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Quinta-feira, 7 de março de 2019 I Série — Número 58
XIII LEGISLATURA 4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2018-2019)
REUNIÃOPLENÁRIADE6DEMARÇODE 2019
Presidente: Ex.mo Sr. Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues
Secretários: Ex.mos Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco Sandra Maria Pereira Pontedeira António Carlos Bivar Branco de Penha Monteiro Ana Sofia Ferreira Araújo
S U M Á R I O
O Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 8
minutos. Deu-se conta da entrada na Mesa dos Projetos de Lei n.os
1141 a 1146/XIII/4.ª, dos Projetos de Resolução n.os 2006 a 2017 e 2019 a 2023/XIII/4.ª e das Apreciações Parlamentares n.os 122 e 123/XIII/4.ª.
No âmbito de um debate, marcado pelo PS, sobre o tema «combate à desinformação — em defesa da democracia», foi apreciado o Projeto de Resolução n.º 2018/XIII/4.ª (PS) — Recomenda a adoção de medidas para a aplicação em Portugal do Plano Europeu de Ação contra a Desinformação,
que foi, depois, aprovado. Usaram da palavra no debate, a diverso título, os
Deputados José Magalhães (PS), Pedro Filipe Soares (BE), Carlos Abreu Amorim (PSD), Telmo Correia (CDS-PP), Diana Ferreira (PCP), Carlos Peixoto (PSD), Pedro Delgado Alves (PS), Luís Monteiro (BE), António Filipe (PCP), Margarida Marques (PS), Vânia Dias da Silva (CDS-PP), Margarida Mano (PSD) e Carla Sousa (PS).
O Presidente encerrou a sessão eram 16 horas e 59 minutos.
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O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, Sr.as e Srs. Funcionários, Sr.as e Srs. Jornalistas, vamos dar
início à reunião plenária.
Eram 15 horas e 8 minutos.
Peço aos Srs. Agentes da autoridade para abrirem as portas das galerias ao público.
A nossa ordem do dia tem no primeiro ponto uma marcação do PS sobre tema «combate à desinformação
— em defesa da democracia».
Antes de entrarmos na ordem do dia, vou dar a palavra ao Sr. Secretário Duarte Pacheco para proceder à
leitura de um longo expediente.
Tem a palavra, Sr. Secretário.
O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e
foram admitidas, várias iniciativas legislativas.
Refiro, em primeiro lugar, os Projetos de Lei n.os 1141/XIII/4.ª (PSD) — Cria um fundo de apoio ao
associativismo jovem no estrangeiro, que baixa à 12.ª Comissão, em conexão com a 2.ª Comissão, 1142/XIII/4.ª
(PSD) — Criação do programa Comunidades Portuguesas no Feminino, que baixa à 2.ª Comissão, em conexão
com a 1.ª Comissão, 1143/XIII/4.ª (BE) — Valorizações remuneratórias dos docentes do ensino superior, que
baixa à 10.ª Comissão, em conexão com a 8.ª Comissão, 1144/XIII/4.ª (CDS) — Nomeação dos membros das
entidades administrativas independentes, que baixa à 1.ª Comissão, 1145/XIII/4.ª (PCP) — Revoga o regime
fundacional e estabelece um modelo de gestão democrática das instituições públicas de ensino superior
(Primeira alteração à Lei n.º 62/2007, de 10 de setembro, que estabelece o regime jurídico das instituições do
ensino superior), que baixa à 8.ª Comissão, e 1146/XIII/4.ª (Deputado não inscrito Paulo Trigo Pereira) — Alarga
os direitos de cidadania no âmbito das Iniciativas Legislativas dos Cidadãos (Procede à quarta alteração à Lei
n.º 17/2003, de 4 de junho), que baixa à 1.ª Comissão.
Deram também entrada na Mesa os Projetos de Resolução n.os 2006/XIII/4.ª (CDP-PP) — Recomenda ao
Governo a reabilitação da EN225, que baixa à 6.ª Comissão, 2007/XIII/4.ª (PAN) — Recomenda ao Governo
que publique o diploma que estabelece o regime jurídico da prevenção da contaminação e remediação dos
solos, que baixa à 11.ª Comissão, 2008/XIII/4.ª (PSD) — Recomenda ao Governo que elabore um programa de
mentoria para jovens emigrantes, em estreita cooperação com o IEFP (Instituto do Emprego e Formação
Profissional) e os consulados portugueses, que baixa à 2.ª Comissão, 2009/XIII/4.ª (PSD) — Recomenda ao
Governo a realização de um Fórum Nacional da Emigração e das Comunidades Portuguesas, que baixa à 2.ª
Comissão, 2010/XIII/4.ª (PSD) — Recomenda a criação de um programa de incentivos à fixação em Portugal
de empresas criadas por portugueses no estrangeiro, que baixa à 2.ª Comissão, 2011/XIII/4.ª (PSD) —
Recomenda ao Governo que apoie a criação de um portal do emigrante e de um guia de regresso do emigrante,
que baixa à 2.ª Comissão, 2012/XIII/4.ª (PSD) — Recomenda ao Governo a promoção do contingente de acesso
ao ensino superior aos jovens portugueses no estrangeiro, que baixa à 2.ª Comissão, 2013/XIII/4.ª (PCP) —
Recomenda ao Governo que intensifique o controlo das espécies invasoras no Parque Nacional da Peneda-
Gerês, 2014/XIII/4.ª (PAN) — Recomenda ao Governo um conjunto de ações com vista à limitação do uso de
produtos que contenham glifosato, que baixa à 7.ª Comissão, 2015/XIII/4.ª (CDS-PP) — Recomenda ao Governo
que coopere de forma ativa com a emigração portuguesa empreendedora, que baixa à 2.ª Comissão,
2016/XIII/4.ª (CDS-PP) — Recomenda ao Governo que proceda à imediata retirada das placas de fibrocimento
existentes na Escola Secundária Dr. João Carlos Celestino Gomes, de Ílhavo, e programe e agende as
necessárias obras de reabilitação, 2017/XIII/4.ª (PSD) — Recomenda ao Governo a criação de um plano de
incentivo à fixação em Portugal de membros da nossa diáspora, que baixa à 2.ª Comissão, 2019/XIII/4.ª (PSD)
— Reabilitação da Escola Básica e Secundária de Fajões, no concelho de Oliveira de Azeméis, distrito de Aveiro,
2020/XIII/4.ª (PCP) — Recomenda ao Governo a divulgação dos estudos sobre as populações de javalis no
território nacional e prejuízos causados aos agricultores e o desenvolvimento de um plano de medidas para
controlo das populações desta espécie, que baixa à 7.ª Comissão, 2021/XIII/4.ª (PCP) — Adota medidas com
vista à melhoria da eficiência energética de edifícios e equipamentos públicos, que baixa à 6.ª Comissão,
2022/XIII/4.ª (PCP) — Recomenda ao Governo o reforço das medidas de apoio aos doentes com doença
inflamatória do intestino, que baixa à 9.ª Comissão, e 2023/XIII/4.ª (PCP) — Recomenda ao Governo a
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realização de um programa de emergência para a valorização dos museus, palácios, monumentos e sítios
arqueológicos, que baixa à 12.ª Comissão.
Deu ainda entrada na Mesa as Apreciações Parlamentares n.º 122/XIII/4.ª (PCP) — Relativa ao Decreto-Lei
n.º 19/2019, de 28 de janeiro, que aprova o regime das sociedades de investimento e gestão imobiliária (SIGI)
e n.º 123/XIII/4.ª (PCP) — Relativa ao Decreto-Lei n.º 25/2019, de 11 de fevereiro, que «Estabelece o número
de posições remuneratórias das categorias da carreira especial de técnico superior das áreas de diagnóstico e
terapêutica e identifica os respetivos níveis da tabela remuneratória única. Define ainda as regras de transição
dos trabalhadores integrados na carreira de técnico de diagnóstico e terapêutica, prevista no Decreto-Lei nº
564/96, de 21 de dezembro, para a carreira especial de técnico superior das áreas de diagnóstico e terapêutica».
É tudo, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Sr. Secretário Duarte Pacheco, obrigado pela leitura destas várias iniciativas que deram
entrada na Mesa.
Passamos ao debate, marcado pelo PS, sobre o tema «combate à desinformação — em defesa da
democracia», com a apreciação do Projeto de Resolução n.º 2018/XIII/4.ª (PS) — Recomenda a adoção de
medidas para a aplicação em Portugal do Plano Europeu de Ação contra a Desinformação.
Para abrir o debate, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães, do Grupo Parlamentar do PS.
O Sr. José Magalhães (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do Partido
Socialista traz, hoje, ao Plenário da Assembleia da República a questão da aplicação, em Portugal, do Plano
Europeu de Ação contra a Desinformação. É um debate sobre a defesa da democracia.
Este Plano é um bom exemplo de como a ação conjunta dos Estados-Membros permite obter, à escala
europeia, mais-valias que de outra forma não seriam possíveis. Vejo muitos jovens nas galerias. É, certamente,
um acaso, mas vem mesmo a calhar, para que se perceba a mais-valia da Europa.
A desinformação deve ser, por nós, europeus, entendida nos seguintes termos: informação verificável, falsa
ou enganosa, criada, apresentada e divulgada para ganho económico ou para enganar intencionalmente o
público e suscetível de causar danos públicos, que incluem ameaças aos processos democráticos e a bens
públicos, como a saúde, o ambiente ou a segurança. Não são considerados desinformação — e este aspeto é,
muitas vezes, esquecido — os erros por inadvertência, as sátiras ou paródias, ou as notícias e os comentários
partidários claramente identificados.
Significa isto que é péssimo que se introduza na linguagem política, em relação a adversários políticos, a
ideia de que estão a promover fake news.
Risos do PSD.
Estão a promover a sua opinião, certa ou errada, da mesma forma que há outras opiniões.
Aplausos do PS.
Sugeriram também os peritos da União Europeia e os da Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa
que não usemos a expressão fake news, primeiro, porque ela é imprecisa e, em segundo lugar, porque está
capturada pelo Presidente dos Estados Unidos com a sua vontade de fustigar órgãos de comunicação social
prestigiados como o New York Times, o Washington Post ou a CNN.
O desafio com que estamos confrontados é este: as novas tecnologias podem ser usadas, nomeadamente
através das redes sociais, para difundir a desinformação numa escala e com rapidez e precisão de
direcionamento inéditas ou, como se provou nas eleições presidenciais americanas e brasileiras, para soprar ao
ouvido dos eleitores mentiras que lhes caem no goto ou os desgostam de ir às urnas, tudo isto apenas porque
fizeram uns tantos likes ou comentários num certo dia ou noite.
O poder das grandes plataformas é, de facto, enorme. Em cada minuto há 38 milhões de mensagens
WhatsApp, 2,8 milhões de mensagens em Snapchat, 187 milhões de e-mails, 4,3 milhões de vídeos no Youtube.
Com o advento das redes 5G, das aplicações de inteligência artificial e a massificação dos computadores
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pequeninos a que chamamos «telemóveis», esse potencial pode ser colocado ao serviço da capacidade dos
cidadãos tomarem decisões bem informadas ou, ao invés, para enfraquecer a liberdade de expressão.
O debate de hoje é sobre um projeto de resolução contendo recomendações, não é sobre um projeto de lei.
Não é nossa intenção produzir qualquer lei no que estamos bem acompanhados por 26 Estados-Membros. Só
a Alemanha, em 2017, e a França, em 2018, legislaram sobre o tema. No caso alemão, as multas enormes não
tiveram de ser aplicadas; no caso francês, o diploma fraturante demorou um ano a produzir e só em maio
saberemos se valeu a pena.
