Página 1
Quarta-feira, 4 de outubro de 2017 I Série — Número 4
XIII LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2017-2018)
REUNIÃOPLENÁRIADE3DEOUTUBRODE 2017
Presidente: Ex.mo Sr. Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues
Secretários: Ex.mos Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco Idália Maria Marques Salvador Serrão António Carlos Bivar Branco de Penha Monteiro Sandra Maria Pereira Pontedeira
S U M Á R I O
O Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 5
minutos. Deu-se conta da entrada na Mesa dos projetos de lei n.os
613 a 618/XIII (3.ª) e dos projetos de resolução n.os 1063 a 1067/XIII (3.ª).
Foram discutidos, na generalidade, os projetos de lei n.os 579/XIII (2.ª) — Eliminação do risco de amianto em edifícios, instalações e equipamentos de empresas (Os Verdes) e 618/XIII (3.ª) — Estabelece procedimentos e objetivos com vista à remoção de produtos que contêm fibras de amianto ainda presentes em edifícios, instalações e equipamentos de foro privado, incluindo empresas privadas e habitações particulares (PAN) juntamente com os projetos de resolução n.os 1066/XIII (3.ª) — Recomenda ao Governo que efetive a atualização da listagem de materiais que contêm amianto nos edifícios, instalações e equipamentos onde se prestam serviços públicos e a consequente remoção, acondicionamento e eliminação de todos os respetivos resíduos (PAN) e 1067/XIII (3.ª) — Recomenda ao Governo
que apresente relatório da execução da Resolução da Assembleia da República n.º 170/2016, de 4 de agosto, e elabore um estudo visando a criação de incentivos para a remoção do amianto nas instalações de natureza privada com fins comerciais, industriais ou de armazenamento (PSD). Intervieram os Deputados Heloísa Apolónia (Os Verdes), André Silva (PAN), Bruno Coimbra (PSD), Maria Manuel Rola (BE), Maria da Luz Rosinha (PS), Álvaro Castello-Branco (CDS-PP) e Ana Virgínia Pereira (PCP).
Procedeu-se à reapreciação do Decreto da Assembleia da República n.º 155/XIII — Primeira alteração, por apreciação parlamentar, ao Decreto-Lei n.º 86-D/2016, de 30 de dezembro, que atribui ao município de Lisboa a assunção plena das atribuições e competências legais no que respeita ao serviço público de transporte coletivo de superfície de passageiros na cidade de Lisboa, transfere a posição contratual detida pelo Estado no Contrato de Concessão de Serviço Público celebrado com a Carris, e transmite a totalidade das ações representativas do capital social da
Página 2
I SÉRIE — NÚMERO 4
2
Carris do Estado para o município de Lisboa. Produziram intervenções os Deputados Luís Moreira Testa (PS), Heitor Sousa (BE), Carlos Santos Silva (PSD), Hélder Amaral (CDS-PP), Bruno Dias (PCP) e Heloísa Apolónia (Os Verdes).
Foi apreciado o Relatório Anual de Segurança Interna — 2016 (RASI 2016), tendo proferido intervenções, além da Ministra da Administração Interna (Constança Urbano de Sousa), os Deputados José Silvano (PSD), Susana Amador (PS), Sandra Cunha (BE), António Filipe (PCP), Telmo Correia (CDS-PP) e André Silva (PAN).
Foi também apreciado o relatório final Comissão Parlamentar de Inquérito à Recapitalização da Caixa Geral de Depósitos e à Gestão do Banco. Intervieram, além dos Deputados Emídio Guerreiro (PSD) e Carlos Pereira (PS), na
qualidade, respetivamente, de Presidente e Relator da Comissão, os Deputados Miguel Tiago (PCP), João Paulo Correia (PS), João Pinho de Almeida (CDS-PP), Moisés Ferreira (BE) e Carlos Costa Neves (PSD).
Procedeu-se à apreciação do relatório anual sobre a igualdade de oportunidades entre homens e mulheres no trabalho, no emprego e na formação profissional, tendo-se pronunciado os Deputados Elza Pais (PS), Sandra Pereira (PSD), Diana Ferreira (PCP), Ana Rita Bessa (CDS-PP), Sandra Cunha (BE) e André Silva (PAN) e o Secretário de Estado do Emprego (Miguel Cabrita).
O Presidente (José Manuel Pureza) encerrou a sessão eram 17 horas e 36 minutos.
Página 3
4 DE OUTUBRO DE 2017
3
O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, Sr.as e Srs. Funcionários, Sr.as e Srs. Jornalistas, declaro aberta
a sessão.
Eram 15 horas e 5 minutos.
Os Srs. Agentes da autoridade podem abrir as galerias.
Antes de iniciarmos a ordem do dia, vou dar a palavra ao Sr. Secretário Duarte Pacheco, para dar conta do
expediente.
O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): — Sr. Presidente e Sr.as e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e
foram admitidos, as seguintes iniciativas: projetos de lei n.os 613/XIII (3.ª) — Repõe o direito dos funcionários
públicos à reparação pecuniária dos danos resultantes de acidentes de serviço e doenças profissionais (BE),
que baixa à 10.ª Comissão, 614/XIII (3.ª) — Primeira alteração à Lei n.º 78/2017, de 17 de agosto, que cria um
sistema de informação cadastral simplificado e revoga a Lei n.º 152/2015, de 14 de setembro (PSD), que baixa
à 7.ª Comissão, 615/XIII (3.ª) — Altera a Lei n.º 23/2007, de 4 de julho, que aprova o regime jurídico de entrada,
permanência, saída e afastamento de estrangeiros do território nacional (PSD), que baixa à 1.ª Comissão,
616/XIII (3.ª) — Sexta alteração à Lei n.º 23/2007, de 4 de julho, que aprova o regime jurídico de entrada,
permanência, saída e afastamento de estrangeiros do território nacional (CDS-PP), que baixa à 1.ª Comissão,
617/XIII (3.ª) — Primeira alteração à Lei n.º 78/2017, de 17 de agosto, que cria um sistema de informação
cadastral simplificado e revoga a Lei n.º 152/2015, de 14 de setembro (CDS-PP), que baixa à 7.ª Comissão, e
618/XIII (3.ª) — Estabelece procedimentos e objetivos com vista à remoção de produtos que contêm fibras de
amianto ainda presentes em edifícios, instalações e equipamentos de foro privado, incluindo empresas privadas
e habitações particulares (PAN); e projetos de resolução n.os 1063/XIII (3.ª) — Recomenda ao Governo a
eliminação de portagens na Via do Infante e a correção da sinalização horizontal em alguns troços requalificados
da EN125 entre Olhão e Vila do Bispo (BE), que baixa à 6.ª Comissão, 1064/XIII (3.ª) — Recomenda ao Governo
prioridade absoluta na conclusão do IC6, bem como na construção do IC7 e IC37 (CDS-PP), que baixa à 6.ª
Comissão, 1065/XIII (3.ª) — Recomenda ao Governo a implementação de medidas na área da oncologia
pediátrica, promovendo maior apoio e proteção aos menores portadores de doença oncológica e aos seus
cuidadores (CDS-PP), que baixa à 9.ª Comissão, 1066/XIII (3.ª) — Recomenda ao Governo que efetive a
atualização da listagem de materiais que contêm amianto nos edifícios, instalações e equipamentos onde se
prestam serviços públicos e a consequente remoção, acondicionamento e eliminação de todos os respetivos
resíduos (PAN) e 1067/XIII (3.ª) — Recomenda ao Governo que apresente relatório da execução da Resolução
da Assembleia da República n.º 170/2016, de 4 de agosto, e elabore um estudo visando a criação de incentivos
para a remoção do amianto nas instalações de natureza privada com fins comerciais, industriais ou de
armazenamento (PSD).
É tudo, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Obrigado, Sr. Secretário Duarte Pacheco.
Ainda antes de iniciarmos a ordem do dia de hoje, gostaria apenas de vos dizer, Sr.as e Srs. Deputados, que
no domingo, dia 1 de outubro, se realizaram eleições autárquicas, o que é sempre um grande dia para a
democracia, com milhares de candidatos às câmaras municipais, às assembleias municipais e às assembleias
de freguesia. Este ano as eleições registaram um aumento da participação eleitoral, havendo quase mais 200
000 eleitores a votar do que em 2013.
Foram eleitos 2074 cidadãos para as câmaras municipais, 6461 para as assembleias municipais e 27 000
para as assembleias de freguesia. É, de facto, um movimento impressionante de cidadania que não podemos
deixar de valorizar.
Quero aqui saudar, em nome da Assembleia da República, todos os eleitos e todos os que participaram
nestas eleições pelo exemplo que deram de serviço às nossas populações. Quero também desejar a todos os
autarcas que vão entrar em funções os maiores sucessos para um mandato que se adivinha bastante desafiante
para o futuro do poder local democrático. E em especial aos Deputados à Assembleia da República, que, por
via da sua eleição, deixarão o Parlamento, deixo, ao mesmo tempo, os meus agradecimentos e os meus
parabéns.
Página 4
I SÉRIE — NÚMERO 4
4
Aplausos do PS, do BE, do PCP, de Os Verdes e de Deputados do PSD.
Vamos, pois, entrar na ordem do dia cujo primeiro ponto consiste na discussão conjunta dos projetos de lei
n.os 579/XIII (2.ª) — Eliminação do risco de amianto em edifícios, instalações e equipamentos de empresas (Os
Verdes) e 618/XIII (3.ª) — Estabelece procedimentos e objetivos com vista à remoção de produtos que contêm
fibras de amianto ainda presentes em edifícios, instalações e equipamentos de foro privado, incluindo empresas
privadas e habitações particulares (PAN), na generalidade, e dos projetos de resolução n.os 1066/XIII (3.ª) —
Recomenda ao Governo que efetive a atualização da listagem de materiais que contêm amianto nos edifícios,
instalações e equipamentos onde se prestam serviços públicos e a consequente remoção, acondicionamento e
eliminação de todos os respetivos resíduos (PAN) e 1067/XIII (3.ª) — Recomenda ao Governo que apresente
relatório da execução da Resolução da Assembleia da República n.º 170/2016, de 4 de agosto, e elabore um
estudo visando a criação de incentivos para a remoção do amianto nas instalações de natureza privada com
fins comerciais, industriais ou de armazenamento (PSD).
Para apresentar o projeto de lei n.º 579/XIII (2.ª), tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Como é do conhecimento
público, Os Verdes têm colocado na agenda parlamentar, recorrentemente, a matéria do amianto,
designadamente nos edifícios públicos.
Apresentámos uma proposta, que resultou na Lei n.º 2/2011, de 9 de fevereiro, que determinava que o
Governo procedesse a um levantamento dos edifícios públicos com amianto e, consequentemente, criasse
soluções para a sua monitorização e para a sua remoção, salvaguardando, desta forma, a saúde pública de
todos quantos trabalham nesses edifícios públicos.
Também é do conhecimento público que, em 2005, foi completamente proibida a comercialização e a
utilização de amianto no edificado. Ocorre que tudo o que foi construído para trás pode, de facto, conter esta
substância altamente cancerígena e que constitui um verdadeiro perigo para a saúde pública.
Ora, tendo Os Verdes efetuado arduamente esse trabalho do levantamento e das ações corretivas aqui, na
Assembleia da República, relativamente aos edifícios públicos, e tendo o Governo, designadamente o Ministério
do Ambiente, garantido que no ano de 2020 estará concluída a remoção do amianto nos edifícios para onde ela
foi ditada, aquilo que Os Verdes consideram é que estamos em tempo de dar outro passo significativo, em
matéria de eliminação ou erradicação do amianto na nossa sociedade, que se prende, justamente, com os
edifícios, as instalações e os equipamentos de empresas privadas.
Nesse sentido, Os Verdes consideram que a saúde não tem um valor no setor público e outro no setor
privado; daí considerarem que é preciso dar esse passo rapidamente.
Os Verdes entendem que a Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT) deve, juntamente com as
organizações de trabalhadores e com as organizações representativas das entidades patronais, promover esse
levantamento dos edifícios empresariais que contêm amianto e que o Governo, a partir desse levantamento,
tenha também uma mão, digamos assim, no apoio, na orientação das empresas para a candidatura a fundos
comunitários de modo a que essa erradicação possa efetivamente ser conseguida.
Julgamos que, através desta proposta, Os Verdes continuam a dar um verdadeiro contributo para a
salvaguarda da saúde pública e para um combate sério e eficaz à questão do amianto na nossa sociedade, na
medida em que essa substância constitui, de facto, um sério perigo para a saúde pública.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para apresentar o projeto de lei n.º 618/XIII (3.ª) e o projeto de resolução n.º 1066/XIII
(3.ª), tem a palavra o Sr. Deputado André Silva.
O Sr. André Silva (PAN): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Massivamente utilizado na construção
até ao final dos anos 90, o amianto constitui um agente cancerígeno com consequências severas para a saúde,
as quais podem surgir vários anos ou décadas após a exposição.
Página 5
4 DE OUTUBRO DE 2017
5
Encontra-se plenamente assente a relação causal entre a exposição ao amianto e o cancro do pulmão,
demonstrando que a sua frequência é 10 vezes superior em trabalhadores expostos durante 20 anos, ou mais,
do que na população em geral.
Em 2005, a utilização e comercialização de amianto e de produtos que contenham esta fibra foi
expressamente proibida, tendo, em 2011, sido proibida a sua utilização na construção ou requalificação de
edifícios, instalações e equipamentos públicos e instituída a obrigatoriedade de levantamento daqueles.
Por um lado, as premissas legais patentes no diploma de 2011 não foram cumpridas. Neste sentido, o PAN
apresenta um projeto de resolução que visa dar cumprimento à lei, efetivando-se a atualização das listagens de
materiais que contêm amianto nos edifícios, instalações e equipamentos onde se prestam serviços públicos e
na consequente remoção, acondicionamento e eliminação de todos esses materiais perigosos.
Por outro lado, enfatizamos que não existe qualquer informação sobre o número de habitações particulares
e empresas privadas onde existam fibras de amianto, nem qualquer diploma legal concernente a esta matéria.
Como tal, apresentamos também um projeto de lei onde propomos um plano de atuação similar ao que existe
relativamente aos edifícios, instalações e equipamentos públicos, procedendo a um levantamento da presença
de amianto nos edifícios privados, abarcando empresas privadas e habitações particulares, avançando também
com a sua remoção numa fase subsequente.
Complementarmente, propomos que, nos contratos de compra e venda e de arrendamento, seja obrigatório
que os proprietários das habitações particulares prestem informação a todos os eventuais compradores ou
arrendatários da existência de amianto e da previsão do prazo de remoção desses materiais.
Em suma, Sr.as e Srs. Deputados, estamos perante um grave caso de saúde pública, comprovado pela
relação estabelecida entre a exposição ao amianto e o aparecimento de doenças oncológicas do foro
respiratório. Não podemos continuar a negligenciar esta situação.
É necessário concluir rapidamente o processo de remoção do amianto em edifícios públicos, o qual já deveria
estar concluído há vários anos. Precisamos também de ser mais exigentes e responsáveis estendendo esta
obrigação aos edifícios privados, protegendo efetivamente a saúde e a vida de todos.
O Sr. Presidente: — Para apresentar o projeto de resolução n.º 1067/XIII (3.ª), tem a palavra o Sr. Deputado
Bruno Coimbra.
O Sr. Bruno Coimbra (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A preocupação com a perigosidade
do amianto para a saúde pública é algo que já vem de longe e que já foi alvo de diversas iniciativas por parte de
alguns grupos parlamentares.
O PSD teve, aliás, várias iniciativas que visavam, de forma consciente, tecnicamente fundamentada e sem
alarmismos, eliminar o problema da exposição aos materiais que contêm amianto, com especial incidência nos
casos em que a remoção é urgente por se verificar a condição friável do amianto, onde ocorre a libertação de
partículas desta fibra.
Já durante a governação do PSD e do CDS tiveram lugar diversas ações ao nível do levantamento e da
listagem de edifícios e equipamentos públicos com materiais contendo amianto e foram realizadas diversas
ações corretivas, com especial incidência sobre as instalações ligadas ao Ministério da Educação e Ciência.
Mais recentemente, já nesta Legislatura, a Assembleia da República — instada por projetos do PSD e do
Bloco de Esquerda — aprovou a Resolução n.º 170/2016, de 4 de agosto, recomendando a continuação e
conclusão dos processos de identificação e remoção do amianto em estruturas onde sejam prestados serviços
públicos.
Hoje, o Grupo Parlamentar de Os Verdes traz-nos uma preocupação que acompanhamos: a presença de
amianto nos edifícios e equipamentos privados e o risco que isso igualmente representa para as pessoas.
Acompanhamos a preocupação, embora tenhamos algumas reservas acerca do procedimento proposto, melhor
definido no projeto do PAN.
Nesse âmbito, recomendamos ao Governo que proceda à identificação dos edifícios e equipamentos de
natureza privada, de comércio, indústria ou armazenamento, que contenham amianto nos materiais da sua
construção e, ainda, a elaboração de um estudo que vise a criação de incentivos de natureza fiscal ou parafiscal
para a remoção desses mesmos materiais.
