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Sexta-feira, 7 de julho de 2017 I Série — Número 106

XIII LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2016-2017)

REUNIÃOPLENÁRIADE6DEJULHODE 2017

Presidente: Ex.mo Sr. Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues

Secretários: Ex.mos Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco Sandra Maria Pereira Pontedeira António Carlos Bivar Branco de Penha Monteiro

S U M Á R I O

O Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas. Deu-se conta da entrada na Mesa dos projetos de

resolução n.os 964 a 966/XIII (2.ª). Foi apreciado o projeto de lei n.º 565/XIII (2.ª) — Direitos

das pessoas doentes em fim de vida (CDS-PP), que foi aprovado, tendo usado da palavra, a diverso título, os Deputados Isabel Galriça Neto (CDS-PP), António Sales (PS), José Manuel Pureza (BE), José Luís Ferreira (Os Verdes), Isaura Pedro (PSD), André Silva (PAN), João Ramos (PCP), Maria Antónia Almeida Santos (PS), Cristóvão Simão

Ribeiro (PSD), Elza Pais (PS), Ricardo Baptista Leite e Ângela Guerra (PSD), Luís Graça (PS), Carla Cruz (PCP), Fátima Ramos (PSD) e Isabel Alves Moreira (PS).

Foi apreciada a Conta Geral do Estado de 2015. Usaram da palavra, além do Secretário de Estado do Orçamento (João Leão), os Deputados Cristóvão Crespo (PSD), Paulo Trigo Pereira (PS), Paulo Sá (PCP), Cecília Meireles (CDS-PP) e Mariana Mortágua (BE).

O Presidente encerrou a sessão eram 17 horas e 28 minutos.

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O Sr. Presidente: — Boa tarde, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.as e Srs. Funcionários, Sr.as e Srs. Jornalistas.

Vamos dar início à sessão.

Eram 15 horas.

Peço aos agentes da Autoridade para abrirem as galerias ao público.

Antes de mais, dou a palavra ao Sr. Secretário, Deputado Duarte Pacheco, para proceder à leitura do

expediente.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e

foram admitidos pelo Sr. Presidente, os projetos de resolução n.os 964/XIII (2.ª) — Pela modernização do

perímetro de rega de Silves, em benefício da criação de condições de competitividade para a agricultura algarvia

(PSD), que baixa à 7.ª Comissão, 965/XIII (2.ª) — Recomenda ao Governo que promova um estudo sobre o

impacto das linhas de muito alta tensão sobre a saúde das populações e suspenda a construção da linha de

muita alta tensão em Barcelos, estudando a possibilidade alternativa da colocação subterrânea dos cabos da

mesma (PSD), que baixa à 11.ª Comissão, em conexão com a 6.ª e a 9.ª Comissões, e 966/XIII (2.ª) —

Prorrogação do prazo de funcionamento da Comissão Eventual de Inquérito Parlamentar à atuação do XXI

Governo Constitucional no que se relaciona com a nomeação e a demissão da Administração do Dr. António

Domingues (Presidente da Assembleia da República).

É tudo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, o primeiro ponto da nossa agenda de hoje consiste no debate, por

marcação do CDS-PP, do projeto de lei n.º 565/XIII (2.ª) — Direitos das pessoas doentes em fim de vida (CDS-

PP).

Para apresentar o projeto de lei, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Galriça Neto, do CDS-PP.

A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A realidade das pessoas

com doenças crónicas e em fim de vida, o seu direito à saúde e aos melhores cuidados é, para o CDS, uma

matéria da maior relevância e que há muito nos mobiliza. Orgulhamo-nos do caminho percorrido, dos contributos

que demos com a Lei do Testamento Vital, a Lei de Bases dos Cuidados Paliativos, os Cuidados Paliativos

Pediátricos, as resoluções sobre o Estatuto do Cuidador, todos eles aqui aprovados.

Sem prejuízo de respondermos aos problemas mais imediatos que surgem a cada dia e cuja gravidade não

ignoramos, não nos coibimos de, de forma planeada e estruturada, fazer política pela positiva, apresentando

iniciativas programadas e medidas dirigidas aos problemas que mais afligem os portugueses. É o caso do que

hoje aqui tratamos.

No que toca ao apoio às pessoas doentes em fim de vida demos passos importantes mas estamos ainda

longe de fazer tudo o que é possível e devido nesta matéria. Foi por isso que, em fevereiro passado, anunciámos

uma iniciativa legislativa e hoje aqui estamos a cumprir, para dar o nosso contributo, ponderado e estruturado,

respondendo a essa verdadeira premência social, a essa fratura dolorosa que advém do facto de milhares de

portugueses com doenças graves e em fim de vida poderem encontrar-se em sofrimento desnecessário e

evitável, por não acederem aos cuidados de saúde a que devem ter direito.

Conscientes desta dolorosa realidade é para esses nossos concidadãos, vulneráveis e tantas vezes sem

voz, que não podem ser ignorados ou marginalizados, que o CDS quer hoje, no respeito inquestionável por

valores constitucionais incontornáveis, apresentar uma proposta com um conjunto de medidas que temos como

decisivas e imprescindíveis.

Aplausos do CDS-PP.

O valor constitucional da inviolabilidade da vida humana em qualquer circunstância, referência maior e

verdadeiro pilar dos direitos humanos, e outros valores dele decorrentes, como os da dignidade e da autonomia,

norteiam as nossas propostas. Não são valores que se afirmem em oposição ao direito à vida e serão sempre

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valores maiores a ter em conta. Nunca será demais afirmar, como já o fizemos noutras ocasiões nesta Câmara,

que defender e promover a dignidade humana é reafirmar que cada ser humano tem um valor intrínseco,

patrimonial, único, não sujeito a transação e não dependente de circunstâncias exteriores, que possam justificar

um menor valor para esse ser humano.

Aplausos do CDS-PP.

A vida humana tem igual valor em todas as circunstâncias e por isso merece proteção em todas elas. Aceitar

que circunstâncias indesejáveis como a doença, a deficiência, o desemprego ou o sofrimento humano, seja

físico ou existencial, retiram valor ao ser humano, implica criar a ideia de que há vidas que valem a pena ser

vividas e outras não.

As propostas que hoje aqui trazemos têm como espinha dorsal a necessidade de intervir ativamente e de

forma humanizada no sofrimento de milhares de portugueses com doença grave e irreversível, de lhes dar uma

resposta dignificante e estruturada e de pugnar pelos seus direitos. Queremos prevenir, reduzir e tratar esse

sofrimento, não deixando nunca que ele se torne insuportável, mantido ou disruptivo. A resposta, não se

esgotando, de forma alguma, nos cuidados de saúde, incluirá sempre uma intervenção ativa e clínica nesse

sofrimento, os cuidados paliativos, eliminando ou reduzindo o problema para níveis razoáveis e suportáveis,

mas não eliminando a pessoa que o experimenta.

A prestação de cuidados paliativos, que se faz por equipas especializadas e independentemente do

prognóstico vital e do diagnóstico, inclui o apoio estruturado às famílias das pessoas doentes, com particular

relevância para as situações de luto e de sobrecarga dos cuidadores.

Quisemos, com esta proposta, verter em lei uma opção ética cientificamente balizada, apoiada em valores

constitucionais de referência, uma proposta que reafirma e condensa um conjunto de recomendações já

disponíveis, mas dispersas no ordenamento jurídico português. Falamos de aspetos que são versados na

própria política europeia de direitos humanos e também em documentos nacionais de referência inquestionável,

que vão desde a Constituição da República Portuguesa, à Lei de Base dos Cuidados Paliativos, à Lei do

Testamento Vital, aos códigos deontológicos dos profissionais de saúde ao mais recente Plano Estratégico para

o Desenvolvimento dos Cuidados Paliativos.

Falaremos também de algumas inovações que introduzimos, sendo que, em nosso entender, todo o

documento constitui, ele próprio, uma forma inovadora de olhar o direito a bons cuidados, de saúde mas não só,

das pessoas em fim de vida.

É neste contexto que o CDS, reafirmando-se a favor da proteção da vida, apresenta uma proposta legislativa

que condensa e reafirma um conjunto de direitos das pessoas doentes e suas famílias, que, no seu todo,

densificam a consagração de um direito a não sofrer de forma mantida e disruptiva, quando no contexto de

doença avançada e em fim de vida, e prevendo ainda medidas para a realização dos respetivos direitos.

Não se trata de uma alternativa a uma outra opção, com uma moldura de argumentos eventualmente conexos

mas, na sua essência, bem distintos. Trata-se, sim, de uma medida focada, de primeira linha, imprescindível

para milhares de portugueses, de um conjunto de direitos a assegurar pelo Estado, de modo a que todos os

cidadãos — repito, todos os cidadãos — se possam sentir protegidos relativamente a uma fase tão relevante

das suas vidas.

Aplausos do CDS-PP.

A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — Muito bem!

A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — De que direitos falamos? Eles estão detalhados na nossa proposta,

mas permitimo-nos destacar aqui alguns.

São direitos em matéria de consentimento informado, de direito à informação, nomeadamente sobre a

natureza da sua doença e de opções de tratamento, conhecendo os objetivos, os benefícios e malefícios dos

mesmos, e com o direito a recusar tratamentos desproporcionados. São direitos que visam reforçar a realização

do testamento vital e a indicação de um procurador de cuidados de saúde.

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São direitos que, sem prejuízo das competências dos profissionais de saúde, visam uma participação mais

ativa na definição do plano terapêutico.

Falamos, ainda, do direito a não ser alvo de obstinação diagnóstica e terapêutica, como, lamentavelmente,

ainda vai acontecendo. As pessoas em contexto de doença avançada e em fim de vida têm direito a não ser

alvo de distanásia, através de obstinação terapêutica e diagnóstica, designadamente, pela aplicação de medidas

que prolonguem ou agravem de modo desproporcionado o seu sofrimento. Nos casos de sofrimento associado

às doenças avançadas e situações de fim de vida, os profissionais de saúde não estão nem ética nem

legalmente obrigados a manter a vida à custa de mais sofrimento para o doente e todas as intervenções devem

ser norteadas por este pressuposto, numa adequação dos objetivos de cuidados e do esforço terapêutico, sem

negligência, e no respeito pelas leges artis e pela inevitabilidade da morte, produzida, nestes casos, por uma

doença que é ela própria progressiva, incurável e irreversível.

A prática da obstinação terapêutica é, por isso, condenável e sancionável, como aliás já hoje decorre dos

códigos deontológicos dos profissionais de saúde, que enfatizam que ela deve ser evitada a todo o custo.

Aplausos do CDS-PP.

Propomos, ainda, o direito a que as pessoas em contexto de doença avançada e em fim de vida devam

receber tratamento rigoroso dos seus sintomas. Nesta matéria queremos destacar o que propomos, porque é

inovador, nos casos em que seja evidente um estado confusional agudo ou a agudização de um estado prévio,

com agitação psico-motora associada, tão frequente em pessoas idosas e em fim de vida. Sublinhamos que a

primeira medida não é a contenção física, que leva a que erradamente se imobilizem, se amarrem, de forma

inadequada e prolongada, doentes fragilizados, ignorando que existe, em primeiro lugar, o direito à realização

de uma contenção química desses sintomas, efetuada através do uso dos fármacos apropriados para o efeito e

dependente de prescrição médica. Se as nossas propostas forem aprovadas, como esperamos, isso passará a

ser um direito.

Aplausos do CDS-PP.

Também destacamos o direito de pessoas com prognóstico vital estimado de semanas ou de dias e que

apresentem sintomas de sofrimento não controlado pelas medidas de primeira linha previstas nas boas práticas

de cuidados paliativos receberem sedação paliativa. Ela será feita com fármacos sedativos devidamente

titulados — isto quer dizer incrementados, o que não inclui a morfina, fármaco seguro mas destinado a outros

fins — e ajustados exclusivamente ao propósito de tratamento do sofrimento, de acordo com os princípios da

boa prática clínica e da leges artis. São princípios que evidenciam que esta prática, se corretamente realizada,

é reversível, não implica total perda de consciência e não encurta a vida.

Aplausos do CDS-PP.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, vou terminar.

Para o sofrimento das pessoas em fim de vida pedem-se respostas exigentes e construtivas, respostas

dignificantes e humanizadoras. Há matérias que transcendem as ideologias, há matérias que, pela sua

relevância, apelam aos consensos. É o que esperamos hoje aqui obter: um largo consenso. Porque a matéria

do sofrimento em fim de vida assim o exige. Porque terá de ser nos consensos — e não apenas quando

animados pela divergência — que somos capazes de mobilizar o melhor das nossas energias. É a sociedade

que no-lo pede, são milhares de pessoas que no-lo pedem e temos a responsabilidade de o fazer acontecer.

Aplausos do CDS-PP.

Um primeiro passo será a viabilização das propostas que o CDS hoje apresenta em matéria de direitos das

pessoas em fim de vida, mas não poderemos ficar apenas por uma aprovação que depois não se traduza em

avanços concretos. Estas propostas são um desafio aos serviços e aos profissionais de saúde, à sociedade e

aos políticos. Temos de ser audazes e corajosos, temos de nos empenhar ainda mais.

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Como já antes aqui disse e hoje quero repetir, será um dever de todos salvaguardar a vida, a integridade

física e espiritual, a liberdade de pensamento, de crença e de expressão e o pluralismo de opinião e de

organização. Essa é a visão humanista que o CDS defende para uma sociedade moderna, aquela que tem na

proteção da vida o alicerce dos direitos fundamentais, uma sociedade exigente que não descarta os mais

vulneráveis ou os que sofrem e que lhes amplia horizontes. Disto não abdicaremos.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Inscreveram-se seis Srs. Deputados para pedir esclarecimentos, aos quais a Sr.ª

Deputada responderá, conforme transmitiu à Mesa, em grupos de três.

Para o efeito, tem a palavra, em primeiro lugar, o Sr. Deputado António Sales.

O Sr. António Sales (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Galriça Neto, o CDS-PP apresenta hoje

um projeto de lei sobre os direitos das pessoas doentes em fim de vida, como se de algo de novo e de original

se tratasse.

No entanto, Srs. Deputados, o projeto de lei nada tem de novo, nada tem de original. A sedação paliativa é

prática corrente nos nossos hospitais. E a lei já regula o consentimento informado, o testamento vital, o

procurador de saúde, as opções de tratamento, a privacidade e a confidencialidade, a recusa da obstinação

terapêutica e o acesso a cuidados paliativos.

Sr.ª Deputada, onde é que está a novidade? Onde é que está a originalidade?

Aplausos do PS.

Pergunto-lhe também, Sr.ª Deputada, se o CDS está preparado para discutir outros direitos de fim de vida,

como, por exemplo, o direito à autodeterminação.

O Sr. Moisés Ferreira (BE): — Muito bem!

O Sr. António Sales (PS): — Ou se, pelo contrário, pretende, com este projeto de lei, fechar a possibilidade

a outra discussão, afirmando como única opção os cuidados paliativos e a sedação paliativa.

Sr.as e Srs. Deputados: Reconhecer a morte e atribuir significado e exigência ao processo de morrer são hoje

as linhas-mestras do pensamento antropológico e filosófico. Se existe um direito à vida universalmente aceite,

também há um direito à morte em condições de dignidade sem sofrimento e com afeto.

Concordamos que a vida é um direito inalienável. Estamos plenamente de acordo em que os cuidados

paliativos devem chegar a todos através do SNS — estamos, aliás, a trabalhar para que tal aconteça através da

formação de recursos humanos, devidamente preparados e credenciados.

Criámos a Comissão Nacional de Cuidados Paliativos (CNCP). Criámos o Plano Estratégico para o

Desenvolvimento dos Cuidados Paliativos. Inaugurámos a primeira unidade ibérica de cuidados paliativos

pediátricos, O Kastelo, com 20 lugares.

Criaremos, neste ano de 2017, 320 camas em cuidados paliativos. Retificámos a portaria que regula a

comparticipação a 90% dos medicamentos opioides em regime ambulatório para tratamento da doença crónica.

Introduzimos a consulta de medicina paliativa na Consulta a Tempo e Horas para as equipas específicas de

cuidados paliativos.

Incluímos os cuidados paliativos como justificação clínica para o acesso ao transporte de doentes não

urgentes.

