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Quarta-feira, 11 de novembro de 2015 I Série — Número 4

XIII LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2015-2016)

REUNIÃOPLENÁRIADE10DENOVEMBRODE 2015

Presidente: Ex.mo Sr. Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues

Secretários: Ex.mos

Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco Idália Maria Marques Salvador Serrão

S U M Á R I O

O Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas. Prosseguiu o debate do Programa do XX Governo

Constitucional, tendo usado da palavra, a diverso título, além da Ministra de Estado e das Finanças (Maria Luís Albuquerque), do Vice-Primeiro-Ministro (Paulo Portas) e do Ministro da Modernização Administrativa (Rui Medeiros), os Deputados Pedro Filipe Soares (BE), António Leitão Amaro (PSD), João Oliveira (PCP), Miguel Santos (PSD), Francisco Mendes da Silva (CDS-PP), André Silva (PAN), Eduardo Cabrita (PS), Mariana Mortágua (BE), Duarte Pacheco (PSD), Paulo Sá (PCP), Cecília Meireles (CDS-PP), Paulino Ascenção (BE), José Luís Ferreira (Os Verdes), Heitor Sousa (BE), Mário Centeno (PS), Luís Leite Ramos (PSD), Carlos César (PS), Filipe Lobo d'Ávila (CDS-PP), Berta Cabral (PSD), Paula Santos (PCP) e Filipe Anacoreta Correia (CDS-PP).

Entretanto, deram entrada na Mesa as moções de

rejeição n.os

1 a 4/XIII (1.ª). A encerrar o debate intervieram, além do Primeiro-

Ministro (Pedro Passos Coelho), os Deputados André Silva (PAN), José Luís Ferreira (Os Verdes), Jerónimo de Sousa (PCP), Telmo Correia (CDS-PP), Catarina Martins (BE), António Costa (PS) e Luís Montenegro (PSD).

No final, após interpelações à Mesa dos Deputados João Oliveira (PCP), Nuno Magalhães (CDS-PP), Hugo Lopes Soares (PSD), Ana Catarina Mendonça (PS) e Luís Montenegro (PSD), a Câmara aprovou a moção de rejeição n.º 1/XIII (1.ª) — Do Programa do XX Governo Constitucional (PS).

Deu-se conta da apresentação dos projetos de lei n.os

24 e 25/XIII (1.ª).

O Presidente encerrou a sessão eram 17 horas e 20 minutos.

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O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, está aberta a sessão.

Eram 10 horas.

Solicito às autoridades policiais que abram as galerias, por favor.

Desejo cumprimentar o Sr. Primeiro-Ministro, os membros do Governo, as Sr.as

e os Srs. Deputados, as

Sr.as

e os Srs. Jornalistas, as Sr.as

e os Srs. Funcionários.

Como sabem, a nossa ordem do dia de hoje consta da continuação do debate do Programa do XX Governo

Constitucional.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares, do Bloco de Esquerda.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs. Deputados: A

campanha eleitoral já era, mas ontem, neste debate, ainda se ouviu falar muito da campanha eleitoral.

Estranhamente, até parece existir da direita uma vontade de negar o resultado eleitoral. E percebo porquê:

porque não foi famoso para o PSD e para o CDS-PP — nós sabemos.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Não foi para si!

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sempre dissemos que se elegeriam Deputados para a Assembleia da

República. São eleições legislativas, que não elegem nem primeiros-ministros, nem governos, mas, sim,

deputados.

Aplausos do BE.

Por isso, quando o PSD e o CDS-PP perderam mais de 750 000 votos, perderam também 25 Deputados. E

passaram, até, de 132 Deputados, uma maioria absoluta e confortável neste Parlamento, para 107 Deputadas

e Deputados. Percebemos, portanto, os motivos da inquietação do PSD e do CDS-PP.

Mas, mesmo assim, quem ouvisse os discursos de ontem poderia achar que eles eram capazes até de

amolecer os corações mais empedernidos e, porventura, até de fazer chorar algumas pedras da calçada.

Falou-se de golpe irreversível nas regras e convenções da nossa democracia — disse o Sr. Primeiro-Ministro

— e de usurpação eleitoral, de falta de humildade democrática e da tentativa de inverter o resultado eleitoral

— disseram as bancadas do PSD e do CDS-PP.

Mas é estranho como aqueles que fazem estas acusações não conhecem sequer o mínimo da sua história

enquanto grupos parlamentares. Olhemos para um passado recente, exatamente para aquele para onde PSD

e CDS-PP, enquanto Governo, atiraram o nosso PIB, a riqueza do nosso País.

Em 1999, tinha o Bloco de Esquerda acabado de chegar à Assembleia da República e tinha o PS ganho as

eleições com 115 Deputados. O que é que aconteceu naquele momento? O que é que o PSD fez naquele

momento? Exatamente aquilo de que está agora a acusar os partidos da oposição: de incumprirem a tradição.

Veja-se: o PSD apresentou uma moção de rejeição a um Governo que tinha uma base de apoio de 115

Deputados, dizendo que tinha perdido as eleições, que tinha sido incapaz de garantir uma maioria social de

apoio e que, por isso, merecia ser rejeitado.

É esta a demagogia do PSD e do CDS-PP, que só lembram as tradições quando lhes convém. Afinal,

reconhece-se que, para eles, a história é a sua memória, e aí têm uma memória muito seletiva: só se lembram

daquilo que lhes convém!

É esta a realidade de quem está desesperado porque, de facto, perdeu as eleições, porque não percebe o

que aconteceu com o resultado eleitoral e porque, ao olhar para as eleições, apenas parece que quer fazer o

papel de Calimero! A demagogia é esta, a da direita, que, não conhecendo a sua história, também não diz

bem ao que vem nem reconhece que a austeridade que defende foi a derrotada nas eleições.

Vejamos o debate que a direita não quer fazer, o que aconteceu nas eleições passadas, o que aconteceu

ao longo de quatro anos e como é agora possível que uma alternativa se esteja a levantar. É que aquele arco

que tanto embandeiram, o tal arco da governação, foi suplantado pelo arco da Constituição, aquela que não

conheceram durante quatro anos e contra a qual governaram continuadamente. Quatro anos! Quatro anos

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sempre contra a Constituição! Só não foram quatro Orçamentos do Estado porque, no último, o PSD e o CDS-

PP fizeram uma espécie de jogada de antecipação e atiraram as medidas para o Tribunal Constitucional ainda

antes de as colocarem no Orçamento do Estado. Se assim não fosse, teriam sido quatro Orçamentos do

Estado apresentados pelo PSD e pelo CDS-PP que «batiam» na Constituição.

Ora, todas e todos nós sabemos que se há um texto unificador de um país é a Constituição. Se há

documento que diz como se organiza uma sociedade é a Constituição de um país. Por isso, os extremistas

são aqueles que, apoiando-se num governo e numa maioria parlamentar, governam contra esse regime

instituído, governam contra essa palavra de um país, que é a Constituição. Esses extremistas são exatamente

o PSD e o CDS-PP.

Aplausos do BE.

Sabemos bem como a austeridade é ideológica, como ela foi o Programa do Governo durante quatro anos

e é ainda o Programa do Governo para os próximos quatro anos. A austeridade promove a concentração das

fortunas e foi por isso que, ao mesmo tempo que o País empobreceu, vimos o número de milionários

aumentar; promove a desigualdade social — cresceu a cada ano do mandato do PSD e do CDS-PP; destrói a

solidariedade no nosso País, e é por isso que a pobreza aumentou ao mesmo tempo que os apoios sociais

foram cortados; e destrói essa solidariedade entre as gerações, entre aqueles que construíram um Estado

social que agora esta direita quer desmantelar.

E porque sabemos que a Constituição é aquilo que une esta alternativa sabemos também como há uma

Europa que não pode ser uma «camisa de forças» para a Constituição, porque não há, na Europa,

Constituições de primeira nem Constituições de segunda. A Constituição alemã não é mais importante do que

a Constituição portuguesa, e é exatamente isso que afirma a alternativa que se está a constituir.

O futuro que passa por esta Assembleia, o futuro que passa por este País é o futuro de quebrar o ciclo de

empobrecimento que PSD e CDS-PP querem continuar. Esse é o verdadeiro plano do Governo.

Queremos mudar a vida do País depois do desastre social que foi a governação do PSD e do CDS-PP. A

única maioria que se expressa no Parlamento é a maioria que rejeitará que PSD e CDS-PP continuem no

Governo. A única maioria que se expressa no Governo é a que tem a legitimidade dos votos de um povo que,

votando em Deputados e Deputadas, retiraram a maioria ao PSD e ao CDS-PP, exigindo que eles não

continuem no Governo.

Aplausos do BE.

Por isso, Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros de Governo,

Sr.as

e Srs. Deputados, na antecipação da rejeição, deixo ao Sr. Primeiro-Ministro — que o vai deixar de ser —

um simples e humilde conselho: diga ao seu futuro eu que não seja piegas, que saia da sua zona de conforto.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Inscreveu-se, para um pedido de esclarecimento, o Sr. Deputado António Leitão

Amaro, do PSD, a quem dou a palavra.

O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as

e Srs. Membros do

Governo, Sr.as

e Srs. Deputados, Sr. Deputado Pedro Filipe Soares, queria fazer uma pequena viagem, se me

permite.

No dia 10 de novembro de 2016, Catarina Martins, a Sr.ª Deputada, aterra no aeroporto da Portela, num

avião da Aeroflot, com o seu simpático sorriso,…

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Da Aeroflot?!

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O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — …vinda do lado do território do Muro, mas preocupada, porque

nem ali conseguiu resolver ou encontrar quem lhe resolvesse os problemas de falta de dinheiro para pagar as

contas do Estado, os salários dos funcionários públicos, as pensões…

Mas Catarina, nesse dia, está feliz, porque já decretou a nacionalização da banca, das empresas de

energia e de transportes, já reestruturou a dívida pública unilateralmente com 60% de corte, já decretou

impostos para tudo e, já agora, pensa em taxar o ar que respiram as pessoas com alguns rendimentos, um

património, mesmo que sejam as poupanças do seu trabalho. Mas também já fez a legislação laboral andar 30

anos para trás, já congelou as rendas, já fixou administrativamente os preços da energia e os preços

agrícolas,…

O Sr. Pedro Soares (BE): — Isso é o canal Panda?!

O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — … já decretou a gratuitidade absoluta de tudo o que o Estado

produza, embora ainda hesite sobre qual é o novo imposto que irá criar para pagar a conta. Já encerrou todos

os estabelecimentos de ensino, de saúde e de apoio social que não sejam propriedade e de gestão pública.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Já foi longe demais, Sr. Deputado!

O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — O que é isso, para Catarina, de livre iniciativa económica das

pessoas? Das instituições particulares de solidariedade social? Das misericórdias? E mesmo nos

estabelecimentos públicos, como as escolas, decretou a gestão coletiva. Correu com esses malvados

negociantes das IPSS e das Misericórdias, porque não percebe como é possível que alguém queira ajudar os

outros sem ter um rendimento com isso. Mas cada vez que o desemprego aumenta, contrata mais alguns

milhares de pessoas para a máquina do Estado. Cortou também os laços atlânticos, saiu da NATO, decretou

que Portugal deixa de fazer e de participar no livre comércio internacional. E se o povo se queixa proclama-lhe

mais um rol de direitos abstratos, como se os seres humanos vivessem de proclamações vazias.

Sei que isto vos parece um sonho, mas não é! Para poder concretizar esse fantasioso caminho, basta

aplicar o programa do Bloco de Esquerda que foi a eleições. A mim parece-me um pesadelo. Mas hoje, a esta

hora, na manhã de 10 de novembro, este ainda é um pesadelo evitável. E, Sr. Deputado Pedro Filipe Soares,

a verdade é que os portugueses também já falaram deste pesadelo, ou programa, e 10% escolheram-no e

90% disseram que não. Amanhã, na verdade, não sei.

Mas, espere, se calhar, o Bloco de Esquerda mudou, tal como Catarina mudou! Porque, há poucas

semanas, dizia que governava quem tivesse o maior número de Deputados no Parlamento, que a maior

bancada parlamentar governava. Mas mudou! Ou, espere, se calhar é por conveniência. Terão aprendido bem

com o vosso novo parceiro de caminho: quando são as horas difíceis, «está quieto»; veja-se o líder anterior:

fez o caminho difícil, o caminho das pedras e quando dobrou o cabo das tormentas, «dá cá, é a minha hora»!

Exatamente a mesma coisa, a mesma conveniência para o País. Nós pegámos no País numa situação

dificílima, recuperámo-lo, devolvemos-lhe autonomia para decidir e quando mandámos embora a troica, eles

chamaram: «Dá cá,…» — conveniência — «…é a minha hora»!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Talvez seja nessa conveniência que se vê a «farinha do mesmo saco».

Mas, Sr.as

e Srs. Deputados, esse programa em que o Bloco de Esquerda acreditava não foi escolhido. Os

portugueses falaram! É verdade que aqui, ontem, também falaram e já vimos a primeira discussão entre

Catarina e Mário Centeno… Srs. Deputados, obviamente, isto não é nenhuma falta de respeito, mas os

portugueses, cada um com a sua opção, escolheram um caminho de recuperação sustentável, de criação de

emprego, que estava a acontecer e que continua a acontecer. Os portugueses falaram e escolheram que

quem governava era Pedro Passos Coelho, e o Sr. Deputado, mais uma vez, quer transformar 10 em 100,

quer transformar a sua micromaioria, que não é uma maioria, na vontade do povo, e a vontade do povo não foi

essa. Mas o povo sabe e estará cá para os julgar da próxima vez!

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Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Leitão Amaro, devo dizer que estava à

espera que iniciasse a sua pergunta por um mea culpa, dizendo «nós, PSD e CDS, estivemos não só no

Governo a aldrabar o País,…

Protestos do PSD e do CDS-PP.

… mas toda a nossa narrativa sobre a tradição, a legitimidade de governação e aquilo que nós, enquanto

partido, fizemos é mentira».

Sobre a moção de rejeição n.º 2/VIII, da VIII Legislatura, em 1999, dizia o PSD ao Partido Socialista — que

tinha 115 Deputados, mais oito do que tem a soma da bancada do PSD com a do CDS, que tinha passado de

112 para 115, o que traduz um crescimento, ao contrário do PSD e do CDS-PP, que passaram de 132 para

107 — que o Programa do Governo do Partido Socialista era exatamente o mesmo que o programa eleitoral

que tinham apresentado, que não mereceu a adesão maioritária dos portugueses, e que isso apenas os

responsabilizava a eles. Logo, o PSD e o CDS rejeitavam aquele governo.

Ora, o que nós vemos é que essa aldrabice é o desconhecimento da sua própria história.

Sobre essa matéria, Sr. Deputado, nem uma palavra! Seria de esperar que o PSD e o CDS, com toda a

pose de Estado que ainda teriam neste momento, dissessem: «Não, é verdade, afinal estamos a dar

argumentos que não são válidos e toda a ideia da tradição é apenas uma falácia que não tem qualquer adesão

à realidade». Sobre isso, zero, Sr. Deputado!

Sobre a ideia de que agora temos 10% a condicionar os 90%, coloco a questão ao contrário: o Sr.

Deputado quer que 38% de Deputados desta Assembleia, ou seja, 107 de 230, condicionem todos os

restantes. Isso não é um pouco exagerado, Sr. Deputado?! Não é exagerar um pouco nas contas da

matemática?!

Aplausos do BE.

E porquê? Só porque PSD e CDS não convivem bem com o resultado eleitoral. Só por isso, Sr. Deputado!

Só por isso!

Risos do PSD.

Devo dizer que até poderia ficar sensibilizado com a matéria se não tivesse sabido o que fizeram ao País

durante quatro anos. Mas, sabendo isso, sei que foi justa a derrota eleitoral que tiveram nas urnas, e a única

conclusão que podemos retirar é a de que, de facto, uma alternativa é desejável e bem-vinda ao País.

Para terminar, Sr. Deputado António Leitão Amaro, quero dizer-lhe que a democracia se exprime pelo

resultado da eleição dos Deputados e das Deputadas nesta Assembleia. O que sempre dissemos e o que

consta da Constituição da República Portuguesa — que só agora parecem ler, na verdade tresler, porque

nunca a conheceram durante quatro anos — é que se elegem Deputadas e Deputados da Nação, não de

distritos ou de regiões da Nação, e que a sua responsabilidade é perante os seus eleitos, sendo aqui que o

Governo tem de vir buscar a legitimidade para governar. Se for rejeitado o seu Programa do Governo, ele cai.

Ora, é exatamente essa democracia que está a ser hoje, aqui, construída, aquela que a Constituição prevê

e, já agora, aquela que foi constituída na base de uma aliança muito melhor do que esta autoproclamada

equipa da governação. É o «arco da Constituição», onde até o PSD já esteve um dia, mas que já esqueceu há

muito tempo!

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado João Oliveira.

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O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, Sr.as

e Srs. Membros do Governo: Foi

a luta dos trabalhadores e do povo que nos trouxe até aqui. Foi a luta corajosa e determinada que os

trabalhadores e o povo português travaram ao longo de quatro penosos anos que conduziu o Governo

PSD/CDS ao isolamento político e social.

Foi essa luta que tornou evidente a ilegitimidade das suas políticas, que denunciou o caráter injusto e

desigual das suas opções e a dimensão dramática das suas consequências.

Foi essa luta que juntou aqueles que se sentiram atingidos nos seus direitos e ofendidos na sua dignidade,

criando as condições para a derrota eleitoral infligida a PSD e CDS, com a perda da sua maioria absoluta.

Mal de nós se agora fechássemos a porta que a luta do povo abriu!

Vozes do PCP: — Exatamente!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Nos últimos quatro anos, assistimos neste País a um enorme esforço

nacional que todos temos o dever de reconhecer e valorizar: o esforço de milhões de portugueses que não

regatearam forças para defender os seus direitos, enfrentando o Governo que os espezinhava; de

trabalhadores e reformados, que lutaram para defender salários, pensões e outros direitos que lhes foram

cortados; de desempregados, jovens e trabalhadores precários, que, querendo construir o futuro das suas

vidas e dispondo apenas da sua força de trabalho, lutaram pelo emprego, por um contrato efetivo, por salários

e horários dignos ou horas de descanso; de pequenos e médios empresários, agricultores e pescadores, que

lutaram para manter as suas atividades e o seu sustento; de intelectuais, artistas, investigadores, que lutaram

pela valorização social e profissional das suas profissões; de populações, que lutaram para defender as suas

escolas, os seus postos de saúde, as suas freguesias e tantos outros bens fundamentais para as suas

comunidades.

Foram esses milhões de portugueses que derrotaram o Governo PSD/CDS, afirmando a unidade onde o

Governo procurou semear a divisão, fazendo vencer a esperança onde o Governo usou a ameaça e quis

impor o medo, derrotando com a ação e a luta as tentativas de impor o conformismo e a resignação.

Foram esses milhões de portugueses que construíram na luta e confirmaram no voto aquilo que

pretendiam: derrotar o Governo PSD/CDS e afirmar a sua aspiração a uma política que dê resposta aos seus

problemas concretos.

A derrota eleitoral de PSD/CDS, com o fim da sua maioria absoluta em resultado da perda de 700 000

votos e 25 deputados, foi a confirmação eleitoral de que, há muito, este era um Governo derrotado.

Protestos do Deputado do PSD Jorge Paulo Oliveira.

Há muito que o Governo PSD/CDS era um Governo sem legitimidade. Por violar compromissos eleitorais,

por governar contra o povo e a Constituição, por não dispor de base política e social de apoio que lhe

permitisse prosseguir a sua política de exploração e empobrecimento, há muito que era um Governo isolado e

derrotado.

E há muito que apenas se mantinha no poder porque se agarrava a uma maioria parlamentar que não tinha

correspondência política e social e porque contava com a conivência do Presidente da República.

Aplausos do PCP.

Depois das eleições do passado dia 4 de outubro, PSD e CDS contam apenas com a conivência do

Presidente da República. Mas como isso não é suficiente para manter um Governo contra a vontade do povo,

teremos hoje mesmo de confirmar a derrota do seu Programa e impedir a sua entrada em funções,

confirmando a vontade popular.

Aplausos do PCP.

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A forma como o Governo PSD/CDS se apresenta neste debate é, de resto, a melhor confirmação de que se

trata de um Governo consciente da sua derrota e de que não pode continuar a governar.

Apresentaram um Programa que nem se atrevem a defender, tão evidente é a constatação de que se

propõem, afinal, manter e agravar a mesma política que vinham fazendo, sem prejuízo de um arrazoado de

contradições com a sua prática política que deixa a nu a sua falta de credibilidade.

Recusam-se a responder a qualquer problema concreto, procuram a todo o custo fazer a discussão

desligada daquilo que deviam ser as suas preocupações centrais — a vida das pessoas e o destino do País —

e fazem toda a discussão política num plano abstrato recorrendo aos únicos argumentos que utilizaram ao

longo de quatro anos: a ameaça, a chantagem, o drama e o medo.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Não discutem o seu próprio Programa, querendo convencer-nos da sua

bondade. Querem apenas, com este debate, fixar a narrativa que têm preparada para o futuro e que assenta

em sete ideias falsas.

Primeira ideia falsa: a de que, nos últimos quatro anos, o Governo PSD/CDS resolveu os graves problemas

estruturais do País.

Afirmam isto num País que deixam com um fardo de 220 mil milhões de euros de dívida pública; com um

desemprego real a atingir mais de 1,1 milhões de trabalhadores; em que 80% dos novos contratos de trabalho

são precários e 20% dos trabalhadores por conta de outrem auferem um salário inferior ao salário mínimo

nacional; onde há 2,8 milhões de pessoas em risco de pobreza; um país de onde saíram 500 000 portugueses,

na sua maioria jovens e dos mais qualificados, que se viram obrigados a emigrar.

Segunda ideia falsa: a de que agora é que vinha aí o tempo bom em que se iam colher os frutos do que foi

feito para trás.

Os dados ontem revelados pelo INE relativos ao comércio externo de mercadorias até setembro apontam

para uma redução do saldo global de 11% no período homólogo e, se excluirmos os combustíveis, o saldo

agravou-se em 36%. O crescimento económico apontado para 1,7% resulta em 1% exclusivamente da

redução do preço do petróleo. Ou seja, é o preço do petróleo que está a camuflar a real evolução económica.

Por outro lado, ninguém percebe que frutos se podem colher do elevado nível de endividamento público e

externo do País, do controlo dos centros de decisão nacionais pelo capital estrangeiro em empresas e setores

estratégicos, que frutos podem resultar do BANIF ou do BES que pesam como espadas sobre as nossas

cabeças ou de uma execução orçamental em 2015 cada vez mais incerta.

O Ministro Mota Soares fazia ontem referência a instituições nacionais com 500 anos de história. Pois, pela

primeira vez em 500 anos, o Estado não dispõe de um serviço público de correios porque o Governo

PSD/CDS vendeu os CTT a uma empresa estrangeira.

Aplausos do PCP.

De árvores destas não se colhem grandes frutos!

Terceira ideia falsa: a de que, apesar de ter governado durante quatro anos a esmagar direitos e a destruir

o País, agora é que o Governo PSD/CDS estava disponível para ser sensível à pobreza e à miséria que

espalhou aos sete ventos e a mudar de atitude relativamente à defesa do interesse nacional.

Com maioria absoluta, referiam-se ao envelhecimento da população como a «peste grisalha»; agora, que

perderam essa maioria, falam do «inverno demográfico».

Depois de terem evitado até onde puderam a atribuição de um tratamento adequado aos doentes com

hepatite C, de terem desvalorizado o sofrimento de doentes que se acumulavam em corredores e salas de

espera de urgências hospitalares, de terem aprovado cortes definitivos nas pensões, que acabaram

chumbados pelo Tribunal Constitucional, planeando logo a seguir outros cortes de 600 milhões na segurança

social, querem agora que acreditemos que se encheram de sensibilidade social.

Insistem na venda da TAP mesmo que fiquem em gestão; envolveram o Estado como avalista de dívidas

que venham a resultar do ruinoso processo de entrega dessa empresa; atribuíram uma subconcessão dos

STCP por ajuste direto já depois das eleições; enxamearam a estrutura do Estado com boys nomeados em

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tempo recorde; contrataram para vender o Novo Banco um especialista em desmantelar e vender património

público cujo lugar de ex-Secretário de Estado ainda nem tinha arrefecido e querem convencer-nos de que

daqui em diante é que defenderiam ferreamente o interesse nacional.

O simples teste de tais proclamações teria um custo insuportável em vidas e retrocesso do País que não

podemos aceitar.

Aplausos do PCP.

Quarta ideia falsa: a de que ganharam as eleições porque se tratava de eleger um Primeiro-Ministro.

Tentam reduzir as eleições a uma falsa disputa para Primeiro-Ministro, para partido mais votado ou para o

governo, mas o critério que escolheram para afirmar essa vitória tem dois problemas de fundo: primeiro, não

existe esse tipo de eleição e, segundo, a vontade maioritariamente expressa pelo povo português não foi essa.

Aquilo que verdadeiramente se decidiu foi o número de Deputados que cada força política elegeu, as

maiorias parlamentares que se podem formar na Assembleia da República e a base institucional que se criou

para suportar uma determinada política e o Governo que pode entrar em funções.

Por muito que custe a PSD e CDS, o critério para a formação dos governos está na Constituição e resulta

da composição da Assembleia da República, não está nos supostos pódios eleitorais das folhas de jornais

aqui brandidas ontem pelo CDS.

Aplausos do CDS-PP:

Quinta ideia falsa: a de que só um Governo PSD/CDS é um governo legítimo e que qualquer outra solução

governativa é ilegítima, sobretudo uma que não resulte de uma coligação pré-eleitoral.

Num quadro em que nem sequer dispõem de condições para entrar em funções, acusam de ilegítimas

outras soluções governativas que possam reunir essas condições na sequência e no respeito da vontade

expressa pelo povo português a partir da composição da Assembleia da República.

Depois de terem passado quatro anos a justificar que, apesar de isolado política e socialmente, o Governo

PSD/CDS se devia manter no poder porque dispunha de uma maioria na Assembleia da República, agora que

já não dispõem dessa maioria tentam arranjar um critério diferente para justificar um resultado idêntico.

A sexta ideia falsa é a de que, para que haja uma alternativa ao Governo PSD/CDS, alguém tem de

prescindir do seu programa e da sua coerência política.

Risos do CDS-PP.

Neste aspeto, regista-se a influência do CDS — daí as suas gargalhadas! —, que não conseguiu ainda

compreender que contribuir para a formação de uma determinada solução governativa não tem de implicar

que se prescinda do Programa, da independência, dos objetivos políticos ou da coerência.

Nem todos os partidos sentem a pressão de passar de eurocéticos a euroconvictos, como o CDS fez em

2002 a troco de uns lugares no Governo de Durão Barroso.

Aplausos do PCP.

E nem todos os partidos aceitam passar de partido dos contribuintes, dos pensionistas e da lavoura a

partido carrasco das pensões, dos agricultores e dos contribuintes, como o CDS fez em 2011 para integrar o

Governo de Passos Coelho.

Aplausos do PCP.

Por fim, a sétima ideia falsa é a de que só há uma escolha: um Governo PàF ou o caos.

O tremendismo e o medo com que PSD e CDS procuram caraterizar as consequências de um Governo que

não o seu corresponde à linguagem de ameaça e de chantagem com que se relacionaram com os

portugueses nos últimos quatro anos.

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De resto, nesse aspeto, há pelo menos uma escolha adequada no Governo. O hoje Ministro Costa Neves,

há um ano Deputado do PSD, comparava uma proposta de renegociação da dívida ao fim da ligação da

Internet com o exterior e ao fim do acesso ao YouTube. Talvez acabe considerado um moderado neste elenco

governamental!…

Aplausos do PCP.

Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Membros do Governo Sr.as

e Srs. Deputados, como já se disse anteriormente, o

Programa do Governo é uma proposta de continuidade e intensificação da política com que PSD e CDS

agravaram a exploração e o empobrecimento, aprofundaram as injustiças e desigualdades e impuseram a

degradação do regime democrático, misturada agora por conveniência com um arrazoado de contradições

com a sua prática política e sem ponta de credibilidade.

O Programa do Governo confirma as muitas e fortes razões para que o Governo PSD/CDS não entre em

funções, não apenas pelos prejuízos que tem causado, mas também pelos que pretendia continuar a causar

aos trabalhadores, ao povo e ao País.

Rejeitar o Programa e derrotar o Governo PSD/CDS são os primeiros passos para concretizar a vontade do

povo. Recuperar direitos retirados, alcançar avanços que correspondam às aspirações dos trabalhadores e do

povo são objetivos para os quais as decisões desta Assembleia da República não são suficientes mas para

cuja concretização podem dar um importante contributo.

A hora não é de pôr o povo à defesa, é de avançar para concretizar tais objetivos. É esta a

responsabilidade que se impõe assumir e a qual o PCP assumirá.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado João Oliveira, a Mesa registou a inscrição, para pedir esclarecimentos,

dos Srs. Deputados Miguel Santos, do PSD, e Francisco Mendes da Silva, do CDS-PP.

