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Sexta-feira, 17 de junho de 2016 I Série — Número 79

XIII LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2015-2016)

REUNIÃOPLENÁRIADE16DEJUNHODE 2016

Presidente: Ex.mo Sr. Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues

Secretários: Ex.mos Srs. Emília de Fátima Moreira Santos Idália Maria Marques Salvador Serrão

S U M Á R I O

O Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 5

minutos. Deu-se conta da entrada na Mesa dos projetos de

resolução n.os 366, 378 e 379/XIII (1.ª) e da proposta de lei n.º 25/XIII (1.ª).

Procedeu-se a um debate de urgência, requerido pelo Partido Ecologista «Os Verdes», sobre o Acordo de Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento (TTIP) e o Acordo Económico e Comercial Global (CETA). Após terem proferido intervenções, na fase de abertura, o Deputado José Luís Ferreira (Os Verdes) e o Ministro dos Negócios Estrangeiros (Augusto Santos Silva), usaram da palavra, durante o debate, a diverso título, além daqueles oradores e da Secretária de Estado dos Assuntos Europeus (Margarida Marques), os Deputados António Ventura (PSD), Lara Martinho (PS), Isabel Pires (BE), Pedro Mota Soares (CDS-PP), Carla Cruz (PCP),

André Silva (PAN), Nuno Serra (PSD), Ascenso Simões (PS), Filipe Lobo d'Ávila (CDS-PP) e João Ramos (PCP).

No encerramento do debate, intervieram o Ministro dos Negócios Estrangeiros e o Deputado José Luís Ferreira (Os Verdes).

Procedeu-se à discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 23/XIII (1.ª) — Cria um regime de reembolso de impostos sobre combustíveis para as empresas de transportes de mercadorias, alterando o Código dos Impostos Especiais de Consumo, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 73/2010, de 21 de junho, e o Regime Geral das Infrações Tributárias, aprovado pela Lei n.º 15/2011, de 5 de junho, tendo intervindo, além do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (Fernando Rocha Andrade), os Deputados Margarida Balseiro Lopes (PSD), Fernando Anastácio (PS), Hélder Amaral (CDS-PP), Heitor Sousa (BE) e Bruno Dias (PCP).

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Foi também discutida, na generalidade, a proposta de lei n.º 22/XIII (1.ª) — Procede à segunda alteração à Lei n.º 7/2007, de 5 de fevereiro, que cria o cartão de cidadão e rege a sua emissão e utilização, à primeira alteração à Lei n.º 37/2014, de 26 de junho, que estabelece um sistema alternativo e voluntário de autenticação dos cidadãos nos portais e sítios na Internet da Administração Pública denominado Chave Móvel Digital, e à sexta alteração ao Decreto-Lei n.º 83/2000, de 11 de maio, que aprova o regime legal da concessão e emissão de passaportes. Intervieram, além da Ministra da Presidência e da Modernização Administrativa (Maria Manuel Leitão Marques), os Deputados Susana Amador (PS), Vânia Dias da Silva (CDS-PP), Paulo Rios de Oliveira (PSD), Sandra Cunha (BE) e António Filipe (PCP).

Foi ainda discutida, também na generalidade, a proposta de lei n.º 24/XIII (1.ª) — Procede à primeira alteração à Lei n.º 61/2014, de 26 de agosto, que aprova o regime especial aplicável aos ativos por impostos diferidos, tendo proferido intervenções o Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais e

os Deputados Ricardo Leão (PS), Paulo Sá (PCP), Cristóvão Norte (PSD), Mariana Mortágua (BE) e João Pinho de Almeida (CDS-PP).

Sobre a Conta Geral do Estado de 2014, intervieram, além do Secretário de Estado do Orçamento (João Leão), os Deputados Cecília Meireles (CDS-PP), Paulo Sá (PCP), Paulino Ascenção (BE), Cristóvão Crespo (PSD) e Paulo Trigo Pereira (PS).

Foram discutidos, na generalidade, os projetos de lei n.os 111/XIII (1.ª) — Inclusão de opção vegetariana em todas as cantinas públicas (PAN), 265/XIII (1.ª) — Determina a inclusão da opção vegetariana nas refeições nas cantinas públicas (BE) e 268/XIII (1.ª) — Ementa vegetariana nas cantinas públicas (Os Verdes), tendo intervindo os Deputados André Silva (PAN), Jorge Duarte Costa (BE), Heloísa Apolónia (Os Verdes), Palmira Maciel (PS), Cristóvão Norte (PSD), Patrícia Fonseca (CDS-PP) e João Ramos (PCP).

A Presidente (Teresa Caeiro) encerrou a sessão eram 19 horas e 5 minutos.

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O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, Sr.as e Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Funcionários,

Sr.as e Srs. Jornalistas, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 5 minutos.

Solicito aos Srs. Agentes de autoridade que abram as galerias.

Tem a palavra a Sr.ª Secretária da Mesa, Deputada Emília Santos, para proceder à leitura do expediente.

A Sr.ª Secretária (Emília Santos): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram

admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: projetos de resolução n.os 366/XIII (1.ª) — Constituição da

Comissão Permanente (Presidente da AR), 378/XIII (1.ª) — Recomenda ao Governo que garanta a natureza

democrática no processo do Acordo de Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento — TTIP (Os Verdes)

e 379/XIII (1.ª) — Recomenda ao Governo que garanta a natureza democrática no processo do Acordo

Económico e Comercial Global — CETA (Os Verdes); e proposta de lei n.º 25/XIII (1.ª) — Procede à alteração

do Estatuto dos Benefícios Fiscais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 215/89, de 1 de julho, e à alteração do Código

do Imposto Municipal sobre Imóveis, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de novembro (ALRAM).

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, da ordem do dia de hoje consta, como primeiro ponto, um debate de

urgência, requerido pelo Partido Ecologista «Os Verdes», sobre o Acordo de Parceria Transatlântica de

Comércio e Investimento (TTIP) e o Acordo Económico e Comercial Global (CETA).

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados:

Os Verdes agendaram este debate de urgência, sobre o Acordo de Parceria Transatlântica de Comércio e

Investimento, mais conhecido por TTIP, e sobre o Acordo Económico e Comercial Global, o CETA, porque estes

tratados são demasiadamente importantes para passarem ao lado dos portugueses e desta Assembleia.

E fizemo-lo, não só pelo conteúdo dos próprios tratados, e portanto pelas implicações que os mesmos podem

trazer para os portugueses e para o País, mas também pela forma como o processo negocial está a decorrer.

E, sobre a forma, muito há a apontar, mas pouco há a dizer. E pouco há a dizer porque o CETA passou

literalmente ao lado dos portugueses e desta Assembleia.

Por mais estranho que possa parecer numa Europa que se diz tão democrática e tão transparente, este

Acordo começou a ser negociado entre a União Europeia e o Canadá em 2009, mas só em 2016, a sua versão

foi tornada pública pela Comissão Europeia. Sete anos de clandestinidade, longe dos olhares dos povos da

Europa. Pela calada da noite, passaram sete anos a negociar; fechados em gabinetes da União Europeia ou

nas instalações de uma qualquer multinacional, escondiam papéis para ninguém ver. Uma vergonha! Foi assim

o processo negocial do CETA: uma vergonha!

Quanto ao TTIP, negociado entre a União Europeia e os Estados Unidos da América, o cenário não anda

muito longe.

Até há pouco tempo, pelo menos em Portugal, o texto não estava disponível. Depois passou a estar. E sabem

onde? Na Embaixada dos Estados Unidos da América. É estranho, não é? E sabem para quem? Apenas para

nós, os Deputados da Assembleia da República, e sob um conjunto apertado de restrições.

Só há pouco tempo, passou a ser possível aos Deputados — e só aos Deputados — consultarem o texto,

numa sala de leitura do Ministério dos Negócios Estrangeiros e, mesmo assim, com uma série de limitações. O

mistério, o secretismo e a falta de transparência que envolvem estes processos são, a todos os títulos,

condenáveis, mas, ao mesmo tempo, induzem-nos a uma importante questão: porquê tanto secretismo? Porque

os tratados são bons para os europeus? Não! Nesse caso, nada haveria a esconder dos povos e nada haveria

a temer. Então é porque não são bons para nós — para os europeus, para os portugueses e para o nosso País.

Mas, mais, este secretismo apenas confirma a suspeita de que o principal objetivo destes tratados é dar

resposta às exigências das grandes multinacionais. E como é que isso se faz? Faz-se, tal como se prevê nos

textos dos Acordos, removendo «barreiras regulatórias», seja ao nível das exigências ambientais, seja ao nível

social e laboral, seja ao nível da segurança alimentar.

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Faz-se, reduzindo os padrões de exigência e de regulamentação europeia em áreas como a agroindústria e

abolindo as restrições sobre organismos geneticamente modificados.

Faz-se, criando novos mercados e abrindo os serviços públicos, como a educação, a água e a saúde, ao

voraz apetite das multinacionais.

Faz-se, sobrepondo os lucros das multinacionais à defesa de direitos económicos, sociais e laborais e à

soberania nacional.

Faz-se, com mais liberalização económica e menos proteção social.

Faz-se, como estes tratados preveem, permitindo às multinacionais processar os Estados, incluindo as

autarquias, sobre decisões que possam comprometer os seus lucros. E processar os Estados não nos tribunais

de cada Estado, mas em tribunais privados, em tribunais arbitrais, tal como as multinacionais gostam.

Com esta benesse às multinacionais, os próprios órgãos de soberania ficariam fortemente condicionados ou

até impedidos de defender o interesse nacional e o interesse das populações,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — … porque, em primeiro lugar, seria necessário não perturbar a

expectativa de lucros das multinacionais e só depois se pensaria nas pessoas e no País.

Aliás, esta possibilidade que é dada às multinacionais de poderem processar o Estado caso este adote

medidas que impeçam ou dificultem a sua margem de lucro, para além de representar uma violação do Estado

de direito democrático, sobretudo quando falamos da soberania dos Estados, deveria obrigar-nos a olhar para

trás.

Olhemos: ao abrigo de um acordo semelhante, a Iberdrola processou a Guatemala por causa de uma disputa

no estabelecimento de tarifas.

A italiana Enel processou a República de Salvador pela paralisação de um projeto geotérmico, quando este

Estado detetou irregularidades.

A multinacional sueca Vattenfall está a processar a Alemanha exigindo 5000 milhões de euros, relacionados

com a decisão da Alemanha de abandonar a energia nuclear a favor das energias renováveis.

A corporação americana Bilcon processou o Estado do Canadá por este lhe ter negado a autorização de

exploração de uma pedreira numa área ambientalmente sensível.

A tabaqueira Philip Morris processou o Uruguai e a Austrália. E sabem porquê? Porque estes países

aprovaram leis antitabaco e a tabaqueira alega que não tem os lucros esperados na comercialização de tabaco.

Os exemplos não faltam, o que falta é tempo para os detalhar.

Ainda assim, os exemplos que aqui ficam são suficientes para percebermos que os tratados de livre comércio

e investimento representam um forte instrumento de proteção dos interesses das multinacionais, criando uma

armadura de segurança jurídica dos investimentos e passando por cima dos direitos sociais, ambientais e

democráticos dos povos.

Para terminar, quero dizer apenas que as elites políticas europeias não podem continuar a ignorar a vontade

dos povos, das pessoas, como têm feito até aqui, porque, como se vê, o que está em causa é demasiado

importante para não ser discutido.

Por isso mesmo, Os Verdes agendaram este debate e entregaram, hoje mesmo, nesta Assembleia, duas

iniciativas legislativas com o propósito de garantir que tanto o CETA, como o TTIP sejam sujeitos a um processo

de ratificação, ou não, por parte desta Assembleia, porque nós queremos, pelo menos, democratizar e tornar o

processo transparente.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Ainda na fase de abertura, tem a palavra, em nome do Governo, o Sr. Ministro dos

Negócios Estrangeiros.

O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros (Augusto Santos Silva): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs.

Deputados: Saúdo a iniciativa do Partido Ecologista «Os Verdes» de convocar este debate parlamentar. O

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projeto de uma parceria transatlântica de comércio e investimento é de tal modo importante que justifica

cabalmente o conhecimento e a discussão pública e um intenso escrutínio parlamentar.

Na minha intervenção inicial, explicitarei a posição do Governo, organizando-a em três tópicos: por que

defendemos o empenhamento da União Europeia, e dentro dela de Portugal, na negociação de uma parceria

económica com os Estados Unidos e o Canadá; por que sustentamos que só vale a pena concluir a negociação

com os Estados Unidos até ao fim do corrente ano se dela resultar um acordo robusto; e por que advogamos o

acompanhamento o mais próximo possível da negociação por parte do Parlamento, dos parceiros sociais e da

opinião pública.

A razão primeira da importância crucial do TTIP para os europeus é de natureza geopolítica e geoestratégica.

Um acordo comercial e económico entre a Europa e os Estados Unidos reforça a centralidade do Atlântico,

equilibrando melhor o jogo entre as grandes forças de tração que operam no mundo globalizado. Esta

centralidade não é apenas económica mas, sim, da ligação transatlântica que exprime uma vinculação comum

à ordem política, democrática e cosmopolita. Que ela se faça com protagonismo exigente e crítico da União

Europeia é uma garantia adicional do enquadramento nessa ordem democrática das dinâmicas económicas de

mercado e, portanto, do respeito dessas dinâmicas pelos valores e pelas normas de caráter social e ambiental

que distinguem os europeus.

Não há, aliás, razão alguma para que esta funcionalidade do comércio internacional para a consolidação de

equilíbrios geopolíticos se reduza ao espaço do Atlântico Norte.

Por isso mesmo, Portugal, que esteve entre os mais empenhados no acordo com o Canadá e está

empenhado no que respeita ao TTIP, é também um dos Estados-membros da União Europeia que mais

persistentemente age em favor das negociações com o Mercosul e mais se bate pelo incremento da cooperação

europeia com os espaços e organizações económicas da África ocidental e do sul.

O nosso País tem aqui um interesse estratégico. O que acentua a vinculação atlântica da Europa melhora o

posicionamento de Portugal na Europa; o que favorece o elo norte-atlântico potencia o modo específico como a

geografia e a história nos fazem viver esse elo norte-atlântico; e o que vira a Europa para o Atlântico no seu todo

abre novos caminhos ao papel mediador de Portugal entre o Velho Continente, as Américas e parte substancial

de África.

Estas considerações não pretendem diminuir o valor económico do TTIP. Articulando os dois blocos mais

avançados, este terá um impacto poderoso sobre a dinâmica económica global, criará uma nova janela de

oportunidade para a Europa, em termos de inovação tecnológica e empresarial, salvaguarda do seu modelo de

relações laborais e reinserção positiva na cadeia internacional de valor.

E não é menos importante a natureza do tratado, que incide não somente nas pautas aduaneiras mas

também nas chamadas «barreiras não alfandegárias» e, sobretudo, nos padrões regulamentares que

enquadram o comércio e o investimento.

Portugal tem interesse no TTIP, porque é uma economia aberta que quer ser mais competitiva e basear a

competitividade no conhecimento e na inovação. Acresce que Portugal tem um interesse específico, porque a

importância do mercado norte-americano está a crescer e pode crescer muito mais, porque o desenvolvimento

do comércio atlântico aumentará o valor do nosso sistema de logística e de transportes e porque temos na

negociação em curso mais pontos ofensivos do que defensivos, já que os produtos que mais exportamos para

os Estados Unidos são dos atualmente mais sujeitos a picos pautais.

Isto não significa, bem entendido, que não procuremos acautelar os nossos pontos defensivos e que não

compensemos com medidas de política adequadas os setores que venham a ficar sujeitos a concorrência

reforçada.

Mas por isso, porque nos parece tão importante do ponto de vista da política externa e da política económica

a celebração do TTIP, é que entendemos que ela só vale a pena se der origem a um acordo robusto e produtivo.

Robusto significa com conteúdo — não faria sentido ficarmos agora por uma simples redução de umas tantas

tarifas pautais. Produtivo quer dizer benéfico para a economia orientada para a sustentabilidade e o

desenvolvimento, que nós, europeus, valorizamos.

Os requisitos são claros. O TTIP não pode implicar — repito, não pode implicar — nenhuma redução

substancial dos padrões europeus no que concerne à saúde pública e à segurança alimentar, o modo de relação

salarial e a proteção ambiental.

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O TTIP há de salvaguardar a soberania dos Estados e a autonomia das políticas nacionais quanto à provisão

e organização dos serviços públicos e quanto à política para a cultura e o audiovisual.

O TTIP tem de garantir o acesso recíproco da União Europeia e dos Estados Unidos aos respetivos mercados

públicos, tem de incluir um bom sistema de resolução de litígios, tem de favorecer a mobilidade profissional e

tem de proteger as indicações geográficas de origem, bem como os outros elementos que enraízam as nossas

economias nos nossos territórios e culturas.

Eis, pois, a posição do Governo: sim ao TTIP, se ele for robusto e produtivo. Exatamente porque o processo

de negociação está em curso e em aberto é que é tão decisivo o debate político e público sobre o TTIP e tão

crucial o seu escrutínio parlamentar.

É certo que uma negociação deste tipo implica competências próprias da Comissão Europeia, mas é verdade

também que o acompanhamento pelo Parlamento Europeu, o acompanhamento pelos parlamentos nacionais e

a participação da opinião pública são absolutamente essenciais.

As dúvidas são legítimas, as críticas são oportunas e as exigências de transparência, esclarecimento e

salvaguarda do interesse público só podem enriquecer o processo de decisão.

Um bom acordo também depende de um intenso empenhamento cívico e político e este debate é uma

demonstração desse nosso empenhamento.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos passar à primeira ronda de intervenções.

Tem a palavra o Sr. Deputado António Ventura, do PSD.

O Sr. AntónioVentura (PSD): — Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr.as e Srs. Deputados: O

Acordo de Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento que está a ser negociado entre a União Europeia

e os Estados Unidos apresenta muitas oportunidades para o desenvolvimento económico e social de Portugal.

Será um bom acordo se forem alcançados compromissos de respeito e responsabilidade para os dois blocos,

à semelhança do que se alcançou com o Acordo Global de Economia e Comércio e que espera ratificação nos

dois lados.

É verdade que existem temáticas muito sensíveis no TTIP que ainda não estão harmonizadas, mas por isso

é que seguem as negociações, sendo que nenhuma das partes desistiu na convergência.

Porém, desta convergência a União Europeia não abdica dos seus valores sociais e ambientais, da

segurança alimentar, da saúde pública, da regulação, entre outros, e até o assume como um meio de marcar os

seus valores e padrões nesta globalização.

O PSD, desde o primeiro minuto, vê nesta parceria enormes possibilidades para Portugal e para as suas

regiões ultraperiféricas na criação de riqueza, novas empresas e emprego.

O PSD trabalha para o futuro de Portugal, pois, por mais passado que Portugal tenha, tem de ter futuro e,

por mais problemas que tenha, tem de ter resoluções. Foi com esta determinação que superámos mais uma

crise e apontámos caminhos de crescimento.

Não podemos deixar aprisionar Portugal na inação. Estamos a falar da mais importante relação económica

bilateral do mundo e do mais amplo e profundo acordo comercial jamais negociado.

Todos os estudos de impacto, globalmente, referem vantagens acrescidas para a União Europeia e para

Portugal nos vários cenários, dos mais pessimistas aos mais otimistas.

Todos os estudos de impacto referem isto.

Para os Açores, prevê-se, num dos cenários estudados, um aumento do PIB em 0,35% e do VAB (valor

acrescentado bruto) em 10 milhões de euros, acrescendo um substancial aumento no comércio de produtos

manufaturados.

Os Açores são ilhas que se situam a meio caminho entre a Europa e a América do Norte. São, portanto,

verdadeiramente incontornáveis em tudo o que se possa discutir relativamente às relações transatlânticas e

asseguram o benefício geopolítico.

Neste sentido, e na esfera de novas possibilidades de valências e funcionalidades para a Base das Lajes,

importa não esquecer toda a estrutura que lhe é inerente, como o respetivo porto marítimo.

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Aliás, convém recordar que a Base das Lajes é o centro de uma zona económica exclusiva, onde circula,

atualmente, cerca de 53% do comércio externo da União Europeia.

Este Acordo é também uma oportunidade para retirar os Açores dos piores resultados socioeconómicos da

história da autonomia, que são da responsabilidade de 20 anos de governação do Partido Socialista,…

Aplausos do PSD.

… resultados que deviam envergonhar quem governa nos Açores e quem já governou nestes 20 anos.

Risos do Deputado do PS Carlos César.

O Sr. Deputado Carlos César está a rir-se, mas eu não me ria com resultados como aqueles que hoje foram

publicados no jornal, ou seja, a de que os Açores são a pior região do País em competitividade, coesão e

desenvolvimento regional. Isto não dá vontade de rir! Isto envergonha, Sr. Deputado Carlos César!

Aplausos do PSD.

Aliás, o Sr. Deputado também é um dos responsáveis por isso.

Portugal, para além de ter laços históricos e culturais com os Estados Unidos da América, tem uma relação

privilegiada, cujo epicentro desta relação se encontra na Base das Lajes.

O Bloco de Esquerda, o Partido Comunista e Os Verdes, partidos que suportam o Governo, são contra a

presença norte-americana na Base das Lajes e manifestam permanentemente oposição ao TTIP e ao CETA.

O Sr. DuarteFilipeMarques (PSD): — Bem lembrado!

O Sr. AntónioVentura (PSD): — São contra estes acordos porque são contra a União Europeia, porque são

contra a livre concorrência, porque são contra a economia aberta e porque são contra o comércio internacional,

que é tão-só o motor da economia da União Europeia. É por isso que nem admitem a existência de negociações.

Protestos do BE.

Mesmo quando todos os cenários sobre o TTIP dizem que os salários em Portugal aumentam, que cresce a

taxa de emprego e que as empresas terão novos mercados, estes partidos são contra devido ao seu radicalismo

ideológico.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. AntónioVentura (PSD): — A extrema-esquerda prefere sempre criar pobres do que criar riqueza. Esta

é que é a verdade!

Aplausos do PSD.

Protestos do BE, do PCP e de Os Verdes.

Certamente que este antagonismo no seio da coligação parlamentar de esquerda fragiliza Portugal e as

regiões ultraperiféricas e enfraquece as negociações da União Europeia.

Com esta coligação de coligações à esquerda, ninguém leva a sério o Governo de Portugal. É também por

isso que Portugal caiu três lugares no ranking mundial de competitividade para 2016, ocupando, agora, a 39.ª

posição, e o investimento diminuiu pela primeira vez desde o terceiro trimestre de 2013, momento em que

Portugal começou a sair da recessão dos anos da troica.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que sintetize, Sr. Deputado.

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O Sr. AntónioVentura (PSD): — Vou sintetizar, Sr. Presidente.

O Governo não pode governar ao dia e sem uma estratégia definida por estar dividido com os seus parceiros.

O Governo não pode ser um contributo para afugentar o investimento externo e para destruir a confiança

conseguida pelo anterior Governo.

O Sr. Fernando Virgílio Macedo (PSD): — Muito bem!

O Sr. AntónioVentura (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados — e agora, sim, termino, Sr.

Presidente —,…

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que termine, Sr. Deputado.

O Sr. AntónioVentura (PSD): — … o Acordo de Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento

continua em negociações. Este é um Acordo de importância vital para o futuro da União Europeia e para o futuro

de Portugal.

Este debate é, sim, mais um momento para saber quem está do lado deste futuro, quem está contra ou quem

está repartido entre estar a favor ou contra por questões estratégicas.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Lara Martinho, do PS.

A Sr.ª LaraMartinho (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Gostaria de iniciar

a minha intervenção chamando a atenção dos Srs. Deputados para dois aspetos fundamentais que temos de

ter em conta quando falamos do TTIP, o acordo de comércio entre a Europa e os Estados Unidos da América.

O primeiro diz respeito à controvérsia gerada em volta da falta de transparência e da falta de acesso à

informação e o segundo diz respeito à avaliação e projeção que devemos fazer sobre o custo de não termos um

TTIP. Este ponto é muito importante porque nele está subjacente uma estratégia de desenvolvimento económico

do nosso País que importa debater e conhecer em profundidade.

Ontem, num colóquio organizado pelo PS na Assembleia da República, tivemos ocasião de ouvir as mais

diversas vozes da sociedade civil num debate muito construtivo e esclarecedor, que esperamos que tenha sido

o primeiro de muitos. Este tipo de iniciativas demonstra que é necessário desmistificar este debate.

A realidade é que o TTIP está longe de ser um pacto secreto, pois é um dos acordos comerciais mais

escrutinados de sempre. Desde o início das negociações, temos visto como a Comissão tem procurado

responder às exigências de transparência.

Para além do acesso à informação e da criação de grupos de diálogo e sessões públicas, verificamos como,

numa das questões mais polémicas — o mecanismo de resolução de litígios entre Estado e investidores —, a

Comissão propôs, com base em contributos da sociedade civil, um sistema de tribunal internacional para o

investimento mais independente e eficaz.

A este propósito, gostaria de solicitar ao Sr. Ministro que nos elucidasse sobre os pormenores deste novo

mecanismo, de como irá funcionar na prática e de que forma garante a esfera de soberania nacional perante

investidores estrangeiros.

Por outro lado, o apelo do Presidente Juncker para a reconfirmação do mandato da Comissão, em resposta

às reticências de alguns Estados-membros, chega em boa hora. Esperemos que esta reconfirmação dê mais

força à Comissão para concluir um acordo ambicioso que responda às nossas expectativas. E gostaríamos de

ter aqui a confirmação do nosso Governo de que se manterá firme neste ponto e que tudo fará, junto dos seus

parceiros no Conselho Europeu, para alcançar este resultado.