Pergunto-lhe, Sr.ª Deputada: para além de terem criado a Lei de Bases dos Cuidados Paliativos, que

saudamos, o que fez o anterior Governo PSD/CDS para implementar iniciativas em matéria de cuidados

paliativos?

Aplausos do PS.

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E, se nada fez, de duas, uma: ou não teve vontade, ou não constituiu prioridade. Agora que tem vontade,

entende que pode e deve constituir prioridade. Pergunto-lhe, Sr.ª Deputada: o que é que fez para mudar de

opinião em tão pouco tempo, em cerca de um ano e meio?

Aplausos do PS.

A discussão sobre cuidados em final de vida não pode, nem deve, ser misturada com a discussão sobre a

eutanásia e/ou o suicídio assistido. São assuntos conexos, que, todavia, devem ser discutidos de forma isolada,

porque, independentemente de sermos contra ou a favor da possibilidade de os nossos cidadãos poderem

abdicar dos seus direitos a viver, podemos sempre discutir formas de melhorar o tratamento ou alívio do

sofrimento disruptivo. Sobre esta matéria, Sr.ª Deputada, estamos, pois, conversados.

Face a este facto, está o CDS preparado para evoluir para uma outra discussão de direitos em fim de vida?

É neste pressuposto que valores, crenças e convicções de cada um estabelecem os nossos limites de ação.

Não fazemos o que fazemos apenas porque é possível, mas porque escolhemos fazê-lo.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, peço-lhe para concluir.

O Sr. António Sales (PS): — Termino já, Sr. Presidente.

A controvérsia médica e a controvérsia ética projetam-se sobre o universo do direito. Para terminar, pergunto-

lhe, Sr.ª Deputada: qual a necessidade de legislar numa matéria em que nem a ética nem a medicina são

controversas e em que o direito, por si só, já pode produzir efeito?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Pureza.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Galriça Neto, o projeto de lei que o

CDS nos traz não reconhece nenhum direito novo, porque todos aqueles que consagra já estão consagrados

na lei.

Não precisamos de mais leis e muito menos de as «condensar» — palavra que é utilizada na exposição de

motivos do projeto de lei do CDS — para encher um projeto de lei vazio de alguma coisa nova. O que precisamos

todos é de nos esforçar para que sejam mais e melhor respeitadas e melhor cumpridas as leis que temos sobre

direitos dos doentes.

Vozes do BE: — Muito bem!

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Mas, mais do que isso, o projeto de lei do CDS reafirma e condensa

estes direitos para negar o direito de escolha da morte assistida. Esse é o seu único objetivo.

Por isso, este projeto de lei é um embuste. É que, sob a capa de consagrar direitos, o que faz é negar direitos,

sob a capa de consagrar escolhas, o que faz é manter limitado o campo das escolhas.

Uma segunda observação é esta: na sofreguidão de impor este debate agora, o CDS rasga mesmo o respeito

pelo tempo de debate público sobre a morte assistida, para que tanto tem apelado o Sr. Presidente da República

e que foi até hoje, até este momento, assumido por todos.

O CDS desdenhou hoje, aqui, os debates promovidos pelo Conselho Nacional de Ética para as Ciências da

Vida, e ignorou mesmo, com soberba, a trajetória da petição n.º 250/XIII (2.ª) — Toda a Vida tem Dignidade

(Federação Portuguesa pela Vida), que está há longo tempo em análise nesta Assembleia e que o CDS, aliás,

tanto tem defendido.

Tanta pressa, na ilusão de que um truque será suficiente para travar a despenalização da morte assistida!

Desconvençam-se disso, Sr.as e Srs. Deputados!

Uma terceira observação é esta: diz o projeto de lei do CDS que «Num contexto de promoção de dignidade

e da autonomia do ser humano, as situações de sofrimento do mesmo justificam múltiplas ações do coletivo,

que não pode ignorar os casos em que seres humanos estejam a viver situações atentatórias dessas mesmas

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dignidade e autonomia.» E acrescenta: «… a sociedade está obrigada a não ficar indiferente e, (…), a encontrar

respostas dignificantes por forma a prevenir, reduzir e tratar esse sofrimento (…)».

Mas pergunto-lhe, Sr.ª Deputada Isabel Galriça Neto: como é que a senhora e o seu grupo parlamentar

promovem a dignidade e a autonomia se negam o direito de cada um escolher como quer e como não quer

responder ao sofrimento, como quer e como não quer responder à degradação física e moral, como quer e como

não quer responder à dependência dos outros ou à perda irreversível dos padrões de dignidade que fixou para

si mesmo ao longo de toda a sua vida?

Sr.ª Deputada, como é que promove a dignidade e a autonomia, negando a autonomia que defende a

dignidade?

O Sr. Moisés Ferreira (BE): — Muito bem!

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Finalmente, e mais do que tudo: este projeto de lei mostra que a

estratégia do CDS é mesmo pôr em alternativa cuidados paliativos e despenalização da morte assistida.

Contrapõe a sedação paliativa à morte assistida, fazendo da sedação paliativa aquilo que ela, de facto, não é,

porque ela não é novidade, não traz nada de novo, não é nova como solução, é praticada há anos nos nossos

hospitais. E, na prática, a Sr.ª Deputada Isabel Galriça Neto sabe tão bem como eu — aliás, tem a obrigação de

saber bem melhor do que eu e do que a maior parte dos nossos Deputados — que sedação paliativa não é mais

do que uma morte e uma agonia lenta ao ralenti.

Por isso mesmo, termino com uma segunda pergunta, Sr.ª Deputada: o que é que é mais certo e o que é que

é mais errado, e o que é que respeita mais as tradições humanistas? É consagrar a morte lenta e inconsciente,

como faz o projeto de lei do CDS, ou é encurtar a agonia e antecipar a morte a pedido do próprio?

A diferença entre nós, Sr.ª Deputada, é que eu quero que a lei e a sociedade permitam, livre e

responsavelmente, todas estas opções, desde que elas sejam escolhas e não imposições, ao passo que a Sr.ª

Deputada e o seu grupo parlamentar querem impedir a escolha para a todos poderem impor as vossas escolhas.

Não vemos nem tolerância, nem democracia, nesta posição do CDS. Mas, com franqueza, isso já não nos

surpreende.

Aplausos do BE e das Deputadas do PS Elza Pais e Isabel Alves Moreira.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Galriça Neto, a iniciativa

legislativa que o CDS hoje nos apresenta incide sobre a área da saúde, mais concretamente nos direitos dos

doentes em fim de vida e na prestação dos cuidados paliativos.

Ora, nós consideramos que, na área da saúde, há muito a fazer nos cuidados paliativos, mas não só. E há

muito a fazer, sobretudo depois de tudo o que o Governo que o CDS-PP integrou fez nesta área.

Como certamente a Sr.ª Deputada estará recordada, o Governo anterior assentou a sua política para a área

da saúde em quatro vetores centrais: primeiro, em cortes cegos numa área tão sensível como é a área da saúde;

segundo, no encerramento de serviços de saúde por todo o País; terceiro, num esforço deliberado e intencional

de imputar os custos de saúde aos utentes; e quarto, mas não menos importante, numa tentativa de beneficiar

os grupos privados com interesses na área da saúde.

Portanto, depois de tudo o que o Governo anterior fez na área da saúde, há, de facto, muito a fazer e muito

a repor. É necessário, antes de mais, um significativo reforço no que diz respeito ao investimento público, um

investimento que permite ampliar a rede de equipamentos públicos quer nos cuidados continuados quer nos

cuidados paliativos. É necessário, nomeadamente, reforçar o investimento nos recursos humanos disponíveis,

criar equipas especializadas e reforçar a formação dos profissionais para que sejam prestados os cuidados de

saúde que as pessoas necessitam e, dessa forma, garantir o cumprimento do direito à saúde com qualidade

para todas as portuguesas e todos os portugueses.

Concretamente no que diz respeito aos doentes em sofrimento por doenças graves, avançadas e incuráveis,

é claro que essas pessoas devem ter acesso aos cuidados paliativos, qualquer que seja o seu prognóstico

estimado. Sobre esta matéria, não temos qualquer dúvida. Aliás, os doentes em sofrimento por doença grave,

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avançada ou incurável não só devem ter direito aos cuidados paliativos como esses cuidados devem ser-lhes

prestados por equipas de profissionais de saúde devidamente qualificados e utilizando meios técnicos eficazes

para o acompanhamento do doente mas também para o apoio às respetivas famílias.

E mais, Sr.ª Deputada — e aqui certamente divergimos —, essas respostas que são necessárias, devem, a

nosso ver, ser públicas para se garantir a universalidade do acesso aos cuidados, porque o direito à saúde não

pode ser só para alguns — a ser, há de ser para todos.

Nesta iniciativa legislativa agendada para hoje pelo CDS-PP e apresentada agora pela Sr.ª Deputada Isabel

Galriça Neto, pretende-se reforçar os direitos dos doentes em fim de vida com doença grave e irreversível e

prognósticos de 6 a 12 meses de vida. Com esse propósito, propõe o CDS a consagração do direito à sedação

paliativa como forma de evitar o sofrimento dos doentes nessa situação. Propõe ainda o CDS que os doentes

em fim de vida participem nas decisões sobre os respetivos tratamentos. Ou seja, em 11 artigos que constituem

o projeto de lei que o CDS hoje nos apresenta, não conseguimos vislumbrar nada de novo, não conseguimos

vislumbrar qualquer novidade, para além daquilo que já existe, nem uma novidade, nem qualquer reforço de

qualquer direito nesta matéria.

Mas, Sr.ª Deputada Isabel Galriça Neto, quando nos debruçamos sobre o projeto de lei que o CDS hoje traz

para discussão e, sobretudo, sobre a exposição de motivos que o acompanha, ficamos com sérias dúvidas sobre

as reais intenções do CDS-PP nesta iniciativa legislativa. É que ficamos sem saber se esta iniciativa legislativa

foi construída e pensada tendo como preocupação maior os doentes em fim de vida e os cuidados paliativos ou

se a iniciativa pretende apenas antecipar o debate sobre a morte assistida. Não sabemos se os reais

destinatários do projeto de lei do CDS são os doentes em fim de vida ou as pessoas que defendem a morte

assistida. Não sabemos se as verdadeiras preocupações do CDS neste agendamento residem na necessidade

de reforçar os direitos das pessoas aos cuidados paliativos ou se as preocupações do CDS são de outra

natureza e de outra dimensão.

Por isso, Sr.ª Deputada Isabel Galriça Neto, o meu pedido de esclarecimento é muito claro e objetivo: quais

são os verdadeiros e reais destinatários desta iniciativa legislativa que o CDS hoje nos apresenta?

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, peço que termine. Já ultrapassou largamente o tempo.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Vou terminar, Sr. Presidente.

Qual foi a real intenção do CDS-PP na apresentação deste projeto de lei?

Aplausos de Os Verdes e do PCP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Galriça Neto.

A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — Sr. Presidente, queria agradecer as questões dos Srs. Deputados

António Sales, José Manuel Pureza e José Luís Ferreira.

Penso que será, no mínimo, desconhecimento dizer que não existe qualquer tipo de novidade no projeto que

nós apresentamos —, crítica que é, aliás, transversal às três bancadas — porque, como tivemos o cuidado de

dizer, sabendo que há algumas recomendações que estão dispersas no ordenamento jurídico português, há

uma inovação que decorre do facto de as densificar. O Sr. Deputado José Manuel Pureza falou de condensar,

diria, de as densificar e de lhes atribuirmos tal relevância que entendemos que devem ser olhadas como direito.

Portanto, entendemos que é inovadora a atitude de não olhar para essas pessoas, cujos direitos não estão a

ser assegurados, como pessoas de segunda.

Aplausos do CDS-PP.

Entendemos nós e entendem outros que, felizmente, connosco trabalharam nesta matéria. Quando os três

Srs. Deputados dizem que não existe novidade, volto a dizer que não leram com atenção.

Queria, sobretudo, dizer que isso me preocupa, e muito, porque ouvindo-vos aos três, nomeadamente o Sr.

Deputado António Sales, faz-me pensar que tudo está bem com as pessoas que estão na situação de sofrimento

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e em fim de vida. Ora, pelo menos, quem está próximo dessa realidade, que a acompanha dia a dia — e o nosso

percurso fala por nós —, sabe que não é verdade, que não está tudo bem.

E o que os senhores disseram — deixem-me dizer-vos em primeiro lugar — é uma afronta aos milhares de

portugueses que, estando neste momento sem apoio e em situações difíceis, sabem, em primeiro lugar, que os

seus direitos não estão devidamente acautelados nem protegidos.

Portanto, nós estamos tranquilos, respaldados por quem? Por esses que todos os dias nos dizem que é

preciso fazer mais alguma coisa e que é preciso melhorar.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Ora bem!

A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — De facto, este debate, com a devida honestidade intelectual e

política, não pode ignorar a realidade. É que, segundo dados recentes do Observatório da Saúde, há uma larga

fatia de portugueses que não tem acesso aos cuidados paliativos.

E vejam, Srs. Deputados, nós não quisemos atribuir nenhum peso culpabilizante a quem quer que seja.

Quisemos, efetivamente — e passo assim para o segundo ponto do nosso projeto —, dizer que o foco do debate

de hoje prende-se com o conjunto de medidas que têm a ver com uma resposta ao sofrimento, que o CDS

entende que não deve tardar. Não tem a ver com o debate da eutanásia, por muito que os senhores queiram

que seja esse o debate que deve ser travado, debate esse a que não nos furtamos.

O Sr. António Sales (PS): — Não é verdade!…

A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — Vai deixar-me concluir, Sr. Deputado?

Portanto, vai mal quem acha que, relativamente à vida das pessoas em fim de vida, só existe a questão da

eutanásia. Há, felizmente, muito mais vida na vida das pessoas em fim de vida para além do debate da

eutanásia|

O CDS não se furtará a esse debate. Repito: o CDS não se furtará a esse debate! Mas esse debate não é,

de facto, sobre a morte assistida, que é do que estamos nós hoje a falar: a morte assistida com cuidados

médicos, a morte assistida com acompanhamento social, com o acompanhamento legal de que estas pessoas

carecem. É, em nosso entender, estreiteza de vistas…

A Sr.ª Maria Antónia Almeida Santos (PS): — Estreiteza de vistas?! Veja o que o vosso Governo fez!

A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — … e falta de visão política não considerar estes direitos para um

grupo tão numeroso de pessoas que, obviamente, está de olhos postos em vós à espera que, sobre um assunto

que não é nem de esquerda nem de direita, os senhores tenham capacidade para estar ao lado delas,

reafirmando um conjunto de direitos e consagrando novos direitos que as dignifiquem. Isto, sim, é estar ao lado

das pessoas que sofrem, é dar uma resposta ao problema do sofrimento, é dar uma resposta ao problema das

pessoas que continuam, desnecessariamente, a estar desprotegidas e esta Assembleia tem hoje a possibilidade

de fazer mais e melhor em matéria de direitos em fim de vida.

Foi por isso que apresentámos esta proposta —, aliás, como recentemente aconteceu em Espanha e como

já aconteceu em França no ano passado —, que, não sendo um conjunto de propostas exatamente igual, não

envergonha, de forma alguma, o Parlamento português.

O CDS, repito, está orgulhoso do grupo de propostas que hoje aqui apresenta porque, efetivamente, para os

milhares de portugueses que precisam de mais respostas, apesar de todos os progressos que já foram feitos,

estas propostas representam um avanço civilizacional.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, há mais inscrições para pedidos de esclarecimento. A primeira é do

Grupo Parlamentar do PSD.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isaura Pedro.

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A Sr.ª Isaura Pedro (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Isabel Galriça Neto, em

primeiro lugar, começo por felicitar o CDS por esta iniciativa.

De facto, o projeto de lei que hoje aqui apresentam é um projeto equilibrado nas suas soluções e reforça,

clarifica e sistematiza os direitos dos doentes em fim de vida, presta um bom serviço à sociedade e significa

uma valorização da pessoa enquanto detentora de uma dignidade que deve ser intocável.

Apesar disso, suscitam-se dúvidas sobre alguns aspetos e soluções nele contidos, que muito agradecia, Sr.ª

Deputada, que fossem esclarecidas.

