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Quinta-feira, 5 de julho de 2018 I Série — Número 102

XIII LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2017-2018)

REUNIÃOPLENÁRIADE4DEJULHODE 2018

Presidente: Ex.mo Sr. Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues

Secretários: Ex.mos Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco Idália Maria Marques Salvador Serrão António Carlos Bivar Branco de Penha Monteiro Sandra Maria Pereira Pontedeira

S U M Á R I O

O Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 5

minutos. Deu-se conta da entrada na Mesa da proposta de lei n.º

139/XIII (3.ª), do projeto de lei n.º 934/XIII (3.ª) e dos projetos de resolução n.os 1748 e 1749/XIII (3.ª).

No âmbito de um debate sobre desigualdades territoriais e descentralização, requerido pelo PSD, ao abrigo do artigo 64.º do Regimento, foi discutido e aprovado, na generalidade, o projeto de lei n.º 890/XIII (3.ª) — Cria a comissão independente para a descentralização (PS e PSD). Usaram da palavra, a diverso título, os Deputados António Costa Silva

(PSD), Santinho Pacheco (PS), João Vasconcelos (BE), Paula Santos (PCP), Álvaro Castello-Branco (CDS-PP), Susana Amador (PS), Hélder Amaral (CDS-PP), Manuel Frexes (PSD), Heloísa Apolónia (Os Verdes), Pedro Soares (BE), Emília Cerqueira (PSD), Norberto Patinho (PS), Pedro Alves (PSD), Renato Sampaio (PS) e Berta Cabral (PSD).

Deu-se conta da apresentação da proposta de lei n.º 140/XIII (3.ª), dos projetos de lei n.os 935 a 938/XIII (3.ª) e dos projetos de resolução n.os 1750 a 1752/XIII (3.ª).

O Presidente encerrou a sessão eram 16 horas e 56 minutos.

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O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, Sr.as e Srs. Funcionários, Sr.as e Srs. Jornalistas, vamos dar

início a esta sessão.

Eram 15 horas e 5 minutos.

Peço aos Srs. Agentes da autoridade o favor de abrirem as portas das galerias.

Antes de entrarmos na ordem do dia, peço ao Sr. Secretário Duarte Pacheco o favor de proceder à leitura do

expediente.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e

foram admitidos pelo Sr. Presidente, a proposta de lei n.º 139/XIII (3.ª) — Altera a Lei de combate ao terrorismo,

transpondo a Diretiva (UE) 2017/541, que baixa à 1.ª Comissão; o projeto de lei n.º 934/XIII (3.ª) — Proíbe o

Estado de recorrer à arbitragem como forma de resolução de litígios em matéria administrativa e fiscal (PCP),

que baixa à 1.ª Comissão; e os projetos de resolução n.os 1748/XIII (3.ª) — Recomenda ao Governo o apoio aos

agricultores afetados pelas intempéries ocorridas nas regiões norte e centro do País (CDS-PP), que baixa à 7.ª

Comissão, e 1749/XIII (3.ª) — Pela construção do novo hospital de Barcelos (PS), que baixa à 9.ª Comissão.

O Sr. Presidente: — Podemos então dar início ao debate sobre desigualdades territoriais e descentralização,

uma marcação do PSD ao abrigo do artigo 64.º do Regimento, e à discussão, na generalidade, e eventual

votação no final do debate, do projeto de lei n.º 890/XIII (3.ª) — Cria a comissão independente para a

descentralização (PS e PSD).

Para apresentar a posição do PSD sobre este tema e sobre o referido projeto de lei, tem a palavra o Sr.

Deputado António Costa Silva.

O Sr. António Costa Silva (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O PSD fez recentemente as

suas jornadas parlamentares, na Guarda, com o tema «afirmação e valorização do interior».

A escolha do local, bem no interior de Portugal, e do tema referido foram uma opção política. O interior, os

territórios de baixa densidade, as regiões de convergência merecem muito mais. Merecem um trabalho político

aprofundado e, por isso, entendemos que este debate deve ser obrigatoriamente continuado.

É um debate que merece ser aprofundado. Devem ser denunciados as falhas do Governo, mas também

devem ser apresentadas propostas e iniciativas que apostem definitivamente nas regiões mais frágeis. É por

isso que trazemos novamente este assunto a debate.

As desigualdades territoriais têm de ser obrigatoriamente minimizadas.

Sou eleito por Évora, no Alentejo, e facilmente posso dar o meu testemunho. Basta dar alguns exemplos

fáceis de compreender: sai do Algarve uma viatura de transporte de doentes para Lisboa, desvia o seu percurso

e vai a Évora buscar mais doentes, passando também por Portalegre para ir buscar mais doentes.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Só o que gasta em ISP é para cima de um balúrdio!

O Sr. António Costa Silva (PSD): — Quando a ambulância de transporte está totalmente cheia, segue

diretamente para Lisboa. É como se se tratasse de uma «carga», uma carga humana.

Sim, isto é demasiado grave para ser verdade! É ainda mais grave porque estamos a falar de doentes

oncológicos. Horas e horas de trajeto para doentes gravemente debilitados.

Esta é a triste realidade que vivem as nossas gentes. Esta é uma realidade atual, não é do tempo da troica.

Sr.as e Srs. Deputados, como se sentem estes portugueses, maltratados desta forma? Muitos deles não

dizem nada. Muitos deles calam, apenas escondem gritos de alma. Gritos de alma abafados pela indiferença.

Como se justificam centros de saúde onde chove lá dentro? Como se justifica que dezenas de postos e

extensões de saúde se encontrem em forte degenerescência em muitos dos territórios do interior do nosso

Portugal, muitos deles abandonados?! Alguém consegue explicar esta degradação quando existem, nos

programas operacionais regionais, montantes significativos para resolver estes problemas?

Sim, são os gritos de alma das nossas gentes, que o sentem.

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Como se justifica que uma região como o Alentejo, que representa cerca de 1/3 do território nacional, não

tenha um ortopedista no sistema nacional de saúde? Como se justifica a quase inexistência de ginecologistas,

anestesistas e outras especialidades em todo o interior de Portugal?

Desta forma não se cumpre Portugal!

Como se justificam as madrugadas de espera, pelos nossos idosos, para serem atendidos por um médico

de família que nem sempre aparece?

É deste Portugal que falamos. É deste Portugal de gritos abafados que falamos.

Como se justifica encerrar os postos de correios dos CTT em Viana do Alentejo, Alvito, Vidigueira e

Barrancos, onde não existe mais nenhum num raio de 30 km?

Sr.as e Srs. Deputados: Barrancos fica lá bem num cantinho do Portugal profundo!

Qual a solução para que o serviço público de correio seja cumprido, também, para estes portugueses? Estes

são os mesmos portugueses que já perderam a camioneta da carreira, que perderam o balcão da Caixa Geral

de Depósitos, que perderam a escola da sua infância, que perderam o pouco que lá tinham.

Protestos de Deputados do PS.

Não, não estamos a falar do período da bancarrota, nem do período do memorando, nem do período da

troica. Estamos a falar do «agora». Assim, não se cumpre Portugal.

Como se explica que não se utilizem os fundos comunitários previstos e orçamentados para os equipamentos

sociais? Como se explica que não se utilizem os fundos comunitários previstos e orçamentados para as áreas

de acolhimento empresarial, mas também para as infraestruturas científicas e tecnológicas? Por que é que as

verbas dos programas operacionais das regiões de convergência não são aplicadas e têm uma taxa de execução

de zero?

Estas são áreas decisivas para o desenvolvimento do interior. Porque é que não estamos a aproveitar estes

fundos para as regiões mais frágeis? O litoral não tem nada a ganhar com um País assim, com um País tão

desigual, tão desequilibrado. É preciso mudar. É preciso mudar radicalmente e rápido. E preciso recusar a

máxima de Lampedusa de mudar algo para que tudo fique na mesma. É necessário mudar fortemente!

É fundamental concretizarmos um pacto pelo interior. Fazer um pacto pelo interior é um dever. Propostas

tais como as que foram apresentadas pelo Movimento pelo Interior podem ser fundamentais para mudar a

realidade. Matérias como a fiscalidade, a desconcentração de serviços, as infraestruturas no interior, empresas

no interior são decisivas para alterar o paradigma existente. É nisso em que acreditamos!

Ora, isto só se faz com uma agenda, com um calendário bem definido. Com ação! E é nessa perspetiva que

o PSD é coautor deste projeto de lei, que cria a comissão independente para a descentralização, o qual

representa a vontade política de reforçar a necessidade de uma maior legitimidade democrática de órgãos com

maior proximidade aos cidadãos, implicando, designadamente, a reorganização dos serviços desconcentrados

do Estado, garantindo a coerência territorial e alargando a rede de serviços públicos de proximidade.

Assim, através da presente iniciativa, confere-se corpo à constituição desta comissão, que terá mandato até

julho de 2019 e que será composta por seis personalidades e um coordenador de reconhecida competência e

mérito científico, escolhidos e designados pela Assembleia da República. A sua missão consistirá em proceder

a uma profunda avaliação sobre a organização e funções do Estado, devendo igualmente avaliar e propor um

programa de desconcentração da localização de entidades e serviços públicos, assegurando coerência na

presença do Estado no território, avaliando recursos e meios próprios a transferir.

Pretende-se, ainda, assegurar um programa de auscultação e debate com entidades regionais, em particular

as áreas metropolitanas, as CIM (comunidades intermunicipais), as comissões de coordenação, a Associação

Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) e a ANAFRE (Associação Nacional de Freguesias).

Os estudos a apresentar e o programa de auscultação deverão culminar com a apresentação pela comissão

independente para a descentralização, até julho de 2019, de anteprojetos e programas que serão referencial

para iniciativas legislativas subsequentes que se revelarem necessárias.

Acreditamos que esta será uma das vias que poderá ajudar a mudar estruturalmente Portugal. Foi com

responsabilidade e espírito de missão que o PSD se envolveu nesta iniciativa.

Aplausos do PSD.

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O Sr. Presidente: — A Mesa regista três inscrições para pedidos de esclarecimento, dos Srs. Deputados

Santinho Pacheco, João Vasconcelos e Paula Santos. Como pretende responder, Sr. Deputado?

O Sr. António Costa Silva (PSD): — Em conjunto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Portanto, para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado

Santinho Pacheco.

Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Santinho Pacheco (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Costa Silva, tomei nota das palavras de

remorso que, em representação do PSD, utilizou para descrever as carências do interior, particularmente de

quem as conhece bem, porquanto passou vários anos pelo Governo e a nenhuma deu resposta e solução.

Aplausos do PS.

O Estado, por via dos sucessivos governos e da administração central, nunca soube dar resposta eficaz à

tendência de litoralização do País, em que tudo acontece numa faixa restrita do território.

Só com políticas públicas potenciadoras do investimento bem concebidas e implementadas será possível

tirar o interior da morte lenta a que vem sendo condenado.

Mas políticas públicas, como? Qual a saída que a democracia e o nosso sistema constitucional têm para nos

oferecer?

Não vale a pena fugir à questão. Um País como o nosso, com os velhos vícios do centralismo, que protegem

as áreas mais populosas e eleitoralmente mais apetecíveis, em prejuízo das zonas mais despovoadas, precisa

urgentemente de uma reforma administrativa. A descentralização é um bom começo, uma boa situação

intermédia para uma regionalização que todos defendemos.

Em que é que as diferenças, as assimetrias, entre o litoral e o interior são mais esbatidas, havendo mesmo

áreas em que há vantagem comparativa para os territórios do interior? Na execução das atribuições e

competências das autarquias. É aqui que a diferença se acentua,…

A Sr.ª Susana Amador (PS): — Muito bem!

Sr. Santinho Pacheco (PS): — … no que tem a ver com as infraestruturas básicas, a qualidade de vida, a

cultura e o ambiente.

Quanto mais poder e competências tiverem as autarquias, com os respetivos meios financeiros, maior é o

nivelamento regional entre o litoral e o interior.

A constituição de uma comissão independente para a descentralização, com a missão de proceder a uma

profunda avaliação sobre a organização e as funções do Estado, sobre a desconcentração e a localização de

entidades e serviços, sobre uma presença coerente do Estado no território demonstra prudência e boa-fé por

parte dos promotores da presente iniciativa legislativa, mas é também um sinal claro da não

governamentalização do processo de descentralização.

Descentralizar não é, não pode ser, um negócio entre os municípios, as freguesias e o Governo, um regateio

de verbas e competências.

Andam mal todos os que se rendem a posições unilaterais de algum dos parceiros ou os que condicionam a

sua posição ao entendimento de terceiros. O que importa são os cidadãos e os interesses das pessoas, quem

está em melhor posição para servir o público numa lógica de proximidade e de custo/benefício. Ou a

descentralização é boa para a cidadania ou não serve para nada! Ou responde melhor aos problemas ou, mal

por mal, antes assim.

