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Quinta-feira, 19 de novembro de 2015 I Série — Número 6

XIII LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2015-2016)

REUNIÃOPLENÁRIADE18DENOVEMBRODE 2015

Presidente: Ex.mo Sr. Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues

Secretários: Ex.mos

Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco Idália Maria Marques Salvador Serrão Moisés Salvador Coelho Ferreira Abel Lima Baptista

S U M Á R I O

O Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 6

minutos. Deu-se conta da entrada na Mesa dos projetos de lei n.

os

26 a 33/XIII (1.ª), das apreciações parlamentares n.os

1 a 6/XIII (1.ª) e dos projetos de resolução n.

os 5 a 8/XIII (1.ª).

Após ter cumprimentado o Embaixador de França, presente na Tribuna destinada ao Corpo Diplomático, o Presidente procedeu à leitura do voto n.º 3/XII (1.ª) — De condenação e pesar pelos atentados terroristas em Paris (Presidente da AR, PSD, PS, BE, CDS-PP, PCP, Os Verdes e PAN), a que o Governo também se associou. De seguida, depois de terem usado da palavra os Deputados Sérgio Azevedo (PSD), Carlos César (PS), Pedro Filipe Soares (BE), Telmo Correia (CDS-PP), João Oliveira (PCP), Heloísa Apolónia (Os Verdes) e André Silva (PAN), o voto foi aprovado por unanimidade, tendo a Câmara, no final, guardado 1 minuto de silêncio, seguido de aclamação.

Em declaração política, o Deputado Carlos Alberto Gonçalves (PSD), além de se ter insurgido contra os atentados terroristas que tiveram lugar em Paris e de ter manifestado solidariedade em relação a todas as vítimas e seus familiares, em especial aos cidadãos de origem portuguesa, salientou o papel da nossa comunidade em França e deu conta das suas preocupações relativamente à

situação política em Portugal. No final, respondeu a pedidos de esclarecimento do Deputado Paulo Pisco (PS).

Em declaração política, o Deputado Bacelar de Vasconcelos (PS) considerou que a coligação formada pelo PSD e pelo CDS-PP teve uma derrota eleitoral, tendo defendido uma solução de Governo decorrente dos acordos alcançados entre o PS, o BE, o PCP e os Verdes. Respondeu, depois, a pedidos de esclarecimento dos Deputados Telmo Correia (CDS-PP), Carlos Abreu Amorim (PSD), Jorge Duarte Costa (BE) e António Filipe (PCP).

Em declaração política, o Deputado José Manuel Pureza (BE) chamou a atenção para a atual situação política do País, manifestou-se contra um eventual governo de gestão e sublinhou haver condições para o Presidente da República constituir um governo apoiado pelo PS, pelo BE, pelo PCP e por Os Verdes. Deu, depois, resposta a pedidos de esclarecimento dos Deputados Pedro Delgado Alves (PS), António Leitão Amaro (PSD) e Paula Santos (PCP).

Em declaração política, o Deputado Nuno Magalhães (CDS-PP), a propósito dos recentes atentados em Paris, alertou para a necessidade de cooperação com a Rússia e reforço da resposta ao terrorismo.

Em declaração política, o Deputado António Filipe (PCP) lembrou que a responsabilidade da formação dos governos

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não é presidencial mas parlamentar e que o Presidente da República deve nomear Primeiro-Ministro o líder partidário com condições para formar governo com apoio do PS, do BE, do PCP e de Os Verdes. Respondeu, depois, a pedidos de esclarecimento dos Deputados Graça Fonseca (PS), Hugo Lopes Soares (PSD), Mariana Mortágua (BE) e Telmo Correia (CDS-PP).

Em declaração política, a Deputada Heloísa Apolónia (Os Verdes) criticou o Presidente da República por ainda não ter nomeado um governo de iniciativa do PS e assim arrastar uma situação que potencia um clima de instabilidade e lembrou alguns compromissos estruturantes e programáticos que Os Verdes irão materializar durante a Legislatura, tendo respondido ao pedido de esclarecimento do Deputado João Galamba (PS).

Deu-se conta da entrada na Mesa dos projetos de lei n.os

34 e 35/XIII (1.ª), dos projetos de resolução n.

os 9 e 10/XIII

(1.ª) e da apreciação parlamentar n.º 7/XIII (1.ª). Foram apreciados, em conjunto, a petição n.º 338/XII

(3.ª) — Apresentada pela DECO — Associação Portuguesa para a Defesa do Consumidor, solicitando à Assembleia da República a adoção de legislação, na área das telecomunicações, que reduza o prazo máximo legal de

fidelização (24 meses) e imponha critérios e limites aos encargos cobrados aos consumidores, de forma a garantir transparência e previsibilidade, e, na generalidade, os projetos de lei n.

os 30/XIII (1.ª) — Altera a Lei das

Comunicações Eletrónicas — Estabelece limites à oneração dos utentes pela resolução de contrato no período de fidelização (décima segunda alteração à Lei n.º 5/2004, de 10 de fevereiro) (PCP) e 32/XIII (1.ª) — Reforça a proteção dos clientes de serviços de comunicações eletrónicas nos contratos de fidelização (BE), tendo-se pronunciado os Deputados João Ramos (PCP), Paulino Ascenção (BE), Ricardo Baptista Leite (PSD), João Paulo Rebelo (PS) e Lília Ana Águas (CDS-PP).

Foi apreciada a petição n.º 499/XII (4.ª) — Apresentada por Vítor Cristiano Roque e outros, denunciando o modo como está a ser gerido o Curso Profissional de Artes do Espetáculo do Externato Delfim Ferreira, em Riba de Ave, concelho de Vila Nova de Famalicão. Intervieram os Deputados Ana Sofia Bettencourt (PSD), Gabriela Canavilhas (PS), Luís Monteiro (BE), Carla Cruz (PCP) e Vânia Dias da Silva (CDS-PP).

O Presidente encerrou a sessão eram 18 horas e 14 minutos.

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O Sr. Presidente: — Sr.as

e Srs. Deputados, Sr.as

e Srs. Funcionários, Sr.as

e Srs. Jornalistas, declaro

aberta a sessão.

Eram 15 horas e 6 minutos.

Solicito aos Srs. Agentes da autoridade que abram as galerias.

Antes de iniciarmos a ordem do dia, dou a palavra ao Sr. Secretário Duarte Pacheco para proceder à leitura

do expediente.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e

foram admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: projetos de lei n.os

26/XIII (1.ª) — Determina o

cancelamento e a reversão do processo de reprivatização indireta do capital social da TAP, SGPS, SA,

revogando o Decreto-Lei n.º 181-A/2014, de 24 de dezembro, e o Decreto-Lei n.º 210/2012, de 21 de setembro

(PCP), que baixa à 6.ª Comissão; 27/XIII (1.ª) — Assegura o acesso a benefícios fiscais por parte de

associações ambientais e zoófilas, procedendo à alteração da Lei n.º 16/2001, de 22 de junho (PAN), que

baixa à 5.ª Comissão; 28/XIII (1.ª) — Assegura a igualdade de direitos no acesso à adoção e ao

apadrinhamento civil por casais do mesmo sexo, procedendo à segunda alteração à Lei n.º 7/2001, de 11 de

maio, e à primeira alteração à Lei n.º 9/2010, de 31 de maio (PAN); 29/XIII (1.ª) — Assegura a igualdade de

direitos no acesso a técnicas de procriação medicamente assistida, procedendo à segunda alteração à Lei n.º

32/2006 de 26 de junho (PAN); 30/XIII (1.ª) — Altera a Lei das Comunicações Eletrónicas, estabelecendo

limites à oneração dos utentes pela resolução de contrato no período de fidelização (12.ª alteração à Lei n.º

5/2004, de 10 de fevereiro) (PCP); 31/XIII (1.ª) — Altera o Código do Registo Civil, tendo em conta a adoção, a

procriação medicamente assistida e o apadrinhamento civil por casais do mesmo sexo (BE); 32/XIII (1.ª) —

Reforça a proteção dos clientes de serviços de comunicações eletrónicas nos contratos de fidelização (BE) e

33/XIII (1.ª) — Restabelecimento dos feriados nacionais suprimidos (BE), que baixa à 10.ª Comissão.

Deram também entrada na Mesa, e foram admitidas, as apreciações parlamentares n.os

1/XIII (1.ª) —

Requerimento do PCP solicitando a apreciação pela Assembleia da República do Decreto-Lei n.º 239/2015, de

14 de outubro — Procede à sexta alteração ao Decreto-Lei n.º 28/2008, de 22 de fevereiro, que estabelece o

regime de criação, estruturação e funcionamento dos agrupamentos dos centros de saúde do Serviço Nacional

de Saúde; 2/XIII (1.ª) — Requerimento do PCP solicitando a apreciação pela Assembleia da República do

Decreto-Lei n.º 169/2015, de 10 de agosto — Procede à primeira alteração ao Decreto-Lei n.º 212/2009, de 3

de setembro, permitindo aos municípios a constituição de parcerias para a concretização das atividades de

enriquecimento curricular (AEC); 3/XIII (1.ª) — Requerimento do PCP solicitando a apreciação pela

Assembleia da República do Decreto-Lei n.º 165/2015, de 17 de agosto — Procede à regulamentação da Lei

dos Baldios; 4/XIII (1.ª) — Requerimento do PCP solicitando a apreciação pela Assembleia da República do

Decreto-Lei n.º 223/2015, de 8 de outubro — Cria um incentivo a atribuir, pelo aumento da lista de utentes, aos

trabalhadores médicos especialistas de medicina geral e familiar a exercer funções nas unidades de saúde

familiar (USF) de modelo A e nas unidades de cuidados de saúde personalizados (UCSP), em zonas

geográficas qualificadas como carenciadas; 5/XIII (1.ª) — Requerimento do PCP solicitando a apreciação pela

Assembleia da República do Decreto-Lei n.º 182/2015, de 31 de agosto — Define os procedimentos para a

regularização das dívidas da extinta Casa do Douro com a natureza de associação pública; 6/XIII (1.ª) —

Requerimento do PCP solicitando a apreciação pela Assembleia da República do Decreto-Lei n.º 158/2015, de

10 de agosto — Procede à segunda alteração ao Decreto-Lei n.º 117/2009, de 18 de maio, alterado pelo

Decreto-Lei n.º 14/2012, de 20 de janeiro, estabelecendo normas sobre o recrutamento para as equipas de

zona de vigilância nas escolas.

Finalmente, deram entrada na Mesa, e foram admitidos, os projetos de resolução n.os

5/XIII (1.ª) —

Orientações fundamentais da política externa portuguesa (PSD e CDS-PP); 6/XIII (1.ª) — Recomenda ao

Governo que proceda à reposição do serviço público de transporte de passageiros na Linha do Leste, em todo

o seu percurso (Os Verdes), que baixa à 6.ª Comissão; 7/XIII (1.ª) — Recomenda ao Governo a elaboração de

um plano ferroviário nacional (BE) e 8/XIII (1.ª) — Revisão prevista da suspensão dos feriados religiosos e

correspondentes feriados civis (PSD e CDS-PP).

É tudo, Sr. Presidente.

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O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, na Conferência de Líderes foi acordado que hoje, antes da ordem do

dia, que, como sabem, consta de declarações políticas e discussão de petições, procederíamos à leitura e

votação de um voto de condenação e pesar pelos terríveis acontecimentos de sexta-feira, dia 13, em Paris.

Gostaria de comunicar que o Sr. Embaixador de França, Jean-François Blarel, se encontra presente na

tribuna do Corpo Diplomático.

Pedia que os Srs. Deputados saudassem o Sr. Embaixador.

Aplausos gerais, de pé.

Srs. Deputados, passo a ler o voto n.º 3/XIII (1.ª) — De condenação e pesar pelos atentados terroristas em

Paris, subscrito por mim próprio, por todos os líderes dos grupos parlamentares e pelo Sr. Deputado do PAN:

«Na última sexta-feira, a humanidade assistiu, com horror, à barbárie.

Um bando organizado de terroristas do autodenominado «Estado Islâmico» espalhou, de forma amoral, o

medo e a morte pelas ruas de Paris.

Pessoas inocentes, de todas as origens e culturas, que se divertiam num concerto, que passeavam junto

ao estádio ou que jantavam em restaurantes da capital francesa, perderam a vida. Perderam a vida pelo

menos 129 pessoas, tendo ficado feridas mais de 300.

Não há causa, nem justificação para atos desta natureza. O que se passou é simplesmente inominável.

Estamos a falar do maior atentado terrorista em solo europeu desde os ataques de Madrid de 2004.

Estamos perante uma tentativa clara de trazer para a Europa a cultura da guerra e da violência que estes

grupos desde há muito praticam no norte de África e no Médio Oriente.

Perante o horror absoluto, impõe-se a condenação absoluta. Perante o mal absoluto, deve prevalecer o

bem comum.

Na resposta a dar, impõe-se o respeito pelas liberdades e pelos direitos fundamentais, bem como a

reafirmação dos Direitos Humanos que o terrorismo pretende desafiar. Porque perder a bússola dos valores é

a melhor forma de nos perdermos de caminho.

Impõe-se também a nós, Assembleia da República Portuguesa, a manifestação de pesar às famílias das

vítimas e de toda a solidariedade ao Estado e ao povo francês.

A solidariedade e a cooperação, como a dos parisienses que nessa noite corajosamente acudiram e

acolheram as vítimas dos atentados, são absolutamente decisivas na prevenção e no combate ao terrorismo.

A Assembleia da República, reunida em sessão plenária, expressa assim a sua mais veemente

condenação e o seu mais profundo pesar pelos atentados terroristas de Paris.»

Vão agora usar da palavra sobre este voto Deputados de todos os grupos parlamentares.

Em primeiro lugar, tem a palavra o Sr. Deputado Sérgio Azevedo.

O Sr. Sérgio Azevedo (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: na passada sexta-feira, o mundo

voltou a ser abalado por mais um conjunto de ataques terroristas em território europeu. Dez meses depois do

ataque ao jornal Charlie Hebdo, Paris voltou a ser palco de uma série de ataques vis e absurdos que tiraram a

vida a mais de uma centena de pessoas.

Mas este não foi apenas um ataque a Paris, foi um ataque a todos nós, à nossa liberdade, aos nossos

valores, à nossa sociedade e à nossa democracia.

A violência cobarde do terrorismo não pode ser encarada como pertença de grupos étnicos ou religiosos,

de grupos culturais ou até mesmo de nações. O horror do terrorismo que se espalha por todo o mundo é a

manifestação do absurdo, do vil e do desumano que nos atinge a uma escala global e que deve ser por todos

combatido.

O combate ao terrorismo, a violência pela violência, a morte pela morte deve ser enfrentado sem tréguas e

sem qualquer tipo de comiseração, num esforço de união e de cooperação entre todos aqueles que

prosseguem os valores da tolerância, do humanismo e da democracia.

A divisa da «liberdade, igualdade e fraternidade», caracterizadora da França integradora, plural e solidária

que conhecemos é também a nossa divisa. E será sob a sua égide que nos guiaremos firmes neste combate

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pela defesa dos valores comuns da humanidade, sem medo de ameaças, sem medo de usufruir das nossas

liberdades, sem medo de viver.

Mas os trágicos acontecimentos de Paris voltam a interpelar uma certa fragilidade no que diz respeito a

uma política efetiva de segurança e de defesa comum. A ameaça deste terrorismo moderno, sofisticado e de

difícil deteção obriga a Europa a passar das palavras aos atos no que concerne à capacidade de resposta

conjunta, enquanto bloco político de nações livres e democráticas.

Hoje mesmo, a França acionou a cláusula de defesa coletiva da União Europeia prevista no Tratado de

Lisboa. Por isso mesmo, o Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata entregará hoje à Comissão

Parlamentar de Defesa Nacional um pedido de audição extraordinária ao Sr. Ministro da Defesa Nacional.

Não tenhamos dúvidas que estes ataques são a manifestação de um extremismo que, independentemente

de ser movido por convicções laicas ou religiosas, quer fundamentalmente impor uma visão totalitária da

sociedade. Por essa razão, tem de ser recusado liminarmente.

É preciso, por isso, envolver e dar a palavra a todos aqueles que possam contribuir para a contínua

afirmação do projeto europeu e de definição desta pátria alargada que é a Europa, como espaço de integração

plena e de liberdade.

Tal como escreveu Alexandre Dumas, na sua obra Os três Mosqueteiros, seremos, tal como na época,

fraternos uns pelos outros e inequivocamente invencíveis sob o duplo seio da igualdade e da coragem.

Seremos aqui, neste contexto, hoje e sempre, um por todos e todos por um.

Aplausos do PSD, do PS e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Carlos César.

O Sr. Carlos César (PS): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: O Partido Socialista associa-se a este

momento de unidade do Parlamento e da Nação Portuguesa em que aprovamos um voto de condenação e de

pesar pelos terríveis acontecimentos do passado dia 13 de novembro.

Associamo-nos no respeito pela dor e pela solidariedade com todos os ofendidos por este miserável ato de

terrorismo que atingiu a França, e fazemo-lo com uma referência muito sentida junto do Sr. Embaixador de

França, que partilha este momento connosco.

Associamo-nos na indignação que a todos move contra atos intoleráveis que ferem supremos valores que a

todos nos identificam — a liberdade, a igualdade e a fraternidade — e que não se confinam à belíssima divisa

da República Francesa.

Reavivamos o nosso compromisso no combate pela civilização e pela humanidade, o nosso culto e o nosso

amor pela diversidade, pela inclusão e pela alegria que a cidade de Paris também encarna.

A ideologia que subjaz a estas formas de terror é hoje a negação mais extrema do valor da vida humana.

Para os ideólogos do totalitarismo religioso e niilista, o terrorismo é um mero meio, não um fim. Porém, esse

meio tem de ser combatido por todos os meios à nossa disposição, sem mais erros, na base da conjugação

internacional, designadamente com os meios da neutralização militar. Compete-nos estarmos solidários com

essa emergência.

Não se ignoram, de igual modo, as necessidades preventivas em matérias de segurança coletiva e em

cada país. Compete-nos também considerá-las sem descurarmos a sua eficácia e sem enfraquecermos a

nossa liberdade e os direitos individuais que integram a nossa cultura.

Mas o momento, hoje, é sobretudo — e deve sê-lo — o da expressão da nossa solidariedade humana

absoluta.

Por isso, termino, lembrando as palavras de um poeta de ascendência açoriana, Jorge de Sena: «(…) tanto

sangue,/tanta dor, tanta angústia, um dia/mesmo que o tédio de um mundo feliz vos persiga —/não hão-de ser

em vão».

Espero que não!

Aplausos do PS, do PSD, do BE, do PCP e do CDS-PP.

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O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares, do Bloco de

Esquerda.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs. Deputados: Num

momento como este, a primeira palavra não pode ser outra que não a da condenação do terror, do fanatismo

dos que trouxeram a morte ao coração da Europa e que, no terror, querem ver a propagação do ódio entre

todas e todos nós.

É também necessário que, das primeiras palavras, numa intervenção neste contexto, surja o nosso pesar

para com as vítimas, a nossa solidariedade para com o povo francês e também para com a comunidade

portuguesa radicada em França, porque foi entre ela que estes acontecimentos também tiveram lugar.

Mas quando somos confrontados com tamanha destruição, quando o valor fundamental da vida é colocado

em causa pelo fanatismo, é importante que nos perguntemos se queremos dar um passo em frente ou se

queremos cair na armadilha do ódio, porque essa é aquela que se apresenta perante nós.

Sobre esta matéria, convém lembrar um conhecido político francês, Dominique de Villepin, e a sua reflexão

feita nas últimas horas. Não é de uma área política próxima da do Bloco de Esquerda e, por isso, creio que a

sua reflexão terá um valor reforçado. Diz ele: «Não é porque um bando de assassinos fanáticos nos declara

guerra que somos nós que temos de cair na armadilha de declarar guerra de volta. Estes ataques estão, em

grande parte, relacionados com um processo histórico que tem crescido com as intervenções no Afeganistão,

no Iraque, na Líbia e em tantos outros lugares e que apenas deitaram gasolina para a fogueira. Vamos

aprender com a experiência. As coisas estão ficando piores do que estavam há 10 anos atrás, as coisas estão

piores aqui, na Líbia, no Afeganistão e no Iraque.»