Desde logo, a questão de saber por que razão considera o CDS que uma pessoa apenas pode beneficiar de

direitos agora propostos quando exista um prognóstico vital estimado de 6 a 12 meses. Se é certo que nestes

casos a pessoa tem o direito de acesso aos cuidados paliativos, noutros, em que o prognóstico é até,

infelizmente, inferior a meio ano, não teria sentido que se lhe aplicasse também o regime que o seu partido

agora propõe? E como articula esta questão, prevista no artigo 2.º com o disposto no artigo 7.º do projeto de lei,

sobre o prognóstico vital breve?

Por outro lado, esta é uma área onde ainda há muito por fazer e eu, como médica, considero ser da maior

importância a abordagem e o acompanhamento integral efetuado por equipas multidisciplinares.

Sabemos que, infelizmente, estas equipas escasseiam nos serviços de saúde. Há poucas equipas

multidisciplinares com formação adequada em cuidados paliativos.

Assim, pergunto-lhe que confiança tem no aumento da formação médica, de enfermagem e de outros

profissionais em cuidados paliativos no nosso sistema de saúde e, em particular, no Serviço Nacional de Saúde,

e se considera que este projeto de lei poderia representar um bom contributo para a sensibilização dos

profissionais de saúde para a condição tão especial do doente em final de vida?

Para terminar, seria importante que se conseguisse nesta Assembleia um consenso, porque, ultrapassando

preconceitos ideológicos e percebendo que qualquer iniciativa que vise melhorar os direitos dos doentes, para

mais quando em final de vida, é algo que nos deveria unir a todos e não dividir por mero sectarismo partidário.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado André Silva, do PAN.

O Sr. André Silva (PAN): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, o CDS convocou hoje os Deputados

para um debate sobre leis e códigos deontológicos já existentes.

Parecendo indiciar tratar-se de um projeto que visa a consagração de novos direitos para as pessoas doentes

em fim de vida, trata-se apenas de uma compilação de direitos já existentes e legalmente consagrados.

Vejamos: o CDS prevê o direito do doente à informação sobre a doença, o prognóstico e os tratamentos

disponíveis, bem como a necessidade de consentimento deste — já está consagrado no Código Deontológico

da Ordem dos Médicos.

O CDS defende a proibição da distanásia, já muito claramente prevista no Código Deontológico da Ordem

dos Médicos.

O CDS defende também o acesso a cuidados paliativos, que encontra já previsão na Lei de Bases dos

Cuidados Paliativos.

O CDS prevê, ainda, outros direitos clínicos já regulados, nomeadamente a possibilidade de realização de

testamento vital e de nomeação de procurador de cuidados de saúde, que resulta do Regime das Diretivas

Antecipadas de Vontade (DAV).

Assim, da comparação entre este projeto e a legislação em vigor, resulta que não existe qualquer reforço ou

ampliação de direitos, tão só e apenas se pretende reafirmar um conjunto de recomendações já disponíveis.

Assim, e porque o CDS não traz substância para discutirmos, a questão que se coloca é: qual é

verdadeiramente o objetivo deste projeto? Será que o CDS está a esboçar uma nova técnica legislativa que

consiste em legislar sobre o que já existe e sobre tudo o que já concordamos? Ou estamos perante um número

de ilusionismo?!

Aplausos do PS.

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Este projeto tem como objetivo levar as pessoas a acreditar que estão a ser atribuídos novos direitos àqueles

que se encontram em situação de doença avançada e em fim de vida, não resultando, todavia, do mesmo

qualquer medida que seja inovadora.

O agendamento do CDS serve para reafirmar o óbvio e tentar condicionar o debate em torno da

despenalização da morte medicamente assistida. Trata-se, apenas, de um modo do CDS trazer o tema, no

cumprimento de uma agenda ideológica castradora, sem acrescentar nada de novo, com o objetivo de perturbar

o debate que se está a fazer em torno deste tema.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Muito bem!

O Sr. André Silva (PAN): — Sem prejuízo destas considerações, o PAN concorda com todas as medidas

propostas pelo CDS.

Tal como o CDS defende na sua exposição de motivos, também defendemos e promovemos a dignidade

humana, também defendemos que o ser humano tem direito a não estar em sofrimento, também defendemos o

acesso aos cuidados paliativos, qualquer que seja o prognóstico estimado enquanto direito inalienável dos

portugueses, e lutamos pela salvaguarda de todos os cidadãos, garantindo os seus direitos na fase final das

suas vidas.

Aquilo que também defendemos, Sr.ª Deputada, para além dos direitos elencados pelo CDS, é o acesso à

morte medicamente assistida, opção legitima daqueles que sofrem, enquanto expressão de autonomia e

liberdade individual.

Sr.ª Deputada Isabel Galriça Neto, gostaria de lhe colocar a seguinte questão: o CDS acredita mesmo que,

por repetir propostas com direitos já previstos, vai melhorar e reforçar os direitos das pessoas em fim de vida?

E, para além da sedação paliativa, que defende, está ou não está na altura de o Estado ter uma resposta

alternativa e digna para aqueles que sofrem?

Aplausos do PS e do BE.

Protestos da Deputada do CDS-PP Isabel Galriça Neto.

O Sr. Presidente: — Para os últimos pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado João Ramos,

do Grupo Parlamentar do PCP.

O Sr. João Ramos (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Isabel Galriça Neto, o PCP fará

uma intervenção onde abordará o tema que o CDS aqui, hoje, nos traz e, por isso, eu queria focar-me na

intervenção da Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Deputada fez uma intervenção centrada na questão dos cuidados paliativos, dando grande ênfase à

questão da dignidade das pessoas. Disse mesmo que são matérias de grande relevância para o CDS e que há

muito mobilizavam este partido.

Antes de lhe colocar a minha questão, queria começar por uma afirmação. Disse que os direitos das pessoas

eram muito importantes para o CDS, mas a Sr.ª Deputada esqueceu-se deles enquanto governava, esqueceu-

se das famílias e da respetiva dignidade de vida. Lembrou-se de reduzir o défice do País à custa dos rendimentos

e dos direitos das famílias. Esqueceu-se, até, do visto familiar, que era tão caro ao CDS.

A Sr.ª Deputada pode falar agora em dignidade da pessoa, mas o que tem por detrás de si e do seu partido

é um historial de ataque aos direitos e à dignidade das pessoas.

Gostava de lhe colocar a seguinte questão: em 2012, foi aprovada, por unanimidade, a Lei de Bases dos

Cuidados Paliativos, com base e a partir de um projeto do CDS que foi, entretanto, discutido com um conjunto

de projetos mais alargados. E, por isso,…

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Ao menos o CDS fez alguma coisa!

O Sr. João Ramos (PCP): — … é a partir desta discussão e desta iniciativa que gostaria de falar naquilo

que há muito mobiliza o CDS.

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Na altura, e na discussão deste projeto, o PCP lembrava que os cuidados paliativos eram o aspeto essencial

dos cuidados de saúde, mas lembrava também que era preciso dinheiro para fazer o que estava proposto no

projeto. Dizia mesmo o PCP que havia uma contradição entre os bons princípios que se inscreviam no projeto

de lei e as más políticas que o CDS, juntamente com o PSD, aplicavam relativamente aos recursos financeiros

da saúde.

Sr.ª Deputada, a Lei n.º 52/2012, a Lei de Bases dos Cuidados Paliativos, baseou-se num projeto de lei da

autoria do CDS e, depois, precisava de ser executada. E para se executar esta lei era preciso duas coisas,

constando a primeira da chamada BASE XXIX da mesma lei, que diz que haverá uma dotação orçamental

específica no quadro do orçamento do Ministério da Saúde. Ora, ainda hoje mesmo confirmei os mapas do

Ministério da Saúde para os anos de 2013, de 2014 e de 2015, e não consta qualquer especificidade

relativamente aos cuidados paliativos.

Em segundo lugar, outra das bases referia que era preciso fazer a regulamentação necessária para a

produção de efeitos e que essa regulamentação tinha de ser feita em 120 dias. A lei entrou em vigor em janeiro

de 2013 e, por isso, a regulamentação tinha de estar pronta até maio de 2013.

Neste período o Governo PSD/CDS nada fez para regulamentar a Lei de Bases dos Cuidados Paliativos. Até

ao momento foram publicados cinco diplomas, apenas um deles é da responsabilidade do PSD e do CDS e foi

publicado já depois das eleições de 4 de outubro.

Já este Governo, para além dos restantes decretos, fez também sete protocolos entre o Ministério da Saúde

e várias instituições universitárias sobre esta matéria.

Por isso, o CDS propôs a lei, mas esqueceu-se de fazer o essencial para que essa lei pudesse entrar em

vigor.

A Sr.ª Deputada falou em afronta aos doentes e a quem precisa destes cuidados, mas eu diria que afronta

foi fazer uma lei e não criar as condições para que ela entrasse em vigor.

A Sr.ª Deputada fala hoje em consensos, e o PSD também veio falar em consensos, mas eles de nada

servem se não houver execução. Sobre esta lei em concreto — a Lei de Bases dos Cuidados Paliativos —,

houve um consenso, ela foi aprovada por unanimidade, na Assembleia da República, mas, depois, os senhores

não fizeram aquilo que precisavam de ter feito.

Por isso, Sr.ª Deputada, sendo esta uma matéria que mobilizou tanto o CDS, que há tanto tempo mobiliza o

CDS, por que é que o CDS, tendo governado três anos depois da publicação da lei, não criou as condições para

que ela entrasse em vigor e assim dar dignidade a estas pessoas?

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Galriça Neto.

A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — Sr. Presidente, queria agradecer as questões da Sr.ª Deputada

Isaura Pedro e dos Srs. Deputados André Silva e João Ramos.

Começo por clarificar que quando mencionamos um prognóstico vital de 6 a 12 meses é até 6 ou 12 meses

e isto inclui, obviamente, as pessoas que têm menor expectativa de vida, e, portanto, esta questão poderá ser

devidamente clarificada.

Quanto à formação, Sr.ª Deputada, para nós, na perspetiva positiva e construtiva com que apresentamos

estas propostas, é evidente que tudo o que seja reforçar, em matéria de relevância das questões de fim de vida,

apela a uma exigência de que se deem mais passos. Já aqui, nesta Casa, e por iniciativa nossa, se aprovaram

propostas legislativas no sentido de ser mandatório reforçar a formação dos profissionais de saúde nas questões

geriátricas e de fim de vida.

De facto, voltam a acusar-nos de que não há novidade e eu volto a dizer que, efetivamente, nos parece que

é preciso ter vistas reduzidas para ignorar e desconhecer a realidade que vai para além da prestação dos

cuidados paliativos e que, efetivamente, diz respeito a milhares de pessoas — os senhores não podem negar

— que, por responsabilidade de todas as entidades envolvidas, poderiam estar em melhores condições no seu

final de vida e não estão.

Para nós, Sr. Deputado André Silva, essa realidade é o que basta — se me é permitido dizer — para

voltarmos a apresentar iniciativas, para apresentarmos um conjunto de iniciativas, como direitos que respondem

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ao sofrimento, porque, de facto, relativamente ao sofrimento das pessoas em fim de vida, a agenda vai muito

para além da questão da eutanásia.

Portanto, o que nos confrange é ver que nesta Casa só se consegue debater um assunto, que é a eutanásia,

quando, relativamente ao sofrimento em fim de vida, há mais vida para além da eutanásia, há mais necessidades

e é por isso que o CDS apresenta este projeto de lei.

Aplausos do CDS-PP.

Relativamente à maioria das pessoas que estão em fim de vida, convirá dizer, Sr. Deputado, que não é a

eutanásia a solução que lhes interessa,…

O Sr. André Silva (PAN): — Não há propostas novas!

A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — … interessa-lhes ter vida com mais qualidade.

O senhor não pode dizer que não há propostas novas, porque isso só revela desconhecimento da realidade,

desconhecimento daquilo que se passa no nosso País e desconhecimento da proposta que apresentámos,

porque, efetivamente, há novidades.

Volto a dizer que, em matéria de sofrimento em fim de vida, reforçar, acrescer não é pouco. Eu não sei por

que é que menorizam, por que é que teimam em menorizar aquilo que diz respeito à realidade de milhares de

portugueses. Não pode ser menorizado. Por isso, o CDS insistirá para que esta agenda seja discutida aqui, com

coragem, com capacidade, e não de uma forma redutora.

O foco do nosso debate, hoje, é em matéria de direitos, não é em matéria de organização de serviços, não

é em matéria de eutanásia, debate a que nunca nos furtámos e cá estaremos para o fazer no tempo próprio,

mas não hoje. Não queiram debater hoje aquilo que não viemos aqui para debater.

Queria terminar dizendo que não vemos que a proposta da sedação paliativa seja uma coisa menor, até

porque, e mais uma vez por desconhecimento, se poderá falar, como já aqui hoje se aludiu, de morte lenta. A

sedação paliativa não encurta a vida, não implica uma perda de consciência e isso o Sr. Deputado deveria saber

antes de proferir determinado tipo de afirmações, que confundem e baralhem quem nos está a ouvir.

Efetivamente, a sedação paliativa é um tratamento, não de primeira linha, não serve para abreviar a vida das

pessoas, não serve para lhes dar uma morte em agonia, como o senhor quer fazer crer. Isso não é sério, Sr.

Deputado.

De facto, é preciso dizer que há muitas outras respostas para as situações de sofrimento, e a sedação

paliativa é uma delas, mas nunca de primeira linha, nem nunca correspondendo a uma morte lenta.

O senhor falou — e bem — sobre o valor da autonomia e da dignidade, mas não ouviu quando eu, daquela

tribuna, disse que dignidade e autonomia não se afirmam contra o valor da vida. Aliás, terá de nos explicar isso,

porque não percebo como quer afirmar dignidade e autonomia quando elimina o sujeito que experimenta a

dignidade e a autonomia. Portando, não reforça a autonomia eliminando o sujeito que a experimenta.

Esse debate, Sr. Deputado, teremos enormes oportunidades de o fazer.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Estão a fazê-lo agora!

A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — Como vê, para não confundir, porque várias vezes,…

Protestos do BE.

Como eu dizia, várias vezes — para sermos claros —, insistiram em que o debate era sobre cuidados

paliativos e não sobre eutanásia, mas, depois, já era sobre eutanásia.

Gostava de deixar, aqui, bem claro que o foco e a intenção do CDS são: reforçar os direitos, aumentar a

proteção das pessoas em fim de vida.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

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A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — Não sei como é que os senhores podem estar contra!

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Está a precipitar-se!

A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — Os portugueses não vão entender. Se os senhores são a favor de

todos os direitos, por que não ser a favor daquilo que hoje estamos a densificar, a querer estruturar e a querer

melhorar?

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — De facto, os portugueses não entenderão por que é que, em matéria

de direitos e de proteção dos mais vulneráveis, não acompanham as propostas que hoje aqui apresentamos.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Antónia Almeida Santos.

A Sr.ª Maria Antónia Almeida Santos (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Direitos das pessoas

doentes em fim de vida. O anúncio da iniciativa do CDS «Direitos das pessoas doentes em fim de vida» colheu

o País de surpresa. A opinião pública não estava à espera da prioridade temporal dada a esta iniciativa pelo

partido que a apresentou, pela simples razão de que decorre, pelo País, um debate sério, ponderado sobre a

possibilidade de os doentes em fim de vida, a seu pedido e de forma consciente e informada, poderem optar por

uma morte assistida.

O CDS anunciou-a como se se tratasse de uma novidade, sublinhando a necessidade de garantir uma

intervenção global, efetiva e eficaz no sofrimento das pessoas em fim de vida.

Que direito iria o projeto de lei acrescentar?

Socialmente, o nosso País tem, na Constituição vigente, a necessária garantia de uma política de saúde

geral, universal e tendencialmente gratuita e, para além disso, a garantia de um conjunto de direitos, liberdades

e garantias pessoais que não só confirma todos os direitos fundamentais reconhecidos pela Declaração

Universal dos Direitos Humanos como, em larga medida, vai mais além, consagrando, até, novas gerações de

direitos.

