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Sexta-feira, 7 de outubro de 2016 I Série — Número 9

XIII LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2016-2017)

REUNIÃOPLENÁRIADE6DEOUTUBRODE 2016

Presidente: Ex.mo Sr. Jorge Lacão Costa

Secretários: Ex.mos Srs. Pedro Filipe dos Santos Alves Sandra Maria Pereira Pontedeira

S U M Á R I O

O Presidente (Jorge Lacão) declarou aberta a sessão às

15 horas e 4 minutos. Deu-se conta da entrada na Mesa dos projetos de lei n.os

307 a 315/XIII (2.ª) e dos projetos de resolução n.os 488 a 492/XIII (2.ª).

Procedeu-se ao debate, na generalidade, do projeto de lei n.º 306/XIII (2.ª) — Altera a Lei de Bases do Sistema Educativo (CDS-PP), que foi rejeitado. Intervieram, a diverso título, os Deputados Ana Rita Bessa (CDS-PP), Susana Amador (PS), Joana Mortágua (BE), Nilza de Sena (PSD), Heloísa Apolónia (Os Verdes), Ana Virgínia Pereira (PCP), Porfírio Silva (PS), Nuno Magalhães (CDS-PP), Emília Santos (PSD), Margarida Mano (PSD), Luís Monteiro (BE) — que também solicitou a distribuição de um documento —, Ana Mesquita (PCP), Amadeu Soares Albergaria (PSD), Paula Santos (PCP), Odete João (PS) e Assunção Cristas (CDS-PP).

Entretanto, o Presidente anunciou à Câmara a nomeação, por aclamação e unanimidade, de António Guterres para Secretário-Geral da ONU (Organização Geral das Nações Unidas).

Posteriormente, foi aprovado, também por aclamação, o voto n.º 136/XIII (2.ª) — De congratulação pela indicação à Assembleia-Geral, pelo Conselho de Segurança, de António Guterres para o cargo de Secretário-Geral da Organização das Nações Unidas (Presidente da AR, PS, PSD, BE, CDS-PP, PCP, Os Verdes e PAN), ao qual se associou o Governo, pela voz do Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (Pedro Nuno Santos), tendo ainda usado da palavra os Deputados Luís Montenegro (PSD), Carlos César (PS), Pedro Filipe Soares (BE), Nuno Magalhães (CDS-PP), João Oliveira (PCP) e Heloísa Apolónia (Os Verdes).

O Presidente (Jorge Lacão) encerrou a sessão eram 17 horas e 43 minutos.

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O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 4 minutos.

Como é do vosso conhecimento, o Presidente da Assembleia da República encontra-se, durante os dias de

hoje e de amanhã, em Bratislava, na Cimeira Informal dos Presidentes dos Parlamentos da União Europeia.

Cumpre-me, portanto, em sua substituição, presidir à sessão de hoje.

Peço aos Srs. Agentes da autoridade o favor de abrirem as galerias.

Peço também ao Sr. Secretário da Mesa, Deputado Pedro Alves, o favor de dar conta do expediente.

O Sr. Secretário (Pedro Alves): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, informo que deram entrada na

Mesa, e foram admitidos, os projetos de lei n.os 307/XIII (2.ª) — Cria um novo regime jurídico para combater o

assédio no local de trabalho (BE), que baixa à 10.ª Comissão, 308/XIII (2.ª) — Procede à sexta alteração à Lei

Eleitoral dos Órgãos das Autarquias Locais, aprovada pela Lei Orgânica n.º 1/2001, de 14 de agosto (BE), que

baixa à 1.ª Comissão, 309/XIII (2.ª) — Alarga o regime de transmissão por morte do arrendamento para

habitação e garante a transmissão por morte no realojamento para habitação por obras ou demolição (PCP),

que baixa à 11.ª Comissão, 310/XIII (2.ª) — Prorroga por 10 anos o prazo de aplicação do novo regime de

arrendamento urbano para os arrendatários com rendimento anual bruto corrigido (RABC) inferior a cinco

retribuições mínimas nacionais anuais (RMNA) para os arrendatários com idade igual ou superior a 65 anos ou

com deficiência igual ou superior a 60% e para o arrendamento não habitacional (PCP), que baixa à 11.ª

Comissão, 311/XIII (2.ª) — Extingue o Balcão Nacional do Arrendamento e repõe o procedimento especial de

despejo por via judicial (PCP), que baixa à 11.ª Comissão, 312/XIII (2.ª) — Garante o realojamento em caso de

obras em prédios arrendados (Quarta alteração ao Decreto-Lei n.º 157/2006, de 8 de agosto – Regime Jurídico

das Obras em Prédios Arrendados, primeira alteração à Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro — Novo Regime do

Arrendamento Urbano e 70.ª alteração ao Código Civil) (PCP), que baixa à 11.ª Comissão, 313/XIII (2.ª) —

Reforça a proteção dos arrendatários em caso de cessação de contrato de arrendamento (Terceira alteração à

Lei n.º 6/2006, de 27 fevereiro, alterada pela Lei n.º 31/2012, de 14 de agosto, e pela Lei n.º 79/2014, de 19 de

dezembro — Novo Regime do Arrendamento Urbano) (PCP), que baixa à 11.ª Comissão, 314/XIII (2.ª) —

Procede à sexta alteração à Lei n.º 19/2003, de 20 de junho, introduzindo medidas de justiça fiscal, igualdade

de tratamento e de transparência no financiamento dos partidos políticos e campanhas eleitorais (BE), que baixa

à 1.ª Comissão, e 315/XIII (2.ª) — Converte em definitivas e permanentes as reduções nas subvenções públicas

para o financiamento dos partidos políticos e para as campanhas eleitorais e nos limites máximos das despesas

de campanha eleitoral (PSD), que baixa à 1.ª Comissão.

Deram ainda entrada na Mesa os projetos de resolução n.os 488/XIII (2.ª) — Pela recuperação da Escola

Alexandre Herculano, no Porto (PS), que baixa à 8.ª Comissão, 489/XIII (2.ª) — Recomenda a reativação do

projeto do metro do Mondego e a sua inclusão no plano de investimentos ferroviários 2016-2020 (BE), que baixa

à 6.ª Comissão, 490/XIII (2.ª) — Pelo pagamento das compensações devidas aos trabalhadores despedidos da

Casa do Douro (BE), que baixa à 7.ª Comissão, 491/XIII (2.ª) — Recomenda ao Governo que proceda ao reforço

da dotação orçamental do Programa de Desenvolvimento Rural (CDS-PP), que baixa à 7.ª Comissão, e 492/XIII

(2.ª) — Programa de ações específicas ligadas ao afastamento e à insularidade (POSEI) (PSD), que baixa à 7.ª

Comissão.

É tudo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sr.as e Srs. Deputados, auguro que durante a tarde de hoje cheguem

notícias memoráveis para Portugal, mas este é o momento de nos concentrarmos na ordem do dia que, como

sabem, é marcada por um agendamento do CDS-PP, de apreciação, na generalidade, do projeto de lei n.º

306/XIII (2.ª) — Altera a Lei de Bases do Sistema Educativo.

Quero ainda chamar a atenção dos Srs. Deputados que após a apreciação deste ponto da ordem de trabalhos

teremos votações.

Para apresentar o diploma, dou a palavra à Sr.ª Deputada Ana Rita Bessa.

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A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O CDS anunciou nesta Câmara,

na semana passada, a apresentação de um projeto de revisão da Lei de Bases do Sistema Educativo.

As reações dos partidos à esquerda, ainda antes de o terem analisado, estudado, discutido ou de sequer o

terem lido, foram de aberta hostilidade. Agora, que já tiveram ocasião de conhecer o projeto, esperamos que o

considerem como ele é: uma oportunidade para apresentarem as vossas ideias e os vossos contributos para a

melhoria da Lei.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — A nossa proposta, que é indubitavelmente do CDS, é apenas o ponto

de partida. Ao encontro da nossa, esperamos as vossas propostas. Esperamos nós, no CDS, mas mais do que

isso, esperam as comunidades educativas — alunos, pais, professores, diretores e não docentes —, que

insistentemente pedem a este Parlamento estabilidade, previsibilidade e confiança.

Aplausos do CDS-PP.

Com esta iniciativa, o CDS pretende abrir uma discussão sobre a Lei de Bases do Sistema Educativo,

passados 30 anos da sua entrada em vigor, para que se fixem algumas regras que garantam a estabilidade do

sistema e para que a educação deixe de ser um palco de arremesso político e ideológico com elevados custos

para escolas e famílias de todo o País.

Passados 30 anos o mundo mudou, mudou o País, mudaram os alunos e a escola também tem de mudar.

Saber acompanhar a mudança, fazer evoluir a base do sistema educativo é essencial para que o País não fique

estagnado em 2016 ou, pior ainda, aprisionado em 1986.

Aplausos do CDS-PP.

Sr.as e Srs. Deputados, num Mundo 3.0 não podemos ficar com uma lei do tempo da telescola.

A proposta que aqui trazemos assume, naturalmente, e sem complexos, o ADN do CDS, ou seja, princípios

que sempre defendemos por consideramos que assim se constrói um sistema inclusivo, capaz de chegar a mais

alunos e mais pais, garantindo que estes têm condições para uma participação ativa na vida escolar dos seus

filhos e melhor possam conciliar vida profissional e vida familiar, propondo, nesse sentido, que se equacione a

revisão do calendário escolar.

A maior participação dos pais sobre as decisões da vida escolar dos seus filhos é uma das ideias essenciais

que entendemos ter dignidade para que conste da Lei de Bases do Sistema Educativo.

Outro dos aspetos centrais da nossa proposta prende-se com matérias que têm estado em cima da mesa ao

longo dos anos, dando origem a sucessivas alterações ou ameaças de alterações, como é o caso dos conceitos

de «autonomia» e de «descentralização». São conceitos que devem estar consagrados na Lei de Bases do

Sistema Educativo, clarificados de modo a que todos neles se revejam. Foi importante, e porventura até positivo,

um período de experimentação, mas hoje é premente que sejam integrados na Lei, para que se tornem

consistentes e consequentes e para que se acabe o tempo dos reveses políticos à custa do sistema educativo.

Também a reorganização dos ciclos de ensino em dois grandes ciclos de seis anos — básico e secundário,

essencialmente abolindo o segundo ciclo, que não dá continuidade ao primeiro nem prepara devidamente os

alunos para o seguinte — é uma das linhas estruturantes da nossa proposta.

Pretende-se a clarificação de uma orientação pedagógica que dê sentido ao percurso da escolaridade

obrigatória e não seja uma manta de retalhos que encontra na História a sua principal justificação.

De resto, e como certamente saberão, esta é uma ideia há muito tempo defendida quer por ex-ministros do

PS, como o Prof. Júlio Pedrosa, e do PSD, como o Prof. David Justino, quer por académicos, como o Prof. João

Formosinho ou o Prof. Sérgio Niza, quer também na recente reflexão promovida pelo CNE (Conselho Nacional

de Educação) sobre a Lei de Bases do Sistema Educativo, encontrando ainda suporte internacional na realidade

de variadíssimos países europeus.

A universalização da educação pré-escolar aos três anos de idade e a obrigatoriedade aos cinco, abrangendo

todas as redes de jardins de infância, estatais e não estatais, é também uma das bases que apresentamos. A

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educação pré-escolar é o tempo adequado para um conjunto de rastreios iniciais da motricidade, da audição, da

visão, do treino de competências potenciadoras da aprendizagem, da sociabilização. Quanto mais crianças, e

em particular aquelas que vêm de contextos desfavorecidos, acederem a este tipo de intervenção, maior

oportunidade de acesso ao sucesso escolar lhes estaremos a dar.

Aplausos do CDS-PP.

Nenhuma destas ideias é um mero floreado a integrar numa lei com este peso, com este significado e que

se pretende duradoura.

Sr.as e Srs. Deputados, não vimos aqui propor medidas bruscas, de supetão, criando ruturas, nem é nosso

objetivo fazer desta proposta um ataque político ao que foi feito até aqui.

Não nos servimos da educação para processos revolucionários. Propomos uma transformação evolutiva,

uma nova lei de bases, com uma necessária progressão, feita sem sobressaltos, a partir de conceitos

estabilizados e sobretudo de um compromisso, para bem de todos, partindo deste Parlamento, o local certo para

desencadear um processo legislativo.

Aplausos do CDS-PP.

No Parlamento, porque é a nossa responsabilidade, ouvindo e participando em todos os debates com todos

os agentes da comunidade educativa, começando pelo CNE mas também os alunos, as famílias, os sindicatos,

os diretores, a academia e, claro, os professores, a quem daqui cumprimento, no primeiro Plenário após a

celebração do Dia Mundial do Professor.

Aplausos do CDS-PP.

É precisamente aqui, no Parlamento, que a discussão deve iniciar-se e completar-se, primeiro num debate

de generalidade, depois dando espaço a todos os contributos e toda a ponderação e, finalmente, chegando ao

momento final do compromisso que poderá gerar a necessária estabilidade para os 30 anos que se seguem.

Porque são os próximos 30 anos a razão de ser deste debate.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — É que podemos continuar a atirar culpas ou podemos começar a

preparar os próximos 30 anos e é para o futuro que temos de adaptar-nos e mudar, mudar com estabilidade e

mudar com previsibilidade.

Foi isto mesmo que nos pediu o Presidente da República, na abertura do ano letivo no CNE — e cito: «Saber

compatibilizar a mudança com o mínimo de estabilidade e previsibilidade no sistema e adequada relevância aos

valores verdadeiramente duradouros é a maior dificuldade na definição e execução das políticas educativas.

Não é possível, não é desejável que cada governo, cada maioria que chega ao poder queira rever, reformar tudo

o que se lhes afigura contradizer posturas doutrinárias ou promessas eleitorais, as mais das vezes sem avaliação

prévia de regimes vigentes, e o façam de supetão, instantaneamente, aos soluços, casuisticamente, de acordo

com a inspiração política (…). Não mudar não é solução. Saber mudar em clima de estabilidade e previsibilidade

é o talento indispensável».

É esta estabilidade que o CDS quer ver consagrada na Lei de Bases, sem introdução de ruturas durante seis

anos, com avaliações do que foi conseguido, para que a mudança seja previsível e sempre para melhor.

É que se não houver previsibilidade, mudam manuais e aumenta o custo para as famílias; mudam programas

e aumenta o esforço dos professores; mudam instrumentos de avaliação e podemos até facilitar, mas deixamos

de saber se melhorámos alguma coisa.

Aplausos do CDS-PP.

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Sr.as e Srs. Deputados: O CDS apresenta aqui as suas ideias, mas não se trata, nem se poderia tratar, com

toda a seriedade, de uma proposta fechada; trata-se de um ponto de partida.

Não nos move a esgrima política. O que nos move é o desencadear de um processo que deve resultar num

documento consensual, numa visão para a educação, para uma evolução consistente e tranquila do modelo que

hoje temos para um modelo que todos consideremos ser melhor para o País.

Hoje, esperamos que esta proposta seja viabilizada e levada à Comissão para que, democraticamente, sejam

recebidos todos os contributos e ponderadas todas as soluções que possam sustentar os próximos 30 anos de

um sistema do qual todos nos queremos orgulhar.

Esta é a nossa proposta, sem ataques, sem processos de intenção, sem passar culpas.

Esta, Sr.as e Srs. Deputados, é a nossa responsabilidade, a de preparar o futuro.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Inscreveram-se cinco Srs. Deputados para pedir esclarecimentos. A

Mesa está informada de que a Sr.ª Deputada Ana Rita Bessa deseja responder um a um.

Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, a Sr.ª Deputada Susana Amador.

A Sr.ª Susana Amador (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Ana Rita Bessa, mais uma vez, saúdo-a,

assim como ao CDS, por trazer o tema da educação a esta Câmara. Vou colocar-lhe duas perguntas, sendo a

primeira a seguinte: o que é indispensável e urgente mudar, hoje, no sistema educativo que não possa ser feito

sem as alterações legislativas hoje propostas pelo CDS a esta Lei de Bases?

A segunda pergunta é esta: quais os estudos, qual a reflexão alargada em que se alicerça esta Lei de Bases?

Não deveria esta discussão ser efetuada da base para o topo e não o inverso? Não deverá o conhecimento e a

auscultação preceder a ação política?

