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Sexta-feira, 17 de março de 2017 I Série — Número 64

XIII LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2016-2017)

REUNIÃOPLENÁRIADE16DEMARÇODE 2017

Presidente: Ex.mo Sr. Jorge Lacão Costa

Secretários: Ex.mos Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco Idália Maria Marques Salvador Serrão Sandra Maria Pereira Pontedeira

S U M Á R I O

O Presidente (Jorge Lacão) declarou aberta a sessão às

15 horas e 5 minutos. Procedeu-se ao debate, na generalidade, da proposta de

lei n.º 62/XIII (2.ª) — Estabelece o quadro de transferência de competências para as autarquias locais e para as entidades intermunicipais, concretizando os princípios da subsidiariedade, da descentralização administrativa e da autonomia do poder local, e dos projetos de lei n.os 383/XIII (2.ª) — Procede à descentralização de competências para os municípios e entidades intermunicipais e nas freguesias no âmbito da educação, saúde, ação social, gestão territorial, gestão florestal, gestão da orla costeira, medicina veterinária, saúde animal e segurança alimentar (PSD), 442/XIII (2.ª) — Lei-quadro que estabelece as condições e os requisitos de transferência de atribuições e competências para as autarquias locais (PCP), 449/XIII (2.ª) — Procede à descentralização de competências para os municípios e entidades intermunicipais no âmbito da educação, saúde, ação social, proteção civil, praias, gestão florestal, saúde animal e segurança alimentar, património e habitação (CDS-PP), juntamente com os projetos de resolução n.os 628/XIII (2.ª) — Recomenda ao Governo que proceda à reorganização e prestação de serviços de atendimento da Administração Pública (PSD), 629/XIII (2.ª) — Recomenda ao Governo que dê continuidade ao processo de concretização da descentralização o âmbito da saúde, educação e cultura

através da celebração de contratos interadministrativos (PSD), 630/XIII (2.ª) — Recomenda ao Governo que proceda à criação de centros de serviços partilhados e valor acrescentado ao nível das entidades intermunicipais (PSD), 722/XIII (2.ª) — Descentralização de competências para as autarquias locais (BE) e 725/XIII (2.ª) — Recomenda ao Governo que diligencie pela reformulação do regime de transferência de competências para as autarquias locais e para as entidades intermunicipais (PAN).

Intervieram no debate, além do Ministro Adjunto (Eduardo Cabrita), os Deputados Pedro Soares (BE), Eurídice Pereira (PS), Emília Santos (PSD), Paula Santos (PCP), Hélder Amaral (CDS-PP), Berta Cabral e Jorge Paulo Oliveira (PSD), Álvaro Castello-Branco (CDS-PP), João Vasconcelos (BE), André Silva (PAN), Susana Amador (PS), José Luís Ferreira (Os Verdes), Maria da Luz Rosinha, João Torres, Norberto Patinho e Carlos César (PS) e Luís Montenegro (PSD).

Entretanto, deu entrada na Mesa, e foi aprovado, um requerimento, apresentado pelo PSD, no sentido de o projeto de resolução n.º 740/XIII (2.ª) — Constituição de uma comissão eventual para a descentralização de competências ao nível do poder local (PSD) ser incluído no guião de votações da sessão do dia seguinte.

O Presidente (Jorge Lacão) encerrou a sessão eram 17 horas e 27 minutos.

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O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sr.as e Srs. Deputados, está aberta a sessão.

Eram 15 horas e 5 minutos.

Peço aos Srs. Agentes da autoridade para abrirem as galerias.

Srs. Deputados, vamos dar início à ordem do dia de hoje com a apreciação, na generalidade, da proposta de

lei n.º 62/XIII (2.ª) — Estabelece o quadro de transferência de competências para as autarquias locais e para as

entidades intermunicipais, concretizando os princípios da subsidiariedade, da descentralização administrativa e

da autonomia do poder local, e dos projetos de lei n.os 383/XIII (2.ª) — Procede à descentralização de

competências para os municípios e entidades intermunicipais e nas freguesias no âmbito da educação, saúde,

ação social, gestão territorial, gestão florestal, gestão da orla costeira, medicina veterinária, saúde animal e

segurança alimentar (PSD), 442/XIII (2.ª) — Lei-Quadro que estabelece as condições e os requisitos de

transferência de atribuições e competências para as autarquias locais (PCP), 449/XIII (2.ª) — Procede à

descentralização de competências para os municípios e entidades intermunicipais no âmbito da educação,

saúde, ação social, proteção civil, praias, gestão florestal, saúde animal e segurança alimentar, património e

habitação (CDS-PP), em conjunto com os projetos de resolução n.os 628/XIII (2.ª) — Recomenda ao Governo

que proceda à reorganização e prestação de serviços de atendimento da Administração Pública (PSD), 629/XIII

(2.ª) — Recomenda ao Governo que dê continuidade ao processo de concretização da descentralização no

âmbito da saúde, educação e cultura através da celebração de contratos interadministrativos (PSD), 630/XIII

(2.ª) — Recomenda ao Governo que proceda à criação de centros de serviços partilhados e valor acrescentado

ao nível das entidades intermunicipais (PSD), 772/XIII (2.ª) — Descentralização de competências para as

autarquias locais (BE), e 725/XIII (2.ª) — Recomenda ao Governo que diligencie pela reformulação do regime

de transferência de competências para as autarquias locais e para as entidades intermunicipais (PAN).

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro Adjunto, Eduardo Cabrita.

O Sr. Ministro Adjunto (Eduardo Cabrita): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O debate que esta

tarde iremos ter em torno da proposta do Governo da lei-quadro da descentralização e de um conjunto vasto de

iniciativas das diversas bancadas parlamentares, constitui um momento alto daquilo que são os valores

constitucionais de afirmação de um Estado assente nos princípios da subsidiariedade, da autonomia do poder

local e da descentralização democrática da Administração Pública.

É exatamente no ano em que se celebram 40 anos sobre as primeiras eleições democráticas para as

autarquias locais que este debate é a forma mais elevada de permitir ao Parlamento, com o compromisso do

Governo, com o compromisso de todas as bancadas, aqui representadas por vontade popular, assumir o nosso

contrato de confiança com o papel único que o poder local tem, ao longo de 40 anos, desempenhado no

aprofundamento da democracia participativa, para que, em primeiro lugar, os elementos fundamentais de

qualidade de vida dos portugueses chegassem a todos os municípios e a todas as freguesias do País e para

que, numa segunda fase, se afirmassem os fatores de desenvolvimento económico, social e cultural e para que,

em tempos mais recentes, os municípios assumissem um papel central na promoção do potencial económico

local, na atração do investimento e na criação de emprego.

A autonomia do poder local democrático é uma das facetas de maior sucesso da democracia portuguesa.

Aplausos do PS.

E tal deve-se sobretudo ao quase meio milhão de portugueses que, ao longo de 40 anos, prestaram serviço

às suas comunidades com base na confiança democrática de quem está próximo, de quem os conhece e avalia

com uma intensidade e escrutínio que só a proximidade permitem.

Sr.as e Srs. Deputados, esta é uma verdadeira reforma do Estado. Com base em 40 anos de experiência,

estamos aqui a afirmar aquele que é um desígnio de consolidação de uma forma diferente de exercer o poder

com maior qualidade de serviço às populações, com maior proximidade, com maior transparência.

É por isso que, ao falarmos de uma lei-quadro da descentralização, estamos, antes de mais, a cumprir a

Constituição que, no seu artigo 6.º, carateriza Portugal como um Estado unitário, mas um Estado unitário assente

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no respeito pela autonomia local, na afirmação do princípio da subsidiariedade e no princípio da descentralização

democrática da Administração Pública.

São estes princípios que nos levam a apresentar aqui uma proposta que surge ao fim de um ano de trabalho

intenso, no âmbito do Governo, envolvendo todas as áreas de governação. Mas, também, um ano de trabalho

intenso com as associações representativas quer dos municípios, quer das freguesias que permitiu criar o

contrato de confiança que levou à adoção, por unanimidade, de uma posição favorável à concretização desta

reforma quer pela Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP), quer pela Associação Nacional de

Freguesias (ANAFRE).

Esta reforma assenta em princípios claros, de universalidade do acesso aos serviços públicos, de igualdade

de oportunidades, de equidade no acesso aos bens públicos, de garantia da natureza pública das funções

sociais do Estado, que entendemos serem melhor realizadas a nível local.

Esta não é uma estratégia nem de desresponsabilização do Estado nem de privatização das funções sociais

do Estado.

Aplausos do PS.

É por isso que, a propósito desta iniciativa, queria saudar todas as forças políticas que entenderam

acompanhar-nos neste debate com iniciativas próprias, sobretudo aquelas que o fizeram sob a forma de

iniciativa legislativa, dizendo ao PCP que tem um diploma que estabelece um conjunto de princípios

estruturadores, dos quais partilhamos em larga medida, e estamos disponíveis para aprofundar o seu debate.

Relativamente ao PSD ou ao CDS, que apresentam iniciativas que acompanham as áreas fundamentais de

descentralização indicadas pelo Governo, queria, também, dizer-lhes que, certamente, teremos toda a

disponibilidade para discutir qual a melhor forma de consagrar uma estratégia clara de descentralização.

As autarquias locais merecem este contrato de confiança, até pela forma como, exemplarmente, ao longo

dos últimos anos, contribuíram para a saúde das contas públicas, sempre com saldos orçamentais positivos.

Em 2016, um ano marcado pelo melhor resultado orçamental das contas públicas portuguesas, em mais de

quatro décadas, os municípios contribuíram para esse resultado com um saldo orçamental positivo de quase

700 milhões de euros. Reduziram a dívida globalmente em cerca de 800 milhões de euros, reduziram prazos de

pagamento e foi reduzido o número de municípios que se encontra em situação de excesso de endividamento.

Por isso, esta proposta concretiza o princípio da subsidiariedade ao identificar um conjunto de competências

que, a partir daqui, devem ser objeto de aprofundamento, quer em diplomas complementares com carácter

estruturante, como a Lei das Finanças Locais, em revisão, que estruturará os recursos próprios ao exercício

destas competências, num quadro de reforço de autonomia financeira local, quer numa revisão da lei de

organização dos serviços municipais, reforçando aquilo que foi já consagrado em sede de Orçamento do Estado,

um reforço da autonomia na organização e forma de estrutura dos serviços das várias autarquias locais.

Este diálogo com a ANMP e com a ANAFRE será prosseguido também em torno dos diplomas setoriais que

o Governo assume o compromisso de colocar em debate com as associações de autarcas, durante a fase de

discussão na especialidade da iniciativa legislativa que hoje estamos a discutir.

Esta proposta de lei-quadro não é o fim de um processo, é, pelo contrário um virar de página que abre um

caminho para um trabalho intenso. Um trabalho intenso de aprofundamento da autonomia local e da autonomia

das escolas na área da educação, que ainda ontem discutimos ao longo de todo o dia com representantes quer

das autarquias locais, quer das associações representativas de diretores de escola, de professores, de

encarregados de educação.

Este trabalho abre caminho para uma intervenção acrescida das autarquias no domínio da saúde,

fundamentalmente na área dos cuidados de saúde primários; coloca os municípios no centro das estratégias

locais de combate à pobreza e à exclusão social, em articulação com as redes sociais locais e com as instituições

particulares de solidariedade social, que têm, a nível local, um papel relevantíssimo; dá às autarquias um papel

acrescido na gestão do território, quer se tratem de zonas ribeirinhas, de praias ou da definição de regras na

gestão do espaço urbano, em matéria de estacionamento ou da regulação da gestão de estradas nacionais; dá

às autarquias um papel fundamental na gestão do património público devoluto, sem utilização, abandonado, que

encontramos em todos os municípios e que, certamente, com intervenção local poderá ser valorizado e colocado

ao serviço das populações com funções públicas novas.

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Esta lei é a condição para que, de imediato, se possa iniciar esta segunda fase dos trabalhos, mais intensa

ainda, em que é necessário o envolvimento de todos, de autarcas, de representantes de todos os setores

envolvidos, com uma participação fundamental de todas as bancadas representadas na Assembleia da

República.

Não podemos dizer aqui que é necessário adiar mais, que é necessário ponderar sobre a preparação para o

exercício deste quadro de poderes. Ao fim de 40 anos, o tempo da descentralização é agora, é hoje mesmo.

E é por isso que, com um faseamento adequado, com gradualismo, com a participação de todos, com um

compromisso de avaliação das políticas, com a participação dos autarcas, com a intervenção de todos os setores

relevantes para o seu desenvolvimento, com a avaliação pela Assembleia da República, através da comissão

parlamentar competente, através das formas que se entenderem mais adequadas de acompanhamento deste

processo, aquilo que hoje estamos aqui a fazer é dar voz aos anseios de um Estado mais descentralizado, de

uma democracia local aprofundada para uma melhor qualidade de governação pública, para maior transparência

na decisão, para maior escrutínio, mas, sobretudo, para servir melhor os cidadãos e para garantir um melhor

Portugal.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Srs. Deputados, chamo a atenção para que os tempos que estão

distribuídos podem ser orientados pelos Srs. Deputados nos termos que considerarem adequados enquanto

puderem dispor do tempo globalmente atribuído. A mesma coisa vale, naturalmente, para o Governo.

Para fazer perguntas ao Sr. Ministro, estão inscritos cinco Srs. Deputados.

Entretanto, a Mesa foi informada de que o Sr. Ministro irá responder ao primeiro bloco de três perguntas e,

de seguida, às duas últimas perguntas.

Sendo assim, para formular perguntas, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Soares.