Creio que esta é a reflexão que devemos todos fazer.

O resultado dos valores que estavam em causa e aqueles que a França trouxe ao mundo e que nos tornou

a nós, europeus, tão únicos, os valores da liberdade, da igualdade, da fraternidade, é o de aprender com os

que mais de perto sofreram estes ataques.

Passo a citar um jornalista, Antoine Leiris, cuja esposa, companheira de 12 anos, mãe do seu filho, morreu

no ataque de sexta-feira passada. Creio que o que refere é a maior aprendizagem que podemos ter. Dizia ele:

«Vocês não terão o meu ódio. Vocês procuram-no, mas responder ao ódio com a cólera seria ceder à mesma

ignorância que vos fez ser quem são. Querem que eu tenha medo, que olhe para os meus concidadãos com

um olhar desconfiado, que sacrifique a minha liberdade pela segurança. Perderam! Continuamos a viver da

mesma maneira».

Este é o repto da França da liberdade, da igualdade, da solidariedade. Este é o repto dos que se recusam a

responder ao ódio com o ódio, que recusam os bombardeamentos de retaliação e dos que sabem que sempre

que o ódio imperou foram as bombas que deram lugar às palavras, e as bombas é que criaram um mundo

ainda mais instável do que aquele em que vivíamos.

Por isso, dizendo não ao ódio, a única resposta que podemos dar aos que querem semear o terror é: não,

vocês não vão ganhar, porque nós não vamos deixar que o ódio impere — liberdade, solidariedade, igualdade

e fraternidade! A solidariedade foi aqui acrescentada como o valor que agora não pode faltar à Europa, que

olha para a França como uma das suas, mas que olha também para os franceses como aqueles que dizem

que não querem ser os responsáveis por mais bombardeamentos.

Aplausos do BE, do PCP e de Deputados do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia, do CDS-PP.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Em primeiro lugar, quero dizer

que este momento é — não podia deixar de ser — um momento emocional, porque todos nós vimos com

horror e com emoção os acontecimentos da noite de sexta-feira 13, em Paris.

A propósito deste momento e deste voto, fui revisitar — não é meu hábito, mas aconteceu neste caso — a

intervenção que eu próprio proferi, algures em janeiro deste mesmo ano, a propósito dos atentados e do

ataque contra o jornal satírico Charlie Hebdo, em Paris. Devo dizer que se eu repetisse exatamente a

intervenção que fiz naquele dia, com pequenas alterações, substituindo a palavra «jornalistas» por

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«cidadãos», substituindo «12 mortos» por «130 mortos», acrescentando o facto de existirem vítimas

portuguesas, a intervenção seria perfeitamente adequada ao que vivemos hoje.

É talvez esse o maior fator de choque, de horror e, se calhar, também, o maior fator emocional. É que,

poucos meses depois, estamos a viver outra vez no coração da Europa, outra vez em Paris, uma situação

mais grave ainda, mais horrorizante ainda, com sete ataques em simultâneo, os quais não conseguimos

prevenir, não conseguimos combater e não conseguimos evitar.

É evidente que isto nos convoca também para várias reflexões. A primeira reflexão e a primeira resposta

tem de ser sempre, obviamente, uma resposta de humanidade. Ainda há pouco ouvi — e concordo

plenamente com essas palavras — o Presidente francês dizer que os refugiados que fogem da guerra na Síria

fogem exatamente do mesmo mal, da mesma realidade que atacou Paris. E essa é a noção de humanidade

que nós temos de ter.

Sr. Presidente, este voto, que é da sua iniciativa — que só podia ser consensual; outra coisa não fazia

sentido, e tudo fizemos para que assim fosse —, não nos furtará, no futuro, a um debate sobre a resposta a

dar a esta situação, sobre a resposta a esta mesma violência, seja esse debate consensual ou não.

Como eu disse na altura, e repito, não podemos perder, em nenhuma circunstância, aquilo que eu,

pessoalmente, gosto de chamar «a superioridade moral das democracias». As democracias não se

comportam como bandos de fanáticos, como bandos de terroristas ou como grupos totalitários. As

democracias têm de usar, na sua ação, sempre e em qualquer circunstância, do respeito pela liberdade, do

respeito pela democracia, do respeito pelos valores humanos.

No entanto, é bom que fique claro que, na nossa opinião, não há nenhuma contradição entre reforçarmos a

nossa segurança e continuarmos a defender a liberdade. Não há nenhuma contradição entre ajudarmos,

apoiarmos, recebermos os que precisam de ser recebidos, designadamente os refugiados, e termos escrutínio

na entrada dentro das nossas fronteiras.

Não há nenhuma contradição entre defender as liberdades e o nosso modo de vida e, ao mesmo tempo,

dar combate firme ao terrorismo. Digo isto com a legitimidade de quem, num debate que aqui tivemos há uns

meses atrás, dizia que nestes momentos — e pela segunda vez estou a citar-me a mim próprio, o que não é

normal — estamos todos juntos, somos todos unânimes, estamos todos de acordo, mas temos de discutir o

que cada um de nós está disposto a fazer para, daqui a uns meses, não estarmos outra vez a votar um voto

de pesar por acontecimentos que ocorram em Paris, noutra cidade europeia, seja onde for.

A França fez uma declaração de guerra, a França vive em estado de emergência. Eu não tenho a menor

dúvida de que nem as autoridades francesas, nem ninguém em França, para proteger os seus filhos que

querem ir a um espetáculo desportivo ou que querem ir a um concerto, escolheu viver em estado de

emergência, ninguém escolheu fazer uma declaração de guerra, fizeram-no por necessidade absoluta. E é

sobre essa necessidade, Sr. Presidente, que teremos de refletir no futuro.

Termino, dizendo que, embora o momento seja de emoção, tem de ser, também, um momento de

determinação. Ouvimos, ontem, as imortais palavras de Rouget de Lisle serem cantadas a plenos pulmões em

Wembley, e é com essas palavras que vou terminar a minha intervenção.

O nosso adversário é, de facto, a tirania, e como diziam essas imortais palavras «contre nous de la

tyrannie/l’étandard sanglant est levé».

Cumprimentemos as autoridades francesas na pessoa do Sr. Embaixador, que aqui se encontra,

expressemos a nossa solidariedade e a nossa firmeza de que a tirania não vencerá e de que o terrorismo não

vencerá, porque a nossa determinação a isso se oporá.

Aplausos do CDS-PP, do PSD e do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira, em nome do

Grupo Parlamentar do PCP.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: As

primeiras palavras do Grupo Parlamentar do PCP são para condenar de forma veemente os atentados

ocorridos em Paris, para expressar a nossa consternação e sentimento de pesar às vítimas e seus familiares e

também para expressar ao povo português e à comunidade portuguesa em França a nossa solidariedade.

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Queremos também estender esta expressão de pesar e de solidariedade a todos os povos que são vítimas

do terrorismo nas suas várias expressões em diversos pontos do mundo, incluindo no Médio Oriente e em

África, onde também a humanidade tem sido confrontada com o horror e a barbárie do terrorismo.

A resposta ao terrorismo exige, necessariamente, o combate às suas causas mais profundas, sejam elas

de natureza política, económica ou social. O combate ao terrorismo exige o fim do apoio político, financeiro e

militar com que grupos terroristas como aqueles que se reúnem em torno do denominado Estado islâmico têm

contado e que têm sido utilizados para desestabilizar e agredir estados soberanos e independentes como a

Síria ou o Iraque.

A escalada de ingerência, de guerra e de imposição de medidas atentatórias aos direitos e liberdades

fundamentais têm comprovadamente falhado o objetivo de combater o terrorismo e têm alimentado o

crescimento de forças racistas, xenófobas e fascistas e a sua ação de terror.

O combate ao terrorismo exige a defesa e a afirmação dos valores da liberdade, da democracia, da

soberania e da independência dos estados.

O combate ao terrorismo tem de passar por opções que ponham fim à escalada de guerra e à militarização

das relações internacionais. Tem de passar por travar novas agressões contra estados soberanos,

nomeadamente na região do Médio Oriente, e por uma política de desanuviamento e de paz nas relações

internacionais, no quadro do respeito pela Carta das Nações Unidas e pelo Direito Internacional.

Aplausos do PCP, do BE e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, de Os

Verdes.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs.

Deputados, Sr. Embaixador de França: Praticamente já tudo foi dito. Nestas circunstâncias, as palavras não

conseguem tapar a dor de modo nenhum, mas cumpre-nos, naturalmente, uma palavra forte de solidariedade

para com todo o povo francês, que, mais uma vez, foi vítima deste horror, destes ataques terroristas, destes

acontecimentos tão trágicos que aconteceram no dia 13 de novembro.

Queria ainda acrescentar que não foram apenas vidas humanas que estiveram em causa e que a dor

relativamente a essas vidas tem de ser profundamente manifestada e condenada. Mas, neste caso, atingiu-se

muito mais do que isso: atingiram-se valores, valores supremos, como os da tolerância, da pluralidade, do

respeito pelas diferenças, valores estes que têm de imperar no mundo.

Para França e para tudo o que França deu ao mundo importa sempre relembrar — e está agora a ser

permanentemente relembrado — os valores da liberdade, da igualdade e da fraternidade e, mais ainda do que

relembrar, importa praticar e implementar. É por isso, Sr. Presidente, que gostava também de, em nome de Os

Verdes, dizer que se a resposta é a escalada do ódio, da vingança e da agressão isto não para, Sr.as

e Srs.

Deputados, isto não para.

Temos de ter a inteligência de saber parar este horror. Então, olhemos para as causas, e se nas causas

encontrarmos a lógica do comércio internacional de armamento, da venda de armas, de financiamento, de

alimento a grupos que praticam o terrorismo, isto tem de acabar Sr.as

e Srs. Deputados. É às causas que

temos de ir para acabar e para responder a este horror.

A solidariedade de Os Verdes, que está, naturalmente, no voto que subscrevemos, como referi, é para com

todo o povo francês, mas também para com todos os povos que têm sido vítimas da guerra e dos atos

terroristas, que têm de ter, de uma vez por todas, um ponto final e a que a inteligência humana e das

sociedades e das comunidades democráticas têm de saber pôr um ponto final, designadamente não

alimentando causas. Não alimentando causas!

Aplausos do PCP, de Os Verdes e de Deputados do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado André Silva, do PAN.

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O Sr. André Silva (PAN): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs. Deputados, Sr.

Embaixador de França e todos os presentes na Sala: Nesta solene ocasião, transmitimos os nossos sentidos

sentimentos de solidariedade para com a França. A todos os seres humanos que sofrem e que perdem a vida

por atos violentos fundados na ignorância, no medo e na discriminação deixamos os nossos sentimentos e a

nossa compaixão.

Próprio do sistema em que vivemos e que se alimenta do medo e da divisão, vamos assistir, com certeza, a

curto prazo, a uma intensificação das políticas de segurança, assentes na guerra e na opressão. Mas, mais do

que respostas bélicas, precisamos de mudar as políticas económicas, sociais e ambientais. Nada justifica

tamanha violência, terror e brutalidade. No entanto, a nós, cidadãos dos países ricos e desenvolvidos, é-nos

dada a oportunidade de refletir sobre a forma como estamos a consumir e a gerar riqueza, sobre a nossa

participação enquanto País e enquanto sociedade na exploração de terceiros e nas suas implicações.

Os muitos e distintos neocolonialismos, com as ações de pressão a que obrigam no terreno, estão longe de

ser inócuos para o bem-estar dos seres humanos de muitos países mais débeis.

Enquanto cidadãos dos países ditos desenvolvidos, com as nossas escolhas diárias, políticas e eleitorais,

somos todos cúmplices das relações de ganho/perda que os nossos países estabelecem com outros países e

seres humanos em posições mais frágeis. Por desgraça, em alguns desses países existem elites dominantes

com reduzidos níveis de consciência que, com outros intuitos, tomam conta do vazio que nós ajudámos a criar,

promovendo e perpetuando linhas de pensamento irrascíveis e de sentimentos mais radicalizados e primitivos.

Mais do que uma resposta bélica da França, aquilo que os terroristas pretendem no final de contas, impõe-

se uma atitude diferente da Europa, no caminho das relações comerciais não depredadoras, da proteção das

pessoas todas, da educação e da consciencialização, do exemplo, lá longe, onde tudo se passa, onde outros

como nós começam a ficar sem terra, onde outros como nós são obrigados a fugir por causa das armas ou

das alterações climáticas que produzimos. Quando lá vamos buscar riqueza, não nos esqueçamos de deixar

algo em troca, senão mais tarde ou mais cedo tudo será cobrado ou fará ricochete — isso está a suceder.

Precisamos de parar. O outro também somos nós e todos queremos a paz.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Informo que o Governo comunicou que também se associa ao voto.

Srs. Deputados, vamos agora proceder à votação do voto n.º 3/XII (1.ª) — De condenação e pesar pelos

atentados terroristas em Paris (Presidente da AR, PSD, PS, BE, CDS-PP, PCP, Os Verdes e PAN).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, vamos guardar 1 minuto de silêncio.

A Câmara, de pé, guardou 1 minuto de silêncio, seguido de aplausos gerais.

Sr.as

e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, passamos agora ao primeiro ponto da nossa ordem do

dia de hoje, que consta de declarações políticas.

Para o efeito, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Alberto Gonçalves, do PSD.

O Sr. Carlos Alberto Gonçalves (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Na passada sexta-feira

Paris, a cidade luz, a minha cidade e a cidade de muitos portugueses, referência de liberdade e de tolerância,

foi uma vez mais alvo de atentados terroristas que a transformaram num verdadeiro palco de guerra. Ataques

inaceitáveis, ataques inconcebíveis, ataques de uma violência extrema que tiveram apenas por objetivo matar

o maior número possível de inocentes e espalhar o terror.

Na altura dos atentados, estava em Paris, no momento em que aconteciam estava no cinema e não

esqueço a preocupação e o pânico estampado na cara das pessoas que iam tendo notícias do que estava a

acontecer. Todos nós tínhamos familiares, amigos ou conhecidos que podiam estar nos locais onde ocorreram

os ataques — momentos muito complicados.

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A pátria de Voltaire fica, uma vez mais, ligada a um momento negro da história do terrorismo internacional.

Desde a Segunda Guerra Mundial que a França não tinha sido alvo de um ataque desta envergadura no seu

território. Estes atentados, tal como os de janeiro passado, ocorreram no coração da cidade, ocorreram no

coração do país, ocorreram no coração da Europa, em locais que, claramente, simbolizam a forma de estar e

de viver das nossas sociedades. E vieram demonstrar que aquilo que conquistámos ao longo de vários

séculos está a ser alvo de um ataque que deve merecer, da nossa parte, uma resposta firme e que demonstre

que esses valores estão acima de qualquer fundamentalismo ou fanatismo.

Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, perante o que vimos, as nossas primeiras palavras devem ser para

manifestar a nossa solidariedade para com todas as vítimas e seus familiares, para com a França e o seu

povo e também para com a comunidade portuguesa.

A França é um país conhecido pela sua diversidade e é neste país que reside uma comunidade franco-

portuguesa estimada em 1 milhão e 300 mil pessoas, uma comunidade que foi, uma vez mais, vítima dos

atentados, pois dois cidadãos de origem portuguesa acabaram por ser mortos nos ataques que ocorreram

junto ao Estádio de Saint-Denis e na sala de espetáculos Bataclan. Permitam-me que, de uma maneira

especial, lembre aqui o Manuel Dias e a Précilia Correia, apresentando às suas famílias, aos seus amigos e a

toda a comunidade portuguesa uma mensagem de apoio e de solidariedade neste momento tão complicado.

Não posso, no entanto, deixar de destacar que, naquelas horas de terror, alguns dos nossos compatriotas

tiveram um papel de grande coragem na ajuda aos sobreviventes da tragédia, o que mereceu o

reconhecimento das autoridades e da comunicação social francesas.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

É também por isso que voltamos, hoje, aqui, nesta Câmara, a reafirmar que temos muito orgulho nas

nossas comunidades espalhadas pelo Mundo e, em particular, pela comunidade portuguesa residente em

França.

Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, permitam-me que fale desta comunidade à qual também pertenço.

Esta é uma comunidade que ama, de forma apaixonada, o seu País de origem, mas que se reconhece

também nos valores do país onde reside e, por isso, não há um português em França que não vibre aos

primeiros acordes da Marselhesa.

Esta forma de estar, de ser solidário com o país de origem e empreendedor no país de acolhimento, tem

sido uma clara mais-valia para o nosso País. A comunidade portuguesa em França é hoje uma referência no

plano económico, através das suas 45 000 empresas, e no plano político, através dos vários milhares de

quadros políticos. Uma comunidade que se revê num país que nos últimos quatro anos recuperou a sua

credibilidade externa, transmitindo evidentes sinais de confiança, de estabilidade e de um País cumpridor.

Foram estes sinais que permitiram um investimento, sem paralelo na história democrática portuguesa, das

comunidades no seu País, o que deu um enorme contributo para o sucesso da nossa economia, muito

particularmente no que diz respeito às exportações e ao investimento.

No entanto, Sr.as

e Srs. Deputados, as comunidades portuguesas olham com perplexidade para a situação

que o País vive atualmente. Não compreendem que no seu País, no nosso País, quem ganha as eleições não

governa. E também não entendem que os acordos que são apresentados por outros não têm a coerência nem

sequer a consistência que permitam, realmente, responder aos anseios daqueles que estão no estrangeiro.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Estes portugueses também não compreendem que um caminho percorrido que mobilizou todos os

portugueses, incluindo aqueles que residem no estrangeiro, possa agora ser posto em causa por questões que

visam apenas concretizar objetivos de sobrevivência política.

Estes são sinais preocupantes para quem reside no estrangeiro e para o pequeno e médio investimento no

nosso País. Para estes portugueses, Portugal tem de dar continuidade às políticas que permitiram superar a

crise e dar a imagem de um País estável no plano político.

Os portugueses residentes no estrangeiro, em outubro, com o seu voto, fizeram a sua escolha, uma

escolha clara e, sobretudo, uma escolha que põe em causa quatro anos de discursos nesta Casa, em que

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muito se falou de emigração apenas como arma de arremesso político. Os resultados eleitorais nos círculos da

emigração foram a melhor resposta.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Esta minha intervenção teve, infelizmente, de se adaptar a uma realidade que consideramos trágica e que

ainda hoje, infelizmente, teve mais desenvolvimentos. O que tem de ser tem muita força.

No entanto, como sempre, a vida tem de continuar. Por isso, depois dos atentados, Paris procura voltar à

normalidade, apesar do clima de insegurança que se instalou.

O Sr. Presidente: — Já ultrapassou o seu tempo, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Alberto Gonçalves (PSD): — Termino já, Sr. Presidente. Peço-lhe alguma condescendência,

tanto mais que a comunidade portuguesa em França lhe é cara, como sabemos.

Os seus habitantes percebem, como todos devemos perceber, que não devemos ficar reféns destes

ataques cobardes, porque isso seria a pior resposta ao que aconteceu. A nossa comunidade volta, neste fim

de semana, a organizar um conjunto de eventos, retomando assim, também, a sua atividade normal.

Termino, lembrando as palavras do General de Gaulle, em 1944, na Câmara de Paris, no momento da

libertação da cidade. De Gaulle afirmava: «Paris outragé, Paris brisé, Paris martyrisé… mais Paris liberé!» Ou

seja, um Paris que tinha sido ofendido, um Paris que tinha sido destroçado, um Paris que tinha sido

martirizado, mas um Paris que estava libertado, e libertado pelos próprios parisienses.

Estas são palavras que se adequam, em parte, ao momento que vivemos.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que termine, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Alberto Gonçalves (PSD): — Vou já terminar, Sr. Presidente.

Mas esta não é uma questão parisiense ou simplesmente francesa, nem sequer um tema de âmbito

europeu. É um tema mundial, é um tema global, porque atravessa fronteiras e deve ultrapassar interesses

nacionais, porque o que está em causa é um bem fundamental e um pilar essencial do mundo em que

vivemos e queremos continuar a viver: a liberdade.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Inscreveu-se, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Paulo Pisco.

Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Paulo Pisco (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Alberto Gonçalves, confesso que,

inicialmente, estava na disposição de felicitar o Sr. Deputado pela sua intervenção. Mas também confesso que

fiquei surpreendido por neste momento, que deve ser de unidade, estar a misturar duas coisas que é

completamente impossível misturar. É inaceitável este tipo de aproveitamento partidário.

Aplausos do PS.

Na realidade, Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, não há palavras que cheguem para descrever o horror

que se viveu no passado dia 13. Nem a emoção mais pungente pode manifestar suficientemente o sentimento

de dor perante as centenas de vítimas que, no espaço de poucas horas, ficaram prostradas, em vários pontos

da cidade, num banho de sangue.

A cidade luz ficou esmagada perante a crueldade dos atentados e o obscurantismo que eles representam.

E, mais uma vez, mas agora com muito maior violência do que no passado mês de janeiro: houve mais de 500

vítimas, entre as quais também cidadãos portugueses, mais de 130 pessoas morreram, muitas continuam em

estado grave, mais de 350 ficaram feridas. Um país inteiro, o mundo em estado de choque e em revolta. E

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também houve muitas vítimas portuguesas. São tantos os portugueses que vivem em Paris que seria quase

um milagre não haver também vítimas portuguesas.

Mas também houve heróis, como o Sr. José e a sua mulher, Manuela, porteiros num prédio junto à sala de

espetáculos Bataclan, na rua Oberkampf, que ajudaram, até à exaustão, os feridos e que um jornal

homenageou, com o título: José, o anjo da guarda dos que escaparam do Bataclan. E é claro que esta

referência a estes portugueses é um orgulho para todos nós, é Portugal que está ali também a mostrar a sua

solidariedade.

Aplausos do PS.

A comunidade portuguesa em França sente tanto a dor como qualquer francês, como qualquer um de nós,

nem podia ser de outra maneira. A França é a segunda pátria dos portugueses. Em França — e,

particularmente, em Paris —, os dias vivem-se num misto de dor, de tristeza, de inquietação, de incredulidade.

O Sr. Presidente: — Já ultrapassou o seu tempo, Sr. Deputado.

O Sr. Paulo Pisco (PS): — Vive-se uma perplexidade imensa que as inúmeras manifestações de

solidariedade não chegam para exprimir. Não há minutos de silêncio nem dias de luto que apaguem da

memória a tragédia do passado dia 13. Este não é apenas um atentado contra as liberdades e a tolerância; é

um atentado contra a humanidade. E, por isso mesmo, é de muito mau gosto estar a misturar estes dois

planos de intervenção política.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Alberto Gonçalves.

O Sr. Carlos Alberto Gonçalves (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Paulo Pisco, na realidade, o Sr.

Deputado podia ter aplaudido, porque acho que a minha intervenção, em nome do meu grupo parlamentar,

fica bem a esta Câmara. Fica bem citar aqui o pesar às famílias do Manuel Dias e da Precília Correia. É que

para esta Casa houve pessoas que morreram em França, mas lá, em França, morreram portugueses que, no

dia a dia, contribuem e trabalham naquele país.

Assim sendo, teria sido bom que, para além do Bloco de Esquerda, que fez uma referência a esta matéria,

o Partido Socialista, na primeira intervenção, se tivesse lembrado da nossa comunidade, que, estando

presente, foi vítima, uma vez mais, dos atentados.

Mas também quero dizer-lhe que vim aqui fazer uma declaração política sobre o meu círculo eleitoral e,

infelizmente, tivemos o que tivemos. Agora, na vossa bancada, há direito de ir fazer uma declaração política

sobre Lisboa, sobre o Porto, sobre Braga, mas, quando se trata das comunidades, os senhores ficam

incomodados. Para as comunidades, os senhores não têm palavras, as comunidades para os senhores são

marginais, são periféricas e são esquecidas.

Protestos do PS, tendo alguns Deputados batido com as mãos nos tampos das bancadas.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, peço que não partam a mobília, por favor.

Risos.

O Sr. Carlos Alberto Gonçalves (PSD): — Aliás, também registei o seu silêncio quando referi outros

pontos, como a perplexidade das nossas comunidades face à situação do País, o seu silêncio relativamente

aos quatro anos em que aparentemente os emigrantes estavam zangados com Portugal. Pois estavam! E, por

isso, deram-nos o melhor resultado desde 1991, porque quem está lá fora pode comparar e pode verificar o

que foi feito aqui durante quatro anos.

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Aplausos do PSD e do CDS-PP.

E o seu silêncio, hoje, aqui, na Assembleia da República, é, no fundo, o reconhecimento pelo Sr. Deputado

Paulo Pisco, que se desloca às comunidades portuguesas, de que esse é o sentimento das pessoas que estão

lá fora.

Por isso, agradeço-lhe a coerência de, hoje, aqui, na Câmara, não ter tido qualquer palavra sobre aquilo

que eu disse quanto à relação entre as comunidades e o País, muito particularmente no que se refere à

economia. Os emigrantes sabem quem tirou o País da bancarrota, os emigrantes sabem quem tirou o País

das primeiras páginas pelas piores razões e os emigrantes sabem quem salvou Portugal. E, para essa

salvação, os emigrantes também contribuíram.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Bacelar de Vasconcelos.

O Sr. Bacelar de Vasconcelos (PS): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Conforme determina o

artigo 108.º da nossa Lei Fundamental, «O poder político pertence ao povo e é exercido nos termos da

Constituição».

Vozes do PS: — Bem lembrado!

O Sr. Bacelar de Vasconcelos (PS): — Por isso, numa democracia, ganha quem melhor sabe interpretar

os sentimentos dos eleitores!

Vozes do PSD: — Eh!…

O Sr. Bacelar de Vasconcelos (PS): — Ganha quem melhor sabe responder às suas expectativas e

aspirações! E, por isso, a coligação do Governo PSD/CDS não conseguiu reunir condições para governar!

Aplausos do PS e do BE.

Protestos do PSD.

A contagem dos votos efetivamente entrados nas urnas rapidamente confirmou, logo ao princípio da noite

eleitoral de 4 de outubro, que os partidos da coligação PàF — o PSD e o CDS — tinham perdido a maioria

absoluta anteriormente conseguida mediante um acordo pós-eleitoral, nas eleições antecipadas de 2011.

Através dos atos eleitorais, da caducidade e da renovação dos mandatos, concretiza-se um princípio de

responsabilidade política e da prestação de contas de todos os eleitos — quer os da maioria quer os da

oposição. Ora, dois terços dos eleitores disseram claramente nas eleições legislativas que rejeitavam as

políticas de miséria e de degradação cívica prosseguidas pelos dois partidos que governaram…

Aplausos do PS e do BE.

… e exprimiram a sua inequívoca preferência por todas as forças que se opuseram a essas políticas, ao

longo de quatro anos e meio, e que reacenderam a esperança numa alternativa real, emergente de uma nova

solução governativa.

Contudo, embora desmentida pelos factos, a coligação de direita luta desesperadamente pela sua

sobrevivência e continua a clamar pela vitória que lhe fugiu, mesmo depois de ver o seu programa rejeitado

por todos os outros partidos representados neste Parlamento:…

Aplausos do PS.

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… o Partido Pessoas-Animais-Natureza, o Partido Ecologista «Os Verdes», o Partido Comunista

Português, o Bloco de Esquerda e o Partido Socialista.

O respeito pela vontade popular significa, precisamente, respeitar as decisões dos legítimos representantes

do povo. Assistimos, nas últimas semanas, a um exercício de exemplar transparência. Os termos dos acordos

alcançados entre o PS, o BE, o PCP e o Os Verdes são públicos e garantem, de forma explícita, o apoio

maioritário da Assembleia da República ao governo do Partido Socialista.

Aplausos do PS.

Nem o acordo pós-eleitoral entre o PSD e o CDS, em 2011, nem a coligação PàF, em 2015, nem o

«compromisso de governo», precipitadamente selado entre o PSD e o CDS no passado mês de outubro,

nenhum deles foi alguma vez objeto de uma tão ampla exposição e de tão rigoroso escrutínio público como os

entendimentos agora alcançados pela esquerda!

A coligação da direita anda tão preocupada a soletrar o texto desses acordos que se esqueceu do

Programa de Governo para a XIII Legislatura, aprovado na Comissão Nacional do PS, no dia 7 de novembro

de 2015. E esqueceu-se de que aí foram incluídas todas as alterações programáticas resultantes das

negociações com o Bloco de Esquerda, o Partido Comunista Português e o Partido Ecologista «Os Verdes», e

que o PS, tal como já tinha feito, aliás de forma inédita, com a apresentação pública dos cenários

macroeconómicos, no verão passado, cuidou, agora, de assegurar a compatibilidade das alterações

acordadas com a estratégia orçamental e as metas originalmente propostas no seu programa eleitoral,

garantindo o respeito pelos compromissos europeus e internacionais a que Portugal se encontra obrigado.

Em confronto com os deploráveis esforços de desestabilização irresponsável promovidos pela coligação

PSD/CDS e o seu Governo demitido, esta solução maioritária, gerada na Assembleia da República, tem sido

acolhida com grande compreensão, tranquilidade política e serenidade financeira, no plano nacional e

internacional. O que a generalidade dos parceiros sociais e as instituições da sociedade civil reclamam é a

urgência de uma solução que ponha termo à indefinição presente e garanta a estabilidade no atual quadro

parlamentar.

Aplausos do PS.

Nada mais absurdo e surreal do que a proposta surpreendente do Primeiro-Ministro de uma revisão

constitucional, que desmente completamente o empenho colocado na revisão constitucional de 1982.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, já ultrapassou o seu tempo.

O Sr. Bacelar de Vasconcelos (PS): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Os governos de gestão são

incidentes de percurso no funcionamento das democracias. Não são uma solução, são um constrangimento

transitório que sempre se deseja tão breve quanto possível. São apenas uma circunstância excecional, cuja

persistência se torna especialmente penosa e imprópria quando, notoriamente, estão criadas as condições

para que a vontade democrática, expressa pelo povo português nas eleições legislativas, possa materializar-

se numa fórmula governativa para a Legislatura que responda positivamente à aspiração, largamente

partilhada, de uma verdadeira mudança política — justa, consistente e duradoura!

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. Bacelar de Vasconcelos (PS): — Vou terminar, Sr. Presidente.

A vontade popular não se reduz a uma equação algébrica. As incógnitas por achar não estão pré-

determinadas; pelo contrário, incumbe aos eleitos a interpretação do sentido do mandato que lhes foi confiado

pelos eleitores. Por isso, é tempo de o PSD e o CDS reconhecerem a sua derrota…

Aplausos do PS.

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Protestos do PSD.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Derrota?! É tudo ao contrário!

O Sr. Bacelar de Vasconcelos (PS): — … e de se resignarem, com dignidade, ao papel honroso que a

democracia sempre reserva às minorias.

O Sr. Presidente: — Faça favor de concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Bacelar de Vasconcelos (PS): — É falso que o País esteja a viver uma crise política. Não há nada

mais normal na vida de uma democracia do que o diálogo e a dissidência, a negociação permanente e a

construção dos consensos que possam rasgar novos caminhos.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. Bacelar de Vasconcelos (PS): — Vou concluir, Sr. Presidente.

É atribuição nuclear do Sr. Presidente da República «assegurar o normal funcionamento das instituições

democráticas». É justamente em nome deste valor e com este objetivo que a Constituição confia ao

Presidente responsabilidades próprias e exclusivas no processo de formação do governo para as superar,

quando se já tornaram irremediáveis, mas, essencialmente, para as antecipar e prevenir. É isso que, em

breve, certamente fará.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Pedro Bacelar de

Vasconcelos, os Srs. Deputados Telmo Correia, Carlos Abreu Amorim, Jorge Costa e António Filipe.

O Sr. Deputado informou a Mesa que pretende responder globalmente ao conjunto das questões

colocadas, pelo que tem, então, a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Telmo Coreia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Bacelar Vasconcelos, queria dizer-lhe

com bonomia e tolerância, porque é o que inspira a sua intervenção, que ela, de facto, comprova uma máxima

— de resto, atribuída a um pensador relevante do espaço imediatamente à minha frente — segundo a qual a

história se repete sempre duas vezes: a primeira sob a forma de tragédia e a segunda sob a forma de

comédia.

Risos e aplausos do CDS-PP e do PSD.

A primeira vez foi no debate do Programa do Governo, que se realizou na semana passada, e a segunda

vez foi agora, em que já estamos numa versão mais ou menos de comédia sobre esta mesma matéria.

Em segundo lugar, o Sr. Deputado fez uma coisa que ainda não tínhamos visto até agora — não vimos na

noite eleitoral, não vimos no debate sobre o Programa do Governo, não vimos em nenhuma circunstância. O

Sr. Deputado, pela primeira vez, chegou aqui e proclamou a vitória, que é algo absolutamente extraordinário e

que ainda ninguém tinha feito.

O Sr. Deputado chegou agora ao Parlamento e em boa hora, pois é reconhecido o seu mérito enquanto

constitucionalista, mas onde é que estava quando estas coisas aconteceram? É que eu trouxe os jornais

dessa altura — e não ando com eles todos os dias — e não houve ninguém no País que não tivesse percebido

que foi a coligação que ganhou e que o maior derrotado foi o Dr. António Costa.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Ninguém teve dúvidas sobre isto. Precisávamos do Sr. Deputado para

vir aqui dizê-lo!

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Em terceiro lugar, devo dizer ao Sr. Deputado que essa «coisa» que estará em construção, chame-se ela

«gerigonça», «manigância», «coisa» ou seja o que for, causa um enorme entusiasmo em toda a esquerda. É

Abril a voltar, são os muros a cair — caiu o Muro de Berlim, o muro de Lisboa ou o muro seja lá de onde for…

—, foi o PREC (Processo Revolucionário em Curso) que acabou 40 anos depois… Sr. Deputado, sabe qual é

o único problema? É que se esqueceram de avisar os eleitores desse pequeno facto durante a campanha

eleitoral,…

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

… esqueceram-se de avisar que o muro ia cair, que o PREC ia acabar, que se iam juntar todos! É que

foram às eleições com programas contraditórios, continuam a ter programas contraditórios e aquilo que até

hoje os senhores têm para apresentar, os tais papéis que os senhores assinaram à porta fechada, tendo

alguém tirado uma selfie, são, numa expressão que tem ficado famosa no nosso debate político dos últimos

dias, muito «poucochinho», pelo que sabemos até agora.

O Sr. Presidente: — Ultrapassou o tempo de que dispunha, Sr. Deputado.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Termino, Sr. Presidente, convidando o Sr. Deputado a dizer, como

constitucionalista que é, se reconhece ou não que este é o tempo do Presidente.

A Assembleia tomou a sua decisão e a decisão que o Presidente tomar será, seja ela qual for,

absolutamente legítima.

O Sr. António Filipe (PCP): — «Seja ela qual for»?!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — O que não pode acontecer, Sr. Deputado, é termos, como vimos no

Bloco de Esquerda, Deputados e até dirigentes a chamarem ao Presidente da República «chefe de seita» ou

termos, como vimos ontem mesmo, um Deputado do Partido Socialista referir-se ao Presidente da República

como «chefe de um gangue». Isso é que não pode acontecer!

Respeitem a decisão e cá estaremos para fazer essa mesma discussão.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Abreu Amorim.

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Bacelar de Vasconcelos,

respeito muito a sua inteligência e, portanto, peço que me conceda alguma latitude na interpretação daquilo

que vou dizer-lhe: ganha as eleições quem tem mais votos!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Nunca pensei ter de dizer-lhe isto cara a cara: ganha as eleições quem tem mais votos!

Houve uma coligação que se apresentou às eleições, ganhou as eleições e existiram outros projetos

políticos que também se apresentaram às eleições com idênticas intenções, aliás por diversas vezes

declaradas, de as vencer e perderam-nas.

Ao ouvir o Sr. Deputado falar do alto da tribuna do resultado eleitoral fiquei com a ideia de que o Partido

Socialista, nestas suas mutações tão dramáticas e tão radicais, parece querer ultrapassar aquela conhecida

perpétua e constante vontade do Partido Comunista Português de vencer todas as eleições desde o 25 de

abril de 1974.

O Sr. Carlos Alberto Gonçalves (PSD): — Muito bem!

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Nunca pensei que o Partido Socialista chegasse a isto.

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O Partido Socialista perdeu as eleições. Mais, e faço-lhe uma pergunta direta, Sr. Deputado: nas eleições

primárias do PS, em setembro de 2014, qual foi o slogan do Partido Socialista? O Partido Socialista anunciava

ao País que eram eleições para escolha do Primeiro-Ministro. Foi ou não verdade que o Partido Socialista

anunciou ao País que essas primárias eram para a escolha do candidato a Primeiro-Ministro? Pois esse

candidato a Primeiro-Ministro venceu as primárias do Partido Socialista do modo que nós conhecemos,

apresentou-se a eleições e perdeu.

Em bom rigor, Sr. Deputado, na aplicação curial do artigo 187.º da Constituição, atendendo aos resultados

eleitorais e ponderando todos os elementos que esta expressão de interpretação lata contem,…

O Sr. António Filipe (PCP): — «Lata» é o que os senhores têm!

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — … quase poderia dizer que o único militante do Partido Socialista

que não tem direito a ser indigitado como Primeiro-Ministro é aquele que se candidatou direta e

expressamente a esse cargo e perdeu: o Secretário-Geral do Partido Socialista!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos do PS.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, já ultrapassou o tempo. Agradeço que termine.

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD). — Queria terminar, mas estou a ser interrompido, pelo que agradeço

ao Sr. Presidente a sua magnanimidade.

Protestos do PS.

Sr. Deputado Bacelar Vasconcelos, deixe-me dizer o seguinte: nas eleições democráticas, os eleitores

manifestam preferências positivas, votam a favor do projeto político em que mais se revêm. Não vale, não é

curial, não é democraticamente honesto querer fazer a partir desta escolha dos eleitores um acordo de

vontades negativas, uma «gerigonça», como já alguém lhe chamou, que não passa de um conjunto de

reservas mentais, que não tem consistência, que não tem viabilidade no futuro.

É isso, Sr. Deputado, que está a ficar cada vez mais expresso nas intervenções do Partido Socialista, que

está a passar ao lado não apenas dos resultados eleitorais mas da verdade eleitoral com que este País se

defrontou no dia 4 de outubro.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Costa.

O Sr. Jorge Duarte Costa (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Bacelar de Vasconcelos, das duas

questões anteriores, regista-se que a direita já guardou no saco das más ideias o discurso da última semana.

Ouvimos Passo Coelho dizer — pouco secundado pelo CDS, é bom registar — que, não conseguindo a

maioria nas últimas eleições, era necessário fazer novas eleições. Para fazer novas eleições era preciso uma

revisão constitucional e, como não tinha votos suficientes para fazer uma revisão constitucional, tinha de haver

uma suspensão da democracia a partir de Belém e um governo de gestão.

Pois bem, nas intervenções que acabámos de ouvir hoje, nem revisão constitucional, nem repetição de

eleições, nada do que a direita foi dizendo ao longo da última semana. Parece-me que está a haver algum

conformismo nas bancadas desse lado. É um bom sinal!

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Está enganado!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — E a pergunta ao Sr. Deputado Bacelar Vasconcelos?!

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O Sr. Jorge Duarte Costa (BE): — Queria colocar ao Sr. Deputado Pedro Bacelar de Vasconcelos a

seguinte questão: estamos na Assembleia da República, um órgão de soberania, que, ao contrário do Governo

e da Presidência da República, não se encontra com poderes diminuídos, viu a sua legitimidade renovada nas

eleições de há um mês e está hoje em condições de assegurar a formação de um governo com uma política

alternativa à que foi seguida até agora.

Pergunto ao Sr. Deputado Pedro Bacelar de Vasconcelos, ilustre constitucionalista, como vê que um

Presidente da República, que deu posse a um governo que já sabia não poder reunir maioria nesta

Assembleia da República, possa insistir em não dar posse a um governo que já assegurou e demonstrou ao

País que dispõe nesta Assembleia da República da maioria necessária para tomar posse.