Como sublinhou ontem o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, aquilo que é negociável mantém-se dentro

dos limites da substância do mandato, pelo que continua a não ser negociável — e é muito importante que este

ponto seja relembrado — o nosso modelo económico-social, os nossos padrões de qualidade, as nossas regras

e a nossa exigência no que respeita aos direitos sociais, ao ambiente, à segurança alimentar, à proteção animal.

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Pelo contrário, o que está realmente aqui em causa é a possibilidade de regulação da própria globalização.

É por isso que este Acordo, mais do que o evidente interesse económico para o nosso País, representa uma

oportunidade de potenciarmos o nosso posicionamento geopolítico no contexto da globalização e de estarmos

no centro do centro.

A alternativa de não termos um TTIP é a alternativa de nos mantermos na periferia do centro de decisões e

influência global, perdendo terreno para outros atores. O custo económico de não termos um TTIP pode, aliás,

ser quantificado. Dos diversos estudos já elaborados, todos indicam que Portugal será um dos países mais

beneficiados. Não podemos, pois, descurar esta oportunidade.

O Sr. DuarteFilipeMarques (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª LaraMartinho (PS): — Contudo, sabemos que, a par dos benefícios globais projetados, alguns setores

serão afetados, pelo que o Partido Socialista apresentou um projeto de resolução que recomenda ao Governo

um conjunto de preocupações a ter em conta no decurso das negociações.

Por isso, queremos ter a garantia, por parte do Governo, de que a implementação deste Acordo não se fará

do dia para a noite, que será tida em conta a especificidade da nossa economia, que serão tidos em conta

períodos necessários para ajustamento do mercado e que serão ativados mecanismos de apoio a esse mesmo

ajustamento.

Como disse no início da intervenção, o PS tem a convicção de que é importante abrir o diálogo sobre o TTIP,

ouvir todas as partes interessadas e desmistificar este Acordo.

O Primeiro-Ministro já disse aqui que o TTIP será ratificado no Parlamento, mas, até lá, temos o dever de

acompanhar e de contribuir para o melhor acordo possível, que responda às nossas expectativas e que seja um

instrumento de crescimento e de desenvolvimento sustentável para o nosso País. É para isso que o PS

continuará a trabalhar.

Aplausos do PS e de Deputados do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Pires, do Bloco de

Esquerda.

A Sr.ª IsabelPires (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, Sr.as e Srs. Deputados:

Em primeiro lugar, o Bloco de Esquerda gostaria de saudar Os Verdes por terem trazido a debate, em Plenário,

um tema tão importante e, como já foi dito, que tão pouco debate público tem tido. Falo, por um lado, dos acordos

de comércio livre entre a União Europeia e os Estados Unidos, o TTIP, e, por outro lado, entre a União Europeia

e o Canadá, o CETA.

Estes dois Acordos, de facto, têm muito em comum, até agora: o secretismo nas negociações, a intenção de

desregulação da economia, do ambiente, do trabalho, da segurança alimentar, entre outras vertentes, e a

colocação, ao mesmo nível jurídico, de Estados e de empresas multinacionais.

No momento em que ainda não está decidido se a assinatura e a ratificação do acordo com o Canadá

compete apenas às instituições europeias ou necessita de aprovação dos parlamentos nacionais também,

importa colocar algumas questões para clarificar do que estamos a falar exatamente no que toca ao tratado de

parceria transatlântica com os Estados Unidas da América e as suas consequências concretas na vida dos

portugueses.

Comecemos pela legislação laboral. Com este acordo e com o conhecimento que existe, neste momento, do

acordo por parte do Governo, um determinado investidor terá que cumprir a legislação laboral portuguesa —

isto implicando salários, direitos, horários de trabalho, entre outras coisas? Pode o Sr. Ministro confirmar que

não haverá uma ingerência ou um desvirtuamento por parte dos investidores na legislação laboral portuguesa?

Sobre padrões de regulação alimentar, pode o Sr. Ministro confirmar e garantir que não será posta em causa

a segurança alimentar dos europeus e dos portugueses, concretamente, com a livre comercialização de

produtos americanos com padrões reconhecidamente mais baixos ao nível da proteção alimentar? Por exemplo,

pode um investidor americano comercializar as suas sementes com OGM em Portugal? Sim ou não?

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Sobre os serviços públicos e a sua abertura no âmbito deste acordo, no concreto, isto significa o quê?

Privatizações? Concessões? Que consequências é que tal terá para setores como a saúde ou a água? Estamos

a falar da impossibilidade de reversão de privatizações, por exemplo? Estamos a falar da impossibilidade de

novas regulamentações em setores como a água pública, a saúde pública, os transportes públicos, caso exista

o interesse de um investidor americano, neste caso?

É necessário, de facto, que comecem a existir respostas concretas para os aspetos concretos da vida de

cada um de nós que irão ser afetados com este acordo.

Consideramos que não pode existir uma confiança cega num mandato negocial da Comissão Europeia e na

boa vontade americana para chegar a um equilíbrio sobre as questões de regulamentação, especificamente.

Nem se deve, sequer, equacionar chegar a um acordo ou a um pré-acordo apenas porque sim, até ao final deste

ano. Tem que existir esclarecimento! Tem de existir informação, debate público e, acima de tudo, democracia

neste processo que não tem existido até agora!

Portanto, como nada disto foi garantido até agora e o rumo das negociações continua a não garantir

segurança para os cidadãos europeus, nomeadamente portugueses, as dúvidas mantêm-se por parte do Bloco

de Esquerda, pelo que para já deixamos aqui estas questões.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Mota Soares, do CDS-PP.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados:

Antes de colocar algumas questões ao Governo, permitam-me uma nota prévia.

Percebemos que, nesta Câmara e neste debate, há duas visões diferentes: uma visão dos partidos mais à

esquerda, que são contra uma economia social de mercado, são contra o comércio internacional, são contra a

globalização da economia e que, nesse sentido, até são contra a circulação e, provavelmente, até a existência

de capitais; e uma outra visão, a de quem é a favor de uma economia aberta, sem barreiras, uma economia que

regule o comércio internacional, que estimule o investimento direto estrangeiro, que é essencial para Portugal.

E esses, sim, são verdadeiramente contra uma economia protecionista, com barreiras e fechada sobre si

mesma.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Aliás, é importante lembrar que o Partido Comunista Português, o

Bloco de Esquerda e o Partido Ecologista «Os Verdes», nunca estiveram a favor da assinatura de qualquer

tratado comercial da União Europeia e desconfio mesmo que são contra o próprio Mercado Comum e a liberdade

de circulação de capitais, de pessoas, de bens e de serviços.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Mas, Sr.as e Srs. Deputados, a globalização não é uma teoria ou

uma ideologia!

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — A sério?!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — A globalização é a nossa realidade de hoje e não é por não

acreditarem nela que ela vai desaparecer.

Por isso mesmo, num sistema de economia aberta e global resta-nos saber como é que podemos influenciar

essa abertura e como é que nos podemos preparar para essa mesma abertura.

Aliás, em Portugal, a discussão entre uma economia aberta e uma economia fechada não é nova. Há 500

anos, quando Portugal iniciou o processo de globalização, virando-se para o mar, virando-se para o Atlântico,

também houve quem defendesse que devíamos ficar fechados sobre nós mesmos, que devíamos ficar

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confinados ao espaço europeu, que devíamos ter barreiras protecionistas. Essa personagem na nossa história

tem um nome: é o Velho do Restelo.

Protestos do Deputado do BE José Luís Ferreira.

Quem neste debate corporiza o Velho do Restelo é esta esquerda reacionária,…

Aplausos do CDS-PP e de Deputados do PSD.

Risos do PCP.

… é esta esquerda imobilista que não percebe que, com a liberalização, com a regulação do comércio

internacional, podemos promover mais crescimento económico, mais emprego, mais riqueza, mais economia e,

nesse sentido, melhor distribuição dos rendimentos.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Já diziam o mesmo da adesão à CEE!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — A discussão que estamos a ter hoje sobre o TTIP é especialmente

importante para Portugal, porque aumenta a possibilidade de termos um crescimento económico sustentado.

Nesse sentido, Portugal, que é, e será sempre, no espaço da União Europeia, um País mais periférico,

passará a ser um País central; tem a centralidade neste quadro Atlântico e isso reforça até a nossa posição

dentro da União Europeia.

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — É por isso que, para nós, é muito importante termos um acordo,

mas tem de ser um bom acordo.

O Sr. João Oliveira (PCP): — O CDS já teve duas casacas!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Um acordo que nos garanta, efetivamente, que conseguimos

diminuir barreiras alfandegárias e não alfandegárias ao comércio. Um acordo que nos garanta que, por exemplo,

nos mecanismos de resolução dos conflitos, temos a garantia efetiva da defesa da nossa soberania.

Por isso mesmo, queria colocar duas questões, muito focadas, ao Sr. Ministro.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, terá de ser rápido porque esgotou o tempo.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito obrigado, Sr. Presidente, pela sua tolerância.

Reconhecendo que há um conjunto de setores que, pelas suas dificuldades, terão muitos desafios — e

lembro-me, de momento, dos setores agroindustrial e agropecuário —, gostava de perguntar ao Sr. Ministro que

espécie de medidas, que espécie de apoios é que podemos encontrar quer no plano nacional, quer no plano

comunitário para garantir que a competitividade desses setores e dessas empresas não é posta em causa.

Uma segunda pergunta sobre a economia digital. O que é que aconteceu na última ronda negocial, porque,

para nós, este setor é muito importante.

Por último, quanto à arbitragem, gostava que nos desse aqui uma garantia de que a soberania dos Estados,

nomeadamente na capacidade de podermos ter instâncias de recursos nacionais, não é posta em causa.

Aplausos do CDS-PP e de Deputados do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Carla Cruz, do PCP.

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A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Saudamos o Partido

Ecologista «Os Verdes» por ter trazido a debate este tema.

A União Europeia prossegue, sob um manto de secretismo, não permitindo o escrutínio democrático do

processo, as negociações com os Estados Unidos da América sobre a Parceria Transatlântica de Comércio e

Investimento, comummente conhecido por TTIP.

O TTIP, à semelhança do que sucede com outros acordos de comércio livre como o CETA, tem como

principal objetivo ir mais longe na liberalização do comércio e serviços, tentando eliminar quaisquer barreiras ao

domínio das grandes multinacionais sobre as economias dos Estados soberanos.

A ver a luz do dia, o TTIP encerraria sérias ameaças para os direitos sociais e laborais, para diversos setores

da economia nacional, para a saúde pública, para a qualidade ambiental e as condições naturais, assim como

para a democracia e para a soberania nacional.

Em termos dos direitos e rendimentos dos trabalhadores, representaria um sério retrocesso, na medida em

que o Acordo prevê o nivelamento, por baixo, da legislação laboral por via da harmonização com a legislação

laboral dos Estados Unidos da América.

As pequenas e médias empresas confrontar-se-ão com mais dificuldades, o que levará certamente ao

encerramento e, consequentemente, à destruição de postos de trabalho, à perda da receita fiscal e ao aumento

das pressões sobre a segurança social. Há estudos da própria Comissão Europeia que apontam para um cenário

preocupante de destruição de postos de trabalho. E, no que respeita à economia portuguesa, os estudos reveem

em baixa o nosso crescimento, apontando para um dos piores desempenhos dos países que integram a União

Europeia.

O tratado inclui, ainda, um capítulo essencial designado por ISDS (investor-state dispute settlement), também

conhecido por mecanismo de resolução de disputas investidor/Estado, que significa a neutralização da justiça

estadual e da aplicação da lei em tudo quanto sejam diferendos que possam motivar o interesse dos grandes

grupos económicos e financeiros e do capital transnacional.

E não, Sr. Deputado do CDS, o Partido Comunista Português não é contra estes capitais, é contra,

efetivamente, o comércio internacional que não tem em conta e não serve os interesses do País e dos

trabalhadores, ao contrário daquilo que o CDS é! O CDS só defende o capital transnacional.

Aplausos do PCP.

O TTIP seria utilizado para promover a liberalização e privatização dos serviços públicos em áreas como a

educação, a água, a energia, os resíduos sólidos, bem como serviria para aprofundar a mercantilização da

cultura colocando em causa direitos sociais arduamente conquistados pelos povos.

Se para os trabalhadores e para os povos o acordo de parceria seria um rolo compressor da sua soberania,

dos seus direitos e conquistas sociais e laborais, das normas de proteção da saúde, da natureza e dos recursos

naturais, para o grande capital será um excelente veículo para aumentar a exploração e a acumulação de

capitais.

Este acordo enfrenta a crescente oposição de largos setores da população e de organizações sociais e

políticas que, em diversos países, levantam a sua voz contra o TTIP.

O PCP considera indispensável a divulgação do conteúdo, da natureza e dos objetivos do TTIP e exorta o

Governo português a promover um amplo debate público sobre o mesmo, bem como a informar o povo

português da sua posição no processo de negociação.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Vou concluir, Sr. Presidente.

Consideramos que o TTIP deve ser, obrigatoriamente, sujeito a processo de ratificação vinculativo pela

Assembleia da República e rejeitado.

Para o PCP, a rejeição do tratado transatlântico deve ser considerada no quadro da rutura com o rumo

neoliberal, militarista e federalista da União Europeia e da construção de uma outra Europa: de paz, de

cooperação, de progresso e justiça social, onde sejam adotadas soluções soberanas de esquerda e patrióticas…

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O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr.ª Deputada. Tem de concluir.

A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — … que coloquem a defesa dos povos, dos seus direitos e aspirações como o

seu objetivo imediato.

É para isso que cá estamos, é para isso que o povo pode contar connosco.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira, de Os Verdes.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Mota Soares: Os «Novos do Restelo»

que agora proclamam as vantagens destes tratados, curiosamente, são os mesmos que, quando da adesão ao

euro, proclamavam as vantagens. Eram só vantagens: emprego, crescimento… Vinha aí a bonança. E o

resultado foi o que se viu!

O Sr. Deputado António Ventura, do PSD, vem falar-nos em criar pobres. Sr. Deputado, criar pobres é com

o PSD e com o CDS. Basta olhar para os últimos quatro anos!

Aplausos de Os Verdes, do BE e do PCP.

Não é preciso ir mais longe.

Portanto, criar pobres é desse lado.

Sr. Ministro, bem sei que este Governo, e o Sr. Ministro, «apanhou o comboio em andamento», no caso do

TTIP, e quase a «chegar à estação», no caso do CETA.

Ainda assim, estamos preocupados com estes dois tratados, por tudo aquilo que representam e também

porque hoje ficámos a saber que a «linha vermelha» não era a resolução, mas, sim, a redução substancial dos

padrões sociais e ambientais da Europa. E, neste ponto, falta saber o que é que isso quer dizer, o que é que

significa uma redução substancial dos padrões.

Sabemos pouco sobre o assunto, porque a consulta que é facultada aos Deputados está rodeada de

restrições e, ainda por cima, a única versão disponível é em inglês.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — É verdade!

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — O que vamos sabendo decorre das fugas de informação, como a

que aconteceu no início de maio, pela Greenpeace, através da qual ficámos a saber que Washington está a

tentar alterar o processo legislativo da União Europeia, reduzindo os padrões de regulamentação,

nomeadamente no que respeita à indústria dos cosméticos e ao uso dos pesticidas na agroindústria.

O que sabemos é que as exceções gerais que estão consagradas no acordo do GATT (Acordo Geral de

Tarifas e Comércio), da Organização Mundial do Comércio, há quase 70 anos e que permitem que os Estados

possam restringir o comércio para proteger a vida ou a saúde humana, animal e vegetal ou a conservação dos

recursos naturais, não constam destes tratados.

O que também sabemos é que não há qualquer previsão para a proteção do clima no texto do TTIP, o que

não se compreende porque as metas da Cimeira de Paris são para cumprir e o comércio não pode ser excluído

das especificações de redução das emissões de CO2. Ainda assim, não há qualquer referência a esta matéria.

E o mesmo se diga relativamente ao princípio da precaução, que é, literalmente, adulterado por imposição

dos Estados Unidos da América, o que é estranho, porque o princípio da precaução tem, inclusivamente,

consagração ao nível do Tratado da União Europeia.

Sr. Ministro, o Governo diz que o mandato da Comissão Europeia tem «linhas vermelhas». O que tenho para

lhe perguntar desde já é se as metas previstas na Cimeira de Paris em matéria de alterações climáticas também

fazem parte ou não dessas «linhas vermelhas».

Por fim, Sr. Ministro, neste momento, decorre uma discussão dentro da Europa no sentido de saber se o

CETA é ou não da competência exclusiva da Comissão Europeia. Há países que entendem que sim e há outros

que se impõem a essa pretensão. Acho que era importante saber qual é a posição do Governo, nesta matéria.

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Esta matéria é muito importante porque, conforme se entender que o acordo é misto ou não misto, assim os

Parlamentos nacionais terão ou não uma palavra a dizer.

Portanto, seria importante que o Governo nos dissesse aqui se considera que estes tratados, pela sua

importância, devem ou não estar sujeitos a um processo de ratificação por parte da Assembleia da República.

Aplausos de Os Verdes e do PCP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado André Silva, do PAN.

O Sr. André Silva (PAN): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Saudamos

Os Verdes por trazer este tema a debate.

O tratado transatlântico para o comércio e investimento, conhecido como TTIP, entra em julho na sua 14.ª

ronda negocial. Começará em Bruxelas e promete ser complexa, depois de alguns países, como França, terem

ameaçado romper as negociações. Aqui entre nós, esperamos que não seja apenas retórica.

Em paralelo, há uma crescente mobilização cívica em todos os países envolvidos nas negociações para que

mais atores sociais e organizações não-governamentais possam fazer parte do processo de debate deste

tratado. Por cá, em Portugal, os nossos governos têm feito a promoção que o TTIP trará mais benefícios do que

prejuízos. Muitas variáveis, dúvidas e incertezas; porém, apenas uma certeza dos nossos governos: que o TTIP

é uma oportunidade.

Mas haverá uma alternativa a este tratado, caso haja uma rutura nas negociações? Ou o imenso investimento

feito neste «cavalo de Tróia» será superior à humildade de conceber que pode haver mais e melhores caminhos

para construir uma economia que realmente beneficie o bem-estar social e proteja os restantes seres e

ecossistemas?

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, peço-lhe que conclua.

O Sr. André Silva (PAN): — Vou concluir, Sr. Presidente.

Estaremos a dialogar em demasia em fóruns privados e supranacionais sobre o futuro da Europa, como

aconteceu no último fim de semana, na Conferência do Clube Bilderberg, na Alemanha, e pouco com os nossos

cidadãos?

Deixamos à consideração estas questões.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, utilizou, nesta fase, tempo dado pelo PS e penso que vai utilizar, na

segunda intervenção, tempo dado pelo PSD e pelo Bloco de Esquerda. É a informação que a Mesa dispõe.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.

O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Agradeço imenso as

questões colocadas, em relação às quais me permito resumir em cinco e a todas elas procurarei responder.

Antes disso, queria fazer uma consideração geral sobre os modelos e as conceções de economia que

estejam aqui em causa. Uma das vantagens que o CETA já tem e que o TTIP, se for negociado como a Comissão

Europeia e os Estados-membros querem, terá é que nos permite fugir à dicotomia entre economia protecionista

e economia desregulada. Isto porque justamente o que se procura é regular o comércio internacional e, assim,

dar um contributo muito importante para a regulação da globalização.

De facto, também não subscrevo o sentido das expressões de «Velho do Restelo», mas também nunca me

esqueço dos primeiros alertas: «Ó glória de mandar! Ó vã cobiça». E o TTIP e o CETA são, justamente,

instrumentos para regular e, portanto, impedir a glória de mandar e a vã cobiça.

Quanto à primeira questão colocada, sobre os limites da negociação do ponto de vista europeu, eles são

claros e todos vão no sentido de evitar a desregulação e, pelo contrário, fazer do acordo comercial e económico

entre a Europa e os Estados Unidos aquilo que o CETA também pode ser, e já o é, na substância: um

instrumento de regulação.

Como é que isto se vê, concretamente? Através de um mandato imperativo que a Comissão Europeia tem,

dado pelo Conselho, e é um mandato muito preciso: da celebração do TTIP, não pode resultar nenhuma redução

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dos níveis de proteção da saúde pública, de proteção ambiental, de cumprimento do princípio da precaução, da

segurança alimentar e de legislação laboral em curso na Europa. Isso é muito claro, como, aliás, veremos mais

à frente quando examinarmos a questão dos mecanismos de resolução de litígios.

Os serviços públicos não estão compreendidos no âmbito do CETA e não estarão compreendidos no âmbito

do TTIP, isto é, os Estados são soberanos nas decisões democráticas que entendam tomar em matéria da

provisão e da organização dos seus serviços públicos, como a saúde, a segurança social, a educação ou o

abastecimento de água às populações.

Portanto, não há que temer neste quadro. É um quadro de aproximação regulamentar dos Estados Unidos

aos padrões europeus, e não o contrário, aquele em que nos situamos.

A segunda questão diz respeito ao processo de ratificação. Vamos distinguir o processo de ratificação do

TTIP. Uma vez o acordo concluído, é evidente: à luz do mandato imperativo que a Comissão tem, o TTIP terá

uma natureza mista. Tendo uma natureza mista, isto é, compreendendo também competências de natureza

própria dos Estados-membros, será sujeita a um processo de ratificação, que inclui a codecisão pelo Conselho

e o Parlamento Europeu e a subsequente ratificação pelos Estados, o que quer dizer, no caso português, a

aprovação desta Assembleia.

No caso do CETA, a maioria dos Estados-membros, entre os quais se inclui Portugal, defende também a

natureza mista do tratado, o que significa que o CETA teria de ser também sujeito ao processo de ratificação

que descrevi: codecisão pelo Conselho e o Parlamento Europeu, ratificação pelos Estados-membros, o que, no

caso português, implica também aprovação pelo Parlamento nacional.

Aguardamos a apresentação da proposta de decisão por parte da Comissão Europeia, que está prevista para

o próximo dia 5 de julho, para examinar a sequência deste debate, mas a opinião da maioria dos Estados-

membros e a opinião do Estado-membro Portugal é a de que o CETA tem também uma natureza mista e,

portanto, implica um processo de ratificação, no qual a participação do nosso Parlamento nacional é necessária.

Quanto à terceira questão, relativa ao andamento das negociações, vamos entrar, no próximo mês de julho,

na 14.ª ronda. As posições estão ainda muito afastadas entre si. Como, aliás, os documentos que têm vindo a

público mostram, a Comissão Europeia tem sido intransigente na defesa dos interesses europeus e no

cumprimento do mandato que recebeu do Conselho e, especificamente, quanto à questão do mundo digital a

13.ª ronda foi muito parca em resultados e esses resultados têm de avançar.

Partilho completamente da expressão da Sr.ª Deputada Isabel Pires, de que não é possível ter uma atitude

de dizer que sim a um acordo porque sim. Como eu próprio disse na intervenção inicial, só faz sentido dizer sim

ao acordo se for um acordo robusto, produtivo e ambicioso.

Quanto à quarta e penúltima questão, sobre o que vai acontecer aos setores cuja situação possa ser

dificultada, direi que o balanço global que podemos antever é largamente positivo. É positivo do ponto de vista

geoestratégico, é positivo do ponto de vista geopolítico e também é positivo do ponto de vista económico,

incluindo para a regulação da globalização, e insisto neste ponto.

Mas, evidentemente, como em todos os acordos comerciais e de investimento, é preciso olhar com uma

atenção acrescida para aqueles setores ou produtos que ficarão sujeitos a uma concorrência reforçada. Em que

é que se materializa essa atenção acrescida? De duas formas: no decurso do próprio processo negocial,

garantindo os produtos sensíveis, isto é, os produtos que, por o serem, ou estão fora do desmantelamento

pautal, ou mantêm tarifas alfandegárias de proteção nem que seja temporária, ou estão sujeitos a limites de

contingentação.

No CETA, cujo texto está concluído, já há vários produtos, incluindo produtos nos quais Portugal tinha um

interesse dito «defensivo», isto é, produtos que nos interessa proteger, estão incluídos entre os produtos

sensíveis. No estado atual das negociações, alguns dos produtos sensíveis do ponto de vista português,

designadamente no setor do concentrado de tomate, estão também nos 2 ou 3% de casos em que o

desmantelamento não será efetuado em proteção desses produtos. Temos de acompanhar com atenção todo

o processo negocial até ao fim para que este recurso de integração dos produtos sensíveis, dos produtos que

são de especial interesse para nós, se mantenha. Esse é um plano.

Há outro plano, o das medidas de política económica nacional dos Estados-membros, e, evidentemente,

haverá medidas de política para permitir que os setores que precisem de atenção e de acompanhamento

adicional no processo de adaptação às novas condições de mercado beneficiem dessa atenção e desse

investimento adicional. É, aliás, isto que dá sentido às políticas públicas, incluindo na área da economia, e que

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permite justamente combater a vã cobiça daqueles que gostariam de eliminar o Estado, de privatizar tudo e de

esvaziar as políticas públicas.

Quanto à última questão, relativa à resolução dos litígios, gostaria de dizer que essa questão é muito

importante. O Sr. Deputado José Luís Ferreira chamou, e muito bem, a atenção para os erros e os perigos

contidos no mecanismo chamado ISDS. Porque temos consciência disso é que esse mecanismo já foi corrigido,

incluindo no CETA. No processo de revisão jurídica final do CETA, foi possível introduzir um novo mecanismo,

cuja sigla é ICS (Investment Court System), que é um mecanismo que procura responder aos perigos e aos

erros que o Sr. Deputado bem identificou.

Quais são as garantias que esse mecanismo dá adicionalmente? Em primeiro lugar, e muito importante, as

condições em que os investidores internacionais podem recorrer ao tribunal arbitral para demandar, para

defender os seus interesses, junto dos Estados com os quais tinham contratado investimento. São situações

rigorosamente limitadas a casos de discriminação em razão do género, de discriminação em razão da raça ou

da religião, discriminação em razão da nacionalidade, expropriação sem indemnização ou denegação da justiça.