Termino com uma pergunta ao PSD e ao Sr. Deputado Costa Silva.

Vozes do PSD: — Finalmente!

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Sr. Santinho Pacheco (PS): — O PSD encara a aprovação deste pacote da descentralização como uma via

para atingir o desígnio constitucional da regionalização?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Vasconcelos.

O Sr. João Vasconcelos (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Costa Silva, o PSD agendou para este debate

o tema das desigualdades territoriais e da descentralização. Ou seja, o PSD procura dar a entender à opinião

pública que está a favor do combate às desigualdades territoriais e a sua solução para todas essas

desigualdades é a apresentação de um projeto de lei, subscrito em conjunto com o Partido Socialista, para a

criação de uma comissão independente para a descentralização.

Veja-se bem: este é o grande milagre, a varinha mágica com que estes dois partidos nos presenteiam para

acabar com as desigualdades territoriais.

Mas está o PSD mesmo preocupado com as desigualdades territoriais, que continuam a persistir no nosso

País? É que uma coisa é aquilo que se promete, outra coisa são as ações práticas de quando os senhores foram

Governo.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!

O Sr. João Vasconcelos (BE): — O que fez o PSD quando esteve coligado com o CDS, no Governo anterior?

Agravou de forma violenta, sem olhar a meios, essas desigualdades territoriais, por exemplo, extinguindo, a

régua e esquadro, mais de um milhar de freguesias a nível nacional,…

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Bem lembrado!

O Sr. João Vasconcelos (BE): — … contra as populações, contra os autarcas deste País, o que conduziu a

um agravamento insuportável das suas condições de vida e subtraiu dezenas de milhões de euros às autarquias

no âmbito da Lei das Finanças Locais, que cortou e anulou investimento, que dificultou a vida das pessoas, que

agravou as desigualdades territoriais, sociais, culturais e económicas.

O PSD, de facto, não tem um pingo de vergonha na cara e esquece-se de dizer o que fez nesta área quando

esteve no governo.

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Isso não é linguagem adequada! O senhor está no Parlamento, não está

na rua!

O Sr. João Vasconcelos (BE): — É caso para dizer: «Bem prega frei Tomás, faz como ele diz, mas não

faças como ele faz.»

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!

Protestos de Deputados do PSD.

O Sr. João Vasconcelos (BE): — Quanto à comissão independente para a descentralização, uma espécie

de nado prematuro nascido da relação incestuosa entre PSD e PS, nem a Constituição estes partidos querem

cumprir.

Protestos de Deputados do PSD.

A Constituição é muito clara quanto aos princípios da descentralização de competências: deve ser feita para

autarquias, ou seja, municípios, freguesias e regiões, ou seja, órgãos eleitos diretamente pelas populações.

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Protestos da Deputada do PSD Emília Cerqueira.

E aqui temos um problema fundamental, que é a questão da regionalização, sobre a qual nada se diz, nem

uma palavra. Querem matar de vez, efetivamente, essa regionalização!?

Sr.as e Srs. Deputados, não contem com o Bloco para este peditório. Nós somos, efetivamente, a favor da

descentralização de competências, tal como preconiza a Constituição da República, mas há questões

fundamentais de que não abdicamos.

A transferência de competências e serviços de âmbito universal, como a saúde e a educação, ao ser feita,

degradará inevitavelmente estes serviços. Sabemos que, por muitos milhões que tenham, muitos dos municípios

não têm escala, não têm dimensão e vão sempre dizer que não têm meios, não têm recursos humanos, técnicos,

financeiros, o que levará à externalização de serviços, à concessão e à privatização de serviços, que só

degradará, efetivamente, estes mesmos serviços.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!

O Sr. João Vasconcelos (BE): — Portanto, esta comissão independente para a descentralização mais não

será do que uma faceta para matar ou adiar definitivamente a regionalização e para dar mais força a

comunidades intermunicipais e comissões de coordenação regional, que não são eleitas diretamente pelas

populações.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!

O Sr. João Vasconcelos (BE): — Pergunto-lhe, Sr. Deputado António Costa Silva: o PSD está ou não a

favor da regionalização? É ou não a favor da criação dessas regiões administrativas?

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Paula Santos, do

Grupo Parlamentar do PCP.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado António Costa Silva, em

primeiro lugar, registo sobre a sua intervenção que, apesar de o tema ser desigualdades territoriais e

descentralização, pouco se referiu ao dito — como está designado — processo de descentralização em curso,

sobre o qual o PSD já acordou com o Governo, e que procurou também marcar a agenda do seu antigo parceiro

de coligação, o CDS, que agendou um debate sobre o desenvolvimento do interior para esta sexta-feira.

Registo também sobre a intervenção que o Sr. Deputado fez um conjunto de referências a problemas

concretos no acesso à saúde que persistem num conjunto de regiões mas que foram muito agravados pelo

Governo do Sr. Deputado, do PSD/CDS.

Durante a sua governação, o que vimos não foi a atribuição de transporte não urgente aos doentes que dele

necessitavam, foi a sua retirada.

A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Exatamente!

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — E houve doentes que deixaram de ter acesso aos cuidados de saúde

exatamente porque o seu Governo não lhes atribuiu esse mesmo transporte.

O que vimos foi encerramento de escolas, encerramento de serviços e valências na área da saúde, portagens

nas ex-SCUT, tiraram — veja-se! — um conjunto de serviços públicos das várias regiões e das várias localidades

e até as freguesias extinguiram!

Protestos do Deputado do PSD Pedro Alves.

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E vêm agora falar de desenvolvimento, de preocupações com o interior, de proximidade, quando tudo o que

fizeram foi agravar a vida daquelas populações…

A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — … e contribuir para a desertificação e o despovoamento do nosso País?!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Deputado, gostaria de lhe colocar questões sobre o acordo entre o PSD

e o Governo, em relação ao qual parece haver algum incómodo. É que o PSD vai agora dar a mão ao PS para

o Governo fazer aquilo que não tinha condições para fazer e, por essa via, o PSD, mesmo sem estarem

garantidas as condições para a transferência de competências para as autarquias, vai dar esse mesmo acordo.

Mas sobre essa matéria nada referiu.

Pergunto: os Deputados do PSD estão confortáveis por a proposta de lei de alteração da Lei das Finanças

Locais manter o incumprimento dessa Lei por mais três anos? Estão confortáveis por darem acordo a um

acréscimo de 24 milhões de euros na receita do IVA (imposto sobre o valor acrescentado), que vai contribuir

ainda mais para as assimetrias regionais? É que — veja-se! — dá com uma mão e tira logo com a outra a seguir,

porque essas verbas vão deixar de fazer parte da base de incidência do cálculo para o fundo de equilíbrio

financeiro, que seria distribuído por todos os municípios.

O PSD é responsável por atacar as funções sociais do Estado ao não garantir a sua universalidade e ao

querer espartilhar a política de educação, a política de saúde, a política cultural por 308 municípios com 308

políticas, não garantindo essa mesma universalidade e penalizando as populações, porque esse vai ser o

resultado de se querer transferir competências sem ter os meios para fazer face aos problemas que estão em

cima da mesa de modo a resolvê-los.

Essa será uma responsabilidade do PS e do PSD se avançarem com este processo — ainda por cima numa

perspetiva de 15 dias. Vêm falar de seriedade, de responsabilidade e, depois, em 15 dias querem fechar um

processo com esta dimensão e natureza, com as questões que se colocam do ponto de vista do regime

financeiro das autarquias locais? De facto, fica bem claro quais são os objetivos que estão presentes

relativamente a esta matéria.

Aquilo que está em cima da mesa é, de facto, a penalização das populações, colocando em causa os serviços

públicos e as funções sociais do Estado.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Costa Silva, do Grupo

Parlamentar do PSD.

O Sr. António Costa Silva (PSD): — Sr. Presidente, antes de mais, quero agradecer as questões que me

foram colocadas.

Sr. Deputado Santinho Pacheco, não percebo qual é a parte que não percebeu. Estamos a falar do tempo

atual, não estamos a falar da troica. Aqueles problemas do interior são de agora, são dificuldades que se sentem

agora e que nós, objetivamente, queremos ajudar a resolver, porque o interior não merece ser maltratado. É

pelos portugueses, pelas nossas gentes, que estamos envolvidos neste projeto.

Srs. Deputados, muitos de vós falaram sobre a questão da regionalização. Nós temos um projeto em cima

da mesa — estamos a discuti-lo hoje — em que toda a discussão fica em aberto, e vamos tê-la daqui para a

frente.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Qual é a posição do PSD?

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O Sr. António Costa Silva (PSD): — Vai ser criada uma comissão especificamente para estudar todas as

possibilidades e cada um discutirá à sua maneira e da forma como entender.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Qual é a posição do PSD?

O Sr. António Costa Silva (PSD): — Ao Sr. Deputado João Vasconcelos quero dizer que nós, para falarmos

das nossas gentes, dos portugueses, não precisamos de bombos, basta falar com alma e coração, Sr. Deputado.

O Sr. Pedro Alves (PSD): — Muito bem!

O Sr. António Costa Silva (PSD): — Sabe uma coisa que é curiosa? Ainda ontem, dizia o Sr. Primeiro-

Ministro que a solução da geringonça ganhou um lugar no coração dos portugueses. Portanto, fiquem

descansados, não tenham ciúmes, que nós não temos preocupações nessa matéria.

Sr.ª Deputada Paula Santos, certamente estará preocupada com as poucas câmaras do PCP — será isso,

certamente.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Veja lá o nível desse argumentário!…

O Sr. António Costa Silva (PSD): — Já tivemos um longo debate sobre esta matéria, meses de audições

de dezenas de entidades, não sei o que é que o PCP quer debater mais ainda. Temos é de decidir, temos de

agir, é isso que nos compete.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — A Mesa aguarda as inscrições dos Srs. Deputados. Há vários partidos que ainda não

intervieram, um dos quais é coapresentador da proposta em discussão.

Pausa.

Entretanto, inscreveu-se o Sr. Deputado Álvaro Castello-Branco, do Grupo Parlamentar do CDS-PP, para

uma intervenção.

Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Então, o CDS vai estragar isto e vai-se meter no meio?!

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Afinal quem é o pai da criança?!

O Sr. Álvaro Castello-Branco (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Estamos aqui hoje, uma

vez mais, a discutir uma iniciativa no âmbito do tema da descentralização.

Quando, no passado dia 14 de junho, aqui discutimos iniciativas relacionadas com finanças locais,

nomeadamente a proposta de lei do Governo de alteração à atual Lei das Finanças Locais, o CDS apresentou

um vasto conjunto de críticas relacionadas com a forma como o Governo conduziu o processo relativo à

descentralização de competências para os municípios e, depois, com as opções que verteu no texto da proposta

de lei sobre as finanças locais.

Sim, é certo que, apesar de um caminho, iniciado pelo anterior Governo, de reforço das competências das

autarquias locais, Portugal é, ainda hoje, um dos países mais centralistas a nível de competências concentradas

no poder central.

Sim, existe um largo consenso quanto à necessidade de reforço das competências das autarquias locais

relativamente a áreas tão essenciais como a saúde, a educação, o transporte escolar, a proteção civil, a

valorização e dignificação de equipamentos educativos e muitas outras, privilegiando uma atuação de qualidade

e de proximidade aos cidadãos.

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No entanto, como diversas entidades que foram ouvidas no grupo de trabalho criado para tratar da temática

da descentralização, na Comissão de Poder Local, enfatizaram, é necessária cautela e são necessários estudos,

análises comparativas e uma avaliação profunda relativamente à atuação e competência quer do poder local

quer do central. Atrevo-me a repetir as palavras do Sr. Presidente do Conselho Metropolitano da Área

Metropolitana de Lisboa, que afirmou, quanto a esta reforma, que — e cito — «mais vale demorar um pouco

mais, de uma maneira mais consistente e mais estudada, do que tentar fazer num ano aquilo que outros países

levaram 40 anos a fazer».

Ora, decorreu um ano sobre estas afirmações. É certo que o Governo já deu entrada nesta Assembleia de

uma proposta de alteração da Lei das Finanças Locais, mas esta foi capaz de merecer diversas críticas dos

vários partidos políticos, com exceção do Partido Socialista.

É certo que compete a esta Assembleia aprovar quer a lei-quadro da transferência de competências quer as

alterações à Lei das Finanças Locais, mas é óbvio que o trabalho inicial, os estudos, as estimativas, os dados

objetivos, tudo isto, tem de ser desenvolvido e entregue pelo Governo e, Sr.as e Srs. Deputados, tal não

aconteceu.

