19 DE MAIO DE 2016
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O Sr. Jorge Duarte Costa (BE): — Nos últimos anos, o glifosato tornou-se omnipresente e é por isso que se
encontram vestígios por todo o lado. Em testes recentes foram identificados vestígios desta substância em
cervejas de 15 marcas alemãs e, até, em tampões e pensos higiénicos fabricados a partir de algodão.
Sr.as e Srs. Deputados, quanto aos efeitos do glifosato na saúde humana, em vez de um enredo de polémicas
entre relatórios contraditórios, a nossa responsabilidade é responder, hoje e aqui, pelo princípio da precaução.
Evitemos por isso o recurso, neste debate, a artifícios de última hora que só comprovam a extensão da influência
destas multinacionais na fiscalização e na monitorização internacional. Refiro-me às notícias destes últimos dias,
mencionando relatórios que alegam que o glifosato não representa perigo para a saúde humana.
Não é preciso ser um especialista para desconfiar de um estudo sobre glifosato que é apresentado
exatamente dois dias antes da cimeira europeia que decide a continuidade ou não das licenças deste herbicida
na União Europeia. Mas, ainda antes de começar a cimeira, já a natureza deste novo relatório está exposta. O
Guardian inglês noticia hoje que o principal responsável pelo relatório é nada menos do que dirigente da
fundação privada que recebeu um milhão de euros da Monsanto e da indústria agroquímica.
Portanto, este estudo sai de cena mesmo antes de entrar e fica como grande estudo de referência aquele
que sempre foi, ou seja, o da Organização Mundial de Saúde (OMS) que liga o glifosato à prevalência do linfoma
não-Hodgkin. O linfoma não-Hodgkin é um dos cancros que mais se regista em Portugal e nos últimos anos
verificaram-se 1700 novos casos por ano.
É por isso que o Bastonário da Ordem dos Médicos portugueses já veio dizer que a conclusão é clara, e cito,
«…este herbicida deveria ser suspenso em todo o mundo…». Trata-se do princípio da precaução e é sobre ele
que somos chamados a decidir, hoje.
Além do uso generalizado e do perigo potencial, a contaminação já é também geral. Na semana passada,
48 Eurodeputados aceitaram submeter-se a testes para verificar a presença de glifosato no organismo. Revelou-
se que cada um deles tinha valores 17 a 35 vezes acima do permitido para a água potável no seu próprio corpo,
no seu próprio sangue.
Em Portugal, há poucas semanas, ninguém pôde ficar indiferente aos dados revelados na reportagem do
programa Sexta às 9, da RTP. A Plataforma Transgénicos Fora (PTF), que reúne um conjunto de organizações
não-governamentais (ONG) da área do ambiente, veio apresentar os resultados de um estudo que encomendou
a um laboratório nos Estados Unidos da América em que um conjunto de famílias se submeteu a testes para
verificar precisamente a presença do glifosato. As conclusões são assustadoras. Estas famílias têm até 260
vezes mais a quantidade normal e aceitável de glifosato que é aquela que se reconhece, por exemplo, na água
potável.
A situação é muito preocupante e está na hora de tomar medidas.
Claro que muitos dos que se opõem à retirada do glifosato, mesmo quando não procuram negar os seus
efeitos negativos no meio ambiente e na saúde de pessoas e animais, argumentam que não há alternativas ao
uso de herbicidas e desta substância ativa em particular. Não se trata de uma argumentação inesperada, aliás,
basta lembrar a persistente defesa do inseticida DDT ainda há poucas décadas.
Rachel Carson, autora de uma das mais prestigiadas obras em defesa do ambiente — o livro Silent Spring
—, foi atacada na praça pública pelos «lobbyistas» quando relatou os impactos devastadores do DDT que hoje
são consensuais.
Foram necessários vários anos para ser reconhecida razão a esta autora e hoje, em 2016, quase todos
possuímos ainda no corpo os vestígios do DDT usado pelas gerações anteriores e os nossos filhos ainda
manifestarão essa presença pela transmissão feita pelo leite materno.
Mas, se decidir bem, Portugal não estará sozinho. Já em abril o Presidente francês anunciou que o glifosato
deixará de ser comercializado em França. Ainda ontem, em declarações à imprensa, a Ministra do Ambiente
declarou que, independentemente dos debates sobre o caráter cancerígeno do glifosato, os estudos de que o
Governo francês dispõe mostram que se trata de um disruptor endócrino, ou seja, o glifosato é um fator de
perturbação hormonal em pessoas e animais. São esperados novos estudos, continuou a Ministra a dizer, para
2017, mas, em todo o caso, enquanto esperam estes novos estudos, não renovarão a autorização para o
glifosato em França.
Existe cobertura legal para esta decisão. A Diretiva 2009/128, da Comissão, prevê que os Estados-membros
assegurem que a utilização de pesticidas seja minimizada ou proibida em certas zonas específicas, como