Não se trata de contestar, no tribunal arbitral, decisões democráticas inteiramente legítimas dos Estados-

membros em matéria de legislação ambiental, de legislação laboral, de proteção da saúde pública ou de garantia

da segurança alimentar. É uma lógica de arbitragem que, ela própria, tem no seu interior um mecanismo de

recurso, duas instâncias, portanto, de arbitragem, desenvolvida por juízes, constituídos pelas partes, mas não

constituídos ad hoc, caso a caso, e juízes sujeitos a regras de prevenção de conflitos de interesses muito

próprias.

Assim, o Governo acompanha as preocupações que todas as bancadas exprimiram sobre estes mecanismos

de resolução de litígios no caso dos investimentos, mas, como eu procurei explicar, as garantias que podemos

dar são garantias muito firmes.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos passar à segunda ronda.

Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Serra, do PSD.

O Sr. Nuno Serra (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A política

comercial europeia não é só um instrumento essencial para a visão estratégia da Europa, para o seu crescimento

económico, mas também contribui decisivamente para a afirmação geopolítica do projeto europeu que tem de

ter essa ambição.

A consolidação de um acordo internacional deve traduzir-se em parcerias que comunguem de valores

comuns no caso da democracia e dos direitos humanos e que garantam a estabilidade nos mercados, para além

de um crescimento sustentado para o futuro, crescimento este que é um instrumento fundamental para os

desafios que a Europa enfrenta.

A Europa, sem abrir novos mercados estáveis como os que hoje aqui discutimos, quer com o Canadá, quer

com a parceria transatlântica, está sujeita a inúmeras condicionantes externas. Basta olhar para aquilo que tem

acontecido nos últimos tempos, seja no embargo russo, seja na crise petrolífera, que trouxe uma dificuldade

acrescida às trocas comerciais com muitos países africanos ou da América Central.

Mais: ao não criar novas parcerias comerciais robustas e estáveis, a Europa sujeita-se a ficar refém de uma

competitividade completamente desregulada dos gigantes asiáticos e da enorme instabilidade que existe no

Médio Oriente e nos países africanos. E isto, sim, é uma fragilidade enorme para aqueles que residem e

trabalham neste bloco europeu.

Contudo, o PSD compreende a razão deste debate e a preocupação com este assunto. Mas esta

preocupação e esta apreensão não quer dizer que devamos bloquear a todo o custo estas oportunidades, como

querem Os Verdes. Pretender fazê-lo, pretender bloquear uma oportunidade destas é reduzir e limitar o

crescimento económico das empresas europeias…

Vozes do PSD: — Muito bem!

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O Sr. Nuno Serra (PSD): — … e espoliar os consumidores de novas opções e oportunidades. Estar em

negação com os acordos comerciais internacionais é, sem dúvida, uma visão pouco abrangente, fechada,

retrógrada e pouco integrada, e se o fizermos, considerando que os outros blocos económicos do mundo estão

cada vez mais competitivo, perderemos oportunidades que os outros não deixarão de perder.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Nuno Serra (PSD): — A nossa visão sobre a parceria transatlântica é positiva, clara e construtiva.

Sabemos bem quais são os nossos valores e as nossas fronteiras nos direitos sociais, nas questões

ambientais, na saúde pública e na segurança alimentar,…

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Nuno Serra (PSD): — … mas também sabemos que não podemos ficar «orgulhosamente sós»,

porque, ao contrário do que a esquerda defende, as empresas não crescem sem mercado, sem consumidores

e os empregos não aparecem por decreto-lei.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado. Já ultrapassou o tempo de que dispunha.

O Sr. Nuno Serra (PSD): — Também temos a consciência de que a concretização do TTIP exige a defesa e

a criação de inúmeros mecanismos que acautelem alguns sectores produtivos europeus perante este acordo.

Neste sentido, julgamos que a União Europeia e os seus Estados-membros devem definir criteriosamente os

interesses defensivos e ofensivos no sector agroalimentar, aproveitando também esta oportunidade para

melhorarmos e investirmos mais nos sectores ameaçados, por forma a garantirmos uma maior competitividade

e crescimento.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Ascenso Simões.

O Sr. Ascenso Simões (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs.

Deputados: O debate que hoje aqui fazemos vai para além das questões meramente comerciais, é um debate

civilizacional.

Depois da II Guerra Mundial, talvez estejamos a fazer uma leitura das relações entre a Europa e os Estados

Unidos, que está à altura das circunstâncias, talvez estejamos a fazer um debate em que a Europa e os Estados

Unidos querem introduzir normas de regulação da globalização a que assistimos. É por isso que o debate que

hoje aqui fazemos é muito importante, é um debate para o qual pedimos a todos os partidos que carreiem os

seus argumentos e posições, para que o possamos levar a todos os cidadãos.

É por isso que a iniciativa de Os Verdes que hoje debatemos é muito relevante, e todos os partidos trazem

para o debate iniciativas e propostas que devem ser tidas em conta.

Em primeiro lugar, o que é que estamos a debater? Estamos a debater a necessidade de abrir mercados, de

aprofundar o comércio internacional. Foi o comércio internacional que potenciou a arte e a música, foi o comércio

internacional que potenciou a investigação, foi o comércio internacional que potenciou a nossa democracia

ocidental e devemos ir mais além no estado em que estamos no comércio internacional com os Estados Unidos

e com o Canadá.

Mas a União Europeia, neste momento, ao fazer esta negociação, não pode aliviar aquele que é o seu

património central de defesa do Estado social, do direito que todos os trabalhadores têm à sua dignidade, ao

seu salário e às suas condições de trabalho, de todos os direitos que os Estados têm não só em reduzir as

implicações de práticas não aceitáveis das indústrias e do comércio no seu ambiente, como em olhar para a

saúde pública como um património, que, na Europa, é central para os povos.

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Portanto, quando afirmamos neste debate a necessidade de caminharmos para um encontro de vontades

entre a Europa e os Estados Unidos, também queremos dizer que esse encontro de vontades não pode ser feito

contra aquilo que é o património da Europa, de valorização da sua realidade, enquanto civilização.

Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado e Srs. Deputados, este debate encontra o Partido

Socialista na mesma posição de sempre e no mesmo ponto. O Partido Socialista é a favor de um acordo de

comércio com os Estados Unidos e com o Canadá, mas o PS quer que este debate se faça com transparência

e com a participação de todos os europeus.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Em nome do Grupo Parlamentar do BE, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Pires.

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados:

Desde a primeira hora que o Bloco de Esquerda tem sérias e fundadas reservas relativamente aos processos

de negociação do acordo de comércio com o Canadá (CETA) e do tratado de parceria transatlântica com os

Estados Unidos da América (TTIP). Por isso, sempre defendeu a suspensão das negociações.

Falamos neste caso de dois tratados negociados nas costas dos povos, cujo principal objetivo é responder

aos anseios das multinacionais por um mercado cada vez mais aberto, idealmente sem grandes barreiras ou

regulações, sejam elas laborais, ambientais, sociais, de saúde pública ou alimentares, e que abra os serviços

públicos essenciais à possibilidade de privatização ou concessão.

Falamos de dois tratados que sobrepõem, jurídica e politicamente, a defesa dos direitos dos cidadãos ao

trabalho com direitos e, por exemplo, a uma alimentação com altos padrões de exigência às vontades de lucro

dos grandes grupos económicos. Esta sobreposição está plasmada nos mecanismos de resolução de litígios

que, embora tenham vindo a sofrer alterações ao longo das 13 rondas de negociações, continuam a não dar

garantia da posição do Estado, enquanto legislador primeiro, para as políticas públicas e do bem comum, dando

ferramentas legais a empresas para penalizarem os Estados por lucros que desejavam obter. Basta olhar para

os exemplos, já existentes, de mecanismos semelhantes, como seja o mecanismo do ISDS, ao abrigo do NAFTA

(North American Free Trade Agreement), no Canadá, em que o Canadá, até hoje, já pagou a empresas

americanas, a favor dos investidores, mais 135 milhões de euros em sete casos. Os exemplos históricos também

devem ser relevantes para o debate. Portanto, os exemplos históricos também devem ser aqui relevantes para

o debate.

Falamos, em suma, de dois tratados que não garantem nada às populações, mas garantem tudo ao grande

capital. E não deixa de ser irónico que, sobre isto, a direita se preocupe com os cidadãos, ao contrário de outras

posições.

Do ponto de vista democrático, as dúvidas são muitas e até hoje, com exceção de poucos países, como a

Alemanha, a França e algumas cidades espanholas, o debate público sobre estas matérias está demasiado

aquém do que seria desejável.

Estes acordos abrem demasiadas brechas jurídicas para a sua aplicação e entrada em vigor sem ratificação

dos Estados-membros, e também isso é condenável. Bem sabemos que tem sido dito que a Comissão Europeia

tem linhas vermelhas ou condições irrevogáveis nesta negociação sobre os temas já hoje questionados, mas

também sabemos que, no seio da Europa, facilmente as linhas vermelhas deixam de ser vermelhas e as

decisões irrevogáveis passam a revogáveis, especialmente num ambiente de negociação em que o poder

americano e o das multinacionais são cada vez mais crescente. E, como a balança, neste momento, não parece

estar a pender para o lado da proteção dos cidadãos, importava ter estas garantias do Governo. No entanto, até

agora, apenas concluímos que só existem planos sem concretização certa, e com incertezas deste género não

se pode compactuar num momento destes.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Filipe Lobo d’Avila.

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O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Entre aqueles que preferem

um país aberto ao mundo e aqueles que defendem um país fechado sobre si mesmo, nós, no CDS, estamos

claramente com os primeiros, que sabem que não vivemos sozinhos e que viver sozinhos não é resposta para

os nossos problemas.

Quem não precisa do TTIP são as grandes multinacionais, Sr.as e Srs. Deputados.

Vozes do CDS-PP: — Claro!

Risos do BE e do PCP.

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — É o grande capital. Estes não precisam do TTIP para rigorosamente

nada!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Exatamente!

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — Quem precisa do TTIP é o mercado europeu, são as economias dos

países da União Europeia.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — É evidente!

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Neste debate, gostava de

colocar em cima da mesa, Sr. Ministro, a geopolítica, em concreto a geopolítica da energia, que hoje é tema

marcante do debate europeu e extraeuropeu.

Sabemos todos que Portugal é um País europeu, mas é também um País atlântico, e Portugal será tanto

mais na Europa quanto conseguir ser um ator principal na aproximação da Europa a regiões do mundo onde

tradicionalmente sempre foi, e é, competente, onde sempre foi, e é, especialmente respeitado e onde sempre

foi, e é, especialmente experiente.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — Neste quadro, Sr. Ministro, utilizando até a expressão que aqui hoje

utilizou do perfeito mediador e dado que o acordo de livre comércio entre a União Europeia e os Estados Unidos

está no centro desta geografia transatlântica, a energia é cada vez mais uma área de interesse nacional

português, mas sê-lo-ia sempre, mesmo fora desse debate, em virtude da pressão política feita pela Rússia a

grande parte dos países europeus e fruto também da revolução energética em curso nos Estados Unidos,

designadamente na produção de gás de xisto.

Estamos, assim, perante um novo mapa energético mundial, que mudou a uma velocidade galopante nos

últimos cinco anos. A geografia de Portugal deve ser valorizada como porta de entrada do gás americano na

Europa, contribuindo para a diversificação das fontes energéticas da União Europeia, acelerando a

concretização do mercado único de energia e repondo o equilíbrio interno da energia europeia.

Sr. Ministro, a inclusão do dossier da energia é fundamental no quadro negocial do TTIP. A criação de um

mercado interno transatlântico impõe que nos debrucemos sobre as implicações no gap energético entre os

Estados Unidos e a União Europeia. Este é um ponto crucial não só da negociação do acordo de parceria nas

assimetrias existentes mas também nas disfunções, em termos de concorrência, pelo acesso a uma energia

mais barata.

Para terminar, Sr. Presidente, chamo a atenção para um outro aspeto, que também tem a ver com a ligação

com o Canadá, que são as oportunidades que podem surgir não só no quadro do investimento e comércio mas

também no quadro energético. Parece, Sr. Ministro, que há um Atlântico emergente, relativamente ao qual

Portugal não pode estar distraído ou alheado, e também uma oportunidade política para nos reforçarmos no

debate europeu e contornarmos aquela que é a nossa habitual e tradicional periferia continental.

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Sr. Ministro, percebendo que o Governo alinha com o PS moderado nesta matéria, peço-lhe um comentário

a este quadro geopolítico centrado na energia transatlântica e também ao reposicionamento de Portugal como

player fundamental de ligação entre os Estados Unidos, o Canadá e a União Europeia.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Ramos.

O Sr. João Ramos (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Ao discutir tratados

estabelecidos entre a União Europeia e países ou espaços terceiros não podemos deixar de lembrar os seus

efeitos junto dos sectores produtivos nacionais, nomeadamente na agricultura.

Os acordos com Marrocos ou com o Mercosul são bem o exemplo de quem beneficia e de quem é prejudicado

com os tratados. Tanto Marrocos como o Mercosul competem diretamente com os países do sul da Europa,

nomeadamente Portugal, nas suas produções agrícolas, e esses tratados abrem-lhes as portas para colocaram

os seus produtos na Europa. Em troca, compram tecnologia e maquinaria, em regra produzida no centro/norte

da Europa, nomeadamente na Alemanha. É caso para aplicar aos tratados a célebre frase futebolística: são 11

contra 11 e no final ganha sempre a Alemanha!

É pela experiência que Portugal deveria pôr as «barbas de molho» mal se fale em tratados negociados pela

União Europeia.

Risos.

Para perceber os interesses que o tratado transatlântico defende basta ver os grupos de pressão criados por

multinacionais europeias e norte-americanas para garantir a sua concretização.

Das várias implicações do tratado transatlântico já identificadas sabe-se que sairão prejudicados a agricultura

familiar, as produções menos intensivas, os mercados locais e de proximidade, a soberania alimentar e a

qualidade alimentar.

Os Estados Unidos da América têm conceções diferentes de produção alimentar, aceites entre os seus

cidadãos, mas inaceitáveis para os europeus. Basta ver que os americanos têm uma utilização muito mais

alargada do cultivo e comercialização dos organismos geneticamente modificados (OGM), e com o TTIP será

imposta aos europeus a eliminação de restrições ou proibições da utilização de OGM, como também têm uma

visão menos restritiva na utilização de pesticidas. Através destes processos não só será reduzida a

biodiversidade, como os agricultores ficarão das mãos das multinacionais produtoras desses OGM.

Nos Estados Unidos é aceitável utilizar hormonas na produção de carne, compostos de clorato nas aves,

assim como de disruptores endócrinos, isto na carne para consumo humano. Ora, esta prática não só não é

admissível pelos consumidores europeus como permite aos produtores pecuários americanos produzirem com

custos muito inferiores.

Neste sentido, o tratado representa uma ameaça séria à saúde pública, à segurança alimentar e ao meio

ambiente.

Para além de que, nos Estados Unidos, não são reconhecidas as Denominações de Origem Protegida (DOP),

para eles qualquer um produz queijo Serra da Estrela ou Vinho do Porto. Quem serão os agricultores europeus

capazes de competir numa situação destas? Muito poucos, certamente, isto quando conhecemos a capacidade

dos Estados Unidos, a grande economia de mercado, em colocar as maiores dificuldades à entrada de produtos

exteriores no seu país.

Em matéria de clareza sobre o que será o tratado transatlântico para a produção alimentar nada bate as

palavras de Vital Moreira quando era Presidente da Comissão que, no Parlamento Europeu, acompanhava a

matéria. Dizia o Eurodeputado que este tratado era uma oportunidade para Portugal, pois o nosso País consegue

produzir produtos com grande qualidade, mas, como temos pouca capacidade financeira, vendemos esses

produtos a quem os pode pagar e nós consumimos produtos de menor qualidade e mais adequados às nossas

possibilidades.

Mais claro sobre para que serve e a quem serve este tratado é quase impossível: ele serve os interesses dos

grupos económicos e financeiros transnacionais, mas não serve os interesses dos povos e da soberania dos

Estados.

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Aplausos do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, queria, em primeiro lugar, registar com

agrado o facto de saber que a posição do Governo português, relativamente ao CETA, é no sentido de entender

que este tratado tem uma natureza mista, o que significa que haverá também de passar pela Assembleia da

República para a sua ratificação. Aliás, a informação que o Sr. Ministro hoje nos deu até vem contrariar as

notícias que foram publicadas na semana passada no Le Monde, que incluíam Portugal no lote dos países que

consideravam que o CETA era matéria exclusiva da Comissão Europeia e, portanto, queria deixar aqui este

registo.

Hoje ouvimos falar dos potenciais benefícios para a economia provenientes destes acordos para as

exportações, para o investimento, oportunidades para as empresas e também para os trabalhadores

portugueses. Mas seria bom que atendêssemos aos factos. E deixo apenas o exemplo do México do antes e

depois da sua adesão à NAFTA, que, como sabemos, é um tratado semelhante aos que agora estamos a

discutir, onde o crescimento conheceu uma desaceleração brutal, quando a taxa de crescimento no resto da

América Latina, sobretudo na América do Sul, foi muito maior, os salários reais mantêm-se a níveis de 1994 e o

desemprego aumentou substancialmente.

Também sabemos que estes tratados são feitos à medida das multinacionais e a nossa economia é uma

economia pequena onde as micro, pequenas e médias empresas têm um peso absolutamente decisivo. Ora,

ver as nossas pequenas e médias empresas a competir com as grandes multinacionais, acho que é mais fácil

acreditar no Pai Natal!

Depois, há um estudo do Parlamento Europeu, que também é preciso ter em conta e que nos diz que, com

a entrada em vigor do TTIP, provavelmente, 1 milhão de europeus ficarão sem o seu emprego. Aliás, é um

relatório com previsões que a própria Comissão Europeia veio depois confirmar.

Sr. Ministro, a propósito do CETA, para além da questão da ratificação, há países que defendem a entrada

em vigor imediata do tratado, mesmo antes de o Parlamento Europeu se pronunciar — é aquilo a que se chama

aplicação provisória ou período experimental. Gostaria de saber qual é a posição do Governo sobre esta matéria,

até porque nós tínhamos a informação de que o Governo português terá dado acordo, no Conselho, à

possibilidade de o CETA entrar em vigor antes de o Parlamento Europeu se pronunciar. E eu queria saber se o

Sr. Ministro confirma esta informação, até porque ela é contraditória com a posição que o Governo tem sobre a

natureza mista do CETA.

Aplausos de Os Verdes e do BE.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado André Silva, que dispõe de tempo

cedido pelo PS, 30 segundos, pelo PSD, 15 segundos, e pelo Bloco de Esquerda, 15 segundos. Como se vê,

foram todos extremamente generosos, tendo, evidentemente, todos ultrapassado os tempos de que dispunham.

Risos.

Portanto, com uma generosidade destas…!

Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. André Silva (PAN): — Sr. Presidente, agradeço aos grupos parlamentares que me cederam o tempo.

Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, ser contra o TTIP e contra o CETA não é ser anti-Europa ou

anticomércio. Não é ser populista ou até nacionalista. Pelo contrário, a rejeição destes tratados reforça a

importância da nossa identidade nacional nos fundamentos mais básicos de soberania.

Como sociedade estamos cansados de ser subjugados aos ditos mercados internacionais, às vontades

burocráticas de instituições supranacionais e a ideologias produtivistas que apenas quantificam as relações e

trocas humanas, numa espiral infinita de consumo e de crescimento.

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Esperamos que, fora destas portas, mais cidadãos e movimentos se envolvam na discussão desta temática

para que juntos possamos compreender que uma economia sustentável, ética e próspera não se faz de cima

para baixo, como as negociações do TTIP, mas de baixo para cima, como a atual vontade de mudança social.

E voltamos a lançar a questão, desta feita ao Sr. Ministro Augusto Santos Silva: irá este Governo trazer o

documento final do TTIP para votação neste Parlamento ou irá fazer um bypass à democracia nacional,

remetendo a decisão para o Parlamento Europeu?

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Europeus.

A Sr.ª Secretária de Estados dos Assuntos Europeus (Margarida Marques): — Sr. Presidente e Srs.

Deputados, vou procurar responder às questões que foram levantadas nesta ronda.

A primeira questão é sobre a importância da política comercial. A política comercial da União Europeia é, de

facto, uma oportunidade para a União Europeia. Hoje, estamos aqui a discutir o CETA e o TTIP, mas poderíamos

fazer uma lista imensa de outros tratados comerciais que a União Europeia, ao longo da sua história, tem

assinado recentemente.

O Sr. Duarte Filipe Marques (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª Secretária de Estados dos Assuntos Europeus: — Refiro-me aos tratados com Singapura, com a

Coreia, com o Japão. E, para além destes tratados, é importante termos em conta que a dimensão comércio é

uma dimensão importante nos tratados de parceria, quer com países, quer com regiões em todo o mundo. Penso

que esta dimensão da política comercial é importante para as economias, mas é também, e tem sido cada vez

mais, um instrumento de regulação no contexto da globalização.

Existem muito poucos instrumentos que nos permitem agir na regulação no contexto da globalização e nós,

sistematicamente, chamamos a atenção para o deficit de capacidade de agir na regulação, no contexto da

globalização, e os contratos comerciais são um instrumento de regulação.

O Sr. Duarte Filipe Marques (PSD): — Bem lembrado!

A Sr.ª Secretária de Estados dos Assuntos Europeus: — A segunda questão é a da transparência, e eu

seguiria muito facilmente as afirmações da Sr.ª Deputada Isabel Pires se estivéssemos a falar do período de

2013 a início de 2015. Efetivamente, estou de acordo com o facto de, inicialmente, no debate deste tratado,

agora em negociação, ter havido muito pouca transparência, no que diz respeito ao conhecimento daquilo que

sistematicamente estava na agenda das negociações em cada uma das rondas. E houve uma contestação

imensa por parte da opinião pública europeias que levou a Comissão Europeia a criar um portal onde todos os

documentos do lado da Comissão Europeia e todos os documentos consolidados, resultantes da negociação

nas sucessivas rondas, estão disponíveis.

Efetivamente, tem havido um progresso, no que diz respeito à transparência na negociação do TTIP. E hoje,

apesar de tudo, é redutor que apenas os Deputados europeus que integram a Comissão INTA (Comércio

Internacional) possam aceder à sala de leitura na Comissão Europeia? É! É redutor que apenas os Deputados

dos parlamentos nacionais possam aceder às salas de leitura nos diferentes Estados-membros da União

Europeia? É! Mas foram as regras possíveis de acordar no contexto desta negociação. E, sobretudo, o que eu

acho importante é constatarmos que houve uma evolução significativa no que diz respeito ao acesso à

informação.

A terceira questão é a da ratificação, relativamente ao TTIP. Eu penso que a resposta, nesta matéria, já foi

clara, o Sr. Ministro respondeu a isso aquando da resposta que deu na primeira ronda, mas devo dizer que, no

TTIP, quando é atribuído o mandato de negociação à Comissão Europeia, considerou-se imediatamente que se

tratava de um tratado misto, ou seja, com a conjugação de competências exclusivas da União Europeia e

competências que têm a ver com as competências dos Estados-membros.

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Portanto, é definido que se trata de um acordo, de um tratado misto. Sendo um tratado misto, tem de ser,

necessariamente, submetido à ratificação dos parlamentos nacionais.

No que diz respeito ao CETA, Portugal defendeu que o CETA é também um tratado misto; Portugal ao lado,

eu diria, da quase da totalidade dos Estados-membros da União Europeia. Hoje, há uma posição de conflito

entre a posição dos Estados-membros e a posição da Comissão Europeia no que diz respeito ao Estatuto do

tratado. A Comissão entende que é um tratado onde há uma competência exclusiva da União Europeia, a maioria

dos Estados-membros, incluindo Portugal, entende que se trata de um tratado misto. Tratando-se de um tratado

misto, terá de ter a ratificação dos parlamentos nacionais.

No que diz respeito à possibilidade de se antecipar a entrada em vigor do tratado, também aqui há dois

aspetos a ter em conta: as únicas dimensões que estão em causa, quando se fala da antecipação da entrada

em vigor do tratado, são as que correspondem aos domínios da competência exclusiva da União Europeia e

não da competência dos Estados-membros, estas terão de ser ratificadas por parte da Assembleia da República,

por parte dos parlamentos nacionais.

Portanto, o poder antecipar a entrada em vigor diz apenas respeito àquilo que é da competência exclusiva

da União Europeia.

Relativamente aos estudos que foram realizados, há uma diversidade imensa de estudos sobre o impacto

do tratado, no que diz respeito à economia e ao emprego nos diferentes sectores que são mais diretamente

tocados pelo tratado, pelo TTIP, e, efetivamente, todos os estudos — uns com qualidade metodológica, outros

sem qualidade metodológica — apontam para um crescimento da economia da ordem dos 0,4% e para um

crescimento do emprego. Evidentemente, existem estudos com cenários mais otimistas e com cenários mais

pessimistas.

Finalmente, no que diz respeito a outras posições que Portugal tem assumido nesta negociação, gostaria de

destacar, sobretudo, a questão que foi colocada no domínio da energia.

Efetivamente, Portugal tem sustentado a pertinência de incluir um capítulo no TTIP que contenha disposições

em matéria de energia, pela relevância da exportação de gás natural liquefeito dos Estados Unidos para a

Europa que acentua a dimensão estratégica e geoestratégica do TTIP de que já falámos aqui. E, deste ponto

de vista, Portugal encontra-se numa posição privilegiada, dada a sua localização geográfica, daí termos

manifestado sempre o nosso interesse na inclusão deste capítulo no TTIP.