Depois de uma análise detalhada do projeto, percebemos que o CDS arranjou uma maneira de perder tempo,

desde logo pelo facto de não acrescentar nenhum direito às pessoas doentes em fim de vida, limita-se a um

enunciado de direitos já consagrados em práticas médicas comuns — desejáveis para atenuar a dor, é certo —

, onde aparece a sedação paliativa.

Como bem refere um médico reconhecido e de muitos de nós conhecido, o Dr. João Semedo, «Como prática

médica, a sedação paliativa mais não é que a morte lenta, a agonia ao ralenti, por decisão médica, como

acontece em milhares de situações nos nossos hospitais.» e «(…) é prática corrente nos nossos hospitais, quer

nas unidades que prestam cuidados paliativos quer nos serviços de internamento.»

Ora, sendo uma modalidade de tratamento paliativo, que é o que parece ser — assim dizem os especialistas

e a Sr.ª Deputada Isabel Galriça Neto, que é, honra lhe seja feita, uma especialista muito reconhecida —, por

que foi, então, este tratamento trazido para o projeto de lei? Isto, sim, é uma novidade.

Estamos hoje a discutir tratamentos em concreto no Plenário da Assembleia da República?!

Estranhamente, o único direito que o CDS não protege no seu projeto é o direito à autodeterminação dos

doentes.

Aplausos do PS e do BE.

Viver é um direito e proteger a vida é um dever do Estado. Ninguém o contesta, mas não podemos impedir

que cada um tenha o direito de ser tratado como cidadão singular, em autêntica autarquia individual, arquiteto

único de si mesmo e não como modelo abstrato de tratamento.

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É óbvio que os doentes têm de ser ajudados nas horas de angústia ou crises de vazio, e há muito que o são,

são ajudados e respeitados nos serviços de saúde e pelos seus profissionais. E, desde já, faço aqui um

agradecimento a todos os profissionais de saúde, que têm sido inexcedíveis para com os doentes que estão

vulneráveis e em fim de vida.

Aplausos do PS.

Portanto, novidade, Sr.ª Deputada, por muito que lhe custe ouvir, não há nenhuma. O título é bom, a

exposição de motivos é longa e cuidadosa, mas o articulado não reflete nem o cuidado, nem as novidades, nem

o objeto do projeto.

Senão, vejamos: todo o projeto de lei é, de facto, um conjunto de redundâncias. Mas vou detalhar um pouco

esta evidência, apesar de o Sr. Deputado André Silva, do PAN, já o ter feito.

Os direitos referidos no artigo 3.º (Direitos em matéria de informação e de tratamento) estão, além de

consagrados num artigo da Constituição, previstos na Lei de Bases da Saúde e também na Lei de Informação

Genética Pessoal e Informação de Saúde.

No que se refere ao artigo 4.º (Obstinação terapêutica e diagnóstica), a Carta dos Direitos e Deveres dos

Doentes enumera, exaustivamente, os direitos apropriados ao estado de saúde de cada doente em concreto.

Os cuidados referidos no artigo 6.º (Cuidados paliativos) já se encontram enquadrados em legislação própria,

a Lei de Bases dos Cuidados Paliativos.

Para terminar, os artigos 8.º, 9.º e 10.º deste não-projeto referem-se a direitos não clínicos, que já estão

consagrados na lei que regula as diretivas antecipadas de vontade, o testamento vital, e a nomeação de

procurador de cuidados de saúde e que cria o Registo Nacional do Testamento Vital. Tudo isto são

redundâncias, tudo isto já está consagrado no nosso ordenamento jurídico.

Sr.as e Srs. Deputados, aqui chegados, confia-se que o partido anunciante — visto que de uma iniciativa

propriamente dita não se trata — acabará por cair em si, sobretudo porque já tem razões para saber que estas

não-propostas não terão outra eficácia senão a de um debate desprestigiante para a imagem que construiu de

si próprio e para o fim da nossa sessão parlamentar.

Neste Parlamento, Sr.ª Deputada, e utilizando as suas próprias palavras, não existe estreiteza de vistas, nem

vistas reduzidas, existem, antes, opiniões diferentes que a Sr.ª Deputada não quis respeitar.

Aplausos do PS e do BE.

Entretanto, assumiu a presidência o Vice-Presidente Jorge Lacão.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Cristóvão Simão Ribeiro.

O Sr. Cristóvão Simão Ribeiro (PSD): — Sr. Presidente, a Sr.ª Deputada Maria Antónia Almeida Santos já

me conhece há alguns anos e, com certeza, confirmará que tenho pelo Grupo Parlamentar do Partido Socialista

e por aquele que é o papel do Partido Socialista no exercício da democracia um respeito enorme. Isto porque

considero o Partido Socialista um partido fundamental para a saúde democrática portuguesa.

A Sr.ª Deputada sabe também que tenho particularmente respeito por si por aquele que tem sido o seu

exercício das funções como Deputada nesta Casa, nomeadamente nas funções que exerce na Comissão

Parlamentar de Saúde, mas perdoe-me que lhe diga, com toda a frontalidade, que a Sr.ª Deputada, hoje, peca

por um defeito que eu tenho que apontar a si e ao Grupo Parlamentar do Partido Socialista: excesso de

disponibilidade. Isto porque os Srs. Deputados do Grupo Parlamentar do Partido Socialista e da Comissão

Parlamentar de Saúde estão, efetivamente, disponíveis para tudo e, neste caso, vieram aqui, num exercício de

disponibilidade, disponibilizarem-se para confundir um debate sério sobre a qualidade da rede dos cuidados

continuados e dos cuidados paliativos com os direitos no fim de vida das pessoas e com aquilo que é uma

discussão, que os senhores querem trazer para intoxicar este debate, a reboque da esquerda radical, sobre a

eutanásia, que é um debate completamente diferente, Sr.ª Deputada, e esse é um exercício que nós não

deixamos passar ao lado sem ser devidamente assinalado.

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Se a Sr.ª Deputada manifesta aqui disponibilidade para fazer um exercício de mudança de tema ou para

tentar levar o tema que estamos a discutir para outros caminhos, perdoe-me, Sr.ª Deputada, que eu tenha

também a mesma disponibilidade que tem o Grupo Parlamentar do Partido Socialista para colocar-lhe algumas

questões que têm precisamente a ver com a sua disponibilidade.

Ora vejamos: explique-me como é que a Sr.ª Deputada e o seu grupo parlamentar conseguem ter

disponibilidade para defender o Ministro da Saúde que já aumentou o montante de pagamentos em atraso dos

hospitais em 44% em dois anos! Explique-me como é que a Sr.ª Deputada tem disponibilidade para isto! Indigna-

me!

Sr.ª Deputada, explique-me como é que está disponível para defender um Governo que já é responsável por

uma dívida brutal do Serviço Nacional de Saúde (SNS) a fornecedores que ronda os 2000 milhões de euros!

Explique-me, porque é das pessoas que estamos a falar. Estamos exatamente a caminhar para o mesmo sítio

para onde caminhávamos em 2011, quando a indústria farmacêutica rejeitava a venda a crédito de

medicamentos aos hospitais públicos, Sr.ª Deputada! E, no fim, é o Estado que vai falhar para com as pessoas,

como, aliás e de resto, tem falhado noutras circunstâncias pela vossa incompetência.

Pergunto-lhe: está ou não disponível para continuar a defender este tipo de políticas de saúde em Portugal?

Mas, e vou mais longe, o seu Governo, face ao anterior Governo, cortou já em 40% o investimento público

na saúde. Aliás, o seu Governo fez mais, o seu Governo cortou a si próprio, no que diz respeito àquela que é a

sua própria posição ou previsão de investimento no SNS. Estamos já em julho e o Governo apenas executou

20% daquilo que tinha previsto executar para o ano todo em medidas de saúde.

Sr.ª Deputada, está ou não disponível para continuar a defender este tipo de políticas em saúde?

Termino, Sr. Presidente, com uma última questão. Há mais de um ano foi aprovada nesta Casa uma

resolução da Assembleia da República que consagrava o Estatuto do Cuidador Informal. Pois bem, Sr.ª

Deputada, mais de um ano depois, o Governo que os senhores suportam não fez absolutamente nada. Repito,

mais de um ano depois o Grupo Parlamentar do Partido Socialista nada fez, zero! Pergunto-lhe, Sr.ª Deputada:

qual é a sua disponibilidade? É para estar ao lado do Sr. Ministro ou é para estar ao lado das pessoas que

precisam desses cuidados e que urgem uma resposta do Estado, porque, infelizmente, estas pessoas não têm

outros meios para tal?

Obrigado, Sr. Presidente, pela tolerância.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Antónia Almeida

Santos.

A Sr.ª Maria Antónia Almeida Santos (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Cristóvão Simão Ribeiro,

começo por agradecer-lhe as amáveis palavras que me dirigiu e por dizer-lhe que, de facto, depois dessas

palavras amáveis, acusou-me de ter confundido o debate, de ter trazido para o debate um assunto que não

estava em discussão, de estar a defender um debate que decorre na sociedade. Ora bem, o Sr. Deputado caiu

no mesmo erro,…

Aplausos de Deputados do PS.

… porque, ao acusar-me, o Sr. Deputado falou de tudo menos de cuidados paliativos ou de direitos de

pessoas doentes em fim de vida.

O Sr. Cristóvão Simão Ribeiro (PSD): — O que é que a Sr.ª Deputada disse sobre cuidados paliativos?

Diga lá!

A Sr.ª Maria Antónia Almeida Santos (PS): — Sr. Deputado, respondendo-lhe muito concretamente, devo

dizer que a minha disponibilidade é total para trabalhar — e já estamos a fazê-lo — na legislação do cuidador

informal. A breve prazo, o Sr. Deputado também será chamado a colaborar e a contribuir, assim nós o

desejamos, para este salto, que tem a ver com cuidados domiciliários. Como sabe, o Governo que eu defendo

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e que estou disponível para continuar a apoiar — e tenho muito orgulho em apoiar o Governo da «geringonça»

—,…

Aplausos de Deputados do PS.

… neste momento, na área da saúde, ainda com problemas, é certo, já executou 70% do Programa que foi

sufragado pelos portugueses.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Cristóvão Simão Ribeiro (PSD): — Não brinque com coisas sérias!

A Sr.ª Maria Antónia Almeida Santos (PS): — Já não estou de acordo com o Sr. Deputado quando tenta,

de uma forma que se virou contra si, peço-lhe desculpa, acusar-me de uma coisa que é o senhor que pratica,

que é não ter opinião, não dizer nada, sobre a questão que está em aberto.

De facto, o projeto que está hoje em discussão se, de alguma maneira, vem reforçar a política do Governo

em matéria de cuidados paliativos, e isto assumo-o aqui, porque, de facto, reforça,…

O Sr. Cristóvão Simão Ribeiro (PSD): — Uma cambalhota!

A Sr.ª Maria Antónia Almeida Santos (PS): — … não traz, nem acrescenta nenhum direito. E, por isso, o

Sr. Deputado não teve ninguém a dizer: «É verdade, não há novidade nenhuma!».

Bom, devo dizer, com a máxima frontalidade, que o Sr. Deputado sabe qual é a minha posição pessoal em

relação à morte assistida, mas não estamos a falar do direito à legalização ou à despenalização da eutanásia,

não é disto que estamos a falar mas, sim, de direitos de doentes em fim de vida, e sobre isto o Sr. Deputado

nem uma palavra disse.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Pureza.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Não valem fingimentos neste

debate. O projeto de lei apresentado hoje pelo CDS é um antiprojeto de lei. O CDS não fez mais do que vir

marcar o seu lugar no debate que o País está a fazer sobre a despenalização da morte assistida. Sem ter a

coragem de o dizer expressamente, este projeto é um projeto sobre a morte assistida para negar a sua

despenalização. Este projeto não é outra coisa senão isso, uma afirmação inequívoca do CDS de que quer

manter na lei a pena de prisão de 1 a 3 anos para o profissional de saúde que, em consciência, entenda que

deve ajudar a respeitar a vontade séria e livre de um doente incurável e com um sofrimento insuportável de que

a sua morte seja antecipada, em nome da dignidade que se fixou a si próprio.

Os 11 artigos deste projeto poderiam reduzir-se a um único com o seguinte conteúdo: «mantém-se em vigor

a criminalização da morte assistida».

O CDS não quer consagrar nenhum direito, quer apenas negar um direito. Este projeto é absolutamente

redundante e, por isso, é supérfluo e é mesmo demagógico. Artigo a artigo, o projeto que temos diante de nós

limita-se a dizer que são legais direitos que constam da lei. O consentimento informado, o testamento vital, a

informação sobre o estado de saúde e sobre as diferentes possibilidades terapêuticas, a proibição da obstinação

terapêutica, o acesso a cuidados paliativos, nada disto é novo, e ainda bem! O que choca, aquilo que não é

sério é que o CDS nos apresente um projeto que inventa o que está inventado e pretenda que aceitemos que é

uma grande invenção. Não é! É puro tacticismo político! A esse tacticismo político respondemos com coerência,

porque não votamos contra direitos que defendemos e que já estão — e bem! — na lei, e seremos coerentes

com essa posição na votação deste projeto. Mas o nosso voto final será fruto de todo o debate que se vier a

fazer, na especialidade, e do expurgo de truques e de obsessões ideológicas conservadoras que abundam neste

projeto.

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Para cumprir a suprema arte de apresentar um projeto sobre a eutanásia com quatro páginas de exposição

de motivos e 11 artigos sem nunca usar a palavra «eutanásia», o CDS faz duas insinuações. A primeira é a

insinuação recorrente de que os adversários da sua cruzada contra a morte assistida aceitam que a doença, a

deficiência, o desemprego ou o sofrimento retiram valor ao ser humano. Isto está escrito na exposição de motivos

do vosso projeto de lei.

Entre os seus vários mantras de autoconvencimento, o CDS tem este de se proclamar partido da vida, contra

o que gostam tanto de designar por cultura da morte.

Esta insinuação é um insulto e a ela eu respondo que o que retira valor ao ser humano é proibir outro ser

humano de escolher o conteúdo da sua vida até ao fim, o que retira valor ao ser humano é ter medo da

autodeterminação de outro ser humano.

A segunda insinuação do CDS é a de que o acesso a cuidados paliativos é alternativo à escolha da decisão

de antecipação da morte. Para o defender, o CDS não hesita em tornar lei a prescrição de uma forma específica,

entre tantas outras, de tratamento: a sedação paliativa.

Deve registar-se, deste modo, que o CDS deixa cair a máscara: não há debate em que o CDS não brade

que os cuidados paliativos não são o adormecimento do doente em sofrimento, mas, agora, vem, afinal,

reconhecer que esse adormecimento e a inerente descaracterização da pessoa está no cerne dos cuidados

paliativos.

Que o tenham confessado com tanta clareza é, afinal, o principal mérito deste projeto, mas este

reconhecimento traz para a lei o que nunca dela deve constar: a apologia da prescrição de uma forma específica

de tratamento. Era o que mais faltava ser o Parlamento a aprovar a prescrição de aspirinas para as dores de

cabeça ou de colírio para as inflamações oftalmológicas.

Sr.as e Srs. Deputados, pela nossa parte, queremos reafirmar neste debate duas coisas fundamentais: a

primeira é a de que seremos firmes na luta pela afirmação do princípio da autodeterminação de todas as

pessoas, incluindo, à cabeça, as pessoas em fim de vida e que tudo faremos para juntar forças e opiniões que

se reconheçam na prioridade a dar ao respeito por esse princípio fundamental. Não cederemos nesse combate

pelo respeito pela decisão que só cada um e cada uma pode tomar sobre as escolhas essenciais para a sua

vida até ao fim, e a melhor forma de o fazer é regular em lei essa decisão, garantindo que ela é séria, é livre, é

consciente e é usada para o seu fim próprio, que é a afirmação da autonomia de cada pessoa.

A segunda reafirmação que queremos fazer é a de que, sendo firmes na defesa da liberdade de cada um

decidir como quer viver a sua morte, repudiaremos sempre a falsa alternativa entre cuidados paliativos e

despenalização da morte assistida. Estaremos sempre na luta pela disponibilização universal de cuidados

paliativos de máxima qualidade pelo Serviço Nacional de Saúde. Os cuidados paliativos, porventura até mais do

que os outros cuidados de saúde, não podem ser um negócio porque são um direito, mas nunca aceitaremos

que isso seja alibi para nos demitirmos da solidariedade com quem, em sofrimento insuportável, não quer que

o seu fim de vida seja esse.