O que é que vos move? Acima de tudo, espero que aquilo que vos possa mover seja a valorização da escola

pública e a construção de uma escola para o século XXI. O PS sempre fez a defesa dessa escola, e continuará

a fazer, tendo em conta que a última alteração à Lei de Bases, em 2009, que visava o alargamento para 12 anos

da escolaridade obrigatória bem como a universalização do pré-escolar, foi aprovada com um largo consenso

nesta Câmara.

Convocam-nos para o consenso e para a estabilidade. Mas esse consenso e essa estabilidade devem, a

nosso ver, ser precedidos de um tempo de auscultação, de um tempo de conhecimento. Celebram-se agora os

30 anos da Lei de Bases, em que também está envolvido o Conselho Nacional de Educação, cujos estudos e

análises também gostaríamos de conhecer. Não conhecemos porque estas comemorações ainda não chegaram

ao fim. Daí que pergunte se, neste processo todo, não haverá alguma precipitação.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Rita Bessa.

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Susana Amador, em relação às suas

perguntas, registo, antes de mais, que o PS aceita a premissa de que é preciso rever a Lei de Bases, que, de

facto, há um trabalho a fazer nessa matéria.

De resto, na semana passada, quando introduzimos este tema na declaração política, o Sr. Deputado Porfírio

Silva até me acusou de alguma irresponsabilidade, perguntando se eu teria consciência da quantidade de

debates, colóquios, artigos e discussões, do Conselho Nacional de Educação, do Sr. Presidente da República,

enfim, de tudo o que era necessário fazer e ouvir para formar opiniões.

O Sr. Deputado disse até que eu estaria a desrespeitar a educação, em Portugal, na medida em que

apresentava no Parlamento — veja-se o sítio estranho que o CDS escolheu para desencadear um processo

legislativo, o Parlamento!… — uma proposta para ser votada hoje.

O Sr. NunoMagalhães (CDS-PP): — Passa-nos cada coisa pela cabeça!…

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A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Portanto, para o PS, tenho duas palavras: proposta e responsabilidade.

Proposta é aquilo que o CDS traz aqui hoje, depois de um longo trabalho de auscultação que fizemos no terreno

e que não impede, não retira,…

Protestos da Deputada do PCP Paula Santos.

… inclui, até, muito daquilo que o CNE já foi ouvindo e trabalhando no seio dos 10 debates que tem previstos,

para além de que ouvimos diretores, associações e pais, o que inclusivamente gerou uma jornada aberta a todos

no final de julho.

Em todo o caso, trazemos aqui uma proposta. É um ponto de partida, não é o fim, é o desencadear de um

processo no qual caberão todas as outras informações, todas as outras audições de que a Sr.ª Deputada dava

conta.

A segunda palavra que tenho para o PS é responsabilidade. Acho que é isso que se pede hoje aqui ao PS,

ou seja, responsabilidade de apresentar os seus contributos, aqui, no Parlamento, que é a sede própria para

desencadear este processo. É aqui que se pede ao PS que, sem ter certezas, venha a debate e traga as suas

propostas para a educação a 30 anos.

Ou o PS quer ser consequente e rever a Lei de Bases, trazendo as suas propostas que, se melhorarem a

Lei atual, nos enriquecem a todos, ouvindo o CNE, de facto, como porventura não terá feito quando alterou a

avaliação, ouvindo também professores, diretores, pais e alunos, alunos que tanto têm a dizer sobre isto e que,

como o Sr. Deputado Porfírio Silva sabe, ainda na passada sexta-feira nos fizeram chegar muitas das suas

queixas, sendo a principal delas a necessidade de estabilidade… Portanto, ou o PS quer ser consequente e

trazer as suas opiniões ou o PS esconde dos portugueses qual é a sua visão para a educação, receio eu, por

taticismo, por medo de trazer a lume as diferenças que tem com os partidos que suportam o Governo, com o

PCP e com o Bloco de Esquerda, e acaba por chumbar aquilo em que o próprio PS acredita e que está proposto

na nossa lei de bases, como, por exemplo, os dois ciclos de seis anos, a universalização do pré-escolar, a

autonomia e a descentralização.

Como é que vai ser, Srs. Deputados? Vão ser consistentes ou vão votar contra as vossas próprias ideias?

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — A Mesa chama a atenção para que não condicionará nem o tempo das

perguntas nem o tempo das respostas, uma vez que o mesmo é descontado no tempo global atribuído a cada

grupo parlamentar.

Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Joana Mortágua.

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Ana Rita Bessa, ninguém compreende muito

bem a razão deste debate agora. Vamos ver se até ao final do debate conseguimos compreender o que é que

leva o CDS a vir aqui, agora, com uma proposta de revisão da Lei de Bases do Sistema Educativo.

Mas, até lá, permita-nos suspeitar: suspeitar que esta revisão seja um cavalo de Troia para que, a pretexto

de uma revisão geral de uma lei pretensamente desatualizada, o CDS consiga colocar na lei aquilo que o País

recusou abertamente, que é retirar ao Estado a responsabilidade de criar uma rede de estabelecimentos de

ensino e de educação que cubra as necessidades de toda a população, fazendo aquilo que o País recusou, ou

seja, fazer dos contratos de associação a regra da escola neste País.

Assim, uma das perguntas é: quer ou não o CDS mudar a Constituição através de uma alteração da Lei de

Bases? Isto é ou não um cavalo de Troia? Ou será dissimulação? Ou será arrependimento?

Por que é que o CDS vem aqui propor uma valorização do papel dos encarregados de educação e dos pais

na gestão democrática das escolas, quando pertenceu a uma maioria parlamentar e a um Governo que retirou

os pais dos conselhos pedagógicos? Porquê? Porquê esta contradição?

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Bem lembrado!

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A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — É bom lembrar que o CDS já fez parte de uma maioria parlamentar e,

portanto, o País sabe bem o que é que o CDS quer, de bem ou de mal, quanto à escola pública. O País lembra-

se que a Presidente do CDS, Assunção Cristas, já veio dizer que devia ser a escola pública a ser sacrificada,

em vez da escola privada. O CDS tem as mãos manchadas do ataque à escola pública.

Isto, Sr.ª Deputada, para chegar a esta questão: o CDS já fez parte de uma maioria parlamentar; o CDS é,

hoje, minoria mas já foi maioria. Por que é que, na altura, o CDS não quis rever a Lei de Bases? Por que é que

não apresentou esta proposta, na altura?

Deixe-me arriscar uma sugestão de resposta: o CDS não propôs uma alteração à Lei de Bases quando podia

fazê-lo, quando podia aprová-la, porque sabia que o País não a queria, porque sabia que não tinha maioria

social para ela, porque sabia que estava isolado nesta proposta de querer fazer dos contratos de associação e

do ensino privado a regra da educação, em Portugal.

Já agora, para terminar, deixo-lhe outra pergunta relativamente à estabilidade. Onde é que a Sr.ª Deputada

estava quando Nuno Crato mudou tudo em poucos meses?

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Rita Bessa.

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Joana Mortágua, a argumentação do

Bloco de Esquerda a propósito deste nosso projeto de lei tem essencialmente a ver com dois temas: por um

lado, com o facto de o Bloco de Esquerda estar aparentemente satisfeito com a atual Lei de Bases e, por outro,

com o facto de o CDS ter um problema com o consenso que ela reflete e nós, na verdade, do que gostávamos

era de um consenso diferente.

A verdade é que não sabemos o que é que o Bloco de Esquerda teria votado, em 1986, em relação a esta

Lei, porque, nessa altura, o Bloco não existia, mas, se calhar, sabemos. É que, Sr.ª Deputada, eu estive a

estudar o assunto e descobri que, em 2003, quando a Lei de Bases fez 17 anos, houve aqui um debate a

propósito da sua revisão. E, como tenho tempo, vou ler, com alguma calma, aquilo que foi dito pelo Bloco de

Esquerda, na altura, designadamente pelo Sr. Deputado João Teixeira Lopes.

Dizia ele: «Em 17 anos, foi todo o País que se transformou: mudou a empresa, mudou a família, mudou a

rua, mudou a televisão; foi um País que mudou, e mudou sabendo que podia mudar e que precisava da escola,

da qualificação, da mobilidade social que só ela permite» — altura em que o Sr. Deputado Luís Fazenda diz:

«Muito bem!»

E o Sr. Deputado João Teixeira Lopes segue dizendo: «Nunca os portugueses depositaram tanta confiança

e expectativa na escola e nunca a escola teve tão pouco para lhes oferecer. Chegou a vez, portanto, de mudar

a escola. Por isso, é tão importante o debate que aqui hoje continuamos. A Lei de Bases do Sistema Educativo,

atualmente em vigor, foi um importante avanço conceptual, mas o País que retrata já não é o mesmo. A reflexão

sobre as mudanças a introduzir na escola, reflexo das mudanças na sociedade, é também fruto do avanço do

conhecimento científico». E note agora, Sr.ª Deputada: «É por isso que o projeto do Bloco de Esquerda propõe

um novo desenho de ciclos, dividido entre ensino médio e secundário. Por isso, defendemos que os primeiros

seis anos correspondam ao ensino básico, reunindo o primeiro e segundo ciclos, correspondendo, de resto, ao

que se passa na grande maioria dos países da União Europeia».

Aplausos do CDS-PP.

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — E então?!

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Mais à frente, diz: «Todas as crianças devem ter direito a uma educação

para a infância. Em zonas desertificadas ou economicamente deprimidas, no caso de crianças com famílias de

baixos níveis de qualificação ou de poder económico, deve ser alargada às crianças com mais de três anos a

educação de infância, prevenindo as desvantagens educativas» — nesta altura, a Sr.ª Deputada Joana Amaral

Dias diz: «Muito bem!».

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A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Portanto, Sr.ª Deputada, vamos lá ver se nos entendemos: afinal,

sabemos que duas das grandes linhas estruturantes que acabei de dizer que apresentávamos na nossa proposta

são defendidas pelo Bloco de Esquerda. Sr.ª Deputada, vai votar contra si própria?! É que este vício da oposição,

levado ao limite, vira-se contra si própria, Sr.ª Deputada.

Assim, pergunto-lhe: como é que vai ser? Os senhores não podem «comer o bolo e ficar com ele no prato».

Não podem estar no Governo e na oposição ao mesmo tempo!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Portanto, como é que vai ser? Vai votar contra si própria ou vai acolher

as propostas do CDS para discussão futura?

Aplausos do CDS-PP.

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Não! Vou votar contra o CDS!

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Nilza de Sena.

A Sr.ª Nilza de Sena (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Ana Rita Bessa, começo por cumprimentar o

CDS por este contributo. É um contributo válido, um contributo útil, um contributo que acresce a outros que virão,

e o PSD tem todo o interesse em fazer uma discussão séria e distendida sobre esta matéria, que é uma lei-

matriz de todo o sistema educativo e à qual todos nos devemos vincular.

Sr.ª Deputada, sem prejuízo da anuência a que esta discussão é útil, tenho, no entanto, algumas dúvidas

que gostava de colocar-lhe. E, não podendo escolher muitos dos pontos em que o CDS propõe alteração, há

aqui dois ou três sobre os quais gostaria de a ouvir.

O primeiro ponto é sobre a proposta que o CDS faz de tornar progressivamente obrigatória a escolaridade

aos cinco anos de idade. Sabemos que temos uma taxa de pré-escolarização que ronda os 96,5%, pelo que é

uma nota positiva para o País. No âmbito internacional, poucos sistemas estendem a escolarização por 12 anos,

como, aliás, ocorreu por força do nosso Governo, na Legislatura anterior. Portanto, o que pergunto, Sr.ª

Deputada, é como é que, apesar de termos esta pré-escolarização, o CDS assume esta questão como uma

questão absolutamente essencial. Nós sabemos que, na Europa, temos apenas um País, que é a Holanda, que

tem o sistema que o CDS propõe. Portanto, perguntava quais são as perspetivas, sobretudo, de impacto desta

medida específica.

A segunda questão, Sr.ª Deputada, tem a ver com a organização do sistema de ensino básico, que é o artigo

8.º, em que o CDS também propõe uma alteração para apenas dois ciclos. No fundo, absorvendo o atual 3.º

ciclo no secundário.

Pergunto à Sr.ª Deputada quais foram os critérios subjacentes à existência desta proposta e se o CDS

estimou o impacto que ela porventura poderá ter, quer a nível de recursos logísticos, físicos, humanos, quer até

em termos de organização curricular dos próprios ciclos.

Deixo uma última nota, Sr.ª Deputada, para lhe perguntar, uma vez que a Lei de Bases também incide na

área do ensino superior, por que é que o CDS não propõe mais medidas nesta área.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Rita Bessa.

A Sr.ª AnaRitaBessa (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Nilza de Sena, agradeço as suas

perguntas.

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Começo por responder à sua última pergunta: a razão pela qual nos concentrámos no ensino não superior

foi porque, como sabe, das três alterações que já houve à Lei de Bases duas de principal monta foram fixadas

no ensino superior. Deste modo, entendemos que já existe um trabalho e uma atualização nessa frente.

O Sr. NunoMagalhães (CDS-PP): — Muito bem!

A Sr.ª AnaRitaBessa (CDS-PP): — No que diz respeito à escolarização obrigatória aos cinco anos, como

sabe, um dos grandes problemas do nosso sistema é a elevada taxa de insucesso no segundo ano de

escolaridade, em que se estima a retenção de cerca de 11 000 alunos nesse ano escolar.

Sabemos também que a grande maioria das escolas onde isso acontece estão situadas em distritos onde

correlacionadamente existe falta do ensino pré-escolar. Por exemplo, Lisboa, Setúbal e Faro são os distritos

onde principalmente ocorrem estes dois fatores: insucesso escolar no 2.º ano e carência de oferta no pré-

escolar.

Parece-nos, portanto, que é crucial fazer crescer a rede de maneira a garantir que todas as crianças, aos

cinco anos, consigam estar na escola, porque sabemos que este é, de certeza, um fator preventivo do insucesso

escolar que terão mais à frente.

Em relação ao que a Sr.ª Deputada me perguntou sobre o ensino secundário, é evidente que todas as

propostas que fazemos para a alteração dos ciclos em dois, quer no secundário, quer, a montante, no básico,

têm repercussões, desde logo no currículo, depois nos professores e também no edificado — por isso,

introduzimos a questão do gradualismo —, e, portanto, as propostas têm de ser ponderadas e discutidas até do

ponto de vista da capacidade orçamental.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa

Apolónia.

A Sr.ª HeloísaApolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Ana Rita Bessa, em primeiro lugar,

saúdo o CDS pelo facto de ter trazido ao seu agendamento potestativo a matéria da educação, porque acho

que, independentemente das ideias divergentes que possamos ter, é um tema relevantíssimo a debater.

Devo, evidentemente, pronunciar-me em concreto sobre o projeto de lei que o CDS apresenta. Nesse sentido,

face aos quatro grandes objetivos que são apresentados e devidamente explicados no preâmbulo desse

diploma, devo dizer que me indignei logo com o primeiro, em que o CDS propõe a consagração da estabilidade

das políticas educativas. E por que é que eu me indignei, Sr.ª Deputada? Porque me lembro do que se passou

na Legislatura passada, em que por acaso, ou não, o Governo era PSD/CDS e a maioria parlamentar era

justamente PSD/CDS.

Nessa Legislatura, vimos uma revisão ou uma reforma curricular, como lhe queiram chamar, sem discussão

com os agentes educativos — e acho que é muito relevante dizer isto, Sr.ª Deputada —, feita à pressa, de uma

forma impositiva, sem discussão com os próprios interessados e em que um dos grandes objetivos era a

consagração das disciplinas-mãe, o Português e a Matemática, e a descredibilização de outras disciplinas

fundamentais à educação das nossas crianças e dos nossos jovens, designadamente as da componente

artística.

Lembro, Sr.ª Deputada, o que fizeram aos professores e ao par pedagógico nas disciplinas de Educação

Visual, ou o que não quiseram fazer.

Lembro a forma como os senhores aumentaram o número de alunos por turma, retirando, portanto, maiores

condições de aprendizagem nas salas de aula. E os professores que estão no terreno bem se queixaram dessa

matéria, Sr.ª Deputada! Dificultaram as tarefas de aprendizagem na sala de aula.

Lembra-se, Sr.ª Deputada, do despedimento em massa de professores feito pelo anterior Governo?

Vozes do PCP: — Bem lembrado!