Por fim, refiro o caso das pequenas e médias empresas que estruturam a economia portuguesa, porque a

economia portuguesa assenta essencialmente em pequenas e médias empresas. Contudo, hoje em dia, apenas

uma pequena parte dessas pequenas e médias empresas exporta para fora do mercado europeu, não chegando

a 3000 o número de empresas nacionais que consegue ter acesso ao mercado americano.

Assim, é essencial que a configuração do TTIP permita às pequenas e médias empresas beneficiar

plenamente do que ficar consagrado no acordo.

Finalmente, mantemos o interesse no reconhecimento e na proteção das indicações geográficas — uma

questão muito importante para Portugal e para a quase totalidade dos Estados-membros da União Europeia —

, porque é um elemento essencial para as exportações nacionais de produtos emblemáticos, como é o caso do

Vinho do Porto, do Vinho da Madeira, do queijo da ilha de São Jorge e outros produtos que integram hoje a lista

das indicações geográficas europeias. Estamos a procurar salvaguardar que essa questão também figure no

tratado.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, concluído o debate, vamos passar à fase de encerramento.

Para uma intervenção, em nome do Governo, tem a palavra o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.

O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, agradeço muito a

oportunidade deste debate.

Quero dizer, em primeiro lugar, que não entendo que criticar o TTIP ou o CETA seja ilegítimo. Pelo contrário,

julgo que as críticas são todas bem-vindas, as perplexidades são algumas e o histórico mostra que devemos

ser muito cautelosos, muito cuidadosos.

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Aplausos do PS.

Portanto, toda a discussão crítica é bem-vinda.

Também não creio que estejamos aqui num acaso em que o mundo seja compreensível a preto e branco:

uns seriam a favor das economias abertas, outros, por criticarem essas economias, seriam inabalavelmente

postergados para o inferno das economias fechadas. Pelo contrário, o que está aqui em causa, sobretudo, é um

esforço de regulação da economia internacional, e é muito importante que esse esforço de regulação

internacional se faça pelo diálogo, que, como a experiência tem mostrado, é muito tenso, entre os dois grandes

blocos económicos, o dos Estados unidos e o da União Europeia.

Como é que podemos ver esse esforço de regulação? Justamente pegando nos exemplos históricos. Vários

Srs. Deputados, nomeadamente a Sr.ª Deputada Isabel Pires, o Sr. Deputado João Ramos, deram exemplos de

problemas, de casos, de exemplos históricos que nos devem levar a sermos muito cuidadosos, muito cautelosos

agora. E o que estamos justamente a fazer é a criar um novo patamar de regulação para evitar todos esses

casos que descreveram, todos os casos que fizeram, durante muito tempo, do comércio internacional um fator

de agravamento das desigualdades do mundo e da desregulação da globalização financeira. Quer o CETA, quer

o TTIP, são o esforço, pelo menos visto do lado europeu, para puxar a regulação da economia internacional

para patamares que sejam aceitáveis.

Qual é, para nós, o patamar mínimo aceitável? É o patamar que defende os interesses e os direitos dos

trabalhadores, é o patamar que defende os interesses e os direitos das pequenas e médias empresas e é o

patamar que defende a soberania dos Estados nas decisões que entendam tomar sobre a forma como querem

organizar os seus serviços públicos, o seu Estado social.

Folgo, aliás, em ver que as bancadas do CDS e do PSD, quando se discute o TTIP, são tão enfáticas na

defesa dos serviços públicos. Tomara que esse seja um sinal de que passarão a ser mais enfáticas na defesa

dos serviços públicos na política interna.

Aplausos do PS.

Isto porque não me parece muito coerente defender, e bem, que a organização de serviços públicos na

segurança social, na saúde, na educação ou no abastecimento de água seja garantida na negociação com os

Estados Unidos e sufragar na política interna propostas de privatização exatamente desses mesmos serviços.

Aplausos do PS.

Devo dizer, até por experiência profissional, que não sou demasiado entusiasta dos estudos que se

desenvolvem numa lógica de constante cenarização, de constante «vamos supor que», prefiro seguir os

exemplos práticos.

Para discutir o TTIP temos um exemplo prático, que é o exemplo do tratado cuja negociação já está concluída,

o CETA.

Preocupou-se o Sr. Deputado João Ramos, e muito bem, com a proteção das indicações geográficas de

origem. É um interesse essencial de Portugal, mas, o Sr. Deputado sabe tão bem como eu que, no CETA, estão

garantidas 145 indicações geográficas de origem protegida de países da União Europeia, e, dessas 145, 19 são

portuguesas. Avançámos, e basta comparar, aliás, o processo negocial em curso com aquele que conduziu ao

tratado dito «Parceria Transpacífico entre os Estados Unidos e 11 outros países do Pacífico», para perceber a

enorme diferença que este TTIP vai representar. Exatamente porquê? Porque a lógica de negociação da União

Europeia é a lógica de proteção do modelo social europeu.

Por isso, estamos todos de acordo — é a minha conclusão —, porque o Governo folga em compreender que,

partindo de perspetivas diferentes, inteiramente legítimas,…

O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, peço-lhe que conclua.

O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros: — Vou terminar, Sr. Presidente.

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O Governo folga em perceber que, partindo, como é natural, de perspetivas diferentes, todos os grupos

parlamentares se exprimiram de uma forma que só significa que apoiam o Governo português e todos os

governos que se batam na presente negociação para que o mandato imperativo recebido pela Comissão

Europeia seja cumprido e, portanto, para que este tratado signifique um avanço no comércio internacional e,

também, na generalização dos direitos sociais, dos direitos ambientais e das preocupações com a segurança

alimentar e com a saúde pública.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção de encerramento do debate, o Sr. Deputado José

Luís Ferreira.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: No encerramento do debate

que Os Verdes agendaram importa sublinhar não só a importância das matérias que estiveram em discussão

como também a sua inequívoca oportunidade.

De facto, tanto o TTIP como o CETA poderão ter efeitos muito pesados na vida dos povos da Europa e,

sobretudo, no nosso País.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Muito bem!

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Como se viu, durante o debate, o que esteve em discussão foi a

tentativa de o poder económico se sobrepor ao poder político. O que esteve em causa foi saber se consentimos,

ou não, esta pretensão das multinacionais de conquistar a Europa. O que esteve em causa foi saber se

pactuamos, ou não, com a pretensão de as multinacionais procederem a um alargamento e à salvaguarda dos

seus fabulosos lucros. O que esteve em causa foi saber se defendemos o Estado de direito e o primado da lei

ou se entregamos o nosso destino, de bandeja, às multinacionais. E as bancadas parlamentares, neste debate,

tiveram a oportunidade de o dizer, de dizer de que lado estão.

Ouvimos falar dos potenciais benefícios para a economia provenientes destes acordos: reduzem obstáculos,

trazem benefícios para as exportações e para o investimento e criam oportunidades para as empresas e para

os trabalhadores portugueses.

É só vantagens, e, curiosamente, vêm dos mesmos que há uns anos anunciavam a adesão ao euro como

sendo o salto para a bonança. Era só vantagens: a economia iria crescer, as exportações nem se falava, o

investimento iria disparar e o emprego iria aparecer. Afinal, foi o que se viu! E, agora, a solução para os mesmos

está nestes tratados.

Sucede que os estudos que existem obrigam a uma revisão em baixa de tanto otimismo.

Vejamos: em meados do mês passado, Bruxelas deu a conhecer um relatório sobre os impactos esperados

do TTIP. O que nos diz o relatório? Diz-nos que, depois, do tratado ser implementado na totalidade, portanto,

em 2030, a diferença no PIB da União Europeia, com e sem TTIP, é de apenas 0,5%, isto num cenário descrito,

no próprio relatório, como muito ambicioso.

Para Portugal, o mesmo relatório aponta uma taxa de crescimento praticamente residual.

Depois, deixemo-nos de conversas, todos nós já percebemos que estes tratados visam proteger as

multinacionais e que temos uma pequena economia aberta, assente, sobretudo, nas micro e nas pequenas e

médias empresas (PME), não tendo, portanto, multinacionais. O que significa que estes acordos representarão

uma verdadeira facada na vida das micro, pequenas e médias empresas portuguesas.

Será que alguém acredita que as nossas micro, pequenas e médias empresas vão competir em pé de

igualdade com as poderosas multinacionais? Só por brincadeira, só por reserva mental.

Sobre o emprego e a criação de emprego, importa recordar o relatório do Parlamento Europeu chamado

TTIP and Jobs. Este relatório prevê que 1 milhão de europeus possa perder o emprego como resultado da

entrada em vigor do TTIP. A própria Comissão Europeia, aliás, confirma que, no mínimo, 600 000 europeus

perderão o emprego, podendo o número chegar ao dobro se o TTIP for integralmente cumprido.

Este relatório, apresentado em Bruxelas, no fim do mês passado, também sublinha que a União Europeia e

os Estados Unidos da América vão emitir mais 21 milhões de toneladas de CO2 para a atmosfera se o TTIP for

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por diante, pondo em causa os acordos de Paris sobre as alterações climáticas. Mas, pelos vistos, isso não

interessa nada, porque, para as multinacionais, o combate às alterações climáticas é uma verdadeira chatice.

Como é, aliás, uma chatice, por exemplo, que na Europa só seja permitido o cultivo de um transgénico, enquanto

nos Estados Unidos da América se podem cultivar 105 variedades diferentes de transgénicos.

É uma chatice! É uma chatice que o TTIP pode resolver às multinacionais e permitir-lhes transformar a Europa

num paraíso para os transgénicos e para a sua produção.

Em síntese, a entrada em vigor destes tratados constituirá um ataque sem paralelo à soberania dos Estados

e à sua capacidade de definir livremente as políticas económicas e sociais que melhor entendam para dar

resposta às necessidades dos respetivos povos.

Não se estranha, por isso, que mais de 3 milhões de cidadãos europeus, dos quais 23 000 são portugueses,

tenham assinado a iniciativa europeia contra as ratificações do CETA e do TTIP.

Também, entre nós, a plataforma Não aos Tratados TTIP/CETA/TISA promoveu uma petição dirigida à

Assembleia da República, através da qual milhares de cidadãos portugueses reclamam que o texto do CETA e

as suas consequências sejam debatidos publicamente na Assembleia da República e que a decisão sobre a sua

ratificação, ou não, tenha lugar na Assembleia da República.

Aliás, aproveito para, em nome de Os Verdes, saudar a plataforma, sobretudo os que se encontram aqui, a

acompanhar os trabalhos.

Sr. Presidente, vou terminar, dizendo que Os Verdes defendem a não ratificação do CETA e do TTIP, porque

ela constitui um imperativo não só político mas também moral, já que estes tratados representam uma ameaça

ao desenvolvimento soberano do nosso País, aos direitos sociais e laborais dos portugueses, aos serviços

públicos e aos nossos valores ambientais.

Protestos do Deputado do CDS-PP João Pinho de Almeida.

Divergimos aqui, mas vou dizê-lo na mesma.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Vou terminar, Sr. Presidente.

Por nós, são as multinacionais que devem estar sujeitas às regras dos Estados e não são os Estados que

têm de estar sujeitos às regras e aos interesses das multinacionais.

Aplausos de Os Verdes, do BE e do PCP.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, chegámos ao fim do debate de urgência, requerido por Os Verdes, e,

consequentemente, o primeiro ponto da nossa ordem do dia.

O segundo ponto da ordem de trabalhos consiste na discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 23/XIII

(1.ª) — Cria um regime de reembolso de impostos sobre combustíveis para as empresas de transportes de

mercadorias, alterando o Código dos Impostos Especiais de Consumo, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 73/2010,

de 21 de junho, e o Regime Geral das Infrações Tributárias, aprovado pela Lei n.º 15/2011, de 5 de junho.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Fernando Rocha

Andrade.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (Fernando Rocha Andrade): — Sr. Presidente, Sr.as e

Srs. Deputados: As diferenças entre as fiscalidades aplicadas em Portugal, em Espanha e em França aos

combustíveis usados pelas empresas de transportes de mercadorias têm levado estas empresas a deslocar

uma parte significativa dos seus abastecimentos de combustíveis para fora de Portugal, beneficiando dos

mecanismos do gasóleo profissional que existem em Espanha e em França.

Reafirmando a opção de que a tributação dos combustíveis, além da sua finalidade de receita, é uma peça

importante de uma estratégia energética, incentivando quer a redução do consumo dos combustíveis poluentes,

quer a diminuição das importações, o Governo não pode ficar indiferente às consequências que a ausência em

Portugal de um regime de gasóleo profissional tem na competitividade do sector dos transportes de mercadorias.

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A diferença nos regimes fiscais confere uma vantagem económica significativa aos operadores cujas bases

de logística estejam mais próximas de locais de abastecimento de baixo custo. Esta diferença tem também

impacto na competitividade nas indústrias exportadoras nacionais, que enfrentam custos de transporte mais

elevados, tanto no movimento interno de fatores de produção, como na colocação das mercadorias nos

mercados externos.

Na proposta que o Governo apresenta à Assembleia da República cria-se um regime que permite a devolução

às empresas de transporte de mercadorias da diferença entre o total dos impostos aplicáveis em Portugal e o

mínimo de imposto que tem de ser aplicado por força do Direito da União Europeia, à semelhança do que

acontece em França ou em Espanha, permitindo reconstituir, na componente fiscal, condições idênticas de

concorrência.

O facto de existir hoje em dia um significativo desvio de comércio com os abastecimentos de empresas

portuguesas a ocorrerem em Espanha permite esperar que o regime proposto tenha um impacto reduzido ou

nulo em acréscimo da despesa fiscal.

A limitação do impacto fiscal negativo da medida exige a delimitação de um universo de veículos que

assegura essa tendencial neutralidade fiscal, por forma a não onerar as contas públicas. O impacto na receita

será o que resultar da diferença entre a perda fiscal nos abastecimentos já regularmente feitos em Portugal por

este universo de veículos e o ganho fiscal nos abastecimentos que passem a ser feitos em Portugal.

Propõe-se que este regime vigore a partir de 1 de janeiro de 2017. Contudo, dada a necessidade de testar a

eficácia de mecanismos de controlo, bem como a resposta dos agentes económicos, essencial à tendencial

neutralidade fiscal, propõe-se que logo após a entrada em vigor da lei possa funcionar um projeto-piloto, em

parte do território nacional, que está já a ser preparado pelo Governo.

É, assim, convicção do Governo que estamos perante uma medida que consegue albergar um regime fiscal

mais favorável, que terá um custo nulo em termos de criação de despesa fiscal ou, pelo menos, muito reduzido,

em relação à redução de custos que significa para o sector produtivo, em particular nas exportações, e, portanto,

em relação à vantagem que traz ao País.

Aplausos do PS.

Entretanto, assumiu a presidência a Vice-Presidente Teresa Caeiro.

A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Margarida Balseiro Lopes.

A Sr.ª Margarida Balseiro Lopes (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Governo decidiu em

fevereiro, à revelia da discussão orçamental, aumentar o ISP (imposto sobre produtos petrolíferos), um grande

aumento e sem qualquer tipo de contrapartida, um aumento com forte impacto na economia, na vida das

empresas e na vida das famílias.

Na altura, o PSD alertou para a injustiça social que é aumentar o ISP, que penaliza, na mesma medida, um

desempregado ou um milionário. É um aumento que prejudica a atividade das empresas portuguesas. O

Governo tardou em ouvir os alertas do PSD, mas, cinco meses depois de os portugueses e das empresas já

terem sentido no bolso este aumento do ISP, estamos hoje, aqui, na Assembleia da República, a discutir esta

proposta de lei, que pretende ser a resposta ao menos generalizado preço dos combustíveis.

Esta proposta mostra que o aumento de imposto, para além de agravar a vida dos portugueses, fez com que

parte da receita fiscal fosse diretamente transferida dos cofres do Estado português para os cofres do Estado

espanhol. Nem os apelos do Ministro da Economia valeram para travar a fuga para Espanha. Mas será esta

proposta de lei a resposta para o problema? O PSD acha que não.

Em primeiro lugar, o Governo prepara-se para criar o regime de exceção em quatro zonas de fronteiras, a

que chama de experiência-piloto, discriminando negativamente todo o restante território nacional.

O Sr. Amadeu Soares Albergaria (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª Margarida Balseiro Lopes (PSD): — Em segundo lugar, esta medida apenas se destina às empresas

de transporte de mercadorias, ficando todas as outras empresas excluídas e, sobretudo, todas as famílias

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excluídas, que já há alguns meses estão a suportar a má decisão do Governo em aumentar o ISP. Agora, parece

existir portugueses de primeira e portugueses de segunda.

O Sr. Amadeu Soares Albergaria (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª Margarida Balseiro Lopes (PSD): — Em terceiro lugar, esta solução encontrada traz consigo uma

enorme carga burocrática. Ao aumento dos custos de contexto junta-se agora a carga burocrática. Aliás, se

havia, da parte do Governo, um genuíno interesse, uma verdadeira vontade política em mitigar, em minimizar o

impacto do aumento do ISP, o Governo não deveria ter criado um mecanismo de reembolso mas, sim, uma

isenção automática, para que não exista esta carga burocrática. O que fica por demais evidente é que o Governo

tomou esta decisão de aumento do ISP sem acautelar os impactos que teria na atividade económica, na vida

das empresas portuguesas e das famílias.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando

Anastácio.

O Sr. Fernando Anastácio (PS): — Sr.ª Presidente, Srs. Secretários de Estado e Sr.ª Deputada Margarida

Balseiro Lopes, começo por recordar que o Governo do seu partido, o PSD, no ano anterior aumentou os

combustíveis em seis cêntimos por litro. Faz bem, de vez em quando, recordar o que se passou e pelo que o

País tem passado.

Aplausos do PS.

Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: Esta proposta de lei vem, precisamente, permitir o reembolso dos

combustíveis para os operadores de transporte de mercadorias, ou seja, promover algumas alterações aos

impostos especiais sobre o consumo e também à lei geral tributária na matéria relacionada precisamente com

estas alterações.

É importante notar que, ao longo de mais de uma década — não são só quatro anos, é mais de uma década

—, as empresas de transportes internacionais têm deslocado parte significativa da sua atividade para Espanha,

para França, precisamente porque esses países beneficiam de um regime especial, o regime do gasóleo

profissional. E isto, em Portugal, como a competitividade fiscal nos combustíveis é particularmente determinante

para o sector dos transportes internacionais, concede uma vantagem significativa a quem está mais perto de

onde há combustíveis a mais baixo custo.

Deste modo, a ausência deste regime, do regime de gasóleo profissional, em Portugal tem sido uma razão

para a perda de competitividade das nossas exportações e para a perda de competitividade inclusive dos

operadores de transportes de mercadorias.

Não se trata de uma medida avulsa ou de uma medida temporal. Aliás, se tiveram o cuidado de ler a proposta

de lei, sabem que é uma proposta que visa entrar em vigor no dia 1 de janeiro de 2017, mas tem, obviamente,

do ponto de vista prudencial, um período de verificação e de monitorização para ser avaliada. Não se trata de

fazer algo que não se pretenda primeiro conhecer os resultados.

Consideramos, aliás, que a implementação desta medida exige essa monitorização e um sistema de controlo

adequado para que este período experimental seja feito. Esta necessidade de monitorização justifica que seja

objeto de avaliação, o que vai acontecer, após a aprovação deste diploma, até ao final do ano em quatro zonas

fronteiriças, com o objetivo de, no ano de 2017, estar em seu pleno vigor em todo o território nacional.

Mas para que esta medida seja eficaz e seja financeiramente viável, é importante avaliar o desvio de

consumos entre o que era feito em Espanha e o que virá para Portugal, por força destas medidas. O sucesso

desta medida exige também um controlo do universo dos veículos e que se assegure a neutralidade fiscal, por

forma a não onerar as contas públicas.

Quero igualmente referir que o sucesso desta medida vai depender, essencialmente, dos comercializadores,

já que ao Governo não cabe fixar o preço dos combustíveis.

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Por tudo isto, é convicção do Grupo Parlamentar do Partido Socialista que esta medida permitirá devolver a

competitividade ao sector dos transportes, assim como devolver competitividade à economia portuguesa e,

particularmente, no que concerne às exportações.

Sr.as e Srs. Deputados, a responsabilidade do Governo é a de criar condições favoráveis à atividade das

empresas com vista a um bom desempenho da economia.

É precisamente isso que estamos aqui a fazer.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Hélder Amaral.

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Há uma diferença, que eu gostaria

de assinalar, entre quem aumenta impostos num quadro da aplicação do Memorando de Entendimento,…

O Sr.João Galamba (PS): — Isso foi em 2014!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — … de reequilíbrio das contas públicas e de um programa de assistência

externa e quem promete virar a página da austeridade, promete entrar num ciclo de crescimento económico e

faz um brutal aumento de impostos, designadamente naquele imposto que afeta empresas, famílias, ou seja,

que afeta todo o tecido económico nacional. Foi o que fez o Partido Socialista.

O Partido Socialista convenceu aqueles que acreditaram que era possível acabar com a austeridade, que

era possível uma política desresponsável em matéria de equilíbrio das contas públicas e, como é óbvio,

rapidamente se percebeu que não passava de um logro ou de um sonho.

A verdade é que este aumento do ISP afeta todas as empresas. O Governo diz: «Bom, é preciso reconhecer

que há um grupo específico de empresas, empresas de transporte, que merecem uma atenção especial».

Vamos, então, perceber como é que o Governo se propõe ajudar este sector.

Eu pensava que podia revisitar os acordos feitos anteriormente, aliás por governos socialistas, onde um

conjunto de matérias e de factos ajudavam o sector, que é um sector com problemas específicos, mas não, o

Governo vem não simplificar mas complicar, numa lógica não de «simplex» mas de «complicadex». O Governo

vem dizer: «Bom, há aqui uma devolução do imposto». Pergunto se o mais lógico não seria isentar este sector.

Seria, à partida, o mais lógico, porque senão temos de começar a perguntar o que é para o Governo empresas

de transportes. São de 12 000 t? São de 7500 t, como está? Ou são de 2000 t, 5000 t? Qual é o critério? Não

seria normal deixar que sejam todas as empresas certificadas para o efeito pelo IMTT, em vez de estarmos a

limitar, introduzindo concorrência desleal no sector? Isto porque, desde logo, todas essas empresas são

profissionais, todas elas usam gasóleo profissional, assim como todas as famílias o são.

A pergunta seguinte é: em que postos? Diz o Governo: em quatro projetos-piloto. A pergunta que se impõe

é: esses quatro projetos-piloto têm capacidade de abastecimento deste sector, deste nível de empresas? A

informação que temos é que não existe.

Estes postos têm, por exemplo, combustível e AdBlue, utilizados pelo sector? Parece que não têm. Há, até,

postos encerrados em muitos desses quatro postos fronteiriços em que o Governo diz que vai ter o projeto-

piloto. Como é que o Governo vai fazer? Vai solicitar a abertura de postos? Portanto, parece-me que, do ponto

de vista prático, vai ser difícil executar esta medida.

Tendo em conta que o Governo tem no Orçamento do Estado uma autorização legislativa para o efeito —

segundo a informação que consegui recolher, mas dir-me-ão se é assim —, uma autorização legislativa para

alterar o artigo 172.º, que tem a ver com as isenções das mais-valias e das menos-valias na transação ou na

compra de veículos novos, parece-me que é mais eficaz para o sector ter ajudas para a renovação de frota,

porque tem ganhos, desde logo, no consumo de combustível, na emissão de CO2 e na sua capacidade de

competir com os outros mercados que já usam esse tipo de produtos, do que propriamente vir com uma medida

de execução difícil, de controlo quase impossível e que introduz, de facto, uma concorrência entre regiões do

País e entre sectores.

Por outro lado, o Governo poderia, porventura, cumprir ou melhorar o mecanismo criado pelo anterior

Governo para este sector, que é o da isenção de portagens em determinados horários ou em determinadas

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tonelagens. É possível alargar e, eventualmente, isentar totalmente, desde que essas isenções tenham impacto

orçamental reduzido.

Para terminar, devo dizer que, de facto, o Governo reconhece que está perante um problema e que tem uma

solução que não é, ela mesma, eficaz, porque é o próprio Governo que diz, na exposição de motivos da proposta

de lei, que é preciso equilibrar e dar condições para a capacidade exportadora das empresas portuguesas,

nivelando ao imposto praticado no resto da União Europeia. Assim teria sido se não tivessem feito esse brutal

aumento de impostos, que afeta diretamente a capacidade exportadora das empresas, a competitividade da

economia portuguesa e das famílias.

O Sr. João Galamba (PS): — O imposto aumentou, mas a carga fiscal baixou!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — O Governo resolveu enganar os portugueses e resolveu, Sr. Deputado

João Galamba, não dizer aquilo que o senhor dizia: «Vamos virar a página da austeridade! Acabaram os

aumentos de impostos!». A verdade é que as famílias e as empresas portuguesas são confrontadas com um

brutal aumento de impostos, sem que daí venha alguma mais-valia para a economia, como dizem os dados.

Aplausos do CDS-PP.

Protestos do Deputado do PS João Galamba.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Heitor Sousa.

O Sr. Heitor Sousa (BE): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Intervenho

sobre esta matéria para expressar algumas dúvidas, suscitar alguns esclarecimentos da parte do Governo e

terminar com um alerta sobre este tema.

As dúvidas têm a ver com o projeto-piloto que o Governo ensaia com a apresentação desta proposta até ao

início do ano de 2017 e também com os limites que se colocam aos veículos, em termos de abastecimentos

globais, para beneficiar desse desconto ou desse reembolso por litro de combustível.

Quanto à questão do teste-piloto, não ponho, obviamente, em causa a necessidade de fazer testes sobre

experiências que se anunciam que entram em vigor a partir de determinada data, neste caso a 1 de janeiro de

2017, porque isso vai dar, com certeza, uma informação preciosa para o Governo poder orçamentar as receitas

de imposto sobre os produtos petrolíferos no próximo Orçamento do Estado para 2017.