Portugal não precisa de importar esse debate fraturante. Primeiro, porque não reina cá o vazio legal;
segundo, porque, em tempo devido e em articulação com outros Estados, será transposta, na sequência de
proposta de lei do Governo, a Diretiva (EU) 2018/1808, sobre os chamados «serviços de comunicação social
audiovisual», que vai atualizar o quadro aplicável ao mundo televisivo e regular as plataformas digitais de partilha
de vídeos; e, finalmente, porque muitas das mais importantes questões que faltam abordar não precisam, nem
de perto nem de longe, de empurrão legal.
Noutros países, os media debatem estes temas, não há razão para não acontecer o mesmo em Portugal,
como, aliás, começa já a suceder. Também está a ser feita uma parceria entre a agência Lusa e a agência EFE
em matéria de verificação de factos, que é, ou será, uma arma importante de combate contra a desinformação.
Já participamos, também, na rede europeia de alerta rápido, na qual tem assento o nosso ciberembaixador, o
Sr. Embaixador Luís Barreira de Sousa. Precisamos de tudo isso.
Há dias, o DN (Diário de Notícias) divulgou a lista dos nossos 10 sites de desinformação com mais seguidores
no Facebook. Feitas as contas, somam 2 518 700 seguidores. Não é pouco! O que é oferecido a estes
seguidores não tem semelhança com os lodaçais de racismo, xenofobia e ódio que inundam redes sociais em
outros países. Por cá, temos títulos gritantes sobre fenómenos extraordinários que nunca aconteceram,
anúncios de poções miraculosas que curam tudo, dicas para eliminar gorduras, rugas e borbulhas e, até, para
recuperar cabelo. Mas não é caso para rir, não é, de facto, caso para rir, porque já daí vieram danos
reputacionais e podem vir mais, e piores. E ninguém sabe a quem podem tocar.
Em 2017, à última hora da eleição presidencial francesa foram disparados boatos sobre alegados atos ilegais
do candidato Macron. Se não tivessem tido resposta imediata, pela mesma via, teriam, provavelmente,
comprometido os resultados das eleições.
Quanto aos salpicos de cinismo que, certos dias e certas noites, encontramos nas redes sociais — cinismo
em relação à democracia —, não seria democrata quem quisesse proibir a sua livre expressão pública, nas
redes sociais ou fora delas, ou tentar decretar o pensamento único.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: Grande praga — grande, grande, grande praga — são os textos e vídeos
pilhados e republicados para atrair clicks e, com eles, rendimentos de publicidade, incluindo publicidade política.
Na internet, a ganância vive paredes-meias com o espírito de solidariedade.
Uma das pessoas responsáveis por práticas de pilhagem digital em Portugal resumiu assim a doutrina que
aplica: «Como não produzimos informação e simplesmente a republicamos, não há manipulação. Só os menos
informados poderão ser manipulados. E, nos dias de hoje, com o acesso a tudo e mais alguma coisa na internet,
só é manipulado quem quer». Notem bem: «Só é manipulado quem quer»! Não é assim. Esta falácia é um lavar
de mãos e uma apologia da passagem de informação falsa, e não pode ser aceite. É essencial promover junto
dos plataformistas e publicitários a exclusão de modelos de publicidade assentes no clickbait quando estão em
causa assuntos de natureza política — e sites de difusão de mentiras que atingem agentes políticos —,
principalmente durante o período eleitoral (pré-campanha e campanha).
Contra tudo isso foi elaborado um código de conduta, assinado em outubro de 2018 pelo Facebook. Já foram
eliminados milhares de perfis falsos, apagadas páginas fraudulentas, cortados rendimentos de publicidade, mas
é preciso mais e melhor. Os meios de queixa disponibilizados pelas plataformas são pouco conhecidos e merece
apoio do Estado a aprendizagem de como se acede a esses meios de correção.
Na nossa opinião, o consórcio Internet Segura pode ser um excelente balcão de apoio à interação com as
plataformas digitais.
Em suma, é importante que as instituições democráticas discutam estes novos desafios. O Sr. Presidente da
Assembleia da República pediu à Assembleia da República a elaboração de um relatório que ajude à ação e,
por sua iniciativa, teremos também um grande colóquio a 15 de abril, na Sala do Senado.
Vamos, portanto, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados, ao debate!
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Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado José Magalhães, a Mesa regista quatro inscrições para pedir
esclarecimentos, nomeadamente dos Srs. Deputados Pedro Filipe Soares, do BE, Carlos Abreu Amorim, do
PSD, Telmo Correia, do CDS-PP, e Diana Ferreira, do PCP.
Como pretende responder, Sr. Deputado?
O Sr. José Magalhães (PS): — Sr. Presidente, responderei aos dois primeiros Srs. Deputados e depois aos
outros dois Srs. Deputados.
O Sr. Presidente: — Tem, então, a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares,
do Bloco de Esquerda.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Deputado José Magalhães,
queria, em primeiro lugar, saudar a pertinência do tema trazido a debate.
Nós, ao contrário de outros grupos parlamentares onde pontuam Deputados que negam a existência de
campanhas organizadas de desinformação, reconhecemos que existe claramente um problema de campanhas
organizadas de desinformação que visam retirar vantagens políticas e económicas de preconceitos, ideias pré-
concebidas, contra a realidade e contra o bom nome de muitas pessoas.
Teria sido mais interessante se o PS tivesse escolhido duas coisas. Em primeiro lugar, uma marcação mais
atempada deste debate, permitindo até cumprir as regras que o PS votou e cujo cumprimento exigiu, mas que
claramente faltou na marcação deste debate. Em segundo lugar, uma demonstração da democracia, que era
expectável num tema como este, em que todos os grupos parlamentares também contribuíssem para o debate,
e não a escolha do que aconteceu, que foi rejeitar que qualquer grupo parlamentar também trouxesse a debate
as suas ideias.
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Muito bem!
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Dou-lhe um exemplo do contrário — aliás, já o anunciámos publicamente
nas jornadas parlamentares e faço-o agora em frente de todas as Sr.as Deputadas e de todos os Srs. Deputados:
no dia 20, iremos discutir a nova economia digital e como é que enfrentamos estes gigantes da economia digital,
que são também parte destas campanhas de desinformação, que retiram lucros milionários sem pagar quaisquer
impostos nos nossos países. Já apresentámos uma proposta que é conhecida de todas e de todos e, sendo um
agendamento potestativo do Bloco de Esquerda, está aberto ao contributo de todos os grupos parlamentares
para que tragam as suas ideias, as suas opiniões.
É assim que nos fazemos fortes contra estes gigantes e não, numa tentativa de colocar apenas a agenda
partidária à frente de algo que é muito mais fundamental para a democracia, ver quem é que tem aqui uma
bandeirinha para colocar neste debate. Desse ponto de vista, foi pena que o PS tenha afunilado essa sua
escolha e foi pena que o PS tenha prestado um mau serviço a um debate democrático que se quer forte para
fazer frente àqueles que estão a atacar a democracia na base de um dos seus pilares fundamentais: a confiança
na informação.
Sr. Deputado, faço-lhe duas perguntas muito diretas.
Primeira, nós apresentámos publicamente um código de conduta do partido nas redes sociais, dizendo que
estamos contra quaisquer campanhas de desinformação; que não utilizaremos perfis falsos, na nossa
publicitação, nem dos nossos dirigentes, nem dos nossos ativistas; que não compraremos seguidores nas redes
sociais; que não utilizaremos imagens ou fotografias de pessoas que depois são falsamente utilizadas em
propaganda eleitoral. Pergunto: o PS acompanha o Bloco de Esquerda nesta solução pública que já apresentou?
Nesta força de afirmação individual de um partido perante as campanhas de desinformação, o PS está disponível
para fazer o que o Bloco de Esquerda fez primeiro, antes de qualquer outro partido neste País, que foi a adoção
de um código de conduta para a sua atuação nas redes sociais?
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A segunda pergunta é a de saber se o PS considera que é com projetos de resolução que este problema se
resolve. Nós olhamos para este projeto de resolução e vemos um enorme vazio, um enorme vazio. Nós temos
uma proposta para ir onde dói mesmo a sério aos gigantes da economia digital, àqueles que, como o Sr.
Deputado dizia, ganham balúrdios de dinheiro com esta atuação, mas que são intocados nos seus lucros com
o projeto de resolução do Partido Socialista. Por isso, pergunto: o PS está disponível para, no dia 20, aprovar a
proposta do Bloco de Esquerda a fim de fazermos aqui o que o PS espanhol quer fazer e que está a ser feito
em França e noutros países europeus, que é taxar os gigantes da economia digital para que não haja uma
evasão fiscal do nosso País e para que não estejamos sempre a dar para o peditório desses gigantes da
economia digital, que ficam cada vez mais fortes, contra os nossos princípios basilares de democracia.
Estas são as perguntas que lhe deixo e espero que seja mais claro nas respostas do que o projeto de
resolução que o PS quis trazer, sozinho, a debate, na tarde de hoje.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Abreu Amorim, do
PSD.
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Magalhães, para o PSD este tema
é muito importante. As democracias modernas e maduras têm de o encarar frontalmente, preparando-se com
as defesas e antídotos que respeitem e façam respeitar a lógica democrática.
Contudo, as fake news não nasceram hoje na política portuguesa, e o PS sabe-o demasiado bem.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Em boa verdade, o PSD até esperava que o PS aproveitasse este
debate para fazer um apropriado ato de contrição ou, em alternativa, pelo menos, uma catarse no sentido que
lhe era dado na Grécia Antiga. Dizia Aristóteles: «A catarse é a purificação das almas através de uma descarga
emocional provocada por um trauma». Aparentemente, nada disso vai acontecer neste debate. Infelizmente, o
PS não reconhece os benefícios da purificação e, em lugar do ato de contrição ou da catarse, o PS parece ter
optado por uma espécie de cataplana parlamentar…
Vozes do PS: — Oh!…
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — … e, ainda por cima, sem o encanto de uma Cristina —…
Aplausos do PSD.
… sem desprimor para o Sr. Deputado José Magalhães, bem entendido —, em que tudo é amalgamado,
confundido e, sobretudo, muito bem cozido para que ninguém se lembre das origens do cozinheiro e dos seus
ajudantes.
Pois existem questões prévias a serem respondidas, se quisermos que o debate seja sério e para levar a
sério.
A revista Sábado — não estamos a falar de um site obscuro ou de uma central de fake news, estamos a falar
de um órgão de comunicação social com uma direção editorial e com jornalistas que assumem e assinam o que
escrevem —, a revista Sábado, dizia, através de documentos obtidos na «Operação Marquês», através de uma
investigação criminal, imputa ao ex-Primeiro-Ministro Sócrates a existência de um blogue, o Câmara
Corporativa, que era pago pelo «amigo» Santos Silva, um blogue anónimo porque todos os textos eram
assinados por um tal Abrantes que, entre outras atividades pouco recomendáveis, fazia a difusão de fake news.
E diz também a mesma revista que membros do Governo de então, e também do atual, colaboravam nessa
autêntica agência de fake news,…
Protestos do PS.
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… designadamente o então Secretário de Estado de José Sócrates, Pedro Marques, depois ministro de
António Costa e agora candidato a Deputado europeu e, quiçá, a comissário europeu!
Aplausos do PSD.
Repito: é a revista Sábado, não é um site de fake news!
Portanto, Srs. Deputados do PS, se queremos ser sérios e se queremos ser levados a sério neste debate tão
importante, esclareçam os portugueses: a notícia da revista Sábado, baseada em documentos de uma
investigação criminal, é verdadeira ou não? Está o PS disposto a assumir esse seu passado e a mostrar o
competente arrependimento público ou, pelo menos, está o PS disponível a desvendar aqui uma ligeira
catarsezinha?