Como se pode aceitar e compreender que um Presidente da República possa manter, nas circunstâncias

que o País hoje vive, toda uma nação em suspenso, todas as decisões por tomar, em nome de uma

estabilidade que, sabe, só é adiada por esta mesma vontade de manter em suspenso o País?

Sr. Deputado, é esta a questão que queria colocar, deixando a nota de que todas as ameaças e novidades

que a direita nos apresentou já se evaporaram da cena política desde há uma semana.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Bacelar de Vasconcelos, queria saudá-

lo pela sua primeira intervenção no Plenário da Assembleia da República e colocar-lhe duas questões sobre a

intervenção que nos trouxe.

Ouvindo a sua intervenção e, já agora, os pedidos de esclarecimento que lhe foram dirigidos pelos Srs.

Deputados Telmo Correia e Carlos Abreu Amorim, fica um grande mistério no ar: se a direita ganhou estas

eleições para que é que quer outras?!

Aplausos do PCP, do PS e do BE.

Se os senhores continuam a achar que ganharam as eleições e que não as perderam, ficarão muito

felizes…

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, o Sr. Deputado António Filipe tem de fazer as perguntas porque

senão, depois, o Sr. Deputado Bacelar Vasconcelos não pode responder.

Faça favor de continuar, Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, dizia eu que se os senhores continuam a achar que

ganharam as eleições e ficam muito felizes e contentes com a vossa vitória, nós esperamos que com a vossa

derrota se possa fazer algo melhor pelo País do que o que os senhores fizeram nos últimos quatro anos.

Dizia há pouco o Sr. Deputado Telmo Correia que agora é o tempo do Presidente e que tem de respeitar-se

a decisão do Presidente, seja ela qual for. Bom, eu interrogo-o pelo seguinte: não sei que exigências é que o

Sr. Presidente da República fez quando nomeou para Primeiro-Ministro o Sr. Deputado Pedro Passos Coelho.

O que todos sabemos é que a única garantia que o Dr. Pedro Passos Coelho dava era a de que o seu

Programa sairia rejeitado na Assembleia da República.

Então, agora perguntamos: qual é a legitimidade política e constitucional do Sr. Presidente da República,

relativamente a uma proposta de constituição de um governo que, à partida, tem garantida a sua passagem na

Assembleia da República, para não aceitar ou, pelo menos, para protelar uma solução como essa? Gostaria

de ouvir a sua opinião sobre esta questão, Sr. Deputado.

Aplausos do PCP, do PS e do BE.

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O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Bacelar de Vasconcelos.

O Sr. Bacelar de Vasconcelos (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, a história repete-se: no século

XIX, Karl Marx já tinha apontado jocosamente essa circunstância quanto a uma vitória conservadora que

justamente se ligava com os primórdios do sufrágio universal. Por isso mesmo, vem a propósito recordarmos

que se encontra, no centro da questão que aqui debatemos, não sobretudo a inibição do Presidente nos

últimos seis meses do seu mandato de dissolver a Assembleia, mas o sentido profundo, estrutural e

estruturante da inibição da dissolução da Assembleia da República nos primeiros seis meses após a sua

eleição.

Aplausos do PS e do BE.

Vozes do PCP: — Bem lembrado!

O Sr. Bacelar de Vasconcelos (PS): — A democracia, Sr. Deputado Carlos Abreu Amorim, é o Governo

da maioria e não subsiste só por si. Como eu comecei por referir, o poder político que pertence ao povo

exerce-se nos termos da Constituição. Mas, alegoricamente, poderíamos dizer que a Constituição é o lado da

secretaria da vontade democrática do povo. É a Constituição que transforma os votos em mandatos, é a

Constituição que atribui um bónus a quem se coliga para beneficiar da média mais alta do método de Hondt.

O Sr. António Costa (PS): — Muito bem!

Protestos do CDS-PP.

O Sr. Bacelar de Vasconcelos (PS): — Sr. Deputado Carlos Abreu Amorim, como bem sabe — basta

percorrer as páginas relativamente a situações de exceção contempladas na nossa Constituição para o

perceber —, o grande receio, o grande perigo que a Constituição procura esconjurar é que a dependência

parlamentar do Governo, a natureza parlamentar do nosso sistema político não possa ser pervertida através

da moderação semipresidencial pensada para acorrer a situações extraordinárias numa forma de conseguir o

inverso daquilo que é a justificação do cargo do Presidente da República: assegurar o normal funcionamento

das instituições democráticas, não embarcar em crises artificiais, não embarcar em lutos pela perda de um

poder que ao fim de quatro anos e meio os Srs. Deputados do PSD e do CDS entendiam que por direito divino

lhes estava eternamente entregue.

Aplausos do PS, do BE e do PCP.

O Sr. Presidente: — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Pureza, do

Bloco de Esquerda.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Incapaz de conseguir uma

maioria eleitoral e uma maioria política que lhe permitisse governar, a direita portuguesa enveredou por um

discurso de resgate de velhos fantasmas e entregou-se a um extremismo ainda mais extremista do que aquele

que marcou as suas políticas nos últimos quatro anos. Isolada, a direita clama pela velha dicotomia que

sempre foi apanágio da impotência política: ou ela ou o caos.

Todavia, o extremismo da direita não tem nenhuma relação com a realidade. Para azar dos seus ideólogos

e dos seus intérpretes políticos, já nem os mercados os ajudam na chantagem do medo: hoje mesmo Portugal

fez emissão de dívida com juros baixíssimos.

Os mesmos mercados que a direita sempre invocou para legitimar todos os ataques aos direitos do

trabalho e todas as políticas de empobrecimento das pessoas e da democracia desmentem categoricamente

que o fim democrático da governação da direita seja o fim dos tempos que ela vaticina ou a tragédia

inclemente que ela dá a certeza de estar iminente.

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Percebe-se o nervoso e a irritação da nossa direita: é que há condições democráticas em Portugal para pôr

fim ao ciclo de austeridade e de ataque ao trabalho e ao projeto constitucional de democracia social,

económica e cultural. E, mais que tudo, há uma «incontível» vontade social de pôr fim à agressão à classe

média e aos mais pobres e de resgate da democracia inteira que a Constituição da República consagra.

A tragédia que a direita anuncia para o País é, pois, afinal, apenas a sua tragédia,…

Aplausos do BE e do PS.

… a tragédia de quem sabe que chegou ao fim o seu tempo de dominação política e que a democracia

exige que se inicie agora um outro tempo em que a Constituição seja mesmo a lei suprema e em que os

direitos de todos e de todas sejam mesmo o essencial. É isso que a direita não tolera, é isso que a faz

extremar mais e mais o seu discurso e a sua prática.

A direita perdeu e sabe que perdeu. Aliás, a direita tratou de antecipar a sua própria derrota. Em 2011,

ainda antes de ser Primeiro-Ministro, Pedro Passos Coelho afirmava que, e cito, «os Membros do Governo

não podem recrutar ilimitadamente uma espécie de administração paralela para os seus gabinetes». Em 2015,

quando já sabia que deixaria de ser Primeiro-Ministro, tratou de garantir mais de uma centena de nomeações

de pessoas da sua área política para altos cargos no aparelho de Estado.

Não há nenhuma razão para que a democracia não se cumpra e não se cumpra já! Toda a lentidão

artificialmente imposta aos procedimentos da formação de um novo governo que corresponda às condições de

maioria estável criadas nesta Assembleia da República tem em vista unicamente degradar a situação e facilitar

as pressões e as chantagens dos mesmos de sempre, dos que nunca desistirão de ser «donos disto tudo».

A verdade é que há, neste Parlamento, uma alternativa capaz de responder às situações de emergência

social em que a direita colocou Portugal e de o fazer com condições de estabilidade e no horizonte de uma

legislatura. Teimar, por capricho político ou por rigidez ideológica, em não materializar essa alternativa em

governo de Portugal é uma pura jogada política sem nenhum sentido de responsabilidade.

Espera-se, por isso, que os constitucionalistas que ontem Passos Coelho e Paulo Portas reuniram para se

aconselharem lhes tenham dado o conselho certo de que Portugal não precisa de se entreter com uma revisão

constitucional de fantasia e inventada para o puro jogo do entretenimento político, mas precisa, sim, de

cumprir o ditame de constituir rapidamente um governo apoiado pela maioria do Parlamento, como não pode

deixar de ser em democracia.

Aplausos do BE, do PS e do PCP.

E de um Presidente da República, que foi mais rápido que a própria sombra quando se tratou de proteger o

seu Governo prestes a evaporar-se pela demissão irrevogável de Paulo Portas, espera-se que

responsavelmente deixe de fazer pouco do País e garanta o regular funcionamento das instituições

democráticas. É esse o seu dever, foi esse o seu juramento.

Aplausos do BE, do PS e do PCP.

O Presidente pode, naturalmente, ouvir quem entender, contanto que tantas conversas não o façam

esquecer aquilo que é verdadeiramente essencial para um democrata: os cinco milhões de votos, todos com

igual dignidade política, todos com igual qualidade de representação da vontade popular, que definiram a atual

composição desta Assembleia e que determinaram a existência nela de duas alternativas de governo, uma

com condições políticas de maioria para se cumprir e outra sem essas condições e que é minoria social e

política.

Aplausos do BE e do PS.

Por isso mesmo e porque os Deputadas e Deputados desta Câmara foram todas e todos eleitos pelo povo

sem nenhum prémio para aqueles ou aquelas que chegassem primeiro, fraude eleitoral e golpe de Estado

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constitucional seria sermos obrigados a ter um inexplicável governo de gestão contra a maioria política que

representa a maioria do nosso povo.

Protestos da Deputada do PSD Conceição Bessa Ruão.

Invoca o Presidente da República que não há razões para pressa, se ele próprio esteve cinco meses como

Primeiro-Ministro de um governo de gestão. É a teoria do «Ai aguenta, aguenta» transportada para o campo

do sistema de governo.

Entretanto, assumiu a presidência o Vice-Presidente Jorge Lacão.

O Sr. Presidente: — Atenção ao seu tempo, Sr. Deputado.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Estou a terminar, Sr. Presidente.

Se o então Primeiro-Ministro Cavaco Silva aguentou cinco meses em gestão, não há de o País aguentar

agora uns oito ou nove? «Ai aguenta, aguenta», sugere o Presidente.

Todavia, convirá lembrar os mais incautos que o então Primeiro-Ministro Cavaco Silva presidiu a um

governo que esperou, em regime de gestão, a realização de eleições, enquanto, hoje, um eventual governo de

gestão seguir-se-ia a um ato eleitoral legítimo que determinou uma composição do Parlamento de que resulta

patente a impotência da direita para formar uma maioria que dê suporte estável a um governo.

Sr.as

e Srs. Deputados, virar a página da austeridade, pôr o País a funcionar, responder às pessoas e aos

seus anseios de dignidade, respeitar vidas inteiras de trabalho e de sofrimento, não dar nenhum pretexto aos

mercados ou a quem quer que seja para chantagear o País e a democracia são as exigências às quais o povo

nos impõe que respondamos e que o façamos com um governo que tenha suporte democrático maioritário

para tornar concretas todas essas respostas.

Aplausos do BE, do PS e do PCP.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sr.as

e Srs. Deputados, neste momento de início de Legislatura em que

me é dado usar da palavra pela primeira vez na condição de Vice-Presidente, queria cumprimentar-vos a

todos.

A Mesa registou a inscrição, para pedir esclarecimentos, de três Srs. Deputados, aos quais o Sr. Deputado

José Manuel Pureza pretende responder em conjunto.

Sendo assim, para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Delgado Alves.

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Manuel Pureza, saúdo-o pela sua

intervenção, que, de facto, vai ao âmago do momento político que estamos a viver.

Temos ouvido com alguma incredibilidade duas expressões usadas frequentemente pela comunicação

social e por parte dos dois partidos da direita em intervenções públicas: uma, a crise política que estamos a

viver, e, outra, a suposta fraude que está a ser perpetrada contra a democracia.

Quanto à crise, não se compreende como é que o normal funcionamento de um Parlamento numa

democracia pode consubstanciar qualquer tipo de crise. Um Governo apresentou-se perante esta Assembleia

com o seu Programa e esta Assembleia, maioritária e democraticamente, com base no mandato dos

representantes, que o receberam, dos cidadãos, rejeitou esse Programa e manifestou, paralelamente, a

capacidade para formar uma alternativa, para construir uma resposta para os problemas que os portugueses

efetivamente sentem no seu dia a dia em relação à verdadeira crise que o País enfrenta: a crise social, a crise

económica, a crise constitucional, a crise das migrações. A verdadeira crise que nos assola não é uma crise

política — essa está resolvida, essa não existiu, essa diz respeito apenas ao funcionamento das regras

democráticas num Parlamento democrático.

Aplausos do PS, do BE e do PCP.

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Mas a segunda expressão perplexizante é a da fraude, como se o funcionamento das instituições, como se

o funcionamento da democracia, como se a existência de quatro grupos parlamentares fiéis ao seu mandato

perante os eleitores — fazendo o que disseram em momento eleitoral que iriam fazer, que era derrubar a

política de austeridade, virar a página, construir uma alternativa para as pessoas, para lhes devolver

rendimento, para preservar os serviços públicos essenciais, para garantir que a Constituição seja cumprida —

não fosse normal. Tudo isto é normal, até diria mais, é um bocejo. É isto que acontece nas democracias pela

Europa fora, pelo mundo fora. Os parlamentos constroem alternativas e este Parlamento construiu uma

alternativa governativa.

Aplausos do PS e do BE.

Fraude, parece-me — e pergunto-lhe se concorda, Sr. Deputado José Manuel Pureza —, é prolongar

artificialmente o que é, por natureza, transitório e é pretender apresentar como solução estável aquilo que, por

definição, a Constituição prevê apenas que seja para uma fase de transição entre momentos governativos.

De facto, a ideia de um governo de gestão como solução alternativa é incompreensível, porque o que o

País precisa é de um governo em plenitude de funções, e é desnecessária porque existe uma maioria nesta

Câmara capaz de exercer com responsabilidade esse mandato.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sr. Deputado, atenção ao seu tempo.

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Finalmente, e incorrendo num vício a que nos habituaram durante

quatro anos, essa ideia é potencialmente inconstitucional porque manifestamente não é para isso que a nossa

democracia criou a figura dos governos de gestão.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António

Leitão Amaro, do PSD.

O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Manuel Pureza, agradecendo a

sua intervenção, quero dizer que me deixa um pouco perplexo — confirmando um pouco a ideia de que há

coisas que parecem estar a virar o mundo ao contrário — ouvir, na manhã de hoje, o Bloco de Esquerda

legitimar a sua ação na vontade e na palavra dos mercados. É interessante. De facto, as coisas mudam e o

Bloco de Esquerda parece ter mudado muito quando cita como fonte de autoridade para um certo caminho a

palavra dos mercados. É, de facto, extraordinário.

Mas, Sr. Deputado, não assuma um futuro que ainda não aconteceu…

O Sr. Sérgio Azevedo (PSD): — Ora bem!

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Não antecipe!

O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — Não assuma políticas que ainda não mudaram.

O Sr. Sérgio Azevedo (PSD): — Menos presunção!

O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — Não assuma um País que é diferente daquele que temos. Sr.

Deputado, também os mercados pronunciam-se, como os portugueses, sobre a realidade que veem e sobre o

caminho que querem.

Ora, as políticas que temos hoje e que dão resultados na criação de emprego, na recuperação económica,

mas também na fiabilidade das nossas contas públicas, são as que temos hoje, com as políticas de hoje e não

com um futuro sonhado por vós e que ainda não aconteceu.

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Por isso, Sr. Deputado, aquilo que hoje os portugueses recuperaram e estão a recuperar não é resultado

dos vossos «amanhãs que cantam»; é de um percurso de recuperação que o País já fez, que o País está a

fazer e que os portugueses escolheram continuar.

Mas, Sr. Deputado, deixe-me fazer-lhe umas perguntas sobre as eleições.

Percebi bem ou o Bloco de Esquerda defende que as eleições legislativas são um ato plebiscitário? São

um referendo? São uma escolha de «sim» ou «não»? O Bloco de Esquerda apresentou, como o PCP, como

Os Verdes, como o PS, propostas, como nós nos apresentámos com as nossas, mas as vossas propostas

tiveram 10%, as do PS 32%, que são muito diferentes das vossas, e as nossas tiveram mais votos do que

quaisquer das outras.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Ultrapassou o tempo que lhe estava atribuído, Sr. Deputado.

O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — Por isso, Sr. Deputado, para si e para o Bloco de Esquerda uma

eleição legislativa é um ato plebiscitário? Eu sei que o Partido Socialista disse que vinha a eleições para

escolher o Primeiro-Ministro e o Bloco de Esquerda, se calhar, também não é assim tão diferente.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sr. Deputado, peço-lhe o favor de concluir.

O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — Vou terminar, Sr. Presidente.

Eu, cada vez que entrava na minha terra, Viseu, via um cartaz do Bloco de Esquerda e a única cara era da

Sr.ª Deputada Catarina Martins. Afinal, não era também o Bloco de Esquerda que apresentava uma escolha

para Primeiro-Ministro?

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!

O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — Finalmente, pergunto se o Sr. Deputado e o seu partido aderem ou

não a todas as escolhas do programa eleitoral do Partido Socialista, exceto quanto às alterações que

acordaram.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Paula

Santos.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Manuel Pureza, queria felicitá-lo pela sua

intervenção.

A questão que gostaria de lhe colocar está relacionada com as recentes declarações do Primeiro-Ministro,

Passos Coelho — embora Primeiro-Ministro de um Governo em gestão, mas Primeiro-Ministro —, defendendo

uma revisão constitucional para poder fazer eleições antecipadas à sua maneira e à sua luz.

Sobre esta matéria, gostaríamos de referir alguns aspetos.

Primeiro, não podemos esquecer que o anterior Governo do PSD/CDS, nos quatro anos da sua

governação, viu várias medidas, que queria impor aos portugueses, serem declaradas inconstitucionais; não

esquecemos também que o atual Governo PSD/CDS, em gestão, já violou a Constituição da República

Portuguesa, por exemplo, no processo relativo à privatização da TAP; e também não esquecemos as

declarações que ouvimos de Passos Coelho que revelam bem o desespero e a forma como PSD e CDS estão

agarrados ao poder.

Mas mais grave do que isto é virem propor um golpe, um golpe com uma revisão constitucional para

poderem ter eleições consecutivas até estas darem o resultado que lhes seja favorável.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exatamente!

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A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Isto é: claramente continuam sem aceitar que foram derrotados, não

aceitam que o seu Programa do Governo foi rejeitado nesta Assembleia da República e que, dada a alteração

de forças políticas na Assembleia da República, PSD e CDS não têm condições para continuar a governar e

não se conformam com os resultados eleitorais. Daí quererem impor um golpe, um golpe em que, muitas

vezes, invocam — e temos ouvido várias vezes dirigentes do PSD e do CDS falarem nisso — o respeito pelos

princípios do nosso regime democrático, mas parece que esse respeito é só quando lhes é favorável,…

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — É o contrário!

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — … porque, depois, quando não é, o que é que propõem? Uma revisão

constitucional para fazer eleições até estas darem os resultados que os senhores pretendem.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Atenção ao seu tempo, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Presidente, vou terminar perguntando ao Sr. Deputado José Manuel

Pureza qual é a apreciação do Bloco de Esquerda em relação a esta matéria. Estamos ou não, de facto,

perante dois partidos, PSD e CDS, que foram derrotados nestas eleições, cuja política foi derrotada e que, à

força, querem impor um caminho que os portugueses não querem?

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Pureza.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Sr. Presidente, começo por agradecer aos Srs. Deputados as

questões que me foram colocadas e dizer que serei breve nas respostas.

Começo por referir-me às perguntas colocadas pelo Sr. Deputado Leitão Amaro para lhe dizer aquilo que o

Sr. Deputado sabe bem, como eu sei, ou seja, que podemos ter, relativamente às atitudes dos mercados,

atitudes muito diferentes, compreensões muito diferentes, juízos completamente antagónicos, mas o Sr.