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A Sr.ª HeloísaApolónia (Os Verdes): — Era, de resto, um dos objetivos da reforma curricular e do próprio

aumento do número de alunos por turma. O Governo anterior foi, talvez, dos governos que mais desrespeitou

os professores em Portugal. E poderíamos galopar nos argumentos do desinvestimento na educação, da

redução da ação social escolar, da forma como aplicaram a PACC (Prova de Avaliação de Conhecimentos e

Capacidades), aquela célebre prova de avaliação dos professores que não avaliava coisíssima nenhuma.

Sr.ª Deputada, isto para dizer que o primeiro objetivo anunciado pelo CDS no seu projeto de lei, que é o da

estabilidade, soa claramente a falsidade. Não tem outro nome!

Vozes do PCP: — Muito bem!

A Sr.ª HeloísaApolónia (Os Verdes): — Por outro lado, Sr.ª Deputada, relativamente aos outros três grandes

objetivos que são traçados sobre a matéria da educação pré-escolar aos três anos, evidentemente, é uma

questão que já está anunciada, é uma questão que queremos ver implementada. Não há novidade nenhuma no

que o CDS aqui traz.

Sobre a questão da descentralização, se o CDS com isto quer dizer municipalização, digo claramente que

não somos favoráveis a essa matéria, não somos favoráveis a meios diferenciados em função das

desigualdades territoriais que este País tem. Não! Entendemos que a educação deve ser um fator de promoção

de igualdade e de robustecimento dessa igualdade.

Por outro lado, e por fim, sobre a matéria dos contratos de associação, Sr.ª Deputada, não é novidade

nenhuma se eu lhe disser que Os Verdes são favoráveis aos contratos de associação apenas quando não existe

oferta pública. Já temos tido aqui, na Assembleia da República, esta discussão por diversas vezes.

É por isso, Sr.ª Deputada, que não me parece que a iniciativa do CDS seja profundamente credível e talvez

a única vantagem que ela tenha na sua apresentação seja o debate que se deve continuar a fazer sobre

educação.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Rita Bessa.

A Sr.ª AnaRitaBessa (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, agradeço a forma

tranquila como colocou as suas questões.

Registo que se indignou com uma série de medidas que o Governo anterior tomou. Poderia continuar a

indignar-se com a forma como várias outras medidas foram tomadas por este Governo, exatamente nos mesmos

termos, sem essa reflexão, sem essa antecipação, sem essa preparação.

A verdade é que, se continuarmos sempre a olhar para trás, para o que foi o sistema educativo, vamos

continuar a indignar-nos com muitas alterações que foram feitas e com as quais não concordamos e revoltarmo-

nos e moermo-nos e desmoermo-nos.

A proposta que trazemos aqui hoje — e disse-o, quando a apresentei na tribuna, sem fazer qualquer ataque,

sem qualquer processo de intenção e sem passa-culpas — é virada para os próximos 30 anos. Nessa matéria,

registo, Sr.ª Deputada, que concorda connosco, ou seja, que é necessário introduzir estabilidade no sistema

educativo, e concorda também que é necessário tratar a universalização do pré-escolar.

Apesar de a Sr.ª Deputada ter falado apenas dos quatro principais pontos, admito que, se ler com atenção a

proposta de alteração, encontrará muitas outras matérias em que eventualmente até temos pontos de

entendimento.

Portanto, Sr.ª Deputada, pergunto-lhe a si também: como é que vai ser? Vai votar contra si própria ou vai

votar a favor da estabilidade do sistema, que também acha necessária?

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Virgínia

Pereira.

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A Sr.ª Ana Virgínia Pereira (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Ana Rita Bessa, justificou a proposta do

CDS com a desatualização da Lei de Bases do Sistema Educativo. O que é que está desatualizado nesta Lei,

Sr.ª Deputada? Será a promoção da democratização do ensino como princípio geral, que eliminaram da vossa

proposta?

Vozes do PCP: — Bem lembrado!

A Sr.ª Ana Virgínia Pereira (PCP): — Permita-me ainda que lhe diga, Sr.ª Deputada, que é no mínimo

singular que uma legislação construída durante meses a fio e na qual participaram largos milhares de pessoas

da comunidade educativa — associações e representantes dos trabalhadores, das autarquias, dos partidos

políticos — seja agora alvo de um processo de alterações apressado e com um único objetivo, o de garantir aos

grupos privados o negócio da educação.

A Sr.ª RitaRato (PCP): — Exatamente!

A Sr.ª Ana Virgínia Pereira (PCP): — É ou não verdade, Sr.ª Deputada, que as propostas que o CDS traz

hoje a debate radicam essencialmente na inclusão do vosso conceito de rede escolar pública, ou seja, público,

privado e cooperativo e profissional privado, para, de facto, garantir aos colégios privados os clientes que lhes

permitem assegurar negócio em nome de uma liberdade de escolha que na prática corresponde ao

financiamento público do lucro privado?

Ademais, como pode falar-se de estabilidade das políticas educativas, Sr.ª Deputada, quando o Governo do

qual o CDS fez parte criou a maior instabilidade de que há memória ao deixar professores no desemprego, com

as vidas suspensas em relação a uma colocação incerta, ao deixar alunos sem professores a cada início de ano

letivo?

Ainda nos lembramos de o ex-Ministro Crato ter pedido desculpa aos portugueses. Lembra-se, Sr.ª

Deputada?

Lembra-se de terem imposto a PAAC, afastando milhares de professores do exercício da sua profissão,

quando toda a comunidade educativa se opunha?

Não, Sr.ª Deputada, a estabilidade do sistema educativo adquire-se cumprindo a Constituição, garantindo os

direitos aí consagrados para as famílias, para os alunos, para todos os trabalhadores da educação. Consegue-

se com uma escola democrática, financiada de acordo com as suas missões, centrada no aluno e nas suas

necessidades. Garante-se quando a escola for um espaço e um tempo onde os alunos gostem de estar e onde

os profissionais da educação se sintam respeitados e valorizados.

Vozes do PCP: — Muito bem!

A Sr.ª Ana Virgínia Pereira (PCP): — Sr.as e Srs. Deputados, a promoção do sucesso escolar propalada

pelo CDS desfaz-se ao olharmos para a sua prática governativa e verificarmos que não foram adotadas medidas

concretas para o combate ao insucesso e ao abandono escolar e que foram criadas vias de elitização e de

segregação na escola pública, reproduzindo as assimetrias sociais existentes e aumentando o número de alunos

por turma.

Sr.ª Deputada Ana Rita Bessa, as propostas que o CDS hoje apresentou passam ao lado dos problemas

com que a escola pública se confronta, ao não apresentar uma só ideia para a eliminação das assimetrias

sociais, para o abandono escolar, para a redução do número de alunos por turma, para a valorização dos

trabalhadores da educação.

A Sr.ª RitaRato (PCP): — É verdade!

A Sr.ª Ana Virgínia Pereira (PCP): — Por outro lado, agrava os problemas existentes ao invés de reforçar e

valorizar a escola pública e a sua função estabelecida na Constituição.

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

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O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Rita Bessa.

A Sr.ª AnaRitaBessa (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Ana Virgínia Pereira, se bem percebo, a

argumentação do PCP, aliás já explanada na última semana, prende-se com o facto de acharem que a Lei de

Bases está integralmente certa e que não é preciso mexer nela, e, por outro lado, prende-se com o facto de se

encontrarem na linha da frente da defesa da escola pública, significando isso que o PCP não tem de apresentar

propostas construtivas, simplesmente tem de estar quieto a fazer essa defesa.

Protestos do PCP.

Aliás, a Sr.ª Deputada Ana Mesquita, na semana passada, falou no imenso, no tremendo contributo que o

CDS tem dado à educação e realmente tenho pena de não encontrar uma correspondência naquele que tem

sido o desempenho do PCP, porque o PCP, na verdade, está preso a 1986 e não tem uma única linha de

contribuição.

Protestos do PCP.

Pelo PCP, em bom rigor, estaríamos ainda na Lei de Bases de 1986 sem nenhuma transformação, coisa que

eu consigo compreender, Srs. Deputados. Consigo compreender que o PCP goste de estar em 1986, ainda

antes da entrada de Portugal na União Europeia e, de preferência, até antes da Perestroika. Consigo perceber

isso muito bem.

A Sr.ª AssunçãoCristas (CDS-PP): — Isso mesmo!

A Sr.ª AnaRitaBessa (CDS-PP): — Srs. Deputados do PCP, sabem, o mundo mudou!

Sabem qual é que era o single mais vendido em 1986? É uma coisa curiosa: o Nikita, do Elton John.

Lembram-se? Este era o single mais vendido em 1986.

Aplausos do CDS-PP.

Protestos do PCP.

A Sr.ª Deputada, que deveria ser muito nova na altura, não teria, se calhar, conhecimentos de inglês, mas, a

maior parte das crianças, hoje em dia, graças a Deus, já tem.

De qualquer forma, vou relembrá-la da tradução de uma parte da letra dessa música, que é muito

interessante: «Se chegar a um tempo que/armas e muros já não te prenderão/e se então for livre de fazer

escolhas/olhe para o Ocidente e encontrará amigos».

Sr.ª Deputada, se quiser sair detrás do muro, se quiser dar um tremendo, um imenso contributo para a

educação, seja bem-vinda ao debate.

Protestos do PCP.

Apresente as suas propostas, diga ao que é que vem para melhorar o sistema. Esta é a oportunidade que o

PCP não tem tido de mostrar ao que é que vem, em vez de ficar atrás do muro a defender aquilo que entende

que tem de defender.

Como é que vai ser? Vai apresentar propostas ou vai ficar a defender?

Aplausos do CDS-PP.

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O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sr.as e Srs. Deputados, chegou a notícia que todos nós esperávamos:

António Guterres foi aclamado e nomeado, por unanimidade, pelo Conselho de Segurança, para Secretário-

Geral das Nações Unidas.

Aplausos, de pé, do PSD, do PS, do BE, do CDS-PP, do PCP e de Os Verdes.

É com muito regozijo e não menos emoção que anuncio à Câmara que, com a concordância de todos os

grupos parlamentares, no final dos nossos trabalhos será apreciado um voto de congratulação, usando da

palavra Deputados de todos os grupos parlamentares.

Srs. Deputados, vamos continuar com a nossa ordem do dia, tendo a palavra, para uma intervenção, o Sr.

Deputado Porfírio Silva.

O Sr. Porfírio Silva (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Partido Socialista trouxe para a política

portuguesa o desafio de uma agenda para a década, a ideia de que, para lá das normais e, até, saudáveis

divergências entre maioria e oposição, em algumas matérias o País precisa de convergências de fundo que vão

para além do horizonte das legislaturas.

A educação é, seguramente, um dos campos onde essa necessidade é mais evidente, desde que

compreendamos que a evolução consistente das qualificações pulsa mais ao ritmo das gerações do que dos

anos letivos. Temo-lo reafirmado insistentemente.

Ainda recentemente, o Grupo Parlamentar do PS, pela voz do Deputado Alexandre Quintanilha, reafirmou

nesta Câmara o nosso empenhamento em trabalhar para construir convergências educativas. Eu próprio, num

debate quinzenal na anterior Sessão Legislativa, suscitei ao Sr. Primeiro-Ministro a dificuldade de compatibilizar

essa necessidade de convergência com o radicalismo ideológico da oposição de direita. O Primeiro-Ministro

respondeu: «A maior base de consenso nacional é a Constituição da República Portuguesa.» Resposta

claríssima e essencial e que é o nosso ponto de partida para apreciar esta iniciativa do CDS de revisão da Lei

de Bases do Sistema Educativo.

Sr.as e Srs. Deputados, o mal do projeto do CDS não é que contenha propostas com que não concordamos.

Isso é expectável e faz parte do trabalho democrático. O problema é que esta proposta erra no tempo e erra no

método. A durabilidade da primeira Lei de Bases assentou na profundidade e largueza do debate que a

construiu, ao contrário da pressa do CDS, que entendeu que bastava uma semana para lançar a primeira pedra

e forçar uma votação.

Há inúmeras e variadas iniciativas em curso para aprofundar a reflexão sobre a Lei de Bases, com destaque

para o processo liderado pelo Conselho Nacional de Educação. Mas o impulso do CDS para o aplauso fácil foi

mais forte do que o sentido da responsabilidade de procurar o tempo e o modo adequados à construção de

entendimentos progressivamente alargados.

Para assumirmos as nossas responsabilidades, precisamos pensar de forma integrada. Por exemplo, a

proposta reorganização dos ciclos de estudos, que merece atenção, implica repensar os grupos de recrutamento

de professores e respetivas habilitações para a docência, a capacidade física das escolas e as respostas que

as tipologias existentes facilitam ou não, bem como a formação dos professores. Querem que votemos essa

proposta sem terem sido estudadas as suas implicações?!

Para assumirmos as nossas responsabilidades, precisamos de evitar a normatividade excessiva, intrusiva.

Por exemplo, a proposta do CDS relativa ao calendário escolar parece não cuidar suficientemente da realidade.

É que, não por acaso, o calendário escolar é definido anualmente, passa de cada vez por um diálogo com as

autarquias e as associações de pais, tem de ser articulado com os calendários dos exames e ainda comunica

com o ensino superior. A norma que o CDS propõe, desarticulada desta visão integrada, parece até ter algum

amadorismo.

O CDS invoca a necessidade de estabilidade educativa. Mas a visão mecânica da estabilidade, em termos

de mera duração da vigência das leis, proposta pelo CDS, não está bem colocada do ponto de vista concreto

da estabilidade das aprendizagens. Se se verificar que uma lei ou decreto produz efeitos nefastos, o que

fazemos? Mantemos o erro durante seis anos para satisfazer a «estabilidade por decreto» do CDS?

É preciso pensar a partir das aprendizagens, das escolas como lugares concretos de aprendizagem, em vez

de pensar apenas a partir da superestrutura. O trabalho curricular é um trabalho nuclear. Onde esteve o valor

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da estabilidade quando o CDS foi conivente com a destruição do currículo nacional? E, agora, vamos legislar

sobre ciclos de estudo sem pensar o currículo?

Está em curso um trabalho, liderado pelo Dr. Guilherme de Oliveira Martins, para definir um perfil de

competências do aluno à saída do 12º ano, evoluindo de uma abordagem curricular fragmentária, fechada nas

disciplinas, para uma abordagem global, integrada, definindo aprendizagens essenciais, bem como

competências sociais e relacionais que predisponham para aprender ao longo da vida. Um trabalho que

permitirá, depois, uma gestão flexível, contextualizada e integrada do currículo. E, entretanto, tomamos já

decisões que se atravessem no caminho desse trabalho?

Esta proposta do CDS erra no tempo, erra no método e, também, erra no foco. É preciso pensar a partir das

aprendizagens. E é preciso pensar a partir do futuro: que escola queremos para o século XXI?

Há caminhos da Lei de Bases ainda insuficientemente concretizados, por exemplo no que diz respeito à

educação para a cidadania, ao desenvolvimento da autonomia dos alunos, à formação da capacidade e do gosto

pela contínua atualização de conhecimentos. Porque é que o projeto do CDS nada diz sobre isto? Tal como

nada diz sobre educação de adultos, educação permanente e aprendizagem ao longo da vida. Talvez porque,

se dissesse, não teriam coragem de vir ao mesmo tempo falar de estabilidade.

Aplausos do PS.

E por que é que não dizem nada sobre estas questões? Por não caberem numa agenda ideológica

demasiado estreita? Mas, então, como querem entrar num processo de construção de convergências?

Insisto, precisamos pensar a partir do futuro. Ou seja, que escola queremos para o século XXI? É que a

escola do século XXI não será apenas uma escola com outra organização, por exemplo menos espartilhada por

disciplinas e com mais trabalho integrado por projetos. Nem será apenas uma escola com outras tecnologias.

Será também uma escola com outros valores e com outro compromisso com os direitos de cidadania. Será uma

escola contra as desigualdades, pela igualdade, onde, para lá do direito ao acesso, temos de avançar mais no

direito ao sucesso, renovar uma batalha pelo direito de acesso ao sucesso. Mas isto não cabe, verdadeiramente,

nesta apressada proposta do CDS.

Sr.as e Srs. Deputados, no conjunto, o que o CDS nos propõe são peçassoltas. No dizer do CDS, são «quatro

grandes alterações», em parte apropriando-se de ideias em debate público, em parte respondendo a interesses

particulares. Mas não é disso que precisamos. Precisamos de novos compromissos, assentes numa visão de

conjunto do sistema educativo capaz de contribuir ainda melhor para o País que queremos, onde se cumpra e

honre a Constituição da República.