Página 6
I SÉRIE — NÚMERO 4
6
Mas, se no âmbito privado estes procedimentos têm de ser iniciados quanto antes, também no âmbito público
os procedimentos estão longe de estar concluídos. Aliás, foi o próprio Ministro do Ambiente que afirmou que a
expectativa é a de que só em 2020 a remoção do amianto presente nos edifícios públicos estará concluída, pelo
que importa acompanhar esta situação e garantir a sua cabal execução.
Desta forma, o Grupo Parlamentar do PSD vem também recomendar ao Governo que apresente à
Assembleia da República, no prazo de 90 dias, um relatório pormenorizado sobre a execução de cada uma das
recomendações constantes da Resolução da Assembleia da República n.º 170/2016, que, recordo, incidia sobre
cinco ações fundamentais: o processo de identificação de amianto em instalações públicas; a priorização e
calendarização das ações de prevenção e controlo de riscos para a saúde pública e para o ambiente,
decorrentes da utilização materiais contendo amianto; a estimativa financeira do investimento a realizar para
proceder a essas mesmas ações; o plano concertado com as autarquias para identificação dos equipamentos
sob sua alçada que contenham materiais com amianto; e a remoção integral do amianto em todos os
equipamentos públicos.
Só assim, com dados concretos acerca dos avanços, a Assembleia da República poderá acompanhar
devidamente a resolução desta problemática.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Manuel Rola, que, antes
de mais, por ser a primeira vez que vai intervir no Plenário, cumprimento.
A Sr.ª Maria Manuel Rola (BE): — Sr. Presidente, quero também cumprimentá-lo, nesta minha primeira
intervenção.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A Diretiva 1999/77/CE, da Comissão, proíbe a utilização de amianto
em todos os Estados-membros desde 1 de janeiro de 2005. Em Portugal, a transposição desta Diretiva apenas
se fez em fevereiro de 2011, seis anos mais tarde.
O Bloco de Esquerda sempre se bateu para que a remoção deste material, identificado como cancerígeno,
fosse célere e, já em 2016, cinco anos depois de ter sido publicada esta legislação e quatro anos após o prazo
de implementação definido, o Bloco de Esquerda lançou uma campanha, juntamente com a Quercus e o
Sindicato dos Trabalhadores em Funções Públicas, para que esta identificação e remoção não tardasse ainda
mais.
Esta campanha passou pela apresentação de um projeto de resolução neste Hemiciclo, que foi aprovado por
unanimidade e que pedia a conclusão da identificação e remoção do amianto nos edifícios públicos, como
definido em 2011.
Vemos a remoção do amianto em todo o edificado em Portugal como uma prioridade e uma urgência. Tendo
em conta que muitas destas construções são da segunda metade do século XX, uma grande parte já estará no
limiar da sua utilização, apresentando um verdadeiro perigo para a saúde de utentes e trabalhadoras que se
veem assim expostas a estas fibras cancerígenas.
Ora, segundo a Quercus, existem pelo menos 6000 edifícios em Portugal que contêm amianto e foram
recebidos vários pedidos de informação sobre a presença do amianto em edifícios privados. Como temos vindo
a dizer sistematicamente, este é um caso de saúde pública e qualidade ambiental urgente. A identificação e
remoção deste material em todo o edificado em Portugal deve ser uma prioridade política, pelo que um plano
nacional estratégico para o amianto, como defende a Quercus, parece-nos uma boa e transversal estratégia
para eliminar de vez este material dos edifícios, assim como para proteger os trabalhadores e trabalhadoras que
a ele foram expostos, nomeadamente nas empresas que produziam amianto e onde foram já identificadas
mortes diretamente relacionadas com a manipulação deste material — referimo-nos à Lusalite, Novinco e
Cimianto.
A remoção do perigo e a proteção das pessoas deve ser garantida em todas as situações.
O mapeamento dos edifícios públicos e a remoção foi orçamentada, finalmente, no Orçamento do Estado
para 2016, sendo esta uma necessidade identificada desde 1999. Vinte anos de exposição identificada a um
material tão perigoso para a saúde pública representa muitos anos de inação do Estado português, que não se
Página 7
4 DE OUTUBRO DE 2017
7
pode considerar admissível. Falta agora resposta para os edifícios privados e para as pessoas que foram
expostas ao longo de anos a este material.
Entendemos que é urgente a resposta política e a generalização e ativação do programa de remoção do
amianto em todo o edificado do território nacional. Estes projetos são, assim, um bom começo, mas há que
aprofundar as medidas e avançar na sua execução.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, foi uma estreia brilhante, respeitando o tempo de que dispunha, além
do interesse do conteúdo da intervenção, evidentemente.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria da Luz Rosinha.
A Sr.ª Maria da Luz Rosinha (PS): — Sr. Presidente e Sr.as e Srs. Deputados, muito boa tarde.
Hoje apreciam-se aqui quatro diplomas, que, em termos finais, têm todos o mesmo objetivo: identificação e
remoção do amianto nos edifícios, instalações e equipamentos em empresas.
Para isso, sobre a questão do amianto em edifícios, vale a pena lembrar que, desde o momento em que o
atual Governo constituiu um grupo de trabalho para apurar a existência deste material em edifícios públicos,
foram sinalizados mais de 2660 estruturas. Este resultado revelou que as diligências levadas a cabo pelo anterior
Governo tinham sido insuficientes, já que a lista elaborada entre 2011 e 2015 assinalava somente 339 estruturas.
Os 2357 edifícios identificados como contendo amianto foram avaliados de forma completa e não apenas
presuntiva. Neste sentido, estabeleceu-se uma priorização das estruturas a intervencionar, tendo-se já resolvido
perto de 200, das cerca de 400 que se assinalaram como urgentes e das quais se destacam os edifícios
escolares.
Este foi um passo determinante relativamente à remoção de materiais contendo amianto nos edifícios onde
se prestam serviços públicos, suportado pela Resolução do Conselho de Ministros do dia 8 de junho, em que se
estabeleceram as regras para se proceder, até 2020, à remoção desses materiais.
Para a concretização destas intervenções, o Governo garantiu que no Plano Nacional de Reformas constasse
uma verba superior a 300 milhões de euros, a ser financiada pelo Banco Europeu de Investimento e pelo Banco
de Desenvolvimento do Conselho da Europa, para erradicar a presença do amianto em edifícios públicos que
sirvam o público.
Erradicar até 2020 o amianto dos edifícios públicos onde se prestam serviços foi o compromisso que o
Governo assumiu e que está a cumprir.
As propostas que hoje os vários partidos apresentam e que se alargam a todos os edifícios onde se
desenvolvem atividades laborais alertam-nos, também, para a necessidade de se proceder ao levantamento dos
edifícios empresariais onde estes materiais estejam presentes.
Concordamos que o Governo estabeleça critérios para que as empresas procedam a essa avaliação nas
suas estruturas, que apresentem um projeto com a respetiva definição de custos e que se possibilite o acesso
a candidaturas a fundos comunitários, no quadro comunitário 2030, para a sua remoção.
Acreditamos, igualmente, que o Governo estará disponível para proceder a uma articulação entre a legislação
existente e a uma simplificação administrativa e a especificar a responsabilidade da implementação das medidas
corretivas em casos onde existam, por exemplo, várias empresas no mesmo edifício, contribuindo, desta forma,
para o respeito e para o valor da saúde de todos os trabalhadores.
O Partido Socialista defende que a exigência aplicada aos edifícios públicos se deve estender aos privados,
tendo em conta que a importância da saúde é igual para todos.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Álvaro Castello-Branco.
O Sr. Álvaro Castello-Branco (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: As iniciativas legislativas
hoje em discussão tratam de um tema muito importante, para não dizer preocupante, que sempre
acompanhámos de perto e que já muitas vezes foi discutido na Assembleia da República.
Página 8
I SÉRIE — NÚMERO 4
8
Ainda muito recentemente foram aprovadas resoluções, por este Parlamento, que tiveram na sua base
projetos de resolução apresentados também pelo CDS, recomendando ao Governo a realização urgente de
obras de reabilitação e de requalificação na Escola Secundária Fernão Mendes Pinto, em Almada, e na Escola
EB 2,3 El-Rei D. Manuel I, de Alcochete, sendo que parte dessas obras incidiam na remoção de todas as placas
de fibrocimento com amianto daquelas instalações.
Todos sabemos que o amianto foi um material utilizado durante muitos anos. No entanto, a partir dos anos
60, foram sendo divulgados estudos que relacionavam diretamente a exposição ao amianto e o contacto com o
mesmo ao cancro do pulmão. E, obviamente, à medida que esses estudos foram sendo lançados essa suspeita
que existia foi sendo confirmada, pelo que, desde essa altura, as autoridades deveriam ter começado a
preocupar-se não só com a utilização mas também com a remoção do amianto, onde ele já existisse.
Em Portugal, legislou-se, pela primeira vez, sobre esta matéria em 1987, a partir daí sucederam-se várias
iniciativas, como é o caso do Decreto-Lei n.º 101/2005, de 23 de junho, do Decreto-Lei n.º 46/2008, de 12 de
março, da Lei n.º 2/2011, de 9 de fevereiro, que foi aprovada por unanimidade por esta Câmara, e, mais
recentemente, da Portaria n.º 40/2014, de 17 de fevereiro, dando resposta a uma obrigação estipulada no
Decreto-Lei n.º 46/2008, de 12 de março.
Neste sentido, o anterior Governo desenvolveu diversas ações ao nível do levantamento e listagem de
edifícios públicos com amianto e efetuou diversas ações corretivas.
Nesta Legislatura, o CDS já por diversas vezes questionou o atual Ministro do Ambiente sobre o
desenvolvimento e a concretização daqueles trabalhos e, apesar de ainda não ter obtido respostas muito
concretas, nomeadamente quanto à calendarização dos trabalhos para a remoção do amianto de todos os
edifícios públicos, tivemos a promessa do Sr. Ministro do Ambiente de que esses trabalhos iriam ser concluídos
até ao ano de 2020.
Parece-nos, sinceramente, pouco para a dimensão deste problema, pois não há qualquer dúvida sobre os
perigos para a saúde pública decorrentes da exposição a este material.
No entanto, e atendendo a tudo o que acabei de referir, o CDS viabilizará todas as iniciativas hoje em
discussão porque, apesar de apresentarem medidas diferentes, têm como objetivo conseguir-se, tão depressa
quanto possível, resolver um problema que se arrasta há demasiado tempo. Esta é a nossa preocupação e,
portanto, tudo o que constitua uma solução, o mais rápida possível, terá o apoio do CDS.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Virgínia Pereira.
A Sr.ª Ana Virgínia Pereira (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: É de extrema importância para
a saúde pública o assunto hoje em discussão.
É sabido que o amianto, pela sua durabilidade e resistência, foi utilizado massivamente em materiais de
construção na segunda metade do século XX, mantendo-se, ainda hoje, em muitas construções públicas e
privadas. É, no entanto, iniludível o perigo que o amianto representa para a saúde e bem-estar das pessoas que
a ele estão expostas, bem como para o ambiente.
É do conhecimento geral, comprovado pelos vastos estudos conhecidos, que a inalação constante de
partículas microscópicas desta fibra natural lançadas para o ar potencia fortemente o risco de doenças
cancerígenas, designadamente o cancro do pulmão, bem como de outras patologias.
Tendo em conta que já estará feita a identificação das instalações públicas que contêm materiais com
amianto, que já se tenha iniciado o processo da sua remoção — aliás, no cumprimento do que está plasmado
na lei —, e que há já um compromisso de que este material será removido na totalidade até ao ano 2020, os
projetos do Partido Ecologista «Os Verdes» e do PAN, na defesa dos direitos dos trabalhadores e da sua não
discriminação nas empresas privadas, designadamente nas micro, pequenas e médias empresas, propõem que
também sejam tomadas medidas para que seja eliminado o risco de amianto, salvaguardando-se as condições
de saúde e de segurança destes trabalhadores.
O PAN foca-se na identificação e remoção de produtos contendo amianto nas habitações particulares, dada
a perigosidade da presença desta fibra natural nas habitações, tendo, em muitas delas, já sido vencido o prazo
Página 9
4 DE OUTUBRO DE 2017
9
de vida útil do amianto, estando este em mau estado de conservação, o que eleva muitíssimo o seu grau de
perigosidade.
É proposta a proibição da utilização de materiais com amianto na requalificação de edifícios e a identificação
de todos eles, com a colaboração da Autoridade para as Condições de Trabalho, das organizações dos
trabalhadores e das associações patronais, e que se proceda, quando necessário, a ações corretivas,
obedecendo às regras de segurança.
O PAN e o PSD recomendam, ademais, que seja atualizada ou concluída a listagem dos materiais que
contêm amianto nos edifícios e instalações onde se prestam serviços públicos e que se proceda às medidas
corretivas e à remoção deste material, quando necessário, para além da identificação dos edifícios, instalações
e equipamentos de cariz privado com a finalidade de se remover o amianto das referidas instalações.
Reafirmamos que, para o PCP, a saúde e a segurança públicas, o bem-estar das populações e dos
trabalhadores, bem como o ambiente, são uma preocupação constante.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para uma segunda intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Desde logo, gostava de
salientar que é muito positivo o facto de todos os grupos parlamentares terem manifestado preocupação e
vontade de podermos agir como Parlamento para que os edifícios das empresas privadas possam também ser
contemplados relativamente à necessidade de fazer o levantamento e a identificação daqueles que contêm
amianto para proceder às ações corretivas.
Levantou-se aqui a questão sobre a metodologia a utilizar para o efeito. Sr.as e Srs. Deputados, aquilo que
Os Verdes apresentam no seu projeto é uma proposta que gostávamos muito de ver depois discutida com o
contributo de todos os grupos parlamentares, em sede de especialidade, sendo que, para nós, há uma questão
que é mesmo inevitável. É que as próprias empresas não podem deixar de estar envolvidas, mas a Autoridade
para as Condições do Trabalho também não pode deixar de estar envolvida, como esteve, de resto,
relativamente aos edifícios públicos. As organizações de trabalhadores e as organizações representativas das
entidades empresariais julgo que também não podem deixar de estar envolvidas, até para que não surjam depois
dúvidas relativamente à questão do levantamento, da identificação dos edifícios, como numa determinada altura
se colocou para os edifícios públicos. E o próprio Governo também não deve ficar de fora relativamente a esta
questão.
O Sr. Presidente: — Peço-lhe que termine, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Vou terminar, Sr. Presidente.
Assim sendo, quanto à metodologia em concreto, podemos evidentemente especificá-la e trabalhá-la melhor,
na especialidade, mas aquilo que importa, de facto, é darmos este passo, em conjunto.
Aplausos de Deputados do PCP.
O Sr. Presidente: — Não havendo mais inscrições, está concluída a discussão conjunta dos projetos de lei
n.os 579/XIII (2.ª) (Os Verdes) e 618/XIII (3.ª), na generalidade, e dos projetos de resolução n.os 1066/XIII (3.ª)
(PAN) e 1067/XIII (3.ª) (PSD).
Vamos passar à reapreciação do Decreto da Assembleia da República n.º 155/XIII — Primeira alteração, por
apreciação parlamentar, ao Decreto-Lei n.º 86-D/2016, de 30 de dezembro, que atribui ao município de Lisboa
a assunção plena das atribuições e competências legais no que respeita ao serviço público de transporte coletivo
de superfície de passageiros na cidade de Lisboa, transfere a posição contratual detida pelo Estado no Contrato
de Concessão de Serviço Público celebrado com a Carris, e transmite a totalidade das ações representativas
do capital social da Carris do Estado para o município de Lisboa.
Tem a palavra o Sr. Deputado Heitor Sousa, do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda.
Página 10
I SÉRIE — NÚMERO 4
10
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, o Sr. Deputado Heitor Sousa está preparado para intervir
mas, como está em cima da mesa uma proposta de alteração, apresentada pelo Partido Socialista, tínhamos
assumido que poderia ser este o primeiro partido a intervir.
Se não estiver inscrito, da nossa parte, não há qualquer problema e o Sr. Deputado Heitor Sousa poderá
intervir desde já.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, mas, até agora, não chegou à Mesa essa informação relativa à proposta
de alteração apresentada pelo Grupo Parlamentar do Partido Socialista.
Certamente, será um erro técnico. Mas faça favor de intervir, Sr. Deputado Luís Moreira Testa.
O Sr. Luís Moreira Testa (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Nesta Câmara, a presente
discussão é recorrente. Foi assim com os STCP (Sociedade de Transportes Coletivos do Porto) e com o Metro
do Porto e é, agora, com a Carris.
Na verdade, no início desta Legislatura, o Governo da República tinha um propósito: evitar a todo o custo,
custasse o que custasse — e, afinal, não custou grande coisa —, o desmantelamento das empresas de
transporte público. Conseguimo-lo a favor dos cidadãos, das comunidades e da prestação do serviço público.
Defendemos as pessoas e as empresas públicas, defendendo o País.