De qualquer forma, Sr. Secretário de Estado, não tendo o Governo uma expectativa mais precisa sobre o

valor do efeito fiscal, de evasão fiscal, que a introdução desta medida de reembolso pode vir a revelar, não tendo

essa expectativa ou não tendo, pelo menos, essa estimativa apurada — e é por essa razão que faz o teste-piloto

—, é estranho que, nesse teste, fiquem de fora dois dos principais corredores de transporte rodoviário

internacional de mercadorias, quer a norte, quer a sul do território, que são o corredor de Valença, por um lado,

e o corredor de Vila Real de Santo António, por outro.

Portanto, se estamos a falar de testes, vamos deixar uma espécie de um buraco, uma zona cinzenta nesta

avaliação estatística. Se estes dois corredores corresponderem a uma fatia significativa dos veículos que se

pretende testar, possivelmente estamos a enviesar a avaliação estatística por não estarmos a cobrir

suficientemente a amostra representativa de todos os veículos que queremos abranger.

Sei que o Governo começou por referir que eram três as zonas de teste deste projeto-piloto, agora já vai em

quatro e, portanto, a minha primeira questão, Sr. Secretário de Estado, é a de saber se o Governo não concederá

a possibilidade de este teste abranger todos os principais corredores de transporte rodoviário internacional de

mercadorias.

A segunda questão que queria colocar-lhe tem a ver com o limite de 30 000 litros para beneficiar desse

desconto. Sr. Secretário de Estado, por que razão é que são 30 000 litros, quando a própria proposta de lei tem

um valor que oscila entre 25 000 e 40 000 litros? Por que razão é que no teste está apontado o valor dos 30 000

litros?

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem de concluir, Sr. Deputado.

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O Sr. Heitor Sousa (BE): — Vou já concluir, Sr.ª Presidente.

Por último, Sr. Secretário de Estado, o princípio de neutralidade fiscal que é invocado na proposta do

Governo, se essa neutralidade fiscal for aplicada e se tiver sucesso é mais do que neutralidade fiscal é,

efetivamente, uma medida positiva para combater o processo de evasão fiscal em matéria de receita sobre o

imposto dos produtos petrolíferos.

Portanto, se for esse o caso, creio que uma das justificações deste Governo é exatamente essa, a da evasão

fiscal, e não necessariamente a de apenas pensar na neutralidade fiscal.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção em nome do PCP, tem a palavra o Sr. Deputado

Bruno Dias.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O

PCP, ao longo dos anos, sempre afirmou, com total clareza, a denúncia, mas também as respostas e as

soluções, face aos problemas sérios que resultam dos custos dos combustíveis para a vida da economia, para

a vida das empresas, particularmente das micro, pequenas e médias empresas, assim como, aliás, das

condições de vida das populações.

A situação que tem vindo a ser sentida no terreno nos setores produtivos é de enorme dificuldade,

particularmente em resultado das políticas de desastre nacional que foram levadas a cabo nos últimos anos.

Para o PCP, estamos perante um problema que exige uma abordagem abrangente não só no que diz respeito

ao território em causa, não só no que diz respeito aos setores em causa, mas, desde logo, no leque de

abordagens e áreas de intervenção para responder às verdadeiras causas do problema.

Hoje, falamos especificamente de uma proposta do Governo dirigida ao setor do transporte rodoviário de

mercadorias de longa distância — até poderíamos dizer além Pirenéus, considerando os corredores que estão

em causa — e avaliamo-la como sendo um passo, uma medida que avança no sentido de aliviar a pressão que

é suportada por estas empresas e dar resposta a uma situação concreta e que as leva a abastecer as viaturas

não em território nacional, mas em território espanhol, dado o diferencial de preços. E só por má-fé alguém

poderia afirmar que o problema é de agora ou é deste ano.

Mas há aspetos que não podemos ignorar.

Primeiro, a matéria dos custos com os combustíveis é relevante para muitos setores económicos, mesmo

para aqueles que não podem ir abastecer a Espanha. E nem falamos só de veículos pesados, falamos de

veículos pesados e ligeiros, de máquinas e equipamentos, falamos de embarcações de pesca.

Segundo, a realidade específica do interior do País e mesmo das zonas raianas é uma realidade concreta

que justifica o prosseguimento desta discussão e deste trabalho para que este regime se possa alargar no

território em que se aplica e não fique apenas por estes quatro concelhos. É de um projeto-piloto que se trata e

é assim que o debatemos.

Terceiro, embora a carga fiscal sobre os combustíveis seja uma questão incontornável que o PCP tem

assinalado há muitos anos — incluindo quando o anterior Governo PSD/CDS-PP aumentou a carga fiscal, já

com os preços em alta —, importa sublinhar, contudo, que o problema dos custos vai muito para além desse

fator. Pode haver quem não queira discutir a questão dos preços antes de impostos, pode haver quem não

queira discutir os lucros milionários das petrolíferas, mas essa discussão vai ter de ser feita, mais cedo que

tarde.

A Petrogal registou 310 milhões de euros de lucros em 2013, 373 milhões de euros em 2014 e 639 milhões

em 2015. Entre 2014 e 2015, os lucros cresceram 71%. É isto que acontece enquanto debatemos os cêntimos

do ISP que se pretende reduzir para um setor em concreto.

Neste quadro e na continuidade de anteriores propostas, o PCP apresentou esta tarde na Assembleia da

República um projeto de resolução que propõe medidas que contribuam para a diminuição dos custos com os

combustíveis.

A saber: a criação de um sistema de preços máximos dos combustíveis líquidos, mas também dos gasosos,

que mais se ajuste aos níveis de produtividade da economia nacional e ao poder de compra das famílias face à

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zona euro; a criação de um sistema de preços diferenciados para setores específicos da economia, tais como a

agricultura, as pescas, os táxis, a pequena camionagem de mercadorias, como também a promoção da

instalação de redes de combustíveis alternativos à gasolina e ao gasóleo, nomeadamente o GPL, o GNC e o

GNL.

No entanto, importa referir que esta matéria é indissociável de uma visão mais geral de uma política para a

energia, que exige a definição de uma estratégia, base de um plano nacional energético, que reduza os

consumos e o défice energéticos, com programas de utilização racional da energia e acréscimos de eficiência

energética, nos transportes, nos edifícios, na indústria, e a diversificação das fontes de energia, no quadro do

declínio das disponibilidades dos combustíveis fósseis.

São questões de fundo, são questões estruturantes que o País não pode ignorar e que o PCP sublinha neste

debate.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — O Grupo Parlamentar do PSD ainda dispõe de tempo e a Sr.ª Deputada

Margarida Balseiro Lopes inscreveu-se para intervir.

Faça favor, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Margarida Balseiro Lopes (PSD): — Sr.ª Presidente, nesta segunda intervenção, queria obviamente

reafirmar que, para o PSD, o desagravamento de impostos é bastante positivo. Aliás, fomos desde o início contra

este agravamento que agora o Governo tenta emendar e fomos nós, aliás, que, em 2014, com a reforma do

IRC, desagravámos os impostos para as empresas. Na altura, o PS concordou, mas entretanto mudou de ideias.

Porém, apesar de ser boa a intenção do Governo em desagravar os impostos, a verdade é que esta é uma

solução má.

Da parte do PSD, vamos, obviamente, dar oportunidade ao Governo e aos partidos que o suportam de, em

sede de especialidade, melhorar esta proposta e encontrar uma solução mais justa, mais equitativa, menos

discriminatória e que não corra o risco de inconstitucionalidade.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para concluir este debate, tem novamente a palavra o Sr. Secretário

de Estado dos Assuntos Fiscais.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar,

queria destacar que o essencial nesta proposta não é, evidentemente, o teste. O teste é apenas instrumental e

durará alguns meses.

O essencial desta proposta é a criação de uma medida estrutural no que toca ao funcionamento do transporte

rodoviário de mercadorias em Portugal e essa medida estrutural é a de criar um regime semelhante àquele que

vigora em Espanha ou em França, porque mesmo nesses países este transporte tem preços mais baixos. Ou

seja, o que prejudica a competitividade das empresas portuguesas não é só a comparação entre os preços-base

dos combustíveis nesses países, mas o facto de estarmos a comparar entre, de um lado, os transportadores de

mercadorias a pagarem o preço-base e, do outro lado da fronteira, os transportadores de mercadorias a pagarem

um preço inferior ao preço-base. É essa, fundamentalmente, a distorção de concorrência que prejudica as

nossas empresas, que devemos remover, a bem da indústria transportadora e, aparentemente, contra a vontade

da direita, o que acho curioso.

Em segundo lugar, o teste é feito no interior porque é aí que se testa a premissa fundamental da medida,

que é a de que pode haver desvio de comércio de Espanha para Portugal, e aquelas fronteiras são as melhores

para o testar, como é evidente.

Por que é que são 30 000 litros? Sr. Deputado, com 30 000 litros e com os veículos registados, a estimativa

de despesa fiscal bruta desta medida são 135 milhões de euros, que é aquilo que estimamos que possa ser

recuperado com o desvio do comércio. A proposta de lei tem limites mais alargados, precisamente para que

possa ajustar-se, no futuro.

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Finalmente, Srs. Deputados, queria apenas lembrar o seguinte: é verdade que os postos no interior estão

encerrados, mas não estão encerrados desde fevereiro.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Essa é que é essa! É um facto!

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — Ou seja, há muitos anos que não se abastece

combustível, que nenhum transportador abastece combustível no interior, há muitos anos que esta medida de

apoio à indústria dos transportes de mercadorias e de apoio à indústria exportadora era necessária e a verdade

é que é a primeira vez que ela é aqui proposta.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Não havendo mais inscrições, fica assim concluído o debate da

proposta de lei n.º 23/XIII (1.ª).

Vamos prosseguir com o ponto 3, que consiste na discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 22/XIII

(1.ª) — Procede à segunda alteração à Lei n.º 7/2007, de 5 de fevereiro, que cria o cartão de cidadão e rege a

sua emissão e utilização, à primeira alteração à Lei n.º 37/2014, de 26 de junho, que estabelece um sistema

alternativo e voluntário de autenticação dos cidadãos nos portais e sítios na Internet da Administração Pública

denominado Chave Móvel Digital, e à sexta alteração ao Decreto-Lei n.º 83/2000, de 11 de maio, que aprova o

regime legal da concessão e emissão de passaportes.

Para fazer a apresentação desta proposta de lei, tem a palava a Sr.ª Ministra da Presidência e da

Modernização Administrativa.

A Sr.ª Ministra da Presidência e da Modernização Administrativa (Maria Manuel Leitão Marques): — Sr.ª

Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A presente proposta de lei pretende, em especial, resolver o problema criado

pela Lei n.º 91/2015, que alterou a Lei n.º 7/2007, a qual suscitou constrangimentos de natureza tecnológica e

de segurança, comprometendo a emissão do cartão de cidadão vitalício.

O Governo entendeu aproveitar a oportunidade para propor a esta Assembleia a introdução de outras

alterações que simplifiquem os procedimentos relacionados com o pedido de renovação do cartão de cidadão,

bem como o uso das suas funcionalidades de autenticação e assinatura eletrónicas.

Além disso, o Governo procurou desenhar a lei de modo a que mais facilmente seja possível acompanhar

alterações tecnológicas cada vez mais aceleradas, para facilitar a vida aos cidadãos e aos serviços emissores

do cartão. As principais soluções técnicas das matérias a regulamentar por portaria foram hoje partilhadas com

as Sr.as e os Srs. Deputados.

Assim, permito-me destacar as seguintes alterações contidas na proposta de lei.

Em primeiro lugar, o Governo propõe-se alargar o prazo de validade do cartão de cidadão, a fixar em portaria.

O prazo de validade passará para 10 anos para os titulares do cartão de cidadão com mais de 25 anos de idade,

mantendo-se em cinco anos até essa idade.

Em segundo lugar, prevê-se a obtenção do cartão de cidadão a partir dos 20 dias após o nascimento,

permitindo-se ao cidadão aceder ao serviço de pedido de cartão de cidadão em ato contínuo ao registo de

nascimento num só balcão. Esta alteração, que é uma prática cada vez mais frequente, é especialmente

relevante para o registo imediato dos cidadãos nos serviços de saúde.

Em terceiro lugar, consagra-se a possibilidade de o cidadão fidelizar um número de telemóvel ou um

endereço eletrónico para a emissão de alertas e comunicações com a Administração Pública.

Em quarto lugar, prevê-se a possibilidade de reutilização da informação, fornecida aquando do pedido do

cartão de cidadão para efeitos de renovação de outros documentos, como o passaporte e a carta de condução,

sempre que o cidadão expressamente o autorize e no respeito e proteção dos dados pessoais.

Em quinto lugar, estabelece-se a possibilidade de emissão de uma segunda via dos códigos PIN e PUK,

caso o cidadão perca ou esqueça os seus códigos, evitando um novo pedido de cartão de cidadão, como

acontece atualmente.

Em sexto lugar, tendo em vista impedir a reprodução do cartão de cidadão fora dos casos previstos na lei,

prevê-se que a respetiva reprodução constitua contraordenação.

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Em sétimo lugar, estabelecem-se, de forma inovadora, as regras subjacentes à emissão do cartão de cidadão

provisório.

Em oitavo lugar, propõe-se que o cartão de cidadão seja o único documento de identificação de todos os

cidadãos nacionais, a partir do início de 2017, sem prejuízo dos bilhetes de identidade, ainda válidos e em

circulação, sendo obviamente possível utilizar o respetivo cartão de identificação profissional no desempenho

de funções profissionais.

Propõe-se, ainda, a alteração da Lei n.º 37/2014, que criou a Chave Móvel Digital, dotando-a agora de outra

funcionalidade, de uma assinatura eletrónica qualificada.

Por último, propõe-se a alteração do Decreto-Lei n.º 83/2000, no sentido de assegurar que um cidadão possa

solicitar, ao mesmo tempo, em caso de perda, por exemplo, a emissão do cartão de cidadão e do passaporte, o

que não é possível atualmente.

Através das diversas alterações que se propõem, entendemos que o cartão de cidadão se mantém como um

documento moderno, integrado, suscetível de autenticar o cidadão em múltiplos sistemas, de forma atualizada

e simples.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Susana

Amador.

A Sr.ª Susana Amador (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs.

Deputados: O ano de 2007 veio traçar um novo rumo na história da nossa identificação civil, marcando-a de

forma indelével.

Em substituição do bilhete de identidade, nasceu um novo documento, o cartão de cidadão, que foi definido,

na altura, pelo então Ministro de Estado e da Administração Interna, António Costa, como «um instrumento de

mobilização para a sociedade de informação e para a modernização da Administração Publica».

Desde 2007, mais de dez milhões e meio de cidadãos são já portadores deste cartão.

O cartão representa assim, inquestionavelmente, uma mais-valia em termos de identificação múltipla e,

simultaneamente, um importante instrumento de modernização que visa não apenas a satisfação de interesses

públicos, mas também de índole privada, que aqui se fundem.

Em 2015, a Lei n.º 7/2007 é objeto de alterações, prevendo-se, entre outras questões, a emissão de um

cartão de cidadão com validade vitalícia para cidadãos que tenham completado 65 anos.

Surgem agora constrangimentos diversos, de natureza tecnológica, de segurança e regulamentar, que

impedem, por ora, a emissão de cartão de cidadão vitalício.

Concluindo-se, assim, pela inaplicabilidade da Lei em vigor, a proposta de lei agora apresentada procura

responder aos princípios que enformavam a Lei n.º 91/2015: menores custos e menos deslocações para os

cidadãos, não resumindo a sua aplicabilidade aos maiores de 65 anos, mas estendendo as vantagens a todos

os cidadãos.

Estes objetivos podem ser alcançados através de um conjunto de alterações às características e ao

procedimento de emissão do cartão de cidadão, onde se destaca, como referiu a Sr.ª Ministra, o aumento do

prazo de validade, de 5 para 10 anos, a partir dos 25 anos de idade, o que permitirá que se eliminem, em média,

seis renovações e o que representará uma economia de 90 € por cidadão.

Surge ainda, como grande novidade nesta proposta de lei, a antecipação da obtenção do cartão de cidadão,

obrigatória para todos os cidadãos nacionais, logo a partir dos 20 dias após o nascimento, ou seja, nasce-se

cidadão, uma relevante medida inserida no Simplex +.

Com esta iniciativa do Governo, preconiza-se igualmente a simplificação dos procedimentos relativos ao

pedido de emissão e renovação do cartão, a utilização das suas funcionalidades de autenticação e assinaturas

eletrónicas.

A proposta sub judice prevê com grande alcance e oportunidade a possibilidade de fidelização de um número

de telemóvel e/ou um endereço eletrónico de cada cidadão, para que possa receber alertas, comunicações e

notificações, tornando este procedimento de comunicação muito mais célere e eficaz.

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É ainda possível reutilizar-se a informação fornecida à Administração Pública no pedido do cartão de cidadão,

para renovarmos outros documentos, como a carta de condução ou o passaporte, protegendo sempre, como é

óbvio, os dados pessoais.

Nesta proposta de lei, surgem ainda duas situações expressas, que permitem pedir um novo número de

identificação civil, nos casos de usurpação de identidade, falsificação ou uso de documento alheio e nos casos

de mudança de sexo. Sublinhe-se que a usurpação de identidade fica mais condicionada com o alargamento do

regime sancionatório à reprodução ilícita de documentos de identificação.

Surgem, ainda, muitas e boas medidas amigáveis do cidadão, que diminuem deslocações e seus custos

inerentes, tais como a que prevê o serviço móvel de entrega do cartão em caso de justificada dificuldade de

deslocação. Para além do já existente serviço móvel do pedido, que está previsto, há a possibilidade de os

cidadãos com 65 anos efetuarem um pedido de renovação através do espaço do cidadão ou da Internet.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr.ª Deputada, queira concluir.

A Sr.ª Susana Amador (PS): — Vou concluir, Sr.ª Presidente.

Dado que esta proposta trata matéria que incide sobre a esfera jurídica fundamental dos cidadãos e que se

inscreve na proteção de dados pessoais, estamos certos de que, em sede de especialidade, na 1.ª Comissão,

serão supridas as dúvidas manifestadas e tidas em linha de conta as reservas e propostas constantes do parecer

da Comissão Nacional de Proteção de Dados, produzido a propósito desta proposta de lei. O mérito das soluções

que nela se preconizam e a sua regulamentação futura justificam que se continue a avançar na simplificação e

no respeito da proteção de dados pessoais.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr.ª Deputada, tem mesmo de concluir.

A Sr.ª Susana Amador (PS): — Vou concluir, Sr.ª Presidente.

Sr.as e Srs. Deputados, para concluir, Portugal, sob a égide do PS e de uma visão de constante inovação e

simplificação, tem sabido ser «aquilo que importa», revelando excelentes boas práticas neste domínio e que têm

sido reconhecidas internacionalmente.

O desafio constante, Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, com que estamos confrontados é em incorporar a

inovação e a qualidade no ADN do Estado. O cartão de cidadão continua a ser, assim, a mudança que ajuda a

mudar.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Antes de dar a palavra à Sr.ª Deputada Vânia Dias da Silva, queria

deixar aqui um apelo: nós temos uma agenda bastante longa, pelo que pedia encarecidamente, em nome da

Mesa, que os Srs. Deputados não ultrapassassem os tempos que constam do quadro eletrónico.

Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Vânia Dias da Silva.

A Sr.ª Vânia Dias da Silva (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, tentarei cumprir escrupulosamente o tempo.

Queria começar por cumprimentar a Sr.ª Presidente, a Sr.ª Ministra e os Srs. Secretários de Estado, as Sr.as

e os Srs. Deputados.

Começo por registar, com pena, é certo, mas sem nenhuma surpresa, a impossibilidade definitiva e absoluta

de se dar corpo à pretensão de se criar o cartão de cidadão vitalício.

Embora não seja, Sr.ª Ministra, rigorosamente unânime a ideia de que não é possível tecnicamente dar corpo

ao cartão de cidadão vitalício — como sabe, Sr.ª Ministra, havia quem defendesse que era possível com outras

soluções —, sempre soubemos das dificuldades que havia nesta matéria e percebemos o argumento da

fragilidade da segurança e da técnica da solução. Por isso, nada mais há a dizer sobre esta matéria, por ora.

Veremos, em sede de especialidade, se é possível fazermos mais alguma coisa, mas percebemos, repito, a

questão.

Quanto ao mais, e saudando desde já as soluções que baixam barreiras e que simplificam a vida dos

cidadãos e que, de resto, vêm na senda daquilo que foi já apresentado no Simplex e que agora se materializam

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nesta proposta de lei, tenho de dizer-lhe, Sr.ª Ministra, que até há uma hora, já quase duas, estava um pouco

perplexa com alguma desfaçatez desta maioria, mas percebi que, depois, tiveram um choque de realidade e

que tentaram emendar a mão. Mas, Sr.ª Ministra, emendaram mal. E explico porquê.

Os senhores desmultiplicaram-se em anúncios em parangonas de jornais, conferências e entrevistas,

propagandeando que agora uma lei só seria aprovada se acompanhada das portarias regulamentadoras. Foi

isso que propagandearam, que está escrito em vários documentos, e podemos ir ver.

Imagine, Sr.ª Ministra, o meu espanto quando começo a ler a proposta de lei e me deparo, por mais de 20

vezes, com remissões para portarias que, pasme-se, não estavam lá. E contei, pelo menos, seis: uma da justiça,

uma da modernização administrativa com a justiça, outra da modernização administrativa, a justiça e as finanças

com os negócios estrangeiros, com a administração interna, enfim, uma série delas.

E, como disse há pouco a Sr.ª Deputada Susana Amador, é certo que há aqui matéria muito sensível e

matéria que respeita a dados pessoais, Sr.ª Ministra. Portanto, não é despiciendo que o tratamento destes dados

pessoais fosse dado a conhecer aos Deputados que têm a missão de fiscalizar todas estas coisas.

Portanto, dizerem que, a partir de agora, todas as leis vão sair com as portarias e, afinal, quando chega aqui

a lei, não há portaria nenhuma, isso não é sério. E à 25.ª hora tentaram emendar a mão e mandaram-nos um e-

mail, mais ou menos às 15 horas e 30 minutos, dizendo que não era possível ao Governo apresentar as portarias,

mas que, ainda assim, davam-nos conhecimento das soluções técnicas que as portarias iriam conter.

Sr.ª Ministra, vamos lá ver se nos entendemos: em vez de mandarem as portarias, mandam-nos a explicação

daquilo que vai ser a portaria?! Isto não faz sentido. Por que é que não mandaram as portarias de uma vez? Isto

francamente não colhe e não faz sentido.

Acho que não vale tudo nestas coisas. E faltar flagrantemente às promessas e «atirar areia para os olhos»

das pessoas é um exercício pouco digno de um Governo que se quer ver respeitado.

Por isso, Sr.ª Ministra, admitam, ao menos, que não conseguem cumprir o que prometeram. Passem a dizer

e a propagandear menos, Sr.ª Ministra, e a fazer mais e melhor. Falar muito é muito bom e é bom propagandear

muito, mas fazer bastante menos do que aquilo que dizem começa a deixar as pessoas indispostas, e era muito

mais útil para os portugueses que fizessem as coisas como dizem e que não dissessem coisas que, depois, não

fazem.

De resto, para concluir, ainda bem que se concretiza o prazo de validade do cartão de cidadão para 10 anos,

o que também estava remetido para uma portaria e nós ficávamos sem saber se, de facto, eram os 10 anos.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Queira concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Vânia Dias da Silva (CDS-PP): — Estou a terminar, Sr.ª Presidente.

Esperemos que, ao menos isso, seja possível manter.

Aplausos do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Volto a fazer o apelo à contenção nas intervenções e ao cumprimento

dos tempos.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Rios de Oliveira.

O Sr. Paulo Rios de Oliveira (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs.

Deputados: Não vou fustigá-la, Sr.ª Ministra, com mais cometários de natureza formal, até porque, por simpatia,

dirigiria mais depressa a crítica ao Sr. Secretário de Estado, que está aqui mais perto de nós, e a criticar alguém

que seja a ele.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (Pedro Nuno Santos): — Aguento bem com as

críticas!

O Sr. Paulo Rios de Oliveira (PSD): — Sr.ª Ministra, «o seu a seu dono». Este tema foi primeiramente

identificado e generosamente resolvido por esta Assembleia, por iniciativa, aliás, do PCP, no tempo em que o

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PCP era um partido da oposição, e foi aqui decidido por todos encontrar uma solução para fazer equivaler o

cartão de cidadão ao antigo bilhete de identidade vitalício.

É que o que estamos aqui hoje a discutir, Sr.ª Ministra — e por isso louvo a sua presença —, é algo que vai

tocar a vida de todos os portugueses, mais do que o Serviço Nacional de Saúde e mais do que o IRS. Do que

estamos aqui a falar vai tocar a vida de todos, pelo menos a daqueles que atingem 20 dias de idade. Portanto,

parece importante.

Aliás, quando foi identificada a dificuldade técnica, que admitimos possa existir, de emitir um cartão de

cidadão vitalício, desde logo pela impossibilidade de manter, se calhar, um chip por 30 anos, coloca-se a questão

da renovação e também se coloca a questão do custo.

Em fevereiro deste ano, foi também deliberado aqui, através de resolução, pedir ao Governo que

urgentemente resolvesse este assunto e, em audição, a Sr.ª Ministra disse-nos que estava a estudar a questão

não só sob o ponto de vista da solução técnica, que admitimos passaria para 10 anos, o que, não sendo

extraordinário, pelo menos iguala outros países, mas também o custo.

Portanto, como não temos ainda o custo e admitimos que os seis meses foi para analisar o custo, uma vez

que a solução é repristinar a norma, não precisavam de seis meses, bastavam seis dias. Ora, para podermos

analisar esta questão em sede de especialidade, pedia à Sr.ª Ministra que nos fizesse chegar qual é o impacto

da eventual renovação gratuita do cartão, o que seria também uma vantagem.