Deputado sabe, como eu sei, que os mercados, designadamente os mercados financeiros, pronunciam-se

sempre em torno de previsões.

Por isso mesmo, estar a falar de resultados heroicos a partir de dados do presente é qualquer coisa que

fala de outra coisa que não são propriamente os mercados. O Sr. Deputado sabe que isso é assim!

Mas queria dizer-lhe algo mais que me parece ser importante: quando o Sr. Deputado me aconselha, com

muito vigor, a que eu não assuma um futuro que ainda não aconteceu, eu gostaria que o Sr. Deputado

dirigisse essas palavras justamente ao seu próprio partido e ao partido com quem estão coligados, porque, na

verdade, não têm feito outra coisa que não seja, relativamente à possibilidade de uma maioria política nesta

Câmara ter hipótese de formar um governo, assumir um futuro que ainda não aconteceu e pintam, aliás, esse

futuro da maneira mais trágica e mais calamitosa que conseguem.

Aplausos do BE.

Portanto, creio que sobre isso estamos conversados.

Quanto às perguntas do Sr. Deputado Pedro Delgado Alves e da Sr.ª Deputada Paula Santos, permitam-

me que responda conjuntamente, porque elas tocam em assuntos que são semelhantes.

Sr.ª Deputada e Sr. Deputado, cada dia que passa hoje, em Portugal, mais se torna perigosamente

pantanosa a situação que se vive no País do ponto de vista do sistema de governo e ninguém — ninguém, em

bom rigor — entende isso.

Na verdade, se ao atual Governo de Pedro Passos Coelho fossem aplicados os critérios que o Presidente

da República tantas vezes enunciou como critérios decisivos para a existência de um qualquer governo, esse

governo há muito que não estaria em funções, não teria, aliás, sido verdadeiramente objeto de tomada de

posse.

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A este respeito termino dizendo o que me parece mais importante: na verdade, diante da atual composição

da Assembleia da República, da existência de um conjunto de acordos que permitem a formação de um

governo com um horizonte de uma legislatura e com o objetivo de alterar o conteúdo política da governação,

não transformar esta realidade em governo é, creio, criar uma crise política artificial que o País não

compreende, que o País não suporta e é dar pretexto a todas as entidades para criarem problemas ao País,

para chantagearem o País, para criarem pressão sobre a nossa economia e sobre a nossa sociedade.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Peço-lhe para concluir, Sr. Deputado.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Pelo lado do Bloco de Esquerda, estamos dispostos a fazer o que

temos de fazer para que haja uma solução política positiva para o País que quebre o ciclo do empobrecimento,

o ciclo da austeridade e que defenda os salários, as pensões e o emprego.

Aplausos do BE, do PS e do PCP.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno

Magalhães, do CDS-PP.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Os ataques terroristas em

Paris causaram o horror e a solidariedade de todas as mulheres e homens de boa vontade em qualquer lugar

do mundo. Suscitaram a repulsa e a indignação dos cidadãos da União Europeia que, instinta e racionalmente,

se colocaram ao lado das vítimas e das suas famílias e apoiaram as autoridades francesas e o seu povo na

procura de uma resposta firme e dentro da nossa tradição e valores para que o mal absoluto não prevaleça

sobre o bem comum.

A Assembleia da República foi, hoje, expressão dessa dor que partilhamos e dessa amizade que

praticamos.

Mas a elaboração consensual do voto de pesar não nos dispensa, pelo contrário, convoca-nos para refletir

sobre questões importantes em torno do fenómeno terrorista, da sua infiltração em solo europeu, da sua

capacidade para se organizar e matar em nome do fundamentalismo, servindo-se para isso de todas as

vulnerabilidades que a Europa e cada uma das suas nações têm.

Devemos, aliás, começar por aqui: se queremos manter uma Europa da liberdade, não podemos dar aos

inimigos da liberdade e do próprio direito à vida quaisquer facilidades.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Presidente francês tem designado a situação vivida como um «ato de guerra». Justo e corajosamente

assim é.

Convém, no entanto, ter a noção da assimetria das circunstâncias. O que o proclamado «Estado Islâmico»

faz é uma guerrilha não convencional (e terrivelmente letal) dotada da capacidade de recrutamento e

fanatização de jovens, muito jovens, que, não raro, têm nacionalidades europeias.

Servindo-se das capacidades tecnológicas e da comunicação que globalizarão os seus atentados e

internacionalizam as suas provocações e, certamente, apoiando-se em financiamentos e logísticas que, por

enquanto, não se têm revelado deficientes para organizar — como uma guerrilha, nova, do século XXI —

atentados não apenas em simultâneo, como recorrendo ao bombismo ou ao massacre suicida generalizado.

Com cumplicidades em madrassas radicais e em legislações ingenuamente permissivas, o Estado Islâmico

constitui-se como uma só ameaça numa Europa diversa em território, credos e culturas, que desejamos.

À guerrilha não convencional do Estado Islâmico — cirurgicamente dirigida contra os valores ocidentais —

o ocidente tem, até aqui, reagido com métodos mais clássicos: as operações aéreas de alcance limitado; a

cooperação entre serviços de inteligência, que nem sempre é fácil; uma estratégia diplomática nem sempre

clara perante a identificação do adversário; e até, reconheçamo-lo, uma nem sempre lúcida escolha dos

aliados.

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Nesta bancada, fazemos parte daqueles que não confundem a Rússia com a União Soviética. A Rússia é

milenar, já lá estava antes da União Soviética, lá continua depois dela e, certamente, lá continuará. De resto, a

Rússia é de tradição cristã e, por razões geográficas, tem uma perceção muito precisa sobre o preço e o risco

da infiltração do fundamentalismo islâmico.

A Europa terá sempre diferenças, no plano dos direitos humanos, comuns relativamente à Rússia. Mas

basta ser realista para perceber que a União Europeia e a Rússia têm interesses não divergentes em matérias

de consulta e de combate a esta matriz do terrorismo.

Mais: não havendo solução para a tragédia da Síria fora da comunidade internacional, e dispondo a Rússia

de voto no Conselho de Segurança, só se evitará o prolongamento dramático e do caos na Síria, com um

entendimento substancial entre, pelo menos, as potências do Conselho de Segurança, o que inclui, como

sabemos, europeus e russos.

É por isso um sinal de esperança (ainda inicial, mas um sinal) que as conversações de Viena permitam

uma via de acordo e que, na sequência dos atentados de Paris, se reconheça a necessidade de coordenação.

Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: A evidência de que estamos perante um fenómeno global, e não

meramente nacional, revela como está desatualizada a retórica da dissolução dos blocos político-militares.

O mundo ocidental precisa de uma Europa segura e de uma aliança atlântica forte. Nenhum país

providencia sozinho a sua segurança, perante ameaças deste calibre e desta perigosidade.

É, portanto, natural que as cláusulas que nos garantem proteção mútua em caso de ataque vejam a sua

utilidade validada. Um certo pacifismo ingénuo não é, definitivamente, resposta de Estados sérios e

sociedades abertas à evidência do terrorismo como uma espécie de quinta coluna em solo europeu.

A este propósito convém também não nos equivocarmos: a Europa é o mundo da tolerância em que

queremos viver e aceita a diversidade, que, de resto, só a enriquece, mas a Europa nunca será capaz de

vencer se tiver vergonha de dizer e assumir o que é.

Há uns anos, um estranho debate impediu a União Europeia de referir a tradição judaico-cristã como a

origem da sua forma de olhar e viver a civilização. Nos dias de hoje, esse medo das nossas referências, esse

receio dos nossos valores, refletem um desarmamento ético perigoso, ainda que, por vezes, inconsciente.

Isso mina a nossa força. Qualquer amálgama entre as grandes religiões e o terrorismo é, evidentemente,

perigosa e ignorante; igualmente o é, em nossa opinião, a falta de identidade cultural no que é ser europeu.

Precisamente, para nós, ter cidadania europeia implica uma adesão voluntária e nítida aos valores da

liberdade, democracia e tolerância, que tanto professamos.

Aplausos do CDS-PP.

O que não é aceitável é que se possa ter a perceção de que é possível beneficiar dos direitos de um

europeu e usá-los para destruir a paz da Europa e a vida dos europeus.

Como reconhece o Presidente francês, o mesmo se diga quanto aos aspetos de legislação de

nacionalidade ou imigração: A Europa — e bem! — acolhe e integra, mas não deve hesitar em vigiar

atentamente e, se necessário, expulsar quem conspira contra a sua segurança.

Aplausos do CDS-PP.

É inevitável o reforço desta resposta e dos Estados afetados em matérias judicial, administrativa e de

segurança e é inaceitável que uma certa dimensão do «politicamente correto», que tende sempre a justificar o

injustificável — e, pior, a tentar explicar o abominável — venha iludir os europeus sobre o que está em causa.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Ultrapassou o tempo de que dispunha, Sr. Deputado.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Estou a terminar, Sr. Presidente.

Os democratas sabem quais são as fronteiras do Estado de direito; também sabem que, se não forem os

democratas a responder pela Europa, ganharão espaço e voz todos os extremismos.

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A segurança e a liberdade não são valores contraditórios, é sempre necessário um justo equilíbrio,

sabendo que, neste momento, mais do que nunca, a nossa segurança é a condição essencial da nossa

liberdade.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Não há inscrições para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Nuno

Magalhães.

Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ficámos ontem a saber pelo Sr. Presidente

da República que há em Portugal uma crise política. Não há razões para haver. Só há uma crise política

artificial porque o Sr. Presidente a criou e só subsiste porque o Sr. Presidente a alimenta.

Na ânsia de se manter no poder custe o que custar ao País, a direita portuguesa não se conforma com os

resultados das eleições de 4 de outubro, em que perdeu a maioria e, confrontada com a perspetiva real do seu

afastamento do poder, aposta na criação de uma crise artificial e no facto consumado de um governo de

gestão que permanece ilegitimamente em funções e que, como se viu no escândalo da venda da TAP, não

hesita em exorbitar as suas competências, comprometendo, de forma intolerável, as decisões que só podem

competir a um governo saído das eleições de 4 de outubro.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Muito bem!

O Sr. António Filipe (PCP): — Não é admissível que, passados 45 dias sobre as eleições legislativas, o

País permaneça sem governo, em consequência de uma crise artificialmente criada pelo Sr. Presidente da

República, que, por meras razões de discordância política, tarda em aceitar a única solução governativa

constitucionalmente válida, baseada na vontade política manifestada por quatro partidos representados na

Assembleia da República e que, no seu conjunto, correspondem à maioria absoluta desta Assembleia.

A atuação do Sr. Presidente da República na atual situação política merece a nossa mais veemente

reprovação. Não me refiro a declarações que revelam o seu total alinhamento político com o Governo

derrotado em 4 de outubro e cujo Programa foi já rejeitado por esta Assembleia, nem me refiro a comparações

manifestamente despropositadas com outros momentos políticos, que já foram, aliás, publicamente

desmentidas.

O que é verdadeiramente grave na situação presente é que o Sr. Presidente da República, que devia ser o

primeiro garante do normal funcionamento das instituições democráticas, esteja a atrasar artificialmente a

entrada em funções de um governo democraticamente legítimo, assumindo poderes que a Constituição não só

não lhe confere como expressamente lhe recusa.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. António Filipe (PCP): — O que a Constituição consagra no seu artigo 187.º, sobre a nomeação do

Primeiro-Ministro, é textualmente o seguinte: «O Primeiro-Ministro é nomeado pelo Presidente da República

ouvidos os partidos políticos representados na Assembleia da República e tendo em conta os resultados

eleitorais.»

Daqui decorrem duas ilações que deviam ser óbvias: como não existe no sistema político português

qualquer eleição direta do Primeiro-Ministro, os resultados eleitorais em causa são para a Assembleia da

República, pelo que o que releva para a nomeação do Primeiro-Ministro é a composição da Assembleia da

República. Não havendo, como não há, uma maioria absoluta na Assembleia da República, o significado dos

resultados eleitorais para a formação do governo é aferido pela audição dos partidos políticos. Conhecidas as

posições dos partidos, é possível apurar as possibilidades de formação do governo. Os partidos não são

consultores do Presidente da República. Pertence-lhes, na verdade, a palavra decisiva.

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Como é sabido, o Presidente da República decidiu nomear um Primeiro-Ministro sem apoio na Assembleia

da República. Ou seja, ouviu os partidos, mas não lhes deu ouvidos. Preferiu atuar na base de uma «tradição»

inexistente e juridicamente irrelevante.

É que o regime democrático português não se rege pela tradição, rege-se pela Constituição.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exatamente!

O Sr. António Filipe (PCP): — E a haver tradição nesta matéria, seria a de nomear como Primeiro-Ministro

o único líder partidário com condições para formar governo com apoio parlamentar. Foi sempre isso que

aconteceu no passado. E se havia «tradição» nesta matéria, o Sr. Presidente quebrou-a e nomeou um

Primeiro-Ministro que a única garantia que dava era a da rejeição do seu Governo pela Assembleia da

República.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. António Filipe (PCP): — Com a nomeação do Dr. Passos Coelho, o Presidente da República

condenou o Governo a uma demissão anunciada, que se concretizou com a aprovação de uma moção de

rejeição do seu Programa pela maioria absoluta dos Deputados em efetividade de funções, nos precisos

termos constitucionais. E, assim, perderam-se 26 dias.

Perante a disposição afirmada — e passada a escrito — por quatro partidos representados na Assembleia

da República, que, no seu conjunto, correspondem à maioria absoluta, de possibilitar uma solução governativa

duradoura, na perspetiva da legislatura, o Presidente da República não nomeia o novo Primeiro-Ministro,

mantém o Governo demitido em funções de gestão e decide proceder a audições.

O Sr. Presidente da República é livre de fazer as audições que quiser e sobre os assuntos que muito bem

entender, mas é preciso dizer que, no que se refere à nomeação de um Primeiro-Ministro, essas audições são

constitucionalmente irrelevantes. As únicas audições que contam são as dos partidos políticos com

representação parlamentar.

As audições, e a demora na nomeação de um Primeiro-Ministro que substitua o já demitido, são

alegadamente justificadas pela necessidade de o Presidente da República ponderar a solidez da solução

oferecida no quadro parlamentar. Só que não é legítimo ao Presidente da República invocar qualquer dilema

que justifique a sua demora na nomeação do futuro Primeiro-Ministro, pela simples e óbvia razão de que o

Presidente da República está constitucionalmente impedido — e bem! — de convocar novas eleições até ao

final do seu mandato.

Perante um governo com apoio parlamentar maioritário, o único dilema constitucionalmente possível para o

Presidente da República é entre a nomeação do Primeiro-Ministro que detém esse apoio ou a dissolução do

Parlamento, devolvendo a palavra ao povo. Não pode o Presidente inviabilizar um governo por não concordar

com o seu Programa ou com a sua orientação. Isso compete unicamente a esta Assembleia. Se o Presidente

se encontra impedido de dissolver o Parlamento até ao final do seu mandato, não há aqui dilema possível. O

Presidente da República, ou nomeia o Primeiro-Ministro aceite pelo Parlamento, e já ontem era tarde, ou

assume a responsabilidade de deixar o País sem governo, abrindo um conflito institucional de consequências

imprevisíveis, cuja resolução seria deixada ao seu sucessor.

Não se diga que o Presidente da República pode nomear um governo de iniciativa presidencial. É muito

claro que a responsabilidade política do Governo se efetiva perante a Assembleia e não perante o Presidente

da República. Sendo certo que nenhum governo pode dispensar o apoio parlamentar para subsistir, num

quadro em que existe a possibilidade de um governo formado na Assembleia da República com apoio

maioritário, qualquer governo de iniciativa presidencial seria condenado à rejeição e a sua subsistência em

gestão traduziria sempre um quadro insustentável de paralisia e confronto institucional.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Atenção ao seu tempo, Sr. Deputado.

O Sr. António Filipe (PCP): — Vou terminar, Sr. Presidente.

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E não se diga que o Presidente poderia manter um governo demitido em gestão até ao verão do próximo

ano. O Presidente da República não pode deixar o País sem governo, sem Orçamento do Estado e em total

paralisia legislativa, com o risco permanente de o governo demitido extravasar os seus limitados poderes de

gestão e gerar uma situação de instabilidade e de permanente conflito institucional.

Concluo, Sr. Presidente, dizendo que, no respeito pela Constituição, o Presidente da República não tem

alternativa. A responsabilidade da formação dos governos não é presidencial, mas parlamentar. Sem poderes

de dissolução, o Presidente da República não pode recusar a solução governativa que o Parlamento oferece

ao País, sob pena de atuar à margem da Constituição e de se tornar responsável por lançar o País numa

situação de ingovernabilidade de consequências imprevisíveis.

Aplausos do PCP, do PS, do BE e de Os Verdes.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Srs. Deputados, inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, quatro

Srs. Deputados e o Sr. Deputado António Filipe informou que pretende responder em grupos de dois.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Graça Fonseca, do PS.

A Sr.ª Graça Fonseca (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, na situação política que

vivemos e na sequência da sua declaração política, julgo que há algo que é importante esclarecer: há um

partido ou, melhor, uma coligação de partidos que ganhou as eleições e que submeteu a esta Câmara o seu

Programa do Governo para aprovação. E, nesta Câmara, todos os Deputados, insisto e reitero, todos os

Deputados individualmente considerados…

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Todos? Eu não!

A Sr.ª Graça Fonseca (PS): — … entenderam que era de rejeitar esse Programa do Governo, por razões

que são públicas e que são conhecidas. Ou seja, o Programa do Governo da coligação propunha todas as

medidas que cada um destes Deputados, em campanha, perante os cidadãos, defenderam ser contra.

Entende a direita, entende a coligação que isso é ilegítimo porque todos os Deputados teriam de aprovar o

Programa do Governo, porque seria obrigatório que isso decorresse da formação do governo.

A questão que se coloca é a de saber qual é, afinal, o papel de cada um dos Deputados desta Câmara, na

sequência da apresentação do Programa do Governo, que não teve maioria nesta Câmara para ser aprovado

e, portanto, necessariamente não teve condições para formar governo a seguir. Repito, qual é o papel de cada

um de nós nesta Câmara? Seremos nós obrigados a votar favoravelmente o Programa do Governo que

contém medidas que cada um de nós defendeu publicamente, na campanha, ser contra?! Esta é uma questão

que urge esclarecer.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Hugo Lopes

Soares.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, começo por

cumprimentá-lo pela declaração política que proferiu.

Queria deixar-lhe uma primeira nota que é, sobretudo, de simpatia para com o Partido Comunista

Português. Queria alertar o Partido Comunista Português para o facto de ter perdido um monopólio que lhe era

muito caro a si e a todos aqueles que militam no Partido Comunista Português, que era o de serem o único

partido político em Portugal que acontecesse o que acontecesse nos resultados eleitorais ganhava sempre as

eleições.

O Sr. Sérgio Azevedo (PSD): — Bem lembrado!

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O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Esse monopólio, Sr. Deputado, acabou de o perder nestas eleições e

é algo que deve preocupar o Partido Comunista Português, porque o perdeu também para o Bloco de

Esquerda e para o Partido Socialista.

Mas o Sr. Deputado António Filipe, do alto da tribuna, teceu um conjunto de considerações, que posso ler,

mas julgo que não estarei longe daquilo que o Sr. Deputado disse, ou, melhor, fez um conjunto de pressões

fortes, diria, àquela que deve ser a atuação do Sr. Presidente da República.

Não quero tirar legitimidade, longe de mim, às considerações que proferiu — a nosso ver, pressões —

relativamente àquilo que entende ser o entendimento que o Sr. Presidente da República deve ter dos

resultados eleitorais, mas faço-lhe uma primeira pergunta: onde está o Deputado António Filipe que, do alto da

mesma tribuna, se indignava, por exemplo, quando estes grupos parlamentares criticavam, veja só, decisões

judiciais do Tribunal Constitucional e considerava essas críticas ilegítimas?!

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Bem lembrado!

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — O Sr. Deputado acha que é menos ou mais legítimo pressionar, da

forma como o fez, um órgão de soberania como o Sr. Presidente da República?!