Para construirmos democraticamente essa resposta precisamos de uma metodologia adequada, capaz de

nos ajudar a construir entendimentos progressivamente alargados. Há que definir um calendário, uma agenda,

um processo de auscultação entre partidos e, também, entre parceiros sociais e associações representativas

dos atores relevantes; encontrar métodos para usar o conhecimento disponível ou a construir, incluindo o recurso

à experiência internacional para clarificar questões e caminhos. E isso é em tudo diferente do modo oraescolhido

pelo CDS.

O Partido Socialista compromete-se, hoje e aqui, a esperar que termine o ciclo atualmente em curso no

Conselho Nacional de Educação sobre a Lei de Bases do Sistema Educativo …

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — É em janeiro!

O Sr. Porfírio Silva (PS): — … e, depois de terem sido extraídas as conclusões desse trabalho, compromete-

se contribuir para que a Assembleia da República adote uma metodologia que nos permita participar ativamente

num diálogo sistemático com a sociedade, orientado para identificar, construir e consolidar convergências e para

aplanar divergências, com o sentido da responsabilidade que a educação nos exige. O sentido da

responsabilidade que, a nosso ver, não iluminou esta iniciativa do CDS.

Aplausos do PS.

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O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sr. Deputado, inscreveram-se dois Deputados para pedidos de

esclarecimento. Como pretende responder?

O Sr. Porfírio Silva (PS): — Em conjunto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Assim sendo, tem a palavra, em primeiro lugar, o Sr. Deputado Nuno

Magalhães.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Porfírio Silva, devo felicitá-lo por isto: o

Sr. Deputado tem aqui uma posição muito difícil, muito complicada.

Basicamente, o que Sr. Deputado veio aqui dizer foi: «Nós até concordamos, mas não podemos; nós até

queremos, mas não podemos.» E importa perguntar por que é que não podem, porque é isso que a comunidade

educativa quer saber, além de querer também perceber quais são as prioridades do Partido Socialista.

O Sr. Deputado veio aqui dizer que a mudança de ciclos até pode ser boa, mas que não é tempo para a

toma; que a medida relativa aos manuais até pode ser boa, mas não é tempo para a tomar; que estar a discutir

a Lei de Bases, que tem 30 anos, até pode ser bom, mas que não é o local! Sr. Deputado, qual é, então, o local

para o discutir? A Assembleia da República, como local de reflexão de uma área como a educação, parece-lhe

um local inadequado? Confesso que não percebo, Sr. Deputado. Ou, por outra, percebo que é uma questão

puramente de pretexto para fazer aquilo que quer, mas que não pode.

O Sr. Deputado veio ainda dizer que o CDS se apropriou de ideias e que, ao mesmo tempo, não deu espaço

necessário ao debate, às necessárias audições das entidades! Sr. Deputado, ou uma coisa ou outra, entenda-

se! Nós tivemos um grupo de estudo a estudar esta matéria durante meses. Tivemos até uma audição com a

presença do Presidente do Conselho Nacional de Educação.

Por isso, Sr. Deputado, essa é a nossa proposta, é o nosso ponto de partida. Como a Sr.ª Deputada Ana

Rita Bessa disse, não é o nosso ponto de chegada. Com certeza que poderemos discutir, poderemos debater.

E se o Partido Socialista diz que é mais para o Natal, que é mais para janeiro, quando acabar a reflexão, então,

Sr. Deputado, se quer consenso, se quer uma atitude séria e responsável, se quer que a comunidade educativa

tenha estabilidade, viabilize esta proposta. Com certeza que aguardaremos para discutir, na Comissão, a

proposta do Partido Socialista.

Se não for assim, Sr. Deputado, é caso para fazer esta pergunta: de que é que o PS tem medo? Tem medo

da comunidade educativa? Tem medo de debater ou tem medo da geringonça? O que é que coloca em primeiro

lugar: a comunidade educativa e a educação ou o poder e o Governo que se querem perpetuar?

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Emília Santos.

A Sr.ª Emília Santos (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Porfírio Silva, começo por lamentar a ausência

do Sr. Ministro da Educação nesta Câmara quando hoje está em discussão a lei mãe do sistema educativo

português.

Vozes do PSD: — Muito bem!

Protestos da Deputada do PCP Rita Rato.

A Sr.ª Emília Santos (PSD): — Nós, PSD, acolhemos o desafio lançado pelo CDS e estamos disponíveis

para contribuir ativamente neste debate. E estamos disponíveis porque, em primeiro lugar, somos um partido

reformista e, em segundo lugar, porque nunca fechamos a porta ao debate na expectativa de que, em matérias

tão estruturantes como esta, as convergências superem as divergências. É isso que os portugueses esperam

de nós, Srs. Deputados. Os portugueses esperam sobretudo que o interesse público não seja ultrapassado pelo

taticismo político que tem paralisado a bancada socialista.

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Sr. Presidente, Sr. Deputado Porfírio Silva, tão urgente quanto discutir o futuro da educação é discutir o seu

presente, um presente desastroso e preocupante, apesar de António Costa ter prometido que ia devolver a paz

às escolas.

Quem está nas escolas sabe e confirma que o ano letivo arrancou sem auxiliares suficientes para assegurar

o seu normal funcionamento, o que foi agravado pela redução das 40 para as 35 horas de trabalho semanal. Só

na Maia falta cerca de uma centena de assistentes operacionais nas escolas; o Centro Escolar de Folgosa tem

120 alunos e não tem um único funcionário colocado pelo Ministério da Educação. O que é que isto significa,

Sr. Deputado? Significa que nem a portaria revista pelo anterior Governo conseguem cumprir.

Quem está na escola sabe também que o ano letivo arrancou e continua sem auxiliares nas unidades de

multideficiência. O Agrupamento de Águas Santas tem três unidades de multideficiência e zero auxiliares —

repito, zero auxiliares —, quando a lei determina que haja dois por unidade.

Onde está o Sr. Ministro da Educação, que diz amar a escola pública e abandona as crianças com

necessidades educativas especiais?

Sr.as e Srs. Deputados, quem está nas escolas sabe ainda que o ano letivo arrancou com fortes

constrangimentos, sem dinheiro para suportar o pagamento da luz, da água e até do papel higiénico graças a

um inusitado corte orçamental de cerca de 20%.

E falo, Srs. Deputados, com conhecimento de causa: no Agrupamento de Escolas da Maia o corte foi de 21

000 €; no Agrupamento de Escolas de Ermesinde, em Valongo, o corte rondou os 30 000 €. Os agrupamentos

terão, agora, de esmolar junto do Ministério as verbas em falta.

Por fim, e porque o tempo não me permite continuar, quero dizer que quem está nas escolas também sabe

que o ano letivo arrancou com o congelamento do valor dos apoios da ação social escolar.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Deputado Porfírio Silva, para que a situação não piore, o Grupo

Parlamentar do PSD exige saber se está feito o levantamento de todos os casos aqui identificados, e que temos

a certeza que o senhor também os tem em memória, e como pretende o Governo suportado pelo seu partido

resolver estes problemas.

Termino, com um aviso a toda a esquerda: quem ama a escola pública não é quem «enche a boca» a fazer-

lhe juras de amor; quem ama a escola pública é quem cria as condições para a poder sustentar.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Porfírio Silva.

O Sr. Porfírio Silva (PS): — Sr. Presidente, começo por agradecer ao Sr. Deputado Nuno Magalhães e à

Sr.ª Deputada Emília Santos as questões colocadas.

Sr.ª Deputada Emília Santos, o Grupo Parlamentar do PSD está tão entusiasmado com o projeto do CDS

para a revisão da Lei de Bases que a Sr.ª Deputada, em 15 segundos, esqueceu logo a Lei de Bases e começou

a falar de outras coisas.

E, mais: a Sr.ª Deputada está como aquele presidente de câmara do PSD que fez a proposta para encerrar

a escola e depois foi para a rua manifestar-se contra o encerramento da escola. Sobre isso estamos

conversados!

Aplausos do PS.

Sr. Deputado Nuno Magalhães, o CDS ficou de fora da Lei de Bases há 30 anos. Agora, não sei se o CDS

está a tentar correr muito para entrar desta vez ou se está a tentar arranjar uma desculpa para voltar a ficar de

fora, como há 30 anos!

Uma coisa é certa, Sr. Deputado: há uma candidata a secretária-geral da ONU que se deu muito mal por ter

aparecido na maratona a 100 m da meta.

O Sr. Deputado também se vai dar mal se comparecer para a maratona antes de ter sido dado o tiro de

partida!

Aplausos do PS.

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O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Tenha vergonha! O seu sentido de Estado é zero!

O Sr. Porfírio Silva (PS): — Mas, já agora, Sr. Deputado…

Protestos do Deputado do CDS Nuno Magalhães.

Como dizia o Prof. Marçal Grilo… Bem, não vou dizer!

Risos do PS.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Tenha vergonha! O CDS apoia o Eng.º António Guterres!

O Sr. Porfírio Silva (PS): — O Sr. Deputado tem problemas em que eu lhe responda?

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Não, não tenho. O que eu tenho é sentido de Estado!

O Sr. Porfírio Silva (PS): — Se não tem, deixe-me responder.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Devia ter vergonha!

O Sr. Porfírio Silva (PS): — Já agora, Sr. Deputado, queria sugerir à Mesa, caso nem todos os Deputados

tenham ainda tido acesso a uma correspondência da Assembleia Legislativa Regional da Madeira que acabou

de nos ser distribuída, que essa correspondência fosse distribuída a todos os Deputados. É que os órgãos de

Governo próprios das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira foram, nos termos habituais, solicitados a

dar parecer sobre este projeto do CDS e acabámos de receber o parecer enviado pela Assembleia Legislativa

Regional da Madeira, através da sua 6.ª Comissão, que diz, basicamente, o seguinte: «Perante uma matéria tão

estruturante quanto as Bases do Sistema Educativo, não pudemos, em tempo útil, num prazo inferior a cinco

dias, analisar de forma completa e consistente o referido diploma. Por isso, não estão reunidas as condições

necessárias para nos pronunciarmos sobre o mesmo.»

Esta é a consequência da forma atrapalhada, da forma atabalhoada, da forma irresponsável como o CDS

tratou desta questão.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Porfírio Silva (PS): — Quando uma força política responsável quer realmente trabalhar para a

convergência, escolhe os métodos apropriados, não tenta golpes, não tenta jogadas, não tenta começar a correr

antes dos outros.

Os senhores enchem a boca a falar do respeito pelo Conselho Nacional de Educação e nem o Conselho

Nacional de Educação respeitam!

Aplausos do PS.

Repito, Srs. Deputados do CDS: responsabilidade! Por favor, responsabilidade! Não nos façam a todos sofrer

as consequências da vossa corridinha particular com o PSD.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sr. Deputado, a Mesa fará chegar aos grupos parlamentares os

documentos que os Srs. Deputados entenderem fazer chegar à Mesa.

Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Margarida Mano.

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A Sr.ª Margarida Mano (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Minhas Senhoras e Meus Senhores:

A Lei de Bases do Sistema Educativo constitui um referencial absolutamente central de política pública da

educação em Portugal. Nela se estabelece o quadro geral do sistema educativo, se advogam princípios, se

define o referencial normativo das políticas educativas que visam o desenvolvimento de todo e qualquer cidadão

português e do País.

A Lei de Bases é uma lei estruturante, a «mãe do sistema», que assegura clareza e estabilidade num

determinado sentido de futuro e que, por isso, carece de um largo consenso da sociedade.

A Lei de Bases do Sistema Educativo português — Lei n.º 46/86 — corresponde, 12 anos depois do 25 de

Abril, ao primeiro compromisso sobre a educação possível em democracia, compromisso que se tem mantido

ao longo dos últimos 30 anos com a adequação em três alterações: as primeiras em 1997 e em 2005,

relacionadas com o ensino superior — acesso, financiamento e processo de Bolonha — e com a formação inicial

de professores; e a última, em 2009, com o estabelecimento do regime da escolaridade obrigatória para as

crianças e jovens com idade entre os 6 e os 18 anos e a consagração da universalidade da educação pré-

escolar para as crianças a partir dos 5 anos de idade.

O compromisso, novo na altura, e que se mantém até hoje, assentou nos princípios da universalidade, da

obrigatoriedade e da gratuitidade no ensino básico, bem como na reorganização do sistema educativo em

educação pré-escolar, escolar e extraescolar. O compromisso com os princípios humanistas como o direito à

educação e à democratização do ensino estava já consagrado na Constituição desde 1976.

Trinta anos depois — e no próximo dia 14 de outubro a Lei de Bases fará 30 anos —, fará sentido rever a Lei

de Bases do Sistema Educativo? Claro que sim!

Em 1986, Portugal aderia à Comunidade Económica Europeia, que passava a contar com 12 membros; a

Inglaterra e a França anunciavam a construção do Túnel da Mancha; na Europa, existiam duas Alemanhas;

Portugal aguardaria mais quatro anos para conhecer a Internet; e, no acidente de descolagem do vaivém

espacial Challenger, faleceu a primeira civil de um programa espacial dos Estados Unidos da América, Christia

McAuliffe, uma professora que iria dar uma aula aos seus alunos a partir do espaço.

Trinta anos depois, todos estaremos de acordo nesta Assembleia que a sociedade portuguesa é hoje

diferente, felizmente incomparavelmente mais próxima dos padrões de desenvolvimento europeu no que diz

respeito à educação.

Mas o mundo é também hoje muito diferente. Hoje, numa Europa com 28 países, quase 27, regulamenta-se

a circulação de carros sem condutor; seres humanos são traficados, aqui, no Mediterrâneo; a ciência permite

fabricar órgãos em laboratório ou em impressão 3D; já são as coisas e não apenas as pessoas que estão ligadas

à Internet; na OCDE, 40 milhões de jovens, 15% da população dos 15 aos 29 anos, são «nem nem», isto é, nem

estudam nem trabalham.

Na sociedade portuguesa, persistem velhos e surgiram novos problemas na educação e, em particular, a

evolução da ciência e da tecnologia alterou distâncias e tempos, acentuando a imprevisibilidade das mudanças.

Trinta anos depois, faz todo o sentido rever a Lei de Bases. Temos a responsabilidade de preparar as

gerações para o futuro, temos a responsabilidade de preparar cada aluno, cada cidadão, para responder aos

problemas de Portugal, hoje e no futuro.

A iniciativa legislativa do CDS-PP, com o projeto de lei de alteração da Lei de Bases, tem a virtude de abrir

um espaço de debate, hoje, no Parlamento, o que é naturalmente positivo, embora não esteja certa de que o

faça da melhor forma para concretizar a mudança desejada.

Criar condições para a convergência para um pacto da educação não pressupõe apenas saber pelo que se

luta, mas estar aberto a construir, em conjunto com os diferentes parceiros sociais, os compromissos possíveis

no sentido do bem comum.

Ora, como todos sabemos, o Conselho Nacional de Educação, cuja missão, como consta do seu artigo 1.º

— e passo a citar —, é «proporcionar a participação das várias forças científicas, sociais, culturais e económicas,

na procura de consensos alargados relativamente à política educativa», iniciou, há cerca de um ano, um ciclo

alargado de estudos e debates que visam avaliar a atualidade e adequação da Lei de Bases do Sistema

Educativo.

O último debate está previsto para o próximo mês de novembro e existe o compromisso por parte do CNE

(Conselho Nacional de Educação) de apresentar um documento-síntese no primeiro trimestre de 2017. Avaliar

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a Lei de Bases é fundamental! Só uma avaliação séria e alargada da Lei de Bases permitirá um debate justo e

informado.

O compromisso do Partido Social Democrata na preparação do futuro do País pressupõe uma participação

ativa no âmbito deste debate do CNE e de todos aqueles para que somos convocados, a que não viraremos as

costas. Mais do que a participação exige a dinamização de uma reflexão alargada, que está em curso em todo

o País, através do Fórum das Políticas Sociais, e exige, naturalmente, a valorização dos compromissos que

venham a ser construídos com as instituições e com os atores responsáveis pelo futuro do estado da educação

em Portugal.

Todos temos consciência de que na construção de um pacto da educação existirão áreas de relativa

confluência e outras de difícil consenso e temos também consciência de que um pacto da educação não pode

limitar-se apenas à introdução de algumas alterações na Lei de Bases de 1986; um pacto da educação, que

pode ter na Lei de Bases um instrumento privilegiado de concretização, deverá permitir consensualizar novos

compromissos face aos difíceis desafios já hoje em aberto em Portugal.