A juntar a este facto, o Governo também aproveita para introduzir algumas alterações, nomeadamente

através da Chave Móvel Digital. E as soluções que nos deixam são curiosas, interessantes e bizarras. Por

exemplo, a possibilidade de um cidadão, através do seu contacto telefónico ou e-mail, passar a ter um acesso

que ele reconhece como válido com os organismos públicos, parece-nos interessante.

Também nos parece interessante que um cidadão possa, com uma única informação, dar conta a todos os

organismos públicos dos seus dados, evitando a redundância e a repetição, que não se justifica. Parece-nos

interessante!

Mas temos alguma dificuldade em entender por que é que, de repente, o prazo para a alteração da morada

passa de 30 para 15 dias — certamente que não é uma questão de contraordenação!

Também ficámos com alguma perplexidade — certamente vamos perceber isso mais tarde — em relação à

nota técnica ter chegado hoje às 17 horas. Quando chegou à minha mão, ainda estava quente da fotocopiadora.

Confesso que não a li.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: — Isso é normal!

O Sr. Paulo Rios de Oliveira (PSD): — A culpa não é sua, mas também não é minha, Sr.ª Ministra.

Uma última questão que foi levantada tem a ver com a possibilidade de um menor de 16 anos poder assinar

digitalmente documentos quando se relaciona com a Administração Pública. Pergunto: se um menor é menor e,

por essa via, não tem a sua capacidade civil integral, vai adquiri-la por esta via? Porquê aos 16 anos? De onde

é que veio esta solução?

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Sandra Cunha.

A Sr.ª SandraCunha (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra, restantes Membros do Governo, Sr.as e Srs.

Deputados: A proposta de lei que o Governo apresenta, ainda que motivada pela resolução daquela

impossibilidade prática da emissão do cartão de cidadão vitalício, introduz várias alterações que visam

desenvolver as potencialidades do cartão de cidadão e que têm um impacto bastante significativo na vida dos

cidadãos e das cidadãs e na relação destes com o Estado e a Administração Pública.

Reconhecemos o mérito e saudamos o esforço de algumas alterações propostas, mas também consideramos

que a abrangência e, sobretudo, a implicação de algumas dessas alterações merecem uma discussão

aprofundada, pelo que esperamos, em sede de especialidade, poder dar azo a essa discussão e esclarecer

dúvidas que temos relativamente a algumas dessas alterações, uma vez que o tempo que temos disponível na

discussão na generalidade não nos permite detalhar estas questões.

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Saliento, contudo, algumas dessas dúvidas que temos.

Preocupa-nos — e já aqui foi dito — este recurso, que está bastante presente nos vários artigos da proposta

de lei, à regulamentação por portaria, o que não nos permite perceber exatamente como é que essas alterações

vão ser desenvolvidas e implementadas. A nota técnica que nos foi distribuída dá já algumas dessas

informações.

Uma das dúvidas que tínhamos era quanto à questão do prazo de validade do cartão de cidadão.

Consideramos que o prazo de validade de 10 anos — e isso já tinha sido falado na 1.ª Comissão — é uma

vantagem em relação ao prazo de validade de cinco anos que existe atualmente.

No entanto, temos mais algumas dúvidas relativamente a outras situações, nomeadamente no que respeita

ao tratamento e à transmissão de dados pessoais, o que importa analisar com maior detalhe.

Esta ideia do Nascer Cidadão parece-nos bastante boa, mas preocupa-nos a sua operacionalização,

nomeadamente o facto de recém-nascidos com 20 dias terem de ir aos serviços para lhes ser retirada a

impressão digital e fotografias, quando os dados biométricos em recém-nascidos de 20 dias ainda não estão

estabilizados e, aliás, alteram-se repentinamente, quase de dia para dia, nomeadamente a cor dos olhos, a

altura e até as características faciais.

Por fim, e vou já terminar, gostaria que nos fosse esclarecida a redução do prazo, de 30 para 15 dias, para

a alteração da morada. Numa altura em que as pessoas estão numa fase de mudança de vida por uma série de

procedimentos de atos administrativos e logísticos, parece-nos que 15 dias é um prazo demasiado reduzido.

Não encontramos, nesta proposta, qualquer justificação para esta alteração.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. AntónioFilipe (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra da Presidência e da Modernização

Administrativa, Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados: A Sr.ª Ministra, há uns dias, nesta Assembleia,

quando apresentou o Simplex, deu o exemplo da senhora sua mãe que tem 94 anos de idade e que recebeu

uma notificação absolutamente indecifrável da parte da Administração Pública.

Sr.ª Ministra, hoje, trago o exemplo da minha mãe: tem 88 anos e tem bilhete de identidade vitalício. Se

tivesse o cartão de cidadão e se tivesse de o renovar, estaria absolutamente incapacitada para o fazer por

razões físicas e sensoriais.

Portanto, esta proposta de lei não vem ao encontro, mas pelo contrário, daquilo que é anunciado pelo

Simplex. Ou seja, cidadãos que, pela sua idade avançada, pela sua incapacidade decorrente da idade ou por

qualquer razão de saúde, não tenham possibilidade prática de renovar o cartão de cidadão têm um problema.

Devo reconhecer que temos dificuldade em entender que haja uma incapacidade técnica absoluta para

resolver este problema, quando, em Espanha, por exemplo, há cartão de cidadão vitalício.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exato!

O Sr. AntónioFilipe (PCP): — Deram-nos explicações técnicas muito relevantes relacionadas com diversos

aspetos, mas devo confessar que isso nos deixa uma sensação de alguma frustração. Que diabo, será

impossível encontrar uma solução técnica?! Em relação a um cidadão centenário ou nonagenário que tenha, de

facto, problemas de demência ou de saúde que o impeçam de assinar, ou de se deslocar, para renovar o cartão

de cidadão, será que não há uma solução da parte do Estado português que permita que, não havendo qualquer

alteração de dados, os dados são exatamente os mesmos, seja oficiosamente a Administração Pública

portuguesa a facultar a esse cidadão a renovação do cartão de cidadão?! Não entendemos que não possa haver

uma solução para este problema.

A Sr.ª Ministra diz «bem, a lei aprovada no final da passada Legislatura, que pretendeu criar caráter vitalício

do cartão de cidadão para os cidadãos a partir de uma certa idade, veio criar um problema», mas a Sr.ª Ministra

traz-nos aqui uma proposta de lei que vai muitíssimo para além disso. Se o problema foi esse, foi muito bem

ciado, porque, então, permitiu também ao Governo o ensejo de poder resolver outros problemas que não

estavam previstos até então.

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Do nosso ponto de vista, é importante que os problemas que o Governo procura resolver com esta proposta

de lei, facilitando a vida aos cidadãos, sejam discutidos, muito bem, vamos por diante. Causa-nos, no entanto,

uma certa frustração que o Estado português não encontre uma solução que garanta que, a partir de uma certa

idade, os cidadãos possam dispor de um cartão em que não tenham de ser eles a tomar a iniciativa de o renovar

e que isso possa ser feito oficiosamente, caso não haja qualquer alteração de dados.

Termino com uma questão para a qual bem chama a atenção a Comissão Nacional de Proteção de Dados

(CNPD), no parecer com que habilitou esta Assembleia, e que tem a ver com a regulamentação, por portaria,

de um conjunto de aspetos relacionados com dados sensíveis e que estão ao abrigo de uma proteção legal e

constitucional. É porque corremos o risco de, ao remeter tantas matérias sensíveis para portaria, estar a incorrer

numa deslegalização de duvidosa constitucionalidade relativamente a essas matérias. Entendemos que este

parecer da CNPD deve ser visto com muita atenção no debate de especialidade que iremos fazer, porque, de

facto, podemos estar a incorrer não só em soluções que desprotejam os cidadãos de garantias fundamentais,

mas também, inclusivamente, em soluções de duvidosa constitucionalidade.

Portanto, há dois aspetos que referi na intervenção e que entendemos que devem ser ainda muito bem

ponderados no debate de especialidade.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — A Sr.ª Ministra da Presidência e da Modernização Administrativa

recebeu 1 minuto do Sr. Deputado André Silva, do PAN, juntando-o, assim, ao tempo que ainda tem disponível

para usar da palavra.

Tem a palavra, Sr.ª Ministra da Presidência e da Modernização Administrativa.

A Sr.ª Ministra da Presidência e da Modernização Administrativa: — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs.

Deputados: Agradeço as sugestões que fizeram, as quais, naturalmente, merecerão a nossa reflexão.

Sr.ª Deputada Vânia Dias da Silva, como resultou desta discussão e se tornou evidente, o compromisso do

Governo é o de que as portarias se tornem públicas ao mesmo tempo que a lei se torna aplicável. Neste

momento, o que está em discussão é uma proposta de lei que pode ser alterada por esta Assembleia.

Naturalmente que eu poderia ter mandado as portarias, mas elas não seriam mais do que propostas de portaria,

que, eventualmente, poderiam ou não vir a ser alteradas se os Srs. Deputados decidissem integrar algumas

matérias na lei, como acabou de resultar da intervenção do PCP.

Aplausos do PS.

Garanto-lhe, Sr.ª Deputada, que, no dia seguinte à publicação da lei, as portarias estarão prontas para serem

publicadas no Diário da República.

Portanto, a intervenção da Sr.ª Deputada Vânia Dias da Silva não faz qualquer sentido.

Protestos da Deputada do CDS-PP Vânia Dias da Silva.

Gostava também de dizer que esta proposta de lei procurou simplificar a estrutura da lei no sentido de mais

facilmente, com vantagens para os cidadãos, podermos introduzir alterações. E fazer as alterações, hoje, é

muito mais rápido do que na altura em que foi criado o bilhete de identidade, em 1914. Mas, naturalmente, é do

interesse do Governo, e com certeza dos Srs. Deputados, que seja assegurada a proteção de dados pessoais

e, ao mesmo tempo, que seja visto o outro ponto de vista que também é vantajoso para os cidadãos, que é o

de não terem de prestar repetidamente a mesma informação a diversos serviços. Terem de ir ali para mudar a

morada na carta de condução e depois terem de ir acolá para mudar a morada no cartão de cidadão.

Sr. Deputado António Filipe, obviamente que, em relação a situações como a da sua mãe, ou a da minha, ou

a de outros cidadãos que estão nestas circunstâncias e bem mais desprotegidos do que as nossas mães, os

serviços do Ministério da Justiça estão disponíveis para ir a casa do cidadão ou ao sítio onde ele se encontre,

não só tratar da renovação do cartão de cidadão, como entregar-lho sem que este tenha de se deslocar.

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Poderemos ainda afinar tecnicamente este serviço para essas situações que, infelizmente, serão cada vez

mais frequentes, mas essa preocupação está acautelada desse modo.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Srs. Deputados, como a Mesa não regista mais inscrições para este

ponto da ordem do dia, vamos passar ao próximo ponto, que consta da discussão, na generalidade, da proposta

de lei n.º 24/XIII (1.ª) — Procede à primeira alteração à Lei n.º 61/2014, de 26 de agosto, que aprova o regime

especial aplicável aos ativos por impostos diferidos.

Para apresentar esta iniciativa, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

O Sr. SecretáriodeEstadodosAssuntosFiscais: — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em 2014, foi

aprovado um regime especial aplicável aos ativos por impostos diferidos, geralmente designados pela sigla

inglesa DTA.

Embora de aplicação geral e à semelhança do que ocorreu em Espanha ou em Itália, este regime dirigiu-se,

sobretudo, ao setor bancário. Devido às regras da contabilidade designadas de Basileia III, os bancos só

poderiam contabilizar como fundos próprios os ativos por impostos diferidos em que houvesse garantia quase

total da sua utilização.

Para acorrer ao sério problema que seria criado nos rácios de capital dos bancos, criou-se um regime que

permitia, em certas condições, a conversão direta destes DTA em créditos fiscais reembolsáveis.

Este regime fiscal, além de criar um risco de impactos orçamentais futuros, sempre esteve rodeado de

dúvidas quanto à sua conformidade com o regime europeu relativo aos auxílios de Estado.

A alteração legislativa proposta neste momento pelo Governo impede a aplicação deste regime a novos DTA

criados a partir de 1 de janeiro de 2016 e, portanto, impede a transformação destes em créditos fiscais

reembolsáveis.

Por forma a preservar as situações já constituídas, é, contudo, assegurada a manutenção do regime em vigor

relativamente aos ativos por impostos diferidos elegíveis já reconhecidos nas demonstrações financeiras das

entidades que tenham aderido a este regime especial.

Assim, e nomeadamente no caso das instituições bancárias, estes ativos continuarão a ser elegíveis para

efeitos do cálculo dos rácios de fundos próprios para efeitos prudenciais.

Adicionalmente, passa a exigir-se que os sujeitos passivos disponibilizem, no processo de documentação

fiscal, informação adicional sobre os ativos por impostos diferidos. Esta alteração tem por objetivo facilitar o

controlo dos ativos por impostos diferidos elegíveis por parte da Autoridade Tributária.

É convicção do Governo que o regime proposto é uma solução equilibrada, que evita a criação de novos

riscos para as contas públicas e que preserva as situações constituídas, do lado das empresas abrangidas,

estando o Governo confiante que esta solução evitará que sejam levantados obstáculos, em termos de direito

da concorrência, à vigência deste regime, relativamente às situações constituídas até ao final do ano passado.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Ricardo Leão.

O Sr. Ricardo Leão (PS): — Sr.ª Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Estamos

perante uma proposta de lei, como foi dito aqui, de alteração à Lei n.º 61/2014.

Um regime especial que permitiu a livre adesão não só do sector bancário mas também de qualquer

sociedade comercial e empresa pública, essencialmente, dos bancos, devido às novas regras de contabilidade,

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nomeadamente a intitulada Basileia III, que, caso não fosse atendida, significaria um sério problema nos ratios

de capital dos bancos.

Importa dizer, portanto, que os impostos diferidos têm origem, fundamentalmente, nas diferenças existentes

entre o resultado contabilístico e o resultado apurado, de acordo com as regras fiscais resultantes das

divergências entre as normas fiscais e as normas contabilísticas. Se não existissem divergências entre as

normas fiscais e as normas contabilísticas não existiriam impostos diferidos.

A presente alteração veio delimitar o âmbito temporal deste regime através da extinção da criação de novos

ativos por impostos diferidos após 1 de janeiro de 2016.

Portanto, o PS felicita o Governo por esta alteração proposta e considera que esta proposta de lei é uma

solução oportuna e equilibrada, porque, por um lado, clarifica melhor e vai ao encontro das diretivas europeias

em linha com os outros Estados-membros que aderiram a este regime e, por outro, consegue, igualmente,

preservar o regime jurídico vigente, na medida em que garante este tipo de ativos, devidamente reconhecidos,

até ao ano de 2015, inclusive, não influenciando, de forma negativa, os ratios de capital, nomeadamente do

sector bancário.

Importa ainda realçar nesta proposta de alteração o assegurar do controlo dos ativos por impostos diferidos

elegíveis com medidas adicionais, na medida em que facilita a atuação da Autoridade Tributária.

O PS, mais uma vez, felicita o Governo pela alteração e por esta iniciativa. No entanto, sendo esta uma

matéria de grande complexidade, gostaria de dizer que há um conjunto de questões e de observações que

importa colocar em sede de especialidade, ouvindo um conjunto de entidades competentes, nomeadamente

quanto ao balanço que fazem sobre o regime em vigor e sobre o impacto que esta alteração vai trazer também.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Sá.

O Sr. Paulo Sá (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Em finais de

2013, o anterior Governo PSD/CDS, levou a cabo uma reforma do IRC que permitia, em particular, que os

prejuízos fiscais pudessem ser deduzidos aos lucros nos 12 anos seguintes. Essa alteração possibilitava que

os grandes grupos económicos e financeiros reduzissem significativamente os impostos a pagar.

Como se isto não bastasse, uns meses depois, o mesmo Governo PSD/CDS avançou com uma proposta de

lei que criava um regime especial de ativos por impostos diferidos, o qual, associado ao aumento do período

para reporte de prejuízos, se traduzia no escandaloso favorecimento da banca. Efetivamente, de acordo com as

regras de Basileia III, os bancos, para poderem beneficiar do diferimento de impostos, reduzindo o montante a

pagar no futuro, eram obrigados a deduzir esses impostos aos capitais próprios.

Com a iniciativa legislativa do anterior Governo, os bancos deixavam de ter essa obrigação, passando o

Estado a assumir como dívida sua esse crédito fiscal que os bancos mantinham nos seus ativos. Desta forma,

os bancos podiam melhorar os seus ratios de capital, sem que os acionistas tivessem que desembolsar um

cêntimo.

A despesa fiscal que o Estado assumia com mais este benefício para a banca, e para os banqueiros, era

contabilizada para o apuramento do défice orçamental, implicando, no âmbito da política levada a cabo pelo

anterior Governo, mais austeridade para os trabalhadores e para o povo.

Naturalmente, o PCP opôs-se a essa opção do anterior Governo PSD/CDS de sacrificar quem vive do seu

trabalho para favorecer ainda mais o grande capital.

Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Nas eleições legislativas do passado mês

de outubro, os portugueses condenaram inequivocamente a política de exploração e empobrecimento levada a

cabo pelo anterior Governo PSD/CDS e exigiram uma mudança.

A nova composição da Assembleia da República tem permitido reverter, ainda que de forma limitada,

algumas medidas de favorecimento do grande capital, implementadas pelo anterior Governo.

Com o contributo e empenho do PCP, o Orçamento do Estado para 2016 reduziu para as grandes empresas

e grupos económicos o período de reporte de prejuízos de 12 para 5 anos, limitando dessa forma as

possibilidades de planeamento fiscal agressivo e de fuga ao pagamento dos impostos devidos por parte destas

empresas e desses grupos económicos.

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A iniciativa legislativa do Governo, hoje em debate, tem como objetivo estabelecer que o regime especial dos

ativos por impostos diferidos, estabelecido pelo anterior Governo, deixa de se aplicar nos períodos de tributação

que se iniciem após janeiro de 2016. Adicionalmente, no que diz respeito aos ativos por impostos diferidos

relativos a períodos de tributação anteriores, a proposta de lei reforça o seu controlo, exigindo a prestação de

informações adicionais.

Estas são mudanças positivas que, naturalmente, valorizamos. Contudo, outros e mais ambiciosos passos

devem ser dados no sentido de romper com o favorecimento dos grandes grupos económicos e financeiros,

assegurando que estes paguem os impostos devidos. É esse o caminho para uma política fiscal mais justa e

adequada.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Cristóvão Norte.

O Sr. Cristóvão Norte (PSD): — Sr.ª Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: A

proposta de lei que hoje discutimos visa rever o regime dos ativos por impostos diferidos, que, é bom recordar,

nasceu, originalmente, da necessidade de construir uma solução para obviar as alterações regulatórias que

fizeram com que os créditos fiscais, nos termos em que eram definidos anteriormente, deixassem de ser

considerados como capital. E, por via disso, se, porventura, nenhuma medida tivesse sido tomada em 2014, a

par daquilo que se verificou em Espanha, em Itália e na Grécia, talvez tivéssemos um tecido económico e social

mais fragilizado, menor concessão de crédito e, consequentemente, maior fragilidade, não apenas nas

empresas como também no sistema bancário.

Protestos do Deputado do PCP Paulo Sá.

No fundo, aquilo que se verificou foi uma posição equilibrada e sensata que procurava reequilibrar a

desvantagem comparativa que Portugal enfrentava. E, portanto, na sua maioria, essas divergências resultavam

da circunstância de se verificarem regimes contabilísticos prudenciais e fiscais largamente distintos, pelo que

este propósito serviu para atingir dois objetivos fundamentais: por um lado, progredir no sentido de reforçar a

robustez das empresas, não deteriorando os seus ratios de solvabilidade e capital, e, por outro, para que essas

medidas e essa transição fosse atingida sem ser de forma abrupta, o que poderia ter agravado a situação do

sistema financeiro em face da vulnerabilidade que todos conhecemos.

Esse foi um aspeto obviamente importante, e, portanto, julgo que este debate, sendo um debate equilibrado,

no sentido de obedecer também às regras impostas pela DGComp e à transitoriedade necessária deste regime,

leva-nos a um caminho que não deve merecer, da nossa parte, censura.

Importa, também, a par daquilo que foi decidido nesse tempo, questionar o Sr. Secretário de Estado, que

ainda tem tempo disponível, a propósito do grupo de trabalho que foi oportunamente criado. Esse grupo de

trabalho, como se recorda, contava com a participação da Autoridade Tributária e do Banco de Portugal e visava,

no fundo, a convergência do regime fiscal e prudencial, de modo a resolver definitivamente o problema.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr.ª Deputada Mariana

Mortágua.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A crise

exigiu medidas extraordinárias, ela foi, aliás, o estado de exceção, o permanente estado de choque, a desculpa

para todas as medidas que, muitas vezes, não seriam aceites de outra forma, porque eram, de facto, socialmente

injustas. O mais caricato e irónico é que, enquanto se cortavam os rendimentos que sustentavam a procura, que

sustentavam as empresas, que sustentavam o valor dos ativos dos bancos, aprovavam-se medidas fiscais para

beneficiar as grandes empresas e os bancos dos efeitos nefastos que os cortes nos rendimentos das pessoas

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tinham causado. E aqui está, também, a causa da crise, a austeridade e a forma injusta como foram aplicados

cortes de rendimentos que prejudicaram a vida das pessoas, mas que prejudicaram, também, a economia.

Mas, depois, até nas medidas extraordinárias para resolver este problema de raiz se aumentaram as

injustiças, porque, em nome desta crise, que foi causada ela própria pela austeridade, veio uma descida de IRC

que, nós sabemos, por um lado, era injusta, porque ao mesmo tempo estava a aumentar-se o IRS, e, por outro,

só afetava as grandes empresas, porque as pequenas não pagam IRC por não terem lucro ou, então, pagam

uma taxa reduzida de IRC. Foi em nome desta crise causada pela austeridade que se aumentou o prazo de

reporte de prejuízos, que se aumentaram isenções nas participações sociais, que promovem o planeamento

fiscal e em que tudo foi permitido.

O regime dos ativos por impostos diferidos é mais uma medida que se insere nestas medidas de injustiça

fiscal, porque ela beneficia muito mais as grandes empresas e, sobretudo, os bancos, ao mesmo tempo que se

penalizam os rendimentos familiares e a vida das pessoas.

Basicamente, o que este regime definia é que os bancos e as empresas podiam criar créditos sobre o Estado

através da acumulação de prejuízos que seriam deduzidos em impostos futuros. É, na prática, uma borla aos

bancos. É tão escandaloso como o BES ir à falência, a resolução do BES causar enormes prejuízos e, depois,

estes prejuízos serem transferidos para o Novo Banco sob a forma de um ativo, que mais não é do que um

crédito sobre o Estado pelos prejuízos causados pela resolução do BES. E o mesmo se passou no BANIF,

quando o Santander, para além de ter recebido para ficar com o BANIF, ainda ficou com créditos sobre o Estado

resultantes de prejuízos passados do BANIF.

São borlas ao sistema bancário! São ajudas encapotadas ao sistema bancário, que contabilizavam, a meio

do ano passado, mais ou menos 8000 milhões. Os bancos contabilizavam, a meio do ano passado, no seu total,

quase 8000 milhões de créditos sobre o Estado. São outras formas de ajuda sobre o Estado.

Por isso, Srs. Deputados, nós só podemos acompanhar a limitação deste regime. A crise não pode, ou a

permanente crise, os permanentes estados de exceção, não podem mais ser desculpas para medidas injustas

que agravam a desigualdade de rendimentos, quer entre pessoas quer entre o trabalho e o capital, que, se

formos ver bem, são na verdade a verdadeira causa da crise e não a sua consequência.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Pinho de

Almeida.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs.

Deputados: A forma ideológica como alguns grupos parlamentares abordaram esta questão mostra bem que

esta é uma questão essencialmente técnica e que, obviamente, ou se faz com um discurso sério sobre a matéria

técnica que está em causa ou se inventa uma narrativa ideológica para não debater nada do que está aqui em

causa.

Aplausos do CDS-PP.

Protestos do Deputado do PCP Paulo Sá.

Nós estamos a discutir uma matéria que tem origem em duas coisas muito simples: uma, na divergência

entre aquilo que é a contabilização de determinados ativos, em termos contabilísticos e fiscais, nas divergências

que têm em termos de registo e nas divergências que têm em termos temporais e, a outra, na solução de umas

e de outras e nos efeitos que isso tem nos balanços.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Isso não é político?!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Por outro lado, alterações de regulação, designadamente

Basileia III, tiveram um impacto direto naquilo que eram as empresas nacionais e, designadamente, nas

empresas do sector bancário. Aquilo que não foi dito na narrativa ideológica do PCP e do Bloco de Esquerda foi

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que, se não tivesse sido feito o que foi feito em 2014, outros países, outras empresas e outras instituições

financeiras de Espanha, de Itália e da Grécia podiam estar sujeitas às mesmas regras de regulação a que

Portugal estava sujeito, mas com regras nacionais que, obviamente, introduziam uma concorrência desleal,

porque eram muito mais favoráveis a essas instituições, e que, portanto, prejudicariam, em comparação, as

instituições nacionais que com elas concorriam em mercado aberto.

Eu sei que o problema ideológico, aqui é não perceber a existência de um mercado aberto e como as coisas

se processam em mercado aberto. Mas, quando há um mercado aberto e há concorrência, se há países que

fazem determinados regimes para favorecer as suas empresas, obviamente que nós não os podemos ignorar e

não podemos deixar de seguir esse caminho.

