I SÉRIE — NÚMERO 62
4
Tudo isto levaria o mais elementar bom senso a alterar o funcionamento do sistema financeiro. Mas qual é a
solução imposta através da supervisão e resolução bancárias únicas, defendidas pela União Europeia, pelos
grandes grupos económicos e pelo monopólio da banca? Criar bancos ainda maiores através de um processo
de concentração e centralização do sector bancário, nacional e europeu, e a dominação monopolista dos
grandes grupos financeiros continentais.
Não foi preciso esperar muito tempo até perceber que o conflito entre o interesse dos que comandam a União
Europeia e o interesse dos portugueses é gritante. A resolução do BANIF e a venda, ou entrega, ao Santander
demonstra com particular clareza a incompatibilidade entre a visão da Comissão Europeia e a visão do interesse
nacional.
Enquanto Portugal tinha menos a perder com o controlo público do BANIF, ou mesmo como banco de
transição, a Comissão Europeia impõe a sua entrega ao Santander, juntamente com mais 2200 milhões de
euros. Saiu cara a brincadeira dos grupos económicos da Madeira, dos créditos dados aos amigos e acionistas
e da atuação de um supervisor e de um governo que ajudaram a esconder um Banco podre ao longo de muitos
anos.
O PCP vem, desde há muito, alertando para os riscos e prejuízos que resultam da integração europeia e do
avanço do processo de afastamento entre o poder e os povos. A forma como o grande capital hoje decide sobre
aspetos fundamentais do sistema financeiro, sobre a economia e sobre a política de cada Estado-membro,
através de organismos não eleitos e não democráticos, faz da União Europeia uma nova forma de ditadura ao
serviço dos monopólios, uma ditadura económica e financeira que se traduz na redução de direitos sociais,
culturais, políticos e económicos.
A continuação desta política levará ao crescimento continuado da descapitalização da banca e da
necessidade de intervenção pública, com custos cada vez maiores e em ciclos cada vez mais curtos.
O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.
O Sr. MiguelTiago (PCP): — Aos quase 20 000 milhões já injetados em bancos, acrescerão outros tantos
milhões, e assim sucessivamente.
A limpeza dos ativos tóxicos da banca tem de ser feita com a riqueza dos que lucraram indevidamente, tem
de ser feita com as empresas e as propriedades, com as contas offshore dos que enriqueceram porque
assaltaram os bancos e as poupanças dos portugueses. Ao mesmo tempo, a banca pública tem de ser
robustecida, afastada das práticas de mercado que mimetizam e servem a banca privada, colocando-a como
um serviço público subordinado ao interesse nacional das pequenas e médias empresas, dos trabalhadores, do
desenvolvimento regional e do povo.
O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.
O Sr. MiguelTiago (PCP): — Termino, Sr. Presidente.
Este debate é um contributo que o PCP pretende dar para uma reflexão urgente sobre o papel da banca,
porque só a banca nas mãos do povo não rouba o País.
Aplausos do PCP e de Os Verdes.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Miguel Tiago, a Mesa regista a inscrição, para pedir esclarecimentos, do
Sr. Deputado Fernando Anastácio.
Tem a palavra, Sr. Deputado Fernando Anastácio.
O Sr. FernandoAnastácio (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Tiago, todos, ou, pelo menos, a
maioria dos Deputados desta Câmara, estamos perfeitamente de acordo que foi uma leviandade por parte do
Governo anterior dizer que a resolução do BES e o Novo Banco não teriam qualquer custo para os contribuintes.
Sobre isto, penso que não há qualquer divergência e a grande maioria deste Parlamento tem essa perfeita
noção. Não se deveria ter passado essa ideia aos portugueses, porque, de facto, há custos para os contribuintes.