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Filipe Soares, esta resolução é tudo
menos inocente e desprovida de consequências, porque ela é escrita sobre o Plano de Ação aprovado pela
União Europeia e que, neste momento, está a ser objeto de articulação entre os Estados-Membros para a sua
aplicação, e isso vai implicar, por exemplo, no Conselho que terá lugar no mês de março, um balanço do que foi
atingido. Nós já criámos, por exemplo, a rede de alerta rápido e temos um ciberembaixador nessa rede…
Protestos do Deputado do PSD Duarte Marques.
… e temos trabalhos em curso para a tradução do texto, para uma divulgação mais fácil. São coisas muito
concretas.
No entanto, temos um ponto de encontro muito interessante, mas está debaixo da gaveta. Vamos tirá-lo: as
nossas duas bancadas estão de acordo em como não é preciso lei nova. Não são precisas leis novas nesta
matéria, temos leis que bastem para tratar das redes sociais e de quaisquer atentados que nelas ocorram e
temos leis eleitorais que permitem eliminar quaisquer focos de violação da lei. Portanto, nesse aspeto, estamos
de acordo e acho que é um ponto muito importante.
Pergunta se acompanhamos o Bloco de Esquerda na ideia de publicar uma espécie de código de conduta.
Devo dizer que temos muitas dúvidas sobre isso,…
O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Isso é que é pena!
O Sr. José Magalhães (PS): — … porque, precisamente, uma coisa que o Plano de Ação diz, ao definir o
que são atos de desinformação, é que não dizem respeito às relações entre os partidos…
O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Mas também incluem!
O Sr. José Magalhães (PS): — Não, não! Não é «também incluem», é excluem expressamente os
comentários partidários claramente identificados.
Portanto, não imagino o Bloco de Esquerda a fazer comentários não identificados ou sórdida publicidade,
comprada e colocada por meios ínvios. Na verdade, não imagino!
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Nós não, mas há outros que sim!
O Sr. José Magalhães (PS): — Não precisam de dizer que são honestos. Não precisam, ninguém esperaria
de vós fake news apresentadas dessa forma.
Portanto, estamos de acordo.
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O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Ainda bem!
O Sr. José Magalhães (PS): — Agora vou escandalizar o Sr. Deputado Abreu Amorim.
O Sr. Deputado Abreu Amorim não consegue decidir-se, porque, por um lado, diz que o tema é muito
importante e, por outro, diz que não é importante, porque não propomos nada, não temos ideia nenhuma, não
sabemos da verdade.
Olhe, pergunte ao seu colega do Parlamento Europeu o que é que ele está a fazer a esta hora e verá que
ele está a fazer um colóquio sobre fakenews.
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Qual colega?
O Sr. José Magalhães (PS): — O Dr. Paulo Rangel.
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — E faz muito bem!
O Sr. José Magalhães (PS): — Faz muito bem! Até tenho pena de não estar a assistir.
Deixe-me ir à questão principal, que é esta: o Sr. Deputado fala da catarse como a purificação das almas,
mas, tanto quanto ainda me lembro, há almas sem emenda! São verdadeiramente perdidas, não têm salvação
possível. Receio bem que seja o seu caso!
Aplausos do PS.
Protestos do PSD.
O Sr. Deputado conhece o plano de ação aprovado pela Comissão Europeia e endorsed pelo Conselho
Europeu? Já alguma vez se deu ao trabalho de lê-lo? É que o Sr. Deputado, em vez de fazer perguntas sobre
o plano, fez perguntas sobre uma violação do segredo de justiça e o Sr. Deputado não quer, certamente, que
eu me pronuncie sobre essa matéria. Ou quer?
Protestos do PSD.
Não nos apanha nesse terreno!
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, inscreveram-se mais dois oradores para pedidos de esclarecimento.
O primeiro é o Sr. Deputado Telmo Correia, do Grupo parlamentar do CDS-PP.
Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. TelmoCorreia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Magalhães, gostaria de dizer-lhe, em
primeiro lugar, que, do nosso ponto de vista, o tema é relevante e é sério. Até diria mais — e não serei, sequer,
o primeiro a dizê-lo nesta Câmara: o tema é de tal forma relevante e de tal forma sério que não justificaria, na
nossa opinião, nenhum concurso, nem nenhuma corrida de 100 metros para ver se algum partido, sozinho, se
chega à frente ou se algum Deputado ganha o título de ser o primeiro a levantar esse mesmo tema aqui. O tema
é demasiado sério para isso.
Desse ponto de vista, o Partido Socialista poderia tê-lo abordado de outra forma, sem restringir a discussão
ao Partido Socialista, Sr. Deputado José Magalhães. Porque foi isso que aconteceu. O debate, inclusivamente,
na primeira distribuição que recebemos, começou por ser proposto sem iniciativas; a seguir, o Partido Socialista
resolveu propor uma iniciativa; e, depois, o Partido Socialista impediu os outros partidos de proporem as suas
próprias iniciativas.
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VozesdoCDS-PP: Muito bem!
O Sr. TelmoCorreia (CDS-PP): — Isso é lamentável, Sr. Deputado, porque este é um tema sério, é um tema
amplo, é um tema para ser discutido entre todos, é um tema para ser partilhado entre todos!
Portanto, à partida, tenho de lhe fazer esse reparo, perguntando-lhe se acha bem restringir a discussão ao
Partido Socialista — espero que não ache — e dizer-lhe que, de outra forma, este debate não será um fake
debate, mas será, provavelmente, small news, porque não permitirá uma discussão ampla e abrangente, como
todos gostaríamos.
Em segundo lugar, Sr. Deputado, o mais importante é sabermos do que estamos a falar e separarmos as
águas. Não se trata exatamente do mesmo tema, mas quando o Sr. Deputado diz que há uns que podem ser
responsáveis e outros que podem não ser responsáveis, diria que temos de distinguir, no plano europeu —
acompanhei vários debates sobre este tema, como, por exemplo, o debate que teve lugar na Assembleia
Parlamentar do Conselho da Europa —, quais são os regimes e os partidos que procuram, em certas
circunstâncias, beneficiar destas manobras populistas e do acesso a este tipo de registos.
Dou-lhe um exemplo: o meu partido, nesta semana mesmo, entendeu que não deveria fazer parte da família
europeia a que pertencemos o partido que governa na Hungria.
Pergunto-lhe se o Partido Socialista segue esta ideia, designadamente em relação ao que se passa em Malta,
na Roménia ou noutros países onde abusos de liberdade de expressão e abusos de direitos humanos são factos
sérios e gravíssimos, num primeiro plano e num maior plano.
É preciso separar estas águas, porque, no limite, Sr. Deputado, estamos a falar de uma realidade — concordo
com algumas opiniões não forçosamente vindas do meu espectro político — que não é propriamente uma
novidade. Ou seja, as fake news não são mais do que a versão moderna dos boatos, os boatos que estiveram
em todos os grandes acontecimentos trágicos da história, tenham eles resultado em progresso, como será
opinião de muita gente nesta Câmara, como a Revolução Francesa, ou tenham resultado em tragédias, como
foi a Segunda Guerra Mundial, e, designadamente, a perseguição aos judeus, promovida ela, desde o princípio,
por fake news, por boatos lançados precisamente contra o povo judaico.
É disso, pois, que estamos a falar. Os boatos sempre existiram, os boatos sempre existirão, o grave é que,
hoje em dia, com o mecanismo de propagação que são as redes sociais e com uma certa credibilização que
estas lhes conferem, os boatos assumem uma gravidade que nunca tinham tido antes. Esse é que é o problema,
e é com esse problema que, obviamente, temos de lidar.
Se me permite uma nota, o Sr. Deputado separa, e bem, a atuação dos políticos e dos partidos daquilo que
são as fake news. Concordo consigo. Não vou buscar o exemplo que já aqui foi apresentado, pois se fosse
pegar no caso do Dr. Pedro Marques, não pegaria na sua história antecedente, mas sim na sua declaração
recente sobre o facto de Portugal liderar nos fundos europeus, notícia que não é verdadeira, mas que não entra
neste conceito de fake news. É de uma outra coisa que estamos a falar. Aí tínhamos de ir a cada declaração
política e o candidato Pedro Marques é, obviamente, um cliente óbvio, recente e importante do Polígrafo. Mas
essa é outra matéria e outro assunto, e posso aceitar o que diz.
Portanto, de que é que estamos a falar e onde é que está a preocupação, Sr. Deputado José Magalhães? A
preocupação essencial não está na insinuação, não está nas declarações de políticos; está, fundamentalmente,
na existência das tais centrais de desinformação, que procuram lançar fake news, atuar sobre eleições, e por aí
fora.
A terminar, deixo-lhe duas perguntas muito concretas.
Recentemente, no dia 6 de novembro, o Sr. Ministro Lavrov esteve, em Espanha, reunido com o Governo
espanhol. Nessa reunião, ele terá discutido conjuntos de atuação em relação ao combate à desinformação nas
várias plataformas e uma colaboração entre a Rússia e o Governo Espanhol nessa mesma matéria. Foi o que
foi anunciado, a imprensa espanhola deu a notícia, o Ministro Borrell confirmou-a e, portanto, foi isso que esteve
em causa.
Sabendo-se que, normalmente, a acusação vem daí — não estou a fazer uma afirmação, mas seria na Rússia
que estariam centradas muitas dessas agências de informação; e deu, ainda há pouco, o exemplo das eleições
norte-americanas — e sabendo-se que, 15 dias depois, houve uma reunião com o Governo português, pergunto
se terá existido, ou não, em relação ao Governo português, um acordo semelhante, uma vez que o próprio
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Ministro Lavrov, à saída, disse que Portugal e a Rússia iriam atuar em várias áreas, designadamente na área
da internet e nesse tipo de domínio.
Não é irrelevante, Sr. Deputado. Não é irrelevante e é muito importante. O CDS perguntou ao Governo e não
obtivemos resposta, até hoje, em relação a essa matéria.
A minha segunda questão diz respeito ao facto de o conjunto de ideias que o Sr. Deputado lança poderem,
no limite, ser vistas como uma crítica ao Governo. De facto, essas ideias resultam de princípios europeus sobre
esta matéria que, supostamente, o Governo estará a seguir — todas elas. Portanto, podem até ser vistas como
uma crítica da sua parte ao Governo, por inação, mas concordamos que tenha que as apresentar, não temos
problema com isso.
Certo é que os países que mais têm lidado com esta matéria, têm-no feito com outra abordagem.
Designadamente, veja o exemplo alemão, que passou muito pelo debate, por exemplo, no âmbito do Conselho
Europeu, que é um regime sancionatório sério, severo, contra a desinformação, designadamente atingindo as
plataformas, atingindo os divulgadores.
Pergunto-lhe, Sr. Deputado, se considera ou não que esse caminho também deve ser trilhado — a França
parece também querer trilhar esse caminho; é uma preocupação legítima — ou se basta, de alguma forma, esta
atuação que propõe, seja em relação aos algoritmos, seja em relação à proteção cibernética, seja em relação
ao esclarecimento e à literacia mediática, por assim dizer.
É isso que lhe pergunto, Sr. Deputado, reconhecendo que o tema é importante, mas admitindo também que
não avançaremos muito só com esta resolução.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª Deputada Diana Ferreira, do
Grupo Parlamentar do PCP.
A Sr.ª DianaFerreira (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, gostaria desde já, Sr. Deputado José
Magalhães, de cumprimentar o Grupo Parlamentar do Partido Socialista pelo debate marcado e pelo tema que
trouxe a debate.
