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Sexta-feira, 13 de março de 2015 I Série — Número 61

XII LEGISLATURA 4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2014-2015)

REUNIÃOPLENÁRIADE12DEMARÇODE 2015

Presidente: Ex.ma Sr.ª Maria da Assunção Andrade Esteves

Secretários: Ex.mos

Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco Luísa Maria Neves Salgueiro

S U M Á R I O

A Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 7

minutos. Deu-se conta da entrada na Mesa dos projetos de lei n.

os

813 a 816/XII (4.ª) e do projeto de resolução n.º 1298/XII (4.ª).

Procedeu-se ao debate conjunto, na generalidade, da proposta de lei n.º 288/XII (4.ª) — Procede à terceira alteração à Lei n.º 23/2007, de 4 de julho, que aprova o regime jurídico de entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros do território nacional, que foi aprovada, e dos projetos de lei n.

os 789/XII (4.ª) — Elimina

os vistos gold da lei de imigração (BE) e 810/XII (4.ª) — Regularização de trabalhadores imigrantes e menores nascidos em Portugal ou a frequentar o sistema de ensino (BE), que foram rejeitados. Usaram da palavra, a diverso título, além do Vice-Primeiro-Ministro (Paulo Portas), os Deputados Cecília Honório (BE), Telmo Correia (CDS-PP), João Oliveira (PCP), Celeste Correia e Ana Catarina Mendonça (PS) e Carlos Peixoto (PSD).

Foram discutidos, conjuntamente, na generalidade, os projetos de lei n.

os 767/XII (4.ª) — Altera o regime de

incompatibilidades e impedimentos aplicável aos eleitos locais e alarga o seu âmbito aos titulares de órgãos de entidades intermunicipais e associações de fins específicos (BE), 768/XII (4.ª) — Altera o Estatuto dos Deputados,

tornando obrigatório o regime de exclusividade dos Deputados à Assembleia da República (BE), 806/XII (4.ª) — Altera o Estatuto dos Deputados e o Regime Jurídico de Incompatibilidades e Impedimentos dos Titulares de Cargos Políticos e Altos Cargos Públicos (PCP), que foram rejeitados, e 808/XII (4.ª) — Reforça as incompatibilidades dos titulares de cargos políticos e altos cargos públicos (PS), que foi aprovado. Proferiram intervenções os Deputados Pedro Filipe Soares (BE), Jorge Machado (PCP), Pedro Delgado Alves (PS), José Luís Ferreira (Os Verdes), João Lobo (PSD) e Telmo Correia (CDS-PP), que também respondeu ao Deputado João Oliveira (PCP), que usou da palavra em defesa da honra da bancada.

Foram também discutidos, na generalidade, os projetos de lei n.

os 811/XII (4.ª) — Impede o cultivo, a

comercialização e a libertação deliberada em ambiente de organismos geneticamente modificados (OGM) (Os Verdes), 784/XII (4.ª) — Proíbe o cultivo, a importação e a comercialização de organismos geneticamente modificados vegetais (BE) e 805/XII (4.ª) — Regula o cultivo de variedades agrícolas geneticamente modificadas (PCP), que foram rejeitados, conjuntamente com o projeto de resolução n.º 1293/XII (4.ª) — Recomenda ao Governo orientações atinentes ao processo de transposição da diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho que altera a Diretiva

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2001/18/CE no que se refere à possibilidade de os Estados-membros limitarem ou proibirem o cultivo de organismos geneticamente modificados (OGM) no seu território (PS), que foi aprovado com o texto substituído pelo autor da iniciativa. Intervieram os Deputados Heloísa Apolónia (Os Verdes), Luís Fazenda (BE), João Ramos (PCP), Miguel Freitas (PSD), Ulisses Pereira (PSD) e Abel Baptista (CDS-PP).

Foi ainda discutida, na generalidade, a proposta de lei n.º 166/XII (2.ª) — Alteração ao regime de bens em circulação objeto de transações entre sujeitos passivos de IVA (ALRAA), tendo proferido intervenções os Deputados Paulo Sá (PCP), Jorge Rodrigues Pereira (PS), Vera Rodrigues (CDS-PP), Lídia Bulcão (PSD) e Pedro Filipe Soares (BE). Foi, depois, aprovado um requerimento do PSD no sentido de a proposta de lei baixar à Comissão de Orçamento, Finanças e Administração Pública, sem votação, pelo prazo de 90 dias.

Foi aprovado, por unanimidade e aclamação, o voto n.º 258/XII (4.ª) — De congratulação pelo título obtido por Nelson Évora no triplo salto, no Campeonato Europeu de Atletismo em Pista Coberta de 2015 (PCP, BE, PS, PSD, CDS-PP e Os Verdes).

Em votação final global, foi aprovado o texto final, apresentado pela Comissão de Economia e Obras Públicas, relativo à proposta de lei n.º 226/XII (3.ª) — Estabelece o regime jurídico aplicável ao exercício da atividade da construção.

Foi também aprovado, em votação final global, o texto final, apresentado pela Comissão Economia e Obras Públicas, relativo à proposta de lei n.º 227/XII (3.ª) — Procede à primeira alteração à Lei n.º 31/2009, de 3 de julho, que estabelece a qualificação profissional exigível aos técnicos responsáveis pela elaboração e subscrição de projetos, coordenação de projetos, direção de obra pública ou particular, condução da execução dos trabalhos das diferentes especialidades nas obras particulares de classe 6 ou superior e de direção de fiscalização de obras públicas ou particulares.

A Câmara aprovou ainda três pareceres da Comissão para a Ética, a Cidadania e a Comunicação autorizando, respetivamente, duas Deputadas do PSD e um Deputado do PS a intervirem em processos que correm em tribunal.

A Presidente encerrou a sessão eram 18 horas e 12 minutos.

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A Sr.ª Presidente: — Srs. Ministros, Sr.ª e Srs. Secretários de Estado, com os cumprimentos da Mesa, Srs.

Deputados, Srs. Jornalistas, está aberta a sessão.

Eram 15 horas e 7 minutos.

Podem abrir as galerias.

Antes de iniciarmos a ordem do dia, vou dar a palavra ao Sr. Secretário para ler o expediente.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e

foram admitidos, os projetos de lei n.os

813/XII (4.ª) — Reforça a proteção das mulheres grávidas, puérperas

ou lactantes no Código de Trabalho (BE), que baixa à 10.ª Comissão, 814/XII (4.ª) — Igualdade na

parentalidade para proteção das mulheres na maternidade e no emprego (BE), que baixa também à 10.ª

Comissão, 815/XII (4.ª) — Repõe direitos no acesso ao abono de família (BE), que baixa igualmente à 10.ª

Comissão e 816/XII (4.ª) — Reforço dos direitos de maternidade e paternidade (PCP), que baixa também à

10.ª Comissão, e o projeto de resolução n.º 1298/XII (4.ª) — Respostas sociais à primeira infância (BE), que

baixa ainda à 10.ª Comissão.

É tudo, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente: — Há ainda bastante ruído na Sala, pelo que peço aos Srs. Deputados que tomem os

respetivos lugares.

O primeiro ponto da ordem do dia consiste no debate conjunto, na generalidade, de três iniciativas: a

proposta de lei n.º 288/XII (4.ª) — Procede à terceira alteração à Lei n.º 23/2007, de 4 de julho, que aprova o

regime jurídico de entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros do território nacional e os

projetos de lei n.os

789/XII (4.ª) — Elimina os vistos gold da lei de imigração e 810/XII (4.ª) — Regularização de

trabalhadores imigrantes e menores nascidos em Portugal ou a frequentar o sistema de ensino, ambos do BE.

Srs. Deputados, vamos então dar início ao debate.

Para apresentar a proposta de lei n.º 288/XII (4.ª), tem a palavra o Sr. Vice-Primeiro-Ministro.

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro (Paulo Portas): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Ao apresentar

esta proposta de alteração ao regime jurídico de entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros

do território nacional, o Governo mantém o que disse desde o primeiro dia — os chamados vistos gold são

importantes para a economia nacional, o seu regime é melhorável e aperfeiçoável.

Sejamos claros sobre as vantagens dos vistos gold. Em pouco mais de dois anos, a política de

autorizações de residência por investimento trouxe para Portugal mais de 1300 milhões de euros.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — Seria insano recusar esse investimento estrangeiro e seria, até, abstruso

oferecer tamanha criação de riqueza a qualquer um dos 14 países estrangeiros que, na Europa, concorrem

com Portugal com regimes semelhantes ou até iguais aos chamados vistos gold.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Por outro lado, as autorizações de residência por investimento tiveram, e têm, uma inegável importância na

dinamização do setor imobiliário, que estava em recessão e já não está. Há muitos estrangeiros que escolhem

Portugal para ter uma casa e os vistos gold foram e são uma vantagem que apareceu no momento certo —

subiram as transações, acentuou-se o crescimento, geraram-se empregos e melhorou a renovação urbana.

Isto num mercado que estava basicamente estancado.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!

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O Sr. Vice-Primeiro-Ministro — Um estudo setorial e independente publicado ontem coloca os chamados

vistos gold na origem de, pelo menos, 1/3 do emprego criado no turismo residencial em Portugal, em 2014, ou

seja, cerca de 20 000 postos de trabalho gerados em todas as atividades que giram à volta do setor

imobiliário.

É ainda de assinalar o contributo que as autorizações de residência por investimento dão para a melhoria

das receitas fiscais do País. Não esqueçamos que, no conjunto das atividades ilegíveis, o investidor

estrangeiro é tributado em sede de IMT, de selo, de IMI, de taxa deliberatória ou IRC.

No período de vigência dos chamados vistos gold terão sido arrecadados junto dos investidores

estrangeiros, só por esta via, cerca de 120 milhões de euros, o que tem, nomeadamente, um impacto positivo

nas contas de várias autarquias.

Passamos, então, ao que podemos e devemos aperfeiçoar e melhorar no regime das autorizações de

residência por investimento. Os dois conceitos nucleares da proposta que aqui trazemos são o reforço da

fiscalização dos vistos gold e a abertura dos vistos gold a novos domínios de aplicação para diversificar os

investimentos.

Do lado da fiscalização, as alterações propostas são basicamente estas: a concessão de vistos gold será

regularmente auditada pela Inspeção-Geral da Administração Interna, o que significa reforçar um crivo externo;

os processos serão instruídos nas delegações regionais do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, o que

significa reforçar um crivo interno; o manual de procedimentos será mais preciso e mandatório; as

competências do grupo de acompanhamento ficam mais definidas e serão menos interpretativas; as

informações da rede consular tornam-se mais evidentes. E chamo a atenção para este facto: exige-se, no

caso dos vistos gold relacionados com o imobiliário, a apresentação da caderneta predial, de modo a dotar de

maior comparabilidade o valor da aquisição e o valor patrimonial e tributário.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — O outro pilar da reforma inova o regime em outras áreas e outros

territórios. Nesse sentido, atende-se, em especial, à defesa, feita por vários setores da opinião pública e da

opinião publicada, de condições mais favoráveis para que o regime dos vistos gold, continuando a ter bons

resultados no imobiliário, dê novas oportunidades em setores como a ciência e a investigação, a arte e o

património, especificamente a reabilitação urbana, e se torne mais acessível a favorecer o investimento em

territórios marcados pela interioridade ou pelo caráter desfavorecido do seu rendimento médio.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — Não se decretam áreas de investimento mas abrem-se oportunidades

que o mercado aproveitará na medida em que as considerar úteis e interessantes.

Conceptualmente, os vistos gold devem poder estar mais próximos, a partir destas alterações, da ciência,

da cultura e das empresas e, se possível, ajudar a colocar os territórios de menor rendimento no nosso País

na geografia do investimento.

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: O Governo esteve e estará atento às sugestões para melhorar o

regime dos vistos gold: escrevemos aos partidos da oposição, ouvimos personalidades, refletimos e

continuaremos a refletir em propostas que façam sentido e que alarguem o consenso que é desejável.

A versão definitiva do diploma é importante para dar estabilidade e horizonte a este tipo de investimentos.

A nossa abertura é também o nosso empenhamento.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — A Mesa regista a inscrição de três Srs. Deputados para fazerem perguntas, a saber:

a Sr.ª Deputada Cecília Honório, do BE; o Sr. Deputado Telmo Correia, do CDS-PP, e o Sr. Deputado João

Oliveira, do PCP. O Governo informa que responderá em conjunto.

Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Honório.

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A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr.ª Presidente, cumprimento os Srs. Ministros e a Sr.ª e os Srs.

Secretários de Estado.

Sr. Vice-Primeiro-Ministro, os vistos gold estão, hoje, associados à corrupção e à detenção de altos

dirigentes do Estado. Não têm nem emenda nem retoque. Esta é, pelo menos, a perceção veiculada por todos

os inquéritos de opinião conhecidos. Talvez o Sr. Vice-Primeiro-Ministro devesse até perguntar ao seu

eleitorado se os vistos gold são para manter, no perfil em que faz esta proposta de lei.

A ideia com que as pessoas ficaram é a de que não há controlo, porque haverá sempre alguma

possibilidade de favorecimento, algum negócio esquisito pelo caminho. Esta é a nossa perspetiva

relativamente a esta questão e, por isso, apresentamos um projeto de lei que se refere à concessão de

autorização de residência para investimento, porque é necessário fazer o balanço.

No total, até hoje, só três vistos gold criaram emprego, 10 postos de trabalho — já era a limitação e o

condicionamento previsto. Foram, em 95%, para a aquisição de bens imóveis, e a pergunta que se impõe é o

que muda, de substancial, com esta proposta de lei.

Na verdade, Sr. Vice-Primeiro-Ministro, o artigo 3.º pouco muda. Ou seja, um milhão de euros dá direito a

uma autorização de residência e 500 000 euros, para aquisição de imobiliário, dá direito a uma autorização de

residência, não havendo garantias de que o quadro da especulação imobiliária não continue.

Somos capazes de ver alguns aspetos positivos em outras vertentes desta proposta que aqui trazem,

nomeadamente em relação aos artigos 61.º ou 122.º, que procuram atrair e fixar estudantes, doutorados,

pessoas que estão a frequentar mestrado ou mesmo a exercer atividade docente. Não nos opomos a esta

necessidade de atração de pessoas qualificadas, que acho um aspeto relevante, mas há outra pergunta de

fundo a fazer: Sr. Vice-Primeiro-Ministro, atrair imigrantes qualificados, com certeza, e os outros? E aqueles

que trabalham, que continuam a sustentar este País e continuam sem ter acesso a uma autorização de

residência? Qual é a resposta do Governo a estas duas questões de fundo?

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — A próxima pergunta cabe ao Sr. Deputado Telmo Correia, do CDS-PP.

Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Vice-Primeiro-Ministro, Sr. Ministro, Sr.ª e Srs.

Secretários de Estado, Sr.as

e Srs. Deputados, penso que a questão primeira e essencial em relação a este

regime dos vistos gold é uma questão de fundo, como acabámos de ver, que é esta: ou concordamos com o

regime ou não concordamos, ou seja, o regime tem em si mesmo mérito ou não o tem.

Desse ponto de vista, convém clarificar que este regime tem um objetivo muito claro. O objetivo deste

regime não é resolver outros problemas que são ao lado, não é resolver o problema da imigração em geral, é

atrair investimento para Portugal, concedendo residência e — que fique claro — não cidadania, como, de

resto, acontece noutros países e noutros regimes,…

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Bem lembrado!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — … existindo este regime em cerca de 40 países no mundo.

Por outro lado, do ponto de vista da atração de investimento, há um facto que é absolutamente indiscutível:

é que este regime concedeu mais de 2000 autorizações de residência, teve um resultado de 1,3 mil milhões de

euros em termos de investimento e no regime de transferências de capital teve um valor menor do que o do

imobiliário mas, ainda assim, superior a 120 milhões de euros.

É evidente que convém talvez refletir um pouco, Sr. Vice-Primeiro-Ministro — e não deixarei de lhe fazer a

pergunta —, sobre algumas das críticas feitas a este regime. A primeira, com a qual não concordamos mas

que conhecemos, é a de que se trata de um regime muito concentrado no imobiliário, designadamente,

através dos investidores chineses, em particular, que vieram para Portugal. Mas, em relação a estes

investidores, também não vejo que haja aqui nenhuma crítica porque todos sabemos e ninguém terá dúvidas,

hoje em dia, que, como alguém dizia, os amigos são para as ocasiões.

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Vozes do CDS-PP: — Bem lembrado!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Estava mesmo a ver-se!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — E foi muito importante que numa ocasião difícil, em que tantos não

acreditavam que o País pudesse vencer a crise, estes investidores chineses tenham ajudado Portugal e

tenham permitido, como alguém dizia também — obviamente, refiro-me ao Secretário-Geral do Partido

Socialista —, que o País hoje esteja muito melhor do que estava há quatro anos.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Vozes do PS: — Não, não!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Não há por aí, estou certo, Sr. Vice-Primeiro-Ministro, crítica a estes

investidores chineses que acreditaram em Portugal, como muito bem reconhecia o Dr. António Costa.

Em relação à questão do imobiliário, também tenho ouvido dizer muitas vezes que o imobiliário não é

reprodutivo, não gera riqueza. Mas, Sr. Vice-Primeiro-Ministro, isso seria um bocado no pressuposto que as

casas aparecem feitas por si próprias,…

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Ora bem!…

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — … que não há pessoas a construir as casas, não há um mercado

imobiliário em Portugal, que estava parado e que estes vistos gold muito ajudaram a reanimar, que não há

pessoas que têm de fazer a manutenção dessas casas, que os compradores das casas não deixam impostos

em Portugal, não pagam impostos em Portugal.

Vozes do CDS-PP: — Exatamente!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Portanto, é absolutamente justo que quem compre uma casa, para

mais deste valor, tenha autorização de residência em Portugal.

Por outro lado — e esta é mais uma pergunta concreta, Sr. Vice-Primeiro-Ministro —, tem sido muito

referido que o terceiro pilar, por assim dizer, o investimento na criação de emprego e de empresas, está muito

aquém das transferências de capital e muito mais aquém ainda em relação ao imobiliário.

Pedia-lhe, Sr. Vice-Primeiro-Ministro, uma explicação sobre isto, sendo que me parece que pode ter a ver

— mas enfim, sobre isso, o Sr. Vice-Primeiro-Ministro o dirá — com o facto de existirem outros programas com

outra atratividade e até mais interessantes do que este, o que poderá ser, obviamente, a explicação para este

facto. Mas deixo-lhe esta pergunta.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Já vai dando meia resposta!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Para concluir, Sr. Vice-Primeiro-Ministro, com a autorização dos Srs.

Deputados das outras bancadas, queria dizer-lhe que, perante um programa que teve problemas, em que

apareceram dificuldades, irregularidades e até suspeições, há dois caminhos possíveis: um é reformulá-lo,

melhorá-lo e torná-lo mais eficaz e o outro é acabar com ele.

Quando encontramos fraudes, como encontrámos no passado, ao regime do rendimento mínimo, não vi

ninguém propor que se acabasse com o rendimento mínimo; quando encontramos fraudes, por exemplo, nos

serviços e no negócio dos medicamentos, ninguém propôs acabar com as comparticipações aos

medicamentos. Obviamente que a solução não é acabar, é melhorar, é mudar, é tornar o regime mais eficaz.

Penso que é isso que o Governo está a fazer nessa matéria.

A Sr.ª Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.

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O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Vou concluir, Sr.ª Presidente.

Se houver problemas nas cartas de condução, como dizia, e bem, o Dr. António Costa na Quadratura do

Círculo, não se acaba com as cartas de condução, melhora-se o sistema para que ele seja mais eficaz, e mais

uma vez cito uma figura importante da política portuguesa.

O Sr. Filipe Neto Brandão (PS): — Também não se acaba com a segurança social, era só o que faltava!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Por isso, Sr. Vice-Primeiro-Ministro, estas mudanças estão ou não a

operar resultados? Qual é a evolução deste mesmo regime? Sabemos que a dúvida fez cair durante algum

tempo os seus resultados, mas ele está ou não a recuperar? Qual é a evolução e qual é a expectativa do

Governo em relação a essa mesma evolução?

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, apesar do tempo das perguntas ser imputado ao tempo geral do

debate, convém que não ultrapassem demasiado o tempo normal da pergunta para equilibrar melhor o debate.

Par efetuar pedidos de esclarecimento, pelo PCP, dou agora a palavra ao Sr. Deputado João Oliveira.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Vice-Primeiro-Ministro, na intervenção que farei mais à

frente neste debate, terei oportunidade de dar conta da posição do PCP — que, de resto, não é nova — de

discordância relativamente à existência deste mecanismo, quer no plano da política de imigração, que no

plano da política económica, mas também num outro plano, que são as preocupações que suscita

relativamente à justiça.

As perguntas que queria colocar-lhe, Sr. Vice-Primeiro-Ministro, têm a ver com dois destes três aspetos, o

primeiro dos quais é o seguinte: o Banco de Portugal, na informação que está publicamente disponível na sua

página da Internet, tem identificado um conjunto de práticas como sendo utilizadas para o branqueamento de

capitais. E três dessas práticas que o Banco de Portugal identifica na fase da colocação dos capitais que são

objeto de branqueamento têm a ver diretamente com três das atividades que estão abrangidas pelo

mecanismo dos vistos gold, ou seja, depósitos em instituições financeiras, investimentos em atividades

produtivas ou lucrativas e em bens de elevado valor.

Ora, Sr. Vice-Primeiro-Ministro, se o Banco de Portugal identifica estes três aspetos como três das práticas

que são utilizadas para o branqueamento de capitais e se o mecanismo dos vistos gold prevê, precisamente, a

utilização de capitais nestes três âmbitos, a pergunta que lhe quero fazer é muito concreta: afinal de contas,

que importância dá o Governo a estas constatações do Banco de Portugal e por que é que o Governo insiste

em não traduzir estas preocupações do Banco de Portugal no regime que aqui hoje novamente nos

apresenta?