Entretanto, o Sr. Deputado João Oliveira informou a Mesa que pretende responder em conjunto aos dois

Srs. Deputados.

Tem, então, a palavra o Sr. Deputado Miguel Santos.

O Sr. Miguel Santos (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Oliveira, o PCP perdeu as eleições, e

perdeu-as com menos votos do que aqueles que obteve há quatro anos.

Protestos do PCP.

Se bem que a doutrina oficial do PCP, desde o 25 de Abril, não regista nenhuma derrota eleitoral. Para o

PCP, desde o 25 de Abril, de alguma forma sempre ganhou as eleições.

Mas o PS também perdeu as eleições. O PS apresentou-se a pedir uma vitória, e perdeu. O PS apresentou

um candidato a primeiro-ministro, e perdeu. Os portugueses não quiseram o Deputado António Costa como

primeiro-ministro — perdeu em toda a linha! — e, agora, promove um arranjo circunstancial para ultrapassar a

derrota. Não soube ganhar e não sabe perder. Perdeu, mas quer ganhar à força; perdeu, mas tem de arranjar

forma de ganhar. E como é que o PS arranja forma de ganhar? Através de uma solução de extrema-esquerda,

colocando-se na posição de refém dos partidos da extrema-esquerda, porque é a única via de o Sr. Deputado

António Costa poder concretizar a sua vontade de, eventualmente, ser primeiro-ministro, arrastando com isso

todo o Partido Socialista atrás, razão que é justificada pelo facto que todos nós sabemos: o de que este é o

único meio de o Deputado António Costa se manter tranquilamente a liderar o Partido Socialista.

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Muito bem!

O Sr. Miguel Santos (PSD): — Já todos percebemos, e o País também percebeu, que os senhores estão

todos de acordo. O BE, o PCP, Os Verdes e o PS estão todos de acordo em derrubar o atual Governo. Mas a

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questão coloca-se no dia seguinte e, no dia seguinte, sabemos o que quer o Sr. Deputado António Costa: quer

ser primeiro-ministro.

Sr. Deputado João Oliveira, o seu camarada Deputado Jerónimo de Sousa, no dia 27 de setembro de

2015, afirmou o seguinte: «O PS insiste um pouco na ideia de que a gente…» — o Partido Comunista — «…

devia dar um jeitinho. “Escolham lá onde é que poderiam ceder”. Cedermos em relação à renegociação da

dívida, ao tratado orçamental? Se é sobre isto, nem tentem, nem vale a pena».

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Bem lembrado!

O Sr. Miguel Santos (PSD): — Sr. Deputado João Oliveira, afinal, quem é que dá o jeitinho? Há jeitinho ou

não há jeitinho? É que é preciso perceber o que é o que o PCP quer, pois há aqui uma nebulosa.

O PCP — e o Sr. Deputado é a prova disso — mantém um discurso dogmático, ortodoxo, inalterado,

inamovível.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!

O Sr. Miguel Santos (PSD): — Interrogo-me: e agora? E sobre aquilo que os senhores não querem falar,

ou seja, os eixos principais, como o euro e o tratado orçamental?

Sr. Deputado, vou dar-lhe três exemplos.

O projeto de resolução n.º 354/XII (1.ª), que propõe a renegociação da dívida pública, da autoria do PCP,

foi rejeitado com votos contra do PSD, do PS e do CDS-PP. O que é que os senhores vão fazer com ele? Vão

metê-lo na gaveta.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Vai ter muitas desilusões!

O Sr. Miguel Santos (PSD): — O projeto de resolução n.º 1063/XII (3.ª), que recomenda ao Governo que

inicie o processo de desvinculação de Portugal do tratado orçamental, da autoria do Partido Comunista

Português, obteve votos contra do PSD, do PS e do CDS-PP. O que é que os senhores vão fazer com ele?

Vão metê-lo na gaveta.

Para terminar, o projeto de resolução n.º 1112/XII (4.ª), da autoria do Partido Comunista Português, propõe

o aumento do salário mínimo nacional para os 600 € em janeiro de 2016, que, é como quem diz, está já aí.

Sr. Deputado, em que é que ficamos? O que é que o PCP vai meter na gaveta?

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Mendes da Silva.

Sr. Deputado, sendo a sua primeira intervenção em Plenário, desejo-lhe as maiores felicidades.

O Sr. Francisco Mendes da Silva (CDS-PP): — Sr. Presidente, muito obrigado. É, de facto, a primeira vez

que uso da palavra neste Plenário, por isso cabe-me endereçar um cumprimento muito especial a todos os

presentes na Câmara, incluindo ao Sr. Presidente, obviamente, ao Sr. Primeiro-Ministro, aos Srs. Membros do

Governo e aos Srs. Deputados.

Tenho uma pergunta breve para fazer ao Sr. Deputado João Oliveira, mas cuja resposta poderá, por

definição de um contraste, sublinhar qual é a legitimidade do Programa do Governo que aqui é apresentado

por permitir saber se este é ou não aquele Programa que melhor respeita o centro político saído das eleições

e, nesse sentido, aquele que melhor respeita os resultados eleitorais. É uma pergunta sobre a tal «posição

comum» que o Partido Comunista Português se prepara para assinar com o Partido Socialista. Ou seja, ao

contrário do que nos foi prometido, é menos do que um acordo e muito menos do que uma coligação.

Sr. Deputado, pergunto-lhe: o que é que essa «posição comum» diz sobre Semestre Europeu, euro, tratado

orçamental e, de modo crucial, o que é que diz sobre orçamento ou orçamentos do Estado? Diz que existe

uma obrigação de negociação mas sem uma obrigação de resultado ou diz, pelo contrário, que há uma

obrigação de viabilização, a única que garante o valor da estabilidade?

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Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados Miguel Santos e Francisco Mendes da Silva,

agradeço as questões que me colocaram, não sem antes fazer um lamento e deixar uma nota de regozijo.

O lamento tem a ver com o facto de os Srs. Deputados, apesar da intervenção que fiz, insistirem em não

discutir aspeto rigorosamente nenhum do Programa do Governo.

Vozes do PSD: — Oh!…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Não procuram contrariar nenhuma das ideias a propósito da situação do

País, da vossa propaganda mentirosa, das vossas ilusões, do mal que fizeram aos portugueses durante quatro

anos. Não tentam rebater nada disso!

Protestos do PSD e do CDS-PP.

A única coisa que aqui nos trazem é uma perspetiva desesperada de se manterem agarrados ao poder

porque sim, sem justificação nenhuma.

Em nome da resolução dos problemas das vidas das pessoas, este é um lamento que tenho de deixar aqui,

porque o debate do Programa do Governo devia ser em torno dos problemas que os portugueses têm nas

suas vidas, dando-lhes resposta.

Deixo também uma nota de regozijo relativa aos pedidos de esclarecimento que me foram feitos. Julgo que

devemos sentir-nos lisonjeados com a preocupação que o PSD e o CDS manifestaram com a manutenção da

nossa natureza e identidade, sobretudo no contexto da campanha anticomunista e verdadeiramente

cavernícola que tem sido desenvolvida contra o PCP.

Aplausos do PCP.

Regozijo-me por haver preocupação, da parte do PSD e do CDS, em que mantenhamos a nossa natureza

e a nossa identidade.

Sr.as

e Srs. Deputados do PSD e do CDS, se calhar, essa é a única matéria em que vos posso tranquilizar.

Podem estar descansados: o PCP não se vai colocar nunca numa posição de incoerência como aquelas que

eu já vou vos descobrir.

Aplausos do PCP.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

A propósito do dia seguinte, da posição comum e dos compromissos, o Sr. Deputado Miguel Santos

perguntou se o PCP dá o «jeitinho» e o Sr. Deputado Francisco Mendes da Silva formulou a sua questão com

aspetos mais concretos.

Srs. Deputados, quero dizer-vos que, com o que se vai passar hoje e nas próximas semanas, talvez se

possa criar uma outra perspetiva dos contributos dos partidos para a formação de soluções governativas que

não passem por uma lógica de convidar companheiros para o percurso procurando liquidá-los ou procurando

partir-lhes a espinha.

Srs. Deputados do PSD e do CDS, há uma diferença grande que foi visível na discussão feita nas últimas

semanas entre o PS e o PCP: nem o PCP tentou convencer o Partido Socialista a abandonar as suas

posições, nem o PS tentou convencer o PCP a desistir do seu Programa.

Risos do PSD e do CDS-PP.

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Já percebemos que isso causa um grande incómodo, porque os senhores habituaram-se a construir

soluções governativas na base de coligações, partindo a espinha ao CDS, que, de alguma forma, tinha de

justificar que aceitava ficar com a espinha partida e perder a coerência relativamente às posições que

assumia.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Os Srs. Deputados quiseram fazer perguntas, mas não estão interessados na resposta. Fica apenas

registado em ata e para quem nos está a ouvir.

O processo de discussão entre o PS e o PCP foi sério e empenhado na procura de respostas políticas para

os problemas do País, para os problemas dos portugueses, para os problemas imediatos que se colocam aos

trabalhadores e ao povo, assumindo que, em relação ao que havia convergência, essa convergência

registava-se e, quando ela não existia, obviamente que não se registava, e nenhum tentou quebrar a espinha

ao outro por causa disso.

Sabem, Sr.as

e Srs. Deputados, ao contrário do que os senhores têm feito neste debate do Programa do

Governo, discutiram-se naquelas reuniões, de forma muito aprofundada, soluções para os problemas

concretos e imediatos dos trabalhadores e do povo, as quais, no tempo em que nós decidirmos e não no

tempo em que os senhores querem para desviar o centro deste debate, vão ter oportunidade de conhecer.

Aplausos do PCP.

Para terminar, dirijo-me em particular ao Sr. Deputado Miguel Santos, que decidiu citar uma afirmação do

Deputado Jerónimo de Sousa, mas podia ter citado tantas outras em que disse, com muita clareza, os

objetivos com os quais o PCP se apresentou ao combate eleitoral.

O primeiro objetivo era derrotar este Governo do PSD e do CDS e o segundo objetivo era criar condições

para contribuir para uma política que desse, de facto, resposta aos problemas dos trabalhadores, do povo e do

País. Sr. Deputado Miguel Santos, estes objetivos não estão desligados entre si.

Nós sabemos que uma política que responda aos problemas dos trabalhadores e do povo pode depender

de muita coisa, e depende de uma logo à cabeça: interromper o ciclo de governação do PSD e do CDS,

derrotar e demitir este Governo de forma a criarem-se condições para que uma outra política possa ser

concretizada. E esse primeiro objetivo foi alcançado.

Quanto ao segundo objetivo, estamos a trabalhar para ele,…

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Ah, ainda não há acordo!

O Sr. João Oliveira (PCP): — … e foi com esse objetivo que fizemos esta discussão.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Então, ainda não há acordo?

O Sr. João Oliveira (PCP): — Obviamente, essa é uma matéria em que a disponibilidade de cada um é

decisiva. E sabe porquê, Sr. Deputado Miguel Santos? O Sr. Deputado queria — e nós percebemos porquê —

que no desafio que lançámos ao Partido Socialista colocássemos à cabeça as matérias de divergência e

disséssemos «sem isto não há nada, sem isto não há possibilidade de responder a problema nenhum do

País!» E a partir daí estavam registadas as divergências e os senhores mantinham-se no poder.

Mas nós fizemos o contrário. Olhando para a correlação de forças nesta Assembleia da República,

percebendo que dela podia sair uma solução governativa diferente da do PSD e do CDS-PP e que estavam

criadas condições para que se pudesse adotar uma política que responda aos problemas dos trabalhadores e

do povo e do País e que seja, de facto, uma solução duradoira, percebendo isso, disponibilizámo-nos a dar o

nosso contributo, e é isso que estamos a fazer para vossa irritação e para vosso incómodo.

Para terminar, Sr. Deputado Miguel Santos, um bocadinho mais de rigor nas afirmações que aqui faz. Olhe

que a CDU não perdeu votos, aumentou votos em relação às eleições legislativas de 2011.

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Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado André Silva.

O Sr. André Silva (PAN): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs.

Deputados e demais presentes nesta Sala: Gostaria de continuar a debater algumas questões do Programa do

Governo que ontem não vi esclarecidas ou que não foram respondidas.

Gostaria de abordar uma questão que está no Programa do Governo, que se prende com a continuação da

aposta no setor na energia renovável.

Queria dizer que nem todo o renovável é positivo do ponto de vista dos impactes ambientais, queria falar

de aspetos depreciativos que encerram a energia hidroelétrica e falar do Plano Nacional de Barragens.

Para o PAN, é incompreensível como é que o Plano Nacional de Barragens ainda não foi suspenso ou,

pelo menos, como é que ainda não houve uma ponderação ou uma possibilidade de ponderação relativamente

à sua continuidade.

As metas deste Plano já foram ultrapassadas e a produtividade destas barragens é marginal no sistema

energético português — estamos a falar de 0,7% da energia primária.

Para a potência que é produzida por estas barragens previstas no Plano Nacional de Barragens existem

outras soluções: um investimento cerca de dez vezes inferior em eficiência energética produziria o mesmo

impacto que este Plano; um investimento cinco vezes inferior no aumento de potência das barragens

existentes faria com que alcançássemos os mesmos objetivos.

Relativamente à Barragem de Foz Tua, que ainda não está concluída — muitas pessoas esquecem-se

disso —, o PAN gostaria de dizer que ela constitui um atentado cultural, um atentado ambiental, um atentado

social, um crime de lesa-pátria.

Sei que nesta fase do debate o Governo não é obrigado a responder a perguntas, mas eu deixo na mesma

a pergunta já feita ao Sr. Primeiro-Ministro e ao Governo: se eu me sentasse com vocês uma hora e vos

comprovasse que, financeiramente, é mais viável suspender e parar a Barragem de Foz Tua, os senhores

mandavam suspender a sua construção para não alagarmos um vale milenar?

Relativamente às questões das terapias não convencionais, a que não foi dada resposta no dia de ontem,

gostaria de dizer que estas terapias só estão disponíveis no setor privado. Os cidadãos portugueses anseiam

por ter acesso à liberdade de escolha consignada na Constituição da República Portuguesa, na Lei de Bases

da Saúde e nas leis relativas às diferentes terapias e aos terapeutas.

Os profissionais de saúde estão isentos do pagamento de IVA, contudo isso não acontece com os

especialistas das terapias não convencionais. Ora, mais uma vez, isto coloca os utentes e os profissionais das

terapias não convencionais em desvantagem relativamente ao recurso às outras áreas de saúde, acarretando

prejuízos para uns, para outros ou para todos. Quando é que se prevê que esta área da saúde passe a estar

em igualdade e a par de todas as outras?

Uma outra questão que também não foi respondida e que foi abordada pelo PAN tem a ver com os

transgénicos, com os organismos geneticamente modificados (OGM).

Os transgénicos são seres vivos criados artificialmente em laboratório que vêm trazer muitos perigos

desnecessários: perigos de saúde para as pessoas, desequilíbrios para a natureza, impactos para a

agricultura convencional e biológica devido à contaminação e prejuízo para a economia, pois aumentam o

controlo corporativo sobre a alimentação, entre outros.

Muitos são os riscos e os impactos que já se conhecem sem que haja qualquer vantagem para o

consumidor, para o ambiente ou para as gerações futuras.

Deve imperar o princípio da precaução, no mínimo, e até lá os OGM, os transgénicos devem ser proibidos.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças.

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças (Maria Luís Albuquerque): — Sr. Presidente da Assembleia da

República, Srs. Deputados: Em 2011, o último Governo socialista levou o País a uma situação de pré-

bancarrota sem capacidade para assegurar o pagamento de salários e pensões.

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Portugal está hoje inegavelmente melhor, depois dos sacrifícios feitos por todos os portugueses nos últimos

quatro anos. Todos os indicadores o comprovam: o desemprego desce para valores inferiores aos que

herdámos; o emprego aumenta; a confiança de consumidores e empresários está em máximos de muitos

anos; o índice de bem-estar continua a aumentar; as exportações têm no PIB o maior peso de sempre; o

turismo cresce em número de turistas e em receitas ano após ano; a escolaridade obrigatória chegou ao 12.º

ano e o insucesso escolar recuou; o número de alunos que entraram no ensino superior neste ano letivo

aumentou significativamente.

Estes são apenas alguns exemplos que espelham a realidade do nosso País, cuja evolução positiva é

reconhecida por todos quantos acompanham Portugal. Só a oposição não o quer reconhecer.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A consolidação das contas públicas desempenha neste quadro de melhoria e de recuperação da confiança

um papel central. Sem contas públicas controladas, sem uma trajetória consistente e credível de diminuição da

dívida pública e de redução do défice, a confiança e a credibilidade perdem-se, a economia ressente-se e com

ela as finanças públicas, o investimento cai, o desemprego aumenta e voltamos ao ponto de partida e aos

inevitáveis sacrifícios.

Nos últimos quatro anos, a atenção dos portugueses esteve como nunca focada na evolução do défice e da

dívida pública, nas variações das taxas de juro, nas avaliações das agências de rating internacionais. Isto

aconteceu porque os portugueses tomaram dolorosamente consciência dos efeitos nas suas vidas destas

variáveis a que antes davam tão pouca atenção.

À atenção da comunicação social e dos cidadãos, ao escrutínio crescente dos nossos credores, sejam eles

os parceiros europeus, o FMI ou os mercados, o Governo PSD/CDS respondeu com um caminho determinado

de controlo das contas públicas e de total transparência quanto à evolução de despesas e receitas.

As sucessivas reclassificações de empresas públicas, integrando-as no perímetro das administrações

públicas, responsáveis pela maior parte do aumento da dívida pública, acabaram em definitivo com práticas

passadas de desorçamentação que tantos efeitos negativos tiveram. O valor registado da dívida é hoje mais

alto, mas é representativo das reais obrigações do Estado e já não apenas da parte que se queria dar a

conhecer.

Vozes do PSD: — É verdade!

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — Qualquer Governo tem hoje a possibilidade de iniciar o seu

mandato com o conhecimento pleno da realidade orçamental, sem receios de surpresas que o impeçam de

alcançar os resultados prometidos, mas, sobretudo, sem desculpas para os seus próprios fracassos. Só a

oposição não o quer reconhecer.

Os dados da execução orçamental estão disponíveis diretamente para a Unidade Técnica de Apoio

Orçamental, que funciona aqui mesmo, no Parlamento.

O Conselho das Finanças Públicas, criado por exigência de Pedro Passos Coelho, ainda enquanto líder da

oposição, avalia também, de forma independente, a evolução das contas públicas e as perspetivas que

servem de base aos compromissos futuros.

A Comissão Europeia, o FMI e o BCE, tal como o Mecanismo Europeu de Estabilidade, seguem

atentamente a evolução das contas nacionais a cada seis meses, com missões de monitorização pós-

programa em Portugal e em permanência no contexto do Semestre Europeu, para assegurar a nossa

capacidade de pagar a dívida contraída, a nossa capacidade de cumprir os compromissos do Tratado

Orçamental, mas também, e sobretudo, para detetar e corrigir atempadamente os desvios da trajetória de

consolidação e crescimento que evitará a repetição das ameaças de bancarrota.

Todos acreditam já ser alcançável a saída de Portugal do Procedimento de Défices Excessivos este ano,

com um défice não superior a 3%. Só a oposição não o quer reconhecer.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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A necessidade de consolidação das contas públicas não é uma questão ideológica; é uma questão de

realismo e, sobretudo, de responsabilidade! O rigor na gestão dos dinheiros públicos é exigido pelo respeito

pelo esforço dos contribuintes e pelo interesse nacional, muito mais que pelos compromissos internacionais.

É verdade que o Tratado Orçamental impõe metas e comportamentos exigentes, mas não é menos

verdade que mereceu a adesão voluntária e convicta de uma esmagadora maioria dos Deputados eleitos, aqui

mesmo, neste Parlamento. E foi assim porque todos reconheceram que é no interesse dos portugueses de

hoje e de amanhã que os esforços são feitos e porque todos sabemos bem demais que os desvios da

trajetória de consolidação, por aqueles que procuram ganhos políticos de curto prazo, serão pagos por nós,

pelos nossos impostos, com a perda dos nossos postos de trabalho, com a redução de oportunidades para os

nossos filhos, condenando as próximas gerações à precariedade e à incerteza.

A indisciplina das contas públicas mina a confiança e a credibilidade que, sabemos bem, se perde tão

rapidamente e é tão difícil de reconquistar. Sem confiança, sem estabilidade política, as empresas não

investem, sem previsibilidade fiscal os investidores internacionais optam por outros destinos para criar riqueza

e emprego e as desigualdades sociais que persistem serão mais agravadas, a segurança social será mais

insustentável e o Serviço Nacional de Saúde estará ameaçado.

Este Governo não decide e não trabalha para os mercados!

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — O que fizemos nos últimos quatro anos foi trabalhar para os

portugueses para que sejamos cada vez menos dependentes dos mercados, das suas perceções e dos seus

comportamentos, que escondem durante muito tempo os riscos que corremos e que abruptamente nos retiram

a confiança e nos penalizam.

Mas a importância dos mercados não se diminui com retórica, acusando-os de serem apenas uma

agremiação de especuladores mal-intencionados.

Os mercados representam as poupanças de outros cidadãos e empresas, de outros países que procuram

oportunidades de investimento. Os mercados são a fonte de financiamento que nos permite reduzir

gradualmente o défice, evitando os custos brutais, inimagináveis, para os portugueses de um forçado equilíbrio

orçamental imediato.

Mas os mercados são também o que permite ao sistema financeiro obter fundos externos para dar crédito

às nossas famílias e às nossas empresas, já que a poupança nacional não é suficiente para financiar o

crescimento económico.

Reduzir a dependência dos mercados consegue-se reduzindo o défice e a dívida pública, consegue-se

honrando os compromissos assumidos e gerando confiança, consegue-se com a redução da taxa de juro e da

perceção de risco. Tal não é, infelizmente, o que estamos a ver nos últimos dias.

A redução das taxas de juro liberta recursos para as funções do Estado social, para a proteção dos mais

desfavorecidos, para a educação e a saúde, para o investimento produtivo. Sempre que a confiança se

quebra, sempre que os investidores receiam que não tenhamos vontade ou capacidade de pagar a dívida,

deixam de estar disponíveis para nos ceder os seus fundos e a ameaça de bancarrota volta a ser real.

Que ninguém duvide: se Portugal se voltar a ver forçado a recorrer a um programa de assistência — um

quarto resgate, não um segundo, em menos de 40 anos —, os sacrifícios por que todos teremos de passar

seriam bem mais duros do que aqueles que ficaram para trás.

E não é preciso, sequer, imaginar o que aconteceria. Basta ver o que tristemente tem sido a história

recente de um dos nossos parceiros do euro, a Grécia, e o custo que o pretenso fim da austeridade e a revolta

contra as regras da Europa tem e terá para os gregos de hoje e de amanhã.

O que ganharam com essa experiência? Mais recessão, mais pobreza, mais desemprego e aumento da

dependência das instituições europeias e do FMI, os únicos ainda dispostos a conceder o crédito de que o

País necessita para evitar a miséria absoluta do seu povo.

O Programa do Governo que ontem apresentámos neste Parlamento coloca, como sempre fizemos, acima

de tudo o superior interesse nacional. Continua o caminho já iniciado de recuperação dos rendimentos e de

redução da carga fiscal sobre trabalhadores e empresas. Fá-lo com o gradualismo que a responsabilidade

exige, assume o compromisso de devolver rendimentos mais rapidamente, se tal for possível, sem

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comprometer o que já se conseguiu, e assegura que o rendimento recuperado permite planear com segurança

e confiança o amanhã, que o que agora se recupera não nos será retirado mais tarde, em dobro, sempre de

forma mais penosa para, mais uma vez, corrigir os erros de quem promete o que não pode cumprir e de quem

coloca interesses particulares à frente dos interesses de Portugal.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Programa do Governo que apresentamos define um caminho de consolidação do que já foi alcançado,

coloca prioridade máxima no combate às desigualdades sociais, que as crises sempre agravam, sustenta a

mudança de paradigma alcançada na última Legislatura de uma economia mais aberta e competitiva mais

capaz de enfrentar o mundo globalizado. Contém medidas para o combate aos desafios de médio e longo

prazo, como a demografia e a sustentabilidade da segurança social, a saúde, a educação e a formação, a

competitividade da economia e a sustentabilidade do modelo social europeu em que nos revemos. Contém as

medidas que ao longo da legislatura nos colocam, com segurança, nesse caminho. Enquadra Portugal na

Europa e no mundo, potenciando o nosso papel e as nossas oportunidades na dinâmica global.

O Programa do Governo assegura estabilidade, responsabilidade e compromisso perante os nossos

parceiros europeus, perante as instituições de que Portugal faz parte, perante aqueles cujos valores

partilhamos e que também nos cabe defender. Mas mais do que tudo assegura estabilidade, responsabilidade

e compromisso perante os portugueses que hoje trabalham ou que já não estão na vida ativa e perante os

portugueses de amanhã, que exigem de nós que entreguemos o País em melhores condições do que o

recebemos.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A democracia em que justamente nos orgulhamos de viver defende as diferenças de opinião, as diferenças

de visão sobre o modelo de sociedade que devemos ter, as diferenças de visão sobre a economia que

queremos, mas defende, acima de tudo, o respeito pelo voto soberano dos portugueses.

Saibamos todos honrar a responsabilidade que nos foi confiada.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Entretanto, assumiu a presidência o Vice-Presidente José de Matos Correia.

O Sr. Presidente: — Inscreveram-se, para formular pedidos de esclarecimento à Sr.ª Ministra de Estado e

das Finanças, oito Srs. Deputados e a Sr.ª Ministra informou a Mesa que responderá em grupos de quatro.

Tem, desde já, a palavra o Sr. Deputado Eduardo Cabrita.

O Sr. Eduardo Cabrita (PS): — Sr. Presidente — a quem saúdo pelo seu primeiro momento de

presidência destes trabalhos —, Sr.ª Ministra das Finanças, Portugal precisa de compromisso, precisa de

estabilidade, precisa de previsibilidade para os cidadãos, para as famílias, para as empresas. E foi por isso

que os portugueses a 4 de outubro disseram «não» à instabilidade, à fratura social, ao desastre económico

que significou a governação que a Sr.ª Ministra aqui representa.

A estabilidade de que nos fala foi marcada por três Orçamentos inconstitucionais. A marca da instabilidade

permanente é a instabilidade fiscal pelo enorme aumento de impostos, por 80 alterações fiscais. Aquilo que

neste momento é o legado da sua governação é o segundo maior défice de toda a União Europeia, 7,2%, e a

terceira maior dívida pública, 130% do PIB, no final de 2014.

O desafio para a construção de um horizonte de confiança é o apoio às pequenas e médias empresas, é a

salvaguarda do emprego, tão atacado pela tributação a 23% das empresas do setor da restauração, é a

salvaguarda da justiça na tributação do rendimento, é a defesa da casa de morada de família daqueles que

são objeto de execuções e do aumento, sem limite, do IVA.

Acabou o tempo da instabilidade, dos Orçamentos retificativos, do confronto permanente com a

Constituição. Chegou o tempo da construção, da confiança, da justiça e da recuperação do rendimento.

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Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Sr. Deputado Eduardo Cabrita, agradeço as palavras que me

dirigiu.

Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Mortágua.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra das Finanças, nos últimos quatro anos este

País assistiu à arrogância de uma maioria e de um Governo convencidos de que, para além de si mesmo, só

existe o caos. E tudo serviu para convencer o povo de que só há o caos para além da direita. Serviu a

chantagem das agências de rating à Comissão Europeia, às bolsas, ao investimento externo — ainda hoje,

ouvimos aqui esses argumentos —, serviu o engano e serviu a manipulação.

Não nos esquecemos de ouvir a Sr.ª Ministra dizer-nos aqui, nesta Casa, que seria possível um corte de

600 milhões na segurança social. Pois nunca mais, nem em campanha nem na apresentação do Programa,

conseguimos discutir, ou saber, qual é o real plano da direita para a segurança social. Engano e manipulação!

Não nos esquecemos — e a Sr.ª Ministra veio aqui apresentar uma lista de bons indicadores e nós

teríamos os mesmos, mas maus, para apresentarmos, se quiséssemos — como tentaram esconder do País os

dados do desemprego e da emigração, chegando mesmo ao ponto de cortar, e soubemos isso hoje, o

financiamento ao Observatório, que teve a coragem e a ousadia de divulgar os dados da emigração antes das

eleições.

O Sr. Jorge Duarte Costa (BE): — Uma vergonha!

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Quebra de confiança política foi aquilo que o Governo justificou.

Aplausos do BE.

Queriam fazer com os dados da emigração a mesma aldrabice que fizeram com o indicador mensal da

sobretaxa. Antes das eleições, a devolução da sobretaxa era de 35%; no mês a seguir às eleições, os

portugueses ficaram a saber que a devolução da sobretaxa, afinal, era 9,7%.