Sobre esta matéria, importa começar por dizer que a difusão de informações ou de conteúdos falsos, a
manipulação da informação que existe não é uma realidade nova, não é uma realidade recente, são velhas
realidades que persistem hoje e que assumem um destaque diferente, fruto também dos meios que são
utilizados para a sua divulgação, designadamente nas redes sociais, como aqui tanto temos falado. Essa é,
naturalmente, uma realidade que entendemos dever ser analisada, que nos merece atenção e, naturalmente,
preocupação.
Mas a discussão sobre a desinformação, sobre a informação falsa, sobre a difusão e promoção de conteúdos
falsos não se pode resumir à questão das redes sociais. E se é verdade que, com as redes sociais ou com as
aplicações digitais, há uma nova dimensão na divulgação de conteúdos falsos e há mesmo uma celeridade
maior nessa mesma divulgação, é também verdade que na comunicação social essa é uma realidade que
também existe e que não surge por acaso.
Hoje, temos a concentração num punhado de grupos económicos de órgãos de comunicação social, de
plataformas de média, de diferentes formas de produção e divulgação de conteúdos. Hoje, o poder da
informação está esmagadoramente nas mãos de grupos económicos que usam o poder económico que têm e
os meios dos quais são proprietários para produzirem os conteúdos que mais lhes interessam ou para
divulgarem a informação que melhor serve os seus interesses. E neste momento, neste debate, uma das
questões fundamentais que entendemos que se deve colocar é a de a quem serve a manipulação da informação
e a informação falsa que é disseminada. Essa é uma das questões que nós deixamos ao PS: quem lucra com
tudo isso?
Lembremos, a título de exemplo, as consequências das falsas informações sobre a existência de armas de
destruição em massa no Iraque, informações que mais tarde se confirmaram ser mentira, mas que, na altura, a
comunicação social dominante reproduziu, amplificando, acriticamente, tudo aquilo que a administração norte-
americana afirmou. Mentiras que foram fabricadas, que resultaram numa guerra, que resultaram na invasão e
na destruição de um país, com consequências tenebrosas para o seu povo.
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Essas são questões que nos devem fazer pensar.
O que pensa o PS sobre a mercantilização da notícia? Sobre o facto de se considerar neste momento que a
boa notícia é a notícia que vende, aquela que possa até garantir o sensacionalismo necessário para se assegurar
as audiências, porque as audiências serão depois também elas determinantes para a venda da publicidade e,
também por esse meio, para obter receitas e rendimentos?
O que pensa o PS também sobre as condições de trabalho em que é feita a produção da notícia, com
profissionais de comunicação social sujeitos a situações de grande precariedade e de baixos salários e de
atropelo a direitos laborais? Como se garante o rigor, a confirmação da notícia, a consulta dos diferentes
intervenientes de um determinado acontecimento, quando os profissionais deste setor têm fracas ou nenhumas
condições de trabalho que permitam fazer tudo isso?
Façamos, Srs. Deputados, a discussão sobre as redes sociais, sobre o contributo para desinformação, para
a disseminação da informação falsa, sobre a necessidade da educação para literacia mediática e para a literacia
digital.
Façamos essa discussão, estamos de acordo com ela, mas falemos também das questões de fundo que
importa aqui colocar: da responsabilidade da comunicação social, do facto de os proprietários dos meios de
comunicação social poderem ser os mesmos a quem pode interessar manipular e falsificar informação e que
haja também a coragem política de os enfrentar.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para responder, o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. JoséMagalhães (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Telmo Correia, este projeto
de resolução já teve vários efeitos, mas um dos efeitos positivos resulta da sua intervenção, em que não só
refere a necessidade de separar águas, como as separa, dando um exemplo, aliás muito interessante, em que
não é acompanhado pelos seus colegas do PSD, mas em que está sozinho, e bem, como é democraticamente
aceitável.
Portanto, já estamos a separar águas.
Não estamos é a fechar a porta a ninguém. O facto de termos apresentado esta resolução não significa que
outros não apresentem documentos sobre o mesmo tema ou sobre temas colaterais que possam ser apreciados
nesta sede ou em sede de Comissão e que não ouçamos sobre eles entidades competentes.
O Sr. Presidente da Assembleia da República pediu à ERC (Entidade Reguladora para a Comunicação
Social) um relatório. Quando ele vier, teremos a ocasião de o discutir. Teremos também o colóquio do dia 15 de
abril, na Sala do Senado. Aí teremos pontos de vista seguramente diferentes sobre esta matéria.
Portanto, nesta matéria, ninguém agarra na bola para a levar para casa. Pelo contrário, incentivamos a que
se leia abertamente o plano de ação e que observemos, junto do Governo, como é que ele está a ser executado.
É que há questões, como por exemplo a da literacia mediática, que não se resolvem de um dia para o outro.
Teremos ocasião de falar dessa matéria. Há outras que podem ser adotadas imediatamente. E já temos o nosso
embaixador para a cibersegurança responsável pelo sistema de alerta rápido, entre outras questões do género.
Portanto, nada nos tirará, enfim, o gesto honroso que foi debater pela primeira vez este tema na Assembleia
da República, ao abrigo de um direito potestativo, mas esperamos, sinceramente, que haja mais e muitos mais
temas e iniciativas para serem debatidas.
A Sr.ª Deputada Diana Ferreira coloca questões que julgo serem bastante pertinentes, mas que me dão um
travo de amargura. Travadas as batalhas do Código Deontológico dos Jornalistas, da Lei de Imprensa, que foi
um objetivo antes do 25 de Abril e depois do 25 de Abril e onde estão todas as boas regras para garantir que
não há notícias de encomenda, nem patifarias disfarçadas de notícia, nem nada de obscuro e indefensável,
julguei que, ao chegar à minha idade, não teria agora de batalhar ainda por isso.
Mas não há alternativa, porque a simbiose entre as redes sociais e os média tradicionais está em curso e
gera, aliás, uma outra coisa perigosíssima, que é a criação de bolhas, onde as pessoas ficam, indiferentes à
opinião dos outros, recebendo informação.
Não duvido que, quando a campanha do Presidente Trump declarou que o Papa Francisco tinha acabado de
apoiar o candidato Trump, muitos milhões de norte-americanos tenham achado isso completamente plausível.
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Terão pensado: «Pois claro, por que não? Nós somos católicos, ele também é católico, certamente apoiou». E,
no entanto, era mentira. E a diferença entre a mentira e a verdade, na era pós-verdade, é uma das grandes
batalhas da civilização. Portanto, precisamos de mais força nesta matéria e a união de forças para isso.
Quem lucra com a inverdade? Cherchez la femme! — é necessário sempre perguntar quem lucra com a
inverdade. Homem ou mulher, quem lucra com a inverdade conduz-nos diretamente à porta onde está a mão
oculta que procura manipular. É essa batalha que se consegue, por exemplo, com os verificadores de factos e
com as redes de transparência, que temos de favorecer nos órgãos de poder democráticos. Portanto, tenho
grande esperança de que nos tragam, tanto a ERC como as personalidades que convidaremos para o colóquio
do dia 15, mais ideias, mais sugestões. Não julgo que alguém nos vá trazer a ideia de fazermos uma lei à
francesa. A lei à francesa é um mistério absoluto na sua aplicação, e só no mês de maio saberemos se teve
algum efeito, nenhum efeito ou efeito negativo. Não precisamos dela. É nosso entendimento que não precisamos
dela.
Muito obrigado, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados, pelas perguntas feitas.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Peixoto, do Grupo
Parlamentar do PSD.
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: As notícias fabricadas são
intemporais. Por isso mesmo, debatê-las em qualquer altura é sempre debatê-las no tempo certo. O que é irónico
é que o tempo certo venha pela mão do partido errado. O PS e o Governo são uma credenciada e cadastrada
fábrica de fake news ou, melhor, de fake good news. Não sou eu, ou não sou só eu, a dizê-lo; é um ex-militante
socialista, Henrique Neto, que conhece bem os cantos à casa e que afirma que o PS tem a maior rede de
desinformação e de mentira existente em Portugal.
O Sr. Duarte Marques (PSD): — Bem lembrado!
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — É, por isso, interessante ouvir um partido que fala em causa própria, com
conhecimento profundo do que diz, com a cátedra acumulada e devidamente testada na matéria.
Mas, sabem, Srs. Deputados, o PS pode estar cheio de experiência, mas falta-lhe, nesta matéria, a decência,
a decência política.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Pode até estar cheio de atualidade, mas falta-lhe a moralidade.
Aplausos do PSD.
Diz quem sabe que, normalmente, quem fala de falsas notícias é quem produz falsas notícias.
Protestos do PS.
Por isso, ao agendarem este tema, fazem-me lembrar — e não levem a mal a metáfora — aquele obeso que
só consome gorduras, que come muita fast food e que sai de casa, vai à casa do vizinho e diz-lhe para só comer
vegetais e fit food — os senhores estão a comportar-se assim — ou como aquele incendiário que ateia um fogo
e, a seguir, veste o fato de bombeiro e vai aparentar que quer apagar o incêndio.
O PS e o Governo, nesta matéria, são péssimos espécimes no que diz respeito à fiel, transparente e
verdadeira informação.
Falando a sério, Srs. Deputados, sem meias-verdades, nem artifícios, porque o Carnaval foi ontem,…
Protestos do PS.
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… ponham lá a mão na consciência e vejam se a vossa ação casa com o vosso discurso. É ou não uma fake
news que o Governo passe a mensagem que aceitou retomar as negociações com os professores, transmitindo
a falsa ideia de que está disponível para chegar a acordo, e que depois, quando eles sobem o elevador e chegam
lá acima, lhes diga que não têm nada para oferecer para além daquilo que já ofereceram?
É ou não um engodo que, no último ano, o Governo e o PS tenham propalado aos sete ventos que resolveram
o problema do Novo Banco e que, agora, estejam a confrontar os contribuintes com a necessidade de lá
colocarem mais 1143 milhões de euros?
É ou não uma falsidade requintada a notícia, repetida vezes sem conta, de que nunca se investiu tanto no
Serviço Nacional de Saúde quando a verdade é que os hospitais chegaram a um degredo onde nunca antes se
tinham encontrado?
É ou não um embuste que o Governo e o PS tenham anunciado a descida do ISP dos combustíveis, que
antes era para o gasóleo e para a gasolina, que depois passou a ser só para a gasolina e que, depois ainda,
passou a ser nem para uma coisa nem para outra, porque decidiram lançar uma nova taxa de carbono, que
manteve os combustíveis cada vez mais caros e os portugueses a terem de fazer mais quilómetros com menos
dinheiro?
É ou não uma ilusão que os senhores tenham levantado a voz para propalarem a descida do custo da
eletricidade, criando, com isso, a expectativa de que todos iriam pagar menos, e que, depois, tenham vindo
corrigir, dizendo que não era para a eletricidade, era só para os contadores, e, depois ainda, que já não era para
todos os contadores, era só para alguns contadores, aqueles de menos potência, que quase 99% dos
portugueses não têm?
E é ou não é uma rasteira — desculpem a expressão — que, em face do surto das vítimas de violência
doméstica, o Primeiro-Ministro, pressionado pela sua inação, venha anunciar que vai diligenciar para que, em
72 horas, sejam aplicadas às vítimas medidas de proteção e ao agressor medidas de coação, quando umas e
outras já existem na lei desde 2015?
E é ou não é um malabarismo político que o PS e o Governo venham anunciar que pagaram a última tranche
da dívida ao FMI, quando não aliviaram o erário público, ao terem-no feito com a contração de outro empréstimo?
É ou não é fantasiosa a tirada do fim das propinas do ensino superior, que primeiro era, depois passou a ser
só para daqui a 10 anos e que agora já não se sabe bem se o é e para quando o será?