Acolhemos igualmente as prestações e os contributos dos parceiros desta maioria progressista. Na verdade,
as suas preocupações eram legítimas e contribuíram para o aperfeiçoamento dos diplomas do Governo.
Da mesma maneira, acolhemos de forma positiva as preocupações do Sr. Presidente da República e, nessa
medida, conseguimos, na proposta que hoje apresentamos, encontrar um caminho que une estas três vertentes:
por um lado, o compromisso assumido com o Governo, com os portugueses e com País; por outro lado, as
propostas e os contributos dados pelos parceiros desta maioria; e, por último, naturalmente, as preocupações
do Sr. Presidente da República.
É neste sentido, com esta cultura de compromisso, que se faz o caminho. E é no respeito integral pelas
pessoas e pelos cidadãos que hoje estamos aqui.
Conseguimos um bom desiderato para o serviço público, um bom desiderato para as empresas públicas e
um ótimo desiderato para aqueles que são os beneficiários do serviço público de transportes.
Aqui está o nosso compromisso. E, ao contrário do que parece, os Srs. Deputados dos partidos que
suportavam o anterior Governo não perceberam nada disto. Não perceberam nada disto e depois espantam-se
com o resultado que têm no seu confronto com a população. É mesmo por isto que nós, todos os dias,
encontramos cada vez mais apoio da população que é governada por este Governo.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Agora, sim, tem a palavra o Sr. Deputado Heitor Sousa.
O Sr. Heitor Sousa (BE): — Sr. Presidente, quero começar por referir o facto de estarmos aqui, em sede de
Plenário, a discutir, pela segunda vez, um veto político, o segundo veto político do Presidente da República
referente ao mesmo tipo de matéria, que tem a ver com empresas de prestação de serviço de transporte público
e empresas públicas que prestam serviço de transporte público.
O primeiro veto político foi o referente à STCP e o segundo caso, agora, diz respeito à Carris.
Em causa estão as mesmas considerações que o Sr. Presidente da República fez, quer no primeiro quer no
segundo veto político. Ora, foram aqui aprovadas pela maioria dos partidos que apoiam o atual Governo
alterações ao Decreto-Lei no sentido de clarificar as condições da prestação do serviço público de transportes
da Carris na cidade de Lisboa e, também, no sentido de introduzir uma série de componentes que aumentam a
possibilidade de participação dos cidadãos ou de outras empresas prestadoras do serviço de transportes na
Área Metropolitana de Lisboa num conselho geral consultivo que passa a funcionar no quadro normal da
estrutura da Carris. Essas propostas foram aprovadas, na generalidade e na especialidade, aqui, na Assembleia
da República, e já podiam estar em vigor.
Página 11
4 DE OUTUBRO DE 2017
11
Não estão em vigor porque o Sr. Presidente da República resolveu invocar o direito de veto, que tem, um
veto político sobre a possibilidade de o Decreto-Lei impedir qualquer concessão da Carris, mesmo que tal possa
vir a corresponder, um dia, à vontade da autarquia local.
Ora, o Sr. Presidente da República, porventura, não esteve suficientemente atento quando escreveu este
item, porque a concessão da Carris, que data de 21 de dezembro de 1973, tem o prazo de validade de 50 anos
e foi concedida pelo município ao Estado.
Portanto, no caso da concessão da Carris, ao contrário do que acontece com a STCP, já existe uma
concessão do município de Lisboa, que está em vigor e que só termina em 31 de dezembro de 2023.
Assim sendo, este item do veto político do Sr. Presidente da República está um pouco desfocado, porque
não é isso que se passa no caso do Decreto-Lei relativo à Carris, aqui aprovado, e no caso da concessão da
Carris.
Dito isto, o que importa retirar deste veto do Sr. Presidente da República é que ele não escapa à matriz
ideológica de onde o Sr. Presidente da República é originário, o Partido Social Democrata, que, como todos
sabemos e nos lembramos,…
O Sr. Presidente: — Peço-lhe que termine, Sr. Deputado.
O Sr. Heitor Sousa (BE): — … tentou privatizar a Carris e o metropolitano de Lisboa a partir da figura da
subconcessão.
É exatamente contra esta possibilidade que estas alterações foram introduzidas e são aqui reafirmadas pela
proposta de alteração que o Partido Socialista apresenta ao Decreto-Lei aprovado pela Assembleia da República
e com a qual manifestamos o nosso acordo.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Santos Silva.
O Sr. Carlos Santos Silva (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Esteve bem o Sr. Presidente da
República quando vetou este Decreto da Assembleia da República, pois o diploma assentava essencialmente
numa opção ideológica por parte da geringonça,…
Protestos do BE.
… não fundamentando essa posição em nenhum facto concreto, do ponto de vista jurídico, económico ou
financeiro, ou até, nomeadamente, em aspetos funcionais ou organizacionais.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Carlos Santos Silva (PSD): — Registámos, com muito agrado, a posição do PS, nomeadamente do
Deputado Luís Testa, no último debate parlamentar, em que afirmou que iriam proceder a alterações que
acautelavam as preocupações do Sr. Presidente da República.
Vozes do PSD: — Mudou de opinião!
O Sr. Carlos Santos Silva (PSD): — No entanto, o que temos hoje é um PS amarrado à esquerda
parlamentar, à geringonça,…
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Carlos Santos Silva (PSD): — … efetuando uma proposta de alteração que denota que vão insistir na
posição inicial, confirmando as críticas que temos efetuado ao diploma e não acautelando as preocupações do
Sr. Presidente da República.
Página 12
I SÉRIE — NÚMERO 4
12
Trata-se de um diploma que contraria a autonomia do poder local democrático, pondo em causa a sua
independência e funcionamento e intrometendo-se claramente e de forma intolerável na gestão das autarquias.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Se assim fosse, era inconstitucional!
O Sr. Carlos Santos Silva (PSD): — Pois, Sr.as e Srs. Deputados, acontece que, enquanto discutimos este
diploma, a Carris continua a descarrilar, continua a perder passageiros, continua a chegar atrasada. Mesmo
com o crescimento do turismo em Lisboa, a Carris continua a descarrilar.
Os utentes continuam descontentes, reclamam de supressão de carreiras, reclamam de perder horas infinitas
no trânsito, reclamam de viajar como sardinhas em lata. Não param as reclamações!
O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Há quatro carreiras novas!
O Sr. Carlos Santos Silva (PSD): — A passagem da Carris para a Câmara Municipal de Lisboa, na prática,
não veio resolver nada. Assistiu-se a uma mudança de acionista e os utentes já sentem uma diferença, sim,
mas é uma diferença para pior.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Hélder Amaral.
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: É bem verdade que estamos a
discutir esta matéria pela segunda vez. E a primeira questão que se põe é se o Sr. Presidente da República está
errado pela segunda vez ou se acertou pela segunda vez. Em nossa opinião, o Sr. Presidente da República tem
razão duas vezes. E não é um veto ideológico, Sr. Deputado Heitor Sousa, porque, se a esquerda quer manter
a coerência, então, pergunto: afinal qual é o modelo de gestão do Metro do Porto? A gestão do Metro do Porto
está de acordo com aquilo que os senhores propõem, hoje? É evidente que não.
O Sr. Heitor Sousa (BE): — A Carris!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — «Mas o Metro do Porto é diferente da Carris», dirão os senhores. Haja
coerência, Sr. Deputado!
E já não vou dar outros exemplos em câmaras lideradas, inclusive, pelo Partido Comunista Português, em
que também se aceitam privados na gestão da coisa pública. Mas aí os senhores ficarão com as atitudes que
tomam.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Disparate!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Portanto, direi o seguinte: foi perfeitamente consensual a criação das
Autoridades Metropolitanas de Transportes para as autarquias. Acho bem, acho razoável, pois estão mais perto
do problema e gerem melhor. O Governo anterior promoveu um largo envolvimento das autarquias na definição
do serviço público. Tudo isso nos parece correto.
Respeitamos nós a autonomia do poder local? O Partido Comunista Português — seguido pelo Bloco de
Esquerda e pelo Partido Socialista — «rasga as vestes» na defesa da autonomia do poder local mas, depois,
quando, na prática, se respeita a autonomia do poder local, alto que as autarquias não podem! E não estamos
a falar de privatizações, estamos a falar de subconcessões.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — De privatizar o serviço!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — De subconcessões, uma coisa completamente diferente!
Página 13
4 DE OUTUBRO DE 2017
13
E o que é que diz o Partido Comunista Português? Diz: «Aí, não! Aí, as autarquias não podem
subconcessionar a capitais privados, não pode haver privados na gestão, isso é muito grave, tem de ser tudo
público!»
É evidente que há boa gestão e má gestão, quer pública, quer privada. E aí, sim, há um ataque, há um
preconceito ideológico contra os privados, contra os capitais privados e contra a gestão privada.
O que direi é o seguinte: lamento que o PS, a troco do apoio parlamentar, tenha deitado para o lixo toda a
sua história. É que quem privatizou mais no País foram governos socialistas, quem inscreveu mais privatizações
no programa da troica e quem fez mais PPP (parcerias público-privadas) foi o Partido Socialista. Fazendo o
quê? Convidando privados, convidando capital privado e gestão privada para ser um parceiro fiável de um
governo supostamente fiável na gestão da coisa pública.
Nós não temos esse preconceito. Para nós, a necessidade de capital estrangeiro, a necessidade de capital
privado, de boa gestão, de boas práticas é útil para a gestão da coisa pública. Por isso, não estamos de acordo
com as propostas que VV. Ex.as aqui trazem.
A manutenção deste Decreto-Lei significa um atropelo ao poder local, um atropelo àquilo que os senhores
sempre defenderam quanto à autonomia do poder local, um atropelo ao serviço público, um atropelo à qualidade
do serviço, é contra as regras de captação de investimento estrangeiro.
É evidente que percebo isto vindo do Bloco de Esquerda e do Partido Comunista Português. Entre a
autonomia do poder local e um bom serviço público, por um lado, e os sindicatos, por outro, os senhores optaram
pelos sindicatos. É por isso que os senhores mantêm essa posição.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Tal como o PCP já teve oportunidade de
assinalar, este veto político do Presidente da República era esperado. Ele reflete o posicionamento de quem
não aceita que se possa impedir a entrega a privados da Carris ou das suas participadas.
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Tem o Metro do Porto!
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Mas a opção política de salvaguarda de empresas públicas — empresas que
são do Estado porque o seu dono é o povo — é uma opção política que não só é legítima como é, na verdade,
aquela que cumpre efetivamente a defesa do interesse público, a defesa das populações e dos trabalhadores e
a defesa da Constituição da República.
Estamos perante uma atitude e uma posição política do Presidente da República que, ao fim e ao cabo, já
conhecíamos, desde logo, de outro processo legislativo sobre este setor, que tinha a ver, designadamente, com
a Lei da Assembleia da República que veio impedir a privatização da STCP. Tal como então afirmámos, trata-
se de uma opção política e não de quaisquer questões de constitucionalidade ou de legalidade e caem pela
base os argumentos dos Srs. Deputados do PSD e do CDS sobre a autonomia do poder local, nesse sentido.
O Sr. António Filipe (PCP): — Muito bem!
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Este Decreto foi aprovado por maioria na Assembleia da República, no
entendimento de que os transportes públicos — e, em particular, esta empresa e o serviço que presta às
populações — não devem ser objeto de apropriação por grupos económicos. No nosso entendimento, não há
nenhuma razão para que a Assembleia da República não reafirme as opções políticas que estiveram na base
da aprovação em causa, que são justas e necessárias, mesmo aquelas que foram questionadas pelo Presidente
da República.
O que o PCP propõe e defende, por isso, é que se possa legislar no sentido de garantir a proibição da
privatização da Carris e das suas participadas, assim como de salvaguardar as restantes medidas que foram
aprovadas, incluindo as medidas de valorização da contratação coletiva, de inegável importância para os
trabalhadores e o serviço público.
Página 14
I SÉRIE — NÚMERO 4
14
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, de Os Verdes, para uma intervenção.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Depois daquilo que aqui já
se ouviu relativamente à matéria que está agora em discussão, não se pode considerar que fechar a porta à
entrega da Carris a privados é uma opção ideológica mas abrir a porta e empurrar para a entrega da Carris a
privados não é uma opção ideológica.
Trata-se, de facto, de uma opção ideológica e não há problema nenhum, Sr.as e Srs. Deputados. É assim
mesmo! A vida política é feita disso mesmo: de opções políticas que são opções ideológicas. Portanto, o Sr.
Presidente da República, quando fez o veto que fez, quando fez essa opção, fê-lo também de acordo com as
suas opções ideológicas e considerou que, eventualmente, seria importante deixar a porta aberta para a Carris
ser entregue a privados.
Ora, Os Verdes contestam claramente essa lógica e consideram que é importante salvaguardar a gestão
pública de uma empresa desta natureza. De resto, um princípio que Os Verdes têm relativamente aos
transportes é o de que a gestão pública dá sempre melhor garantia aos cidadãos relativamente às suas
necessidades do que a gestão privada, que é feita numa lógica de lucro e, portanto, implica muitas vezes cortes
nas carreiras, cortes nos percursos, fugindo àquelas que são as verdadeiras necessidades da população.
Enfim, é uma questão tão ideológica como a defesa que Os Verdes aqui fizeram intransigentemente da
gestão pública da água. Consideramos que há determinados setores que, de tão estratégicos para a resposta
aos cidadãos e ao desenvolvimento do País, de facto, cabem na gestão pública e não na sua entrega ao setor
privado.
Aplausos de Deputados do PCP.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Testa, do Grupo Parlamentar do PS, para a última
intervenção.
O Sr. Luís Moreira Testa (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O caminho desta discussão espanta-nos
de forma atroz.
Relativamente à autonomia do poder local, quem entrega mais meios, mais capacidade de prestação de mais
serviço não tem confiança e não tem respeito pela autonomia do poder local?! É o que mais temos!
Quem tem preconceitos aqui revela-os relativamente ao seu próprio preconceito quanto à gestão pública da
coisa pública. Depois da fé gorada na gestão privada, esmagada pela gestão da banca, vemos agora o
preconceito contra a gestão pública, não só a gestão pública grosso modo mas também a gestão pública das
autarquias locais.
É curioso, no tempo em que vivemos, depois da noite eleitoral de domingo, percebermos que quem não tem
confiança na sua própria gestão autárquica possa ter tido o resultado que teve. É da vida!
Estamos aqui com respeito pela autonomia do poder local, mas, sobretudo, com confiança no poder local.
O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Luís Moreira Testa (PS): — Quem age assim, manifestando respeito e consideração, atribui meios e
competências. Este é o nosso caminho.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado Carlos Silva, do Grupo Parlamentar do PSD, inscreveu-se agora para
intervir, já depois da última intervenção, feita pelo PS, que é quem propõe a iniciativa de alteração.
Não levantando o Grupo Parlamentar do PS nenhuma objeção, dou a palavra o Sr. Deputado Carlos Silva,
para uma intervenção.
Página 15
4 DE OUTUBRO DE 2017
15
O Sr. Carlos Santos Silva (PSD): — Sr. Presidente, agradeço ao Partido Socialista a compreensão.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: Esta opção não foi só ideológica, foi também eleitoralista, e digo que foi
eleitoralista porque não acautela os interesses de cidadãos desta Área Metropolitana de Lisboa.
Pergunto quais são os direitos dos utentes residentes fora de Lisboa, como, por exemplo, em Almada,
Amadora, Loures, Odivelas, Oeiras, porque esses ainda se sentem mais discriminados pela atuação da Carris.
Para esses a diferença ainda é maior: são discriminados incompreensivelmente pelos descontos que os
residentes em Lisboa têm e a que eles não têm direito.
Protestos da Deputada de Os Verdes Heloísa Apolónia.
O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Os descontos são para todos!
O Sr. Carlos Santos Silva (PSD): — Qual é o mecanismo que permite que os autarcas desses concelhos
possam ter uma palavra a dizer sobre a gestão da Carris no seu território? É que cerca de 40% da operação da
Carris é fora do concelho de Lisboa.
O Sr. António Costa Silva (PSD): — Muito bem!
O Sr. Heitor Sousa (BE): — Não é verdade!
O Sr. Carlos Santos Silva (PSD): — Como é que vai ser possível para esses utentes de fora de Lisboa, dos
concelhos limítrofes, fazerem ouvir a sua voz? Qual é o mecanismo que a geringonça pensou para eles?
Para nós, a Carris tanto pode ser privada como pública, o que conta é que preste um bom serviço público de
transportes, de qualidade, para os utentes. Mantemos a nossa posição, que é a de que a municipalização da
Carris não resolve qualquer problema estrutural da empresa.
Lamentamos ainda que a preocupação deste debate tenha sido a de, a todo custo, impedir a privatização da
Carris e não tenha sido a de garantir a qualidade dos serviços de transportes. Lamento que a esquerda
parlamentar, sobre esta matéria, a da prioridade dos utentes, não tenha tido uma única preocupação, uma única
palavra.
Aplausos do PSD.
Protestos da Deputada de Os Verdes Heloísa Apolónia.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Agora falo eu!