Depois de tudo o que aconteceu com os vistos gold, depois de todos os problemas a partir dos processos

judiciais e das investigações criminais que envolveram este mecanismo dos vistos gold, por que é que o

Governo insiste em desconsiderar estas questões que o Banco de Portugal identifica como vias para o

branqueamento de capitais e não prevê qualquer medida para evitar que o mecanismo dos vistos gold seja

utilizado para branqueamento de capitais? Esta é a primeira pergunta que lhe queria deixar, Sr. Vice-Primeiro-

Ministro.

A segunda questão tem a ver com uma preocupação no plano da política económica.

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro sabe tão bem como nós — é o autor do despacho de 2013 que altera o

despacho de 2012, que também já era da sua autoria — que o Governo alterou os quantitativos mínimos

relativamente à criação de postos de trabalho. Queremos perceber por que é que a exigência que era

colocada para atribuição do visto, de 30 postos de trabalho, passou a ser de 10 postos de trabalho, e qual é,

afinal de contas, o relevo económico que o Governo quer dar a este tipo de mecanismos.

Sr. Vice-Primeiro-Ministro, teremos oportunidade, na intervenção, obviamente, de desenvolver este aspeto,

mas a questão é que fomos confrontados, ainda muito recentemente, com o problema de pessoas de outras

nacionalidades que foram burladas com os investimentos que fizeram em Portugal, particularmente com

investimentos no setor imobiliário.

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Portanto, já ficámos com a ideia de que não existem muitos mecanismos de controlo e verificação da forma

como os negócios que estão por trás da atribuição dos vistos gold são realizados. Mas há um outro problema,

até do ponto de vista económico, do ponto de vista das exigências — e, Sr. Vice-Primeiro-Ministro, não estou a

colocar a questão no plano concreto, depois, de como o investimento é realizado — que o próprio Governo faz

para a atribuição destes vistos gold, e parece-nos que a fasquia começa a ser demasiado baixa para todo o

relevo económico que o Governo parece dar a estes mecanismos.

Portanto, nesta primeira fase, gostávamos que nos pudesse esclarecer relativamente a essa decisão,

porque é importante para percebermos exatamente, do ponto de vista económico, do que é que estamos a

falar quando falamos de investimentos para a criação de riqueza e de postos de trabalho.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Vice-Primeiro-Ministro.

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, começando pela Sr.ª Deputada

Cecília Honório, que cumprimento, queria lembrar-lhe o que — a meu ver, bem — disse o Secretário-Geral do

Partido Socialista, num programa de televisão antes destes acontecimentos se darem: «Não é por haver um

caso de corrupção na Direção-Geral de Viação que se acaba com as cartas de condução». Eu acrescentaria:

«Não é por haver uma fraude numa avaliação que se acaba com os exames». Quando há um problema de

legalidade, que a lei e a justiça caiam em cima do problema e se tirem as respetivas consequências.

Mas o que eu não faria, com certeza, era entregar aos 14 países, que concorrem com Portugal em

sistemas parecidos com o dos vistos gold, a criação de riqueza que pode e deve ser feita em Portugal. A

minha função não é contribuir para a criação de riqueza de países estrangeiros, é para atrair investimento

estrangeiro para Portugal.

O segundo ponto para que queria chamar a sua atenção — já tivemos esta divergência, mas eu voltaria a

acentuar este ponto — é o seguinte: a Sr.ª Deputada confunde autorizações de residência pedidas por

invocação expressa da alínea sobre a criação de uma empresa que tem um conjunto de postos de trabalho

com o impacto no mercado laboral dos investimentos no imobiliário.

Sr.ª Deputada, acho que é de elementar bom senso afastar o preconceito nestas coisas. O imobiliário é um

setor económico e nenhum país vive sem ele ou contra ele. O imobiliário estava parado. O imobiliário ganhou

dinamismo, entre outros fatores, com os vistos gold: subiram as transações, subiu a criação de emprego, subiu

a remuneração das empresas e deixaram-se impostos nas autarquias e no Estado português, pagos por

investidores estrangeiros.

Como aqui já foi dito, as casas não caiem do céu, alguém tem de as construir, alguém tem de as manter,

alguém tem de as reabilitar, alguém tem de as equipar, alguém tem de as vender, alguém tem de as promover,

e isto só para lhe falar de algumas das atividades económicas que giram em torno do imobiliário.

Portanto, quando há 1300 milhões de euros maioritariamente aplicados no imobiliário, dizer que isso não

tem impacto nem na economia nem no trabalho acho que é não ter adesão à realidade.

E recomendo vivamente a leitura de um estudo, que não é do Governo, não é da maioria, mas de uma

associação profissional, a Associação Portuguesa de Resorts, feito por uma consultora específica e

identificada, sobre turismoresidencialemPortugalem2014, que refere que a criação de postos de trabalho

reconhecida é de cerca de 60 000 postos de trabalho. O que o que está relacionado com os vistos gold neste

crescimento? Um terço disto. Ora, um terço de 60 000 são cerca de 20 000 postos de trabalho. Não acho

pouco, Sr.ª Deputada, e acho que fazer pouco daqueles que têm uma oportunidade de trabalho com um

sistema que atrai investimento é uma consideração que atribuo mais ao preconceito do que à racionalidade.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — Relativamente a alguns dos aspetos que referiu e que são relevantes,

chamaria a atenção, Sr.ª Deputada, para o Plano Estratégico sobre as Migrações, que foi hoje aprovado e

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que, com certeza, o Parlamento terá ocasião de discutir. E um dado que, porventura, lhe terá escapado é o do

número de refugiados em situação especialmente difícil que se encontravam reinstalados em Portugal no

início da Legislatura, o qual duplicou. Portanto, não é possível, Sr.ª Deputada, querer estabelecer um contraste

entre a atração de investimento, que é uma política do Governo, e a proteção de pessoas em situação

extremamente difícil, que é também uma política do Governo. Não acho que valha a pena o contraste porque

os números não o demonstram.

O Sr. Deputado Telmo Correia, que também saúdo, colocou duas questões muito pertinentes. A primeira

tem a ver com a possibilidade de haver outros programas.

Quando as pessoas dizem que os vistos gold dinamizaram o investimento e levaram a transferências de

capital mas que a alínea dedicada à criação de empresas teve menos impacto, isso é revelado pelos números

mas é também revelado por uma outra circunstância: quem quer criar uma empresa e postos de trabalho em

Portugal vai, em primeira linha e em segunda linha, ao sistema de incentivos contratuais que já existem há

muitos anos, que são mais largos e mais atrativos do que uma autorização de residência, que, nesse caso, é

um plus mas não é a essência do contrato feito com o Estado português.

Por isso mesmo, hoje em dia, quem quer criar empresas e investir em Portugal — e, felizmente, o

investimento deu sinais bastante positivos em 2014, mais 5,4% num ano — vai ao fundos comunitários, vai ao

Código Fiscal do Investimento, vai ao regime negocial dos contratos de investimento, vai aos apoios ao

empreendedorismo, e só em última linha é que irá aos vistos gold.

Depois, Sr. Deputado, e não faço parte daqueles que possam, sequer por alusão, mencionar estrangeiros

conforme a sua nacionalidade, — Portugal é um país universal e universalista há muitos séculos —, quero

dizer-lhe o seguinte: é evidente que a incerteza sobre o regime, depois de um crescimento bastante

espetacular, gerou uma certa retração na sua procura. Mas também é verdade que, a partir do momento em

que o Governo, ouvindo a oposição, como era nosso dever, e procurando refletir sentimentos racionais da

opinião pública, e também da opinião publicada, indicou quais são as linhas essenciais de reforma dos vistos

gold, garantindo maior fiscalização e que eles podem aplicar-se ao imobiliário, com certeza, onde têm grande

sucesso, à transferência de capital, para a resiliência do nosso sistema, onde também foram significativos,

mas também a áreas como a inovação, a ciência, a cultura, a arte, o património e territórios de menor

rendimento, a partir daí, há uma certa recuperação. E aproveito para saudar esse facto.

O número de processos que estão para definição no Serviço de Estrangeiros e Fronteiras é significativo. Se

compararmos fevereiro e janeiro deste ano com fevereiro e janeiro do ano passado, estamos um pouco abaixo

mas já começámos a recuperar, o que é um bom sinal.

O Estado de direito tem, felizmente, um custo que é preciso pagar para ter o direito.

A Sr.ª Presidente: — Queira concluir, Sr. Vice-Primeiro-Ministro.

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — E o sistema é, em si mesmo, meritório para atrair investimento e para

criar riqueza, é aperfeiçoável e isso é o que estamos aqui a fazer.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Para apresentar os projetos de lei do Bloco de Esquerda, tem a palavra a Sr.ª

Deputada Cecília Honório.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Vice-Primeiro-Ministro, até prova em contrário, a fraude

entrou pela porta da lei. Em todo o caso, relativamente aos casos objetivos, três vistos criaram emprego. O Sr.

Vice-Primeiro-Ministro ainda não fez contestação nem destes dados nem sequer dos «inúmeros» postos de

trabalho que diz que os vistos gold criaram até hoje.

Em todo o caso, quero dar conta das duas iniciativas legislativas que aqui apresentamos. A primeira

elimina os vistos gold, incide particularmente sobre o artigo 3.º e, muito objetivamente, elimina a possibilidade

de quem tem 1 milhão de euros ter acesso imediato a uma autorização de residência e de quem tem 500 000

euros poder, através da aquisição de casa, também ter acesso a esta garantia.

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Ao mesmo tempo, aproveitamos este espaço em que debatemos questões fundamentais, porque estamos

a mexer na lei de imigração, para fazermos propostas concretas no que diz respeito à regularização dos

imigrantes.

Há, hoje, em Portugal, milhares de imigrantes, que aqui vivem e que aqui trabalham, que fazem os seus

descontos para a segurança social e pagam os seus impostos e continuam a ser cidadãos irregulares,

continuam a ser cidadãos de um País que não os reconhece como tal, uma vez que recentemente também

fomos dando conta desta linha divisória crescente entre imigrantes de primeira e imigrantes de segunda.

Fazemo-lo tendo em muito particular cuidado o n.º 2 do artigo 88.º desta lei, dando a garantia da regularização

de todas estas pessoas que são necessárias para o País.

E fazemo-lo tendo em conta, muito particularmente, as crianças e os jovens imigrantes, aquelas e aqueles

que estão dentro do nosso sistema de ensino e que ainda são muitas vezes vítimas do estatuto da

irregularidade. Não há nenhuma lei suficientemente humana enquanto houver crianças e jovens condenados à

irregularidade.

É por isso que aqui apresentamos estas duas iniciativas legislativas.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Inscreveu-se, para pedir esclarecimentos, a Sr.ª Deputada Celeste Correia.

Tem a palavra, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Celeste Correia (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Cecília Honório, ouvi-a com atenção e, tal

como em 2012, não estamos de acordo consigo. Mas isso é normal, Sr.ª Deputada, estamos em partidos

diferentes, fazemos leituras diferentes da realidade e temos propostas diferentes para mudar essa mesma

realidade — é o que está a acontecer agora.

Houve objetivos que não foram bem definidos? Houve, sim. Houve objetivos que não foram atingidos?

Claro que houve. Por exemplo, a Sr.ª Deputada disse que este processo, na criação de postos de trabalho, foi

um fiasco. Mas também na predominância dada ao mercado imobiliário de luxo, o Governo, na altura, não

percebeu que, por exemplo, a cultura é uma riqueza que gera riqueza.

Houve comportamentos desviantes neste processo? Houve, sim. Mas aí a justiça tem uma palavra e deve

agir em conformidade, como aqui já foi dito.

Sr.ª Deputada, vivemos num mundo sem fronteiras e não há uma cidadania universal. O que quero

perguntar-lhe é o seguinte: não acha que os Estados têm o direito — e não só o direito como o dever — de

definir e pugnar por aquilo que é do interesse nacional? E não é da opinião de que, neste caso, é do interesse

nacional tentar captar estes investimentos, como fazem os inúmeros países que já foram aqui citados? Não

acha que o Estado português tem um outro leque de critérios que podem ser utilizados, como, por exemplo, os

vistos humanitários, os vistos para as vítimas de tráfico, para reagrupamento familiar, etc.?

São estas as questões que lhe coloco, Sr.ª Deputada.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Honório.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Celeste Correia, agradeço-lhe a sua

questão e reconheço o seu empenho de há muito tempo nestas questões, mas quase que lhe devolvia a

pergunta, pois não percebi exatamente qual é a posição do PS sobre os vistos gold.

A Sr.ª Deputada falou-nos aqui de interesse nacional e, enfim, condenou alguns aspetos que referiu

dizerem respeito à justiça. Mas a pergunta que lhe deixo é outra: a Sr.ª Deputada Celeste Correia, que tem

tantos anos de luta nesta área, acha que darmos a possibilidade de ter acesso a uma garantia de uma

autorização de residência a quem tem 1 milhão de euros ou a quem tem 500 000 euros para comprar uma

casa responde ao interesse nacional? Acha que esta garantia responde ao interesse nacional?

A nós parece-nos que não. E, neste sentido, devolvo-lhe a pergunta: qual é, afinal, a proposta do PS? Qual

é, afinal, a leitura do PS relativamente aos vistos gold?

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Diz a Sr.ª Deputada que não estamos de acordo. Pois não, em muitas circunstâncias, não estamos de

acordo — é assim mesmo a democracia. Mas, nesta vertente, ou percebi mal ou parece-me que a posição do

PS é, como tantas outras vezes, mais próxima da posição do Governo.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Catarina Mendonça.

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — Sr.ª Presidente, sendo esta a primeira intervenção que faço desde

há uma semana, altura em que tive uma indisposição de saúde, quero agradecer à Sr.ª Presidente e a todos

os Colegas a manifestação de solidariedade e desejo de rápidas melhoras. Hoje, estou aqui de novo pronta

para o combate, mas realmente há momentos em que o corpo cede e não temos possibilidade de controlá-lo.

Aplausos do PS, do PSD, do CDS-PP e do BE.

Sr.ª Presidente, Sr. Vice-Primeiro-Ministro e demais Membros do Governo, Sr.as

e Srs. Deputados:

Estamos aqui hoje para analisar mais uma alteração ao regime jurídico de entrada, permanência, saída e

afastamento de estrangeiros do território nacional.

A matriz fundadora deste regime jurídico vem de 2007 — creio que é sempre bom, nestes momentos,

relembrá-lo. Foi uma iniciativa de um governo socialista e esse regime foi também da iniciativa do, então,

Ministro de Estado e da Administração Interna, António Costa.

Este regime e a sua preocupação com a inclusão social dos imigrantes permitiram que Portugal fosse

internacionalmente considerado como um País de boas práticas de acolhimento de imigrantes.

E, Sr.ª Deputada Cecília Honório, peço-lhe de novo que consulte o IPEX (InterParliamentary EU Information

EXchange) e que volte a ler a referência de que, em matéria de imigração, Portugal tem muitas cartas a dar na

União Europeia e no mundo,…

Aplausos do PS.

… e tem sido um dos melhores países no acolhimento, na integração e, sobretudo, no assumir a

interculturalidade que a riqueza dos imigrantes traz às nossas sociedades.

A Sr.ª Celeste Correia (PS): — Muito bem!

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — Esta matriz fundadora de 2007 tem resistido, felizmente, às

investidas securitárias e, muitas vezes, restritivas que a Europa tem imposto.

Essa matriz fundadora resistiu também, já nesta Legislatura, à alteração feita à lei de estrangeiros, quando

também aí houve a tentativa de fazer uma transposição demasiado restritiva da Diretiva de Retorno. Mas

também quero aqui sublinhar que foram o consenso e o diálogo partidários que permitiram que não nos

desviássemos desta matriz.

E é nesta proposta que, hoje, o Sr. Vice-Primeiro-Ministro vem apresentar a esta Casa que continuamos a

resistir a esta deriva restritiva e securitária, o que — e devo dizê-lo, porque nestes momentos isso também

deve ser sublinhado —, atendendo à deriva atual da União Europeia, é mesmo um bom sinal.

Hoje, estamos essencialmente a analisar um conjunto de alterações ao regime de concessão dos vistos por

investimento no País. Esta é apenas uma parte da questão do regime jurídico que a lei consagra, mas é uma

parte muito importante. De facto, em 2012, Portugal juntou-se aos países com práticas especiais para o

acolhimento de investidores, criando um regime de vistos associado ao investimento.

Sr.as

e Srs. Deputados, quem não for capaz de perceber que a regulação da permanência de estrangeiros é

um problema social, mas não é apenas e só um problema social, nunca será capaz de perceber o sentido do

regime e das alterações que hoje são propostas e discutidas nesta Câmara. Percebo bem mas discordo da

posição do Bloco de Esquerda, ela não é nova. Ao longo dos anos, o Bloco de Esquerda nunca apoiou

nenhuma alteração que fosse no melhor sentido, de melhoria da lei de imigração ou das leis de estrangeiros.

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O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Este é o único PS sensato, o de Ana Catarina Mendonça!

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — Estamos aqui hoje a falar da permanência de pessoas a quem

pedimos algo de especial, de pessoas que se dispõem a ajudar Portugal e de pessoas que estão dispostas a

pôr as suas fortunas ou as suas posses ao serviço da economia portuguesa. E se são pessoas que querem

fazer bem e nos querem ajudar, então, devemos também tratá-las de forma especial. E isso não colide, em

nada, com a integração dos imigrantes que não podem contribuir dessa forma mas que devem e merecem ter

aqui as mesmas oportunidades na sua inclusão.

Aplausos do PS.

Dir-me-ão, por isso, os Srs. Deputados mais à esquerda do PS que aqueles que se dispõem a contribuir

para a economia portuguesa são privilegiados — e sê-lo-ão. Mas são também respostas equitativas a quem se

dispõe a ajudar-nos nas nossas prioridades.

Para esse regime ser eficaz, no interesse do País, ele tem de estar focado adequadamente nas nossas

prioridades, e essa focalização tem evidentemente de ser aperfeiçoada. De resto, quero saudar aqui a

abertura manifestada pelo Sr. Vice-Primeiro-Ministro, no seu discurso, quanto à possibilidade de, em sede de

especialidade, melhorarmos o que o Partido Socialista considera que ainda é possível melhorar nesta lei.

Nesta iniciativa, há uma preocupação com a melhoria do regime atual, que, desde já, saudamos. Uma

preocupação que demonstra que até este Governo, quando a necessidade aperta, percebe que tem de fazer

um caminho diferente.

Mas há também, na nossa opinião, diferenças de perspetiva e até mesmo insuficiências de espírito

reformador, como o facto de, em alguns setores, não tornar o investimento produtivo mais atrativo do que o

investimento imobiliário. Explicarei tão breve quanto possível, Sr.ª Presidente, mais à frente.

O PS quer que Portugal seja governado com realismo e sensibilidade para a melhoria da vida de quem cá

vive e trabalha e acolhemos esta iniciativa com espírito crítico mas aberto ao que ela pode vir a melhorar no

regime dos estrangeiros, nomeadamente após as melhorias que receber em sede de especialidade.

Esperamos nós que sejam acolhidas.

Dessas melhorias permitam-me que destaque a necessidade de tornar ainda mais atrativo o investimento

em ciência, cultura ou reabilitação urbana, setores que são absolutamente vitais para o desenvolvimento

económico do País e para o bem-estar de todos aqueles que aqui vivem. Por isso, desde já antecipo que, para

nós, Grupo Parlamentar do Partido Socialista, para atração de investimento, o valor na área da cultura deveria

baixar dos 350 000 € para os 250 000 €, tornando, assim, mais atrativa a possibilidade deste investimento.

Gostaria também de dizer que, na área da reabilitação urbana, vale a pena repensar melhor o que temos

para fazer.

Por isso mesmo, Sr.ª Presidente, permita-me que utilize um pouco mais tempo para explicar uma matéria

que me parece importante.

A aquisição de imóveis antigos ou localizados em zonas de reabilitação urbana ou para reabilitação urbana

no montante de 500 000 € é uma alteração positiva mas será ineficaz e não terá aptidão para desviar o

investimento dos imóveis novos para a reabilitação urbana.

Por isso, a nossa proposta é a de não ir ao encontro do consumidor típico, podendo desviar-nos desse

consumidor típico e fazendo assim com que não prefira um imóvel novo mas um imóvel que verdadeiramente

necessite dessa reabilitação urbana, baixando, por isso mesmo, para 150 000 € a possibilidade do

investimento para reabilitar prédios que necessitam mesmo de reabilitação. Muitas vezes esta reabilitação é

confundida.

Antes de terminar, devo dizer ao Sr. Vice-Primeiro-Ministro que, nesta bancada, não há reflexos

condicionados sobre esta matéria. Não estamos contra as medidas por serem suas, mas estamos disponíveis

para trabalhar em conjunto.

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A Sr.ª Presidente: — Queira concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — Vou concluir, Sr.ª Presidente, apresentando a proposta do Partido

Socialista de criação de um fundo de capitalização de pequenas e médias empresas em Portugal.

Este é um setor que tem tipo graves problemas. A anemia no investimento na nossa economia é, hoje, uma

realidade e talvez este momento da discussão da imigração para o investimento fosse uma oportunidade para

criar um fundo de capitalização das pequenas e médias empresas que possa não só revitalizar mas também

trazer mais emprego e mais economia.

Foi uma longa intervenção para dizer que estamos globalmente de acordo e aqui deixamos três notas para

discutir em sede de espacialidade.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Sr.ª Deputada, manifesto o nosso contentamento por este regresso rápido.

Como tive ocasião de lhe dizer, vi, do local onde me encontro, como, no momento da sua indisposição,

todas as diferenças se apagaram.

Vamos passar ao próximo orador. Pelo PSD, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Peixoto.

O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Vice-Primeiro-Ministro, Sr. Ministro, Sr.ª e Srs.