O Sr. Jorge Duarte Costa (BE): — Bem lembrado!

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Diga, Sr.ª Ministra, qual é, afinal, a previsão dos dados da sobretaxa,

agora que vem apresentar um Programa que sabe que vai ser chumbado e que não será Governo.

A manipulação deste Governo é necessária por um motivo: só a manipulação pode sustentar ilusões. A Sr.ª

Ministra disse-nos aqui, hoje, que a consolidação orçamental não é ideológica. É, sim, ideológica! É ideológica

na dimensão como é feita, no desemprego que causa, na pobreza que causa e a quem causa essa pobreza e

é ideológica na forma como é feita e nas escolhas políticas que se fazem para essa consolidação orçamental.

Vozes do BE: — Muito bem!

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — O Programa que aqui nos apresentam escolhe manter cortes de

pensões e aumento da sobretaxa até 2019 — apesar de o Tribunal Constitucional ter dito que os salários eram

para devolver no próximo ano —, mas, ao mesmo tempo, diminui os impostos sobre os lucros das grandes

empresas em 20%. Isto é ou não é uma escolha ideológica, Sr.ª Ministra? É lógico que isto é uma escolha:

castigar o trabalho e levantar impostos sobre grandes empresas, como aconteceu e como continuará a

acontecer.

A Sr.ª Ministra veio aqui dar-nos lições sobre disciplina, seriedade, verdade… Mas nós também nos

lembramos como este Governo garantiu aos portugueses que o BES não traria 1 cêntimo de custos para os

contribuintes, bem nos lembramos como saiu cara a este Governo a campanha eleitoral antecipada. Agora

sabemos que não só o Novo Banco vai precisar de mais capital, a juntar aos 3900 milhões de euros — e os

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bancos já disseram que não vão pagar esse aumento de capital —, como a fatura do BANIF vai sair mais cara

do que aquilo que se pensava.

Qual é a fatura, Sr.ª Ministra, desta gestão tão disciplinada, destas promessas de que nem o Novo Banco

nem o BANIF trariam custos para os contribuintes?

O Sr. Jorge Duarte Costa (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr.ª Ministra, esta será a última vez que aqui debatemos neste modelo,

e eu não consigo esconder o meu entusiasmo por isso mesmo. Isto não acontece por má vontade do Bloco de

Esquerda, acontece porque mais de 700 000 pessoas deixaram de confiar no seu Governo para defender o

interesse nacional, preferiram confiar noutros Deputados, noutras Deputadas, que têm igual legitimidade para

construir uma alternativa em que a estabilidade não vem da chantagem contra os pobres, em que a segurança

vem da estabilidade dos rendimentos, da devolução dos salários, da estabilidade da dignidade e da

estabilidade que só a esperança pode dar às pessoas.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr.

Deputado Duarte Pacheco.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra das Finanças, começo por cumprimentá-la.

Permita-me que lhe coloque duas questões.

A primeira é a de saber se é verdade ou não que este Governo herdou, em 2010, um défice superior a

11%,…

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Bem lembrado!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — … que Portugal está em vias de ter um défice inferior a 3% e, por isso

mesmo, sair do procedimento por défice excessivo, se isso não significa juros mais baixos para o Estado, para

as empresas, para as famílias e se, por isso mesmo, não seria criminoso que qualquer governo não fizesse o

necessário para que este objetivo fosse alcançado em 2015.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Sr.ª Ministra, gostava de lhe perguntar, concreta e diretamente, se está

em condições de nos garantir que este Governo fará todos os possíveis para que a meta dos 3% não seja

ultrapassada.

Segunda questão: factos são factos. É verdade que o Programa do Partido Socialista apresentado aos

eleitores previa uma dívida superior ao do próprio Governo em mais de 30 000 milhões em 2019. Mas agora o

programa das esquerdas consegue esta coisa espantosa: mais despesa, menos receita e o défice baixa.

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Milagre!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Perante isto que é espantoso, Sr.ª Ministra, vejo aqui três possibilidades.

Primeira possibilidade: o milagre. Sabemos que eles existem. Será que nas contas públicas existem

milagres? Deixo-lhe a pergunta.

Segunda possibilidade: será que o Excel dos socialistas ainda é o mesmo do do Eng.º Sócrates que, antes

das eleições, em 2009, baixava impostos, aumentava salários e que nos conduziu à bancarrota? Porventura,

pode ser uma possibilidade.

Terceira possibilidade: será que, em 2016, os socialistas já estão a prever um crescimento superior àquele

que estava inicialmente previsto, resultado, portanto, da atuação deste Governo e do bom caminho da nossa

economia?

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É porque, Sr.ª Ministra, perante estes cenários e perante estas alternativas, se fosse verdade que menos

receita e mais despesa dá menos défice, proponho que este Plenário aprove a candidatura do PS ao prémio

Nobel da Economia e que se vá pelos cinco cantos do mundo apregoar esta nova novidade. O PS sabe como

se pode fazer melhor, melhor e melhor. Com menos receita, mais despesa e menos défice, o prémio Nobel é

para eles, de certeza.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Para formular pedidos de esclarecimento, antes da resposta

da Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Sá.

O Sr. Paulo Sá (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra das Finanças, este Governo foi responsável pelo

mais brutal e mais profundo ataque fiscal aos rendimentos do trabalho de que há memória.

Por via da redução do número de escalões de IRS, do aumento significativo da taxa de imposto em cada

escalão, incluindo no escalão mais baixo, da limitação das deduções na saúde, educação e habitação e,

ainda, da sobretaxa extraordinária, num só ano o Governo aumentou a carga fiscal que incide sobre os

rendimentos dos trabalhadores em 3200 milhões de euros. Um brutal aumento de impostos que foi

apresentado na altura como temporário, mas que o Governo pretende perpetuar.

Além da promessa de eliminação da sobretaxa extraordinária no longínquo ano de 2019, não encontramos

no Programa do recauchutado Governo qualquer intenção de reverter o colossal aumento de impostos que

incide sobre os rendimentos de trabalho.

Este é um Governo que, tendo sido derrotado pela luta dos trabalhadores e nas urnas, insiste na

perpetuação da política, condena os trabalhadores e o povo português ao empobrecimento e Portugal à

regressão social.

Sr.ª Ministra das Finanças, o Governo afirma não haver folga orçamental para reverter o brutal aumento de

impostos que recai sobre os rendimentos do trabalho, mas já há folga orçamental para reduzir durante seis

anos consecutivos, repito, seis anos consecutivos, a taxa do imposto que incide sobre os lucros das empresas.

Sr.ª Ministra, explique aos portugueses esta opção do Governo de esmagar os trabalhadores com uma

insuportável carga fiscal, ao mesmo tempo que reduz os impostos às grandes empresas e aos grupos

económicos.

Sr.ª Ministra das Finanças, explique, ainda, por que é que na véspera das eleições disse aos portugueses

que iria devolver 35% da sobretaxa de IRS, para logo a seguir às eleições reduzir esse valor para menos 10%.

Reconheça, Sr.ª Ministra, que a ação do Governo assentou, durante estes quatro anos, e continua a

assentar, na mentira e no embuste.

No Programa do Governo, Sr.ª Ministra, não há uma palavra sobre a situação no BANIF e no BES/Novo

Banco. A Sr.ª Ministra não pode sair daqui sem dizer qual vai ser o impacto orçamental e na vida dos

portugueses da situação existente nestes dois bancos.

Por fim, Sr.ª Ministra, aproveite a sua derradeira presença na bancada do Governo para esclarecer os

portugueses sobre a borla fiscal que o Governo deu, recentemente, ao Novo Banco de forma ilegal e obscura.

Pelos nossos cálculos, essa borla fiscal foi de, pelo menos, 445 milhões de euros. Sr.ª Ministra, confirma este

valor?

Sr.ª Ministra, há dinheiro para dar perdões fiscais aos banqueiros, mas não há dinheiro para reduzir os

impostos de quem vive do seu trabalho.

Sr.ª Ministra, onde estão, no Programa do Governo, as medidas para pôr fim às mordomias e benesses da

banca e do grande capital?!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra de Estado e

das Finanças.

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A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Eduardo Cabrita, não me

colocou nenhuma questão, mas, em todo o caso, gostaria de relembrar ao Sr. Deputado que o desempenho

de Portugal em matéria de défice e de dívida é, infelizmente, muito negativo, porque assim o herdámos do

Governo anterior. Basta pensar, Sr. Deputado, num défice de 11,2% que este ano ficará abaixo de 3% para

percebermos quem é que, de facto, tem responsabilidade nesse triste registo que as nossas contas públicas

têm tido.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Quanto aos Srs. Deputados Mariana Mortágua e Paulo Sá, como algumas questões são comuns, opto por

responder a ambos em conjunto.

Relativamente ao custo para os contribuintes do caso do Novo Banco, sugiro que perguntem ao vosso

novo parceiro de coligação, que, aparentemente, terá intenção de pôr dinheiro dos contribuintes no Novo

Banco. Não foi isso que nós fizemos e connosco não é isso que vai acontecer.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos do PCP e de Os Verdes.

Quanto à matéria fiscal, Srs. Deputados, aquilo que temos vindo a fazer é, efetivamente, baixar impostos.

Não é verdade que não se baixem os impostos sobre o trabalho, há uma reforma do IRS que visa,

nomeadamente, aliviar as famílias com dependentes a cargo, sejam descendentes ou ascendentes, e isto é

muito importante para todas as famílias que possam beneficiar. Há a redução do IMI, nas câmaras que

optaram por fazê-lo, também para as famílias com filhos, e esta é uma alteração que beneficia diretamente

quem trabalha.

Sim, Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, nós acreditamos que as empresas criam riqueza, criam emprego,

criam valor para o País. Por isso mesmo é que foi possível baixar o IRC e, ainda assim, aumentar a receita do

IRC, o que só comprova que a nossa estratégia está, de facto, certa. E não vale a pena vir dizer que é para as

grandes empresas e para o grande capital, porque para essas empresas continua a existir a sobretaxa de IRC,

em sede de derrama, que está no Código do IRC, e que não se prevê reduzir em nenhum ponto do nosso

Programa.

As PME beneficiam, já hoje, de uma taxa de IRC mais baixa, de 17%, Sr.ª Deputada. Não é verdade que

estejamos a beneficiar as grandes empresas, agora que acreditamos que baixar a carga fiscal sobre as

empresas, em sede de IRC, é a forma adequada de promover a criação de riqueza e de emprego, sim, Sr.ª

Deputada, acreditamos, e os resultados que estamos a ver quer no crescimento do investimento, quer no

aumento da receita de IRC comprovam que temos razão,…

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Não, não!

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — … por muito que lhe custe a aceitar, Sr.ª Deputada.

No que diz respeito às folgas orçamentais para reduzir outras matérias, Srs. Deputados, aquela que é a

nossa preocupação maior é não andar para trás, é devolver o que pode ser devolvido sem pôr em causa o que

já se conseguiu, porque, como disse na minha intervenção, a última coisa que queremos é voltar à experiência

anterior, de, em cima das eleições, termos um aumento salarial de 2,9% para, três meses depois, nos

cortarem 10%. Não queremos isso! Devolvemos aquilo que puder ser devolvido, para que as pessoas, com

confiança, possam programar o seu futuro e não tenham de sofrer os sobressaltos de andar sempre a pagar

os erros que se fazem.

Sr. Deputado Duarte Pacheco, reafirmamos o nosso compromisso de ter este ano um défice abaixo de 3%.

Seria, de facto, como diz, criminoso que alguém que viesse a tomar conta das finanças públicas antes do final

do ano fizesse alguma coisa para pôr em causa esta meta, porque é em benefício dos portugueses e no

interesse dos portugueses que esta meta será alcançada. É nessas circunstâncias que temos as contas

públicas, com informação transparente e que todos poderão consultar, ou seja, não precisarão apenas de

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acreditar na nossa palavra, há muitas formas de o verificar, de modo completamente independente e

autónomo.

Quanto à questão de saber como é possível fazer esta quadratura do círculo — mais despesa, menos

receita e crescimento —, de facto, Sr. Deputado, na literatura, sou uma apreciadora do realismo mágico, gosto

muito de muitos escritores latino-americanos, mas realismo mágico em cenários macroeconómicos parece-me

um exercício que, para além de não ter nada de lúdico, tem muito de perigoso.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos do Deputado do PS João Galamba.

Mas veremos como é possível conseguir aquilo que não se consegue. Receio, Sr. Deputado, que só será

conseguido no papel, porque a realidade se encarregará de demonstrar que, de facto, não é possível.

Sr. Deputada Mariana Mortágua, diz que «sem nós é o caos», mas espero, sinceramente, que não seja.

Nós somos portugueses, trabalhamos cá, vivemos cá, criamos cá os nossos filhos e tenho muita esperança de

que não seja o caos. Espero, sinceramente, que quem vier a assumir responsabilidades não provoque o caos,

porque não deixaremos de alertar de quem é essa responsabilidade.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Srs. Deputados, iniciamos agora a segunda ronda de

pedidos de esclarecimento à Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Meireles.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, de facto, a

evolução financeira de Portugal nos últimos anos foi muito significativa, mas este é um lado da história, o outro

lado é o de que ela foi também muito, muito difícil.

Aquilo que foi conseguido foi com esforço, com sacrifício e foi, sobretudo, construído com a esperança de

todos os portugueses ou de muitos portugueses. Com a esperança de que era possível ultrapassarmos os

problemas, com a esperança de que era possível não voltarmos a passar por aquilo que estávamos a passar,

com a esperança de que Portugal não estava condenado a ser sistematicamente um País entre os mais

pobres da Europa, um País com crónicos problemas financeiros, um País sempre assolado por instabilidade

ou problemas. Foi essa esperança e é essa esperança que muitos portugueses conseguiram materializar e é

essa esperança que importa não perder agora, porque estamos, de facto, num novo ciclo e, obviamente,

ninguém o questiona, como também ninguém questiona a recuperação de rendimentos.

Aquilo que muitas vezes ouvimos neste Hemiciclo é uma coisa tão absurda que chega a ser inacreditável.

Não há nenhum Governo que tenha prazer em fazer cortes, não há ninguém que tenha prazer em fazer cortes,

muito pelo contrário, todos queremos não apenas a recuperação de rendimentos mas que Portugal tenha cada

vez mais meios, que seja possível não apenas recuperar mas aumentar rendimentos. O que importa é discutir

como o fazemos, para que isso seja para sempre, porque, como a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças

disse, e bem, todos temos na memória momentos de recuperação de rendimentos antes de eleições que

rapidamente se transformaram em cortes de rendimentos depois das eleições.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Nós queremos uma recuperação gradual de rendimentos, porque

queremos uma recuperação de rendimentos para sempre, não queremos uma recuperação de rendimentos

até às próximas eleições. É esta diferença abissal que nos separa!

Importa também dizer que ouvi falar aqui, muitas vezes, ao longo dos últimos anos, em Estado social,

como já ouvi muito neste debate do Programa do Governo. Gostava de lhe dizer, Sr.ª Ministra, que falar é uma

coisa, fazer é outra, completamente diferente. Creio que quem mais defende o Estado social é quem garante

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as condições para que ele continue a funcionar, não é quem muito fala nele, mas, depois, deixa o País no

estado de não conseguir pagar pensões nem salários. Isso não é defender o Estado social!

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Falir o Estado é o maior ataque ao Estado social que se pode fazer, e

isto aconteceu em Portugal!

Por último, Sr.ª Ministra, gostava de lhe dizer o seguinte: podemos discutir aqui se o défice é ou não uma

questão ideológica — certamente, será uma discussão muito interessante —, mas há um facto que é

indiscutível que é o de que ter défice significa que temos despesa do Estado que não é paga com recurso a

impostos e, portanto, o dinheiro para a pagar tem de vir de algum lado. Isto não é uma questão ideológica, é

um facto. Não deixa de ser a suprema ironia que aqueles que, na retórica, mais são contra os mercados sejam

precisamente aqueles que, pelo aumento do défice, mais querem que Portugal continue a depender dos

mercados e do estrangeiro.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Esta é a suprema ironia e é a suprema ironia que muitos partidos, aqui, terão de explicar! Sim, porque fazer

um acordo de Governo e uma coligação de Governo torna necessário sair da posição confortável daqueles

que sempre comentam e sempre criticam para a posição de responsabilidade daqueles que explicam aquilo

que estão a fazer.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Ora bem!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Veremos, então, quem estará à altura das responsabilidades, mas,

neste debate, aquilo que vi foram muitas críticas, muito dizer como deveria ser feito e muito pouco assumir as

responsabilidades sobre como será feito.

A minha questão é muito concreta, Sr.ª Ministra: se nos desviarmos deste caminho que o Programa do

Governo prevê, que é um caminho de recuperação económica — por mais que a retórica queira dizer o

contrário, este caminho é de recuperação económica e de recuperação gradual de rendimentos —, se

voltarmos àquilo que é, para alguns, a festa orçamental e, para outros, o absoluto descontrolo orçamental, o

que é que isso significará, do ponto de vista de andarmos para trás e de podermos estar a pôr em causa não

os rendimentos deste ano mas os rendimentos dos próximos 10 anos?

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr.

Deputado Paulino Ascenção.

O Sr. Paulino Ascenção (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, o desespero com

que a direita se apresenta neste debate, face ao entendimento do PS com os partidos à sua esquerda, faz

lembrar a situação de uma noiva que foi trocada por outra nas vésperas da boda e agora vem exibir a sua

frustração, proclamando que o desejado não vai ser feliz com a esquerda e que só poderia ser feliz com a

direita.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Muito bem!

O Sr. Paulino Ascenção (BE): — Quero também assinalar aqui outro namoro, outra intimidade do Sr.

Primeiro-Ministro com o Presidente do Governo Regional da Madeira.

Para atender à ambição pessoal de poder do Dr. Albuquerque e a pretexto da dívida oculta da Madeira, foi

combinado entre os dois, e aplicado, um plano duríssimo, uma dupla austeridade. Esta foi a região do País

onde ocorreu o maior aumento de impostos e é, atualmente, a região do País onde a taxa de desemprego é

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mais alta. Quem sofreu foram os madeirenses e as responsabilidades pela ocultação da dívida, essas,

continuam por apurar.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Muito bem!

O Sr. Paulino Ascenção (BE): — O Primeiro-Ministro, este ano, já visitou a Madeira por duas vezes, ao

contrário do que sucedeu nos quatro anos anteriores do seu mandato, em que desprezou completamente os

madeirenses e nunca lá pôs os pés.

A Madeira defronta-se com uma dívida enorme e insustentável.

Para 2016, 30% do Orçamento regional serão consumidos pelo serviço da dívida. Não há Orçamento que

aguente nem há serviços públicos que aguentem tamanhos encargos! Este Programa do Governo não diz

nada quanto a este problema. Quanto a renegociação da dívida, é tabu para VV. Ex.as

. Pagar a dívida, sim,

senhor, custe o que custar; salvar a vida das pessoas, isso, não.

Do Governo Regional da Madeira e do PSD da Madeira também não vos chegará qualquer reivindicação a

este nível, como é óbvio. Como o Dr. Albuquerque deve favores ao Primeiro-Ministro, pela ajuda que recebeu

para ascender ao poder, agora, tem de pagar esses favores e a forma de o fazer é estar calado, não levantar

ondas, não defender os interesses da Madeira.

Aplausos do BE.

Outra questão importante, Sr.ª Ministra, é o financiamento do Estado para o novo hospital do Funchal, pois

o Orçamento regional, dado o que já expus, não tem margem para investimento.

O PSD-Madeira, durante a campanha, dava o hospital por construído, só pela circunstância de estar

inscrito no programa eleitoral, o Sr. Vice-Primeiro-Ministro, Paulo Portas, foi à Madeira, em campanha, garantir

que o hospital iria mesmo ser construído, mas agora — pasme-se! — olhamos para o Programa do Governo e

nada diz, constando apenas uma expressão vaga, no sentido de que se vai promover a reavaliação das

prioridades na construção ou ampliação de hospitais.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Pois é!

O Sr. Paulino Ascenção (BE): — Portanto, o novo hospital do Funchal esfumou-se neste Programa do

Governo e o que vale aos madeirenses é que este Governo também se vai esfumar rapidamente.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr.

Deputado José Luís Ferreira, a quem peço desculpa por não ter concedido a palavra anteriormente.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra das Finanças, pelos vistos, não

adianta nada questioná-la sobre a borla fiscal ao Novo Banco porque, decididamente, a Sr.ª Ministra não quer

falar sobre o assunto, o que nos deixa ainda mais preocupados.

Mas diz a Sr.ª Ministra das Finanças que estiveram quatro anos a trabalhar para os portugueses. Sr.ª

Ministra, a verdade é que os últimos quatro anos vão ficar marcados pela mais grave e monstruosa injustiça

fiscal de que há memória.

Vejamos: enquanto, para quem trabalha, o Governo foi aumentando brutalmente os impostos em sede de

IRS para valores, aliás, absolutamente imorais, para as grandes empresas não se cansou de aliviar os

impostos — primeiro, baixou o IRC, de 25% para 23%, e, depois, de 23% para 21% —, uma baixa de

impostos, registe-se, que apenas veio beneficiar as grandes empresas.

Enquanto, para quem trabalha, o Governo não se cansou de reduzir os montantes, em sede de IRS, no que

diz respeito às deduções, seja da educação, seja da saúde, mas também da habitação, para os grandes

grupos económicos e financeiros ofereceu volumosos e imorais benefícios fiscais. Por exemplo, alargaram a

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isenção das mais-valias e dos lucros transferidos para o estrangeiro; reduziram a participação social de 10%

para 5%; e aumentaram o prazo de reporte de prejuízos de 5 para 12 anos.

Enquanto o Governo aplicou uma sobretaxa extraordinária a quem trabalha, não foi capaz de aplicar o

imposto sobre transações financeiras, que estava, aliás, previsto no Orçamento do Estado para 2014 — e

tinha autorização desta Assembleia para o aplicar —, de apenas 0,5%. Para isso, o Governo não foi capaz de

aplicar esse imposto, porque o que interessava era mexer nos rendimentos do trabalho.

Aliás, a carga fiscal sobre quem trabalha e sobre os pensionistas foi de tal ordem que o Governo se viu

obrigado a procurar fórmulas para esconder a real dimensão do embate fiscal. E a fórmula encontrada foi

pagar o 13.º mês em duodécimos, com um objetivo muito claro: para que os portugueses não sentissem o

verdadeiro embate e a exata dimensão da carga fiscal.

Sr.ª Ministra, o Governo diz que a baixa do IRC para as grandes empresas é feita em nome da

competitividade. Mas sabemos, e a Sr.ª Ministra certamente também saberá, que tanto o Banco de Portugal

como o Instituto Nacional de Estatística, nos estudos que fizeram, dizem que os obstáculos ao investimento

nada têm a ver com questões de natureza fiscal.

O grande obstáculo ao investimento chama-se «procura». Se não há procura, não há investimento. E

sabemos por que é que não há procura. Porque o Governo PSD/CDS, na última Legislatura, passou quatro

anos, literalmente, a depenar as famílias. Portanto, não há procura, logo, não há investimento.

Gostaria, Sr.ª Ministra, que pudesse adiantar alguma coisa sobre o balanço que o Governo faz sobre esta

baixa do IRC para as grandes empresas em 5 pontos percentuais. E digo que é para as grandes empresas,

pois sabemos que essa baixa do IRC é apenas para as grandes empresas porque as pequenas e médias

empresas não chegam lá.

Sr.ª Ministra, é curioso que, neste Programa do Governo, não encontremos uma única palavra sobre os

offshore. Parece-nos que não faz muito sentido que haja lugares no planeta que continuem fora da alçada dos

Estados e onde o poder judicial não entra. E, assim, permite-se que enquanto continua a reinar a imoralidade

para uns poderem viver em verdadeiros paraísos fiscais, a generalidade vive num verdadeiro inferno fiscal.

Bem sabemos que isso não depende apenas do Governo português, mas também sabemos que o Governo

português, se quiser, pode colocar a questão e levantar o problema tanto nas instâncias europeias como nos

organismos internacionais de que faz parte.

Uma vez que o Programa do Governo nada refere sobre os offshore, gostaria que a Sr.ª Ministra, se

pudesse, nos dissesse algo sobre este assunto, que é um verdadeiro atentado à moralidade fiscal.

Aplausos de Os Verdes e do PCP.

O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Para formular pedidos de esclarecimento à Sr.ª Ministra de

Estado e das Finanças, tem a palavra o Sr. Deputado Heitor Sousa.

O Sr. Heitor Sousa (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra das Finanças, num debate sobre o Programa

deste Governo, devo começar por confessar alguma frustração pelo facto de me ver forçado a dirigir as duas

perguntas que trago apenas à Sr.ª Ministra das Finanças, Maria Luís Albuquerque.

Na verdade, gostava de poder confrontar estas questões, para além da Sr.ª Ministra, com os outros dois

elementos que, no Governo anterior, configuraram uma verdadeira troica hooliganista, que tentou arrumar a

questão das privatizações das empresas de transporte até ao passado dia 4 de outubro. Falo do ex-Ministro

da Economia, Pires de Lima, e do ex-Secretário de Estado dos Transportes, Sérgio Monteiro.

Seja por não terem tido a coragem de assumir as suas responsabilidades e de se sentarem ao seu lado,

seja por se terem recusado a fazer o papel da recriação histórica da figura de Egas Moniz, qual mensageiro

pronto para o sacrifício — neste caso, com as privatizações ao pescoço —, a verdade é que foram tratar da

sua vidinha aceitando a mão amiga do Estado, restando, por isso, a Sr.ª Ministra para responder a duas

questões muito simples.

A primeira é esta: depois de ter acompanhado o Secretário de Estado dos Transportes numa espécie de

cruzada contra as PPP rodoviárias e de este ter invocado os efeitos negativos que trazem para as finanças

públicas, considera a Sr.ª Ministra que os atuais processos de subconcessão são o quê? São as boas PPP

contra as más PPP — e tivemos o ex-Secretário de Estado a negociar essas PPP do lado dos bancos e, logo

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depois, passaram a ser más PPP — ou teremos a repetição dos contratos swap que a Sr.ª Ministra bem

conhece e que mais não são do que PPP financeiras? Será que temos aqui uma reedição da história do banco

bom e do banco mau?

Isto leva-me à segunda questão: o risco da operação. Sr.ª Ministra, qual é o risco dos privados neste

negócio? Há alguma hipótese de a Avanza vir a receber menos do que está estabelecido nas cláusulas

mínimas de salvaguarda? Poupo-lhe a resposta: não há!

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — Ora viu?!

O Sr. Heitor Sousa (BE): — Como é que se conta esta narrativa dos falsos avestruzes? De forma simples

e como se fosse um motor a dois tempos.

Num primeiro tempo, faz-se o jogo sujo da destruição das empresas, a coberto de um suposto processo de

reestruturação sob a ação de uma brigada hooliganista, colocada à frente dessas empresas, cuja única

preocupação foi a de colocar os seus homens de mão, destruir processos de trabalho consolidados e levar

muitos trabalhadores à demissão, sujeitando-os a um revoltante assédio moral, atirados para alas de empresa,

funcionando como guetos, até assinarem a sua demissão.

Depois, para garantir a segurança máxima no recebimento das rendas, aprovam-se portarias onde estão

penhoradas as receitas dos transportes para os próximos oito anos. Essa será a mínima parte, porque o resto

vem dos pagamentos por disponibilidade, ou seja, pagamentos com um risco nulo, de que se desconhece ao

certo o montante, mas que podem representar, pelo menos, um quarto do total.

Como explica a Sr.ª Ministra que, por exemplo, nas receitas a entregar ao concessionário, uma subida do

gasóleo valha 20% de um fator de correção dessas receitas a entregar ao concessionário?

Como explica, por exemplo, que uma subida do nível geral da remuneração média do trabalho no País

equivalha a uma correção de cerca de 50% do valor a pagar à concessionária pelos chamados «pagamentos

por disponibilidade»?

Se não fosse o hooliganismo radical da fúria privatizadora deste Governo, que, pelos vistos, pretende

estender a empresa pública Infraestruturas de Portugal com as infraestruturas rodoviárias e ferroviárias,

qualquer pessoa que defenda o interesse público só acabará por agradecer a um futuro governo alternativo a

travagem imediata deste saque dos cofres públicos e a gestão pública de um bem que é de todos e ao serviço

de todos.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra de Estado e

das Finanças.

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — Sr. Presidente, Srs. Deputados, muito rapidamente,

começaria por responder ao Sr. Deputado Heitor Sousa que não tenho nenhuma dúvida de que a História se

encarregará de agradecer a quem defendeu o País de uma situação de bancarrota e a quem colocou o País

de volta num roteiro de crescimento.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Quanto à reestruturação das empresas de transportes, Sr. Deputado, depois das múltiplas explicações que

foram dadas neste Parlamento, acho que é tão evidente a necessidade absoluta de reestruturação que essas

empresas tinham que podemos gastar o tempo do nosso debate a explicar outras matérias.