Que compromisso futuro queremos assumir, enquanto sociedade, com a educação especial? Que escola

inclusiva queremos ou podemos assumir? Queremos continuar a considerar a formação profissional uma

«modalidade especial de educação escolar»? Ou queremos valorizar o ensino profissional como parte integrante

de um ciclo, constituindo-se como uma via com programas e manuais próprios, num diálogo próximo do território

e da economia da região? Queremos manter o mesmo compromisso de há 30 anos com a diáspora portuguesa,

e refiro-me ao ensino do Português no estrangeiro, num estrangeiro que hoje se chama mundo, de uma Língua

Portuguesa que é um dos valores estratégicos mais preciosos que temos enquanto nação?

Um verdadeiro pacto exige novos conceitos para responder aos novos e exigentes desafios que conhecemos,

bem como àqueles que conseguimos perspetivar no futuro.

Neste contexto, o PSD apresentará oportunamente a sua proposta.

A educação constitui uma preciosa fonte de soberania, tanto mais preciosa quanto, por força das

circunstâncias, a mesma soberania se dissolve noutros planos, desde a economia ao funcionamento das

instituições.

Hoje, e cada vez mais no futuro, a soberania das comunidades deriva muito do cuidado que as mesmas

colocam na educação. As políticas educativas não são neutras e existe margem para debate, tanto no plano dos

princípios como no que respeita aos procedimentos. De resto, ao contrário do que sucede noutros países, em

Portugal discute-se pouco o tema da educação.

Existem, contudo, objetivos que se podem considerar consensuais e, face a esses consensos, fica-se com a

impressão de que alguns debates mais acesos são realmente desfocados ou, pelo menos, artificialmente

alimentados.

Afinal, todos querem uma escola onde os alunos possam aprender e os professores ensinar com eficácia e

com gosto.

Todos querem professores qualificados, motivados e respeitados pela sociedade. Os professores merecem-

no amplamente, desde logo, mas, para além desse fator de justiça, é inegável que o professor é, de longe, o

elemento decisivo de todo o processo educativo. Mais, muito mais do que as instalações, os recursos

tecnológicos, os programas ou os manuais.

Todos querem uma escola que seja dinâmica, autónoma e diversa, mas que seja, ao mesmo tempo, uma

escola clarividente, sem nunca perder de vista os grandes valores da democracia sem nunca perder de vista os

grandes valores da democracia, responsabilidade e compromisso cívico, o fomento do espírito crítico,

combinação entre tradição e inovação, estímulo da criatividade e do espírito de autonomia.

Afinal, todos querem uma escola de bom senso e de coragem.

De bom senso, porque o género humano não dispõe de melhor auxiliar quando se trata de fazer escolhas;

de coragem serena, quando se trata de resistir a determinadas tendências que capciosamente se foram

instalando: a ideia de que não vale a pena estudar como não vale a pena nenhum tipo de esforço. Não podemos

deixar que esta e outras ideias se instalem, corroendo o essencial das sociedades livres e democráticas em que

vivemos. Podem ser simpáticas à primeira vista, mas, na verdade, comprometem o futuro dos nossos jovens

que hão de integrar-se em ambientes de trabalho cada vez mais exigentes.

Termino, partilhando um caminho onde não estou sozinha. As palavras que tenho vindo a preferir são minhas,

mas o pensamento em torno da educação constitui o resumo do pensamento expresso por um vasto friso de

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nomes que, desde há décadas, têm escrito sobre este mesmo assunto: afinal, outra coisa não disseram

pedagogos como António Sérgio, João de Deus Ramos ou João José Camoesas; outra coisa não disseram

ainda Leite Pinto, Veiga Simão, Roberto Carneiro ou Eduardo Marçal Grilo, numa continuidade essencial que

nos deveria fazer refletir mais.

Quero com isto dizer que os consensos em educação não são apenas desejáveis, como se fossem um ideal

vago e utópico. Não! Esses consensos existem. É necessário identificá-los, lembrá-los e sistematizá-los. Esses

consensos são absolutamente vitais para qualquer nação e talvez ainda mais para uma nação como Portugal.

Há dissídios ideológicos e há divergências no plano operativo, houve, de resto, divergências constantes entre

todos estes nomes, mas todos estes nomes — ou quase todos — se encontram no plano dos objetivos.

Para além de todos os ajustamentos ditados pela alteração de circunstâncias, a Lei de Bases tem que traduzir

esse consenso.

Uma lei de bases tem que constituir um referencial de estabilidade, não pode limitar-se a ser um edifício

bonito, mas oco. Muito pelo contrário.

A Lei de Bases tem que ser encarada enquanto um normativo inspirador e regulador das políticas mas,

sobretudo, das realidades concretas que fazem a vida dos portugueses.

ALei de Bases do Sistema Educativoque queremos para Portugal tem que inspirar um sentido de futuro

partilhado!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — A Mesa regista a inscrição para um pedido de esclarecimento por parte

do Sr. Deputado Luís Monteiro, do Bloco de Esquerda, a quem dou a palavra.

O Sr. Luís Monteiro (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Margarida Mano, não sei

se se recorda, mas talvez se recorde que, em 2010, ainda estava o PSD na oposição, quando apresentou a

ideia de revisão constitucional.

Nessa altura, dizia o então candidato a Primeiro-Ministro, agora Deputado Pedro Passos Coelho, numa

entrevista ao Jornal Económico, que era irrealista achar que as áreas como a saúde ou a educação poderiam

continuar a ser tendencialmente gratuitas.

Passaram dois anos, já estava o PSD no Governo e existia uma maioria parlamentar, e apareceu também a

ideia bizarra de criar propinas no ensino secundário — não sei se se lembra, Sr.ª Deputada! —, que depois

acabaram por esquecer de tão bizarra e de tão difícil que era de defender, mesmo com uma maioria parlamentar

mas sem nenhuma maioria social que defendesse essa medida.

Lembra-se, Sr.ª Deputada, dos anos de turbulência que Nuno Crato criou no sistema educativo, na educação,

nas turmas e nas escolas nos últimos quatros anos? Lembra-se, Sr.ª Deputada, quando, no início da anterior

Legislatura, tivemos o maior atraso no começo do ano letivo como nunca o País tinha sentido?

Compreendemos ainda que, depois desse divórcio que o PSD fez com o CDS desde as últimas eleições, o

PSD até se queira distanciar desta difícil, digamos assim, entrada agora do CDS na discussão da Lei de Bases

contra a qual esteve em 1986. O que não compreendemos é como é que a Sr.ª Deputada anuncia que o PSD

apresentará uma proposta para a revisão da Lei de Bases, portanto uma proposta vinda do PSD, mas não

recupera nenhuma das ideias que defendeu em 2010 até 2012. Será que essa Lei de Bases vem trazer as tais

famosas propinas para o ensino secundário? É disso que estamos à espera da proposta do PSD?

Qual é o sentido desse futuro partilhado? É o sentido de trazer os problemas que hoje o ensino superior já

vive? É esse o sentido de responsabilidade e de futuro que o PSD tem para uma revisão da Lei de Bases, Sr.ª

Deputada?

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Margarida Mano para responder.

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A Sr.ª Margarida Mano (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Monteiro, não sei onde é que o Sr.

Deputado estava em 2010, mas sei onde eu estava. Não estava aqui, estava a acompanhar um País que parecia

viver uma realidade absolutamente irreal.

Também não sei se o Sr. Deputado ouviu aquilo que eu disse, mas, se ouviu, saberá que a proposta de uma

lei de bases, a apresentar pelo PSD, será sempre uma proposta depois de um consenso e de um estudo que

está a ser trabalhado e que vai colocar a ferida em aspetos muito mais relevantes do que aqueles que estão na

espuma dos dias.

O que é que eu quero dizer? Falei na educação especial, falei na formação profissional, falei no ensino do

Português. Portanto, estar a falar de propinas na discussão da Lei de Bases parece-me absolutamente

descabido, sobretudo porque, se ouviu o que eu disse, sabe que o princípio da gratuitidade como o princípio da

universalidade…

Neste momento, o Deputado do BE Luís Monteiro exibiu um documento.

Não sei o que é que o Sr. Deputado está a mostrar. Isso pode funcionar para as televisões, mas penso que

não é sério!

Aplausos do PSD.

Eu também tenho aqui papéis para mostrar, mas não me parece que acrescentem muito face àquilo que é o

debate.

Os princípios que estão definidos constitucionalmente e os princípios que estão na Lei de Bases naturalmente

que só poderão ser alterados ou só poderão ser assumidos com um largo consenso. Essas são as regras da

democracia e não penso que alguém vá querer alterar a democracia. Pelo menos, ninguém vai querer ser

antidemocrático no PSD.

Portanto, quando o Sr. Deputado fala na gratuitidade que está consagrada do ponto de vista do ensino básico,

9 anos antes, agora 12, o que penso que estará a tentar fazer é levantar alguns fantasmas que eu não conheço

nem pretendo conhecer.

O PSD estará de forma séria no debate da Lei de Bases que, como espero ter ficado claro da minha

intervenção, é uma lei demasiado séria e demasiado importante para o futuro não só das crianças e dos jovens

de hoje mas, sobretudo, para os dos próximos anos, porque ninguém acredita que uma lei de bases — eu, pelo

menos, tenho muitas dúvidas — não dure, pelo menos, uma década.

Portanto, penso que é um debate demasiado sério para podermos estar — pelo menos, da minha parte não

o farei — a ostentar soundbites para as televisões e para os jornais.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Luís Monteiro (BE): — Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sr. Deputado, presumo que seja sobre o andamento dos trabalhos.

O Sr. Luís Monteiro (BE): — Sr. Presidente, pretendo pedir a distribuição de um documento.

Possivelmente por desconhecimento, a Sr.ª Deputada Margarida Mano não conhece as propostas do PSD

do passado em relação à educação, pelo que peço à Mesa que distribua uma notícia do Jornal de Negócios,

datada de 20 de maio de 2010, onde Passos Coelho diz que saúde e educação tendencialmente gratuitas é

irrealista.

Peço, pois que a Mesa diligencie no sentido da distribuição do documento.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sr. Deputado, faça o favor de entregar o documento na Mesa para que

seja distribuído.

Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Joana Mortágua.

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A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, gostaria de começar por dizer à Sr.ª

Deputada Ana Rita Bessa que o projeto de lei do CDS sobre a revisão da Lei de Bases do Sistema Educativo

parte de um pressuposto errado que contamina todo o documento: a ideia de que falta um consenso na

educação.

O grande consenso que existe na educação em Portugal e que o CDS não quer reconhecer chama-se escola

pública, a única capaz de garantir serviço público de educação em condições de igualdade para todas e para

todos. E essa é a grande frustração do CDS neste debate. Não é com a modernidade ou a falta dela na Lei de

Bases. O CDS não pode é com o consenso que lhe deu origem, o consenso da escola pública, o consenso da

Constituição, da qual o CDS se autoexcluiu quando votou contra.

O CDS fala de futuro, mas o que quer é recuperar os debates e as polémicas do passado, os debates sobre

a dualização do ensino, sobre a falsa liberdade de escolha, sobre a existência da escola como modo de seleção

social, e é por isso que esta proposta é um verdadeiro «cavalo de Troia».

Não é a necessidade do pré-escolar que nos divide, o que nos divide é que nós conhecemos o currículo do

CDS nesta matéria, nós sabemos o que é que o CDS e o PSD fizeram quando estiveram no Governo.

Reintroduziram as vias vocacionais no básico como versão moderna da separação entre o liceu e as escolas

comerciais e industriais, e esta proposta agora aqui apresentada, de revisão da Lei de Bases, não se afasta da

visão que encara o ensino profissional como o destino daqueles que têm insucesso escolar.

O Sr. Porfírio Silva (PS): — Exatamente!

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Introduziram exames, rankings, metas curriculares, programas excessivos

e absurdos feitos para que apenas uma pequena parte dos alunos pudesse apreendê-los na totalidade. Criaram

um sistema que estava deliberadamente feito para que apenas um pequeno grupo pudesse ter sucesso e todos

os outros ficassem abandonados e ficassem para trás.

Fizeram incursões contra a escola de cidadania, progressista, emancipatória e crítica, fizeram incursões

contra a escola como espaço de democracia, quiseram submeter os professores à força da precariedade, os

alunos à força de um exame e as escolas à força de um lugar no ranking.

Como é que o CDS pode vir falar de autonomia das escolas, quando o que propõe é oferecer essa autonomia

aos municípios que as queiram «comprar», esquecendo que uma escola democrática não cabe na tutela de

nenhum vereador da educação nem de nenhum presidente de câmara, esquecendo que os professores não

devem estar à mercê dos critérios de contratação de cada câmara municipal e do partido que nela tem maioria,

esquecendo que o Estado não se pode desresponsabilizar do financiamento e da função social da educação.

Falam de igualdade de oportunidade e sucesso escolares, mas introduzem a falsa liberdade de escolha como

defesa de um mercado de educação. Como se o País não tivesse já dito que não à ideia de financiar os colégios

privados com dinheiro público, como se não soubéssemos todas e todos que essa liberdade de escolha significa

cheque-ensino e que o cheque-ensino significa apenas uma coisa: o fim e a destruição da escola pública.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Não é nada disso. Está a inventar!

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — O que isto significa é porem os colégios a fazer um casting aos alunos que

garantem os melhores lugares nos rankings.

O CDS sabe que perdeu este debate, o debate dos contratos de associação, e agora quer ganhar na

secretaria.

Sr.as Deputadas e Srs. Deputados, a Lei de Bases não é um dogma, não há problema em modernizá-la, não

há problema em melhorá-la, há problema, sim, em substituir o consenso da escola pública que lhe deu origem

pelo dogma das rendas aos colégios privados. Isso é que é um problema!

E, sim, há problemas nas escolas, há professores a menos, há auxiliares a menos, há democracia a menos,

há recursos a menos, há alunos a mais nas turmas. Mas a Lei de Bases não é responsável pelo fracasso de

sucessivos Governos, que decidiram desinvestir e sacrificar a escola pública, a começar pelo Governo que a

Sr.ª Deputada e o seu partido apoiaram.

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Vozes do BE: — Muito bem!

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Srs. Deputados e Sr.as Deputadas, o CDS não vem aqui à procura de um

consenso; o que o CDS não quer, o que o CDS recusa é o consenso da Constituição da República Portuguesa.

Vozes do BE: — Muito bem!

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Aliás, disse-o na altura em que votou contra a Constituição! Disse que uma

das razões pelas quais não a aprovava era porque o papel do ensino privado era apenas supletivo em relação

ao papel da escola pública. E, nisto, temos de reconhecer a coerência do CDS e temos até de propor que o CDS

faça disto o próximo slogan do seu outdoor: «CDS, há 40 anos a proteger os colégios privados!». É um bom

slogan, é uma grande coerência, vem do tempo da Constituinte, é um debate do passado!

Aplausos do BE.

Não, o CDS não está aqui à procura de consenso, o CDS está aqui, agora em minoria, para agitar a bandeira

dos colégios privados. E, Sr.ª Deputada Ana Rita Bessa, Sr.as e Srs. Deputados, mal estaria a escola pública,

mal estaria o País, mal estaria a democracia se esta maioria parlamentar aceitasse mudar a Lei de Bases do

Sistema Educativo debaixo da bandeira dos colégios privados.

A verdade é que, apesar do CDS, temos escola pública.

A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — Não veem mais nada! Só o CDS!

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Apesar do CDS, temos dois pactos sociais, chamados «Constituição da

República Portuguesa» e «Lei de Bases do Sistema Educativo», que nos permitem mais 30 anos de progresso

social, como aquele que tivemos nos últimos 40 anos.

Esses pactos sociais foram aqueles que o CDS recusou.

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — E quais são?!

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Mas as propostas do CDS para o presente e o futuro são as propostas que

o País recusou há 40 anos. E é tempo de deixar de olhar para o passado e para as propostas do passado, para

começarmos a olhar para o futuro.

A escola pública precisa de um compromisso de futuro,…

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — E qual é?!

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — … mesmo que seja apesar do CDS.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para uma intervenção, tem, agora, a palavra a Sr.ª Deputada Ana

Mesquita.