Para o Bloco de Esquerda, a despenalização da morte assistida é um imperativo sem condições, nem

compensações!

Aplausos do BE, do PAN e de Deputados do PS.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Elza Pais.

A Sr.ª Elza Pais (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Manuel Pureza, assegurar o direito dos doentes

em fim de vida é o dever do Estado de direito, é uma exigência da Constituição, decorre de compromissos

internacionais da OMS (Organização Mundial de Saúde) e também das políticas europeias de direitos humanos.

Até aqui estamos todos de acordo. O projeto que o CDS acabou de apresentar vem, por isso, pedir, como já

aqui foi dito, o que está a ser feito.

Mas este é o momento — e permita-me, Sr. Deputado José Manuel Pureza, que me dirija à Sr.ª Deputada

Isabel Galriça Neto — de perguntar onde estava quando o CDS diminuiu pensões, quando diminuiu o

complemento solidário para idosos, quando não apoiou a criação de novas unidades de cuidados continuados

que estavam prontas a funcionar. Nessa altura, nem uma palavra!

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Protestos do CDS-PP.

O CDS dificultou o acesso aos cuidados de saúde de muitas e muitas pessoas.

Defender os direitos dos doentes em fim de vida é o que sempre se fez, é o que se continua a fazer, bem

como aliviar a dor, criar e alargar esta rede de cuidados continuados e de cuidados paliativos.

Protestos da Deputada do CDS-PP Isabel Galriça Neto.

Isto nunca esteve em causa, tudo isto está a ser feito.

Protestos do CDS-PP.

Sr. Deputado José Manuel Pureza, se não se importar, volto a dirigir-me à Sr.ª Deputada Isabel Galriça Neto:

há um direito de que não falam no vosso projeto e esse direito tem a ver com a dignidade e o respeito pelo

sofrimento humano, com a dignidade e o respeito pelas opções de cada ser humano, é o direito à

autodeterminação.

A medicina resolve muita coisa, sim! A medicina alivia a dor, sim! Temos a responsabilidade de aumentar e

de alargar as unidades de cuidados continuados e paliativos, sim, e estamos a fazê-lo! Mas há um limite que a

medicina não resolve: em certas circunstâncias, não consegue restituir uma vida com autonomia, o que, para

muitas pessoas, é o mesmo que dizer uma vida com dignidade.

Ora, estas pessoas, em certas circunstâncias, em consciência e de forma reiterada, podem querer desistir e,

por isso, não podemos, não devemos, retirar-lhes esse direito.

Nesta linha, Sr. Deputado, acompanhamo-lo nestas suas preocupações, porque defender esse direito é

defender uma vida com dignidade, não respeitar esse direito é alimentar uma cultura de imposição, e disso não

vamos, nunca, abdicar.

Aplausos do PS e do PAN.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem a palavra o Sr. Deputado Ricardo Baptista Leite para pedir

esclarecimentos.

O Sr. RicardoBaptistaLeite (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Manuel Pureza, direitos das

pessoas em fim de vida é o tema que estamos a debater. De facto, temos assistido, ao longo dos últimos meses,

a este debate na praça pública e muitos têm defendido estes direitos nos jornais, mas, finalmente, temos uma

proposta concreta para discutirmos aqui, pelo que felicito o CDS e a Deputada Isabel Galriça Neto por nos

trazerem uma proposta concreta sobre a qual podemos falar.

Este debate que estamos a encetar traz-nos algo muito positivo e até raro na Assembleia da República, que

é um consenso generalizado em torno dos termos em que esta proposta de lei é apresentada. Não ouvi, desde

o Bloco de Esquerda ao Partido Social Democrata, qualquer oposição ao conjunto de direitos aqui consagrados.

O Sr. Deputado José Manuel Pureza, que cumprimento pela intervenção que fez, disse que esta iniciativa,

apesar de concordar com todas as propostas presentes, pretende apenas negar o acesso à morte assistida.

Ora, para além de esse ser um tema que não é aquele que estamos aqui a discutir, considerar que o conjunto

de leis que hoje existem garantem que os portugueses em fim de vida não estão a sofrer ou é querer enganarmo-

nos, a nós próprios, ou é um ato de profunda ignorância, porque, na realidade, não resulta. O conjunto de leis

que existe hoje não é suficiente e o reforço legislativo que aqui se propõe pretende precisamente garantir um

conjunto de direitos de modo a assegurar que aqueles que precisam de ter acesso a esses direitos o tenham. E

temos falhado como sociedade, não o negue, Sr. Deputado. Todos nós, dentro e fora do Parlamento, desde os

cuidados paliativos aos cuidados continuados, devemos fazer mais, incluindo aqueles que estavam antes mas

também aqueles que estão hoje no poder. Os senhores também têm corresponsabilidade.

Fico muito curioso para ver a vossa posição no próximo Orçamento do Estado sobre estas matérias.

Em consciência, pergunto ao Sr. Deputado José Manuel Pureza: acha que a morte assistida hoje seria

realizada de uma forma plena, no sentido em que quem hoje está em sofrimento teve acesso a todos os meios

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possíveis e imaginários para que não estivesse a sofrer? Esta é a questão de base que, como sociedade, temos

de questionar.

A verdade é esta, Sr. Deputado: não estamos a fazer tudo para evitar o sofrimento de quem está a sofrer no

nosso País. Sem resolvermos as questões de base no nosso País, sem garantirmos as questões de base que

evitam o sofrimento dos nossos doentes, não podemos ter uma discussão séria sobre outras opções que não

sejam aquelas que estão hoje a ser discutidas.

Portanto, seria importante saber qual é a posição do Bloco de Esquerda e isso será traduzido através do

vosso voto.

Aplausos do PSD e da Deputada do CDS-PP Isabel Galriça Neto.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Pureza.

O Sr. JoséManuelPureza (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, agradeço as questões que me

foram colocadas.

Não posso deixar de fazer um reparo: esta insistência, por parte do Grupo Parlamentar do CDS e agora por

parte do Grupo Parlamentar do PSD, em atirar para este lado do Parlamento a acusação de ignorância é a prova

de um espírito de arrogância e de um espírito de superioridade intelectual que eu não aceito. Não aceito!

Aplausos do BE, do PS e do PAN.

Estamos, como dizia alguém, e bem, perante um confronto democrático de pontos de vista e esse confronto

democrático não se compadece com qualquer acusação desta natureza neste Parlamento.

Aplausos do BE e do PS.

Isto dito, respondendo ao Sr. Deputado Ricardo Baptista Leite, a quem agradeço, uma vez mais, a questão

que me colocou, devo dizer que o Sr. Deputado pertence a uma família política que, em alguns momentos, teve

o desassombramento de participar em lutas importantes pela abertura de horizontes e pela abertura de direitos,

pelo que queríamos acreditar que, uma vez mais, iria ser assim em matérias tão importantes como aquelas que

são as dos direitos individuais das pessoas em Portugal.

O Sr. Deputado sabe tão bem quanto eu — e não o acuso de ignorância —, ou melhor do que eu, que não

há conquista de liberdades quando não estão reunidas todas as condições necessárias, possíveis e imaginárias.

Por isso mesmo, quero dizer-lhe que a afirmação do direito de cada um a escolher como quer viver a sua

morte é algo que deve ser feito em todos os momentos, a par com a luta pela oferta e disponibilização de

cuidados paliativos.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. JoséManuelPureza (BE): — Termino, Sr. Presidente.

Estas não são questões que se opõem — não nos farão cair nessa armadilha! —, são questões

complementares.

Protestos do PSD.

Enquanto os senhores defendem a abertura à despenalização da morte assistida só quando houver cuidados

paliativos de oferta universal, nós dizemos: são questões complementares.

O Sr. RicardoBaptistaLeite (PSD): — Não foi essa a pergunta que coloquei! Seja sério!

O Sr. JoséManuelPureza (BE): — Sr.ª Deputada Elza Pais, não quero terminar — e, Sr. Presidente, peço

a mínima tolerância — sem lhe dizer que tem toda a razão. Este debate não pode ficar inquinado por qualquer

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manifestação de cultura de imposição, e é isso exatamente que nos distingue. Nós estamos do lado de quem

defende uma cultura de tolerância, e é isso que está em causa, ao passo que outros defendem uma cultura de

negação da tolerância e uma cultura de imposição.

Aplausos do BE, do PS e do PAN.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ângela Guerra, do

PSD.

A Sr.ª ÂngelaGuerra (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Gostaria, em primeiro lugar, de

saudar o Grupo Parlamentar do CDS por ter trazido, em boa hora, a este Parlamento um projeto de lei sobre os

direitos das pessoas doentes em fim de vida.

Trata-se de um tema que não é fácil e, por isso, pouco falado no espaço político e nem sempre da melhor

forma, mas é um tema da maior importância e talvez um dos que requer maior humanidade por quem o aborda.

Afinal, os progressos da ciência e a formidável evolução que as nossas sociedades modernas alcançaram

nos últimos séculos e, principalmente, nas últimas décadas não nos libertam, nem poderiam libertar, da

inexorável lei da vida e da morte.

A matéria hoje em debate deve, assim, ser discutida com seriedade, sem demagogias, sem soluções

milagrosas, nem facilidades enganadoras, sem preconceitos ideológicos instrumentalizadores do ser humano,

porque o que está em causa é demasiado sério.

Sr. Presidente e Sr.as e Srs. Deputados, o partido proponente reconhece que a sua iniciativa legislativa não

tem um carácter essencialmente inovatório, antes visa compulsar um conjunto de direitos das pessoas doentes

em final de vida, direitos que, em parte, já se encontram consagrados em textos legais nacionais e internacionais,

bem como em normas éticas relativas a diversas profissões de saúde.

Mas essa característica do projeto de lei não diminui, na perspetiva do PSD, o objetivo que o mesmo tem

essencialmente em vista, que é o de servir de Magna Carta dos direitos das pessoas doentes e em fim de vida.

Procurou-se — a nosso ver, bem — congregar num único diploma o conjunto dos direitos de pessoas que se

encontram numa situação de especial vulnerabilidade e que, por isso mesmo, merecem o reconhecimento do

legislador, o apoio e o conforto da sociedade.

É certo que algumas das soluções propostas pelo CDS podem justificar um esclarecimento do âmbito pessoal

dos beneficiários desta lei, nos termos do artigo 2.º, e a sua necessária articulação com o constante no artigo

7.º ou, ainda, a questão que preveem no n.º 4 do artigo 3.º.

Igualmente importará ponderar, com o maior cuidado, os termos, o modo e a forma de como qualquer

eventual informação sobre o prognóstico de vida da pessoa doente que aqui nos ocupa deve ser dado e por

quem.

Quer isto dizer que, nestes casos tão especiais, a forma de comunicação é tão importante como a informação

em si, devendo ter-se especialmente presente que cada pessoa é um caso singular e carece, por isso, de uma

abordagem específica que respeite a sua idiossincrasia e a sua condição particular.

A formação dos profissionais de saúde em cuidados paliativos é, assim, um aspeto essencial que cumpre

não descurar e que não tem ainda merecido suficiente atenção.

Outrossim, os aspetos referentes às decisões terapêuticas, bem como as soluções propostas em caso de

discrepância de vontades e de decisões entre os doentes ou os seus representantes legais e os profissionais

de saúde, carecerão de uma cuidadosa reflexão, a qual deverá integrar o saber de escolas científicas e de

pensamento.

Um esclarecido exemplo do que se acaba de afirmar pode ser encontrado no Parecer sobre Aspetos Éticos

dos Cuidados de Saúde Relacionados com o Final da Vida, de 1995, do Conselho Nacional de Ética para as

Ciências da Vida, que continua a oferecer uma importante base para a reflexão séria e fundamentada sobre o

tema que hoje discutimos.

Nesse Parecer, de que foi relator o Prof. Dr. Daniel Serrão, sustenta-se — e cito — o seguinte: «Quando não

há esperança razoável de cura e as melhorias presumidas dependem de pesados sacrifícios físicos, impostos

à pessoa doente pelo tratamento a efetuar, são as regras da medicina de acompanhamento que devem

prevalecer.

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O objetivo primordial desta forma de cuidado médico é o de conseguir para a pessoa doente, em fase de

incurabilidade, o maior conforto e bem-estar, tanto físico como psíquico e afetivo».

Ora, esta dimensão ética não pode ser diminuída e muito menos esquecida quando está em causa a pessoa

doente em fim de vida.

Dito isto, Sr. Presidente e Sr.as e Srs. Deputados, cumpre agora enquadrar a presente iniciativa legislativa no

contexto mais vasto dos cuidados de saúde prestados às pessoas doentes e em final de vida, e aí

fundamentalmente falamos de cuidados paliativos. Neste domínio, importa, desde logo, lembrar a Lei n.º

52/2012, que aprovou a Lei de Bases dos Cuidados Paliativos, e, igualmente aprovada na anterior Legislatura,

a Lei n.º 25/2012, que regula as diretivas antecipadas de vontade, conhecida como «lei do testamento vital».

Mas, na anterior Legislatura, o trabalho realizado em prol da dignidade humana nas situações de doença

grave e irreversível não se limitou à aprovação dos diplomas referidos.

Com efeito, o Governo anterior criou uma comissão nacional com o objetivo de coordenar a Rede Nacional

de Cuidados Paliativos, em 2014, e determinou ainda a constituição das equipas intra-hospitalares de suporte

em cuidados paliativos nos estabelecimentos hospitalares do SNS, tendo sido criadas 27 dessas equipas em

2014.

Os anteriores governos contratualizaram igualmente mais de 2100 camas nos cuidados continuados

integrados e abriram mais de 200 camas nos cuidados paliativos, criando ainda 11 Equipas Comunitárias de

Suporte em Cuidados Paliativos (ECSCP). O objetivo foi o de vir a dar apoio a cerca de 60 000 doentes

diretamente e a mais 180 000 pessoas indiretamente, e esta é uma tarefa que está ainda em execução.

Facto é que o trabalho realizado entre 2011 e 2015 foi reconhecido até pelo atual Ministro da Saúde, quando

disse que tinha de reconhecer que, no quadro de restrição financeira, se houve zona onde o anterior Governo

fez um bom esforço foi nesta área, na dos cuidados continuados e paliativos. Disse que os números mostravam

o trabalho e, por isso, reconhecia-o.

Aplausos do PSD.

Esperava-se, por isso, ultrapassadas ainda em 2015 as dificuldades circunstanciais que o País viveu no

passado recente, que o atual Governo apostasse mais no desenvolvimento desta rede de cuidados paliativos,

prosseguindo e reforçando até o esforço dos anteriores Executivos.

Verdade é que a abertura do número de camas está a ser ainda insuficiente, para mais se tivermos presente

que muitas delas estavam já lançadas pelo anterior Executivo, designadamente ao nível dos cuidados

continuados e paliativos pediátricos, como é o caso da Unidade O Kastelo.

Além disso, continuam a faltar equipas intra-hospitalares de suporte em cuidados paliativos, o mesmo

sucedendo com novas camas e equipas comunitárias de cuidados paliativos.

Com efeito, estima-se que existam atualmente pouco mais de 350 camas de cuidados paliativos quando

seriam necessárias mais de 1000, e o SNS tem apenas a funcionar poucas dezenas de equipas domiciliárias de

cuidados paliativos, concretamente 19.

A insuficiência desta resposta torna-se particularmente evidente quando se calcula que, entre nós, todos os

anos, cerca de 80 000 necessitem destes cuidados paliativos.

Neste contexto é de lamentar a reversão da devolução dos hospitais às Misericórdias, já que algumas das

referidas unidades incluíam tipologias de convalescença e de cuidados paliativos.

O setor social poderia estar a ser um importante parceiro do Estado no desenvolvimento desta rede, o que

não só não aconteceu mais devido à cegueira política de uma esquerda radicalizada que sacrificou os doentes

no altar do seu preconceito ideológico. Sucedem-se, aliás, situações de falta e atrasos nos pagamentos a

entidades do setor social, que dispõem de unidades e de equipas de cuidados paliativos.

Mas essa cegueira, que há pouco referi, está também bem patente no chumbo pela esquerda reunida do

projeto de resolução n.º 487/XIII (2.ª), que o PSD apresentou há uns meses nesta Câmara, através do qual se

recomendava ao Governo a aprovação e implementação de um plano nacional de ação para o envelhecimento

ativo e positivo.

Aliás, cumpre lembrar, aqui, que o Parlamento aprovou, há cerca de um ano, a Resolução n.º 129/2016,

recomendando ao Governo a criação do estatuto do cuidador informal, dirigido à proteção de quem trata de

pessoas dependentes com doenças crónicas nos seus domicílios.

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Passado um ano, não só o Governo não criou ainda esse estatuto, apesar de o Ministro já o ter prometido

no ano passado, como a situação se agrava se tivermos presente que Portugal tem a maior taxa de cuidados

domiciliários informais da Europa e uma das menores taxas de cobertura de cuidados formais.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Vivemos hoje um tempo singular. Ao discurso encantatório do

Governo sucede-se a dura realidade; às promessas não cumpridas sucedem-se as greves de médicos,

enfermeiros, enfermeiros especialistas, farmacêuticos, técnicos de diagnóstico e terapêuticas e outros

profissionais do SNS; aos amanhãs que cantavam sucede-se o aumento das reclamações dos utentes do SNS;

ao discurso facilitista sucede-se um brutal aumento das dívidas do SNS, que se aproximam já perigosamente

dos 2000 milhões de euros, com o inerente estrangulamento da atividade dos hospitais e asfixia financeira de

muitas centenas de empresas fornecedoras de material clínico e farmacêutico.

O PSD tem advertido sistemática e reiteradamente para o problema do aumento das dívidas no SNS.

Estamos seriamente preocupados. Sem sustentabilidade e responsabilidade não há sistema público que

aguente e direitos dos cidadãos que resistam, e sem pagamentos atempados aos nossos valorosos bombeiros

pelos transportes de doentes também não há operacionalidade no terreno que resista.

Esta é uma evidência que se aplica também ao SNS, quer na sua vertente sistémica, quer na perspetiva

mais concreta dos direitos dos doentes, que hoje discutimos.

Legislar não é sempre fácil, mas também hoje não nos é difícil. Por isso, o que verdadeiramente importa é

que o Governo dê concretização às propostas e recomendações desta Assembleia, garantindo que, hoje, os

cuidados básicos e paliativos estão em condições de suficiência, porque só assim o País passará a respeitar a

dignidade da pessoa em fim de vida.

Por isso, Sr.ª Deputada Isabel Galriça Neto, concordamos quando V. Ex.ª afirma: «A vida humana tem igual

valor em todas as circunstâncias e, por, isso merece proteção em todas elas.»

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sr.ª Deputada, a Mesa regista um pedido de esclarecimento.

Para o efeito, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Graça.

O Sr. Luís Graça (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O CDS apresentou hoje um projeto de lei

sobre a definição de um conjunto de direitos das pessoas doentes carregado de segundas intenções, porque

aquilo que apresentou foi, apenas, a compilação de direitos que já existem e de objetivos que já estão a ser

prosseguidos pelo Governo. Não há nenhum direito novo.

Aliás, ouvimos a Sr.ª Deputada do CDS, Isabel Galriça Neto, e a Sr.ª Deputada do PSD, Ângela Guerra, que,

não conseguindo aqui anunciar nenhum direito novo, fazendo apenas lembrar aquela melodia de alguém que

pensou mandar pintar o céu em tons de azul para ser original e, depois, percebeu que, afinal, alguém já tinha

pintado o céu de azul.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Deputada do PSD quis, aqui, confrontar-nos com a realidade. Pois eu também quero confrontá-la com

a realidade: podemos, neste debate, pedir ao Governo para fazer mais pelas pessoas doentes em estado muito

grave, em estado terminal, podemos pedir ao Governo para criar uma rede de cuidados paliativos com mais

vigor e com mais força, mas não podemos dizer aquilo que a Sr.ª Deputada Ângela Guerra acabou de dizer,

porque, por exemplo, em Faro, Sr.ª Deputada, estava concluída, paga e montada uma unidade com 15 camas

para cuidados paliativos no Hospital de Faro e o seu Governo utilizou aquele espaço para outro serviço,

desmontando aquelas camas e fazendo com que aquela unidade não cumprisse o objetivo inicial.

Por isso, pergunto: que rede defende o PSD? Uma rede pública, no SNS, ou uma rede privada de cuidados

paliativos?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ângela Guerra.

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A Sr.ª Ângela Guerra (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, confesso que ouvi aqui neste debate coisas

inacreditáveis,…

Vozes do PS: — Ah…!

A Sr.ª Ângela Guerra (PSD). — … designadamente que este projeto de lei, apresentado pelo CDS, é

supérfluo, é demagógico, e, agora, o Sr. Deputado Luís Graça até disse que era uma melodia.

De facto, ao que assistimos aqui ao longo do debate foi à esquerda parlamentar a tentar desviar o interesse

das pessoas nesta questão tão importante dos seus direitos aos cuidados de fim de vida para o tema da

eutanásia. E veja-se: sendo essa a vossa perspetiva, sendo esse o vosso direito de pensar assim, ela é legítima,

é a correta, pois claro, mas se for a nossa, é demagógica ou, então, já está tudo feito e o Governo anterior nada

fez.

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Ângela Guerra (PSD): — Portanto, não conseguimos perceber-vos. Mas também quem não nos vai

conseguir perceber, lá em casa, são as pessoas. As pessoas, lá em casa, é que não vos conseguem perceber.

Relativamente à questão que o Sr. Deputado me colocou, devo dizer que não entendi muito bem a sua

questão, porque o PSD tem provas dadas na implementação da rede de cuidados continuados e da rede de

cuidados paliativos – aliás, da tribuna, eu citei os números e os factos e o senhor só tem de consultar os

elementos.

A nossa posição é clara; a posição que não é clara, veja-se, sobre determinadas matérias, em concreto

quanto ao setor da saúde, é a vossa, a do PS a do PCP e a do Bloco.

O Sr. Cristóvão Simão Ribeiro (PSD): — Claro!

A Sr.ª Ângela Guerra (PSD): — E, Srs. Deputados, esta não é só a minha perspetiva. Para além da

perspetiva do Observatório Português dos Sistemas de Saúde, que a Sr.ª Deputada Isabel Galriça Neto já hoje

aqui citou, a verdade é que apareceu por aí uma carta assinada por 25 personalidades da área da esquerda,

entre as quais pessoas conhecidas de VV. Ex.as, como o Presidente da Associação de Renovação Comunista,

Paulo Fidalgo, médicos, enfermeiros, dirigentes políticos e sindicais, antigos bastonários ligados ao PCP, ao

Bloco e ao PS, nomes como Cipriano Justo, Jaime Mendes, João Proença, José Manuel Boavida, Mário Jorge

Neves, Sérgio Esperança, e muitos outros que eu vos podia citar, que vêm dizer coisas tão espantosas quanto

a esta vossa forma de tratar a saúde e os cuidados de saúde, como isto: «A governação da saúde está a tornar-

se um grão na engrenagem da geringonça. Estamos a meio do mandato e a geringonça não chegou à saúde,

uma área que ficou de fora».

O Sr. Cristóvão Simão Ribeiro (PSD): — Muito bem lembrado!

A Sr.ª Ângela Guerra (PSD): — «Não há uma política de saúde, apenas medidas pontuais e nota-se um

claro retrocesso.»

O Sr. Cristóvão Simão Ribeiro (PSD): — Só engolem sapos!

A Sr.ª Ângela Guerra (PSD): — «O Governo comprometeu-se com quatro pilares e nenhum ainda produziu

resultados com efeitos práticos no terreno». Ou, por fim – e confesso que estas duas são fantásticas: «A

ineficácia do SNS tem permitido aumentar a indústria privada e as desigualdades entre os portugueses».

O Sr. Cristóvão Simão Ribeiro (PSD): — Bem lembrado!

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A Sr.ª Ângela Guerra (PSD): — Como é que é possível que a esquerda parlamentar esteja a potenciar a

indústria privada?

E, mais, dizem ainda estas 25 personalidades, «que os portugueses estão a ficar mais doentes para terem

um défice controlado».

Srs. Deputados, eu, se não dissesse que isto era verdadeiramente preocupante, afirmava, sem dúvida

nenhuma, que é uma vergonha!

Poderão VV. Ex.as dizer que isso são as opiniões dessas 25 personalidades. Pois não são! São também as

opiniões do Observatório Português dos Sistemas de Saúde, que diz que o «subfinanciamento do setor persiste,

empurra os cidadãos para pagamentos diretos cada vez maiores e quem não pode pagar adia o tratamento,

infelizmente, e uma larga maioria dos portugueses não tem acesso aos cuidados paliativos».

O Sr. Cristóvão Simão Ribeiro (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª Ângela Guerra (PSD): — E por que será, pergunto eu, Sr.as e Srs. Deputados, concretamente aos

Srs. Deputados do PS?

Na segunda feira tivemos conhecimento da Conta Geral do Estado, que mostra que o Governo pediu ao

Parlamento autorização para, na área da saúde, gastar 10,48 milhões de euros e, no final, parece que gastou

menos 331 milhões. E nós pensamos: será que isto são as cativações? Não são! Isto é para lá das cativações…

Vozes do PSD: — Bem lembrado!

A Sr.ª Ângela Guerra (PSD): — É que a Direção-Geral do Orçamento vem dizer que as cativações são cerca

de 80 milhões e esta Conta Geral do Estado vem dizer que o total das cativações atinge um valor recorde de

1000 milhões de euros, um valor histórico dizem alguns do PS,…

Vozes do PSD: — Uma vergonha!

A Sr.ª Ângela Guerra (PSD): — … que serviu ao Governo para conseguir alcançar o défice do qual os

senhores se vangloriam tanto.

Eu tenho vergonha! E os companheiros de esquerda que vos sustentam vêm agora dizer uma coisa

inacreditável: os senhores abusaram de um instrumento de gestão das contas públicas para atingir os propósitos

desta propaganda.

Estas cativações, veja-se, aprovadas aqui no Parlamento pelo PS, pelo Bloco e por Os Verdes, assinadas

de cruz nesta norma que permite isto, permitem agora — e queixa-se o Bloco, e muito! — que o Sr. Ministro das

Finanças tenha um poder discricionário para alterar verbas atribuídas ao Ministério da Saúde sem que a

Assembleia escrutine devidamente isto.

Como é que é possível, Srs. Deputados? Os senhores não têm nada a dizer sobre este assunto?!

O projeto de lei sobre os cuidados continuados é muito importante. Os senhores deviam ter vergonha e dar

continuidade ao que o anterior Governo fez. Façam lá isso, Srs. Deputados!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — A Mesa não interrompeu a Sr.ª Deputada no período da resposta porque,

olhando para o tempo sobrante, hesitou relativamente à utilização adequada desse tempo ainda disponível.

Para uma intervenção, tem agora a palavra a Sr.ª Deputada Carla Cruz.

A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: De acordo com a legislação em vigor, os

cuidados paliativos são definidos como «cuidados ativos, coordenados e globais, prestados por unidades e

equipas específicas, em internamento ou no domicílio, a doentes em situação de sofrimento decorrente de

doença incurável ou grave, em fase avançada e progressiva, assim como às suas famílias, com o principal

objetivo de promover o seu bem-estar e a sua qualidade de vida através da prevenção e alívio do sofrimento

físico, psicológico, social e espiritual, com base na identificação precoce e no tratamento rigoroso da dor e outros

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sintomas físicos, mas também psicossociais e espirituais» e destinam-se a pessoas com doenças graves e/ou

avançadas e progressivas.

Os cuidados paliativos, de acordo com a Organização Mundial de Saúde, devem, entre outros, promover o

alívio da dor e de outros sintomas disruptivos, ajudar o doente a viver tão ativamente quanto possível até à

morte, ajudar a família a lidar com a doença e acompanhá-la no luto.

Para prosseguir tais desideratos é fundamental o trabalho em equipa para atender às necessidades dos

doentes e das suas famílias. Porém, a realidade está muito longe de corresponder ao que está estipulado.

De acordo com os dados publicados recentemente pelo Relatório da Primavera, da autoria do Observatório

Português dos Sistemas de Saúde, verifica-se uma diminuta resposta, sobretudo da resposta pública. Aliás,

resposta pública que o PSD não quis dar, e bem sabemos porquê, porque o PSD não investiu na resposta

pública a este nível de cuidados.

Segundo a fonte já citada, a «taxa de cobertura nacional das equipas comunitárias de suporte em cuidados

paliativos era de 21%,» registando-se ainda uma enorme assimetria na distribuição do território, havendo

distritos em que não há qualquer equipa, como sucede em Aveiro, Braga, Castelo Branco, Guarda, Leiria,

Portalegre, Santarém, Vila Real e Viseu.

A distribuição assimétrica também se verifica ao nível das unidades de cuidados paliativos.

Em 2016 existiam 26 unidades de cuidados paliativos — é verdade, mais do que no tempo do Governo

PSD/CDS-PP — e estavam distribuídas desta forma: Norte – 5; Centro – 5; Lisboa e Vale do Tejo — 12; Alentejo

– 3 e Algarve – 1, sendo que também neste nível de cuidados há distritos que não têm qualquer unidade.

O relatório supracitado confirma aquilo que o PCP há muito vem dizendo: há uma escassez gritante de camas

no Serviço Nacional de Saúde. E vai mais longe afirmando: «uma baixa taxa de cobertura nacional e regional

de unidades de cuidados paliativos de agudos, com total inexistência nos hospitais universitários e quase total

nos hospitais de capital de distrito».

A par da insuficiência de camas regista-se um «baixo número de profissionais em todos os grupos

profissionais».

Por fim, um dado preocupante: «o tempo de sobrevivência pós-admissão é baixo, revelando que o doente é

admitido muito próximo ou já em fase de morte iminente».

Este facto não pode ser desligado do diagnóstico atrás descrito, das dificuldades de acesso aos cuidados de

saúde em geral e aos cuidados paliativos em particular, mas, sobretudo, das políticas que foram seguidas por

sucessivos governos e, de forma particular, por PSD e CDS, que hoje quiseram, mais uma vez, branquear.

Neste debate, o CDS também tentou ilibar as suas responsabilidades na carência e na insuficiência da

resposta nos cuidados paliativos, a que acresce o facto de não ter sequer criado a regulamentação da lei que

patrocinou. E, aliás, não respondeu ao desiderato e à pergunta que o PCP lhe dirigiu sobre essa matéria.

Recordamos os baixos níveis de investimento e, sobretudo, os cortes que realizaram no Serviço Nacional de

Saúde.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os cuidados paliativos, como a restante prestação de cuidados de saúde,

para o PCP, são uma responsabilidade do Estado e devem ser assegurados a todos os cidadãos que precisem,

incluindo as crianças e os adolescentes.

É preciso que o Governo reforce o investimento público e o financiamento do Serviço Nacional de Saúde.

O PCP defende, agora como no passado, o reforço do investimento público para ampliar a rede de

equipamentos públicos de cuidados paliativos no País, uma rede que responda às necessidades existentes.

Os doentes precisam de respostas e para tal é necessário que se reforce o investimento público, que se

contratem profissionais, que sejam criadas equipas especializadas, que se reforce a formação dos profissionais,

que se assegurem as condições de trabalho, que sejam respeitadas as carreiras e os direitos dos trabalhadores.

São condições imprescindíveis para que sejam prestados os cuidados de saúde de que a população necessita

e se garanta o cumprimento do direito à saúde de qualidade.

Tudo isto não está contemplado na iniciativa que o CDS aqui apresentou. Também não o estranhamos,

porque o investimento público, a defesa da resposta pública e do Serviço Nacional de Saúde é algo que não é

compatível com as políticas do CDS.

Todavia, o compromisso do PCP é esse mesmo, é com a resposta pública, é com o reforço dos cuidados

paliativos e com os direitos dos doentes, todos eles, incluindo os doentes crónicos que necessitam deste tipo de

apoio.

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Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para uma intervenção, tem, agora, a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Alves

Moreira.