O Sr. Luís Moreira Testa (PS): — Eu dou licença.
O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado Bruno Dias também quer utilizar a mesma prerrogativa e o Grupo
Parlamentar do PS aceita essa vontade.
Assim sendo, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias, para uma intervenção.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, é caso para dizer: agora falo eu! Não era suposto prolongarmos
o debate, mas, perante este desafio do Deputado Carlos Silva, importa fazer duas observações.
Neste caso, uma primeira reação à intervenção que acabámos de ouvir é a de que o Sr. Deputado Carlos
Silva e o PSD enganaram-se no debate. É que na discussão em que está em causa, essencialmente, a questão
da salvaguarda da Carris na esfera pública e a decisão de se impedir a sua privatização, lá vem o Sr. Deputado
Carlos Silva falar da decisão de entregar à Câmara Municipal de Lisboa a Carris, que foi um debate que, salvo
erro, tivemos há uns meses, nesta mesma Sala.
O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — Mantém-se atual!
Página 16
I SÉRIE — NÚMERO 4
16
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Estabelecida que foi a aprovação do normativo da Assembleia que respondia
com as alterações que foi possível alcançar nessa matéria, aparece agora o Sr. Deputado Carlos Silva, pelo
PSD, a omitir e a esquecer e a ignorar aquilo que foi a atuação do seu Governo em todo o mandato anterior,
quando queriam encerrar carreiras de uma forma absolutamente bárbara…
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Bem lembrado!
O Sr. Bruno Dias (PCP): — … na Carris, no metropolitano, em todo o transporte público, inclusivamente nos
mesmos concelhos que acabou de referir. É mesmo caso para dizer que se nós não o conhecêssemos tão bem
até diríamos que estava distraído, Sr. Deputado.
Aplausos do PCP e de Os Verdes.
Entretanto, assumiu a presidência o Vice-Presidente José Manuel Pureza.
O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, muito boa tarde.
Concluímos, assim, a reapreciação do Decreto da Assembleia da República n.º 155/XIII.
Antes de entrarmos no ponto seguinte, informo os Srs. Deputados que deu entrada na Mesa uma proposta
de alteração ao Decreto da Assembleia da República n.º 155/XIII, que será votada amanhã.
Srs. Deputados, passamos agora ao terceiro ponto da nossa ordem de trabalhos, que consta da apreciação
do Relatório Anual de Segurança Interna 2016 (RASI 2016).
Para iniciar o debate, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Administração Interna, Constança Urbano de Sousa.
A Sr.ª Ministra da Administração Interna (Constança Urbano de Sousa): — Sr. Presidente, Ex.mas Sr.as
Deputadas e Ex.mos Srs. Deputados: É, naturalmente, com muito gosto que me encontro aqui, hoje, para uma
breve apreciação do Relatório Anual de Segurança Interna relativo ao ano de 2016, embora este seja da
responsabilidade da Secretária-Geral do Sistema de Segurança Interna, que é a responsável, no fundo, pela
recolha e pelo tratamento dos dados respeitantes a toda a criminalidade registada no nosso País por todos os
órgãos de polícia criminal e não apenas por aqueles que eu diretamente tutelo.
Feito este ponto prévio, gostaria de fazer um breve balanço do RASI 2016, focando três aspetos: os dados
globais mais relevantes, uma análise muito sumária de algumas categorias criminais e a distribuição geográfica
da criminalidade.
Desde 2008 que se verifica no nosso País uma descida muito sustentada da criminalidade registada, quer
da criminalidade geral, que diminuiu, entre 2008 e 2016, qualquer coisa como 21%, quer, dentro desta, da
criminalidade grave e mais violenta, que ainda teve uma diminuição mais expressiva ao longo destes anos, de
32%. Em 2016, esta tendência manteve-se, com uma descida da criminalidade geral participada na ordem dos
7,1%, mais expressiva ainda na criminalidade violenta, que desceu mais de 11%.
Quanto à análise das categorias criminais, gostaria de realçar a descida nos crimes de furto, nas suas mais
diversas formas, com uma variação de -9,6%, bem como nos crimes de roubo, também nas suas diversas
formas, com uma variação de -14%, seguindo, no fundo, a tendência que se tem registado nos últimos anos.
Quanto às subidas, destaca-se uma subida mais expressiva nos crimes de burla, nas suas diversas formas,
com mais de 7%, e nos crimes relativos ao tráfico de estupefacientes, com um maior volume de apreensões e
detenções, o que também tem muito a ver com a pró-atividade policial.
Nos crimes informáticos, ou em meio informático, mantém-se, sem surpresa, a tendência de subida,
registando, no fundo, mais 142 casos em 2016, o que representa uma subida de 21%.
Gostaria de destacar, na criminalidade mais violenta e grave, que é aquela que gera um maior sentimento
de insegurança nas populações, descidas muito significativas no roubo na via pública e no roubo por esticão,
tendo-se registado uma descida de mais de 7% no primeiro e de mais de 24% no segundo. Este é um tipo de
crime que contribui muito para o sentimento de insegurança das pessoas em geral.
Página 17
4 DE OUTUBRO DE 2017
17
Além disso, tivemos descidas muito acentuadas em algumas tipologias de crime, como o roubo a farmácias,
com menos 68%.
Nos roubos em transportes de valores e na extorsão tivemos subidas mais acentuadas.
A violência doméstica continua a ser um fenómeno que é acompanhado com especial atenção. Infelizmente,
não só devido ao constante elevado número de participações, verificou-se em 2016 um ligeiro acréscimo de
1,5% em relação ao ano anterior.
Quanto à delinquência juvenil, que é outro fenómeno que merece destaque, gostaria de realçar a sua descida
muito significativa.
No que concerne à distribuição geográfica, verificou-se, em distritos como Lisboa, Porto, Leiria, Vila Real,
uma descida também muito acentuada da criminalidade.
Só tenho dados provisórios para o primeiro semestre de 2017 em relação ao período homólogo do ano
passado, mas, de acordo com os dados de que disponho, a criminalidade violenta e grave continua a sua
tendência de descida e a criminalidade geral, sem esta tipologia, tem registado um ligeiro aumento, de cerca de
2%, no primeiro semestre de 2017 relativamente ao período homólogo.
No entanto, penso que estes dados…
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Queira fazer o favor de terminar, Sr.ª Ministra.
A Sr.ª Ministra da Administração Interna: — Vou já terminar, Sr. Presidente.
Estes dados confirmam que Portugal continua a ser um país seguro, o terceiro país mais seguro do mundo,
de acordo com os índex internacionais, também graças ao empenho abnegado de todos aqueles profissionais
das várias polícias portuguesas que diariamente zelam pela nossa segurança.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para uma intervenção pelo Grupo Parlamentar do PSD, tem a
palavra o Sr. Deputado José Silvano.
O Sr. José Silvano (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos
Parlamentares, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados: Ao analisar este Relatório que traduz os números da
criminalidade geral, podemos afirmar que contém aspetos positivos e aspetos negativos que traduzem
preocupações para o futuro.
Nos aspetos positivos, assinala-se uma redução de participações de 7,1%, em que a criminalidade violenta
e grave foi reduzida em cerca de 11,6%. Em termos concretos, esta diminuição deveu-se essencialmente ao
decréscimo significativo nos crimes de furto de veículo, de furto de metais preciosos, na condução de veículo
com taxa de álcool igual ou superior a 1,2 g/l e no furto em residência com arrombamento ou chaves falsas.
No que concerne à criminalidade violenta e grave, destacam-se os crimes de roubo na via pública, que
representaram 74,5% do total dos crimes.
Dois aspetos positivos que interessa realçar: a proatividade policial, que fez reduzir significativamente o tipo
de crimes com atuação preventiva e antecipada das polícias, e os programas gerais de prevenção e
policiamento, desde o apoio das crianças ao apoio a idosos, à prevenção rodoviária, etc. É sempre melhor
prevenir do que remediar.
Mas temos de salientar também os aspetos negativos.
O aumento generalizado da criminalidade informática, nomeadamente o crime de sabotagem informática,
que aumentou 140%, e o crime de falsidade informática, que aumentou 58%, e o aumento de 36% dos crimes
de pornografia com menores, que também se destaca nesta tipologia de crimes.
O crime de violência doméstica também aumentou 1,4%. Os crimes em ambiente escolar aumentaram 6,2%,
embora estas ocorrências tenham sido no exterior da sala de aula.
O crime de tráfico de seres humanos aumentou 35,2% e a este aumento estão associadas três grandes
intervenções no âmbito da exploração laboral agrícola, que queremos aqui referir.
Página 18
I SÉRIE — NÚMERO 4
18
Mas, atenção, ultimamente têm surgido notícias que dizem que Portugal é uma nova rota de tráfico de
crianças africanas. Desde março que o SEF (Serviço de Estrangeiros e Fronteiras) detetou cinco vítimas
menores no aeroporto de Lisboa. Há que dar atenção a este crime, especificamente.
O crime de extorsão foi o que mais aumentou em Portugal. Os crimes de maus tratos e de abandono de
animais de companhia, devido à alteração legislativa, também aumentaram significativamente.
No domínio da sinistralidade rodoviária, onde ultimamente foram introduzidas pelo Governo medidas
legislativas, é de realçar o aumento de mortes na estrada em cerca de 35, em igual período do ano anterior. É
urgente perguntar para quando uma avaliação desta medida, que foi uma alteração significativa.
Estes dados, traduzidos em números, devem merecer a nossa atenção e o nosso parecer, para que o
Governo veja bem as alterações estratégicas que tem para os atenuar.
Assim, no tratamento individualizado da criminalidade, o Relatório aborda as ameaças globais à segurança.
Diz o Relatório que, nos últimos anos, têm vindo a ser recebidos e avaliados indícios que dão conta do
agravamento de alguns fatores de risco, alguns já detetados no nosso País.
Em «Orientações Estratégicas para 2017», consta a prioridade de execução da Estratégia Nacional de
Combate ao Terrorismo. Assim, urge perguntar o seguinte: com base nestas preocupações, cada vez mais
atuais, não é necessário e urgente restabelecer a normalidade nos serviços de informação da República
Portuguesa? Para quando a eleição dos órgãos em falta? Para quando a normalização dos serviços do Serviço
de Estrangeiros e Fronteiras nos aeroportos? Para quando a entrada em velocidade cruzeiro do ponto de
contacto?
E, em matéria de atribuição e aquisição da nacionalidade portuguesa, onde se registam aumentos
significativos de pedidos de nacionalidade, não foi arriscado introduzir sucessivas alterações à lei? O SEF
entende que as alterações são más e que o regime anterior era equilibrado.
E na prevenção do combate aos incêndios florestais, a realidade deste ano não merece mais atenção no
planeamento futuro desta prevenção e combate aos fogos?
Mais do que uma análise aos dados recolhidos em 2016, é necessário referir se as orientações estratégicas
apontadas pelo Governo neste Relatório resolvem ou atenuam estas preocupações, que ainda se mantêm na
sociedade portuguesa.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Tem agora a palavra, em nome do Grupo Parlamentar do Partido
Socialista, a Sr.ª Deputada Susana Amador.
A Sr.ª Susana Amador (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos
Parlamentares, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados: A sociedade atual está sujeita a uma complexidade crescente
dos fenómenos criminógenos, o que implica que a segurança seja objeto de trabalho integrado, de reconstrução
e de evolução constante e inteligente, por forma a prevenir e a combater eficazmente a criminalidade e manter
níveis de segurança adequados e elevados, como reflete o Relatório de Segurança Interna de 2016, que hoje
aqui apreciamos. Enquanto bem coletivo de inegável valor social, a segurança pública assume crescentemente
elevada relevância económica.
Sabemos bem que a capacidade de garantir segurança é fonte de desenvolvimento da nossa Pátria.
Portugal é hoje um dos países mais seguros do mundo, de acordo com o Global Peace Index, do Instituto for
Economics and Peace, dado revelador de que o Estado português tem assegurado com competência a defesa
da legalidade democrática e dos direitos dos cidadãos, à luz do artigo 272.º da Constituição.
É assim de inteira justiça elogiar e saudar todos os homens e todas as mulheres que diariamente ao serviço
das forças de segurança e órgãos de polícia criminal — na PSP (Polícia de Segurança Pública), na GNR (Guarda
Nacional Republicana), no SEF, na PJ (Polícia Judiciária), na Autoridade Marítima Nacional e no Sistema de
Coordenação — garantem a ordem, a segurança e a tranquilidade pública de todos os portugueses e de todas
as portuguesas.
Aplausos do PS.
Página 19
4 DE OUTUBRO DE 2017
19
O Relatório de Segurança Interna de 2016 espelha esse mesmo quadro de segurança de largo espectro e
apresenta dados globalmente muito positivos, com os quais nos congratulamos.
A descida sustentada desde 2008, quer da criminalidade geral, que diminuiu 21%, quer dentro da
criminalidade violenta e grave, que diminui uns expressivos 32%, é um sinal inequívoco da eficácia ao longo dos
anos na prevenção, na reinserção e na repressão.
Sublinhe-se, contudo, que em 2015, último ano do anterior Governo, PSD/CDS, a criminalidade geral tinha
voltado a aumentar, mais 1,3%, contrariando a tendência de anos anteriores.
Durante o ano de 2016, ano de inteira responsabilidade do Governo atual, foram registadas menos 25 160
participações, uma redução de 7,1% face a 2015, e a criminalidade violenta e grave apresenta menos 2203
participações, desceu 11,6%.
O número de crimes registados pelas polícias em 2016 é o mais baixo desde que são publicadas estatísticas
pelo Sistema de Segurança Interna, a partir de 2003.
Caros Deputados e Caras Deputadas, estes valores são os mais baixos dos últimos 15 anos, sendo que
ocorrem num contexto exigente de aumento da população nos principais centros urbanos do Porto e de Lisboa,
por força dos números crescentes do turismo.
A criminalidade violenta e grave teve maior expressão em Lisboa, no Porto e em Setúbal, o que, obviamente,
terá reflexos na planificação de segurança nestes territórios.
No âmbito dos crimes contra as pessoas merece particular atenção deste Grupo Parlamentar o crime de
violência doméstica contra cônjuge, que regista um aumento de 1,4% de participações face a 2015, o que ilustra
também o maior reporte das forças de segurança e dos gabinetes dedicados a este crime. Estamos perante um
flagelo que tem levado a diversas alterações legislativas, muitas sob a égide do Partido Socialista, visando mais
eficácia na prevenção e na punição, e que requer novas metodologias preventivas, que estamos a adotar.
Saudamos o número crescente de salas de atendimento à vítima, sendo que quase 65% das esquadras e postos
já disponibilizam este serviço, bem como a política de territorialização e envolvimento dos municípios
portugueses, via protocolos que o Governo tem desenvolvido num contínuo investimento em prol da igualdade.
O combate à violência doméstica é assim um combate de toda a sociedade, sendo que a educação para a
igualdade e cidadania dos nossos jovens será determinante nas nossas escolas para a sua erradicação e para
o combate à violência no namoro que, ao ser desocultada, aumentou o número de participações em ambiente
escolar.
A propósito dos jovens, surge um dado tranquilizador em termos do RASI de 2016, já observado no ano
anterior, que se prende com a diminuição da delinquência juvenil em 22,7% e da criminalidade grupal em 14,9%,
ou seja, os nossos jovens assumem hoje menos condutas desviantes, o que nos permite vislumbrar um futuro
melhor em termos de segurança.
Por último, revemo-nos por inteiro nas Orientações Estratégicas para 2017, que visam: manter o rumo da
descida continuada da criminalidade, apostando nos programas e nas ações específicas de prevenção e
policiamento; reforçar as necessidades operacionais e materiais do setor; promover mais e melhor segurança
rodoviária; assegurar um tratamento prioritário ao nível da prevenção e investigação do crime de tráfico de seres
humanos e imigração ilegal; afirmar uma política de controlo de fronteiras assente nos princípios da
solidariedade, da humanidade e da responsabilidade partilhada, assegurando uma adequada e justa proteção
internacional no quadro da União Europeia aos refugiados, de que muito nos orgulhamos; e melhorar a eficiência
da proteção civil e as condições de proteção e socorro.
Sr.as e Srs. Deputados, num quadro de exigência e de complexidade acrescida do fenómeno criminógeno,
em que as ameaças globais à segurança, como o terrorismo, a ciberameaça e a proliferação de armas químicas
carecem de uma supervisão constante dos sistemas de informação e de uma cooperação internacional eficaz
que avalie de forma permanente a ameaça, dados os fatores de risco existentes e a que Portugal não está
imune, é vital a mobilização de todos para que Portugal continue a ser um País de elevado nível de segurança.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Queira fazer o favor de terminar, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Susana Amador (PS): — Termino de imediato, Sr. Presidente.
A segurança interna, Caros Deputados e Caras Deputadas, constitui uma área essencial para as políticas
públicas que partem do princípio democrático fundamental de que liberdade e segurança revestem dimensões
Página 20
I SÉRIE — NÚMERO 4
20
da dignidade humana e da cidadania. Serão sempre esses os valores em que forjamos o País livre e o País
seguro que nos orgulhamos de ser.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Tem agora a palavra, em nome do Grupo Parlamentar do Bloco
de Esquerda, a Sr.ª Deputada Sandra Cunha.