A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: As políticas educativas, o sistema

educativo e a escola têm uma importância fulcral no crescimento das crianças e dos jovens, na construção do

nosso futuro coletivo numa ótica de progresso e no desenvolvimento e aprofundamento da democracia. Se todos

têm, segundo a nossa Constituição, direito à educação e à cultura, cabe ao Estado promover a democratização

da educação e as demais condições para que a educação contribua para a superação das desigualdades

económicas, sociais e culturais.

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Se «Roma e Pavia não foram feitas num dia», também a Lei de Bases do Sistema Educativo não o foi. Foram

meses de trabalho, dezenas de reuniões por todo o País, com o envolvimento da comunidade educativa — pais,

alunos, professores e trabalhadores — e a participação das autarquias locais, processo de amplo debate que

visou construir uma legislação estrutural para a educação no nosso País, por forma a responder aos direitos

constitucionalmente consagrados.

A Sr.ª Ana Virgínia Pereira (PCP): — Bem lembrado!

A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — Processo, esse, que o CDS pretende obliterar com a proposta que hoje nos

é apresentada, a pretexto de uma suposta necessária atualização da lei, querendo instituir, no incrível prazo de

sete dias, Srs. Deputados, uma revisão que permita alterar alguns dos seus princípios fundamentais, para impor

a sua desastrosa prática política.

O exercício demagógico que fazem, ao invocar a necessidade de consagração da estabilidade das políticas

educativas, para alterar de rompante uma lei estável, denuncia o seu verdadeiro objetivo: trata-se de garantir

aos grupos privados mais um amplo campo para o desenvolvimento dos seus negócios, desferindo mais uma

machadada na escola pública, com vista à sua privatização.

Defender a estabilidade na educação seria, antes de mais, partir para um processo de balanço, verificando

o que está por cumprir na Lei de Bases do Sistema Educativo e batalhando para que o que está em falta seja

concretizado. Mas não é esse o interesse de CDS. Nunca foi! E nunca foi, desde o dia em que votou contra esta

lei, desde o dia em que votou contra a Constituição da República Portuguesa.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Bem lembrado!

A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — Aliás, onde estava a palavra «estabilidade» no dicionário do Governo anterior,

de PSD e CDS? Estava nas turmas a rebentarem pelas costuras e nos professores contratados há mais de 15

anos, como na Escola Secundária da Apelação?! Ou na falta de contratação de centenas de psicólogos, de

técnicos de educação especial, de professores de educação especial?!

O Sr. Amadeu Soares Albergaria (PSD): — Agora está tudo resolvido!

A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — Ou na vida das crianças que ficaram sem o subsídio de educação especial?!

Era aí que estava? E o que dizer da estabilidade dos 25 000 professores contratados, ano a ano de mala às

costas, deixando filhos, família, casa e vida para trás? Ou das escolas em que faltavam milhares de

funcionários? Ou do inaceitável recurso à precariedade e aos Contratos Emprego-Inserção para suprir

necessidades permanentes das escolas?

A orientação neoliberal do Governo PSD/CDS, cuja governação os Srs. Deputados destes partidos pouco

gostam de relembrar, porque sabem que foram momentos de má memória para os trabalhadores e para o povo

português, conduziu à desresponsabilização cada vez maior do Estado na educação e, mais ainda, levou à

expansão do setor privado, em detrimento de uma escola pública, democrática e de qualidade.

A descentralização que preconizam, num País pejado de assimetrias e com as dificuldades que o Governo

anterior tanto aprofundou na escola pública, é tão-somente arrepiar caminho para mais um processo de

privatização, atirando as escolas públicas para a gestão privada, colocando em causa a universalidade do direito

à educação.

Vem ainda o CDS invocar a necessidade de consagração em lei de uma suposta «liberdade de escolha»!?

Não é de liberdade de escolha que se trata, é de uma falácia! O que o CDS defende e pretende impor é a

primazia dos privados, plasmando na lei o que é a sua conceção de rede escolar pública: uma rede em que os

privados, sejam eles de cariz lucrativo, cooperativo ou do chamado setor solidário, tenham «a faca e o queijo na

mão». E, claro, com o Estado a financiar diretamente o que é de alguns, cortando no financiamento daquilo que

é de todos — a nossa escola pública, universal e democrática.

O que está hoje aqui em debate são medidas que querem atacar o papel da escola pública enquanto espaço

de inclusão, de superação das desigualdades económicas e sociais, de emancipação individual e coletiva, de

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formação integral do indivíduo, de crescimento, de democracia, tornando-a num instrumento que replica

eternamente as desigualdades existentes.

A proposta do CDS — veja-se lá! — retira a democratização dos princípios gerais da lei,…

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Não, não retira!

A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — … e há pouco nem quiseram responder porquê,…

Protestos da Deputada do CDS-PP Ana Rita Bessa.

Não, nos princípios gerais já não está!

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Está, está!

A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — Como eu estava a dizer, a proposta do CDS retira a democratização dos

princípios gerais da lei e acentua as assimetrias entre público e privado, insistindo claramente numa lógica de

rankings, de competição e disputa entre as escolas, não permitindo o desenvolvimento homogéneo do sistema

de ensino, nem tão-pouco de práticas pedagógicas positivas.

Sr.as e Srs. Deputados: Como pode esta iniciativa sequer ser levada a sério se nem tenta dar resposta,

qualquer resposta, aos inúmeros problemas atuais com que a escola pública efetivamente se confronta?!

O PCP defende como prioridade inequívoca o investimento público, com o reforço das condições materiais

e humanas das escolas públicas,…

A Sr.ª Ana Virgínia Pereira (PCP): — Muito bem!

A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — … com o alargamento da rede pública de escolas, cumprindo a Constituição

da República Portuguesa e a Lei de Bases do Sistema Educativo.

Para o PCP, o Estado deve garantir o acesso à educação e o instrumento para o fazer é a escola pública

universal, de qualidade e gratuita em todo o ensino obrigatório, independentemente das condições económicas

e sociais de cada um.

Cá estaremos, Sr.as e Srs. Deputados, para o combate a todos os ataques à escola pública, venham de onde

vierem, vistam a «pele de ovelha» que vestirem.

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Ainda para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Susana

Amador.

A Sr.ª Susana Amador (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Ao contrário do anterior Governo, do

PSD/CDS, que aplicou à educação uma visão ajustada à estratégia de empobrecimento assente em baixos

salários e na desvalorização das qualificações, o PS está totalmente mobilizado na aposta numa escola pública

de qualidade e no sucesso escolar de todos os alunos.

Para o Partido Socialista, a educação desempenha um papel central na promoção da justiça social e

igualdade de oportunidades, sendo que esta é igualmente fator indutor do crescimento económico e da

sustentabilidade do País.

A estabilidade a que alude o CDS na sua iniciativa é, sem dúvida, um princípio fundamental, porém só a

atingimos através de processos de análise, debate e compromissos que permitam definir finalidades comuns e

partilhadas, a serem vertidas, designadamente, na Lei de Bases, sendo que essa estabilidade esteve ausente,

muito ausente, nos últimos quatro anos.

Vozes do PS: — Muito bem!

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A Sr.ª Susana Amador (PS): — Desde o início desta Legislatura que temos sabido ouvir alunos, pais,

educadores, professores e sindicatos, estar no terreno para, depois, agir, porque o conhecimento precede

sempre a ação política, que se quer responsável, participada e qualificada. Enfim, tudo o que o CDS não fez, ao

apresentar uma iniciativa que mexe no pilar do sistema educativo e, como tal, deveria ser precedida de um largo

consenso, devendo espelhar um repensar da educação para os próximos anos. Não se vislumbra esse repensar,

essa estratégia, esse arejamento ou a modernidade.

Este agendamento e iniciativa surgem, aliás, ao arrepio de vários processos que estão neste momento em

curso, quer ao nível do Conselho Nacional de Educação, quer com equipas intergovernamentais e associações

representativas, designadamente no campo da descentralização de competências em matéria educativa.

Foi um processo responsável e amadurecido, como se exige? Não. De todo, a responsabilidade não passou

por aí.

Afinal, o que pretende o CDS? Convergência e discussão alargada ou, mais uma vez, antecipar-se ao PSD,

também nesta área?

A educação não merece posições conjunturais ou antecipações táticas, merece, ao invés, todo o nosso

esforço coletivo, uma agenda, auscultação da base para o topo e reflexão sustentada.

Vozes do PS: — Muito bem!

A Sr.ª Susana Amador (PS): — Na verdade, algumas das alterações operadas rigidificam o sistema, trata-

se como mero despacho uma lei que deve ser enquadradora e confundem-se princípios com normas de gestão

e com medidas de opções políticas que os anteriores Governos PSD/CDS implementaram com enorme

sobressalto.

Por seu turno, o PS, com o apoio dos partidos da esquerda, tem vindo a repor a serenidade e a respiração

democrática no sistema educativo. Foi assim com a abertura do ano letivo,…

A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — Foi?!

A Sr.ª Susana Amador (PS): — … foi assim com a universalização do pré-escolar, que se materializou,

desde logo, na abertura de 100 novas salas,…

A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — Está um bocadinho fora da realidade!

A Sr.ª Susana Amador (PS): — … num quadro de forte cooperação com o setor solidário e social. Este será,

aliás, o primeiro ano de implementação das Orientações Curriculares para a Educação Pré-Escolar, sendo certo

que, para o PS, repensar a educação pré-escolar exige pensar a educação a partir dos 0 anos, desde o

nascimento.

É com imensa esperança que verificamos o Programa Nacional de Promoção do Sucesso Escolar, baseado

em planos de combate ao insucesso educativo e que já envolve 800 escolas, bem como as tutorias no ensino

básico, que vão reforçar mecanismos de acompanhamento individualizado dos alunos com maiores dificuldades

e que abrangerão cerca de 25 000 alunos.

Pela primeira vez na nossa história, Srs. Deputados e Sr.as Deputadas, foram atribuídos manuais escolares

a 80 000 alunos inscritos no 1.º ano do ensino básico, público e privado, o que, com o congelamento do preço

dos manuais, representará uma redução muito significativa para as despesas das famílias.

Concretiza-se também neste novo ano escolar um novo modelo de avaliação no ensino básico, que assume

as provas como instrumentos de melhoria da aprendizagem e não como processos que fomentam a exclusão.

Sr.as Deputadas e Srs. Deputados: Em matéria de educação, a nossa inspiração e estabilidade será sempre

a Constituição da República. Por isso a cumprimos, com as medidas já adotadas de valorização da rede pública,

no seu hardware e software, centradas na qualidade do ensino e aprendizagens, numa rede de cobertura

universal cuja racionalidade não admite redundâncias nem financiamentos injustificados. Não haverá

retrocessos nesta matéria, nem fugas para a privatização do ensino, ancoradas em livres escolhas e em novas

leis de bases com «pele de cordeiro».

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O Sr. Porfírio Silva (PS): — Exatamente!

A Sr.ª Susana Amador (PS): — Em matéria de educação, os alunos e as suas aprendizagens e formação

integral serão sempre o centro das nossas preocupações. Por isso os queremos ouvir, valorizar as suas

atividades não curriculares, estimular a sua participação nos orçamentos participativos, despertá-los para o

conhecimento, para a inovação, para novos modelos de aprendizagem, para que voltem a gostar da escola e

de estar na escola, dado que se afastaram da mesma, como bem alerta o relatório Estado da Educação 2015.

Em matéria de educação, os professores, os pais e o pessoal não docente podem e devem ser valorizados

e, por isso, também os queremos ouvir sobre as alterações a efetuar à Lei de Bases, a seu tempo, porque a

dimensão e natureza desta Lei de Bases do Sistema Educativo assim o exige.

Para concluir, responderemos com um plano de trabalho sustentado nas novas orientações para o currículo,

ouvindo da base para a estrutura de topo e, sobretudo, com elevado sentido de responsabilidade e busca de

convergências e consensos, visando a construção de um sistema educativo e de uma escola para o Século XXI,

porque a responsabilidade, a modernidade, a educação e a liberdade estão sempre a passar por aqui!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Também para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Amadeu

Soares Albergaria.

O Sr. Amadeu Soares Albergaria (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados: Já afirmámos

que consideramos oportuno rever e propor alterações a esta lei estruturante do sistema de educação e formação,

ajustando-a às novas realidades e desafios do serviço público de educação.

É consensual que o nosso País conseguiu, nos últimos 30 anos, ultrapassar défices acumulados de

qualificação. Melhorámos continuamente, e muito, nos principais indicadores qualitativos internacionais, e isso

foi bom para Portugal.

Mas é também consensual que muito há a progredir, que muito há a fazer e que muito há a debater para

atingirmos um sistema educativo de qualidade, ajustado não só à realidade atual mas também àqueles que

serão, previsivelmente, os principais desafios de desenvolvimento do País.

Queremos um sistema educativo capaz de permitir que cada um dos portugueses alcance a sua felicidade

pessoal. Queremos um sistema educativo que, iniciando-se no pré-escolar, garanta boa e sólida formação no

ensino básico e secundário, robustecendo a formação superior e a investigação. Queremos um sistema capaz

de alavancar o desenvolvimento social e económico de Portugal.

Sr. Presidente, revisitar a Lei de Bases é olhar também para a nossa sociedade democrática e livre, para o

seu funcionamento, para a sua vivência e para os seus desafios num mundo globalizado.

Que sociedade queremos para os nossos filhos e netos? Como podemos melhorar e assegurar uma justa

igualdade de oportunidades? Como podemos reforçar a liberdade de aprender e ensinar? Como podemos

promover a qualidade da educação e da formação? Como podemos preparar melhor o sistema educativo para

dar resposta não apenas às necessidades do presente mas, sobretudo, às necessidades do futuro? Que visão

temos para o ensino e para o desenvolvimento de Portugal?

Esta não é, nem pode ser, uma visão imposta por alguns, por minorias ou maiorias de ocasião, por interesses

de corporações ou por uma visão toldada por preconceitos ideológicos. Tem necessariamente de ser uma visão

partilhada por todos, que promova a verdadeira igualdade de oportunidades, que amplie a liberdade dos

estudantes no desenvolvimento dos seus projetos de vida, que robusteça a formação superior e avançada, que

estimule a investigação, que crie condições para um crescente envolvimento da sociedade civil, que facilite a

transferência de conhecimento para o tecido produtivo e que, com isso, promova o progresso do nosso País.

Isto significa que qualquer revisão da Lei de Bases tem de estar alicerçada num debate seguro, informado e

participado. Esta reflexão não pode ser objeto de agendas político-partidárias pontuais ou contextuais mas,

antes, de um consenso social e político muito alargado que garanta a perenidade, a estabilidade e a

previsibilidade do sistema educativo português.

Esta é uma reflexão que foi, e está a ser, desenvolvida pelo Conselho Nacional de Educação. Considerámos

prudente esperar por este valiosíssimo contributo. Mas é também uma ponderação que está a ser promovida

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pelo Partido Social Democrata, no âmbito do seu fórum das políticas sociais, e que continuará com um trabalho

de grande proximidade relativamente aos que, no dia a dia, dão expressão a esta lei estruturante.

Feito este trabalho participado e aberto a todos, o PSD não deixará de, oportunamente, apresentar o seu

projeto de revisão da Lei de Bases, mas há linhas que não ultrapassamos e tudo faremos para que não sejam

ultrapassadas. E o contexto atual deixa-nos particularmente apreensivos.

O modelo de sociedade que defendemos não é o de uma sociedade estatizada, igualitarista, centralizada,

que desconfia da sociedade civil, das pessoas e da iniciativa privada,…

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!

O Sr. Amadeu Soares Albergaria (PSD): — … é, pelo contrário, um modelo de sociedade que promove a

equidade, a justiça social, que acredita nas pessoas e nas suas instituições. E isso traduz-se num sistema

público de educação encarado como um serviço público, que tenha como foco central o estudante e a qualidade

na educação e na formação prestada, que garanta a qualidade na educação para todos, que aposte na

autonomia dos projetos educativos, que promova a relação com a comunidade educativa alargada, que amplie

a flexibilidade e a liberdade de cada vez mais ensinar melhor para melhor aprender, que assuma a

descentralização de competências. Queremos um sistema público de educação cada vez mais moderno e

inovador, capaz de capacitar mais eficazmente os nossos estudantes para liderarem a revolução digital a que

se assiste.

Nos seus 30 anos, a Lei de Bases merece ser revisitada. O PSD contribuirá ativamente para esse debate.

Entendemos este projeto de lei como um contributo positivo. Temos pontos que nos aproximam e pontos que

nos merecem mais reflexão, mas esse é um debate que teremos e para o qual chamamos todos os partidos

com assento parlamentar.