Finalmente, para não perdermos mais tempo com exemplos, é ou não é uma narrativa falsa que o Governo,
através do providencial ex-Ministro do Planeamento e Infraestruturas — hoje promovido, dentro da casa e da
família socialista, a cabeça-de-lista das eleições europeias, um verdadeiro artífice do desperdício de fundos
europeus e o escriba anónimo de um blog já hoje aqui falado —, venha, a três meses de eleições, sem dialogar
com quase ninguém, e só a olhar para a força dos votos das áreas metropolitanas, anunciar investimentos de
grande capitão, de cerca de 22 milhões de euros para 10 anos, quando, nos últimos 5, o País só conseguiu
gastar 1,5 milhões de euros, também pela mão do Governo do Partido Socialista, colocando o investimento
público nos patamares de 1970?
Srs. Deputados, para o PS e para o Governo, os fins — leia-se «ganhar eleições» — justificam os meios —
leia-se «relatos falsos». Mas lembrem-se de que estes mecanismos e processos propagandísticos só abrem
portas a um enfraquecimento da democracia e a um desastre humano que, ainda hoje, está refém de ditaduras
que se afirmaram e chegaram ao poder à custa de fake news.
A fake politic não facilita a convivência democrática; polariza, fratura, divide, cria um discurso de ódio e de
emoção e cria a visão maniqueísta de que, de um lado, estão os bons e, do outro lado, estão os maus.
O PSD não quer estar nem de um lado nem do outro, não tem essa superioridade moral. O PSD quer estar
onde sempre esteve, com a consciência tranquila, com a consciência de quem não «vende gato por lebre».
Quando antes esteve no Governo, perante dificuldades e sacrifícios, falou sempre com verdade, mesmo
perdendo votos. Teve essa imagem de marca e continua ferreamente a lutar por ela.
Na oposição, não trepa paredes para vociferar gratuitamente contra quem está no poder, só «porque sim»
ou só para fazer a manchete do dia seguinte.
Nesta matéria de falsas notícias, o PSD tudo fará para as combater, seja pela via do reforço da proteção dos
dados pessoais dos cidadãos, seja com mecanismos de capacitação das autoridades policiais para enfrentarem
o cibercrime.
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Se o PS quiser juntar-se a nós nesta missão, terá, antes, de fazer o ato de contrição que aqui também já foi
falado e, porventura, de voltar à escola para reaprender a estar na vida sem cair na teimosa tentação de se
desviar de códigos de conduta que deveriam ser invioláveis.
A sensação que nós temos, Srs. Deputados, é que o PS, neste momento, vive numa confusão tal que já não
sabe distinguir bem o que é verdadeiro e deve ser salientado do que é falso e deve ser rejeitado.
Já foi assim no tempo do PS de José Sócrates e os resultados foram os que se viram. Este PS é um
sucedâneo do anterior, pelo que, para terminar, se impõe pedir-lhe um favor: não sujeite o País a ter de regressar
a este triste e penoso passado. Deem agora o exemplo — têm essa oportunidade — que nunca antes
conseguiram dar.
Aplausos do PSD.
Entretanto, assumiu a presidência o Vice-Presidente José de Matos Correia.
O Sr. Presidente: — Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, dois Srs. Deputados, aos quais o Sr.
Deputado Carlos Peixoto, segundo informou a Mesa, responderá em conjunto.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra, em nome do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, o Sr.
Deputado Pedro Delgado Alves.
O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Peixoto, não sei se lhe dê os
parabéns, porque acho que se esforçou para não abordar, em momento algum da sua intervenção, nenhum dos
temas em debate. Mas, se esse era o objetivo, os meus parabéns!
De facto, não basta usar a palavra «ciber» e falar em cibercrime ou em proteção de dados pessoais e achar
que está a abordar o tema que está em discussão, que é o tema fake news e que tem a ver com manipulação
de informação e com a manipulação intencional por parte de quem quer manipular o funcionamento da
democracia. Este é o tema que está em discussão.
Como foi bem dito em intervenções anteriores, seja pelo Sr. Deputado José Magalhães, seja pelo Sr.
Deputado Telmo Correia, há que diferenciar aquilo que é o debate político, a diferença de opinião, a diferença
de perceção sobre factos, daquilo que é a vontade manifestada por quem se organiza para passar a perceção
de que é um órgão de comunicação social e, através deste meio, transmitir informação falsa. E este tema é
particularmente importante.
E o PSD disse: «Este tema é particularmente importante». Disse-o na intervenção do Sr. Deputado Carlos
Abreu Amorim, há pouco, e disse-o agora, para, logo a seguir, fazer o pior espetáculo possível, em termos de
demonstração do que deve ser um debate político sério sobre um tema fundamental para a estabilidade das
democracias na Europa e em Portugal, não se limitando a outra coisa que não à chicana, ao ataque ao Partido
Socialista e ao ataque ao funcionamento das instituições, que nada têm a ver com o tema.
Aplausos do PS.
É daqueles momentos em que sentimos que poderíamos estar todos, manifestamente, a puxar para o mesmo
lado, porque a todos os democratas interessa que haja perceção clara, por parte dos cidadãos, do que é
informação, mas, ao invés de participar neste debate de forma construtiva, a opção é transformar isto numa feira
de discussão de assuntos que não têm a ver com o tema.
Hoje em dia, no momento que a Europa atravessa, o tema prende-se, de facto, com o debate em torno do
que é o crescimento galopante do populismo.
O crescimento galopante do populismo recorre, efetivamente, à ideia das notícias falsas com o objetivo de
construir tudo aquilo de que se alimenta: a simplificação de temas que são complexos, bastante bem
demonstrada pelo que o Sr. Deputado há pouco fez na tribuna; a redução dos temas àquilo que não são os
temas que estão em debate mas, sim, àquilo que pode acicatar a emoção, a irracionalidade, o impulso junto dos
cidadãos, ao invés de um debate sério, sereno, sobre os temas que estão efetivamente em cima da mesa; o
convite à vitimização e ao protesto como alimento das forças que constroem oposição à democracia, mais uma
vez ao arrepio do que deve ser um debate bem construído; e, no limite — algo que não esteve patente na sua
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intervenção mas de que o populismo também se alimenta —, à ideia contrária às elites. As elites seriam algo
necessariamente negativo e esta ideia de que a informação se presta diretamente ao cidadão, que agora não
tem nenhum obstáculo ao fornecimento de informação, é particularmente danosa.
O Sr. Filipe Neto Brandão (PS): — Muito bem!
O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — E não é preciso falarmos de atividade política. Algo que hoje mais aflige
cidadãos em todo o mundo é o crescimento de movimentos como o que se opõe à vacinação e que aposta na
disseminação de informação que associa a vacinação ao autismo, produzindo um efeito devastador naquilo que
são as políticas de saúde pública.
O Sr. José Magalhães (PS): — Verdade!
O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — É isto que está em discussão a propósito das fake news: é a
manipulação, através de Estados estrangeiros, de resultados eleitorais noutros países; é a utilização de
instrumentos que devem ser protegidos, como a porta de entrada no templo sagrado da democracia, e que os
senhores desbaratam nesta intervenção, como se não fosse importante, e que, no fundo, deveria ser o tema
abordado.
Aplausos do PS.
Num momento em que, na Europa e noutros pontos do mundo, assistimos a fenómenos de cooperação
populista daqueles que se querem associar, em vários locais, para destruir as raízes da democracia — árvore
muito frágil e hoje em perigo em vários pontos da Europa —, aquilo que devemos fazer é olhar para os exemplos,
para as propostas, para aquilo que temos em cima da mesa, ver se concordamos ou não e trazer mais coisas a
debate.
Temos aqui uma proposta que resulta de um contexto europeu, no qual este debate tem vindo a ser feito,
mas sabemos que há muito mais que pode ser feito. O Bloco de Esquerda referia as próprias auto vinculações
que os partidos podem adotar no seu comportamento, aquilo que, em conjunto, nos podemos vincular a não
fazer, de forma a que os cidadãos possam distinguir muito claramente o que é sério e o que é manipulador.
São estes os dados que deveriam estar em cima da mesa, mas, infelizmente, não foi isso que retirámos da
sua intervenção.
Ainda assim, a pergunta que deixo é esta: há disponibilidade do PSD para participar seriamente neste debate,
para contribuir com propostas para este assunto? Não é para saber se no passado houve quem tenha tido uma
opinião distinta da vossa ou da nossa ou para saber se interpretamos os factos de forma diferente.
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Ah! Isso já não interessa!
O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Para terminar, o que é importante saber e o que é fundamental é a
ideia de que temos todos direito à opinião, não temos é direito aos nossos factos próprios.
Vozes do PSD: — Ah!
O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — A ideia dos fake news, dos factos próprios e da criação de realidades
alternativas é o que está a minar a democracia deste lado do Atlântico, do outro lado do Atlântico e em muitos
locais do planeta. É isso que esperamos que possa ter outra reação e outra resposta por parte do PSD.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — O segundo pedido de esclarecimentos é do Grupo Parlamentar
do Bloco de Esquerda.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Monteiro.
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O Sr. Luís Monteiro (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, o Sr. Deputado Carlos Peixoto, do PSD,
repetiu várias vezes na sua intervenção que a discussão sobre as fake news e a desinformação são um tema
importante. Estamos de acordo, apesar de o agendamento do Partido Socialista parecer ter sido feito um pouco
em cima do joelho.
Independentemente disso, a verdade é que o tema é importante. Mas também é verdade que a forma como
o Sr. Deputado colocou aqui a questão baralhou completamente toda a discussão.
Amanhã teremos um debate quinzenal, importante para escrutinar o trabalho do Governo sobre todas as
promessas que cumpriu e sobre todas as promessas que não cumpriu.
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Isto não são promessas!
O Sr. Luís Monteiro (BE): — Coisa diferente é discutirmos de que forma é que os cidadãos recebem
informação sobre como é que o Governo, ou qualquer outro órgão, desempenha as suas funções.
Portanto, resumir o debate sofre a desinformação e as fake news e relacioná-lo com a forma como o Governo
cumpre ou não as suas promessas não é, de todo, o debate que aqui está a ser feito. Isso é fugir à questão e a
minha pergunta é, justamente, esta: qual é a razão para o PSD querer fugir à discussão verdadeira das fake
news?
Quer apenas fazer um escrutínio sobre o trabalho do Governo num agendamento sobre a desinformação,
que é um problema além-fronteiras?! É exatamente isso que quer fazer, ou quer resumir o importante espaço
que temos aqui hoje para discutir mecanismos de combate às fake news?!
Não estamos apenas a falar do trabalho do Governo,…
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Também estamos!
O Sr. Luís Monteiro (BE): — … do ponto de vista daquilo que faz bem, daquilo que faz mal, daquilo que
cumpre ou daquilo que não cumpre. Estamos a discutir se chega a casa das pessoas e aos jornais, à imprensa,
a forma como o Governo, ou qualquer outra organização, faz esse trabalho e como comunica com os cidadãos.
É esse o debate que está aqui a ser feito.
Não quero acreditar que a posição do Sr. Deputado e do resto da sua bancada é justamente a posição do
seu colega de bancada que diz que as fake news e os populismos são tretas de Bruxelas. É exatamente essa a
posição que o PSD decidiu aqui tomar?
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Não foi isso que eu disse, pois não!?
O Sr. Luís Monteiro (BE): — As fake news são tretas de Bruxelas ou são, realmente, uma coisa para levar
em conta, para que todos os partidos tenham aqui um verdadeiro código de conduta e um compromisso em
relação àquilo que é uma responsabilidade de defesa do regime democrático?! Ou vamos querer menorizar o
debate e torná-lo num debate quinzenal que, na verdade, não é?