O Sr. PedroSoares (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro Adjunto, a primeira questão que gostaríamos de

colocar é aquilo que nos seus termos entendemos como uma contradição. Somos absolutos defensores do

processo de descentralização e consideramos que, neste desígnio essencial de aproximar os cidadãos da

capacidade de decisão e de fiscalização das várias instâncias do Estado, teria sido importante que o Governo

tivesse dado seguimento à possibilidade de reversão da agregação de freguesias. O argumento que o Governo

utilizou para não o fazer foi o de que estaríamos muito próximos das eleições autárquicas e que seria necessário

muito trabalho até lá.

Bem, mas nós estamos aqui hoje a tratar precisamente uma alteração estrutural do modo de funcionamento

das autarquias e das suas competências à beira de eleições e com muito trabalho pela frente.

Sr. Ministro, era muito importante que tivesse havido, de facto, a possibilidade de dar voz às freguesias e

que as freguesias que não se sentissem confortáveis com o processo de agregação pudessem ter decidido uma

nova reformulação dos seus limites territoriais, o que teria sido muito importante e assim seria dado um sinal

fundamental para o aprofundamento da democracia, e isso não foi feito. É preciso que o Governo explique por

que é que não o fez efetivamente.

Este País está claramente atrasado no que diz respeito ao cumprimento da Constituição quanto às questões

da descentralização. Para cumprir a Constituição a este nível é preciso dizer que o processo de descentralização

deve ter como objeto e como destinatário as autarquias locais, que, nos termos constitucionais, são as

freguesias, são os municípios e são também as regiões administrativas.

O que é facto é que não vemos em nenhum diploma do Governo uma única vez a palavra «descentralização»

para as regiões administrativas. Não se vê uma única vez como objetivo, como horizonte a possibilidade de

criação das regiões administrativas. Pelo contrário: o Governo andou enredado numa situação complexa de criar

uma espécie de entidades atípicas, híbridas, que eram as CCDR (Comissões de Coordenação e

Desenvolvimento Regional), que, apesar de serem órgãos desconcentrados do Estado, teriam eleição por parte

das autarquias. De facto, essas comissões não eram nem uma coisa, nem outra, e não cumpriam o desígnio da

Constituição.

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Para nós, esta questão é fundamental. Descentralizar é aprofundar a democracia, descentralizar é aproximar

os cidadãos, é dar mais possibilidade de participação aos cidadãos no processo de decisão e no processo de

fiscalização.

Temos uma divergência de fundo com o Governo sobre esta matéria e queremos referi-la com toda a

frontalidade: não entendemos que a descentralização possa ter como objeto entidades que não têm legitimidade

democrática própria direta. A descentralização não faz sentido para entidades intermunicipais que não são

eleitas, que não têm o escrutínio direto dos cidadãos e em que a sua legitimidade é por interposta entidade, que

são os municípios.

Ora, descentralizar tem de ser democratizar, descentralizar tem de ser para entidades que têm legitimidade

democrática própria, não pode ser para criar entidades mais ou menos cinzentas, mais ou menos sem

legitimidade própria democrática e que não cumpram o objetivo da descentralização.

Esta é uma divergência de fundo que o Bloco de Esquerda tem com o Governo nesta matéria e não podemos

deixar de a colocar com toda a frontalidade.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para formular perguntas, tem a palavra a Sr.ª Deputada Eurídice Pereira,

do PS.

A Sr.ª EurídicePereira (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro Adjunto, o tema da descentralização tem sido

recorrente no discurso político ao longo dos anos, mas a verdade é que, por diversos processos desenvolvidos,

com maior ou menor expressão, souberam sempre a pouco.

O passo que agora é proposto, traduzido na abrangência e determinação da proposta do Governo, com o

qual o Grupo Parlamentar do Partido Socialista se revê, assume um caráter bem distinto das experiências

anteriores.

Recordo que foi grande o momento, em 1976, aquando da instauração do poder local na Constituição. Quatro

décadas passadas, está agora nas nossas mãos fazer do momento presente outro grande momento com o

aprofundamento da diversidade de competências sob a alçada da autonomia do poder local democrático.

É possível que esta seja uma promissora aposta — testemunha-o o envolvimento dos diversos grupos

parlamentares, que fizeram dar entrada de um conjunto expressivo de iniciativas.

Faço questão de destacar uma condição que preside à iniciativa do Governo: a confiança. Refirmo: na

proposta do Governo existe ausência de desconfiança no poder local no que à sua capacitação diz respeito, o

que, como todos nós sabemos, nem sempre assim foi.

É possível hoje dizer que esta reforma pode considerar-se inspirada no lema de Alexandre Herculano, para

quem «é o progresso das ideias que traz as reformas e não o progresso dos males públicos que as torna

inevitáveis».

Esta não é uma reforma forçada, esta é uma reforma desejada e planeada. Direi de outro modo: é a

maturidade do processo democrático que nos trouxe aqui e que nos permite estar disponíveis para discutir a

potenciação dos princípios da subsidiariedade, até porque Portugal é dos países mais centralizadores da União

Europeia, apesar de estar identificada uma vasta lista de competências com desadequação de escala.

Dito isto, Sr. Ministro, gostaria de lhe colocar algumas e rápidas questões.

A primeira pergunta, que é sobre uma vertente particularmente sensível e que tem a ver com o financiamento,

é muito direta: como se perfilha o modelo de alocação de fundos à descentralização?

A segunda pergunta, igualmente importante e que importa clarificar, tem a ver com o investimento: o nível

onde a decisão de investimento vai ocorrer depende do valor desse investimento ou serão tomados em atenção

outros critérios?

Por último, e faço meramente uso, de modo exemplificativo, de uma das áreas para dar melhor a conhecer

a forma e as opções com que a descentralização vai ser feita: que modelo específico de repartição de

competências se perfilha para a área da saúde? Ou seja: como é que o modelo é balizado e até onde se pretende

chegar?

Aplausos do PS.

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O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para formular perguntas, tem a palavra a Sr.ª Deputada Emília Santos,

do PSD.

A Sr.ª EmíliaSantos (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro Adjunto, no final do ano passado, tivemos

oportunidade de afirmar, nesta mesma Casa, que descentralizar competências para o poder local é um ato de

inteligência do Estado. Hoje, vimos cá reafirmá-lo não de uma forma gratuita ou circunstancial mas com a

legitimidade de quem esteve sempre na linha da frente no processo de descentralização, com experiências

concretas que deram resultados e que importa retomar.

Para além disso, vimos cá reafirmar que o PSD não teve apenas um discurso descentralizador, teve uma

prática de concretização de reformas.

Temos obra feita, o que muito nos orgulha.

Orgulhamo-nos de ter concluído, na anterior Legislatura, as negociações para a execução dos projetos-piloto

de descentralização nas áreas da educação, da cultura e da saúde.

Orgulhamo-nos de ter concluído a implementação destes projetos.

Orgulhamo-nos de fechar um programa de contratualizações com 34 municípios, abrangendo 1,8 milhões de

habitantes.

Também, por isso, o PSD tem não só legitimidade como património para erguer a bandeira da

descentralização e lutar para que a vontade de se aprovar uma lei enquadradora não fique no plano das

intenções.

A nossa disponibilidade para trabalhar uma solução que sirva melhor Portugal e os portugueses é pública e

já foi anunciada.

É o País e os portugueses que pedem ao Estado que tenha bem presente as suas funções e que as saiba

colocar nas mãos de quem as desempenha melhor para benefício de todos.

Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, é com autoridade de quem fez e não se limitou a dar

palpites que vimos aqui manifestar a nossa preocupação, e até estranheza, em relação a algumas matérias

constantes da proposta de lei do Governo.

Estranhamos, desde logo, Sr. Ministro, a posição do Governo relativamente aos contratos

interadministrativos em matéria de educação. O Governo deu garantias expressas aos municípios de que estes

contratos, que têm a duração de quatro anos, seriam para cumprir. Sr. Ministro, pergunto-lhe se palavra dada

vai ser palavra honrada. É que a presente proposta de lei prevê a revogação do decreto-lei que assumiu esses

contratos. E vai mais longe: refere que vai manter os contratos até à plena concretização das transferências das

novas competências, o que significa que os contratos caducarão imediatamente com essa transferência que

poderá ocorrer logo em 2018.

Dito isto, parece-nos que os contratos interadministrativos estão em risco e, sobretudo, parece-nos que vêm

coartar a possibilidade de a delegação de competências, que foi efetuada a título do projeto-piloto, poder tornar-

se definitiva, como preveem e acreditam, e assim gorar as expectativas dos envolvidos e recuar na

descentralização de competências.

Pergunto: o Governo tem plena consciência do que está a fazer ou este é apenas mais um erro de perceção

mútua que terá de ser imediatamente corrigido?

Sr. Ministro, estranhamos também a expressa vontade de o Governo transferir para os municípios a

competência da avaliação dos imóveis para efeitos de cobrança do IMI. E estranhamo-lo porque descentralizar

não é «chutar para canto» as competências que não gostamos ou que nos são incómodas, descentralizar é um

trabalho sério para destinar cada tarefa a quem melhor a pode executar.

Tem de haver ganhos na mudança e não recuos. Neste caso, isto não está provado.

Não podemos, por isso, concordar com esta inesperada proposta, como não podemos promover a

incoerência na responsabilização da avaliação dos imóveis para efeitos do IMI.

Por fim, Sr. Ministro, estranhamos também que, em matéria de habitação, esta proposta queira descentralizar

o que já está descentralizado há muito.

A transferência do património habitacional do Estado já se realiza desde 1993 e só não foi mais longe porque

os próprios municípios assim não o desejam. Pergunto-lhe: querem impor por decreto o que os municípios até

hoje disseram que não queriam?

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Não entendemos, igualmente, o que se pretende descentralizar em matéria de arrendamento e de

reabilitação urbana. Os municípios já têm total autonomia nestas matérias para desenvolverem as iniciativas

que entenderem, a não ser que o Governo queira acabar com as políticas públicas associadas aos programas

de financiamento da reabilitação urbana e do apoio ao arrendamento. Ou será que o Governo quer encontrar

um pretexto para desinvestir em matéria de política pública nacional de habitação?! Acredito e tenho esperança

que assim não seja.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Ministro Adjunto, nós, PSD, temos caminho percorrido em matéria

de descentralização, temos propostas concretas e estamos disponíveis para as discutir. Saberemos medir a

nossa intervenção neste processo pelo grau de abertura e de diálogo que o Governo e o Partido Socialista

demonstrarem na apreciação das nossas propostas.

Da nossa parte, não contem com cheques em branco.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para responder a este conjunto de perguntas, tem a palavra o Sr. Ministro

Adjunto, Eduardo Cabrita.

O Sr. MinistroAdjunto: — Sr. Presidente, agradeço às Sr.as Deputadas e ao Sr. Deputado o conjunto de

questões que me colocaram.

Sr. Deputado Pedro Soares, não podemos estar mais de acordo sobre a prioridade e a relevância de cumprir

o desígnio constitucional de aproximação da decisão.

É por isso que não enjeitamos qualquer outro debate. Mas este debate é sobre transferência de competências

e sobre descentralização para as autarquias que têm quatro décadas de provas dadas e que está previsto no

quadro constitucional no sentido de reforçar decisivamente as competências e as condições do seu exercício

pelos municípios e pelas freguesias.

Como disse, não enjeitamos qualquer outro debate e achamos que este é o tempo certo, que não podemos

adiá-lo, que tal deve envolver a participação de todas as bancadas.

Permitam-me responder, desde já, quer às questões da Sr.ª Deputada Eurídice Pereira, quer às da Sr.ª

Deputada Emília Santos.

Aquilo que vemos é o empenho do Governo. Ficaremos satisfeitos – e até ao momento temo-lo visto –, se

tivermos também, da parte de todas as bancadas, um empenho neste objetivo, isto é, que o próximo ciclo

autárquico 2017/2021 seja marcado por passos decisivos no sentido do alargamento das competências quer

dos municípios quer das freguesias.

Para isso, deveremos definir as regras nesta sessão legislativa para que, quando as eleições forem

disputadas, em setembro ou outubro, quem for a votos tiver a plena consciência de quais são as regras com

que irá exercer o seu mandato.

Relativamente à questão das freguesias, o que consta do Programa do Governo é o compromisso de

reavaliação e, por isso, assumimos aqui e revemo-nos na deliberação da Assembleia da República exatamente

no sentido de, independentemente das posições que não enjeitamos e das críticas que em devida altura foram

feitas, proceder à avaliação do que foi feito, de como é que está a funcionar e, sobretudo, de como é que

poderemos fazer melhor.

Sr.ª Deputada Eurídice Pereira, temos, em Portugal, ao fim de 40 anos de democracia local, uma participação

das autarquias nas receitas públicas de pouco mais de 14% e isso coloca-nos muito longe da média europeia,

que é de 25%.

O nosso objetivo é o de que, gradualmente, nos aproximemos dessa média europeia e, por isso, inscrevemos

no Programa Nacional de Reformas o objetivo intermédio de atingir, até ao final da Legislatura, 19% de

participação dos municípios e das freguesias na gestão de receitas do Estado. Isto está associado, naturalmente,

a novas competências e está associado a um papel que, hoje, os municípios têm já no investimento público, em

que a sua participação é de 46% no investimento público realizado. Aliás, ainda ontem no debate sobre

educação foi realçado que se deve à intervenção dos municípios o facto de, neste momento, 150 escolas

estarem já num processo de requalificação em que os municípios assumem metade da contrapartida nacional,

sendo a outra metade assumida pela administração central.

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Também na área da saúde, temos de ir mais além, sobretudo na área dos cuidados de saúde primários, onde

estabelecemos medidas nesse caminho, sendo que um conjunto de municípios da área envolvida passaram já

a designar um elemento executivo da gestão das unidades locais de saúde e passaram a presidir aos conselhos

consultivos, quer dos hospitais EPE, quer dos hospitais SPA, quer dos agrupamentos de centros de saúde. É

necessário ir além, fundamentalmente na intervenção nos cuidados de saúde primários.