A Sr.ª Sandra Cunha (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos
Parlamentares, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados: Gostaria de deixar algumas notas muito concretas
relativamente ao Relatório Anual de Segurança Interna de 2016.
Vou começar, evidentemente, pela congratulação pela descida continuada, e que já vem de alguns anos, do
número de participações da criminalidade em geral e da criminalidade violenta e grave, com duas ressalvas,
contudo.
Quando falamos de crimes que aumentam ou de crimes que diminuem, estamos, na realidade, a falar dos
dados da criminalidade participada e, portanto, temos de ter algum cuidado para não extrapolar estes dados
para uma realidade que não sabemos se encontra eco neste número de participações. Por isso, temos de ter
cuidado na extrapolação destes dados para a realidade efetiva.
A segunda ressalva é a de que a tendência de descida uniforme do número de participações encontra uma
exceção na Região Autónoma dos Açores, o que nos deve convocar, em relação a esta matéria, preocupação
e uma atenção especial a esta Região.
Posto isto, o Bloco de Esquerda entende, contudo, como preocupante — apesar da congratulação continuada
dos dados participados — o facto de os crimes contra as pessoas serem continuamente, ano após ano, a
segunda categoria dos crimes com maior frequência e que, dentro desta categoria, especificamente, a violência
doméstica continue a ocupar o segundo lugar, com quase 30% das participações nesta categoria. Houve mais
304 participações de violência doméstica contra cônjuge ou análogo desde 2015.
Destacamos, igualmente, como muito preocupante — aliás, à semelhança dos anos anteriores e, portanto,
indicador de que o que está a ser feito é insuficiente — a taxa de incidência do crime de violência doméstica nas
Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira, que é quase o dobro da taxa no Continente.
As tendências também se mantêm: as vítimas são maioritariamente do sexo feminino, os denunciados
predominantemente do sexo masculino, o grau de parentesco maioritariamente cônjuge/companheiro ou ex-
cônjuge/ex-companheiro.
A violência doméstica persiste, portanto, como um dos principais problemas de segurança no País e com
uma evidente marca de género.
Infelizmente, neste campo específico da violência doméstica, as más notícias não param por aqui: o RASI
dá conta de uma subida de 6% no número de participações por violência no namoro, mais 123 do que no ano
anterior. Sendo certo que este pode ser também um indicador de uma maior predisposição das vítimas para
denunciarem as situações, estes são, contudo, números elevadíssimos que nos devem convocar a todos e a
todas para a mais elevada preocupação e a mais determinada ação.
É necessário intensificar, em articulação com as Regiões Autónomas, com as autarquias e com as escolas,
as campanhas públicas de sensibilização e informação especificamente direcionadas para os públicos mais
jovens, sobre a violência doméstica no namoro, de acordo com o que o Bloco de Esquerda já propôs, numa
iniciativa apresentada em abril deste ano e que foi, aliás, aprovada por unanimidade.
Assim, pergunto, Sr.ª Ministra, o que está programado especificamente pelo Governo para o combate efetivo
a este flagelo da violência no namoro.
Por outro lado, o combate e socorro às vítimas de violência doméstica depende também, todos sabemos, da
capacidade e da preparação especializada das forças de segurança. Registamos com preocupação o aumento
significativo do número de elementos das forças de segurança que cessaram funções de 2015 para 2016, mas,
sobretudo, o facto de os ingressos de novos elementos não suprirem aqueles que saíram. Gostaria, igualmente,
de ouvir a Sr.ª Ministra sobre esta matéria e sobre se estão previstos novos concursos de ingresso para as
forças de segurança e, se sim, para quando.
Página 21
4 DE OUTUBRO DE 2017
21
No que respeita às salas de atendimento às vítimas de violência doméstica, a cobertura continua na ordem
dos 63%. Já houve vários projetos, várias iniciativas que deram entrada nesta Assembleia, que foram discutidos
e aprovados, sobre a necessidade de reforço destas salas de atendimento, pelo que pergunto se isto está a ser
concretizado pelo Governo.
No que respeita à formação e capacitação das forças de segurança, o Bloco de Esquerda apresentou uma
iniciativa, também aprovada em Plenário por unanimidade, que responde com medidas concretas aos dados
que o RASI nos traz, segundo os quais mais de metade dos crimes de violência doméstica ocorre durante as
horas de repouso habitual, noite e madrugada, sendo, portanto, necessário garantir que os elementos das
patrulhas e das equipas que primeiro respondem a estas emergências estejam dotados da formação e das
competências necessárias.
Queria deixar uma última palavra sobre os crimes contra a autodeterminação sexual. O RASI apresenta
dados relativos ao número de detidos e às percentagens das várias tipologias de crime, mas ficamos sem saber
exatamente o número de participações em cada tipologia. As informações são insuficientes e não nos permitem
uma perspetiva de evolução deste tipo de crime. Preocupante, nesta categoria, é o facto de as tipologias com
percentagens mais elevadas se referirem ao abuso sexual de crianças, à pornografia de menores e à violação.
Mais uma vez, o RASI não nos permite perceber a real incidência destes crimes e, portanto, é algo que tem de
ser resolvido. Pergunto, Sr.ª Ministra, qual é a estratégia do Governo para o combate a este tipo de criminalidade,
que é dos mais horrendos no conjunto dos crimes contra as pessoas, e também de que forma o RASI poderá
trazer mais informação sobre a real incidência desta criminalidade.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Tem agora a palavra o Sr. Deputado António Filipe, do PCP.
O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos
Parlamentares, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados: Naturalmente que é motivo de congratulação o facto de o
Relatório de Segurança Interna relativo ao ano de 2016 apontar para uma diminuição geral da criminalidade.
Ao longo de um conjunto significativo de anos, temos aqui discutido as razões para se verificar uma redução
sensível dos índices gerais de criminalidade no nosso País, o que para alguns até poderá ser difícil de explicar,
na medida em que, como se sabe, o número de efetivos das forças policiais continua a ser exíguo e,
reconhecidamente, aquém das respetivas necessidade.
Mas se repararmos nos debates que aqui travámos sobre os relatórios de segurança interna, nomeadamente
nos anos 90, e os elementos de que dispomos hoje, verificamos que houve uma alteração significativa na ordem
jurídica portuguesa, que tem a ver com as alterações na chamada «lei da droga» que se verificaram no final dos
anos 90 e que tiveram um impacto muito significativo.
Se verificarmos os debates sobre os relatórios de segurança interna dos anos 90, constatamos que o maior
fator de crescimento da criminalidade que se verificava nesses anos tinha a ver com a criminalidade associada
à toxicodependência, não apenas no que dizia respeito ao consumo e tráfico de drogas, mas a toda uma prática
de crimes contra o património e contra as pessoas, que estavam relacionados com a toxicodependência, com o
consumo de drogas e com a necessidade de milhares de toxicodependentes — não estou a exagerar —
encontrarem forma de sustentar as suas dependências.
As alterações que se verificaram no nosso País nessa matéria, e que são, aliás, objeto de elogio e estudo
internacional, em muito contribuíram, certamente, para que, ao longo dos últimos anos, se tenha verificado uma
sensível e sustentada diminuição dos índices gerais de criminalidade.
Portanto, com a contribuição que o Grupo Parlamentar do PCP deu para essa alteração legislativa, na qual
depositou muitas esperanças, podemos dizer, hoje, que a convergência que foi possível obter nessa altura —
de que só os partidos de direita se excluíram — permitiu, de facto, que hoje possamos apontar para níveis de
criminalidade diferentes daqueles que existiam.
Risos do Deputado do CDS-PP Telmo Correia.
Página 22
I SÉRIE — NÚMERO 4
22
O Sr. Deputado Telmo Correia ri-se. Acho que tem razão para sorrir, tendo em conta as consequências
positivas dessa alteração legislativa, mas já não tem muita razão para sorrir se se lembrar que o CDS se opôs
a ela.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, obviamente que há preocupações. Os índices que aqui são relatados no que
concerne à violência doméstica apontam para a necessidade de se intensificar o combate a essa forma de
criminalidade, a sua prevenção e, obviamente, também a sua repressão.
A existência de outro tipo de crimes, designadamente novas formas de criminalidade, como a
cibercriminalidade, que vai tendo uma importância cada vez maior, e, obviamente, os números relativos ao tráfico
de seres humanos suscitam a maior das preocupações e há que continuar a dar uma grande atenção à
necessidade de reduzir os índices de criminalidade, porque, apesar de haver uma diminuição, continua a haver,
naturalmente, uma criminalidade significativa, relativamente à qual não nos é permitido baixar a guarda.
Relativamente aos efetivos, há questões que devem ser colocadas: continuamos a verificar que em algumas
forças policiais há uma manifesta exiguidade de efetivos, designadamente no que se refere à Polícia Marítima
e ao SEF. Apesar de no SEF se ter verificado o ingresso de 90 inspetores estagiários em 2016, continua a haver
uma manifesta carência de efetivos, incompatível com as responsabilidades de que este serviço de segurança
está incumbido.
É também com preocupação que vemos que, relativamente a 2016, se verificou um ligeiro aumento de
efetivos na GNR — e quando falo em aumento, falo na diferença entre as saídas e as entradas —, mas há um
grande défice de efetivos na PSP, em que 832 saídas só foram compensadas com 446 entradas, o que significa
uma redução de quase 400 efetivos nesta força de segurança.
Portanto, esta ainda é uma preocupação que temos de manter, até porque a idade relativamente avançada
dos efetivos das forças de segurança, e que vai avançando, obviamente, em termos médios, obriga a um grande
esforço na renovação dos efetivos, particularmente daquelas forças de segurança que têm maiores
responsabilidades, dado o âmbito territorial de atuação, que são a PSP e a GNR. Portanto, esta é uma
preocupação que subsiste.
Já agora, para terminar, diria que não basta elogiar o esforço que estes profissionais fazem no combate à
criminalidade — nunca é demais elogiá-los —, há que compensá-los também pelo seu trabalho e, efetivamente,
a reposição de direitos a estes profissionais não deve ser esquecida. Quando falamos de níveis salariais, da
necessidade de ter atenção aos horários de trabalho, às promoções, não podemos esquecer que estes
profissionais também merecem a melhor das nossas atenções.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Tem a palavra, em nome do Grupo Parlamentar do CDS-PP, o
Sr. Deputado Telmo Correia.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos
Parlamentares, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados: Queria começar por dizer que, de facto, e como sublinhou
agora mesmo o Sr. Deputado António Filipe, eu sorri, mas fi-lo por duas razões que me parecem razoáveis e
interessantes, Sr. Deputado.
Em primeiro lugar, e independentemente da bancada onde nos possamos sentar neste Hemiciclo, a
tendência estrutural, a tendência determinante para que Portugal tenha, há uns anos a esta parte, a
criminalidade a descer e para que essa criminalidade global continue a descer — chegamos aqui com uma baixa
de 7,1% na criminalidade geral participada — é algo que nos deve alegrar a todos e que, obviamente, não
negamos. Não negamos a realidade, achamos positivo e muito relevante, e esta é a primeira razão para sorrir.
Em segundo lugar, o Sr. Deputado António Filipe tenta ver nessa mesma realidade um enorme mérito no
Governo — de resto, ainda bem que há alguém na sua bancada que continua a ver tantos méritos nesta solução
governativa e nesta geringonça, alguém teria de ser! —, mas de facto, como aqui foi dito e a própria Sr.ª Ministra
começou por dizer, esta é uma tendência que vem muito de trás, há muitos anos que assim é. Portanto, não
vale a pena criar a ilusão de que há grandes mudanças e de que houve grandes alterações, porque não foi
assim, Sr. Deputado.
Página 23
4 DE OUTUBRO DE 2017
23
O Sr. António Filipe (PCP): — Anos 90!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Esta é a primeira apreciação e diremos que, globalmente, o Relatório
deixa-nos satisfeitos.
Não obstante, nós, no CDS — eu, o Deputado Nuno Magalhães e outras pessoas da nossa bancada —,
defendemos, há muitos anos, a ideia de que, mesmo numa tendência global positiva, quando há certos tipos de
crime que demostram sinais de aumento ou sinais preocupantes ou alarmantes, eles devem merecer uma
atenção especial.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP) — Muito bem!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Neste Relatório em concreto, podíamos falar no roubo no transporte de
valores, que tem um aumento muito significativo, de resto. Podíamos falar também, ainda que não seja tão
grande como em anos anteriores, no número de assaltos nas bombas de gasolina, como também podíamos
dizer que, apesar de tudo, grande parte da criminalidade violenta diz ainda respeito aos roubos na via pública.
Portanto, há uma grande tendência desse ponto de vista.
Já aqui foi falada, e nós acompanhamos, a questão da violência doméstica e da violência no namoro, que
tem ainda números muito relevantes no nosso País.
Portanto, essas são áreas que, na minha opinião, devem merecer, na estratégia e na resposta do Governo,
uma atenção específica.
Mais concretamente ainda, achamos preocupante — porque é algo que já vem de há uns anos a esta parte,
algo que o CDS tem sempre falado, algo em que o CDS fez propostas concretas — a violência, não tanto no
interior dos estabelecimentos escolares, mas naquilo a que se chama «ambiente escolar», que continua a ser
uma preocupação grande deste Relatório de Segurança Interna. Se algo deve estar protegido é, obviamente,
as nossas crianças e os nossos jovens e se há ambiente, de entre todos, que deve estar protegido é, obviamente,
o ambiente à volta das escolas. Esse é um dado de preocupação.
Por último, Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Sr.as e Srs. Deputados, podíamos perguntar se tudo isto ocorre,
como pretenderiam alguns Srs. Deputados, por uma extraordinária ação do Governo, porque o Governo tem
resolvido e respondido a todas as questões. Eu diria que não e aí mantemos sinais de preocupação muito
grandes.
Se isto ocorre, se a criminalidade continua a diminuir é, em larguíssima medida, como aqui também já foi
dito, e bem, porque há um extraordinário mérito dos homens e das mulheres que estão nas nossas forças de
segurança.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP) — Muito bem!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — É o mérito deles que tem permitido esta baixa continuada, é o mérito de
mulheres e homens que trabalham sem ver, muitas vezes, o seu problema de estatuto resolvido, como sabemos,
que sentem e têm cada vez mais evidentes sinais de descontentamento, que vivem, muitas vezes, sem os meios
suficientes para combater a criminalidade. Soubemos, recentemente, que até na Área Metropolitana de Lisboa
ou na Área Metropolitana do Porto não existem carros, que muitos dos carros estão parados, que o equipamento
é deficiente. Estas são questões que, do nosso ponto de vista, não estão a ser suficientemente resolvidas, como
muitas outras.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr.ª Ministra, eu podia perguntar-lhe em que ponto estamos relativamente
à lei sindical, se vamos ter, se não vamos ter, podia perguntar-lhe o que é que aconteceu. De resto parece ser
um paradigma deste Governo, nas áreas de soberania… Não sabemos nada de Tancos, mas também não
sabemos nada das armas Glock que desapareceram. Já temos conclusões? Já sabemos o que é que se
passou? Não temos conclusões definitivas.
Página 24
I SÉRIE — NÚMERO 4
24
Sr.ª Ministra, reconhecendo que a senhora até reagiu — e bem — a algumas iniciativas e propostas, também
nossas, na área do terrorismo, de que este relatório fala como questão central, pergunto-lhe onde é que está o
plano de segurança do Aeroporto, porque os 90 dias para a sua elaboração, que esta Assembleia aprovou, já
estão ultrapassados e até agora não vemos esse plano terminado. Trata-se de uma questão fundamental, que
é a proteção da nossa fronteira externa.
Segundo notícias recentes que vieram a público, a própria questão dos metadados, onde nós tivemos
impulso, e que, em boa hora, o Governo acompanhou, está também, ainda, carente de regulamentação.
Vi, também, a Sr.ª Ministra anunciar recentemente que a formação seria alargada, e ainda bem, ao
policiamento de proximidade — estou a falar da questão central do terrorismo —, mas há muita coisa ainda por
fazer.
Vamos avançar para o debate orçamental, mas fica-nos a ideia e a preocupação de que nestas áreas há
carências, há despesa por fazer, há meios e há condições, designadamente para os homens e as mulheres das
forças de segurança…
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Queira terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Veja-se a questão dos efetivos e a questão do SEF, que estão por
resolver. E nós esperamos, Sr.ª Ministra, que esta seja a hora de resolver o que o Governo não tem resolvido,
pois essa é a sua obrigação.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado André Silva.
O Sr. André Silva (PAN): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Do Relatório Anual de Segurança Interna
2016 queremos destacar os dados referentes à violência doméstica. Olhando para o panorama dos 20 distritos
de Portugal continental e regiões autónomas, verificamos que as ocorrências de violência doméstica
aumentaram em mais de 50% dos distritos, com um crescimento acentuado em Braga e Portalegre.