Aqui chegados, estamos hoje a discutir, concretamente, um projeto de lei, apresentado pelo PSD e pelo PS,

que prevê a criação de uma comissão independente para a descentralização. Esta iniciativa decorre de um

acordo estabelecido entre o PSD e o Governo relativamente a este tema.

A comissão a criar terá por missão «proceder a uma profunda avaliação independente sobre a organização

e funções do Estado» aos níveis regional, metropolitano e intermunicipal, pretendendo também «assegurar um

programa de auscultação e debates públicos com entidades regionais, em particular as áreas metropolitanas,

as comunidades intermunicipais, as comissões de coordenação e desenvolvimento regional, a Associação

Nacional de Municípios Portugueses e a Associação Nacional de Freguesias».

Sr.as e Srs. Deputados, a avaliação profunda sobre a organização e funções do Estado e a auscultação e o

debate com todas as entidades regionais e municipais deveria ter estado na base de todo este processo de

descentralização. Não se pode começar a construir a casa pelo telhado e não se pode querer avançar com uma

reforma desta natureza, onde está em causa a prestação de serviços fundamentais às populações, sem, de

facto, fazer aquela avaliação profunda.

Aplausos do CDS-PP.

Decorreram mais de 15 meses desde a apresentação da proposta de lei do Governo para a descentralização,

foram ouvidas dezenas de entidades. O Governo há um ano que insiste que é a Assembleia da República que

está a atrasar o processo da descentralização, porque se recusa a aprovar uma reforma que desconhece, quer

nos pressupostos, quer nos princípios, quer nas consequências, nomeadamente financeiras. E, ao fim deste

tempo todo, é apresentada uma proposta de criação de uma comissão para fazer a avaliação profunda que

incumbia ao Governo fazer antes mesmo de apresentar a proposta de lei-quadro.

Sr.as e Srs. Deputados: Não votaremos contra a criação desta comissão independente, mas lamentamos,

mais uma vez, a forma como todo o processo da descentralização tem vindo a ser conduzido.

Desde o início de funções que o Governo vem proclamando que a descentralização é a sua pedra angular

de atuação, é a sua prioridade. Passados três anos e apenas a um ano do fim da Legislatura só agora se vão

começar a estudar, a avaliar e a analisar as implicações deste processo.

Por isso mesmo, é com grande preocupação que o CDS e os portugueses constatam que, quanto à

descentralização, esta Legislatura, a Legislatura do Governo do Partido Socialista, foi uma Legislatura perdida.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, a Mesa não regista mais inscrições para intervenções. Apesar de ainda

haver tempos disponíveis, nenhum grupo parlamentar procedeu a qualquer inscrição. Há uma forma muito

rápida de a Mesa responder a estas situações, pelo que não sei se algum grupo parlamentar prefere evitar essa

fórmula.

O PSD e o CDS já intervieram mas relembro que, no final do debate, vamos votar um projeto apresentado

pelo PS e pelo PSD.

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A Sr.ª Susana Amador (PS): — Sr. Presidente, peço desculpa, quero inscrever-me para uma intervenção.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr.ª Deputada Susana Amador.

A Sr.ª Susana Amador (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Podemos hoje dizer, com absoluta

certeza, que o desenvolvimento territorial e regional é gerado pelo capital humano e pela educação.

Assim, a aposta no conhecimento, no ensino de adultos, com o Qualifica (75 centros em 57 concelhos do

interior), na captação de alunos para o ensino superior em regiões do interior, através do aumento de 5% de

vagas, na valorização dos politécnicos, com mais de 12 000 alunos inscritos nos cursos técnicos superiores

profissionais lecionados exclusivamente nestes estabelecimentos, a par de mais inovação e ciência em três

laboratórios colaborativos, a funcionar no interior, conduzirá seguramente a mais competitividade e

diferenciação.

Tem sido notório, em termos do Portugal 2020, que os apoios per capita nos territórios de baixa densidade

superam os do litoral (25% acima da percentagem de população neles residente).

Particularmente relevante é a discriminação positiva conseguida no domínio da sustentabilidade, com o

POSEUR (Programa Operacional Sustentabilidade e Eficiência no Uso de Recursos), no capital humano,

inclusão social e emprego.

Sr.as e Srs. Deputados: O Programa Nacional para a Coesão Territorial (PNCT), que tem uma execução de

75%, cumpriu 122 das suas medidas horizontais, em áreas que vão desde a justiça, com a reabertura de 20

tribunais, à modernização, com a abertura de 215 espaços cidadão, bem como à saúde, onde se criaram 150

vagas, totalmente preenchidas, para médicos no interior.

Este Programa está agora em fase de revisão. Conheceremos em breve, no decurso deste mês, as novas

medidas que visam responder aos novos desafios e realidades socioeconómicas, que são agora distintas do

contexto em que o Programa foi elaborado, e que tiveram igualmente em conta os contributos da sociedade civil,

em particular do Movimento pelo Interior, e ainda as diretrizes inscritas no Programa Nacional da Política de

Ordenamento do Território (PNPOT).

Este é o momento certo, porque estamos a negociar o Quadro Financeiro Plurianual e a projetar os fundos

estruturais, onde defendemos que a política de coesão pós-2020 deve reforçar a sua orientação para a

promoção da competitividade da economia e dos territórios, numa trajetória de convergência real persistente.

O combate a todas as desigualdades sociais, que permitiu, aliás, retirar 360 000 pessoas do limiar de

pobreza, a criação de milhares de empregos, também no interior, e a inversão das desigualdades territoriais têm

sido, efetivamente, uma prioridade política do Partido Socialista, como o comprovam a reprogramação dos

fundos de base territorial, com um crescimento que supera os 600 milhões de euros, ou o recente Programa

BEM — Beneficiação de Equipamentos Municipais, para o interior, a par dos investimentos estruturantes

efetuados ao nível do Programa Nacional de Regadios, como pudemos constatar nas nossas jornadas no Baixo

Alentejo, em que o Alqueva e a sua expansão futura, potenciadora de novas culturas e oportunidades,

representam bem a visão estratégica da governação socialista, na qual se reveem, em absoluto, os autarcas

contactados e as populações visitadas.

Sr.as e Srs. Deputados: A conjugação da reforma da descentralização com o Programa Nacional para a

Coesão Territorial e o Programa Nacional de Investimentos convergem para uma mudança da visão sobre o

todo nacional e abre as janelas de uma nova ambição e valorização do poder local, que está em posição de

conhecer, de modo profundo, as assimetrias e necessidades sociais, bem como as necessidades políticas locais

e as aspirações das pessoas.

O histórico do poder local fala por si, quer no seu desempenho económico e financeiro, com saldos positivos

sucessivos (o setor local, só em 2017, gerou um saldo de 460 milhões que contribuiu para a redução do défice

em 3 décimas do PIB), quer nas respostas geradas ao longo dos anos, quer, mais recentemente, no âmbito da

crise migratória, ao associar-se ao acolhimento de mais de 1600 refugiados que se redistribuíram por cerca de

100 municípios de norte a sul do País, confirmando a solidariedade que está no seu ADN (ácido

desoxirribonucleico).

Sabemos bem que só um Estado mais descentralizado poderá inverter a cristalização de desigualdades que

o centralismo potencia e que compromete o processo de desenvolvimento equilibrado dos vários territórios.

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Sabemos, ainda, que só conferindo às freguesias novos poderes, meios humanos e financeiros

descentralizados, a partir do poder central, mas igualmente aos municípios, atribuindo a estes últimos o papel

de gestores de todas as políticas públicas com impacto local e imbuídas detransversalidade, é que mudaremos

o paradigma de um Portugal historicamente centralista e desigual.

Aplausos do PS.

Encontram-se em fase de especialidade, as propostas de lei-quadro da transferência de competências para

as autarquias e a revisão da lei das finanças locais e, tal como se impunha, já é do conhecimento da Associação

Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) e do Parlamento, o impacto financeiro da reforma, por municípios

e por área a transferir, pelo que urge prosseguir o caminho, porque o tempo nunca espera por nós.

Estamos, como é evidente, perante um processo estruturante iniciado em 2016, que exigiu diálogo

continuado, grupos de trabalho temáticos entre o Governo e os municípios portugueses, busca de convergência

permanente com a ANMP, que, ontem mesmo, aprovou, por larga maioria, um importante e construtivo parecer

sobre ambos os diplomas, dando o seu acordo e confiança a todo este processo e ao trabalho parlamentar em

curso,…

Aplausos do PS.

… num sinal de vontade reformadora vestida de futuro, por parte dessa incontornável «casa do poder local»

que são os municípios portugueses.

Essa articulação foi igualmente constante com a ANAFRE (Associação Nacional de Freguesias) e gerou

ainda, e bem, acordos alargados, porque estamos perante matérias que vão para além da Legislatura.

Através do projeto de lei n.º 890/XIII (3.ª), que integra este agendamento potestativo, juntámos mais uma

peça a este relevante processo reformador, conferindo-se corpo à constituição de uma comissão independente

que nos conduzirá a uma segunda fase da descentralização, mais profunda, e que deverá proceder a uma

profunda avaliação sobre a organização e funções do Estado, devendo igualmente avaliar e propor um programa

de desconcentração da localização de entidades e serviços públicos, assegurando coerência na presença do

Estado no território. Uma comissão que pode abrir portas e pode ser uma via mais aprofundada em termos de

regiões.

Esta reforma, ao ser colocada ao serviço do desenvolvimento sustentável, será, sem dúvida, a mudança de

paradigma que se esperava e um motor de coesão e de combate às desigualdades territoriais.

Assim, por um Portugal mais igual, temos forçosamente de chegar ao coração da democracia, que, há mais

de 40 anos, habita nesse lugar profundamente democrático que quer mais descentralização para prosseguir

melhor as necessidades públicas e justas aspirações coletivas.

Aplausos do PS.

Esse lugar, Sr.as e Srs. Deputados, chama-se poder local, o lugar das ideias que sonham, que transformam

e que nos fazem avançar, e onde não fica ninguém para trás, porque é um lugar de Abril!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, inscreveram-se para pedir esclarecimentos os Srs. Deputados João

Vasconcelos, Hélder Amaral e Manuel Frexes. Como é que pretende responder?

A Sr.ª Susana Amador (PS): — Responderei em conjunto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Muito bem, Sr.ª Deputada.

Então, para formular o primeiro pedido de esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Vasconcelos,

do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda.

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O Sr. João Vasconcelos (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Susana Amador, como sabe, a Constituição

da República preconiza, há mais de 40 anos, a descentralização de competências para as autarquias, órgãos

diretamente eleitos pelas populações, mas os Governos do PS, do PSD e do CDS, ao longo destes anos todos,

não deram cumprimento a esse desiderato.

Estamos agora perante uma situação em que o PS, suportado por uma maioria parlamentar à esquerda,

manda esses partidos literalmente às urtigas e faz um acordo de regime, típico do bloco central, com o PSD.

Pior ainda: submete-se a todas as exigências que o PSD vinha defendendo! É por isso que o PSD agora tem

um tom mais cordato, mais pacífico, relativamente a esta matéria.

Sr.as e Srs. Deputados, como disse há pouco, o Bloco de Esquerda não está disponível para que o Estado

prescinda de funções sociais importantes, e é a isto que conduzirá este processo não de descentralização mas,

sim, de municipalização de competências em áreas fundamentais como a saúde e a educação.

Por outro lado, e há vozes que o têm reclamado, isto irá fazer com que as escolas e os professores percam

autonomia pedagógica e autonomia profissional.

Para terminar, Sr.ª Deputada, coloco-lhe uma questão: que justificação tem o PS a dar ao País, por se juntar,

nesta matéria, ao PSD, cujo historial, em termos de desigualdades, tem uma mancha muito negra?!

Mais: pode a Sr.ª Deputada garantir que este processo de transferência de competências não irá levar, de

facto, à perda de autonomia pedagógica e profissional tanto de professores como de escolas?

Aplausos do BE.

Entretanto, assumiu a presidência o Vice-Presidente José de Matos Correia.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem, agora, a palavra o Sr. Deputado Hélder Amaral, do

CDS-PP.

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, não resisto a ser solidário com as

dores dos partidos mais à esquerda do Partido Socialista, pois têm vivido com três desejos: o primeiro é o de

que o PS nunca os engane; o segundo é o de que, se os enganar, eles não saibam; e o terceiro é o de que, se

souberem, não se importem, para que isto possa continuar tudo como está.

Mas, às vezes, os antigos amores são muito fortes e os amores do bloco central têm muita força. Estamos,

hoje, perante um desses episódios.

Sr.ª Deputada Susana Amador, depois de 2006, depois de tanto interesse na descentralização — preceito

constitucional, é verdade, embora eu entenda que o que interessa mesmo é ter bons governos, governos que

governem e sejam competentes, que atuem, que sejam diligentes, e não propriamente a distância a que se

situam —, uma matéria tão estudada e tão central na governação do Partido Socialista, e mesmo enjeitando os

seus parceiros, ouvi a Sr.ª Deputada Susana Amador, hoje, dizer aqui o seguinte: «Bom, a nossa ideia não é só

criar uma comissão independente, é sancionar na comissão independente o conjunto de propostas e ideias que

já temos decididas, fruto de longas audições».

Que competências efetivas vão para as juntas de freguesia? Que competências efetivas vão para as CCDR

(Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional)? Que competências efetivas passam para o

supramunicipal, sejam elas simples ou outras realidades? Que competências vão para os municípios

propriamente ditos e que mecanismos de controlo irão ter as assembleias de freguesia e as assembleias

municipais para controlar essas competências? Sobre esta matéria, V. Ex.ª fez um discurso filosófico, emotivo,

apelou a Abril, mas ficámos exatamente na mesma.

Nem tão-pouco fez uma avaliação do que está no acordo do bloco central, como, por exemplo, e permita-me

que leia, quando refere que «Sejam mantidos em vigor os contratos interadministrativos (…)». Manter mas,

depois, descentralizar?!… Nas mesmas áreas ou em áreas diferentes? Qual foi a avaliação que fizeram sobre

o processo que está em curso? Com que bases é que se vai agora mudar?

De facto, Sr.ª Deputada, foi muito pouco e gostaria que nos pudesse dizer mais, porque, como deve calcular,

estas matérias até têm a ver com aquilo que o CDS fez, e bem, e que vai discutir na próxima semana.

Uma coisa são políticas públicas para ajudar empresas e famílias a fixarem-se no interior, resolvendo o

problema genérico de demografia que o nosso País tem, e que podem ser potenciadas, complementadas ou até

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melhoradas com políticas de descentralização, outra coisa são as competências próprias das freguesias e dos

municípios e o envelope financeiro.

Sr.ª Deputada, havendo competências que são genéricas e iguais para todos os municípios, concordará

comigo que nem todos os municípios são iguais. Há municípios que têm capacidade técnica, humana, dimensão,

massa crítica, e há outros que não têm.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Essas são boas perguntas para o PSD também responder!

O Sr. HélderAmaral (CDS-PP): — Estas competências podem ou não agravar ainda mais a falta de coesão

territorial, que é o que queremos evitar? Acho que podem agravar muito mais estas questões.

Esta é, de facto, uma matéria muito relevante, porque pode definir o País que queremos para a próxima

década.

E parece-me curto que, sobretudo, o Governo e os seus parceiros estejam com arrufos, zangados,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Isso é para o PSD?!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — É para todos menos para o CDS!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — … e não tenham participado efetivamente neste debate, de modo a

estarmos hoje, aqui, com algo mais concreto e plausível e a podermos dizer: «Bom, fizemos uma avaliação dos

projetos-piloto que estão no terreno, fizemos uma avaliação dos contratos interadministrativos, fizemos uma

avaliação da dimensão dos municípios, fizemos uma avaliação do pacote financeiro e, afinal de contas, temos

uma missão para a comissão independente». E, sobre esta matéria, até percebo que a Associação Nacional de

Municípios Portugueses diga que 10% é um sucesso, mas é um sucesso com as atuais competências, porque,

se for para somar novas competências, já tenho dúvidas se será um sucesso ou um fracasso.

Portanto, nada disto se clarificou, nada disto se esclareceu.

O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Sr. Deputado, tem de terminar.

O Sr. HélderAmaral (CDS-PP): — Termino, Sr. Presidente.

Eu, que gostava de poder contribuir para o debate, estou a tentar adivinhar a matéria, porque, de facto, o

debate trouxe pouca coisa, poucas ideias e, assim, é muito difícil participar.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado

Manuel Frexes, do PSD.

O Sr. ManuelFrexes (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Susana Amador, com o devido respeito, devo

dizer-lhe que continua com a retórica das medidas avulsas e piedosas intenções para resolver as profundas

desigualdades territoriais.

A intervenção que aqui fez, uma narrativa de caráter romântico, ajuda, sobretudo, a anestesiar o problema,

em vez de ajudar a resolvê-lo, porque a realidade é bem mais dramática.

Sabe, Sr.ª Deputada, venho de um distrito, o distrito de Castelo Branco, onde as assimetrias regionais e as

desigualdades de oportunidades mais se têm feito sentir, impedindo um desenvolvimento económico e social

equilibrado e sustentado.

Infelizmente, três concelhos do meu distrito ocupam os três primeiros lugares dos municípios mais afetados

pelo despovoamento e pelo envelhecimento da população. São eles Penamacor, Vila Velha de Ródão e Idanha-

a-Nova. Estes municípios perderam, nas últimas décadas, cerca de metade da sua população e, se nada for

feito, irão perder mais de metade da restante população até 2040.

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Como se isso não bastasse, o envelhecimento populacional é outra consequência do despovoamento destes

municípios. Para dar uma ideia, o rácio de idosos por jovens, por exemplo, em Vila Velha de Ródão, é de cerca

de 800 idosos por cerca de 100 jovens.

A densidade populacional nestes municípios é de cerca de 7 habitantes por quilómetro quadrado, quando

em Lisboa, Amadora e Odivelas é superior a 7000 habitantes por quilómetro quadrado, ou seja, 1000 vezes

superior.

É caso para perguntar, Sr.ª Deputada: que futuro para estes concelhos? Que futuro para os vastos territórios

do interior? Que futuro para Portugal?

Acontece que Portugal está farto de diagnósticos, de avaliações, de estudos e de observatórios, de

perguntas, de interpelações e, sobretudo, de unidades de missão para a valorização do interior, que foram um

fracasso e nada fizeram pelo nosso País.

Foi preciso acontecer uma tragédia de proporções inimagináveis — os incêndios do ano passado, que,

historicamente, ficarão sempre ligados ao atual Governo — para que se revelasse uma outra tragédia, esta,

silenciosa, profunda, crescente e causadora de efeitos devastadores, que é a do abandono do nosso território,

do abandono do interior.

Sr.ª Deputada, Portugal precisa de um plano de ação e não de uma unidade de missão.

Hoje, como disse, o País reclama ações e soluções. Portugal precisa de medidas efetivas e radicais, em vez

de medidas avulsas e erráticas e, sobretudo, de retórica, do faz-de-conta e de políticas de fachada que servem

para ignorar ou esquecer o problema.

Se nada for feito, o interior continuará a transformar-se em regiões cada vez mais desertificadas e

abandonadas e o litoral a concentrar-se em ilhas cada vez mais densas, com a consequente degradação da

qualidade de vida de todos os portugueses. Sim, de todos os portugueses, porque este é um problema estrutural

e nacional que afeta todos, quer vivam no interior ou no litoral, que responsabiliza todos e que a todos tem de

mobilizar.

De modo que, Sr.ª Deputada, é necessária a identificação de políticas públicas de natureza integrada e

discriminatória a favor do interior e que, a médio prazo, traduzam a inversão do rumo que se tem verificado nas

últimas décadas.

Pergunto-lhe, Sr.ª Deputada, se o Partido Socialista está disponível para dar expressão e eficácia legal às

medidas de caráter fiscal e outras que hoje estão no centro do debate, as quais já mereceram o apoio das mais

altas figuras do Estado, incluindo o do Sr. Primeiro-Ministro.

Por fim, pergunto se está o Governo disponível para passar das palavras aos atos e promover a abolição das

portagens nas autoestradas da coesão ou, pelo menos, a sua redução substancial, nomeadamente na A23, na

A24 e na A25.

O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Tem de terminar, Sr. Deputado.

O Sr. ManuelFrexes (PSD): — Será que desta vez é a sério, Sr.ª Deputada, e que a palavra dada será

palavra honrada?!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Susana

Amador.

A Sr.ª SusanaAmador (PS): — Sr. Presidente, começo por responder ao Sr. Deputado Manuel Frexes, do

PSD, para lhe dizer que não é desta vez que a palavra dada é palavra honrada, tal acontece sempre com o

Partido Socialista e com esta governação.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

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Sr. Deputado, julgo que esteve um pouco distraído quando proferi a minha intervenção. Considerar que o

Programa Nacional para a Coesão Territorial, que tem 164 medidas horizontais integradas, que vão da justiça à

saúde, que tem um grau de execução de 75% e que tem 122 medidas cumpridas, é casuístico ou desgarrado

significa que esteve, de facto, muito distraído, Sr. Deputado.

O Sr. ManuelFrexes (PSD): — Olhe para a realidade!

A Sr.ª SusanaAmador (PS): — A realidade diz-nos o quê? Diz-nos que os senhores encerraram tribunais e

que nós reativámos 20 tribunais, beneficiando 800 000 pessoas que foram prejudicadas com a vossa

governação.

Aplausos do PS.

A realidade diz-nos também que colocámos 150 médicos no interior, com 150 vagas preenchidas.

A realidade diz-nos que, na segurança pública, beneficiámos mais de 40 postos de proximidade. E poderia

continuar com os serviços públicos que foram desativados,…

O Sr. ManuelFrexes (PSD): — Os balcões da Caixa Geral de Depósitos!

A Sr.ª Susana Amador (PS): — … retirados do Estado, dizendo-lhe que, por exemplo, voltámos a colocar

em Castelo Branco o callcenter da segurança social, tendo sido criados 150 postos de trabalho, e postos de

trabalho com qualidade e duradouros.

Aplausos do PS.

Sr. Deputado, também referi que o Programa Nacional para a Coesão Territorial está, neste momento, a ser

revisto, vai incluir medidas de natureza fiscal e, no que diz respeito a estas novas medidas, irá acolher

contributos da sociedade civil e do Movimento pelo Interior.

Portanto, é um Programa que está a ser revisto e que vai acomodar todas estas realidades, ao mesmo tempo

que se conjuga a descentralização com o referido Programa, com o Programa Nacional de Investimentos para

o nosso País e com projetos estruturantes, como o de Alqueva, que referi e que é um projeto com a marca dos

Governos socialistas, porque, quando o PS governa, há investimentos estruturantes no Alentejo, o Alentejo de

que os Srs. Deputados se esqueceram durante muitos anos.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

Falei também do Portugal 2020, no âmbito do qual se conseguiram 600 milhões na reprogramação dos

fundos de base territorial.

Portanto, Sr. Deputado, acho que lhe respondi com honestidade e demonstrando a nossa vontade política

incontornável de valorizar o interior, conjugando este esforço da descentralização que irá combater as

assimetrias regionais.

Em relação às questões colocadas pelo Sr. Deputado João Vasconcelos, do Bloco de Esquerda, quero dizer-

lhe, com toda a consideração, que não esteja preocupado com o facto de esta reforma se esquecer de alguém.

Esta reforma não se esqueceu de ninguém desde o início.

O PS, pela voz do seu líder parlamentar, Carlos César, de outros Deputados e do Sr. Primeiro-Ministro,

António Costa, sempre referiu que este processo deveria ser aglutinador.

Da nossa parte, nunca inviabilizámos iniciativas e sempre dissemos que era um processo que precisava de

todos e que precisava, obviamente, de um trabalho continuado e alargado, como o que fizemos com os

municípios portugueses, com a ANAFRE (Associação Nacional de Freguesias) e com o Conselho de

Concertação Social, com a ajuda de todas as bancadas desta Casa.

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Encontrámos uma via de diálogo com o PSD num projeto que é estruturante, que vai para além da

Legislatura, mas continuamos sempre a incluir todos neste processo reformador, que não quer deixar ninguém

para trás e que precisa, obviamente, do contributo de todos os Srs. Deputados desta Casa.

Por isso, Caro Deputado, o que temos feito com esta reforma é incluir, não é desunir.

Ao mesmo tempo, volto a reiterar que esta reforma não desresponsabiliza o Estado ao longo destes anos de

Legislatura e, com o apoio das esquerdas, ao invés, temos vindo a robustecer o Estado social, dando-lhe mais

presença no território, apostando na criação de medidas que ajudem quem tem reformas mais baixas, repondo

os mínimos sociais, com o complemento solidário para idosos, o rendimento social de inserção e o aumento

extraordinário que fizemos ao nível do abono de família.

Portanto, se há Governo que tem robustecido o Estado social tem sido o do PS, ao longo desta Legislatura,

com o apoio do Bloco de Esquerda, do Partido Comunista Português e de Os Verdes. Aquilo que é essencial

para o reforço do Estado tem vindo a ser feito.

Em relação à educação, não temos de ter receio. Há uma preocupação de conciliar sempre a autonomia da

escola e a autonomia pedagógica dos professores com a autonomia do poder local. A escola pública e o poder

local são dois sucessos do 25 de Abril, são dois sucessos da democracia, e seguirão par a par. Seguramente,

Sr. Deputado, não haverá nenhuma invasão dessa autonomia por parte do poder local — temos de confiar! Eu

confio no poder local dos autarcas e estou certa de que o Sr. Deputado não desconfia dos autarcas deste País

nem desconfia do poder local.

Aplausos do PS.

Sr. Deputado Hélder Amaral, agradeço também as suas questões.

Quero dizer-lhe que não chegámos até aqui sem estudos feitos, sem análises efetuadas. Começámos, logo

no início de 2016, com um documento orientador para a reforma do Estado e para a descentralização. Nesse

documento orientador estavam identificadas as necessidades de transferência de competências para as

freguesias, para os municípios e para o nível intermunicipal, não descurando a legitimidade democrática das

CCDR (Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional) e também das áreas metropolitanas.

O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Sr.ª Deputada, tem de terminar.

A Sr.ª SusanaAmador (PS): — Sr. Deputado, para nós, este processo é um imperativo programático, político

e constitucional. Esse é o nosso roteiro.

Esta comissão independente irá continuar esse processo, que será também seguido por uma comissão de

acompanhamento, tal como está prevista no artigo 6.º da lei-quadro, para que, ao mesmo tempo, se aprofunde

uma segunda fase da descentralização, associando o valor do capital humano e académico, como sei que o

CDS sempre valoriza.

É um processo que não se esgota, que está em aberto, em construção, e que precisa também, obviamente,

do vosso apoio e contributo.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Para uma intervenção, tem, agora, a palavra a Sr.ª Deputada

Heloísa Apolónia.

A Sr.ª HeloísaApolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Sobre este agendamento

potestativo que o PSD marcou e que traz hoje a discussão no Plenário, sobre a questão das desigualdades

territoriais e da descentralização, Os Verdes gostariam de fazer duas observações prévias.

A primeira observação prende-se com a solução que o próprio PSD traz para esta discussão, a qual está

traduzida num projeto de lei que cria a comissão independente para a descentralização. Isto já não é grande

novidade. Ao que parece, a solução que o PSD tem para dar hoje sobre as mais diversas matérias é a criação

de comissões.

Já no outro dia, discutimos também a questão da natalidade e lá veio o PSD propor mais uma comissão.

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Portanto, esta é a verdadeira solução que têm para os mais diversos setores com os quais os cidadãos se

vão confrontando, e hoje é a vez, em concreto, da organização do nosso território. Ou seja, cria-se uma comissão

e lavam-se consciências. Será assim, Sr.as e Srs. Deputados? Empurram-se as soluções dos problemas para a

frente?

Nós consideramos que não são apresentadas soluções efetivas e que o PSD é incapaz de encontrar essas

soluções concretas e de as propor à Assembleia da República. Tal não é estranho, contudo, porque nós

conhecemos a atividade governativa e as opções governativas do PSD e do CDS.

Sr.as e Srs. Deputados, será porventura justo, muito justo, relembrar que os senhores contribuíram com toda

a força que tinham para a desvalorização do nosso território, designadamente, do interior do País. Com certeza,

Os Verdes não vão ter necessidade de lembrar a toda a gente — mas vamos fazê-lo, de qualquer forma — o

papel que tiveram relativamente, por exemplo, ao encerramento de serviços públicos fundamentais, quer na

área da educação, quer na área da saúde, e como esvaziaram o interior do País destes serviços fundamentais

à vida das populações.

Poderíamos também falar de outro serviço público essencial, ao qual os senhores se agarraram para destruir,

designadamente no interior do País, e estou a falar de transportes — tanto no Douro, como no Alentejo

encontramos vários exemplos que poderiam ser dados. Talvez vos deva lembrar, concretamente, a forma como

encerraram o serviço de passageiros na Linha do Leste — nós, Os Verdes, tivemos de trabalhar nesta

Legislatura afincadamente para que fosse possível repor esse serviço às populações — e o que daí resultou

para a economia da região, designadamente para o ensino superior da região, e de como a liquidação dos

transportes consegue esvaziar depois todo um conjunto de atividades ao seu redor.

O Sr. JoãoOliveira (PCP): — Bem lembrado!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Os senhores contribuíram para que isso acontecesse e vêm hoje

aqui fazer o quê? Lavar consciências? Ainda por cima, Sr.as e Srs. Deputados, sem propostas concretas! E nem

vamos falar da liquidação da atividade produtiva no interior do País, designadamente na área agrícola, para a

qual os senhores bem contribuíram.

Este é o quadro de base e, por isso, Sr.as e Srs. Deputados, e em particular Sr.as e Srs. Deputados do PS, é

grave que os senhores, quando pensam na descentralização e na relevância da descentralização, decidam fazer

um acordo com o PSD, que tem este historial. E é grave, de facto, que considerem que o PSD dará um bom

parceiro para materializar uma lógica de descentralização — daí não virão, certamente, boas soluções.

Qual é o grande receio de Os Verdes sobre as vossas propostas em matéria de descentralização? Nós, por

princípio, evidentemente, somos a favor da descentralização, mas, quando se quer desresponsabilizar o Estado

e passar o ónus dos problemas para as autarquias, lamento, isso não é respeitar as autarquias, isso é tramar,

se me permitem a expressão, tramar as próprias autarquias! Isto é grave, já que há determinadas funções tão

importantes, funções do Estado, como a educação ou a saúde, onde é determinante haver uma política nacional

forte e não 308 políticas de educação ou de saúde no nosso País!

Além do mais, a nossa experiência em matéria de descentralização protagonizada por governos do PS e do

PSD diz-nos que se passam as competências, mas não se passam os correspondentes meios financeiros para

que as autarquias possam atuar. Portanto, este é o historial que nós conhecemos e nada nos diz que será

diferente.

Mas o que é que os senhores propõem em termos, por exemplo, de um comando constitucional, que é a

regionalização? Nada! Não propõem absolutamente nada! Esse patamar fundamental entre o Estado central e

as autarquias…

O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Sr.ª Deputada, tem de terminar.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Vou terminar, Sr. Presidente.

Sr.as e Srs. Deputados do PS, e relativamente à reposição das freguesias, àquela asneira brutal que o

Governo do PSD e do CDS fez? Nada! Também se silenciam relativamente a esta matéria.

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Portanto, Sr. Presidente, aqui ficam manifestadas as grandes preocupações de Os Verdes em relação a

estes assuntos chamados «acordos de regime», mas que, de facto, em nada, em nada, vêm beneficiar as

portuguesas e os portugueses.

Nós, Os Verdes, aqui estaremos, na Assembleia da República, para trabalhar no sentido da melhoria da

qualidade de vida das pessoas e da valorização do nosso território.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Muito bem!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Não temos feito, de resto, outra coisa.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Pedro

Soares, do Bloco de Esquerda.

O Sr. Pedro Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Nós, ao fim destes anos de modelo

territorial, só podemos chegar à conclusão de que este modelo territorial, baseado numa organização

administrativa que exclui um nível intermédio de administração e pulveriza, em centenas de autarquias locais, a

representação e a capacidade política territorial, chegou a um beco sem saída.

De facto, a situação que hoje vivemos é uma situação de grave diferença territorial, de falta de coesão

territorial, que afeta diretamente as pessoas que vivem num sítio ou outro do País, em função da sua própria

geografia. Aliás, em relação à pergunta do Sr. Deputado Santinho Pacheco, sobre se o PSD encarava este

acordo entre o Governo e o PSD no sentido da regionalização, a ausência de resposta do Sr. Deputado António

Costa Silva foi esclarecedora.

Protestos do Deputado do PSD Carlos Peixoto.

De facto, o que o PSD quer é manter a linha do ex-ministro Relvas, no sentido da liquidação da

regionalização, da liquidação de uma verdadeira descentralização e de uma verdadeira descentralização

administrativa do nosso País. Aliás, o Partido Socialista abandona o objetivo da regionalização, retira do seu

léxico a palavra «regionalização», chega ao ponto de abandonar o que está inscrito no próprio Programa do

Governo — a criação de autarquias metropolitanas, a correção dos erros de extinção das freguesias a régua e

esquadro. E porquê? Porque quer aceitar, porque está disponível para aceitar todas as imposições do PSD em

matéria de administração do território.

Aliás, o Partido Socialista está a ceder a um verdadeiro bullying territorial da direita, do PSD, sobre o Partido

Socialista. Este facto é a grande fratura que temos aqui, neste Parlamento. Toda esta cedência ao bullying

territorial do PSD resume-se, depois, a uma proposta. É uma proposta tão pífia que nem sequer chega para

suscitar ciúmes. Quando se fala em ciúmes, sinceramente, isto é tão fraquinho que não pode suscitar ciúmes!

O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Ai não?!

O Sr. António Costa Silva (PSD): — É o que parece!

O Sr. Pedro Soares (BE): — Uma comissão independente para a descentralização? Mas, Srs. Deputados,

olhem bem para o que lá está escrito, não é para o título, olhem bem para o que lá está escrito! No objeto, há

dois pontos: avaliação, repito avaliação, «sobre a organização e funções do Estado» — nada diz sobre

descentralização, nada diz sobre regionalização; o outro objetivo, esse ainda mais caricato, é «programa de

desconcentração da localização de entidades e serviços públicos».

Sr.as e Srs. Deputados, isto devia ser objeto de uma intervenção da ASAE (Autoridade da Segurança

Alimentar e Económica), porque é publicidade enganosa! Então, os senhores colocam no título «Comissão

independente para a descentralização» e depois põe como objetivo um programa para a desconcentração? Não

vão querer que vos explique, com certeza, a diferença entre desconcentração e descentralização.

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Risos do PSD.

Escusem-me de fazer isso, por favor! É que há uma enorme diferença entre descentralização e

desconcentração! O que os senhores querem é enganar os portugueses e as portuguesas, querem que se

confunda descentralização com desconcentração!

Portanto, Sr. Deputado António Costa Silva, não está tudo em aberto neste debate, não está!

A Sr.ª Berta Cabral (PSD): — Está, está!

O Sr. Pedro Soares (BE): — O que está em aberto é uma política de desconcentração e não de

descentralização! Está escrito! Está escrito no acordo que os senhores fizeram com o Governo e com Partido

Socialista!

Sr.as e Srs. Deputados, a diferença entre desconcentração e descentralização é fundamental e esta proposta

para uma comissão independente para a descentralização é, de facto, publicidade enganosa. Não é

descentralização, é desconcentração!

Este é o problema político que fratura este Parlamento. Reparem, Portugal tem uma das mais baixas

percentagens de recursos públicos geridos a nível sub-regional. A União Europeia a 28 gere 33,4% dos recursos,

a OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico) a 35 gere 40,4%. E Portugal?

Portugal gere 12,6%! Ou seja, há uma discrepância brutal e isto tem que ver com descentralização, não tem que

ver com desconcentração.

A Sr.ª Berta Cabral (PSD): — Concentre-se!

O Sr. Pedro Soares (BE): — Se os senhores enviarem o Infarmed (Autoridade Nacional do Medicamento e

Produtos de Saúde) para o Porto,…

O Sr. António Costa Silva (PSD): — Não somos nós! É o Governo!

O Sr. Manuel Frexes (PSD): — O senhor está desconcentrado!

O Sr. Pedro Soares (BE): — … a despesa continua a ser central, não é descentralização, é a continuação

da concentração, é apenas desconcentração, é apenas despesa central. Assim, PS e PSD não querem, de

facto, a descentralização. Ficam-se por uma limitada e inconsequente desconcentração.

Não enganem os portugueses! Esta fratura é uma fratura importante, porque põe em causa a capacidade de

decisão das populações, a capacidade de decisão dos cidadãos nos seus territórios em relação ao seu próprio

desenvolvimento territorial. É isto que os senhores não querem, não querem dar capacidade de decisão política

a esses cidadãos, aos cidadãos dos vários territórios.

A questão que está a colocar-se neste Parlamento é apenas um simulacro, um faz-de-conta. Aquilo que

existe, neste momento, neste debate, em relação ao acordo entre o Governo e o PSD, é, pura e simplesmente,

um simulacro. Não tem nada que ver com descentralização e isso é preciso que fique muito claro, neste debate.

Por isso, o Bloco de Esquerda não pode acompanhar esta proposta de criação de uma comissão

independente.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Sr. Deputado Pedro Soares, inscreveu-se, para pedir

esclarecimentos, a Sr.ª Deputada Emília Cerqueira, do PSD, mas o Sr. Deputado não tem tempo para responder.

O Sr. Pedro Soares (BE): — Se algum grupo parlamentar me desse tempo, eu responderia.

O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — O PSD deseja, ainda assim, pedir esclarecimentos?

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A Sr.ª Emília Cerqueira (PSD): — Sim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Emília Cerqueira.

A Sr.ª Emília Cerqueira (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Soares, deixe-me que lhe diga que

isto foi um muro de lamentações. Não foram ciúmes! Parecia uma crise existencial da geringonça, foi o que

realmente pareceu!

O Sr. Deputado falou, falou, falou, melhor dizendo, lamentou-se, lamentou-se, lamentou-se, mas lamentou-

se do vosso arrufo e do vosso amuo, porque os senhores ainda não conseguiram ultrapassar e por isso um dia

são oposição e outro dia são governo, como vos dá jeito.

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Emília Cerqueira (PSD): — Custa-vos muito aceitar, Sr. Deputado, aquela que é, e sempre foi, uma

premissa fundamental do PSD: o interesse nacional.

Risos do PCP.

Ao contrário dos senhores, que gostam de alardear grandes parangonas, nós estamos interessados nos

portugueses e nos problemas das desigualdades territoriais de que falou, Sr. Deputado. Fala-se muito em interior

e cria-se aqui a ideia de que o interior é Trás-os-Montes, as Beiras e o Alentejo. Mas não! As desigualdades não

são só isso! Aliás, eu sou do Alto Minho, um território aparentemente do litoral, mas que na verdade é um

autêntico território do interior em termos de indicadores. E com uma agravante: a nossa concorrência direta é a

Galiza, onde temos Vigo, Pontevedra, Santiago de Compostela, Corunha.

O Sr. Pedro Soares (BE): — Regiões!

A Sr.ª Emília Cerqueira (PSD): — Mas mais do que isto, os Srs. Deputados, como parte do Governo,

queixam-se aqui muito, mas o que fizeram para acabar com estas desigualdades territoriais? A A28 com

portagens? Sr. Deputados, nem vos lembrou, quando negociaram o Orçamento — sim aquele de que fazem

parte, embora hoje pareça que nada têm que ver com isso —, estarem a fazer discriminação nessas

autoestradas? Claro que não! O Alto Minho não precisa!

Quando agravaram o imposto sobre os combustíveis — sim, aqueles 6 cêntimos que os senhores criaram —

, houve alguns postos fronteiriços que passaram a ter um regime fiscal igual ao espanhol. No Alto Minho? Claro

que não! Monção, Melgaço, Vila Nova de Cerveira, esses, não contam para nada! Afinal, parece que estavam

desconcentrados e não descentralizados. São confusões que acontecem!

Mais, Srs. Deputados: na altura dos incêndios, quando nos arderam mais de 4000 ha e se perderam casas,

o Bloco e todos os que fazem parte da solução governativa anunciaram uma reforma florestal. Sabem o que foi

feito até hoje? Nesta vossa reprogramação de fundos, sabem o que foi feito? Deixem-me que vos diga: nada!

Há uma casa reconstruída em Monção, sabiam? Sim, há, porque a proprietária pagou! Porque a CCDR-N

(Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte) diz para não fazerem nada, diz que não há

dinheiro. Isto é vossa responsabilidade! Vai muito além dos discursos, vai muito além dos sound bites.

O Sr. Manuel Frexes (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª Emília Cerqueira (PSD): — Responsabilizem-se e assumam que são governo! E quando deixarão de

se queixar, de fazer este muro de lamentações e tomar medidas concretas, exatas, que ajudem a acabar com

as desigualdades territoriais?

Aplausos do PSD.

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O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — O Bloco de Esquerda não dispõe de tempo para responder e,

portanto, passamos à próxima intervenção, da Sr.ª Deputada Paula Santos, a quem dou a palavra

Faça favor.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Dos elementos de que dispomos

relativamente ao processo de transferência de competências, podemos afirmar que não se augura nada de bom.

No processo em curso, há um pressuposto que está presente: não pode haver aumento da despesa pública.

Ora, não podendo haver aumento da despesa pública e se sobre aquilo que hoje está subfinanciado não for

feito um investimento necessário para assegurar, por exemplo, o investimento na educação, na saúde, na

cultura, se são as mesmas verbas que serão transferidas para as autarquias, então os problemas, que hoje

temos identificados, continuarão a não ser resolvidos.

Por isso, não estamos perante um processo de descentralização de competências mas, sim, perante um

processo de transferência de encargos para as autarquias, como os que, aliás, vimos no passado.

Vejamos o exemplo da educação: há carência de assistentes operacionais nas escolas e a portaria em vigor

não dá resposta à necessidade efetiva dos trabalhadores, tendo em conta a realidade concreta nas escolas; há

escolas que não têm pavilhões desportivos para se poder lecionar adequadamente a disciplina de Educação

Física ou para desenvolver o desporto escolar; há instalações de escolas que estão absolutamente degradadas

— aliás, há escolas que, há décadas, nunca tiveram um investimento profundo no plano da sua conservação e

manutenção. No entanto, aquilo que consta da proposta é que se transfira o que hoje está no Orçamento do

Estado. Ou seja, não resolve o problema — foi, aliás, o que PSD e CDS fizeram com os contratos

interadministrativos.

Para a manutenção das escolas está uma verba de 20 000 €, a mesma de 2008 dos contratos de execução

do Governo do Partido Socialista. Só que com este pequeno problema: esta verba não é só para manutenção e

conservação, é também para o apetrechamento das escolas.

Por isso, estamos perante um processo da responsabilidade do PS e, agora, o PSD parece que foi metido

dentro do bolso do Governo e se deixou levar por meia dúzia de tostões que não vão resolver qualquer problema,

só vão prejudicar as populações.

Protestos do PSD.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Esta é a realidade deste processo, porque o incumprimento da Lei das

Finanças Locais continua lá, Srs. Deputados!

Aplausos do PCP.

Continua na proposta que agora os senhores aceitaram e acordaram com o Governo.

Relativamente a estas matérias, dizemos que um processo de descentralização é muito mais do que transferir

competências para as autarquias. A verdadeira regionalização, tal qual como diz a nossa Constituição, exige a

reposição das freguesias — que PS, PSD e CDS impediram que fossem repostas nesta Legislatura —, de acordo

com a vontade das populações. Se o objetivo era o de aproximar o Estado das populações tinha-se avançado,

em primeiro lugar, com a reposição das freguesias.

Isto deixa-nos uma questão: traz-se, hoje, a debate uma proposta para a criação de uma comissão para a

descentralização, mas, Srs. Deputados, vão discutir o quê quando o PS e o PSD já estabeleceram um acordo?

O Sr. João Oliveira (PCP): — Ora aí está!

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Ou querem continuar a adiar a regionalização e a adiar o cumprimento da

Constituição, que é a Lei-mãe do nosso País?

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

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A Sr.ª Paula Santos (PCP): — É isto que está presente nesta matéria.

Nós não podemos acompanhar, de todo, esta perspetiva, porque o que está em cima da mesa é uma

desresponsabilização do Estado, do Governo no cumprimento das suas funções, na garantia da universalidade

das funções sociais do Estado.

Por outro lado, também consideramos que o processo na Assembleia da República deve ser sério e que não

se pode estar agora a acelerar em nome não sabemos bem de quê, colocando os Deputados como verbos-de-

encher em todo este processo e votando de cruz propostas que em nada vão valorizar o poder local, muito

menos vão beneficiar as populações nem garantir melhores serviços públicos.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Muito bem!

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — A Assembleia da República, de facto, não se deve meter desta forma num

processo.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — A Mesa regista a inscrição de dois Srs. Deputados para pedir

esclarecimentos.

Como desejar responder, Sr.ª Deputada?

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Em conjunto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Tem, então, a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr.

Deputado Norberto Patinho.

O Sr. Norberto Patinho (PS): — Sr. Presidente, em primeiro lugar, gostaria de dizer que o Sr. Deputado

Costa Silva, como já vem sendo hábito, traçou um retrato negro do Alentejo onde vive e eu gostava que o visse

numa perspetiva mais positiva, lembrando que os aspetos negativos que aqui referiu foram causa da governação

anterior ou, pelo menos, foram agravados os problemas da interioridade do Alentejo. O caos e o desprezo que

os senhores dedicaram aos alentejanos resultaram, precisamente, naquilo que o Sr. Deputado aqui se queixou.

No entanto, vivemos hoje um momento da maior importância. A Associação Nacional de Municípios

Portugueses e o Governo estabeleceram um acordo e é importante frisar que esse é um acordo dos autarcas e

estes — posso dizê-lo, porque há quase 40 anos que o sou — desde sempre estiveram disponíveis e desde

sempre reivindicaram mais competências para poderem estar numa situação de maior proximidade ao serviço

das suas populações, das suas gentes, para tentar resolver os problemas das suas regiões. É algo a que os

autarcas nunca se demitiram e é algo que os autarcas ambicionam.

Felizmente, com este Governo, com uma vontade descentralizadora que manifestou desde a primeira hora

que assumiu a governação, foram criadas as condições para, penso que após a governação do Eng.º Guterres,

se conseguir um consenso entre autarcas e Governo para encontrarmos uma delegação de competências que

possa, através da proximidade, melhorar a qualidade de vida e contribuir para o desenvolvimento das nossas

regiões.

Queria, pois, congratular-me com este acordo histórico entre o Governo e a Associação Nacional de

Municípios Portugueses e dizer que este consenso criado entre Governo e municípios é uma peça fundamental

para o avanço do processo de descentralização. Os municípios têm um papel determinante no desenvolvimento

de políticas que corrijam as assimetrias e que promovam a coesão social e territorial.

O que aqui está em causa é permitir que os autarcas possam contribuir para o desenvolvimento das suas

terras. O acordo, que aqui tem sido tão criticado por alguns, permite, sobretudo aos autarcas, encarar o futuro

com segurança para que possam planear a sua gestão, independentemente do Governo que estiver em cada

momento à frente do País e independentemente da força política que estiver à frente de cada uma das

autarquias.

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Aplausos do PS.

Ao longo da minha vida enquanto autarca, contribui, participei e trabalhei com muitos autarcas do Partido

Comunista. Foram parceiros importantíssimos no desenvolvimento da minha região.

Conheço o trabalho desenvolvido por muitos, a vontade e a disponibilidade que têm para usar o cargo que

detêm no sentido de contribuírem para uma melhor qualidade de vida dos seus munícipes e para o

desenvolvimento dos seus territórios. Correspondendo àquela que é a vontade determinada de muitos autarcas,

da generalidade dos autarcas, mas, em especial, dos autarcas do Partido Comunista, que conheço, penso que

era necessário que o Partido Comunista tivesse um papel mais ativo neste processo de discussão.

Por isso, pergunto-lhe, Sr.ª Deputada Paula Santos, se o PC está disponível,…

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — O PCP!

O Sr. Norberto Patinho (PS): — … desculpe, se o PCP está disponível para contribuir ativamente na

discussão que se vai seguir para o reforço das competências das autarquias locais, permitindo também aos

autarcas que assumam o protagonismo que é necessário neste processo de desenvolvimento territorial e de

coesão social.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado

Pedro Alves.

O Sr. Pedro Alves (PSD): — Sr. Presidente, antes de mais, quero começar por dizer à Sr.ª Deputada Paula

Santos, do Partido Comunista Português, que os Deputados do PSD, em relação à descentralização, não são

«verbos-de-encher», respeitam muito o trabalho, a opinião e a posição dos seus autarcas no âmbito da

Associação Nacional de Municípios Portugueses. Espero também que o PCP respeite o trabalho dos seus

autarcas nessa Associação.

Aplausos do PSD.

Embora a descentralização esteja, hoje, no centro do nosso debate político sobre o interior, não podemos

considerá-la, de forma alguma, como o alfa e o ómega das assimetrias regionais. Não podemos ficar apenas

por aqui; caso contrário, ficaremos muito aquém das necessidades do interior.

A recente tragédia dos incêndios tornou claro que a coesão territorial é, simplesmente, uma questão de

regime, que o combate às assimetrias é, hoje, um desafio estruturante e decisivo para o futuro do nosso País.

Porém, enquanto não avançamos para esta reforma, quero convidar as Sr.as e Srs. Deputados a fazerem

uma pequena avaliação das assimetrias regionais que, hoje, vive o nosso País, fruto da ação deste Governo, e

que têm sido alvo de grande preocupação na região de Viseu.

Começo pela saúde, que também aqui já foi referida. O Centro Hospitalar Tondela-Viseu, que, até agora, era

uma unidade de excelência e de referência para a região Centro, vive, hoje, tempos de grande desassossego e

sobressalto. Desde logo, pela marca de água socialista: aumento significativo da dívida e dos prazos de

pagamento aos fornecedores; grave carência de recursos humanos nos diferentes serviços — faltam mais de

100 enfermeiros, faltam 65 médicos especialistas, falta de técnicos superiores de saúde, de técnicos de

diagnóstico e terapêutica, de assistentes técnicos, de assistentes operacionais. Tudo isto se reflete no acesso

dos utentes aos cuidados de saúde e facilmente podemos verificar através do aumento do tempo de espera

para consultas, para cirurgias, para tratamentos e para exames e também, de uma forma geral, através na

redução da capacidade, da produtividade e da qualidade do Centro Hospitalar.

Além disso, há um atraso incompreensível na concretização de alguns investimentos que são fundamentais

para a qualidade do Centro Hospitalar, como são as obras de ampliação do Serviço de Urgência e também a

construção de um centro oncológico. Segundo o Conselho de Administração, ainda nada foi feito, porque não

há autorização das Finanças, ou seja, não há dinheiro.

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E grave, muito grave, falhas no fornecimento de materiais e de medicamentos, bem como da manutenção

de alguns equipamentos. Pasme-se, chegou-se ao ponto de haver rutura de stock das fraldas no Serviço de

Pediatria e de o Centro Hospitalar ter de se socorrer de uma grande superfície comercial local para aí adquirir

as fraldas.

É isto que se passa no Centro Hospitalar Tondela-Viseu!

Falemos agora de infraestruturas, e está bem recente na memória de todos nós a questão do IP3. É este o

maior embuste do Governo. A boa escola de propaganda e de encenação de José Sócrates está de volta! Estão

de volta também à estrada as tendinhas, mas, desta vez, vá-la, com alguma modéstia, sem alguns coktails. É

inadmissível e revelador de uma enorme falta de sentido de Estado que o Primeiro-Ministro coloque em

consideração a opção entre obras e pessoas. As pessoas, para nós, serão sempre a nossa prioridade.

Deixem-me ser um pouco irónico: quero aqui pedir desculpa aos professores, porque o Primeiro-Ministro

anunciou que a recuperação do serviço para efeitos de carreira não é possível por causa das obras do IP3. Mas

que também fique aqui claro que não aceitamos ser o bode expiatório para as más opções e decisões do

Governo!

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Não? A sério?!

O Sr. Pedro Alves (PSD): — Todos sabemos que havia outras opções, que o Governo, o Partido Socialista,

o Bloco, o PCP e Os Verdes rejeitaram por questões de natureza ideológica. Isso, sim, é governar! Governar é

fazer opções e, se as opções tomadas têm consequências e afetam a vida dos professores e dos funcionários

públicos, então quem as tomou deve ser politicamente penalizado.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Vocês é que estão a dar apoio ao Governo! Deixe-se dessa conversa!

O Sr. Pedro Alves (PSD): — E quanto à obra em si? Falemos, então, da obra, do IP3. Como é possível ter-

se o descaramento de aproveitar o lançamento de um concurso de uma empreitada simples, de requalificação

do traçado para recuperar o traçado original, não se apresentar qualquer calendário com a obra e passar tudo

para o final de 2019? É isto! Esta é a realidade dos factos. É assim que o Governo tem tratado a nossa região,

o interior e todo o País.

Sr.ª Deputada, quero então perguntar-lhe, para que não se esqueça: onde estava a Sr.ª Deputada no dia 25

de novembro de 2015? Ou no dia 3 de dezembro de 2015? Onde estava, também, no dia 15 de março de 2016?

Onde estava no dia 29 de novembro de 2016? Ou no dia 27 de novembro de 2017?

Eu digo-lhe, Sr.ª Deputada: estava aqui, nesta Casa, a aprovar o Programa de Governo e a aprovar os

Orçamentos do Estado de 2016, de 2017 e de 2018.

Aplausos do PSD e do CDS.

Protestos do PCP.

Esses, sim, são a causa da gravidade destas assimetrias

Protestos do PCP.

Por isso, Sr.ª Deputada, por muitas desculpas que arranje, tudo o resto são lágrimas de crocodilo.

Aplausos do PSD e do CDS.

Protestos do PCP.

O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Paula Santos.

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A Sr.ª PaulaSantos (PCP): — Sr. Presidente, começo por agradecer as questões do Sr. Deputado Pedo

Alves e do Sr. Deputado Norberto Patinho.

Começando por responder ao Sr. Deputado Pedro Alves sobre onde é que nós estávamos, digo-lhe que

estávamos a impedir a desastrosa política do PSD e do CDS, de cortes nos salários, de cortes nas pensões, de

cortes na escola pública, no Serviço Nacional de Saúde.

Aplausos do PCP.

Protestos do PSD e do CDS

Não pusemos o conta-quilómetros a zero em janeiro de 2016, como o PSD e o CDS. Os problemas que hoje

existem têm responsáveis. E os Srs. Deputados do PSD e do CDS são responsáveis, porque não resolveram

nenhum problema, só os agravaram.

Aplausos do PCP.

Sr. Deputado, deixe-me dizer-lhe que compreendo o vosso incómodo. É que estão envergonhados com o

acordo que fizeram com o Governo do Partido Socialista em matéria de descentralização e continuam a não

querer falar sobre essa matéria. Nós percebemos a vossa vergonha relativamente a essa matéria. A vossa

postura relativamente a estas questões e no que diz respeito ao acordo que acertaram com o Governo do Partido

Socialista vai no sentido de prejudicar as populações, daí esse vosso incómodo.

Sr. Deputado Norberto Patinho, de facto, os eleitos do PCP e da CDU nas autarquias sempre tiveram a

postura de valorização das populações, de tudo fazer para defender os interesses das populações. Lamento é

que o Partido Socialista não procure encontrar consenso com o PCP. É que nós apresentámos propostas

concretas relativamente a esta matéria, sobre as condições para uma verdadeira transferência de competências,

princípios, objetivos, critérios e condições que devem ser respeitados; apresentámos uma proposta de lei sobre

a Lei das Finanças Locais, de raiz,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente.

A Sr.ª PaulaSantos (PCP): — … que rompe com a atual lei, numa perspetiva de recuperação de capacidade

financeira das autarquias; apresentámos uma proposta no sentido de se iniciar um processo de regionalização

e apresentámos uma proposta para a criação das autarquias metropolitanas.

O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Tem de terminar, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª PaulaSantos (PCP): — Viemos à discussão de uma forma construtiva, viemos à discussão com

propostas concretas. O Partido Socialista é que tomou a sua opção por convergir com o PSD. E para convergir

com o PSD exatamente no sentido oposto àquele que a nossa Constituição defende quando fala nas questões

de descentralização e em relação ao princípio de descentralização, porque a regionalização ficou de fora e

quanto à reposição das freguesias nem falar. Aquilo que está em cima da mesa é não resolver nenhum problema

e transferir os encargos com as autarquias. Isso, Sr. Deputado, não podemos acompanhar.

Consideramos que esse não é o caminho, nem de reforço do poder local democrático, nem de garantia dos

direitos das funções sociais que a nossa Constituição consagra, nem de melhoria do serviço público que o

Estado presta.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: (José de Matos Correia) — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Renato

Sampaio, do Grupo Parlamentar do PS.

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O Sr. RenatoSampaio (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A descentralização de competências

para as autarquias é a base fundamental da reforma do Estado. Esta é uma reforma que todos proclamam,

todos reclamam, todos prometem, mas que, na prática, até hoje, nunca foi verdadeiramente concretizada. O que

hoje temos não passa de um mero estabelecimento de protocolos, de contratos-programa ou de outros

instrumentos administrativos entre a administração central e a administração local. Esta não é uma boa prática

de governação, porque não garante autonomia desejável do poder local, cria desigualdades entre municípios e

desresponsabiliza quem tem obrigação de executar projetos e de implementar políticas públicas essenciais.

Inventaram-se modelos de organização territorial que nos faziam crer que a descentralização passava por

aí, como foi o caso particular da reforma imposta da administração do território, que falhou, porque imposta e

implementada sem a participação dos vários decisores políticos e contra os cidadãos.

Portugal é um dos países menos descentralizados da Europa, onde impera o centralismo, que nos tem

conduzido a um Estado burocratizado, feito de lentas decisões, de duplicação de estruturas de gestão e de

desresponsabilização dos gestores públicos.

A descentralização enquanto modelo de organização do território pode ser concretizada por duas vias: pela

regionalização ou pela transferência de competências para a administração local. O PS sempre defendeu a

regionalização e não abdica dela, não abdica deste desígnio e sobre esta matéria não recebe lições de ninguém.

Mas a regionalização está hoje muito comprometida pela imposição do referendo vinculativo constitucionalmente

consagrado.

Resta-nos, de momento, a transferência de competências para as autarquias locais, se quisermos e se existir

a vontade política de concretizarmos esta importante reforma.

Por parte do Governo e do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, existe essa vontade política de construir

um amplo consenso nesta Câmara, por forma a garantir a estabilidade destas políticas, um bem maior do Estado

democrático, e assim fazer com que esta reforma não esteja à mercê das maiorias conjunturais que se venham

a formar no futuro. Temos consciência de que as autarquias, por estarem mais próximas dos cidadãos, da

tomada de decisões e pelo conhecimento que têm da realidades locais e dos seus territórios, estão em melhores

condições para executarem políticas públicas essenciais, com maior eficiência, melhores critérios de

transparência e confiança, maior racionalização dos recursos disponíveis, contribuindo assim para o

desenvolvimento local efetivo, para a coesão económica e social do território, reforçando ainda a solidariedade

intermunicipal, promovendo políticas ativas para a valorização do interior e a fixação de pessoas nestes

territórios.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, hoje, o poder local é uma realidade consistente que nos permite

promover uma descentralização adequada, efetiva e necessária à realidade dos diversos territórios, potenciando

uma governação de proximidade e o uso eficiente dos recursos locais. Todavia, para este desígnio se

concretizar, é necessário desenvolver um novo quadro de financiamento da administração local para

acompanhar o reforço das competências das autarquias, convergindo, conforme a meta estabelecida no

programa nacional de reformas, para a média europeia em termos de participação das autarquias nas receitas

públicas.

Foi o que o Governo fez com a apresentação de uma proposta de alteração à Lei das Finanças Locais,

compatibilizando assim as novas competências com o novo modelo de financiamento.

O Sr. Presidente: (José de Matos Correia) — Tem de terminar, Sr. Deputado.

O Sr. Renato Sampaio (PS): — Temos em processo legislativo um conjunto de propostas do Governo com

o objetivo de transferir novas competências para as autarquias locais, bem como uma profunda alteração à Lei

das Finanças Locais.

A esta Câmara está atribuída a responsabilidade de aprovar esta decisiva reforma da Administração Pública.

O Grupo Parlamentar do PS quer contribuir para que se crie um amplo consenso nestas políticas e, assim,

estamos disponíveis para trabalhar com todos — com todos sem exceção — para promovermos uma verdadeira

descentralização do Estado.

Aplausos do PS.

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O Sr. Presidente: (José de Matos Correia) — Como cabe ao Partido Social Democrata encerrar o debate,

pergunto ao CDS-PP se deseja utilizar o tempo que ainda lhe resta.

Pausa.

Como o CDS-PP não deseja intervir, tem a palavra, para encerrar o debate, a Sr.ª Deputada Berta Cabral,

do Grupo Parlamentar do PSD.

A Sr.ª BertaCabral (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Este debate sobre desigualdades

territoriais e descentralização focou-se substancialmente na questão da descentralização, mas o PSD, quando

marcou este debate, queria ir muito mais longe porque considera que descentralização e valorização do interior,

valorização do território são faces da mesma moeda.

Pese embora o enorme avanço e evolução que se deu nos últimos 40 anos em matéria de poder local,

Portugal continua, apesar disso, a ser um País demasiado centralizado que tem vindo a assistir ao acentuar

progressivo das assimetrias regionais.

Descentralizar não é condição suficiente para promover o desenvolvimento coeso do País, mas é,

seguramente, condição necessária. Por isso, o PSD, a par do seu pioneirismo de liderança em matéria de

delegação de competências nas autarquias locais e em matéria de iniciativa legislativa sobre descentralização,

apresentou igualmente um projeto de criação do Estatuto dos Territórios de Baixa Densidade e apresenta agora

um projeto de lei — que é este que estamos a discutir — para a criação de uma comissão independente para a

descentralização e para a organização subnacional do Estado. Houve quem a chamasse aqui de comissão para

descentralização, erradamente — comissão para a descentralização e para a organização subnacional do

Estado.

Os problemas, Sr.as e Srs. Deputados, estão identificados. Temos, por isso, de nos concentrar nas soluções.

E o Movimento para o Interior, que congregou individualidades de competência reconhecida e de vários

quadrantes políticos, deu um extraordinário contributo através da apresentação de 24 medidas que não

podemos deixar de considerar.

Desafiamos, por isso, o Governo e os demais partidos deste Parlamento para que, no próximo Orçamento,

se possa dar execução a medidas que incentivem a manutenção e a captação de investimento e de emprego

no interior do País. O desafio é, pois, o de lançar mãos à obra e estruturar um edifício jurídico e administrativo

de nível subnacional que, ao abrigo do princípio da subsidiariedade, seja capaz de conjugar descentralização

com valorização do território.

A celebração do acordo assinado entre o PSD e o Governo sobre descentralização é um sinal claro da

vontade, da determinação e da urgente necessidade de trabalharmos por um País mais igualitário, mais atento

às especificidades regionais e mais solidário.

Sr.as Deputadas e Srs. Deputados, o PSD tem provas dadas. As autonomias regionais instituídas pela mão

do PSD são prova disso. Sem as competências próprias, consagradas nos estatutos político-administrativos das

regiões autónomas e sem os recursos europeus acrescidos, por força do estatuto de ultraperiferia, a realidade

social e económica destas regiões seria completamente diferente.

Importa também ter em conta que há um longo caminho a percorrer e que os indicadores económicos e

sociais destas regiões, em particular dos Açores, ainda são muito preocupantes. É por isso que o Governo, na

nossa opinião, tem de ter mais ambição na negociação do próximo quadro financeiro plurianual, porque as

regiões e o interior do País não podem perder fundos nesta etapa do pós-2020. Pelo contrário, tem de haver

crescimento dos fundos de coesão, tem de haver crescimento dos fundos da política agrícola comum e tem de

haver, para os Açores e para Madeira, crescimento do programa específico designado por POSEI (Programa de

Opções Específicas para o Afastamento e a Insularidade nas Regiões Ultraperiféricas). Temos de fazer da

coesão territorial uma causa nacional e o PSD, nessa matéria, diz «presente!»

Orgulhamo-nos, quer no poder, quer na oposição, de fazermos prevalecer o sentido de responsabilidade e o

interesse nacional. O passo em frente que hoje damos para esta segunda fase do processo de descentralização

insere-se nesta postura reformista e de propositura.

Gostamos demais do nosso País e gostamos demais das nossas regiões para nos demitirmos da

responsabilidade de dar a Portugal um futuro melhor.

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Aplausos do PSD.

Entretanto, reassumiu a presidência o Presidente, Eduardo Ferro Rodrigues.

O Sr. Presidente: — Está encerrado este debate.

Dou, agora, a palavra ao Sr. Secretário Duarte Pacheco para dar conta de várias iniciativas que, entretanto,

deram entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e

foram admitidas, várias iniciativas legislativas.

Refiro, em primeiro lugar, a proposta de lei n.º 140/XIII (3.ª) — Autoriza o Governo a estabelecer o regime

sancionatório aplicável ao exercício da atividade da pesca comercial marítima, que baixa à 7.ª Comissão, em

conexão com a 1.ª Comissão.

Deram também entrada na Mesa os projetos de lei n.os 935/XIII (3.ª) — Desincentiva a utilização de

microplásticos em produtos de uso corrente, como cosméticos e produtos de higiene, de modo a salvaguardar

os ecossistemas e a saúde pública (Os Verdes), que baixa à 11.ª Comissão, 936/XIII (3.ª) — Impede o cultivo e

a libertação deliberada em ambiente de organismos geneticamente modificados (OGM) (Os Verdes), que baixa

à 7.ª Comissão, em conexão com a 11.ª Comissão, 937/XIII (3.ª) — Alarga a abrangência das regras de

rotulagem para os alimentos geneticamente modificados (Os Verdes), que baixa à 7.ª Comissão, em conexão

com a 6.ª Comissão, e 938/XIII (3.ª) — Regula o cultivo de variedades agrícolas geneticamente modificadas

(OGM) (PCP), que baixa à 7.ª Comissão, em conexão com a 11.ª Comissão.

Deram ainda entrada na Mesa os projetos de resolução n.os 1750/XIII (3.ª) — Recomenda ao Governo a

elaboração de relatório anual sobre a política de asilo em Portugal (PS), que baixa à 1.ª Comissão, 1751/XIII

(3.ª) — Recomenda ao Governo que promova a melhoria das condições de saúde mental, em ambiente laboral,

nas forças e serviços de segurança, criando um programa de promoção da resiliência psicológica dos

operacionais (PAN), que baixa à 1.ª Comissão e 1752/XIII (3.ª) — Pela ampliação e melhoria da capacidade

operacional da pista do aeroporto da Horta (PCP), que baixa à 6.ª Comissão.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, antes de votarmos, na generalidade, o projeto de lei que esteve hoje

em debate, vamos proceder à verificação do quórum, utilizando o sistema eletrónico.

Pausa.

O quadro eletrónico regista 197 presenças, às quais se acrescentam 5, dos Srs. Deputados Constança

Urbano de Sousa e Luís Moreira Testa, do PS, António Leitão Amaro, do PSD, e Assunção Cristas e Vânia Dias

da Silva, do CDS-PP, perfazendo 202 Deputados, pelo que temos quórum para proceder às votações.

Vamos, então, votar, na generalidade, o projeto de lei n.º 890/XIII (3.ª) — Cria a comissão independente para

a descentralização (PS e PSD).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD e do PS, votos contra do BE, do PCP, de Os

Verdes e do Deputado do PS Paulo Trigo Pereira e a abstenção do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado do PAN está ausente.

O Sr. Deputado Paulo Trigo Pereira pediu a palavra. Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Paulo Trigo Pereira (PS): — Sr. Presidente, é para anunciar que entregarei uma declaração de voto,

por escrito, sobre a votação deste projeto.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, fica registado.

Chegamos, assim, ao fim da sessão de hoje.

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Srs. Deputados, a próxima reunião plenária terá lugar amanhã, quinta-feira, às 15 horas. Da ordem do dia

constará, como ponto único, a interpelação ao Governo n.º 22/XIII (3.ª) — Sobre a defesa do Serviço Nacional

de Saúde (Os Verdes).

Desejo a todos uma boa tarde.

Está encerrada a sessão.

Eram 16 horas e 56 minutos.

———

Declaração de voto enviada à Mesa para publicação

Relativa ao projeto de lei n.º 890/XIII (3ª):

O projeto de lei n.º 890/XIII (3.ª), apresentado pelo PS e PSD vem na sequência da assinatura da Declaração

Conjunta sobre a Descentralização, entre o Governo PS (pelo Ministro Eduardo Cabrita) e o PSD (por Álvaro

Amaro, PSD e ANMP) em 18 de abril de 2018. Este projeto pretende proceder à criação de uma Comissão

Independente para a Descentralização cuja missão consiste, entre outros, em promover um estudo sobre a

«organização e funções do Estado», «promover um programa de desconcentração da localização de entidades

e serviços públicos, assegurando coerência na presença do Estado no território», avaliando os recursos e meios

próprios a transferir para assegurar todo este processo.

De acordo com o referido projeto esta comissão será composta por sete personalidades, incluindo um

coordenador, de reconhecida competência e mérito científico, designados pela Assembleia da República,

contando com o apoio de instituições do ensino superior de reconhecidas competências no domínio da

investigação sobre as políticas públicas e tendo um conjunto de atribuições já referidas e das quais também se

destaca a elaboração de um conjunto de estudos e a realização de auscultações e de debates públicos que

deverão culminar na apresentação pela Comissão, até julho de 2019, de relatórios da atividade desenvolvida e

de anteprojetos de diplomas que serão referencial para iniciativas legislativas subsequentes que se revelem

necessárias.

Face ao enquadramento geral desta Comissão Independente existe um conjunto de objeções e de

preocupações que se nos levantam, que apresentamos de seguida e que nos impelem a votar contra este projeto

de lei.

Em primeiro lugar, levanta-se-nos uma objeção de base acerca do sentido e pertinência de constituir uma

comissão independente para apresentar propostas, na sequência de uma avaliação e estudo independentes,

nos domínios da descentralização, organização e funções do Estado. Isto porque se trata de decisões de

natureza, não técnica, mas político-ideológica sob as quais não há, nem deve haver, tratamento ou análise

puramente independente e técnica. Em nosso entender, o poder político, cada partido em particular, não deve

eximir-se de deliberar e de definir o sentido geral desta reforma estruturante para o nosso país. Isto sem prejuízo

de posteriormente, e uma vez definida essa orientação política geral poder haver a intervenção de uma comissão

técnica para contribuir para propostas legislativas que traduzirão essa orientação geral (o que, de resto, já

sucedeu no passado). Porém, não é isso que aqui surge: o que se propõe é que seja esta comissão

independente a propor a orientação política desta reforma e as propostas que a concretizam. Nesta matéria não

devem existir processos de desresponsabilização de decisões do poder político, mas antes uma clarificação das

opções político-ideológicas de cada partido e de eventuais acordos políticos que definam as orientações gerais

da descentralização e desconcentração.

Em segundo lugar, não fica claro da análise do articulado deste projeto de lei em que medida e termos se

concretizará o apoio das instituições do ensino superior ao trabalho desenvolvido pela Comissão previsto no art.

2.º/3 do Projeto. Da análise do projeto de lei não é possível descortinar em que termos se aferem as

«reconhecidas competências académicas na investigação sobre as políticas públicas» destas instituições, em

que termos se procederá à escolha destas instituições, se estão (ou não) em causa apenas instituições públicas

e a que título (gracioso ou não) se processa este apoio. Estas não são questões de menor importância.

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Em terceiro lugar, importa notar que o referido projeto de lei prevê a equiparação dos membros desta

Comissão a dirigentes superiores de 1.º grau para efeitos remuneratórios (art. 7.º/5) e, em geral, o exercício de

funções sem exclusividade (art. 7.º/1),sendo os encargos decorrentes do apoio logístico, financeiro e

administrativo que se mostrem necessários ao trabalho da Comissão suportados exclusivamente pela

Assembleia da República e pelo seu orçamento (art. 8.º). Esta equiparação, para efeitos remuneratórios, dos

membros da comissão com os dirigentes superiores de 1.º grau apresenta-se-nos como injustificada pela

desproporcionalidade das remunerações aqui em jogo e pela excessiva (e injustificada) oneração do orçamento

da Assembleia da República com tais remunerações.

É certo que estes artigos 7.º/1 e 5 e 8.º certamente se inspiram claramente nos artigos 7.º/1 e 4 e 8.º da Lei

n.º 49-A/2017, de 10 de Julho, relativos à Comissão Técnica Independente para análise e apuramento dos factos

trágicos que ocorreram em Portugal nos dias 17 e 24 de Junho de 2017 e em relação à qual mostrei a minha

concordância devido à absoluta excecionalidade dos factos que fundamentaram a sua constituição. O que fazer,

na sequência da tragédia dos incêndios é algo que exige antes do mais uma resposta técnica que ultrapassa

decerto a capacidade dos deputados e dos partidos políticos apresentarem soluções adequadas. Porém, no

caso da descentralização essa excecionalidade não só não existe, como também foge daquela que foi a prática

relativamente a grupos de trabalho e comissões técnicas para a elaboração de reformas do poder local que

existiram no passado, nomeadamente as de iniciativa governativa.

Em quarto lugar, da análise que fizemos do presente projeto de lei não nos parece que o mesmo preveja

mecanismos que assegurem a articulação e conexão das eventuais propostas de diplomas legislativos

resultantes dos trabalhos da Comissão com o pacote de diplomas sobre matéria legislativa conexa que já deram

entrada na Assembleia da República (e que inclusivamente já foram, em alguns casos, discutidos em plenário

— como sucedeu, por exemplo, num conjunto de alterações no plano das finanças locais que acabaram por

baixar à 5.ª comissão). Assim, não se percebe em que medida o trabalho da Comissão pode ser, na atual fase

do processo, uma mais-valia, já que pode fazer surgir propostas que podem gerar confusões e atrasos

desnecessários no processo de discussão que atualmente já está em curso no plano da Assembleia da

República, atrasando ainda mais a implantação desta reforma estruturante no nosso país. A criação desta

comissão independente é, neste contexto, uma forma de desresponsabilização da Assembleia da República,

num domínio nobre da sua atuação, de que não deveria ser alheada.

Que fique claro que nada tenho a opor, antes pelo contrário, a um acordo que inclua PS e PSD, e eventuais

outros partidos, sobre a descentralização e a desconcentração. Tenho mesmo pugnado por acordos alargados

em matérias de regime. Discordo, porém, do processo concreto de implementação deste acordo.

Assim, face aos argumentos, de substância e de forma, acima aduzidos, não posso acompanhar este projeto

de lei.

O Deputado do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, Paulo Trigo Pereira.

——

Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO.

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