Sr.ª Deputada Emília Santos, revejo-me, de modo muito positivo, na disponibilidade da sua bancada,

expressa na sua intervenção, para, em sede de especialidade, trabalharmos intensamente no sentido de um

efetivo aprofundamento da democracia local, porque nesta matéria temos uma história e temos compromissos

assumidos.

Por isso, ontem, em matéria de educação, ao longo de todo o dia, analisámos pouco mais de uma dezena

de contratos interadministrativos, que referiu, e os mais de uma centena de municípios que, desde 2008, gerem

as escolas dos 2.º e 3.º ciclos com base em contratos de execução. São mais de uma centena de municípios

que, desde 2008, gerem assim as suas competências.

É por isso que o que queremos não é eliminar experiências; é avaliá-las, ir mais além e fazer melhor, no

aprofundamento de competências em matéria de gestão de receitas fiscais próprias, numa intervenção na área

da habitação, ou na área da gestão do património público devoluto ou abandonado, matéria que também já foi

alvo de uma iniciativa do Partido Social Democrata.

É nestas áreas que, em sede de especialidade, certamente, aprofundaremos o debate para, com base na

exigência de mais descentralização e de mais democracia local, sem esquecer nada do que já foi feito e sem

tabus sobre o passado, fazer melhor no futuro.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Paula Santos.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, hoje realizamos aqui um debate importante, mas

fazemo-lo com uma discussão que ainda está por fazer: a da regionalização, a da criação das regiões

administrativas. Falar de descentralização do Estado, falar da organização administrativa do Estado exige

também que tenhamos em conta a necessidade de criação das regiões administrativas e a necessidade de

concretização da regionalização, tal qual consta da nossa Constituição.

Sr. Ministro, o processo de transferência de competências, aliás, os processos de transferências de

competências que temos tido no nosso País não tem sido positivos, diria, até, que a avaliação é bastante

negativa.

De uma forma sintética, aquilo que se tem verificado é uma transferência de encargos sem assegurar as

condições para a execução das competências, ou seja, transferem-se competências sem os respetivos meios.

Assim foi com as escolas do 1.º ciclo e com os jardins-de-infância, assim foi com os contratos de execução em

2008, com um Governo do Partido Socialista, e assim foi com os contratos interadministrativos em 2015, com o

Governo do PSD e CDS.

Portanto, como já referi, transferem-se os encargos e as competências, mas não se dão as condições e nós

consideramos que isto não é um bom exemplo, consideramos que, de facto, em relação a esta matéria, um

processo de descentralização de competências deve ter um pressuposto e deve estar subjacente a um conjunto

de outros princípios.

Por isso, a primeira questão que gostaria de colocar-lhe é a seguinte: que garantias dá este Governo, que

garantias nos são colocadas, de forma a assegurar que o processo de transferência de competências ou de

descentralização, que está a propor, não é mais do mesmo, e que, efetivamente, um conjunto de questões, que

até enunciam e que estão por resolver, não ficam, como ficaram, sem resolução à vista?

Consideramos que é importante, quando se fala de um processo de competências, ter um diagnóstico, é

preciso fazer um levantamento da situação, é preciso prever a evolução, é preciso avaliar impactos, é preciso

prever as condições, pois, caso contrário, não se está a transferir competências; está-se a transferir encargos.

Tivemos conhecimento de que a Associação Nacional de Municípios Portugueses pediu este conjunto de

elementos e, do que sabemos, eles ainda não foram disponibilizados. Ora, era sobre esta matéria que, em

segundo lugar, gostaria de ouvir o Sr. Ministro.

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Uma terceira questão muito breve: num processo de transferência de competências, para que ele seja

participativo e verdadeiramente democrático, temos de envolver as várias entidades e associações do nosso

País. A questão que coloco ao Sr. Ministro é a de saber, relativamente a esta matéria, que discussões foram

feitas no conjunto dos setores, o que, aliás, aparece na proposta do próprio Governo.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Hélder Amaral.

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, esta matéria é séria, muito relevante e o CDS

gostaria de dar o seu contributo. Aliás, parece que é por demais evidente que, como dizia a bancada do Partido

Socialista, esta é uma reforma desejada e planeada.

Quanto a ser desejada, tenho tendência a concordar, até porque o CDS aparentou propostas, o Partido Social

Democrata apresentou propostas e, pelo que tenho ouvido, os Deputados de todas bancadas têm, de uma forma

ou de outra, sugestões e muitas dúvidas sobre a matéria. Porém, que esta reforma seja planeada é que eu já

tenho a maior das dúvidas e é sobre isto que eu me queria concentrar. É que, se é verdade que o CDS concorda

com a descentralização – é evidente que sim, nós desejamo-la –, não queremos é nenhum tipo de

regionalização, seja ela encapotada ou não encapotada.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Portanto, a qualquer tentativa de uma regionalização de forma

encapotada, o CDS não dará o seu consentimento.

Porém, em relação às matérias de descentralização, que tenham como princípio, como o Sr. Ministro dizia e

bem, a proximidade da decisão, uma coerência entre os vários poderes, essencialmente segurança jurídica,

clareza, certeza e, acima de tudo, uma eficácia dos serviços prestados ao cidadão, o CDS diz «sim».

Portanto, precisamos de saber exatamente do que é que estamos a falar o sobre o que vamos trabalhar,

nomeadamente temos de saber quais são as áreas. Também parece evidente – aliás, todas as bancadas fizeram

perguntas sobre isso – querer saber qual o tipo de financiamento que estas novas competências vão ter. Qual

é o financiamento? Porque transferir para as autarquias — e não vou tão longe dizendo que o Governo quer

transferir para as autarquias aquilo que incomoda ou aquilo que não lhe dá jeito, vou acreditar que vamos

aproveitar a experiência instalada de 40 anos de poder local,…

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — … vamos aproveitar, inclusivamente, erros, sobreposições e

incompatibilidades de algumas competências em variadíssimas áreas, e há algumas que no documento não

estão claras, desde logo a gestão do património… A proposta refere «todo e qualquer património classificado

no município…» Mas qual? Todo? De âmbito municipal, nacional…? Quer interfere onde? Quem interfere o quê?

Quem dispõe o quê?

Também já aqui foram colocadas questões sobre os contratos interadministrativos ou até de avaliação de

imóveis. Como é que isso será feito?

Mas eu até poderia ir mais longe. Sr. Ministro, como foi agora dito pelo PCP, e também queremos subscrever

isso: como é que podemos discutir esta matéria de forma séria, de forma coerente, de forma perene — porque

não podemos nesta matéria, quer seja em termos de educação, de ação social, de saúde estar sempre em

experimentalismos nem há razão para isso — sem estudos?

Diz a Associação Nacional de Municípios Portugueses que não tem estudos. O Sr. Ministro criou alguns

grupos de estudos específicos. Onde é que estão os documentos? Onde é que estão as conclusões? Como é

que se compatibiliza com as CCDR (Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional)? O Sr. Ministro

tinha uma ideia, recuou nessa ideia e hoje não sabemos exatamente o que é que se vai fazer na eleição, na

transparência das CCDR. Como é que ficam as competências intermunicipais? Como é que elas se conjugam

com as dos municípios?

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O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr. Ministro, temos muitas dúvidas e muito poucas certezas.

Sr. Ministro, para início de conversa e, aproveitando a nossa boa vontade e a nossa vontade de colaborar

numa verdadeira descentralização, tem de nos dizer um pouco mais e…

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — … tem de nos prometer que manda os estudos.

Se não podemos fazer tudo teremos de fazer menos, mas o pouco que possamos fazer que seja eficaz, que

seja sustentável, que reforce o poder local e também as necessárias competências do poder central com as

competências intermunicipais, com as competências regionais e com as competências dos municípios

portugueses.

Sr. Ministro, tem a nossa disponibilidade, mas o que temos é muito pouco, precisamos de muito mais e, por

isso, deixo aqui uma pergunta no sentido de que o Sr. Ministro nos possa esclarecer sobre o que é que está

verdadeiramente na cabeça do Governo e na cabeça de V. Ex.ª.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro.

O Sr. Ministro Adjunto: — Sr. Presidente, agradeço à Sr.ª Deputada Paula Santos e ao Sr. Deputado Hélder

Amaral as questões colocadas, que, de algum modo, como o Sr. Deputado referiu, permitem uma resposta em

conjunto, sem que isso signifique menor consideração pela relevância dos temas que ambos colocaram. É que,

fundamentalmente, o que interpreto da intervenção do PCP e da do CDS é uma profunda disponibilidade para

serem parceiros neste debate e para, com as outras bancadas e com o Governo, participarem num projeto de

aprofundamento com solidez de um caminho de descentralização.

Perguntou-nos a Sr.ª Deputada Paula Santos, com toda a frontalidade, que garantia é que o Governo podia

dar que não seja mais do mesmo, que não seja aquilo que já aconteceu outras vezes em que a vontade

descentralizadora e a transferência de competências não foi acompanhada dos necessários recursos.

Sr.ª Deputada, estamos a apresentar esta iniciativa no momento em que nos comprometemos, ao fim de

pouco mais de um ano de Governo, porque foi o tempo que precisámos para trabalhar intensamente com a

Associação Nacional de Municípios Portugueses e com a Associação Nacional de Freguesias, de modo a ter o

apoio unânime para que chegássemos a esta fase, com o compromisso de, em dois anos, devolver autonomia

às autarquias locais, aumentou recursos e aumentou a capacidade de acesso a fundos europeus e ao

investimento.

O Sr. Deputado Hélder Amaral diz-nos que estamos aqui perante uma lei-quadro, uma lei geral, e que é

preciso saber muito mais. Tem toda a razão, Sr. Deputado, assim como tem toda a razão a Sr.ª Deputada Paula

Santos. E, por isso, o nosso compromisso é o de que, ultrapassada esta fase, em que se verifique uma ampla

convergência no Parlamento em torno do sentido descentralizador, durante os trabalhos de especialidade, o

Governo vai apresentar propostas não necessariamente formais, porque algumas delas dependerão da versão

final que vier a sair do trabalho da Assembleia. Ou seja, o Governo assume o compromisso de apresentar

propostas quer às associações de autarcas, quer a debate com os sectores — o da educação, o da saúde, com

os vários sectores —, quer também ao Parlamento de anteprojetos da Lei das Finanças Locais, da lei de

organização dos serviços municipais, dos diplomas sectoriais sobre as várias áreas que aqui foram referidas.

Como, por exemplo, o diploma sectorial sobre educação, o diploma sectorial sobre saúde, o diploma sectorial

sobre gestão do património, para falar expressamente das áreas que quer a Sr.ª Deputada Paula Santos quer

o Sr. Deputado Hélder Amaral tiveram oportunidade de questionar. Mas são mais, muitas mais.

Portanto, o nosso compromisso é, a partir desta semana, feito este debate, intensificar ainda mais o trabalho

com todos. Quer o trabalho com os representantes dos autarcas, quer o trabalho com os vários sectores, quer

o trabalho, que é fundamental, com o Parlamento, porque esta não pode ser uma reforma do Governo, tem de

ser uma reforma de toda a sociedade portuguesa.

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Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Srs. Deputados, durante a intervenção da próxima oradora, a Mesa

aceitará as inscrições para os pedidos de esclarecimento que desejem formular.

Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Berta Cabral.

A Sr.ª Berta Cabral (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados:

O PSD continua na linha da frente das políticas do poder local.

Fomos o primeiro partido político a colocar a descentralização de competências do Estado na agenda política

deste Parlamento, desde logo na discussão do Programa Nacional de Reformas e, posteriormente, na discussão

do Orçamento do Estado, em novembro de 2016, sob a forma de propostas de alteração ao Orçamento,

liminarmente chumbadas pela maioria de esquerda. Fomos derrotados, mas não fomos vencidos, porque,

quando temos a razão do nosso lado, nós persistimos até que a força da razão vença a razão da força!

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Berta Cabral (PSD): — Em janeiro passado, apresentámos de novo os nossos projetos e aqui

estamos, hoje, a debatê-los de forma aberta e frontal.

Volvidos 40 anos de poder local democrático é consensual que, o poder local foi uma peça-chave na

democratização do País, na melhoria da qualidade de vida das pessoas e no desenvolvimento do território. O

PSD, como grande partido do poder local, reconhece e orgulha-se do contributo que os autarcas deram ao nosso

País ao mesmo tempo que reconhece que têm ainda muito mais para dar a Portugal.

Alguém tem dúvidas de que o resultado do trabalho desenvolvido por 308 municípios e por mais de 3000

freguesias será sempre incomparavelmente superior ao desenvolvido pelo poder executivo centralizado em São

Bento ou no Terreiro do Paço?! Claro que não!

Porém, este consenso no discurso não teve a devida correspondência ao nível da ação. A verdade é que a

vontade política para a concretizar ficou muito aquém dos consensos oratórios. E também é verdade que foi

durante o último Governo, liderado por Pedro Passos Coelho, que assistimos a avanços decisivos relativamente

ao processo de descentralização.

O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — Bem lembrado!

A Sr.ª Berta Cabral (PSD): — Uma realidade constatada pelo atual Primeiro-Ministro, na altura Presidente

da Câmara Municipal de Lisboa, que numa conferência no Porto afirmou a este propósito, e cito: «Tenho de

reconhecer que tenho encontrado mais boa vontade do atual Governo do que dos dois governos socialistas

anteriores».

O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — Bem lembrado!

A Sr.ª Berta Cabral (PSD): — O trabalho feito pelo anterior Governo, no que toca à descentralização para

as autarquias locais de um conjunto de competências relevantes, tem de ser retomado, aprofundado e alargado

a todo o universo autárquico. É isso que propomos com as quatro iniciativas legislativas que trazemos a debate.

Projetos que se inserem na estratégia de descentralização do PSD, onde se enquadram também a criação

do estatuto dos territórios de baixa densidade, e o projeto de lei que visa possibilitar a utilização de património

público do Estado pela administração local, ambos em discussão na especialidade neste Parlamento.