O PSD, como partido reformista que é, não deixará de contribuir para a construção de um sistema educativo,

do pré-escolar ao universitário, de e para o futuro. É isso que os portugueses aspiram, é esse o nosso dever e

propósito. É isso que faremos.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Srs. Deputados, relembro que procederemos a uma votação no final

deste debate.

Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Paula Santos.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A marcação deste debate só veio

confirmar aquilo que o PCP vinha dizendo.

De facto, é à rede pública de ensino que cabe garantir a cobertura de estabelecimentos; se assim não fosse

o CDS não teria tido a necessidade de trazer uma proposta em que introduz os privados, como se de rede

pública se tratasse, e quer tratar tudo por igual, para beneficiar e financiar as escolas privadas.

Trouxeram aqui preocupações com os estudantes e as famílias. Mas está o CDS verdadeiramente

preocupado com os estudantes e as famílias? Quando esteve no Governo só lhes dificultou a vida, oferecendo-

lhes mais precariedade, desregulamentação do horário de trabalho, das condições e dos direitos. Dificultaram

as condições para as famílias acompanharem os seus filhos na escola.

Quis o CDS transpor para a Lei de Bases do Sistema Educativo a sua opção política e ideológica. Colocou

na Lei de Bases do Sistema Educativo a causa dos problemas da escola pública e da educação, mas o

verdadeiro problema está não só no incumprimento e na violação da própria Lei de Bases mas na sua prática

política, porque, quando foram Governo, tudo fizeram para destruir, desqualificar a escola pública.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Peço-lhe o favor de concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Vou terminar, Sr. Presidente.

A opção do CDS é muito clara: a escola pública é destinada aos mais pobres, aos excluídos, aos filhos dos

trabalhadores, enquanto salvaguarda uma escola de qualidade para a elite da sociedade portuguesa.

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O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem mesmo de concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Rejeitamos completamente esta perspetiva, esta visão, Sr. Presidente, e não

compactuaremos com este embuste, porque a escola pública de qualidade é aquela que é para todos: universal,

gratuita e democrática.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete João.

A Sr.ª Odete João (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Após 30 anos da aprovação da Lei de

Bases do Sistema Educativo, é tempo de revermos o caminho que foi feito e, também, de lembrar e elogiar os

homens e as mulheres que, em 1986, contribuíram para a sua elaboração e aprovação.

Desde logo, sublinhamos a longevidade e a vitalidade deste importante diploma, no que se refere à

organização do sistema educativo e à sua estrutura, que continua a ser uma referência para professores,

famílias, autarcas e restantes parceiros sociais. Longevidade e vitalidade devem ser valorizadas.

A constância jurídica desta lei no tempo resulta de, na sua origem, ter estado um profundo trabalho técnico

de preparação, mas, sobretudo, um acordo político de princípio que envolveu a quase totalidade dos partidos

com assento parlamentar.

Neste contexto, a iniciativa que o CDS traz a esta Câmara — de alteração da Lei de Bases —, sem estar

alicerçada em estudos e fundamentos adequados, é extemporânea e só pode ser justificada pela pretensão de

procurar impor uma visão restritiva do próprio sistema educativo.

Ao longo dos anos, sempre se privilegiou, na apreciação da Lei de Bases do Sistema Educativo, o consenso

e a construção de maiorias alargadas em vez de um ganho político imediato e conjuntural ditado por um taticismo

que se esgota em si mesmo.

Desde a aprovação da Lei de Bases, em 1986, por uma larga maioria de que o CDS não fez parte, procedeu-

se a três alterações, todas sob a égide do Partido Socialista, em 1997, em 2005 e em 2009, nomeadamente aos

graus ministrados nos institutos politécnicos, à organização de graus e diplomas no ensino superior, acolhendo

a adequação ao processo europeu de Bolonha, ao alargamento da escolaridade obrigatória para 12 anos e à

universalização do pré-escolar a partir dos cinco anos.

Pelo caminho ficou a alteração à Lei de Bases em 2003, proposta pelo Governo de então, PSD/CDS, e que

foi vetada pelo Sr. Presidente da República por entender que não estavam reunidos os consensos necessários,

para além de existirem fundadas dúvidas sobre a constitucionalidade de algumas normas. Este ataque do

PSD/CDS aos princípios da Lei de Bases do Sistema Educativo teve continuidade no anterior Governo, primeiro,

com o encaminhamento precoce dos alunos para vias vocacionais, cerceando os seus percursos e, depois, com

o instituírem os exames como único critério de seriação dos alunos,…

Vozes do PS: — Muito bem!

A Sr.ª Odete João (PS): — … ambos eram parte integrante de um modelo de segregação social dos nossos

jovens e que, agora, esta iniciativa quer replicar.

Também as alterações no currículo, implementadas pelo anterior Governo, tornaram incoerente a sua

estrutura, menorizaram algumas áreas do currículo, como a das Expressões, com prejuízo para a formação

global dos alunos. Estas alterações contrariaram os princípios da Lei de Bases e foram objeto de críticas

generalizadas pelas associações científicas e profissionais e pela sociedade em geral.

Vozes do PS: — Exatamente!

A Sr.ª Odete João (PS): — O desinvestimento feito na escola pública, perpetrado pelo Governo PSD/CDS,

teve várias dimensões, desde logo, nos contratos de associação estabelecidos com o ensino particular e

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cooperativo, quando existiam escolas públicas com capacidade para receber os alunos, para além da paragem

das obras de requalificação das escolas secundárias.

O Governo PSD/CDS desmantelou a educação e formação de adultos. Nunca tantos tiveram tão poucas

oportunidades de formação, quando se sabe que cerca de 55% de cidadãos entre os 25 e os 64 anos não têm

o ensino secundário completo e num País em que as insuficiências na qualificação representam um entrave

estrutural ao seu desenvolvimento.

Face a este drama coletivo, a ação do Governo anterior foi um estrondoso retrocesso e um fracasso rotundo,

e agora nada diz!

Sr.as e Srs. Deputados, o Partido Socialista está determinado em colocar a escola pública no caminho de

onde nunca deveria ter saído e em não deixar nenhum aluno para trás, aumentando o nível de qualificações de

todos os cidadãos.

O caminho a percorrer far-se-á com debates aprofundados e amplos consensos de modo a responder aos

desígnios e aos objetivos que o futuro exige de nós.

Sabemos que as leis não são estáticas. Reconhecemos que as transformações económicas, sociais e

culturais concorrem para a necessidade de antecipar no sistema educativo as mudanças a que assistimos no

mundo que nos rodeia. No entanto, o aperfeiçoamento a introduzir no enquadramento jurídico do sistema

educativo, a ocorrer, tem de resultar de amplos compromissos políticos e de consensos que devem estar

alicerçados em estudos e avaliações, tendo sempre por perspetiva estratégica o desenvolvimento das

qualificações dos portugueses e do País.

É neste contexto que devemos serenamente aguardar os resultados dos estudos e das reflexões em curso,

como os que são promovidos pelo Conselho Nacional de Educação, através do ciclo de conferências que

encetou com especialistas, ou do grupo de trabalho constituído no Ministério da Educação sobre o perfil de

competências dos alunos à saída do secundário, independentemente de virem a ser tomadas outras iniciativas

para aprofundar o debate e construir soluções conjuntas.

Portanto, a forma e o modo como o CDS pretende alterar a Lei de Bases nega os princípios da estabilidade

e da confiança que anunciam.

Vozes do PS: — Muito bem!

A Sr.ª Odete João (PS): — A iniciativa do CDS é também, por isso, extemporânea e insiste numa via que o

País já deu provas de não querer continuar a percorrer. Um caminho incapaz de responder aos desafios do

presente, não contribuindo para dar resposta às carências e insuficiências do nosso sistema educativo, no

respeito pelo princípio da igualdade de oportunidades e do futuro de todos os portugueses.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para a última intervenção deste debate, tem a palavra a Sr.ª Deputada

Assunção Cristas, do CDS-PP.

A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Nesta tarde, ouvimos um

exercício de debate nesta Câmara que eu diria que, não fosse termos já um histórico do lado do CDS nestas

matérias de trazer temas para agendamentos potestativos e de ouvir a reação dos partidos nesta Câmara, seria

até surpreendente.

Não desistimos, insistimos. Trouxemos os temas da natalidade e do apoio à família, temas estruturantes,

essenciais e que eu diria que tinham tudo para serem consensuais nesta Câmara; trouxemos o tema da proteção

aos idosos e do envelhecimento ativo, que ainda está a aboborar em comissão, até agora sem nenhum

progresso; trouxemos um mínimo de proposta de consenso em matéria de segurança social, e para todos esses

temas a resposta desta Casa foi que o CDS não tem legitimidade para os discutir, não pode sequer pensar em

trazê-los a esta Câmara, não deve trazer para aqui estas matérias. E em todos esses casos nos atiraram com

o passado.

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Pois bem, queria dizer-vos que, nesses casos, e neste tema da educação, temos os olhos postos no futuro,

só no futuro, e não declinamos o nosso direito e dever, enquanto Deputados e enquanto grupo parlamentar, de

trabalhar em prol de Portugal, das suas famílias, dos seus alunos e dos seus professores.

Aplausos do CDS-PP.

Queria dizer-vos que, lá fora, as pessoas certamente não compreenderão. O que hoje trouxemos a este

Parlamento foi uma proposta de início de debate, de um debate aberto, com certeza com a participação de

todos, de um debate que acolheu aquele que está a ser feito lá fora em fóruns diversos, nomeadamente pelo

Conselho Nacional de Educação, e as conclusões que até agora já são conhecidas e, certamente, a convicção

de que um ano parlamentar inteiro — e se calhar nem um — não é suficiente para debater, aprofundar e chegar

a conclusões nessa matéria.

Sr.as e Srs. Deputados, o que nós, no CDS, não admitidos, e jamais admitiremos, é que nos queiram limitar

na nossa liberdade de propositura e de escolha do calendário, porque achamos que este é o momento para

iniciar esse debate. Se outros acham que é outro o momento, pois com certeza que cá estaremos nesse

momento, cá estaremos com as nossas propostas que já foram apresentadas e com outras tantas que teremos

oportunidade de trabalhar até lá.

Incomoda a alguns que o CDS trabalhe, que trabalhe muito? Que seja rápido? Lamento, é assim que

fazemos. Fazemos bem, fazemos com muito afinco, fazemos procurando os momentos certos e achámos que

o início do ano escolar e a comemoração dos 30 anos da Lei de Bases do Sistema Educativo seria o momento

certo não para excluir ninguém mas para dar o nosso contributo, e o contributo para este debate, para quem

exerce o mandato dado pelo povo, o mandato representativo do povo, é feito nesta Casa, é feito no Parlamento.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Trabalham para a efeméride!

A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — Lamento, porque hoje o que vi de todas as bancadas, praticamente

sem exceção, foi um desmerecer do próprio Parlamento, dizendo «é preciso que outros discutam». Pois bem,

esta é a nossa Casa, esta é a Casa da Democracia, esta é a Casa de todos os portugueses e é aqui que temos

de apresentar as nossas propostas e de as discutir, e se as temos prontas, pois que as tragamos. Se os senhores

têm ideias, pois que as tragam!

Aplausos do CDS-PP.

Se não as têm agora, nós esperamos, não temos problema nenhum. Mas penso que lá fora ninguém

compreende que esta Casa não queira trabalhar no sentido de, por exemplo, dar estabilidade às políticas de

educação. Quem, nesta Casa, está contra a que não se alterem regras durante seis anos, regras nos programas,

regras nas avaliações, regras em relação aos próprios manuais e à organização dos ciclos?

O Sr. Porfírio Silva (PS): — Por que não fizeram isso? Que incoerência!

A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — Quero crer que não há ninguém. Se calhar, precisamente porque se

ocuparam a explicar como houve tantas mudanças, talvez devessem ser mais sensíveis à estabilidade.

Devo dizer que eu e os meus colegas do CDS andamos de norte a sul do País, falamos com as escolas, com

diretores, com professores, com alunos e com pais e de todos ouvimos a mesma coisa: «estabilidade, por favor

deem-nos estabilidade, deem-nos tranquilidade nas escolas». E é isso exatamente que queremos propor daqui

para o futuro, estabilidade.

Isto não é a favor nem contra nenhum governo, que fique muito claro. Se os senhores quisessem até

estaríamos disponíveis para cristalizar este momento. É assim que acham que está bem? Pois cristalizemos,

mas durante seis anos não se mude nada, avalie-se, avalie-se com tranquilidade, avalie-se com profundidade e

com firmeza e depois, então, ajuste-se e mude-se.

Lamento que não haja neste momento abertura. Mas percebi que há, só que, neste momento, há taticismo.

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Protestos do PCP.

Não quero crer que as Sr.as e Srs. Deputados não tenham ideias sobre essa matéria.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Peço-lhe o favor de concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — Aliás, já o PSD assim o referiu, de forma muito clara. Foram os únicos

que disseram que teriam um momento para apresentar as suas propostas. Pois bem, as nossas estão aqui e

certamente que aqui estaremos para conferir, para dialogar, para as confrontar com as de todos os grupos

parlamentares.

Habituem-se. Podemos ser incómodos? Pois seremos, mas não declinamos o nosso direito e o nosso dever

de trazer a esta Casa, sempre, matérias que julgamos serem importantes para o dia a dia dos portugueses,

importantes para gerar consensos, importantes para dar estabilidade. Foi assim na educação, foi assim noutras

matérias e continuaremos a trazê-las. Quem fica mal nesta fotografia, Srs. Deputados, é quem não quer discutir,

é quem não quer conversar.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Chegámos assim ao final deste debate, sendo este o momento de

passarmos à votação da iniciativa legislativa subjacente.

Vamos proceder à verificação do quórum de deliberação, utilizando o sistema eletrónico.

Pausa.

Sr.as e Srs. Deputados, o quadro eletrónico regista 195 presenças, às quais se acrescentam os Srs.

Deputados Amadeu Soares Albergaria, Fernando Virgílio Macedo e José Pedro Aguiar Branco, do PSD, e

Bacelar de Vasconcelos, Carlos Pereira e Fernando Anastácio, do PS, o que perfaz 201 Deputados, pelo que

temos quórum.

Vamos, então, votar, na generalidade, o projeto de lei n.º 306/XIII (2.ª) — Altera a Lei de Bases do Sistema

Educativo (CDS-PP).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do BE, do PCP e de Os Verdes, votos a favor

do CDS-PP e a abstenção do PSD.

Está assim concluído este ponto da nossa ordem de trabalhos.

Sr.as e Srs. Deputados, tal como estabelecido por concordância entre a Mesa e os vários grupos

parlamentares é o momento de pormos à consideração do Plenário o voto n.º 136/XIII (2.ª) — De congratulação

pela indicação à Assembleia Geral, pelo Conselho de Segurança, de António Guterres para o cargo de

Secretário-Geral da Organização das Nações Unidas (Presidente da AR, PS, PSD, CDS-PP, PCP, BE, Os

Verdes e PAN).

Passarei a ler o voto:

«O Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU) aprovou hoje o nome de António

Guterres, por aclamação, para o cargo de Secretário-Geral da ONU, a indicar à Assembleia-Geral.

Esta decisão do Conselho de Segurança da ONU representa o culminar de um inovador e longo processo

realizado nas Nações Unidas, com sucessivas audições, debates e votações, sempre vencidas com enorme

brilho e sucesso por António Guterres, dando ao mundo o testemunho do significado que terá a força de uma

nova liderança ancorada na fidelidade à Carta das Nações Unidas e aos seus princípios e valores,

nomeadamente da paz, da cooperação e do respeito pela igualdade entre Estados soberanos e independentes.

A candidatura de António Guterres ultrapassou a mais importante das etapas, para a qual foram

determinantes as suas capacidades e a sua experiência, testadas ao longo de uma carreira ao serviço das

pessoas e da causa pública, nomeadamente durante os 10 anos em que liderou o Alto Comissariado das Nações

Unidas para os Refugiados.

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Pelas suas qualidades humanas, políticas e intelectuais, António Guterres é, sem sombra de dúvida, uma

personalidade particularmente preparada para enfrentar a complexidade dos problemas do mundo atual e foram

os seus méritos que se revelaram capazes de mobilizar, no País, o empenhamento dos órgãos de soberania, o

esforço da diplomacia, o apoio do conjunto das forças políticas e da sociedade portuguesa, tornando a sua

candidatura, a todos os títulos, uma candidatura exemplar.

António Guterres, como futuro Secretário-Geral da ONU, é uma garantia em prol de uma ordem internacional

com menos conflitos, com adequado apoio às necessidades das populações perante crises humanitárias e com

um trabalho efetivo e consequente pela segurança e pela paz entre povos e nações.

Há uma Nação que se enche de orgulho e emoção, primeiro com a conferência de imprensa do Conselho de

Segurança, e, depois, com a indicação, por aclamação, feita à Assembleia Geral.

A Assembleia da República, reunida em sessão plenária, congratula-se vivamente com a indicação de

António Guterres à Assembleia Geral para o cargo de Secretário-Geral da Organização das Nações Unidas,

ocorrida hoje, dia 6 de outubro, pelo Conselho de Segurança, e aguarda, com grande expectativa, a confirmação

da sua eleição pela Assembleia-Geral da ONU.»

Sr.as e Srs. Deputados, vamos proceder à votação deste voto de congratulação.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade e aclamação, registando-se a ausência do PAN.

Segue-se um período de intervenções sobre o tema objeto do voto que acabou de ser aprovado.

Em primeiro lugar, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Montenegro.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em nome da bancada parlamentar

do PSD, quero felicitar o Eng.º António Guterres por esta indicação. Creio que ela é motivo de alegria e de

orgulho para todos os portugueses e, nessa medida, o Parlamento, como fórum representativo da vontade

popular do povo português, não pode deixar de se associar a este momento e endereçar, em primeira linha, ao

próprio, a sua palavra de felicitação.

Tal como o voto refere, é o culminar de um processo exigente, que ficou marcado pela competência com que

o Eng.º António Guterres o foi trilhando e que foi somando os apoios que permitem, hoje, esta indicação.

Queria também, em nome do PSD, enaltecer a proficiência de toda a nossa estrutura diplomática, que teve

aqui mais uma demonstração da excelência do seu trabalho e do resultado, que também lhe é devido, que

conseguimos obter.

Finalmente, Sr.as e Srs. Deputados, uma palavra também para registar o espírito verdadeiramente nacional

que envolveu os órgãos de soberania; a saber, o Sr. Presidente da República e o Governo, os partidos políticos,

personalidades e instituições da nossa comunidade, que cooperaram em busca daquilo que, estou convencido,

representa também o interesse nacional.

Sr.as e Srs. Deputados, o Eng.º António Guterres já evidenciou qualidades para poder liderar uma nova

agenda no mais relevante fórum de encontro dos povos e das nações do mundo. Através dele, Portugal

continuará a ser uma parte ativa numa agenda de paz, de cooperação e de solidariedade entre as nações; uma

agenda focada no desenvolvimento económico e social, mas sempre direcionada para o reconhecimento e para

a salvaguarda dos direitos humanos; uma agenda atenta às tensões e conflitos regionais, aos equilíbrios

geopolíticos, mas também às ameaças de posições radicalistas, se não — e, às vezes, mesmo — de fanatismos

ideológicos e civilizacionais; uma agenda atenta aos novos fluxos migratórios e ao flagelo que atinge muitas

pessoas que hoje fogem da guerra e da morte, precisamente, de uma forma desesperada, a que nenhuma nação

ou organização internacional pode ficar indiferente; e uma agenda também ativa e pró-ativa na preservação do

nosso planeta, do ambiente, relativamente às alterações climáticas, a tudo o que são preocupações de médio e

de longo prazo.

Termino, Sr. Presidente, dizendo que todos estes desafios são muito exigentes, mas nós temos uma grande

confiança em que, através deste nosso concidadão, Portugal vai, como noutros momentos da nossa história,

estar na primeira linha daquilo que é uma preocupação global com o bem-estar dos seres humanos.

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Vamos, mais uma vez, ser parte do futuro, ser parte da aproximação dos povos e das culturas, ser parte da

obtenção da paz, da preservação dos direitos humanos, de forma solidária, para que todos tenham acesso a

uma vida tranquila e feliz.

Sr.as e Srs. Deputados, vivemos, hoje, mais um capítulo da vocação ecuménica do nosso povo, do nosso

querido Portugal. É mais uma forma de expressarmos aquilo que, ainda recentemente, na posse de Sua

Excelência o Sr. Presidente da República, aqui ficou evidenciado, com uma força grande desta nossa Nação

que é Portugal.

Aplausos do PSD, do PS e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para uma intervenção, tem a palavra, em representação do PS, o Sr.

Deputado Carlos César.

O Sr. Carlos César (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: António Guterres será o novo Secretário-

Geral das Nações Unidas. Esperam-no tarefas de enorme complexidade nos domínios da recuperação da

credibilidade da instituição aos olhos do mundo, mas, sobretudo, da regulação e da boa influência na resolução

de inúmeras pendências, que fazem perdurar, nas mais diversas partes do globo, conflitos, intolerâncias,

disfunções e desigualdades incompatíveis com a dignidade humana.

A sua eleição é uma grande alegria para todos nós. Para o PS, evidentemente, por razões de filiação natural,

mas para todos os portugueses, independentemente da sua condição e das suas preferências partidárias.

É uma vitória do mérito próprio, da humildade cívica e de uma vida ao serviço das pessoas. De uma vida

cívica empenhada, persistente e corajosa; de uma reiterada vontade de ajudar a construir; de uma competência

testada aos mais diversos níveis e cenários; de um indomável inconformismo; de um indestrutível sentido

humanitário; de uma determinação que nunca escapou ao diálogo e à moderação; de uma elevada consciência

sobre o valor de uma ação diplomática ativa ao serviço da concertação mundial e regional.

A sua nova condição de líder das nações é motivo de júbilo para uma instituição como a Assembleia da

República, que ele aqui serviu, justamente, entre outras formas, como Presidente do Grupo Parlamentar do

Partido Socialista, no qual, então, tive também a honra de servir.

E está também de parabéns o Governo e a diplomacia portuguesa.

É uma grande notícia para Portugal e, assim esperamos, uma boa notícia para o mundo, um mundo que

tanto necessita de quem o sirva com razão e com coração.

Aplausos do PS, do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem a palavra, em nome do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda,

o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares,

Sr.as e Srs. Deputados: António Guterres foi aclamado como o novo Secretário-Geral da ONU e indicado pelo

seu Conselho de Segurança. É um motivo de regozijo para todas e todos nós e pelo qual o cumprimentamos.

É, em primeiro lugar, a vitória de um processo diplomático limpo e transparente, que conseguiu vencer as

jogadas de bastidores, algumas das quais chegaram mesmo do coração da Europa.

É uma vitória que revigora a própria ONU, mostrando que nem sempre as suas decisões são determinadas

pela tecnocracia, pelo calculismo político ou pelos alinhamentos internacionais, mas é também a vitória das

prioridades sobre a política internacional que António Guterres adotou como Alto-Comissário da ONU para os

Refugiados, e esperamos que essas continuem a ser o seu principal desafio agora, como Secretário-Geral das

Nações Unidas.

Num mundo cada vez mais complicado, a ONU perdeu objetivamente capacidade de influência e, dessa

forma, ficou mais frágil a defesa do direito internacional na solução pacífica dos conflitos e na defesa dos direitos

humanos.

Numa realidade que tantas vezes ultrapassa a própria ONU, é necessário repor a agenda da defesa desses

princípios e destes direitos nas preocupações das nações.

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É isso que consideramos ser exigível a António Guterres e que confiamos que ele alcançará.

Em nome da bancada parlamentar do Bloco de Esquerda, desejamos as maiores felicidades ao Secretário-

Geral das Nações Unidas, António Guterres, e esperamos que a esperança nele depositada se materialize numa

nova centralidade da paz e dos direitos humanos no mundo.

Aplausos do BE, do PS e do PCP.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para uma intervenção, tem a palavra, em nome da bancada do CDS-PP,

o Sr. Deputado Nuno Magalhães.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A eleição, por aclamação, do

Eng.º António Guterres para Secretário-Geral da ONU honra Portugal e seguramente honrará as Nações Unidas.

É uma vitória, em primeiro lugar, de António Guterres, das suas qualidades, da sua personalidade, do seu

percurso, mas é também uma vitória da transparência no método de escolha do Eng.º António Guterres e do

novo Secretário-Geral das Nações Unidas. Nesse sentido, é também uma vitória das próprias Nações Unidas,

mas também realça a capacidade da diplomacia portuguesa e a postura irrepreensível que teve desde o início

do processo.

Será certamente um mandato exigente, num mundo cada vez mais complexo e com desafios cada vez mais

difíceis: das crises humanitárias e dos refugiados — bem conhecidas, de resto, daquele que será o novo

Secretário-Geral das Nações Unidas — à instabilidade global, às crises humanitárias, à guerra e aos problemas

sociais e económicos. E também, porque não, aproveitando esta transparência na forma de designação,

reformar a própria ONU, tornando-a mais aberta e mais próxima de todos nós, menos burocrática e mais

decisória?

Estamos em crer que António Guterres, pelas suas qualidades pessoais e pelo seu percurso, estará

certamente à altura. O CDS sempre, e sem reservas, apoiou esta candidatura naquilo que foi um esforço

nacional e a capacidade de vários órgãos de soberania e entidades colocarem o interesse nacional acima de

qualquer divergência.

Por isso, felicitamos António Guterres pela sua eleição e desejamos-lhe as maiores felicidades.

Aplausos do CDS-PP e do PS.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para uma intervenção, tem a palavra, em nome da bancada do PCP, o

Sr. Deputado João Oliveira.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Com este

voto de congratulação, a Assembleia da República assinala a indicação de António Guterres para Secretário-

Geral das Nações Unidas pelo Conselho de Segurança, significando isso, como, de resto, o próprio voto indica,

que ficou ultrapassada a mais importante das etapas para a sua eleição como Secretário-Geral das Nações

Unidas. Por isso, queremos cumprimentar, em primeiro lugar, o Eng.º António Guterres.

Esta indicação conclui um processo de apreciação de diversas candidaturas, entre as quais António Guterres

se destacou desde o início, o que é indissociável da sua capacidade e da sua experiência, e não deixa

igualmente de estar associada ao exercício das responsabilidades que assumiu como Alto-Comissário das

Nações Unidas para os Refugiados, particularmente num momento em que a situação internacional,

designadamente em resultado do agravamento de conflitos militares, da guerra, ficou marcada, de forma

dramática, pelo agravamento do drama dos refugiados.

Com este voto de congratulação, a Assembleia da República assinala esta indicação de António Guterres

para um importante cargo da diplomacia internacional, ao mesmo tempo que sublinha as exigências que esse

cargo comporta, não só quanto à defesa e ao respeito do direito internacional como consagrado nos princípios

e nos valores transpostos para a Carta das Nações Unidas, mas também quanto à necessidade de uma ação a

favor da promoção da paz, do diálogo e da cooperação entre povos e Estados, do desenvolvimento económico

e social, no respeito pelos direitos dos povos e pela soberania e independência dos Estados.

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Em nome do Grupo Parlamentar do PCP, queremos, portanto, deixar também ao Eng.º António Guterres os

nossos votos de sucesso na exigente missão que tem pela frente.

Aplausos do PCP e do PS.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para uma intervenção, tem a palavra, em nome da bancada de Os

Verdes, a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª HeloísaApolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, em nome do Grupo

Parlamentar de Os Verdes, quero também saudar a eleição de António Guterres para o cargo de Secretário-

Geral das Nações Unidas.

Gostaria de sublinhar o facto — já foi referido por outras bancadas — de termos estado perante um processo

longo de eleição sempre vencido em cada etapa por António Guterres.

Gostava também de sublinhar que, além das suas outras capacidades reconhecidas e já aqui expostas por

outras bancadas, a sua significativa experiência adquirida como Alto-Comissário da ONU para os Refugiados

deu-lhe certamente um conhecimento muitíssimo real dos problemas, como o próprio teve ocasião de salientar

— a fome, a miséria, a pobreza, o medo, a discriminação, a fuga à guerra a que tantos seres humanos estão

sujeitos e de que são vítimas, quantas vezes como se de uma pena perpétua se tratasse.

As funções que desempenhou durante 10 anos deram-lhe certamente uma bagagem para uma intervenção

consequente, agora a outro nível, nas Nações Unidas.

O desejo que temos é que António Guterres possa ser o rosto de uma Organização das Nações Unidas fiel

aos princípios da Carta das Nações Unidas, pela paz, pela cooperação entre os povos, pelo respeito e pela

igualdade de estados soberanos, pelo direito à autodeterminação dos povos e também com uma profundíssima

consciência de que estamos hoje perante novos desafios, como as alterações climáticas ou a quebra brutal da

biodiversidade no nosso planeta, que desestabilizam o planeta e de que este tanta necessidade tem para todos

os seres humanos e para o desenvolvimento que nele queremos proporcionar.

Sr. Presidente, o Partido Ecologista «Os Verdes» saúda e deseja os maiores sucessos a António Guterres

como Secretário-Geral das Nações Unidas.

Aplausos de Os Verdes, do PS e do PCP.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tendo-se o Governo associado a este voto que acabou de ser votado

pela Câmara, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (Pedro Nuno Santos): — Sr. Presidente, Sr.as e

Srs. Deputados: Como devem imaginar, foi com grande satisfação e orgulho que o Governo recebeu a notícia

da confirmação da nomeação de António Guterres como Secretário-Geral das Nações Unidas.

As razões desta vitória são várias, mas a primeira, bem distante de qualquer outra, foram, e são, as

qualidades incontestáveis e absolutamente consensuais de António Guterres: a sua vastíssima experiência

política, nomeadamente em matéria de política e relações internacionais, o seu vastíssimo conhecimento das

instituições internacionais, a sua longa carreira de dedicação à causa pública, o genuíno humanismo que o

distingue de tantos homens que se dedicam à vida política.

Como tão bem disse o Sr. Presidente da República ainda hoje, ganhou o melhor. E, quando é assim, não é

apenas bom para António Guterres, é-o também para as Nações Unidas. As Nações Unidas conseguiram eleger

o melhor, e esta é mesmo a maior vitória de todo este processo.

Queremos destacar o papel de Portugal como construtor de pontes. Esse é um papel que é reconhecido

internacionalmente e que foi reconhecido mais uma vez.

A candidatura de António Guterres rapidamente se transformou numa candidatura global, de África, da

Europa, da Ásia, das Américas. Esta era, desde o início, uma candidatura de todas as nações, de todos os

povos do mundo.

Não podíamos deixar de valorizar a unidade nacional em torno desta candidatura e que, obviamente, também

foi importante para esta vitória.

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Todos os órgãos de soberania — e já aqui foram referidos —, como o Governo da República, o Sr. Presidente

da República, a Assembleia da República, todas as forças políticas e todos os partidos políticos, de uma forma

unânime, abraçaram esta candidatura.

O método inovador que foi seguido nesta eleição e que responsabiliza ainda mais a eleição de António

Guterres é também um fator diferenciador: é a primeira vez que o Secretário-Geral das Nações Unidas é eleito

através de um processo transparente e sério como este. E refiro-me também à campanha serena do próprio

António Guterres. Foi uma campanha feita pela positiva, que deve servir de ensinamento não só a quem está

na política internacional mas a todos nós, valorizando os adversários, aliás, cujos méritos só reforçaram ainda

mais a valia da eleição de António Guterres.

Esta é, sobretudo, e antes de mais, uma vitória de António Guterres, uma vitória pessoal, mas Portugal e os

portugueses também a sentem como sua.

Aplausos do PS, do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Srs. Deputados, é o momento de encerrarmos uma das circunstâncias

mais felizes, seguramente, vividas no nosso Parlamento.

Cumpre-me, agora, anunciar a ordem do dia para amanhã.

A reunião plenária terá início às 10 horas e da ordem do dia consta o debate da interpelação n.º 7/XIII (2.ª)

— Sobre políticas para a deficiência (BE) e a proposta de resolução n.º 19/XIII (1.ª) — Aprova o Acordo que Cria

uma Associação entre a União Europeia e os seus Estados-Membros, por um lado, e a América Central, por

outro, assinado em Tegucigalpa, em 29 de junho de 2012, à qual não estão atribuídos tempos para debate. Por

fim, haverá lugar a votações regimentais.

Sr.as e Srs. Deputados, muito boa tarde a todos.

Está encerrada a sessão.

Eram 17 horas e 43 minutos.

Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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