Aplausos do BE.
Protestos do Deputado do PSD Carlos Abreu Amorim.
O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Tem a palavra, para responder, o Sr. Deputado Carlos Peixoto.
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Delgado Alves, quero dizer-lhe que, na
minha ótica, não há melhor forma de traduzir uma realidade e de a levar à perceção pública da maneira mais
escorreita possível que não seja com exemplos concretos.
A Sr.ª Margarida Mano (PSD): — Muito bem!
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O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — O que tentámos fazer foi passar da teoria à prática,…
O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — É um grande teórico!
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — … foi tentar demonstrar-vos que as fake news vêm desde logo e têm muito
como origem a vossa casa.
Protestos do PS.
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Assumam!
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Se os senhores não conseguem, na vossa casa, transmitir informação fiel,
verdadeira, isenta e transparente, não podem, repito, não podem ficar zangados com o facto de, aqui, o PSD ou
qualquer outro partido denunciar a forma completamente manipulada como o Governo tem anunciado as suas
medidas e a sua política. Isto também são fake news e não contribui em nada para o aprimoramento da
democracia.
Sr. Deputado, não vi ninguém, até agora e apesar das perguntas, a responder àquela pergunta que foi feita
pelo Sr. Deputado Carlos Abreu Amorim. É ou não é verdade aquilo que diz a revista Sábado? É ou não é
verdade que havia ex-membros do Governo socialista que escreviam de forma viciada, com informações
privilegiadas, num blogue, só para enlamear as pessoas e só para criar factos que são falsos?!
O Sr. Deputado fala em populismo. Sabe onde é que mora, ou onde é que morou ontem o populismo?
A Sr.ª Margarida Marques (PS): — Na sua família política europeia!
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Vou-lhe dizer: na «casa» da Cristina Ferreira!
Risos da Deputada do PSD Rubina Berardo.
Ontem, o populismo esteve na «casa» da Cristina Ferreira, com o Primeiro-Ministro a fazer uma cataplana!
A Sr.ª Rubina Berardo (PSD): — É verdade!
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Isto é que traz o populismo para o País!
Aplausos do PSD.
Protestos do PS, do BE e do PCP.
O Sr. Deputado Luís Monteiro veio aqui como que transformando-se no INEM (Instituto Nacional de
Emergência Médica) do Partido Socialista!
Risos da Deputada do PSD Rubina Berardo.
Veio em socorro do Partido Socialista!
Sr. Deputado, nós sabemos muito bem o que fazer com este debate. O PSD sabe muito bem como é que se
combatem as fake news. O PSD quer combater as fake news. Eu disse como! O debate ainda não acabou.
O Sr. José Magalhães (PS): — Ah!
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — O PSD ainda vai voltar a falar, mas quero dizer-lhe que somos a favor da
proteção dos dados pessoais, somos a favor de uma intervenção adequada e de uma sensibilização dos
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gigantes digitais e somos a favor de um reforço da capacitação das polícias por forma a lidarem com este
fenómeno.
Sabemos disto mas tal não retira aquela que é a fonte, a origem, desta questão. E a origem desta questão
está na manipulação que, desde logo, o Partido Socialista tem feito, de forma que consideramos grave, da
informação que transmite aos portugueses. Foi só isso que quis demonstrar.
Mas não se preocupe, Sr. Deputado, porque vamos explicar ao País e aos portugueses que estamos do lado
daqueles que querem combater esta tragédia. É que há muitos de nós que já foram vítimas dela, no futuro muitos
haveremos de o ser e não sabemos a que portas é que estas questões vão bater.
Aplausos de Deputados do PSD.
O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Tem agora a palavra, para uma intervenção em nome do Grupo
Parlamentar do PCP, o Sr. Deputado António Filipe.
O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Queria fazer três referências acerca deste
debate.
Em primeiro lugar, como questão prévia, queria dizer que nos associamos à crítica que já foi feita ao Partido
Socialista sobre as circunstâncias que rodearam este agendamento, na medida em que, efetivamente, não vale
a pena estarmos a perder muito tempo a definir regras quando, depois, elas não são respeitadas por aqueles
que, neste caso, até chegaram a propô-las.
Esperamos, portanto, que não se crie um precedente com este procedimento e que as regras assumidas
sejam efetivamente respeitadas.
Quanto à questão que aqui foi colocada, o tema é, sem dúvida, pertinente. É um tema muito relevante porque
todos temos consciência de exemplos históricos em que a desinformação teve consequências catastróficas, e
há que chamar à atenção para o facto de que se as chamadas fake news, as notícias falsas, têm hoje uma
proliferação inédita, por via das redes sociais, estão muito longe de ser uma novidade, como todos sabemos.
Todos nos lembramos, como a minha camarada Diana Ferreira já aqui referiu, de toda a desinformação que
rodeou a Guerra do Iraque, mas eu diria mais: toda a desinformação que rodeou a Guerra dos Balcãs, toda a
desinformação que tem vindo a rodear a agressão à Síria, toda a desinformação em torno da situação na
Venezuela.
A Sr.ª Rubina Berardo (PSD): — Ah!
O Sr. António Filipe (PCP): — E esta desinformação está muito longe de se limitar às redes sociais, pelo
contrário, é uma desinformação veiculada diariamente através dos grandes meios de comunicação social,
através da comunicação social dominante, que se limita a repetir aquilo que o poder político e mediático pretende
que se repita. Também são fake news e também têm uma enorme gravidade.
A questão que se coloca relativamente às redes sociais, essa, é relativamente nova e suscita, de facto,
preocupações. Suscita preocupações porque aquilo que são crimes tipificados no Código Penal, tais como a
difamação ou a injúria, e que são agravados quando cometidos através da comunicação social, ficam impunes
quando cometidos através das redes sociais, dada a sua gigantesca proliferação.
Este é um problema novo para o qual não se encontrou resposta adequada. Obviamente, há que
salvaguardar a liberdade de expressão, mas há que encontrar formas de tutela do bom nome das pessoas ou
das entidades. Esta é uma questão que merece um debate profundo, um debate sério, e para a qual não se
encontrou, até agora, um antídoto adequado.
A terceira questão que queria referir, Sr. Presidente, tem a ver com o projeto que o Partido Socialista nos
traz e que vai mal ao remeter para o Plano Europeu da Ação Contra a Desinformação. Isto porque, se nos
procurarmos informar sobre o que consta exatamente deste plano — e não é fácil encontrar uma versão
portuguesa na documentação emanada das várias instituições europeias, pelo que tivemos de nos socorrer da
versão inglesa, à qual é possível ter acesso —, temos de concluir que este plano de ação da União Europeia
não é propriamente contra a desinformação. É um plano de ação de desinformação a favor da União Europeia
e da NATO (North Atlantic Treaty Organization), porque adota uma posição conjunta relativamente às ameaças
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que aquilo que a União Europeia chama de desinformação acarreta para os valores defendidos e para a ação
externa da União Europeia e da NATO.
Ora, vai muito mal por aí, porque, efetivamente, este plano de ação assume um inimigo, o diabo russo, ou
seja, a influência da Rússia nas eleições norte-americanas, a influência da Rússia no Brexit, a influência da
Rússia naquilo que está por vir. Em todas as eleições até 2020 há um espectro, que é a ameaça russa.
Parece-nos que essa é, apesar de não ter quaisquer elementos sobre a capacidade russa nesta matéria,
uma visão pelo menos redutora, sobretudo quando vemos um senhor chamado Steve Bannon, que se passeia
pelo mundo afirmando-se como o grande mentor do Presidente dos Estados-Unidos nas redes sociais, o grande
mentor da operação que levou Bolsonaro ao poder, no Brasil, e o grande mentor da extrema-direita em Espanha,
ufanando-se já de que, graças a ele e à sua grande capacidade de criação e disseminação de fake news, a
extrema-direita vai ter um grande sucesso em Espanha. Isto é extremamente preocupante. E aí a União
Europeia, quanto ao senhor Steve Bannon, coloca-se do mesmo lado da barricada, porque ele está
supostamente a defender os mesmos valores que a União Europeia pretende proteger.
Por isso é que este não é um bom plano de ação, porque não equaciona verdadeiramente a necessidade de
defender os valores democráticos, bem pelo contrário. A ideia que se dá é a de que a União Europeia pretende
reservar para si a mentira oficial e criticar tudo aquilo que possa pôr em causa a ideia de que o projeto europeu
é um «projeto maravilha», apontado à humanidade.
Seria bom que houvesse na União Europeia uma preocupação com a difusão de falsidades através da
comunicação social, mas, infelizmente, nesse plano de ação não é isso que vemos. No plano de ação, aquilo
que vemos é uma tentativa de impor uma versão oficial e rotular tudo aquilo que a contrarie, o que é muito
diferente da preocupação que nos devia trazer a este debate.
Portanto, quer-nos parecer que esta iniciativa do PS não é um bom contributo para um tema que seria muito
importante ser discutido com seriedade.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — O Sr. Deputado tem um pedido de esclarecimento. Já não tem
tempo para responder, mas, ainda assim, dou a palavra à Sr.ª Deputada Margarida Marques, se a quiser. Uma
coisa posso dar como garantida: não vai ter uma fakeanswer, porque não vai ter answer nenhuma.
Risos.
A Sr.ª Margarida Marques (PS): — Sr. Presidente, Sr.as Deputadas, Srs. Deputados, a intervenção que o
Sr. Deputado António Filipe acabou de fazer tem dois aspetos que acho interessante salientar: um primeiro
aspeto tem a ver com a legislação existente, com a capacidade e a resistência da legislação existente para lidar
com um conjunto de realidades, designadamente do domínio da imprensa, em particular naquelas que poderão
ser consideradas crime.
Essa legislação efetivamente existe e não estamos a propor nova legislação.
Vozes do PS: — Muito bem!
A Sr.ª Margarida Marques (PS): — Agendámos este debate, e é importante que ele se faça, pelo segundo
aspeto da questão levantada pelo Sr. Deputado António Filipe.
Dizia o Deputado Carlos Coelho, em novembro de 2018, o seguinte: «Não somos ingénuos e sabemos que
são muitas as forças externas — políticas, estatais, económicas e militares — que querem condicionar o
processo eleitoral, seja através de fake news, da utilização de grandes quantidades de dados para manipulação
eleitoral ou através de financiamentos a partidos extremistas que querem destruir o projeto Europeu».
O Sr. José Magalhães (PS): — Muito bem!
A Sr.ª Margarida Marques (PS): — Li expressamente esta declaração do Deputado Carlos Coelhos para
lembrar aos Srs. Deputados do PSD que é aqui que a questão efetivamente se coloca: na defesa da democracia
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europeia. Repito, na defesa da democracia europeia porque todos já percebemos que as democracias europeias
estão a ser ameaçadas e estão a sê-lo por forças desta natureza.
Esta questão é tanto mais importante quanto haverá eleições europeias dentro de três meses e é por isso
que existe este plano de contingência por parte da União Europeia, o qual foi pedido pelo Conselho Europeu à
Comissão Europeia e assenta num conjunto de pilares que têm como objetivo fundamental a defesa das
democracias europeias.
O Sr. Deputado lembrou Bannon. Bannon não manda no mundo inteiro mas, pelo menos neste momento,
está concentrado na Europa. Todos sabemos que ele está concentrado na Europa, a trabalhar na Europa e a
trabalhar para as eleições europeias.
A questão que queria colocar ao Sr. Deputado — que já não tem agora tempo para responder, mas talvez
haja tempo para responder mais tarde, na continuação deste debate — é se efetivamente entende, em primeiro
lugar, que é necessário defender as democracias europeias, e, em segundo lugar, se acha que cada Estado-
Membro pode só por si combater aquilo que é um ataque sistemático às democracias europeias. Ou seja,
considera mais eficaz um plano de ação nacional ou um plano de contingência ao nível europeu?