Educação, saúde, apoio social, gestão florestal, gestão da orla costeira, gestão territorial, medicina

veterinária, segurança alimentar, são áreas onde os municípios podem e devem intervir, prestando melhores

serviços às populações, com maior eficácia e eficiência, ou seja, com economia de meios, rapidez de resposta,

com rosto, com sensibilidade e com responsabilidade.

Por isso, apresentamos propostas concretas de transferência universal de competências naquelas áreas ao

mesmo tempo que propomos manter e alargar a realização de contratos interadministrativos em matérias que,

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permanecendo na esfera das políticas nacionais, podem com vantagem ser delegadas e executadas pelo poder

local.

De igual modo, entendemos vantajoso potenciar a criação de centros partilhados e de valor acrescentado ao

nível das entidades intermunicipais, que permitam ganhos de escala e otimização de recursos assim como

recomendamos a reorganização, alargamento e implementação de uma rede de prestação de serviços de

atendimento da administração pública, na linha do Programa Aproximar implementado pelo anterior Governo.

Sr.as e Srs. Deputados, depois de muitos e variados anúncios, o Governo propõe a este Parlamento uma lei-

quadro sobre transferência de competências para as autarquias locais e para as entidades intermunicipais,

pouco densificada, que menciona competências que já residem nas autarquias locais a par de novas

competências a transferir, criando confusão e incerteza interpretativas. Uma proposta de lei que não tem eficácia

imediata, fazendo depender a sua concretização de decretos-lei sectoriais.

Se é compreensível que a proposta de lei do Governo não delimite em absoluto todas as matérias a transferir,

não podemos, por outro lado, permitir uma margem de discricionariedade normativa tão excessiva como aquela

que nos é proposta, particularmente no que diz respeito à autorização legislativa para alterar o Código do IMI.

O PSD não permitirá, porque não pode permitir, nem nunca o fará, que se deixe instrumentalizar este

Parlamento.

O PSD continua disponível, em sede de especialidade, para debater e construir as melhores políticas e as

melhores soluções, mas não aliena as competências deste Parlamento, nem está nos nossos propósitos abdicar

da intervenção e do acompanhamento parlamentar em toda a extensão do diploma.

Garantir que o processo de descentralização é acompanhado da transferência dos adequados recursos

financeiros, mediante revisão do regime financeiro das autarquias locais, é igualmente um dos pressupostos de

que o PSD também não abdica.

Neste processo, o PSD não está do lado do partido A, do partido B ou do Governo. O PSD está do lado dos

autarcas, do lado dos portugueses.

O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª Berta Cabral (PSD): — Continuamos a considerar que é de toda a conveniência que o novo mandato

autárquico se desenrole num quadro de novas competências. Já se perdeu um ano e corremos o risco de perder

mais quatro se não agirmos com rapidez e de forma assertiva. Consideramos importante que haja uma estrutura

parlamentar que se dedique a este processo legislativo.

O PSD propõe a constituição de uma comissão parlamentar eventual para, em 90 dias, tratar o processo da

descentralização de competências nos municípios, nas freguesias e nas entidades intermunicipais.

Aplausos do PSD.

Como disse há pouco, da tribuna, o Sr. Ministro, e nós acompanhamos, este é o início de um caminho e, por

isso, temos de trabalhar rapidamente para chegar ao seu final.

A transversalidade do tema, abrangendo quase todas as áreas da governação, a profusão de legislação que

se torna necessário adaptar e produzir e o apertado calendário de que dispomos impõem o envolvimento e a

dedicação de Deputados de todos os partidos e de todas as áreas abrangidas pela descentralização, áreas que

transcendem, em muito, aquilo que são as competências exclusivas da comissão parlamentar competente. Por

isso, propomos a constituição dessa comissão eventual.

O Parlamento e o Governo, através dos partidos que o apoiam, têm de estar à altura das expectativas que

foram criadas sobre esta matéria, é isso que os portugueses esperam.

Da nossa parte, nós, PSD, continuamos a acreditar numa democracia verdadeiramente representativa,

descentralizada, ágil e próxima das pessoas, por isso contem connosco.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Srs. Deputados, inscreveu-se, para pedir esclarecimentos, o Sr.

Deputado Pedro Soares.

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Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Pedro Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Berta Cabral, tinha alguma expectativa de que a

Sr.ª Deputada — digo-o com toda a simpatia, como é óbvio —, como oriunda de uma Região, nos viesse falar

dos benefícios da regionalização, sendo certo que uma coisa são as regiões autónomas, outra coisa são as

regiões administrativas, mas, certamente, seria um excelente testemunho. E é interessante que, tal como o

Governo, também o PSD não é sequer capaz de verbalizar a palavra «regionalização», o que demonstra bem o

sentido que se pretende com a descentralização.

O PSD coloca claramente na sua intervenção, e isso ficou muito evidente, Sr.ª Deputada, que

descentralização é para municípios e entidades intermunicipais. E se nós compreendemos que a

descentralização deve ser para os municípios, porque defendemos que, em matéria de âmbito local, a gestão

deve ser local, nada mais do que isso, entendemos que, para além do local, também o supramunicipal e o

regional devem ter entidades próprias para que sejam objeto dessa regionalização. Os senhores consideram

que essas entidades são as comunidades intermunicipais.

Sr.ª Deputada, não a preocupa que tarefas tão importantes sejam destinadas a entidades que não têm

legitimidade democrática própria e direta, que não tenham o escrutínio direto da população, que não sejam

objeto de avaliação universal e direta dos cidadãos?! Parece-me que isto é essencial num Estado democrático!

É que, sim, senhora, a Sr.ª Deputada colocou aqui a questão de que tem havido uma perspetiva de

centralização no Terreiro do Paço. Mas qual é a alternativa do PSD em relação à centralização no Terreiro do

Paço? É descentralizar para entidades que não têm legitimidade democrática própria?! Ou seja, essas entidades

têm menor escrutínio democrático que o próprio Governo. É isto que os senhores estão a defender?! É um

Estado mais cinzento, um Estado menos escrutinável, um Estado que, ao nível supramunicipal, intermunicipal

ou regional, não tenha, de facto, essa legitimidade própria que lhe é conferida por eleições democráticas?!

Mais: qual é a posição do PSD em relação às Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto? Os senhores

defendem que haja eleição direta? Aliás, estava no Programa do Governo a eleição direta das Áreas

Metropolitanas de Lisboa e do Porto e seria, talvez, mesmo a componente mais interessante deste processo de

descentralização, mas foi precisamente esse que caiu, e caiu também — é a perceção que temos, mas podemos

estar errados — pela pressão do PSD, que não quer a eleição direta das Áreas Metropolitanas de Lisboa e do

Porto. Esta é uma perspetiva pouco democrática, Sr.ª Deputada, relativamente ao processo de descentralização,

o que nos preocupa muito, profundamente.

Nós queremos descentralização para democratizar, para aproximar os cidadãos da decisão e da fiscalização

e não para os afastar.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Berta Cabral.

A Sr.ª Berta Cabral (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Soares, gostaria de começar por lhe dizer

que não esperava da sua parte uma pergunta tão fora do contexto. Na verdade, quem não quer descentralizar

começa a falar e a debater outros assuntos. Foi isso que o Bloco aqui nos trouxe. Disse-nos exatamente que

não quer descentralizar e que quer falar de outras questões.

Este debate é sobre descentralização! Descentralização nas freguesias, nos municípios e nas entidades

municipais. E, para lhe responder muito rapidamente, as entidades intermunicipais são exclusivamente

constituídas por autarcas, autarcas legitimamente eleitos.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem, agora, a palavra, para apresentar a iniciativa do PCP, a Sr.ª

Deputada Paula Santos.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Fazemos

esta discussão com a consciência daquela que fica por fazer.

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O debate sobre a organização administrativa do Estado e a descentralização democrática revela a absoluta

necessidade da criação de regiões administrativas, que a Constituição preconiza e que continua por concretizar.

Olhar para a organização do Estado tendo em conta as regiões administrativas possibilita uma abordagem

mais coerente sobre qual o nível de poder mais adequado para o exercício de cada uma das atribuições e

competências.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Muito bem!

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Avançar com a regionalização é o que cria as condições para uma política de

desenvolvimento regional com a ativa participação das autarquias e dos agentes económicos e sociais.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A Constituição da República Portuguesa destaca como princípio da

organização do Estado a descentralização. Como já afirmámos aqui, um processo de descentralização de

competências exige a recuperação e a afirmação da autonomia do poder local, exige um quadro claro e

sustentado de condições que enquadrem a transferência de competências, exige um regime de financiamento

com os meios necessários, estabilidade de execução e previsível evolução e exige a reposição de condições

organizacionais, materiais e humanas.

Queremos contribuir para este debate com propostas concretas.

Apresentamos hoje o projeto de lei-quadro que estabelece as condições e os requisitos de transferência de

atribuições e competências para as autarquias locais.

Num processo desta natureza, antes de se definir o quê, tem de se definir como, em que condições, com

que objetivos e a que princípios deve obedecer. É a isto que o PCP procura dar resposta, porque não podemos

decidir quais as competências a transferir para as autarquias sem considerar as condições para o seu exercício.

Consideramos que a transferência de competências deve respeitar os seguintes princípios: a preservação

da autonomia administrativa, financeira, patrimonial, normativa e organizativa interna das autarquias locais; a

garantia do acesso universal aos bens e serviços públicos necessários à efetivação de direitos constitucionais;

a coesão nacional, eficiência e eficácia da gestão pública; a unidade do Estado na repartição legal de atribuições

entre as entidades públicas e administrativas e a adequação do seu exercício aos níveis da administração

central, regional e local; a adequação dos meios às necessidades; e a estabilidade de financiamento no exercício

das atribuições que lhes estão cometidas.

Descentralizar não é sinónimo de desconcentrar, nem de delegar.

Descentralizar significa o poder de executar, mas também o poder de decidir. Por isso, propomos que a tutela

a que as autarquias estão sujeitas seja a de mera legalidade, respeitando o seu quadro de autonomia.

Propomos também que as autarquias que recebam novas atribuições e competências tenham os poderes de

planeamento, programação, execução, conservação, manutenção e fiscalização e que sejam acompanhadas

de todos os meios que lhes estão afetos.

Em matéria de finanças locais, propomos que, de acordo com as normas constitucionais, as autarquias

tenham receitas próprias e participem por direito próprio no produto dos impostos e demais receitas cobradas

pelo Estado, que haja reversão das atribuições, se houver redução das respetivas dotações financeiras, e que,

quando se verificar uma participação nos impostos, na lei de Orçamento do Estado, inferior ao previsto na Lei

das Finanças Locais, o Estado fique vinculado à reposição dos valores em causa nos três anos seguintes.

A plena realização e exercício das atribuições e competências exige que os meios financeiros tenham em

conta não só a despesa associada a cada atribuição em concreto mas também o grau de execução entre o

programado e o realizado, os montantes necessários para executar o programado e ainda a identificação de

carências, em particular de meios humanos e técnicos, acrescido de 5% a 10% para despesas de administração.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Muito bem!

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A descentralização não pode

corresponder à desresponsabilização do Governo, nem à transferência de encargos e de descontentamentos

da administração central para a administração local, transferindo o ónus negativo e problemas que persistem

para as autarquias.

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Estamos, também, em profundo desacordo com a perspetiva de transferir competências para as entidades

intermunicipais. Estas entidades não são autarquias, nem fazem parte da organização do Estado.

A descentralização não pode pôr em causa a universalidade de funções sociais do Estado, nem de direitos

fundamentais. A descentralização deve contribuir para combater assimetrias e desigualdades e não para as

aprofundar. No limite, não é admissível que passem a existir 308 políticas de educação, ou 308 políticas de

saúde, ou que a estratégia de preservação do património cultural classificado varie em função da localização

geográfica, sem uma orientação nacional. O Estado tem de assegurar que nenhum cidadão é discriminado em

função da zona do território onde vive e que o direito à educação, à saúde, à segurança social, à cultura têm de

ser garantidos a todos os cidadãos em igualdade.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Muito bem!

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — No âmbito desta discussão, procura-se dar centralidade à proximidade. A

proximidade e o conhecimento da realidade concreta são aspetos que assumem uma enorme importância, mas

não são a questão central. Qual o valor da proximidade quando esta não tem correspondência, em termos de

condições e meios, para responder aos problemas identificados? Com os contratos de execução e os contratos

interadministrativos ficaram resolvidos os problemas relativos ao parque escolar ou à carência de assistentes

operacionais? Não, e não foi por falta de proximidade mas, sim, pela não criação das condições e dos meios

adequados.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Um verdadeiro processo de

descentralização de competências deve romper com as opções políticas do passado, de ataque ao poder local,

desrespeitando e violando os seus princípios constitucionais, e de não alocação dos meios adequados às

autarquias.

Um verdadeiro processo de descentralização só, de facto, assim é se daí resultar uma melhor e maior

capacidade para responder aos anseios da população, para a prestação de serviço público de qualidade, no

respeito pelos direitos dos trabalhadores e sua valorização e na afirmação da autonomia do poder local.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Paulo

Oliveira.

O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Paula Santos, o PCP gosta muito de

dizer, e bem, que o País precisa da descentralização. Precisa da descentralização para se modernizar, precisa

da descentralização para corrigir assimetrias, precisa da descentralização para se desenvolver económica e

socialmente.

Mas, depois, o que faz o PCP? O PCP vota contra! O PCP vota contra todas as propostas de lei, todos os

projetos de lei e todos os projetos de resolução que versem sobre descentralização de competências e

atribuições para as autarquias locais. O PCP vota contra!

Protestos da Deputada do PCP Rita Rato.

E vota contra, independentemente dos domínios em que se preconiza a dita descentralização. Seja nas áreas

da educação, da saúde, dos transportes, da cultura, da solidariedade social, da gestão patrimonial, da proteção

civil, da gestão da orla costeira ou do ordenamento do território, o Partido Comunista Português, invariavelmente,

vota sempre contra, e vota contra pelas mais variadas e, permitam-me dizer, erradas razões.