Secretários de Estado, Sr.as

e Srs. Deputados: Começaria por enaltecer a sensatez da intervenção produzida

pela Sr.ª Deputada Ana Catarina Mendes, talvez excecionando a última parte, que é mais controversa.

É pena que o Partido Socialista não olhe para o seu exemplo e não tenha a mesma sensatez para, noutros

assuntos estruturantes para o País, ter esse tipo de equilíbrio nas intervenções que aqui profere.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Estamos hoje perante três iniciativas: uma proposta do Governo e dois projetos de lei do Bloco de

Esquerda.

O que é que muda com a proposta do Governo? Em primeiro lugar, mudam as apostas: na investigação

científica, na produção cultural, na recuperação do património nacional e nas obras de requalificação urbana.

Em segundo lugar, muda também a aposta na captação de talentos, naquela lógica um bocadinho

metafórica de que Portugal precisa mais de miolo do que de tijolo, porque permite que cidadãos estrangeiros

que tenham obtido um grau de mestre ou de doutor em Portugal tenham autorização de residência por mais

um ano.

Em terceiro lugar, muda algo que é muito grato aos Deputados que foram eleitos pelo interior do País,

como é o meu caso, que fui eleito pelo distrito da Guarda.

Esta proposta do Governo demonstra um sinal claro de apoio ao investimento de estrangeiros nas zonas

de baixa densidade populacional, reduzindo em 20% as necessidades de investimento de capital e

promovendo, assim, a coesão territorial, matéria que diz muito à minha pessoa e ao meu partido, que, aliás,

elegeu esta como uma causa de prioridade nacional.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Em último lugar, esta proposta do Governo reforça, como já disse o Sr.

Vice-Primeiro-Ministro, a fiscalização interna e externa, mas também a fiscalização anterior e posterior à

emissão das autorizações de residência.

Em suma, Sr.as

e Srs. Deputados, estas alterações circunscritas, que são necessárias num programa que

também é muito sensato, inserem-se, de facto, nesta nossa política de diplomacia económica, que é crucial

para o crescimento do País e para a promoção do emprego.

Quanto às propostas do Bloco de Esquerda, nomeadamente aquela que, de forma mais ou menos

arrasadora, vem eliminar os vistos gold da lei da imigração, Sr.ª Deputada Cecília Honório, não creio que

aquilo que seja bom para o País seja mau para o Bloco de Esquerda. Sinceramente, não creio! E aquilo que

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se vê, mais coisa, menos coisa, nos argumentos que aqui deduziu, e que constam da exposição de motivos, é

mais ou menos o que passo a explicar.

Usam quatro argumentos. O primeiro é o de que este programa surge de «braço dado» com atos de

corrupção e de enriquecimento injustificado. Ora, esta conclusão sofre, desde logo, de uma enormíssima

deformação: confunde a virtualidade de um programa com a pouca seriedade — pelo menos falada, ainda não

comprovada — de alguns que lidam com o programa e que deviam dar o exemplo dessa seriedade.

Mas, como a Sr.ª Deputada bem sabe, uma maçã podre não afeta o resto da fruta. Se há acidentes na

estrada, não vamos propor que se acabe com os carros, que se acabe com a circulação na estrada. Se há

crimes de peculato na função pública, não vamos propor acabar com os funcionários públicos. Se há crimes

associados ao programa dos vistos gold, o que temos de fazer, e o que o Governo está a fazer com o que

propõe, é reforçar a fiscalização e melhorar e adaptar este programa.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Ensaiaram bem os exemplos!

O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Pode não se gostar dos vistos gold, mas misturar este conceito com atos

de corrupção é, com todo o respeito, um disparate.

Depois vem o Bloco de Esquerda dizer que há uma desigualdade entre o cidadão imigrante que já cá está

e, porque não tem uns milhares para investir, sofre de burocracias e de dificuldades várias para obter os

vistos.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — E é mentira?!

O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Sr.ª Deputada, não sendo totalmente mentira, é preciso tratar de forma

diferente aquilo que é diferente. Cumpre perguntar-lhe: entre estes imigrantes que investem no visto gold e os

outros que já cá estão, quais são os que enriquecem mais o País? Fazem-no da mesma forma? Valorizam-no

da mesma maneira? Criam o mesmo potencial para o País?

Portanto, as situações diferentes são tratadas de formas diferentes; não há imigrantes de 1.ª e imigrantes

de 2.ª!

Protestos do Deputado do PCP João Oliveira.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Foi o que disse agora!

O Sr. Carlos Peixoto (PSD — O que há, Srs. Deputados, é imigrantes que oferecem ao País

oportunidades diferentes de outros imigrantes — é tão simples quanto isso.

Depois, diz-se que o visto gold é facilitador do acesso a direitos. Não é verdade, não é exato, porque os

direitos não são sonegados a quem não tem dinheiro. O procedimento para obter a autorização de residência

é que é diferente num caso e no outro.

Mas, mesmo que assim não fosse, Sr.as

e Srs. Deputados, não sei o que é que o Bloco de Esquerda

prefere: se é que entrem em Portugal pessoas com dinheiro, com trabalho, com capacidade de

autossustentação ou pessoas que não têm esses atributos. Não sei sinceramente o que é que se prefere.

O que lhe quero dizer é que o Bloco de Esquerda parece combater a riqueza. Quero dizer-lhe que o PSD

quer combater a pobreza. É uma grande diferença. O PSD não tem nenhum tipo de aversão à riqueza.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Portanto, Sr.as

e Srs. Deputados, precisamos de todos os imigrantes, dos imigrantes laborais e dos

imigrantes chamados capitalistas, e, independentemente de quaisquer amarras conceptuais e ideológicas e

com mais ou menos pragmatismo ou utilitarismo, os dados são o que são e desmentem a possibilidade de o

projeto do Bloco de Esquerda poder vir a ser aprovado. Os dados já foram aqui ditos e vão ser reforçados:

houve 2203 vistos de autorização de residência, com 1,3 mil milhões de euros, em dois anos.

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A Sr.ª Deputada conhece alguma medida em Portugal que, em tão pouco tempo, tenha tido um impacto

financeiro tão grande? Eu não conheço.

Em 2013, a receita do IMT aumentou 5 milhões de euros, apesar de a venda de casas ter diminuído 20%.

Isto quer dizer alguma coisa? Está associados aos vistos gold.

Segundo o AICEP (Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal), no segundo e terceiros

trimestres de 2014, os vistos gold deram um enormíssimo contributo para que o turismo em Portugal tivesse

uma taxa de aumento de 7,3%, com a criação de 46 800 postos de trabalho.

Isto pode não lhe dizer nada, mas, por exemplo, na avenida da Liberdade, abriram várias lojas ditas de luxo

(não aprecio especialmente o termo) que criaram centenas de empregos qualificados, com conhecimentos em

línguas estrangeiras, devido aos turistas estrangeiros potenciais compradores; na hotelaria, as dormidas

aumentaram 5,1% e a reabilitação urbana de Lisboa tem tido um comportamento positivo.

É ou não verdade, Sr.ª Deputada, que a banca se recapitalizou e tem agora maiores disponibilidades para

conceder crédito? É ou não verdade que aumentaram os números de voos e as rotas aéreas? É ou não

verdade que já há filhos de investidores a estudar em Portugal, a pagar aqui as suas propinas, a enriquecer

culturalmente o País e com mais e melhores ligações ao exterior?

A Sr.ª Presidente: — Queria concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Vou concluir, Sr.ª Presidente, dizendo que também já há, por causa dos

vistos gold, filhos de investidores a nascer em Portugal, contribuindo, assim, para inverter os números da

recessão demográfica.

Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada, a vossa proposta, a ser aprovada, colocaria Portugal isolado, num oásis, a

andar para trás, no retrocesso e, como sabe, o caminho do País e a receita do sucesso, pelo menos para o

PSD e para a maioria dos portugueses, é exatamente a receita inversa.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Peço aos Srs. Deputados que observem os tempos regimentais.

Está ainda inscrito, para intervir, pelo PCP, o Sr. Deputado João Oliveira.

Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. João Oliveira (PCP). — Sr.ª Presidente, Sr. Vice-Primeiro-Ministro, espero ainda obter as respostas

às perguntas que fiz no início do debate. Mas, para não deixarmos de expor a nossa opinião relativamente à

discussão que estamos a fazer, queria dizer que, da parte do PCP; mantemos a nossa oposição à existência

destes mecanismos dos vistos gold, porque consideramos que esta opção do Governo é injusta enquanto

política de imigração, é uma opção errada enquanto política económica e é uma opção preocupante no plano

da justiça.

Consideramos que esta é uma opção injusta em termos de política de imigração porque mantém uma

política de portas fechadas para quem vive só do seu trabalho e uma política de portas abertas de vistos

dourados para quem tem dinheiro.

O Sr. David Costa (PCP): — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Quem só quer trabalhar acaba condenado à ilegalidade, quem tiver 1 milhão

de euros nem precisa de ter autorização de residência, basta passar uma semana por ano no nosso País.

Sr. Vice-Primeiro-Ministro, consideramos, por outro lado, que esta é uma opção errada no plano da política

económica, porque precisamos, no plano económico, de vencer a nossa dependência externa, não

precisamos de a acentuar. Precisamos de políticas económicas com verdadeiro impacto económico na criação

de emprego e na criação de riqueza em Portugal, particularmente apostando nos nossos setores produtivos.

Ora, o que confirmamos é que este programa dos vistos gold, não só nos resultados que apresenta, mas

até nos pressupostos em que assenta, aponta no sentido exatamente contrário. A confirmação disto, Sr. Vice-

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Primeiro-Ministro, está neste elemento: em 1700 vistos, apenas 3 se justificam com a criação de postos de

trabalho.

Consideramos que esta é uma opção preocupante no plano da justiça, porque a criação deste mecanismo

dos vistos dourados leva a que haja condições propícias à ocorrência de casos de corrupção, de

branqueamento de capitais ou de procuradoria ilícita. Sr. Vice-Primeiro-Ministro, o problema é que a proposta

de lei do Governo não afasta nenhuma dessas preocupações, não contém nenhuma medida para evitar essas

preocupações e a ocorrência desses fenómenos criminais — daí as perguntas que lhe fiz no início.

Não há medidas que previnam o branqueamento de capitais, não há medidas que previnam a corrupção,

não há medidas que previnam a fraude de que os cidadãos estrangeiros foram vítimas nos negócios que

envolvem a atribuição destes vistos.

Sr. Vice-Primeiro-Ministro, podíamos apenas discordar da opção do Governo, mas o problema é que

fazemos mais do que isso: constatamos que esta proposta de lei não dá resposta a nenhum dos problemas

que foram identificados e, sobretudo, que foram trazidos à praça pública a partir daquele processo-crime

envolvendo altos titulares de cargos públicos. Esta proposta de lei muda alguma coisa para que, na essência,

tudo fique na mesma.

Não há resposta quanto às preocupações relativas à corrupção, ao branqueamento de capitais ou à

procuradoria ilícita e não há resposta quanto às situações de fraude cometidas na venda de imóveis de que

foram vítimas os cidadãos estrangeiros naqueles processos que foram divulgados e até noticiados

publicamente.

Mais: as novidades da própria proposta de lei não nos descansam. Relativamente à investigação científica,

o que precisamos é de estancar a sangria de recursos humanos, particularmente de investigadores, que está a

sair do País. Ou seja, temos de estancar a sangria da capacidade científica instalada no nosso País. De facto,

precisamos de romper com a dependência externa que se regista, sobretudo, no plano científico.

Ora, o que encontramos nesta proposta de lei, quer em matéria de cultura, quer em matéria de

investigação, é que o Governo espera que aqueles que até hoje só quiseram investir na compra de imóveis e

na transferência de capitais façam também alguns investimentos em matéria de ciência e de cultura.

Os investimentos em ciência e em cultura são frequentemente fachadas de beneficência que ocultam,

infelizmente, atividades menos meritórias. Esperemos que esses problemas possam estar ultrapassados.

Sr. Vice-Primeiro-Ministro, o que lhe estou a dizer não traduz a opinião do PCP, são o Banco de Portugal e

as instituições internacionais que o dizem.

O investimento, particularmente em bens de elevado valor, como é o caso dos bens artísticos ou culturais,

é uma das formas de ocultar a proveniência ilícita de determinados capitais. Por isso, é preciso haver

mecanismos de controlo. O Sr. Vice-Primeiro-Ministro concordará que, abrindo uma porta em que pode entrar

o bom e o mau, tem de haver, pelo menos, algum mecanismo de controlo para ver quem entra, de modo a

evitar problemas.

De qualquer forma, nada disto ilude a conclusão final que entendemos que deve ser retirada de todo este

processo.

Em vez de tomar medidas de integração social e laboral para os trabalhadores imigrantes e as suas

famílias — infelizmente, condenam muitos à ilegalidade —, em vez de se preocupar, do ponto de vista

económico, em assentar a prioridade numa política económica que recupere os nossos setores produtivos e a

criação de emprego em Portugal a partir da riqueza aqui criada, em vez de procurar levar mais longe

mecanismos de aprofundamento para o combate da criminalidade económica e financeira, o Governo fez uma

opção que contraria todos estes objetivos e, portanto, o PCP continuará a não poder estar de acordo com esta

opção do Governo.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, hoje, tem estado a haver um excesso de uso do tempo, pelo que

lhes pedia que observassem mais os tempos. Quando o primeiro orador se excede no tempo, a Mesa não tem

legitimidade para controlar os tempos dos oradores que se seguem. Por isso, temos todos de ter

autocontenção.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Vice-Primeiro-Ministro.

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O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado João Oliveira, não queria

deixar de lhe responder. Há pouco, fiquei sem tempo, pelo que agradeço o tempo que me foi agora cedido.

Sr. Deputado João Oliveira, acho que está a ser injusto quando diz que não são incisivas as medidas de

reforço de fiscalização. É evidente que, havendo uma fiscalização permanente e regular dos processos e das

decisões, havendo maior diferenciação das propostas de decisão na própria estrutura interna dos Serviços de

Estrangeiros e Fronteiras, havendo conclusões entregues à 1.ª Comissão do Parlamento dos relatórios feitos

regularmente e havendo um seguimento das várias propostas que foram feitas no relatório da Inspeção-Geral

da Administração Interna se encontram mecanismos reforçados de fiscalização.

A outra coisa em relação à qual acho que o Sr. Deputado João Oliveira não está a ser atento é a de que a

proposta de lei do Governo menciona, explicitamente, na alínea d) do n.º 3 do artigo 65.º, que só podem fazer

essas transferências de capital as entidades que estão regularmente inscritas no Banco de Portugal depois de

um processo de verificação prévia. Portanto, ao exigir-se este requisito, exige-se o cumprimento prévio das

matérias, que interessam a todos, de combate ao branqueamento de capitais.

Sr. Deputado João Oliveira, mais ainda: também não é justo não referir que ao exigir nos vistos gold

relativos ao imobiliário a apresentação da caderneta predial se está a dar ao candidato uma informação

autêntica, uma informação credível que permite comparar o valor da aquisição com o valor tributário e

patrimonial.

Com toda a franqueza, acho que quanto mais câmaras o Partido Comunista governar mais um dia chegará

a ser a favor de um regime parecido com os vistos gold, pela simples razão de que permite captar receitas

junto de investidores estrangeiros e uma boa parte delas fica nas autarquias.

Protestos do Deputado do PCP João Oliveira.

É bastante importante estar em regime competitivo— diria isto quer ao Partido Comunista quer ao Bloco de

Esquerda, apesar das suas posições serem diferentes.

Qual era a consequência de fecharmos a loja dos vistos gold? É que a criação de riqueza e o investimento

que é feito em Portugal iria ser feito em Espanha. O que é que temos, como portugueses, a ganhar com isso?

As casas que se deixavam de vender em Portugal passavam a ser vendidas em Espanha e os investimentos

em projetos científicos, ou em projetos de investigação, ou em projetos de recuperação de património, ou em

projetos de reabilitação urbana que podiam ser feitos cá passavam a ser feitos em Espanha.

Protestos do PCP.

Foi, aliás, curiosa a circunstância em que o regime português teve um período, como todos conhecemos,

de alguma incerteza. Nessa altura, qual foi o regime que cresceu mais imediatamente em paralelo? O

espanhol.

Sr. Deputado, com toda a franqueza lhe digo que sou pragmático. Vivemos em economia aberta,

competimos pelo investimento, por isso ou o atraímos para Portugal ou deixamos ir criar riqueza e postos de

trabalho para outros países.

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — Como para Espanha!

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — Sr. Deputado João Oliveira, não queria, pois, deixar de lhe dar a minha

resposta relativamente a esta matéria.

Se o PCP tem mais propostas a fazer relativamente a matérias de controlo e crivo que considere

relevantes, tem absoluta possibilidade de o fazer na especialidade.

Também queria deixar uma palavra à Sr.ª Deputada Ana Catarina Mendes, que saúdo.

Sr.ª Deputada, sou absolutamente favorável a um princípio de avaliação permanente de políticas públicas e

reservo para poucas coisas os dogmas de fé. Portanto, estou absolutamente disponível para melhorar,

aperfeiçoar, corrigir, porque entendo que este regime é importante independentemente dos governos, uma vez

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que a competição global pela atração de investimento vai permanecer. E eu acho que nenhum de nós quer

que o nosso País volte a viver em autarcia.

A Sr.ª Presidente: — Queira concluir, Sr. Vice-Primeiro-Ministro.

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — Procurarei concluir, Sr.ª Presidente.

Sr.ª Deputada, ouvimos com atenção as sugestões que fez e procuraremos, naquelas — e são várias —

que nos parecem aceitáveis para discussão, um consenso. Também estamos disponíveis para melhorar o

sistema.

O que queremos é que Portugal tenha um instrumento de atração de investimento estrangeiro que pague

aqui os seus impostos e que contribua para o nosso crescimento económico. Se o puder fazer em muitas

atividades de que nós precisamos para ter um País mais desenvolvido e mais moderno, não tenho nenhuma

dúvida em ir procurar o esforço político necessário para o conseguir.

Queria apenas dizer ao Sr. Deputado Carlos Peixoto, do PSD — e termino, Sr.ª Presidente —, que as

competências em matéria de pensar, de refletir e de propor uma estratégia de divulgação dos vistos gold

também estão definidas no diploma. Essas competências são do grupo de acompanhamento, que reúne as

várias entidades que, na cultura, na ciência, nas empresas, na internacionalização, têm opiniões e pareceres a

dar. Portanto, não se trata, como se diz, de delegar no poder autárquico a promoção. Cada território sabe

apresentar a sua proposta de valor, mas como instrumento do País obviamente que tem de ser uma política

integrada.

Sr.ª Presidente, agradeço a sua tolerância, que foi muita.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Fica, assim, concluído o debate sobre o primeiro ponto da ordem do dia.

Cumprimento o Sr. Vice-Primeiro-Ministro, o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, a Sr.ª e os Srs.

Secretário de Estado.

Passamos ao segundo ponto da ordem do dia, que consta da discussão conjunta, na generalidade, dos

projetos de lei n.os

767/XII (4.ª) — Altera o regime de incompatibilidades e impedimentos aplicável aos eleitos

locais e alarga o seu âmbito aos titulares de órgãos de entidades intermunicipais e associações de fins

específicos (BE), 768/XII (4.ª) — Altera o Estatuto dos Deputados, tornando obrigatório o regime de

exclusividade dos Deputados à Assembleia da República (BE), 806/XII (4.ª) — Altera o Estatuto dos

Deputados e o Regime Jurídico de Incompatibilidades e Impedimentos dos Titulares de Cargos Políticos e

Altos Cargos Públicos (PCP) e 808/XII (4.ª) — Reforça as incompatibilidades dos titulares de cargos políticos e

altos cargos públicos (PS).

Para apresentar os dois projetos de lei do Bloco de Esquerda, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe

Soares.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Atualmente, há, não só no

nosso País, mas em várias sociedades ocidentais, uma enorme suspeição que paira na nossa sociedade. É o

mundo dos negócios e da política que vive tornando reféns os interesses públicos dos interesses privados e é

aquela porta giratória em que pessoas, mas também interesses, andam sempre a ser jogados do privado para

o público e do público para o privado e em que as pessoas sentem sempre que são os seus interesses, os

interesses públicos, que saem prejudicados em favor de uns quaisquer interesses privados.

Veja-se as redes tentaculares dos grandes grupos económicos e percebemos bem do que estamos a falar.

O caso do Banco Espírito Santo é um, mas é um caso paradigmático, daqueles que estavam instalados na

nossa sociedade, com redes de interesses em toda ela, e em que vemos que, muitas das vezes, viviam acima

de todos nós, em cima dos interesses públicos.

É por isso que temos um renovar do compromisso de transparência, mas também da palavra de

compromisso entre quem está detentor de um cargo público e aquele que votou nele, aquele que depositou a

sua confiança no Deputado, na Deputada, naquele que espera, legitimamente, que o represente.

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Por isso, o Bloco de Esquerda dá o passo necessário, o passo de propor a esta Assembleia da República

que, de uma vez por todas, se leve por diante o regime de exclusividade das Deputadas e dos Deputados

como regime em vigor para todas e para todos, sem exceção. Não podemos ter mais exemplos de

administradores, de consultores, de gestores, ou de advogados que, de manhã, estão num qualquer escritório

a debater e a defender interesses privados e que, de tarde, estão na Assembleia da República sabe-se lá bem

a defender que interesses, …

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Mas o que é isso?!

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — … sabe-se lá bem se a defender interesses privados, se a defender os

interesses daqueles que neles votaram e que deles esperavam alguma confiança.

Protestos do Deputado do PSD Hugo Lopes Soares.

Não pedimos nada mais, nada menos, do que o mesmo que é feito em França ou em Espanha: que os

Deputados estejam em regime de exclusividade! Repito: só pedimos o mesmo que é feito em Espanha e o

mesmo que é feito em França! Essa é a exigência da democracia!

