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I SÉRIE — NÚMERO 37

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O Sr. António Filipe (PCP): — Está mais que demonstrado que não é a maior ou menor moldura penal que

impede a prática de crimes. É claro que a crimes graves devem corresponder penas graves, mas devem ser

evitados aumentos avulsos de penas que nos conduzam a um sistema penal desequilibrado e incoerente.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. António Filipe (PCP): — Percebe-se a intenção dos proponentes de agravar as penas para além dos

cinco anos para evitar a suspensão das penas de prisão, mas esse é um problema do Código Penal que não

pode ser resolvido à peça. Ou se volta atrás na decisão tomada há uns anos de permitir a suspensão da

execução de penas de prisão inferiores a cinco anos ou se excluem certos crimes da possibilidade de

suspensão. O que não se pode fazer é aumentar as penas de certos crimes para evitar a suspensão da execução

das penas de prisão.

A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — Muito bem!

O Sr. António Filipe (PCP): — Em segundo lugar, discordamos da consideração da violação como crime

público. Discordamos precisamente em nome da proteção dos direitos das vítimas. Um crime considera-se

público quando essa consideração é do interesse da sociedade. O crime é semipúblico e depende de queixa

quando se remete para o interesse da vítima a ponderação do que fazer em face do crime. Salvo no caso dos

menores, a que o Código Penal já dá resposta, obrigar uma vítima de violação a participar num processo contra

a sua vontade pode levar a uma revitimização que é contraproducente. Também neste aspeto a vítima deve ter

direito à autodeterminação, não pode ser instrumental à realização de uma justiça pública.

Argumenta-se, por analogia, com a violência doméstica. Embora as situações não sejam idênticas, no caso

da violência doméstica permite-se que a vítima possa suspender o processo, o que no caso vertente não se

propõe.

Finalmente, defende-se o agravamento do regime penal proposto com a ideia de alterar a consciência social

relativamente a certo tipo de crimes. O problema é que não é essa a função do direito penal. O direito penal é

uma última ratio de intervenção para a proteção de bens jurídicos fundamentais consolidados. Não é pela via

da repressão penal que se alteram consciências sociais.

Concluímos, pois, afirmando que compartilhamos as preocupações quanto à necessidade de encontrar boas

soluções para a tutela penal adequada dos crimes sexuais, atenta a sua enorme gravidade, mas não nos

identificamos com falsas soluções como as que são propostas, que, podendo ser mediaticamente sedutoras,

são erradas do ponto de vista do interesse das vítimas e da coerência que deve ter uma adequada política

criminal.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Alves Moreira, do Partido

Socialista.

A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — Sr. Presidente, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados: Como se prova uma

violação? Como qualquer crime. Esta deveria ser a resposta óbvia e a resposta certa. O tempo da coutada do

macho ibérico não tem hoje cabimento no nosso Código Penal. As fundamentações sexistas que chocaram o

País não se corrigem na lei, porque a lei, pura e simplesmente, não as acolhe. Foi por isso que, como muita

gente, a propósito, por exemplo, da invocação da Bíblia para pisar uma mulher, fui para a rua, como outras

pessoas, dizer «justiça machista não é justiça». Mas não podemos, qual legisladores transformados em ativistas

de casos, ir mudando a lei para reduzir a zero a possibilidade de más fundamentações judiciais.

O PS está disponível para participar numa discussão séria, difícil, como são sempre as que se referem a

tipificações penais, e fará uma proposta a curto prazo no que toca à concretização da Convenção de Istambul

em matéria de consentimento da vítima.

O que está em causa nestes projetos é eliminar as referências à «violência» ou à «ameaça grave» nos crimes

de coação sexual e de violação, numa formulação da qual resulte claro que há uma enorme diferença entre —

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