Vota contra, porque, diz, ela desresponsabiliza a administração central.

Vota contra, porque as autarquias locais são incapazes de secundarizar os interesses económicos.

Vota contra, porque, diz, ela ataca as funções sociais do Estado.

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Vota contra, porque, diz, ela conduz à privatização dos serviços públicos.

Vota contra, porque ela abre as portas às negociatas das autarquias locais com os privados.

Sr.ª Deputada, para o PCP, as autarquias são empresas privadas e os autarcas são gente perigosa que se

vende aos interesses dos grandes grupos económicos.

Aplausos de Deputados do PSD.

Protestos da Deputada do PCP Rita Rato.

Sr.ª Deputada, o PCP é o campeão verbal da descentralização, mas é o último classificado na sua ação.

Na verdade, na verdade, Sr.ª Deputada, o PCP é o partido mais centralista do regime democrático português.

O Sr. João Oliveira (PCP): — O Sr. Deputado, de facto, não acrescenta nada à discussão!

O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — Esteja à vontade, porque não estou a falar do centralismo democrático,

esse princípio leninista que, ainda hoje, faz parte do código genético do Partido Comunista Português, estou a

falar do centralismo na verdadeira aceção da palavra.

É verdade que o PCP, Sr.ª Deputada, procura disfarçar esta sua particular característica, e o projeto de lei

que hoje submete a esta Câmara é um exemplo disso mesmo.

Sr.ª Deputada, o projeto de lei do Partido Comunista Português não identifica uma competência, uma

atribuição a transferir para as autarquias locais.

Vozes do PSD e do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — O projeto de lei do Partido Comunista Português, Sr.ª Deputada, nem

sequer é capaz de identificar um domínio, um domínio apenas, onde essa descentralização de competências

poderia acontecer.

Por isso, Sr.ª Deputada, pergunto: será hoje? Será hoje o dia em que o PCP, finalmente, nos vai elucidar

sobre estas questões? Será hoje o dia em que, porventura, Sr.ª Deputada, o País, os portugueses e os autarcas

portugueses se vão livrar da retórica comunista sobre a descentralização de competências?! É hoje esse dia,

Sr.ª Deputada?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Paula Santos.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Paulo Oliveira, já percebemos que o PSD

não quer fazer este debate de uma forma séria.

Protestos do PSD.

Não percebeu, ou não quer perceber, a iniciativa que o PCP trouxe a debate, porque é contrária àquilo que

o PSD fez, nomeadamente quando esteve no Governo, em que, por exemplo, aprovou ou, melhor dizendo,

impôs, fez uma espécie de «pesca à linha», aos municípios a transferência de competências na área da

educação antes de verificar se as condições estavam ou não asseguradas para que se pudesse concretizar

essa transferência de competências.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — É isso mesmo! Exatamente!

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Diga lá, Sr. Deputado, se, em matéria de educação, as questões relativas ao

parque escolar, que já foram transferidas para os municípios, estão concretizadas e que meios é que foram

alocados.

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O Sr. João Oliveira (PCP): — Muito bem!

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Aquilo que estava na vossa iniciativa era que não haveria aumento da despesa

pública. Então, com o subfinanciamento a que a educação foi votada nos últimos anos, em particular pelo seu

Governo, cujo resultado está à vista, se vocês não o resolveram, como é que iria ser resolvido?! Os problemas

persistem!

Aplausos do PCP.

O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — É hoje que vão esclarecer ou não?!

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Em matéria de assistentes operacionais, o que é que ocorreu? Está a ser

cumprida a portaria. Portaria que, aliás, nem responde àquelas que são as reais necessidades das escolas.

Ficaram resolvidos os problemas de carência de assistentes operacionais com o vosso processo, a que

chamaram «descentralização», mas que não passou de uma delegação, em que as competências continuaram,

e continuam, a ser do Governo?!

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Atenção ao tempo, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Vou terminar, Sr. Presidente.

O que fizeram foi um contrato com os municípios para que os municípios executassem as vossas

competências e, ainda por cima, com uma tutela de mérito. Vejam bem o respeito que têm pela autonomia do

poder local democrático!

Aplausos do PCP.

Foi assim que, ao longo de anos, reduziram as transferências de verbas para o poder local democrático, que

alteraram a Lei das Finanças Locais…

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Peço-lhe o favor de concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — … e que diminuíram a participação dos municípios. Vêm agora falar em

seriedade?!

O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — É hoje o dia ou não?!

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — O que o PCP hoje aqui traz é bem mais sério. O que o PCP aqui propõe, e

vou terminar mesmo, Sr. Presidente, é bem mais sério do que a sua intervenção, Sr. Deputado. Vamos ver, mas

com realidade, como é que queremos a organização do Estado. E não é numa perspetiva como a dos senhores,

de um Estado regulador,…

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Ó Sr.ª Deputada, peço-lhe o favor de não abusar da generosidade da

Mesa.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — … que, depois, transfere para os grupos económicos a execução de um

conjunto de direitos.

Terminando mesmo, Sr. Presidente, a nossa perspetiva é bem diferente: os direitos aos serviços públicos

têm de ser assegurados,…

O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — Não é hoje!

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A Sr.ª Paula Santos (PCP): — … mas temos de olhar para a organização do Estado com os três níveis, o

nível nacional, o nível local e a criação de regiões administrativas.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para apresentar a iniciativa do CDS-PP, tem, agora, a palavra o Sr.

Deputado Álvaro Castello-Branco.

O Sr. Álvaro Castello-Branco (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs.

Deputados: O tema que hoje estamos a discutir é, na sua essência, unanimemente defendido por todos os

partidos representados nesta Câmara, ou seja, todos defendem uma maior descentralização.

A descentralização de competências do poder central para o poder local e regional é essencial para o efetivo

e melhor desenvolvimento económico e social de toda a população portuguesa.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Álvaro Castello-Branco (CDS-PP): — No CDS, não temos dúvidas de que esse é o caminho, não

temos dúvidas da missão fundamental desempenhada pelos órgãos autárquicos na oferta de serviços públicos

de qualidade aos portugueses, integrando a primeira linha e a mais próxima dos cidadãos.

Mas, se todos estamos de acordo quanto aos benefícios de uma maior descentralização, já divergimos

quanto ao modo e às matérias a descentralizar. E são estas, por isso mesmo, o objeto de discussão fundamental

que todos devemos debater.

O anterior Governo PSD/CDS-PP iniciou este caminho de reforço da descentralização. Por isso, o XIX

Governo Constitucional, do PSD e do CDS-PP, desenvolveu e implementou uma profunda reforma,

nomeadamente no que se refere às atribuições e competências das autarquias locais e das entidades

intermunicipais, através da Lei n.º 75/2013, de 12 de setembro.

Por outro lado, no que se refere a áreas como a educação, saúde, segurança social e transportes, foram

aprovados diversos diplomas no sentido de efetivar a descentralização destas funções sociais.

O caminho iniciado pelo anterior Governo, da descentralização, deve ser aprofundado e concretizado, razão

pela qual o CDS não quis deixar de participar em todo este processo e de apresentar um projeto de lei sobre

esta matéria.

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Álvaro Castello-Branco (CDS-PP): — Assim, e para dar continuidade ao aludido caminho,

entendemos que no âmbito da educação, saúde, ação social, proteção civil, praias, gestão florestal, saúde

animal, segurança alimentar, património e habitação devemos proceder à descentralização de competências

para os municípios e entidades intermunicipais. Temos um longo trabalho pela frente, muito a discutir e a

desenvolver, com a intervenção de todos — Associação Nacional de Municípios Portugueses, ANAFRE

(Associação Nacional de Freguesias), autarcas —, mas entendemos que existem alguns princípios e regras

básicas que devem ser observados e do que parece resultar do diploma apresentado pelo Governo não estão

devidamente acautelados.

Assim, e desde logo no que se refere às áreas a transferir para os municípios, entendemos que, antes da

transferência de qualquer competência, todas as situações devem ser analisadas e o cumprimento efetivo das

funções em causa salvaguardado. Para isso, deve-se ter em conta as especialidades de cada um dos municípios

que constituem o País, as suas valências, capacidades, meios e todos os critérios que nos permitam avaliar se

determinada competência pode, e deve, ser exercida a nível local ou por uma entidade intermunicipal.

Para além disso, a par dessas transferências, tem de ficar devidamente salvaguardado que os municípios e

as entidades envolvidas dispõem de todos os recursos financeiros, materiais e humanos necessários ao pleno

cumprimento dessas funções. Necessário é, também, que fique salvaguardado que o exercício das

competências por municípios e entidades intermunicipais não comporte aumento da despesa pública.

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Sr.as e Srs. Deputados, conforme já referimos anteriormente, não daremos ao Governo um cheque em branco

nesta matéria, queremos que ela seja discutida nesta Casa, assim como toda a legislação fundamental para a

concretização da descentralização.

Temos muitas dúvidas relativamente a muitas áreas que o Governo pretende descentralizar, porque uma

coisa é descentralizar e outra coisa é a desresponsabilização sobre funções que cabem ao Estado central e que

só o Estado as deve prestar. Para além disso, parece-nos que a proposta que o Governo aqui nos traz não é

uma proposta devidamente analisada, discutida com todos os parceiros, nomeadamente com os municípios.

Sr. Ministro, o Governo já deveria ter apresentado a esta Assembleia um relatório sobre a transferência e

delegação de competências levadas a cabo nos últimos anos, salientando as principais fragilidades e virtudes,

mas, do que percebemos, tal ainda não foi feito. Esperamos que seja realizado com a brevidade possível.

O Governo, desde a sua tomada de posse, em novembro de 2015, fala-nos de descentralização e da

importância que esta assume na sua política. Com o princípio estamos de acordo. Acontece que, do que se

percebe, muitas das competências que pretendem transferir para os municípios, referidas na proposta que hoje

aqui nos apresentam, nem sequer foram discutidas ou analisadas com os mesmos ou com os seus

representantes.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Bem lembrado!

O Sr. Álvaro Castello-Branco (CDS-PP): — Do que sabemos, o Governo criou grupos de trabalho para

discutir a descentralização, mas pouco ou nada avançou, e, segundo declarações públicas do Presidente da

Associação Nacional de Municípios Portugueses, nunca lhes apresentou documentação sobre a transferência

das competências que estamos aqui a discutir. Sr. Ministro, desse modo, não se compreende que o Governo

queira verdadeiramente promover uma descentralização, deixando de fora os principais protagonistas.

Como é que o Governo pretende, por exemplo, que os municípios procedam à avaliação e reavaliação de

imóveis, designadamente para efeito de liquidação do IMI (imposto municipal sobre imóveis)? A maior parte dos

municípios não tem meios para isso e as desigualdades nacionais, provocadas por interesses locais, podem ser

graves. Aliás, o Sr. Presidente da Associação Nacional de Municípios Portugueses já veio publicamente dizer

que as câmaras recusam ficar com a competência de avaliar e reavaliar os imóveis, para efeitos de liquidação

do IMI. Será pois, em nosso entender, aconselhável manter essa competência no Estado central.

Também a transferência dos imóveis destinados a habitação social, pertencentes ao Estado, para os

municípios será um presente envenenado para estes, caso não seja feita pelo Estado a reabilitação desses

imóveis que, na sua generalidade, estão num estado de grande degradação e, por isso, a sua receção tem sido

recusada por parte dos municípios.

Sr.as e Srs. Deputados, estas são algumas das nossas muitas preocupações. A descentralização nunca se

concretizará sem um comprometimento de todos, mas, acima de tudo, do Governo.

Contudo, não é isso que esta proposta de lei, que hoje aqui discutimos, comporta. Esperávamos,

sinceramente, mais de quem afirma reiteradamente que a descentralização é a pedra angular da reforma do

Estado.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem a palavra o Sr. Deputado João Vasconcelos, para apresentar o

projeto de resolução n.º 722/XIII (2.ª), do BE.

O Sr. João Vasconcelos (BE): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A

revolução de Abril, através da Constituição da República, consagrou uma das principais conquistas, o poder

local democrático, emanado da vontade popular das cidadãs e dos cidadãos deste País e que, há bem pouco

tempo, comemorou 40 anos de existência. Um poder local assente na legitimidade e na participação

democráticas, na autonomia e rejeitando o centralismo do poder central.

Durante os anos de chumbo do Governo PSD/CDS-PP, o poder local democrático sofreu um dos maiores

ataques de que há memória: foram subtraídos às autarquias milhões e milhões de euros, através do

incumprimento da Lei das Finanças Locais; os serviços foram drasticamente reduzidos ou degradaram-se de

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forma calamitosa; foi ensaiada uma falsa descentralização e foram extintas mais de 1 milhar de freguesias a

nível nacional, a régua e esquadro, pela mão do Sr. Relvas.

A Constituição prevê a descentralização de competências para as autarquias, freguesias, municípios e

regiões, como órgãos diretamente eleitos pelas populações. Descentralizar é uma prioridade para democratizar

e desburocratizar o aparelho do Estado. Também é sabido que o Programa do tal Governo contempla

mecanismos de descentralização, mas sempre feita para municípios e freguesias, e que também prevê a

existência de uma nova autarquia, as áreas metropolitanas, eleitas por sufrágio direto universal, objeto de

descentralização de competências.

Se o Governo já tinha recuado em relação à reposição de freguesias extintas, constata-se novo recuo quanto

às Áreas Metropolitanas de Lisboa e Porto.

Embora crítico deste modelo, o Bloco de Esquerda sempre o poderia, e poderá, aceitar, pois uma efetiva e

verdadeira descentralização só se consumará com a criação das regiões administrativas. Defendemos,

inequivocamente, a regionalização, pois só com a eleição direta dos órgãos de decisão se atingirá da melhor

forma a descentralização administrativa e a democratização do Estado.