É precisamente em Portalegre, em Faro, na Madeira e nos Açores que a taxa de incidência é superior à
média nacional e reforçando um aumento em relação a 2015.
Por seu turno, e em todo o País, 84% das vítimas são mulheres e 86% das pessoas denunciadas são
homens, o que, infelizmente, continua a demostrar que vivemos numa sociedade onde ainda resistem as raízes
que durante anos consolidaram e validaram uma posição de força em que a masculinidade domina.
Sr.as e Srs. Deputados, para o PAN o RASI serve para percebermos em conjunto como prevenir e combater
a criminalidade e a violência, seja através de mecanismos de prevenção, seja através de mecanismos de
denúncia e ação.
Nesse sentido, e tendo em conta o caso específico da violência doméstica, apelamos para que o Governo
dê corpo à urgente recomendação da Assembleia da República, proposta pelo PAN, e que diligencie pela
formação e intercâmbio de conhecimentos dos agentes dos órgãos de polícia criminal, criando melhores
condições para a prevenção, denúncia e atendimento às vítimas, tendo em conta os indicadores sociais do
nosso País.
Estamos perante um crime com gravosas e profundas repercussões nos planos pessoal, familiar, profissional
e social das vítimas em causa, facto que, por si só, é merecedor das devidas e adequadas respostas da nossa
parte.
Outra nota que não podemos deixar de fazer, até porque também revela padrões de violência na nossa
sociedade, diz respeito aos crimes contra animais de companhia.
Segundo o RASI, esta categoria continua a ser parte das quatro mais representativas, tendo-se registado
descidas em praticamente todas as manifestações de violência menos nas relativas aos animais.
Só a GNR realizou 16 622 ações de fiscalização a animais não considerados potencialmente perigosos e
levantou 12 000 autos de contraordenação. Foram participados 1046 crimes de maus tratos contra animais.
Página 25
4 DE OUTUBRO DE 2017
25
Importa sublinhar que estes dados apenas dizem respeito a animais de companhia. Se assim não fosse,
estaríamos perante um número muito superior de participações já que é recorrente a denúncia sobre maus tratos
por exemplo a cavalos ou mais recentemente relativamente ao transporte de animais vivos.
Apesar dos dados evidenciarem uma maior preocupação com os animais, também é verdade que existe um
longo caminho a percorrer, principalmente no que diz respeito ao entendimento de que todos os animais
merecem respeito e serem tratados com dignidade.
Este caminho tem de passar, necessariamente, pela extensão da proteção contra maus tratos a todos os
animais, conferida atualmente apenas aos animais de companhia e isso ainda não aconteceu porque a maioria
dos Deputados da Assembleia da República não quer.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Srs. Deputados, vamos agora passar ao ponto seguinte da nossa
ordem de trabalhos, que consiste na apreciação do relatório final da Comissão Parlamentar de Inquérito à
Recapitalização da Caixa Geral de Depósitos e à Gestão do Banco.
Cada grupo parlamentar dispõe de 3 minutos para intervir.
Como sempre fazemos em debates desta natureza, tem a palavra, em primeiro lugar, o Sr. Presidente
daquela Comissão, o Sr. Deputado Emídio Guerreiro.
O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Presidir a esta Comissão não foi
fácil. O facto de a mesma ter sido constituída por iniciativa de uma minoria deste Parlamento prejudicou os
nossos trabalhos.
Ficou para mim clara a necessidade de rever o regime jurídico dos inquéritos parlamentares, nomeadamente
quando as comissões são criadas ao abrigo do preceito constitucional da proteção dos direitos das minorias. O
regime atual prevê a obrigatoriedade da constituição da mesma, mas as omissões da lei tornam o funcionamento
das mesmas num exercício complexo onde as maiorias torpedeiam os direitos das minorias.
E foi assim que aconteceu, prejudicando não só os trabalhos mas, e sobretudo, a imagem do Parlamento
junto dos cidadãos e a confiança que deve existir entre os eleitos e os eleitores.
Esta Comissão demonstrou outra falha da atual lei. Os poderes de investigação das autoridades judiciais
cometidos às comissões de inquérito foram postos em causa por diversas vezes pelas leituras diversas que,
quer os grupos parlamentares quer as entidades externas, foram fazendo destes mesmos poderes.
E depois a questão dos prazos, num cenário destes, com uma comissão parlamentar de inquérito constituída
potestativamente por uma minoria, e sem o devido consenso em torno da mesma, fomos surpreendidos pela
recorrente utilização de todos os expedientes dilatórios legais que, objetivamente, nos impediram de aceder a
informações determinantes para os trabalhos.
De recurso em recurso, a Caixa Geral de Depósitos, a CMVM, o Banco de Portugal e o Ministério das
Finanças ganharam o tempo suficiente para se furtarem ao dever de prestar as informações solicitadas pelos
diversos grupos parlamentares, e isto apesar de várias decisões judiciais a favor do Parlamento.
E assim se escoaram os prazos previstos para a duração do inquérito sem que tenhamos obtido quer as
decisões dos recursos interpostos quer as informações solicitadas.
Há que criar disposições na lei que permitam às instituições utilizarem os recursos previstos, mas sem colocar
em causa os trabalhos das comissões parlamentares de inquérito.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, foi um exercício difícil, mas que permitiu identificar de forma clara
onde podemos e devemos atuar na revisão do regime jurídico dos inquéritos parlamentares.
Foi difícil, mas não posso deixar de dar uma palavra de apreço aos funcionários e assessores do Parlamento
pelo profissionalismo demonstrado, ao Sr. Deputado relator pelo esforço feito em tempo recorde, bem como a
todos os coordenadores e Deputados que, apesar de tudo, sempre contribuíram para que os trabalhos
decorressem da melhor forma. Mas, sejamos claros, com este figurino legal, as comissões parlamentares de
inquérito de pouco ou nada servem.
Aplausos do PSD e de Deputados do CDS.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Tem, agora, a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado
Relator da Comissão de Inquérito em apreço, o Sr. Deputado Carlos Pereira, do Partido Socialista.
Página 26
I SÉRIE — NÚMERO 4
26
O Sr. Carlos Pereira (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O relatório final da Comissão
Parlamentar de Inquérito à Recapitalização da Caixa Geral de Depósitos constituiu um grande esforço de
escrutínio às razões, de toda a ordem, que conduziram à capitalização do banco público em 2016.
É verdade que esta Comissão Parlamentar de Inquérito viveu momentos atribulados e sofreu vicissitudes
que condicionaram o trabalho final mas, apesar de tudo, foi possível produzir um relatório que traduz a essência
das quase duas dezenas de audições e é o resultado da documentação disponibilizada.
Não há, e julgo relevante aclarar, no conteúdo das conclusões apresentadas, qualquer tentativa de produzir
realidades baseadas em suposições ou qualquer esforço especulativo. Foi um exercício baseado nos factos
apresentados e nas declarações proferidas, como, aliás, não poderia deixar de ser.
Por isso, o relatório apresentado corresponde à atividade de escrutínio desta Comissão Parlamentar de
Inquérito e não traduz nenhuma tentativa de justificar qualquer tese de índole partidária. Esta é, porventura, a
conclusão que faltava mas que não poderia deixar de ser apresentada por dever de defesa de todos os que
contribuíram genuinamente, e de forma responsável, para as conclusões finais, sejam Deputados, sejam
assessores ou sejam as instituições envolvidas.
Já referi várias vezes, e volto a sublinhar, que teria sido importante que as diferentes entidades, a quem foi
solicitada documentação, não tivessem colocado entraves ou mesmo, se preferirem, que os tribunais tivessem
assegurado mais celeridade na garantia da cedência da informação. Ninguém no País compreende que existam
restrições a um escrutínio no quadro da Assembleia da República, desde que cumprindo todos os preceitos
regimentais.
É claro que todos compreendemos os limites e as eventuais consequências à devassa, sem regras e de
proveito puramente partidário, à vida de um banco em funcionamento, mas todos concordam, estou certo disso,
que tão importante como salvaguardar a solidez do banco público, neste caso, é assegurar as mínimas
condições de transparência à atividade parlamentar, não apenas para a credibilização da Assembleia mas,
sobretudo, para salvaguarda do dever de prestação de contas ao povo deste País.
Este esforço de mais transparência por parte das diferentes instituições envolvidas tornaria mais consistente
e eficaz o desenrolar das audições e poderia ter permitido um relatório mais esclarecedor.
É verdade que a controvérsia, logo no início da instalação da Comissão Parlamentar sobre os limites do
objeto não ajudaram ao andamento dos trabalhos, ainda por cima porque este objeto foi sendo alvo de tentativas
de alteração ao longo do processo de inquérito, tornando muito instável o rumo dos trabalhos em curso e
prejudicando todas as tarefas de escrutínio e é, também, relevante apontar a irracionalidade do longo período
de funcionamento desta Comissão de Inquérito, que foi alvo de quatro suspensões e duas prorrogações, fazendo
com que tivesse sido necessário um ano inteiro para ouvir menos de 20 personalidades.
Foi neste quadro que foram desenvolvidos os trabalhos deste relatório, que contou com contributos dos
Grupos Parlamentares do PS, do PCP e do Bloco de Esquerda, que aproveito para agradecer, e que produziu
centenas de conclusões.
Estas conclusões contaram com o voto favorável do PS, do Bloco de Esquerda e do PCP e tiveram o voto
contra do PSD e do CDS.
Com toda a legitimidade, estes partidos, PSD e CDS, consideraram não estar em condições de votar
favoravelmente as conclusões como, por exemplo, a capitalização de 2016, facto essencial que motivou a
Comissão Parlamentar de Inquérito, foi consequência de uma recapitalização da Caixa Geral de Depósitos em
2012 concretizada pelos valores mínimos; a utilização de CoCo com elevada remuneração não favoreceu a
reestruturação da Caixa; a crise do subprime, que se transformou em crise financeira e económica, aprofundou
o incumprimento; a política expansionista do BCE levou à redução de juros e à queda da margem financeira; o
aprofundamento das exigências regulatórias, com necessidades de mais capital; e, não menos importante, os
eventuais erros na concessão de crédito.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Queira terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Carlos Pereira (PS): — Não ficou demonstrado na Comissão Parlamentar de Inquérito o racional do
interesse público da participação da Caixa Geral de Depósitos em alguns projetos do conhecimento público,
como La Seda ou Vale de Lobo e também não se verificou o total e adequado distanciamento da Caixa Geral
Página 27
4 DE OUTUBRO DE 2017
27
de Depósitos de alguns interesses económicos, como se observou na operação Champalimaud, BCP, entre
outros.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Muito obrigado, Sr. Deputado.
O Sr. Carlos Pereira (PS): — Sr. Presidente, peço alguma ponderação.
A Caixa Geral de Depósitos falhou o cumprimento do Plano de Capitalização de 2012, apesar da garantia do
Banco de Portugal, que o banco público tinha condições de o cumprir.
Para terminar, duas observações finais da minha total responsabilidade.
Caso surjam novos elementos que permitam o aprofundamento do escrutínio do objeto desta Comissão
Parlamentar de Inquérito, considero que os partidos devem desencadear todos os mecanismos que assegurem
total clarificação dos factos.
Refiro ainda que o relatório entregue foi concretizado com a garantia do rigor, da entrega e do sentido de
responsabilidade com que encarei este desafio.
Agradeço a todos os contributos e a colaboração prestada.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Sr. Deputado, a Mesa foi particularmente tolerante porque não
há, até agora, inscrições dos restantes grupos parlamentares para intervir. Assim, demos, também, tempo para
que os grupos parlamentares ponderassem inscrever-se para participar, coisa que não acontece até ao presente
momento.
Pausa.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Tiago.
O Sr. MiguelTiago (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PSD e o CDS continuam a querer fazer o
número que fizeram na Comissão Parlamentar de Inquérito à Recapitalização da Caixa Geral de Depósitos e à
Gestão do Banco, no seguimento, aliás, da sua tática de transformar a Caixa numa arma de arremesso partidário
e político, com o prejuízo que isso teve para a Caixa e para a instituição Comissão Parlamentar de Inquérito.
O Sr. AntónioFilipe (PCP): — Exatamente!
O Sr. MiguelTiago (PCP): — Esse prejuízo é da estrita responsabilidade do PSD e do CDS, com ênfase
para o PSD devido ao seu comportamento ao longo dos mais de 12 meses em que funcionou esta Comissão
Parlamentar de Inquérito, período durante o qual o PSD mais não fez do que tentar utilizar a Caixa, corroer a
sua estabilidade e fragilizá-la, amesquinhando, ao mesmo tempo, a figura parlamentar do inquérito e a própria
Assembleia da República.
Era um palco triste aquele que o PSD fazia da Comissão de Inquérito e tem vindo até agora, mesmo através
da intervenção do seu Presidente, que aproveito para saudar, a fazer exatamente o mesmo.
Srs. Deputados, o PCP apresentou várias propostas de alteração a este relatório. Destaco, especialmente,
as relacionadas com o papel das várias gestões da Caixa, as responsabilidades políticas de PS, PSD e CDS ao
longo do tempo na sua gestão, as opções e os compromissos políticos assumidos, mas também a natureza da
supervisão e as imposições da União Europeia e das instâncias europeias perante o que consideramos que
deveriam ser atos correspondentes à soberania nacional, nomeadamente no que toca às condições de
capitalização da Caixa Geral de Depósitos.
Não podemos admitir que a União Europeia imponha à Caixa Geral de Depósitos condições para se
recapitalizar. Ou seja, impõe ao acionista da Caixa Geral de Depósitos condições para se recapitalizar que
jamais imporia a qualquer privado, prejudicando o acionista da Caixa, que é o Estado português, a República
Portuguesa.
Página 28
I SÉRIE — NÚMERO 4
28
O PCP apresentou estas propostas para que pudessem constar do relatório, evidenciando o confronto que
existe entre as imposições europeias e o interesse nacional, nomeadamente no que toca à estabilidade do
sistema financeiro.
Infelizmente, o relatório acabou por não ser aprovado por um golpe administrativo do PSD, que tentou
precipitar a votação, e acabaram por ficar apenas três pontos, pontos nos quais, curiosamente, o PCP se revê
e que votou a favor.
Termino, Sr. Presidente, salientando um desses três pontos, aquele que afirma que a Caixa Geral de
Depósitos deve manter-se como banco público. Srs. Deputados — e porque as máscaras que caem também
precisam de ser relembradas —, o PSD votou contra esse ponto. O mesmo PSD que andava a dizer que, afinal,
não defendia uma Caixa privada é aquele que vota contra um ponto que diz que a Caixa deve ser pública. E
quem vota contra uma Caixa pública quer uma Caixa privada.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Srs. Deputados, a Mesa continua a aguardar inscrições por parte
dos restantes grupos parlamentares.
Não havendo inscrições, a Mesa decidirá, naturalmente, passar ao ponto seguinte, uma vez que não
podemos esperar tanto tempo.
Pausa.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Paulo Correia.
O Sr. JoãoPauloCorreia (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: As minhas primeiras palavras são
para cumprimentar o Sr. Deputado Carlos Pereira, relator desta Comissão de Inquérito, que fez o seu trabalho
de forma séria, empenhada e dialogante na elaboração do relatório que apresentou à Comissão.
O PSD e o CDS usaram esta Comissão Parlamentar de Inquérito para atacar a capitalização pública da Caixa
Geral de Depósitos, defendendo o que sempre sonharam fazer, que é privatizar a Caixa.
Aplausos do PS e do Deputado do PCP Miguel Tiago.
Este ataque permanente à Caixa como banco público é motivado por razões ideológicas e de tática política.
Por razões ideológicas, porque a direita sempre teve o velho sonho de privatizar um conjunto de ativos públicos,
entre os quais a Caixa Geral de Depósitos. Por razões de tática política, porque a direita percebeu que a
capitalização e o fortalecimento da Caixa Geral de Depósitos seriam um bem essencial para o modelo de
crescimento do atual Governo.
Desde a chegada de Pedro Passos Coelho à presidência do PSD que a direita se manifestou logo com a
intenção de privatizar a Caixa Geral de Depósitos. Recordamos, pois, as declarações de Pedro Passos Coelho
no sentido de que era necessário abrir a Caixa a privados ou dispersar parte do capital da Caixa da bolsa de
valores. O anterior Governo, do PSD e do CDS, tudo fez para fragilizar a Caixa e abri-la a privados.
Recordamos a capitalização de 2012 e de 2013, que foi feita pelos mínimos regulatórios. Não prepararam a
Caixa para apoiar urgentemente as pequenas e médias empresas, não prepararam a Caixa para uma recessão
prolongada. O Estado emprestou dinheiro à Caixa Geral de Depósitos, tendo o anterior Governo forçado a Caixa
a pagar 90 milhões de euros de juros por ano ao Estado, sabendo que essa seria uma tarefa difícil para as
administrações da Caixa Geral de Depósitos. Essa foi a razão que levou o ex-administrador da Caixa, o Dr.
Nogueira Leite, a demitir-se, pois não acreditou nesse processo de capitalização.
O anterior Governo escondeu os problemas da Caixa na mesma gaveta que escondeu os problemas do
BANIF, por razões de agenda eleitoral, as legislativas de 2015, e também porque queria provar o que se veio a
descobrir, que tinha pés de barro, que foi a «saída limpa».
Aplausos do PS.
Página 29
4 DE OUTUBRO DE 2017
29
O anterior Governo, como disse há pouco, tudo fez para fragilizar a Caixa Geral de Depósitos com o objetivo
de a poder privatizar. A maior prova de que a direita é contra a capitalização pública da Caixa Geral de Depósitos
é o facto de não ter votado a favor da norma do Orçamento do Estado para 2017 que propunha a capitalização
da Caixa Geral de Depósitos. O CDS absteve-se e o PSD votou contra.
No relatório que foi proposto à Comissão de Inquérito, o ponto apresentado que defendia a Caixa como banco
público teve os votos contra do PSD e do CDS.
Se a Caixa continua a ser um banco público deve-se à alteração de uma maioria parlamentar. Foi esta nova
maioria parlamentar, uma maioria de esquerda e um novo Governo, que impediu a entrada de privados na Caixa
Geral de Depósitos.
Aplausos do PS.
Também não podemos esquecer que foi o sucesso das negociações com Bruxelas e a decisão inédita das
entidades europeias que permitiram a capitalização pública da Caixa Geral de Depósitos, porque uma Caixa
pública e forte significa a consolidação do sistema bancário e do sistema financeiro e são um bem e um ativo
essenciais para a recuperação económica e para o crescimento da nossa economia.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Pinho
de Almeida.
O Sr. JoãoPinhodeAlmeida (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Esta Comissão de
Inquérito tem uma história e obviamente que essa história não é indiferente à avaliação que fazemos da sua
conclusão.
Mas, em primeiro lugar, queria deixar claro algo que aqui ficou das intervenções anteriores, quer a do Sr.
Deputado João Paulo Correia, quer a do Sr. Deputado Miguel Tiago.
O Sr. Deputado João Paulo Correia passou a Comissão toda a defender algo que é falso e que foi várias
vezes desmentido, insistindo numa mentira, que é a de dizer que o CDS é a favor da privatização da Caixa Geral
de Depósitos. Sr. Deputado, não vou perder o meu tempo a dizer isso. Ouça o que disse o Sr. Deputado Miguel
Tiago — nem sequer é uma opinião, é factual — sobre as votações que aconteceram nesta Assembleia da
República.
O CDS não é a favor da privatização da Caixa Geral de Depósitos e com o seu voto demonstrou isso, votando
sempre a favor de tudo o que eram deliberações no sentido de manter a Caixa pública e defendemos até em
que termos é que a queríamos manter. Mas o Sr. Deputado João Paulo Correia gosta de viver na sua ilusão,
traz sempre o seu discurso escrito, mas tem de mudar a redação para que possa coincidir com a realidade e ser
verdadeiro.
Relativamente à Comissão, há duas hipóteses: ou fazemos uma discussão de conclusões como se a
Comissão tivesse sido séria ou denunciamos a farsa que a maioria aqui montou.
Para nós, foi muito claro: o que aconteceu com esta Comissão de Inquérito foi uma imposição, por parte dos
Grupos Parlamentares do PS, do PCP e do BE, de uma maioria de silêncio, de uma maioria de ocultação e de
uma maioria de mentira. O que fizeram foi não permitir que aquilo que os tribunais validaram como competências
do Parlamento chegasse até ao fim.
Tenho comigo a notificação, que este Parlamento recebeu, de declaração de inutilidade superveniente da
lide, algo que eu próprio tinha defendido que iria acontecer quando foi discutido o relatório na Comissão, evidente
para quem reconheceu ao Parlamento poderes para aceder à vergonha da gestão da Caixa durante anos —
empréstimos concedidos sem qualquer critério, favores que foram dados ao banco público…
Aplausos do CDS-PP e de Deputados do PSD.
Página 30
I SÉRIE — NÚMERO 4
30
Srs. Deputados, é muito bonito apregoar que queremos que a Caixa seja pública, mas, então, digam tudo,
digam que querem que a Caixa seja pública para financiar os vossos negócios, e isso nós não queremos. Não
queremos!
Aplausos do CDS-PP e de Deputados do PSD.
Protestos do PS.
Se queriam dizer que não era verdade, deixassem os tribunais cumprir a sua função. Os tribunais disseram
que podíamos aceder à informação. Nós quisemos aceder à informação e os senhores acabaram com a
Comissão.
No momento em que íamos receber a informação e os processos de concessão de crédito, devido à falta de
confiança em relação ao que tinham andado a fazer na Caixa, os senhores acabaram com a Comissão.
O que aconteceu foi vergonhoso. O Parlamento tem poderes que não são poderes de nenhuma maioria, o
Parlamento tem poderes que são do Estado de direito, que são da democracia e que são dos eleitores que em
nós confiaram o seu voto. E os senhores impediram não só que os próprios tivessem acesso à informação, mas
que os outros que não estavam disponíveis para compactuar com essa ocultação também não tivessem acesso
a ela.
Este é o momento negro da democracia portuguesa, esta é uma vergonha do Parlamento português, é um
ataque à democracia e um ataque ao Estado de direito que não pode ser igual para todo o Parlamento, tem de
ficar com a assinatura de quem o cometeu.
O PS, o PCP e o BE traíram o Estado de direito, traíram a democracia representativa, taparam negócios
sujos com a sua ocultação e para sempre serão responsáveis por isso.
Aplausos do CDS-PP e de Deputados do PSD.
O Sr. AntónioFilipe (PCP): — O que acabámos de ouvir foi uma vergonha!
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Moisés
Ferreira.
O Sr. MoisésFerreira (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Antes de mais, cumprimento o Sr.
Deputado relator pelo seu trabalho de elaboração do relatório final.
Gostaria de dizer que, para esse relatório final, o Bloco de Esquerda também contribuiu decisivamente, tendo
apresentado mais de 40 propostas. Portanto, apresentámos mais 40 propostas do que o PSD e o CDS-PP, que
não apresentaram nenhuma. Apesar de agora terem verbalizado muitas coisas, o PSD e o CDS nem sequer
apresentaram propostas de alteração ao relatório.
O BE apresentou, pois, várias propostas, e fê-lo porque a explicação para os resultados operacionais da
Caixa Geral de Depósitos nos últimos anos não pode cingir-se apenas ao subprime ou à política monetária do
BCE. Era preciso tornar explícito no relatório final que houve, durante os últimos anos, interferências políticas,
diretas e claras, na gestão da Caixa Geral de Depósitos.
Desde o caso Champalimaud à venda do Banco Pinto & Sotto Mayor ao BCP, que resultou em prejuízos
para a Caixa, desde a obrigação de alienar o setor segurador, desde nomeações partidárias feitas para a Caixa
Geral de Depósitos, desde Celeste Cardona a Carlos Santos Ferreira, houve interferência política na Caixa Geral
de Depósitos nos últimos anos.
E apresentámos mais de 40 propostas de alteração também porque é claro que houve situações de gestão
que nada tinham a ver com o interesse público. Refiro os empréstimos para compra de ações do BCP, que em
nada beneficiavam a Caixa Geral de Depósitos e que acabaram com o Presidente da Caixa a tornar-se
Presidente do BCP. São situações pouco claras e que devem constar do relatório final.
Refiro também o envolvimento da Caixa Geral de Depósitos em negócios que nada tinham a ver com o
interesse público e que apenas beneficiaram os chamados «promotores privados», como no caso Vale do Lobo.
Página 31
4 DE OUTUBRO DE 2017
31
Refiro ainda a utilização da Caixa Geral de Depósitos como um veículo de resolução para toda a estratégia
de investimento e de prejuízo em negócios em Espanha.
Tudo isso deveria constar do relatório final, tudo isso deveria estar denunciado no relatório final, mas o PSD
e o CDS-PP não quiseram concluir nada disso e chumbaram essas conclusões.
Mas também chumbaram outras conclusões, que diziam que o anterior Governo subcapitalizou a Caixa e
que trouxe mais problemas para o Banco público, que concluíram que o anterior Governo obrigou a Caixa a
vender o seu setor segurador e que sabia, desde o final de 2014, que precisava de mais capital e nada fez.
O PSD e o CDS-PP chumbaram todas e quaisquer conclusões.
Podem ter tentado impedir esta Comissão de Inquérito de concluir o que quer que fosse, mas a verdade é
que os factos são estes e isso nem o CDS-PP nem o PSD conseguirão apagar.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado Carlos Costa Neves.
O Sr. Carlos Costa Neves (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Este é um mau momento para
a Assembleia da República, impedida que foi de exercer o direito, sobretudo o dever, de fiscalizar decisões do
Governo e de sucessivas administrações do banco público.
No dia propício a todas as respostas, constata-se a opacidade e consuma-se o desrespeito pelas mais
elementares prerrogativas da oposição. Debate-se, aliás, um relatório vazio, porque as conclusões da Comissão
de Inquérito não foram sequer aprovadas por falta de comparência de Deputados do Partido Socialista. Debate-
se um relatório que não existe!
Hoje, o Parlamento deveria conhecer o que justificou a volumosa recapitalização de 5000 milhões de euros
— dinheiro dos portugueses —, bem como se tal volume decorreu de compromissos prévios com a
administração de António Domingues.
Hoje, o Parlamento deveria saber se tal necessidade de capital se deveu ou não a atos de gestão
politicamente induzidos ou fraudulentos.
Aplausos do PSD.
O Ministro das Finanças, a administração da Caixa, os Grupos Parlamentares do Partido Socialista, do Bloco
de Esquerda e do Partido Comunista Português tudo fizeram para boicotar o acesso a informação essencial.
Um boicote sistemático, sem disfarce, nem pudor! Ao longo de um ano, tudo foi valendo para disfarçar
compromissos, ocultar factos e evitar o apuramento de responsabilidades, tal era o medo de quem governa do
que se pudesse apurar.
É neste contexto que se dá a inédita demissão do então Presidente da Comissão, Deputado José Matos
Correia, que, com o rigor e a dignidade que são seu timbre, a justificou com as decisões dos partidos de esquerda
que, e cito: «(…) violam a lei, são atropelos à democracia e põem em causa o funcionamento da Comissão de
Inquérito».
Sublinho que o Grupo Parlamentar do PSD atribui a maior importância à informação que, a 20 de junho de
2017, o Tribunal da Relação de Lisboa dirigiu à Comissão Parlamentar de Inquérito relativa a, cito: «(…)
averiguações de factos abstratamente qualificados como integradores de crimes de gestão danosa, previstos e
punidos pelo artigo 235.º, n.º 1, do Código Penal (…)», acrescentando que, torno a citar, «(…) uma parte
substancial dos créditos que resultaram em imparidades foi concedido a partir de 2007.», ou seja, no tempo dos
tais projetos de potencial interesse nacional, os PIN. Recordam-se?
Para impedir o acesso a informação essencial, os partidos que apoiam o Governo foram ao ponto de
precipitar o fim da Comissão de Inquérito, ainda que estivessem em trânsito decisões judiciais, suscitadas pela
própria Comissão e que lhe eram favoráveis, anulando, assim, o papel dos tribunais e do Parlamento, pondo
mesmo em causa a eficácia desta e de futuras comissões parlamentares de inquérito.
Termino, Sr. Presidente, dizendo que, para prevenir tal situação, importa que, em linha com as
recomendações de todas as anteriores comissões de inquérito, nos empenhemos na revisão do Regime Jurídico
dos Inquéritos Parlamentares.
Página 32
I SÉRIE — NÚMERO 4
32
Fica a proposta, Sr.as e Srs. Deputados.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Srs. Deputados, terminamos assim a apreciação do relatório final
da Comissão Parlamentar de Inquérito à Recapitalização da Caixa Geral de Depósitos e à Gestão do banco.
Passamos ao último ponto da nossa ordem de trabalhos de hoje que consiste na apreciação do relatório
anual sobre a igualdade de oportunidades entre homens e mulheres no trabalho, no emprego e na formação
profissional, cabendo 3 minutos a cada grupo parlamentar e um minutos e meio ao Sr. Deputado do PAN.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Elza Pais.
A Sr.ª Elza Pais (PS): — Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Começo por
saudar o Governo pela apresentação deste relatório de progresso sobre a situação dos homens e das mulheres
no trabalho, no emprego e na formação profissional.
Saúdo também, obviamente, a CITE (Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego), a ACT
(Autoridade para as Condições de Trabalho) e outras entidades pela extraordinária, rigorosa e elevada qualidade
deste relatório.
Sabemos que o que não é medido é como se não existisse e, por isso, este é um instrumento fundamental
para se saber o que já foi feito, para se saber o que ainda não foi feito, para se corrigirem desequilíbrios e para
continuarmos a direcionar as políticas públicas para o combate às desigualdades e às discriminações no
trabalho.
Gostaria de deixar uma primeira nota para dizer que a situação das mulheres no trabalho é o reflexo da
situação do País. Por isso, o registo de melhorias significativas na vida das famílias traduz-se em melhorias
significativas na vida das mulheres. Hoje, temos mais 56 500 pessoas empregadas do que em 2015 e a taxa de
desemprego diminuiu significativamente para os 11,4%.
Assim, saudamos o Governo pela aposta que está a fazer em Portugal e pela aposta que está a fazer nas
pessoas.
Mas, apesar destas melhorias significativas, algumas desigualdades persistem em alguns setores,
nomeadamente ao nível salarial, onde as mulheres ganham hoje menos 16,7% do que os homens quando
desempenham trabalho de valor igual, sendo certo que este gap tem vindo a diminuir, e ganham menos quando
são mais qualificadas, o que não quer, contudo, dizer que não se deva apostar na qualificação, antes pelo
contrário, porque, quando são qualificadas, elas veem o seu emprego aumentado dois pontos percentuais
relativamente aos homens.
Também gostaria de saudar as iniciativas que o Governo está a promover nesta matéria e que, brevemente,
serão apresentadas nesta Câmara.
A segunda nota é para dar conta das políticas de conciliação entre a vida profissional, familiar e pessoal que
estão a produzir efeitos bons. Há mais homens a usar estas licenças, nomeadamente a licença de parentalidade
de uso exclusivo dos homens, registando-se um aumento significativo de mais 20%, relativamente a 2015, e um
aumento significativo nestes últimos 10 anos de 34%, ou seja, há 34% de homens a usar esta licença.
Temos, portanto, de continuar a investir nestas políticas para que as carreiras das mulheres não sejam
prejudicadas quando se ausentam do trabalho para tratar dos seus filhos ou das pessoas idosas. Temos de
continuar a investir nestas políticas para que este gap não seja aumentado mas, sim, possa continuar a ser
diminuído.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Queira terminar, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Elza Pais (PS): — Termino, Sr. Presidente, com uma última nota, para dizer que este relatório prova,
mais uma vez, que a Lei da Paridade para as empresas vai ser útil e vai ser necessária para reforçar a liderança
política e não só, também empresarial, das mulheres — aproveito para saudar todas as mulheres eleitas nestas
últimas eleições.
Página 33
4 DE OUTUBRO DE 2017
33
Por último, Sr. Presidente, quero saudar a atividade inspetiva da CITE, que muito tem feito para sublinhar e
dar visibilidade às discriminações, e dizer que a igualdade é uma área estruturante na vida da sociedade e que
a aposta do Governo na igualdade é uma aposta no desenvolvimento e nas pessoas.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Sandra
Pereira.
A Sr.ª Sandra Pereira (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados:
Apreciamos hoje o relatório sobre o progresso da igualdade entre mulheres e homens no trabalho, no emprego
e na formação profissional, relativo ao ano de 2016.
Importa, aqui, referir que no presente relatório constata-se a manutenção de uma elevada taxa de
participação feminina no mercado de trabalho, tendência que tem vindo a observar-se ao longo dos últimos
anos, sendo de 48,8% para as mulheres e de 51,2% para os homens.
A taxa de mulheres empregadas com o ensino superior mantém igualmente a tendência dos últimos anos,
crescendo a maior ritmo do que a dos homens, sendo de destacar que em 2016, no ano transato, 60,2% da
população empregada com o ensino superior é do sexo feminino.
O relatório refere, ainda, que, apesar da elevada taxa de atividade das mulheres no mercado de trabalho,
continua a haver assimetrias na distribuição do emprego sectorial, com alguns ligeiros progressos em setores
com maior predominância masculina. A diferença salarial entre homens e mulheres persistiu em 2016, tendo as
mulheres auferido cerca de 80,3% da remuneração média mensal de base dos homens.
Quando consideradas as desigualdades salariais em função dos níveis de qualificação, constata-se, tal como
nos anos precedentes, que a diferença salarial entre homens e mulheres foi menor na base e maior no topo da
hierarquia.
No âmbito da conciliação da atividade profissional com a vida familiar e pessoal, o número total de horas de
trabalho continuou a ser mais elevado para as mulheres do que para os homens, persistindo, Sr.as e Srs.
Deputados, as desigualdades entre homens e mulheres na partilha de responsabilidades na prestação de
cuidados e no trabalho doméstico não remunerado.