Passo a ler aqui um texto de um cidadão bastante conhecido das bancadas da direita, Bagão Félix, que

sobre esta matéria diz o seguinte: «A exclusividade de um Deputado não deve ser uma opção, deve ser um

imperativo. Estamos na presença de um órgão de soberania que, direta e democraticamente, representa a

vontade popular. Os seus membros eleitos deverão, por isso, exprimir o carácter inequívoco do mandato e não

estarem condicionados, direta ou indiretamente, por interesses que podem colidir com o interesse geral e o

bem comum. Estamos perante um delicado assunto de Estado, para o qual não vale apenas remediar, antes

importa prevenir todo o tipo de conflitos de interesses, seja por ação, seja por omissão.» Ora, é isto que

estamos aqui a propor. Mas propomos que também seja alargada aos eleitos locais, em regime de

permanência e a tempo inteiro, esta obrigatoriedade. É exigência da democracia!

Não queremos qualquer suspeição ainda vigente e a exclusividade é garantida tolerância zero a esta

promiscuidade de interesses.

Aplausos do BE.

Entretanto, assumiu a presidência o Vice-Presidente Miranda Calha.

O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Jorge Machado.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: A promiscuidade entre o poder político e

o poder económico está longe de ser um problema recente no nosso País e está à vista de todos os

portugueses que se está a agravar. Este facto justificou que, por diversas vezes, o PCP apresentasse

iniciativas legislativas para combater este problema que está a afetar a democracia portuguesa.

As propostas que o PCP apresentou visavam dificultar a usurpação, por parte do poder económico, do

papel que cabe ao poder político e dificultar as relações menos transparentes.

Se é verdade que os problemas da promiscuidade entre o poder económico e o poder político que existem

na Assembleia da República, mas também nos altos cargos do Estado, não podem ser eliminados com uma

simples alteração à lei, também não deixa de ser verdade que é urgente alterar a lei para eliminar relações

óbvias de promiscuidade que hoje existem.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Muito bem!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Contudo, PSD, CDS e PS têm assumido uma posição de boicote e têm

votado, sucessivamente, contra as soluções que o PCP apresentou.

Sr. Presidente, Srs. Deputados, os novos desenvolvimentos, como os casos dos submarinos, do BPN e do

BES, mais que justificar, reforçam a necessidade de uma alteração à lei.

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Queremos, hoje —, data em que reapresentamos um projeto de lei —, reafirmar que quanto pior, quanto

mais insuficiente for a lei mais espaço haverá para que situações de promiscuidade existam, mais espaço

existe para que se promova a corrupção e a sobreposição de interesses económicos de meia dúzia de grupos

económicos aos interesses da generalidade dos portugueses. Por isso, o PCP reapresenta este projeto de lei,

que impede muitas das promiscuidades que hoje verificamos.

Com as soluções que o PCP apresenta, deixa de ser possível que um titular de um cargo político, como um

Deputado à Assembleia da República, possa fazer, por via das sociedades de advogados ou por via das

sociedades gestoras de participações sociais, o que hoje está impedido de fazer a título individual.

Hoje, há uma espécie de offshore das incompatibilidades e impedimentos.

Se os factos forem praticados por uma sociedade de advogados em que um Deputado participa ou por uma

SGPS, então, nada é impedido, não há impedimentos ou incompatibilidades.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Muito bem!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — A título de exemplo: um Deputado está impedido de vender uma resma de

papel à Assembleia da República se tiver uma livraria, e muito bem! Mas se, por via de uma sociedade de

advogados ou de uma SGPS, esse mesmo Deputado participar num negócio de largos milhões de euros com

o Estado, não há nada no Estatuto dos Deputados, com a interpretação que PS, PSD e CDS foram fazendo,

que o impeça.

O Sr. David Costa (PCP): — Bem lembrado!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Um outro aspeto que alteramos no regime jurídico de incompatibilidades e

impedimentos dos titulares de cargos políticos e altos cargos públicos consiste em alargar de três para cinco

anos o período de impedimento do exercício de atividades privadas, no âmbito de empresas ou outras

entidades, com as quais teve contacto ou com as quais teve de lidar no exercício das suas funções públicas.

Por fim, entre outras alterações, entendemos que o critério de apenas aplicar as regras das

incompatibilidades se um Deputado detiver mais de 10% da sociedade comercial em causa é insuficiente, e,

por isso, propomos que, independentemente da participação social, se essa for relevante, então o Estatuto dos

Deputados deve aplicar-se.

Com este projeto de lei, o PCP dá, mais uma vez, um contributo para que se separe, como ordena a

Constituição, o poder político do poder económico.

Mais uma vez, vamos ver, aquando das votações, quem se coloca do lado da promiscuidade, da opacidade

e do terreno pantanoso da confusão de interesses e quem, como o PCP, luta para pôr fim à promiscuidade

que todo o País vê.

Aplausos do PCP.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Miranda Calha): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Delgado

Alves.

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: O debate que aqui nos traz

hoje é, de certa forma, evidentemente, pertinente e a melhoria da qualidade das normas que regulam a

transparência da atividade dos titulares de cargos políticos, que delimitam aquelas que devem ser as esferas

de proteção do mandato é, obviamente, um assunto que está na ordem do dia. Ainda na semana passada, em

temática similar, o Partido Socialista e outros grupos parlamentares tiveram já oportunidade de apresentar

iniciativas com vista à melhoria da qualidade da legislação que temos.

Portanto, não me parece que seja correto ou sequer adequado, ou sequer produtivo para este debate,

colocar a questão nos termos em que é colocada, como se existisse pureza absoluta e um caráter totalmente

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impoluto de alguns Srs. Deputados que se sentam nesta Câmara, enquanto que os outros são uns

facínoras,…

Vozes do PS, do PSD e do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — … são umas pessoas absolutamente incapazes de apresentar

soluções estruturadas e responsáveis.

Aplausos do PS, do PSD e do CDS-PP.

Portanto, centremo-nos no que é essencial: como é que melhoramos a qualidade da democracia? Como é

que fazemos os cidadãos acreditar, num momento em que, muitas vezes, de facto, desacreditam dos seus

responsáveis e dos seus representantes? Como é que vamos fazer este caminho sem enveredarmos por

demagogia, mas também sem deixarmos de reconhecer que o problema existe e que deve ser melhorado?

O Partido Socialista traz um projeto que assenta, essencialmente, em cinco objetivos fundamentais no que

diz respeito a incompatibilidades e impedimentos.

Em primeiro lugar, em alguns aspetos, é, de facto, necessário alargar o âmbito daqueles que são

abrangidos pela noção de alto cargo público, dando nota da necessidade de incluir consultores e aqueles que

participem, em representação do Estado, em negociações estruturantes para o funcionamento da economia.

Efetivamente, o que temos hoje não chega. Há que alargar o âmbito de aplicação do regime.

O período de nojo que vem classificado e se encontra consagrado na lei desde 1993 em alguns casos

também não vai tão longe quanto devia, porque ainda temos uma lei datada e marcada por um momento em

que, essencialmente, as preocupações giravam em torno do processo de privatizações. Não significa que,

hoje, deixe de ser relevante este aspeto e, por isso, não alteramos a lei. Mas, de facto, alargamos e

aumentamos o período de nojo também para o desempenho de funções em qualquer entidade que tenha,

direta ou indiretamente, benficiado de qualquer tipo de apoio financeiro que não seja titulado através de um

procedimento concursal.

Por outro lado, também há que alargar para o plano externo aquilo que já vigora internamente e olhar para

aquelas situações em que alguém teve de intervir em procedimento junto a organizações internacionais, por

exemplo, e que, obviamente, pode ser colocado numa situação de potencial conflito de interesses após a

cessação de funções. Por isso, pegamos exatamente no regime que tínhamos e alargamo-lo também para

outras áreas em que a questão se começa a colocar.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr. Presidente, no que diz respeito a um aspeto que liga este projeto

ao projeto apresentado na semana passada, no plano da transparência, penso que é boa hora de tornar

obrigatório o registo de interesses nos municípios, e, de facto, reconhecer que aí também há um caminho a

fazer no que respeita ao aumento da transparência e, portanto, o regime facultativo, na proposta do Partido

Socialista, passa a ser um regime obrigatório para todos os municípios do País.

Finalmente, no que respeita ao Estatuto dos Deputados, continuando num caminho de clareza no regime

de exercício do mandato, para que não fique na disponibilidade dos grupos parlamentares, para que não fique

na disponibilidade de considerações de interesse pessoal ou partidário dos titulares do cargo, de facto, temos

de ser claros em apertar a malha nas regras que permitem a substituição dos Srs. Deputados, como no

passado se fez, em relação às causas que podem levar à suspensão do mandato.

Por isso mesmo, alteramos as regras neste domínio e alargamos também algumas das incompatibilidades

a serem aplicadas ao exercício de profissões, nomeadamente uma que está muito em cima da discussão, que

é a atividade de advogado, mas reconhecendo os casos em que se justifica o impedimento, nomeadamente os

casos em que pode haver a possibilidade de litigar contra ou a favor do Estado e outras pessoas colectivas

públicas e em qualquer tribunal.

É isto que apresentamos. É claro, é eficaz e terá o condão de oferecer melhores soluções, mais

transparentes e mais claras para os cidadãos.

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Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Miranda Calha): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís

Ferreira.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Estamos diante de um

conjunto de iniciativas legislativas que pretendem introduzir novas regras no funcionamento do sistema

político.

Em jeito de conclusão, poderia dizer-se que se pretende credibilizar a vida democrática, que se pretende

torná-la mais transparente, atribuir-lhe mais rigor, mas também se procura garantir uma real e efetiva

separação entre o poder político e o poder económico, indo, aliás, ao encontro da nossa Constituição, que

elege a subordinação do poder económico ao poder político, como um princípio fundamental da organização

económica.

São, portanto, medidas necessárias, sobretudo numa altura em que se torna cada vez mais percetível um

sentimento generalizado entre os portugueses de uma certa subordinação do poder político ao poder

económico, e onde as decisões políticas são, tantas vezes, nubelosas, porque pouco transparentes e porque,

pura e simplesmente, o interesse público não foi considerado.

Ora, o interesse público tem de ser o fator determinante, tem de ser o fundamento exclusivo de qualquer

decisão política. E se queremos, na verdade, garantir a presença do interesse público nas decisões políticas,

não pode haver titulares de cargos políticos, que, ao mesmo tempo que exercem o seu mandato, ocupam uma

parte do seu tempo a trabalhar para grupos económicos e financeiros, que, muitas vezes são também

destinatários dessas decisões.

Os eleitores votam para que os eleitos se dediquem a tratar de assuntos públicos — que tratem, que

cuidem do interesse público! —, não votam para que os eleitos, no exercício do seu mandato, estejam a cuidar

de interesses privados.

É por isso que, neste esforço de credibilizar a democracia e de garantir a subordinação do poder

económico ao poder político — um esforço que, de resto, nos deve convocar a todos —, ganha uma

importância decisiva, não só o reforço e o alargamento das incompatibilidades dos titulares de cargos políticos

e de altos cargos públicos, mas também a clarificação das regras atuais do Estatuto dos Deputados, que têm

vindo a permitir situações verdadeiramente estranhas à nossa democracia, que se pretende absolutamente

transparente.

É recorrente, por exemplo, assistir à nomeação de gestores públicos que, depois, vão de armas e

bagagens para empresas privadas, tantas vezes concorrentes das empresas com capitais públicos, para as

quais foram, inicialmente, nomeados pelo Governo.

São situações destas que comprometem a defesa do interesse público e que hipotecam, até, a nossa

democracia. E é isto que é necessário contrariar e acautelar no plano legislativo.

É por isso que Os Verdes entendem que esta Assembleia da República não pode ficar indiferente, fingindo

como se não se estivesse a passar nada. Esta Assembleia tem a obrigação de agir no sentido e aperfeiçoar as

regras atualmente em vigor para credibilizar a nossa democracia, para garantir a defesa do interesse público e

para evitar que o poder político se confunda com o interesse e com o poder económico.

Os Verdes farão a sua parte neste combate, viabilizando as propostas em discussao. Vamos espeerar que

os restantes grupos parlamentares, nomeadamente as bancadas da maioria, também se associem a este

combate que a todos deve mobilizar.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Muito bem!

O Sr. Presidente (Miranda Calha): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Lobo.

O Sr. João Lobo (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Vou referir-me apenas, brevemente, a

intervenções que aqui foram produzidas pondo em causa a dignidade de profissionais dignos, honrados,

sérios.

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Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Refiro-me diretamente aos advogados que, se as Sr.as

e os Srs. Deputados não sabem, têm deveres para

com a comunidade antes dos deveres políticos, têm obrigação de não interferirem ou de não exercerem

influência sobre as decisões políticas estatutárias. Portanto, antes de chegarem à Assembleia, têm esses

deveres primários para com a comunidade.

Não queiram os senhores, à custa da seriedade dos outros que aqui estão presentes — e muitos aqui

estão! —, tirar vantagens políticas para credibilizarem uma ordem política que merece ser credibilizada, sim,

com um combate às formas, que não produzem de modo sério e leal, mas não à custa dos profissionais

liberais, designadamente dos advogados.

Expliquem-nos, Srs. Deputados, como é que alguém em prática individual, no exercício da sua profissão

liberal — e reporto-me aos advogados —, estando cá quatro anos, consegue sobreviver mantendo o escritório

e perdendo a clientela.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — E no Governo?

O Sr. João Lobo (PSD): — Expliquem os senhores que crime é este para que queiram erradicar os

profissionais deste órgão legislativo.

É admissível isto, Srs. Deputados? É eticamente aceitável o que os senhores pretendem? Não é isto que

os senhores pretendem, certamente!

Como o Bloco de Esquerda não considerou que é vedado aos senhores membros das autarquias locais o

exercício de atividades de comércio ou indústria no âmbito da respetiva autarquia.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Isto não é um discurso do PS? É uma posição nova do PSD?

O Sr. João Lobo (PSD): — Não posso aceitar que aqueles que, voluntariamente, abnegadamente,

entregam o melhor de si à comunidade estejam proibidos de exercer um direito fundamental, que é o direito à

liberdade económica.

Isto é inaceitável, como é inaceitável, Srs. Deputados, que o Bloco de Esquerda nos diga a nós, que

estamos aqui, que a política e a democracia não podem ser reféns dos conflitos de interesses de Deputados e

Deputadas que dedicam parte do seu dia a interesses privados e a outra metade a fazer legislação para

contentar esses mesmos interesses.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — O senhor está em permanência?

O Sr. João Lobo (PSD): — Srs. Deputados, se é verdade isto, digam!

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Denunciem, levantem o dedo!

O Sr. João Lobo (PSD): — Digam quem é!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Porque não o dizem! E digam-mo a mim!

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — E dizemos!

O Sr. João Lobo (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, o projeto que tem por objetivo tornar

obrigatório o regime de exclusividade de Deputados não pode merecer o apoio da bancada do PSD porquanto,

e em síntese brevíssima, parte de axiomas indemonstrados, desinseridos da práxis que atinge a dignitas

daqueles que entregam o melhor de si à República e à democracia.

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Não se compatibiliza com um conceito material alargado de democracia, sendo que não existe democracia

fora da Constituição e nenhuma vontade contra ela pode prevalecer. Não se conforma com o dever de

aprofundamento democrático participativo e não abrange os titulares das organizações sociais com funções

políticas. Engendra níveis de dependência e de funcionalização partidária dos Deputados, suscitando reservas

quanto à sua independência.

Não se coaduna com a observância do princípio democrático, devolvendo a respiração da vida comunitária

às oscilações das vontades partidárias, suprimindo infundamentadamente sujeitos diretos da vida política.

O Sr. Presidente (Miranda Calha): — Queira terminar, Sr. Deputado.

O Sr. João Lobo (PSD): — Termino, Sr. Presidente.

Também não se coaduna com o direito de acesso ao exercício de cargos políticos e de representação

entendido da sua dimensão negativa, proibindo discriminações na igualdade de acesso e na vertente de que

ninguém pode ser prejudicado na sua carreira profissional e nos limites às restrições quanto ao exercício de tal

direito.

Trata-se de um conjunto de projetos que a bancada que represento não pode aceitar. A bancada do PSD

votará contra as propostas em apreço e, em sede própria, encontra-se disponível para discutir com o Partido

Socialista as ideias e as propostas que consubstanciam o seu projeto de lei.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Miranda Calha): — Para uma intervenção, tem agora a palavra o Sr. Deputado Telmo

Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: De uma forma breve, quero

dizer que esta matéria tem, do nosso ponto de vista, e logo a abrir, uma questão de princípio e de filosofia.

Por uma questão de princípio e de filosofia, somos pelo rigor, pela transparência e por um regime de

incompatibilidades sério. Fica dito.

A segunda questão que quero sublinhar é que nós não somos, nunca fomos, nunca seremos e não vamos

ser neste debate a favor de um regime que eleja Deputados sem profissão, sem credibilidade, sem

independência, sem experiência de vida para serem aqui meros funcionários do Parlamento ou funcionários

dos seus próprios partidos.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Não é, nunca foi, nem nunca será o nosso ponto de vista. De resto, são estranhos alguns dos projetos que

aqui são apresentados, excluindo, Sr.ª Deputada Cecília Honório, essa coisa do moralismo radical da extrema-

esquerda, sempre à procura de construir um homem novo. Pergunto aos Srs. Deputados do Bloco de

Esquerda como é que é possível, ao mesmo tempo, apresentarem aqui um projeto que diz, por um lado, que o

mandato de Deputado é exclusivo, ou seja, é eleito e está aqui quatro anos a ser Deputado, e, ao mesmo

tempo, quererem a rotatividade dos Deputados.

Que nexo é que isso tem?

Sr. Deputado Pedro Filipe Soares, vão ao ponto de, no artigo 5.º do vosso projeto, dizerem que mandato de

Deputado é exclusivo, ou seja, foi eleito e é só Deputado, mas que pode suspender o mandato por motivo

profissional relevante.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Não perde o vínculo, pois não?

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Mas qual motivo profissional, se ele é exclusivo?

Faz algum sentido? É um fato feito à medida do Bloco de Esquerda, dos interesses do Bloco de Esquerda

e de uma bancada que, felizmente, digo eu, vai minguando.

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Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Maior moralismo ainda ouvimos da parte do Partido Comunista Português. Nada que nos surpreenda. Com

ironia, diria mesmo que me parece estranho que o PCP esteja muito preocupado com a possibilidade de um

Deputado patrocinar ou desempenhar funções ao serviço de um Estado estrangeiro.

Se os Deputados não pudessem ter ligações a um Estado estrangeiro, não havia PCP há muitos, muitos

anos, porque, durante anos, não fizeram mais nada se não servir um império estrangeiro que, felizmente,

também já desapareceu.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Protestos do PCP, tendo o Deputado Jorge Machado batido com as mãos no tampo da bancada.

O Sr. Deputado Jorge Machado, além de tentar estragar o património do Estado batendo nessa bancada,

fala muito de promiscuidade e de relações de promiscuidade. Mas essa promiscuidade começa e acaba

quando?

Protestos do PCP.

Essa promiscuidade aplica-se a quem é funcionário do partido ou só se aplica a quem trabalha para outra

entidade?

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Essa promiscuidade aplica-se a quem tem ligação a uma associação profissional ou empresarial ou aplica-

se também a quem, no Parlamento, serve unicamente os interesses dos sindicatos?

Vozes do CDS-PP: — Ora!…

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Convém saber, porque queremos um Parlamento livre, de gente livre,

não queremos que seja como em Pyongyang, onde os Deputados são todos escolhidos pela direção do

partido, são retirados pela direção do partido e se a direção do partido não gostar deles são mandados para

casa e vêm outros, escolhidos a dedo pela direção do partido.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Em relação ao projeto de lei do Partido Socialista, e porque tenho o meu tempo a esgotar-se, queria dizer,

Sr. Deputado Pedro Delgado Alves, que não acompanhamos totalmente o vosso projeto.

Existem, no entanto, aspetos que nos merecem consideração, como os que estão relacionados com o

próprio registo de interesses, com o seu alargamento, com o pensamento, até, de a que ponto vão algumas

das incompatibilidades. Por isso, ponderaremos, junto do Partido Socialista, a possibilidade de haver uma

discussão sobre essa matéria, porque, mesmo não concordando com tudo, há temas e matérias que nos

parecem relevantes.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente (Miranda Calha): — Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, é para defesa da honra e consideração da bancada.

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Vozes do CDS-PP: — Oh!…

O Sr. Presidente (Miranda Calha): — Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Telmo Correia, utilizou várias expressões com

que pretendeu ofender esta bancada. À maior parte delas não darei resposta, porque compreendo que, no

desespero, na discussão das opções políticas, o Sr. Deputado não tenha outro tipo de argumentos.

Queria, no entanto, fazer a defesa da honra e da consideração da bancada, porque há um argumento que

o Sr. Deputado utilizou na sua intervenção que, manifestamente, nos obriga a usar da palavra para esse

efeito.

Espero que tenha sido por ignorância que o Sr. Deputado tenha utilizado os argumentos que utilizava o

fascismo, até 1974, para atacar os comunistas. Espero que tenha sido por ignorância que tenha utilizado os

argumentos que se utilizavam nesta Sala, na Assembleia Nacional, para acusar os comunistas de defesa de

um império estrangeiro. Espero que tenha sido por ignorância, porque se não foi por ignorância, Sr. Deputado

Telmo Correia, é muito mais grave.

Se o Sr. Deputado Telmo Correia quis utilizar de forma consciente os mesmos argumentos que utilizava o

Estado fascista para combater politicamente os comunistas, para os prender, torturar e assassinar, porque se

dizia na altura que eram defensores de um império estrangeiro, se utilizou de forma consciente todos estes

argumentos e não por ignorância, então, Sr. Deputado Telmo Correia, é o seu discurso que não tem lugar

nesta Assembleia, porque esta é a Assembleia da democracia, pela qual muitos comunistas deram a sua vida,

sacrificaram a sua liberdade, inclusivamente pagando com o sacrifício mais elevado que se pode pagar para

que o Sr. Deputado se exprima hoje em liberdade enquanto Deputado.

Espero que o Sr. Deputado aproveite a oportunidade que vai ter agora na resposta a esta defesa da honra

e consideração da bancada para dizer que não era essa a sua intenção, porque se utilizou esses argumentos

conscientemente o Sr. Deputado vai ter muito mais consequências a retirar.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Miranda Calha): — Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, começo por dizer que percebi a agressividade do Sr.

Deputado João Oliveira, no entanto não percebi — mas gostava de saber, para minha tranquilidade — qual é a

ameaça.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Protestos do PCP.

Qual é a ameaça? Só quero saber qual é a ameaça!

O Sr. João Oliveira (PCP): — É não ter condições para exercer o seu mandato!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — O senhor quer retirar-me daqui para me pôr onde? Quer pôr-me num

gulag? Espero que não.

Sr. Deputado, vamos lá ver o que eu disse. Os senhores são funcionários do partido ou não são? O partido

paga os salários e fica com parte dos salários dos Deputados ou não fica?

O Sr. João Oliveira (PCP): — Não respondo a esses disparates!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — O partido escolhe quem é Deputado livremente e corre com eles

livremente ou não corre?

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A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Está desesperado!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Os Deputados do partido servem, muitas vezes, os interesses dos

sindicatos ou não servem?

Tudo isso é verdade, mas a questão essencial é, Sr. Deputado, a questão da União Soviética ou da

admiração pela Coreia do Norte. E aí, Sr. Deputado, mantenho o que disse: nasci em democracia e sou

democrata.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Esses eram os argumentos do fascismo!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Quer ouvir, Sr. Deputado? A primeira coisa que aprendemos em

democracia é a ouvir os outros e a não estarmos sempre aos gritos quando os outros estão a falar!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Se os Srs. Deputados se dizem democratas, oiçam os outros!

Aquilo que lhe quero dizer, Sr. Deputado, é que respeito a luta do Partido Comunista Português, mas

sublinho que, ao longo da sua história, foi sempre subserviente a Moscovo, subserviente aos interesses de

Moscovo, mesmo quando grande parte dos comunistas europeus condenaram a invasão de Praga, a entrada

na Checoslováquia, as mudanças, o regime.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Continua a usar argumentos do fascismo.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Os comunistas portugueses foram sempre subservientes e por isso é

que a vossa grande referência, Álvaro Cunhal, era um herói soviético.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Bem lembrado!

O Sr. João Oliveira (PCP): — São argumentos do fascismo!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Não são argumentos do fascismo, Sr. Deputado, são argumentos de

democrata, porque foram os democratas que derrotaram o comunismo soviético, não foram os fascistas!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Quem derrotou o comunismo soviético foram os democratas, não foram os fascistas! Foi Churchill, foi De

Gaulle, foram muitos democratas. Foram esses que venceram aquela que foi a maior tirania e a maior

opressão do século passado: o comunismo soviético, que os senhores continuam a venerar.

Digo-lhe, como democrata, como homem livre e como Deputado desta Casa, que não aceito nem o

fascismo nem o comunismo, porque são irmãos, e muito parecidos.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente (Miranda Calha): — Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Machado para uma intervenção,

que terá de ser rápida e compacta, porque dispõe de muito pouco tempo.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: É curioso que, num debate em que

estamos a falar da promiscuidade entre o poder político e o poder económico, em que estamos a falar de

transparência, de seriedade no exercício das funções, as intervenções do PSD e do CDS-PP sejam

completamente surreais. Vão buscar a China, a Coreia, a União Soviética, porque não querem discutir a

questão de fundo.

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Aplausos do PCP.

E ficaram profundamente irritados porque o PCP denunciou aqui que há problemas sérios de

promiscuidade entre o poder económico e o poder político, e essa é uma realidade que todos os portugueses

veem.

Portanto, Sr. Deputado João Lobo, não se trata de um problema de seriedade do exercício das funções de

advogado, trata-se, sim, de um problema de seriedade do exercício do mandato de Deputado. É que já

tivemos Deputados que, enquanto advogados, individualmente, não podiam participar em negócios do Estado,

mas participaram, enquanto Deputados integrados em sociedades de advogados, em negócios com o Estado,

Sr. Deputado! Ignorar isso é ignorar a realidade.

A solução que o PCP apresenta e coloca em discussão, e que irritou tanto o PSD e o CDS-PP, é no sentido

de que os Deputados não possam intervir em negócios com o Estado, seja a título individual, seja em

sociedades de advogados, seja integrados em sociedades de participações e gestões sociais.

E escusam de se irritar. Pelo menos, em toda a irritação fica claro qual é o problema dessas duas

bancadas relativamente a esta matéria.

Mais: alargámos o período de nojo. Mais: alterámos as regras.

O Sr. Presidente (Miranda Calha): — Queira terminar, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Termino já, Sr. Presidente.

Nós apresentámos um conjunto de soluções que resolvem ou que visam apontar à solução de um

problema concreto que os portugueses sentem. É que há uma promiscuidade entre o poder político e o poder

económico e a Constituição não permite, o povo não permite e a democracia não permite essa realidade.

Aplausos do PCP.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Miranda Calha): — A Mesa regista a inscrição do Sr. Deputado Pedro Filipe Soares para

uma intervenção. Ainda dispõe de 13 segundos.

Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, com a mesma tolerância que também foi usada para

com outros Deputados, quero dizer, em primeiro lugar, à bancada do CDS que há alguma confusão neste

debate. Eu sei que pressiona o CDS quando falamos em Bagão Félix, a consciência fica ali meio tremida.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — O que é que eu tenho a ver com o Bagão Félix? Não concordo com

nada do que ele diz!

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Mas é verdade que há muita confusão.

Vou simplificar. O que é exclusividade de funções? É que qualquer Deputado ou Deputada, sentado nestas

cadeiras, tem o compromisso de ter toda a sua disponibilidade, apenas e só, para a defesa do interesse

público. É o que acontece em Espanha, é o que acontece em França, e não me consta que seja, de facto,

para o partido. Mais: não cessam o vínculo, suspendem-no!

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Claro!

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Se tivessem lido não o nosso projeto, mas a lei, veriam que é

exatamente isso que acontece. O PSD dizia: «Bem, mas não há casos…» Mas, Srs. Deputados, estão agora a

utilizar a tática da avestruz nesta matéria? O que nós não desconhecemos são casos de Deputados que,

enquanto tal, coabitaram nos seus escritórios com negócios de milhões e mantiveram as suas funções, como

é o caso de José Luís Arnaut e de outros.

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O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Isso já está na lei!

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Não utilizem a tática da avestruz, porque o povo não compreende. O

povo exige mais compromisso, que é exatamente o que trazemos — mais compromisso com a democracia.

Essa é a nossa proposta, veremos de que lado é que está a maioria.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Miranda Calha): — Inscreveu-se ainda o Sr. Deputado Pedro Delgado Alves para uma

intervenção.

Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Estão a furar uma regra da Conferência de Líderes!

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr. Presidente, está a ser invocada uma praxe parlamentar no sentido

de que o grupo parlamentar responsável pelo agendamento seria o último a usar da palavra. Trata-se de uma

praxe parlamentar que entendemos não existir, mas não quero, obviamente, colocá-la em causa porque não

tinha dela conhecimento.

As inscrições gerem-se no quadro do tempo. Portanto, se um grupo parlamentar tiver tempo para reagir a

uma intervenção e tendo outro grupo parlamentar terminado, não há outra forma de articular. No entanto,

sublinhando que não quero pôr em causa a lealdade parlamentar, não farei a intervenção que tencionava fazer

até a questão estar esclarecida.

O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Mas o BE já fez a mesma coisa!

O Sr. Presidente (Miranda Calha): — Srs. Deputados, este debate está encerrado.

Vamos passar ao terceiro ponto da nossa ordem de trabalhos, que consiste na discussão, na generalidade,

dos projetos de lei n.os

811/XII (4.ª) — Impede o cultivo, a comercialização e a libertação deliberada em

ambiente de organismos geneticamente modificados (OGM) (Os Verdes), 784/XII (4.ª) — Proíbe o cultivo, a

importação e a comercialização de organismos geneticamente modificados vegetais (BE) e 805/XII (4.ª) —

Regula o cultivo de variedades agrícolas geneticamente modificadas (PCP) em conjunto com o projeto de

resolução n.º 1293/XII (4.ª) — Recomenda ao Governo orientações atinentes ao processo de transposição da

diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho que altera a Diretiva 2001/18/CE no que se refere à

possibilidade de os Estados-membros limitarem ou proibirem o cultivo de organismos geneticamente

modificados (OGM) no seu território (PS).

Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Os Verdes entenderam

que era altura de trazer novamente à Assembleia da República uma discussão a propósito dos organismos

geneticamente modificados. Justamente por isso, Os Verdes apresentam um projeto de lei ao Parlamento que

propõe, justamente, impedir o cultivo, a comercialização e a libertação deliberada em ambiente de

transgénicos.

Sr.as

e Srs. Deputados, apresentamos esta proposta, atendendo a algumas condições.

Em primeiro lugar, que o cultivo de transgénicos não se faz em campo fechado nem em laboratório, faz-se

em campo aberto, e a questão da contaminação é, naturalmente, uma questão impossível de impedir

completamente.

Por outro lado, Sr.as

e Srs. Deputados, sabemos que continua a haver controvérsia científica relativamente

a esta matéria, sabendo-se que não está comprovada a inocuidade dos transgénicos.

Também sabemos que os cidadãos dos diferentes Estados da União Europeia, por via de diversos estudos

já realizados, tendem a rejeitar em massa os transgénicos.

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Por outro lado, também, as multinacionais querem ganhar terreno também nos Estados-membros da União

Europeia para aumentarem o seu negócio, para fabricarem o seu lucro, e a União Europeia tem cedido aos

apetites dessas multinacionais. Veja-se, por exemplo, a questão da rotulagem que, para nós, é bem

demonstrativa desta cedência quando se determinou, por exemplo, que os produtos que contêm menos de

0,9% de transgénicos não tenham obrigatoriedade de informação por via da rotulagem ao consumidor. Isto é

absolutamente inadmissível.

Mas enquanto alguns Estados-membros da União Europeia proibiam o cultivo de transgénicos no seu

espaço geográfico, como, por exemplo, a Alemanha, a França, a Polónia e outros países, Portugal achava, por

via de diversas maiorias parlamentares do PSD, do CDS e do PS, que na União Europeia é que se decidia e

que nós, cá, acatávamos as decisões relativamente à matéria dos transgénicos.

Ocorre que, Sr.as

e Srs. Deputados, na União Europeia determinou-se agora que essa questão da decisão

sobre o cultivo de transgénicos passa para a «competência» (entre aspas) dos Estados-membros. Ou seja, a

partir de agora, são os Estados-membros que decidem se permitem ou não o cultivo no seu espaço

geográfico.

Portanto, há uma alteração, uma novidade que, de resto, vai contra um dos fortes argumentos que as

diversas maiorias parlamentares usavam nesta Câmara. Por isso, Os Verdes entendem que é tempo de

rediscutir a questão com esta nova realidade, apelando aos grupos parlamentares que aprovem o projeto que

Os Verdes apresentam para que o possamos discutir em sede de especialidade.

O Sr. Presidente (Miranda Calha): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr. Presidente, Sr.as

Deputadas, Srs. Deputados: Vou referir-me à intervenção

do Bloco de Esquerda, proferida na semana passada, relacionada com esta questão dos organismos

geneticamente modificados (OGM) e da nova realidade europeia, aqui já aludida.

No âmbito da União Europeia, pode haver aceitação por parte da agência e da autoridade ambiental, mas a

autorização para o cultivo ou para a comercialização de OGM compete a cada Estado-membro. Nesse aspeto,

a União Europeia acabou por lavar as mãos, até porque a esmagadora maioria dos Estados-membros da

União Europeia não queriam a comercialização e o cultivo de OGM, de transgénicos. Porquê? Porque as

pressões da opinião pública são muito fortes acerca de não estar garantido o princípio da precaução para a

manutenção da biodiversidade e para as consequências que isso possa ter na saúde pública. Portanto, só em

cinco Estados-membros é que há esta realidade dos OGM, de entre os quais Portugal.

Curiosamente, nesse debate a direita entendeu não falar, e é com espanto que no dia a seguir a essa

intervenção, reparo numa resolução do Conselho de Ministros que já definiu a legislação para os OGM em

Portugal, a qual, presumo, esteja neste momento em Belém para promulgação.

Portanto, tenho um pedido para fazer encarecidamente aos Srs. Deputados do PSD e do CDS: digam-nos

o que é que o Governo terá aprovado sobre OGM. Estão aqui hoje em discussão várias iniciativas de grupos

parlamentares da oposição, mas gostaríamos de saber qual é, afinal, a posição dos partidos que suportam o

Governo e quais as grandes linhas que o Governo terá aprovado em Conselho de Ministros, o que poderia

enriquecer o nosso debate.

A circunstância é a de apelar para que, em Portugal, se respeite o princípio da precaução. Será que os Srs.

Deputados da maioria, que dizem vir a autorizar a manutenção do milho transgénico em Portugal ou,

eventualmente, a abrir a porta a outro tipo de organismos geneticamente modificados, têm garantias, do ponto

de vista científico, de que está a ser preenchido o princípio da precaução? Têm garantias que, do ponto de

vista económico, há alguma mais-valia no plantio do milho transgénico? Têm uma opinião fundamentada —

que não seja a dos que trabalham com a Monsanto ou com outras multinacionais da indústria agroquímica —

de que pode e deve ser cultivada e comercializada em Portugal essa realidade dos transgénicos? Nós cremos

que não, mas o debate será este.

Na nossa opinião, o debate não deveria ser como tem sido até agora, mas sobre tentar observar o princípio

da precaução, uma moratória ou uma suspensão ou a proibição e, depois, tentar tirar algumas conclusões,

fazer uma avaliação… Mas não, cultiva-se porque sim, não há argumento, não há fundamento científico, não

há prova e, não havendo prova, deve agir-se a favor da saúde pública e do ecossistema e não ao contrário.

Portanto, este tem sido o debate.

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O Bloco de Esquerda, já no ano de 2000, conseguiu aprovar um projeto de lei que defendia a

biodiversidade e aprovou o princípio da precaução, imediatamente ignorado por todos os Governos. E é aí que

queremos voltar.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Miranda Calha): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Ramos.

O Sr. João Ramos (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: A passagem da responsabilidade das

decisões sobre o cultivo de organismos geneticamente modificados da União Europeia para os Estados-

membros trouxe, novamente, a questão dos OGM à ordem do dia.

Perante esta possibilidade, pelo menos dois ministros já manifestaram a intenção de não impor limitações.

Os impactos positivos do desenvolvimento científico e tecnológico na área da biotecnologia não podem deixar

de pugnar por uma criteriosa aplicação do princípio da precaução, em particular ao setor agrícola,

relativamente ao qual existe uma crescente pressão para a introdução de organismos geneticamente

modificados.

A agricultura dominante em Portugal é a das explorações agrícolas familiares de pequena e média

dimensão. As explorações de caráter empresarial e de grandes dimensões, centradas nas produções

intensivas e em massa — que têm vindo a consolidar a sua posição por ação do atual Governo —, têm

também maior apetência para procurar o lucro máximo, através da proteção ecológica mínima.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. João Ramos (PCP): — A agricultura nacional só tem a ganhar com a defesa e promoção da

qualidade do produto nacional biológico de espécies regionais e tradicionais, ao invés da padronização da

produção em massa e de modo intensivo.

A atual legislação responsabiliza o produtor de agricultura convencional ou biológica pela tomada de

precauções que limitam a contaminação das suas explorações pelas transgénicas vizinhas, cujos produtores

são pouco mais do que responsabilizados pela notificação dos produtores adjacentes.

São já conhecidos no mundo casos de agricultores judicialmente perseguidos por deterem variedades

patenteadas, que chegaram às suas explorações por polinização cruzada.

Portugal não terá vantagens em optar pelo cultivo transgénico. O Estado deve zelar pela capacidade

produtiva da generalidade dos agricultores portugueses por condições que lhes assegurem rendimentos e

condições de vida dignas, proporcionando aos portugueses uma produção agroalimentar simultaneamente

sadia e de qualidade. Ao invés, copia soluções que põem em causa os modos de produção convencionais e

que apenas servem os interesses de alguns grandes produtores e do agronegócio.

A atual legislação sobre zonas livres de organismos geneticamente modificados inibe na prática a

declaração como zona livre ao atribuir supremacia ao direito de cultivar transgénicos sobre o direito de não os

cultivar. Com a legislação atual, basta um qualquer proprietário agrícola de uma determinada região pretender

cultivar organismos geneticamente modificados para que as declarações de zona livre deixem de fazer efeito.

Com o presente projeto de lei, o PCP propõe que a agricultura convencional e/ou biológica sejam a regra e

que todo o País seja considerado uma zona livre de transgénicos, remetendo o cultivo de organismos

geneticamente modificados para o âmbito da exceção.

O Sr. David Costa (PCP): — Muito bem!

O Sr. João Ramos (PCP): — Hoje, em nome do princípio da precaução, admitimos a exceção para a

investigação ou experimentação científica. Amanhã, face ao desenvolvimento da ciência e da técnica, os

portugueses saberão decidir o que é melhor para a agricultura e para o País.

Aplausos do PCP.

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O Sr. Presidente (Miranda Calha): — Tem agora a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Miguel

Freitas.

O Sr. Miguel Freitas (PS): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Os organismos geneticamente

modificados ultrapassam a questão agrícola. É uma questão ambiental, mas muito particularmente uma

questão de sociedade.

O que é verdade é que a sociedade europeia, no seu todo, tem tido sempre um sentido de prudência

relativamente aos organismos geneticamente modificados. Nas instâncias europeias, quer no Conselho, quer

no Parlamento Europeu, assim tem sido. O que é verdade é que apenas um OGM existe e é cultivado hoje na

Europa — o milho.

Portanto, aquilo de que verdadeiramente estamos a tratar é disto: apenas um OGM é cultivado, hoje, a

nível europeu.

Também em Portugal, o sentido tem sido o da prudência. Transposta que foi a diretiva em 2003, em 2005 o

Governo do Partido Socialista apertou o que eram os critérios do princípio da precaução com princípios claros

de proteção quer das culturas convencionais, quer das culturas biológicas.

Portanto, é com base nessa legislação de 2005 que o que podemos dizer é que, neste momento, a questão

dos organismos geneticamente modificados, em Portugal, é uma questão contida, isto é, temos verificado, ao

longo dos anos, que não há uma expansão como se previa dos organismos geneticamente modificados.

Face a isto, é verdade que há agora um elemento novo, que é uma diretiva que está aprovada já em

segunda leitura, mas ainda não está aprovada a nível europeu — ainda está na fase de recolha de

assinaturas, mas a verdade é que conhecemos o conteúdo da substância desta diretiva — que o que veio

fazer não foi deixar aos Estados-membros autorização de cultivo mas sim, a prerrogativa de limitar ou proibir

nos seus territórios. A autorização mantém-se no âmbito europeu, o que os Estados-membros podem fazer é

limitar ou proibir.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. Miguel Freitas (PS): — O que é que o PS entende relativamente a esta matéria?

Em primeiro lugar, temos 10 anos de OGM em Portugal e o que é preciso é que haja uma avaliação do que

foi o impacto dos OGM no País.

Em segundo lugar, entendemos que esta é uma matéria que necessita de ser avaliada, mas também

monitorada e escrutinada. E o melhor escrutínio é que, a partir de agora, qualquer lei que seja feita no sentido

da limitação ou da proibição dos OGM em Portugal seja lei da Assembleia da República. Isto é, sendo esta

uma questão de sociedade e não uma questão agrícola nem exclusivamente ambiental, o melhor sítio para se

encontrar os consensos a nível nacional é a Assembleia da República.

Em terceiro lugar, entendemos que há aqui uma questão de informação, de transparência e, portanto, é

necessário que haja uma base de dados permanente no Ministério da Agricultura que possa ser consultada

por todos os cidadãos relativamente a esta matéria.

A Sr. Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Então, não há?!

O Sr. Miguel Freitas (PS): — E, finalmente, entendemos que deve ser reforçada a informação ao

consumidor. Há, aliás, uma resolução do Partido Ecologista «Os Verdes», aprovada nesta Assembleia da

República, sobre a questão da rotulagem dos OGM que gostaríamos de ver passada do papel ao processo

legislativo.

Este é, mais uma vez, o sentido do Partido Socialista, o sentido da prudência relativamente à questão dos

organismos geneticamente modificados.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Miranda Calha): — Tem agora a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Ulisses

Pereira.

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O Sr. Ulisses Pereira (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Gostava de começar por

cumprimentar os proponentes das quatro iniciativas hoje em discussão sobre a existência e cultivo de

organismos geneticamente modificados em Portugal.

Trata-se de um tema que, não sendo novo em discussão neste Plenário, nunca teve um debate mais

alargado, sem tabus e preconceitos associados.

O PSD tem defendido esta reflexão ampliada, porque julga que a incerteza do que está em causa merece

mais do que ideias pré-definidas de contra, ou a favor.

Sendo um tema atual, perante a aprovação de uma nova diretiva da União Europeia onde será possível

que o Estado-membro possa limitar ou proibir o cultivo de OGM que tenham sido autorizados ao nível da

União Europeia — o que até agora não acontecia —, julgamos que o Parlamento mereceria mais do que os

dogmáticos, mas legítimos, projetos de lei apresentados pelo Bloco de Esquerda, pelo Partido Comunista e

por Os Verdes. Esperávamos mais.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Nós também esperávamos mais da parte do PSD!

O Sr. Ulisses Pereira (PSD): — No caso do PCP, proíbe-se o cultivo de OGM, prevendo-se exceções, mas

não definindo esse regime de exceção,…

O Sr. João Ramos (PCP): — Então não?!

O Sr. Ulisses Pereira (PSD): — … o que poderia levar à aprovação ad hoc de áreas de cultivo de

transgénicos, sem decisões homogéneas e integradas.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — É verdade!

O Sr. Ulisses Pereira (PSD): — O caso do Bloco de Esquerda e de Os Verdes é mais radical e com uma

duvidosa base legal. Além da proibição do cultivo, o Bloco de Esquerda vem propor a proibição de importação

e comercialização de todos os produtos de OGM. Tal impedimento reduziria muitíssimo o leque de produtos

alimentares à disposição dos consumidores portugueses. Por exemplo, os consumidores nacionais deixariam

de ter acesso a um imenso número de produtos onde a soja está presente, na totalidade ou em parte.

No PSD, não podemos acompanhar estas propostas fundamentalistas e sem adaptação à realidade em

que nos inserimos.

No PSD, nunca fomos pró-transgénicos. Acreditamos na evolução da ciência e que a inovação é essencial

ao desenvolvimento económico da agricultura, cuja função mais nobre é alimentar uma população mundial de

7000 milhões de pessoas. Contudo, nunca defendemos uma introdução descontrolada destes organismos na

produção agrícola, nem nunca usámos argumentos para alargar a sua introdução em Portugal.

Sempre defendemos o princípio da precaução, porque, mesmo dentro da comunidade científica, não há

certezas e as teorias evoluem com o aprofundamento dos estudos dedicados à genética e às modificações

genéticas.

Srs. Deputados, quanto às recomendações do Partido Socialista, concordamos com o princípio de algumas

delas, embora outras nos pareçam redundantes ou mesmo desnecessárias.

Recomendar que se assegure aos consumidores a informação suficiente já está em vigor em diversos

regulamentos comunitários, legislação nacional e, conforme já foi referido, por uma resolução aprovada nesta

Assembleia. Da mesma forma que uma avaliação externa da legislação em vigor deverá ser efetuada, mas por

serviços internos. Vimos esta evolução no projeto de resolução do Partido Socialista e acompanhamo-lo.

Vemos também com agrado um maior escrutínio pela Assembleia da República nas decisões de limitação

ou proibição de cultivos de variedades geneticamente modificadas.

Em suma, o PSD mantém uma posição cautelar quanto ao cultivo de OGM, defende uma avaliação da

experiência de quase 10 anos de cultivo de milho transgénico no território nacional, de modo a que as

decisões futuras se baseiem em factos científicos e também empíricos, defendemos que se assegure sempre

o princípio da precaução, sem renegar a evolução dos conhecimentos científicos e tecnológicos.

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O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!

O Sr. Ulisses Pereira (PSD): — Por isso, não acompanhamos os argumentos dos partidos mais à

esquerda e revemo-nos em posições moderadas, defendendo o interesse comum do nosso mundo rural.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Miranda Calha): — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Abel Baptista.

O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Pela quarta vez, pelo menos, nos

últimos 10 anos, discutimos neste Parlamento a questão dos organismos geneticamente modificados.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — E então?!

O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — E então, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, pela quarta vez lhe digo que,

ao contrário de si, não tenho uma posição fundamentalista, tenho uma posição tolerante, uma posição a favor

da agricultura portuguesa e uma posição democrática de coexistência dos diferentes tipos de agricultura: a

biológica, a tradicional e aquela que pode cultivar OGM. Aliás, isto é dito desde 2005 quer pelo CDS, quer por

mim próprio.

Portanto, Sr.ª Deputada, não temos uma posição diferente da que sempre tivemos.

Não partilhamos da sua posição porque não podemos entender que se possa delimitar, proibir um

agricultor português de fazer aquilo que um agricultor espanhol, francês, alemão ou polaco pode fazer,

competindo, assim, com o que é a atividade agrícola dos nossos agricultores portugueses. Defendo os

interesses de Portugal e dos portugueses, em primeiro lugar.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Na Alemanha, não há!

O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Sr. Deputado Luís Fazenda, o princípio da precaução tem de estar

sempre presente no cultivo dos transgénicos — aliás, uma questão que gostaria de deixar muito clara é que as

regras de segurança têm de ser, e são-no no caso português, claras, mas podem ser ainda melhor clarificadas

no que diz respeito à segurança do uso de transgénicos —, repito, o princípio da precaução tem de estar

sempre presente no cultivo dos transgénicos, como não poderia deixar de ser até porque são regras

comunitárias, o princípio da responsabilização quer das entidades produtoras, quer dos agricultores no uso

dos transgénicos também tem de estar sempre presente, mas não podemos impedir que, respeitando estes

princípios, o agricultor não possa fazer uso dos OGM.

Como foi já bem referido não por alguém da coligação, mas pelo Partido Socialista, o uso de OGM em

Portugal e na Europa é exclusivo ao milho. Não se aplica à batata, nem à soja, onde já se produz noutros

continentes com organismos geneticamente modificados, exatamente por respeito ao princípio da precaução.

Mas, Sr.as

e Srs. Deputados, não podemos acompanhar a proibição do cultivo de um produto que depois o

importamos para consumo. Isso seria absolutamente injusto para com a nossa agricultura.

Permitam-me duas ou três notas relativamente à proposta do Partido Socialista.

Sendo uma proposta diferente, claramente, porque, como diz o Deputado Miguel Freitas, e bem, o que está

aqui em causa com a nova orientação da União Europeia, não é a autorização para a introdução de

transgénicos mas, sim, a sua proibição, que é determinada pelos Estados-membros. Os Estados-membros

podem proibir o seu cultivo em determinadas circunstâncias e, inclusivamente, não só por razões ambientais e

de saúde mas também, por exemplo, por razões ligadas ao uso do solo. Agora, um Estado-membro pode fazê-

lo.

Mas gostaria de dizer ao Sr. Deputado Miguel Freitas e, em geral, ao Partido Socialista que o vosso projeto

de resolução não merece a nossa concordância em três dos seus quatro aspetos.

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Primeiro, sobre a questão da avaliação externa, não me parece fazer sentido haver uma avaliação externa,

a não ser relativamente às questões já referidas pela União Europeia e pelo Estado português.

Depois, diz o Sr. Deputado que uma questão desta natureza é, sobretudo, administrativa, que pode e deve

ser fiscalizada pelo Parlamento. Mas, então, sendo uma questão administrativa, estamos a querer introduzir,

nesta matéria uma exigência maior do que temos para outras de maior dimensão, como, por exemplo, na área

da saúde, a autorização de novos medicamentos? Além de mais, neste último caso, não é o Parlamento que

proíbe ou autoriza, terá de ser o Estado.

Por outro lado, não se percebe o seguinte: se o Estado português autorizar, não vem à fiscalização do

Parlamento, mas já vem à fiscalização do Parlamento, se for para proibir?! Em minha opinião, isto não faz

sentido.

Faz sentido, sim, e aí acompanharemos o Partido Socialista, que seja prestada mais informação, toda a

informação disponibilizada, devendo o rótulo conter toda a informação sobre os OGM.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — E o Governo? O que é que aprovou o Governo?!

O Sr. Presidente (Miranda Calha): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Ramos,

usando o pouco tempo de que dispõe.

O Sr. João Ramos (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Deputado Miguel Freitas referiu não

haver nada de novo relativamente a esta matéria dos OGM, a não ser uma proposta de diretiva que poderá

permitir aos Estados-membros limitar ou proibir a utilização destes organismos. O que acontece é que, pelo

menos dois Ministros deste Governo, já disseram que o Governo não colocará qualquer impedimento ou

inibição ao seu cultivo. Ora, na nossa perspetiva, isto é preocupante e é nesse sentido que apresentamos o

nosso projeto de lei.

Devo ainda acrescentar, Sr. Deputado, que não concordamos com o facto de dizer que não há nada de

novo, porque entendemos que há outras matérias novas, nomeadamente o Tratado Transatlântico, o dito

«TTIP» (Transatlantic Trade and Investment Partnership), um tratado comercial com os Estados Unidos da

América, que têm uma perspetiva, relativamente à produção e à utilização de organismos, completamente

diferente e que nós, na Europa, não aceitamos da mesma forma. Por isso, há também aqui um cruzamento e

implicações relativamente a esta matéria.

O Sr. Deputado Ulisses Pereira diz não entender qual é o regime de exceção. Se calhar, não leu o que

estava lá escrito, porque o que o projeto do PCP defende é a proibição de transgénicos, exceto em casos de

investigação científica, para fins medicinais ou terapêuticos e para outros fins considerados relevantes, desde

que autorizado pelo Governo. Depois, é lógico que a legislação é regulamentada e que os processos de

regulamentação afinam estas matérias que são aqui definidas.

Por outro lado, quando os Srs. Deputados dizem que a posição de defesa dos OGM é de defesa do mundo

rural, devo dizer que esta posição interessa principalmente ao agronegócio, às grandes multinacionais, como a

Syngenta ou a Monsanto, já aqui referidas — a estas, sim, interessa este tipo de negócios. Aliás, não

deixamos de cruzar este aspeto com o processo de patenteamento das sementes, que foi refreado, mas que

continua a ser defendido por alguns, e que tem uma implicação muito grande no mundo rural e na obrigação

da aquisição de sementes.

O Sr. Presidente (Miranda Calha): — Queira terminar, Sr. Deputado.

O Sr. João Ramos (PCP): — Vou terminar, Sr. Presidente.

Concluo dizendo o seguinte: os Srs. Deputados dizem-se muito disponíveis para aprovar não os projetos

de lei, mas medidas moderadas, nomeadamente as contidas no projeto de resolução do PS.

O que quero dizer é que as medidas não são moderadas, são iníquas. E os Srs. Deputados, que têm tido

responsabilidades governativas e não têm respeitado, nem legislação, nem recomendações da Assembleia da

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República, mais uma vez se juntam para aprovar medidas que são iníquas e que não vão à essência do

problema.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Miranda Calha): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa

Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Só não percebi, por parte

do PSD, do CDS e do PS, no que é que resulta exatamente o princípio da precaução. Depois, é muito

interessante ver o vocabulário que utilizaram. É que o PS diz: «Nós temos uma posição de prudência», o PSD

diz: «Nós temos uma posição cautelar» e o CDS diz: «Nós temos uma posição tolerante». E, no meio de todas

estas posições, o que vai acontecendo é a experiência a céu aberto do cultivo dos organismos geneticamente

modificados e uma desqualificação da agricultura biológica, em Portugal.

Sr. Deputado Abel Baptista, apostemos na agricultura biológica! Quer fazer a diferença? Vamos por aí! Mas

não vamos com experimentalismos, que, tal como os Srs. Deputados no íntimo reconhecem, podem vir a dar

maus resultados. É que os Srs. Deputados sabem que há muitas dúvidas sobre os efeitos dos OGM quer ao

nível da saúde, quer ao nível do ambiente e dos ecossistemas, designadamente ao nível da biodiversidade.

Depois, o Sr. Deputado Abel Baptista vem dizer: «Nós defendemos uma agricultura democrática». Ó Sr.

Deputado, e nós não defendemos?!

Sr. Deputado, o que é que lhe chama a atenção sobre a questão da contaminação, da impossibilidade de

conter a contaminação? E quando fala em democracia, em países democráticos, está a referir-se a que

países? À Alemanha? Então, a Alemanha, na sua perspetiva, não é democrática, porque proibiu os OGM?!…

Para mim, não o é, mas por outras razões. Está a referir-se à França, à Áustria, à Polónia, ao Luxemburgo?

Sr. Deputado, vamos lá ver se arranjamos alguns argumentos mais convincentes!

E, Sr. Deputado Ulisses Pereira, já cá faltava o argumento do combate à fome! Não vamos por essas

hipocrisias, Sr. Deputado. Para combater a fome no mundo temos todos os instrumentos disponibilizados —

todos, todos! É a ânsia do lucro, a falta de solidariedade entre humanos neste mundo que não permite

combater a fome. Não venha agora servir as multinacionais, dar-lhes mais lucro, a pretexto de combater a

fome, que eles não querem combater. São argumentos falsos, não valem nada, Sr. Deputado!

Aplausos de Os Verdes e do PCP.

O Sr. Presidente (Miranda Calha): — Srs. Deputados, está concluído o debate, na generalidade, dos

projetos de lei n.os

811/XII (4.ª) (Os Verdes), 784/XII (4.ª) (BE) e 805/XII (4.ª) (PCP), conjuntamente com o

projeto de resolução n.º 1293/XII (4.ª) (PS).

Vamos passar à apreciação, na generalidade, da proposta de lei n.º 166/XII (2.ª) — Alteração ao regime de

bens em circulação objeto de transações entre sujeitos passivos de IVA (ALRAA).

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Sá.

O Sr. Paulo Sá (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Assembleia Legislativa da Região Autónoma

dos Açores, considerando que o regime de bens em circulação é excessivamente burocrático, constituindo um

grave obstáculo à eficiência das empresas, particularmente das micro e pequenas empresas, o que afetará

negativamente a competitividade da nossa economia, e que este regime não tem em linha de conta a

realidade da produção, da distribuição e da logística moderna, nem as características das diversas operações

em Portugal, propõe um conjunto de alterações ao regime em vigor, tornando-o mais adequado à realidade do

tecido produtivo nacional, constituído maioritariamente por micro e pequenas empresas.

As propostas da Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores merecem a nossa concordância.

Os bens transportados para afetação a uso próprio da atividade, o transporte de pescado entre os portos e a

lota, a par da simplificação da comunicação através de telefone e da exclusão destas obrigações para

empresas com volume de negócios inferior a 250 000 €, são medidas adequadas, proporcionais face aos

objetivos de combate à fuga e evasão fiscais.

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As micro e pequenas empresas, muitas pequenas explorações agrícolas de carácter familiar, muitas

atividades associadas à ruralidade e que, pela sua qualidade e importância social e económica nas regiões em

que se inserem, merecem um tratamento diferenciado porque são diferentes, foram afetadas negativamente

pelas alterações impostas pelo atual Governo ao regime de bens em circulação.

Na altura, o PCP alertou e denunciou os efeitos perversos das opções políticas da atual maioria, que

assentam na desconfiança em relação aos micro e pequenos empresários, numa estratégia de os

responsabilizar pela fuga e evasão fiscais, tratando-os a todos como potenciais prevaricadores. Esta postura

do Governo tem como objetivo esconder a opção ideológica de privilegiar os interesses das grandes empresas

e dos grupos económicos e financeiros, permitindo-lhes e facilitando-lhes práticas abusivas de planeamento

fiscal agressivo, profundamente lesivas do interesse público e que conduzem à sobrecarga tributária que recai

sobre os trabalhadores e as micro, pequenas e médias empresas.

O Governo insiste em não distinguir níveis de informalidade e de subsistência com criminalidade financeira,

com branqueamento de capitais, com esquemas de planeamento fiscal agressivo, apenas acessíveis aos

grandes grupos económicos e financeiros e às grandes fortunas.

A sanha persecutória contra os trabalhadores e os micro e pequenos empresários em sede fiscal contrasta

com a política de favorecimento fiscal ao grande capital, com os inúmeros e generosos benefícios fiscais, com

os perdões fiscais, com os instrumentos de planeamento fiscal, colocados à disposição das grandes empresas

e grupos económicos.

Reafirmamos aqui a necessidade de uma política fiscal alternativa que, articulada com a dimensão

orçamental, assegure o financiamento das funções sociais do Estado, rompa com o favorecimento dos

grandes grupos económicos e financeiros e alivie fiscalmente os trabalhadores e as famílias, assim como as

micro e pequenas empresas.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Miranda Calha): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge

Rodrigues Pereira.

O Sr. Jorge Rodrigues Pereira (PS): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: O ditado popular

«depressa e bem não há quem» aplica-se muito bem a todo este processo legislativo relacionado com o

regime de bens em circulação, objeto de transações entre sujeitos passivos de IVA.

Vejamos: o decreto-lei de 2012 deveria ter sido aplicado em janeiro de 2013, mas a sua execução foi

adiada para 1 de maio, a que se seguiu um novo adiamento para 1 de julho e uma nova portaria que anulava

quaisquer sanções até outubro de 2013, para que as empresas pudessem adaptar-se ao novo sistema.

A intenção de criar um novo regime para tornar mais simples e mais rápido o cumprimento da obrigação de

emissão de documentos de transporte pelas empresas revelou-se um estorvo à vida das mesmas: em vez da

eficiência pretendida e de lhes simplificar a vida, o que se introduziu foi uma complicada teia burocrática com

recurso a novas tecnologias e com procedimentos de utilidade duvidosa. Em vez de estarmos a trabalhar para

a simplificação, para a desburocratização, para medidas que facilitem o crescimento e o desenvolvimento das

pequenas e médias empresas, estamos no sentido inverso.

Se as empresas de maior dimensão podem ultrapassar mais facilmente o que se lhes exige, a grande

maioria não pode corresponder aos requisitos propostos.

Se esta é uma realidade que atinge uma parte significativa do continente português, ela torna-se mais

evidente nas regiões insulares, como os Açores.

A legislação em vigor traz enormes dificuldades e muita burocracia a diferentes setores, desde a agricultura

às pescas, à construção civil ou à pequena distribuição de produtos, e vai contra tudo o que é eficiência de

uma economia moderna e contra a vontade dos agentes económicos.

Sem dúvida alguma, devemos ser intransigentes no combate à economia paralela, aos imaginativos

esquemas de evasão fiscal, mas o que não podemos é implementar mecanismos desajustados da realidade.

O reforço da fiscalização torna-se, pois, uma necessidade.

Esta proposta da assembleia regional foi aprovada em julho de 2013, tendo, de seguida, dado entrada

neste Parlamento, mas só agora, em 2015, veio a Plenário. Entretanto, foi publicada legislação que responde

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a algumas das solicitações regionais, mas permanecem outras que merecem a nossa atenção e devem ser

analisadas, na especialidade, na respetiva comissão.

Apesar de, em finais de 2013, se ter previsto, no artigo 3.º, um maior número de exclusões, consideramos

que devemos, tal como refere a presente proposta, considerar a possibilidade de introduzir neste artigo os

veículos agrícolas, o pescado na deslocação entre os portos e a lota, os bens transportados por motivos de

afetação ou uso próprio da atividade, tal como ponderar o aumento do valor do volume de negócios referido no

n.º 10 do artigo 5.º.

Neste sentido, acompanhamos a proposta da Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores, que

foi aprovada por todos os partidos políticos representados na respetiva assembleia regional.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Miranda Calha): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Vera

Rodrigues.

A Sr.ª Vera Rodrigues (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Discutimos, hoje, uma proposta da

Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores relativamente a um regime que está em vigor desde

2013. A verdade é que a forma como a proposta foi elaborada reflete claramente algumas ansiedades e

preocupações e também algumas condicionantes que se antecipava que viessem a verificar-se e que se, por

um lado, em alguns casos, não se verificaram, por outro lado, foram já suplantadas.

Estranho a abordagem do Partido Socialista relativamente a esta matéria, porque tem um discurso que, de

certa forma, acaba por ser incongruente. É que o Governo não criou uma obrigação nova de serem emitidas

guias ou documentos de transporte; essa obrigação já existe há muito tempo, há mais de 30 anos.

O que passou a acontecer foi justamente o movimento contrário àquele que o Sr. Deputado refere, que é

reduzir a burocracia. Há um processo automático e imediato de comunicação de documentos de transporte por

via eletrónica.

Portanto, se estamos a eliminar papel e se estamos a criar um procedimento automático, que é feito

quando a mercadoria é expedida, obviamente, estamos a contribuir para que haja menos burocracia e não

mais burocracia. É justamente o contrário.

Para além disso, gostaria de dizer que, de facto, o regime que foi criado e o valor de referência dos 100

000 € é inteiramente compatível e congruente com um conjunto de obrigações fiscais, nomeadamente a de as

empresas terem um sistema de faturação certificado a partir dos 100 000 €. Portanto, os 100 000 € não são

sequer um valor aleatório ou que o Governo tenha escolhido de forma ad hoc.

Tudo isto para dizer que, de certa forma, entendemos as preocupações que foram refletidas na altura em

que o projeto foi elaborado, em 2013. Hoje, em março de 2015, e após um ano completo de aplicação plena

deste regime, o ano de 2014, os resultados que temos e que foram conseguidos no que diz respeito ao

combate à fraude e à evasão fiscais são manifestamente satisfatórios e vão ao encontro do objetivo do

Governo, de fazer um combate sem tréguas à fraude e à evasão fiscais, por uma razão simples: de equidade e

de justiça.

Portanto, o combate à fraude e à evasão fiscais sempre foi um desígnio do Partido Socialista, pelo que não

entendemos a forma como se referiu àquilo que esta proposta pretendia identificar. Para além de que, não

obstante, a forma como ela foi elaborada ultrapassa o âmbito de competências da própria Assembleia

Legislativa dos Açores, fazendo, como já disse, em 2013, uma alteração deste regime jurídico, que ficaria

vigente para todo o território, e, hoje em dia, mais de um ano depois, está em pleno funcionamento.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Miranda Calha): — Para uma intervenção, tem agora a palavra a Sr.ª Deputada Lídia

Bulcão.

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A Sr.ª Lídia Bulcão (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Mais uma vez, chega-nos para ser

debatida no Plenário uma proposta vinda da Assembleia Legislativa Regional dos Açores com quase dois anos

de atraso.

Neste caso em concreto, parece-nos ainda de maior gravidade porque, além de ter dado entrada em julho

de 2013, ainda foi acompanhada por um pedido de urgência vindo da ALRAA (Assembleia Legislativa da

Região Autónoma dos Açores), aprovado por unanimidade na Comissão de Orçamento, Finanças e

Administração Pública, a 29 de julho de 2013.

Esta forma de tratamento dado às iniciativas vindas das regiões autónomas parece-me que roça um certo

desprezo pela autonomia regional e que não dignifica, de forma alguma, o funcionamento da Casa da

democracia.

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Lídia Bulcão (PSD): — Neste caso, esta demora torna-se tanto mais gravosa quanto altera

completamente o contexto em que a proposta vem agora a ser discutida.

Na data em que deu entrada, esta iniciativa trazia a debate um tema extremamente pertinente, visto que

estava na ordem do dia a implementação da nova lei de transporte de mercadorias, envolta em algumas

dificuldades, que levaram até a sucessivos adiamentos da data da sua entrada em vigor.

Ora, passados dois anos, o cenário é completamente diferente e os principais constrangimentos foram

ultrapassados, por exemplo, com a introdução da isenção de guia de transporte para casos de autoconsumo

ou com a harmonização e simplificação das guias de transporte para os agricultores.

Hoje, o regime não só está a funcionar em pleno como tem obtido resultados extremamente positivos a

nível nacional, bastante acima das expectativas iniciais.

O balanço de 2014 da reforma dos documentos de transporte diz-nos que, em 2014, cerca de 75 000

empresas submeteram eletronicamente documentos de transporte, o que corresponde a cerca de 30 000

agentes económicos diariamente, num total de 130 milhões de documentos de transporte e mais de 1000

milhões de bens transportados.

O sucesso da reforma a nível nacional não significa, contudo, que não possam existir ainda alguns

constrangimentos pontuais na Região Autónoma dos Açores, decorrentes das suas características específicas

e dispersão geográfica, que condicionam sempre a atividade das pequenas e médias empresas açorianas.

Assim sendo, e caso o proponente o entenda, talvez fosse, antes, de ponderar a apresentação de uma

proposta com um regime específico para a Região Autónoma dos Açores, em substituição desta iniciativa que

tem um carácter claramente nacional e que, até por isso, como disse a Sr.ª Deputada Vera Rodrigues, parece

ultrapassar a própria competência legislativa da Assembleia Regional dos Açores nesta matéria.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Miranda Calha): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe

Soares.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Há um argumento que foi

utilizado pelas bancadas da maioria que tem validade neste contexto e que se prende com o período que

decorreu desde que a iniciativa deu entrada na Assembleia e o debate. Creio que será pouco compreensível,

para quem até esperava que houvesse um processo de urgência na Assembleia da Republica, que tenha

passado mais de um ano e meio até ao dia do debate.

As preocupações mantêm-se e, por isso, creio que os problemas identificados não resultarão em concluir

que este debate deixa de ter atualidade, porque ele ainda tem.

Há diversos produtores, agentes económicos que, fruto de terem uma atividade bastante reduzida, têm

custos de contexto que são obrigados a cumprir, como os sistemas de faturação ou os sistemas de emissão,

toda a parafernália de documentos relativos às suas obrigações fiscais, o que lhes coloca dificuldades — e é o

caso em apreço nesta iniciativa —, particularmente quando estamos a falar de agentes com uma atividade

económica bastante reduzida, com pouco dinheiro em causa e, por isso, legitimamente dizem que, entre terem

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uma atividade, pagar impostos, cumprir a lei, não é possível fazer as duas coisas, porque a atividade que têm

não lhes dá um retorno capaz de a manter, pagando e cumprindo a legalidade.

As bancadas da maioria utilizaram outro argumento, que, creio, levará a alguma reflexão, pelo menos no

momento da votação.

Disseram, mais explicitamente até do lado do PSD, que até poderíamos admitir este debate no que toca a

um regime específico para a Região Autónoma dos Açores.

Ora, o Bloco de Esquerda tem apontado diversos problemas ao modelo vigente. Por isso, achamos que é

mau nos Açores, como é mau em todo o País. Mas, verdade seja dita, se tivermos uma solução apenas para

os Açores, é menos mau face ao que atualmente existe.

Podemos partir desta proposta de lei e fazer esse debate na especialidade. Para isso é necessária abertura

de todos os grupos parlamentares para chegarmos à fase da especialidade. Senão, a nossa conclusão é a de

que as preocupações quer do CDS, quer do PSD sobre esta matéria, na prática, não têm consequência.

Dizem que estão preocupados, até teriam abertura para um debate específico para a Região Autónoma dos

Açores, mas as suas preocupações não têm consequência porque vão matar esta iniciativa e qualquer

possibilidade de, até ao final da Sessão Legislativa, termos uma alteração nos processos, pelo menos na

Região Autónoma dos Açores.

Temos essa abertura, votaremos a favor da iniciativa e fazemos o repto para que, pelo menos para os

Açores, seja possível fazer uma alteração da lei vigente.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Miranda Calha): — Como não há mais inscrições, dou por concluída a discussão, na

generalidade, da proposta de lei n.º 166/XII (2.ª).

Entretanto, assumiu a presidência a Presidente, Maria da Assunção Esteves.

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, vamos entrar no período regimental de votações.

Antes de mais, vamos proceder à verificação do quórum, utilizando o sistema eletrónico.

Pausa.

Srs. Deputados, o quadro eletrónico regista 196 presenças, às quais se acrescentam 4 Deputados do PS,

perfazendo 200 Deputados, pelo que temos quórum para proceder às votações.

Vamos começar pelo voto n.º 258/XII (4.ª) — De congratulação pelo título obtido por Nelson Évora no triplo

salto, no Campeonato Europeu de Atletismo em Pista Coberta de 2015 (PCP, BE, PS, PSD, CDS-PP e Os

Verdes).

O Sr. Secretário, Deputado Jorge Machado, vai fazer o favor de ler o voto.

O Sr. Secretário (Jorge Machado): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, o voto é do seguinte teor:

«A Assembleia da República congratula-se pelo título obtido por Nelson Évora, que se sagrou, a 7 de

março de 2015, Campeão Europeu do Triplo Salto, com a marca de 17,21m, no Campeonato Europeu de

Atletismo em Pista Coberta de 2015, que decorreu em Praga.

Nelson Évora, atleta português de 30 anos, junta este título ao de Campeão do Mundo do Triplo Salto, nos

Mundiais de Osaka, em 2007, à Medalha Olímpica Nobre Guedes, atribuída no mesmo ano, ao título de

Campeão Nacional do Triplo Salto em 2008 e à Medalha de Ouro obtida nos Jogos Olímpicos de Pequim, no

mesmo ano.

O resultado e o título recentemente alcançados ganham especial significado considerando as graves

lesões sofridas por Nelson Évora, em janeiro de 2012 e em janeiro de 2014, superadas com grandes

dificuldades, mas muita determinação, empenhamento e dedicação de Nelson Évora.

A Assembleia da República saúda o atleta Nelson Évora por todo o seu percurso desportivo e títulos

alcançados, pelo esforço e dedicação demonstrados na superação das dificuldades causadas pelas lesões

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sofridas e felicita o atleta Nelson Évora pelo mais recente título de campeão europeu no triplo salto, assim

dignificando e valorizando significativamente o atletismo português.»

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, vamos proceder à votação do voto n.º 258/XII (4.ª).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade e aclamação.

Passamos agora a votar, na generalidade, a proposta de lei n.º 288/XII (4.ª) — Procede à terceira alteração

à Lei n.º 23/2007, de 4 de julho, que aprova o regime jurídico de entrada, permanência, saída e afastamento

de estrangeiros do território nacional.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, do PS e do CDS-PP e votos contra do PCP,

do BE e de Os Verdes.

Esta iniciativa baixa à 1.ª Comissão.

Segue-se a votação, na generalidade, do projeto de lei n.º 789/XII (4.ª) — Elimina os vistos gold da lei de

imigração (BE).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD, do PS e do CDS-PP e votos a favor do PCP,

do BE e de Os Verdes.

Srs. Deputados, votamos agora, na generalidade, o projeto de lei n.º 810/XII (4.ª) — Regularização de

trabalhadores imigrantes e menores nascidos em Portugal ou a frequentar o sistema de ensino (BE).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD, do PS e do CDS-PP e votos a favor do PCP,

do BE, de Os Verdes e da Deputada do PS Celeste Correia.

Vamos proceder à votação, na generalidade, do projeto de lei n.º 767/XII (4.ª) — Altera o regime de

incompatibilidades e impedimentos aplicável aos eleitos locais e alarga o seu âmbito aos titulares de órgãos de

entidades intermunicipais e associações de fins específicos (BE).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP, votos a favor do BE e

abstenções do PS, do PCP e de Os Verdes.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr.ª Presidente, dá-me licença que use da palavra?

A Sr.ª Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr.ª Presidente, é para anunciar que o PCP irá entregar uma declaração de

voto sobre o projeto de lei que acabámos de votar.

A Sr.ª Presidente: — Fica registado.

Srs. Deputados, segue-se a votação, na generalidade, do projeto de lei n.º 768/XII (4.ª) — Altera o Estatuto

dos Deputados, tornando obrigatório o regime de exclusividade dos Deputados à Assembleia da República

(BE).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD, do PS e do CDS-PP e votos a favor do PCP,

do BE e de Os Verdes.

O Sr. Duarte Filipe Marques (PSD): — Sr.ª Presidente, dá-me licença que use da palavra?

A Sr.ª Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.

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O Sr. Duarte Filipe Marques (PSD): — Sr.ª Presidente, é para anunciar que irei entregar uma declaração

de voto em meu nome e em nome do Deputado Cristóvão Norte.

A Sr.ª Presidente: — Fica registado, Sr. Deputado.

Votamos agora, na generalidade, o projeto de lei n.º 806/XII (4.ª) — Altera o Estatuto dos Deputados e o

Regime Jurídico de Incompatibilidades e Impedimentos dos Titulares de Cargos Políticos e Altos Cargos

Públicos (PCP).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD, do PS e do CDS-PP e votos a favor do PCP,

do BE e de Os Verdes.

O Sr. Manuel Mota (PS): — Sr.ª Presidente, dá-me licença que use da palavra?

A Sr.ª Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Manuel Mota (PS): — Sr.ª Presidente, é para informar a Câmara que irei apresentar uma declaração

de voto em relação aos dois diplomas anteriores.

A Sr.ª Presidente: — Sr. Deputado, fica registado.

Vamos proceder à votação, na generalidade, do projeto de lei n.º 808/XII (4.ª) — Reforça as

incompatibilidades dos titulares de cargos políticos e altos cargos públicos (PS).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes e abstenções

do PSD e do CDS-PP.

Este projeto de lei baixa à 1.ª Comissão.

Segue-se a votação, na generalidade, do projeto de lei n.º 811/XII (4.ª) — Impede o cultivo, a

comercialização e a libertação deliberada em ambiente de organismos geneticamente modificados (OGM) (Os

Verdes).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD, do PS e do CDS-PP, votos a favor do PCP,

do BE e de Os Verdes e a abstenção dos Deputados do PS Carlos Enes e Inês de Medeiros.

De seguida, vamos votar, na generalidade, o projeto de lei n.º 784/XII (4.ª) — Proíbe o cultivo, a importação

e a comercialização de organismos geneticamente modificados vegetais (BE).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD, do PS e do CDS-PP, votos a favor do PCP,

do BE e de Os Verdes e a abstenção dos Deputados do PS Carlos Enes e Inês de Medeiros.

Votamos agora, na generalidade, o projeto de lei n.º 805/XII (4.ª) — Regula o cultivo de variedades

agrícolas geneticamente modificadas (PCP).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD, do PS e do CDS-PP, votos a favor do PCP,

do BE e de Os Verdes e a abstenção dos Deputados do PS Carlos Enes e Inês de Medeiros.

O Sr. Miguel Freitas (PS): — Sr.ª Presidente, é para anunciar que irei apresentar uma declaração de voto

sobre os últimos três projetos de lei que acabámos de votar.

A Sr.ª Presidente: — Fica registado, Sr. Deputado.

Srs. Deputados, segue-se a votação do projeto de resolução n.º 1293/XII (4.ª) — Recomenda ao Governo

orientações atinentes ao processo de transposição da diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho que

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altera a Diretiva 2001/18/CE no que se refere à possibilidade de os Estados-membros limitarem ou proibirem o

cultivo de organismos geneticamente modificados (OGM) no seu território (PS).

Informo que o texto deste projeto de resolução foi alterado pelo seu autor.

Srs. Deputados, o CDS-PP solicita a votação conjunta das alíneas a), b) e c) e, depois, a votação da alínea

d) separadamente.

Vamos, então, votar conjuntamente as alíneas a), b) e c) do projeto de resolução n.º 1293/XII (4.ª).

Submetidas à votação, foram aprovadas, com votos a favor do PS, do PCP e do BE, votos contra do CDS-

PP e abstenções do PSD e de Os Verdes.

Votamos, agora, a alínea d) do mesmo projeto de resolução.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PCP e do BE e abstenções do PSD, do

CDS-PP e de Os Verdes.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, dá-me licença que use da palavra?

A Sr.ª Presidente: — Faça favor, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, para que seja compreensível o sentido de voto de

Os Verdes relativamente ao projeto de resolução que acabámos de votar, apresentaremos, por escrito, uma

declaração de voto.

A Sr.ª Presidente: — Fica registado, Sr.ª Deputada.

Srs. Deputados, por uma espécie de economia de tempo, não fizemos a leitura das epígrafes das alíneas

que foram votadas. De todo o modo, a Mesa costuma fazê-lo, embora não o tenha feito agora.

Votamos agora um requerimento, apresentado pelo PSD e CDS-PP, solicitando a baixa à Comissão de

Orçamento, Finanças e Administração Pública, sem votação, pelo prazo de 90 dias, da proposta de lei n.º

166/XII (2.ª) — Alteração ao regime de bens em circulação objeto de transações entre sujeitos passivos de

IVA (ALRAA).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Este diploma baixa, pois, à 5.ª Comissão, pelo prazo de 90 dias.

Vamos votar, em votação final global, o texto final, apresentado pela Comissão de Economia e Obras

Públicas, relativo à proposta de lei n.º 226/XII (3.ª) — Estabelece o regime jurídico aplicável ao exercício da

atividade da construção.

O Sr. Luís Leite Ramos (PSD): — Sr.ª Presidente, dá-me licença que use da palavra?

A Sr.ª Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Leite Ramos (PSD): — Sr.ª Presidente, é para anunciar que, quanto à votação dos textos finais

relativos às propostas de lei n.os

226 e 227/XII (3.ª), não participarei na votação por eventual conflito de

interesses.

A Sr.ª Presidente: — Fica registado, Sr. Deputado.

Vamos, então, votar, em votação final global, o texto final, apresentado pela Comissão de Economia e

Obras Públicas, relativo à proposta de lei n.º 226/XII (3.ª) — Estabelece o regime jurídico aplicável ao exercício

da atividade da construção.

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Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PS e do CDS-PP e votos contra do PCP,

do BE e de Os Verdes.

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, vamos proceder à votação final global do texto final, apresentado

pela Comissão Economia e Obras Públicas, relativo à proposta de lei n.º 227/XII (3.ª) — Procede à primeira

alteração à Lei n.º 31/2009, de 3 de julho, que estabelece a qualificação profissional exigível aos técnicos

responsáveis pela elaboração e subscrição de projetos, coordenação de projetos, direção de obra pública ou

particular, condução da execução dos trabalhos das diferentes especialidades nas obras particulares de classe

6 ou superior e de direção de fiscalização de obras públicas ou particulares.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PS e do CDS-PP e votos contra do PCP,

do BE e de Os Verdes.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Peço a palavra, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente: — Para que efeito, Sr. Deputado.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Para anunciar que, em relação às votações relativas às propostas de lei n.os

226/XII (3.ª) e 227/XII (3.ª), o PCP apresentará uma declaração de voto.

A Sr.ª Presidente: — Sr. Deputado, fica registado.

Tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Campos.

O Sr. Paulo Campos (PS): — Sr.ª Presidente, queria também informar que apresentarei uma declaração

de voto.

A Sr.ª Presidente: — Fica registado, Sr. Deputado.

Srs. Deputados, vamos agora proceder à votação de três pareceres da Comissão para a Ética, a Cidadania

e a Comunicação.

Tem a palavra o Sr. Secretário Deputado Duarte Pacheco, para anunciar os referidos pareceres.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados deram entrada na Mesa três

pareceres da Comissão para a Ética, a Cidadania e a Comunicação.

O primeiro parecer é relativo a uma solicitação da Comarca do Porto, Vila Nova de Gaia, Secção Criminal

— J1, processo n.º 232/13.1GFVNG, tendo a Comissão para a Ética, a Cidadania e a Comunicação decidido

emitir parecer no sentido de autorizar a Sr.ª Deputada Adelaide Canastro (PSD) a intervir no processo no

âmbito dos referidos autos.

A Sr.ª Presidente: — Vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Sr. Secretário Deputado Duarte Pacheco, faça favor de dar conta do segundo parecer.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): — Sr.ª Presidente, o segundo parecer refere-se a um pedido da

Comarca de Lisboa, Instância Central, 1.ª Secção de Instrução Criminal — J7, processo n.º 11469/12.0TDLSB,

tendo a Comissão para a Ética, a Cidadania e a Comunicação decidido emitir parecer no sentido de autorizar a

Sr.ª Deputada Maria da Conceição Caldeira (PSD) a intervir no processo no âmbito dos referidos autos.

A Sr.ª Presidente: — Vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

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O Sr. Secretário Deputado Duarte Pacheco vai dar conta do terceiro e último parecer.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): — Sr.ª Presidente, o último parecer é relativo a uma solicitação do

Ministério Público da Comarca do Porto, DIAP, 7.ª Secção, processo n.º 193/14.10PIPRT, tendo a Comissão

para a Ética, a Cidadania e a Comunicação decidido emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado

José Magalhães (PS) a intervir no processo no âmbito dos referidos autos.

A Sr.ª Presidente: — Vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, amanhã, não haverá Plenário. Como todos sabem, terão lugar as Jornadas Parlamentares

do PS, que, desejo, corram com as maiores felicidades.

A próxima sessão plenária realiza-se quarta-feira, dia 18, com início às 15 horas, tendo a ordem do dia os

seguintes pontos: 1 — Declarações políticas; 2 — Debate do projeto de resolução n.º 1281/XII (4.ª) —

Recomenda o reforço das medidas de combate ao cancro da pele (PPD/PSD e CDS-PP); 3 — Apreciação

conjunta da petição n.º 428/XII (4.ª) — Apresentada pela AHRESP — Associação da Hotelaria, Restauração e

Similares de Portugal, solicitando à Assembleia da República a reposição do IVA nos serviços de alimentação

e bebidas na restauração e hotelaria, e consequente alteração legislativa e do projeto de resolução n.º

1303/XII (4.ª) — Recomenda ao Governo a reposição da taxa do IVA no sector da restauração nos 13% (Os

Verdes).

Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 12 minutos.

———

Declarações de voto enviadas à Mesa, para publicação

Relativa ao projeto de lei n.º 767/XII (4.ª):

O Grupo Parlamentar do PCP absteve-se na votação do projeto de lei n.º 767/XII (4.ª) (BE), que altera o

regime de incompatibilidades e impedimentos aplicável aos eleitos locais e alarga o seu âmbito aos titulares de

órgãos de entidades intermunicipais e associações de fins específicos.

O PCP não recusa a necessidade de, em cada momento, poder aperfeiçoar o regime jurídico das

incompatibilidades e impedimentos de todos os titulares de cargos públicos e políticos, entre os quais se

encontram os eleitos nas autarquias locais. Em diversos momentos, em várias Legislaturas, o Grupo

Parlamentar do PCP apresentou iniciativas legislativas sobre estatutos e regimes jurídicos de

incompatibilidades e impedimentos dos eleitos nos diversos órgãos.

No entanto, é importante reconhecer que, no caso das autarquias locais, já existe um conjunto vasto de

legislação e de mecanismos aplicáveis aos seus eleitos que permitem a necessária fiscalização e aferição da

sua situação profissional face ao exercício do mandato.

Este debate tem subjacentes as questões da ética e da transparência da vida política e deve ter em conta o

regime aplicável a todos quantos exercem cargos políticos. Com efeito, a crise de confiança dos cidadãos face

às instituições políticas e as suspeições em relação a quem exerce funções públicas contribui para minar os

fundamentos da legitimidade democrática e do próprio regime democrático.

Num regime de democracia representativa, como o nosso, é essencial pugnar nas palavras e nos atos pela

mais completa transparência das instituições e atos políticos, pela maior seriedade, isenção e imparcialidade

no exercício dos cargos para o qual são eleitos os titulares de qualquer cargo político. Mas isso não significa

tirar ab initio qualquer juízo negativo, nem generalizado, nem promover a desconfiança nas instituições.

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Assim, o PCP entente que urge alterar o regime das incompatibilidades e impedimentos dos Deputados à

Assembleia da República e o regime dos titulares de altos cargos públicos no sentido de evitar situações de

promiscuidade entre o poder político e o poder económico.

Os Deputados do PCP, Jorge Machado — Paula Santos.

———

Relativa aos projetos de lei n.º 768/XII (4.ª) e 806/XII (4.ª):

Os Deputados subscritores desta declaração votaram contra projeto de lei n.º 768/XII por respeito à

disciplina de voto do Grupo Parlamentar do PSD, não sem declararem que, no caso em apreço, apoiam o

espírito da iniciativa que brota do Bloco de Esquerda mas entendem que a mesma não tem forçosamente de

albergar outros aspetos, sob pena de assumir uma deriva estigmatizante para todos os que aceitam o encargo

de ser representantes.

O exercício da função de Deputado à Assembleia da República exige um empenho a 100% nas funções de

representação dos cidadãos, uma independência absoluta e total liberdade e concentração. Consideram os

Deputados subscritores que o desempenho de funções em exclusividade é um enorme contributo para a

credibilização da função e para a transparência das decisões.

Nesse sentido, aliás, como já sublinharam em anteriores ocasiões, impõe-se avançar para uma reforma do

sistema de representação que pondere matérias como o voto preferencial, a eventual limitação de mandatos, a

exclusividade, a política de remunerações e o número de parlamentares adequados para responder às tarefas

do Parlamento.

Não sendo tratada esta matéria com a profundidade que se exige, não se avistava outro sentido de voto

que não a rejeição da proposta, nos termos agora enfatizados.

Os Deputados do PSD, Duarte Filipe Marques — Cristóvão Norte.

——

Votei, no dia 12 de março, contra o projeto de lei n.º 768/XII (4.ª) do BE, cuja epígrafe era «altera o Estatuto

dos Deputados, tornando obrigatório o regime de exclusividade dos Deputados à Assembleia da República»,

pese embora o facto de me ser caro o princípio da exclusividade e da transparência no desempenho das

funções de deputado, com os seguintes fundamentos:

Exerço desde o início o cargo de Deputado em regime de exclusividade, forma que entendo ser a mais

adequada para o desempenho de tais funções. Porém, o projeto de lei do BE aqui em consideração, apesar de

a sua epígrafe apontar nesse sentido, não se ficava pelo regime de exclusividade dos Deputados à

Assembleia da República, previsto no artigo 1.º do seu projeto, antes pelo contrário.

O projeto de lei n.º 768/XII (4.ª), no seu artigo 2.º, propunha a alteração do artigo 5.º do Estatuto dos

Deputados com o objetivo de repor a designada rotatividade dos Deputados por interesses partidários

(«execução de funções específicas no respetivo partido»), uma solução oposta ao sentido das Leis n.os

3/2001

e 44/2006, que já tinham acabado com este tipo de possibilidades. É que os conceitos de exclusividade e de

rotatividade são inconciliáveis e contradizem-se nos seus termos.

Aliás, é paradoxal que o BE queira no mesmo projeto tratar destes dois aspetos, uma vez que a

rotatividade introduziria aquilo que supostamente se quer combater, falta de transparência, imprevisibilidade,

discricionariedade e desresponsabilização dos eleitos perante os eleitores, que nunca saberiam, exatamente,

quem os representava.

O Deputado do PS, Acácio Pinto.

———

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Inúmeros autores têm sustentado que as democracias industriais avançadas — muito por força das

mudanças estruturais que caracterizam a transição das sociedades industriais para as sociedades pós-

industriais, mas também em virtude das transformações ao nível dos valores, das atitudes e dos

comportamentos políticos individuais — enfrentam atualmente uma espécie de malaise of the spirit, que as

coloca perante novos desafios e ameaças (André Freire et al., 2009).

O Partido Socialista tem dado importantes contributos para a reforma do sistema político e moralização do

mesmo, nomeadamente com a Lei da Paridade, limitação dos mandatos executivos, fim das subvenções

vitalícias, e considero o reforço das incompatibilidades dos titulares de cargos políticos e altos cargos públicos

fundamental para aprofundar estas reformas.

De acordo com alguns estudos recentes, as causas dessa malaiseofthespirit» não são nem endógenas

nem exógenas às próprias democracias — como terá acontecido no início do século XX —, encontrando-se

antes associadas aos seus eleitorados nacionais, cada vez mais desconfiados e críticos perante o

funcionamento das instituições políticas e igualmente cínicos e céticos em relação ao desempenho dos seus

titulares (Dalton, 1996).

Não devemos, pois, ignorar esta realidade e, sendo a democracia um sistema político essencialmente

aberto e dinâmico, consideramos ser importante introduzir elementos que consubstanciem estes preceitos.

Apesar de compreender a bondade da defesa de um regime de exclusividade para os Deputados à

Assembleia da República, defendido pelo BE e pelo PCP, este serviria, essencialmente, para profissionalizar

os Deputados, alimentando a ideia de «carreirismo político» incompatível com o sistema democrático e com os

valores republicanos de transitoriedade do desempenho de funções em cargos políticos.

É nesta perspetiva que defendo a renovação no exercício de cargos políticos como exemplo basilar dos

princípios republicanos; como fundamento de uma democracia mais participativa e plural; como motor de uma

sociedade em que os eleitores se sentem mais próximos dos eleitos e em que se desconstrói a corrosiva ideia

de casta que envolve os detentores de cargos políticos, minorando o sentido pejorativo que encerra a ideia da

política como profissão, afirmando inequivocamente o primado do serviço cívico que norteia a atividade

política.

Não ignoro os argumentos a contrario, como a potencial diminuição da qualidade legislativa e as restrições

à liberdade democrática. Em relação ao primeiro, pode-se sempre utilizar a mesma argumentação, ou seja,

detentores de cargos políticos que se perpetuam no exercício de funções podem estar cada vez mais

alheados da realidade que os rodeia e a renovação será sempre potenciadora de novas práticas e novas

experiências.

Não devemos ignorar, também, que a maior parte da produção legislativa do Parlamento se sustenta nas

opções políticas do partido que os Deputados representam e, em muito menor grau, na sua iniciativa

individual.

Quanto à segunda possível crítica, podemos, desde logo, referir que já introduzimos esse tipo de restrições

nos mandatos executivos e, como alguns politólogos defendem, essa restrição individual subsume-se numa

liberdade mais abrangente, no sentido em que permite que um maior número de cidadãos possa exercer

essas funções.

Considero assim que muito teria o sistema político português a ganhar com a limitação dos mandatos no

exercício das funções de Deputado à Assembleia da República, assembleias legislativas regionais e similares

e assembleias municipais.

O Deputado do PS, Manuel Mota.

——

Relativas aos projetos de lei n.os

811/XII (4.ª), 784/XII (4.ª), 805/XII (4.ª) e ao projeto de resolução n.º

1293/XII (4.ª):

A estabilidade do conhecimento científico que possuímos, associada ao equilíbrio do quadro legislativo em

vigor e o respeito rigoroso pelo princípio da precaução devem orientar permanentemente a ação do agente

político e do legislador quando discutimos esta matéria.

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A situação, à data presente, sobre o processo de transposição da Diretiva do Parlamento Europeu e do

Conselho que altera a Diretiva 2001/18/CE no que se refere à possibilidade de os Estados membros limitarem

ou proibirem o cultivo de organismos geneticamente modificados (OGM) no seu território não coloca em causa

o que atrás foi referido.

Concordando com o teor da intervenção do Sr. Deputado Ulisses Pereira (PSD), quero apenas sublinhar —

porque essa questão me parece crucial — que o Parlamento pode e deve, num quadro sereno e tranquilo,

concretizar um debate oportuno sobre esta matéria.

Para a concretização desta iniciativa, refiro-me particularmente às forças políticas e partidárias que

tradicionalmente mais se opõem ou suscitam dúvidas sobre os OGM.

O Deputado do PSD, Vasco Cunha.

——

No que concerne aos projetos de lei n.os

784/XII (4.ª) (BE), 805/XII (4.ª) (PCP) e 811/XII (4.ª) (Os Verdes),

todos sobre a temática dos organismos geneticamente modificados, votei contra com os seguintes

fundamentos:

1 — Mais do que agrícola ou de ambiente, a temática dos organismos geneticamente modificados assume-

se como uma questão de sociedade;

2 — Neste campo e na Europa, o sentido prevalecente tem sido o da prudência;

3 — O Eurobarómetro mostra, de resto, que os cidadãos europeus assumem bastante desconfiança quanto

aos organismos geneticamente modificados (87%), e Portugal não foge à regra;

4 — Também por isso, a legislação nacional começou por integrar o princípio da precaução,

salvaguardando os riscos de contaminação;

5 — Talvez consequência deste princípio, temos, no nosso País, cultivado apenas um organismo

geneticamente modificado, o milho MON 810;

6 — Surge agora uma nova Diretiva, cujo processo está prestes a concluir-se no momento em que o

Parlamento se volta a debruçar sobre a temática dos organismos geneticamente modificados;

7 — Tal Diretiva permitirá aos Estados-membros limitarem ou proibirem o cultivo de organismos

geneticamente modificados nos seus territórios;

8 — Entre a proibição pura e simples e a porta aberta para os governos permitirem a entrada de

organismos geneticamente modificados, o Partido Socialista apresenta uma proposta razoável;

9 — Desde logo, proceder à avaliação externa da legislação em vigor que regula o cultivo de variedades

geneticamente modificadas e da sua aplicação, nomeadamente quanto ao princípio da precaução mas

igualmente quanto aos objetivos de política ambiental e de política agrícola, ao uso do solo, aos impactos

socioeconómicos ou à ordem pública;

10 — Depois, no quadro daquela transposição, que preveja que as decisões de limitação ou proibição de

cultivo de variedades geneticamente modificadas sejam objeto de lei, e, como tal, careçam de aprovação pela

Assembleia da República, concorrendo para um maior escrutínio das ações neste domínio, e, sobretudo, para

a coresponsabilização do Parlamento numa das áreas de política em que se perspetiva mais vantajoso o

consenso político;

11 — Ainda, que seja disponibilizada, pelos canais considerados mais adequados, nomeadamente através

dos portais das instituições da administração do Estado com competências sobre este domínio, informação

transparente e precisa relativamente às áreas cultivadas com organismos geneticamente modificados;

12 — E, por último, que seja assegurado que aos consumidores é prestada informação suficiente para uma

escolha consciente e responsável, na senda, de resto, de uma das grandes preocupações da Diretiva em

processo de finalização, que é a de assegurar um elevado nível de proteção dos consumidores, através da

adoção de medidas de rotulagem e informação eficazes;

13 — Propostas apresentadas no sentido de conferir maior consistência à futura legislação que decorrerá

do processo de transposição da Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho que altera a Diretiva

2001/18/CE, no que se refere à possibilidade de os Estados-membros limitarem ou proibirem o cultivo de

organismos geneticamente modificados no seu território;

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14 — Infelizmente, esta discussão ocorre sem levar em consideração a riqueza varietal do banco genético

existente em Portugal, que importa valorizar;

15 — Domínio sobre o qual não deixarei de intervir, com recurso ao poder de iniciativa legislativa;

16 — Em face do exposto, e com o presente enquadramento, decidi votar contra na votação, na

generalidade, dos diplomas em apreço.

O Deputado do PS, Miguel Freitas.

——

O Grupo Parlamentar de «Os Verdes» absteve-se na votação relativa ao projeto de resolução n.º 1293/XII

(4.ª) pelas razões que a seguir se apresentam:

1 — Porque consideramos que o passo que se impõe no País é o de impedir o cultivo de OGM, face às

incertezas sobre os efeitos para a saúde e para o ambiente (designadamente de longo prazo) dos

transgénicos, bem como face às certezas da impossibilidade de travar processos de contaminação de outras

culturas pelas culturas OGM, uma vez que se desenrolam em campo aberto. O projeto de resolução n.º

1293/XII (4.ª) não está construído na lógica de proibição nem sequer de limitação do cultivo de OGM.

2 — Porque o texto do projeto de resolução em causa está repleto de expressões ou de omissões que

criam condições para que o Governo as interprete de modo a que nada se altere em relação ao que hoje está

estabelecido sobre os OGM (e.g. quando refere uma avaliação da legislação e da sua aplicação, nada refere

sobre uma avaliação dos efeitos concretos do cultivo; refere a disponibilização de informação sobre a área

cultivada pelos canais mais adequados sem que se perceba que canais são esses e quem/como a eles tem

acesso; refere a necessidade de informação suficiente ao consumidor, em vez de referir informação cabal).

3 — Porque o debate em Plenário decorrente da discussão do projeto de resolução (o qual foi arrastado

pela iniciativa tomada pelo Partido Ecologista «Os Verdes» de agendamento do projeto de lei n.º 811/XII (4.ª),

que impede o cultivo, a comercialização e a libertação deliberada em ambiente de OGM) demonstrou que o

que move os autores da iniciativa, o PS, não é a limitação ou proibição de transgénicos, demonstrou que é

bastante tolerante com o cultivo de OGM, o que necessariamente se traduz no texto da sua iniciativa.

Assim sendo, Os Verdes entenderam abster-se por, estando a favor de todo o tipo de avaliação e de

informação, não concordarem com um caminho que não é traçado no sentido de, pelo menos, limitar o cultivo

de OGM.

Os Deputados de «Os Verdes», Heloísa Apolónia — José Luís Ferreira.

———

Relativa às propostas de lei n.os

226/XII (3.ª) e 227/XIII (3.ª):

Tal como o PCP oportunamente denunciou, estas propostas de lei consagram como regra a precariedade e

a figura das empresas de construção praticamente sem quadros de pessoal nem corpo técnico, que contratam

e dispensam pessoal em função de cada empreendimento, com o recurso sistemático ao vínculo precário e a

«prestações de serviços» para suprir necessidades permanentes.

Estamos perante uma ameaça à qualidade do trabalho especializado prestado, submetendo as micro,

pequenas e médias empresas (a esmagadora maioria) nas mãos da meia dúzia de grandes grupos que

dominam o mercado.

Estas propostas de lei provocam o agravamento das desigualdades, da dependência económica e da

fragilização das MPME (micro, pequenas e médias empresas) face aos grupos económicos e às grandes

empresas, e mesmo uma ameaça ao futuro das empresas portuguesas face ao poderio das multinacionais. Tal

situação é particularmente evidente quando se constata o quadro normativo da subcontratação e a

complexidade burocrática que se adensa, em particular com o regime do alvará para obras públicas e do

alvará para obras particulares, com a carga processual para um e outro.

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Quando a lei deveria contribuir para qualificar (a tão propalada «competitividade»), esta contribui para

desqualificar e, por essa via, apontar ainda mais rapidamente para uma «destruição (supostamente) criativa»,

que é na verdade uma política de terra queimada.

Aliás, a verdade é que a situação atual no sector é já de uma integração de facto das maiores empresas

em grupos transnacionais, designadamente espanhóis, com a subcontratação a verificar-se habitualmente

entre as grandes empresas e o universo das micro, pequenas e médias empresas portuguesas.

Ora, com estas propostas de lei [em particular com a 226/XII (3.ª)], as MPME portuguesas são sacrificadas

à concorrência direta e desigual das MPME estrangeiras, que beneficiam de condições mais favoráveis não só

do ponto de vista técnico (como frequentemente se refere) mas desde logo no acesso ao financiamento,

custos mais baixos em diversos fatores de produção e várias outras vantagens competitivas, que são negadas

e retiradas às empresas portuguesas.

Isso mesmo é evidenciado na própria questão da língua oficial. O diploma referido revela uma atitude de

subserviência e abdicação da soberania nacional, patente em exemplos tão chocantes como a inacreditável e

inconstitucional «adoção» da língua inglesa como espécie de segunda língua oficial do nosso País para o

sector da construção, admitindo-se a entrega de uma declaração, certificado ou outro documento oficial e

obrigatório sempre em inglês.

Mais grave ainda, a redação aprovada para a proposta de lei n.º 226/XII (3.ª) significa que tais documentos

podem ser apresentados à nossa administração pública em qualquer língua (em árabe ou em japonês, por

exemplo), sendo que esta pode solicitar a sua tradução «quando tal se justifique em função da tecnicidade ou

complexidade dos mesmos». Seria caricato se não fosse tão grave.

Os dois diplomas visam substituir a interdisciplinaridade das diferentes especialidades pela polivalência

técnica, com o objetivo de proporcionar às empresas responder ao maior número de solicitações com o menor

efetivo de quadros técnicos especializados.

Os dois diplomas ilustram um desconhecimento profundo no que diz respeito às alterações verificadas nos

processos de projeto e de comunicação à obra, em particular com a generalização do uso de ferramentas

informáticas e as respetivas repercussões na direção e na fiscalização das obras de construção. E o mesmo

acontece no que diz respeito à realidade de um sector como o da construção civil, cuja crise o aproxima do

colapso.

Na Comissão de Economia e Obras Públicas da Assembleia da República foi constituído e incumbido desta

discussão na especialidade um Grupo de Trabalho. Numerosas audições foram realizadas, numerosos

pareceres foram apresentados, desde as associações profissionais até às confederações do sector da

construção. Nem uma só entidade defendeu estas propostas de lei.

Estamos perante dois diplomas desastrosos do ponto de vista político, económico e até do ponto de vista

técnico.

Quando tanto se fala em legislar de forma clara e compreensível, a opção do Governo e da maioria é a de

aprovar diplomas de uma complexidade labiríntica, uma lamentável e aberrante confusão legislativa, que —

particularmente no caso da proposta de lei n.º 227/XII (3.ª), mas não só — se traduziu em enxertar uma

portaria numa lei da República, colocar as questões mais decisivas nos quadros anexos e remeter para

regulamentação posterior critérios chave que determinam o que esta lei será na prática.

É isso que acontece no caso da definição concreta das «classes de obra» e do valor a que correspondem:

tudo continua a ser deixado ao absoluto critério do Governo. Ou seja, a Assembleia da República é colocada a

aprovar uma Lei que estratifica o exercício de profissões em função do valor de uma obra sem se referir a

esse valor, deixando essa definição sempre para o Governo.

Com a proposta de lei n.º 226/XII (3.ª), a opção que se impunha era, pelos piores motivos, uma opção

simples. Perante a gravidade das opções que determina, a degradação que impõe e a política de terra

queimada que aponta, não há aproveitamento possível de tal documento, de tal modo que a generalidade das

entidades do sector, ouvidas na AR, convergiram na ideia de que seria preferível deixar a atual lei em vigor em

vez de aprovar esta proposta do Governo. Por isso mesmo o PCP não propôs alterações a este documento,

antes defendeu que ele fosse simplesmente arquivado.

Quanto à proposta de lei n.º 227/XII (3.ª), estávamos perante um texto e uma opção política de conteúdo

igualmente gravoso e injusto mas simultaneamente perante um processo legislativo iniciado, que permitia abrir

caminho a soluções e correções de problemas existentes no quadro legal em vigor. Por isso o PCP, não

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deixando de fazer a denúncia e o combate em relação ao real propósito e significado desta proposta de lei,

não abdicou de intervir de forma construtiva ao apresentar propostas concretas e confrontando a maioria com

essas soluções alterativas.

As propostas do PCP para este diploma incidiram assim sobre três aspetos fundamentais.

Em primeiro lugar, procurámos adequar e atualizar o quadro normativo no tocante à direção de obra e

direção de fiscalização de obra, bem às especialidades técnicas para elaboração de projeto, tendo em conta e

dando sequência designadamente aos contributos das Ordens dos Engenheiros e dos Engenheiros Técnicos.

Esses contributos, em larga medida, tornaram-se então propostas de alteração em sede de especialidade,

muitas das quais aprovadas por unanimidade, permitindo corrigir erros que se verificavam no texto inicial e nas

normas em vigor.

Várias exclusões claramente injustificadas foram assim eliminadas, reconhecendo-se a qualificação, por

exemplo, dos engenheiros do ambiente e dos engenheiros técnicos do ambiente para a direção de obra e a

direção de fiscalização de obra em intervenções de vária natureza. Assim, não pode deixar de ser valorizado

que, com o contributo do PCP no processo de especialidade, dando voz às ordens profissionais, melhorias

concretas e importantes tenham sido alcançadas.

Em segundo lugar, e ainda em relação às funções de direção de obra e direção de fiscalização de obra,

propusemos o pleno reconhecimento da qualificação dos arquitetos para o exercício dessas funções. A este

nível, as opções impostas por PSD, PS e CDS-PP foram infelizmente no sentido de inviabilizar esse pleno

reconhecimento que o PCP defendia como regra. Esses partidos acabaram então por aprovar um estatuto

mitigado para os arquitetos neste domínio, que vem menorizar e secundarizar a sua condição e qualificação

profissional (limitando o exercício dessa função até à classe 6 de obra, e ainda assim com significativas

condicionantes e exceções).

Em terceiro lugar, apresentámos uma norma transitória que permitisse salvaguardar a atividade profissional

das pessoas abrangidas pelo Decreto n.º 73/73 (com destaque para os agentes técnicos de arquitetura e

engenharia) e que foram confrontadas com a proibição de realizarem os trabalhos que sempre realizaram até

novembro de 2014, altura em que terminou o prazo de cinco anos estipulado na Lei n.º 31/2009, de 3 de julho.

Também aqui a posição do PSD, PS e CDS-PP foi de impossibilitar uma solução justa e equilibrada para

este problema, que apontasse um caminho para o futuro que é unanimemente aceite mas que tivesse em

conta a realidade concreta, das pessoas concretas, que faziam o seu trabalho até lhes ser imposta uma

mudança de regras. Nunca defendemos que se alargasse ou eternizasse esse âmbito, simplesmente não

consideramos justo nem aceitável que ele seja erradicado por decreto.

Ainda a este propósito, não podemos deixar de registar o «volte face» insólito: o texto que o Governo

inscreveu no articulado do anteprojeto de proposta de lei sobre esta matéria «desapareceu» aquando da

apresentação da proposta de lei do Governo na Assembleia da República. E quando o PCP retomou essa

mesma formulação e a apresentou como proposta de alteração na especialidade, o PS mas também o PSD e

o CDS-PP rejeitaram essa proposta que era, afinal, originária do próprio Governo.

Transpareceu neste processo de forma evidente uma tentativa particularmente insidiosa da parte do

Governo de transformar o processo legislativo num conflito corporativo, despolitizando o debate e colocando

classes profissionais e trabalhadores uns contra os outros.

O PCP, desde o primeiro momento, rejeitou esse caminho, denunciando essa atitude do Governo. E

demonstrou que, com estas propostas de lei e com esta política, são prejudicados os trabalhadores no seu

conjunto, nas várias profissões; são prejudicadas as populações e o interesse público.

Por tudo isto, o PCP votou contra as duas propostas de lei em apreço.

O Deputado do PCP, Bruno Dias.

———

Nota: A declaração de voto anunciada pelo Deputado do PS Paulo Campos não foi entregue no prazo

previsto no n.º 3 do artigo 87.º do Regimento da Assembleia da República.

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I SÉRIE — NÚMERO 61

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Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.

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