De qualquer modo, não avançando a regionalização, nada temos a objetar à instituição das áreas

metropolitanas como autarquias locais. O que se pede é um igual tratamento para todo o território nacional. Mas

até nas áreas metropolitanas o Governo recuou.

Estamos, hoje, a discutir várias iniciativas, do Governo e de partidos, e o Bloco de Esquerda não podia faltar

a este debate. Nada temos a objetar aos projetos apresentados pelo PCP e pelo PAN, mas o mesmo não

dizemos relativamente à proposta de lei, do Governo, e aos projetos do PSD e do CDS.

A proposta do Governo parece assentar no Decreto-Lei n.º 30/2015, do Governo PSD/CDS-PP, que procurou

materializar uma alegada descentralização, melhor dizendo, uma municipalização das funções sociais do Estado

nas áreas da educação, da saúde, da segurança social e da cultura. O Governo vai ainda mais longe noutras

propostas de descentralização de competências para os órgãos.

Se, em muitas destas áreas, a transferência de competências é pacífica para o Bloco de Esquerda, noutras

não aceitamos ou merecem-nos sérias reservas. Por exemplo, a gestão de pessoal na educação ou na saúde,

a gestão de recursos educativos, os jogos de fortuna e azar, a segurança alimentar, a gestão das áreas

protegidas e a avaliação e reavaliação de imóveis não devem estar no âmbito das competências municipais.

Onde o Governo diz «mata», o PSD e o CDS dizem «esfola», basta ver os seus projetos.

Protestos do PSD.

O PSD apresenta o figurino dos contratos interadministrativos, os quais foram alvo, durante o seu Governo,

de grande contestação, em especial no sector da educação.

Uma outra preocupação para o Bloco de Esquerda prende-se com a previsível falta de escala de recursos,

técnicos, humanos e financeiros.

Um outro aspeto inaceitável tem a ver com a descentralização de competências para as comunidades

intermunicipais.

Em suma, as propostas do Bloco de Esquerda assentam nos seguintes pressupostos: que a descentralização

de competências promova a democracia, a participação e capacidade de decisão cidadãs e, como tal, apenas

sejam recetoras de competências as autarquias locais (freguesias, municípios e regiões administrativas); que a

descentralização não englobe competências dos serviços públicos cujo exercício não recomende uma escala

municipal; que nas áreas urbanas possam ser criadas novas formas de organização territorial, como as áreas

metropolitanas; que a descentralização de competências tenha como objetivo manter a universalidade dos

serviços públicos; que a descentralização de competências proteja os direitos laborais dos trabalhadores; e que,

finalmente, se avance no caminho da regionalização.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem a palavra o Sr. Deputado André Silva para apresentar o projeto de

resolução n.º 725/XIII (2.ª), do PAN.

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O Sr. André Silva (PAN): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados:

O PAN não acompanha o Governo no processo de centralização massiva de competências do Estado nos

presidentes de câmara.

O Governo e o PSD querem colocar os presidentes de câmara a assumir a gestão total de matérias como as

de ordenamento do território, ambiente, áreas protegidas, saúde animal, proteção e bem-estar animal,

segurança alimentar ou saúde pública. Mas o insólito deste processo verifica-se no esvaziar o Estado de

competências de fiscalização e tutela destas matérias, que, pela sua importância, se encontram na esfera da

administração central, e centralizá-las nos presidentes de câmara. Os presidentes de câmara, que ocuparão os

conselhos diretivos das CCDR (comissões de coordenação e desenvolvimento regional), órgãos sem

legitimidade democrática e pluralidade política, irão fiscalizar-se a si próprios.

Na exposição de motivos da proposta de lei lê-se que este processo torna o Estado mais inteligente, mais

moderno e, logo, mais forte. Para o PAN, pelo contrário, Sr. Ministro, está em causa o evidente desrespeito pelo

princípio da separação de funções e a existência de conflitos de interesses que facilitam mecanismos de

favorecimento e de corrupção na gestão de políticas em áreas universais e do bem comum.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Susana Amador.

A Sr.ª Susana Amador (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados:

A reforma da descentralização e o caminho para que apontamos, na nossa proposta, parte de princípios

fundamentais, como os da autonomia, da subsidiariedade, da universalidade do serviço público e da igualdade

de oportunidades de acesso ao mesmo, sem descurar uma justa repartição de recursos. É uma reforma que se

veste de futuro, de desenvolvimento e de democracia.

O Grupo Parlamentar do Partido Socialista parte, assim, para este debate com total abertura, visando a

obtenção de um máximo denominador comum, por ser uma reforma que requer alargados consensos,

auscultação do que se tem a dizer junto à ANMP, à ANAFRE e demais entidades, abrangência e convergência.

É com imenso gosto que verificamos que todos os partidos tiveram impulso legislativo e quiseram trazer à

discussão este tema. É, assim, com um espírito construtivo que se apresentam a debate, o que saudamos.

Esta vontade política espelhada nas iniciativas de todos revela o reconhecimento da importância do papel do

poder local, eleito ao longo destes 40 anos de democracia, e emite um sinal político inequívoco: podendo,

embora, partir de pressupostos diferentes ou desenhar soluções diversas, existe um inegável reconhecimento

da importância da descentralização de competências para órgãos mais próximos das pessoas, uma vez que a

proximidade é o princípio básico de uma verdadeira democracia e motor para o progresso.

Sabemos que a proximidade, Srs. Deputados e Sr.as Srs. Deputadas, reforça o desenvolvimento económico

e social, aprofunda a unidade nacional e os laços de solidariedade entre todos os portugueses. Estamos certos

de que juntos, na especialidade, na comissão competente — não vemos necessidade de recorrer à criação de

outra comissão eventual, já que temos uma comissão própria para esse efeito —, conseguiremos construir o

edifício legislativo que honrará estes 40 anos de poder local democrático.

Após 40 anos de poder local, podemos e devemos ir mais longe na concretização do artigo 6.º da Constituição

da República Portuguesa.

Tal como observou o Primeiro-Ministro, recentemente, os países da Europa que foram mais longe na sua

capacidade de desenvolvimento foram também aqueles que conseguiram mobilizar as energias locais, tendo

níveis mais elevados de descentralização. Por isso, temos de avançar.

Um Estado democrático, representativo e participado não pode desvalorizar a descentralização como motor

para se afirmar como tal, nem pode ignorar o valor e a dimensão que o poder local nele deve ocupar. Em

especial, no âmbito da saúde, da educação, da habitação ou da ação social é notória a excessiva centralização

de competências, que não permite uma atuação tão ágil e em tempo útil por parte da Administração Pública na

resolução dos problemas e necessidades dos cidadãos. Por isso, devemos avançar.

Uma das áreas que cresce em transferência de competências é a da educação, onde existe uma experiência

acumulada em Portugal muito significativa e positiva. As autarquias desenvolvem hoje, com grande dedicação

e competência, uma continuada expansão de oferta de educação pré-escolar. Têm um olhar atento e

consequente na construção e conservação do parque do ensino básico: asseguram alimentação, transporte

escolar e promovem o sucesso dos nossos jovens.

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Por isso, temos de confiar, de forma prudente e serena, com respeito pela autonomia da escola e dos

professores, temos como desiderato melhorar o serviço público de educação, acrescentando qualidade,

especificidade e abertura ao meio escolar.

Sublinhe-se que esta reforma nunca irá desresponsabilizar o Estado do seu papel no sistema educativo,

social ou na saúde, o qual se manterá na senda prossecução de um Estado social e de bem-estar. Aliás — e

este Governo tem-no demonstrado à exaustão —, temos vindo a robustecer este Estado social.

Srs. Deputado e Sr.as Deputadas, Meus Senhores e Minhas Senhoras, esta reforma abre as portas de uma

nova ambição e valorização do poder local que está em posição de conhecer de um modo profundo as

assimetrias e necessidades sociais, bem como as aspirações das pessoas, que devem ser sempre a essência

da política. Por elas, temos de abrir esta porta reformista, a chave que a abre chama-se «descentralização»,

que rima sempre com democratização.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira,

de Os Verdes.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados:

O Governo apresenta-nos hoje, para discussão, uma proposta que pretende proceder à transferência de

significativas competências do Estado para a gestão das autarquias e outras que ainda virão, como sejam a da

floresta ou a das áreas protegidas.

Como elemento central desta discussão, Os Verdes pretendem reafirmar que a descentralização, a nosso

ver, não deve perder de vista a criação das regiões administrativas e que deve ter como pressuposto a defesa

e a valorização da autonomia do poder local, sempre na perspetiva de melhor responder às necessidades das

populações e de promover a qualidade dos serviços públicos prestados aos cidadãos.

A descentralização não pode, nem deve, ser encarada como uma forma de desresponsabilizar o Estado

central das suas funções. A descentralização não pode ocorrer só porque o Estado não quer, ou não consegue,

dar resposta ao que pretende descentralizar. E, face à proposta que está em discussão, Os Verdes não podem

deixar de registar as muitas e sérias reservas e preocupações que ela nos oferece.

Em primeiro lugar, porque algumas destas transferências incidem em áreas que a nossa Constituição inclui

nas Funções sociais do Estado, desde logo, a saúde e a educação. Estamos, portanto, a falar de áreas que a

Constituição elegeu como fundamentais para a nossa qualidade de vida e bem-estar e que devem, por isso

mesmo, ser asseguradas de forma universal a todos os cidadãos e em todo o território.

Por outro lado, esta descentralização — diz-se na proposta — pretende aproximar a gestão dos cidadãos,

mas as propostas de transferência na área da educação, por exemplo, contrariam completamente este

propósito.

O Governo está a propor retirar competências que atualmente são asseguradas pelas escolas para as passar

para a gestão das autarquias. Sucede que quem mais perto está dos alunos, das famílias e quem melhor

conhece e domina os problemas das escolas são exatamente os órgãos das escolas e os professores.

Aliás, na área da educação, o atual Governo está a dar continuidade ao processo de municipalização que o

Governo anterior avançou em 15 municípios-piloto.

Mas, hoje, já nos vão chegando os ecos dos casos-piloto e as queixas dos professores são mais que muitas,

para além de a autonomia das escolas estar a ficar comprometida, como é o caso de Sousel, no distrito de

Portalegre, onde a autonomia da escola está a ser completamente posta em causa.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Bem lembrado!

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Acresce, ainda, que esta proposta pode potenciar uma gestão

desligada das estratégias políticas nacionais, onde age cada um à sua maneira no seu local, cada um por si.

Esta questão é particularmente importante, sobretudo ao nível da educação, da saúde, da cultura ou da

conservação da natureza.

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Para além disso, há decisões políticas em certos setores, que exigem um nível de conhecimento técnico que

devem ser tomadas por quem o detém, sendo que esse conhecimento não está, nem pode ser, disperso. Aliás,

ainda ontem, no debate do Fórum do Património, promovido pela plataforma de associações desta área, esta

matéria foi muito focada. Hoje, a decisão é suportada por uma cadeia hierárquica técnica especializada que é

fundamental, mas que corre o risco de ser quebrada.

Portanto, em jeito de conclusão, gostaria de dizer que Os Verdes defendem a descentralização e são

favoráveis ao reforço do poder local, mas há nesta proposta muita coisa que não está esclarecida, nem balizada,

ficando tudo em aberto para posteriores diplomas.

Como nem nas autarquias, nem no Estado se fazem omeletes sem ovos, seria fundamental garanti-los, mas

a proposta não os garante. Mais: se, até agora, muita coisa não tem corrido bem com a gestão do Estado, isso

não se deve à estrutura que gere, mas, sim, à falta de meios.

Deixo dois exemplos: na educação, os problemas de falta de auxiliares nas escolas não advêm de quem

gere, mas do facto de não serem contratados mais auxiliares; na cultura, a recuperação do património tanto é

bem feita localmente, como ao nível nacional e com grandes níveis de cooperação, aliás, entre os dois

patamares. O seu abandono deve-se mais à falta de dinheiro do Orçamento do Estado para a cultura do que a

qualquer outro motivo.

Portanto, não será a descentralização que irá resolver o problema; pelo contrário, poderá até retirar o saber

que é muito técnico e centralizado. As autarquias, não tendo esse saber, terão forçosamente de recorrer ao

privado, gastando ainda mais dinheiro.

Por outro lado, esta descentralização pode levar a que haja decisões que passem a ser tomadas ao acaso,

em função do local, sem qualquer estratégia nacional, em áreas e matérias onde esta estratégia é fundamental

para garantir não só os mesmos direitos a todos os cidadãos, como também para gerir o saber, o conhecimento,

a reflexão, em termos de desenvolvimento nacional e também em termos de recursos.

Como se vê, tudo isto precisa de mais debate, de mais reflexão. Nesta matéria, não pode haver pressas, tem

de haver o envolvimento dos profissionais, das autarquias, das associações e das organizações representativas

dos trabalhadores, sem nunca perder de vista a previsão constitucional da criação das regiões administrativas.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria da Luz

Rosinha, do PS.

A Sr.ª Maria da Luz Rosinha (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro Adjunto, Sr. Secretário de Estado das

Autarquias Locais e Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, Sr.as e Srs. Deputados: Quarenta

anos depois das primeiras eleições autárquicas livres, que foram um sinal claro da democracia local, chegou o

momento da grande reforma que a descentralização consagra, momento, esse, que é assumido por todas as

forças políticas com assento parlamentar como de especial importância, já que o reforço de competências das

autarquias locais valoriza a sua intervenção e potencia os resultados da gestão dos recursos públicos.

As autarquias sempre reclamaram novas competências como reforço da autonomia local, conscientes de

que mais responsabilidades e meios possibilitam, pela proximidade, uma maior rapidez e eficácia na resolução

dos problemas e na execução das políticas.

A Sr.ª Susana Amador (PS): — Muito bem!