Passado este tempo, há uma questão que é preciso analisar: tanto Portugal, como os outros países que

tomaram medidas idênticas foram alvo de processos por parte da Direção-Geral da Concorrência, no sentido de

apurar se esta matéria era ou não considerada auxílio ilegal de Estado.

A questão que há aqui a considerar é a seguinte: se não nos levanta qualquer questão, do ponto de vista

técnico, que esta resposta legislativa resolve esse problema, então a questão que se pode pôr é uma questão

política importante da concorrência com os outros Estados.

Assim, o Governo é responsável por perceber e por decidir se aquilo que Portugal está a fazer neste momento

é algo que põe ou não em causa o risco de concorrência com outros países com regimes mais favoráveis, e,

portanto, se vai ou não prejudicar os sectores que nacionalmente vão estar sujeitos a uma regra diferente em

comparação com os mesmos sectores noutros países, e se os outros países fazem a mesma interpretação e a

mesma evolução que nós.

Da parte do CDS, há o benefício da dúvida, consideramos que a evolução faz sentido, mas não podemos

deixar de manifestar aqui esta reserva, que é uma reserva de proteção daquilo que é o tecido económico

nacional, no sentido de não estarmos a ser mais papistas que o Papa, não estarmos a ser mais europeístas do

que os outros países que connosco concorrem e não estarmos, assim, a prejudicar sectores essenciais da nossa

economia.

Aplausos do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Secretário de Estado dos

Assuntos Fiscais.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — Sr.ª Presidente, intervenho só para esclarecer a

questão colocada pelo Sr. Deputado João Pinho de Almeida.

Informo que, tanto quanto o Governo dispõe de informação, os restantes países que tinham aprovado antes

de nós regimes deste género também já os terminaram.

Portanto, Portugal é verdadeiramente o último País a ter um regime legal nestes termos, razão que mais

aconselha a que também, em Portugal, este regime seja terminado nos termos que se propõe.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Srs. Deputados, a Mesa não regista mais inscrições para este ponto

da ordem de trabalhos, dou-o por concluído e agradeço ao Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais a sua

presença.

Assim sendo, vamos dar início à discussão da Conta Geral do Estado de 2014.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento (João Leão): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, o que

nos traz aqui hoje é a discussão da Conta Geral do Estado de 2014. Naturalmente, a apreciação da Conta Geral

do Estado, que anualmente se faz nesta Câmara, é uma parte integrante e fundamental do exercício de

fiscalização política a que os governos, democraticamente, têm de estar sujeitos.

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Na verdade, é com a apreciação da Conta Geral do Estado que os Srs. Deputados podem julgar o

cumprimento, por parte do Governo, dos seus objetivos orçamentais e das consequências das políticas

orçamentais aprovadas aqui, no Parlamento.

Ora, como sabemos, estamos hoje a apreciar a Conta Geral do Estado respeitante ao ano de 2014, a qual

não é duplamente da responsabilidade do atual Governo, porque não nos coube executar o Orçamento de 2014,

nem, tão-pouco, elaborar a respetiva Conta.

Assim, a discussão que hoje decorrerá faz-se com a presença da bancada do Governo que não pode, pela

natureza das coisas, ser avaliado pela apreciação da Conta Geral do Estado de 2014.

Ainda assim, há ensinamentos que podem ser retirados da Conta Geral de 2014 e podem ser aproveitados

em futuros exercícios de elaboração da Conta, em particular, as recomendações formuladas pelo Tribunal de

Contas no seu parecer à Conta Geral do Estado.

Não teríamos tempo para repassar aqui cada uma das 95 recomendações formuladas pelo Tribunal de

Contas, ainda assim, como de resto já foi afirmado pelo Sr. Ministro das Finanças, na sua audição na COFMA

(Comissão de Orçamento, Finanças e Modernização Administrativa), existe o compromisso, por parte do

Governo, de observar as recomendações do Tribunal de Contas, na medida em que as mesmas virão a contribuir

para a melhoria do relato incluído na Conta.

De resto, algumas das recomendações já estão a ser, na prática, consideradas pelo atual Governo e foram

até tidas em conta na preparação do Orçamento do Estado para 2016. A título de exemplo, no que concerne à

contabilização da receita, o Orçamento do Estado para 2016 procura dar resposta aos reparos formulados pelo

Tribunal de Contas, a propósito do registo das contribuições do serviço rodoviário e da contribuição para o

audiovisual.

Adicionalmente, todo o trabalho a desenvolver com vista à melhoria da equidade da informação orçamental,

o qual há de estar ligado à implementação do novo sistema, o SNC-AP, bem como de implementação da Lei do

Enquadramento Orçamental virão dar resposta às recomendações do Tribunal de Contas quanto à necessidade

de melhoria da qualidade dos dados da Conta Geral do Estado.

Concluindo, embora a análise da Conta Geral do Estado, a que agora se procede, não sirva o propósito de

avaliação do atual Governo em funções, as recomendações formuladas, bem como o debate que se seguirá,

serão, certamente, no futuro, tidas em consideração na elaboração da Conta Geral do Estado.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Meireles.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: As discussões das contas são

sempre algo peculiares e características, porque a verdade é que, quando vamos discutir a Conta, muitas das

discussões sobre o que era fundamental e sobre o Orçamento que lhe estava subjacente já estão feitas. E esta

Conta de 2014 não é exceção, tem, é verdade, a particularidade de que o Governo que hoje responde pela

Conta não ser o Governo que apresentou o Orçamento para o ano de 2014. Bom, mas isso sempre acontece,

ou quase sempre tem acontecido, nas transições de Governo.

Aliás, se pensarmos no ano de 2014 e naquilo que a Conta de 2014 espelha, é verdade que esse também

foi um ano particularmente marcante, porque foi o ano em que a troica saiu de Portugal.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — E, se é verdade que havia um Governo que não tinha chamado a troica,

também é verdade que foi ele a herdá-la, juntamente com os portugueses, infelizmente, e foi ele a libertar

Portugal da troica e dessa invasão à nossa soberania.

Vozes do CDS-PP: — Bem lembrado!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Ainda bem que esta fase está ultrapassada e, certamente, da parte

desta bancada e, quero crer, de todas, tudo faremos para que Portugal não volte a passar por isso.

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Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Em segundo lugar, 2014 também ficou marcado por outro

acontecimento. Apesar de algumas vozes que então falavam e faziam previsões de espirais recessivas e de

recessões que não terminariam e se aprofundariam, a verdade é que 2014 foi, de facto, o primeiro ano marcado

por um crescimento real do PIB, em linha com o crescimento da área euro e com a generalidade das previsões.

Creio que esta última asserção — que não é minha, é da UTAO — do crescimento em linha com a área do

euro e com a generalidade das previsões não deixa de ser uma boa notícia para o então ano 2014 e eu apenas

posso desejar que, em 2016, também possamos acabar o ano dizendo que tivemos um crescimento em linha

com a área euro e com as previsões.

Pena é que os números que já conhecemos sejam precisamente do contrário, de divergirmos com a área

euro e de divergimos das posições otimistas do Governo.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Esperemos que a Conta Geral do Estado de 2016, quando for

apresentada, também possa ter estas linhas.

Aplausos do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Sá.

O Sr. Paulo Sá (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: O debate que

fazemos hoje, sobre a Conta Geral do Estado de 2014, constitui uma oportunidade, que não desperdiçaremos,

para relembrar aquilo que o PSD e o CDS tentam, de todas as formas, fazer esquecer: as malfeitorias levadas

a cabo pelo anterior Governo.

Protestos da Deputada do CDS-PP Cecília Meireles.

O CDS já fez a sua intervenção e esqueceu-se de referir essas malfeitorias.

Assim, vamos, então, relembrar que, no ano de 2014, PSD e CDS tentaram aplicar cortes definitivos nas

pensões de aposentação, de reforma, de invalidez e de sobrevivência,…

Aplausos do PCP.

… assim como tentaram agravar os cortes salariais aos trabalhadores da Administração Pública, elevando-

os para 12%, intenção que só não conseguiram concretizar porque foi contrariada pela luta dos trabalhadores e

por decisões do Tribunal Constitucional.

Agora, PSD e CDS até agendam debates sobre envelhecimento ativo e a sustentabilidade da segurança

social e apresentam nesses debates dezenas de iniciativas legislativas para fazer passar a ideia de que estão

muito preocupados com os reformados, mas a verdade é que, quando estavam no Governo, infernizaram a vida

aos reformados.

Mas as malfeitorias do PSD e CDS, em 2014, não se ficaram pelos cortes nos salários e nas reformas,

atacaram as funções sociais do Estado na saúde, na educação e na proteção social, prosseguindo uma política

de degradação dessas funções, tentando transformar os direitos de todos no negócio de alguns, diminuíram os

impostos sobre as grandes empresas e os grupos económicos, por via da reforma do IRC, ao mesmo tempo

que mantinham o brutal saque fiscal sobre os rendimentos do trabalho, prosseguiram a destruição do sector

empresarial do Estado, por via das privatizações, vendendo ao desbarato empresas públicas estratégicas para

o desenvolvimento nacional.

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Esta política de liquidação de direitos laborais e sociais, de confisco dos rendimentos dos trabalhadores e

reformados, de empobrecimento de amplas camadas da população e de abdicação da soberania nacional, foi

sempre justificada pelo PSD e CDS com a necessidade de consolidação das contas públicas.

Mas a verdade é que, em 2014, a dívida pública continuou a crescer, atingindo o máximo histórico de 130,2%,

e o défice orçamental fixou-se nos 7,2%, valor superior ao défice de 2012 e 2013. É uma evidência que a

consolidação das contas públicas com que o anterior Governo PSD/CDS enchia a boca não passava de um

pretexto — de um mero pretexto — para impor uma política de exploração e empobrecimento, concretizando

um velho sonho da direita de ajustar contas com o 25 de Abril e de destruir as suas importantes conquistas no

plano económico, social e cultural.

Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Nas eleições legislativas do passado dia

4 de outubro, os portugueses rejeitaram, inequivocamente, as políticas impostas por PSD e CDS e manifestaram

o seu desejo de mudança.

Desde essa altura, com o empenhado contributo do PCP, foram adotadas diversas medidas que dão resposta

aos problemas mais urgentes dos trabalhadores e do povo em matéria de direitos laborais e sociais, de

rendimentos e de efetivação dos direitos à saúde, educação e proteção social. É este caminho, de reposição de

direitos e de rendimentos, que devemos prosseguir, para que os portugueses possam olhar para o futuro com

esperança.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Paulino

Ascenção.

O Sr. Paulino Ascenção (BE): — Sr.ª Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: A

Conta Geral do Estado de 2014 revela o falhanço do cumprimento das metas a que se propôs o anterior Governo,

as metas orçamentais deste exercício económico e as metas da Legislatura, no âmbito da ambição de ir além

da troica.

Metas mais importantes, como a do défice, ficaram muito acima, além de, depois de terem sido revistas por

duas vezes, a dívida ter crescido muito além do previsto, pois encontrava-se, no final de 2009, em 17 pontos

percentuais do PIB acima do valor de 2011.

A estabilidade do sistema financeiro era uma outra ambição prioritária, mas as notícias que vieram a público

entretanto dão bem a evidência de quão longe é que estamos de alcançar esse objetivo.

O falhanço das metas é o falhanço da política de austeridade em resolver os problemas do País, que só

agravou os problemas e acrescentou novos, como a pobreza, a emigração, o desemprego e a precariedade.

A insistência neste rumo, nesta política, só se compreende por uma obsessão ideológica de quem, com uma

agenda oculta, pretende alargar o fosso das desigualdades sociais, concentrar a riqueza e o poder numa

pequena elite e condenar a maioria da população à indigência.

Concentrar o poder é limitar o campo das escolhas e é reduzir o âmbito da democracia, e são opções

ideológicas. Era uma agenda ideológica que produzia estas escolhas e não questões técnicas, como os

senhores pretendem vender.

Até uma entidade tão insuspeita como o Conselho das Finanças Públicas veio considerar que o que foi feito

não responde ao objetivo que era pretendido, o equilíbrio das contas públicas, que o que foi feito não passou de

cortes transversais, cegos, apressados e sem obedecer a uma estratégia, uma maquilhagem sem efeitos

duradouros. Essa maquilhagem passou pela trafulhice de apresentar aos portugueses medidas como

temporárias quando, em Bruxelas, se garantia que eram medidas permanentes, pelo recurso a medidas

extraordinárias, pela antecipação de receitas, como foi o caso da contribuição da banca para o Fundo de

Resolução, que foi cobrada em 2015 quando era devida em 2016, que beneficiou a execução orçamental de

2015 e prejudicou a do ano corrente, ou passou pela trafulhice de esconder «debaixo do tapete» o caso BANIF.

Os funcionários públicos e as pensões foram o mealheiro do anterior Governo, que cortou a eito na educação,

na saúde e na segurança social, mas, quando estavam em causa certas clientelas, aí foi generoso. Por exemplo,

as PPP (parecerias público-privadas), quer as rodoviárias quer as da saúde, foram poupadas aos cortes e na

educação surgiram novas PPP, novas rendas a privados, com os contratos de associação com colégios em

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locais onde não havia manifestamente necessidade. E a racionalidade destas medidas foi, mais uma vez,

concentrar riqueza, transferir rendimentos de quem trabalha para que não o faz, desmantelar o Estado e os

serviços públicos.

A evidência desta maquilhagem salta à vista com as recentes notícias que vieram a público, como o desvio

de verbas da ADSE para pagar despesas do Estado, dinheiro que resulta dos descontos nos salários dos

funcionários, que é deles, para pagar despesas que nada têm a ver com o fim para que os funcionários

descontam.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem a palavra o Sr. Deputado Cristóvão Crespo, para uma intervenção,

em nome do PSD.

O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — Sr.ª Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Sr.

Secretário de Estado, respeitamos o juízo do Tribunal de Contas em relação à Conta, mas queremos um juízo

político aqui, na Assembleia.

Eu estava na expectativa de ver qual era o Ministro das Finanças que teríamos hoje, aqui, a pronunciar-se

sobre a Conta Geral do Estado, e, afinal, não temos o Sr. Ministro, temos o Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (Pedro Nuno Santos): — E…!

O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — Isto porque, se fosse o Sr. Ministro, teríamos duas hipóteses: ou teríamos

o Sr. Ministro, no estrangeiro, a pedir tempo para que as reformas dos últimos anos se materializassem, ou

teríamos o Sr. Ministro, que está disponível para ficar na sombra do Primeiro-Ministro e da coligação socialista,

bloquista e comunista, a assistir à destruição dessas mesmas reformas. Resta saber qual é a opção que tomam.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: — Escolha o senhor!

O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — Ou seja, se, definitivamente, o Ministério das Finanças assiste ao discurso

otimista do Sr. Primeiro-Ministro — irritantemente otimista — ou se daqui a pouco, mais à frente, se as coisas

correrem mal, temos o discurso da desculpabilização tardia.

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Fale da Conta de 2014! Está a esgotar o tempo e não diz nada!…

O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — Na audição na Comissão, o Sr. Ministro foi contraditório.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: — Qual deles?

O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — Por um lado, reconheceu, citando a expressão do Sr. Ministro, que «a

economia entrou em recuperação», mas, por outro, afirmou que não foi de acordo com aquilo que o Governo

tinha previsto.

Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: Falar da Conta Geral do Estado de 2014, e também da de 2015,

na sequência lógica, é falar de resultados.

Protestos do PS.

Vozes do PCP: — Fale dos cortes das pensões que os senhores queriam fazer!

O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — Já lá vamos, Srs. Deputados! Falar da Conta é falar de resultados e de

resultados positivos,…

Vozes do PSD: — Muito bem!

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Protestos do PCP.

O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — … de convergência com a zona euro.

As contas bateram certas…

O Sr. João Galamba (PS): — Certas é que não bateram!

O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — … no desempenho da economia e na consolidação orçamental.

Vozes do PSD: — Muito bem!

Protestos do BE e do PCP.

O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — Sr. Deputado Paulino Ascenção, basta olhar para uma simples folha do

Relatório do Orçamento do Estado para 2014, de outubro de 2013. Tem, na página 18 desse Relatório, que,

para o PIB, a previsão era de 0,8% e foi de 0,9%, que, para o investimento, a previsão era 1,2% e o resultado

foi 2,5%, que, para o emprego, a previsão era (-)0,4% e o resultado foi 1,6%, que, para a taxa de desemprego,

a previsão era 17,7% e o resultado foi 13,9%,…

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — … que, para a capacidade líquida de financiamento da economia

portuguesa, a previsão era de 1,9%.

O Sr. Paulo Sá (PCP): — Fale lá dos cortes! Gasta o tempo e não fala dos cortes!

O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — O Sr. Deputado, que nos acusa de uma agenda ideológica, veja lá o que

é que comparou! O senhor esteve preocupado com o défice e com a dívida. Ora, vindo da sua bancada, o défice

e a dívida — algo que é horroroso! — foi aquilo que não cumprimos, e é aquilo de que o senhor nos acusa! Para

o senhor não é importante o emprego, o desemprego, a criação de riqueza?! Afinal, esses é que são os dados

maus, Sr. Deputado?! O senhor acusa-nos de uma agenda ideológica e, afinal, a ideologia que utiliza é aquela

de que nos acusa!

Srs. Deputados, já agora, apesar dos sacrifícios e dos esforços dos portugueses nos últimos cinco anos, os

resultados estão à vista em 2014 e em 2015…

Protestos do BE e do PCP.

O Sr. João Galamba (PS): — Pois, estão! É o risco de sanções!

O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — Sr. Deputado João Galamba, sabe qual é o melhor exemplo? É que,

desde ontem, temos cá a troica para a quarta avaliação pós-troica. Sr. Deputado, são quatro avaliações pós-

troica e foram mais 12 no período da troica. Sabe de que é que isso resulta? Da vossa governação! Todas estas

visitas da troica são resultado da vossa governação, dos governos anteriores e deste agora. O resultado das

vossas governações são 12 mais 4; 16 visitas da troica é o brilhante resultado da última vez que estiveram no

Governo.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Em nome do PS, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Trigo Pereira.

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O Sr. Paulo Trigo Pereira (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Talvez

seja de começar por uma nota pedagógica, digamos que por uma análise paradoxal do PSD, pela voz do

Deputado Cristóvão Crespo, que considera, por um lado, que a economia é de mercado e, por outro, que os

resultados económicos são todos da responsabilidade do Governo.

O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — Não, senhor!

O Sr. Paulo Trigo Pereira (PS): — Sr. Deputado, numa economia de mercado, os resultados económicos

são, antes do mais, consequência dos consumidores, nas suas decisões de consumir e poupança, das

empresas, nas decisões de investimento e de exportação, e, depois, temos o Governo que pode ajudar ou

dificultar a economia. E, neste contexto, de facto, o Governo não ajudou muito.

Vale a pena lembrar que o anterior Governo PSD/CDS tinha uma clara agenda política económica, que era

a seguinte: queria fazer austeridade que considerava que iria ser expansionista e queria fazer um crescimento

económico assente, exclusivamente, na procura externa, nomeadamente nas exportações. E a reorientação da

política económica, operada no 2.º semestre de 2013 e em 2014, foi consequência das decisões do Tribunal

Constitucional — é bom lembrar isto! Repito: foi consequência das decisões do Tribunal Constitucional.

Aplausos do PS.

O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — Como é que pode afirmar isso?

O Sr. Paulo Trigo Pereira (PS): — Foram obrigados, foram forçados a uma política económica diferente da

que pretendiam.

Vozes do PS: — Exato!

O Sr. Paulo Trigo Pereira (PS): — Em 2014 não tivemos um Orçamento do Estado, tivemos três: tivemos o

inicial, tivemos o primeiro retificativo, em março, e tivemos o segundo retificativo, em setembro.

Já aqui foram lembradas — e agradeço ao Sr. Deputado Paulo Sá tê-lo feito — as medidas inacreditáveis

colocadas no Orçamento do Estado para 2014, que foram, e bem, declaradas inconstitucionais pelo Tribunal

Constitucional,…

O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — Se foram declaradas inconstitucionais, não foram aplicadas!

O Sr. Paulo Trigo Pereira (PS): — … e passarei, então, à apreciação que o Tribunal de Contas fez

objetivamente sobre a Conta Geral do Estado. Não vos maçar com tudo, mas vou falar aqui de meia dúzia de

coisas.

O que o Tribunal de Contas disse foi o seguinte: em relação à administração central, não aplicação do POCP

(Plano Oficial de Contabilidade Pública) na sua totalidade; omissão de impostos nas receitas do Estado;

subavaliação da despesa fiscal; falta de informação sobre o stock da dívida; não menção do Fundo de

Resolução.

Sobre a não menção do Fundo de Resolução, os Srs. Deputados dizem que não o puseram na Conta Geral

do Estado porque não se sabia se iria ou não ao défice.

O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — Não, não é «não se sabia»!

O Sr. Paulo Trigo Pereira (PS): — Mas já se sabia exatamente o que aconteceria com o Fundo de

Resolução: ou o Novo Banco era vendido até meados de 2015, ou iria, como foi, ao défice e à dívida. Portanto,

o mínimo de honestidade intelectual exigiria que houvesse uma seção na Conta Geral do Estado que dissesse:

«Bom, não sabemos se isto vai ou não ao défice, mas…». Mas nada disso é dito!

Vozes do PS: — Muito bem!

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O Sr. Paulo Trigo Pereira (PS): — Sobre a segurança social, o que o Tribunal de Contas diz é que a Conta

não permite ter uma imagem verdadeira, apropriada, da situação económica, financeira e patrimonial da

segurança social.

Para terminar, eu diria que esta Conta Geral do Estado tem uma engenharia financeira que convém explicar.

Há uma maneira de fingir que a dívida pública não aumenta tanto. E como é que se faz? Fazendo com que o

Fundo de Estabilização da Segurança Social compre mais dívida pública. E o dado é apenas este: em 2014, o

Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social, que tinha 5300 milhões de dívida em carteira, passou

a ter 8000 milhões de euros de dívida em carteira. Ou seja, se o Fundo de Estabilização Financeira da Segurança

Social não tivesse alterado a sua carteira e comprado dívida pública, a dívida pública teria aumentado não aquilo

que aumentou, que foi 1,2%, mas 2,7%.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — Ó Sr. Deputado!…

O Sr. Paulo Trigo Pereira (PS): — Portanto, isto é falta de transparência na Conta Geral do Estado, exige-

se maior rigor e fico satisfeito por ter ouvido o Sr. Secretário de Estado João Leão.

Para terminar, direi que o PS não vai votar favoravelmente esta Conta Geral do Estado, e não vai porque ela

tem lacunas de informação, tem falta de transparência, tem engenharia financeira e isto não contribui para a

honorabilidade do Estado.

Aplausos do PS.

Protestos da Deputada do CDS-PP Cecília Meireles.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Srs. Deputados, terminada a discussão da proposta de lei n.º 24/XIII

(1.ª), despedimo-nos dos Srs. Secretários de Estado, e passamos ao ponto seguinte da ordem de trabalhos,

que consta da discussão conjunta, na generalidade, dos projetos de lei n.os 111/XIII (1.ª) — Inclusão de opção

vegetariana em todas as cantinas públicas (PAN), 265/XIII (1.ª) — Determina a inclusão da opção vegetariana

nas refeições nas cantinas públicas (BE) e 268/XIII (1.ª) — Ementa vegetariana nas cantinas públicas (Os

Verdes).

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado André Silva, do PAN.

O Sr. André Silva (PAN): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Trazemos hoje ao debate a proposta

de que todas as cantinas públicas possam disponibilizar uma opção alimentar saudável, sustentável e acessível

para todos os portugueses. Trata-se de uma iniciativa inclusiva não apenas para os milhares de cidadãos que,

cada vez mais, têm optado por dietas vegetarianas, mas também para todos os que procuram alternativas

alimentares saudáveis.

Começo por expressar o meu agradecimento àqueles que têm defendido e trabalhado por esta possibilidade,

nomeadamente a Associação Vegetariana Portuguesa, bem como os 15 000 subscritores da petição que deu

entrada na Assembleia da República sobre este tema e a todos os que, ao longo dos anos, têm contribuído para

um diálogo construtivo.

O impacto que a alimentação tem na nossa saúde é incontornável e só por este motivo esta iniciativa já

representa um forte investimento. A própria Direção-Geral de Saúde reconhece os benefícios de uma

alimentação baseada em produtos de origem vegetal, reconhecendo também que esta opção alimentar contribui

para a proteção da saúde humana. Para além disso, apresenta, tendencialmente, um custo menor do que uma

refeição não vegetariana, visível no aumento evidente da oferta destas opções na restauração.

Uma consciência coletiva cada vez maior assenta as suas escolhas alimentares numa atitude ética ao

conhecer as reais condições de produção industrial de animais para consumo humano, uma produção massiva

e intensiva que continua a justificar a proteção do seu bem-estar numa lógica exclusivamente utilitarista.

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Por outro lado, a produção pecuária é o maior poluidor mundial e as escolhas alimentares serão um dos

fatores mais decisivos para a mudança climática, com enormes impactos sobre o consumo de água, de energia

e de uso do solo, recursos cada vez mais esgotados.

Muito nos satisfaz constatar que algumas autarquias estão a fazer avanços de extrema importância na

informação e sensibilização das pessoas para o impacto que a sua alimentação tem na saúde e no equilíbrio

dos ecossistemas.

A Câmara Municipal de Monchique, por exemplo, já introduziu uma ementa vegetariana nas escolas,

reconhecendo as qualidades e vantagens de uma alimentação diferente.

Muitas crianças e jovens, nas escolas onde se formam enquanto cidadãos, veem vedada a sua liberdade de

escolha na burocracia da lei que, ao não prever opções, tem criado diversos obstáculos que as excluem.

O Parlamento é um espaço dinâmico de cruzamento de diferentes olhares e saberes e que poderá

certamente acolher a mudança com vista a melhorar o nível nutricional da população, a estimular padrões

alimentares mais éticos e mais sustentáveis e a incluir uma vasta parcela de cidadãos que já segue um regime

alimentar diferente!