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Bem lembrado!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Já se esqueceu do que dizia noutros fóruns, noutras ocasiões, em

questões muito menos importantes do que aquela que se coloca hoje ao País?!

Ó Sr. Deputado António Filipe, convém que nos entendamos! Recordo-me bem do que a bancada do

Partido Comunista Português dizia, aquando da crise política de 2004! O que os senhores diziam daquilo que

deveria ser feito pelo, então, Presidente Jorge Sampaio? A cada ida a Belém os senhores legitimavam essas

audições! A cada reunião do Conselho de Estado os senhores diziam: «Muito bem, esta situação tem de ser

ponderada!». Nunca o ouvi dizer: «Ó Sr. Presidente da República, despache-se lá e nomeie o Dr. Pedro

Santana Lopes, porque há no Parlamento uma maioria absoluta que ganhou as eleições e que assim o

entende!». Nunca o ouvi dizer isso, Sr. Deputado!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Esgotou o tempo de que dispunha, Sr. Deputado.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Termino, Sr. Presidente, agradecendo a sua benevolência, com uma

pergunta muito direta. Ouvi o Sr. Deputado António Filipe dizer que, mais uma vez, o Sr. Presidente da

República cometeu um erro ao nomear um Primeiro-Ministro que já se sabia de antemão que veria o seu

Programa do Governo rejeitado nesta Câmara.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Foi um erro deliberado!

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Queria perguntar ao Sr. Deputado António Filipe de qual das vezes é

que o Partido Comunista Português mentiu aos portugueses e ao Sr. Presidente da República? E a minha

pergunta é muito clara. Ouvi várias entrevistas do Secretário-Geral do Partido Comunista Português, desde

que esteve com o Sr. Presidente da República em audiência até à data da assinatura do acordo às

escondidas, a dizer que ainda não havia qualquer acordo, que estavam em negociações. Em qual das vezes é

que mentiu? Das vezes em que disse que ainda não havia acordo ou da vez em que disse ao Sr. Presidente

da República que já havia um acordo, e andaram 15 dias a brincar às negociações?! Explique-se agora aos

portugueses, por favor!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Graça Fonseca, a questão que colocou é

muito pertinente, porque aquilo que a direita pretende dizer é que, por parte do PSD e do CDS, perante a

apresentação nesta Assembleia do programa de um governo sem apoio parlamentar, todos os outros

Deputados eram obrigados, coagidos a aceitar, mesmo que tivessem uma alternativa. Ou seja, nós temos uma

alternativa, mas os senhores é que governam; somos obrigados a apoiar o vosso Governo, porque, enfim, os

senhores acham que sim.

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — São 40 anos!

O Sr. António Filipe (PCP): — Portanto, isto é um absoluto contrassenso, Sr.ª Deputada, porque quem

decide a formação dos governos é a maioria parlamentar que se forma e que corresponde, efetivamente, à

expressão da vontade dos portugueses nas urnas.

O Sr. Deputado Hugo Lopes Soares misturou uma série de coisas e disse uma série de imprecisões que

me vão permitir corrigir.

Bom, em primeiro lugar, o Sr. Deputado compara as críticas que acabei de fazer ao Sr. Presidente da

República, à sua atuação…

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — As pressões!

O Sr. António Filipe (PCP): — … ou, neste caso, à sua não atuação, com aquilo que o PSD disse

relativamente aos juízes do Tribunal Constitucional. Deixe-me usar uma expressão popular, isso é «confundir

a estrada da Beira com a beira da estrada».

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — É, é!

O Sr. António Filipe (PCP): — Isto porque uma coisa é emitir uma opinião legítima sobre a atuação de um

órgão de soberania,…

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — São pressões!

O Sr. António Filipe (PCP): — … outra coisa é defender, como a Sr.ª Deputada Teresa Leal Coelho

chegou a fazer publicamente, a existência de sanções jurídicas contra os juízes do Tribunal Constitucional,

contra uma decisão jurisdicional.

Protestos do PSD.

Isso, Sr. Deputado, do ponto de vista da separação de poderes, não pode levar a qualquer comparação.

Mas, Sr. Deputado, sobre as posições do PCP, elas são claríssimas desde a noite das eleições.

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — São, são!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Ganharam!

O Sr. António Filipe (PCP): — Desde a noite das eleições, quando o Secretário-Geral do PCP, salientando

a derrota que os senhores tinham sofrido ao perderem 700 000 votos e ao terem perdido a maioria absoluta,

considerou que seria inteiramente possível ser formado um governo de iniciativa do Partido Socialista, que

está tudo muito claro, tudo muito claro!

Aos Srs. Deputados que se queixam muito, dizendo que demorou muito tempo a existir um acordo entre os

vários partidos…

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O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Ainda estamos à espera desse acordo!

O Sr. António Filipe (PCP): — Olhe, Sr. Deputado, se o Sr. Presidente da República não tivesse nomeado

o Dr. Pedro Passos Coelho, seguramente, esse acordo teria sido publicitado muito mais cedo. Infelizmente,

não foi!

Aplausos do PCP e do PS.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana

Mortágua.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, antes de mais, quero

cumprimentá-lo pela declaração política.

Vou tentar encontrar aqui uma base de entendimento. É ou não verdade que o País foi a eleições e elegeu

230 Deputados com igual legitimidade nesta Assembleia da República?! É ou não verdade que PSD e CDS

tiveram oportunidade de formar governo, mas falharam?! E falharam, porque, quando apresentaram aqui o

Programa do Governo não conseguiram conquistar a maioria dos votos dos Deputados eleitos com igual

legitimidade na Assembleia da República.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — É ou não verdade que, perante esse falhanço, se formou neste

Parlamento uma maioria de Deputados com igual legitimidade, capaz de apresentar uma alternativa estável de

governo?!

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Mais: é ou não verdade que não cabe aos Deputados da direita, nem ao Presidente da República, avaliar a

bondade do programa dessa maioria?!

Vozes do PSD: — Ai cabe, cabe!

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — O programa que sai dessa maioria é um programa político que não cabe

à direita avaliar! Aliás, a alternativa aqui proposta por essa maioria é uma alternativa bem diferente das

alternativas que a direita até agora fez propagar na comunicação social. O que se propõe é o cumprimento da

Constituição, em vez de uma revisão apressada e sem qualquer jeito da Constituição; o que se propõe é

estabilidade governativa, ao invés de um governo de gestão durante os próximos meses, que nada mais trará

ao País do que instabilidade, exatamente aquilo que os Srs. Deputados dizem querer evitar.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Talvez por isso, talvez por saberem da inconsistência e da

irresponsabilidade das alternativas que existem a esta maioria parlamentar,…

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Do vosso acordo!

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — … nenhum dos Srs. Deputados tenha tido a coragem de vir aqui

defender nem um governo de gestão, nem uma revisão constitucional.

Vozes do BE: — Muito bem!

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A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Continuamos à espera! Ouvimos as críticas, ouvimos o medo de

perderem o poder, não ouvimos alternativas!

Vozes do BE: — Muito bem!

Protestos do PSD.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr. Deputado, gostaria de terminar, perguntando se, perante isto,

perante todos estes factos, é ou não verdade que não há nenhuma razão constitucional e política que

justifique uma decisão do Presidente da República no sentido de nomear um governo de gestão,…

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — O Sr. Presidente da República não está vinculado!

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — … a não ser a proteção da sua própria área política e um preconceito

ideológico primário contra a esquerda em Portugal?!

Aplausos do BE, do PS e do PCP.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado

Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, em primeiro lugar, gostaria

de dizer que ouvi com interesse a sua declaração política e, de facto, há uma parte dela que, obviamente, não

é nova — temos estado a ouvir o mesmo ao longo da tarde — e há uma outra parte que, enfim, não quereria,

sequer, rebater, porque não tem a ver consigo, quanto muito, teria a ver com o Partido Socialista e não

consigo. Isto porque o PCP não queria que o centro-direita governasse, nem quando tinha acabado de ganhar

as eleições com maioria absoluta. Portanto, aí…

O Sr. João Oliveira (PCP): — E tínhamos razão!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — … eu não esperaria outra atitude da sua parte. O que nos surpreendeu

neste contexto não foi o PCP, o que nos surpreendeu de alguma forma neste contexto foi, de facto, o Partido

Socialista, que fez uma escolha e, do nosso ponto de vista, uma escolha que rompe com toda a tradição do

nosso sistema parlamentar e do nosso sistema de governo e que é, desse ponto de vista, inédita. Ou seja, o

Partido Socialista, numa situação difícil e exigente do País, em vez da formação da maior maioria, assumindo,

obviamente, quanto mais não fosse, o seu papel enquanto oposição e alternativa, escolheu tentar formar esta

maioria que os senhores agora integram. E esta maioria, obviamente, é o que é! É uma maioria formada

depois das eleições, é uma maioria formada a partir de uma maioria negativa, é uma maioria formada por

quem perdeu as eleições, é uma maioria liderada pelo maior derrotado da noite eleitoral.

Vozes do CDS-PP: — Exatamente!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Isto é que não é normal no nosso sistema de governo e, Sr. Deputado

António Filipe — sei que é atento a estas matérias —, muda o nosso sistema de governo. Isto porque nós

tivemos um sistema de governo feito para que não houvesse maiorias, feito para permitir que quem fosse

minoria pudesse governar e, agora, temos um sistema de governo em que só há duas hipóteses: ou há uma

maioria de um lado, ou há uma maioria do outro. Não sei se esta mudança é positiva, acho que é uma

mudança negativa, mas é a minha opinião.

Quanto às suas considerações sobre as interpretações do Tribunal Constitucional e outras, quero só dizer-

lhe, Sr. Deputado, que, no meu ponto de vista, não se trata de um problema da «beira da estrada e da estrada

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da Beira». Os senhores é que, antes, se o Presidente Jorge Sampaio, perante uma maioria estável no

Parlamento, quisesse derrotá-la e convocar eleições, diziam: «Muito bem! Era o que já deveria ter feito!»;

agora, se o atual Presidente quiser ponderar que escolha faz, numa situação em que a palavra e o papel são

dele, dizem: «É inaceitável! Temos de fazer pressão!». Não se trata de «confundir a estrada da Beira com a

beira da estrada», Sr. Deputado, o senhor é que confunde, provavelmente, o género humano com o seu primo

Germano.

Risos do CDS-PP.

Este é que é o problema, não é o problema da «beira da estrada e da estrada da Beira»! A confusão é sua,

não é de mais ninguém!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Em relação a isto, Sr. Deputado, quero até dizer-lhe que há uma contradição óbvia.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Atenção ao tempo, Sr. Deputado.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Vou terminar, Sr. Presidente.

Ouvi ontem o Sr. Deputado António Costa, como Secretário-Geral do Partido Socialista, dizer: «Bom, até a

direita, até o centro-direita não quer ficar em gestão». Disse, não disse, Sr. Deputado António Costa?!

O Sr. António Costa (PS): — Disse!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Ouvi-o, disse-o, com certeza!

Agora, vem o Sr. Deputado António Filipe dizer: «Os senhores querem ficar em gestão a qualquer preço!».

Bom, já não é só sobre a NATO, o euro ou a Europa que os senhores têm de se entender, têm de se entender

também nisto, porque, de duas uma, ou queremos ou não queremos. Portanto, não vão por aí! Os senhores é

que só têm uma coisa a dizer aqui: «Queremos chegar ao poder! Queremos chegar ao poder! Queremos

chegar ao poder! Queremos chegar ao poder a qualquer custo!».

Sr. Deputado, mesmo a terminar, já ouvimos desde insultos a pressões, durante toda a tarde, mas,

sinceramente, como parlamentar que conheço há muitos anos, diga-me se os senhores estão convencidos de

que pressionar, atacar e até insultar o Presidente da República os vai levar a algum lado. É que não estou

nada convencido disso, mas, sinceramente, ao longo desta tarde, não os vi fazer outra coisa.

Sr. Deputado, não seria melhor respeitarem a decisão do Presidente, que, seguramente, terá ponderado e

que, depois de ouvir os partidos, o que será brevemente, tomará uma decisão que será, certamente, de bom

senso?! Parece-me que seria bastante melhor, Sr. Deputado.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Mariana Mortágua e Sr. Deputado Telmo

Correia, muito obrigado pelas questões que colocaram e que me permitem, também, fazer algumas

referências.

Desde logo, acho curioso que quer o Sr. Deputado Telmo Correia, quer, há pouco, o Sr. Deputado Hugo

Lopes Soares tenham trazido aqui o exemplo do Dr. Santana Lopes, que é o exemplo acabado de que não há,

em Portugal, eleições para Primeiro-Ministro.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Ora aí está!

O Sr. António Filipe (PCP): — Portanto, é interessante que tragam esse exemplo.

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Protestos do PSD e do CDS-PP.

Mas o que é que faz toda a diferença entre esses momentos que os senhores invocam e o momento atual?

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — A vossa opinião mudou!

O Sr. António Filipe (PCP): — É muito simples: nessa altura, o Presidente da República tinha poderes de

dissolução do Parlamento e o atual Presidente da República não tem e, portanto, agora, não há dilema. Agora,

ou o Presidente da República aceita, como lhe compete, como é seu dever constitucional, o governo que lhe é

oferecido pela Assembleia da República, ou deixa o País sem governo. É esta a questão, não há aqui nenhum

dilema, há uma responsabilidade que deve ser assumida: ou respeitar o Parlamento, ou deixar o País numa

situação de ingovernabilidade. É esta opção que o Sr. Presidente da República tem de tomar.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — E irá tomar!

O Sr. António Filipe (PCP): — Queria dizer que somos inteiramente livres e é nosso dever — estamos

num Parlamento — emitir as nossas opiniões sobre as questões mais relevantes para a vida política nacional.

E esta questão, a questão do governo do País, é incontornável! É incontornável! Não passaria pela cabeça de

ninguém, perante a situação que o País está a viver, que houvesse uma sessão parlamentar, um Plenário,

com declarações políticas e que passássemos todos ao lado desta situação, como se o País não estivesse há

45 dias à espera de um governo que possa entrar em plenitude de funções.

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Não é verdade!

O Sr. António Filipe (PCP): — Os senhores, naturalmente, são livres de rejeitar o programa de um

qualquer governo que aqui seja apresentado, como nós fomos livres de rejeitar o Programa do Governo que

aqui foi apresentado.

Aplausos do PCP, do BE e de Deputados do PS.

O que não é legítimo é procurar impedir artificialmente que esse programa seja apresentado, e é isto com

que estamos neste momento confrontados. Os senhores assumirão a responsabilidade, como nós assumimos

as nossas; agora, o que não é legítimo é procurar impedir que um governo que tenha apoio parlamentar nesta

Assembleia possa ser nomeado e possa assumir funções.

Termino dizendo que há pouco o Sr. Deputado Telmo Correia, e o Sr. Deputado Hugo Lopes Soares

também fez alusão a isso, disse que o PCP, na noite das eleições, anuncia sempre que ganhou.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Eu não disse isso!

O Sr. António Filipe (PCP): — Devo dizer que nós temos muita fama, mas há outros que têm muito mais

proveito, porque já passaram 45 dias sobre a vossa derrota e os senhores ainda andam a afirmar que

ganharam, e não sabemos quando é que vão acabar com esse discurso!

Risos e aplausos do PCP, do PS, do BE e de Os Verdes.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Também para proferir uma declaração política, tem a palavra a Sr.ª

Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: O Sr. Deputado Telmo

Correia vai desculpar-me, mas o PSD e o CDS é que andam numa absoluta contradição, porque ora dizem

que não aceitariam, em qualquer circunstância, ficar num governo de gestão, ora dizem que, com certeza,

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aceitariam ficar num governo de gestão. Sabe porquê, Sr. Deputado? É porque o desespero é muito, é muito

para não largar o poder.

Protestos do CDS-PP.

Sr.as

e Srs. Deputados, o País está suspenso à espera que o Presidente da República, que tarda, tome a

decisão que se impõe para a formação do governo.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Com efeito, no passado dia 10 de novembro, a Assembleia da República deliberou a rejeição do Programa

do Governo PSD/CDS, tal como o Presidente da República já sabia que aconteceria. O Parlamento deliberou

dessa forma, porque nele existe uma maioria de Deputados, pertencentes a várias forças políticas, que não se

associa ao PSD e ao CDS, no seu desejo ávido de continuar a cimentar políticas de empobrecimento

estrutural e a desqualificação das potencialidades do desenvolvimento de Portugal, tornando-nos, sempre,

mais dependentes do exterior.

Na verdade, PSD e CDS não têm qualquer suporte parlamentar, para além dos 107 Deputados que detêm

juntos, o que é insuficiente para lhes suportar um governo e para lhes viabilizar essas medidas gravosas para

o País, como as que aprovavam na Legislatura anterior. Perderam a maioria que tinham na Assembleia da

República e as forças políticas que se comprometeram, perante os eleitores, com a mudança de políticas têm

hoje a maioria de Deputados. Por mais que o PSD, o CDS e o Sr. Presidente da República não se conformem,

essa foi a vontade dos eleitores!

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Presidente da República já sabia tudo isto quando nomeou o líder do PSD como Primeiro-Ministro e

quando deu posse ao Governo PSD/CDS. Já sabia que o Governo cairia, aquando da aprovação de moções

de rejeição do seu Programa, e já sabia que, por consequência, estava a arrastar uma decisão de governação

para o País que se impunha, e impõe, como urgente.

O facto é que o arrastar da situação potencia um clima de instabilidade que é o Presidente da República

que está a construir de uma forma incompreensível. O que é um facto é que já lá vão mais de 40 dias, desde o

ato eleitoral, que chumbou a maioria de deputados do PSD e do CDS, e já lá vai mais de uma semana, desde

o chumbo parlamentar do Governo PSD/CDS, traduzindo a decisão eleitoral dos portugueses, quando

elegeram os 230 Deputados para a Assembleia da República, de onde resultou uma nova correlação de forças

e a oportunidade de mudança política no País.

Os Verdes reafirmam que, face à composição parlamentar decorrente dos resultados eleitorais e à

representatividade das forças políticas com assento parlamentar, estão criadas as condições para se formar

um governo da iniciativa do PS e para se gerar e gerir uma solução de governabilidade de forma duradoura e

sustentável, com políticas que promovam melhores condições de vida aos portugueses e desbloqueiem as

potencialidades de desenvolvimento e de criação de riqueza do País, numa dimensão de sustentabilidade que

agregue as componentes ambiental, social e económica do desenvolvimento.

Acresce, ainda, que foram estabelecidas posições comuns, quer pelo Partido Ecologista «Os Verdes», quer

pelo PCP, quer pelo BE, com o PS, que traduzem uma visão alargada à XIII Legislatura e que refletem

convergências parlamentares encontradas para os objetivos e questões, urgentes e emergentes, para gerar

uma mudança política que traga esperança ao País e às suas gentes.

A Constituição da República Portuguesa não determina que o Primeiro-Ministro e respetivo governo saiam

do gosto pessoal e político do Presidente da República mas, sim, que o Primeiro-Ministro seja nomeado pelo

Presidente da República, tendo em conta os resultados eleitorais e ouvidos os partidos políticos com

representação parlamentar. Os resultados eleitorais determinaram a perda da maioria de Deputados do PSD e

do CDS e criaram as condições para uma alternativa de governabilidade que o Presidente da República não

pode, em qualquer circunstância, ignorar ou relativizar.

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Neste sentido, qualquer opção pela manutenção de um governo de gestão, por parte do Presidente da

República, não poderia deixar de ser interpretada de três formas cumulativas: primeiro, como mais um amparo

ao PSD, ao CDS e às suas políticas, rejeitadas pelos portugueses; segundo, como um ato de retaliação, em

relação aos portugueses que fizeram escolhas nas eleições e que determinaram uma maioria de Deputados

no Parlamento dispostos a promover uma mudança política; e, terceiro, como uma decisão que determinaria

uma paragem oficial do País, sem margem de manobra para tomar decisões e criando uma crise política e

institucional que não teria qualquer razão de existir.

Protestos do Deputado do PSD Carlos Abreu Amorim.

Face a tudo isto que ficou referido, o Sr. Presidente da República não tem outra alternativa de decisão que

não a de um governo da iniciativa do PS,…

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Isso é pressão!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — … sustentada nos resultados eleitorais e na disponibilidade dos

diversos partidos políticos com representação parlamentar, os quais voltará a ouvir. E nada mais do que isto!

Protestos da Deputada do CDS-PP Cecília Meireles.

Tudo o que for para além disso, como exigências de pressupostos e, até, de políticas a prosseguir,

extravasará o papel atribuído ao Presidente da República, na medida em que estão criadas as condições para

o regular funcionamento das instituições.

Pela parte de Os Verdes, estamos aqui para contribuir para medidas e políticas que promovam melhores

condições de vida no presente e no futuro aos tantos desempregados, aos tantos emigrados, aos tantos

precários, aos tantos despejados, resultantes das políticas anteriores que foram prosseguidas de uma forma

absolutamente insensível.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Queira concluir, Sr.ª Deputada, terminou o seu tempo.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Concluo, Sr. Presidente, dizendo que estamos aqui para

contribuir para políticas diferentes que acreditem nas pessoas, que não as usem em favor dos grandes

interesses económicos e financeiros, que dignifiquem a nossa sociedade, que gerem sempre melhores

padrões ambientais e modos de vida compatíveis com o uso sustentável dos nossos recursos. Estes são

alguns compromissos estruturantes e programáticos de Os Verdes que materializaremos, em muitas propostas

e soluções, durante a Legislatura, aqui, na Assembleia da República.

Aplausos de Os Verdes, do PS, do BE e do PCP.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Inscreveu-se para pedir esclarecimentos à Sr.ª Deputada Heloísa

Apolónia o Sr. Deputado João Galamba.

Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. João Galamba (PS): — Sr. Presidente, Sr.a Deputada Heloísa Apolónia, penso que, mais uma vez,

ficou evidente, sobretudo para a direita que insiste em não ver o que se passou, que existe uma nova maioria

neste Parlamento capaz de viabilizar um governo do Partido Socialista e de sustentar a sua ação governativa.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Até quando?

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O Sr. João Galamba (PS): — A direita pode continuar a insistir e a fingir que ela não existe, mas, agora,

está aqui, perante os vossos olhos, uma nova maioria e espero que, desta vez, tenham percebido o que se

passou.

Sr.a Deputada, uma das dificuldades da direita portuguesa é a de não perceber normas que ela própria

aprovou. A direita portuguesa, PSD e CDS, tem tentado passar esta ideia de que a norma constitucional que

impede a dissolução do Parlamento nos seis primeiros meses, após a sua eleição, é, de alguma forma, uma

força de bloqueio. Já tínhamos tido essa leitura da própria Constituição e, agora, temos a leitura de uma norma

que sempre foi defendida pelo CDS e pelo PSD.

Ora, é preciso reafirmar aqui que essa norma que impede a dissolução do Parlamento nos seis meses

após as eleições não é, ao contrário do que PSD e CDS tentam, agora e não no passado, sugerir, algo que

impeça a realização de eleições, é algo que existe para valorizar, exatamente, as eleições que acabaram de

ocorrer…

Vozes do PS: — Bem lembrado!

O Sr. João Galamba (PS): — … e a composição parlamentar que decorreu dessas eleições.

É, portanto, contra as eleições e contra a Constituição que devemos ler esta posição, um pouco exótica,

contra a história do próprio PSD e do próprio CDS, que é a de quererem abolir uma norma que existe para

valorizar a democracia, valorizar as eleições, valorizar o voto dos portugueses e valorizar o Parlamento, a

Assembleia da República.

Mas, Sr.a Deputada, a pergunta que quero fazer é se entende que o País pode esperar mais um dia por

começar a inverter as políticas que estes quatro anos nos deixaram. Pode o País esperar pela inversão dos

cortes de rendimento? Pode o País continuar com um governo que atacou e quer continuar a atacar salários e

o mundo do trabalho?

Protestos do CDS-PP.

Pode continuar o País a conviver com um Governo que, manifestamente, não soube, não é capaz e já não

tem condições para defender o interesse do País e dos portugueses?

Aplausos do PS e do Deputado do BE José Manuel Pureza.

Entretanto, reassumiu a presidência o Presidente, Ferro Rodrigues.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.a Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Galamba, agradeço a questão

colocada.

Julgo que PSD e CDS gostariam de esperar, gostariam de esperar, gostariam de esperar e de ter a

esperança de ficar, mas os portugueses não podem mais esperar, Sr. Deputado, porque as políticas

hediondas que foram praticadas e as suas consequências tiveram repercussões tamanhas na vida dos

portugueses que é fundamental gerar políticas, no sentido de as inverter e de promover a qualidade de vida

merecida aos portugueses e que os portugueses ditaram nas últimas eleições realizadas no dia 4 de outubro.

Protestos de Deputados do PSD e do CDS-PP.

Julgo que aquilo que hoje o País percebe é que as eleições legislativas servem para eleger 230 Deputados

para a Assembleia da República, e quem quer que seja que lhes diga que essas eleições servem para eleger

um Primeiro-Ministro mente!

Protestos da Deputada do CDS-PP Cecília Meireles.

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Isto porque é da composição parlamentar, do quadro parlamentar e da representatividade de cada força

política na Assembleia da República que tudo o resto decorre, e nesse «tudo o resto» inclui-se a formação de

um governo.

Vozes do PCP: — Muito bem!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Há uma alternativa de governo e, portanto, é essa alternativa de

governo que tem de ser imediatamente viabilizada.

Na nossa perspetiva, Sr. Deputado João Galamba, tal como o dissemos, o Sr. Presidente da República, se

não quer criar uma crise política institucional no País — e tem o dever de não a criar — e quer contribuir, como

a Constituição dita, para o regular funcionamento das instituições, só tem uma alternativa, que é, justamente, a

de viabilizar, naquilo que lhe toca, um governo da iniciativa do Partido Socialista e que será viabilizado aqui, na

Assembleia da República, como os partidos que têm a maioria de Deputados na Assembleia da República já o

afirmaram, e reafirmarão, certamente, perante o Sr. Presidente da República.

Perante aquilo que dita a Constituição, o Sr. Presidente da República decide em função dos resultados

eleitorais e depois de ouvidos os partidos, ou seja, depois de ouvida a disponibilidade dos partidos para essa

legislatura ou aquilo a que os partidos se comprometem para essa legislatura, o resultado está ditado e não há

outra decisão possível.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Vou pedir à Sr.ª Secretária da Mesa, Deputada Emília Santos, para anunciar a

entrada de várias iniciativas.

Tem a palavra, Sr.ª Secretária.

A Sr.ª Secretária (Emília Santos): — Sr. Presidente, deram entrada na Mesa, e foram admitidas, as

seguintes iniciativas legislativas: projetos de lei n.os

34/XIII (1.ª) — Extinção das reduções remuneratórias na

Administração Pública (PS), que baixa à 10.ª Comissão, e 35/XIII (1.ª) — Extinção da contribuição

extraordinária de solidariedade (PS), que baixa à 5.ª Comissão; projetos de resolução n.os

9/XIII (1.ª) —

Recomenda a divulgação e o estudo da Constituição da República Portuguesa na escolaridade obrigatória (Os

Verdes), 10/XIII (1.ª) — Recomenda a definição de um conjunto de prioridades para a agricultura familiar

tendentes ao estabelecimento de um estatuto da agricultura familiar portuguesa (PCP); e a apreciação

parlamentar n.º 7/XIII (1.ª) — Relativa ao Decreto-Lei n.º 246/2015, de 20 de outubro, que procede à alteração

à Lei n.º 90/2009, de 31 de agosto (Aprova o regime especial de proteção na invalidez), e à terceira alteração

ao Decreto-Lei n.º 265/99, de 14 de julho, alterado pelos Decretos-Leis n.os

309-A/2000, de 30 de novembro, e

13/2013, de 25 de janeiro (Procede à criação de uma nova prestação destinada a complementar a proteção

concedida aos pensionistas de invalidez, velhice e sobrevivência dos regimes de segurança social em situação

de dependência) (BE).

É tudo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, passando ao ponto 2 da nossa ordem de trabalhos, vamos dar início

à discussão, conjunta, da petição n.º 338/XII (3.ª) — Apresentada pela DECO — Associação Portuguesa para

a Defesa do Consumidor, solicitando à Assembleia da República a adoção de legislação, na área das

telecomunicações, que reduza o prazo máximo legal de fidelização (24 meses) e imponha critérios e limites

aos encargos cobrados aos consumidores, de forma a garantir transparência e previsibilidade, e, na

generalidade, dos projetos de lei n.os

30/XIII (1.ª) — Altera a Lei das Comunicações Eletrónicas — Estabelece

limites à oneração dos utentes pela resolução de contrato no período de fidelização (décima segunda

alteração à Lei n.º 5/2004, de 10 de fevereiro) (PCP) e 32/XIII (1.ª) — Reforça a proteção dos clientes de

serviços de comunicações eletrónicas nos contratos de fidelização (BE).

Para proceder à apresentação do projeto de lei do PCP, tem a palavra o Sr. Deputado João Ramos.

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O Sr. João Ramos (PCP): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, gostaria de iniciar a minha intervenção

saudando a DECO e os mais de 157 000 subscritores da petição que hoje discutimos. Tão elevado número de

subscritores dá bem conta da dimensão da problemática da relação entre consumidores e as operadoras de

comunicações eletrónicas que a petição aborda. Também ao Grupo Parlamentar do PCP têm chegado as

preocupações dos consumidores com o facto de os operadores não utilizarem como regra de duração de

contrato os 12 meses que a lei aconselha mas os 24 que traça como duração máxima.

Quando o cliente pretende denunciar o contrato, em regra, é obrigado a pagar a totalidade do mesmo, ou

seja, o pagamento que lhe é exigido vai muito além do que seria aceitável: a amortização do equipamento ou

do investimento que a operadora realizou par prestar o serviço.

Outra queixa recorrente prende-se com os mecanismos que as operadoras utilizam para eternizarem os

contratos recorrendo a expedientes como a oferta de promoções perto do término do período de fidelização.

Em muitos casos, a simples atualização de tarifário ou a aceitação de uma promoção oferecida pela operadora

dá a esta o direito de impor um novo período de fidelização. Isto acontece em casos em que não há nem novo

contrato, nem adenda ao contrato anterior, nem investimento adicional da operadora.

Este comportamento vai condicionando a liberdade de o consumidor optar pelas soluções e pelas

operadoras de comunicações que, a cada momento, melhor sirvam os seus interesses ou a sua

disponibilidade financeira.

Procurando responder às preocupações dos consumidores e dos subscritores da petição, o Grupo

Parlamentar do PCP apresenta um projeto de lei. Não propusemos a alteração ao período de fidelização,

porque entendemos que esta matéria precisa de ser aprofundada, mas propomos que a informação relativa à

duração dos contratos seja clara, percetível e prévia à celebração dos mesmos.

O PCP propõe ainda que a qualquer momento do período de fidelização o consumidor tenha o direito de

ser informado sobre a data do termo desse período, bem como sobre o valor que lhe cabe pagar em caso de

resolução antecipada do contrato.

O PCP propõe também que, durante o período de fidelização, os encargos para o consumidor, decorrentes

da resolução do contrato por sua iniciativa, não possam ultrapassar os custos que o fornecedor teve com a

instalação da operação, sendo proibida a cobrança de qualquer contrapartida a título indemnizatório ou

compensatório. Com esta norma reconhecemos o direito da operadora a ser ressarcida do investimento que

fez para iniciar a operação, o que não lhe reconhecemos é o direito de poder cobrar valores em função da sua

expectativa de encaixe financeiro.

Vivemos um período em que as expectativas dos portugueses, relativamente aos seus rendimentos futuros

e aos seus direitos, foi profundamente abalada. De resto, consideramos que a entidade reguladora devia,

especialmente nesta matéria, desempenhar com eficácia a sua função de supervisão e estabelecer regras e

limites na relação das empresas operadoras com os consumidores.

Para o PCP é necessário que esta relação entre consumidor e operador seja equilibrada para que possam

ser garantidos os direitos dos primeiros. É com esse objetivo que apresentamos esta iniciativa legislativa.

O Sr. Presidente: — Já ultrapassou o seu tempo, Sr. Deputado.

O Sr. João Ramos (PCP): — Termino, Sr. Presidente, dizendo que manifestamos total disponibilidade para

discutir outras soluções no decurso do processo legislativo.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Paulino Ascenção, para uma intervenção.

O Sr. Paulino Ascenção (BE): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Quero, em nome do Grupo

Parlamentar do Bloco de Esquerda, saudar a Associação de Defesa do Consumidor, a DECO, os seus

associados e todos os subscritores da petição pública que hoje é presente ao Plenário, por esta iniciativa que

enriquece a nossa democracia.

O mercado das telecomunicações, ao contrário das promessas feitas no momento da sua liberalização e da

privatização dos operadores, continua a não permitir aos consumidores uma verdadeira mobilidade e impede-

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os de beneficiarem das várias ofertas disponibilizadas pelos operadores, nomeadamente pela imposição de

períodos de fidelização excessivos (24 meses) e de penalizações desproporcionadas face aos benefícios

auferidos.

A realidade neste ponto desmente, mais uma vez, certas posições ideológicas daqueles que veem na

liberalização e na privatização a solução para os males do mundo.

Estes dois fatores, o período de fidelização excessivo e as penalizações desproporcionadas, estão na

origem de uma parcela importante das reclamações dos consumidores. Segundo a DECO, o sector das

comunicações é o que regista mais queixas e o período de fidelização é, dentro deste sector, a maior fatia

dessas mesmas queixas, e, convém salientar, esta petição contou com a subscrição de 157 000 cidadãos.

O Bloco de Esquerda acompanha as preocupações da DECO, quanto à necessidade de maior

transparência e segurança para os consumidores e à exigência aos operadores de informação detalhada

sobre as várias componentes do preço, dos custos de resolução do contrato e dos motivos que fundamentam

a existência do período fidelização.

Importa discriminar, no momento de formação do contrato, o custo do regular fornecimento do serviço e

dizer quais são os outros custos que fundamentam a fidelização e que serão amortizados nesse mesmo

período, nomeadamente os custos da instalação e dos equipamentos subsidiados. Importa também informar

sobre eventuais custos quando da resolução do contrato, designadamente de desmontagem ou recolha de

equipamentos.

Ora, após o período de fidelização, na renovação automática do contrato, a mensalidade deve ser ajustada

automaticamente ao custo do regular fornecimento do serviço e a parcela da mensalidade que respeita aos

custos que justificaram a fidelização não pode continuar a ser cobrada, como acontece atualmente.

Por outro lado, em caso de resolução antecipada do contrato, a indemnização a exigir ao cliente deve

cingir-se ao número de mensalidades que faltam cumprir desses mesmos custos que ainda não foram

amortizados. Julgamos que deve ser fornecida periodicamente, na fatura, nomeadamente, a informação sobre

quantas mensalidades ainda faltam para terminar o período de fidelização e o valor atual dos custos a assumir

com essa resolução antecipada.

O Bloco de Esquerda está disponível para acolher melhorias neste projeto de lei em sede de especialidade,

tendo em vista a maior transparência, segurança para os consumidores e um mercado mais aberto, mais

concorrencial.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Ricardo Baptista Leite.

O Sr. Ricardo Baptista Leite (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Permitam-me que comece

por cumprimentar os mais de 150 000 cidadãos portugueses que assinaram a petição da DECO e que

propõem a adoção de legislação que, no mercado das comunicações eletrónicas, reduza o prazo máximo legal

de fidelização estabelecido nos 24 meses.

Os peticionários apelam igualmente para que sejam impostos critérios e limites aos encargos a cobrar aos

consumidores finais, de modo a garantir transparência e previsibilidade.

Tive a honra de ser o autor do relatório que incidiu sobre esta petição e que foi, favoravelmente, apreciado

por todos os partidos políticos na Comissão de Economia. No decorrer desse processo, que antecedeu esta

discussão, hoje, em Plenário, tivemos a oportunidade de auscultar, para além dos peticionários, o Ministério da

Economia, a Autoridade da Concorrência, a ANACOM, a Associação dos Operadores de Comunicações

Eletrónicas, entre outros. Volvido esse longo processo de audiências, tendo procurado reunir com máximo

rigor a posição de todas as partes interessadas, cumpre-nos, hoje, refletir sobre as conclusões que retiramos.

Da apreciação realizada, parece-nos que será vantajoso prosseguir um esforço de reflexão que possa

então afunilar numa eventual alteração legislativa, isto é, que tenha como consequência a salvaguarda dos

interesses dos cidadãos portugueses, clientes das operadoras de comunicações móveis.

Nesse sentido, consideramos que, no decorrer dos períodos de fidelização acordados entre as operadoras

e os seus clientes, devem ser estabelecidos claramente limites à realização de alterações contratuais por parte

das empresas.

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Nos casos em que haja uma alteração unilateral da parte da operadora, o consumidor deve poder rescindir

o contrato sem a obrigação de pagamento de qualquer penalização.

A informação a prestar ao consumidor, quer antes, quer depois de assinar um contrato com uma

operadora, deve ser clara e de fácil acesso. Mais, a apresentação de opções comerciais que não obriguem à

fidelização por parte do cliente devem ser disponibilizadas com a mesma publicitação que as demais ofertas

dos promotores.

Há ainda um outro aspeto realçado no relatório que apresentei e que não mereceu, surpreendentemente,

qualquer referência nas propostas apresentadas quer pelo PCP, quer pelo BE. Refiro-me à necessidade de se

introduzir mecanismos de proteção em caso de desemprego involuntário comprovado, protegendo assim os

cidadãos que, repentinamente, possam ficar numa situação de grande vulnerabilidade financeira e social

perante as operadoras.

Desconhecemos, de facto, se os partidos da esquerda já reuniram bilateralmente ou se já têm até um

acordo tripartido. Com o PSD, a realidade é esta…

Protestos da Deputada do PCP Rita Rato.

Sem graça nenhuma, Sr.ª Deputada.

Como eu dizia, com o PSD, nenhum partido da esquerda falou.

O Sr. Jorge Duarte Costa (BE): — Já disseram que votam contra tudo!

O Sr. Ricardo Baptista Leite (PSD): — Da nossa parte, devo dizer que os projetos de lei apresentados

pelo PCP e pelo BE são claramente insuficientes, por terem esquecido por completo os que estão ou podem

vir a estar em situação de desemprego involuntário e, portanto, em situação de profunda vulnerabilidade.

No fundo, as propostas das esquerdas mantêm os cidadãos em situação de grande vulnerabilidade e não

respondem plenamente às questões suscitadas pelos peticionários. Por tudo isto, as propostas, tal como

estão, são, para nós, insuficientes.

Apesar disto, reafirmamos aqui que o PSD está disponível para prosseguir o debate sobre soluções

legislativas concretas em sede de especialidade, porque, para nós, acima dos jogos político-partidários, estão

os interesses dos cidadãos portugueses.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Paulo Rebelo, para uma intervenção.

O Sr. João Paulo Rebelo (PS): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Na minha primeira intervenção

nesta Assembleia, permitam-me dirigir uma palavra especial ao Sr. Presidente, cuja personalidade admiro há

já vários anos, sendo, portanto, um particular gosto vê-lo a assumir estas funções.

Permitam-me também saudar e apresentar os meus cumprimentos a todas as Deputadas e a todos os

Deputados eleitos pelos diversos partidos, fazendo votos de que todos tenham um bom desempenho ao longo

desta Legislatura no exercício do mandato que nos foi conferido nas passadas eleições de 4 de outubro.

Terminando as saudações, quero deixar uma palavra de reconhecimento a todos os cidadãos subscritores

e, em particular, à DECO, pela petição que somos hoje chamados a apreciar nesta Assembleia.

O tema desta petição é claro e incide sobre um dos principais problemas que importa resolver na legislação

que regula as denominadas comunicações eletrónicas: o período de fidelização. Na verdade, e conforme é

público, têm vindo a ocorrer, e num número cada vez mais crescente, queixas, por parte dos consumidores,

sobre a falta de proteção que o regime de fidelização dos contratos apresenta. Acresce-se que estas queixas

estão, normalmente, associadas a outras relacionadas com a informação que é transmitida pelos operadores

aos consumidores.

Sr. Presidente, tratamos, portanto, de uma matéria de enorme relevância e que é a base da relação de

confiança que as partes, operadores e consumidores, acordam na celebração de qualquer contrato:

informação clara, facilmente percetível e previamente disponibilizada.

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A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — Muito bem!

O Sr. João Paulo Rebelo (PS): — Esta petição, entre outros méritos, levou já a que um conjunto de

audições fosse realizado e que estejam já compilados diversos pareceres sobre este tema. Para além da

própria DECO, foi ouvida a Apritel (Associação dos Operadores de Telecomunicações) e o próprio regulador

do sector, a ANACOM (Autoridade Nacional de Comunicações), bem como recolhidas, a título de exemplo, as

apreciações do Ministério da Economia e da Autoridade da Concorrência. É desta forma que entende o Partido

Socialista estar consensualizada a necessidade de reforço na qualidade de informação a ser prestada aos

consumidores, bem como a necessidade de alteração dos períodos de fidelização.

Assim, a nosso ver, estão reunidas as condições para que, na especialidade, possamos apreciar os

projetos de lei, quer do PCP, quer do Bloco de Esquerda, sem prejuízo de eventuais propostas que possam

ocorrer nessa sede e que se prossiga, assim, um trabalho que reforce nos normativos vigentes a proteção dos

consumidores, não descurando a importância do papel dos operadores do sector. Da nossa parte, estamos,

portanto, disponíveis para levar a cabo este trabalho, viabilizando estas iniciativas.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, muito obrigado pelas palavras simpáticas que dirigiu ao Presidente da

Assembleia da República e também lhe desejo uma excelente desempenho na Legislatura.

Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Lília Ana Águas, do CDS-PP.

A Sr.ª Lília Ana Águas (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Saúdo, em primeiro lugar, a

DECO, e, em nome da DECO, todos os que subscreveram esta petição, que tem como objetivo a revisão da

Lei das Comunicações Eletrónicas.

Como sabemos, é uma lei que sofreu, ao longo de vários anos, alterações, as quais visaram não só a

adequação das diretivas comunitárias mas também a própria adaptação às novas realidades.

Assim, não é de estranhar que, num sector como o das telecomunicações, que está sempre em constante

inovação tecnológica e com grandes apostas no marketing, haja necessidade de uma intervenção frequente

por parte do legislador. Ora, é isso mesmo que, mais uma vez, se está a verificar.

A DECO fez saber que o atual quadro legislativo não está a corresponder às expectativas dos

consumidores e, portanto, todos os outorgantes dos contratos de prestação de serviços de telecomunicações

têm estado em dimensões jurídicas diferentes.

Desta forma, o CDS entende que deve ser feita uma intervenção ponderada que sirva verdadeiramente os

interesses dos consumidores e que não coloque em causa a segurança jurídica.

Ora, para que isso se possa verificar, e segundo os alertas da DECO, é necessário melhorar e aclarar a

informação prestada ao consumidor, principalmente na matéria que respeita à cessação contratual antecipada.

Isto porque o consumidor que assine um contrato deve saber exatamente, na hipótese de cessação do

mesmo, quais são os valores exatos que terá de indemnizar a cada momento que o faça.

Em nosso entender, para que as posições contratuais se possam equivaler, será necessário clarificar quais

os objetos contratuais suscetíveis de indemnização.

Se aparentemente é consensual que a utilização tecnológica deve ser indemnizada, já não se passa o

mesmo com o que respeita aos períodos de tempo restantes, após a cessação contratual, em que o limite

deve ser sempre o da expectativa jurídica e nunca o da totalidade do serviço. A proporcionalidade tem de ser

sempre a que está associada aos valores indemnizatórios.

Na petição é feita referência ao excessivo período de tempo da fidelização, neste caso, 24 meses. No

entanto, a própria lei esclarece e prevê que os clientes possam ainda celebrar contratos de 12 meses. Resta,

contudo, perceber se as operadoras oferecem aos seus clientes esta informação. É por isso mesmo que, para

que se possam garantir os direitos dos consumidores, será sempre necessário que o regulador possa ajudar a

avaliar o respeito das operadoras por algumas garantias já existentes. Na nossa perspetiva, uma intervenção

legislativa deve ser ponderada e que permita mais transparência, mais informação, mais capacidade de ação

da entidade reguladora e mais justiça na indemnização por cessação antecipada dos contratos em causa.

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Recordo: aquilo que se pretende hoje é aumentar as garantias dos consumidores. Mas, para que se possa

alcançar esta intervenção,…

O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, já ultrapassou o seu tempo.

A Sr.ª Lília Ana Águas (CDS-PP): — Peço só 1 minuto, Sr. Presidente.

Como eu estava a dizer, esta intervenção deve ser meticulosa por forma a equilibrar duas perspetivas:

primeiro, o equilíbrio contratual e, segundo, o acesso dos consumidores às tecnologias da informação a preços

acessíveis.

O CDS está, certamente, empenhado em conseguir alcançar estes desígnios, de forma a obter proveito

parcial das propostas que aqui são apresentadas em conjunto com esta petição.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: — Assim, terminámos o ponto 2 da nossa ordem do dia.

Passamos ao ponto 3, e último, que consiste na apreciação da petição n.º 499/XII (4.ª) — Apresentada por

Vítor Cristiano Roque e outros, denunciando o modo como está a ser gerido o Curso Profissional de Artes do

Espetáculo do Externato Delfim Ferreira, em Riba de Ave, concelho de Vila Nova de Famalicão.

Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Sofia Bettencourt.

A Sr.ª Ana Sofia Bettencourt (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: O assunto que hoje sobe a

Plenário reveste-se de uma importância acrescida no atual contexto político em que vivemos. Prova que a livre

escolha, o Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo e o do Aluno são, efetivamente, adequados.

As bancadas do Bloco de Esquerda, do PCP, de Os Verdes e do PS, embora afirmem que a educação é

central para o desenvolvimento do País, não apresentam soluções que potenciem uma maior interligação

como agentes de exigência e de qualidade de pais e alunos na vida da escola.

É público que as reivindicações destes pais e alunos, baseadas na assunção do seu dever na defesa da

qualidade de ensino, conduziram a ações que garantiram e salvaguardaram o percurso dos alunos e o

exercício do seu direito à liberdade de escolha.

A Sr.ª Conceição Bessa Ruão (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª Ana Sofia Bettencourt (PSD): — Na realidade, o envolvimento de todos os parceiros na definição

de uma rede escolar com maior diversificação, capaz de gerar alternativas de escolha a cada família e a cada

aluno, resolveu uma questão que muitos entendiam fadada ao infortúnio.

Sempre defendemos que as escolhas se devem fazer de forma informada e livre, que as ofertas formativas

têm de ter qualidade para que sejam reconhecidas, para que sejam potenciadoras de valor acrescentado para

quem frequenta e para o mercado de trabalho.

Não somos defensores de um sentido ideológico igualitário, porque nada acrescenta, porque não favorece

alternativas, porque potencia sistemas pouco transparentes…

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Ana Sofia Bettencourt (PSD): — … e porque, a reboque de um falso igualitarismo de acesso, não

se garante uma igualdade de oportunidades.

O Sr. Amadeu Soares Albergaria (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª Ana Sofia Bettencourt (PSD): — Assumimos que é pela livre escolha, pela transparência dos

processos, pelo maior envolvimento e responsabilização de todos, também de pais e de alunos, que o sistema

melhora.

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Assumimos que este caminho é promotor de uma maior exigência e que confere às famílias um poder real

de influência e de parceria com o estabelecimento de ensino.

Cumprimento, pois, os peticionários desta iniciativa, pela forma construtiva como assumiram um papel

importante, como cumpriram e ajudaram a cumprir e como se envolveram para construir soluções que

possibilitem e fortaleçam a liberdade de escolha e potenciem a qualidade da oferta ministrada.

Por último, uma palavra ao Sr. Presidente da Câmara Municipal de Vila Nova de Famalicão, pela defesa

que fez destes educandos,…

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Ana Sofia Bettencourt (PSD): — Termino já, Sr. Presidente.

Como eu dizia, uma palavra ao Sr. Presidente da Câmara Municipal de Vila Nova de Famalicão, pela

defesa que fez destes educandos, colocando-os no centro da sua ação política, ao contrário de forças políticas

locais, que, ao votarem contra, demonstraram uma incapacidade de encontrar soluções.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Gabriela Canavilhas.

A Sr.ª Gabriela Canavilhas (PS): — Sr. Presidente, cumprimento V. Ex.ª e todas as Sr.as

e Srs. Deputados

presentes, com os votos de melhor sessão legislativa possível.

O assunto que a presente petição aqui nos traz e nos denuncia é paradigmático, do ponto de vista da

desresponsabilização e inércia a que chegaram as políticas de educação durante o Governo de Passos

Coelho, em particular as que respeitam ao ensino artístico. Os últimos quatro anos foram marcados por um

gritante empobrecimento da oferta educativa.

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — Muito bem!

A Sr.ª Gabriela Canavilhas (PS): — Assistimos à criação de um novo sistema educativo, o da instrução

escolar low cost,…

Aplausos da Deputada do PS Ana Catarina Mendonça Mendes.

… que transformou a educação numa mera formatação de alunos para conhecimentos essenciais e para

treino de exames. É difícil identificar onde Nuno Crato mais falou, face ao descalabro em que deixou as

políticas educativas, mas, sem dúvida, um dos alvos mais atingidos foi o ensino artístico.

Vozes do PS: — Muito bem!

A Sr.ª Gabriela Canavilhas (PS): — O Curso Profissional de Artes do Espetáculo do Externato Delfim

Ferreira, em Riba de Ave, no concelho de Vila Nova de Famalicão, que existe desde 2008, com contrato de

associação com o Ministério da Educação e Ciência, tinha o direito de esperar da tutela institucional, a quem

compete garantir o correto funcionamento das instituições que avaliza e financia, a função de árbitro e garante

do bom prosseguimento da sua missão educativa, que, de resto, até 2013, foi de grande e de reconhecida

qualidade.

Mas quando surgiram problemas, nomeadamente após a mudança da direção da escola, problemas graves

entre a direção, alunos e pais, que condicionaram o trabalho académico, a comunidade educativa ficou

abandonada e entregue a si própria. Dirigiram comunicações ao Governo, ao Secretário de Estado do Ensino

Básico, à Direção-Geral dos Estabelecimentos Escolares, etc., e não obtiveram resposta, apenas no final do

ano letivo souberam da existência de uma inspeção. Os problemas arrastaram-se por demasiado tempo, Sr.

Presidente, faltando um acompanhamento de proximidade e a introdução de um fator fundamental nesta

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equação, a mediação, a proteção dos alunos e o sentimento de não abandono. Tudo isto faltou ao Externato

Delfim Ferreira, e a prova é que os alunos e os pais tiveram de recorrer à Assembleia da República,…

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Gabriela Canavilhas (PS): — … face à inoperância e à incapacidade do Governo de Passos

Coelho. Dezenas de escolas profissionais de arte e todo um conjunto vital de instituições artísticas nacionais

sofreram, e muito, com o desrespeito com que foram tratadas por Nuno Crato — a falta recorrente de

financiamento, de promessas falhadas, de procedimentos administrativos incompetentes e uma evidente

menorização do seu papel na formação cívica e cultural dos portugueses.

Sr. Presidente, termino já, dizendo que se precisa urgentemente de políticas de proximidade e de

descentralização de competências; precisa-se de políticas onde as artes e as humanidades sejam respeitadas;

precisa-se de um compromisso…

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Gabriela Canavilhas (PS): — … com visão e ambição para a educação. É o que teremos com o

próximo governo de esquerda em Portugal.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Monteiro, do Bloco de Esquerda, a quem

cumprimento, pois julgo que é a sua primeira intervenção.

O Sr. Luís Monteiro (BE): — Muito obrigado, Sr. Presidente.

Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Em primeiro lugar, cumprimento e saúdo os peticionários que,

através de um instrumento da democracia, trouxeram até aqui uma discussão à qual nenhum governo pode

fugir, nem tão-pouco pode fugir às suas responsabilidades.

O problema do Externato Delfim Ferreira é a imagem de um país destruído e abandonado pelas políticas

de Nuno Crato nos últimos quatro anos e sabemos bem que a falta de democracia e de transparência na

gestão escolar acontece por demissão do Ministério da Educação e do Governo durante todos estes anos

nesta matéria.

Quem constrói o ensino artístico, todos os dias, com as suas próprias mãos, na Escola Artística Soares dos

Reis, na Escola António Arroio, nas escolas de teatro, de ballet, nos conservatórios, conhece bem a política

que foi implementada.

O Sr. Jorge Costa (BE): — Muito bem!

O Sr. Luís Monteiro (BE): — Cortaram nos apoios e nas verbas, seja no Orçamento do Estado ou através

do POPH (Programa Operacional Potencial Humano); desvalorizaram os programas curriculares do ensino

das artes; desrespeitaram os profissionais da área e também os estudantes. E é este o paradigma do

presente. O estado da arte resume-se num governo em gestão, que acha que pode privatizar a TAP, mas não

pode transferir as verbas do Orçamento do Estado para as escolas de ensino artístico.

O Sr. Jorge Duarte Costa (BE): — Muito bem!

O Sr. Luís Monteiro (BE): — Vejam-se os resultados: Conservatório Nacional em vias de fechar a porta

por falta de dinheiro.

Alguém nos «andou a dar música» nos últimos quatro anos. Está na hora de trocar de «banda», que esta

está mesmo desafinada!

Aplausos do BE.

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O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Carla Cruz, do PCP.

A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do Partido Comunista

Português começa a sua intervenção por saudar os peticionários, os mais de 4000 cidadãos que se

associaram a esta iniciativa.

Evidentemente que não podemos deixar de fazer um comentário à intervenção da Sr.ª Deputada do PSD,

porque a Sr.ª Deputada do PSD faz uma intervenção em que não refere o problema concreto que foi vivido

pela população escolar, pelos estudantes do Externato Delfim Ferreira, e nós bem percebemos as razões por

que a Sr.ª Deputada Ana Sofia Bettencourt resolve falar de tudo e de nada sobre a situação.

Mas, Sr.ª Deputada, até porque esteve na Comissão aquando da audição dos peticionários, era bom que

aqui, até por respeito aos próprios peticionários, fizesse alguma menção ao problema concreto, problema que

foi também resultado das opções políticas do anterior Executivo do PSD/CDS-PP, por intermédio do Ministro

Nuno Crato.

Aliás, este problema não foi resolvido atempadamente por inércia, por opção política desse mesmo

Governo e desse Ministério. É que na resposta que a relatora da petição pediu ao Ministério da Educação e

Ciência é o próprio Ministério que diz, relativamente à questão, que pediu à DGESTE (Direção-Geral dos

Estabelecimentos Escolares), que tem acompanhado a situação, aguardando-se — reparem bem! —, no

âmbito da rede escolar, para o ano letivo 2015/2016 — portanto, para o presente ano letivo em relação a um

problema que estava identificado no ano letivo de 2014/2015 —, a apresentação de uma solução adequada,

por forma a salvaguardar os interesses dos respetivos alunos.

Aqui está claramente o que foi a opção política, aquela que tem sido a opção política do PSD e do CDS no

caso do ensino artístico!

Mas esta petição alerta também para os problemas causados pelo facto de o ensino ser financiado por via

do POPH (Programa Operacional Potencial Humano), de que todos se recordarão: problemas no

financiamento, atrasos nos pagamentos aos docentes, e aos próprios alunos, de subsídios de transporte e de

subsídios de alimentação.

O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, peço-lhe que conclua.

A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Termino, Sr. Presidente, dizendo que esta petição chama também a atenção

para um problema grave que aconteceu e cuja não resolução atempada causou um grave prejuízo pedagógico

àqueles alunos.

Finalmente, Sr. Presidente, Srs. Deputados, esta petição chama a atenção para a necessidade de uma

valorização da rede pública de ensino e do alargamento do ensino público artístico especializado.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, que creio ser a última no âmbito deste debate,

a Sr.ª Deputada Vânia Dias da Silva, que tem outro nome parlamentar no controlo eletrónico.

A Sr.ª Vânia Dias da Silva (CDS-PP): — Sr. Presidente, esse problema será resolvido a breve trecho,

espero eu. Muito obrigada.

Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Mais de 4000 cidadãos solicitaram a nossa reflexão e a nossa

intervenção no sentido de salvaguardar o Curso Profissional de Artes do Espetáculo-Interpretação, no

concelho de Vila Nova de Famalicão. Começo, por isso, por saudar os peticionários, em particular os que,

eventualmente, ainda se encontram hoje connosco. São exercícios de cidadania como este que também dão

significado à democracia que conquistámos e à Câmara que representamos.

No documento que apresentaram ressalta a natural preocupação dos pais e encarregados de educação

com alguns problemas verificados no decurso do ano letivo que já findou, pugnando pela continuidade do

curso e, sobretudo, pela proteção dos estudantes.

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Esta bancada e este Governo desde logo lamentaram a situação que, então, se vivia e de imediato

encetaram as diligências necessárias à resolução do problema.

De um pressuposto partimos todos, seguramente: para além do óbvio superior interesse dos alunos, o que

importava era acautelar a manutenção daquela oferta educativa no concelho e, principalmente, uma oferta que

não afastasse a qualidade, o rigor e a exigência do ensino que este Governo sempre defendeu, e defende.

Deve-se, aliás, às forças políticas que integram a atual coligação a aposta e o desenvolvimento do ensino

profissional no sistema educativo português, o que nos confere uma responsabilidade acrescida na

valorização sócio-educativa destes cursos, razão por que, além do mais, a pretensão dos peticionários não

podia deixar de ser atendida.

Donde, depois de devidamente verificada, estudada e ponderada a questão, norteado pelo maior interesse

em presença — o dos educandos — o atual Governo foi ao encontro da solicitação dos peticionários,

mantendo-se o Curso Profissional de Artes do Espectáculo-Interpretação em funcionamento no concelho de

Vila Nova de Famalicão e decorrendo o presente ano letivo em condições de absoluta normalidade, com a

serenidade, o rigor e a exigência que — e muito bem — se reclama do ensino profissional.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Chegámos ao fim da nossa ordem do dia de hoje.

A próxima reunião plenária terá lugar amanhã, às 15 horas, constando do primeiro ponto da ordem do dia o

debate do projeto de resolução n.º 2/XIII (1.ª) — Sobre a afirmação dos principais compromissos europeus de

Portugal (PSD e CDS-PP) e do segundo ponto a discussão conjunta, na generalidade, dos projetos de lei n.os

1/XIII (1.ª) — Revoga as Leis que humilham mulheres que recorrem à IVG (Revogação da Lei n.º 134/2015, de

7 de setembro, e da Lei n.º 136/2015, de 7 de setembro) (BE), 4/XIII (1.ª) — Restabelece o respeito pela

dignidade das mulheres portuguesas e a salvaguarda da sua saúde sexual e reprodutiva, revogando as Lei n.º

134/2015 e a Lei n.º 136/2015, ambas de 7 de setembro (PS), 10/XIII (1.ª) — Elimina mecanismos de coação e

condicionamento sobre as mulheres no acesso à interrupção voluntária da gravidez, revoga a Lei n.º

136/2015, de 7 de setembro e repristina a Lei n.º 16/2007, de 17 de abril (PCP) e 14/XIII (1.ª) — Revoga a Lei

nº 134/2015, de 7 de setembro, e a Lei nº 136/2015, de 7 de setembro, de modo a combater o aborto

clandestino e a respeitar a dignidade das mulheres que decidem interromper voluntariamente a gravidez (Os

Verdes).

Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 14 minutos.

Retificação

Ao n.º 3 do Diário, de 10 de novembro de 2015:

No Sumário, 2.ª cl., § 2.º, l. 7, onde se lê «Vânia Barros», deve ler-se «Vânia Dias da Silva».

Na pág. 83, l. 1, § 3.º, 4.º, 9.º, 11.º, 13.º e 16.º, na pág. 84, l.1, § 1.º e na pág. 88.º, l.1, § 8.º, onde se lê

«Vânia Barros», deve ler-se «Vânia Dias da Silva».

Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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