O Sr. José Magalhães (PS): — Muito bem!
A Sr.ª Margarida Marques (PS): — É muito importante que as instituições europeias tenham procurado,
dentro do quadro da sua capacidade legislativa, que é limitada nesta matéria, conseguir o compromisso junto
das diferentes plataformas para que elas se possam associar — o Facebook, o Twitter, etc. — no sentido de
poderem identificar fake news, verdadeiras fake news, ou seja, notícias que possam prejudicar e que possam
reorientar todo o processo de preparação das eleições europeias, pondo em causa as democracias europeias.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Dou a palavra ao Sr. Deputado Luís Monteiro, do Bloco de
Esquerda, para uma intervenção.
O Sr. Luís Monteiro (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O debate sobre a desinformação não é
um debate novo, não é um debate só nacional nem um debate só europeu. Isso exige que a análise e a
capacidade de discutir o problema também nesta Casa, na Assembleia da República, nos obrigue a abrir
fronteiras com outros intervenientes, com outros organismos e com outra capacidade de análise.
É errado assumir um debate sobre as fake news com um posicionamento meramente conjuntural sobre se é
este ou se é aquele governo que hoje toma a condição de governar o País. E é justamente por não se poder
assumir com essa ligeireza o debate sobre as fake news que, se todos os grupos parlamentares, hoje, na
Assembleia da República, assumissem o papel de atacar o Governo ou a oposição por criarem fake news em
relação àquilo que é ou deveria ser a conduta do Governo e do País, então, estaríamos a discutir a situação do
País mas não estaríamos a discutir a desinformação e as fake news.
Aliás, retornemos, por exemplo, a 2011. Em 2011, em plena campanha eleitoral para as legislativas, o então
candidato Pedro Passos Coelho jurou a pés juntos não cortar o 13.º nem o 14.º mês.
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Foi antes! Foi em abril!
O Sr. Luís Monteiro (BE): — Repito, jurou a pés juntos não cortar o 13.º nem o 14.º mês. O que é que fez,
mal chegou ao Governo? Cortou o 13.º e o 14.º mês! Estamos perante uma fake news? Não, Srs. Deputados!
Estamos perante um governante que mentiu ao País, mas não estamos perante uma situação de fake news.
É esse o problema do PSD,…
Protestos do PSD.
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… é que não sabe nem consegue fazer a diferença entre o escrutínio da ação governativa e a desinformação
altamente organizada, com agências internacionais, que adulteram a perceção pública sobre a verdade. Até
porque, Srs. Deputados, toda a gente percebeu que o então candidato Pedro Passos Coelho mentiu ao País.
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Não mentiu! Houve o memorando pelo meio! Não é verdade!
O Sr. Luís Monteiro (BE): — Não há dúvida sobre isso! Como não há dúvida de que mentiu ao País sobre
o 13.º e o 14.º mês, não estamos perante fake news, estamos perante um candidato que mentiu ao País.
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Isso serve para defender o PS!
O Sr. Luís Monteiro (BE): — Mas o debate que hoje fazemos não é sobre o que o Sr. Deputado Miguel
Morgado está a dizer na última fila, que são «tretas de Bruxelas». É um debate sobre o que nos preocupa e
preocupa-nos porque adultera resultados eleitorais, como possivelmente aconteceu nos Estados-Unidos e no
Brasil, e pode eventualmente adulterar resultados eleitorais já nas próximas eleições europeias e nas próprias
eleições legislativas. Mas, sobre essa matéria, o PSD, principalmente, nada tem a dizer sobre o assunto.
Porém, o Bloco de Esquerda tem. Apresentámos há pouco tempo a possibilidade da existência de um código
de conduta, onde todos os partidos políticos assumem uma capacidade de combater as fake news e um
posicionamento de não ter margem mínima para essa situação.
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Ah! Isso resolve tudo! Está tudo dito…
O Sr. Luís Monteiro (BE): — Apresentámos também um projeto de lei que capacita a imprensa tradicional,
nacional e local, e garante que a imprensa digital e os meios digitais tenham a obrigação de um pagamento, por
imposto, para capacitar a verdade da informação.
São as únicas alternativas que existem? Não! Mas é um passo muito importante para garantir a verdade na
informação, para garantir a defesa do regime democrático, e cá estará o Bloco de Esquerda para fazer esse
debate, hoje e no futuro.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Dado que o Sr. Deputado Luís Monteiro não regista qualquer
pedido de esclarecimento, dou a palavra à Sr.ª Deputada Vânia Dias da Silva, do CDS-PP, para uma
intervenção.
A Sr.ª Vânia Dias da Silva (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A desinformação, a
propaganda e a manipulação não fazem de todo parte de um fenómeno novo, antes pelo contrário. Foi, aliás,
em nome dele que, no século XX, com uma mole de pessoas seduzidas e manipuladas, se cometeram os crimes
mais hediondos de que há memória, sobre os quais já hoje, nesta Câmara, se falou.
Devemos, por isso, à história o combate a este velho fenómeno, agora transformado por mecanismos de
propagação mais rápidos, mais abrangentes e cada vez mais polarizados.
O admirável mundo novo da internet e das redes sociais é isso mesmo: admirável. Todo um mundo novo e
aberto, onde todos comunicamos com todos e onde todos sabemos tudo o que há para saber. A materialização
em todo o seu esplendor da teoria da ação comunicativa que Habermas idealizou.
Mas também aqui os ideais venderam ilusões. A participação massiva que a internet e as redes sociais
trouxeram é mais emocional do que racional, é mais sôfrega do que ponderada, e, sobretudo, é mais controlada
por algoritmos do que por nós próprios.
Apesar da abertura e da proximidade que a internet nos trouxe, acabamos todos a viver em bolhas, numa
visão paradoxalmente redutora e maniqueísta, em que de um lado estão os bons e do outro lado estão os maus,
sem confronto e nem combate saudável de ideias, extremando-se posições e fomentando-se ódios, vendo, no
fundo, pouco mais do que aquilo que a internet nos quer mostrar.
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Não, não são as fake news que ganham eleições e que criam os maus que os bons querem salvar, proibindo-
as, mas, sim, são as fake news, a propaganda e a manipulação que, entre outras causas mais profundas e
estruturais, ajudam a crescer fenómenos populistas de todos os lados e espectros partidários, que todos temos
o dever de contrariar.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O projeto de resolução que o PS aqui apresenta hoje dá, no essencial,
corpo ao Plano Europeu de Ação Contra a Desinformação. Felicitamos, portanto, o PS por ter trazido este
assunto à discussão. Pena é, Sr. Deputado José Magalhães, que o PS não tenha deixado que a discussão
efetivamente acontecesse. Preferiu o PS ter o exclusivo de pôr em português aquilo que na Europa se aprovou.
É uma opção regimentalmente válida mas é muito pobre, do ponto de vista do democrático, no esgrimir de
argumentos e de soluções, e esta é uma matéria demasiado séria para se comprazer em exercícios solitários.
Ainda assim, deixamos duas ou três ideias que, para o CDS, são vitais e a que o PS não dá resposta.
A primeira tem a ver com o papel do serviço público, que o projeto de resolução do PS, simplesmente, ignora
e não devia, Sr.as e Srs. Deputados, pois o serviço público tem de poder ser o garante e o fiel da balança nesta
matéria e isso podia e devia já ter sido trazido à liça.
O Sr. José Magalhães (PS): — Muito bem!
A Sr.ª Vânia Dias da Silva (CDS-PP): — O segundo aspeto que o projeto de resolução do PS não valoriza
é o da participação dos media enquanto intermediários entre as perceções e os factos. Sabemos que não é
possível proibir notícias falsas. É, aliás, inaceitável fazê-lo, na medida em que acabaríamos inelutavelmente na
antítese daquilo que queremos acautelar. Porém, sabemos todos, também, que só uma concertação dos media
para a construção de um instrumento capaz e fiável de verificação de factos permitirá uma atuação cabal contra
as notícias falsas, e sobre isso o PS diz nada.
Finalmente, o projeto de resolução do PS podia e devia ter-se concentrado em propor o estudo de soluções
como a alemã ou a francesa. O Sr. Deputado José Magalhães disse há pouco que não valia a pena. Pois o CDS
acha que valia muito a pena fazê-lo. Mas não, o PS escolheu não o fazer e escolheu não deixar que outros o
fizessem. É uma oportunidade perdida, que lamentamos, mas cá estaremos para, a seguir, voltarmos ao debate.
Fica nas cenas do próximo capítulo.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Para uma intervenção, em nome do Grupo Parlamentar do
PSD, tem a palavra a Sr.ª Deputada Margarida Mano.
A Sr.ª Margarida Mano (PSD): — Sr. Presidente, Caros Deputados: Temos hoje em debate, e sem
arrastamento de iniciativas de qualquer grupo parlamentar, porque tal não permitiu o PS, um tema tão importante
como o combate à desinformação em defesa da democracia.
Neste contexto, referimos três notas prévias.
A primeira é a de que a democracia se defende na liberdade, na pluralidade, na ética e não na penumbra de
expedientes, no silenciamento de iniciativas de outros partidos ou na busca de protagonismos mediáticos.
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Muito bem!
A Sr.ª Margarida Mano (PSD): — É sintomático da sinceridade e boa-fé do PS neste debate, quando
propositadamente silencia a possibilidade de outros grupos parlamentares agendarem iniciativas. Os bons
princípios e a ética não se anunciam, demonstram-se!
Vozes do PSD: — Muito bem!
A Sr.ª Margarida Mano (PSD): — A segunda nota tem a ver com o combate à desinformação, que se faz
com gente esclarecida e informada. O Deputado José Magalhães é reconhecidamente alguém que sabe e que
atuou, enquanto responsável, no Estado. Mas o combate à desinformação faz-se também sem excesso de
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frenesim, o combate à desinformação faz-se, seguramente, longe dos maus exemplos, conhecidos por fabricar
notícias falsas, de que este Governo e os Governos de José Sócrates não se afastam.
Finalmente, quero sublinhar que a responsabilidade não se endossa. Este é um tema onde todos somos
responsáveis, enquanto cidadãos, partidos e Parlamento. É por isso difícil perceber que para o PS, neste debate,
a sua responsabilidade se restrinja à apresentação de um projeto de resolução com recomendações ao seu
Governo para fazer o que o dito Governo já prometeu fazer. Tal só é compreensível com um PS que já começa
a desconfiar das promessas do Governo!
O Sr. José Magalhães (PS): — Olhe que não!
A Sr.ª Margarida Mano (PSD): — O Governo designou o Embaixador Luís Barreira de Sousa como
responsável por este sistema. Este assumiu fazer um balanço, no final do primeiro trimestre, de um sistema que
já estaria em pleno funcionamento, de acordo com as palavras do Ministro dos Negócios Estrangeiros. Pois
bem, o PSD conhece o plano de ação, conhece a Comunicação 236, da Comissão Europeia [COM(2018) 236],
pelo que vai hoje mesmo dar entrada de um requerimento para que venha ao Parlamento prestar contas e
informar tudo o que já foi feito neste domínio, no âmbito de um sistema que já estará a funcionar.
O PSD considera o combate à desinformação um combate de sobrevivência em defesa da democracia e da
liberdade de expressão.
Uma democracia saudável depende vitalmente de um fluxo de informação saudável, apoiado em meios de
comunicação que mantêm os seus cidadãos informados. É um pressuposto fundamental que a informação seja
fidedigna e este pacto democrático sofre quando a informação é omissa ou, pior, adulterada para servir alguma
agenda.