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Duarte

Costa.

O Sr. Jorge Duarte Costa (BE): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Sr.as Deputadas: Hoje debatemos a

questão das cantinas sociais e da qualidade da sua prestação e da sua oferta.

As cantinas públicas têm um papel social relevante. Elas servem os utentes de serviços públicos, os

funcionários desses serviços, os serviços como o sistema prisional e o ensino público, nomeadamente as

escolas. Em muitas destas cantinas é onde os alunos mais desfavorecidos têm, por vezes, a única refeição

nutricionalmente equilibrada que tomam durante um dia inteiro e esse papel social é muito importante ser

sublinhado num País, como Portugal, onde essas dificuldades económicas têm existido.

É por isso também que é preciso olhar para as cantinas públicas como um espaço onde deve ser reconhecida

a diversidade da opção alimentar que hoje ocorre na sociedade portuguesa, de uma forma especialmente

acentuada. Como foi referido na intervenção do Sr. Deputado André Silva, há, hoje, uma parte importante da

população que opta por um regime, uma dieta vegetariana, e essa diversidade deve estar refletida na oferta

pública das cantinas do Estado. Além disso, essa diversidade é um acréscimo de qualidade pela presença da

opção e pela pluralidade da oferta nutricional que as cantinas públicas devem ter.

Portanto, defender as cantinas públicas é defender que elas respondam também a essa diversidade na

qualidade do seu serviço.

A importância que a diminuição da presença da proteína de origem animal pode ter na composição da dieta

das cantinas públicas, com o aumento da diversidade das fontes de proteína, não é apenas um postulado dos

defensores do vegetarianismo. Se olharmos para o que diz a própria Direcção-Geral de Saúde, como sequência

da estratégia do Programa Nacional para a Promoção da Alimentação Saudável, foram já lançados dois manuais

dedicados à alimentação vegetariana. Esses manuais foram lançados com o objetivo de promover a informação

disponível nas instituições de saúde sobre os benefícios do consumo de produtos de origem vegetal e o seu

papel na prevenção da doença, nomeadamente nas doenças crónicas, como a doença cardiovascular,

oncológica, diabetes e obesidade. É esse o papel do reforço da proteína vegetal na composição da dieta da

maior parte da população em Portugal, e tem sido sucessivamente diagnosticado, como bem sabemos, o

desequilíbrio na composição da dieta.

Por isso, não existe nenhum motivo para que as cantinas públicas não possam passar a ter, no mais breve

prazo, uma opção vegetariana nas suas refeições.

Teremos, assim, melhores cantinas, mais inclusivas e mais saudáveis.

Aplausos do BE e do PAN.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para apresentar o projeto de lei de Os Verdes, tem a palavra a Sr.ª

Deputada Heloísa Apolónia.

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A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Os Verdes apresentam

também à Assembleia da República um projeto de lei que prevê que as cantinas públicas possam oferecer,

como alternativa alimentar, uma ementa vegetariana.

Vou dar nota prévia para, depois, explicar o que propomos em concreto, porque propomos em concreto e

como propomos em concreto.

A nota prévia é para dizer que, ao longo dos anos, Os Verdes têm procurado, nesta Casa, que as cantinas

públicas sejam cada vez mais exemplares nas ofertas prestadas aos seus utilizadores. Justamente por isso, e

já nesta Legislatura, foi aprovado um projeto de lei de Os Verdes que previa que as cantinas públicas fossem —

e vou utilizar esta palavra para ser clara — um absorvedor de produtos locais, ou seja, que as cantinas públicas

fossem também uma fonte de escoamento da produção local, que é uma questão extraordinariamente

importante ao nível económico, social e ambiental, isto é, a relocalização da produção e o consumo local, a

procura local.

Refiro tudo isto para dar um exemplo onde se integra também este projeto que Os Verdes agora apresentam,

ou seja, no sentido de que as cantinas públicas possam ser exemplares nas ofertas que prestam aos seus

utilizadores.

O que é que propomos em concreto? Propomos que as cantinas públicas ou os refeitórios públicos

contenham um menu vegetariano como opção às outras ementas que oferecem. Isto é exatamente aquilo que

propomos. Não queremos obrigar ninguém a consumir, a ser ou a tornar-se vegetariano. As pessoas fazem as

suas opções alimentares, esperamos nós, com a consciência dos seus impactos.

Mas a verdade — e agora passo à razão por que apresentamos o projeto de lei — é que há muitas pessoas

em Portugal a fazer a opção por uma dieta vegetariana e nós não podemos fechar os olhos a essa realidade,

designadamente nas cantinas públicas. Há quem não faça essa opção, há quem a faça. E as pessoas que fazem

a opção por uma dieta vegetariana acabam por ficar arredadas da utilização da cantina pública, do serviço que

é prestado, porque não há oferta desse menu, dessa ementa.

Nesse sentido, consideramos até que podemos qualificar esta medida como um fator de não discriminação,

e consideramos isso importante.

Por outro lado, como é que propomos que seja implementada esta matéria? Como sabemos, e como até já

foi também aqui referido, a dieta vegetariana implica uma racionalização de equilíbrio e há que garantir que não

gere um défice de nutrientes importantes. E, nesse sentido, o que Os Verdes propõem é que a opção vegetariana

em cantinas públicas seja tratada por técnicos habilitados a escolher ementas com composição equilibrada,

como salvaguarda da igualdade e da saúde, para além de outras matérias que consideramos importantes.

Propomos também, Sr.as e Srs. Deputados, sabendo da necessidade de adaptação das próprias cantinas e

refeitórios a esta nova realidade, designadamente a técnicos habilitados para o efeito, estabelecemos um

período de adaptação destas infraestruturas de 90 dias contatos a partir da entrada em vigor da presente lei.

Em suma, é esta a proposta que Os Verdes hoje apresentam à Assembleia da República e que considera,

evidentemente, haver todas as condições para que seja aprovada.

Aplausos do PCP e do PAN.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Palmira Maciel.

A Sr.ª Palmira Maciel (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A regulamentação de temas

relacionados com a alimentação saudável, o abastecimento local e a salvaguarda de padrões de qualidade em

cantinas públicas têm sido uma prioridade política do Grupo Parlamentar do Partido Socialista.

A qualidade da alimentação é um fator decisivo em sociedades modernas, igualitárias e justas, permitindo a

todos os cidadãos o acesso a refeições equilibradas e satisfatórias, sob o ponto de vista de segurança alimentar

e nutricional.

Nos últimos tempos, fruto de diferentes motivações, o número de portugueses que adotam o regime

vegetariano, de forma permanente, temporária ou esporádica, tem crescido consideravelmente.

Uma alimentação saudável deve ser equilibrada e variada, incluindo, naturalmente, os produtos de origem

vegetal, bem como produtos de origem animal. Estas são também as bases da dieta mediterrânica, que, como

se sabe, é Património Cultural e Imaterial da Humanidade, de acordo com a ONU.

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Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O aumento do número de portugueses a aderir a uma alimentação

vegetariana tem levado à implementação desta dieta em diversas cantinas públicas, de forma voluntária.

Convém referir que uma grande maioria das cantinas universitárias já disponibiliza uma opção vegetariana.

Por outro lado, os hospitais públicos também incluem uma opção vegetariana, desde que a mesma se revele a

mais adequada à situação clínica ou terapêutica do doente.

Julgamos, de facto, que a inclusão da opção vegetariana nas cantinas públicas tem vindo a ser gradual e

que está a ser devidamente implementada. Esta disponibilização poderá, em nosso entendimento, ser

determinada por cada estabelecimento em função da procura que lhe é dirigida.

Para além dos impactos orçamentais inerentes, que se revelam de difícil contabilização e que não devem ser

desconsiderados, esta hipótese de inclusão da opção vegetariana carece de uma prévia avaliação com um

levantamento do ponto de situação da sua universalidade nos diferentes sectores e serviços públicos. Existem

entidades, nomeadamente escolas, que teriam dificuldade em adaptar-se ao prazo de implementação previsto

nos diplomas, dado que já contrataram fornecimento para períodos bastante mais longos.

Por outro lado, a adoção e manutenção de uma dieta vegetariana exige conhecimentos científicos,

alimentares e, sobretudo, nutricionais que requerem cuidados específicos no seu uso, designadamente em

algumas fases da vida, nomeadamente nas idades mais jovens.

A introdução da opção vegetariana nas escolas requer um plano de qualificação dos diferentes profissionais,

que, pela sua atividade em cantinas públicas escolares, podem influenciar conhecimentos, atitudes e

comportamentos em hábitos alimentares saudáveis das crianças e jovens.

A promoção de campanhas de sensibilização que inclua os alunos, encarregados de educação e toda a

comunidade educativa deveria ser reforçada para promover 0uma alimentação saudável e sustentável.

Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Mais e melhor saúde depende da escolha de um estilo de vida

saudável, onde a alimentação é apenas uma de diversas escolhas.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem, mais uma vez, a palavra o Sr. Deputado

Cristóvão Norte.

O Sr. Cristóvão Norte (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: perante as propostas que

discutimos aqui hoje, apraz-nos registar que, em primeiro lugar, somos pela liberdade de escolha, pela

pluralidade, e não queremos impor o nosso modelo, a nossa visão a ninguém. Aceitamos que haja outras visões,

porventura conflituantes, muitas vezes complementares. Portanto, desse ponto de vista, o que é absolutamente

imprescindível é construir alternativas alimentares saudáveis, equilibradas, forjadas em escolhas livres e

conscientes e que se traduzam em opções alimentares voluntárias. Este parece-me um princípio que todos aqui

somos capazes de aceitar.

Já foi percorrido um caminho significativo a este respeito. É importante que se ofereçam condições para que

esse caminho possa ser trilhado por quem assim o entenda, mas também não devemos negligenciar alguns

aspetos que são de importância maiúscula quando estamos a tratar esta matéria.

Levantaria aqui algumas questões, desde logo em relação ao preâmbulo do projeto de lei do PAN. O PAN

— e isso tem sido hábito em algumas das posições que tem assumido na Assembleia da República — apresenta

na redação das propostas que submete à apreciação uma posição mais moderada do que aquela que se verifica

nos preâmbulos.

Portanto, quando olhamos para os preâmbulos, vemos a imposição de um modelo unilateral, que não deve

respeitar a pluralidade e a liberdade de escolha, mas, quando a confrontamos com as posições constantes dos

projetos que submetem à apreciação desta Assembleia, verificamos que moldam essas circunstâncias a

condicionantes, talvez tático-estratégicas, que não visam o objetivo primordial que está na génese das propostas

que apresentam.

Portanto, gostaria de levantar duas ou três questões sumárias que, julgo, devem merecer uma reflexão

aturada sobre esta matéria e sobre as propostas que devemos tratar com responsabilidade.

Desde logo, quanto à questão do custo, é sabido, e qualquer um de nós compreende, que a universalização

da inclusão obrigatória da ementa vegetariana nas cantinas públicas tem repercussões ao nível dos custos. Isto

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é absolutamente evidente. Não vejo que isso já esteja estimado, mas é importante fazê-lo para tomarmos uma

decisão informada e sabermos qual é a magnitude da transformação que estamos a operar.

Por outro lado, em alguma medida isto pode conflituar com o desperdício alimentar e é bom ponderar essa

circunstância, sabendo que a diversidade de oferta pode, eventualmente, bulir com condições que a Assembleia

da República, já em projetos de resolução anteriores, considerou fundamental.

Depois, do ponto de vista científico, em particular naquilo que tange à alimentação dos jovens, é preciso

saber de que modo estão ou não salvaguardados os imperativos científicos que resultam de uma avaliação

prévia da proteína vegetal e animal.

Portanto, levantaria aqui estas três questões que acho que são importantes. Entendo que devemos travar

esse debate, sabendo que, do nosso ponto de vista, tudo o que seja possível aprofundar no domínio da liberdade

de escolha, da tolerância e da diversidade dos projetos de vida de cada um não deve merecer o nosso repúdio

ou a nossa censura.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção em nome do CDS-PP, tem a palavra a Sr.ª

Deputada Patrícia Fonseca.

A Sr.ª Patrícia Fonseca (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O CDS é também, e sempre

foi, um partido defensor da liberdade de escolha — liberdade de escolha na educação, na saúde e, também, na

alimentação. Por isso, qualquer iniciativa que contribua para uma maior diversidade destas opções terá, como

é óbvio, o nosso apoio e a nossa concordância.

Mas, por isso mesmo, entendemos que estes projetos de lei hoje apresentados são pouco ambiciosos,

porque se, por um lado, afirmam que, e cito, «… é importante que sejam asseguradas as condições para que

todos possam seguir as suas dietas sem qualquer tipo de discriminação…», por outro lado, preveem apenas a

inclusão da dieta vegetariana e ignoram outras, como, por exemplo, a dieta kosher, a halal ou outras que são

seguidas não por opção de cada um, mas por questões de saúde, como a dieta para as pessoas celíacas, que

são intolerantes ao glúten.

Posta esta questão, de facto, não temos nada contra e somos favoráveis à inclusão da dieta vegetariana

como opção para que cada um possa livremente escolher.

Mas voltemos à dieta vegetariana: uma dieta deste tipo exige conhecimentos específicos, alimentares e

nutricionais, que, apesar de simples, não são intuitivos. Por isso, como qualquer outro padrão alimentar, as

dietas vegetarianas podem ser inadequadas e, mesmo, prejudiciais, se mal planeadas. Estas afirmações não

sou eu que as faço, são afirmações que constam no relatório Linhas de orientação para uma alimentação

vegetariana saudável, que já aqui foi mencionado e que é referido nos vários projetos de lei. Só que, ao contrário

da interpretação que nos é sugerida nos textos destes projetos de lei, o relatório não pretende afirmar que a

alimentação vegetariana é necessariamente uma alimentação saudável.

O que este relatório pretende, Srs. Deputados, é dar um contributo para que quem opte livremente por uma

dieta vegetariana o possa fazer com informação suficiente para que ela seja saudável. Esta é uma diferença

que pode parecer subtil, mas é uma diferença. É mais ou menos como «a estrada da Beira e a beira da estrada»:

há uma diferença.

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Muito bem!

A Sr.ª Patrícia Fonseca (CDS-PP): — Este relatório da Direção-Geral de Saúde refere ainda que seguir uma

dieta vegetariana não implica, à partida, mais e melhor saúde. A realidade é que a dieta vegetariana está muitas

vezes associada a um estilo de vida saudável, com mais exercício físico e esse fator pode mascarar a análise

quando se compara um padrão alimentar vegetariano com outros não vegetarianos.

Por isso, mais e melhor saúde depende da escolha e de um estilo de vida saudável de cada um onde a

alimentação é apenas um dos fatores das diversas escolhas.

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Há muitos bons exemplos de refeições voluntárias disponibilizadas nas cantinas públicas, nomeadamente

até no distrito por onde fui eleita, onde, na cidade do Entroncamento, por iniciativa de uma família, a escola

passou a ter refeições vegetarianas, notícia que foi hoje veiculada na TSF.

Concretamente, para terminar, Sr.ª Presidente, no que se refere ao articulado destes projetos de lei queria

deixar duas notas, uma delas que me parece muito relevante, porque a definição de refeição vegetariana que é

aqui mencionada nestes projetos de lei está errada, Srs. Deputados.

O Sr. Amadeu Soares Albergaria (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª Patrícia Fonseca (CDS-PP): — O que aqui é definido como refeição vegetariana elimina todos os

produtos de origem animal.

O Sr. Jorge Duarte Costa (BE): — Nem todos!

A Sr.ª Patrícia Fonseca (CDS-PP): — Como sabem muito bem, isto corresponde a uma alimentação vegana

e não vegetariana.

O Sr. Jorge Duarte Costa (BE): — Não generalize, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Patrícia Fonseca (CDS-PP): — O projeto de lei de Os Verdes faz esta distinção na exposição de

motivos, mas, depois, no articulado do projeto de lei define a refeição vegetariana como vegana.

Não se percebe sobre o que é que os Srs. Deputados pretendem legislar, se é sobre uma refeição vegana e

um modo de vida ou se, de facto, é sobre uma refeição vegetariana.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr.ª Deputada, vai ter de concluir.

A Sr.ª Patrícia Fonseca (CDS-PP): — Vou terminar, mesmo, Sr.ª Presidente.

Quero dar nota também de um lapso no projeto de lei do PAN que, no artigo 6.º, quando determina as

contraordenações não as identifica e, portanto, não conseguimos perceber quais são as contraordenações que

o Sr. Deputado pretende que constem no projeto de lei.

Aplausos do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção em nome do PCP, tem a palavra o Sr. Deputado

João Ramos.

O Sr. João Ramos (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: As cantinas públicas representam uma oferta

alimentar para quem, no seu trabalho, na escola, na universidade, tem de fazer uma refeição fora de casa,

representando uma solução económica. Para além disso, e pela dureza das políticas dos últimos anos, têm sido

o único local onde milhares de crianças fazem a sua única refeição equilibrada do dia.

As cantinas públicas têm uma história longa, mas um conjunto de regras foram impedindo os serviços

públicos de gerirem diretamente as que detinham e elas foram entregues a empresas de grande dimensão,

escolhidas por concursos nacionais. Todo este enquadramento e a necessidade de as empresas concorrerem

entre si para ganharem os concursos tiram margem de manobra a decisões sobre as ementas, qualidade dos

produtos e até a possibilidade de compra de produtos de proximidade. São muitos os casos, nomeadamente

nas escolas, em que foi notada uma quebra na qualidade das refeições com a passagem de cantinas para

empresas.

A questão da relação entre a qualidade dos produtos e a possibilidade de compra de produtos de produção

local já foi tratada aquando da discussão dos projetos sobre consumo local nas cantinas públicas. Essa

qualidade é indissociável não só da produção local como da agricultura familiar, capaz de produzir em qualidade

e diversidade.

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A alimentação tem uma relação estreita com a saúde humana e os hábitos alimentares têm relações estreitas

com diversas patologias. Quanto maiores são as dificuldades económicas ou menores os níveis de formação,

piores tendem a ser os hábitos alimentares. É conhecida a relação existente entre baixos rendimentos e a

obesidade.

Conscientes da relação entre saúde e alimentação, muitos portugueses optam por dietas com as quais

procuram melhorar a sua saúde e a sua qualidade de vida.

Sabemos que existem muitos argumentos contra ou a favor desta ou daquela dieta. Em matéria alimentar,

como em muitas outras, a quantidade desadequada de produtos tem muito mais a ver com eventuais malefícios

do que o seu consumo.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Muito bem!

O Sr. João Ramos (PCP): — Não fazemos a apologia desta ou daquela dieta, até porque algumas dietas,

ao restringirem a utilização de alguns alimentos, procuram a variedade e o equilíbrio nutricional através da

introdução de produtos exóticos ou elaborados a partir de matérias-primas exóticas. Por isso, as preocupações

com a sustentabilidade da alimentação humana devem ter em conta essa realidade. Por isso, também o PCP

não acompanharia posições no sentido de obrigar ou proibir esta ou aquela dieta. A diversidade e as

possibilidades de escolha são a resposta às preocupações com uma alimentação saudável.

Não importa tanto discutir opções alimentares porque haverá posições e argumentos capazes de defender

as diversas opções. O equilíbrio estará numa dieta variada, com pesos diferentes de diferentes grupos

alimentares, mas variada.

As cantinas, pela sua importância no fornecimento de refeições, devem disponibilizar aos seus utilizadores

uma qualidade irrepreensível, mas, tendo em conta que operam, habitualmente, para um universo generalizado

de cidadãos, devem também oferecer uma variedade alimentar que vá ao encontro dos desejos e das opções

alimentares dos seus utilizadores.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção em nome de Os Verdes, tem a palavra a Sr.ª

Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Foram feitas duas críticas que,

julgo, é sensato aceitar.

Uma tem a ver com a questão da definição da ementa vegetariana que, na especialidade, podemos trabalhar

corretamente, e a outra tem a ver com o facto de, eventualmente, o período de adaptação poder ser demasiado

curto, e nós, na especialidade, estamos dispostos a alargar este período de adaptação.

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Muito bem!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Há outras críticas que Os Verdes consideram que não têm

pertinência.

Uma tem a ver com a questão da qualidade oferecida na própria refeição em termos dos seus nutrientes,

pois, se propomos que haja técnicos habilitados a programar essas refeições, é evidente que essa questão

estará assegurada.

Por outro lado, a questão que o PSD coloca dos custos e do desperdício alimentar também não nos parece

pertinente. Porquê? Há uma coisa que tem de ser assegurada, e o Sr. Deputado acabou por dizer que todos

devemos assegurar, que é a liberdade de opção, a liberdade de escolha da dieta alimentar. Se a oferta não for

feita, não há liberdade de escolha.

Em relação ao desperdício alimentar, o que o Sr. Deputado está a dizer é que qualquer cantina que ofereça

dois pratos está a promover desperdício alimentar. Espero que não venha a propor aqui, na Assembleia da

República, que uma forma de combater o desperdício alimentar é que todas as cantinas públicas tenham apenas

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um prato, uma ementa para oferecer. Acho que isso não é correto. O desperdício alimentar tem a ver com a

gestão que se faz dos alimentos e das refeições. Essa é outra discussão completamente diferente.

Para rematar, Sr.ª Presidente, quero dizer o seguinte: compreendo uma crítica que o CDS faz no sentido de

dizer que há outras dietas e outras necessidades, até para efeitos de saúde. Estou em crer, Sr.ª Deputada, que

aos poucos vamos começar a atingir tudo.

Lembra-se, Sr.ª Deputada, que no Orçamento do Estado também propusemos para Programa de Leite

Escolar a introdução do leite sem lactose, mas há outros leites que ficaram de fora e que, eventualmente, vão

ter de ser introduzidos.

Portanto, o que acho é que não temos de querer tudo para ir dando passos para que a liberdade de opção

das pessoas seja assegurada. É esse o contributo que Os Verdes gostariam de dar.

Aplausos de Os Verdes e do PCP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção em nome do Bloco de Esquerda, tem a palavra

o Sr. Deputado Jorge Costa.

O Sr. Jorge Duarte Costa (BE): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Há dois argumentos que se opõem às

propostas apresentadas. Um é o argumento pobre, que foi agora referido, que diz que os custos são uma

objeção. Se os custos fossem uma objeção, a medida que o Parlamento ainda há pouco tempo aprovou, a de

favorecer a produção local e a agricultura familiar, também não teria sido aprovada, porque, se tivermos um

critério económico estrito, é muito mais barato ir comprar à grande produção industrial e à grande distribuição.

O Sr. Cristóvão Norte (PSD): — Ninguém disse isso, mas devíamos ponderar tudo isso!

O Sr. Jorge Duarte Costa (BE): — Aqui também se trata de privilegiar a oferta da qualidade e respeitar a

diversidade das opções.

O segundo é o argumento antivegetariano estrito que nos foi trazido pelo CDS de forma um pouco

surpreendente, porque parece confundir a dieta vegetariana com a dieta tibetana. Parece que enquanto não

houver nas cantinas públicas oferta kosher ou halal não poderá haver oferta vegetariana.

Esse não é um argumento que possa ser trazido ao debate. O vegetarianismo ou a dieta vegetariana não é

uma matéria de opção religiosa, é uma matéria de opção nutricional e dietética e é essa diversidade que deve

ser respeitada.

O que é necessário é que haja equilíbrio na dieta vegetariana, como na dieta omnívora tradicional.

O que acontece a alguém que só coma bife e batatas fritas é o que acontecerá a alguém que só coma alface

e tomate. Mas esse equilíbrio, que tem de estar presente em qualquer das ofertas nas cantinas,…

A Sr.ª Patrícia Fonseca (CDS-PP): — E já está!

O Sr. Jorge Duarte Costa (BE): — … é qualquer coisa que é preciso preparar.

A objeção, como disse também a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, mais razoável que aqui foi levantada

prende-se com o tempo e a necessidade de preparar essa transição.

Sobre isso, penso que aqui se podem construir acordos fortes que nos permitam melhorar essa oferta na

cantina pública, melhorar essa diversidade e respeitar a opção vegetariana que é, hoje, mais generalizada do

que era ainda há pouco tempo e que cada vez mais portuguesas e portugueses optam por fazer.

Aplausos do BE e do PAN.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Srs. Deputados, concluímos assim os trabalhos de hoje.

A próxima reunião plenária realizar-se-á amanhã, a partir das 10 horas, com a seguinte ordem do dia: do

primeiro ponto, consta um agendamento potestativo do PS, sobre economia e empresas e, do segundo ponto,

estão agendadas, sem tempos de discussão, as propostas de resolução n.os 4/XIII (1.ª) — Aprova a Convenção

entre a República Portuguesa e a República Democrática de São Tomé e Príncipe para Evitar a Dupla Tributação

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e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos sobre o Rendimento, assinada em São Tomé, em 13 de

julho de 2015, 5/XIII (1.ª) — Aprova o Acordo entre a República Portuguesa e os Estados Unidos da América

para Reforçar o Cumprimento Fiscal e Implementar o FATCA, assinado em Lisboa, em 6 de agosto de 2015,

6/XIII (1.ª) — Aprova o Acordo entre a República Portuguesa e a República Socialista do Vietname para Evitar

a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos sobre o Rendimento, assinado em

Lisboa, em 3 de junho de 2015, 7/XIII (1.ª) — Aprova a Convenção entre a República Portuguesa e a República

da Costa do Marfim para Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos sobre o

Rendimento, assinada em Lisboa, em 17 de março de 2015, e 8/XIII (1.ª) — Aprova a Convenção entre a

República Portuguesa e o Reino do Barém para Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria

de Impostos sobre o Rendimento, assinada em Manama, em 26 de maio de 2015.

No final do debate, teremos as votações regimentais.

Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 5 minutos.

Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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