A Sr.ª Maria da Luz Rosinha (PS): — A apreciação que a ANAFRE e a Associação Nacional de Municípios

fizeram da proposta de lei apresentada pelo Governo, que hoje se apresenta a debate na generalidade, dando

parecer favorável e mostrando toda a disponibilidade para o trabalho que se vai seguir, deixa claro que os

autarcas, através das estruturas que os representam, estão de acordo com esta proposta na generalidade,

aguardando os diplomas setoriais que irão clarificar os mecanismos dessa mesma descentralização.

Estamos, aliás, perante um processo legislativo que convoca e — gostaria também de afirmar — congrega

todas as forças políticas. Disso é bem sinal as iniciativas que todos os partidos fizeram entrar na Assembleia da

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República e que, depois do debate na generalidade, irão ser analisadas com toda a abertura e interesse pelo

Partido Socialista.

A descentralização de competências não diz apenas respeito aos municípios, mas também às freguesias

que têm sido em muitos casos a única representação do Estado e entidade prestadora de serviços públicos

junto das populações em territórios mais distantes, de baixa densidade e com ligações difíceis.

O Governo do Partido Socialista reconhece a importância das freguesias quer no serviço às populações, quer

na dinamização do território. Por isso, propõe o reforço das suas competências próprias, absorvendo nesse

quadro muitas das que hoje são delegadas e possibilitando que outras venham a ser negociadas entre os

municípios e as freguesias, mediante a celebração de contratos interadministrativos e após a aprovação por

parte dos seus órgãos deliberativos.

Quando falamos de transferência de competências, falamos sempre também de transferência de meios

financeiros que são afetos às novas competências que estarão devidamente salvaguardadas, como é

compromisso do Governo, em cada ano na Lei do Orçamento do Estado, bem assim como os necessários

recursos humanos.

Há um compromisso por parte do Governo de que a transferência de competências não se constituirá como

um aumento de encargos para as freguesias. Salientamos que fica ainda claro que as transferências de novas

competências são diferenciadas em função da natureza e dimensão das freguesias, considerando a população

e a capacidade de execução de cada uma delas.

O Governo do Partido Socialista, com esta proposta de lei, dá corpo a um compromisso assumido de

transformar o modelo de funcionamento do Estado, começando pelas autarquias locais.

Estamos a viver um momento que, depois de concluído, fará história e capacitará as autarquias, municípios

e freguesias e comunidades intermunicipais para um melhor serviço às populações e uma melhor qualidade de

vida para todos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Srs. Deputados, não é possível intercalar outros pedidos de palavra de

outros grupos parlamentares, dado que a dinâmica das intervenções não o permite.

Dou, por isso, a palavra ao Sr. Deputado João Torres, do PS, para uma intervenção.

O Sr. João Torres (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro Adjunto, Sr. Secretário de Estado das Autarquias

Locais e Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, Sr.as e Srs. Deputados: Discutimos, hoje, várias

iniciativas parlamentares que procuram, numa primeira instância, atingir um objetivo comum, o de melhor servir

os cidadãos e tornar o Estado mais eficiente e próximo das pessoas.

Não é por acaso que a discussão sobre a descentralização merece uma atenção reforçada por parte de todos

os grupos parlamentares, por parte da sociedade e, desde logo, por parte do Governo. A montante de todas as

reformas de que Portugal carece, importa clarificar o quadro de competências da administração direta e indireta

do Estado, assim como das próprias autarquias e das suas estruturas associativas.

Justamente por esse motivo, o Governo consagrou no seu Programa a transformação do modelo de

funcionamento do Estado como um zéniteda sua intervenção, mobilizando esforços para tornar possível um

clima de franco e profícuo diálogo e de busca pela imprescindível e necessária concertação que o Sr. Ministro

tão bem tem referido.

A proposta de lei que o Governo apresenta a esta Câmara é, nesse sentido, não um ponto de partida, não

um ponto de chegada, mas uma base sólida de trabalho que merece a concordância parlamentar do Partido

Socialista. É uma proposta que se define em três elementos essenciais: o reformismo, a ambição e o equilíbrio.

O reformismo, pela capacidade inegável de aprofundamento dos princípios da subsidiariedade, da

descentralização e da autonomia das autarquias locais, proporcionando que quem melhor pode gerir, quem

melhor pode decidir e quem melhor pode resolver disponha de todas as condições para esse efeito,

designadamente dos meios humanos, financeiros e patrimoniais que se afigurem necessários e imprescindíveis.

A ambição, pelo conjunto de domínios que abrange, da educação à saúde, da cultura à habitação, sem

esquecer, por exemplo, as áreas portuárias e marítimas e tantas outras cuja gestão é tangente às políticas de

ordenamento do território e ambientais.

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Por último, o equilíbrio, pela inabalável e imprescindível salvaguarda da autonomia regional e pela

consideração do papel das freguesias, sem negligenciar, a seu tempo, a apresentação de decretos-leis setoriais

e a avaliação de períodos transitórios e de faseamento na concretização, para que a eficiência e a eficácia

pretendidas não fiquem, em momento algum, prejudicadas.

Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, mais de 40 anos volvidos sobre a Revolução dos

Cravos, que determinou precisamente a autonomia do poder local, este é o momento certo para refletir, mas,

fundamentalmente, este é o tempo certo para agir. As autarquias locais são responsáveis por algumas das

mutações mais notáveis que o País conheceu ao longo das últimas décadas. Promover o alargamento das suas

competências não significa apenas aportar-lhes responsabilidades acrescidas, implica, justamente, a

valorização da nossa democracia, e, Sr. Presidente, essa valorização é potenciada sempre que o poder de

decisão se aproxima dos cidadãos mais um nível, mais um degrau, mais um patamar, com transparência, rigor

e ponderação.

É, pois, a própria democracia que hoje, mais do que nunca, nos exige esta ação transformadora, a bem da

res publica e de um Portugal mais preparado para os desafios do futuro.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Norberto Patinho,

do PS.

O Sr. Norberto Patinho (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro Adjunto, Sr. Secretário de Estado das Autarquias

Locais e Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, Srs. Deputados e Sr.as Deputadas: A

descentralização e o reforço de competências e da autonomia do poder local são, para o Partido Socialista,

temas estruturantes, assumidos como pedra angular da reforma do Estado. Estão plasmados no Programa

Eleitoral do Partido Socialista, na Agenda para a Década e no Programa do Governo.

Num Estado cuja tendência centralista, alegadamente justificada pela crise económico-financeira, foi

agravada nos últimos anos, o Governo, com esta proposta de lei, assume claramente uma rutura com o

preconceito ideológico dos que veem nas autarquias meros serviços desconcentrados da administração central,

assumindo claramente uma nova forma de governar assente na proximidade, na simplificação e na eficácia,

uma forma de governar que garanta melhores serviços públicos para todos os cidadãos e em todo o País.

No Partido Socialista, acreditamos, sempre acreditámos, que a construção de um país mais justo e mais

coeso só se concretizará com uma participação clara e inequívoca do poder local. O caminho que é assumido

com a proposta de lei aponta para uma descentralização universal, propiciadora da igualdade de oportunidades

para todos os municípios e para todos os cidadãos, fundamentada na promoção da coesão territorial, na

melhoria da qualidade dos serviços prestados às populações e na racionalização dos recursos disponíveis.

Não confundindo descentralização administrativa com contratualização ou delegação de competências, o

documento que está em apreciação é respeitador da autonomia municipal e garante a integridade da soberania

do Estado em todos os domínios dos interesses próprios das populações das autarquias locais.

Com total respeito pelos autarcas e autarquias e pela sua autonomia, é potenciada uma maior proximidade

entre decisores públicos, cidadãos e território, através do reforço das atribuições e poderes dos municípios e

das freguesias.

Quero felicitá-lo, Sr. Ministro, e ao Governo, pelo clima de confiança que foi construído e aprofundado nas

relações com o poder local e com as suas associações representativas e que torna possível responder a

reivindicações e aspirações de há muitos anos.

Com 40 anos de provas dadas, os autarcas são justamente merecedores do voto de confiança que o Governo

lhes concede com este aprofundamento e reforço das competências e dos correspondentes meios humanos,

materiais e financeiros, necessários ao seu exercício.

Mais meios, mais competências, mais responsabilidades para poder servir melhor as populações.

Aplausos do PS.

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O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Também para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro

Soares, do Bloco de Esquerda.

O Sr. Pedro Soares (BE): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Importa que

todos tenhamos a perceção de que é importante avançar para esta reforma da descentralização, mas é preciso

que tenhamos os pés bem assentes no chão. Ou seja, não basta dizermos que estamos disponíveis para todos

os debates, é preciso fazê-los, é preciso promovê-los, e não é essa a disponibilidade que estou a ver por parte

de algumas bancadas deste Hemiciclo.

Reparem no seguinte: cerca de 70% dos nossos municípios têm menos de 30 000 habitantes e o que

constatamos hoje é que os presidentes de câmara desses municípios, e de muitos outros, são já os maiores

empregadores da sua área.

Neste momento, com este processo de descentralização previsto pelo Governo e que tem, pelos vistos, o

apoio da direita, esses presidentes de câmara serão também decisivos no emprego, nomeadamente nos centros

de saúde e nas escolas; serão fundamentais na determinação dos critérios para a atribuição de subsídios da

segurança social; terão funções nas comissões intermunicipais ao nível da distribuição de fundos comunitários

e de competências que estão muito para além da sua própria legitimidade municipal.

Estamos a asfixiar a democracia local e esta deve ser uma questão essencial, porque, que saibamos, menos

democracia local não significa melhor gestão pública, nem melhor administração da coisa pública. O que temos

de incentivar e incrementar é mais democracia local e para isso é preciso que haja escala, é preciso que haja

pluralidade. Contudo, temos as maiores dúvidas de que este processo de descentralização conduza a essa

mesma democracia local ou ao aprofundamento da democracia.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para uma intervenção, tem agora a palavra o Sr. Deputado Carlos César,

do PS.

O Sr. Carlos César (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro Adjunto, Sr. Secretário de Estado das Autarquias

Locais e Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, Sr.as e Srs. Deputados: Queria fazer uma

intervenção final muito breve, em nome do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, para reiterar e salientar o

empenhamento do PS no processo de diálogo e de tomada de decisão que, assim o esperamos, concretize um

avanço histórico e significativo no processo de descentralização política para o nosso País.

Consideramos, em primeiro lugar, que este pode e deve ser um momento adequado para procurarmos e

alcançarmos os consensos que nos permitam progredir no desenvolvimento do acervo e da matriz constitucional

do Estado português em matérias de proximidade, eficiência e democraticidade da estrutura do Estado.

Aplausos do PS.

Em segundo lugar, entendemos que a circunstância de a generalidade dos partidos terem contribuído para

este debate, através da apresentação de projetos, é um bom sinal, independentemente de divergências

facilmente detetáveis.

A Sr.ª Susana Amador (PS): — Muito bem!

O Sr. Carlos César (PS): — Trata-se, afinal, de matérias excecionalmente relevantes para a boa governação

e para o reforço da cidadania. Não ignoramos que nesta Assembleia da República, como fora dela, há

sensibilidades diferentes sobre as virtualidades, os modelos e a intensidade da descentralização política. Por

isso mesmo, é propósito do Grupo Parlamentar do Partido Socialista ponderar todas essas contribuições, sem

acordos prévios ou preconceitos partidários, no trabalho que se seguirá no âmbito da comissão parlamentar

respetiva.

Procuraremos valorizar o que mais nos unir e não polemizar no que for motivo de desentendimento. Estamos

na linha da frente do consenso e do diálogo necessário, como sempre.

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Aplausos do PS.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, assim o faremos porque entendemos que é desejável e possível que

os partidos concluam com assertividade e aproveitamento legislativo o estabelecimento de um novo quadro de

competências para as autarquias locais e para as entidades intermunicipais, potenciando o valor da imediação

desses níveis decisórios, para uma melhor administração em áreas pertinentes para o desenvolvimento local e

regional.

Importará, pois, aprofundar esses novos termos, seja em domínios como o do serviço de atendimento aos

cidadãos e às empresas, seja em áreas diversificadas, desde a educação, a saúde, à ação social, à gestão do

território, à proteção civil, ao ambiente, à habitação ou à cultura. Em cada caso — repito, em cada caso —,

porém, importará fazer um esforço no sentido de fixar o nível de responsabilidades cuja repartição confirmarmos

como os mais úteis às realidades regionais e do conjunto do País e acautelar também o universo com potencial

próprio e específico, no caso das regiões autónomas.

É com essa orientação que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista avaliará todas as propostas, inclusive

a do Governo.

Sr.as e Srs. Deputados, a reforma do Estado, de que se tem falado ao longo dos últimos anos sem que,

infelizmente, se tenham alcançado as concretizações pertinentes, não pode agora dispensar o aprofundamento

efetivo da descentralização.

Neste exato dia em que se assinala mais um aniversário da morte de uma extraordinária mulher portuguesa,

nascida na freguesia de Fajã de Baixo, a cerca de 1500 km da Assembleia que aqui nos reúne e da qual foi

também Deputada, Natália Correia,…

Aplausos do PS e dos Deputados do BE José Manuel Pureza e do PCP António Filipe.

… termino, invocando não só a sua memória de autonomista, como a palavra que, nesta circunstância, ela

poderia usar, de estímulo ao decisor político. Partindo da Ode à Paz e parafraseando: «Abram as portas da

história, deixem passar a vida».

Contra receios, que sei infundados, lembro que tanto há má administração e bons governantes a nível central

como a nível regional ou local. Porém, uma autarquia reforçada, tal como uma entidade intermunicipal

valorizada, tal como uma região que urge descentralizar, são provas de maturidade e um motor acrescido de

busca de empreendedorismo, de eficiência e de equidade.