A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O projeto de lei do CDS tem

como único propósito passar a mensagem de que a discussão em curso sobre a morte assistida, e que terá

lugar neste Parlamento laico, caducou. É o velho truque de contrapor os cuidados paliativos necessários e de

boa qualidade a qualquer outra escolha, como se de uma alternativa se tratasse.

Não vou perder mais tempo com a manobra de diversão.

A Sr.ª Maria Antónia Almeida Santos (PS): — Muito bem!

A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — Vale a pena, sim, tirar o retrato do CDS a partir do preâmbulo do seu

(não) diploma, todo ele a confissão de uma visão da sociedade que não tem cabimento no século XXI, que não

encontra conforto na nossa Constituição, felizmente avessa a paternalismos e que por isso não admite

supremacias morais e desconfianças estaduais relativamente às escolhas pessoais e necessariamente plurais

de cada ser humano.

Aplausos do PS e do BE.

É assim, mesmo que essas escolhas de vida não caibam na cartilha de valores absolutos do CDS.

O CDS insiste numa leitura absolutista da vida humana, não jurídica e, antes, de delegação implícita para o

divino, pelo que, por sua vontade, as mulheres que recorrem à IVG (interrupção voluntária da gravidez) deveriam

continuar a ir para a cadeia.

A Sr.ª Ângela Guerra (PSD): — Ó meu Deus!…

A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — É a consequência evidente de uma leitura dos valores constitucionais

que esquece que nenhum deles é absoluto e que a dignidade da pessoa humana, sobretudo na vertente da sua

autonomia, bem como o direito ao livre desenvolvimento da personalidade, habilitam o legislador a encontrar

soluções para aqueles que somos em cada momento e não, como propõe o CDS, para aqueles que deveríamos

ser,numa espécie de construção de modelo comportamental único, de cidadão-tipo,o que nos traz à memória

o pior da escuridão do século XX.

A «moral do CDS», disfarçada num (não) projeto de lei, está vertida no preâmbulo, que é a apologia

preventiva da recusa de um reduto insubstituível da dignidade autónoma de cada pessoa, que antecipa a

trincheira dos bons e a trincheira dos maus, os tais adeptos da cultura da morte, esse slogan.

Assim, antes de haver o debate que o CDS quer dar por findo, o maniqueísmo está traçado, está delineado,

numa leitura expropriativa da Lei Fundamental.

É para isto que o (não) projeto de lei do CDS serve.

Atira-se areia para os olhos dos doentes em final de vida, com um preâmbulo que caracteriza quem, ao

contrário do CDS, tem uma palavra a dizer sobre o direito à autodeterminação dos doentes e o respeito pela sua

vontade, pelos seus valores e pela sua decisão, como, e cito o preâmbulo, «redutores», «arcaicos», «pobres»

e «desumanos». É um insulto, Srs. Deputados!

Aplausos do PS e do BE.

São os que querem «eliminar pessoas», para usar o léxico do Partido Popular.

O Grupo Parlamentar do Partido Socialista não tem posição oficial sobre a morte assistida mas não se furtará

à discussão da mesma num Parlamento sujeito a uma Constituição aberta às escolhas democráticas do

legislador.

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O tema é sério demais, os doentes em fim de vida merecem-nos respeito demais para fingirmos que estamos

a falar da criação de direitos, quando o que o CDS quer é antecipar (numa espécie de mensagem de veto) as

conclusões de uma discussão delicada que teremos de ter. Afinal, CDS, para quê um articulado com o que já

está na lei e é velho na boa prática clínica?! É ler o preâmbulo para perceber o desplante.

Aplausos do PS e do BE.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Inscreveu-se, para pedir esclarecimentos, a Sr.ª Deputada Fátima

Ramos.

Tem a palavra, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Fátima Ramos (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Alves Moreira, antes de mais, apresento

os meus cumprimentos a todos.

Assistimos hoje, aqui, a um debate que deveria ter sido muito sério, um debate em que aquilo que se

procurava era aumentar a proteção das pessoas em fim de vida, aumentar a proteção das pessoas e das famílias

que sofrem.

Em vez de assistirmos a medidas e sugestões que melhorassem o estado de vida dessas pessoas,

assistimos a um autêntico clima de guerrilha, de guerrilha que falou do passado, de guerrilha que, em vez de

falar do presente e daquilo que pretendemos para o futuro, se escondeu atrás daquilo que foi feito no passado.

Sabemos que, no passado, este assunto não ficou resolvido, sabemos que ainda continuamos a ter muita

necessidade de cuidados paliativos. Sabemos disso, mas estamos aqui para falar e para pensar no futuro e no

presente, e é esse o desafio que vos deixo, Sr.as e Srs. Deputados.

Hoje, isso não foi cumprido, mas espero que num futuro momento o seja, de facto, porque o que queremos

é que as pessoas tenham um bom Serviço Nacional de Saúde, sejam cuidadas, estejam tranquilas e tenham

esperança.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem a palavra, para responder, a Sr.ª Deputada Isabel Alves Moreira.

A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Fátima Ramos, foi o próprio PSD, pela

voz da Deputada Ângela Guerra, que afundou o CDS, não dizendo uma única palavra sobre o projeto de lei do

CDS.

A Sr.ª Ângela Guerra (PSD): — Ó Sr.ª Deputada, deixe lá o PSD! Olhe para a sua intervenção!

A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — É precisamente porque sabe que o projeto de lei do CDS não acrescenta

um único direito àquilo que está na lei e nas práticas médicas.

Aplausos do PS e do BE.

Portanto, Sr.ª Deputada Fátima Ramos, onde vê guerrilha, nós vemos autenticidade, onde vê guerrilha, nós

vemos respeito pelos doentes que estão a assistir a este debate e que sabem que, deste lado, não ficamos

parados e que, enquanto uns atiram areia para os olhos com esses direitos, outros explicam aquilo que está

verdadeiramente por detrás da intenção do CDS.

Aplausos do PS e do BE.

A Sr.ª Ângela Guerra (PSD): — Sr. Presidente, permite-me o uso da palavra?

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Pede a palavra para que efeito, Sr.ª Deputada?

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A Sr.ª Ângela Guerra (PSD): — Para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sobre…

A Sr.ª Ângela Guerra (PSD): — Para solicitar a distribuição de um documento, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Faça favor de indicar de que documento se trata, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Ângela Guerra (PSD): — Sr. Presidente, gostava de pedir que pudesse ser distribuída à Sr.ª Deputada

Isabel Alves Moreira a intervenção que o PSD acabou de fazer na tribuna, que tenho aqui em papel, onde se

faz referência expressa a números e a propostas concretas sobre artigos do projeto de lei que o CDS hoje nos

apresenta, coisa que, efetivamente, o PS, na sua intervenção, não fez.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Está feito o pedido, Sr.ª Deputada.

Sr.as e Srs. Deputados, tem agora a palavra, para encerrar a apreciação do projeto de lei n.º 565/XIII (2.ª), a

Sr.ª Deputada Isabel Galriça Neto.

A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em matéria de direitos das

pessoas em fim de vida, densificar e reforçar será sempre valor acrescentado e, para nós, isso impõe-se, nunca

será menor, nunca será redundante.

O foco do nosso debate, hoje, são as respostas ao sofrimento. E, apesar das múltiplas recomendações que

já existem sobre esta matéria, e nós também o dissemos, na prática, elas não se concretizam para milhares de

portugueses.

Por isso tudo, porque essas pessoas continuam a sofrer, o que façamos nessa matéria nunca será supérfluo

nem será taticismo. Para nós, a resposta ao sofrimento faz-se cuidando, e não tendo medo das palavras nem

utilizando eufemismos, não se faz eliminando o que sofre.

De facto, é disso que se trata. E é verdade que defendemos direitos e valores, é verdade que afirmamos,

como muitos que pensam como nós, que existe um direito à vida, que a vida é um bem inviolável, mas não

existe um direito a ser morto por outro nem um dever daí decorrente, que será o dever de matar.

Portanto, o que gostaria de deixar aqui bem claro é que não nos furtamos a qualquer debate, nem a este

nem a outro. Podemos fazê-lo e fazemo-lo em torno de valores, pensando diferente.

Os Srs. Deputados do Bloco de Esquerda e do Partido Socialista entendem que se deve respeitar a salutar

divergência de ideias mas, depois, porque as nossas ideias são diferentes das vossas, já as ridicularizam,

desvalorizam,…

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Exatamente!

A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — … falando de «cruzada», de «truques», de «cair da máscara», de

«desplante», de «arrogância» ou de «armadilhas».

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Exatamente!

A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — Em que ficamos, afinal, Srs. Deputados?! Democracia, sim, mas se

pensarmos todos da mesma maneira?!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Exatamente!

A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — Sejamos sérios! Sejamos sérios!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

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A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — Fizemos hoje este debate, como faremos outros, distintos, na

certeza de que defendemos a dignidade, a autonomia, a liberdade, a autodeterminação, não o fazendo nunca

em oposição ao valor maior da defesa da vida humana, pilar dos direitos humanos que, 150 anos depois da

abolição da pena de morte, nos orgulhamos de continuar a defender neste País.

Este é um assunto que não é de esquerda nem de direita, exige coragem e compromisso, exige que

mobilizemos a nossa energia não pela truculência das picardias mas pela grandeza da causa.

E porque não está tudo bem, continuaremos a bater-nos pela proteção das pessoas que sofrem e que estão

em fim de vida. O CDS não faltará para lhes dar voz, porque este debate, hoje, aqui, impõe-se. Orgulhamo-nos

de ter feito estas propostas, orgulhamo-nos de ter estado neste debate. Estaremos neste, como noutros, sempre

em favor dos mais vulneráveis, dizendo que não há vidas indignas, que todas as vidas merecem proteção.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Srs. Deputados, não há mais pedidos de palavra, pelo que está, assim,

encerrado este ponto da nossa ordem do dia. Chamo a atenção de que se tratou de uma marcação do CDS,

que tem, por isso, direito à votação da sua iniciativa, votação essa que ocorrerá no final dos trabalhos, o que

equivale a dizer depois do ponto seguinte.

O ponto seguinte é o da apreciação da Conta Geral do Estado de 2015, tema que será apresentado pelo Sr.

Secretário de Estado do Orçamento, a quem dou a palavra.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento (João Leão): — Sr. Presidente, Sr.as Deputadas e Srs.

Deputados: O que nos traz aqui hoje é a discussão da Conta Geral do Estado de 2015.

A apreciação da Conta Geral do Estado, que anualmente se faz nesta Câmara, faz parte do exercício de

fiscalização política a que os Governos têm democraticamente de se sujeitar. Estamos hoje a apreciar a Conta

Geral do Estado de 2015, que não é, em grande parte, da responsabilidade do atual Governo.

O défice orçamental, em 2015, ficou acima do inicialmente previsto, 4,4% quando estava previsto um défice

de 2,7%. Como podem observar na Conta Geral do Estado de 2015, e como se verifica também em muitos

outros exercícios orçamentais, a receita e a despesa ficaram bastante abaixo do teto inicialmente fixado no

Orçamento do Estado. O que é, até certo ponto, natural, porque são previsões de despesa, que são sempre

feitas com a folga necessária para acomodar as circunstâncias da execução ao longo do ano.

Em particular no caso da administração central, em 2015, a despesa ficou cerca de 1580 milhões de euros

abaixo do orçamentado. Estes desvios podem ser resultado quer de receitas próprias não cobradas, quer de

procedimentos da administração, de contratação pública, que não foram terminados.

O importante não é apenas quanto se gasta em cada área de governação mas como se gasta.

Assim, no decorrer da execução orçamental, um dos objetivos centrais da nossa atuação é efetuar uma

análise criteriosa da despesa, tentando garantir a racionalidade e eficiência na gestão dos recursos financeiros

e a sua alocação às áreas consideradas prioritárias.

Concluindo, o Governo espera, da análise da Conta Geral do Estado de 2015, que os ensinamentos desta

Conta sejam tidos em conta na elaboração de futuros orçamentos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Srs. Deputados, a Mesa não tem ainda pedidos de palavra para

apreciação da Conta Geral do Estado de 2015.

Pausa.

Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Cristóvão Crespo.

O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: É usual

afirmar a necessidade de analisar a prestação de contas, que é a Conta Geral do Estado, que seja o mais

próximo possível da realidade.

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2015 é uma exceção, Sr. Secretário de Estado. É uma exceção porque encerra um período determinante

que o País viveu, não por culpa própria mas por culpa dos Governos socialistas anteriores. Por isso, 2015

apresenta um saldo de que nos podemos orgulhar como País.

O Governo herdou, em 2015, um País em procedimento por défice excessivo, em rutura financeira do Estado,

do sistema financeiro e dos privados.

É à luz deste enquadramento que nos orgulhamos que dessa avaliação se possa dizer que o ano de 2015

foi marcado pela continuação da recuperação da atividade económica. Quem o diz, e escreve, não é o PSD, é

a Unidade Técnica de Apoio Orçamental, da Assembleia da República.

Sr. Secretário de Estado, o mesmo não é possível dizer de 2016, em relação a 2015. Por isso, é importante

estarmos agora a discutir a Conta Geral do Estado de 2015 quando foi apresentada já a Conta Geral do Estado

de 2016, pois podemos fazer a comparação e, por sinal, as duas foram elaboradas pelo atual Governo.

Num tempo em que nos dizem que já não há austeridade nem cortes, o que é que verificamos? Agora

chamam-se poupanças setoriais, forma mais elaborada de querer esconder as cativações permanentes. O

Governo não nos quer dizer onde, mas percebe-se onde estão pois na proteção civil, na segurança nacional, na

saúde e na educação elas são mais que evidentes. Repito: na proteção civil, na segurança nacional, na saúde

e na educação as poupanças setoriais, ou cativações permanentes, estão bem evidentes e os resultados

começam também a ser claros, duros, dramáticos e violentos para os portugueses.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — Bem podem o Bloco de Esquerda e o PCP indignar-se, porque isso são

lágrimas de crocodilo de quem aprovou e validou os Orçamentos para 2016 e 2017.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Trigo Pereira.

O Sr. Paulo Trigo Pereira (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Se estivéssemos aqui a discutir a

política orçamental de 2015 obviamente que o voto do Partido Socialista só poderia ser desfavorável.

É que, se relembrarmos o que foi 2015, este foi o ano em que se mantiveram praticamente intactos os cortes

salariais na função pública, manteve-se a sobretaxa do IRS (imposto sobre o rendimentos de pessoas

singulares), mantiveram-se os cortes nas prestações sociais e todas as medidas que, ao contrário do que o

Deputado Cristóvão Crespo acabou de referir, no fundo, concretizavam uma ideia de austeridade expansionista,

que o PSD, durante a sua governação, tentou imprimir à política orçamental. Felizmente, o Tribunal

Constitucional reverteu esta política orçamental.

Protestos do Deputado do PSD António Leitão Amaro.

Mas a Conta Geral do Estado não é a política orçamental do Governo PSD/CDS-PP, é uma conta, ou seja,

é o registo de receitas e despesas e de como elas foram executadas.

Não vamos antecipar já a discussão da Conta Geral do Estado de 2016, porque o que interessa aos

portugueses, mais do que as cativações de que falaremos amanhã com todo o à-vontade, é saber o que

aconteceu à saúde, o que aconteceu à educação e, de facto, nestes itens, a Conta Geral do Estado dá um bom

indicador do que foi a realidade.

O Partido Socialista, na sua avaliação da Conta Geral do Estado, obviamente, tem em conta as

recomendações feitas pelo Tribunal de Contas, e mais de metade das recomendações do Tribunal de Contas

foram acolhidas nesta Conta Geral do Estado, o que é claramente positivo.

Não temos tempo, infelizmente, para discutir aqui em detalhe, e deveríamos ter mais tempo para discutir em

detalhe estas recomendações do Tribunal de Contas. No fundo, e já o dissemos na Comissão de Orçamento,

Finanças e Modernização Administrativa (COFMA) mas não foi aqui, em Plenário, o Partido Socialista considera

que deve ser dado mais relevo à Conta Geral do Estado, quer em sede de COFMA, quer em sede de Plenário,

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e vai propor — aliás, já o fez até em sede de COFMA — que haja maior capacidade e maior racionalidade na

apreciação parlamentar da Conta Geral do Estado, neste Parlamento.

Termino só com esta nota: temos centenas de páginas, positivamente, em pareceres do Tribunal de Contas

e do Conselho Económico e Social. Dentro desta Casa, temos pareceres setoriais, que se repetem todos na

análise do cenário macro, na análise das políticas, todas as comissões enviam os pareceres para a COFMA,

que, por sua vez, faz um novo parecer. Ora, isto não parece ser nada eficiente, nada eficaz, e aquilo que é mais

importante, que é identificar recomendações relevantes do Tribunal de Contas e ver como é que elas podem ser

implementadas, não é feito. O Partido Socialista está empenhado em melhorar o processo orçamental e, neste

sentido, vamos votar favoravelmente esta Conta Geral do Estado.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Paulo Sá.

O Sr. Paulo Sá (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: É uma situação

recorrente nas Contas Gerais do Estado o Tribunal de Contas formular recomendações visando corrigir os

problemas e sucessivos governos não implementarem estas recomendações, ou implementá-las parcial e

tardiamente.

Veja-se, por exemplo, a opção do anterior Governo PSD/CDS-PP de não aplicar as recomendações relativas

aos benefícios fiscais, apresentando em sucessivas Contas Gerais do Estado dados errados ou incompletos,

onde avulta uma omissão, denunciada pelo Tribunal de Contas, de mais de 1000 milhões de euros de benefícios

fiscais a grandes empresas.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Bem lembrado!

O Sr. Paulo Sá (PCP): — Esta situação de desconsideração das recomendações do Tribunal de Contas deve

ser ultrapassada.

O atual Governo deve fazer um esforço no sentido de implementar todas as recomendações, apresentando

Contas Gerais do Estado que traduzam com rigor a realidade das contas públicas.

Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Em 2015 o anterior Governo PSD/CDS-PP

prosseguiu com a sua política de exploração e empobrecimento, de liquidação de direitos laborais e sociais, de

confisco de rendimentos dos trabalhadores, de aprofundamento da ofensiva contra as funções sociais do

Estado, de favorecimento fiscal do grande capital à custa de trabalhadores, reformados e micro e pequenos

empresários, e de venda ao desbarato de empresas públicas estratégicas para o desenvolvimento nacional.

Mas como 2015 foi um ano de eleições legislativas, o anterior Governo PSD/CDS-PP também desenvolveu

uma intensa campanha de mistificação e mentira, destinada a esconder as dramáticas consequências da sua

política para os trabalhadores e para o povo. Foi a mistificação da saída limpa do programa da troica,

escondendo dos portugueses os reais problemas do sistema bancário; foi a mentira da devolução da sobretaxa

de IRS, uma promessa que se esfumou no dia seguinte às eleições; foi ainda a mentira de que o País estava

melhor, mesmo quando a vida dos portugueses estava pior.

Mas os portugueses não se deixaram enganar por estas mentiras e mistificações…

Protestos da Deputada do CDS-PP Cecília Meireles.

…e, no dia 4 de outubro de 2015, disseram não à politica de exploração e empobrecimento de PSD e CDS

e manifestaram o seu desejo de mudança.

Apesar da desesperada tentativa do anterior Presidente da República de impor um Governo PSD/CDS-PP,

ao arrepio da vontade popular, foi possível, com o contributo decisivo do PCP, iniciar uma nova etapa na vida

política nacional e adotar um conjunto de medidas que deram resposta a alguns dos problemas mais urgentes

dos trabalhadores e do povo.

Valorizamos as medidas de reposição de direitos e rendimentos adotadas no último ano e meio, mas

assinalamos também o seu caráter limitado e insuficiente.

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Para não defraudar as legítimas expectativas dos trabalhadores e do povo, criadas com a derrota e o

afastamento do Governo PSD/CDS-PP, é imperativo prosseguir e aprofundar estas medidas de valorização de

direitos e rendimentos, um caminho que exige a rutura com os interesses do capital monopolista e com a

submissão às imposições da União Europeia.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — A Mesa não sabe se dá a palavra à Sr.ª Deputada Cecília Meireles ou à

Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, ou vice-versa, ou nem a uma nem a outra. Querem desempatar, Sr.as

Deputadas, ou desempata a Mesa?

Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Cecília Meireles.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr. Presidente, se o Bloco de Esquerda está constrangido com as

últimas opções orçamentais que fez, o que compreendo…

Risos do PSD.

… e até, caridosamente, vou ajudar.

O Sr. João Oliveira (PCP): — É sempre a mesma coisa!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — É costume haver algum desfasamento entre a nossa discussão da

Conta Geral do Estado e o período em que estamos. Este ano não é exceção.

Gostava também de dizer, como posição pessoal, que o Parlamento passa, de facto, muito tempo a elaborar

relatórios com muito pouca eficácia prática e, portanto, acho que isto devia ser repensado, até porque esta Conta

é um dos momentos em que mais relatórios efetuamos, com muito poucas consequências.

Em relação à Conta Geral do Estado de 2015, e não deixa de ser curioso estar a discutir a Conta de 2015

quando conhecemos já, há pouco tempo, a Conta de 2016, esta é de facto a Conta de um Governo e de vários

Orçamentos que receberam um défice de mais de 11% e deixaram um défice de 3% do PIB, sem o efeito do

BANIF.

É, de facto, a Conta do primeiro ano que se conheceu depois do programa de ajustamento, sem a troica, e

em que muitos diziam que a economia crescia pouco, mas, ainda assim, cresceu mais do que viria a crescer no

ano a seguir. Mas é também a Conta de um ano em que, ao contrário do que sabemos agora que aconteceu

em 2016, havia duas coisas diferentes, sendo a primeira a não existência de cativações de quase 1000 milhões

de euros, num verdadeiro orçamento paralelo e oculto. É que, basicamente, é discutido um orçamento aqui,

durante vários dias, com um processo completo na discussão em sede de especialidade, e depois, na prática,

acontece uma coisa completamente diferente.

Por outro lado, esta Conta tem autores e é importante que o digamos. É que àquilo a que tenho assistido, a

que se assistiu no dia de ontem, com o PCP e o Bloco a fingirem uma enorme surpresa com as cativações, digo:

Srs. Deputados, as contas são resultado dos orçamentos e os orçamentos são resultado do que se aprova. As

cativações, Srs. Deputados, são o resultado da aprovação e de votações que fazem aqui no Plenário. Quanto

ao artigo das cativações, o Bloco votou a favor e, portanto, pode agora dizer que não sabia de nada e que está

muito surpreendido mas, Srs. Deputados, estas cativações, que conhecemos de 2016, de quase 1000 milhões

de euros, têm autores. E os autores não são só aqueles que estão ali sentados, do Partido Socialista,…

Aplausos do CDS-PP.

… são também esses que estão aí sentados, do PCP, do Bloco de Esquerda e de Os Verdes. Há autores

para estes cortes e há autores para a degradação dos serviços públicos que eles provocaram e esses autores

são os senhores que estão aí sentados.

Aplausos do CDS-PP.

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O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Mortágua.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, a análise das contas gerais do

Estado dos últimos anos e também a de 2015, que encerra um período de austeridade, mostra-nos e permite-

nos concluir que, ironicamente, o Governo que mais fez o controlo orçamental e que mais viveu obcecado pelo

controlo do défice foi aquele que mais vezes falhou as suas previsões.

Falharam, sistematicamente, as suas previsões sobre consolidação orçamental, sobre crescimento

económico, sobre desemprego, sobre receitas, sobre despesas.

Protestos do Deputado do PSD José Pedro Aguiar Branco.

Não existe, Srs. Deputados, comparação, sobretudo, não existe comparação nos tempos recentes para o

radicalismo das escolhas orçamentais no período que terminou em 2015, ou seja, para o aumento brutal de

impostos, para a sobretaxa, para os escalões de IRS, para o aumento do IVA da restauração e da eletricidade,

para os cortes salariais, para os permanentes ataques à Constituição, para os cortes sem comparação nos

serviços públicos — 500 milhões de euros acumulados na educação, 1000 milhões de euros só em 2013, na

saúde, naquilo que preserva a democracia e que o País mais precisava na altura da crise.

Protestos do Deputado do PSD José Pedro Aguiar Branco.

E tudo isto acontecia com pouco rigor na atribuição de benefícios fiscais e enquanto se tentava diminuir os

impostos sobre as grandes empresas.

Protestos do Deputado do PSD Duarte Filipe Marques.

Hoje é mais simples — porque temos as contas — olhar para trás e perceber o quão contraproducente foi

esta política. De cada vez que se cortavam centenas de milhões de euros na despesa pública ou que se

aumentavam os impostos em centenas de milhões de euros, só uma pequena parte desse ajustamento é que

chegava ao défice, porque tudo o resto era perdido para a recessão, tudo o resto era perdido para o desemprego,

tudo o resto foi perdido para a emigração.

O Sr. José Pedro Aguiar Branco (PSD): — Tem de mudar o chip!

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — A verdade é que a austeridade foi muito mais a causa do prolongamento

da crise em Portugal do que consequência dessa mesma crise.

O País precisará de anos para recuperar o investimento perdido, para recuperar as pessoas que partiram,

para recuperar a degradação dos serviços públicos. E tudo isto sem que fosse possível resolver outros

problemas do País.

A verdade é que o problema da banca não foi resolvido. Pelo contrário, em nome do défice, de uma agenda

eleitoral e de uma propaganda de saída limpa, empurrou-se o real problema do País, que era o seu sistema

bancário, para debaixo do tapete, deixando os problemas para quem viesse depois resolver.

O Sr. José Pedro Aguiar Branco (PSD): — Tem de mudar o chip!

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Isto sem o mínimo de preocupação sobre o que seria o futuro ou sobre o

que seriam as contas públicas no futuro.

É certo que a política orçamental hoje não é perfeita, tem falhas e que muito teremos de fazer para a melhorar,

mas o País soube romper com a austeridade autopunitiva.

Srs. Deputados, a verdade é que os resultados económicos e sociais estão hoje muito longe da destruição

que foi provocada pelas escolhas orçamentais de PSD e CDS.

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Protestos do Deputado do PSD Jorge Paulo Oliveira.

Isso, Srs. Deputados, é inegável. Ao discutimos hoje a Conta Geral do Estado de 2015, penso que seria uma

oportunidade para os Srs. Deputados do PSD e do CDS-PP, por uma vez e finalmente, assumirem que as suas

escolhas orçamentais…

Entretanto, reassumiu a presidência o Presidente, Ferro Rodrigues.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe para terminar, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Termino, Sr. Presidente.

Dizia, seria uma oportunidade para os Srs. Deputados de PSD e CDS assumirem que as suas escolhas

orçamentais destruíram a economia do País, destruíram direitos sociais, mas sem resolver nenhum dos

problemas estruturais com que Portugal se confrontava.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Sr. Presidente, Srs. Deputados, até 2015, tivemos um corte

drástico na despesa, um aumento brutal de impostos, a continuação do Procedimento por Défice Excessivo e

do processo de sanções.

A partir de 2016, saímos do Procedimento por Défice Excessivo, houve uma baixa da carga fiscal e o início

do reforço dos organismos e serviços públicos, mesmo excluindo as despesas com pessoal. Um exemplo: não

havendo cativações, nem no SNS, nem nas escolas, a saúde e a educação aumentaram 4% e a despesa 3%

este ano, ao contrário do que se verificou nos últimos anos em que aconteceu exatamente o oposto.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Apesar de se ter inscrito para intervir depois de ter sido dada a palavra ao Sr. Secretário

de Estado, tem a palavra o Sr. Deputado Cristóvão Crespo, para uma intervenção.

O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado, Sr.

Deputado Paulo Trigo Pereira, muito estranho a sua intervenção, quando foi o próprio Sr. Deputado que

escreveu — não disse, escreveu — que, se o Tribunal de Contas não definisse as regras para os cortes na

função pública, não havia possibilidade de existir alguém que pudesse desempenhar a contento a função de

Ministro das Finanças. Portanto, muito estranhamos a sua intervenção, Sr. Deputado Paulo Trigo Pereira.

Mas, também, ressalta outro aspeto importante das intervenções dos Srs. Deputados. Tanto o Sr. Deputado

Paulo Trigo Pereira, como o Sr. Deputado Paulo Sá vieram falar da questão das recomendações, que são

importantes. Porém, fugiram aos resultados! Prestação de contas quer dizer resultados!

Srs. Deputados, temos a Conta Geral do Estado de 2016 que nos dá resultados! Dá-nos os resultados da

economia em 2015 e em 2016, por sinal, muito melhores em 2015 do que em 2016. Dá-nos resultados em

relação às exportações que aceleraram em 2015 e desaceleraram em 2016.

O Sr. Carlos Santos Silva (PSD): — Muito bem!

O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — Dá-nos resultados em relação à dívida da Administração Pública na ótica

de Maastricht, havendo menos 1,2 pontos percentuais na dívida, um decréscimo, que se cifrou em 129% do

PIB, voltando a crescer em 2016 para 130,4% do PIB.

O Sr. Carlos Santos Silva (PSD): — Muito bem!

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O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — Registou-se, portanto, um aumento de 1,4 pontos percentuais.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr. Deputado, por favor.

O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — Srs. Deputados, não há que fugir à prestação de contas. Ela é bem clara

hoje, comparando com aquilo que foi em 2016.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem mesmo de concluir.

O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — Vou concluir, Sr. Presidente.

É importante também citar aquilo que escreveu o INE (Instituto Nacional de Estatística). O INE diz que as

reformas do PSD diminuíram a exclusão social…

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem mesmo de concluir! Peço-lhe para levar a sério o que a Mesa lhe

está a dizer!

O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — …e aumentaram os rendimentos desde 2013.

Obrigado, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, chegámos ao fim do debate, havendo lugar agora à votação. Antes,

porém, vamos proceder à verificação do quórum de deliberação, utilizando o sistema eletrónico.

Os Srs. Deputados que, por qualquer razão, não o puderem fazer terão de o sinalizar à Mesa e depois fazer

o registo presencial, para que seja considerada a respetiva presença na reunião.

Pausa.

O quadro eletrónico regista 204 presenças, às quais se acrescentam as dos Deputados Helena Roseta e

Jorge Gouveia, do PS, Pedro Pinto, do PSD, e Cecília Meireles, do CDS-PP, perfazendo 208 Deputados, pelo

que temos quórum para proceder à votação.

Votamos, então, na generalidade, o projeto de lei n.º 565/XIII (2.ª) — Direitos das pessoas em fim de vida

(CDS-PP).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD e do CDS-PP e abstenções do PS, do BE, do

PCP, de Os Verdes e do PAN.

O projeto de lei baixa à 9.ª Comissão.

Chegámos, assim, ao final dos nossos trabalhos.

A próxima reunião plenária terá lugar amanhã, às 10 horas, com a seguinte ordem do dia: do primeiro ponto

consta, por marcação do PSD, um debate de atualidade ao abrigo do artigo 72.º do Regimento da Assembleia

da República, sobre falta de transparência nos cortes de despesa nos serviços públicos.

Em segundo lugar será apreciada a proposta de lei n.º 91/XIII (2.ª) — Estabelece o programa de regularização

extraordinária dos vínculos precários.

Em terceiro lugar será apreciada a proposta de lei n.º 80/XIII (2.ª) — Altera o Código do Imposto Único de

Circulação, o Código do Imposto Municipal sobre Imóveis e prorroga a vigência dos benefícios fiscais relativos

ao mecenato científico.

Em quarto lugar, apreciaremos a proposta de lei n.º 76/XIII (2.ª) — Altera a Lei de Bases da política pública

de solos, de ordenamento do território e de urbanismo.

Em quinto lugar será realizado o debate com a presença do Governo, nos termos previstos nas alíneas a) e

b) do n.º 1 do artigo 4.º da Lei n.º 43/2006, de 25 de agosto, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 21/2012,

de 17 de maio, relativa ao acompanhamento, apreciação e pronúncia sobre a participação portuguesa no

processo de construção da União Europeia, juntamente com a discussão do projeto de resolução n.º 963/XIII

(2.ª) — Apreciação do Relatório sobre Portugal na União Europeia 2016 (Comissão de Assuntos Europeus).

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Do ponto seis constam as votações regimentais no final do debate.

Desejo uma boa tarde a todos e até amanhã.

Eram 17 horas e 28 minutos.

Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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