No que diz respeito a uma questão concreta que o Sr. Deputado José Luís Ferreira me colocou e à qual

ainda não respondi, a do imposto sobre transações financeiras, importa, de facto, esclarecer.

Quanto à chamada «borla fiscal» ao Novo Banco, Sr. Deputado, já respondi a isso, até à exaustão. Até já

tivemos uma comissão de inquérito ao processo de resolução do Banco Espírito Santo.

Protestos do PCP e de Os Verdes.

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Sei que a repetição tem os seus méritos, mas, no interesse do tempo, peço ao Sr. Deputado para fazer o

favor de rever as múltiplas vezes em que o expliquei.

Protestos do PCP e de Os Verdes.

Mas, de facto, o imposto sobre transações financeiras é uma questão que importa esclarecer.

Portugal faz parte dos 11 países da área do euro que estão a pôr em prática aquilo a que se chama

«modelo de cooperação intergovernamental» e que permitirá a criação do imposto sobre transações

financeiras nestes 11 países. No âmbito do ECOFIN e do Eurogrupo, tenho participado em reuniões destes 11

países para discutir esta matéria. Inclusivamente, quem está hoje à frente da discussão técnica deste ponto é

um técnico português da REPER que está a colaborar diretamente com a Comissão Europeia para poder levar

este processo por diante.

Portanto, Sr. Deputado, o imposto sobre transações financeiras será posto em prática quando houver

acordo entre estes 11 países, porque é esse o compromisso que temos estabelecido.

Quanto à questão das offshore, aguardo, com ansiedade, para ver, num futuro programa do Governo de

um futuro e hipotético Governo de esquerda, o que é que lá efetivamente aparece.

Ao Sr. Deputado Paulino Ascenção, que questionou sobre o hospital da Madeira, direi que está, de facto,

previsto investimento na próxima legislatura e isso consta do Programa do Governo.

Mas, Sr. Deputado, só para esclarecer, relativamente a essa repetida acusação de que apenas nos

preocupamos com a dívida e com os mercados e não nos preocupamos com a vida das pessoas, é preciso

não perceber que são as pessoas que pagam os desmandos de quem não tem cuidado, de quem não tem a

responsabilidade de assegurar o financiamento.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

E todas as pessoas em Portugal sabem-mo bem demais, Sr. Deputado.

Por último, Sr.ª Deputada Cecília Meireles, relativamente aos riscos de um desvio deste caminho de

expansão, direi o seguinte: neste momento, o que temos é uma situação consolidada. Temos, neste momento,

a esta data, uma margem financeira, uma reserva financeira — um cofre cheio, para que saibam do que eu

estou a falar! — com quase 7800 milhões de euros, que nos permitem fazer face aos reembolsos do próximo

ano, de dívida que foi contraída muito antes de cá chegarmos. Isso, de facto, dá uma grande tranquilidade aos

portugueses.

O desvio desta rota, quando estas margens não acontecerem, teria um preço muitíssimo mais elevado —

aliás, já o pagámos no passado e sabemos muito bem como é.

Quanto à questão da recuperação de rendimentos, fica-me apenas uma dúvida que, eventualmente, o

Partido Socialista poderá esclarecer: se é possível repor os salários da Administração Pública conseguindo até

melhor resultado no défice, por que é que o PS não começou por o prometer? Por que razão é que, se era

possível, não o fizeram logo de início? E somos nós que temos problemas ideológicos, Srs. Deputados?

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Mário

Centeno.

O Sr. Mário Centeno (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as

e Srs. Deputados: Depois do que

observámos nos últimos quatro anos, a forma mais simples para definir a visão da economia apresentada no

Programa do Governo é a do cinismo em forma de vazio.

O Programa do Governo é uma mão cheia de nada e outra de coisa nenhuma. Não há compromissos, por

exemplo, acerca do salário mínimo; é vago no que se diz acerca da Europa; tem poucos números e os poucos

que tem não estão certos.

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A dívida pública, no final de 2015, estará em 125% do PIB, Sr.ª Ministra das Finanças? Já vendeu o Novo

Banco? Ou terá o Dr. Sérgio Monteiro, com a sua remuneração milionária — mais uma saída limpa —, vendido

o Banco na semana passada sem que de tal nos tenhamos dado conta?

Aplausos do PS e do BE.

Sr. Primeiro-Ministro, falta a troica ao seu Governo. Durante quatro anos, com a desculpa da troica,

instrumentalizaram as instituições da República, viveram na ditadura do «não há alternativa». A direita

portuguesa sempre confundiu a fiscalização democrática com forças de bloqueio. Pretende «suspender a

democracia».

Recorro a uma brilhante frase de Mia Couto para o Governo de que agora nos despedimos: «A diferença

entre a recessão e a expansão é que na recessão os pobres são os primeiros a perder; na expansão os

pobres são os primeiros a não ganhar».

Aplausos do PS.

Por isso temos hoje um País mais pequeno. Somos menos. Desde 2011 emigraram 350 000 portugueses.

No terceiro trimestre de 2015, perdemos mais 55 000 portugueses trabalhadores.

Voltei a ouvir a voz de Adriano Correia de Oliveira: «Este parte, aquele parte, e todos, todos se vão». Hoje,

temos um País mais pobre.

Protestos do Deputado do PSD Carlos Abreu Amorim.

Quase 1 milhão de portugueses recebem o salário mínimo, um salário mínimo degradado. Mas os outros

portugueses com trabalho também viram os seus rendimentos cair, uma realidade que este Governo tentou

esconder para justificar o corte no salário mínimo. Sim, porque num ato de propaganda «vendeu» ao FMI um

gráfico de onde eliminava os portugueses cujo salário tinha sido cortado em mais de 5%. Meus Senhores,

mais de 25% de todos os trabalhadores foram eliminados desse gráfico. Não é assim que se faz política na

Europa.

Aplausos do PS.

Sr. Primeiro-Ministro, ontem queixou-se de que a austeridade lhe tinha sido imposta, mas a austeridade,

quando é ideologia, é uma escolha, um destino para si.

Foi, ou não, o Sr. Primeiro-Ministro que se lamentou recentemente por apenas ter falhado na redução dos

custos salariais? Isto é austeridade ou é redenção?

Aplausos do PS.

Mas a vontade destruidora não se ficou pelo mercado de trabalho. Os milhares de pequenas empresas que

fecharam nos últimos quatro anos são disso testemunho. Lamento dizer-lhe, Sr. Primeiro-Ministro, mas estas

empresas não tiveram uma saída limpa. Foram empresas para quem o seu liberalismo significou aumentos de

impostos e das rendas energéticas, fechando-lhes o mercado nacional apenas por uma crença de que o

pecado morava aqui.

Por isso é que entre 2013 e 2015 as importações de bens de consumo cresceram 30% — as importações

— e a produção interna destes bens dirigida ao mercado nacional caiu — caiu, ouviram bem — 5,3%. Hoje, as

importações estão em máximos históricos, mas a economia é mais pequena.

Os tiques de autoritarismo que revelou ao longo destes últimos anos não os perdeu no dia 4 de outubro.

Apenas, porque foi a isso obrigado, encenou uma farsa a que gosta de chamar «negociação».

É falso, repito, é falso que o Partido Socialista não se tenha disposto a saber mais acerca das vossas

intenções programáticas. Confrontados com 58 perguntas, não responderam a nenhuma.

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Aplausos do PS.

E continuamos sem encontrar respostas no documento a que chamam «Programa de Governo».

Os senhores deixaram o sistema financeiro inoperante, os bancos descapitalizados e incapazes de apoiar

o investimento, o incumprimento bancário das famílias e empresas nos níveis mais altos de toda a história da

democracia portuguesa.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

Menos de um mês depois do maior embuste político e económico montado em Portugal com a saída limpa,

em maio de 2014, caía com enorme estrondo o segundo maior banco privado português. Em nenhum outro

sistema financeiro de um país europeu se viu tamanha irresponsabilidade, mas o Sr. Primeiro-Ministro e a Sr.ª

Ministra das Finanças não tiveram nada a ver com isto.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Afinal, era apenas o Governo, e estava a prazo. Estavam mesmo, Meus Senhores. A maioria nesta

Assembleia não é vossa.

Aplausos do PS.

Srs. Deputados, a ideia de Europa que trazemos connosco é a de uma Europa solidária, em que os países

não se segmentam pelo rendimento, mas interagem por um ideal comum de prosperidade e direitos cívicos.

Portugal regrediu nos indicadores de pobreza, de exclusão social, de precariedade laboral, de emprego mal

remunerado, de educação. Portugal perdeu Europa nos últimos quatro anos.

O Programa do Governo que hoje despedimos com justa causa não resolve estes problemas.

Aplausos do PS.

O Partido Socialista considera que a economia só pode crescer num contexto de responsabilidade

financeira e no cumprimento das suas obrigações. O Partido Socialista assume as suas responsabilidades

europeias e honrará todos os compromissos do País.

Portugal precisa de outra política.

Portugal terá outra política.

Aplausos do PS, de pé.

Entretanto, reassumiu a presidência o Presidente, Ferro Rodrigues.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Mário Centeno, aproveito para o cumprimentar pela sua primeira

intervenção neste Plenário e informar que não tem pedidos de esclarecimento.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado André Silva.

O Sr. André Silva (PAN): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs.

Deputados e Sr.as

Deputadas e demais presentes na Sala: Da leitura que fiz do Programa do Governo,

gostava de abordar um aspeto que se prende com a proteção de menores e sobre uma certa violência que é

exercida sobre crianças, ou seja, a violência que é praticada na tauromaquia.

A classificação etária de espetáculos é meramente indicativa, pelo que não garante a proteção efetiva das

crianças e o cumprimento da Declaração dos Direitos da Criança.

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Além disso, têm acesso às bancadas das praças de touros crianças de todas as idades, incluindo menores

de três anos, em clara violação com o disposto no artigo 26.º do Decreto-Lei n.º 23/2014, de 14 de fevereiro,

que assistem a inúmeros episódios de grande violência não só com animais, cavalos e touros, mas também

com os artistas.

O regime de acesso e de exercício da atividade de artista tauromáquico e de auxiliar de espetáculo

tauromáquico, que estabelece o limite mínimo de 16 anos para tourear, abre uma exceção para a atuação de

forcados e amadores de todas as modalidades, permitindo a participação de menores de idade, mediante uma

autorização da Comissão Nacional de Proteção de Crianças e Jovens em Risco.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, já ultrapassou o tempo que lhe estava atribuído.

O Sr. André Silva (PAN): — Termino, Sr. Presidente, dizendo que a exceção foi criticada pela própria

Amnistia Internacional, através do Cogrupo sobre os Direitos das Crianças, que considerou que este diploma

viola a Convenção sobre os Direitos das Crianças.

Aplausos de Deputados do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Vice-Primeiro-Ministro.

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro (Paulo Portas): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Cumprimento o Sr.

Presidente, os membros da Mesa e todos os parlamentares que iniciam funções nesta Legislatura, uma

Legislatura, já todos o percebemos, absolutamente invulgar.

Comecemos exatamente por aí.

No espaço de um mês, que é quase nada no tempo histórico, foram decapitadas e reduzidas a pó todas as

convenções que permitiram, ao longo de 40 anos, um código de vida em comum nesta Câmara, um acervo de

regras de tolerância mútua e cordialidade democrática entre todos e para todos a benefício das instituições e

da sua fidelidade ao povo,…

A Sr.ª Conceição Bessa Ruão (PSD): — Muito bem!

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — … um conjunto de convenções simples, mas sábias, escritas ou

praticadas, mas nunca antes ignoradas ou subvertidas que permitiram ao longo dos tempos ao regime

funcionar, aos governos governar, às oposições fiscalizar, cada qual na decorrência linear da vontade popular,

que é o primeiro fundamento para todos aqui estarmos.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Dir-se-á — e um conservador não tem dificuldade em admitir isso — que as tradições evoluem e que as

sociedades mudam. Nada mais certo. Mas, como provam as melhores democracias do mundo — e um

progressista não devia ter dificuldade em reconhecer isso —, as regras das instituições devem ser estáveis e

devem ser perenes. Uma convenção não é uma mera tradição que o tempo pode transformar em objeto de

museu ou curiosidade exótica. As convenções são o vade mecum das instituições, garantem que cada um tem

a sua função e que nenhuma é exercida em contramão do povo, que é o soberano.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A todas e a todos se aplicam tanto na vitória como na derrota e nelas todos se comprometem tanto em

maioria como em minoria.

Há um mês o povo votou. Um mês depois, o funcionamento das nossas instituições tornou-se

irreconhecível. Quebraram-se, pelo menos, cinco convenções que nada tinham de superficiais ou acessórias.

Em primeiro lugar, a convenção de que quem ganha as eleições governará o País.

Em segundo lugar, a convenção de que quem tem mais Deputados preside à Câmara.

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Em terceiro lugar, a convenção de que um Governo saído de eleições tem o benefício da dúvida e vê o seu

programa não rejeitado.

Em quarto lugar, a convenção de que o nosso regime é semipresidencial de jure, não é meramente

parlamentar de facto.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — Em quinto lugar, a convenção de que um país do euro não coloca o

epicentro da governabilidade na dependência de partidos ou coligações que legitimamente não acreditam no

euro ou que querem sair do euro na primeira esquina.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Quebrar tudo isto pode satisfazer os que acham que estão a experimentar o seu peculiar 1917 ou a viver o

que julgam ser o seu privativo assalto ao Palácio de Inverno.

Risos do PS.

Com todo o respeito, a esmagadora maioria dos portugueses não votou em nenhuma dessas aventuras no

dia 4 de outubro.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Recorrendo ao direito à indignação, é preciso dizer que esta instrumentalização das instituições para servir

objetivos de curtíssimo prazo e com natureza de fação é matematicamente possível, até pode ser formalmente

constitucional, mas é, seguramente, politicamente ilegítima.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Essa ilegitimidade consiste em impedir que governe a maioria relativa que venceu as eleições para forçar

um Governo da minoria relativa que perdeu as eleições.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O povo não se reconhece nesta fratura,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Como é que sabe?

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — … muitos democratas com opções de voto diferentes estão horrorizados

ou simplesmente angustiados com as consequências. Os que sabem alguma coisa de História percebem que

o eixo da roda do regime mudou, deixando de estar levemente à esquerda do centro ou levemente à direita do

centro para aterrar vertiginosamente à esquerda da esquerda e claramente na periferia ou até em oposição às

opções internacionais fundamentais que caracterizam o Portugal livre, democrático e europeu.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Adelino Amaro da Costa dizia, e bem, que os moderados se servem da mudança para evitar a rutura. O

caminho escolhido pelo Secretário-Geral do Partido Socialista foi exatamente o oposto: não aceitou a derrota;

não tirou da derrota qualquer consequência; não negociou de boa-fé com quem, por acaso, até venceu as

eleições;…

O Sr. Carlos César (PS): — Não é verdade!

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O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — … dissipou a possibilidade de marcar, com as suas ideias ou propostas,

uma maioria de compromisso; preferiu pôr o País insolitamente à espera do comité central do PCP, agora, e,

se calhar, nos tempos que aí vêm!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Só o PCP?!

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — Desperdiçou a oportunidade de dar aos portugueses o sossego e a

esperança de pôr o Governo, esse, sim, legítimo, na dependência razoável do que para os socialistas fosse,

em cada momento, aceitável. E, curiosamente, neste debate, que serviu como primeiro debate daquilo que

tem designado como «novo paradigma», o Secretário-Geral do Partido Socialista não deu o corpo ao

manifesto, revelando até onde a ferida da ilegitimidade o assusta e até onde o retrai a perceção de que a

vontade real do povo foi defraudada pela vontade declarada dos diretórios.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Do que não há memória, ninguém conhece o fim. Mas recomenda a prudência e até o facto de ser o líder

partidário há mais tempo em funções que vos deixe algum pressentimento do que este experimentalismo

encerra. Quebrar todas as convenções sem propor outras que, prestável e legivelmente, as substituam é uma

imprudência, mas abre um precedente. Não consigo acreditar ainda naqueles que acusam o Secretário-Geral

do Partido Socialista de ter sido subitamente acometido por uma espécie de «síndrome de Gusmão»: antes

primeiro-ministro por uns tempos, do que líder da oposição para toda a vida!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Mas, se isso for verdade, então um dia acabará por suceder-lhe manobra igual ou semelhante e de tão alto

cairá como a tão alto se quis guindar sem que para tal o povo o elevasse.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

E é até possível que isso suceda pela mão dos que o ajudaram, perante a impassível coerência dos que

agora estão a submeter-se a escrutínio porque ganharam as eleições. Podem os senhores concordar ou

discordar, mas sejam, ao menos, consequentes. O Secretário-Geral do Partido Socialista escolheu o caminho,

repito, do que é matematicamente possível, do que é formalmente constitucional, mas do que é politicamente

ilegítimo. Escolheu, também, os seus companheiros de viagem. Se esse caminho prevalecer, conte apenas

com a nossa coerência.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — E, se mais à frente, se vir aflito, se mais adiante não conseguir gerir a

pressão explosiva — podem crer que será explosiva — da demagogia em competição entre o BE e o PCP, de

um lado, e do realismo e dos compromissos em Bruxelas, do outro, não venha, depois, pedir socorro.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Para nós, com respeito pessoal, mas com frontalidade política, será, se o conseguir ser, um primeiro-

ministro politicamente ilegítimo e é tamanha a irresponsabilidade do que está a fazer que terá de resolver os

seus problemas com a frente dos perdedores.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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Nós já fomos os bombeiros do vosso resgate, duas vezes.

Vozes do PSD e do CDS-PP: — Uma grande verdade!

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — É verdade!

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — A vossa conduta assemelha-se à dos pirómanos do regime. Não

seremos cúmplices dessa consequência!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A vós pode bastar — e parece que basta — o conchavo dos diretórios. Por nós, basta a legitimidade que o

povo nos deu.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, para além da questão da legitimidade, há outras duas que merecem

uma anotação breve: a da estabilidade e a da confiança.

Da estabilidade — nós, que ganhámos as eleições mas que não dispomos de maioria absoluta,

procurámos a estabilidade dentro da coerência dos fundamentais, com cedências, com transigências, com

compromissos, com abertura e, sobretudo, com disposição positiva de compromisso.

Pedirei emprestada a Vasco Pulido Valente a definição da vossa manobra: não é bem um governo, é uma

geringonça!

Risos do PSD e do CDS-PP.

Não é uma coligação — isso já se viu! —, tão-pouco será um acordo, porque haverá vários. Supõe-se que,

para haver vários, é porque nenhum será exatamente igual; se nenhum for exatamente igual, é porque as

partes não se comprometem da mesma forma. É tal a dificuldade em conciliar o inconciliável que até nas

moções de rejeição tiveram dificuldade em fazer uma só.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

E todos percebemos que nos modos parlamentares vos custa muito aplaudirem-se uns aos outros,…

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

… embora dizendo isto estou, certamente, a favorecer que o Dr. António Costa, quando já não houver

ocasião para lhe fazer perguntas, mereça uma salva de palmas.

Risos do PSD e do CDS-PP.

Será muito curioso verificar o que diz a tal posição comum entre o PS e o PCP. Contém uma obrigação de

viabilização dos orçamentos, dos programas de estabilidade ou das regras do tratado orçamental? Logo

saberemos, porque é aí que está o cerne da estabilidade.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Está mortinho por saber!

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — Obrigação de procurar apoio previamente teria qualquer governo sem

maioria absoluta, mas uma obrigação de resultados e de viabilização é o que se esperaria de uma maioria que

não fosse meramente negativa, porque só isso contém os elementos suficientes de estabilidade e de

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consistência. Se houvesse tal, o PCP teria deixado de ser quem é, embora para tal o PS parecesse disponível

a deixar de ser tudo o que foi.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Porém, se ainda tardam em mostrar o acordo político, é porque alguma fragilidade terá. Temo que a

geringonça deixe Portugal, a sua credibilidade, a sua economia, a sorte dos nossos compatriotas, à mercê das

reuniões semestrais do comité central na Soeiro Pereira Gomes,…

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

… inteiramente respeitável, mas que estranha ironia no século XXI!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Da confiança — o anterior Governo foi o da superação do resgate e do fim da troica. Com o extraordinário

esforço dos portugueses e a inestimável ajuda, nunca suficientemente agradecida, ao País e aos portugueses,

dos parceiros sociais e dos parceiros da economia social.

O Governo, cujo Programa vai hoje a votos, é o da recuperação gradual de rendimentos, gradual para ser

viável; é o da moderação progressiva dos impostos, progressiva para ser possível; é o da aposta no

investimento e nas exportações, como vanguarda de uma economia saudável, sem desprezar, como os

números já indicam, a parcela do consumo. Em alternativa, o que a vossa geringonça nos oferece é uma

espécie de bebedeira de medidas, tudo a correr e, de preferência, ao mesmo tempo. Ora, como todos

sabemos, as bebedeiras têm um só problema, chama-se ressaca.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Jorge Duarte Costa (BE): — A vossa ressaca!

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — O que têm para apresentar é exclusivamente orientado para o consumo.

Ora, essa é uma ilusão de curto prazo, que não chega para fazer de Portugal um País próspero.

O que o vosso projeto não contabiliza é o poderoso impacto que a desconfiança pode ter no crescimento a

prazo, no investimento mais depressa, e, portanto, na criação de emprego, que é o primeiro desiderato de

todos.

Em globalização, a confiança evapora-se, porque há outros países preparados para receber a confiança

que nós perdermos. Em globalização, o investimento e, portanto, o emprego deslocalizam-se num instante,

porque há outros países preparados para receber o investimento e o emprego que nós perdermos.

Acresce que, na retórica que nos trazem, haverá uma Europa nova à espera de uma nova política. E eu,

que vejo a Europa «engripada» na crise dos refugiados, ameaçada pelo fenómeno do terrorismo, em risco

pelo referendo no Reino Unido, duramente testada pelo que sucedeu na Grécia, apenas para citar a agenda

previsível, lamento dizer-vos, mas não vejo muito espaço para compreender um Portugal que seja reincidente

nos défices excessivos e no descontrolo da dívida pública.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — Pode ser que me engane e desejo estar equivocado, mas vejo na vossa

retórica mais a ilusão do primeiro SYRIZA do que o choque de realidade do segundo SYRIZA.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Estou absolutamente preocupado com o dano de credibilidade que tudo isto pode fazer ao nosso País e ao

nosso povo.

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Protestos do PS.

Ontem, ao ler um título internacional, cito, «Portugal, a nova Grécia?», arrepiei-me.

Protestos do PCP.

Sr.as

e Srs. Deputados do PSD, do PS, do CDS e do PAN, estávamos, estamos, muito perto de conseguir.

Deitar tudo a perder é deitar fora os sacrifícios que tantos portugueses fizeram. Hoje, tendes a oportunidade

de viabilizar um governo que é politicamente legítimo. Aguardamos, serenamente, a vossa decisão. E porquê?

Porque, a nós, o eleitorado já julgou; a alguns de vós, a História julgará.

Aplausos, de pé, do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — O Sr. Vice-Primeiro-Ministro tem duas inscrições para pedir esclarecimentos, que

serão respondidos em conjunto.

Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Leite Ramos.

O Sr. Luís Leite Ramos (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Vice-Primeiro-Ministro, Portugal, e lembrou-o há

pouco, percorreu nos últimos quatro anos um caminho difícil, exigente, mas de esperança. Deixou para trás a

pré-bancarrota socialista, a troica e um programa draconiano de assistência financeira, sem programa

cautelar, sem segundo resgate, sem espiral recessiva e reencontrou o caminho da retoma económica, da

estabilidade política e da confiança internacional que permitiu devolver aos portugueses a esperança no futuro.

Os sinais inequívocos de recuperação económica multiplicam-se. A economia voltou a crescer e a ter no

seu horizonte ainda melhores perspetivas de crescimento.

As exportações das empresas portuguesas batem recordes; o desemprego caiu para taxas inferiores às de

2011; os índices de confiança dos consumidores, dos empresários e dos investidores aumentaram, estando

hoje em níveis que o País se desabituara durante mais de uma década. Mas, apesar dos enormes progressos

registados, Portugal continua a ter diante de si desafios muito complexos e perante os quais não pode haver

nem adiamentos, nem retrocessos. Se não queremos desbaratar os sacrifícios dos portugueses e arriscar tudo

o que o País conseguiu nos últimos quatro anos, temos de enfrentar e vencer esses desafios. E há um desafio

em particular que merece especial atenção, aliás, como o Sr. Vice-Primeiro-Ministro fez questão de o sublinhar

na sua intervenção, que é o da credibilidade e da confiança de Portugal perante os seus parceiros

internacionais, perante os mercados e os investidores, perante os seus credores e financiadores.

V. Ex.ª conhece bem o valor incomensurável desta credibilidade e desta confiança internacional, porque

sabe quão difícil foi recuperá-la e sabe, também, quão fácil é perdê-la. Por isso, pergunto-lhe o que fará o

Governo para preservar, consolidar e valorizar esta credibilidade e confiança, ou, melhor, o que não pode,

nem deve, fazer para não destruir e lançar de novo o País nas mãos de uma qualquer troica e pedir, de novo,

um novo resgate.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos César.

O Sr. Carlos César (PS): — Sr. Presidente, Sr. Vice-Primeiro-Ministro Paulo Portas, os portugueses já

estão habituados aos seus exercícios lúdicos à volta dos temas políticos e das soluções de governo, mas

perguntar-se-ão hoje, nas suas casas, ao ouvi-lo, se V. Ex.ª terá ou não um défice de perceção política sobre

o que realmente se passou nas últimas eleições.

Risos do PSD e do CDS-PP.

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É que, Sr. Vice-Primeiro-Ministro, nós, socialistas, sabemos o que valemos, sabemos quantos somos. V.

Ex.ª, como líder do PP, sabe apenas que o seu partido é uma presunção, mas não sabe se é uma realidade.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Os portugueses interrogam-se, também, sobre aquilo que aludiu como «pressão explosiva do PCP, do

Bloco de Esquerda e de Os Verdes», e os portugueses, em casa, pensarão: mas este nosso Vice-Primeiro-

Ministro não terá também um défice de memória?! Pressão explosiva maior não foi aquela que V. Ex.ª

desenvolveu na Legislatura que agora terminou?!

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Carlos César (PS): — Perigo maior não foi para os investidores e para os mercados aquilo que o

senhor então fez?! É que a espera pela decisão do Comité Central do PCP provocou menos prejuízos nesses

sectores do que a perturbação que o senhor introduziu quando estava no Governo.

Aplausos do PS, do BE e do PCP.

E, por fim, Sr. Vice-Primeiro-Ministro, os portugueses, nas suas casas, pensaram assim: mas como pode

ele dizer, se o governo de Portugal estiver em dificuldades, «não venham cá pedir socorro»?!

Risos do PSD.

É como quem diz: ou estamos no governo, ou vai tudo abaixo! Prometemos ressaca!

Aplausos do PS.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

É esse o seu último défice, o seu défice é a falta de sentido do interesse nacional.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD e do CDS-PP, tendo alguns Deputados batido com as mãos nas bancadas.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, a conjugação de apartes faz com que não se consiga perceber

nenhum deles.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — É uma anedota!

O Sr. Presidente: — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Filipe Lobo

d’Ávila.

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Vice-Primeiro-Ministro, é verdade que este

debate vai longo e, até aqui, faz lembrar-me uma outra história, a história do sapo e do escorpião.

Nessa outra história — mais lúdica, é verdade, Sr. Deputado Carlos César —, pede o escorpião ao sapo

que o leve até à outra margem do rio. Responde o sapo, dizendo que não, que não o levaria até à outra

margem, com receio de levar uma picada mortal. Fazendo mil juras de que não o picaria, o escorpião acaba

por convencer o sapo, picando-o, mesmo ao chegar à outra margem. E perante o porquê, em sofrimento, do

sapo, responde o escorpião: está na minha natureza.

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Risos.

Sr. Vice-Primeiro-Ministro, neste debate já percebemos que o PS faz de sapo.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Só falta saber…

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Quem é o escorpião!

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — … quem será o escorpião, se o Bloco de Esquerda, se o PCP, se

até o próprio Partido Socialista, ou mesmo os três ao mesmo tempo.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Sr. Vice-Primeiro-Ministro, com o esforço dos portugueses, Portugal atravessou já para a outra margem.

Portugal cresce economicamente mais do que a zona euro, a confiança dos consumidores subiu a níveis do

princípio do século e o desemprego desce, de forma lenta e consistente.

O Sr. João Oliveira (PCP): — O desemprego desce de forma lenta e consistente?!

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — A pergunta que eu gostaria de fazer, Sr. Vice-Primeiro-Ministro, é

curta e clara.

No passado fim de semana ouvimos o Sr. Deputado António Costa fazer acusações ao CDS, dizendo que

o CDS tinha mudado de posição sobre a Europa em 24 horas para poder entrar naquele que seria o governo

do Primeiro-Ministro Durão Barroso. Mas disse mais, disse, também, que o acordo das esquerdas, este

aparente acordo das esquerdas, teria a mesma legitimidade que o acordo pós-eleitoral de 2011.

Sr. Vice-Primeiro-Ministro, eu gostaria que comentasse,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Que comentasse?!

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — … esclarecendo aqueles que, como é demais evidente, falam, de

facto, sem conhecerem o que é o CDS.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Vice-Primeiro-Ministro.

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Ramos, a função deste Governo é

preservar a confiança que foi conquistada. Essa confiança considera hoje Portugal um país de referência do

ponto de vista da superação de um resgate e de uma crise financeira e económica — crise associada a esse

resgate e, evidentemente, consequência dele —, como aquela que nós vivemos.

A confiança manifesta-se nos indicadores que são conhecidos. Os melhores indicadores de confiança,

desde 2001, é o dos consumidores, não é preciso nenhum choque de consumo. Os melhores indicadores de

confiança nos empreendedores, desde 2008, revela-se no crescimento do investimento, que é, porventura, o

indicador mais crítico para a economia portuguesa, e na transformação que sofreram, de uma forma virtuosa,

as nossas empresas que se viraram para o exterior quando detetaram demasiada recessão ou estagnação

nos mercados tradicionais, o interno e alguns europeus.

Hoje, as exportações representam 43,5% do PIB a preços constantes; há uns anos, representavam 28%.

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Tudo isto é mais fácil pela confiança e tudo isto fica em risco com a desconfiança. Apenas quero dizer, em

nome daquilo em que acredito, que um governo que fique dependente dos estados de alma do Partido

Comunista Português não inspira confiança à economia, ao investimento e à criação de emprego.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos do Deputado do PCP João Oliveira.

Ao Sr. Deputado Carlos César quero começar por corrigi-lo levemente, saudando, naturalmente, a sua

eleição para essa função.

Diz o Sr. Deputado: «Nós, os socialistas, sabemos quantos somos, o senhor, o que sabe é que o seu

partido é uma presunção». Bem, contados os votos no dia 4 de outubro, nós, coligação, somos 38,5%;…

O Sr. Carlos César (PS): — Com o CDS-PP!

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — … VV. Ex.as

, Partido Socialista, são 32%. Ou seja, nós ganhámos e não

foi por poucochinho. VV. Ex.as

perderam e não foi por poucochinho.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — Havia de ter ido a votos!

O Sr. Carlos César (PS): — Isso é com o CDS!

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — Mas se querem comparar os blocos políticos, então, tenham a humildade

de avisar o povo…

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — … e, da próxima vez, candidatemo-nos, nós, em coligação e, vocês, em

frente esquerda e vamos ver quem ganha! Vamos ver quem ganha!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Já agora, Sr. Dr. Carlos César, Sr. Presidente do Grupo Parlamentar, quero dizer-lhe o seguinte: sim, esta

coligação teve problemas difíceis, como tem qualquer coligação, e os senhores já fizeram várias. Sim, nós

superámos os problemas difíceis que tivemos. Sim, esta coligação foi a primeira a terminar o seu mandato e a

candidatar-se, enquanto tal, ao mandato seguinte. Sim, esta coligação orgulha-se de ter recebido o voto

maioritário do povo português, frase que os senhores não podem dizer.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Por fim, permita-me uma levíssima correção. Diz o senhor «ou somos nós a governar, ou vai tudo abaixo».

Eu peço muita desculpa, mas a atitude do Partido Socialista, que faz lembrar aqueles meninos que só jogam

futebol se a bola for deles, é esta: nós perdemos, mas ou somos nós a governar ou não governa quem o povo

quis escolher!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Ao Sr. Deputado Filipe Lobo d’Ávila quero apenas agradecer a oportunidade de clarificar, porque achei

estranho. Eu conheço o Secretário-Geral do Partido Socialista há muito tempo e achei estranho que ele

utilizasse argumentos que não têm sustentabilidade nos factos.

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Sim, o CDS defendeu um referendo ao Tratado de Maastricht e, a meu ver, logicamente, porque foi o

Tratado que mudou a natureza da construção europeia.

Protestos do BE e do PCP.

Sim, o CDS teve posições eurocéticas.

Não, e é radicalmente falso que tenha mudado de opinião ou tenha evoluído na sua posição para poder

obter, como o senhor disse, lugares no Governo de Durão Barroso.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — Porquê, Sr. Deputado? Porque a revisão da posição do CDS nessa

matéria foi feita em 1998. Eu candidatei-me a líder do CDS para recentrar a posição do Partido na Europa,

para aceitar a moeda única antes de ela começar. Houve congressos, houve moções, houve votações, houve

vencidos e vencedores, houve até dissidências. É o que acontece num partido democrático.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Claro!

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — A frase que sai do congresso, quatro anos antes e duas eleições antes

do Governo de Durão Barroso, é esta: «O CDS respeitará a moeda única e não proporá a saída de Portugal

da moeda única»!

O senhor, nas negociações que anda a fazer, não consegue o mesmo — agora, sim, em 24 horas! — nem

do Partido Comunista Português, nem do Bloco de Esquerda.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Escusava de ter feito uma elipse na argumentação, porque não lhe fica bem — pura e simplesmente, quem

consulte os documentos, sabe que não foi assim.

Mas, em qualquer caso, para terminar, Sr. Deputado, há realmente, como já aqui tem sido sugerido, duas

pequenas — pequenas do ponto de vista daqueles que acham que ganharam as eleições, tendo, por acaso,

perdido — diferenças substanciais entre 2011 e 2015. Em 2011, quem formou governo foi o partido que

venceu as eleições. Em 2015, o que o Partido Socialista quer é que o governo seja formado por aqueles que

perderam as eleições.

Protestos do PS.

Não estou a dizer mais do que isto, que é inteiramente legível.

Mas, mais, é que, em 2011, por causa do resgate que vocês pediram, por causa da troica que vocês

chamaram, por causa do Memorando que vocês assinaram, tanto o PSD como o CDS disseram ao povo

português que estavam disponíveis para fazer uma coligação a seguir às eleições.

Diga-me um momento — exceto no tal Partido Livre, que não elegeu ninguém — em que os três líderes

dos três partidos da frente esquerda, ou da geringonça, tenham dito ao povo português previamente que iam

fazer uma coligação.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

São duas diferenças, e não são pequenas. Forma governo, como sempre aconteceu em 40 anos, quem

ganhou as eleições. E as coligações foram previamente admitidas pelos dois partidos que as podiam formar.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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O Sr. Presidente: — Srs. Deputado, informo a Câmara que, de acordo com o Regimento, as moções de

rejeição teriam de ser entregues até ao final do debate, o que já sucedeu.

Foram entregues quatro moções de rejeição do Programa do XX Governo Constitucional, a saber: a moção

de rejeição n.º 1/XII (1.ª), apresentada pelo PS; a moção de rejeição n.º 2/XIII (1.ª), apresentada pelo BE; a

moção de rejeição n.º 3/XIII (1.ª), apresentada pelo PCP; e a moção de rejeição n.º 4/XIII (1.ª), apresentada

por Os Verdes, que, certamente, já foram todas distribuídas.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro da Modernização Administrativa.

O Sr. Ministro da Modernização Administrativa (Rui Medeiros): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs.

Deputados: Antes de mais, gostaria, nesta ocasião em que me dirijo ao Parlamento pela primeira vez, de

cumprimentar, de forma sincera, os membros desta Assembleia da República e formular votos de bom

trabalho na Legislatura que agora se inicia.

Cabe-me apresentar as linhas gerais e orientadoras da estratégia do novo Governo para a área da

modernização administrativa. Estamos a falar de uma das prioridades políticas que consta do programa

eleitoral da coligação Portugal à Frente.

O programa, sufragado nas urnas no passado dia 4 de outubro, assume expressamente como um dos

desafios fundamentais para a nova Legislatura a promoção da eficiência da Administração, de forma a torná-la

mais próxima dos cidadãos e mais amiga das empresas.

Não se trata de um chavão político desprovido de conteúdo. A política de modernização administrativa

deve ser um instrumento focado e orientado para a resolução dos problemas concretos com que as pessoas e

as empresas se deparam diariamente na sua relação com a Administração. Justamente por isso, é uma

prioridade política.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Antes de prosseguir, porém, não posso deixar de sublinhar aqui, nesta Assembleia, que a preocupação

com a modernização administrativa tem sido uma constante, tanto dos governos do PSD e do CDS como dos

governos do Partido Socialista, fossem eles maioritários ou minoritários.

Foi essa continuidade, aliás, que permitiu que Portugal desse passos sólidos nesta área e garantisse uma

continuidade das políticas reformistas.

Estou a falar de factos, não de opiniões. Desde o velho Secretariado para a Modernização Administrativa,

criado em 1991, até ao mais recente programa Simplex, tudo prova esta linha de continuidade.

O mesmo se diga em relação ao último Governo. O anterior Executivo procedeu a uma profunda revisão do

Portal do Cidadão e do Balcão do Empreendedor, criou o Mapa do Cidadão e lançou o programa Aproximar,

garantindo hoje o funcionamento de mais de 325 Espaços do Cidadão espalhados pelo País. É importante

notar que muitas destas decisões tiveram o apoio expresso dos Deputados do Partido Socialista. Por isso, foi

sem surpresa que verificámos que nos programas eleitorais dos partidos que integram o arco europeu há uma

clara convergência no que diz respeito à preocupação com a modernização administrativa e com a Agenda

Digital para a Europa. O mesmo não se pode dizer dos programas eleitorais da CDU e do Bloco de Esquerda,

porque este tema da modernização administrativa passa largamente despercebido.

Seja como for, o que eu sei, o que este Governo sabe é que a modernização administrativa é um domínio

em que os portugueses, todos os portugueses sem exceção, querem e exigem o mesmo: uma Administração

eficiente, não burocrática e ao serviço das pessoas e das empresas.

É tempo, no entanto, de olhar para o futuro. Se é verdade que já muito foi feito, é também verdade que há

muito por fazer. É preciso alterar, e alterar muito, o modo como a nossa Administração funciona e se relaciona

com os cidadãos e os agentes económicos e sociais.

A criação, na orgânica deste Governo, de um ministro ou de uma pasta da modernização administrativa é

disso mesmo sintomático. Pela primeira vez, existe uma pasta que tem como principal tarefa definir e executar

uma política de modernização administrativa única e integrada, supra-sectorial e transversal a todas as áreas

da governação.

O motivo desta opção é óbvio: o estudo e a experiência acumulada revelam que não é possível uma efetiva

modernização dos serviços públicos com uma perspetiva meramente sectorial. Ninguém contesta e é

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amplamente reconhecido a nível internacional que temos hoje medidas de excelência em vários sectores,

mas, para modernizar plenamente a Administração, é necessário uma perspetiva transversal. Só assim, com

uma coordenação ao mais alto nível, será possível, de forma articulada e integrada, construir um melhor

Estado, isto é, construir um Estado mais eficiente e eficaz, capaz de fazer mais e melhor, com os mesmos

recursos.

É esta a aposta que apresentamos, hoje, à Assembleia da República: construir uma Administração, capaz

de fazer mais e melhor, com os mesmos recursos.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Passemos ao País real. Em termos práticos, o que é que isto

significa? A resposta para nós é clara e assenta em três pilares estruturais. Queremos uma Administração

próxima, uma Administração simples e uma Administração digital.

Proximidade significa, além de uma Administração que leva a sério o princípio da descentralização, uma

Administração que chega a todos e que não deixa ninguém para trás. Ou seja, um Estado próximo dos

cidadãos, próximo da população mais desprotegida e próximo dos agentes económicos e sociais.

A proximidade passa por apostar em lojas do cidadão efetivas em cada município de Portugal. A

proximidade requer inclusão social, requer uma Administração que seja capaz de chegar às zonas mais

afastadas e às pessoas que, mesmo nas grandes zonas urbanas, vivem em isolamento.

Mas proximidade significa também uma Administração próxima das empresas e dos empreendedores. É

preciso, para além do Balcão do Empreendedor e do Gestor do Contribuinte, criar a figura do Gestor do

Empreendedor, assegurando, em articulação com as associações empresariais, um atendimento

personalizado aos agentes económicos, garantindo que as boas ideias e os grandes projetos não se perdem

em procedimentos burocráticos infindáveis.

O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — Muito bem!

O Sr. Ministro da Modernização Administrativa: — Mas não basta uma Administração próxima, é preciso

uma Administração simples. E uma Administração simples é uma Administração que confia, que confia nos

particulares e que confia na iniciativa privada.

Todos sabemos, por experiência própria, que não há nada mais complicado do que fazer coisas simples. É

preciso, desde logo, combater a tentação do excesso de leis e levar a sério o desafio da simplificação

legislativa e regulatória. Um tal objetivo, para não ser um mero jogo de palavras, impõe uma avaliação rigorosa

do impacto das leis projetadas e adotadas. Impõe também que se simplifiquem os procedimentos. Não faz

sentido que os serviços públicos exijam aos cidadãos ou às empresas documentos que já estão na sua posse.

É impensável que a mesma pessoa tenha de apresentar, várias vezes, em diferentes serviços, os documentos

que já apresentou uma vez.

Uma Administração simples, uma Administração que confia tem de mudar o paradigma e alargar o

Licenciamento Zero até onde for possível.

Mas a modernização administrativa é também digital. Em plena era da globalização tecnológica, a própria

Agenda Digital para a Europa exige uma Administração que aposte na inovação tecnológica e na digitalização.

O princípio digital tem de ser mais do que um PowerPoint sofisticado; o princípio digital tem de entrar nos

serviços públicos.

Mais, o digital postula e conduz à transparência. É preciso apostar na transparência, é preciso apostar

numa Administração responsável, em que cidadãos e agentes económicos e sociais saibam, a cada momento,

qual o grau de desempenho dos serviços públicos.

Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: É tempo de concluir. Quero deixar apenas duas notas finais. A

primeira para referir que a modernização administrativa só se faz com os funcionários públicos. Os

funcionários públicos são a pedra angular neste processo de reforma. Por isso, neste momento em que o

Governo apresenta o seu Programa na Assembleia, é importante que não haja quaisquer equívocos: este

Programa não só conta com os trabalhadores em funções públicas como aposta na sua capacitação e

valorização.

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Segunda e última nota: fizemos o que tínhamos de fazer nestes 10 dias. Temos uma visão estratégica para

a modernização administrativa em Portugal. Estamos certos de que este é o caminho. A palavra cabe agora

aos Srs. Deputados, cabe a todos e a cada um decidir em consciência se pretendem ajudar a concretizar esta

ambição ou se, pelo contrário, preferem uma rutura artificial numa área em que os partidos do arco europeu

sempre convergiram.

Aplausos do PSD do CDS-PP e de alguns Deputados do PS.

O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, antes de mais aproveito para o cumprimentar pela sua primeira

intervenção neste Plenário, e informo que se inscreveram para pedir esclarecimentos os Srs. Deputados Berta

Cabral, do PSD, Paula Santos, do PCP, e Filipe Anacoreta Correia, do CDS-PP.

Como é que pretende responder, Sr. Ministro?

O Sr. Ministro da Modernização Administrativa: — Em bloco, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Sendo assim, tem a palavra a Sr.ª Deputada Berta Cabral.

A Sr.ª Berta Cabral (PSD): — Antes de mais, Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do

Governo e Sr.as

e Srs. Deputados, é a primeira vez que me encontro nesta Assembleia e, por isso, uma

saudação a todos e votos de bom trabalho.

Vivemos tempos singulares e invulgares. Tempos em que a verdade deu lugar à meia verdade, em que a

ética já não é o que era, em que a democracia passou a ser uma realidade de geometria variável onde se

transformam derrotas em vitórias, em nome de interesses inconfessáveis, passando por cima da vontade dos

eleitores. Tempos em que prevalece a razão da força e não a força da razão!

O Sr. Duarte Filipe Marques (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª Berta Cabral (PSD): — Os portugueses votaram e disseram claramente que a coligação PSD/CDS-

PP deveria continuar a governar e que o Sr. Primeiro-Ministro Pedro Passos Coelho deveria continuar a liderar

o Governo de Portugal. Esta foi a sua vontade expressa nas urnas em eleições livres e democráticas, por mais

que outros queiram dizer o contrário.

O Sr. Duarte Filipe Marques (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª Berta Cabral (PSD): — Foi o reconhecimento do mérito, da coragem e da determinação do Governo

que os portugueses reconheceram.

O PSD e o CDS-PP, ao longo dos últimos quatro anos, estiveram sempre à altura dos acontecimentos e,

sem lamúrias, assumiram o desígnio nacional de resgatar o País e de promover o equilíbrio das contas

públicas.

O Governo que agora inicia funções e que hoje tem o seu Programa em discussão promove a continuação

de uma política do Governo que cessou funções e que levou ao equilíbrio das contas públicas, que levou ao

crescimento económico, que levou à criação de emprego, que conduziu ao aumento das exportações e que

conduziu, natural e sequencialmente, à recuperação do rendimento dos portugueses e das suas famílias.

Os portugueses reconheceram o esforço feito, compreenderam o sentido das reformas e dos sacrifícios e

manifestaram, inequivocamente, que querem um Portugal moderno livre e democrático e que honre os seus

compromissos orçamentais europeus e internacionais.

Continuar as reformas já encetadas e promover a desburocratização e a descentralização com vista a

tornar a Administração mais próxima e amigável das pessoas e das empresas é, como diz o Sr. Ministro, uma

prioridade política deste Governo e deste Programa.

O Sr. Duarte Filipe Marques (PSD): — Muito bem!

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A Sr.ª Berta Cabral (PSD): — Reduzir os custos de contexto, promover a coesão social e territorial,

modernizar o tecido produtivo, promover a participação dos cidadãos na vida pública e política é essencial

para revigorar o tecido económico e social e fortalecer a democracia.

É uma tarefa iniciada, mas nunca acabada! Por isso, Sr. Ministro da Modernização Administrativa, desejo-

lhe os maiores sucessos nas suas funções.

Vozes do PSD: — Muito bem!

Protestos do PCP.

A Sr.ª Berta Cabral (PSD): — Por fim, quero deixar-lhe uma questão: gostaria que esclarecesse esta

Câmara sobre a relação que pretende estabelecer entre a área que tutela e a administração local, que também

está sob a sua orientação e tutela.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, estou habituado a vê-la aqui, no Hemiciclo, embora noutras funções,

pelo que não me lembrei de que esta era a sua primeira intervenção no Plenário como Deputada. Assim,

saúdo-a por esse facto, tal como fiz com todos os outros Srs. Deputados.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Paula Santos, para pedir esclarecimentos.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro Rui Medeiros, não deixa de ser curioso que,

depois deste longo período de debate, tenha sido preciso o Governo ficar somente com 10 minutos para o Sr.

Ministro vir falar um pouco sobre algumas propostas que apresenta no Programa do Governo.

O Sr. Ministro, na sua intervenção, procurou falar-nos de modernidade, mas de modernidade com velhas

opções, propostas e medidas que já foram rejeitadas e que nos últimos quatro anos levaram à destruição de

serviços públicos e de emprego público.

Este Governo fala de modernização administrativa e justifica-a com argumentos de proximidade, de

eficiência. Sr. Ministro, pergunto: onde esteve a proximidade e a eficiência da administração pública quando o

PSD e o CDS-PP decidiram encerrar escolas? Onde esteve a proximidade e a eficiência dos serviços públicos

quando decidiram encerrar centros de saúde, serviços e valências em muitos hospitais? Onde esteve a

proximidade e a eficiência dos serviços públicos quando encerraram postos dos CTT, quando encerraram

serviços desconcentrados na área dos sectores produtivos, quando encerraram Laboratórios do Estado na

área da agricultura ou até quando extinguiram freguesias? Onde esteve a proximidade e a eficiência dos

serviços públicos quando, agora, no Programa — e a isso não se referiu — apresenta como proposta a

extinção de municípios? Como se já não fosse penalizador empobrecer o nosso regime democrático e

penalizar as populações, também agora quer extinguir municípios no nosso País.

A modernização administrativa de que nos falou mais não é do que uma desresponsabilização do Governo

por aquelas que são as suas atribuições e competências. E isto é bem visível no que diz respeito às propostas

de descentralização de competências para os municípios na área da saúde, da educação, da ação social,

onde há uma clara desresponsabilização do Governo por aqueles que são os direitos fundamentais dos

cidadãos.

O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, faça favor de concluir, pois já ultrapassou o tempo do seu Grupo

Parlamentar.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Vou terminar, Sr. Presidente, com uma última questão, que não posso

deixar de colocar.

Não deixa também de ser curioso, Sr. Ministro, que venha aqui, à Assembleia da República, falar na

valorização dos trabalhadores quando o PSD e CDS-PP, no anterior Governo, aquilo que fizeram foi retirar

direitos, foi destruir postos de trabalho,…

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O Sr. Presidente: — Tem mesmo de concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — … foi encerrar serviços, foi pôr a administração pública com menos 70 000

trabalhadores.

Sr. Ministro, de facto, não é desta forma que prestamos melhores serviços aos cidadãos.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Filipe Anacoreta Correia, a

quem também cumprimento pela primeira intervenção em Plenário.

O Sr. Filipe Anacoreta Correia (CDS-PP): — Muito obrigado, Sr. Presidente.

Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr. Ministro da Modernização Administrativa e Sr.as

e Srs.

Deputados, aproveito, também, esta minha primeira intervenção para os cumprimentar e desejar-lhes as

maiores felicidades nesta Legislatura.

Sr. Ministro da Modernização Administrativa, começo por cumprimentá-lo e, através de si, todo o Governo

pelas suas palavras na apresentação que aqui fez do Programa do Governo e, sobretudo, por esta prioridade

política que o Governo assumiu na criação deste Ministério da Modernização Administrativa.

Ao ouvi-lo, lembrei-me de alguém que também teve presença importante no Parlamento: Francisco Lucas

Pires. Dizia ele: «Ao princípio não ‘era’ o Estado mas o Homem — ‘era’ o Homem, o espírito e o barro… É esta

uma verdade em função da qual será o Estado a ter de se humanizar — não o homem quem tem de se

estadualizar».

Humanizar, modernizar, é justamente esta a prioridade que os portugueses esperam de nós. É

precisamente isto que os portugueses esperam de nós neste debate, que, hoje, tem a atenção e a

preocupação de tantos por más razões.

Muito longe daquilo que tanto se tem falado e que hoje já foi apelidado de «um acordo reacionário», uma

triste união de forças conservadoras, que tem como único objetivo manter o status quo que o País já não

consegue pagar. E isto é tanto mais estranho, ao falarmos da modernização administrativa, porque,

precisamente, é uma área que vai muito para além da preocupação exclusiva desta coligação. Por que não

reconhecê-lo? Também nesta área, o Partido Socialista teve uma intervenção e deu um contributo importante

e que nós reconhecemos em tantos que, hoje, estão nessa bancada. E não deverá ser, precisamente, nesta

preocupação, que tanto nos reuniu, de humanizar, de modernizar e de simplificar o Estado, que devemos

responder aos portugueses?!

Termino, Sr. Ministro, com esta pergunta: não acha que é fundamental este propósito alargado continuar a

seguir o seu caminho, ou agora ele deverá ser posto em causa apenas por um acordo reacionário?

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Modernização Administrativa, Rui

Medeiros.

O Sr. Ministro da Modernização Administrativa: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Berta Cabral, antes de

mais, quero agradecer as suas palavras e gostava de sublinhar três notas que me pareceram muito

importantes, no quadro do que foram os seus pedidos de esclarecimento.

Primeira nota, penso que tem toda a razão, porque, além de uma administração de proximidade, é

fundamental prosseguir o trabalho. Não haja ilusões, a modernização administrativa não se faz por decreto. A

modernização administrativa é um trabalho que demora muito e que exige um investimento de muito tempo e

de muita gente.

Portanto, a ideia de que nós não inventámos a roda, mas que ainda há muito a fazer para que a roda

funcione e funcione plenamente, é absolutamente certeira.

A segunda nota não se prende com o que me perguntou mas com o ter-me desejado o maior sucesso, o

que foi objeto de riso e de comentário. De facto, é como quem diz, dentro de horas este Governo verá,

certamente e com probabilidade, aprovada uma moção de rejeição do seu Programa.

Gostava que ficasse claro o seguinte: nós entrámos não vergados e cairemos, se cairmos, de pé!

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Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A terceira e última nota prende-se com a administração local. A administração local é, de facto, um

problema central, uma preocupação absolutamente determinante deste Programa do Governo e, devo dizer,

aqui muito se fez nos últimos quatro anos. Desde 1999 que há um quadro de descentralização que se

manteve intacto até que este Governo ousou avançar, e ousou avançar como deveria avançar: em ligação

com os municípios e não de forma impositiva e unilateral.

Portanto, se há domínio em que se avançou e em que seria importante continuar a avançar, contra a

resistência de algumas autarquias e de alguns autarcas, é no domínio da administração local.

Sr.ª Deputada Paula Santos, apenas quatro notas em relação ao que me disse.

Primeiro, quando me refere, e articulando com a administração local, uma Administração que não esteve

próxima, que se afastou, retomo o que disse em relação à descentralização: a Administração dos últimos

quatro anos foi uma Administração que se aproximou, e não estou a falar apenas dos espaços do cidadão,

estou a falar, por exemplo, dos centros de saúde. Alguns centros de saúde acabaram, mas, certamente, o que

houve foi racionalização, e, se for fazer a contabilização final, perceberá que no final houve mais centros de

saúde do que havia.

Portanto, o balanço é positivo, não é um balanço negativo.

Segunda nota em relação ao que disse. As suas palavras começaram assim: «Curioso só agora falar do

Programa do Governo!».

Deixe-me dizer-lhe que estive aqui ontem e hoje e ao que assisti, fundamentalmente, não foi à discussão

do Programa do Governo. Estive aqui para discutir o Programa do Governo e estou aqui a discutir o Programa

do Governo!

Terceiro: repare que, como não há discussão do Programa do Governo, o tema dos funcionários públicos

não é o do Programa do Governo, o tema dos funcionários públicos é o passado, é aquilo de que acusam o

anterior Executivo, porque se lerem este Programa do Governo é claro que se diz que a aposta é na

valorização dos funcionários públicos, na diferenciação do mérito. Isso está «preto no branco» no Programa do

Governo.

Protestos do PCP.

Já agora, deixo uma quarta e última nota. Uma vez que estamos a falar do Programa do Governo — é

disso que deveríamos falar, é nisso que me estou a centrar —, para quem quer falar do Programa do Governo,

não fale de extinção dos municípios, porque não há no Programa do Governo nenhuma referência à extinção

dos municípios. O que se diz é que se deve promover a interação entre os municípios e que se,

voluntariamente, os municípios o quiserem, poderá haver.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Está lá a agregação!

O Sr. Ministro da Modernização Administrativa: — As últimas palavras são dirigidas ao Sr. Deputado

Filipe Anacoreta Correia, a quem agradeço, desde logo, por recordar as palavras de Francisco Lucas Pires, de

quem sou um aprendiz e que admiro profundamente.

Devo dizer que a sua afirmação de que não é o Estado que está no centro mas é a pessoa, de que é

preciso humanizar o Estado e olhar para as pessoas de carne e osso é uma preocupação que preside a este

Programa do Governo. É um aproximar das pessoas de carne e osso e, portanto, também das pessoas mais

afastadas, da pessoas mais desprotegidas.

A segunda nota, que subscrevemos totalmente, é a de que é pena que se perca a dimensão transversal,

porque, verdadeiramente, este tema da modernização administrativa sempre foi um tema em que convergiram

os partidos do arco europeu. E aqui não haja dúvidas: os partidos do arco europeu são o PSD, o CDS e o PS.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, não havendo mais inscrições, vamos interromper os trabalhos, que

retomaremos às 15 horas, com a fase de encerramento do debate e com a votação das moções de rejeição.

Eram 13 horas e 3 minutos.

Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 15 horas e 1 minuto.

Peço às autoridades policiais no favor de abrirem as galerias ao público.

Srs. Deputados, vamos proceder ao debate de encerramento Programa do XX Governo Constitucional,

após o que haverá lugar à votação das moções de rejeição.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado André Silva, do PAN.

O Sr. André Silva (PAN): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros de Governo, Sr.as

e Srs.

Deputados e todos os presentes na Sala: Neste momento de encerramento do debate sobre o Programa do

Governo é importante que se faça um balanço adequado e justo destes dois dias de trabalho, ajustando-os ao

imperativo de mudança que os portugueses têm vindo a pedir.

O Programa traz algumas propostas que indicam ligeiros ajustes ao desagravamento dos sacrifícios que

nos foram pedidos. Contudo, ao aprofundarmos com mais detalhe, não podemos deixar de considerar que o

mesmo Programa dá continuidade ao rumo seguido pelo Governo durante os quatro anos anteriores.

Verificamos que este Programa do Governo acentua cada vez mais a intenção de substituir a noção de Estado

social por uma noção mais assistencialista.

Tal como já tive oportunidade de referir, é com agrado que constatamos que existe a preocupação do

Governo em propor medidas que vão ao encontro do bem-estar animal. Ainda assim, algumas propostas

assentam em contradições. Isto é, o Programa do Governo tanto confirma que se deve melhorar o bem-estar

dos animais como, noutro ponto, beneficia o lucro dos produtores, agilizando procedimentos comerciais

relacionados, por exemplo, com o transporte de animais, sem especificar as condições de bem-estar exigidas

por tais práticas. Privilegia-se a lógica de mercado, através do lucro fácil, em detrimento da proteção desejável

para estes animais.

No que à nossa casa comum, a natureza, diz respeito, concluímos que o seu valor continua associado ao

valor comercial que possa gerar. Não encontrámos preocupações com a questão da utilização de

agroquímicos ou do cultivo de transgénicos, para além de não termos observado quaisquer indicações de que

o Plano Nacional de Barragens, tal como está definido, seja para acabar ou ser reavaliado, por contribuir para

um conjunto de atentados ambientais, culturais e sociais e não melhorar a qualidade de vida dos portugueses.

Sentimos também a ausência de medidas concretas no âmbito do incentivo aos modos de produção

biológicos.

De um governo, o PAN espera um novo rumo que não se limite a mitigar as questões ligadas ao

agravamento das condições de vida dos portugueses mas que inicie um novo paradigma de relações

económico-sociais que não assente na velha dicotomia entre exploração capitalista e luta de classes, não

devendo a sua realização e felicidade dos portugueses ser apenas proporcional à sua capacidade produtiva.

Do debate aqui realizado realço a importância de uma consciência político-partidária responsável no

alinhamento de agendas, deliberações e prioridades.

Existem medidas aqui debatidas que só podem avançar com o audacioso compromisso de um vasto

acordo entre protagonistas e forças políticas que partilhem o desejo genuíno de criar alternativas sustentáveis

nos vários eixos governativos.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado já ultrapassou o seu tempo.

O Sr. André Silva (PAN): — Vou já terminar, Sr. Presidente.

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O PAN está disposto a contribuir o mais possível para estas soluções com um único critério: o de despertar

consciências para valores sociais, éticos e ecológicos fundamentais, sem os quais o nosso futuro é colocado

em risco, bem como o dos animais que connosco partilham o planeta e a natureza.

O ser humano não é a medida de todas as coisas. É nosso dever assegurar que contribuímos todos para

uma evolução civilizacional, através das nossas ações, para uma melhoria do bem-estar das pessoas, dos

animais e da natureza.

Aplausos de Deputados do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção final, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as

e Srs. Membros do

Governo, Sr.as

e Srs. Deputados: A vida tem destas coisas. Um Governo que generalizou a precariedade vive

agora uma situação verdadeiramente precária. Um Governo a prazo, que os portugueses revogaram no

passado dia 4 de outubro, apresenta-nos agora um Programa repleto de pressupostos falsos e a partir de

premissas completamente erradas.

Logo no primeiro parágrafo do Programa, afirma-se: «De uma forma clara, os portugueses disseram que

queriam que o PSD e o CDS prosseguissem na sua missão e levassem adiante o seu compromisso de

trabalho nesta Legislatura». Sucede que os portugueses não disseram nada disso, não foram os portugueses

que disseram isso.

Quem quis que o PSD e o CDS continuassem as suas desastrosas políticas foi o Presidente da República.

Os portugueses disseram uma coisa completamente diferente. Aquilo que os portugueses disseram no dia 4

de outubro foi: «vamos eleger 230 Deputados à Assembleia da Republica, criando uma nova correlação de

forças no Parlamento, de forma a impedir que o PSD e o CDS continuem no Governo. Vamos criar as

condições para quebrar este ciclo de políticas de direita, que destruíram a nossa capacidade produtiva,

aumentaram as desigualdades sociais, alargaram o fosso entre ricos e pobres, agravaram as injustiças sociais

e colocaram a generalidade dos portugueses, praticamente, a ‘pão e agua’».

Foi isto que os portugueses disseram no dia 4 de outubro: «não queremos continuar a ser vítimas das

políticas do PSD e o CDS».

É preciso que agora se façam traduzir estes resultados eleitorais. É a democracia a funcionar. Quer se

goste, quer se não goste, são estas as regras da democracia e com elas teremos de saber conviver.

Mas os portugueses não só condenaram de forma muito clara as políticas de austeridade e de

empobrecimento prosseguidas pela coligação de direita, como também expressaram uma firme vontade de

mudança de políticas.

Seria assim irresponsável não atender a este novo quadro parlamentar, como se não tivesse havido

eleições e como se tudo se mantivesse igual.

Bem sabemos que os partidos que se comprometeram perante os eleitores com as políticas de mudança

assentam em propostas políticas diferentes, têm programas eleitorais diferenciados e avançam de pontos de

partida também diferentes.

Ainda assim, face à emergência de pôr fim às políticas de austeridade e procurando ir ao encontro da

vontade dos portugueses, Os Verdes envolveram-se com seriedade e responsabilidade na discussão de um

Programa do Governo sustentado em políticas alternativas, capazes de quebrar o ciclo de empobrecimento e

o travão ao desenvolvimento ambiental, social e económico do País.

Sr.as

e Srs. Deputados, como se previa, o Programa do Governo PSD/CDS é marcado, essencialmente,

pela continuidade disfarçada do «agora é que vai ser». Em bom rigor, o que o PSD e o CDS agora prometem

é combater os resultados das políticas que impuseram ao longo dos últimos quatro anos.

De facto, olhando para os cinco objetivos fundamentais sobre os quais assenta o Programa do Governo, a

novidade é apenas o descaramento.

Vejamos: andaram quatro anos a convidar ou a forçar os nossos jovens a emigrar e prometem agora

combater o «inverno demográfico». Andaram quatro anos a castigar as pessoas e a semear pobreza e

prometem agora valorizar as pessoas e combater a pobreza. Andaram quatro anos a destruir o Estado social e

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a agravar as desigualdades sociais e agora prometem defender e revigorar o Estado social e combater as

desigualdades sociais.

Andaram quatro anos a destruir as micro, pequenas e médias empresas, a fomentar o desemprego, a

diminuir os rendimentos das famílias e o seu poder de compra e vêm agora prometer fortalecer a economia, a

criação de emprego, o aumento dos rendimentos das famílias e o seu poder de compra.

Andaram quatro anos a encerrar e a fragilizar os serviços públicos para agora virem prometer a

qualificação dos serviços públicos.

E são estes os cinco objetivos do Programa do Governo, cuja única novidade é, como já disse, o

descaramento, o mesmo Programa que, em matérias fundamentais, como o setor da água, reafirma a intenção

de continuar a reestruturação deste sector, tornando-a mais apetecível para o negócio do sector privado,

constituindo, portanto, uma ameaça de privatização deste bem essencial à vida.

Ao nível da conservação da natureza, fica tudo igual, continua o desinvestimento e a «nova organização»,

que foram os fatores que mais prejudicaram a conservação e a proteção da natureza.

No combate às alterações climáticas, continua a inação em relação a um dos sectores que mais

contribuem para a emissão de gases com efeito estufa, os transportes. Neste sector, a única preocupação do

Governo, para variar, é a da privatização.

Não faltam, por isso, motivos para Os Verdes, com sentido de responsabilidade, rejeitarem este Programa

do Governo.

Para isso, Os Verdes apresentaram, hoje, uma moção de rejeição ao Programa do Governo PSD/CDS,

como forma de quebrar este ciclo de políticas que tanto tem vindo a infernizar a vida dos portugueses.

Aplausos de Os Verdes, do PS, do BE e do PCP.

O Sr. Presidente: — Para fazer uma intervenção, neste período de encerramento, em nome do PCP, tem a

palavra o Sr. Deputado Jerónimo Sousa.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro- Ministro, Srs. Deputados: Hoje cumpre-

se um importante passo. Milhões de portugueses respirarão de alívio pelo fim de um Governo que, ao longo de

mais de quatro anos, com a maior arrogância e frieza, lhes infernizou a vida e tinha como objetivo prosseguir a

sua obra destruidora.

O Sr. António Filipe (PCP): — Exatamente!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — A derrota da coligação PSD/CDS é inseparável da luta que os

trabalhadores e o povo travaram contra a política de retrocesso social e de declínio económico.

Os resultados das eleições legislativas do passado dia 4 de outubro, em que a coligação PSD/CDS perdeu

mais de 700 000 votos, viu reduzida a sua votação em 12 pontos percentuais, perdeu 25 Deputados e perdeu

a maioria absoluta, exprimem uma clara condenação à política prosseguida nos últimos quatro anos pelo

Governo PSD/CDS.

Não podemos deixar de assinalar o significado e a dimensão dessa condenação num quadro em que o

Governo e os partidos que lhe deram suporte chantagearam o povo português com o medo, desencadearam

uma operação de instrumentalização do aparelho do Estado ao serviço dos seus interesses eleitorais e

mantiveram escondida a sua verdadeira agenda e programa político.

Aplausos do PCP, do PS e do BE.

O PSD e o CDS não querem que se diga a verdade e que se fale da realidade.

O Governo PSD/CDS deixa um enorme rasto de destruição: o desemprego real a atingir mais de 1,1

milhões de portugueses; a precariedade generalizada; a dura realidade dos baixos salários dos trabalhadores

por conta de outrem e, em particular, dos que auferem o salário mínimo nacional ou um valor ainda mais

baixo; a esmagadora maioria das reformas inferior ao limiar de pobreza; o brutal subfinanciamento da saúde e

da educação, negando o direito ao seu acesso pleno a milhões de portugueses; os sucessivos cortes nas

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prestações sociais, como se verificou este ano, com mais cerca de 520 milhões de euros suprimidos; os 2,8

milhões de portugueses em risco de pobreza. Esta é uma situação marcada por níveis dramáticos de

desemprego, de pobreza e de crescentes desigualdades sociais.

Este é um País a braços com uma crise demográfica, sangrado em vida pela emigração de centenas de

milhares de jovens, em parte significativa, altamente qualificados.

Este é um País com um elevado grau de enfraquecimento do aparelho produtivo, com crescente

dominação dos centros de decisão estratégica no estrangeiro, com a fragilização de um tecido económico já

de si débil, com um encerramento recorde de empresas e com uma situação de endividamento brutal das que

restam. É um Estado desfeito em muitos dos seus centros de competência e saber, empobrecido de recursos

humanos, desestruturado e desanimado.

Este é um País que viu, nestes últimos quatro anos, a sua economia recuar década e meia, com a

produção a cair 10 000 milhões de euros, o investimento global e público a recuar dramaticamente com

pesadas e graves consequências futuras e a dívida pública a aumentar 50 000 milhões de euros.

Não, Sr. Primeiro-Ministro, não diga mais que os portugueses foram compreensivos perante os sacrifícios

que os senhores lhes impuseram.

O trabalhador, com o seu salário, o seu rendimento e os seus direitos cortados, o pensionista ou o

reformado, com a reforma ou a pensão cortada ou congelada, a família confiscada ou que perdeu a sua casa,

o desempregado sem emprego nem subsídio, o pequeno empresário arruinado, o pequeno agricultor e o

pescador impedidos de cultivar ou pescar, os homens e mulheres da cultura e da ciência desvalorizados,

todos eles sentiram não compreensão mas indignação perante tanto esbulho, confisco e sacrifício, sabendo,

ainda por cima, que o resultado seria para cobrir os desmandos da banca, para os grandes grupos

económicos e não para resgatar o País.

Aplausos do PCP, do PS e do BE.

Esta é uma realidade social e económica que era vontade do PSD e do CDS-PP manter e agravar, aspeto

que ficou claro pelo conteúdo do Programa do Governo, aqui tão mal e tão pouco defendido pelos seus

autores.

O Governo aqui se apresentou ignorando os graves problemas estruturais do País que persistem, insistindo

na falsa ideia de que a sua política conduziu a um caminho de recuperação económica, repetindo

proclamações vazias quanto à resolução dos problemas sociais como o desemprego e a pobreza e

procurando iludir a realidade das crescentes dificuldades que atingem os trabalhadores e o povo.

O que o Governo PSD/CDS-PP deixou claro foi a perspetiva de continuidade e intensificação da política de

agravamento da exploração, de empobrecimento, de assalto aos rendimentos dos trabalhadores e do povo, da

injustiça fiscal, da destruição das funções sociais do Estado e dos serviços públicos, do confronto com a

soberania e a degradação do regime democrático.

O PSD e o CDS-PP conduziram o nosso País a uma situação de retrocesso económico e social jamais

vivida depois do 25 de Abril. Procuram, agora, resgatar-se a si próprios da derrota eleitoral que sofreram

integrando no Programa do Governo medidas e promessas destinadas a criar a ilusão de que estariam em

condições e na disposição de inverter o rumo da sua política, revertendo algumas das decisões com que

atingiram os trabalhadores e o povo ao longo dos últimos quatro anos.

O Programa do Governo mostra o objetivo claro de assegurar os eixos essenciais da política de desastre

nacional seguida nos últimos anos e coloca ainda mais a necessidade de pôr termo ao novo/velho Governo

PSD/CDS pelos prejuízos que tem causado e pelos que pretendia continuar a causar aos trabalhadores, ao

povo e ao País.

É neste contexto que o Programa do Governo da coligação PSD/CDS apenas serve para confirmar aquilo

que sempre dissemos aos portugueses: com o PSD e o CDS-PP no poder, a política de exploração e

empobrecimento para os trabalhadores e para o povo iria prosseguir, porque o PSD e o CDS-PP não têm

outra forma de governar que não passe pela destruição de direitos económicos, sociais e laborais das classes

trabalhadoras.

Se já muito foi destruído, mais ainda queriam destruir no domínio laboral e nas áreas da educação, da

saúde e da segurança social. Assim o PSD e o CDS-PP tivessem a oportunidade de continuar a prosseguir no

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poder as suas políticas, como, aliás, desejariam todos aqueles que, intocáveis no alto dos seus privilégios,

beneficiaram com as opções tomadas nestes anos, esses mesmos que, na iminência da derrota deste

Governo e perante a real possibilidade da nova correlação de forças na Assembleia da República, em vez de

reverterem os roubos de direitos e rendimentos do nosso povo, não só se lançam numa odiosa campanha de

medo e chantagem como procuram, desde já, proteger os seus mesquinhos interesses, como revela a

distribuição antecipada de dividendos que alguns grupos económicos têm em curso, visando evitar a justa

tributação fiscal a que deveriam estar sujeitos A esse exercício do cinismo de classe, em que se fala em nome

do País para proteger interesses de uma pequena minoria, nós queremos dizer basta!

Aplausos do PCP, do PS, do BE e de Os Verdes.

A opção do povo português expressa no resultado das últimas eleições legislativas permite impedir essa

coligação de prolongar, uma vez mais, a sua política de mentiras e permite travar este caminho de degradação

contínua das condições de vida dos portugueses.

Por tudo isto, o PCP rejeita o Programa do Governo PSD/CDS-PP e, em conjunto com outros partidos,

criou as condições para que ele seja rejeitado, pondo termo à sua nefasta ação. A posição conjunta do PS e

do PCP sobre solução política expressa os termos dessa opção.

Aplausos do PCP, do PS, do BE e de Os Verdes.

Estão criadas condições institucionais e políticas para outra solução governativa.

Existe na Assembleia da República uma base institucional que permitirá ir tão longe quanto for a disposição

de cada força política que a compõe, para suportar o caminho da reposição dos salários e dos rendimentos, da

devolução dos direitos, do reforço do acesso à saúde, à educação e à segurança social, do apoio às micro,

pequenas e médias empresas, do apoio aos reformados e aos jovens, e que pode permitir a concretização de

um conjunto de medidas e soluções que deem resposta a interesses imediatos dos trabalhadores e do povo.

É este o nosso compromisso, indissociável da indispensável política patriótica e de esquerda, dessa nossa

aspiração profunda de uma política alicerçada nos valores de Abril, por um Portugal com futuro.

O tempo, Sr. Presidente, Srs. Deputados, não é de expetativa, nem de atentismo. É tempo de participação,

de ação e de construção de um futuro melhor!

Aplausos do PCP, do PS e do BE.

Neste momento, o Deputado do PSD António Costa Silva exibiu um cartaz com a mensagem «não à

moção de rejeição».

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia, do CDS-PP.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr. Vice-Primeiro-Ministro, Srs.

Membros do Governo, Sr.as

e Srs. Deputados: Chegados ao final deste debate existem conclusões óbvias a

retirar e a primeira conclusão é a de que a coligação Portugal à Frente, que já tinha ganho a campanha

eleitoral e que ganhou as eleições no dia 4 de outubro, voltou a ganhar, hoje e ontem, este debate do

Programa do Governo.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Protestos do BE e do PCP.

Ficou claro, Srs. Deputados, que existe uma maioria e um Governo que têm um rumo para Portugal, como

ficou igualmente claríssimo que, em Portugal, só há um político preparado para liderar esse Governo, e esse

político é o Primeiro-Ministro, chama-se Pedro Passos Coelho.

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Aplausos do CDS-PP e do PSD.

É exatamente aquele que os portugueses escolheram. Escolheram bem e não se enganaram.

O Governo está a conduzir Portugal no caminho da recuperação económica, recuperação que se sente e é

real. É por isso este debate demonstrou, mais uma vez, que os portugueses, quando escolheram este

Governo e estes líderes, Pedro Passos Coelho e Paulo Portas, não se enganaram.

Por outro lado, não ignoramos que desde o primeiro momento, desde o início deste debate, pairou sempre,

qual gigantesco elefante vermelho sentado no meio da Sala, o espetro das moções de rejeição previamente

anunciadas. Não o ignoramos! Esteve sempre no meio da Sala, ainda que o principal responsável desse facto,

o Secretário-Geral do Partido Socialista, só o tenha comentado nos corredores, não tendo, até este momento,

vindo a esta tribuna assumir as suas responsabilidades, como era sua obrigação, perante a Câmara e perante

a democracia.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Dizer que este debate é uma perda de tempo, como disse ontem o Dr. António Costa, é um desrespeito por

esta Câmara, mas, sobretudo, é um desrespeito pelo voto dos portugueses.

Não posso também deixar de registar o enorme exercício de hipocrisia daqueles que, tendo anunciado

mesmo antes deste debate a rejeição do Programa do Governo, vieram aqui criticar as intervenções que

fizemos sobre esse facto, acusando-nos de não querermos discutir, de esconder ou mesmo de estarmos

envergonhados do Programa que aqui apresentámos, como fez ontem, em resposta a uma pergunta que lhe

dirigi, o líder parlamentar do Partido Socialista, Carlos César.

Que fique muito claro: não só não estamos envergonhados como temos todos muito orgulho no trabalho

que fizemos e no Programa do Governo que apresentámos.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Temos todos muito orgulho, mas, em particular, quem esteve aqui nos últimos quatro anos tem muito

orgulho em ter começado uma Legislatura com o País em estado de pré-bancarrota, por culpa da governação

do Partido Socialista, e termos conseguido, ao fim de quatro anos, recuperar a credibilidade de Portugal,

controlar o défice, pôr a economia a crescer e pôr o desemprego a descer. Temos muito orgulho nisso!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Protestos do BE e do PCP.

Sabemos que não conseguimos evitar muitos sacrifícios que foi necessário pedir aos portugueses, mas

conseguimos evitar ruturas, conseguimos, sobretudo, fazer a nossa maior obrigação: proteger os rendimentos

dos portugueses, evitar ruturas sociais, responder à emergência social. Temos muito orgulho nisso, e é por

isso que também temos orgulho no Programa que agora apresentamos.

O Programa que apresentamos é a decorrência lógica do trabalho e do que fizemos enquanto povo e

enquanto Nação. É, como dissemos na campanha eleitoral, um Programa que demonstra que agora podemos

mais, é um Programa que, mantendo a consolidação das contas públicas, mantendo o rigor e a estabilidade,

quer ir mais longe, e já não falamos agora em excecionalidade. Queremos eliminar a excecionalidade.

Trata-se de um Programa que consolida o crescimento económico e o investimento, baixando impostos, e

que, ao mesmo tempo, já não fala em emergência social mas, sim, em desenvolvimento social, porque agora

Portugal pode mais, como dissemos na campanha eleitoral.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

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Temos muito orgulho neste Programa e neste Governo, como temos a certeza que só prosseguindo este

caminho Portugal não correrá riscos desnecessários e continuará a proteger os resultados que temos

conseguido, não voltando para trás.

Se alguém aqui, Srs. Deputados, poderia estar envergonhado é quem deixou o País na bancarrota, quem

não ajudou em nada a resolver o problema que criou e, agora, quer chegar ao poder a qualquer custo, usando

uma qualquer manigância, pondo em risco tudo o que conseguimos até agora.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Não são os interesses do País que podem ser subordinados ao interesse de uma maioria conjuntural, aos

interesses partidários ou, mesmo, à sobrevivência política de um secretário-geral. Bem pelo contrário; é o

Parlamento que deve responder às necessidades do País e as necessidades do País o que nos exigiam era

uma maioria sólida que continuasse o caminho que estamos a trilhar.

O Partido Socialista faltou a essa chamada. O Partido Socialista faltou porque não teve a humildade

democrática de ler a vontade dos portugueses, de recordar o que aconteceu em 2011 e perceber que não

devemos repetir os erros que nos levaram a essa situação dramática.

O Partido Socialista preferiu escolher um caminho inédito na nossa democracia, impedindo de governar

quem venceu as eleições. Ao fazê-lo, escolheu o caminho do radicalismo e do aventureirismo, lançando a

governação do País numa solução que não só não é legítima como não garante estabilidade. É muito

poucochinho, Srs. Deputados!

Permitam-me que vos diga, Sr.as

e Srs. Deputados, que, tendo ouvido falar ao longo destes dois dias em

expressões como seja «o desespero da direita», vos esclareça: nós, no centro-direita, somos gente tolerante.

Vozes do PCP: — Oh!…

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sabemos há muitos anos que o povo é sereno, repito, sabemos há

muitos anos que o povo é sereno. O desespero não faz parte da nossa cultura nem faz parte da nossa ética.

Nós, tal como os 2 086 165 portugueses que votaram na coligação, não estamos desesperados mas

estamos indignados. Indignados porque aquilo que esta nova troica da esquerda está a fazer, impedindo o

Governo legítimo de governar, é uma indignidade e é por isso que estamos indignados.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Substituir um Governo legítimo pode até ser formalmente possível e formalmente constitucional, mas não é

aceitável.

Sempre, na democracia portuguesa, quem venceu as eleições pode governar: foi assim com Mário Soares;

foi assim com Cavaco Silva; foi assim com António Guterres; foi assim com José Sócrates. Sempre quem

ganhou pode governar.

Mário Soares, de resto, referindo-se a posteriori a um hipotético governo formado na altura por uma soma

de partidos que não tinham ganho as eleições — e, na altura, estávamos a falar do PS, do PRD e do PCP –,

foi claríssimo e disse, e cito: «uns tipos que queriam ir a toda a força para o Governo». Na altura, estava a

referir-se a esses partidos. Mas que belo retrato para VV. Ex.as

, Srs. Deputados! Que belo retrato para VV.

Ex.as

!….

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

É muito poucochinho!

Podia também recordar aqui Jorge Sampaio, a propósito nas eleições nos Açores, quando disse: «É

inaceitável, é impensável que quem não ganhou queira governar!» Não é assim, Dr. Carlos César? Lembra-se

disso?

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

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O Sr. Carlos César (PS): — Isso não é verdade! Não foi assim!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Mas existe também uma questão de estabilidade.

A estabilidade resulta do facto de esta soma negativa que agora quer governar não ter ido a votos com

esse programa. Ou seja, pelo que percebemos, não mudaram sequer de opinião: o Bloco de Esquerda

continua a defender o fim do Tratado Orçamental e a renegociação da dívida, e, aparentemente, o PS não; o

PCP continua a defender a saída do euro e nacionalizações, como consta na moção que apresentaram —

aliás, pela primeira vez, não falam em pacto de agressão, o que já não é mau, já é um progresso —,…

Risos do CDS e do PSD.

… mas o PS também não o defende; PCP e Bloco defendem a saída da NATO, e esperemos que o PS não

o defenda também.

Ou seja, no limite, continuam diferentes e aquilo que poderíamos até acusar o PCP e o BE é de se estarem

a aproveitar, despudoradamente, do estado de necessidade de um secretário-geral do Partido Socialista. Pode

ser legal, mas não é bonito!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Cheguei a dizer que tinham mudado em 24 horas, mas faço-vos a justiça de dizer que, afinal, não

mudaram. Agora, o risco que temos com esta troica das esquerdas é o regresso ao despesismo e é o regresso

da outra troica. Este é que é o risco sério e é esse o risco que enfrentamos.

Legitimidade, quando não foram a votos com um programa conjunto, tem esse problema. Espera-vos, Sr.

Deputado João Oliveira, um choque com a realidade. Vamos ver como é que se saem desse choque com a

realidade.

É, de resto, simbólico que ao longo deste mês de reuniões de equipas técnicas, de reuniões à porta

fechada, de reuniões secretas, tanto quanto sabemos, nunca se sentaram ao mesmo tempo os três à mesma

mesa…

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP: — Nem se conhecem!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Hoje mesmo, pelo que sabemos, a assinatura dos acordos foi feita à

vez e à porta fechada, não fossem correr o risco de aparecerem os três juntos na fotografia!. Não fossem

correr o risco de aparecerem todos juntos na fotografia… Isto diz muito sobre a estabilidade.

A partir daqui, a pergunta é clara e é óbvia, e o Comité Central conhece-a bem. É a célebre pergunta de

Vladimir Ilyich Ulyanov: o que fazer? A partir daqui, o que fazer?

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Nós respondemos de forma clara: nós não desistimos porque sabemos bem o que foi necessário fazer para

tirar o País da bancarrota e proteger os portugueses. Nós não desistimos porque o que está em causa é o

futuro de Portugal e das suas novas gerações. Nós não desistimos porque fomos avaliados pelos portugueses,

ganhámos as eleições e temos legitimidade popular, eleitoral e democrática. E não só não desistimos como

ganhamos, com esta realidade, um suplemento de alma adicional, que resulta de um dos mais fortes

sentimentos que se pode ter em política: o da injustiça.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Muito bem!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — A decisão que vão tomar é ilegítima e é injusta, mas isso só nos dá

mais força para continuar, em nome dos nossos valores e em nome de Portugal.

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Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Podem até derrubar-nos, mas uma coisa resulta muito clara: caímos, mas caímos de pé e quem cai de pé

não morre!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O que conta não é o lugar onde nos vamos sentar, o que conta não é sequer o tamanho de uma maioria

aritmética e artificial, o que conta mesmo é o tamanho da nossa razão e é com ela que continuaremos a

combater.

Aplausos do CDS-PP e do PSD, de pé.

O Sr. Presidente: — Para a intervenção de encerramento, tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina Martins.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: No debate destes dois dias, foi

repetido à exaustão e em diversos formatos que nunca aconteceu o que está a acontecer. Eu não podia

concordar mais. Estamos a fazer o que nunca foi feito. Ainda bem! Estava mais do que na hora!

Aplausos do BE, do PS, do PCP e de Os Verdes.

Fazer como mandam as convenções seria o pior de tudo, porque faltaria à resposta à vida das pessoas,

como sempre tem faltado, e porque faltaria à verdade dos resultados eleitorais.

Não é no Parlamento que está a acontecer o que nunca aconteceu antes, foi no País. E nós, eleitos e

eleitas com a mesma legitimidade, representamos essa mudança. Ilegítimo seria deixar que permanecesse no

Governo a direita que a maioria do povo rejeitou.

Vamos, portanto, aos resultados eleitorais, que, aparentemente, a direita tem dificuldade em compreender.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Em 2011, o PSD, sozinho, elegeu 108 Deputados e Deputadas. Não chegava para formar um governo com

apoio maioritário no Parlamento, mas coligou-se com o CDS, que tinha eleito 24 Deputados, e conseguiram

uma maioria de 132 Deputados e Deputadas.

Hoje, PSD e CDS juntos têm apenas 107 Deputados, menos do que teve PSD sozinho em 2011, ou seja,

perderam 700 000 votos e 25 Deputados.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Para serem governo precisam que outra força política os apoie no Parlamento. E, como está à vista, não

têm esse apoio e é por isso que o vosso Governo é rejeitado, porque não têm os votos suficientes no País e

na Assembleia da República. Não os tiveram no 4 de outubro! Não elegeram Deputados e Deputadas

suficientes.

Aplausos do BE, do PS, do PCP.

PSD e CDS estão em choque e parecem achar que a obrigação das outras forças políticas é apoiá-los,

contra o compromisso eleitoral que os elegeu, contra tudo o que dissemos na campanha e nestes quatro anos

de oposição.

PSD e CDS querem que quem concorreu contra o seu Governo, agora, suporte o seu Governo, porque

sim, porque se convenceram que as soluções de governo só podem ser as mesmas de sempre e que nenhum

resultado eleitoral pode mudar verdadeiramente nada. Nunca se viu um Paulo Portas tão cavaquista como o

do dia em que perdeu o poder.

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Aplausos do BE, do PS, do PCP e de Os Verdes.

Sr.as

e Srs. Deputados: O dia de hoje marca uma mudança política no nosso País que não é pequena, que

não é fruto nem de meros jogos aritméticos conjunturais nem do voluntarismo de bancadas parlamentares.

Perceber o momento que vivemos exige compreender como cresceram as condições para esta mudança,

quem foram os seus obreiros e em que se traduz para o futuro.

Ao longo dos últimos quatro anos existiu uma reconfiguração do País que não foi pequena. A sucessão de

orçamentos inconstitucionais foi apenas a ponta do iceberg das alterações que a direita impôs contra os

pilares da democracia em Portugal.

Não há democracia sem condições de igualdade e liberdade. E por isso o acesso à educação, como à

saúde, e, desde logo, os direitos laborais são pilares de democracia. Uma escola pública e um Serviço

Nacional de Saúde fragilizados e desarticulados são condições de desigualdade. O ataque à contratação

coletiva, a precariedade e o desemprego massivos são condições do medo de quase todos, em nome da

prepotência de uns poucos.

Se hoje a direita está isolada no Parlamento foi porque se isolou nos últimos anos para atacar o País, para

quebrar o contrato social em que se funda a democracia. Quem pôs geração contra geração, trabalhadores

contra trabalhadores, pobres contra pobres, para que o ressentimento abrisse espaço à quebra do contrato

social em que se funda a democracia, acabou isolado, e ainda bem.

Aplausos do BE, do PS, do PCP e de Os Verdes.

O que a direita lê hoje como um ataque à democracia é, de facto, o resgate da democracia.

A enorme crise social que a direita impôs ao País acabou por criar novas condições políticas concretas. A

relação de forças que temos hoje na Assembleia da República corresponde ao desejo de mudança e à

esperança no País e na democracia. Se quem governou até agora não teve maioria, não é menos verdade

que a alternância do costume também não é já opção. Os resultados eleitorais exigem muito mais de todos

nós.

O milhão de pessoas que se expressou à esquerda do «centrão» representa a prioridade da resposta à

emergência social. Esse milhão é a força que mudou tudo.

E o que significa esta mudança? Desde logo, a recusa da mentira e do permanente jogo de sombras.

Vejam bem a gigantesca campanha da direita de que tudo estava melhor: das pancadinhas nas costas dos

mercados e de Berlim, à sobretaxa que ia ser devolvida, a direita teve todo o horário nobre, todos os meios de

comunicação social, para falar do seu sucesso e das suas promessas enquanto escondia o que fez e o que

tinha no Programa. E mesmo assim perdeu, perdeu 700 000 votos e perdeu a maioria porque mentiu e já não

sabe fazer mais do que mentir.

Aplausos do BE e do PS.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Sr.as

e Srs. Deputados: «Não se esqueça de mim. Não se esqueça de nós. Não se esqueça.» foram as

frases que mais ouvi nesta campanha eleitoral. Há todo um País que se sente esquecido. O País das pensões

cortadas, dos salários de miséria, do desemprego e do estágio, do velho demais para trabalhar e novo demais

para a reforma, da vida toda pela frente que só existe se for lá fora, no estrangeiro.

Um povo inteiro ouve falar dos compromissos internacionais, da instabilidade dos mercados, do perigo da

fuga de capitais, e pergunta-se: e quando terá a minha vida um segundo que seja da atenção de quem decide

das nossas vidas?

Haverá um momento para se ponderar o compromisso do Estado com quem contribuiu toda a vida e hoje

não tem sequer dinheiro para os medicamentos? De quem trabalha cada vez mais horas e só vê o salário

encolher? Quando entrará na política a preocupação tremenda com a instabilidade de quem perdeu o

emprego, de quem perdeu a casa, de quem não consegue sequer comprar os iogurtes para os miúdos?

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Haverá um momento para começarmos a preocupar-nos a sério com a fuga das pessoas do nosso País? Com

a fuga de 110 000 em idade ativa por ano, por não encontraram aqui um emprego digno?

Já sei! Aqui, neste Plenário, para a direita, falar de mercados é preocupação de gente séria; falar da fome e

do desespero, é demagogia insuportável.

Aplausos do BE, do PS e do PCP.

E, mais, repetiu a direita ao longo de todo o debate como ao longo dos últimos anos: se os mercados não

estiverem felizes e bem alimentados, ninguém no País terá o que comer. E enquanto cuidam zelosamente dos

sempre insaciáveis e irascíveis mercados nem se dão conta que o País se esvazia de gente e se esvazia de

futuro.

Eu não me esqueço! Nós não nos esquecemos!

Protestos do PSD.

O Bloco de Esquerda não se esquece e é por isso que rejeitamos este Governo, é por isso que

construímos a alternativa, um compromisso em nome das pessoas, um compromisso de quem não se demite

de responder à emergência, de quem não esquece.

Logo na pré-campanha eleitoral, o Bloco de Esquerda assumiu esse compromisso da disponibilidade para

uma maioria que respondesse à emergência. Anunciámo-lo publicamente: cá estaríamos para debater uma

solução para o País com um Partido Socialista que se comprometesse com medidas essenciais pelo emprego,

salários, pensões. E cumprimos com o nosso compromisso.

Vozes do BE: — Muito bem!

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — A recuperação de rendimentos prevista no acordo é tímida face a tudo o

que se perdeu nestes anos; a proteção social fica aquém da emergência criada pela destruição da direita; a

capacidade de investimento é curta face à absoluta necessidade de reconstrução da capacidade produtiva e

do emprego, mas são os passos possíveis…

Vozes do PSD: — Ah!…

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — … nos constrangimentos de que o Partido Socialista não abdica. Não

concordamos, mas sabemos que os passos que fomos capazes de dar juntos são a diferença entre continuar

a empobrecer ou responder pela vida das pessoas, e não faltamos à responsabilidade.

Aplausos do BE, do PS e do PCP.

A clareza de quem sempre disse ao que vem e nunca baixa os braços é a maior garantia de estabilidade

de quem não falha ao compromisso que faz.

Quem transformou linhas vermelhas em linhas laranjas para ser vice-primeiro-ministro pode não

compreender que a estabilidade radique, antes de tudo o mais, no compromisso político claro com o País.

Também essa é uma mudança que hoje fazemos e de que nos orgulhamos.

Sr.as

e Srs. Deputados, nestas eleições trabalhámos afincadamente para uma convergência o mais ampla

possível, que garanta estabilidade à vida das pessoas e que, por isso, permita uma solução de governo para a

legislatura. E foi possível. Há compromissos sobre a recuperação de rendimentos da função pública, do salário

mínimo, da reposição de pensões, do alívio fiscal de quem vive do seu trabalho, da proteção da habitação e de

cobrar impostos a quem nunca pagou e tem sempre ganho nestes anos. Compromissos com a contratação

coletiva e a proteção contra o abuso e a precariedade; compromissos com feriados e horas de trabalho;

compromissos contra privatizações, porque um país não se vende, compromissos com a escola e o Serviço

Nacional de Saúde.

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O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Concluo, Sr. Presidente.

Compromissos com a cultura e com a ciência, porque sem elas não há futuro.

Sr.as

e Srs. Deputados, dentro de momentos rejeitaremos o Governo do empobrecimento. Quando fizermos

essa votação, não estaremos apenas a livrar o País de um Governo que foi recusado pela maioria nas urnas,

estaremos também, e sobretudo, a concretizar a esperança dessa mesma maioria numa mudança que

responda pela vida concreta das pessoas.

Nos últimos dias, por todo o País, toda a gente discute política — o que foi, o que será. Ainda bem! Votar

deixou de ser um ritual com resultado pré definido.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Concluo já, Sr. Presidente.

A política —, ou seja, o País, as escolhas sobre a vida desta comunidade que é a nossa — é agora assunto

de todos e convoca cada um e cada uma de nós. A democracia é todos os dias e é agora.

Aplausos do BE, de pé, do PS, do PCP e de Os Verdes.

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para encerrar o debate, em nome do Partido Socialista, tem a palavra o Sr. Deputado

António Costa.

Aplausos do PS, de pé.

Risos do PSD e do CDS-PP.

Vozes do PSD e do CDS-PP: — Levantem-se! De pé!

O Sr. António Costa (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr. Vice-Primeiro-Ministro, Sr.as

e Srs.

Membros do Governo, Sr.as

e Srs. Deputados: A coligação PSD/CDS perdeu a maioria e está agora em

minoria nesta Assembleia da República.

Protestos do PSD.

Esta é a expressão aritmética e política da vontade de mudança que os cidadãos manifestaram nas urnas e

que nos compete, a nós, respeitar e fazer cumprir.

Aplausos do PS, do BE, do PCP e de Os Verdes.

Risos do PSD e do CDS-PP.

O Programa do Governo que nos foi apresentado não traduz esta vontade de mudança, pelo contrário, é

um programa de continuidade sem evolução. Um Programa que prossegue a austeridade para além da troica,

que defende um modelo de desenvolvimento assente no empobrecimento e na destruição de direitos, que

aposta no enfraquecimento do Estado social e na privatização dos serviços públicos, que se conforma com

uma postura submissa na União Europeia, sem se bater, na defesa dos interesses nacionais, por um reforço

da coesão e um novo impulso à convergência.

Em suma, este é um Programa do Governo que não responde à vontade de mudança dos portugueses.

Dissemos e repetimos que ninguém contasse com o PS para apoiar a continuação das políticas da

coligação PSD/CDS.

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Aplausos do PS.

Palavra dada tem de ser palavra honrada…

Protestos e risos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Sr.as

e Srs. Deputados do PSD e do CDS-PP, peço-vos que tenham o mesmo

comportamento durante intervenção do Secretário-Geral do PS que o PS teve durante as intervenções do

Primeiro-Ministro e dos vossos representantes.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Não seja parcial!

O Sr. António Costa (PS): — Vou repetir. Dissemos e repetimos que ninguém contasse com o PS para

apoiar a continuação das políticas da coligação PSD/CDS. Palavra dada tem de ser palavra honrada e esta é

a primeira razão.

Aplausos do PS e do BE.

A coligação PSD/CDS tem menos Deputados que as restantes bancadas porque teve menos votos que os

demais partidos aqui representados. Quem colocou a maioria em minoria foram os votos livres e soberanos

dos cidadãos eleitores que elegeram os 230 Deputados que compõem a Assembleia da República.

Este é um quadro político novo. A antiga maioria deixou de ser maioria e não pode pretender continuar a

ser o que já deixou de ser.

Aplausos do PS, do BE e do PCP.

Agora, já não se basta a si própria, nem para formar governo, nem para fazer aprovar a legislação da sua

iniciativa, nem tão pouco para aqui impedir aqui a aprovação de legislação que contrarie o seu Programa.

Neste novo quadro parlamentar, a coligação PSD/CDS, para ter maioria, carece sempre de obter o apoio

ou a abstenção tolerante de pelo menos uma, de duas ou mesmo das três outras bancadas.

O ónus de criar condições estáveis de governabilidade cabia, em primeiro lugar, à força política com maior

representação parlamentar, no caso o PSD, que tem mais três Deputados que o PS.

O PSD não conseguiu mais do que renovar a coligação com o CDS. Bem sei que é exatamente o mesmo

que há quatro anos, mas com uma diferença fundamental: é que há quatro anos PSD e CDS formavam só por

si uma maioria e agora PSD e CDS estão em minoria.

Aplausos do PS, do BE e do PCP.

O PSD não foi, por isso, capaz de formar um Governo com apoio parlamentar maioritário. O que aqui nos

apresenta é um Executivo minoritário, que não criou condições de governação estável e duradoura.

Portugal precisa de estabilidade e a coligação PSD/CDS não a assegura. Por isso, este seu Governo não

serve as necessidades do País, Portugal precisa de um outro Governo.

A nossa Constituição ainda não consagra, porque o PSD nunca o permitiu, a figura da moção de censura

construtiva.

Não somos, como a coligação PSD/CDS já demonstrou ser, incapazes de construir uma solução de

maioria, mas não somos mesmo uma oposição como o PSD e o CDS já anunciaram ir ser, animada pelo

revanchismo e focada na obstrução.

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Aplausos do PS, do BE, do PCP e de Os Verdes.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Vocês são-no hoje!

O Sr. António Costa (PS): — Srs. Deputados, estavam tão ansiosos por me ouvir, agora, ouçam-me!

Aplausos do PS, do BE, do PCP e de Os Verdes.

Por isso, o PS anunciou, responsavelmente, na própria noite das eleições, que não inviabilizaria a

formação deste Governo PSD/CDS se não existissem condições para formar um Governo que fosse uma

alternativa real e credível.

Este novo quadro político é também particularmente exigente e responsabilizante para o PS e para todas

as outras forças políticas, que, opondo-se à coligação PSD/CDS, têm de assumir o ónus que o PSD se revelou

incapaz de satisfazer.

Nestas circunstâncias, os portugueses interpelam o conjunto das bancadas que se opõem à coligação

PSD/CDS: estão em condições de viabilizar a formação de outro Governo no atual quadro parlamentar? Pode

esse Governo ter a consistência que só um programa de Governo coerente assegura? Pode esse Governo

beneficiar de condições de governabilidade contra moções de rejeição ou de censura? Pode esse Governo ter

perspetivas de estabilidade ao longo da Legislatura, porque a maioria que o viabiliza também se dispõe a

apreciar conjuntamente os instrumentos fundamentais da ação governativa, como sejam os Orçamentos do

Estado em cada ano?

O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — Com este acordo, não!

O Sr. António Costa (PS): — Hoje, já conhecemos as respostas a estas perguntas. As bancadas

parlamentares do Partido Socialista, do Bloco de Esquerda, do Partido Comunista Português e do Partido

Ecologista «Os Verdes» garantem o suporte parlamentar maioritário que permite a formação de um Governo

do PS, na coerência do seu programa de Governo, com condições de governação estável no horizonte da

Legislatura.

Aplausos do PS, do BE, do PCP e de Os Verdes.

Pela parte do PS, sabemos que não ganhámos as eleições,…

Vozes do PSD e do CDS-PP: — Ah!…

O Sr. António Costa (PS): — … mas sabemos também que não temos o direito de nos furtar à

responsabilidade de procurar assegurar a Portugal aquilo de que Portugal precisa nem de trair a vontade de

mudança daqueles que em nós votaram.

A aprovação da moção de rejeição não é a expressão de uma mera maioria negativa contra o Governo

PSD/CDS, …

Vozes do PSD e do CDS-PP: — Não!…

O Sr. António Costa (PS): — … nem conduz o País ao impasse ou à ingovernabilidade. Pelo contrário, é a

resposta construtiva que viabiliza um outro Governo, com um programa coerente, credível e consistente, com

condições estáveis de execução ao longo da Legislatura.

Aplausos do PS, do BE e do PCP.

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Nós não nos antecipámos nem impedimos aquilo que cabia ao PSD fazer; nós conseguimos cumprir aquilo

que o PSD não foi capaz de fazer.

Aplausos do PS.

Há uma alternativa com suporte maioritário a este Governo minoritário, há uma alternativa à precariedade

de um Governo sem capacidade de executar o seu Programa, há uma alternativa à instabilidade de um

Governo em contradição com a maioria que se lhe opõe, há, em suma, uma alternativa que serve Portugal.

É verdade que não seria a primeira vez que Portugal teria um Governo minoritário, mas seria a primeira vez

que se formaria um Governo minoritário contra a vontade maioritária de uma maioria parlamentar que

permitisse viabilizar um Governo alternativo.

Aplausos do PS, do BE e do PCP.

No passado, os Governos minoritários só se formaram porque as oposições, no seu conjunto, não lograram

formar um Governo alternativo…

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Eram sempre do PS!

O Sr. António Costa (PS): — … e, no passado, os Governos minoritários só subsistiram enquanto essas

oposições não somaram o seu voto para inviabilizar a sua governação.

E esta não é também a primeira vez que diferentes forças políticas acordam entre si soluções pós-eleitorais

que viabilizem a formação de um Governo. Para não ir mais longe, foi assim que PSD e CDS formaram o seu

anterior Governo.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Mas já tinha sido assim com dois dos Governos de Mário Soares, com os Governos de Durão Barroso e de

Pedro Santana Lopes.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

A principal novidade é que, desta vez,…

O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — Os senhores perderam!

O Sr. António Costa (PS): — … e pela primeira vez, nem PSD, nem CDS concorrem para a maioria que

viabiliza o Governo a formar.

Aplausos do PS, do BE e do PCP.

Mas é também chegado o momento de perceberem, de uma vez por todas, que não gozam do direito

natural a governar e que todas as forças políticas representadas nesta Câmara gozam de igual legitimidade

para apoiar e participar nas soluções de Governo.

Aplausos do PS, do BE e do PCP.

Que, pela primeira vez, possa haver um Governo resultante de acordos parlamentares entre o PS, o Bloco

de Esquerda, o PCP e Os Verdes é, de facto, uma novidade. Uma novidade que valoriza o pluralismo

parlamentar, fortalece a democracia e enriquece as alternativas de Governo. E quero aqui saudar o sentido de

responsabilidade patriótica que o permitiu, garantindo simultaneamente a Portugal a estabilidade governativa

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de que o País carece e assegurando aos portugueses a mudança que maioritariamente disseram querer nas

últimas eleições.

Aplausos do PS, do BE e do PCP.

A política é feita de escolhas e a escolha que fazemos dá uma solução governativa ao País e mostra que,

em democracia, há sempre alternativas, sendo nosso o dever de as construir.

O que é novo é que, desta vez, as oposições foram capazes de assegurar, à partida, uma alternativa

maioritária na formação do Governo.

Acabou um tabu, derrubou-se um muro, venceu-se mais um preconceito. Aqui, nesta Assembleia da

República, somos todos diferentes nas nossas ideias, mas todos iguais na nossa legitimidade.

Aplausos do PS, do BE, do PCP e de Os Verdes.

Ninguém desconhece a identidade plural desta base parlamentar. Nenhuma destas bancadas se dispõe a

abdicar ou a disfarçar as diferenças doutrinárias e programáticas que as distinguem. A esquerda é e deseja

continuar a ser plural e diversa e, para construirmos em conjunto, nenhum de nós tem de revogar o que é

irrevogável.

Aplausos do PS, do BE e do PCP.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. António Costa (PS): — O que permite esta solução é a capacidade que cada um teve de,

respeitando as diferenças identitárias, partilhar um conjunto de prioridades para o horizonte da Legislatura,

não com base num acordo para a fotografia, mas assente num compromisso para fazer aquilo que é

necessário.

Aplausos do PS, do BE e do PCP.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Vou terminar, Sr. Presidente.

Sim, é possível aliviar a asfixia fiscal da classe média, não obstante divergirmos sobre a nacionalização do

setor energético!

Sim, é possível melhorar o rendimento das famílias sem que tenhamos de partilhar a opinião sobre a

NATO!

Sim, é possível defender o Estado social, malgrado termos diferentes visões sobre a nossa participação no

euro!

Sim, é possível combater o desemprego e a precariedade laboral, apesar de pensarmos diferentemente

sobre a União Europeia!

Sim, é possível dizer que chegou o momento de romper com o radicalismo ideológico, a arrogância e a

autossuficiência que animou a governação da coligação PSD/CDS.

Este é o momento de pôr termo à governação da coligação, para abrir um novo ciclo governativo. Só assim

podemos virar a página, dando, novamente, aos portugueses um tempo de esperança e a Portugal um futuro

de confiança.

Aplausos do PS, de pé, do BE, do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: — Para a intervenção de encerramento do debate, em nome do Grupo Parlamentar do

PSD, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Montenegro.

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O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro e Srs. Membros do Governo, Sr.as

e

Srs. Deputados: Finalmente, ouvimos o Dr. António Costa. Mas quero começar por lhe dizer que fugiu à maior

nobreza do debate democrático: o contraditório, a salutar confrontação democrática de posições. E este não

era um debate qualquer!

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — O Dr. António Costa preferiu as reuniões secretas com os seus novos

camaradas, preferiu cozinhar nas costas do povo e ao arrepio da vontade dos portugueses uma nova hipótese

de Governo.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Uma aldrabice!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Os resultados eleitorais, o debate plural e contraditório, isso, é coisa

pouca.

Este comportamento arrogante, esta prepotência democrática, esta soberba definiu-a, em tempos, António

José Seguro. E passo a citar: «Costa é uma desilusão para os que o acharam um D. Sebastião».

Mas o Dr. António Costa lá apareceu e está cá hoje. Diz o povo «mais vale tarde que nunca». Falou para

explicar o inexplicável, falou para defender o indefensável, falou para assumir um acordo mínimo e também a

irresponsabilidade máxima. Mas, em política, não se pode fugir ao escrutínio da autenticidade, da

democraticidade, da sustentação das escolhas e da coerência.

O Dr. António Costa perdeu as eleições, mas quer ser Primeiro-Ministro. Será coerente? Os portugueses

perguntam-se: será coerente esta vontade do Dr. António Costa?

Esqueçamo-nos, por momentos, das tradições e das convenções da nossa democracia. Vejamos o próprio,

o político, o aspirante a Primeiro-Ministro.

Em 26 de maio de 2014, disse: «Nas legislativas, o PS não pode ter uma vitória que sabe a pouco. Para

ganhar eleições em condições de governabilidade, ao PS não basta ganhar por um voto. O PS tem de crescer

muito.» — citei António Costa.

Ora, um ano e meio depois, o PS não teve uma vitória que soube a pouco; perdeu! Não ganhou por um

voto, perdeu por mais de 340 000 votos! Não cresceu muito; cresceu 1% neste período, quando, em igual

período, a coligação do PSD/CDS-PP cresceu 11,5%.

Onde está a coerência do Dr. António Costa?

«Palavra dada é palavra honrada!»

Risos e aplausos do PSD e do CDS-PP.

Em 9 de setembro de 2014, disse: «Eu não quero ser desagradável, mas há um equívoco na leitura que

fazes do resultado das europeias. Toda a gente percebeu que dificilmente o PS ganharia as legislativas. Se o

PS tivesse tido o resultado que eu desejava, não dava este passo» — disse António Costa para António José

Seguro.

Ó Dr. António Costa, eu também não quero ser desagradável, mas veja o ridículo do seu equívoco agora! A

gente não percebeu que o PS dificilmente ganharia. Toda a gente percebeu, o povo votou, e o PS perdeu

mesmo! Que passo dá o Dr. António Costa, agora?!…

Mas, vamos dar mais um salto, vamos até 29 de março de 2015, ao Teatro Rivoli, no Porto. Disse António

Costa: «Quando o PS apela a uma maioria «não o faz pela mesquinha vontade de ter mais Deputados do que

os outros; fá-lo porque quer que o Governo seja formado por decisão dos portugueses e não por jogos

políticos na Assembleia da República».

Vozes do PSD e do CDS-PP: — Oh!…

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — «Palavra dada, palavra honrada»!

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Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Que «pérola» da incoerência política! Foi o Dr. António Costa que o disse e é o Dr. António Costa que está

a fazer o contrário! É esta a sua credibilidade?!

Já agora, vamos também a 9 de abril de 2015, quando disse: «Não podemos deixar nem aos jogos

partidários nem à vontade do Presidente da República a escolha do novo Governo. No País de Abril, quem

vota e quem escolhe os Governos é o povo e vai ser o povo a escolher o próximo Governo.»

Deixem-me dizer, simpaticamente: Elementar, meu caro Costa, é o povo que escolhe o Governo.

Risos de Deputados do PSD.

É, aliás, da ética republicana — que tantas vezes invocam aqui! Ou não é, Srs. Deputados do Partido

Socialista?

«Palavra dada é palavra honrada!»

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

E, sobre os novos «camaradas de viagem», vamos mais perto, só há dois meses, ao dia 4 de setembro.

Disse António Costa: «Quem ouvir o PCP e o Bloco de Esquerda percebe que os dois partidos só têm um

objetivo — combater o Partido Socialista. São meros partidos de protesto. Querem estar nas manifestações,

mas não no Governo, a resolver o problema das pessoas». É mais ou menos o que está a acontecer por estes

dias, na tal palavra dada que é a palavra honrada.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

E disse também: «Há uma radical diferença entre o PS e a dupla PCP/Bloco de Esquerda, que tem a ver

com a Europa: para nós a Europa e o euro são inegociáveis». Portanto, alguém capitulou, neste domínio,

alguém perdeu de vista as suas convicções.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Exatamente!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Para terminar estas citações, vamos, por assim dizer, à mais «costista»

das palavras, numa derradeira citação: a palavra «poucochinho».

Estamos, ainda mais perto do dia de hoje, foi em Odivelas, a 19 de setembro de 2015: «Para que haja

estabilidade, é necessário que não ganhemos por poucochinho, porque, como já disse uma vez, quem ganha

por poucochinho só pode fazer poucochinho. Precisamos de uma vitória clara que seja inequívoca, que nos dê

uma maioria».

É António Costa que o diz: «Quem ganha por poucochinho só pode fazer poucochinho». E o País pergunta:

então, se é assim, quem perde por muito o que é que pode fazer?

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Arranjinhos à la carte? É isso que pode fazer?

Vozes do CDS-PP: — Uma golpada!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Ficar refém de programas despesistas, ideologicamente fanáticos? É

isso que pode fazer?

Sr.as

e Srs. Deputados: O PS vai derrubar o Governo que ganhou porque quer ser o Governo que perdeu.

Que oposição mais bota-abaixista pode haver maior do que esta, Dr. António Costa? Estava, há pouco, a

querer antecipar aquilo que poderá ser hipoteticamente a oposição do PSD e do CDS? Mas já viu a sua

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oposição? Nem um dia de execução do Programa do Governo e já está a deitar abaixo o Governo? E veio

aqui invocar os exemplos de 2002 e de 2011 como se fossem similares?!

Já ontem tive a ocasião de lhe dizer — o Sr. Deputado não quis participar no debate e, portanto, não

pudemos cruzar posições — que é de facto, confundir o inconfundível. É que há uma outra coisa que o Sr.

Deputado não disse, ou seja, que todos os Governos minoritários, até agora, não foram derrubados com a

aprovação de moções de rejeição, e nenhum Governo do Partido Socialista teve o PSD a fazer aquilo que o

Sr. Dr. António Costa e o Partido Socialista estão, hoje, a fazer a este Governo, legitimado nas urnas.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Nunca aconteceu, nunca aconteceu! Perguntem a Mário Soares! Perguntem a António Guterres! E

perguntem, mesmo, a José Sócrates!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O essencial deste debate, Srs. Deputados, é, portanto, simples ou relativamente simples: havia um líder

que era para ganhar eleições por muito, «muitinho», porque o anterior ganhava por «poucochinho». Depois,

perdeu, perdeu por muito.

Risos de Deputados do PSD.

E, qual náufrago político, estava a ir ao fundo, a afogar-se no mar e na viagem que ele próprio escolheu.

Eis senão quando avistou duas boias. A distância para as boias era enorme, programaticamente era mesmo

quase irrecuperável. E, por isso, aquilo que nós hoje aqui temos, neste dia, não é um acordo tripartido, não é

um Governo formado a três, com membros do Governo de todos os partidos. Aliás, nem é um acordo, parece

que é uma posição política comum, que é, agora, um novo conceito.

Mas há uma coisa que é inequívoca: esta solução é frouxa, é incoerente, está carregada de imprecisões,

de incompatibilidades, de incertezas.

Até porque havia um outro problema: é que a salvação não era possível só com uma boia. Uma boia não

chegava, eram precisas as duas. E, por isso, os portugueses, admitindo-se constitucionalmente a solução,

ainda poderiam pensar: bom, mas se eles se juntarem os três, se eles tiverem um programa único, se eles

forem os três para o Governo, talvez possam dar garantias de execução do seu programa.

Mas, não, não foi nada disso que aconteceu!

Até para a apresentação das moções de rejeição tiveram que apresentar cada um a sua. E, assim, este

«afogado político» teve de agarrar-se às duas boias, com uma pequena grande questão: é que vai ser

obrigado a seguir o caminho que essas boias lhe indicarem, porque, no dia em que não tiver o apoio de uma

das boias, não vai ter salvação na maioria parlamentar.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Claro que esta é uma escolha, é uma escolha firme, e os Srs. Deputados do PCP e do Bloco de Esquerda,

quais boias salvadoras, estão aqui para garantir que a boia não se vai furar. Nós vamos ver e vamos aguardar.

Mas, Sr.as

e Srs. Deputados, no encerramento deste debate, eu gostava de dizer também, de forma muito

clara e frontal, que hoje, nesta Assembleia da República, assistiremos à adulteração da vontade popular

expressa nas últimas eleições legislativas.

Vozes do PS: — Oh!…

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — O PSD e o CDS governaram quatro anos, e, com os portugueses,

retomámos o crescimento a e a criação de emprego, prestámos contas, fomos a votos e ganhámos,

claramente, as eleições.

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Trouxemos para aqui um Programa, sim, de continuidade, e, sim, para continuar a transformar Portugal, já

não num contexto de emergência, mas num contexto de crescimento que é o atual.

O Sr. João Oliveira (PCP): — É o crescimento para baixo!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — A nossa economia está a crescer, as nossas contas públicas estão

equilibradas, o desemprego está a diminuir,…

Protestos do Deputado do PCP João Oliveira.

… sem demagogias, com realismo!

Trata-se de um Programa que assegura a saúde financeira do Estado, que combate as desigualdades

sociais, que quer modernizar a Administração Pública, que quer cumprir as nossas principais obrigações

internacionais e europeias. Um Programa que quer preservar o Estado social e quer dar, cada vez mais, uma

oportunidade a todos os portugueses para fazerem vingar o seu projeto de vida pessoal e profissional.

Os portugueses sabem que o caminho dos últimos anos foi de grande esforço, e estou convencido de que

não querem, de maneira nenhuma, desperdiçá-lo!

Os portugueses sabem que se hoje invertermos este caminho a responsabilidade é de quem vai aprovar as

moções de rejeição, mas é, em particular, do maior partido da oposição.

Quero, em nome do PSD, afirmar aqui, mais uma vez, que não vamos abandonar Portugal.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Não fomos nós que dividimos os portugueses entre «o nós» e «o eles».

Não fomos nós, repito, que dividimos os portugueses entre «o nós» e «o eles»!

Temos muito respeito pelo esforço e pelo sacrifício das pessoas!

Temos respeito por quem ainda não tem emprego!

Temos respeito também por quem, na sociedade, nas empresas, nos serviços públicos, nas instituições de

solidariedade social constrói a força de um País justo, solidário e ambicioso!

Um futuro Governo liderado pelo PS, se existir, não é de facto, fruto da vontade popular.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Não!…

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Mas os portugueses sabem quem impediu este Governo legítimo de

governar e, naturalmente, no momento próprio, não vão deixar de atribuir essa responsabilidade.

Hoje, derruba-se o Governo do povo.

Risos do PS, do BE e do PCP.

Talvez venha a haver um Governo de alguns Deputados, mas hoje derruba-se o Governo que o povo

escolheu.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Os vossos Deputados foram escolhidos pelo povo. E os nossos não?

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Quero terminar dizendo que nenhuma, mas nenhuma mesmo, jogada

parlamentar derrubará as nossas convicções e as nossas responsabilidades.

Aplausos do PSD e do CDS-PP, de pé.

O Sr. Presidente: — Em nome do Governo, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

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O Sr. Primeiro-Ministro (Pedro Passos Coelho): — Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr.as

e

Srs. Deputados: Ao encerrar, pela parte do Governo, este debate do Programa do Governo, quero começar

por destacar que o Governo se apresentou a esta Câmara com um Programa que é de coerência.

Houve quem lhe tivesse chamado de continuidade. Na verdade, o Governo não mudou nem de atitude,

nem de posição. O que mudou foram os problemas e a situação do País. E mudaram bem, porque mudaram

em razão da ação a que procedemos durante quatro anos.

Disse-o na abertura desta discussão ontem e foi realmente com ansiedade e angústia que iniciámos o

nosso mandato em 2011. O País estava à beira da bancarrota, tinha, durante quase 10 anos, duplicado a sua

dívida externa e o Estado tinha as contas descontroladas, não conseguindo ter acesso a financiamento e, por

isso, não conseguindo fornecer o que era indispensável para cumprimento das suas obrigações externas e

internas.

Por isso mesmo, começámos o nosso mandato a executar um Memorando de Entendimento que não foi

por nós negociado,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Não?!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … mas que foi por nós concluído.

Hoje, esse Programa de coerência com que nos apresentamos ao Parlamento evidencia a recuperação das

finanças públicas e a recuperação da economia, evidencia o equilíbrio externo que persiste há três anos e

exibe o desendividamento progressivo quer do Estado, quer dos privados.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Como é que pode dizer uma coisa dessas?!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Temos, hoje, uma taxa de desemprego inferior àquela que conhecemos

quando iniciámos funções em 2011. Em virtude disso, criámos condições para defender e até reforçar o

Estado social. E já aqui o disse: o Estado social que não é financiável por um Estado falido ameaça todos os

portugueses.

Os portugueses, hoje, sabem que podem confiar no seu Estado social porque se esforçaram muito e

sacrificaram muito para que esse Estado social fosse defendido.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Tivemos também a possibilidade de defender o serviço público e aproveito para recordar aqui que, apesar

de haver, ao fim de todos estes anos, quem confunda serviço público com propriedade pública, na verdade

nunca os confundimos e sempre defendemos o interesse público e o serviço público, mesmo quando fizemos

privatizações em Portugal.

Aplausos do PSD e do CDS-PP

O Programa com que nos apresentámos é, portanto, um Programa que pode atacar problemas sérios que

subsistem com outro domínio de possibilidades. Quando colocámos uma nova prioridade na ação política do

Governo, sabíamos que não era possível realizar tudo em quatro anos e que havia mesmo instrumentos que

não estavam disponíveis quando iniciámos esse caminho há quatro anos.

Não temos, portanto, em Portugal, à nossa frente, nestes quatro anos, o quadro negativo de que partimos

em 2011. O nosso Programa reflete a obediência à estabilidade e à responsabilidade para com os sacrifícios

que os portugueses fizeram, e que lhes pedimos, e, ao mesmo tempo, apresentámo-lo de uma forma

antidemagógica, de uma forma não eleitoralista, enfim, de uma forma determinada e realista.

A oposição, devo dizer, as oposições foram derrotadas por estes factos. Não esqueço que ao longo destes

quatro anos as oposições profetizaram que não cumpriríamos as nossas metas, que não conseguiríamos

evitar um segundo resgate, que não conseguiríamos sobreviver à emergência financeira e económica e que

iríamos colapsar numa emergência social. E nada disto aconteceu em Portugal nestes quatro anos!

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Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Mas a oposição não foi apenas derrotada pelos factos,…

O Sr. João Galamba (PS): — Factos que o Sr. Primeiro-Ministro inventa!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … foi também derrotada nas eleições. Quem considera que a oposição

ganhou pressupõe que ela se apresentou com uma unidade que ela não tem.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Outra vez esta história?!

O Sr. Primeiro-Ministro: — E, de facto, não há unidade nas oposições derrotadas nas eleições. Basta

olhar o programa de cada uma das oposições e ver o quão incompatível entre si é esse conjunto de

programas.

Quando agora se propõem derrubar o Governo que ganhou as eleições, como, de resto, ficou bem patente

ao longo deste debate, as oposições só manifestaram um propósito, um único propósito: reescrever o

resultado eleitoral e converter uma soma de derrotas numa maioria negativa para afastar o Governo que

ganhou as eleições.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

E, até agora, essa maioria negativa ainda não passou disso mesmo, ou seja, de uma maioria negativa.

Evidentemente, esta circunstância só se apresenta possível porque essa é a vontade do Partido Socialista.

Isto é iniludível. De facto, não é a vontade do Partido Comunista Português, do Partido Ecologista «Os

Verdes» e do Bloco de Esquerda que determinarão o chumbo deste Programa. Estes partidos não fizeram

outra coisa durante os últimos quatro anos que não fosse pedir a demissão de um Governo de maioria

absoluta.

Realmente, o resultado democrático nunca impediu estes partidos de desrespeitarem a vontade popular, a

não ser que a vontade popular fosse a sua própria.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Setecentas mil vontades populares!

O Sr. Primeiro-Ministro: — O PS, portanto, faz aqui a diferença. O PS afirmou com antecedência que

apresentaria uma moção de rejeição do Programa do Governo e que viabilizaria essa rejeição, depois de ter

dito que só o faria se tivesse uma maioria alternativa, uma maioria estável, duradoura e consistente, maioria

essa que ainda não apresentou, até este momento, nenhuma solução política que garanta estabilidade.

O Sr. António Costa (PS): — Ora essa!

O Sr. Primeiro-Ministro: — E foi penoso ouvir o Secretário-Geral do Partido Socialista explicar ao País, ao

fim de tantas semanas depois das eleições, que a plataforma de que dispõe para derrubar este Governo nem

sequer salva ou garante o Governo que aí vem de uma maioria que o derrote neste Parlamento, porque nem

sequer tem garantido um acordo que inviabilize a rejeição do seu Governo, no futuro.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos da Deputada do PS Isabel Alves Moreira.

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Por que razão procede assim, então, o Partido Socialista? Atrevo-me a dizer, do que ouvimos no debate,

que as diferenças que foram assinaladas face ao Programa do Governo e que justificariam um chumbo do

próprio Governo são, em muitos aspetos, ou artificiais ou propositadamente empoladas. É verdade que

também há diferenças sensíveis em algumas matérias económicas e essas diferenças são saudáveis, mas

não justificam só por si o derrube de um Governo que tenha saído das eleições.

O Partido Socialista veio aqui falar-nos, então, de austeridade, justificando com a política de austeridade a

necessidade de derrubar este Governo, mas parece-me que a questão da política de austeridade é uma falsa

questão. De facto, foi um Governo do Partido Socialista que começou em Portugal por cortar salários, congelar

pensões, subir impostos, criar contribuições extraordinárias, propor cortes em pensões em pagamento

equivalentes aos que se aplicaram em salários, acabar com prestações de abono de família, entre muitas

outras.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Isto a que hoje o Partido Socialista chama «o radicalismo e o abandono do centro» foi iniciado pelo Partido

Socialista ainda em 2010.

Vozes do PSD e do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Então, devemos dar razão ao Partido Socialista? É esta uma política de

radicalismo que nos afasta do centro político? Devo dizer que não. De facto, estas medidas e estas políticas

que o Partido Socialista iniciou não foram mais do que a consequência da irresponsabilidade do Governo que

liderou durante seis anos.

A verdade é que o Partido Socialista teve de adotar todas estas medidas depois de ter, desde 2005,

conduzido a política nacional, em primeiro lugar, com uma maioria absoluta e, depois, com uma minoria

parlamentar sustentada pelos outros partidos neste Parlamento.

Então, se é assim, por que escolheu o Partido Socialista agora chumbar o Governo, inviabilizando o seu

Programa?

Parece-me evidente que o Partido Socialista recusou associar-se à maioria maior desta Câmara e do País,

que é uma maioria de matriz europeia, e preferiu juntar-se às minorias que o têm combatido desde sempre e a

quem, que se saiba, não o ligam quaisquer laços importantes quer em matérias de fundo, quer em matérias de

soberania. Aliás, convém recordar que o que de mais estruturante o Portugal democrático fez foi feito, seja ao

nível das revisões constitucionais, seja ao nível da adesão à União Europeia, contra essas minorias e com o

Partido Socialista, com o Partido Social Democrata e com o CDS-PP.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

E foi assim, evidentemente, porque aqueles que sempre combateram o Partido Socialista sempre se

colocaram fora desse consenso em matéria nacional. E, a menos que o atual Partido Socialista nos venha

revelar proximamente diferenças essenciais na sua matriz programática, nós não podemos concluir outra coisa

que não seja, o que é legítimo supor, que o que move a liderança do Partido Socialista, hoje, não é senão o

apetite pelo poder.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O que o PS nos oferece como explicação não é convincente. Conforme está prometido, se vier a derrubar,

hoje, este Governo por vontade do Partido Socialista é bom não esquecer que essa vontade se formulou não

porque o Partido Socialista tivesse sido ostracizado, mas porque fez uma escolha radical.

Quando propus ao Dr. António Costa que se associasse a esta maioria maior, até integrando-a, se fosse

caso disso, no Governo, fi-lo diretamente por achar que isso era importante para o futuro do País. Ao ter

recusado essa proposta para dizer ao Sr. Presidente da República: «Não perca tempo a nomear este

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Governo, que não tem estabilidade», poderia ter acrescentado: «Não tem estabilidade porque eu não estou

disponível para lha conferir».

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Mas, então, Sr.as

e Srs. Deputados, Sr. Presidente da Assembleia da República, se esta maioria negativa

que hoje se propõe derrubar o Governo o fizer, ela tem moralmente a obrigação de se converter numa maioria

positiva. É assim que ela deve ser conduzida, com sentido de responsabilidade perante o Sr. Presidente da

República. O que conhecemos hoje, dos acordos políticos que foram realizados, não sustenta essa visão de

maioria positiva.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Se fosse, como diz o líder do Partido Socialista, pedra de toque para avaliar a estabilidade de um governo

pôr questões fundamentais de lado, metê-las na gaveta ou em suspenso, para não inviabilizar o derrube de

um governo nem a posse do seguinte, se para isso bastasse um processo de consultas antes que moções de

censura sejam apresentadas ou que orçamentos venham a ser apresentados, por que razão não estaria o

Partido Socialista disposto a oferecer esse mínimo de condições a quem ganhou as eleições?

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O que se passará, então, neste Parlamento, não é normal. Nunca foi normal em 40 anos e não pode ser

entendido como normal por ninguém. Os representantes do povo no Parlamento não têm uma missão

mandatória estrita,…

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … podem sempre interpretar o voto do povo. Sempre defendi que o mandato

representativo não é limitado nem mandatório e, às vezes, é mesmo preciso interpretar a nossa representação

em função daquilo que entendemos ser o mais adequado. Por isso, respondemos perante aqueles que

representamos nas eleições, mesmo quando podemos ou devemos ir contra aquilo que parece ser a vontade

de quem nos escolheu, mas temos de concordar na audácia de fazer uma tão rápida reinterpretação da

vontade popular, quando as eleições tiveram lugar ainda há algumas semanas no País.

Portanto, a reinterpretação que está a ser feita significa, ao contrário do que é normal e do que foi normal

em 40 anos, que o Partido Socialista, em função da sua ambição de poder, não se importa de revogar o

mandato que foi conferido a este Governo nas eleições para que ele próprio possa assumir as funções de

Governo.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Mas, então, há realmente um imperativo de clarificação que devemos respeitar. Que fique muito claro: não

só esta maioria negativa tem ainda de evoluir mais para poder ser uma verdadeira maioria positiva — o que

vimos, até hoje, não é uma maioria positiva —, mas tem também de ser suficiente. Esta maioria que derruba

hoje o Governo está, de facto, obrigada à suficiência parlamentar, seja para a ação e a atividade corrente do

Governo, seja para as questões maiores de governação e que são indispensáveis a qualquer governo, a

saber, Orçamentos do Estado, apresentação de programas de estabilidade, execução de reformas estruturais,

cumprimento de regras europeias e de tratados internacionais.

O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — É isso mesmo!

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O Sr. Primeiro-Ministro: — Quem hoje votar pelo derrube do Governo legítimo não tem legitimidade para

mais tarde vir reclamar sentido de responsabilidade, de patriotismo ou de europeísmo a quem hoje se negou

todos estes atributos.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Não há, aqui, Sr.as

e Srs. Deputados, ao contrário do que há pouco ouvi, nenhum revanchismo,…

Risos do PCP.

… o que há é uma questão de ética, e de ética republicana também.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Espero que as circunstâncias que se vão seguir a esta votação não venham confirmar aquilo que vai sendo

avançado nas notícias, isto é, de que dela emergirá um Governo minoritário do Partido Socialista, apoiado por

três minorias parlamentares radicais que sempre combateram o Partido Socialista. Porque assim se

confirmaria, se acontecesse, que, na visão da democracia do Secretário-Geral do Partido Socialista, só

governos minoritários socialistas é que podem ser admissíveis dentro da Casa da democracia. Se não forem

do Partido Socialista, a eles se deve exigir a maioria absoluta.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, não acredito na coesão desta nova maioria que se anuncia.

Desconfio que o País também não. Falta-lhe identidade, falta-lhe cimento.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Vocês acabaram com a Cimpor!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Por isso, o que se anuncia é, realmente, um Governo minoritário e que se

constitui em cima de uma soma de vontades minoritárias e, como sabemos, a soma das partes é sempre

diferente do todo. E o todo do Governo que está a pré-anunciar-se, neste caso, não vai além da soma das

partes, permanece aquém da soma das partes.

Desconfio também do que se está a prometer e, sobretudo, de que o prometido seja compatível com as

nossas obrigações europeias e com o interesse próprio de tirar o País da pressão da dívida e do défice, sem o

que não é possível aliviar a pressão dos impostos e atrair investimento que sustente crescimento e emprego,

como até aqui.

Sei, por experiência própria, e não apenas dos livros, que ganhar autonomia financeira e política não se faz

lançando dúvidas sobre a capacidade de cumprir. E, como, de resto, o que se promete hoje em matéria de

alívio fiscal ou de rendimentos tem sempre um preço, porque, se o não tivesse, todos nós, hoje, estaríamos a

fazer as mesmas promessas, cá aguardaremos pela fatura correspondente.

É evidente que o que podemos aliviar agora resulta do esforço duro que fizemos nestes anos. Espero que

o que nos prometem agora para futuro não se tenha de pagar em dobro amanhã.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Como disse o Governador do Banco de Portugal, os erros de política

económica que se fizerem agora serão pagos com mais dor no futuro. E não será apenas assim…

O Sr. João Galamba (PS): — Foi encomendado para o seu discurso?!

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O Sr. Primeiro-Ministro: — Eu sei que o Sr. Deputado tem sempre grande consideração e respeito pelas

figuras da democracia portuguesa e pelo Sr. Governador do Banco de Portugal… Eu respeito-os sempre,

independentemente das minhas simpatias.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Mas, como diz o Governador do Banco de Portugal, se os erros de política económica que se fizerem hoje

pagam-se com mais dor no futuro, a verdade é que foi sempre assim no passado, não é só no futuro que será

assim, foi sempre assim no passado e, infelizmente, preservamos boa memória desse passado — ou má

memória, em melhor razão.

De resto, ainda não iniciou funções um tal governo e já temos a desconfiança dos investidores a expressar-

se no anormal alargamento dos spreads da dívida pública e nos credit default swaps, que medem, justamente,

o risco de incumprimento da dívida pública.

Concluo, Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, dizendo que, no que me diz respeito, no que nos diz

respeito, não estamos nem nunca estivemos agarrados ao poder.

Vozes do PS e do PCP: — Ah!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Temos, do poder, uma noção de serviço e, portanto, que deceção para as

oposições deleitar-se com uma ideia falsa, que é a de que nos custará muito sair do Governo. Não é todos os

dias que se sai do Governo com o voto do eleitorado.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Poucos políticos se poderão orgulhar dessa circunstância. Nós cá estaremos a lutar por Portugal, como, de

resto, estamos habituados a fazer, em coerência e fiéis aos nossos princípios. Sempre disse que não

abandonava o meu País, e não o abandono. Se não me deixam lutar por ele à frente do Governo, como

quiseram os eleitores, lutarei no Parlamento, por que me orgulho de ter muito respeito.

Aplausos, de pé, do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Obrigado, Sr. Primeiro-Ministro.

Srs. Deputados, vamos passar à votação da moção de rejeição n.º 1/XIII (1.ª) — Do Programa do XX

Governo Constitucional (PS).

Esta é uma votação com recurso a voto eletrónico e, portanto, para os Srs. Deputados que não estão

familiarizados com o sistema, vou tentar, rapidamente, explicar: as Sr.as

e os Srs. Deputados que quiserem

votar contra a moção de rejeição levantam-se quando eu perguntar «quem vota contra» e pressionam a tecla

vermelha, que é o «não»; os que quiserem abster-se levantam-se quando eu perguntar «quem se abstém» e

pressionam a tecla branca, que é a da «abstenção»; e os que quiserem votar a favor da moção de rejeição

levantam-se quando eu perguntar «quem vota a favor» e pressionam a tecla verde, que é o «sim».

Mas, primeiro, vamos proceder à verificação de quórum, apesar de sabermos que existe. Peço aos Srs.

Deputados que tiverem problemas em se registar no sistema eletrónico que informem a Mesa desse facto,

para que os serviços possam corrigir alguma falha.

Pausa.

Srs. Deputados, penso que podemos passar à verificação de quórum, utilizando os meios eletrónicos, pois

não podemos esperar mais tempo.

Pausa.

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O quadro eletrónico regista a presença de 220 Deputados, dos quais 86 são do PSD, mas suponho que

estejam mais do que 86 Deputados na Sala… Dizem-me que há três Srs. Deputados do PSD que não

conseguiram registar-se.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, como julgo que é fácil de contar, estão presentes 15

Deputados do PCP e, no resultado da verificação de quórum, só aparecem 13 e julgo que todos fizeram o

registo eletrónico.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr. Presidente, peço a palavra também para uma interpelação à

Mesa.

O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr. Presidente, é notório e fácil de perceber que estão presentes os

18 Deputados do CDS-PP. Simplesmente, os Srs. Deputados João Rebelo, Manuel Isaac e, creio, Filipe Lobo

d’Ávila não conseguiram registar-se no sistema eletrónico. Por isso, ou repetimos ou, então, contamos com a

presença deles, que é pública e notória. É como o Sr. Presidente entender.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, penso que podemos proceder à votação — já se viu que há quórum

de votação —, esperando que os problemas eletrónicos sejam, entretanto, solucionados.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Sr. Presidente, a bancada do PSD regista, na verificação de quórum,

86 Sr.as

e Srs. Deputados e pelas informações que temos estão presentes os 89 Deputados.

De qualquer forma, tratando-se de uma votação que é especial e que, além disso, carece de maioria

absoluta dos Deputados em exercício de funções ou repetimos a verificação de quórum para que todos

possam registar-se, o que nem sempre acontece por força dos problemas informáticos, ou, então, a votação

terá de ser nominal ou por fila para que se possa verificar que cada um dos Srs. Deputados pôde exercer o

seu direito de voto, tanto mais quando se trata de uma matéria como esta.

Sr. Presidente, esta é a sugestão que a bancada do Partido Social Democrata faz.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos, então, tentar, de novo, proceder ao registo de todos os Srs.

Deputados. Peço aos serviços que voltem a pôr o sistema a zeros, para que se possa recomeçar o processo

de registo dos Srs. Deputados.

Pausa.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, julgo que no Grupo Parlamentar do PCP o problema está

identificado. O sistema eletrónico não regista o Sr. Deputado Francisco Lopes e a Sr.ª Deputada Rita Rato

aparece associada ao Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda, o que é manifestamente incorreto.

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Risos.

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — Sr. Presidente, pedi a palavra para dizer que os Srs. Deputados

José Manuel Carpinteira e Maria Antónia Almeida Santos, apesar de estarem no Hemiciclo, não conseguem

fazer os seus registos. Mas temos presentes os 86 Deputados.

O Sr. Presidente: — Há vários Srs. Deputados que não conseguem registar-se eletronicamente, mas

vamos proceder à votação.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Luís Montenegro, faça favor.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr. Presidente, numa interpelação à Mesa, para tentar ajudar a

solucionar este problema, porque se há dia em que estas imperfeições informáticas não podem deixar margem

para dúvidas, para interesse de todos os que querem aprovar e os que querem rejeitar a moção ou as moções

que vão a votação, é hoje, sugiro, creio que não é difícil, que se faça uma votação por fila. São seis filas, são

seis contagens, é só somar os votos a favor, os votos contra e as abstenções e proclamar o resultado. É a

forma mais fácil de ultrapassar esta dificuldade informática e de termos uma votação fidedigna, face à

presença de Deputados na Sala.

O Sr. Presidente: — Obrigado pelo seu contributo, Sr. Deputado Luís Montenegro. Penso que essa é uma

boa solução.

Vamos, então, proceder à votação, por fila, da moção de rejeição n.º 1/XIII (1.ª) — Do Programa do XX

Governo Constitucional (PS), sendo que a sua aprovação exige maioria absoluta dos Deputados em

efetividade de funções.

Submetida à votação, obteve os votos da maioria absoluta dos Deputados em efetividade de funções,

tendo-se registado 123 votos a favor (86 do PS, 19 do BE, 15 do PCP, 2 de Os Verdes e 1 do PAN) e 107

votos contra (89 do PSD e 18 do CDS-PP).

Aplausos, de pé, do PS, do BE, do PCP e de Os Verdes.

A solicitação dos partidos que entregaram outras moções de rejeição, considera-se que o objetivo da

primeira moção de rejeição completa este exercício e que não vale a pena votar mais três moções de rejeição.

Assim sendo, as consequências políticas são estas: a moção de rejeição foi aprovada e, consequentemente,

de acordo com o artigo 217.º do Regimento da Assembleia da República — Rejeição do programa do Governo

e voto de confiança —, n.º 6, o Presidente da Assembleia da República comunicará ao Presidente da

República, para efeitos do artigo 195.º da Constituição, a aprovação desta moção de rejeição. O artigo 195.º

da Constituição é o artigo sobre a demissão do Governo.

Os grupos parlamentares, querendo, dispõem de 5 minutos para produzir declarações de voto.

Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, o Sr. Secretário, Deputado Duarte Pacheco, vai proceder à leitura do

expediente.

Tem a palavra.

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11 DE NOVEMBRO DE 2015

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O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram

admitidos, os projetos de lei n.os

24/XIII (1.ª) — Determina o cancelamento e a reversão do processo de fusão

da Rede Ferroviária Nacional (REFER, EPE) com a EP — Estradas de Portugal, SA, e sua transformação na

sociedade anónima com a denominação Infraestruturas de Portugal, SA (PCP) e 25/XIII (1.ª) — Determina o

cancelamento e a reversão do ajuste direto e do processo de «subconcessão» a privados da STCP e Metro do

Porto (PCP).

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, terminados os nossos trabalhos, informo que a próxima sessão

plenária terá lugar amanhã, pelas 15 horas, tendo como ordem do dia a apreciação e votação do projeto de

deliberação n.º 1/XIII (1.ª) — Elenco e composição das comissões parlamentares permanentes (Presidente da

AR).

Está encerrada a sessão.

Eram 17 horas e 20 minutos.

———

Declaração de voto enviada à Mesa, para publicação, relativa ao Programa do XX Governo Constitucional

Após o encerramento do debate sobre o Programa do Governo da coligação Portugal à Frente e a

consequente apresentação da primeira moção de rejeição apresentada no Parlamento, o PAN — Pessoas-

Animais-Natureza apresenta uma declaração de voto.

O sentido de voto teve como primeiro critério de decisão as causas e valores do partido, recordando que o

PAN não se revê nos enquadramentos deterministas à esquerda, centro ou direita — os quais serão sempre

reducionistas — e que este voto prende-se exclusivamente com a análise das propostas do atual Programa do

Governo, à luz daqueles que são os princípios que organizam as causas e valores do PAN.

Apesar da proteção animal ter merecido uma nova atenção no Programa apresentado pelo Governo, o

PAN identificou várias lacunas, omissões e pontos nos quais o partido não se revê.

Foram colocadas no momento de debate oito perguntas concretas pelo PAN com o objetivo de obter

respostas claras, o que, infelizmente, não aconteceu. O Sr. Primeiro-Ministro não respondeu à nossa pergunta

sobre a inclusão das terapias não convencionais no Serviço Nacional de Saúde (SNS), nem à nossa questão

sobre organismos geneticamente modificados (OGM), o mesmo acontecendo com o pedido de esclarecimento

que fizemos sobre a eventual privatização do sector das águas.

Questionámos ainda o Sr. Primeiro-Ministro sobre o estatuto jurídico dos animais, deixando de os

considerar como coisas, bem como da possibilidade de dedução das despesas médico-veterinárias em sede

de IRS. As respostas aqui prestadas limitaram-se a remeter para o quadro vigente (das despesas gerais),

equiparando os animais de companhia a outros artigos do quotidiano, como, por exemplo, relógios de pulso ou

peças de vestuário.

Nestes dias de discussão do Programa, verificou-se uma evidente ausência de resposta por parte do

Governo quanto às questões relacionadas com o impacto da violência a que as crianças estão sujeitas

aquando da participação e assistência em espetáculos de tauromaquia.

Pedimos também esclarecimentos sobre as propostas para procurar o problema do desemprego estrutural

e tecnológico, que se reporta a cerca de 1 milhão de portugueses que se encontram excluídos do mercado de

trabalho de forma permanente.

Foram também colocadas questões que demostram as nossas reservas quanto ao modo como o Programa

do Governo pretende mitigar o problema das emissões de gases de efeito de estufa, mais especificamente

relacionados com o controlo das emissões de metano, cujo impacto é predominante para o aquecimento

global.

O PAN reconhece que o Programa traz algumas propostas que indicam ligeiros ajustes ao desagravamento

dos sacrifícios que foram pedidos aos portugueses. Contudo, ao aprofundar com mais detalhe, é manifesta a

linha de continuidade com o rumo seguido pelo Governo durante os quatro anos anteriores, acentuando-se

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I SÉRIE — NÚMERO 4

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cada vez mais a preponderância da lógica de mercado em detrimento da qualidade de vida das pessoas, do

bem-estar animal e da sustentabilidade da natureza.

O PAN esclarece que está na Assembleia da República para fazer parte da solução e não para dividir e

que, por este motivo, viabilizará ou rejeitará propostas do Governo, de acordo com o reconhecimento, ou não,

de um compromisso sério e responsável com as causas e valores que defende e quer trazer ao debate

parlamentar.

Neste sentido, após os argumentos explanados e um cuidado trabalho de análise e deliberação criteriosa

ao Programa do Governo, o partido Pessoas-Animais-Natureza tomou a decisão de votar favoravelmente a

moção de rejeição apresentada.

O Deputado do PAN, André Silva.

———

Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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