Bem sei que não chegaremos, para já, tão longe quanto desejável, mas espero que fiquemos mais perto.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Montenegro,

do PSD.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Creio

que, no final deste debate, todos percebemos a importância e o interesse do assunto que aqui discutimos.

Assunto esse que tem a ver com o seguinte: como pode o Estado, a Administração ser mais eficiente? Como

pode o Estado, a Administração prestar mais e melhores serviços aos cidadãos? Como pode utilizar eficazmente

os recursos disponíveis e garantir a acessibilidade aos principais sistemas públicos? Mas também como pode o

Estado, a Administração potenciar um crescimento mais saudável, mais duradouro e mais acentuado da

economia? É este o fulcro do debate que aqui hoje realizamos.

Cuidar do ordenamento territorial seja nas áreas metropolitanas, seja nos territórios de baixa densidade,

oferecer melhores serviços na educação, na saúde, no apoio social, preservar e valorizar a cultura e o

património, o meio ambiente, os recursos naturais da floresta até ao mar, todos estes propósitos, todos estes

desígnios exigem uma reflexão profunda e decisões acertadas. Decisões a pensar no futuro e não amarradas

ao presente ou ao passado. Decisões a pensar nas pessoas e nas comunidades locais e não a pensar nos

governos ou nos partidos. Decisões estruturantes e não decisões meramente conjunturais.

O PSD chamou-vos para este debate há um ano, quando aqui discutimos o Plano Nacional de Reformas.

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Vozes do PSD: — É verdade!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Nessa altura, desdenharam das nossas intenções.

O PSD chamou-vos novamente para este debate, quando aqui discutimos o Orçamento do Estado para 2017.

O Governo e os partidos que o apoiam rejeitaram esse debate nessa oportunidade.

O PSD volta agora a convocar-vos,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — O PSD parece a campainha das escolas!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — … e esperamos mesmo que, à terceira, seja de vez e que, desta vez, por

uma vez, as palavras possam coincidir com os atos.

A sociedade portuguesa e as pessoas concretamente consideradas merecem a nossa dedicação e merecem

ser ouvidas e integradas nas nossas decisões.

Deste processo legislativo deve resultar, com clareza, em que modalidades e quais as competências que a

administração central pode delegar para poderem ser executadas pela administração local.

Deve também resultar com clareza que recursos financeiros, patrimoniais, logísticos e humanos vão ser

alocados às autarquias para prosseguirem estas competências que vão adquirir.

O passo que, agora, se pretende dar é grande e deve centrar-se numa ideia clara: construir uma organização

do Estado adequada ao progresso social e económico do País, capaz de, se não eliminar, pelo menos atenuar

as desigualdades e estimular as oportunidades.

Do nosso ponto de vista, a proposta do Governo é manifestamente insuficiente. Em alguns momentos, chega

mesmo a ser inconsequente ou, pelo menos, ambígua. Mas não deixa de ser uma proposta válida, que deve ser

tida em consideração no Parlamento.

Mas, é sabido, no PSD fomos mais longe, vamos mais longe neste processo de descentralização e trazemos

a este debate quatro iniciativas políticas e legislativas, que são mais densas, mais ambiciosas e promovem, de

forma mais transparente, este processo descentralizador.

Claro está que não serão perfeitas e claro está que também podem ser melhoradas no debate que todos

aqui se predispuseram a realizar. De resto, é nosso entendimento que todos os contributos são, de facto, bem-

vindos. Todos os contributos que possam dimanar deste Parlamento — dos Deputados e das Deputadas, dos

grupos parlamentares —, mas também de fora deste Parlamento — das organizações autárquicas, das

instituições sociais, da academia, de todos quantos podem trazer a esta reflexão e a este processo decisório

contributos positivos que possam enriquecer as opções que temos de tomar. Pela nossa parte, contamos com

todos esses contributos.

E temos também a intenção de não atrasar mais este processo. Queremos mesmo até acelerá-lo, porque é

nosso entendimento que não há tempo a perder.

Por isso, termino, Sr.as e Srs. Deputados, reafirmando aqui a proposta que já fizemos neste debate, do

método que, do nosso ponto de vista, pode ser mais eficaz e tornar mais rápida e mais profunda a discussão

que podemos travar neste Parlamento: criar uma comissão específica, uma comissão eventual, que, de uma

forma rápida e exclusiva, se possa dedicar ao tratamento das iniciativas hoje em debate e de outras que,

porventura, possam chegar ainda à Assembleia da República. Esta comissão vai, portanto, favorecer uma

discussão transversal de todas as dimensões e de todos os setores de atividade que estão na base dos projetos

que os partidos e o Governo trouxeram ao Parlamento.

É por isso que não podemos esperar outra coisa que não seja a de esta proposta poder ser viabilizada. É

que, Sr.as e Srs. Deputados e Srs. Membros do Governo, os que têm mesmo interesse em aproximar posições,

os que querem mesmo contribuir e ajudar a que possam consensualizar-se decisões que possam ser projetadas

na vida das pessoas e na organização do País para as próximas décadas, aqueles que estão «de peito aberto»

neste debate e neste caminho, esses, com certeza, não vão optar, como no passado, pela falta de comparência

num instrumento de discussão e de decisão tão simples de poder concretizar como este.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Não guarde rancores!

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O Sr. Luís Montenegro (PSD): — É o desafio que daqui lanço, com a consciência de que, desta vez, não

vão existir novos obstáculos que possam desfavorecer o aprofundamento que os portugueses exigem de um

processo que, repito, tem de ter como consequência uma Administração mais próxima. E não só mais próxima,

porque a proximidade em si não constrói boas decisões, a proximidade favorece, mas nós temos a obrigação

de ir mais longe do que tornar as decisões próximas, elas têm de se refletir na vida quotidiana de cada cidadão,

na vida quotidiana de cada comunidade, na vida do País, para que ele possa ser mais próspero e para que essa

prosperidade não deva ser prejudicada por manobras político-partidárias.

Este é o desafio que vos lançamos, conscientes de que não o vão desperdiçar.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem a palavra a Sr.ª Secretária Emília Santos para dar conta da entrada

na Mesa de um requerimento.

A Sr.ª Secretária (Emília Santos): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, deu entrada na Mesa um

requerimento, apresentado pelo Grupo Parlamentar do PSD, solicitando que, nos termos do artigo 96.º do

Regimento, seja incluído no guião das votações a realizar na sessão de amanhã, dia 17 de março de 2017, o

projeto de resolução n.º 740/XIII (2.ª) — Constituição de uma comissão eventual para a descentralização de

competências ao nível do poder local (PSD).

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Pergunto se alguém se opõe.

Pausa.

Não havendo qualquer objeção a que assim se proceda, este diploma será integrado no guião de votações

de amanhã.

Tem agora a palavra, para uma intervenção, o Sr. Ministro Adjunto.

O Sr. Ministro Adjunto: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: No encerramento deste debate, queria

dizer-lhes que, da minha experiência de vivência parlamentar de cerca de década e meia, quer aí, desse lado,

nas bancadas, em legislaturas com características muito diversas, quer das várias vezes em que tive

oportunidade de intervir enquanto membro do Governo, este dia é certamente um daqueles que mais marcará

aquilo que julgo ser o verdadeiro coração das competências do Parlamento e aquilo que é um encontro com a

história de aqui honrarmos 40 anos de poder local democrático e, com base numa grande convergência que

verificamos aqui em torno do papel decisivo das autarquias locais, construirmos, assumindo aquilo que são

diferentes pontos de vista, aquilo que são preocupações e reservas legítimas sobre aspetos em que é

fundamental ir mais além, concretizar melhor, caracterizar mais profundamente aquilo que é o sentido da

reforma. Mas verifico que há aqui uma convergência muito significativa de todas as bancadas em torno daquilo

que é fundamental: aprofundar a democracia local, cumprir a Constituição, dar uma força reforçada a uma

democracia de proximidade.

Aplausos do PS.

É por isso, Sr.as e Srs. Deputados, que queria ser muito claro relativamente a aspetos essenciais deste

debate. Estamos aqui a cumprir, no tempo próprio, uma peça fundamental, estruturante do Programa do

Governo, que o Primeiro-Ministro tem, aliás, sublinhado sempre, qualificando-a como a verdadeira pedra angular

da nossa visão para a reforma do Estado.

E estamos a fazê-lo no tempo próprio. Lançámo-nos a esta tarefa desde o primeiro dia da constituição do

Governo. Durante um ano, trabalhámos intensamente com as associações de autarcas, com todas as áreas do

Governo e com todas as áreas da Administração Pública. Não fazemos como quem deixou tema tão relevante

para os últimos tempos, para os últimos meses de uma Legislatura de maioria absoluta.

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É neste tempo próprio que queremos construir com todos as convergências necessárias para que o próximo

ciclo autárquico, de 2017 a 2021, possa ser marcado pelo desenvolvimento deste projeto de democracia local.

A segunda questão decisiva é a da responsabilidade do Estado. Não há aqui nenhuma opção pela

desresponsabilização do Estado. Cabe-nos a todos, cabe aos órgãos de soberania e cabe ao Governo assegurar

a igualdade de oportunidades, a universalidade do acesso aos serviços públicos e que funções sociais do Estado

sejam exercidas por entidades públicas. Não há aqui nenhum processo nem de privatização, nem de

desresponsabilização; há aqui uma convicção profunda de que é a nível local que, em muitos destes domínios,

poderemos servir melhor as populações, com melhor qualidade de serviço público.

Aplausos do PS.

A terceira questão essencial deste debate é a aplicação efetiva do princípio da subsidiariedade. Nós não

temos qualquer dúvida de que há funções que têm de continuar a ser exercidas, pela sua natureza, a nível

nacional, pelo Governo, pelas suas estruturas. É assim quanto à definição de regras na carreira de professores,

é assim quanto à matriz do Serviço Nacional de Saúde, é assim quanto ao estabelecimento de regras

fundamentais de acesso às prestações sociais ou aos princípios de defesa do património cultural de matriz

nacional.

Não temos nenhuma dúvida de que há funções que seriam melhor desempenhadas a nível regional. E cá

estaremos para definir, para discutir aquilo que são funções que têm uma natureza regional.

Mas há funções que, até por uma questão de escala, têm uma natureza supramunicipal. Por isso, quando os

municípios o entendam, cabe às áreas metropolitanas ou às comunidades intermunicipais exercer essas funções

que exigem uma escala supramunicipal.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Já excedeu o seu tempo, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro Adjunto: — Irei concluir, Sr. Presidente.

É por isso também que não aceitamos qualquer labéu de desconfiança sobre o poder local, porque é a nível

local que o escrutínio, a prestação de contas, a fiscalização se exercem com maior eficácia. Não temos dúvida

quanto a isso. E, se errarem, serão estes agentes de políticas públicas responsabilizados por todas as formas,

até porque, ao contrário de outro tipo de poderes, são avaliados dia a dia pelas populações e de forma definitiva

ao fim de cada ciclo eleitoral, como sucederá dentro de poucos meses.

Assim, Sr.as e Srs. Deputados, saio daqui com uma alegria que raras vezes tive neste Parlamento, com a

confiança de que, com a participação crítica, com a participação ativa de todas as bancadas, construiremos,

com sentido de urgência, com sentido de responsabilidade, nos próximos meses, nesta Sessão Legislativa, as

melhores soluções. Deste modo, setor a setor, com os recursos necessários, com regimes jurídicos claros e

transparentes, conseguiremos as melhores soluções para servir melhor a democracia local, para consolidar uma

estratégia de subsidiariedade, de descentralização, para cumprir a Constituição, mas, sobretudo, para estar

melhor ainda ao serviço de Portugal, dos portugueses e do Estado de direito democrático.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, damos, assim, por

encerrados os nossos trabalhos de hoje.

Passo a anunciar a ordem do dia da sessão de amanhã, com início às 10 horas.

Em primeiro lugar, procederemos ao debate, na generalidade, da proposta de lei n.º 50/XIII (2.ª) — Cria o

regime jurídico do transporte em veículo a partir de plataforma eletrónica e do projeto de lei n.º 450/XIII (2.ª) —

Estabelece um novo regime jurídico para a atividade de transporte de passageiros em veículos automóveis

ligeiros descaracterizados (BE), juntamente com o projeto de resolução n.º 724/XIII (2.ª) — Recomenda ao

Governo a adoção de medidas que modernizem e introduzam transparência no setor do táxi (BE).

Em segundo lugar, procederemos a um debate, agendado a requerimento do Grupo Parlamentar do Bloco

de Esquerda, sobre o CETA, Acordo Económico e Comercial Global, entre a União Europeia e o Canadá.

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No terceiro ponto, apreciaremos, na generalidade, o projeto de lei n.º 416/XIII (2.ª) — Estabelece mecanismos

de proteção do património azulejar, procedendo à 13.ª alteração ao Regime Jurídico de Urbanização e

Edificação (PS), em conjunto com os projetos de resolução n.os 645/XIII (2.ª) — Consagra o dia 6 de maio como

o Dia Nacional do Azulejo (PS), 683/XIII (2.ª) — Proteção do património azulejar português (PCP), 720/XIII (2.ª)

— Recomenda ao Governo a criação de mecanismos de proteção do património azulejar português (CDS-PP)

e 723/XIII (2.ª) — Proteção e valorização do património azulejar português (BE).

Em quarto lugar, será discutido, na generalidade, o projeto de lei n.º 452/XIII (2.ª) — Planeamento da

emergência nuclear e envolvimento dos cidadãos (Os Verdes), em conjunto com os projetos de resolução n.os

601/XIII (2.ª) — Recomenda a criação de um plano de emergência de resposta a incidentes na central nuclear

de Almaraz (BE) e 726/XIII (2.ª) — Recomenda ao Governo português que elabore um plano de emergência

radiológico para acidentes nucleares transfronteiriços (PAN).

Estão previstas votações regimentais às 12 horas.

Sr.as e Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Muito boa tarde a todos.

Eram 17 horas e 27 minutos.

Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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