A desinformação é também uma arma letal contra o valor da liberdade de expressão. O PSD tem, nesta
matéria, um legado que lhe é caro e que não enjeita: os cidadãos devem comunicar livremente entre si. A
primeira responsabilidade do Estado é não interferir ou censurar mas, antes, assegurar um ambiente favorável
a um debate público pluralista e inclusivo, com liberdade de expressão. A verdade não é contingente de forças
legais ou políticas. Galileu estava sozinho e tinha razão!
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Muito bem!
A Sr.ª Margarida Mano (PSD): — A primeira responsabilidade do poder é para com a democracia, e a desta
é para com a verdade.
O combate à desinformação tem, contudo, tanto de importante quanto de complexo.
A provar que é um combate difícil está o facto de não ser suficiente legislar. A única força eficaz no combate
é a qualidade da democracia, que não se conquista por decreto. Legislar pode mesmo traduzir-se num ato
falhado, como ilustra o caso paradigmático da Malásia.
Mesmo em presença de soluções mais circunscritas e ponderadas — e temos exemplos em França, na
Alemanha, na Itália e no Reino Unido —, existe uma crítica de valor maior em democracia: o perigo de censura.
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Muito bem!
A Sr.ª Margarida Mano (PSD): — O combate à desinformação é sobretudo um combate complexo!
É certo que as notícias falsas e a manipulação da informação já vêm do mundo analógico. Que o digam os
mais velhos, com memórias reais da censura, ou escritores como Orwell, a quem a década de 40 inspirava um
temeroso 1984. O seu infame «Ministério da Verdade» surge como um duplo aviso ao nosso tempo: por um
lado, mostra-nos o poder último, destrutivo e despótico da desinformação e, por outro, o perigo de um Estado
sem noção dos seus limites, onde, passo a citar, «quem controla o passado controla o futuro; quem controla o
presente controla o passado», uma sociedade onde mesmo saber o que era falso já não bastava para chegar
ao verdadeiro.
Também é certo que deixámos que essas antigas práticas analógicas se transformassem em práticas digitais,
num mundo onde a velocidade se alterou profundamente, onde impera a lógica de rede, sem pontos nodais,
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sem gatekeepers. Confunde-se o cidadão com o editor, confunde-se o comentador com o jornalista, confunde-
se a lei e, por fim, a democracia.
A exposição dos cidadãos a uma desinformação em larga escala é um desafio para todos nós. A internet
mudou profundamente a maneira como os cidadãos acedem e interagem com a informação. A democracia
participativa e inclusiva é disso uma boa consequência, a democracia desinformada e manipulada seria disso
um péssimo resultado.
Há muito para fazer neste contexto por entidades competentes, académicos, profissionais e sociedade civil
em geral. A reflexão e a ação devem considerar três fases no processo, a primeira das quais é a da motivação.
É importante perceber as motivações que subjazem à criação das notícias falsas e assegurar que estas
atividades, lesivas para a democracia, não ficam impunes quando detetadas ou deixadas à mercê de um sistema
de justiça que não está preparado para a sua velocidade, evolução e «difusividade».
Ao nível da disseminação, é fundamental conhecer quais os principais veículos de informação falsa nos
media sociais, bem como o tipo de mensagem veiculada. É fundamental melhorar a capacidade digital e humana
de detetar a sua circulação.
Neste âmbito, a política pública tem de ter três princípios: a responsabilização das plataformas; a valorização
da intervenção cívica, em que os próprios cidadãos denunciam estas situações; e a defesa do verdadeiro
jornalismo, que, com o seu código deontológico, pode constituir o melhor antídoto às notícias falsas.
Finalmente, o impacto e perceção. É fundamental ter uma análise de quem são as pessoas que alcança e
quais as mais permeáveis.
Acima de tudo, é necessário formar cidadãos que tenham a capacidade de análise crítica da informação
enquanto agentes participativos em democracia. Ninguém tem dúvidas de que, a longo prazo, a aposta na
educação é a vacina contra todas as notícias falsas.
No entanto, esta é uma guerra que tem de ser ganha em várias frentes, estando nós, aqui, no Parlamento,
na primeira linha. Há que liderar, dando o exemplo. Estar a deliberar sobre este projeto de resolução antes que
o Parlamento saiba o que o Governo já fez ou antes de fazer um debate aprofundado sobre a matéria, é começar
mal, é demitirmo-nos da nossa responsabilidade enquanto órgão máximo da pluralidade democrática.
O Parlamento tem de assumir esta liderança na plenitude da representação dos vários partidos em termos
normativos e de fiscalização apertada das políticas públicas. Endossar as responsabilidades exclusivamente
para um Governo, qualquer que seja, é abrir as portas para instrumentalizar esse combate e condicionar o
debate público.
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Muito bem!
A Sr.ª Margarida Mano (PSD): — Um ecossistema de informação livre, pluralista e bem regulado, baseado
em exigentes padrões profissionais, é indispensável a uma saudável democracia e debate democrático. São
estas algumas palavras das conclusões da Comissão Europeia.
Se queremos combater a desinformação, comecemos, então, por este Parlamento. Só com coragem e
honestidade, no contexto do mandato democrático que todos aqui temos, poderemos apresentar, em conjunto,
as soluções de que Portugal e a nossa democracia precisam.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Uma vez que a Mesa não regista mais inscrições, dou a palavra
à Sr.ª Deputada Carla Sousa, para a intervenção de encerramento do debate desta iniciativa do Partido
Socialista.
A Sr.ª Carla Sousa (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O projeto de resolução que aqui apresentamos
e que foi debatido hoje é, de facto, um primeiro contributo para uma discussão que, perante os avanços
tecnológicos com que nos deparamos, será, por boas e más razões, um debate recorrente. Aí, saudamos,
claramente, o interesse de todas as bancadas por manter esta questão em aberto.
Nós não estamos a abordar um fenómeno novo, mas ele tornou-se mais complexo, porque a rapidez com
que a desinformação se propaga e é partilhada é muito maior; porque os meios tecnológicos ao dispor permitem
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já hoje criar desinformação, não só em texto, mas também em imagem e som, contribuindo para o caos
desinformativo; e porque a quantidade de utilizadores presentes nas redes sociais e plataformas onde ela se
dissemina é maior do que em qualquer outro meio de comunicação.
E numa altura em que o descrédito nas instituições é grande, em que os mediadores tradicionais de
comunicação estão enfraquecidos, em que a desconfiança nos políticos e nas elites impera e em que os
utilizadores passam mais tempo nas redes do que em qualquer outro lugar, os que procuram manipular a esfera
pública digital têm oportunidade de capitalizar esses níveis de insatisfação.
Como assinala o Digital News Report, hoje, a internet é uma combinação de caos desinformativo: ausência
de regras, conjunto de algoritmos que encorajam a disseminação rápida de conteúdos de baixa qualidade e de
desinformação; a própria forma como os links são partilhados nas redes sociais dificulta a identificação da
natureza dos conteúdos.
Por isso, parece-nos de suma importância alargar e amplificar os projetos de literacia mediática existentes,
porque capacitar os cidadãos para identificar e evitar a desinformação é a solução mais democrática para
restaurar a confiança nos media tradicionais, nos concidadãos e nas instituições, minimizando, assim, as
hipóteses de manipulação sem que seja sacrificada a liberdade de expressão. E, para isso, precisamos de
políticas de literacia pensadas a médio e a longo prazo,…
O Sr. José Magalhães (PS): — Claro!
A Sr.ª Carla Sousa (PS): — … com estratégias que capacitem os cidadãos, com instrumentos que lhes
permitam perceber como a esfera pública digital é moldada.
Portugal não está imune ao fenómeno da desinformação, como temos visto em notícias recentes, e os
portugueses mostram vulnerabilidades na identificação do fenómeno. No recente Eurobarómetro, 56% dos
cidadãos nacionais inquiridos afirmaram não conseguir identificar notícias falsas, não as perceber como um
problema para o País e para o funcionamento da democracia. São números que estão abaixo da média da União
Europeia, o que levou Bruxelas a afirmar que esta questão é preocupante e merece maior atenção.
Os poderes públicos e civis não estão alheios ao problema.
Como é do vosso conhecimento, foi muito recentemente assinado um protocolo entre o Ministério da
Educação e o Sindicato dos Jornalistas para a criação de um projeto-piloto na área da literacia mediática, que
prevê o envolvimento de mais de 100 professores de 40 agrupamentos de escolas e que tem como objetivo
colocar jornalistas e académicos, especialistas em media, a formar professores, para que estes ensinem e
incentivem os alunos a desenvolverem o seu espírito crítico.
Mas é possível ir mais longe e desenhar estratégias com o envolvimento de todos os elementos do
ecossistema mediático: reguladores, plataformas, velhos media, novos editores, universidades ou associações
representativas, para que juntos consigam criar um programa que capacite os cidadãos a navegar no volume
da desinformação existente on line, mas também que os faça entender como funciona a rede, como é alimentada
a economia da atenção, como funcionam as funções geradas pelo utilizador, os algoritmos, como as suas
interações e o rasto digital transformam a democracia e o mundo em que vivemos. Ensinar os cidadãos a usar
os media, mas também explicar-lhes como os media os usam a eles!
De facto, é importante que estes projetos extravasem o ambiente escolar e ocupem um espaço público,
porque os grupos vulneráveis não são apenas os estudantes nem os jovens, são também as pessoas com mais
de 55 anos e com baixo nível de formação.
O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Sr.ª Deputada, peço-lhe que termine.
A Sr.ª Carla Sousa (PS): — Vou já terminar, Sr. Presidente.
Gostaria ainda de lembrar, e já foi aqui referida, a importância dos meios do serviço público de televisão, de
rádio e da Agência Lusa. Todos eles estão a trabalhar em prol comum, com projetos de fact-checking e de
verificação de informação para serem colocados ao dispor de todos nós.
Termino, dizendo que é importante que quer a televisão pública, quer a agência de comunicação potenciem
as suas marcas e desenhem projetos para públicos diferenciados sobre o tema do combate à desinformação,
que é, no fundo, também, este combate pela democracia.
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I SÉRIE — NÚMERO 58
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Contamos com todos!
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Srs. Deputados, com esta intervenção, dou por encerrado o
debate sobre o projeto de resolução, apresentado pelo Partido Socialista, e passamos à votação.
Antes de mais, vamos proceder à verificação do quórum, utilizando o sistema eletrónico.
Pausa.
Entretanto, reassumiu a presidência o Presidente, Eduardo Ferro Rodrigues.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, o quadro regista 192 presenças, às quais se acrescentam as dos Srs.
Deputados José Magalhães e Joaquim Barreto, do PS, e Carla Barros e Cristóvão Norte, do PSD, perfazendo
196 Deputados, pelo que temos quórum para proceder às votações.
Vamos, então, votar o Projeto de Resolução n.º 2018/XIII/4.ª (PS) — Recomenda a adoção de medidas para
a aplicação em Portugal do Plano Europeu de Ação contra a Desinformação.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do BE, do CDS-PP e do Deputado não inscrito
Paulo Trigo Pereira, votos contra do PCP e de Os Verdes e a abstenção do PSD.
Srs. Deputados, chegámos ao fim dos nossos trabalhos de hoje.
A próxima reunião plenária terá lugar amanhã, quinta-feira, dia 7 de março, às 15 horas.
Em primeiro lugar, será apreciado o Voto n.º 754/XIII/4.ª (PAR) — De pesar pelas vítimas de violência
doméstica.
Seguir-se-á o debate quinzenal com o Primeiro-Ministro, ao abrigo da alínea b) do n.º 2 do artigo 224.º do
Regimento.
Está encerrada a sessão.
Eram 16 horas e 59 minutos.
Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO.