalado no setor da justiça, com

professores para colocar no final de outubro, com a falência do maior banco comercial privado do nosso País,

com o País a braços com injustiças revoltantes e não teve uma única palavra para os problemas reais que os

portugueses sentem na pele no seu dia a dia. Sobre isso não houve uma palavra da sua parte.

Sr. Primeiro-Ministro, não precisamos de desmentir o seu discurso. Para o desmentir está aqui a proposta

de Orçamento que o Governo apresentou e que vamos discutir nos próximos dias.

O Sr. Primeiro-Ministro diz que o Governo fechou há cinco meses o Programa de Assistência, mas o que é

facto — já aqui foi demonstrado — é que não há uma única medida que constava do programa da troica que

não esteja neste Orçamento. As únicas medidas de alívio de austeridade em matéria de salários e pensões

não resultam de decisões do Governo, resultam, pura e simplesmente, de decisões do Tribunal Constitucional,

que inviabilizaram medidas impostas e desejadas por este Governo.

Os cortes salariais hão de ser repostos em 2016, quando o senhor já não for Primeiro-Ministro, quando os

senhores já não estiverem no Governo, não porque o atual Governo o deseje mas porque o Tribunal

Constitucional o impõe no seu acórdão. Aliás, a intenção inicial deste Governo — bem nos recordamos — era

a de que houvesse uma reposição de 20% até 2018 em função das disposições orçamentais. Portanto, o

Governo nunca quis repor os cortes salariais em 2016. O Tribunal constitucional é que o impõe, seja qual for o

Governo que esteja em funções em 2016. Essa é que é a realidade.

Para concluir, Sr.ª Presidente, o Sr. Primeiro-Ministro dizia há pouco que nós já não temos os

constrangimentos da troica e que agora temos é o Tratado Orçamental e os compromissos internacionais do

Estado português. E eu pergunto, Sr. Primeiro-Ministro: e o Governo português não tem uma ideia para o País

que vá para além do mero acatamento de imposições que nos são feitas a partir do exterior? É evidente que

não tem, Sr. Primeiro-Ministro. O drama é que, de facto, não tem. O Governo não tem uma ideia para o País

que vá para além de servir os interesses dos mais poderosos à custa dos interesses da grande maioria da

população, à custa dos interesses do povo e do País. E é por isso que o Governo foge à realidade o mais que

pode.

O problema que o Governo tem é que os portugueses sentem essa realidade e os Srs. Membros do

Governo, do PSD e do CDS, vão ter de ser confrontados pelos portugueses com as vossas responsabilidades

perante a situação para que atiraram o País e perante a falta de quaisquer perspetivas de esperança de

superação da crise que os portugueses estão a atravessar.

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro para responder.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, queria começar por responder ao Sr. Deputado Luís Fazenda,

dizendo-lhe que julgava ter sido claro na resposta que dei há pouco a propósito da questão da reposição dos

salários da Administração Pública.

De acordo com aquilo que foi a decisão do Tribunal Constitucional, essa reposição deverá ser integral em

2016. Isto foi o que foi decidido pelo Tribunal Constitucional. Também é certo que o Tribunal Constitucional

disse que a proposta que o Governo tinha mostrado intenção de fazer, que era a de continuar a reposição ao

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ritmo de 20% ao ano, não podia ser avaliada pelo Tribunal na medida em que não havia uma determinação

legal nesse sentido.

Mas também já esclareci, Sr. Deputado, que, sim, se for Primeiro-Ministro, irei ser congruente com aquilo

que defendi: reposição à razão de 20% ao ano. Portanto, irei propor que em 2016 haja uma nova reversão de

20% dos salários para os portugueses. Creio que fui muito claro a dizer isso.

O Sr. Deputado disse também que há um corte de 700 milhões de euros na educação. Creio também já ter

respondido a isso, e o Sr. Deputado terá ocasião, durante o debate na especialidade, de ver bem que isso não

é assim, antes pelo contrário. Temos, dentro da área da educação, uma redução que é significativamente

inferior a essa e creio que aquilo que o Sr. Deputado disse também a propósito dos ingressos no ensino

superior — de resto, não foi o único — não tem um padrão de tendência significativa. Nós temos vindo a

oscilar nos ingressos no ensino superior em cada ano com uma ligeira tendência de descida, mas que é

mesmo muito ligeira. Portanto, temos oscilado nesses valores, mas posso garantir-lhe que isso não resulta do

facto de nós não termos reforçado quer o apoio social, quer a forma como respondemos em tempo útil a essas

carências dos estudantes que ingressam no ensino superior.

Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, percebo que ache estranho que o Governo tenha uma estratégia de

crescimento verde e que apresente uma fiscalidade verde que tenha em conta a alteração de comportamentos

e, sim, Sr.ª Deputada, que tenha também em conta alternativas, estando algumas delas previstas desde já e

outras que irão ser prosseguidas nos próximos anos. Por isso é que se trata de uma estratégia, não se trata de

um conjunto de ações ou de decisões que vigorarão apenas em 2015. Portanto, Sr.ª Deputada Heloísa

Apolónia, não leve a mal que concentre a minha resposta num aspeto essencial.

Diz a Sr.ª Deputada que nós escusamos de iludir as pessoas, que estamos ao serviço de grandes

interesses. Sr.ª Deputada, quero repudiar totalmente essa afirmação! Eu estou ao serviço dos interesses dos

portugueses e de nenhuns outros interesses.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Quero que isso fique muito claro perante esta Câmara.

Diz o Sr. Deputado Pedro Delgado Alves que passámos ao lado da ciência. Não, Sr. Deputado, pelo

contrário. Na verdade, o que nós estamos a fazer é uma nova aposta estratégica na ciência. É verdade que,

do ponto de vista financeiro, o programa orçamental da ciência e do ensino superior não ficou de fora ao longo

destes anos dos sacrifícios e das reduções que tivemos de fazer em quase todos os programas orçamentais,

mas é verdade, em primeiro lugar, que pela primeira vez desde 2009 nós vamos alterar a tendência de

diminuição do financiamento para o setor da ciência e ele será reforçado.

Em segundo lugar, o facto de termos hoje menos bolsas individuais não significa, Sr. Deputado, que

estejamos a apostar menos nos centros de investigação e na investigação científica. Não, Sr. Deputado, é

porque temos mais programas, é porque temos mais bolsas integradas em programas doutorais de outra

qualidade. E, Sr. Deputado, aquilo que lhe posso dizer — de resto, já tive ocasião de o recordar — é que, de

acordo com a nova avaliação que está a ser feita a todas as instituições desta área, a todos os centros de

investigação, o que temos hoje é que sete em cada dez bolseiros que estão integrados em instituições irão ter

um financiamento acrescido para a área da ciência e apenas dois em cada dez que estão integrados em

instituições terão apenas financiamento de funcionamento. E, Sr. Deputado, apenas um está em instituições

que não terão financiamento.

Mas se o Sr. Deputado acha que, simplesmente, boa estratégia para a ciência é aumentar o financiamento

a todos, para aqueles que funcionam bem e para aqueles que funcionam menos bem, então, Sr. Deputado,

não estamos de acordo e a nossa estratégia é, de facto, outra.

Sr. Deputado António Costa Rodrigues, deixe-me dizer-lhe que creio que as perspetivas no setor da

eletricidade, no setor das interligações elétricas para Portugal e para Espanha, bem como para os países

bálticos são inteiramente diferentes daquelas que têm vigorado desde 2002. Desde 2002, no Conselho

Europeu de Barcelona, que temos metas indicativas que nunca tiveram qualquer grau de concretização. E

finalmente nós conseguimos que houvesse um compromisso no sentido de ter a Comissão Europeia a liderar

um processo que tem de assegurar que até 2020 as interligações no caso de Portugal e de Espanha e dos

países bálticos atinjam o mínimo de 10% e que essa meta seja elevada para 15% até 2030. Creio que isto

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será muito importante, quer para realizar o mercado interno de energia na Europa, quer para acabar com esta

ilha energética em que nós nos encontramos com Espanha, quer para atrair maior investimento em

renováveis, que são, com certeza, uma estratégia coerente que nós temos prosseguido de há muitos anos a

esta parte, não só com este Governo, e que, do nosso ponto de vista, deve prosseguir também na Europa.

Finalmente, queria dizer apenas ao Sr. Deputado António Filipe que não existe nenhuma dessintonia entre

aquilo que foi o discurso realista que fiz e aquilo que é o Orçamento do Estado. Sei que, por vezes, as

perspetivas com que olhamos para aquilo que não vemos com maior interesse proporciona alguns exercícios

criativos. O exercício criativo maior que vi foi um título que dizia que este Orçamento simbolizava a

austeridade eleitoralista, o que quer que isso queira significar.

Sr. Deputado, este Orçamento do Estado prossegue uma determinação clara de diminuição de défice e de

dívida e, nessa medida, contém muitas medidas que perdurarão ainda algum tempo e que visam assegurar

que Portugal possa atingir um equilíbrio orçamental e um défice estrutural não superior a 0,5%, que é o nosso

objetivo de médio prazo até 2017. E esforçar-nos-emos para conseguirmos colocar Portugal fora dessa zona

de perigo em que estão sempre os países que têm excesso de défice e excesso de dívida.

Mas, Sr. Deputado, este Orçamento do Estado, ao contrário do que diz, traz já a consequência positiva de

muitos dos sacrifícios que já fizemos no passado, porque a crise não acabou. Eu nunca disse que a crise

acabou, Sr. Deputado! Está muito equivocado. A crise ainda não acabou. O que nós temos é a economia a

crescer, que é uma coisa diferente, Sr. Deputado. E temos o desemprego a diminuir, o que é outra coisa, Sr.

Deputado. Não vamos confundir as coisas. A fase mais aguda da crise na Europa está para trás das nossas

costas, mas com certeza que ainda enfrentamos desafios muito importantes. Nós não fazemos de conta, Sr.

Deputado, por isso é que este Orçamento tem de ser também um Orçamento de responsabilidade.

Mas, Sr. Deputado, há um propósito naquilo que nos sugere que não posso aceitar: o de que nunca

quisemos fazer a reposição salarial na função pública. Não é verdade, Sr. Deputado. Tanto não é verdade que

em 2012, que foi o ano em que nós fizemos vigorar os cortes salariais equivalentes à supressão dos 13.º e

14.º meses, o pior ano do ponto de vista do impacto sobre os rendimentos na Administração Pública em

função, evidentemente, dos níveis de rendimento de salários dos funcionários, tinha uma previsão no

Documento de Estratégia Orçamental de uma reposição desses salários. Era, na altura, Ministro de Estado e

das Finanças o Prof. Vítor Gaspar, e recordo-me muitíssimo bem de ter discutido com ele, no Conselho de

Ministros, em que termos haveríamos de prever a reposição salarial, e ela ficou prevista no Documento de

Estratégia Orçamental para ter lugar em quatro anos, que é exatamente o que tencionamos fazer.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — A Mesa propõe que completemos esta ronda de perguntas ao Sr. Primeiro-Ministro e

que só depois interrompêssemos os nossos trabalhos para almoço.

Sendo assim, tem a palavra, para pedir esclarecimentos, a Sr.ª Deputada Cecília Meireles.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, há pouco foi interpelado pela

bancada do PS, designadamente pelo Sr. Deputado João Galamba, sobre o tema do crescimento económico.

Ouvir o PS falar de crescimento económico, por um lado, já é um avanço, porque, pelo menos, já admitem que

há crescimento económico, coisa que não acontecia eu não diria há um ano atrás, mas há alguns meses.

Mas se temos aqui um avanço do ponto de vista do tema, a verdade é que, em coerência, creio eu,

estamos perante um retrocesso.

Sobre esta matéria, penso que vale a pena olharmos um pouco para aquilo que aqui era dito,

designadamente, mais uma vez, pelo PS, há um ano atrás, sobre o Orçamento para 2014, este que está em

vigar. E há um ano atrás, em 16 de Novembro, dizia o Sr. Deputado João Galamba na RTP-Informação: «Mas

este Orçamento…» — o que está em vigor este ano — «… mata definitivamente todo e qualquer sinal de

retoma. Com este Orçamento voltamos a 2011. Portanto, vai repetir-se tudo outra vez: vai aumentar o

desemprego, a recessão. Tenho a certeza absoluta de que a recessão vai voltar.»

Vozes do PSD e do CDS-PP: — Oh!…

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A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — São estas certezas absolutas que às vezes nos levam aos

arrependimentos.

Protestos do PS.

E eu creio que a bancada do PS, estando eu a fazer uma citação de um digníssimo Deputado da vossa

bancada, deveria ter aqui uma rara oportunidade de aplaudir e não de gritar em protesto.

Mas dizia também o Sr. Deputado João Galamba, em 31 de outubro de 2013, à Sr.ª Ministra das Finanças:

«Portanto, este Orçamento não tem credibilidade. Infelizmente, as medidas que lá estão vão realizar-se, mas

que credibilidade é que tem? Vão outra vez cortar salários, vão outra vez fazer aumentar o desemprego, vão

outra vez fazer aumentar as falências e vão outra vez degradar o balanço dos bancos. A Sr.ª Ministra das

Finanças diz que não. Porquê? Porque acredita».

E mais dizia à Sr.ª Ministra das Finanças o Sr. Deputado João Galamba: «Isto só demonstra que a Sr.ª

Ministra das Finanças não faz a mais pequena ideia do que se passa na economia».

Pergunto ao Sr. Primeiro-Ministro se não será o caso de ser o Partido Socialista que não faz a mais

pequena ideia do que se passa na economia em Portugal.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Mas mais, porque também reparei que o Sr. Primeiro-Ministro, na sua primeira intervenção, falou do

segundo resgate, que foi uma novela a que assistimos durante vários meses. A oposição, por razões que,

creio eu, não serão particularmente misteriosas, em todo o caso, «fez ouvidos de mercador» e não falou mais

do tema, mas acho que vale a pena lembrarmos o que se dizia na altura.

Tenho aqui um artigo de opinião do Sr. Deputado Pedro Nuno Santos, também digníssimo Deputado da

bancada do Partido Socialista, que, em 2 de outubro de 2013, no jornal i, sobre resgate sem austeridade, que

era, na altura, a grande bandeira do Partido Socialista, dizia o seguinte: «A menos de nove meses do fim do

Programa de Assistência Económica e Financeira, com taxas de juro implícitas da dívida portuguesa a rondar

níveis insustentáveis, é cada vez mais óbvio que Portugal não conseguirá regressar aos mercados. O segundo

resgate está por pouco tempo, está para perto e nem sequer precisávamos de ter sido previamente

informados, como fomos, em on, pelo Sr. Primeiro-Ministro e, em off, por responsáveis da Comissão

Europeia».

E mais dizia, e peço desculpa, Sr. Primeiro-Ministro, porque creio que esta expressão não será

particularmente adequada a este debate, mas, em todo o caso, é uma citação: «É incompreensível que,

perante o fracasso avassalador do primeiro resgate, se queira responder com repetição do erro, mas,

infelizmente, são a irracionalidade e a estupidez que comandam atualmente Portugal e Europa».

Pergunto, Sr. Primeiro-Ministro, se, por acaso, já ouviu o Partido Socialista reconhecer que se enganou

redondamente, ao dizer que Portugal teria um segundo resgate…

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

… e se já reconheceu, não perante o Governo, mas perante os portugueses, que, não contente em falir

Portugal uma vez, estava preparadíssimo para abonar e falir Portugal uma segunda vez.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente: — A próxima pergunta cabe ao Bloco de Esquerda.

Sr.ª Deputada Mariana Aiveca, faça favor.

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, ficámos a perceber, pela sua

resposta, que, se, em 2016, fosse Primeiro-Ministro, não cumpriria a decisão do Tribunal Constitucional

relativamente aos salários da função pública.

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O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Não foi isso que disse!

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Percebemos que não será Primeiro-Ministro, mas percebemos também que

fica aqui a promessa extraordinária de não cumprir a decisão do Tribunal Constitucional.

Tenho mais duas questões, Sr. Primeiro-Ministro, a primeira das quais sobre pensões. As pensões

mínimas do regime geral do sistema de segurança social estão congeladas.

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro (Paulo Portas): — Homessa!

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — As pensões de 274 € estão congeladas, as pensões de 303 € e de 386 €

estão congeladas, e disse aqui o senhor que assim se manterão, abaixo do limiar da pobreza. Aliás, o único

subsídio que poderia colmatar esta situação era o complemento solidário para idosos (CSI), que os senhores

cortaram. Portanto, os senhores mantêm na pobreza mais de 2 milhões de pensionistas. Esta é a realidade,

pelo que a propaganda do descongelamento das pensões mínimas é uma propaganda de mentira política.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Segunda questão, Sr. Primeiro-Ministro: o célebre teto moral, nas palavras

que proferiu há pouco. A proposta de lei de Orçamento do Estado não refere, em nenhum artigo, como é que

os senhores vão aplicar este teto. Já ouvimos a Sr.ª Ministra das Finanças «desfiar» uma teoria, em sede de

comissão, ouvimos também o Sr. Ministro da Solidariedade e da Segurança Social «desfiar» outra teoria,

todas elas no sentido do célebre teto moral. Quero dizer-lhe, Sr. Primeiro-Ministro, que todas as prestações

sociais do regime não contributivo têm um teto: o RSI tem teto, o CSI tem teto, o subsídio social de

desemprego tem teto. Todas as prestações têm teto, pelo que os senhores, agora, querem pôr uma prensa em

cima de todos esses tetos, que é a prensa da perseguição aos mais pobres. É terrorismo social!

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — E o senhor, hoje, tem obrigação de nos dizer como vai fazer, porque, de

facto, na proposta de lei não diz, apenas diz que, com isto, vai poupar 100 milhões de euros. A pergunta

concreta é: onde, como e a quem se dirige? É porque os senhores são incapazes de dizer isto e continuam

com a monumental mentira de um teto moral.

Dir-lhe-ei, para finalizar, Sr. Primeiro-Ministro, que o que lhe ficava bem era estabelecer a baliza moral de

não permitir mais empobrecimento, em contraponto com aquilo que existe, porque há cada vez mais pobres,

que o senhor permite, ao mesmo tempo que os ricos aumentam ao ritmo de 10 000 por ano. Esta é que era a

baliza moral! Teto moral, Sr. Primeiro-Ministro, significa terrorismo social!

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — A próxima pergunta cabe ao PCP.

Sr.ª Deputada Diana Ferreira, faça favor.

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, menos 704 milhões de euros para o

ensino básico e secundário. São 1330 milhões cortados desde 2011 e, em quatro anos, mais de 2000 milhões

de euros retirados à escola pública.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exatamente!

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Aprofundam-se medidas que conduziram ao despedimento de professores

(mais de 25 000, desde 2011), funcionários e outros profissionais, agudizando a carência de meios humanos

existente há vários anos e contribuindo cada vez mais para a degradação das condições pedagógicas.

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O desastroso arranque do ano letivo compromete-o irremediavelmente. Não é um acaso ou incompetência;

muito pelo contrário, é consequência das opções políticas de sucessivos Governos, não estando desligada

das políticas dos PEC, do pacto de agressão, do desinvestimento e do ataque à escola pública e aos seus

profissionais.

O Sr. David Costa (PCP): — Exatamente!

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Milhares de professores das escolas que respondem a necessidades

permanentes continuam à espera de vinculação. Como é que se pode resolver a precariedade laboral dos

professores sem a sua vinculação e com estes cortes?!

Continuam a sujeitar-se, todos os anos, dezenas de milhares de professores a andarem com a «casa às

costas» e os alunos a interrogarem-se se terão aulas. Continua o recurso ao trabalho precário e a contratos

emprego-inserção, para tentar disfarçar, e mal, a tremenda escassez de funcionários nas escolas.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exatamente!

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Como é que se pode resolver a precariedade laboral dos funcionários com

menos financiamento à escola pública?!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Prosseguem e aprofundam-se políticas de encerramento de escolas,

imposição de mega-agrupamentos, reorganização curricular, aumento do número de alunos por turma, com

um propósito bem identificado: empurrar os alunos para o privado.

À política de desmantelamento da escola pública alia-se o favorecimento direto da escola privada,

mantendo contratos de associação com peso significativo e sem perspetiva de investimento numa rede pública

de creches e pré-escolar, continuando a sua entrega a entidades privadas.

Educação especial, Sr. Primeiro-Ministro! À palavra inclusão devem corresponder medidas efetivas de

garantia de todos os técnicos e apoios necessários nas escolas e nas instituições que trabalham com estas

crianças e jovens, algo que o Governo não faz nem quer fazer. Corta no ensino básico e secundário, com

graves impactos nas condições de acompanhamento e inclusão dos alunos; não cumpre os acordos

estabelecidos com instituições de educação especial; nega professores, técnicos e funcionários necessários. É

assim que o Governo garante o respeito e o cumprimento dos direitos destas crianças e jovens?!

No ensino superior público, Sr. Primeiro-Ministro, os pouco mais de 939 milhões de euros chegam para os

salários e para as despesas de funcionamento? Qual é o impacto do corte salarial parcial neste setor? O

aumento de 1,17%, do anterior Orçamento para este, é, sequer, suficiente para devolver parcialmente os

salários?

Com este Governo, o que é certo mesmo são os mais de 15% retirados ao ensino superior público desde

2011.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Bem lembrado!

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Os trabalhadores pagam mais impostos, os estudantes cada vez mais

propinas (mais 28% de propinas do que em 2011), mas o subfinanciamento às instituições agrava-se

continuadamente.

Este Governo impede o acesso de milhares de jovens ao ensino superior, devido aos seus custos

exorbitantes e às profundas limitações da ação social escolar.

Para muitos, não há saída: ou não se candidatam ou são obrigados a trabalhar para pagar aquele que é

um seu direito, consagrado na Constituição. Estamos, assim, perante a promoção do abandono escolar. Como

é possível combater o abandono escolar quando falha a ação social escolar?!

É cada vez mais notório que o ensino superior não é para todos, mas sim para quem o puder pagar.

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A política deste Governo PSD/CDS, de facto, é a mesma desde 2011: a desresponsabilização do Estado, a

elitização do ensino e a destruição da escola pública de Abril.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — A próxima pergunta cabe ao PSD.

Sr.ª Deputada Mónica Ferro, faça favor.

A Sr.ª Mónica Ferro (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, ao longo destes três difíceis anos,

várias foram as reformas encetadas por este Governo, algumas delas aqui já referidas. Mas também nas

áreas de soberania esta maioria não baixou os braços.

Todos sabemos que uma parcela relevante da nossa soberania traduz-se na capacidade de o País, de per

si e em alianças, garantir a segurança e defesa dos portugueses e contribuir para a segurança coletiva,

participando na cooperação técnico-militar e nas missões humanitárias.

A atividade de policiamento aéreo dos nossos F16 e a sua integração em missões internacionais que,

ontem e hoje, têm estado em destaque nas notícias reiteram esta relevância.

Bem sabemos que do varandim da Câmara Municipal de Lisboa, infelizmente, não se vê tão longe, mas o

PSD não deixará que essa defesa seja esquecida.

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Mónica Ferro (PSD): — Trata-se de uma responsabilidade estruturante do nosso Estado de direito,

do nosso projeto de desenvolvimento humano.

Uma responsabilidade que, em sede de discussão orçamental, alinha em três eixos: por um lado, a

contribuição para a segurança e desenvolvimento globais, com a manutenção das nossas forças nacionais

destacadas e um ligeiro aumento, mas significativo, na cooperação técnico-militar, na concretização do

processo de reestruturação do Ministério da Defesa Nacional e das Forças Armadas; a ambiciosa reforma

Defesa 2020 continuará, com o objetivo de garantir maior eficiência e eficácia e permitir um equilíbrio entre os

recursos disponíveis,…

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Onde?!

A Sr.ª Mónica Ferro (PSD): — … as necessidades das Forças Armadas e os compromissos de defesa

nacional, uma reforma feita em tandem com um esforço legislativo assinalável.

Com impacto orçamental, convém ainda destacar, porque é de Orçamento que falamos, as alterações nos

estabelecimentos militares de ensino, a reforma do sistema de saúde militar, a conclusão da reestruturação

dos estabelecimentos fabris do Exército e o redimensionamento territorial.

O outro eixo diz respeito ao reforço do setor empresarial da defesa, uma área estratégica. A tónica, aqui, é

procurar parcerias e parceiros internacionais que tragam valor acrescentado à economia nacional, para o

tecido empresarial e para as áreas de inovação científica e tecnológica.

Sr. Primeiro-Ministro, depois da assinatura do programa de resgate, da emergência em assegurar o

pagamento dos salários às nossas Forças Armadas, mantemos a exigência em querer fazer mais e melhor,

com rigor e responsabilidade, dar resposta às necessidades de reequipamento das nossas Forças Armadas e

cumprir as missões que a elas competem.

Sabemos quais são as reações costumeiras.

À incredulidade e à oposição declarada com que alguns partidos encaram certas medidas adotadas por

este Governo, respondemos com a tranquilidade de quem tem obra para mostrar.

Os Estaleiros Navais de Viana do Castelo e a sua subconcessão são, talvez, um desses exemplos.

Vozes do PSD: — Muito bem!

Protestos do PCP.

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A Sr.ª Mónica Ferro (PSD): — Viana do Castelo recupera hoje o dinamismo e a construção naval e

recupera a sua imagem de competência.

Protestos da Deputada do PCP Rita Rato.

É verdade, Sr.ª Deputada!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Foi mais um dos enganos!

A Sr.ª Mónica Ferro (PSD): — Foi mais um dos enganos! Exatamente!

Sr. Primeiro-Ministro, este Orçamento traduz, na defesa, uma nova abordagem qualitativa.

Podemos garantir a esta Câmara e aos portugueses e às portuguesas que nos ouvem que este Orçamento

assegura a operacionalidade das nossas Forças Armadas, garante as condições para o cumprimento das

missões que lhes estão atribuídas, desde logo a segurança e defesa do povo português e da pátria e a

construção da paz e segurança internacionais.

Gostaríamos de ter a oposição do nosso lado neste debate, pelo menos a contribuir positivamente para ele,

mas bem sabemos que não nos demoveremos.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — A próxima pergunta e última desta ronda cabe ao PCP.

Sr. Deputado Miguel Tiago, faça favor.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, este é, claramente, um Orçamento que

persiste — aliás, o Sr. Primeiro-Ministro não o nega — no rumo de empobrecimento, apesar de trazer, dada a

situação e a altura em que nos encontramos, uma máscara de alívio, perante aquilo que se tem vindo a passar

com os portugueses. E até a sua intervenção tem, sobre isso mesmo, contradições: o mesmo Orçamento que

faz uma estimativa de crescimento económico baseada especialmente nas exportações é aquele que diz que

o cenário internacional que alimenta essas exportações é adverso.

Portanto, Sr. Primeiro-Ministro, as expetativas que aqui traz para poder mascarar de alívio o Orçamento de

empobrecimento são elas próprias muito frágeis.

Sr. Primeiro-Ministro, em 2010, o Estado português pagava, em juros e encargos da dívida pública,

qualquer coisa como 4800 milhões de euros; era já uma fatia incomportável, com custos muito significativos

para os portugueses. Hoje, não chega a cinco anos, esse valor ascende a 8200 milhões de euros, já previstos

no Orçamento do Estado para 2015.

Sr. Primeiro-Ministro, isto é o resultado, não daquilo que diz ser uma diminuição da dívida, mas de uma

dívida que continua incomportavelmente a crescer. Aliás, nem a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças teve

coragem de vir dizer, na apresentação que fez aos grupos parlamentares do Orçamento do Estado, que a

dívida portuguesa teria diminuído em percentagem do PIB, porque isso se deve a uma alteração da bitola para

o SEC 2010,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — … que faz com que a proporção entre o PIB e a dívida, estatisticamente,

esteja alterada, porque a dívida pública — e o Sr. Ministro deve sabê-lo ou, se não sabe, é igualmente grave

— aumentou 4,1 mil milhões de euros no último ano, ao contrário daquilo que aqui nos tentou fazer crer.

Sr. Primeiro-Ministro, entre 2014 e 2020, estima-se, o Estado português continua comprometido com mais

60 000 milhões de euros de juros para pagar de dívida, o que significa que a fatia do Orçamento que será

afeta a juros tenderá, inclusivamente, a crescer até 2020.

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Para termos uma ideia: com os juros da dívida que gastamos num ano, podíamos repor três anos de cortes

salariais na função pública; podíamos pagar oito anos de medicamentos gratuitos a todos os portugueses nos

hospitais;…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exato!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — … podíamos pagar 25 anos de propinas a todos os portugueses de todos os

graus de ensino;…

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Muito bem!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — … podíamos pagar 700 anos daquilo que é gasto, atualmente, com o apoio a

todas as artes, a todas as expressões artísticas no nosso País.

É isto que estamos a sacrificar a cada ano que passa!

Sr. Primeiro-Ministro, se estivesse, de facto, ao serviço dos portugueses, como aqui nos tentou fazer crer,

não estava a negociar as nossas escolas, não estava a negociar a nossa saúde, não estava a negociar os

nossos salários,…

O Sr. David Costa (PCP): — Muito bem!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — … os nossos horários, as nossas férias, o nosso bem-estar, a nossa

felicidade, a troco dos juros para salvar os grupos económicos.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Muito bem!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr. Primeiro-Ministro, este é o último Orçamento do Estado que este

Governo apresenta, mas também que estas forças políticas apresentam, que este projeto político apresenta.

Isto porque cada vez é mais evidente para todos que é preciso uma alternativa e que essa alternativa não vem

nem do PS, nem do PSD, nem CDS — dos partidos do arco do desgoverno e da bancarrota —, mas que é

preciso vir noutro sentido.

Não serão aqueles que desde 1976 a esta parte praticam políticas de submissão e de direita que

responderão às necessidades, tão só porque as necessidades, neste momento, são precisamente as de uma

política de afirmação do interesse nacional pela esquerda.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, já não disponho de tempo para

responder, a não ser à custa, evidentemente, do tempo que o Governo tenciona dispensar também à Sr.ª

Ministra de Estado e das Finanças, bem como a outros Srs. Ministros para intervirem neste debate.

Espero, portanto, que compreendam que procurarei responder de uma forma mesmo muito sintética.

À Sr.ª Deputada Cecília Meireles, queria apenas dizer que também acompanhei esse exercício de

memória, tão oportuno, que aqui fez quando citou Srs. Deputados do Partido Socialista que afirmavam

categoricamente que aquilo que aconteceu não era possível acontecer.

Já aconteceu, no passado, a mesma coisa, quando estavam no Governo. Recordo-me, perfeitamente — é

a minha vez de citar a Sr.ª Dr.ª Manuela Ferreira Leite, neste debate —, de a então Sr.ª Deputada Manuela

Ferreira Leite, líder do meu partido, ter prognosticado que os processos económicos que estavam a ser

desenvolvidos pelo Governo de então iriam conduzir, inevitavelmente, a um endividamento insustentável do

País e que isso haveria de conduzir a uma situação insustentável para as finanças públicas…

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Bem lembrado!

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O Sr. Primeiro-Ministro: — … e de mais ou menos os mesmos, mais reforçados, na altura, por outros

pesos do Governo de então, dizerem que aquela era uma visão catastrofista, que nunca aconteceria. E

aconteceu!

Portanto, Sr.ª Deputada, esse exercício de memória é muito bem-vindo, porque no Governo ou na oposição

o Partido Socialista tem demonstrado, infelizmente, fraca capacidade de aprendizagem.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Deputada Mariana Aiveca trouxe aqui mais uma tentativa de confusão com as questões do Tribunal

Constitucional. Não há nenhuma ambiguidade, Sr.ª Deputada. O Governo cumpre, sempre, as decisões do

Tribunal Constitucional. Sempre! Cumpriu no passado e há de cumprir no futuro! Sempre, como não pode

deixar de ser!

O Tribunal Constitucional não inviabilizou que houvesse em anos, a partir de 2016, uma política de

reposição salarial gradual; disse que não se pronunciaria sobre ela neste Acórdão,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Não é verdade!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … na medida em que a proposta que era referida pelo Governo não tinha

efeitos vinculativos para anos subsequentes e, portanto, era matéria que o Tribunal não avaliaria.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Página 21 do Acordão!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Avaliava apenas aquilo que representava 2014, na medida em que isso

pudesse corresponder a uma alteração do Orçamento, e entendia-a para 2015.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Não é verdade!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Não há garantias de como é que o Tribunal Constitucional decidirá, se o

Governo apresentar uma proposta de lei do Orçamento que preveja a restituição de mais 20% para 2016. Se o

Tribunal Constitucional vier a decidir pela inconstitucionalidade, nós cumpriremos. É assim! Não pode ser de

outra maneira!

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Está a «atirar o barro à parede»!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Mas nós faremos aquilo que dissemos que íamos fazer: iremos apresentar

propostas, sucessivamente, que garantam que 20% ao ano da reposição dos salários possa ser feita.

Portanto, está a Sr.ª Deputada a ver o quão eleitoralista estou a ser! Espero que, desta vez, não haja uma

quarta pergunta do Bloco de Esquerda com o mesmo propósito e que agora se sintam inteiramente

esclarecidos. Espero que sim!

Sr.ª Deputada, a propósito das balizas morais e do teto das prestações, gostaria que a questão de princípio

fosse discutida de forma adequada, porque é importante sabermos se estamos ou não de acordo com a

questão de princípio.

Ora, a questão de princípio é esta: o Estado tem, através da administração central e da administração local,

prestações que transfere para as famílias e para os contribuintes, evidentemente, para aqueles que mais

precisam. O Estado não tem uma noção de qual é, em termos consolidados, o efeito das transferências, o

cúmulo das transferências que faz para cada agregado. Não tem! E precisa ter! Digo eu e diz o Governo. Diz o

Bloco de Esquerda ou não?

Protestos do BE.

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O Bloco de Esquerda diz assim: «Não, não, isso não nos interessa. Desculpem lá! Os senhores não têm

nada que ter essa visão consolidada. Os senhores têm prestações para isto, prestações para aquilo,

prestações para aqueloutro, e vão, se fizerem favor, fazendo essas transferências, independentemente de

saber se esse cúmulo é superior, ou não, àquele que representam para as famílias que suportam esse esforço

solidário os impostos que têm de pagar».

Protestos do BE.

E eu digo, Sr.ª Deputada, que o nosso princípio é este, e não é o único, evidentemente. O Reino Unido já

prosseguiu neste sentido no passado e nós entendemos que é moralmente defensável fazê-lo, da mesma

maneira que é moralmente defensável criar uma condição de recursos para assegurar que as prestações são

atribuídas a quem mais precisa delas — porque precisar, precisa quase toda a gente, Sr.ª Deputada.

Também é moralmente defensável que tenhamos a certeza de que aqueles que pagam os seus impostos

não estão a fazer um esforço superior àqueles que beneficiam do cúmulo dessas transferências. E nesta

questão de princípio, Sr.ª Deputada, o Bloco de Esquerda tem de dizer o que pensa: se está de acordo com

esse princípio ou se, como a Sr.ª Deputada Mariana Aiveca disse, considera que este princípio é «terrorismo

social»,…

Protestos da Deputada do BE Mariana Aiveca.

… sendo que, Sr.ª Deputada, o que considero «terrorismo social» é o oposto, é colocar agregados

familiares que têm rendimentos de 800 €/mês a pagar impostos para o setor solidário e é termos agregados

familiares que percebem, em cúmulo, mais do que os rendimentos daqueles que pagam os impostos para o

apoio solidário.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Deputada Diana Ferreira — não me leve a mal — fez um discurso tremendista que, como todos os

discursos tremendistas que vêm do Partido Comunista Português, terminam referindo a destruição de Abril.

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — E é!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Diz a Sr.ª Deputada que tudo corre mal na área social. E escolheu o abandono

escolar que, veja a Sr.ª Deputada, tem sido dos indicadores que recuperou.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Aonde?!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Imagine que recuperou!

Protestos da Deputada do PCP Diana Ferreira.

Nós, hoje, temos sido mais bem-sucedidos no combate ao abandono escolar do que no passado. Portanto,

esperava que, pelo menos isso, a fizesse rever, revisitar o discurso que trazia preparado.

Mas, quando a Sr.ª Deputada refere o processo de vinculação de professores, eu estou de acordo e devo

dizer que temos vindo, justamente, a resolver esse problema. Por isso é que incluímos, nos concursos que

foram feitos, um crescente número de professores que ficará vinculado ao Ministério da Educação e, portanto,

ao Estado. Isto é, reduziremos, àquilo que deve ser a sua natural dimensão, aqueles que constam de uma

bolsa de contratados, que devem, por isso mesmo, constituir uma bolsa variável e que não podem estar

vinculados, na medida em que não correspondem a necessidades permanentes e recorrentes no sistema.

Protestos da Deputada do PCP Diana Ferreira.

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Mas, Sr.ª Deputada, se há Governo que tem conseguido terminar, justamente, com essa chaga, é este

Governo, tendo sido aquele que apresentou maiores resultados na vinculação de professores.

Protestos do PCP e do BE.

Finalmente, a Deputada Mónica Ferro fez uma justíssima referência à reforma no setor da defesa que eu

só posso acompanhar, sobretudo quando diz que é pena que outras bancadas, no Parlamento, dediquem às

funções de soberania muito pouco ou quase nada das suas intervenções, a não ser que, por qualquer razão,

alguma coisinha não tenha corrido bem em reformas que tenham sido feitas no setor da soberania. Nesse

caso, a coisa tem total dignidade e merece ser referenciada aqui, no Parlamento. Quando, por qualquer razão,

tudo corre bem, o lastro e vasto manto da ignorância!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Deputado Miguel Tiago fez aqui a recordatória sobre o empobrecimento.

Sr. Deputado, o PIB, em Portugal, desde 2010, terá contraído, sensivelmente, 6% ou um pouco menos. Se

medirmos apenas a comparação entre 2010 e 2013, será até um pouco inferior a 6%. Foi, sensivelmente, 8%

no caso da Irlanda, se não tivermos em conta, evidentemente, os efeitos one-off que se registaram do lado da

banca. E no caso da Grécia, que passou também por uma crise profunda, esses resultados somam quase

16%. Repare que não estou a somar linearmente os resultados que foram observados em cada ano, porque a

base nominal vai sendo diferente e, portanto, estamos a fazer a avaliações real: mais de 16%!

Isto significa que Portugal foi, dos três países que estiveram sob resgate, aquele em que a destruição ou o

empobrecimento, como o Sr. Deputado queira caraterizar, foi menor. Talvez não seja por acaso que, depois, a

retoma não seja tão vigorosa quanto é noutros países, onde a recessão foi mais forte.

Mas, Sr. Deputado, não vejo o que é que isso possa ter de mal, porque, se tivemos um efeito recessivo

menor do que noutros países que enfrentaram problemas tão graves como os nossos e, eventualmente,

podemos dizer que ficámos no pior dos mundos porque nem tivemos, como um, excesso de dívida privada, e

como outros, excesso de dívida pública, tivemos ambos, creio que não deixa de ser notável que tivéssemos,

apesar de tudo isso, conseguido, neste período, apresentar a menor taxa de destruição económica dos países

que tiveram problemas.

Portanto, Sr. Deputado Miguel Tiago, eu, acompanhando aquilo que diz e lamentando que o nosso PIB

tenha contraído, não posso deixar de sublinhar também, porque isso é importante, que foi o que, em

proporção, contraiu menos relativamente a todos os outros que tiveram esses problemas.

Protestos do Deputado do PCP Miguel Tiago.

Mas há uma coisa sobre a qual quero esclarecer o Sr. Deputado. Eu disse que tínhamos diminuído o rácio

da dívida pública, e isso parece-me evidente. Mas o Sr. Deputado nunca me ouviu dizer que não temos

acrescentado dívida pelo facto de termos défice. É o contrário, Sr. Deputado! Isso é o que tenho

insistentemente repetido e a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças também! Nós temos um stock de dívida

muito elevado, e esse stock de dívida, no que a este Governo diz respeito, corresponde, no essencial, a dois

efeitos: em primeiro lugar, ao efeito défice, sendo que, devo dizer, já começámos a ter excedentes

orçamentais, pelo que esse efeito défice é hoje menor do que foi no passado, nomeadamente durante os

Governos do Partido Socialista, em que tivemos défices primários e não excedentes primários; em segundo

lugar, ao efeito que se designa «bola de neve», isto é, ao efeito que deriva de a nossa taxa de crescimento do

PIB nominal ser, evidentemente, porque houve recessão, inferior à taxa de crescimento do financiamento da

dívida.

Ora, Sr. Deputado, estes são aspetos que estamos a alterar, quer numa frente quer noutra. Eu esperava,

por isso, que o Sr. Deputado pudesse, pelo menos, reconhecer esses méritos ao Governo.

Termino, Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, com a afirmação que o Sr. Deputado Miguel Tiago fez:

precisamos de ter uma alternativa. É verdade! E acrescento: uma alternativa com clareza política, para que

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possamos saber exatamente aquilo que numa democracia se exige, ou seja, que aqueles que defendem

alternativas digam com clareza o que defendem.

Até este momento, Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, em que concluímos esta fase do debate, sabemos

qual é a estratégia económica, financeira e orçamental deste Governo, mas ainda não sabemos qual é a

estratégia orçamental, financeira e económica do principal partido da oposição.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

E sabemos que a estratégia dos restantes partidos da oposição é sair da Europa, sair do euro, reestruturar

a dívida, o que só devia preocupar os portugueses.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Muito obrigada, Sr. Primeiro-Ministro.

Srs. Deputados, vamos interromper os trabalhos.

Eram 13 horas e 37 minutos.

Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 15 horas e 16 minutos.

Vamos, então, prosseguir o debate, na generalidade, das propostas de lei relativas ao Orçamento do

Estado para 2015 e às Grandes Opções do Plano para 2015.

Informo a Câmara que vamos entrar, agora, num período de intervenções, após o Sr. Primeiro-Ministro,

esta manhã, ter procedido à apresentação dos diplomas e ter respondido às perguntas dos Srs. Deputados. As

intervenções terão a seguinte ordem: PS, PSD, CDS-PP, PCP, Bloco de Esquerda, Os Verdes e, finalmente,

Governo, pela voz da Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças.

Então, para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Vieira da Silva, do PS.

O Sr. Vieira da Silva (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs. Deputados: O

debate sobre a proposta de Orçamento do Estado para 2015 é, como sempre, um debate central na vida

parlamentar, ainda mais quando se trata do Orçamento correspondente à última sessão legislativa deste ciclo

político.

O debate de hoje é mais do que um debate orçamental, por isso mesmo. É um debate que encerra um ciclo

de política económica, financeira e social que foi levado a cabo pela maioria PSD/CDS. Foi um ciclo especial,

já que coincidiu, em grande medida, com o período de assistência financeira a Portugal. Esse facto marcou a

política orçamental e todas as políticas públicas.

O que hoje importa avaliar é, essencialmente, a forma como a maioria e o seu Governo geriram esse difícil

período, os resultados que obtiveram e, naturalmente, a forma como hoje a maioria propõe prosseguir a sua

política.

Admitamos, por um momento, que as estimativas e os objetivos económicos da proposta do Governo para

o Orçamento serão uma realidade. Partilhemos, então, por um momento, esse otimismo governamental. Que

País nos oferece esta maioria para 2015? Para além da retórica, a crueza dos factos: o que a maioria oferece

para 2015 é uma economia que, ao nível da riqueza criada, terá recuado para os valores de 2004, um

retrocesso superior a uma década. Agora, sim, podemos falar de uma década perdida.

Aplausos do PS.

O que a maioria oferece para 2015 é uma promessa, no que respeita ao emprego, de um número de

postos de trabalho idêntico ao que existia em 1995. Há duas décadas, Portugal possuía um número de

mulheres e homens a trabalhar um pouco inferior ao projetado — repito, ao projetado — para 2015.

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O que a maioria oferece para 2015 é um País a investir menos do que acontecia em 1990, há 25 anos, um

País a investir menos do que há um quarto de século — não uma década, não duas décadas mas, sim, um

quarto de século!

Nestes dados singulares, há todo um País retratado: o País onde aumentam as desigualdades; o País que

vê crescer a pobreza e mesmo a pobreza mais dura, a da privação severa, como nos mostrou o Eurostat há

dois dias — 1,1 milhões de pessoas encontram-se em situação de privação material severa; o País que viu

sair em poucos anos centenas de milhares dos nossos; o País em que as jovens gerações olham para a

fronteira como um destino quase inevitável.

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, não existe retórica que o esconda, propaganda que o adoce —

este é o retrato do País para o qual somos chamados hoje a escolher um Orçamento do Estado.

Dirão alguns, e bem, que para esse retrato muito contribuiu a profunda crise financeira, económica e social

que atingiu o mundo na década passada, e é verdade; dirão outros, e ainda assim bem, que este é também o

resultado de políticas erradas ou insuficientes da União Europeia e da zona monetária que Portugal partilha.

Mas o que não pode ser escondido é que essas políticas foram sempre não apenas subscritas, mas

entusiasticamente apoiadas pela atual maioria e pelo seu Governo.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

Estes são também os resultados de quem quis o lugar de executor exemplar das políticas sem futuro, de

quem afirmou, não há muito, com irresponsável orgulho, que queria ir para além da troica, cortar mais e mais

depressa, para que da dor nascesse uma economia diferente, pujante e regenerada. Mas não, a dor só trouxe

mais dor, dor e medo de um futuro bloqueado. E é esta a política que o Governo promete prosseguir. É por

isso, é também por isso, que este é um mau Orçamento.

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Infelizmente, o pressuposto de que parti, o otimismo que por um

breve momento partilhei sobre as estimativas, não é razoável. Esta proposta de Orçamento falha no seu

momento fundador, aquele em que se ganha ou se perde o teste fundamental de um exercício de proposta

orçamental — o teste da credibilidade. E falha esse teste em quase todos os seus passos essenciais. Desde

logo, porque o cenário macroeconómico não é credível.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Isso é mentira!

O Sr. Vieira da Silva (PS): — Crescer 1,5% em 2015 afasta-nos, por vezes de forma não marginal, da

grande maioria das estimativas recentes, nacionais ou internacionais. Nem a Fitch, nem a OCDE, nem a

Universidade Católica, nenhuma destas entidades preveem um crescimento de 1,5% para o próximo ano.

Crescer 1,5% não é, infelizmente, credível, até porque se avolumam demasiados sinais negativos.

Temos uma União Europeia onde os riscos de deflação se adensam e, com eles, o receio de uma

estagnação prolongada.

Temos uma economia portuguesa onde os indicadores mais recentes põem em causa as perspetivas de

crescimento, onde o indicador avançado de atividade económica do Banco de Portugal está, há três meses,

com valores negativos, como já não víamos desde os piores momentos da recessão; uma economia

portuguesa onde a recente crise no setor financeiro veio trazer nova vaga de dificuldades de crédito, que deixa

alarmados todos os parceiros sociais, mas que é sistematicamente desvalorizada pelo Governo.

Mas a credibilidade do cenário macroeconómico é também expressa numa outra falta de credibilidade,

numa previsão que é também o reconhecimento de um fracasso. O Governo baseia a quase totalidade das

perspetivas de crescimento numa aceleração da procura interna e, em particular, num aumento do consumo

das famílias. Aquilo que era diabolizado como a fonte de quase todos os males aparece agora como a

salvação para um crescimento com que se pretende marcar um novo rumo.

Aplausos do PS.

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De Diabo em anjo, foi assim que este Governo, em pouco tempo, tratou a procura interna. E o tão

propagandeado modelo do regenerado crescimento assente na dinâmica das exportações e da procura

externa líquida já falhou em 2014 e, para 2015, mesmo com previsões convenientes de exportações e

importações — exportações a acelerarem e importações a desacelerarem —, a dinâmica externa é o parente

largamente minoritário dos fatores de crescimento.

Infelizmente, não é apenas o cenário macroeconómico que carece de credibilidade, o mesmo se passando

com as receitas fiscais e contributivas, sempre a crescerem acima da economia.

O que dizer das previsões de crescimento das contribuições para a segurança social — contribuições dos

empregadores e dos trabalhadores —, que crescem cinco vezes mais do que a já otimista previsão de

crescimento de 1% para o emprego? Que dizer destas previsões? Não, não há nenhuma razão séria que

esteja na base destas previsões, apenas a necessidade de garantir na folha de cálculo, que não na realidade,

uma meta do défice que, ainda assim, o Governo assume que fica acima do previamente acordado com a

União Europeia. É também por isso que este é um mau Orçamento.

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Existe uma terceira razão presente nesta proposta que, essa sim,

confirma uma realidade — a degradação das condições sociais dos mais fragilizados.

Só uma retórica pouco séria e pouco informada pode recusar uma realidade evidente: em Portugal, as

desigualdades estão a aumentar e a pobreza a crescer perigosamente.

Todos os dados são coincidentes e encontram uma síntese nas estatísticas do Eurostat: a taxa de pobreza

relativa aumenta, mas aumenta ainda mais a pobreza absoluta, e esse aumento atinge principalmente os mais

jovens e não poupa muitas famílias trabalhadoras. A repartição de rendimento entre os mais ricos e os mais

pobres evolui no sentido do agravamento das desigualdades, a severidade da pobreza aumenta, como nos

mostra a estimativa recente da privação material calculada para 2013.

Neste quadro, que apenas sintetiza uma dura realidade de mobilidade social descendente que atinge a

grande maioria dos portugueses, eis que o Governo se prepara para produzir um novo corte nas

transferências sociais destinadas aos mais pobres, o já famoso teto das prestações não contributivas, que

engloba o subsídio de desemprego, o rendimento social de inserção, o abono de família, o subsídio social de

maternidade pré-natal e, naturalmente, as pensões não contributivas.

Foi um corte anunciado em sede de relatório do Orçamento do Estado. Não posso aqui discutir aspetos

deste corte que não são ainda conhecidos, apesar de, para o Governo, o corte já merecer o destaque de 100

milhões de reduções de despesa na tradicional caixa dos cortes. Mas não podemos deixar de clarificar o

sentido desta opção.

Depois de sucessivas reduções, de sucessivos cortes nas prestações não contributivas, com destaque

para o complemento solidário para idosos e para o rendimento social de inserção, pretende-se agora, sempre

com o pretexto do rigor, uma nova e poderosa redução nas prestações que se destinam a agir na distribuição

de rendimentos. O Governo esquece-se de que é nesta área, nas políticas sociais excluindo as pensões, que

é mais frágil a proteção dos mais pobres e que essa fragilidade tem vindo a aumentar nos últimos anos. Mais

uma vez, basta consultar as estatísticas do Eurostat.

Conhecemos a atração pelo discurso populista que este Governo tem em matérias de prestação de

combate à pobreza, mas a nós, Deputadas e Deputados e a todos aqueles que partilham os valores da coesão

social e do humanismo, tal não nos pode impedir de rejeitar esta forma de fazer política.

Aplausos do PS.

Anuncia-se um corte, estima-se o seu valor, não se explica nem o como nem o porquê, apenas se agita,

mais uma vez, o risco moral do abuso e da fraude — pura demagogia! Falamos das prestações mais vigiadas

de todos os gastos públicos; falamos de famílias a quem se vai estreitando o direito à dignidade; falamos de

valores mínimos de solidariedade e de respeito humano. Um teto individual ou familiar para as prestações

sociais é inaceitável e não corresponde a nenhum problema sério do nosso modelo social.

Aplausos do PS.

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Quem assim procede, quem desconhece que o esforço de redução das desigualdades mais dramáticas é

um verdadeiro bem público, afasta-se de um consenso que foi responsável por progressos civilizacionais

únicos na história da humanidade.

Cumpre-nos, Sr.as

e Srs. Deputados, recusar liminarmente esse caminho. E é também por isto que esta é

uma má proposta de Orçamento, pelo que tem de falta de credibilidade, de acréscimo da carga fiscal, de

fragilização do Estado social, de recuo nas políticas de qualificação, e pelo que não tem de recusa de corte

com o passado falhado, de nenhum sinal de prioridade aos mais frágeis, da ausência de um caminho para um

verdadeiro programa de recuperação da economia, do emprego e da sociedade portuguesa.

Este não é o Orçamento de que Portugal precisa, não será o nosso Orçamento.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, estão inscritos o Sr. Deputado Adão Silva, do PSD, e o

Sr. Deputado José Ribeiro e Castro, do CDS-PP. O Sr. Deputado Vieira da Silva irá responder individualmente

a cada um.

Tem a palavra o Sr. Deputado Adão Silva.

O Sr. Adão Silva (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs.

Deputados, Sr. Deputado Vieira da Silva, deixe-me começar por lhe dizer: por quem o Dr. António Costa nos

manda avisar, Sr. Deputado!

Risos do Deputado do PSD Hugo Lopes Soares.

Por quem nos manda avisar! Deixe-me introduzir neste debate uma expressão latina: tabula rasa, papel em

branco.

V. Ex.ª procura, na sua intervenção, fazer do passado, do Governo do Partido Socialista, onde V. Ex.ª foi

Ministro por duas vezes, uma espécie de papel em branco, tabula rasa — não aconteceu nada durante este

Governo do Partido Socialista,…

O Sr. Amadeu Soares Albergaria (PSD): — Zero!

O Sr. Adão Silva (PSD): — … não aconteceu nada!

Sobre a questão da limitação das prestações sociais de regime não contributivo, de que V. Ex.ª aqui falou,

não aconteceu nada, nada. Por isso é que em março de 2010, no PEC 2, é dito o seguinte: «Definição de tetos

e diminuição da despesa». Mais, Sr. Deputado: diz que o rendimento social de inserção, que em 2010 foi de

520 milhões de euros, em 2012, dois anos depois, havia de ser de 370 milhões de euros, uma queda de 150

milhões de euros.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Mas isso é outra coisa!

O Sr. Adão Silva (PSD): — Não aconteceu nada, tabula rasa. Não aconteceu nada, Sr. Deputado, nada!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

V. Ex.ª, nesta matéria, como emissário do Dr. António Costa, é puro como um anjo, não aconteceu nada.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Nasceu ontem!

O Sr. Adão Silva (PSD): — E também não acontece nada no futuro, porque também para o futuro é tabula

rasa. Dizia o Presidente do meu Grupo Parlamentar, quando V. Ex.ª acabou a intervenção: «Já?!». Sim, este

«já» era de espanto, porque alguém com a responsabilidade e o conhecimento de V. Ex.ª subir à tribuna, dizer

o que quis sobre o Orçamento e não ter uma proposta alternativa,…

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O Sr. Amadeu Soares Albergaria (PSD): — Uma só!

O Sr. Adão Silva (PSD): — … foi uma tabula rasa, Sr. Deputado, tudo papel em branco. VV. Ex.as

foram

papel em branco no passado e queriam um cheque em branco no futuro. Isso é que não vai acontecer, cheque

em branco não, Sr. Deputado!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

E digo-lhe mais, Sr. Deputado: isto não é como o Sr. Lampedusa dizia, que é preciso que mude alguma

coisa para que tudo fique igual.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Essa é a estratégia do PSD!

O Sr. Adão Silva (PSD): — É preciso que haja um novo líder, um novo candidato a Primeiro-Ministro por

parte do PS, para que tudo fique na mesma. Pois é, para que tudo fique na mesma!

V. Ex.ª não traz uma proposta, uma ideia, uma alternativa, o vosso propósito é o de criticar, criticar e mais

criticar. Os portugueses querem saber mais, Sr. Deputado, porque este Orçamento também é uma outra coisa,

é um Orçamento em que se testa a coerência, e eu gostava de testar a sua coerência, Sr. Deputado.

V. Ex.ª era Ministro em setembro/outubro de 2010. Quando, na reunião do Conselho de Ministros, se

decidiu que o Orçamento para 2011 traria o congelamento das pensões mínimas, V. Ex.ª, que é um

democrata, um homem de sentimento e de sensibilidade social, não protestou? Não contestou? Não disse:

«Isto não está certo, não congelem as pensões mínimas? Haja sensibilidade social!».

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Quando cortaram os salários, quando congelaram uma proposta, que, aliás, V. Ex.ª tinha levado à

concertação social, de aumento do salário mínimo nacional, V. Ex.ª não «tugiu nem mugiu»? Convinha saber

qual é a sua coerência.

Sr. Deputado, já agora gostava de saber qual é a sua coerência numa coisa: o que acha V. Ex.ª deste

Governo que, durante quatro anos, aumentou as pensões mínimas a cerca de 1 100 000 portugueses? Diga-

nos, se faz favor, conte-nos sobre a coerência do seu passado e conte-nos sobre a objetividade da coerência

deste Governo no que tem a ver com a sensibilidade social, que está bem evidente ao longo destes

Orçamentos.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Vieira da Silva.

O Sr. Vieira da Silva (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Adão Silva, como os Srs. Deputados

relembraram, fiz parte de dois governos do Partido Socialista,…

Vozes do PSD: — Ah! Não!…

O Sr. Vieira da Silva (PS): — … sob a direção do Primeiro-Ministro José Sócrates.

Vozes do PSD: — Ah!

O Sr. Vieira da Silva (PS): — E estou aqui, olhos nos olhos das Sr.as

e dos Srs. Deputados, por uma razão

muito simples: foi com base nas políticas que nós defendemos que fui eleito Deputado, repito, que fui eleito

Deputado!

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Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

E tenho o mesmo direito, todo o direito, de defender as minhas posições e não tenho nenhum problema em

discutir o passado.

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Não é o direito, é a competência!

O Sr. Vieira da Silva (PS): — Esses governos tiveram posições diferentes daquelas que são agora as

posições desta maioria e deste Governo,…

A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Bem diferentes!

O Sr. Vieira da Silva (PS): — … nomeadamente num aspeto muito importante: é que nós sempre fizemos

tudo para impedir a intervenção estrangeira em Portugal. Sempre fizemos tudo!

Aplausos do PS.

Protestos e risos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, deixem o Sr. Deputado Vieira da Silva prosseguir, se faz favor.

O Sr. Vieira da Silva (PS): — Srs. Deputados, penso que agora já se acalmaram… Espero que o tempo

não esteja a ser contado para o Partido Socialista…

Protestos do PSD.

… porque esta é uma intervenção típica do uso do tempo da maioria.

O Sr. José Magalhães (PS): — Muito bem!

Protestos do PSD.

Gostaria de dizer, apenas, o seguinte: não foi o Partido Socialista que disse que tinha toda a

disponibilidade para governar com o Fundo Monetário Internacional, foi o Dr. Pedro Passos Coelho.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Não foi o Partido Socialista que disse que cumprirá este acordo e que irá mais além, foi o Dr. Passos

Coelho.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

E quanto às citações do Dr. Passos Coelho, só há um problema: é que são tantas e tão contraditórias que

o Regimento não me permite citar todas.

Aplausos do PS.

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Protestos do PSD e do CDS-PP.

Mas há um aspeto que é essencial. Os Srs. Deputados estão a falar de cheque em branco? Não, o que se

passou com a vossa maioria foi um verdadeiro cheque sem cobertura, porque os senhores…

Aplausos do PS.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Sr.ª Presidente,…

A Sr.ª Presidente: — Sr. Deputado, o tempo é descontado enquanto houver ruído.

Pausa.

O Sr. Vieira da Silva (PS): — Sr.as

e Srs. Deputados, estão a tentar que eu não o diga, mas vou dizê-lo…

Vozes do PSD e do CDS-PP: — Diga, diga!

O Sr. Vieira da Silva (PS): — Estou a referir-me a algo muito simples: é que os senhores estão aí sentados

com base num programa eleitoral que afirmava que, para corrigir os problemas das contas públicas, não era

preciso cortar salários nem aumentar impostos. Isso é que é um cheque sem cobertura!

Aplausos do PS.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Voltando aos aspetos específicos da intervenção do Deputado Adão Silva, fui à tribuna fazer o que as

bancadas da maioria já tinham pedido: «Expliquem por que é que votam contra». Querem mais argumentos?!

A mim, bastam-me aqueles!

Mas o Sr. Deputado leu mal a sua cábula, porque, quando fala em cortes nas prestações não contributivas,

é bom que leia todo o texto. Desafio o Sr. Deputado ou qualquer outro Deputado desta Assembleia a

encontrar, nesse tal programa de estabilidade, qualquer afirmação que aponte para aquilo que tem sido

defendido por este Governo, que são os cortes, cortes individuais ou familiares, aos beneficiários de

prestações sociais. Nem uma palavra sobre isso, tal nunca foi concretizado, porque essa não é, nunca foi nem

será a nossa política.

Aplausos do PS.

Sr. Deputado, gostava de ter mais tempo para falar das pensões mínimas, mas estranho como é que a

repetição desse argumento não vem acompanhada por razões de honestidade e seriedade, já que os

senhores, quando lhes convém, gostam de atribuir a paternidade do Memorando de Entendimento ao Partido

Socialista, esquecendo que o assinaram.

Protestos do PSD.

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, os apartes sistemáticos perturbam, efetivamente, a compreensão

global da oratória. Pedia-lhes que tivessem um pouco mais de tranquilidade a escutar o Sr. Deputado Vieira da

Silva.

O Sr. Vieira da Silva (PS): — Tenho uma grande paciência para ouvir os barulhos dos Srs. Deputados.

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Sr. Deputado, vou ler-lhe o ponto 1.12. do Memorando de Entendimento: «Suspender a aplicação das

regras de indexação das pensões e congelar as mesmas, exceto as pensões mais reduzidas» — exceto as

pensões mais reduzidas!

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

A Sr.ª Presidente: — O Sr. Deputado Adão Silva pede a palavra para que efeito?

O Sr. Adão Silva (PSD): — Sr.ª Presidente, é para fazer uma interpelação à Mesa, apenas para pedir a V.

Ex.ª que faça a melhor divulgação da página do PEC 2010-2013, de março de 2010, concretamente o quadro

n.º 2.

A Sr.ª Presidente: — Pede, então, que seja distribuído, Sr. Deputado.

Sr. Deputado Vieira da Silva, a interpelação cabe no quadro regimental. É uma interpelação para um

procedimento. O Sr. Deputado pede a palavra para que efeito?

O Sr. Vieira da Silva (PS): — Sr.ª Presidente, é exatamente para o mesmo efeito.

A Sr.ª Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Vieira da Silva (PS): — Sr.ª Presidente, vou fazer chegar à Mesa as páginas do Programa de

Estabilidade e Crescimento 2010-2013 em que se discriminam — desta vez discriminam-se — todas as

iniciativas que tinham como objetivo a redução da despesa pública em Portugal, neste domínio.

A Sr.ª Presidente: — Será distribuído, Sr. Deputado.

Continuamos com as perguntas ao Sr. Deputado Vieira da Silva. É a vez do CDS-PP e tem a palavra o Sr.

Deputado Ribeiro e Castro.

O Sr. JoséRibeiro e Castro (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Vieira da Silva, ouvi-o, com

interesse, citar algumas estatísticas do passado, reportar a números que seriam iguais aos de 2004 e dizer

que a década teria sido perdida. E tendo sido V. Ex.ª Ministro desse ciclo, pensei que o Sr. Deputado

identificasse a origem desse problema.

No Contra-informação, eu era conhecido como «Cozinheiro e Castro» e vou aplicar à economia um

princípio da cozinha, que é o princípio do soufflé. Foi esse crescimento económico que os senhores fizeram

em Portugal: era um crescimento feito de claras em castelo e ar.

Risos do CDS-PP e do PSD.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Esse ar era de destruição de setores produtivos, como fizeram, por exemplo, na política agrícola,…

Vozes do CDS-PP: — Exatamente!

O Sr. JoséRibeiro e Castro (CDS-PP): — … e puro artificialismo, como já aqui foi várias vezes discutido:

as autoestradas sem carros, os aeroportos sem aviões, os TGV sem comboios. E endividamento, muito

endividamento. Isso passou.

Portanto, a década perdida foi, de facto, essa. Mas, se o Sr. Deputado quiser «esticar» até hoje, não o levo

a mal, porque nós só neste ano é que nos vamos começar a libertar das consequências desse legado. Este é

o primeiro Orçamento pós-troica, que os senhores chamaram. Foram os senhores que chamaram a troica!

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Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Depois, temos aqui, manifestamente, um problema com a linguagem e com as palavras.

Nós é que defendemos o Estado social.

Risos do Deputado do PS João Galamba.

Nós é que defendemos o Estado! Nós é que defendemos o Estado social.

O que o Partido Socialista legou a Portugal, quando chamou a troica, foi um Estado falido; e um Estado

falido não é um Estado social, é um Estado que não dá garantias a ninguém.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Deputado usa ainda a linguagem das «políticas da austeridade». Mas eu sou daqueles que acha que

o Governo não tem aplicado políticas de austeridade; tem aplicado políticas de rigor. Há uma diferença entre

austeridade e rigor. Austeridade há naquele que tem muitos recursos e não os quer gastar; rigor é o daquele

que aplica os recursos escassos que tem, que é o que nos tem acontecido.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Mas houve tempos em que o Sr. Deputado defendia as medidas de austeridade. A minha colega Cecília

Meireles recordou-me aqui, o que lhe agradeço, um recorte de jornal, uma notícia de setembro de 2010, do

Jornal de Notícias, cujo título é Medidas de austeridade são fundamentais para crescimento económico do

País, diz Vieira da Silva.

Vozes do CDS-PP e do PSD: — Ah!... Aí já eram diferentes!

O Sr. JoséRibeiro e Castro (CDS-PP): — Justificava V. Ex.ª, nessa altura, a esperança de que «o

aumento do IVA de 21% para 23%» e «o corte dos salários da função pública» pudessem «gerar dinâmica na

procura externa». Era esta a convicção do Sr. Deputado.

Vozes do CDS-PP e do PSD: — Ah!... Não me diga! Já não se recorda!

O Sr. JoséRibeiro e Castro (CDS-PP): — No fim do seu discurso, Sr. Deputado, apetece-me, portanto,

responder-lhe com as palavras que o Sr. Deputado, então Ministro, usou nesta conferência. Dizia o Sr.

Deputado, então Ministro Vieira da Silva: «A contestação é algo que faz parte da vivência do regime

democrático. Ao Governo compete fazer o seu trabalho, que é tomar as medidas e chamar a atenção dos

portugueses para os riscos que Portugal correria se as não tomasse».

É isso mesmo que aqui estamos a fazer; mas já num caminho de libertação da rota da dívida e não de

regresso à rampa e ao precipício da ruína, que é onde o discurso do PS nos conduziria.

Portanto, gostaria de perguntar-lhe, no tempo que ainda me resta, qual é, afinal, a política orçamental do

PS em termos europeus. O PS cumpre ou não cumpre o pacto orçamental?

O Sr. João Galamba (PS): — Vocês não cumprem!

O Sr. JoséRibeiro e Castro (CDS-PP): — O PS reconhece ou não que a violação do Pacto de

Estabilidade e Crescimento por vários países conduziu ao quadro que gerou uma crise gravíssima do euro e a

gravíssima crise financeira que ainda estamos a viver? E que daí resultou a necessidade do tratado

orçamental, e não é claro se quer ou não cumpri-lo.

O Sr. João Galamba (PS): — Está enganado, é ao contrário!

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O Sr. JoséRibeiro e Castro (CDS-PP): — Pergunto-lhe isto porque, há dias, a Comissão Europeia pôs

sob aviso cinco governos — cinco governos: da Eslovénia, de Malta, da Áustria, da Itália e da França. Estão

sob aviso e observação.

Vamos ver: a Eslovénia tem um Primeiro-Ministro liberal, de centro-esquerda, Miro Cerar, em coligação

dominante com os socialistas. Em Malta está Joseph Muscat. De que partido é? Trabalhista, da área do PS.

Na Áustria, está Faymann, o Chanceler do SPO, socialista. Em Itália está também um socialista e em França

não é um, mas são dois socialistas, Manuel Valls e François Hollande.

Portanto, se hoje, no Orçamento, seguíssemos também a linha do PS, haveria não cinco, mas seis países

sob observação estrita da Comissão Europeia.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

E o que é que isso significa? Significa, Sr. Deputado, o descrédito em Portugal de novo a aumentar;

significa o rating a cair; significa os juros a subir; significa as condições de financiamento externo a Portugal a

apertar; e significa chamar a troica outra vez.

Os senhores têm saudades da troica!

Significa o segundo resgate, ou melhor, o quarto, porque nesta República, graças a governos do PS, já

tivemos três resgates e não queremos o quarto.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente: — Sr. Deputado Vieira da Silva, tem a palavra para responder.

O Sr. Vieira da Silva (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Ribeiro e Castro, em primeiro lugar, gostaria

de lhe dizer que fico muito satisfeito que a minha intervenção lhe tenha dado a oportunidade para fazer esta

longa intervenção que, provavelmente, teria dificuldade em fazer noutras circunstâncias.

Risos do PS.

Mas, na sua intervenção, não identifiquei muito bem perguntas, apenas um conjunto mais ou menos

desarticulado de afirmações.

Começo, Sr. Deputado, por lhe lembrar — e, em si, parece-me particularmente grave — que a sua

memória recente, ou um pouco mais distante, da História portuguesa está um pouco menos precisa. Quem

chamou o Fundo Monetário Internacional, quem provocou uma crise séria de equilíbrio nas relações externas

de Portugal — é um facto conhecido e indesmentível — foi um governo participado pelo partido que o senhor

aqui representa,…

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Vozes do PSD: — Pelo Teixeira dos Santos!

O Sr. Vieira da Silva (PS): — … aquando do segundo acordo com o Fundo Monetário Internacional.

Portanto, essa história dos três acordos está um bocadinho mal contada.

Mas, Sr. Deputado, se bem entendi a pergunta que me fez, se eu estava satisfeito com a política europeia,

tenho de lhe dizer que não estou. A política europeia que tem sido seguida, desde a eclosão, em primeiro

lugar, da grande recessão e, depois, da crise das dívidas soberanas, tem sido uma política errática, em que a

União Europeia tem, infelizmente, chegado sempre atrasada aos problemas e não tem tido a capacidade de

defender um bem supremo do projeto europeu, que, creio, o Sr. Deputado muito valoriza, que é a coesão

dentro da União Europeia. Nunca, como nos últimos anos, foi tão profunda a divergência cavada e agravada

entre países da União Europeia e entre países da zona euro.

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E pensar, Sr. Deputado, que a responsabilidade é sempre dos mesmos — neste caso é sempre nossa, e

não estou agora a falar do Governo, estou a falar do nosso País — é não compreender não apenas os erros

mas também os interesses que, na União Europeia, têm impedido uma resposta sólida à crise das dívidas

soberanas. É que há quem esteja a ganhar com esta dívida e não são, infelizmente, os países do sul, os

países da periferia e aqueles que mais precisam do projeto europeu para a convergência.

Aplausos do PS.

Sr. Deputado, a austeridade é um tema que poderemos discutir, mas gostaria de lembrar-lhe as palavras

muito recentes do Presidente em transição da União Europeia, quando disse que «aqueles que têm a

expectativa que a austeridade traga o crescimento bem podem esperar sentados» — não foram estas as

palavras exatas, mas foi este o sentido.

É que se a austeridade trouxesse crescimento e emprego não haveria problemas de crescimento e de

emprego na União Europeia, e a União Europeia tem problemas de crescimento, tem problemas de emprego e

tem, acima de tudo, problemas profundos de assimetrias e desigualdades no seu seio. E é a incapacidade de

responder a estes problemas, de os perceber, até, que tem marcado a política deste Governo e da família

política a que o Sr. Deputado pertence.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Prosseguimos com as intervenções desta tarde. A próxima é do PSD.

Tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Pacheco.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e

Srs. Deputados: Em 2015, Portugal vai registar, pelo segundo ano consecutivo, crescimento económico a um

ritmo superior à média da União Europeia.

Em 2015, Portugal vai registar, pelo segundo ano consecutivo, um crescimento do emprego e uma

diminuição do desemprego.

Em 2015, Portugal vai registar um aumento do poder de compra das famílias.

Em 2015, Portugal vai registar um défice das contas públicas abaixo dos 3%: 2,7%, o valor mais baixo da

nossa democracia, saindo do procedimento por défice excessivo.

Em 2015, Portugal vai registar um novo excedente externo, sinal da sua recuperação financeira.

Esta realidade, apresentada no Orçamento do Estado de forma transparente e perfeitamente escrutinada,

como nunca tinha acontecido, é defendida pelo Governo da República e confirmada, mais décima menos

décima, pelas instâncias nacionais e internacionais, independentes do debate político interno.

As oposições e alguns articulistas menosprezam os progressos apresentados no Orçamento do Estado

para 2015, afirmando que são irrealistas e que o futuro é bem mais negro.

Perante esta dúvida, devemos começar por perguntar se os críticos, nomeadamente do PS, do PCP, do

Bloco de Esquerda e de Os Verdes, têm mais credibilidade do que os técnicos do Banco de Portugal, do

Conselho de Finanças Públicas, do Fundo Monetário Internacional ou da Comissão Europeia.

Devemos perguntar ainda por que é que qualquer cidadão não deve confiar nas instâncias independentes,

para acreditar antes nas vozes destes partidos.

Talvez seja útil recordar o que os líderes destes mesmos partidos disseram, há um ano, sobre o Orçamento

do Estado para 2014. Então, desprezando o crescimento, previsto pelo Governo, de 0,8%, argumentaram que

o ano de 2014 seria um novo ano de recessão, de aumento do desemprego, que nos conduziria a um segundo

resgate e à permanência da troica, em Portugal.

A realidade, Srs. Deputados, desmentiu estas previsões fatalistas. Portugal não só teve uma saída limpa do

programa de ajustamento como superou as metas de crescimento e de emprego previstas pelo Governo.

O ocorrido no Orçamento do Estado para 2014 credibiliza, não por convicção mas por factos e pela

realidade concreta, a proposta de Orçamento do Estado para 2015, e descredibiliza todos os que a têm

criticado, pois aqueles que fracassaram nas previsões para 2014 são os mesmos, precisamente os mesmos,

que vêm, de novo, pôr em causa as previsões para 2015.

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Srs. Deputados da oposição, as vossas previsões foram desmentidas pela realidade em 2014 e estamos

convictos de que as vossas previsões voltarão a ser desmentidas pela realidade em 2015, devido ao esforço

deste Governo e dos portugueses, de todos os portugueses, na recuperação do País.

Mas esta questão deve fazer-nos refletir: o que leva a oposição, e, em especial, o PS, a criticar as linhas

orientadoras do Orçamento do Estado para 2015?

Na verdade, no fim de 2010, quando o PS ainda governava Portugal, o País encontrava-se à beira da

bancarrota: estava numa situação iminente de rutura de pagamentos, a prática da desorçamentação era regra

geral, o défice público atingiu, de acordo com os novos critérios do Eurostat, 11,2%, o valor mais alto desde o

25 de Abril, a despesa pública oficial ultrapassou os 50% do PIB.

Hoje, passados três anos de governação desta maioria, quão diferente é a situação! Fruto de um grande

esforço dos portugueses e da forte determinação do Governo, Portugal regista uma evolução: de um défice

externo, passámos a um excedente; as nossas exportações passaram de 28% do PIB para mais de 40% do

PIB, com ganhos reais de quota de mercado; Portugal ganhou 10 pontos no índice de competitividade;

Portugal cresce mais do que a zona euro; o emprego está em recuperação e o desemprego em queda; a

despesa pública primária caiu mais de 11 000 milhões de euros; o combate à evasão e à fraude fiscais é um

sucesso; o défice público terá, no fim desta Legislatura, o valor mais baixo da nossa democracia; o País

apresenta excedentes primários; a dívida pública está controlada; os juros da dívida pública estão em mínimos

históricos; o índice de confiança dos consumidores e dos empresários (sim, Srs. Deputados, não são números

macro), apresenta valores superiores aos registados antes do início da crise.

É este progresso, é esta recuperação da credibilidade que alguns não querem ver, sem nunca dizerem o

que fariam de diferente para alcançar resultados melhores, neste curto espaço de tempo.

É altura de perguntar ao PS, que, ao longo destes três anos, raramente esteve disponível para dar uma

mão ao País, por que está contra este Orçamento. Por acaso, está contra o combate à evasão e à fraude

fiscais que o Governo vem protagonizando e que permitiu, em 2014, um crescimento significativo da receita,

sem qualquer agravamento das taxas dos impostos?

Será que o PS está contra a melhoria do poder de compra das famílias, via aumento do salário mínimo, via

aumento das pensões, via reposição de 20% da redução salarial, via redução do IRS por inclusão do

quociente familiar?

Será que o PS está contra a devolução de parte ou do todo da sobretaxa de IRS aos cidadãos, caso a

receita fiscal em sede de IVA e de IRS fique acima do previsto, numa lógica de a receita extraordinária não

servir para mais despesa mas, antes, para aliviar os contribuintes?

Será que o PS está contra a redução do IRC, que antes consensualizou e que vai permitir um desafogo às

empresas, atrair investimento e criar emprego?

Será que o PS está contra a redução do défice, sabendo que mais défice significa mais dívida e mais

encargos para as gerações futuras?

Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs. Deputados: O debate do Orçamento do Estado

permite uma discussão clara sobre o rumo que cada um propõe para o País.

Do lado do Governo, esse rumo é claro: rigor e responsabilidade, para permitir o crescimento e a melhoria

das condições de vida dos cidadãos. Do lado do PS, só recebemos conversa vaga e vazia, dizer mal só por

dizer, sem conseguir afirmar como, no contexto europeu, assegurava o respeito pelos compromissos do País,

libertava Portugal do procedimento por défice excessivo, diminuía impostos e melhorava o poder de compra

das famílias.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — A realidade é que o presente Orçamento concilia o rigor com a promoção

do crescimento e com a defesa dos mais carenciados.

Assim, são reforçadas as verbas para contratualização com as IPSS em mais de 50 milhões de euros. É

reforçado o orçamento do Serviço Nacional de Saúde. É ampliado o Programa de Emergência Social. São

aumentadas as verbas destinadas à formação profissional. A dedução à coleta do limite das despesas com

saúde, em sede de IRS, passa de 800 € para 1000 €.

É reforçado o programa de educação para adultos e de reintegração de pessoas com deficiência.

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São atualizadas as pensões mínimas para mais de 1,1 milhões de pensionistas. Mantém-se a majoração

do subsídio de desemprego para casais em que ambos os cônjuges estejam desempregados. Alarga-se o

subsídio de desemprego para empresários em nome individual e criam-se mecanismos de proteção social

para pequenos empresários e comerciantes.

Em paralelo, Srs. Deputados, são mantidas as taxas extraordinárias sobre pensões e salários mais

elevados, sobre as empresas com mais lucros, e sobre sectores especiais, nomeadamente a banca, a energia

e a indústria farmacêutica.

Continua a reduzir-se a despesa com as PPP, com as indemnizações compensatórias a empresas públicas

e com a máquina do Estado, a qual vai prosseguir a modernização e a aproximação aos cidadãos a um ritmo

crescente.

Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs. Deputados: Portugal viveu,

nos últimos três anos, um período muito difícil da sua história. A nossa governação esteve tutelada por

entidades externas. Foram muitos os sacrifícios solicitados às empresas e às famílias portuguesas.

Aprender com a história é nosso dever. Evitar repetir os mesmos erros e evitar voltar a confiar nos mesmos

que provocaram esta situação, é a obrigação de todos nós.

O PSD é um partido inconformado e reformista e está ciente das dificuldades que persistem, do muito que

há a fazer para Portugal ser um País mais desenvolvido e mais justo. Mas o PSD também está convicto da

missão cumprida, de Portugal ter sido conduzido a uma saída limpa do programa de ajustamento e de terem

sido lançadas as bases de um processo sustentável de crescimento, de emprego e de melhoria do poder de

compra das famílias.

Talvez seja esta a realidade que assusta a oposição, mas também é esta a realidade que nos leva a dizer,

Deputados do PSD, que estamos muito orgulhosos do trabalho feito e que estamos convictos de um novo ciclo

de esperança para Portugal.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Paula Santos, do

PCP, Mota Andrade, do PS, e Mariana Mortágua, do BE.

O Sr. Deputado Duarte Pacheco responderá em conjunto aos três Srs. Deputados.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Paula Santos.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Duarte Pacheco, começo por lhe fazer já uma

pergunta a propósito do debate que aqui tivemos hoje de manhã. Apesar de o Tribunal Constitucional obrigar à

reposição integral dos salários em 2016, hoje, no debate, ouvimos o Primeiro-Ministro afirmar que, se for

Primeiro-Ministro, será congruente com aquilo que defendeu, ou seja, uma reposição à razão de 20% por ano,

e que, portanto, irá propor que, em 2016, haja uma nova reversão de 20% dos salários para os portugueses.

A questão que lhe coloco é se é esta a perspetiva que o PSD tem, a de que, em 2016, pretende impor

novos cortes nos salários, de 2016 a 2018, sabendo que isso contraria a decisão do Tribunal Constitucional.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Muito bem!

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Deputado, ouvimos a sua intervenção e o que pudemos registar foi que

nada disse sobre o impacto das políticas que este Governo tem vindo a implementar nos últimos três anos,

nomeadamente naquela que é a realidade concreta, na vida das pessoas, naquilo que as pessoas vivem e

sentem todos os dias, nas suas dificuldades em aceder a um conjunto de direitos.

O que podemos concluir é que se trata de uma intervenção com um objetivo, o de branquear as

consequências da política que este Governo prosseguiu nos últimos anos. E essas consequências são bem

claras, Sr. Deputado: desemprego, emigração forçada, nomeadamente dos mais jovens, desigualdades e

empobrecimento.

Pergunto-lhe, inclusivamente, o seguinte, Sr. Deputado: quando disse que tinha orgulho na política e

naquilo que tinha sido feito por este Governo, é disto que tem orgulho, é desta situação concreta, das pessoas

cada vez mais pobres, das pessoas cada vez com mais dificuldades para aceder aos seus direitos?

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O alastramento da pobreza é, portanto, um das faces mais visíveis desta política, que afeta sobretudo as

crianças. Sr. Deputado, perante o facto de 24,4% das crianças estarem em risco de pobreza e de a fome estar

a regressar às escolas, o que é que faz este Governo? Agrava ainda mais a redução das prestações sociais,

com um novo corte de 375 milhões de euros. Mas, sobre isto, não o ouvimos, Sr. Deputado.

Este é também um Orçamento que, com ou sem troica, dá mais um passo no desmantelamento das

funções sociais do Estado. Querem despedir mais 12 000 trabalhadores, e isto vai ter implicações no

desmantelamento dos serviços públicos. Querem transferir competências para as autarquias, numa clara

desresponsabilização do Governo e tratando as autarquias como meros executantes da vossa política.

Querem um corte de 700 milhões de euros na educação, o que contribui para a continuidade da degradação

da escola pública, para mais encerramentos, para mais degradação do parque escolar, para o agravamento da

carência de profissionais nesta área, assim como para a sua precariedade.

Na saúde, vangloriam-se do aumento do orçamento. Mas, Sr. Deputado, isto não é verdade. Não é verdade

porque este orçamento traz novos encargos, nomeadamente com a ADSE, a ADM e a SAD, incorpora um

conjunto de novas entidades no perímetro orçamental, como os hospitais EPE ou as entidades EPE, as

unidades locais de saúde. E, Sr. Deputado, desde 2011, este Governo retirou ao Serviço Nacional de Saúde

mais de 1800 milhões de euros.

O resultado disto também está à vista: adiamento das cirurgias por falta de camas de internamento, como

sucede no IPO do Porto, e internamento de doentes nos corredores por falta de camas, no hospital do

Barreiro.

Por isso, pergunto-lhe: é este o caminho e é este o orgulho que tem nas suas políticas?

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — De facto, hoje as pessoas precisam de cuidados de saúde e não

conseguem aceder por causa da vossa política. Ao mesmo tempo que corta na saúde, na educação e nas

prestações sociais, o Governo transfere para as PPP, só na área da saúde, 840 milhões de euros. É esta a

equidade: corta nos serviços públicos, transfere para as entidades privadas.

Portanto, em relação aos interesses dos grandes grupos económicos, mais uma vez este Governo não

toca. Parece que é algo sagrado.

Antes, justificavam a austeridade e a tomada destas medidas de cortes orçamentais com a crise. Agora,

justificam exatamente as mesmas medidas com a recuperação e com a sustentabilidade, essa

sustentabilidade que, no vosso léxico, tem o significado de privatizações, de cortes orçamentais, de

desresponsabilização.

Pergunto ao Sr. Deputado se a sustentabilidade que pretende é retirar o abono de família a mais de 600 mil

crianças, continuar a haver milhares de estudantes do ensino superior que abandonam os seus cursos por

dificuldades económicas ou quando 1,6 milhões de utentes não têm médico de família.

Estas não são, sem sombra de dúvidas, as nossas opções. Estas são opções que têm levado a que a

saúde e a educação sejam cada vez mais para quem pode pagar. O que está subjacente a esta política, o que

está subjacente aos vossos propósitos é, de facto, uma verdadeira reconfiguração do Estado, em que

pretendem destruir as funções sociais do Estado e ter cada vez mais o Estado a servir os interesses do grande

capital. Nós rejeitamos este caminho, porque é um caminho que viola a nossa Constituição.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — A próxima pergunta é do PS.

Tem a palavra o Sr. Deputado Mota Andrade.

O Sr. Mota Andrade (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.

Deputado Duarte Pacheco, quero dizer-lhe que ouvi a sua intervenção com atenção, que se pautou, de uma

forma muito clara, por ser um estado de negação. É o estado de negação da maioria que acompanha o

Governo. V. Ex.ª disse e reafirmou várias vezes que este não era o Orçamento possível, que este é o

Orçamento certo, o Orçamento de que os portugueses precisam.

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O Sr. Deputado disse outra coisa interessante: que não compreendia porque é que a oposição não vos

acompanhava. No que toca ao Partido Socialista, respondo-lhe de uma forma muito simples: nós não

acompanhamos este Orçamento do Estado pelo aumento enorme que ele contém em termos de carga fiscal.

Esta é uma resposta muito clara da parte do Partido Socialista. Estamos, de facto, contra este Orçamento do

Estado para 2015 em função do aumento da carga fiscal que ele preconiza.

Quero dizer-lhe também que o Partido Socialista não sabe se o corte na educação é de 700 milhões ou de

400 milhões, mas, seja o que for, um corte desta dimensão na área da educação é dramático para o futuro dos

portugueses.

Quero desde já lançar-lhe um repto e espero, aliás, que a maioria não use o rolo compressor que tem

usado em relação a vários diplomas — lembro, recentemente, o diploma do arrendamento urbano.

Passo a referir-me ao imposto municipal sobre imóveis, o IMI. Os números são francos, são claros, são

transparentes: em 2010, o IMI representava 1000 milhões para os portugueses; em 2015, a previsão é a de

que ele represente 1632 milhões, um aumento extremamente significativo, como concordará.

Estivemos, desde a primeira hora, contra esse aumento. Sabemos, aliás, que houve grandes discussões

na maioria e que o Sr. Primeiro-Ministro veio dizer que não se podia mudar o IMI porque esse aumento iria

servir para resgatar câmaras em dificuldades.

Ora, Sr. Deputado, todos sabemos que os portugueses foram, durante anos, levados a comprar a sua

habitação, todos nós sabemos que o anseio dos portugueses era ter habitação própria e agora rebenta-lhes na

sua habitação esta bomba-relógio.

Deixo, portanto, o seguinte repto: VV. Ex.as

estão ou não de acordo que, em sede de especialidade, seja

criada uma cláusula de salvaguarda para levantar este problema, para terminar com essa ansiedade que a

maior parte das famílias portuguesas têm em relação ao que vão ter de pagar de IMI em 2015? Esta é uma

proposta muito clara que aqui lhe deixo.

Também o questiono sobre a fiscalidade verde: porque é que a fiscalidade verde e tudo o que lhe diz

respeito só será lei depois da votação do Orçamento do Estado? Será que a fiscalidade verde irá só ter um

aumento — e já é muito! — de 165 milhões, como o Governo diz? Ou, então, essa fiscalidade verde, como diz

o Presidente da Galp, vai representar para os portugueses 346 milhões de aumento de impostos? Os

senhores estão ou não dispostos a antecipar a votação desse diploma para ele entrar corretamente, e não

depois, nas previsões do Orçamento do Estado para 2015?

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Para colocar a próxima pergunta, pelo Bloco de Esquerda, tem a palavra a Sr.ª

Deputada Mariana Mortágua.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Duarte Pacheco, o Orçamento que o

Governo aqui nos apresenta descredibiliza-se a si próprio — não é preciso que ninguém o descredibilize —, da

mesma forma que os anteriores se descredibilizaram. Não preciso de recordar-lhe as previsões que o

Memorando de Entendimento fazia, nem a primeira, nem a segunda, nem a terceira, nem a quinta revisão

deste Memorando e como todas elas falharam.

Não preciso de lhe recordar as previsões estrondosas do Governo relativamente ao défice, que foi sempre

maior do que o esperado, suscitando sempre orçamentos retificativos.

Não preciso de lhe recordar como o desemprego desceu muito mais fundo do que aquilo que seria

esperado pelo Governo.

Não preciso de lhe recordar como o PIB caiu muito mais e o investimento caiu muito mais do que aquilo

que era esperado pelo Governo.

Não preciso de lhe recordar que o Governo nunca admitiu, mas esta é a verdade, que a austeridade tem

impactos profundíssimos na sociedade que nunca foram tidos em conta quando foram feitas as previsões.

Não preciso de lhe recordar que a dívida não parou de aumentar desde que o PSD e o CDS chegaram ao

Governo e que hoje pagamos mais 8000 milhões por juros da dívida, que é quase o equivalente a todo o

Serviço Nacional de Saúde de um país.

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Não preciso de lhe recordar que este Orçamento apresenta exatamente a mesma austeridade, os mesmos

cortes do passado, mas mais impostos: mais impostos indiretos, mais impostos sobre o consumo, mais

impostos sobre os combustíveis, mais impostos sobre os imóveis e a habitação. É o mesmo, mas com mais

impostos.

A maioria recusa-se a admitir que esta austeridade destrói o País, destruiu a economia e está a destruir a

Europa. Não é por acaso que a Europa está à beira de uma terceira recessão. Não consegue perceber que a

austeridade destrói as economias. Trata-se de uma recessão europeia que, aliás, coloca em causa as próprias

previsões do Governo relativamente à procura externa. É o próprio Conselho de Finanças Públicas que diz

que as previsões são otimistas, que Portugal não vai exportar aquilo que o Governo diz que vai exportar. E a

isto adiciona-se o facto de a OCDE, a Fitch ou a Católica dizerem também que as previsões de crescimento

são otimistas.

O cenário macroeconómico apresentado por este Governo não faz sentido, não é credível.

Aquilo que temos à nossa frente, depois de quatro anos de austeridade, é o mesmo modelo produtivo, uma

balança de bens que não é positiva — é a balança de serviços, que foi atacada por este Governo, que é

positiva — e a exportação de mercadorias não é o sucesso que os senhores vendem. Trata-se de uma

economia baseada no consumo interno, com um setor produtivo que estruturalmente não mudou, que continua

baseada em baixos salários e em atividades de pouco valor acrescentado e pouco qualificadas. Não seria de

esperar outra coisa, porque a política deste Governo foi a de baixos salários e a de desinvestir na educação,

desinvestir na qualificação.

A somar a esta falência do modelo produtivo há um conjunto de medidas antissociais. A primeira medida

fiscal que Governo se lembrou de aplicar foi a de descer o IRC sobre as grandes empresas. O Sr. Primeiro-

Ministro vem aqui dizer que era para ajudar o tecido empresarial e produtivo, mas nunca diz que as pequenas

e médias empresas não pagam IRC porque não têm lucros suficientes para o pagar. Quem paga IRC são os

grandes grupos económicos. São esses que pagam IRC e são esses que foram beneficiados duas vezes.

Aquilo que as pequenas empresas nos pedem quando vêm ao Parlamento é que se baixe o IVA da

restauração, que se baixem os impostos indiretos, que se desça o IVA sobre a eletricidade, que se baixem os

impostos sobre os combustíveis. É isso que as empresas querem. Mas, ao contrário, o Governo apenas dá

benefícios às grandes empresas e aos grandes interesses económicos.

O contraponto a esta política é muito simples — e não vou deixar de responder à questão que nos colocou

quando disse que se sentia orgulhoso com este Orçamento do Estado e com esta política. Pergunto: sente-se

orgulhoso de um País em que aumentam 10 000 milionários por ano mas em que aumenta, em proporção, a

taxa de pobreza? Sente-se orgulhoso por ter um País como Portugal onde a percentagem de crianças

carenciadas é de 27,4%, sendo a média na zona euro de 10%? Sente-se orgulhoso por ter o dobro de

crianças carenciadas do que é a média europeia? Sente-se orgulhoso por ter um gasto público em prestações

sociais que é de metade do da média europeia quando tem o dobro da pobreza?

Estas são as consequências da austeridade. As consequências da austeridade são as de um País mais

pobre, com mais precariedade, com mais emigração, com menos perspetivas de futuro e não há nenhuma

sustentabilidade, não há nenhuma perspetiva de um futuro melhor nos dados sociais que nos apresentam, que

não são apenas as fantasias de cenários macroeconómicos do Orçamento do Estado!

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Pacheco.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Mota Andrade e Sr.as

Deputadas Paula

Santos e Mariana Mortágua, agradeço as questões que colocaram.

Deixo uma primeira nota sobre a credibilidade do Orçamento que aqui foi questionada mais uma vez pelos

Srs. Deputados do Bloco de Esquerda. Compreendo que a Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, que há um ano

não estava neste debate, não se recorde do que foi dito, aqui, pelos seus colegas.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Estava, sim!

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O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — A Sr.ª Deputada Catarina Martins dizia que iriamos ter um Orçamento do

Estado para 2014 que nos levava a um segundo resgate, a uma nova troica, mais ou menos a um programa

cautelar.

Sabe, Sr.ª Deputada, toda a oposição tinha a mesma bitola. O Sr. Deputado Paulo Sá também dizia: «O

Governo prevê um crescimento de 0,8% do PIB, mas esta é uma estimativa propositadamente otimista para

tentar criar a ilusão de que, depois, a austeridade vai dar a recessão. Chame-lhe o que quiser: segundo

resgate, programa cautelar ou outro nome qualquer vai ser a realidade».

Dizia também, na altura, o Sr. Deputado José Luís Ferreira, de Os Verdes: «O objetivo para que aponta o

crescimento do PIB em 0,8% não é propriamente um objetivo, mas uma miragem».

Srs. Deputados, miragem foram as vossas previsões. A realidade foi muito melhor do que isso, devido ao

esforço dos portugueses e devido à determinação do Governo. Quanto a credibilidade, estamos, pois,

conversados!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Srs. Deputados, só não vou buscar as declarações do Partido Socialista porque já foram aqui referidas,

tanto do antigo como do novo PS, e são todas iguais.

Quanto ao que o Sr. Deputado Mota Andrade questionou, diria o seguinte: a perceção que eu tenho e

penso que a generalidade dos portugueses tem é a de que, fosse qual fosse o Orçamento, dissesse o que

dissesse, propusesse o que propusesse, os senhores diriam mal e votavam contra. Essa, infelizmente, é a

realidade. Foi isso que os senhores nos mostraram ao longo destes três anos. E porquê? Porque, mesmo

depois de se terem comprometido com o Memorando de Entendimento, quando era apresentada uma

proposta de lei concreta a implementar aquilo que tinham assinado, os senhores procuravam uma vírgula fora

do sítio para poderem dizer que estavam contra.

Portanto, Srs. Deputados, se lá tivéssemos a os senhores iam à procura do b, e se lá tivéssemos b os

senhores iam à procura do c, porque os senhores não estão interessados em ajudar o País a sair

definitivamente do programa que tivemos e a termos uma vida melhor. Os senhores estão, pura e

simplesmente, interessados em dizer mal por dizer mal. É essa a vossa política tout court.

Foram ainda colocadas questões sobre o IMI e sobre os salários.

Quanto ao IMI, em primeiro lugar, a avaliação do património foi incluída no Memorando de Entendimento

pelo Partido Socialista — é bom recordar.

Em segundo lugar, quem introduziu a cláusula de salvaguarda, nesta Casa, com o voto contra do Partido

Socialista, foram os partidos da oposição — esqueceram-se rapidamente dessa nota.

Em terceiro lugar, prevê-se neste Orçamento um alargamento das isenções e não ouvi uma única palavra

de saudação.

Em quarto lugar, as melhorias podem ser sempre feitas e, por isso estamos, sempre a trabalhar porque

queremos sempre mais e melhor.

Finalmente, Sr.ª Deputada, quanto aos cortes salariais, cabe ao futuro governo perceber, depois de

eleições livres, como é que vai implementar a decisão do Tribunal Constitucional. Mas nós não fugimos às

nossas responsabilidades e, por isso mesmo, quando aqui foi apresentado o documento de estratégia

orçamental, dissemos qual era a intenção deste Governo, porque não queremos voltar a uma situação de

rutura financeira.

Propusemos, de uma forma clara, que essa reposição ocorresse ao longo de cinco anos. Essa proposta foi

feita antes da decisão do Tribunal Constitucional, ou seja, em maio, no documento de estratégia orçamental.

Estamos de cara bem levantada, porque colocamos sempre os interesses do País acima de qualquer

interesse partidário.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Sá.

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O Sr. Paulo Sá (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Este Orçamento do

Estado representa uma tentativa de prosseguir, não só em 2015, mas durante décadas, a política de

exploração e de empobrecimento dos PEC e do programa da troica.

O Governo repete até à exaustão que o País está melhor, que entrámos num período de crescimento

económico e de criação de emprego, que o défice orçamental está controlado e que a dívida pública irá

finalmente diminuir, mas, simultaneamente, continua a impor medidas de empobrecimento dos trabalhadores e

do povo.

Confirmando esta contradição insanável entre o seu discurso e as suas opções políticas, o Governo

apresenta uma proposta de orçamento que confisca salários e pensões, promove o desemprego e a

precariedade, prossegue o desmantelamento das funções sociais do Estado e dos serviços públicos, agrava

ainda mais a insuportável carga fiscal que recai sobre os trabalhadores e o povo, acentua o ataque ao poder

local e à sua autonomia e consagra a criminosa política de privatização de empresas e setores estratégicos da

economia nacional.

É um Orçamento que soma mais de 1200 milhões de euros de austeridade adicional à já difícil situação em

que se encontra o País e as vidas dos trabalhadores e do povo.

Impossibilitado pelo Tribunal Constitucional de cortar os salários como pretendia, o Governo mantém

congelados os salários na Administração Pública até 1500 € e aplica, a partir desse valor, novos cortes que

podem ir até 8%.

O Governo empurra milhares de trabalhadores da Administração Pública para a chamada requalificação —

antecâmara do despedimento — e, por essa via, aplica-lhes um corte de, pelo menos, 60% nos seus salários.

Insiste nos cortes dos suplementos remuneratórios, do subsídio de refeição, das ajudas de custo e da

remuneração do trabalho suplementar e trabalho noturno; renova os aumentos dos descontos para ADSE,

SAD e ADM e prossegue com o seu objetivo de destruição de mais 12 000 postos de trabalho na

Administração Pública, número que ultrapassa os 100 000 no período compreendido entre 2010 e 2015.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. Paulo Sá (PCP): — Impossibilitado pelo Tribunal Constitucional de aplicar nas pensões os cortes que

pretendia por via da contribuição de sustentabilidade, o Governo insiste em novos cortes nas pensões de valor

mais elevado, para as quais os pensionistas fizeram os seus descontos ao longo de uma vida de trabalho e

renova o congelamento da generalidade das pensões.

O Governo prevê várias medidas que dão expressão ao aumento da idade da reforma por via do chamado

fator de sustentabilidade; insiste no corte dos complementos de pensão dos reformados das empresas

públicas; congela o valor das prestações sociais por via da não atualização do indexante dos apoios sociais.

Através da imposição de um teto máximo, o Governo corta 100 milhões de euros nas prestações sociais.

Com este Orçamento do Estado, o Governo prossegue a política de redução do investimento público. Não

é possível obter um crescimento sustentável do PIB em torno dos 3% se o investimento representar menos do

que 25% do PIB e o investimento público for inferior a 5%. Para 2015, o Governo prevê um investimento global

e um investimento público muito abaixo destes limiares, não permitindo sustentar um crescimento adequado

às necessidades de desenvolvimento nacional.

O Governo prossegue ainda a política de estrangulamento financeiro e de desmantelamento dos serviços

públicos e das funções sociais do Estado; encerra serviços públicos e corta 8,3% nos orçamentos da

educação e do ensino superior, 0,7% nos serviços públicos de saúde e 1,4% na solidariedade, emprego e

segurança social, ao mesmo tempo que aumenta as verbas para os negócios privados feitos com dinheiros

públicos do Orçamento do Estado.

Os brutais sacrifícios impostos aos trabalhadores e ao povo em nome das imposições da União Europeia,

do equilíbrio das contas públicas ou com a justificação das dificuldades económicas que o País enfrenta

contrastam com o favorecimento do grande capital.

Com este Orçamento do Estado, continua a transferência maciça de recursos públicos para os grandes

grupos económicos e financeiros por via dos 8200 milhões de euros em juros da dívida pública, dos 1300

milhões de euros em parcerias público-privadas e dos 3900 milhões de euros comprometidos com o BES.

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Com este Orçamento do Estado, o Governo prossegue a entrega ao grande capital, por via das

privatizações ou das concessões de empresas públicas estratégicas, acrescentando-se agora a TAP ao já

extenso rol, que inclui a STCP, Metro do Porto, Carristur, Metro de Lisboa, CTT, REN, Caixa Seguros, EMEF e

CP Carga.

Sr.ª Presidente Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, com esta proposta de Orçamento, o Governo

leva mais longe a opção de utilizar a política fiscal como instrumento de agravamento das desigualdades e de

empobrecimento dos trabalhadores, concedendo, em sentido contrário, ainda mais benefícios ao grande

capital.

O Governo optou por agravar a carga fiscal que incide sobre os rendimentos do trabalho, ao mesmo tempo

que reduz, pelo segundo ano consecutivo, a taxa de imposto sobre os lucros das empresas, sem adiamentos,

nem condições, como as que são estabelecidas para a devolução da sobretaxa de IRS.

A redução da taxa de IRC, associada ao aumento do número de anos em que é possível fazer reporte de

prejuízos e a outros instrumentos de planeamento fiscal agressivo introduzidos com a reforma do IRC, levará a

uma redução dos impostos pagos pelas grandes empresas e pelos grandes grupos económicos. É o próprio

Governo a admitir que, em 2015, a receita de IRC representará apenas 35% da receita de IRS, um valor que

há apenas alguns anos ultrapassava os 60%.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Bem lembrado!

O Sr. Paulo Sá (PCP): — A carga fiscal que incide sobre os rendimentos dos trabalhadores e do seu

consumo sofrerá, em 2015, um aumento de 4,7%. Só em sede de IRS e de IVA são 947 milhões de euros

adicionais.

Em apenas três anos — 2013, 2014 e 2015 —, o Governo pretende arrecadar 11 mil milhões de euros

adicionais em sede de IRS, por via do brutal aumento deste imposto concretizado em 2013.

O suposto alívio fiscal resultante de uma eventual devolução da sobretaxa em 2016 é um embuste! Na

realidade, as condições para que a sobretaxa seja devolvida são tão difíceis de cumprir que é pouco provável

que ocorra qualquer devolução. Mas, mesmo que isso venha a acontecer, para devolver 100 milhões de euros

da sobretaxa, em 2016, seria necessário cobrar, em 2015, cerca de 27 760 milhões de euros em IRS e IVA.

A reforma do IRS, apresentada pelo Governo como amiga das famílias, não ilude o brutal aumento da

carga fiscal sobre os rendimentos dos trabalhadores, que foi imposto em 2013 e mantido desde então. É o

próprio Governo que vem desmentir a sua propaganda ao introduzir, à última hora, uma cláusula de

salvaguarda, confirmando que para a maioria das famílias a reforma do IRS se traduziria em mais um aumento

de impostos.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. Paulo Sá (PCP): — É um aumento de impostos que se consumará por outra via, a da fiscalidade

verde, em que as preocupações de ordem ambiental não passam de um mero pretexto para tributar

adicionalmente os trabalhadores e o povo.

Algumas famílias poderão não ser prejudicadas, no curto prazo, com a reforma do IRS, mas todas pagarão,

desde já, o aumento de impostos da fiscalidade verde, com a agravante de o aumento dos impostos indiretos

ir aprofundar as injustiças fiscais, uma vez que estes impostos não têm em conta os rendimentos dos

contribuintes.

O Governo e a maioria PSD/CDS, que o suporta, tendo estabelecido como objetivo a redução ou mesmo a

eliminação das funções sociais do Estado, contrapõem despesa pública à carga fiscal, tentando iludir, em

abstrato, que não há impostos a mais, o que há é um peso fiscal insuportável e crescente sobre os

rendimentos dos trabalhadores.

O País precisa de uma política fiscal mais justa, como aquela que o PCP propõe, que, assegurando as

funções sociais do Estado e o investimento público, alivie a carga fiscal sobre os trabalhadores e o povo,

assim como sobre as micro e pequenas empresas e, ao mesmo tempo, rompa com o escandaloso

favorecimento da banca e dos grupos económicos.

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Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, ao mesmo tempo que corta salários, pensões

e prestações sociais, que esmaga os trabalhadores com uma insuportável carga fiscal, que ataca as funções

sociais do Estado e que encerra serviços públicos, o Governo continua a canalizar avultados recursos públicos

para o pagamento de juros da dívida pública.

Em 2015, os juros ascenderão já a 8200 milhões de euros, prevendo a Comissão Europeia que Portugal

tenha de pagar, no período de 2014 a 2020, um total de 60 mil milhões de euros em juros.

Apesar de o Governo proclamar que um dos objetivos centrais do programa da troica é a redução da dívida

pública, a verdade é que, desde 2010, ela aumentou mais de 51 000 milhões de euros, excedendo em muito

qualquer limiar de sustentabilidade.

Defende o Governo que é possível reduzir a dívida pública para 60% do PIB, mas omite que este objetivo

só poderia ser alcançado à custa da imposição, durante décadas, de brutais medidas de austeridade, como as

que têm sido aplicadas no âmbito dos PEC e do programa da troica.

Para garantir chorudos lucros aos que especularam com a dívida soberana, o Governo não hesita em

condenar o País e os portugueses a um empobrecimento sem fim.

Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, a proposta de Orçamento do Estado para 2015

confirma a impossibilidade de resolver os graves problemas nacionais, insistindo na política de direita que nos

conduziu a esta situação.

O PCP apresentará um conjunto de propostas de alteração ao Orçamento do Estado que afirmam a rutura

com esta política de exploração, empobrecimento e desastre nacional.

São propostas que, valorizando o trabalho e os trabalhadores, defendendo as funções sociais do Estado e

os serviços públicos e concretizando uma política fiscal mais justa, apontam para uma política alternativa

verdadeiramente ao serviço do povo e do País. São propostas que convergem com a luta dos trabalhadores e

do povo, de todos os democratas e patriotas, para a derrota deste Governo.

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Semedo.

O Sr. João Semedo (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs.

Deputados: Permitam-me que comece com uma breve referência a uma parte importante da discussão de hoje

de manhã, pois pela sua importância e pela sua gravidade não pode deixar de merecer uma referência política

da minha parte.

Não se tratou de um lapso, de uma distração, de um esquecimento, de um equívoco do Sr. Primeiro-

Ministro. Não! O Sr. Primeiro-Ministro teve oportunidade de corrigir as suas palavras, caso se tivesse tratado

de um equívoco, porque quer o Deputado Luís Fazenda, quer a Deputada Mariana Aiveca lhe deram a

oportunidade de o corrigir, mas não foi isso que aconteceu.

O Sr. Primeiro-Ministro repetiu novamente o que tinha dito: se ganhar as eleições, Pedro Passos Coelho

sente-se mandatado para não respeitar a decisão do Tribunal de Contas e manter os cortes na função pública

em 2016.

O Primeiro-Ministro não fez um anúncio, fez, sim, uma ameaça a todos os funcionários públicos. Deu uma

garantia de que vai continuar a austeridade, mesmo que para tal seja necessário violar a lei e desrespeitar o

Tribunal Constitucional.

Este episódio tem a vantagem política de ficarmos a saber o que fará Pedro Passos Coelho caso ganhe as

eleições no próximo ano. Fica agora por saber o que pensa, o que dirá e o que fará o Partido Socialista sobre

os cortes dos salários na Administração Pública.

Vozes do BE: — Muito bem!

O Sr. João Semedo (BE): — Sr.as

e Srs. Deputados, o Orçamento de Estado é o momento em que o

Governo apresenta e define as suas prioridades políticas.

Tratando-se, neste caso, do último Orçamento desta Legislatura está na hora, também, de fazer o balanço

destes quatro anos. Digamos que é este o momento para acertar as contas destes quatro anos; não apenas

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as contas que fazemos ao estado em que a Nação se encontra, mas também as contas àquilo que esta

maioria prometeu e aos resultados efetivos da sua política: política de rendimentos, política fiscal, política

laboral, o mesmo é dizer austeridade, saque fiscal, selvajaria laboral. É disso que vou tratar de seguida.

Foi em nome da dívida que todos os sacrifícios foram sendo justificados, a começar pelo maior sacrifício de

todos: o empobrecimento do País e dos cidadãos.

Foi em nome da captação do investimento estrangeiro que, no momento em que todos os impostos

subiam, este Governo baixou duas vezes os impostos sobre os lucros das empresas.

Foi em nome de uma suposta competitividade e em nome do investimento estrangeiro que todos os direitos

laborais foram sendo retirados.

Comecemos, então, pela dívida. Com a economia subjugada por anos e anos de austeridade, com o

rendimento dos cidadãos posto em causa pelo desemprego, aumento de impostos e cortes salariais, mais os

cortes verificados nos serviços públicos e nas prestações sociais, a dívida, Sr.as

e Srs. Deputados, nunca

cresceu tanto, encontrando-se no final deste ano mais 13 pontos acima do previsto no Memorando da troica.

Falamos de 20 000 milhões de euros a mais!

Primeira conclusão: os sacrifícios foram em vão! A austeridade comprometeu a vida dos cidadãos e até a

própria saúde das contas públicas.

Segundo ponto: depois de ter aumentado todos as taxas e impostos, do IRS ao IVA, do IMI às taxas e aos

impostos sobre os combustíveis, das taxas moderadoras ao preço dos transportes, o Governo, como já disse e

repito, diminuiu, por duas vezes, o imposto sobre os lucros das empresas, primeiro de 25% para 23% e, agora,

de 23% para 21% neste Orçamento.

O Governo disse que o fazia para tornar o País mais amigo do investimento estrangeiro. E a pergunta que

fazemos, Sr.as

e Srs. Deputados, é: qual foi o resultado? Não vemos nenhum investimento estrangeiro

significativo. Os números oficiais, de resto, demonstram que os vistos gold que, como sabem, é dinheiro não

reprodutivo e que não gera postos de trabalho, mesmo esses representam o maior quinhão do investimento

estrangeiro. Investimento estrangeiro na economia não existiu!

Segunda conclusão: a diminuição do IRC teve apenas como resultado o aumento da injustiça fiscal e o

aumento de lucros das grandes e das maiores empresas! Este Governo sabe para quem governa e a política

fiscal que desenvolve é o retrato fiel da forma como tem privilegiado os grandes interesses e prejudicado quem

vive do seu trabalho.

Terceiro ponto que quero abordar: no mundo do trabalho, o Governo não se limitou, como se isso fosse

pouco, a baixar salários, aumentar os dias de trabalho e a retribuição paga pelas horas extra; acabou,

literalmente, com a contratação coletiva, impôs a lei do mais forte no banco de horas e aumentou o horário de

trabalho na função pública.

Mas o Governo ainda foi mais longe e multiplicou os mecanismos para garantir o trabalho gratuito,

perpetuar os estágios pagos pelo Estado, estratagema, apenas, para conseguir adulterar as estatísticas do

desemprego mais favoráveis ao Governo.

São, hoje, mais de 60 000 pessoas a trabalhar quase gratuitamente e sem nenhuma perspetiva de

qualificação ou de vir a encontrar emprego. 60 000 pessoas a ocupar os lugares no Estado que o Governo fez

vagar com uma política desenfreada de despedimentos na Administração Pública.

Terceira conclusão: Nem trabalho, nem direitos, nem salário! O Governo instaurou o regime do «vale tudo»

no trabalho e a precariedade é a regra para o Governo. Perderam-se, entretanto, quase meio milhão de postos

de trabalho e muitos deixaram de dar lugar à retribuição de um salário. Para a direita, trabalhar passou a ser

uma ocupação. Para a direita, emprego com direitos é coisa do passado.

Sr.as

e Srs. Deputados, este Orçamento de Estado não vai no caminho que o País precisa. Confrontados

com o fracasso das promessas efetuadas pelo Governo, PSD e CDS, no entanto, continuam a teimar e a

insistir no desastre da austeridade.

O Bloco de Esquerda não deixará de, ao longo deste debate, apresentar a sua alternativa: uma política

fiscal que deixe de sobrecarregar quem vive dos rendimentos do trabalho e tribute os que sistematicamente

têm escapado por entre os pingos da chuva — os rendimentos do capital e os rendimentos do património;

acabar com benefícios e isenções fiscais indevidos às empresas. São milhares de milhões de euros que,

sendo cortados às despesas sociais, servem apenas para alimentar o capital especulativo.

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O País gasta mais em juros que em despesas de educação e, apesar disso, o Governo recusa-se a bater o

pé aos credores, aos mercados e à Comissão Europeia.

É preciso quebrar com o Tratado Orçamental, é preciso reestruturar a dívida, libertando recursos para o

investimento na economia, na administração e nos serviços públicos em políticas ativas de emprego.

É necessário travar e reverter a política de privatizações e colocar o setor financeiro ao serviço da

economia e dos interesses do País, por isso propomos a nacionalização do Novo Banco, única solução que

melhor acautela os interesses das contas públicas do País.

É necessário, ainda, restituir direitos sociais e combater a precariedade.

As prioridades deste Orçamento, Sr.as

e Srs. Deputados, permitem perceber bem para quem governa a

direita. Este Orçamento não engana! Os grandes interesses económicos agradecem mais esta borla do PSD e

do CDS.

Ao contrário, os portugueses que vivem do seu trabalho ou da sua reforma, aqueles que este Orçamento

põe a pagar mais impostos por menos serviços públicos, esses suspiram pelo dia em que se verão livres deste

Governo. A esses todos dizemos: estamos convictos de que já falta pouco!

Sr. Primeiro-Ministro, não nos venha hoje pedir desculpa. Já não há desculpa que lhe valha!

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs.

Deputados: É verdade que o Orçamento do Estado para 2015, nas suas linhas essenciais, se confunde com

os anteriores Orçamentos apresentados por este Governo. Trata-se de um Orçamento de austeridade, de

continuação dos sacrifícios e de aumento de impostos para quem trabalha.

E, ao contrário do que afirma o Sr. Vice-Primeiro-Ministro, o facto inédito deste Orçamento de Estado não

reside no objetivo do défice; o único facto inédito neste Orçamento é que, ao contrário dos outros Orçamentos

do Governo PSD/CDS, este não esteve submetido a quaisquer condicionantes externas.

Ora, tendo sido elaborado sem a troica e mantendo o Governo as mesmas políticas de austeridade,

significa que o Governo andou três anos a enganar os portugueses ao criar-lhes a expectativa de que, com a

saída da troica, tudo voltaria ao sítio. Afinal, a troica foi embora, mas as políticas ficaram e nada foi ao sítio!

E a única leitura possível é que o Governo pretende, de facto, transformar em definitivos os cortes que

foram sempre anunciados e apresentados como provisórios.

Diz o Sr. Vice-Primeiro-Ministro que «a fixação do objetivo de 2,7% para o défice de 2015 é um facto

inédito nos últimos 40 anos». Não, Sr. Vice-Primeiro-Ministro, não é! Em 2007, o défice foi de 2,6%!

Mas, para além disso, estamos a falar do objetivo e não do resultado e, se atendermos às disparidades ou

à distância entre os objetivos e os resultados orçamentais dos últimos três anos, o que seria, de facto, inédito

era o Governo cumprir as metas orçamentais que constam deste Orçamento do Estado. O que seria inédito

era que o Governo nos apresentasse um Orçamento que respeitasse a nossa Constituição, porque, até ao

momento, este Governo ainda não foi capaz de fazer aprovar um único Orçamento do Estado dentro das

normas constitucionais. Nem um até ao momento!

E se, por hipótese académica, o Sr. Primeiro-Ministro continuasse em funções depois das eleições — há

um «se», porque é pouco provável que continue —, ficámos hoje a saber que o Orçamento para 2016

continuaria a ser apresentado à margem da Constituição, porque o Sr. Primeiro-Ministro pretenderia insistir na

devolução dos salários a conta-gotas, quando o Tribunal Constitucional já disse que o que falta devolver nos

cortes salariais é para devolver na totalidade no ano de 2016.

Inédito seria se o Governo pensasse mais nas pessoas e menos nas grandes empresas.

Inédito seria se o Governo aliviasse a pressão fiscal sobre as famílias, em sede de IRS, em vez de descer

o IRC para as grandes empresas.

Inédito seria se este Orçamento não somasse cortes aos cortes dos últimos anos nas políticas sociais,

nomeadamente na educação, na justiça, mas também na segurança social.

Inédito seria se o Governo não continuasse na saga do encerramento de escolas e na redução de

professores.

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Inédito seria se o Governo devolvesse a totalidade do que retirou aos trabalhadores da Administração

Pública e não se ficasse apenas pelos 20% do total que retirou.

Inédito seria se o Governo não continuasse nesta onda de privatizações ou concessões de todas as

empresas públicas que interessam aos senhores do dinheiro, nomeadamente da TAP, da EGF, da STCP, da

Metro do Porto, da Carris, da Metro de Lisboa, dos CTT, da REN, da Caixa Seguros, da EMEF, da CP Carga,

e por aí fora.

Inédito seria se este Orçamento procurasse combater o desemprego.

Inédito seria se o Governo não pretendesse diminuir mais uns milhares de postos de trabalho, tanto da

administração central, como da administração local, como no setor empresarial do Estado.

Inédito seria se este Orçamento refletisse um esforço ao nível do investimento público, que, aliás, tem um

crescimento inferior ao da variação do PIB.

Inédito seria se o Governo investisse nos serviços públicos e melhorasse as condições de vida dos

cidadãos, que hoje se deparam com uma gritante injustiça. Aliás, à maior carga fiscal de que há memória,

corresponde menos investimento nos serviços públicos.

Inédito seria se este Orçamento não viesse aumentar as ingerências e agravar as restrições à autonomia e

à gestão do poder local.

Inédito seria se o Governo não tratasse as autarquias locais como órgãos desconcentrados do Governo.

E inédito seria se o Governo assumisse as funções sociais do Estado e procurasse com este Orçamento

promover a justiça social.

Mas, infelizmente, o único facto inédito deste Orçamento é que ele foi elaborado sem a sombra da troica e

as desculpas do Governo para justificar os sucessivos cortes nos salários, nas pensões e nos apoios sociais,

bem como as desculpas para o brutal aumento da carga fiscal sobre as famílias esfumaram-se da noite para o

dia com a saída da troica.

Termino, citando o Conselho Económico e Social quando voltou a insistir «na necessidade de reduzir a

carga fiscal sobre as famílias, tendo como objetivos a diminuição das grandes desigualdades fiscais e a

dinamização da procura interna e do mercado doméstico» — é o que diz o Conselho Económico e Social no

parecer sobre as Grandes Opções do Plano para 2015.

E, agora, dizemos nós: os portugueses exigem e têm direito a uma política alternativa que promova o

crescimento, melhore as condições de vida das famílias, combata o desemprego, dinamize o investimento

público e a procura interna e, sobretudo, que promova a justiça social.

Não é nada disso que acontece com este orçamento do Estado para 2015.

Aplausos de Os Verdes e do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Está agora inscrito o Governo.

Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças.

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças (Maria Luís Albuquerque): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados:

A apresentação de uma proposta de Orçamento do Estado no Plenário da Assembleia da República é um dos

momentos mais marcantes do exercício da governação e do escrutínio democrático por parte dos

representantes eleitos dos cidadãos. É um tempo de balanço sobre o que já foi executado pelo governo em

funções e de perspetivar um novo ano e a continuidade ou mudança das políticas propostas.

É, assim, o momento ideal para um debate aberto e construtivo sobre o que nos une e o que nos separa na

visão do País, legitimados que todos estamos para o papel que nos cabe desempenhar. É o momento para

esclarecer dúvidas e debater propostas, revelando com clareza aos portugueses o que o Governo e cada um

dos partidos com assento parlamentar defende e propõe. É o momento para estabelecer consensos e marcar

diferenças, com seriedade e convicção.

A proposta de Orçamento do Estado para 2015 é a primeira que apresentamos no pós-programa. É um

Orçamento de responsabilidade e de rigor que assegura um défice abaixo de 3% do PIB pela primeira vez

desde a adesão ao euro. Reconhece e consolida as conquistas dos portugueses nos últimos três anos, em

que o esforço de ajustamento foi intenso, mas será executado com aceleração do crescimento económico,

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redução do desemprego, recuperação do poder de compra, mais competitividade e maior autonomia, sempre

no respeito pelos compromissos assumidos.

Cada proposta de Orçamento do Estado continua a construir sobre as bases do anterior e determina a

trajetória dos que se lhe seguirão.

Por isso, tanto como gerir o ano de 2015, este Orçamento assegura a consolidação de um caminho de

crescimento sustentado, assente em finanças públicas progressivamente mais equilibradas e abre caminho a

um orçamento de 2016 num contexto de maior estabilidade.

O processo orçamental é hoje mais transparente; as contas públicas são sujeitas a maior escrutínio; a

desorçamentação do passado deixou de ser possível; os procedimentos de monitorização internos foram

reforçados; e o combate à fraude e evasão fiscais é significativamente mais eficaz. Não mais qualquer governo

que assuma funções encontrará surpresas nas contas públicas, ou quem se propõe governar poderá invocar o

desconhecimento da sua real situação para não apresentar propostas concretas.

O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Muito bem!

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — Muito já foi feito — em termos de consolidação orçamental,

em termos de processo orçamental e em todas as outras dimensões do Programa de Ajustamento. Porém, o

ajustamento não está ainda completo. Exige-se, assim, que o primeiro Orçamento pós-Programa tenha o

mesmo rigor dos anteriores e, sobretudo, que continue a promover a sustentabilidade das finanças públicas.

Porque este é o objetivo último do ajustamento — não se trata apenas de reduzir o défice orçamental, trata-se

de avançar para o equilíbrio orçamental, gerar excedentes primários e garantir a sua manutenção. Porque o

futuro que nos deve ocupar e preocupar vai muito para além do ano de 2015.

A proposta do Governo para o próximo ano começou a ser elaborada no quadro do Documento de

Estratégia Orçamental para 2014-2018.

No mês de abril, o Governo definiu a trajetória orçamental de médio prazo e determinou o montante de

medidas necessário para atingir o objetivo para o défice orçamental em 2015. Desde então, as perspetivas

orçamentais para 2014 e 2015 alteraram-se significativamente. A descida mais acentuada do desemprego, a

evolução macroeconómica e a eficácia das medidas de combate à fraude e evasão fiscais tiveram um impacto

muito positivo nas contas públicas. Se nada mais tivesse acontecido, terminaríamos o ano de 2014 bem

abaixo do défice de 4% que tinha sido previsto e o objetivo para 2015 facilmente seria também cumprido. Os

ganhos de credibilidade e confiança, interna e externa, teriam sido um ativo precioso para o País. Mas parte

importante destes efeitos positivos foi anulada na sequência das decisões do Tribunal Constitucional. Refiro-

me em particular ao Acórdão de 30 de maio, declarando a inconstitucionalidade de três normas do Orçamento

de 2014, e aos Acórdãos de 14 de agosto, sobre os dois diplomas que antecipavam a base legislativa do

Orçamento de 2015.

No que respeita a 2014, a impossibilidade de manter a redução remuneratória de 2,5% a 12% causou uma

pressão significativa sobre as despesas com pessoal, obrigando à revisão dos tetos de despesa e,

consequentemente, à apresentação de um Orçamento retificativo em agosto deste ano. A decisão de

reintroduzir a redução remuneratória de 3,5% a 10% permitiu mitigar apenas parte deste impacto.

No que respeita a 2015, importa salientar que a alteração do desenho da redução remuneratória, a

declaração de inconstitucionalidade de duas outras medidas do Orçamento de 2014 — que se manteriam no

próximo ano — e a impossibilidade de introduzir a contribuição de sustentabilidade sobre as pensões

resultaram num impacto global de quase 1400 milhões de euros, quando comparados o exercício de 2015

previsto no DEO e o exercício de 2015 possível na proposta de Orçamento.

Em cinco meses, as circunstâncias mudaram significativamente. E as medidas inicialmente acordadas para

atingir um défice de 2,5% do PIB em 2015 deixaram de ser suficientes.

O esforço do Governo incidiu antes de mais na continuação da redução da despesa, reconhecendo embora

que as limitações jurídico-constitucionais têm tornado esse exercício progressivamente mais difícil. Os

ajustamentos do lado da receita, incidindo essencialmente em setores ou atividades específicas, visam uma

distribuição mais equitativa do esforço de ajustamento e orientar comportamentos individuais ou coletivos, no

sentido de uma vida mais saudável ou de um crescimento ambientalmente mais sustentável.

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No total, o Governo definiu medidas de consolidação orçamental para 2015 num montante de 1249 milhões

de euros. Estas medidas permitiram assegurar a redução do défice orçamental para 2,7% do PIB, mas não

eram suficientes para alcançar a meta de 2,5% do PIB com que Portugal se comprometera.

Considerando que sensivelmente 75% da despesa pública corresponde a rubricas rígidas e sujeitas a

enormes pressões de crescimento, resultantes do elevado endividamento mas também da dinâmica

demográfica negativa, seria extremamente difícil definir novas medidas de redução de despesa de dimensão

expressiva. O cumprimento da meta estabelecida para o défice obrigaria assim a um novo aumento

generalizado de impostos, isto é, obrigaria a alterações das taxas associadas às principais categorias de

impostos.

Neste contexto, após ponderação cuidada entre o custo que novas medidas do lado da receita fiscal

poderiam vir a ter num contexto de recuperação da confiança das famílias e da própria atividade económica e

o custo que o não cumprimento estrito do limite de 2,5% para o défice orçamental poderia ter na credibilidade

externa, o Governo optou por não aumentar as taxas dos principais impostos, fixando o défice orçamental do

próximo ano em 2,7% do PIB.

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — Este objetivo encontra-se ligeiramente acima do

compromisso anteriormente estabelecido para o défice, mas sucede a três anos de esforço muito intenso e de

cumprimento dos requisitos do ajustamento nas suas várias frentes. O objetivo reafirma também a

determinação do País em sair do procedimento por défice excessivo no ano de 2015 e demonstra o empenho

em prosseguir o ajustamento no pós-Programa.

O Orçamento do Estado para 2015 mantém assim o rigor que se exige para garantir a sustentabilidade das

finanças públicas e traduz os resultados do rigor que tem marcado a presente legislatura.

Para além de registar um défice orçamental inferior a 3% do PIB, Portugal deverá obter, em 2015, um

excedente orçamental primário de 2,2% do PIB — o terceiro excedente primário consecutivo, o maior

excedente primário das duas últimas décadas.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Após iniciar uma trajetória descendente em 2014, prevê-se que o rácio da dívida pública no PIB diminua

para 123,7% em 2015, refletindo ainda importantes reservas de liquidez.

A redução total da despesa pública entre 2010 e 2015 será na ordem dos 7,8 mil milhões de euros,

invertendo uma tendência de crescimento persistente, pelo menos, desde 1995. De facto, caso se tivesse

mantido o crescimento anual médio de 6% registado entre 1995 e 2010, a despesa pública atingiria no próximo

ano cerca de 126 000 milhões de euros — mais 40 000 milhões de euros do que se prevê no Orçamento do

Estado para 2015.

Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: A proposta de Orçamento do Estado para 2015 é uma proposta de

responsabilidade. Reflete a responsabilidade assumida durante o Programa de Ajustamento, não obstante as

dificuldades, reflete a responsabilidade de manter um caminho sério para o futuro.

Repito o que há pouco disse: em cada proposta de Orçamento a responsabilidade que nos cabe, a todos,

vai muito além do ano a que respeita. As dificuldades que Portugal ainda tem pela frente, num contexto

externo sempre mais exigente, não nos permitem desistir e sacrificar o futuro, desperdiçando os muitos

esforços que todos tivemos de fazer.

O ano 2011 tem de continuar muito vivo na nossa memória coletiva para que não hesitemos no caminho a

trilhar. Um caminho de melhoria contínua, de esperança renovada e de avanços que não voltem a transformar-

se em recuos, para que não seja preciso começar tudo outra vez.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Inscreveram-se, para formular perguntas à Sr.ª Ministra, 11 Srs. Deputados.

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O Governo informa que a Sr.ª Ministra responderá, primeiro, a um conjunto de cinco perguntas, depois, de

quatro e, depois, de duas.

Sendo assim, tem a palavra, para fazer perguntas, o Sr. Deputado Pedro Nuno Santos, do PS.

O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra, não vai levar-me a mal se, antes de me

dirigir a si, fizer um ponto prévio relativamente à intervenção da Sr.ª Deputada Cecília Meireles mas também à

intervenção do Sr. Deputado Duarte Pacheco, que recuperam várias citações de Deputados da oposição a

propósito do anúncio do segundo resgaste.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Mas temos mais!

O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — Fico, desde logo, agradado por saber que a Sr.ª Deputada lê os meus

artigos no jornal i, mas a verdade é que muito antes de Deputados da oposição falarem em segundo resgaste

foi mesmo o Primeiro-Ministro que o fez em finais de 2012.

O jornal i lembra uma conversa — não desmentida, não confirmada — entre o Primeiro-Ministro e o Vice-

Primeiro-Ministro, em que, a propósito das objeções do CDS relativamente ao Orçamento, o Primeiro-Ministro,

alegadamente, terá ameaçado com o fim da coligação e a responsabilização do CDS por um segundo resgate.

Protestos do PSD.

Mas a verdade é que não foi não só confirmada como a coligação não se rompeu.

Risos do PSD.

Em finais de agosto de 2013, é o Económico e o Jornal de Negócios que recuperam declarações de

Passos Coelho: Passos Coelho admite segundo resgate a Portugal. Isto foi na sequência de o Tribunal

Constitucional ter anunciado o chumbo às regras da mobilidade de funcionários públicos.

Portanto, bem antes de muita gente, também o Primeiro-Ministro temia um segundo resgaste.

É bem verdade que nós não precisámos do segundo resgaste, mas isso deve-se menos ao Governo e bem

mais aos programas de cedência de liquidez do BCE e também à própria intervenção de Mario Draghi, que

garantiu que as taxas de juro fossem continuamente baixando e possibilitassem a Portugal o regresso aos

mercados.

Mas foi também o Primeiro-Ministro, muito antes de muita gente em Portugal, que temeu, que admitiu um

segundo resgaste, não verificado. Mas esse evitar do segundo resgaste não foi da responsabilidade do

Governo mas, sim, da intervenção do BCE.

A Sr.ª Ministra esteve recentemente, para apresentar o Orçamento, na Comissão de Orçamento e Finanças

e o Partido Socialista perguntou-lhe qual era o impacto da crise do BES na economia e no Orçamento. A Sr.ª

Ministra falou apenas do impacto direto no Orçamento, dizendo que não percebia de onde poderia vir um

impacto da crise do BES. Não fez qualquer referência ao impacto na atividade económica. A verdade é que,

no Orçamento, não há uma referência ao impacto da crise de um dos mais importantes bancos privados

portugueses na atividade económica e, portanto, no cenário macroeconómico.

O Sr. Primeiro-Ministro, há dois dias, disse mais do que tinha dito a Sr.ª Ministra. O Sr. Primeiro-Ministro

reconheceu que a crise no GES teria um impacto, com certeza, não quantificável e que não seria bom para a

economia, portanto no cenário macroeconómico e, portanto, no Orçamento.

Depois, fez aqui um discurso sobre diferenças entre impacto macro e impacto micro, sem percebermos

muito bem aquilo que queria dizer. Talvez a Sr.ª Ministra nos possa explicar melhor o que estava o Sr.

Primeiro-Ministro a tentar explicar. Presumo que a compatibilizar a sua intervenção com a da Sr.ª Ministra, no

Parlamento.

Sabemos todos que a crise do GES há muito que é uma crise do BES, Sr. Primeiro-Ministro, e sabemos

também — e não é a oposição ou o PS que o diz — que o impacto será significativo. Banco de Portugal,

Universidade Católica, recentemente o Conselho Económico e Social, alertam para o impacto negativo que a

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crise do Banco Espírito Santo pode ter no cenário macroeconómico traçado pelo Governo na proposta de

Orçamento do Estado para 2015.

Esta é uma matéria importante, porque vem somar a todas as dúvidas sobre o cenário macroeconómico. E

o cenário macroeconómico, no Orçamento, é central neste debate, porque daí dependem todas as previsões

sobre receitas fiscais, sobre défice orçamental, sobre dívida pública. É, pois, importante que esclareça este

ponto.

Nós, hoje, sabemos que, primeiro, não há nenhum organismo que não aponte uma previsão de

crescimento inferior à previsão do Governo, sabemos também que, enquanto o Governo prevê uma

aceleração do crescimento económico, prevê essa aceleração em contexto de desaceleração europeia e

mundial, sabemos, ainda, que os indicadores coincidentes de atividade económica do Banco de Portugal

apresentam valores negativos há três meses e que o indicador avançado da OCDE está também em queda há

três meses.

Portanto, os sinais que vamos tendo contrariam esse cenário e a ausência da crise do BES no Orçamento

vem agravar, adensar, estas dúvidas.

A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Muito bem!

O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — Sr.ª Ministra, é fundamental que clarifique hoje, de uma vez, o seguinte:

há ou não impacto da crise do BES na atividade económica? Há ou não impacto da crise do BES, por essa

via, no cenário macroeconómico? O Governo previu ou não, quantificou ou não esse impacto? Esse impacto

está ou não acautelado no cenário macroeconómico que propõe no Orçamento?

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — A próxima pergunta cabe ao PSD.

Sr. Deputado Fernando Virgílio Macedo, faça favor.

O Sr. Fernando Virgílio Macedo (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra das Finanças, uma das reformas

estruturais mais relevantes efetuadas nos últimos anos foi, sem dúvida, a reforma do Código do IRC.

Relembro que essa reforma foi aprovada por uma larga maioria de Deputados neste Parlamento,

nomeadamente pelos Deputados dos Grupos Parlamentares do CDS, do PSD e do Partido Socialista. O

Grupo Parlamentar do PSD e também, penso que posso dizer isto, o Grupo Parlamentar do CDS continuam

firmemente convicto e comprometido com a reforma que foi efetuada, porque pensamos, sinceramente, que

esta reforma aumenta a competitividade fiscal do nosso País. E era também importante que o PS reafirmasse

se continua ou não comprometido, se continua a acreditar nos efeitos positivos que essa reforma do Código do

IRC trouxe ou se agora tem dúvidas sobre esses efeitos positivos e sobre o voto positivo que deu em 2013, na

reforma deste Código do IRC.

Vozes do PSD: — Bem lembrado!

O Sr. Fernando Virgílio Macedo (PSD): — Efetivamente, Sr.ª Ministra, nessa reforma, estava previsto que

existisse uma redução da taxa de IRC, de 2% ao ano, até a taxa se situar entre 17% e 19%.

Ora, as questões que queria colocar-lhe são estas: qual é a importância desta descida da taxa de IRC para

a economia em geral, para as empresas, para os investidores e, mesmo, para as famílias, ao fim e ao cabo

para as pessoas, que é o mais importante?

O Sr. João Galamba (PS): — É zero!

O Sr. Paulo Sá (PCP): — E para o capital!

O Sr. Fernando Virgílio Macedo (PSD): — Esta descida da taxa de IRC potencia ou não novos

investimentos?

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O Sr. João Galamba (PS): — Não!

O Sr. Fernando Virgílio Macedo (PSD): — Potencia ou não autofinanciamento das empresas?

O Sr. João Galamba (PS): — Não!

O Sr. Fernando Virgílio Macedo (PSD): — Potencia ou não criação de novos empregos?

O Sr. João Galamba (PS): — Não!

O Sr. Fernando Virgílio Macedo (PSD): — Potencia ou não a manutenção de empregos?

É que, sinceramente, acho que potencia e tem efeitos muito positivos na economia como um todo.

Finalmente, Sr.ª Ministra, esta descida, que vem efetivamente confirmar aquilo que se acordou em 2013, é

ou não um sinal que Portugal transmite aos mercados de que em Portugal existe previsibilidade fiscal,…

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Ui! É o que mais existe!

O Sr. Fernando Virgílio Macedo (PSD): — … ou seja, que aquilo que foi acordado em 2013 é para se

manter, que os investidores, quando investem em Portugal, quer sejam nacionais ou estrangeiros, sabem o

quadro fiscal com que podem contar?! É porque sabemos que os mercados investidores valorizam muito essa

previsibilidade fiscal.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — A próxima pergunta cabe ao Bloco de Esquerda.

Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, faça favor.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, o mínimo que

se pode exigir à Sr.ª Ministra e ao Governo, quando comparecem no Plenário, na apresentação dos

Orçamentos do Estado, é que digam toda a verdade: aos Deputados, aos Jornalistas — possam ou não ser

preguiçosos —, aos portugueses.

Vamos começar pela verdade do BES.

A Sr.ª Ministra veio à Assembleia da República dizer que tomou conhecimento da solução no dia 1 de

agosto; disse que essa solução não teria nenhum custo para os contribuintes e disse que não via como é que

a falência do BES poderia afetar a economia. Hoje, sabemos que foi a Ministra e o Governo que negociaram a

solução para o BES, não foi uma solução encontrada pelo Banco de Portugal e comunicada ao Governo no dia

1; hoje, sabemos que não há forma de esta solução não custar aos contribuintes; e sabemos que ela terá

impacto económico na economia portuguesa ou mesmo no financiamento das empresas.

Apesar disto tudo, apesar de sabermos do impacto do BES, não há uma palavra sobre o BES nas

previsões do Orçamento do Estado para 2015. Não tem impacto nas contas públicas, não tem impacto no

cenário económico, é como se não existisse, é como se o maior grupo privado português nunca tivesse falido.

E nós queremos saber qual é a verdade sobre o BES.

Queremos também saber qual é a verdade sobre o cenário macroeconómico que nos apresenta. Como é

que se explicam previsões de crescimento maiores do que todas as previsões feitas por instituições

independentes.

Como é que se explicam previsões de inflação maiores do que todas as outras. Será que, por acaso, uma

maior inflação empola artificialmente o PIB e diminui artificialmente a dívida pública? Será que é por isso que

usam um deflator do PIB que é muito diferente daqueles que as instituições usam?

Como é que explica uma reforma fiscal verde que, afinal, é só mais um aumento de impostos indiretos?

Como é que se explica a salganhada do IRS?

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Ainda agora, o Sr. Deputado do PSD falava em estabilidade fiscal. Quem olha para o IRS e para esta

cláusula de salganhada vê tudo menos estabilidade fiscal. Vamos ter dois códigos do IRS, um para um tipo de

contribuintes, outro para outro tipo de contribuintes! Se isto é estabilidade fiscal, o que é que será instabilidade

fiscal?!

Protestos de Deputados do PSD.

E, já agora, qual é o impacto desta salganhada nas receitas fiscais?

Sr.ª Ministra, nós queremos saber como é que explica todas estas contradições, como é que explica todas

estas confusões, como é que explica todas estas malabarices!

Será que a Sr.ª Ministra e o seu Governo andaram tão preocupados a vigiar e a controlar cada cêntimo que

os pobres recebiam de prestações sociais, a combater cada abuso das crianças subsídio-dependentes deste

País, que não teve tempo para olhar e acautelar o rigor do próprio Estado, a seriedade com que o próprio

Estado trata os contribuintes e os cidadãos?!

É ou não é verdade que Portugal gasta mais em juros e menos em prestações sociais e salários do que a

maioria dos países na zona euro, como, aliás, diz o relatório da UTAO?!

É ou não é verdade que o Governo, do alto do seu rigor, se apropria indevidamente de 244 milhões de

euros de IMI, por não fazer uma reforma na forma como as casas são avaliadas — caso denunciado pela

DECO?!

É ou não é verdade que o Governo retira a cláusula que protege cidadãos do aumento do IMI, o aumento

do preço nas suas casas, mas permite que fundos imobiliários só paguem metade do IMI?! É um benefício

fiscal de metade do IMI para fundos imobiliários especulativos, mas as famílias são obrigadas a pagar IMI!

É ou não é verdade que este Governo de «rigor» é capaz de penhorar uma casa a uma família de uma

mãe que recebe salário mínimo e tem filhos a cargo, por uma dívida ao Estado de 500 €?!… Um Estado que

penhora uma casa de família por uma dívida de 500 €!…

É ou não é verdade que houve um aumento de 30% do IRS, houve aumento do IVA da eletricidade, houve

aumento dos impostos indiretos, impostos sobre combustíveis, e o único imposto que desceu foi o imposto

sobre as grandes empresas?!

É ou não é verdade que há 27,4% de crianças carenciadas neste País? É o dobro da zona euro e os

apoios que recebem são metade daqueles que, em média, a zona euro presta!

É ou não é verdade que este Governo só governa para o défice? É ou não é verdade que este Governo só

governa para os mercados, só governa para os interesses financeiros, enquanto assiste, impavidamente,

como se não houvesse solução, ao empobrecimento generalizado do País e à emigração forçada a que dotou

grande parte da geração mais jovem, mas também de uma geração de desempregados de longo prazo, que é

um estigma desta sociedade que não tem parado de crescer, desde que entrou para o Governo?!

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — A próxima pergunta cabe ao PCP.

Sr. Deputado Paulo Sá, faça favor.

O Sr. Paulo Sá (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra das Finanças, ao mesmo tempo que corta salários,

pensões e prestações sociais, que esmaga os trabalhadores com uma insuportável carga fiscal, que ataca as

funções sociais do Estado e encerra serviços públicos, o Governo favorece o grande capital, atribuindo-lhe

escandalosos benefícios fiscais. E não só atribui esses escandalosos benefícios fiscais como os oculta nas

contas do Estado, e quem o diz, Sr.ª Ministra, é o Tribunal de Contas.

Há cerca de um ano, o Tribunal de Contas denunciou o facto de o Governo ter omitido 1045 milhões de

euros, repito, 1045 milhões de euros de benefícios fiscais a grandes empresas, em sede de IRC. O Tribunal de

Contas denunciou ainda o facto de o Governo, nos relatórios dos Orçamentos do Estado, inflacionar os

benefícios fiscais em sede de IRS e IVA, ao mesmo tempo que oculta benefícios fiscais em sede de IRC. E,

com esta grosseira manipulação das contas públicas, o que o Governo tenta fazer é esconder que o IRC tem

mais benefícios fiscais do que todos os outros impostos juntos.

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Sr.ª Ministra das Finanças, estas conclusões do Tribunal de Contas foram todas reafirmadas no recente

relatório de uma auditoria solicitada pela Assembleia da República, por sugestão do PCP, confirmando que o

Governo oculta, nas contas do Estado, mais de 1000 milhões de euros de benefícios fiscais a SGPS. E vem

aqui a Sr.ª Ministra falar de transparência!… Não há qualquer transparência, Sr.ª Ministra, o que há é

ocultação e manipulação destes dados.

O Sr. António Filipe (PCP): — Muito bem!

O Sr. Paulo Sá (PCP): — Na sequência dessa auditoria, o Tribunal de Contas determinou que o Governo

deve revelar, no Orçamento do Estado, de forma verdadeira e integral, todos os benefícios fiscais que são

concedidos. Apesar disso, o Orçamento do Estado para 2015 ignora estas recomendações do Tribunal de

Contas e omite os benefícios fiscais concedidos a SGPS, em sede de IRC.

Sr.ª Ministra, vai o Governo acatar as decisões do Tribunal de Contas ou, pelo contrário, vai continuar a

afrontar este Tribunal, colocando-se à margem da lei?!

Sr.ª Ministra, vai o Governo revelar, de forma verdadeira e integral, no Orçamento do Estado, os benefícios

fiscais concedidos nos diferentes impostos, incluindo os mais de 1000 milhões de euros de benefícios fiscais

atribuídos a SGPS, em sede de IRC?!

Sr.ª Ministra, como justifica este escandaloso favorecimento do grande capital, ao mesmo tempo que

continua a atacar os direitos e os rendimentos dos trabalhadores e dos reformados?!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Boa pergunta!

O Sr. Paulo Sá (PCP): — Sr.ª Ministra, como é que explica que queira cortar 375 milhões de euros nas

prestações sociais destinadas àqueles que se encontram em situação de pobreza ou de exclusão social e, ao

mesmo tempo, queira manter benefícios fiscais ao grande capital, de mais de 1000 milhões de euros?!

Sr.ª Ministra, tem de responder a estas questões!

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — A próxima pergunta é do CDS-PP.

Sr.ª Deputada Cecília Meireles, faça favor.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, este

Orçamento que aqui nos traz é, sem dúvida, um Orçamento de um ciclo diferente e, sobre isso, vamos falar.

Gostava que me permitisse que fizesse aqui um leve inciso para responder ao Sr. Deputado Pedro Nuno

Santos, porque ele teve essa consideração por mim e eu não queria fazer a desfeita de não lhe responder. E

eu, que já tinha fechado aqui o meu baú, não de tesourinhos, mas de citações que também terão o seu quê de

deprimente, vi-me obrigada a abri-lo outra vez, porque, Sr. Deputado, compreenda, podia citar de cor algumas

coisas que têm a ver com banqueiros alemães e pernas a tremer, mas todos temos direito aos nossos

momentos infelizes e eu não quis ter essa desconsideração pelo Sr. Deputado, que sei que merece melhor.

Mas já que falou e confrontou a Sr.ª Ministra com o pseudo-irrealismo das previsões e do cenário

macroeconómico que aqui nos trazia — e também vou falar desse cenário macroeconómico —, achei que

valia a pena testar a originalidade do seu argumento e, então, fui ver que o Sr. Deputado, há um ano,

exatamente em relação ao objetivo do défice, que, por acaso, foi cumprido, dizia: «O Governo insiste na

mesma estratégia».

E acrescentava: «O irrealismo do objetivo é hoje óbvio para quase todos». O que é hoje óbvio para quase

todos, acho, é que o objetivo não era irrealista, pelo contrário, era bastante realista.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Mas cumpriram?

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — E dizia ainda o Sr. Deputado que «já devíamos todos, portanto, ter

percebido que a atual estratégia de ajustamento simplesmente não funciona». Mas é bem verdade que ela

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funcionou e que estamos aqui hoje a discutir um Orçamento que é, simultaneamente, de consolidação e de

crescimento orçamental, e é sobre ele que falarei.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. João Galamba (PS): — E os dois Orçamentos retificativos?

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Creio que estamos a discutir o Orçamento do Estado para 2015! Mas

fico feliz sempre que agrado à bancada do PS! Só acho estranho que os senhores reajam sempre contra as

vossas próprias palavras… Penso que talvez não fosse pior alguma ponderação antes de as proferirem,

porque evitavam, depois, esta excitação quando são citados!…

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Vamos, então, passar àquilo que importa, que é o Orçamento para o próximo ano.

Sr.ª Ministra, este é, de facto, um Orçamento de um ciclo bem diferente. Mas não é um ciclo de

irresponsabilidade, nunca com tal nos comprometemos, nem nunca foi esse o nosso objetivo. O nosso objetivo

era a saída da troica e a saída da situação de protetorado em que, sim, o Governo do PS nos lançou, embora

agora queira disfarçar e fingir que se teve de chamar a troica, ou que Portugal chegou ao estado a que

chegou, foi por causa de um dia ou de uma semana… São precisos muitos meses, eu diria mesmo que são

precisos muitos anos, para cavar um buraco da dimensão daquele que os senhores cavaram em Portugal.

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Tal como foram precisos muitos anos para tirar Portugal desse

buraco, mas nós conseguimos fazê-lo.

Desta forma, este Governo está de parabéns e estão, sobretudo, de parabéns os portugueses, que muitos

sacrifícios tiveram de fazer para que esta fase negra pudesse ser encerrada.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Orçamento que a Sr.ª Ministra aqui nos traz é um Orçamento de crescimento económico, que está em

linha, aliás, com aquilo que foi previsto por muitas organizações internacionais e que é superior, embora

levemente, ao que temos este ano e ao da zona euro.

Também quanto ao desemprego — e o combate ao desemprego tem de ser uma prioridade constante

deste Governo — temos dados positivos, porque, depois de termos chegado perto dos 18%, prevemos, para o

próximo ano, uma taxa de 13,4%, o que significa uma redução bastante mais acelerada do que aquela que

tinha sido prevista no ano passado.

Sr.ª Ministra, o que lhe pergunto é se neste Orçamento, que é, de facto, diferente dos anteriores e que

inaugura um novo ciclo, não é também já visível algum alívio relativamente aos sacrifícios que foram pedidos

para podermos ter um crescimento mais sustentável.

Falo, por exemplo, do aumento do salário mínimo nacional, que já está em andamento, e falo da

atualização das pensões mínimas sociais e rurais, que têm sido pontualmente atualizadas por este Governo.

Falo também de alguns sinais de moderação fiscal, quer para as empresas — e é importante perceber que

quem realmente paga os impostos das empresas são os trabalhadores, quando elas não criam investimento e

não são criados postos de trabalho —, quer dando algum alívio às famílias com filhos, ao podermos ter um

IRS mais amigo das famílias e da natalidade, sem prejudicarmos, naturalmente, aqueles que não têm filhos,

porque não podem, não querem ou estão noutra situação.

Pergunto, portanto, se não temos, com os aspetos que referi, o exemplo de um ciclo diferente, com um

maior alívio mas sem nunca esquecer a responsabilidade, pois, de certeza, queremos todos um Portugal

melhor e viver melhor mas não queremos, contudo, voltar ao passado.

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Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente: — Terminada a primeira ronda de perguntas, tem a palavra a Sr.ª Ministra de Estado e

das Finanças, para responder.

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, começo por responder à

questão que me foi colocada, primeiro, pelo Sr. Deputado Pedro Nuno Santos e, depois, também pela Sr.ª

Deputada Mariana Mortágua, sobre o impacto do BES.

Os Srs. Deputados insistem muito na ideia de que no Orçamento do Estado devíamos ter uma previsão do

impacto do BES. E a previsão que os Srs. Deputados fazem é que o impacto do BES vai ser muito mau. Nós

também achamos que, de facto, um problema num banco com esta dimensão é mau para a economia. Porém,

como já tive ocasião de dizer, entendemos que, face à robustez do restante sistema financeiro, aliás,

confirmada no domingo passado com o resultado dos testes de stress efetuados pelo Banco Central Europeu,

esse risco é muito mais mitigado do que se esta situação tivesse acontecido em momentos anteriores, em

que, de facto, o nosso sistema financeiro estava bem mais frágil.

Mas bem mais importante do que discutir um número que os Srs. Deputados entendem dever estar no

Orçamento do Estado é saber, afinal, qual é a solução que, em vossa opinião, devia ter sido utilizada no caso

do BES. Os Srs. Deputados preocupam-se tanto com as consequências da solução que foi aplicada mas não

perdem um momento para dizer aos portugueses que solução teriam preferido, que solução acham que teria

menores custos!… Desde que não seja, obviamente, a solução de o problema não existir, porque, essa, todos

a preferíamos, mas, como compreenderão, não estava à disposição de ninguém.

O Sr. Deputado Pedro Nuno Santos referiu-se ainda às palavras do Sr. Primeiro-Ministro relativamente ao

impacto, ou não, do BES e do GES. Naturalmente, não falarei pelo Sr. Primeiro-Ministro. Compreendo que o

Sr. Deputado tenha pena de não ter tido a oportunidade de colocar as perguntas diretamente ao Sr. Primeiro-

Ministro, mas terá de esperar por uma outra oportunidade.

Quanto à questão da reforma do IRC, Sr. Deputado Fernando Virgílio Macedo, de facto, o PS, tanto quanto

sabemos, continuará comprometido. E digo «tanto quanto sabemos» porque foi definido, no âmbito do acordo

e da aprovação da reforma do IRC, que um grupo de acompanhamento dessa reforma faria uma

recomendação ao Governo no sentido de propor, ou não, a continuação da redução da taxa. E esse grupo de

acompanhamento, que inclui um representante designado pelo Partido Socialista, recomendou ao Governo

que continuasse este caminho.

O Governo continua convicto de que, de facto, este é o caminho certo, tanto mais que, quando olhamos

para os resultados da receita de IRC já este ano, verificamos que não temos a perda de IRC associada à

descida da taxa. Porque uma descida da taxa do IRC, bem como todas as outras medidas que foram incluídas

na reforma do IRC, tornam o nosso País mais amigo do investimento, mais amigo da criação de emprego,

mais amigo da atividade das empresas, e esse é o primeiro passo para que possamos continuar a moderação

fiscal também para as famílias.

Começámos por aí e continuamos a entender que essa é, de facto, a melhor forma de começar, porque é a

forma sustentável de proporcionar crescimento à economia e de podermos refletir os benefícios para todos os

cidadãos.

A previsibilidade fiscal, como sabemos, é muito importante. De resto, basta ver a evolução de Portugal nos

rankings internacionais de competitividade, de facilidade de fazer negócios, nestes últimos anos, para ficar

claro que avaliações externas e independentes nos colocam hoje numa posição muito mais favorável do que

há uns anos, nomeadamente do que há três anos, o que é claramente um benefício para todos os

portugueses.

Os Srs. Deputados falam da credibilidade do cenário macroeconómico. Ora, tive também a curiosidade de

ler, no Diário da Assembleia da República, a ata do debate do ano passado e, um pouco como disse a Sr.ª

Deputada Cecília Meireles, de facto, é deprimente ver como pouco mudaram os argumentos quando, um ano

volvido, é tão óbvio que tanto se enganaram!

O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — Houve dois Orçamentos retificativos!

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A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — Portanto, como tanto se enganaram, repetem a mesma

coisa e simplesmente ignoram olimpicamente o facto de as previsões que a oposição fez terem tido mais, mas

muito mais, falhas que as previsões do Governo.

E, já que os Srs. Deputados estão sempre a citar a UTAO — e acho que, sim, a UTAO produz documentos

da maior relevância —, deixem-me dizer-vos que na página 4 do parecer da UTAO sobre a proposta de

Orçamento do Estado pode ler-se o seguinte: «O cenário macroeconómico previsto no OE/2015 considera um

crescimento real do PIB de 1,5% para 2015. Este cenário, em termos reais, encontra-se em linha com as

projeções de outros organismos internacionais.» E refere-se que evidencia alguns riscos descendentes, mas

também alguns riscos ascendentes. É o que está escrito na página 4 do parecer da UTAO, se os Srs.

Deputados tiverem curiosidade de ler.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — E o deflator do PIB?

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, relativamente à questão

do deflator do PIB, a explicação é técnica, e tem a ver com uma alteração de metodologia, nomeadamente das

rendas imputadas.

Não há qualquer manipulação do deflator para ter qualquer efeito mais ou menos positivo sobre qualquer

variável; tem a ver a alteração de regras técnicas, nomeadamente com a imputação de serviços e com rendas

imputadas, o que faz com que, no nosso caso, essa diferença seja muito significativa, sobretudo devido à

elevada taxa de casa própria dos portugueses quando comparada com a de outros países. Portanto, trata-se

meramente de uma questão técnica, Sr.ª Deputada, e que é muito fácil de explicar.

Quanto às questões que têm sido colocadas hoje, sistematicamente, acerca de os juros serem muito

elevados e de como poderíamos usar o dinheiro dos juros para fazer outras coisas, aí, estamos todos de

acordo. Era, de facto, muito melhor que não tivéssemos de afetar uma verba tão grande ao pagamento de

juros. Mas os juros são da dívida e dívida é memória, memória dos anos em que gastámos mais do que

tínhamos e em que acumulámos esta dívida.

Se os Srs. Deputados acham que, agora, deixávamos de pagar os juros e teríamos muito dinheiro para

fazer outras coisas, deveriam explicar claramente onde é que o iam buscar! É que um País que continua a ter

défice e a ter de se financiar deixa de o conseguir fazer quando se recusa a pagar aquilo a que se

comprometeu. Assim sendo, esse dinheiro que supostamente não seria usado para os juros desapareceria,

não só para os juros mas para tudo o resto, e teríamos, então, problemas bem mais sérios. Essa é uma

conversa que não faz sequer sentido!

Aplausos do PSD.

Passo, agora, às questões colocadas sobre os benefícios fiscais, em que foi referido que são sempre

prejudicados os mesmos e que há um aumento da carga fiscal.

Pasmo quando os Srs. Deputados tanto falam em aumento de carga fiscal sem haver aumento das taxas

de impostos. E pergunto-me se, por acaso, defenderão que não deve haver medidas no sentido de fazer com

que todos os contribuintes cumpram aquilo que é devido, se por alguma razão ficam incomodados com o facto

de, hoje em dia, a fraude e evasão fiscais serem muito mais baixas do que no passado.

É isso que os Srs. Deputados defendem, ou seja, que todos aqueles que têm obrigação de pagar impostos

não devem ser chamados a contribuir? É que o aumento da receita fiscal não é um aumento da carga fiscal

sobre cada um, mas parece-me que, ao longo de todo este debate, houve ou uma grande confusão, o que é

grave, ou uma propositada má-fé, o que, provavelmente, é ainda mais grave.

Relativamente à questão sobre aquilo que se faz para proteger as famílias e a terem dito que as pessoas

têm muitas dificuldades, é verdade, Srs. Deputados, os portugueses têm ainda muitas dificuldades. É por isso

que temos de continuar a trabalhar, para que essas dificuldades sejam reduzidas o mais possível e tão cedo

quanto possível, mas sempre com consciência daquilo que é possível fazer-se e acudindo sempre aos mais

desfavorecidos.

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Fala-se do aumento do preço da eletricidade mas não se fala da medida do Governo que aumentou, em

largos milhares, o número das famílias que beneficiam da tarifa social da eletricidade.

O Sr. Amadeu Soares Albergaria (PSD): — Exatamente!

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — Fala-se que desapareceu a cláusula de salvaguarda do IMI

mas não se fala da cláusula de salvaguarda, que não tem limite temporal, para as famílias de mais baixos

rendimentos; não se fala do aumento do mínimo de existência, que coloca muito mais famílias sem pagar IRS;

não se fala das vantagens para as famílias com filhos que vão ser sentidas nos bolsos de cada um de nós em

2015, porque há, efetivamente, uma redução da carga fiscal.

Não podemos apresentar uma parte das coisas e achar que os portugueses não veem a outra parte daquilo

que está a acontecer.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Com os senhores vale tudo!…

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — Portanto, temos, efetivamente, moderação fiscal para as

empresas, para todas as empresas. Não vale a pena dizer-se que é para as grandes empresas, porque os

Srs. Deputados sabem muito bem que o IRC não é só para as grandes empresas, é para todas as empresas.

Todas as empresas que pagam impostos têm um benefício de redução da taxa.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sabe que as pequenas empresas não liquidam! Não têm receitas para isso!

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — As grandes empresas com lucros elevados têm uma

sobretaxa adicional, que não descemos. Portanto, as grandes empresas, efetivamente, pagam mais impostos.

Devo ainda referir que temos vantagens no IRS para as famílias com filhos, subimos o mínimo de

existência e temos sucessivamente aumentado as condições de proteção dos agregados familiares mais

desfavorecidos, no IMI, no IRS,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Com o aumento do salário mínimo nacional!

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — … com o aumento do salário mínimo nacional — obrigada,

Sr. Deputado, por me lembrar —, com as reformas mínimas sociais e rurais e com a majoração do subsídio de

desemprego.

Portanto, este Governo não se limita a dizer que está preocupado com os mais desfavorecidos, age

efetivamente para proteger os mais desfavorecidos.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Muito obrigada, Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças.

Prosseguindo as perguntas, segue-se, agora, um conjunto de quatro.

Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Reis, do PSD.

O Sr. Nuno Reis (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, alguns partidos, que há

meia dúzia de anos criticavam e até ridicularizavam quem alertava para a insustentabilidade do nosso

endividamento externo, parecem ter despertado e até encontraram soluções aparentemente fáceis para um

problema tão complexo. Há quem, de facto, não tenha aprendido nada com a história.

De facto, só assim se compreende que, ao mesmo tempo que dizem estar preocupados com a dívida

pública, continuem a desvalorizar a necessidade de termos contas públicas equilibradas.

Sr.ª Ministra, sabendo-se que Portugal virá a ter em 2015, pelo terceiro ano consecutivo, um excedente de

saldo primário, algo inédito na nossa história recente, pergunto-lhe como avalia a dinâmica da nossa dívida

pública à luz das necessidades de financiamento do Estado, dos pressupostos do Orçamento para 2015 e da

estratégia orçamental de médio prazo.

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Mas, mais do que isso, porque este tema tem vindo a ser usado como arma de arremesso por alguns,

peço-lhe que faça um exercício de memória e que, à luz do novo sistema europeu de contas, para mais fácil

comparabilidade, nos confirme se a dívida pública consolidada não estava já acima dos 110% do PIB em

junho de 2011, quando este Governo recebeu a herança falida do Governo José Sócrates.

Aplausos do PSD.

A reboque desta segunda questão, pergunto-lhe se não era previsível que a dívida pública aumentasse

num Estado que estava em pré-bancarrota e que acabava de requerer um financiamento de 78 000 milhões de

euros, sensivelmente metade da riqueza nacional gerada num ano.

Sabendo-se que na perspetiva da necessidade de uma maior transparência das contas públicas foi

importante que houvesse uma alteração das regras de contabilização de custos e dívidas, houve,

necessariamente, que incluir custos brutos de PPP (parcerias público-privadas) e de dívida de todas as

empresas do Estado, que não era, na altura, contabilizada para efeitos de perímetro de consolidação

orçamental. Portanto, houve uma necessidade de reajustar o valor da divida.

A quarta questão que lhe deixo é se pela ilusão de não haver dívida reconhecida, se pela ilusão de haver

dívida escondida ou de ela não ser devidamente contabilizada, algum país passa a ter menos obrigações do

que aquelas que efetivamente já tinha no passado.

Finalmente, uma quinta e última questão. No final da semana passada, assistimos a um quebrar do silêncio

da liderança do Partido Socialista sobre o tema dívida pública, cujo líder disse, e cito: «É necessário que os

consensos técnicos alargados se vão estabelecendo ao nível europeu, porque só uma solução ao nível

europeu seria possível e admissível». Pergunto, Sr.ª Ministra, depois de tanta retórica de algumas figuras do

Partido Socialista, se considera que há assim tão grande diferença entre a nova alternativa que o líder

socialista agora revela e aquilo que tem sido a atuação responsável e proativa do Governo na questão da

gestão da dívida.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — A próxima pergunta cabe à Sr.ª Deputada Isabel Santos, do PS.

Tem a palavra, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Isabel Santos (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as

Deputadas, Srs. Deputados, Sr.as

e Srs. Membros do

Governo, Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, quero dizer-lhe que segui com atenção a sua intervenção e

que há nela dois aspetos que me impressionaram de facto.

Primeiro, o ar cândido com que a Sr.ª Ministra atravessa um corredor encantatório,…

Vozes do PSD: — Oh!

A Sr.ª Isabel Santos (PS): — … em que tudo se resume a um jogo de números e em que tudo se ajusta

com grande equilíbrio e harmonia, mediante a nossa vontade, nesse jogo de números. Depois, a forma como a

Sr.ª Ministra, num dia como o de hoje, em que foi feito um anúncio pelo Sr. Primeiro-Ministro que surpreendeu

muitos portugueses e muitos trabalhadores da Administração Pública, foge ao tema Administração Pública,

que está debaixo da sua tutela, como esse tema lhe escaldasse os pés, lhe queimasse os lábios.

Protestos do PSD.

Sr.ª Ministra, peço-lhe que saia desse corredor, que atravesse para este lado do espelho, para este País

real, um País com portugueses e uma Administração Pública com trabalhadores lá dentro e que nos fale deste

País onde todos os dias há pessoas que procuram os serviços de saúde e veem operações adiadas — como

ainda ontem foi anunciado estar a acontecer no IPO do Porto — porque há falta de recursos e há falta da

possibilidade de contratação de recursos humanos para suprir a necessidade criada pela saída de pessoas;

que nos fale de escolas onde ainda faltam professores, de escolas que ainda têm dificuldades de

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funcionamento por falta de auxiliares; que nos fale de uma segurança social em estado de pré-rotura, onde

faltam funcionários, onde há trabalhadores com contrato de inserção/emprego com acesso a bases de dados e

a processos individuais.

Sr.ª Ministra, quero que me fale de tudo isto e que, olhando para toda esta realidade, me responda

claramente a duas perguntas muito precisas: confirma que se por um leve e desgraçado acaso do destino o

PSD vencesse as próximas eleições…

O Sr. Amadeu Soares Albergaria (PSD): — Chama-se vontade do povo!

A Sr.ª Isabel Santos (PS): — … — valha-lhe Deus! valha-lhe Deus! —, a recuperação dos cortes salariais

só seria cumprida em 2019, fazendo tábua rasa do acórdão do Tribunal Constitucional e declarando a

suspensão da Constituição da República Portuguesa?

Confirma ou não, Sr.ª Ministra, que, oficiosamente, têm sido dadas ordens aos dirigentes de diversos

serviços para a elaboração de listas de funcionários para a colocação em processo de requalificação, esse

título cínico e piedoso que VV. Ex.as

encontraram para essa porta de embarque para o despedimento dos

trabalhadores da Administração Pública?

São listas em que se prevê a redução do número de trabalhadores, em muitos serviços, na casa dos

12,5%. Diga, Sr.ª Ministra, se confirma ou desmente cabalmente esta informação ou se existem, de facto,

algumas metas que sejam diferentes.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — A próxima pergunta cabe ao Sr. Deputado Miguel Tiago, do PCP.

Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra, em primeiro lugar, quero relembrá-la que não

disse uma palavra em resposta à pergunta do meu camarada Paulo Sá, sobre a forma como o Governo vem

escondendo os benefícios fiscais que atribui aos grandes grupos económicos, aliás, denunciada no relatório

de auditoria do próprio Tribunal de Contas e com o qual o PCP tem confrontado várias vezes este Governo. É

que para os grandes grupos económicos o Governo encontra sempre uma maneira de perdoar nos impostos.

Sr.ª Ministra, este Orçamento, tal como, aliás, os do passado, fazem do défice uma espada que pende

sobre os portugueses, em que o défice é usado como um instrumento de chantagem sobre os portugueses.

Mas até o cálculo do défice — porque tem critérios para ser calculado — está ao serviço dos grandes

interesses, até o critério do cálculo do défice!…

Vejamos, Sr.ª Ministra: pagar os abonos de família conta para o défice; pagar os subsídios de desemprego

conta para o défice; as restantes prestações sociais contam para o défice; a saúde conta para o défice, a

segurança dos cidadãos, a justiça, os salários, as pensões, contam para o défice.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Quando se trata de salvar bancos, quando se trata de ir em socorro dos

grandes grupos económicos, que nem o risco do negócio assumem porque o Estado está lá para os salvar,

então, já não conta para o défice.

O Sr. David Costa (PCP): — Ora bem!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Os 4,9 mil milhões que o Governo acaba de entregar ao Fundo de

Resolução para salvar um banco privado já não contam para o défice. Os outros tantos milhares de milhões

que o Governo entregou para salvar os bancos, quer tenha sido através da recapitalização, quer de processos

ruinosos a que vieram a chamar nacionalização, não contam para o défice.

O Sr. David Costa (PCP): — Bem lembrado!

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O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr.ª Ministra, isso, por si só, demonstra bem que usam o défice como uma

espada sobre os portugueses para os ameaçar, apenas para justificar os cortes sobre aquilo que são as

vossas responsabilidades constitucionais — vossas, do Governo, Sr.ª Ministra.

As responsabilidades que o Governo tem de assumir perante a Constituição da República são um custo e

contam para o défice; aquelas que nem sequer vêm na Constituição, como pagar os juros, a agiotagem e a

especulação, para essas venha todo o dinheiro porque, para o Governo, não contam para o défice.

Sr.ª Ministra, volto a perguntar sobre os impactos do BES na economia porque são importantes e o

Governo deve ter condições de os prever, e, mais do que isso, pergunto por que é que neste Orçamento do

Estado se prevê que haja mais 1500 milhões de euros afetos ao Fundo de Resolução.

Sr.ª Ministra, não pense que pode responder novamente como respondeu na Comissão de Orçamento,

Finanças e Administração Pública, dizendo: «Bem, aquele dinheiro estava disponível, não tínhamos onde o

aplicar, pusemo-lo nos Fundo de Resolução para salvar bancos». Era importante que fosse explicado qual é o

atual estado da banca portuguesa, do sistema financeiro português, não só do BES mas também dos

restantes bancos, e qual é a perspetiva do Governo quanto à utilização de recursos públicos,…

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Exatamente!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — … porque o dinheiro que o Governo usa para salvar bancos é dinheiro

público, ou foi o Estado que o angariou através das contribuições da banca…

O Sr. David Costa (PCP): — Bem lembrado!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — … ou foi o Estado que o recebeu através da contração de empréstimos

sobre os quais todos nós, os portugueses que trabalham, pagaremos os juros.

Sr.ª Ministra, Sr.ª Deputada do CDS, aproveito para dizer que não é este Governo que vai salvar o País e

isso está à vista, este Governo enterra o País. Se alguém salvar o País são os trabalhadores portugueses que

lutam para trabalhar, que lutam pelos seus direitos, apesar deste Governo.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — A próxima pergunta cabe ao CDS-PP. Tem a palavra a Sr.ª Deputada Vera

Rodrigues.

A Sr.ª Vera Rodrigues (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Ministros, Sr.ª Ministra de

Estado e das Finanças, a oposição tem hesitado, ao longo deste debate, entre o discurso das falhas de

previsão e o discurso do salto de canguru, protagonizado esta manhã pelo Sr. Deputado João Galamba.

A realidade que o Partido Socialista tentou construir esta manhã passava mais ou menos por termos

aplicado a sua receita e termos saltado diretamente de 2010 para 2015 e, afinal, ter sido com a receita do

Partido Socialista que o consumo interno cresceu,…

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Exatamente!

A Sr.ª Vera Rodrigues (CDS-PP): — … que as exportações cresceram, que o desemprego cresceu e que

o crescimento apareceu.

O Sr. João Galamba (PS): — Não percebeu nada do que eu disse!

A Sr.ª Vera Rodrigues (CDS-PP): — Sr.ª Ministra, não foi assim e os portugueses sabem que não foi

assim.

Não foi por passo de mágica e sabemos bem o quanto nos custou. E por tudo o que já foi dito neste

debate, mas também porque existe um mar de diferenças entre esta maioria e a oposição, há, pelo menos,

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dois números que são claros e que têm de ficar bem explícitos: há 15 000 milhões de défice que foram

cortados entre 2010 e 2015 e há 8000 milhões de dívida. É esta a diferença que nos separa do Partido

Socialista.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Vieira da Silva (PS): — Não percebeu nada!

A Sr.ª Vera Rodrigues (CDS-PP): — Mas, para além desta fábula irrealista em que o Partido Socialista

vive, nunca chega a explicar como é que se dá este salto e este passo de mágica, este salto de canguru.

Nunca explica como é que financiaria a sua estratégia de crescimento baseada em investimento público,

nunca explica quem é que nos emprestaria dinheiro, nunca explica como é que conseguiria estancar a dívida

com défices sucessivos, nunca explica que impostos aumentaria para controlar o défice ou, pelo contrário, que

despesas cortaria para conseguir atingir esse controlo.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

A Sr.ª Vera Rodrigues (CDS-PP): — Sr.ª Ministra, desconfiamos muitíssimo das intenções deste Partido

Socialista.

Mas ficando a saber que, de facto, o Partido Socialista vive mal com a realidade, enquanto a oposição

discute falhas de previsão, há um País lá fora que se agiganta e que trabalha, perante um Orçamento que é

realista e que acaba com vários mitos.

Sr.ª Ministra, este Orçamento do Estado mostra bem que é possível crescer e, ao mesmo tempo, controlar

o défice; que é possível fazer ajustamento e recuperar emprego; que é possível fazer ajustamento e ganhar

competitividade lá fora; que é possível fazer ajustamento e gerar confiança nos consumidores e nos agentes

económicos; que é possível fazer ajustamento e repor rendimentos aos portugueses; que é possível crescer e

manter excedentes externos.

Mas há outra coisa muito relevante: é que este Orçamento mostra o fim do mito da dívida insustentável, e é

importante que aqui fique claro, Sr.ª Ministra, que dívida é esta.

Há um mapa do Conselho de Finanças Públicas e outro do FMI que mostram bem a decomposição e a

caracterização daquela que é a evolução da dívida pública entre 2010 e 2013. Não é só o Governo, por meio

do Orçamento do Estado, que identifica os efeitos que mais contribuem para a inversão da tendência de

crescimento da dívida pública. Em abono da verdade, há outro efeito muito relevante, o de percebermos se no

montante de dívida que temos nesta altura estão ou não refletidas as acumulações de depósitos da

Administração Pública, que o Partido Socialista esvaziou, que o Partido Socialista tinha vazio em 2011,

quando foi preciso pedir dinheiro para pagar salários e pensões.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

A Sr.ª Vera Rodrigues (CDS-PP): — Gostaríamos de saber se neste montante de dívida está ou não a

regularização de dívidas e de responsabilidades com as quais nós não contávamos, que não estavam inscritas

no Orçamento e que agora temos de pagar e, evidentemente, se está ou não o reflexo do défice primário e do

efeito de juros.

Sr.ª Ministra, não fazemos este exercício por mera retórica. Há um exercício de memória que precisa de ser

feito. Ao contrário do que é hábito da oposição, não temos intenção de «sacudir a água do capote». Trata-se

de algo bem mais profundo: é termos a noção daquele que é o nosso ponto de partida e, qualquer que seja o

caminho que temos a percorrer, é sempre importante sabermos qual é o ponto de partida. Mas, mais: é termos

uma noção clara e evidente de que a inversão desta trajetória significa deitar pela janela fora todos os

sacrifícios e todos os objetivos que já foram alcançados.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

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A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças para responder.

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — Sr.ª Presidente, começo por responder ao Sr. Deputado

Nuno Reis, que me colocou a primeira questão, mas, também, em parte, à Sr.ª Deputada Vera Rodrigues,

relativamente à questão da dívida pública.

Efetivamente — e já tive o cuidado de referir esses dados quando estive na COFAP a apresentar o

Orçamento do Estado —, com a alteração da metodologia estatística, nós temos agora a possibilidade de

fazer a verdadeira comparação dos níveis de dívida ao longo destes últimos anos. E aquilo que podemos

verificar, quando consideramos o SEC 2010 (Sistema Europeu de Contas 2010), e apenas para comparação

de quem, efetivamente, criou dívida no Governo anterior — portanto, no mandato que decorreu entre 30 de

setembro de 2009 e junho de 2011 —, é que o Governo anterior aumentou a dívida em 54 944 milhões de

euros, o que equivale a 29,2 pontos percentuais do PIB, em menos de dois anos.

Este Governo, em três anos — com suposta espiral recessiva, com o efeito da bola de neve, com todas

aquelas coisas que ouvimos aqui hoje e ao longo destes últimos três anos —, aumentou-a em 28 561 milhões

de euros, em 20,1 pontos percentuais. E ainda tem dinheiro nos cofres, ao contrário do que nós encontrámos

quando chegámos.

O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — Veja o que fez ao povo!

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — Estes são os números em termos de SEC 2010, que são os

verdadeiramente comparáveis, ou seja, quando consideramos toda a dívida que existia, independentemente

de estar ou não registada nas contas. E embora a Sr.ª Deputada Isabel Santos diga que eu faço um jogo de

números, isto não é um jogo de números, são números que se retiram da base de dados do Banco de Portugal

— se tiverem curiosidade de fazer as contas, estão lá.

Quanto às questões colocadas pelo Sr. Deputado Nuno Reis relativamente à solução da dívida ao nível

europeu, devo dizer que o que me causa mais estranheza é o Partido Socialista referir a necessidade de

encontrar uma solução para a dívida ao nível europeu, de apelar e defender a mutualização da dívida e depois

termos tantos autarcas do Partido Socialista que, quando têm de participar no Fundo de Apoio Municipal para

serem solidários com outras autarquias, entendem que não têm de pagar para quem se portou mal. Não sei se

é o mesmo partido, mas que não parece, não parece, Srs. Deputados.

Quanto à discussão sobre a dívida pública, efetivamente é importante que se saiba a posição de cada

partido, nomeadamente dos partidos que dizem ter ambição de ser governo, mas muito importante para os

portugueses é que se perceba porque é que a dívida pública é tão grande. Eu já o disse hoje aqui e já o tinha

dito em ocasiões anteriores: dívida é memória; dívida é o resultado dos comportamentos passados, e essa é a

questão principal que nós devemos compreender na dívida. Não se trata só de como vamos pagá-la mas,

sobretudo, de como vamos evitar voltar a deixá-la crescer, sob pena de passarmos o resto dos nossos dias

numa montanha-russa de recessões e falsas recuperações que dão aos portugueses aquilo que não

merecem, que é uma vida sem futuro.

A Sr.ª Deputada Isabel Santos fala na «candura» com que apresento os números e o Sr. Deputado João

Galamba, no ano passado, falava em «convicção». Suponho que, embora com palavras diferentes, se refiram

mais ou menos ao mesmo e que, na prática, com isso, estejam a tentar querer dizer que as previsões não têm

credibilidade. Não é a convicção que retira credibilidade às previsões, antes pelo contrário. E, sobretudo, não

são os resultados efetivos, que mostram que as previsões estavam certas, que levam a classificar como

«candura» a forma como as previsões são apresentadas.

A Sr.ª Deputada diz-me que eu não falo no tema da Administração Pública. Sr.ª Deputada, eu tenho não só

o maior respeito pela Administração Pública, como eu própria trabalhei no setor público em toda a minha

carreira não académica há mais de 20 anos. Não só tenho o maior respeito como sou parte dessa

Administração Pública, quadro dessa Administração Pública, que conheço por dentro, com os seus méritos,

com as suas dificuldades, e que nos merece o maior respeito.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Muito bem!

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A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — E é precisamente porque nos merece o maior respeito que

temos de garantir que a Administração Pública é mais eficiente, que presta bons serviços aos cidadãos, que

não pesa excessivamente na despesa, para evitar que, no futuro, tenha de sofrer penalizações injustas. É a

bem da Administração Pública que as medidas que tomamos têm vindo a ser tomadas.

Estranho, apenas, que a Sr.ª Deputada fale de que não há camas nos hospitais. Aquilo que este Governo

tem feito é, continuamente, reforçar o orçamento da saúde. Mas a maneira como a Sr.ª Deputada fala faz

parecer até que não havia listas de espera no Serviço Nacional de Saúde no tempo do Governo do Partido

Socialista.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Nem dívida!

Protestos do PS.

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — Também já se esqueceram dessa parte. Não havia, nada!…

Toda a gente era atendida na hora — sabemos, Sr.ª Deputada!…

A Sr.ª Isabel Santos (PS): — E o Tribunal Constitucional? E a Constituição?

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — Em relação à questão que procuram constantemente

colocar sobre dizermos ao que vimos e o que é que em 2016 será feito aos salários, devo dizer, Sr.ª

Deputada, que eu própria, quando apresentei o documento de estratégia orçamental no dia 30 de abril, disse

claramente: «A intenção do Governo é fazer uma reversão gradual das reduções salariais.» O Tribunal

Constitucional, como já foi hoje aqui dito e repetido, disse que tal não estava devidamente determinado e

quantificado e, como tal, não se pronunciava. Ou seja, não disse nem que sim, nem que não; entendeu que

não tinha condições para se pronunciar.

Mas como nós, Sr.ª Deputada, gostamos de dizer ao que vimos para que os portugueses saibam com o

que podem contar, reiteramos a intenção de fazer uma reversão gradual das reduções remuneratórias,

especificando que serão de 20% ao ano, precisamente para garantir que uma reposição de uma única vez não

deita abaixo e não faz voltar para trás tudo aquilo que já conseguimos, pois, nesse caso, em vez de se fazer

uma reversão gradual, teríamos de voltar a fazer novos cortes, e isso, todos os trabalhadores do setor público,

nos quais eu me incluo, de facto não merecem.

A Sr.ª Isabel Santos (PS): — E os cortes?

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — Sr. Deputado Miguel Tiago, vamos lá ver se nos

entendemos de uma vez por todas relativamente ao valor de 1500 milhões de euros: nós temos, no capítulo 60

do Orçamento do Estado, um montante global que está previsto para fazer empréstimos a entidades públicas,

nomeadamente a empresas públicas ou ao Fundo de Resolução, se for necessário. Esse montante pode ser

transferido das empresas públicas para o Fundo de Resolução, ou vice-versa. Repito, com toda a clareza: não

há nenhuma previsão de necessidades adicionais do Fundo de Resolução em 2014 — porque é de 2014 que

o Sr. Deputado está a falar, embora hoje estejamos aqui a discutir o Orçamento para 2015 — que nos levem a

pensar que esse montante ou qualquer outro seja necessário no Fundo de Resolução. Esse montante estava

previsto no Orçamento do Estado desde que há um ano, o apresentámos e é do Orçamento de 2014, e não do

Orçamento para 2015, que estamos a falar.

O Sr. Deputado diz também que até a própria metodologia de cálculo do défice favorece a banca. Em

primeiro lugar, e como todos sabemos, a metodologia de cálculo do défice não é determinada pelo Governo,

decorre de regras internacionais que são iguais para todos. E a razão pela qual determinadas despesas, como

salários, abonos de família ou pensões, contam para o défice é porque acontecem todos os anos, é porque

todos os anos se repetem. As outras medidas acontecem uma vez; elas são registadas, mas não têm impacto

para a frente. Não é preciso arranjar impostos para as financiar para a frente, mesmo quando acontecem.

No caso dos bancos do sistema português que foram recapitalizados, eles já devolveram a maior parte do

dinheiro que lhes foi emprestado, e com bastante lucro para o Estado, Sr. Deputado. O que aconteceu com o

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Banco Espírito Santo, mais uma vez, é uma solução que coloca o ónus e a responsabilidade sobre o sistema

financeiro e não sobre os contribuintes. E repetirei isto tantas vezes quantas forem necessárias.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — E quem é que paga?

A Sr.ª Presidente: — A Mesa regista ainda duas inscrições para pedidos de esclarecimento à Sr.ª Ministra

de Estado e das Finanças.

Para o efeito, tem a palavra a Sr.ª Deputada Conceição Ruão.

A Sr.ª Conceição Bessa Ruão (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra, se me permite, e antes de lhe

colocar uma questão, gostaria de fazer dois incisos.

Há pouco, o Sr. Deputado Nuno Santos fez uma citação do Sr. Primeiro-Ministro e eu queria só recordar

que, há dois anos, a dúvida era a do acesso aos mercados para financiamento da República. Hoje, não se

trata do acesso, mas sim do melhor preço a pagar pelas diferentes emissões, o que faz toda a diferença dos

preços que pagamos, bem melhores, quase, do que há dez anos.

Aplausos do PSD.

Em segundo lugar, houve um simples pormenor na intervenção do Sr. Deputado Vieira da Silva, mas que

não foi só isso. O Sr. Deputado reconheceu e assinalou como o Governo geriu este difícil período e, por um

momento, implicitamente, admitiu e reconheceu a situação de dificuldade em que o PS deixou este País.

Mas, prosseguindo, Sr.ª Ministra, apesar de todos os sacrifícios e dificuldades, este Governo conseguiu

manter a proteção aos trabalhadores com menores recursos. Porém, os trabalhadores da Administração

Pública com remunerações mais elevadas foram chamados a contribuir com um maior esforço para a

consolidação orçamental ao longo dos últimos anos.

Reconhecida a possibilidade de iniciar a reversão de medidas de caráter transitório, executadas num

contexto de emergência financeira, foi e é de determinar o espaço orçamental disponível para iniciar esse

processo de reversão.

Sr.ª Presidente, Srs. Ministros, queria deixar-lhes aqui, especialmente à Sr.ª Ministra, algumas questões.

Como será acautelada, do ponto de vista do impacto orçamental, a reversão salarial aos funcionários da

Administração Pública em 2015? Como decorrerá a reversão da redução remuneratória no setor público

empresarial? No âmbito do processo de reestruturação e criação de condições para assegurar a

sustentabilidade financeira e económica das empresas e entidades do setor público empresarial, quais as

medidas previstas? E, em especial, como é tratada a área da saúde neste contexto?

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Para colocar a próxima pergunta, tem a palavra o Sr. Deputado Jacinto Serrão.

O Sr. Jacinto Serrão (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra, quando foi conhecida a dívida oculta da

Madeira, de 6,3 mil milhões de euros, o Sr. Primeiro-Ministro disse que iria agir sem contemplações para o

apuramento das responsabilidades políticas do Governo regional e para o apuramento da verdade. Em relação

a uma dívida de 6,3 mil milhões de euros oculta, grande parte dela em faturas escondidas na gaveta.

Por causa destas ilegalidades do Governo Regional, o Governo da República impôs um austero plano de

resgate à Região Autónoma da Madeira, conferindo a todos os madeirenses e porto-santenses uma dupla

austeridade, que deixa a economia no estado em que está e os madeirenses praticamente exangues.

O DCIAP, o Ministério Público, abriu um processo para o apuramento da verdade e solicitou ao Governo

que colaborasse neste âmbito para o apuramento da verdade dos factos. E — pasme-se! —, no relatório

apresentado pelo Ministério Público, pode ler-se, na página 3, que o Governo da República se recusou

perentoriamente a prestar a colaboração solicitada pela justiça.

Sr.ª Ministra, quero fazer-lhe duas perguntas.

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Primeira pergunta: por que é que, tal como consta do relatório do Ministério Público, o Governo da

República, através da Inspeção-Geral de Finanças (IGF), se recusou perentoriamente a colaborar com a

justiça?

Segunda pergunta: Sr.ª Ministra, de que lado está, afinal, o Governo? Está do lado dos cidadãos que vivem

na Região Autónoma da Madeira? Ou está do lado das cúpulas do PSD/Madeira?

Aplausos do PS.

Protestos do Deputado do PSD Correia de Jesus.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças.

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Conceição Ruão, quanto à

questão da reversão remuneratória, que se vai operar já no próximo ano de 2015, efetivamente haverá uma

reversão de 20% da redução remuneratória que está agora em vigor e que será para todos os trabalhadores

que são abrangidos pela redução remuneratória, quer da administração central, quer da administração local,

quer do setor empresarial do Estado, quer do setor empresarial local, isto é, todos aqueles que são hoje

abrangidos pela redução remuneratória verão essa redução reverter 20% a partir do próximo ano.

Naturalmente que o custo associado a essa reversão está incluído no Orçamento do Estado e está,

obviamente, considerado naquilo que são as nossas metas do défice.

Quanto à questão do tratamento da área da saúde, os hospitais-empresa, que, lembro-me bem, há alguns

anos, fizeram parecer que tinham reduzido muito o número de funcionários públicos, estão de volta, ou seja,

como eles verdadeiramente nunca desapareceram e nunca houve uma redução de funcionários públicos,

agora já estão de volta dentro do perímetro das contas públicas e verificamos que, de facto, esse movimento

anterior foi só, esse sim, um «faz de conta».

Esses hospitais têm uma situação muito deficitária, como, aliás, e infelizmente, uma grande parte das

empresas públicas, como é o caso das empresas do setor de transportes. Aquilo que o Governo tem vindo a

fazer é melhorar estruturalmente a situação de todas essas empresas, passando situações de défice

operacional para resultados operacionais positivos e indo, com sucessivos aumentos de capital, resolvendo a

dívida que foi acumulada e que está hoje dentro do perímetro das contas públicas.

Nos hospitais-empresa, a intenção do Governo é fazer também um processo semelhante, em que a

recapitalização dos hospitais e a sua colocação no caminho de uma trajetória mais saudável e sustentável do

ponto de vista empresarial lhes permita também com isso reduzir as dívidas acumuladas. É, mais uma vez,

aquilo que temos vindo a fazer em todos os vários casos.

Quanto ao Sr. Deputado Jacinto Serrão, lamento informá-lo, Sr. Deputado, mas não sei a que relatório se

refere, não consegui perceber exatamente qual era a citação que o Sr. Deputado fazia desse relatório do

Ministério Público e acho muito estranho que a IGF se tenha recusado a colaborar com o Ministério Público.

Não conheço o relatório, irei procurar saber o que se passa, mas parece-me que só pode haver aí uma má

leitura ou um mal-entendido. Não é de todo razoável que isso possa ter acontecido. Em todo o caso, se tivesse

havido alguma recusa de um organismo do Ministério das Finanças em dar a informação seguramente que o

pedido me teria chegado e que o juiz teria obrigado a que a informação fosse prestada.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Jacinto Serrão (PS): — Peço a palavra, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente: — Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Jacinto Serrão (PS): — Para fazer uma interpelação à Mesa, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.

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O Sr. Jacinto Serrão (PS): — Sr.ª Presidente, é para solicitar à Mesa que faça distribuir na Sala,

particularmente na bancada do Governo, o relatório do Ministério Público, que já é do conhecimento público,

onde se diz, na página 2, que, atendendo às especificações técnicas e ao tipo de conhecimentos, atendendo

ao objeto do inquérito, e para o apuramento cabal dos factos, foi solicitada a colaboração da Inspeção-Geral

de Finanças. Na página 3, é dito que «no que diz respeito à Inspeção-Geral de Finanças, em reunião mantida

na presença da então Sr.ª Diretora do departamento, foi-nos perentoriamente negada a disponibilidade de

qualquer técnico, sem que para tal tivessem sido apresentadas quaisquer razões».

A Sr.ª Presidente: — Será feita a distribuição, Sr. Deputado.

O Sr. Jacinto Serrão (PS): — Sr.ª Presidente, posso fazer chegar o relatório do Ministério Público, do

DCIAP, para que a Sr.ª Ministra fique na posse da informação completa.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Também tem a sentença?!

A Sr.ª Presidente: — O documento será distribuído, Sr. Deputado.

A próxima intervenção cabe ao Partido Socialista e será feita pelo Sr. Deputado Eduardo Cabrita.

Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Eduardo Cabrita (PS): — Sr.a Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.

as e

Srs. Deputados: Este é o último Orçamento de um Governo em desagregação, a poucos meses do juízo final

dos portugueses. Depois de quatro Orçamentos e de oito Orçamentos retificativos, chegamos a este debate de

um Orçamento que o Governo sabe que não irá executar e que confessa o reconhecimento do esgotamento

de um modelo económicoque nasceu do clamor da intervenção externa e que se sente perdido desde que

deixou de ter a tutela da sua musa inspiradora.

É este o Governo que, em 2012, pelo saudoso Álvaro Santos Pereira, anunciava o fim da crise. É este o

Governo que, em 2013, pelo desiludido Vítor Gaspar, dizia que era essa a hora do investimento. É este o

Governo que, em 2014, pelo irrevogável Paulo Portas, dizia que o momento da libertação chegaria em maio,

mas que confirma, neste Orçamento, o quarto ano de aumento de impostos, confirma a desistência de

introduzir alterações estruturais na economia portuguesa, confirma, hoje ainda aqui, uma cruzada permanente

contra a Constituição e o Estado de Direito, confirma a violação sistemática do contrato social com os

pensionistas e com os trabalhadores do Estado e confirma a aversão pela concertação social.

Este Governo, que é filho da crise da dívida e do sistema financeiro, chegou com uma dívida pública de

94% do PIB e encontra-se, hoje, com mais de 130% do PIB de dívida pública.

Este é o Governo que acompanhou intervenções em que quatro dos cinco maiores bancos foram sujeitos

ao apoio do Estado e em que a questão do acesso ao financiamento e da falta de confiança no futuro são os

maiores problemas identificados pelas empresas.

Aplausos do PS.

Este é o Governo que mais comprimiu a procura interna em democracia, pela primeira vez, com três anos

consecutivos de recessão, é o Governo que, no ano passado, se ufanava do milagre estrutural do equilíbrio

das contas externas e que, este ano, celebra a recuperação do aumento das importações de automóveis. Este

é o Governo que se orgulhava do ajustamento orçamental, feito em dois terços pelo lado da despesa e que

encerra o seu ciclo com medidas que, em 90%, se devem ao aumento de impostos.

Este é o Governo que destruiu ativos estratégicos da economia nacional, sem se preocupar em dar

cumprimento à lei que aqui aprovou, de regular o dever de salvaguarda do interesse nacional em processos de

privatizações.

Mas se na despesa as opções pela degradação do ensino básico e secundário ou pela estigmatização dos

mais pobres como os beneficiários do RSI (rendimento social de inserção) e do complemento solidário para

idosos são obsessões ideológicas que nem as criticas da OCDE ou da UNICEF conseguem travar, é na

política fiscal que se revela a total falência de quatro anos de governação…

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Aplausos do PS.

… de coligação entre o partido que escolheu governar com o FMI e o antigo partido dos contribuintes.

Em 2015, a carga fiscal atinge um valor recorde tanto se medida em termos absolutos como se medida

relativamente ao PIB, a composição da receita acentua a penalização dos rendimentos do trabalho e da classe

média, e não há fábula de desagravamentos futuros ou de reformas fiscais paralelas que iludam as

consequências para os portugueses das opções deste Orçamento.

De aumento de impostos se escreverá a história deste Governo, a saber: do imposto extraordinário sobre

os salários, não previsto no Memorando da troica, logo à chegada em 2011, assim como do aumento do IVA

sobre a energia de 6% para 23%; do aumento do IVA, em 2012, incluindo o famoso aumento do IVA da

restauração de 13% para 23%, tão criticado pelo dirigente do CDS, Pires de Lima, antes de assentar praça no

Conselho de Ministros; da enorme reforma do IRS, em 2013, que reduziu os escalões de oito para cinco e

aumentou a receita em 35%, em 2013, e acima de 10% com as liquidações feitas em 2014, mas, então, sem

necessidade de qualquer comissão de reforma com especialistas, sem necessidade de diálogo social, de

apelo ao consenso político ou de preocupação com as famílias.

É assim com o aumento do IMI, em 2015, superior a 10%, pelo fim da cláusula de salvaguarda,

penalizando as famílias, mais uma vez afetadas pelas opções deste Governo.

No ano passado, o PS contribuiu para que se fizesse justiça nas alterações introduzidas no IRC. Foi graças

ao PS que foi travado o aumento em 75% do pagamento especial por conta.

Aplausos do PS.

Foi graças ao PS que as pequenas e médias empresas tiveram uma nova taxa de imposto de 17% para os

primeiros 15 000 € de lucros. Foi graças ao PS que foi feita justiça e que as empresas com mais de 35 milhões

de euros de lucros não tiveram nenhum abatimento fiscal, porque, como dissemos, enquanto houvesse cortes

de pensões e de salários, não seria justo que beneficiassem de qualquer redução de imposto.

Aplausos do PS.

É esse acordo que, grosseira e unilateralmente, o Governo viola neste momento. Este Governo, que só

paga pensões porque o Tribunal Constitucional o condenou a fazê-lo,…

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Tenha vergonha!

O Sr. Eduardo Cabrita (PS): — … que só devolve salários porque o Tribunal Constitucional o condenou a

fazê-lo, e que aumenta, de novo, a carga fiscal, com a sobretaxa a pagar por inteiro em 2015, demonstra quais

são os seus verdadeiros padrões de justiça social.

Aplausos do PS.

Para as tão cantadas pensões mínimas 2,5 € por mês, para as empresas 247,5 milhões de euros de

abatimento fiscal em IRC, num momento em que o Governo diz não ter qualquer margem para a redução de

impostos. São estes os critérios de justiça e os critérios de avaliação da margem de intervenção em matéria

fiscal por parte deste Governo.

Aplausos do PS.

Já ouvimos falar aqui hoje de uma agenda fiscal paralela para um futuro incerto, de propostas ditas

«neutrais». Faremos esse debate na altura própria, sem biombos que disfarcem as opções deste Governo.

Mas a Sr.ª Ministra das Finanças, que tanto disse que essas reformas seriam neutrais, talvez pudesse hoje

ter explicado aquilo a que o responsável pela comissão de reforma chamou de «uma grande salganhada», ou

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confirmado se é ou não verdade que o fim da dita «neutralidade» implica, quando este Orçamento nem sequer

está aprovado, que se comece, desde já, a preparar um Orçamento retificativo para 2015.

Aplausos do PS.

Mas, sobretudo, importa não confundir os contribuintes que sofreram 4000 milhões de aumento de imposto

com os eventuais 150 milhões resultantes desta alteração em matéria de IRS.

Acreditamos no papel do Estado regulador, no seu papel único na garantia da igualdade de oportunidades

e na prioridade do combate à pobreza, denunciada esta semana quer pela OCDE, quer pela UNICEF.

Não confundimos os vossos «amanhãs que cantam» da devolução da sobretaxa com o presente enorme

aumento de impostos. Não confundimos a preocupação na união dos portugueses pelo futuro e pela confiança

no crescimento com a guerra civil dos novos contra os velhos, do privado contra o público ou com o desânimo

coletivo causado pelos apelos à emigração.

Estamos num Governo que, hoje, é considerado a viver um tempo perdido. Foi isso que nos disseram

todos os parceiros sociais. Os próximos meses serão um tempo perdido. É tempo de criar a aliança com os

portugueses pelo futuro, lançar os compromissos para novos tempos de justiça fiscal, de redescoberta do

papel do investimento, de prioridade ao emprego e de aposta no crescimento.

A melhor boa notícia deste Orçamento é que é o último deste Governo!

Aplausos do PS.

Entretanto, assumiu a presidência o Vice-Presidente António Filipe.

O Sr. Presidente: — Inscreveu-se, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Luís Menezes.

Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Eduardo Cabrita, ponderámos, durante algum

tempo, se lhe poríamos alguma questão relativamente a esta sua intervenção porque, tendo tido o cuidado de

ver a intervenção que fez no ano anterior, constatámos que, basicamente, repete os mesmos argumentos,

com palavras diferentes, e que, de facto, é coerente no seu discurso.

A única questão que gostaria de lhe lembrar — e vou ter o cuidado de o citar — é que a falta de

credibilidade que o Sr. Deputado Eduardo Cabrita dizia que o Orçamento do Estado para 2014 tinha, quer no

crescimento económico, que era, na altura, de 0,8%, quer na taxa prevista de desemprego, que era, na altura,

de 17,7%, foi contrabalançada com uma perspetiva de crescimento do PIB de 1%, para este ano — o Governo

errou de facto, mas por defeito! —, e com uma previsão, para este ano, quanto ao desemprego médio de

14,2%, contra os 17,7%.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Veja bem!

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Por isso, admiro a sua coerência discursiva, mas a sua falta de credibilidade

é total. Os números falam por si, não somos nós que estamos a falar.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Sr. Deputado, não posso deixar de falar em algumas contradições. Este

Orçamento pode ter muitos defeitos, mas é um Orçamento corajoso, sério e ambicioso.

É um Orçamento corajoso, porque tem a capacidade de, em áreas como as parcerias público-privadas,

cortar mais de 300 milhões de euros, só para 2015, face àquilo que os senhores deixaram de Orçamento em

2011.

É um Orçamento sério, porque, ao contrário do que os senhores dizem, as suas perspetivas

macroeconómicas estão todas enquadradas dentro das previsões dos organismos internacionais.

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O Sr. Deputado Vieira da Silva disse que a OCDE prevê um crescimento diferente daquele que é previsto

no Orçamento do Estado. De facto, é verdade: prevê 1,4% e o Orçamento do Estado prevê 1,5% — é uma

diferença gigantesca! O FMI prevê 1,5%, a Comissão Europeia prevê 1,5%. Por isso, se há coisa que este

Orçamento de Estado é, é credível na base, nas suas fundações.

Sr. Deputado Eduardo Cabrita, há uma coisa que não admitimos: que desdenhe, do alto da tribuna, do

aumento das pensões mínimas dizendo que são uns meros 2 €, quando foi o seu Governo que as congelou e

fomos nós que as descongelámos. Isso nós não vamos, de maneira nenhuma, aceitar!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Sr. Deputado, termino fazendo um comentário em jeito de pergunta. Esta maioria está muito curiosa em

perceber o que é que vai nascer deste novo PS, o que é que o Partido Socialista do Dr. António Costa vai

trazer em termos de propostas concretas para este Orçamento. O Partido Socialista do Dr. António Costa,

sobre questões de austeridade, tinha opiniões muito interessantes proferidas pelo Deputado Vieira da Silva em

2010, que dizia que a austeridade era essencial para o crescimento. Por isso, pergunto quais são as propostas

concretas que o Partido Socialista vai trazer em sede de especialidade.

Não é esta a altura para as discutir, mas estamos muito curiosos em saber se vai haver propostas

concretas ou se será o cheque em branco que temos visto nos últimos meses.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado Eduardo Cabrita, tem a palavra para responder.

O Sr. Eduardo Cabrita (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Menezes, agradeço-lhe mais pela

intervenção que fez do que pela questão que teve oportunidade de me colocar.

Queria dizer que compreendo a sua dificuldade. Compreendo, aliás, a circunstância terrível de ter

preparado a sua intervenção sem qualquer relação com o que eu disse na minha intervenção,

fundamentalmente centrada na ilusão fiscal de um Orçamento que atinge um record histórico em matéria de

carga fiscal. É o quarto Orçamento sempre a aumentar a carga fiscal e que estabelece um record quer em

termos de volume de receita quer em termos de relação com o PIB, qualquer que seja o critério.

Sr. Deputado, por isso, compreendo a sua dificuldade em enfrentar essa matéria, tanto mais quando

defende com ânimo, com pundonor, que cumprimento, um Governo que bateu um outro record: em 40 anos de

democracia, nunca, numa legislatura, repito, nunca um Governo conseguiu apresentar oito Orçamento

retificativos, corrigindo sempre o «tiro», corrigindo sempre o desacerto das suas previsões.

Aplausos do PS.

Mesmo admitindo, como hipótese de trabalho — porque só saberemos os dados finais sobre o

crescimento, sobre a evolução da economia em 2014 no primeiro trimestre de 2015 —, que o Sr. Deputado

tem razão, que o Governo vai acertar na previsão quanto ao percentual de crescimento, o Governo

reconheceu que fracassou porque, quando dizia que ia haver um crescimento baseado nas exportações, o que

houve foi um abrandamento das exportações e um crescimento baseado no aumento do consumo interno, em

larga medida, devido àquele que, insolitamente, tem sido o melhor defensor da recuperação económica: não o

Governo, mas o Tribunal Constitucional.

Aplausos do PS.

Sr. Deputado, também fico surpreendido porque, tendo caraterizado aquilo que é o orgulho do Deputado

que participou ativamente, no ano passado, na discussão que ocorreu, no Parlamento, com o PSD e com o

CDS, sobre a necessidade de criar mecanismos de estabilidade fiscal, de previsibilidade fiscal, de justiça

fiscal, protegemos, por isso, as pequenas e médias empresas, impedimos, por isso, o crescimento em 75% do

pagamento especial por conta, como queria o seu Governo, impedimos, por isso, que houvesse benefício

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fiscal imerecido para as empresas que têm lucros superiores a 35 milhões de euros e que não beneficiaram 1

cêntimo da alteração feita ao IRC e, mais, fizemos, por isso, depender qualquer futura evolução das taxas —

artigo 8.º, n.º 1, da Lei n.º 2/2014, sempre esquecida pela Sr.ª Ministra das Finanças e pelas intervenções da

direita — da evolução das taxas do IRS e do IVA.

Ora, é este o quadro e, grosseiramente, mostrando quais são as vossas opções, direi que elas são claras:

corte de 100 milhões nas prestações sociais; quanto ao aumento das pensões mínimas, respeito, porque

respeito o trabalho, respeito aqueles que têm sido massacrados pelo aumento da pobreza e pelo aumento da

desigualdade que a OCDE e a UNICEF denunciavam esta semana que se têm verificado desde 2011. Com

esse aumento, estou solidário. Não estou é solidário com um Orçamento em que não há qualquer margem

para a redução de impostos e em que a única redução é relativa, fundamentalmente, às grandes empresas e

vale 247 milhões de euros.

Essa é a vossa escolha (2,5 € e 247 milhões de euros), esse é o vosso padrão de justiça!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Vamos passar à próxima intervenção, da parte do Governo.

Tem a palavra o Sr. Ministro da Economia.

O Sr. Ministro da Economia (António Pires de Lima): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Orçamento do

Estado para 2015 é um Orçamento que consolida a trajetória de recuperação da procura interna, que estimula

o aumento do investimento e que está alinhado com a vocação exportadora do nosso tecido empresarial.

Exportações, consumo privado e investimento: estes são os três motores em que assenta a recuperação

da nossa economia.

O motor do consumo privado é alimentado pela confiança dos consumidores, que atingiu este mês,

segundo dados do INE, o valor mais alto desde maio de 2002, ou seja, o valor máximo em 12 anos — repito, o

valor mais alto desde 2002 —, mas também em 2015, pela recuperação dos salários da função pública e pela

atualização em mais de 4% do salário mínimo nacional, um sinal de valorização e dignificação do trabalho

dado a todo o sector privado. Um sinal, é bom lembrá-lo — já o fez antes o ex-líder da oposição —, só

possível com o fim do Programa de Assistência Económica e Financeira.

O motor do investimento privado cresce, pela primeira vez em muitos anos, em 2014 e voltará a crescer,

assim o esperamos, em 2015, alimentado pela confiança dos agentes económicos, agora em máximos desde

2008, e por políticas atrativas.

O supertriplo pacote de atração de investimento é um conjunto de políticas sem paralelo.

Em primeiro lugar, pela ativação, ainda em novembro de 2014, do acordo de parceria Portugal 2020, que

tem 9500 milhões de euros, mais 20% do que o anterior QREN, destinados a promover a competitividade e a

internacionalização das empresas, nomeadamente as pequenas e médias empresas, numa ligação

privilegiada à inovação e à ciência, e com estímulos concretos à empregabilidade.

Portugal, é bom lembrá-lo, foi o segundo País a concluir a negociação do acordo de parceria e é um dos

primeiros países a abrir candidaturas.

Em segundo lugar, a reforma do IRC, que prossegue. Para além da simplificação fiscal para micro e

pequenas empresas, reduz-se a taxa em mais dois pontos, para 21%, a caminho do objetivo anunciado de

17%.

Em terceiro lugar, o novo código fiscal do investimento, que majora em função da geografia, da inovação

tecnológica e da criação de emprego, até 25%, quando hoje não pode superar os 20%, um crédito fiscal em

função do investimento. Um novo código fiscal do investimento que isenta de IRC as novas empresas, as

startups, pelo menos nos primeiros três anos de vida.

Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Quero falar-vos de um País que aproveitou o duro tempo do

ajustamento económico e financeiro para fazer reformas e que por ter tido a determinação de empreender

essas reformas estruturais é hoje, claramente, um País mais competitivo.

Em apenas cinco anos, o peso das nossas exportações passou de 28% para mais de 41% do PIB. A

competitividade é especialmente visível neste crescimento continuado das nossas exportações.

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Passámos de um défice externo na ordem dos 10%, em 2011, para um excedente de 3% do PIB em 2013,

superavit, esse, que se manterá em 2014 e em 2015.

Ora, desse reforço de competitividade, assente em dados económicos reais e constatado

internacionalmente, falam-nos os mais prestigiados rankings internacionais, que incluem o Índice de

Competitividade Global, do Fórum Económico Mundial, o rankingFazer Negócios, do Banco Mundial, o Índice

de Regulação dos Mercados de Produtos, da OCDE, e o Índice Melhores países para fazer negócios, do

instituto americano Forbes.

No Índice de Competitividade Global 2014, um ranking de enorme prestígio publicado em setembro e

monitorizado de perto por investidores internacionais, há um País que subiu 15 lugares entre 144 países, que

está agora em 36.º lugar, colado à Espanha, e que superou a Itália, a República Checa, a Polónia e Malta.

Esse País chama-se Portugal.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Ministro da Economia: — Há um País que progrediu 84 lugares em oito anos e que hoje está no

quinto lugar do ranking quanto à facilidade e rapidez de se iniciar um negócio. Esse País chama-se Portugal.

Há um País cujas escolas de gestão e negócios se encontram no quarto lugar a nível mundial. Esse País

chama-se Portugal.

Há um País onde se destaca a qualidade e oferta dos nossos cientistas e engenheiros, ocupando o oitavo

lugar a nível mundial. Esse País chama-se Portugal.

Há um País que subiu 43 posições na eficiência do mercado laboral. Esse País chama-se Portugal.

Há um País que subiu 28 posições na reforma do mercado de bens e serviços. Esse País chama-se

Portugal.

Aliás, de acordo com o Índice de Regulação dos Mercados de Produtos, da OCDE — um indicador que

mede o impacto dessas mesmas reformas na economia —, Portugal registou a maior evolução entre 2008 e

2013, sendo hoje a décima economia, entre 33 países da OCDE, e o sétimo entre países da União Europeia

no que diz respeito à menor restrição para investir.

Há dados que foram novamente confirmados no relatório Fazer Negócios 2014, publicado ontem, que

dizem que há um País que hoje, num conjunto de 189 economias, está na vigésima quinta posição no ranking

da facilidade em fazer negócios e empresas. Esse País é, obviamente, Portugal.

De acordo com este relatório, somos o País da Europa do sul mais bem posicionado e estamos à frente,

claro, de Itália, de França, de Espanha, mas também estamos à frente de países como a Holanda, a Bélgica e,

inclusivamente, o Japão.

Este progresso não acontece por acaso. Hoje, em Portugal, é mais simples, muito mais simples, iniciar uma

atividade empresarial. É mais direta a relação com o fisco e são menos os impostos a pagar pelas empresas

que criam emprego. É grande a qualidade e a qualificação das nossas pessoas e é manifestamente boa a

nossa infraestrutura pública.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Ministro da Economia: — São as empresas, os gestores e os trabalhadores do setor privado, mas

também a universidade, a escola e a Administração Pública que, numa aliança virtuosa, puxam Portugal para

cima nos rankings e consolidam a recuperação da nossa economia, criando perto de 100 000 postos de

trabalho líquidos ao longo do último ano.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — Mas isso foi só no último ano!

O Sr. Ministro da Economia: — A taxa de desemprego chegou a ser de 17,7% no início de 2013, em

Agosto estava em 13,9% e estou certo de que vai continuar a descer nos próximos tempos.

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O centro da atividade política está nas pessoas, nas famílias. Uma pessoa que quer trabalhar e não tem

essa oportunidade está privada de uma parte da sua dignidade humana.

O combate ao desemprego é uma preocupação permanente do Governo, mas tendo a consciência de que

só o investimento, nomeadamente privado, pode gerar essas oportunidades. Srs. Deputados, com a

recuperação do investimento privado e com a retoma económica, o desemprego vai continuar a cair.

O Estado tem sido um parceiro constante dos programas que criam oportunidades de emprego no sector

privado. É uma parceria sem intrusões e sem intervenções nas decisões de gestão das empresas privadas,

mas que mantém um acompanhamento próximo, sistemas de incentivos com base no mérito e uma agenda

focada para dar à economia e às empresas portuguesas maior competitividade e uma presença crescente a

nível mundial.

Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Estamos no caminho certo. Sim, para cumprirmos o objetivo de uma

economia que gera mais oportunidades para todas as pessoas e para todas as famílias, há ainda muita

estrada para percorrer. Mas o pior que poderia acontecer a Portugal seria não persistir num caminho que

manifestamente está a produzir bons resultados.

Não há maior fator de esperança no futuro do que a confiança que temos nas pessoas. O melhor ativo de

Portugal são os portugueses.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Entretanto, reassumiu a presidência a Presidente, Maria da Assunção Esteves.

A Sr.ª Presidente: — Sr. Ministro da Economia, a Mesa registou a inscrição, para fazer perguntas, de sete

Srs. Deputados.

Entretanto, a Mesa já foi informada que o Sr. Ministro irá responder, em primeiro lugar, a um conjunto de

quatro perguntas e, depois, às últimas três.

Sendo assim, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias, do PCP.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Economia, importa talvez retificar o que parece

ser um equívoco. O Sr. Ministro está, de facto, a discutir o Orçamento do Estado, não está num roadshow de

propaganda daqueles que tem feito ao longo do tempo em que tem vindo a exercer funções.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — A verdade é que um em cada quatro portugueses está em risco de pobreza,

houve 120 000 portugueses a sair do País, em 2013, para emigrar, o crédito malparado atingiu níveis recorde,

mas o Sr. Ministro diz que estamos no caminho certo porque os níveis de confiança são do melhor que há.

Muitos parabéns, Sr. Ministro! É este o País que vai na mente de V. Ex.ª, mas não é este o País com que

estamos a trabalhar e a lidar.

Em relação a 2015, os senhores preveem que o consumo privado e o investimento acelerem, que as

importações diminuam e ainda estimam que as exportações de bens e serviços, que vêm abrandando desde o

segundo semestre do ano passado, cresçam 4,7%, isto com um abrandamento da procura externa de alguns

dos nossos principais mercados, designadamente da França e da Alemanha. Aliás, esta manhã, o Sr.

Primeiro-Ministro, na página 3 do discurso, falou, e cito, «num contexto económico internacional adverso».

Pergunto, então: exportar para onde?

Entretanto, o Governo prevê, para 2015, um investimento global indigente de 15,2% do PIB e o

investimento público a preços correntes caiu 30% desde o início do mandato deste Governo e, hoje, atinge

níveis inferiores aos de 1996. A situação do investimento privado não é muito melhor, é inferior à situação de

1998 e caiu 15% desde 2011.

Para além disso, a produção industrial está em queda — são dados do INE referentes a setembro, que o

Sr. Ministro não referiu —, a produção de bens de consumo está a cair 6,5% e as indústrias transformadoras

estão a cair 3,6%.

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O Sr. Ministro quer mesmo continuar com essa propaganda? Quer continuar com esse discurso do milagre

económico, enquanto prossegue o massacre às micro e pequenas empresas confrontadas com a asfixia fiscal,

com a burocracia, com a falta de financiamento, com o crédito malparado a atingir níveis recorde? O Sr.

Ministro não teve, outra vez, uma palavra para essa inqualificável opção política de manter a taxa máxima do

IVA da restauração, desprezando um setor inteiro e tendo em conta o contributo que representa para o País!

Sr. Ministro da Economia, enquanto o Governo enche o discurso com a confiança dos mercados e o

milagre económico, o País enfrenta a vossa política de desmantelamento da economia.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — O Sr. Ministro não sabe, nem quer saber, quais são as consequências

decorrentes de deixar cair a PT, seja lá o que for que aconteça, porque é uma empresa privada.

O Sr. Ministro não sabe, nem quer saber, quais são as consequências decorrentes de entregar aos grupos

económicos o maior exportador nacional: a TAP, companhia aérea de bandeira. Considera, porventura, que

nos esquecemos que já não existiria hoje a TAP se a entrega desta companhia aérea à Swissair tivesse

avançado, como o Governo PS tentou na década de 90?

O Sr. David Costa (PCP): — Bem lembrado!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — O Sr. Ministro quer avançar para novas PPP nos transportes, sabendo que a

STCP e a Metro do Porto não vão poder pagar aos privados que ficarem com o negócios os mais de 1000

milhões de euros que os contratos impõem! Esse pagamento será feito à custa de mais dívida, Sr. Ministro?

Os senhores podem falar na confiança que têm nos portugueses, mas o que a vida está a demonstrar é

que os portugueses não podem confiar num Governo que não é de confiança.

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

A Sr.ª Presidente: — A próxima pergunta cabe ao CDS-PP.

Tem a palavra o Sr. Deputado Hélder Amaral.

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Economia, acho que o País tem vivido

desde há muito tempo a esta parte, e este Orçamento é prova disso, um clima de renovada esperança,

esperança essa que tem visibilidade em muitos sinais.

Hoje mesmo, verificou-se um desses sinais: o indicador de confiança dos consumidores é o melhor desde

2002, o que é uma prova claríssima disso.

Por isso, estranho que a oposição, que é cega por alguns constrangimentos ideológicos, ou por falta de

respeito e de confiança nos portugueses, não queira perceber que há, de facto, algo que está a mudar, algo

que já mudou e algo que vai melhorar no País e na vida dos portugueses.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr. Ministro, cumprimento-o a si e ao Governo por terem conseguido

perceber que, no momento de crise, o fator de confiança era o mais importante, conseguindo ser um

verdadeiro protetor desse sinal de confiança e percebendo que o que era fundamental era ter um Governo que

fosse um parceiro fiável, um parceiro que pudesse facilitar a vida às empresas e aos trabalhadores, e isso foi

feito.

Tal é visível nos três pilares que o Sr. Ministro tem falado e com os quais eu concordo, que são as

exportações, o consumo privado, que cresce 1,7%, e o investimento privado, algo que já não acontecia há

décadas, mas que começa a dar sinais de retoma.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

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O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Estes dados são conferíveis e são tão simples de analisar mesmo para

aqueles que querem ver desgraça onde há factos positivos.

No entanto, há um setor que, no meio disto tudo, é a grande locomotiva: o turismo. Sei que às vezes dizem

que uma economia assente em serviços não é uma economia com futuro, que o turismo não é assim muito

importante.

Por isso, gostava de lhe perguntar, Sr. Ministro, qual é o impacto deste setor na criação de emprego líquido

e qual é o impacto deste setor no PIB.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Podia até dar alguns dados, desde o RevPAR (revenue per available

room), desde o número de dormidas, desde os rendimentos por quarto, desde o gasto por cada turista. Tem

aumentado. Aliás, só no mês de agosto o rendimento aumentou 10%, a somar ao melhor ano de sempre. Só

em termos de dormida são mais 7,1 milhões, o que equivale a 11,3%, a somar a meses e meses de aumento

de resultados.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Bem lembrado!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Isto é algo que está a acontecer por mérito das empresas, dos

trabalhadores, mas também da ação do Governo que, em vez de taxar, optou por facilitar, o que foi positivo.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Também gostava de dizer que este Governo combate a despesa e até

resolve problemas de dívidas deixados por outros. Quanto às parcerias público-privadas tínhamos uma renda

à volta de 700 milhões, mas é bom lembrar que este ano chega a fatura das subconcessões. Foram sete as

subconcessões pensadas para ganhar eleições e não para resolver problemas técnicos do País.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — As subconcessões foram feitas no ano de eleições e a fatura vai agora

cair em quem, mais uma vez, tem de pagar e tem de resolver o problema.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr. Ministro, também gostava de lhe perguntar, em percentagem dos

encargos brutos, quanto significa, em média, a poupança na duração dos contratos. Deve ser um valor

considerável e dá a medida exata do esforço que este Governo fez para cortar na despesa, para poupar e

para pagar dívidas deixadas por outros.

Gostava também de perguntar se a poupança que este Governo já fez compara ou não compara bem com

a proposta do Partido Socialista que queria criar mais uma taxa sobre as PPP. Pergunto-lhe isto para

percebermos quanto é que valia essa dita taxa que, depois, por vergonha ou algum decoro, o PS nunca mais

falou nela,…

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Bem lembrado!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — … e se compara ou não muito mal com os cortes que o Governo já fez

em matéria de parceiras público-privadas.

Portanto, Sr. Ministro, são estes dados claros e objetivos que provam muito bem um Governo que faz, que

corrige erros e que respeita o esforço dos portugueses e uma oposição que tem sempre uma competência

enorme em promover despesa, em promover dívida e, quando toca a hora de assumir responsabilidades, faz

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de conta de não é nada com ela e foge como o diabo da cruz dessas responsabilidades. E é de

responsabilidades que eu queria falar.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente: — A próxima pergunta cabe ao Bloco de Esquerda.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Mortágua.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro Pires de Lima, há um ano o Sr. Ministro só

queria falar de exportações e ouvimo-lo várias vezes falar sobre esse tema, mas qual não é a nossa surpresa

quando, passado um ano, ouvimo-lo iniciar o seu discurso falando da procura interna.

Aliás, também não se percebe por que é que inicia o seu discurso falando da procura interna e tenta tão

insistentemente castigá-la, mantendo o IVA da restauração e mantendo este novo imposto sobre os

combustíveis — e, já agora, gostava de saber qual é sua opinião sobre a fiscalidade verde e mais este imposto

sobre a produção em Portugal.

Mas não gostaria de deixar de lhe dar o prazer de falar sobre exportações e produção industrial. É que há

um país onde o índice de produção industrial teve a maior queda desde setembro de 2013 — bens duradouros

e não duradouros. Esse país é Portugal, esse país, que teve uma queda na produção industrial, é também um

país que está com problemas em exportar, que tem exportado menos, que tem conseguido perder quotas de

mercado e essa dinâmica vai ser agravada pela quebra da procura externa, que está à vista de toda a gente

menos do Governo.

Mas, mais, sabemos também que, segundo um relatório da própria Comissão Europeia que analisa a

qualidade das exportações, há um País em que as exportações perderam qualidade e têm hoje menos valor

acrescentado, menos tecnologias e são mais baseadas em baixos salários. Esse país é Portugal.

É este relatório da Comissão Europeia que diz que Portugal perdeu qualidade nas exportações desde

2007, portanto durante a altura em que estaríamos a melhorar a nossa posição de competitividade. Então,

Portugal debate-se exatamente com os mesmos problemas, ou piores, do que os que tinha antes: falta de

qualificações e menos salários.

Face a estes problemas claros e objetivos da economia portuguesa, o Sr. Ministro da Economia vê um

grupo económico como a PT a desmantelar-se à frente dos seus olhos, pondo em risco um centro de

investigação e desenvolvimento crucial para a economia do País, e nada diz.

Perante isto, o Sr. Ministro da Economia está disposto a vender o maior exportador nacional, que é a TAP,

um centro, também ele, de excelência e de desenvolvimento económico e tecnológico.

Perante isto, o Sr. Ministro da Economia está disposto a vender a EMEF.

Perante isto, o Sr. Ministro da Economia está disposto a fazer concessões — sabe-se lá a quem e em que

modos? —, de todos os transportes.

Portanto, Sr. Ministro, tenho de lhe perguntar: qual é o seu papel? A estratégia que tinha para a economia

falhou, recusa intervir onde deve intervir… Bom, parece-nos que o seu papel é distribuir empresas a grupos

privados.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — A próxima pergunta cabe ao PSD.

Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Leite Ramos.

O Sr. Luís Leite Ramos (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Economia, falemos, então, do

Orçamento do Estado para 2015, de investimento e de fundos comunitários.

O Dr. António Costa, muito recentemente, do seu varandim da Praça do Município, criticou o Governo e a

proposta de Orçamento do Estado com as seguintes frases, que passo a citar: «O País terá menos de 50% de

fundos em execução, o que significa uma redução brutal do investimento com os fundos comunitários.»

Mas, embalado pelas réplicas da espuma mediática e pela oportunidade de, finalmente, ter alguma coisa a

dizer ao País, o Dr. António Costa foi mais longe na sua crítica, afirmando que há «um enorme atraso na

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execução do QREN» e acusou o Governo de «não saber usar os fundos» comunitários e de vir a ter «uma

baixíssima execução no novo quadro comunitário de apoio».

São afirmações curiosas, Sr. Ministro, e eloquentes, sobretudo porque são proferidas por alguém que

pertenceu a um Governo que, em finais de 2008, dois anos depois do início do anterior programa, apenas

tinha executado 1,9% e que em janeiro de 2011, depois de quatro anos de execução, apenas tinha gasto 23%

dos fundos disponíveis.

Vozes do PSD: — Bem lembrado!

O Sr. Luís Leite Ramos (PSD): — Nós já estávamos habituados à amnésia do Partido Socialista

relativamente à herança que deixou ao Governo e ao País; não estávamos era habituados à ligeireza

insustentável e à leviandade irresponsável dos argumentos do Dr. António Costa, que só são compreensíveis

por uma absoluta falta de noção sobre a matéria e por uma grande incompetência.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Pergunto-lhe, Sr. Ministro: Portugal vai ou não utilizar integralmente os fundos comunitários que tem ao seu

dispor no âmbito do QREN para apoiar as empresas e a economia até ao último cêntimo?

O Sr. João Oliveira (PCP): — Espere lá que o Poiares Maduro já lhe dá a tática!

O Sr. Luís Leite Ramos (PSD): — Segunda questão: em 2015, haverá uma quebra do investimento nas

empresas e na economia com recurso aos fundos comunitários?

Terceira questão: qual é, relativamente às empresas, a posição de Portugal, quando comparada com

outros países, na execução destes fundos?

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Economia.

O Sr. Ministro da Economia: — Sr.ª Presidente, vou direto, então, às preocupações aqui manifestadas

pelos Srs. Deputados, a quem agradeço as perguntas e a quem cumprimento.

Começo por dizer que, relativamente ao tema das exportações, Sr.ª Deputada Mariana Mortágua e Sr.

Deputado Bruno Dias, a trajetória das empresas, em 2014, continua a ser positiva. A saber, um crescimento

previsível de 3% no final do ano e um crescimento acumulado até ao final de agosto de 2%, é certo, muito

alavancado por uma economia de serviços transacionáveis ligados, obviamente, também à indústria do

turismo e outras indústrias, que vai levar Portugal, em 2014, a bater o seu recorde de exportações, atingindo,

provavelmente, mais de 69 000 milhões de euros.

Eu acho que a Sr.ª Deputada do Bloco de Esquerda faz muito mal ao dizer que as exportações perdem

quota de mercado, porque, ao dizer isso, não só está a iludir a realidade como, mais do que ao Governo, está

a desqualificar, está a desconsiderar, está a desvalorizar o trabalho dos empresários, dos gestores e dos

trabalhadores,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Tínhamos apostado em como ia dizer isso!

O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — Pois, já sabíamos que ia dizer isso!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Oiçam! Oiçam!

O Sr. Ministro da Economia: — … repito, dos trabalhadores do setor privado.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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Não me pergunte, Sr. Deputado Bruno Dias, para onde é que Portugal vai exportar em 2015, porque, Sr.

Deputado, essa é uma empresa a que o Governo não pode responder; o Governo não exporta,…

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Exporta! Exporta!

O Sr. Ministro da Economia: — … quem exporta são as empresas. O melhor que o Sr. Deputado tem a

fazer é seguir o caminho das empresas.

O que lhes posso dizer, Srs. Deputados Bruno Dias e Mariana Mortágua, é que, através da diplomacia

económica — como, aliás, ainda se viu esta semana no México (de onde acabámos de regressar), depois de

outras viagens que se fizeram à Turquia, à Colômbia, ao Perú, ao Brasil, mas também a destinos mais

tradicionais nas nossas exportações, como é o caso da Alemanha, da Espanha ou da França —, o Governo

procura afirmar-se como um parceiro das empresas privadas.

Que não seja por falta de empenho político que as empresas privadas deixam de esgotar todas as

possibilidades que têm de exportar.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Partilho de algumas das preocupações aqui manifestadas relativamente à evolução do financiamento. Esse

é um tema que nos preocupa.

Os dados dos primeiros meses do ano, nomeadamente até julho de 2014, revelam um crescimento do

crédito bancário de cerca de 5% relativamente aos setores transacionáveis e uma redução dos custos desse

crédito muito substancial.

O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — Onde é que isso está?!

O Sr. Ministro da Economia: — É evidente que algumas adversidades, que conhecemos entretanto, terão

o seu impacto na evolução do crédito e o Governo acompanha de perto a situação, nomeadamente no que

respeita ao crédito às pequenas e médias empresas.

Não deixa de ser verdade aquilo que acabei de dizer: este Governo foi o segundo Governo na União

Europeia a fechar a negociação para o acordo de parceria…

O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — Já foi aprovado?!

O Sr. Ministro da Economia: — … e é um dos primeiros, senão o primeiro País da União Europeia, a abrir

candidaturas já em novembro, de forma a que as empresas possam, durante o ano de 2015, aceder aos

fundos do novo acordo de parceria.

Ainda este mês, depois de cumpridos todos os trâmites nacionais e validados pela Comissão Europeia, vai

ser operacionalizada a instituição financeira de desenvolvimento que, através da banca comercial, agilizará

crédito às pequenas e médias empresas e que, através das capitais de risco privado, agilizará a oferta de

instrumentos de capital e quase capital às pequenas e médias empresas.

Deixem-me dizer, a esse propósito — e entro já na resposta ao Sr. Deputado Leite Ramos, do PSD —,

que, ao nível do QREN, Portugal regista em finais de setembro uma taxa de realização que é a maior da União

Europeia — 83%! Não foi essa seguramente, como sabe, Sr. Deputado, a situação que este Governo herdou

como testemunho do Governo anterior.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Bem lembrado!

O Sr. Ministro da Economia: — A taxa de realização atingirá 87% no fim de 2014.

A taxa de compromisso de candidaturas já ultrapassa os 100%; é de 109%,…

O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — Também era melhor…!

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O Sr. Ministro da Economia: — … pelo que estou em condições de garantir aqui, nesta Câmara, que,

apesar do trabalho pouco cuidado que o Governo que nos antecedeu na execução do QREN,…

O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — Só fala do Governo anterior!

O Sr. Ministro da Economia: — … Portugal atingirá uma taxa de realização de 100% quando o programa

estiver fechado.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Relativamente ao tema das parcerias público-privadas, gostava de dizer que, se não fosse a atuação deste

Governo de uma forma continuada pelo meu antecessor e pelo Sr. Secretário de Estado das Infraestruturas,

Transportes e Comunicações, não teria sido possível reduzir os encargos com as parcerias público-privadas

rodoviárias em 33%.

No tempo de vida destas parcerias, o valor a pagar pelo Estado foi reduzido mais de 310 milhões de euros

por ano, de 22,3 mil milhões de euros antes da negociação para 14,8 mil milhões de euros depois das

negociações realizadas por este Governo.

Qualquer taxa ou taxinha que fosse aplicada por iniciativa de algum partido da oposição, seguramente, não

permitiria nem um terço destes ganhos que foram obtidos por renegociação e sem pôr em causa a reputação,

o bom nome de Portugal.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Por último, duas palavras, de forma breve.

É verdade, Sr. Deputado Hélder Amaral, a preocupação deste Governo tem sido a de ser um guardião, de

proteger os sinais positivos da economia, num braço de ferro entre as adversidades que puxam ou poderiam

puxar a economia para a estagnação e para a recessão e as energias que puxam a economia para cima. O

Governo tem estado neste braço de ferro sempre a puxar pelo lado positivo da economia. E, demonstrando

que não existe nenhuma obsessão com metas orçamentais cegas, corrigimos a meta-objetivo para 2015, não

cedendo à tentação de aumentar impostos, fosse o IVA ou qualquer outra nova taxa sobre os aeroportos ou a

hotelaria.

Naquilo que depende do Governo nacional, não haverá taxas aeroportuárias, não haverá nenhuma taxa a

onerar os empresários do setor turístico.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Trata-se de um setor onde diminuímos, em dois terços, as taxas pagas e os custos de contexto das

agências de viagens. Diminuímos até em 80% as taxas pagas pela animação turística, eliminámos as taxas de

classificação que os hotéis pagavam ao Turismo de Portugal para se classificarem, num setor que criou,

diretamente, 30 000 postos de trabalho ao longo do último ano, num setor que vale 10% da riqueza que

criamos em Portugal e 16% da nossa agenda de exportações.

Finalmente, Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, sobre a PT, diz a Sr.ª Deputada que eu nada disse.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Não ouviu bem!

O Sr. Ministro da Economia: — Acho que foi manifesto que, sobre a PT, já disse tudo aquilo que tinha

para dizer.

O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — Mas diga aqui!

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O Sr. Ministro da Economia: — E, para terminar, deixe-me dizer que acho que a Portugal Telecom é uma

empresa mais feliz pelo facto de, pela primeira vez na sua história, não ter um ministro de um Governo a

«meter o nariz onde não é chamado».

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr.ª Presidente, peço desculpa, permite-me o uso da palavra?

A Sr.ª Presidente: — Pede a palavra para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Para solicitar a distribuição de um documento, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente: — Queira, então, identificar o documento, Sr. Deputado Bruno Dias.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr.ª Presidente, os 7,6% de quebra no crédito concedido às empresas, que

vem na página 88 do Boletim do Banco de Portugal, desmentindo cabalmente as afirmações do Sr. Ministro, é

só um exemplo, vale o que vale, mas é um exemplo do que está a acontecer.

A Sr.ª Presidente: — Seguimos, então, para as próximas perguntas, que são três, a primeira das quais

cabe ao PS.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Paula Vitorino.

A Sr.ª Ana Paula Vitorino (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Economia, de facto, é sempre uma

grande expectativa aguardar pela sua intervenção, porque a sua presença nesta Assembleia significa sempre

momentos de grande ironia, roçando até, às vezes, momentos zen.

Num Orçamento que perpetua a austeridade, que agrava, mais uma vez, a carga fiscal, o Sr. Ministro

continua aqui a vender o sonho do crescimento, do regresso do investimento público, da retoma da economia.

Sr. Ministro, de facto, é um encanto!… E é um encanto, porque começa a falar de rankings atrás de rankings e

de diversificação e, às tantas, Sr. Ministro, está a diversificar para o mundo do faz-de-conta. Pensei que o Sr.

Ministro ia falar do ranking da facilidade de concretização de negócios, em que se apressou tanto a dizer que

Portugal tinha subido seis níveis, pois imaginei que viesse dizer que se tinha enganado e que, afinal,

infelizmente, Portugal tinha descido dois níveis.

Aplausos do PS.

Mas, Sr. Ministro, sendo este o Governo que conseguiu uma marca histórica de três anos de recessão, que

diabolizou o investimento público, que promoveu a depressão do investimento privado, que teve um recuo de

várias décadas… O Sr. Deputado Hélder Amaral, enfim, diz que, após décadas e décadas, finalmente, vai

crescer o investimento privado, quando sucede o contrário… Também deve estar contagiado pelo momento

zen imposto pelo Sr. Ministro…

Risos do PS.

De facto, a nova Comissão do Sr. Juncker aposta no investimento para combater toda a depressão a nível

europeu, que foi provocada pelo excesso de austeridade, e apresenta um programa de 300 000 milhões de

euros. E, na realidade, o Sr. Ministro também chega aqui com alguma bagagem: uma queda de 15% do

investimento em 2012 e de 6,3% em 2013 e, contrariamente àquilo que disse — deve ser o jet lag —, foram

agravadas as condições de financiamento das empresas, pelo que, neste momento, pelo menos em agosto,

temos quebras da facilidade de investimento de cerca de 8%.

Mas, efetivamente, a somar a tudo isto temos a coragem do Sr. Ministro ao dizer, e pedíamos que o

confirmasse, que o caminho da recuperação passa, definitivamente, pela atração do investimento — estou a

citar uma afirmação do Sr. Ministro —, sendo que a sua previsão de crescimento é insignificante, porque é de

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1% para este ano e de 2% para 2015. O que vai acontecer é que vai ficar responsável por não acompanhar a

boleia da Comissão Europeia relativamente a esta matéria, porque, infelizmente, o que traz aqui debaixo do

braço é o famoso PETI3+ (Plano Estratégico dos Transportes e Infraestruturas 2014-2020), não sei se também

plus, em que vem anunciar, com garbo, investimentos que o seu antecessor já havia dito que ia fazer em 2012

e que, por esta altura, já estariam em funcionamento, como é o caso da ligação de mercadorias entre Sines e

Badajoz. «Bem prega Frei Tomás»!

Já agora, Sr. Ministro, sobre isso, gostaria de perguntar quantos programas operacionais é que já estão

aprovados relativamente ao quadro comunitário. E, sendo novembro já na segunda-feira, gostaria também de

saber para onde é que podemos encaminhar as pessoas que nos perguntam sobre a apresentação das

candidaturas, porque, se em novembro já podem apresentar as candidaturas, temos de saber onde é que

podem apresentar essas candidaturas na segunda-feira.

Aplausos do PS.

Gostaria também que esclarecesse o seguinte: o Sr. Ministro disse que não iria ser feito mais nenhum

aumento das taxas portuárias da ANA. Há uns dias, esteve na Comissão de Economia, a ser ouvido, o

Presidente do INAC (Instituto Nacional de Aviação Civil) e, Sr. Ministro, desde o início do contrato de

concessão já foram aprovados — ia dizer «aumentos», mas já sei que uns são aumentos, outros são

ajustamentos, certo?!… —, entre aumentos e ajustamentos, 30% de aumentos das taxas pagas pelos

passageiros. Esta é que é a verdade, Sr. Ministro! E mais: três já estão em execução e, relativamente aos

outros dois, um é para entrar em funcionamento no dia 1 de dezembro deste ano e o outro no dia 1 de

dezembro do próximo ano. Diga lá, Sr. Ministro, se, afinal, esses dois vão ou não para a frente, apesar de já

estarem todos propostos pela concessionária e aprovados pela tutela.

Já agora, Sr. Ministro, diga lá se consegue aprender com os erros e se considera que continua a ter

legitimidade para privatizar a TAP, dada a vergonha que têm sido estes processos.

Por falar em vergonha, Sr. Ministro, quero falar-lhe dos transportes de Lisboa e Porto, porque gostaria de

saber se mantém uma frase que foi dita, no seguinte sentido: «se as câmaras apresentarem melhor proposta,

temos todo o gosto em lhes concessionar os transportes». Isto chama-se arrogância, Sr. Ministro, e foi dito por

alguém com responsabilidades no seu Ministério.

Aplausos do PS.

Portanto, aquilo que queremos saber é se vai ou não arranjar uma solução que mereça o acordo dos

municípios quer de Lisboa, quer do Porto.

Sr. Ministro, estou a terminar, mas gostaria de saber o que tem a dizer — o Sr. Ministro, que deixou as

ilusões de modernizador, ao assentar praça como fiel soldado deste Governo — quanto ao desprezo pela

reabilitação urbana no acordo de parceria para utilização dos fundos europeus, ao aumento dos custos dos

transportes públicos rodoviários, resultantes da vossa fiscalidade pseudoverde, à perpetuação do IVA da

restauração em 23%, inclusive nas refeições escolares, à diminuição, em setembro, do índice de produção

industrial, conforme publicado hoje pelo INE.

Sr. Ministro, bem-parecido, de verbo fácil,…

Vozes do PSD: — Oh, oh!

Risos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Ana Paula Vitorino (PS): — … vende sonhos e ilusões, sempre com um mote: «agora é que vai ser,

agora é que vai ser»! «Havemos de ter»! O quê? Não sei! «Havemos de ter»!

Como disse, há uns dias, a Sr.ª Ministra das Finanças, este Orçamento do Estado não chega assim do

nada, sucede a três anos de provas dadas. É verdade, Sr. Ministro, provas dadas, as tais provas que fazem

com que os portugueses já não acreditem neste Governo. E, por isso, Sr. Ministro, lamento informá-lo que,

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muito brevemente, vai deixar de exercer esse papel, que lhe fica tão bem, de Ministro da propaganda deste

Governo.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — A próxima pergunta cabe ao CDS-PP, pelo que tem a palavra o Sr. Deputado Filipe

Lobo d’Ávila.

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Economia, não vou fazer qualquer

tipo de comentário idêntico àquele que foi feito pela Sr.ª Deputada Ana Paula Vitorino, mas quero dizer-lhe

uma coisa: o Sr. Ministro não se deve preocupar com o jet lag, porque há quem esteja neste Parlamento em

jet lag permanente.

Risos e aplausos do CDS-PP e do PSD.

O jet lag socialista é, de facto, permanente, Sr.ª Deputada Ana Paula Vitorino, e não há nada que se

consiga fazer para desfazer esse jet lag ou mesmo para fazer com que o Partido Socialista consiga aprender

com os erros do passado. Isto, de facto, é um bom exemplo daquilo que resulta deste debate.

O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Vivem num mundo cor de rosa!

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — Sr. Ministro, ao longo destes últimos anos, temos ouvido muitas

coisas, sobretudo da bancada do Partido Socialista, que arriscou prognósticos, diferentes opiniões, muitas

delas diferentes entre si, e muitos até arriscaram palpites. E a verdade é que, hoje, este debate é, uma vez

mais, um bom exemplo disso mesmo.

Ouviu-se falar aqui em década perdida, uns falaram também, ainda, em espiral recessiva, em recessão, no

efeito «bola de neve», no problema do aumento descontrolado da dívida e do desemprego, num segundo

resgate, numa nova troica, etc. Ouvimos de tudo, e ouvimo-lo aqui, hoje, uma vez mais. A verdade é que, em

regra, quem apresenta estes prognósticos, quem arrisca estes palpites nunca deu qualquer contributo; em

regra, quem apresentou estes mesmos prognósticos, quem apresentou estes palpites nunca assumiu qualquer

responsabilidade ou até aquela que é a sua própria responsabilidade.

Em regra, todos falharam nos palpites, e esse, Sr.ª Deputada Ana Paula Vitorino, esse é que é o

desencanto, e é o desencanto, calculo, para o próprio Partido Socialista, porque a todos eles, a uns e outros, o

País respondeu com esforço, com superação e com crescimento, com crescimento em 2014, com o défice

mais baixo desde que Portugal entrou no euro, com uma redução no desemprego e com a taxa de

crescimento das exportações mais elevada da União Europeia. Basta percebermos que, entre o quarto

trimestre de 2011 e o quarto trimestre de 2013, ficámos mesmo à frente de países como a Alemanha, a França

— pasme-se, a França, esse grande exemplo socialista!… —, a Espanha e a Itália.

Mas os portugueses responderam também com indicadores de confiança, que são dos indicadores mais

elevados dos últimos oito anos.

São sinais claros, apesar dos palpites, do caminho que seguimos; são sinais claros, apesar dos palpites, de

que estamos a fazer um caminho para uma economia que dê futuro a Portugal e não, como no passado, Sr.

Deputado Vieira da Silva, por uma economia que hipotecava o nosso futuro. Apesar de todos esses palpites,

são sinais claros de que, depois do resgate, devemos ter confiança e esperança no futuro de Portugal e,

sobretudo, deveremos reconhecer e acreditar na capacidade dos portugueses.

O Sr. Ministro da Economia falou num tema essencial, falou-nos aqui nos três motores essenciais para a

recuperação da economia: a estabilização do consumo privado e da procura interna, a manutenção do

dinamismo das exportações e a captação de investimento. Quero fazer-lhe duas perguntas muito simples, a

primeira das quais é a seguinte: depois do colapso socialista, depois do ajustamento, com a retoma, com

prudência orçamental, com crescimento, querendo ser competitivos e querendo exportar mais, onde

continuaremos a apostar, que desafios temos pela frente e que novos mercados deveremos explorar?

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A segunda pergunta que lhe quero fazer, Sr. Ministro, tem a ver com a prioridade da competitividade, que

aqui hoje também sublinhou. O Sr. Ministro tem dito, e bem, que o reforço da competitividade é uma prioridade

do Governo e do Ministério da Economia e que no centro da economia estão as pessoas e as empresas.

Vozes do CDS-PP: — Claro!…

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — Pergunto-lhe: que incentivos ao investimento e, sobretudo, à

internacionalização das empresas podemos esperar, num País, como o Sr. Ministro referiu, que é hoje um

País mais competitivo e que é também, apesar dos palpites, um País mais confiável e mais credível? É que

este, no fim do dia, Sr.ª Deputada Ana Paula Vitorino, este é o ranking que verdadeiramente interessa.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Protestos do PS e do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Para uma pergunta, pelo PSD, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Serra.

O Sr. Nuno Serra (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Economia, hoje, pelos vistos, acabámos com o

momento zen do PS, mas começámos com um momento de dúvidas existenciais por parte do Partido

Socialista. E não é que, hoje, o PS acordou com uma dúvida? Qual seria a intensidade do crescimento

económico para 2015? Pois bem, em primeiro lugar, isso é bom, pois já admitem que há crescimento

económico, ao contrário do que os senhores deixaram, quando largaram o Governo, mas importa dizer que,…

Protestos do PS.

… infelizmente, quando este Governo tomou posse, em 2011, não teve dúvidas, teve umas tristes certezas

que também tinham grande intensidade.

Em 2011, este Governo deparou-se com um intenso crescimento do PIB, mas negativo; em 2011, este

Governo deparou-se com um intenso défice excessivo; em 2011, este Governo deparou-se com uma

intensidade brutal de encargos derivados das PPP que os senhores do PS contrataram.

Sr. Ministro, pergunto-lhe: se este Governo não tivesse tido a responsabilidade de pensar não no nosso

futuro mas no futuro daqueles que ainda virão, que são os nossos filhos e os nossos netos, e se não tivesse

tido a tenacidade, a vontade e a intensidade de, em três anos, renegociar as PPP, obtendo um corte de 33,5%

no valor total, e, neste Orçamento, uma redução na despesa de 306 milhões de euros, qual seria a

consequência para este Orçamento do Estado? Qual seria a consequência para os portugueses? Peço-lhe

que explique, mas que o explique à bancada do PS.

Já hoje aqui foi dito pelo Sr. Primeiro-Ministro que muitos destes contratos foram assinados entre 2008 e

2011, para iniciar o pagamento em 2014. Sr. Ministro, qual seria a consequência para Portugal, se não

tivéssemos renegociado as PPP?

No Orçamento para 2015, as indemnizações compensatórias ao serviço público de transportes serão

reduzidas em 56,2 milhões de euros, face a 2014, num acumulado de redução da despesa de 650 milhões de

euros para este setor.

Além disso, em 2015, último ano desta Legislatura, este Governo continua o seu ímpeto reformista e vai

realizar fusões nas empresas públicas que trarão poupanças para os contribuintes superiores a 1000 milhões

de euros, nos próximos cinco anos.

Pergunto-lhe, Sr. Ministro: como seria o Orçamento do Estado para 2015, quais os custos para os

portugueses, para Portugal, para as gerações futuras, se este Governo não tivesse a coragem, a

responsabilidade e a ambição de fazer estas reformas?

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Economia.

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O Sr. Ministro da Economia: — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Ana Paula Vitorino, como é que eu não

haveria de ficar zen, até um pouco corado, depois de ouvir a Sr.ª Deputada?!

Ainda bem que lhe pareço um encanto!

Risos.

Para mim, Sr.ª Deputada, a senhora é sempre uma presença encantadora.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Relativamente às questões que me colocou, depois dos simpáticos comentários que me fez, deixe-me

dizer-lhe, objetivamente, e creio que com isto também respondo a algumas inquietações, algumas das quais

partilho, no que diz respeito ao crédito, aqui deixadas pelo Deputado Bruno Dias.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Isso é agora…

O Sr. Ministro da Economia: — A produção industrial acumulada até ao fim de agosto cresceu 2,5%,

relativamente ao mesmo período do ano passado; em setembro caiu,…

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Exatamente!

O Sr. Ministro da Economia: — … mas, Sr. Deputado, agradeço que olhe para os números do ano

completo, porque, em agosto e em julho, tinha crescido, em cada um desses meses, quase 4%.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Agora, veja lá para onde vai…

O Sr. Ministro da Economia: — Relativamente ao crédito, essa é uma preocupação que partilho e acho

que todo o Governo partilha.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Há 10 minutos, não!…

O Sr. Ministro da Economia: — Recomendo, em qualquer caso, Srs. Deputados, que leiam a página 25,

ponto 3, do Boletim Económico do Banco de Portugal, onde se reconhece, em primeiro lugar, uma diminuição

significativa do preço do crédito às empresas, uma aproximação muito forte dos spreads relativamente a

outros países do centro da Europa,…

Protestos do Deputado do PS Pedro Nuno Santos.

… uma melhoria do financiamento a projetos com um perfil de risco menos atrevido e um aumento do

crédito às empresas exportadoras. Este é o balanço que é possível fazer, com os dados de que dispomos, dos

primeiros sete meses de 2015.

Relativamente ao investimento, quero lembrar à Sr.ª Deputada Ana Paula Vitorino que o investimento, que,

de facto, caiu de uma forma continuada desde 2001/2002 até 2013, é composto não só pelo investimento em

formação bruta de capital fixo, que está a crescer em 2014, mas, admito, ainda de uma forma marginal — e é

um crescimento um pouco acima de marginal que prevemos também para 2015 —, mas um investimento

numa empresa, nomeadamente em empresas dos setores transacionáveis, é composto pelo investimento em

ativos fixos — formação bruta de capital fixo — e também, quando o ciclo económico muda, em stocks, em

variação de existências.

Ora, contabilizando esses dados, o das variações de existências, segundo dados do INE, porque não vale

a pena eu estar a inventar dado nenhum, no primeiro trimestre de 2014 o investimento cresceu 12,6% e voltou

a crescer, em termos homólogos, 4,6% no segundo trimestre.

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Portanto, creio que, primeiro, antes de investir em ativos fixos, é normal que as empresas racionais

procurem aumentar a taxa de utilização dos seus equipamentos já existentes, e é isso que estão a fazer.

Numa segunda fase, e isto também já se está a começar a verificar, é normal que invistam no aumento da sua

capacidade, através de investimento em formação bruta de capital fixo. E o Estado, o Governo, sinalizou

também, de uma forma plurianual, através do Plano Estratégico dos Transportes e Infraestruturas, aquela que

é a sua prioridade de investimentos em infraestruturas nos próximos seis anos, com 59 projetos que, creio,

uniram todos os partidos nesta Assembleia, inclusive naquilo que foi proposto ao nível da ampliação de

capacidade nos portos de Sines, de Leixões e também de Lisboa.

Relativamente ao tema da atração do investimento, já falámos do IRC. Já referi que — e esta é uma

resposta que também deixo ao Sr. Deputado Filipe Lobo d’Ávila —, com o novo Código Fiscal do Investimento,

as empresas vão poder aceder a créditos fiscais até 25%, em função da mais-valia tecnológica inovadora dos

seus investimentos, em função dos empregos que se comprometam a realizar, em função da geografia onde

realizam esses investimentos. E espero — é essa a expetativa que temos — que, durante o mês de novembro,

o acordo de parceria possa ser ativado.

Não me pergunte a mim, Ministro, onde devem os empresários dirigir-se. A mim, não será, seguramente,

porque, neste Governo, não há Ministros a apadrinharem candidaturas de empresas, no âmbito do acordo de

parceria.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Devem dirigir-se, sim, aos organismos intermédios, à Administração Pública competente, porque é

competência dessa Administração Pública receber os projetos de candidatura e fazer a devida avaliação.

Relativamente ao tema das parcerias público-privadas, repito: no período de vida das parcerias públicas

rodoviárias estamos a falar de uma poupança de 7500 milhões de euros. Portanto, aquilo que o Estado teria

de assumir no Orçamento do Estado para 2015, se não tivesse efetuado esta bem-sucedida renegociação,

seria mais 310 milhões de euros.

Ao nível das concessões, Sr.ª Deputada, creio que a nossa principal preocupação, no Governo, é estar

com o centro de atenção virado para os munícipes da Área Metropolitana de Lisboa e da Área Metropolitana

do Porto. É no serviço a esses munícipes que pensamos quando falamos — e fechá-las-emos — nas

concessões dos transportes públicos de Lisboa e do Porto.

A Sr.ª Ana Paula Vitorino (PS): — E as competências sobre o território?

O Sr. Ministro da Economia: — E com isso iremos também poupar aos contribuintes, durante o ano de

2015, pelo menos, 85 milhões de euros em indemnizações compensatórias.

Por último, para responder a uma das preocupações aqui evidenciadas pelo Sr. Deputado Nuno Serra,

quero dizer também que, entre parcerias público-privadas, indemnizações compensatórias e racionalização

eficiente, com a fusão da REFER com a Estradas de Portugal numa nova entidade que se chama

Infraestruturas de Portugal, vamos conseguir, no Orçamento do Estado para 2015, poupanças superiores a

650 milhões de euros.

Muito obrigado pela vossa atenção.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Muito obrigada, Sr. Ministro da Economia.

Srs. Deputados, a Mesa não regista mais inscrições, pelo que terminamos os trabalhos de hoje. Voltaremos

a reunir amanhã, às 10 horas, para continuarmos a apreciação conjunta, na generalidade, das propostas de lei

n.os

254/XII (4.ª) — Aprova o Orçamento do Estado para 2015 e 253/XII (4.ª) — Aprova as Grandes Opções do

Plano para 2015.

Cumprimento os Srs. Deputados, o Sr. Primeiro-Ministro e os Srs. Membros do Governo, desejando a

todos um resto de dia muito feliz.

Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Página 116

I SÉRIE — NÚMERO 18

116

Eram 19 horas e 45 minutos.

Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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