O relatório que hoje apreciamos demonstra que ainda temos um longo caminho para percorrer. Continuamos
a ter assimetrias muito significativas com tímidos progressos que ainda revelam insuficiências e desigualdades
persistentes entre as mulheres e os homens no trabalho e no emprego.
No caso da desigualdade salarial, apesar das mudanças que têm ocorrido, as mulheres continuam a ter
salários médios inferiores aos dos homens, um padrão que não pode deixar de nos preocupar.
Como sabemos, estas matérias, no plano jurídico, nacional e internacional, há muito que estão resolvidas,
mas as disparidades, na prática, continuam a existir.
Por outro lado, temos ainda questões relevantes de disparidades e de segregação profissional em diferentes
setores tradicionalmente com baixa taxa da feminização.
Sr.as e Srs. Deputados, é urgente corrigir estes desequilíbrios. Foi neste sentido que o Grupo Parlamentar do
PSD já apresentou, na Sessão Legislativa anterior, iniciativas com o objetivo de combater as desigualdades
salariais entre homens e mulheres e promover uma maior transparência na política salarial das empresas, na
linha do que tem sido aprovado quer pelo Parlamento Europeu quer pela Comissão Europeia.
Na sequência da iniciativa do Grupo Parlamentar do PSD, foi aprovada, em maio passado, a Resolução da
Assembleia da República n.º 124/2017, que recomenda ao Governo que tome medidas com vista à eliminação
das desigualdades salariais entre homens e mulheres das quais destacamos: a obrigatoriedade de as médias e
grandes empresas privadas procederem à elaboração de uma análise das diferenças salariais entre homens e
mulheres; a implementação de medidas que diminuam a segregação sexual horizontal nos sectores profissionais
onde esta existe; e a intensificação de ações de fiscalização junto das empresas, por parte da ACT, com vista à
deteção da prática de diferenças salariais injustificadas.
Sr.as e Srs. Deputados, agradecemos que o Governo promova, efetivamente, a execução destas medidas
tão relevantes e que foram aprovadas consensualmente por este Parlamento.
Página 34
I SÉRIE — NÚMERO 4
34
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Diana Ferreira para uma
intervenção.
A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O relatório anual sobre a igualdade
de oportunidades entre mulheres e homens no trabalho, no emprego e na formação profissional, com dados
relativos ao ano de 2016, confirma aquilo que o PCP tantas vezes denunciou: a consagração dos direitos em lei
não significa por si só a concretização desses direitos na vida.
Da lei à vida existe a realidade sentida todos os dias nos locais de trabalho e que se caracteriza pela negação
e incumprimento de direitos consagrados na Constituição: o direito de que a trabalho igual corresponde salário
igual; o direito à articulação da vida familiar, pessoal e profissional; e o direito ao emprego com direitos.
Deste relatório destacamos alguns dados: as disparidades salariais persistem, auferindo as mulheres 80%
da remuneração média mensal dos homens e quanto maior é a qualificação profissional maior é a disparidade
salarial entre homens e mulheres; as matérias relacionadas com os horários de trabalho continuam a ser as
principais matérias alvo de parecer e queixas na Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego.
No ano de 2016 deram entrada na CITE 1229 processos de não renovação de contrato de trabalho a mulher
grávida, puérpera e lactante, sendo que sobre estes não está prevista a obrigatoriedade do parecer da CITE.
O PCP tem propostas sobre esta matéria, em discussão na especialidade, na qual defendemos que se torne
obrigatório e vinculativo o parecer da CITE sobre o despedimento e não renovação de contratos de trabalho a
mulheres grávidas, puérperas e lactantes.
Não basta que as entidades patronais informem a CITE, é urgente garantir nestas situações a elaboração de
parecer obrigatório e vinculativo da CITE que assegure que o despedimento não é ilícito.
Parece-nos claramente insuficiente que de um total de 36 000 visitas inspetivas da ACT apenas tenham sido
detetadas 30 infrações e 140 advertências relativas a matéria de igualdade e de não discriminação.
A falta de inspetores e de outros profissionais da ACT e da CITE não podem significar menos fiscalização,
não podem significar a criação de melhores condições para negar e desrespeitar os direitos dos trabalhadores.
É urgente garantir todos os inspetores em falta, todos os meios humanos da CITE que garantam a eficácia
no cumprimento da lei e o respeito pelos direitos dos trabalhadores.
O PCP continuará a intervir e a lutar para que a igualdade seja uma realidade na lei, mas também na vida de
todos os dias.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Ana Rita
Bessa.
A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: O
relatório em apreciação atesta que está a ser feito um caminho calmo, de convergência quanto à presença das
mulheres no mercado de trabalho, embora ainda em clara situação desfavorável em relação às mulheres.
Em 2016, embora o crescimento do emprego feminino tenha sido mais expressivo, a distribuição é ainda
favorável ao género masculino com 51,3% versus 48,7% para as mulheres.
A posição relativa das mulheres no mercado de trabalho tem vindo a melhorar, fruto também da sua crescente
qualificação, e essa tendência tenderá a acentuar-se uma vez que, por exemplo, a taxa de abandono escolar
das raparigas é já igual ao objetivo estabelecido para 2020, de 10%, enquanto que para os rapazes está ainda
na casa dos 17%.
Portanto, o mercado de trabalho está a reagir bem, embora possamos criticar o ritmo a que o faz. Já quanto
à diferença salarial de género, continua a verificar-se, como já aqui foi dito, uma grande disparidade,
particularmente nos quadros superiores, em que as mulheres recebem 72% do salário dos homens.
Interessa perceber por que é que persiste esta disparidade. Uma das razões, para a qual o relatório aponta,
é a dificuldade na conciliação trabalho/família. As mulheres afetam diariamente mais 1 hora e 40 minutos ao
trabalho doméstico e cuidado com a família, sendo que há sete vezes mais mulheres que homens a viverem
sozinhas com crianças a cargo.
Página 35
4 DE OUTUBRO DE 2017
35
O CDS apresentou, nesta Câmara, em 5 de maio de 2016, um conjunto de medidas para a promoção da
natalidade que, de forma indireta, afetariam positivamente a igualdade no emprego. Vários projetos de lei e
projetos de resolução, abrangendo prestações sociais, fiscalidade, regime laboral, habitação e apoio formal na
primeira infância, baixaram, sem votação, à Comissão de Trabalho e Segurança Social e acabaram por ser
rejeitados pelos partidos de esquerda. Tivesse havido maior capacidade de consenso e talvez os dados deste
relatório pudessem começar a ser diferentes.
Trata ainda o relatório da participação das mulheres em lugares de decisão na Administração Pública, no
setor empresarial do estado (SEE) e no setor privado.
Constata-se que o Governo — que assumiu a igualdade de género como medida programática, e ainda bem
— tem falhado na sua própria Casa, uma vez que a Administração Pública replica os padrões de desigualdade
do mercado de trabalho. Tendo escolhido começar por impor quotas às empresas do PSI 20, talvez fosse agora
tempo de cuidar que seja o Estado a dar o exemplo e o contributo, de facto.
Termino com uma nota, à margem, sobre a participação das mulheres em cargos autárquicos. Sendo ainda
cedo para ter todo o panorama, é já possível dizer que apenas foram eleitas 32 mulheres como presidentes de
câmara, mais 9 do que em 2013. Em 308, é um número baixo e, na verdade, não poderia ter sido muito maior,
tendo em conta que os dois maiores partidos autárquicos apresentaram apenas entre 13% a 14% de mulheres
candidatas à presidência.
Talvez nós, os partidos, também possamos fazer melhor.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Sandra
Cunha.
A Sr.ª Sandra Cunha (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Secretária de Estado, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e
Srs. Deputados: Começo por saudar este relatório que nos permite ter uma leitura atual desta realidade e
também uma leitura da evolução sobre a igualdade e as desigualdades entre homens e mulheres no trabalho,
no emprego e na formação profissional.
Este relatório não nos traz muitas novidades em relação àquilo que já sabíamos, que já sabemos e que aqui
temos vindo a falar nos últimos tempos em várias ocasiões.
Temos uma taxa de emprego feminina inferior à dos homens.
Temos uma taxa de feminização mais elevada ainda naquelas atividades tradicionalmente femininas, como
a prestação de cuidados, a saúde e a educação.
Temos uma assinalável assimetria entre homens e mulheres nos cargos de direção e de chefia com,
evidentemente, uma larga maioria dos homens a ocupar estes cargos.
Temos as continuadas diferenças salariais; apesar do princípio «trabalho igual, salário igual», plasmado na
Constituição da República Portuguesa e também no Código do Trabalho, esta disparidade persiste.
Temos a indicação de que — e, mais uma vez, também já sabíamos — quanto mais alto é o cargo maior é a
desigualdade salarial e que quanto maior é a formação profissional e a formação escolar, a qualificação escolar,
mais desigualdade existe.
Neste relatório há um dado que se retira, apesar de não ser referido nele, e apelo a que passe a estar incluído
nele, que tem a ver com as reformas. É preocupante o facto de estas disparidades persistirem ao longo da vida
e, depois, contribuírem para a formação das reformas, contribuindo assim para a persistência da desigualdade
entre homens e mulheres também nesta fase da vida. No contexto europeu, a disparidade nas pensões de
reforma entre homens e mulheres situa-se nos 39%.
Verifica-se a mesma coisa relativamente às associações sindicais, onde os homens estão sempre em maior
representação do que as mulheres na Administração Pública, nos lugares de decisão da Administração Pública,
central, regional e local, no setor empresarial do estado e no setor privado.
A este propósito quero lembrar que a Lei n.º 62/2017, de 1 de agosto, no seu artigo 13.º, prevê o compromisso
do Governo de, até 31 de dezembro deste ano, apresentar uma proposta de lei que defina o regime de
representação equilibrada entre mulheres e homens, aplicando o limiar mínimo de 40% na administração direta
e indireta do Estado e nas instituições de ensino superior públicas, e o limiar mínimo de 33,3% nas associações
públicas.
Página 36
I SÉRIE — NÚMERO 4
36
Esta persistente sub-representação das mulheres nas instâncias do poder político, em todos estes órgãos,
implica um nível de garantia dos direitos políticos das mulheres inferior ao dos homens, constitui um obstáculo
à garantia e à promoção efetiva dos direitos humanos das mulheres e à realização da igualdade efetiva entre
homens e mulheres.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Queira terminar, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Sandra Cunha (BE): — Vou terminar, Sr. Presidente, com uma última nota, que é em relação à
conciliação entre atividade profissional e vida pessoal. Sabemos, e este relatório também nos dá conta disso,
que as mulheres despendem 1 hora e 40 minutos a mais, por dia, do que os homens nestas atividades, com
crianças e pessoas dependentes, e estas desigualdades também afetam de forma penalizadora as mulheres.
Portanto, temos muito trabalho a fazer, temos de fazer mais e melhor nesta matéria.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado André
Silva.
O Sr. André Silva (PAN): — Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: A
desigualdade ilude-nos, dá-nos a volta, apresenta-nos indicadores enganosos, tolda-nos o discernimento.
Não se pode olhar para a desigualdade só de frente, e o relatório anual sobre a igualdade de oportunidades
entre homens e mulheres no trabalho, no emprego e na formação profissional vem provar-nos isso mesmo.
O exercício é este: não podemos olhar para o indicador da qualificação sem olhar para as assimetrias de
representação laboral. Não podemos olhar para a ocupação dos cargos de topo sem olharmos para as
diferenças salariais. Não podemos olhar para a população ativa sem olharmos para o desemprego. Não
podemos falar de atividade profissional sem falarmos de vida familiar e trabalho não pago e não podemos sequer
olhar para a realidade do trabalho, do emprego e da formação profissional sem olharmos para as conceções
sociais sobre papéis e representações de género.
Na balança, entre estes indicadores, pesamos homens e mulheres, e são as mulheres a saírem bem mais
prejudicadas.
Por isso, a nossa missão, enquanto cidadãos e representantes democráticos, não pode terminar quando se
melhora uma percentagem ou quando se aprova uma lei. Não podemos sequer pensar em descansar sobre a
igualdade. A nossa missão consiste em afrontar a desigualdade todos os dias, descobrir todos os seus ângulos
e todos os seus truques e apresentar medidas concretas para a sua erradicação. O PAN assume aqui este
compromisso.
Esperamos, Sr.as e Srs. Deputados e Srs. Secretários de Estado, que os dados apresentados pelo Governo
neste relatório também sirvam para incentivar as restantes forças partidárias a trabalhar nesse sentido.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado
do Emprego, Miguel Cabrita.
O Sr. Secretário de Estado do Emprego (Miguel Cabrita): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Apesar
de consagrado na nossa Constituição, o direito à igualdade entre homens e mulheres, depois de tantos
progressos, as desigualdades persistem ainda na sociedade portuguesa, desde logo no mundo do trabalho e
desde logo em matérias tão fundamentais como os salários.
Tendo como referência o setor privado, sabemos que há 10 anos a disparidade salarial de género era de
18,8%. Em 2015, este gap salarial tinha recuado apenas para os 16,7% — uma assimetria ainda vincada e
acima de tudo uma progressão lenta.
Mais, quando olhamos para os dados do Eurostat, onde considerámos apenas as empresas com 10 ou mais
trabalhadores, o gap salarial é ainda de 17,8%, em 2015, e aumentou mesmo na última década. Este exemplo,
e não é um exemplo de somenos, ilustra bem uma realidade.
No plano jurídico, quer internacional quer nacional, temos hoje instrumentos da maior relevância, mas
continuamos, na prática, a ter assimetrias significativas entre mulheres e homens, assimetrias ao nível da gestão
Página 37
4 DE OUTUBRO DE 2017
37
das empresas, assimetrias no acesso ao emprego, assimetrias de rendimento. Assimetrias que atravessam
igualmente a esfera privada e continuam a convocar a promoção de mecanismos adequados de conciliação do
trabalho e da vida familiar. E, porque estas assimetrias persistem, persiste igualmente a necessidade de
promover ativamente a igualdade entre homens e mulheres, é, aliás, uma tarefa do Estado, inscrita na
Constituição.
O presente relatório reúne um conjunto de indicadores para avaliar os progressos e bloqueios, no que toca
à igualdade de género no mercado de trabalho, sob coordenação da Comissão para a Igualdade no Trabalho e
no Emprego, entidade tripartida que tem a missão específica e insubstituível de promover, com todos os
parceiros sociais, a igualdade e o combate à discriminação entre homens e mulheres.
Como sucede desde 2001, o relatório revela progressos, mas também a existência de desigualdades
significativas entre mulheres e homens que comprometem os princípios da igualdade, da equidade, da
meritocracia, princípios centrais nas sociedades democráticas, e justificam por isso a definição de políticas
públicas para pôr fim às diferenças, ainda existentes, em diferentes domínios.
Desde logo, políticas para promover a igualdade entre mulheres e homens no mercado de emprego, para
efetivar o princípio constitucional de salário igual para trabalho igual e de igual valor e para tornar mais
equilibrada a representação dos sexos em cargos de decisão.
O Governo já está a dar passos concretos nestas frentes. Muito recentemente, mediante proposta do
Governo, foi aprovada, nesta Assembleia, a lei que estabelece um regime de maior equilíbrio entre homens e
mulheres nos órgãos de administração e fiscalização das entidades do setor público empresarial e não apenas
das entidades e empresas cotadas em bolsa.
No mês de maio apresentámos aos parceiros sociais um pacote de medidas da promoção da igualdade
salarial entre mulheres e homens por um trabalho igual ou de valor igual prestado no mesmo empregador. Após
recolha dos contributos dos parceiros sociais o Governo vai prosseguir esta agenda e vai aprovar uma proposta
de lei sobre esta matéria a submeter, ainda este ano, à Assembleia da República.
São medidas e passos concretos. Passos de uma estratégia mais alargada de promoção da igualdade entre
mulheres e homens. Uma estratégia que requer acima de tudo um verdadeiro pacto social e uma base sólida de
informação, para a qual o relatório hoje apresentado é um contributo, para melhor informação da opinião pública
e, naturalmente, para melhor decisão de todos os agentes políticos.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Concluo dizendo que é com o apoio alargado e empenhado desta
Câmara que contamos para novos progressos nesta matéria, também nesta Assembleia, e contamos em nome
das mulheres, dos homens e da igualdade.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Srs. Deputados, concluída a apreciação do relatório anual sobre
a igualdade de oportunidades entre homens e mulheres no trabalho, no emprego e na formação profissional
terminamos a nossa ordem de trabalhos de hoje.
A próxima sessão plenária realizar-se-á amanhã, às 15 horas, com o debate quinzenal com o Primeiro-
Ministro sobre políticas de habitação, ao abrigo da alínea a), do n.º 2, do artigo 224.º do Regimento, cabendo
assim a primeira intervenção do debate ao Primeiro-Ministro.
Seguem-se as votações regimentais no final do debate.
A todas e a todos agradeço a vossa colaboração e desejo a continuação de uma boa tarde.
Está encerrada a sessão.
Eram 17 horas e 36 minutos.
Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.